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Quinta-feira, 20 de março de 2014 I Série — Número 62

XII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2013-2014)

REUNIÃOPLENÁRIADE19DEMARÇODE 2014

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Pedro Filipe dos Santos Alves Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 6

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de lei n.º

212/XII (3.ª), do projeto de lei n.º 533/XII (3.ª) e dos projetos de resolução n.

os 982 a 985/XII (3.ª).

Ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento, procedeu-se a um debate com o Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho), que respondeu às perguntas formuladas pelos Deputados António José Seguro (PS), Luís Montenegro (PSD), Nuno Magalhães (CDS-PP), Jerónimo de Sousa (PCP), Catarina Martins (BE) e Heloísa Apolónia (Os Verdes), tendo a Presidente e todos os intervenientes no debate endereçado condolências ao PS pelo falecimento de Medeiros Ferreira, que o Deputado António José Seguro (PS) agradeceu, na qualidade de Secretário-Geral do Partido Socialista.

Com a participação do Primeiro-Ministro, a Câmara procedeu a um debate preparatório do próximo Conselho Europeu, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei de Acompanhamento, Apreciação e Pronúncia pela Assembleia da República no Âmbito do Processo de Construção da União Europeia.

Após o Primeiro-Ministro ter proferido uma intervenção inicial, usaram da palavra os Deputados António José Seguro (PS), Jerónimo de Sousa (PCP), Catarina Martins (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), José Ribeiro e Castro (CDS-PP) e Luís Montenegro (PSD), tendo o Primeiro-Ministro voltado a usar da palavra no encerramento do debate.

A Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 1 minuto.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Jornalistas,

está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 6 minutos.

Podem ser abertas as galerias.

Antes de darmos início aos nossos trabalhos, com o primeiro ponto da nossa ordem do dia, que consiste no

debate quinzenal com o Primeiro-Ministro, vou dar a palavra ao Sr. Secretário, Deputado Pedro Alves, para ler

o expediente.

O Sr. Secretário (Pedro Alves): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e

foram admitidas pela Sr.ª Presidente, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 212/XII (3.ª) —

Aprova um novo regime jurídico das assembleias distritais, que baixa à 11.ª Comissão; projeto de lei n.º

533/XII (3.ª) — Reduz para 35 horas o limite máximo do horário semanal de trabalho para todos os

trabalhadores, procedendo à 6.ª alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova o Código do

Trabalho, e à revogação da Lei n.º 68/2013, de 29 de agosto, que estabelece a duração do período normal de

trabalho dos trabalhadores em funções públicas (PCP); e projetos de resolução n.os

982/XII (3.ª) — Pela

realização dos concursos de apoio direto às artes em 2014 e por um modelo de apoio às artes mais justo e

com mais recursos (PCP), que baixa à 8.ª Comissão, 983/XII (3.ª) — Defesa das crianças e jovens com

deficiência (BE), 984/XII (3.ª) — Recusa o pagamento do défice tarifário pelos consumidores (BE) e 985/XII

(3.ª) — Manutenção de serviços no Hospital Pulido Valente, em Lisboa (Os Verdes), que baixa à 9.ª Comissão.

É tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Peço, agora, aos Srs. Deputados que ainda se encontram em pé o favor de tomarem

os seus lugares, a fim de criarmos condições na Sala para darmos início ao debate.

Como já referi, o primeiro ponto da nossa ordem do dia consiste no debate quinzenal com o Primeiro-

Ministro, ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento da Assembleia da República, o que

significa que a sua moldura não inclui uma intervenção inicial do Primeiro-Ministro. Assim, terá lugar o conjunto

de intervenções dos vários grupos parlamentares, em forma de pergunta, a que se seguirão as respostas do

Primeiro-Ministro. A ordem das intervenções dos grupos parlamentares será a seguinte: PS, PSD, CDS-PP,

PCP, BE e Os Verdes.

Srs. Deputados, como sempre, no início da tarde, a intervenção do primeiro orador tem algum ruído. Por

isso, aguardarei um pouco, para que sejam criadas na Sala as condições ótimas para o debate.

Pausa.

Vamos, então, dar início ao debate, cabendo a primeira intervenção ao PS.

Tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, começo a

minha intervenção por um assunto da maior importância para o funcionamento do regime democrático

português. Ao contrário do que anunciou a sua Ministra da Justiça, o tempo da impunidade no nosso País,

infelizmente, não acabou. Refiro-me às prescrições judiciais que envolvem ex-banqueiros.

Já todas as forças políticas tiveram oportunidade de se pronunciar, lamentando essa situação, só que o

assunto é da maior gravidade e não pode ficar apenas pelo lamento.

No Parlamento, tivemos já oportunidade de solicitar a presença do Conselho Superior da Magistratura.

Também por nossa iniciativa, transmitimos esta nossa profunda preocupação ao Sr. Presidente da República.

Sendo fiéis ao princípio da separação de poderes, consideramos que há um único Estado de direito

democrático em Portugal. Por isso, quero aqui afirmar a disponibilidade do Partido Socialista para, em

cooperação com todos os outros grupos parlamentares, avaliar, do ponto de vista legislativo, quais as

alterações que devem ser efetuadas, com bom senso, para evitar situações como estas, designadamente a

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possibilidade de certos mecanismos de recurso suspenderem os prazos de prescrição, dentro de certos

limites.

Não quero com isto dizer que este caso em concreto ou os casos concretos tenham a ver com os prazos.

Esses casos concretos devem ser avaliados e apuradas as respetivas responsabilidades. Se houve

prescrição, há responsáveis e os responsáveis têm de ser responsabilizados por esta situação lamentável.

Todos os órgãos de soberania devem cooperar para evitar situações como esta.

Este é o primeiro ponto que lhe quero aqui trazer.

Na minha segunda questão quero confrontá-lo com aquilo que consideramos ser a perseguição do seu

Governo aos trabalhadores portugueses, trabalhadores públicos e trabalhadores do setor privado.

Para além de o senhor ter promovido o maior aumento de impostos da nossa democracia — cerca de 33%

sobre o rendimento de pessoas singulares — e depois de ter feito cortes permanentes aos funcionários

públicos, o Sr. Primeiro-Ministro resolveu aumentar a contribuição dos trabalhadores da função pública para a

ADSE. Disse que era para garantir a sustentabilidade da ADSE.

Disse-lhe aqui, num dos últimos debates quinzenais, que estava contra e que isso não iria promover

nenhuma sustentabilidade; iria, pelo contrário, financiar a consolidação das contas públicas, o que era um

profundo erro, porque significava retirar mais rendimento, em cima do rendimento que já retirou, aos

funcionários públicos.

Vozes do PS: — Bem lembrado!

O Sr. António José Seguro (PS): — O senhor insistiu, dizendo que não. Pois bem, passou pela vergonha

de ter um veto político do Sr. Presidente da República,…

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não tem!…

O Sr. António José Seguro (PS): — … precisamente com os mesmos fundamentos que o Partido

Socialista aqui enunciou no debate quinzenal.

Mas o mais grave é o seguinte: o Primeiro-Ministro, fora de qualquer consenso que, sobre essa matéria, se

pudesse obter, o que é que faz? Num único segundo, volta a repetir o mesmo erro e a entregar na Assembleia

da República uma proposta de lei. Quero dizer-lhe que essa sua medida é uma autêntica provocação aos

trabalhadores da função pública.

Aplausos do PS.

Mas há mais, Sr. Primeiro-Ministro: as provocações não param de aumentar em relação aos trabalhadores.

Quero confrontar o Primeiro-Ministro com um anúncio que surgiu, na imprensa, de que o Governo se

prepara para reduzir o montante das indemnizações para despedimentos sem justa causa. Quer dizer, já não

basta termos mais de 800 000 portugueses desempregados, mais de 300 000 inativos e ainda, àqueles

trabalhadores que são despedidos sem justa causa, o Governo, aparentemente, através de um acordo com a

troica, prepara-se para diminuir o montante da sua indemnização.

Vozes do PS: — Uma vergonha!

O Sr. António José Seguro (PS): — Isto é inaceitável e é imoral, numa democracia e num Estado de

direito democrático.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António José Seguro,

ouvi com muita atenção o que referiu a propósito das prescrições que vieram a público envolvendo processos

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que estavam a correr entre o Banco de Portugal e a justiça, sobre atividades que banqueiros tiveram no

passado próximo.

Quero dizer ao Sr. Deputado que, como Presidente do PSD, também tive oportunidade de me pronunciar

publicamente sobre essa matéria, e, como Chefe do Governo, que é uma qualidade diferente, não podendo

deixar de respeitar, como o Sr. Deputado disse, e bem, a separação de poderes, não posso deixar de o

acompanhar no objetivo de promover, junto da Assembleia da República, que é o órgão de soberania

adequado para poder fazer essa avaliação, todas as diligências que forem necessárias não apenas para

apurar responsabilidades e saber o que se passou mas também para poder atuar sobre as causas desses

fundamentos, se isso estiver no alcance legislativo.

Não creio que a Sr.ª Ministra da Justiça esteja distraída relativamente a essa matéria e, portanto, quero

dizer à Câmara que o Governo acompanhará o processo que vier a ser desencadeado, em termos

parlamentares, para poder cooperar no sentido de evitar que estas situações possam voltar a ocorrer ou que,

tendo ocorrido, não por razão de entorse legislativo mas por outro tipo de responsabilidades, a

autogovernação das próprias magistraturas saiba retirar daí as devidas consequências.

Julgo que isso é essencial para repor a confiança dos cidadãos na justiça.

Quanto ao enquadramento geral que o Sr. Deputado faz relativamente aos trabalhadores, suscita o Sr.

Deputado a questão da ADSE. Aliás, no resto, creio que não trouxe nenhuma novidade. Todas as medidas

que aqui enumerou foram medidas que este Governo, com os partidos que o suportam, a maioria, aqui, no

Parlamento, corajosamente, tem vindo a adotar no sentido de cumprir os objetivos de redução do nosso défice

público.

O Sr. Deputado diz que passei pela vergonha de ter de encarar um veto político do Sr. Presidente da

República. Sr. Deputado, não é vergonha nenhuma! O Sr. Presidente da República, no uso dos seus direitos

constitucionais, pode entender promulgar ou não promulgar e devolver ao Governo os decretos, como pode

devolver ao Parlamento as leis. Cabe ao Governo, também nos termos dos seus poderes constitucionais,

procurar ultrapassar esses designados vetos, nomeadamente através da forma que o Governo utilizou,

convertendo o diploma numa proposta de lei e enviá-la para o Parlamento, para que o Parlamento a possa

discutir e, eventualmente, aprovar.

Quero dizer-lhe, Sr. Deputado, que, como publicamente já expliquei, o Governo mantém a importância da

medida que tomou. E, nessa razão, embora respeitando aquilo que é uso constitucional do Sr. Presidente da

República, não quero deixar de reiterar a relevância deste diploma, que tem um enquadramento simples: o

Estado comprometeu-se a garantir, até 2016, o autofinanciamento da ADSE; antecipámos esse

autofinanciamento na sequência de uma decisão do Tribunal Constitucional relativamente às pensões públicas

que deveriam ter convergido para a regra da segurança social.

Nessa altura, o Governo tomou duas medidas: uma foi esta, a de antecipar a elevação, para 3,5%, das

contribuições dos beneficiários da ADSE, já no ano de 2014; a outra foi a de alargar o valor de rendimento da

contribuição de referência para a contribuição extraordinária de solidariedade, baixando-o dos 1350 € para os

1000 €. Isto, Sr. Deputado, como foi anunciado publicamente, corresponde à intenção do Governo de respeitar

aquilo que foi acordado, juntamente com a troica, em relação ao objetivo do défice para 2014.

Portanto, sim, Sr. Deputado, estas duas medidas visam a consolidação das contas públicas, mas visam

mais do que isso, designadamente a da ADSE visa a autossustentabilidade do sistema, que, no caso da SAD

(Serviços de Assistência na Doença) e da ADM (Assistência na Doença aos Militares das Forças Armadas)

será ainda deficitário ao longo deste ano. No caso da ADSE — é verdade! — está previsto um excedente em

2014, mas está previsto que esse excedente fique justamente afeto às despesas futuras da própria ADSE,

portanto, afeto ao conjunto dos beneficiários que, com as suas contribuições, pagam as coberturas deste

seguro de saúde que é a ADSE.

Vozes do PS: — Ah!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Portanto, Sr. Deputado, não posso acompanhá-lo quando diz que se trata de

uma provocação aos trabalhadores; trata-se, simplesmente, de dotar a própria ADSE de condições de

sustentabilidade de futuro, e creio que a Sr.ª Ministra das Finanças ainda ontem teve oportunidade de, na

Comissão de Orçamento e Finanças, justificar bem os motivos por que nos parece que essa

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autossustentabilidade não pode ser vista apenas numa base de anualidade, de orçamento anual, mas, sim,

numa base plurianual.

Nessa medida, Sr. Deputado, como eu próprio tive ocasião de informar o Sr. Presidente da República,

parece-nos que a iniciativa mantém toda a pertinência.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, sobre o seu acordo com a

troica para diminuir o montante das indemnizações por despedimento por justa causa, V. Ex.ª nada referiu.

Volto a dar-lhe a possibilidade de se referir a esse assunto.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado, não há nenhum acordo. Foi mencionado que o

Governo exploraria com os parceiros sociais a possibilidade de diminuir o diferencial que existe hoje entre os

montantes a pagar em caso de indemnização por despedimento sem justa causa face aos montantes que

devem ser pagos no despedimento por justa causa.

Como o Sr. Deputado sabe, esse diferencial não existia antes desta última alteração, o que significa que,

depois de a mesma ter ocorrido, existe uma arbitragem grande que pode vir a ser explorada no sentido de

procurar obter junto do tribunal a confirmação de que não há um despedimento por justa causa mas, sim, um

despedimento sem justa causa para poder haver lugar à retribuição que tem, nesta ocasião, um diferencial

significativo.

Protestos do PS e do BE.

Sr.ª Presidente, normalmente, reajo bem a todos os apartes feitos na Sala, mas peço a sua ajuda para que

os Srs. Deputados criem as condições para que eu possa responder. Julgo que isso é do interesse do Sr.

Deputado interpelante.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, os à partes repetidos, às vezes, são perturbadores; a Mesa tem

sempre uma esperança de que eles parem e é por isso que, por vezes, intervém mais tarde.

Peço aos Srs. Deputados para terem algum cuidado em não reiterarem os apartes.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, os à partes são bem-vindos, fazem parte do debate

parlamentar, mas a permanente insistência em à partes dificulta realmente quer quem questiona quer quem

responde.

A Sr.ª Presidente: — É essa a questão, Sr. Primeiro-Ministro.

Faça o favor de continuar.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, concluindo, gostaria de dizer ao Sr. Deputado que não existe,

portanto, nenhum acordo. O que existe é uma vontade, que ficou expressa, de explorar com os parceiros

sociais a eventual necessidade de vir a corrigir este diferencial. Não temos nenhuma ideia preconcebida nesta

matéria e não deixaremos de conversar com os parceiros sociais sobre ela.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, diz que não há nenhum acordo,

que há uma vontade expressa.

Sr. Primeiro-Ministro, sinceramente, já sabemos o que significa a semântica do Governo quanto a

requalificação e despedimentos; aqui, com certeza, estamos segundo a mesma matriz, a falar rigorosamente

do mesmo, isto é, em reduzir os montantes de indemnização por despedimento sem justa causa.

Sr. Ministro, quero dizer-lhe que esta situação é um verdadeiro atentado aos trabalhadores, acontecendo

num momento de grandes dificuldades e de crise social. Isto é, já não basta o trabalhador ser despedido sem

justa causa como ainda lhe vão diminuir a indeminização a que tem direito por lei.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Claro!

O Sr. António José Seguro (PS): — Quero dizer-lhe que o Partido Socialista não aceitará nenhuma

alteração àquilo que neste momento existe que ponha em causa os direitos dos trabalhadores.

Aplausos do PS.

Uma segunda questão diz respeito aos trabalhadores da função pública.

Sr. Primeiro-Ministro, é claro que o Sr. Presidente da República tem todo o direito ao veto político. Não lhe

falo no reconhecimento desse direito — era o que mais faltava! —, o que lhe falo é da justificação e da

fundamentação.

Aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro aqui refere é que vai haver um excedente este ano. Demorou a

reconhecê-lo. Lembra-se? Quando fizemos aqui esse debate, só há segunda ou à terceira é que o Sr.

Primeiro-Ministro reconheceu.

Vozes do PS: — Bem lembrado!

O Sr. António José Seguro (PS): — Mas reconheceu! E o que é que significa reconhecer que há

excedente? Significa que o senhor está sempre a ir além daquilo que é necessário. Foi assim em relação ao

Memorando e é também assim em relação a esta matéria concreta.

Vozes do PS: — Exatamente!

O Sr. António José Seguro (PS): — Estamos a falar de 0,1% do PIB, Sr. Primeiro-Ministro. Se os

trabalhadores da função pública não tivessem de pagar mais impostos, não tivessem de receber menos salário

por sua opção, naturalmente que um ponto percentual de aumento de contribuição para a ADSE não faria mal

ao mundo. O que aqui está em causa verdadeiramente é que o senhor está a ir de novo ao bolso, neste caso,

dos trabalhadores da função pública. Cada vez que o senhor ouve «público», aí está, carrega mais no

acelerador, neste caso contra os trabalhadores da função pública! Isto não é aceitável.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Uma vergonha!

O Sr. António José Seguro (PS): — Ir para além daquilo que é necessário, Sr. Primeiro-Ministro, contribui

para que o nosso País esteja numa situação de maior pobreza e de maior desigualdade.

Recordo-lhe o relatório da OCDE agora conhecido. O relatório sublinha que o esforço dos portugueses foi

superior ao da média dos países da OCDE. O relatório da OCDE agora conhecido sublinha que Portugal é o

País mais desigual da Europa e que a população portuguesa com mais rendimentos tem mais benefícios do

que aquela que vive com mais dificuldades.

Em Portugal, todas as semanas são destruídos 2700 postos de trabalho. Sr. Primeiro-Ministro, podemos ter

melhor ou pior opinião sobre a situação do País, mas há uma coisa que temos de reconhecer, que, aliás, todos

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reconhecemos e a esmagadora maioria do povo português sente-o: de facto, os portugueses estão pior e o

País está pior. Se a vossa sensibilidade é a de que «bem, os portugueses estão pior mas o País está melhor»,

não vos acompanhamos nessa ausência de sensibilidade em relação à situação do País.

Aplausos do PS.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, a sua receita e a sua estratégia orçamental têm, infelizmente, um custo

pesado para os portugueses. O País está hoje pior do que há dois anos e meio, está mais pobre e está,

infelizmente, mais desigual.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra, embora já disponha de muito pouco tempo.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, o Governo sempre

considerou que havia um excedente na ADSE, portanto, isso não é novidade. O que dissemos foi que o

Governo não iria apropriar-se desse excedente para a despesa pública. Esse excedente está na ADSE para

cobrir despesa futura, e essa despesa vai aumentar, Sr. Deputado. Portanto, o Governo reitera aquilo que

disse então, ou seja, teremos no futuro um crescimento das despesas da ADSE.

O Sr. António Gameiro (PS): — Mas porquê?

O Sr. Primeiro-Ministro: — Volto a dizer que nos casos da SAD e da ADM, mesmo com este aumento da

contribuição, os subsistemas são deficitários anualmente. No caso da ADSE não será assim, mas, em primeiro

lugar, trata-se de um seguro…

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Um seguro?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … que, comparado com todos os outros que são hoje conhecidos, tem um

nível de cobertura associado a um custo extremamente vantajoso para todos; em segundo lugar, trata-se de

um sistema voluntário e, portanto, só contribui quem assim o deseja; e, em terceiro lugar, as despesas irão

aumentar nos próximos anos inevitavelmente, na medida em que o sistema está aberto a funcionários públicos

cujo número não tem vindo a aumentar mas, sim, a reduzir, e os seus beneficiários não são só funcionários

públicos mas também pensionistas, que, com o passar dos anos, têm, evidentemente, maiores necessidades

de despesa nesta área.

Portanto, Sr. Deputado, digo-lhe, como disse ao Sr. Presidente da República, respeitando sempre os

argumentos de quem diverge, de quem tem outra opinião, que, do nosso ponto de vista, os próximos anos

devem ser vistos, também no que concerne à ADSE, com prudência. Não de maneira a penalizar os seus

beneficiários mas, prudentemente, a protegê-los no médio e longo prazos.

Diz o Sr. Deputado que os portugueses estão pior por causa da receita do Governo. Sr. Deputado, a

verdade é que a receita que o Governo tem vindo a aplicar é aquela que é determinada pelas condições

objetivas que o País tem vivido desde 2011.

O Sr. José Junqueiro (PS): — O País está pior!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Portanto, Sr. Deputado, julgo que conhece bem a resposta que o Partido

Socialista deve ouvir nesta ocasião. A receita adotada é a que se destina a um País que tem uma dívida e um

défice elevados. Essa dívida e esse défice elevados devem-se, no essencial, não aos défices gerados por este

Governo mas, sim, por Governos anteriores.

Sr. Deputado, seria bem-vinda mais alguma compreensão e espírito de compromisso quando o que

verdadeiramente este Governo está a fazer é a corrigir desequilíbrios que foram herdados, em Portugal, por

todos os portugueses, em 2011.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o consenso de que o País

precisa já existe e é reconhecido internacionalmente. Portanto, sobre esse assunto nem mais uma palavra.

Aplausos do PS.

Devo dizer-lhe também que há outro consenso de que o País precisa, e esse consenso existe — existe no

País, existe socialmente e existe politicamente, em especial nos partidos da oposição. Quem está fora desse

consenso é o Governo e o Primeiro-Ministro.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. António José Seguro (PS): — Nunca negámos a necessidade do equilíbrio das contas públicas e

nunca precisámos de nenhuma reunião nem de apelos ao consenso para aqui o afirmarmos em todas as

ocasiões e para votarmos todos os instrumentos legislativos para o efeito.

Mas o Sr. Primeiro-Ministro não quer olhar para o outro lado, porque esse é apenas uma parte do

problema; a outra parte é a vida concreta dos portugueses. Olho para o País e este não é o País que eu

quero, Sr. Primeiro-Ministro — um País onde não há esperança; um País onde há mais de 800 000

portugueses desempregados; um País onde há mais de 310 000 portugueses em idade de trabalhar e que já

desistiram porque não conseguem encontrar emprego; um País que vê sair todos os anos dezenas de

milhares de portugueses para trabalharem fora de Portugal; um País que tem uma classe média

completamente destruída. É para esse País que as políticas têm e fazem sentido.

Ora, na sociedade portuguesa esse consenso existe, colocando a prioridade no emprego, colocando a

prioridade no crescimento económico. O crescimento económico também ajuda a equilibrar as contas

públicas. Do que o País precisa é de reformas, não é de cortes.

Mas o Sr. Primeiro-Ministro só se lembra de falar num consenso — depois, não é capaz de explicar o que é

em concreto — sabe quando? Quando acorda com a troica fazer cortes! Cortes onde? Nas funções sociais do

Estado, na saúde, na educação, na proteção social dos portugueses, ao aumentar os impostos. Foi assim em

2012, com os 4000 milhões de euros, foi assim em 2013 e é assim em 2014.

Quando o Governo está em dificuldades volta-se para o PS, mas não é para dar passos no sentido daquilo

que o PS defende ou das suas soluções. Não, é para dizer ao PS: «venham cá certificar a nossa política». Nós

nunca certificaremos a vossa política. Sabe porquê? Porque, desde o início, estamos em oposição à vossa

política.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Luís Montenegro, no dia em que nos

despedimos de José Medeiros Ferreira, queria deixar ao Sr. Deputado António José Seguro e ao Partido

Socialista, em particular, a manifestação do nosso sentido pesar.

Passando ao Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro, para formular as

suas perguntas.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, aproveito para endereçar também, em nome do Grupo

Parlamentar do PSD, um cumprimento ao Sr. Deputado António José Seguro, ao Grupo Parlamentar do

Partido Socialista e ao Partido Socialista pelo falecimento de José Medeiros Ferreira, que connosco partilhou

muitos debates nesta Câmara, entre outra atividade cívica, política e académica em Portugal, que merece todo

o nosso apreço. Apresentamos as nossas condolências à sua família e ao Partido Socialista.

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Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, em nome da bancada do PSD, queria também concordar com as

palavras do Sr. Deputado António José Seguro a propósito da avaliação que cumpre fazer, em sede

parlamentar, do regime da prescrição.

Com respeito pelo princípio da separação de poderes, estaremos sempre em tempo, no Parlamento, para,

antes de mais, tentar esclarecer o País sobre aquilo que sucedeu relativamente ao caso referido, mas também

para podermos avaliar o regime da prescrição no nosso ordenamento jurídico, nomeadamente a forma como

se processa o instituto da suspensão que, em sede de recurso, se possa operar quanto às prescrições.

Contudo, devo fazer notar que essa reflexão aconteceu ainda no ano passado, e ainda no ano passado

aprovámos normas, no âmbito do Código Penal, na circunstância com os votos favoráveis do PSD e do CDS-

PP e os votos contra do Partido Socialista,…

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Convém lembrar!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … onde revisitámos essa matéria. Aliás, na senda daquilo que já

tínhamos feito em 2007, aquando de uma alteração anterior também sobre este domínio, na altura seguindo

um princípio de entendimento que tinha sido subscrito pelo partido que então estava no poder, o Partido

Socialista, e pelo PSD, o maior partido da oposição, na sequência do pacto para a justiça que conjuntamente

subscrevemos e que executámos em oito das nove partes que continha.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Bem lembrado.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as

e Srs. Deputados, no PSD, mais

uma vez, estamos a tempo de podermos fazer essa reflexão, mas sempre com o espírito com que nos

conduzimos nas duas anteriores.

Sr. Primeiro-Ministro, sobre a atualidade política e o que é a vida do País e das pessoas, de facto, é notável

que hoje ainda não tenhamos aqui falado na circunstância de estarmos a dois meses de terminar o nosso

Programa de Assistência Económica e Financeira, cumprindo o prazo fixado no Memorando de Entendimento

que foi negociado pelo Partido Socialista e subscrito também pelo PSD e pelo CDS-PP.

Este é o tempo em que devemos ter presente o facto de termos cumprido todos os principais objetivos

consagrados nesse compromisso nacional que juntou os três partidos com maior representação parlamentar.

Isso significa, de resto, que temos tido a capacidade de ter as nossas finanças públicas disciplinadas, de

executar muitas das reformas estruturais previstas nesse Memorando e, simultaneamente, criar condições

para ter, hoje, em Portugal, sinais positivos que vêm do lado da atividade económica, do aumento da nossa

capacidade exportadora, e até mesmo do lado do mercado de trabalho, onde têm sido assinalados números

importantes, quer relativos à baixa da taxa de desemprego, quer relativos à recuperação da capacidade de

criação de emprego.

De resto, hoje mesmo foram conhecidos também alguns dados do Instituto Nacional de Estatística que

atestam uma melhoria, a níveis de 2010, da nossa atividade económica.

Sr. Primeiro-Ministro, é verdade que estes sinais da economia, estes sinais de recuperação da nossa

capacidade e dinâmica económica nem sempre chegam à vida quotidiana das pessoas porque o ajustamento

que fomos forçados a fazer trouxe sacrifícios. Nunca escondemos que foram pedidos sacrifícios, e grandes, às

pessoas, às famílias e às empresas.

Há, de facto, uma disparidade entre o que é a recuperação do País e o que, muitas vezes, as pessoas

sentem no seu dia-a-dia, ainda que algumas o sintam, porque hoje temos menos desempregados, por

exemplo, do que tínhamos há um ano atrás, o que significa que houve algumas pessoas que viram a sua vida

melhorada. Mas isto é importante numa relação de verdade com os nossos concidadãos: estamos no bom

caminho, sabemos que estamos a criar bases sólidas, consistentes e que apelam a que tenhamos alguma

capacidade e alguma paciência para as vermos refletidas na vida quotidiana de todos e na recuperação das

condições de vida que tivemos antes de sermos forçados a este programa de emergência.

Sr. Primeiro-Ministro, falou-se aqui de um relatório da OCDE mas não se falou de um relatório do FMI que

é importante para podermos também fazer notar que em Portugal, como em nenhum outro país da União

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Europeia, foram pedidos efetivamente mais sacrifícios àqueles que podiam dar um contributo maior e menos

sacrifícios àqueles que não podiam dar esse contributo.

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Isto foi refletido e analisado não só em países que tiveram programas de

assistência económica e financeira mas também em países que tiveram de implementar medidas de

austeridade independentemente de terem programas.

Bem sabemos que a oposição faz o discurso contrário e tenta induzir a opinião pública de que não tivemos

essa sensibilidade social. Tivemos, Sr. Primeiro-Ministro, e tanto tivemos que este resultado é inequívoco,

como não poderia deixar de ser, porque foi este Governo que, por exemplo, descongelou as pensões mínimas,

precisamente salvaguardando aqueles que têm menos rendimentos.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — É melhor ver bem os dados da OCDE!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Foi este Governo que propôs e aprovou, com esta maioria, no

Parlamento, taxas adicionais de solidariedade para os maiores rendimentos, quer singulares, quer coletivos.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Exatamente!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Foi este Governo que, inclusivamente, implementou uma taxa muito

elevada que tributa os rendimentos do capital, que, em 2011, quando o Partido Socialista abandonou o

Governo, era de 21,5% e hoje é de 28%.

Sr. Primeiro-Ministro, isto significa, contrariamente ao discurso produzido pela oposição sobre as medidas

que afetam a vida quotidiana das pessoas, que este Governo e esta maioria têm tido a sensibilidade de

proteger aqueles que são mais desfavorecidos e que, por essa via, sentem de uma forma mais intensa os

efeitos da crise.

Sr. Primeiro-Ministro, este é um tempo onde temos a oportunidade de confrontar ideias — com certeza que

sim! —, de confrontar pontos de vista, mas é também um tempo onde temos de nos concentrar no essencial,

que é pensarmos não só no que nos trouxe ao resgate financeiro de 2011, não só naquilo que nos traz a

estarmos hoje a dois meses de sair do Programa de Assistência Económica e Financeira, mas também, e

sobretudo, naquilo que vem a seguir, o que pode ser o Portugal dos próximos anos, aquilo que pode ser não

desbaratarmos nem desperdiçarmos, precisamente, este esforço e este sacrifício que afetou a vida das

pessoas, das famílias e das empresas.

Para essa projeção, Sr. Primeiro-Ministro, era importante que tivéssemos o contributo de todos os partidos,

de todos os parceiros sociais, de todas as forças vivas da nossa sociedade. Infelizmente, Sr. Primeiro-Ministro,

não temos tido, por parte do principal partido da oposição, uma disponibilidade para podermos encontrar

pontos de compromisso relativamente a aspetos importantes que têm a ver com o nosso futuro próximo. Por

exemplo, saber onde devemos colocar tetos para a nossa despesa pública para continuarmos a ter disciplina

orçamental; saber quais devem ser as prioridades do investimento público de médio prazo; saber como

devemos aproveitar os próximos fundos comunitários para podermos financiar a economia e, com isso, fazer

renascer a nossa capacidade produtiva e a nossa capacidade de a economia gerar emprego.

Esse contributo é importante para podermos, também, ter políticas que salvaguardem o Estado social, para

que possa valer àqueles que mais precisam, quando precisam.

Essa discussão, Sr. Primeiro-Ministro, pode ser feita com base em divergências, é verdade, mas tal como

aconteceu na área da justiça — e comecei esta intervenção fazendo alusão ao pacto da justiça que assinámos

em 2006, quando estávamos na oposição e o Partido Socialista estava no poder —,…

Protestos do PS.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas que grande memória!

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O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … também agora, independentemente da confrontação política,

devíamos ter a disponibilidade de todos para poder confluir no que é mais importante para a vida quotidiana

das pessoas.

Protestos do PS e do PCP.

Bem sei que há alguns — que estão, de resto, a manifestar-se — que têm uma preocupação excessiva

com as eleições…

Aplausos do PSD e do Deputado do CDS-PP Nuno Magalhães.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Vocês é que precisam das eleições!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Esta semana fomos, até, surpreendidos pelo cabeça de lista do Partido

Socialista às próximas eleições europeias, o Deputado Francisco Assis, que dizia, grosso modo, que não há

condições para haver consensos até às eleições legislativas. Só depois, e de preferência se o Partido

Socialista vencer as eleições e se o PSD e o CDS-PP mudarem de lideranças. Era, basicamente, esta a tese

do Deputado Francisco Assis e do Partido Socialista,…

Vozes do PS: — Olhe que não! Olhe que não!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … o que é duplamente grave, porque, em primeiro lugar, o pressuposto

para haver consenso é que haja eleições — isso é que é o mais importante! — e, depois, para haver

consenso, é preciso que o Partido Socialista seja liderante no Governo. Também isso é o que é mais

importante para haver consensos.

Sr. Primeiro-Ministro, nós não temos essa postura…

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

… e aqui nos reafirmamos: apesar de sermos maioritários nesta Câmara e apesar de liderarmos o

Governo, em coligação com o CDS-PP, continuamos disponíveis, quanto aos objetivos fundamentais do País

que afetam a vida das pessoas e dos que vierem a seguir a nós, para podermos encontrar pontos de

entendimento e de compromisso com o Partido Socialista.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, como já aqui afirmei mais do

que uma vez, e reitero, a capacidade de uma sociedade política para encontrar pontos de convergência e de

compromisso é um sinal de progresso, de maturidade e de desenvolvimento, e não o contrário. As sociedades

em que as instituições são mais frágeis e em que a radicalização do discurso se torna um impedimento ao

compromisso são normalmente as mais atrasadas e as que impõem aos seus cidadãos custos sociais,

económicos e políticos mais elevados.

Ter a capacidade de, a partir das divergências, conseguir identificar pontos de convergência para o futuro

é, de certa maneira, não apenas sinónimo de inteligência política mas também de capacidade para gerar

confiança no futuro e, portanto, para abrir a esperança à sociedade e não o desespero.

Por essa razão é que o Governo se tem mostrado aberto a compromissos, sabendo bem que lhe cabe

sempre a decisão em matéria de governação. E se há coisa que os portugueses sabem é que este Governo

nunca se eximiu às suas responsabilidades. Portanto, ao contrário do que muitas vezes nos é apontado, o

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Governo não usa o diálogo, a tolerância, a abertura para o compromisso como um expediente para não tomar

decisões ou para não decidir em matéria tão relevante como é, para Portugal, a matéria da estratégia

orçamental e das reformas estruturais.

Mas há uma coisa que sabemos, Sr. Deputado: é que nos termos do pedido de ajuda externa formulado

pelo País em 2011, cujo Governo, na altura, não era o mesmo de hoje, havia um entendimento muito alargado

de que só conseguiríamos recuperar a nossa autonomia se conseguíssemos, em simultâneo, estabilizar

financeiramente o País e corrigir os desequilíbrios graves que durante vários anos tornaram difícil a realização

dos direitos sociais e tornaram inevitável o custo social daquilo a que chamamos ajustamento. Não ajusta

quem quer, apenas, ajusta quem precisa de ajustar.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Evidentemente, isso era alvo de grande convergência há três anos atrás, tanto

que, quando o Partido Socialista estava no Governo, entendeu que precisávamos de reformas estruturais, de

estabilizar financeiramente o País, de reduzir o défice.

É certo que sabemos que sobretudo as metas para a redução do défice não eram realistas, como se veio a

demonstrar, e, portanto, precisávamos de as reajustar de modo a que o esforço de correção que o País tinha

de fazer para consolidar as suas finanças públicas fosse viável. E não há dúvida que conseguimos essa

correção. Quer dizer, aquilo que no início não tinha sido devidamente bem estabelecido, nós corrigimos.

Às vezes, somos acusados, pelo próprio Partido Socialista e pela oposição, de não respeitar os limites

iniciais, que eram, evidentemente, inatingíveis e que exigiriam cortes de despesa e medidas de austeridade

muito mais avultadas do que as que tivemos de adotar. Mas quando fizemos esse ajustamento, justamente

para podermos corresponder à realidade, afinal, as medidas adotadas foram excessivas, supondo, portanto,

que devíamos ter tido mais de défice do que aquilo que tivemos.

Sr. Deputado, parece-me que devemos sempre reiterar a nossa predisposição para o diálogo e para o

compromisso, e não só com o Partido Socialista, embora este partido tenha, evidentemente, especiais

responsabilidades que lhe foram conferidas pelo eleitorado. Tem não apenas as responsabilidades históricas

mas também as responsabilidades de ser o maior partido da oposição.

No entanto, um Governo e uma maioria têm de estar sempre abertos ao diálogo com todos os partidos e

com os parceiros sociais. Este Governo não deixa de promover esse diálogo e quero aproveitar a ocasião para

dizer que não deixaremos, sobre os termos em que concluiremos o nosso Programa de Assistência

Económica e Financeira e de como projetaremos uma estratégia pós-programa, de solicitar reuniões a todos

os grupos parlamentares para os podermos ouvir e com eles debater essa estratégia de médio prazo.

Mas parece-nos evidente que há aqui um diferencial que precisava de ser preenchido, encurtado. É que, há

três anos, havia a convicção de que o País precisava de fazer desvalorização interna, quer dizer, ter medidas

de correção que garantissem que o défice iria baixar e que a nossa dívida externa iria ser corrigida. Mas de

cada vez que chamamos os partidos à oportunidade de concretizarem, com ideias próprias, a estratégia

material para obter essas metas, os partidos, evidentemente, dizem que o que querem é mais défice, ou mais

tempo com mais défice, com mais financiamento, ou dizem, simplesmente, que não querem aceitar as

medidas.

Portanto, Sr. Deputado, creio que a situação está muito bem respondida. Pelos vistos, somos muitos a

convergir na ideia de que é preciso equilibrar as contas públicas, mas só alguns é que fazem alguma coisa

para as corrigir.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Como é o caso, infelizmente, do Partido Socialista, que promete fazer a demonstração só se estiver no

Governo; se não estiver, e enquanto não estiver, acha que as medidas devem competir ao Governo, não vá

isso fazer, evidentemente, com que perca alguns votos no eleitorado em cada eleição que se avizinha. Para o

Partido Socialista é melhor tratar das medidas depois das eleições e, até lá, o Governo que tome as que são

necessárias.

E não há dúvida de que o Governo toma sempre as medidas que são necessárias.

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Protestos do PS.

Sr. Deputado Luís Montenegro, tenho a certeza que não levará a mal que aproveite a sua pergunta para

completar uma resposta que, por falta de tempo, não pude dar ao Sr. Deputado António José Seguro.

Quero, no entanto, antes disso, e como, de resto, já fiz publicamente, transmitir ao líder do Partido

Socialista as minhas condolências pelo falecimento do Dr. Medeiros Ferreira, que foi não apenas um dirigente

e destacado militante do Partido Socialista, mas também uma personalidade muito relevante na democracia

portuguesa, tendo desempenhado funções públicas de grande nível que não podemos deixar de evocar.

Respondendo ao Sr. Deputado António José Seguro, que suscitou a questão do equilíbrio social, quero

dizer que, apesar de só há muito pouco tempo ter tido conhecimento do estudo que a OCDE publicou

relativamente a um scoreboard com indicadores sociais, e não tendo tido oportunidade de ler extensivamente

o texto conclusivo que o relatório exibe, tive, no entanto, muita facilidade em ver rapidamente os indicadores

que são publicados no anexo. Eles permitem-nos, pelo menos num lance rápido, ver quais são os indicadores

que suportam as conclusões, que mostram, em muitos aspetos, melhorias que são um pouco contraditórias

com aquilo que foi a síntese apresentada na comunicação social. De facto, aquilo que se consegue ver é que,

relativamente aos 10% dos portugueses com menores rendimentos, após o período de consolidação, a sua

média em termos nacionais melhorou face ao período pré-crise.

Relativamente às condições que medem a desigualdade, nomeadamente segundo o coeficiente de Gini,

também é verdade que ele diminuiu no mesmo período, passando de 0.36 para 0.34, o que significa,

evidentemente, que houve uma correção, embora muito ligeira, das desigualdades.

Isso permite-me, pelo menos, concluir — como, aliás, foi tornado público num relatório publicado pelo

Fundo Monetário Internacional em janeiro deste ano — que houve uma preocupação muito grande deste

Governo em garantir a progressividade do esforço que deveria ser pedido a cada um dos portugueses neste

processo de consolidação das contas públicas. E esse estudo também mostra que, na nossa classe de

rendimentos — a última classe, a quinta classe de rendimentos —, fez-se um esforço que é, em termos

proporcionais, o dobro daquele que foi feito pela classe mais baixa e que esse esforço foi subindo

progressivamente nos escalões de rendimento, de tal maneira que o último escalão fez o dobro do esforço do

primeiro.

Isso significa que, em seis países europeus que desenvolveram esforços mais severos de consolidação

orçamental, Portugal foi aquele em que a preocupação de progressividade foi maior, o que significa, Sr.

Deputado António José Seguro, que o Governo, apesar da tarefa que teve de concretizar a diminuição do

défice público e não de o aumentar, procurou fazê-lo com progressividade, que é, como quem diz, com

sensibilidade social.

Sr. Deputado, para alguém que também é presidente de um partido social-democrata, e apesar da crise,

isso dá muito mais satisfação do que ver exatamente o contrário, ou seja, governos que, supostamente, em

termos sociais, tinham uma inspiração idêntica ou ainda maior do que a nossa e que chegaram ao resultado

oposto.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do CDS-PP.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Queria

começar deixar duas notas prévias.

Em primeiro lugar, queria, em nome do CDS, manifestar o nosso pesar pelo desaparecimento de José

Medeiros Ferreira e para, ao mesmo tempo, endereçar ao Secretário-Geral do Partido Socialista, ao Partido

Socialista, à família e aos amigos as nossas sentidas condolências.

Em segundo lugar, gostaria de dizer, em relação ao desafio, ao repto lançado pelo Secretário-Geral do

Partido Socialista, que, para o CDS, aquilo que se passou em alguns bancos — e sublinho bem «em alguns

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bancos» — é muitíssimo grave. E quanto mais grave foi aquilo que se passou mais grave se torna que o seu

desfecho seja a prescrição.

Por isso, mais do que este pingue-pongue mediático entre instituições autónomas — e é bom esclarecer

que são instituições sem qualquer tipo de tutela por parte do Governo, portanto absolutamente autónomas —

sobre quem teve ou não mais responsabilidades nesta matéria, importa, com serenidade, e respeitando,

obviamente, o princípio da separação de poderes, ir ao encontro daquilo que os portugueses mais querem,

que é, por um lado, saber o que aconteceu e porque é que aconteceu, mas, sobretudo, evitar que se volte a

repetir. E sobre esta matéria quero ser muito claro: obviamente, haverá, da parte do CDS, como já hoje

mesmo, de manhã, aconteceu em comissões parlamentares, total disponibilidade para que assim seja.

Eram, pois, estas as duas notas prévias que queria deixar, Sr. Primeiro-Ministro.

De resto, a quase dois meses do fim do Programa de Assistência Económica e Financeira, o CDS gostaria

de referir dois temas, que entendemos serem os dois maiores desafios de Portugal, deste Governo, desta

maioria e de todos os responsáveis políticos, que são o crescimento económico e as políticas sociais.

Quanto ao crescimento económico, Sr. Primeiro-Ministro, gostaríamos de assinalar dados publicados nos

últimos dias — hoje mesmo, creio — do INE que dão conta do indicador de atividade económica de janeiro de

2014 e que, quando comparado com janeiro de 2013, registou uma subida de 2,5%, tendo o consumo privado

registado também uma subida de 2,1%, a melhor desde 2010, a melhor desde há quatro anos, a melhor desde

que tínhamos um governo que ainda proclamava que estávamos numa fase de crescimento económico.

Sr. Primeiro-Ministro, isso é importante, não só numericamente mas, sobretudo, porque revela confiança

por parte das famílias, dos investidores, das empresas nas reformas que estão a ser feitas e no caminho

percorrido. E essa confiança, que de resto já aqui foi muitas vezes referenciada, é extensível à OCDE, porque

é preciso ler não só o relatório todo como todos os relatórios da OCDE. Foi a OCDE que, há uma semana,

disse e revelou que o indicador para a economia portuguesa sobe há 20 meses consecutivos, facto que

também não ocorria há bastante tempo, tendo até salientado mais: que Portugal é o sexto país que melhor

cumpre as reformas recomendadas pela própria OCDE. Convém, pois, ler e perceber todos os relatórios que

são publicados pelo mesmo organismo.

E mais uma vez, hoje, o INE referiu que o setor da hotelaria e do turismo registou, em relação ao período

homólogo do ano anterior, um crescimento de 10,1%, com um aumento dos proventos na ordem dos 6,4%.

O Sr. João Oliveira (PCP): — E os trabalhadores com salários em atraso?!

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — São, obviamente, notícias animadoras. Estamos a falar de janeiro,

não estamos a falar de nenhuma sazonalidade. Por muito que desagrade a alguns partidos da oposição, há

crescimento num setor estratégico, como é o do turismo.

Sr. Primeiro-Ministro, dei três exemplos, como poderia ter dado muitos mais, que talvez justifiquem a

credibilidade internacional de que o nosso País goza neste momento e que é cada vez maior. De resto, esta

semana pudemos ouvir esse mesmo reconhecimento e essa mesma credibilidade da parte de um responsável

do Governo alemão, que disse: «Portugal está a fazer grandes progressos e está a começar a caminhar pelo

seu próprio pé e parece que a crise económica está a ser superada».

Não, Srs. Deputados, não foi a Sr.ª Angela Merkel quem disse isso; quem o disse foi o Sr. Frank-Walter

Steinmeier, do SPD alemão, família política do Partido Socialista. É bom assinalar este facto.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Sr. Primeiro-Ministro, perante todos estes dados e perante todos estes factos, parece-nos incompreensível

a posição que o PS parece querer assumir em Portugal. O Partido Socialista parece não querer — oxalá esteja

enganado! — contribuir para um compromisso alargado que, mais do que beneficiar este Governo ou esta

maioria, beneficiaria Portugal e os portugueses, com parece ir contra as políticas que são propostas ou

executadas por governos ou partidos da oposição da mesma família política do Partido Socialista Europeu, e

que, quando assumem responsabilidades, num ou noutro lado, defendem não o caminho da Sr.ª Merkle ou do

Sr. Hollande, mas um caminho próprio e comum para a Europa.

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Parece mesmo, Sr. Primeiro-Ministro, que, internamente, o Partido Socialista funciona como uma espécie

de travão ao compromisso e que, externamente, está em contramão, contra tudo e contra todos, contra o rumo

da Europa e contra o rumo que aqueles que lhe são próximos também estão a traçar, como o Sr. Steinmeier

ou o Sr. Hollande.

A nosso ver, não há qualquer tipo de dúvidas: o caminho tem sido difícil e os sacrifícios têm sido inúmeros,

mas é precisamente para dar sentido útil a esses sacrifícios que devemos procurar o consenso.

Disse, e bem, Sr. Primeiro-Ministro, citando o relatório do FMI, que Portugal foi o país onde houve reformas

estruturais ou ajustamentos em que as medidas restritivas foram mais progressivas, em que foi tirado mais aos

que tinham mais rendimento e menos aos que tinham menor rendimento. E isso também tem um espelho claro

no programa de emergência social que está a ser executado, mas que deve ser implementado, realçado,

sublinhado e reforçado, se necessário.

Por isso, no entender do CDS, é necessário que, a dois meses do fim do Programa de Ajustamento

Financeiro, haja bom senso e consenso, sentido de Estado e de responsabilidade, para dar sentido útil aos

sacrifícios, que foram muitos, que os portugueses passaram. Nesse contexto, o diálogo com o PS deve ser

uma prioridade, porque, a nosso ver, por muito que não queira, mais tarde ou mais cedo, será uma

inevitabilidade: na redução da dívida, para cumprir o Tratado Orçamental; na calendarização e na escolha das

infraestruturas prioritárias; no regime fiscal e laboral, para que possamos ter durabilidade nas reformas,

previsibilidade nas opções e estabilidade nas políticas.

Esse é um esforço que, creio, justifica aquele que os portugueses fizeram. O Sr. Primeiro-Ministro já disse,

mas em nome do CDS quero também afirmar que, por muito que isso possa ser dificultado, cá estaremos nós

a insistir, as vezes que forem necessárias, para que haja sentido de diálogo, de compromisso e de consenso

nestas matérias, que, repito, são estruturantes, não para este Governo, não para a maioria, mas para Portugal,

para os portugueses e com um impacto muito direto na sua vida.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, o nosso objetivo de conclusão

do Programa de Assistência Económica e Financeira não pode deixar de se interligar com a nossa capacidade

para ter pleno acesso a financiamento de mercado. Por exemplo, não é por pedir ajuda externa que um país

corrige o seu défice comercial ou o seu défice da conta corrente, não é o empréstimo que lhe é fornecido que

resolve o problema do desequilíbrio externo. O que o empréstimo que lhe é proporcionado resolve é o

problema de financiamento que o Estado é incapaz de resolver em mercado. Ora, um país que não tem

condições para se financiar, um Estado que não consegue emitir títulos do Tesouro, obrigações do Tesouro

para financiar a sua despesa pública põe em causa a realização de todos os direitos sociais e da própria ação

das políticas públicas. Portanto, quando se pede ajuda externa, o que se pretende é arranjar financiamento

que, de outra maneira, não se conseguiria arranjar — e nós conseguimos obter esse financiamento. Durante o

período que nos foi dado para fazer o ajustamento, tínhamos também de corrigir aquilo que eram os

desequilíbrios — e nós corrigimo-los. Isso é importante.

Quando dizemos que o País está melhor do que estava há três anos, é porque há três anos o País tinha

um défice da balança corrente e de capital de quase 10% do PIB e no final de 2013 tinha um excedente de

quase 2%. Isso significa que nós, enquanto economia — agora já não estou a falar apenas do Estado —, em

vez de continuarmos a endividar-nos (o Estado, as famílias, as empresas), estamos, nesta altura, a ter uma

posição que é até ligeiramente excedentária.

Claro que isso, para alguns partidos, é um problema, pois, para esses, é preferível acumular défices e

dívidas do que excedentes. Mas essa é a mentalidade que nos separa, é verdade. Julgo que, do ponto de

vista externo, acumular um excedente é melhor para futuro do que acumular défices.

Também corrigimos — não totalmente, mas demos passos importantes para corrigir — o défice interno, na

medida em que, em 2010, tínhamos um défice público de quase 10% e agora estamos a atingir, até final deste

ano, um défice público inferior a metade desse valor, de 4%, gerando também aqui um excedente primário.

Quer dizer que poderemos, só por essa via, amortizar uma parte do stock de dívida que foi acumulada durante

anos e que, nessa medida, poderemos começar a ver descer o nosso rácio da dívida, em particular se a

economia crescer. Mas a economia também está a crescer. De resto, está quase a fazer um ano que a nossa

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economia começou a crescer. Foi justamente a partir do segundo trimestre de 2013 que ela começou a

crescer.

Isso significa que a partir de abril do ano passado até hoje a economia tem estado a crescer. O

desemprego tem estado a cair, não tanto quanto gostaríamos, mas tem estado a descer. E a verdade também

é que o emprego tem estado a subir, o que é importante, quanto mais não seja para estarmos bem cientes de

que a diferença na taxa de desemprego não resulta apenas do fenómeno da emigração, que também

aconteceu, significa também que há mais oportunidades que estão a ser geradas.

Significa, portanto, que, durante estes três anos em que nos deram o dinheiro — deram-no não apenas

porque não o tínhamos de outra maneira mas também para nos dar tempo de corrigirmos os nossos

problemas —, temos estado a corrigir os problemas.

Qual é o objetivo? O objetivo é o de se criar, para futuro, uma situação mais sustentável do que aquela que

tínhamos antes.

Se todos aqueles que nos puderem financiar concordarem que o País está nesse caminho de confiança, a

gerar melhores condições para futuro do que aquelas que nos conduziram à ajuda externa, o risco associado a

Portugal baixará. E se o risco baixar, baixam as taxas de juro. E se baixarem as taxas de juro, conseguiremos

financiar-nos, no futuro, em melhores condições do que no passado.

Quanto às taxas que já hoje estamos a defrontar, seja no curto prazo, como se comprovou hoje com

emissões a 6 meses e a 12 meses,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — São insustentáveis!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … em que nós tivemos custos significativamente inferiores, sobretudo a 6

meses, àqueles que tivemos no ano passado…

O Sr. João Oliveira (PCP): — São insustentáveis!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e que são perfeitamente sustentáveis,…

Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.

… seja a 8 e a 10 anos, que são taxas ainda elevadas, mas que estão a convergir a uma grande

velocidade para taxas que também são sustentáveis, se é isso que estamos a obter do ponto de vista dos

credores externos, então isso deve querer dizer que estamos a fazer o nosso trabalho de casa bem feito.

Porque é que um compromisso, a médio prazo, em matéria orçamental, pode ajudar muito no momento em

que concluímos este exercício e vamos aceder plenamente a mercado? Porque, dado que o ciclo de governo

termina em setembro de 2015 e nós, quando emitimos dívida a 5, 8 ou 10 anos estamos a convidar os

investidores a confiar no País, não daqui até 2015,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Já está a arrumar as malas para setembro!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … mas daqui até 2020, até 2024, é muito importante que os investidores

percebam que este caminho que temos trilhado, de correção destes desequilíbrios, não vai ser abandonado no

futuro.

Ora, não existe, na maior parte dos investidores, a certeza de que outros partidos, muito diferentes e que

têm representado, ao longo dos anos, um minoria na escolha dos portugueses, possam vir, no futuro, a ter

grande influência nos resultados dos governos futuros. Mas o mais provável é que o principal partido da

oposição possa vir a defender, um dia, uma posição diferente daquela que hoje o Governo defende. E se ela

for de modo a não respeitar esta trajetória, os investidores, apesar de reconhecerem que estamos a fazer o

que devemos, poderão desconfiar que, no futuro, um outro governo, com outra orientação, possa afastar-se

dessa obrigação.

O Sr. António José Seguro (PS): — Oh!

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Por essa razão é que transmiti ao Sr. Secretário-Geral do Partido Socialista a

importância de o PS remover esse tipo de incerteza ou de risco junto dos investidores.

E isso não ajuda, em particular o Governo; isso ajuda à perceção do risco sobre Portugal e também a

melhorar as taxas de juro portuguesas. Portanto, ajuda Portugal e os portugueses.

Se o Partido Socialista, ainda para mais, concorda que é preciso, porque subscreveu o Tratado

Orçamental, reduzir o défice e cumprir uma estratégia orçamental de consolidação das contas públicas que

gira excedentes primários e que, portanto, mantenha o equilíbrio das contas, não se percebe porque não está

disposto, em vésperas de acabarmos o Programa, a acompanhar-nos no objetivo de dizer «este caminho que

temos seguido, de respeito destes objetivos, irá prosseguir».

Termino, Sr.ª Presidente, dizendo o seguinte: a credibilidade que o País tem conquistado nestes tempos

deve-se, evidentemente, à sua capacidade para acreditar em si próprio e no futuro.

Mas nós precisamos de renovar esses votos sempre que, em momentos simbólicos, isso possa ter

importância para os portugueses. E isto responsabiliza quem está no Governo e quem está na oposição.

Por essa razão é que manteremos sempre, e sempre, a disponibilidade para poder fazer compromissos,

sempre que eles forem importantes. Julgo que o demonstrámos quando estávamos na oposição, e

continuamos a fazê-lo agora que estamos no Governo.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do PCP, o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, permita-me que, em nome do PCP, e reafirmando o

nosso pesar já enviado ao Partido Socialista, apresente as nossas condolências pela morte de Medeiros

Ferreira. Naturalmente que, aquando da votação do voto a ser apresentado na próxima sexta-feira, teremos a

possibilidade de fundamentar o nosso pesar e as nossas condolências.

Sr. Primeiro-Ministro, quero fazer uma breve observação sobre a questão das prescrições.

Independentemente das responsabilidades que possam caber à justiça, porque entendemos que deve ser

responsabilizada, uma vez que a justiça portuguesa tem uma natureza própria, uma natureza de classe — é a

própria Constituição que diz que todos nós temos direito ao acesso à justiça, apesar de alguns terem mais do

que outros, tendo em conta as capacidades económicas, e daí considerarmos que essa responsabilização

deve ser feita —, o Sr. Primeiro-Ministro estará de acordo connosco, até porque as bancadas que apoiam o

Governo estiveram de acordo, esta manhã, em apoiar uma iniciativa do nosso grupo parlamentar nesse

sentido, que também é importante que o Governador do Banco de Portugal seja ouvido e explique na

Assembleia da República como foi possível o arrastamento deste processo, que não compete apenas aos

tribunais. O apuramento da responsabilidade, Sr. Primeiro-Ministro, é fundamental, até para demonstrar que o

crime não compensa, o que infelizmente nem sempre tem acontecido. Aliás, corremos o risco de ver alguns

em fila a usar esse esquema das prescrições.

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Mas, Sr. Primeiro-Ministro, quanto às questões relativas à situação

nacional, não foi aqui referido um elemento importante, que consta do prefácio de um dos Roteiros do Sr.

Presidente da República, que vem, no plano dos seus conteúdos, acabar com esse discurso da libertação do

País com a saída da troica em 17 de maio, considerando-o como uma pura fantasia.

Sabemos que não foi o Sr. Primeiro-Ministro que colocou relógios para a contagem decrescente do tempo,

anunciando o dia da libertação do protetorado. Sabemos que não foi o Sr. Primeiro-Ministro que inventou o

porta-aviões do nosso desenvolvimento. Contudo, aquilo que o Sr. Vice-Primeiro-Ministro disse, com a sua

habitual exuberância, acaba por demonstrar aquilo que eu disse, ou seja, que, de facto, era pura fantasia.

E é fantasia porque, nesse tal Roteiro, o Sr. Presidente da República, partindo de parâmetros, regras,

condicionalismos e espartilhos estabelecidos, diz que, até 2035, ou seja, durante mais 20 anos, os

portugueses vão ter de continuar a «apertar o cinto».

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No entanto, o Presidente da República subestima um elemento fundamental: é que não é ele a datar o fim

dessa austeridade, dos sacrifícios. Quem pode determinar isso é o povo português, e não o Presidente da

República, este Governo ou possivelmente qualquer um de nós.

Mas, falando do novo ciclo — e ainda ontem um ministro do seu Governo falou do novo ciclo —, é capaz de

nos explicar, Sr. Primeiro-Ministro o que é isso da mudança, o que é isso do novo ciclo? O que é que vai

mudar na vida dos portugueses, na vida daqueles que têm feito tantos e tantos sacrifícios forçados nas suas

reformas, nas suas pensões, nos seus impostos, no seu direito à saúde, no direito à educação e à proteção

social? Que mudança é essa? Que novo ciclo é que vai ser aberto? E, sim ou não, afinal, é o Presidente da

República que tem razão, condenando os portugueses a uma pena prolongada de 20 anos de austeridade, ou

esse novo ciclo, essa mudança vai ter significado e substância na vida das pessoas?

Dizemos isto porque conhecemos bem aquilo que o Governo pretende fazer. E já foram aqui referidas

algumas matérias, como a da alteração à legislação laboral, visando a flexibilização e o embaratecimento dos

despedimentos, visando o aumento da ADSE, e visando a liquidação da contratação coletiva, direito

conquistado antes do 25 de abril — antes do 25 de Abril, Sr. Primeiro-Ministro! —, e ainda algumas medidas

que significam novos ataques às funções sociais do Estado, designadamente aquele anúncio de 2000 milhões

de euros de cortes que estão já previstos.

Ou seja, Sr. Primeiro-Ministro, diga lá aos portugueses, àqueles que estão, de facto, numa situação

dramática, aos desempregados, aos reformados, aos trabalhadores, aos militares, aos agentes das forças de

segurança, aos pequenos empresários arruinados com esta política de impostos, e até, se quiser, às famílias

daqueles jovens que precisam de frequentar o ensino especial, diga lá em que é que esse ciclo de mudança

que está a ser anunciado se vai refletir na vida dos portugueses.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, estou inteiramente de

acordo com aquilo que afirmou sobre a questão do apuramento de responsabilidades no caso das prescrições

e, portanto, acho muito bem que o Parlamento trate também de ouvir as responsabilidades do Banco de

Portugal na condução do processo. Acho isso — e presumo que já se poderia deduzir das minhas afirmações

— não só perfeitamente natural como exigível. Portanto, felicito o Sr. Deputado e o seu partido por essa

iniciativa.

Quanto à questão que coloca, sobre o prefácio escrito pelo Presidente da República no seu último livro de

discursos, a propósito da saída da troica, não me compete explicar o que o Sr. Presidente da República quer

ou não dizer, pois isso cabe ao Sr. Presidente da República e não a mim, mas posso, sobre os assuntos lá

tratados, ter também uma opinião.

Sr. Deputado, a sua pergunta dá-me a possibilidade de dar um contributo para esclarecer uma matéria que

parece andar um pouco confundida no debate público, nomeadamente no que tem que ver com os direitos dos

credores.

A troica é credora de quase 78 000 milhões de euros que emprestou a Portugal. São normas da União

Europeia — não é uma matéria que diga respeito nem à minha vontade, nem à vontade do Sr. Deputado, nem

à vontade do Sr. Presidente da República —, adotadas nos regulamentos europeus, as de que enquanto

subsistir dívida até um valor equivalente a mais de 25% do total dos empréstimos que tiverem sido outorgados,

os credores terem o direito de saber se o país em causa, o devedor, está ou não em condições de satisfazer

as suas obrigações. É assim! Posso mesmo dizer que não me parece que a questão traga alguma novidade.

Não é uma questão de opção, é assim! Enquanto não amortizarmos até 75% dos empréstimos que auferimos

evidentemente que teremos de dar explicações aos nossos credores das responsabilidades que temos junto

deles.

Isso não significa um regime de avaliação trimestral como aquele que existe durante o período em que o

Programa de Assistência Económica e Financeira é desenvolvido. Trata-se de um regime totalmente diferente.

Portanto, com certeza que enquanto não pagarmos pelo menos até 75% das nossas dívidas, há o direito de os

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nossos credores se inteirarem dos esforços que estamos a fazer para lhes pagarmos aquilo que lhes

devemos. Não vejo que isso, Sr. Deputado, tenha nada de extraordinário.

Diz também o Sr. Deputado que só em 2035 é que deixaremos de apertar o cinto. Creio, Sr. Deputado, que

estamos perante uma questão relacionada com o que está na nossa lei de enquadramento orçamental e que

decorre também do Tratado Orçamental, que foi ratificado nesta Câmara.

Os Estados-membros da União Europeia que subscreveram esse Tratado devem corrigir os seus desvios

acima de um rácio de dívida de 60% que consta do Pacto de Estabilidade e Crescimento, à razão de 1/20 por

cada ano. Isso significa, evidentemente, que poderemos levar até 20 anos a corrigir esses desvios. Se esses

desvios forem muito pronunciados, é evidente que o prazo máximo deverá ser tentado, pois se existe um

esforço muito grande a desenvolver para se regressar a um nível de 60% é natural que não se faça isso em

meia dúzia de anos e que se use o prazo máximo para se poder fazer essa amortização. É, pois, disso que se

trata.

Não é preciso ser-se um barra em aritmética para se perceber que, se se corrige 1/20 por ano, em 20 anos

dever-se-á ter corrigido essa diferença. Não é verdade, Sr. Deputado?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Com estas políticas, não se consegue!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Por conseguinte, também não me parece que o Sr. Presidente da República

tenha feito uma proclamação sobre este assunto. O Sr. Presidente da República limitou-se a constatar que, se

temos um rácio superior a 120% de dívida no Produto, é evidente que demoraremos uns largos pares de anos,

pelo menos esses 20 anos, a regressar aos 60%.

Sr. Deputado, quando participei numa conferência de um diário económico, o JornaldeNegócios,

justamente sobre as condições do pós-Programa, referi o que é a condição mínima de sustentabilidade da

nossa dívida e apareceu uma quanta gente explicando que essa condição estava em contradição com o

prefáciode um Roteiro do Sr. Presidente da República, na medida em que o Sr. Presidente da República

estava a falar da necessidade de corrigir o nosso desvio para os 60% de rácio da dívida que o Pacto

Orçamental contém, enquanto a minha era uma condição de demonstração de sustentabilidade da dívida. Ora,

isso é verdade. Nós, além de precisarmos de demonstrar a sustentabilidade da dívida, também precisamos de

cumprir os objetivos que estão no Tratado Orçamental.

Veja, Sr. Deputado, como afinal se fez tanta confusão à volta de pouco.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem de novo a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, que ainda dispõe de

algum tempo.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, procurarei ser célere.

Sr. Primeiro-Ministro, afinal, sobre mudança e novo ciclo nem uma palavra! Aliás, percebemos que aquilo

que disse ao PS é que admite alteração do Governo desde que se mantenha a mesma política. É por isso que

nós, por exemplo, que nem fomos convocados para isso, não alinhamos com esse consenso, porque o

problema está, de facto, na política e nesses parâmetros que estabeleceu.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Isso depende do povo português, Sr. Deputado!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — A Sr.ª Merkel disse-lhe, com uma grande satisfação: «Não se

preocupe! Saia pela porta traseira, saia pela porta da frente, saia pela porta do lado, seja uma saída limpa,

cautelar ou não, tem o nosso apoio!»

O Sr. Primeiro-Ministro: — Nós somos cumpridores!

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O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É evidente que a senhora sabe que, independentemente da porta de

saída, o caminho já está obrigatoriamente traçado, tendo em conta as regras, os parâmetros e os

condicionalismos impostos no quadro da União Europeia.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — E nós pensamos que é preciso romper com esse caminho!

Nesse sentido, não gostei de ver, ontem, o Primeiro-Ministro da República Portuguesa a agradecer à Sr.ª

Merkel. Mas agradecer o quê, Sr. Primeiro-Ministro?! Parecíamos um bocado o afilhado pobre a bater à porta

da madrasta rica, muito agradecido e obediente. É outra vez o regresso do bom aluno! Não lhe fica bem! Um

bocadinho de brio patriótico, Sr. Primeiro-Ministro, não lhe ficaria nada mal em relação a esta situação.

Por último, Sr. Primeiro-Ministro, creio que usou uma argumentação que é contra si próprio. Disse que

quando os partidos colocam a questão em relação às contas públicas, ao défice e à divida só veem soluções

que não podem ser prosseguidas. Mas nós insistimos, Sr. Primeiro-Ministro: porquê essa forma de se

expressar em relação a uma necessidade objetiva? Mais cedo ou mais tarde, vai ter de ser assumida a

questão da renegociação da dívida, do próprio serviço da dívida, que está a atingir níveis insuportáveis. E o Sr.

Primeiro-Ministro vem referir isso como um elemento de perturbação?! Ou está a pensar, Sr. Primeiro-Ministro,

com essa fuga às responsabilidades, que quem vier atrás que feche a porta?

Nós não aceitamos essa conceção!

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do Bloco de Esquerda.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, gostaria de começar por renovar os votos de pesar que

ontem apresentámos ao Partido Socialista e à família pela morte de José Medeiros Ferreira.

Sr. Primeiro-Ministro, venho aqui falar de um tema que parece nunca prescrever, que é o verdeiro regime

de exceção de que a banca goza neste País.

A imprensa económica tem dado conta da intenção do Governo de criar um veículo financeiro sustentado

pelo Estado para o crédito mal parado dos bancos nacionais e outros ativos que dão prejuízo.

A banca parece entusiasmada com a ideia, que é, como sabe, uma ideia que tem consequências nas

contas públicas. Ou seja, este veículo seria o mesmo que dizer que os mesmos portugueses que vivem a

redução de salário e de pensão, a perda de emprego, a perda de apoios sociais vão ser mais uma vez

chamados a pagar as perdas da banca.

Depois dos 5000 milhões do BPN, das recapitalizações do BCP, do BANIF e do BPI, não podemos aceitar

sequer que o Governo esteja a pensar em criar um veículo financeiro em tudo semelhante à Parvalorem ou à

Parups, que tem os ativos do BPN, que, como sabe, só em 2013 custaram 500 milhões de euros ao Estado.

Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, do que gostaríamos era de ter o seu compromisso, a sua garantia de que

nenhum cêntimo mais do erário público será gasto a pagar as perdas da banca!

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, teria muito gosto em

responder-lhe, mas tenho seguramente falta de informação, porque não identifico aquilo que possa ter sido

referenciado na imprensa de especialidade económica sobre quaisquer veículos que o Governo intentasse

criar para transferir — foi isso que percebi — perdas da banca. Não estou a par, Sr.ª Deputada.

O que lhe posso dizer é que se há alguém no Governo que tenha tal intenção eu não tenho conhecimento

dela. Não consta do Programa do Governo, não foi matéria que tivesse sido discutida e por isso não posso

responder à Sr.ª Deputada senão nestes termos. Ignoro do que se trata.

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Não há dúvida de que os bancos portugueses têm registado imparidades ao longo destes anos e essas

imparidades têm obrigado os próprios bancos a fazer provisões de capital, como a Sr.ª Deputada sabe, para

que os seus rácios core Tier 1 possam estar de acordo com aquilo que são as determinações da EBA

(European Banking Authority), que é a autoridade europeia que fixa esse regime.

A Sr.ª Deputada saberá também que quando os bancos registam essas imparidades, nomeadamente

quando elas correspondem a crédito mal parado, vencido há determinado tempo e que não tem previsão de vir

a ser cobrado, ele é tido como uma perda fiscal que corrige as contas anteriores que os bancos apresentaram,

havendo um prazo determinado para poderem registar essas perdas fiscais.

Sr.ª Deputada, isto é tudo o que lhe posso dizer, o que provavelmente a Sr.ª Deputada sabe e que

corresponde ao nosso quadro legal. Não sei se existe alguma intenção na banca de criar veículos próprios

para transferir ou não este tipo de perdas, portanto não posso pronunciar-me sobre intenções que outros

possam ter ou não. Mas não tenho conhecimento de que, dentro do Governo, esta matéria tenha sequer sido

trabalhada.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, ontem mesmo, o Diário Económico

dava conta da intenção de criação desse veículo precisamente por causa dos critérios de Basileia.

Sr. Primeiro-Ministro, pode não responder sobre esse veículo, mas há uma garantia que nos pode deixar

aqui: a garantia de que não vai gastar nem mais um cêntimo dos contribuintes a pagar perdas da banca!

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada, tenho muita dificuldade em responder-lhe

nesses termos, porque o Governo não deixará de respeitar a lei que está em vigor.

Portanto, depende do que é que a Sr.ª Deputada entende por perdas fiscais. Se existe um regime em que

todas as entidades — não é só a banca, mas todas as entidades — podem reportar perdas fiscais em que, por

lei, sejam relevadas, é evidente que elas serão relevadas nesses termos da lei.

Isto já acontece, já aconteceu antes, acontecerá no futuro e não pode ser de outra maneira. Os bancos,

como outras empresas, quando pagam impostos com base na previsão de uma receita ou de um proveito que

acaba por não se concretizar, têm um determinado período para ajustar depois essa despesa fiscal. E isso irá

acontecer na mesma.

Mas o Governo não tenciona intervencionar mais bancos — não sei se é isso que a Sr.ª Deputada está a

perguntar.

Não há, nesta altura, nada que indique que os bancos portugueses necessitem, da parte do Estado, de um

processo de recapitalização.

Em qualquer caso, volto a dizer o que já disse noutras ocasiões: se porventura isso fosse necessário, nós

estaríamos em condições de o poder fazer! Julgamos que isso não será necessário, mas, se for, o Governo

português não permitirá o risco para a economia portuguesa de poder vir a ter uma crise bancária. Mas não

me parece, de acordo com as declarações que têm sido proferidas pelo Sr. Governador do Banco de Portugal,

que exista um cenário parecido com esse.

Portanto, Sr.ª Deputada, não posso dar outra resposta. A menos que a Sr.ª Deputada me coloque uma

pergunta em concreto. Eu não tenciono nem deixo de tencionar gastar dinheiro dos contribuintes com bancos

na medida em que não há nenhuma contingência nesta altura que indique que haja qualquer banco que

necessite de operações de recapitalização para as quais o Governo deva disponibilizar meios.

Se isso vier a acontecer, em termos que não posso nem devo especular, o Governo cá estará para assumir

as suas responsabilidades, como fez no passado.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Primeiro-Ministro, registo que responde à minha pergunta

e ainda bem que o faz, mas registo também que não dá a garantia que lhe pedi. Ou seja, o que noticia a

imprensa económica é que pode estar a caminho uma nova Parvalorem para ativos de várias bancas

nacionais e, quando se fala em Parvalorem, como sabe, a palavra que mais diz aos portugueses é a primeira

parte, isto é, «parvos». A banca tem feito dos contribuintes parvos, porque os contribuintes têm pago todas as

perdas da banca, e isso tem de acabar.

Sr. Primeiro-Ministro, quero voltar a algumas perguntas que, julgo, continuam a precisar de resposta.

Uma delas prende-se com os benefícios fiscais para as famílias e com certeza estará recordado da

pergunta que já lhe diz sobre os benefícios fiscais para famílias numerosas.

O PSD e o CDS anunciaram, no dia 27 de setembro, no dia de reflexão antes das eleições autárquicas,

que teriam apresentado, na Assembleia da República, projetos relativos à redução do IMI até 50%, às

deduções no IRS com a educação e à redução de impostos automóveis para famílias numerosas.

Recordo que, no dia 18 de outubro, o PSD e o CDS pediram que esses projetos não fossem votados,

pediram o seu adiamento e deixaram-nos em «banho-maria» até agora.

Hoje, volta a ser manchete no jornal que o Governo quer dar mais benefícios fiscais a quem tem filhos.

A pergunta que tenho para lhe fazer é se é desta que vai haver alguma política fiscal para a natalidade ou

se é sempre e só propaganda eleitoral. Vai descongelar os projetos do PSD e do CDS que foram

apresentados na Assembleia, relativos ao IMI e ao IRS para famílias numerosas ou, pelo contrário, estamos,

mais uma vez, a assistir a um «número» de propaganda eleitoral?

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, é a segunda vez que me pede

para eu fazer um comentário sobre notícias de jornal. Não me levará a mal que eu não comente as notícias de

jornal.

A Sr. ª Deputada tem toda a possibilidade de questionar o Partido Social Democrata e o CDS-PP sobre os

projetos de lei que os dois partidos apresentam na Assembleia e a razão por que pedem, ou não, a sua

suspensão — essa é matéria à qual os partidos responderão, evidentemente.

O Governo não fez nenhum anúncio sobre esta matéria, Sr.ª Deputada. O que o Governo fez foi empossar

uma comissão que ficou de apresentar, ainda durante este ano, um relatório sobre a reforma do IRS, pois a do

IRC, como os Srs. Deputados sabem, já foi apresentada no ano passado e foi aprovada por esta Câmara.

Nós aguardaremos pela apresentação desse relatório e, depois, não deixaremos de fazer as escolhas

políticas que se impõem por parte do Governo e que possam vir a favorecer políticas de natalidade,

dependendo das propostas que aparecerem e da margem de manobra orçamental que o próprio Governo

enfrente. Mas, isso, Sr.ª Deputada, não é objeto de qualquer especulação da minha parte, nesta altura.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — A Sr.ª Deputada Catarina Martins ainda dispõe de tempo.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Repare, Sr. Primeiro-Ministro, que eu não o questionei sobre notícias de

jornal. Questionei-o sobre projetos do PSD e do CDS que estão no Parlamento congelados há seis meses. E o

Sr. Primeiro-Ministro não disse, para ser consequente com as suas palavras sobre benefícios fiscais a quem

tem filhos, se vai ou não descongelar os projetos.

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Portanto, voltamos ao problema de sempre, que é a diferença entre o que se diz e o que se faz. Na

verdade, tudo o que de bom o Governo tenta anunciar nunca vai para frente e as famílias sabem que ficam

sempre e só com as más notícias. Ficam sempre e só a pagar mais, mesmo quando já não se percebe o que

estão a pagar. Aliás, a posição do Primeiro-Ministro sobre a ADSE é bem clara a este respeito: diz que não é

preciso mais dinheiro para a ADSE, que até está equilibrada, mas que pode vir a ser. É, portanto, um imposto,

como dizíamos, e os funcionários públicos são tratados pelo Governo como um porquinho mealheiro.

Ora, os funcionários públicos não podem ser tratados assim, como não podemos continuar a ter uma

política de insustentabilidade para quem vive neste País, em nome da sustentabilidade dos credores.

Ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro dizer que está contente porque acha que as taxas de juro são sustentáveis

e que temos, portanto, a confiança dos credores. O que o Sr. Primeiro-Ministro não disse é que a

sustentabilidade que planeia para os credores é em nome da insustentabilidade do País, ou seja, em nome

dos cortes nos salários, nas pensões, na educação e na saúde.

Quando o Sr. Primeiro-Ministro chama «essa gente» a quem, com bom senso, lhe vem dizer que tem um

problema de sustentabilidade de vida pública, tem um problema de futuro com o País, o Sr. Primeiro-Ministro

esconde, de facto, que não tem nenhum projeto para quem vive neste País, para quem trabalha neste País e

não se importa absolutamente nada de não pagar pensões, de não pagar salários, de não cumprir na

educação, de não cumprir na saúde, de não cumprir com as suas obrigações com as pessoas, desde que

possa cumprir com as obrigações para os credores, as quais vão sempre crescer.

Sr. Primeiro-Ministro, não posso deixar de notar que este debate começou com um não debate. Sobre a

reunião de há dois dias, sobre o que une e aproxima PSD e PS nem uma palavra. A divergência insanável

parecer ter ficado sanada a tempo. Talvez tenha servido para o Sr. Primeiro-Ministro ter levado o fiel líder do

Partido Socialista, nas palavras de Angela Merkel, no bolso do casaco com que foi a Berlim prestar contas.

Sr. Primeiro-Ministro, tem de prestar no País, tem de prestar contas por tornar insustentável, por tornar

impossível o futuro neste País.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é de Os Verdes.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, queria, em nome de Os Verdes, juntar-me ao

pesar, já aqui manifestado, pelo falecimento de Medeiros Ferreira e dirigir as mais sentidas condolências ao

Partido Socialista e também à família.

Sr. Primeiro-Ministro, talvez recordar um bocadinho de história não seja mau para relembrar que o Sr.

Primeiro-Ministro, em campanha eleitoral, jurou aos portugueses que tinha as contas todas muito bem feitas e

que havia uma coisa de que tinha a certeza: não seria necessário cortar salários. Entretanto, todos

conhecemos a história seguinte: foram cortados, e muito!

Em 2011, Vítor Gaspar, então Ministro das Finanças, garantia que um corte nas remunerações «só pode

ser temporário. O corte é temporário: durante a vigência do Programa de Ajustamento».

Decorreu tempo, houve cortes nos salários e o Sr. Primeiro-Ministro vem agora dizer que os portugueses

nem pensem que se podem repor os valores salariais de 2011, aquilo que o Sr. ex-Ministro Vítor Gaspar tinha

dito. Ou seja, isto é uma «bola de neve», sempre para pior, sempre para pior!

Ocorre que um dos apoiantes — se não mesmo coautor — destas políticas, o Sr. Presidente da República,

já veio clarificar uma coisa aos portugueses: pelo menos, durante os próximos 20 anos este País é para viver

na miséria, assim com esta brutal austeridade, porque é preciso.

É preciso, então, perguntar aos autores diretos destas políticas, ao Governo PSD/CDS, como é que é. Ou

seja, que condições serão necessárias para que se reponha aquilo que se retirou aos portugueses,

designadamente ao nível salarial.

Já percebi que o Sr. Primeiro-Ministro, de debate em debate, não quer dizer quando. Muito bem. Então

dirá, por favor, aos portugueses que condições são precisas o País ter para que seja reposto o que foi retirado.

Por uma razão muito simples, Sr. Primeiro-Ministro: os portugueses não podem viver numa incógnita. O futuro

do País não pode ser uma incógnita!

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O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Muito bem!

A Sr.ª Presidente: — Eu deveria ter indicado, para esclarecimento do grande público, que o debate de hoje

com o Primeiro-Ministro é uma espécie de debate duplo; o primeiro configurando o habitual debate quinzenal e

o segundo o debate preparatório do Conselho Europeu, que tem a participação do Primeiro-Ministro, feito nos

termos da Lei de Acompanhamento, Apreciação e Pronúncia pela Assembleia da República, no âmbito do

Processo de Construção da União Europeia.

Vozes do PS: — Ainda não acabou o debate quinzenal!

A Sr.ª Presidente: — Antes de dar a palavra ao Sr. Primeiro-Ministro, lembro que foi acordado em

Conferência de Líderes que este debate tem a seguinte moldura…

O Sr. António José Seguro (PS): — Mas, Sr.ª Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro ainda dispõe de tempo

relativamente ao debate quinzenal.

A Sr.ª Presidente: — Os Srs. Deputados farão o favor de me esclarecer se estou equivocada.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, eu não respondi à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem toda a razão, mas o zelo dos meus colegas de Mesa fez

com que se me fosse apresentado o debate seguinte. O equívoco é meu, não é de mais ninguém. Foi apenas

fruto do trabalho de zelo pela apresentação do segundo debate que me estava a ser feito.

Peço desculpa a todos.

Para concluir o debate quinzenal, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, o Sr. Presidente da

República não prescreveu nenhuma miséria para os próximos 20 anos. Não posso concordar consigo.

O Sr. Presidente da República fez a menção, que todos conhecemos, não disse nenhuma novidade. E a

Sr.ª Deputada, que participou nestes debates no Parlamento, também está muito bem informada. Não

precisava de ouvir o Sr. Presidente da República falar nesta matéria para saber. A Sr.ª Deputada já o sabia.

Pode haver muitos portugueses que não estejam devidamente inteirados dessa situação, mas a Sr.ª Deputada

está, seguramente, porque esse debate foi tido aqui, no Parlamento.

A Sr.ª Deputada sabe que o País, quer nos termos do tratado orçamental quer nos termos das regras

europeias que vigoram dentro da zona euro, está comprometido a ter um objetivo de médio prazo, que não

pode, em termos de equilíbrio orçamental, fugir a um défice estrutural superior a 0,5%, que tem até 2105 para

sair do procedimento por défice excessivo, ou seja, para ter menos de 3% de défice e que devemos, nos

termos da nossa lei de enquadramento orçamental, corrigir o desvio acima de 60% do rácio da dívida, à razão

de 1/20 por ano, até regressar a esse patamar dos 60% que consta do Pacto de Estabilidade e Crescimento.

Portanto, Sr.ª Deputada, estas são as regras. Estas são, portanto, as obrigações de Portugal, de Espanha,

de França, da Alemanha, da Áustria, da Itália, de todos os países que fazem parte da zona euro.

Ora, Sr.ª Deputada, se o País acumulou um stock de dívida pública elevado, que, no entanto, é sustentável,

aquilo que o País deve fazer, como outros países fizeram no passado, é definir uma trajetória para as suas

contas públicas e para a dívida pública de modo a honrar os seus compromissos. Portanto, Sr.ª Deputada, é

isso que iremos fazer.

Já tinha referido aqui noutras ocasiões que, quando um Estado escolhe um caminho de incumprimento, é

objetivamente porque não tem condições para cumprir. Desde que tenha condições para cumprir, esse

resultado é incomparavelmente melhor do que não cumprir as suas obrigações, porque isso, sim, põe em

causa as políticas públicas e os direitos sociais.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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A Sr.ª Presidente: — Agora, sim, concluímos este debate…

Vozes do PCP: — A Sr.ª Heloísa Apolónia ainda dispõe de tempo.

A Sr.ª Presidente: — Peço desculpa, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vejo que a Mesa está desejosa de chegar ao próximo debate.

A Sr.ª Presidente: — Parece, Sr.ª Deputada, mas não é verdade!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o problema está justamente

na trajetória, porque a trajetória definida por este Governo foi a do empobrecimento dos portugueses e aquilo

que o Sr. Primeiro-Ministro está a dizer é que, para não nos desviarmos da trajetória, os portugueses não

podem sair da pobreza. Ou seja, esta pobreza é para continuar. Foi o termo que eu usei: a miséria do País é

para continuar.

Gostava de tentar perceber qual é o limite, em termos de números, de défice, de dívida — se o Sr.

Primeiro-Ministro quiser —, de taxa de procura interna, de crescimento do País que o Sr. Primeiro-Ministro

encontra para poder repor o que retirou aos portugueses. Ou vivemos agora na lógica do «nunca mais»?

É que os senhores saltam de conversa em conversa e sempre que dizem e acrescentam mais qualquer

coisa é sempre para piorar! Sr. Primeiro-Ministro, precisamos de compreender o futuro do País e aquilo que os

senhores têm moldado para o futuro do País.

Para terminar, gostava de dizer o seguinte: quando os portugueses estão pior, o País está pior. Portanto, o

Sr. Primeiro-Ministro não pode continuar a insistir que o País está melhor, quando os portugueses vivem pior.

Isso faz o Sr. Primeiro-Ministro desfasar-se daquela que é a realidade e não ter em conta aquela que é a

verdadeira realidade dos portugueses.

Sr. Primeiro-Ministro, falamos muito de saídas, da forma como sairemos no próximo mês de maio ou, quem

sabe, daqui a 20 anos, mas uma coisa os portugueses podem ter a certeza: a única saída limpa — limpinha!

— que este País poderia ter, era, de facto, a saída em grande do Governo daqui para fora!

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, não a posso acompanhar

quanto a esse seu último desejo, mas posso garantir-lhe que a trajetória que temos não é a de

empobrecimento.

A Sr.ª Deputada pergunta qual é o limite, subentendo eu, do processo de consolidação das nossas contas

públicas. O limite da nossa consolidação de contas públicas é chegarmos ao objetivo a que nos propomos,

que é o de não ter o défice, ter as contas equilibradas e, nessa medida, dar, no que respeita ao Estado, um

contributo muito grande para que a economia possa crescer. Portanto, esse é o nosso objetivo.

No entanto, a Sr.ª Deputada formulou um desejo, o que é uma coisa diferente. Formulou o desejo de que o

País não precisasse de fazer ajustamento, que o País não precisasse de consolidar as contas públicas, que o

País não necessitasse de fazer sacrifícios para corrigir os desequilíbrios que tem. Sr.ª Deputada, aí estou

totalmente de acordo. Tomara eu que não precisássemos de fazer nada isso.

Mas deixe-me responder-lhe de uma forma muito ilustrativa: no dia em que um Estado não conseguir

financiar a sua despesa e a sua atividade, nesse dia não haverá nenhuma ilusão do nível de pobreza a que

chegou e não haverá nenhuma ilusão quanto àquilo que tem de ser corrigido para se poder financiar a sua

despesa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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Sr.ª Deputada, um Estado que não consegue levantar o dinheiro que é necessário para poder cumprir as

suas obrigações, seja com salários, seja com pensões, seja com os seus contratos, no dia em que um Estado

não tiver esse financiamento, todos os direitos ficarão em causa. É isso que não quero que aconteça, é isso

que não quero que volte a acontecer e é isso que, se cumprirmos com as nossas obrigações, não acontecerá.

Por isso, seria tão importante termos, coletivamente, não apenas formulado um desejo vago de que

poderíamos ter as coisas equilibradas, mas mostrarmos em concreto como é que poderíamos atingir esse

resultado. Ora, nós estamos a aproximar-nos desse resultado com o esforço dos portugueses, mas também

com a determinação do Governo e não, Sr.ª Deputada, com aquilo que pode considerar-se o apoio que Os

Verdes possam dar para esse percurso. Provavelmente, Os Verdes prefeririam que este caminho não fosse

trilhado e que o País não tivesse financiamento para poder satisfazer as suas necessidades. Mas aí, Sr.ª

Deputada, é a responsabilidade que nos separa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, agora, sim, termina o debate quinzenal, o primeiro debate desta

tarde. Reitero as minhas desculpas à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia e ao Sr. Primeiro-Ministro.

Vamos passar ao segundo debate desta tarde, que consta do debate preparatório do próximo Conselho

Europeu, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei de Acompanhamento, Apreciação e Pronúncia

pela Assembleia da República no Âmbito do Processo de Construção da União Europeia.

Há pouco, dizia, embora adiantadamente, que este debate tem uma moldura acordada em Conferência de

Líderes, que consiste no seguinte: a abertura do debate será feita pelo Sr. Primeiro-Ministro, seguindo-se as

intervenções de todas as bancadas parlamentares, que não terão uma réplica imediata do Sr. Primeiro-

Ministro, e o encerramento será feito pelo Sr. Primeiro-Ministro.

Sendo assim, Srs. Deputados, declaro aberto o segundo debate da tarde, dando.

Tem a palavra para uma intervenção, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Esta semana, terá lugar o Conselho

Europeu que, de acordo com o seu calendário habitual, se dedica, na Primavera, no essencial, aos aspetos

que estão relacionados com a coordenação das políticas económicas dos Estados-membros, no quadro

daquilo que é conhecido como o Semestre Europeu. A meio do semestre o que se faz é o seguinte: a partir de

um relatório que é apresentado pelo Presidente da Comissão, é feita uma avaliação preliminar do nível de

desenvolvimento e de execução das recomendações específicas, que são dirigidas aos diversos Estados-

membros, no sentido de executarem, de acordo com o seu plano nacional de reformas ou com os seus

programas de convergência ou de estabilidade, as ações necessárias para a correção dos desequilíbrios

macroeconómicos, mas fundamentalmente orçamentais que possam exibir.

No entanto, desta vez, temos em agenda aspetos relacionados com a competitividade industrial na Europa

e temos também um primeiro debate sobre os novos objetivos que a União Europeia possa vir a estabelecer

na área da política energética e das alterações climáticas, tendo em vista a fixação de novas metas até 2030,

uma vez que o essencial das metas que estavam estabelecidas até 2020 se encontra relativamente bem

encaminhado no plano europeu.

Evidentemente, não escapa a ninguém que a situação que se vive na Ucrânia será também uma questão

que merecerá uma atenção muito especial por parte do Conselho Europeu, como, de resto, já aconteceu no

Conselho de Ministros extraordinário que esteve lugar há cerca de duas semanas.

Relativamente à questão económica, gostaria apenas de deixar uma breve referência quanto à posição

portuguesa. Em primeiro lugar, para dizer, como todos sabem, que estaremos até maio deste ano fora dos

requisitos normais do Semestre Europeu, na medida em que temos requisitos reforçados pelo facto de

estarmos a executar o Programa de Assistência Económica e Financeira. Em qualquer caso, a situação

portuguesa já foi objeto de apreciação na última reunião do Ecofin e do Eurogroup, na sequência da 11.ª

avaliação da troica que aqui teve lugar e, portanto, não é de esperar que a questão portuguesa possa

merecer, da parte da Comissão Europeia ou dos parceiros europeus, alguma observação particular, embora

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não deixe, evidentemente, de transmitir aos meus colegas aquilo que tem sido o resultado essencial que

temos vindo a alcançar e os desafios que ainda temos no âmbito da conclusão do nosso Programa.

Seja como for, não podemos deixar de destacar a importância que tem este tipo de exercícios no Conselho

da Primavera, não só para a política económica em cada Estado-membro, mas também para a política

macroeconómica da União Europeia como um todo.

A saída do nosso Programa vai, evidentemente, enquadrar-nos neste exercício normal, que, no segundo

semestre, já nos obrigará a mostrar à Comissão Europeia aquilo que são as nossas intenções em matéria de

política orçamental, antes ainda, portanto, de o Governo apresentar a sua proposta de Orçamento para a

Assembleia da República a poder analisar. Evidentemente que o desenho das nossas políticas públicas terá

um grande significado para a avaliação que será feita em termos europeus.

Aquilo que também merece atenção da minha parte relaciona-se com o processo de construção de uma

verdadeira união bancária, na medida em que, como sabem, existe ainda alguma indecisão no processo que o

trílogo vem desenvolvendo no sentido de obter um acordo entre o Conselho Europeu e o Parlamento Europeu

nesta matéria.

É sabido que, apesar de saudar o consenso que foi atingido em sede de Conselho Europeu, manifestei,

quer no Conselho, quer publicamente, o desejo de que pudéssemos chegar a um conteúdo mais avançado e

mais aprofundado que nos desse mais garantias de que o processo de união bancária pudesse vir ao encontro

das nossas pretensões. Insisto: uma parte significativa da política monetária, que é conduzida pelo Banco

Central Europeu, não tem um mecanismo de transmissão devidamente eficiente, pois existe ainda uma

fragmentação financeira muito elevada na Europa.

Não temos nenhuma dúvida de que este processo, que já se iniciou com a instituição de uma autoridade

única de supervisão, conduzirá a um regresso de mais confiança nos mercados financeiros europeus e que

isso ajudará a ultrapassar a situação de fragmentação que ainda hoje vivemos. Mas não chega, é preciso que

o mecanismo de resolução bancária tenha um adequado apoio europeu e que possa constituir-se de uma

forma mais rápida do que aquilo que está previsto. Portanto, não deixarei de insistir nesta matéria, procurando

sensibilizar os meus colegas para esse resultado.

Finalmente, termino com duas notas.

Em primeiro lugar, em relação aos documentos divulgados a propósito do desenvolvimento da indústria em

termos europeus, ao mesmo tempo que é crítico para a retoma económica na Europa, é ainda insuficiente face

àquilo que são as metas estabelecidas e à relativa indefinição dos meios de financiamento que serão alocados

a essa estratégia.

Em segundo lugar, uma referência às metas para a agenda do clima e da energia. Portugal tem vindo a

defender metas mais ambiciosas e eu próprio tive ocasião de enviar uma carta ao Presidente do Conselho

Europeu renovando a comunicação que o Ministro do Ambiente e da Energia fez no respetivo Conselho de

Ministros.

Precisamos de metas mais ambiciosas em termos europeus, mas não apenas para a redução dos gases

com efeito de estufa, não apenas para diminuir a intensidade energética e, portanto, aumentar a eficiência

energética, não apenas para aumentar a percentagem de renováveis no consumo de energia final, mas

também para aumentar as interligações que nos poderão garantir a realização de um verdadeiro mercado

interno de energia.

Desse ponto de vista, parece-me que uma coisa deve andar a par da outra e espero que este debate, que

se vai agora iniciar, à luz, até, dos desenvolvimentos que foram registados na Ucrânia, possa sofrer agora uma

aceleração. Isto porque, é evidente, existe uma grande dependência energética de uma parte significativa da

Europa, das políticas energéticas que são desenvolvidas pelos Estados russos, pela Confederação Russa e,

evidentemente, o aumento das interligações da Península Ibérica para o resto da Europa pode corresponder a

necessidades de inverter essa grande dependência de muitos países europeus, disponibilizando não apenas

maior segurança e diversificação nas fontes energéticas e no abastecimento energético, mas também a custos

mais favoráveis para todos os europeus, com benefício para os mercados português e espanhol.

Sr.ª Presidente, termino dando nota de que, relativamente à Ucrânia, não deixaremos de fazer uma

avaliação da situação, seguramente para renovar o nosso convite à Rússia, bem como à Ucrânia, para que se

encontrem soluções diplomáticas e políticas para um problema sério que foi originado em termos que não são

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reconhecidos pela comunidade internacional. O que se passou com a Crimeia não respeita a Constituição da

Ucrânia, não respeita as leis internacionais e precisa de ser revertido.

Admito, portanto, que o Conselho possa ser bastante vigoroso na reafirmação de sanções que possam

conduzir a uma mudança de posição por parte dos intervenientes, mantendo sempre os canais políticos e

diplomáticos abertos para que uma solução negociada possa vir a ser alcançada.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Segue-se um conjunto de intervenções dos grupos parlamentares, sem direito de

réplica, com a seguinte ordem: PS, PCP, Bloco de Esquerda, Os Verdes, CDS-PP e PSD.

Pelo PS, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.

O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, quero, em primeiro lugar, agradecer as mensagens e

a expressão de sentimento e de condolências que foram dirigidas ao Partido Socialista e a esta bancada pelo

desaparecimento do nosso colega e, no caso concreto do PS, nosso camarada José Medeiros Ferreira.

Quero agradecer à Sr.ª Presidente da Assembleia da República, ao Sr. Primeiro-Ministro, ao Sr. Deputado

Luís Montenegro, ao Sr. Deputado Nuno Magalhães, ao Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, à Sr.ª Deputada

Catarina Martins e à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

Teremos oportunidade de, no momento adequado, na próxima sexta-feira, nos pronunciarmos mais

profundamente sobre o legado que está na nossa memória de um homem comprometido civicamente, primeiro

como resistente à ditadura e depois servindo o ideal democrático, como ele o sabia fazer, como governante —

Ministro dos Negócios Estrangeiros — e como parlamentar.

Foi aqui que o conheci melhor, revelando-se um homem de grande cultura, um homem de uma rara

inteligência e de um fino humor — aliás, só apanágio dos homens que têm uma grande inteligência — e,

simultaneamente, um homem muito frontal que dizia em todas as circunstâncias o que pensava sem se

preocupar quem incomodava.

É assim que nós o recordamos e eu quero, recordando-o, agradecer, uma vez mais, as manifestações de

pesar que todos os colegas, o Governo e a Sr.ª Presidente nos dirigiram.

O Sr. Primeiro-Ministro iniciou este debate de preparação do Conselho Europeu e eu quero dizer-lhe,

honestamente, que não tenho grandes expetativas quanto a esta reunião do Conselho Europeu.

O Sr. Primeiro-Ministro falou na necessidade de coordenação de políticas económicas. Ora, isso é o que a

Europa nunca fez! Nós temos uma União Económica e Monetária com uma única política cambial e uma única

política monetária, mas com 18 políticas orçamentais diferentes. E, para além de termos esta singularidade de

uma união monetária, que não é económica, exceto no nome e, portanto, incompleta, temos assistido a uma

União Europeia que lida mal com a crise e que, por essa via, em vez de corrigir os desequilíbrios, agrava-os.

Por isso, a expetativa em relação a essa coordenação de políticas económicas separa-nos, uma vez mais,

da perspetiva que o Primeiro-Ministro tem.

Temos, no entanto, uma preocupação que, possivelmente, deverá ser abordada nesse Conselho Europeu

no âmbito da política industrial e na necessidade de apoio à ciência, à tecnologia, à investigação, que é o caso

concreto das patentes.

Como o Primeiro-Ministro sabe, o Conselho Europeu tem instado os Estados-membros a ratificar o Acordo

para o Tribunal de Patentes, o que cria profundas preocupações nas empresas portuguesas e no nosso País,

designadamente porque as línguas oficiais que estão previstas não incluem o português; incluem o inglês, o

francês e o alemão…

O Sr. João Oliveira (PCP): — O anterior Governo tem grandes responsabilidades nisso!

O Sr. António José Seguro (PS): — … e, supostamente, qualquer empresa portuguesa terá de dirimir o

seu conflito em Paris, isto é, fora de Portugal.

Ora, considero que este é um ponto da maior relevância que deve ser colocado na reunião do Conselho

Europeu, visto que poderá, uma vez mais, colocar as empresas portuguesas num patamar diferente de

competitividade no Mercado Único Europeu.

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Em relação à Ucrânia, acompanhamos o que o Primeiro-Ministro disse aqui quanto à necessidade de

procurarmos uma solução diplomática, uma solução pacífica para o conflito.

Convinha, pois, que a Europa tivesse uma postura e uma atitude próprias. Não tem de ser

necessariamente autónoma, poderá convergir e coincidir com outras atitudes, designadamente com as dos

nossos aliados — os Estados Unidos da América —, mas é importante que a Europa tenha uma posição clara,

uma posição firme e que seja parte, ela própria, na tentativa de oferecer uma solução diplomática e política

para este conflito.

Este é um conflito que acontece dentro da própria Europa e que necessita que a União Europeia possa

fazer mais do que um simples lamento ou uma expressão de quais devem ser os instrumentos — volto a dizer,

pacíficos e diplomáticos — para encontrar uma solução.

Gostava de aproveitar o pouco tempo de que ainda disponho para dizer ao Sr. Primeiro-Ministro que não

meta mais medo aos portugueses. Há pouco, no debate que aqui teve lugar, o Primeiro-Ministro disse que era

muito importante haver um consenso no País para afastar as incertezas dos investidores.

Recordo que tivemos uma reunião, na segunda-feira passada, onde tive oportunidade de transmitir que,

sobre a matéria que diz respeito à estratégia orçamental, isto é, à sua política de cortes, há uma divergência

insanável. O que é que aconteceu no dia seguinte nos mercados? Houve algum aumento da taxa de juro, Sr.

Primeiro-Ministro? Nenhuma! Pelo contrário, até houve uma ligeira descida. E isto por uma razão muito

simples: porque os investidores sabem que os compromissos que o Partido Socialista assumiu são para

cumprir.

Mas os investidores sabem, e o País também, que houve um momento de grande incerteza e as taxas de

juro aumentaram. Ai se aumentaram…! Sabe quando é que foi, Sr. Primeiro-Ministro? Foi em julho! E não foi

por culpa do Partido Socialista!

O Sr. Mota Andrade (PS): — Bem lembrado!

O Sr. António José Seguro (PS): — Foi por causa da demissão dos dois ministros do seu Governo: o

Ministro das Finanças, Vítor Gaspar, e o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Portas. Essa é que foi a

grande incerteza que provocou um aumento das taxas de juro, com prejuízo para os portugueses.

O Sr. António Braga (PS): — É verdade!

O Sr. António José Seguro (PS): — Em democracia, nenhum líder político deve meter medo aos

portugueses, muito menos um Primeiro-Ministro!

Nós devemos afirmar, sem qualquer problema, as nossas divergências e eu aqui reafirmo o que lhe disse

na nossa reunião presencial e no final, ou seja, que, em matéria de estratégia orçamental, há uma divergência

insanável. E nós temos a autoridade de o dizer, não apenas porque vivemos em democracia, mas porque em

novembro de 2011 disponibilizei o Partido Socialista para uma renegociação do nosso programa de

ajustamento que tivesse em conta as novas realidades do País, as novas realidades do desempenho da

economia na zona euro e, nessa altura, o Primeiro-Ministro não esteve disponível para esse consenso. Os

resultados estão à vista!

Volto a referir: do ponto de vista político e do ponto de vista social, há, hoje, um consenso na sociedade

portuguesa do qual o Governo teima em manter-se afastado e se exclui, que tem a ver com uma simples

diferença: a nossa prioridade está no emprego, na criação de postos de trabalho, na dinamização da economia

e no equilíbrio das contas públicas de uma forma sustentável.

E aqui emerge a questão da dívida, Sr. Primeiro-Ministro. Há muito tempo que defendemos uma

renegociação da dívida e consideramos que só em contexto europeu — já lhe disse isso várias vezes, e

reafirmo-o — é que encontraremos uma solução sustentável para a nossa dívida, não apenas no plano do

equilíbrio das contas públicas mas também nas consequências que isso tem para os portugueses,…

A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

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O Sr. António José Seguro (PS): — … porque se encontrarmos uma solução europeia para a dívida,

designadamente com a proposta que temos aventado, de mutualização da parte superior aos 60% — não

apenas da dívida portuguesa mas a de todos os outros países da Europa, e estamos a falar de 15 em 18

países —, aí, sim, poderemos beneficiar dessa solução, de modo a aliviar os sacrifícios dos portugueses.

São os portugueses que nos motivam, Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do PCP.

Tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Do que nos é possível conhecer

até agora da agenda do Conselho Europeu, ficam claras duas questões.

Primeira, quer o Conselho quer a Comissão estão a protagonizar uma gigantesca campanha de

mistificação em torno da ideia de que o pior da crise já passou. Conhecemos bem essa campanha por cá —

uma campanha ditada pelo facto de estarmos à porta das eleições.

Mas, se há algo clarificador no projeto de conclusões do Conselho para lá da propaganda que encerra, é a

involuntária confissão e o autodesmentido da campanha em torno da retoma e da saída limpa.

Lemos o projeto de conclusões e lá estão todas as linhas de aumento da exploração, de canalização de

recursos públicos para a banca, de concentração e centralização do capital na União Europeia, de garantia de

lucros fabulosos aos monopólios e às transnacionais, à custa dos salários e direitos dos trabalhadores.

Basta ver, por exemplo, o que está redigido no projeto de conclusões sobre a Irlanda para se ver quais são

as tão cantadas saídas.

Sabe o que está na forja para o povo inglês, Sr. Primeiro-Ministro? No processo do Semestre Europeu, a

Irlanda será incluída no procedimento por défice excessivo, portanto, será incluída no processo de governação

económica, ou seja, restrições de soberania económica e orçamental, prosseguimento de destruição de

direitos sociais e laborais, cortes adicionais nos salários e pensões de forma permanente, mais privatizações,

destruição dos serviços públicos para alimentar a gula do grande capital.

Ora, isto vem dizer-nos o que já sabíamos: nem lá nem cá há saídas limpas! Só políticas das «troicas» por

outros meios…!

Por outro lado, e apesar do orçamento da União Europeia continuar a ser um indigente — em sentido

metafórico, perceba-se! —, pretende-se canalizar o que resta para melhorar a competitividade da política

industrial, mobilizando os recursos para a investigação de excelência e para os grandes projetos de

infraestruturas.

Ora, todo este palavreado mais não quer dizer do que subjugar o investimento na ciência ao serviço do

mercado, particularmente as grandes multinacionais através do que chamam «de excelência» que, traduzido,

significa a exclusão de estruturas de investigação de países como o nosso e a canalização dos fundos para a

investigação em tudo o que possa ser vendável, deixando de fora qualquer política de investigação pública e

ao serviço do interesse de todos, processo este, de resto, agravado pelo regime de patentes (unitária) e pela

intenção da criação do tribunal unificado de patentes.

É preciso lembrar que, quando aqui colocámos a questão, só o CDS nos acompanhou, porque a posição

do Governo de então do Partido Socialista era contrária, ou seja, era a favor desta mutilação que hoje volta a

estar aqui na ordem do dia.

Vozes do PCP: — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Para cumprir aqueles objetivos lá vêm com as parcerias público-

privadas, forma bem conhecida de investimento público para lucro privado, e o recurso à dita «fuga de

cérebros» jovens e menos jovens de elevado grau de formação e conhecimento científico.

Mas de relevo é a gigantesca operação de concentração do setor bancário que está em marcha. A

operação a que chamam «união bancária», salvaguardando, ao mesmo tempo, a união económica e

monetária e o instrumento que permite aos países produtores de produtos de elevada incorporação

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tecnológica e grande procura no mercado mundial continuarem a acumular excedentes e passarem aos países

de economias mais frágeis, como Portugal, os défices.

Depois de terem privado os países da União Europeia da sua política monetária, avançaram para a política

orçamental e fiscal e, agora, é chegada a vez de lhes retirarem o pouco — ou nada, se quisermos — que

ainda restava de possibilidade de determinarem o papel da banca numa economia soberana e produtiva,

tendo em vista a criação de emprego, uma política justa de rendimentos e de serviços públicos de qualidade.

Paulatinamente, os povos vão sendo privados de instrumentos fundamentais para a determinação do seu

futuro, sem que se sejam chamados a pronunciar-se.

Vai-se acentuado, assim, o clamoroso confronto desta União Europeia com a democracia, em conflito com

os interesses e aspirações dos povos. Um processo que cresce nas costas dos povos, retirando-lhe o seu

inalienável direito a determinar o seu presente e o seu futuro, um processo que retira o poder de intervenção

das instituições de soberania nacional e que se realiza contra direitos democráticos dos povos e das suas

aspirações.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: A imagem mais significativa desta

semana é a sua ida a Berlim falar com a chanceler alemã antes mesmo do Conselho Europeu.

Sabemos que Berlim se mostrou contente com a obediência às medidas orçamentais europeias e não

parece, naturalmente, preocupada com a insustentabilidade da dívida portuguesa e, muito menos, com a

insustentabilidade da vida dos portugueses.

Sr. Primeiro-Ministro, bem sei que estes debates são para discutir o Conselho Europeu. O nosso problema

é que é o próprio Governo a prestar contas a Berlim, desvalorizando o Conselho. Portanto, o problema é como

na Alice no país das maravilhas saber quem manda, e quem manda neste Governo é, claramente, Angela

Merkel.

A crise que estamos a viver, e este debate é a prova disso, é uma crise de democracia e de soberania.

Neste lado do espelho, o Parlamento português eleito debate com o Governo eleito o que deve ir fazer a um

Conselho Europeu, com outros governos europeus da União Europeia eleitos.

Tudo indicava que este devia ser o momento relevante da nossa democracia. O problema é o outro lado do

espelho, e do outro lado do espelho a visita do Primeiro-Ministro a Berlim, antes do Conselho Europeu, mostra

bem que estamos reféns dos interesses alemães em todo este processo.

Debatemos com gosto a agenda do Conselho Europeu, mas precisamos de saber onde é que o Governo

está a debater os interesses do nosso País e com quem o está a fazer. Mas, enfim, vamos à agenda do

Conselho, vamos ao semestre europeu, à sustentabilidade da dívida, das contas públicas e à sustentabilidade

da vida dos portugueses.

O Sr. Primeiro-Ministro, no último debate, não quis aqui responder sobre o que seria em concreto o pós

troica deste Governo, mais precisamente o que iria constar do documento de estratégia orçamental que vai

agora debater a Bruxelas.

Entretanto, felizmente, o Sr. Presidente da República veio explicar, no prefácio do seu último livro, o plano

da direita. O plano da direita é, nem mais, nem menos, austeridade durante mais 30 anos e mesmo assim, ou

por isso mesmo, só conseguir pagar a dívida se o País atingir em todos esses 30 anos taxas de crescimento

de 3% e saldos orçamentais de 4%.

Bem sei que o Sr. Primeiro-Ministro, numa conferência ao Diário Económico, veio dar outros números, com

taxas de menos 2% de crescimento, mas, como saberá, também não demorou nem duas horas a serem

desmentidos os seus números por economistas, porque as contas não batiam certo.

Voltemos, então, aos números do Presidente, onde sabemos que as contas batem certo, mas o problema é

outro. O problema é que, em Portugal, nunca, em 40 anos de democracia, foi possível atingir taxas de

crescimento de 3% e saldos orçamentais de 4%, o que seria preciso para tornar a dívida sustentável sem a

reestruturar.

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Aliás, não é só em Portugal, pois a verdade é que nunca nenhum país o conseguiu, nem mesmo a

Alemanha que, nos últimos 17 anos, só conseguiu taxas destas durante dois anos.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, o problema, quando se prepara para ir a

um Conselho Europeu sobre o semestre europeu, sobre o que vai apresentar no documento de estratégia

orçamental, sobre a austeridade, essa pancada mais forte que está a preparar para os portugueses, é saber

se, como dizia o ex-Secretário de Estado Carlos Moedas em 2010, será a dívida que nos mata ou se seremos

nós capazes de matar a dívida.

Bem sei que o Sr. Primeiro-Ministro considera irresponsável falar agora da sustentabilidade da dívida e da

necessidade da sua reestruturação, mas é hoje, quando a dívida está em 130% do PIB e o País está em

recessão, quando a dívida são 200 000 milhões de euros, que temos de perceber que Carlos Moedas, quando

a dívida estava em 70% do PIB, quando era pouco mais de metade do que é agora e quando o País nem

sequer estava em recessão, tinha razão e a dívida tem de ser mesmo reestruturada.

A verdade, Sr. Primeiro-Ministro, é que há hoje um consenso alargado em Portugal. É o consenso do bom

senso, que diz que a austeridade não paga dívidas. Precisamos de crescimento e, para isso, tem de haver

reestruturação da dívida, é preciso renegociar com os credores, é preciso renegociar em nome do País.

Sr. Primeiro-Ministro, não temos esperança que este Governo seja capaz de o fazer ou, sequer, que o

queira fazer. Quando olhamos para a balança de poder nesta União Europeia e com este Governo que temos

vemos na balança do poder quem ganha e quem perde com a estratégia do seu Governo, vemos que a atitude

de subserviência face à Alemanha define quem ganha e quem perde. Quem ganha é a Alemanha, quem

ganha é a finança, quem perde é o nosso País, como mostra a destruição que este Governo tem imposto à

nossa economia, às pessoas, à vida concreta de quem vive e de quem quer viver em Portugal.

Sr. Primeiro-Ministro, uma vez que começou por ir a Berlim antes do Conselho Europeu, a pergunta que

tenho para lhe fazer é a seguinte: afinal, o Conselho Europeu é em Berlim ou é em Bruxelas? Portugal

negoceia com Bruxelas ou negoceia com Berlim?

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Começo justamente pelo

tema das alterações climáticas. Infelizmente, as consequências diretas das alterações climáticas já se sentem

muito por todo o mundo e, também, naturalmente, em Portugal.

Aquilo que hoje conhecemos relativamente aos impactos sobre o litoral não apenas das alterações

climáticas mas também de todos os erros que foram cometidos, de políticas concretizadas sobre o litoral e que

agravam os efeitos e os impactos das alterações climáticas, têm de nos dizer alguma coisa.

Assim, o alerta que gostava de deixar ao Sr. Primeiro-Ministro é o seguinte: estamos sem financiamento

adequado para a concretização de uma estratégia nacional de adaptação às alterações climáticas. Há alguns

dias, neste mesmo Plenário, dissemos que a palavra de ordem neste momento relativamente ao litoral é

recuar. Não temos financiamento adequado para o efeito e isto tem repercussões graves ao nível económico,

ao nível social e ao nível ambiental.

Neste momento, para além das questões da adaptação às alterações climáticas e reportando-me agora à

questão da mitigação, estamos sem plano nacional de mitigação de combate às alterações climáticas. Ora,

consideramos que o Governo português devia trabalhar depressa e bem nessa matéria.

Por outro lado, deixo aqui uma preocupação acerca de algum recuo na ambição que a União Europeia tem

tido relativamente a esta matéria, e, por isso mesmo, vemos os Estados Unidos e a sua aversão ao combate

às alterações climáticas a ganhar algum terreno a nível mundial. Esta é uma preocupação que aqui queremos

deixar e gostaríamos que o Sr. Primeiro-Ministro a transmitisse a nível europeu.

É que, a longo prazo, devido à não atuação atempada nesta matéria, perderemos, e não apenas a nível

ambiental. Para alguém que goste de secundarizar esta parte, direi que perderemos também ao nível social e

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ao nível económico e teremos uma fatura grande, em dinheiro, a pagar. Ora, é isso que queremos também

evitar.

Sr. Primeiro-Ministro, por outro lado, gostaria de dizer que as metas que a União Europeia está a impor aos

países, independentemente da sua situação económica concreta, é uma coisa extraordinariamente

preocupante. Ou seja, impor determinadas metas sem ter em conta as realidades concretas e os impactos

diferenciados que metas iguais podem ter sobre realidades diferentes, é uma coisa preocupante. Nesse

sentido, aquilo que gostaríamos de dizer é que as metas que nos são impostas são incompatíveis com a

nossa capacidade de gerar crescimento e, portanto, com a nossa capacidade de gerar riqueza.

Assim se vai formando uma Europa das desigualdades, uma Europa onde a Alemanha é grande e onde

Portugal é pequenino e nos encontros que Pedro Passos Coelho tem com a chanceler Merkel nota-se essa

grandeza da Alemanha e essa pequenez de Portugal. E, Sr. Primeiro-Ministro, isto deve, também, merecer-

nos preocupação.

Por outro lado, gostava de terminar dizendo o seguinte: tomara, Sr. Primeiro-Ministro — mas tomara

mesmo! —, que os portugueses, na próxima oportunidade que são as eleições europeias, deem um claro

recado — mas grande! — ao Governo português, à troica e à União Europeia, que tanto fazem definhar este

País.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Ribeiro e Castro.

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as

e Srs. Deputados: A

União Europeia tem atravessado anos muito difíceis e vive ainda desafios muito fortes. Como se não bastasse

um certo «engasganço» económico, a crise e a incerteza financeira, as dificuldades sociais e a crise social,

chegou a crise da Ucrânia. Esta é uma crise difícil: dura, exigente, muito complexa.

Pela nossa parte, não queremos, nem devemos, contribuir para uma escalada, pelo contrário, mas não

devemos diminuir minimamente a sua gravidade. É uma crise grave. Mais, é uma crise perigosa, muito

perigosa. Oxalá haja uma saída limpa para a embrulhada que se armou na fronteira leste da União Europeia.

O Conselho Europeu e os Estados-membros devem avaliá-la como o mais estrondoso fracasso da política

de vizinhança da União Europeia e o mais intenso desafio com que está confrontada.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Mas erros de avaliação não justificam nem desculpam,

minimamente, a ação russa.

Tem de ser dito que não queremos confrontação com a Rússia, queremos cooperação e boa cooperação

com a Rússia, mas é indispensável que a Rússia, por seu lado, não queira confrontação com o resto da

Europa, queira boa cooperação também e perceba que vivemos no século XXI, não no século XIX, nem

sequer no século XX.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — O dever de solidariedade nesta contingência é

indiscutivelmente com a Ucrânia, uma vez que a anexação da Crimeia é inaceitável na substância, no tempo e

no modo.

Se mais não houvesse para dizer, este foi um movimento traiçoeiro, ou seja, aproveitar um tempo de

vulnerabilidade política de um vizinho que atravessa uma transição democrática muito difícil para lhe

abocanhar uma parte do território é um procedimento politicamente inaceitável e moralmente muito reprovável.

Depois da blitzkrieg inventou-se o blitz referendum para mascarar a ilegitimidade da anexação territorial a

que fomos assistindo, em direto e pela televisão, na Crimeia e no Kremlin.

As consequências destes factos são incalculáveis, na exata significação da palavra — impossíveis de

calcular. E não devemos confundir com aceitação a placidez e a tranquilidade com que olhamos factos

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inaceitáveis, pelo que os condenamos energicamente no plano político e diplomático. Repito: são factos

inaceitáveis, que deixarão rasto no terreno e na memória.

Creio que é muito importante termos uma diplomacia enérgica e clara na União Europeia e conseguir uma

estabilização mínima que permita que as eleições do próximo dia 25 de maio decorram bem, com liberdade, e

que as novas autoridades ucranianas possam conduzir a saída desta crise de uma forma estável e duradoura.

Tenho algumas saudades das décadas em que as pessoas se lamentavam de que a Europa era um

gigante económico e um anão político. Há quanto tempo já lá vão esses tempos em que nos lamentávamos

das coisas que nos corriam bem, porque não éramos sequer um anão político e éramos, geralmente,

respeitados.

Hoje, somos um grandalhão económico, um pouco desajeitado, temerosos do nosso desígnio e

politicamente, demasiadas vezes, em desconchavo. Este Conselho Europeu e o tempo até às eleições

europeias de maio são mais uma oportunidade para fazer renascer o sonho europeu e responder às

aspirações dos cidadãos e aos desafios da atualidade.

Não sei se todos os 28 seremos capazes disso, mas esse é o convite que aí está mais uma vez.

Será importante que Jean-Claude Juncker seja o próximo presidente da Comissão Europeia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Dos candidatos apresentados é, indiscutivelmente, aquele que

é um experiente governante, um experiente primeiro-ministro e tem longos anos de liderança do ECOFIN. É,

portanto, o mais experimentado, o mais apto, para lidar com as exigências preponderantes deste tempo difícil

que atravessamos e vamos ainda atravessar no próximo quinquénio. Além disso, é também um grande amigo

de Portugal.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Ao contrário da Sr.ª Deputada Catarina Martins, quero felicitar o

Sr. Primeiro-Ministro pelo êxito da sua visita, ontem, a Berlim, pelo apreço que obteve pelos resultados que

Portugal tem conseguido, com muita dificuldade e muito esforço, e também pelo apoio que colheu para as

próximas tarefas que teremos de cumprir. Isto é muito importante.

Pelo nosso lado, no CDS, gostámos muito de o ouvir dizer que Portugal faz a sua parte e a exigir também

que União Europeia faça mais.

A oposição, frequentemente, critica o discurso do Governo, mas nós estamos conscientes de que temos de

fazer a nossa parte e exigimos que a União Europeia, por seu lado, faça mais e corrija as desigualdades e as

assimetrias. É isto que, no fundo, nos afasta do Partido Socialista. O Partido Socialista não quer que façamos

a nossa parte, mas é indispensável que a façamos, até para ganharmos crédito e força para exigir da União

Europeia que faça também melhor a sua parte.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Por exemplo, acompanhamo-lo totalmente no dinamismo, na

determinação com que tem exigido passos decisivos na união bancária. Acompanhamos o Governo nessa

exigência e temos também uma grande expectativa de que, antes das eleições europeias, o consenso entre o

Conselho e o Parlamento Europeu possa ser obtido, mais próximo das linhas que o Parlamento Europeu tem

posto em cima da mesa, que são aquelas que, de facto, resolvem o problema, acabando com a fragmentação

financeira que tanto penaliza a nossa economia.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Temos também esperança de que o Partido Socialista se

aproxime progressivamente do consenso e do bom senso que são indispensáveis nesta matéria.

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Era muito importante!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Três notas muito rápidas.

Primeira, sobre a Cimeira UE/África. É muito importante que a diplomacia portuguesa volte a agarrar a

Cimeira UE/África. Foi em 2007, numa presidência portuguesa, que essas cimeiras voltaram a ser feitas e este

é um domínio muito importante que devemos seguir com mais atenção.

Também nas conclusões conhecidas sobre a energia, sublinhamos, pela nossa parte, a expectativa do

Conselho, de que se reduzam custos, custos do cidadão e da economia, porque as nossas empresas também

estão bastante penalizadas, bem como o consumidor doméstico. Portanto, nesta matéria, há progressos que a

maioria e o Governo ainda têm de conseguir.

Quanto à questão da patente europeia (que ouvi, com interesse e surpresa, ser aqui suscitada pelo Sr.

Deputado António José Seguro), acompanhamos a preocupação, mas não cometemos o erro do PS, que, no

último Governo do Partido Socialista, nos fez embarcar numa cooperação reforçada…

Vozes do CDS-PP: — É verdade!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — … que era um truque disparatado que lesava a nossa língua, a

nossa economia, e também os tratados, e que nos fez embarcar no comboio da patente unitária que,

inevitavelmente, iria descarrilar.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Nessa altura, estivemos sós com o Partido Comunista e temos

pena de que não tenhamos sido mais prudentes, como a Espanha e a Itália, e não nos tenhamos oposto a um

caminho que não é positivo.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Exatamente!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Enfim, Sr. Primeiro-Ministro, creio que estamos a chegar a uma

altura em que os cidadãos, de facto, esperam mais da Europa.

Diversamente do Partido Socialista, tenho esperança no Conselho Europeu e tenho esperança de que

sejamos capazes de passar da fase do bom aluno para a fase do bom cidadão, isto é, ativos, participantes e

exigentes. Fazemos a nossa parte, mas não hesitamos em pedir a todos os outros, nomeadamente aos mais

poderosos, àqueles que podem mais, que deem à Europa a solidariedade que ela pede.

Vozes do CDS-PP: — Exatamente!

O Sr. José Ribeiro e Castro (CDS-PP): — Esta é conhecida como a Cimeira da Primavera; e creio que a

Europa espera, de facto, uma primavera de crescimento e emprego, que era também a outra denominação

tradicional desta Cimeira.

Desejo-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, sobretudo uma coisa: inspiração! Sabemos que tem determinação, pelo

que espero que nos debates, no Conselho, consiga provocar nos seus colegas a inspiração que faça despertar

nos cidadãos europeus um momento de reencontro.

Aplausos do CDS-PP e de Deputados do PSD.

O Sr. António José Seguro (PS): — Está salvo o Conselho Europeu!

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

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O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs.

Membros do Governo: Quero começar por colocar duas questões prévias relativamente àquilo que foi aqui

afirmado pelo Sr. Deputado António José Seguro.

A primeira é para dizer que o PSD não considera tão irrelevante como o Sr. Deputado António José Seguro

a posição do Partido Socialista relativamente a formar, com a maioria e o Governo, compromissos políticos

com vista ao futuro.

Entendemos que um compromisso do Partido Socialista com as principais orientações estratégicas do

País, nos próximos anos, é um bom sinal para os mercados, constitui uma perceção que não deixará de ter

reflexo nas taxas de juro e também uma perceção de que as reformas que o País está a empreender terão

durabilidade, sustentabilidade e estabilidade, o que servirá o crescimento económico e a estabilização

financeira.

Uma segunda nota é relativa a uma novidade deste debate: o Partido Socialista, através do Sr. Deputado

António José Seguro, apresentou-se aqui defensor de uma renegociação da dívida. É certo que conhecíamos

a posição do Partido Socialista de renegociar o Programa de Assistência Económica e Financeira, porque isso

foi, de facto, referido várias vezes em intervenções públicas do Partido Socialista. Agora, renegociar a dívida

ou mesmo reestruturá-la é uma novidade que não sabemos se compagina uma adesão a um conhecido

manifesto lançado na sociedade nos últimos dias. Porventura, será a 71.ª subscrição desse manifesto, mas

creio que o Partido Socialista e o Sr. Deputado António José Seguro terão oportunidades e ocasiões, no

futuro, de poderem explicar ao País em que termos é que defendem a renegociação da dívida para os

próximos anos.

Protestos do PS.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não faça perguntas difíceis!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, no que toca ao Conselho Europeu,

acompanhamos as três prioridades que o Governo aqui apresentou para levar a esta reunião. Desde logo,

aquela que tem a ver com a criação de uma união bancária plena.

Sabemos que há um diálogo entre o Conselho e o Parlamento Europeu que gostaríamos que pudesse ter

resultados práticos o mais depressa que for possível, porque todos sabemos que a implementação e a criação

de facto de uma união bancária permite a igualdade de financiamento em toda a União Europeia e favorece o

financiamento das nossas empresas, face às desigualdades que hoje se verificam relativamente a outros

Estados-membros.

Também no que toca a uma outra prioridade a que o Sr. Primeiro-Ministro aqui se referiu, qual seja a de

criar condições para uma maior competitividade industrial da Europa — fala-se, inclusivamente, num

renascimento industrial da Europa, aliás, nós, em Portugal, temos uma Estratégia de Fomento Industrial para o

Crescimento e o Emprego 2014-2020 para a qual também queremos colher os contributos dos outros partidos

—, é essencial a criação das condições para uma união bancária, quer para implementarmos a nossa

estratégia nacional, quer para obtermos uma estratégia europeia no domínio do relançamento da indústria,

porque não há reindustrialização se não houver financiamento, se não houver capacidade de as empresas, em

igualdade de circunstâncias, poderem ter os seus projetos e esses projetos poderem ser competitivos.

Uma terceira nota, Sr. Primeiro-Ministro, relativamente à agenda que diz respeito ao clima e à energia.

Desde 2007 que se definiram metas no âmbito europeu e creio mesmo que estamos em condições de

poder dizer que Portugal tem estado no cumprimento dos objetivos estabelecidos no domínio energético, quer

em termos de redução das emissões de gases com efeito de estufa, quer do aumento da capacidade das

energias renováveis, quer mesmo da melhoria da eficiência energética. Mas, como o Sr. Primeiro-Ministro aqui

aludiu, e bem, há uma outra componente, a da interligação entre os Estados da União Europeia, sem a qual

não teremos aumentos de eficiência nem mesmo redução de custos da energia.

Aliás, e o Sr. Primeiro-Ministro também o referiu, o contexto político da situação que se vive na Ucrânia

preocupa-nos muito — e esperamos que também possa sair deste Conselho uma resposta vigorosa da União

Europeia, como disse o Sr. Primeiro-Ministro, no sentido do respeito pelas leis internacionais, pela

Constituição do Estado da Ucrânia e também pelos direitos, liberdades e garantias de todos os cidadãos

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ucranianos —, mas a situação de instabilidade política que se vive na Ucrânia também tem repercussões a

nível económico na Europa, pelo que a Europa deveria fazer alguma reflexão no domínio da política

energética. E, a este respeito, a questão das interligações ganha mais acuidade, designadamente em Estados

como o nosso.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto-lhe se no enquadramento a que aqui aludiu há pouco, de criação

de um verdadeiro mercado interno da energia, podemos esperar que, também por esta via — eu diria quase

infelizmente, também por esta via —, estejamos a chegar ao momento em que os objetivos da União

Europeia, nomeadamente para a década de 2020 a 2030, podem potenciar uma maior capacidade de países

como Portugal e Espanha terem uma ligação à rede europeia, beneficiando com isso todos os Estados-

membros da União Europeia. É que Portugal beneficiará, com certeza absoluta, e estou em crer que o

Governo não deixará de o ter em atenção.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, chegámos ao fim do debate, pelo que vamos entrar no período de

encerramento.

Assim sendo, para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A encerrar, quero dizer que alguns Srs.

Deputados quiseram aproveitar este debate para prolongar o debate anterior. Respeito-o e direi apenas que

procurarei não fazer o mesmo. Em todo o caso, quero responder às questões que foram mais sensíveis, no

enquadramento europeu.

Em primeiro lugar, quero dizer que tenho hoje sobre a União Europeia uma visão mais aberta, mais otimista

do que aquela que tinha quando cheguei ao Governo, em 2011. É que é sabido que os tratados que instituíram

nomeadamente a união económica e monetária continham demasiadas imperfeições, mas isto não implicou

que a criação da união económica e monetária, ela própria, e a União Europeia, tal como o Tratado de

Maastricht a concebeu, tivessem sido um passo negativo para a Europa, pelo contrário, foram passos

extremamente positivos, arrojados e ambiciosos.

Como em todas as épocas, há limites para o perfecionismo; fazem-se arbitragens e concessões entre

muitos Estados. O nível de negociação que, então, ocorreu foi, no entanto, suficientemente bem sucedido para

que a União Europeia tivesse entrado num caminho que julgo ser de aprofundamento da democracia

económica e social, com um projeto comum, que é o de um mesmo mercado e uma mesma moeda, mas que,

por essa razão, terá muito mais no futuro se os governos e os povos que a integram assim o desejarem.

As imperfeições e insuficiências que os tratados revelaram tiveram, ao longo destes quatros últimos anos,

respostas muito positivas, que, mais uma vez, não serão a palavra final, em termos de perfeição institucional

na Europa, mas não há nenhuma dúvida de que estamos hoje muito mais próximos de responder

adequadamente a algumas das insuficiências quer da união monetária, quer da união económica e estamos

mais próximos de ter um espaço de convergência política, que é um espaço de liberdade, mas é também um

espaço de partilha de soberanias mais intenso do que aquele que tínhamos anteriormente.

Claro que todos os que têm uma perspetiva cética relativamente a essa construção aproveitam qualquer

insuficiência, qualquer fracasso, qualquer desaire,…

O Sr. António Filipe (PCP): — Pequenas minudências!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — … para poderem dizer que esse exercício é um exercício perigoso e que nos

devemos distanciar dele. E, sem novidade, no debate que aqui travámos, algumas forças políticas

recuperaram essa visão, que é uma visão pessimista, porque divergente sobre aquilo que se pretende no

processo de construção europeia.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É o pessimismo da razão e o otimismo da vontade!

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O Sr. Primeiro-Ministro: — E quando o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa vem amaldiçoar o semestre

europeu, a responsabilidade orçamental, evidentemente, não faz mais do que o cabeça de lista do Partido

Comunista Português ao Parlamento Europeu quando diz que Portugal devia sair do euro.

Vozes do PCP: — É verdade!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Evidentemente, procuraremos fazer o contrário, porque queremos que

Portugal esteja cada vez mais integrado nessa Europa que também tem o euro e um mercado europeu.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

Mas a minha visão distancia-se da oferecida pelo Sr. Deputado António José Seguro, que no seu discurso

interno, doméstico, veio explicar — como aqui o voltou a fazer hoje, embora de uma forma muito mais clara do

que anteriormente, e da qual também me distancio — que os problemas de sustentabilidade da dívida

portuguesa só se podem resolver no âmbito europeu. Portanto, no fundo, para efeitos domésticos, veio dizer

«não temos saída fora de uma solução que se encontre na Europa».

Risos e protestos do PS.

Depois, acrescenta «mas a Europa não tem soluções». Portanto, o Sr. Deputado oferece zero de

expetativa positiva e de esperança ao povo português, porque diz «nós, sozinhos, não vamos lá, mas a

Europa também não nos resolverá o nosso problema».

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Protestos do PS.

Sr. Deputado, quanto a inspirar medo a alguém, estamos conversados. É que, se eu não fosse Primeiro-

Ministro e não tivesse a informação que tenho, que felizmente me habilita a concluir o contrário do Sr.

Deputado, como português, eu ficaria assustado com essa visão de quem se propõe dirigir o País no futuro.

Vozes do PS: — Oh!…

O Sr. António José Seguro (PS): — Estragou o debate!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O Sr. Deputado disse mesmo que deveremos renegociar a dívida na base

europeia. Quero aqui reafirmar, depois daquilo que outros Srs. Deputados também mencionaram, que Portugal

tem uma dívida sustentada, e procurei esclarecer essa matéria quando — recordo —, participando numa

conferência na semana que passou, demonstrei, numa perspetiva conservadora, que elementos que são

perfeitamente realizáveis mostram a sustentabilidade da dívida.

Protestos do BE.

Evidentemente, isso não chega para cumprir o Tratado Orçamental. Para cumprir o Tratado Orçamental é

preciso mais exigência. Mas não esperaria ouvir do Partido Socialista a conclusão oposta! Na medida em que

o Partido Socialista teve ocasião de ratificar o Tratado Orçamental, não vai, com certeza, dizer «ratificámos um

Tratado que torna a nossa dívida insustentável»!

O Partido Socialista tem de decidir se quer ou não cumprir o Tratado Orçamental que aqui ratificou e se,

caso o queira cumprir, em que medida é que acha que a nossa dívida não é sustentável no âmbito desse

Tratado.

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Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António José Seguro (PS): — Não percebeu nada!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ora, acho que a dívida é sustentável também no âmbito desse Tratado. E julgo

que o País tem mais a ganhar em cumprir com esses objetivos do que em declarar que não tenciona cumpri-

los. E é muito importante ser direto, claro e transparente: ou temos ou não temos intenção de cumprir.

Como é evidente, não podemos responder pelos próximos 20 ou 30 anos em Portugal. Nenhum de nós o

pode fazer, mas podemos dizer qual é, sem nenhum rodeio, a nossa perspetiva para esses 20 ou 30 anos: se

partirmos de boa-fé para esse exercício, dizendo que nos vamos aplicar para conseguirmos atingir esses

resultados; ou que temos uma reserva mental e, embora achando que sim, que é preciso ratificar, que é

preciso cumprir, não tencionamos cumprir. É uma diferença absoluta!

Ora, nesta matéria, era muito útil que houvesse uma resposta inequívoca da parte de Portugal. Eu tenho-a

oferecido na perspetiva do Governo português, mas evidentemente que cada um se responsabiliza pelas

afirmações que faz.

Vozes do PS: — É óbvio!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Concluo, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, abordando duas outras matérias

que aqui foram referenciadas.

Refiro, em primeiro lugar, a minha visita a Berlim.

Creio que não terá passado despercebido aos Srs. Deputados que me senti muito honrado por ter sido

convidado pelo jornal Die Welt para, na sua conferência anual, que este ano ocorreu mais tarde, mas que junta

o essencial das organizações e das maiores empresas alemãs, produzir uma comunicação.

Aceitei o convite desse grande jornal alemão, muito prestigiado, para ser, juntamente com o Presidente do

Conselho Europeu, o convidado de honra nessa conferência, tendo aproveitado essa visita para poder

também trocar impressões com a minha colega, chefe de governo, Chanceler Angela Merkel.

Quero dizer que poder realizar encontros bilaterais com outros chefes de Governo que respeitamos, no

âmbito da União Europeia, não só não é um ato de submissão, como é um ato de grande soberania. E fi-lo

com a Chanceler Merkel, em Berlim, como o faço em qualquer outro país da União Europeia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Devo dizer também que os nossos parceiros europeus, independentemente da orientação política dos

governos que vigora em cada país, têm tido uma cooperação essencial para que Portugal possa superar as

suas dificuldades.

O agradecimento que exprimi em Berlim é o mesmo que tenho expressado em várias outras capitais: é o

agradecimento pela cooperação que os nossos parceiros europeus demonstraram relativamente a Portugal,

para que pudesse ultrapassar as dificuldades que está a viver.

A segunda questão que quero referir está relacionada, Sr.ª Presidente, com o Tribunal de Patentes

Unificado. É sabido que, ainda no anterior Governo, avançou uma cooperação reforçada, em termos europeus,

para a criação de um tribunal europeu de patentes. É verdade que o atual Governo manteve a sua

participação nessa cooperação reforçada, embora tenha intervindo no sentido de melhorar os termos — como

outros governos, de resto, o fizeram — associados à criação desse tribunal.

O nosso objetivo, evidentemente, é o de oferecer aos criadores portugueses melhores possibilidades de

poderem registar as suas patentes, nomeadamente em termos europeus. Ora, é perfeitamente possível que

possam instituir-se secções, locais ou regionais, desse Tribunal europeu, onde a língua de origem pode ser

adotada.

Julgo importante manter quilo que foi uma iniciativa do anterior Governo, e que, no essencial, me parece

correta. Precisamos de melhorar as garantias dos criadores europeus, no registo das suas patentes. E creio

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que a solução que está ser desenvolvida é, realmente, em termos unificados, uma solução melhor e com mais

garantias do que aquela que hoje existe.

A Sr.ª Presidente: — Queria concluir, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Termino, Sr.ª Presidente, agradecendo a todos o contributo que deram para

este debate. Julgo que Portugal tem, hoje, condições para acreditar que o futuro que temos à nossa frente na

União Europeia é um caminho mais robusto e mais esperançoso do que aquele que percorremos nos últimos

anos.

A evidência está aí à porta: a recuperação económica pode não ser ainda duradoura aos olhos da maior

parte dos europeus, mas é importante para resolver problemas sociais que se acumularam durante a crise e

que também pode ir ao encontro dos interesses dos portugueses.

Neste debate no Conselho Europeu de Bruxelas, não deixaremos de realçar as expetativas que temos e

também de sublinhar alguns aspetos que são da responsabilidade europeia e que precisam de andar mais

depressa para que aqueles que demonstraram ter responsabilidade também possam agora colher os

benefícios da solidariedade e da coesão europeias que, evidentemente, precisamos coletivamente de atingir

para progredirmos e melhorarmos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Muito obrigada, Sr. Primeiro-Ministro.

Termina aqui este debate, ficando assim concretizada a nossa ordem do dia.

Desejo aos membros do Governo muito boa tarde.

Passo a referir a ordem do dia de amanhã: o primeiro ponto será preenchido pelo debate, na generalidade,

da proposta de lei n.º 211/XII (3.ª) — Modifica o valor dos descontos a efetuar para os subsistemas de

proteção social no âmbito dos cuidados de saúde, concretamente da Direção-Geral de Proteção Social aos

Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE), dos Serviços de Assistência na Doença (SAD) e da Assistência

na Doença aos Militares das Forças Armadas (ADM); o segundo ponto consistirá na discussão da petição n.º

307/XII (3.ª) — Apresentada pelo Prof. Arq.º José Manuel Fernandes e outros, solicitando à Assembleia da

República que encontre uma solução para o cinema Odéonque dignifique a cidade de Lisboa; do terceiro e

último ponto consta a apreciação da petição n.º 232/XII (2.ª) — Apresentada por Hélder Simão Ribeiro de

Oliveira e outros, solicitando à Assembleia da República que a legislação em vigor em matéria de contratos

seja revista no sentido de obrigar a que os mesmos sejam redigidos com tamanho mínimo de letra 11 e com

espaçamentoentre linhas de 1,15.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 1 minuto.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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