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Sábado, 7 de março de 2015 I Série — Número 59

XII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2014-2015)

REUNIÃOPLENÁRIADE6DEMARÇODE 2015

Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves

Secretários: Ex.mos

Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz

S U M Á R I O

A Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 7

minutos. Deu-se conta da apresentação dos projetos de

resolução n.os

1290 e 1291/XII (4.ª). Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, dos

projetos de lei n.os

765/XII (4.ª) — Transparência dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos (BE), 766/XII (4.ª) — Combate o enriquecimento injustificado (BE), 782/XII (4.ª) — Enriquecimento injustificado (trigésima quinta alteração ao Código Penal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, quarta alteração à Lei n.º 34/87, de 16 de julho, e sexta alteração à Lei n.º 4/83, de 2 de abril) (PCP) — que foram aprovados —, 803/XII (4.ª) — Estabelece medidas de reforço ao combate à criminalidade económica e financeira, proibindo ou limitando relações comerciais ou profissionais ou transações ocasionais com entidades sedeadas em centros offshore ou centros offshore não cooperantes (PCP) — que, a requerimento do PCP, baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sem votação, por um prazo de 60 dias —, 798/XII (4.ª) — Enriquecimento ilícito (PSD e CDS-

PP) e 801/XII (4.ª) — Reforça o regime de controlo dos acréscimos patrimoniais não justificados ou não declarados dos titulares dos cargos políticos e equiparados (PS) — que foram aprovados — e do projeto de resolução n.º 1286/XII (4.ª) — Propõe a adoção pelo Estado português de um plano de ação nacional e internacional para a extinção dos centros offshore (PCP) — que, a requerimento do PCP, baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sem votação, por um prazo de 60 dias,

Intervieram no debate, a diverso título, os Deputados Pedro Filipe Soares (BE), António Filipe (PCP), Teresa Leal Coelho (PSD), Helena Pinto (BE), Telmo Correia (CDS-PP), Jorge Lacão (PS), João Oliveira (PCP), José Luís Ferreira (Os Verdes), Luís Fazenda (BE), Teresa Anjinho (CDS-PP) e Carlos Abreu Amorim (PSD).

Foram aprovados os votos n.os

255/XII (4.ª) — De pesar pelo falecimento de António de Sousa Gomes, político e gestor (PS), 256/XII (4.ª) — De pesar pelo falecimento do músico Fernando Alvim (PS, PSD, CDS-PP, BE, Os Verdes, e PCP) e 257/XII (4.ª) — De pesar pelo falecimento do ex-

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Deputado Amadeu Ferreira (PS, PSD e CDS-PP), após o que a Câmara guardou 1 minuto de silêncio.

Foi aprovado o projeto de resolução n.º 1287/XII (4.ª) — Deslocação do Presidente da República a Paris (Presidente da AR).

Foram aprovados, na generalidade, as propostas de lei n.

os 279/XII (4.ª) — Procede à vigésima segunda alteração

ao Código de Processo Penal, atualizando a definição de terrorismo, 280/XII (4.ª) — Procede à sexta alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro (Lei da Nacionalidade), fixando novos fundamentos para a concessão da nacionalidade por naturalização e para oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, 281/XII (4.ª) — Procede à segunda alteração à Lei n.º 101/2001, de 25 de agosto, que estabelece o regime jurídico das ações encobertas para fins de prevenção e investigação criminal, permitindo que sejam incluídos nas ações encobertas todos os ilícitos criminais relacionados com o terrorismo, 282/XII (4.ª) — Procede à quinta alteração à Lei n.º 5/2002, de 11 de janeiro, que estabelece medidas de combate à criminalidade organizada e económico-financeira, de modo a abranger todos os ilícitos criminais relacionados com o terrorismo, 283/XII (4.ª) — Procede à quarta alteração à Lei n.º 52/2003, de 22 de agosto (Lei de combate ao terrorismo), criminalizando a apologia pública e as deslocações para a prática do crime de terrorismo, 284/XII (4.ª) — Procede à segunda alteração à Lei n.º 23/2007, de 11 de julho, que aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional, modificando os fundamentos para a concessão e cancelamento de vistos e para a aplicação da pena acessória de expulsão, 285/XII (4.ª) — Procede à terceira alteração à Lei n.º 49/2008, de 27 de agosto, que aprova a Lei de Organização da Investigação Criminal, de modo a abranger todos os ilícitos criminais relacionados com o terrorismo, e 286/XII (4.ª) — Procede à primeira alteração à Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto, que aprova a Lei de Segurança Interna, modificando a composição do Conselho Superior de Segurança Interna e a organização e o funcionamento da Unidade de Coordenação Antiterrorista, e o projeto de lei n.º 797/XII (4.ª) — Quinta alteração à Lei n.º 25/2008, de 5 de junho (PSD e CDS-PP).

Foi aprovado um requerimento, apresentado pelo PSD e pelo CDS-PP, solicitando a baixa à Comissão de Economia e Obras Públicas da proposta de proposta de lei n.º 287/XII (4.ª) — Aprova o Regime Jurídico do Serviço Público de Transporte de Passageiros, sem votação, por um prazo de 30 dias.

Os projetos de lei n.os

771/XII (4.ª) — Procede à oitava alteração da Lei n.º 25/2006, de 30 de junho, visando um regime sancionatório mais equitativo nas situações de incumprimento do pagamento de taxas de portagem em infraestruturas rodoviárias (PS) e 796/XII (4.ª) — Oitava alteração à Lei n.º 25/2006, de 30 de junho, que aprova o regime sancionatório aplicável às transgressões ocorridas em matéria de infraestruturas rodoviárias onde seja devido o pagamento de taxas de portagem (PSD e CDS-PP) foram aprovados, na generalidade, tendo sido rejeitados, também na generalidade, os projetos de lei n.

os 794/XII (4.ª) — Altera

o regime de cobrança de portagens, até à sua eliminação, em defesa dos direitos dos utentes das autoestradas (PCP), 799/XII (4.ª) — Estabelece a amnistia pelo incumprimento de

pagamento de taxas de portagens (BE), 800/XII (4.ª) — Retira competência ao serviço de finanças para instauração e instrução dos processos de contraordenação por não pagamento de taxas de portagem (oitava alteração da Lei n.º 25/2006, de 30 de junho, que aprova o regime sancionatório aplicável às transgressões ocorridas em matéria de infraestruturas rodoviárias onde seja devido o pagamento de taxas de portagem) (BE) e 802/XII (4.ª) — Impede as situações de aplicação abusiva de coimas, e de outros custos, aos casos de não pagamento de portagens (Os Verdes).

Foi rejeitado o projeto de resolução n.º 1267/XII (4.ª) — Pelo apuramento dos beneficiários finais das transações financeiras que lesaram o BES e o Estado português (PCP).

O projeto de resolução n.º 1280/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo a criação de mecanismos que assegurem o pagamento atempado dos contratos para a prestação de serviço público de educação às escolas do ensino particular e cooperativo (PSD e CDS-PP) foi aprovado.

Foram rejeitados os projetos de resolução n.os

1253/XII (4.ª) — Pela suspensão das demolições nas ilhas-barreira da ria Formosa (PCP), 1279/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo que promova, com caráter de urgência, uma reflexão aprofundada sobre as intervenções programadas para a ria Formosa e sobre as suas consequências para as populações, suspendendo, com efeito imediato, todas as ações em curso que envolvam a demolição de habitações, até que estejam assegurados o respeito pelo princípio da igualdade e o direito à habitação (PS) e 1282/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo a suspensão imediata das demolições na ria Formosa (BE).

Em votação final global, foi aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública, relativo à proposta de lei n.º 278/XII (4.ª) — Procede à segunda alteração ao regime que cria a contribuição extraordinária sobre o setor energético, aprovado pelo artigo 228.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro.

Também em votação final global, foi aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Obras Públicas, relativo à proposta de lei n.º 275/XII (4.ª) — Aprova o novo Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional.

Ainda em votação final global, foi aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Segurança Social e Trabalho, relativo ao projeto de lei n.º 680/XII (4.ª) — Consagra expressamente a identidade de género no âmbito do direito à igualdade no acesso a emprego e no trabalho, procedendo à quinta alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 fevereiro (PS).

No final, o Deputado João Oliveira (PCP) solicitou o uso da palavra para proferir uma declaração de voto oral relativamente às votações dos projetos de resolução n.

os

1253, 1279 e 1282/XII (4.ª), sobre demolições na ria Formosa. Após se terem pronunciado os Deputados Luís Montenegro (PSD), Nuno Magalhães (CDS-PP), Pedro Filipe Soares (BE) e Miguel Freitas (PS), o Presidente considerou que, por não estarem em causa votações finais globais, as declarações de voto deveriam ser apresentadas à Mesa, por escrito.

O Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 20 minutos.

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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.

Eram 10 horas e 7 minutos.

Podem ser abertas as galerias.

Antes de iniciarmos a ordem do dia, vou dar a palavra ao Sr. Secretário para dar conta do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e

foram admitidos, os projetos de resolução n.os

1290/XII (4.ª) — Recomenda a valorização da educação para a

cidadania em todos os ciclos do ensino básico e secundário (PS), que baixa à 8.ª Comissão, e 1291/XII (4.ª) —

Recomenda ao Governo que promova a abertura do procedimento de classificação do atual «Museu de

Aveiro» para «Museu Nacional de Aveiro» (PS), que baixa também, à 8.ª Comissão.

É tudo, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos dar início à ordem do dia com a apreciação conjunta, na

generalidade, dos projetos de lei n.os

765/XII (4.ª) — Transparência dos titulares de cargos políticos e altos

cargos públicos (BE), 766/XII (4.ª) — Combate o enriquecimento injustificado (BE), 782/XII (4.ª) —

Enriquecimento injustificado (trigésima quinta alteração ao Código Penal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48/95,

de 15 de março, quarta alteração à Lei n.º 34/87, de 16 de julho, e sexta alteração à Lei n.º 4/83, de 2 de abril)

(PCP), 803/XII (4.ª) — Estabelece medidas de reforço ao combate à criminalidade económica e financeira,

proibindo ou limitando relações comerciais ou profissionais ou transações ocasionais com entidades sedeadas

em centros offshore ou centros offshore não cooperantes (PCP), 798/XII (4.ª) — Enriquecimento ilícito (PSD e

CDS-PP) e 801/XII (4.ª) — Reforça o regime de controlo dos acréscimos patrimoniais não justificados ou não

declarados dos titulares dos cargos políticos e equiparados (PS) e do projeto de resolução n.º 1286/XII (4.ª) —

Propõe a adoção pelo Estado português de um plano de ação nacional e internacional para a extinção dos

centros offshore (PCP).

Srs. Deputados, estão já inscritos, para apresentar os respetivos diplomas, os Srs. Deputados Pedro Filipe

Soares, António Filipe, Teresa Leal Coelho e Telmo Correia.

Para apresentar as iniciativas do Bloco de Esquerda, tem, pois, a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe

Soares.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.a Presidente, Sr.

as e Srs. Deputados: A corrupção é um flagelo que

mina a confiança na democracia, nos políticos e no próprio Estado de direito. É com base nisso que a voz

popular diz que políticos e partidos são todos iguais, o que é profundamente falso.

Por isso, fazemos este debate e, por isso, o Bloco de Esquerda desafiou todos os grupos parlamentares

para que, numa matéria tão importante, fosse possível que todos fizessem a sua proposta e que as escolhas

de todos ficassem em cima da mesa.

Para nós, esta é uma preocupação que vem de longe. Aprovámos o agravamento de penas e a criação do

crime urbanístico. Tivemos como ponto central a criminalização do enriquecimento ilícito, proposta que foi

apresentada em 2009, 2010, 2011 e, em 2012, um texto subscrito em conjunto com outros partidos (do qual o

PS se excluiu) chegou mesmo a ser uma tentativa de lei. Mas não viu a luz do dia: o Tribunal Constitucional

considerou que essa proposta deveria ser reformulada.

Aprendendo com essa decisão, a iniciativa legislativa para criminalizar o enriquecimento não declarado é,

da nossa parte, o capítulo seguinte na vontade imensa de combate à corrupção.

A proposta não podia ser mais clara: pegar nas obrigações declarativas do património de políticos e altos

quadros do Estado hoje já existentes e ser mais exigente na transparência. A transparência patrimonial e de

interesses no exercício de cargos públicos é um valor essencial para a qualidade da democracia e para o

combate à corrupção.

Propomos criar uma nova entidade, específica para este efeito, que verifique e valide as declarações de

património. A atual dispersão de competências no tratamento e controlo das declarações de património e

incompatibilidades dos titulares de cargos públicos e políticos, bem como o facto de os órgãos competentes

não serem especializados, impede que o mesmo seja eficaz. Por isso, propõe-se, a exemplo de outros países,

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como em Espanha ou em França, a concentração destas competências numa entidade independente, que

funciona junto do Tribunal Constitucional, a entidade da transparência.

Mas queremos ir ainda mais longe, alargando a lista de quem tem a obrigação de declarar o seu

património. Desde membros do Governo, a consultores ou peritos do Estado, ou Deputados e membros

ministeriais. Quem decide no País tem que declarar o seu património e por isso é que nós propomos que o

atual sistema de controlo de riqueza e impedimentos seja reforçado, porque ele hoje é manifestamente

insuficiente. A influência dos gabinetes de titulares de cargos políticos ou dos consultores em processos

legislativos e em processos de alienação de bens do Estado exige um alargamento subjetivo deste regime.

Mas insistimos que deve ser possível uma monitorização contínua desse património, dessa riqueza. Para

além do alargamento dos prazos declarativos para um período de seis anos, após a cessação de funções,

exigimos que essas declarações sejam atualizadas anualmente.

E como quem não deve não teme, essas declarações devem ser publicadas na Internet, acessíveis a todos

os cidadãos.

Lembro aqui as palavras do Sr. Deputado Telmo Correia em debate anterior sobre esta matéria: «No

regime das declarações, devemos alargar esse regime, aprofundá-lo e garantir, sobretudo, que há mais

fiscalização sobre as declarações que são prestadas». Sr. Deputado Telmo Correia, aqui está, no projeto do

Bloco de Esquerda, essa resposta.

Sr.a Presidente, Sr.

as e Srs. Deputados, com estas propostas, respondemos também às preocupações do

Tribunal Constitucional. O bem jurídico a proteger, uma das questões que dizia estar indefinido no diploma

anterior, é claro e inequívoco: é o dever de transparência dos agentes públicos. Se há património não

declarado, então passa a ser crime, e um novo tipo de crime, um crime autónomo nunca antes sugerido. E não

existe inversão do ónus da prova, porque a obrigação criada é a da declaração do património. Se há um

enriquecimento desproporcionado, então esse será comunicado ao Ministério Público. Tudo centrado numa

entidade especializada, com recursos para a sua tarefa, coadjuvante do Tribunal Constitucional e que pode

decidir pela perda de mandato ou pela demissão do agente público.

Ninguém escapa a esta exigência e quem não cumprir pode perder o seu mandato. Pode ser mesmo um

primeiro-ministro a ficar sem o seu mandato.

Simples? Exatamente. Exigente? Muito. Não podia ser de outra forma.

Apresentamos ainda, nesta matéria, um projeto que — não se enganem — é complementar, que ataca,

pela via fiscal, o enriquecimento injustificado, taxando em 100% a riqueza acumulada abusivamente. Não

confundamos, insisto, com o enriquecimento não declarado: esta via não substitui nem anula o combate à

corrupção no Estado. E esperamos que tenha hoje melhor acolhimento que nas vezes em que foi rejeitado

pelo PS, pelo PSD e pelo CDS.

Como dizia a Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, no último debate que aqui tivemos na Assembleia sobre

estas matérias, «precisamos de soluções que resistam ao argumento dogmático que sustenta que a nossa

Constituição não nos permite combater o estado corrompido das coisas».

Ora, se é esse o desafio, nesse desafio nós temos as nossas propostas, porque é no respeito

constitucional que nós as fizemos. Com a exigência de quem sabe que de nós não se espera menos que uma

solução forte para o problema da corrupção e que a sociedade e a democracia não se compadecem com o

falhanço da resolução deste problema, cuja necessidade é genericamente reconhecida e exigida.

Este é o momento em que não podemos falhar.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, ficam assim apresentados os projetos de lei do Bloco de Esquerda.

Entretanto, inscreveram-se para intervir, pelo PS e pelo PCP, os Srs. Deputados Jorge Lacão e João

Oliveira, que eu não tinha referido no início do debate.

Para apresentar as iniciativas do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Cabe-me apresentar o projeto de

lei do PCP relativo à criminalização do enriquecimento injustificado. Mais tarde, o Sr. Deputado João Oliveira

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fará a apresentação dos projetos do PCP relacionados com os offshore e com a criminalidade económica e

financeira.

No que se refere ao enriquecimento injustificado, foi precisamente há oito anos que o PCP apresentou

nesta Assembleia, em 15 de fevereiro de 2007, um projeto de lei nessa altura também designado por

«enriquecimento injustificado». Mais tarde, em 2009, nas iniciativas legislativas evoluiu-se para a designação

de «enriquecimento ilícito» e temos, de certa forma, oscilado nesta designação para propormos iniciativas que

basicamente têm o mesmo objeto.

Nessa altura, há oito anos, o projeto de lei apresentado pelo PCP foi rejeitado com os votos contra do PS,

do PSD e do CDS. Houve uma evolução quando apresentámos uma iniciativa em 2009, pela segunda vez:

nessa altura os votos contra foram apenas do PS e do CDS. Até que, finalmente, foi possível encontrar uma

solução maioritária para aprovar um texto que foi declarado inconstitucional pelo Tribunal Constitucional, como

sabemos, com a consideração de que o texto aqui aprovado violava a presunção de inocência

constitucionalmente consagrada por significar uma inversão do ónus da prova relativamente à prática do ilícito

criminal.

Na iniciativa que agora apresentamos, temos escrupulosamente em conta aquela que foi a decisão do

Tribunal Constitucional. Uma das considerações feitas e que levou à declaração de inconstitucionalidade era a

de que não havia precisão quanto à determinação do bem jurídico a defender com a criminalização do

enriquecimento ilícito — foi assim que se designou o texto então aprovado. Daí que aquilo que o PCP agora

propõe é que muito claramente se estabeleça que o bem jurídico a preservar é o valor da transparência na

obtenção de património e rendimentos. É esse o valor a que corresponde uma obrigação de declaração de um

património, declaração inicial se esse património for acima de 400 salários mínimos nacionais. Ou seja, um

património que seja superior a 200 000 € deve ser declarado ab initio, após a entrada em vigor do texto legal

que for aprovado e, para além disso, acréscimos patrimoniais de valores superiores a 200 salários mínimos

deve implicar, obrigatoriamente, uma atualização dessa declaração dentro de um determinado prazo com

indicação da origem desse acréscimo patrimonial ou desse acréscimo de rendimentos. É a forma que

encontramos para tutelar juridicamente, com a aplicação de uma sanção penal em caso de incumprimento, o

valor da transparência.

Portanto, respondemos à crítica fundamental feita pelo Tribunal Constitucional, que considerava que o

enriquecimento só por ocorrer não pode significar um ilícito criminal, apenas seria ilícito se tivesse por detrás

uma origem ilícita, e isso teria de ser demonstrado pelas autoridades judiciárias. O ónus da prova não deveria

recair sobre o próprio agente.

O que agora dizemos é que a não declaração ou a não declaração da origem do acréscimo patrimonial

deve ser, essa, sim, um ilícito criminal, deve ter uma sanção penal direta. Claro que esse enriquecimento não

justificado poderá ser indício da prática de outros atos criminosos, mas aí, então, as autoridades judiciárias,

com base nesses indícios, terão de fazer a investigação necessária. Mas a injustificação do rendimento, essa,

já é, em si mesma, um ilícito, em nome da transparência que importa tutelar.

Entendemos que este regime para os titulares de cargos políticos, de altos cargos públicos ou de

funcionários deve ser um regime agravado, mas este crime deve existir para o conjunto da sociedade e,

portanto, também outros cidadãos que tenham um acréscimo patrimonial injustificado devem ter o dever social

de, perante os seus concidadãos, justificar esse acréscimo patrimonial.

Sublinhamos que deve haver um regime mais agravado para funcionários e titulares de cargos políticos e

altos cargos públicos, mas deve haver um dever geral de transparência que impenda sobre o conjunto da

sociedade. Todos temos, na sociedade portuguesa, a experiência amarga de atos de corrupção gravíssimos

que são praticados no âmbito do setor privado, designadamente no âmbito do setor financeiro, e isso também

não deve ficar impune quando se criminaliza o enriquecimento injustificado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — Há também soluções propostas pelos outros partidos, pelo que a nossa

posição é a de que deve haver uma viabilização para especialidade de todas as iniciativas apresentadas, sem

prejuízo de termos algumas dúvidas e divergências relativamente a outros caminhos que são encetados.

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Quer-nos parecer, designadamente, que o projeto do Partido Socialista significa um regime mais agravado,

se se quiser, da declaração de rendimentos de titulares de cargos políticos, que já existe hoje. Relativamente

ao projeto do PSD, pensamos que falta um aspeto, que é o da obrigação de declaração, a qual não é explícita

e deveria haver uma explícita obrigação de declaração a partir da qual fosse aferível o enriquecimento

injustificado, e também nos parece que se justifica um maior aperfeiçoamento quanto à precisão do bem

jurídico-penal a proteger. Parece-nos que a formulação encontrada pelo PSD não responde inteiramente às

questões suscitadas pelo Tribunal Constitucional.

Mas essas são questões que podemos e devemos dirimir na especialidade. Fazemos votos para que, mais

cedo do que tarde, esta Legislatura aprove a criminalização do enriquecimento injustificado, porque seria um

passo muito significativo e de muito valor no combate à corrupção, que é um combate que muito preocupa os

portugueses.

A impunidade do enriquecimento injustificado é, de facto, algo que falta na nossa ordem jurídica, que é

sentido pela generalidade dos nossos concidadãos e a Assembleia da República tem o dever de corresponder

a essa preocupação, aprovando a legislação pertinente.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Para apresentar o projeto de lei do PSD e do CDS-PP, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Teresa Leal Coelho.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: «Quem adquira,

possua, utilize, converta ou transmita bens sabendo que estes têm a sua origem numa atividade criminal,

cometida por ele ou por qualquer terceira pessoa, ou realize qualquer outro ato para ou encobrir a sua origem

ilícita, ou ajudar uma pessoa que haja participado na infração ou infrações a iludir as consequências legais dos

seus atos, será punido com pena de prisão de seis meses a um ano e multa até ao triplo do valor dos bens.

Nestes casos, o tribunal, atendendo à gravidade dos factos e às circunstâncias pessoais do delinquente,

poderá impor também a pena de inabilitação especial para o exercício da sua profissão ou indústria pelo

tempo de um a três anos».

Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: Acabei de ler um trecho do artigo 301.º do Código Penal

espanhol.

«O facto de não poder justificar os recursos correspondentes ao seu modo de vida ou de não poder

justificar a origem de um bem detido, estando em relação direta com uma ou várias pessoas envolvidas na

prática de crimes (…) é punido com uma pena de três anos de prisão e de 75 000 € de multa» — li agora um

trecho do artigo 321-6, que pune o enriquecimento injustificado em França.

Com a leitura destes trechos de normas estrangeiras, pretendo deixar claro, neste Parlamento, que o mito

de que os nossos parceiros europeus não detêm instrumentos jurídico-penais respeitantes à criminalização do

enriquecimento ilícito ou injustificado não passa de um mero mito que tem vindo a ser repetido à exaustão,

mas que não corresponde à realidade dos factos nem se torna verdade pela repetição constante.

Em ambos os casos que referi, Espanha e França, e poderíamos fazer o percurso pela Bélgica e por outros

Estados do nosso paradigma de direitos humanos, o legislador introduziu ferramentas de combate à

criminalidade que passam por constituir crime punível com pena de prisão a fruição de bens de um delito

prévio, sem que a punição dependa da prévia condenação pelo crime base do enriquecimento.

Repito, em ambos os casos, nos ordenamentos jurídicos espanhol e francês, da nossa matriz de direitos

humanos, aquilo que o legislador entendeu introduzir no foro do direito penal foi, precisamente, um crime

punível com pena de prisão, decorrente da fruição de bens de origem ilícita, sem que o prévio delito tenha de

ser identificado ou sirva de base à condenação e à aplicação de uma pena.

Espero que este mito de que a criminalização do enriquecimento ilícito ou do enriquecimento injustificado e

de que a presunção da inocência tem nos nossos parceiros europeus um caráter absoluto, possa seguir o seu

percurso doutrinário em Portugal, tal como seguiu noutros Estados-membros da União Europeia e do

Conselho da Europa e também da Organização das Nações Unidas.

As normas que citei, do Código Penal espanhol e do Código Penal, francês foram introduzidas ou

modificadas, no caso da França, respetivamente, em 2003 e 2006. Foi um longo percurso, desde 1981, que a

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doutrina e a jurisprudência dos nossos parceiros europeus trilharam, no sentido de admitir restrições à

presunção de inocência, sempre que outros valores igualmente atendíveis estejam em causa.

Sem prejuízo da especial proteção que os ordenamentos jurídicos da nossa matriz de Estado de direito

democrático e de economia de mercado devem garantir à formação, aquisição, manutenção e transmissão do

património, simultaneamente, devem assegurar condições de correta formação do património, punindo,

através de sanções penais, a formação e a fruição de património irregularmente constituído. Só há proteção da

aquisição do património e da fruição do património, tal como a nossa matriz do direito à propriedade privada

sustenta, se a proteção for feita, em simultâneo, pela via penal, contra aquisições e fruições irregulares do

património.

É nossa convicção de que as circunstâncias em que o património de alguém ou a fruição continuada de

património manifestamente incompatível perante os rendimentos e os bens declarados ou a declarar é objeto

de um juízo de forte censura social, como já foi aqui referido pelos Deputados que me antecederam.

Este comportamento constitui uma perturbação grave à ordem social e à proteção das condições sociais e

económicas e atenta contra interesses fundamentais do Estado. Trata-se de um comportamento desviante da

ordem jurídica instituída.

Este juízo é tão mais evidente num contexto em que uma grave crise financeira afetou as economias

nacional e internacional, nomeadamente no que respeita à preservação dos recursos financeiros e

económicos necessários ao desenvolvimento humano, social e económico, à confiança nas instituições, à

salvaguarda da convivência pacífica da sociedade, à transparência e à probidade, bem como à credibilidade

no mercado nacional, à equidade, à livre concorrência e à igualdade de oportunidades — valores que

constituem o núcleo essencial dos interesses fundamentais do Estado e da vida comunitária.

Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: Com um olhar objetivo sobre a sociedade portuguesa,

há uma forte perceção da evidência de que alguns, nas últimas décadas, se apropriaram de recursos

indispensáveis à promoção do progresso. Isto mesmo acabou de ser também referido pelos Deputados que

me antecederam e é um juízo de vox populi.

A sociedade portuguesa, nas últimas décadas, gerou ricos a quem se deve exigir que prestem contas, sem

receios nem subterfúgios e sem medo de ofender os mais privilegiados ou os mais dominantes.

É neste enquadramento que defendemos, desde há mais de uma década, o juízo de política criminal de

criminalizar o enriquecimento ilícito, injustificado ou desproporcionado, como lhe queiram chamar, com o

objetivo de alargar as ferramentas de investigação e combate à corrupção e, por outro lado, com o objetivo de

impor um elevado nível de escrutínio sobre a obtenção e fruição de património, nos casos em que há fortes

indícios de que não foi corretamente formado.

É hoje incontroverso que a disparidade manifesta entre os rendimentos e o património representa uma

grave disfunção social.

Deve, por isso, a política legislativa criminal fazer corresponder a este juízo de censura um tipo de crime,

adequado à prevenção e à repressão dos comportamentos atentatórios dos valores da transparência e da

probidade, bem como desviantes do desenvolvimento económico, social e humano, preservando,

simultaneamente, os princípios conformadores do Estado de direito democrático, a par da garantia da

operacionalidade do instrumento jurídico, da ferramenta de combate à criminalidade e à corrupção.

Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: Não descuramos a necessidade de dar resposta às

questões de inconstitucionalidade pronunciadas pela jurisprudência do Tribunal Constitucional, vertida no

douto Acórdão n.º 179/2012, razão pela qual, no âmbito do projeto de lei n.º 798/XII, que apresentamos

conjuntamente com o Grupo Parlamentar do CDS-PP, promovemos uma mais detalhada identificação dos

bens jurídicos tutelados, bem como caracterizamos com maior precisão o comportamento censurado e

garantimos que a prova dos elementos do crime compete exclusivamente ao Ministério Público.

Por outro lado, considerando que a formação ou fruição irregular de património deve ser particularmente

sancionada no que respeita a quem tem especiais deveres de transparência e probidade, propomos que, para

titulares de cargos políticos ou de alto cargo público, o valor da incompatibilidade relevante para efeitos de

criminalização conte a partir de uma discrepância superior a 100 salários mínimos (cerca de 50 000 €) e que,

para estes, a pena seja especialmente agravada a partir da discrepância acima de 350 salários mínimos

(cerca de 175 000 €), subindo o valor da incompatibilidade relevante para efeitos de criminalização de

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comportamento privado para 350 salários mínimos (cerca de 175 000 €) e seja especialmente agravada a

partir da discrepância de 500 salários mínimos (cerca de 250 000 €).

Por último, propomos que as penas aplicadas a titulares de cargos políticos ou de alto cargo público sejam

de 5 e 8 anos, em função da desproporção, e para os cidadãos em geral de 3 e 5 anos.

Este é o projeto que hoje aqui apresentamos, propondo-nos, desde já, a promover, em sede de

especialidade, um debate concertado com as várias forças políticas representadas neste Parlamento, com

vista a introduzir os contributos que vierem a ser objeto de consensualidade. E, necessariamente, estamos

disponíveis para dar os nossos contributos a todos os projetos que vimos, com grande satisfação, dar entrada

neste Parlamento, sobretudo os projetos apresentados pelo BE e pelo PCP.

Estamos de acordo com a necessidade de exigir declarações de rendimentos, declarações de património

acima de determinados montantes. Entendemos que a circunstância atual económica e financeira justifica que

se exija tal declaração a quem exiba patrimónios manifestamente elevados, relativamente à mediana dos

patrimónios, deve ter uma justificação.

Muito obrigada pela atenção, Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Muito obrigada, Sr.a Deputada Teresa Leal Coelho.

A Mesa regista pedidos de esclarecimento por parte do BE e do PCP. Pergunto se a Sr.a Deputada

pretende responder em conjunto ou separadamente.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Em conjunto, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: — Muito bem, Sr.a Deputada.

Tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.a Deputada Helena Pinto para formular pedidos de esclarecimentos.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.a Deputada Teresa Leal Coelho, o projeto de lei agora

apresentado pelo PSD e pelo CDS, e que a Sr.a Deputada nos detalhou, quer responder e ultrapassar as

questões colocadas pelo Tribunal Constitucional, quando este se pronunciou pela inconstitucionalidade do

diploma, aprovado por esta Assembleia, sobre o enriquecimento ilícito.

Penso ser preocupação de todas e de todos encontrar as soluções adequadas e constitucionais para um

novo patamar no combate à corrupção no nosso País. Por isso, Sr.a Deputada Teresa Leal Coelho, registando

as suas opiniões e as palavras expendidas em relação ao projeto de lei apresentado pelo Bloco de Esquerda,

queremos colocar-lhe duas questões.

Uma questão prende-se com a definição do bem jurídico a proteger.

Como sabe, e é referido no vosso projeto de lei, este foi um dos fundamentos para a pronúncia da

inconstitucionalidade. A opção do Bloco de Esquerda foi a de considerar a obrigação de transparência dos

titulares de cargos políticos e públicos, no que diz respeito ao seu património e rendimentos, como o bem

jurídico a proteger.

Na nossa apreciação, o projeto de lei do PSD e do CDS persiste numa indefinição do bem jurídico, não

respondendo ainda, cabalmente, ao acórdão do Tribunal Constitucional. Por isso, gostávamos que a Sr.a

Deputada fosse um pouco mais longe neste aspeto.

A nossa segunda questão prende-se com a proposta do Bloco de Esquerda para a criação da entidade de

transparência dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos.

Não considera a Sr.a Deputada Teresa Leal Coelho que a atual situação, que, aliás, também caracterizou

na sua intervenção, e a menor atenção do Tribunal Constitucional em relação às declarações dos titulares de

cargos públicos — existe uma menor atenção, não propositada, mas devido às circunstâncias — tem

dificultado a fiscalização e, por isso mesmo, reduzido a eficácia que se exige sobre esta matéria?

A criação desta entidade, dotando-a dos recursos necessários, como é óbvio, não contribuirá, ela própria,

para a credibilização da política, respondendo àquilo de que a Sr.a Deputada também falou, a tal consciência

social existente de repúdio pela opacidade, por um lado, mas também respondendo à constatação de que não

existe fiscalização suficiente em relação às obrigações dos titulares de cargos políticos?

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Nesta fase do debate, eram estas as questões que lhe gostaríamos de colocar.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.a Deputada Teresa Leal Coelho, queria colocar-lhe duas

questões relacionadas com o projeto de lei do PSD e do CDS-PP, que acabou de apresentar, e a que, de certa

forma, já aludi na minha intervenção inicial, mas que gostaria de aprofundar.

Em primeiro lugar, parece-nos que, no projeto de lei, falta uma obrigação declarativa específica. Porquê?

Porque se criminaliza um acréscimo patrimonial e esse acréscimo tem de ter, como base, um ponto de partida,

qualquer que ele seja; tem de acrescer a algo.

Acontece que declarações de património têm-nas os titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos,

não as têm outros cidadãos. E na declaração de rendimentos que todos os cidadãos fazem em sede de IRS,

pelo menos aqueles cidadãos que têm um nível de rendimentos que é compatível com aquilo que se exige,

que não tenham rendimentos mais exíguos, não há, de facto, uma declaração específica de património que

possa servir de ponto de partida para o que se pretende criminalizar.

Por conseguinte, a minha primeira questão é no sentido de saber se não consideram que é necessário que

haja uma obrigação explícita de declaração de rendimentos e património, seja como propomos, junto da

administração fiscal, aproveitando o prazo que existe para a declaração de IRS, seja por outra forma. Mas

quer-nos parecer que há no vosso projeto uma falha, uma omissão que importaria colmatar.

A segunda questão prende-se com a precisão da definição do bem jurídico a tutelar.

Quando o Tribunal Constitucional considerou que não havia, no texto anterior, uma definição de que bem

jurídico era esse, quer-nos parecer que a tentativa que fazem de contornar esta questão arrisca-se a ser

também ela declarada inconstitucional por falta de precisão.

Porque, senão, vejamos.

Os senhores consideram que «a conduta prevista no número anterior…» — ou seja, o enriquecimento —

«… constitui uma perturbação grave à ordem social e à proteção das condições sociais e económicas e atenta

contra interesses fundamentais do Estado, nomeadamente no que respeita à preservação dos recursos

económicos, necessários ao desenvolvimento humano, social e económico, à confiança e à credibilidade das

instituições, e visa salvaguardar a convivência pacífica da sociedade, a transparência das fontes de

rendimentos e a probidade, a credibilidade do mercado nacional, a equidade, a livre concorrência e a

igualdade de oportunidades, valores que constituem o núcleo essencial dos interesses fundamentais do

Estado na vida comunitária». Sr.a Deputada, não me leve a mal, isto ficaria bem no preâmbulo, mas já não fica

bem no articulado.

É que, a constar no articulado, isto trata-se, verdadeiramente, de uma ladainha que tem muito pouca

precisão relativamente ao bem jurídico a defender. Portanto, não estando em desacordo com estes valores

que aqui estão ínsitos, de facto, em abstrato, o que nos parece é que o risco de insistir numa solução

inconstitucional é muito grande.

Portanto, apelávamos para que os Srs. Deputados refletissem sobre esta questão e sobre a necessidade

de haver uma precisão maior relativamente à definição do bem jurídico a defender, para conseguirmos levar

por diante, com êxito, esta nossa tarefa de criminalizar o enriquecimento injustificado ou ilícito, como se

preferir.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.a Deputada Teresa Leal Coelho para responder.

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr.ª Presidente, vou responder aos Srs. Deputados Helena Pinto e

António Filipe simultaneamente, na medida em que as questões colocadas são da mesma natureza.

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Começando pelas referências que foram feitas ao bem jurídico e à necessidade de dar resposta ao

Tribunal Constitucional, no que respeita precisamente à delimitação, à concretização, à especificação de um

bem jurídico a proteger, utilizámos uma técnica legislativa que reconhecemos não ser a melhor…

Vozes do PS: — Ah!…

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — … ao introduzirmos o n.º 2 neste artigo n.º 335.º-A. Mas fizemo-lo,

conscientemente.

O Sr. José Magalhães (PS): — Mal!…

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Aliás, já o tínhamos feito aquando da aprovação da Lei do Segredo

de Estado.

O Sr. José Magalhães (PS): — Mal!…

A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Também na Lei do Segredo de Estado utilizámos uma técnica que

importámos do Código Penal francês e da Lei do Segredo de Estado francesa.

Embora não seja a técnica legislativa usual, é uma técnica legislativa que é pontualmente utilizada,

precisamente para evidenciar questões relacionadas com os valores essenciais de uma determinada ordem

jurídica. E foi por isso mesmo que optámos por introduzir este n.º 2, no artigo n.º 335.º-A, que remete para as

normas do segredo de Estado e para os interesses fundamentais do Estado na criminalização da violação do

segredo de Estado. A nossa Constituição é conforme ao enquadramento, precisamente, desses interesses

fundamentais de Estado.

Em suma, essa norma está em vigor e foi esta a nossa opção.

Por outro lado, entendemos que a transparência e a probidade são valores a preservar, mas entendemos

que, para além da transparência e da probidade, são também valores a preservar aqueles em que se sustenta

a doutrina de décadas relativa à criminalização do enriquecimento ilícito. Não é a doutrina nacional, é a

doutrina estrangeira.

Mas a doutrina estrangeira sustenta a necessidade de criminalização de enriquecimento ilícito e fez o

percurso, relativamente à questão da ponderação ou da necessidade de restrições à presunção de inocência,

face a outros valores igualmente atendíveis, sustentando-os nos valores do Estado de direito e da

necessidade de salvaguarda dos custos financeiros e económicos para o progresso social, que é um valor

absolutamente determinante das sociedades. Foi isso que quisemos concretizar, para além da transparência e

probidade.

Mas como disse há pouco, estamos totalmente disponíveis para receber os contributos e para melhorar

estas soluções.

O nosso entendimento é o de, não obstante estarmos disponíveis para outros caminhos, como já referi na

minha intervenção, fazer o percurso que outras ordens jurídicas fizeram e que chegaram a bom porto. Aliás,

citei aqui duas normas, apesar de o próprio Acórdão do Tribunal Constitucional dizer que nenhum parceiro

europeu criminaliza o enriquecimento ilícito. Não é assim, criminaliza!

Aliás, ouve-se amiúde dizer que nenhum parceiro europeu criminaliza. Eu acabei de ler duas normas em

vigor e poderia ler mais duas ou três normas em vigor que não atendem ao crime a montante. E, portanto, é

esse percurso que também queremos fazer. Também estamos aqui numa cruzada relativa à ponderação de

valores.

Para terminar, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, já tinha feito referência, na minha intervenção inicial, à

questão da declaração de rendimentos. Estamos disponíveis para trabalhar essa matéria.

No nosso projeto, também reportamos a declarações ou comunicações que sejam exigidas por lei, mas

podemos dar passos em frente nesta matéria.

No que diz respeito à entidade de transparência, é, curiosamente, uma importação dos modelos espanhol e

francês. Portanto, se quisermos olhar melhor para esses dois modelos e para a eficiência do combate e da

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investigação à corrupção — tanto no caso francês como no caso espanhol, tem dado provas —, podemos

também seguir esse caminho.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Fica assim apresentada, pelo PSD, a iniciativa conjunta do PSD e do CDS-PP.

Para apresentar a mesma iniciativa, dou a palavra, pelo CDS-PP, ao Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Queríamos, no nosso início

desta discussão sobre a matéria do enriquecimento ilícito, sublinhar um aspeto muito importante, que é o facto

de esta não ser, como aqui já foi dito, de resto por várias bancadas, uma iniciativa isolada. Este não é o ovo de

Colombo que nos permitirá, por assim dizer, combater todos os fenómenos de corrupção.

A Assembleia tem dado passos certos, assertivos sobre este tema. Ainda recentemente aprovámos matéria

que veio das várias recomendações do GRECO (Group of States Against Corruption), que vão desde os

prazos de prescrição ao estatuto de arrependido, um pacote sério de matéria de combate à corrupção. E agora

voltamos, mais de três anos depois do início do último debate que fizemos sobre esta matéria, ao tema do

enriquecimento ilícito. Voltamos depois, inclusivamente, de um diploma ter sido aprovado por esta Câmara

com uma votação ampla de todos os partidos — se não estou em erro, só o Partido Socialista não

acompanhou essa deliberação — e de uma decisão contrária do Tribunal Constitucional.

E voltamos porquê? Do ponto de vista do CDS-PP, sublinharia, em primeiro lugar, que voltamos a esta

matéria agora por uma razão de coerência. Acreditamos que a criminalização do enriquecimento ilícito é

importante e é relevante para Portugal. Esta é a razão de coerência.

Em segundo lugar, fazemo-lo por uma razão de persistência, porque, não obstante as dificuldades e a

dificuldade da matéria, não está na nossa índole, por assim dizer, desistir com facilidade. Portanto,

entendemos que, por uma questão de persistência, devemos insistir nesta matéria.

Por último, fazemo-lo por uma questão de convicção. A nossa convicção é a de que determinadas

situações, determinados comportamentos existentes na sociedade portuguesa e que a chocam com base no

enriquecimento ilícito devem ter uma resposta clara e inequívoca. Esta é a razão de convicção.

Aplausos do CDS-PP.

É evidente que, como disse, este não é um instrumento único. Falei-vos do instrumento do GRECO, podia

falar-vos até do trabalho que anteriormente foi feito numa comissão da Legislatura anterior sobre o combate à

corrupção e que permitiu avanços importantíssimos, nomeadamente no âmbito do crime urbanístico ou da

inelegibilidade dos políticos, designadamente dos autarcas, quando pronunciados por crimes associados ao

seu mandato. Enfim, este é mais um passo para além de muitos outros que já aqui foram dados.

Queria ainda sublinhar um aspeto que me parece fundamental. Depois de trabalho aturado, de debate

interno e no seio da coligação, fizemos uma opção, que foi a de criminalizar o enriquecimento ilícito e de não

seguir nenhum dos sucedâneos possíveis. Havia um outro caminho, mas escolhemos não o seguir.

Do ponto de vista do CDS-PP e do que eu gostaria de vos dizer, queria deixar muito claro — fi-lo, de resto,

há uns anos, quando discutimos o diploma anterior — que não aceitamos a ideia de que a criação de riqueza

seja, por si mesma, um crime ou um comportamento ilícito.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Isso é, do nosso ponto de vista, absolutamente inaceitável.

Muito menos temos ódio ou preconceito em relação àqueles que criam riqueza. Pensamos exatamente o

contrário, ou seja, que a riqueza é um bem que promove o desenvolvimento e que, promovendo o

desenvolvimento, promove o progresso de toda a sociedade. O nosso inimigo é, e será sempre, a pobreza. O

nosso inimigo não é, nem será nunca, a riqueza.

Aplausos do CDS-PP.

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O que queremos criminalizar não é a riqueza nem a obtenção de riqueza. O que queremos criminalizar é a

obtenção ilícita, criminosa e ilegítima de riqueza por parte de alguns, roubando recursos de todos. É isso que

queremos criminalizar.

Não temos, nessa matéria, nenhum preconceito. E, se me permitem, usaria uma frase célebre de Mark

Twain, que é a seguinte: «A riqueza é sempre muito difícil de tolerar, sobretudo se for a riqueza dos outros».

Não temos, portanto, esse preconceito em relação à riqueza.

Sabemos que, nesta matéria, encontramos dificuldades, designadamente do ponto de vista constitucional,

e estas dificuldades levaram-nos a ponderar qual o caminho a seguir, ou seja, perante as dificuldades,

inclusivamente a dificuldade constitucional, como é que poderíamos resolver esta matéria.

Já vos disse que não escolhemos apresentar exatamente o mesmo projeto mas com outra linguagem. Não

foi esse o nosso caminho. Se assim não foi, quais eram as alternativas?

A primeira alternativa, a mais óbvia, era não fazer nada, ou seja, deixar tudo como estava, reconhecer a

dificuldade constitucional e não ter mais nenhuma ação sobre esta matéria.

A segunda alternativa — e essa era uma hipótese que chegámos a ponderar — era a de concentrarmos a

nossa proposta numa solução que fosse essencialmente fiscal. É, nalguma medida, o que fazem outras forças

políticas, designadamente o Bloco de Esquerda e também o PCP, quando apresentam projetos que têm

incidência sobretudo na matéria fiscal.

Devo dizer que, desse ponto de vista, existiriam, nas leituras que fizemos, outros caminhos mais simples e

mais diretos. E reconheço até que seguir uma via estritamente fiscal seria talvez a forma mais fácil de abordar

este caminho e esta mesma matéria. Mas também não foi essa a solução que escolhemos, mesmo sabendo

que podia ser uma solução baseada, por exemplo, nas manifestações de fortuna. Mas não fomos por aí.

A terceira hipótese era fingir que estávamos muito interessados, dizer que também tínhamos um projeto,

apresentar uma coisa que não tem nada a ver com nada, que não muda praticamente nada e, com isso, fingir

que estávamos a participar no debate ou que estávamos interessados no enriquecimento ilícito. Essa é, mais

ou menos, a solução do Partido Socialista, mas também não quisemos ir por aí.

Não escolhemos nenhuma destas opções, ou seja, não procurámos um caminho ao lado e insistimos na

criminalização do enriquecimento ilícito procurando, como aqui foi explicado, responder às questões do

Tribunal Constitucional. Como? Em primeiro lugar, tornando clara a definição de um tipo criminal e tornando-o

mais objetivo, procurando partir de um conceito concreto, que é o do acréscimo patrimonial sempre que ele

seja incompatível com as declarações de rendimentos em dois anos subsequentes, escolhendo esses dois

anos em relação à prática do crime e comparando um com o outro, como é evidente, e alargando também a

fruição, porque se não esvaziaríamos, obviamente, a eficácia deste tipo criminal. Aí procurámos objetivar.

Por outro lado, quisemos tornar mais claro o bem jurídico a proteger. Fazemo-lo de forma detalhada. Já

aqui foi explicado, perguntado e respondido, mas diria que deste bem jurídico há dois aspetos que são

fundamentais. Em primeiro lugar, destacamos a proteção dos interesses fundamentais do Estado, que

sabemos quais são, e dentro desses interesses o bem a proteger, em relação à vida em comunidade, a

confiança e a credibilidade do próprio Estado. Por outro lado, a obrigação de transparência dos titulares de

cargos políticos e de altos funcionários, mas também a obrigação de transparência de todos os cidadãos nas

suas declarações. É aí que se centra o bem jurídico e é aí que procurámos clarificar, também, dando resposta

às dúvidas do Tribunal Constitucional. Por isso, partindo de um tipo de crime que não é estritamente fiscal,

centramos a objetivação desse tipo criminal, depois, na avaliação fiscal e na avaliação das declarações.

Por último, pretendemos responder também, de forma objetiva, à questão da presunção de inocência.

Tínhamos procurado no projeto anterior que, protegendo os honestos, pudesse haver uma explicação do

património por parte do próprio. Como isso foi considerado como inversão do ónus da prova, neste momento e

este projeto não implica nenhuma afirmação de inocência do próprio e, portanto, desse ponto de vista não

inverte, na nossa opinião, o ónus da prova.

Salvaguardamos assim, como disse, os comportamentos honestos, legítimos, bem como as fontes de

rendimento legítimas que estão, de resto, previstas no nosso projeto, como sejam, por exemplo, as

liberalidades, designadamente as doações e as sucessões.

Temos a noção da dificuldade que um projeto deste tipo tem sempre no equilíbrio de valores entre

privacidade e património, por um lado, e transparência, por outro, entre liberdade individual e capacidade de

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controlo da riqueza por parte dos organismos do Estado. Há sempre um equilíbrio que é difícil, mas não

prescindimos de combater comportamentos que consideramos inaceitáveis.

Por outro lado, e em penúltimo lugar, ao contrário do que fazem outros projetos, escolhemos não criar um

crime exclusivo para políticos.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não temos dúvida de que os políticos e os altos funcionários têm

especial responsabilidade, têm deveres, obrigações e ética particulares em relação à generalidade dos

cidadãos. E é por essa especial responsabilidade que o crime é mais grave, é por isso que os valores são

diferentes, é por isso que a moldura penal é maior.

No entanto, não cremos que seja aceitável que haja à partida uma suspeição como se este tipo de crimes e

como se o enriquecimento ilícito fosse uma coisa exclusiva de políticos e de altos funcionários, porque não é,

e isso aí, sim, violaria o princípio da igualdade.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Não queremos também, nem aceitamos — não está nos nossos princípios — uma espécie de big brother

estatal que tudo controla, que tudo quer saber e que sobre tudo quer incidir. Não é essa a nossa ideia. Não

nos esqueceremos nunca da célebre frase de Lord Acton que dizia que «o poder absoluto corrompe

absolutamente». Por isso, não queremos um Estado com poder absoluto que possa invadir toda a esfera de

privacidade nesta ou noutras matérias. Temos a noção que, ao contrário do que se possa dizer e do que se

possa pensar, quanto mais houver Estado, quanto mais tudo depender do Estado, quanto mais o Estado

interferir em todos os setores da vida social, política e económica, mais estamos a criar o campo fértil da

burocracia para que a corrupção possa grassar.

Um Estado reformado, um Estado limitado às suas funções essenciais tem menos campo e menos margem

para a progressão da corrupção.

Termino, Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados, dizendo e repetindo que não temos nenhum preconceito

contra a criação de riqueza. Temos a ideia firme de que a criação ilegítima, a obtenção ilegítima e ilícita de

riqueza deve ser criminalizada, sublinhando e separando os vários papéis, logo à partida o papel da economia

que, numa sociedade moderna, é exatamente o de criar riqueza. É para criar riqueza que a economia existe e

não para qualquer outro fim.

Sublinhamos também o papel da política que é, depois de criada a riqueza, garantir que ela seja distribuída

com justiça, em função do mérito de cada um.

Por último, sublinhamos o papel da justiça, que é o de combater aqueles que se aproveitam e que

procuram obter riqueza de forma ilegítima e ilícita.

Para nós, estes três papéis são separados, são claros e é com esta intenção e com este espírito que agora

aqui apresentamos e defendemos este projeto de combate ao enriquecimento ilícito.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, segue-se a apresentação do projeto de lei do Partido Socialista.

Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Sr.a Presidente, Sr.

as e Srs. Deputados: Este debate e a apreciação dos

projetos em torno do controlo de rendimentos e do património significa um voltar ao ponto de partida de há três

anos, quando a questão poderia ter ficado adequada e eficientemente resolvida no aprofundamento dos

princípios da transparência e da responsabilidade, tal como o PS, então, propôs.

Foi, como todos sabemos, o que infelizmente não aconteceu, dado que, da direita à esquerda deste

hemiciclo, se fizeram orelhas de mercador às advertências feitas e se insistiu em opções cujos vícios

constitucionais vieram a ser inequivocamente confirmados, aliás por unanimidade, pelo Tribunal

Constitucional.

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A inderrogabilidade da presunção de inocência, da não inversão do ónus da prova em direito penal, do in

dubio pro reo e do direito à não autoincriminação continuam…

A inderrogabilidade da presunção de inocência, da não inversão do ónus da prova em direito penal, do in

dubio pro reo e do direito à não autoincriminação continuam a fazer parte da boa herança jurídica e

democrática com que, no PS, nos orgulhamos de identificar, pois foi em nome da liberdade que nos fundámos

como partido e é e será sempre em nome dela e da garantia dos direitos fundamentais que nos bateremos.

Perderam-se, entretanto, por pura teimosia, anos de resposta consistente no aperfeiçoamento do regime

de responsabilidade e de controlo das declarações de rendimentos e património e no tratamento de eventuais

acréscimos patrimoniais não justificados. Mas antes, como agora, continuamos persuadidos do bem fundado

do caminho que apontámos e que, por isso, continuamos a defender.

Pelo que passo a expor as orientações mais relevantes do projeto do PS.

Em primeiro lugar, propõe-se um significativo alargamento do elenco das entidades sujeitas ao dever de

apresentação das declarações de património e rendimentos. Doravante, não apenas aos titulares de cargos

políticos, mas abarcando, também, os altos dirigentes da Administração Pública central, descentralizada e

regional, bem como os administradores do setor público empresarial.

Em segundo lugar, o prazo para apresentação das declarações devidas é encurtado de 60 para 30 dias.

Em terceiro lugar, as declarações exigíveis devem ser apresentadas até ao fim do terceiro ano após a

cessação dos mandatos.

Em quarto lugar, as declarações de património e rendimentos devem passar a desagregar os rendimentos

obtidos e a identificar as suas fontes.

Em quinto lugar, a eventual recusa de apresentação da declaração devida fará incorrer o responsável em

crime de desobediência.

Em sexto lugar, a avaliação das declarações, tanto na disponibilidade do Tribunal Constitucional, como do

Ministério Público, como da Autoridade Tributária, além das já vigentes regras sobre consulta pública, devem

passar a ser registadas em suporte eletrónico e, consequentemente, suscetíveis de utilização mais eficiente.

Em sétimo lugar, por efeito do cruzamento de dados ou na base de investigação ao abrigo do regime legal

dos sinais exteriores de riqueza, a administração fiscal pode providenciar, junto do tribunal tributário, a

apreensão cautelar de todo o acervo patrimonial não devidamente justificado.

Em oitavo lugar, em sede de Código do IRS, prevê-se o agravamento da taxa fiscal incidente sobre o

património não justificado, que passa dos atuais 60% para 80%.

Em nono lugar, estabelece-se adequada compatibilização de normas, por forma a garantir que, em caso de

condenação por crime de natureza económica e financeira, e em resultado de sentença, o referido acervo

patrimonial não justificado seja definitivamente perdido a favor do Estado. E é oportuno lembrar que foi por

iniciativa de um Governo do PS, em 2002, que a lei relativa à criminalidade económica e financeira já prevê tal

solução.

Em décimo lugar, para que procedimentos penais possam ter lugar, no caso de a eles haver lugar em

relação à prática dos crimes de natureza económica e financeira ou inerentes à corrupção, a participação da

administração fiscal ao Ministério Público deve, necessariamente, ter lugar nas situações verificadas de não

justificação dos rendimentos e do património.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, reafirmamos, pois, a integral coerência da proposta do PS, e é tempo para

declarar que o Grupo Parlamentar do PS estabeleceu como orientação viabilizar, na generalidade, por

abstenção, o conjunto dos demais projetos apresentados. Vai fazê-lo em nome de um empenhamento genuíno

em contribuir para um resultado positivo do presente processo legislativo. Mas fica o aviso: no final do

processo, só poderá votar favoravelmente soluções conformes com os princípios matriciais do Estado de

direito.

Aplausos do PS.

É, pois, em nome desses princípios que importa clarificar, desde já, as orientações que não

acompanhamos.

Aquelas que, em sede criminal, continuam a comprometer o princípio da presunção de inocência e, com

ele, a proteção da não incriminação própria ou da proibição da inversão do ónus da prova.

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Aquelas que implicam o confisco por decisão administrativa, mesmo sem prova provada da prática de

ilícitos criminais.

Aquelas que, no seu radicalismo, entram em contradição consigo mesmas ao, por exemplo, estipularem

que a aquisição de um bem, pouco acima de 30 000 €, face a um rendimento de 25 000, faz incorrer o agente,

qualquer pessoa, portanto, na imediata presunção de enriquecimento injustificado e, consequentemente, é

alvo de avaliação fiscal, mas, pasme-se, sendo o rendimento inferior a esse montante e a aquisição

largamente superior, então, contraditoriamente, tudo pode acontecer sem qualquer dever de avaliação.

Aquelas orientações que, desistindo de exigir a identificação de um concreto tipo criminal relativo às várias

formas de enriquecimento ilícito, constroem um bem jurídico meramente formal e com natureza ideológica, que

identificam com designados, cito, «interesses fundamentais do Estado e da vida comunitária». Para quê? Para

assim intentarem criminalizar situações e comportamentos, independentemente da prova de enriquecimento

ilícito e da formação da culpa conexa, na verdade, limitando-se a um simples juízo de perigo abstrato.

Mas, como já disse o Conselho Superior da Magistratura na Assembleia da República, a transparência não

é um bem jurídico em si, é um instrumento para a realização de outros bens jurídicos.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Por isso, a natureza ideológica, tal como estabelecida, de um bem jurídico

fabricado de modo grosseiramente proclamatório e difuso — ladainha, como lhe chamava, há pouco, o Sr.

Deputado António Filipe —, é, por isso, desmerecedor de tutela penal constitucionalmente protegida,

compromete irremediavelmente as conceções tributárias do iluminismo liberal e racionalista a que até há

pouco, em democracia, a direita tinha sabido ser fiel. Se, como se apresenta agora, o projeto do PSD e do

CDS se fizesse lei, os critérios de valor constitucional da necessidade, da adequação e da proporcionalidade e

os princípios da subsidiariedade e da proibição do excesso em direito penal passariam a letra morta. Que

repúdio deste atentado a princípios basilares do Estado de direito não haveria de exprimir homens como Sá

Carneiro, Menéres Pimentel ou Mário Raposo, a cuja memória aqui me inclino.

O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!

O Sr. Jorge Lacão (PS): — E, a propósito, meditemos no que lapidarmente diz o Professor Jorge

Figueiredo Dias, no seu Manual de Direito Penal, e cito: «Deve manter-se a recusa de qualquer conceção

penal baseada na extensão da criminalização, que transforme o direito penal em instrumento diário de governo

da sociedade e em motor ou propulsor de fins de pura política estadual».

E diz mais o Professor: «que a eficiência descarnada…» — e a expressão é sua — «… do direito penal não

pode constituir base de legitimação democrática».

E outra, acrescento, não pode, pois, ser a conclusão aplicável a uma tentativa de criar um ilícito criminal

relativo a acréscimos patrimoniais sem cuidar de exigir a identificação das formas de aquisição ilícita desses

acréscimos. Trata-se, nos seus termos, da própria confissão do fracasso, e, portanto, da evidência da

instrumentalização do direito penal como arma de arremesso ao serviço de meros fins populistas de afirmação

fácil do combate político.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Muito bem!

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Por isso, pergunto a todas as Sr.as

e todos os Srs. Deputados, sabendo que,

no catálogo dos crimes legalmente previstos, já figuram condutas censuráveis que vão da corrupção ao

peculato, do tráfico de capitais ao tráfico de influências, da fraude fiscal à participação económica em negócio,

para só citar alguns de entre outros crimes igualmente graves, pergunta-se se será legitimo submeter toda a

sociedade a um novo tipo criminal em que, face à categoria de criminalidade altamente organizada que lhe é

estabelecido, todo e qualquer cidadão, independentemente da suspeita em relação a concretas atividades

delituosas, face a indiciada desconformidade de rendimentos e bens, possa ser submetido — repare-se bem

— a procedimentos de investigação e prevenção, antes, sequer, da abertura formal de inquérito e da

constituição de arguido e, portanto, sem prazo, com procedimentos que, além de incluírem a quebra do sigilo

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bancário e do sigilo fiscal, admitem o recurso a regimes agravados de proteção especial de testemunhas, das

ações infiltradas, da gravação da voz e da imagem por qualquer meio.

É esta uma resposta necessária, adequada, proporcional e compatível com o estatuto de proteção dos

cidadãos ou é esta uma resposta que convoca a cultura do estado policial atrás de cada pessoa tornada

suspeita e nem sequer, necessariamente, da prática de um ilícito criminal do catálogo. Não é isto o maior

atentado a uma conceção democrática da ordem pública? Em que sociedade queremos viver, afinal? Ou será

que prevenir e combater a impunidade já não carece de fazer respeitar as liberdades fundamentais?

Depois, se damos a consideração devida à condição dos representantes democráticos do povo, não é

possível deixar de questionar que princípio de justiça e equidade pode justificar que, no fim das contas, a um

particular investigado se declare um estatuto de não punibilidade, beneficiário de uma espécie de perdão

prévio até ao limiar da ordem dos 175 000 € de acréscimo patrimonial ou de fruição patrimonial incompatível

com os seus rendimentos e bens e que só a partir de 250 000 € se permita, em face da moldura penal

aplicável, fazer atuar a possibilidade da prisão preventiva, mas, em contraste, a titular de cargo político baste

uma contradição objetiva na casa dos 50 000 € para o fazer incorrer em situação criminosa, suscetível de

prisão preventiva.

Por isso, digo: agravar descontroladamente, repito, agravar descontroladamente sanções penais por causa

de responsabilidades políticas representa a maior confissão do fracasso da idoneidade no funcionamento da

própria democracia.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Muito bem!

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Daí que pergunte: haverá limites para fazer de um agente político um potencial

bode expiatório das insatisfações coletivas? Haverá limites para este tipo de populismo, que já nada tem a ver

com a promoção dos valores da transparência e da confiança, mas tudo tem a ver com uma corrida louca para

o suicídio da credibilidade das instituições democráticas?

Aplausos do PS.

Em que tipo de sociedade queremos viver, afinal? Como se configura no caso concreto do projeto do PSD

e do CDS, numa sociedade em que a lei — como seria o caso — protege descaradamente os que mais podem

à custa dos que mais se expõem?

O combate à corrupção e às várias dimensões criminais do enriquecimento, nisso certamente estaremos

de acordo, tem de prosseguir sem desfalecimentos, mas sem submeter o conjunto dos cidadãos ao excesso

de sobrecargas burocráticas, a investigações e fiscalizações desproporcionadas, nuns casos, a efeitos penais

violadores da presunção de inocência, noutros, ao confisco desligado da prova material do crime, noutros

ainda, e a discriminações infamantes que nenhum princípio de justiça pode acolher.

Norberto Bobbio escreveu um dia que «uma sociedade torna-se mais ingovernável quanto mais aumentam

os pedidos da sociedade e não aumenta, de um modo correspondente, a capacidade das instituições para

lhes dar resposta». São palavras bem ponderadas, a merecer que nos perguntemos se o esforço legislativo

em que nos envolvemos é realmente destinado a fortalecer a capacidade de resposta das instituições ou a dar

a ilusão de que construímos um megassistema de controlo dos atos das pessoas, um quadro de fiscalização

orwelliano que, afinal, acabe por redundar na suprema imperfeição do seu incumprimento ou, por hipocrisia

premeditada, na sua deliberada inaplicabilidade, tanto mais quanto o tipo legal designado «enriquecimento

ilícito» acaba a ser exclusivamente atribuído à competência de uma polícia, apesar de os meios de avaliação

estarem largamente no domínio da autoridade fiscal. Ou seja: onde se põe a competência, faltarão os meios,

onde estão as condições e os meios nega-se a competência. Portanto, como balanço, uma soma de soluções

erróneas e erradas.

Em contraste, volto a afirmá-lo, o PS julga ter encontrado o caminho adequado, um caminho exigente em

que os titulares de cargos políticos, os dirigentes superiores da Administração Pública e os gestores públicos

respondam adequadamente e também, por consequências fiscais para rendimentos e património, não

devidamente justificados que, nesse caso, se agravam sensivelmente.

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Estamos cientes do grau de exigência, ponderação e rigor das nossas soluções e continuamos

convencidos de que tais soluções são as que, com sentido geral de justiça e seriedade de propósitos, a

sociedade espera de nós.

As audições que, em sede de Comissão, iremos propor em muito, estamos certos, se encarregarão de

iluminar a viabilidade dos caminhos a seguir.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Fica, assim, apresentado o projeto de lei do PS.

Para apresentar as iniciativas legislativas do PCP, dou a palavra ao Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: As outras duas iniciativas que o

PCP traz a este debate, além da do enriquecimento injustificado, são iniciativas verdadeiramente pioneiras do

debate parlamentar e tratam de uma matéria que é da maior relevância.

Ao longo dos anos temos vindo a confirmar a miríade de problemas que surgem a partir da existência de

offshore, problemas, de resto, em muitas circunstâncias identificados no debate político que vamos fazendo na

Assembleia da República e que sempre encontraram uma constatação: a de que Portugal não pode, por si só,

acabar com os offshore por todo o mundo e, portanto, o reconhecimento da insuficiência dessa posição

unilateral do País foi sempre um obstáculo no debate político.

Ora, o que o PCP hoje faz neste debate é precisamente apontar um caminho para ultrapassar esse

obstáculo. E procuramos ultrapassá-lo com a noção da verdadeira dimensão do problema que temos à frente.

Quando falamos de offshore, não estamos só a falar de paraísos fiscais, estamos a falar de outras

realidades de outros territórios, países ou regiões que não só pelos regimes fiscais mas por outras condições

se constituem como biombos atrás dos quais se escondem realidades criminais, realidades de corrupção, de

tráfico de influências, de fraude fiscal, do necessário branqueamento de capitais, porque se trata de realidades

que se escondem por trás de uma barreira intransponível quer das autoridades de supervisão, quer das

autoridades judiciárias.

As zonas offshore são, de facto, em muitas situações, autênticas zonas insondáveis do ponto de vista da

supervisão financeira e da cooperação judicial.

A existência destes espaços jurídicos funciona como uma zona livre de vigilância, de supervisão ou de

ação judiciária. Temos vindo a confirmar, ao longo dos anos, as múltiplas dificuldades que se colocam ao

Banco de Portugal, ao Instituto de Seguros de Portugal, à CMVM, ao próprio Ministério Público na perseguição

e punição da atividade criminal que utiliza os centros offshore como um biombo para esconder as operações

que dão suporte a essa atuação criminosa. Portanto, trata-se de zonas onde nem a lei fiscal, nem as

autoridades judiciárias ou sequer a supervisão financeira conseguem entrar.

Os exemplos são variados e poderíamos referir aqui um longo rol, mas referiremos apenas um deles: a

situação do BPN, onde se confirmou que, pela utilização de entidades criadas pelo próprio grupo com sede em

paraísos fiscais, particularmente em centros offshore não cooperantes, ou seja, em centros offshore onde não

há qualquer cooperação com as autoridades de supervisão financeira portuguesas ou com as autoridades

judiciárias portuguesas, se desenvolveram práticas criminosas que estão a coberto de qualquer tipo de

fiscalização, de vigilância ou, até, da própria punição.

E, Sr.as

e Srs. Deputados, estas realidades originam dramáticas consequências para os cidadãos e os

Estados não só nos planos económico e financeiro, mas também no plano criminal.

O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Os offshore são, de facto, verdadeiros biombos atrás dos quais se

escondem hoje várias expressões da criminalidade.

A utilização de complexos esquemas e redes de empresas — muitas das quais sediadas em offshore,

cooperantes ou não — é um elemento comum que impossibilita ou dificulta essa intervenção, que já referimos,

no plano da supervisão ou da intervenção criminal, permitem o desenvolvimento de práticas que visam apenas

a obtenção de rendas máximas ou da ocultação da proveniência ou destino do capital — particularmente

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quando ele tem uma proveniência ou um destino relacionado com a criminalidade —, de operações de

planeamento e engenharia fiscal, de «circularização» e branqueamento de capitais. E os offshore são, de

facto, plataformas utilizadas para criar esquemas complexos de fuga aos impostos ou de branqueamento de

capitais, bem como para concretizar operações financeiras entre empresas, de forma a artificialmente

inflacionar os seus lucros ou ocultar dívida — as conhecidas operações de round tripping ou, em português,

operações de ida e volta.

Sr.as

e Srs. Deputados, considerando todo este quadro, considerando todo este cenário, não só no plano

nacional como internacional, de dificuldades em combater a criminalidade e de obter a informação necessária

para efeitos de supervisão ou de exercício de ação criminal, é fundamental encontrar uma resposta para

aquele obstáculo que está identificado de há muito tempo a esta parte.

Tem sido várias vezes afirmado que a existência de paraísos fiscais ultrapassa a capacidade de

intervenção e decisão de um só Estado. De facto, o papel dos veículos sediados nos offshore deve convocar a

ação política e diplomática, visando a extinção dos centros offshore à escala global.

Combater ativamente nos planos nacional e internacional e no âmbito das relações entre Estados a

existência, a constituição e a utilização de paraísos fiscais, que são verdadeiras câmaras obscuras da

economia e da finança, particularmente da criminalidade económica e financeira, é a proposta que o PCP hoje

aqui traz.

Se é verdade que um governo não pode decidir o fim dos paraísos fiscais além das suas fronteiras, não é

menos verdade que um governo tem toda a legitimidade para pugnar pelo fim dessas estruturas junto dos

restantes Estados e instituições internacionais, nomeadamente da União Europeia e das Nações Unidas, seja

pela negociação, seja pela subscrição ou conceção de tratados internacionais, no sentido de combater a

existência dos offshore.

E enquanto tal objetivo não é atingido deve assumir-se a necessidade da ação legislativa no sentido da

limitação das possibilidades de utilização dos offshore, com o reforço das medidas de controlo e prevenção

por parte das autoridades fiscais, judiciais, económicas e financeiras, de supervisão e regulação.

Cada governo, cada Estado, tem competência para, na sua própria sede, impedir o envolvimento de

paraísos fiscais e jurisdições não cooperantes em fluxos financeiros ou operações que envolvam a riqueza

gerada nos seus próprios territórios.

O PCP apresenta, portanto, dois projetos que correspondem inteiramente a estas preocupações. Por um

lado, propomos um plano de ação concertada a nível nacional e internacional — e incluindo, obviamente, a

União Europeia e a ONU — para a extinção dos offshore, que prevê que o Estado português assuma uma

posição clara no sentido de pôr fim à existência dos mesmos.

Por outro lado, entendemos que é determinante que Portugal inicie a aplicação de normas que limitem a

exposição da sua economia, do seu sistema financeiro e do seu sistema judicial à utilização dos offshore e

apresentamos um conjunto de propostas concretas relacionadas com estas matérias para que se possa dar

concretização a estes objetivos de combate à criminalidade económica e financeira.

Sr.as

e Srs. Deputados, o que fazemos é, procurando aproveitar o que já hoje existe no plano da legislação

nacional, nomeadamente, de combate ao branqueamento de capitais e à criminalidade económica e

financeira, encontrar formas de identificar offshore que o são só por si e offshore não cooperantes, ou seja,

aquele tipo de offshore onde não há qualquer articulação com as entidades de supervisão ou as autoridades

judiciárias.

Por outro lado, pretendemos envolver os próprios supervisores e o próprio Ministério Público na definição

das condições que devem ser respeitadas para ser verificada essa cooperação.

Identificados os offshore não cooperantes, o que propomos é o estabelecimento de uma proibição de

relações comerciais, profissionais ou de realização de operações financeiras que tenham como destino ou

proveniência entidades sediadas em offshore não cooperantes.

Relativamente a todos os outros offshore, o que propomos é um mecanismo de registo e controlo das

relações comerciais, das operações financeiras realizadas, aproveitando exatamente todo o regime que já

existe para o controlo das operações financeiras relacionadas com o branqueamento de capitais.

De resto, nestes projetos, procurámos utilizar, na definição dos conceitos, o muito trabalho que já foi

avançado, quer no plano nacional, quer no plano internacional, pelos Estados e pelas entidades de

supervisão, aproveitando, nomeadamente, aquilo que resulta dos regulamentos do Banco de Portugal, que foi,

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ao longo do tempo, desenvolvendo regulamentação relacionada com os offshore. Portanto, procurámos utilizar

conceitos que sejam os mais definidos possível para que se possa, de facto, combater a criminalidade que se

esconde por trás dos offshore e se possa apontar um objetivo de extinção internacional dos offshore, sem que

isso signifique que fiquemos de braços cruzados.

Sr.as

e Srs. Deputados, para terminar, queria apenas dizer que a constatação de que os offshore são um

mecanismo que esconde uma boa parte da criminalidade que estamos hoje aqui a tratar deve conduzir a uma

consequência que, julgamos nós, é a necessidade de afirmação pelo Estado português do seu empenhamento

na extinção dos offshore e na tomada de medidas que, até que eles estejam extintos internacionalmente,

combatam e previnam a criminalidade económica e financeira, também por via do controlo, da fiscalização ou

da proibição de relações com offshore.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Ficam, assim, apresentadas as iniciativas do PCP.

Prosseguimos o debate com as intervenções dos oradores já inscritos: pelo Partido Ecologista «Os

Verdes» o Sr. Deputado José Luís Ferreira e pelo Bloco de Esquerda o Sr. Deputado Luís Fazenda.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: O combate à

corrupção volta a marcar a agenda, volta a ser tema nesta Assembleia da República.

Temos, assim, pela frente a discussão de um importante pacote legislativo em matéria de combate à

corrupção, um vasto e largo conjunto de propostas que vão desde o reforço do controlo de acréscimos

patrimoniais não justificados ou não declarados dos titulares de cargos políticos e equiparados à transparência

dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, até ao enriquecimento ilícito ou injustificado,

passando, ainda, pelo reforço ao combate à criminalidade económica e financeira e pela extinção dos centros

offshore.

Estamos, portanto, a discutir iniciativas legislativas que versam sobre matéria importante, algumas das

quais já foram, aliás, objeto de discussão nesta Assembleia da República e até nesta Legislatura, mas nem

por isso perdem a sua oportunidade e, sobretudo, a sua importância. Apesar de serem vários, os projetos em

discussão, todos convergem, de uma forma ou de outra, num único propósito e num só objetivo: combater a

corrupção.

Um combate que se impõe por imperativos éticos. Um combate que se impõe para melhorar a nossa

democracia, tornando-a mais transparente e atribuindo mais rigor à gestão da coisa pública. Um combate para

credibilizar as instituições da nossa democracia, mas também um combate na defesa e na afirmação de uma

cultura de responsabilidade.

Em jeito de antecipação, mas certamente sem surpresa, porque Os Verdes estiveram sempre de acordo

com as propostas aqui discutidas no que diz respeito ao combate à corrupção, quero dizer que Os Verdes

acompanham globalmente todas as iniciativas legislativas hoje apresentadas e acompanham, portanto, os

restantes grupos parlamentares neste elevado combate, que é o combate à corrupção.

Sem prejuízo da importância que as outras propostas revestem, Os Verdes pretendem destacar, por um

lado, o conjunto de iniciativas que incidem sobre o enriquecimento ilícito ou injustificado e, por outro, aquelas

que procuram reforçar o combate à criminalidade económica e financeira através dos centros offshore.

De facto, na nossa perspetiva, estas duas matérias assumem uma importância absolutamente decisiva no

combate que todos reconhecemos ser necessário travar.

Comecemos pela criação do crime de enriquecimento ilícito ou injustificado, aplicável quer a funcionários

públicos, quer a titulares de cargos políticos.

A criação deste tipo criminal pode não ser a solução para acabar com a corrupção, e certamente não será,

mas reveste uma importância decisiva para o sucesso, no seu combate.

Na verdade, a impunidade com que os cidadãos, tantas vezes, vão assistindo ao enriquecimento

«estranho» de pessoas que exercem funções públicas, não fragiliza apenas a ideia de justiça, acaba por

descredibilizar também o conjunto das instituições democráticas, criando fortes desconfianças sobre o seu

funcionamento.

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É também por isso que entendemos que a transparência que deve nortear a gestão da coisa pública e,

sobretudo, a responsabilização das pessoas que têm essa missão perante os cidadãos exigem, a nosso ver, a

criminalização do enriquecimento ilícito.

Naturalmente que esta criminalização deve ser feita no respeito pelas garantias constitucionais, tanto a

nível penal, como a nível processual penal, a começar pela presunção da inocência e tudo o que ela

pressupõe, desde logo, o ónus da prova, que tem, obviamente, de recair sobre o Ministério Público.

Ora, a nosso ver, as iniciativas hoje em discussão, como, aliás, outras no passado, não procedem a

qualquer inversão do ónus da prova e, portanto, pretendem promover o enriquecimento injustificado a crime,

respeitando as garantias constitucionais.

Bem sabemos que o texto aqui aprovado em 2012, também com os votos favoráveis do Grupo Parlamentar

do Partido Ecologista «Os Verdes», acabou por ser declarado inconstitucional, apesar de entendermos que,

nessa proposta, era ao Ministério Público que, no âmbito dos seus poderes de investigação, competia fazer

prova da desproporção entre o património e os rendimentos normais que decorrem do exercício de

determinada função e se essa desproporção fosse obtida de forma lícita, estaria obviamente excluída a

ilicitude. Não havia, portanto, a nosso ver, inversão do ónus da prova.

Não foi, porém, esse o entendimento do Tribunal Constitucional, que, naturalmente, Os Verdes respeitam.

Ora, nas propostas hoje em causa, os proponentes apresentam soluções que procuram — uns mais do que

outros, é verdade — dissipar quaisquer reservas de natureza constitucional.

No projeto de lei do PSD/CDS — que, a nosso ver, é o único que poderá apresentar um mínimo risco

quanto à sua conformidade constitucional — não só se procura promover uma melhor e mais detalhada

identificação dos bens jurídicos tutelados, como se caracteriza ainda com maior precisão o comportamento

censurado, para além de se reforçar a garantia de que a prova dos elementos do crime compete

exclusivamente ao Ministério Público.

No projeto de lei do PCP, o valor jurídico-penal que se pretende tutelar acaba por ser a transparência da

aquisição de património ou de rendimentos de valor elevado, estabelecendo-se não só o dever da sua

declaração às finanças, como ainda o dever de declarar a origem desse acréscimo anormal de património. Ou

seja, o acréscimo patrimonial não constitui de per si qualquer presunção de ilicitude. Neste projeto de lei, o que

se sanciona como ilícito é a falta de declaração ou da indicação da origem desse património, que, quando e se

corrigido, dispensa a pena.

No caso do projeto de lei do BE — e ainda que, a nosso ver, não se tipifique propriamente o

enriquecimento injustificado como crime —, sempre que houver uma disparidade suscetível de ser enquadrada

como enriquecimento injustificado, torna-se necessário justificar a origem daquele enriquecimento, sob pena

de o enriquecimento injustificado vir a ser tributado a uma taxa de 100%, para além de se prever uma

agravação da pena nos casos em que se provar que houve falsas declarações ou omissão de informações

relativas aos esclarecimentos sobre enriquecimento injustificado.

Estamos, assim, perante soluções que afastam quaisquer reservas do ponto de vista da constitucionalidade

deste importante instrumento no combate à corrupção, que é o enriquecimento injustificado.

Cai, assim, por terra, estamos em crer, o único argumento de todos quantos, no passado, se opuseram à

tipificação do enriquecimento ilícito como crime.

Estamos, portanto, em condições de dar um passo importante para moralizar a gestão da coisa pública,

para tornar a nossa democracia mais transparente, para responsabilizar ainda mais as pessoas que têm a

missão de gerir e tomar conta daquilo que é de todos, mas também para ir ao encontro de um sentimento

generalizado nos portugueses, onde reina o desânimo e o desacreditar, perante a impunidade com que, tantas

vezes, vão assistindo ao enriquecimento «estranho» de pessoas que exercem funções públicas.

Mas estamos ainda em condições de avançar no sentido de dar resposta a compromissos que o Estado

português assumiu no plano internacional, desde logo ao nível das Nações Unidas, através da Convenção das

Nações Unidas contra a Corrupção.

De facto, nessa Convenção das Nações Unidas, também conhecida como Convenção de Mérida, o Estado

português assumiu o compromisso de introduzir o crime de enriquecimento ilícito na sua arquitetura legislativa,

em matéria penal.

Recordo que essa Convenção subiu a Plenário nesta Assembleia, em junho 2007, tendo sido ratificada em

setembro do mesmo ano. E quando aqui colocada a votação para ratificação, essa importante Convenção das

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Nações Unidas, através da qual Portugal assumiu o compromisso de elevar o enriquecimento ilícito a crime,

mereceu a concordância de todas as bancadas deste Plenário.

Vamos, portanto, esperar que os projetos de lei hoje em discussão sobre esta matéria tenham o mesmo

desfecho.

Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: Como tive oportunidade de referir no início desta intervenção, no

conjunto dos projetos de lei que agora discutimos, Os Verdes pretendem destacar também a importância que,

a nosso ver, assumem as iniciativas que procuram reforçar o combate à criminalidade económica e financeira

através dos centros offshore. Na verdade, os offshore são a imagem da injustiça no sistema: enquanto uns

poucos vivem em paraísos fiscais, a maioria das pessoas vive num verdadeiro e penoso inferno fiscal.

Mas, para além desta imoralidade e injustiça, os paraísos fiscais apenas servem para os grandes grupos

económicos e as grandes fortunas criarem mecanismos altamente elaborados para fugir aos impostos ou para

proceder ao branqueamento de capitais.

Bem sabemos que um Governo não pode, por si, impor o fim dos paraísos fiscais fora das suas fronteiras.

Mas também sabemos que qualquer Governo pode e deveria ter a obrigação de canalizar esforços, junto dos

restantes Estados e das organizações internacionais de que faz parte, para procurar medidas e encontrar

soluções no sentido de acabar com os paraísos fiscais.

Não faz qualquer sentido que haja no planeta zonas absolutamente intocáveis, zonas onde a supervisão

financeira não entra, onde a cooperação judicial fica à porta e onde os próprios Estados preferem fingir que

não existem ou, então, que está tudo bem, que faz parte do sistema, que é assim, e pronto. Não pode ser.

Nem faz sentido, nem os cidadãos compreendem, como é que um simples contribuinte que se esquece das

suas obrigações fiscais ou que não sabia que tinha de as pagar, neste caso, como a ignorância da lei a

ninguém aproveita, é perseguido pelo Estado, e a nosso ver bem, mas, quando se trata da grande

criminalidade fiscal, os Estados fingem que nada se passa.

Não pode ser, tem de haver formas de pôr fim a este verdadeiro e monstruoso pecado com perdão

consentido.

O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!

O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Para tal, haja vontade e coragem política, porque o combate à

corrupção também passa por aqui. Também tem de passar pelos paraísos fiscais, porque nada deve ficar de

fora neste combate.

Para terminar, Sr.as

e Srs. Deputados, quero dizer apenas que Os Verdes consideram que todas as

contribuições que, de uma forma ou de outra, potenciem e reforcem a eficácia no combate à corrupção são

sempre bem-vindas, mas também é necessário que respeitem as respetivas garantias constitucionais, tanto a

nível penal, como a nível processual penal, o que, a nosso ver, sucede nos projetos hoje em discussão, ainda

que haja, como referi, algumas reservas relativamente ao projeto de lei do PSD/CDS.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do Sr. Deputado Luís Fazenda, do Bloco de Esquerda.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as

Deputadas e Srs. Deputados: É já um lugar-comum

dizer-se que as democracias liberais — e é destas que estamos a tratar — passam por uma situação de

doença e que essa doença exige remédio na própria democracia. E há sintomas evidentes dessa doença nas

democracias liberais, vulgo, europeias.

Têm a ver com a desconfiança generalizada dos cidadãos nos sistemas de justiça, lentos, pouco eficazes

na repressão criminal, classistas no acesso e na defesa em tribunal. Têm a ver com a desconfiança muito

generalizada dos cidadãos em governos que promovem políticas de desigualdade e de austeridade. Têm a ver

com a desconfiança dos cidadãos em parlamentos com poderes cada vez mais diminuídos. Têm a ver com o

excesso de publicitação dos parlamentos, como montras da democracia, na imensa exiguidade da sua

capacidade de intervenção. Tudo isto tem vindo a minar a confiança nas democracias liberais.

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Evidentemente que uma ou múltiplas iniciativas acerca de enriquecimento não declarado, injustificado,

outras medidas de combate à corrupção, medidas facilitadoras do acesso dos cidadãos ao sistema político, a

uma democracia participativa acentuada, tudo isto fará com que haja remédios para esses sintomas

gravíssimos, intervindo numa relação de forças diversa, também nas democracias liberais.

Mas não podemos ocultar, nem escamotear, o âmago do debate que hoje aqui travamos. Ou seja, na

perceção popular — e ela é iniludível — entende-se, e há motivos para isso, que agentes responsáveis do

Estado têm rendimentos e património absolutamente injustificados. E isso descredibiliza a prática da política,

concorre para agravar a crise da política.

E, nessas condições, há uma visualização rápida e generalizada de que os políticos, os responsáveis

políticos, aqueles que procuram representar os interesses num sistema democrático, são aqueles que acabam

por constituir uma coisa endogâmica, uma casta, como se diz hoje, e a democracia vai deslizando para a

oligarquia.

A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Exatamente!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — E isso é especialmente criticável.

Podemos sempre ver o problema ao contrário. E ver o problema ao contrário é dizer: há aí umas

campanhas populistas contra a democracia, em que querem fazer dos políticos bodes expiatórios.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Também é verdade!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — E é verdade que essas campanhas existem. Agora, a verdade é que podemos

ver de um outro modo, provavelmente muito mais interessante e muito mais combativo, do ponto de vista da

defesa do regime democrático-constitucional.

Ou seja, a especial transparência dos políticos e dos altos responsáveis do Estado é exatamente aquilo

que permite mostrar que «quem não deve não teme» e que esses representantes são aqueles que estão em

condições de enfrentar todo o tipo de escrutínio público, todo o tipo de escrutínio dos cidadãos.

Ou seja, este tipo de regras, num período de doença das democracias liberais e de campanhas populistas

e reacionárias contra sistemas democráticos, é, afinal de contas, o teste de stress das democracias. Está aqui

o âmago do problema e está aqui a importância deste debate político, que transcende em muito uma, duas ou

três leis. Este é o debate dos tempos que vamos vivendo, o qual transcende as nossas fronteiras e está bem

alargado na Europa, como se poderá facilmente comprovar.

Sr.as

e Srs. Deputados, a ideia de que há um deslizamento para a oligarquia pondera-se e autoriza-se.

Então, enfrentemos, nos métodos democráticos, nas formas de vivificação do regime democrático, mas

também na especial transparência daqueles que são representantes políticos, agentes políticos e agentes do

Estado.

Dir-se-á, então: mas para combater o enriquecimento ilícito, o principal projeto de lei que o Bloco de

Esquerda apresentou — e esse é que é o sucessor do projeto falhado do enriquecimento ilícito — é o

enriquecimento não declarado. Portanto, é uma alteração profunda à lei do controlo de riqueza dos titulares de

cargos políticos. Esse é que é o nosso principal projeto.

Procuramos enfrentar as decisões do Tribunal Constitucional, aceitando-as de boa mente como

enriquecedoras daquilo que deve ser o nosso conjunto de apetrechos, de ferramentas para fortificar esta

defesa republicana.

Portanto, definimos um tipo legal de crime — o enriquecimento não declarado —, definimos um bem

jurídico a proteger — o especial dever de transparência dos titulares de cargos políticos e de altos

responsáveis do Estado — e entendemos que o crime se consuma pelo simples facto de cotejar aquilo que é o

património declarado com aquilo que seja o património em fruição por parte de alguns desses responsáveis. A

prova do crime consome-se na sua documentação.

O Ministério Público poderá atuar nessas circunstâncias. Não deixamos nenhuma prova diabólica ao

Ministério Público, não deixamos nenhum presente envenenado a quem quer que seja e atuamos nessa

medida.

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Entendemos que, para a generalidade dos cidadãos, a via fiscal pode punir enriquecimento injustificado.

Estamos dispostos a discutir montantes, métodos — não temos a pretensão de ter uma proposta acabada e

rigorosa em todos os aspetos —, a possível conformidade constitucional de uma ou outra norma que, para

nós, é absolutamente secundária no conjunto do ordenamento que estamos a propor. Estaremos à vontade e

com grande empenho para fazer esse debate.

Contudo, Sr.as

e Srs. Deputados, é importante frisar que o projeto de lei que a maioria nos apresenta tem

uma dificuldade que parece bastante evidente. Para pleito da democracia e do debate, devo dizer que o

problema do bem jurídico a proteger — aliás, isso já foi aqui várias vezes matéria de intervenção — não está

tipificado.

Quanto às tarefas fundamentais do Estado, não vou reler tudo o que a seguir está detalhado, porque os

proponentes entenderam que, ao detalhar um conjunto de circunstâncias, ele responderia à questão do

Tribunal Constitucional. Na nossa ótica, não responde à questão do Tribunal Constitucional e cria um tipo

criminal heteróclito, estranho, porquanto ele é uma espécie de «crime de lesa-majestade» moderno, é tudo e é

quase nada.

Portanto, não está claramente definido o bem jurídico a proteger, para nós o dever de especial

transparência do Estado.

Mas isso decorre do quê? Decorre de se englobar no mesmo tipo de crime, nas mesmas circunstâncias,

quer os agentes políticos, os responsáveis do Estado, quer os cidadãos em geral. É que, a pretexto de

determinada interpretação do princípio da igualdade, ou de conveniência imediata, porque tanto está a punir

um banqueiro como um político, e o político não é prejudicado em relação a qualquer outro tipo de cidadão —

creio que é uma visão manifestamente mais estreita deste processo —, se o tipo de crime se aplicar

exclusivamente, pelo menos nesta fase, a responsáveis políticos, podem consagrar com facilidade o dever

especial de transparência.

O problema é que, alargando o crime quer ao setor privado quer ao setor público, aliás, aos cidadãos em

geral, há uma enorme dificuldade em declarar qual o tipo de crime e, mais, em conseguir que esse crime seja

justificado como crime autónomo, no caso dos cidadãos que não têm especial responsabilidade política.

Creio mesmo que há uma lesão do princípio da igualdade quando, em relação aos cidadãos políticos, aí,

sim, há um regime declarativo agravado que nada tem a ver com o regime geral dos cidadãos. Acho, aliás,

uma dificuldade prática, uma inexequibilidade, conseguir que a máquina tributária que temos funcione em

tempo útil para o conjunto da declaração de todos os cidadãos por via fiscal.

Portanto, temos as maiores dúvidas sobre a constitucionalidade desse processo e do erro de petição de

princípio que ele encerra, que é não separar as responsabilidades dos políticos, logo democracia, de outros

problemas em geral, que, aliás, já estão previstos, em catálogo, na lei penal e que, portanto, não deveriam

inquinar, influenciar ou agir indiretamente sobre uma lei adequada, eficaz e proporcional do controlo de riqueza

dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos.

Sem dever nada, sem temer nada, de cara levantada perante os cidadãos e perante as cidadãs é esse o

desafio que a democracia enfrenta.

Acusam-nos alguns de apresentarmos um projeto de lei, acerca do enriquecimento injustificado — a

segunda iniciativa que propomos —, confiscatório porque prevê uma taxa de 100% para a generalidade dos

cidadãos.

Gostava — porque creio que temos críticas à direita, e não só — de recordar uma declaração feita há

poucos anos pelo Sr. Deputado Fernando Negrão, em nome do PSD, quando se debateu o enriquecimento

ilícito. Perguntava o Sr. Deputado Fernando Negrão: «se o enriquecimento não está de todo justificado, por

que não é o mesmo taxado em 100%, já que os 40% que o Governo pretende deixar ao enriquecido…» — na

altura, o Governo do Partido Socialista — «… constituirão um prémio pela sua capacidade de enganar o

fisco?».

Não se trata aqui de confiscar rendimentos claramente lícitos, claramente legítimos. Trata-se de fazer

reverter, em perda para o Estado, um diferencial de enriquecimento não justificado.

Não é necessário apurar a origem — isso também nos refere o acórdão do Tribunal Constitucional. Não é

preciso apurar uma origem ilícita nesse rendimento. É preciso é apurar que se trata de um rendimento

desproporcionado e injustificado.

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Sr.as

e Srs. Deputados, acho que o desafio é hoje. Acho que este debate tem de estar aberto a toda a

sociedade. É um debate que pode ajudar a refundar a democracia, a dar-lhe uma feição social, a dar-lhe uma

configuração política muito mais próxima dos cidadãos e das cidadãs ou, então, insistir em vias inviáveis ou,

talvez, em sofísticas muito tremendistas, mas que só trazem rigidez no tratamento político do problema. E

essa sofística pode ter mérito intelectual, mas não terá seguramente o benefício dos cidadãos e das cidadãs.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é da Sr.ª Deputada Teresa Anjinho, do CDS-PP.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as

e Srs. Deputados: A título final, há que

reconhecer que nos encontramos num momento em que o fenómeno da corrupção está muito presente, não

apenas na vida dos especialistas ou da Academia, mas, em particular, na vida do cidadão comum.

Os Estados democráticos, como bem referiu o Sr. Deputado Luís Fazenda, estão confrontados com uma

necessidade acrescida de se protegerem contra o fenómeno da corrupção.

Não podemos aceitar a corrupção como uma inevitabilidade do sistema. É, de facto, fundamental, como já

foi tantas vezes dito, colocar em prática tudo quanto for possível para a contrariar. Das políticas públicas e

legislativas ao exercício do poder judicial, não tenho quaisquer dúvidas em afirmar que devemos apostar

claramente no reforço das medidas de natureza preventiva e repressiva, sendo que neste enquadramento,

Sr.as

e Srs. Deputados, é indiscutível que ao Estado cabe um importante papel no campo da monitorização, da

consciencialização e da responsabilização.

Todavia, não é menos verdade que, para que a prevenção da corrupção seja um facto, cabe igualmente

aos cidadãos o importante papel de intervir e de responder positivamente. Ou seja, se queremos eficácia, a

solução deve ser estrutural, atuando a montante e a jusante desta realidade, tanto ao nível da monitorização

como dos meios, como da própria consciencialização, reconhecendo na educação um dos maiores aliados

contra o enraizamento cultural deste fenómeno, transversal a toda a sociedade.

Reconhecemos que este esforço e esta aposta estão, de facto, a ser feitos. Recentemente, e merece ser

destacado, Portugal subiu duas posições no Índice de Perceção da Corrupção da Transparency International,

estando, em 2014, no 31.º lugar. O esforço está a ser feito e todos reconhecemos que algo mudou, pelo que

também nós aderimos, por esta via, a um combate que é claramente transversal a todos os partidos.

De facto, os diplomas em debate, sendo diferentes entre si, parecem, na verdade, comungar de uma

mesma visão e reconhecimento do problema, divergindo, como se percebe, na estratégia.

Saúdam-se, pois, neste propósito, as diversas iniciativas.

Pela nossa parte, reconhecemos que o processo não tem sido fácil e que o acórdão do Tribunal

Constitucional exigiu um esforço acrescido.

Foi o que fizemos, no estrito reconhecimento de que este é um caminho perante o qual nos tínhamos

comprometido e um caminho necessário face à realidade, mesmo que assumidamente com desafios.

A criminalização do enriquecimento ilícito introduz, assim, no quadro jurídico-penal, mais um instrumento

que, sem dispensar outras políticas e ações, pode, a nosso ver, contribuir de uma forma eficaz para a sua

prevenção, transmitindo à comunidade uma mensagem clara de censura em relação a este tipo de

comportamentos.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Como quer que se designe, existe um bem jurídico com evidente

dignidade penal, inerente ao princípio do Estado de direito, que é a confiança ou credibilidade do Estado

perante a coletividade e a decorrente capacidade de intervenção.

Este reconhecimento, por si só, legitima o legislador a impor a transparência da situação patrimonial, não

apenas daqueles a quem incumba funcionalmente preparar, manifestar ou executar a vontade do Estado, mas

de todos os cidadãos.

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E aqui se situa exatamente uma das nossas diferenças, como já foi muito bem realçado, em relação ao

diploma do Partido Socialista, que compreendemos, todavia, não acompanhamos exatamente pelo facto de

reconhecermos que a corrupção é transversal a toda a sociedade e muitas destas situações, igualmente

danosas e ameaçadoras dos pilares de um Estado de direito democrático, ocorrem fora da esfera — até já

mais escrutinada e justificadamente — dos titulares dos cargos políticos e equiparados.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Refira-se, a este propósito, que já consideramos relevante refletir e

ponderar o alargamento do universo das pessoas sujeitas à obrigação de declaração de património, sendo

que, para o efeito, consideramos mais ponderada a proposta do Partido Socialista.

Aliás, no passado, o CDS foi, inclusivamente, mais longe e, em nome da credibilização dos diversos

intervenientes da vida política, sejam eles titulares de cargos políticos ou titulares de altos cargos públicos — o

que deve constituir uma prioridade e uma preocupação permanente —, defendemos a uniformização dos

diferentes regimes de registos de interesses, aproximando o regime legal aplicável às autarquias do regime

legal consagrado na Assembleia da República.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — É verdade!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Mas, se admitimos ponderar esta questão, já temos muitas

dificuldades em acompanhar outras, igualmente em debate, nomeadamente a proposta do Bloco de Esquerda

de criação de uma nova figura junto do Tribunal Constitucional — a tal entidade de transparência dos titulares

de cargos políticos e altos cargos públicos —, com configuração e competências que nos suscitam muitas

dúvidas face ao modelo atual (até do ponto de vista orçamental, Sr. Deputado Luís Fazenda),…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — … ou o projeto de resolução do Partido Comunista Português, em

matéria de offshore (mesmo reconhecendo que houve um avanço nesta matéria, Sr. Deputado João Oliveira),

que parece, de alguma forma, ignorar não apenas o princípio da extraterritorialidade, como o trabalho que o

Governo tem feito, e continua a fazer, em matéria de combate à fraude e evasão fiscais e aduaneira.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Recentemente, o Ministério das Finanças divulgou o plano estratégico

para 2015-2017, anunciando 40 medidas e algumas das quais tocam exatamente nestas questões.

Mais: é impossível esquecer o que foi executado também nestas matérias, nomeadamente no que se

refere ao reforço dos mecanismos de troca de informações, que têm tido grande eficácia e têm sido

reconhecidos de forma generalizada.

Para terminar, deixo uma última nota relativa ao projeto de lei do PCP sobre o enriquecimento ilícito.

De facto, a via encontrada é uma via. Reconhecemos, no vosso preâmbulo, a resposta que procuram dar

ao acórdão do Tribunal Constitucional e também a tentativa de resposta ao enquadramento fiscal. Todavia,

temos dúvidas de que esta seja a resposta mais eficaz para o problema em questão.

Em suma, o CDS está disponível, como, aliás, sempre esteve, para debater propostas que visem, por

intenção e por fundamento, a prevenção e o combate à corrupção, o aumento e a melhoria da transparência.

Em nome da mesma transparência de intenções e da boa prática política, sublinhamos, desde já, que

temos bastantes dúvidas relativamente a algumas das propostas em discussão.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim.

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O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Muito se falou, hoje, em

transparência, em combate à corrupção e em enriquecimento ilícito, injustificado, desproporcionado ou não

declarado.

Independentemente das diferenças de visão do mundo e das coisas que os proponentes de todos os

projetos que foram discutidos têm, todos estão imbuídos de um sentido meritório e salutar de melhorar o

funcionamento do sistema político e de retemperar a confiança dos portugueses e dos seus agentes políticos.

Contudo, este debate deve provocar, em todos nós, uma reflexão sobre algumas linhas de evolução que

devemos perspetivar para o nosso sistema político — esse será, talvez, o nosso maior repto.

Afinal, que mulheres e homens queremos nós como agentes políticos?

Deve, realmente, o sistema político ceder à tentação e evoluir mediante impulsos diretos e imediatos do

populismo mediático?

Como realizar o justo equilíbrio entre as exigências de transparência na vida pública e a refutação do

desenho ilusório de um político que a demagogia mediática quer necessariamente assético e

bacteriologicamente puro?

Como conciliar a existência de um sistema político que contenha os mecanismos institucionais capazes de

constranger os eventuais comportamentos abusivos com a ideia indispensável de que aqueles que escolhem

desempenhar cargos políticos não são, nem podem ser, cidadãos colocados, a priori e inevitavelmente, sob

suspeita pública e, por isso, fatalmente diminuídos na sua capacidade de exercício de direitos?

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — E isso, desde logo, porque estarão sujeitos a obrigações ativas e

passivas e a deveres de escrutínio pessoal que, com muita probabilidade, seriam considerados insuportáveis

para qualquer outro cidadão.

Nas últimas décadas, na generalidade das democracias ocidentais, muitas vezes à boleia de casos

bastante mediatizados de corrupção na política, foi-se progressivamente instalando, em parcelas da opinião

pública, uma visão depreciativa da política, sobretudo no que respeita à atividade parlamentar. Os políticos,

nessas análises aligeiradas, padeceriam de desonestidade endémica, de impreparação irremediável e de uma

vocação natural para a prática de malfeitorias variadas.

Em bom rigor, essa visão pejorativa não constitui uma novidade. Todas, mas todas, as degenerações

despóticas que o século passado conheceu iniciaram o seu percurso com o aviltamento sistemático das

lógicas de funcionamento das democracias e dos seus protagonistas, exacerbando os seus defeitos e

aproveitando as suas debilidades.

Exemplos clássicos, entre nós, podem ser encontrados na feroz campanha antiparlamentar que também

esteve na origem do 28 de maio de 1926 e do Estado Novo, que tanto gostava de se contrapor a si mesmo,

referindo-se à suposta «balbúrdia» da I República.

Hoje, um percurso similar parece estar a ser feito pelos populismos sem ideologia e pelas ideologias

meramente populistas, ambos matizados por generalizações sobre os políticos agora disponíveis em novas

embalagens digitais.

Saber como se devem defender as democracias contra aqueles que, servindo-se delas, as querem

derrubar, constitui um dos maiores desafios da nossa contemporaneidade. E tenho grandes inquietações

sobre se o melhor remédio para defender o Estado de direito democrático é o de ceder às pressões dos que,

conscientemente ou não, patrocinam o «Estado de não direito», na expressão de Gomes Canotilho.

Devemos todos perguntar se será lógico, democrático e eficaz assimilar a versão difusa, feita de sentenças

de café e da sabedoria insindicável dos títulos de tabloide, que costumam assegurar que só é possível

aperfeiçoar o sistema político impondo encargos e encolhendo direitos àqueles cujo primeiro dever é afirmar

os direitos de todos os outros.

Num aparente complexo de culpa, os agentes políticos democráticos, em toda a parte, têm vindo a

condescender com a demagogia populista. Só que esta — ninguém se iluda! — nunca desistirá de demonizar,

seja qual for o grau da transigência.

É evidente que, quanto maior é a responsabilidade de decisão, mais acrescidos deverão ser os deveres de

exame público dessa atividade — essa é uma condição essencial para a credibilização da política. Mas tal

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nunca poderá atingir o limite situado numa espécie de capitis deminutio para aqueles que desempenham

funções políticas ou funções em altos cargos públicos.

A resposta assumida pelas iniciativas aqui debatidas parece residir em encontrar o ponto de equilíbrio entre

as exigências de transparência do sistema e a dignidade inerente à função política. Temos de realizar um

sistema com regras de funcionamento claras, robustas e consistentes e que não tenham o efeito indesejável

de menorizar aqueles que, num dado momento da sua vida, resolveram dar o melhor do seu esforço em prol

do interesse público e da sua comunidade.

É neste sentido que se dirigem estas iniciativas. E é também isso que se espera alcançar no debate da

especialidade, que se iniciará a partir de hoje.

Oxalá saibamos todos estar à altura deste momento, percebendo que os valores da transparência do

sistema e da probidade dos seus agentes são indeclináveis. Mas estes só terão aplicação se a política e os

políticos forem respeitados e nunca serão respeitados aqueles que prescindiram de se dar ao respeito.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão. Já não dispõe de

muito tempo.

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Sr.ª Presidente, eu sei. Muito obrigado.

Sr.as

e Srs. Deputados, inscrevi-me para fazer esta intervenção precisamente na sequência das palavras do

Sr. Deputado Abreu Amorim.

Sr. Deputado, queria dizer-lhe que estou de acordo com o essencial dessas palavras, mas tenho de lhe

manifestar uma perplexidade: a sua abordagem contradiz completamente a abordagem até agora feita pela

Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho.

Aplausos do PS.

Portanto, assistimos a um partido, ou talvez a um sistema, a dois discursos e a duas abordagens. Se a sua

posição contradissesse, no plano declarativo, a posição da Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, resolveriam

isso entre ambos. Mas, Sr. Deputado Abreu Amorim, quero dizer-lhe com toda a sinceridade que, estando de

acordo com o essencial da sua intervenção, não consigo perceber como é o senhor apoiará o projeto do seu

partido, porque o projeto do seu partido é a negação completa dos valores que defendeu.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira. Também dispõe

de pouco tempo.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, vou procurar conter-me dentro do tempo disponível que

tenho.

Registo apenas dois elementos que julgo que são importantes nesta discussão.

O primeiro diz respeito ao avanço que se fez nesta discussão relativamente às questões do enriquecimento

injustificado ou não declarado, consoante a terminologia que se prefira.

Este é um debate que, ao longo dos anos, por boas e más razões, tem vindo a ter alguns sobressaltos.

Esperamos que, com esta discussão e com o processo na especialidade que se vai iniciar agora, de uma vez

por todas se afastem todas as preocupações de inconstitucionalidade, garantindo mecanismos que

salvaguardem princípios constitucionais, que têm obrigatoriamente de ser preservados e defendidos até às

últimas circunstâncias.

E quanto a isso, Sr. Deputado Jorge Lacão, estamos inteiramente de acordo e registamos o facto de, nas

intervenções feitas pelo Sr. Deputado, não ter havido nenhuma referência critica ao projeto do PCP

relacionada com essa matéria. Ou seja, registamos como muito positivo o facto de não ter sido identificada

nenhuma dificuldade em termos de inconstitucionalidade em relação ao projeto de lei do PCP, porque nós, de

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facto, fizemos esse esforço. Fizemos o esforço de trazer à discussão um projeto de lei que, procurando

criminalizar o enriquecimento injustificado, o faça nos termos constitucionalmente previstos.

Portanto, registamos como muita positiva a apreciação que foi feita ao projeto do PCP por parte das outras

bancadas, porque tivemos esse cuidado e levámo-lo muito a sério.

Relativamente à matéria relacionada com os offshore, esperamos que, com a discussão que poderemos

fazer sobre este processo, na especialidade, das iniciativas que o PCP trouxe à discussão, a Assembleia da

República possa, pela primeira vez, tomar uma posição clara quanto à postura do Estado português no que diz

respeito à sua existência, apontando um caminho para a sua extinção. Essa constatação vem surgindo, ao

longo dos anos, no debate.

A partir deste momento, com os projetos que o PCP trouxe, temos a possibilidade de afirmar esse caminho

para acabar com os offshore e para que, até lá, se possam tomar medidas que garantam o combate à

criminalidade, que utiliza precisamente o biombo dos offshore para esconder práticas e procedimentos que a

alimentam ou que beneficiam dela.

Esperamos que, com este processo na especialidade, a Assembleia da República possa encontrar um

caminho para afirmar uma posição de recusa por parte do Estado português deste estado de coisas, que hoje

é evidente perante cada vez mais exemplos que denunciam esta realidade de financiamento ou de benefício

da criminalidade a partir dos offshore.

O contributo que o PCP deu é, de facto, pioneiro. Não temos a ilusão de que este caminho pode ser feito

de um dia para a outro, mas é preciso dar os primeiros passos, e é essa a proposta que o PCP trouxe para

este debate.

Sr.as

e Srs. Deputados, quer em relação ao enriquecimento injustificado, quer em relação à extinção dos

offshore, esperamos que deste processo que hoje se inicia possa resultar uma posição clara e firme da

Assembleia da República para ultrapassar estes dois graves problemas que atingem a sociedade portuguesa.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente: — Fica, assim, concluído o debate.

Srs. Deputados, vamos entrar no período regimental de votações.

Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o sistema eletrónico.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro eletrónico regista 194 presenças, às quais se acrescentam as dos Deputados

Pedro Delgado Alves, do PS, e Michael Seufert, do CDS-PP, perfazendo 196 Deputados, pelo que temos

quórum para proceder às votações.

Srs. Deputados, temos hoje três votos de pesar, que vão ser lidos e votados. No final guardaremos 1

minuto de silêncio.

Assim sendo, para proceder à leitura do voto n.º 255/XII (4.ª) — De pesar pelo falecimento de António

Sousa Gomes, político e gestor (PS), tem a palavra a Sr.ª Secretária Rosa Maria Albernaz.

A Sr.ª Secretária (Rosa Maria Albernaz): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

«Faleceu, no passado dia 20 de fevereiro, aos 79 anos, António Francisco Barroso de Sousa Gomes.

Nascido em Lisboa, em janeiro de 1936, António Sousa Gomes, licenciado em Engenharia Mecânica pelo

Instituto Superior Técnico, desempenhou, com elevada dedicação, diversos cargos governamentais e da

administração do Estado.

Militante do Partido Socialista, António Sousa Gomes foi Ministro da Indústria e Tecnologia e Ministro do

Plano e Coordenação Económica, no I Governo Constitucional, e Ministro da Habitação e Obras Públicas, no II

Governo Constitucional.

Entre 1983 e 1991, foi Presidente do Conselho de Administração do IPE — Investimentos e Participações

Empresariais, S.A., desempenhando idênticas funções na Empresa Geral do Fomento entre 1987 e 1991. Em

1992, foi eleito em Assembleia Geral de Acionistas para o cargo de Presidente do Conselho de Administração

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da CIMPOR — Cimentos cie Portugal, SGPS, S.A., tendo o seu papel sido decisivo para tornar este grupo

cimenteiro num dos dez maiores a operar no mercado mundial.

Lembrar António Sousa Gomes é recordar um político destacado e um gestor insigne, que deixou uma

marca de enorme competência e probidade em todos os cargos e funções desempenhadas, nomeadamente

pelo contributo determinante, no setor público e no setor privado, para o desenho de estratégias de

desenvolvimento do nosso País e de medidas para melhorar e impulsionar o crescimento da economia

nacional.

A Assembleia da República, reunida em sessão plenária, manifesta o seu pesar pela morte de António

Sousa Gomes e envia sentidas condolências à sua família».

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar o voto que acabou de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, passamos, agora, ao voto n.º 256/XII (4.ª) — De pesar pelo falecimento do músico

Fernando Alvim (PS, PSD, CDS-PP, BE, Os Verdes e PCP), que vai ser lido pelo Sr. Secretário Duarte

Pacheco.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:

«Faleceu, no passado dia 27 de fevereiro, o músico Fernando Alvim.

Nascido em Cascais, em 6 de novembro de 1934, Fernando Gui San Payo de Sousa Alvim foi um dos mais

notáveis músicos portugueses.

Iniciou a sua formação musical através do violoncelo, passando a dedicar-se ao estudo da guitarra clássica

já na juventude, na Escola de Guitarra do Professor Duarte Costa, em Lisboa, daí transitando para o curso de

guitarra clássica do Conservatório Nacional.

Aos 21 anos, inicia a carreira de guitarrista, tocando como acompanhante em casas de fado amador, como

no Abril em Portugal ou no Luso, ao lado de artistas como Luz Sá da Bandeira ou Vicente da Câmara.

O ano de 1959 marca o início de uma intensa parceria de décadas com Carlos Paredes, a quem adivinhava

os caminhos e com quem pisou palcos em todo o mundo, tendo procedido à gravação de inúmeros discos,

participado em peças teatrais como Bodas de Sangue e A Casa de Bernarda Alba, de Federico Garcia Lorca,

ou O Render dos Heróis, de José Cardoso Pires, e filmes, nomeadamente sob a direção de Paulo Rocha, em

Os Verdes Anos (1962) e Mudar de Vida (1966).

Da sua vasta carreira, espelhada em 35 obras da sua autoria, e intensa atividade, que o levou a colaborar

com o Grupo Verde-Gaio e com o Ballet Gulbenkian, registo ainda para o Conjunto de Guitarras de Fernando

Alvim (1969), que fundou com Pedro Caldeira Cabral, António Luís Gomes e Edmundo Silva e para as

colaborações magistrais com António Chainho, Janita Salomé e, até, com o grupo Sitiados.

Fernando Alvim, que assumia gostar ‘(…) de acompanhar e harmonizar, de tirar tons’, grava, em 1969, o

intemporal tema Pedra Filosofal, ao lado de Manuel Freire, ano em que também é convidado por Amália

Rodrigues para gravar o tema Formiga bossa nossa, de Alexandre O'Neil e Alain Oulman.

Mas, de todos os seus trabalhos, é a cumplicidade com Carlos Paredes o que mais se destaca. Nunca

reivindicando para si qualquer protagonismo, Fernando Alvim era dos poucos músicos com o talento e a

versatilidade necessários para conseguir acompanhar a criatividade e energia do genial guitarrista. Fazia-o

com paixão e descrição, e embora tivesse um papel fundamental no envolvimento criativo da música de

Paredes, sempre considerou ser necessário ‘(…) um certo recato, acompanhar sem grandes malabarismos’.

A sua paixão pelo fado, que dizia ter começado ao 14 anos, depois de ouvir a Amália a cantar, nunca o

abandonou, tendo mais recentemente colaborado com Carlos do Carmo, Ana Moura, Camané, Pedro Joia ou

Ricardo Pereira.

O jazz e a bossa nova são outras das suas paixões, o que lhe permitiu colaborar com músicos e artistas

tão diversos como Adriano Correia de Oliveira, Caetano Veloso, Charlie Hayden, Chico Buarque, José Carlos

Ary dos Santos, Vinícius de Moraes, José Afonso, Rão Kyao, Teresa Salgueiro, entre muitos outros.

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Homem discreto e delicado, queria ser recordado ‘(…) como um simples acompanhador de fados e

guitarradas», mas foi um virtuoso que, durante mais de cinco décadas, graças ao seu talento e à sua

generosidade, permitiu «que outros brilhassem’.

A 7 de junho de 2005, foi agraciado com a Medalha de Mérito Cultural, atribuída pela Câmara Municipal de

Cascais, e, em 2012, com a Medalha de Honra da Sociedade Portuguesa de Autores, como forma de

reconhecimento pelo trabalho de décadas ao serviço da dignificação da música portuguesa que muito lhe

deve.

A Assembleia da República, reunida em sessão plenária, presta a devida homenagem a Fernando Alvim e

envia sentidas condolências à sua família, aos seus amigos e companheiros na música e no canto».

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar o voto que acabou se ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, o voto n.º 257/XII (4.ª) — De pesar pelo falecimento do ex-Deputado de Amadeu Ferreira

(PS, PSD e CDS-PP) vai ser lido pelo Sr. Secretário Raúl de Almeida.

O Sr. Secretário (Raúl Almeida): — Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor: «Foi com

pesar e profunda consternação que a Assembleia da República tomou conhecimento do falecimento, no

passado dia 1 de março, de Amadeu Ferreira, um dos principais responsáveis pela promoção do mirandês.

Nascido em Sendim, Miranda do Douro, em julho de 1950, Amadeu Ferreira era o Presidente da

Associaçon de la Lhéngua i Cultura Mirandesa.

Depois de exercer as funções de jurista, foi diretor, membro do Conselho Diretivo e Vice-Presidente da

Comissão de Mercado de Valores Mobiliários, tendo, nas palavras do seu Presidente Carlos Tavares, dado

‘(…) o contributo essencial para a tornar na instituição respeitada que é’ durante os 23 que aí trabalhou.

Autor e tradutor de uma vastíssima obra em português e em mirandês, também com os pseudónimos

Francisco Niebro, Marcus Miranda e Fonso Roixo, Amadeu Ferreira deixa um imenso legado, que inclui a

tradução para o mirandês de Os Quatro Evangelhos, de Os Lusíadas, da Mensagem ou de obras de Horácio,

Vergílio e Catulo, entre outros.

Seus são também La bouba de la Tenerie, Cuntas de Tiu Jouquin, Lhéngua Mirandesa — Manifesto an

Forma de Hino e Ditos Dezideiros/Provérbios Mirandeses.

Deputado à Assembleia da República (na II Legislatura), Presidente da Academia de Letras de Trás-os-

Montes, Membro do Conselho Geral do Instituto Politécnico de Bragança e Professor Convidado da Faculdade

de Direito da Universidade Nova de Lisboa, foi, igualmente colaborador de diversos órgãos de comunicação

social, como o Jornal do Nordeste, o Mensageiro de Bragança, o Diário de Trás-os-Montes, o Público e a rádio

Mirandum FM.

Homem de convicções e princípios, foi, em 2004, agraciado com a Comenda da Ordem do Mérito da

República Portuguesa, pelas mãos do Presidente da República Jorge Sampaio.

Associado ao reconhecimento oficial de direitos linguísticos da comunidade mirandesa, Amadeu Ferreira

deixa uma marca indelével na valorização do imenso património mirandês, constituindo a sua morte uma

perda irreparável para a cultura nacional.

Na sua biografia, obra póstuma, Belheç-Velhice, lançada ontem na Faculdade de Direito da Universidade

Nova de Lisboa, pode ler-se, pela mão do seu pseudónimo Fracisco Niebro, que «(…) Há um tempo para

nascer e um tempo para morrer. A alma não pode voar para o céu. Se assim fosse, como podiam nascer

coisas novas? Essa é a ressurreição das almas: são vidas novas, é tudo o que vive. É por isso que fazem mal

em sepultar as pessoas no cemitério: deviam enterrá-las pelos campos para ajudar as almas a nascer. Assim,

Deus, seja lá ele quem for, tem muito mais trabalho».

A Assembleia da República, reunida em sessão plenária, manifesta o seu pesar pela morte de Amadeu

Ferreira, expressando a sua consternação às gentes e ao município de Miranda do Douro, e enviando sentidas

condolências à sua família.»

A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar o voto que acabou se ser lido.

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Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos guardar 1 minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Srs. Deputados, prosseguimos com as votações regimentais, começando pela votação do projeto de

resolução n.º 1287/XII (4.ª) — Deslocação do Presidente da República a Paris (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos, agora, votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 279/XII (4.ª) — Procede à vigésima segunda

alteração ao Código de Processo Penal, atualizando a definição de terrorismo.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Srs. Deputados, a proposta de lei que acabámos de votar baixa à 1.ª Comissão.

Vamos votar, também na generalidade, a proposta de lei n.º 280/XII (4.ª) — Procede à sexta alteração à Lei

n.º 37/81, de 3 de outubro (Lei da Nacionalidade), fixando novos fundamentos para a concessão da

nacionalidade por naturalização e para oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP,

do BE e de Os Verdes.

A proposta de lei baixa também à 1.ª Comissão.

Vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 281/XII (4.ª) — Procede à segunda alteração à Lei n.º

101/2001, de 25 de agosto, que estabelece o regime jurídico das ações encobertas para fins de prevenção e

investigação criminal, permitindo que sejam incluídos nas ações encobertas todos os ilícitos criminais

relacionados com o terrorismo.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP, votos contra do PCP e

de Os Verdes e a abstenção do BE.

Esta proposta de lei baixa, igualmente, à 1.ª Comissão.

Votamos agora, na generalidade, a proposta de lei n.º 282/XII (4.ª) — Procede à quinta alteração à Lei n.º

5/2002, de 11 de janeiro, que estabelece medidas de combate à criminalidade organizada e económico-

financeira, de modo a abranger todos os ilícitos criminais relacionados com o terrorismo.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Srs. Deputados, a proposta de lei baixa à 1.ª Comissão.

Passamos à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 283/XII (4.ª) — Procede à quarta alteração à

Lei n.º 52/2003, de 22 de agosto (Lei de combate ao terrorismo), criminalizando a apologia pública e as

deslocações para a prática do crime de terrorismo.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP,

do BE e de Os Verdes.

A proposta de lei baixa à 1.ª Comissão.

Vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 284/XII (4.ª) — Procede à segunda alteração à Lei n.º

23/2007, de 11 de julho, que aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de

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estrangeiros do território nacional, modificando os fundamentos para a concessão e cancelamento de vistos e

para a aplicação da pena acessória de expulsão.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP,

do BE e de Os Verdes.

A proposta de lei baixa à 1.ª Comissão.

Vamos, agora, proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 285/XII (4.ª) — Procede à

terceira alteração à Lei n.º 49/2008, de 27 de agosto, que aprova a Lei de Organização da Investigação

Criminal, de modo a abranger todos os ilícitos criminais relacionados com o terrorismo.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Srs. Deputados, a proposta de lei baixa à 1.ª Comissão.

Vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 286/XII (4.ª) — Procede à primeira alteração à Lei n.º

53/2008, de 29 de agosto, que aprova a Lei de Segurança Interna, modificando a composição do Conselho

Superior de Segurança Interna e a organização e o funcionamento da Unidade de Coordenação Antiterrorista.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e abstenções do PCP,

do BE e de Os Verdes.

A proposta de lei baixa também à 1.ª Comissão.

Vamos, agora, proceder à votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 797/XII (4.ª) — Quinta alteração à

Lei n.º 25/2008, de 5 de junho (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS-PP e do BE e abstenções

do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, o projeto de lei que acabámos de votar baixa também à 1.ª Comissão.

Segue-se a votação de um requerimento, apresentado pelo PSD e CDS-PP, solicitando a baixa à

Comissão de Economia e Obras Públicas, sem votação, por um prazo de 30 dias, da proposta de lei n.º

287/XII (4.ª) — Aprova o Regime Jurídico do Serviço Público de Transporte de Passageiros.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, em consequência da aprovação deste requerimento, a proposta de lei n.º 287/XII (4.ª) —

Aprova o Regime Jurídico do Serviço Público de Transporte de Passageiros, baixa à comissão competente,

que, no caso, é a 6.ª Comissão, sem votação.

Votamos, agora, na generalidade, o projeto de lei n.º 771/XII (4.ª) — Procede à oitava alteração da Lei n.º

25/2006, de 30 de junho, visando um regime sancionatório mais equitativo nas situações de incumprimento do

pagamento de taxas de portagem em infraestruturas rodoviárias (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e abstenções do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, este projeto de lei baixa também à 1.ª Comissão.

Peço agora ao Sr. Vice-Presidente Guilherme Silva o favor de me substituir na presidência da Mesa.

Neste momento, assumiu a presidência o Vice-Presidente Guilherme Silva.

Srs. Deputados, vamos, então, prosseguir com as votações, começando pela votação, na generalidade, do

projeto de lei n.º 796/XII (4.ª) — Oitava alteração à Lei n.º 25/2006, de 30 de junho, que aprova o regime

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sancionatório aplicável às transgressões ocorridas em matéria de infraestruturas rodoviárias onde seja devido

o pagamento de taxas de portagem (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, este projeto de lei baixa à 1.ª Comissão.

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Conceição Bessa Ruão (PSD): — Sr. Presidente, quero apenas anunciar que, relativamente às

duas últimas votações, apresentarei uma declaração de voto.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Fica registado, Sr.ª Deputada.

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Sr. Presidente, quero apenas esclarecer que, relativamente ao

projeto de lei n.º 771/XII (4.ª), apresentado pelo Partido Socialista, a orientação de voto que foi dada pela

bancada do Grupo Parlamentar do PSD foi de abstenção e julgo que terá havido uma interpretação errada por

parte da Mesa.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, como calcula, não estava na presidência da Mesa

aquando dessa votação, mas, naturalmente, tomamos nota e fica registado.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, já agora, se me permite…

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor, Sr. Deputado Hélder Amaral.

O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, não me apercebi de que houvesse leitura diversa, mas

o sentido de voto do CDS-PP, relativamente à mesma iniciativa legislativa também é de abstenção.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Então, Srs. Deputados, recapitulando, o projeto de lei n.º 771/XII

(4.ª) — Procede à oitava alteração da Lei n.º 25/2006, de 30 de junho, visando um regime sancionatório mais

equitativo nas situações de incumprimento do pagamento de taxas de portagem em infraestruturas rodoviárias

(PS) foi aprovado, com votos a favor do PS e abstenções do PSD, do CDS-PP, do PCP, do BE e de Os

Verdes.

Vamos prosseguir, com a votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 794/XII (4.ª) — Altera o regime de

cobrança de portagens, até à sua eliminação, em defesa dos direitos dos utentes das autoestradas (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e votos a favor do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Vamos votar, na generalidade, o projeto de lei n.º 799/XII (4.ª) — Estabelece a amnistia pelo incumprimento

de pagamento de taxas de portagens (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP, do BE e

de Os Verdes e a abstenção do PS.

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Vamos proceder à votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 800/XII (4.ª) — Retira competência ao

serviço de finanças para instauração e instrução dos processos de contraordenação por não pagamento de

taxas de portagem (oitava alteração da Lei n.º 25/2006, de 30 de junho, que aprova o regime sancionatório

aplicável às transgressões ocorridas em matéria de infraestruturas rodoviárias onde seja devido o pagamento

de taxas de portagem) (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS e do CDS-PP e votos a favor do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Vamos votar, na generalidade, o projeto de lei n.º 802/XII (4.ª) — Impede as situações de aplicação abusiva

de coimas, e de outros custos, aos casos de não pagamento de portagens (Os Verdes).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP, do BE e

de Os Verdes e a abstenção do PS.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É incrível!

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Peço aos Srs. Deputados que, durante as votações, não se

manifestem e permitam que a votação se faça com o rigor, a atenção e o silêncio necessários.

Vamos passar, agora, à votação do projeto de resolução n.º 1267/XII (4.ª) — Pelo apuramento dos

beneficiários finais das transações financeiras que lesaram o BES e o Estado português (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP, do BE e

de Os Verdes e a abstenção do PS.

Protestos do PCP.

Vozes do PSD:—Chiu!….

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, peço que se contenham durante as votações e

durante o anuncio dos seus resultados, ou seja, durante todo o processo que estamos a prosseguir.

Vamos passar à votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 765/XII (4.ª) — Transparência dos titulares

de cargos políticos e altos cargos públicos (BE).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do BE e de Os Verdes e abstenções do PSD, do PS,

do CDS-PP e do PCP.

Srs. Deputados, este projeto de lei baixa à 1.ª Comissão.

Vamos, agora, votar, na generalidade, o projeto de lei n.º 766/XII (4.ª) — Combate o enriquecimento

injustificado (BE).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do BE e de Os Verdes e abstenções do PSD, do PS,

do CDS-PP e do PCP.

Srs. Deputados, o projeto de lei também baixa à 1.ª Comissão.

Segue-se a votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 782/XII (4.ª) — Enriquecimento injustificado

(trigésima quinta alteração ao Código Penal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, quarta

alteração à Lei n.º 34/87, de 16 de julho, e sexta alteração à Lei n.º 4/83, de 2 de abril) (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PCP e de Os Verdes e abstenções do PSD, do

PS, do CDS-PP e do BE.

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O diploma baixa igualmente à 1.ª Comissão.

Srs. Deputados, vamos proceder agora à votação de um requerimento, apresentado pelo PCP, solicitando

a baixa à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sem votação, por um prazo

de 60 dias, do projeto de lei n.º 803/XII (4.ª) — Estabelece medidas de reforço ao combate à criminalidade

económica e financeira, proibindo ou limitando relações comerciais ou profissionais ou transações ocasionais

com entidades sedeadas em centros offshore ou centros offshore não cooperantes (PCP) e projeto de

resolução n.º 1286/XII (4.ª) — Propõe a adoção pelo Estado português de um plano de ação nacional e

internacional para a extinção dos centros offshore (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, em resultado desta votação, os diplomas objeto deste requerimento baixam diretamente,

sem votação, à 1.ª Comissão.

Segue-se a votação, na generalidade, do projeto de lei n.º 798/XII (4.ª) — Enriquecimento ilícito (PSD e

CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP e de Os Verdes e abstenções

do PS, do PCP e do BE.

Este projeto de lei baixa à 1.ª Comissão.

O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para que efeito, Sr. Deputado.

O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, para informar que, relativamente aos projetos de lei n.os

766/XII (4.ª), 782/XII (4.ª) e 798/XII (4.ª) fiz chegar, eletronicamente, a declaração de voto.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Fica registado, Sr. Deputado.

Srs. Deputados, vamos votar…

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, tem a palavra.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, ainda em relação à votação anterior, queria também

para anunciar à Mesa a entrega de uma declaração de voto.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Fica também registado, Sr. Deputado.

Srs. Deputados, peço que façam anunciar as vossas declarações de voto com alguma antecedência, para

não perturbarem a votação subsequente.

Vamos, então, votar, na generalidade, o projeto de lei n.º 801/XII (4.ª) — Reforça o regime de controlo dos

acréscimos patrimoniais não justificados ou não declarados dos titulares dos cargos políticos e equiparados

(PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e de Os Verdes e abstenções do PSD, do

CDS-PP, do PCP e do BE.

Este projeto de lei baixa igualmente à 1.ª Comissão.

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Vamos proceder à votação do projeto de resolução n.º 1280/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo a criação

de mecanismos que assegurem o pagamento atempado dos contratos para a prestação de serviço público de

educação às escolas do ensino particular e cooperativo (PSD e CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, para informar que o Grupo Parlamentar do PCP apresentará

uma declaração de voto sobre esta votação.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Fica registado, Sr.ª Deputada.

O Sr. Jorge Fão (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Fão (PS): — Sr. Presidente, informo que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista

apresentará uma declaração de voto sobre esta votação.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Fica igualmente registado.

Srs. Deputados, vamos passar à votação do projeto de resolução n.º 1253/XII (4.ª) — Pela suspensão das

demolições nas ilhas-barreira da ria Formosa (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Vamos votar, agora, o projeto de resolução n.º 1279/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo que promova, com

caráter de urgência, uma reflexão aprofundada sobre as intervenções programadas para a Ria Formosa e

sobre as suas consequências para as populações, suspendendo, com efeito imediato, todas as ações em

curso que envolvam a demolição de habitações, até que estejam assegurados o respeito pelo princípio da

igualdade e o direito à habitação (PS).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, passamos à votação do projeto de resolução n.º 1282/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo

a suspensão imediata das demolições na ria Formosa (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP,

do BE e de Os Verdes.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, para anunciar à Mesa que o Grupo Parlamentar do PCP,

relativamente às últimas três votações, pretende fazer uma declaração de voto oral.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para que efeito, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, exatamente no mesmo sentido, anunciando a pretensão de

fazer uma declaração de voto oral, no final das votações.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Dou também a palavra ao Sr. Deputado Miguel Freitas, que a pediu.

O Sr. Miguel Freitas (PS): — Sr. Presidente, para anunciar que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista

pretende fazer uma declaração de voto oral sobre a matéria que acabámos de votar.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — O Sr. Deputado Artur Rêgo pediu igualmente a palavra. Faça favor.

O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito, ou seja, para anunciar que faremos

uma declaração de voto oral.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, segue-se a votação final global do texto final,

apresentado pela Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública, relativo à proposta de lei n.º

278/XII (4.ª) — Procede à segunda alteração ao regime que cria a contribuição extraordinária sobre o setor

energético, aprovado pelo artigo 228.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP e de Os Verdes e abstenções

do PS, do PCP e do BE.

Vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Economia e Obras

Públicas, relativo à proposta de lei n.º 275/XII (4.ª) — Aprova o novo Estatuto das Estradas da Rede

Rodoviária Nacional.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP, do BE e

de Os Verdes e a abstenção do PS.

Passamos agora à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Segurança Social e

Trabalho, relativo ao projeto de lei n.º 680/XII (4.ª) — Consagra expressamente a identidade de género no

âmbito do direito à igualdade no acesso a emprego e no trabalho, procedendo à quinta alteração ao Código do

Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 fevereiro (PS).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, de acordo com o artigo 155.º do Regimento, as declarações de voto orais estão previstas

exclusivamente em caso de votação final global de diplomas. Consequentemente, sobre projetos de resolução

não cabem aqui declarações de voto orais.

Nessa medida, pedia aos Srs. Deputados que manifestaram essa intenção que façam chegar à Mesa as

suas declarações de voto por escrito.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Mas há anuência de todos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Parece-me que tem sido esta a leitura que a Mesa tem feito,

portanto não me parece que estejamos agora em situação de a alterar.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, há, de facto, antecedentes de declarações de voto orais em

relação à votação de projetos de resolução, inclusivamente noutras legislaturas. Posso dar o exemplo do

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projeto de resolução relativo à ratificação do Acordo de Londres, em que quer eu, quer o Sr. Deputado Ribeiro

e Castro proferimos uma declaração de voto oral.

Julgo, pois, que com a manifestação de intenção de todas as bancadas para fazerem declarações de voto

orais a anuência está tacitamente considerada e julgo que o consenso está registado.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, se houver consenso de todas as bancadas,

naturalmente que a Mesa não se oporá. Peço essa confirmação.

Pausa.

O PSD e o CDS-PP não concordam.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, quero apenas registar o facto de ser por imposição do PSD e

do CDS-PP que se quebra esse precedente e que se impede a possibilidade de serem proferidas declarações

de voto orais nesta circunstância. Obviamente que se percebe que PSD e CDS-PP não querem falar das

questões das demolições na ria Formosa, mas vão ter de as enfrentar.

Aplausos do PCP e do BE.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — O Sr. Deputado João Oliveira foi claro quando referiu que tinha

registo de precedente em sentido diverso em anterior legislatura.

A Mesa tem a ideia de que, nesta Legislatura, não houve precedente nesse sentido. Apesar disso, haveria

abertura da Mesa para, no caso de haver consenso, dar a palavra aos Srs. Deputados para proferirem

declarações de voto orais, mas, não havendo, manteremos o sentido da norma expressa do Regimento, e,

sendo assim, pedia aos Srs. Deputados que entregassem as suas declarações de voto por escrito.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro. Mas não vale a pena, penso eu, continuarmos esta

discussão.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, gostaria apenas de clarificar que o PSD e o CDS-PP não

impuseram nada. Quem impõe esta limitação é o Regimento.

O Sr. Paulo Sá (PCP): — Não querem discutir a questão!

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Não tenho ideia — estou aqui há várias legislaturas, há mais até que o

Sr. Deputado João Oliveira — desse precedente nem do seu enquadramento, se ele, eventualmente ocorreu.

Sejamos muito claros, Srs. Deputados: não temos nenhuma intenção de impor nada, cumprimos as regras

do Regimento. Este assunto foi debatido, foi votado, os Srs. Deputados podem apresentar as declarações de

voto por escrito e podem ter outras iniciativas. O PSD, por exemplo, apresentou hoje mesmo um projeto de

resolução sobre esta matéria.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, gostaria de dizer que partilhamos do entendimento

da Mesa.

Há uma norma expressa, e sendo uma norma expressa é evidente que nos vincula a todos. Se houve

precedentes, foram manifestamente excecionais.

Mas há algo que, em jeito de interpelação, não posso deixar passar, até para as pessoas que nos estão a

ver perceberem, que é uma coisa muito simples: não somos nós que estamos a inviabilizar que esta matéria

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seja discutida, porque ela foi discutida em comissão. E foi discutida por opção de quem? Por opção do PCP e

do Bloco de Esquerda.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Protestos do PCP e do BE.

Se quisessem, teriam discutido a questão aqui em Plenário.

É esta a prioridade que dão ao assunto!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Portanto, para terminar, gostaria que ficasse claro que cumprimos a lei e que acompanhamos a leitura da

lei, da Mesa e do Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado Pedro Filipe Soares tem a palavra.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, é para, exatamente nos mesmos termos dos oradores

anteriores, dizer que a existência de um consenso para se fazerem declarações de voto orais sobre esta

matéria foi visível nesta Câmara. Esse consenso foi rompido por parte das direções das bancadas do PSD e

do CDS-PP curiosamente quando os seus Deputados da região até queriam falar sobre essa matéria.

Por isso, se alguém não quer, de facto, fazer uma observação, ter uma opinião sobre esta matéria…

O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — É o Bloco!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — … é a maioria, que quer calar, quando deveria falar sobre isto. É a

consciência pesada das direções que seria espiada pelos Srs. Deputados da região. Percebemos, afinal, que

não há vontade de debate.

Aplausos do BE.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, pedi a palavra para fazer uma interpelação à Mesa sobre o

seguinte: o Sr. Deputado Nuno Magalhães foi rigoroso quando disse que esta questão foi discutida na

comissão por iniciativa do PCP.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ah!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Foi o PCP que levou à comissão a discussão das demolições na ria

Formosa.

Mas queria acrescentar alguma coisa a esse rigor: o PCP propôs o agendamento na comissão porque as

demolições estão a acontecer e essa era a única forma urgente de responder a um problema que está a

acontecer! Não podíamos ficar dois meses à espera do agendamento da questão em Plenário!

Aplausos do PCP.

O que é lamentável é que o PSD e o CDS-PP tenham impedido a discussão…

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, faça favor de terminar. Ficámos esclarecidos sobre

as razões…

O Sr. João Oliveira (PCP): — … da iniciativa na Assembleia da República e queiram, também agora,

impedir as declarações de voto.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Freitas.

Pedia que fôssemos breves e que não prolongássemos este incidente.

O Sr. Miguel Freitas (PS): — Sr. Presidente, julgo que todos percebemos o que aqui se passou. Todos

percebemos que, de facto, a maioria, mais uma vez, procurou que esta matéria não tivesse uma discussão

clara neste Plenário.

Risos do PSD e do CDS-PP.

Tentou impedir a discussão na comissão e impediu aqui que fossem proferidas declarações de voto por

parte de todos os partidos.

Como foi dito, e muito bem, pelos Srs. Deputados do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda, é mais

que evidente que, neste momento, estão a acontecer demolições e aquilo que era fundamental era que

houvesse uma decisão no sentido de que isso fosse travado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.

Gostaria que não prolongássemos este incidente.

O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, não tenciono prolongar. Aliás, fui muito breve na minha

interpelação de há pouco, mas é evidente que não posso deixar passar em claro que os partidos da oposição

digam que nós estamos a inviabilizar a discussão do que quer que seja. Não estamos a inviabilizar discussão

nenhum!

Na nossa ordem de trabalhos não constava a discussão desta matéria, constava a votação, e ela foi

efetuada. O direito regimental que assiste aos Deputados, a todos, é o de apresentarem declarações de voto

escritas.

Sr. Presidente, a matéria foi discutida em comissão e, de facto, vai ser discutida no Plenário, mas vai sê-lo

porque, ao contrário do PCP e do Bloco de Esquerda, o PSD vai agendar, em Conferência de Líderes, o

projeto de resolução que apresentou sobre esta matéria.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Portanto, àqueles que acham que temos receio de debater o que quer que seja eu digo com toda a clareza

e toda a transparência: nós estamos aptos a discutir tudo e vamos discutir esta matéria.

Protestos do PCP.

Sr. Presidente, quero deixar uma última nota apenas para que também fique clara uma coisa: o Sr.

Deputado João Oliveira, tanto quanto percebi, fez alusão a um precedente que tinha a ver com uma resolução,

mas que era uma resolução que aprovava um tratado, que tem uma força diferente da dos projetos de

resolução que aqui votámos anteriormente.

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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, está esclarecida e ultrapassada a questão. Os Srs.

Deputados apresentarão, se assim o entenderem, declarações de voto escritas.

A próxima sessão tem lugar na quarta-feira, dia 11 de março, pelas 15 horas, e terá como ordem do dia o

debate quinzenal com o Primeiro-Ministro e o debate, também com a participação do Primeiro-Ministro, de

preparação do Conselho Europeu, que tem lugar ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei de

Acompanhamento, Apreciação e Pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do processo de

Construção da União Europeia.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 13 horas e 20 minutos.

———

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação

Relativa aos projetos de lei n.os

766/XII (4.ª), 782/XII (4.ª) e 798/XII (4.ª):

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista decidiu viabilizar, pela via da abstenção, a discussão na

especialidade de todos os projetos de lei dos demais partidos, manifestando assim a sua abertura para a

melhoria e aprofundamento da discussão.

Compreendo e aceito tal posição e, por isso, a acompanho.

Porém, a gravidade de algumas das soluções propostas pelos projetos que ora viabilizo são de tal monta

que impõem que sobre elas desde já me pronuncie e demarque inequivocamente, manifestando que as

mesmas, a não serem alteradas na discussão a fazer em sede de especialidade, ditarão o meu voto contra.

Assim, por exemplo, quando o Bloco de Esquerda inscreve, no seu projeto de lei n.º 766/XII (4.ª), uma

alteração ao Código Penal que propõe um agravamento de penas «[…] sempre que o agente, no âmbito de

procedimento tributário anterior, pelos mesmos factos, não tenha colaborado com a administração tributária

[…]», hesito entre classificar tal proposta como ignorante ou demagógica. Inconstitucional é-o, sem dúvida, por

violação do artigo 32.º da Constituição.

Transcrevo o que o Tribunal Constitucional (Ac 179/2012) já escreveu na decisão que, por unanimidade,

considerou inconstitucional a lei que PSD, CDS, PCP, BE fizeram aprovar em 2012: «… [o estatuto jurídico-

processual do arguido em processo penal exige que] uma decisão condenatória em matéria penal assente na

demonstração positiva da culpa do arguido e seja obtida sem sacrifício do tríptico garantístico constituído pela

presunção de inocência, pelo in dubio pro reo, e pelo nemo tenetur se ipsum acusare e dos demais direitos

que gravitam em torno do arguido.»

Insistem também todos os proponentes em fazer erigir a transparência à categoria de bem jurídico.

Insistem, pois, em permanecer cegos e surdos ao que, por exemplo, o Conselho Superior da Magistratura

recordou nesta Assembleia, em audição realizada a 4 de fevereiro de 2010 («a transparência não é um bem

jurídico em si; é um instrumento para a realização de outros bens jurídicos»), ou até aos ensinamentos de

Figueiredo Dias, insigne mestre do Direito Penal português, que tendo dedicado toda uma vida ao estudo do

Direito Penal, modestamente nos confessou, relativamente ao enriquecimento ilícito, «o que eu não acho

possível é que possa desenhar-se aí um bem jurídico autónomo suscetível de uma tutela autónoma» (audição

na AR em 26.05.10).

Confesso a minha perplexidade ao constatar que Deputados e Deputadas há que, sem aparentes

qualificações para tal, displicentemente despeçam, sem mais, os avisados ensinamentos daquele que é, muito

justamente, considerado o maior dos penalistas portugueses e/ou do órgão de gestão da magistratura judicial

e violem assim, de modo despudorado, o artigo 18.º, n.º 2 da Constituição da Republica Portuguesa.

Acresce que o direito penal existe para punir comportamentos, não o resultado de comportamentos: o

resultado de um comportamento só pode servir para atenuar ou agravar a punição do comportamento. É este

princípio basilar, consagrado no artigo 29.º, n.º1 da Constituição, que continua a ser violado em todos os

projetos apresentados.

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Aquando da discussão dos projetos que originariam o Decreto n.º 37/XII da Assembleia da República e que

viria a ser rechaçado por unanimidade no Tribunal Constitucional (Ac. 179/2012), a Deputada Teresa Leal

Coelho afirmou «E que não se levantem vozes corrosivas de populismo bacoco, sustentadas em argumentos

falaciosos de técnica jurídico-constitucional e jurídico-penal, que servem o objetivo de iludir para prosseguir

tudo na mesma.»

Quem agora insiste em prosseguir por uma via que antecipadamente já sabe estar destinada a ser

declarada inconstitucional só pode, na verdade, estar a «iludir para prosseguir tudo na mesma». Dificilmente

poderíamos descortinar comportamento mais censurável. Ou populismo bacoco, para citar a própria.

O combate que urge contra a corrupção deve ser feito em nome e para defesa do Estado de Direito; nunca

à custa do Estado de Direito.

O Deputado do PS, Filipe Neto Brandão.

———

Relativas ao projeto de resolução n.º 1280/XII (4.ª):

Os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tendo votado a favor do projeto de resolução,

apresentado pelo PSD e pelo CDS-PP, que recomenda ao Governo a criação de mecanismos que assegurem

o pagamento atempado dos contratos para a prestação de serviço público de educação às escolas do ensino

particular e cooperativo, vêm apresentar as seguintes considerações:

O propósito da presente iniciativa é o de recomendar ao Governo a assunção da garantia de pagamento

atempado dos contratos para a prestação de serviço público de educação às escolas do ensino particular e

cooperativo.

Concordamos em absoluto com o princípio mas reforçamos que esta é uma obrigação do Governo e a

simples necessidade de a Assembleia da República ter de se pronunciar para garantir que o Governo cumpra

as suas obrigações constitui um verdadeiro atestado de incompetência ao Governo.

O financiamento do ensino artístico especializado decorre da própria autorização de funcionamento por

parte do Ministério da Educação e Ciência, prévia ao início de cada ano letivo, da qual consta um conjunto de

obrigações decorrentes do serviço público prestado.

O Partido Socialista considera que este projeto de resolução apenas vem demonstrar que o Governo foi

inapto e negligente no tratamento da matéria, onerando as instituições de ensino com custos desmesuráveis

decorrentes da assunção de compromissos mensais para salvaguardar o funcionamento regular das

instituições.

A salvaguarda de um regular procedimento no próximo ano letivo passa, não por qualquer alteração

legislativa, mas antes pela preparação atempada de todo o processo por parte do Ministério da Educação e

Ciência, sendo premente a alteração dos prazos de candidatura ao financiamento público por parte dos

estabelecimentos de ensino particular e cooperativo e a definição de um rigoroso cronograma de

procedimentos que garanta a transferência dos montantes necessários ao arranque do ano letivo.

Os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

——

O PCP votou favoravelmente este projeto de resolução porque entende que o Governo deve assumir os

compromissos assumidos com as instituições, e portanto, parece-nos óbvia esta recomendação.

Contudo, não podemos desligar a apresentação desta resolução da realidade concreto, que responsabiliza

o Governo pelo atraso superior a mais de quatro meses na transferência das verbas referentes aos contratos

de patrocínio do ensino artístico especializado e das verbas do POPH a escolas do ensino artístico e do

ensino profissional. Aliás, PSD e CDS poderiam ter referido apenas as escolas do ensino artístico e ensino

profissional, mas optaram por referir «escolas do ensino particular e cooperativo».

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Importa, por isso, deixar de forma clara a posição do PCP sobre esta matéria.

O artigo 75.º da Constituição da República dispõe que cabe ao Estado assegurar a criação de uma «rede

de estabelecimentos públicos de ensino que cubra as necessidades de toda a população». Este comando

constitucional resulta do próprio conceito de «ensino público» e do seu reconhecimento como pilar

fundamental do regime democrático, tal como o prevê o artigo 74.º da Constituição.

Contudo, sucessivos governos PS, PSD e CDS têm vindo a fazer um caminho de substituição de

financiamento do Orçamento do Estado para verbas do POPH, causando enormes atrasos no pagamento de

salários e despesas fixas e instabilidade na vida das escolas. Tal opção política representa uma

desresponsabilização do Estado na concretização de uma função social — a educação.

Para além disto, o Governo PSD/CDS tem, ao longo do seu mandato, apostado no desmantelamento da

escola pública, conforme consagrada na Lei de Bases do Sistema Educativo e na Constituição, amputando-a

de instrumentos essenciais. Ao mesmo tempo que destrói o papel e a qualidade da escola pública, favorece

descaradamente a escola privada e os negócios do privado com a educação.

A opção ideológica é reduzir a escola pública a um instituto de formação profissional de banda estreita, e

por isso aprofunda a escola dual e o ensino vocacional, ao mesmo tempo que financia com recursos públicos

um negócio dos privados para uma escola de elite. Quando despede milhares de professores, psicólogos e

funcionários o Governo sabe que está a amputar a escola pública de instrumentos que concretizam o princípio

da cultura da formação integral do indivíduo.

Utilizando a falácia da liberdade de escolha, o Governo PSD/CDS, ao mesmo tempo que destrói a escola

pública, favorece direta e indiretamente a escola privada. Isto é, através de financiamento direto às famílias e

através do encerramento de turmas na escola pública para autorizar a abertura nas escolas privadas, criando

apenas oferta formativa na escola privada específica e negando a sua criação na escola pública.

Hoje, o Governo PSD/CDS coloca em causa o papel da escola pública enquanto espaço de inclusão e

superação das desigualdades económicas e sociais. A escola pública é um pilar do regime democrático, pelo

que, quando o Governo ataca e destrói a escola pública, está a atacar e a degradar o próprio regime

democrático.

A Deputada do PCP, Rita Rato.

——

Relativamente ao projeto de resolução n.º 1280/XII (4.ª), o voto favorável do Bloco de Esquerda funda-se

estritamente na necessidade de garantir que o Ministério da Educação e Ciência corrija de forma célere os

atrasos por ele causados na transferência das verbas contratualizadas com as escolas de ensino artístico

especializado.

Seis meses após o início do ano letivo, nenhuma das 23 escolas da rede recebeu qualquer reembolso. Ao

contrário das práticas normais de anos anteriores, este ano letivo apenas em setembro e outubro foram

lançadas respetivamente as candidaturas pedagógica e financeira para estas escolas acederem ao

financiamento. Ou seja, devido ao atraso do Governo, as escolas têm neste momento dívidas crónicas às

Finanças e à Segurança Social, que nem sequer lhes permitem receber os normais reembolsos das

candidaturas.

Uma resposta a esta situação exige, por isso, três passos: a regularização urgente de todos os reembolsos

devidos a estas escolas; o Estado deve assumir as dívidas destas escolas às Finanças e à Segurança Social

provocadas pelo atraso do Governo em lançar as candidaturas; de modo a permitir o início do próximo ano

letivo de forma regular, o Governo deve antecipar para fevereiro as candidaturas pedagógica e financeira para

o próximo ano letivo 2015/2016.

As Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda, Helena Pinto — Catarina Martins — Cecília Honório

— João Semedo — Luís Fazenda — Mariana Aiveca — Mariana Mortágua — Pedro Filipe Soares.

———

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Relativa aos projetos de resolução n.os

1253/XII (4.ª), 1279/XII (4.ª) e 1282/XII (4.ª):

O processo para a demolição das casas nas ilhas-barreira da ria Formosa foi iniciado pelo anterior Governo

do PS e está agora a ser concretizado pelo atual Governo do PSD/CDS.

Há muitos anos que, a pretexto da defesa dos valores naturais, sucessivos governos destes três partidos

procuram expulsar as comunidades locais das ilhas-barreira da ria Formosa, assim como limitar o direito das

populações à utilização dessas ilhas-barreira como espaço de lazer e fruição, com o objetivo de entregar este

valioso património natural aos grandes interesses privados para que estes os explorem em seu benefício.

O PCP não aceita que, para satisfazer a avidez dos grandes grupos económicos, se sacrifiquem os direitos

das populações.

O PCP entende que a proteção dos recursos e valores naturais deve ter em conta os hábitos, práticas e

atividades tradicionais das áreas protegidas, não podendo contribuir para afastar as populações das áreas e

valores a proteger.

O PCP entende que a existência dos núcleos urbanos das ilhas-barreira da ria Formosa, assim como o seu

valor social, económico e cultural, deve ser reconhecida e que os milhões de euros destinados a demolições

deviam ser usados para proteger e salvaguardar o valioso património natural que é a ria Formosa, para

requalificar as zonas edificadas nas ilhas-barreira e para apoiar as atividades económicas que aí se

desenvolvem.

São estas as opções do PCP, pelo que votámos favoravelmente os projetos de resolução n.os

1253/XII (4.ª)

(PCP), 1279/XII (4.ª) (PS) e 1282/XII (4.ª) (BE).

O Deputado do PCP, Paulo Sá.

———

Nota: As declarações de voto anunciadas pela Deputada do PSD Conceição Bessa Ruão e pelo Deputado

do PS Pedro Delgado Alves não foram entregues no prazo previsto no n.º 3 do artigo 87.º do Regimento da

Assembleia da República.

———

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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