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Sexta-feira, 10 de abril de 2015 I Série — Número 71
XII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2014-2015)
REUNIÃOPLENÁRIADE9DEABRILDE 2015
Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves
Secretários: Ex.mos
Srs. Maria Paula da Graça Cardoso Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz
S U M Á R I O
A Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 9
minutos. Na abertura do debate da interpelação n.º 21/XII (4.ª) —
Centrada na continuação da política da troica pelo Governo e na afirmação da política alternativa das soluções para o País (PCP) usaram da palavra o Deputado Francisco Lopes (PCP) e a Ministra de Estado e das Finanças (Maria Luís Albuquerque). Seguiram-se no uso da palavra, a diverso título, além daqueles oradores, os Deputados Elsa Cordeiro (PSD), Miguel Tiago (PCP), Pedro Nuno Santos (PS), Pedro Filipe Soares (BE), Adão Silva (PSD), José Luís Ferreira (Os Verdes), Cecília Meireles (CDS-PP), Rita Rato (PCP),
Mariana Mortágua (BE), Jorge Machado, Bruno Dias e Paulo Sá (PCP), Sónia Fertuzinhos (PS), Michael Seufert (CDS-PP) — que solicitou à Mesa a distribuição de documentos —, João Galamba (PS) — que também solicitou à Mesa a distribuição de documentos —, Afonso Oliveira (PSD), Vera Rodrigues (CDS-PP), Nuno Reis (PSD) e Carla Cruz (PCP).
No encerramento do debate, usaram da palavra o Deputado João Oliveira (PCP) e a Ministra de Estado e das Finanças.
A Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 48 minutos.
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, Sr.ª Secretária de Estado
dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Sr. Ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares e Sr.
Secretário de Estado Adjunto e do Orçamento — a quem a Mesa cumprimenta —, Srs. Jornalistas, está aberta
a sessão.
Eram 15 horas e 9 minutos.
Srs. Agentes de autoridade, podem abrir as galerias.
Srs. Deputados, hoje a ordem do dia consiste na interpelação n.º 21/XII (4.ª) — Centrada na continuação
da política da troica pelo Governo e na afirmação da política alternativa e das soluções para o País (PCP).
Srs. Deputados, como hoje não há leitura prévia de expediente e há ainda muitos Srs. Deputados a
tomarem os seus lugares, fazemos uma pequeníssima pausa para que haja condições para o debate.
Pausa.
Srs. Deputados, vamos, então, iniciar a ordem do dia, com a moldura do artigo 227.º do Regimento.
A abertura do debate é feita pelo partido requerente da iniciativa, pelo que tem a palavra o Sr. Deputado
Francisco Lopes.
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Sr.a Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Portugal
atravessa um dos períodos mais difíceis da sua história. Passaram esta semana quatro anos sobre o dia 6 de
abril de 2011 em que, no seguimento dos PEC, o Governo PS de então, com o acordo do PSD e do CDS,
decidiu colocar Portugal no caminho do pacto de agressão da troica.
O Governo PSD/CDS-PP aplicou entusiasmado esse programa correspondente às suas opções políticas,
proclama uma saída que não se vê e continua a mesma política, com consequências que estão hoje bem
marcadas na realidade portuguesa.
Qual é verdadeiramente o rasto da política de direita, da política dos PEC e do pacto de agressão, da ação
do Governo? Que política é esta?
Esta é a política da destruição do aparelho produtivo e da produção nacional. O PIB, em termos reais,
passou de 181 000 milhões de euros em 2008 para 169 000 milhões de euros em 2014, uma quebra de 6,6%,
recuando para o nível existente em 2001, há uma década e meia.
Esta é a política do corte do investimento público. O investimento decisivo para manter a produção, as
infraestruturas, equipamentos e para o desenvolvimento caiu de 7200 milhões de euros em 2009 para 4200
milhões de euros em 2014.
Esta é a política do desemprego massivo. Entre 2009 e 2014, o número de postos de trabalhou foi reduzido
em quase meio milhão, a taxa de desemprego em sentido restrito passou de 9,4 para 13,9%, apesar da
emigração e da não contabilização de mais de 160 000 «ocupados» em estágios, programas ocupacionais e
ações de formação. O número de desempregados em sentido amplo passou de 653 000 para mais de 1200
milhões, a taxa de desemprego dos jovens atinge os 35%, o número de desempregados de longa duração
duplicou e apenas 23% dos trabalhadores desempregados recebem subsídio de desemprego.
Esta é a política da emigração forçada, que expulsou do País, por razões económicas, nos últimos cinco
anos, quase 400 000 portugueses, uma dimensão sem paralelo nos últimos 50 anos, só comparável com o
tempo do fascismo.
Esta é a política do aumento da exploração, de corte nos salários e pensões, de alterações para pior ao
Código do Trabalho e à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, de golpe na contratação coletiva,
facilitação dos despedimentos, eliminação de feriados, desregulação e aumento dos horários de trabalho,
promoção dos despedimentos, corte dos complementos de reforma em empresas públicas de transportes e de
generalização da precariedade com os falsos recibos verdes e o recurso a trabalho forçado e não pago, como
os chamados «contratos emprego-inserção» ou os estágios a preencher necessidades permanentes.
Os salários no sector privado baixaram neste período, entre 2011 e 2013, 13% e na Administração Pública
baixaram praticamente o dobro. A parte do trabalho na distribuição do rendimento nacional reduziu-se e
representa apenas 37%, enquanto a parte do capital atinge 62%.
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Esta é a política do empobrecimento, que promove baixos salários e pensões, cortes nos seus montantes,
desemprego, eliminação de apoios sociais, abono de família, complemento solidário para idosos, rendimento
social de inserção. Uma razia que cria uma situação dramática com a taxa de pobreza a passar, entre 2009 e
2013, de 17,9 para 25,9%, mais 800 000 pessoas na pobreza, 2700 milhões de portugueses atingidos
fortemente nas suas vidas.
Esta é a política das privatizações e dos cortes na Administração Pública e nos serviços públicos. No
Serviço Nacional de Saúde condicionando o acesso e a prestação dos cuidados de saúde, provocando a
rutura das urgências dos hospitais. Na escola pública aos vários níveis, incluindo o estrangulamento financeiro
do ensino superior e o desinvestimento na ciência. No ataque ao poder local, na degradação da justiça, na
desconsideração das Forças Armadas e dos militares, tal como dos profissionais das forças de segurança. Na
degradação dos mais diversos serviços públicos, no ataque ao direito à habitação.
Esta é a política do aprofundamento das injustiças e desigualdades sociais. Numa situação em que apenas
1% da população detém cerca de 25% da riqueza nacional e 5% da população acumula 50% dessa riqueza, o
Governo aumentou de forma brutal os impostos sobre os trabalhadores, os reformados e a população em
geral e diminuiu os impostos sobre os grupos económicos e financeiros. O lucro acumulado pelos principais
grupos económicos e financeiros e o dinheiro público que é drenado para a banca sobre os escândalos do
BPN, do BPP ou do BES para as PPP e os swaps contrasta com a redução dos salários e pensões e os cortes
dos apoios àqueles que necessitam de proteção e apoio social.
Esta é, por tudo isto e muito mais, uma política e este é, por tudo isto e muito mais, um Governo que não
servem o povo e o País.
Aplausos do PCP.
Srs. Deputados, meia década passada, de PEC e pacto de agressão, os centros de decisão do grande
capital, o Governo PSD/CDS-PP, desdobram-se em propaganda enganosa procurando esconder o desastre
para onde conduziram e estão a conduzir o País. Mas a realidade não deixa dúvidas quanto ao grande salto
atrás a que o País foi sujeito.
Os grandes constrangimentos mantêm-se e agravam-se tendo como elementos centrais o domínio do
capital monopolista e a dependência externa.
Entre os principais problemas e constrangimentos, está o garrote da dívida pública. Uma dívida
insustentável que compromete o presente e o futuro do País. Uma sangria em juros, mais de 8000 milhões de
euros por ano, mais do que o País gasta no Serviço Nacional de Saúde e o dobro do investimento público.
O capital financeiro transnacional não está preocupado com o nível da dívida do nosso País. O que lhe
interessa é que, em nome da dívida, possa continuar a fazer o saque dos recursos nacionais com os juros que
recebe.
Portugal precisa de se libertar deste garrote, este dinheiro é fundamental para garantir salários, pensões,
apoios sociais, serviços públicos, para investir no desenvolvimento do aparelho produtivo, aproveitar os
recursos do País, aumentar a produção nacional, criar emprego.
É bom ter presente que a grande justificação para os PEC e para o pacto de agressão com a troica foi a
dimensão do défice e da dívida pública.
Passados estes anos, neste período de aproximação às eleições, multiplicam-se as declarações de
responsáveis do PSD e do CDS-PP, acompanhados em surdina pelo PS, dizendo que a dívida é sustentável.
Entretanto, a dívida que invocaram querer combater aumentou quase 80 000 milhões de euros desde 2009 e
atinge 128% do PIB, 225 000 milhões de euros. Isto é, se a correlação de forças o permitisse, após as
eleições, não faltariam argumentos para um programa ainda mais violento contra os trabalhadores, o povo e o
País, para tentar perpetuar este caminho de declínio nacional.
O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — A isso o PCP diz basta! Dizemos basta de humilhação, de exploração e
empobrecimento, basta de corrupção e dependência.
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Assumimos com confiança o projeto de libertação, de dignidade e honestidade, de desenvolvimento e
soberania que Portugal precisa.
Assim, no momento em que o Governo se articula com a União Europeia para continuar a política da troica,
quando insiste em submeter o País aos constrangimentos dos mecanismos do tratado orçamental, dos
pacotes da governação económica e do Pacto de Estabilidade e Crescimento, quando elabora os chamados
«Programa Nacional de Reformas» e «Programa de Estabilidade», que não são mais que a continuação da
exploração, do empobrecimento e do declínio nacional, o PCP confronta-o nesta interpelação com o desastre
da sua política e a afirmação da política alternativa necessária ao País.
Portugal precisa de soluções e o Grupo Parlamentar do PCP apresentará, hoje mesmo, um projeto de
resolução com esse objetivo. Soluções para o País que o PCP adianta e ganham apoio na sociedade
portuguesa.
Aplausos do PCP.
A saber:
A renegociação da dívida pública, nos seus prazos, juros e montantes.
O fim da chamada «governação económica», assim como a revogação do tratado orçamental, a
desvinculação de Portugal desses instrumentos e o estudo e preparação do País para libertação da submissão
ao euro.
A defesa dos setores produtivos e a produção nacional e a garantia do controlo público dos setores básicos
e estratégicos da economia, designadamente da banca.
A valorização do trabalho e dos trabalhadores, através de uma justa distribuição do rendimento, assente na
valorização dos salários, no pleno emprego, na defesa do trabalho com direitos e maiores reformas e pensões,
no combate ao desemprego e à precariedade.
A defesa dos serviços públicos e das funções do Estado, em particular as suas funções sociais,
designadamente do Serviço Nacional de Saúde, da escola pública, da segurança social e da cultura.
Uma política fiscal mais justa, que assegure o investimento e o financiamento das funções sociais do
Estado, rompa com o favorecimento dos grupos económicos e financeiros e alivie a carga fiscal sobre os
trabalhadores e o povo, sobre as micro, pequenas e médias empresas.
Tais são aspetos essenciais da política que o PCP propõe, da política que Portugal precisa.
Srs. Deputados, há quatro anos, no dia 5 de abril de 2011, o PCP anunciou ao País a sua proposta
inovadora de renegociação da dívida pública, inserida num caminho alternativo de desenvolvimento
económico e social. PS, PSD e CDS-PP recusaram esse caminho e optaram pela troica com a devastação
nacional que se conhece.
Perderam-se quatro anos, o retrocesso é notório, a situação hoje é muito pior, mas é sempre tempo. O
tempo do Governo está a esgotar-se, um tempo de decisão do caminho alternativo aproxima-se. O PCP, pela
sua parte, apresenta soluções para o País e está preparado e pronto para assumir todas as responsabilidades
que o povo português lhe queira atribuir, para concretizar uma política patriótica e de esquerda, vinculada aos
valores de Abril, para um Portugal com futuro.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
A Sr.ª Presidente: — A abertura do debate é completada pela intervenção do Governo, pelo que tem a
palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças (Maria Luís Albuquerque): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados:
Começo por agradecer ao Sr. Deputado Francisco Lopes a oportunidade de vir aqui, ao Parlamento, fazer um
debate, que é oportuno, sobre quais são os compromissos que Portugal assumiu e os compromissos que
devemos cumprir ao longo deste mês de abril, aliás, na sequência dos contributos que pedimos aos partidos e
aos parceiros sociais.
Como o Sr. Deputado sabe, pedimos a todos os partidos com assento parlamentar, numa carta minha do
dia 6 de março, que nos remetessem contributos para a elaboração do Programa Nacional de Reformas que
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tem depois, naturalmente, um espelho orçamental no Programa de Estabilidade para os próximos quatro anos,
precisamente porque entendemos que devemos ouvir os partidos com assento parlamentar e incorporar esses
contributos numa discussão para podermos ter um Programa Nacional de Reformas e um Programa de
Estabilidade que sejam o mais consensuais possível dentro dos representantes eleitos.
Na verdade, relativamente aos contributos que foram pedidos, o PCP referiu, na carta que enviou em
resposta, que, efetivamente, entende não dever mandar contributos, porque está em total desacordo com
todas as regras que, entretanto, estão estabelecidas e às quais o País se vinculou, como o Sr. Deputado
voltou, agora, a reiterar no seu discurso.
Não obstante, Sr. Deputado, Portugal assumiu estes compromissos por vontade expressa da maioria dos
Deputados eleitos e, como tal, esses compromissos serão, naturalmente, cumpridos, mas respeitamos a
posição dos Srs. Deputados.
No entanto, deixe-me referir-lhe que, quando o Sr. Deputado diz que continuam as políticas da troica, se o
Sr. Deputado se refere à necessidade de manter a disciplina orçamental, é verdade, este Governo vai
continuar a insistir na necessidade de manter a disciplina orçamental,…
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — … porque foi a falta de disciplina orçamental, no passado,
que obrigou a que, nestes últimos anos, fossem tomadas medidas que foram, sem dúvida alguma, muito
gravosas para os portugueses.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Foram muito gravosas para quem está desempregado, para
quem, entretanto, perdeu o emprego e para as pessoas que mais precisam de proteção social, apesar de o
Governo tudo ter feito para proteger os mais desfavorecidos. E já foi amplamente reconhecido em múltiplos
relatórios internacionais que, de facto, a distribuição dos sacrifícios, em Portugal, teve em atenção os mais
desfavorecidos. Sempre protegemos as pensões mais baixas, sempre protegemos os salários mais baixos,…
O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Está a brincar!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — … atualizámos as pensões mínimas sociais e rurais ao
longo deste período, sempre tivemos uma grande preocupação com os mais desfavorecidos.
Mas, efetivamente, a crise tem consequências graves e a consequência mais grave é ao nível do
desemprego. O Sr. Deputado referiu, e bem, que, em 2008 — penso que o número que citou era de 2008 —, o
desemprego já estava acima dos 9% e quando a crise eclodiu já estava na casa dos dois dígitos. É verdade
que se agravou muito, é verdade também que, em grande parte, já reverteu, e esperamos que assim
continue,…
O Sr. João Galamba (PS): — Continue?! Já está a aumentar!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — … mas, efetivamente, aquilo que se passou na década
anterior foi uma persistente subida de desemprego que deveria ter servido de alerta ao Governo para corrigir o
rumo das políticas que estavam a ser tomadas. Como a crise era menos aparente — e note-se que a crise era
apenas menos aparente, porque ela estava, efetivamente, em formação —, essa questão foi menosprezada,
não lhe foi dada a atenção devida e quando, finalmente, se acordou para o problema era já tarde, o que
obrigou a um programa de emergência e à tomada de medidas que foram mais duras do que se tivessem sido
tomadas a tempo.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Exatamente!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Essa é, agora, a nossa responsabilidade, Srs. Deputados.
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O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Vê-se!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Quando começamos a ver a economia a recuperar, quando
começamos a estabilizar as finanças públicas, temos a obrigação, e os portugueses assim o exigem, de
garantir que o novo ciclo de melhoria não será aproveitado para voltar a criar os problemas do passado, mas
que será usado para prevenir os problemas do futuro, porque é isso que, efetivamente, salvaguardará os
portugueses das penosas dificuldades que tiveram de sofrer ao longo destes anos. Portanto, quando se diz
que, no próximo ciclo, vamos devolver tudo, vamos pagar tudo, como se o problema tivesse desaparecido, é
pura irresponsabilidade, Srs. Deputados.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Aquilo que temos de garantir é que criamos as condições
para que o problema não se repita.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Depois, o Sr. Deputado referiu o garrote da dívida pública e a agiotagem.
Sr. Deputado, uma notícia que está hoje em todos os meios de comunicação social é o facto de a taxa de
juro, a dois anos, em Portugal, estar em torno de valores negativos. Tenho alguma dificuldade em conciliar o
conceito de agiotagem com taxas de juro negativas na dívida pública.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Em qualquer caso, Srs. Deputados, aquilo que, efetivamente, nos deve preocupar é como é que o País tem
condições para criar riqueza, porque só se pode distribuir aquilo que existe. E a nossa primeira e principal
preocupação, uma vez alcançada a estabilidade das contas públicas, tem de ser a de a preservar para evitar
que um novo descalabro nas contas públicas tenha consequências gravosas sobre a economia real, sobre o
emprego, sobre as famílias portuguesas, sobre aqueles que mais precisam de ter a garantia de que o Estado
estará lá para os apoiar, porque são os que mais dependem do apoio do Estado no Serviço Nacional de
Saúde, na escola pública, nos subsídios de desemprego, nos apoios sociais. Para que o Estado possa,
efetivamente, dar todas essas condições, o Estado tem de garantir que, nos melhores momentos, faz o que é
necessário para amealhar para os momentos que são mais difíceis.
Quando o Sr. Deputado refere que a crise, ao longo destes 3 anos, empurrou o País 15 anos para trás, o
que o Sr. Deputado se deveria estar a perguntar era que políticas é que seguimos nos 15 anos anteriores para
criar a riqueza que se destruiu com uma recessão de 6,5% e o que é que isso diz sobre a taxa de crescimento
dos 15 anos anteriores.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — O PSD não esteve no Governo?!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Quando todos à nossa volta cresciam, quando a Espanha
reduziu a sua dívida pública numa grande percentagem do PIB, quando a Irlanda reduziu a sua dívida pública,
quando a Bélgica reduziu a dívida pública para metade, durante esse período, Portugal aumentou a dívida
pública e quase não cresceu.
O Sr. João Galamba (PS): — E como é que está hoje a dívida pública da Irlanda e da Espanha?!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Por isso é que uma recessão de 6,5%, que é séria, que é
grave, atirou o País 15 anos para trás.
O Sr. João Galamba (PS): — E como é que está hoje a dívida pública da Irlanda e da Espanha?! Diga lá!
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A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Está na altura de fazermos uma reflexão sobre a razão pela
qual 6,5% queimaram 15 anos, sobre o que se desperdiçou nesses 15 anos e por que é que tivemos de sofrer
tanto nos últimos 4 anos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Deputado Francisco Lopes diz que a dívida aumentou 80 000 milhões, mas, Sr. Deputado, a maior
parte desta dívida não aumentou, apareceu,…
Vozes do PCP: — Ah!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — … apareceu explicitamente nas contas públicas, porque,
efetivamente, a dívida das empresas públicas, das entidades que foram reclassificadas já existia, apenas não
aparecia.
O Sr. Ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Guedes): — Já cá estava!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Quando ela apareceu, obviamente, fez aumentar o número
da dívida pública, mas só fez aparecer um número que já existia. Aliás, o perigo dessa desorçamentação foi
algo para o qual o Governo anterior foi alertado, mas todos os comportamentos menos responsáveis sempre
se manifestam nas piores alturas. Infelizmente, é sempre assim, é nas piores alturas que todas estas coisas
aparecem.
Mas nesta dívida que o Sr. Deputado diz que aumentou está também uma almofada financeira que nos
permite olhar para os portugueses e dizer, com confiança, que não vamos estar em circunstância difícil,
mesmo que à nossa volta alguma coisa corra mal,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Enquanto as pessoas passam fome! É a teoria dos cofres cheios!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — … que não vamos estar aflitos, à procura de dinheiro para
pagar salários e pensões, porque temos reservas para poder fazer face a essas necessidades, que não vamos
deixar de pagar os compromissos do Serviço Nacional de Saúde, porque temos reservas, se for necessário,
para fazer face a essas dificuldades. E basta pensarem, Srs. Deputados, no que é a dificuldade de um
Governo como o grego, que está a querer negociar um programa e não tem um tostão nos seus cofres para
poder fazer essa negociação em condições.
O Sr. Duarte Filipe Marques (PSD): — Bem lembrado!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Nós estivemos numa situação como essa em 2011, tivemos
de fazer uma negociação à pressa, muito provavelmente em piores condições do que teríamos feito, se não
estivéssemos na iminência de entrar em bancarrota e de não ter dinheiro para solver os compromissos,
nomeadamente de salários e pensões.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Isso, Srs. Deputados, chama-se governar de forma responsável e manter margens de prudência que
protejam os portugueses daquilo que se pode passar à nossa volta e que está para lá do nosso controlo.
Naturalmente, à medida que o processo for estabilizando, à medida que o enquadramento for melhorando,
a necessidade dessa almofada financeira também vai diminuindo. Mas sabermos que continuamos a ter
condições de honrar os nossos compromissos e de não deixar os portugueses à mercê dos caprichos do
mercado ou das exigências de credores oficiais exige que tenhamos esta política de prudência e de
responsabilidade.
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No essencial, Srs. Deputados, aquilo que nos deve unir aqui, nesta discussão, respeitando as diferenças
que temos, é como é que podemos garantir que o caminho de crescimento e recuperação que o País já iniciou
se consolida, avança, quais são os compromissos que podemos e devemos assumir nos próximos anos, para
que o nosso caminho, de futuro, seja sempre melhor, para que consigamos reduzir o desemprego, para que
consigamos voltar a atrair investimento privado no País, para que consigamos manter a disciplina das contas
públicas e evitar que mais alguma vez Portugal — e seria a quarta vez em menos de 40 anos — tenha de se
ver na situação em que se viu nos últimos 4 anos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, a Mesa regista já muitas inscrições, a primeira das quais da Sr.ª
Deputada Elsa Cordeiro, do PSD, para formular perguntas ao Sr. Deputado Francisco Lopes.
Estão também já inscritos 10 Srs. Deputados para formularem perguntas à Sr.ª Ministra de Estado e das
Finanças. Não sei como é que a Sr.ª Ministra pretende responder…
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr.ª Presidente, responderei em conjunto a três, mais três e,
finalmente, quatro Srs. Deputados.
A Sr.ª Presidente: — Muito bem, Sr.ª Ministra.
Assim sendo, tem a palavra, em primeiro lugar, para formular perguntas ao Sr. Deputado Francisco Lopes,
a Sr.ª Deputada Elsa Cordeiro.
A Sr.ª Elsa Cordeiro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Francisco Lopes, mais uma vez, e de uma
forma indecorosa,…
O Sr. António Filipe (PCP): — De forma indecorosa?!
A Sr.ª Elsa Cordeiro (PSD): — … pretendem os Deputados do PCP trazer a debate e fazer transparecer
que as políticas implementadas por este Governo são inadequadas e que só há salvação para o País com
políticas patrióticas de esquerda, de índole conservadora e já derrotadas pela história.
Quero relembrar as Sr.as
Deputadas e os Srs. Deputados que, em 2011, estava o País em pré-bancarrota,
o Estado só tinha dinheiro para pagar salários e prestações sociais por mais dois meses e Portugal teve de
solicitar ajuda externa para mantermos a nossa soberania e podermos pagar os salários e as prestações
sociais.
Relembro que estivemos, durante dois anos e meio, sob um programa de assistência financeira bastante
duro para todos os portugueses.
Relembro que passámos pela pior crise económica dos nossos 40 anos de democracia.
O Sr. João Galamba (PS): — Causada pelas políticas do Governo!
A Sr.ª Elsa Cordeiro (PSD): — Esta situação não pode ser imputada a este Governo, mas às políticas
erradas, despesistas e irresponsáveis do Governo socialista.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Elsa Cordeiro (PSD): — Mas este Governo e esta maioria conseguiram, com as suas políticas, tirar
o País da bancarrota, quando já ninguém acreditava que era possível, cumprir o programa de assistência
financeira, quando já ninguém acreditava que era possível, e voltar a ter crescimento económico, quando já
poucos acreditavam que era possível.
Querem as Sr.as
Deputadas e os Srs. Deputados do PCP fazer transparecer que, com outra política fiscal,
resolviam todos os nossos problemas. Nunca, mas nunca houve um Governo que se preocupasse tanto com
as famílias e com as pequenas e médias empresas.
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Protestos do PCP e do BE.
Ouçam, Srs. Deputados, ouçam!
É por isso que existe um escalão reduzido de IRC para as pequenas e médias empresas; é por isso que,
ao contrário do que querem fazer transparecer, existe uma derrama estadual, além da taxa de IRC, que tributa
as grandes empresas, com lucros acima de 1500 milhões de euros; foi por isso que se aumentou a
contribuição do setor bancário; foi por isso que se introduziu a contribuição extraordinária sobre o setor
energético; foi por isso que se aumentou a contribuição sobre a indústria farmacêutica.
Por outro lado, aumentámos as pensões mínimas, majorámos o subsídio de desemprego para casais
desempregados, criámos a taxa bonificada de energia e alargámos a isenção de IMI para as famílias de
menores rendimentos.
Sr.as
e Srs. Deputados, muitos mais exemplos poderia dar de políticas fiscais que oneram os rendimentos
mais elevados, evidenciando a justiça social da ação deste Governo. Hoje, temos um Estado mais eficiente e
mais amigo das famílias e das empresas;…
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Elsa Cordeiro (PSD): — … hoje, é possível financiarmo-nos a taxas negativas — nenhum dos Srs.
Deputados da oposição acreditava nisto, mas hoje é possível, face à credibilidade deste Governo!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — A Sr.ª Ministra subscreve isto, das taxas negativas?!
A Sr.ª Elsa Cordeiro (PSD): — Quando, num passado recente, ninguém nos financiava, este Governo
recuperou a credibilidade do País e aumentou a confiança dos portugueses.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Que disparate!
A Sr.ª Elsa Cordeiro (PSD): — Por isso, Sr. Deputado Francisco Lopes, pergunto-lhe: numa economia
global, quando pertencemos a uma União Europeia e a uma moeda única, defende, nas suas soluções
políticas, a saída do País do euro? É que, Sr. Deputado, há que falar verdade, há que ser verdadeiro para os
portugueses, porque nenhum português quer passar por mais sacrifícios num futuro próximo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada, houve uma distração da Mesa no que diz respeito ao limite de tempo
de que dispunha, mas, apesar de tudo, é imputável no tempo global do grupo parlamentar.
No entanto, para equilibrarmos o debate, pedia aos Srs. Deputados que respeitassem os limites de tempo
regimentais.
Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Francisco Lopes para responder.
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.a Deputada Elsa Cordeiro e Sr.ª Ministra das
Finanças, queria mostrar a minha surpresa perante o que acabou por ser dito. No fundo, vieram aqui referir-
nos que o nosso País, este ano, não vai pagar 8000 milhões de euros de juros da dívida, mas vai receber
milhares de milhões de euros dos credores, porque a taxa de juro é negativa!
A Sr.ª Elsa Cordeiro (PSD): — É mesmo demagogo!
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Grande informação que tivemos hoje, aqui!
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Protestos da Deputada do PSD Elsa Cordeiro.
Isto mostra que aquilo que foi dito é uma questão pontual que pretende esconder a questão real da
situação da vida do País. Aliás, os grandes grupos económicos, os nossos credores não estão preocupados
com a dívida do nosso País. Para eles, ela pode subir, porque, se subir, eles vão sacar mais juros!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Hoje, podem até dizer, numa conjugação, que os juros podem baixar,
mas amanhã, daqui a um mês ou daqui a um ano podem, artificialmente, fazer subir as taxas de juros.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Nós não podemos estar sujeitos a este garrote! É por isso que é uma
questão de responsabilidade a renegociação da dívida.
Em relação à questão do euro, diria o seguinte: atenção, o PCP defende que é necessário o País estudar e
preparar-se para se libertar do domínio do euro. Alguém, no seu devido juízo, se tiver consciência das
responsabilidades no nosso País, pode dizer que não se deve estudar, que não se deve pensar?! Podemos
estar sujeitos a que, um dia, o Banco Central Europeu ou a União Europeia digam: «Vocês têm de cortar nos
salários, nas pensões… Têm de destruir a vossa atividade produtiva» e aceitamos isso em nome do euro?!
Temos de estar preparados, temos de estudar para que, no momento em que seja necessário defender os
interesses nacionais — e, tantas vezes isso é necessário!… —, se diga: «Por aí não vamos! Temos
alternativa! Somos um País soberano! Somos um povo que merece ser tratado com dignidade!».
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — A política do Governo está ao serviço dos grandes grupos económicos e
financeiros e dos especuladores, contra os interesses do povo português, e os resultados do cumprimento
desse programa estão à vista. Ainda nesta semana e na semana passada, vimos o que aconteceu, vimos o
que é pobreza, miséria, fome: milhares de pessoas no estuário do Tejo empurradas para a apanha da ameijoa,
numa situação em que têm de buscar o seu sustento, com risco de vida!
Protestos do PSD.
É o exemplo daquilo que significa a pobreza!
Por outro lado, minimizam os senhores o que significa 400 000 portugueses terem sido empurrados para a
emigração! Sabem o que isto significa?! Significa que, em todo o distrito de Coimbra, não restaria uma pessoa
se não tivessem migrado pessoas de outras zonas do País!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Figueira da Foz, Coimbra, todas as cidades, vilas e aldeias do distrito de
Coimbra não ficariam com uma única pessoa! Esta é a dimensão da emigração nos últimos quatro anos! E isto
tem consequências para hoje e para o futuro.
Quanto à questão da injustiça fiscal, vemos o aumento colossal dos impostos do IVA, do IRS — mais 35%
— para os trabalhadores e para a generalidade da população,…
A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — … enquanto o imposto sobre as grandes empresas, o IRC, diminuiu de
23% para 21% e vai a caminho de uma maior redução!
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A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Uma grande parte desse dinheiro que deixa de entrar nos cofres do
Estado vai para onde? Vai para os lucros dos grandes grupos económicos e uma grande parte sai de Portugal,
prejudicando o desenvolvimento do nosso País.
Esta política e este Governo não servem; é preciso uma política alternativa. Nós temos soluções para o
País e estamos a colocá-las em debate, na Assembleia da República.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — O primeiro orador a formular a pergunta à Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças é o
Sr. Deputado Miguel Tiago.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.a Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, em primeiro lugar,
essa propaganda da retoma económica e de um caminho de progresso contrasta fortemente com a realidade
que está à vista dos portugueses. Mas é compreensível querer fazer-nos crer que estamos quase lá, que
basta só mais um esforço, que basta só mais um bocadinho para, enquanto isso, poderem continuar a
esbulhar nos salários, nas pensões, nos direitos dos portugueses. Querem convencer-nos de que só falta mais
um bocadinho e de que tudo até aqui seria em vão, quando, na verdade, quanto maior for o tempo de vida
deste Governo maiores serão os sacrifícios!
Sr.ª Ministra, «cofres cheios»?! Os seus cofres estão cheios é de dívida para pagar dívida. É disso que
estão cheios os cofres do Governo!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Entre 2011 e 2014, a dívida cresceu mais de 30 000 milhões de euros,
estando agora nos 130% do PIB. Os custos com juros representam já mais de 8580 milhões de euros anuais e
prevê-se que esse custo se mantenha em crescimento. Até 2020, os portugueses serão forçados a pagar um
total de 60 000 milhões de euros de juros, só por dívida já contraída.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O que gastamos, anualmente, em juros, Sr.ª Ministra, financiaria um outro
serviço nacional de saúde inteiro, a funcionar durante todo um ano,…
O Sr. David Costa (PCP): — É verdade!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … ou o ensino gratuito para todos os portugueses até ao mais elevado grau
de ensino durante um ano, ou duplicaria o orçamento do apoio às artes durante 400 anos.
Este é o caminho que nos trouxe até aqui e com o qual urge romper, Sr.ª Ministra.
O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Com o novo Programa de Estabilidade, que opções tomará este Governo?
Continuar a aceitar as imposições da União ou procurar convergir com os outros países que têm problemas de
endividamento semelhantes e estão sujeitos a semelhantes imposições, como o PCP propõe? Optar por
continuar a pagar juros exorbitantes, sacrificar direitos, salários e pensões, continuar a destruir serviços
públicos, as funções sociais, culturais, económicas e, até, as de soberania do Estado ou renegociar a dívida
para poder investir na educação, na saúde, na segurança social, na cultura, na produção, na valorização dos
salários e pensões, como o PCP propõe? Persistir na entrega do País e da sua riqueza a interesses privados e
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estrangeiros ou defender o interesse nacional? Persistir na entrega da soberania a interesses alheios aos dos
portugueses ou defender o nosso direito a decidir sobre o nosso próprio destino?
Sr.ª Ministra, recusar a renegociação da dívida não é honradez, é pretexto para continuar a política da
troica e de esbulho da riqueza produzida por quem trabalha.
Renegociar a dívida é defender o interesse nacional e isso — está a vista de todos — não pode ser feito
por uma delegação da União Europeia, tem de ser por um governo ao lado e ao serviço do povo e do País,
como o PCP propõe.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do PS.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Nuno Santos.
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, o Governo e a
maioria que o apoia têm assentado o seu discurso na ideia de que foram pedidos pesados sacrifícios ao povo
português, mas que valeu a pena. Valeu a pena porque, entretanto, depois do sofrimento e dos sacrifícios, a
economia começou a recuperar. Infelizmente, isso não é verdade, se levarmos em consideração os dados
sobre o emprego e o desemprego.
Muita gente tem a ideia de que uma economia, depois de bater no chão, começa a crescer. Infelizmente —
e a Sr.ª Ministra sabe disso —, é possível uma economia bater no chão e lá ficar. Aliás, se a Grande
Depressão nos mostra alguma coisa é que muitos países, depois de anos em queda, ficaram também muitos
anos com economias moribundas, em que cresciam e voltavam a cair, em que criavam emprego e voltavam a
destruir. É, possivelmente, isso que está a acontecer com a economia portuguesa!
No primeiro ano e meio do ajustamento, o País viu serem destruídos 418 000 postos de trabalho.
A partir de janeiro de 2013, iniciámos uma recuperação: a criação de emprego líquido. Isso criou a
expetativa entre todos nós de que, provavelmente, podíamos estar a entrar numa trajetória sustentável de
criação de emprego. Infelizmente, a partir de agosto de 2014, o emprego começou a ser destruído, a criação
líquida de emprego deixou de existir.
Se até janeiro de 2013, foram destruídos 418 000 postos de trabalho, entre janeiro de 2013 e agosto de
2014, foram criados 171 000.
A partir de agosto, começou a destruição. Entre agosto e setembro, perdemos 4000 empregos; em outubro,
20 000 empregos; em novembro, 3000; em dezembro, 14 000; em janeiro, 7000; em fevereiro, 11 000
empregos destruídos!
Estamos há seis meses a assistir a uma queda ininterrupta do emprego: são 158 000 postos de trabalho
destruídos, nos últimos seis meses!
O que está a acontecer-nos, Sr.ª Ministra? Qual é a explicação do Governo?
O Ministro da Economia explicou a queda, com base na sazonalidade. Mas a sazonalidade que explicaria
esta queda é a mesma que, provavelmente, explicará algum crescimento, no verão; a mesma que explicará a
destruição de emprego, novamente, no inverno.
Quer isto dizer, Sr.ª Ministra, que atingimos o limite de criação estrutural de emprego, que a recuperação
estrutural terminou e que não passaremos dos 3,5% para baixo?
A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Sr.ª Ministra, nos últimos meses, entre novembro e fevereiro de 2015,
assistimos a uma destruição de 29 000 postos de trabalho, 16 000 foram empregos subsidiados perdidos.
Imagino que para um liberal seja frustrante perceber que o mercado de trabalho está tão dependente de
emprego subsidiado. O que acha a Sr.ª Ministra desta dependência do mercado de trabalho português, face
ao emprego financiado por dinheiros públicos?
A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
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O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Sr.ª Ministra, num contexto em que as taxas de juro estão próximas de
zero ou, até, em alguns prazos, negativo, em que o euro está a depreciar-se, em que o preço do petróleo está
a metade do valor de há um ano, como explica que desde há seis meses o emprego esteja a cair de forma
ininterrupta? Sr.ª Ministra, o que está a acontecer-nos?
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do Bloco de Esquerda.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, uma das suas
frases, hoje, aqui dita e repetida pelo Governo é a de que o Governo tinha um compromisso com os salários e
com as pensões, que manteve esse compromisso durante a sua governação e que foi por esse compromisso
que governou, garantindo que a dívida não os levava. Nada mais falso, Sr.ª Ministra! Nada mais falso!
O compromisso com este Governo foi, exatamente, o de cortar todos os anos salários, o de retirar pensões
àqueles que uma vida inteira descontavam. E os números não mentem. Com este Governo, o seu
compromisso com a austeridade levou 13% dos salários do privado, quase 20% dos salários do público.
Todos os anos deste Governo o seu compromisso com a austeridade congelou as pensões médias e
retirou o dinheiro às pensões mais elevadas.
Todos os anos deste Governo o seu compromisso com a austeridade mergulhou mais o País na pobreza,
congelou e retirou apoios sociais, criou mais pobreza entre os mais jovens e o desemprego não parou de
aumentar.
O seu compromisso não é com o País, não é com as pessoas, nunca foi! É com os grandes interesses e,
particularmente, com a austeridade. Esse é o suprassumo para o qual tem governado e que mostra a escolha
que está em cima da mesa: cortar, cada vez mais, às pessoas para salvar os grandes grupos económicos,
particularmente a banca, em vez de sacrificar a banca para, com isso, dar vida às pessoas. Este foi o Governo
que quis estar comprometido com os grandes interesses portugueses e da Europa, com os grandes interesses
da banca.
Protestos do Deputado do CDS-PP Michael Seufert.
Nas escolhas que fez deixou, há muito, pessoas para trás, sacrificadas na sua austeridade!
Mas há escolhas muito óbvias. Com este Governo, todos os anos os impostos foram cada vez mais
pesados sobre quem trabalha. Vemos isso ainda este ano: o IRS é a base, é o pilar da receita fiscal,
juntamente com o IVA, e caem em cima de quem trabalha neste País, ao mesmo tempo que os grandes
grupos económicos estão, agora, muito agradecidos ao Governo pelas sucessivas baixas do IRC.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Muito bem!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Mas vejamos o que está a acontecer na banca: os bancos tiveram,
com este Governo, o maior dos negócios. Há um termo — «impostos diferidos» —, em que eles têm
garantidos, por décadas, que vão ter borla fiscal deste Governo. Mas há um, em particular, que se chama
Banco Espírito Santo, que tem a haver, no Novo Banco, 2830 milhões de euros.
Sr.ª Ministra, há uma pergunta que tem de responder aqui. Esse Banco, que se prevê, pelas ofertas que se
vão conhecendo, que não vai valer mais do que isso, vai agora ser vendido nos seguintes termos: «Agora dê
cá um dinheirinho que nós, logo a seguir, damos-lho em descontos fiscais. Se pagar agora, recebe mais à
frente em impostos diferidos». É esta a sua justiça social? É este o seu compromisso com o sistema fiscal
iníquo que só trouxe pobreza?
Se fossem pessoas, não havia diferimento de impostos, não havia, sequer, um perdão fiscal como o que
houve. Se fossem pessoas, ficavam sem casas se não pagassem o IMI, ficavam com as suas vidas
paralisadas se não pagassem IRS.
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A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Mas essas são as escolhas, de facto, de quem tem a austeridade como
compromisso e de quem, há muito, esqueceu as pessoas.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças para responder.
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, queria começar por
subscrever algumas afirmações dos Srs. Deputados do PCP, que afirmam que devemos defender os
interesses nacionais e que somos um povo que merece ser tratado com dignidade.
Acho que qualquer um de nós subscreverá essas frases e eu, pessoalmente, subscrevo, Sr. Deputado.
Temos é formas diferentes de salvaguardar os interesses nacionais e, ao longo destes anos de democracia, e
já lá vão alguns, temo-nos sempre apresentado aos portugueses com as nossas visões sobre o que é que
salvaguarda esses interesses e temos respeitado o resultado dessas votações quanto ao que salvaguarda os
referidos interesses.
É assim que aqui estamos hoje e aqui estaremos, certamente, depois das próximas eleições legislativas,
respeitando aquilo que o povo soberanamente determinar, naquilo que seja a sua visão sobre o que é que, de
facto, defende os interesses nacionais. Mas acho que todos podemos reclamar que o fazemos legitimamente.
Quanto às questões que o Sr. Deputado Miguel Tiago colocou, nomeadamente a de que os juros pagos
vão continuar a aumentar, devo dizer, Sr. Deputado, que os juros pagos não vão continuar a aumentar, os
juros pagos vão descer, precisamente porque vamos substituir dívida que é mais cara por dívida que é mais
barata.
De facto, é verdade que temos uma grande dependência do endividamento externo. Sr. Deputado, já disse
aqui muitas vezes, e não me cansarei de repetir, que a dívida é memória dos défices passados e a única
forma de não depender dos credores é não precisar de lhes pedir dinheiro. E essa solução é que os Srs.
Deputados não apresentam.
O que o Sr. Deputado diz é: deixamos de pagar juros com renegociação da dívida e, depois, fazemos
muitos investimentos. Sr. Deputado, vamos imaginar que fazíamos isto num ano e que tínhamos os 8000
milhões. E, depois, no ano seguinte? Acabava-se, porque a riqueza não se gera por milagre nem por boas
intenções.
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — 8000 milhões, por ano!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Infelizmente para muita gente, a política que o Sr. Deputado
defende até já teve múltiplas aplicações práticas e nunca, Sr. Deputado, em nenhum dos países, isso se
traduziu em progresso e em riqueza para as respetivas populações.
Aplausos do PDS e do CDS-PP.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Não é verdade!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Essa é a verdade, Sr. Deputado.
Quer os Srs. Deputados gostem, ou não, a verdade é que os regimes comunistas caíram todos porque
nunca criaram riqueza e boas condições de vida para o povo. E isso não é uma questão de opinião, é um facto
histórico. O capitalismo, com os defeitos que tem nas sociedades ocidentais, como foram vulgarmente
chamadas, teve crises mas criou, efetivamente, riqueza e as pessoas melhoraram o seu nível de vida. As
coisas são como são, Sr. Deputado.
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Mas não são assim!
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A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado Pedro Nuno Santos, o Sr. Deputado fala dos
números do desemprego. Os números do desemprego naturalmente preocupam o Governo. Aliás, temos dito
muitas vezes que o desemprego tem de ser a nossa maior preocupação, porque é claramente aquilo que mais
preocupa os portugueses.
Sabemos também que o emprego não se cria por decreto nem prometendo em campanha eleitoral 150 000
empregos, porque eles, depois, não acontecem, como nós, aliás, vemos.
O Sr. António Filipe (PCP): — Vá dizer isso aos chineses!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — O emprego cria-se com a criação de riqueza!
Os Srs. Deputados também diziam, creio que era o Sr. Deputado Miguel Tiago, que estamos a querer
convencer os portugueses de que já só falta um bocadinho. Sr. Deputado, quem dera que só faltasse um
bocadinho!
Na verdade, ainda falta bastante, porque o problema que foi criado no País era, de facto, muito grande.
Conseguimos estabilizar, inverter a tendência, mas é preciso continuar o esforço. Não estamos a dizer que
vamos ter de impor novos sacrifícios mas temos de dizer que a recuperação terá de ser cautelosa,…
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Mas qual recuperação?!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: —… a recuperação não pode nunca levar a uma situação em
que voltemos a cair no mesmo.
Os Srs. Deputados poderão verificar que cada vez que caímos numa crise ela é pior que as anteriores e
quem sofre são sempre os mesmos, são os portugueses. É responsabilidade nossa garantir que aquilo que
formos melhorando seja feito de forma responsável e as pessoas percebem que quando recuperamos de uma
situação muito difícil temos de o fazer com cautela para garantir que não voltamos atrás.
Quando o Sr. Deputado diz que está muito preocupado com o desemprego, devo dizer, sobre a questão do
desemprego, ou da falta de criação de emprego, que é verdade que o desemprego continua a descer em
termos homólogos e é verdade que nos últimos meses tivemos uma subida do desemprego, mas nunca o Sr.
Deputado me ouviu dizer que isto agora ia sempre melhorar, sem qualquer sobressalto.
Aliás, eu já disse várias vezes que vamos ter alguns sobressaltos e que o caminho não será fácil, e isso é o
que se exige de Governos responsáveis, ou seja, que reconheçam que o caminho tem dificuldades, que
reconheçam que vai haver momentos em que as coisas correm menos bem, mas o que importa é avaliar a
tendência.
A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Termino já, Sr.ª Presidente.
Gostava também que o Sr. Deputado Pedro Nuno Santos me explicasse por que é que durante o Governo
socialista, numa primeira fase, com um suposto crescimento económico, quando tudo corria bem à volta, o
desemprego aumentou sempre. Nessa altura o Sr. Deputado não estava preocupado.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Adão Silva.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Ministros e Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs.
Deputados, a Sr.ª Ministra referiu-se aqui algumas vezes à necessidade da disciplina orçamental e também à
estabilidade das contas públicas.
Quero começar por elogiar o Governo pelo esforço que foi feito para conseguir esta estabilidade das
finanças públicas, porque esta não é uma palavra vã, tem repercussões extraordinárias no País. Uma das
repercussões que tem é, nomeadamente, a sustentabilidade do Estado social.
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Não há dúvida de que precisamos de disciplina orçamental e o esforço que foi feito foi grande, mas a noção
que há é que este esforço valeu a pena. E, nesse sentido, há dados evidentes neste momento, Sr.ª Ministra,
que eu queria enfatizar neste debate.
Ontem, o seu colega da Segurança Social, numa audição que fez na Comissão, trouxe-nos dados da maior
relevância: no primeiro trimestre de 2015, comparado com o primeiro trimestre de 2014, as contribuições para
a segurança social cresceram 154 milhões de euros. Isto é quase 5% mais do que no primeiro trimestre de
2014. Significa isto que, se não mudou — e não mudou — a taxa social única, algo está a acontecer neste
País para que as contribuições cresçam desta maneira.
Por isso, a minha pergunta é a seguinte: depois do desastre que foi 2011, provocado pelo Partido
Socialista, o que é que realmente está a acontecer neste País, no que tem a ver com as contribuições para a
segurança social? Será que isto é o reflexo do aumento homólogo do emprego….
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Claro!
O Sr. Adão Silva (PSD): — … e do aumento dos salários, em que se reflete a taxa social única? E será
que isto dá, ou não dá, sustentabilidade ao sistema público da segurança social?
Sabemos muito bem, Sr.ª Ministra, que quando os senhores chegaram ao Governo e o sistema da
segurança social estava em colapso, foi lá colocado pelo Estado, até ao momento, cerca de 3600 milhões de
euros, até final de 2014. Isto foi verba pública para que o sistema de segurança social não colapsasse.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — E no BPN? Quanto é que meteram no BPN?
O Sr. Adão Silva (PSD): — É muito importante saber que o sistema público da segurança social tem meios
para se autossustentar e é por isso, Sr.ª Ministra, que lhe peço um comentário a este crescimento
extraordinário, diria mesmo espetacular, das contribuições no primeiro trimestre de 2015, que é, seguramente,
o resultado da disciplina orçamental a que V. Ex.ª aqui fez referência.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, para pedir esclarecimentos.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. membros do Governo, Sr.as
e Srs.
Deputados, a Sr.ª Ministra das Finanças começou a sua intervenção a falar de compromissos e a dizer que os
compromissos são para se cumprir.
Mas a Sr.ª Ministra não disse tudo, porque senão dizia que, para este Governo, só são para cumprir alguns
compromissos. Isto porque o Estado tinha um compromisso, por exemplo, com os reformados e o Governo
veio dar o dito pelo não dito. Daquilo que era um compromisso com os reformados, que andaram a descontar
uma vida inteira, porque confiaram no Estado, o Governo não quis saber!
Portanto, Sr.ª Ministra, quando disser que os compromissos são para cumprir, acrescente também «só
alguns», dependendo, sobretudo, dos destinatários.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não diga isso!
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Depois, Sr.ª Ministra, andámos quatro anos a falar de sinais
positivos, de milagres económicos, de luz ao fundo do túnel.
O Governo diz que a recuperação tem sido notória, que a estabilidade social e económica está à prova de
fogo, anunciou o Sr. Primeiro-Ministro lá longe, no Oriente, se calhar, na esperança de que cá essas verdades
não sejam ouvidas.
Os cofres estão cheios, diz a Sr.ª Ministra das Finanças, numa insólita postura de abastança e perante a
indignação de milhares de pessoas que passam em Portugal graves privações económicas. Mas, de repente,
desligamos a televisão e, afinal, os cofres estão vazios! O dinheiro não é nosso.
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Nas famílias, o dinheiro, que era para um mês, não chega ao fim da terceira semana. O desemprego voltou
a subir, entre janeiro e fevereiro deste ano tivemos mais 11 000 desempregados e a pobreza continua a
alastrar.
Afinal, a troica foi-se embora mas ficaram as políticas. Fico surpreendido mas a Sr.ª Ministra hoje confirmou
que assim será. Sabe o que é que isso quer dizer, Sr.ª Ministra? Quer dizer que o Governo andou quatro anos
a mentir aos portugueses, quando apresentou os cortes e os aumentos de impostos como sendo provisórios.
Em bom rigor, aquilo que o Governo nos está a dizer é, simplesmente, isto: como o corte nos salários,
como o aumento de impostos, como o corte nos apoios sociais não resultaram, o Governo vai continuar a
manter os cortes nos salários, o aumento de impostos e os cortes nos apoios sociais.
Era isto, Sr.ª Ministra, que o Governo devia dizer, de uma vez por todas, aos portugueses!
Voltando aos cofres cheios, Sr.ª Ministra, os cofres estão cheios com dinheiro da dívida. Essa almofada
implica um custo com juros, um custo que o Governo ainda não divulgou. Se esse dinheiro está depositado a
taxas negativas, como sucede, por exemplo, no BCE, isso significa que estamos a pagar não só juros pelo
empréstimo que fizemos mas também a pagar juros pelo depósito que estamos a fazer. É assim ou não, Sr.ª
Ministra? Já agora, se nos pudesse dizer quanto é que isso vai custar, por contribuinte, seria bom.
Por fim, e para terminar, Sr.ª Ministra, o Governo criou um regime especial de créditos fiscais para os
bancos. Esse regime, aparentemente, está a ser analisado por Bruxelas, porque Bruxelas quer saber se
estamos diante de um benefício ilegal atribuído aos bancos por parte do Governo, ou seja, a Comissão
Europeia quer saber se o Governo português concedeu ajudas de Estado ilegais à banca.
Sr.ª Ministra, confirma, ou não, estas diligências por parte da Comissão Europeia?
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Tem agora a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados,
num debate como este que o PCP aqui trouxe — e bem, aliás, porque é sempre bom termos estas discussões
que são discussões de alternativas e é bom que o sejam, de facto, já que não é possível fazer escolhas sem
discutir as alternativas — podemos assumir duas posturas.
Uma delas é muito simples, e vê-se, aliás, muitas vezes nesta Câmara, que é discutirmos um mundo
fantástico, que todos gostávamos muito que existisse, em que a despesa pública aumenta todos os anos, o
défice aumenta todos os anos e não se sabe como, por milagre, quer a dívida, quer os impostos diminuem
todos os anos. É um mundo extraordinário, é um mundo fantástico, mas tem um pequeno detalhe: é não ter
nada a ver com a realidade, não existir nem em Portugal nem em parte nenhuma do mundo.
Portanto, se queremos mesmo discutir alternativas, temos de discutir alternativas baseadas na realidade.
Os portugueses, que trabalharam muito e se esforçaram muito, nos últimos quatro anos, para superar as
dificuldades que atravessavam, percebem e sabem bem que não querem voltar ao passado.
É que, de duas, uma: podemos fingir que não se passou nada nos últimos quatro anos e, mais, fingir que o
que se passou caiu do céu aos trambolhões e não há nenhumas responsabilidades em relação à situação
absolutamente calamitosa em que Portugal se viu mergulhado, ou podemos enfrentar as coisas. Ora, foi isso
que fez a maior parte dos portugueses, que trabalharam, superaram as dificuldades e, neste momento,
querem olhar para o futuro e ter mais…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … crescimento económico e mais prosperidade, e não continuar
numa espécie de regresso ao passado, a discutir questões que na realidade não existem.
Vejamos: ouvimos muitas discussões — e bem, porque a dívida pública é um problema — sobre a dívida
pública e até sobre juros agiotas, mas a verdade é que quando os juros eram mais altos e quando a dívida
mais aumentava, eu não ouvia essas discussões, pelo contrário, ouvia discussões sobre onde é que devíamos
gastar mais. Só quando o problema já era dificilmente resolúvel é que os senhores se lembraram dos juros
agiotas e da dívida.
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Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Gostava também de esclarecer uma coisa: podemos, de facto, discutir se pagamos ou não a dívida. É uma
discussão legítima. O que não percebo são as discussões em que chamam de «renegociação» ao «não
pagamos», porque não pagar não é renegociar nada, é não pagar!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — O CDS da Madeira sabe muito bem o que quer dizer renegociar!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E, depois, imaginam que não há consequências. É que se vamos ter
uma discussão séria acerca deste assunto, tenho muito prazer em ter esta discussão, e talvez possamos
discutir, em concreto, o caso grego, que a Sr.ª Deputada, com certeza, gostará muito de discutir,…
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.
… e as consequências concretas, na realidade, de se prometer coisas absolutamente irrealistas às
pessoas. É uma excelente discussão.
Mas, neste balanço de alternativas, há uma alternativa que também não quero deixar de discutir. Chamar-
lhe-ia regresso ao passado.
Ontem, vi uma notícia em que o Secretário-Geral do PS dizia que «é preciso dizer basta à política deste
Governo», e depois dizia que «a verdade é que as finanças públicas não estão melhores do que há quatro
anos». Lembrei-me de ir ver algumas manchetes de há quatro anos, do dia 8 de abril mas de 2011, e vi,
nomeadamente, no Diário Económico (é isto que os senhores acham melhor do que agora!) uma notícia que
referia: «Analistas esperam que auxílio financeiro chegue até final de maio». Estado ainda não decidiu se
realiza ou não mais leilões da dívida». É isto que os senhores acham melhor? E é isto que os senhores têm
para oferecer aos portugueses?!
Depois, vi outra notícia que dizia: «cinco anos de austeridade, com mais impostos e menos proteção
social». Era isto que os senhores achavam melhor,…
O Sr. António Filipe (PCP): — Isso foi o que aconteceu!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … era esta a discussão que os senhores preferiam?!
Por último, refiro uma notícia que dizia: «juros da dívida que Portugal contraiu no último ano davam para
pagar toda a rede do TGV».
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
É isto que os senhores querem oferecer aos portugueses?! É o regresso ao passado?!. Srs. Deputados,
acho que eles não querem voltar aí.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, há pouco deixei a pergunta
do Sr. Deputado Pedro Filipe Soares por responder, mas não me esqueci e vou responder agora às questões
que me colocou.
Tanto o senhor como o Sr. Deputado José Luís Ferreira fizeram referência aos cortes de pensões e ao não
cumprimento de compromissos. Há aqui um ponto, Srs. Deputados, que sempre desaparece pela forma como
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os Srs. Deputados colocam a questão, que é o facto de 86% dos pensionistas nunca terem tido qualquer corte
nas pensões.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Têm pensões de miséria!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — E as pensões mais baixas, sociais e rurais, foram
atualizadas todos os anos, acima da taxa de inflação.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Não é verdade!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Isso é verdade, Sr. Deputado! Também é verdade, sim, que
a alguns outros pensionistas, a 14%, tivemos de pedir um contributo para a consolidação das finanças
públicas e para ultrapassar um período difícil. Isso é verdade, Srs. Deputados, e explicámos múltiplas vezes
por que é que foi necessário fazê-lo, por que é que foi necessário pedir esse sacrifício a alguns pensionistas
— reitero, a 14% dos pensionistas e não a todos, como os Srs. Deputados sempre querem fazer crer quando
falam no assunto.
Depois, Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, o senhor disse uma frase que é muito bonita: sacrificar a banca
para dar vida às pessoas. Sr. Deputado, sei que soa bem mas não sei o que é que isso significa, porque se
por sacrificar a banca o Sr. Deputado quer dizer nacionalizá-la, nós também pusemos dinheiro na Caixa Geral
de Depósitos e esse dinheiro sai do bolso dos contribuintes, porque nós é que somos o acionista.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — E o BES?!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Se quer dizer fechar os bancos, pergunto o que é que o Sr.
Deputado diz a todas as pessoas que lá trabalham e que perderiam o emprego. Portanto, gostaria de saber o
que quer dizer isso de sacrificar a banca para dar vida às pessoas.
Os Srs. Deputados também dizem que os impostos aumentaram muito. É verdade, houve um enorme
aumento de impostos. As palavras são nossas, deste Governo, nem sequer são da oposição,
reconhecidamente, porque também dificuldades grandes em optar por outro tipo de medidas que, do nosso
ponto de vista, teriam conduzido a um caminho de mais rápido crescimento e consolidação orçamental.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Era mais impostos e mais cortes de salários!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Relativamente à questão dos impostos diferidos dos
bancos, que o Sr. Deputado diz que é uma borla aos bancos, Sr. Deputado, deixe-me completar aquilo que
disse: quando os bancos têm a possibilidade de transformar estes impostos por ativos diferidos em créditos
fiscais, o Estado fica com o valor equivalente a 110% desse montante em ações.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Fez isso? Tem ações no Novo Banco?
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Não sei por que é que o Sr. Deputado diz que isso é mau.
Ou seja, se ficamos com um direito que, em termos de valor, é 10% acima daquilo que lá colocamos, de duas,
uma: ou nos tornamos acionistas dos bancos, o que, de acordo com o Sr. Deputado, se calhar, até seria uma
coisa que lhe agradava, porque passávamos a ter controlo público, mas o Sr. Deputado também sabe o que é
que o controlo público implica e por que é que os bancos preferem não o ter. Este mecanismo destina-se a
desincentivar a utilização e a garantir que os contribuintes fiquem salvaguardados em qualquer caso.
O Sr. Deputado José Luís Ferreira perguntou-me se é verdade que a Direção-Geral da Concorrência está a
investigar os DTA (deferred tax assets)). É verdade que a Direção-Geral da Concorrência está a fazê-lo.
Pergunto se o Sr. Deputado recomenda que se responda à Direção-Geral da Concorrência o mesmo que em
relação ao programa de estabilidade, «não queremos saber, essas decisões dos senhores não nos
interessam», ou aqui as instituições europeias já devem ser respeitadas? É só para perceber se o critério é
sempre o mesmo.
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O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — As ajudas são ilegais?
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Por último, quanto à pergunta do Sr. Deputado Adão Silva,
de facto, o aumento das contribuições para a segurança social é um sinal efetivo de que há mais emprego e
de que há mais rendimento do trabalho. Quando fazemos a comparação com o período homólogo podemos
verificar, com esse indicador, a clara melhoria que tivemos quer no número de postos de trabalho quer no
rendimento nos salários associados a esses postos de trabalho.
Como muito bem o Sr. Deputado referiu, a taxa social única não aumentou e, portanto, se se obtém um
resultado que é claramente superior e a taxa não variou, é porque a base é maior. Este é um dado
absolutamente objetivo quando comparamos o primeiro trimestre de 2014 com o de 2015, e, de facto…
O Sr. João Galamba (PS): — Os salários e as pensões aumentaram, Sr.ª Ministra!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr. Deputado, ainda bem que me recorda que os salários e
as pensões aumentaram. Muito obrigada!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. João Galamba (PS): — É das tais medidas que a Sr.ª Ministra não queria!
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato, do PCP.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, o desemprego é, pelas razões, o
resultado mais expressivo do projeto político do seu Governo: empobrecimento, agravamento da exploração,
tentativa de destruição de direitos laborais e sociais.
Quatro anos de Governo PSD/CDS e o resultado são mais de dois milhões de desempregados, mais 500
000 postos de trabalho destruídos, mais de 2,6 milhões de pessoas a viver numa situação de pobreza, cortes
nos salários, agravamento da precariedade, aumento do horário de trabalho, emigração forçada de mais de
400 000 portugueses. À custa de quê e em nome de quem, Sr.ª Ministra, é o que lhe perguntamos.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — À custa da dignidade da vida dos trabalhadores e do povo e em nome das
imposições que a União Europeia exige e o Governo aceita, de joelhos, sem questionar.
O País vive problemas económicos e sociais dramáticos e, perante isto, o que é que o Governo tem para
oferecer? Mais do mesmo! E nós entendemos que os trabalhadores não aceitam e o País não aguenta mais
desemprego e exploração.
O Governo assume ou não a responsabilidade de cumprir as ordens da União Europeia para agravar o
corte dos salários ou, pelo contrário, assume a necessidade de aumento dos salários, designadamente do
salário mínimo nacional?
Cumpre as ordens da União Europeia para facilitar e embaratecer ainda mais os despedimentos ou aposta
no reforço do aparelho produtivo como via para a criação de emprego?
Cumpre as ordens da União Europeia para agravar a precariedade ou assume a defesa do emprego com
direitos como uma prioridade, erradicando todas as formas de contratação precária que respondem a
necessidades permanentes das empresas?
Cumpre as ordens da União Europeia para aumentar e desregulamentar a jornada de trabalho ou vai
diminuir o horário de trabalho e defender o direito à articulação entre a vida familiar, pessoal e profissional?
Defender os trabalhadores e os seus direitos exige romper com este caminho imposto pela União Europeia,
exige a valorização do trabalho e o cumprimento da Constituição e dos seus valores como solução para o
País. Para tal, é preciso derrotar este Governo, é preciso outra política e outro Governo.
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Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do
Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra, Sr.as
e Srs.
Deputados, lembramo-nos bem que a troica tinha três pilares igualmente importantes: finanças públicas,
reforma económica e estabilidade do sistema financeiro.
A nova economia foi o mote do Governo para fazer passar aquilo que não era mais do que um processo
ideológico de devastação de direitos do trabalho, de devastação de tudo aquilo que foi conquistado, como o
Estado social, com o 25 de Abril.
Mas, passados quatro anos, vamos ver que setores da economia cresceram em termos de emprego e em
termos de valor acrescentado e encontramos dois: serviços e banca. Agricultura e indústria? Não cresceram!
Foram setores que decresceram em termos de valor acrescentado nestes quatro anos e que cresceram em
termos de percentagem de emprego.
Dois setores cresceram: serviços e banca. E nós perguntamos se é esta a nova economia que custou
tantos sacrifício e de austeridade a construir.
E é exatamente sobre a banca — este aparente setor em expansão na economia portuguesa — que
gostava de questionar a Sr.ª Ministra, aliás, sobre a banca e sobre a estabilidade financeira, que era um dos
pilares da troica e da sua intervenção em Portugal.
A troica e este Governo perseguiram pensionistas, perseguiram estudantes, perseguiram funcionários
públicos, perseguiram trabalhadores por causa de uma dívida que não foi criada por eles. A dívida pública não
é culpa de quem trabalhou, nem de quem viveu e nem de quem sustentou os serviços sociais neste País.
Agora, queremos saber quem vai pedir à troica e quem vai pedir ao Governo responsabilidades por aquilo
que aconteceu no sistema financeiro, porque era sua responsabilidade a estabilidade do sistema financeiro.
Mal a troica virou costas, o BES foi abaixo, faliu, com custos para a economia, com custos para os clientes,
com custos para todos nós enquanto contribuintes. O Montepio está nos limites do capital, o BPI também não
está nos seus melhores dias e nós queremos saber quem assume a responsabilidade.
Vamos pedir à troica o dinheiro que falta pagar para o Novo Banco? É a troica que vai pagar por aquilo que
não fez, apesar de ter a responsabilidade da estabilidade do sistema financeiro? O que andaram aqui a fazer?
Agora não se pede responsabilidades por aquilo que não foi feito, enquanto a troica não teve nenhum pejo
em pedir responsabilidades aos portugueses por aquilo que não fizeram, no passado, e por fazer os mais
pobres por aquilo que as elites e os mais ricos tinham feito?
Sr.ª Ministra, o que vai acontecer se o valor que vão dar pelo Novo Banco for, de facto, na ronda dos 2000
milhões de euros? O que vai acontecer, porque podemos chegar ao absurdo de haver um banco ou uma
empresa que vem dar 2000 milhões de euros por um banco que tem lá dentro um crédito sobre o Estado que
vale 2865 milhões! É «um negócio da China», não há nenhuma dúvida sobre isso! Para quem é que é um bom
negócio? É um bom negócio para quem compra o Novo Banco ou é um bom negócio para quem vende o Novo
Banco?
Como é que este País, que diz que não tem dinheiro para devolver salários, não tem dinheiro para devolver
pensões, não tem dinheiro para pagar serviços públicos, pode comprometer-se a dar uma borla fiscal, no
futuro, de 2865 milhões de euros ao novo comprador do Novo Banco?
Que País é este? Que escolhas são estas que se fazem? Há austeridade para uns e menos recursos para
aquilo que é essencial mas, aparentemente, vão comprometer-se as gerações futuras, que vão ter de perder
2865 milhões de euros em impostos que o dono do Novo Banco nunca vai pagar, à custa, claro, de serviços
públicos e à custa, claro, de mais dívida pública.
A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Para terminar, a Sr.ª Ministra disse que estes créditos se podiam tornar
em propriedade. Presumo, então, que o Estado tenha ações do Novo Banco no valor dos créditos fiscais que
lá tem.
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Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra, Srs. Deputados,
para o Partido Comunista Português o futuro do nosso País não passa por cofres cheios de dívidas,
desemprego para baixar salários, emigração e fome para que os ricos fiquem cada vez mais ricos.
Para o PCP, o futuro do nosso País passa pela valorização e dinamização dos diferentes setores
produtivos, passa por pôr o País a produzir mais riqueza que reverta para a grande maioria dos portugueses e
não para a concentração capitalista.
Assim, neste debate, importa questionar se o Governo quer continuar a cumprir as ordens da União
Europeia para destruir os setores produtivos ou se vai tomar uma posição de defesa do interesse nacional.
Das pescas à agricultura, da indústria aos serviços, existem no nosso País as pessoas e as condições
objetivas para produzir muito mais, para sermos autossuficientes em muitos bens e substituir bens que
importamos por exportações.
Não só é possível como imprescindível romper com as amarras da União Europeia e da política de direita
que destruíram e destroem as pescas. É importante a modernização e o alargamento da frota pesqueira para
dinamizar este importante setor e atingir a soberania alimentar.
É urgente aproveitar as enormes potencialidades que o nosso País tem de produção agrícola. Isto implica,
desde logo, como o PCP propõe, não permitir que nos imponham constrangimentos às nossas opções.
O exemplo da produção de leite e o fim das quotas é elucidativo como o PSD, CDS e PS, no plano nacional
e da União Europeia, comprometem o autoabastecimento do País e destroem milhares de pequenos
produtores.
O País precisa de aproveitar os recursos minerais, colocando-os não ao serviço das multinacionais mas ao
serviço do País, com a exploração e a obtenção de mais-valia em toda a fileira, desde a extração à
transformação do minério.
O País precisa, com investimento público, de criar as condições para a re-industrialização da nossa
economia e produzir mais e com mais incorporação nacional. Só desta forma é possível pagar a dívida que é
legítima, crescer, promover emprego e combater os défices estruturais que o País tem.
Portugal não é um País pobre, é, sim, um País empobrecido pela política de direita.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Termino com uma pergunta, Sr.ª Ministra: vai o Governo apresentar à
União Europeia um programa de estabilidade que aceita as imposições que nos prejudicam ou vai defender o
interesse nacional?
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Segue-se uma outra pergunta do PCP.
Dada a ordem das inscrições recebidas pela Mesa, não foi possível fazer aqui uma rigorosa alternância das
intervenções das bancadas, pelo que dou a palavra, pelo PCP, ao Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A Sr.ª Ministra das Finanças e o
Governo a que pertence têm vindo a insistir numa teoria segundo a qual o País não se pode dar ao luxo de ter
empresas públicas que defendam o desenvolvimento e a soberania nacional, promovam o emprego com
direitos, salvaguardem o controlo democrático e a socialização da riqueza criada.
Na vossa teoria, isso não é para nós: quem não tem dinheiro não tem vícios! Vai daí, venderam ao
desbarato o património público aos grandes interesses, como foram as operações na EDP, REN, ANA, CTT,
GALP, PT, e os negócios segurador e de saúde da Caixa Geral de Depósitos. E o que foi feito, Sr.ª Ministra
aos 9,2 mil milhões de euros dessa entrega? Foram para o pagamento de juros de mora. Muitos parabéns!
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A realidade concreta está à vista, Sr.ª Ministra das Finanças. Ao contrário do que os senhores afirmam, a
verdade é que o País não se pode dar ao luxo de abdicar de um setor empresarial do Estado.
A vossa estratégia para o País resume-se a essa vossa famosa frase, «liquidar ou privatizar». Não
aceitamos essa «escolha» que os senhores nos querem dar agora em relação à TAP, à EMEF, à CP Carga,
aos transportes públicos.
Portugal não tem dinheiro, Sr.ª Ministra, para alimentar grupos económicos privados, monopolistas,
rentistas, que só vivem acima das nossas possibilidades. Enquanto o País se afundava na crise económica e
social, saíam de Portugal, em lucros, em dividendos, em juros, 198 000 milhões de euros nos últimos oito
anos!
Isto para a Sr.ª Ministra não interessa nada. Vai conversando, vai fazendo outras coisas, mas a verdade é
que a realidade é esta: não seremos um País soberano e desenvolvido sem uma economia liberta do domínio
dos monopólios e de imposições externas, com setores de propriedade diversificados, sim, com as suas
dinâmicas próprias e complementares, respeitadas e apoiadas pelo Estado.
Mas aqui assume um caráter estratégico e decisivo a defesa de um setor empresarial do Estado que seja
dinâmico, integrado e eficiente, no setor financeiro e noutros setores básicos e estratégicos da economia — a
energia, a indústria, os transportes e comunicações —, que desempenhe um papel determinante no
desenvolvimento das forças produtivas e na aceleração do desenvolvimento económico, em que a gestão das
empresas, com a participação dos trabalhadores, seja coordenada e assegurada por gestores íntegros e
competentes ao serviço efetivo de um Estado democrático e do bem público.
Vai fazer como fez o anterior Ministro das Finanças, do anterior Governo, que dava a PT como um
belíssimo exemplo de privatizações, Sr.ª Ministra? É esta a pergunta que deixamos.
Tem ou não a consciência de que há um futuro a construir mas não com essa política de desmantelamento
e venda do País «às peças»?
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Dou a palavra à Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, para responder.
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr.ª Presidente, a Sr.ª Deputada Rita Rato começou por
falar da emigração forçada de 400 000 pessoas.
Sr.ª Deputada, o Observatório da Emigração diz, por exemplo, que no ano de 2007 emigraram 90 000
pessoas e no ano de 2012 emigraram 95 000. Ou seja, não percebo muito bem, porque no ano de 2007, antes
de a crise começar, houve 90 000 pessoas que foram forçadas a emigrar. Isto antes da crise começar!…
O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Onde é que foi buscar os números?!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Os Srs. Deputados não podem olhar para um país que
sempre teve muitos emigrantes, sempre, ao longo da nossa História,…
Vozes do CDS-PP: — Ah pois!
Risos de Deputados do PS.
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — … e contar todos os números como emigração forçada.
Se os Srs. Deputados fizerem a análise ao aumento da emigração, com os dados oficiais disponíveis mais
recentes, o que temos é uma média que, em relação à década anterior, é cerca de 10 000 a 12 000 pessoas a
mais por ano. Isto é só para fazermos a discussão, em termos sérios, do que é que foi efetivamente o aumento
da emigração causado pela crise.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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Quanto à questão levantada pela Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, que diz que temos um processo
ideológico, Sr.ª Deputada, temos diferenças ideológicas, sobre isso estamos de acordo desde o princípio, mas
um processo ideológico de destruição da economia, Sr.ª Deputada!… Faça-me um favor: não há processos
ideológicos de destruição da economia, há diferenças ideológicas sobre a forma como se promove o
crescimento da economia, e isso é de respeitar. Quando a Sr.ª Deputada coloca a questão nesses termos,
tenho um bocadinho mais de dificuldade em respeitar a sua posição, devo dizer.
Relativamente ao raciocínio que fez sobre os DTA (deferred tax assets), deixe-me só acompanhar o seu
raciocínio.
A Sr.ª Deputada diz que nós demos ao Novo Banco 2,8 mil milhões de euros em créditos fiscais. E os
investidores, por esse mundo fora, devem ser extraordinariamente burros, porque até acham que só vão pagar
2000 milhões por uma coisa que tem 2,8 mil milhões lá dentro. Ora, se tem esse valor todo para oferecer, Sr.ª
Deputada, por que é que não há gente a ver esse valor que a Sr.ª Deputada vê? Tenho alguma dificuldade em
perceber essa visão de mercado que só a Sr.ª Deputada vê e que o mercado, aparentemente, não vê.
Protestos da Deputado do BE Mariana Mortágua.
E explico-lhe porquê, Sr.ª Deputada: nós não demos 2,8 mil milhões de euros de créditos fiscais. O que
está reconhecido é a possibilidade de transformar em créditos fiscais este valor, se o Banco tiver prejuízos nos
próximos anos que permitam a conversão em créditos fiscais, e não é na totalidade dos prejuízos de cada ano,
é com regras claras. E, se o fizerem, isso dá ao Estado o direito de ter ações, diluindo os restantes acionistas,
de valor equivalente a 110%. O mercado sabe que é esse o valor dos DTA e por isso mesmo, Sr.ª Deputada, é
que ninguém acha que seja uma coisa fantástica oferecida ao Novo Banco, como, aparentemente, a Sr.ª
Deputada vê.
Se isso for verdade, há de, com certeza, encontrar um investidor que esteja disposto a pagar pelo menos
este valor, senão mais; caso contrário, a sua teoria, Sr.ª Deputada, tem muito pouca substância.
E, claro, ainda não demos ações ao Novo Banco porque não lhes demos nada, porque não lhes demos
créditos fiscais. Eles podem ter uma conversão no futuro e, nessa altura, é que poderemos ter ações. Como
por enquanto não lhes demos nada, é natural que também não tenhamos nada em troca.
O Sr. Deputado Bruno Dias falou aqui sobre as privatizações e referiu que o Governo diz que o País não se
pode dar ao luxo de ter empresas públicas.
Sr. Deputado, eu nunca disse isso. O que nós dizemos é que há muitos setores de atividade onde
entendemos que as empresas públicas não são a melhor solução e é preferível que essas atividades sejam
desenvolvidas num ambiente de concorrência, no ambiente do setor privado.
Protestos dos Deputados do PCP Bruno Dias e Jorge Machado.
O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Os Estaleiros de Viana!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Também já sei que temos essa divergência, mas, Sr.
Deputado, deixe-me recordar-lhe que, apesar de uma aparente contestação antes do processo, não tenho
ouvido queixas dos trabalhadores dos Estaleiros de Viana do Castelo, dos CTT ou da ANA, desde que foram
privatizados.
Protestos do PCP.
Sabe porquê, Sr. Deputado? Por exemplo, porque deixaram de estar sujeitos aos cortes salariais…
Protestos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, está a ser difícil ouvir a Sr.ª Ministra.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É verdade, Sr.ª Presidente, é verdade!
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A Sr.ª Presidente: — Faça favor de continuar, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Obrigada, Sr.ª Presidente.
Efetivamente, os trabalhadores dessas empresas públicas viram-se libertos das imposições de reduções
salariais que existiam por estarem no setor público e têm direito, por exemplo, a distribuição de lucros, que é
algo que, naturalmente, os trabalhadores valorizam.
As empresas continuam cá, continuam a criar valor no País, continuam a promover emprego no País,
continuam a pagar impostos no País. Não é uma questão de não nos podermos dar ao luxo de ter empresas
públicas; não podemos é dar-nos ao luxo de ter empresas públicas que gastam mais do que produzem. Isso,
Sr. Deputado, não nos podemos dar ao luxo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PCP.
Quando o Sr. Deputado Jorge Machado pergunta se vamos apresentar um programa de estabilidade que
obedeça às imposições da Comissão Europeia ou defender os interesses nacionais, Sr. Deputado, digo-lhe
que vamos defender os interesses nacionais e respeitar os portugueses que votaram maioritariamente para
esta Casa nos partidos que subscreveram as obrigações do tratado orçamental. Chama-se a isso respeitar os
portugueses, Sr. Deputado.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos prosseguir com o debate. Chegámos à fase das intervenções
dos partidos e estão já inscritos o PCP e o PS.
Para uma intervenção pelo PCP, dou a palavra ao Sr. Deputado Paulo Sá.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Ao longo dos
anos, Governos do PS, PSD e CDS foram impondo uma política fiscal de escandaloso favorecimento do
grande capital, ao mesmo tempo que oneravam, de forma brutal, os rendimentos do trabalho.
Esta política fiscal de esbulho dos rendimentos dos trabalhadores foi acompanhada por uma redução de
direitos laborais, de salários e de prestações sociais, assim como pela degradação dos serviços públicos e das
funções sociais do Estado, aprofundando o desequilíbrio na distribuição de riqueza entre o trabalho e o capital.
A recente reforma do IRC e as alterações em sede de IRS são bem reveladoras das opções do Governo
em matéria fiscal.
A taxa nominal do IRC foi reduzida de 25% para 21% em apenas dois anos; foi aumentado
substancialmente o número de anos em que é possível fazer reporte de prejuízos; foram criados instrumentos
de planeamento fiscal agressivo, particularmente no âmbito da fiscalidade internacional. Estas são alterações
que beneficiam especialmente as grandes empresas e os grupos económicos, permitindo-lhes reduzir
substancialmente o valor dos impostos entregues ao Estado.
Logo em 2014, primeiro ano de aplicação da reforma do IRC, a receita deste imposto caiu 580 milhões de
euros. Nos dois primeiros meses de 2015 já caiu, em termos homólogos, 11%.
Paralelamente, as receitas de IRS não param de aumentar. O Governo e a maioria parlamentar que o
suporta bem tentam justificar este aumento com o anémico crescimento económico e com os resultados do
combate à fraude e à evasão fiscal, mas é uma evidência — que só não vê quem não quer ver — que o brutal
aumento da carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho é o resultado da opção, assumida em 2012, de
reduzir o número de escalões do IRS, aumentar as taxas deste imposto em todos os escalões e introduzir uma
sobretaxa extraordinária sobre os rendimentos do trabalho.
Em consequência desta opção, a receita de IRS disparou. Em apenas 3 anos — 2013, 2014 e 2015 — a
receita adicional em IRS será de mais de 11 000 milhões de euros. Ou seja, em apenas três anos, o Governo
quer cobrar aos trabalhadores o IRS de quatro anos.
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Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Ao longo dos anos, o PCP denunciou as
injustiças e iniquidades fiscais impostas por Governos do PS, PSD e CDS, propondo alternativas para uma
tributação mais justa e mais adequada às necessidades de desenvolvimento económico e social do País.
Em particular, apresentámos, em novembro de 2014, um projeto de lei sobre política fiscal que
demonstrava que é possível desonerar fiscalmente, de forma significativa, os trabalhadores e as famílias,
assim como as micro e pequenas empresas, e ao mesmo tempo aumentar a receita fiscal anual, permitindo
responder às necessidades de investimento público e de financiamento das funções sociais do Estado.
Mostrámos que isto é possível desde que se rompa com o favorecimento do grande capital, tributando-o de
forma mais adequada.
As soluções apresentadas pelo PCP em matéria fiscal são justas e adequadas às necessidades de
desenvolvimento económico e social do País. São soluções que servem os interesses dos trabalhadores, do
povo e do País! São soluções que abrem perspetivas de um futuro melhor!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos.
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Sr.ª
Ministra das Finanças, não só as contas públicas não estão em ordem e muito menos estabilizadas — basta
olharmos para a dívida — como o País tem hoje menos condições para crescer e alavancar o
desenvolvimento económico. E basta olharmos para o nível do desemprego, para os níveis de emprego, que
recuou décadas nestes últimos três anos, ou, se quiser, para os níveis de investimento, que só encontram
níveis equivalentes aos de hoje nos anos 80 do século passado, antes da adesão à CEE.
Por isso, Sr.as
e Srs. Deputados, para além da propaganda da maioria e das promessas dos «amanhãs que
cantam», impõe-se a realidade dos factos, a realidade da vida, do presente e do futuro, de milhões de
portugueses e portuguesas, e essa é uma realidade que desmente a propaganda do Governo, confirmando
apenas, isso sim, uma promessa antiga de Pedro Passos Coelho, a de que, com esta maioria, a solução é o
empobrecimento. E os últimos meses têm sido pródigos na demonstração desta realidade: empobreceram as
famílias, os desempregados, os mais pobres dos pobres, as crianças e até muitos dos que mantiveram o seu
emprego.
Empobreceu o Estado, que, cada vez mais, vê degradada a qualidade dos seus serviços públicos: na
educação, onde assistimos ao mais doloroso ano letivo da nossa história recente; na justiça, com as
trapalhadas das mudanças sem visão e sem sustentação; na saúde, onde a realidade dos factos leva o
Governo a culpar a produção de estatísticas oficiais pelas erradas opções do Governo ou onde ainda o
Governo assume que o privado cresceu, sim, com o apoio das transferências do Estado, à custa do setor
público.
Aplausos do PS.
E empobreceu a economia, com uma recessão económica que, sabemos hoje, foi mais profunda e mais
grave do que se estimava. Quando o investimento se afundou para além de tudo o que seria imaginável, não
foi o apenas presente que se degradou, foi a capacidade de construir um melhor futuro que foi atingida.
Um País mais pobre, Sr.ª Ministra, Sr.as
e Srs. Deputados da maioria, um País que recua no combate à
pobreza e às desigualdades como Portugal recuou nestes últimos três anos e meio é um País com menor
capacidade para se desenvolver e para gerar riqueza (para usar a sua expressão neste debate).
Aplausos do PS.
Um País que, como Portugal, aumenta, em três anos e meio, em mais meio milhão de portugueses e
portuguesas, o número de pessoas que vivem no limiar de pobreza, recuando uma década, é um País com
menor capacidade para se desenvolver e para gerar riqueza.
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Um País que, como Portugal, agrava as desigualdades, ao ponto de os 10% mais ricos terem todo o
rendimento e mais ainda dos 10% mais pobres, é um País com menor capacidade para se desenvolver e para
gerar riqueza.
Um País que recua aos anos 60 nos níveis de emigração e que regista níveis históricos de quebra na taxa
de natalidade é também um País com menor capacidade para se desenvolver e para gerar riqueza.
Um País, Sr.ª Ministra, que corre o risco de ter um desemprego estrutural, na ordem dos dois dígitos — há
estudos nacionais e internacionais que dizem que corremos o risco de o número do desemprego estrutural
apontar para 13% —, é um País que enfrenta um risco que Portugal nunca enfrentou, um risco que,
claramente — até a Sr.ª Ministra concordará —, põe em causa a nossa capacidade de crescermos e de nos
desenvolvermos.
Aplausos do PS.
Finalmente, Sr.ª Ministra, um País que assenta toda a sua estratégia na desvalorização salarial, na quebra
e no corte dos salários e das pensões e no enorme aumento de impostos é também um País com menor
capacidade para crescer e para gerar riqueza. E essa é a responsabilidade do seu Governo e das suas
políticas, que aqui hoje veio defender mais uma vez.
Aplausos do PS.
Este é um retrato que a propaganda do Governo não consegue vencer.
E os Srs. Deputados da maioria, hoje, mostraram-se muito preocupados com o regresso ao passado.
Sr.ª Ministra, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: O problema é que, nestes três anos e
meio, o País já regressou ao passado, no pior que esse passado significou para a nossa capacidade de
crescermos e de nos desenvolvermos.
Aplausos do PS.
Com este Governo, Portugal regressou ao passado de um Portugal mais pobre. Com este Governo,
Portugal regressou ao passado de um Portugal com mais desigualdade. Com este Governo, Portugal
regressou ao passado de um Portugal menos qualificado e que investe na educação menos do que deveria
investir. Com este Governo, Portugal regressou ao passado de um País com piores serviços públicos. E, com
este Governo, Portugal regressou ao passado de um País com piores condições para se aproximar dos países
mais desenvolvidos e de um País — sim, Sr.ª Ministra! — que regressou ao passado ao perder uma parte
importante da sua população ativa.
O Governo tem demonstrado um problema enorme com os dados do INE. A Sr.ª Ministra foi buscar os
dados do Observatório da Emigração, mas convido-a a ver os dados do INE e vai perceber não só que, nestes
últimos três anos e meio, a emigração aumentou muito mais do que até aqui, como, sim, regressámos ao pior
do nosso passado, à década de 60 do século passado, em que o País sangrava os seus recursos humanos.
Aplausos do PS.
Este é um retrato, Sr.as
e Srs. Deputados, que a propaganda não consegue vencer. E estes são os
resultados das políticas deste Governo, que falharam e que comprometem não apenas o nosso presente como
também o nosso futuro.
Mas são políticas que os portugueses não aceitam, são políticas que os portugueses vão rejeitar e são
políticas que vão mudar, porque é essa a vontade de um cada vez maior número de portugueses.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Michael Seufert.
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O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos, julgo importante
neste debate falarmos um pouco sobre o que são as perspetivas de futuro e, sobretudo, sobre o que foi o
passado para não voltarmos a repetir os erros que já cometemos.
A Sr.ª Deputada falou aqui em vários indicadores para acusar este Governo de ter retrocedido décadas,
dezenas de anos, em vários indicadores.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E acha que não têm nada a ver com isso? É preciso descaramento!
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Podia era ter olhado para o ponto de partida deste Governo e ter visto
a marcha-atrás que o Governo do Partido Socialista já tinha feito, entre 2005 e 2011, para perceber que este
Governo, muitas vezes, já recuperou terreno relativamente à situação em que os senhores deixaram o País.
Repare, na taxa de risco de pobreza, a Sr.ª Deputada diz que recuámos uma década. Não recuámos, Sr.ª
Deputada!
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Recuámos, sim!
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Em 2011, a taxa de risco de pobreza do País já era igual a 2006 e os
senhores tinham estado no Governo entre 2006 e 2011. Os senhores andaram para trás quando estavam a
querer andar para a frente, o que é uma coisa extraordinária. Portanto, foram os senhores que fizeram o País
recuar.
Em relação ao emprego, diz a Sr.ª Deputada que recuámos duas décadas, a 1997. Sr.ª Deputada, este
Governo recuou de 1998 a 1997, porque, em 2011, a taxa de desemprego estava ao nível de 1998. Portanto,
Sr.ª Deputada, o PS já tinha feito a marcha-atrás toda, nós nem tivemos de pagar portagem!
Quanto ao investimento, sabe onde é que o Governo do PS deixou os níveis de investimento em 2010?
Sabe ao nível de que ano? Deixou-o aos níveis de 1992, Sr.ª Deputada! E a Sr.ª Deputada diz que recuámos
20 anos?! Pudera! Nós pegámos no País quando os senhores, entre 2006 e 2011, puseram os níveis de
investimento do País ao nível de 1992, Sr.ª Deputada!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Falou também da emigração e disse que recuámos aos tempos do Estado Novo. Qual era o número de
emigrantes que o País tinha em 2010, o último ano em que o Partido Socialista esteve inteiramente a governar
o País?
O Sr. João Galamba (PS): — Era de 23 760!
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Os níveis eram os do ano de 1967, Sr.ª Deputada! O recuo de três
décadas deste Governo foi, afinal, de um ano, Sr.ª Deputada, porque o resto foi da responsabilidade do
Partido Socialista.
Posto isto, aquilo que os portugueses hoje têm de se perguntar é se, por cima de tudo isto, desta
recuperação que já fizemos, ainda queremos ter a gestão orçamental do Partido Socialista, que é esconder a
dívida nas empresas públicas e empurrar a despesa para a frente! É que, Sr.ª Deputada, a dívida que nós hoje
estamos a pagar é a dívida do Partido Socialista!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
E muita dessa dívida vai ser paga por contribuintes que ainda nem nasceram e estão à espera de nascer
para poderem ter em seu nome um cheque passado pelo Partido Socialista chamado «dívida pública».
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos.
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A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Michael Seufert, muito obrigada pela sua
questão.
Sr. Deputado, percebo a sua intervenção e a tentativa que tem de fazer para demonstrar que aquilo que
referi na minha intervenção não é verdade.
Mas não conseguiu, porque os números o desmentem. Evidentemente, o Sr. Deputado pode apresentar os
números que quiser, mas eu também poderei fazer chegar à Mesa, para ficar em Ata, os números oficiais do
INE. Esta maioria tem revelado uma desconfiança enorme dos números oficiais, mas eles existem e podem
ser consultados por quem nos ouve, inclusive pelos Srs. Deputados.
Mas o Sr. Deputado, quando fala de dívida e da dívida do anterior Governo, tem a noção do valor a que a
dívida chegou com o seu Governo, com o Governo que o Sr. Deputado apoia?
Aplausos do PS.
Como é que o Sr. Deputado se atreve a falar da dívida, que os portugueses estão a pagar hoje…
Protestos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — A sua!
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, pedia-lhes que deixassem a Sr.ª Deputada concluir.
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — Muito obrigada, Sr.ª Presidente. Não só a minha voz não está nas
melhores condições como não queria ter de falar mais alto do que aquilo que é devido.
Sr. Deputado, a dívida está hoje mais alta do que estava quando este Governo entrou em funções. E o
desemprego, Sr. Deputado, continua mais alto do que quando este Governo entrou em funções.
Protestos do Deputado do PSD Hugo Lopes Soares.
E os senhores, esta maioria e este Governo, têm dois problemas. Uma coisa foi o que disseram antes das
eleições e o que fizeram a seguir, que foi completamente ao contrário. E outra coisa é o que conseguiram, ou,
melhor, o que não conseguiram, porque nem os senhores têm as contas públicas em ordem, nem o País está
hoje com melhores condições para crescer e para se desenvolver. E este é um facto, Sr. Deputado, que nós
os dois podemos estar aqui a discutir e acerca do qual podemos discordar,…
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — E vamos discordar!
A Sr.ª Sónia Fertuzinhos (PS): — … mas, lá fora, no País, cada vez mais os portugueses concordam que
este Governo falhou, que estas políticas falharam e que é preciso mudar.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra das Finanças, as
perguntas que lhe fiz ficaram sem resposta.
Sobre os DTA (deferred tax assets), não se trata de saber se se responde ou não, trata-se de saber se o
Governo está ou não a conceder ajudas ilegais à banca. Essa é que é a questão.
Sobre a almofada financeira, a Sr.ª Ministra também não respondeu. Nem falou dos custos para o
contribuinte, nem sequer foi capaz de confirmar ou contrariar o facto de estarmos a pagar juros pela dívida que
enche os seus cofres e a pagar ao mesmo tempo pelo depósito do dinheiro que afinal não é nosso.
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Sr.ª Ministra, bem pode dizer que a oposição está a exagerar, que o INE se engana nos números, mas a
verdade é que o desemprego continua a subir desde finais do ano passado. Mesmo com a emigração e com
os truques que o Governo arranjou para esconder o desemprego real, mesmo assim, o desemprego está
muito elevado e, pior do que isso, não há sinais de que haja uma inversão da tendência. Pelo contrário, basta
ouvir as notícias: agora, até a AXA Portugal prepara-se para despedir 11% dos seus trabalhadores em
Portugal. Isto para já não falar nas ajudas que o Governo deu para engrossar este caudal de despedimentos,
não só quando facilitou e tornou o despedimento mais barato no setor privado como também acontece com as
dispensas que está a fazer ao nível da Administração Pública.
É preciso também ter presente que mais de metade dos desempregados não têm acesso a qualquer apoio
social, que a pobreza continua a alastrar e que a generalidade das famílias está a viver num verdadeiro e
permanente sufoco porque o Governo continua a dizer que não há dinheiro para repor os salários, que não há
dinheiro para baixar os impostos sobre os rendimentos, que não há dinheiro para repor as prestações sociais.
Mas há sempre dinheiro para ajudar a banca, pelos vistos até nem sempre de forma legal. E também encontra
folga para baixar o IRC sobre as grandes empresas, como baixou, de 25% para 23% e encontrou ainda folga
para o baixar de 23% para 21%.
Também estranhamos que o investimento não recupere, não dê sinais de retoma, tanto o investimento
público como o investimento privado. Aliás, em relação ao investimento público, os valores de 2014 foram os
mais baixos registados nas últimas duas décadas, segundo dados do INE. Mesmo com juros baixos, o
investimento não descola, o que significa que o investimento está dependente do aumento da procura. Sem
procura não há investimento. E todos nós sabemos o esforço que o Governo fez para dinamizar a procura:
literalmente depenou os rendimentos das famílias, pelo que não tendo as famílias rendimentos não pode haver
procura. Sem procura não há investimento, sem investimento não há emprego. É por isso que se torna
necessário, de facto, renegociar a dívida.
O Governo diz que não há dinheiro para o investimento porque o dinheiro que há é para os juros, então,
renegocie-se a dívida de forma a que nos seja permitido respirar, procurar canalizar recursos para a economia
porque não há nenhum povo que pague dívidas sem produzir, e nós só conseguimos produzir se houver
investimento público.
Para muita surpresa minha, dizia há pouco a Sr.ª Deputada Cecília Meireles — aliás, uma tese ou uma
liturgia que não já não é nova — que renegociar a dívida é dizer «não pagamos».
Sr.ª Deputada, como é que renegociar a dívida é dizer que não pagamos?! Por acaso, sabe qual é a
posição do CDS relativamente à dívida da Região Autónoma da Madeira? Se calhar, não está a dizer que o
CDS da Madeira não quer pagar a dívida!? Ou está? Está a dizer que o CDS da Madeira não quer pagar a
dívida? Pelos vistos, até o PSD na Madeira, no final da campanha, já começou a defender a renegociação da
dívida.
Portanto, pergunto se, na Madeira, o PSD e o CDS-PP também defendem o «não pagamos».
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, a Sr.ª Ministra, na resposta que deu, não explicou que
os DTA (deferred tax assets) são ativos por impostos diferidos, que só existem porque são um direito que os
bancos têm de pagar menos impostos no futuro, de deduzir isso em impostos que vão pagar no futuro. E eles
existem de facto. E é porque existem de facto que estão nos balanços, e é por estarem nos balanços como
ativo que permitem a vários bancos portugueses, entre eles o Novo Banco, e muito provavelmente o BCP,
funcionarem. Se não fosse este ativo, que é um bónus fiscal futuro, não tinham capital para funcionar.
Por isso, não vale a pena atirar para o Bloco de Esquerda a vontade de nacionalizar a banca, porque o que
é facto é que a banca privada não está a conseguir funcionar sem a ajuda do Estado através desta borla fiscal
futura.
É por isto que a Comissão Europeia desconfia de que estes ativos por impostos diferidos, que ajudam os
bancos a funcionar através de impostos que vão deixar de pagar no futuro, são uma ajuda pública aos bancos.
E há aqui, sim, uma diferença de atitude. Privatiza-se a TAP, privatiza-se a ANA, privatizam-se todas as
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empresas públicas porque não pode haver ajuda do Estado à economia, mas, depois, para entregar 8000
milhões de ativos por impostos diferidos aos vários bancos portugueses, já não há nenhum problema e já se
enfrenta a Comissão Europeia num processo de possível violação de direito da concorrência e de ajuda
pública à banca.
Portanto, Sr.ª Ministra reformulo a pergunta: no futuro, onde é que se vai cortar? Que pensões, que salários
é que se vão cortar? Que IRS é que se vai aumentar? O que é que se vai dizer às pessoas que esperam uma
descida do IVA quando os bancos deixarem de pagar 6000 milhões, que é o total de ativos por impostos
diferidos, quando os bancos privados deixarem de dar este dinheiro ao Estado como sua contribuição fiscal? A
quem é que vão cortar no futuro? A que pessoas, a que pequenas empresas vão aumentar os impostos para
poderem pagar estes 6000 milhões com que os bancos não vão contribuir para os cofres do Estado? Que
desculpa e que bode expiatório é que vão encontrar nessa altura para aumentar a dívida e para voltar a cortar
nos salários e nas pensões e voltar a aumentar os impostos?
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Galamba.
O Sr. João Galamba (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. as
e Srs. Deputados, antes de dizer uma coisa à Sr.ª
Ministra das Finanças, gostava de dizer ao Deputado Michael Seufert que vale tudo, mas não vale mentir, Sr.
Deputado!
Protestos do CDS-PP.
O Sr. Deputado disse que o risco de pobreza em 2011 já era igual ao de 2006. Isso é falso, quer para uma
pessoa a viver sozinha, quer para um casal. Vou dar-lhe os números do INE: em 2005 a taxa de risco de
pobreza foi 19,1%, em 2011 a taxa de risco de pobreza foi de 18,2%. É mais baixa e não mais alta, Sr.
Deputado. Portanto, faltou à verdade.
Aplausos do PS.
No caso de um indivíduo a viver sozinho, a taxa de risco de pobreza em 2005 foi de 34,9% e em 2011 foi
de 24,2% — também faltou à verdade, Sr. Deputado.
Aplausos do PS.
Agora vamos olhar para o emprego. O Sr. Deputado falou de emprego e a Sr.ª Ministra das Finanças disse
que o emprego esteve a cair a década toda. Ora, é falso, Sr.ª Ministra das Finanças. Segundo dados também
do INE, em 2005, a soma do emprego a tempo parcial e a tempo total foi de 5,47 milhões; em 2008, antes da
crise financeira, era de 5,116 milhões.
Portanto, Sr.ª Ministra das Finanças, não é verdade que o emprego esteve a cair a década toda. O
emprego caiu, sim, com a crise financeira internacional.
Mas sabe que mais, Sr.ª Ministra? Caiu muito mais em 2012 do que caiu na altura da na crise financeira,
com as políticas deste Governo.
Vemos agora que, em 2012, não caímos apenas 3,4%, caímos 4%. Foi a maior recessão desde o PREC,
Sr.ª Ministra das Finanças.
A Sr.ª Ministra das Finanças veio sugerir que a dívida só aumentou porque havia uma dívida escondida.
Isso é falso, por duas razões.
Em primeiro lugar, não havia dívida escondida; havia regras do Eurostat que Portugal cumpria, como todos
os países, tal como os governos do PSD anteriores aos do PS cumpriram as regras que existiam. As regras
mudaram, mudou o critério. Não é dívida escondida, Sr.ª Ministra!
Protestos do PSD e do CDS-PP.
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Mas olhemos para os valores da dívida, porque a Sr.ª Ministra sugere sempre que o aumento da dívida se
deve apenas à alteração das regras, e isso também é falso, Sr.ª Ministra.
Fui agora consultar — aliás, já lhe tinha dito isso no passado — as séries do Banco de Portugal líquidas da
dívida escondida. Portanto, a dívida já está normalizada durante toda a série. Vou dar-lhe os números, Sr.ª
Ministra das Finanças: em 2010, a dívida era de 96,2% e agora está em 130%, o que já inclui a alteração de
perímetro. Sr.ª Ministra das Finanças. Não se trata de dívida escondida que subitamente apareceu, é a dívida
que as políticas deste Governo criaram.
Agora olhemos apenas para o fim de 2011, se quiser excluir uns meses: no final de 2011, a dívida era de
104% do PIB e agora é de 130%.
Portanto, Sr.ª Ministra, independentemente do ano que escolhemos, 2010 ou 2011, a Sr.ª Ministra das
Finanças e este Governo aumentaram a dívida pública sempre num valor superior a 20 pontos percentuais do
PIB.
Sabe qual era o valor que a Sr.ª Ministra previa no primeiro Documento de Estratégia Orçamental deste
Governo? Previa que iam aumentar apenas 6%. Sr.ª Ministra das Finanças, quase o quádruplo, e não tem a
ver com dívida escondida ou com alterações de perímetro, mas, sim, com uma escolha errada deste Governo
em 2012, que, felizmente, foi travada pelo Tribunal Constitucional.
A Sr.ª Ministra das Finanças disse ainda algo espantoso que, de facto, resume grande parte da dissonância
cognitiva deste Governo, e que lhe peço que oiça.
A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. João Galamba (PS): — A Sr.ª Ministra das Finanças disse há pouco uma coisa espantosa, na
resposta que deu, não me lembro se ao PCP se ao Bloco de Esquerda: disse que o Governo foi obrigado a
aumentar impostos por causa do Tribunal Constitucional e que queria era ter cortado salários e pensões e
terminou a sua intervenção vangloriando-se da devolução de salários e pensões. Constatei que essa
devolução existiu porque a Sr.ª Ministra foi obrigada a fazê-lo. A Sr.ª Ministra, na mesma intervenção, queixa-
se de ter sido obrigada a devolver e, no final, vangloria-se desse facto. Isto diz muito!
Aplausos do PS.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, é para, em interpelação à Mesa, pedir a distribuição
de um documento e apresentá-lo nos termos do Regimento.
A Sr.ª Presidente: — Faça favor de identificar o documento, Sr. Deputado.
O Sr. Michael Seufert (CDS-PP): — Não vou pedir para defender a honra, porque percebo a exaltação do
Sr. Deputado João Galamba a defender o Governo do seu messias.
Os dados que pedia para serem distribuídos dizem respeito à taxa de risco de pobreza e são da
PORDATA, que cita o INE, onde se lê que, em 2010 — mas poderia dizer em 2011, porque a diferença é
apenas de uma décima —, o último ano de mandato completo do Partido Socialista, a taxa de risco de
pobreza, após transferências sociais, é de 18%, quando, em 2006, era de 18,1%.
O Sr. Deputado optou por partir do princípio de que eu menti. Poderia ter-me enganado, o que seria
legítimo, mas aqui está a prova de que isso não aconteceu.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
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A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado João Galamba, tem a palavra o Sr.
Deputado Afonso Oliveira.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr.ª Presidente, creio que não posso fazer um pedido de esclarecimento,
na medida em que o Partido Socialista já não dispõe de tempo para responder, pelo que farei uma
intervenção, se a Sr.ª Presidente me der a palavra para o efeito.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, também pode fazer a pergunta. Mesmo que o Sr. Deputado João
Galamba não possa responder, a pergunta tem um valor autónomo.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Aquilo a que
aqui assistimos nos últimos minutos foi a uma tentativa do Deputado João Galamba de tentar esconder o lapso
que teve de reconhecer que no ano anterior houve uma devolução de rendimentos aos portugueses. Na fase
final, fez um esforço para tentar demonstrar o indemonstrável, como dizia Fernando Pessoa. Mas a verdade é
que não lhe correu bem.
Reconheceu claramente que houve, nesse ano, devolução de rendimentos aos portugueses e que em 2015
haverá devolução de rendimentos aos portugueses.
O que deveria aqui dizer e não disse — era importante que o tivesse dito — é que estamos numa semana,
como disse o PCP na sua intervenção inicial, em que comemoramos quatro anos de uma triste evocação. E
qual é a evocação? É a evocação do momento em que o Partido Socialista, no Governo, reconheceu
claramente a sua incapacidade para governar o País, a sua incapacidade de financiar o País e deitou a toalha
ao chão, num processo de quase falência do País.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Nós sabemos que foi assim, os portugueses sabem que foi assim, o Partido Socialista sabe que foi assim
— não o quer reconhecer em cada momento, mas sabe que foi assim. E é uma infelicidade estarmos aqui,
quatro anos depois, nesta comemoração.
Mas foi ao Governo que saiu das eleições de 2011 a quem competiu levantar o País, consolidar contas
públicas, recuperar a credibilidade internacional, recuperar a confiança dos portugueses e, como já disse aqui
hoje a Sr.ª Ministra das Finanças, e muito bem, tentar fazê-lo criando condições para quem mais tinha
dificuldades pudesse aguentar este período.
É preciso reconhecer o trabalho que o Governo desenvolveu ao longo de quatro anos. Qual foi esse
trabalho? Foi de recuperação da soberania, de crescimento económico, de crescimento recorde das
exportações, de indicadores ímpares do turismo, de clara recuperação da credibilidade e de recuperação de
um fator fundamental sem o qual a economia não pode crescer nem pode desenvolver-se, que é a confiança.
Esse é um fator fundamental para potenciar o bom investimento, criando mais e melhor emprego.
Sr.as
e Srs. Deputados, a pergunta que se coloca aqui hoje é a seguinte: onde esteve o Partido Socialista
durante quatro anos? Esteve sempre indisponível para compromissos, incapaz de perceber a realidade do
País, sempre com muita vontade de não ajudar, sempre à procura da sua nova narrativa, como gosta de dizer,
e sempre órfão do PEC 4 , do qual ouvimos falar sistematicamente.
Mas o Partido Socialista não pode continuar a esconder-se. Tem de assumir aqui hoje — este era o
momento, é pena que não tenha sido — as suas responsabilidades. Já não resulta tentar passar por entre os
pingos da chuva. O Partido Socialista tem mesmo de nos dizer quais são as suas propostas.
As perguntas que gostava de colocar ao Sr. Deputado João Galamba — esta, sim, era uma belíssima
oportunidade para ter brilhado neste Parlamento — são muito simples. O PS tem de responder a elas nos
próximos tempos. Para o PS é difícil responder, mas é importante que o faça: que alternativas apresentam
para os portugueses? Que alternativas apresentam para a consolidação das finanças públicas? Ou vai o PS
voltar a fazer nos próximos tempos campanha eleitoral, promessas eleitorais, como fez no passado, ou vai
responder aos portugueses que alternativas tem para Portugal e para os portugueses?
É que os portugueses já vos conhecem. E o melhor conselho que vos posso dar é que não vão por aí.
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Vera Rodrigues.
A Sr.ª Vera Rodrigues (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A verdade é que este debate
começou num tom relativamente morno, mas, de facto, é difícil ficar indiferente a algumas das acusações que
aqui ouvimos.
O PCP traz aqui hoje um debate sobre a troica e faz-me lembrar — todos nós, certamente, já tivemos essa
experiência — quando estamos parados num semáforo e, de repente, há aqueles condutores mais distraídos
que, perante o semáforo que passa de vermelho a verde, ficam parados e não arrancam. O PCP parece um
desses condutores.
A troica foi embora há um ano atrás, eles continuam parados no semáforo vermelho e, entretanto, o País
avançou.
Quanto ao Partido Socialista, há, de facto, campeonatos que nós não jogamos. O campeonato em que
queremos jogar, Sr.ª Ministra, é o que faz o País avançar. O campeonato em que discutimos e disputamos
quantos anos recuou cada um não traz nada a ninguém, não traz proposta nenhuma, não traz solução
nenhuma a nenhum português!
Por isso, Sr. Deputado João Galamba, o campeonato do recuo não nos interessa. Aliás, esse é um
campeonato típico do refúgio e do recuo de um partido que ainda não conseguiu apresentar proposta
nenhuma de solução de vida e de futuro para o País. Continuam agarrados ao passado…
O Sr. Pedro Nuno Santos (PS): — Vocês é que continuam agarrados ao passado!
A Sr.ª Vera Rodrigues (CDS-PP): — … porque sobre o futuro não conseguem dizer absolutamente nada!
O Partido Socialista ensaiou aqui o número das estatísticas sobre vários números. Já percebemos,
claramente, que perdeu esse debate, porque fica sempre agarrado à atitude típica dos alunos que estudam
apenas com base em cábulas. Fazem as cábulas, fazem os post-its e, quando eles caem, ficam sem discurso.
Risos do CDS-PP.
Reparem: o Partido Socialista já usou o post-it da espiral recessiva. Esse post-it caiu e o PS ficou sem
discurso.
Depois, usou o post-it do segundo resgate. Esse post-it perdeu a cola e o PS perdeu o discurso.
Também usou o post-it da recessão. Esse post-it perdeu a cola e a adesão à parede e o PS perdeu o seu
discurso. Aliás, ensaiaram vários discursos, nomeadamente o do aumento do desemprego.
O Sr. João Galamba (PS): — E não é que aumentou mesmo o desemprego!?
A Sr.ª Vera Rodrigues (CDS-PP): — Sr. Deputado João Galamba, este Governo e esta maioria nunca
embandeiraram em arco, mas a verdade é que há resultados que são inquestionáveis. Pode dar as voltas que
quiser às estatísticas, mas a verdade é que os portugueses, felizmente, começam a sentir alguma diferença
entre aquele que foi o vosso tempo e aquele que é o nosso tempo.
Claramente, o vosso desespero é sinónimo de que a realidade deixou de vos dar razão, e felizmente, não
para nós, mas para a vida dos portugueses.
O PS continua a insistir em milagres que não resultaram no passado e que nunca voltarão a resultar.
Sr.ª Ministra, um dos temas em relação ao qual nunca mais ouvimos o PS falar foi o da importância do
funcionamento dos estabilizadores automáticos. Lembro-me de alguns debates, no início desta governação,
em que, por várias vezes, o Sr. Deputado João Galamba falou na importância de o Governo ter de deixar
funcionar os estabilizadores automáticos, na importância de subir o subsídio de desemprego, na importância
de deixarmos que as receitas fiscais caiam. Sr.ª Ministra, o PS é vítima das suas próprias soluções.
Para que isso acontecesse era preciso que não tivéssemos tido uma dívida para pagar, era preciso que
não tivéssemos que ter aumentado impostos para corrigir um défice que teve de baixar de 11% para 4,5%, era
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preciso que não tivéssemos de ter saído de um Programa de Assistência Financeira, do qual este Governo
teve de sair para libertar os portugueses e para libertar a economia portuguesa do buraco e do poço em que o
Partido Socialista nos meteu.
Portanto, o Partido Socialista continua a ser vítima de si próprio e continua a olhar para trás.
Sr.ª Ministra, já sabíamos que o caminho não ia ser fácil, mas posso dizer-lhe que, pelo menos da parte da
bancada do CDS, sabemos sempre que o caminho não é fácil. Connosco foi sempre assim.
Não governámos em períodos de vacas gordas, não fingimos ter o dinheiro que não tínhamos, não
pedimos dinheiro para além da nossa capacidade de o poder pagar para levarmos ao limite a desconfiança
dos credores em relação à nossa solvabilidade. Nada disso aconteceu.
Sr.ª Ministra, quero dizer, em relação a um debate que é sobre a troica, que águas passadas não movem
moinhos. Desafio o Sr. Deputado João Galamba a ir perguntar aos portugueses se acham que o País está
melhor hoje do que estava em 2011 e surpreenda-se com a resposta.
Aplausos do CDS-PP e do CDS-PP.
O Sr. João Galamba (PS): — Sr.ª Presidente, dá-me licença que use da palavra?
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, é para que efeito?
O Sr. João Galamba (PS): — Sr.ª Presidente, é para o mesmo efeito que usou da palavra há pouco o Sr.
Deputado Michael Seufert.
Reafirmo todos os números que aqui citei e continuo a dizer que o Sr. Deputado faltou à verdade.
Estamos a imprimir o relatório e irei distribuí-lo a toda a Câmara.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, tratou-se de uma réplica e não de uma questão relativa ao andamento
dos trabalhos. Pedia-lhe atenção para isso.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, dá-me licença?
A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Deputada, é para que efeito?
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — É para uma brevíssima interpelação à Mesa sobre a condução dos
trabalhos, se a Sr.ª Presidente me autorizar.
A Sr.ª Presidente: — Sim, desde que seja sobre a condução dos trabalhos.
Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, é mesmo sobre a condução dos trabalhos.
Tal como o Sr. Deputado Michael Seufert pediu para distribuir um documento e já o entregou, gostaria
também de ter acesso ao documento que o Sr. Deputado João Galamba distribuiu, já que foi para o mesmo
efeito.
O Sr. João Galamba (PS): — O documento está a sair da impressora! Já o vai ter!
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, pedia o favor de usarem as figuras regimentais adequadamente.
Srs. Deputados, vamos prosseguir com o debate.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Reis.
O Sr. Nuno Reis (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Há quatro
dias, fez quatro anos que se realizou uma conferência de imprensa com o Secretário-Geral do PCP em que se
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defendia a renegociação imediata da dívida pública como a solução para os graves problemas que o País
vivia.
Um dia depois, a 6 de abril de 2011, o Ministro das Finanças do Governo de José Sócrates dava conta de
que não existia nos cofres mais do que o suficiente para pagar dois meses de salários, prestações sociais e
para assegurar as diversas funções do Estado.
Com a solução do PCP, com um Estado descredibilizado internacionalmente, sem poder negocial face aos
credores e tendo que, para concretizar essa medida, não negociar, mas incumprir unilateralmente, ficou por
explicar que países ou entidades é que nos iriam emprestar o dinheiro de que já então necessitávamos, que é,
nada mais, nada menos, metade da riqueza nacional gerada num ano.
Na altura, o PCP ainda não assumia de forma taxativa o que hoje, mais às claras, assume: é preciso
preparar o País para a saída do euro. Na prática, se tivéssemos feito, há quatro anos, o que o PCP defendia,
teria resultado nesse desiderato e sem preparação prévia.
Entre a reestruturação unilateral da dívida, a saída do euro, a nacionalização da banca, a fixação
administrativa de preços e outras medidas que o PCP vem defendendo, há uma agenda que não é nem de
longe nem de perto inovadora. Reconheça-se a coerência, embora, permitam-me, persistir nos mesmos erros
e nada aprender com eles é um tipo de coerência de duvidosa qualidade.
Protestos do PCP.
Esse radicalismo ideológico vai passando mais ou menos incólume. Talvez pelo facto de a maior parte das
pessoas ter a consciência de que quem assim pensa não tem o poder executivo que lhe permita dar
cumprimento a essa agenda, muitos consideram que não valerá a pena sequer um escrutínio mais atento
dessas medidas fáceis para problemas difíceis.
O PCP corporiza a estratégia da unidade de frentes e aplica como ninguém a tática das reivindicações
parciais para os diferentes grupos e classes sociais que pretende seduzir. Daí que o discurso
compartimentado que tem para os professores, para os médicos, para esta ou para aquela classe de
funcionários públicos ou de setores da sociedade pode até soar bem porquanto a sua aplicação prática iria
sempre de encontro a muitos desejos individuais.
No entanto, se tudo isso fosse possível levar à prática, seriam exigidos recursos que o País não tem e que
a algum lado teria de ir buscar.
Aplausos do PSD.
Com a mesma ligeireza com que se apresenta uma solução miraculosa para a dívida, convive a suprema
incoerência de se desvalorizar sistematicamente a necessidade de equilíbrio das contas públicas e de só se
apresentar propostas setoriais, que, a ser implementadas no seu todo, agravariam irremediavelmente outros
problemas que pretendem resolver.
Nestes quatro anos, muita coisa mudou internacionalmente. Houve países que, na Europa, beneficiaram de
reestruturações significativas da dívida, mas nem assim essa realidade foi suficiente para desobrigar da
necessidade de reformas.
A saída iminente de um país do euro poderá dar, a prazo, mais um exemplo prático de que os modelos e
ideias que o PCP preconiza resultariam no isolamento do País face ao exterior e em consequências mais
negativas do que positivas para as populações. Mas oxalá, a bem desse povo, que tal não aconteça.
Aplausos do PSD.
Na Venezuela, até agora apresentada por alguns paladinos da esquerda do nosso País como um modelo
social a seguir, luta-se pelos direitos humanos, contra as perseguições políticas, ao mesmo tempo que a
inflação cavalga e os bens alimentares escasseiam nas mercearias.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não diga mal da Venezuela, porque o Paulo Portas passa lá a vida!
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O Sr. Nuno Reis (PSD): — O Equador, apresentado como modelo pela sua reestruturação de dívida,
passa agora pelas dificuldades esperadas de uma economia excessivamente dependente do petróleo.
Até Cuba, aliás, se vai lentamente abrindo ao exterior.
Só a agenda que o PCP tem para oferecer ao País permanece irreformável. Não surpreende que para o
PCP quanto pior melhor.
Se é verdade que sem miséria social o comunismo não tem seguidores, não é menos verdade que nunca,
na história, houve uma experiência comunista que não trouxesse miséria ainda maior aos povos que
conseguiu liderar.
Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Se o PCP está em
contraciclo com a história, o PS está à margem da história. Só assim se pode entender o discurso e as
práticas dos seus dirigentes.
O PS considera que não teve nenhuma responsabilidade em ter levado o País à bancarrota e que não teve
nenhuma responsabilidade nas medidas do Memorando que foram contrapartida ao pedido de auxílio
internacional.
Para o PS, o seu líder, António Costa, não foi o número dois de José Sócrates. Os resultados das
sondagens não são da responsabilidade da velha…, perdão, da nova liderança. Os resultados eleitorais na
Madeira nada têm a ver com o grande líder. Os socialistas do PASOK perdem na Grécia, mas a nova
liderança, mais à esquerda, até tem élan nos media. O PS está com eles!
O tempo passa e nada de bom se augura. Então, toca a descolar dessa nova alternativa que, afinal, até já
nem é da mesma família política.
O PS quer ter um novo Hollande… Não, o PS quer ter um novo Tsypras… Não, afinal o Matteo Renzi é que
é…! De ziguezague em ziguezague, entre nova inspiração e velha aspiração, chega-se até a pensar num novo
António. Será o velho Costa um novo Seguro para esta maioria?
Aplausos do PSD.
As inundações em Lisboa são como os buracos: não têm solução. Perdão, até pode haver solução, mas
custará uns 100 milhões de euros, coisa pouca para socialistas. Mas isso era dantes; agora, a 100% no Largo
do Rato é que vai ser!
Medidas para apresentar nem vê-las. Zero! Mas há para aí um grupo de 12 magos que vai propor alguma
coisa, talvez lá para o Verão, não vá alguém estar a trabalhar e prestar atenção às soluções que configuram a
tal alternativa do velho novo cancioneiro socialista.
Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados, as exportações continuam
a crescer.
As perspetivas de crescimento económico do País estão, hoje, acima das do Governo e até acima da
média da zona euro.
O novo quadro comunitário abre oportunidades de investimento e de desenvolvimento, de que o País bem
precisa e pode aproveitar, caso as apostas não sejam meramente as de ganhar a próxima eleição mas de
trabalhar pela futura geração.
Entre as políticas que nos fariam recuar à miséria que se vivia nos paraísos do lado de lá da cortina de
ferro ou entre os políticos que nos fariam caminhar, a exemplo de governos socialistas anteriores, para uma
quarta bancarrota em democracia, a escolha deverá ser esclarecida.
Ninguém está isento de falhas, mas os resultados estão aí e devem ser comparados à luz do que outros
propuseram e teriam feito.
Não duvidamos que este Governo seja bem melhor do que as alternativas das cigarras esquerdistas. O
País merece melhor. A atual maioria é, seguramente, mais fiável que as pretensas alternativas.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Cruz.
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A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ao fim de quase
quatro anos de governo, o investimento público, a preços correntes, está a níveis inferiores aos de 1996.
Nessa data, o investimento público representava 4,9% do PIB, hoje representa menos de metade.
O Governo optou por desresponsabilizar o Estado pela dinamização económica e social, reduzindo em
30% o investimento público desde 2011. Para 2020, a meta do Governo é de 18%, o valor mais baixo das
últimas décadas, um valor manifestamente insuficiente para o desenvolvimento e o progresso do País.
O Governo, numa campanha sem precedentes, anda pelo País a acenar com os fundos comunitários para
o período 2014/2020. Diz que Portugal vai receber 26 000 milhões de euros para investimento, mas nada diz
sobre um facto muito importante: é que, nesse mesmo período, Portugal irá pagar 60 000 milhões de euros de
juros.
A brutal redução do investimento público, em particular nas funções sociais do Estado, conduziu à
degradação da qualidade de vida dos portugueses e, ainda, ao declínio da produção nacional e ao
aprofundamento das assimetrias regionais. Para inverter esta situação é imprescindível apostar no
investimento público.
A política de promoção do investimento público é parte integrante da alternativa política patriótica e de
esquerda proposta pelo PCP. Uma política que favoreça o investimento produtivo e a produção de bens
transacionáveis, aumentando o investimento; que assegure e garanta serviços públicos de qualidade, pondo
fim à destruição da Administração Pública e ao despedimento e retirada de direitos aos seus trabalhadores;
que assegure um Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito, um sistema público de segurança
social, consolidando o seu caráter universal e solidário, uma escola pública de qualidade que possibilite a
formação integral do indivíduo; que promova o financiamento de programas públicos de investigação
fundamental e aplicada, rejeitando a empresarialização e a mercantilização da investigação científica; que
reforça o papel do Estado nos setores básicos e estratégicos da economia e adote uma política onde as
empresas e as instituições públicas privilegiem o aparelho produtivo nacional; que apoie a agricultura e as
pescas, em particular os pequenos produtores, e defenda as fileiras existentes.
O investimento público, Sr.ª Ministra, é um elemento determinante para a resolução dos graves problemas
nacionais, mas também para a modernização do País, das suas estruturas sociais e económicas.
Uma política que assuma verdadeiramente o objetivo de recuperar a soberania nacional e desenvolver o
País tem de assumir o investimento público como elemento central na resolução dos problemas do presente e
na preparação do País para os desafios futuros.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente. — Tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças para uma intervenção.
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Julgo que talvez se possa
ter gerado aqui alguma confusão relativamente à matéria dos DTA (deferred tax assets) e, porque acho que é,
de facto, uma matéria importante, para que não fiquem mal-entendidos, gostaria de esclarecer várias
questões, que, aliás, tive ocasião de referir quando aqui fizemos a proposta de lei e vim explicá-la e defendê-la
junto dos Srs. Deputados.
Primeiro ponto, isto não se aplica só aos bancos, mas a todas as empresas. Aplica-se a uma categoria
muito particular de perdas, que são as imparidades de crédito e as imparidades com fundos de pensões.
Naturalmente, os bancos são as principais empresas que ficam abrangidas por este regime, mas não
exclusivamente. Isso é um ponto importante, porque, por exemplo, fundos de pensões não é de todo um
exclusivo da banca.
Queria também esclarecer que os DTA são ativos por impostos diferidos quando o princípio da existência
de créditos fiscais é algo que está consagrado no nosso regime fiscal já há muitos anos. O que tivemos foi
uma alteração do quadro regulamentar dos bancos que obrigou a que houvesse também esta alteração para
que aquilo que eram os créditos fiscais pudesse vir a ter o mesmo tipo de impacto no capital dos bancos que
tinha no passado, como foi oportunamente explicado.
Em qualquer caso, queria sublinhar, mais uma vez, que aquilo que está no balanço dos bancos não é,
automaticamente e sem custo, convertível num direito sobre o Estado, nem por um período de tempo ilimitado.
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Do que se trata é da possibilidade de converter em determinadas condições, nomeadamente perante a
existência de prejuízos, parte desses ativos em créditos fiscais, mas em troca disso o Estado tem o direito de
entrar no capital desse banco com ações, diluindo os restantes acionistas por um valor 10% acima daquilo que
lá foi colocado, para garantir que os contribuintes continuam salvaguardados. Este é que é o regime dos
impostos por ativos diferidos. Que não fique a ideia de que foi um valor que o Estado resolveu oferecer aos
bancos e que só porque aparece registado nos balanços foi oferecido. O que aparece registado é por uma
questão de regras contabilísticas e prudenciais, mas, efetivamente, não dá nenhum direito de saque, sem mais
e sem contrapartida, sobre o Orçamento do Estado.
Sr. Deputado João Galamba, acho interessante que tenha comparado a dívida entre 2010 e 2014 e sobre
essa questão gostaria de lhe dizer o seguinte: primeiro, vamos comparar aquilo que é comparável, que é
retirando os depósitos da administração central. Portanto, em 2010, tínhamos 96%, em 2014 temos 120%,
porque efetivamente em 2010 não havia depósitos da administração central que tivessem impacto nesta
alteração,…
O Sr. João Galamba (PS): — Havia, havia!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — … porque aquilo que existia, na altura, era uma política de
minimizar os excedentes de tesouraria e o próprio desempenho do IGCP (Agência de Gestão da Tesouraria e
da Dívida Pública) era até avaliado por esse critério.
Entre 2007 e 2010 — e isto é particularmente importante —, quanto ao aumento para a variação da dívida
de que estamos aqui a falar, o saldo primário contribuiu para o aumento da dívida em 15,7%, ou seja, metade
do aumento da dívida é explicado por défices primários. Portanto, aí não falamos de juros, retiramos o efeito
dos juros e temos um aumento da dívida, só pelo que se gasta a mais do que aquilo que se recebe, excluindo
juros, de 15,7%. Metade do aumento da dívida entre 2007 e 2010 é défice primário.
Quando olhamos para aquilo que aconteceu entre 2010 e 2014, quanto é que o saldo primário contribuiu
para o aumento da dívida? Contribuiu 3,3 pontos percentuais em 34. Comparamos 27 com 34 e o saldo
primário era de 15,7% no caso do Governo socialista e de 3,3 no caso deste Governo.
Quando olhamos para a fatura de juros, verificamos que corresponde a 19 pontos percentuais, mas quase
80% desta fatura de juros é dívida herdada, Srs. Deputados,…
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Claro!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — … porque ela já existia quando começámos a governar. Isto
só para recentrar a discussão que tínhamos tido sobre a dívida.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. João Galamba (PS): — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente. — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. João Galamba (PS): — É sobre a condução dos trabalhos, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente. — Faça favor.
O Sr. João Galamba (PS): — Sr.ª Presidente, aparentemente, a Sr.ª Ministra, à semelhança do Sr.
Deputado Michael Seufert, também tem um problema com os números, pelo que vou distribuir à Sr.ª Ministra
das Finanças os dados do Banco de Portugal que mostram que, ao contrário do que disse aqui, em 2010 a
dívida líquida de depósitos baixa de 96% para 93%.
Vou também proceder à impressão do Boletim Estatístico do Banco de Portugal para dar à Ministra das
Finanças, a fim de ter uma visão mais correta dos dados, porque manifestamente não conhece os números.
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Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP, tendo Deputados batido com as mãos nos tampos das bancadas.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar à fase de encerramento da interpelação ao Governo.
Como todos sabem, intervém, em primeiro lugar, o partido autor da iniciativa e, em seguida, o Governo.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Com
esta interpelação do PCP, o Governo foi sujeito a um confronto com a verdade. Um confronto com a verdade
em relação à real situação nacional, um confronto com as suas responsabilidades na situação do País, um
confronto com os planos a que querem amarrar Portugal e também um confronto com as verdadeiras soluções
para os problemas nacionais.
Neste confronto com a verdade, o Governo chumbou. Chumbou porque não quer dizer a verdade sobre a
situação do País, nem assumir as suas responsabilidades, chumbou porque não quer dizer a verdade sobre os
planos que está a fazer para continuar a política da troica e chumbou, também, porque se recusa a aceitar que
são outras as soluções para o País.
O Governo quer apagar da memória dos portugueses o que foram estes anos de empobrecimento e
declínio. Quer apagar essa memória vendendo ilusões em relação à real situação do País, como se os
problemas tivessem desaparecido.
Falam de libertação da troica, de almofadas financeiras, de sustentabilidade da dívida e de cofres cheios,
enquanto as crianças vão para as escolas com fome, os trabalhadores desesperam sem salário e os idosos
são condenados à morte antecipada por falta de acesso à saúde.
Protestos do PSD.
O Governo faz, afinal, o que anteriores governos fizeram: varre os problemas para debaixo do tapete na
esperança de que até às eleições ninguém dê por eles.
O Governo insiste na invenção da retoma desprezando as dificuldades dos portugueses, insiste na
invenção da recuperação, apesar de a realidade, todos os dias, a desmentir, insiste na invenção de resultados
económicos e sociais que não existem, porque isso é tudo o que lhe resta perante a derrota que tem como
certa.
Tudo o que resta ao Governo e aos partidos que o suportam é inventar um País que não existe, para
poderem dizer que os sacrifícios valeram a pena e que produziram resultados.
O Governo PSD/CDS quer esconder que se está a articular com a União Europeia para perpetuar esta
política. Quer esconder que se está a preparar para oferecer o País e as vidas dos portugueses numa bandeja
de prata em nome do cumprimento das imposições do tratado orçamental, da governação económica, da
União Económica e Monetária.
Tudo o que têm para propor ao País é a venda de ilusões e a continuação da política dos quatro PEC e do
pacto da troica, que agora se esconde sob a máscara do Programa de Estabilidade e do Plano Nacional de
Reformas.
Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: O Governo PSD/CDS não só não tem,
como não quer ter uma política alternativa à política dos PEC e da troica que pretende continuar.
O Governo não tem, nem quer fazer uma política diferente da de dois pesos e duas medidas com que
penalizou os trabalhadores e o povo em benefício dos grandes interesses económicos e financeiros.
Alguém ouviu, neste debate, o Governo assumir que é preciso devolver salários e pensões cortados nos
últimos cinco anos? Alguém ouviu, neste debate, o Governo afirmar que é preciso produzir mais para dever
menos e distribuir a riqueza com mais justiça pelos trabalhadores? Alguém ouviu, neste debate, o Governo
defender um programa de investimento público que modernize o País e a sua estrutura produtiva e científica?
Que dote o País de equipamentos, infraestruturas, redes de transportes e comunicações que respondam aos
problemas atuais e preparem o País para os desafios do futuro? Alguém ouviu neste debate o Governo
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reconhecer que é necessário preparar o futuro investindo na educação, na saúde, na segurança social ou na
cultura?
Ninguém ouviu nada disso ao Governo porque não é esse o plano a que querem amarrar o País. O plano a
que o Governo quer amarrar o País é o plano de continuação da política da troica.
A situação do País não é o que diz a propaganda do Governo e a saída para a grave crise nacional não
está na continuação da política de direita que a trouxe, não está na continuação da política dos PEC e da
troica; a solução para os problemas nacionais está numa política alternativa, patriótica e de esquerda.
O País precisa de renegociar a dívida pública, nos seus prazos, juros e montantes para se libertar desse
garrote e para ter recursos para fazer a política alternativa que resolva os problemas nacionais.
O País precisa de se desvincular da chamada «governação económica» e do tratado orçamental e precisa
de estudar e preparar-se para a libertação da submissão ao euro.
Portugal precisa de defender os setores produtivos e a produção nacional e garantir o controlo público dos
setores básicos e estratégicos da economia, designadamente da banca.
Portugal precisa de valorizar o trabalho e os trabalhadores, através de uma justa distribuição do
rendimento, assente na valorização dos salários, no pleno emprego, na defesa do trabalho com direitos, no
aumento das reformas e pensões, no combate ao desemprego e à precariedade.
Portugal precisa de defender os serviços públicos, as funções sociais do Estado na saúde, na escola
pública, na segurança social, um serviço público de cultura.
Para concretizar essa política alternativa o País precisa de renegociar a dívida, mas precisa também de
uma política fiscal mais justa, adequada às necessidades de desenvolvimento económico e social do País e
que assegure o financiamento do Estado e o investimento público. Uma política fiscal alternativa que rompa
com o favorecimento e os privilégios da banca e dos grupos económicos e alivie os impostos sobre os
trabalhadores, o povo, as micro, pequenas e médias empresas.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. João Oliveira (PCP): — A solução para os problemas nacionais está numa política alternativa e,
como foi dito no início desta interpelação, o PCP apresentará um projeto de resolução que concretize essa
política alternativa.
Traremos esse projeto ao confronto com o Programa de Estabilidade do Governo, não porque tenhamos
ilusões quanto à possibilidade de o Governo aceitar as propostas do PCP mas porque essa é uma obrigação
que assumimos com os trabalhadores e o povo e não deixaremos de a cumprir.
Aplausos do PCP.
Deste Governo PSD/CDS não esperamos, nem nunca esperámos, nada, mas temos uma inabalável
confiança nos trabalhadores e no povo português e na sua capacidade de encontrarem o caminho que rompa
com a política de direita e conduza o País a um futuro de progresso, desenvolvimento e justiça social.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Este debate acabou por
ser bem mais sobre aquilo que passou do que sobre aquilo que queremos para a frente. Mas, como o que
passou é muito fértil e útil em lições que devemos retirar para futuro, o debate foi, efetivamente, útil, ainda que
não o classificasse, necessariamente, como muito construtivo. Ainda assim, não deixaremos de continuar a
tentar.
O Governo herdou, de facto, uma situação muito difícil em 2011 e, ao longo destes anos, teve de conviver,
permanentemente, com uma total falta de colaboração de toda a oposição. As previsões foram sempre
catastrofistas, nunca, em momento algum, o Governo apresentou um dado positivo, e houve muitos,
felizmente, ao longo destes anos, que a oposição não tivesse tentado destruir — ou descredibilizando a fonte,
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ou minimizando a importância —, mas nunca, nunca, acompanhando o Governo, mesmo quando era
manifesto que os resultados eram positivos para os portugueses.
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Tenho alguma dificuldade em conciliar isto com uma
suposta defesa dos interesses nacionais.
A verdade é que previram um segundo resgate, uma espiral recessiva. Depois, previram a saída com um
programa cautelar, porque era impensável ser noutros termos.
O Sr. João Galamba (PS): — Foi o Primeiro-Ministro! Se não cortássemos 4000 milhões!…
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Como não houve um segundo resgate nem houve
necessidade de um programa cautelar, à falta de melhor argumento, dizem que saímos, mas é como se não
tivéssemos saído porque as políticas são as mesmas.
Vozes do PCP: — É verdade!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Portanto, mais uma vez, independentemente do que se
consiga e das vantagens que isso traga para os portugueses, a oposição insiste em não o reconhecer.
A verdade é que muitas coisas melhoraram, mas também é verdade que o País continua a ter dificuldades
e desafios. A dimensão dos desequilíbrios que foram acumulados desde a adesão ao euro precisa de tempo
para ser corrigida. Não é possível, nunca, em nenhuma circunstância, fazê-lo em três ou quatro anos, muito
menos quando temos de fazer um ajustamento desta dimensão num cenário de recessão e de crise
internacional. É que uma coisa é ajustar quando à nossa volta tudo corre bem, outra é ajustar quando os
nossos principais parceiros também têm dificuldades, quando a falta de confiança é generalizada, quando a
crise é global e não apenas nacional.
Ainda assim, Portugal foi capaz de dar a volta e foi capaz de se situar hoje num ponto em que,
efetivamente, estamos a discutir se o crescimento é muito ou pouco, se o desemprego desceu muito ou pouco.
A verdade é que estamos a discutir crescimento e estamos a discutir trajetórias de descida do desemprego.
Isto faz toda a diferença! Já não estamos a discutir recessão, já não estamos a discutir o que discutíamos
antes.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. João Galamba (PS): — Está a aumentar, agora!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — Mas pedimos à oposição contributos para a elaboração do
Programa Nacional de Reformas e, já o referi aqui, o PCP e Os Verdes optaram por não dar contributos,
porque entendem que discordam de todo aquele que é o quadro europeu e preferem dar os seus contributos
num outro formato. Respeitamos!
O Partido Socialista mandou-nos Uma Agenda para a Década 2015-2024, esclarecendo, na carta que a
capeava, que são os projetos para os próximos 10 anos. Bom, foi este o valor acrescentado que o PS
entendeu enviar, em resposta à carta que remeti, como contributo para o Programa Nacional de Reformas.
Ainda assim, enviei hoje mesmo uma nova carta, convidando os partidos para uma reunião na próxima
terça-feira, para termos, mais uma vez, oportunidade de recolher contributos e ouvir opiniões, antes de o
Governo aprovar os documentos que têm de ser remetidos a Bruxelas este mês. E, no dia 22, antes de esses
documentos serem remetidos, viremos aqui, a este Parlamento, apresentá-los e debatê-los.
Portanto, independentemente da falta de vontade de colaboração da oposição, o Governo continuará a
insistir, na esperança de que alguma coisa saia desse lado. Podemos perguntar-nos se não sai por receio de
ser copiado ou se não sai porque não há nada para sair, e inclino-me mais para a segunda hipótese.
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10 DE ABRIL DE 2015
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Quanto aos dados efetivos, ainda hoje verificámos que as exportações crescem, que as previsões de
crescimento e das diversas variáveis têm vindo a ser revistas em alta e que, efetivamente, continuamos, ainda
e sempre, a tomar iniciativas para reformar o Estado, para melhorar a vida dos cidadãos. Ainda hoje, em
Conselho de Ministros, foi aprovado um conjunto de medidas para o setor das águas que vai permitir uma
redução muito expressiva do custo da água no interior do País, porque nos preocupamos com os custos da
interioridade. Foi também aprovada a alteração das Bases de Concessão das PPP, herança que recebemos
do Governo anterior,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Afinal, os senhores são um Governo ou um cabeça-de-casal?!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — … aprovação, esta, que garante uma poupança de 2000
milhões de euros, estando previsto, a curto prazo, fazer a aprovação dos restantes contratos. Isto chama-se,
efetivamente, cortar nas rendas e nos supostos interesses, que os Srs. Deputados tanto invocam.
Srs. Deputados, dizem que não nos preocupamos com as pessoas?! Não nos preocupamos com as
pessoas, quando queremos baixar os custos da água, quando majoramos os investimentos no interior,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Vá ao Baixo Alentejo!
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: — … quando damos benefícios fiscais às empresas que lá se
instalam, quando garantimos que temos recursos para cumprir as funções do Estado, para manter o Serviço
Nacional de Saúde, para manter a escola pública?! Srs. Deputados, as pessoas não se defendem com
proclamações, defendem-se com políticas concretas, com resultados e com a garantia de que, quando
precisarem, o Estado cá estará para assegurar aquilo que são os seus direitos fundamentais.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Com as intervenções do PCP e do Governo, encerra-se o debate da interpelação n.º
21/XII (4.ª) e, desse modo, a nossa ordem de trabalhos de hoje.
Cumprimento os Srs. Membros do Governo e agradeço aos Srs. Deputados que intervieram no debate.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, com início às 10 horas, e terá a seguinte ordem de
trabalhos:
1 — Apreciação conjunta dos projetos de resolução n.os
1292/XII (4.ª) — Valorizar a ria Formosa e clarificar
o estatuto jurídico do núcleo da Culatra (PSD e CDS-PP), 1308/XII (4.ª) — Pelo reconhecimento do valor
social, económico e cultural dos núcleos urbanos das ilhas-barreira da ria Formosa e imediata suspensão das
demolições de habitações na Culatra, Hangares, Farol, península do Ancão e ilhotes da ria Formosa (PCP),
1394/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo o reconhecimento do valor económico e cultural dos núcleos
populacionais existentes nas ilhas-barreira e ilhotes da ria Formosa e na península do Ancão (BE) e 1398/XII
(4.ª) — Recomenda ao Governo um conjunto de ações em torno da requalificação e valorização da ria
Formosa (PS);
2 — Apreciação, na generalidade, do projeto de lei n.º 835/XII (4.ª) — Procede à quarta alteração à Lei n.º
5/98, de 31 de janeiro, determinando um novo modelo de designação do Governador do Banco de Portugal e
dos demais membros do Conselho de Administração (PS);
3 — Apreciação conjunta, também na generalidade, dos projetos de lei n.os
849/XII (4.ª) — Estabelece uma
cláusula de salvaguarda para efeitos de IMI (imposto municipal sobre imóveis) e revoga a isenção concedida
aos fundos imobiliários (PCP), 851/XII (4.ª) — Revoga os benefícios fiscais dos fundos imobiliários no
pagamento do imposto municipal sobre imóveis (IMI) (BE), 852/XII (4.ª) — Suspensão extraordinária do
aumento do IMI (imposto municipal sobre imóveis) em 2015 (BE), 853/XII (4.ª) — Introduz a atualização anual
automática do valor da habitação para efeitos de pagamento do imposto municipal sobre imóveis (IMI) para
uma maior justiça social (BE), 854/XII (4.ª) — Introduz taxas reduzidas de IMI (imposto municipal sobre
imóveis para habitação própria (BE) e 850/XII (4.ª) — Introduz maior equidade fiscal e maior justiça social no
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I SÉRIE — NÚMERO 71
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Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (vigésima sexta alteração ao Código do Imposto Municipal sobre
Imóveis, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro) (PS);
4 — Apreciação conjunta do projeto de resolução n.º 1311/XII (4.ª) — Criação de um programa nacional de
emergência para o património cultural e recurso a fundos europeus para o seu financiamento, no quadro da
Estratégia 2020 (BE), do projeto de lei n.º 840/XII (4.ª) — Procede à primeira alteração à Lei n.º 107/2001, de 8
de setembro, procedendo à alteração das regras de inventariação, de expedição e de exportação de obras e
altera a taxa de IVA aplicável ao restauro de bens móveis culturais (PS) — na generalidade — e do projeto de
resolução n.º 1396/XII (4.ª) — Medidas de proteção do património cultural português (PCP);
5 — Apreciação, na generalidade, do projeto de lei n.º 855/XII (4.ª) — Cria o passe jovem (Os Verdes),
conjuntamente com os projetos de resolução n.os
1397/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo a reintrodução de
passes escolares (PS), 1399/XII (4.ª) — Repõe o desconto do passe 4_18, alargando-o a todas as crianças e
jovens até aos 18 anos (BE) e 1401/XII (4.ª) — Repõe o desconto do passe sub 23, alargando-o a todos os
estudantes do ensino superior até aos 23 anos, inclusive (BE);
6 — Apreciação da proposta de resolução n.º 98/XII (4.ª) — Aprova o Acordo relativo ao Tribunal Unificado
de Patentes, assinado em Bruxelas, em 19 de fevereiro de 2013.
7 — No período regimental, haverá lugar a votações.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 48 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.