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Quinta-feira, 25 de junho de 2015 I Série — Número 102
XII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2014-2015)
REUNIÃOPLENÁRIADE24DEJUNHODE 2015
Presidente: Ex.mo Sr. Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Secretários: Ex.mos
Srs. Pedro Filipe dos Santos Alves Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz
S U M Á R I O
O Presidente (Guilherme Silva) declarou aberta a
sessão às 14 horas e 39 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de
resolução n.os
1540 a 1550/XII (4.ª), das propostas de resolução n.
os 117 e 118/XII (4.ª), dos projetos de lei n.
os
1007 a 1012/XII (4.ª) e das apreciações parlamentares n.os
146 a 149/XII (4.ª).
Procedeu-se ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 335/XII (4.ª) — Transpõe a Diretiva 2013/11/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de maio de 2013, sobre a resolução alternativa de litígios de consumo, estabelece o enquadramento jurídico dos mecanismos de resolução extrajudicial de litígios de consumo. Intervieram, além da Ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz), os Deputados Paulo Simões Ribeiro (PSD), Cecília Honório (BE), Fernando Serrasqueiro (PS), João Oliveira (PCP) e Teresa Anjinho (CDS-PP).
Foi discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 337/XII (4.ª) — Aprova o regime jurídico da transmissão e execução de sentenças em matéria penal que imponham penas de prisão ou outras medidas privativas da liberdade, para efeitos da execução dessas sentenças na União Europeia, bem como o regime jurídico da transmissão e execução de sentenças e de decisões relativas à liberdade condicional para efeitos da fiscalização das medidas de
vigilância e das sanções alternativas, transpondo as Decisões-Quadro n.
os 2008/909/JAI, do Conselho, e
2008/947/JAI, do Conselho, ambas de 27 de novembro de 2008. Produziram intervenções, além da Ministra da Justiça, os Deputados Andreia Neto (PSD), João Oliveira (PCP), Teresa Anjinho (CDS-PP), Cecília Honório (BE) e Isabel Oneto (PS).
A proposta de lei n.º 336/XII (4.ª) — Procede à décima oitava alteração ao Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de maio, foi discutida na generalidade, tendo proferido intervenções a Ministra da Administração Interna (Anabela Rodrigues) e os Deputados Jorge Fão (PS), Carina Oliveira (PSD), João Paulo Viegas (CDS-PP), Bruno Dias (PCP) e Pedro Filipe Soares (BE).
Foi apreciado o Relatório Anual de Segurança Interna (RASI), tendo-se pronunciado, a diverso título, a Ministra da Administração Interna e os Deputados Filipe Neto Brandão (PS), Carlos Peixoto (PSD), Cecília Honório (BE), Jorge Machado (PCP) e Nuno Magalhães (CDS-PP).
Foram apreciados o projeto de resolução n.º 1483/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo que regule o exercício da profissão de criminólogo (PSD), a petição n.º 261/XII (2.ª) — Apresentada por Vítor Miguel Pereira da Silva e outros, solicitando à Assembleia da República que seja reconhecida a profissão de criminólogo em Portugal, e os projetos de
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resolução n.os
1542/XII (4.ª) — Sobre a criação da profissão de criminologista (CDS-PP) e 1549/XII (4.ª) — Reconhecimento e regulamentação da profissão de criminólogo (BE). Intervieram os Deputados Cristóvão Simão Ribeiro (PSD), Teresa Anjinho (CDS-PP), Pedro Filipe Soares (BE), Elza Pais (PS) e Jorge Machado (PCP).
Foi apreciada a petição n.º 473/XII (4.ª) — Apresentada pela Sociedade Portuguesa de Engenharia de Reabilitação e Acessibilidade (SUPERA), solicitando à Assembleia da República a criação de legislação sobre residências e melhoria dos cuidados prestados a pessoas com deficiência motora grave, tendo-se pronunciado os Deputados Raúl de Almeida (CDS-PP), David Costa (PCP), Idália Salvador Serrão (PS), José Luís Ferreira (Os Verdes), Maria Conceição Pereira (PSD) e Mariana Aiveca (BE).
Foi também apreciada a petição n.º 450/XII (4.ª) — Apresentada por Paulo Jorge Melich Farinha e outros, solicitando à Assembleia da República que debata a possibilidade de intervenção do Estado para o
estabelecimento de um serviço público de transporte marítimo regular de passageiros por ferryboat entre a Ilha da Madeira e o Continente, conjuntamente com o projeto de resolução n.º 1546/XII (4.ª) — Transporte por ferryboat entre o Continente e a Madeira (BE). Proferiram intervenções os Deputados Mariana Mortágua (BE), Rui Barreto (CDS-PP), Bruno Dias (PCP), Jacinto Serrão (PS) e Francisco Gomes (PSD).
A Câmara apreciou ainda a petição n.º 452/XII (4.ª) — Apresentada pelo SINTAP (Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública e Entidades com Fins Públicos), solicitando à Assembleia da República que tome medidas urgentes contra a aplicação do regime de requalificação da Segurança Social. Usaram da palavra os Deputados António Cardoso (PS), Maria das Mercês Soares (PSD), Rita Rato (PCP), Artur Rêgo (CDS-PP) e Mariana Aiveca (BE).
O Presidente (Guilherme Silva) encerrou a sessão eram 18 horas e 12 minutos.
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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, está aberta a sessão.
Eram 14 horas e 39 minutos.
Peço aos Srs. Agentes da autoridade o favor de abrirem as galerias.
A nossa ordem do dia é a seguinte: debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 335/XII (4.ª) —
Transpõe a Diretiva n.º 2013/11/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de maio de 2013, sobre a
resolução alternativa de litígios de consumo, estabelece o enquadramento jurídico dos mecanismos de
resolução extrajudicial de litígios de consumo;
Discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 337/XII (4.ª) — Aprova o regime jurídico da transmissão
e execução de sentenças em matéria penal que imponham penas de prisão ou outras medidas privativas da
liberdade, para efeitos da execução dessas sentenças na União Europeia, bem como o regime jurídico da
transmissão e execução de sentenças e de decisões relativas à liberdade condicional para efeitos da
fiscalização das medidas de vigilância e das sanções alternativas, transpondo as Decisões-Quadro n.os
2008/909/JAI, do Conselho, e 2008/947/JAI, do Conselho, ambas de 27 de novembro de 2008;
Discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 336/XII (4.ª) — Procede à décima oitava alteração ao
Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de maio;
Apreciação do Relatório Anual de Segurança Interna (RASI);
Apreciação conjunta do projeto de resolução n.º 1483/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo que regule o
exercício da profissão de Criminólogo (PSD), da petição n.º 261/XII (2.ª) — Apresentada por Vítor Miguel
Pereira da Silva e outros, solicitando à Assembleia da República que seja reconhecida a profissão de
criminólogo em Portugal, e dos projetos de resolução n.os
1542/XII (4.ª) — Sobre a criação da profissão de
criminologista (CDS-PP) e 1549/XII (4.ª) — Reconhecimento e regulamentação da profissão de criminólogo
(BE);
Apreciação da petição n.º 473/XII (4.ª) — Apresentada pela Sociedade Portuguesa de Engenharia de
Reabilitação e Acessibilidade (SUPERA), solicitando à Assembleia da República a criação de legislação sobre
residências e melhoria dos cuidados prestados a pessoas com deficiência motora grave;
Apreciação conjunta da petição n.º 450/XII (4.ª) — Apresentada por Paulo Jorge Melich Farinha e outros,
solicitando à Assembleia da República que debata a possibilidade de intervenção do Estado para o
estabelecimento de um serviço público de transporte marítimo regular de passageiros por ferryboat entre a ilha
da Madeira e o continente e do projeto de resolução n.º 1546/XII (4.ª) — Transporte por ferryboat entre o
Continente e a Madeira (BE);
Apreciação da petição n.º 452/XII (4.ª) — Apresentada pelo SINTAP (Sindicato dos Trabalhadores da
Administração Pública e Entidades com Fins Públicos), solicitando à Assembleia da República que tome
medidas urgentes contra a aplicação do regime de requalificação da segurança social.
Antes de darmos início aos nossos trabalhos, peço ao Sr. Secretário Pedro Alves o favor de proceder à
leitura do expediente que, entretanto, deu entrada na Mesa.
O Sr. Secretário (Pedro Alves): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram
admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: projetos de resolução n.os
1540/XII (4.ª) — Reforça as medidas
de prevenção, controlo e tratamento da diabetes (PSD e CDS-PP), 1541/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo a
salvaguarda do ensino artístico especializado, mediante a estabilidade do seu modelo de financiamento e das
respetivas transferências para as instituições de ensino (PS), 1542/XII (4.ª) — Sobre a criação da profissão de
criminologista (CDS-PP), 1543/XII (4.ª) — Pela rejeição do denominado Acordo de Parceria Transatlântica de
Comércio e Investimento (TTIP) (PCP), que baixa à 4.ª Comissão, 1544/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo a
instituição do dia 17 de maio como o dia nacional contra a discriminação das pessoas lésbicas, gays,
bissexuais, transexuais e intersexo (BE), que baixa à 1.ª Comissão, 1545/XII (4.ª) — Financiamento das
escolas do ensino artístico pelo Orçamento do Estado garantindo o direito ao ensino artístico de todos os
alunos (BE), 1546/XII (4.ª) — Transporte por ferryboat entre o Continente e a Madeira (BE), 1547/XII (4.ª) —
Recomenda ao Governo a implementação de medidas pelo reconhecimento e proteção das pessoas com
fibromialgia (BE), 1548/XII (4.ª) — Recomenda medidas de combate à precariedade e reformula as regras dos
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estágios emprego (BE), 1549/XII (4.ª) — Reconhecimento e regulamentação da profissão de criminólogo (BE)
e 1550/XII (4.ª) — Garantir um novo paradigma de controlo da população de animais (Os Verdes);
Propostas de resolução n.os
117/XII (4.ª) — Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e a
Universidade das Nações Unidas relativo à Unidade Operacional de Governação Eletrónica Orientada para
Políticas da Universidade das Nações Unidas em Guimarães, Portugal, assinado em Lisboa, em 23 de maio
de 2014, que baixa à 2.ª Comissão com conexão à 8.ª, e 118/XII (4.ª) — Aprova o Acordo entre a República
Portuguesa e a Universidade das Nações Unidas relativo à Criação, Funcionamento e Localização da Unidade
Operacional de Governação Eletrónica Orientada para Políticas da Universidade das Nações Unidas em
Guimarães, Portugal, assinado em Lisboa, em 23 de maio de 2014, que baixa à 2.ª Comissão com conexão à
8.ª;
Projetos de lei n.os
1007/XII (4.ª) — Procede à alteração da designação da Freguesia União das Freguesias
de Lagos (São Sebastião e Santa Maria), no município de Lagos, para São Gonçalo de Lagos (PS, PSD, CDS-
PP e BE), que baixa à 11.ª Comissão, 1008/XII (4.ª) — Regime jurídico da modernização de centros de
recolha oficial de animais e dos serviços municipais de veterinária (PCP), 1009/XII (4.ª) — Pela reposição das
35 horas de trabalho semanal na Administração Pública (Os Verdes), 1010/XII (4.ª) — Proíbe e regulariza o
recurso a contratos emprego-inserção e contratos emprego-inserção + (BE), 1011/XII (4.ª) — Criar um
orçamento que não imponha mais austeridade ao País (nona alteração à Lei n.º 91/2001, de 20 de agosto —
Lei de Enquadramento Orçamental) (BE) e 1012/XII (4.ª) — Proibição do abate compulsivo de animais nos
centros de recolha (BE);
Apreciações parlamentares n.os
146/XII (4.ª) — Relativa ao Decreto-Lei n.º 86/2015, de 21 de maio, que
define o regime jurídico da formação médica especializada com vista à obtenção do grau de especialista e
estabelece os princípios gerais a que deve obedecer o respetivo processo (PCP), 147/XII (4.ª) — Relativa ao
Decreto-Lei n.º 92/2015, de 29 de maio, que cria o sistema multimunicipal de abastecimento de água e de
saneamento do Centro Litoral de Portugal, constitui a sociedade Águas do Centro Litoral, SA, e atribui-lhe a
concessão da exploração e da gestão do sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento
do Centro Litoral de Portugal, 148/XII (4.ª) — Relativa ao Decreto-Lei n.º 93/2015, de 29 de maio, que cria o
sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento do Norte de Portugal, constitui a
sociedade Águas do Norte, SA, e atribui-lhe a concessão da exploração e da gestão do sistema multimunicipal
de abastecimento de água e de saneamento do Norte de Portuga e 149/XII (4.ª) — Relativa ao Decreto-Lei n.º
94/2015, de 29 de maio, que cria o sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento de
Lisboa e Vale do Tejo, constitui a sociedade Águas de Lisboa e Vale do Tejo, SA, e atribui-lhe a concessão da
exploração e da gestão do sistema multimunicipal de abastecimento de água e de saneamento de Lisboa e
Vale do Tejo.
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, vamos entrar no primeiro ponto da ordem do dia,
que consta, como já referi, da discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 335/XII (4.ª) — Transpõe a
Diretiva n.º 2013/11/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de maio de 2013, sobre a resolução
alternativa de litígios de consumo, estabelece o enquadramento jurídico dos mecanismos de resolução
extrajudicial de litígios de consumo.
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.
A Sr.ª Ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A proposta
de lei n.º 335/XII (4.ª) tem por objeto transpor para a ordem jurídica nacional a Diretiva n.º 2013/11/UE, do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de maio de 2013, sobre a resolução alternativa de litígios de
consumo.
Por um lado, vem estabelecer os princípios e as regras a que deve obedecer o funcionamento das
entidades de resolução alternativa de litígios de consumo, designadas por entidades RAL (resolução
alternativa de litígios), e, por outro, vem definir o enquadramento jurídico das entidades de resolução
extrajudicial de litígios de consumo em Portugal, que funcionam em rede, concretamente, dos centros de
arbitragem de conflitos de consumo autorizados pelo membro do Governo responsável pela área da justiça.
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De acordo com o n.º 1 do artigo 2.º, a presente proposta de lei será apenas aplicável aos procedimentos de
resolução extrajudicial de litígios nacionais e transfronteiriços promovidos por uma entidade RAL quando os
mesmos sejam indiciados por um consumidor contra um fornecedor de bens ou prestador de serviços, que
respeitem obrigações contratuais resultantes de contratos de compra e venda ou de prestação de serviços
celebrados entre um fornecedor de bens ou prestador de serviços e consumidores estabelecidos ou residentes
em Portugal ou na União Europeia.
Importa salientar que se encontram expressamente excluídos do âmbito de aplicação deste diploma os
chamados serviços de interesse geral, sem caráter económico, os serviços de saúde prestados aos doentes
por profissionais do setor, para avaliar, manter ou reabilitar o seu estado de saúde, e os prestadores públicos
de ensino complementar ou superior, os litígios de fornecedores de bens ou prestadores de serviços contra
consumidores e os procedimentos apresentados por consumidores junto de serviços de reclamações, ou de
natureza equiparada, dos fornecedores de bens, prestações de serviços ou autoridades reguladas
sectorialmente competentes, geridos pelos próprios.
Para além disso, estabelecem-se requisitos que harmonizam os meios de RAL: a conciliação, a mediação e
a arbitragem. Por outro lado, as entidades estabelecidas em território nacional que pretendam promover a
resolução de litígios de consumo através de um procedimento RAL podem solicitar a sua inscrição na lista de
entidades RAL, devendo esta lista ser comunicada à Comissão Europeia até 9 de janeiro de 2016.
Sr.as
e Srs. Deputados, ainda em matéria de arbitragem institucionalizada, a verdade é que se prevê que,
na instrução de pedidos de criação dos novos centros de arbitragem de conflitos de consumo, se deverá
pronunciar a Direção-Geral do Consumidor, o que é extremamente importante para o reforço dos direitos
destes cidadãos.
Em suma: a transposição desta Diretiva proporciona uma oportunidade para a adoção de um
enquadramento jurídico mais consistente e mais sistemático, a bem do cidadão e a bem do consumidor.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Entretanto, assumiu a presidência a Presidente, Maria da Assunção Esteves.
A Sr.ª Presidente: — Sr.ª Ministra da Justiça, aproveito para a cumprimentar, bem como à Sr.ª Secretária
de Estado dos Assuntos Parlamentares.
A Mesa ainda não regista inscrições, pelo que peço aos grupos parlamentares o favor de inscreverem os
seus Deputados para podermos prosseguir o debate.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Simões Ribeiro.
O Sr. Paulo Simões Ribeiro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.ª Secretária de Estado,
Sr.as
e Srs. Deputados: A resolução dos litígios de consumo sempre mereceu uma especial atenção por parte
desta bancada. Aliás, não queria deixar de recordar que foi durante um Governo do PSD que a resolução
extrajudicial de litígios conheceu os primeiros desenvolvimentos em Portugal, sendo que foi em 1989 que foi
estabelecido o primeiro centro de arbitragem de conflitos de consumo.
De facto, a resolução extrajudicial de conflitos de consumo é extremamente importante por ser acessível,
célere e de custos muito reduzidos, ou gratuita, em alguns casos, permitindo a desjudicialização do exercício
da justiça, para além da prestação de informação jurídica aos consumidores, antes do recurso à conciliação, à
mediação e à arbitragem.
A aprovação da Diretiva n.º 2013/11/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de maio de 2013,
sobre a resolução alternativa de litígios de consumo, reafirmou a importância da proteção dos interesses
económicos dos consumidores europeus, mediante o recurso a mecanismos alternativos de justiça.
É esta Diretiva que o Governo pretende transpor para a ordem jurídica interna, sendo, aliás — e não quero
deixar passar isto em claro —, um dos primeiros Governos europeus a fazê-lo, pelo que não quero deixar de
cumprimentar o Governo e, em particular, a Sr.ª Ministra da Justiça.
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Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Paulo Simões Ribeiro (PSD): — Nesta iniciativa legislativa estabelecem-se requisitos de qualidade
harmonizados para as entidades de resolução alternativa de litígios e para os seus procedimentos, a fim de se
assegurar que, após a sua aplicação, os consumidores tenham acesso a mecanismos extrajudiciais de
resolução de elevada qualidade, transparentes, eficazes e equitativos, independentemente do lugar da União
Europeia em que residam, contribuindo para o bom funcionamento do mercado interno.
Propõe-se ainda a criação da rede de arbitragem de consumo, que integra os centros de arbitragem de
conflitos de consumo autorizados para prosseguir as atividades de informação, de mediação, de conciliação e
de arbitragem destes litígios, promovendo o funcionamento integrado destas entidades e a adesão a uma
mesma lógica de funcionamento, com a utilização de sistemas comuns e a implementação de procedimentos
uniformes.
Sendo a resolução alternativa de litígios um exercício desjudicializado da justiça, que permite alcançar
soluções extrajudiciais de conflitos de consumo, para o PSD, faz todo o sentido transpor esta Diretiva para o
nosso ordenamento jurídico e, assim, contribuir para o aumento da confiança dos consumidores e dos
profissionais e para o desenvolvimento do mercado comum.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.as
e
Srs. Deputados: Invoca-se a Diretiva n.º 2013/11/UE, reforçando-se a proteção dos consumidores europeus
com recursos a meios alternativos de justiça e estabelecendo-se, assim, requisitos para as entidades na
resolução alternativa de litígios e, ao mesmo tempo, de procedimentos.
Neste sentido, propõe-se a criação de uma rede de arbitragem de consumo, envolvendo os centros de
arbitragem, numa lógica comum de funcionamento, e abrindo, ao mesmo tempo, o seu âmbito, com exceção,
como a Sr.ª Ministra já aqui salvaguardou, da saúde, da educação e dos serviços de interesse geral não
económico, embora esta formulação tenha sido considerada por alguns, como sabe, razoavelmente imprecisa
e talvez possa ser melhorada.
Sem prejuízo de outras alterações propostas feitas por entidades consultadas, algumas das quais já foram
integradas nesta iniciativa, subsistem algumas reservas, nomeadamente em relação ao artigo 10.º — Eficácia
e acessibilidade dos procedimentos de resolução alternativa de litígios, onde se deveria incluir a previsão, pelo
menos, de uma taxa máxima relativa às questões da arbitragem e a previsão clara da gratuitidade para a
negociação e para a mediação.
No artigo 11.º — Recusa de tratamento de um litígio,apesar de algumas correções já integradas, mantém-
se alguma discricionariedade das entidades ou mesmo a não definição dos limites previsíveis nas alíneas b) e
d), pelo que pensamos que esta é uma matéria a corrigir.
Relativamente aos artigos 8.º — Independência e imparcialidade e 9.º — Transparência, estes são
princípios muito corretos, que só podemos saudar, mas colocamos o problema de fundo que é o do modelo do
financiamento para garantir todos estes requisitos.
De facto, foram encerrados vários centros de informação autárquica ao consumidor por falta de meios e
uma das questões que subsiste nesta iniciativa é, de facto, o modelo de financiamento que pode sustentar e
validar os princípios e as normas aqui consagradas.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.
O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.as
e Srs.
Deputados: Se há países europeus a justificar uma normalização, a justificar esta Diretiva, Portugal não está aí
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incluído, na medida em que o sistema português é, praticamente, idêntico ao que a Diretiva vem, hoje, impor
com harmonização mínima aos diferentes países.
Portugal tem vindo a ser dotado há muitos anos de um sistema que, hoje, é o que praticamente foi acolhido
em termos europeus nesta Diretiva. É um sistema que funciona bem, é um sistema de baixo custo, é um
sistema célere e é um sistema que permite desviar dos tribunais processos que podiam vir a avolumar o
trabalho fundamental dos tribunais.
No entanto, há três pontos que, pela nossa parte, justificariam, até porque estamos perante uma
harmonização mínima, que o Governo interviesse nesta área.
O primeiro ponto tem a ver com o financiamento público destes centros, sendo que, pelo menos, devia
estar aqui previsto qual é o critério. Hoje, é vulgar haver um financiamento por parte da justiça, outro
financiamento por parte da economia, sem sabermos o critério que justifica a valorização desse tipo de
financiamento. O Estado tem aqui um papel importante e, numa lei com esta dignidade, justificar-se-ia que
houvesse, pelo menos, uma norma relativamente ao comprometimento do Estado e ao seu critério.
Um segundo ponto tem a ver com a obrigação de o Estado garantir a intervenção em todo o território
nacional supletivamente. Sempre que, em razão da área geográfica, haja zonas não cobertas, isso vai criar
situações em que há consumidores que podem utilizar este sistema e há outras que só ficam com o recurso
para tribunal.
Então, justificar-se-ia que o Estado tivesse aqui um papel importante para garantir que, supletivamente nas
áreas do País não cobertas, houvesse uma intervenção, quer através da Direção-Geral da Política de Justiça
quer através da Direção-Geral do Consumidor, no sentido de garantir que todo o território nacional estivesse
coberto. Hoje, em alguns casos, não é assim, porque há ainda um sistema, mas pode vir a aconteceu que haja
zonas do País não cobertas.
Por último, Sr.ª Ministra, o artigo 24.º — Norma transitória, pela nossa parte, deveria ser melhorado, na
medida em que darmos garantias aos atuais centros de arbitragem, centros de mediação ou centros de
informação de que o expediente era de transição para este sistema, que seria um sistema fluído, sem custos e
com reduzida burocracia, e, agora, torná-lo numa nova inscrição, possivelmente com algumas taxas, parece-
nos que é desadequado.
Por isso, o artigo 24.º devia ser melhorado no sentido de que essa transição se fizesse quase
automaticamente, com uma fiscalização a posteriori.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.as
e Srs. Deputados: As objeções
que temos a esta proposta de lei não são tanto quanto a este ou àquele aspeto da proposta de lei, nem à
forma como ela está redigida, são objeções relativamente à opção de fundo, e essas a Sr.ª Ministra também já
as conhece.
Não partilhamos dessa euforia, que não é exclusiva deste Governo, pois já Governos anteriores, do Partido
Socialista, a partilhavam relativamente aos mecanismos de resolução alternativa de litígios, e não partilhamos
dessa euforia relativamente aos resultados que pode produzir sobretudo em relações desequilibradas entre as
partes.
Estamos a tratar, neste momento, de uma proposta de lei que cuida das relações estabelecidas entre
particulares e fornecedores de bens ou serviços, aliás, particulares que não atuem no âmbito da sua atividade
comercial. É esta a definição de consumidor que está prevista nesta proposta de lei e que, necessariamente,
não é uma relação equilibrada.
Na verdade, uma relação entre um particular e um fornecedor de bens ou serviços é uma relação
particularmente desequilibrada, até porque o quadro dos conflitos de consumo que hoje se colocam é, muitas
vezes, de alguma massificação até dos meios que se utilizam para a celebração/concretização da relação de
comércio.
O problema que está aqui criado, Sr.ª Ministra, é que os mecanismos de resolução alternativa de litígios
são mecanismos que não implicam, pelo contrário admitem o afastamento da aplicação da lei para a utilização
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de outras regras. De resto, ainda há uns tempos, tivemos a discussão da proposta de lei sobre a arbitragem
voluntária em que essa era uma das questões que era colocada.
Agora, temos aqui um problema: é que nós somos, sucessivamente, confrontados com a discussão e a
aprovação de leis que têm como objetivo proteger os direitos dos consumidores e assegurar determinados
tipos de garantias mínimas. Aliás, aprovámos algumas leis, uma delas em 2012, relativamente, por exemplo,
ao comércio eletrónico, que visava defender os consumidores no âmbito do comércio eletrónico,
estabelecendo um conjunto de requisitos e de garantias mínimas relativamente ao recurso de mecanismos
eletrónicos para a celebração de relações de comércio, mas a verdade é que, depois, somos confrontados
com um sistema de desjudicialização que pode conduzir ao afastamento dessas leis que são aprovadas para a
defesa do consumidor.
Portanto, este é mais um argumento que nos faz desconfiar muito destes fundamentos, que, de resto, já
aqui foram trazidos pelo PSD, quanto às vantagens da desjudicialização e às vantagens da insistência nos
mecanismos de resolução alternativa de litígios.
Continuamos a considerar que se a lei defende os consumidores, os conflitos que resultam do consumo
devem ser discutidos nos tribunais que aplicam essas leis que defendem os consumidores, e a resposta, Sr.
Deputado Paulo Ribeiro, é que se os tribunais são mais caros, então, reduzam as custas; se os tribunais
demoram mais tempo, então, reforcem os meios da justiça; se os tribunais são de mais difícil acesso pelas
populações, então, não encerrem tribunais e permitam às populações, neste caso aos consumidores, um
acesso mais facilitado aos tribunais para poderem fazer valer as leis que pretendem defender os direitos dos
consumidores.
Remetermos os conflitos do consumo para mecanismos de resolução alternativa de litígios, que não
preveem ou não garantem a aplicação dessas leis que defendem os direitos dos consumidores, não é uma
boa forma de dizer que se pretende defender os direitos dos consumidores.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Anjinho.
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP). — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.as
e Srs.
Deputados: Temos assistido, de facto, nos últimos anos, a um claro desenvolvimento dos meios de resolução
alternativa de litígios, sendo certo que é na área do consumo que a sua implementação se tem feito sentir com
maior acuidade, atribuindo-se mesmo precedência à mesma no seu desenvolvimento.
Ora, com o presente diploma, que se consubstancia, como todos bem sabem, na transposição de uma
diretiva, consagra-se, assim, o enquadramento jurídico dos mecanismos de resolução extrajudicial de litígios
de consumo.
Uma leitura da Diretiva permite-nos perceber os vários objetivos subjacentes à sua aprovação: desde o
atenuar das disparidades existentes nos Estados-membros ao nível da cobertura, da qualidade e da
divulgação da resolução alternativa de litígios, procurando eliminar essa barreira às compras além-fronteiras,
até ao objetivo de eliminar a desvantagem concorrencial para os comerciantes estabelecidos em Estados-
membros onde não existe acesso suficiente a estes procedimentos, passando pela intenção de criar um ponto
único de entrada para a resolução extrajudicial de litígios on line, através de entidades de resolução alternativa
de litígios, que passam a estar interligadas numa plataforma, podendo, deste modo, desempenhar as suas
funções com qualidade em toda a União Europeia.
Em suma, procura-se, de facto, valorizar e implementar regras harmonizadas de imparcialidade,
independência e transparência, como disse a Sr.ª Deputada Cecília Honório, bem como mecanismos de
celeridade, acessibilidade e de equidade nos procedimentos.
Por isso mesmo, concordamos com o Conselho Superior da Magistratura (CSM), quando diz que a União
Europeia procurou, sem dúvida, reforçar a confiança dos consumidores no mercado interno, nomeadamente
no que diz respeito ao comércio eletrónico, e concretizar o potencial e as oportunidades do comércio
transfronteiriço e online.
Reconhecemos, naturalmente, a existência de críticas, as quais incidem, essencialmente, nos mecanismos
alternativos de resolução de litígios, aliás, disso deu nota a intervenção do Sr. Deputado João Oliveira.
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Mas, em relação a essas críticas, não tenho dúvidas em afirmar que estes mecanismos, que, nuns casos,
concorrem e, noutros, complementam a atividade dos tribunais, se apresentam como um novo caminho para a
realização do direito de acesso à justiça, não pondo de forma alguma em causa a validade, necessidade e
adequação do processo judicial.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Mais: os processos RAL, ou seja, de resolução alternativa de litígios,
pelas suas características de informalização, de procura do acordo, de celeridade, de custo tendencialmente
mais reduzido e de menor estigmatização pessoal e social, são procedimentos favoráveis a uma maior procura
de tutela jurídica por parte dos cidadãos, que, muitas vezes, não se reveem no modelo clássico de tribunais e
acabam mesmo por não reagir perante as agressões dos seus direitos.
Por isso, ao garantir o acesso à justiça, estes mecanismos contribuem, de facto, para o reforço da
cidadania e do Estado de direito.
Dito isto, e sem prejuízo de eventuais alterações de especialidade, mormente dirigindo-se a clarificações
que poderão, eventualmente, fazer sentido ou responder mesmo às dúvidas que aqui se fizeram sentir, vou
terminar dizendo que não se pode deixar de reconhecer, nesta sede, o contributo muito positivo das soluções
que foram encontradas, tanto na salvaguarda dos direitos do consumidor, em sede de resolução alternativa de
litígios, como na justiça e na adequação dos procedimentos gizados.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Sr.ª Presidente, antes de mais, os meus cumprimentos.
Sr.ª Deputada Cecília Honório, desde 1985 que existe uma rede deste tipo de centros.
Tomei boa nota das suas reflexões e quero dizer-lhe que, naturalmente, há abertura para esclarecer todas
essas dúvidas, que, creio, são dúvidas surgidas em virtude de uma não compaginação com outros meios
alternativos de resolução de litígios, regimes-base que já aprovámos.
Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, os critérios estão exatamente aqui.
Por fim, Sr. Deputado João Oliveira, caso não se tenha dado nota, isto são duas decisões-quadro de
adaptação. No mais, reiteramos, naturalmente, toda a disponibilidade para o esclarecimento de quaisquer
dúvidas que possam surgir.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por concluído o debate, na
generalidade, da proposta de lei n.º 335/XII (4.ª), agradecendo a presença dos membros do Governo.
Seguimos para o segundo ponto da nossa ordem de trabalhos, com a apreciação, também na
generalidade, da proposta de lei n.º 337/XII (4.ª) — Aprova o regime jurídico da transmissão e execução de
sentenças em matéria penal que imponham penas de prisão ou outras medidas privativas da liberdade, para
efeitos da execução dessas sentenças na União Europeia, bem como o regime jurídico da transmissão e
execução de sentenças e de decisões relativas à liberdade condicional para efeitos da fiscalização das
medidas de vigilância e das sanções alternativas, transpondo as Decisões-Quadro n.os
2008/909/JAI, do
Conselho, e 2008/947/JAI, do Conselho, ambas de 27 de novembro de 2008.
Para apresentar a proposta de lei, tem, novamente, a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Sr.ª Presidente, Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados: Estamos, novamente, no
âmbito da cooperação judiciária internacional, que tanta falta faz em tempos em que os crimes económicos em
geral exigem o reforço dessa cooperação.
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Nesta proposta de lei, procede-se à introdução de um novo mecanismo de cooperação judiciária
internacional em matéria penal, assente no reconhecimento mútuo e garantindo o respeito pelos direitos
inerentes ao processo penal.
Assim, quando seja proferida uma sentença condenatória criminal num Estado-membro da União Europeia,
a pena aplicada ao arguido pode ser executada noutro Estado-membro, mediante um procedimento
específico, simples e célere, consistente na transmissão direta entre autoridades judiciárias, no estrito respeito
pelo princípio da separação de poderes. O mesmo sucede com as decisões relativas à concessão de
liberdade condicional.
O procedimento é dotado de todas as garantias, devendo a solicitação ser acompanhada da certidão da
decisão judicial cuja execução se pretende e constituindo condição indispensável o consentimento do
condenado.
Relativamente às decisões judicias que sejam enviadas a Portugal para a sua execução, é aferida, em
sede de procedimento de reconhecimento, a sua conformidade com os princípios fundamentais em matéria
penal, devendo verificar-se, designadamente, se os factos em causa também constituem crime à luz da lei
portuguesa e se a pena não se encontra prescrita. Caso se constate que esses princípios não se mostram
respeitados, é recusado o reconhecimento da decisão judicial.
Sendo reconhecida a sentença, procede-se, então, à sua execução, estabelecendo-se que a mesma deve
ocorrer no estabelecimento prisional mais próximo do local da residência ou da última residência em Portugal
do condenado.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: As peças deste processo encaixam-se de molde a desenhar um
espectro largo e abrangente no plano da justiça criminal, especialmente no que respeita, insisto, à cooperação
judiciária internacional, mostrando-se já regulados os procedimentos tendentes à transmissão entre os
Estados-membros da União Europeia do mandado de detenção europeu, bem como das decisões que
apliquem medidas de coação.
A possibilidade da transmissão das sentenças-penas e das sentenças relativas à liberdade condicional
completa este quadro.
Um longo caminho tem vindo a ser percorrido, com vista à criação de um espaço de liberdade, de
segurança e de justiça, cuja pedra angular tem sido sempre o respeito pelos direitos fundamentais. Na base de
tudo isto encontra-se sempre a eminente dignidade do ser humano.
A presente proposta de lei tem uma matriz profundamente humanista, pois permite que as medidas de
coação sejam exercidas no território de residência, não implicando deslocalizações e desinserções sociais
desnecessárias. É para isto, Srs. Deputados, que peço, naturalmente, os vossos contributos, seguindo sempre
esta matriz profundamente humanista.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Andreia Neto.
A Sr.ª Andreia Neto (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.ª Secretária de Estado dos
Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Sr.as
e Srs. Deputados: Traz hoje o Governo à discussão a
transposição de duas decisões-quadro do Conselho Europeu.
Sr.as
e Srs. Deputados: Têm sido muitas as diretivas comunitárias e as decisões-quadro transpostas pela
mão deste Governo e, por isso, saudamos o esforço que tem sido feito neste sentido.
No caso em apreço, é importante, desde já, realçar o cumprimento do princípio do reconhecimento mútuo
como um elemento da cooperação judiciária em matéria penal na União Europeia, bem como o respeito pelos
direitos humanos, pelas liberdades fundamentais do Estado de direito.
É imperioso que, no espaço comum europeu, exista uma harmonização dos conceitos de liberdade, de
segurança e de justiça.
Sr.ª Ministra, Sr.as
e Srs. Deputados: Sendo a Europa um espaço comum e globalizado, os problemas,
necessariamente, tendem a procurar soluções semelhantes, tanto mais quanto estamos a falar de direitos,
liberdades e garantias.
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A Comunidade Europeia, com a sua política a este nível, iniciou um procedimento com a adoção destas
decisões-quadro relativas a um quadro regimental comum de um conjunto de instrumentos, numa política
europeia de cultura judiciária, com vista a facilitar e a tornar mas fluida a cooperação judiciária entre os
Estados-membros.
Sr.as
e Srs. Deputados: Estando, ao falar de matéria tão sensível como a da cidadania, o Grupo
Parlamentar do PSD saúda o reforço vertido na transposição destas decisões-quadro através destes dois
importantes instrumentos de integração e de cooperação europeia em matéria judiciária penal.
O Grupo Parlamentar do PSD congratula-se, assim, neste enquadramento, com a adoção de um
procedimento inerente ao reconhecimento e execução de sentenças e decisões em matéria penal, não só
relativamente ao cumprimento da pena e execução de sentenças e decisões em matéria penal, ao
cumprimento de pena ou medida privativa de liberdade, como também no que concerne à pena de prisão
suspensa na sua execução e à liberdade condicional.
Estaremos também disponíveis para debater o assunto na especialidade, de forma a contribuir para um
eventual aprofundamento do debate.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, a Mesa aguarda alguns instantes pela inscrição de mais Srs.
Deputados.
Pausa.
Peço aos grupos parlamentares o favor de inscreverem os seus oradores, de modo a prosseguirmos o
debate.
Pausa.
Srs. Deputados, não sei se podemos, desde já, presumir que não há mais oradores…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, peço desculpa, permite-me o uso da palavra?
A Sr.ª Presidente: — Afinal, não podemos presumir, porque sempre há mais um orador.
Tem a palavra, Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.as
e Srs. Deputados: Para
quebrar este impasse, quero dizer que, relativamente a esta matéria, há uma concordância genérica da parte
do PCP com os objetivos que esta proposta de lei visa.
De resto, julgamos que, por via do reforço da cooperação judiciária internacional, do aperfeiçoamento dos
seus mecanismos, com algumas referências que já foram feitas neste debate ao espaço que há ainda para
aperfeiçoar e melhorar esses mecanismos de cooperação judiciária internacional, muitos destes problemas
poderão ser, certamente, ultrapassados, dispensando os mecanismos que estão previstos nessa lei. Aliás,
atrevia-me mesmo a dizer que a dispensa da utilização dos mecanismos que estão previstos nesta lei seria o
melhor exemplo e a melhor realidade com que estaríamos confrontados, porque isso significaria que, do ponto
de vista da cooperação judiciária internacional, tudo funcionaria sem que tivéssemos de recorrer a outro tipo
de soluções.
Mas quero dizer-lhe, Sr.ª Ministra, que há alguns aspetos da proposta de lei que nos levantam algumas
dúvidas ou, pelo menos, a necessidade de alguma discussão mais aprofundada em sede de especialidade.
Percebemos que, do anteprojeto até à proposta de lei, o Governo fez algumas alterações, introduzindo,
inclusivamente, algumas das matérias que tinham sido sinalizadas nos pareceres que anteriormente tinham
sido pedidos, nomeadamente naqueles que foram apontados pela Procuradoria-Geral da República e pelo
Conselho Superior do Ministério Público, relativamente ao projeto de proposta de lei, mas há alguns aspetos
que, julgamos nós, ainda devem ser melhor considerados, designadamente aquele que tem a ver com o
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consentimento, com a necessária articulação entre as normas que exigem o consentimento, que determinam
as condições em que esse consentimento deve ser obtido e aquelas outras que determinam a dispensa do
consentimento ou a consagração do mecanismo do consentimento tácito, quando não há resposta por parte
de quem é dirigido esse pedido de consentimento.
Portanto, julgamos que, em relação àquilo que está previsto, por exemplo, no n.º 1 do artigo 8.º ou no n.º 4
do artigo 10.º, há necessidade de articular esses vários mecanismos para que, sobretudo, a consideração que
é colocada relativamente à resposta dada pelo Estado a quem se dirige o pedido possa ser compatibilizada
com aquele pedido de consentimento e a resposta, ou a falta de resposta, de consentimento.
Por outro lado, Sr.ª Ministra, há um aspeto que nos parece que deve ser, de facto, melhor ponderado,
apesar de esse alerta ter sido feito no parecer do Conselho Superior do Ministério Público e de o Governo ter
introduzido, no texto da proposta de lei, algumas preocupações que se prendem com esta questão da medida
de coação da detenção provisória ou de medidas que correspondam a uma limitação da liberdade dos
cidadãos. Ainda assim, julgamos que têm de ser consideradas, mais em pormenor, as exatas implicações
desta previsão, sob pena de poder aqui haver, eventualmente, um confronto com aquilo que está determinado
na Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 27.º, nomeadamente, em relação às situações
excecionais em que os cidadãos podem ser privados da sua liberdade. Isto porque julgamos que a natureza
excecional da medida de coação, no caso da detenção provisória, deve ser efetivamente compatibilizada com
os requisitos, traduzidos em parte no nosso Código de Processo Penal, a propósito de um processo que está
em fase de inquérito e que têm, naturalmente, de ser considerados de forma diferenciada, caso haja uma
sentença que vai ser executada.
Julgamos que estes aspetos não são tão pouco melindrosos quanto isso. Portanto, na especialidade,
procuraremos que algumas destas dificuldades possam ser ultrapassadas, para que os objetivos de fundo que
presidem a esta iniciativa possam ser, de facto, alcançados.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Anjinho.
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados:
Através da proposta de lei que, hoje, discutimos, e que essencialmente se consubstancia na transposição de
duas Decisões-Quadro do Conselho, pretende o Governo, como bem percebemos, aprovar o regime jurídico
da transmissão e execução de sentenças, em matéria penal, que imponham penas de prisão ou outras
medidas privativas da liberdade, para efeitos da execução dessas sentenças na União Europeia, bem como o
regime jurídico da transmissão e execução de sentenças e de decisões relativas à liberdade condicional, para
efeitos da fiscalização das medidas de vigilância e das sanções alternativas.
No essencial, o que se pretende aqui consagrar, em forma de lei, é o princípio do reconhecimento mútuo —
como, aliás, foi aqui bem referido pela Sr.ª Deputada Andreia Neto — com base na confiança recíproca
estabelecida entre os Estados-membros,…
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — … garantindo, paralelamente, o respeito pelos direitos inerentes ao
processo penal.
O diploma afasta a necessidade de revisão e confirmação da sentença penal estrangeira, passando a
aplicar a estes casos um procedimento específico, mais simples, mais célere, ainda que plenamente
garantístico dos direitos individuais.
Digno de nota: prevê-se na proposta de lei um conjunto de infrações que, como disse a Sr.ª Ministra na sua
intervenção, tendo-se por verificadas nas decisões que são reconhecidas e executadas, permitem o
afastamento do requisito da dupla incriminação do facto, contanto que puníveis com pena privativa de
liberdade de duração máxima não inferior a três anos.
A cooperação judiciária entre os Estados, no quadro específico da União Europeia, atinge um elevado nível
de integração, que pode ser explicado pelas próprias características da construção europeia. A livre circulação
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de mercadorias, capitais, serviços e pessoas criou, de facto, um espaço sem fronteiras internas; e, em
consequência, foi estabelecido — na Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen, de 1990, mas que,
depois, naturalmente, teve o seu seguimento —, conjuntamente com a supressão do controlo nas fronteiras
internas, um conjunto de medidas compensatórias, incluindo o incremento da cooperação policial e judiciária
em matéria penal.
Mais: a própria União Europeia, desde a entrada em vigor do Tratado de Amesterdão, procura também a
manutenção e o próprio desenvolvimento de um espaço de liberdade, segurança e justiça, objetivo que, aliás,
depois da adoção do Tratado de Lisboa, tem, no elenco dos objetivos fundamentais da União Europeia,
precedência sobre o estabelecimento do mercado interno.
Ora, a criação deste espaço europeu comum tem como consequência inevitável o abdicar, por parte dos
Estados, de algumas prerrogativas tradicionalmente contidas no núcleo de soberania. É esta, aliás, a génese
da cooperação judiciária em matéria penal: uma alteração de paradigma que apenas se justifica pelo facto de
os Estados terem considerado que podem confiar uns nos outros e nas instituições da União Europeia.
A base para esta confiança mútua é, aliás, reconhecida, como tal, numa importante disposição, o artigo 2.º
do Tratado da União Europeia, que nos relembra, de facto, valores comuns, como sejam o da dignidade
humana, o da liberdade, o da democracia e o da igualdade, e só ela possibilita também o atual nível de
cooperação entre os Estados, em matérias tão fortemente ligadas à sua soberania.
O princípio fundamental em que assenta a cooperação judiciária em matéria penal é,tal como previsto no
artigo 82.º, n.º 1, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, o reconhecimento mútuo das
sentenças e decisões judiciais dos Estados-membros. Sem este princípio, a cooperação judiciária em matéria
penal não conseguiria, sem dúvida, atingir os objetivos que a justificam. E, a esse respeito, há, de facto, uma
nota digna de se fazer nesta sede, que é um importante elemento que caracteriza a cooperação judiciária, ou
seja, a abolição, em relação a certos domínios da criminalidade, da exigência da dupla incriminação.
A abolição do controlo da dupla incriminação é uma medida compensatória — como, aliás, há pouco referi
— da supressão do controlo nas fronteiras, sendo que o intuito é, de facto, fortalecer o direito penal de cada
Estado-membro, impedindo que um agente possa utilizar em seu proveito a existência de diferentes sistemas
jurídicos para cometer crimes e não ser punido.
Vou terminar, dizendo que não ignoramos que, paralelamente a uma concordância generalizada, existem
reparos formulados pelas entidades que foram ouvidas pelo Governo. Todavia, segue-se agora uma fase de
especialidade onde, estou certa, os mesmos serão devidamente escrutinados e respondidos, em nada
obstando a uma apreciação, naturalmente muito positiva, que fazemos das normas em discussão, em nome,
aliás, do valor da dignidade da pessoa humana.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Dou, agora, a palavra à Sr.ª Deputada Cecília Honório.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo: Com esta proposta de lei
traduz-se o princípio do reconhecimento mútuo da cooperação judiciária, em matéria penal, no espaço da
União Europeia, consagrado, aliás, em inúmeros instrumentos, a começar pelo próprio Tratado de Lisboa.
E, enfim, deixo uma nota: no modelo de Europa que, pelo menos, para nós, faz cada vez menos sentido
em matérias tão sensíveis, aqui se dá mais um passo em frente na procura de uma cultura judiciária europeia.
Nesse sentido, a transposição destas duas Decisões-Quadro, de 2008, enfim, sendo uma transposição com
atraso, não deixa, do nosso ponto de vista, de ser também sublinhada como uma transposição positiva.
No essencial, o que se procura é a agilização de procedimentos necessários ao reconhecimento e
execução de sentenças e decisões, em matéria penal, em boa parte também afastando o peso da revisão e da
confirmação de sentença penal estrangeira. Deste ponto de vista, e reconhecendo o atraso mas a natureza
positiva da transposição, um acordo global, há também da nossa parte a ressalvar alguns aspetos que foram
anotados nomeadamente pelas entidades consultadas, reconhecendo, mais uma vez, que há um esforço final
na redação de integração de algumas delas.
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A começar, menciono o facto de a transposição ter sido feita em conjunto relativamente a estas duas
matérias, opção que não me parece ter sido seguida por mais nenhum Estado-membro. Não sei se a Sr.ª
Ministra da Justiça quer justificar, de alguma forma, esta opção que levanta algumas dúvidas.
Ao mesmo tempo, há a ambiguidade, já aqui anotada, quanto à questão do consentimento, e temos em
boa nota o Parecer da Procuradoria-Geral da República, que nos parece que deve ser tomado em conta, bem
como a reflexão sobre a necessidade e a persistência do disposto no artigo n.º 45.º.
Por outro lado, acho que não estou enganada se for necessário ponderar um aspeto de contexto.
Ultrapassa-se aqui a limitação da transferência de pessoa condenada com as contingências absolutas,
intransponíveis, do consentimento e do acordo entre Estados interessados. E aqui é preciso levar em boa nota
que, reconhecendo-se, como essencial, que as penas possam ser cumpridas no meio social de origem —
estamos de acordo com esta questão —, também é verdade que há mais reclusos portugueses detidos nas
cadeias da União Europeia do que o inverso. Portanto, há aqui, parece-nos, um dado de contexto que não
deve ser descurado, nesta apreciação.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, pelo PS; tem a palavra a Sr.a Deputada Isabel Oneto.
A Sr.ª Isabel Oneto (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O Partido Socialista concorda,
genericamente, com a proposta de lei que hoje o Governo traz a debate, relativamente à matéria de
transmissão e de execução de sentenças estrangeiras e do reconhecimento também das nossas sentenças no
espaço europeu, precisamente no âmbito da cooperação jurídica internacional, no reforço do espaço de
liberdade, segurança e justiça que é o espaço da União Europeia.
Cumpre salientar o facto de, essencialmente, estar em causa, nestas Decisões-Quadro que aceitam a
execução da sentença em país estrangeiro, a finalidade da reinserção social da pessoa condenada, o que,
creio, é uma matriz que atravessa, hoje, o espaço da União Europeia, e o reconhecimento de que,
relativamente ao fim das penas, ele é um fim comum, sem retirar, obviamente, capacidade a cada Estado-
membro de punir de acordo com a sua legislação, mas fazendo garantir que o fim último da pena é o da
reinserção social da pessoa condenada. Neste sentido, havendo um espaço de partilha da União Europeia,
aprofundá-lo por esta via representa, de facto, o aprofundamento do espaço que queremos de liberdade,
justiça e segurança.
Já aqui foram referidas algumas situações que irão merecer, em sede de especialidade, alguns
aperfeiçoamentos, refletidos dos próprios Pareceres juntos à proposta de lei, e também já refletidos na própria
proposta de lei, que absorveu parte das sugestões feitas nesses pareceres.
Obviamente, quanto à questão do consentimento, acima de tudo, quando consentimento presumido, há
que garantir a sua notificação no sentido de assegurar que, embora o consentimento seja presumido, a pessoa
teve conhecimento dessa notificação.
Também há questões relativas à detenção, matéria que o Partido Socialista vai, em sede de especialidade,
procurar apurar, na medida em que nem sequer está referido na proposta de lei. Refere-se que a pedido do
Estado de emissão é possível proceder à detenção, mas é preciso clarificar em que medida e quais as
formalidades que este pedido deve cumprir.
Em todo o caso, e pese embora o atraso, porque estas Decisões-Quadro já deviam ter sido transpostas
para o direito português no final de 2011, sempre cabe dizer que mais vale tarde do que nunca. E também
nós, aqui, contribuiremos para o aprofundamento do espaço da cooperação internacional judiciária.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de deixar uma palavra de
tranquilidade. Estas transposições têm uma norma-travão de respeito pelos princípios e pelas normas do
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nosso direito penal, processual penal e, claramente, constitucional. Portanto, penso que muitos desses receios
estarão afastados por esta consagração expressa no âmbito desta diretiva.
Srs. Deputados, creio que não há nenhuma dúvida de que quando estão em causa direitos, liberdades e
garantias ou princípios essenciais, como, por exemplo, na autonomia do Ministério Público, não tenho receio,
como aconteceu recentemente em Estocolmo, de votar isolada. E fi-lo, em nome da autonomia do Ministério
Público.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Assim concluímos o debate do segundo ponto da nossa ordem do dia. Agradeço a
presença da Sr.ª Ministra da Justiça.
Prosseguindo, dou as boas vindas aos membros de Governo que já se encontram presentes na Sala para
o próximo debate, a Sr.ª Ministra da Administração Interna e o Sr. Secretário de Estado.
Faremos aqui uma breve pausa, antes de darmos início ao próximo debate.
Pausa.
O ponto seguinte da ordem de trabalhos de hoje consiste na discussão, na generalidade, da proposta de lei
n.º 336/XII (4.ª) — Procede à décima oitava alteração ao Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º
114/94, de 3 de maio.
Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Ministra da Administração Interna.
A Sr.ª Ministra da Administração Interna (Anabela Rodrigues): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados:
A presente proposta de lei introduz a carta de condução por pontos em Portugal.
O Código da Estrada, na sua redação vigente, prevê já a cassação da carta aos infratores reincidentes,
mas o sistema atual é pouco transparente e não permite algumas das reconhecidas vantagens da carta por
pontos, as quais irei sublinhar no decurso desta exposição.
A carta por pontos é a solução adotada pela maioria dos países europeus, onde este sistema se encontra
plenamente consagrado e estabilizado. Este é um regime mais transparente e de fácil compreensão para os
cidadãos, aumentando o grau de perceção e de responsabilização dos condutores face aos seus
comportamentos, o que se traduz — e é essa a experiência dos nossos parceiros europeus que
implementaram a carta por pontos — na redução da sinistralidade rodoviária e consequente melhoria da saúde
pública.
É justo referir que esta proposta resulta, em parte, do trabalho realizado no âmbito da Estratégia Nacional
de Segurança Rodoviária pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, tendo contado ainda com a
participação ativa do grupo consultivo da Estratégia Nacional, o qual é composto por cerca de 50 entidades da
sociedade civil. Foram também ouvidas outras entidades no decurso do processo legislativo, com especial
nota para o parecer do Conselho Superior do Ministério Público, que muito contribuíram para melhorar a
proposta.
Se me permitem, Srs. Deputados, entraria agora no detalhe da proposta.
Propõe-se a atribuição inicial de 12 pontos aos condutores, sendo que os condutores perdem dois ou
quatro pontos pela prática, respetivamente, de contraordenações graves ou muito graves.
A condução sob o efeito de álcool, acima dos limites legais, ou de substância psicotrópica tem um regime
diferenciado pela particular e muito negativa contribuição para a sinistralidade rodoviária. Lembro, Sr.as
e Srs.
Deputados, que, em 2013, cerca de 1/3 dos condutores vítimas mortais em acidentes rodoviários apresentou
uma taxa de álcool no sangue superior ao legalmente admitido. As contraordenações rodoviárias desta
natureza, graves ou muito graves, implicam a perda de três ou cinco pontos, respetivamente.
A possibilidade de extinguir contraordenações rodoviárias permite, e permitirá no futuro, orientar o sistema
da carta por pontos para penalizar, em especial, aqueles comportamentos que mais contribuem para a
sinistralidade rodoviária, permitindo também, desta forma, a maior consciencialização dos condutores para os
perigos na estrada.
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É importante também salientar que, em termos da proposta, os crimes rodoviários passam a ter relevância
para o regime da cassação da carta e implicam a perda de seis pontos. Ainda no que se refere à perda de
pontos, prevê-se um limite de seis pontos para as contraordenações praticadas em cúmulo, exceto quando
esteja em causa a condução sob o efeito do álcool ou substância psicotrópica.
A subtração de pontos ao condutor tem consequências, mas, ao contrário do regime vigente, não se trata
apenas da cassação da carta. Existe uma aposta clara na reabilitação do condutor através da frequência de
ações de formação rodoviária e na realização do novo exame teórico de condução.
Por último, gostaria ainda de sinalizar que os condutores têm a possibilidade de recuperar os pontos
perdidos: por cada período de três anos sem que exista registo de contraordenações graves, muito graves ou
crimes de natureza rodoviária são atribuídos três pontos ao condutor e é importante notar que os condutores
poderão recuperar pontos até ao limite de 15, mais três do que os iniciais. O regime proposto não só penaliza
o mau comportamento na estrada, como beneficia e, portanto, incentiva o bom comportamento.
Prevê-se ainda um regime excecional para os condutores profissionais a quem é permitido recuperar
pontos ao final de dois anos.
Faço apenas mais duas notas finais, antes de terminar. Mantém-se totalmente inalterado o regime das
coimas e das sanções acessórias — não existe qualquer alteração nesta matéria —, as contraordenações
continuam a ser punidas com coima e, quando aplicável, com a sanção acessória de inibição de conduzir.
A proposta prevê a sua entrada em vigor a 1 de junho de 2016, com quase, portanto, um ano de vacatio
legis, porque é importante assegurar o cabal esclarecimento dos cidadãos e dos condutores em particular.
Este prazo alargado permitirá isso mesmo, através do lançamento de amplas campanhas de sensibilização e
esclarecimento por parte do Ministério da Administração Interna, através da Autoridade Nacional de
Segurança Rodoviária.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jorge Fão.
O Sr. Jorge Fão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.ª e Sr. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs.
Deputados: O combate à sinistralidade rodoviária tem de ser, e é, um desígnio nacional. Não temos dúvidas
nenhumas disso.
Esse combate implica a preocupação constante dos decisores políticos e também responsabiliza
constantemente todos os cidadãos. Estamos todos constantemente convocados, enquanto cidadãos, para
este combate e para ajudar a reduzir as consequências da sinistralidade. E temos uma tarefa difícil!
Apesar da grande evolução que temos tido nos últimos anos em Portugal, reduzir o número de acidentes, o
número de mortos e o número de feridos graves tem de continuar, efetivamente, a ser um objetivo de todos
nós. E convém lembrar que, apesar desta evolução, em 2014, no ano passado, ainda ocorreram cerca de 117
000 acidentes nas estradas portuguesas, morreram 480 pessoas e registaram-se perto de 2700 feridos
graves. Isto significa um morto e cerca de seis feridos graves por dia na estrada, com as consequências que
daí advêm.
Portanto, a realidade tem essa dimensão, mas é também mutável e imprevisível.
Veja-se o que está a acontecer em 2015: no período homólogo, de janeiro a 21 de junho, já houve, em
Portugal, mais 2300 acidentes do que no ano passado, mais 64 feridos graves e mais — atenção a esta
questão — 33 mortos do que no ano passado.
As consequências da sinistralidade rodoviária em Portugal constituem, pois, um problema de grande
dimensão, por isso necessita de um combate persistente, aturado. E sobretudo exige, da parte dos decisores
políticos, uma monitorização constante dos dados estatísticos, um estudo aturado dos acidentes no que diz
respeito à avaliação das suas causas para as combater e iniciativa política a vários níveis, desde logo na
promoção de campanhas de sensibilização para alterar o comportamento dos cidadãos no ambiente
rodoviário, no investimento constante e sistemático na melhoria das condições de segurança das
infraestruturas rodoviárias, na modernização do sistema de segurança ativo e passivo dos veículos, numa
fiscalização atuante, mas também pedagógica, compreensiva e eficaz e, sobretudo, num regime sancionatório
que seja ajustado a esta realidade.
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Estamos, pois, convencidos de que é nesse sentido que surge esta proposta de lei para alteração do
Código da Estrada, que tem como primeiro objetivo ajustar um conjunto de normas da última revisão e rever a
sua redação, mas que pretende também introduzir uma alteração ao Código, implementando o regime de carta
de condução por pontos. Esta é a inovação, que significa alterar completamente a redação do artigo 148.º,
aditar o artigo 121.º-A e revogar o artigo 141.º. São estas as principais propostas que o Governo apresenta
nesta alteração.
O sistema de carta por pontos tem mais de 40 anos de experiência na Europa. Começou na Alemanha em
1974, tendo-se seguido na sua implementação a Grécia, a França e, depois, sucessivamente, outros países.
Também há alguns países, como é, por exemplo, o caso da Suécia e da Dinamarca, que não têm este sistema
em vigor. Contudo, a alteração proposta trará a Portugal, cremos, um novo cenário relativamente a esta
matéria.
O Governo entende — e estamos de acordo com isso — que esse sistema aumentará a exigência e a
responsabilidade dos condutores e que lhes permitirá uma monitorização e uma gestão da sua autorização de
condução de uma forma mais eficiente e mais concreta. Por isso, sinceramente, parece-nos que esta iniciativa
deve seguir o seu caminho para discussão na especialidade com a concordância e o voto favorável do Partido
Socialista.
Na discussão da especialidade daremos contributos, sugeriremos algumas pequenas alterações,
solicitaremos alguns pareceres que nos parecem importantes, nomeadamente da Associação de Cidadãos
Automobilizados, do Automóvel Clube de Portugal e da Associação de Escolas de Condução. Com esses
contributos, parece-nos que Portugal passará a dispor de um regime de carta por pontos que será mais um
contributo e mais um passo para reduzir a sinistralidade rodoviária e as suas nefastas consequências.
Tem sido posição do Partido Socialista colaborar nesse processo. Essa é e continuará a ser a sua posição.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Carina Oliveira para uma intervenção.
A Sr.ª Carina Oliveira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as
e Srs.
Deputados: Na carta por pontos, vamos por pontos.
Saudamos e louvamos este Governo pela concretização daquilo que já está expresso na Estratégia
Nacional de Segurança Rodoviária desde 2009, cujo objetivo último é aquele que nos move: salvar vidas na
estrada.
A carta por pontos já existe na maior parte dos países da Europa, em alguns desde 1974, com
especificidades diferentes de país para país.
Desde 1994, que, em Portugal, o regime de carta de condução já é, na sua filosofia e aplicação prática, em
tudo semelhante àquilo que agora se propõe, ou seja, a um determinado número de contraordenações
graves/muito graves e o respetivo cumulativo correspondem sanções e cassação de carta. Agora o que se
fpropõe é apenas traduzir isso em numérico: a cada condutor são atribuídos 12 pontos, às contraordenações
graves/muito graves são subtraídos pontos em função da natureza e do cúmulo de infrações. É um regime
mais intuitivo, mais transparente e de fácil perceção para o condutor, que pode facilmente gerir a sua condição
ao volante.
Deixo uma palavra sobre a penalização acrescida à subtração de pontos em caso de crimes de natureza
rodoviária e por efeito do álcool. Sempre dissemos — e continuaremos a afirmá-lo — que o álcool na estrada
mata. Não hesitaremos em apoiar todas as medidas que forem tomadas no sentido de prevenir e penalizar
este tipo de comportamentos.
Sublinho os efeitos positivos na tradução de comportamentos em pontos positivos. O sistema de premiar
condutores que, durante três anos, tenham cadastro limpo com mais três pontos (até um máximo de 15) é de
justiça para quem anda na estrada a cumprir as regras. É também de justiça que essa diferenciação se faça
para condutores profissionais, baixando esse período para os dois anos de cadastro limpo, em virtude da
frequência com que esses mesmos condutores exercem as suas funções e da probabilidade de autuação por
parte das forças de segurança.
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Deixo uma palavra final, pedindo ao Governo a sensibilidade para as alterações que este Parlamento vai
querer introduzir na especialidade. Espero que todos os partidos, sem exceção, apresentem contributos que
melhorem o panorama da condução em Portugal
Da parte do PSD e do CDS-PP, queremos ver incluída nestas alterações a revalidação de conhecimentos
como forma de aumentar a capacidade de conhecimentos dos condutores e de premiar, ainda que
simbolicamente, esse fator diferenciador e positivo.
Atualmente, a renovação da carta de condução em Portugal é meramente administrativa: vai-se ao médico,
preenchem-se uns papéis e verifica-se que o condutor volta a estar em condições de se meter à estrada. Mas,
muitas vezes, esquecem-se os sinais, as alterações tecnológicas, as mudanças de desenho urbano, que o
contacto de novo com regras e formas dos sinais de trânsito é um contributo que pode ajudar a melhorar a
condução.
Para o PSD a carta de condução tem de ser mais do que um papel que se tem na mão.
A ideia que temos, e que queremos discutir na especialidade com o contributo de todos os partidos neste
Parlamento, seria a de premiar com um simbólico ponto cada condutor que, na revalidação da sua carta de
condução, queira voltar a frequentar, de forma voluntária e a expensas próprias, uma conduta positiva.
Acreditamos que, com esta medida, são mais os ganhos efetivos no comportamento do condutor do que a
importância do ponto na carta.
Tudo o que seja feito para salvar vidas na estrada para nós nunca é demais.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Viegas.
O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.ª e Sr. Secretários de Estado,
Sr.as
e Srs. Deputados: A sinistralidade rodoviária é uma preocupação constante que nos deve levar a
promover eventos de modernização no que diz respeito ao combate às dificuldades que vão surgindo no seio
da segurança rodoviária.
Agir e atualizar os diplomas normativos que dão sustentabilidade ao sistema contraordenacional do Código
da Estrada é, assim, uma meta que deve mobilizar todos os que têm obrigações nas instituições legislativas
nacionais, principalmente de quem tem a tutela da segurança rodoviária.
É isso que agora acontece. O Ministério da Administração Interna está consciente de que o sistema
contraordenacional necessitava de uma modernização que se adequasse às necessidades da segurança e
que permitisse que os condutores olhassem de forma positiva para um sistema que, até hoje, apenas visava
penalizar e punir, sem qualquer deferência positiva para todos aqueles que, com regularidade, cumprem os
preceitos da lei da condução nas estradas.
Legislar é, nas situações em que se corresponde às expectativas dos cidadãos, dar seguimento à
dimensão social que permite que a nossa sociedade aceite e se regule por um conjunto de regras que
representam o direito interno.
O CDS concorda que a aposta do Governo seja feita na prevenção, pois entendemos que essa é a forma
mais eficaz de combater o problema.
Esta nova metodologia de acompanhar as contraordenações ao Código da Estrada penalizará, como
anteriormente acontecia, todos os condutores que tenham cometido infrações. Contudo, o método muda.
Depois da entrada em vigor da lei, quem cometer infrações graves e muito graves será penalizado com a
subtração de pontos ao crédito base de 12 pontos.
Mas — e é aqui que o sistema se torna mais perfeito —, há novidades de caráter pedagógico, inovação
que, aliás, não pode deixar de ser considerada positiva por todos. Agora, sempre que um condutor atinja um
número mínimo de pontos de penalização terá de frequentar obrigatoriamente uma ação de formação, algo
que, sendo levado ao extremo, e no caso de se atingirem pontos negativos, dá direito a cassação da carta.
Mas, e até aqui, tudo é próximo do que acontecia. O que faz sentido destacar nesta medida é que, para lá
da pedagogia por recurso à penalização do infrator, passam a existir pontos positivos para quem tiver
comportamentos positivos.
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Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. João Paulo Viegas (CDS-PP): — Isto é um verdadeiro convite ao bom senso e respeito pelas regras
de trânsito; esta é, na ótica do CDS, uma grande aposta pedagógica que, estamos convictos, contribuirá
positivamente para a melhoria dos comportamentos ao volante.
Sempre que um condutor, durante três anos, tenha um comportamento exemplar será beneficiado com
mais três pontos até um limite de 15 pontos.
Estamos, então, perante uma aposta credível, moderna e que tem também uma sensibilidade legislativa
especial. O Governo, tendo a noção de que estas mudanças têm de ser amplamente divulgadas e explicadas,
decidiu que existiria um período de adaptação até 1 de julho de 2016.
Recordamos, também, que a maioria dos países da União Europeia tem a carta por pontos ou sistema
similar. São exemplo disso a Espanha, a França, a Itália e o Reino Unido, como, aliás, já foram aqui referidos.
Esta medida vai ainda ao encontro de algo que já estava previsto na Estratégia Nacional de Segurança
Rodoviária, e tal como também já foi anunciado, no nosso entender, e na discussão na especialidade, faz
sentido incluir uma proposta para a atribuição de um ponto positivo sempre que na revalidação da licença de
condução esta seja acompanhada por uma atualização de conhecimentos.
Estamos convictos que um condutor atualizado será, certamente, um melhor condutor. Ficamos, por isso,
satisfeitos pelo facto de o Governo ter dado o mote para a modificação do sistema contraordenacional no
Código da Estrada.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Queria
salientar aquilo que poderá não estar tão evidente para alguns mas, durante o processo legislativo para o
Código da Estrada, há cerca de dois anos, essa evidência foi reconhecida por todos.
Dir-se-ia que o regime atualmente em vigor em Portugal já corresponde a uma carta por pontos, mas sem
os pontos. Ou seja, tal como noutros países — e o parecer da Prevenção Rodoviária Portuguesa citava os
casos da Áustria, da Dinamarca, da Finlândia e da Holanda —, já temos esta realidade no registo, nas
consequências das contraordenações graves e muito graves e no correspondente risco de cassação da carta
de condução, com a acumulação de contraordenações.
Portanto, o que faltava era identificar e expressamente colocar os pontos para, de uma forma mais visível,
o cidadão, o condutor e as autoridades terem esse registo e esse conhecimento.
Registamos, entretanto, que, como a Sr.ª Ministra referiu, o Governo acolheu o importante contributo do
Conselho Superior do Ministério Público, designadamente para o artigo 148.º e para a forma de
operacionalizar este tipo de registo e este tipo de consequências, mas há uma palavra que devemos deixar
relativamente às situações relacionadas com a recuperação de pontos, digamos assim, por via da formação,
das ações de validação de conhecimentos, de reciclagem, dir-se-ia, nas escolas de condução. Ora, nesta
altura, é indissociável desse aspeto uma discussão e uma lei que esta Assembleia da República aprovou, com
o nosso voto contra, há pouco mais de um ano, que é o regime jurídico do ensino da condução automóvel,
com o quadro de uma desregulação, de abertura a uma concorrência desigual ou até desleal, com os grupos
económicos a tomarem conta do setor e com os negócios que aí à frente se podem desenhar a propósito
desta matéria. É uma boa ideia que pode resultar num mau quadro resultante das opções políticas que a
montante se tomaram.
O Governo aproveita a oportunidade para propor alguns aperfeiçoamentos pontuais em algumas normas
do Código da Estrada, o que nós podemos perfeitamente equacionar e discutir na especialidade em relação a
casos de zonas de coexistência, matéria contraordenacional, etc.
Para terminar, registamos o facto de o Governo ter ouvido um conjunto de entidades muito relevantes nesta
matéria, com um contributo muito consequente — e que, ainda por cima, até foi acolhido — em matérias
importantes mas, infelizmente, mais uma vez, não teve em conta o contributo, a experiência e a reflexão que
os motoristas profissionais e as suas organizações poderiam trazer a esta discussão. São trabalhadores que
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andam todos os dias na estrada, que enfrentam, quantas e quantas vezes, a fadiga, o risco e muitas vezes o
insuportável sacrifício e que, relativamente a esta matéria, seria importante ouvir.
A Assembleia da República deverá promover essa audição, que é importante termos em conta, até por
causa de situações bem recentes. E não querendo antecipar conclusões de investigações eventualmente em
curso, queremos relembrar que, junto do Sr. Secretário de Estado e do anterior Sr. Ministro, nós, PCP,
colocámos várias vezes a questão da fiscalização, na estrada, ao horário de trabalho e de condução,
fiscalização essa em articulação com as autoridades competentes em matéria de condições de trabalho
relativamente à implicação que tudo isso tem para as vidas humanas, para a segurança na estrada. Hoje em
dia, tudo o que diga respeito à fadiga na condução dos trabalhadores, dos motoristas profissionais, é também
uma matéria que vem para cima da mesa quando falamos de segurança rodoviária.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: É
óbvio que a aplicação de medidas que possam reduzir a sinistralidade é sempre matéria positiva e merecerá o
nosso acompanhamento.
É certo — já foi dito anteriormente, pelo que será redundante repeti-lo — que a questão dos pontos na
carta de condução, estando implicitamente em curso já em Portugal, pode, de facto, melhorar esta
compreensão de que comportamentos perigosos reduzem também a qualidade dos condutores com a redução
dos pontos na sua carta de condução.
Nós compreendemos essa realidade, os exemplos internacionais que existem e essa nova forma de
apresentar a realidade portuguesa já existente. Sabemos que não é a única forma de reduzir a sinistralidade e
que há outras matérias que deveriam acompanhar também estas preocupações, matérias que se prendem
com os condutores, mas também com as infraestruturas. Há ainda muitos pontos negros nas estradas
portuguesas, e esses são fatores relevantes da sinistralidade.
Mas, atendendo às questões dos condutores, às suas atuações e àquilo que é imputável às suas escolhas,
há nesta lei algumas matérias que debateremos na especialidade para podermos perceber como é que o
Governo a concebeu e que abertura tem para podermos também chegar a consenso.
O Governo tem, nesta lei, muita preocupação sobre como retirar os pontos, no fundo sobre quais são as
escolhas que retiram pontos aos condutores. Há uma primeira pergunta que se poderia fazer, que é a de saber
por que é que aqueles comportamentos que mais resultam em acidentes, como por exemplo o excesso de
velocidade, não deveriam ter também um agravamento na retirada de pontos como tem a condução com uma
elevada taxa de alcoolémia, por exemplo. Poderíamos ter essa preocupação e, pelo menos, equacionar se o
Governo estudou ou não esta opção e como é que poderíamos abordar este problema.
Por outro lado, pode-se questionar que mecanismos poderiam existir não pela retirada de pontos, mas pela
obtenção de pontos. Por exemplo, alguém que teve uma condução que levou a excesso de velocidade e por
isso sofreu uma retirada de pontos, se tivesse uma ação de formação ou de sensibilização poderia, por isso,
ter recuperação de pontos? Em que medida é que a poderia ter? Poderíamos até alargar, eventualmente, a
forma de ter essa recuperação de pontos.
No fundo, são estas as matérias que iremos debater na especialidade, deixando claro que não temos uma
visão negativa sobre a proposta de lei. Achamos que ela vai dando passos positivos para podermos ter um
combate fundamental na nossa sociedade, que é o combate à sinistralidade rodoviária, que tantas vidas tem
ceifado no nosso País, e que achamos que não deve ter espaço no nosso futuro.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Concluído este ponto da nossa ordem do dia, prosseguimos com a apreciação do
Relatório Anual de Segurança Interna (RASI).
Serão atribuídos 5 minutos a cada grupo parlamentar, estando já inscrita a Sr.ª Ministra da Administração
Interna para abrir o debate e apresentar o relatório.
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Tem a palavra, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O Relatório Anual de
Segurança Interna relativo ao ano de 2014 reflete uma redução generalizada da criminalidade que fica em
valores manifestamente inferiores à média dos últimos 12 anos.
Face ao ano anterior, a criminalidade geral diminuiu 6,7% e, por sua vez, a criminalidade violenta e grave
diminuiu 5,4%.
De 2013 para 2014 houve uma redução do número de homicídios, do número de roubos a edifícios
comerciais ou industriais, do número de roubos a residências, entre reduções verificadas noutros tipos de
crimes. Isto é, acentua-se a tendência de queda constante e consistente da criminalidade geral, violenta e
grave, uma trajetória que se iniciou em 2008 e que, desde então, tem vindo a registar valores cada vez mais
baixos.
É inequivocamente um bom resultado, fruto do brio, da dedicação e dos níveis de competência e
profissionalismo alcançados pelas forças e serviços de segurança.
Porém, não podemos esquecer os desafios que este Relatório Anual de Segurança Interna também reflete.
Embora se verifique um aumento residual do crime de violência doméstica, o total de casos verificados é muito
superior ao desejável e ao que é aceitável numa sociedade livre.
Muito embora os especialistas afirmem que mais do que um aumento do crime estamos perante um
fenómeno de desocultação de casos de violência, a verdade é que a violência doméstica é um desafio
premente que urge debelar e cujo combate a todos nos convoca.
A Polícia de Segurança Pública e a Guarda Nacional Republicana têm desenvolvido um trabalho notável no
combate à violência doméstica, assentando a sua estratégia no quadro da prevenção e no apoio e
acompanhamento especializado às vítimas. Importa reforçar este trabalho e investir na consciencialização
pública, que é onde esta batalha tem de ser travada, numa perspetiva estrutural e de longo prazo.
Ainda assim, e sem esquecer este e outros desafios, a verdade é que Portugal é um país seguro, cada vez
mais seguro, algo que é demonstrado pelos últimos relatórios anuais de segurança interna, em particular pelo
RASI, referente ao ano de 2014.
Termino, expressando a minha confiança e o meu agradecimento às mulheres e homens que diariamente
zelam pela nossa segurança. E manifesto uma sentida palavra de apreço pelos portugueses, que, ainda que
confrontados com situações de enorme dificuldade, deram provas inequívocas de uma maturidade
democrática e de uma responsabilidade cívica ímpares.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Filipe Neto Brandão.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Administração Interna, o PS
congratula-se com os resultados do RASI, mas sobre eles pronunciar-me-ei na intervenção que tenciono fazer
mais tarde.
Neste momento, quero apenas colocar três questões à Sr.ª Ministra, a primeira das quais se prende com o
seguinte: quando a Sr.ª Ministra — e recordo que tomou posse em novembro do ano passado e que este RASI
foi apresentado em março deste ano — faz inscrever no relatório, concretamente nos objetivos estratégicos
para 2015, portanto, para este ano, que irá dar uma especial atenção à gestão dos meios aéreos da ANPC
(Autoridade Nacional de Proteção Civil), o pedido que não pode deixar de ser feito, Sr.ª Ministra, é que
esclareça a confusão que, neste momento, está criada com a disponibilidade dos meios aéreos, a dias que
estamos do início da fase Charlie, sendo certo que, em 22 de maio, a ANPC veio dizer que os cinco Kamov
estavam inoperacionais, que no dia imediatamente seguinte o Sr. Secretário de Estado veio esclarecer que,
afinal, três desses cinco estavam perfeitamente operacionais e que a Sr.ª Ministra, nesse mesmo dia, veio
dizer, aparentemente pretendendo tranquilizar-nos, que dois dos helicópteros pesados seriam substituídos por
quatro helicópteros ligeiros.
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E isto, Sr.ª Ministra, com grande perplexidade, porque a Sr.ª Ministra bem sabe que um helicóptero ligeiro
não substitui nenhum helicóptero pesado. Um helicóptero pesado transporta 5000 litros de água e, assim
como a Sr.ª Ministra não substitui um balde por duas chávenas, também não serão dois helicópteros ligeiros
sobrepostos que terão condições para lançar a mesma carga de água. Portanto, manifestamente, essa sua
declaração é incompreensível e gostava que a Sr.ª Ministra esclarecesse qual é a disponibilidade dos meios
aéreos para a fase Charlie, que estamos a dias de iniciar.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Muito bem!
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — A segunda pergunta, muito breve, tem a ver com o seguinte: a Sr.ª
Ministra fez inscrever que constituiria um objetivo estratégico para 2015 a revisão das leis orgânicas das forças
de segurança. Estou a fazer-lhe esta pergunta, porque, contrariamente ao seu antecessor que, por três vezes,
foi à 1.ª Comissão prestar esclarecimentos sobre o RASI, esta é a primeira vez que a Sr.ª Ministra nos pode
prestar esclarecimentos sobre ele. Sr.ª Ministra, em julho de 2014, fontes do MAI referiam que estavam
concluídas as propostas de leis orgânicas. No entanto, a Sr.ª Ministra confrontou o País com a falta de
veracidade dessa questão. Assim sendo, Sr.ª Ministra, queria saber em que medida é que se concretiza esse
objetivo estratégico da revisão das leis orgânicas.
Finalmente, a Sr.ª Ministra faz inscrever, com grande perplexidade, diga-se, na página 136 do RASI, que
«os contratos locais de segurança constituem um instrumento essencial…» — repito, a qualificação é
«essencial» — «… no reforço do objetivo da segurança e do aumento de confiança das populações».
A pergunta que se impõe, Sr.ª Ministra, é esta: como é que a Sr.ª Ministra faz incluir isto no RASI, quando
este Governo não fez aprovar um único contrato local de segurança e, pelo contrário, os que havia foram
todos desativados?
Aplausos do PS.
Entretanto, reassumiu a presidência o Vice-Presidente Guilherme Silva.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Administração Interna.
A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Filipe Neto Brandão,
relativamente à primeira questão, digo que o MAI está empenhado em três objetivos: em primeiro lugar, no
apuramento total das responsabilidades através do inquérito que foi determinado à IGAI (Inspeção-Geral da
Administração Interna); em segundo lugar, através da ANPC, na recuperação das aeronaves que possam
integrar, o mais rapidamente possível, o dispositivo; e, em terceiro lugar, na eventual contratação de meios
adicionais, considerados, do ponto de vista operacional, necessários para substituir os que estiverem em falta.
Quanto às leis orgânicas, nada mais tenho a acrescentar, nem retiro nada do que referi nesta Assembleia,
na 1.ª Comissão.
Quanto aos contratos locais de segurança, realmente estão inscritos, porque se entende que eles precisam
de uma revisão, designadamente no que diz respeito a questões de financiamento.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Neto
Brandão.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, segundo o princípio da alternância…
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Sr. Deputado, para haver alternância é preciso haver inscrições,
mas a Mesa não as tem.
Tem a palavra para uma intervenção, Sr. Deputado.
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O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, seguramente não há problema algum quanto a isso.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente à questão do RASI — e porque manifestamente o tempo
que me sobra para intervir não é muito —, queria, sobretudo, congratular-me com os resultados do RASI de
2014. Mas queria dizer, porque importa fazê-lo e acho que deve ser sempre sublinhado, que, apesar de os
números serem bons, cada crime, cada acidente rodoviário ou cada sinistro é, em si mesmo, um drama
pessoal que não pode, nunca, ser ignorado. Portanto, ao mesmo tempo que nos congratulamos com os
resultados, queremos obviamente assinalar esse facto e registá-lo como relevante.
A criminalidade participada tem vindo a descer sistematicamente desde 2008, tendência que registamos
com agrado, e a criminalidade participada violenta e grave tem vindo a diminuir sistematicamente desde 2010.
É também esta referência que queremos deixar assinalada.
Sr.ª Ministra, a primeira intervenção que o seu antecessor, Dr. Miguel Macedo, teve oportunidade de fazer,
enquanto Ministro da Administração Interna, neste Plenário, foi exatamente para a apresentação do Relatório
Anual de Segurança Interna do ano de 2010. Nessa intervenção, o Sr. Ministro Miguel Macedo teve
oportunidade de registar que tinha herdado um País seguro e que os valores do Relatório Anual de Segurança
Interna de 2010 eram globalmente positivos.
Congratulo-me por verificar que este, que será o último Relatório Anual de Segurança Interna deste
Governo, mantém a tendência. Portanto, agora, parafraseando as então declarações do Ministro Miguel
Macedo e reportando-as a este ano, diremos que os valores do Relatório Anual de Segurança Interna são
globalmente positivos e congratulamo-nos que Portugal seja e continue a ser um País seguro.
Aplausos do PS e do Deputado do PSD Carlos Peixoto.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos
Peixoto.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Administração Interna, Sr. Secretário de
Estado e Sr.ª Secretária de Estado, Sr.as
e Srs. Deputados: Lembro-me que, há pouco mais de três anos, fiz
aqui uma declaração política sobre segurança interna e disse, então, que num país mergulhado em incertezas,
com os nervos mais ou menos em franja, a segurança era sempre aparente e que todos os cuidados eram
poucos no sentido de assegurar a ordem e a paz social. É mais ou menos esta a síntese da declaração que,
na altura, fiz.
Receava então — e não estava sozinho nisso — que, num País sob assistência e com indicadores sociais
em inflexão, a insegurança e os índices de criminalidade aumentassem ou disparassem mesmo.
Enganei-me, e ainda bem que me enganei.
Em 2013, o País teve resultados muito positivos nesta área e, em 2014, conseguiu melhorar ainda mais
esta sua prestação.
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Muito bem!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Isto significa, em primeiro lugar, que tempos conturbados, social e
economicamente, não são sinónimo de aumento de criminalidade; em segundo lugar, que tempos de
conturbação salarial também não equivalem a um baixar de braços das forças de segurança; e, em terceiro
lugar, que, em tempos mais difíceis, o povo português não se esqueceu da sua civilidade e do seu pacifismo.
Por isto, Sr.ª Ministra, é importante reforçar aquilo que já foi dito pela Sr.ª Ministra, agora também
acompanhado pelo Partido Socialista, ou seja, que a criminalidade geral participada — são dados, são factos
contra os quais não há mesmo quaisquer argumentos — baixou 6,7% relativamente a 2013 e que a
criminalidade grave e violenta baixou 5,4%. Depois, há um dado muito relevante, quase inédito na nossa
história democrática, o de que, este ano, foi, segundo creio pelos estudos que fiz, o primeiro ano em que a
criminalidade diminuiu em todos, em todos os distritos sem exceção. Além do mais, este foi também o primeiro
ano em que, em termos de categoria ou de tipologia de crimes, só houve três que aumentaram (e não são
assim tão relevantes), toda a outra tipologia diminuiu.
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Em contrapartida, houve também uma diminuição acentuada dos crimes rodoviários (acabámos de falar
neles, na segurança rodoviária, no ponto anterior da nossa ordem do dia), que desceram 16,5%, com a taxa
de sinistralidade mais baixa dos últimos 50 anos e com menos 7,3% de mortes.
Até a violência doméstica, que gerou já controvérsia, baixou — apenas numa participação, é verdade, mas
baixou. Só aumentou 31 casos, se considerarmos a violência doméstica entre casais, ou seja, de forma
desagregada. Mas a violência doméstica global — contra idosos, contra crianças, contra enteados —, toda
aquela que o Código Penal abrange, diminuiu um caso, uma participação.
Depois, já que estamos a iniciar o período de incêndios, é importante salientar aqui que o crime de fogo
posto e de incêndio baixou 34,7%.
Sr.ª Ministra e Srs. Secretários de Estado, o que isto significa é que, mesmo em tempo de crises, não
houve desinvestimento. O Governo fez um reforço policial no sentido de permitir que entrassem, em 2014, 433
guardas e 36 oficiais na GNR e 101 agentes e 25 oficiais na PSP. E também conseguiu fazer com que, em
tempos de crise, esse desinvestimento não acontecesse na parte dos equipamentos das forças de segurança:
419 novos veículos entregues e 11 milhões de euros de investimento em instalações.
Terminando, Sr. Presidente, é evidente que estes méritos não são só do Governo, são de todos. Em
primeiro lugar, é mérito do Governo, que tomou medidas e teve políticas com suficiente assertividade, no
sentido de estancar o aumento da criminalidade. Em segundo lugar, é mérito das polícias, que souberam
desempenhar com grande dignidade a função que lhes foi cometida.
A Sr.ª Carla Rodrigues (PSD): — Muito bem!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — E, em terceiro lugar, é mérito dos portugueses, que assimilaram estas
boas regras de convivência e de civilidade comunitária.
Num País que precisa de transmitir estabilidade e confiança, quer cá dentro quer relativamente à nossa
imagem externa por forma a captar ainda mais níveis de turismo para este continuar a ser o motor da
economia, é evidente que a paz pública…
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — … é a prova da nossa liberdade de todos os dias. E o comportamento dos
portugueses, em 2014, é evidentemente marcado por uma palavra: a da continuidade na redução progressiva
dos níveis de criminalidade.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Nunca atingiremos, Sr. Presidente e Sr.ª Ministra, os níveis do grau zero
da criminalidade, da perfeição, porque a natureza humana não é perfeita.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Mais seis meses e nem era preciso polícia!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Mas, sem prejuízo da habitual vigilância que todos devemos ter, temos
seguramente razões para estarmos mais tranquilos e para encararmos o futuro com mais confiança e com a
certeza de que Portugal é, de facto, um País ainda mais seguro.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Mais seguro do que isto só Gotham City!…
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília
Honório.
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A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Os
dados da criminalidade participada em 2014 registam um decréscimo objetivo de 6,7%, o valor mais baixo da
tendência decrescente, pelo menos desde 2008. É um aspeto positivo que já foi aqui sublinhado, se bem que
entendamos que um dia se estudará esta realidade de, num contexto de crise, a criminalidade aparentemente
descer mas, ao mesmo tempo, também é bom reconhecer que as prisões continuam cheias. Mas, enfim,
repito, é um dado positivo.
No entanto, queria, se possível, baixar alguns sinais de euforia já aqui registados que têm este tónus de
pré-campanha e deixar-vos algumas notas, aproveitando a presença da Sr.ª Ministra, sobre aspetos que nos
parecem muito preocupantes neste quadro que, não deixamos de registar, é globalmente positivo.
Em primeiro lugar, dentro da criminalidade mais participada, tudo desce menos o furto de oportunidade e a
violência doméstica, o terceiro crime mais participado. Já aqui foi registada esta diferença de dados
relativamente à violência doméstica. O próprio RASI assume preocupação relativamente ao elevado número
de participações. Enfim, 25 mulheres assassinadas são muitas. Por muito trabalho que se tenha feito e que se
deva continuar a fazer, são ainda muitas pois qualquer vida que se perde é uma perda muito grande.
Na criminalidade violenta e grave tudo desce menos o roubo em transporte público e a violação, que tem
mais 30 participações — 8,7% de aumento —, o abuso sexual de crianças e menores dependentes — mais
17,7% —, maus-tratos e sobrecarga de menores — mais 23,3% —, lenocínio e pornografia infantil — mais
40,2%.
Estes dados destas formas de violência e desta criminalidade merecem, certamente, uma atenção muito
especial, porque são dados muito preocupantes. Nós podemos constatar este decréscimo em continuidade da
participação de muitos crimes, mas estes crimes, muitas vezes dentro das quatro paredes ou perto delas,
muitas vezes incindindo e tendo uma forma de género — são mulheres, são meninas, sobretudo — devem
merecer atenção e medidas específicas, e é essa advertência que queríamos deixar.
Sobre os dados das prisões fala-se pouco. Há 14 000 reclusos, 2330 preventivos — 16,6% —, que são
muitos, Sr.ª Ministra. Em 2014, houve 73 mortes, 22 suicídios, mais 11 óbitos no cômputo geral e mais 9
suicídios. São dados que, objetivamente, devem preocupar o Governo.
O mesmo se diga relativamente à delinquência juvenil. Os dados aos quais o RASI se reporta são dados
que merecem uma atenção particular. Há um acréscimo de 453 participações, dados que devem merecer uma
intervenção muito especial.
O terceiro dado que gostaria de trazer a este debate insere-se no quadro das ameaças globais à
segurança, que é um tema que está na ordem do dia, uma vez que o próprio terrorismo, como bem sabemos,
está no topo destas preocupações e assim é apresentado no âmbito do RASI.
Quando fazemos este debate relativamente a uma proposta de lei que foi acordada entre o Governo e o
PS, ou que, pelo menos, dá lugar à satisfação do Sr. Deputado Jorge Lacão, e nessa proposta de lei se prevê
o acesso a dados, matéria que, do nosso ponto de vista, levanta as maiores dúvidas de constitucionalidade —
estamos a falar dos dados das operadoras, entre outros —, é preciso perguntar quer ao Governo, quer ao PS,
porventura, quais são os dados objetivos que os levam a tanta preocupação e do que é que estamos a falar,
se pelo menos olharmos para dentro do RASI. Ora, o que constatamos, de acordo com os dados do quadro da
página 16, é que estatisticamente os dados são insignificantes, como o próprio relatório releva, ou seja, são
muito mais baixos do que se compararmos com qualquer outro crime.
O RASI reconhece que não há um movimento sistemático de cidadãos nacionais em palco de jihadismo,
mas que há a participação de alguns convertidos, ou seja, que é uma realidade conhecida, localizada e
controlável. E, deste ponto de vista, só vos posso deixar a dúvida: para quê esta paranoia securitária? Para
quê utilizar o terrorismo como pretexto para a potencial violação de direitos fundamentais, que é o que está em
causa na proposta de lei que acordaram?
A realidade objetiva é esta e com isto, Sr.ª Ministra, não quero desvalorizar o perigo. Não estamos a
desvalorizar e a dizer que o perigo não existe, estamos a falar de números concretos, e eles estão dentro do
Relatório Anual de Segurança Interna relativamente a 2014. Vale a pena pensar nisto. Talvez ainda possam
recuar.
Aplausos do BE.
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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge
Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Na análise do
Relatório Anual de Segurança Interna de 2014 o que queremos começar por destacar é um facto que se
repete todos os anos: é que grande parte deste Relatório trata da criminalidade participada e não da
criminalidade real.
O descrédito nas instituições, a demora da justiça e os custos com a justiça são alguns dos factos que
levam os portugueses a não participar a criminalidade ocorrida.
Por isso, este Relatório Anual de Segurança Interna é assim, nesta parte, um instrumento muito pouco
credível e com pouca aderência à realidade que se verifica no terreno. Daí quase ironizar que, a este ritmo,
não tarda muito não existe criminalidade em Portugal, porque todos os anos diminui a criminalidade.
Há factos que explicam estes acontecimentos, factos no próprio RASI que demonstram como se trabalham
os dados da criminalidade. Dou um exemplo: surgem, ano após ano, novas agregações de tipo de crime com
o objetivo de diminuir outras categorias e tipos de crime. Temos, por exemplo, os crimes contra a identidade e
a integridade pessoal com um crescimento de 46%, o que não é naturalmente credível. Contudo, este
aumento de 46% à agregação de determinado tipo de crime permite esvaziar outros tipos de crime e, assim,
iludir as estatísticas da criminalidade.
Um outro facto que altera as estatísticas é o facto de as ações de fiscalização rodoviária terem tido uma
quebra acentuada de 2013 para 2014. Tivemos menos 3000 ações de fiscalização e menos 14 000 agentes
alocados às ações de fiscalização. Como é óbvio, se não há ações de fiscalização ou se elas se reduzem
significativamente os tipos de crime naturalmente que baixam, não porque não existam, mas porque não existe
a fiscalização necessária.
Queremos aqui registar, com preocupação, o facto de o terceiro crime mais participado ser o da violência
doméstica, o que demonstra bem o flagelo que esse mesmo crime significa, sendo também ele um exemplo de
como esta agregação de tipos leva a esvaziamento de estatísticas.
Há dois anos atrás, salvo erro, o crime de violência doméstica fazia parte da categoria dos crimes violentos,
da criminalidade grave. Como deixou de fazer, diminuiu aquilo que é a estatística da criminalidade grave, não
obstante continuar a ser um problema muito significativo.
Queremos, nesta discussão do Relatório Anual de Segurança Interna de 2014, aproveitar para saudar e
elogiar o trabalho de todos os agentes das forças de segurança no País. Mas, para o PCP, os elogios não
chegam. Exigem-se medidas concretas para que os agentes tenham as condições necessárias para o
desempenho das suas funções e importa valorizar os agentes nos seus direitos e salários.
O PSD, o CDS e o Governo ficam-se pelos elogios, o PCP exige medidas concretas. Por isso, Sr.ª Ministra,
gostava de abordar um conjunto de questões.
O Governo revogou a lei da programação de aquisição de equipamentos, mas subsistem graves problemas
quanto aos equipamentos, nomeadamente as viaturas que estão completamente obsoletas, com idade e
quilometragem excessivas.
Há dezenas e dezenas de esquadras da PSP e postos da GNR sem as mínimas condições de trabalho. O
que é que vai fazer, Sr.ª Ministra, relativamente a esta realidade?
O número de efetivos, de agentes, é claramente insuficiente e regista-se um preocupante aumento da
idade média dos agentes. Portanto, este envelhecimento é algo que preocupa e que merecia uma reflexão por
parte da Sr.ª Ministra.
Sr.ª Ministra, ao contrário dos elogios sem consequência, vamos resolver problemas concretos. Há um
problema na aposentação dos agentes da PSP. Como sabe, os agentes da PSP podem — e bem —
aposentar-se aos 60 anos de idade, no entanto a Caixa Geral de Aposentações tem o entendimento que se
trata de uma reforma antecipada — quando não o é —, o que leva a injustificadas penalizações. O que é que
vai fazer para corrigir este problema concreto que afeta a vida dos agentes?
Sr.ª Ministra, sobre os estatutos profissionais da GNR e da PSP, quando vão ser publicados, sabendo que
estamos em fase avançada de negociação? Urge a publicação dos estatutos.
Quanto ao estatuto da GNR, queremos aqui manifestar a nossa preocupação quanto às notícias que são
veiculadas e que levam à preocupação do acentuar do cariz militar desta força. A GNR desempenha funções
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de segurança interna, Sr.ª Ministra, logo não pode ter natureza militar e tem de se caminhar para a natureza
civil desta força.
Esta visão militarizada da GNR apenas serve para agravar a exploração, impor horários desregulados e
impor um estatuto disciplinar que é, claramente, do século passado.
Por fim, coloco duas questões: há intenção, por parte do Governo, de utilizar militares na reserva na
vigilância de escolas. Como justifica esta opção, Sr.ª Ministra? Há confusão completa de conceitos. Não sabe
a Sr.ª Ministra que os artigos 272.º e 273.º da Constituição não permitem a utilização de militares para missões
de segurança interna? Como justifica esta opção, que é claramente inconstitucional?
Sr. Presidente, para terminar, quanto à proteção civil, não ficámos sossegados com a explicação dada
relativamente aos Kamov. Sr.ª Ministra, importa que haja garantias concretas no sentido de que estes meios
pesados de combate a incêndios estejam efetivamente operacionais no pico do verão e as declarações que
aqui foram produzidas pela Sr.ª Ministra não nos dão essa garantia, pelo que manifestamos a nossa
preocupação quanto a essa matéria.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno
Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados:
Analisamos hoje, como já foi aqui dito, o último Relatório Anual de Segurança Interna desta Legislatura.
Quatro anos volvidos, quatro relatórios volvidos, importa, se calhar, fazer um pouco, também, o balanço do
que aconteceu nesta Legislatura e nesses quatro anos e, sobretudo, recuar àquilo que era dito,
nomeadamente pela oposição, mesmo aquela que agora parece continuar insatisfeita apesar destes
resultados, prevendo a maior das catástrofes.
O que é que dizia, então, a oposição? Dizia que Portugal ia estar sujeito, como esteve, a um programa
duríssimo de assistência económica e financeira, que o Governo ia ser obrigado — como foi — a tomar um
conjunto de medidas que evidentemente tinham um impacto duríssimo na vida de muitos portugueses, logo a
criminalidade ia aumentar.
Ou seja, havia aqui uma tese de certa oposição de que em cada pessoa que dramaticamente caía numa
situação desesperada de desemprego havia um potencial criminoso. Era essa a tese de certa oposição, quase
que desejando que houvesse esse aumento da criminalidade. Erraram em toda a linha; há uma redução
consistente, sustentada, reiterada, histórica, até, dessa mesma criminalidade.
Havia, então, uma segunda tese que dizia que, mesmo que assim não fosse, a criminalidade ia aumentar
certamente, porque com as medidas, também elas difíceis, também elas constantes do Memorando de
Entendimento, que iam afetar todos os funcionários públicos e, desde logo, as forças e serviços de segurança
ia haver uma enorme desmotivação dos homens e das mulheres das forças e serviços de segurança, com isso
um baixar de braços, quiçá mesmo uma greve de zelo, portanto haveria menos prevenção à criminalidade,
menos combate à criminalidade, logo a criminalidade ia disparar. Isto era o que dizia certa oposição da
esquerda mais à esquerda.
Mais uma vez enganaram-se. O que é facto é que os homens e as mulheres das forças e serviços de
segurança são pessoas zelosas, com brio, gostam da missão que cumprem, estiveram à altura do momento, à
altura das responsabilidades nas dificuldades e por causa deles e, em primeiro lugar, por causa desses
homens e dessas mulheres estes números foram possíveis. É a eles que se deve uma palavra de homenagem
pois souberam estar à altura das circunstâncias.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Mas havia uma terceira tese que era a de, como o investimento, por força mais uma vez do Memorando de
Entendimento, iria ser reduzido no Ministério da Administração Interna, essa redução iria afetar a capacidade
operacional das forças e serviços de segurança. Mais uma vez, a oposição errou, não só, obviamente, no
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constrangimento orçamental, dado que foi possível reequipar as forças e serviços de segurança, como foi
possível, até, fazer investimentos.
Ouvi aqui, por exemplo, o Sr. Deputado Jorge Machado dizer que não foram feitos investimentos que
precisam de ser feitos. É evidente que alguns não foram feitos, pois não é possível resolver em quatro anos as
múltiplas dificuldades das forças e serviços de segurança, mas lembro-me do caso, até num distrito que o PCP
conhece bem, em Palmela, que deve ser das poucas obras públicas em que o mesmo membro do Governo, o
ex-Ministro Miguel Macedo, lançou a primeira pedra, inaugurou a obra, pagou totalmente a obra.
Quantas vezes, em Portugal, nós temos esses exemplos? Pena é que isso não tivesse acontecido noutros
governos, pois seria bem melhor para o País.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Sr.ª Ministra, quanto ao Relatório, congratulamo-nos com esta redução da criminalidade.
Nunca ninguém pode estar satisfeito, como é evidente, quando há crimes — e ainda há crimes graves e
violentos —, mas quando há uma redução de 5,4% da criminalidade grave e violenta e de 6,7% da
criminalidade participada em todo o País é evidente que isso nos dá alento para fazermos melhor e para
melhorar as condições de vida dos homens e das mulheres das forças e serviços de segurança, a quem se
deve quase na totalidade esta redução.
Há, evidentemente, algumas notas que gostaria de deixar e que devem merecer a nossa atenção: por
exemplo, o abuso sexual de crianças, adolescentes e menores dependentes subiu; no Programa Escola
Segura e a na delinquência juvenil, vemos algumas subidas, que urge combater e sabemos que o Governo
está a fazê-lo.
Por fim, Sr.ª Ministra, queria dizer-lhe que pode contar com o CDS para as medidas de combate ao
terrorismo. Há aqui uma tese, que acabámos de ouvir, que é um pouco assim: como não houve atentados
terroristas em Portugal e como não há conhecidos perpetradores de ataques terroristas é um ato securitário
prevenir o terrorismo. Ou seja, quase que se poderia concluir que devemos deixar primeiro vir os atentados e
depois, então, tomar as medidas securitárias.
Sr.ª Ministra, nós não estamos nessa via, achamos que é preciso, de facto, prevenir, que é preciso também
reprimir, mas, sobretudo, prevenir, e o que não queremos são os ataques terroristas, porque eles têm duas
características: são quando menos se espera e são muitas vezes feitos, sobretudo este tipo de terrorismo, por
quem menos se espera.
Estamos, obviamente, satisfeitos e, de acordo com o maior partido da oposição, achamos muito importante
o que foi aprovado em matéria de combate ao terrorismo, o que faz de Portugal, ao nível europeu, um País
com uma excelente organização quer do ponto de vista administrativo, quer do ponto de vista legislativo.
Para finalizar, quero dizer apenas que teremos ainda um próximo Relatório Anual de Segurança Interna
relativo a este ano e esperamos que os dados assim continuem. Confiamos nisso, confiamos nas forças de
segurança cada vez mais motivadas e para isso, obviamente, também confiamos no trabalho do Governo.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da
Administração Interna.
A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria apenas salientar que
a descida de 6,7% da criminalidade geral que se verificou foi pelo sexto ano consecutivo, o significa que, no
conjunto dos seis anos, a criminalidade geral decresceu 18,4% e, quanto à criminalidade violenta e grave, a
descida de 5,4% que se verificou foi pelo quarto ano consecutivo, o que significa que, no conjunto dos quatro
anos, decresceu mais de 22%.
Queria ainda retirar daqui uma outra ilação: acentuar uma mais intensa descida da criminalidade violenta e
grave — julgo que isto é de assinalar.
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Em geral, como já foi dito, temos de nos regozijar com os resultados de mais este Relatório Anual de
Segurança Interna, manter uma atuação diligente e ativa no sentido de continuar a reduzir a criminalidade e
atuar, sobretudo, do lado preventivo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, como não há mais inscrições, dou por concluída a
discussão do Relatório Anual de Segurança Interna.
Vamos passar ao ponto 5, que consiste na apreciação conjunta do projeto de resolução n.º 1483/XII (4.ª) —
Recomenda ao Governo que regule o exercício da profissão de criminólogo (PSD), da petição n.º 261/XII (2.ª)
— Apresentada por Vítor Miguel Pereira da Silva e outros, solicitando à Assembleia da República que seja
reconhecida a profissão de criminólogo em Portugal, e dos projetos de resolução n.os
1542/XII (4.ª) — Sobre a
criação da profissão de criminologista (CDS-PP) e 1549/XII (4.ª) — Reconhecimento e regulamentação da
profissão de criminólogo (BE).
Para apresentar o projeto de resolução n.º 1483/XII (4.ª), tem a palavra o Sr. Deputado Cristóvão Simão
Ribeiro.
O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Ao longo desta
Legislatura, muito para além da reconhecida preocupação que este Grupo Parlamentar e esta maioria tiveram
com o rigor das contas públicas, com o combate ao desemprego e com o apoio à economia e que, de resto,
números recentes vêm confirmar as boas escolhas e as boas opções tomadas, tem sido, sobretudo, nossa
preocupação o acesso dos jovens ao mercado de trabalho e, muito em particular, a questão do livre acesso ou
do direito que os jovens portugueses devem ter ao exercício da profissão para a qual estudaram, para a qual
se esforçaram e para a qual grande parte das famílias portuguesas fizeram um esforço, para que estes jovens
a pudessem ter, apesar de todos os constrangimentos.
Por isso, Sr. Presidente, quero começar por cumprimentar os peticionários presentes hoje nesta Casa,
representando um total de mais de 4000 peticionários, e, de uma forma muito particular, a Associação
Portuguesa de Criminologia, aqui representada pelo seu Presidente, Dr. Vítor Miguel Silva.
Assim, este Grupo Parlamentar e esta maioria vêm aqui dar respaldo aos seus legítimos anseios e às suas
legítimas aspirações, propondo ao Governo a regulamentação da profissão de criminólogo.
Sr. Presidente, entendemos que o Estado, enquanto pessoa de bem, não deve, nunca, substituir-se à
sociedade civil, mas deve dar condições a esta mesma sociedade para que todo e qualquer indivíduo possa
realizar-se em termos pessoais.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — Portanto, o Estado deve aqui agir no sentido de permitir a estes
jovens a sua realização pessoal e profissional, que, mais do que tudo, é um direito que lhes assiste. Esta é a
minha preocupação enquanto social-democrata e é, sobretudo, a minha preocupação enquanto Deputado
nesta Casa.
Sr.as
e Srs. Deputados, sendo a criminologia uma área do saber que se debruça sobre a etiologia do crime,
a investigação criminal, a reinserção social, os fatores biológicos, psicológicos e sociais que estão na base e
no fundamento do delito e estando provada a mais-valia da aplicação e da intervenção destes profissionais na
investigação criminal, estranho é, para mim e para esta bancada, que estes enfrentem tantas dificuldades no
que respeita ao seu acesso ao mercado de trabalho, uma vez que não constam sequer na base de dados de
recursos humanos da Administração Pública nem da Classificação Nacional das Profissões.
Quero dizer que, atualmente, existem cerca de 1400 jovens licenciados em Criminologia que nem sequer
conseguem aceder a estágios profissionais.
Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, se não se trata, apenas e só, de uma destrinça, trata-se também de
uma questão de incoerência. O Estado certificou, credibilizou instituições do ensino superior para ministrar
licenciaturas, cursos superiores e mestrados nesta área do saber em concreto, não procedendo
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posteriormente ao seu reconhecimento, ao reconhecimento das suas apetências e das suas qualificações
profissionais.
Sr.as
e Srs. Deputados, com esta iniciativa, o que se pretende é colmatar esta tremenda injustiça e esta
incoerência que hoje sentimos, assegurando o acesso a uma justa e merecida carreira profissional a todo este
conjunto de jovens portugueses.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para apresentar o projeto de resolução do CDS-PP, tem a palavra a
Sr.ª Deputada Teresa Anjinho.
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: As iniciativas ora em
discussão visam, no essencial, reconhecer a justiça e a propriedade do pedido subjacente à petição que hoje
discutimos, subscrita por mais de 4000 pessoas, que aproveito, em nome do CDS, para cumprimentar na
pessoa do seu primeiro subscritor, Dr. Vítor Miguel Silva, Presidente, como já foi referido, da Associação
Portuguesa de Criminologia, presente nas galerias, e que apela ao reconhecimento da profissão de
criminólogo em Portugal.
Infelizmente, o preâmbulo desta causa, como também já foi referido, é já longo e não isento de peripécias
sejam elas administrativas, sejam mesmo contenciosas.
A criminologia é uma área do conhecimento que se pauta pela multidisciplinariedade, pretendendo analisar
e estudar o fenómeno criminal pelo cruzamento de diversas áreas do saber e práticas, nomeadamente das
ciências sociais, das ciências jurídicas, das ciências biomédicas, assentando particularmente no Direito, na
Sociologia, na Psicologia e na Medicina.
No essencial, centra-se nos métodos para o conhecimento do crime, do delinquente, da vítima da
criminalidade, da perceção da segurança e da reação social do crime, sendo esta a única ciência que
verdadeiramente se debruça sobre o estudo de todas estas áreas.
Dito isto, não temos dúvidas das suas especiais aptidões e competências para a assunção de diversas
funções, as quais, dada a natureza das matérias apreendidas, assumem particular acuidade na esfera pública,
salientando para o efeito a atuação ao nível das forças policiais, do sistema prisional ou dos serviços de
reinserção social.
Todavia, a realidade dos factos tem atestado injustificadas situações de restrição, nomeadamente na
candidatura a concursos públicos para os quais dificilmente se compreende a exclusão dos licenciados em
Criminologia.
Está claramente em causa o disposto no artigo 47.º da Constituição da República Portuguesa, nos termos
do qual todos têm direito a escolher livremente a profissão ou o género de trabalho.
Em nome da defesa deste direito, e considerando que não está em causa uma restrição imposta pelo
interesse coletivo ou inerentes à sua capacidade, a Associação Portuguesa de Criminologia, por duas vezes,
requereu a anulação de um concurso público: um, para técnicos superiores de reinserção social; outro, no
quadro do SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras).
Ora, este último já obteve uma decisão favorável da Relação que, na sua argumentação, salienta, de facto,
que estes poderes, na definição dos termos dos concursos, não são discricionários, pelo que toda e qualquer
restrição terá de fundar-se no conceito de interesse público que, no caso em apreço, não se verifica, sendo os
licenciados em Criminologia qualificados científica e academicamente para desenvolver as funções em causa.
Sr.as
e Srs. Deputados, este apelo ao reconhecimento, como podem compreender, vai para além dos
concursos públicos, tendo, inclusivamente, expressão, como também já foi referido, ao nível da própria
inscrição no Instituto de Emprego e Formação Profissional ou no acesso aos estágios.
Estando cientes de que para o Instituto Nacional de Estatística as tarefas e funções a desempenhar por um
licenciado em Criminologia se enquadram em vários grupos-base e que, por isso, entendem não ser possível
inserir a profissão de criminólogo na Classificação Portuguesa das Profissões, uma vez que, segundo os
próprios, o nível Profissão é criado a partir e dentro do âmbito de um único grupo-base, é nosso entendimento
que, face a todos os constrangimentos, de que temos vindo a ter conhecimento, e limitações injustificadas —
chamo a atenção para que estas impugnações dos concursos públicos têm vindo a ocorrer à medida que há
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criminólogos que se candidatam, que são preteridos e que pretendem agir —, a profissão de criminólogo deve
ser considerada relevante e, para os devidos efeitos, devidamente inserida no nível suplementar, nível
Profissão, da Classificação Portuguesa das Profissões.
Termino, Sr. Presidente, dizendo que, não nos opondo às restantes recomendações e pretensões,
acreditamos que por esta via todos os restantes constrangimentos serão resolvidos em nome da justiça.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para apresentar o projeto de resolução do Bloco de Esquerda, tem
a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, queria começar por saudar a
Associação Portuguesa de Criminologia.
Há ditados populares que têm um cariz positivo e, creio, o que se adequa aqui é o de que quem luta
sempre alcança e o dia de hoje é um passo para vencer os entraves burocráticos para impedir — não há outra
explicação — que quem tem uma formação adequada possa ver reconhecida a sua profissão.
Vamos por passos nesta matéria.
Em primeiro lugar, isto poderia e deveria ter sido feito há mais tempo. Ainda há meses falávamos e pairava
toda a insegurança do lado dos peticionários porque não tinham resposta da Assembleia da República, porque
a Assembleia da República não tinha resposta do Governo sobre questões simples como a de saber por que é
que esta profissão não era regulamentada. De facto, já estavam prisioneiros da burocracia do Estado e
tornaram-se prisioneiros da burocracia da Assembleia da República, pelo que, creio, o dia de hoje é o dia da
libertação nesse aspeto, e ainda bem que ele chegou.
Em segundo lugar, como é que é compreensível que o Estado, que desde 2006/2007 reconhece a
formação em Criminologia — aliás, a primeira instituição de ensino superior a ter uma formação nesta área foi
a Faculdade de Direito da Universidade do Porto, em 2006/2007 —, tenha chegado a 2015 sem reconhecer a
profissão? E é o próprio Estado, o Governo, já agora — a Sr.ª Ministra da Justiça, que esteve presente há
momento, ou a Sr.ª Ministra da Administração Interna, consoante o concurso público em causa —, que poderia
ter tido ações concretas para acabar com estas restrições, mas não o fez ao longo de mais de quatro anos de
mandato. E isto é inaceitável!
Quem foi formado, tendo o Estado reconhecido a sua formação e as instituições superiores que lhe deram
essa formação, não pode, depois, ser impedido de entrar na vida ativa por questões burocráticas, mesmo que
elas advenham de excesso de zelo das instituições públicas. Isto não é aceitável.
Por isso, o que propomos, creio que na esteira de todos os projetos de resolução em debate, é que se
acabe com estas restrições. É essencial que assim seja, porque são mais de 1100 profissionais que estão em
causa e em suspenso, à espera, para poderem aceder à sua vida ativa, na plenitude. São profissionais de
cujas competências nós precisamos, porque são dos mais bem formados no nosso País — as médias de
acesso a estes cursos, já agora, quase a par de Medicina, assim o indicam — e, por isso, não podemos
desperdiçar quer os seus conhecimentos, quer as suas competências técnicas. Devemos, então, dar os
passos necessários para resolver, de uma vez por todas, estes problemas.
Obviamente, isto passa pela inclusão da profissão de criminólogo na lista da Classificação Nacional das
Profissões, passa por enquadrá-la na base de dados das profissões regulamentadas no IEFP (Instituto do
Emprego e Formação Profissional) e passa, obviamente, por, nos futuros concursos públicos, todos, deixar de
haver as restrições que até agora têm existido.
Esta é a nossa motivação, vamos acompanhar os projetos de resolução do PSD e do CDS-PP, que visam
também a mesma matéria, e esperamos que, de facto, da teoria que hoje estamos aqui a discutir à prática
sejam poucos os dias para que os criminólogos possam ter a justiça por que tanto anseiam nas suas vidas.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elza Pais.
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A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, começo por saudar os
peticionários aqui presentes, na pessoa do Dr. Vítor Miguel Silva, e dizer que, apesar de recente em Portugal,
a formação em criminologia e a profissão de criminólogo são extremamente importantes para o exercício de
diversas atividades no âmbito da investigação criminal, da mediação penal, da avaliação de risco em situações
de violência doméstica, das peritagens forenses, entre muitas e muitas outras.
Os criminólogos são há muito uma profissão internacionalmente afirmada e reconhecida pelo modo como
têm colocado o seu saber, transversal em vários domínios do conhecimento, desde a justiça à sociologia e à
psicologia, entre outras, ao serviço da análise e compreensão das novas dinâmicas do crime e da sempre
complexa e difícil relação entre os processos de agressão e a vitimação.
Hoje, o assento colocado na justiça restaurativa tem, inclusivamente, levado ao desenvolvimento de novos
modelos para lidar com o fenómeno da criminalidade, onde os danos causados às vítimas e à comunidade
sejam tidos em consideração.
A este propósito, ainda no decorrer desta semana, concretamente na próxima sexta-feira, vai haver aqui,
em Plenário, uma discussão — e houve hoje na 1.ª Comissão — sobre a transposição de uma diretiva relativa
ao estatuto da vítima em processo penal, que aponta, de facto, no sentido deste paradigma emergente, ao
qual temos de dar respostas.
Ora, também aqui os criminólogos têm uma palavra a dizer, têm um papel muito importante para um novo
entendimento da criminalidade, para um novo entendimento da relação vítima/agressor, para um novo
entendimento dos danos causados à comunidade, para a mediação penal e também para a peritagem, bem
como para um novo entendimento dos contextos e dinâmicas que caracterizam a criminalidade, no sentido de
se reforçar o apoio à decisão judicial e à execução das medidas que vierem a ser adotadas.
Trata-se, assim, de uma profissão que está apta, repito, está apta e é muito útil em diversos contextos
institucionais no campo da justiça, desde a reinserção social aos serviços prisionais, a centros educativos, a
centros de acolhimento e assistência a vítimas de crime.
Mas os criminólogos têm tido diversos bloqueios que já aqui foram referidos, sobretudo a nível
administrativo e também de agilização do sistema, no exercício dessa atividade profissional. Por exemplo, não
têm a profissão integrada na base de dados de recursos humanos da Administração Pública nem na
Classificação Nacional das Profissões, pelo que urge ultrapassar essas dificuldades, que têm bloqueado o
desenvolvimento da atividade profissional, que até pode ser independente, e do trabalho que os criminólogos
podem realizar.
O PS acompanha, por isso, os projetos em discussão para o reconhecimento e regulação da profissão de
criminólogo e para incluir a profissão de criminologista/criminólogo na Classificação Nacional das Profissões.
Dar-se-á, assim, um passo em frente no reconhecimento e dignificação de uma profissão extremamente
importante ao nível das novas abordagens da criminalidade.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge
Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A primeira intervenção do PCP nesta
matéria tem de passar, necessariamente, pelo reconhecimento e saudação daqueles que são os mais de 4000
peticionários e da Associação Portuguesa de Criminologia, que fizeram chegar à Assembleia da República um
problema muito concreto.
Queria aqui salientar que a petição pelo reconhecimento da profissão de criminólogo em Portugal destaca
um conjunto de informações que são importantes, designadamente a integração da profissão de criminologia
na Classificação Nacional das Profissões, o facto de no nosso País existirem já quatro instituições com esta
área do saber, com este curso e, ainda, que este curso tem uma multidisciplinaridade com uma abrangência
muito significativa, através de uma licenciatura que envolve conhecimento nas áreas das ciências do
comportamento, das ciências forenses, das estatísticas do direito, dos métodos, da investigação científica e da
filosofia científica.
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A criminologia está hoje apta para intervir num conjunto de serviços, desde a reinserção social ao sistema
prisional, mas também na investigação junto das forças policiais e, por isso, salientamos aqui este aspeto, que
é já um dado adquirido na nossa sociedade.
Nesse sentido, a petição requer a integração da criminologia na Classificação Nacional das Profissões,
bem como o reconhecimento no âmbito do IEFP, do INE e do Código do IRS, mas também salienta um aspeto
que passou aqui, no âmbito das intervenções que antecederam, um bocadinho ao lado, que é o de, nos
futuros concursos públicos para áreas de criminólogos, estes profissionais possam desempenhar funções para
as quais a sua licenciatura surja explicitamente nas habilitações solicitadas.
Ora, temos aqui um conjunto de projetos de resolução que o PCP vai votar favoravelmente, e não temos
quaisquer dúvidas em votar a favor destes projetos que recomendam a resolução deste problema, mas
queremos salientar dois aspetos.
Primeiro, é sempre curioso ver o PSD e o CDS-PP a recomendarem ao Governo PSD/CDS-PP que faça
alguma coisa relativamente a esta questão.
Risos do PSD e do CDS-PP.
Depois, queremos dizer aqui que o Governo PSD/CDS-PP teve quatro anos para resolver esta «tremenda
injustiça», segundo as palavras do Sr. Deputado do PSD, e nada fez, antes pelo contrário.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Bem lembrado!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Queríamos aqui recordar que o PCP, confrontado com esta injustiça que
os criminólogos enfrentam, questionou o Governo, nomeadamente a Ministra da Justiça, relativamente ao
reconhecimento do curso em determinados concursos públicos para acesso a profissões e a resposta da Sr.ª
Ministra da Justiça foi uma desilusão. É porque, ao contrário do que a maioria PSD/CDS-PP explicita no seu
projeto de resolução, a resposta de três linhas, por parte do Ministério da Justiça, vai no sentido de que a
Polícia Judiciária procedeu à abertura de um concurso para a categoria de inspetor-estagiário, através de um
ofício, no Diário da República, que não interessa para o caso, ao qual os detentores da licenciatura em
Criminologia podem concorrer. Ora, batatas! Que eles podiam concorrer, já todos sabíamos, o problema é que
o Ministério da Justiça não reconhece, efetivamente, o curso de criminólogo como um curso, como uma
habilitação solicitada e expressamente reconhecida e, portanto, o entrave ao reconhecimento da profissão
está, hoje, no Governo.
Temos esperança, e, por isso, iremos votar a favor dos projetos de resolução que estão em cima da mesa,
de que, efetivamente, esta situação se desbloqueie e se proceda ao reconhecimento destes profissionais.
Perante um curso homologado pelo próprio Estado, como habilitação necessária nos serviços de
segurança interna, nas diferentes modalidades que existem e onde podem exercer funções, sendo um curso
necessário e reconhecido, é inaceitável que seja o próprio Governo o obstáculo ao reconhecimento desta
profissão.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Para terminar, quero dizer que iremos continuar a acompanhar este
processo e esta justa reivindicação dos criminólogos portugueses, seja com este Governo ou com o futuro
Governo que se proporcione ao nosso País.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, no escasso tempo de que ainda dispõe, tem
a palavra o Sr. Deputado Cristóvão Simão Ribeiro.
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O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: De forma muito breve, e
recorrendo, também aqui, à senda dos provérbios populares, queria dizer a esta Câmara que, na gíria e lá
pelas bandas da minha terra, costuma dizer-se que «depois da senhora casada, não lhe faltam pretendentes».
Aplausos do PSD.
Protestos do PCP.
E também se costuma dizer, a contrario, que, depois da criança nascida, há sempre dúvidas e questões de
fundo, aquando da paternidade ou da assunção da paternidade quanto ao resultado de uma relação.
Não pretende aqui esta bancada, esta maioria ou até a Juventude Social Democrata, a que presido, e que
tomou a dianteira desta iniciativa, debater a fundo ou, de resto, criar qualquer tipo de discussão em torno deste
assunto, pretendemos, antes, isso sim, que este problema seja resolvido, ajudando a vida das centenas de
jovens que disso necessitam.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — Estamos, naturalmente, disponíveis, e assumimos este
compromisso, para que, de acordo com um diálogo aberto e global com os partidos que compõem esta
Câmara, possamos chegar a uma solução que melhore, efetivamente, a vida deste conjunto de jovens.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Com alguns anos de atraso!
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que está encerrado o
debate conjunto dos projetos de resolução n.os
1483/XII (4.ª), 1542/XII (4.ª) e 1549/XII (4.ª) e da petição n.º
261/XII (2.ª).
Vamos passar à apreciação da petição n.º 473/XII (4.ª) — Apresentada pela Sociedade Portuguesa de
Engenharia de Reabilitação e Acessibilidade (SUPERA), solicitando à Assembleia da República a criação de
legislação sobre residências e melhoria dos cuidados prestados a pessoas com deficiência motora grave.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raúl de Almeida.
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados: No início desta
intervenção, começaria por cumprimentar os peticionários pela iniciativa e pelo foco importante que revela.
Já temos falado aqui, neste Plenário, neste Parlamento, sobre a necessidade de construção de um
caminho cada vez mais eficaz de integração das pessoas com deficiência. Esta petição ajuda-nos também
nesse caminho, traz ideias novas e pistas para o desenvolvimento de políticas que qualquer Governo deverá
adotar, e que nós saudamos, pois são um encorajamento para cada vez mais podermos produzir um trabalho
mais eficiente. E isto leva-nos a fazer aqui um histórico daquela que tem sido a ação deste Governo, muito em
particular através do Ministério da Solidariedade, do Emprego e da Segurança Social, precisamente em muitos
dos pontos que são referidos.
Tem sido um aspeto importante apoiar e impulsionar a experimentação de projetos inovadores, o que vem
sendo feito, desde há muito, por este Governo, na área da deficiência: uma atuação em diálogo e proximidade,
sempre, com as organizações representativas destas pessoas, que tem permitido o exercício de tomada de
decisões e a experimentação de intervenções inovadoras e emergentes para estas pessoas. Isto inclui-se
também muito num ponto que esta petição trata, que é o da autonomia, da capacidade de acesso destas
pessoas à sua residência, da forma como podem viver na sua residência com a maior independência possível.
E, neste domínio, desde as políticas que ditaram a criação e o reconhecimento profissional dos cuidadores a
todas as políticas que o Ministério da Solidariedade, do Emprego e da Segurança Social tem levado a cabo,
todas vão no sentido desta ajuda externa a estas pessoas, na sua casa, no seu lar, onde se sentem mais
realizadas, mais felizes e com maior autonomia, com a valorização seja das suas vidas, seja da vida dos
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profissionais que as ajudam. E não podemos esquecer que isto não se faz só pela via profissional, faz-se
também pelo encorajamento das políticas de boa vizinhança, de políticas que integram a pessoa cada vez
mais e melhor na sua circunstância.
Portanto, há já aqui um caminho andado, a nível dos cuidados pessoais e de higiene, das atividades
domésticas, dos cuidados de alimentação e nutrição, das atividades instrumentais quotidianas, das
deslocações a serviços de saúde e ao próprio trabalho, das atividades de mediação da comunicação e de
participação social na educação cívica, na cultura, no desporto e no lazer.
Fala-se também aqui da questão arquitetónica. Não a escamoteamos, é muito importante e o próprio
Estado tem de dar ainda passos importantes nesta matéria, mas tem-se feito muito, temos avançado muito,
embora seja um caminho que não termina aqui e que deve ter continuidade.
Lembramos também, e é muito importante, que, no Portugal 2020, o Governo tem linhas dedicadas só a
esta matéria da autonomia e da valorização da autonomia dessas pessoas seja através da rede dos
cuidadores de proximidade, seja através das redes de vizinhança, de que já falei, ou de pessoas próximas das
pessoas com deficiência e incapacidade no desenvolvimento do apoio a prestar, de forma a evitar por todos os
meios a institucionalização, que é o que, sempre que possível, nos parece desejável.
Este é um caminho. É um caminho de investimento, é um caminho em que este Governo tem investido de
forma clara, é um caminho que não termina hoje e a nossa atenção permanente, dedicada, a estas pessoas
deve ser a nossa forma de vida, porque é pelo exercício de direitos, é pelo exercício da democracia…
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — … e é, Sr. Presidente, pelo exercício dos direitos humanos que
sempre devemos pugnar nesta Casa.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado David Costa.
O Sr. David Costa (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP saúda a
SUPERA, Sociedade Portuguesa de Engenharia de Reabilitação e Acessibilidade, como primeiro peticionário,
e todos os cidadãos subscritores da petição em apreço, com mais de 5400 assinaturas.
Tendo como objeto, na defesa dos direitos das pessoas com deficiência motora severa, a adoção de um
novo modelo de abordagem na criação de infraestruturas e residências preparadas para receber as pessoas
com deficiência motora grave, os peticionários apresentam um conjunto de propostas concretas que visa a
criação de condições de vida digna e independente.
Em boa verdade, são ainda muitos os exemplos concretos de falta de legislação ou de não aplicação da lei
vigente que regule esta matéria, especificamente quer em infraestruturas do poder local, central e regional,
quer no setor social ou em residências privadas, onde assistimos a barreiras arquitetónicas, impeditivas da
mobilidade das pessoas com deficiência motora severa.
O PCP, que acompanha e identifica todos estes problemas colocados pelos peticionários, e perante a
inércia governamental do PSD/CDS, que se recusam a ver aquilo que é a realidade sentida por estes
cidadãos, apresentou uma iniciativa legislativa que visava a criação de um programa-piloto de apoio à vida
independente para pessoas com deficiência agravada.
Na sua própria habitação, com condições de independência e autonomia, promovendo a inserção na vida
profissional das pessoas com deficiência, o PCP propôs a criação de um programa-piloto, em articulação e
com o envolvimento das organizações das pessoas com deficiência, que visava definir os objetivos, critérios,
tipos de resposta, quantidade de apoios, natureza dos apoios e procedimentos de uma futura prestação social
de apoio à vida independente para pessoas com deficiência agravada e reduzida autonomia.
A ser aprovada, a proposta do PCP iria não só permitir melhorar a autoestima destes cidadãos e aliviar a
pressão sobre os membros da família, como proporcionar às pessoas com deficiência mais oportunidades de
participação plena na vida económica e social da comunidade.
O PSD e o CDS chumbaram a nossa proposta!
Propusemos, ainda, a criação de um serviço-piloto de assistentes pessoais, com formação nas várias
áreas, designadamente na assistência a cuidados de higiene, tarefas domésticas e serviços sociais, como o
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apoio no emprego, no acesso a equipamentos de desporto, cultura e lazer e no desenvolvimento da vida
social.
O PSD e o CDS chumbaram a nossa proposta!
O PCP continuará a bater-se pela consagração de uma adequada legislação para os cidadãos com
deficiência que garanta todos os direitos constitucionalmente previstos e um caminho com dignidade e
independência para todos os portugueses, repito, para todos os portugueses, em respeito pelos valores de
Abril.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Idália
Salvador Serrão.
A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Queria saudar a Sociedade
Portuguesa de Engenharia de Reabilitação e Acessibilidade, que apresenta esta petição.
Não deixa de ser irónico que seja esta Sociedade, a SUPERA, a apresentar-nos esta petição, quando o
Governo acabou com o curso de Engenharia de Reabilitação, na UTAD (Universidade de Trás-os-Montes e
Alto Douro), impedindo, desta forma, que estes profissionais exerçam a sua atividade, mas fazendo também
tudo para que as barreiras arquitetónicas, tão importantes, e as outras barreiras não sejam derrubadas, porque
esta mensagem é uma mensagem que o Governo dá à sociedade, que é muito explícita: para o Governo, a
reabilitação, a engenharia de reabilitação, a deficiência não são, de facto, uma prioridade.
Por isso, bem podem o Governo, o PSD e o CDS dizer que têm tudo resolvido, quando o que foi feito foi
muito pouco. Os senhores dizem que aumentaram a capacidade de acolhimento, aumentando o número de
camas; promovem a formação de cuidadores, como já aqui foi dito, aliás, formaram 400 assistentes pessoais,
cuidadores de proximidade, quando o que fizeram foi aprofundar o apoio domiciliário. Estas respostas são
importantes, mas por si só não chegam.
Por isso, Caras e Caros Colegas Deputados, enquanto o Governo e os Deputados da maioria não
distinguirem o que são pessoas com deficiência com e sem capacidade para o trabalho, enquanto não derem
condições às pessoas com deficiência que têm capacidade para o trabalho, que querem trabalhar, que
precisam de apoio para a autonomia, não estarão a desenvolver políticas direcionadas para as pessoas com
deficiência, na sua diversidade.
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Demagogia pura!
A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Mas também quem inscreve no Orçamento do Estado para 2015 um
corte de 100 milhões de euros, invocando um teto social que nunca conseguiu explicar; quem inventa, depois
de muito apertado, um subsídio social de doença, prestação que não existe; quem, nos últimos dias, vem falar
de uma taxa de proteção social para tentar mostrar serviço, taxa de proteção social que também não existe, é
natural que sejam os mesmos que olham para as pessoas com deficiência sem atender às suas
características individuais, às suas realidades e às suas necessidades.
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Não diga isso!
A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Projetos inovadores, Sr. Deputado do CDS?! Estão parados!
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Parados?!
A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Participação das pessoas com deficiência?! Os cidadãos foram
descartados! Foram eles que nos disseram aqui, no Parlamento, que foram descartados, não obstante, depois
da vigília que fizeram no fundo das escadas do Parlamento, o Governo os ter iludido com promessas que não
cumpriu.
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Portanto, Sr.as
e Srs. Deputados, as pessoas com deficiência e que têm capacidade para o trabalho querem
ter autonomia, querem trabalhar, querem ter um financiamento direto para poderem escolher o assistente
pessoal que melhor se adapte às suas características e à sua situação e querem, sobretudo, deixar de ser os
eternos beneficiários para onde os senhores os continuam a empurrar para poderem ser contribuintes.
Protestos do Deputado do CDS-PP Raúl de Almeida.
É aí que reside a questão, Sr. Deputado!
Mas o Governo não entende. Aliás, ou não entende ou não tem a humildade para querer aprender,
aprender com as pessoas com deficiência, de quem tanto os senhores falam, e nem quer dar autonomia a
estes cidadãos.
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Não diga isso!
A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Esta não é a posição do Partido Socialista.
As pessoas com deficiência têm direitos que estão consagrados na Constituição da República Portuguesa
e em instrumentos que foram assinados e ratificados pelo Estado português, como a Convenção sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.a Deputada.
A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo que os Governos, Sr.as
e Srs.
Deputados, tudo têm de fazer para garantir a estas pessoas condições de autonomia.
Aplausos do PS.
O Sr. Raúl de Almeida (CDS-PP): — Lamentável!
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís
Ferreira.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: As minhas primeiras
palavras são, naturalmente, para saudar, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes»,
os milhares de cidadãos que subscreveram a petição que agora estamos a discutir, uma saudação que se
estende também à Sociedade Portuguesa de Engenharia de Reabilitação e Acessibilidade pelo trabalho que
desenvolveu na dinamização desta petição, através da qual se reclama a criação de um quadro legislativo
sobre residências e melhorias nos cuidados prestados a pessoas com deficiência motora severa.
Estamos, portanto, a discutir uma petição e uma matéria que, do ponto de vista do Partido Ecologista «Os
Verdes», reveste a maior importância e cuja atualidade é absolutamente inquestionável, sobretudo se
considerarmos a forma como o Governo PSD/CDS tem olhado para a importância das prestações sociais, — o
que fica claramente visível nos cortes assustadores que, ao longo do tempo, este Governo foi fazendo às
prestações sociais e que vieram agravar ainda mais a delicada e frágil situação em que se encontram as
pessoas que são agora, e bem, objeto de atenção por parte dos cidadãos que subscreveram a presente
petição.
De facto, este Governo não se limitou apenas a não proceder às justas e adequadas atualizações seja das
pensões de invalidez, seja das pensões sociais de invalidez. O Governo procedeu, ainda, a cortes
substanciais nessas pensões, o que, naturalmente, veio agravar a situação das pessoas beneficiárias dessas
mesmas prestações sociais.
O mesmo se diga relativamente ao subsídio por assistência de terceira pessoa, do complemento por
dependência ou, até, do subsídio mensal vitalício, cujos magros valores estão muito longe das necessidades
das pessoas, perante a indiferença e até a insensibilidade do Governo que, enfim, só tem olhos para a banca.
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Importa, portanto, sublinhar a defesa dos direitos fundamentais das pessoas com deficiência motora
severa, que necessitam de residências devidamente adaptadas às suas capacidades, mas também de meios
para poderem contratar alguém que lhes assegure o necessário apoio.
É, pois, imperioso promover a qualidade de vida das pessoas com deficiência motora severa e criar as
condições para que possam exercer a sua cidadania.
Resta-nos apenas dizer que partilhamos as preocupações dos peticionantes e acompanhamos na íntegra
os seus propósitos e objetivos. O Partido Ecologista «Os Verdes» manifesta, desde já, a sua inteira
disponibilidade para, em conjunto com os outros grupos parlamentares, havendo vontade nesse sentido,
encontrar soluções legislativas que possam ir ao encontro das pretensões expressas nesta petição.
Ficamos a aguardar, Srs. Deputados do CDS. Ficamos a aguardar, Srs. Deputados do PSD.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.a Deputada Maria
Conceição Pereira.
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Sr. Presidente, começo por cumprimentá-lo a si, bem como as
Sr.as
e os Srs. Deputados.
Em nome do Grupo Parlamentar do PSD, quero cumprimentar os mais de 5000 cidadãos que
subscreveram esta petição, que, como já aqui foi dito, tem como primeiro peticionário a SUPERA, Sociedade
Portuguesa de Engenharia de Reabilitação e Acessibilidade.
É bom também dizer que, na audição que tivemos aos peticionários, estes se fizeram acompanhar de
alguns elementos do Movimento Deficientes Indignados, a quem também saudamos. É bom lembrá-los!
Os signatários da petição, como aqui já foi dito, pretendem a criação de legislação sobre residências e a
melhoria dos cuidados prestados a pessoas com deficiência motora. Fundamentam esta pretensão nos
direitos fundamentais que assistem às pessoas portadoras de deficiência motora severa e na falta de
condições das entidades ou associações para receberem essas pessoas.
Este Grupo Parlamentar e este Governo acompanham estas pretensões e quero dizer-lhe, Sr.a Deputada
Idália Serrão, que este Grupo Parlamentar não aceita lições de moral em relação à questão da deficiência.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Nós não estamos aqui para iludir nem os deficientes, nem os
portugueses em geral, como os senhores iludiram prometendo um país cor-de-rosa que não existia e que nos
levaram quase à bancarrota. Essa é que é a verdade, Sr.a Deputada!
Aplausos do PSD.
Protestos da Deputada do PS Idália Salvador Serrão.
Nós ouvimos as pessoas e também ouvimos essas pessoas que estiveram ao fundo da escadaria.
A Sr.ª Idália Salvador Serrão (PS): — Não parece!
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Não parece é que a Sr.a Deputada queira ouvir.
O Sr. Adão Silva (PSD): — É má vontade!
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Tanto não quer ouvir que interrompe!
Protestos da Deputada do PS Idália Salvador Serrão.
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Mas, Sr.a Deputada, este Governo procedeu a várias iniciativas e posso dizer-lhe que até nas áreas da
arquitetura e das barreiras arquitetónicas procedeu a alterações ao Código Civil que, hoje, permitem, muitas
vezes, aos condóminos ou àqueles que tiverem familiares com problemas a colocação de rampas de acesso
ou de plataformas.
Foi também este Governo — queira ou não a senhora ouvir — que aumentou o número de lares
residenciais, com zonas para casais e salas autónomas para receberem as suas visitas. Pois é, de 201
acordos, em 2011, passámos para 267 acordos e mais de 5000 utentes.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Ora bem!
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Esta é a realidade.
Em residências autónomas, de 15 acordos passámos para 50 acordos; de 99 para 275. Isto é que é
política! Isto é que é trabalhar a favor das pessoas que precisam do nosso apoio!
Foi também este Grupo Parlamentar do PSD, juntamente com o CDS, que apresentou um projeto de lei
para melhorar as condições de concessão de crédito bonificado à habitação da pessoa com deficiência, hoje,
a Lei n.º 64/2014. É bom lembrar, Sr.a Deputada!
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — É também este Governo que, como já referiu o Sr. Deputado
Raúl de Almeida, inscreveu as verbas necessárias, porque, sem dinheiro, e é costume dizer — há pouco, o
Deputado Cristóvão Simão Ribeiro usava uns ditos populares — que «sem ovos não se fazem omeletas». Por
isso, é preciso inscrever as verbas para que possamos criar os modelos de vida independente. Este Governo
fê-lo, e não o fez em ilusões, repito, não o fez em ilusões!
Sr.a Deputada, esta proposta já está consubstanciada através da publicação da Portaria n.º 97/2015, de 30
de março.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Exatamente!
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Esta é que é a realidade! Portanto, não são palavras, nem
promessas vãs.
Este programa operacional, para além disto, como já foi dito, prevê uma rede de cuidadores de
proximidade, e, por isso, em relação às candidaturas, prevê-se a sua abertura para breve. Estamos certos de
que estes programas vão concretizar muitos dos anseios e dos pedidos das pessoas com deficiência.
Por isso, saudamos, uma vez mais, os subscritores desta petição.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Quero dizer também ao Sr. Deputado David Costa que não
aprovámos os vossos projetos porque eram uma redundância de um trabalho que já vinha sendo
desenvolvido.
O Sr. João Oliveira (PCP): — É preciso descaramento para dizer uma coisa dessas!
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Por isso, é bom registar.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Nós não queremos redundâncias!
A Sr.ª Maria Conceição Pereira (PSD): — Quero aqui também dizer, mais uma vez, que as pessoas
portadoras de deficiência podem acreditar que este Governo e esta coligação nunca deixarão para trás quem
mais merece a nossa atenção e o nosso empenho.
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana
Aiveca.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Começo por saudar os
peticionários, na pessoa da Sociedade Portuguesa de Engenharia de Reabilitação e Acessibilidade, que
dinamizaram esta petição subscrita por mais de 5000 cidadãos e cidadãs.
Gostaria de dizer, Sr.as
e Srs. Deputados, que não gosto, não gostamos e pedimos, por favor, que evitem,
quando se discutem assuntos sérios, fazer apenas balanços do que uns já fizeram ou do que outros já fizeram.
As pessoas estão fartas deste discurso!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Olha que esta!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Esta problemática é demasiado séria para virem aqui contar espingardas
sobre as pequeninas coisas que uns e outros fizeram ou não fizeram.
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Pensei que estava a referir-se ao PS!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Por isso, gostaria de colocar esta problemática tão importante que aqui é
invocada nesta petição no centro de um debate sério.
O Sr. Amadeu Soares Albergaria (PSD): — Essa é a grande história do Bloco de Esquerda!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Já se fizeram muitas coisas, pequenas coisas, mas que têm grande
importância em termos de caminho da própria sociedade e de conceito relativamente a como se encaram hoje
as pessoas com deficiência. Esse caminho da sociedade não é bandeira de nenhum Governo, é bandeira do
País, de todos nós, individualmente considerados e coletivamente empenhados.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Só os senhores é que têm bandeiras!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Esta discussão que permanentemente se faz de passa-culpas, de balanços
é uma discussão que não ajuda em nada à seriedade do debate, porque estamos a falar de coisas
absolutamente sérias.
Este era o apelo que queria fazer.
Falando agora na petição, nesta linha, creio que todos e todas temos obrigação de assumir que estes
cidadãos e cidadãs devem ter autonomia, uma vida independente e todos os contributos são importantes. Esta
petição dá-nos pistas para uma legislação mais profunda, mais adequada e o Governo deveria assumir, de
uma forma modesta, que ainda falta fazer muito para que o caminho da igualdade na diferença, que é o
caminho da democracia e da liberdade, tenha a sua plenitude.
É nesta perspetiva que o Bloco de Esquerda sempre discute as temáticas dos cidadãos e das cidadãs com
deficiência.
Termino dizendo que a 28 de abril deste ano fizemos uma audição subordinada ao tema «Promoção da
autonomia pessoal, vida independente», onde ouvimos muitos movimentos e relatos na primeira pessoa que
nos devem convocar para alterar a legislação. Esta legislação das barreiras arquitetónicas é de grande
importância e terão de reconhecer os partidos que têm estado no Governo que não está tudo feito e que há
um caminho longo a percorrer.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — É essa responsabilidade que nos convoca, hoje, a todos e que
responsabiliza mais quem está no Governo, obviamente.
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Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — A Mesa não regista mais inscrições relativas à petição n.º 473/XII
(4.ª).
Assim sendo, passamos ao ponto 7 da ordem do dia, que consiste na discussão da petição n.º 450/XII (4.ª)
— Apresentada por Paulo Jorge Melich Farinha e outros, para o estabelecimento de um serviço público de
transporte marítimo regular de passageiros por ferryboat entre a Ilha da Madeira e o Continente,
conjuntamente com o projeto de resolução n.º 1546/XII (4.ª) — Transporte por ferryboat entre o Continente e a
Madeira (BE).
Para apresentar o projeto de resolução do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana
Mortágua.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Começo por cumprimentar os
peticionários, partilhando da análise e do diagnóstico que fazem.
Sabemos bem que a insularidade tem custos graves para as regiões autónomas — e isso aplica-se à
Madeira e aos Açores —, sabemos que esses custos devem ser combatidos com políticas públicas e também
sabemos como a austeridade tem prejudicado as regiões autónomas a nível fiscal, a nível das ajudas e das
transferências que tanto precisam para combater os efeitos da insularidade.
Mas os efeitos da insularidade também devem ser combatidos com uma rede de transportes eficiente,
acessível e diversificada que responda às necessidades destas populações. Acontece que isso, neste
momento, não está a ser cumprido no caso da Região Autónoma da Madeira e isso começa logo na ligação
entre o continente e a Madeira que, neste momento, apenas é assegurada por uma via aérea. Isso não pode
ser e é fácil perceber porquê.
Não podemos ter uma parte do nosso País dependente unicamente de um meio de transporte ou de uma
infraestrutura de aeroporto.
É fácil perceber que, no dia em que acontece alguma coisa ao meio aéreo, por condições meteorológicas
ou porque há um problema com as infraestruturas aéreas, a zona da Madeira fica isolada do resto do País e
do resto do mundo por falta de alternativas de transporte.
É fácil perceber que os cidadãos e as cidadãs da Madeira, quando se deslocam ao continente, devem
poder trazer as suas viaturas para poderem circular aqui, como cidadãos nacionais que são, sem terem de
alugar um carro, coisa que seria desnecessária se houvesse um ferry que pudesse fazer esse transporte.
É fácil perceber que um cidadão ou uma cidadã que seja sujeito a uma operação e que esteja proibido de
andar de avião ou a quem seja recomendado que não se desloque por via aérea deve ter uma alternativa para
se deslocar entre a sua residência e o continente, onde há centros hospitalares que, por exemplo, fazem
operações às cataratas. E devem poder fazê-lo o mais rapidamente possível, com o maior conforto possível.
É fácil até perceber que o cidadão que tem medo de andar de avião não pode ficar para sempre condenado
na Madeira e tem de poder aceder ao continente, tem de conseguir sair da Região Autónoma da Madeira.
Por isto, parece-me que ninguém defende a não introdução, ou reintrodução, de um meio de transporte
marítimo como o ferryboat que faça uma ligação entre o continente e a Região Autónoma da Madeira.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Termino, Sr. Presidente.
É isso que vimos recomendar acrescentando mais um ponto: que seja reintroduzido rapidamente e que
essa reintrodução seja feita segundo critérios de serviço público. Isto porque é disso que se trata: de serviço
público, de coesão territorial, de desenvolvimento económico e social da Região Autónoma da Madeira.
É isso que vimos propor.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Barreto.
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O Sr.Rui Barreto (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Hoje, debatemos não só uma petição,
mas também um projeto de resolução do BE sobre uma matéria muito importante.
Começo por saudar, na pessoa do Sr. Paulo Jorge Farinha, todos os peticionários que trouxeram esta
matéria ao Parlamento nacional. Trata-se de uma matéria de especial relevância e que nos tem preocupado a
todos, povo insular.
Nunca é demais referir que aqueles que vivem numa ilha têm de enfrentar enormes constrangimentos à
mobilidade e também obstáculos ao comércio de mercadorias entre o continente e as regiões autónomas.
É bom recordar também que no século passado tivemos transporte de passageiros, até 1978, entre o
continente e as regiões autónomas. Houve um interregno de 23 anos e, mais recentemente, em 2008, tivemos
uma operação entre a Madeira, as Canárias e Portimão que vigorou até 2012.
Por isso, entendemos que um País como o nosso, com uma história marítima relevante e que teve no
passado uma marinha mercante à escala global, deve centrar este assunto nas suas prioridades.
Devo dizer que a Madeira e os Açores são as duas únicas regiões na Europa sem transporte marítimo de
passageiros para o respetivo continente e isso deve ser motivo bastante para nos mobilizar a todos no sentido
de encontrarmos uma solução para reduzir estas assimetrias.
Recentemente, é verdade, com a visita oficial do Sr. Primeiro-Ministro e também do Ministro da Economia à
Região Autónoma da Madeira, este assunto foi colocado na agenda e foi criada uma comissão conjunta entre
a Região Autónoma da Madeira e o Governo da República no sentido de encontrar uma solução para que seja
reposta a linha de transporte de passageiros e de mercadorias entre a Madeira e o continente.
Por isso, desejamos que este assunto possa merecer toda a atenção e que seja colocada toda a energia
no sentido de potenciar a mobilidade dos madeirenses para o continente, mas também que constitua uma
oportunidade para o povo continental e aqueles que chegando aqui, de outras paragens, também possam
chegar à Madeira. É uma oportunidade para aproximar os povos, para fomentar o comércio e, assim, reduzir
as assimetrias que são evidentes e que nos convocam a todos.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Começo por cumprimentar os
peticionários e por relembrar que os madeirenses e os porto-santenses são e têm de ser cidadãos
portugueses de pleno direito.
Os seus direitos, a mobilidade e a coesão territorial não podem ser deixados ao sabor das agendas e dos
interesses de um suposto mercado que, pelos vistos, não aparece.
E quando falamos, de facto, do objeto da petição, ele corresponde à necessidade de se criar uma
alternativa às viagens aéreas entre a Região Autónoma da Madeira e o continente, que contribuiria para a
correção de desigualdades quanto à mobilidade no território nacional e para dar corpo ao princípio da
continuidade territorial. Até porque não pode ser ignorada a ideia de que o transporte marítimo tem um valor
próprio e um papel estratégico no desenvolvimento, na coesão e na soberania nacionais.
No que respeita a esta região ultraperiférica, consideramos que são de apoiar todas as possibilidades de
melhoria e avanço no transporte público para prover às necessidades das populações e da economia local e
regional, nomeadamente no transporte marítimo de/e para o continente e entre ilhas, apesar de já existir um
subsídio de mobilidade para o transporte de passageiros por via marítima que, em boa verdade, não tem ainda
onde se aplicar porque, neste momento, a ligação não existe. Na Madeira, falava-se do restabelecimento da
ligação marítima supostamente para o mês de maio— ligação marítima que, durante algum tempo, foi
realizada por um operador espanhol, mais concretamente das ilhas Canárias —, mas tal não aconteceu até
agora e fala-se que será lá mais para o fim do ano. Vamos ver!
Relativamente à solução que está apontada quer na petição, quer no projeto de resolução parece-nos que
seria mais adequado considerar a promoção efetiva do serviço público que permitisse uma garantia mais
sólida neste domínio dos transportes marítimos quer quanto ao serviço prestado, quer quanto aos preços
praticados.
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A este propósito, recordamos a posição e a proposta apresentada, há anos, pelo Sindicato dos Capitães,
Oficiais, Pilotos, Comissários e Engenheiros da Marinha Mercante no sentido de que o País pudesse
aproveitar a oportunidade do novo Quadro Comunitário justamente para proceder a esse investimento
estratégico para o nosso desenvolvimento e para a tal aposta no mar. Essa proposta pretendia a dinamização
de uma marinha mercante de bandeira nacional, de comércio e de pesca, apoiada nas capacidades dos
estaleiros navais nacionais.
Claramente as opções políticas seguidas pela troica, ou pelas troicas — a nacional e a estrangeira —, têm
sido no sentido contrário a essa estratégia de desenvolvimento do setor marítimo-portuário nacional e, pelos
vistos, também neste domínio, continuamos a depender, na prática, das capacidades e das opções de
operadores de outros países e, portanto, os pré-anúncios e anúncios de apoios e os apoios decididos ficam
sempre em função de eventuais serviços que por ali passem e façam escala.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Termino, Sr. Presidente, dizendo que não desistimos, Srs. Deputados, de
trazer para esta discussão este ponto fundamental: Portugal tem de voltar a ter uma verdadeira marinha
mercante e tem de voltar a ter uma política de serviço público, em defesa das populações, da coesão
territorial, do desenvolvimento e da soberania.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jacinto
Serrão.
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: As minhas primeiras palavras vão
para os mais de 4500 peticionários que, de forma abnegada, tudo têm feito para restabelecer as ligações
marítimas de passageiros entre o continente e a Madeira.
São cidadãos de todo o País — da Madeira, do continente e até mesmo dos Açores — e são a expressão
máxima do sentimento de unidade nacional que une todos os portugueses.
Segundo a Constituição da República Portuguesa, cabe sobretudo ao Estado promover a correção das
desigualdades derivadas da insularidade das regiões, visando a plena consagração dos direitos de cidadania
dos residentes nas ilhas.
Estes princípios, constitucionais e estatutários, remetem para a obrigação do Governo em garantir os
transportes regulares e acessíveis para a mobilidade de todos os portugueses e a salvaguarda do princípio da
coesão social, económica e territorial.
Assim, a presente petição remete para a necessidade de um novo modelo de transportes marítimos e de
uma visão política por parte de quem governa, voltada para o mar, para potenciar a nossa economia e também
para a afirmação do nosso País no mundo.
Claro que estas pretensões só podem ser concretizadas se o Governo da República e o Governo Regional
tiverem vontade para eliminar as barreiras que existem neste momento nos portos portugueses e, acima de
tudo, coragem para enfrentar os interesses instalados, interesses que, demonstradamente, estão longe de
servir o bem-comum.
Por fim, e até mesmo como Deputado relator desta petição, deixo duas observações que acho pertinentes.
Olhamos com muita apreensão a ausência de resposta do Governo da República para os problemas
identificados e que são da sua responsabilidade executiva direta.
Registe-se, também, a atitude irresponsável e inadmissível dos governos regionais, que criaram todos e
mais alguns obstáculos na operacionalização do Porto do Funchal, obstáculos que determinaram, em parte, o
abandono da ligação estabelecida pelo operador privado que fez, com êxito, esta ligação durante quatro anos
e sem subsídios estatais.
Ao Sr. Deputado do CDS, que acabou de fazer referência a que existe agora uma vontade por parte do
Governo da República em criar uma comissão, devo dizer-lhe que isto faz-me lembrar um velho clássico:
quando não se quer resolver um problema, cria-se uma comissão para o estudar!
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Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Ora, Sr. Deputado, os problemas estão identificados e o que nós precisamos
é de medidas concretas para a solução do problema.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco
Gomes.
O Sr. Francisco Gomes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A petição que hoje
consideramos está assente em três fundamentos diferentes.
Existe um fundamento jurídico-constitucional claro, que emana do estatuto político-administrativo da Região
Autónoma da Madeira e da Constituição da República Portuguesa, nomeadamente, o princípio da
solidariedade e o princípio da continuidade territorial, que preveem a intervenção do Estado no sentido de
reduzir as assimetrias geradas pela condição de ultraperiferia.
Existe um segundo fundamento, um fundamento social, que tem a ver com a criação de uma alternativa
viável ao transporte aéreo de cargas e de pessoas para os portugueses residentes na Região Autónoma da
Madeira.
Existe um terceiro fundamento, um fundamento económico, que tem a ver com reduzir os sobrecustos
gerados para a economia da Madeira pelo afastamento do mercado da Madeira relativamente ao mercado do
continente e de todos os outros mercados situados fora da ilha.
Ora bem, todos estes três fundamentos estão referidos no texto da petição e cada um deles, só por si,
justifica a nossa sensibilidade e a nossa aceitação desta petição. Mas existe uma quarta razão, um quarto
fundamento, que apoia esta petição e as medidas que estamos aqui a debater, que é um fundamento nacional
e que tem a ver com o nosso caráter como Nação atlântica.
Temos orgulho no País que somos, temos orgulho nas diferentes regiões que constituem o nosso País e na
riqueza social, humana e cultural que trazem a Portugal.
Temos até orgulho na vastidão geográfica que as nossas regiões conferem ao País e na pujança
geoestratégica que, particularmente, as autonomias nos conferem no espaço do Atlântico. Mas também
sabemos que quanto mais nos apegamos à noção de Portugal atlântico mais acerrimamente temos de
defender a ideia de que nenhum português pode ser refém da região onde nasce e nenhum português merece
ter a pairar sobre a sua cabeça o estatuto de cidadão de segunda ou de terceira categoria por causa da forma
como o sistema de transportes está organizado no seu País.
Sr.as
e Srs. Deputados, é isto que está aqui em causa, a criação de um Portugal mais coeso, mais unido e,
por isso, mais forte, e sabemos que a luta por estes valores, num cenário pós-crise, não é uma luta fácil, mas
esta Assembleia da República não pode demitir-se dessa luta, esta Assembleia da República não se demite
desse debate, não se demite dessa discussão.
Por isso, Srs. Deputados, o caminho está traçado, as opções estão feitas e é à vossa sensibilidade para
esta petição, para estas medidas, que faço o apelo para que a consideremos, que a aceitemos e demos um
passo em frente no sentido de estarmos à altura de um Portugal mais coeso.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Não há mais inscrições relativamente a este ponto.
Vamos passar ao ponto seguinte e último da nossa ordem de trabalhos, a apreciação da petição n.º 452/XII
(4.ª) — Apresentada pelo SINTAP (Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública e Entidades com
Fins Públicos), solicitando à Assembleia da República que tome medidas urgentes contra a aplicação do
regime de requalificação da segurança social.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Cardoso.
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O Sr. António Cardoso (PS): — Sr. Presidente Sr.as
e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, em nome do PS,
quero saudar e felicitar o SINTAP pela presente iniciativa — defesa dos postos de trabalho na segurança
social —, ao que o Partido Socialista acrescenta, como forma de defender a dignidade e a qualidade no
funcionamento dos serviços públicos.
Os peticionários destas medidas pedem urgência para se pôr termo ao desmantelamento do Estado social
e de direito, como é de lei e de justiça, revogando a decisão de aplicação da requalificação na segurança
social.
Consideram os peticionários que há falta de trabalhadores nas mais diversas áreas da segurança social,
tendo esta perdido, nos últimos três anos, cerca de 2500 trabalhadores. Perante estes dados, consideram
irracional que se fragilize a segurança social com o envio para a requalificação/despedimento de 697
trabalhadores e trabalhadoras, que mais não é do que procurar extinguir no mapa de pessoal, de forma cega,
estes postos de trabalho.
A presente petição deu entrada em dezembro de 2014 e, pese o facto do tempo decorrido, mantém toda a
atualidade e oportunidade, pelo que faz todo o sentido a sua apreciação.
O País assiste à destruição de tudo o que envolve serviços públicos. Este Governo tem uma antipatia, para
não dizer perseguição, aos serviços públicos. Esta cegueira é perigosa, pois põe em causa a dignidade e
qualidade do funcionamento dos serviços públicos, nomeadamente no atendimento presencial ao público, nas
áreas processadoras de prestações e contribuições, no acompanhamento técnico das famílias disfuncionais,
nas respostas sociais nas IPSS, na intervenção social da rede privada, às quais foram emitidos licenciamentos
pela segurança social.
A saída de profissionais debilita o funcionamento das diversas áreas da segurança social, levando ao
inevitável encerramento dos respetivos serviços, complicando a vida dos cidadãos.
Para o PS, a insistência deste Governo nestas políticas erráticas só agrava as desigualdades sociais no
nosso País, onde assistimos a uma degradação e abandono dos serviços públicos. Situemo-nos no
funcionamento das CPCJ. Cada vez mais temos um maior número de crianças em situação de abandono e
sem proteção, vítimas do crescimento da pobreza infantil, dadas as suas naturais fragilidades e
vulnerabilidades.
A pobreza infantil, em Portugal, atingiu números assustadores que nos levam a recordar os tempos
longínquos de tristeza e medo antes do 25 de Abril. É tempo de travar as políticas erradas deste Governo, não
queremos o regresso ao tempo da canção de intervenção, que dizia: «As crianças passam fome com os
dentes enterrados no pão que ninguém mais come».
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria das
Mercês Soares.
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Permitam-me que as
minhas primeiras palavras sejam de saudação, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata,
aos 4123 cidadãos que subscreveram a petição n.º 452/XII, pela defesa dos postos de trabalho na segurança
social, que aqui hoje debatemos.
O exercício cívico que os peticionários exerceram deve ser realçado, pois reforça o nosso sistema
democrático, dando expressão às espectativas e aspirações dos cidadãos. Lamento é que frases
demagógicas, como aquela que o Sr. Deputado do Partido Socialista aqui usou, utilizando «crianças»,
utilizando «fome», se enquadrem neste debate. Os senhores podem estar em campanha eleitoral mas, com
esta matéria, nós não estamos; é demasiado séria e nobre para a usarmos.
Aplausos do PSD.
Mas vejamos o que estes peticionários pedem. O exercício cívico destes peticionários pretende chamar a
atenção desta Assembleia da República para a questão do envio de 614 trabalhadores da segurança social
para a requalificação.
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Recordemos uma situação que é extremamente importante aqui, hoje, afirmar. Em primeiro lugar, esta
matéria já foi tão discutida que todos já aduzimos o que achamos sobre o que aqui se debate. Mas, por
respeito pelos cidadãos e pelos peticionários, volto a recordar que o processo de requalificação não é um
processo de despedimento.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Ora!
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Enganou-se, de novo, o Sr. Deputado do Partido Socialista;
enganam-se, ao longo dos demais debates, os Deputados dos demais partidos da oposição. Não houve um
único despedimento, o processo…
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Vai haver!
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — A Sr.ª Deputada afirma, «vai haver», e eu também posso dizer
«não vai haver», Sr.ª Deputada!
Aplausos do PSD.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Mas é que já havia, de trabalhadores com muita qualificação!
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Ninguém vai ser despedido. O processo de requalificação, é
preciso recordá-lo, foi criado pelo Partido Socialista, no Governo do Eng.º José Sócrates. Na altura, o Partido
Socialista não ficou condoído. É que, na altura, o Ministério da Agricultura remeteu cerca de 7000 funcionários
do Ministério para a requalificação e, na altura, os senhores não levantaram a voz, pelo contrário, defenderam-
no.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Ai levantámos, levantámos! E o PSD votou a favor!
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Em síntese, quero aqui dizer, para concluir, que dos 614
trabalhadores da segurança social em causa, já foram colocados 154, em serviços públicos, em serviços da
Administração Pública. Isto são números, são factos! Os restantes irão frequentar, e alguns já estão a
frequentar, ações de formação que lhes permitem elevar as suas competências.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Quantos? Quantos?
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — É bom que sejamos rigorosos e que não usemos as pessoas e
os seus sentimentos como bandeira de campanha eleitoral.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Rato.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do
Partido Comunista Português, queria começar por saudar os peticionários e saudar, sobretudo, os
trabalhadores da segurança social, que têm, ao longo dos últimos meses, travado uma luta muito corajosa e
determinada em defesa dos postos de trabalhos e em defesa da segurança social pública, universal e
solidária.
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Aplausos do PCP.
E a Sr.ª Deputada Mercês Borges disse tanta coisa mas esqueceu-se de dizer o essencial. É que, como
relatora desta petição, esqueceu-se de prestar contas a esta Casa e dizer que o Governo nem sequer se
dignou a responder à Assembleia da República sobre esta petição.
Veja bem o tempo que gastou a trocar culpas entre PS, PSD e CDS, que são os três culpados pela
existência desta aberração que é a requalificação profissional e que antes era mobilidade, e esqueceu-se de
dizer que o Governo nem sequer respondeu!
Mas importa dizer aqui que a data desta petição, dezembro de 2014, foi também a data de uma greve dos
trabalhadores da segurança social que foi determinante, desde logo, para que a situação dos trabalhadores
com incapacidade fosse acautelada.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — E se o Governo recuou relativamente a 14 trabalhadores com incapacidade foi
porque as suas estruturas representativas, designadamente a Frente Comum, o obrigaram e o exigiram.
O Sr. João Oliveira (PCP): — É verdade!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Esta situação é inaceitável porque todos estes trabalhadores tinham funções
permanentes, todos faziam falta aos serviços da segurança social. Temos ouvido por diversas vezes nesta
Casa exemplos concretos de como responsáveis e coordenadores distritais de intervenção precoce, técnicos
que constituíam as equipas multidisciplinares de apoio aos tribunais e técnicos que integravam a coordenação
das amas e das creches familiares foram afastados por este Governo.
E foram afastados porque este Governo, no mesmo dia em que informava os trabalhadores que «a porta
da rua era a serventia da casa», estava a fazer entrevistas a estagiários e para contratos emprego-inserção
para suprir postos de trabalho permanentes, nas salas exatamente ao lado de onde estava a informar as
pessoas que «a porta da rua era a serventia da casa».
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Isto é bem revelador de que a estratégia deste Governo é substituir
trabalhadores com direitos por trabalhadores sem direitos. Entendemos que isso é inaceitável e é uma marca
da política deste Governo.
Por isso, Sr. Presidente, quero dizer o seguinte: o PCP foi sempre contra a mobilidade do anterior Governo
do Partido Socialista, ao contrário da Sr.ª Deputada Mercês Borges, do PSD, que votava a favor da mobilidade
do PS.
Ora, o PCP é coerente, tanto era contra a mobilidade do PS como é contra a mobilidade do PSD e do CDS,
e os senhores eram a favor da mobilidade do PS.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
Protestos do PSD.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É que PS, PSD e CDS defendem o mesmo, porque o PREMAC (Plano de
Redução e Melhoria da Administração Central), a política de despedimento de funcionários públicos é do PS,
do PSD e do CDS.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
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A Sr.ª Rita Rato (PCP): — A privatização de serviços públicos faz parte da matriz do PS, do PSD e do
CDS. Por isso é que não nos ficamos por atacar este Governo. É que o problema não é só da requalificação
profissional, é do que está por trás desta proposta, que é a destruição das funções sociais do Estado.
Por isso, termino, Sr. Presidente, dizendo que o compromisso do PCP é com os trabalhadores da
Administração Pública, é com os trabalhadores da segurança social, porque o compromisso do PCP é com a
Constituição da República Portuguesa.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, acabei de ouvir a Sr.ª Deputada Rita Rato e a Sr.ª
Deputada confirmou aquilo que é um traço de coerência do PCP nestas matérias e ao longo da história: o PCP
é contra tudo, sempre!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Esse argumento é novo!…
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — E, mais, se este Governo ou qualquer governo anterior, de repente, fizesse
uma abertura de concurso para 500 000 funcionários públicos, o PCP estava aqui a berrar e a dizer que era
inadmissível porque tinha de ser, pelo menos, para 1 milhão, 500 000 era pouco.
Risos da Deputada do PCP Rita Rato.
Portanto, o PCP é contra tudo. O PCP só ficará satisfeito quando toda a gente trabalhar para o Estado e o
Estado estiver completamente falido. Aí é que o PCP estará satisfeito.
Agora, o que me espanta não é o Partido Comunista Português. Espanta-me, isso sim, que o Partido
Socialista tenha esta posição, agora.
Sr. Deputado António Cardoso, com toda a consideração pessoal que tenho por si, não consigo
compreender como é que o Partido Socialista, que criou efetivamente a mobilidade e a defendeu
acerrimamente, através do seu Governo, dos seus ministros, dos seus altos dirigentes, de Deputados com
intervenções aqui neste Plenário (Deputados que lembro pela sua qualidade e seriedade, como a Sr.ª
Deputada Maria José Gamboa), tenha agora esta posição. O PS sempre defendeu a mobilidade,…
O Sr. António Cardoso (PS): — Sem sacrificar serviços!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … a requalificação como essencial para a melhoria, a modernização e a
melhor qualidade da Administração Pública. E nesse âmbito, só num ministério, como aqui já foi dito, mandou,
de uma assentada, 7000 trabalhadores da Administração Pública para a mobilidade, dizendo precisamente
que era para os requalificar.
O Sr. António Cardoso (PS): — Não é igual!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Portanto, não posso aceitar que, de boa fé, o Partido Socialista, hoje,
tenha este discurso face a uma situação específica de 600 e tal trabalhadores que foram enviados para a
mobilidade.
E esta petição aqui em discussão tem atualidade, porque, em 2014, quando foi feita, o discurso da
oposição era que não havia requalificação nenhuma,…
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — E não há!
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O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — … não havia reintegração ou qualquer possibilidade de reintegração
desses trabalhadores, e que aquilo era um pretexto para um despedimento coletivo imediato, era só uma
questão de tempo.
Ora, a vinda desta petição a discussão a Plenário, agora, é tremendamente útil, porque podemos dizer que,
ao contrário de tudo o que foi afirmado, dessas 600 e tal pessoas não houve uma única que fosse despedida,
mais de 100, quase 200, já estão reintegradas, e outro grande grupo está em requalificação, com vista à
aquisição de novas competências para a sua futura reintegração. Mais, o grosso das pessoas do ISS (Instituto
de Segurança Social) enviadas para a requalificação não tinham funções que tivessem sequer a ver com o
core da atividade do ISS.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Falso!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Eram enfermeiros, docentes, assistentes operacionais…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É falso! Não é verdade!
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Ó Sr.ª Deputada, oiço-a diariamente a dizer falsidades, mas não o digo por
uma questão de pudor.
Portanto, gostaria que a Sr.ª Deputada, principalmente dirigindo-se a alguém que, ao contrário da Sr.ª
Deputada, tenta ser realista…
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, não entrem em diálogo.
Sr. Deputado, faça favor de prosseguir.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, estou no exercício da palavra, pelo que faço a minha
intervenção nos termos em que desejar.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor, Sr. Deputado, mas não entre em diálogo. E peço aos
Srs. Deputados que respeitem a intervenção do Sr. Deputado Artur Rêgo.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Portanto, Sr.ª Deputada, dispenso-lhe esses epítetos.
Como estava a dizer, eram basicamente enfermeiros, docentes e assistentes operacionais. E a nomeação
dos enfermeiros e dos docentes para as funções que desempenhavam compete, respetivamente, ao Ministério
da Saúde e ao Ministério da Educação, e não ao ISS.
Ora, ao contrário do que diziam — ou seja, que o envio destes 600 e tal trabalhadores para a requalificação
iria desestruturar os serviços do ISS, o que nós sempre desmentimos —, o facto é que, independentemente
desse envio para a requalificação, reduziu-se em 19% as despesas da administração face a 2011 e diminuiu o
tempo médio de atribuição do subsídio de desemprego, do subsídio de doença, do subsídio social de
desemprego e do abono de família.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Irei concluir, Sr. Presidente.
E nenhum dos serviços essenciais do ISS ficou afetado por esta requalificação.
Concluindo, nem os trabalhadores foram despedidos, muitos deles foram já reintegrados e outros estão em
requalificação, nem o ISS e as suas competências e funcionalidades ficaram minimamente afetados pelo envio
destes trabalhadores para a requalificação.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana
Aiveca.
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A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A petição tem atualidade porque a
verdade é que ao que assistimos foi a um despedimento coletivo de 614 pessoas. Essa é que é a realidade.
Vozes do BE: — Muito bem!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Diz a Sr.ª Deputada Mercês Borges que ainda ninguém foi despedido. Só
que, Sr.ª Deputada, a lei diz que o contrato dos trabalhadores, que não é contrato de trabalho em funções
públicas, cessa após dois anos em processo de requalificação.
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Se não forem reintegrados!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Ó Sr.ª Deputada, quantas pessoas é que estão colocadas?! O Sr.
Deputado Artur Rêgo diz que são 200 e tal.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Quase 200!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Curioso!… É que o Sr. Ministro não nos dá esse dado. E a Sr.ª Presidente
do ISS, na audição que aqui fizemos, também não nos deu dados.
Depois, os Srs. Deputados dizem esta outra coisa muito importante: «Não devemos, nesta altura, jogar
com as pessoas e os seus sentimentos». E eu pergunto: e o que é que os senhores fizeram, quando, sem
nenhum estudo credível — e ficou demonstrado que não tinham nenhum estudo credível quando a Sr.ª
Presidente do ISS, aqui, não nos conseguiu basear a razão da requalificação, não tinha nenhum estudo —,
deitaram fora, para fora dos serviços essenciais da ação social,…
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Não!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — … porque é disso que estamos a falar,…
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — … pessoas com 20 e 30 anos de serviço e algumas com mais?!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Então, não jogaram nada com os sentimentos das pessoas?!
Mais, também não jogaram nada com os sentimentos das populações, que viram as suas comissões de
proteção de crianças e jovens em risco sem pessoas?
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Isso está controlado!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Não está nada controlado!…
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Está!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Santiago do Cacém continua na mesma, o serviço local do Seixal continua
encerrado. Degradaram os serviços, jogaram com as pessoas, e agora vêm dizer, como que a «chorar
lágrimas de crocodilo», que há aqui alguém, que não eles, que está a jogar, em campanha eleitoral, com os
sentimentos das pessoas.
Protestos da Deputada do PSD Maria das Mercês Soares.
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Os senhores jogaram, na segurança social, com os sentimentos mais básicos dos profissionais e dos
utentes, degradaram a qualidade de alguns serviços…
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Alguns!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Obviamente, não foi de todos os serviços, Sr.ª Deputada. Já agora, ainda
não despediram todos, mas lá chegarão, porque é isso que querem! Querem transformar a segurança social
numa outra coisa qualquer que não uma segurança social pública e universal. É esse o projeto. Gostam mais
daquelas coisas da caridadezinha.
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Não!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Mas, quando digo que não degradaram todos os serviços, quero dizer que,
obviamente, ainda não despediram todos os trabalhadores. Mas é essa a vossa intenção, a de transformar a
segurança social numa coisa diferente, transformar o Estado social num Estado diferente, porque esse é o
vosso projeto ideológico.
A Sr.ª Maria das Mercês Soares (PSD): — Não!
A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Portanto, tem razão de ser esta discussão, aqui hoje, porque, afinal, estes
trabalhadores foram deitados borda fora dos serviços onde tinham know-how. E, agora, andam do INA para
casa, de casa para o INA, do INA para o serviço de finanças, do serviço de finanças para o «instituto não sei
das quantas», a dizer: «Vejam lá se precisam de mim».
E, perante isto, os senhores dizem que não jogaram com os sentimentos das pessoas?! Então, o que é que
fizeram?!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, está concluída a
apreciação da petição n.º 452/XII (4.ª), assim como estão concluídos os nossos trabalhos de hoje.
A próxima sessão plenária tem lugar amanhã, pelas 14 horas e 30 minutos, tendo como ordem do dia os
seguintes pontos:
Em primeiro lugar, proceder-se-á à discussão conjunta do projeto de lei n.º 896/XII (4.ª) — Procede à
criação da Ordem dos Assistentes Sociais (PS) e da petição n.º 522/XII (4.ª) — Da iniciativa de David Filipe
Capitão Martins e outros, solicitando a votação na generalidade e na especialidade do projeto de lei n.º 896/XII
(4.ª), que procede à criação da Ordem dos Assistentes Sociais, até ao término da XII Legislatura;
Segue-se a discussão, em conjunto, dos projetos de resolução n.os
1463/XII (4.ª) — Reconhecimento dos
doentes portadores de fibromialgia (PSD e CDS-PP) e 1514/XII (4.ª) — Pelo efetivo cumprimento do
reconhecimento da fibromialgia e dos direitos dos doentes fibromiálgicos (PCP), da petição n.º 463/XII (4.ª) —
Apresentada por Fernanda Margarida Neves de Sá (Associação Portuguesa de Doentes com Fibromialgia),
solicitando que a Assembleia da República legisle no sentido de uma avaliação dos doentes com fibromialgia
de acordo com o seu grau de incapacidade, e do projeto de resolução n.º 1547/XII (4.ª) — Recomenda ao
Governo a implementação de medidas pelo reconhecimento e proteção das pessoas com fibromialgia (BE);
O terceiro ponto consta do debate conjunto dos projetos de lei n.os
971/XII (4.ª) — Combate a precariedade,
impedindo o recurso a medidas indevidamente consideradas como promotoras de emprego, como CEI, CEI+ e
estágios-emprego, para responder a necessidades permanentes dos serviços públicos e empresas (PCP),
972/XII (4.ª) — Combate a precariedade laboral e reforça a proteção dos trabalhadores (PCP) e 1010/XII (4.ª)
— Proíbe e regulariza o recurso a contratos empego-inserção e contratos emprego-inserção+ (BE), na
generalidade, e do projeto de resolução n.º 1548/XII (4.ª) — Recomenda medidas de combate à precariedade
e reformula as regras dos estágios-emprego (BE);
Em quarto lugar, irá proceder-se à discussão conjunta, na generalidade, dos projetos de lei n.os
895/XII (4.ª)
— Trinta e cinco horas para maior criação de emprego e reposição dos direitos na função pública (BE), 860/XII
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(4.ª) — Reduz para 35 horas o limite máximo do horário semanal de trabalho para todos os trabalhadores,
procedendo à oitava alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova o Código do Trabalho, e à
revogação da Lei n.º 68/2013, de 29 de agosto, que estabelece a duração do período normal de trabalho dos
trabalhadores em funções públicas (PCP) e 1009/XII (4.ª) — Pela reposição das 35 horas de trabalho semanal
na Administração Pública (Os Verdes);
Segue-se o debate conjunto do projeto de resolução n.º 1550/XII (4.ª) — Garantir um novo paradigma de
controlo da população de animais (Os Verdes) e, na generalidade, dos projetos de lei n.os
1008/XII (4.ª) —
Regime jurídico da modernização de centros de recolha oficial de animais e dos serviços municipais de
veterinária (PCP) e 1012/XII (4.ª) — Proibição do abate compulsivo de animais nos centros de recolha (BE);
Em sexto lugar, será apreciada a petição n.º 472/XII (4.ª) — Apresentada por Maria de Fátima Marques
Carvalho e outros, solicitando à Assembleia da República a criação para os docentes em regime de
monodocência que iniciaram funções em 1978/1979 e 1979/1980 de um regime de aposentação igual ao
previsto na Lei n.º 77/2009, de 13 de agosto;
Por fim, serão apreciados, em conjunto, a petição n.º 476/XII (4.ª) — Apresentada por Suzana Raquel
Matias da Silva Batoca e outros, solicitando à Assembleia da República a assunção de um conjunto de
medidas que permitam a sustentabilidade e promovam a dignificação do ensino artístico especializado e os
projetos de resolução n.os
1529/XII (4.ª) — Propõe o financiamento às escolas do ensino artístico
especializado de música e de dança em condições que assegurem a sua estabilidade e um ensino de
qualidade (PCP), 1541/XII (4.ª) — Recomenda ao Governo a salvaguarda do ensino artístico especializado,
mediante a estabilidade do seu modelo de financiamento e das respetivas transferências para as instituições
de ensino (PS) e 1545/XII (4.ª) — Financiamento das escolas do ensino artístico pelo Orçamento do Estado,
garantindo o direito ao ensino artístico de todos os alunos (BE).
Lembro aos Srs. Deputados que hoje, pelas 19 horas, será inaugurada a exposição em homenagem ao
Eusébio.
Muito boa tarde.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 12 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.