Página 1
Sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017 I Série — Número 46
XIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2016-2017)
REUNIÃOPLENÁRIADE2DEFEVEREIRODE 2017
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretários: Ex.mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Idália Maria Marques Salvador Serrão António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro Sandra Maria Pereira Pontedeira
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 5
minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de lei n.os
57 a 59/XIII (2.ª) e do projeto de resolução n.º 642/XIII (2.ª). Foi discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 46/XIII
(2.ª) — Altera o exercício da liberdade sindical e os direitos de negociação coletiva e de participação do pessoal da Polícia de Segurança Pública com funções policiais, tendo-se pronunciado a Ministra da Administração Interna (Constança Urbano de Sousa) e os Deputados Jorge Machado (PCP), Carlos Peixoto (PSD), Sandra Cunha (BE), Susana Amador (PS) e Telmo Correia (CDS-PP).
Foi discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 47/XIII (2.ª) — Aprova o estatuto disciplinar da Polícia de Segurança Pública, sobre a qual intervieram a Ministra da Administração Interna e os Deputados Sandra Cunha (BE), Sara Madruga da Costa (PSD), Jorge Machado (PCP), Telmo Correia (CDS-PP) e Susana Amador (PS).
Foi discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 48/XIII (2.ª) — Procede à primeira alteração à Lei n.º 22/2013, de 26 de fevereiro, dando acesso aos administradores judiciais a
várias bases de dados, nomeadamente, ao registo informático das execuções, às bases de dados tributárias e da segurança social,tendo feito intervenções, para além da Ministra da Justiça (Francisca Van Dunem), os Deputados Fernando Anastácio (PS), José Silvano (PSD), Vânia Dias da Silva (CDS-PP), António Filipe (PCP) e Sandra Cunha (BE).
Procedeu-se à discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 49/XIII (2.ª) — Aprova a lei da saúde pública, tendo usado da palavra, a diverso título, o Secretário de Estado Adjunto e da Saúde (Fernando Araújo) e os Deputados José Luís Ferreira (Os Verdes), Isabel Galriça Neto (CDS-PP), Ricardo Baptista Leite (PSD), Luís Soares (PS), João Ramos (PCP) e Moisés Ferreira (BE).
Foram discutidos, em conjunto, na generalidade, os projetos de lei n.os 364/XIII (2.ª) — Altera a Lei n.º 37/81 (Lei da Nacionalidade)(PSD)e 390/XIII (2.ª) — Altera a Lei da Nacionalidade, aprovada pela Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, e o Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de dezembro (BE), tendo proferido intervenções os Deputados José Cesário (PSD), José Manuel Pureza (BE), António Filipe
Página 2
I SÉRIE — NÚMERO 46
2
(PCP), Pedro Delgado Alves (PS), Telmo Correia (CDS-PP) e Carlos Páscoa Gonçalves (PSD).
Foram ainda discutidos os projetos de resolução n.os 430/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo a implementação da gratuitidade do acesso aos museus e monumentos nacionais para jovens até aos 30 anos, durante os fins de semana e feriados (PS), 636/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo que adote as medidas necessárias para fomentar o acesso de todos os cidadãos aos museus e monumentos nacionais, principalmente para as pessoas até aos 35 anos, instituindo a gratuitidade no acesso aos fins de semana, feriados e
quartas-feiras e alargando o recurso às novas tecnologias de informação (CDS-PP) e 640/XIII (2.ª) — Gratuitidade no acesso a museus nacionais, monumentos nacionais e outras entidades com comparticipação pública (BE). Proferiram intervenções os Deputados Diogo Leão (PS), Teresa Caeiro (CDS-PP), Jorge Campos (BE), Cristóvão Simão Ribeiro (PSD) e Ana Mesquita (PCP).
Deu-se conta da entrada na Mesa do projeto de lei n.º 392/XIII (2.ª).
O Presidente (José Manuel Pureza) encerrou a sessão eram 17 horas e 45 minutos.
Página 3
3 DE FEVEREIRO DE 2017
3
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, vamos dar
início à nossa sessão.
Eram 15 horas e 5 minutos.
Peço aos Srs. Agentes da autoridade o favor de abrirem as galerias.
Antes de entrarmos na ordem do dia, peço ao Sr. Secretário Duarte Pacheco que proceda à leitura do
expediente.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram
admitidas, as seguintes propostas de lei: n.o 57/XIII (2.ª) — Estabelece as prescrições mínimas em matéria de
proteção dos trabalhadores contra os riscos para a segurança e a saúde a que estão ou possam vir a estar
sujeitos devido à exposição a campos eletromagnéticos durante o trabalho e transpõe a Diretiva 2013/35/EU,
do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que baixa à 10.ª Comissão; n.º 58/XIII (2.ª) —
Estabelece os princípios e as regras do intercâmbio transfronteiriço de informações relacionadas com a prática
de infrações rodoviárias num Estado-Membro e transpõe a Diretiva 2015/413/EU, que baixa à 1.ª Comissão; e
n.º 59/XIII (2.ª) — Adapta ao ordenamento jurídico interno as obrigações decorrentes da Decisão 2008/615/JAI
e da Decisão 2008/616/JAI, que a executa, em sede de transmissão de dados do registo de veículos para efeitos
de deteção e investigação de infrações de natureza penal, que baixa à 1.ª Comissão.
Deu ainda entrada o projeto de resolução n.º 642/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo que proceda à urgente
reabilitação e requalificação da Escola Secundária Ferreira Dias, de Agualva-Sintra (CDS-PP).
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos então iniciar a nossa ordem do dia, cujo primeiro ponto consiste
na discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 46/XIII (2.ª) — Altera o exercício da liberdade sindical e os
direitos de negociação coletiva e de participação do pessoal da Polícia de Segurança Pública com funções
policiais.
Para introduzir o debate, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Administração Interna, que cumprimento,
endereçando também cumprimentos aos outros membros do Governo presentes.
Faça favor, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra da Administração Interna (Constança Urbano de Sousa): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas
e Srs. Deputados: Hoje, vamos discutir uma proposta de lei que visa, sobretudo, alterar a lei sindical da Polícia
de Segurança Pública de 2002. A maioria dos artigos apenas visa adaptar a redação das disposições daquela
lei à evolução terminológica entretanto introduzida por uma série de diplomas, de entre os quais o estatuto da
PSP e a lei do trabalho em funções públicas.
O objetivo essencial e principal desta proposta consiste em rever o regime de gozo de faltas sindicais,
introduzindo aqui — e repito — o mesmo modelo de representatividade da lei do trabalho em funções públicas,
que está consagrado não só para os demais trabalhadores da função pública, mas também para os
trabalhadores do setor privado, incluindo também no que diz respeito à legitimidade para a negociação coletiva.
Ou seja, os critérios de representatividade que condicionam o gozo destas faltas são, precisamente, os
mesmos. No entanto, não se alteram os números, isto é, os dirigentes sindicais continuam a gozar quatro dias
de faltas remuneradas por mês — 48 dias por ano — a que acrescem 33 dias de faltas justificadas, que são as
mesmas estabelecidas para o resto da função pública. Os delegados sindicais continuam a gozar as mesmas
12 horas mensais de faltas remuneradas.
O gozo destes direitos passa, no entanto, a ficar subordinado aos mesmos critérios de representatividade
que vigoram para os demais trabalhadores da função pública. Recordo que, hoje, à luz da lei vigente, o gozo
destes direitos não tem qualquer limitação em função da representatividade, o que leva a constrangimentos de
vária ordem. Desde logo, a constante alteração de escalas de serviço, de cerca de 9000 por mês, que afeta não
só os polícias, mas também toda a atividade da PSP. Hoje, temos cerca de 14 sindicatos de polícias a gozar
créditos de faltas sindicais e também faltas justificadas não remuneradas.
Página 4
I SÉRIE — NÚMERO 46
4
Temos sindicatos com pouco mais de 110 associados, em que mais de 95 são dirigentes sindicais ou
delegados sindicais a gozar, respetivamente, 48 dias de folgas remuneradas por ano e 20 dias de folgas
remuneradas por mês. Só em 2015 estiveram ausentes do serviço cerca de 31 153 dias, sobretudo com especial
incidência aos fins de semana, sextas e segundas-feiras. Ou seja, todos os dias cerca de 85 polícias estão
ausentes para exercício de atividade sindical — todos os dias! —, o que equivale a 600 por semana. Portanto,
o que se pretende com esta proposta é introduzir um critério de representatividade igual ao que vigora para a
generalidade dos trabalhadores da função pública.
Quanto ao famoso artigo 3.º, procurou-se a sua densificação, mas reconheço que a redação proposta pode
conduzir a interpretações não queridas e indesejadas. Por isso, penso que os Srs. Deputados saberão encontrar
a formulação adequada.
Por fim, quanto ao regime de transferência, mantém-se aquele que é praticamente o mesmo que está
consagrado na lei do trabalho em funções públicas, com algumas diferenças. Mas estou disponível para qualquer
revisão.
Esta é uma proposta de lei em relação à qual penso que todos os Srs. Deputados, com todo o sentido de
Estado, saberão encontrar as formulações mais adequadas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado, do Grupo
Parlamentar do PCP.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, começo por saudar os
profissionais da PSP presentes nas galerias.
Como sabe, Sr.ª Ministra, não há uma objeção do PCP quanto aos objetivos de fundo aqui anunciados e
vertidos no diploma. Contudo, o PCP considera que há a necessidade imperiosa de alterar os aspetos mais
gravosos do diploma, entre eles o artigo 3.º, que diz respeito às declarações dos dirigentes, o artigo 4.º, sobre
a possibilidade de transferência de dirigentes, o artigo 7.º, que refere as incompatibilidades, e o artigo 18.º,
quanto aos créditos de horas dos delegados sindicais.
Para o PCP, é fundamental corrigir esses aspetos, pelo que pergunto qual é a disponibilidade do Governo
para os corrigir. Se existir essa mesma disponibilidade, desde já afirmamos que iremos propor a audição de
todas as estruturas representativas dos trabalhadores. Vamos avançar para este processo legislativo com a
profunda convicção de que não é só possível corrigir os aspetos mais nefastos, como também é possível,
inclusivamente, melhorar o diploma e, assim, melhorar as condições para a atividade sindical na PSP.
Sr.ª Ministra, a pergunta que lhe quero deixar é a seguinte: qual é a disponibilidade do Governo para este
objetivo?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Administração Interna.
A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Deputado, a disponibilidade é total.
Risos do PSD.
O Sr. Presidente: — Trata-se de uma resposta concreta a uma pergunta concreta.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Peixoto, do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Deputados: Começo também por
cumprimentar os profissionais da PSP que se encontram nas galerias.
Queria começar por dizer à Sr.ª Ministra que esta proposta de lei mostra, em todo o seu esplendor, a
fragilidade deste Governo. Quanto mais tempo passa, mais fica provado que o Governo e o Partido Socialista
não se entendem com a sacrossanta maioria de esquerda, que prometeu ao País uma governação estável,
Página 5
3 DE FEVEREIRO DE 2017
5
duradoura e sem sobressaltos. Foi assim com a TSU, poderá vir a ser assim com as PPP da saúde, poderá vir
a ser assim na regulamentação da Carris, poderá vir a ser assim na regulamentação da Uber e é assim,
seguramente, nesta lei sindical.
O PS e o Governo, nesta matéria, não ligaram nenhuma aos seus parceiros de coligação, não os ouviu. E,
ao que parece, também não ligou nenhuma aos sindicatos, porque, Sr.ª Ministra, não há nenhum sindicato que
concorde inequivocamente, do princípio ao fim, com esta lei. Talvez por isso e por outras coisas, Sr.ª Ministra,
o líder do seu Governo deve estar hoje a engolir aquilo que disse aqui, neste Parlamento, na sexta-feira passada,
ou seja, que o PSD não serve em nada para o País.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Pois é!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Foram estas as palavras dele.
Sr.ª Ministra, bastaram quatro dias para se ver que o PSD serve, e serve para muito. Olhe, desde logo, serve
para que lhe seja pedido que sirva de amparo às divergências do Partido Socialista e do Governo com os partidos
de coligação. Mas serve também, porque é absolutamente imprescindível, para a votação de leis com o valor
reforçado que esta tem, que precisa de dois terços do voto favorável dos Deputados.
Sr.ª Ministra, trata-se de casos em que não é o PS nem o Governo que precisam do PSD, mas é a
Constituição que diz que não se pode mexer nestas matérias sem o voto do PSD. Portanto, Sr.ª Ministra, em
áreas de soberania, em áreas de Estado, em áreas de segurança, o PSD vota tradicionalmente ao lado do PS.
O Sr. Deputado Filipe Neto Brandão diz que eu não falei no Partido Socialista. É verdade, o Partido Socialista
e o PSD juntos perfazem os dois terços, o que significa que, nestas matérias, têm estado juntos ao longo da
História. Nos últimos 10 ou 15 anos, só por duas vezes não o estiveram, e por razões perfeitamente justificáveis,
mas mesmo assim, Sr.ª Ministra, nem por isso o Governo foi capaz de ter sido politicamente previdente, de
respeitar a tradição, de respeitar a Constituição e de respeitar o maior partido da oposição. Aqui está uma
demonstração de valentia que, por vezes, dá maus resultados.
Ainda assim, o PSD é um partido responsável, é um partido da segurança, é um partido que entende que a
negociação coletiva é prioritária.
Esta proposta tem, obviamente, aspetos positivos, não negamos isso — introduz alguma equidade no
sistema, procura corrigir situações sinalizadas como perversas e penalizadoras da atividade operacional das
polícias. Mas isso não chega, Sr.ª Ministra. O PSD não passa cheques em branco a ninguém. Tem, por isso,
três linhas vermelhas que quer, desde já, aqui deixar expressas e vincadas.
Em primeiro lugar, travará a já conhecida «lei da rolha», a do artigo 3.º desta proposta de lei, por conter
restrições inadmissíveis ao exercício da atividade sindical.
Em segundo lugar, reclamará do Governo uma clarificação precisa sobre as regras da participação na
negociação coletiva, designadamente as do artigo 31.º, que suscitam dúvidas de constitucionalidade e abrem a
porta para que se consagre a existência, a nosso ver errada, de sindicatos de primeira e de sindicatos de
segunda.
Em terceiro lugar, e talvez o mais importante, o PSD disponibiliza-se, já aqui, a participar numa negociação
que tenha como prioridade equacionar e revisitar a atividade sindical no seu todo, globalmente, não só da PSP,
mas de forma abrangente, porque acha que não há razão nenhuma para se entender que só nesta matéria é
que é preciso revisitar este regime.
Sr.ª Ministra, são estes os parâmetros que o PSD define e espera que venham a ser acolhidos, pois só assim
se sentirá habilitado a formar o seu sentido de voto, e um sentido de voto definitivo.
Mas isto não é porque o Governo merece, Sr.ª Ministra, é porque os polícias e o País precisam disso.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra Cunha, do Grupo
Parlamentar do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Sandra Cunha (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de mais, quero
também saudar os polícias presentes nas galerias e quero começar por lembrar que a liberdade sindical é um
Página 6
I SÉRIE — NÚMERO 46
6
direito constitucionalmente consagrado. Pode ler-se, no artigo 55.º da Constituição da República Portuguesa:
«É reconhecida aos trabalhadores a liberdade sindical, condição e garantia da construção da sua unidade para
defesa dos seus direitos e interesses».
Pode também ler-se, também, no artigo seguinte, artigo 56.º: «Compete às associações sindicais defender
e promover a defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores que representem».
Vozes do BE: — Muito bem!
A Sr.ª Sandra Cunha (BE): — Ora, tal só pode acontecer se forem garantidas todas as condições
necessárias ao exercício dessa representação.
O Bloco de Esquerda considera, não obstante a necessidade de revisão desta lei, que a proposta que o
Governo hoje aqui apresenta, e que visa regular, precisamente, o exercício da liberdade sindical do pessoal da
Polícia de Segurança Pública não reúne, efetivamente, essas condições.
Preocupa-nos, em primeiro lugar, a redação dada ao artigo 3.º desta proposta, nomeadamente quando se
proíbem «as declarações que violem os princípios da hierarquia de comando e da disciplina» e, ainda, «as
informações relativas a dispositivos e ao planeamento, execução, meios e equipamentos empregues em
operações policiais». Efetivamente, consideramos que esta redação limita o que é muito da essência da
atividade sindical e fere a liberdade de expressão dos elementos sindicalizados.
Em segundo lugar, consideramos que a proposta de alterar a proibição da transferência do local de trabalho
para órgão ou serviço fora da localidade desvirtua a legitimidade de representação desse elemento dentro desse
próprio serviço desse local de trabalho concreto.
Em terceiro lugar, e ainda que não se trate de uma alteração introduzida com esta proposta do Governo, mas
antes um imperativo decorrente da lei em vigor, é nosso entendimento que não deve ser limitado o direito de
filiação e participação ativa em associações sindicais a polícias em efetividade de serviço já que esta limitação
exclui vários profissionais que, não estando em serviço efetivo na PSP não deixam, contudo, de ser profissionais
da polícia. O exemplo mais gravoso encontra-se na situação dos polícias em suspensão de serviço.
Consideramos que esta exclusão pode limitar a liberdade de ação sindical, uma vez que a consequência paralela
de um processo que culmine na suspensão de serviço é precisamente a impossibilidade da continuação do
exercício da atividade sindical.
Presente igualmente na lei em vigor, e mantida na redação agora proposta pelo Governo, é a limitação a três
faltas para os membros das assembleias gerais, congressos ou órgãos equivalentes. Para além das
assembleias constituintes e das assembleias para alterações de estatutos, é também necessária a realização,
para a organização e para a gestão destas associações sindicais, de outras assembleias, como, por exemplo,
as necessárias para a prestação de contas ou para a apresentação do orçamento, isto já para não falar das
assembleias extraordinárias. Julgamos, portanto, que esta é, igualmente, matéria a ser trabalhada.
Matéria que merece igualmente atenção é a alteração proposta à definição de unidade orgânica. Ao deixar
de se considerar a esquadra para efeitos de definição do número de delegados sindicais com direito a crédito
de horas, e passando a considerar-se o comando territorial, diminui-se em grande medida a presença de
delegados sindicais nos diversos locais de trabalho. Pode chegar-se à situação de se ter um delegado sindical
num comando com várias esquadras que distam entre si vários quilómetros, o que condiciona, evidentemente,
o exercício da atividade sindical desse delegado.
Por último, e uma vez que o tempo aqui disponível não permite a discussão aprofundada que um diploma
desta importância merece, destacamos, ainda, a alteração introduzida no artigo 34.º da proposta do Governo e
que restringe a negociação coletiva à apreciação e negociação entre o Governo e os sindicatos, ficando de fora
a negociação com a hierarquia direta. Não se compreende esta alteração, uma vez que existem matérias
atualmente objeto de negociação coletiva, como sejam, por exemplo, as relativas aos horários de trabalho, que
são da responsabilidade direta da hierarquia da PSP.
O Bloco de Esquerda considera que a alteração de diplomas cujo objeto consagra direitos
constitucionalmente consagrados merece um debate aprofundado e um trabalho cuidadoso que deve ser
sempre feito em articulação e em conjunto com as próprias associações sindicais.
O Bloco de Esquerda está disponível para esse trabalho. Esperamos que o Governo também esteja.
Página 7
3 DE FEVEREIRO DE 2017
7
Aplausos do BE.
Entretanto, assumiu a Presidência o Vice-Presidente José Manuel Pureza.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Susana Amador.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Administração Interna, Sr.as e Srs.
Deputados: Começo também por saudar os profissionais da PSP aqui presentes.
A proposta de lei hoje em discussão, nesta Câmara, convoca-nos a todos para a adoção de alterações ao
exercício da liberdade sindical e direitos de negociação coletiva e de participação do pessoal da PSP com
funções policiais.
Com efeito, a PSP é uma estrutura policial que exerce relevantes funções de defesa da legalidade
democrática, de garantia da segurança interna e dos direitos dos cidadãos, nos termos do artigo 272.º da
Constituição.
Nós, Partido Socialista, entendemos que a política de segurança deve sempre assentar numa cultura
democrática. E não há uma política de segurança democrática se os seus profissionais não virem reconhecidos
direitos democráticos essenciais, sem prejuízo da especificidade das funções que desempenham.
Sempre foi esse o entendimento do Partido Socialista e dos seus sucessivos governos e, por isso, estivemos
na génese da Lei n.º 14/2002, a lei vigente, oriunda de uma proposta do Governo do então Primeiro-Ministro
António Guterres e que reconheceu, aqui, a liberdade sindical para os profissionais da PSP.
E eis que voltamos de novo, na Casa da democracia, a esta tão importante discussão, dado que as leis não
são estáticas, ao invés são evolutivas, tal como o sistema que visam regular.
Sim, o PS teve a coragem de mexer nesta lei e de fazer uma proposta. O PSD teve mais de quatro anos para
o fazer e não o fez.
A realidade existente, tal como sublinhou já a Sr.ª Ministra, interpela-nos a fazer alterações que respeitam
essa cultura democrática mas que salvaguardam igualmente a eficácia e a operacionalidade do nosso sistema
de segurança pública, que se quer de proximidade, de prevenção e de combate à criminalidade.
Srs. Deputados, dada a natureza da matéria em causa, decorreu o competente período de apreciação
pública, que nos permitiu recolher contributos relevantes, individuais e também das associações do setor,
contributos esses que devem merecer a nossa análise e devida ponderação em sede de especialidade na 1.ª
Comissão. É, pois, com total abertura que fazemos este debate, tendo consciência que esta discussão é apenas
o início de um caminho para que possamos ter, de facto, uma lei equilibrada e justa como é intenção do Governo
e do Partido Socialista.
Queremos, acima de tudo, adequar o regime do direito coletivo do pessoal com funções públicas da PSP aos
princípios fundamentais do exercício de funções públicas.
A proposta de lei incide, ainda, sobre o elenco do artigo 3.º relativo a matéria tipificada de restrições à
liberdade sindical, que será seguramente objeto de aperfeiçoamentos, como foi já aqui demonstrado, e
clarificação na especialidade, dado tratar-se de um núcleo especial que, por ser de restrições de direitos à
liberdade sindical, é de enorme sensibilidade e que não se pretende alargar ou ampliar e, por isso, iremos
clarificar essa questão.
Por seu turno, o regime de faltas e de atribuição de créditos de horas, remunerados aos dirigentes e aos
delegados sindicais, é objeto de alterações, considerando-se justificadas faltas até ao limite de 33 faltas por ano,
a que acrescem 44 dias de faltas remuneradas. Um limite que se afigura adequado e equilibrado, até perante o
bem que se pretende também salvaguardar — a segurança dos cidadãos.
Em 2015, as faltas ascenderam a mais de 31 000, mais 5000 que em 2014 e mais 10 000 que em 2013.
Sublinhe-se que a proposta de lei mantém, ainda, o direito a um crédito de quatro dias remunerados por mês,
para o exercício das suas funções, aos membros da direção da respetiva associação sindical e para os
delegados sindicais um crédito de 12 horas remuneradas por mês, num total de 144 horas anuais, que a proposta
de lei não altera. Critérios de proporcionalidade também para a intervenção e a negociação coletivas.
Conscientes de que estas propostas carecem de aperfeiçoamentos e de benfeitoras necessárias e úteis,
quer o Governo, quer o Partido Socialista estão abertos para prosseguir esta discussão por forma a dissipar
dúvidas e alargar o grau de convergência que estas matérias constitucionalmente também exigem.
Página 8
I SÉRIE — NÚMERO 46
8
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Termino já, Sr. Presidente.
Sr.as e Srs. Deputados, o objetivo aqui presente é o de assegurar uma evolução sustentada e nivelada pelos
padrões de organização e de exercício de direitos sindicais a nível europeu que seja compatível com um
adequado nível de operacionalidade e segurança proporcionada aos portugueses.
Estamos certos de que Portugal continuará neste caminho, adotando soluções justas, proporcionais e
equilibradas, conciliando direitos e liberdade sindical com a segurança dos cidadãos numa sociedade
democrática, não perdendo nunca de vista que um Estado de direito é igualmente um Estado de fundamentação.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo
Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
Discutimos hoje uma alteração à lei sindical aplicável à PSP. E a primeira coisa que convém lembrar quando
discutimos uma alteração a essa lei é que ela foi feita em 2002. E em 2002 o CDS e também o Partido Social
Democrata alteraram uma posição histórica que tinham, crítica da possibilidade de existência de sindicatos na
PSP, permitindo, assim, que o sindicalismo existisse.
Tenho orgulho em ter participado nesse processo e de ter sido um dos Deputados que esteve nesse
processo, na altura praticamente recém-chegado aqui. E tenho orgulho nisso porquê? Porque consideramos
que os agentes policiais, os homens da PSP, vivem situações de desgaste superiores ao normal dos
trabalhadores, vivem situações de risco extremamente difíceis, lutam com a falta de meios, e os sindicatos são,
obviamente, uma forma muitíssimo importante de os proteger quando grande parte da opinião pública, e às
vezes até da opinião política, os abandona completamente nos momentos de maior dificuldade. Foi por isso que
alterámos a lei.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Construiu-se um edifício, que é o edifício sindical.
Olhando agora para esse edifício, fazendo um balanço do que foi feito uns anos depois, o que é que nós
concluímos? Que o edifício é perfeito? Não! Que há problemas! E nós reconhecemos a existência desses
problemas. Um deles será, obviamente, a proliferação de sindicatos, a sua representatividade e a existência e
dificuldade, até, de diálogo que isso representa.
Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados, o reconhecimento de que o edifício tem problemas não é razão para o
deitarmos abaixo, porque aquilo que, de alguma forma, o Governo faz com esta proposta — passe a figura de
estilo — é reconhecer que o edifício sindical que foi construído tem alguns problemas: tem uma frincha, por essa
frincha entra frio. Bom, pega-lhe fogo. E ardeu o edifício todo, indo o que estava bem e o que estava mal e
destruindo, obviamente, a liberdade sindical que não pode, nem deve ser destruída.
Aplausos do CDS-PP.
E porque é que nós dizemos isto? Sr.ª Ministra, obviamente, que, na nossa opinião, esta proposta tem um
problema de conteúdo e tem um problema de método. Tem um problema de conteúdo que é evidente, ou seja,
o artigo 3.º, para qualquer pessoa que defenda a liberdade sindical, é inaceitável, porque os sindicatos têm
razão, Sr.ª Ministra: é a lei da rolha. Como é que nós podemos saber das carências, da dificuldade de meios,
das dificuldades que os homens têm se eles não puderem falar sobre esta matéria e estiverem sempre
subordinados à hierarquia? É inaceitável. A garantia de inamovibilidade para os dirigentes sindicais é
fundamental e não pode nem deveria ser mexida. A representatividade deve ser feita e deve ser permitida, quer
do ponto de vista sindical, quer do ponto de vista da representatividade por classe. Há uma série de regras,
como a possibilidade de exercerem outros cargos, que, como aqui foi lembrado — e bem — pela Sr.ª Deputada
Página 9
3 DE FEVEREIRO DE 2017
9
do Bloco de Esquerda, é fundamental. Portanto, esta lei ataca a liberdade sindical e, desse ponto de vista, é, na
minha opinião, inaceitável.
Mas há um problema de método muito claro. O PCP abriu este debate e perguntou à Sr.ª Ministra: «Olhe,
isto para nós não serve. A Sr.ª Ministra muda?» E a Sr.ª Ministra disse: «Mudo tudo. Façam lá como quiserem
que para mim está tudo bem.».
O que eu pergunto é se não deveriam ter conversado primeiro, pelo menos entre os partidos que apoiam o
Governo. Não acham que fazia sentido a Sr.ª Ministra chegar aqui com uma proposta que tivesse, pelo menos,
o acordo dos partidos da «geringonça»?
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Isto não é maneira de governar, Sr.ª Ministra. É que a Sr.ª Ministra não tem sequer o apoio dos partidos —
se calhar nem do seu partido tem! É indiscutível que, numa matéria que exige maioria de 2/3 dos Deputados em
efetividade de funções, deveria falar com o maior partido da oposição, porque esta é uma matéria de Estado.
Mas não falou. E, tanto quanto se percebe, também não falou com os sindicatos, porque os sindicatos apontam
caminhos simples para resolver esta matéria: elevar o grau de representatividade, construir formas de
associação e de estímulo à federação. Pergunto, Sr.ª Ministra: falou com os sindicatos? Recebeu-os? Negociou
com eles? Dialogou? Não! Ó Sr.ª Ministra, mas como é que quer fazer uma lei sindical se nem sequer ouve os
sindicatos?!
Aplausos do CDS-PP.
Não percebo, sinceramente não percebo!
Portanto, a Sr.ª Ministra não falou com os sindicatos, nem com os grandes, nem com os pequenos. Alguns
dos pequenos dizem que a lei até pode ser vantajosa para os grandes, mas depois falamos com os grandes e
dizem que também são contra.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. TelmoCorreia (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo o seguinte: não há nenhum
sindicato que concorde com esta lei, e o líder do maior sindicato dos polícias disse que — e vou citá-lo — «esta
lei deve envergonhar a esquerda e os partidos de esquerda».
Aplausos do CDS-PP e do Deputado do PSD Carlos Abreu Amorim.
A Sr.ª Ministra quer evitar uma votação? Com certeza! Não vamos votar, porque o resultado seria o chumbo,
como já percebemos. Esta proposta de lei vai ser discutida na especialidade, mas isso terá de ser de uma forma
completamente diferente. Nós vamos contribuir, mas tem de ser de uma forma completamente diferente, porque
deste modo não serve.
Aplausos do CDS-PP e de Deputados do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge
Machado.
O Sr. JorgeMachado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Hoje, discutimos
um importante diploma para a vida e para as condições de trabalho dos profissionais da PSP.
O exercício da liberdade sindical dentro da PSP, que ainda hoje incomoda muita gente, é um aspeto
fundamental para a democracia e para a melhoria do serviço prestado às populações.
Sabemos que muitas das condições de trabalho dos profissionais, que importa melhorar, estão consagradas
em diplomas, como o estatuto profissional da PSP.
Página 10
I SÉRIE — NÚMERO 46
10
Contudo, o presente diploma, que regula o exercício da liberdade sindical, é estrutural para a participação
dos profissionais na vida interna da PSP e, consequentemente, para a melhoria das condições de vida, de
trabalho e de funcionamento da própria instituição.
Admitindo que existem problemas com a quantidade de utilização dos créditos ou dispensas de serviço para
a atividade sindical que causam embaraços e que importa corrigir, não podemos deixar de referir que o que a
vida mostrou nestes anos de sindicalismo na PSP foi o seu inegável contributo para uma PSP mais moderna e
capacitada.
Neste âmbito, é justo destacar o contributo responsável e empenhado da ASPP/PSP (Associação Sindical
dos Profissionais da Polícia), a associação sindical com maior representatividade, cuja ação tem dignificado o
movimento sindical na PSP.
Entendemos que, neste debate, é oportuno prestar homenagem àqueles que, na luta pelo direito ao
sindicalismo na PSP, participaram na célebre luta dos «secos e molhados» e é oportuno lembrar que os
comissários Santinhos, José Carreira e muitos outros entregaram a sua vida à causa da liberdade, da
democracia e da dignidade dos profissionais da PSP.
Aplausos do PCP.
Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Deputados, não havendo objeções quanto aos objetivos de fundo do
diploma, há, contudo, aspetos neste diploma que são inaceitáveis.
O PCP não aceita que, à boleia da resolução de um problema — e esse problema resolve-se estipulando
regras que façam com que os créditos sindicais sejam proporcionais ao número de associados inscritos no
respetivo sindicato — se use este processo legislativo para condicionar ou limitar a atividade sindical dentro da
PSP.
Para o PCP, não é aceitável que as declarações dos dirigentes sindicais sejam limitadas ou condicionadas.
O artigo 3.º, tal como está, não pode continuar.
Os profissionais da PSP que estão em funções sindicais podem estar limitados na sua atividade partidária,
mas para o PCP é inaceitável que sejam limitados na sua atividade politica ou condicionados por uma suposta
violação do princípio da hierarquia, comando e disciplina.
Alguém, nesta Assembleia da República, conhece a figura da isenção política, uma figura que não se pode
confundir com isenção partidária? Nós não a conhecemos.
Para nós, é fundamental reformular o artigo 4.º da proposta de lei, que prevê a transferência de dirigentes
sindicais, garantindo que estes não podem ser afastados do seu posto de trabalho.
Entre outros, o artigo 7.º, sobre incompatibilidades, e o artigo 18.º, sobre créditos dos delegados sindicais,
precisam de alterações para que fique claro que não se visa prejudicar a atividade sindical dentro da PSP.
Das afirmações que a Sr.ª Ministra proferiu neste debate, registamos como positiva a abertura manifestada
para, em sede de discussão na especialidade, alterar o diploma nos seus aspetos mais nefastos.
Da nossa parte, como afirmámos na primeira intervenção, partimos para este processo legislativo com a
convicção de que não só é possível corrigir os aspetos nefastos deste diploma, como, inclusive, é possível
melhorá-lo. E iremos lutar para que o sindicalismo na PSP saia reforçado, prestigiado e se eleve a cultura
democrática dentro da PSP.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma última intervenção sobre este ponto da ordem de
trabalhos, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Administração Interna.
A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente e Srs. Deputados: Em relação ao artigo 3.º da
proposta de lei, mais uma vez reconheço que a sua redação possa ter sido infeliz. Como pode levar a
interpretações indesejadas e não queridas, estou naturalmente disposta a reformulá-lo.
Sr. Deputado Carlos Peixoto, o artigo 31.º é precisamente igual àquele que está na Lei Geral do Trabalho
em Funções Públicas e que se refere à legitimidade para a negociação coletiva.
Página 11
3 DE FEVEREIRO DE 2017
11
O modelo de representatividade, Sr. Deputado Telmo Correia, é o mesmo que existe hoje para a generalidade
dos trabalhadores em funções públicas e que está consagrado na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas.
Faça esse trabalho de comparação e verá que as regras não se alteraram.
Por força da Constituição, poderiam ter um exercício mais limitado da sua liberdade sindical, mas a opção foi
precisamente a de dar o mesmo regime que a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas garante aos demais
trabalhadores da função pública. Nem mais, nem menos. É isso, tão só isso.
Quanto à questão de método, sempre pensei que esta era a Casa da democracia e que os senhores eram
soberanos. Esta é uma mera proposta de lei e os Srs. Deputados terão, seguramente, toda a competência e
toda a sabedoria para fazerem desta mera proposta de lei a melhor lei possível.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, vamos entrar no segundo ponto da nossa ordem
de trabalhos, que consiste na discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 47/XIII (2.ª) — Aprova o Estatuto
Disciplinar da Polícia de Segurança Pública.
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Administração Interna.
A Sr.ª MinistradaAdministraçãoInterna: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta de lei
visa dotar a PSP de um novo estatuto disciplinar que substitua aquele que foi aprovado há mais de 27 anos e
que estava absolutamente desadequado à evolução legislativa entretanto verificada em Portugal.
Esta proposta de lei foi amplamente negociada com as associações sindicais da PSP, porque é relativa a
uma matéria que está e continuará a estar sujeita, nos termos da lei, a negociação coletiva.
Do conjunto de medidas que vão ser introduzidas, passo a realçar algumas.
Clarificou-se o princípio da independência e autonomia do procedimento disciplinar em relação ao
procedimento criminal.
Quanto à suspensão preventiva, acolheu-se a jurisprudência do Tribunal Constitucional, e esta deixou de ser
um efeito automático da pronúncia por um crime, além de se ter eliminado qualquer perda remuneratória durante
o período desta medida cautelar.
Foi introduzida uma medida cautelar de transferência preventiva limitada no tempo e no espaço.
Reconheço que, de forma inovadora, se estabelece a possibilidade de suspensão do processo, à semelhança
do que existe hoje no processo-crime e é impossível, em abstrato, para infrações mais leves, substituir o
procedimento criminal por injunções desde que seja com o consentimento do arguido. Pensamos que, com esta
medida, se eliminam os efeitos estigmatizantes de algumas penas e aumenta a celeridade processual.
Quanto às penas disciplinares, eliminou-se a repreensão verbal em obediência ao princípio da
obrigatoriedade de um processo escrito.
Procedeu-se a uma melhor caracterização da pena de multa e da possibilidade de ela nunca exceder um
terço da remuneração do infrator.
Também se estabeleceu, quanto à pena de multa, a possibilidade de pagamento em prestações.
Excluiu-se, do âmbito de aplicação deste estatuo disciplinar, os aposentados. Embora, durante a negociação
coletiva, tivéssemos mantido a posição de que os aposentados da polícia, sempre que cometessem crimes,
invocando essa qualidade de polícia, seriam submetidos, agora, nesta versão proposta à Assembleia, essa
possibilidade foi eliminada.
Aos aposentados apenas é possível a aplicação de processo disciplinar quando cometeram infrações
enquanto estavam no ativo, ou seja, antes de estarem aposentados.
Mesmo assim, para as penas mais gravosas, que implicam, hoje, de acordo com o regime vigente, a perda
total de remuneração, consagrou-se o princípio do Código de Processo Civil, que estabelece a
impenhorabilidade de dois terços dos rendimentos das pessoas. Portanto, mesmo nestes casos, as penas a
aplicar apenas poderão implicar a perda de um terço da remuneração.
Penso que este é um estatuto disciplinar moderno, adequado e sem oferecer qualquer dúvida quanto à sua
constitucionalidade, que não merece qualquer censura, eliminando-se, assim, todas as censuras que o estatuto
que está neste momento em vigor merece.
Página 12
I SÉRIE — NÚMERO 46
12
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra
Cunha.
A Sr.ª SandraCunha (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Administração Interna, Sr.as e Srs. Deputados:
Dentro de algumas semanas, mais concretamente no dia 20 de fevereiro de 2017, cumprem-se 27 anos desde
a publicação da Lei n.º 7/90, que aprovou o estatuto disciplinar da Polícia de Segurança Pública vigente, pelo
que a necessidade de proceder à sua atualização é, desde há muito, mais do que evidente.
A necessidade de atualização é necessária não apenas pela desconformidade da redação do atual estatuto
com a evolução da legislação em geral nestas quase três décadas, mas, sobretudo, porque alguns dos preceitos
do atual estatuto suscitaram sérios problemas interpretativos e até de conformidade com os ditames
constitucionais.
Por isso mesmo, o Bloco de Esquerda considera fundamental a eliminação da possibilidade de suspensão
de funções e retirada de um sexto do vencimento a um polícia pronunciado por crimes com penas superiores a
três anos, tal como prevê o atual n.º 1 do artigo 38.º do estatuto vigente, o qual foi recentemente declarado
inconstitucional por violação dos princípios da presunção de inocência do arguido e da proporcionalidade.
Entendemos igualmente que é necessário compatibilizar as penas aplicáveis com a garantia de um
rendimento mínimo de subsistência, princípio vigente, aliás, há muitos anos no direito processual civil que
assegura a impenhorabilidade relativa das remunerações ou pensões.
Do mesmo modo, consideramos da mais elementar justiça e bom senso a previsão legal que possibilite ao
arguido o pagamento das multas em prestações.
Somos também favoráveis à consagração da possibilidade da suspensão do processo, tal como já se prevê
no Processo Penal, quando à infração seja, em abstrato, suscetível de vir a ser aplicada a pena de repreensão
ou de multa mediante o cumprimento de injunções e regras de conduta pelo arguido, com o acordo deste, e
verificados alguns pressupostos que permitam a previsibilidade de que estas respondam suficientemente às
exigências de prevenção e à ausência de um grau de culpa elevado.
Da mesma forma, entendemos que pessoas em situação de pré-aposentação ou aposentação não devem
ser sujeitas às mesmas regras aplicáveis aos demais profissionais da Polícia de Segurança Pública.
Como tal, consideramos que esta proposta de lei, apresentada pelo Governo, vem responder a uma série de
situações, que, aliás, já eram reivindicações das associações sindicais e dos profissionais da Polícia de
Segurança Pública, e consideramos que vem, de facto, resolver algumas dessas situações, e isso é um bom
objetivo cumprido.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sara
Madruga da Costa.
A Sr.ª SaraMadrugadaCosta (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados: Aproveito a
presença de efetivos da PSP no Parlamento para lhes dirigir, em nome do PSD, uma saudação e um
agradecimento pelo seu trabalho, empenho e dedicação na redução da criminalidade, tornando Portugal num
País mais seguro.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª SaraMadrugadaCosta (PSD): — O consenso alcançado em torno do estatuto disciplinar da PSP
também é fruto do trabalho desenvolvido pelo anterior Governo, que, em 2015, aprovou o estatuto profissional
e que previa, no seu artigo 6.º, um regime deontológico e disciplinar próprio para os polícias.
Sr.ª Ministra, o estatuto profissional e o estatuto disciplinar da PSP são importantes contributos para
aumentar a eficiência da organização da polícia e para aumentar a motivação dos seus elementos. Mas estes
Página 13
3 DE FEVEREIRO DE 2017
13
estatutos serão insuficientes se não forem dados passos concretos no aumento e no rejuvenescimento dos
efetivos, na melhoria das condições profissionais e no reforço dos meios da PSP.
Ao fim de um ano, em jeito de balanço, temos de concluir que a sua atuação é claramente insuficiente. É
insuficiente tendo em conta as reais necessidades do País e é insuficiente tendo em conta as suas próprias
promessas.
Sr.ª Ministra, quatro exemplos apenas para ilustrar o que acabo de referir: da prometida incorporação de 800
novos agentes, contamos apenas com 300, e estes graças ao anterior Governo.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Exatamente!
A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Continuamos no campo das meras promessas quanto ao novo
modelo de aquisição de fardamento online o do outsourcing dos bares e das cantinas como forma de libertar
recursos operacionais.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Bem lembrado!
A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Continua também sem conhecer a luz do dia, Sr.ª Ministra, a
regulamentação efetiva do estatuto profissional quanto ao novo sistema de avaliação de faltas e concursos de
promoção anuais.
O mesmo se diga relativamente à nova lei orgânica da PSP.
E qual é o resultado desta sua atuação, Sr.ª Ministra? O resultado é facilmente demonstrável com o recurso
a diversos episódios constrangedores e preocupantes, como os que aconteceram e acontecem no Aeroporto de
Lisboa, onde a falta de efetivos, a falta de meios, a falta de formação, quer ao nível da PSP quer ao nível do
SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras), permitem fugas de passageiros.
Com esta política de desinvestimento nunca teremos a política que queremos, que precisamos e que os
efetivos justamente reclamam.
Sr.ª Ministra, reconhecemos a importância desta iniciativa, mas não nos revemos nas suas políticas e na sua
insuficiente atuação. Insuficiente para que a PSP possa desempenhar eficientemente a sua importante missão
de defesa da legalidade democrática, da garantia da segurança interna e dos direitos dos cidadãos.
Aplausos do PSD e do Deputado do CDS-PP Telmo Correia.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge
Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Deputados: Sr.ª Ministra, neste diploma,
em que se altera o estatuto disciplinar do pessoal da PSP, fazem-se sentir os contributos ativos das estruturas
representativas dos trabalhadores, que, aliás, foram aqui sinalizados e que nós queremos valorizar como um
aspeto muito positivo.
A negociação deve ser encarada de uma forma séria e, sendo assim encarada, todos ficamos a ganhar,
porque foram incluídos contributos que foram manifestados pelas estruturas e o diploma ficou enriquecido.
Além deste aspeto, queremos valorizar como positiva a perspetiva da exclusão das medidas disciplinares
para as aposentados, que era um problema que se prolongava no tempo, a impenhorabilidade de um terço do
salário, que decorre da legislação de jurisprudência nacional mas que importava clarificar no estatuto disciplinar,
e o novo mecanismo da possibilidade da suspensão do procedimento, que é inovador e que merece a nossa
concordância.
Há, no entanto, Sr.ª Ministra, alguns aspetos que nos oferecem dúvidas, que remeteremos para discussão
em sede de especialidade e que não podemos deixar de sinalizar. Desde logo, uma questão de fundo, que é a
seguinte: deve ou não o processo disciplinar ser conduzido pelo superior hierárquico? Essa é uma dúvida que
temos na medida em que, muitas vezes, pode acontecer que o processo disciplinar possa ser usado como forma
de retaliação sobre o agente e uma forma de o evitar seria delegar o processo disciplinar não no superior
Página 14
I SÉRIE — NÚMERO 46
14
hierárquico mas, sim, numa estrutura autónoma e independente que fizesse a condução do processo disciplinar
de forma independente e, portanto, imune a essa possibilidade.
Sabemos que esta matéria implica até alterações do estatuto e não só no regime disciplinar, mas queremos
deixar esta questão em cima da mesa.
Por outro lado, consideramos que há um peso excessivo das infrações graves. A separação entre infrações
leves, graves e muito graves oferece dúvidas que importa clarificar em sede de especialidade, na medida em
que a redação, tal qual está, permite que as infrações leves sejam praticamente inexistentes, uma vez que há
um peso excessivo na classificação e uma condução que parece indicar uma orientação para as infrações graves
dada a formulação jurídica.
Estaremos disponíveis, como é óbvio, para, em sede de especialidade, aprofundar esta matéria, que
reportamos como importante.
O último aspeto que queremos salientar tem a ver com a possibilidade de a transferência preventiva e a
suspensão preventiva, que já existia no atual estatuto disciplinar, terem um peso que consideramos excessivo.
Uma transferência preventiva que pode durar até oito meses ou uma suspensão preventiva que pode durar
até seis meses pode ser considerada — e nós consideramo-lo, à partida — como excessiva na medida em que
o acusado não tem ainda, sequer, formada a acusação para que se possa defender
Sabemos que há mecanismos que permitem a filtragem das situações em que se aplica a suspensão e a
transferência, mas, não obstante este tempo excessivo que ela pode durar, ela pode também configurar um
aspeto de retaliação sobre o profissional, sem que haja, repito, uma acusação formada.
Para terminar, Sr. Presidente — e agradeço a boa vontade a tolerância –, gostaria de dizer que, neste
processo legislativo, também estaremos, em sede de discussão na especialidade, empenhados em melhorar o
diploma, assim haja vontade política para o fazer.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo
Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados: Começo por dizer, Sr.ª Ministra, que esta matéria do estatuto disciplinar não tem a controvérsia nem
o problema que tinha a matéria anterior e, portanto, situemos as coisas como elas são e separemos umas coisas
das outras.
Em relação ao que aqui discutimos, Sr.ª Ministra, é verdade que estamos na Casa da democracia e é verdade
que os grupos parlamentares podem decidir o que entenderem, mas convinha que o Governo, quando chegasse
aqui com um diploma, tivesse tido o cuidado de, pelo menos, negociar com os partidos que o apoiam e de, pelo
menos, ouvir as partes interessadas, designadamente os sindicatos, porque isto não é método!
Vozes do CDS-PP: — Obviamente!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Dizer «eu avanço como muito bem entendo, com qualquer coisa que sai
do meu gabinete e, agora, vejam lá se na comissão fazem uma lei…» Bom, não me parece que este seja, repito,
Sr.ª Ministra, método para resolver este tipo de problemas.
Disse também a Sr.ª Ministra que não há nem mais nem menos do que há para a função pública. Mas, Sr.ª
Ministra, vamos ver se nos entendemos — e, se calhar, é aí que está precisamente uma das nossas
divergências. É que foi o Partido Socialista que considerou — e estamos a falar, obviamente, da Lei n.º 12-
A/2008 — que os polícias eram funcionários públicos,…
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Exatamente!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … mas, para nós, os polícias não são meros funcionários públicos, não
podem ser tratados como se fossem só funcionários públicos, porque têm obrigações, têm deveres, têm até os
seus sindicatos, têm impedimentos que os funcionários públicos não têm — por exemplo, o direito à greve — e,
Página 15
3 DE FEVEREIRO DE 2017
15
portanto, têm de ser diferenciados pela natureza da sua atividade, pelo risco que ela comporta e por tudo o que
lhe está associado. Isto parece-me bastante evidente.
Em relação a esta questão, Sr.ª Ministra, quero dizer que não vamos opor-nos a ela, trabalharemos na
especialidade, como é evidente, e registamos até — aliás, isso já aqui foi dito e estamos de acordo — que é
preciso dignificar esta atividade.
Estes homens lutam muitas vezes com … As notícias são diárias, Sr.ª Ministra — aliás, a Sr.ª Deputada Sara
Madruga da Costa ainda agora falava disso –, as notícias são de ontem, de hoje, são notícias sobre agentes
que têm de utilizar os seus próprios carros, porque não há viaturas disponíveis! É por isso que é importante dar
liberdade aos sindicatos, porque são eles quem, em primeira mão, denuncia essas faltas, denuncia a ausência
de meios, denuncia a ausência de condições.
Em termos disciplinares, há aqui um avanço, e isso é significativo: há um avanço, por exemplo, em relação
à questão da remuneração, no sentido de garantir a subsistência básica — obviamente, um direito fundamental;
há um avanço quando não há perda da retribuição no início de um processo e até de uma suspensão, porque,
obviamente, poderia ser injusto e não há ainda decisão nenhuma; há um avanço em relação à questão de os
aposentados não estarem sujeitos ao processo disciplinar.
Portanto, esta matéria não nos merece as críticas que fizemos antes e estaremos disponíveis para discutir
em sede de especialidade, com um intuito que é sempre este, Sr.ª Ministra — e esta terá de ser uma
preocupação e terá de ser uma discussão séria: numa área de soberania, numa área de Estado, numa área que
implicaria, ou deveria implicar, um consenso alargadíssimo nesta Câmara, não podemos decidi-la sem termos
esse mesmo consenso e sem ouvirmos os representantes de quem está todos os dias no terreno e arrisca a
sua vida pela segurança dos portugueses.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Susana
Amador.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por saudar o
Governo, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, por este importante estatuto disciplinar. Um
estatuto, como disse, moderno, um estatuto que importava rever, dada a longevidade do estatuto atual, e tão
necessário.
Este estatuto surge como corolário lógico e objetivo da revisão operada ao estatuto do pessoal com funções
policiais da PSP, que prevê, no seu artigo 6.º, que os polícias se regem por um regulamento disciplinar próprio.
Assim, impunha-se a adoção de um novo estatuto, dado que o atual teve de conviver com três diplomas
orgânicos e três estatutos de pessoal da PSP, a que se somou a nova legislação de trabalho, que excluía do
seu âmbito de aplicação o pessoal com funções policiais da PSP, e o novo Código de Processo Administrativo,
pilar dos procedimentos administrativos, tornando assim imperiosa, e bem, a necessidade de harmonizar o
regime disciplinar com as alterações legais que ocorreram sucessivamente.
Por isso, andou muito bem o Governo ao considerar as preocupações que estiveram subjacentes à feitura
do diploma e a auscultação enorme, consensual e alargada que presidiu à sua feitura.
As alterações são tão profundas que se justificava, em termos de rigor e de clareza do sistema, a
apresentação de um diploma novo, e foi isso que se fez com a coragem política, que temos sempre de
reconhecer tendo em conta que são matérias complexas, que, mais uma vez, o Partido Socialista teve.
Este diploma foi objeto de auscultações obrigatórias e também facultativas e o que aconteceu foi que houve
pareceres de concordância ou propostas de alteração que foram, todas elas, incorporadas, o que nos revela
também o caráter muito participado, consensual e de grande concertação em todo este processo.
Gostaria ainda de dizer que esta proposta assenta num compromisso das polícias com a PSP, com a
comunidade e com os cidadãos, e é muito importante o compromisso que perpassa esta legislação.
Com este novo estatuto disciplinar, pretende-se, acima de tudo, sistematizar e harmonizar um conjunto de
alterações com o procedimento administrativo geral de onde gostaríamos de destacar: a obrigatoriedade de
procedimento disciplinar com vista à aplicação de uma medida ou pena disciplinar; a obrigatoriedade de registo
escrito em todas as situações; a qualificação das infrações disciplinares em leves, graves e muito graves; a
Página 16
I SÉRIE — NÚMERO 46
16
eliminação da pena de repreensão verbal; a consagração de uma escala, que inclui as penas de repreensão,
multa, suspensão; a caraterização da pena de multa, cujo desconto mensal não pode agora exceder um terço
do vencimento do infrator — há aqui um conjunto de critérios até de humanidade que são muito importantes e
que queremos sublinhar; a eliminação da faculdade de agravação das penas após a notificação ao arguido; e,
gostaríamos de destacar, e muito, a possibilidade da opção do arguido pelo pagamento da multa em prestações;
a possibilidade da suspensão do processo, à semelhança do que ocorre na lei processual penal, o que nos
permite também eliminar os efeitos sempre estigmatizantes de uma pena; e, por último, gostaria também de
destacar o reforço da posição do advogado constituído no procedimento disciplinar.
Em suma, Sr.as e Srs. Deputados, presidem a estas alterações critérios de harmonização, de simplificação,
de modernização, de celeridade e de atualização de procedimentos que salvaguardam, de forma adequada e
justa, as garantias dos visados, colocando-se, a nosso ver, este novo estatuto disciplinar da PSP, que ora
estamos a discutir e que também melhoraremos, seguramente, em sede de especialidade ao melhor nível dos
procedimentos europeus, prestigiando-se, assim, por esta via, a Polícia de Segurança Pública, que tem sido
fonte de orgulho nacional pelo seu elevado sentido de serviço público, o que queremos saudar aqui de viva voz.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para o encerramento deste ponto da nossa ordem de trabalhos,
dou a palavra à Sr.ª Ministra da Administração Interna.
A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: À semelhança da
proposta de lei anterior, sobre a liberdade sindical, também esta proposta de lei, que consagra um novo estatuto
disciplinar, vai ser discutida pelos Srs. Deputados.
Os Srs. Deputados representam o poder legislativo, pelo que terão a competência e a sabedoria para, com
esta mera proposta, concluir um processo legislativo com seriedade e sentido de Estado.
Quanto à questão de método, Sr. Deputado Telmo Correia, eu valorizo o papel da Assembleia da República,
pelo que não conseguiria nunca apresentar algo pré-negociado que retirasse aos Srs. Deputados de todas as
bancadas parlamentares a sua responsabilidade de legisladores.
Sr. Deputado, queria o quê? Um cheque já assinado? Não, Sr. Deputado! O Sr. Deputado e os Srs.
Deputados de todas as bancadas parlamentares terão a oportunidade de, naturalmente, assumirem as suas
responsabilidades com sentido de Estado e de melhorarem todas estas propostas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, terminado este debate, passamos ao terceiro
ponto da ordem de trabalhos, com a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 48/XIII (2.ª) — Procede
à primeira alteração à Lei n.º 22/2013, de 26 de fevereiro, dando acesso aos administradores judiciais a várias
bases de dados, nomeadamente, ao registo informático das execuções, às bases de dados tributárias e da
segurança social.
Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça, Francisca Van Dunem.
A Sr.ª Ministra da Justiça (Francisca Van Dunem): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta iniciativa
legislativa visa, como foi já referido, garantir o acesso direto dos administradores judiciais, para o exercício das
respetivas funções, ao registo informático das execuções e às bases de dados do registo comercial, do registo
predial, do registo automóvel e de outros registos e arquivos semelhantes.
É a concretização de mais uma medida inscrita no programa Capitalizar e é complementar de uma outra
medida, adotada já em setembro, que assegura o acesso direto por via eletrónica ao sistema informático de
suporte à atividade dos tribunais, o CITIUS, desta categoria de auxiliares da justiça.
É uma medida que elimina vários passos na obtenção de informações essenciais ao desfecho dos processos
de insolvência, já que, atualmente, estas informações podem ser obtidas mas apenas com intermediação do
tribunal.
Página 17
3 DE FEVEREIRO DE 2017
17
É uma medida que permite também afastar as situações de falta de colaboração dos devedores ou confirmar
de forma expedita o seu património, o que é particularmente relevante, já que o tribunal, em casos de liquidação,
tem necessidade de conhecer exatamente o património do devedor e que, nas situações de recuperação, o
acesso à informação é essencial para garantir a transparência.
Finalmente, esta proposta insere-se num feixe de medidas de simplificação, que prosseguirão, neste
segmento específico, com o alargamento da tramitação eletrónica, na parte do processo que, do ponto de vista
legal, cabe aos administradores, sendo esta uma outra medida inscrita também no Programa Capitalizar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, sucede que a Mesa não tem, neste momento,
registo de qualquer inscrição para este ponto do debate, pelo que passaremos ao ponto seguinte, se nenhum
Deputado ou nenhuma Deputada se inscrever.
Pausa.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Anastácio, em nome do Grupo Parlamentar
do Partido Socialista.
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.as e Srs. Deputados: Uma
justiça célere e eficaz é essencial para um bom desempenho da economia.
É uma prioridade do Governo, bem como do Grupo Parlamentar do PS, criar as necessárias condições à
existência de um ambiente amigo das empresas.
A agilização de procedimentos, muito em particular no âmbito da recuperação e revitalização das empresas,
assim como na aceleração dos processos de reestruturação empresarial, é uma necessidade por todos
reconhecida.
O desenvolvimento da Administração Pública eletrónica permitiu que se criasse e desenvolvesse um conjunto
de bases de dados públicas, as quais vieram facilitar a ação dos agentes judiciários e que, hoje, permitem retirar
da esfera do juiz a prática de atos meramente administrativos, com o objetivo de dar uma maior eficácia à
tramitação processual. O regime da insolvência e da recuperação das empresas é, de facto, um exemplo onde
este tipo de medidas têm perfeito cabimento.
Importa salientar, como já foi referido, que é importante para o cumprimento das competências e das
atribuições dos administradores de insolvência o conhecimento efetivo e o acesso às bases de dados públicas
para melhor poderem cumprir a sua missão, nomeadamente conhecer o património dos devedores e das
empresas.
A presente proposta de lei vem alterar o artigo 11.º da Lei n.º 22/2013 e, através dela, os administradores
judiciais passam a ter acesso, em termos equiparados aos agentes de execução, ao registo informático das
execuções, bem como passam a ter a possibilidade de consultar as bases de dados da Administração Tributária,
da segurança social, das conservatórias do registo predial, comercial e automóvel e outros semelhantes.
É uma matéria que, com certeza, irá contribuir para um melhor desempenho destas atividades, mas que
também, a respeito dela, não queria deixar de fazer aqui, hoje, uma reflexão.
A possibilidade de acesso a dados pessoais existentes nas bases de dados da Autoridade Tributária, da
segurança social ou dos registos comerciais é um aspeto essencial, é facto, mas também queria referir que a
procura da celeridade e da eficácia deverá estar sempre compaginada com o respeito pela proteção de dados
pessoais e a garantia de sigilo.
Dos diferentes pareceres que foram emitidos perpassa esta preocupação, preocupação que acompanhamos.
Portanto, é essencial que, nesta matéria, não restem dúvidas de que estes profissionais, por força do
exercício das suas atividades e no preciso âmbito das mesmas, devem estar sujeitos a um dever de sigilo e
confidencialidade relativamente aos dados pessoais e informações a que tiverem acesso.
A discussão na especialidade, com o pedido de pareceres a entidades como, por exemplo, a Comissão
Nacional de Proteção de Dados e o Banco de Portugal, entre outros, irá permitir acautelar esta preocupação e
encontrar uma melhor formulação.
Página 18
I SÉRIE — NÚMERO 46
18
Termino com a certeza de que este é mais um passo, um contributo, para o aperfeiçoamento da legislação
existente com vista a tornar a justiça naquilo que todos pretendemos e que a economia exige: uma justiça mais
célere, mais eficaz e mais justa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado
José Silvano, em nome do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. José Silvano (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.as e Srs. Deputados: Vem, hoje, ao
Parlamento uma alteração à Lei n.º 22/2013 com o objetivo de agilizar as consultas à base de dados, a celeridade
nos processos de insolvência e uma informação mais rigorosa e abrangente dos bens que estão afetos à massa
falida. É importante que tal se faça para a celeridade da justiça.
Mas quem diria que quem traz hoje, aqui, esta iniciativa é um Governo apoiado pelo Partido Socialista que
há quatro anos, quando a discussão do estatuto do administrador judicial foi feita nesta Casa, em dezembro de
2012, afirmava que esta reforma era inepta? E dizia mais, e passo a citar: «Srs. Deputados, a aprovação do
estatuto dos administradores judiciais não vai levar a lado nenhum, nem vai correr bem.»
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Bem lembrado!
O Sr. José Silvano (PSD): — É, pois, importante que seja o próprio Partido Socialista, ou o Governo do
Partido Socialista, a trazer aqui, hoje, a ampliação e a valorização dessa norma aprovada, a do papel dos
administradores judiciais.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. José Silvano (PSD): — Queria também dizer que estamos de acordo com este princípio, com algumas
limitações — e a Sr.ª Ministra conhece as próprias dúvidas levantadas pelos parceiros —, nomeadamente na
regulação desses direito, isto é, os direitos a conceder têm de ser precisos e regulamentados e tendo sempre
em vista a confidencialidade destes dados. Sabemos que, às vezes, estes agentes não são propriamente atreitos
ao sigilo nestas matérias, pelo que tem de se ter alguma cautela.
Tem também de se fazer — achamos nós — um registo de quem consulta o quê e se só consulta ou se faz
análise de dados, porque aqui pode estar um problema jurídico que pode complicar estas situações.
Queríamos também dizer que quem abusa deve ter penas disciplinares. Por isso, esta proposta de lei deve
conter também penas disciplinares apropriadas a quem faz abusos destas matérias e destes poderes.
Sr.ª Ministra, termino com mais uma citação. Durante a discussão desta lei, o Partido Socialista disse, na
altura, nesta Câmara, o seguinte: «O plano de reabilitação de empresas e o estatuto do administrador judicial
são os abanos com que os Ministros da Economia e da Justiça pretendem debelar o sinistro que o seu colega
das Finanças adiou na economia portuguesa». Dizia há quatro anos, aqui, o interventor do Partido Socialista
sobre esta matéria.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. José Silvano (PSD): — Será que agora, com a ampliação destes poderes — e vou terminar, Sr.
Presidente —, eles não querem só debelar o sinistro, mas querem correr com o Ministro das Finanças?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem agora a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada
Vânia Dias da Silva, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP.
Página 19
3 DE FEVEREIRO DE 2017
19
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça e Srs. Secretários de Estado,
começo por cumprimentá-los.
Sr.ª Ministra, não temos uma oposição de princípio a esta regra, a este acesso às bases de dados públicas
pelos administradores judiciais nos mesmos termos em que isso é permitido aos agentes de execução, mas
temos uma dúvida.
A dúvida prende-se com o seguinte: se este acesso vai ser feito nos mesmos termos dos agentes de
execução, também os administradores judiciais terão de ter os mesmos deveres e obrigações dos agentes de
execução. É isso que é preciso balizar aqui, é isso que é preciso ter em atenção.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — De resto, gostaria de lhe dizer, Sr.ª Ministra, que o CDS, juntamente
com o PSD, quando estava no Governo, foi precursor numa alteração que foi feita ao Código de Processo Civil
— que hoje é muito importante —, que permitiu aos agentes de execução penhorarem contas bancárias sem
prévia autorização judicial.
Portanto, entendemos que é fundamental que os administradores judiciais também possam ter acesso a
estas bases de dados públicas sem prévia autorização judicial. É, no entanto, preciso cuidar que este acesso
seja feito com condições de segurança e absolutamente balizado para aquilo que são as funções dos
administradores judiciais.
Percebemos que o que se pretende é que sejam aceleradores das insolvências — concordamos o mais
possível com esse princípio, porque, em Portugal, as insolvências demoram demasiado tempo e isso prejudica
a economia e as pessoas até por causa do fenómeno de arrastamento que umas insolvências trazem em relação
às outras —,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — … mas é pernicioso fazê-lo em termos tão latos que não sejam
absolutamente garantísticos.
Assim, Sr.ª Ministra, para além desta dúvida, acho que era importante — e discutiremos isso em sede de
especialidade — que na própria lei que hoje alteramos, em que já há uma contraordenação geral para a violação
dos deveres a que estão obrigados, houvesse não só uma contraordenação, mas também uma pena disciplinar,
no caso de violação dessas obrigações.
De resto, Sr.ª Ministra, gostava de lhe deixar duas questões que são laterais, mas que, na nossa opinião,
também são importantes relativamente a esta questão, exatamente para diminuir o tempo de resposta dos
processos de insolvência.
No ano passado — creio que em maio —, a Sr.ª Ministra falou no recuo da ideia de nomeação equitativa de
administradores judiciais. Até ao momento, não ouvimos mais falar sobre esta questão. Mantém a questão ou,
pelo contrário, recuou na ideia de não serem nomeados equitativamente? É que agora parece-nos que a solução
é pior: sobrecarrega uns e tira trabalho a outros. E as insolvências, como sabemos, não se compadecem com
os atrasos que já têm.
Antes de finalizar, Sr. Presidente, gostava de perguntar à Sr.ª Ministra se recuou na ideia de deixar abrir um
concurso para mais administradores judiciais. A Sr.ª Ministra falou em abrir um concurso para mais
administradores judiciais, apesar dos 70 que entraram na Legislatura passada, e eu gostava de perceber se
cedeu àquilo que a classe entende, ou seja, se entende não ser necessário, ou se, pelo contrário, continua a
entender que são necessários mais administradores judiciais.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, a Mesa não regista mais inscrições nesta altura,
pelo que vamos passar ao ponto seguinte da nossa ordem de trabalhos. Se assim não for…
Pausa.
Página 20
I SÉRIE — NÚMERO 46
20
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, em nome do Grupo Parlamentar do PCP.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Srs. Secretários de Estado, Srs.
Deputados: Foram já aqui manifestadas preocupações acerca desta proposta de lei, designadamente pelo Sr.
Deputado Fernando Anastácio, que compartilhamos.
Pensamos que é uma proposta de lei que é relevante, que deteta, de facto, um problema que importa ajudar
a resolver, designadamente em relação à celeridade dos processos de insolvência. Porém, há aqui direitos de
terceiros que devem ser salvaguardados e há aspetos, designadamente relacionados com o sigilo por quem tem
acesso a determinado tipo de dados, que devem ser salvaguardados para além de qualquer dúvida.
Portanto, consideramos que é necessário ver muito cuidadosamente, na especialidade, os aspetos concretos
desta proposta de lei, mas, obviamente, compreendemos as razões para a sua apresentação e estamos
disponíveis para dar a nossa contribuição.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada
Sandra Cunha, em nome do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Sandra Cunha (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Srs. Secretários de Estado, Srs.
Deputados: Esta proposta de alteração ao regime jurídico dos administradores judiciais, que atribui o acesso às
bases de dados públicas nos mesmos termos em que este é conferido aos agentes de execução, é
evidentemente uma proposta a que o Bloco de Esquerda não nega pertinência e necessidade.
O Bloco de Esquerda é também sensível aos objetivos que a ela presidem, nomeadamente no que diz
respeito — e já aqui foi referido várias vezes —à agilização das consultas às bases de dados por parte dos
administradores judiciais, à obtenção de informação precisa e rigorosa sobre os bens que constituem a massa
insolvente e à garantia ou à possibilidade de maior celeridade nos processos de insolvência que esta alteração
poderá imprimir.
Esta proposta de lei incide, contudo, sobre matéria que é especialmente sensível para o Bloco de Esquerda
— o acesso a dados pessoais relativos à vida privada dos cidadãos e das cidadãs —, pelo que entendemos
que, à semelhança do que defendemos noutros debates que já aqui tiveram lugar e em que esta questão se
colocava, também neste caso é fundamental assegurar o escrupuloso respeito pelos princípios constitucionais
da proporcionalidade e adequação no acesso a estes dados.
Por isso, consideramos que esta proposta de alteração pode e deve ser melhorada em sede de
especialidade, nomeadamente através da clarificação de várias questões que já foram, aliás, sinalizadas nos
vários pareceres emitidos relativamente a esta proposta, tais como: a garantia de que todas as pessoas que
tenham conhecimento de dados pessoais ficam obrigadas aos deveres de sigilo e confidencialidade; a garantia
de que o acesso a estes dados se destina ao uso exclusivo no e para o exercício das competências específicas
destes administradores judiciais em cada processo concreto; a garantia de que o acesso em desrespeito destes
pressupostos será objeto de responsabilidade disciplinar e, eventualmente, de responsabilidade civil e criminal,
como também já foi aqui referido por outras bancadas; a clarificação do alcance do acesso permitido aos
administradores judiciais, ou seja, se incidirá apenas sobre a consulta ou se também permitirá a inscrição e
atualização eventual de bases de dados, sendo, nesta hipótese, necessário proceder igualmente à alteração do
Decreto-Lei n.º 201/2003; e a identificação do sistema informático concreto que vai permitir esta consulta de
bases de dados pessoais, nomeadamente se se tratará de uma espécie de SISAAE (Sistema Informático de
Suporte à Atividade dos Agentes de Execução), adaptado aos administradores judiciais, se será o PEPEX
(Procedimento Extrajudicial Pré-Executivo) ou um qualquer outro sistema informático a desenvolver.
Gostaríamos, pois, de obter estes esclarecimentos.
Por último, queremos reforçar que o cumprimento de regras bem definidas e a fiscalização no acesso a dados
pessoais e a bases públicas de dados pessoais por parte de terceiros são condições absolutamente essenciais
para a salvaguarda dos direitos e garantias dos cidadãos e das cidadãs.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.
Página 21
3 DE FEVEREIRO DE 2017
21
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Obviamente, quero congratular-me pelo facto
de haver aqui um entendimento de princípio sobre a necessidade desta medida.
Penso que, no essencial, aquilo em que poderá haver alguma dissensão ou alguma maior preocupação tem
a ver com as questões dos direitos fundamentais, dos regimes de segredo a que estão sujeitas estas bases e,
obviamente, da vinculação ao segredo a que ficarão sujeitos estes agentes.
Queria dizer, em primeiro lugar, que o Governo, ao nível da preparação desta lei, fez as audições que seriam
adequadas e, nesse âmbito, ouviu a Comissão Nacional de Proteção de Dados, que considerou que o acesso
dos administradores judiciais a estas bases, exclusivamente no âmbito dos processos em que trabalham e para
esse efeito, era ajustado, adequado e proporcional.
Penso, no entanto, que, se os Srs. Deputados entenderem que, para além disso, há necessidade de se criar
mecanismos mais apertados no que diz respeito à salvaguarda do segredo, identificando, eventualmente,
consequências para a violação desse segredo ou para a utilização indevida dos dados, não vejo qualquer
obstáculo e estou completamente aberta a essa possibilidade.
Queria também recordar que, em 2013, o regime era este, ou seja, até 2013 a norma legal previa este acesso.
Portanto, esta previsão de acesso não é nova, é uma previsão de acesso que já existia, que não estava, de
facto, regulamentada e implementada, mas já existia, exatamente nestes termos, ou seja, havia uma
equiparação dos administradores aos agentes de execução. No regime de 2013, aquilo que está mal, do meu
ponto de vista, e efetivamente trata-se de uma «lei sem braços», é que estes agentes, que têm, no fundo, no
sistema de insolvência e recuperação de empresas, um lugar paralelo ao dos agentes de execução, acabam
por ficar sem os instrumentos que lhes permitem exercer a sua função. E, nesta perspetiva, a lei de 2013 é, de
facto, uma lei que, diria, não tem potencialidades para resolver as questões a que estava destinada.
Relativamente a outras…
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra da Justiça: — Com certeza, Sr. Presidente.
Quanto à questão da plataforma, em princípio será próxima do SISAAE.
No que se refere à questão da contingentação ou não, está tudo a ser decidido no quadro do Capitalizar,
onde há um conjunto de normas que estão a ser pensadas, pelo que será apresentado oportunamente.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, terminado este debate, vamos passar ao quarto
ponto da nossa ordem de trabalhos, que consta da discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 49/XIII
(2.ª) — Aprova a lei da saúde pública.
Para iniciar o debate e apresentar a proposta de lei, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da
Saúde.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Saúde (Fernando Araújo): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs.
Deputados: A proposta de lei que hoje vos venho apresentar aprova a lei da saúde pública, estabelecendo
medidas de proteção e promoção da saúde, de prevenção da doença, bem como de controlo e resposta a
ameaças e riscos de saúde pública, em benefício da população, integrando-se esta medida na prioridade do
Programa do Governo, de promover uma nova ambição para a saúde pública.
Procede-se, através da presente proposta, à consolidação numa única lei da mais relevante legislação
específica de saúde pública produzida ao longo de várias décadas e dispersa por inúmeros normativos, pelo
que se revogam quinze diplomas, designadamente, duas leis, oito decretos-leis, um decreto regulamentar e
quatro portarias, procedendo-se à sua atualização.
Neste sentido, prossegue o Governo a sua aposta na simplificação e na melhoria da qualidade da legislação,
através da consolidação legislativa e da eliminação de legislação dispersa.
Pretende-se, assim, em especial, estabelecer as regras e os princípios de organização da saúde pública,
incluindo os serviços das autoridades de saúde e do Conselho Nacional de Saúde Pública, atualizando as
mesmas em função dos progressos alcançados nesta área de intervenção específica.
Página 22
I SÉRIE — NÚMERO 46
22
As competências dos serviços de saúde pública de nível nacional, regional e local são reforçadas nas áreas
da vigilância epidemiológica, da monitorização do estado de saúde da população, do planeamento e intervenção
programada em saúde e em investigação epidemiológica, apostando-se na elaboração de planos nacionais,
regionais e locais tecnicamente mais robustos e que satisfaçam, efetivamente, as necessidades em saúde.
Por outro lado, e porque o sucesso da prossecução destas competências só é possível com o envolvimento
de todos os profissionais das áreas da saúde pública, é enriquecida a sua participação alargada e o seu
funcionamento em rede, em ambiente colaborativo e participativo, dotando-os mesmo de instrumentos vitais ao
seu funcionamento.
Importa destacar, neste contexto, que o anteprojeto de lei que serviu de base à presente proposta resultou
dos trabalhos desenvolvidos pela Comissão para a Reforma da Saúde Pública Nacional, a qual, para além de
presidida pelo Sr. Diretor-Geral da Saúde, é constituída por representantes das várias administrações-gerais de
saúde, integra também representantes das diversas ordens e associações profissionais, organizações sindicais
e outras associações da área da saúde, perfazendo um total de mais de 25 elementos. Esta Comissão acolhe,
assim, uma visão ampla de envolvimento dos vários saberes e competências em saúde pública, a qual se
pretende ver refletida na orgânica e na funcionalidade dos seus serviços.
São, ainda, estabelecidas medidas de proteção e promoção da saúde e prevenção da doença, prevendo-se
um sistema de vigilância epidemiológica, um sistema de vigilância entomológica e um sistema de vigilância
ambiental, bem como a proteção específica através da vacinação.
Neste âmbito, reconhecendo, ainda, o importante contributo da saúde pública para a governação, determina-
se que a aprovação de medidas legislativas com impacto na área da saúde deve ser precedida de estudos
prévios, numa perspetiva da saúde em todas as políticas.
São, ainda, estabelecidos procedimentos relativos à gestão de emergências em saúde pública e concretizada
a criação do centro especializado de alerta e resposta.
A proposta de lei que irão apreciar hoje, a qual pode e deve, naturalmente, ser melhorada com as propostas
dos Srs. Deputados e das Sr.as Deputadas, em sede de especialidade, irá consubstanciar uma das iniciativas
da nova ambição para a saúde pública, num movimento reformista que pretende dar enfoque ao papel da saúde
pública como instrumento fulcral para o reforço da posição do cidadão no centro do sistema de saúde.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José
Luís Ferreira, de Os Verdes.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Saúde, Os
Verdes olham com agrado a ideia de consolidar num único diploma legal, pelo menos, a legislação mais
relevante sobre saúde pública, que se encontra dispersa por um abundante conjunto de diplomas legais, porque,
de facto, esta pretensão pode facilitar a leitura e a correta interpretação das normas legais sobre saúde pública.
Também consideramos que só teremos a ganhar com a intenção de consolidar e atualizar os progressos
alcançados na área da intervenção específica da saúde pública. Mas nós só teremos, efetivamente, a ganhar
se, de alguma forma, se conseguir reforçar a capacidade dos serviços de saúde, se se enriquecer a participação
alargada dos profissionais envolvidos e, por fim, se os serviços forem dotados dos meios e dos instrumentos
necessários ao seu desejável funcionamento, porque, se assim não for, pouco ou nada se avança naquilo que
é essencial.
Mas, ainda assim, Os Verdes têm algumas dúvidas e preocupações com esta proposta, as quais
consideramos importantes e que gostaríamos de ver esclarecidas. São dúvidas e preocupações que assentam,
sobretudo, em dois elementos que, segundo tivemos oportunidade de apurar, terão sido até acordados entre o
Governo e a Comissão para a Reforma da Saúde Pública mas não constam da proposta que o Governo, agora,
nos apresenta.
Estamos a falar, por um lado, nos rácios e, por outro, no suplemento remuneratório para outros profissionais,
além dos médicos, com funções de autoridade de saúde.
Começando por esta última preocupação, a proposta do Governo apenas prevê o suplemento remuneratório
para médicos com funções de autoridade de saúde, deixando outros profissionais de fora, desde logo, os
Página 23
3 DE FEVEREIRO DE 2017
23
técnicos de saúde ambiental e também os enfermeiros de saúde pública. É isto, pelo menos, que resulta do
artigo 11.º da proposta de lei.
No que diz respeito aos rácios, o atual Decreto-Lei n.º 81/2009, que ainda está em vigor mas que a proposta
pretende revogar, estabelece os seguintes rácios: um médico com grau de especialista em saúde pública para
cada 25 000 habitantes, um enfermeiro para cada 30 000 habitantes e um técnico de saúde ambiental para cada
15 000 habitantes. Sucede que nem estes nem outros rácios estão previstos nesta proposta de lei, o que poderá,
certamente, agravar ainda mais a carência de profissionais nesta área. Aliás, há um estudo recente da
Associação Portuguesa de Saúde Ambiental que nos indica que, nas unidades de saúde pública, faltam cerca
de 270 técnicos de saúde ambiental. O que nos parece é que esta proposta, ao não prever estes rácios, vai
certamente dificultar a admissão destes profissionais e irá acentuar a desigualdade na distribuição dos recursos,
com grave prejuízo, certamente, para as zonas carenciadas do interior.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, gostaríamos que nos pudesse prestar esclarecimentos sobre estas duas
questões que agora foram aqui colocadas e que, para nós, se revestem de muita importância.
Aplausos de Os Verdes.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Não havendo mais pedidos de esclarecimento, tem a palavra,
para responder, o Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Saúde.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Saúde: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Governo e o
Ministério da Saúde, em particular, pretendem dotar estes serviços de saúde pública com os meios e os recursos
necessários para o seu adequado funcionamento. É vital que esta nobre área da saúde possua capacidade de
intervenção e dê resposta exatamente aos objetivos que a própria lei tem plasmados.
Sobre as questões que colocou, relativas aos rácios e suplementos remuneratórios, consideramos que esta
proposta de lei é equilibrada. Pode ser, naturalmente, melhorada, mas não deve ser limitativa em termos da
própria evolução que importa ter numa área de intensa evolução e dinâmica. Portanto, pensamos que o ideal é
ser uma lei suficientemente aberta e equilibrada e que se possa ir adequando à evolução que é necessária em
termos de meios e recursos, ao longo do tempo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel
Galriça Neto, em nome do Grupo Parlamentar do CDS-PP.
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Saúde, Sr.as
e Srs. Deputados: Estamos hoje a debater uma proposta de lei, do Governo, que aprova a lei da saúde pública,
uma proposta que é, lamentavelmente, mais uma vez, apresentada pelo Governo à Assembleia da República
sem ser acompanhada de qualquer estudo ou parecer que a fundamente devidamente.
Relembro que tanto o Regimento da Assembleia da República como o Decreto-Lei n.º 274/2009 estabelecem
que as propostas de lei sejam acompanhadas de documentação que as fundamente.
Sublinhando a relevância da matéria em causa, gostaria, assim, de perguntar ao Sr. Secretário de Estado se
foram ouvidas, para a elaboração desta iniciativa, por exemplo, a Comissão Nacional de Proteção de Dados, a
Ordem dos Médicos, a Ordem dos Enfermeiros, o INSA (Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge) ou
a Direção-Geral de Alimentação e Veterinária e, se sim, quais foram as suas posições relativamente ao conteúdo
desta proposta de lei.
Naturalmente que várias audições terão de ser realizadas em sede de especialidade, mas gostava de saber
que entidades ouviu o Governo, para além da Direção-Geral de Saúde, que, como é público, foi a entidade que
esteve encarregue de preparar esta iniciativa.
É que, Sr. Secretário de Estado, ao contrário do que o Governo assumiu no seu Programa, de proceder a
uma verdadeira reforma da saúde pública, esta proposta de lei parece-nos tão-só uma compilação da legislação
já existente. É certo que a legislação que existe sobre saúde pública é vasta, está dispersa e precisa de ser
Página 24
I SÉRIE — NÚMERO 46
24
consolidada, concordamos. Mas não está esta iniciativa do Governo muito aquém da prometida reforma da
saúde pública?
Não somos só nós a dizê-lo, a própria Federação Nacional dos Médicos (FNAM) tornou pública a sua posição
relativamente a esta proposta de lei, mostrando enormes reservas e levantando questões que nos parecem
pertinentes. Por exemplo, está a reforma da saúde pública articulada com as reformas dos cuidados de saúde
primários, dos cuidados hospitalares e dos cuidados continuados e paliativos? Onde está plasmada, nesta
proposta de lei, a abordagem às novas patologias sociais, às doenças crónicas, à prevenção e à forma de
intervenção nos seus determinantes? Onde é que esta proposta de lei dá resposta a estas questões?
Temos várias outras questões, Sr. Secretário de Estado. Quantos médicos, enfermeiros e profissionais
especialistas em saúde pública há, neste momento, no País? É público que não chegam para as necessidades.
Foi feito um planeamento prévio das necessidades em recursos humanos nesta área? Como estamos em termos
de formação em saúde pública? Esta proposta não é clarificadora nem nos tranquiliza relativamente a esta
matéria.
Temos, ainda, outras questões a levantar relativamente à transmissão e proteção dos dados pessoais, que
entendemos muito relevantes, mas, como o tempo aqui é escasso, deixaremos estas questões para serem
colocadas à Comissão Nacional de Proteção de Dados, em sede de especialidade.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, a saúde pública é uma área importantíssima,
que tem, efetivamente, de ser melhorada e modernizada em Portugal. Nesse sentido, importa refletir se o que
se pretende é apenas, e só, consolidar num único diploma a legislação vasta e dispersa que existe sobre esta
matéria — e, nesse caso, esta proposta cumpre este objetivo — ou se, pelo contrário, queremos ir mais além —
e o CDS entende que sim — e se deve aproveitar a oportunidade e avançar para a necessária reforma da saúde
pública.
Aqui, Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, o Governo fica muito longe de cumprir este compromisso.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem a palavra para uma intervenção, o Sr. Deputado Ricardo
Baptista Leite, em nome do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado:
Este Governo, de facto, tem sido profícuo na construção de imagens e de chavões de propaganda, e a imagem
da vaca voadora estará, para sempre, na nossa retina.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Na realidade, ao longo deste último ano, fomos ouvindo o Governo
dizer que queria uma nova ambição para a saúde pública. Mas, quando chega a hora da verdade, vemos depois
uma proposta de lei que de saúde pública traz pouco de novo e de ambição não traz nada.
É, na realidade, uma mera compilação de leis — como disse a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto —, ainda
para mais muitas das quais desatualizadas e que não foram alvo de atualização.
Mas não é apenas o Partido Social Democrata que o afirma. Como disse a Sr.ª Deputada Isabel Galriça Neto,
a própria FNAM, a Federação Nacional dos Médicos — aliás, a sua proximidade é conhecida do próprio Partido
Comunista Português —, afirmou, de forma perentória, em comunicado, que esta consolidação da legislação
existente nada traz de reformador. Aliás, a FNAM vai mais longe, ao ponto de afirmar que esta proposta, e passo
a citar «está desajustada das exigências que uma moderna saúde pública reclama no século XXI.»
Nesta proposta, o Governo mantém o status quo, mantém tudo como estava e focaliza toda a ação de saúde
pública nas doenças infeciosas, mas nem nesta abordagem foi feita uma modernização. Vejamos o caso da
gripe, em Portugal. Os dados falam por si: neste inverno, a mortalidade excessiva em Portugal foi superior à dos
demais países da Europa a 15. Ou seja, estamos a ser ineficientes na nossa ação e a proposta de lei em nada
vem corrigir esta trajetória. Com isso, as pessoas sofrem quando não deveriam sofrer, com isso as pessoas
morrem quando poderiam continuar a viver.
Página 25
3 DE FEVEREIRO DE 2017
25
Lamento ter de dizer isto, mas aquilo que o Governo apresenta hoje, nesta Câmara, é uma proposta de lei
omissa no essencial, nada reformadora e desajustada da realidade atual.
Num País onde as doenças cárdio e cerebrovasculares são a principal causa de mortalidade, em que vemos
os números de prevalência da diabetes a subir, não vemos nada nesta proposta de lei para abordar as doenças
crónicas.
Num País onde o consumo de álcool e de tabaco e o vício do jogo estão em crescendo, com níveis elevados
de consumo de ansiolíticos e antidepressivos, que resposta dá esta proposta de lei aos problemas da
dependência e de saúde mental? Nenhuma.
Num País onde os governantes afirmam que os cidadãos devem estar no centro do Serviço Nacional de
Saúde, o que sugere esta proposta de lei para promover uma cidadania ativa? Nada.
Num País que é o mais envelhecido de toda a Europa, o que recomenda a proposta de lei para abordar os
desafios demográficos? Rigorosamente nada.
Sr.as e Srs. Deputados, num País que continua a ser marcado por profundas desigualdades, o que propõe
esta proposta de lei para abordar os determinantes sociais de saúde? Nada, nada, nada.
Termino onde comecei. Todos os agentes profissionais e políticos têm vontade de uma verdadeira reforma
da saúde pública, uma reforma de que o País precisa, mas neste caso, no final, fica a desilusão de uma
oportunidade perdida.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Teresa Caeiro.
A Sr.ª Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Luís Soares, em nome do
Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. Luís Soares (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD, de
facto, não para de nos surpreender.
A primeira pergunta que é preciso fazer, depois da intervenção do Sr. Deputado que me antecedeu, é onde
é que andou o PSD, nestes últimos quatro anos.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — A pagar as vossas dívidas!
O Sr. Luís Soares (PS): — De facto, compreende-se que a posição do PSD mudou pela circunstância de
estar hoje na oposição.
Honra seja feita ao CDS que, apesar de tudo, vem aqui dizer que este objetivo de condensar legislação que
estava dispersa um pouco por todo o ordenamento jurídico é uma medida positiva. Quero aqui dizer que esta
proposta é isso mesmo, é uma proposta que dá o pontapé de saída para o que era a legítima aspiração de toda
a comunidade da saúde, de condensar, por um lado, a legislação que estava dispersa num único diploma mas,
acima de tudo, de dar o pontapé de saída para aquilo que todos ansiamos também, que é a reforma da saúde
pública, em Portugal.
Aplausos do PS.
Sr.as e Srs. Deputados, não podemos encarar este momento e esta iniciativa do Governo como uma
oportunidade perdida, porque dizer que esta é uma oportunidade perdida é desmerecer o trabalho que foi feito
pelo Governo, pelo grupo de trabalho, pela Comissão para a Reforma da Saúde Pública Nacional, constituído
pela Direção-Geral de Saúde, pelas administrações regionais de saúde, pelas associações profissionais, pelas
organizações sindicais, pelas associações da área da saúde… Então este trabalho feito por todas estas
instituições é trabalho perdido? Não, não é trabalho perdido, Sr.as e Srs. Deputados.
Sabemos bem — é bom que se diga — das discordâncias de algumas entidades, já hoje manifestadas nesta
Assembleia por alguns Srs. Deputados, relativamente à circunstância de esta proposta não contemplar, desde
Página 26
I SÉRIE — NÚMERO 46
26
já, a tão ansiada reforma da saúde pública. O Partido Socialista encara-a, como já disse, como o pontapé de
saída e a Assembleia da República, os grupos parlamentares, têm aqui um papel absolutamente relevante.
Estamos hoje a iniciar esta discussão, que seguirá para a especialidade, onde faremos o nosso trabalho,
convidaremos as instituições que se queiram pronunciar sobre este assunto, certos de que este não é um
trabalho menor, é um trabalho que está ao serviço da reforma da saúde pública e que vai ao encontro dos
desafios que todos temos. Desafios concretos, já inscritos no Plano Nacional de Saúde, e também desafios em
abstrato, de promoção da saúde, prevenção da doença, articulação dos serviços de saúde em rede, em
plataformas colaborativas, envolvendo os desenvolvidos meios e sistemas de informação e comunicação, sem
prescindir do papel absolutamente relevante dos recursos humanos e da sua capacitação.
É esse o desafio que deixo a todos os grupos parlamentares, a todas as instituições, já ouvidas ou que ainda
possam vir a ser ouvidas, para que este trabalho na especialidade enriqueça o trabalho que é o pontapé de
saída dado pelo Governo.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos, em
nome do Grupo Parlamentar do PCP.
O Sr. João Ramos (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Ministério da
Saúde publicou despacho para criar a Comissão para a Reforma da Saúde Pública Nacional, onde apontava a
necessidade de aprovar um novo quadro legal da saúde pública que dê resposta às atuais necessidades.
Contudo, passados três meses, num contexto em que alguns intervenientes afirmam não terem sido criados
os espaços de reflexão, surgiu a proposta de lei hoje em discussão. Esta, conforme é afirmado no preâmbulo,
faz essencialmente uma compilação de legislação dispersa, com algumas atualizações. Isto está muito longe da
reforma anunciada.
Avança-se sem uma avaliação da atual situação da saúde pública. Sem esse diagnóstico, dificilmente as
propostas responderão aos problemas existentes.
A iniciativa legislativa deixa de lado um dos principais problemas da saúde pública: a grave carência de
profissionais. O reduzido número de médicos especialistas em saúde pública é dramático, pior no sul do País
do que no norte, mas também aqui muito poucos. São também poucos os enfermeiros de saúde pública, e era
necessário valorizar o seu papel. Há concelhos onde existe um técnico de saúde ambiental para 80 000
habitantes. É necessário contratar mais técnicos e aproveitar adequadamente o seu perfil profissional.
Não têm sido valorizadas experiências que demonstraram ser positivas, como foram os centros regionais de
saúde pública. A saúde pública, a prevenção da doença e a promoção da saúde têm sido remetidas para um
plano subalterno no quadro do Serviço Nacional de Saúde.
Relativamente à proposta de lei, parece-nos desadequado que o nível local seja o do agrupamento de centros
de saúde ou o da unidade local de saúde, o que em muitas regiões do País significa colocar o nível básico no
nível distrital.
Outro problema está na inexistência de uma carreira de saúde pública, como já existiu, uma vez que os
delegados de saúde são designados em comissão de serviço. Foi a desvalorização das carreiras que contribuiu
para a escassez de profissionais. A nova legislação persiste no erro.
A proposta abre a porta para que o Programa Nacional de Vacinação seja entregue a privados e esse
programa é demasiado sério para andar ao sabor da pressão de interesses privados.
Uma política de saúde pública tem obrigatoriamente, entre outros, de reforçar as estruturas de saúde pública
de proximidade, organizando-as numa base concelhia. É fundamental o reforço dos profissionais na área da
saúde pública através do desenvolvimento urgente de um reforço da formação na especialidade de saúde
pública. É importante o desenvolvimento de um sistema informático integrado e eficaz como ferramenta
fundamental para monitorizar o estado de saúde e sustentar as bases das políticas de saúde pública. Os planos
e programas nacionais de saúde devem ser determinantes da ação e não meros tratados de boas intenções e
devem incluir o financiamento e a avaliação dos resultados. O planeamento não pode estar desligado do
desenvolvimento das políticas.
Página 27
3 DE FEVEREIRO DE 2017
27
Estas e outras propostas foram já apresentadas pelo PCP, em 2015. Nessa altura, foram rejeitadas, mas
tiveram o voto favorável do PS. Poderiam agora ser concretizadas e, por isso, não devemos perder esta
oportunidade e interviremos em sede de especialidade para que tal aconteça.
Fica a pergunta, Sr. Secretário de Estado: está o Ministério disponível para acolher alterações à sua proposta
que permitam reforçar e valorizar a saúde pública?
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Moisés Ferreira,
em nome do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: É óbvio
que uma consolidação legislativa não é de somenos, é importante, mas a proposta de lei sobre saúde pública
não pode ser só isso. Aliás, acredito que não é só isso. O espírito desta proposta não é só o da consolidação
legislativa. Efetivamente, é preciso avançar muito mais, nomeadamente em sede de especialidade, para que ela
seja bastante mais robusta, eficaz e aplicável na realidade e na prática.
O Sr. Secretário de Estado enunciou alguns objetivos para esta proposta de lei: a proteção e a promoção da
saúde, a prevenção da doença, a vigilância epidemiológica dos riscos para a saúde. Estamos de acordo com
todos estes objetivos, mas temos de perceber a forma de melhor os concretizarmos, porque achamos que em
muitos deles esta proposta de lei ainda é insuficiente.
É óbvio que estamos de acordo quanto à necessidade de uma aposta na prevenção da doença e na
promoção da saúde, de termos uma população com mais e melhor esperança de vida, com uma vida livre de
doença. Por isso, é importante — e registamo-lo — a inclusão e a previsão da existência de planos locais de
saúde, por exemplo, que, provavelmente, podem ser mais robustos e reforçados na própria proposta de lei.
Creio que seria ainda importante atribuir às autoridades de saúde a provedoria de saúde dos cidadãos, coisa
que não está nesta proposta de lei, e deveria estar. Aliás, essa provedoria seria uma transposição do que muitos
delegados e autoridades de saúde pública já fazem na realidade. Creio que isso poderia estar aqui também.
Existem ainda outras questões que, certamente, em sede de especialidade, pormenorizaremos mais, mas
aproveito para as referir desde já ao Sr. Secretário de Estado.
Consideramos positiva a competência de fiscalização e de auditoria aos estabelecimentos de saúde, de
forma a melhorar a prestação de cuidados de saúde à população. No entanto, o facto de a autoridade de saúde
e de os serviços de saúde pública estarem integrados na estrutura da ARS (Administração Regional de Saúde)
ou dos ACES (agrupamentos de centros de saúde) pode criar alguns problemas de independência em relação
aos próprios estabelecimentos que depois vão fiscalizar. Era importante que, em sede de especialidade, também
refletíssemos sobre isto.
Outras questões que já foram colocadas têm a ver com os rácios de profissionais, ou seja, com o facto de a
proposta de lei prever a existência de rácios de profissionais para garantir que a saúde pública não é só uma
proposta de lei, ou, depois, uma lei em Diário da República, mas que tenha efetivamente um corpo de
profissionais para a aplicar na realidade.
Tudo isto para dizer que o Bloco de Esquerda espera que, na discussão na especialidade, haja um processo
longo e maturado com a audição de várias entidades e de vários especialistas em saúde pública para alterar a
proposta de lei.
Da parte do Partido Socialista, percebemos que também é essa a intenção, mas pergunto ao Governo que
abertura tem para essa discussão em sede de especialidade e para efetuar as alterações necessárias à proposta
de lei.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Srs. Deputados, concluída a discussão, na generalidade, da proposta
de lei n.º 49/XIII (2.ª), vamos prosseguir a nossa ordem de trabalhos com a discussão conjunta, na generalidade,
dos projetos de lei n.os 364/XIII (2.ª) — Altera a Lei n.º 37/81 (Lei da Nacionalidade) (PSD) e 390/XIII (2.ª) —
Página 28
I SÉRIE — NÚMERO 46
28
Altera a Lei da Nacionalidade, aprovada pela Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, e o Regulamento Emolumentar dos
Registos e Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de dezembro (BE).
Para apresentar o projeto de lei do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.
O Sr. José Cesário (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em tempos em que tanto se fala de
tolerância e de justiça, esperamos que, hoje, esta Assembleia seja capaz de responder positivamente aos
anseios de milhares de cidadãos que, um pouco por todo o mundo, lutam diariamente pelo simples direito de
serem portugueses, tal como os seus avós ou os seus cônjuges.
Em primeiro lugar, a aquisição da nacionalidade portuguesa por parte de cidadãos casados ou vivendo em
união de facto com portugueses é habitualmente um processo absolutamente dramático e desesperante face à
morosidade e à extrema burocracia da nossa Administração. Para além disso, face aos enormes custos de tal
processo, torna-se mesmo num ato apenas acessível a quem tiver meios financeiros significativos, o que impede
todos os cidadãos de recursos mais modestos de a ele recorrerem.
Trata-se, assim, de um processo injusto e absolutamente gerador de desigualdades sociais totalmente
inadmissíveis nos tempos que correm para quem advoga os mais elementares princípios de justiça. Por isso,
defendemos hoje a sua simplificação, dispensando a intervenção do Ministério Público em tal processo.
Em segundo lugar, recuperamos hoje uma antiga proposta nossa sobre a atribuição da nacionalidade
originária aos netos de cidadãos nacionais. Tal como em 2015, entendemos que tal processo não deve ser
condicionado por obstáculos burocráticos incompreensíveis e dificilmente demonstráveis com objetividade,
como a ligação ao território nacional.
O facto de tais condições não terem sido regulamentadas desde há já mais de um ano é a razão suficiente
para que as eliminemos.
Para nós, é muito claro que os netos de portugueses têm todas as condições para partilharem connosco a
nossa nacionalidade. São tão portugueses como qualquer um dos que se senta neste Plenário.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. José Cesário (PSD): — Saibamos ter a grandeza para fazer justiça a tantos e tantos que aguardam
por uma resposta deste Parlamento.
Por isso, porque o objetivo desta iniciativa é conseguir concretizar mudanças efetivas e positivas na vida das
pessoas que servimos, pondo de parte qualquer lógica politiqueira e demagógica, admitimos a baixa à respetiva
comissão deste nosso projeto de forma a esgotarmos todas as hipóteses de encontrarmos as melhores soluções
para os problemas que identificámos em diálogo com todas as restantes forças políticas.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para apresentar o projeto de lei do Bloco de Esquerda, tem a palavra
o Sr. Deputado José Manuel Pureza.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Do outro lado do Atlântico
chegam-nos sinais grotescos de um tempo em que a nacionalidade está a ser usada para privar cidadãos e
cidadãs de direitos básicos e para conduzir políticas de terror xenófobo.
Pois muito bem, face a isso, o que vimos aqui propor é que a nacionalidade em Portugal seja exatamente o
contrário: um instrumento privilegiado, forte, de reconhecimento de direitos em que se exprima uma estima
efetiva pela riqueza das sociedades plurais e cosmopolitas.
Até 1981, vigorava em Portugal um princípio: quem nascia em Portugal tinha a nacionalidade portuguesa. A
partir desse ano, houve uma mudança no regime jurídico: os filhos de estrangeiros nascidos em Portugal
passaram a ter a nacionalidade dos seus pais, ou seja, nascidos em Portugal ficaram imigrantes em Portugal.
A consequência desta alteração são milhares de jovens e, entretanto, também, muitos adultos forçados a
terem a nacionalidade de um país que realmente não é o seu, com o qual não têm uma relação minimamente
consistente, forçados a ter, pela lei, uma nacionalidade sem raiz e a serem cidadãos de segunda no nosso País,
onde têm raízes.
Página 29
3 DE FEVEREIRO DE 2017
29
Estas pessoas, para adquirirem a nacionalidade do País onde sempre viveram, onde cresceram, onde
estudaram, onde estabeleceram laços sociais e afetivos, têm de exibir um certificado de aproveitamento em
Português durante dois anos, o registo criminal do país de origem dos seus pais e pagar entre 175 € a 250 €.
Mas, já para as pessoas que beneficiam de vistos gold, basta que venham a Portugal sete dias por ano e, ao
fim de seis anos de residência legal, podem fazer a prova de Português para obterem a nacionalidade.
A nossa proposta é, portanto, simples, Sr.as e Srs. Deputados: a de que os filhos de estrangeiros nascidos
no território português tenham a nacionalidade portuguesa.
Gostamos e temos grande orgulho de ser o País de Emília e de Ivan, de Mamadú e de Rosa, de Samira e
de António, de Francisco e de Xandra, de Gelson e de Inês!
Batemo-nos para que, tendo todos o mesmo laço com Portugal, todos possam ser portugueses.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe,
em nome do Grupo Parlamentar do PCP.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Estamos a discutir dois projetos de lei que
estão nas antípodas um do outro.
Começaremos, então, de acordo com a ordem de entrada na Mesa, pelo projeto de lei do PSD. Já tivemos
ocasião, na Legislatura anterior, de manifestar a nossa oposição a este tipo de solução. Estamos a falar de quê?
Estamos a falar de cidadãos portugueses que emigraram para outros países, que tiveram os seus filhos nos
outros países e que não lhes atribuíram a nacionalidade portuguesa quando o podiam ter feito.
Portanto, os filhos desses cidadãos que, segundo a lei portuguesa, seriam portugueses de origem, não o
foram, pela simples razão de que os seus pais preferiram atribuir-lhes outra nacionalidade.
Bom, agora que têm netos e que Portugal é um País da União Europeia veio-lhes todo o patriotismo ao de
cima e querem dar aos seus netos, per saltum, aquilo que não quiseram dar aos seus filhos. Então, é caso para
perguntar onde é que estava o portuguesismo quando não quiseram atribuir a nacionalidade portuguesa aos
seus filhos e podiam tê-lo feito!
Mas o que há de mais absurdo nesta solução é que se procura dar uma nacionalidade originária a algo que
não é originário. Ou seja, uma nacionalidade originária é a de origem, não pode haver uma nacionalidade
originária com efeito retroativo. Para isso é que existe a naturalização!
Mas os senhores não querem a solução da naturalização pela simples razão de que querem abranger
pessoas que não têm qualquer ligação à comunidade nacional. Por isso é que, na Legislatura anterior, o Partido
Socialista deu ao PSD a benevolência de aprovar legislação neste sentido, dizendo que era necessário haver
alguma ligação à comunidade nacional. É isso que os senhores agora querem eliminar, ou seja, querem atribuir
nacionalidade portuguesa a quem não tem condições para a requerer por naturalização. Como não têm
condições para o menos, os senhores querem dar-lhes o mais!
Srs. Deputados, é uma distorção às regras de atribuição da nacionalidade portuguesa, à qual, pensamos,
não se deve incorrer. Não devemos transformar a aquisição da nacionalidade portuguesa numa espécie de
nacionalidade de conveniência, ou seja, «porque dá jeito queremos ser portugueses»! Não contarão connosco
para essa solução.
O projeto de lei do Bloco de Esquerda tem um princípio generoso. Podemos dizer que compartilhamos o
princípio de que deve haver um alargamento do princípio do jus soli na legislação relativa à nacionalidade
portuguesa. Consideramos, no entanto, que os termos usados no projeto de lei do Bloco de Esquerda vão longe
demais quanto a isso. Quer parecer-nos que, de facto, se deve alargar o princípio do jus soli e que se deve
ajudar a resolver um outro problema, que é do passado. Trata-se de pessoas que nasceram em Portugal e que
não adquiriram a nacionalidade portuguesa, não lhes foi atribuída originariamente nos termos da lei e que não
a obtiveram por naturalização, por via de entraves burocráticos. Pensamos que isso deve ser resolvido
efetivamente, porque achamos que pessoas que nasceram e foram criadas em Portugal, que têm Portugal como
o seu País, devem poder ser portugueses. Isso deve ser resolvido.
Página 30
I SÉRIE — NÚMERO 46
30
Mas daí a considerar que qualquer cidadão que nasça em Portugal, mesmo que acidentalmente, adquira a
nacionalidade portuguesa originária, parece-nos que é ir longe demais e que deve haver algum critério melhor
pensado relativamente a essa matéria.
Ou seja, para um alargamento do jus soli contarão connosco, mas um alargamento irrestrito desse princípio
quer parecer-nos que é uma solução que não é muito ponderada e que deveria ser melhor equacionada do
ponto de vista, sublinho, da necessidade de alargar a sua aplicação. Do nosso ponto de vista, o princípio do jus
soli ainda é excessivamente restrito.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado
Alves, do PS.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate que nos convoca leva-
nos a dois caminhos distintos e a dois elementos diferentes da Lei da Nacionalidade, mas em relação a ambos
sublinho que um fator importante, apesar de não ser um valor único e absoluto, é o da estabilidade dos atos
legislativos.
O projeto de lei que o PSD hoje apresenta, em que recupera a iniciativa legislativa que apresentou na
Legislatura passada e que foi aprovada apenas mediante uma correção que garantisse que existam laços de
efetiva ligação à comunidade nacional, reabre um debate que tivemos muito recentemente e para o qual me
parece que este Parlamento conseguiu construir uma solução relativamente equilibrada para acautelar as
circunstâncias daqueles que, com uma expectativa legítima, gostariam de aceder à nacionalidade portuguesa,
mas sem perder de vista que a Lei da Nacionalidade não pode pura e simplesmente assentar apenas na vontade
pontual, sem demonstrar a existência de um substrato suficientemente denso e claro de ligação com a
comunidade nacional.
Além disso, o PSD traz-nos também um outro aspeto, esse, sim, novo, que poderá ser objeto de discussão
e de melhoramento, que diz respeito à possibilidade de dispensa de oposição nas circunstâncias de casamento
ou de união de facto. Mas mesmo aí temos algumas reservas e dúvidas quanto à eficácia e ao modelo sobre o
qual o Ministério Público pode, eventualmente, passar a ficar dispensado. São matérias para as quais ainda não
há clarificação suficiente que nos permita dizer com toda a certeza que o podemos acompanhar, mas, pelo
menos, é merecedor de alguma discussão e atenção.
Por outro lado, temos a iniciativa legislativa do Bloco de Esquerda.
Penso que podemos todos consensualmente dizer que as políticas de asilo e imigração de Portugal nos
devem orgulhar há muitos anos. Somos reiteradamente bem classificados nos rankings que olham e aprovam
para as matérias de acolhimento da população migrante e da população exilada, e também aí é uma boa
demonstração de que há efetivamente abertura deste País às fronteiras e a outros povos que connosco vêm
partilhar as suas vidas e os seus destinos. Mas daí não retiramos necessariamente que, da forma como vem
proposta, possamos acompanhar o Bloco de Esquerda pela maneira como consagra, de forma totalmente
aberta, o jussoli, até porque ele pode acarretar riscos significativos para os próprios migrantes. Isto porque,
muitas vezes, o jus soli é que pode estar na origem de soluções que levam às migrações, não digo forçadas,
mas impulsionadas pela vontade de nascer num determinado território, porque sabem que, sem qualquer um
outro critério, há lugar à aquisição da nacionalidade.
Simultaneamente, por essa razão — porque também há riscos e a Lei da Nacionalidade deve ter essa cautela
—, a aquisição automática e imediata da nacionalidade por efeito do casamento, sem uma ponderação que
permita balizar a duração desse casamento e a efetiva ligação à comunidade nacional, também nos parece ser
merecedora de maior atenção, sendo que a unidade familiar e a presença dos restantes membros da família é
garantida através da lei que assegura o título de residência e que todos podem viver connosco de forma
totalmente legal.
Diria também que, para efeitos de atribuição da nacionalidade, é ainda arriscado dispensarmos da presença
legal em Portugal quem aqui esteja de forma não regular, pelo menos, durante um período de seis anos. Porque
mesmo nesse caso, olhando para as múltiplas capacidades e oportunidades, que a lei portuguesa hoje oferece,
de regularização daqueles que connosco partilham os seus destinos, é estranho — e raro, até — encontrarmos
Página 31
3 DE FEVEREIRO DE 2017
31
uma situação em que isso não tenha acontecido e que, ainda assim, se procede à atribuição direta da
nacionalidade, sem sequer existir previamente um título de residência válido face à lei portuguesa.
No entanto, e para concluir, são, de facto, merecedoras de atenção e preocupação as questões colocadas
ao nível dos custos administrativos e mesmo dos custos financeiros destes mesmos processos.
Portanto, parece-nos que há aqui espaço para ponderação…
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Mas tem menos espaço para falar, Sr. Deputado. Vai ter de concluir.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Ia terminar, Sr.ª Presidente, já estava na reta final.
Parece-nos também que, neste mesmo ponto, deve haver alguma ponderação para distinguir o que é o
processo de regularização ou de feitura de um cartão de cidadão e o processo um pouco mais complexo, que
pode ocorrer em matéria de naturalização. Como digo, nesses pontos também estamos disponíveis para um
diálogo e para uma construção positiva.
Muito obrigado pela tolerância, Sr.ª Presidente.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia,
do CDS-PP.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta discussão, não sendo nova,
é, obviamente, sempre da maior importância. É, de resto, difícil para um parlamento encontrar um tema, um
motivo, um fundamento que seja mais importante do que discutir quem é ou pode ser português.
Portanto, a questão da nacionalidade é, obviamente, um tema central e da maior importância.
Por isso mesmo, estas questões podem ser discutidas com boas intenções, com bons princípios ou, até, com
argumentos de coração, mas esses argumentos não são suficientes para as decisões que temos de tomar. Ou
seja, a decisão tem de ser ponderada, racional e pensada.
Inclusivamente, hoje, numa notícia sobre esta matéria, é dito que o Parlamento discutirá projetos que alargam
a possibilidade de ser português. Vamos pensar sobre isso e sobre estes mesmos projetos.
Em relação ao PSD, a oposição ou não nas circunstâncias de casamento ou união de facto pode merecer
reflexão. Estamos disponíveis para essa reflexão, ainda que não nos pareça que seja uma mudança essencial
ou fundamental.
Em relação à segunda proposta que o PSD faz, como disse, e bem, o Sr. Deputado António Filipe, essa
matéria foi discutida não há muito tempo e o que dissemos, quando essa discussão teve lugar, foi que, na nossa
perspetiva, secundada depois pelo Partido Socialista, poderíamos atribuir a nacionalidade originária a netos de
portugueses, mas para nós era um requisito fundamental demonstrar a efetiva ligação desses netos de
portugueses à comunidade nacional.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Foi, de resto, um requisito e uma redação na qual participámos. Pouco
tempo depois, abandonarmos a conclusão a que tínhamos chegado em trabalhos e em negociações — e até
com um arco amplo, que, na altura, envolveu o próprio Partido Socialista —, parece-nos, obviamente, um recuo
desnecessário.
O que teríamos de fazer era, quando muito, regulamentar a demonstração dessa efetiva ligação à
comunidade nacional, através do domínio da língua, da ligação a Portugal, da visita ao território nacional.
Teríamos de ir por aí e não recuar, porque, enfim, a nacionalidade, quando estamos numa segunda ou terceira
geração, em que as gerações anteriores não tiveram interesse na nacionalidade portuguesa, tem, obviamente,
de ser vista com alguma cautela.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
Página 32
I SÉRIE — NÚMERO 46
32
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Já em relação à proposta do Bloco de Esquerda, ainda que possa ser
sustentada, como fez o Sr. Deputado José Manuel Pureza, com alguma sensibilidade e algum coração, convém
que percebamos que contempla riscos muitíssimo importantes. De resto, nesta matéria, para não me citar a mim
mesmo e para não reproduzir o discurso que fiz há uns meses, vou citar um outro Deputado que falou sobre
este mesmo assunto e cujas palavras, na minha opinião, são sábias.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Palavras breves. Sábias, mas breves, Sr. Deputado.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, são brevíssimas palavras do então Sr. Deputado Pedro
Silva Pereira. Dizia o então Deputado: «O projeto do Bloco de Esquerda é todo ele um convite à imigração ilegal
e clandestina».
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Ou seja, permitir que crianças, filhas, por exemplo, de um imigrante ilegal
— apesar do facto de, circunstancialmente, estarem ilegalmente em Portugal — sejam automaticamente
portuguesas é todo um erro. Devemos estimular a imigração legal e não a imigração ilegal. E, ao mesmo tempo
que falamos dos riscos dos populismos, convém que não sejamos irresponsáveis, porque, sendo irresponsáveis,
damos fundamento aos populismos que por aí vão nascendo.
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para uma intervenção, volta a ter a palavra o Sr. Deputado José
Manuel Pureza, do Bloco de Esquerda.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Muito brevemente, queria dizer
que o Sr. Deputado Telmo Correia fez uma contraposição — que conhecíamos, aliás, de outros protagonistas
políticos — entre decisões de coração e de razão. A isso contraponho a necessidade de decisões de justiça,
porque é disso que se trata, na verdade.
Ou seja, esta é uma batalha que se tornou cada vez mais essencial, nos tempos tão de chumbo que estamos
a viver nesta mesma matéria. Todos os defensores dos direitos humanos estão convocados a tomar posição
nesta matéria, e é isso que queremos fazer.
Para terminar, Sr.ª Presidente, registo com muito agrado o acolhimento de princípio que foi colocado por
diversas bancadas. Nesse sentido, temos todo o interesse que esta proposta faça o seu caminho na
especialidade e criaremos condições para que assim seja.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para concluir este debate, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr.
Deputado Carlos Páscoa, do PSD.
O Sr. Carlos Páscoa Gonçalves (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas: Há um estudo
da Universidade de Toronto, no Canadá, que prova que a verdadeira ligação da diáspora com Portugal é feita
pelos netos de portugueses no exterior.
A Prof.ª Manuela Marujo fez as entrevistas com os vários netos e ficou surpreendida por, no início, eles se
referirem única e exclusivamente aos avós e não aos pais.
Não é de hoje que nós, que andamos pela diáspora, confirmamos isso. É uma realidade que os netos se
consideram mais portugueses, defendem Portugal, defendem a tradição e são verdadeiros embaixadores nas
áreas económica, política, jurídica e nas artes. Aliás, em Portugal consideramos como grande um
lusodescendente quando o encontramos num cargo elevado nos Estados Unidos da América, por exemplo.
É por essa razão que não desistimos de dar uma oportunidade para equilibrar a situação dos netos. Se
tivermos dois netos de portugueses nascidos no exterior, descendentes do mesmo avô, um pode ter a
Página 33
3 DE FEVEREIRO DE 2017
33
nacionalidade de origem porque o seu pai a pediu e o outro não a pode ter porque o seu pai estava impedido
de obter a dupla nacionalidade.
Entretanto, reassumiu a presidência o Vice-Presidente José Manuel Pureza.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, queira terminar, por favor.
O Sr. Carlos PáscoaGonçalves (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.
É muito importante dizer que a nacionalidade é atribuída ao neto porque foi concedida ao pai, mas não pode
ser comparado com um caso em que o pai era funcionário público ou algo desse tipo, porque até à década de
90 era proibida a dupla nacionalidade e ninguém, morando na Argentina, no Brasil ou no Uruguai, deixaria de
ter a nacionalidade do país de nascimento para ter a nacionalidade portuguesa. Por isso, temos de corrigir essa
falha.
Sr. Presidente, vou terminar dizendo que contamos com a aprovação do nosso projeto de lei, porque a
diáspora merece isso. O Partido Socialista apresentou, no último debate, anexos para colocar na lei, mas a
Ministra da Justiça está há um ano com esse projeto na gaveta e não o regulamenta. Isto é simplesmente para
substituir essa falha.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Srs. Deputados, terminada a discussão, na generalidade, dos
projetos de lei n.os 364 e 390/XIII (2.ª), vamos passar ao sexto e último ponto da nossa ordem do dia, que
consiste na apreciação dos projetos de resolução n.os 430/XIII (1.ª) — Recomenda ao Governo a implementação
da gratuitidade do acesso aos museus e monumentos nacionais para jovens até aos 30 anos, durante os fins
de semana e feriados (PS), 636/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo que adote as medidas necessárias para
fomentar o acesso de todos os cidadãos aos museus e monumentos nacionais, principalmente para as pessoas
até aos 35 anos, instituindo a gratuitidade no acesso aos fins de semana, feriados e quartas-feiras e alargando
o recurso às novas tecnologias de informação (CDS-PP) e 640/XIII (2.ª) — Gratuitidade no acesso a museus
nacionais, monumentos nacionais e outras entidades com comparticipação pública (BE).
Para apresentar o projeto de resolução do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Leão, do Partido
Socialista.
O Sr. Diogo Leão (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista
apresenta hoje um projeto de resolução que tem por objetivo reafirmar politicamente a nossa vontade de tornar
gratuita a entrada nos museus e monumentos nacionais aos fins de semana e feriados para os jovens até aos
30 anos de idade durante esta Legislatura e, mais concretamente, já durante o próximo ano de 2018.
Este objetivo é a tradução palpável de uma política transversal que prepara melhor as novas gerações. É
uma das oportunidades mais relevantes e de maior alcance que o País pode oferecer à sua juventude no âmbito
da cultura.
A franquia das portas, a libertação, a partilha — sem onerações — da sua entrada no vastíssimo património
cultural nacional cumprirá as finalidades mais diversas, que podem passar tão simplesmente pelo lazer, pela
aprendizagem e paixão pelo conhecimento, pelo aperfeiçoamento individual, pelo desenvolvimento do gosto e
da estética ou pela simples fruição livre destes espaços privilegiados da nossa cultura portuguesa, lusófona,
europeia e universal, que não necessita de especial motivação a não ser a da vontade individual de cada jovem
cidadão em ir e aventurar-se.
Para todos os jovens até aos 30 anos a implementação desta medida representará um acesso mais
democrático, mais permanente, mais justo e inclusivo aos bens culturais. Bem culturais, esses — museus e
monumentos nacionais —, que representam a riqueza da nossa identidade e refletem a diversidade deste
património único, algum do qual classificado como património mundial pela UNESCO.
Temos museus e monumentos para todos os públicos, áreas do conhecimento e interesses. São locais de
memória viva. São espaços onde conseguimos observar a materialização do conhecimento académico,
Página 34
I SÉRIE — NÚMERO 46
34
compreendendo épocas, períodos, técnicas, tradições, tendências e estilos. E também são o local de registo
dos nossos costumes populares e seculares, em domínios tão vastos como a nossa História, as artes e a ciência.
Museus e monumentos não se reduzem, de forma simplista, a janelas para o passado e para a nossa História,
não são repositórios estáticos, nem meras moradas de último e eterno repouso dos tesouros nacionais. São
instituições hoje cada vez mais dinâmicas, mais empenhadas em envolver as suas coleções, as suas exposições
e os seus estudos em harmonia ou confronto com o universo contemporâneo e quotidiano, em possibilitar a
compreensão do presente através do estudo e interpretação do passado.
E relembram-nos que é preciso conhecer o «antes», para sonhar com o «depois», que é preciso sonhar com
o «depois», para que, com génio, ousadia e conhecimento, alcancemos o passo seguinte e, então, possamos
compreender que o «impossível», o que foi futuro, se transformou, com persistência, experimentação e trabalho,
em presente. É essa uma das lições centrais da História na busca pelo conhecimento.
Uma palavra de espanto para o arrojo da direita neste assunto, nomeadamente no que toca ao CDS. Em
2011, foram corresponsáveis pela restrição e redução das entradas gratuitas nos museus nacionais,
condicionando-as aos primeiros domingos de cada mês. Agora, apresentam-se, aparentemente, bem generosos
na expansão dessa mesma gratuitidade. Mas os cidadãos sabem que a vossa credibilidade está em défice,
quando se faz uma coisa no Governo e se defende o inverso na oposição.
Sr.as e Srs. Deputados, esta iniciativa tem o mérito de reforçar aquele que já é o intuito do Governo, porque
relembro a Câmara que consta do Programa do XXI Governo Constitucional.
Pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, rejeitamos qualquer abordagem economicista a esta questão
específica. É que o investimento é claro e o saldo mais positivo ainda: é pelo bem-estar, pela qualificação e pelo
acesso à cultura das novas gerações. É uma oportunidade para a juventude, que, bem implementada e bem
divulgada, o País não pode perder.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para apresentar o projeto de resolução do CDS-PP, tem a palavra
a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de fazer três afirmações
nesta apresentação do projeto de resolução do CDS que recomenda ao Governo que adote as medidas
necessárias para fomentar e incentivar o acesso de todos os cidadãos aos museus e monumentos nacionais,
principalmente para pessoas até aos 35 anos, instituindo a gratuitidade no acesso, aos fins de semana e feriados
e às quartas-feiras e alargando o recurso às novas tecnologias de informação.
Sempre foi muito claro para o CDS que o acesso à cultura é um eixo inalienável da afirmação da nossa
identidade. É também um fator inegável de coesão social. E é certamente — e, talvez, sobretudo — um fator de
desenvolvimento de toda uma sociedade.
Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, não tenhamos dúvidas de que uma sociedade com mais aceso à cultura,
com mais fruição da cultura é uma melhor sociedade.
Ora, o Governo, em dois Orçamentos consecutivos, já fez muitas promessas, mas apresentou muito poucos
resultados. Nomeadamente — e convém não esquecer —, as propostas constantes dos sucessivos programas
eleitorais, quer do Partido Socialista quer dos partidos de esquerda que apoiam este Governo, no sentido de
fazer exigências, quando estavam na oposição, de 1% do PIB no orçamento da cultura, e, até agora, temos
0,1%. Há, pois, uma diferença em relação àquilo que os senhores exigiram durante anos a fio!
Vozes do CDS-PP: — Bem lembrado!
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Ora, perante esta inércia e esta renegação do passado, o CDS responde
com a seguinte proposta: os jovens assumem um papel fundamental, quer do ponto de vista das políticas
transversais para a juventude, quer do ponto de vista da formação de novos públicos, quer do ponto de vista da
qualificação da nossa sociedade.
Em segundo lugar, o acesso aos museus é um elemento importantíssimo para a promoção da cultura, para
a fruição da cultura e para a criação da cultura.
Página 35
3 DE FEVEREIRO DE 2017
35
O Orçamento do Estado para 2017 já contém o compromisso de adotar medidas para, e vou citar, a
«reposição da gratuitidade da entrada nos museus e monumentos nacionais». Os senhores esquecem-se,
reiteradamente, que, quando o CDS e o PSD estiveram no Governo, fizeram-no em circunstâncias de especial
dificuldade, de especial contenção e de especiais exigências perante os nossos credores, os que nos
emprestaram dinheiro, para que Portugal não fosse à falência. É bom que os senhores não esqueçam esta
realidade.
O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Ora, o CDS concorda com esta proposta constante do Orçamento do
Estado, mas insistimos que temos, desde logo, desconfiança relativamente às promessas do Partido Socialista.
E sabem porquê, Srs. Deputados? Porque o Orçamento do Estado para 2016, o qual entrou em vigor há mais
de um ano, já se propunha repor esta gratuitidade. Portanto, tiveram um ano para implementar esta gratuitidade
e não o fizeram. E agora vêm renovar, como tantas vezes acontece, as mesmas promessas, Orçamento após
Orçamento.
O Sr. Filipe Lobo d’Ávila (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Portanto, o CDS avança com muita desconfiança.
Em terceiro lugar, concordando com a iniciativa, entendemos que devemos ir mais longe. E mais longe,
como? Garantindo esta gratuitidade para os jovens até aos 35 anos, aos fins de semana e feriados, até às 14
horas, e às quartas-feiras, durante todo o dia. Isto porque, como sabemos, a população estudantil tem nesse
dia uma carga escolar muito mais aliviada.
Entendemos também que, para além da articulação com os municípios, para além de programas integrados
para a educação pré-escolar, o ensino obrigatório e também o ensino superior, se deve alargar a utilização de
mecanismos de áudio-guias digitais e outras aplicações móveis aos museus e monumentos nacionais, devendo
toda a população, sobretudo a jovem, beneficiar destas novas tecnologias.
Sr. Presidente, agradecendo a sua tolerância, vou concluir dizendo que o CDS está muito empenhado na
aprovação deste projeto de resolução e espera que estas medidas sejam finalmente implementadas, de modo
a que não fiquemos, ano após ano, e Orçamento após Orçamento, à espera que isso aconteça.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para apresentar o projeto de resolução do BE, tem a palavra o
Sr. Deputado Jorge Campos.
O Sr. Jorge Campos (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nós vemos com bons olhos a proposta
apresentada pelo Partido Socialista, embora nos pareça que, eventualmente, talvez tivesse podido ir um pouco
mais longe.
Em todo o caso, permitam-me algumas considerações.
A gratuitidade no acesso a museus e monumentos nacionais e outras entidades com participação pública
para determinados segmentos da população não é apenas um imperativo da democratização da cultura; é
também, e fundamentalmente, uma medida para a literacia cultural, indispensável à relação do homem com o
mundo.
Quando falamos, por exemplo, de literacia artística, estamos a falar de um conjunto de competências
resultantes da aquisição de saberes e linguagens, as quais promovem uma relação mais próxima, lúdica e
esclarecida com as diferentes artes. A experiência estética, o domínio dos seus códigos conduz àquilo a que
Roland Barthes chamou O Prazer do Texto.
Mas essa relação do homem com a arte e, de uma forma mais abrangente, com a cultura não se esgota na
experiência individual da fruição. Vai mais longe: induz a reflexão, incentiva a ação, solta a imaginação. O que
quer dizer que estamos perante uma poderosa ferramenta da democracia.
Página 36
I SÉRIE — NÚMERO 46
36
Infelizmente, à semelhança do que acontece em muitos outros países, hoje temos um elevado grau de
iliteracia cultural. As causas são diversas. A elas não são certamente estranhos os efeitos da crise, a sistemática
suborçamentação da cultura e um conjunto de medidas erráticas, cujas consequências perduram no tempo.
No passado recente, são exemplos a redução arbitrária dos quadros de pessoal, fusões sem sentido que
acabaram por limitar o funcionamento das estruturas e, sobretudo, uma gritante ausência de pensamento e de
visão estratégica no que às políticas culturais diz respeito.
Ora, promover a literacia cultural passa pelo reconhecimento daquilo que é património e herança comum,
uma espécie de língua profunda, que dá acesso à identidade. A partir desse legado, cuja preservação é tarefa
quotidiana, cumpre desenhar um caminho de convergências dinâmicas. Por ele, passam estruturas e criadores,
equipamentos e agentes culturais, de modo a potenciar, no quadro da contemporaneidade, a formação, a criação
e a divulgação que, promovendo a literacia cultural, vitaliza a literacia cidadã. O projeto de resolução do Bloco
de Esquerda vai nesse sentido.
Entendemos, por isso, que o Governo deve garantir e alargar os critérios de acesso gratuito a esses
equipamentos culturais, sejam eles públicos ou privados com participação do Estado. Queremos abrir portas.
Nesse sentido, impõe-se, desde logo, que seja aplicada a medida constante do Orçamento do Estado para
2017, cujo objetivo é repor a gratuitidade de acesso a todos os museus e monumentos nacionais, aos domingos
e feriados, até às 14 horas. Queremos mais jovens nos museus. São eles o ponto de partida para a criação de
novos públicos e os museus são espaços de aprendizagem informais que devem ser devidamente
rentabilizados.
Sugerimos também uma campanha nacional que envolva escolas, municípios e os Ministérios da Cultura e
da Educação, de modo a fomentar a participação dos alunos nos espaços culturais do seu concelho, distrito ou
região.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Campos (BE): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Fazemos estas propostas com plena consciência de que o somatório das convergências de meios na
prestação de serviços públicos de cultura excede largamente, pelo seu caráter simbólico, a soma das partes.
Porquê? Porque se trata, ao fim e ao cabo, de fazer mais democracia.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado
Simão Ribeiro, do PSD.
O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando debatemos, nesta
Câmara, questões relacionadas com política de juventude, há, desde logo, todo um conjunto de princípios que
me cabe, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, aqui enunciar.
Se o Sr. Presidente preferir, entenda-se como uma espécie de registo de interesses ou de um património
histórico que o PSD tem a respeito destas matérias. Desde logo, é a defesa que o Grupo Parlamentar do PSD
faz da transversalidade, no que diz respeito às políticas de juventude no nosso País.
Estivemos manifestamente contra, somos manifestamente contra e seremos sempre manifestamente contra
aquilo que, para o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, parece de menor importância, mas que, para nós,
não é, que é o acantonamento das políticas de juventude àquilo que é o Ministério da Educação, porque, em
nosso entender, este é um património em que, por obrigação dos Governos, deve haver um responsável com
elevadas capacidades no Governo e com poderes a ele adstritos que possa acompanhar todas as políticas nas
diversas pastas que digam respeito àquilo que tem que ver com a sustentabilidade das próximas gerações.
Um segundo registo de interesses, Sr. Presidente, é o seguinte: para o PSD, a ciência, o conhecimento e,
sobretudo, o acesso à cultura está na base ideal e é um dos pilares fundamentais da construção de uma
sociedade mais elevada, mais rica e com maiores ferramentas para lutar pelo seu próprio futuro.
Mas, a este respeito, e sobre a matéria que aqui nos traz hoje, Sr. Presidente, gostaria de salientar aquilo
que, aliás, já foi hoje aqui referido, e muito bem, pela Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, que é o seguinte: é que o
Página 37
3 DE FEVEREIRO DE 2017
37
Orçamento do Estado para 2017, que é um Orçamento das esquerdas parlamentares, como bem sabemos,
prevê adotar medidas para a reposição da gratuitidade da entrada nos museus e monumentos nacionais aos
domingos, até às 14 horas. Mas a verdade é que, até ao dia de hoje, aquilo que vimos de concreto a respeito
disto, Sr.as e Srs. Deputados, é zero. Portanto, cabe-me salientar aqui três pontos.
Primeiro ponto: salientar aquilo que foi uma evolução progressiva do número de visitantes a museus e a
monumentos desde 2011 até aos anos de 2014 e de 2015, apesar do discurso negativista e catastrofista das
esquerdas em Portugal e nesta Câmara, que diziam que desmantelávamos e desinvestíamos
consequentemente no acesso à cultura em Portugal. Aliás, recordo uma das medidas do Governo PSD/CDS
que teve que ver, por exemplo, com a introdução de um bilhete especial que atendia, nomeadamente, às famílias
numerosas.
Segundo ponto: enquanto líder de uma juventude partidária, elogio aquela que é a prestação ou a posição
da bancada do Partido Socialista e, sobretudo, dos jovens Deputados do Partido Socialista, que aqui fazem uma
espécie de puxão de orelhas ao Governo. Eu, no vosso lugar, faria exatamente o mesmo, Srs. Deputados!
O Governo tem sido inerte, tem sido inexistente naquilo que diz respeito a políticas de juventude em Portugal.
Faz bem a Juventude Socialista, fazem bem os jovens Deputados do Partido Socialista em tomar a dianteira e
o lugar que caberia ao Governo ao impor aqui aquela que será a primeira medida desta Legislatura — na nossa
opinião, será aprovada e não será por nós que não o será — no que diz respeito a políticas de juventude em
Portugal.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Cristóvão Simão Ribeiro (PSD): — Para terminar, Sr. Presidente, gostaria de saudar, obviamente, a
iniciativa que o CDS-PP aqui traz. Para além de a extensão da idade ser muito mais equitativa e abrangente do
que a proposta pelas outras bancadas, esta é, de resto, uma proposta muito mais inovadora, porque insere o
critério da utilização das novas tecnologias, de uma maior interatividade dos jovens com a arte e com a cultura.
Sr.as e Srs. Deputados, para terminar — agora sim —, gostaria de dizer que o Grupo Parlamentar do PSD
está e estará sempre disponível para dar o seu contributo no que diz respeito a políticas de juventude, sejam
elas de educação, de emprego, de ensino superior, mas não está disponível para compactuar com um Governo
inexistente do qual o pouco que conhecemos no que diz respeito a matérias de juventude são polémicas em
cima de polémicas.
Aplausos do PSD e da Deputada do CDS-PP Teresa Caeiro.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana
Mesquita, do PCP.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A cultura de um país constitui um
elemento central na sua identidade, na sua perspetiva de desenvolvimento e na afirmação do protagonismo
histórico do seu povo.
O caminho entre os trabalhadores e as populações e toda a cultura, no quadro atual, passa pela
responsabilidade inalienável do Estado e da administração central e pelo cumprimento do direito constitucional
à fruição cultural.
Nesse sentido, o PCP apresentou uma proposta em sede do Orçamento do Estado para 2017 para alargar
a gratuitidade do acesso à cultura. É preciso agora que a lei seja cumprida — já o devia ser desde dia 1 de
janeiro — e que a aplicação da medida comece o mais rápido possível e, se necessário for, alargando o âmbito
dos cidadãos abrangidos para lá dos residentes em território nacional.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Assinalamos que dois dos projetos aqui em discussão incluem até,
precisamente, a menção à necessidade de cumprimento do que foi aprovado por proposta do PCP.
Página 38
I SÉRIE — NÚMERO 46
38
O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr.as e Srs. Deputados, não existe algo como um suposto excesso de
gratuitidade no que concerne aos museus. Nesse capítulo, situamo-nos mesmo abaixo da média europeia,
mesmo muito abaixo, se nela incluirmos casos como o Reino Unido, onde foi tomada há mais de uma década,
em 2001, a decisão de tornar gratuitos todos os museus nacionais. Na sequência desta medida, o número de
visitantes aos museus no Reino Unido aumentou 51% em 10 anos. O número de crianças menores de 16 anos
que visitaram os museus disparou, o público alargou-se, tornando-se mais abrangente e inclusivo, por exemplo,
ao nível de visitantes provenientes de zonas economicamente desfavorecidas e de minorias étnicas.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Criou-se o hábito de ir ao museu com regularidade e não uma vez por festa.
Segundo dados do Grupo Europeu de Estatísticas sobre os Museus e do Eurostat, os bilhetes deste setor no
nosso País estão entre os mais caros da Europa, tendo em conta a paridade do poder de compra. É também
por isto, mas não só, que remeter as visitas gratuitas para um domingo por mês, prosseguindo a opção — sim!
— do PSD e do CDS aquando da sua passagem pelo último Governo, que, por opção política da direita, fez
questão de levar o pacto de agressão ainda mais longe do que o BCE (Banco Central Europeu), a União
Europeia e o FMI (Fundo Monetário Internacional) quiseram ir — também convém relembrar isto —, não poderia
senão comprometer o direito constitucional da fruição cultural. Ficariam comprometidos o acesso e a experiência
da fruição e não se desenvolveria o imprescindível hábito de frequência e conhecimento dos nossos museus e
monumentos.
Aliás, de acordo com dados do INE (Instituto Nacional de Estatística) sobre as estatísticas culturais relativas
a 2015 e dados da DGPC (Direção-Geral do Património Cultural) relativamente a 2016, podemos observar
claramente que a percentagem de visitantes nacionais tem vindo a decrescer e que, no caso dos museus
nacionais, é a primeira vez desde que há estatísticas nesta área que existiram mais visitantes estrangeiros do
que nacionais, fenómenos que não se explicam apenas e só pelo aumento do turismo estrangeiro.
Conjuntamente com a diminuição do público escolar, estas são questões que merecem reflexão e iniciativa.
Vozes do PCP: — Exatamente!
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr.as e Srs. Deputados, a defesa do direito de todos a toda a cultura implica
a rejeição de uma política que condena os que, sendo esmagadoramente maioritários, veem a sua fruição
cultural reduzida àquela pequena parcela da cultura que a classe dominante lhes destina.
É, por isso, da maior importância o alargamento do regime da gratuitidade de acesso aos museus e
monumentos nacionais, conforme o PCP propõe e defende.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Sr.as e Srs. Deputados, terminámos, assim, a discussão dos
projetos de resolução n.os 430/XIII (1.ª) e 636 e 640/XIII (2.ª) e, com ela, a ordem de trabalhos.
Antes de dar por encerrada a sessão, peço à Sr.ª Secretária Emília Santos para dar conta da entrada na
Mesa de um projeto de lei.
Faça favor, Sr.ª Secretária.
A Sr.ª Secretária (Emília Santos): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, informo que deu entrada na Mesa, e
foi admitido pelo Sr. Presidente, o projeto de lei n.º 392/XIII (2.ª) — Altera o Código do Imposto sobre o
Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro, criando a
obrigatoriedade da informação anual da possibilidade de consignação de 0,5% do IRS a instituições religiosas,
instituições particulares de solidariedade social ou pessoas coletivas de utilidade pública (CDS-PP), que baixa
à 5.ª Comissão.
É tudo, Sr. Presidente.
Página 39
3 DE FEVEREIRO DE 2017
39
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Muito obrigado, Sr.ª Secretária.
Sr.as e Srs. Deputados, resta-me anunciar a ordem do dia da sessão de amanhã, com início às 10 horas.
Do primeiro ponto consta a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 51/XIII (2.ª) — Altera o regime
de congelamento e de perda dos instrumentos e produtos do crime na União Europeia, transpondo a Diretiva
2014/42/UE.
No segundo ponto, será discutido o projeto de resolução n.º 560/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo a
vinculação dos docentes contratados de acordo com o previsto na Diretiva 1999/70/CE (BE), juntamente, na
generalidade, com o projeto de lei n.º 278/XIII (1.ª) — Propõe um regime de vinculação dos docentes na carreira
(PCP).
Segue-se, no terceiro ponto, o debate, na generalidade, do projeto de lei n.º 388/XIII (2.ª) — Procede à
eliminação da portaria que aumentou o imposto sobre produtos petrolíferos (CDS-PP).
Do quarto ponto consta a discussão conjunta dos projetos de resolução n.os 171/XIII (1.ª) — Determina a
manutenção do Novo Banco na esfera pública, assegurando a sua propriedade e gestão públicas ao serviço dos
interesses do povo e do País (PCP) e 641/XIII (2.ª) — Pela manutenção da propriedade do Novo Banco na
esfera pública (BE).
No quinto ponto, serão apreciados, na generalidade, os projetos de lei n.os 12/XIII (1.ª) — Redução de
resíduos de embalagens (Os Verdes) e 389/XIII (2.ª) — Determina o regime jurídico da utilização de embalagens
fornecidas em superfícies comerciais (PCP), juntamente com o projeto de resolução n.º 638/XIII (2.ª) —
Recomenda ao Governo que diligencie no sentido de reduzir o número de embalagens plásticas, assim
fomentado a utilização de outros materiais mais ecológicos (PAN).
Por fim, às 12 horas haverá votações regimentais.
A todas e a todos desejo a continuação de uma boa tarde.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 45 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.