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Sexta-feira, 23 de junho de 2017 I Série — Número 100

XIII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2016-2017)

REUNIÃOPLENÁRIADE22DEJUNHODE 2017

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Emília de Fátima Moreira Santos Sandra Maria Pereira Pontedeira António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 5

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa das propostas de

resolução n.os 53 e 54/XIII (2.ª), dos projetos de lei n.os 551, 553 e 555 a 563/XIII (2.ª) e dos projetos de resolução n.os 927 a 937/XIII (2.ª).

Procedeu-se ao debate, na generalidade, da proposta de lei n.º 81/XIII (2.ª) — Define os objetivos, prioridades e orientações de política criminal para o biénio de 2017-2019. Intervieram, a diverso título, além da Ministra da Justiça (Francisca Van Dunem), os Deputados José Manuel Pureza (BE), Carlos Peixoto (PSD), João Oliveira (PCP), Telmo Correia (CDS-PP) e Jorge Lacão (PS).

Foi discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 90/XIII (2.ª) — Procede à quadragésima terceira alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, à quinta alteração ao Código da Execução das Penas e Medidas Privativas de Liberdade, aprovado pela Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro, à primeira alteração à lei de

vigilância eletrónica, aprovada pela Lei n.º 33/2010, de 2 de setembro, e à segunda alteração à Lei da Organização do Sistema Judiciário, aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto. Pronunciaram-se, além da Ministra da Justiça, os Deputados José Manuel Pureza (BE), José Silvano (PSD), Vânia Dias da Silva (CDS-PP), João Oliveira (PCP) e Jorge Lacão (PS).

Foi apreciado o Relatório Anual do Provedor de Justiça 2016, tendo intervindo os Deputados Carlos Abreu Amorim (PSD), Susana Amador (PS), José Manuel Pureza (BE), Vânia Dias da Silva (CDS-PP) e Jorge Machado (PCP).

Sobre a petição n.º 90/XIII (1.ª) — Solicitam a criação do «Dia Nacional da Inclusão», no dia 17 de junho (Ana Cristina Pinto Rebelo dos Santos Abrantes Pires e outros), pronunciaram-se os Deputados Maria da Luz Rosinha (PS), Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP), Diana Ferreira (PCP), Sandra Pereira (PSD) e José Moura Soeiro (BE).

O Presidente (José de Matos Correia) encerrou a sessão eram 16 horas e 57 minutos.

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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, vamos dar

início à sessão.

Eram 15 horas e 5 minutos.

Peço aos Srs. Agentes da autoridade para abrirem as galerias.

Antes de entrarmos no período da ordem do dia, peço à Sr.ª Secretária Deputada Emília Santos para anunciar

o expediente.

A Sr.ª Secretária (Emília Santos): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram

admitidos pelo Sr. Presidente, as propostas de resolução n.os 53/XIII (2.ª) — Aprova o Acordo entre a República

Portuguesa e a República da Cotê d'Ivoire sobre Serviços Aéreos, assinado em Lisboa, em 22 de junho de 2016,

que baixa à 2.ª Comissão, e 54/XIII (2.ª) — Aprova o Protocolo que altera a Convenção referente às infrações e

a certos outros atos cometidos a bordo de aeronaves, assinado em Montreal, em 4 de abril de 2014, que baixa

à 2.ª Comissão; os projetos de lei n.os 551/XIII (2.ª) — Lei das Finanças Locais (PCP), que baixa à 11.ª Comissão,

553/XIII (2.ª) — Repõe o valor do trabalho suplementar e o descanso compensatório, aprofundando a

recuperação de rendimentos e contribuindo para a criação de emprego (Décima quinta alteração ao Código do

Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro) (BE), que baixa à 10.ª Comissão, 555/XIII (2.ª) —

Garante a assistência parental ao parto (PAN), 556/XIII (2.ª) — Alarga a gratuitidade do acesso ao serviço de

transporte escolar a todos os alunos do ensino obrigatório, procedendo a alteração ao Decreto-Lei n.º 55/2009,

de 2 de março (Os Verdes), que baixa à 8.ª Comissão, 557/XIII (2.ª) — Revoga a retirada da Ilha de Man, Jersey

e Uruguai da lista dos países, territórios e regiões com regimes de tributação privilegiada claramente mais

favoráveis (CDS-PP), que baixa à 5.ª Comissão, 558/XIII (2.ª) — Estabelece os princípios gerais da carreira de

médico veterinário municipal, revogando o Decreto-Lei n.º 116/98, de 5 de maio (CDS-PP), que baixa à 7.ª

Comissão, 559/XIII (2.ª) — Prevê a devolução de taxas moderadoras no caso de o utente desistir do atendimento

de urgência, procedendo a alteração ao Decreto-Lei n.º 113/2011, de 29 de novembro (Os Verdes), que baixa

à 9.ª Comissão, 560/XIII (2.ª) — Estipula o reembolso do valor de taxas moderadoras no caso de demora

significativa no atendimento de urgência, procedendo a alteração ao Decreto-Lei n.º 113/2011, de 29 de

novembro (Os Verdes), que baixa à 9.ª Comissão, 561/XIII (2.ª) — Fixa o regime de atribuição e os montantes

dos acréscimos em suplementos e outras compensações que se fundamentem na prestação de trabalho em

condições de risco, penosidade e insalubridade (Sexta alteração à Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho — Lei Geral

de Trabalho em Funções Públicas) (PCP), que baixa à 10.ª Comissão, 562/XIII (2.ª) — Regularização excecional

da situação dos trabalhadores sem vínculo jurídico com funções permanentes nas autarquias locais (PCP), que

baixa à 10.ª Comissão, e 563/XIII (2.ª) — Procede à segunda alteração à Lei n.º 15/2014, de 21 de março, de

modo a reforçar os direitos da mulher grávida durante o parto e da mulher puérpera após o internamento (Os

Verdes).

Deram ainda entrada na Mesa os projetos de resolução n.os 927/XIII (2.ª) — Necessidade de dotar o País de

uma Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e da Biodiversidade atualizada (Os Verdes), que baixa à

11.ª Comissão, 928/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo que atue no sentido de assegurar o cumprimento dos

direitos das mulheres na gravidez e no parto (PAN), 929/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo a disponibilização

de parto na água no Serviço Nacional de Saúde (PAN), 930/XIII (2.ª) — Pela rejeição do CETA — Acordo

Económico e Comercial Global entre a União Europeia e o Canadá (Os Verdes), que baixa à 2.ª Comissão,

931/XIII (2.ª) — Requalificação e ampliação urgente da Escola Básica de 2.º e 3.º ciclos El-Rei D. Manuel I, em

Alcochete (PCP), que baixa à 8.ª Comissão, 932/XIII (2.ª) — Pelo urgente reinício das obras de reabilitação da

Escola Secundária do Monte de Caparica (Os Verdes), que baixa à 8.ª Comissão, 933/XIII (2.ª) — Em defesa

do sítio arqueológico da cidade de Balsa (BE), que baixa à 12.ª Comissão, 934/XIII (2.ª) — Reforça as medidas

de acompanhamento da grávida e puérpera no Serviço Nacional de Saúde (PCP), 935/XIII (2.ª) — Sobre a

opção pelo parto em meio aquático no Serviço Nacional de Saúde (Os Verdes), 936/XIII (2.ª) — Execução do

traçado entre Virela-Fornelo definido no estudo de impacte ambiental do aproveitamento hidroelétrico Ribeiradio-

Ermida (Os Verdes), que baixa à 6.ª Comissão e 937/XIII (2.ª) — Pela promoção das ilhas na política de coesão

europeia (PS), que baixa à 4.ª Comissão.

É tudo, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, vamos dar início à ordem do dia.

O primeiro ponto é a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 81/XIII (2.ª) — Define os objetivos,

prioridades e orientações de política criminal para o biénio de 2017-2019.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça Francisca Van Dunem.

A Sr.ª Ministra da Justiça (Francisca Van Dunem): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, os meus respeitos.

O Governo apresenta aqui, hoje, em cumprimento da Lei-Quadro da Política Criminal, a proposta de definição

de objetivos, prioridades e orientações em matéria de prevenção da criminalidade, de investigação criminal, de

exercício de ação penal e de execução de penas e medidas de segurança para o biénio 2017-2019.

A proposta aqui apresentada colhe a sua fundamentação material na informação disponibilizada pelo

Relatório Anual de Segurança Interna, RASI 2016, numa leitura concertada com as análises prospetivas com

origem internacional, basicamente com origem na Europol, que identificam as tendências do crime nas suas

distintas dimensões de materialidade e de gravidade.

Como se refere na fundamentação que integra a proposta, os objetivos gerais de política criminal para o

biénio 2017-2019 visam a manutenção da descida sustentada dos índices de criminalidade, em particular da

grave e organizada, através da prevenção geral e da prevenção especial, o que compreende, para além de

ações de prevenção secundária, o esclarecimento do crime e a efetivação das sanções penais, num prazo

razoável, com correspondente efeito a um tempo dissuasor e pacificador pela estabilização das expetativas

comunitárias na capacidade de ação das forças e serviços de segurança e do aparelho da justiça.

Sinalizando diferenças procedimentais para o crime de excecional gravidade, para o crime grave e para o

crime de média e baixa densidade, a proposta salvaguarda a coerência entre a fase preliminar e as fases

subsequentes do processo penal, à semelhança do que já acontecia na Lei n.º 38/2009, e concilia a definição

de prioridades com o novo modelo de gestão dos tribunais.

No plano da prevenção, ao lado de programas de policiamento direcionados para fenómenos criminais

concretos, antecipa-se a prevenção do risco com a inscrição expressa da intervenção de estruturas

administrativas vocacionadas para inspeção setorial.

Deu-se centralidade à vítima, atribuindo-se prioridade à sua proteção e à reparação dos danos por ela

sofridos.

Enfatizou-se a prevenção da reincidência pela reinserção do agente através da melhoria da oferta de

programas de reinserção, quer em meio livre, quer em ambiente institucional.

Finalmente, definiu-se um elenco de fenómenos criminais, de prevenção e de investigação prioritários que

se considera compaginável, ainda, no plano numérico, com a efetivação pelas autoridades competentes das

prioridades que aqui serão definidas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para formular pedidos de esclarecimento, o Sr. Deputado José Manuel

Pureza.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados.

Sr.ª Ministra, depois de a ouvir atentamente gostaria de lhe colocar algumas questões relativas ao diploma

que está agora em apreciação.

Na verdade, definir objetivos, definir prioridades, definir orientações para a política criminal implica, como,

aliás, o diploma explicita na sua exposição de motivos, uma fundamentação rigorosa e uma fundamentação

baseada nos melhores instrumentos de conhecimento da realidade portuguesa, designadamente em matéria de

criminalidade, naturalmente.

Isso mesmo é referido na exposição de motivos, dizendo-se que se leva em conta os dados do RASI e

também dados prospetivos de instâncias internacionais — a Sr.ª Ministra acabou agora mesmo de falar da

Europol. Isto suscita-nos uma primeira perplexidade que gostaria de expor.

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Com base no conhecimento concreto da realidade portuguesa em matéria de criminalidade, como é que se

pode fundamentar a escolha deste diploma reiterando a escolha do diploma idêntico anterior, relativo ao biénio

2015-2017, do crime de terrorismo como o crime prioritário, a primeira prioridade em matéria de investigação?

Posso até perceber que, em matéria de prevenção, se possa apontar essa realidade, mas, tanto quanto conheço,

do ponto de vista da realidade concreta da criminalidade em Portugal, a investigação ser a primeira das

prioridades é qualquer coisa que, manifestamente, me causa, enfim, bastante estranheza, colocando, aliás, o

crime de terrorismo como uma prioridade acima daquelas que são produtoras de uma vitimação muito

preocupante, e podemos aqui citar diversas, desde a violência doméstica até aos crimes contra crianças e

jovens, até aos crimes de violência no desporto, até ao tráfico de armas, esses sim crimes com uma

materialidade verificada no contexto português e que mereceriam, portanto, do nosso ponto de vista, uma

atribuição de prioridade, quer do ponto de vista da prevenção, quer do ponto de vista da investigação.

Como é que se justifica, Sr.ª Ministra, neste plano, que a criminalidade económica e financeira seja, do ponto

de vista da investigação e da prevenção, relegada para uma posição, na ordem pela qual é apresentado o elenco

de crimes, o elenco de fenómenos criminais, totalmente subalterna? De acordo com aquilo que pude ler, a

criminalidade económica e financeira ocupa o 16.º lugar nas prioridades em matéria de prevenção e

especificamente o branqueamento de capitais ocupa a 11.ª posição, no que diz respeito às prioridades de

investigação. Eis, pois, uma primeira perplexidade.

Em segundo lugar, Sr.ª Ministra, e adiantando rapidamente, quanto às questões relativas à monitorização,

artigo 5.º deste diploma, na verdade deixa-se de fora…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o seu tempo.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Terminarei em brevíssimos segundos, Sr. Presidente, agradecendo a

sua tolerância.

Apenas uma questão: deixam-se de fora estruturas que são fundamentais para a monitorização pelo

Ministério Público, a saber, o DCIAP (Departamento Central de Investigação e Ação Penal) e os DIAP

(Departamentos de Investigação e Ação Penal) distritais ou, ainda, os tribunais superiores.

Creio que, do ponto de vista da monitorização, também isto merece, naturalmente, a maior das dúvidas e

gostaria que a Sr.ª Ministra nos esclarecesse sobre os critérios que presidiram a esta escolha.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Não há mais inscrições, pelo que tem a palavra, para responder, a Sr.ª Ministra da

Justiça.

A Sr.ª Ministra da Justiça: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Manuel Pureza, agradeço as suas

perguntas e compreendo a sua perplexidade. Queria, no entanto, dizer-lhe que, se é verdade que se pode

encontrar um sinal político neste elenco, não é menos verdade que estes crimes são todos igualmente prioritários

— é justamente uma das grandes dificuldades destas enunciações —, o que significa que não há uma

categorização da prioridade em função da posição da indicação do crime ou do fenómeno criminal nesta lista.

Quanto à primeira objeção que me colocou, é a resposta que lhe dou. De facto, curiosamente, na altura em que

se esteve a discutir isto até se sugeriu a possibilidade de ficar por ordem alfabética. Porquê? Justamente porque

se percebia que uma questão deste tipo se poderia suscitar. Mas aquela que tem sido a leitura prática destas

leis de política criminal aponta no sentido de não haver aqui, propriamente, uma hierarquia de prioridades entre

estes crimes.

Relativamente à segunda questão, tem razão. A norma do artigo 5.º, quando prevê a intervenção dos

presidentes das comarcas e quando prevê a intervenção…

O Sr. Presidente: — Sr.ª Ministra, peço-lhe para terminar, porque já ultrapassou o tempo de que dispunha.

A Sr.ª Ministra da Justiça: — Vou já terminar, Sr. Presidente.

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Como estava a dizer, a norma do artigo 5.º, quando prevê a intervenção dos presidentes das comarcas e dos

coordenadores, deixa de fora, de facto, o espaço do DCIAP. Nessa perspetiva, seria importante que houvesse

aqui referência à Procuradoria-Geral nos concelhos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Carlos Peixoto.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Sr.ª Ministra

da Justiça, politicamente falando, como é óbvio, não é do tempo em que o PS criticava aqui, com alguma

ferocidade,…

O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Ferocidade?!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — … a atual lei de política criminal, que não votou favoravelmente. E não votou

favoravelmente porque entendia que a estrutura dessa lei não devia ser a estrutura seguida, que a melhor

estrutura, filosofia e modelo a seguir deveria ser a da anterior lei de política criminal.

Portanto, a Sr.ª Ministra não precisa de perder muito tempo a justificar por que é que abandonou, fez tábua

rasa daquilo que o PS, então, dizia sobre esta matéria e seguiu exatamente o modelo da atual lei em vigor, que

foi pensada, posta em prática e aprovada pelo anterior Governo.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Louva-se o reconhecimento de que antes também se faziam coisas boas.

Mas isto, Sr.ª Ministra, não quer dizer que esteja tudo irrepreensível, porque não está. O alargamento que o

atual Governo faz das prioridades é algo inquietante e, porventura, algo irrazoável. É que aumenta, na parte dos

crimes de prevenção prioritária, nove tendências ou fenómenos criminais e aumenta nove ou doze, consoante

o critério, na parte da investigação prioritária. Para este Governo parece que tudo é prioritário e, quando tudo é

prioritário, Sr.ª Ministra, nada é prioritário.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — É verdade!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — É como as exceções: se há muitas exceções, elas tornam-se regra e deixa

de haver exceções. Isto é o que nos inquieta.

Outra questão é a hierarquização das prioridades, de que falou o Sr. Deputado José Manuel Pureza e a que

a Sr.ª Ministra respondeu de forma também algo inquietante.

O Sr. Deputado José Manuel Pureza disse assim: «Ó Sr.ª Ministra, é algo estranho que o crime de terrorismo

esteja catalogado em primeiro lugar». Ora essa! Ora essa! Então alguém, do ponto de vista do alarme social, da

proteção social, da proteção comunitária, põe em causa que o crime de terrorismo seja um crime altamente

prioritário?! Não o deixe cair, por favor, Sr.ª Ministra!

Em todo o caso, o Governo tem de fazer uma outra coisa, que é o seguinte: não colocar, na hierarquização

das prioridades, crimes contra o património e crimes económicos à frente dos crimes contra as pessoas, que é

aquilo que faz nesta proposta. Isto não é correto! Não sei se o problema está ou não nas letras do alfabeto, se,

para o Governo, é mesmo tudo prioritário, mas acho que era importante, por uma questão de simbolismo, de

mensagem para as autoridades judiciárias, que se colocassem, por exemplo, Sr.ª Ministra, os crimes contra a

vida e a integridade física dos agentes de autoridade à frente dos crimes de extorsão. Acho que esta

preocupação devia ser manifestada.

Portanto, Sr.ª Ministra, acho que o Governo seguiu aqui um critério um bocadinho simplista, um bocadinho

ligeiro, somando às prioridades as tendências do RASI. Foi o que fez! Não houve mais critério! Só que, se fez

isso, também devia, por coerência,…

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O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o tempo de que dispunha, pelo que lhe peço o favor de

concluir.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Termino já, Sr. Presidente.

Como estava a dizer, se o Governo fez isso, também devia, por coerência, tirar das prioridades os crimes

que registaram uma descida no RASI.

De qualquer forma, Sr.ª Ministra, o PSD está perfeitamente disponível para, em sede de especialidade,

acolher e trabalhar, com o Partido Socialista, com o Governo e com os outros partidos,…

O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — … algumas afinações e melhorias que esta lei, apesar de tudo, ainda merece.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Justiça: Queria começar

por dizer que esta discussão não permite ainda ultrapassar muitas das dúvidas que têm surgido, praticamente

desde há 10 anos — em 2007 —, quando discutimos pela primeira vez a lei de prioridades da política criminal,

na sequência da aprovação da lei-quadro da orgânica criminal.

É que, de duas uma, ou aprovamos uma lei inconsequente para não pôr em causa a autonomia do Ministério

Público, para não beliscar a própria separação e independência do poder judicial ou, para tornarmos a lei

consequente, de facto, temos de pôr em causa esses valores. Esse tem sido, de resto, o problema, aliás, acho

que esta intervenção do Sr. Deputado Carlos Peixoto revela isso mesmo: a intenção de dar consequência à lei

é dificilmente compatível com o respeito pela autonomia do Ministério Público e com as competências próprias

do Ministério Público em matéria de ação penal.

Sr.ª Ministra, gostava de lhe dizer que continuamos a entender que esta lei é perfeitamente desnecessária e

que, pelo contrário, aquilo que devia ser feito não era, de dois em dois anos, retomarmos a discussão e a

aprovação de leis de prioridades mas, pelo contrário, ir à lei orgânica da investigação criminal e revogar, de uma

vez por todas, a definição desta lei. E dou-lhe um exemplo, Sr.ª Ministra, da desnecessidade de leis de

prioridades de investigação criminal, que foi aquilo que aconteceu entre 2011 e 2015. Aliás, pode até dizer-se

que uma das boas coisas que o Governo anterior fez, em matéria de justiça, foi não fazer, foi precisamente onde

o Governo não fez que fez alguma coisa acertada.

Risos do Deputado do BE José Manuel Pureza.

O Governo anterior — e a anterior Ministra da Justiça era muito conhecida pela crítica que fazia a esta matéria

das prioridades de política criminal — decidiu não apresentar uma lei de prioridades da política criminal entre

2011 e 2015. Nós perguntamos: deixou de haver investigação criminal? Não, não deixou!

Mais: o próprio parecer do Ministério Público, apresentado naquela altura, em 2015, dizia precisamente que,

durante esse período de quatro anos, o Ministério Público, no âmbito das suas competências próprias em

matéria de ação penal, não deixou de estabelecer objetivos, identificar prioridades, desenvolver projetos de

acordo com esses objetivos e essas prioridades, com base na perceção da evolução dos fenómenos criminais

e na execução das opções de política criminal subjacentes à legislação penal e processual penal.

Portanto, Sr.ª Ministra, nós, de facto, continuamos convencidos de que esta lei de prioridades da política

criminal é perfeitamente desnecessária, porque terá de ser sempre o Ministério Público, no âmbito da sua

autonomia, a definir aquelas que são as prioridades, a alocar os recursos e a definir os objetivos em função de

tudo isso. E isto, Sr.ª Ministra, coloca-nos exatamente no mesmo ponto em que temos estado, em que estivemos

em 2007 e 2009 e em que estivemos, depois, em 2015, quando o anterior Governo acabou por apresentar uma

lei que nós, de forma relativamente acertada na previsão que fizemos, identificámos logo, na altura, como sendo

uma lei para o Governo que viesse a seguir. Isso veio mesmo a confirmar-se.

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Mas continuamos confrontados com os mesmos problemas. A Sr.ª Ministra fez aqui referência ao RASI e

consta, de facto, do anexo que integra a proposta de lei essa referência ao Relatório Anual de Segurança Interna

como um elemento-base para que o Governo aponte os critérios das prioridades em matéria de política criminal,

mas nós perguntamos, Sr.ª Ministra: há alguma avaliação já feita pelo Governo relativamente à lei anterior, à

forma como definiu as prioridades, à forma como foram definidas as opções pela anterior lei de prioridades da

investigação criminal? É que nós encontramos nesta lei a repetição de muitos dos critérios e das opções que

foram seguidos na anterior lei, apresentada em 2015, e alguns deles motivo de crítica.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Para terminar, Sr. Presidente, e não abusar da sua tolerância, vou apenas dar

um exemplo à Sr.ª Ministra: a prioridade deixa de ser prioridade quando houver risco de prescrição, que é um

problema das anteriores propostas e também desta, no n.º 3 do artigo 4.º.

Quanto ao envolvimento do DCIAP e dos DIAP distritais na monitorização, que já aqui foi referido e a que a

Sr.ª Ministra já deu resposta, esperamos que ele possa ainda ser ultrapassado.

Relativamente à definição do terrorismo como prioridade, já vinha da anterior lei, já foi motivo de crítica e

mantém-se.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Concluo, Sr. Presidente, com esta referência: há um problema que persiste

no artigo 15.º, com as equipas especiais, que, sendo constituídas pela Procuradoria-Geral da República e

mantendo-se na dependência funcional do Ministério Público, mantêm também a dependência hierárquica dos

respetivos membros.

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Ministra, nós consideramos que estes problemas não estão em condições

de ser resolvidos enquanto continuarmos a discutir uma lei…

O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — … que é, de facto, uma lei de prioridades, sem poder definir efetivamente

prioridades, para não pôr em causa a autonomia do Ministério Público, que é, de facto,…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado João Oliveira, tem mesmo de terminar.

O Sr. João Oliveira (PCP): — … um valor que julgamos que não pode, de forma nenhuma, ser beliscado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: De uma forma

breve, quero dizer que esta lei não é, seguramente, a resolução de toda a lógica e de toda a estratégia da política

criminal. E, obviamente, é possível e até aceitável a crítica de que uma lei destas tem sempre tanta abrangência,

seja na prevenção, seja na investigação, que permite o contra-argumento de, estando tanta coisa, no fundo, não

sabermos exatamente o que é prioritário. É uma crítica normal, aceitável e razoável.

Por outro lado, Sr.ª Ministra, gostaria de lhe dizer que, do nosso ponto de vista, sendo oposição, nestas

matérias e em matérias de política de Estado, procuramos sempre ser oposição responsável e rigorosa. Nós

não vamos dizer que está tudo mal, quando esta lei não tem uma mudança substancial em relação àquilo que

foi feito por outros governos, anteriormente, designadamente aqueles que tinham maioria apoiada pelo CDS.

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Não há uma mudança substancial e não só não há uma mudança substancial como há, e dou-lhe razão nesse

ponto, uma descida sustentada das taxas de criminalidade e dos valores da criminalidade.

Portanto, reconhecendo isso mesmo, diria que naquilo que está a correr bem convém não mexer, não alterar

muito. E não veja aqui nenhuma crítica, Sr.ª Ministra, porque não faço o exercício que aqui vimos, ainda agora,

de ser sempre, por princípio, oposição. O Sr. Deputado João Oliveira, quando está na oposição, é oposição,

quando está no Governo, é oposição ao Governo anterior e, portanto, está sempre na oposição.

Risos do CDS-PP e do PSD.

Não faço esse exercício, Sr.ª Ministra, e acho mesmo, já que falamos da oposição, que o Sr. Deputado José

Manuel Pureza tem, de facto, uma dificuldade de compreensão ou um bloqueio em relação à questão do

terrorismo. É que o Sr. Deputado, no outro dia, dizia «não são precisos os metadados, porque até já existe a

possibilidade de escutas na investigação criminal»,…

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Claro!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … ou seja, não percebeu que a investigação só ocorre depois de o crime

já ter acontecido e que os metadados não servem para isso, servem para prevenir.

E, já agora, chamo até a atenção do Governo, da Sr.ª Ministra da Justiça e do Sr. Secretário de Estado dos

Assuntos Parlamentares para que já é tempo de o Parlamento e o Governo trabalharem nas propostas que

foram aprovadas — a do Governo e a nossa —, de modo a que, em matéria de prevenção, os nossos serviços

de informações tenham rapidamente acesso a metadados, instrumento fundamental para prevenir os crimes de

terrorismo.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Mas, se ocorrer um crime de terrorismo, como aconteceu, recentemente,

em vários países europeus, como em França ou em Inglaterra, por exemplo — e esperemos que não aconteça

no nosso País —, essa investigação não é prioritária, Sr. Deputado? Cabe na cabeça de alguém que essa

investigação não seja prioritária? Vamos pensar no que aconteceu há pouco tempo em Inglaterra. A investigação

desse crime não é prioritária? É óbvio que é prioritária.

Mas fica ainda uma dúvida, Sr.ª Ministra: a de saber se esta hierarquia de investigação é, de facto, uma

hierarquia ou se é meramente indicativa, ou seja, não ficou claro, na sua alusão abecedária, se se trata ou não

de uma hierarquia.

Pela leitura da proposta de lei, são considerados crimes de investigação prioritária, entre outros — e esta é

uma novidade —, a criminalidade praticada em ambiente prisional. Neste caso, haverá uma razão, haverá,

seguramente, uma sustentação, pode ficar alguma dúvida da nossa parte. Em relação aos outros crimes de

investigação criminal, não temos grande dúvida, Sr.ª Ministra. Só podemos saudar como positivo que se

acrescente a criminalidade violenta em ambiente escolar.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — De resto, o CDS tem apresentado sempre iniciativas, tipificando e

agravando toda a criminalidade que seja cometida em ambiente escolar, incluindo, obviamente, o envolvente e

as imediações dos estabelecimentos de ensino, porque achamos que é particularmente grave seja o furto, seja

o tráfico de droga, seja qualquer crime que possa afetar as crianças. Só podemos estar de acordo que se

acrescente aos crimes de investigação prioritária a criminalidade violenta em ambiente escolar, bem como a

proteção, que tantas vezes não é até acompanhada neste Parlamento, da integridade e da vida dos nossos

agentes de autoridade.

Por aí, não vemos problema de maior. Quando muito, vemos necessidade de esclarecimento sobre a

hierarquia e a efetiva aplicação destas prioridades.

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O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço para concluir, o que, aliás, já devia ter acontecido.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — E assim termino, Sr. Presidente.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão, do PS.

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos

Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Convém, em primeiro lugar, compreendermos o pressuposto jurídico-

constitucional em que assenta esta iniciativa legislativa. Esse pressuposto está claramente estabelecido na

Constituição, no seu artigo 219.º, que, para o essencial do que está em causa, diz o seguinte: «Ao Ministério

Público compete (…) nos termos da lei, participar na execução da política criminal definida pelos órgãos de

soberania (…)».

Portanto, o que estamos aqui a fazer é a manifestar um respeito escrupuloso por uma prescrição

constitucional. E, ao fazê-lo, estamos a evidenciar aquilo que deve saltar aos olhos de todos nós, numa

consciência de cidadania: todas as políticas, incluindo as políticas de prevenção e de investigação criminal,

implicam uma responsabilidade democrática. E essa responsabilidade democrática é exemplarmente assumida

pelo enquadramento legal em que esta matéria se processa.

Ao Governo compete apresentar uma proposta, ouvidas as entidades relevantes do setor, à Assembleia da

República compete apreciar essa proposta e, ao mesmo tempo, deve o Parlamento conhecer, da parte do

Procurador-Geral da República, a apresentação do relatório de execução na concretização das orientações de

política criminal.

Segue-se daqui — e pergunto — que haja, por esta via, alguma possibilidade de afetação da autonomia do

Ministério Público? A resposta é óbvia: nem pensar! Nem pensar, porque o que esta Lei estabelece, e bem, é

que o Procurador-Geral da República, na circunstância a Sr.ª Procuradora-Geral da República, tem a

incumbência de estabelecer diretivas e instruções genéricas para assegurar os graus de cumprimento

adequados a estas orientações e, portanto, nenhuma ingerência da nossa parte em relação à determinação de

qualquer processo de investigação em concreto.

Compreendendo tudo isto e não fazendo confusões fáceis, de nenhum modo — mas de nenhum modo, volto

a sublinhá-lo — está em causa a autonomia institucional do Ministério Público.

O que está em causa é a possibilidade de, através de uma boa leitura crítica dos dados criminais —

nomeadamente, os que nos são fornecidos pelo RASI (Relatório Anual de Segurança Interna) —, podermos

adequar o esforço de prevenção e o esforço de investigação e termos as autoridades judiciárias do Ministério

Público em sintonia desejável com a avaliação do grau de prioridade do processamento dos processos, mesmo

em fase de julgamento — matéria em relação à qual os presidentes das comarcas têm já hoje uma competência

própria, de resto, sinalizada nesta Lei — e, ao mesmo tempo, colocando os órgãos de investigação criminal em

coerência com a concretização destes objetivos, estabelecermos uma linha completa e coerente, desde a

responsabilidade democrática à orientação do Ministério Público e aos graus de execução da prevenção e da

investigação a todos os níveis.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o tempo de que dispunha. Peço-lhe para concluir.

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente.

É assim que deve ser e quero fazer votos para que assim seja.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Uma vez que o Governo já não dispõe de tempo para responder, passamos ao ponto

dois da nossa ordem de trabalhos, com a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 90/XIII (2.ª) —

Procede à quadragésima terceira alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de

setembro, à quinta alteração ao Código da Execução das Penas e Medidas Privativas de Liberdade, aprovado

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pela Lei n.º 115/2009, de 12 de outubro, à primeira alteração à lei de vigilância eletrónica, aprovada pela Lei n.º

33/2010, de 2 de setembro, e à segunda alteração à Lei da Organização do Sistema Judiciário, aprovada pela

Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto.

Para apresentar a proposta de lei, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.

A Sr.ª Ministra da Justiça: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo comprometeu-se no

Programa que apresentou a este Parlamento a rever os conceitos de prisão por dias livres e outras penas de

curta duração, em casos de baixo risco, intensificando as soluções probatórias e também a assumir o recurso à

pena contínua de prisão na habitação com vigilância eletrónica, em casos judicialmente determinados, com

eventual possibilidade de saída para efeitos de trabalho ou atividades formativas.

É em cumprimento desse compromisso que apresentamos aqui esta proposta.

Optamos pela eliminação total das penas de prisão por dias livres e do regime de semidetenção, seguindo,

aliás, um procedimento utilizado pela Espanha desde 2003, com bons resultados.

De facto, as informações dos serviços prisionais dão-nos conta de uma elevada taxa de incumprimento da

prisão por dias livres e da falta de condições logísticas e humanas dos estabelecimentos prisionais para que

aquela pena possa alcançar os efeitos ressocializadores que dela se pretende extrair.

Por outro lado, o nível de aplicação do regime de semidetenção é, atualmente, residual. No momento há um

único caso em todo o sistema.

Este quadro permite-nos a conclusão de que a subsistência das penas de prisão por dias livres e da

semidetenção vinha produzindo poucos ou nenhuns resultados ressocializadores.

As alterações agora propostas visam estender, aprofundar e clarificar a permanência na habitação,

conferindo-lhe um papel político-criminal de relevo. Vincamos, por um lado, a sua natureza de regime não

carcerário do cumprimento da pena curta e alarga-se, por outro lado, a possibilidade da sua aplicação em casos

em que a prisão é concretamente fixada em medida não superior a dois anos.

Não obstante as alterações propostas, o procedimento em matéria de aplicação das penas mantém-se

relativamente idêntico.

Aproveitou-se o ensejo para introduzir no Código Penal algumas alterações de que ele carecia. Considerando

o tempo de que disponho, limitar-me-ei a referir duas.

A primeira é a alteração do artigo 240.º para o adequar à Decisão-Quadro 2008/913/JAI, do Conselho, relativa

à luta por via do direito penal contra certas formas e manifestações de racismo e xenofobia.

Além disso, uma outra alteração introduzida tem a ver com o regime sancionatório dos agentes da prática de

crime de incêndio florestal. Neste segmento, as alterações propostas têm em vista uma resposta sancionatória

de natureza penal que seja, simultaneamente, mais adequada à tutela dos bens jurídicos protegidos pela

incriminação e a reintegração do condenado na sociedade. Para isso, propõe-se o alargamento do âmbito da

aplicação da pena relativamente indeterminada e prevê-se a obrigação de permanência na habitação, com

fiscalização de meios eletrónicos por controlo à distância.

Com o mesmo intuito de fazer da privação da liberdade a última ratio, prevê-se, ainda, que a suspensão da

execução do internamento e a liberdade para prova possam ser subordinadas à obrigação de permanência na

habitação, com fiscalização por meios eletrónicos de controlo à distância, no período coincidente com maior

incidência de fogos.

Essa possibilidade facilitará, seguramente, o juízo de que, com a suspensão da execução do internamento,

se alcança a finalidade da medida e de que a colocação do agente em liberdade para prova permite alcançar,

em meio aberto, as finalidades de internamento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Não havendo pedidos de esclarecimento, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr.

Deputado José Manuel Pureza, do Bloco de Esquerda.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr. Secretário de Estado dos

Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Queria fazer, em nome do Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda, duas observações sobre esta iniciativa legislativa.

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A primeira diz respeito ao sistema prisional e sistema penal. O Bloco de Esquerda tem conferido a esta

matéria uma importância grande por ser uma realidade de teste a uma cultura de direitos humanos, de Estado

de direito democrático, de respeito pela dignidade das pessoas.

Temos, na verdade, um triplo problema com o sistema prisional, ao qual a sociedade portuguesa tarda em

dar uma resposta satisfatória.

Em primeiro lugar, há uma degradação muito inquietante das condições físicas do parque penitenciário. E

sabemos bem que, por iniciativa do Bloco de Esquerda, foi aprovada, no âmbito do Orçamento para 2017, a

elaboração, por parte do Governo, de um relatório com calendarização de prioridades, com a quantificação de

meios, etc.

Em segundo lugar, há uma perda inquietante de centralidade da função ressocializadora. Há uma

degradação das condições de exercício dessa função, há uma perda de qualidade das próprias carreiras de

técnicos de reinserção social, e isso é bastante preocupante.

Em terceiro lugar, e acima de tudo, diria que há um problema de composição e de natureza da população

prisional, uma população jovem, pobre, condenada por pequena delinquência, que se perpetua no sistema

prisional, sem geração de alternativas.

Não é, pois, um problema de sobrelotação, é um problema de uma cultura de encarceramento que, de alguma

maneira, tomou conta do próprio sistema judiciário e em que as medidas alternativas não têm tido capacidade

efetiva de ter o efeito ressocializador.

Portanto, saudamos que se regresse com este conjunto de medidas, e com outras que são necessárias, à

centralidade da ressocialização e para tirar do meio prisional quem não tem de estar, efetivamente, em meio

prisional para cumprir a sua pena, certo de que esta função só se cumprirá efetivamente se for acompanhada

de um conjunto de outras medidas que têm a ver com a resposta à desqualificação do parque penitenciário, a

qualificação e reforço da valência de reinserção social. Saudamos, pois, esta parte, digamos assim, do diploma.

Saudamos, também — e esta é a segunda observação —, o ajustamento que se faz do tipo legal de crime

no artigo 240.º do Código Penal, ao autonomizar o incitamento à violência e ao ódio por razões de discriminação

racial, sexual ou religiosa. É algo que nos merece registo e saudação. Converge, aliás, com um projeto de lei

que o Bloco de Esquerda trouxe a este Plenário, de criminalização de comportamentos racistas, e que se opõe

à regulação, que até agora tem sido dominante, desta matéria através de contraordenações e, portanto, de

punição através de coimas.

No debate na generalidade, o nosso projeto de lei foi vivamente criticado por apontar para a lógica da

criminalização de comportamentos racistas. Mas ainda bem que essas críticas, hoje, nesta iniciativa do Governo,

são transformadas em aproximação — ainda limitada, mas já é um caminho de aproximação. Isto porque — e

vou terminar —, como tivemos ocasião de afirmar no debate, na generalidade, do nosso projeto de lei, e cito:

«O racismo é um atentado contra a dignidade das pessoas e as práticas de discriminação racial têm que ser

objeto da máxima reprovação social e jurídica. E isso tem um nome: crime.»

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Silvano, do PSD.

O Sr. José Silvano (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr.as e Srs. Deputados: Esta iniciativa

legislativa, Sr.ª Ministra, tem motivos confessáveis — aqueles que acabou de afirmar —, nomeadamente a

ressocialização, a elevada taxa de incumprimento destas medidas no sistema prisional, a falta de condições

logísticas e humanas que existem nas nossas cadeias. Estes são os motivos confessáveis que estão claros na

proposta de lei.

Mas também tem um principal motivo, que ainda agora o Sr. Deputado do Bloco de Esquerda acabou de o

afirmar com toda a clareza, que é o combate à sobrelotação dos estabelecimentos prisionais e o atenuar o

sistema de funcionamento, que está em rutura, das nossas prisões.

A prova de que este é o motivo principal são as próprias declarações da Sr.ª Ministra feitas, há uns tempos,

na 1.ª Comissão, é a intervenção do Bloco de Esquerda sobre esta matéria e são as orientações estratégicas

inscritas na Direção-Geral de Serviços Prisionais, que refere que uma das prioridades para 2017 é rever os

conceitos de prisão por dias livres e outras penas de curta duração.

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Tudo isto, Sr.ª Ministra, para dizer que o principal motivo desta legislação é resolver os problemas do sistema

prisional, nomeadamente a falta de recursos humanos, a falta de condições materiais, a falta de dignidade dos

presos e a falta de segurança das nossas cadeias.

Este é, na nossa opinião, o principal motivo que está base desta legislação.

Por isso, Sr.ª Ministra, é melhor dizermos o motivo que leva à apresentação desta legislação, em vez de

apontarmos os motivos secundários.

Contudo, estamos de acordo com as principais medidas tomadas sobre esta matéria — isto que fique claro

— e temos de referir duas, em particular, que a Sr.ª Ministra aqui nos trouxe.

A primeira diz respeito à questão da autonomização do crime de ódio, prevista no artigo 240.º. Devo dizer

que esta não é uma iniciativa que surge por atividade do Governo, é a transposição de uma diretiva do Conselho

Europeu que estava aprovada e que é transcrita para o referido artigo, autonomizando este crime no Código

Penal, e bem, porque, a partir daqui, este crime tem a sua autonomia e as penas são muito mais agravadas.

E, Sr.ª Ministra, estamos de acordo essencialmente com o aditamento do artigo 274.º-A, sobre os crimes de

incêndio florestal. Entendemos que o que foi feito é útil e, nesta época, que atravessamos, de incêndios, pode

vir a ser útil deter por tempo indeterminado aqueles arguidos que já incendiaram e apanharam pena de prisão.

Nas alturas em que ocorrem mais fogos,…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o seu tempo. Peço para concluir.

O Sr. José Silvano (PSD): — … poder tê-los na prisão, ou num estabelecimento, se forem inimputáveis, é

útil para que não possam ser, depois, mais um fator de ignição dos fogos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, do CDS-PP.

A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr. Secretário de Estado

dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: Estas alterações ao Código Penal — que não são muitas,

mas são de relevo — que nos traz hoje a Sr.ª Ministra resultam, algumas delas, designadamente a eliminação

das penas de prisão por dias livres e o regime de semidetenção por troca por penas de permanência na

habitação com meio de controlo à distância, vulgo com pulseiras eletrónicas, do programa eleitoral do PS. Há já

quase dois anos que falávamos nisto e agora, finalmente, aparece.

Porém, aparece sem estudos, sem experiências comparadas prévias e sem pareceres, o que nos deixa a ter

uma discussão um bocadinho coxa, porque esta não é uma matéria de somenos e precisávamos de alguma

fundamentação para podermos decidir com rigor o que está em causa.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — O que é preciso explicar, Sr.ª Ministra — e essa é uma pergunta

que lhe deixo, desde já —, é se os fins das penas, os fins da prevenção geral e da prevenção especial, para

além da questão da ressocialização, a que me referirei de seguida, ficam cabalmente cumpridos. Ou seja,

pergunto se se cumprem melhor os fins da prevenção geral e especial com esta alteração.

Sr.ª Ministra, nesta Câmara todos percebem, mas é preciso explicar também lá fora — e esta é a segunda

pergunta que faço — se a detenção com pulseira eletrónica na habitação é melhor para a consciencialização do

arguido para o crime que cometeu, portanto, se isto cumpre melhor essa função, e se, por outro lado, a

comunidade em geral fica mais descansada com esta medida, ou seja, se, ao invés da prisão, as pessoas forem

para casa com pulseiras eletrónicas, isso dá uma maior segurança à comunidade em geral.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

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A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr.ª Ministra, é isto que gostávamos de saber mas que não sabemos

e não temos pareceres para perceber da bondade da solução. Não estamos a dizer que é algo mau, mas

estamos a questionar sobre a bondade da solução porque não temos nenhuma outra forma de perceber.

De resto, quanto à função ressocializadora, se, em teoria, a entendemos perfeitamente, temos uma dúvida,

que se prende com a sua efetividade. Todos sabemos que os agentes de ressocialização são escassos.

Sabemos também que a Sr.ª Ministra abriu um concurso e que já há mais agentes neste momento. Mas esses

agentes de ressocialização que existem neste momento servem para atender às necessidades atuais. Foi isso

que sempre nos disse e sempre foi posto em causa o não haver agentes suficientes, neste momento, para

atender às necessidades atuais. Aumentando-se o recurso à pulseira eletrónica, parece-nos que soçobram

problemas, ou seja, faltam, na mesma, agentes ressocializadores.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — O que pergunto muito diretamente, Sr.ª Ministra, é se está previsto

contratar mais agentes ressocializadores e se isso tem respaldo no próximo Orçamento do Estado, por exemplo,

ou em outro contexto.

Em relação às outras alterações, concordamos, mas ficamos com pena que tenha excluído do crime de

incitamento ao ódio e à violência aquilo que o CDS já propôs nesta Câmara e que está para discussão na

especialidade…

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, já ultrapassou o seu tempo. Peço-lhe para concluir.

A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Vou concluir, Sr. Presidente.

Queria perguntar à Sr.ª Ministra por que razão não incluiu algo que já foi aprovada nesta Câmara e que tem

a ver com a inclusão das pessoas com deficiência nos crimes de incitamento ao ódio e à violência.

É uma pena que não o tenha feito, mas espero que, na especialidade, possamos acordar em incluir esta

matéria.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira, do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Justiça: Esta proposta

de lei trata, de facto, de algumas das questões mais melindrosas, digamos assim, do ponto de vista do direito

penal e do sistema prisional, porque, no fundo, elas mexem com as opções que devem ter como fundamento o

objetivo de ressocialização, que tem de ser o objetivo primeiro, central, de qualquer sistema penal.

Portanto, Sr.ª Ministra, quando estamos a discutir a natureza das penas privativas ou não privativas da

liberdade, a forma como, do ponto de vista legal e das opções do aplicador da lei ao caso concreto, essas opções

se adequam aos objetivos de prevenção geral e especial, quando estamos a discutir as condições de

ressocialização que os reclusos encontram no sistema prisional, em função da natureza da pena que lhes é

aplicada, estamos a discutir questões centrais do sistema penal e do sistema prisional e que são aspetos

fundamentais para podermos alcançar, com sucesso, os objetivos de ressocialização dos arguidos que são

condenados pela prática de crimes.

Estas são matérias complexas, mas queria, ainda assim, Sr.ª Ministra, referir quatro ou cinco aspetos que

nos parecem essenciais, esperando que, desta vez, a nossa intervenção possa ser compreendida pelo CDS, já

que, há bocado, não conseguiram compreender exatamente aquilo que dissemos.

Sr.ª Ministra, queria começar por dizer o seguinte: a determinação da natureza das penas e as condições de

funcionamento do sistema prisional são matérias distintas. Não nos parece que as questões que têm a ver com

a sobrelotação dos estabelecimentos prisionais ou com as suas condições de funcionamento, que não

asseguram condições de ressocialização aos reclusos, ou outros problemas que vão surgindo do ponto de vista

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do funcionamento do sistema prisional devam ter como consequência alterações do ponto de vista da natureza

das penas que são consideradas nesta ou naquela circunstância.

De resto, temos uma iniciativa apresentada relativamente a um plano de investimentos no sistema prisional

que permita adequar as condições de funcionamento do sistema a esses objetivos maiores da ressocialização

dos reclusos para que essa matéria seja tratada devidamente no espaço em que deve ser tratada. Julgamos

que esses são critérios que devem ser reservados para aí e não em relação ao resto.

Relativamente às alterações que a proposta de lei aponta, ou seja, para a natureza das penas privativas e

não privativas da liberdade e as condições em que podem ser aplicadas, da parte do PCP, acompanhamos, no

essencial, essas propostas que o Governo adianta. Felizmente, o Governo considera hoje a reversão de algumas

opções que foram feitas no passado com prejuízo para o nosso funcionamento penal, nomeadamente uma

opção feita em 2007 relativamente ao período de suspensão de execução da pena de prisão entre um e cinco

anos. Todas as evidências apontavam para a necessidade de a rever e de a adequar em função da experiência,

o que veio, de facto, a confirmar as preocupações que, na altura, foram suscitadas. Portanto, saudamos o

Governo por isso.

Também saudamos o Governo pela opção de manter, com caráter absolutamente subsidiário, a aplicação

das penas privativas da liberdade e, mesmo assim, dentro dessas, apontar preferencialmente para as que não

implicam a reclusão do condenado num estabelecimento prisional, optando por outras soluções, do ponto de

vista não só da reinserção social mas também da reinserção do recluso, que se têm manifestado, de facto, mais

adequadas.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe para concluir.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente.

Julgamos que, ainda assim, é preciso ter em consideração algumas preocupações que aqui foram

manifestadas — preocupações que acompanhamos sem alarmismos —, nomeadamente, relativas às

considerações de prevenção geral que, em muitas circunstâncias, algumas destas opções podem suscitar e

que, julgamos, devem ser ponderadas com todo o rigor.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Também acompanhamos a perspetiva de que, em relação ao combate ao

racismo e à xenofobia, se há necessidade de alteração no tipo de ilícito no artigo 240.º do Código Penal, então

que se trabalhe nesse sentido, não numa lógica que seja securitária e punitiva, como tantas vezes acaba por

acontecer, mas numa lógica de adequação do tipo de ilícito penal para que, nos tribunais, a justiça possa ser

feita com essa segurança de que a lei prevê, sem margem para dúvidas, a cobertura desse tipo de

comportamentos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão, do PS.

O Sr. Jorge Lacão (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Justiça, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos

Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: É dever dos responsáveis políticos, seja do lado do Governo e do

Ministério da Justiça, em particular, seja do lado do Parlamento, poder avaliar o grau de satisfação daqueles

objetivos que, num determinado momento, foram considerados como adequados à prossecução de determinada

finalidade.

Ora, essa avaliação, ainda que num domínio parcial, demonstra-nos, à evidência, por todos os relatórios

conhecidos, que o regime da prisão por dias livres e o da chamada «semidetenção» não alcançaram

satisfatoriamente os objetivos propostos nem do ponto de vista da prevenção geral — garantir condições de

segurança à comunidade —, nem do ponto de vista da prevenção especial, através das medidas de suporte à

ressocialização deste tipo de pessoas envolvidas em cumprimento de penas.

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Temos agora, também por força da evolução das capacidades eletrónicas dos sistemas, a possibilidade de

conciliar a existência de um regime restritivo da liberdade e, portanto, uma pena que não deixa de continuar a

ser gravosa porque implica limitação da liberdade e da mobilidade de alguém, com a possibilidade de garantir a

eficácia do cumprimento, através dos sistemas de controlo eletrónico, cujo grau de fiabilidade já está

amplamente demonstrada, e de poder, ao mesmo tempo, de forma inovadora — e isso traduz-se na proposta

de lei, do Governo —, procurar alcançar a complementaridade com meios aplicados de ressocialização,

particularmente dirigidos às camadas mais jovens, a delinquentes com idade abaixo dos 21 anos ou àqueles

que possam, pela natureza da situação avaliada em concreto pelo tribunal, conciliar uma solução restritiva de

liberdade mas com possibilidades de inserção social, ao nível de trabalho efetivo, de formação ou da

possibilidade da continuação dos estudos.

Ora, ter soluções integradas que permitam estas várias respostas em conjugação é seguramente muito

melhor do que, por exemplo, levar delinquentes primários para ambientes carcerários, em relação aos quais, de

forma muito duvidosa, se pode fazer e concretizar os objetivos de ressocialização que, pelo menos em termos

teóricos, todos nós dizemos querer prosseguir.

Creio, por isso, que estamos aqui num momento de excelente concretização de uma medida apresentada

pelo Programa do Governo, que, estou convencido, independentemente de algumas dúvidas pontuais, tem todas

as potencialidades para merecer o mais amplo consenso político desta Câmara.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, a quem

foram cedidos tempos de intervenção por Os Verdes.

A Sr.ª Ministra da Justiça: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O convencimento do Governo é de

que, efetivamente, as medidas que foram aqui propostas têm a ver não tanto com as questões de sobrelotação,

que foram aqui referidas, mas com o problema da população prisional, ou seja, o que é que se encarcera e

quando é que se encarcera e, além disso, os efeitos criminógenos que podem decorrer da manutenção ou da

inclusão em meio prisional de agentes primários e que são apanhados nas malhas da justiça por prática de

crimes de menor densidade criminal. Esta é, de facto, a questão.

É óbvio que, optando nós por esta via, precisamos de fazer um grande investimento no que diz respeito aos

programas de ressocialização em meio aberto e em meio fechado.

No que diz respeito a estes programas queria também dizer, porque também foi colocada a questão, que, de

facto, no ano passado, não só adquirimos instrumentos de controlo eletrónico à distância, como também

admitimos pessoas para reinserção social e este ano temos outro concurso, porque temos esta previsão. Em

qualquer caso, gostaria de explicitar que, na altura em que se esteve a trabalhar neste projeto, foram

concomitantemente feitos estudos para avaliar o impacto desta medida — estão em causa aproximadamente

500 reclusos — em termos de necessidades quer de controlo eletrónico, quer de agentes. Isso está tudo

perfeitamente previsto e controlado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Vamos passar ao terceiro ponto da nossa agenda de hoje, que é a apreciação do

Relatório Anual do Provedor de Justiça 2016.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Abreu Amorim, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Provedor de Justiça é um

órgão da Administração independente, com uma histórica profícua e valiosa de 42 anos na nossa democracia.

Ao longo deste tempo institucionalizou-se como um baluarte respeitado e omnipresente na defesa dos

direitos dos cidadãos e, particularmente, na tutela dos direitos fundamentais.

Embora destituído de poder vinculativo específico, o Provedor de Justiça tem alcançado os seus objetivos

através daquilo que o atual Provedor já classificou, a meu ver de uma forma bastante feliz, como «a persuasão

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da palavra», também acompanhada da respeitabilidade que praticamente todos os seus protagonistas têm

granjeado nos últimos 42 anos.

É também neste sentido e com este propósito que o Provedor de Justiça divulga regularmente a atividade

que desenvolve através do Relatório Anual. Este Relatório é o espelho da ação do Provedor e a comprovação

da atual imprescindibilidade deste órgão da Administração independente.

O presente Relatório tem algumas inovações em relação aos relatórios anteriores. Em primeiro lugar, é um

relatório composto por 213 páginas, mas, com os seus dois anexos, tem um total de 633 páginas. Por

comparação direta com o Relatório de 2015 verifica-se que foi introduzido um novo capítulo referente ao núcleo

da criança, do idoso e da pessoa com deficiência, uma inovação que o Grupo Parlamentar do PSD saúda.

Os indicadores salientados neste Relatório são variadíssimos. Vou escusar-me de dizer todos, são todos

importantes, mas saliento que há uma lógica de diminuição de procedimentos, de queixas, por via eletrónica,

escritas, verbais e presenciais, inclusivamente das exposições e do número de arquivamentos, bem como do

número de pendências.

Em relação às matérias sobre as quais mais têm incidido mais as exposições e as queixas dos cidadãos,

verifica-se que, nos procedimentos, as matérias da segurança social estão em primeiro lugar, com 21,3%; a

fiscalidade com 18,9%; a relação de emprego público com 10%, e a administração da justiça apenas com 7,5%.

Para além desta lógica de diminuição das queixas e das exposições dos cidadãos, o Sr. Provedor de Justiça,

no âmbito dos poderes que lhe estão legalmente conferidos, formulou três pedidos ao Tribunal Constitucional.

Na audição realizada na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, no dia 14

de junho, o Sr. Provedor de Justiça, além de ter apresentado o seu Relatório e as preocupações fundamentais

que nele estão ínsitas, salientou duas queixas concretas.

A primeira em relação às instalações da Provedoria. Diz o Sr. Provedor que estas instalações não estão, de

modo algum, adequadas à receção e acolhimento dos cidadãos com deficiência.

Em segundo lugar, o Sr. Provedor renovou uma queixa que não é nova, em relação ao Mecanismo Nacional

de Prevenção da Tortura, que foi cometido à Provedoria em 2013, mas que não foi acompanhado de um

aumento de verbas nem do incremento do apoio logístico.

O Grupo Parlamentar do PSD entende que, durante os anos da austeridade em que o País procurava sair

da situação de aflição financeira e orçamental em que outros o deixaram, estas restrições, eventualmente,

seriam compreensíveis. Neste momento, em que se ensaiou, já desde 2014, uma saída dessa situação um

pouco dramática que todos vivemos; no momento em que é anunciado o fim da austeridade e de todas as

medidas restritivas, particularmente aquelas que dizem respeito aos direitos dos cidadãos, é absolutamente

incompreensível que esta importantíssima função do Mecanismo Nacional de Prevenção da Tortura não tenha

o respetivo envelope financeiro a acompanhar a dignidade desta tarefa.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o tempo de que dispunha, peço-lhe que conclua, por favor.

O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.

O Sr. Provedor anunciou também que a arquitetura da Provedoria foi desmaterializada por completo, o que

é também de salientar e de louvar.

Sr. Presidente, se me permite, queria dizer ainda que o Provedor de Justiça ganhou raízes na arquitetura

administrativa e político-constitucional da nossa democracia, legitimou-se pela sua ação de defesa do cidadão

e constitui um verdadeiro termómetro do estado das relações entre os cidadãos e o Estado, e isso deriva também

da desobrigação natural do Provedor em relação ao poder político. Além da sua legitimidade formal, o Provedor

ganhou legitimidade material e saudamos a apresentação deste Relatório.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Susana Amador, do Grupo

Parlamentar do PS.

A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em 2017, o órgão Provedor de Justiça

comemora 42 anos ao serviço da democracia, do Estado de direito e dos direitos fundamentais.

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Com uma estrutura técnica de qualidade, preparada para acolher queixas dos cidadãos contra as

ilegalidades, os abusos ou as arbitrariedades dos poderes públicos, garantido, assim, os direitos e liberdades

fundamentais e de defesa dos direitos humanos, o Provedor é um servidor ainda da justiça e do direito,

reforçando, através da sua atividade, a cultura democrática e a dignidade da pessoa humana.

Tal como refere Catarina Sampaio Ventura: «O Provedor de Justiça é um guardião dos direitos das pessoas,

seja na sua veste de contribuintes, de beneficiários da segurança social, de consumidores, de agentes

económicos, de trabalhadores, de reformados ou aposentados, de estudantes, entre outras».

O Relatório hoje em apreciação espelha, com inegável qualidade e densidade, essa relevante atividade

desenvolvida em 2016 e evidencia todas essas «vestes» dos cidadãos acima enunciadas, que recorrem a este

organismo num inequívoco sinal de confiança no acolhimento e tratamento das suas queixas e consequente

garantia dos seus direitos. As 38 183 solicitações recebidas em 2016 denotam essa mesma confiança,

credibilidade e prestígio consolidado desta instituição, que saudamos vivamente.

Registe-se, ainda, que foram recebidas 4026 chamadas telefónicas através das Linha da Criança, do Cidadão

Idoso e da Pessoa com Deficiência, bem como foram prestados mais de 5800 atendimentos pela Divisão de

Informação e Relações Públicas desta instituição.

O ano de 2016 foi também o ano do novo sistema informático de gestão procedimental, do funcionamento

pleno do projeto integrado de atendimento ao cidadão e foi um ano de viragem, uma vez que a tendência de

crescimento de pendências se inverteu, descendo 7%. É também muito positiva toda a agilidade e eficiência

pelo facto de muitos dos processos terem sido resolvidos no primeiro mês, 22%, e de 45,4% deles terem

alcançado a reparação da ilegalidade, conduzindo ao arquivamento da queixa.

Os assuntos mais versados são os da segurança social, fiscalidade, emprego público e justiça. As temáticas

com maior crescimento absoluto são as da habitação e urbanismo, educação e assuntos penitenciários. No

domínio da habitação, gostaria de destacar que merece realce a visita dos relatores especiais da ONU sobre

direito à habitação condigna, que nos interpelam a investir mais neste eixo que, como sabemos, foi um dos

direitos sociais que mais impacto negativo sofreu com as políticas recessivas da direita e que o Governo atual

tem vindo a inverter, devendo destacar-se o trabalho do grupo de trabalho relativo à habitação, que, no

Parlamento, desenvolve uma atividade notória.

No que diz respeito aos direitos dos trabalhadores regista-se uma descida de 14,5% de procedimentos, mas

gostaria de destacar que são ainda muito elevadas as queixas relativas às recusas de jornada contínua e de

horário flexível, o que dificulta a conciliação tão necessária entre a vida profissional e a vida familiar e pessoal,

que tanto penaliza as mulheres, em particular.

Acresce que a conciliação, para além de ser um direito constitucional, é uma prioridade em matéria de

igualdade de género, quer na União Europeia, quer em Portugal, e que a Subcomissão de Igualdade acompanha

com particular zelo.

Merece ainda destaque neste Relatório a melhoria do dever de cooperação com a segurança social, bem

como a melhoria na uniformização de procedimentos quanto à inscrição de cidadãos na segurança social.

Evolução positiva tiveram igualmente os assuntos atinentes à nacionalidade e direitos dos estrangeiros.

O Provedor formulou ainda 12 recomendações.

Sr. Presidente, não poderíamos deixar de sublinhar e valorizar a atividade do Provedor de Justiça enquanto

instituição nacional de direitos humanos, onde o destaque vai para o projeto O Provedor de Justiça, as prisões

e o século XXI: diário de algumas visitas, que levou o Provedor de Justiça a visitar 10 estabelecimentos

prisionais, merecendo reflexão nesta Casa a questão das visitas dos filhos dos reclusos, a sua humanização, a

alimentação, entre outras questões.

Por via do Mecanismo Nacional de Prevenção, foram visitados 53 locais onde se encontram pessoas privadas

ou limitadas na sua liberdade e emitidas recomendações subsequentes.

Por último, gostaríamos de destacar a função de ligação entre o plano nacional e o internacional quanto à

defesa dos direitos humanos e saudar a presidência portuguesa da Federação Ibero-Americana, de

Ombudsman que foi atribuída ao Provedor de Justiça em março de 2016, sendo que o primeiro relatório

português incidiu sobre a pobreza, que constitui, aliás, um tema essencial da Agenda 2030, um tema muito

relevante, quando a pobreza e a fome continuam a matar diariamente milhares de seres humanos.

Mais uma vez, na sua mensagem inicial, o Provedor não deixou de destacar o tema dos refugiados, a cultura

dos direitos humanos e os riscos e atropelos que sofrem à escala global, sublinhando, e bem, o Provedor que

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Portugal se afirma como um exemplo para o mundo no acolhimento e integração de pessoas migrantes, sendo

um dos países da União com mais refugiados recolocados, um dos mais destacados.

Por último, diz o Provedor, em Razões de uma razão(II), o seguinte: «O Provedor não legisla, não governa,

não julga, mas faz coisa diferente, e é sua missão ir mais além e mais fundo». Desejamos, assim, que a

Provedoria de Justiça continue a ir mais fundo, fazendo jus à sua natureza informal, direta e próxima,

reencontrando-se diariamente com os cidadãos que a buscam em prol da defesa dos seus direitos fundamentais,

os quais também afirmamos, de forma indeclinável, aqui, neste Parlamento e neste grupo parlamentar!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Pureza, do Grupo

Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Dos direitos consagrados na lei

à sua efetivação prática vai muitas vezes uma distância que é demasiadamente grande — é a distância que a

assimetria do poder permite e alimenta.

Por isso mesmo, a efetividade dos direitos continua a ser um desafio de primeira grandeza para o Estado de

Direito democrático que queremos ser. Isso passa prioritariamente por duas linhas de atuação: a primeira é a

defesa coerente da universalidade efetiva no acesso ao sistema de justiça, contrariando, assim, a colonização

do sistema de justiça por um pequeno conjunto de grandes utilizadores; e a segunda é precisamente a que

passa por dotar o Provedor de Justiça dos meios humanos, dos meios materiais e também dos meios financeiros

para um desempenho à altura das suas responsabilidades, não só como ouvidor mas também como Mecanismo

Nacional de Prevenção contra a Tortura e Instituição Nacional em matéria de direitos humanos.

O Relatório relativo a 2016, como já os relatórios anteriores, mostram-nos com rigor cirúrgico, diria eu, os

domínios em que os direitos dos mais fracos ficam, as mais das vezes, reféns na sua efetividade do poder dos

mais fortes. É o caso da segurança social, da fiscalidade, da relação de emprego público e da administração da

justiça, acima de todos os outros domínios.

Mas gostaria, em nome do Bloco de Esquerda, de destacar dois aspetos deste Relatório e da atividade do

Provedor que são, a nosso ver, da maior importância. Em primeiro lugar, a sua atividade no âmbito da visibilidade

dada à questão dos direitos humanos no sistema prisional. A visita a 10 estabelecimentos prisionais, em 2016,

a abertura de dois procedimentos por iniciativa do Provedor de Justiça — um, em matéria de alimentação e,

outro, em matéria de direitos de visita —, as 53 visitas feitas a locais de detenção ou de privação da liberdade,

no âmbito da sua função como Mecanismo Nacional de Prevenção associado ao Protocolo Adicional à

Convenção das Nações Unidas contra a Tortura, são uma marca importante deste Relatório.

O segundo domínio é o dos direitos dos cidadãos imigrantes. Naturalmente que a defesa dos direitos

legalmente estabelecidos em matéria de segurança social destas pessoas é da maior importância. Na audição

que tivemos com o Sr. Provedor de Justiça, este foi também alertado para a necessidade de que sejam

garantidos os direitos contra a dilação extrema de prazos para a atribuição de uma autorização de residência a

estas pessoas.

Certamente que os indicadores estatísticos são da maior importância para a avaliação deste Relatório, mas,

por nós, dando importância a esses indicadores, damos ainda mais importância às palavras firmes na defesa

dos direitos dos mais fracos. Por exemplo, na recomendação do Provedor de Justiça contra as demolições nos

Bairros de Santa Filomena e 6 de Maio, na Amadora; ou no pedido de fiscalização sucessiva da

constitucionalidade de legislação que violava os direitos dos trabalhadores à justa reparação quando essas

pessoas estão em condições de vítimas de acidentes de trabalho ou de doença profissional.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o próprio Provedor de Justiça escreveu neste Relatório o seguinte:

«(…) cabe ao Provedor de Justiça afirmar, com a força que decorre da sua eleição parlamentar e do específico

mandato que lhe está confiado, que a natureza universal e indivisível dos direitos humanos não pode, em

momento algum, ser colocada em causa e que a coragem de atuar em defesa destes valores é a única forma

de lutar contra os populismos que os colocam em crise». São palavras muito acertadas, às quais nos

associamos. É com uma profunda cumplicidade com a razão destas palavras que cumprimentamos o Provedor

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de Justiça e que nos associamos ao sentido cultural e ao sentido político da ação que o seu Relatório de 2016

nos retrata.

Aplausos do BE.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente José de Matos Correia.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva.

.

A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Já foram apresentados

nesta Câmara vários argumentos em relação ao Relatório do Provedor de Justiça. O Provedor de Justiça é, de

resto, um símbolo constitucional importantíssimo, constitui mais um dos fiéis da balança da nossa democracia,

uma democracia já robusta, garante o exercício dos direitos, liberdades e garantias e tem sido sempre —

qualquer um dos Provedores de Justiça que temos tido o prazer de conhecer — um ator fundamental no

escrutínio do acesso a direitos fundamentais dos cidadãos e também no escrutínio do funcionamento dos

serviços públicos.

Este Relatório, como já aconteceu no ano passado, dá-nos alguns sinais positivos e que nos tranquilizam. E,

como dizia há pouco o Sr. Deputado José Manuel Pureza, a estatística aqui é importante. É importante

percebermos, através desta atividade, o que realmente vai bem, mas também o que vai mal.

Quero ainda registar aqui positivamente, por mais um ano, a diminuição do número de queixas e o aumento

da percentagem dos casos em que se conclui pela reparação da ilegalidade ou da injustiça. É sinal de que o

Provedor de Justiça tem tido um papel ativo, interventivo e tem funcionado como um garante do acesso a direitos

fundamentais.

No entanto, há que assinalar aqui uma preocupação que é recorrente e que, por isso mesmo, é ainda mais

inquietante. No ano passado, já a assinalámos e, este ano, não é novidade: desde há dois anos que o maior

número de queixas diz respeito ao regime da segurança social, ao regime da fiscalidade e à relação de emprego

público. E isto já vem, como referi, do ano passado e do ano anterior. Portanto, cabe ao Governo ter um papel

mais interventivo nesta matéria e melhorar o acesso a estes direitos. É que, na verdade, estas têm sido matérias

permanentemente em causa e com o maior número de queixas ao Sr. Provedor. Por isso, era importante que o

Governo tivesse um papel ativo nesta matéria, para que, no próximo ano, quando aqui estivermos a discutir

novamente o relatório de atividades do Sr. Provedor, possamos registar uma diminuição relativa do número de

queixas nestes domínios.

De resto, quero também salientar que aumentou, em relação ao ano passado, o número de queixas

relativamente ao urbanismo e habitação, à educação e ao sistema penitenciário. E aqui gostava de me

concentrar, sobretudo, no sistema penitenciário. Todos conhecemos as queixas, que também têm sido

recorrentes, em relação ao funcionamento do nosso sistema penitenciário. Ora, o Sr. Provedor faz ressaltar o

agravamento das condições do sistema penitenciário português no que toca à sobrelotação, à alimentação, ao

alojamento, à violência, aos cuidados de saúde, aos contactos e às visitas dos filhos dos reclusos. Na verdade,

do que aqui lemos, nada parece funcionar nos estabelecimentos prisionais. Para além da sobrelotação, tudo o

resto — condições de alojamento, alimentação, violência, cuidados de saúde, contactos e visitas dos filhos dos

reclusos — tem sido posto em causa. Portanto, nada funciona no nosso sistema penitenciário.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Não é de agora!

A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — É verdade, não é de agora!

Mas o problema tem-se agravado e essa tendência é que tem de ser travada.

E a verdade é que o Governo está em funções há dois anos e ainda não se mexeu nesta questão — aliás,

lembro que, no Orçamento do Estado para 2016, este Governo até diminuiu o valor atribuído às refeições para

os reclusos, o que é um dos sinais de que este sistema penitenciário, que já estava mal, piorou com este

Governo. É aqui que quero pôr a tónica e é aqui que quero deixar registado que é preciso intervir, ativa e

rapidamente, para melhorar o sistema prisional.

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E a sobrelotação não se combate retirando as pessoas das prisões quando elas têm, de facto, de ir para a

prisão. Portanto, o que tem de se melhorar é o sistema penitenciário em si e resolver o problema a montante e

não a jusante.

Assim, quero ressaltar da ação do Sr. Provedor esta sua atividade, no âmbito do Mecanismo Nacional de

Prevenção contra a Tortura, e felicitá-lo pelo acompanhamento que tem dado a esta questão, que é muito

importante e precisa de ser atendida com urgência.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge

Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do

Partido Comunista Português, queria começar por destacar a importância do Provedor de Justiça, o papel

relevante que tem, não só no plano constitucional, com as atribuições que tem, mas fundamentalmente no seu

papel de ligação aos problemas concretos dos portugueses.

Julgo que este Relatório espelha bastante essa mesma realidade, no sentido de que se percebe que o

Provedor de Justiça tem uma relação de intermediação entre os problemas que os portugueses vivem com a

administração central ou autárquica e as empresas para a solução concreta desses mesmos problemas, e o

apelo que normalmente se faz ao Provedor para a resolução desses problemas concretos.

Queria registar, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, que o Relatório é claro

quando afirma que houve 30 000 solicitações, das quais 6875 resultaram em queixas concretas. Há uma redução

efetiva e generalizada dos diferentes indicadores do número de queixas apresentadas e da tramitação, o que

tem de ser registado.

Queríamos também aqui sinalizar, como já foi referido, que grande parte das queixas se assumem na área

da segurança social, com 21%, na fiscalidade, com 18,9%, na relação de emprego público e na administração

da justiça, imediatamente a seguir.

Queria ainda registar que não é por acaso que temos gigantescos problemas e um grande número de queixas

relativamente à segurança social, porque tivemos sucessivos anos de desinvestimento e degradação da

capacidade de resposta da segurança social, uma política de gestão de quadros e de recursos humanos

verdadeiramente desastrosa, tivemos um Governo PSD/CDS-PP que promoveu um gigantesco despedimento

de recursos humanos, de pessoas na segurança social, e tudo isto teve impactos.

É verdade que a segurança social é um problema grave de acessibilidade das pessoas à Administração, isto

é, não há resposta por parte da segurança social a muitas solicitações que lhe são feitas, o que leva naturalmente

a queixas por parte do Provedor. É um problema que urge resolver e que queríamos aqui sinalizar.

Queríamos destacar do Relatório o facto de o Sr. Provedor ter feito um conjunto de visitas aos

estabelecimentos prisionais. De facto, foram visitados 10 estabelecimentos prisionais e 53 locais de detenção,

o que, para nós, também é muito importante, tendo em conta a natureza dos estabelecimentos e a necessidade

imperiosa de acompanhar estas realidades. Também aqui se verificam problemas estruturais muito significativos

que importa recuperar mas que resultam essencialmente daquilo que foram opções estratégicas de sucessivos

governos, e não só do anterior.

Acho que o Relatório é bastante exaustivo e elucidativo relativamente às prioridades, pelo que queríamos

terminar alertando apenas para um facto que nos foi transmitido pelo Sr. Provedor na audição na 1.ª Comissão,

e tendo em conta, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que até vamos discutir, a seguir, uma petição que fala das

questões da inclusão. O facto é que as instalações da Provedoria não são acessíveis para as pessoas com

deficiência, o que, se não fosse tão dramático, seria irónico. É que o Sr. Provedor recebe inúmeras queixas de

pessoas com deficiência relativamente a problemas de acessibilidade a serviços públicos, e ele próprio não é

acessível às pessoas com deficiência.

Julgo que o apelo que o grupo parlamentar lançava era no sentido da resolução, o mais rápido quanto

possível, deste problema para que, efetivamente, as instalações do Sr. Provedor tivessem essa mesma

possibilidade de acessibilidade por parte de todos, e esta é uma questão da mais elementar justiça.

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Srs. Deputados, como a Mesa não regista mais pedidos de

palavra para uma intervenção, dá por concluída a apreciação do Relatório Anual do Provedor de Justiça 2016.

Passamos, pois, ao quarto ponto da ordem de trabalhos, que é a apreciação da petição n.º 90/XIII (1.ª) —

Solicitam a criação do «Dia Nacional da Inclusão», no dia 17 de junho (Ana Cristina Pinto Rebelo dos Santos

Abrantes Pires e outros).

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha.

A Sr.ª Maria da Luz Rosinha (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de deixar uma

saudação especial aos subscritores da petição n.º 90/XIII (1.ª), cuja primeira assinatura pertence à Sr.ª Ana

Cristina Pinto Rebelo dos Santos Abrantes Pires, seguida de outros 4500 peticionários, que solicita a criação do

«Dia Nacional da Inclusão». Esta petição foi apreciada na Comissão de Trabalho e Segurança Social e,

encontrando-se em conformidade com todos os requisitos exigidos, foi remetida ao Sr. Presidente da

Assembleia da República para agendamento e discussão em Plenário, o que acontece hoje.

A solicitação expressa baseia-se no princípio de que a inclusão social é um direito e um dever de todos nós,

um direito e um dever para o qual o Partido Socialista está muito sensibilizado e desperto — tanto assim é que

não só criou uma Secretaria de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência como tem tomado diversas

medidas específicas ou transversais na área da inclusão.

Esta petição, que chegou à Assembleia da República em 2016, tem à partida uma grande virtude, a de ser

um alerta da sociedade civil, preocupada com os fenómenos de exclusão existentes, porque, na realidade,

quando falamos de assinalar a inclusão através de um dia que lhe seja dedicado, o que estamos efetivamente

a fazer é a alertar e a sensibilizar para o combate à exclusão, que é necessário fazer.

Se podemos dizer que já há muitos dias atribuídos e que, inclusivamente, temos o dia 3 de dezembro, que

assinala o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, a verdade é que consciencializar para a inclusão é

algo diferente, porque é muito mais ambicioso, já que abrange um muito maior número de problemas. E permito-

me destacar três áreas que demonstram bem que assinalar a exclusão e trabalhar para a inclusão merecem

bem o esforço da sociedade civil e o envolvimento do Governo: falo-vos da área dos refugiados, drama que tem

afetado milhares e milhares de pessoas; falo-vos da exclusão por motivos de dificuldades na área da

aprendizagem sem que tenha sido diagnosticada qualquer limitação; falo-vos ainda de outro exemplo que, à

medida que as tecnologias avançarem, irá gerar mais situações de exclusão, que é a exclusão digital, um

fenómeno dos nossos dias. Dei três exemplos, mas poderia ter dado muitos mais.

Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Peticionantes, usei o termo «exclusão» para percebermos quanto a

inclusão é importante na nossa prática de vida e, nesse sentido, queria deixar registado que o Partido Socialista

considera a iniciativa meritória e merecedora de todo o nosso apoio.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Anacoreta Correia para

uma intervenção.

O Sr. Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar,

quero saudar os 4501 subscritores da petição que solicitam a criação do «Dia Nacional da Inclusão» na pessoa

da primeira subscritora, Ana Cristina Pinto Rebelo dos Santos Abrantes Pires, que se encontra aqui presente

juntamente com outros, de entre os quais destaco o Dr. António Bagão Félix, que aproveito para cumprimentar.

Se há temática que nos deve unir a todos — e este tem sido também o nosso empenho —, para além de

todas as divergências ideológicas, é precisamente a da inclusão. A inclusão, quer seja das pessoas com

deficiência quer seja das pessoas com escassos recursos sociais ou outros, tem obrigatoriamente de ser um

dos eixos prioritários de qualquer política social, pois os cidadãos a quem se dirigem estas políticas encontram-

se numa situação de especial vulnerabilidade.

Por esse motivo, não compreendemos a ausência reiterada de resposta do Governo aos ofícios a ele dirigidos

pelo Parlamento sobre esta petição. Não é aceitável, em nosso entender, que, das cinco entidades convidadas

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a pronunciarem-se sobre o teor desta iniciativa, o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social

tenha sido o único a não responder, apesar de ter sido convidado a fazê-lo por, pelo menos, duas vezes. Das

restantes entidades — Conselho Económico e Social, Confederação Nacional dos Organismos de Deficientes,

Associação Portuguesa de Deficientes, Federação Portuguesa de Centros de Formação Profissional e Emprego

de Pessoas com Deficiência —, à exceção da Associação Portuguesa de Deficientes, todas se mostraram

concordantes com a pretensão da petição, o que demonstra claramente a aceitação de grande parte do setor.

O CDS sempre olhou, e continua a olhar, para as políticas dirigidas a estes cidadãos como uma prioridade,

quer no governo quer na oposição. Foi por isso mesmo que já nesta Sessão Legislativa agendámos um debate

sobre políticas de deficiência, no qual apresentámos cerca de 20 iniciativas, tendo a esmagadora maioria sido

aprovada. Louvamos a capacidade de nesta Câmara ter sido possível um entendimento para além do estrito

ciclo partidário. Treze dessas medidas foram mesmo publicadas há dois dias em Diário da República, das quais

destaco: a criação de um grupo de trabalho com o objetivo de estudar formas de exercício do direito de voto por

cidadãos eleitores com doença ou deficiência física notória; a criação de um documento único comprovativo do

grau de deficiência; a defesa junto das instituições da União Europeia da não discriminação da remuneração

das pessoas com deficiência em projetos financiados por fundos comunitários; a implementação de serviços de

informação e sinalização, designadamente a criação de uma plataforma pública on-line; a criação da plataforma

portuguesa de autorrepresentantes das pessoas com deficiência até ao final de 2017, a qual deverá ser ouvida

sempre que se pretenda alterar a legislação; a reformulação dos apoios às empresas que contratam pessoas

com deficiência; a valorização das entidades formadoras de cães de assistência.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP): — Estas foram as medidas aqui aprovadas, mas, por muito que

tenhamos procurado fazer, a verdade é que há muito a fazer. E, se não ignoramos que há já um dia de

consagração da deficiência, o facto de haver um dia que promova e lembre a importância da inclusão é

certamente uma matéria que merece, em primeiro lugar, o aplauso pela iniciativa que consagra e, sobretudo, o

empenho para que se promova, efetivamente, a inclusão.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Sr. Deputado, tem de terminar.

O Sr. Filipe Anacoreta Correia (CDS-PP): — Naturalmente, nós, no CDS, estamos atentos e estamos

empenhados no processo que esta petição também promove.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira para uma

intervenção.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Desde já, em nome do Grupo Parlamentar

do Partido Comunista Português, gostaria de cumprimentar os peticionários e de saudar, naturalmente, as

preocupações que manifestam quanto à necessidade de se garantir uma efetiva inclusão social.

A construção de uma sociedade inclusiva, tantas vezes evocada, exige medidas concretas que garantam

todos os dias o cumprimento de direitos fundamentais, exige políticas que garantam o direito constitucional de

todas as crianças e jovens ao ensino numa escola inclusiva e solidária, com os meios humanos, materiais e

pedagógicos necessários e adequados para garantir o acompanhamento das suas necessidades específicas.

Educação inclusiva significa que todas as crianças e jovens, independentemente das suas características,

origens e condições, podem aprender juntos na escola pública das suas comunidades.

A construção de uma sociedade inclusiva exige políticas de integração laboral das pessoas com deficiência

que lhes permitam viver com dignidade nas suas habitações, participar na vida das suas comunidades junto dos

seus familiares e amigos, promovendo a sua autonomia e independência. Exige políticas que promovam o

emprego com direitos, que valorizem os salários e que garantam uma melhor distribuição da riqueza, num

combate efetivo às desigualdades sociais. Exige políticas de efetiva proteção social que não sejam feitas num

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caminho de assistencialismo. Exige medidas que garantam o acesso de todos aos cuidados de saúde e que

tenham em conta necessidades específicas, como é o caso das pessoas com deficiência no que se refere, por

exemplo, às ajudas técnicas, às terapias, aos tratamentos de reabilitação e acompanhamento. Exige que se

assegurem as necessárias condições para que o Serviço Nacional de Saúde cumpra o seu papel, cumprindo-

se o direito constitucional à saúde.

Uma sociedade inclusiva exige o cumprimento do direito de todos à mobilidade e também, no caso das

pessoas com deficiência de forma mais específica, exige políticas que eliminem barreiras físicas e arquitetónicas

de comunicação e de informação, bem como as limitações existentes no acesso aos transportes. Exige medidas

que garantam o acesso de todos em condições de igualdade ao trabalho, à proteção social, à saúde, à educação

e ao conhecimento, mas também à habitação, à cultura, ao desporto, ao lazer, à participação ativa na vida

política e social.

Uma sociedade inclusiva exige medidas que correspondam à sua dimensão e ao significado de combate à

exclusão social e à discriminação e, no caso, a qualquer tipo de discriminação, seja das pessoas com deficiência,

das crianças e jovens com necessidades especiais, seja de todos aqueles cuja realidade económica, social e

cultural pode significar a negação de direitos fundamentais.

Sobre todas estas matérias, o PCP tem intervindo e apresentado propostas concretas na Assembleia da

República. A construção de uma sociedade inclusiva é inseparável do cumprimento de direitos fundamentais,

aliás consagrados na Constituição da República de Abril, e de políticas concretas que traduzam esses direitos

na vida de todos, não num mas em todos os dias da vida de todas as pessoas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra

Pereira.

A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, em nome do

Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, quero saudar, naturalmente, os 4501 peticionários que se

dirigiram à Assembleia da República, através desta petição, solicitando a criação do «Dia Nacional de Inclusão»,

e, se me permitem, vou fazê-lo na pessoa da primeira subscritora, a Sr.ª Ana Cristina Pires, que está aqui

presente e a quem aproveito para cumprimentar.

O Grupo Parlamentar do PSD leva estas matérias muito a sério e está em crer que há ainda um longo

caminho a percorrer no que toca à inclusão, mas sabemos todos que é um caminho que só poderemos fazer

juntos: o poder político, os cidadãos, as instituições. A inclusão das pessoas excluídas da sociedade é uma

matéria de todos nós, em conjunto; é uma matéria de sociedade que devemos todos, em conjunto, realizar

permanentemente, todos os dias, para, assim, prosseguirmos o esforço contínuo de aprofundamento de uma

sociedade mais justa, uma sociedade mais solidária e uma sociedade mais igual.

Sr.as e Srs. Deputados, temos a obrigação e o dever coletivo de garantir às pessoas excluídas, às pessoas

com deficiência ou incapacidade, às crianças, aos idosos, aos refugiados a plena fruição de todos os direitos

humanos e liberdades fundamentais exatamente na mesma medida que aos demais cidadãos.

Para o Grupo Parlamentar do PSD, a plena inclusão das pessoas que vivem à margem da sociedade constitui

um compromisso programático que nos deve unir e é por isso que esta é uma matéria que encaramos como

uma reserva de unidade, uma reserva de unidade que estará sempre acima do combate político e de quaisquer

partidarismos. Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, estamos disponíveis para os necessários consensos, de forma

a desenhar mais e melhores políticas de integração e inclusão social.

O Partido Social Democrata é um partido humanista, mobilizar-se-á sempre contra as desigualdades,

quaisquer que sejam, e estará sempre, continuamente, empenhado na construção de uma sociedade mais justa

e mais inclusiva para todos, uma sociedade que, sobretudo, valorize a diversidade e faça dela uma força.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado José Soeiro para uma

intervenção.

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O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, queria começar por saudar, em nome do Bloco de

Esquerda, os peticionários e as peticionárias que aqui estão presentes.

As preocupações com a inclusão social têm ganhado uma expressão crescente no espaço público e nos

discursos sociais, o que não acontece por acaso. Na realidade, cada vez mais pessoas se sentem afastadas e

discriminadas no acesso a bens fundamentais da sociedade, e falo de bens e de recursos materiais que são

essenciais para a sobrevivência, mas também de bens culturais e simbólicos, falo da limitação no acesso a uma

cidadania plena, que é uma condição de autonomia e emancipação.

A preocupação com a inclusão chama-nos justamente a atenção para a indivisibilidade dos direitos civis,

sociais e políticos. Cada um destes direitos não pode existir sem os outros, sob pena de vivermos uma cidadania

amputada, ou seja, termos cidadãos de primeira e de segunda, o que é, obviamente, ofensivo para a democracia.

Há também uma cultura de meritocracia, que apresenta a sociedade como um mundo de competição que

premeia e seleciona os aptos e pune, responsabilizando-as, as vítimas da exclusão. Esta cultura tem sido um

obstáculo a uma verdadeira política de inclusão, porque «naturaliza» as desigualdades e tende a justificar a

exclusão como inevitável.

Na verdade, a questão da inclusão tem, necessariamente, de articular dialeticamente esses dois polos em

tensão, que são o direito à igualdade e o direito à diferença. Para usar a formulação feliz do Boaventura de

Sousa Santos, «(…) temos o direito a ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza e temos o direito a ser

diferentes quando a nossa igualdade nos descarateriza», acrescentando, ainda, que a igualdade que interessa

é, pois, aquela que reconhece as diferenças, sem que essas diferenças produzam, alimentem ou reproduzam

as desigualdades.

O paradoxo da inflação do discurso sobre a inclusão nas últimas décadas, nomeadamente na Europa, é que

essa inflação discursiva tem sido concomitante com uma lógica de agravamento das desigualdades e talvez a

política de austeridade — essa máquina de produzir exclusão com todo o cortejo de sofrimento social que

acarretou — seja o melhor exemplo desse paradoxo.

Na verdade, a produção dessa desigualdade faz parte da lógica intrínseca dos grandes sistemas de

opressão, da lógica da exploração do capitalismo predatório, do sexismo e do patriarcado, do colonialismo e das

suas manifestações racistas e xenófobas, do capacitismo. Cada um destes sistemas produz todos os dias

desigualdades e exclusão e são essas desigualdades, todas elas e cada uma, que é preciso combater.

Por isso, termino dizendo que honrar as preocupações dos peticionários e das peticionárias, com inclusão,

tem de ser, do nosso ponto de vista, um compromisso concreto nas políticas de educação e saúde, nas políticas

de emprego e urbanismo, no acesso a bens fundamentais, nas políticas redistributivas, no reforço do Estado

social, promovendo, simultaneamente, essa igualdade e o respeito pela diversidade, uma igualdade não apenas

de oportunidades, mas de condições e de acesso concreto, a cada momento, aos recursos e aos bens sociais

a que todos temos direito e que têm de ser distribuídos.

Este é o compromisso do Bloco de Esquerda neste Parlamento. Este é o compromisso do Bloco de Esquerda

com cada um dos peticionários e com cada uma das peticionárias.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — A Mesa não regista mais pedidos de intervenção, pelo que dou

por encerrada a discussão da petição n.º 90/XIII (2.ª).

Cumpre-me informar o Plenário da agenda da sessão de amanhã, que terá início às 10 horas.

Da ordem de trabalhos consta, como primeiro ponto, a discussão, na generalidade, das propostas de lei n.os

83/XIII (2.ª) — Estabelece o estatuto do mediador de recuperação de empresas, 84/XIII (2.ª) — Aprova o regime

extrajudicial de recuperação de empresas, 85/XIII (2.ª) — Aprova o regime jurídico de conversão de créditos em

capital, 86/XIII (2.ª) — Altera o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros

de território nacional e transpõe as Diretivas 2014/36/UE, 2014/66/UE e (EU) 2016/801, 87/XIII (2.ª) — Altera o

procedimento e processo tributários, e do projeto de lei n.º 429/XIII (2.ª) — Aprova o regime de regularização de

cidadãos estrangeiros indocumentados (PCP).

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23 DE JUNHO DE 2017

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Do segundo ponto consta a discussão conjunta, na generalidade, das propostas de lei n.os 88/XIII (2.ª) —

Transpõe parcialmente a Diretiva 2014/91/UE, no que diz respeito às funções dos depositários, às políticas de

remuneração e às sanções, e 74/XIII (2.ª) — Regula os fundos de recuperação de créditos.

Do terceiro ponto consta a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 89/XIII (2.ª) — Autoriza o

Governo a regular o acesso e o exercício da atividade de intermediário de crédito e da prestação de serviços de

consultadoria relativamente a contratos de crédito, transpondo a Diretiva 2014/17/UE, do Parlamento Europeu

e do Conselho, de 4 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos de crédito aos consumidores para imóveis de

habitação.

Segue-se, no quarto ponto, a discussão conjunta do projeto de lei n.º 555/XIII (2.ª) — Garante a assistência

parental ao parto (PAN), na generalidade, dos projetos de resolução n.os 928/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo

que atue no sentido de assegurar o cumprimento dos direitos das mulheres na gravidez e no parto (PAN) e

929/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo a disponibilização de parto na água no Serviço Nacional de Saúde

(PAN), do projeto de lei n.º 563/XIII (2.ª) — Procede à segunda alteração à Lei n.º 15/2014, de 21 de março, de

modo a reforçar os direitos da mulher grávida durante o parto e da mulher puérpera após o internamento (Os

Verdes), na generalidade, e dos projetos de resolução n.os 934/XIII (2.ª) — Reforça as medidas de

acompanhamento da grávida e puérpera no Serviço Nacional de Saúde (PCP) e 935/XIII (2.ª) — Sobre a opção

pelo parto em meio aquático no Serviço Nacional de Saúde (Os Verdes).

Por fim, haverá votações regimentais às 12 horas, e não no final da sessão, como estava previsto na versão

anterior da ordem de trabalhos.

Desejo a todos a continuação de uma boa tarde.

Está encerrada a sessão.

Eram 16 horas e 57 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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