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Terça-feira, 19 de setembro de 2017 I Série — Número 1
XIII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2017-2018)
REUNIÃOPLENÁRIADE18DESETEMBRODE 2017
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretários: Ex.mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Idália Maria Marques Salvador Serrão António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro Sandra Maria Pereira Pontedeira
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 5
minutos. Ao abrigo do artigo 72.º do Regimento, procedeu-se a um
debate de atualidade, requerido pelo PSD e pelo CDS-PP, sobre o «alegado furto no paiol de Tancos», tendo proferido intervenções, além do Ministro da Defesa Nacional (Azeredo Lopes), os Deputados Sérgio Azevedo (PSD), Jorge Machado (PCP), João Vasconcelos (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), José Miguel Medeiros (PS), João Rebelo (CDS-PP) e Carlos Costa Neves (PSD).
Em declaração política, o Deputado António Filipe (PCP), ao iniciar-se mais uma sessão legislativa, salientou os principais pontos positivos da solução política encontrada para a governação do País na atual Legislatura, deplorou que se mantenham convergências do Partido Socialista com os partidos de direita em questões estruturantes e enunciou medidas que considerou serem ainda necessárias para a melhoria de vida dos trabalhadores e do povo português em geral. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Wanda Guimarães (PS), José Cesário (PSD), Pedro Filipe Soares (BE) e Nuno Magalhães (CDS-PP).
Em declaração política, a Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) enalteceu a dinamização da economia devido à retoma do poder de compra dos portugueses e referiu os problemas sentidos nos transportes públicos e na mobilidade dos cidadãos. Depois, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Luís Moreira Testa (PS), António Costa Silva (PSD), Hélder Amaral (CDS-PP), Carlos Matias (BE) e João Oliveira (PCP).
Em declaração política, o Deputado Porfírio Silva (PS) fez um retrato do estado do ensino em Portugal e falou da necessidade de se fazer uma nova lei de bases que promova a igualdade de oportunidades no acesso e no sucesso educativo, tendo, no fim, respondido a pedidos de esclarecimentos dos Deputados Nilza de Sena (PSD), Joana Mortágua (BE), Ana Rita Bessa (CDS-PP) e Ana Mesquita (PCP).
Em declaração política, o Deputado Jorge Duarte Costa (BE) criticou legislação aprovada pelo anterior Governo na área da energia e congratulou-se pela sua revogação, permitindo a redução de preços aos consumidores. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados
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Carlos Pereira (PS), Bruno Dias (PCP), Luís Leite Ramos (PSD) e Hélder Amaral CDS-PP).
Procedeu-se ao debate conjunto da proposta de resolução n.º 49/XIII (2.ª) — Aprova o Acordo Económico e Comercial Global entre o Canadá, por um lado, e a União Europeia e os seus Estados-membros, por outro, assinado em Bruxelas, em 30 de outubro de 2016, e dos projetos de resolução n.os 930/XIII (2.ª) — Pela rejeição do CETA — Acordo Económico e Comercial Global entre a União Europeia e o Canadá (Os Verdes), 1050/XIII (2.ª) — Rejeita a aprovação para ratificação do Acordo Económico e Comercial Global (CETA) entre a União Europeia e o Canadá (PCP), 1052/XIII (2.ª) — Pela rejeição do Acordo Económico e Comercial Global — CETA (União Europeia-Canadá) (BE) e 1053/XIII (2.) — Pela rejeição do Acordo Global de Economia e Comércio entre a União Europeia e o Canadá (CETA) (PAN). Usaram da palavra, a diverso título, além da Secretária de Estado dos Assuntos Europeus (Ana Paula
Zacarias), os Deputados José Luís Ferreira (Os Verdes), Carla Cruz (PCP), Isabel Pires (BE), André Silva (PAN), José Cesário (PSD), Pedro Mota Soares (CDS-PP) e Lara Martinho (PS).
Foi discutida, na generalidade, a proposta de lei n.º 94/XIII (2.ª) — Altera o regime jurídico da segurança contra incêndio em edifícios, tendo-se pronunciado, a diverso título, o Secretário de Estado da Administração Interna (Jorge Gomes) e os Deputados Jorge Machado (PCP), José Manuel Carpinteira (PS), Álvaro Castello-Branco (CDS-PP), Pedro Soares (BE) e António Topa (PSD).
Deu-se conta da retirada, pelo PCP, do seu projeto de lei n.º 601/XIII (2.ª) e da entrada na Mesa dos projetos de lei n.os 603 a 605/XIII (2.ª) e 606/XIII (3.ª), dos projetos de resolução n.os 1047 a 1053/XIII (2.ª) e 1054, 1055 e 1059/XIII (3.ª) e da apreciação parlamentar n.º 45/XIII (2.ª).
O Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 45 minutos.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 5 minutos.
Peço aos Srs. Agentes da Autoridade o favor de abrirem as galerias.
Cumprimento as Sr.as e os Srs. Deputados, as Sr.as e os Srs. Funcionários e as Sr.as e os Srs. Jornalistas.
Vamos dar início às reuniões plenárias da 3.ª sessão legislativa da XIII Legislatura, começando com uma
marcação do PSD e do CDS-PP, um debate de atualidade, ao abrigo do artigo 72.º do Regimento da Assembleia
da República, sobre o «alegado furto no paiol de Tancos».
Para abrir o debate, tem a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, o Sr. Deputado Sérgio Azevedo.
O Sr. Sérgio Azevedo (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Srs. Secretários de Estado
da Defesa Nacional e dos Assuntos Parlamentares, Sr.as e Srs. Deputados: A valorização de uma existência
orgânica do Estado apela à realização visível de estruturas institucionais que lhe servem de base e que
atravessam todas as instâncias intermediárias, conferindo aos cidadãos direitos e deveres que modelam a sua
íntima relação recíproca.
O desenvolvimento da ideia de direito numa sociedade política democrática constitui, em simultâneo, um
conjunto de direitos e deveres de todos os seus membros, traduzindo-se num equilíbrio entre a coesão interna
e a pluralidade das autonomias que a integram. É assim com a defesa nacional, com a sua relação de proteção
e defesa do Estado e na relação recíproca que ela estabelece com todos os cidadãos.
Se quisermos, é o extravasar da mera defesa da identidade coletiva, mas também da identidade da própria
autonomia individual do cidadão, implicando a sua capacidade em ser, simultaneamente, titular de direitos e
deveres para com o Estado, sobretudo no âmbito da defesa nacional, como, de resto, sobressai da nossa
Constituição, no seu artigo 276.º.
Assim, defender a Pátria não se pode esgotar num sentimento meramente patriótico. Antes se estende na
defesa do regime democrático baseado na dignidade da pessoa humana, na vontade popular, na representação
parlamentar plural e livre e no caminho para uma sociedade justa, solidária e fiscalizadora da atividade política,
que é como dizer na defesa de um patriotismo constitucional assente em direitos, liberdades e garantias
indisponíveis e irrenunciáveis de onde, inequivocamente, se extrai o escrutínio parlamentar como expressão
primacial do escrutínio popular. Não sendo por acaso que os deveres de defesa da Pátria, constitucionalmente
estabelecidos, assumem uma dimensão estruturante do nosso sistema político, estando o seu cumprimento,
inclusive, garantido pela via penal, não podendo, por isso, como tão bem nos lembra António Vitorino, estar nas
mãos do poder político, de nenhum poder político, a decisão sobre a sua defesa.
Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O que se passou em Tancos
é um assunto grave que põe em causa a segurança do Estado, que compromete Portugal no quadro
internacional e que merece um cabal esclarecimento das instituições militares e políticas que tutelam a defesa
nacional e um inquestionável aclaramento ao Parlamento português como titular da representação política do
povo.
Não foi por acaso que, no quadro parlamentar, o esclarecimento deste assunto recolheu unanimidade nos
partidos que integram a Comissão Parlamentar de Defesa Nacional. É essa unanimidade no esclarecimento que
faz este assunto transcender as fronteiras do debate político-partidário, transformando-o numa questão de
Estado e numa responsabilidade do Estado.
E aqui a responsabilidade do Estado não é apenas a do apuramento da responsabilidade política; é, sim, a
da garantia de que tudo está a ser feito, de que tudo foi sempre feito para impedir situações como as que se
passaram em Tancos.
É neste contexto que podemos, então, ponderar três dimensões distintas: a responsabilidade que emana de
uma investigação pelas autoridades judiciais que, encontrando-se em segredo de justiça, aguardaremos o
resultado do seu decurso; a responsabilidade que emana das investigações internas do Exército que devem ser
do conhecimento do Parlamento; e a responsabilidade de cooperação do Ministério da Defesa Nacional com os
restantes órgãos de soberania para que, em conjunto, se encontrem soluções na salvaguarda de defesa do
Estado.
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Tem sido isto, aliás com as limitações constitucionais evidentes, por que o Sr. Presidente da República,
Comandante Supremo das Forças Armadas, tem pugnado e que nenhuma das instituições democráticas pode
deixar de subscrever: a exigência de uma investigação cabal.
Ora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, há duas dimensões que não têm sido devidamente preenchidas, não
apenas porque o Sr. Ministro não respondeu satisfatoriamente à Comissão de Defesa Nacional sobre o
sucedido, mas porque optou por revelar à imprensa um conjunto de suposições que adensam as dúvidas em
vez de as esclarecer.
Continuamos sem perceber se houve, de facto, um furto no paiol de Tancos; continuamos sem perceber o
que se passou nas 24 horas seguintes ao alegado furto e qual a razão que levou o Secretário-Geral do SIRP
(Sistema de Informações da República Portuguesa)a dizer, publicamente, que apenas teve conhecimento do
furto pela comunicação social como, de resto, com a Unidade de Coordenação Antiterrorismo, que só reuniu 48
horas depois, reconhecendo que também tomou conhecimento do sucedido pela comunicação social, não tendo
sequer sido avisada pelo Exército; e continuamos sem saber o que levou a Unidade Nacional Contra o
Terrorismo a auxiliar nas investigações, uma vez que o Governo confirmou, com grande probabilidade, que os
riscos de segurança interna ou a associação a qualquer tipo de atividade terrorista eram diminutos ou
inexistentes.
Assim como, permita-me Sr. Ministro, continuamos, no limite, sem saber se é verdade ou não que terá ficado
um ano na gaveta um despacho que mandava alterar e reforçar as medidas de segurança nos paióis de Tancos.
Este não é um debate para agastar nem o Governo, nem o Ministro da Defesa, em particular, não é um
debate político-partidário comum; é um debate a favor da segurança do Estado e a favor de uma tutela
competente capaz de prevenir e atuar sempre que a segurança do Estado é posta em causa. Respostas que o
Parlamento tem o direito de obter.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro: CDS e PSD — é esta a ordem
— decidiram promover este debate de atualidade a propósito do desaparecimento de material militar de Tancos.
Importa referir que se o objetivo destes partidos fosse o apuramento de responsabilidades, fosse aprofundar
a discussão sobre as causas e os problemas que permitiram estes factos e o cabal esclarecimento destes
lamentáveis acontecimentos, sempre podiam ter optado por discutir este assunto em reunião da Comissão de
Defesa Nacional, com a presença do Sr. Ministro, já na próxima quarta-feira, pois tal discussão, em sede de
Comissão, além de mais alargada, poderia permitir a transmissão de informação reservada ou confidencial ao
Parlamento.
Mas se é infeliz a escolha por parte do PSD e do CDS deste modelo de discussão para este assunto de
extrema sensibilidade, também não deixa de ser bastante infeliz a opção do Sr. Ministro em dar entrevistas sem
antes esclarecer o Parlamento.
Entendemos que teria sido bem mais correto que, em vez de dar entrevistas, onde assistimos a um ministro,
na modalidade de comentador, a lançar várias hipóteses, dúvidas e cenários, que não ajudam ao
esclarecimento, ao contrário só ajudam à confusão, o Sr. Ministro se3 tivesse primeiro dirigido ao Parlamento
do nosso País.
Não deixa de ser absurdo que, depois dos vários esclarecimentos prestados pelo Primeiro-Ministro, pelo
Presidente da República, pelo General Chefe do Estado-Maior do Exército, e pelo General Chefe do Estado-
Maior-General das Forças Armadas, o Sr. Ministro venha agora, em entrevista, colocar como hipótese a
possibilidade de se tratar de um problema de abate ou de um problema de inventário.
Sr. Ministro, não há verificação regular do material que vai para abate? Não há inventário? Não há
transmissão da informação do inventário quando se sucedem os Chefes de Estado-Maior dos ramos? E a
Inspeção-Geral do Exército não soube ou não sabe nada sobre este assunto?
Sr. Ministro, isto é mau demais para o Sr. Ministro se incluir na bancada dos que se dedicam a especular.
Em vez de especular na comunicação social, que apenas acrescenta ruído a algo já estrondoso, entendemos
que o Sr. Ministro deve apresentar as conclusões da investigação interna e esclarecer o que aconteceu.
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O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Além disso, e independentemente das responsabilidades criminais, que
competem ao Ministério Público apurar, o Sr. Ministro deve apurar e retirar as ilações com a assunção de
responsabilidades também do Sr. Ministro, uma vez que, nos termos do artigo 199.º da Constituição da
República Portuguesa, o Sr. Ministro tem, no que respeita à defesa nacional, competência administrativa para
dirigir os serviços e a atividade da administração direta do Estado, a civil e a militar, e tem poder para
superintender a administração indireta e exercer a tutela sobre a administração autónoma.
Sr. Ministro, aqui, como noutros casos, como no das mortes no curso de Comandos, e independentemente,
como disse, do apuramento das responsabilidades criminais, a culpa não pode morrer solteira e as
responsabilidades políticas de quem tutela, a responsabilidade de quem manda nos mais altos níveis nas Forças
Armadas deve ser imputada e/ou assumida.
Sr. Ministro, depois de vários anos de desinvestimento que degradaram as condições operacionais dos
diferentes ramos das Forças Armadas, deixar que estes escândalos continuem impunes e sem que os
responsáveis sejam responsabilizados é um duro golpe na credibilidade das Forças Armadas, que não tem nem
terá o apoio do PCP.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Vasconcelos.
O Sr. João Vasconcelos (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs.
Deputados: O roubo do armamento militar em Tancos em junho passado — mais de duas centenas de granadas
de vários tipos, explosivos, disparadores, cargas de corte, cerca de 1500 cartuchos de 9 mm e outro material de
guerra — foi um acontecimento extremamente grave.
Este triste e grave acontecimento significa um falhanço clamoroso do Estado n, torna-se imperioso, quanto
antes, apurar as responsabilidades até ao fim, custe o que custar e doa a quem doer.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. João Vasconcelos (BE): — Foi o que logo exigiu o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda,
solicitando um conjunto de esclarecimentos ao Ministério da Defesa e que fosse feita uma investigação rigorosa.
O Bloco de Esquerda não aceita que a culpa, mais uma vez, morra solteira na instituição militar. Veja-se o
tristemente célebre processo dos submarinos: ainda hoje estamos à espera dessas respostas e desses
esclarecimentos. Grosso modo, o País não pode limitar-se a assistir à exoneração e à readmissão de cinco
comandantes militares e praticamente nada mais acontecer.
O Bloco de Esquerda também ficou deveras surpreendido com as declarações do Sr. Ministro no sentido de
que, no limite, não pode ter havido furto nenhum, visto não haver prova visual, nem testemunhal, nem confissão
sobre o roubo de material.
A situação é tanto mais estranha quanto o Exército admitiu a violação do perímetro de segurança nos paióis
de Tancos e o arrombamento de dois paiolins, levando ao desaparecimento do material militar. Aliás, o próprio
Chefe do Estado-Maior do Exército, em audição na Assembleia da República, veio a público referir que as
responsabilidades eram todas militares, que o que aconteceu tem a ver com erros estruturais e sistémicos, que
houve desleixo e falta de supervisão e que tinha havido cumplicidade interna, daí a exoneração dos cinco
comandantes militares posteriormente readmitidos.
Também a Procuradoria-Geral da República referiu que estavam em causa suspeitas da prática dos crimes
de associação criminosa, tráfico de armas internacional e terrorismo internacional.
Desta forma «não bate a bota com a perdigota»!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!
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O Sr. João Vasconcelos (BE): — Sabemos que foram feitos inquéritos e investigações pela Polícia Judiciária
Militar, pela Polícia Judiciária e pela instituição militar, sabemos também já há relatórios elaborados pelos ramos
das Forças Armadas, pela Inspeção-Geral de Defesa Nacional, mas não se deixa de lamentar que a Assembleia
da República praticamente nada saiba oficialmente visto que esses relatórios foram classificados como
«secretos», apenas se sabendo que foram tomadas algumas decisões pelo Exército, nomeadamente em matéria
de armazenamento e segurança do material de guerra.
Se o Governo não tem andado bem nesta matéria, então os partidos de direita, PSD e CDS, muito menos.
Como não têm factos políticos de relevante interesse nacional, procuram fazer chicana política à volta de
determinados acontecimentos: foi sobre os incêndios e as listas fantasmas de Pedrógão Grande, foi sobre o
desaparecimento do material militar… Pedem, a torto e a direito, a cabeça de ministros.
A direita anda mesmo de cabeça perdida e já ninguém, ou quase ninguém, os leva a sério. Ainda não se
conformaram com a ideia de que já não governam o País e que foram derrotados em 2015. Agora ficaram
mesmo assustados com o facto de a agência de rating Standard & Poor’s ter retirado Portugal do nível lixo em
que se encontrava, precisamente desde janeiro de 2012, situação imposta pelo Governo PSD/CDS e que tantos
malefícios causou ao País. E devem estar bem preocupados pela derrota esmagadora que já se anuncia para
o PSD e para o CDS nas próximas eleições autárquicas.
Sr. Ministro, poderá adiantar ao Parlamento mais alguns detalhes sobres os relatórios produzidos pela
instituição militar em relação ao material produzido? Afinal, houve ou não houve furto de material militar em
Tancos?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados: Os Verdes também consideram que, tendo em conta a natureza da matéria que aqui estamos hoje
a tratar neste debate, teria sido mais prudente, julgo eu, que PSD e CDS tivessem promovido esta discussão
em comissão. De facto, não há dúvida que a discussão em comissão permitiria outro tipo de esclarecimento
que, em sessão plenária, consideramos não será prestado.
De todo o modo, entenderam marcar este debate em Plenário. Muito provavelmente o objetivo nem é mesmo
o cabal esclarecimento da situação mas, enfim, tendo em conta que o debate está a decorrer, Os Verdes
participarão nele, como é evidente.
Dirijo-me, por isso, ao Sr. Ministro para dizer que aquilo que já ficou conhecido como «o assalto aos paióis
de Tancos» é de uma extrema gravidade. Na verdade, aquilo que os portugueses souberam foi que foram
roubados de Tancos materiais como granadas, munições, explosivos. Portanto, não é brincadeira,
evidentemente.
Sucede-se depois um conjunto de questões que contam a história de uma forma completamente deturpada
e julgo que confusa para a generalidade dos portugueses, inclusivamente o facto de ter vindo a público que,
eventualmente, aquele material nem teria perigosidade nenhuma porque já estava obsoleto e fora de prazo. Mas
o exercício que vou pedir ao Sr. Ministro que faça é o de que, justamente, se coloque do lado dos portugueses
que estão a assistir a esta questão.
Sr. Ministro, há de convir que a história acaba mesmo por ser confusa porque, de repente, ouvem o Sr.
Ministro proferir estas palavras: «No limite, pode nem ter havido furto nenhum.». Confusão! Terá havido abate?
Terá havido furto? Depois, questiona-se: então, não há o registo efetivo do material? E se ele foi abatido não há
registo do material que foi abatido? Como é que isso se faz?
Coloca-se também a questão da falta de vigilância. Há um sistema de videovigilância que vou perguntar ao
Sr. Ministro há quantos anos não funciona. Seguramente, um sistema de videovigilância levou a que se fizesse
um investimento considerável. Não funciona há quanto tempo? Porquê é que não funciona? E é, ou não,
importante que funcione?
Portanto, Sr. Ministro, no meio desta confusão toda, destas declarações que não têm ajudado nada à
questão, os portugueses, no mínimo, sentem-se com uma enorme falta de confiança. E o normal será que se
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sintam mesmo com uma grande insegurança. Por isso, Os Verdes também consideram que há esclarecimentos
que devem ser hoje prestados pelo Sr. Ministro.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Miguel Medeiros.
O Sr. José Miguel Medeiros (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro e Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados: O Grupo Parlamentar do PS tem acompanhado a Comissão de Defesa Nacional nos seus
consensos sobre as necessidades de apuramento de todos os factos e responsabilidades no incidente de
Tancos.
Acreditamos que as questões relacionadas com a defesa da Nação são um desígnio do País e, como tal,
não podem nem devem ser utilizadas como arma de arremesso político-partidário.
Não estando acima ou fora do alcance do escrutínio parlamentar, os assuntos da defesa, têm, no entanto,
sido tratados ao longo do tempo, nesta Casa, com sentido de Estado e reserva devida. A prova disso é que
temos estado de acordo no essencial, como demonstra a linha de conduta comum entre o Parlamento, o Sr.
Presidente da República e o Governo.
O mais importante é o apuramento dos factos, perceber o que realmente aconteceu e tomar as medidas
necessárias para evitar que acontecimentos como este se repitam.
Afinal, é da segurança e defesa nacionais que estamos a tratar, matérias de soberania por excelência.
Tornam-se, assim, difíceis de compreender as posições do PSD e do CDS, traduzidas numa excitação e num
frenesim político-partidário sem precedentes, em torno das questões de defesa nacional.
Aplausos do PS.
Será que, sem argumentos e sem alternativas para apresentar sobre as questões substantivas da defesa
nacional, decidiram refugiar-se no domínio da querela partidária, agitando fantasmas e entretendo-se a pedir, à
vez, ora a demissão do Ministro ora a demissão dos chefes militares, ora a demissão de ambos?
Parecem esquecer-se que esta é uma área que não é própria para estes exercícios, demasiado séria para
ser tratada de forma tão pouco prudente.
A Sra. Deputada Assunção Cristas disse, no debate do Estado da Nação, apenas alguns dias depois do
ocorrido e antes ainda de quaisquer conclusões, que «o País ficou em sobressalto» e o CDS apressou-se a
pedir a demissão do Ministro e do chefe do Exército.
Já o líder do PSD, escassos dias após o incidente, veio perguntar porque é que ainda não havia demissões,
deixando no ar a sugestão de demissão do Sr. Ministro da Defesa e das chefias militares. Veio agora, na passada
semana, recuar nesse pedido, ainda assim utilizando o tema como arma de arremesso partidária.
E a pergunta que se coloca nesta altura é se fará algum sentido puxar o País para o sobressalto e alarmar
os portugueses, quando sabemos que o Governo, as Forças Armadas e o poder judicial estão a fazer o seu
trabalho.
Os relatórios estão concluídos dentro dos prazos e deles foram já extraídas, no imediato, consequências no
domínio da segurança dos paióis nacionais e das instalações militares.
É verdade que ainda são necessários esclarecimentos adicionais, designadamente das investigações
criminais ainda em curso.
A luta política em democracia não pode toldar o sentido de Estado que nos é exigido em assuntos desta
natureza e importância.
Não é legítimo, nem aceitável, que o debate político sobre um tema destes se faça, sobretudo, na praça
pública, com pedidos de demissão e ataques sistemáticos ao Ministro da Defesa e às chefias militares, como
temos vindo a assistir.
Estamos a tratar das Forças Armadas e esse desabrido estilo confrontacional não nos vai ajudar em nada a
recuperar a credibilidade, nem aqui, nem noutro domínio qualquer.
Aplausos do PS.
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Afinal, parece que os bons resultados que o Governo tem apresentado, com amplo reconhecimento externo,
levam a direita, renegando responsabilidades, a virar-se avidamente para ocorrências nas áreas da soberania
e a explorá-las com o mesmo estilo que tem vindo a usar para a putativa chegada do diabo ao mundo da
economia.
Felizmente que os portugueses percebem estas manobras e não se deixam assustar. O País está tranquilo
e as Forças Armadas estão a fazer o seu trabalho.
O PS, como os portugueses, confia na capacidade do Governo e do Sr. Ministro da Defesa para conduzir
este assunto, com o sentido de responsabilidade e a serenidade que se exigem.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Rebelo, do Grupo
Parlamentar do CDS-PP.
O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Defesa Nacional, Srs. Secretários de Estado,
Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Este debate ocorre 81 dias depois do furto do armamento da base militar de
Tancos. Ocorre depois de cinco audições realizadas na Comissão de Defesa Nacional, onde foi possível apurar
um conjunto de factos desconhecidos e muitas vezes negligenciados pelos Deputados do Partido Socialista,
que não se cansaram de desvalorizar e diminuir esses factos, numa atitude, partilhada pelo Senhor Ministro, de
«não sei, não quero saber e tenho raiva de quem sabe».
Ocorre depois de várias diligências feitas pela Comissão de Defesa ao Ministério que lidera, às quais o Sr.
Ministro insiste em «fazer vista grossa».
Ocorre depois de feitos pelo menos três apelos públicos — três! — do comandante supremo das Forças
Armadas, o Sr. Presidente da República, a pedir celeridade e eficácia no apuramento de responsabilidades.
Aplausos do CDS-PP.
Mas este debate ocorre também dias depois da entrevista do Sr. Ministro a dois órgãos de comunicação
social, onde fez declarações absolutamente irresponsáveis e impróprias que não dignificam o exercício do cargo
de Ministro da Defesa Nacional.
São declarações irresponsáveis porque minam a credibilidade do Estado e o prestígio das Forças Armadas,
e não é aceitável que um ministro alimente de forma especulativa uma tese que, de resto, já havia sido afastada
pelo chefe do Exército, de que o assalto foi gradual, supondo até que poderia nem ter havido assalto, entrando
em profunda contradição com o relato do Sr. General Rovisco Duarte, que negou essa possibilidade aquando
da sua audição.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — E são declarações impróprias porque não é admissível que um ministro de
um governo se coloque à margem de um processo de averiguação de responsabilidades como se de um mero
espectador se tratasse.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Ministro obriga-nos, uma vez mais, a reiterar as razões por que não tem condições para continuar à
frente do Ministério da Defesa Nacional.
O Sr. Ministro é, hoje, um ministro sem credibilidade, sem autoridade, e por isso sem capacidade para exercer
o seu mandato.
Para melhor sustentar as razões já invocadas pela Presidente do CDS, impõe-se fazer uma fita do tempo
dos seus erros políticos e institucionais.
Em primeiro lugar, perante o maior assalto militar de que há memória no nosso País, o Sr. Ministro foi o
primeiro a desvalorizar a gravidade da situação, dizendo — e passo a citar — que havia «quebras e falhas de
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segurança muito superiores», em contradição, de resto, com o que disse o Ministro dos Negócios Estrangeiros,
que qualificou este incidente — e passo a citar — de «o maior do século XXI».
Em segundo lugar, o Sr. Ministro assumiu categoricamente a responsabilidade política pelo incidente, sem
retirar quaisquer consequências políticas do mesmo.
Em terceiro lugar, soubemos que o Sr. Ministro assinou um despacho no início de junho a autorizar o reforço
de vedações que se encontravam em estado de degradação evidente, manifestando, posteriormente — pasme-
se —, desconhecimento da situação de segurança em Tancos. Sr. Ministro, se não sabia, devia saber.
Aplausos do CDS-PP.
Em quarto lugar, pelas audições realizadas na Comissão de Defesa, soubemos que os responsáveis do
Sistema de Segurança Interna (SSI) e do SIRP (Sistema de Informações da República Portuguesa) só tiveram
conhecimento do furto de Tancos 24 horas depois e, mais grave do que isso, pela comunicação social. Como é
igualmente grave que só 48 horas depois é que foi convocada a Unidade de Coordenação Antiterrorismo
(UCAT). Sr. Ministro, nem uma palavra sua ou de outro membro do Governo sobre esta gravíssima
descoordenação!
Em quinto e último lugar, três meses depois do incidente, o Sr. Ministro não tem mais nada para dizer ao
País senão supor, conjeturar ou presumir sobre o que eventualmente se terá passado, à revelia de todos os
apelos que têm sido feitos pelo Sr. Presidente da República.
É grave, Sr. Ministro. E qualquer uma destas razões seria mais do que suficiente para justificar a sua
demissão.
O roubo de Tancos parece uma tragicomédia: O Ministro não sabe o que lá havia, o Ministro não sabe o que
lá aconteceu, o Ministro não sabe o que de lá desapareceu, o Ministro nem sequer sabe se houve roubo ou o
que furtaram!
Aplausos do CDS-PP.
Diga-nos, Sr. Ministro: se um colega seu da NATO (North Atlantic Treaty Organization) lhe perguntar o que
aconteceu em Tancos vai responder com a mesma displicência?
O Sr. Ministro parece ser o único que ainda não percebeu que a sua permanência à frente do Ministério da
Defesa Nacional se tornou absolutamente insustentável, indesejável e contrária aos interesses nacionais.
E não querendo recorrer a nenhuma das declarações dos líderes do PCP e do Bloco de Esquerda, partidos
que suportam o Governo — o Deputado Jerónimo de Sousa e a Deputada Catarina Martins —, que são
reveladoras, aliás, do mal-estar e do embaraço que o Sr. Ministro está a infligir à geringonça, lembrar-lhe-ia
apenas o que disseram alguns camaradas seus, como Francisco Assis, António Vitorino, Ana Gomes, todos
socialistas, todos críticos.
Cito só Francisco Assis, que se sentou naquela bancada durante muitos anos como líder parlamentar, que
passo a citar: «O Ministro «revela uma inadequação (…) quase permanente às exigências específicas do
exercício da função concreta de Ministro da Defesa».
Sr. Ministro, a sua inadequação ao cargo só é comparável ao seu isolamento político. Por isso, uma vez mais
lhe digo: saia, Sr. Ministro! Não espere pelas eleições ou pela próxima remodelação, saia pelo seu próprio pé.
O Sr. Ministro tem a obrigação de perceber que houve um momento a partir do qual as suas palavras e as
suas omissões se tornaram num fator de incredulidade, de insegurança e até de escárnio.
Compete-lhe, por isso, responder, em consciência, a esta pergunta: a sua continuação no cargo ainda serve
a primeira das missões de um Ministro da Defesa, que é a de garantir que Portugal está seguro e que os
equipamentos das Forças Armadas estão protegidos? Pense bem, Sr. Ministro!
O apego ao cargo é, talvez, humano mas não é seguramente um serviço que presta ao País.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Ministro da Defesa Nacional.
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O Sr. Ministro da Defesa Nacional (Azeredo Lopes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Foram aqui
colocadas até agora várias questões importantes quanto ao furto de material militar nos paióis nacionais de
Tancos. Começo, por isso, se me permitem, por distinguir de imediato os diferentes planos que, a meu ver, estão
aqui em causa.
Por um lado, o plano da investigação criminal — e devo insistir neste ponto. É ao Ministério Público que
compete exercer a ação penal, não ao Ministro da Defesa Nacional, como bem se percebe, se mais não fosse
necessário, pelo comunicado da Sr.ª Procuradora-Geral da República, de 4 de julho de 2017.
O inquérito, como, aliás, seria de esperar, encontra-se em segredo de justiça. Por isso, muitas das questões
suscitadas pelos Srs. Deputados sobre o que se sabe e o que não se sabe, sobre a averiguação da existência
de um crime, sobre a determinação dos seus agentes, sobre a determinação da sua responsabilidade,
descoberta e recolha das provas, são do domínio da autoridade judiciária competente, não do Ministério da
Defesa Nacional.
Por muito que se insista, este apuramento não pode ser substituído por processos de averiguações que têm
objeto e função bem diferentes, como acentuado, em 4 de setembro último, pelo Sr. Presidente da República, a
propósito do andamento da investigação criminal. E passo a citar: «Passaram dois meses e uma semana,
precisamente, e eu continuo a acreditar que as entidades encarregadas da investigação criminal estão
conscientes da importância do tempo, de como o tempo no apuramento dos factos e de eventuais
responsabilidades é importante e de como as conclusões da investigação são importantes para as Forças
Armadas e até para a própria investigação por parte das Forças Armadas em termos internos».
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, um outro plano que aqui se convoca, e já foi convocado, é o da ação
do Exército.
O Exército tem colaborado ativamente com a Polícia Judiciária, tendo esta, aliás, solicitado o processo de
averiguações levado a cabo no Regimento de Engenharia n.º 1 (RE1).
O relatório preliminar do Exército deu origem aos processos de averiguações.
Foram, ainda, instaurados três processos disciplinares. Aliás, no que a processos disciplinares diz respeito,
cabe ao Chefe do Estado-Maior do Exército, nos termos da lei, «administrar a disciplina no respetivo ramo». O
Chefe do Estado-Maior do Exército informou, e mantém informado, o Ministro da Defesa Nacional, que aguarda
pela conclusão de tais processos.
Além disso, e no imediato, foram já reforçadas as medidas de segurança ativas e passivas nas instalações
militares e procedeu-se à revisão das normas e dos procedimentos internos no âmbito da segurança militar.
Estão ainda a ser realizados investimentos imediatos na segurança dos paióis, paiolins e áreas sensíveis
das instalações do Exército. Neste conjunto, destacam-se, por exemplo, os investimentos nos paióis de Santa
Margarida, já a decorrer, e também, no âmbito da segurança, em 16 unidades do Exército.
Desencadearam-se, depois, medidas estruturais para garantir a eficiência do dispositivo.
Posso aqui destacar, pela sua relevância e grande complexidade, a implementação do plano de
esvaziamento dos Paióis Nacionais de Tancos, que envolverá a colaboração ativa de várias entidades,
nomeadamente da GNR e da PSP, e que já está a decorrer desde 14 de setembro.
Finalmente, foi elaborada e difundida uma diretiva relativa à reorganização do dispositivo de armazenamento
dos artigos da classe V.
No que se refere, agora, ao plano de ação estrito do Ministro da Defesa Nacional, como já tive ocasião de
dar conta em reunião da Comissão de Defesa Nacional, em 7 de julho, na sequência do ocorrido e no âmbito
das minhas competências, adotei, de imediato, na altura, dois despachos, um dos quais dirigido aos chefes dos
ramos das Forças Armadas, para que fosse dada prioridade às áreas relacionadas com a segurança do material
de guerra, nomeadamente armamento, munições e explosivos, e determinando que fosse apresentado, no prazo
de 30 dias, aliás, cumprido sem exceção, um relatório sobre as atuais condições de segurança das instalações
militares destinadas àquele material sob sua responsabilidade.
Num outro despacho, dirigido à Inspeção-Geral da Defesa Nacional (IGDN), determinei a realização de uma
inspeção extraordinária, vulgo auditoria, aos procedimentos e condições de segurança em vigor nas Forças
Armadas, num prazo de 60 dias, também ele integralmente cumprido.
Os relatórios dos ramos, incluindo, naturalmente, o do Exército, além de medidas tomadas no imediato,
identificaram medidas que tiveram de ser implementadas logo e outras que serão implementadas a médio e
longo prazo.
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Os relatórios de auditoria da Inspeção-Geral da Defesa Nacional fizeram, aliás, recomendações quanto a
ações futuras a serem adotadas.
Está realizada, por isso, num tempo que tem de se considerar breve, uma radiografia geral da situação atual
do armazenamento do material de guerra, munições e explosivos.
Em resultado destes elementos, determinei, através de despacho e nos termos do artigo 14.º da Lei de
Defesa Nacional, uma série de medidas a serem adotadas.
Do teor e da substância desse despacho, antes de por mim ter sido assinado, foi dado já conhecimento à
Comissão de Defesa Nacional, no dia 11 de setembro.
Ainda assim, porque estamos em Plenário e pela sua importância, destacaria as seguintes medidas: ao nível
das normas e procedimentos, o desenvolvimento, pelo Chefe de Estado-Maior-General das Forças Armadas,
em articulação com os Chefes de Estado-Maior dos três ramos, de um sistema de informação comum para
controlo efetivo de material sensível, que garanta a informação necessária e o controlo de acesso à informação
segundo os patamares mais evoluídos.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, peço-lhe para concluir.
O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — Ao nível das infraestruturas, foi determinado o desenvolvimento de
ações de concentração e de desenvolvimento prioritário de obras nas várias instalações.
Ao nível dos recursos humanos, foi determinado que os processos de seleção, certificação, formação e treino
dos militares dedicados a funções de segurança sejam aperfeiçoados.
Vou concluir, Sr. Presidente, mas, antes, permitam-me apenas, a final, um esclarecimento: a todos estes
relatórios foi atribuída, por quem os realizou e não pelo Ministro da Defesa Nacional, a classificação de
«secreto». Creio que a avaliação feita pelos ramos e pela Inspeção-Geral da Defesa Nacional é compreensível
por todos.
Em síntese, e sem prejuízo de críticas legítimas, entendo que o Governo fez o que devia ser feito, e fê-lo
num tempo muito curto.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Carlos Costa Neves.
O Sr. Carlos Costa Neves (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
Depois de ouvir o Sr. Ministro atentamente, tenho de repetir as seguintes perguntas: o que aconteceu em
Tancos? Quando e como foi assaltada a instalação militar? O que desapareceu? Que consequências se tiram
do que aconteceu? De quem é a responsabilidade operacional? De quem é a responsabilidade política?
Passados três meses, em vez de respostas, avolumam-se as interrogações, já que as respostas têm sido,
como hoje, nenhumas.
É nestas circunstâncias que o Sr. Ministro, ignorando as perguntas, formuladas em carta subscrita pelo
Presidente da Comissão de Defesa Nacional, dá uma entrevista em que acentua a confusão em que temos
vivido.
Segundo afirma, «no limite, pode não ter havido assalto», aderindo, assim, à tese de simulação de assalto
para acerto de inventário — sem tirar nem pôr o que alvitraram, em momentos distintos, os Coronéis Sousa e
Castro e Vasco Lourenço.
Assalto ou simulação, o que hipoteticamente aconteceu em 28 de junho — nem a data é certa — é de uma
gravidade extrema. Estamos no domínio da segurança nacional, logo no núcleo das funções do Estado. E todos
o referenciaram: o Sr. Presidente da República; as forças políticas representadas nesta Assembleia; o Governo;
os chefes militares; a opinião pública e publicada. Armas à guarda de quem nos guarda não podem, pura e
simplesmente, desaparecer!
No entanto, praticamente três meses depois do alegado assalto, está instalada a confusão total: o assalto
terá acontecido em 28 de junho — se é que houve assalto… — mas, apesar da sua gravidade, o Chefe de
Estado-Maior-General e o Ministro da Defesa terão sido informados mais tarde.
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Os serviços de informações da República tomam conhecimento do desaparecimento das armas pela
comunicação social e a unidade antiterrorismo só reúne dois dias depois do presumível assalto.
Não são confirmados ou desmentidos rumores de que entidades judiciais terão sido informadas da
possibilidade de assalto.
A lista confidencial do material furtado, que afinal pode não ter sido furtado, aparece nos jornais.
Após o alegado assalto, o Chefe de Estado-Maior do Exército fala em desleixo e exonera os cinco
comandantes de Tancos para que tudo se apure sem constrangimentos. Duas semanas depois, os exonerados
são reconduzidos, certamente porque tudo se apurou, mas não se sabe o que se apurou.
Dois distintos oficiais generais, Faria Menezes e José Calçada, nem mais nem menos do que o Comandante
Operacional e o Diretor de Pessoal do Exército, passam à reserva. Porquê?
O Sr. Primeiro-Ministro, após o regresso de férias, convoca uma reunião com os chefes dos três ramos das
Forças Armadas, no fim da qual promove uma declaração à imprensa em que é passada a ideia de que uma
parte do material desaparecido seria obsoleta, como se isso mudasse o que quer que fosse.
Há uma semana, o Sr. Ministro da Defesa, em entrevista que certamente não deu para divulgar as conclusões
dos inquéritos, que até estavam classificados como «secretos», introduz a tese de «não sei se alguém entrou
em Tancos. No limite, pode não ter havido assalto». Isto, para além de induzir insegurança, desautoriza o Chefe
do Estado-Maior do Exército e descredibiliza externamente o País.
Poderia continuar indefinidamente.
Sr. Ministro, diga-nos o que até agora não nos disse: foi assalto ou simulação de assalto? Quando foi? Quem
foi? Como foi? O que desapareceu? De caminho, identifique os responsáveis operacionais e assuma a
responsabilidade política.
Aplausos do PSD e de Deputados do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:
A primeira coisa que quero pedir ao Sr. Ministro é que distinga claramente a intervenção de Os Verdes das
intervenções que o PSD e o CDS aqui fizeram.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Ainda bem!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Estamos aqui com uma profunda seriedade relativamente a esta
matéria e a procurar, de facto, os esclarecimentos que são devidos.
Por isso, Sr. Ministro, a primeira coisa que lhe quero dizer, depois de ter ouvido a sua intervenção, é que Os
Verdes consideram que a investigação que está a ser levada a cabo deve prosseguir sem qualquer
constrangimento.
Quero dizer-lhe, em segundo lugar, que Os Verdes não vieram pedir-lhe nenhuma informação confidencial.
De resto, no início da intervenção tive mesmo o cuidado de dizer que me dá a sensação de que, tendo em conta
a natureza da matéria, as informações prestadas em sede de comissão poderiam ser um pouco mais
aprofundadas do que aquelas que podem ser dadas em Plenário. Mas, face a tudo isto, Sr. Ministro, e tendo em
conta as questões que lhe coloquei, acho que há informação que o Sr. Ministro podia ter dado que não cabe no
âmbito desta matéria confidencial e que talvez até nos ajudasse a perceber algumas responsabilidades
alargadas, designadamente sobre o sistema de videovigilância, o investimento que foi feito ou o não
funcionamento relativamente a esta matéria, que é fundamental.
Por outro lado, Sr. Ministro, vai-me desculpar, mas com as afirmações públicas que o Sr. Ministro fez,
referindo que, no limite, pode não ter havido furto nenhum, lançou a confusão e esta não está esclarecida. Por
isso, findo este debate, Os Verdes consideram que o Sr. Ministro ainda deve explicações sobre o significado
desta afirmação.
Acho que o Sr. Ministro teria tudo a ganhar se o fizesse, assim como os portugueses, evidentemente, pois é
neles que pensamos primeiro.
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O Sr. Presidente: —Tem a palavra, para uma nova intervenção, o Sr. Deputado Carlos Costa Neves.
O Sr. Carlos Costa Neves (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados: Queria apenas dar nota de que saímos deste debate como saímos das audições que promovemos
na Comissão de Defesa Nacional.
Não viemos, em primeira instância, ao Plenário apresentar o assunto, ao contrário do que foi dito.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Exatamente!
O Sr. Carlos Costa Neves (PSD): — Nós suscitámos todas estas questões na Comissão de Defesa
Nacional, vamos continuar a suscitá-las na mesma Comissão e voltaremos ao Plenário, se for necessário, até
que tenhamos os esclarecimentos que não só temos direito a ter como todos os portugueses têm direito a ter.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem ainda a palavra, para uma nova intervenção, o Sr. Deputado José Miguel Medeiros.
O Sr. José Miguel Medeiros (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.
Deputados: Queria apenas fazer um remate desta discussão, porque ficou claro, hoje, que o PSD e o CDS não
olham a meios para atingir os fins.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
É que o que estava previsto inicialmente era um requerimento do CDS para que o assunto fosse discutido
na Comissão e o Sr. Ministro disponibilizou-se para estar presente. Depois, o CDS e o PSD cozinharam a
situação, decidiram transformá-la num debate de atualidade e trazer o problema para aqui, pondo esta discussão
no plano em que têm posto sempre, o da querela político-partidária.
Portanto, Sr. Ministro, tem a nossa confiança, continue o trabalho, que é isso que o País espera de si.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a Mesa infringiu uma prática habitual, que é a de deixar a última
intervenção para os partidos que marcaram o debate. Neste caso, tal não aconteceu, mas não foi por
responsabilidade de qualquer secretário da Mesa, foi devido à minha falta de atenção à situação.
Passamos ao segundo ponto da nossa ordem de trabalhos, que consta de declarações políticas.
Para proferir a primeira declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Contra todas as profecias de desgraça,
ameaças de cataclismos, previsões de regresso da troica e de aparições do mafarrico, eis que iniciamos a
segunda metade da XIII Legislatura. Legislatura que, traduzindo na Assembleia da República a vontade
manifestada pelo povo português, na luta e no voto, de afastar o PSD e o CDS do Governo, permitiu dar corpo
a uma solução política para a governação do País que deu início a uma nova fase da vida nacional de reposição
e conquista de direitos por parte dos trabalhadores e do povo em geral.
A solução política encontrada nesta Legislatura tem um enorme significado para a vida democrática
portuguesa, na medida em que representa o desmoronar dos dogmas que marcaram o discurso político e
mediático dominante durante quase quatro décadas no nosso País.
Nesta Legislatura acabou a mentira mil vezes repetida de que as eleições legislativas não seriam mais do
que uma forma de eleição direta do Primeiro-Ministro.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
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O Sr. António Filipe (PCP): — Nesta Legislatura acabou o dogma de que as eleições legislativas se
resumiriam a uma escolha do partido de turno predestinado, no quadro de uma alternância sem alternativas, a
executar as políticas de exploração e de empobrecimento de muitos para o enriquecimento de poucos, de acordo
com o pensamento único ditado pelos interesses do grande capital financeiro.
Nesta Legislatura acabou a famigerada teoria do arco da governação, segundo a qual os partidos à esquerda
do PS não poderiam ter qualquer palavra a dizer quanto à solução governativa para o País, devendo permanecer
remetidos à marginalidade de um sistema político ideologicamente sequestrado por políticas de direita.
Esta Legislatura permitiu demonstrar que não há eleitores de primeira e de segunda e que todos os
Deputados de todos os partidos têm exatamente a mesma legitimidade democrática, a legitimidade que só o
povo português tem poderes para conferir.
O PCP tornou muito claros, desde a noite das eleições legislativas, os seus propósitos para a presente
Legislatura. Manifestou a sua disponibilidade para encontrar uma solução política que, no quadro da nova
correlação de forças da Assembleia da República, correspondesse à vontade manifestada pelo povo português
de afastar o PSD e o CDS da governação do País e afirmou que não desperdiçaria nenhuma oportunidade para
lutar pela defesa, reposição e conquista de direitos dos trabalhadores e do povo português.
Toda a ação do PCP nesta Legislatura tem sido norteada por estes propósitos, sem abdicar de um só dos
seus princípios, sem desistir das suas propostas e sem hesitar em rejeitar as medidas que considere negativas
para o povo e para o País.
É por isso, com total frontalidade, que o PCP considera deplorável que se mantenham convergências do PS
com os partidos de direita em questões estruturantes, relativas à soberania da República e à configuração do
regime democrático, como a legislação laboral, a submissão à NATO e à União Europeia, a ratificação do CETA
(Acordo Económico e Comercial Global) ou o acesso aos chamados metadados por parte dos Serviços de
Informações.
Aplausos do PCP.
E é com a mesma frontalidade e em total coerência que o PCP se congratula com a reposição, nesta
Legislatura, de muitos dos direitos que o Governo PSD/CDS havia roubado ao povo português e que muitos
consideravam perdidos para sempre. A viragem política que se operou com a nova fase da vida política nacional
não foi de mera cosmética. Teve efeitos muito positivos para as condições de vida de largos estratos da
população, particularmente para os menos favorecidos, e teve um impacto comprovadamente positivo para a
evolução económica do País. Mas é também em nome dessa coerência que o PCP afirma que a viragem
verificada fica muito aquém do que seria possível e do que continua a ser necessário.
Sem uma política patriótica e de esquerda, sem romper com a submissão ao euro, sem a renegociação de
uma dívida externa que suga grande parte dos recursos nacionais e sem o controlo público do sistema financeiro
não será possível afastar os constrangimentos que limitam de forma drástica as possibilidades de um
desenvolvimento económico e social sustentado do nosso País e de melhorar, de forma significativa, as
condições de vida dos trabalhadores e do povo.
As malfeitorias impostas pelo Governo PSD/CDS contra os direitos dos trabalhadores continuam por reverter,
designadamente em matéria de contratação coletiva, de regimes de férias, de horários de trabalho e de
reposição de carreiras. Os reformados continuam a não ver reconhecido o seu direito a não serem penalizados
após uma longa vida de trabalho e de contribuições. As freguesias extintas contra a vontade das populações
continuam por repor. Estão por dar passos mais decididos no sentido de garantir direitos fundamentais no acesso
à saúde, à educação, à habitação ou à proteção social.
O PCP não desistiu, não desiste e não desistirá de lutar por estes objetivos. Assim, no primeiro dia da sessão
legislativa que agora se inicia, o PCP reapresentou já, nesta Assembleia, um projeto de resolução que
recomenda a fixação do salário mínimo nacional em 600 € a partir de 1 de janeiro de 2018, projetos de lei que
visam consagrar 25 dias úteis de férias para os trabalhadores do setor público e do setor privado, um projeto de
lei que visa a reposição das freguesias extintas em 2013, de acordo com a vontade expressa pelas respetivas
populações, e um projeto de lei que altera o regime de concurso dos professores, de modo a garantir a
vinculação e a estabilidade da sua vida pessoal e profissional.
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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nas circunstâncias da presente Legislatura, o PCP orgulha-se, justamente,
de contribuir com o seu posicionamento, a sua ação e as suas propostas para melhorar as condições de vida
dos portugueses e defender o interesse nacional. É esse o compromisso e a responsabilidade que o PCP
assume plenamente perante os trabalhadores e o povo: não perder uma única oportunidade que seja para lutar
pela defesa, reposição e conquista de direitos do povo português. É isso que tem feito e é o que continuará a
fazer.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado António Filipe, inscreveram-se quatro Deputados para pedidos de
esclarecimento. Como pretende responder?
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, responderei a grupos de dois pedidos de esclarecimento.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Wanda Guimarães.
A Sr.ª Wanda Guimarães (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, o Partido Socialista
congratula-se com o reconhecimento de que se revestiu esta nova formulação na Assembleia da República e
que, evidentemente, tem como principal protagonista o Partido Socialista. Não podemos, portanto, deixar de nos
regozijarmos com esta declaração pública reconhecendo esta nossa iniciativa.
Relativamente à legislação laboral e a outros aspetos que foram referidos, como o do aumento do salário
mínimo para 600 € já em 2018, quando a concertação social tem um acordo em que os 600 € estão previstos
para 2019, como a questão dos 25 dias de férias para o setor privado e para a Administração Pública e outras
matérias que foram aqui elencadas, devemos dizer que não há surpresas. Ou seja, o Partido Socialista tem,
sobre esta matéria, uma posição perfeitamente clara e defende a concertação social. Estes aspetos fazem parte
da concertação social.
Relativamente a outros aspetos que também aqui foram focados, que têm a ver com a melhoria das
condições de vida e de trabalho dos trabalhadores portugueses, gostaria de dizer que estas são matérias que
não queremos, de facto, sonegar àqueles que têm a primazia da negociação coletiva, que são as organizações
sindicais. Prezamos por demais o contributo e a importância das organizações sindicais neste contexto e é por
isso que não podemos acompanhar a perspetiva que o Partido Comunista tem sobre estas matérias.
O Sr. Deputado elencou também a questão, no âmbito da segurança social, das longas carreiras
contributivas, um aspeto que nos preocupa sobremaneira e em que já estamos, como toda a gente sabe — é
público e notório —, a trabalhar na solução que virá beneficiar muitos. Não há dúvida de que talvez para alguns
não haja benefício muito grande, mas para os que vão ser beneficiados posso garantir-vos que é um enorme
avanço e uma questão de justiça que ninguém, nesta Assembleia, poderá pôr em causa.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.
O Sr. José Cesário (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, confesso que estava à espera de
mais veemência de sua parte, sobretudo depois da declaração situacionista do Sr. Deputado João Vasconcelos,
há pouco, em nome do Bloco de Esquerda, ao considerar factos sem relevo o desastre de Pedrógão ou o assalto
a Tancos.
O Sr. João Vasconcelos (BE): — Não foi isso!
O Sr. José Cesário (PSD): — Estava à espera que V. Ex.ª fosse efetivamente mais longe, porque há, aqui,
um problema grave de consciência que o Partido de Comunista tem de ter. O Partido Comunista Português é
conivente com o Governo em toda a estratégia que tem vindo a ser desenvolvida de perfeito desastre na
organização dos serviços públicos.
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Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. José Cesário (PSD): — Os senhores são coniventes com o Governo quando há portugueses a sofrer
por não terem consultas nos hospitais, por não terem intervenções cirúrgicas.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. José Cesário (PSD): — Há professores colocados em escolas a 300 ou 400 km de sua casa. Há
portugueses a sofrer quando há, por exemplo, serviços de notariado ou conservatórias que não conseguem
responder ou consulados que marcam reuniões com os cidadãos para dali a três ou quatro meses. Isto é
responsabilidade do Governo e é responsabilidade do Partido Comunista Português.
Aplausos do PSD.
O que é que o Partido Comunista Português vai fazer para defender efetivamente os mais frágeis? Quando
é que abandona a sua retórica, repito, também situacionista do Governo? Como é que o Partido Comunista
Português vai concretizar, na prática, a declaração do Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, que considerou
dificilmente repetível o acordo que levou à constituição deste Governo? É isto que está em causa, Sr. Deputado.
Não fuja às questões. Fundamentalmente, assuma as suas responsabilidades em todas as tais malfeitorias do
atual Governo relativamente a largos setores da sociedade portuguesa.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, a Sr.ª Deputada Wanda Guimarães colocou aqui, de facto,
um ponto que nos divide: contestou aqui a possibilidade de se fazer um aumento do salário mínimo nacional
para 600 € em 2018, que consideramos uma medida da mais elementar justiça social e, para além disso,
positiva, não apenas para as condições de vida dos trabalhadores, que passariam a auferir esse salário mínimo,
mas também para a receita fiscal, para a receita da segurança social e para a própria economia nacional. A Sr.ª
Deputada diz que isso tem de ser decidido em concertação social. Se a concertação social não está de acordo
com esta medida — o que não é surpresa, porque o patronato resiste sempre a tudo o que seja aumento salarial
para os trabalhadores —, temos pena, mas o órgão de soberania eleito pelo povo português foi a Assembleia
da República e não a Comissão Permanente de Concertação Social.
Aplausos do PCP.
Tanto assim é que o próprio Governo assumiu compromissos políticos relativos ao salário mínimo nacional
diferentes dos que consideramos justos, independentemente do que sejam as decisões da concertação social.
Portanto, não atire com as responsabilidades para a concertação social, porque o Partido Socialista tem de
assumir também responsabilidades perante o País.
Sr. Deputado José Cesário, ouvimos ontem o presidente do PSD a queixar-se amargamente de que ninguém
reconhecia os méritos que o Governo PSD/CDS teve.
Vozes do PSD: — E não!
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Deputado, já agora, não seja sectário e reconheça também os deméritos.
Protestos do PSD.
O Sr. Deputado fez aqui o levantamento de problemas que existem na sociedade portuguesa, que afetam os
portugueses e que têm de ser resolvidos e melhorados, nomeadamente no acesso à saúde e a um conjunto de
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serviços públicos essenciais, mas, Sr. Deputado, reconheça o estado em que a catastrófica governação
PSD/CDS deixou esses serviços públicos.
Aplausos do PCP.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Não venha dizer que há dois anos estava tudo ótimo e que agora tudo piorou, porque isso não é verdade.
Não seja sectário e reconheça também os deméritos do Governo PSD/CDS.
Já agora, Sr. Deputado, quando o PCP voltar a propor, na Assembleia da República, medidas legislativas
para resolver esses problemas, não vote contra, que é o que o PSD tem feito sistematicamente.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, registo a declaração política
que aqui fez e deixe-me pegar em alguns acontecimentos destes últimos dias para também analisar um pouco
a situação política em que estamos inseridos.
Foi estranho ver o PSD e o CDS nesta tentativa de, quais emplastros, se colocarem numa fotografia para a
qual, claramente, não foram chamados e, pelo contrário, onde nunca poderiam sequer estar.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Essa é boa!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Quando falamos de bons resultados da economia, parece que PSD e
CDS se esqueceram de quando anunciaram ao País que o diabo estava já aí a seguir!
O que tem sido levado por diante é exatamente o contrário do que o PSD e o CDS anunciavam e do que
queriam para o País. Se não, veja-se, quando se decidiu aumentar o salário mínimo nacional, PSD e CDS
diziam: «Não é possível! Não vai ser possível!». O salário mínimo já foi aumentado em 52 € por mês, mas o
PSD e o CDS diziam que não era possível porque a economia não aguentava este ritmo.
Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.
Já ouvimos tantas vezes esta ladainha de que mais direitos aos trabalhadores e mais salário no bolso ao
final do mês eram um ataque à economia. Quando olhamos para a economia a crescer e para o desemprego a
descer percebemos como muito do medo que tinham transposto para a nossa realidade, na prática, era a vossa
ideologia contra as pessoas e contra os trabalhadores, contra quem vive do seu trabalho, que tentavam impor
ao País e não aquilo que era justo, que era a valorização dos salários.
Ainda me lembro, por exemplo, de como o CDS se juntou ao PSD para alertar para um corte de 600 milhões
de euros nas pensões — daqui a pouco o Sr. Deputado Nuno Magalhães poderá explicar como o iriam fazer.
Mas nós conseguimos, de facto, até ter um aumento extraordinário das pensões, algo que PSD e CDS sempre
negaram, e já temos garantido, pelo menos, que as pensões irão aumentar novamente em 2018, não vão ficar
congeladas como CDS e PSD queriam.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Para concluir, Sr. Presidente, pergunto ao Sr. Deputado se esta ladainha
de que os direitos estão sempre contra a economia e que as pessoas devem ser sacrificadas à economia, de
facto, não tem sido desmontada com a realidade. O que temos provado ao longo destes dois anos é que quanto
mais direitos e rendimentos as pessoas têm melhor está a economia. Por isso, pergunto se a conclusão é essa
ou se a resposta não deve ser a de continuar e aprofundar este caminho.
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Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado António Filipe faz aqui uma declaração
política, de resto, a primeira do PCP, como assinalou, nesta Sessão Legislativa, que eu dividiria em duas partes.
Na primeira parte, o Sr. Deputado faz uma análise que, eu diria, corresponde exatamente àquilo que o Sr.
Deputado e o PCP pensam, ou seja, no fundo, está tudo bem, não se passa nada: «Estamos aquém, é verdade,
mas anteriormente é que se estava mal, porque nós agora conseguimos reverter tudo». Até aos 3 minutos,
basicamente, o Sr. Deputado fez o elogio do Governo, o que teria o meu elogio, de resto, porque, pelo menos,
seria uma declaração política sincera e que viria a confirmar que o PCP faz, como faz, parte da atual coligação
que sustenta o atual Governo. Aliás, eu até já tinha escrito a pergunta que iria fazer — então, de que é que se
queixa o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa? —, porque na primeira parte da sua declaração disse que, afinal, o
PCP tinha conseguido grandes vitórias, esquecendo-se até, o que não deixa de ser curioso, de uma tal, que
existiu, chamada «greve de enfermeiros»,…
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Isso!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Isso não interessa nada!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … de um tal Ministro que insultou os enfermeiros, das cativações na
saúde, na educação, dos Comandos Metropolitanos de Lisboa e do Porto, que não têm viaturas por não haver
dinheiro para as consertar, das escolas que ameaçam fechar por terem menos de metade do rácio de auxiliares
e de funcionários.
Pensei que o PCP se iria manter nessa lógica de «não se passa nada!». Mas o Sr. Deputado, às tantas, por
volta dos 4 minutos e 24 ou 26 segundos, pensou: «Bom, não posso dizer só isto, tenho de dizer mais alguma
coisa». Então, o Sr. Deputado veio falar naquilo que o PCP quer já a seguir, calculo eu, no Orçamento do Estado,
que é a criação de 25 dias úteis de férias para todos os trabalhadores, a reposição de todas as freguesias, a
alteração do regime de concursos de professores.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — É candidato aonde?
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — O Sr. Deputado, mais ou menos, a partir dos 4,5 minutos deixou de
ter um registo mais honesto, do ponto de vista político, obviamente, e passou a «geringonçar», se me permite a
expressão.
Perante isto, Sr. Deputado, a minha pergunta é óbvia: se não houver reposição de freguesias…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado, por favor.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, termino já, vou só colocar a minha pergunta.
Se não houver reposição de freguesias, se o regime de professores não for alterado, se não houver 25 dias
de férias para todos os trabalhadores, se não houver o aumento do salário mínimo nacional, como o Sr.
Deputado deseja, o que é que fará? Isto porque, se não fizer nada, é caso para dizer que o PCP passou a ser
só fumaça! E o PCP está muito sereno.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, se o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares não me levar a mal,
começarei por responder à direita, para poder terminar na esquerda…
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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É o chamado «fim em beleza»!
O Sr. António Filipe (PCP): — Exatamente!
O Sr. Deputado Nuno Magalhães respondeu à sua própria pergunta, porque a segunda parte da minha
intervenção, como acabou de dizer, responde às dúvidas que poderiam ser suscitadas pela primeira.
O Sr. Deputado diz que o PCP enunciou aqui uma série de propostas, designadamente o aumento do salário
mínimo, o aumento do número de dias úteis de férias para todos os trabalhadores e outras, e termina com uma
pergunta concreta: o que é que acontece se essas propostas não forem aprovadas? Sr. Deputado, a resposta
é muito simples: o PCP continuará a lutar pela aprovação dessas propostas.
Risos do CDS-PP.
Se o CDS estiver disposto a votá-las favoravelmente dará uma grande ajuda para a sua aprovação, Sr.
Deputado! Portanto, o CDS tem até grande parte da responsabilidade…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ai agora é nossa?!
O Sr. António Filipe (PCP): — … na aprovação dessas propostas. Por isso, convidamos o CDS a concordar
com as propostas do PCP porque isso será um passo significativo para a aprovação das mesmas.
O Sr. João Oliveira (PCP): — O arrependimento é um ato cristão…
O Sr. António Filipe (PCP): — Não apresentamos aqui as nossas propostas à espera que elas sejam
rejeitadas, Sr. Deputado, fazemo-lo seriamente com a convicção de que seria importante para o País que elas
fossem aprovadas. Por isso, lutamos para que elas sejam efetivamente aprovadas, porque consideramos que
isso seria muito bom para o País e para o povo português.
Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, eu começaria por dizer que nós, PCP, como se costuma dizer, não
embandeiramos em arco com as decisões das agências de rating. Criticámos quem em Portugal considerava
que a opinião das agências de rating era o alfa e o ómega para a economia portuguesa e que Portugal tinha de
se submeter àquilo que fosse o diktat dessas agências.
Portanto, como dissemos isso e considerámos absolutamente absurda a classificação da dívida portuguesa
como lixo, também não vamos agora dizer que as agências de rating já são boas, porque, efetivamente, agora
Portugal já não está no nível lixo, segundo a Standard & Poor’s.
Posto isto, há uma coisa que temos de dizer: não valorizamos o facto de a Standard & Poor’s ter considerado
que a dívida pública portuguesa já não estava no nível lixo, porque sabemos que, se houver um novo ataque
especulativo à dívida pública portuguesa, a Standard & Poor’s, na maior das calmas, volta a classificá-la de lixo.
Agora, o mérito que isto tem é o de ter colocado no lixo o discurso político do PSD dos últimos anos.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Isto é que é absolutamente inequívoco!
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Se algo foi colocado no lixo foi o discurso político que o PSD e o CDS têm andado a fazer nos últimos anos.
Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, para terminar esta minha intervenção, queria deixar aqui um apelo ao
apoio à iniciativa que o PCP apresentou relativamente ao aumento do salário mínimo nacional para os 600 € já
em janeiro de 2018. Consideramos que é uma medida da mais elementar justiça social, que seria importante
para os trabalhadores e para a economia nacional e fazemos aqui um apelo para que todas as forças políticas
aceitem este repto…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
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O Sr. António Filipe (PCP): — Concluo de imediato, Sr. Presidente.
Como eu dizia, apelo para que todas as forças políticas aceitem este repto de lutarmos juntos para que os
portugueses possam ter, muito em breve, uma conquista da mais elementar justiça.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quanto melhor estiverem
as pessoas, melhor está o País. Julgo que esta deve ser uma afirmação inequívoca e inabalável.
Deve ser o bem-estar dos cidadãos, da população, a servir de barómetro para a utilidade e a estabilidade
das políticas e não qualquer nota de alguma agência de rating. Acho que todos deveríamos ter isto presente.
É por isso que neste início de sessão legislativa será, porventura, importante relembrar o quão relevante foi
também todo o percurso que até aqui já se fez, e, acrescento em nome de Os Verdes, já muito mais se poderia
ter feito, no sentido da reposição de rendimentos às famílias portuguesas. Era da mais elementar justiça fazê-
lo, mas foi, e está a ser, também da maior utilidade, designadamente para a dinamização da economia do País.
Quem anda na rua e contacta regularmente com o comércio local apercebe-se do balão de oxigénio que essa
retoma do poder de compra das famílias trouxe também para a dinamização do comércio local.
É evidente que temos agora outras lutas pela frente, porque ainda há muito para fazer pelas pessoas no
País. Os Verdes vão, seguramente, no âmbito do próximo Orçamento do Estado, mas não só, lutar,
afincadamente, pelo descongelamento da progressão nas carreiras na Administração Pública, pela maior
progressividade no IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares), pelo combate à precariedade,
designadamente nos professores, na função docente, mas também pela necessidade premente da revisão do
Código do Trabalho.
Vamos lutar, afincadamente, por um maior e mais significativo investimento nas áreas da saúde e da
educação, porque são funções sociais do Estado absolutamente relevantes e que devem merecer uma atenção
muito particular, tendo em conta as machadadas ferozes que foram dadas nestas áreas pelo anterior Governo
PSD/CDS.
Há uma outra área fundamental para Os Verdes: os transportes públicos e a mobilidade dos cidadãos. E aqui
gostaria de me reter um pouco, para desenvolver um pouco mais esta matéria, que me parece absolutamente
crucial.
Neste mês de setembro, as famílias portuguesas estão já a usufruir da proposta, apresentada por Os Verdes
no âmbito do anterior Orçamento do Estado e que foi aprovada, relativa ao desconto no preço do passe social
sub23 para os estudantes universitários. É fundamental, disseram Os Verdes, e a vida demonstrou essa razão,
e as pessoas estão hoje a poder usufruir desse desconto no passe social, que é fundamental para a motivação
na utilização do transporte coletivo pelos jovens portugueses.
Fomentar o transporte público é determinante, mas há um que é absolutamente crucial, que é o transporte
ferroviário. Hoje, deparamo-nos com o fenómeno das alterações climáticas e acho que já todas as pessoas
perceberam que não é para brincar, é mesmo para levar a sério. Ou nós entendemos, de facto, que o trabalho
para a mitigação do aquecimento global é determinante ou, então, sofreremos maiores consequências dos
extremos climáticos.
Ora, a área dos transportes e da mobilidade coletiva é determinante para diminuir as emissões de gases com
efeito de estufa, mas o transporte ferroviário é aquele que está em melhores condições de dar uma resposta
mais eficaz.
Pergunta-se, então: por que é que no nosso País esta matéria não é prioritária? Por que é que no nosso País
não se investe, conveniente e adequadamente, nos transportes públicos ferroviários? Nós precisamos — e Os
Verdes reiteram esta reivindicação — de um plano ferroviário nacional, que crie e determine uma estratégia para
o investimento ferroviário no País. Nós precisamos do transporte ferroviário como fonte de resposta às
assimetrias regionais do interior. Os Verdes batalharam tanto pela reposição do transporte de passageiros na
Linha do Leste que conseguiram o transporte diário de passageiros, mas é preciso mais! Beja, capital de distrito,
não tem essa ligação ferroviária direta.
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O transporte ferroviário é determinante não só na ótica do combate às assimetrias regionais mas também
nas grandes áreas metropolitanas. Como é possível, em pleno século XXI, termos, por exemplo, a linha
ferroviária de Cascais absolutamente obsoleta, se a compararmos com a demais rede ferroviária nacional? O
PSD e o CDS queriam privatizá-la, nós dissemos: «Não!». Mas é preciso mais, é preciso investimento público
nesta matéria e o aproveitamento de fundos comunitários para esta reabilitação. Esta linha tem uma corrente
elétrica incompatível com a demais rede ferroviária e, por isso, esse facto inibe ou dificulta muito o investimento
na renovação do material circulante, provoca várias avarias e dificulta a resposta que é fundamental dar aos
cidadãos.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Jorge Lacão.
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr.ª Deputada, por favor.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino já, Sr. Presidente.
Sr.as e Srs. Deputados, temos muito trabalho para levar adiante. Os Verdes, o seu Grupo Parlamentar, cá
estão para erguer as suas mãos, o seu trabalho, justamente por essas boas causas, porque o seu barómetro é
o bem-estar das pessoas.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, a Mesa regista cinco pedidos de esclarecimento. Como
pretende responder?
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, responderei no fim, conjuntamente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Muito bem, assim faremos.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Testa.
O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Sr. Presidente, antes de mais, quero felicitar a Sr.ª Deputada Heloísa
Apolónia, reconhecendo nas suas palavras o nosso trabalho e o resultado da nossa ação no Governo de
Portugal.
Este País tem registado, nos últimos tempos, nos ainda curtos meses de Governo, uma assinalável
transformação, em termos de ação governativa, na abordagem à área dos transportes. Aliás, a Sr.ª Deputada,
nas suas palavras, recorda precisamente o que vinha sendo abordado na Agenda para a Década, documento
inspirador desta governação do Partido Socialista, do seu programa eleitoral e do Programa do Governo em
funções.
O transporte ferroviário não tem só um impacto positivo e significativo em termos ambientais. O transporte
ferroviário tem também impacto positivo em termos de coesão territorial. Por isso, é e tem sido uma prioridade
para o Grupo Parlamentar do Partido Socialista no que respeita aos investimentos assinalados por este Governo
e muito mais se fará nos próximos tempos — assim contribuam Os Verdes e os demais grupos parlamentares
para tal — para que possamos lograr uma negociação dos próximos quadros comunitários a favor do transporte
ferroviário, porque só assim conseguiremos dar resposta efetiva a essa necessidade do País.
Nós estamos apostados nisso, muito apostados nisso. Não quero, na minha região, um comboio semanal
que só leva pessoas da minha região e nunca traz riqueza. Não quero que o País ande a duas, a três ou a quatro
velocidades. Há uma resposta para isso, em termos de transportes, e ela só é dada pelo transporte ferroviário.
Brincar com as palavras e com as ações, como alguns brincaram, ao longo de quatro anos — durante quatro
anos jogaram com os meros instrumentos orçamentais e de ação política — foi brincar com os portugueses.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Não estamos disponíveis para que isso continue assim e, por isso,
precisamos que todos, em conjunto, possamos encontrar respostas para este problema efetivo do País.
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa
Silva.
O Sr. António Costa Silva (PSD): — Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, este tema é, de facto, muito
importante para Portugal, mas eu pergunto, de imediato, à Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia e a todos os partidos
que suportam esta governação, o que é que, em termos práticos, tivemos nos últimos dois anos no que respeita
a investimento ferroviário. Deveria perguntar: afinal, de que é que se queixam, quando no nosso País tivemos
zero em termos de investimento público ferroviário?! Quando falamos de transportes, tivemos nada! E os
senhores não se queixam?! Quando nós apresentamos projetos de resolução, como foi o caso concreto das três
paragens da linha de comboio Sines/Caia, os senhores, todos, chumbam-nos em conjunto e, depois, vêm falar
de descarbonização! É isso que os senhores querem?! É isso que nos vêm propor?!
Então, descarbonizar não é tirar os camiões, por exemplo, da zona dos mármores e colocar o mármore no
comboio, transportando-o desta forma mais competitiva para o Porto?! Isto não é descarbonizar?! E os senhores
chumbam os projetos de resolução?!
Gostaríamos de perceber qual é, afinal, o papel, aqui, na Assembleia, de Os Verdes no meio de toda esta
história.
Sr.ª Deputada, permita-me que lhe faça um conjunto de perguntas, porque há uns temas que são, de facto,
muito importantes.
Nesta semana, na quarta-feira, iremos apresentar na Assembleia da República um projeto de resolução
referente a um conjunto de investimentos ferroviários, mas também rodoviários e no metropolitano, que são
muito importantes para Portugal e nós estamos curiosos para ver qual será a expectativa de todos,
nomeadamente de Os Verdes, em relação a esses investimentos. Até agora, nem comboio, nem linha, nem
nada!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Nada!
O Sr. António Costa Silva (PSD): — São só conversas, em todo o lado!
Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.
Pergunto: quando vamos ter o início das obras para a modernização e a eletrificação da linha Porto/Setúbal
até às praias do Sado? Para quando as linhas internacionais de Poceirão/Lisboa e de Setúbal/Sines/Caia? Para
quando a modernização da Linha do Norte, da Linha do Oeste, da Linha de Cascais? Para quando? Há dois
anos que estão no Governo e ainda não há nada!
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!
O Sr. António Costa Silva (PSD): — Temos alguma expectativa em relação a uma resposta. É agora? — é
a pergunta que lhe faço.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, eu estava tentado a dizer
que concordo com quase todo o caderno de reivindicação que V. Ex.ª fez dali, da tribuna, mas fico na expectativa
redobrada de saber qual será o sentido de voto do Partido Ecologista «Os Verdes» na próxima quarta-feira,
quando votarmos projetos de resolução do CDS-PP onde muitas dessas obras estão plasmadas. E não há lá
nada de novo, apenas um conjunto de obras que merece um consenso alargado nesta Câmara.
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Muitos dos projetos de resolução apresentados, quer pelo Partido Comunista Português quer pelo Bloco de
Esquerda, recaem sobre muitas matérias em concreto, desde logo, o Metro do Mondego, a Linha de Cascais,
entre outras, e, portanto, a Sr.ª Deputada não disse nada de novo.
Acho que esta sessão legislativa começa bem, começa, para já, com o Partido Comunista Português e o
Partido Ecologista «Os Verdes», numa encenação, a piar de fininho, a piar baixinho. Não sei se é por causa das
eleições autárquicas…
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Deve ser! Deve ser!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … ou se é para darem sinais de que as negociações para o Orçamento
do Estado estão a correr mal. Por que é que digo isto? Digo-o porque, Sr.ª Deputada, é muito pouco, é
poucochinho, vir apenas enunciar aquilo que todos nós desejamos e sabemos.
A Sr.ª Deputada diz que é preciso mais investimento público. Sabe qual foi o ministério onde houve mais
cativações, 361 milhões de euros? Foi no Ministério do Planeamento e das Infraestruturas. O que é que a Sr.ª
Deputada andou a fazer quando este Governo parou, adiou e anulou tudo o que era obra, até de manutenção,
na ferrovia e na rodovia?
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Então, a Sr.ª Deputada assobiava para o lado?! A Sr.ª Deputada fazia
apenas declarações de intenção?! A Sr.ª Deputada, aquando do Orçamento, não aprovou uma regra que
permitiu essas cativações?! Alguma vez se assistiu a uma degradação dos serviços de transportes, como se
assiste agora?
Protestos do PCP.
A Sr.ª Deputada diz: «Bom, agora é que é!». Quando diz «agora é que é», o que a Sr.ª Deputada está a fazer
é reconhecer que o anterior Governo resolveu o problema, começou a devolução de rendimentos e permitiu que
os resultados bons da economia tenham mais a ver com a ação do Governo anterior do que propriamente com
a ação deste Governo. Este Governo, pura e simplesmente, parou, adiou, e, por isso, a Sr.ª Deputada diz que
temos de trabalhar mais, que temos de investir mais, agora é que começa tudo, o que quer dizer que, de facto,
se há alguma melhoria na economia e na vida dos portugueses, o mérito é do anterior Governo e não deste.
Mas ainda vai a tempo, Sr.ª Deputada. Se quiser olhar com calma e serenidade para o projeto de resolução, a
bancada do Partido Ecologista «Os Verdes», juntamente com a do PSD e a do CDS, ainda vai a tempo para,
juntos, conseguirmos convencer o Partido Socialista a cumprir as promessas que ele próprio fez relativamente
ao eixo norte, ao eixo sul, à Linha de Cascais, à Linha do Oeste, à Linha do Vouga… Ou seja, a Ferrovia 2020
que está calendarizada e foi apresentada pelo Partido Socialista mas que, como sempre, da promessa à
conclusão vai uma enorme diferença. Prometem muito, mas fazem pouco!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Carlos Matias.
O Sr. Carlos Matias (BE): — Sr. Presidente, antes de mais, cumprimento a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia
pelas temáticas que nos trouxe, em particular, pelo tema da ferrovia, do caminho-de-ferro.
Com efeito, o caminho-de-ferro tem um papel importantíssimo no combate às alterações climáticas, pelas
características do próprio modo de transporte. Tem também um papel importantíssimo na correção das
desigualdades territoriais e, em particular, na promoção dos territórios do interior. Ora, neste aspeto, diga-se, a
direita tem uma «folha de serviços» muito manchada pelo encerramento de linhas, de ramais e estações, pelo
que não pode vir agora aqui, de um momento para o outro, «rasgar as vestes» por aquilo que não está a ser
feito.
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Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Carlos Matias (BE): — Mas há um aspeto muito particular que gostaria que a Sr.ª Deputada Heloísa
Apolónia tivesse desenvolvido mais — pareceu-me que o iria fazer, mas, porventura, não o terá feito por falta
de tempo —, que é o papel que o transporte ferroviário tem na promoção da indústria metalomecânica pesada
ferroviária, a qual é absolutamente fundamental para garantir a segurança desse modo de transporte.
É que se é verdade que a segurança é importante em todos os modos de transporte, mais ainda o é num
modo de transporte tão pesado e tão importante.
Portanto, o que quero perguntar é se acha que é compaginável manter a segurança do transporte ferroviário
com uma política que tem sido seguida, ao longo de anos e anos, de desinvestimento na indústria ferroviária,
em particular na EMEF (Empresa de Manutenção de Equipamento Ferroviário) e em várias empresas
especialmente bem qualificadas para garantir a manutenção, a remodelação e a construção de comboios, em
qualidade e em segurança.
Gostaria de saber qual é a opinião da Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia sobre esse aspeto. E ainda se acha
ou não importante haver um forte investimento público na indústria metalomecânica pesada, associada ao
transporte ferroviário, porque, do ponto de vista do Bloco de Esquerda, o mesmo é absolutamente essencial
para criar emprego, para a segurança, para o desenvolvimento do País e para garantir uma ferrovia moderna e
adequada às exigências do nosso País.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, em primeiro lugar, quero
saudá-la pela declaração política que aqui nos trouxe nos vários elementos que referiu e, em particular, pelo
enfoque que deu às matérias relacionadas com o transporte e as infraestruturas e com a necessidade de
investimento nesses mesmos transportes e nessas mesmas infraestruturas como um elemento estratégico, não
só para o desenvolvimento do País mas também para a coesão territorial e, em particular, para o investimento
que é necessário realizar no interior do País, para fixar população, para desenvolver a economia nacional e,
assim, garantir o desenvolvimento do País e a melhoria das condições de vida dos portugueses.
Estas matérias são elementos centrais no debate político e têm de estar presentes quando discutimos as
perspetivas de futuro e o caminho que temos de fazer para termos um País mais desenvolvido.
E essas matérias, em particular, em relação à questão dos transportes — não apenas do transporte
ferroviário mas, sobretudo, do transporte ferroviário —, têm de ser necessariamente consideradas naqueles dois
aspetos que a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia referiu: por um lado, precisamos de ter empresas públicas que
garantam a prestação de um serviço público com qualidade e que contribua efetivamente, não apenas no plano
do transporte de mercadorias mas também no plano do transporte de passageiros, para a satisfação das
necessidades das populações e para a garantia do desenvolvimento do País; e, por outro lado, precisamos de
ter, no plano das infraestruturas, o investimento necessário para dotar o País da rede de infraestruturas,
nomeadamente para o transporte ferroviário, necessária a esses objetivos.
Esses dois aspetos que a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia referiu na sua declaração política são, de facto,
centrais. E é extraordinário o que ouvimos dos Deputados do PSD e do CDS — e, em particular do Sr. Deputado
Costa Silva, ainda por cima eleito pelo círculo eleitoral de Évora, no Alentejo —, com o passado que tiveram, de
arrasar todos os projetos de investimento público, alguns dos quais o Sr. Deputado aqui referiu, em particular.
De facto, o Sr. Deputado Costa Silva lembrou-se hoje de falar na ligação ferroviária Sines/Caia, mas esteve
quatro anos no Governo e nunca teve sequer a preocupação de ver que o projeto em causa para essa ligação
cortava a cidade de Évora, deixando um terço separado do resto, com mais de 50 comboios por dia a passarem
a 10 metros das janelas das pessoas. Hoje, faz aqui este discurso compungido, de preocupação com o
investimento na Linha Sines/Caia. É caso para dizer, Sr. Deputado: haja topete!
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr. Deputado.
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O Sr. João Oliveira (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
A questão é que o investimento público, quer nas empresas públicas de transportes quer nas infraestruturas,
é decisivo para resolver muitos dos problemas com que já hoje as populações estão confrontadas, não apenas
com a situação de degradação a que chegou o metropolitano ou a Linha de Cascais, mas também com o
transporte ferroviário, muitas vezes, pura e simplesmente, liquidado em tantas regiões do País. O exemplo do
Metro Mondego e do fracasso que significa aquele projeto face à linha ferroviária que servia os interesses das
populações e que deixou de existir é apenas um dos exemplos.
Queria perguntar-lhe, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, para além dos exemplos que identificou, qual é a
perspetiva que o Partido Ecologista «Os Verdes» tem relativamente à necessidade do investimento público já
no próximo ano, e aproveitando os fundos comunitários para resolver muitos destes problemas concretos,
integrado numa estratégia de desenvolvimento nacional onde o transporte ferroviário possa ser, de facto, um
elemento central e estratégico.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Foi-lhe concedida muita tolerância pela Mesa, Sr. Deputado João
Oliveira.
Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço-lhes todas as
considerações e questões que me colocaram.
Quero dizer que, para Os Verdes, é absolutamente fulcral colocar no centro da agenda política a matéria do
transporte ferroviário, da mobilidade ferroviária. Não apenas por razões de coesão territorial (mas também, pois
é razão muito forte), não apenas por matérias ambientais e de mitigação das alterações climáticas (mas também,
pois é razão muito forte), mas por todo um outro conjunto de circunstâncias, algumas das quais aqui focadas
por outros Srs. Deputados.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Exatamente!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Mas — e deixe-me lembrar-lhe, Sr. Deputado Hélder Amaral — até
por razões turísticas e de dinamização económica das localidades. E é talvez com uma lágrima no olho — do
Sr. Deputado, eventualmente — que hoje podemos falar da Linha do Tua, Sr. Deputado, uma daquelas que os
senhores arrancaram e destruíram e, com isso, a potencialidade de uma região para a sua dinamização
económica e turística.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
É verdade que o Sr. Deputado António Costa Silva deveria ter um pouquinho mais de pudor ao vir aqui falar
da Linha Sines/Caia.
Protestos do PSD.
É que os senhores não sabem ouvir as populações, nem têm qualquer interesse nos impactos dos vossos
projetos nas populações e naquilo que poderia acontecer, como o Sr. Deputado João Oliveira aqui referiu, à
cidade de Évora. Não quiseram saber de absolutamente nada, porque a vossa arrogância também passou pelo
setor ferroviário e, designadamente — já agora, deixe-me dizer —, pelo desinvestimento brutal que fizeram,
durante os vossos quatro anos de governação, na matéria da ferrovia.
O Sr. Deputado veio agora falar da Linha do Oeste. No entanto, não falaram, porque têm vergonha, mas
poderíamos falar, da questão da ligação direta à capital por via de Beja. Poderíamos aqui falar da questão da
passagem do Alfa, que deixou de passar, em Setúbal, na capital do distrito; poderíamos falar de tantas linhas
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fulcrais, que poderiam garantir a mobilidade concreta das populações e potenciar o desenvolvimento económico
dessas regiões. Mas os senhores nada fizeram — pior, desinvestiram!
Protestos do PSD.
Mas o que acho graça — sem ter graça nenhuma, evidentemente — é o Sr. Deputado Hélder Amaral chegar
aqui e dizer: «Para os senhores, agora é que é!». Agora é que é?!
O Sr. António Costa Silva (PSD): — Passaram dois anos!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Para os senhores, agora é que é! Os senhores estão na oposição,
agora não vos custa reivindicar! Mas, quando lá estiveram, durante dois anos, dois anos…
Protestos do PSD.
E vou fazer-lhe uma pergunta, Sr. Deputado, bastando acenar-me que «sim» ou «não» com a cabeça que já
fico satisfeita: considera uma questão menor a luta que Os Verdes empreenderam para a reposição do
transporte de passageiros na Linha do Leste?
Pausa.
Não responde! Sr. Presidente, não responde. Não quer responder. Acha que é politicamente irrelevante para
a população de Portalegre, do distrito de Portalegre? Não responde, só aponta o dedo!
Não acha que é fundamental termos liquidado a vossa intenção de privatização da Linha de Sintra ou da
Linha de Cascais?
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
Não acha?! Queria uma linha ferroviária numa lógica…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Como dizia, o Sr. Deputado queria uma linha ferroviária numa lógica de não serviço às populações, mas de
defesa de grandes interesses económicos. Foi sempre essa a vossa lógica, Sr. Deputado. Nunca se
preocuparam com as populações, nunca se preocuparam com o equilíbrio territorial!
Olhem, Srs. Deputados, nesta matéria, acho que não têm mesmo legitimidade para falar!
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tendo o PSD e o CDS-PP abdicado de proferir declarações políticas
hoje, em função do debate de atualidade que teve lugar no primeiro ponto, passamos a uma declaração política
por parte do Sr. Deputado Porfírio Silva.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Neste ano letivo teremos, no ensino
superior público, mais 10% de estudantes do que no ano passado.
Na primeira fase do concurso nacional, tivemos o maior número de candidatos desde 2009, os colocados em
primeira opção no ensino politécnico aumentam 16% e os colocados em regiões de menor densidade
demográfica aumentam 13%.
Voltamos a acreditar que estudar vale a pena, deixando para trás a triste narrativa dos que propalavam que
temos graduados a mais.
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Aplausos do PS.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Diga lá quem foi!
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Na ação social escolar, entrou em funcionamento a renovação automática das
bolsas: menos burocracia e bolsas pagas atempadamente. É um avanço importante, depois de, no ano passado,
termos tido o maior número de bolsas atribuídas desde 2010.
Aplausos do PS.
Fruto de iniciativa legislativa do PS, a partir deste ano, todos os estudantes de licenciatura e mestrado
integrado poderão pagar as suas propinas em pelo menos sete prestações, ou num esquema mais flexível,
sendo que as propinas só poderão ser cobradas aos beneficiários de bolsas quando estas já tenham sido
efetivamente pagas. E entrará este ano em vigor o novo sistema de bolsas de estudo para estudantes do ensino
superior com incapacidade igual ou superior a 60%.
Conhecemos recentemente resultados do Inquérito ao Potencial Científico e Tecnológico Nacional (IPCTN).
Os números mostram que, enquanto a diminuição do investimento público em Investigação e Desenvolvimento
(I&D) arrasta uma quebra ainda maior do investimento privado, como aconteceu na Legislatura anterior, o
aumento do investimento público em I&D arrasta um aumento ainda maior do investimento privado, como
mostram os dados relativos a 2016.
Aplausos do PS.
Regista-se também um reforço dos recursos humanos em Ciência e Tecnologia (C&T), com a permilagem
de investigadores da população ativa a subir de 7,4, em 2015, para 7,9, em 2016.
Olhemos agora para os outros níveis de ensino. O País continua a avançar no pré-escolar: em dois anos
letivos, abrem mais de 170 novas salas e, no fim da Legislatura, quando comemorarmos os 10 anos do
alargamento da escolaridade obrigatória para o 12.º ano, teremos universalizado a oferta do pré-escolar aos 3
anos. Estes são dois marcos relevantes, em que o Partido Socialista deixa a sua marca.
Aplausos do PS.
O País continua a avançar na educação de adultos. Com a abertura concretizada de 42 novos Centros
Qualifica, cumpre-se a meta de 300 centros a funcionar em 2017.
Foi retomado o investimento no edificado. Há obras de reabilitação e de modernização a decorrer por todo o
País.
Continuamos a investir nos recursos humanos. Em dois anos letivos, no passado e neste, teremos um reforço
de mais de 2000 assistentes operacionais nas escolas e no próximo ano letivo mais 500.
Aplausos do PS.
Trata-se de melhorar, em muito, o apoio aos alunos com necessidades educativas especiais e o apoio, no
pré-escolar, com um assistente por sala.
Pela primeira vez, este ano, foi autorizada a renovação dos contratos de técnicos especializados, que já
estavam nas escolas, ou com psicólogos ou terapeutas da fala ou intérpretes de língua gestual portuguesa. Mais
de 1500 que, assim, estão a tempo e horas, onde fazem falta.
Aplausos do PS.
Continuamos a valorizar os professores. Os planos de formação contínua dos centros de formação dos
agrupamentos estão todos a avançar, porque sabemos bem que os professores são essenciais para o sucesso
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educativo e confiamos no seu trabalho, enquanto na governação anterior quem queria formação tinha de a pagar
do seu próprio bolso.
Aplausos do PS.
Só este ano, vincularam mais de 3400 professores — a maior vinculação de sempre num só momento. É um
passo importante no combate à precariedade.
A 6 de setembro estavam colocados todos os professores que tinham sido pedidos pelas escolas. É um sinal
importante de prontidão do sistema.
Continua a ser reforçada a ação social escolar, que volta a apoiar as visitas de estudo, que alargou ao 3.º
escalão o apoio na compra de manuais, que alargou o serviço de refeições nas pausas letivas e que, a partir
deste ano, entregará manuais gratuitos a todos os alunos do 1.º ciclo.
Aplausos do PS.
Continuamos a valorizar as escolas e a sua autonomia. Está a avançar o projeto de autonomia e flexibilidade
curricular, com a adesão voluntária de mais de 200 escolas, públicas e privadas, dando mais espaço às escolas
e aos professores para promoverem melhores aprendizagens.
Continua o reforço da rede do ensino profissional.
Continua o programa de promoção do sucesso escolar para que todos, e não apenas alguns, possam
aprender mais e melhor.
Aplausos do PS.
Também na educação muito há ainda por fazer, sabemos disso. Mas o muito que está a ser feito é claramente
mobilizador das melhores energias de professores, alunos e famílias.
Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista assumiu, nesta Câmara,
o compromisso de aguardar pela conclusão dos trabalhos do Conselho Nacional de Educação sobre a avaliação
da Lei de Bases do Sistema Educativo nos seus 30 anos de vigência e, a partir daí, contribuir para que a
Assembleia da República adote uma metodologia para um diálogo sistemático e aberto à sociedade sobre as
perspetivas de atualização da Lei de Bases.
A durabilidade da primeira Lei de Bases assentou na profundidade e na largueza do debate que a construiu.
Não podemos esquecer esse ensinamento e, sem tirar uma vírgula aos méritos políticos da atual maioria
parlamentar de esquerda plural, é preciso afirmar que uma nova lei de bases do sistema educativo não deveria
ser fruto apenas da estrita maioria parlamentar de cada momento.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Termino já, Sr. Presidente.
Outros já tiveram essa tentação. O PSD e o CDS já tiveram essa tentação.
Protestos de Deputados do PSD.
Mas o PS entende que, uma vez que a educação pulsa mais ao ritmo das gerações do que ao dos anos
letivos, devemos trabalhar para alargar as convergências produtivas que sejamos capazes de construir.
Assim, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentará proximamente as suas propostas para uma
metodologia que abra a Assembleia da República a um diálogo plural e alargado acerca dos desafios a que há
de responder uma nova lei de bases do sistema educativo, sendo certo que, para os socialistas, também em
matéria educativa,…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem mesmo de concluir, Sr. Deputado.
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O Sr. Porfírio Silva (PS): — … a linha de rumo passa sempre por melhor cumprir e honrar a Constituição da
República Portuguesa, promovendo uma efetiva igualdade de oportunidades no acesso e no sucesso educativo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado Porfírio Silva, inscreveram-se quatro Srs. Deputados para
pedir esclarecimentos. Como deseja responder?
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Globalmente, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Nesse caso, para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Nilza de Sena.
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — Sr. Presidente, cumprimento o Sr. Deputado Porfírio Silva por ter trazido o
tema da educação a esta sessão plenária.
Vejo, desde logo, a sua manifestação de agrado e de satisfação do Partido Socialista com o estado da
educação, com o estado do ensino em Portugal. Não o ouvi, nesta sua intervenção de mais de 7 minutos, falar
do atual drama que vivem milhares de professores do quadro, subitamente desterrados e ultrapassados por uma
decisão imponderada, por uma decisão injusta,…
O Sr. José Cesário (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — … por uma decisão que até é de legalidade duvidosa por parte da tutela, que
alterou um concurso sem aviso prévio, sem sensibilidade para pessoas que vão estar a mais de 200 ou 250 km
de casa. Não ouvi uma palavra, Sr. Deputado!
Também não ouvi uma palavra em relação a algo que o PSD repetiu e repetiu ao longo de todo o ano transato
e que volta a ser um problema neste ano. Não esquecemos que, neste ano letivo, para os mais de 3000
assistentes operacionais em falta para garantir aquilo que é exigido para o bom funcionamento das nossas
escolas, a resposta foi muito curta: 300 efetivos, Sr. Deputado.
Protestos de Deputados do PS.
Serão mais! Aliás, o que os senhores fizeram foi adiar a portaria dos rácios publicada tardiamente. Para quê?
Para deliberadamente a tutela, por razões meramente financeiras, fazer uma política de comunicação a dizer
que vão pôr muitos assistentes operacionais, que só chegarão muito tarde às escolas, Sr. Deputado. É isto que
o Partido Socialista tem a dizer de positivo sobre o ano letivo, sobre o arranque deste ano?
Sr. Deputado, isto seriam coisas para fazer corar as pedras da calçada! As escolas, verdadeiramente,
funcionaram mal no ano anterior, vão continuar a funcionar mal neste ano, houve escolas que fecharam com
protestos públicos de pais e demais comunidade educativa e, portanto, Sr. Deputado, vir dizer que há 3000
assistentes operacionais nas escolas só pode ser para rir, porque vão repetir o mesmo número do ano passado.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — Sr. Deputado Porfírio Silva, quero dizer-lhe que a insensibilidade continua e
que seria bom que pudessem, pelo menos, atingir os resultados que atingimos no anterior Governo,…
Risos de Deputados do PS.
… porque, de facto, tínhamos 3000 assistentes operacionais em 2015.
Era isso já suficiente, era isso já bom, e nem isso os senhores conseguiram cumprir até agora.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana
Mortágua.
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, começo por cumprimentar as Sr.as e os Srs. Deputados e o
Sr. Deputado Porfírio Silva por ter trazido tantas questões relevantes para o debate sobre a educação no nosso
País.
O Bloco de Esquerda não tem dúvida de que a escola pública está hoje um pouco mais próxima daquilo que
desejaríamos e daquilo por que lutamos do que estava quando o PSD e o CDS estavam no governo a tentar
destruí-la. Temos consciência de que há hoje mais professores e professoras nas escolas do que havia antes.
Temos consciência de que esta portaria permite que haja também mais assistentes operacionais, mais
trabalhadores do que aqueles que existem hoje e que resultam da portaria que o PSD e o CDS deixaram como
herança às escolas. Teremos de confrontar essa portaria com a realidade diária das escolas para saber se ela
é suficiente ou se será necessário um novo reforço de assistentes operacionais.
Estamos a meio da Legislatura, é verdade, e chegamos aqui com uma folga orçamental importante. O Bloco
de Esquerda tem dito, e vem reafirmar aqui, que aquilo por que é preciso disputar neste Orçamento do Estado
é a garantia de que não falta, nem faltará, dinheiro para a educação, sobretudo no momento em que o País tem
esta folga orçamental tão relevante.
Aquilo que pergunto, Sr. Deputado Porfírio Silva, é se não acha que já é tempo de conseguirmos conquistas
tão importantes como a diminuição do número de alunos por turma. Já não é tempo de conseguirmos conquistas
tão importantes como a vinculação de mais de 10 000 professores precários, em relação aos quais o Bloco de
Esquerda está a fazer tudo para que possam ter processos de vinculação extraordinária a partir deste Orçamento
do Estado?
O Sr. Luís Monteiro (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Pergunto-lhe se também não é importante conseguir que os alunos deixem
de ter aulas em contentores, como é o caso da escola do Monte de Caparica, em Almada, tendo em conta que
a portaria está assinada pelo Ministério da Educação e que só falta a assinatura do Ministro das Finanças.
Pergunto-lhe se o PS acompanha a ideia de que estas prioridades têm de começar a ser resolvidas neste
Orçamento do Estado, já a partir do mês de outubro.
Mas, Sr. Deputado, para além de saber se nos acompanha nestas prioridades de investimento na escola
pública, que continua a ser tão necessário, também não quero deixar de abordar a questão que levantou sobre
a Lei de Bases do Sistema Educativo. O Bloco de Esquerda só está disponível para alterações, sobretudo nesta
matéria, que aprofundem a democracia dentro da escola pública, e isso começa pela alteração do modelo de
gestão.
O Sr. Luís Monteiro (BE): — Muito bem!
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Preocupa-nos muito que o Sr. Deputado do PS venha fazer algum tipo de
apelo a partidos que, num passado bem recente, fizeram propostas de alteração à Lei de Bases do Sistema
Educativo para introduzir negócios privados e escolas privadas com pagamentos públicos na Lei de Bases do
Sistema Educativo.
Portanto, receamos que, ao tentar apelar à direita para que contribua neste desafio, o PS esteja à espera do
comboio na paragem do autocarro. Aquilo que queremos saber é se vamos ter a companhia do Partido Socialista
nas alterações que são tão necessárias para a democratização da escola pública.
O Sr. Luís Monteiro (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Se for por aí que querem aprofundar a Lei de Bases, então, muito bem,
podem contar com o Bloco de Esquerda.
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Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita
Bessa.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, é muito bom poder começar
esta Sessão Legislativa a dar os parabéns, não necessariamente ao PS e à sua política, mas aos 45 000 alunos
que entraram na 1.ª fase do ensino superior. Aliás, este é um número que marca uma tendência positiva que se
regista já desde 2014 e, portanto, é um trabalho continuado ao longo de vários governos.
Estes bons resultados são explicados, desde logo, pelo trabalho dos próprios alunos, dos seus professores
do ensino não superior e das próprias instituições do ensino superior, que têm vindo a adequar as suas ofertas.
Se é certo que a recuperação económica tem um papel nestes resultados, também é certo que há um
conjunto de políticas setoriais que trazem a este lugar de hoje: o alargamento da escolaridade obrigatória, a
criação dos cursos técnicos superiores profissionais, os CTESP, da responsabilidade do Governo anterior e que
este ano registaram 6000 inscritos nos politécnicos e, de fundo, uma aposta num ensino obrigatório exigente e
com ênfase em disciplinas estruturantes como o Português, a Matemática e as Ciências Fundamentais.
Este é o trabalho que é posto em causa quando, ao contrário do que o Sr. Deputado Porfírio Silva aqui diz,
o ano letivo arranca com uma flexibilização curricular que foi anunciada em agosto, sem consulta pública, para
ser aplicada em turmas que os alunos desconhecem se incluem a sua ou se a do colega do lado, com escolas
fechadas por falta de funcionários, com erros grosseiros do Ministério da Educação que põem em causa a
colocação e a vida de centenas de professores, com carências no pré-escolar, com a ausência da redução do
número de alunos por turma e com obras em escolas que foram anunciadas mas que nunca chegaram a
acontecer.
Sr. Deputado Porfírio Silva, não é só preciso anunciar, é preciso fazer, e estamos a meio da Legislatura, se
calhar já seria altura de começar a mostrar algum trabalho. Assim, Sr. Deputado, se é tudo como descreve,
pergunto se está em condições de dizer à Sr.ª Diretora da Escola Secundária Rainha Dona Amélia, que ameaça
fechar portas no dia 25 deste mês, que destes 1500 funcionários só cinco — que são aqueles de que ela precisa
para cumprir o rácio — serão colocados nas escolas antes deste dia.
Pergunto-lhe também se está em condições de garantir ao Sr. Diretor do Liceu Camões que as obras que
foram prometidas vão ser realizadas ou à população da Quinta do Conde que a nova escola vai ser atribuída.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Pergunto-lhe também se está em condições de dizer às cerca de 700
crianças de 4 anos que não tiveram lugar no pré-escolar que, afinal, o ensino pré-escolar está universalizado e
que são elas que, seguramente, estão enganadas.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Deputado Porfírio Silva, é mesmo preciso começar a fazer e não
basta continuar ad aeternum a anunciar, inclusivamente no próprio Orçamento do Estado.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para o último pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Ana Mesquita.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, começo por cumprimentar as Sr.as e os Srs. Deputados e
agradecer ao Sr. Deputado Porfírio Silva o tema que nos trouxe hoje.
Os desafios para o presente ano letivo são mais do que muitos e há muito ainda a fazer para reverter o rumo
de destruição da escola pública que foi prosseguido por sucessivos governos, designadamente pelo último
Governo, PSD/CDS.
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Nós, PCP, dizemos que é necessário chegar mais longe.
Gostaríamos de perceber o que é que o Partido Socialista tem a dizer sobre a proposta do PCP para o
alargamento da gratuitidade dos manuais escolares até alcançarmos a escolaridade obrigatória, neste caso já
aos 2.º e 3.º ciclos, aquando do Orçamento do Estado para 2018.
Em relação aos assistentes operacionais, assinalamos a concretização da revisão da portaria dos rácios,
conforme a proposta do PCP, no Orçamento do Estado para 2017. Fizemos muita força para que isto
acontecesse, mas ficamos ainda com muitas preocupações em relação a esta matéria, nomeadamente com a
manutenção da possibilidade de escolas com menos de 21 alunos ficarem ainda sem qualquer assistente
operacional — e perguntamos como pode uma escola funcionar nestas condições — e também com o facto de
apenas haver uma aplicação plena desta proposta de revisão dos rácios, que foi agora apresentada pelo
Governo, no próximo ano letivo.
Relativamente ao ensino superior, não podemos deixar de manifestar também algumas preocupações. Por
um lado, a relação entre o aumento do número de estudantes colocados no ensino superior e o contexto de
recuperação de rendimentos, que o PCP considera ainda tímida e insuficiente, diz-nos algo muito relevante:
existem muitos estudantes que ao longo dos anos ficaram fora do ensino superior, de facto, por razões de
insuficiência económica, por não terem dinheiro para aceder aos mais altos níveis de educação e para o
cumprimento de um direito constitucional.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — É preciso fazer algo em relação a isto.
É preciso fazer algo também em relação à situação de subfinanciamento crónico das instituições de ensino
superior, como tem vindo a ser denunciado, nomeadamente, até, por declarações do reitor da Universidade da
Beira Interior, que, de facto, no diz que há algo que tem de ser alterado profundamente na Lei do Financiamento
do Ensino Superior.
Por fim — concluo, Sr. Presidente —, relativamente à Lei de Bases do Sistema Educativo, Sr. Deputado
Porfírio Silva, apenas com uma questão: fala-se agora de fazer uma alteração eventual, mas para quando a
concretização plena da Lei de Bases do Sistema Educativo?
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Porfírio Silva.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, quero agradecer às Sr.as Deputadas Nilza de Sena, Joana
Mortágua, Ana Rita Bessa e Ana Mesquita pelas questões que me colocaram, às quais vou procurar responder
o melhor que sei.
Sr.ª Deputada Nilza de Sena, a desfaçatez em política deveria ter, apesar de tudo, alguns limites.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Os Srs. Deputados querem evitar que eu responda à Sr.ª Deputada? Parece-me que sim!
Protestos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Deputada Nilza de Sena falou, no que diz respeito aos concursos de professores, do drama de milhares
de professores do quadro, da alteração do concurso e de ilegalidades. Nada disso é verdade! Repito: nada disso
é verdade! Não houve nenhuma alteração do concurso, não houve nenhuma ilegalidade e não há nada que se
pareça com milhares de professores nessa circunstância. Aquilo que, de facto, aconteceu é que há regras que
têm uma justificação que, pelos vistos, o PSD não compreende.
A vinculação extraordinária de professores é para colocar os professores onde o sistema precisa e estava lá
uma regra: qualquer professor vinculado tem de ficar, pelo menos, um ano na vaga onde se vincula, porque foi
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para lá para preencher uma necessidade. Pelos vistos, há pessoas que assinam abaixo-assinados a protestar
contra essa regra embora tenham concorrido a um concurso onde essa regra era explícita. Também é verdade…
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — Não diga isso!
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Digo, Sr.ª Deputada, digo! Porque não me escondo na demagogia política e falo
com os professores, tal como falei na Comissão de Educação e fora dela.
Aplausos do PS.
Além disso, Sr.ª Deputada, é preciso ter muito descaramento, depois daquilo que os senhores fizeram aos
professores durante a vossa governação, para vir agora chorar «lágrimas de crocodilo».
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr.ª Deputada, apesar de algumas estratégias que os professores utilizam
legitimamente para procurar melhorar e progredir na sua carreira terem resultado mal — por exemplo,
professores que assinalaram 100, 150, 160 preferências num concurso, em alguns casos, deu mau resultado —
, apesar disso e porque compreendemos e queremos corrigir as situações, o Ministério anunciou que vai haver
um concurso extra para que esses, só se quiserem, possam, no próximo ano, tentar corrigir essa situação e
depois, daqui a quatro anos, acertar no concurso geral.
Portanto, estamos conscientes do que se está a passar, não fazemos demagogia nem esquecemos o
passado, como os senhores esquecem as suas próprias responsabilidades e aquilo que fizeram nos anos
anteriores.
Aplausos do PS.
Quanto aos assistentes operacionais, este Governo, além de ter contratado a sério os assistentes que os
senhores tinham nas escolas, na maior parte dos casos em precariedade, no ano passado…
A Sr.ª Nilza de Sena (PSD): — E este ano?
O Sr. Porfírio Silva (PS): — … deixou contratar mais 300 assistentes operacionais e para este ano, antes
de começar o ano letivo, já fez o mesmo…
Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.
… para mais 250. Perguntar-me-ão se chega. Não! Tanto que não chega — e nós sabemos que não chega
— que já foram autorizados concursos para mais 1500 este ano. E sabemos que é preciso continuar, pelo que
vão ser autorizados mais 500 no próximo ano. Temos consciência de que ainda não atravessámos a ponte toda,
mas temos consciência disso, coisa que os senhores não tiveram e, pelos vistos, continuam a mostrá-lo, ainda
não têm.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Muito bem!
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Quanto ao resto, Sr.as Deputadas…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Atenção ao tempo, Sr. Deputado.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, termino rapidamente.
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Quanto à Lei de Bases do Sistema Educativo, é claro que queremos aprofundar o caráter democrático e
constitucional da lei de bases e não é para voltar para trás que aceitamos esse debate, é para avançar. Mas
esperemos que a direita seja capaz de compreender isso.
Quanto à folga orçamental — isto tem sido dito com toda a clareza, o próprio Primeiro-Ministro já o disse —,
sabemos que não podemos fazer tudo num Orçamento, nem em dois, nem em três, se calhar não podemos
fazer tudo numa Legislatura, mas estamos a avançar e avançaremos o mais que pudermos porque o caminho
é este.
Os Srs. e as Sr.as Deputadas reconhecem que o caminho é este, que estamos a ir na direção certa e é para
isso que trabalhamos. Sabemos que o vosso contributo também tem sido positivo para esse caminho, sabemos
disso e, portanto, podemos todos continuar a fazê-lo, porque o caminho é este e o rumo…
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Faça o favor de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Vou já terminar, Sr. Presidente.
Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, só quem não sabe a gravidade do desinvestimento que os senhores fizeram
no mandato passado, só quem não sabe como os senhores travaram as obras nas escolas, só quem não sabe
a forma como os senhores atacaram a pedagogia nas escolas, só quem não sabe disso é que pensa que se
podia corrigir tudo num ano ou em dois.
Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, tome consciência de que os senhores, que escolheram a educação para
cortar centenas de milhões de euros…
Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.
… a mais do que previa o Memorando de Entendimento, cavaram uma ferida muito dura na escola pública
e, portanto, isto sim, vai demorar mais tempo a corrigir, mas vamos corrigir…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, tem de terminar.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — … e ou os senhores percebem isso ou ficam para trás. Não fiquem,
acompanhem, venham connosco, mas entrem a sério, não entrem com esquecimento, não entrem com falta de
memória, não entrem a tentar apagar o que fizeram na última Legislatura.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Nem sempre é fácil gerir os tempos disponíveis.
Para uma declaração política pelo Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Costa.
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ao longo dos anos, os acionistas
privados da EDP levaram para casa os superlucros cobrados na mais elevada fatura elétrica da Europa.
Sobre os acordos à esquerda, tem sido possível concretizar algumas medidas para começar a corrigir esta
situação, mas, nos últimos dias, uma série de notícias fizeram luz sobre alguns erros colossais cometidos pelo
anterior Governo, o tal que prometeu reduzir as rendas excessivas instaladas no sistema elétrico e que acabou
por agravá-las ainda mais.
Pela calada, no final do seu mandato, os responsáveis do Governo PSD e CDS pelo setor da energia
produziram uma rajada de diplomas que, discretamente, todos somados asseguraram que os consumidores
ficariam obrigados a pagar às empresas elétricas centenas de milhões de euros anuais sob a forma de subsídios
e compensações de vária ordem.
Todos os anos os consumidores já pagam hoje mais de 1200 milhões de euros de subsídio, valor acima do
preço de mercado, pela eletricidade de fonte eólica, solar e de cogeração, mas as decisões do Governo anterior
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levaram a um injustificável aumento deste sobrecusto para os consumidores. Foi esse o caso de três diplomas
noticiados nos últimos dias.
O primeiro diploma permitia que licenças de produção em mini-hídrica, atribuídas através de concurso,
pudessem, por vontade das empresas, ser transformadas em centrais solares com produção a preços
subsidiados. O Bloco lançou o alerta e, após parecer da Procuradoria-Geral da República, o Secretário de
Estado da Energia anulou esse despacho, manifestamente ilegal.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Estavam em causa cerca de 80 milhões de euros em sobrecusto adicional
ao longo de 15 anos.
O segundo diploma é um decreto-lei de 2014, em que o Governo da direita permitia que as centrais eólicas
aumentassem a sua capacidade de produção com atualizações tecnológicas e pudessem cobrar, por esta
produção acrescida, os mesmos preços subsidiados pagos pela potência originalmente instalada. Só no ano
passado este decreto da direita custou aos consumidores mais 50 milhões de euros em sobrecustos, sendo
agora revogado pelo Governo.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — O terceiro diploma é um despacho, agora também anulado, que foi
publicado na sexta-feira antes das eleições de 2015 e que autorizava as elétricas a cobrar aos consumidores
na fatura os seus custos com a tarifa social e com a contribuição extraordinária sobre o setor elétrico. Lê-se e
não se acredita!…
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Uma vergonha!
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Não é que as leis que instituem a tarifa social e a CESE (Contribuição
Extraordinária sobre o Sector Energético) proíbem explicitamente essa repercussão sobre os consumidores?!
Mas sob a passividade do regulador, essa cobrança foi mesmo feita nos últimos anos. Agora, a devolução aos
consumidores desta cobrança indevida pode representar, em 2018, um alívio das faturas na ordem dos 100
milhões de euros.
Ficam ainda por esclarecer, e impõe-se esse esclarecimento integral, os contornos de uma outra decisão,
tão pesada para os consumidores, tomada pelo Governo anterior de forma tão flagrantemente ilegal.
Depois destas notícias, muitos terão ficado de boca aberta perante tamanhos favores. Saibam que ainda há
outras taludas milionárias que o Governo fez sair aos do costume e que esses negócios ainda estão por corrigir
e até por esclarecer plenamente. É o caso do prolongamento dos contratos subsidiados na produção eólica,
uma decisão tomada na contramão da tendência europeia, que elimina antecipadamente os regimes
subsidiados.
Essa extensão dos subsídios ao longo dos próximos anos foi proposta às empresas em troca de um
pagamento à cabeça. As empresas fizeram as contas e não houve uma que recusasse a extensão do subsídio.
O negócio acabou por funcionar como uma espécie de empréstimo ruinoso para a parte pública, um sobrecusto
adicional na casa de várias centenas de milhões de euros a pagar ao longo dos próximos anos.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Uma vergonha!
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — O regulador e o Governo devem dar a conhecer aos consumidores todos
os detalhes de mais este negócio lesivo feito pelo Governo anterior e devem ser divulgados os seus efeitos
sobre a fatura ao longo dos próximos anos.
Aplausos do BE.
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Sr.as e Srs. Deputados: A EDP não se conforma com a mudança do ciclo político nem com algumas decisões
de defesa do interesse público tomadas pela maioria no Parlamento e pelo Governo. Reage num surto de
litigância judicial e numa ofensiva de propaganda, alegando que existe e está em curso uma guerra contra a
EDP.
Só em 2017 a EDP já interpôs três ações judiciais contra o Estado, uma delas diretamente contra a pessoa
do atual Secretário de Estado. Ora, na sequência da constituição como arguidos dos principais administradores
da EDP, a atenção pública às rendas excessivas pagas desde 2007 a título de subsídios CMEC (Custos de
Manutenção do Equilíbrio Contratual), levou a uma generalizada exigência de rigor e de correção políticas e a
EDP deixou de parecer intocável.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — É cada vez mais flagrante que os lucros astronómicos do setor elétrico
assentam em más políticas e na promiscuidade com o poder. Ora, nos próximos tempos é de esperar um reforço
da propaganda e mais queixas do setor sobre a perseguição e sobre a má vontade do poder político. Não é de
esperar outra coisa, até porque estamos nas vésperas da revisão dos CMEC, com vista à definição da
remuneração futura das centrais cobertas por este regime. Esse acerto de contas deverá recuperar a favor dos
consumidores o que foi cobrado excessivamente ao longo de 10 anos. Deve ser obedecida a decisão do
Parlamento que, com a única abstenção do PSD, apelou à eliminação, no futuro, das rendas excessivas no setor
elétrico.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Enquanto Portugal for o paraíso do «rentismo» no setor elétrico, vamos
continuar a ser recordistas nos preços, recordistas na pobreza energética e recordistas na mortalidade sazonal.
E os anúncios de políticas sustentáveis de transição para as renováveis ou de eficiência não passarão de
publicidade enganosa.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — No processo de revisão dos CMEC, e em geral no combate às rendas
excessivas no setor elétrico, as expectativas sobre a atuação do Governo aumentam com as decisões corretas
que vêm sendo tomadas nesta área.
Se for posto cobro a este escândalo poderemos, finalmente, verificar nos preços da eletricidade em Portugal
o início de uma redução sensível, urgente como ela é num país onde a pobreza energética faz vítimas todos os
anos.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Estão inscritos quatro Srs. Deputados para formularem perguntas ao Sr.
Deputado Jorge Costa, que entretanto informou a Mesa que irá responder em conjuntos de duas.
Em primeiro lugar, por ordem de inscrição, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pereira, do Partido Socialista.
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Jorge Costa, antes de
mais agradeço-lhe ter trazido este tema tão relevante para o País, até porque a energia e as respetivas políticas
públicas relacionadas com a energia tornaram-se, no nosso ponto de vista, no grande exemplo que prova que
o País está diferente e está a olhar para as pessoas, a olhar para os cidadãos e para os consumidores. Este é,
de facto, um exemplo disso e um exemplo de que este Governo está a fazer diferente.
Aliás, sobre esta matéria, este Governo tem ultrapassado obstáculos atrás de obstáculos. O Sr. Deputado
referiu vários desses obstáculos na sua intervenção e eu diria mais: são armadilhas atrás de armadilhas que
têm, obviamente, dificultado o objetivo deste Governo e dos grupos parlamentares que o sustentam — olhar
para o consumidor e baixar os custos da energia.
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Por isso, podemos dizer de forma muito clara que, do nosso ponto de vista — e julgo que grande parte dos
que aqui estão concordarão — há uma linha que separa claramente a atuação deste Governo da atuação do
Governo do PSD/CDS no que diz respeito à energia: enquanto o que animava o Governo do PSD/CDS era
assegurar todas as condições — condições extramercado, diga-se em abono da verdade — para que as
companhias garantissem rendimentos elevados, o que anima o Governo do Partido Socialista, apoiado pelo
PCP, pelo Bloco de Esquerda e por Os Verdes, é assegurar todas as condições para acabar com os abusos
que foram aqui descritos pelo Sr. Deputado Jorge Costa, por um lado, mas também para acabar com as rendas
excessivas, que é, obviamente, um problema que tem penalizado os cidadãos e os consumidores.
Portanto, Caros Deputados, estamos perante um tempo novo,…
Protestos do PSD.
… um tempo em que quem determina os caminhos da gestão energética é o Governo e não as companhias,
que influenciam o Governo para determinar outros caminhos para a gestão energética. Este é, de facto, um
tempo novo, um tempo que os consumidores e o País agradecem e que faz as pessoas ficarem melhor, que é
esse o objetivo da política e dos governos.
Termino, Sr. Deputado, fazendo uma pergunta concreta: perante este contexto difícil que acabámos de
referir, de armadilhas atrás de armadilhas, de obstáculos atrás de obstáculos e até de intimidação ao Governo
por parte de algumas companhias, é ou não importante que o Governo prossiga e aprofunde as políticas que
defendem a transparência do setor, para além das muitas medidas que têm sido implementadas no próprio
Orçamento do Estado, e não só, e também a redução dos custos energéticos, custe a quem custar?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, do PCP.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Jorge Costa, é da maior
importância a discussão e a denúncia das práticas que têm vindo a ser seguidas por sucessivos governos — e
sublinho sucessivos governos —, porque, até hoje, ainda estão para aparecer todas as faturas de despachos,
decisões e quejandos, que, ao longo dos anos, foram sendo assumidos por responsáveis políticos.
No essencial, aquilo que o Sr. Deputado mencionou na sua declaração política foi o centro da nossa denúncia
e da nossa referência na recente reunião da Comissão de Economia, com o Sr. Ministro da Economia e o Sr.
Secretário de Estado da Energia, em que colocámos o destaque em situações como esta e noutras que são, no
mínimo, incompreensíveis e inexplicáveis e, nalguns casos, autênticos escândalos nacionais, como aqueles que
gostaria de acrescentar ao rol que aqui trouxe.
Começo pela situação que está plasmada na Portaria n.º 85-A/2013 — teoricamente para baixar a taxa de
juro a pagar pela parcela fixa dos CMEC —, em que se refere, logo no artigo 1.º: «A presente portaria aprova,
em conformidade com os pressupostos e a metodologia constantes da proposta apresentada pela EDP —
Gestão da Produção de Energia, S.A., a taxa nominal…» e continua. Ou seja, tal como tivemos ocasião de dizer
na altura, na governação anterior não tivemos governação por outsourcing, mas antes a privatização do
Governo, porque uma portaria em Diário da República aceitava como bons, sem perguntar nada a ninguém, os
pressupostos e a metodologia constantes da proposta apresentada pela EDP. E foi assim que a taxa ficou
definida em Diário da República.
Já em governos anteriores, tivemos concessões — como o caso da concessão de barragens à EDP, EDP
companhia —, em que uma avaliação pela própria REN de um valor de concessão de 1,6 mil milhões de euros
por 20 anos se saldou, afinal, numa concessão em que a EDP pagou 759 milhões de euros: Isto significa que,
no mínimo, o Estado foi defraudado em cerca de 840 milhões.
Estamos a falar de milhões, de centenas de milhões, de milhares de milhões de euros, mas tendo em conta
aquilo de que falamos, em relação aos resultados da EDP, dá vontade de dizer como dizia o operário da peça
de Bertolt Brecht: «eis o remendo. / Mas onde está / o nosso casaco?».
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, ultrapassou o seu tempo.
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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.
E onde é que está o casaco? É caso para dizer que é um guarda-fato acumulado nos lucros e nos resultados
da EDP e do setor energético ao longo dos anos, o que coloca em cima da mesa a questão central do controlo
público, da gestão pública e do domínio central de um setor estratégico que deve estar ao serviço do povo e do
País para não estarmos aqui a discutir remendos, quando o casaco e o guarda-fato estão a ser completamente
usufruídos e acumulados ao longo destes anos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral,
do CDS.
Pausa.
O Sr. Deputado Jorge Costa pretende responder às duas primeiras perguntas e depois às restantes.
Nesse caso, e com um pedido de desculpas, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Costa.
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados Carlos Pereira, do PS, e Bruno Dias, do
PCP, começo por agradecer as perguntas. Temos, de facto, um choque flagrante entre as promessas do
Governo anterior, quanto às rendas da energia, e aquilo que foi a sua prática.
Poderíamos ficar um dia inteiro a falar dos negócios que a privatização da EDP instituiu como regra no setor
e de que os sucessivos governos — como bem disse o Sr. Deputado Bruno Dias — foram fazendo prática, mas
há um aspeto que queria aqui sublinhar a propósito da questão da transparência levantada pelo Sr. Deputado
Carlos Pereira, que é, precisamente, a repercussão dos custos da CESE e da tarifa social na fatura dos
consumidores.
Este é um elemento verdadeiramente assombroso da política do anterior Governo, que pegou no dinheiro
que a lei definia que deveria ser entregue pelas companhias para financiar o desconto dos que mais precisam
e distribuiu esse encargo pelo conjunto dos consumidores, para aliviar a EDP e manter os seus lucros
exatamente intocados. Mas o que mais espanta é que uma norma tão flagrantemente ilegal, um despacho tão
em choque com a legislação em vigor possa ter passado entre os pingos da chuva do regulador.
Portanto, fica aqui evidente a insuficiência da regulação para assegurar os mínimos de transparência neste
setor. Além disso, este caso ensina-nos ainda que há necessidade de a democracia, de o Parlamento e de o
Governo, em nome do interesse público e da contenção dos custos energéticos que fazem parte do Programa
do Governo aqui aprovado, numa ação conjugada, poderem ter os resultados que, nítida e flagrantemente, a
regulação não conseguiu ter ao longo dos anos.
Concordo com o Sr. Deputado Bruno Dias quanto à exigência do controlo público do setor, não apenas por
razões de transparência, mas também por razões de interesse estratégico nacional, que importa assegurar.
Portanto, a lógica da privatização, se significa uma degradação dessa posição estratégica, só poderia ter as
consequências que veio a ter em matéria de transparência.
Mas hoje está nas mãos de todos, e não apenas dos que defendem o controlo público do setor energético,
assegurar as condições de eliminação das rendas excessivas que se instalaram no setor. O PSD foi o único
partido que decidiu abster-se nesse desígnio, quando foi aqui apresentado, pelo que é importante que os
restantes partidos que estão empenhados na eliminação das rendas excessivas, ou que se declaram
empenhados nessa eliminação, consigam, já no processo dos CMEC, na revisão dessas rendas e na sua
eliminação, apresentar resultados e fazer baixar a fatura.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Agora, sim, tem a palavra o Sr. Deputado Hélder Amaral.
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O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Jorge Costa, quero
felicitá-lo pelo tema que aqui traz, porque permite fazer luz sobre o debate das rendas excessivas e, nesta
matéria, a minha bancada não recebe lições de nenhuma outra.
Não tenho aqui comigo, mas posso fazer-lhe chegar, um conjunto de iniciativas do Bloco de Esquerda para
reduzir o IVA da eletricidade para 6%. Agora que os Srs. Deputados aprovam orçamentos, apoiam o Governo,
estão no Governo, queria perguntar-lhe qual é o IVA da eletricidade.
Podemos todos perceber o que vai no discurso e nas iniciativas apresentadas neste Parlamento e o que, na
realidade, acontece na fatura dos consumidores.
Posso dar-lhe outro exemplo: os senhores criaram ou, melhor, não criaram, a tarifa social é criada pelo
anterior Governo, mas os senhores revisitaram o processo, introduziram alterações que o melhoraram e dizem
que os consumidores não vão pagar absolutamente nada dessa tarifa social.
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Pode dizer criar, porque foi, materialmente, criar!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — A minha pergunta é muito simples: o senhor garante, aqui, que isso não
está a acontecer? Tem a garantia de que isso não está a acontecer? É para ver até que ponto vai a competência
e a eficácia do Governo que V. Ex.ª apoia!
Quero dizer-lhe também que há défice tarifário e, mais uma vez, o défice tarifário, que pesa na fatura da
eletricidade dos consumidores, tem um pai, que se chama Partido Socialista. Foi o Partido Socialista que criou
o défice tarifário, que aumentou garantias de potência, CMEC e CAE (Contratos de Aquisição de Energia) em
TIR (taxas internas de rentabilidade) que hoje precisam de ser revistas e que são consideradas excessivas.
Não basta o Sr. Deputado vir aqui, como veio o Sr. Secretário de Estado, dizer que há rendas excessivas. O
único Governo que alguma vez teve instrumentos legislativos que, em concreto, cortaram rendas excessivas,
foi o Governo anterior. O senhor diz que foi pouco, foi tarde, foi da forma errada, que o instrumento legislativo
não era o adequado,…
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Foi treta!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — … mas a minha pergunta é a seguinte, Sr. Deputado: qual é o instrumento
legislativo que tem para a redução dos CMEC, para os CAE, para a garantia de potência, para a cogeração?
O senhor disse: «agora é que vai ser, vamos agora rever os CMEC». O senhor sabe que os critérios de
revisão que a ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos) utiliza são dados pela EDP e pela REN
(Rede Elétrica Nacional)? O senhor tem algum instrumento para alterar essa realidade ou vai só criticar a
existência dessa realidade?
O que o senhor quer disfarçar — percebo-o bem! — é aquela borla fiscal, que é a única coisa que há de
concreto.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — É o tal casaco que ficou no armário da EDP. É a borla fiscal de 174
milhões que foi aprovada para a EDP com o seu voto, com o seu silêncio.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Ah, isso é o casaco?! Isso nem para os botões de punho!…
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Pedro Nuno Santos): — Está a falar de outra
coisa! Está a desviar!
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Isso, sim, é um negócio ruinoso para os cofres do Estado. Isso, sim, é o
equivalente ao empréstimo com 15% de juros e como o Sr. Deputado, lá no fundo, lá no fundo tem alguma
vergonha, sendo condicionado com esta borla fiscal, vem aqui disfarçar com outras matérias, sem nenhum dado
em concreto.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — O dado em concreto é: existe ou não uma borla fiscal dada à EDP, que
anula tudo o que o Governo anterior fez?
Portanto, Sr. Deputado, assuma essa responsabilidade, tenha a coragem de fazer alguma coisa sobre isso
e não venha fazer de conta que está a promover ou proteger os consumidores quando, no fundo, no fundo, o
que se está a proteger é a EDP.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Leite Ramos,
do PSD.
O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, quero começar por saudar o
Deputado Jorge Costa por esta intervenção muito pertinente sobre energia. Aliás, tal como o Deputado Hélder
Amaral, quando o ouvi falar sobre energia, pensei que ia pedir desculpa ao País pela borla fiscal dos 170 e tal
milhões de euros que deram à EDP. Mas não!
Aplausos do PSD.
O Sr. Deputado resolveu cavalgar a onda do anúncio mentiroso, porque é disto que se trata, Sr. Deputado.
O anúncio que o Sr. Secretário de Estado fez — mais não foi do que um anúncio, porque ainda não tomou a
decisão — é um anúncio mentiroso, porque tenta, em nome de uma pretensa ilegalidade de pagamento da tarifa
social por parte dos contribuintes, dizer que os consumidores estão a custear a tarifa social.
O que é que se passa exatamente? O que o Sr. Secretário de Estado vem dizer é completamente diferente,
embora o anúncio contradiga o que ele diz. Ele vem dizer que, em termos de diferencial fiscal, entre Portugal e
Espanha, onde as empresas em questão estão a atuar, há um acerto de contas que está estabelecido pela lei,
que está no acordo do Mercado Ibérico de Eletricidade, que faz parte das próprias diretivas comunitárias porque
a dupla tributação é impossível. Escondendo tudo isto, o Sr. Secretário de Estado lança uma cortina de fumo,
organiza uma espécie de expediente para entreter as pessoas e para justificar a inoperância, a falta de
competência e, sobretudo, a incapacidade para continuar a política do anterior Governo para fazer reformas
estruturais e fazer cortes nas rendas criadas pelos Governos do Partido Socialista.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Muito bem!
O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Compreendo bem que o Deputado Carlos Pereira não queira agora falar
das rendas nem das políticas do Engenheiro Sócrates, que, aliás, regista que está completamente abandonado
pelo Partido Socialista. Portanto, entendo essa decisão ou essa formulação como se tivessem esquecido
completamente o que fizeram no passado, mas quem criou tarifas bonificadas,…
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Quem foi?
O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — … quem criou rendas na energia foram os senhores, que não têm pejo
nem decoro quando vêm criticar os outros por o terem feito.
Aplausos do PSD.
O único Governo que cortou rendas na energia foi o Governo do PSD/CDS. O resto é conversa e não vale a
pena estarmos aqui a discutir aquilo que, na verdade, não é mais do que um expediente politiqueiro para
esconder o fracasso das políticas do próprio Governo, em matéria de energia.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
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O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Este é um expediente para esconder, sobretudo, aquilo que os senhores fizeram, a borla fiscal que deram à
EDP. Quando acordaram, ficaram com vergonha de o terem feito e portanto, agora, têm de mostrar um
pseudocombate contra as grandes empresas, quando, na prática, o que os senhores estão a fazer é esconder
o erro que cometeram.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado: o seu partido concorda que se acabe com o Mercado Ibérico da Eletricidade? O
que está em causa, nesta decisão do Sr. Secretário de Estado, é romper com essas regras, é romper com o que
está estabelecido nesse contrato e, portanto, deitar por terra todo o trabalho feito nos últimos anos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Costa.
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, o CDS vem responder a tudo menos ao
assunto que estava em cima da mesa. Fala de IVA, diz que o BE defende a EDP e até nos acusa de uma borla
fiscal.
Sr. Deputado, o CDS e o PSD é que incluíram no seu programa eleitoral a eliminação da contribuição
extraordinária sobre o setor energético.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — Os senhores é que queriam dar — e puseram no vosso programa — uma
enorme borla fiscal e já antes do exercício do mandato estavam a fazer essa batota.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Não fomos nós!
O Sr. Jorge Duarte Costa (BE): — O impressionante é que se possa ter feito um despacho a imputar aos
consumidores — colocando na fatura os custos da CESE e da tarifa social — o pagamento do que a lei
estabelece como obrigação da EDP. Essa foi a vossa política no despacho que agora está em apreço. E não se
diga que o MIBEL (Mercado Ibérico da Eletricidade) vai ruir por se remover uma semelhante aberração. Não é
por se retirar um despacho que é incompatível com a lei que o sistema elétrico português vai ser removido do
mercado ibérico.
Srs. Deputados, não tergiversem, não mudem de assunto. Estamos a discutir decisões opacas e no limiar do
escândalo tomadas pelo Governo do PSD e do CDS.
Protestos do CDS-PP.
Percebo o incómodo. Ainda têm na memória aqueles célebres despachos assinados no último dia ou durante
os governos de gestão de que fizeram parte! Este é mais um! Não gostam de ouvir mas é isso que vem a público
e é isso que escandaliza as pessoas. É que a EDP teve no Governo de direita, que anunciou cortes nas rendas,
o seu melhor amigo e o resultado em rendas foi zero ou, melhor, foi menos do que zero, pois resultou em mais
carga sobre os consumidores, os consumidores ficaram a pagar mais.
Sobre a garantia de potência, sobre o subsídio de interruptibilidade, sobre todas essas matérias, têm vindo
a ser tomadas medidas que já começaram a dar um resultado visível nas faturas. Trata-se de um resultado
modesto, certamente, mas foi o menor aumento das faturas em 10 anos.
Durante os vossos governos, os consumidores pagavam mais 3% ao ano nas faturas e foi a isso que se
habituaram até ao ano passado verem o menor aumento da década, fruto do início desta política. E é preciso
continuar, é preciso remover da legislação e do normativo o que os senhores lá puseram e os buracos que
abriram para que a EDP e as outras elétricas pudessem continuar a exercer o seu «rentismo» sem limite.
Portanto, é preciso enfrentar o processo dos CMEC com autoridade política, tendo objetivos claros e
garantindo que aquilo que foi cobrado a mais ao longo dos anos, que está identificado como um sobrecusto
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abusivo pago pelos consumidores — 2500 milhões de euros, diz a ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços
Energéticos) —, seja devolvido e, para a frente, este subsídio deve ser simplesmente eliminado.
Este é o mandato que o Parlamento deu ao Governo, este é o mandato em relação ao qual o Governo tem
de responder perante o País e esperamos que o resultado da revisão dos CMEC venha a permitir, pela primeira
vez em mais de uma década, reduzir a fatura elétrica em Portugal.
Somos o País que paga a fatura elétrica mais alta da Europa e temos recordes tristes do ponto de vista da
pobreza energética e da mortalidade sazonal resultante dessa pobreza energética.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. JorgeDuarteCosta (BE): — Essa realidade só se agravou ao longo dos mandatos da direita e é essa
herança negra, que resulta do exercício da vossa política e da dos governos anteriores, que estamos a tratar de
corrigir e vamos com muita determinação — e da parte do Bloco de Esquerda podem ter a certeza disso — atrás
desses resultados.
Aplausos do BE.
O Sr. HélderAmaral (CDS-PP): — Tem alguma portaria para apresentar?
Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente Ferro Rodrigues.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos dar início ao debate conjunto da proposta de resolução n.º
49/XIII (2.ª) — Aprova o Acordo Económico e Comercial Global entre o Canadá, por um lado, e a União Europeia
e os seus Estados-membros, por outro, assinado em Bruxelas, em 30 de outubro de 2016, e dos projetos de
resolução n.os 930/XIII (2.ª) — Pela rejeição do CETA — Acordo Económico e Comercial Global entre a União
Europeia e o Canadá (Os Verdes), 1050/XIII (2.ª) — Rejeita a aprovação para ratificação do Acordo Económico
e Comercial Global (CETA) entre a União Europeia e o Canadá (PCP), 1052/XIII (2.ª) — Pela rejeição do Acordo
Económico e Comercial Global — CETA (União Europeia-Canadá) (BE) e 1053/XIII (2.) — Pela rejeição do
Acordo Global de Economia e Comércio entre a União Europeia e o Canadá (CETA) (PAN).
Para apresentar a proposta de resolução, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus,
a quem aproveito para dar as boas-vindas a este Plenário.
A Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus (Ana Paula Zacarias): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs.
Deputados: Para mim, é uma honra estar pela primeira vez neste Hemiciclo, sobretudo para vos propor a
aprovação do Acordo Económico e Comercial Global entre a União Europeia e o Canadá.
O CETA é o mais moderno e o mais abrangente dos múltiplos acordos de que Portugal é signatário.
Trata-se, neste caso, de um Acordo com um parceiro com quem partilhamos seguramente interesses
comerciais, que são complementares, mas também uma história baseada em valores, interesses comuns e um
compromisso compartido com o desenvolvimento sustentável e com altos padrões ambientais, de segurança
alimentar e de defesa do consumidor.
Desta forma, procura-se regular o comércio internacional e dar, assim, um contributo importante para a
regulação da globalização.
Como já foi dito aqui várias vezes, pensamos que este acordo trará para a União Europeia e para Portugal
oportunidades económicas importantes na área dos bens e dos serviços, dos fluxos de investimento, da criação
de emprego e no reconhecimento de qualificações profissionais.
Ao longo das negociações, Portugal pugnou pelos seus interesses de maneira a garantir, entre muitas outras
coisas, a proteção dos direitos de propriedade intelectual e o reconhecimento de 20 indicações geográficas
portuguesas.
O CETA preserva igualmente o direito de regular da União Europeia. A União não abdicou da prerrogativa
de adotar normas mais exigentes no futuro e de gerir, de forma mais adequada, os serviços públicos.
O CETA consagra um novo modelo de tribunal de investimento bilateral, que, é certo, não sendo perfeito, dá
maior segurança jurídica às partes pela designação dos juízes nomeados pelos Estados-parte do acordo.
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Reconhecemos que o acompanhamento do processo negocial pelo Parlamento Europeu e pelos parlamentos
nacionais constituiu um mecanismo importante para assegurar a transparência nas negociações e dar resposta
às legítimas preocupações de alguns setores económicos e políticos.
Ao longo do processo, foram feitas várias audições parlamentares, responderam-se a muitos pedidos de
esclarecimento apresentados pelos Srs. Deputados e pela sociedade civil, realizaram-se numerosas
conferências e, em resposta a uma resolução desta Assembleia, tiveram lugar três grandes debates, um em
Lisboa, outro em Leça da Palmeira e ainda outro em Leiria, um dos quais com a presença da Comissária
Europeia para o Comércio.
Sabemos que, nesta matéria, sempre persistiram pontos de vista diversos, mas cremos que muitas das
preocupações foram atendidas e clarificadas.
Será, contudo, importante continuar a acompanhar de perto a implementação deste acordo com mecanismos
de monitorização e ações de informação e promoção que permitam às empresas, sobretudo às PME (pequenas
e médias empresas), usufruir de benefícios concretos.
Finalmente, estou confiante de que a entrada em vigor provisória do acordo, mesmo que parcial, contribuirá
também para tranquilizar as preocupações que ainda possam subsistir.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Secretária de Estado, a Mesa registou a inscrição, para pedir esclarecimentos, de
dois Srs. Deputados, sendo que o primeiro a usar da palavra é o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. JoséLuísFerreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus,
Os Verdes estiveram desde sempre, desde o início, contra este acordo. E esta firme oposição decorre não só
da forma secreta e muito pouco transparente de como o processo foi negociado mas também do seu conteúdo
e das implicações que representa para o nosso País.
Para além disso, este processo de ratificação está verdadeiramente inquinado. Acho até que em democracia
nunca vimos um processo tão inquinado como este. É que a entrada em vigor provisória do acordo representa
uma manobra absolutamente estranha e até ilegítima por parte da União Europeia face aos Estados-membros
porque nos coloca perante uma espécie de facto consumado, o que transforma este processo de ratificação
num simples ato para cumprir calendário.
Face ao que está em causa com este acordo, o processo de ratificação acaba por se reduzir a um mero faz-
de-conta, o que, a nosso ver, é absolutamente inadmissível e inqualificável.
Sr.ª Secretária de Estado, como sabe, o Governo belga requereu ao Tribunal de Justiça da União Europeia
uma análise ao CETA para que este Tribunal possa aferir da sua conformidade com os tratados europeus e com
os direitos fundamentais.
Pergunto: não seria mais sensato aguardar pela decisão desse Tribunal antes deste processo de ratificação?
O que motiva esta pressa toda?
Aplausos de Os Verdes, do BE e do PCP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla Cruz.
A Sr.ª CarlaCruz (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus, são cada vez
mais as vozes que se levantam contra o CETA e são cada vez mais os retrocessos nos direitos sociais,
ambientais, de saúde pública, de desregulação, de desproteção e de destruição da capacidade produtiva de
importantes setores produtivos portugueses.
Sr.ª Secretária de Estado, gostaria de saber como é que o Governo pretende preservar os interesses
nacionais, defender a produção nacional, os direitos sociais e laborais e os serviços públicos face a este acordo.
Sr.ª Secretária de Estado, em concreto, pergunto-lhe o seguinte: como vai defender a agricultura e a
produção agrícola, que devem obedecer ao princípio da precaução e disso se abdica no acordo? Como vai
defender a saúde dos consumidores, que corre sérios riscos devido ao abandono deste princípio da precaução?
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Como é que o Governo vai defender os produtos de denominação de origem protegida (DOP)? A Sr.ª Secretária
de Estado disse que o Governo fez uma grande pressão e que consegui 20, mas são 137 os produtos
portugueses de denominação de origem protegida que existem e que foram deixados ao abandono.
Como é que vai salvaguardar e defender os direitos dos trabalhadores, Sr.ª Secretária de Estado? Como é
que o Governo o vai fazer perante um acordo que só tem informações vagas e princípios que não são
vinculativos?
São estas as questões concretas que lhe deixamos, Sr.ª Secretária de Estado.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado dos Assuntos Europeus.
A Sr.ª SecretáriadeEstadodosAssuntosEuropeus: — Sr. Presidente, Srs. Deputados José Luís Ferreira
e Carla Cruz, em resposta às perguntas que foram colocadas quero dizer que este acordo é misto, o que significa
que só entrará em vigor no dia 21 de setembro a parte que é da competência da Comissão Europeia; a parte do
acordo que é da competência nacional não entrará em vigor neste momento, só entrará em vigor depois de os
parlamentos nacionais se terem pronunciado.
Quanto aos outros aspetos, há várias questões que é necessário tomar em consideração.
Este acordo terá um importante impacto positivo em relação às PME, uma vez que vai evitar duplicação de
auditorias e vai fazer com que se possam manter os standards que existem e melhorar algumas destas questões.
Quanto aos direitos laborais, eles não estão a ser postos em causa. Há também um compromisso do Canadá
em relação a estes direitos laborais e à adesão às Convenções da OIT (Organização Internacional do Trabalho).
Não irão ser alterados os direitos dos trabalhadores, apenas as empresas terão ganhos económicos com este
acordo.
Portanto, entendemos que este acordo é dinâmico.
O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo. Peço-lhe que conclua, Sr.ª Secretária de Estado.
A Sr.ª SecretáriadeEstadodosAssuntosEuropeus: — Termino já, Sr. Presidente.
Agradeço e tomei boa nota dos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados.
Recordo apenas que o CETA já foi ratificado pela Espanha, pela Letónia, por Malta e pela Dinamarca e
Portugal pode ser o próximo País a fazê-lo, se os Srs. Deputados assim o entenderem.
Com franqueza, se não conseguirmos fazer um acordo com o Canadá, como parceiro estratégico da União
Europeia e de Portugal, com quem poderemos negociar no futuro?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.
O Sr. JoséLuísFerreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje é um dia triste para a
nossa democracia porque discutimos a possibilidade de o poder político ceder aos interesses do poder
económico; discutimos a possibilidade de entregar parte da nossa soberania aos poderes das multinacionais;
discutimos a possibilidade de renunciar aos nossos tribunais para entregar os litígios entre as multinacionais e
o nosso País a tribunais arbitrais, como as multinacionais tanto gostam; discutimos a possibilidade de as
multinacionais poderem intentar ações contra o Estado português, se aquelas entenderem que as políticas
desencadeadas pelos governos comprometem a sua expectativa de lucro.
Lembramos, a este propósito, a tabaqueira Philip Morris, que, ao abrigo de um acordo semelhante, intentou
uma ação contra os Estados do Uruguai e da Austrália, exigindo milhões e milhões de dólares, pelo facto de
estes países, a pensar na saúde dos seus cidadãos, terem implementado políticas antitabagistas. A
multinacional do tabaco entendeu que estas políticas perturbavam a sua expectativa de lucro e recorreu aos tais
tribunais arbitrais.
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Além disso, uma multinacional sueca intentou uma ação contra o Estado da Alemanha porque a Alemanha
decidiu abandonar a energia nuclear.
Estes são apenas dois dos muitos exemplos que aqui podiam ser referidos e que ilustram a viragem que o
CETA vai provocar.
Os governos e as autarquias vão deixar de ter como preocupação central dar resposta aos problemas dos
respetivos países e dos seus cidadãos, porque a grande preocupação passa a ser apenas não perturbar o lucro
das multinacionais.
Mais: se Portugal ratificar o CETA, estará a alinhar num retrocesso civilizacional, podendo até ser objeto de
chantagens corporativistas.
Tal como evidenciam experiências anteriores, abriremos a porta à sobreposição de interesses corporativos
em detrimento da soberania nacional, da capacidade de definir livremente políticas económicas, sociais e
ambientais e de defesa do interesse público.
Do ponto de vista ambiental, o CETA deixa em aberto a possibilidade de as empresas contornarem legislação
e acordos internacionais, como o Acordo de Paris, pondo em risco quaisquer esforços que sirvam para combater
as alterações climáticas.
No caso da agricultura, este acordo terá impactos negativos nas pequenas e médias produções e na
produção e comercialização de produtos regionais, desde logo porque vários produtos portugueses ficarão
desprotegidos, o que provocará quebras no rendimento dos produtores. Note-se que dos mais de 140 produtos
protegidos em Portugal apenas 20 estão protegidos pelo CETA.
Ao nível da segurança alimentar, registamos as diferenças entre as normas europeias e as do Canadá no
que respeita aos transgénicos, aos fatores de crescimento, às hormonas e ao bem-estar animal, sendo o Canadá
muito mais permissivo e muito menos rigoroso do que a União Europeia.
Ora, face ao que está em causa, Os Verdes consideram que o CETA deve ser rejeitado por esta Assembleia
e, por isso, apresentam uma iniciativa legislativa nesse sentido, ou seja, rejeitar a ratificação do CETA.
Aplausos de Os Verdes e de Deputados do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Carla cruz.
A Sr.ª Carla Cruz (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O PCP rejeita o
CETA, rejeição esta que resulta do facto de este acordo atentar contra a soberania nacional, os interesses dos
povos e os direitos sociais, laborais e democráticos.
A rejeição do acordo nada tem a ver com a apologia de políticas isolacionistas que alguns querem fazer crer.
O acordo económico e comercial global entre a União Europeia e o Canadá, que hoje discutimos, não é um
simples acordo de comércio, é um acordo que não se cinge apenas a eliminar tarifas aduaneiras mas visa limar
as barreiras técnicas e regulamentares através da criação da denominada «cooperação regulatória». Ou seja,
o CETA tem como objetivo avançar ainda mais na liberalização do comércio e dos serviços, apontando a
eliminação de quaisquer barreiras ao domínio das transnacionais sobre as economias de Estados soberanos e
forçando a harmonização legislativa revendo em baixa o acervo regulamentar, social, laboral, ambiental e
higiénico-sanitário.
O acordo vai ainda mais longe e procura impedir os Estados e os cidadãos de defenderem os seus interesses
impondo um instrumento jurídico, o ICS (Investment Court System), que se sobrepõe às jurisdições e instituições
soberanas do Estado.
O CETA, a ser ratificado, implicará, contrariamente ao que disse, Sr.ª Secretária de Estado, um retrocesso
nos direitos sociais, laborais, ambientais e de saúde pública e levará à desregulação, à desproteção e à
destruição da capacidade produtiva. Mas, no essencial, Srs. Membros do Governo, o CETA contribuirá para
aumentar as pressões para nivelar por baixo as condições de trabalho e enfraquecer os direitos dos
trabalhadores.
Não podemos deixar de recordar aqui, Sr.ª Secretária de Estado, que o processo das negociações não foi
um processo de negociação democrático, foi um processo que foi feito às escondidas, no maior secretismo e
contra aquilo que foram as vontades das populações.
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Rejeitamos o CETA e os demais acordos livres de comércio. Afastamo-nos completamente da posição
assumida pelo Governo português de aceitação de mais esta imposição da Comissão Europeia e, por isso,
apresentamos uma iniciativa legislativa que rejeita a aprovação para ratificação do CETA entre a União Europeia
e o Canadá.
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Encontramo-
nos hoje na última ocasião possível de debate público sobre o CETA e o Bloco de Esquerda não pode deixar de
lamentar que assim seja, pois não se conhece ainda o estudo de impacto para Portugal, as negociações durante
anos foram bastante blindadas à opinião pública, não se tiveram em conta as contestações e os alertas dados
por várias organizações, sindicatos e até alguns governos e, essencialmente, não se ouviram os cidadãos e
cidadãs.
Hoje voltamos ao tema em Plenário, mas tal não significa, está bem longe disso, que se possa afirmar, aqui,
que houve um debate público alargado e que tenha chegado ao conhecimento das pessoas o que está em
causa, porque isso, pura e simplesmente, não corresponde à verdade.
Estes processos, infelizmente, sempre foram assim. A União Europeia tem-se pautado por processos pouco
ou nada democráticos e o argumento que agora se utiliza da tentativa de regular a globalização é, em especial
neste caso, um falso argumento, porque ele serve para esconder aquilo que realmente está em causa: o
favorecimento das grandes corporações.
Estamos perante uma nova geração de acordos comerciais — este é apenas o primeiro que está prestes a
ser concretizado — que não são mais apenas acordos comerciais, são acordos comerciais e de investimento,
altamente complexos, que dão um poder demasiado elevado às multinacionais e retiram, efetivamente, aos
Estados poder de decisão política em prol dos cidadãos, como já aqui foi referido.
Não podemos deixar de nos focar, no entanto, no elemento mais gravoso deste acordo, que é também alvo
daquilo que será a ratificação por parte dos parlamentos nacionais e que é o mecanismo arbitral de resolução
de litígios, tema este sobre o qual os parlamentos nacionais se pronunciam e percebe-se porquê. Porque, na
verdade, é um modelo que permite a desaplicação do direito interno, seja ele nacional ou europeu, colocando
em risco até o princípio do Estado de direito democrático vertido no artigo 2.º da Constituição da República
Portuguesa, e também porque rejeita o princípio dos tribunais enquanto órgãos de soberania do Estado, também
previsto na nossa Constituição.
Isto acontece, muito simplesmente, porque se pretende criar um tribunal privado, o que coloca em causa a
própria natureza pública da justiça, que se irá reger pelo próprio acordo e não pelo direito nacional ou europeu
e, portanto, estamos perante uma espécie de pescadinha de rabo na boca: estamos perante um tribunal que é
autossuficiente, que é criado por um acordo e que se rege pelas regras desse mesmo acordo sem responder a
mais nenhuma legislação, seja ela nacional ou europeia.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Portanto, está também longe do escrutínio público e é desequilibrado, pois, nesta
suposta balança, o poder está todo colocado do lado dos investidores e os alertas, Sr. Secretária de estado, têm
sido dados, nomeadamente pela Associação Nacional de Juízes Portugueses, pela Associação Europeia de
Juízes, pelos magistrados do Ministério Público, pela própria associação de juízes alemã, pela jurisdição do
Tribunal de Justiça Europeu sobre tribunais arbitrais.
Não faltam alertas sobre este mecanismo e sobre o perigo que este mecanismo representa para a
democracia e atente-se também ao processo que decorre ainda hoje contra o Governo canadiano, que assenta
exatamente em premissas que dizem muito à nossa Constituição, nomeadamente o princípio da igualdade mas
também do acesso ao direito e à tutela jurisdicional.
Sr.as e Srs. Deputados, infelizmente, até hoje não foi dada a atenção merecida a este acordo, que abre um
precedente para novos acordos que se avizinham, nomeadamente com o Japão.
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Não foi por falta de alertas, seja ao nível europeu ou, aqui, no nosso País, mas deliberadamente não se
ouviram as organizações ambientais, laborais, de proteção de dedos, agrícolas, de saúde pública, de direitos de
autor — enfim, poderíamos aqui continuar a elencar várias organizações —, porque se o tivessem feito, tanto
as instituições europeias como os governos, com certeza não estaríamos aqui, hoje, a debater a possibilidade
de ratificação do CETA, por uma razão muito simples: porque o acordo é mau, vai ter consequências ainda não
totalmente percetíveis, não protege os cidadãos nem os produtores e inicia — e isto é essencial — um caminho
de alteração profunda de como vemos o Estado de direito democrático, de como vemos e assumimos o papel
legislador desse Estado e de como vemos até o exercício da soberania popular.
Estes conceitos, que deveriam estar na base do que é criado ou do que é acordado pela própria União
Europeia e por Portugal, são postos completamente de lado e o Bloco de Esquerda considera que estes
conceitos ficam feridos com a ratificação deste acordo, bem como o ficam os princípios constitucionais do nosso
País.
Portanto, Sr.ª Secretária de Estado e Srs. Deputados, se queremos ser responsáveis perante os cidadãos e
cidadãs e se queremos zelar pela sua proteção, pelos seus interesses e pela própria Constituição só temos uma
opção: vetar o CETA.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de estado, Sr.as e Srs. Deputados: Falemos
hoje de responsabilidades políticas. Hoje, PS, PSD e CDS, partidos do arco da governação, ratificarão o CETA
em plena consciência, um ato transnacional entre a União Europeia e o Canadá que é feito à medida de uma
elite corporativa mas trabalhado à revelia dos cidadãos e sem salvaguardar importantes interesses de todos
nós, como a proteção ambiental, a produção agrícola ou o bem-estar animal.
Este tratado foi durante anos negociado a portas fechadas, longe do olhar dos meios de comunicação e com
a conivência política não só dos Deputados nacionais como das suas famílias políticas europeias.
PS, PSD e CDS decidem hoje penhorar milhares de empregos de classes baixas e médias a uma elite
empresarial multinacional. PS, PSD e CDS decidem hoje hipotecar o já avançado crédito climático que as nossas
sociedades extractivistas têm e garantir que o projeto europeu é cada vez mais um sonho por cumprir em vez
de se tornar uma realidade.
O descrédito grassa com estes exemplos de más políticas públicas. Mesmo depois de o PAN ter aprovado
aqui no Parlamento uma resolução para se debater profunda e abertamente o CETA na sociedade portuguesa
apenas três condicionadas e circunscritas conversas, a que o Governo chama de grandes debates, foram tidas.
Se este acordo é assim tão bom, tão vanguardista, tão tudo, ao contrário daquilo para que os relatórios
técnicos de organizações não-governamentais do ambiente, observatórios e institutos, sindicatos, sociólogos,
economistas e de outras entidades vêm alertando, porquê não o defender calorosamente num verdadeiro debate
integrado e participativo? Sabemos porquê. Porque falharia na prova final e quanto mais se soubesse o que se
propõe mudar com o CETA mais a opinião pública mudaria em relação ao mesmo.
Assim, de fininho, despimos ainda mais a nossa democracia do melhor que ela tem: a participação e a
transparência.
Esperemos que os portugueses compreendam o que o PS, o PSD e o CDS estão a validar, que percebam
quem hoje hipoteca o presente do País e o futuro da Europa, isto porque, mais à frente, de nada servirá atribuir
as responsabilidades a externalidades e aos mercados, como tão usualmente é feito neste Parlamento e pelos
responsáveis políticos do costume.
Cá estaremos para pegar nos cacos e arrumar a casa mas não nos fartaremos de vos dizer: nós avisámos!
Aplausos de Deputados do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.
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O Sr. José Cesário (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD vai votar favoravelmente a proposta
de resolução do Governo que aprova o CETA, assinado em 2016, depois de várias rondas negociais realizadas
entre 2009 e 2014.
O nosso voto assenta em razões que têm em conta, essencialmente, os superiores interesses dos cidadãos
e o futuro do projeto europeu, que defendemos, assente no primado do humanismo, na democracia e no
desenvolvimento.
Para nós, o CETA começa por significar a concretização de uma efetiva cooperação política e económica
entre dois espaços com valores sociopolíticos e níveis de progresso semelhantes.
O Canadá é um país extremamente desenvolvido, com regras de organização empresarial e de proteção aos
trabalhadores e ao ambiente perfeitamente conciliáveis com as dos países da União Europeia. Claro que
sabemos bem que este acordo implica grandes desafios para o nosso universo empresarial e laboral, que tem
sabido corresponder a outros impactos bem recentes e que tem, agora, mais uma oportunidade para aperfeiçoar
métodos de produção e modelos organizacionais que, decerto, gerarão mais produtividade e mais emprego.
Por outro lado, este acordo traduz uma clara aproximação entre países que rejeitam em absoluto o
isolacionismo e o protecionismo, questão particularmente importante no momento em que se avolumam
tendências pouco consonantes com a aproximação entre os povos e a cooperação entre os países.
Pena é que alguns dos que se ouvem amiúde criticar com grande veemência aqueles que defendem essas
posições mais isolacionistas venham agora, contraditoriamente, atacar soluções que visam exatamente
combater o isolamento das nações e o protecionismo defensor dos mais privilegiados.
O Sr. Carlos Abreu Amorim (PSD): — Exatamente!
Protestos do PCP.
O Sr. José Cesário (PSD): — Mas, Srs. Deputados, não nos esquecemos igualmente que o Canadá alberga
uma significativa comunidade portuguesa, que hoje deverá possuir mais de 600 000 elementos disseminados
por todas as províncias.
Trata-se de uma comunidade perfeitamente integrada, que tem uma participação ativa em todas as áreas da
sociedade canadiana cuja multiculturalidade dá garantias de plena integração a pessoas das mais variadas
origens, num exemplo que deve ser permanentemente seguido.
Protestos do PCP.
Também por isso é importante a celebração deste acordo, pois todos nós, europeus e canadianos, temos
muito a fazer em conjunto para melhorar ainda mais os modelos sociais, culturais e económicos em que
assentam as nossas sociedades.
Finalmente, Srs. Deputados, não resisto a recordar o modo como o Bloco de Esquerda decidiu criticar a
parceria de cooperação económica União Europeia/Canadá, que temos igualmente discutido paralelamente com
o CETA (Acordo Económico e Comercial Global).
Lamenta o Bloco que — e cito: «Tanto o CETA como o TTIP (Transatlantic Trade and Investment Partnership)
surgem para servir os interesses económicos das empresas». Repito: «(…) para servir os interesses económicos
das empresas». Será possível que, em pleno século XXI, ainda se tenha uma visão desta natureza, passadista,
ignorando que são as empresas o grande fator de desenvolvimento do mundo?
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe para concluir.
O Sr. José Cesário (PSD): — Ignorando que, de um modo geral, elas assentam as suas relações numa
lógica personalista, geradora de emprego e de riqueza? Como é possível conceber o desenvolvimento sem
empresas, Srs. Deputados? Será que o CETA não deverá ter entre os seus principais objetivos exatamente o
apoio ao universo empresarial?
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O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir.
O Sr. José Cesário (PSD): — É neste tipo de parceiros, com esta visão passadista, que o Governo assenta
a sua lógica governativa, o que, obviamente, não deixará de ter graves repercussões a prazo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, permita-me que comece por cumprimentar a Sr.ª
Secretária de Estado Ana Paula Zacarias, na sua primeira intervenção neste Plenário, e também que
cumprimente a anterior Secretária de Estado, que neste momento se senta na bancada do Partido Socialista,
Deputada Margarida Marques, porque sei que também trabalhou muito neste mesmo processo.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este Acordo de livre comércio é muito importante por três ordens de
grandeza e a ratificação que estamos a discutir hoje é também muito importante igualmente por três ordens de
grandeza.
A primeira é a importância económica que este Acordo tem. Com mais investimento, com mais crescimento,
com mais comércio, vamos conseguir gerar mais riqueza, e este Acordo comercial é de especial importância
para Portugal. Basta, aliás, olharmos para o mapa. Portugal, que é, muitas vezes na geografia europeia, um
país periférico, é, certamente, um país central na geografia atlântica. E o que a União Europeia está a fazer é a
estabelecer e a aprofundar estes mesmos laços com o Canadá que, ainda por cima, é um país com padrões de
qualidade alimentar, de segurança ambiental, de proteção social muito parecidos com os nossos.
Protestos de Os Verdes e de Deputados do PCP.
Certamente que outros partidos gostariam de fazer isto eventualmente com países como a Venezuela ou a
Coreia do Norte, mas parece-nos que estes são mais semelhantes aos padrões europeus.
Protestos de Os Verdes e de Deputados do PCP.
Muito curiosamente, os estudos dizem todos, de uma forma muito clara, que este Acordo pode potenciar um
crescimento na União Europeia de cerca de 12 000 milhões de euros, sendo que, neste caso, Portugal pode ser
o país que representa o segundo maior beneficiário.
Sabemos que, neste momento, as exportações de Portugal para o Canadá representam somente 0,8% de
todas as nossas exportações, mas também sabemos que isto pode significar a abertura a um mercado de cerca
de 300 milhões de consumidores para as 1400 empresas portuguesas que já lá estão estabelecidas e, acima
de tudo, para muitas outras empresas portuguesas.
Nesse sentido, foi muito importante, porque também há desafios que este Acordo nos coloca, termos
conseguido, por exemplo, a proteção da maioria das nossas denominações de origem protegida, conseguindo
também…
Protestos de Os Verdes e de Deputados do PCP.
… o desmantelamento de um conjunto de barreiras pautais, e também de muitas barreiras não pautais, sendo
aí que, muitas vezes, estão os maiores entraves.
A segunda ordem de grandeza na importância de termos, neste momento, no quadro europeu, a ratificação
deste mesmo processo é o facto de sabermos que há, hoje, na Europa, quer do lado de lá do Atlântico, quer do
lado de cá do Atlântico, uma enorme onda populista, uma enorme onda protecionista e isolacionista, e às vezes
até muito barulhenta, que é contra o comércio livre, que é contra a regulação da globalização. Essa onda vê-se,
quer à extrema-direita, quer à extrema-esquerda e também temos connosco, nesta Sala, representantes dessa
mesma onda, nas bancadas situadas frente à bancada do meu partido.
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É importante, nesse sentido, demonstrarmos que a União Europeia não se deixa aprisionar por este discurso,
que é um discurso que leva sempre a que as barreiras se imponham e a que, nesse sentido, a própria União
Europeia possa crescer menos.
Há ainda um terceiro aspeto que é muito importante, que é a confissão feita neste debate pelo Bloco de
Esquerda, pelo Partido Comunista Português e pelo Partido Ecologista «Os Verdes», sendo estes três partidos
que suportam hoje a solução governativa em Portugal.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Qual é a novidade?!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — São partidos que têm um poder efetivo e que tinham o poder efetivo
de travarem este Acordo se quisessem. Bastava terem incluído nas bases programáticas que assinaram com o
Partido Socialista a travagem deste mesmo Acordo, mas sabemos que os senhores não o fizeram.
Protestos de Os Verdes e de Deputados do PCP.
Sei que os senhores são muito vocais neste Parlamento, mas parece-me que é um bocadinho aquela
vocalidade, aquela lógica, citando aqui um ditado popular…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe para concluir.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — … que certamente seria do agrado do Sr. Deputado Jerónimo de
Sousa, do «cão que ladra, mas não morde». É exatamente assim que os senhores estão neste processo.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Lara Martinho.
A Sr.ª Lara Martinho (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, cumprimento a Sr.ª Secretária de
Estado e faço votos de muito sucesso no exercício das funções governativas.
Sr.as e Srs. Deputados: Estamos a um pequeno passo de aderir, em pleno, ao Acordo Económico e Comercial
Global entre a União Europeia e o Canadá. Outros já o fizeram.
Estamos também a um pequeno passo de se abrir, assim, um leque de novas oportunidades para as nossas
empresas, já com a provisória entrada em vigor do CETA no próximo dia 21 de setembro, como assim entendeu
o Parlamento Europeu.
É com pequenos passos mas com uma grande visão que estamos a construir um Portugal melhor.
Um Portugal melhor com a taxa de desemprego mais baixa dos últimos oito anos, com as exportações a
crescer três vezes mais do que no final de 2015, com a economia a crescer mais do que na zona euro e na
União Europeia.
Um Portugal melhor com a saída da classificação de «lixo» na notação da dívida portuguesa, com melhores
condições de acesso ao financiamento por parte do sistema financeiro e das empresas portuguesas.
Um Portugal melhor com a criação de condições mais favoráveis para o aumento das nossas exportações e
do investimento, de que é exemplo a negociação deste Acordo.
Já muitas vezes o afirmámos: este Acordo está num novo patamar, numa nova geração de acordos
comerciais da União Europeia. É um Acordo ambicioso, em que merecem destaque cinco grandes
potencialidades.
Primeira potencialidade: a eliminação de 99% dos direitos aduaneiros sobre bens e de barreias não pautais,
sem pôr em causa os padrões e regras europeias.
Segunda: a equidade na proteção de direitos de propriedade intelectual, com o reconhecimento, pela primeira
vez, do sistema europeu de indicações geográficas.
Terceira: a liberalização dos serviços do investimento com a reserva dos serviços públicos.
Quarta: a criação de um novo instrumento de resolução de conflitos de investimento.
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Quinta potencialidade: o compromisso quanto ao comércio e desenvolvimento sustentável, nomeadamente
acordos e padrões internacionais na área do trabalho e do ambiente, entre outros.
Com o CETA perspetiva-se o incremento das relações comerciais e de investimento entre Portugal e o
Canadá, sobretudo tendo em conta a eliminação das taxas alfandegárias em segmentos industriais tradicionais
na nossa economia e com potencial de exportação para o Canadá, como é o caso dos têxteis de lar e do calçado.
É de salientar, também, o aumento da quota alocada à importação de queijos da Europa para o Canadá.
É, por isso, importante o Governo concentrar-se em dar continuidade ao diálogo e ao apoio às empresas, em
particular nestes setores de maior potencial de exportação e às PME (pequenas e médias empresas), para que
estas conheçam e saibam tirar o maior partido das vantagens do mercado canadiano.
O contínuo sucesso das empresas portuguesas, num mundo onde a concorrência e as cadeias de valor são
globais, exige um acesso mais fácil aos mercados estrangeiros. A União Europeia tem um papel fundamental
neste processo.
Aliás, neste momento, na União Europeia, estão em vigor, ou em fase de negociação, acordos comerciais
com mais de 140 parceiros em todo o mundo. De facto, a política comercial é uma prioridade da União Europeia
e ainda na semana passada o Presidente da Comissão, Jean Claude Juncker, anunciou um conjunto de
propostas e iniciativas para tornar a política comercial mais transparente e mais responsável.
Neste sentido, lançamos também um desafio ao Governo, para que se comprometa cada vez mais em
assegurar a participação das empresas e trabalhadores, associações, câmaras de comércio, ONG
(organizações não governamentais) e também das regiões autónomas na definição da política comercial
europeia e nos acordos que se avizinham, para que também estes, cada vez mais, respondam melhor aos
interesses do nosso País.
Termino, dizendo que, ao ratificar este Acordo, Portugal reitera também a sua vocação de País moderno e
aberto ao mundo…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Lara Martinho (PS): — … e envia um sinal contrário às tendências protecionistas e isolacionistas que
têm ganho fôlego nos últimos tempos.
Termino, Sr. Presidente, dizendo que a ratificação deste Acordo demonstra que é possível prosseguir a
defesa do interesse estratégico nacional num mundo aberto e globalizado.
Vamos continuar a construir um futuro melhor, um Portugal melhor.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, terminada esta discussão, passamos ao último ponto da ordem do dia,
que consta da discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 94/XIII (2.ª) — Altera o regime jurídico da
segurança contra incêndio em edifícios.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna (Jorge Gomes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs.
Deputados: A presente proposta de lei visa proceder à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 220/2008, alterado
pelo Decreto-Lei n.º 224/2015, que estabelece o regime jurídico da segurança contra incêndio em edifícios.
O Programa do XXI Governo Constitucional definiu como objetivo central a transformação do modelo de
funcionamento do Estado, nomeadamente através do reforço de autonomia das autarquias locais e da
descentralização democrática da Administração Pública.
Para se atingir este desiderato foi consagrado o alargamento da participação dos municípios em vários
domínios, entre os quais o da proteção civil. Neste âmbito, as competências para apreciar projetos e medidas
de autoproteção e para realizar vistorias e inspeções a edifícios classificados na 1.ª categoria de riscos, no
regime jurídico de segurança contra incêndios em edifícios, serão transferidos para os municípios.
No exercício destas competências, os municípios irão assegurar o cumprimento deste regime em edifícios
habitacionais, administrativos, escolares e hospitalares, lares de idosos, recintos de espetáculos, espaços
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desportivos e de lazer, restaurantes e hotéis, edifícios comerciais e culturais, entre outros, classificados na 1.ª
categoria de risco, de acordo com as dimensões, número de pisos ocupados e número de efetivos.
Na proposta de lei foram corrigidas inexatidões detetadas na alteração efetuada em 2015 ao citado regime
e introduzidas algumas alterações num conjunto de artigos necessárias à garantia de uma maior eficácia jurídica
das normas aí contidas, clarificando conceitos e procedendo a ajustamentos técnicos pontuais.
Em síntese, destacam-se algumas alterações.
Primeira: a adaptação do diploma à proposta de lei-quadro de descentralização, na medida em que, nos
termos do artigo 26.º desta proposta, se pretende descentralizar para os municípios as competências
anteriormente mencionadas com reflexos positivos na receita municipal. Neste âmbito, foram introduzidas
alterações em 12 artigos, sendo que a proposta de lei determina que a implementação total das competências
atribuídas aos municípios está dependente de credenciação, pela Autoridade Nacional de Proteção Civil, dos
respetivos técnicos.
Segunda alteração: a criação de uma sanção acessória de interdição de exercício de atividade a aplicar às
empresas que não se encontrem habilitadas a prosseguir a atividade de comercialização, instalação e
manutenção de equipamentos e sistemas de segurança contra incêndios em edifícios.
Terceira: a possibilidade de apresentação de fichas de segurança nas operações urbanísticas de menor
relevância.
Quarta: a previsão de um regime transitório relativo aos requisitos exigidos aos profissionais para a
elaboração de projetos de segurança contra incêndios em edifícios e medidas de autoproteção.
Por fim, importa referir que foi promovida a audição de 13 entidades, que se pronunciaram e que
enriqueceram, com o seu contributo, esta proposta de lei.
É uma proposta que garante maior simplificação, maior proximidade e maior eficácia na aplicação do regime
jurídico da segurança contra incêndio em edifícios.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, o Grupo Parlamentar do PCP
manifesta sérias dúvidas e objeções quanto a esta proposta de lei. Trata-se de dúvidas quanto à necessidade e
de objeções quanto ao modelo de transferir mais competências para as câmaras municipais, sem que estas
sejam acompanhadas quer de um pressuposto base para o PCP, que é o da regionalização, quer da
transferência dos meios financeiros para que as câmaras municipais possam desempenhar as novas atribuições
que são transferidas.
Portanto, esta proposta de lei, manifestamente, levanta um conjunto de preocupações que queria referir, Sr.
Secretário de Estado.
A primeira questão que coloco é a de saber o porquê da necessidade de apresentação desta iniciativa
legislativa neste momento e também porque é que se transfere para os municípios as responsabilidades relativas
aos edifícios de categoria 1 de risco e não são abrangidos, por exemplo, os edifícios de categoria 2 de risco, o
que seria um pressuposto para a viabilização financeira das câmaras municipais. Completa-se um conjunto de
transferências sem que se perceba a razoabilidade do mesmo.
Pergunto ainda se acha razoável, Sr. Secretário de Estado, que sejam as assembleias municipais a definir
as taxas praticadas por cada um dos municípios, levando, claro, a naturais discrepâncias regionais e locais no
que diz respeito a estas mesmas taxas.
Havendo outros problemas identificados com este regime jurídico, como sejam os problemas relativos aos
edifícios de apoio dos estabelecimentos considerados como de risco elevado ou de elevada perigosidade, esses
problemas não foram resolvidos. Por que é que não foram resolvidos esses problemas, designadamente a
consideração da simplificação da tramitação relativamente a esses mesmos edifícios de apoio, em detrimento
de outros?
Por fim, gostaríamos de suscitar um aspeto que, para nós, é importante. É que da iniciativa legislativa não
resulta a necessidade, que consideramos imperiosa, de articular os projetos em concreto e as soluções de
segurança encontradas para cada um dos edifícios com as necessidades de meios operacionais,
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nomeadamente os simulacros e as medidas de treino necessárias para os agentes nacionais de proteção civil.
A título de exemplo, os bombeiros são completamente relegados do licenciamento, da obtenção de informação,
dos simulacros, dos treinos necessários para os edifícios de alto risco, sendo essa competência, bem como o
acesso à informação, no que se refere aos edifícios de maior perigosidade, remetidos exclusivamente para a
Autoridade Nacional de Proteção Civil. Não percebemos este distanciamento entre a Autoridade Nacional de
Proteção Civil e os bombeiros, que, depois, na prática, naturalmente, terão de lidar com as situações de risco,
caso se venham a verificar.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Machado, o
porquê da necessidade foi, realmente, o que foi sentido por nós, ou seja, de incluir dentro do pacote de
descentralização aquilo que consideramos risco que pode ser tratado ao nível do município. Mas também o
fizemos com todo o cuidado e com toda a atenção, porque há transferência de responsabilidade e do pacote
financeiro. Isto está previsto, está feito o estudo do custo/benefício e transferimos para as autarquias 483 000 €
de responsabilidade e 1,082 milhões de euros de receita. Isto sem falar em contraordenações que,
eventualmente, possam surgir.
Portanto, estamos só…
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Onde é que isso está escrito?
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, peço-lhe para não entrar em diálogo e para prosseguir com a
sua resposta.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna: — Nós entendemos que as taxas, sim, devem ser
aplicadas pelos respetivos municípios. Os municípios é que terão o poder de decisão.
Porquê o nível I e não o II? Porque, quanto maior é o nível do risco, maior se torna a exigência. E também
tem de se dar tempo aos municípios para prepararem as suas capacidades de resposta.
Relativamente ao facto de os bombeiros ficarem afastados…
O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o tempo de que dispunha, pelo que lhe peço para concluir, Sr. Secretário
de Estado.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna: — Sr. Presidente, só para terminar, direi que,
relativamente ao afastamento dos bombeiros nos simulacros, iss não é verdade, já que fazem parte. Em todo e
qualquer simulacro da Autoridade Nacional de Proteção Civil, o primeiro agente de proteção civil são os
bombeiros.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Carpinteira.
O Sr. José Manuel Carpinteira (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as Deputadas e Srs.
Deputados: Decorridos cerca de nove anos sobre a entrada em vigor do Regime Jurídico da Segurança Contra
Incêndio em Edifícios, o Governo tomou a iniciativa oportuna de apresentar a proposta de lei n.º 94/XIII, que
hoje discutimos em Plenário.
As alterações têm, essencialmente, como objetivo adaptar o diploma à lei-quadro da descentralização, na
medida em que, nos termos do artigo 26.º dessa lei-quadro, se pretende proceder à descentralização para os
municípios da competência para apreciar projetos e medidas de autoproteção, realizar vistorias, inspeções e
fiscalização e a instrução e decisão dos processos sancionatórios a edifícios classificados na categoria de risco
reduzido, ainda que a implementação total das competências atribuídas aos municípios esteja dependente de
credenciação dos técnicos municipais pela Autoridade Nacional de Proteção Civil.
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Sublinhe-se que as alterações relativas à descentralização destas matérias foram objeto de parecer favorável
da Associação Nacional de Municípios, incluindo a repartição do produto das coimas.
Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta de lei corrige imprecisões detetadas, introduz algumas alterações num
conjunto de artigos, necessárias para garantir uma maior eficácia jurídica das normas, clarifica conceitos e
procede a alguns ajustamentos técnicos pontuais.
Por outro lado, é introduzida uma alteração, que na nossa opinião faz sentido, nas operações urbanísticas
de todas as utilizações-tipo da categoria de risco reduzido: a aplicação de uma ficha de segurança.
Num domínio tão sensível como o da segurança de pessoas e bens, esta proposta de lei merece, obviamente,
a nossa aprovação.
Em síntese, Sr.as e Srs. Deputados, podemos referir que este diploma, apresentado pelo Governo,
descentraliza, simplifica, clarifica e é mais exigente nomeadamente ao fixar requisitos mais rigorosos aos
responsáveis pela elaboração dos projetos de segurança e das medidas de autoproteção contra incêndios em
edifícios e em recintos classificados como integrando a categoria mais elevada de risco, onde se incluem
infraestruturas como escolas, hospitais ou lares de idosos.
Reconhecemos que, para além de uma legislação adequada e competente, é necessária a efetiva aplicação
de medidas de autoproteção e ações de sensibilização públicas, nomeadamente sobre como agir em caso de
incêndio em edifícios.
A educação para a proteção civil da população e em meio escolar é cada vez mais um imperativo. Deverá
ser esse também o caminho a seguir.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, também para uma intervenção, o Sr. Deputado Álvaro Castello-
Branco.
O Sr. Álvaro Castello-Branco (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs.
Deputados: O regime jurídico da segurança contra incêndio em edifícios é uma temática muito importante e que,
efetivamente, merece toda a atenção. Assim, para o CDS-PP, é fundamental que uma reforma do regime em
vigor seja precedida de um amplo debate, alargado a diversas entidades e a especialistas nesta matéria.
Ora, na exposição de motivos deste diploma, o Governo refere — e o Sr. Secretário de Estado também já
referiu aqui — que foram ouvidas muitas e variadas entidades relevantes nesta área, concretamente 13
entidades, nomeadamente a Associação Nacional de Municípios Portugueses, o Laboratório Nacional de
Engenharia Civil, os Serviços Regionais de Proteção Civil dos Açores e da Madeira, entre outras.
No entanto, Sr. Secretário de Estado, consultada a página da iniciativa, não encontramos qualquer parecer,
contributo ou documento resultante dessas consultas. E a questão que coloco aqui é esta: existem? E, se
existem, pretende o Governo remeter tais documentos a esta Assembleia? É que, Sr.as e Srs. Deputados, esta
falta de informação do Governo tem sido uma constante e não nos parece razoável nem admissível,
principalmente no que se refere ao processo de descentralização de que esta iniciativa depende.
Como todos sabemos, encontra-se ainda pendente a iniciativa do Governo quanto à descentralização de
competências para os municípios, bem como as iniciativas sobre a mesma matéria apresentadas pelos grupos
parlamentares.
O Governo, no que toca a esta matéria, pretendeu, em primeiro lugar, que esta Assembleia aprovasse uma
lei-quadro totalmente às escuras, sem o acompanhamento de estudos, pareceres ou contributos de quaisquer
entidades.
Depois, percebendo que a Assembleia da República não aprovaria uma reforma desta natureza e importância
às escuras, remeteu os vários diplomas setoriais que estava a preparar, entre eles o diploma referente ao regime
jurídico da segurança contra incêndio em edifícios.
Ora, a proposta de lei que hoje aqui estamos a discutir é exatamente esse diploma, com todas as referências,
nomeadamente a uma lei x, que é a lei relativa à descentralização de competências, a qual ainda não está
aprovada e, uma vez que não é o Governo que decide os agendamentos e votações desta Casa, não se sabe
ainda se e quando irá ser efetivamente aprovada, tal como não sabemos qual o seu texto final.
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Pensávamos que o Governo já tinha percebido que esta Assembleia, nomeadamente o CDS, não passa
cheques em branco e que, em matérias tão importantes como a que estamos hoje aqui a tratar, é necessário
um debate sério e alargado.
Sr.as e Srs. Deputados, já aqui disse e repito: o CDS não tem dúvidas quanto à missão fundamental que é
desempenhada pelos órgãos autárquicos na oferta de serviços públicos de qualidade aos portugueses,
integrando a primeira e mais próxima linha de apoio.
No entanto, sublinho o que muitas das entidades afirmaram quando foram ouvidas no Grupo de Trabalho —
Pacote Descentralização, que foi criado na Comissão competente sobre esta matéria. E cito: «Não se pode fazer
em meia dúzia de meses o que deveria ter sido feito em 40 anos»!
A proposta de lei que hoje aqui discutimos, bem como todos os diplomas setoriais referentes à transferência
de competências, assim co, para que, quando forem votados, todos os partidos o possam fazer em consciência
e sem pressões, nomeadamente do Governo.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, consideramos extemporânea, neste momento, a apresentação desta
proposta de lei a esta Assembleia.
Aplausos do CDS-PP e do Deputado do PSD Jorge Paulo Oliveira.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Pedro Soares.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta de lei, para além de
procurar corrigir inexatidões e ajustar o regime contraordenacional, coloca uma questão fundamental, do nosso
ponto de vista, que é a da passagem de competências relativamente à inspeção e pareceres sobre um conjunto
de edifícios, no que respeita ao sistema de proteção contra incêndios, da Autoridade Nacional de Proteção Civil
para os municípios. E esta passagem da Autoridade Nacional de Proteção Civil para os municípios é um
problema que está colocado no âmbito do processo de descentralização.
Portanto, esta proposta de lei consiste, no essencial, em dar um passo no sentido da municipalização de
competências da administração central, o que, na nossa perspetiva, é preocupante, tendo em conta que se trata,
de facto, de uma espécie de municipalização às pinguinhas que o Governo está a querer promover, alegando
que, neste momento, existe uma proposta de lei-quadro sobre a descentralização, mas, como já foi aqui referido
por vários Srs. Deputados, ela está em debate, ou seja, não existe na realidade como diploma aprovado.
Portanto, o Governo alegar que é necessário avançar com a proposta de lei de municipalização desta
competência em concreto, porque há uma proposta de lei de descentralização que poderá, eventualmente,
prever esta medida, parece não ter, de facto, grande sentido.
Do nosso ponto de vista, esta proposta de lei deveria, em primeiro lugar, vir acompanhada de um relatório
sobre as condições dos 308 municípios do nosso País para integrarem e assimilarem esta competência de
elevada complexidade técnica e de grande responsabilidade, no que diz respeito à segurança das pessoas e
dos edifícios. Será que o Governo sabe, quanto aos vários municípios do nosso País, quais os que têm técnicos
devidamente credenciados pela entidade competente para exercer esta função? Nós não sabemos. Reparem
que mais de 70% dos nossos municípios têm menos de 30 000 habitantes, são pequenos municípios. Será que
todos os municípios têm competências técnicas para exercer estas funções? E qual é, efetivamente, o impacto
financeiro desta medida em termos de orçamentos municipais? Qual é o impacto financeiro para os municípios
se ajustarem a esta lei, no caso de ela vir a ser aprovada? Nada disto a Assembleia conhece e, por isso, faria
todo o sentido que esta proposta de lei fosse, de facto, integrada no debate sobre a descentralização.
Mais: que garantias é que o Governo pode dar de que evita a externalização destas funções, a
subcontratação a privados destas tarefas ligadas a uma função importante, em termos de segurança da
população e dos edifícios? Que garantias pode dar para evitar que a municipalização desta competência se
transforme, efetivamente, na abertura e na promoção de um novo negócio ligado, agora, a este serviço?
Reparem que há…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Concluo já, Sr. Presidente.
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Como estava a dizer, reparem que há 3,5 milhões de edifícios no nosso País, segundo os últimos relatórios,
54% dos quais têm de ser reabilitados nos próximos anos. De facto, abre-se uma grande expectativa de negócios
sobre esta matéria e, portanto, precisávamos de ter garantias quanto às consequências efetivas da
descentralização, da municipalização destas funções.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para concluir o debate, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António
Topa.
O Sr. António Topa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A presente iniciativa — a proposta de
lei n.º 94/XIII — integra os 21 projetos de descentralização por transferência de competências para as autarquias
locais que o Governo apresentou ao Parlamento, todos condicionados à aprovação da proposta de lei n.º 62/XIII
(2.ª), que baixou à 11.ª Comissão sem votação, encontrando-se em fase de nova apreciação na generalidade,
e que estabelece o quadro de transferência de competências para as autarquias locais e para as entidades
intermunicipais.
Quanto a este regime jurídico da segurança contra incêndios em edifícios, estamos a aprovar, ou vamos
tentar aprovar, algo que, à partida, é «pôr o carro à frente dos bois». Se tivéssemos aprovado a proposta de lei
n.º 62/XIII (2.ª), que define o regime de transferência de competências para as autarquias, naturalmente não
estávamos aqui a passar um cheque em branco, como diz o Sr. Deputado Castello-Branco.
Portanto, essencialmente, prefiro falar dos aspetos ligados à descentralização, porque este documento é,
efetivamente, técnico, é um documento que não dá muita discussão, nos aspetos de natureza técnica.
Prefiro discutir os aspetos de natureza política da descentralização e dizer que o Governo anda há 2 anos a
falar da importância da descentralização, levou 14 meses a apresentar a sua proposta e fê-lo em cima das
eleições autárquicas. Insiste em classificar a sua proposta como central e ponto de partida para a discussão,
quando as únicas propostas que o Parlamento aprovou na generalidade foram as do PSD e as do CDS. Na
verdade, de todas as iniciativas apresentadas, apenas o CDS-PP e o PSD submeteram a votação as suas
propostas, de sua autoria, aprovadas por maioria. As demais forças políticas de esquerda e o Governo preferiram
refugiar-se na cómoda e confortável descida das suas iniciativas à comissão parlamentar competente, sem
votação.
Recorde-se que, nesta Legislatura, o PSD foi a primeira força política a colocar a temática da
descentralização na agenda parlamentar. Apresentámos propostas concretas aquando da discussão do
Programa Nacional de Reformas e do Orçamento do Estado para 2017 e foram ambas chumbadas pela maioria
que apoia o Governo. Mas não desistimos e, no final de janeiro passado, apresentámos um novo pacote
legislativo sobre descentralização para ajudar a resolver os problemas das autarquias, da administração central
e, sobretudo, para servir Portugal e os portugueses.
É importante referir que o PS inviabilizou inexplicavelmente a criação de uma comissão eventual que oferecia
as condições para que o processo legislativo fosse feito de forma transversal, plural, aprofundado tecnicamente
e em tempo útil de 90 dias.
À margem da Assembleia da República e dos Deputados, isoladamente e no conforto dos gabinetes, outros
à margem do debate sobre o pacote da descentralização, continua a aprovar-se a iniciativa descentralizadora.
A Sr.ª Ministra da Administração Interna avançou com alterações ao regime jurídico das polícias municipais de
Lisboa e do Porto; o Sr. Ministro da Saúde transferiu competências para as autarquias; quanto à indicação de
um administrador executivo na generalidade dos locais de saúde, o Sr. Ministro do Ambiente avançou com a
municipalização da Carris; o Sr. Ministro do Ambiente legislou sobre as responsabilidades das autarquias na
gestão das áreas protegidas sem contrapartidas financeiras e ainda muitas outras situações que foram
aprovadas por decreto-lei e que têm a ver, muito, com a descentralização de competências. Todos ultrapassam
Eduardo Cabrita, Ministro Adjunto, que tem o compromisso de defender a proposta do Governo para a aprovação
de uma lei-quadro da transferência de competências para as autarquias locais.
O Governo, por muito que diga o contrário…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, por favor.
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O Sr. António Topa (PSD): — Sr. Presidente, concluo já.
O Governo não tem uma estratégia, tem várias estratégias, tantas quantas as agendas próprias de cada
Ministro, que agem de forma avulsa e à margem da discussão que está em curso no Parlamento.
Para terminar, refiro que o PSD conhece a capacidade de fazer bem das autarquias locais, sendo favorável
ao processo de descentralização através de leis aprovadas pelo Parlamento, com consensos alargados devido
à sua importância para o País.
O Sr. Presidente: — Tem mesmo de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. António Topa (PSD): — Queremos participar para que tais objetivos se concretizem.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, damos, assim, por concluída a discussão, na generalidade, da proposta
de lei n.º 94/XIII (2.ª).
Vou dar a palavra ao Sr. Secretário Duarte Pacheco, que vai dar conta de vários anúncios que tem para lhes
oferecer.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, informo que o
projeto de lei n.º 601/XIII (2.ª) — Reforça as obrigações de supervisão pelo Banco de Portugal e a transparência
na realização de auditorias a instituições de crédito e sociedades financeiras (trigésima sexta alteração ao
Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras) (PCP) foi retirado pelos seus autores.
Deram entrada na Mesa, e foram admitidas pelo Sr. Presidente, várias iniciativas legislativas.
Em primeiro lugar, refiro os projetos de lei n.os 602/XIII (2.ª) — Define quais os atos próprios dos médicos
veterinários (PAN), 603/XIII (2.ª) — Altera o Código do Trabalho, modificando o regime jurídico aplicável à
transmissão de empresa ou estabelecimento (PAN), 604/XIII (2.ª) — Estabelece um sistema de preços máximos
no setor do gás comercializado em garrafa ou canalizado, butano ou propano (PAN), 605/XIII (2.ª) — Altera o
Anexo I do Decreto-Lei n.º 114/2014, de 21 de julho, que estabelece os procedimentos necessários à
implementação do sistema de faturação detalhada, previsto na Lei n.º 12/2014, de 6 de março, que procedeu à
segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 194/2009, de 20 de agosto, relativamente aos serviços públicos de
abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos urbanos (PAN) e
606/XIII (3.ª) — Altera o regime jurídico aplicável à transmissão de empresa ou estabelecimento (PS).
Deram igualmente entrada na Mesa os projetos de resolução n.os 1047/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo
que promova o investimento em infraestruturas ferroviárias e rodoviárias com vista a melhorar a mobilidade dos
cidadãos, a coesão territorial, a competitividade das empresas e a sustentabilidade ambiental (CDS-PP),
1048/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo o reforço da fiscalização do mercado do gás engarrafado, por forma
a reduzir a diferença existente entre o preço de referência e o preço médio de venda ao público (CDS-PP),
1049/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo a publicação, por concelho, das áreas ardidas nos grandes incêndios
florestais (CDS-PP), que baixa à 7.ª Comissão, 1050/XIII (2.ª) — Rejeita a aprovação, para ratificação, do Acordo
Económico e Comercial Global (CETA) entre a União Europeia e o Canadá (PCP), 1051/XIII (2.ª) —
Recomendação ao Governo relativamente ao Plano Estratégico de Transportes e Infraestruturas (PETI 3+)
(PSD), 1052/XIII (2.ª) — Pela rejeição do Acordo Económico e Comercial Global — CETA (União Europeia-
Canadá) (BE), 1053/XIII (2.ª) — Pela rejeição do Acordo Global de Economia e Comércio entre a União Europeia
e o Canadá (CETA) (PAN), 1054/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que, em articulação e com o envolvimento
do município de Braga, garanta a preservação, requalificação e valorização do recolhimento de Santa Maria
Madalena ou das convertidas, em Braga (CDS-PP), que baixa à 12.ª Comissão, 1055/XIII (3.ª) — Recomenda
ao Governo que promova uma forma eficaz de divulgação dos dados referentes à qualidade da água junto dos
consumidores (CDS-PP) e 1059/XIII (3.ª) — Deslocação do Presidente da República a Angola (Presidente da
AR).
Finalmente, deu ainda entrada na Mesa a apreciação parlamentar n.º 45/XIII (2.ª) — Relativo ao Decreto-Lei
n.º 95/2017, de 10 de agosto, que regula a transferência para a Caixa Geral de Aposentações, IP, do encargo
financeiro com os complementos de pensão dos trabalhadores da Carris (BE).
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É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário Duarte Pacheco.
Resta-me dar conta aos Srs. Deputados da ordem do dia de amanhã.
Os nossos trabalhos iniciar-se-ão às 15 horas, com a apreciação conjunta, na generalidade, da proposta de
lei n.º 75/XIII (2.ª) — Estabelece o direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género
e o direito à proteção das caraterísticas sexuais de cada pessoa e dos projetos de lei n.os 242/XIII (1.ª) —
Reconhece o direito à autodeterminação de género (BE) e 317/XIII (2.ª) — Assegura o direito à
autodeterminação de género (PAN).
Segue-se um segundo ponto, em que serão discutidos, na generalidade, os projetos de lei n.os 593/XIII (2.ª)
— Estabelece a segregação funcional da autoridade de resolução dentro do Banco de Portugal (PSD), 594/XIII
(2.ª) — Procede à quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 228/2000, de 23 de setembro, que cria o Conselho
Nacional de Supervisores Financeiros (PSD), 595/XIII (2.ª) — Reforça a transparência e as incompatibilidades
e impedimentos dos administradores e dirigentes do Banco de Portugal (PSD), 596/XIII (2.ª) — Procede à
segunda alteração à Lei n.º 67/2013, de 28 de agosto, que aprova a lei-quadro das entidades administrativas
independentes com funções de regulação da atividade económica dos setores privado, público e cooperativo
(PSD) e 597/XIII (2.ª) — Procede à quadragésima quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de
dezembro, que cria o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (PSD), conjuntamente
com o projeto de resolução n.º 1035/XIII (2.ª) — Recomenda o reforço dos mecanismos de supervisão financeira
da União Europeia e a conclusão da união bancária (PSD).
Serão ainda apreciados conjuntamente, na generalidade, os projetos de lei n.os 525/XIII (2.ª) — Define os
atos próprios dos médicos veterinários (PS) e 602/XIII (2.ª) — Define quais os atos próprios dos médicos
veterinários (PAN).
Assim chegamos ao fim dos nossos trabalhos.
Desejo-vos um resto de boa tarde.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 45 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.