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Quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018 I Série — Número 50
XIII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2017-2018)
REUNIÃOPLENÁRIADE21DEFEVEREIRODE 2018
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretários: Ex.mos Srs. Pedro Filipe dos Santos Alves Idália Maria Marques Salvador Serrão Sandra Maria Pereira Pontedeira
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 3
minutos, tendo, de seguida, felicitado o Grupo Parlamentar do PSD pela realização do Congresso daquele partido.
Deu-se conta da apresentação da proposta de lei n.º 111/XIII (3.ª), dos projetos de lei n.os 777 a 780/XIII (3.ª) e dos projetos de resolução n.os 1330 a 1349/XIII (3.ª).
Em declaração política, a Deputada Diana Ferreira (PCP) manifestou-se contra a anunciada intenção de compra do Grupo Media Capital pela multinacional Altice, o que considerou ter graves consequências para o País, tendo defendido que o Governo dispunha dos mecanismos necessários para travar o negócio. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Pedro Delgado Alves (PS), Pedro Pimpão (PSD), Vânia Dias da Silva (CDS-PP) e Heitor Sousa (BE).
Em declaração política, a Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes) insurgiu-se contra a decisão do Governo espanhol pelo licenciamento de exploração da mina de urânio em Retortillo, próximo da fronteira portuguesa, sem consultar o Estado português, e apelou a todos os grupos parlamentares
para aprovarem um projeto de resolução do seu partido com vista a travar esse processo de exploração. Deu, depois, resposta a pedidos de esclarecimento dos Deputados Emília Cerqueira (PSD), Pedro Soares (BE), Patrícia Fonseca (CDS-PP), Miguel Tiago (PCP) e Santinho Pacheco (PS).
Em declaração política, o Deputado Feliciano Barreiras Duarte (PSD) assinalou a realização do 37.º Congresso do seu partido, no qual foi aprovada uma nova estratégia política na sequência da eleição de Rui Rio para líder do PSD, tendo ainda cumprimentado o Presidente cessante do seu grupo parlamentar, bem como toda a sua equipa. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Pedro Filipe Soares (BE), Ana Catarina Mendonça Mendes (PS), Nuno Magalhães (CDS-PP), João Oliveira (PCP) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Em declaração política, o Deputado João Galamba (PS) enalteceu os dados relativos ao crescimento económico do País, comparando-os com os de outros países de Europa, e criticou aqueles que desvalorizam esses dados. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados
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Cecília Meireles (CDS-PP), Paulo Sá (PCP), António Costa Silva (PSD) e Mariana Mortágua (BE).
Em declaração política, o Deputado Pedro Soares (BE), a propósito da abertura da mina de urânio a céu aberto em Retortillo, junto à fronteira portuguesa, pediu ao Governo português uma atitude firme junto do Governo espanhol e das instâncias europeias para salvaguarda dos interesses nacionais face aos impactos ambientais que essa exploração terá para o nosso País. Posteriormente, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados José Manuel Carpinteira (PS), Paula Santos (PCP), Emília Cerqueira (PSD) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Em declaração política, a Deputada Patrícia Fonseca (CDS-PP) acusou o Governo de estar a tomar medidas que põem em risco não só o modelo de desenvolvimento do setor agrícola mas também o da floresta, tendo, depois, dado resposta a pedidos de esclarecimento dos Deputados João Azevedo Castro (PS), Nuno Serra (PSD), João Ramos (PCP) e Pedro Soares (BE).
Procedeu-se à apreciação conjunta da petição n.º 273/XIII (2.ª) — Solicitam a desvinculação de Portugal do Tratado e Protocolos Modificativos ao Acordo Ortográfico de 1990 e a revogação da Resolução do Conselho de Ministros n.º 8/2011 (António Duarte Arnaut e outros) e do projeto de resolução n.º 1340/XIII (3.ª) — Recomenda o recesso de Portugal do Acordo Ortográfico de 1990, acautelando medidas de acompanhamento e transição, a realização de um relatório de balanço da aplicação do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa e uma nova negociação das bases e termos de um eventual acordo ortográfico (PCP). Proferiram intervenções os Deputados Ana Mesquita (PCP), José Carlos Barros (PSD), Diogo Leão (PS), Nuno Magalhães (CDS-PP) e Jorge Campos (BE).
Deu-se conta da entrada na Mesa do projeto de lei n.º 781/XIII (3.ª) e dos projetos de resolução n.os 1350 e 1351/XIII (3.ª).
O Presidente (Jorge Lacão) encerrou a sessão eram 18 horas e 16 minutos.
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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, está aberta a
sessão.
Eram 15 horas e 3 minutos.
Peço aos Srs. Agentes da autoridade o favor de abrirem as portas das galerias ao público.
Srs. Deputados, antes de entrarmos na ordem do dia, gostaria de felicitar o Grupo Parlamentar do PSD pela
realização do seu Congresso que teve lugar no passado fim de semana. Um abraço a todos.
Peço, ainda, ao Sr. Secretário Pedro Alves o favor de proceder à leitura de expediente.
O Sr. Secretário (Pedro Alves): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa várias iniciativas
legislativas.
Refiro a proposta de lei n.º 111/XIII (3.ª) — Autoriza o Governo a aprovar um regime fiscal e contributivo mais
favorável para a atividade de transporte marítimo e um regime especial de determinação de matéria coletável
com base na tonelagem de navios, que baixa à 5.ª Comissão.
Deram também entrada na Mesa os projetos de lei n.os 777/XIII (3.ª) — Determina a prorrogação dos
contratos de bolsas de investigação, dos contratos de bolsa no âmbito de projetos de investigação científica e
outros similares (PSD), que baixa à 8.ª Comissão, 778/XIII (3.ª) — Revoga o regime excecional e temporário
relativo à reabilitação de edifícios ou de frações estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 53/2014, de 8 de abril, relativo
a riscos sísmicos e outros (PAN), que baixa à 11.ª Comissão, 779/XIII (3.ª) — Repõe a possibilidade de
acumulação das prestações por incapacidade permanente com a parcela da remuneração correspondente à
percentagem de redução permanente da capacidade geral de ganho do trabalhador (PCP), que baixa à 10.ª
Comissão, e 780/XIII (3.ª) — Estabelece o regime de recuperação do controlo público dos CTT (PCP).
Deram ainda entrada na Mesa os projetos de resolução n.os 1330/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que
implemente a obrigatoriedade de informação sobre operações urbanísticas de reabilitação ocorridas em edifícios
ou frações relativamente aos padrões e normas técnicas que foram ou não cumpridos (PAN), que baixa à 11.ª
Comissão, 1331/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo urgência na reabilitação e requalificação da Escola
Secundária do Restelo (CDS-PP), que baixa à 8.ª Comissão, 1332/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a
imediata suspensão de novas demolições na ilha da Culatra e o tratamento em pé de igualdade de todos os
seus núcleos populacionais (BE), que baixa à 11.ª Comissão, 1333/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que
proceda à célere elaboração e implementação de um novo Plano Nacional de Prevenção e Combate ao Tráfico
de Seres Humanos (PAN), que baixa à 1.ª Comissão, 1334/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a criação de
uma plataforma de valorização do agroalimentar português (CDS-PP), 1335/XIII (3.ª) — Pelo fim das demolições
nas ilhas-barreira da Ria Formosa (PCP), que baixa à 11.ª Comissão, 1336/XIII (3.ª) — Reparação dos danos
ambientais causados pelas forças militares norte-americanas estacionadas na Base das Lajes (CDS-PP), que
baixa à 11.ª Comissão, 1337/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que tome medidas de reforço da investigação,
experimentação, apoio, acompanhamento e aconselhamento agrícola (PCP), 1338/XIII (3.ª) — Recomenda ao
Governo que tome medidas de apoio e valorização da produção de castanha (PCP), que baixa à 7.ª Comissão,
1339/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a criação da zona especial de proteção (ZEP) do centro histórico do
Porto (PCP), que baixa à 12.ª Comissão, 1340/XIII (3.ª) — Recomenda o recesso de Portugal do Acordo
Ortográfico de 1990, acautelando medidas de acompanhamento e transição, a realização de um relatório de
balanço da aplicação do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa e uma nova negociação das bases e
termos de um eventual acordo ortográfico (PCP), 1341/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que crie um comité
científico eco-agro-alimentar (PAN), 1342/XIII (3.ª) — Reversão da privatização dos CTT (Os Verdes), 1343/XIII
(3.ª) — Pela preservação e valorização do porto comercial de Faro (PCP), que baixa à 6.ª Comissão, 1344/XIII
(3.ª) — Pela melhoria do transporte ferroviário no Algarve (PCP), que baixa também à 6.ª Comissão, 1345/XIII
(3.ª) — Pelo aproveitamento pleno das potencialidades do porto comercial de Portimão (PCP), que baixa à 6.ª
Comissão, 1346/XIII (3.ª) — Em defesa das pequenas empresas de rent-a-car e de transfer que desenvolvem a
sua atividade no aeroporto de Faro (PCP), que baixa, igualmente, à 6.ª Comissão, 1347/XIII (3.ª) — Pela criação
da administração dos portos do Algarve, integrando todos os portos comerciais, de pesca e de recreio da região
algarvia (PCP), que baixa à 6.ª Comissão, 1348/XIII (3.ª) — Pela abolição das portagens na Via do Infante e
rápida conclusão das obras de requalificação na EN125 (PCP), que baixa à 6.ª Comissão, e 1349/XIII (3.ª) —
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Recomenda ao Governo a aprovação de medidas compensatórias específicas dirigidas aos produtores de
castanha (PS), que baixa à 7.ª Comissão.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar ao primeiro ponto da ordem do dia, que consta de
declarações políticas.
Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, do Grupo Parlamentar do PCP.
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A realidade tem vindo a dar razão ao PCP
quando se pronuncia contra a entrega a interesses privados de empresas e setores estratégicos que deveriam
estar nas mãos do Estado ao serviço do desenvolvimento do País.
Hoje, a PT (Portugal Telecom) está sob controlo da multinacional Altice — que é o mesmo que dizer que o
capital estrangeiro controla a maior operadora de telecomunicações do País, empresa líder de mercado na
televisão por cabo, operadora única da TDT (televisão digital terrestre), detendo, nas suas mãos privadas, o
acesso universal, as condições de acesso e a emissão de canais do serviço público de televisão —, dona da
rede de fibra ótica e detentora da rede do SIRESP (Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança
de Portugal), com significativa participação enquanto acionista deste serviço, controlando assim o sistema de
comunicações de emergência do nosso País.
Hoje, a PT, uma grande empresa nacional e absolutamente estratégica no plano das telecomunicações, está
nas mãos de quem tem interesses contrários aos interesses nacionais.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — A Altice chegou deixando claro ao que vinha: afirmações do seu fundador
em como não gostava de pagar salários e que pagaria o mínimo que pudesse; a gigantesca operação de
chantagem, repressão e assédio sobre os trabalhadores da PT; a intenção de despedimento de milhares de
trabalhadores; a perpetuação da precariedade; a fraude que praticou, recorrendo abusivamente à utilização
ilícita das regras da transmissão de estabelecimento; a fuga às suas responsabilidades, como na questão da
reposição das redes de telecomunicações para muitas populações das regiões afetadas pelos incêndios de
outubro que ainda hoje aguardam essas ligações.
Deixou claro ao que vinha e que tudo valia para maximizar lucros e alargar esferas de influência.
O almejado alargamento do polvo da Altice, evidente na anunciada intenção da compra do Grupo Media
Capital, não pode ser ignorado no debate político, não pode ser confiado nem escondido por uma decisão
supostamente técnica de uma qualquer entidade reguladora, mais preocupada com a árvore do que com a
floresta, não pode ser encarado como um qualquer negócio entre empresas privadas de «importação de
sabonetes», pois é da soberania nacional que estamos a falar.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — A sua eventual concretização poria nas mãos da Altice, multinacional de
capitais estrangeiros, além de todas as dimensões estratégicas que já domina, canais de televisão abertos e de
cabo, rádios, portal da internet, produção de conteúdos, numa concentração de propriedade e titularidade dos
órgãos de comunicação social que viola princípios constitucionais, designadamente os artigos 38.º e 39.º da
Constituição.
A concentração monopolista assumiria aqui uma dimensão nunca vista de um conglomerado de poder, com
o domínio das principais plataformas mediáticas e o poder quase absoluto das telecomunicações, de que
resultariam profundíssimas e gravíssimas implicações no plano económico, social, cultural e político, no
condicionamento da liberdade de informação e do pluralismo e, neste sentido, do próprio regime democrático,
pondo em causa a soberania e os interesses nacionais.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
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A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Todo o processo de privatização da PT demonstra que este negócio não
pode acontecer. Todas as consequências desastrosas para os seus trabalhadores e para um tão importante e
estratégico setor como o das telecomunicações, vendido às peças e muito longe de responder às necessidades
da população e do País, o evidenciam.
O PCP não compactuará com silêncios e abstenções, mais ou menos constrangidos ou comprometidos,
nesta matéria — silêncios e abstenções significam cumplicidade com todo este processo.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Entendemos que o Governo dispõe de todos os mecanismos necessários e
possíveis para travar este negócio e defender o interesse nacional. E não precisa de esperar por pareceres de
entidades reguladoras, que podem ser simplesmente descartáveis ou, mesmo, inqualificáveis e inaceitáveis do
ponto de vista democrático, como se viu no caso da ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação Social).
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em 1994, era criada a Portugal Telecom, SA, que juntava a TP (Telecom
Portugal), os TLP (Telefones de Lisboa e Porto) e a TDP (Teledifusora de Portugal), absorvendo, em 1995, a
Marconi.
Ainda nesse ano, pelas mãos de um Governo do PSD, realizou-se a primeirafase de privatização da PT,
seguida de uma segunda fase em 1996, uma terceira em 1997, uma quarta em 1999 e uma quinta fase em
2000, já tendo entregue a quase totalidade da Portugal Telecom — aquela que já foi a maior empresa nacional
— a privados, ficando o Estado limitado às 500 ações golden share, literalmente oferecidas, 11 anos mais tarde,
pelo Governo de PSD de então, aos acionistas privados.
Pelo meio, às mãos de sucessivos governos, tiveram lugar vários episódios ilustradores do vergonhoso
processo de desmantelamento da PT — a venda da Vivo à Telefónica, distribuindo-se milhões em dividendos
pelos acionistas, livres de impostos; os milhões aplicados na brasileira Oi; a fusão da PT e da Oi; a venda, por
uma bagatela, da rede fixa pública de telecomunicações à PT; a gestão danosa na PT e o empréstimo de 900
milhões de euros desta à Rioforte; e, cereja no topo do bolo, a venda da PT à multinacional Altice.
O percurso por estas datas e momentos é fundamental para que falemos hoje das consequências
desastrosas da privatização da PT para o nosso País e para os trabalhadores desta empresa.
E, neste caso da operação de assalto da Altice para a compra do Grupo Media Capital, não estamos apenas
perante um negócio com gravíssimas consequências para o País, estamos perante um processo que constitui
um grave atentado à democracia, à soberania e ao interesse nacional.
O PCP intervirá para travar este assalto da Altice à Media Capital, para defender os interesses do País, os
direitos dos trabalhadores destes setores, para que se faça um caminho de regresso da PT ao controle público.
Só assim se impedirá que os interesses dos grupos económicos e a sua ganância de acumular cada vez
mais lucros se sobreponham aos interesses do País e aos interesses e direitos dos portugueses.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, inscreveram-se quatro Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.
Como deseja responder?
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, respondo em grupos de dois.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputadas, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, o
Partido Socialista saúda-a pela preocupação demonstrada e pela oportunidade da declaração política que
acabou de fazer, porque partilhamos e acompanhamos também muitas das preocupações expressas na sua
intervenção.
Aliás, num dos vários domínios que são suscitados e em relação ao qual já tivemos oportunidade de nos
pronunciar, o domínio laboral, não só partilhamos como penso que conseguimos ser consequentes com a
preocupação, subscrevendo e apresentando conjuntamente formas de, no futuro, e em relação a casos
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similares, conseguir prevenir a ocorrência de problemas que menorizam, efetivamente, a proteção dos
trabalhadores.
Penso que o aspeto que quis focar nesta sua intervenção diz bem mais respeito à matéria da concentração
no setor das telecomunicações e da comunicação social e, de facto, aí, são evidentes os riscos que se
apresentam e a necessidade de ser particularmente claros no exercício pleno de todas as competências e de
todos os poderes que são conferidos às entidades públicas.
Há muito tempo que o Partido Socialista sublinha que é fundamental termos regras claras sobre transparência
na titularidade dos órgãos de comunicação social e que existam limites à concentração dos meios, sejam eles
quando respeitam ao mesmo setor ou mesmo limites diagonais, matéria que, até hoje, nem sempre foi possível
concretizar como gostaríamos, mas, de facto, o problema com o qual nos deparamos é o de que temos um
modelo que coloca muito da análise de um processo como este nas mãos dos reguladores setoriais, seja a
Autoridade da Concorrência, seja também, em particular, a ERC.
É, portanto, neste quadro que temos de trabalhar e é este o quadro que vigora para resolver e emitir uma
pronúncia sobre esta matéria. E é precisamente aqui, olhando, em particular, para aquela que deve ser a posição
de uma entidade reguladora da comunicação social num Estado de direito democrático, tendo em conta que a
sua função não é apenas a de acautelar um setor mas também a de defesa de direitos fundamentais e de um
património indispensável ao funcionamento da democracia, que é a existência de uma comunicação social livre,
não condicionada por qualquer tipo de pressões externas, económicas ou de outra natureza, que verificamos
que, efetivamente, a possibilidade que está em cima da mesa é geradora de suficientes riscos e dúvidas e, por
isso, todos os elementos merecem uma apreciação bastante concreta.
Dito isto, Sr.ª Deputada — e esta é a minha questão —, num quadro regulatório como aquele que temos
atualmente, num quadro regulatório que eminentemente delegou e transferiu…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado, pois já ultrapassou o tempo de que dispunha.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, num quadro regulatório que, essencialmente, delegou e colocou esta tarefa nas mãos
dos reguladores setoriais, que mecanismos é que a Sr.ª Deputada entende existirem, para além deste, que é,
efetivamente, o quadro constitucional e legal no qual temos de trabalhar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Pimpão, do Grupo
Parlamentar do PSD.
O Sr. Pedro Pimpão (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, veio
aqui falar-nos sobre um negócio que já foi debatido, nomeadamente dentro daquelas que são as nossas
competências, no âmbito da 12.ª Comissão (Comissão de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto),
tivemos oportunidade de ouvir a opinião dos membros que faziam parte do Conselho Regulador da ERC,
conhecemos as reservas que o parecer da ANACOM coloca quanto a este negócio e o que sabemos também é
que, neste momento, estamos à espera da pronúncia por parte da Autoridade da Concorrência, para
conhecermos o destino final do negócio entre estes dois intervenientes.
Mas, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, o que gostava de ter ouvido da tribuna era a preocupação que o PCP
deveria ter com o setor da comunicação social em geral.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
O Sr. Pedro Pimpão (PSD): — Era essa preocupação que gostava de ter ouvido da tribuna, de acordo com
o que hoje se passou aqui, na Assembleia da República. Hoje, na Assembleia da República, no período da
manhã, tivemos oportunidade de testemunhar uma conferência sobre a imprensa centenária, foi inaugurada
uma exposição sobre a imprensa centenária,…
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A Sr.ª Rita Rato (PCP): — E?…
O Sr. Pedro Pimpão (PSD): — … tivemos cá jornalistas, redatores, diretores de jornais a falarem das
dificuldades que sentem no dia a dia para continuarem a cumprir a sua missão e a Sr.ª Deputada Diana Ferreira
vai à tribuna e não é capaz de dirigir uma palavra a estes profissionais da comunicação social que passam
dificuldades e que não têm uma palavra da parte deste Governo.
Aplausos do PSD.
Pensava que ia falar nisso, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, juro que pensava que ia aproveitar esta
oportunidade para fazer um mea culpa por suportar um Governo que tem pouca relevância ao nível da aposta
na comunicação social.
Protestos do PCP.
Mas vou dizer-lhe: em relação a incentivos à imprensa local e regional, em 2016 e 2017, houve dinheiro, mas
o dinheiro não chegou a quem precisava dele.
Estamos, neste momento, a assistir a dificuldades económico-financeiras de órgãos de comunicação social,
de imprensa local, regional e nacional, que passa dificuldades e que merecia uma palavra de apoio da parte
deste Governo, mas não há uma palavra dos Deputados que suportam o Governo nesta Câmara, precisamente
no sentido de suprir as dificuldades da comunicação social em Portugal.
Por isso, Sr. Presidente, e uma vez que nem sequer no acordo de suporte parlamentar…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado, já ultrapassou o tempo de que dispunha.
O Sr. Pedro Pimpão (PSD): — … que dá apoio a este Governo a comunicação social foi debatida, analisada
e proposta alguma medida, vou terminar, apelando ao Partido Comunista no sentido de que a Sr.ª Deputada
aproveitasse esta oportunidade para se redimir e, perante esta Câmara,…
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Pimpão (PSD): — … dizer o que é que o PCP vai propor para melhorar os órgãos de
comunicação social que passam dificuldades no nosso País.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, do Grupo Parlamentar
do PCP.
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, antes de mais, agradeço as questões colocadas pelos Srs.
Deputados Pedro Delgado Alves e Pedro Pimpão.
Gostaria de começar, exatamente, pelo Sr. Deputado Pedro Pimpão, dizendo que o Grupo Parlamentar do
PCP teve oportunidade de intervir na sessão que teve lugar esta manhã, manifestando profundas preocupações
com os profissionais do setor da comunicação social, e manifestando essas preocupações com os profissionais
do setor privado e do setor público da comunicação social, bem como com as situações de precariedade e dos
baixos salários, sendo que esta não foi a primeira vez, e não será, com certeza, a última, que o fizemos.
Enquanto este problema não se resolver, o PCP intervirá ou colocará em cima da mesa as preocupações que
tem com as condições de trabalho dos profissionais do setor da comunicação social, jornalistas e outros.
Por isso, sobre a intervenção do PCP nessa matéria, que, aliás, é ampla e de há vários anos, penso que
estamos devidamente esclarecidos.
Quanto às preocupações manifestadas aqui com os problemas sentidos até pelas próprias empresas de
comunicação social, Sr. Deputado, importa dizer que a realidade da concentração dos meios de comunicação
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social num punhado de grupos económicos está também na origem de muitos desses problemas com que o Sr.
Deputado aqui disse estar preocupado,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — … mas relativamente aos quais o PSD, enquanto esteve no Governo, nada
fez,…
O Sr. Pedro Pimpão (PSD): — Isso não é verdade!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — … não resolveu o problema dessas empresas nem interveio para melhorar
as condições de trabalho dos trabalhadores do setor da comunicação social.
Aplausos do PCP.
Importa, ainda, registar aqui, Sr. Deputado Pedro Pimpão, que, sobre a Altice e o risco que a Altice
representa, com a possível compra do Grupo Média Capital, o PSD nada tem a dizer, o PSD não tem uma
opinião de preocupação,…
Aplausos do PCP.
… o PSD não está preocupado com as consequências para o País da concretização deste negócio.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, para terminar, gostaria de lhe dizer o
seguinte: nós entendemos que o Governo tem todos os mecanismos legais e constitucionais para intervir e
poder, efetivamente, travar este processo.
Este processo, este assalto da Altice à Média Capital, mais do que um problema regulador, que não o é, é
efetivamente um problema político, é uma questão de defesa do interesse nacional, de defesa da nossa
soberania. E, neste âmbito, o Governo tem todas as condições, todas as competências e todos os instrumentos
legais e constitucionais para intervir e travar este assalto da Altice à Média Capital, impedindo que este negócio
se concretize. É uma responsabilidade que o Governo deve, efetivamente, assumir.
Ainda a este propósito, importava aqui lembrar também que a Altice não cumpriu com as suas
responsabilidades, por exemplo, no que se refere ao restabelecimento das ligações para as populações afetadas
pelos incêndios, o que, por si só, é motivo mais do que suficiente para que, efetivamente, o Governo intervenha,
pois a fuga às responsabilidades, por parte desta empresa, é um espelho daquela que é a sua prática no nosso
País.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Vânia Dias da
Silva, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Diana
Ferreira, antes de mais, queria agradecer-lhe por ter trazido este problema a Plenário.
À primeira vista, parecia até que concordaríamos nalguns termos do problema que aqui nos colocou, mas,
depois, ouvindo a intervenção da Sr.ª Deputada, percebemos que, afinal, não, que, afinal, o PCP não surpreende
e põe o foco no negócio, enquanto o CDS entende que a política não tem de entrar nos negócios e os negócios
não têm de entrar na política.
Protestos do PCP.
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Para nós, os negócios devem seguir livremente e, nos setores regulados, quem tem de intervir não são os
políticos, são os reguladores, porque é para isso que existem, é para isso que lá estão. Exatamente por isso, o
CDS, muito antes de o PCP ter tratado desta questão, pôs o dedo na ferida e perguntou à Entidade Reguladora
para a Comunicação Social por que é que se tinha eximido de emitir o parecer a que estava obrigada.
A ERC eximiu-se do parecer a que estava obrigada no passado, com a anterior direção, e eximiu-se agora
também, depois da pergunta do CDS, no sentido de saber se não queria emendar a mão e, sim, emitir agora o
parecer que está em falta, que devia ter emitido e que, infelizmente, não emitiu. A nova ERC — veja-se só! —
entendeu que também não valia a pena pronunciar-se, porque a administração anterior tinha decidido e tinha-
se pronunciado relativamente à comunicação social, o que, na nossa opinião, é um erro, e um grave erro.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — E vai daí…
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr.ª Deputada, o que lhe queria perguntar neste domínio é se, para
além das preocupações com o negócio, o PCP está efetivamente preocupado com o estado de coisas em que
se encontra a comunicação social, com a vida futura dos nossos jornais, da nossa imprensa, das nossas
televisões, porque é esse o nosso foco, é isso que deve preocupar-nos a todos.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Estou mesmo a concluir, Sr. Presidente.
Como sabe, e há pouco na conferência dizíamos isso mesmo, a imprensa é um pilar essencial da nossa
democracia e, se nada se fizer pela nossa comunicação social, podemos também pôr em causa a nossa
democracia.
O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Portanto, pergunto-lhe, Sr.ª Deputada, o que tem o PCP a dizer
nesse domínio, muito mais do que imiscuir-se nos negócios dos particulares.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem, ainda, a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Heitor Sousa, do
Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
O Sr. Heitor Sousa (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, queria começar por lhe agradecer
o facto de ter feito a sua declaração política, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, sobre a multinacional
Altice e a política que ela tem desenvolvido e continua a querer desenvolver na área das telecomunicações e
por lhe dizer, Sr.ª Deputada, que estou completamente de acordo em que esta ocasião, aliás, desde o último
ano a esta parte todos os dias são adequados e oportunos para falar da política da Altice. A própria Altice
desmente a Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, quando diz que os negócios não se devem misturar com a
política, porque é a própria Altice que faz questão de misturar a política com os seus negócios; caso contrário,
não teria vindo aqui atrever-se a fazer queixinhas sobre um grupo parlamentar que, cumprindo o seu contrato
de confiança com a população portuguesa, apresentou um projeto de lei em defesa da recuperação da
propriedade e da gestão pública da rede básica de telecomunicações, que foi privatizada desde o início pelo
PSD e concluída também pelo PSD.
O rosto da política de privatização da Portugal Telecom, em Portugal, é de um único partido: o PSD. Desde
o tempo de Cavaco Silva até Pedro Passos Coelho, há uma linha política contínua e sistemática de privatização
da rede de telecomunicações e de entrega da gestão a grupos privados. O resultado da entrega dessa gestão
a grupos privados é suficientemente importante e relevante para que nós, aqui, discutamos a urgência de fazer
regressar a rede de telecomunicações ao controlo público.
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Nesse sentido, o Bloco de Esquerda já apresentou nesta Assembleia da República um projeto de lei que
esperamos que seja discutido e aprovado no próximo dia 16 de março.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado. Já ultrapassou o tempo de que dispunha.
O Sr. Heitor Sousa (BE): — Queria, portanto, perguntar-lhe, Sr.ª Deputada, para concluir, se não acha que
já é tempo suficiente de experiências e de conseguir suportar a agressão…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de terminar. Também acho que já é tempo suficiente.
O Sr. Heitor Sousa (BE): — … que a multinacional Altice tem provocado nos direitos de telecomunicações
do povo português, para reverter esta privatização desastrosa.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, do Grupo Parlamentar
do PCP.
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, agradeço também as questões colocadas pela Sr.ª Deputada
Vânia Dias da Silva e pelo Sr. Deputado Heitor Sousa.
Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, permita-me que lhe diga, desde já, que, para o CDS, pelos vistos, a
defesa do interesse nacional é imiscuir-se em negócios privados.
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Não!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — É que quando suscitamos a preocupação sobre o negócio da Altice e da
Média Capital é exatamente porque nos preocupa a defesa do interesse nacional.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Mas há uma questão que, naturalmente, tem de ser colocada à cabeça e
como fator essencial desta discussão, que é a do regresso da PT ao controlo público.
Vozes do CDS-PP: — Ah!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — É que se a PT se tivesse mantido nas mãos do Estado, provavelmente, não
estaríamos hoje, aqui, a ter esta discussão.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Poderíamos estar a ter outras discussões e a fazer outros debates políticos,
mas não esta, que estamos hoje aqui a fazer, de uma maior concentração de uma fileira estratégica que abarca
redes de comunicação, canais de televisão, rádios, portais de internet, fileira estratégica, essa, que está ou pode
vir a estar nas mãos de uma única empresa.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — É disto, Sr.ª Deputada, que estamos a falar e isto não é uma questão
regulatória,…
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — É, é!
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A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — … isto é uma questão política que resulta de opções políticas de diversos
governos que quiseram privatizar a PT.
Aplausos do PCP.
É disto que estamos aqui a falar, porque esta discussão resulta exatamente de todo o processo de
privatização da PT. Estivesse a PT nas mãos do Estado e esta não seria uma discussão que estivesse a ter
lugar neste momento.
Sr.ª Deputada, também importava reforçar que, de facto, esta questão de se travar este negócio não tem a
ver com o imiscuir-se em negócios privados por parte da política, mas, sim, com a defesa da nossa soberania,
com a defesa nacional do nosso País, com a nossa segurança, porque não podemos esquecer aquilo que
sucedeu no âmbito do SIRESP (Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal), quando
dos trágicos acontecimentos do ano passado e as consequências que isto tem, ainda hoje, para as populações.
Mas disso o CDS não estará interessado em falar.
Sr. Deputado Heitor Sousa, agradeço também a intervenção que fez e reitero aqui algo sobre o controlo
público da PT, que é, de facto, fundamental.
As empresas e os setores estratégicos do nosso País não podem estar à mercê dos interesses privados,
nem podem servir para que grupos económicos cavalguem para aumentar a sua riqueza à custa desses setores
estratégicos, à custa até de serviços e de bens que deviam estar ao serviço dos interesses das populações e
do desenvolvimento do País.
A melhor maneira de contribuir para que se possa travar este negócio é o Governo intervir com todos os
mecanismos legais e constitucionais que tem ao seu dispor e tomar as devidas medidas para que a PT regresse
ao controlo público, para que regresse às mãos do Estado, enquanto empresa e setor estratégico e fundamental,
que é, para o nosso País, a fim de garantir condições de vida às nossas populações e contribuir para o
desenvolvimento do País.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma declaração política, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje, na Comissão de
Ambiente, o Sr. Ministro do Ambiente foi questionado sobre diversas matérias, designadamente sobre a
exploração mineira de urânio em Retortillo, Salamanca, e sobre os seus impactos em Portugal.
Sr.as e Srs. Deputados, é de radioatividade que estamos a falar, de um projeto que se encontra a cerca de
30 km da fronteira portuguesa, com impacto direto no nosso território, designadamente sobre o rio Douro.
Ora, Sr.as e Srs. Deputados, subo hoje, em nome de Os Verdes, a esta tribuna, depois desta reunião da
Comissão, e depois de ouvir as respostas do Sr. Ministro do Ambiente, para fazer um apelo a todos os grupos
parlamentares. O apelo é no sentido de aprovem o projeto de resolução de Os Verdes, agendado para o próximo
dia 16 de março, que exorta o Governo a tomar diligências para, junto do Governo espanhol, travar o processo
para exploração de urânio em Retortillo, junto à nossa fronteira, com efeitos ambientais significativos para o
nosso País, tendo em conta que não houve avaliação de impactos transfronteiriços.
Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me salientar alguns aspetos do historial relativamente a esta matéria.
O processo iniciou-se em 2011, a empresa Berkeley apresentou um projeto para instalação da exploração
de mina de urânio a céu aberto, com uma unidade de reprocessamento de urânio, com cemitério de resíduos
radioativos.
Tendo tomado conhecimento do processo, Os Verdes puseram-se no terreno relativamente a esta matéria
e, em 2013, trouxeram-na expressamente à Assembleia da República, colocando uma pergunta ao Governo
sobre a matéria, à qual o Governo respondeu que não existia informação nem na Agência Portuguesa do
Ambiente (APA), nem na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC) referente
ao projeto a instalar em Retortillo.
Sr.as e Srs. Deputados, nesta altura já a avaliação de impacto ambiental estava a decorrer e com a declaração
de impacte ambiental praticamente a ser emitida, como o foi, favoravelmente, em final de 2013.
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Em 2014, Os Verdes fizeram uma deslocação ao local onde estava prevista a instalação do referido projeto
e, juntamente com o partido congénere espanhol, EQUO, apresentámos uma queixa à União Europeia,
alegando, nomeadamente, não ter havido avaliação de impactos transfronteiriços e também relativamente ao
impacto desse projeto na Rede Natura 2000, em Espanha.
Em 2017, a União Europeia acabou por abrir uma investigação relativamente a esta componente de impacto
sobre a Rede Natura 2000, mas não se pronunciou quanto à ausência de avaliação de impactos transfronteiriços.
Em 2015, Os Verdes voltam a questionar o Governo. Na resposta foi percetível que existia ainda um
desconhecimento profundo do projeto, pese embora os alertas que Os Verdes já tinham dado e também a
emissão de declaração de impacte ambiental, ia já para dois anos. Sempre a mesma conversa: «Estamos a
aguardar informação».
Em 2016, em resposta a outra pergunta de Os Verdes, o Governo, concretamente o Ministério do Ambiente,
respondeu, reconhecendo haver impactos sobre Portugal relativamente ao projeto em causa, reiterando a
deficiente informação que obteve sobre o projeto e dizendo que tinha intenção de abrir uma consulta pública em
Portugal, assim que chegasse a informação.
Em 2017, Os Verdes continuaram a pedir informações e respostas ao Governo aqui, na Assembleia da
República, através de perguntas escritas e, inclusive, num debate quinzenal com o Sr. Primeiro-Ministro.
Em 2018, particularmente hoje, é percetível que o Governo português continua, serenamente, a aguardar
informação de Espanha para aferir dos impactos do projeto sobre Portugal.
A verdade, Sr.as e Srs. Deputados, é que aqui está a colocar-se a mesma questão que já tivemos, várias
vezes, oportunidade de debater relativamente à questão de Almaraz, àquela central nuclear absolutamente
obsoleta e que já devia ter encerrado em 2010.
O Governo considera que tem o direito de ser informado, coloca-se numa atitude passiva — não apenas este
Governo, também o Governo anterior —, mas Os Verdes consideram que esta não é a atitude correta por parte
do Governo. O Governo tem de ter uma atitude proativa e tem de exigir o seu direito a participar na avaliação
de impacto ambiental, tendo em conta a componente dos impactos transfronteiriços.
É por isso, Sr.as e Srs. Deputados, que Os Verdes apelam à aprovação do projeto de resolução que
agendámos para o próximo dia 16 de março, porque a não existência de uma avaliação de impacto ambiental
transfronteiriço tornou o processo completamente desconforme para avançar seja por que via for e porque, Sr.as
e Srs. Deputados, há uma violação clara do protocolo de atuação entre o Governo português e o Governo de
Espanha na aplicação das avaliações ambientais de planos, programas e projetos com efeitos transfronteiriços.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, inscreveram-se os Srs. Deputados Emília Cerqueira, do Grupo
Parlamentar do PSD, Pedro Soares, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, Patrícia Fonseca, do Grupo
Parlamentar do CDS-PP, e Miguel Tiago, do Grupo Parlamentar do PCP, para formularem pedidos de
esclarecimento. Como pretende responder?
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, responderei aos pedidos de esclarecimento em
conjunto.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Emília Cerqueira.
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, saúdo Os Verdes por trazerem esta
matéria a debate, matéria que foi, aliás, discutida esta manhã, em audição regimental, com o Sr. Ministro do
Ambiente, e que o PSD trouxe também à discussão, dada a nossa preocupação, que partilhamos com Os
Verdes.
Como sabe, neste momento existem não só estas minas de urânio, mas várias outras e é importante que isto
se diga. Fala-se apenas em Retortillo, como se este fosse o único caso, mas temos Villar, Alameda, Águila e
Retortillo, numa espécie de triângulo, nas províncias de Salamanca. É uma preocupação grande aquela que o
PSD tem, como tem tido com Almaraz.
A nossa maior preocupação é ver a passividade do Governo desde que tomou conhecimento desta situação,
em 2016. Segundo informação da APA, o Governo português foi notificado, pela primeira vez, em 2016, sobre
a questão das minas de Retortillo, que estão em fase avançada. Preocupa-nos enormemente que apenas depois
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de uma visita da Comissão de Ambiente a Retortillo e aos municípios transfronteiriços, tenhamos visto o Governo
a tomar uma posição, inclusive o Primeiro-Ministro a dizer que iria auscultar o Governo espanhol sobre esta
matéria.
Ainda hoje de manhã, o Sr. Ministro do Ambiente acabou por ter esta mesma atitude passiva, que tem sido,
aliás, a matriz de atuação do Governo relativamente a estas matérias ligadas ao nuclear.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Portanto, estamos a falar, infelizmente, de uma situação muito mais
abrangente. Estamos a falar do projeto nuclear de Almaraz, do armazém de resíduos e, agora, da exploração
de urânio na zona transfronteiriça, sendo que a exploração destas minas de urânio, nos moldes em que se
encontra, sendo esta a maior mina de urânio ao ar livre — é importante que se diga isto, que é a céu aberto —,
pode causar grandes impactos ambientais deste lado da fronteira. Embora saibamos que o Governo português
não tem competência direta na gestão de Espanha, a verdade é que esperávamos que tivesse sido mais
proativo. Inclusive, estando esta questão já lançada ao Governo português — que tinha, desde 2016,
conhecimento oficial —, esperávamos que o Governo a tivesse levado à Cimeira Luso-Espanhola, que se
realizou em 2017, mas nada. Nem uma palavra nem uma linha nas suas conclusões e nos resumos, pelo menos
da documentação que nos fez chegar.
Esta é uma situação que nos preocupa enormemente. Preocupa-nos a implicação que pode ter nos lençóis
freáticos…
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe que termine.
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Terminarei, Sr. Presidente, perguntando a Os Verdes se, para além de
um projeto de resolução, que, como sabemos, vai parar quase sempre à gaveta, haverá alguma iniciativa
legislativa conjunta com vista ao impacto ambiental transfronteiriço.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Pedro Soares.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, é um facto que estamos
perante mais um grave episódio nas relações entre as autoridades portuguesas e as autoridades espanholas,
depois de tudo o que se passou com Almaraz.
A ideia com que ficamos é a de que parece que as autoridades portuguesas nada aprenderam com o
processo de Almaraz.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Bem visto!
O Sr. Pedro Soares (BE): — No caso de Retortillo, temos quatro atores principais: o Governo português
anterior, que não se pode eximir de responsabilidades porque esteve desde 2013 sem fazer nada relativamente
a esta matéria; o Governo atual, que continua a trocar correspondência com as autoridades espanholas, mas
não tem nenhuma atitude relativamente ao diálogo bilateral que tem de haver, mas também no quadro da União
Europeia, exigindo que o protocolo de atuação entre os dois países seja cumprido; também o Estado espanhol,
que se refugia em atitudes evasivas, que sonega informação, que não é transparente, que não é claro e que
não aplica as normas internacionais a que está obrigado; e, finalmente — sempre finalmente —, as populações
de um lado e do outro da fronteira, que, através dos seus autarcas, têm expressado a maior preocupação
relativamente à possibilidade de implantação destas minas de urânio em Retortillo.
A questão que gostaria de colocar, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, e agradecendo desde já ter trazido este
tema a debate em Plenário, na Assembleia da República, é a seguinte: que medidas é que a Assembleia da
República, de forma consensual, de forma convergente, porque é absolutamente necessário que assim seja,
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deve exigir ao Governo português, de modo a que as normas internacionais sejam aplicadas, de modo a que
seja travada a implantação da mina de urânio em Retortillo?
Isto porque está em causa o bem-estar das populações, está em causa, no território, o ambiente e a saúde
das populações, como, aliás, bem sabemos pela experiência que tivemos de exploração de urânio no nosso
País e que, felizmente, terminou há 17 anos com o encerramento das minas da Urgeiriça.
É fundamental travar…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, vou terminar.
É fundamental travar aquela iniciativa da Berkeley, é fundamental travar a exploração de urânio em Retortillo.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Patrícia Fonseca.
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, o CDS entende que Portugal tem de
respeitar a autonomia dos outros Estados, neste caso concreto de Espanha, mas Portugal também não deve
abdicar de exercer os seus direitos, no âmbito do protocolo sobre projetos com impacto transfronteiriço.
Neste como noutros casos, nomeadamente o de Almaraz, o Governo não nos transmite a nós, CDS, a mínima
confiança — penso que também estará de acordo connosco — nem de que Espanha esteja a cumprir, nem de
que Portugal esteja a ser firme na exigência do cumprimento desses compromissos.
Isto é claro para nós nas contradições que o próprio Sr. Ministro revela: primeiro, disse que Espanha honrará
os seus compromissos, mas ainda hoje de manhã veio dizer que só consegue obter informação do país vizinho
quando tirada a ferros. Disse também que tem acompanhado este assunto, mas ouvimos no domingo passado
os autarcas portugueses em Almeida dizerem que já colocaram diversas questões ao Governo, e até à
Administração Pública, mas que nunca obtiveram resposta, o que nos leva a questionar se, de facto, o Sr.
Ministro tem essas respostas, então, porque é que as guarda para ele.
O Sr. Ministro diz confiar no compromisso espanhol de informar Portugal sobre as decisões que venha a
tomar, mas a pergunta que lhe coloco, Sr.ª Deputada, é no sentido de saber se acha, e bem, que os portugueses
não podem ficar descansados no que diz respeito aos impactos para a qualidade do ambiente e da saúde pública
decorrentes do eventual avanço da exploração desta mina, já que faz parte desta solução governativa. Qual é
a estratégia que a Sr.ª Deputada entende ou tem planeada para, no fundo, fazer com que o Governo defenda
os interesses e o bem-estar dos cidadãos portugueses e a saúde pública?
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, em primeiro lugar, em nome
do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, quero cumprimentá-la pela iniciativa do Partido
Ecologista «Os Verdes» de trazer este tema ao Plenário.
Ainda hoje, durante a manhã, na Comissão de Ambiente, este tema foi amplamente debatido, sendo
importante que todo o Plenário da Assembleia da República possa ser envolvido nesta discussão.
Tudo indica que, de facto, o Estado espanhol se esteja a preparar para seguir adiante com a estratégia de
implantação de uma exploração mineira de urânio a 39 km da fronteira portuguesa, próxima de cursos de água
que são afluentes do Douro e onde existe um regime de ventos predominantes que pode também pôr em causa
a qualidade do ar que é respirado pelos portugueses, com a suspensão de partículas radioativas.
Face aos indícios de que o Estado espanhol pretende avançar com esta exploração, é, pois, absolutamente
determinante que sejam tomadas todas as medidas para garantir a saúde pública, a defesa do ambiente, o bem-
estar dos portugueses e, evidentemente, com particular intensidade, as populações do distrito da Guarda, na
zona de Almeida, que se encontram mais próximas desta exploração, em Retortillo.
Da parte do PCP, gostávamos de afirmar que o compromisso para com estes objetivos é integral e que tudo
faremos para que quer a Assembleia da República, quer o Governo envidem todos os esforços no sentido de
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garantir a defesa do interesse dos portugueses, daqueles que habitam naquela região e, evidentemente, das
questões de saúde pública.
Isso coloca o Governo perante uma situação clara: tem de intervir junto do Estado espanhol em respeito,
claro, pela sua autonomia, pela sua organização interna, pelas suas decisões, mas também em respeito pelos
protocolos internacionais, pela lei que permite que haja uma interação entre os dois Estados no caso de um
conflito transfronteiriço…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Portanto, das duas, uma: o Governo português tem de exigir que aquela
exploração não avança ou que Espanha dota Portugal de todos os instrumentos para ser capaz de apurar o
verdadeiro impacto ambiental e na saúde pública daquela exploração, com garantias de que serão tomadas
todas as medidas de mitigação necessárias para que o risco possível seja o mais próximo do zero.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Santinho Pacheco.
O Sr. Santinho Pacheco (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, queria começar por
agradecer a Os Verdes o facto de manterem este tema na ordem do dia.
Já de manhã, na sequência da visita da 11.ª Comissão à zona raiana com Espanha na zona da Guarda,
mantivemos um diálogo aceso e cada um de nós exprimiu os seus pontos de vista, mas, na verdade, a mina de
Retortillo e o rio Yeltes são um enorme problema para Portugal, nomeadamente para a região da Guarda.
Não vale a pena estarmos constantemente a esgrimir argumentos no sentido de encontrar culpados, mas,
desde 2013, foi-nos dito, na câmara de Almeida, que aquele município vinha alertando o Governo português
para esta situação. Não vale, pois, a pena estarmos a argumentar quando é que isto começou ou deixou de
começar, o importante é a resposta que vamos dar, porque estamos perante uma situação muito séria.
Naquelas regiões, a terra é o único ativo cuja mobilização depende de todos nós, a natureza é o que resta
aos raianos. E constatámos que, mesmo do lado espanhol, a esperança daquela gente reside, precisamente,
naquilo que Portugal possa vir a fazer. Perderam a esperança com o Governo espanhol e com as Cortes
espanholas, perderam a esperança com a Junta de Castilla y León e nós somos, de certa maneira, a boia de
salvação a que se estão a agarrar para se resolver esta situação.
A questão não é apenas raiana, da região da Guarda ou da região fronteiriça de Salamanca, é de toda a
bacia hidrográfica do Douro. Não nos podemos esquecer de que aquela região tem dois Patrimónios da
Humanidade, o Douro Vinhateiro e as Gravuras do Côa, e que o turismo e o vinho são produtos absolutamente
fundamentais, bastando uma pequena campanha negra para pôr em causa investimentos que ali se fazem e
que são, na verdade, a esperança para aquela zona.
Queria deixar duas ou três questões à Sr.ª Deputada.
Primeiro, não concordo minimamente com a ideia de que o Governo português está a assistir passivamente
à questão, mas temos de ver que pouco mais pôde fazer até agora além do que tem feito.
Se, no entender de Os Verdes, o Ministério do Ambiente não está a responder ao problema como deve,
perante os dados que existem, o que se pode fazer mais neste momento em defesa da nossa soberania
ambiental?
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. Santinho Pacheco (PS): — Temos de pôr fim a este contrabando ambiental que a Espanha está a
fazer com Portugal. Temos de nos unir em torno desse objetivo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Emília Cerqueira, do PSD, não quero
dizer que a Sr.ª Deputada não tem legitimidade para dizer o que quer que seja, como é evidente. Quem sou eu
para lhe retirar essa legitimidade!? Mas devia ter algum embaraço quando fala da questão da passividade do
Governo, porque, então, o qualificativo que utiliza em relação ao atual Governo, com o que concordo, tem de
ser alargado ao anterior Governo, com o que também concordo.
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Não é verdade!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não é verdade, diz a Sr.ª Deputada.
Na minha declaração política, fiz um historial sobre a forma como Os Verdes questionaram, no Parlamento,
os diversos Governos e o que nos disse o seu Governo foi, serenamente: «Não temos nenhuma informação
sobre a matéria». Mas a Sr.ª Deputada, na altura, não se alertou. Sabe porquê? Porque a sua mobilização é
feita em função dos autores e não das causas concretas. É isso que lhe retira legitimidade e credibilidade, Sr.ª
Deputada.
O Sr. Deputado Pedro Soares, do BE, pergunta-me que medida é que a Assembleia da República pode tomar
de forma consensual para exigir do Governo ação relativamente a esta matéria. Digo-lhe, como referi há pouco
da tribuna, que uma das medidas que acho que a Assembleia da República deve tomar a curto prazo é
justamente a aprovação do projeto de resolução de Os Verdes que está agendado para o dia 16 de março, para
que, de uma forma unânime, esta Assembleia apele a uma mobilização do Governo junto do Governo espanhol
no sentido de que aquele projeto da exploração mineira de urânio em Retortillo não avance, tendo em conta,
designadamente, que não houve avaliação de impactos transfronteiriços.
A Sr.ª Deputada do CDS-PP Patrícia Fonseca pergunta-me também o que é que vamos fazer perante o
Governo.
Já agora, aproveito para fazer uma retificação: não faço parte da solução governativa.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Ai não?! Não se ponha de fora!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Faço parte da Assembleia da República, tal como a Sr.ª Deputada.
Os Verdes trazem uma proposta à Assembleia da República para uma ação concreta, para exortar o Governo
à ação, e espero que a Sr.ª Deputada vote a favor desse projeto de resolução. Espero que tenha ouvido o
historial que referi na declaração política que proferi na tribuna.
Sr. Deputado do PCP Miguel Tiago, também concordamos que o Governo deve envidar todos os esforços
junto do Governo espanhol para intervir relativamente a esta matéria. Quero dizer-lhe, Sr. Deputado, claramente,
que o protocolo de 2008 relativamente à avaliação dos impactos transfronteiriços foi violado! Não podemos
deixar de ter isso em conta.
Se me disserem «mas Espanha é soberana nas suas decisões relativamente à exploração dos seus recursos,
à sua política energética», tenho de responder que também somos soberanos, e justamente por isso é que não
podemos levar, de forma silenciosa, impávidos e serenos, com os impactos das decisões de ordem ambiental
que o Governo espanhol toma. Se têm impacto transfronteiriço, devemos ter uma palavra a dizer,
designadamente quanto à avaliação desses impactos.
Por outro lado, Sr. Deputado Santinho Pacheco, do PS, dou-lhe razão numa questão que levanta e que me
parece muito importante. Disse na minha declaração política como é que Os Verdes se mobilizaram desde a
tomada de conhecimento do projeto quer na Assembleia da República, quer fora dela.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino mesmo, Sr. Presidente.
É verdade que o Município de Almeida também alertou para essa matéria muitas vezes, de forma muito
veemente, o Governo anterior. É verdade, Sr. Deputado, que àquela gente retiraram tudo, retiraram serviços
públicos fundamentais, dinâmica regional; não lhe retirem agora nem a natureza, nem a saúde.
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O Sr. Presidente: — Para proferir a declaração política do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Feliciano
Barreiras Duarte.
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Realizou-se, no passado
fim de semana, o 37.º Congresso Nacional do PSD - Partido Social Democrata.
Desde logo, gostaria de saudar os partidos políticos que se fizeram representar no encerramento desse
Congresso Nacional, muito em especial o CDS-PP, na pessoa da sua presidente, a Sr.ª Deputada Assunção
Cristas, que nos honrou com a sua presença.
Neste Congresso, foi eleita uma nova direção nacional do PSD e foram também aprovadas, por unanimidade,
as grandes linhas de orientação política do PSD para os próximos dois anos.
Foi um Congresso em que se discutiram ideias e se aprovou uma estratégia com o objetivo de servir Portugal
e os portugueses.
Houve participação, houve debate, sempre com a maior elevação em todas as intervenções que tiveram
lugar.
O Dr. Rui Rio, o novo presidente do Partido Social Democrata, viu a sua moção global aprovada por
unanimidade, a mesma moção com que se apresentou às eleições diretas do passado dia 13 de janeiro, e deu
ao País um exemplo de união e de pluralismo.
Alguns partidos políticos, mais habituados a algumas regras do centralismo democrático, nunca poderão
perceber que a força da democracia reside no respeito pelas opiniões dos outros, mesmo quando diferentes, e
que esse respeito é uma força e não uma fraqueza dos partidos democráticos.
Sr.as e Srs. Deputados: Afirmei há pouco que o PSD aprovou, neste Congresso, a sua nova estratégia política.
É uma estratégia essencialmente virada para o País, dirigida aos portugueses, concentrada no bem comum. É
uma estratégia que exige de cada um de nós sentido de dever e sentido de serviço público.
Como afirmou o Dr. Rui Rio, ter as pessoas como o centro e a razão da nossa ação é a missão e a base
fundamental do pensamento e da ação de um verdadeiro partido social-democrata.
As grandes áreas que o Presidente do PSD definiu como prioridades para a estratégia futura do seu partido
político decorrem e assentam muito nessa visão personalista e interclassista que concebe a política ao serviço
das pessoas e não as instrumentaliza em benefício de um qualquer outro projeto de poder.
Por isso, elegemos como grandes áreas de atuação futura as questões sociais e os desafios económicos do
País. Por exemplo, Portugal não pode mais continuar a ignorar os problemas da baixa natalidade que, desde há
décadas, comprometem o nosso futuro coletivo. Faltam medidas sociais de efetivo e decisivo apoio aos jovens
casais para que estes possam ter os filhos que desejam, sendo, por isso, necessárias políticas públicas amigas
da família, que promovam a natalidade e favoreçam o acesso à habitação por parte das famílias jovens com
filhos.
Mas, Sr.as e Srs. Deputados, Portugal também não pode continuar a abandonar os idosos à sua sorte ou
permitir que muitos hospitais, que servem para tratar doentes, se transformem em estabelecimentos para
internamentos sociais. É, assim, preciso aumentar, e muito, a rede de cuidados continuados e paliativos e
apostar decididamente numa estratégia de apoio aos cuidados domiciliários.
O PSD não esperará mais. Iremos iniciar, por isso, uma discussão pública, envolvendo as forças vivas da
nossa sociedade, sobre várias matérias de interesse na área social, económica e outras, porque, por exemplo,
no capítulo das políticas sociais, impõe-se uma abordagem corajosa que reforce a sustentabilidade da nossa
segurança social nas próximas décadas. E o PSD não deixará de confrontar os demais partidos políticos com
esse nosso dever perante as gerações futuras.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — A saúde é outra área que há muito preocupa o PSD. Ao contrário
do que a propaganda oficial ainda vai sustentando, infelizmente o Serviço Nacional de Saúde está doente: listas
de espera a aumentar nas cirurgias, doentes há anos à espera por uma consulta de especialidade hospitalar,
falta de materiais de consumo clínico nos hospitais e profissionais de saúde desmotivados e frustrados com a
falta de resposta do Governo aos problemas do setor.
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O PSD reafirma hoje, aqui, a defesa de um Serviço Nacional de Saúde mais eficaz, com mais autonomia,
que aposte mais na prevenção da doença em vez de ter de a combater em fase avançada.
A falta de investimento do atual Governo no Serviço Nacional de Saúde é simplesmente vergonhosa.
Mas poderíamos falar de muitas outras áreas, por exemplo da educação, na qual o PSD continuará a pugnar
pelo regresso a uma cultura de exigência que conduza ao sucesso educativo e devolva aos nossos estudantes
uma perspetiva de futuro em que o mérito e o saber sejam a medida dos seus limites.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal é, há muito, um país excessivamente centralizado. A decisão
política é demasiado longínqua dos cidadãos.
Defendemos, por isso — e tivemos oportunidade de o dizer durante esta semana, quer ao Sr. Presidente da
República, quer ao Sr. Primeiro-Ministro —, uma estratégia de médio e longo prazo que concretize uma
verdadeira reforma do Estado, capaz de garantir, como afirmou o Presidente do PSD, «um país mais equilibrado
territorialmente, com uma melhor e mais rigorosa gestão da despesa pública».
O Sr. Presidente: — Já terminou o tempo de que dispunha, Sr. Deputado. Peço-lhe que termine, por favor.
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Na economia, Portugal tem de crescer mais e melhor. O Estado deve ser cada vez menos um empecilho ao
empreendedorismo e cada vez mais um facilitador do investimento. Por isso, muitos destes desafios têm de ser
enfrentados assumindo cada um as suas responsabilidades. Para o PSD, o Governo do Partido Socialista está
refém do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista.
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado. Mesmo atendendo à tolerância inerente ao facto de
estar a falar sobre o Congresso de um grande partido português, o Sr. Deputado tem de cumprir o Regimento.
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Termino, Sr. Presidente, dizendo apenas mais duas coisas.
O PSD defende a concretização de muitas destas reformas e está disponível para promover um diálogo
profícuo com todos os partidos políticos, sobretudo com aqueles que connosco têm mais proximidade.
Ao terminar esta intervenção, e sendo hoje o dia em que o Sr. Presidente do Grupo Parlamentar, Dr. Hugo
Soares, termina as suas funções, permitam-me que, em nome da nova direção nacional do PSD, lhe apresente,
e a toda a equipa que o acompanhou nos últimos meses, os melhores cumprimentos.
Aplausos do PSD.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Hoje lembraram-se dele!…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte, inscreveram-se cinco Deputados para pedidos
de esclarecimento. Como pretende responder?
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Sr. Presidente, responderei a um conjunto de dois e, depois, a
um conjunto de três.
O Sr. Presidente: — Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do Bloco de
Esquerda, para pedir esclarecimentos.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Feliciano Barreiras
Duarte, como é óbvio, manda a praxe que se cumprimente o partido saído do Congresso, cumprimentando
também a sua pessoa em particular pelo cargo que agora vai ocupar.
Em primeiro lugar, devo dizer-lhe que muito honrou o Bloco de Esquerda ser o tema principal do Congresso
do PSD. Não, claro, pelo carinho com que nos trataram, mas porque, de cada vez que nos bateram, percebemos
que, claramente, estávamos a cumprir o nosso papel e a defender o País.
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A grande mensagem que o PSD tentou fazer passar este fim de semana foi a de que tem um novo cantor e
uma nova música. Mas, esmiuçando o Congresso e o que lá foi dito, percebemos que a letra da música é
exatamente a mesma daquela de que dizem ter virado a página.
Senão, vejamos o que disse o Presidente do seu partido, na intervenção de encerramento: falou dos temas
de que já Passos Coelho tinha tantas vezes falado e, acima de tudo, com que PSD e CDS tantas vezes tinham
magoado o País; falou da segurança social para dizer que era preciso arranjar uma sustentabilidade. Ora, isso,
em PSD, quer dizer «é preciso arranjar onde cortar»!
Pergunto-lhe, então, Sr. Deputado, se é agora, aqui, que tem a coragem para nos dizer onde vai cortar os
600 milhões de euros com que o PSD foi a eleições, dizendo que teria de se cortar na segurança social.
Pergunto-lhe também se tem agora, aqui, a coragem de dizer o que Rui Rio não disse, ou seja, propor o
plafonamento da segurança social, criando um sistema privado para descapitalizar o sistema público.
Pergunto-lhe igualmente, Sr. Deputado, se, na saúde, vai ter a coragem de dizer aqui, preto no branco, se o
PSD vai propor a continuidade da política de descapitalização do Serviço Nacional de Saúde, de retirada de
profissionais, de ataque ao seu financiamento e de degradação da qualidade da saúde no nosso País, como fez
durante os quatro anos da sua governação.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, por favor.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Pergunto-lhe também se, em relação à educação, vai dizer aqui, mais claramente do que disse Rui Rio
quando dizia que tinha saudades do exame do 4.º ano, que, afinal, o modelo de Nuno Crato é exatamente o
mesmo que o PSD tem para apresentar ao País.
Pergunto-lhe ainda se, quando fala de consumo interno, no final da recuperação económica vai novamente
propor cortes nos salários ou nas pensões.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Para terminar, pergunto-lhe, Sr. Deputado, se não deveria começar este
novo ciclo com um pedido de desculpas às pessoas a quem cortaram salários, a quem cortaram pensões, ao
Estado social, que cortaram, e ao País, que sacrificaram durante quatro anos.
Aplausos do BE.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Ganhe juízo!
O Sr. Presidente: — Para pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes,
do Grupo Parlamentar do PS.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado
Feliciano Barreiras Duarte, em primeiro lugar, e em nome do Partido Socialista e do seu Grupo Parlamentar,
queria saudar democraticamente a realização do 37.º Congresso do Partido Social Democrata.
Em segundo lugar, queria dizer-lhe, Sr. Deputado, que foi pena que o País todo tivesse assistido mais às
querelas internas do Partido Social Democrata do que propriamente a uma ideia concreta para o País, que é
isso que os portugueses desejam.
Aplausos do PS.
Protestos do Deputado do PSD António Leitão Amaro.
Em terceiro lugar, Sr. Deputado, queria felicitar o novo Presidente do PSD pela nova era de diálogo que abriu
entre o PSD e o Governo em temas tão essenciais como a descentralização e o Portugal 2030, temas
absolutamente cruciais para o modelo de desenvolvimento do País, que o Governo e o PS colocaram na agenda.
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Queria dizer-lhe o seguinte, Sr. Deputado: o PSD continua a ser o mesmo PSD de sempre. Sobre a
natalidade, a saúde, ou a educação é incapaz de reconhecer que, para que todas estas coisas possam estar
nos devidos lugares, e bem, de forma a que os portugueses tenham melhor acesso à saúde e à educação, é
preciso que haja maior crescimento económico, mais emprego e estabilidade no emprego.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Não diga isso!
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Sr. Deputado, o que lhe pergunto é se esta nova era do
PSD, de diálogo, é uma era também de reconhecimento de que Portugal está hoje muito melhor. Portugal tem
hoje mais 288 000 postos de trabalho e uma taxa histórica de desemprego. Isso sim, Sr. Deputado, tem a ver
com medidas concretas, que dizem respeito à vida das pessoas e estimulam a natalidade, porque dão
estabilidade às famílias e às pessoas.
Aplausos do PS.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se, quando fala da saúde, sabe que foi o seu Governo, apoiado pelas bancadas
do PSD e do CDS, que fez o maior ataque de que há memória ao Serviço Nacional de Saúde e se sabe que
hoje 94% dos portugueses têm médico de família,…
Protestos do PSD.
… há mais 2000 médicos, há mais 2000 enfermeiros e mais 350 milhões de euros na área da saúde.
Mas o estado em que os senhores deixaram a saúde não nos deixou nem pode deixar descansados,…
Vozes do PSD: — Oh!…
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — …porque o que os senhores fizeram foi um ataque aos
serviços públicos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada, por favor. Já ultrapassou largamente o tempo de
que dispunha.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Termino, Sr. Presidente.
Não vale apenas o discurso do PSD sobre as questões sociais e a preocupação social.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Que lata!…
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — São precisas medidas concretas e saber se estão ou não
estão de acordo com o rumo que estamos a tomar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder a estes dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado
Feliciano Barreiras Duarte.
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Sr. Presidente, começo por agradecer os cumprimentos que me
foram endereçados pelos Srs. Deputados Pedro Filipe Soares e Ana Catarina Mendes.
Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, se esteve atento ao que se passou no Congresso do PSD, ouviu mal,
percebeu mal ou esteve a ver e a ouvir outro congresso. Aliás, permita-me que lhe diga que o PSD, como partido
que se orgulha de ter contribuído significativamente, ao longo de décadas, para o nosso Estado de direito
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democrático, convidou vários partidos políticos para o nosso Congresso e só houve um que não só não esteve
presente como nem sequer respondeu ao convite: foi o seu partido!
Aplausos do PSD.
O Sr. Adão Silva (PSD): — É assim!…
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Nem tem moral!
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Por isso, quando o ouvi perguntar se hoje eu e o PSD iríamos
ter coragem para falar nos cortes, não resisto a devolver-lhe esse desafio que me fez: é hoje que o Bloco de
Esquerda tem a coragem, perante todos nós, de assumir que protagoniza uma austeridade escondida? Uma
austeridade que se tem traduzido em coisas deste género: em sete hospitais, espera-se mais de dois anos por
uma consulta; há mais de 700 médicos à espera de abertura de concursos…
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — No tempo do PSD é que era bom!…
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — … e mais de 1700 doentes aguardam por cama. E poderíamos
falar dos números do investimento público, poderíamos falar de outras áreas das políticas públicas.
Não sei se os senhores já se arrependeram da circunstância política que permitiram que, pela primeira vez,
nos últimos anos, se instalasse em Portugal.
O PSD já fez esse luto, e um dos méritos deste Congresso foi precisamente esse. Mas os senhores não
queiram dizer que só estão na atual solução governativa para aquilo que acontece na satisfação das vossas
clientelas e das manifestações de rua, que, aliás, e todos nós o temos percebido, cada vez mais vão acontecer.
Portanto, muito provavelmente, já é tempo de os senhores começarem a assumir a vossa austeridade,
porque têm mentido ao País, dizendo que a austeridade acabou.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes, quero dizer-lhe que o
Presidente do PSD, o Dr. Rui Rio, assumiu perante o País, esta semana, nomeadamente em reuniões que teve
com o Sr. Presidente da República e, ontem, durante muito tempo, com o Sr. Primeiro-Ministro, que o PSD está
disponível para, em nome da defesa intransigente dos superiores interesses de Portugal e dos portugueses,
contribuir para encontrarmos várias soluções para matérias de regime. Fá-lo em coerência, em nome daquilo
que o Presidente do PSD sempre defendeu, antes e depois de ser Presidente do PSD.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Sr.ª Deputada, permita-me que lhe diga o seguinte: não vamos
aqui falar do espetáculo das querelas internas, porque, comparativamente com as querelas internas que já se
passaram em eleições diretas no seu partido, nós somos uns meninos de coro.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte, gostaria
também, em nome do CDS-PP, de cumprimentar o PSD pelo Congresso que realizou no passado fim de
semana, os recém-eleitos em novas funções, nomeadamente, e em particular, V. Ex.ª, e desejar as maiores
felicidades à atual direção do PSD no desempenho das funções que ora inicia.
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O CDS, como bem referiu, acompanhou com muito interesse este Congresso, tendo-se feito representar, no
seu encerramento, pela Presidente do partido. Quero deixar uma nota de agradecimento pela forma como foi
recebida não só a Presidente do CDS bem como toda a comitiva do nosso partido.
Quero dizer-lhe que manteremos — e cremos que estaremos de acordo em manter — uma relação
privilegiada, não artificial, como outras, uma relação de partidos que, quando o País necessita, quando o País
exige, quando é necessário assumir responsabilidades, sabem fazer, mesmo daquelas divergências que têm,
convergências.
Desde logo, gostaria de assinalar o discurso do recém-Presidente do PSD no encerramento do Congresso,
do qual V. Ex.ª também veio hoje, aqui, sublinhar algumas ideias. Refiro as ideias de preocupação com a
demografia; de preocupação com o estado a que a saúde chegou por força daqueles — imagine, Sr. Deputado!
— que, durante anos, encheram a boca com a defesa do Serviço Nacional de Saúde e que, hoje, são os
primeiros, segundos e terceiros inimigos desse mesmo Serviço Nacional de Saúde;…
Vozes do PSD: — É verdade!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … de preocupação com a educação, por força daqueles que andaram,
anos após anos, a defender o sistema público de educação, mas que são aqueles que permitem que haja
escolas públicas de educação que não funcionam, ou por falta de condições físicas ou por falta de condições
ao nível do pessoal;…
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — No seu tempo é que era bom!?…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … e também de preocupação, numa perspetiva de mais longo prazo,
em relação a uma matéria tão fundamental como é a da segurança social.
Devo dizer-lhe que, sobre tudo isto, o CDS, durante dois anos, apresentou propostas, as tais propostas
concretas que a Sr.ª Deputada Ana Catrina Mendes veio aqui exigir ao PSD. Durante dois anos, o CDS
apresentou essas propostas concretas, na Assembleia e fora dela. Mas, Sr. Deputado, a verdade é que todas
estas propostas tiveram um único destino por parte do PS, do PCP, do Bloco de Esquerda e do Partido
Ecologista «Os Verdes»: o caixote do lixo.
Porém, quero dizer-lhe que, da nossa parte, manteremos sempre, e não obstante isso, a disponibilidade para
que esses consensos, naquilo que é essencial para o País, possam fazer-se.
Sabemos que entre nós, entre os nossos partidos, esses consensos são naturais, não são artificiais, e serão
necessariamente fáceis de fazer.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe para concluir.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Termino, Sr. Presidente, fazendo uma pergunta muito clara ao Sr.
Deputado. Gostaria de saber se o Sr. Deputado, face aos cortes que o Governo e que esta maioria têm feito em
serviços essenciais que identificou, não considera necessária uma maioria de centro-direita, de 116 Deputados,
para que, assim, o País possa ter um Governo que não olhe para o curto prazo mas para o médio e longo prazos.
Era esta a pergunta que queria deixar-lhe, Sr. Deputado.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte, naturalmente, queria
começar por cumprimentá-lo a si e, na sua pessoa, ao seu partido pela realização do Congresso do PSD.
Queria ainda registar um primeiro conjunto de questões, que, na nossa perspetiva, resultam, com alguma
clareza, do Congresso, que, de resto, acompanhámos. De facto, resulta, com alguma clareza, daquele
Congresso a tentativa que o PSD faz, de apagamento da memória daquilo que foi a política que executou a
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partir do Governo, particularmente a partir do último Governo, com a ação destruidora do País e dos direitos dos
trabalhadores.
Parece-nos que também é relativamente clara a tentativa de branqueamento das responsabilidades que o
PSD tem nos gravíssimos problemas estruturais que o País continua a atravessar.
E parece-nos igualmente claro que o PSD está a procurar encontrar o caminho que permita recuperar essa
política de agravamento da exploração e do empobrecimento que desenvolveu a partir do último Governo.
No fundo, o PSD procura parecer que abandonou aquilo que fez no Governo, mas, na verdade, mantém
exatamente a mesma orientação, exatamente o mesmo sentido da política de desastre nacional que executou
no anterior Governo.
E isso é particularmente claro, Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte, quando se olha para o que foi dito
em relação à segurança social e aquilo em que o PSD insiste, não só no sentido da privatização da segurança
social, mas também, e de novo, em retomar a discussão sobre a sustentabilidade da segurança social para
chegar à conclusão de que é preciso ou cortar pensões e prestações sociais,…
O Sr. Adão Silva (PSD): — Não é nada disso!
O Sr. João Oliveira (PCP): — … ou mexer nas receitas da segurança social.
Isso é também particularmente claro quando o PSD insiste em que, em relação à saúde, o caminho tem de
ser o da privatização, o do negócio da saúde, com o SNS num plano secundário, depauperado de recursos e
de investimento e apenas limitado a cuidados de saúde mais básicos para quem não tem recursos económicos,
o que acontece igualmente em relação à educação, onde propõe, por exemplo, no ensino superior, uma lógica
de ensino superior para as elites e comandado pelos interesses dos grandes grupos económicos.
Ora, isto leva ao primeiro conjunto de questões que queria deixar ao Sr. Deputado, que são as seguintes: o
PSD está mesmo convencido de que os portugueses já se esqueceram do mal que os senhores lhes fizeram e
que lhes perdoam?
Protestos do Deputado do PSD Hugo Lopes Soares.
Até quando é que o PSD vai insistir na recusa em reconhecer o mal que fez ao País e aos portugueses, o
mal que fez aos trabalhadores e ao povo? Até quando vão insistir na recuperação dessa política que executaram
contra os interesses dos trabalhadores e do povo?
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Concluo já, Sr. Presidente.
Um segundo aspeto que queria registar muito rapidamente tem a ver com o seguinte: não faltam elementos
que revelam a convergência entre PS, PSD e CDS em matérias que são estruturais para o País, infelizmente
com os exemplos que se concretizam, de que dessas convergências só resultam prejuízos para o País, para os
trabalhadores e para o povo.
O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Vou concluir, Sr. Presidente.
Na aceitação das imposições da União Europeia, na recusa da renegociação da dívida, na manutenção do
domínio do capital monopolista sobre setores estratégicos ou em matérias, por exemplo, como aquela que
aconteceu há 15 dias, com a recusa da proposta que o PCP fez para o pagamento do trabalho extraordinário, a
convergência entre PS, PSD e CDS tem como consequência prejuízos para o País, para os trabalhadores e
para o povo.
O Sr. Presidente: — Tem mesmo de terminar, Sr. Deputado.
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O Sr. João Oliveira (PCP): — E isso só confirma, Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte, que o PSD não
faz parte da solução que é preciso aprofundar: o caminho da reposição de direitos e de rendimentos e a
concretização uma política que verdadeiramente resolva os problemas do País.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte, queria
também, em nome do Partido Ecologista «Os Verdes», começar por saudar a realização do 37.º Congresso do
PSD.
Queria dizer-lhe, Sr. Deputado, que julgo haver alguns partidos que, às vezes, gostariam que, pela realização
de um congresso, se apagasse uma parte pelo menos do seu passado, gostariam que as pessoas se
esquecessem, que se passasse uma borracha e que nunca mais se lembrassem daquilo por que
verdadeiramente esses partidos foram responsáveis nas políticas levadas a cabo e que tanto afetaram as
pessoas.
Sr. Deputado, eu ouvi-vos no Congresso a saudarem-se uns aos outros, a aplaudirem-se uns aos outros,
relativamente às políticas que tinham praticado, por exemplo, no último Governo do PSD e do CDS, sem
demonstrarem um único sinal, por mais pequenino que fosse, de arrependimento relativamente a muitas das
políticas que praticaram e viabilizaram, que tanto afetaram e maltrataram os portugueses.
Depois, há uma coisa que não custa nada, Sr. Deputado, que é pegar numas determinadas bandeiras e dizer
isto: «Estamos todos muito preocupados com a natalidade. Estamos muito preocupados com os idosos, com a
saúde, com a educação, com as assimetrias regionais e com a segurança social. E levantamos estas bandeiras
com grande preocupação.»
É caso para dizer, como muita gente diz: «Preocupados estamos todos». A questão é saber que soluções é
que encontramos para que essas questões sejam resolvidas. E as respostas do PSD foram dadas,
designadamente no Governo anterior, e as suas orientações foram muito claras. Quando os senhores retiraram
e cortaram salários aos trabalhadores portugueses e quando os senhores enveredaram por uma lógica de
alargamento da precariedade, o sinal que deram às famílias foi que estas não tinham condições para ter os
filhos que desejavam, e isso afeta a lógica da natalidade que precisamos necessariamente de inverter.
Relativamente à proteção dos idosos, os senhores, quando retiraram salários aos filhos, também desprotegeram
o acompanhamento dos filhos aos idosos. E também lhes cortaram as pensões. Não se esqueça disso, Sr.
Deputado!
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe para concluir.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Vou concluir, Sr. Presidente.
E quando encerraram serviços públicos no interior do País, encerraram linhas ferroviárias e fragilizaram
linhas ferroviárias em Trás-os-Montes e no Alentejo, fomentaram as assimetrias regionais.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem de concluir.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — E quando retiraram profissionais do Serviço Nacional de Saúde e
das escolas públicas fragilizaram estes serviços.
Estas foram as vossas respostas, as respostas que os portugueses conheceram da vossa parte, das quais,
de certeza, não têm saudades.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte.
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O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, agradeço os
seus cumprimentos e reafirmo aquilo que o Presidente do PSD, Rui Rio, já afirmou mais do que uma vez: para
nós, o CDS-PP é um partido político com o qual temos diferenças, mas é muito mais aquilo que nos une do que
aquilo que nos divide e orgulhamo-nos do trabalho que fizemos em conjunto, ainda recentemente, num momento
tão difícil para a nossa vida coletiva.
No que diz respeito à questão que coloca, sobre se o País precisará ou não de ter uma maioria de centro-
direita, alternativa à atual governação, pode contar com o PSD, porque é nesse sentido que trabalharemos nos
próximos meses e durante os anos de 2018 e 2019.
Sr. Deputado João Oliveira, agradeço também os seus cumprimentos, como agradeço à delegação do
Partido Comunista Português por, mais uma vez, nos ter honrado com a sua presença no encerramento do
nosso Congresso.
Quando fala da nossa memória, quero dizer-lhe que o PSD se orgulha do trabalho que tem feito nas últimas
décadas, ao serviço de Portugal e dos portugueses, desde logo na solidificação do nosso Estado de Direito
democrático, na definição de traves-mestras da nossa democracia, nomeadamente na estabilização do sistema
político, do regime político, na separação de poderes, da primeira revisão constitucional, quando acabámos com
o Conselho da Revolução e foi criado o Tribunal Constitucional e passámos a ser uma democracia de corpo
inteiro. O PSD orgulha-se ainda da opção que tomámos por Portugal pertencer à NATO, orgulha-se da opção
europeia que tomámos, orgulha-se do trabalho que fizemos quer em governos em que foi preciso tomar decisões
difíceis, quer em governos em que promovemos o desenvolvimento económico e social do País.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Muito bem!
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Aliás, como referi há pouco na declaração política que proferi, o
PSD enfrentará as próximas eleições legislativas com o objetivo claro de as vencer, como venceu as de 2015.
E temos a perfeita consciência de que os portugueses que nos deram a vitória em 2015, ao contrário do que
possam pensar, estarão muito mais atentos àquilo que tem sido a governação do Partido Socialista e,
nomeadamente, a alguns dos erros que vamos encontrando naquilo que se pode definir como uma austeridade
de outro tipo e uma austeridade escondida.
Até me apetecia perguntar ao Sr. Deputado João Oliveira se o PCP vai fazer alguma coisa, por exemplo, em
relação a matérias como a que consta de um artigo da imprensa, intitulado «O PCP exige o dobro do
investimento público». Curioso é o chamado «Governo da esquerda e das extrema-esquerdas» ser o Governo
que, nos últimos anos, comparativamente, em Portugal, menos promove o investimento público.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Essa é que é essa!
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — O que seria se isso acontecesse connosco?! Já para não falar
de outras matérias, de que não importa agora falar porque o tempo é curto.
Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, agradeço também os seus cumprimentos. Oferece-me dizer-lhe, quando
pergunta se nós nos arrependemos — perguntou-me várias vezes se nos arrependíamos disto ou daquilo —,
que há uma coisa de que estou certo: não estamos arrependidos de ter mandado embora a troica.
O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — É que, quando a puseram em Portugal, fomos nós que tivemos
de tratar dela.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — E eram poucos aqueles que teriam condições para o fazer e nós
tivemos a coragem para tal, não pensando nos interesses do PSD, pensando, acima de tudo, nos interesses de
Portugal e dos portugueses.
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Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Galamba para uma declaração política.
O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nos últimos tempos, temos assistido a
uma tentativa de desvalorizar os resultados económicos do País.
Alguns insistem em dizer que o maior crescimento do século, afinal, é pouco ou nada, que Portugal cresce
apenas porque também cresce toda a Europa. Portugal — insistem —, comparado quer com a UE quer com a
zona euro, é um dos países que menos cresce, e isto é culpa do Governo e da atual maioria, que são inimigos
da iniciativa privada, desperdiçam a boa conjuntura externa e não fazem as reformas de que o País precisa.
Se os últimos dois anos, afinal, não trouxeram o diabo, há quem garanta que o País ficou claramente abaixo
dos resultados que poderia ter, caso as políticas fossem outras. Quais? Ninguém sabe e os próprios não
esclarecem.
Ao invés da presença do demo, parece que agora temos falta de espírito reformista, uma acusação que,
curiosamente, também ela, recorre ao além e ao sobrenatural, por presumir a existência de um espírito que,
como todos os verdadeiros espíritos, se encontra desprovido de matéria. Teologicamente, até poderia fazer
algum sentido; politicamente, nem por isso, pois dizem que são precisas reformas, embora ainda não saibam
dizer quais.
Que há muitos países que crescem mais que Portugal não é um facto de hoje, mas de sempre. Portugal é,
desde há muito, um dos países que menos crescem na Europa. Em 2015, por exemplo, havia 18 países que
cresciam mais do que Portugal — alguns, muito, muito mais. A diferença entre 2015 e 2017 é que, pela primeira
vez neste século, Portugal cresce acima da média europeia e — ainda mais importante — encurtou, de forma
muito significativa, a diferença face aos campeões do crescimento europeu. Isto, sim, é uma relevantíssima
novidade face ao passado recente do País — uma reforma, portanto.
Sim, a conjuntura externa é boa, ninguém o nega, mas também o era em 2015, quando a União Europeia e
a zona euro cresciam sensivelmente o mesmo que crescem agora e Portugal não só crescia abaixo da média
europeia como estava em forte desaceleração, tendo praticamente estagnado na segunda metade do ano.
Curiosamente, Espanha até crescia mais em 2015 do que cresceu agora, em 2017.
O que mudou nisto tudo foi que Portugal cresceu muito mais a partir da segunda metade de 2016, e cresceu
mais com outra política, facto que não pode deixar de ser valorizado e devidamente reconhecido.
Aplausos do PS.
De 2015 para 2017, o crescimento na zona euro acelerou 0,1 pontos percentuais; em Portugal, essa
aceleração foi nove vezes superior, 0,9 pontos percentuais.
Em 2015, o crescimento da economia portuguesa era quase metade do da economia espanhola; em 2017,
essa diferença foi reduzida em três quartos: 3,1% em Espanha, 2,7% em Portugal.
Olhando para o caso irlandês, a comparação ainda é melhor para Portugal, porque a Irlanda crescia 25,6%
em 2015, enquanto agora só cresce 8,3% — curiosamente, exatamente o mesmo que crescia em 2014, quando
Portugal crescia 0,9%, um terço do que cresce agora.
Podemos continuar a dar exemplos.
Quando olhamos para os países campeões do crescimento, também melhorámos: em 2015, a diferença, em
média, face aos países que mais cresciam na União Europeia, era de 2,8 pontos percentuais; hoje, essa
diferença é muito mais curta, sendo apenas de l,7.
Façamos as comparações que fizermos, dêmos as voltas que dermos, é inegável que Portugal está hoje, em
termos económicos, no bom caminho, e está seguramente num caminho melhor, muito melhor, do que aquele
em que estava.
Não estamos satisfeitos, como é evidente, mas sabemos que os bons resultados se devem às boas políticas
e que, portanto, se as políticas mudam e os resultados melhoram, então, devemos consolidar e aprofundar a
estratégia que tem sido seguida e que concretiza essa mesma mudança.
Consolidar os resultados obtidos e preparar o futuro — é este o nosso compromisso.
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Crescimento elevado do investimento, significativo reforço do investimento direto estrangeiro, crescimento
elevado e cada vez mais diversificado das exportações — esta é a marca da sustentabilidade.
A aposta nas qualificações e a aposta na inovação, de que é um excelente exemplo a aposta nos laboratórios
colaborativos, recentemente apresentada pelo Primeiro-Ministro e pelo Ministro da Ciência, são formas de
qualificar e valorizar o tecido produtivo português, aumentando a produtividade sem ser à custa do emprego e
dos salários.
É preciso reconhecer que o aumento do rendimento das famílias e o crescimento do consumo que lhe está
associado são a causa e a consequência do crescimento económico.
Mais e melhor emprego, mais rendimento e melhores salários, aumento real das pensões e melhoria da
proteção social (rendimento social de inserção, subsídio de desemprego, abono), mais justiça fiscal e melhor
distribuição do rendimento, nada disto é um mero resultado do crescimento, muito menos uma espécie de prémio
por sacrifícios passados, é uma parte integrante e fundamental do crescimento que temos hoje e que queremos
continuar a ter no futuro.
A competitividade faz-se incluindo as pessoas e as suas condições de vida, nunca se faz contra essas
pessoas ou em oposição a elas.
Aplausos do PS.
Portugal cresce hoje de forma inclusiva e sustentável, reduzindo a pobreza e as desigualdades e investindo
no futuro. É este o rumo que queremos manter e aprofundar, é este o compromisso do PS, hoje e sempre.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a Mesa regista a inscrição de quatro Srs. Deputados para pedir
esclarecimentos. Como pretende responder?
O Sr. João Galamba (PS): — Dois a dois, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Assim, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero cumprimentar o Sr. Deputado
João Galamba pelo tema que trouxe, tendo-nos falado sobre os dados do crescimento económico.
Sobre esta matéria, gostava de dizer, em primeiro lugar, que o facto de Portugal estar a ter crescimento
económico é bom, é um facto positivo. Pena é, é o que posso dizer, que neste ano em que estamos, 2018,
segundo as previsões, não venhamos a ter um crescimento tão expressivo como o que tivemos em 2017.
Sobre este ponto estaríamos de acordo, o problema é que o Sr. Deputado, não contente em elencar estes
factos — claro! —, tinha de vir falar-nos do maior crescimento do século, do quase maior crescimento de sempre.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Do milénio, mesmo!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Aliás, já tinha ouvido todas estas teorias quando se falava do melhor
défice do século, em todo um clima de euforia, apesar de alguns avisados conselhos, certamente, até de
pessoas bastante mais sensatas do que eu, desaconselharem a euforia. A euforia, Sr. Deputado, é sempre má
conselheira.
Também seria mais credível, Sr. Deputado, não fosse o facto de quase todos nesta Casa e nestas bancadas
já terem ouvido as expressões «o maior crescimento do século», «o melhor défice de sempre».
Sr. Deputado, lembro-me bem de já ter ouvido exatamente estas expressões, e não foi assim há tanto tempo,
não foi sequer há dois anos. Quando é o Governo a utilizá-las, podemos fingir, pelo menos, que estamos a falar
de coisas diferentes, porque tivemos o Primeiro-Ministro Sócrates a dizê-las e temos agora o Primeiro-Ministro
António Costa a dizê-las, tivemos o Ministro das Finanças Teixeira dos Santos a dizê-las e temos agora um
protagonista diferente, o Ministro Mário Centeno. Mas aqui, no Parlamento, da parte do PS, o protagonista a
dizê-las continua a ser o Deputado João Galamba.
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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Portanto, torna-se particularmente difícil fingir que estamos a falar de
coisas diferentes e de momentos diferentes,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … porque são exatamente os mesmos momentos de euforia,
conduzidos pelo mesmo discurso de facilidades e de resultados fantásticos,…
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … que nos levam a um fim que não é, de certeza, aquele que nem o
Sr. Deputado nem eu desejamos.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Com certeza, Sr. Presidente.
Portanto, pergunto-lhe, Sr. Deputado João Galamba: se estamos tão bem, tão bem, tão bem, por que é que
continuamos a ter a austeridade escondida nos serviços públicos?
A Sr.ª Isabel Galriça Neto (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Por que é que continuamos a ter um investimento público muito abaixo
daquele que tivemos em 2015?
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem de concluir.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E, já agora, por que é que não aproveitam a oportunidade para baixar
o aumento de impostos que fizeram no gasóleo e na gasolina? Se está tudo tão bem, não sei para que são
precisas estas medidas.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Galamba, em primeiro lugar, queria
cumprimentá-lo pelo tema que abordou hoje, na sua declaração política.
Como sabe, o anterior Governo e os partidos que o suportaram, PSD e CDS, insistiram muito numa ideia de
que não havia alternativa à política que prosseguiam de cortes de direitos e rendimentos. Martelaram esta ideia
até à exaustão, mas foi uma ideia derrotada nas eleições legislativas de outubro de 2015.
Perante o novo quadro político, em que, com o contributo decisivo do PCP, se avançou no caminho da
reposição de direitos e rendimentos, revertendo as malfeitorias do anterior Governo, PSD/CDS, estes dois
partidos apressaram-se a prever o desastre.
O Sr. Deputado lembra-se, com certeza, daquilo que, há dois anos ou ano e meio, o PSD e o CDS diziam
sobre as consequências da reposição de direitos e rendimentos e o que isso significaria para o País: um desastre
económico, um segundo resgate e até anunciaram a vinda do diabo.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!
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O Sr. Paulo Sá (PCP): — Felizmente, para Portugal e para os portugueses, o diabo não se dignou responder
à sua convocatória.
Risos do Deputado do PCP João Oliveira.
Mas a reposição de direitos e rendimentos não só não levou à estagnação económica, ao colapso económico,
como, pelo contrário, fez com que a economia crescesse mais, aqueles números que o Sr. Deputado referiu.
Aliás, o Sr. Deputado reconheceu na sua intervenção que a devolução de direitos e rendimentos é causa do
crescimento económico. A este propósito, queria fazer-lhe uma pergunta muito direta, singela, até: se a política
de reposição de direitos e rendimentos tivesse ido mais longe do que foi, não estaríamos hoje a falar de dados
económicos mais significativos do que aqueles que o Sr. Deputado referiu na sua intervenção?
O Sr. João Oliveira (PCP): — Boa questão!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — E, em relação ao futuro, Sr. Deputado, visto que afirma que a devolução de direitos
e rendimentos é a causa do crescimento económico, se esta política for prosseguida, aprofundada e levada a
novos patamares, não iremos ter um crescimento económico mais significativo, uma criação de emprego mais
significativa, uma redução ainda maior da taxa de desemprego?
O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Pergunto ainda se, reconhecendo isto, o Sr. Deputado também não reconhece que
é necessário eliminar aqueles entraves ao aprofundamento da política de reposição de direitos e rendimentos
que resultam das limitações e dos constrangimentos impostos pela União Europeia.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Concluo, Sr. Presidente, dizendo que são esses constrangimentos e limitações
que impedem que a política de reposição de rendimentos seja elevada a um novo patamar e, consequentemente,
impedem um maior crescimento económico e uma maior criação de emprego.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Galamba.
O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Presidente, vou começar por responder às questões levantadas pela Sr.ª
Deputada Cecília Meireles, do CDS.
A Sr.ª Deputada relativizou o crescimento, falando das previsões para este ano, mas deveria ter falado
também das previsões para o ano passado. Isto porque, e isto a Sr.ª Deputada não disse, em 2017 também se
previa que a economia portuguesa crescesse menos, bem menos, do que a economia europeia e o que tivemos
foi a realidade a derrotar essas previsões.
Por isso, pediria ao CDS alguma prudência, sobretudo com base na experiência dos tempos mais recentes,
quanto a valorizar em excesso previsões que, como todas as previsões que foram feitas sobre a política deste
Governo e desta maioria, têm saído derrotadas pela realidade. Portanto, eu valorizaria mais a realidade do que
as previsões.
Sobre o discurso do CDS relativamente a uma alegada austeridade escondida, Sr.ª Deputada, já tivemos
esta conversa várias vezes. O Partido Socialista aceita as críticas do Bloco de Esquerda, do PCP e de Os Verdes
quando dizem que este Governo ainda não corrigiu suficientemente o legado deixado pelo anterior Governo. De
facto, não conseguimos eliminar em todos os setores e em todas as áreas a destruição operada, com afinco e
grande zelo, durante quatro anos, mas esse caminho está a ser feito.
Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.
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Portanto, se o CDS quiser mimetizar o discurso do Bloco, do PCP e de Os Verdes, reconhecendo que a
alteração, face à política do anterior Governo, é importante mas ainda insuficiente, direi que isso faz sentido.
Caso contrário, Sr.ª Deputada, tenho alguma dificuldade em aceitar — e lembro, por exemplo, o seu caso
concreto — que alguém que concordou com o corte de 600 milhões de euros nas pensões venha agora criticar
um governo que, embora não esteja a repor nem a reinvestir ao ritmo desejado pelo PCP e pelo Bloco, está
seguramente a repor e a investir a um ritmo significativamente mais elevado do que aquele que veio do anterior
Governo e do que aquele que os partidos desse Governo prometiam para o período 2016-2019.
Protestos de Deputados do PSD e do CDS-PP.
Sr. Deputado Paulo Sá, concordo inteiramente consigo, na medida em que os partidos da direita, PSD e
CDS, têm de se reconciliar com o facto de terem apostado todas as fichas na ideia de que não havia alternativa,
de que vinha aí o demónio ou o descalabro e de isso não ter acontecido. Aparentemente, ainda não fizeram
esse luto, nem deram um passo em frente para a nova narrativa, mas, de facto, foi isso que aconteceu.
Não só em Portugal mas também no estrangeiro, muitas vozes diziam que era impossível desviarmo-nos um
milímetro do caminho de falhanços do anterior Governo, porque valorizavam mais o empenho do que os
resultados. O anterior Governo dizia que estava muito empenhado em reduzir o défice, empenhado em resolver
os desequilíbrios estruturais do País, apesar de ter feito o oposto: não ter acertado em nenhuma meta do défice
e ter agravado todos os equilíbrios estruturais do País.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Todos os equilíbrios estruturais?!
O Sr. João Galamba (PS): — O que o Sr. Deputado Paulo Sá diz faz uma diferença fundamental entre a
esquerda, apesar das nossas diferenças, e a direita.
Foi, aliás, bem afirmada este fim de semana, no Congresso do PSD, a ideia de que os direitos das pessoas,
as suas condições de vida, os seus rendimentos e as condições que permitem às famílias portuguesas consumir
não são elementos fundamentais de qualquer estratégia de crescimento, são, quanto muito, uma decorrência
eventual e provir de um crescimento, defendido pelo PSD e pelo CDS, que não sabemos muito bem de onde
vem. Mas a ideia de que primeiro vem o crescimento e depois, quem sabe, um dia, talvez as pessoas, os seus
direitos e o seu rendimento é, de facto, uma posição que não partilhamos.
Nós consideramos que as condições de vida da população, os seus rendimentos e os seus direitos são
elementos centrais de qualquer estratégia de crescimento inclusivo, e tem sido exatamente isto que este
Governo e esta maioria têm posto em prática, com os resultados muito positivos que se conhecem e que são
claramente diferenciadores face à política do Governo anterior.
O Sr. João Azevedo Castro (PS): — Muito bem!
O Sr. João Galamba (PS): — É por isso que também concordo consigo, Sr. Deputado, de que é preciso
continuar e aperfeiçoar a atual estratégia.
O Partido Socialista, ao contrário do PCP — e, já agora, do Bloco e de Os Verdes —, entende que a reposição
de direitos não é tudo, tem de se compatibilizar essa reposição de direitos com a sua sustentabilidade. E
pensamos que a política que tem sido seguida nos últimos anos e que está em prática neste Orçamento traduz
exatamente essa visão equilibrada entre reposição de direitos e de rendimentos e o compromisso de garantir
finanças públicas sólidas.
Não há melhor garantia para os trabalhadores e para os pensionistas portugueses de que o seu rendimento
será respeitado do que assegurar que as medidas que tomamos para a defesa desse mesmo rendimento
respeitam a condição de sustentabilidade. É isto que temos feito e é isto que continuaremos a fazer, Sr.
Deputado.
Aplausos do PS.
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Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Jorge Lacão.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa Silva.
O Sr. António Costa Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Galamba, de facto, a sua capacidade
criativa e imaginativa para inventar aqui mais uns milhões em investimento que nós não conhecemos demonstra
claramente a seriedade da intervenção que o senhor faz aqui.
O Sr. Cristóvão Crespo (PSD): — É só fantasia!
O Sr. António Costa Silva (PSD): — Também estamos muito satisfeitos e habituados a ver o Partido
Socialista a relembrar e a comparar o passado, esquecendo sempre o seu próprio passado, nomeadamente o
da bancarrota. Isso nunca o lembra aqui, evidentemente, pois esses números não lhe interessam
Como é evidente, e os senhores devem compreender, nós estamos satisfeitos em ver a economia portuguesa
a crescer, que não restem quaisquer dúvidas, mas não pensem os senhores que somos os pessimistas e os
senhores os otimistas! Não, entendemos que o crescimento da economia portuguesa é importante, e, portanto,
não nos venham com essa conversa.
Mas, de facto, na vossa intervenção, não há uma única referência aos desníveis históricos de poupança
negativos que estamos a ter — 4%. Sobre isto nem uma única referência! Não interessa para nada! Não
interessa a ninguém!
Também não há nenhuma referência aos dados económicos sobre o nível de endividamento de Portugal.
Não interessa para nada, interessa um apagão histórico sobre essas histórias.
Também não interessa nada o crescente endividamento das famílias portuguesas. É um dado que não
interessa para nada! Mais uma vez, esquecemos totalmente aquilo que se está a passar e voltamos àqueles
tempos do «gastar alegremente e empobrecer tristemente». É claro que não, vocês já fizeram o apagão do
vosso triste passado, sem que, para isso, tivessem feito um pedido de desculpa aos portugueses.
Não há qualquer referência aos baixíssimos índices de investimento que tivemos nos últimos anos; aqui, sim,
records históricos dos últimos 60 anos. Lembramos que os anos de 2016 e 2017 não foram nada famosos. O
Estado falhou em diferentes áreas.
Com isso, Sr. Deputado João Galamba, como é evidente, comparamos a economia portuguesa com a
economia europeia e faz sentido ver como cresceram os outros países da União Europeia. Ora vejamos: a
Letónia cresceu 3,5%; a Eslováquia, 4%; a Hungria, 3,7%; a Polónia, 4,2%; a Lituânia, 2,9%; a Roménia, 4,5%;
a Bulgária, 3,7%; a Eslovénia, 4,2%; a Croácia, 2,8%…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.
O Sr. António Costa Silva (PSD): — Termino já, Sr. Presidente.
A República Checa cresceu 3,2%; a Finlândia, 2,8%; a República de Malta, 5,6%; Chipre, 3,2%; a Holanda
2,9%. Magnífico resultado português! Ainda bem que a economia está a crescer, mas, de facto, tanto este
Governo como os senhores, a única preocupação que têm é com o curto prazo e com as eleições de 2019, mais
nada! Não têm preocupação com Portugal!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Mariana Mortágua.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Galamba, uma coisa sabemos de
certeza: nenhum governo fará alguma vez pior do que o PSD e o CDS fizeram durante os quatro anos de
austeridade e a crise em que afundaram este País quando tiveram a oportunidade de ser governo.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
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Protestos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Hoje, os resultados são bons e dão-nos razão. Proteger os salários,
proteger as pensões, aumentar os apoios sociais melhoram a economia e fortalecem-na. Estava profundamente
errado quem, como o PSD e o CDS, defendia que era empobrecendo e que era sofrendo que se sairia da crise.
A direita estava errada e o seu programa só poderia ser salvo se houvesse uma crise. Não houve, e, portanto,
o programa da direita falhou. A direita, hoje, não tem programa para o País, pelo que só pode fazer estes
exercícios, de se queixar que é bom, mas pouco.
Para se queixar que é bom, mas pouco, está cá o Bloco de Esquerda, Sr. Deputado!
O Sr. António Costa Silva (PSD): — Ah!…
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Devo ser muito honesta, Sr. Deputado João Galamba, para lhe dizer que
muitas das medidas que aqui apresentou como sendo responsáveis pelo crescimento económico foram em
frente depois de duras negociações com o Governo e apesar de muitas resistências do Governo, e muitas delas
ficaram mesmo pelo caminho.
Hoje, poderíamos ter mais crescimento e melhor crescimento caso o Governo não tivesse subvalorizado o
efeito das políticas de devolução e de aumento de distribuição de rendimento. A prova disso é que no PEC o
Governo previa um crescimento de 1,8% para 2017 e o crescimento ficou em 2,7%.
Por isso, a primeira pergunta que lhe faço é: que balanço crítico faz deste crescimento, que foi muito além
do que tinha sido previsto pelo Governo?
Segunda pergunta: quem é que fica a ganhar com uma economia que cresce mais? Como é que se distribui
a riqueza de uma economia que cresce mais para dar sustentação ao crescimento económico? E há alguns
mecanismos que são promessas do PS: a segunda fase do regime de reformas antecipadas; a lei dos contratos
a prazo; as alterações ao trabalho temporário; o fim do banco de horas individual; o combate à precariedade.
A minha pergunta não é se se compromete com estas medidas, porque elas são exigências para 2018. A
minha pergunta é se o PS consegue ser consequente com a análise que o Sr. Deputado fez da tribuna e se
consegue ir mais longe, nomeadamente reavivando e protegendo a contratação coletiva, revertendo as políticas
da direita no código laboral, que descem o valor do trabalho, protegendo o salário e dando sustentação ao
processo de crescimento económico a que estamos a assistir.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Galamba.
O Sr. João Galamba (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Costa Silva, parece que não ouviu a
minha intervenção.
Sr. Deputado, Portugal sempre foi dos países que menos cresceu na Europa, e é verdade que há muitos
países que crescem mais do que Portugal hoje. A questão é que em 2015, no último ano do seu Governo, o
discurso do seu partido era o de que, aí, sim, se tinham criado as condições para uma verdadeira retoma e
convergência com a Europa. Aliás, todos os países que elencou, esses mesmos países cresciam mais do que
Portugal.
A diferença entre 2015 e 2017 não é haver 18 ou 20 países a crescerem mais do que Portugal, porque esse
era o número em 2015,…
Protestos do Deputado do PSD António Costa Silva.
… a diferença é que, pela primeira vez em muitos anos, crescemos mais do que a média e estamos muito
mais próximos desse pelotão da frente.
Aplausos do PS.
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E é essa diferença, Sr. Deputado, que era importante ser reconhecida pelo PSD. Não vale a pena mudar
caras e dizer que não se reveem na política do passado do PSD se não mudarem também o discurso sobre a
realidade do País,…
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Muito bem!
O Sr. João Galamba (PS): — … e isto, infelizmente, nem este Congresso alterou, porque mantém
exatamente o mesmo discurso que a anterior liderança do PSD. Nisto, Sr. Deputado, não mudaram nada e se
querem verdadeiramente virar a página, então, tratem de mudar e de reconhecer a realidade que hoje,
efetivamente, existe.
Protestos do Deputado do PSD António Costa Silva.
O País cresce mais, cresce muito mais e está muito mais próximo. O exemplo perfeito é o da Espanha. Os
Srs. Deputados estiveram sempre a falar de Espanha: «Espanha é o nosso modelo!», «Temos de crescer tanto
como a Espanha!».
Ora bem, Sr. Deputado, em 2015, Espanha crescia 3,4% do PIB e Portugal crescia 1,8%. Em 2017, Espanha
cresce 3,1% e Portugal cresce 2,7%. Logo, a diferença, face aos campeões de crescimento na União Europeia,
é, hoje, a menor dos últimos 15 anos.
Portanto, o Sr. Deputado pode dar as voltas que quiser, citar os países que entender, o que é um facto é que
hoje estamos muito melhor do que no passado,…
Aplausos do PS.
… porque, apesar de esses países crescerem mais, a diferença é muito menor face a Portugal. Esse é um
caminho que temos feito e é importante que reconheça esse esforço do Governo, das empresas, dos
trabalhadores portugueses, é o contributo de todos eles que permite a Portugal ter hoje os resultados que tem.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. João Galamba (PS): — Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, o Partido Socialista reconhece,
evidentemente, que a devolução de rendimentos e de direitos é fundamental para os resultados económicos
que temos hoje, mas também reconhece, ao contrário do Bloco de Esquerda, que o esforço para garantir o
cumprimento de metas e finanças públicas sólidas…
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — E a lei do trabalho?!
O Sr. João Galamba (PS): — … é um ingrediente igualmente importante. Temos de trabalhar em várias
frentes, pois não há crescimento económico sem devolução de rendimentos e de direitos e não há devolução
de rendimentos e de direitos sem sustentabilidade das finanças públicas. E é este resultado que temos a
obrigação de garantir aos portugueses.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — A lei do trabalho?!
O Sr. João Galamba (PS): — Sobre a legislação do trabalho, Sr.ª Deputada, há diferenças entre o Partido
Socialista e o Bloco de Esquerda, mas há uma coisa que todos reconhecemos, que é através da organização
dos trabalhadores, da negociação coletiva e da defesa dos seus direitos que se mantém um crescimento salarial
elevado. É importante investir nas qualificações, mas não chega; por isso é que o diálogo laboral e a concertação
de trabalhadores são fundamentais.
O Partido Socialista tem diferenças face ao Bloco de Esquerda — há coisas em que acompanhamos o Bloco
de Esquerda e coisas em que não acompanhamos e há coisas em que o Bloco de Esquerda não acompanha o
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Partido Socialista. Nós valorizamos o diálogo social, valorizamos a contratação coletiva e é por essa razão que
as portarias de extensão aumentaram,…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. João Galamba (PS): — … foram alargadas significativamente, face ao Governo anterior, aliás,
contrariando recomendações e ideias, quer do PSD e do CDS quer das próprias instituições europeias. Era
importante que o Bloco de Esquerda reconhecesse isso, porque o que importa entre nós não é concordarmos
em tudo. E não é, certamente, o Bloco de Esquerda tornar-se numa visão mimética do PS e, seguramente,
também não é o oposto, o PS a transformar-se numa versão mimética do Bloco de Esquerda.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, faça favor de concluir.
O Sr. João Galamba (PS): — O importante é a esquerda ser capaz de colaborar, de dialogar…
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir.
O Sr. João Galamba (PS): — … e de construir soluções que melhorem a condição de vida dos portugueses.
É isto que temos feito e espero que seja isto que continuemos a fazer, não só em 2018 mas durante muitos e
bons anos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro
Soares.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: Portugal fechou em 2001 a
última mina de urânio em território nacional.
Dezassete anos depois e muitas dezenas de milhões de euros após o encerramento, o passivo ambiental do
urânio ainda não está resolvido e as populações da região continuam a sofrer na saúde os efeitos da
radioatividade.
Surpreendentemente, quando por todo o mundo a indústria do nuclear perde terreno, Portugal volta a ser
confrontado com os perigos do urânio e da radioatividade, mas agora do lado de lá da fronteira, a cerca de 40
km, em Retortillo, junto ao município de Almeida.
O Estado espanhol autorizou e concessionou à Berkeley Minera, de Espanha, o projeto mineiro Retortillo-
Santidad de exploração de urânio, que, a concretizar-se, seria a única mina de urânio a céu aberto em toda a
Europa, tal é o impacto deste tipo de explorações no território e no ambiente.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Muito bem!
O Sr. Pedro Soares (BE): — O perímetro das duas minas encontra-se em área de elevada sensibilidade
ecológica e ambiental, junto ao Parque Natural do Douro Internacional (PNDI), e é atravessada pelo rio Yeltes,
afluente do Douro.
Espanha já emitiu, em 2013, a declaração de impacte ambiental favorável ao projeto, apesar de terem sido
determinados 14 impactos severos que incluem contaminação dos solos, contaminação da atmosfera,
alterações nas águas superficiais e nas águas profundas, prejuízos em habitats de interesse comunitário, na
fauna e, particularmente, na avifauna, entre outros.
Incompreensivelmente, só em 2016 é que as autoridades portuguesas pedem a Espanha as primeiras
informações e consideram que o projeto é suscetível de ter efeitos ambientais significativos em território
português.
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Desde aí, o comportamento das autoridades espanholas tem sido evasivo e não colaborativo. Não
reconhecem que o projeto pode ter impactos em Portugal, desde logo no rio Douro, o que é absurdo e contra
todas as evidências.
Não acionam o Protocolo de atuação entre os dois países, como lhes competia, para a realização de uma
avaliação de impacto ambiental transfronteiriço, com envolvimento das autoridades portuguesas e espanholas
e consulta pública nos dois territórios. Pelo contrário, andam quase há dois anos a trocar correspondência sem
que transmitam qualquer informação relevante.
A preocupação das populações, manifestada através dos autarcas da região e também dos alcaides, ficou
evidente na visita da Comissão de Ambiente.
A possibilidade de contaminação radioativa por via aérea e por via fluvial tem contornos devastadores para
as expectativas de desenvolvimento que restam àqueles territórios, ligadas ao ambiente, ao património, ao
turismo, à produção agrícola e à produção pecuária extensiva.
A Berkeley Minera, de Espanha, quer explorar urânio junto à fronteira portuguesa durante 10 anos, retirar
lucros e abastecer a indústria do armamento e das centrais nucleares, mas tudo faz em colaboração com o
Governo espanhol e com o Comissário Europeu do Ambiente, ex-Ministro do Governo de Rajoy, para não
assumir os graves danos à natureza e os impactos no território português.
Na verdade, trata-se de dumping ambiental: eles ficam com os lucros, nós ficamos com todos os prejuízos,
com o passivo ambiental que perdurará por décadas nas populações, na saúde das pessoas e nos territórios e
que custará milhões ao erário público em processos de descontaminação.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. Pedro Soares (BE): — Portugal tem o direito e o dever de exigir garantias, e já o deveria ter feito.
Desde logo, o Governo PSD/CDS, em 2013, quando foi conhecida a Declaração de Impacte Ambiental e quando
a Câmara Municipal de Almeida lhe pediu esclarecimentos sobre esta matéria, irresponsavelmente, deixou que
o País se atrasasse.
Agora, o Governo português não pode continuar a insistir no atraso e deixar-se ficar por uma troca de
correspondência inconsequente e que só serve a estratégia radioativa da Berkeley, do Governo espanhol e do
Comissário Miguel Arias Cañete.
Como em Almaraz, querem que Portugal fique confrontado com factos consumados, minas escavadas,
atentados ambientais dificilmente reversíveis e populações desprotegidas.
É já evidente, é mais do que óbvio que Espanha não quer reconhecer os impactos no nosso território e não
quer fazer a avaliação de impacto ambiental transfronteiriça.
O Ministro do Ambiente já se dispôs a ir a Madrid e não obteve resposta. As autoridades espanholas andam
a enrolar até que a última licença seja passada e a componente industrial possa avançar.
O Governo espanhol não cumpre o Protocolo de atuação entre os dois países e o Ministro do Ambiente
português acabou de o reconhecer hoje de manhã, na Comissão de Ambiente.
Que mais é preciso, que mais evidências são necessárias para que o Governo português, o Ministério dos
Negócios Estrangeiros exija a Espanha o cumprimento do Protocolo de atuação?
Que mais é preciso para que o nosso Primeiro-Ministro se desloque com urgência ao distrito da Guarda, a
afirmar a solidariedade com as populações, com os autarcas de Almeida, de Pinhel, dos municípios do Douro
Superior, com garantias de defesa dos seus interesses, que são os interesses de todo o País?
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. Pedro Soares (BE): — Que mais é preciso para que o Governo português participe, nas instâncias
europeias, o incumprimento da Berkeley Minera, de Espanha, e do Governo espanhol relativamente às suas
obrigações e às normas europeias?
Sr.as e Srs. Deputados, o Governo português, o Estado português tem obrigações com aquelas populações,
tem obrigações com o ambiente do nosso País, tem obrigações com a nossa população e não pode eximir-se
delas. Tem de exigir ao Governo de Espanha o cumprimento das normas europeias, das normas internacionais.
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Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr. Deputado Pedro Soares, inscreveram-se para pedir esclarecimentos
quatro Srs. Deputados. Como pretende responder?
O Sr. Pedro Soares (BE): — Respondo dois a dois, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sendo assim, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Carpinteira.
O Sr. José Manuel Carpinteira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, antes de mais, quero
cumprimentar o Sr. Deputado Pedro Soares por manter este assunto na ordem do dia.
De facto, a mina de urânio a céu aberto que a empresa Berkeley quer explorar em Retortillo, a poucos
quilómetros de Portugal, é um grave problema.
É verdade também que este é um problema que teve o seu início em 2013, como já aqui foi dito, com a
Declaração de Impacte Ambiental, que deveria ter sido transfronteiriço e não o foi. Aí, o Governo anterior nada
fez; agora, o PSD também vem lamentar-se desse facto.
É verdade que este é um assunto preocupante e que esta exploração de urânio junto à fronteira portuguesa
vai criar-nos, com certeza, muitos problemas. Devemos, por isso, exigir que Espanha avalie os impactos
transfronteiriços, de modo a preservar a saúde pública e o ambiente.
As poucas pessoas que ainda resistem nessas terras de fronteira merecem que Portugal olhe por elas. Essas
pessoas já perderam quase tudo: os serviços públicos e até a esperança num futuro melhor. Não lhes retirem
agora a saúde e o ambiente natural.
Mas, Sr. Deputado Pedro Soares, não é verdade que o Governo português não esteja a fazer nada.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. José Manuel Carpinteira (PS): — Este Governo está a acompanhar e a exigir informações e até já
pediu, como o Sr. Deputado referiu, uma reunião com a Sr.ª Ministra do Ambiente de Espanha, para tentar
resolver rapidamente este problema.
Pergunto, por isso, ao Sr. Deputado, que medidas e ações em concreto podem o Governo e a Assembleia
da República tomar para mitigar este grave problema?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Soares, quero também cumprimentá-lo
pelo tema que trouxe à discussão na Assembleia da República.
As questões que coloca são, de facto, pertinentes para o nosso País, em particular para as comunidades, as
localidades, as populações que residem próximo da fronteira.
O próprio Governo português já reconheceu que há ou que poderá haver, de facto, impactos no nosso
território, na sequência do avanço deste projeto da mina de urânio em Retortillo. Esses impactos poderão ser
aéreos, radioativos e também nos afluentes, em particular, no rio Douro, poderão ser no nosso património
ambiental, e vale a pena referir a existência do Parque Natural do Douro Internacional e de um conjunto de áreas
protegidas, e ainda poderão ser na saúde pública das populações.
Consideramos, relativamente a esta matéria, fundamental que o Governo intervenha para salvaguardar os
interesses nacionais, para salvaguardar os interesses públicos, para garantir o bem-estar das nossas
populações, a saúde pública, e também para salvaguardar as questões ambientais. É fundamental que assim o
seja.
Consideramos que o Governo português, no quadro do relacionamento diplomático internacional com o
Governo espanhol, tudo deve fazer para que o interesse público seja salvaguardado e para que haja,
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efetivamente, uma avaliação de impacto ambiental transfronteiriça que identifique claramente as consequências
e os impactos nos nossos territórios, para que se tomem as medidas adequadas face a essa mesma avaliação.
É por isto que o PCP, hoje, neste debate, volta a dizer — já o dissemos de manhã, já o afirmámos, na nossa
intervenção — que tudo fará para que o interesse nacional e os interesses das populações sejam protegidos e
sejam salvaguardados.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Soares.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, começo por agradecer aos Srs. Deputados José Manuel
Carpinteira e Paula Santos as questões que colocaram.
Quero apenas referir, muito rapidamente, que reconheço que o Governo português tem feito alguma coisa,
tem trocado correspondência com o Governo espanhol, efetivamente. Têm sido cartas até com algum carinho
entre os dois Governos, pois somos países amigos, países vizinhos.
Mas, Srs. Deputados, falta claramente uma questão aqui, falta atitude política relativamente à gravidade da
situação. Esse é o problema central, Srs. Deputados, porque não chega fazer declarações públicas depois da
visita que a Comissão de Ambiente fez a Retortillo e depois de ter havido a repercussão mediática que houve e
a mobilização de autarcas de um lado e do outro da fronteira.
O Governo português já deveria ter tido essa atitude política antes, já deveria ter mobilizado todas as suas
disponibilidades diplomáticas, no sentido de exigir a Espanha o cumprimento do Protocolo de atuação entre os
dois países, e não o fez, efetivamente. Tem estado a fazer perguntas. É bom que faça perguntas, mas, Srs.
Deputados, nós precisamos é de respostas, nós precisamos de garantias do Governo espanhol relativamente a
esta questão, e é isto que não tem existido.
Por isso, digo e reafirmo, não tem havido atitude política por parte do Governo. É preciso que haja, de uma
vez por todas, atitude política por parte do Governo português. Por isso, coloquei este desafio concreto ao
Governo português: em primeiro lugar, que o Ministério dos Negócios Estrangeiros desenvolva todas as
possibilidades diplomáticas que tem no sentido de exigir ao Governo espanhol o cumprimento do Protocolo de
atuação entre os dois países; em segundo lugar, que o Governo português, através do seu Primeiro-Ministro,
dê um sinal fundamental ao País e a Espanha de que está disponível para mobilizar todos os seus meios políticos
para defender, como dizia a Sr.ª Deputada Paula Santos, o interesse público, os interesses das populações, os
interesses do nosso território, o interesse do ambiente e dos ecossistemas do nosso País. Era muito importante
que se deslocasse ao distrito da Guarda, que se deslocasse ao Douro Internacional e que o afirmasse, clara e
publicamente, para que todos pudessem ouvir e para que as populações daqueles territórios também
ganhassem confiança no Governo português para a defesa dos seus interesses.
É este o sentido, é esta a atitude política que é fundamental que seja tomada, e que ainda não o foi.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Passamos ao segundo bloco de pedidos de esclarecimento.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Emília Cerqueira.
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Soares, hoje tem sido um dia quase
inteiramente dedicado a esta matéria, quer pelo PSD quer pelo Bloco, através do Sr. Deputado e de mim própria.
Deixe-me dizer-lhe que estamos solidários com a sua intervenção, pelo menos com quase toda a intervenção.
Concordamos que é importante haver uma atitude enérgica, proativa, atuante por parte do Governo para vir
proteger estas populações.
Vemos esta preocupação com bons olhos, e é bom que isto fique bem claro, porque estamos a falar do nosso
interior mais pobre, mais envelhecido, mais deprimido e cuja única riqueza é, verdadeiramente, a sua paisagem,
a sua natureza, o seu meio ambiente, a sua envolvente, esta é a grande riqueza daqueles territórios que não
têm muitas outras fontes de rendimento e de riqueza para se valorizarem, e ficámos preocupados tanto em
Almeida, na reunião com os autarcas como, depois, em Espanha, na reunião com os alcaides, que também nos
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expuseram as suas preocupações, porque, realmente, a realidade de um lado e do outro da fronteira é muito
similar.
Deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado, que apenas lamento que o Bloco de Esquerda, apesar de vir com este
discurso, no qual nos revemos — e digo-o mais uma vez —, fazendo parte desta solução governativa, só seja
oposição de vez em quando e que, nos dias em que é Governo, não tenha instado o Governo a tomar atitudes
e medidas concretas para além destas que, agora, estamos a ver.
Vozes do PSD: — Muito bem!
A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sr. Deputado, atenta a sua intervenção de hoje tão veemente sobre esta
matéria e a preocupação tão evidente quanto à questão do urânio e do nuclear, que é uma questão mais central
e mais abrangente e que a todos preocupa, pergunto: quais são as medidas concretas, para além de palavras,
discursos e comunicados, que o Bloco de Esquerda pretende trazer a esta Assembleia, de forma a que todos,
em conjunto, possamos ter atitudes reais, legislativas e que, sim, condicionem, de alguma forma, a atuação do
Governo?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Soares, apesar de Os Verdes
já terem feito hoje uma declaração política justamente sobre esta matéria, muito do que queríamos dizer já ficou
dito, queria saudar o Bloco pelo facto de reforçar esta discussão com a declaração política que acaba de proferir.
Sr. Deputado, uma das coisas que mais deve incomodar-nos é esta passividade dos governos — vamos
dizer assim —, relativamente a um assunto que tem impacto concreto sobre Portugal. E estamos a falar de
radioatividade, de metais pesados, de contaminação de recursos hídricos, de contaminação atmosférica, com
repercussão também no rio Douro e, portanto, em todos os municípios e em toda a população envolventes.
Portanto, estamos a falar de uma questão muito séria.
Ora, com uma Declaração de Impacte Ambiental proferida favoravelmente, com um Protocolo de atuação
para avaliação dos impactos transfronteiriços entre o Governo português e o Governo espanhol claramente
violado, como se compreende esta passividade? Digo «passividade» porque a atitude não passa de «solicitar»,
«aguardar» informação por parte de Espanha, e, de facto, isto não pode ser.
Quando temos esta consciência clara de que a APA afirmou perentoriamente, numa resposta a uma pergunta
escrita feita por Os Verdes, que tem profunda consciência dos impactos diretos e indiretos que este projeto, em
concreto, de exploração mineira de urânio em Retortillo tem sobre o território nacional, como é que não se tem
uma atitude proativa? Não é no sentido de pedir, é no sentido de exigir que tenhamos uma participação ativa
num processo de avaliação de impacto ambiental. É isto que se exige!
É evidente que estamos a falar, como já aqui foi referido, de territórios com uma grande escassez de resposta
ao nível da sua dinamização, da sua economia, da atividade oferecida às suas populações, como é o caso dos
concelhos de Almeida, de Figueira de Castelo Rodrigo, de Freixo de Espada à Cinta e de outros municípios
banhados pelo Douro, portanto nas imediações. Estamos a falar de uma machadada que pode ser dada a um
potencial de vitalidade de uma região onde tanto lhes tem sido retirado. E não pode ser.
Sr. Deputado, já aqui informei que Os Verdes agendaram um projeto de resolução concreto sobre esta
matéria exortando claramente o Governo a tomar essa atitude proativa e a defender os interesses dos
portugueses, do nosso território, dos nossos recursos hídricos e dos nossos ecossistemas.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, queira fazer o favor de terminar.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino já, Sr. Presidente.
Gostava de ter uma palavra do Sr. Deputado sobre o apoio a essa iniciativa que Os Verdes vão aqui
apresentar.
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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Soares.
O Sr. Pedro Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados, começo por agradecer às
Sr.as Deputadas Emília Cerqueira e Heloísa Apolónia as questões que colocaram.
Sr.ª Deputada Emília Cerqueira, sei que é originária de um território que tem características rurais e,
certamente, conhece muito bem aquilo que se passa com as populações que vivem nesses territórios. São
populações que têm um nível de desproteção elevado, que têm, por vezes, dificuldade em fazer ouvir a sua voz,
em reivindicar o interesse próprio nestas matérias.
Sr.ª Deputada, acha bem que populações destes territórios rurais, de baixa densidade, abandonados,
estejam há quatro anos sem qualquer resposta, sem qualquer referência dos governos portugueses, dois deles
da responsabilidade do Governo PSD/CDS? Isto é inconcebível! Isto não é atitude, isto não é proteger
populações que precisam, em primeiro lugar, de ser protegidas pelo Estado português e, no caso concreto, pelo
Governo português. Isto não foi feito e, felizmente, agora, por iniciativa da Assembleia da República, este
problema está a ser suscitado.
Ainda bem que a Comissão do Ambiente foi visitar aqueles territórios e falou com os autarcas de um lado e
com os alcaides do outro lado da fronteira. Houve populações que se mobilizaram à nossa ida e, como já foi dito
hoje, na reunião da Comissão, houve pessoas de Retortillo, espanhóis, que vieram ter connosco e que nos
disseram «a nossa última esperança está em vós. Está nos Deputados e nas Deputadas portugueses. Levantem
esta questão, porque nós precisamos de impedir, de travar a implantação daquela mina perigosíssima de
exploração de urânio, em Retortillo».
A Sr.ª Deputada, que conhece bem a população rural, também sabe, com certeza, o que é uma ladainha.
Essa repetição da oração de que fazemos parte da maioria que apoia o Governo e, como tal, parece que não
temos legitimidade para colocar as questões já não convence ninguém, a não ser aqueles que têm fé nessa
ladainha, e só a Sr.ª Deputada é que poderá tê-la.
Devo dizer que a postura do Bloco de Esquerda, independentemente de fazer parte da maioria parlamentar
que suporta este Governo, tem sido sempre de colocar todas as questões, todas as suas discordâncias com
toda a frontalidade e, mais uma vez, foi isso que fez em relação às populações de Almeida, de Retortillo e de
toda aquela região do Douro Internacional.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Pedro Soares (BE): — Está a fazê-lo e ainda bem que se está a procurar consenso nesta Assembleia
da República no sentido de haver uma votação clara, se possível unânime, em defesa destas populações com
vista a travar a exploração mineira.
Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, queria dizer-lhe que, como é óbvio, pode contar com o nosso voto e também
com o nosso contributo para que em relação aos vários projetos de resolução haja uma grande votação nesta
Assembleia da República no sentido de colocar ao Governo português a necessidade absoluta de diligenciar de
forma a travar a exploração mineira de Retortillo-Santidad.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Patrícia
Fonseca, do CDS-PP.
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A agricultura e as florestas ocupam
três quartos do nosso território, mas muitos teimam em continuar a ignorar o contributo que estes setores dão
para o crescimento da economia e para o desenvolvimento sustentável do País.
Nos anos de 2011 a 2015, quando Portugal esteve sob intervenção financeira, a recuperar da bancarrota em
que o Partido Socialista o colocou, o setor agrícola mostrou toda a sua resiliência, dinamismo e capacidade de
inovação.
Nesse período, as exportações do agroalimentar e florestas cresceram sempre acima do resto da economia
e sempre mais do que as importações, o que contribuiu para uma redução substancial do défice da balança
comercialdo setor.
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Não apenas na cortiça, mas também no vinho, no azeite e nas hortofrutícolas, desde a tradicional pera rocha
aos modernos pequenos frutos, os produtores recuperaram confiança e isso foi notório no aumento das decisões
de investimento, conseguindo-se executar o quadro comunitário a 100%.
A opinião pública ficou, neste período, mais consciente da enorme transformação que o setor sofreu, para
melhor; passou a ser encarado com modernidade e com futuro, e muitos foram os jovens que se quiseram
instalar.
Chegados a 2 de dezembro de 2015, logo no debate do Programa deste Governo das esquerdas unidas, o
CDS fez questão de afirmar, numa pergunta ao então recém-Primeiro-Ministro, António Costa, a importância
que a agricultura e o mundo rural têm para o CDS, que sempre os considerou relevantes para o desenvolvimento
do País e da economia nacional.
Lamentavelmente, nestes últimos dois anos, quem dúvidas tivesse pôde constatar que, para o PS e para
este Governo, a agricultura e os agricultores, tal como a floresta e os produtores florestais, não estão na lista de
prioridades.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Desde a forma como tem sido gerida uma das mais graves secas de
que há memória, à falta de apoio ao investimento, ao ataque brutal à floresta portuguesa ou à anedótica situação
da gestão dos combustíveis rurais, pouco há de positivo que tenha a marca deste Governo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos em fevereiro de 2018. Temos 100% do País em seca, mais de
metade severa. Janeiro foi o 10.º mês consecutivo com precipitação abaixo do normal e os últimos 18 meses
são o período mais seco desde que há registos estatísticos.
Desde abril de 2017 que o CDS tem vindo a alertar para a necessidade de medidas de apoio extraordinárias
aos agricultores, mas o Ministro Capoulas Santos teima em ignorar esta realidade.
Apresentámos propostas, como a isenção da taxa dos recursos hídricos, um apoio à alimentação animal ou
uma ajuda às despesas com eletricidade, mas o Governo responde com coisa nenhuma.
Pior, o Ministro engana os portugueses e anuncia milhões quando não dá sequer tostões. Limita-se a adiantar
as ajudas que já são dos agricultores por direito, que são 100% comunitárias e não custam 1 cêntimo aos cofres
do Estado. Tudo isto porque, ficámos hoje a saber, e cito, «não tem saquinhos de dinheiro» para distribuir aos
agricultores. Esses «saquinhos de dinheiro» foram todos para os sindicatos.
Aplausos do CDS-PP.
Srs. Deputados, ontem foram conhecidas as previsões agrícolas do INE, que indicam que este ano terá a
menor área de cereais de outono-inverno dos últimos 100 anos. As pastagens esgotaram e os produtores
pecuários estão a dar ração aos animais, encarecendo brutalmente os custos de produção. As culturas de
regadio, bem, essas ninguém sabe se haverá água para as regar, pelo que é uma incógnita se virão, sequer, a
ser semeadas.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não me diga que já deixaram de rezar!?
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Estranhamente, à esquerda do PS, o Bloco e o PCP, nem uma
palavra. Bem ao contrário de fevereiro de 2012, quando não faltaram as críticas e as vozes inflamadas que
agora se calam. É a paz social comprada, Sr. Deputado João Oliveira!
Aplausos do CDS-PP.
E no que respeita ao investimento? Como está o PDR (Programa de Desenvolvimento Regional)? Se não
está parado, está a andar au ralenti.
A mais de metade do programa há ainda ações cujos concursos nunca abriram e algumas delas nem sequer
foram regulamentadas. Só 36% dos projetos estão contratados e há mais de 6000 candidaturas que estão
decididas, mas para as quais não há disponibilidade financeira. A execução do Orçamento do Estado tem sido,
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todos os anos, abaixo dos 100 milhões de euros e está apenas, apenas, em 41%. Para terem uma ideia, Srs.
Deputados, estes 41% correspondem a uma execução anual de 13,5%, a mesma que levou, imagine-se, à
exoneração da gestora em 2016, porque era necessário, à época, imprimir uma nova dinâmica no Programa.
Mais uma vez, à esquerda, o silêncio é total.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — E como está a floresta? Depois de um dramático verão de 2016, o
Governo, quiçá após consulta de um qualquer focus group, apressou-se a apresentar uma suposta reforma da
floresta, que não passou, na sua maioria, de um conjunto de alterações legislativas a diplomas já existentes,
numa atitude autista e prepotente contra tudo e contra todos.
Infelizmente, antes mesmo que essa reforma — a maior desde o tempo de D. Dinis, segundo afirmou o
Ministro da Agricultura — pudesse sequer produzir efeitos, eis que chega 2017 e Portugal vive o mais fatídico,
devastador e mortífero ano em termos de incêndios e os portugueses constatam que estavam entregues à sua
sorte.
O Governo volta, então, a fazer um conjunto de alterações avulsas aos diplomas recentemente aprovados,
porque afinal não estavam bem assim. Alterações que foram tantas e tão bem preparadas nos gabinetes dos
Srs. Ministros que nem o próprio Governo se entende e assistimos ao caricato de o Primeiro-Ministro vir
publicamente num dia dizer uma coisa para 15 dias depois se vir desdizer.
Primeiro, que cortem tudo e, depois, que cortem só o mato; primeiro, que não pode existir quaisquer árvores
50 m em redor das casas e, depois, que já podem desde que distem entre si 4 m, mas, claro, se forem eucaliptos
— essa espécie maldita, agora também secundada pelo pinheiro bravo, então têm de distar 10 m.
E porquê, perguntam os Srs. Deputados? Porque sim, porque alguém nos gabinetes entendeu que era assim
sem consultar os especialistas, que dizem que é um erro.
Entretanto, em inúmeras aldeias por esse País fora foram muitos os que cortaram árvores de fruto dos seus
quintais.
Para concluir, direi, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que a agricultura, o mundo rural e o setor agroalimentar
são uma potencialidade para o território, indispensáveis ao desenvolvimento do País.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Esgotou o seu tempo, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Estou a terminar, Sr. Presidente.
No CDS, defendemos, por isso, um mundo rural com lugar para todos, para os mais competitivos e para os
mais pequenos que ocupam o território e prestam serviços de agrossistemas.
Os agricultores portugueses são empreendedores, inovadores e sabem há muito que não podem contar com
esta maioria, que não podem contar com este Governo das esquerdas unidas.
O CDS, em matéria de agricultura, diz «presente», e diz «presente» com coerência. O que defendemos hoje
é o que fizemos ontem e o que projetamos para amanhã.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Sr.ª Deputada, inscreveram-se quatro Srs. Deputados para pedir
esclarecimentos. Como é que deseja responder?
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Em grupo de dois, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Muito bem, Sr. Deputada.
Assim sendo, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Castro, do PS.
O Sr. João Azevedo Castro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Patrícia Fonseca,
aproveito a oportunidade para felicitá-la pelo tema que nos trouxe.
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Começo por referir que o Programa do Governo, em execução, prevê uma despesa de 1167 milhões de
euros, permitindo executar 615 milhões de euros em fundos comunitários; mais de 50% do Orçamento inclui
transferências para os agricultores e para as empresas; a generalidade dos organismos do Ministério vê
reforçadas as suas dotações, com reforço de recursos humanos, resolvendo questões de precariedade; a crise
do leite foi, e está a ser, enfrentada de frente, sem empurrar o problema.
O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Muito bem!
O Sr. João Azevedo Castro (PS): — Estamos na presença de respostas a questões de atualidade, sem
esquecer as mais emergentes, como as da floresta, num contributo claro para o desenvolvimento do potencial
económico da agricultura, para a sua competitividade, para a sua internacionalização, com uma aposta no
regadio, visando uma utilização eficiente e sustentável do recurso «água» — já podemos falar, como realidade,
sobre a ampliação do Alqueva, resolvendo o que o anterior Governo devia ter resolvido, em mais de 50 000 ha
o que há dois anos parecia uma miragem —,…
O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Muito bem!
O Sr. João Azevedo Castro (PS): — … com uma aposta no desenvolvimento rural, com preocupações de
rejuvenescimento do setor, com o estatuto da pequena agricultura com direitos e deveres, com uma reforma da
floresta em curso, que se projetará no médio e longo prazo, com um cadastro, e estão criadas as condições
para, finalmente, avançar em Portugal, tendo como suporte o Fundo Florestal Permanente que inclui um
acréscimo de investimento com o aumento da sua dotação.
Prevê-se, ainda, uma execução orçamental na ordem dos 100%, reitero, na ordem dos 100%, repetindo a
execução de 2017 e de 2016 — Portugal é o terceiro País da União Europeia na execução do FEADER (Fundo
Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural) —,…
O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Essa é que é essa!
O Sr. João Azevedo Castro (PS): — … e um corte objetivo com os sucessivos défices de investimento
anteriores.
É verdade que ainda muito há a fazer, como também é verdade que foram herdados problemas do passado
que não deveriam ter existido e de que é exemplo o buraco financeiro nas medidas agroambientais.
Tudo isto num quadro de contenção e de rigor que os tempos exigem, permitindo corresponder aos
compromissos externos do País.
Neste contexto, gostaria de perguntar à Sr.ª Deputada se acha que a agricultura portuguesa está mais bem
estruturada e organizada para uma melhor negociação do quadro comunitário que se avizinha.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Serra,
do PSD.
O Sr. NunoSerra (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, começo por cumprimentar o CDS e a Sr.ª
Deputada Patrícia Fonseca por ter trazido o tema da agricultura a debate e, em especial, uma matéria que é da
maior relevância nos dias de hoje, a seca.
A gravidade da seca e as suas consequências aos mais diversos níveis exigem, da parte do poder político,
uma atitude séria e responsável, o que, infelizmente, não temos visto por parte deste Governo.
Já agora, no seguimento do pedido de esclarecimento do Sr. Deputado do PS, gostaria de dizer que para
este caso não há desculpa, não se deve a algum buraco do Governo anterior. A seca está mesmo a acontecer
agora e a culpa de não ter sido feito nada é deste Governo.
O Sr. NunoMagalhães (CDS-PP): — Muito bem!
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O Sr. NunoSerra (PSD): — Mais: a forma como este Governo está a tratar da seca mostra um desnorte
completo.
Protestos do PS.
Aliás, o desnorte pode ouvir-se pelos protestos.
A falta de acompanhamento e de ferramentas para tratar da seca mostra também quais foram as prioridades
deste Governo e, acima de tudo, mostra a sua falta de visão política quando se trata de trabalhar para Portugal.
O Governo passou dois anos a ceder às exigências dos partidos mais à esquerda do PS e a tentar resolver
os problemas com que se comprometeu para se manter no cargo, mas esqueceu-se de governar para Portugal
e para os portugueses. Exemplo disso é o Plano Nacional de Regadios, que está com dois anos de atraso e,
hoje, o Ministro referiu-se a ele como sendo uma solução para a seca, solução essa que disse ser para 2021.
Srs. Deputados, em 2021 já morreram todos os animais e acabaram os agricultores! Não é em 2021 que se vai
resolver um problema de hoje, é hoje que este Governo tem de ter ferramentas!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. NunoSerra (PSD): — O Plano Nacional de Regadios começa com dois anos de atraso por culpa deste
Governo.
Mais, Srs. Deputados: dizerem que se vai ajudar os agricultores a resolver o problema da seca criando uma
linha de crédito com 5 milhões é realmente brincar com os portugueses, é onerar mais aqueles que precisam
neste momento de ser desonerados para fazer face às suas despesas.
Sr.ª Deputada Patrícia Fonseca, concorda ou não que é lamentável e de um desprezo completo dizer que os
agricultores, tendo em conta o que fazem no País, precisam é de «saquinhos de dinheiro»?
Em vez de vir falar de «saquinhos de dinheiro» e de ter andado a cativar dinheiro para resolver problemas
que o anterior Governo quis resolver, o Sr. Ministro devia ter agarrado nesse dinheiro — não precisava de ser
em saquinhos — para aumentar a execução do PDR, especialmente para as linhas destinadas aos mecanismos
mais eficientes do uso da água. Aí, sim, teria resolvido o problema da seca e teria ajudado os portugueses.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Patrícia Fonseca.
A Sr.ª PatríciaFonseca (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados João Castro e Nuno Serra, agradeço
as questões que me colocaram e que são, de facto, muito pertinentes.
Sr. Deputado João Castro, o Orçamento do Estado é um conjunto de intenções. O Governo bem pode prever
gastar 1000 milhões de euros, mas, se depois não os gastar, não interessa nada eles estarem lá. O que temos
constatado nos últimos dois anos é que a execução orçamental ao nível da agricultura tem ficado muito, muito,
aquém do que o Governo tem projetado. Portanto, isso não nos diz nada.
Relativamente à execução a 100% do PDR, devo dizer que o PS é exímio em tentar confundir as pessoas,
dizendo que executaram 100% e que o Governo anterior só executou 14%. Isto porque confunde execução
anual com execução global do Programa e, ao compararem a execução de um ano com a execução global do
Programa, torna-se muito fácil baralhar quem não está por dentro dos assuntos e não pode fazer uma análise
correta.
O Sr. NunoMagalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª PatríciaFonseca (CDS-PP): — Sr. Deputado João Castro, respondendo concretamente à questão
que me colocou sobre se o setor da agricultura está melhor estruturado e organizado para negociar o próximo
quadro comunitário de apoio, gostaria de dizer que sim, mas isso vai depender muito do que os senhores fizerem
ao setor e se o setor conseguir resistir ao que os senhores lhe têm feito.
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Os senhores têm «a faca e o queijo na mão», são Governo, e por isso vão poder definir as políticas para
ajudar o setor a manter-se organizado e estruturado, porque foi assim que nós o deixámos.
O Sr. NunoMagalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª PatríciaFonseca (CDS-PP): — Sr. Deputado Nuno Serra, respondo agora às suas questões, que
são, de facto, muito pertinentes.
Não posso deixar de concordar consigo quanto à necessidade do aumento das verbas do Orçamento do
Estado, da dotação nacional, para o PDR. Aliás, este Governo, assim que entrou em funções, retirou a
reprogramação do PDR, que estava a ser analisada em Bruxelas, e que aumentava precisamente de 15% para
20% a dotação orçamental prevista no Orçamento do Estado, o que permitiria, isso, sim, alavancar o fundo
comunitário que o PS gosta muito de inverter e de dizer que alavanca, mas alavanca para baixo, empurrando
para baixo, em vez de «subir as escadas».
Só há uma forma de responder ao dinamismo que o setor agrícola tem demonstrado a nível de investimento:
reforçar o PDR com verbas do Orçamento do Estado.
Quanto ao Plano Nacional de Regadios, folgo ouvir o Sr. Deputado João Castro falar nos 50 000 ha — apenas
50 000 ha — de regadio do Alqueva. Isto porque o Sr. Ministro — e é bom que fique claro — gosta muito de
dizer que tem 90 000 ha novos de regadio, mas não tem. O Sr. Ministro pegou no que estava projetado no PDR,
somou-lhe 50 000 ha do Alqueva e diz que fez o Plano Nacional de Regadios com 500 000 milhões de euros e
com 90 000 ha de regadio. É bom que se fale exatamente do que aconteceu.
O Sr. JoãoAzevedoCastro (PS): — Arranjou empréstimo!
A Sr.ª PatríciaFonseca (CDS-PP): — Arranjou, e bem, Sr. Deputado! Estranho seria se não arranjasse. Só
que, primeiro, era preciso concluir Alqueva, ou seja, concluir a obra que estava a ser feita, antes de pensar em
alargar, porque não se deve pôr — usando um termo agrícola — «a carroça à frente dos bois».
Portanto, é melhor concluir o que está por fazer antes de se começar a fazer outra coisa.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Ramos.
O Sr. JoãoRamos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Patrícia Fonseca, é um gosto
discutir questões agrícolas consigo, até porque elas evidenciam bem as diferenças entre o PCP e o CDS.
A Sr.ª Deputada trouxe o discurso de sempre do CDS, que é o discurso do sucesso da agricultura, mas o
problema desse discurso é que olha apenas para uma parte, a que está a crescer, e esquece um todo que é
muito grande, que é o caso da agricultura familiar, da pequena e média agricultura, que sofreu muito quando o
CDS esteve no Governo. Aliás, o CDS sempre recusou que houvesse um estatuto para a agricultura familiar,
para a pequena e média agricultura, que tanta falta faz no interior, como se verificou com os incêndios de 2017.
A Sr.ª Deputada trouxe também o discurso da modernidade da agricultura, esquecendo que há um conjunto
de problemas enormes associados ao modelo de desenvolvimento da agricultura, que não é um modelo de
desenvolvimento, é apenas um modelo de crescimento.
Estamos a produzir mais, o País está a produzir mais numa série de áreas, mas surgiu um conjunto de
problemas associados. Basta ir a Beja, a Aljustrel, a Serpa ou a Avis, onde o PCP fez há pouco tempo as suas
jornadas parlamentares, para perceber as dificuldades e os problemas ambientais que estão aí instalados, bem
como a destruição de património cultural que é feita pela atividade agrícola e a falta de distribuição da riqueza
que é produzida. O desemprego e o despovoamento têm-se mantido nestas regiões onde não há
desenvolvimento da atividade agrícola.
Por isso, a Sr.ª Deputada não pode dizer — aliás, disse-o, mas não deveria ter dito, porque não é correto
nem é acertado — que nós ficámos calados. A Sr.ª Deputada não tem de conhecer as visitas e as reuniões que
o PCP faz sobre esta matéria, mas devia conhecer as iniciativas, que foram inclusivamente apresentadas aqui,
na Assembleia da República, sobre a temática da seca. Veja lá, Sr.ª Deputada, que o CDS até votou
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favoravelmente a maioria das medidas que foram propostas pelo PCP. Por isso, vir dizer que estamos calados
relativamente a esta matéria claramente não corresponde à verdade.
Sobre a seca e o problema que está instalado, bem como sobre a questão do regadio e das barragens, a
perspetiva do CDS em relação a esta matéria é a seguinte: «Fizemos barragens, temos água nas barragens,
então que venha aí a agricultura», como se não houvesse amanhã, como se fossemos um País que já não
tivesse problemas de água, apesar de termos esses reservatórios.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. JoãoRamos (PCP): — Termino, Sr. Presidente.
Portanto, com o objetivo de se estimular o desenvolvimento do modelo de agricultura, sobretudo aquele que
se tem instalado nos perímetros de rega, o CDS concorda que se arranque o olival tradicional, que resiste melhor
à seca, para se semear um olival superintensivo, que está a secar em alguns sítios porque agora não há água.
O CDS estimula esse tipo de agricultura.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem mesmo de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. JoãoRamos (PCP): — Termino, Sr. Presidente, dizendo que reconhecemos muitos erros e muita falta
de fazer coisas por parte deste Governo, mas a maior responsabilidade que apontamos é de não se afastar
suficientemente daquelas que foram as opções do CDS.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Soares.
O Sr. PedroSoares (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Patrícia Fonseca, ouvi com muita atenção a sua
declaração política — e é sempre muito importante trazer o tema da agricultura e da floresta ao Parlamento —,
mas devo dizer-lhe, com toda a sinceridade, que não me revejo na maior parte da sua declaração, até porque
há um aspeto central que nos separa relativamente à nossa conceção sobre a agricultura.
O CDS tem uma tradição de apoio e de defesa dos interesses da agroindústria, das monoculturas, do
eucalipto, em vez da defesa, mesmo tendo em conta os problemas da seca, da pequena agricultura, da
multifuncionalidade da floresta, de tudo o que signifique diversidade nos territórios rurais.
Na realidade, percebemos que, nos últimos anos — e o Governo que a senhora apoiou também contribuiu
de forma decisiva —, tem existido uma concentração de fundos comunitários destinados à grande agricultura,
às grandes explorações, à agroindústria, às monoculturas. No entanto, deveria ter sido tomada uma medida
essencial para combater esta tendência, como a regionalização dos critérios de atribuição dos fundos à
agricultura, mas essa medida nunca foi assumida, nunca houve coragem política para a assumir.
Sr.ª Deputada, apesar de compreender as questões que colocou, não posso deixar de lhe dizer, com toda a
frontalidade, que para enfrentar os problemas da seca é preciso ter uma visão estratégica, que eu nunca vi da
parte do CDS e da direita em Portugal, de adaptação às alterações climáticas, à agricultura e à floresta; muito
pelo contrário. Ou seja, em vez de financiar e de promover as monoculturas na floresta, nomeadamente o
eucalipto, devia ter promovido os sobreiros, os castanheiros e as outras árvores autóctones, pois essas, sim,
são resilientes aos processos de seca, os quais sabemos que vão ser cada vez mais graves nesta perspetiva
das alterações climáticas.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. PedroSoares (BE): — Vou já concluir, Sr. Presidente.
Basta olhar para a situação a que chegámos precisamente neste tipo de floresta, em que cada vez há mais
problemas fitossanitários e em que cada vez há mais problemas em relação à renovação das espécies que já
referi.
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Para finalizar, também devo dizer que, mesmo em relação à agricultura, em vez de monoculturas que
carecem de um grande consumo de água, é preciso apostar numa estratégia de adaptação tecnológica para a
poupança da água, mas também de adaptação das novas espécies, e não continuar com a efabulação do
regadio, dizendo que vai resolver os problemas da seca. Como é evidente, é uma contradição nos próprios
termos.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem mesmo de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. PedroSoares (BE): — Vou mesmo terminar.
Sr.ª Deputada, tenhamos uma outra visão para a agricultura que não seja apenas a do agronegócio e a das
grandes explorações e privilegiemos a pequena agricultura e a agricultura familiar, a dos pequenos proprietários,
a dos pequenos produtores, através de circuitos curtos, poupando na água e o ambiente.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Patrícia Fonseca.
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Sr. Presidente, agradeço ao Deputado João Ramos e ao Deputado
Pedro Soares a oportunidade que me dão de explicar algumas matérias que, por falta de tempo, não tive
oportunidade de explicar na minha intervenção inicial.
Srs. Deputados, aquilo que separa o CDS do Bloco de Esquerda e do PCP, é, de facto, muito grande. Os
senhores estão amarrados ao passado, a uma agricultura de há 50 anos, do século passado, e não devem ter
ouvido bem aquilo que eu disse da tribuna, porque o que nós defendemos, e foi isso que coerentemente fizemos,
é que se deve apoiar a agricultura competitiva, mas também aquela que é mais pequena, que ocupa o território
e que presta serviços de ecossistemas.
A grande diferença — e já tive oportunidade de o dizer neste Plenário mais do que uma vez — é que os
senhores só defendem a agricultura pequenina e nós entendemos que há espaço para as duas e que ambas
são importantes. Isso é que nos separa.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Srs. Deputados, de facto, não consigo entender esta estranha forma
de combate às alterações climáticas. Para combater as alterações climáticas, em vez de se regar, vamos deixar
as culturas morrerem à sede e, qualquer dia, Portugal vai ser uma extensão do deserto do Sara?
Gostaria, talvez, de ouvir os Srs. Deputados dizerem…
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Já o chamaram de deserto!
Protestos do PCP.
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Oiçam, Srs. Deputados!
Se, em vez de defenderem uma agricultura do século passado, os Srs. Deputados defendessem a inovação
e o aumento da eficiência, talvez pudessem vir defender a eficiência dos regadios tradicionais que têm perdas
elevadíssimas…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Vá ver o olival do Alqueva!
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — O Alentejo não é só o Alqueva, Sr. Deputado João Oliveira, e o Sr.
Deputado sabe isso, certamente, muito bem.
Sr. Deputado Pedro Soares, sou defensora, tal como o CDS, do montado de sobro e da floresta autóctone,
mas, apesar de a bolota se poder comer, efetivamente, nós não nos alimentamos de bolota e de cortiça e,
portanto, é necessário mais qualquer coisa na agricultura deste País.
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O Sr. Pedro Soares (BE): — A nossa economia alimenta-se disso!
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Sr. Deputado João Ramos, percebo a sua indignação. Os senhores
tanto têm defendido e tanto têm pugnado pelo estatuto da pequena agricultura familiar e, agora… Quer dizer,
este Governo, que tem utilizado esta política de Robin dos Bosques, de tirar aos maiores para distribuir aos
pequenos, mesmo assim não conseguiu pôr dinheiro suficiente nos saquinhos para distribuir aos agricultores,
como o Sr. Ministro diz.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Ora bem!
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — Portanto, aquilo que o Sr. Ministro vos anunciou foi um estatuto da
pequena agricultura familiar que é tão pequena, tão pequena, tão pequena que não serve a ninguém e, de facto,
é uma desilusão para todos. É uma agricultura de subsistência, que tem toda a relevância, é necessária, mas
não é assim que Portugal vai ter um bom desenvolvimento económico…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Patrícia Fonseca (CDS-PP): — … e que vai conseguir equilibrar a sua balança comercial. Não é assim
que nós lá vamos, Srs. Deputados.
Os Srs. Deputados estão agarrados ao passado. Têm, de facto, de desprender as amarras e viver no século
XXI.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, terminamos, assim, o primeiro ponto da nossa ordem
do dia, relativo às declarações políticas.
Passamos ao segundo ponto, com a apreciação conjunta da petição n.º 273/XIII (2.ª) — Solicitam a
desvinculação de Portugal do Tratado e Protocolos Modificativos ao Acordo Ortográfico de 1990 e a revogação
da Resolução do Conselho de Ministros n.º 8/2011 (António Duarte Arnaut e outros) e do projeto de resolução
n.º 1340/XIII (3.ª) — Recomenda o recesso de Portugal do Acordo Ortográfico de 1990, acautelando medidas
de acompanhamento e transição, a realização de um relatório de balanço da aplicação do novo Acordo
Ortográfico da Língua Portuguesa e uma nova negociação das bases e termos de um eventual acordo ortográfico
(PCP).
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Mesquita.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: O PCP saúda os mais de
20 000 subscritores da petição, alguns dos quais aqui presentes, nas galerias da Assembleia da República.
Em 4 de Junho de 1991, o PCP foi o único Grupo Parlamentar que não votou favoravelmente a proposta de
resolução sobre a ratificação do Acordo Ortográfico. Fizemos críticas severas quanto à metodologia seguida
pelo Governo para apuramento das bases do AO90 (Acordo Ortográfico de 1990). Manifestámos as nossas
preocupações quanto às consequências do Acordo, alertando que o processo tendia — e cito — «a transformar-
se num atoleiro cujas dimensões e proporções desconhecemos». Estava certo o PCP.
De facto, veio o Primeiro Protocolo Modificativo, veio o Segundo, o Acordo continuou a ser um mau Acordo,
a não responder às críticas feitas em 1990 por várias pessoas e entidades. E aqui estamos hoje. Subsistem
incongruências, insuficiências, dificuldades práticas na aplicação do Acordo, visíveis todos os dias nas escolas,
nos média, nos livros, nas páginas oficiais de entidades públicas. Foram referidas por inúmeras vezes em
contributos escritos e audições dos grupos de trabalho sobre esta matéria.
O PCP não tem uma conceção fixista em torno da ortografia. Mas valorizamos a participação política e
científica, o robustecimento técnico da norma escrita, a democraticidade da escrita e da oralidade. E estes são
aspetos determinantes que não foram plenamente alcançados ou, alguns, sequer tidos em conta neste
processo.
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A existência de um qualquer Acordo só pode ter algum sentido se for integrada no contexto mais global de
uma verdadeira política da língua.
Uma política que promova maior cooperação com os países de língua portuguesa, com um profundo e
intrínseco respeito pela identidade cultural de cada povo, que assuma a necessidade de promoção e difusão do
livro e dos autores portugueses, que reflita sobre a natural evolução da língua envolvendo todos os interessados.
Não por via de imposições legislativas desligadas da realidade concreta e da comunidade.
A verdade nua e crua é que, volvidos 28 anos, não existe um Acordo Ortográfico comummente aceite,
ratificado e depositado por todos os países da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP). Não há
sequer previsão concreta em relação a países como Angola ou Moçambique. Falta-lhe o alicerce.
Há quem considere impossível ou contraproducente voltar atrás e corrigir os erros cometidos, porque muitas
crianças e jovens já aprenderam o Acordo Ortográfico na escola, mas não houve, Sr.as Deputadas e Srs.
Deputados, qualquer pejo em fazer experimentalismo ortográfico com os alunos que tiveram de o aprender.
Vozes do PCP: — Exatamente!
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — A esmagadora maioria da população aprendeu a norma ortográfica anterior,
e é também por isso que não é tarde para corrigir um percurso que tem origem num procedimento errado desde
que se acautelem as necessárias medidas de acompanhamento a quem aprendeu e a quem utiliza a grafia do
Acordo.
É preferível aprender com todo este processo, estudá-lo, sair do Acordo Ortográfico e devolver a discussão
– ou melhor, dar finalmente a discussão – à comunidade científica e literária na definição de objetivos e princípios
de partida para uma nova negociação das bases e termos de um acordo ortográfico, assim seja entendida a sua
necessidade, junto dos restantes países da CPLP.
É essa a proposta do PCP.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Carlos Barros.
O Sr. José Carlos Barros (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Saúdo os mais de
20 000 peticionários e cumprimento-os pelo inestimável contributo para a discussão desta matéria.
Começaria por lembrar que o Acordo Ortográfico nasceu de um propósito de defesa e valorização da língua
portuguesa que, ao longo do tempo, colheu um quase generalizado consenso político. Penso que esse consenso
alargado no essencial se mantém, ou seja, esse propósito genérico de os países que partilham a língua
portuguesa se empenharem solidariamente na sua defesa e valorização.
Não obstante, e quanto aos aspetos técnicos associados ao intento de uniformização da ortografia,
nomeadamente quanto às bases técnicas do Acordo Ortográfico, e mais recentemente quanto aos próprios
resultados da sua aplicação, é conhecido que cedo começaram as polémicas e as discordâncias e o
entendimento crescente de que esse objetivo de defesa da unidade essencial da língua portuguesa seria ilusório.
Não é por acaso, portanto, que, em finais da primeira década de 2000, se repetiam os apelos à ponderação,
numa matéria que, como insistia Vasco Graça Moura, entre outros, recomendava um profundo debate, de modo
a que fossem tomadas todas as precauções que o interesse nacional impunha.
Não foi, no entanto, o que aconteceu. Numa altura em que se recomendava prudência e debate, uma
resolução do Conselho de Ministros de janeiro de 2011 determinou a aplicação do Acordo Ortográfico, ou seja,
a sua entrada em vigor.
A história, desde aí, é conhecida: o Acordo está em vigor no sistema educativo, os manuais escolares foram
adaptados à nova ortografia, por outro lado o Acordo não foi ratificado por metade dos países que o
subscreveram, em vez da uniformização parecem acentuar-se os problemas de instabilidade ortográfica. A
própria autora das Bases Técnicas do Acordo, ou seja, a Academia das Ciências de Lisboa, órgão consultivo do
Governo português em matéria linguística — recorde-se —, recentemente, considerou inadiável a discussão,
apresentando, já em 2017, um documento com sugestões para o aperfeiçoamento do Acordo.
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Entendemos, pois, que há muito a discutir e por isso achamos incompreensível, e inaceitável, a atitude dos
Srs. Ministros da Cultura e da Educação ao recusarem-se a responder à solicitação de informação por parte da
Comissão de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto no âmbito da elaboração do relatório da petição em
debate.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. José Carlos Barros (PSD): — Portanto, há muito a discutir e, por isso, propusemos a criação de um
grupo de trabalho, atualmente em funcionamento no âmbito da Comissão de Cultura, Comunicação, Juventude
e Desporto, que nos permitirá, no curto prazo, dispor de um ponto de situação pormenorizado sobre os efeitos
da aplicação do Acordo e, portanto, avaliações ponderadas, sustentadas por argumentos que, no essencial, não
poderão deixar de ser de ordem técnica e científica.
É também por isso que achamos extemporâneo o projeto de resolução agora apresentado pelo Partido
Comunista Português.
Para concluir, não abandonamos o entendimento de que se justificam todos os esforços de envolvimento
solidário dos países que connosco partilham esta língua comum, no sentido da sua defesa e valorização; não
desconhecemos o que se nos exige, a todos, de ponderação e responsabilidade numa matéria, a vários níveis,
sensível. Mas também não queremos, como tem sido a posição do Governo e do Partido Socialista, fazer de
conta que não há nada a discutir quando, na verdade, está um elefante sentado no meio da sala.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Leão.
O Sr. Diogo Leão (PS): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Gostaria, naturalmente, de
começar por saudar os cidadãos peticionários, em particular por agirem em conformidade com uma causa em
que acreditam.
Os princípios que levaram ao estabelecimento do Acordo Ortográfico de 1990 continuam a ser relevantes
para o Partido Socialista. Um esforço de convergência de sete países de língua oficial portuguesa, ao qual
felizmente se somou Timor-Leste, para conferir ao nosso idioma comum a unidade possível a nível da grafia,
uma coesão que permitisse ao conjunto dos estados-membro da CPLP defender e projetar no presente tanto
quanto no futuro a língua portuguesa enquanto língua identitária de uma cultura comum que sempre foi e é,
aumentando o seu peso internacional e eliminando uma tendência que existia, para o afastamento entre duas
vertentes ditas oficiais, que diminuíam à escala global o valor da língua portuguesa.
É importante também sublinhar a relevância para a literacia — a facilitação da aprendizagem da escrita e da
leitura no vasto quadro dos falantes de português da CPLP, para a qual o Acordo Ortográfico contribui.
Creio ser sempre útil reafirmar que o Acordo incide sobre a ortografia da língua portuguesa e não sobre a
gramática das variedades do português falado pelo mundo, que não são nem nunca poderão ser alteradas por
uma reforma ortográfica.
A evolução das reformas ortográficas durante o século XX, mesmo na esfera simplesmente interna e
nacional, foi sempre atribulada e causadora de estranhezas e rejeições compreensíveis perante algumas
normas a adotar. Foi, inclusive, motivo de divisões geracionais entre os que aprendem pela nova ortografia e os
que se mantém fieis às normas anteriores.
Desde logo, discordamos de noções expressas no texto da petição, desde a suposta inconstitucionalidade
do Acordo até à noção de que a convenção que regula a escrita limita a criatividade natural da língua portuguesa.
Ora, as crónicas de Fernão Lopes, os poemas em português do Cancioneiro Geral compilado por Garcia de
Resende, as rimas de Bocage ou a prosa de Eça de Queiroz não perdem a qualidade cultural e literária em
virtude das sucessivas atualizações da grafia a que foram sujeitas pelas várias reformas ortográficas desde 1911
até hoje.
Em suma, o que os peticionários pedem à Assembleia da República, e ao qual o Partido Comunista Português
confere uma iniciativa resolutiva, é a desvinculação de Portugal do Acordo Ortográfico, que é o mesmo que dizer
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a denúncia ou retirada do País deste tratado internacional. Para o Grupo Parlamentar do PS, nenhum passo
neste sentido pode ser entendido como positivo ou desejável para o interesse nacional e lusófono.
Não quer isto dizer que as normas contidas no Acordo Ortográfico de 1990 e posteriores protocolos
modificativos sejam imunes à crítica, à discordância ou à melhoria. O Partido Socialista participa no Grupo de
Trabalho constituído na Assembleia da República para avaliar o impacto da aplicação do Acordo Ortográfico,
que se tem debruçado dignamente sobre estes quesitos.
Mas para dirimir divergências foi concebida sede própria definida no texto do tratado, nomeadamente o
Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), certamente disponível para o debate que deve ser conduzido
por linguistas e académicos especialistas, com o rigor e os critérios científicos que esta matéria exige.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Nuno Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Começo,
naturalmente, por saudar e cumprimentar os peticionários por esta petição que apresentam hoje à Assembleia
da República.
Da parte do CDS, não obstaculizamos a pretensão, que de alguma forma nos foi chegando, de esta petição
poder ser discutida mais tarde, até por motivos que ouvirão no discurso que gostaria de fazer em nome do CDS.
Passados 28 anos sobre a assinatura do Acordo Ortográfico, continua o desacordo, muitas dúvidas e alguma
confusão. A prova, se não bastassem os milhares de pessoas que subscrevem esta petição, está nos erros que
diariamente se encontram na imprensa escrita ou em documentos oficiais e no intenso debate académico e da
sociedade civil, em geral, que subsiste, após todos estes anos.
Mais: no ano passado, a Academia das Ciências de Lisboa aprovou um documento intitulado Sugestões para
o aperfeiçoamento do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, onde se propõe o regresso de consoantes
mudas, do acento gráfico em alguns vocábulos, do acento circunflexo noutros, assim como do hífen. A nosso
ver, é bem um exemplo da forma um pouco impreparada como este Acordo foi feito.
Podemos, Sr.as e Srs. Deputados, como já aqui foi dito, não discutir isto? Podemos dizer que o assunto está
definitivamente encerrado? Podemos fechar os olhos a todas estas críticas e à prática que não pratica este
Acordo? Não temos o dever de escutar estas dúvidas? Obviamente, temos o dever de discutir, debater e
perceber todas estas questões e todas estas dúvidas, tanto mais que, no ano passado, na cidade da Praia, foi
finalmente apresentado o Vocabulário Ortográfico Comum, que, segundo o preâmbulo do Acordo Ortográfico de
1990, teria de ser elaborado até ao dia 1 de janeiro de 1993 — pasme-se, Sr.as e Srs. Deputados! Isto prova
todo um conjunto de incertezas e de impreparação que, a nosso ver, tornam esta matéria um assunto com
grandes implicações na língua, na educação, nas relações internacionais de Portugal — é certo! —, e que,
manifestamente, divide mais em vez daquele que devia ser o seu objetivo, que era unir.
Por estas razões, o CDS defendeu a criação de um Grupo de Trabalho para Avaliação do Impacto da
Aplicação do Acordo Ortográfico de 1990, cujos trabalhos, sublinho, ainda decorrem,…
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Já houve um, na Legislatura anterior!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — … que vai fazer o ponto de situação da aplicação que tem vindo a ser
efetuada do Acordo Ortográfico e avaliar o grau de concretização dos objetivos que se propunha atingir. Este, a
nosso ver, é um trabalho que tem sido sério, que é sério e sobre um assunto que também é sério.
Ouvir pessoas, entidades, instituições e pontos de vista foi exatamente o que falhou antes das assinaturas
dos tratados e dos protocolos.
Neste momento, aguardamos que esse Grupo de Trabalho, que ouviu essas entidades e essas pessoas,
conclua o seu trabalho e elabore um relatório final onde possamos encontrar as melhores conclusões não só
sobre o que fazer com este Acordo, que parece, manifestamente, um desacordo, mas também, ao mesmo
tempo, sobre as formas como, defendendo o interesse nacional, pugnando pelas relações internacionais de
Portugal e pela palavra dada por Portugal, podemos ainda defender os interesses e a prática de todos os
portugueses, que é manifestamente contrária a este Acordo, nestes termos.
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Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Tem, agora, a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Jorge
Campos, do Bloco de Esquerda.
O Sr. Jorge Campos (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo, naturalmente, por saudar os
peticionários e agradecer as questões suscitadas a propósito do Acordo Ortográfico de 1990.
Sabemos bem da complexidade destas matérias e das disputas a seu propósito. Não é uma situação nova.
Diremos que desde sempre se verificou uma discordância de fundo entre aqueles que privilegiam os critérios
fonéticos e aqueles outros defensores dos critérios etimológicos.
Recordo que a primeira reforma ortográfica entendida como tal reporta à I República, passando a haver, a
partir de então, duas ortografias, uma de Portugal, outra do Brasil.
Depois de várias tentativas de unificação, só foi encontrado um denominador comum em 1945, ou seja,
muitos anos depois.
Mesmo assim, essa convenção ortográfica falhou. Seria necessário esperar mais 45 anos pelo Acordo de
1990, que, como está à vista de todos, não é perfeito.
De então para cá, e vão 28 anos, o processo tem conhecido diversos episódios e outros tantos sobressaltos,
tendo a Assembleia da República vindo a fazer, no âmbito das suas funções, o escrutínio competente da
implementação do Acordo.
Para este fim, na Legislatura anterior, e por proposta do PCP, foi constituído um grupo de trabalho, o mesmo
sucedendo na atual Legislatura, por proposta do PSD e, creio, também do CDS. Em ambos os casos, foram
feitas numerosas audiências e recolhidos dezenas de contributos que são públicos e estão patentes no site do
Parlamento. E, obviamente, desses testemunhos e dessas audiências transparecem as divergências existentes.
O Grupo de Trabalho atual — é bom reforçá-lo — prossegue, neste momento, o seu trabalho.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na petição agora em debate é requerida a desvinculação da República
Portuguesa do Tratado do Acordo Ortográfico.
O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda reconhece a legitimidade das preocupações expressas mas não
se revê no argumentário e muito menos na pretensão de desvinculação do Acordo. Importa reconhecer que há
um caminho feito, bem ou mal mas há, com impacto em vários domínios, designadamente no ensino e na
comunicação social.
Mais: o Vocabulário Ortográfico Comum, o VOC, está concluído, podendo ser consultado na página do
Instituto Internacional da Língua Portuguesa, o IILP, com sede em Cabo Verde, bem como na página da
Comunidade dos Países da Língua Portuguesa (CPLP).
Ora, é nesta conjuntura que o PCP apresenta, por arrastamento, um projeto de resolução que recomenda o
recesso de Portugal do Acordo Ortográfico.
A proposta do PCP, apesar de acautelar medidas de acompanhamento e transição, comporta, a nosso ver,
riscos de vária ordem, podendo, desde logo, pôr em causa tratados internacionais e impor, a um outro nível, a
elaboração, mais uma vez, de novos currículos e manuais escolares. Não acompanhamos, por isso, a proposta
do PCP.
A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Esse argumento é falso!
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Faça favor de concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Campos (BE): — Vou concluir, Sr. Presidente, se me permitir e me der só mais 1 minuto.
O Bloco de Esquerda não tem uma posição imobilista sobre o Acordo Ortográfico. Aliás, já na Legislatura
anterior, apresentou um projeto de resolução tendo em vista rever aspetos técnicos, com o objetivo de o
melhorar. É o que continuará a fazer em devido tempo, até porque a nossa língua, em função da sua natureza
viva e dinâmica, assim o exige.
Muito obrigado pela tolerância, Sr. Presidente.
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I SÉRIE — NÚMERO 50
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Aplausos do BE e da Deputada do PS Gabriela Canavilhas.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, não digam a ninguém que dei mais 1 minuto ao Sr.
Deputado Jorge Campos.
Risos.
Peço, agora, à Sr.ª Secretária, Deputada Emília Santos, o favor de nos dar conta de algumas iniciativas que
deram entrada na Mesa.
A Sr.ª Secretária (Emília Santos): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram
admitidos pelo Sr. Presidente, o projeto de lei n.º 781/XIII (3.ª) — Altera o Código Civil, reconhecendo a
possibilidade de renúncia recíproca à condição de herdeiro legal na convenção antenupcial (PS), que baixa à
1.ª Comissão, e os projetos de resolução n.os 1350/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que dê cumprimento à
Resolução da Assembleia da República n.º 91/2017 para requalificação da Escola Básica 2,3 do Alto do Lumiar
(CDS-PP), que baixa à 8.ª Comissão, e 1351/XIII (3.ª) — Sexta alteração à Resolução da Assembleia da
República n.º 20/2004, de 16 de fevereiro, que aprova a estrutura e competências dos serviços da Assembleia
da República (PSD, PS, BE, CDS-PP, PCP e Os Verdes).
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Srs. Deputados, chegámos, assim, ao fim dos nossos trabalhos.
A próxima sessão plenária realizar-se-á amanhã, quinta-feira, às 15 horas, e da ordem de trabalhos constam
nove pontos.
Em primeiro lugar, iremos proceder à realização de um debate de atualidade, requerido pelo CDS-PP, ao
abrigo do artigo 72.º do Regimento da Assembleia da República, sobre segurança interna.
Em segundo lugar, procederemos à apreciação, na generalidade, da proposta de lei n.º 109/XIII (3.ª) —
Procede à alteração das regras de comercialização de produtos financeiros e de organização dos intermediários
financeiros e transpõe as Diretivas 2014/65/UE e (UE) 2016/1034, do Parlamento Europeu e do Conselho, e a
Diretiva Delegada (UE) 2017/593, da Comissão.
Seguidamente, procederemos à apreciação conjunta dos projetos de resolução n.os 1212/XIII (3.ª) —
Recomenda ao Governo que promova um comité científico agroalimentar (PSD), 1334/XIII (3.ª) — Recomenda
ao Governo a criação de uma plataforma de valorização do agroalimentar português (CDS-PP), 1337/XIII (3.ª)
— Recomenda ao Governo que tome medidas de reforço da investigação, experimentação, apoio,
acompanhamento e aconselhamento agrícola (PCP) e 1341/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que crie um
comité científico eco-agroalimentar (PAN).
Em quarto lugar, apreciaremos o projeto de resolução n.º 1266/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que dê
início ao processo de rescisão do contrato de concessão de Serviço Postal Universal notificando a CTT —
Correios de Portugal, SA, de incumprimento grave (BE), juntamente com, na generalidade, o projeto de lei n.º
780/XIII (3.ª) — Estabelece o regime de recuperação do controlo público dos CTT (PCP) e com o projeto de
resolução n.º 1342/XIII (3.ª) — Reversão da privatização dos CTT (Os Verdes).
Em quinto lugar, iremos apreciar, na generalidade, o projeto de lei n.º 743/XIII (3.ª) — Estabelecimento do
prazo mínimo de 120 dias para a disponibilização dos formulários digitais da responsabilidade da Autoridade
Tributária (CDS-PP).
Seguidamente, apreciaremos, também na generalidade, o projeto de lei n.º 591/XIII (2.ª) — Determina a
aplicação do Acordo de Empresa da EPAL a todos os trabalhadores das empresas criadas no âmbito do Decreto-
Lei n.º 34/2017, de 24 de março (PCP).
Em sétimo lugar, procederemos à apreciação conjunta, na generalidade, dos projetos de lei n.os 542/XIII (2.ª)
— Cria maior justiça no direito a prestação por incapacidade decorrente de doença ou acidente de trabalho (Os
Verdes), 613/XIII (3.ª) — Repõe o direito dos funcionários públicos à reparação pecuniária dos danos resultantes
de acidentes de serviço e doenças profissionais (BE) e 779/XIII (3.ª) — Repõe a possibilidade de acumulação
das prestações por incapacidade permanente com a parcela da remuneração correspondente à percentagem
de redução permanente da capacidade geral de ganho do trabalhador (PCP).
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22 DE FEVEREIRO DE 2018
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Em último lugar, está agendado, sem tempos para debate, o projeto de resolução n.º 1351/XIII (3.ª) — Sexta
alteração à Resolução da Assembleia da República n.º 20/2004, de 16 de fevereiro, que aprova a estrutura e
competências dos serviços da Assembleia da República (PSD, PS, BE, CDS-PP, PCP e Os Verdes).
Chamo a atenção das Sr.as Deputadas e dos Srs. Deputados para que o último ponto da ordem de trabalhos
é de votações regimentais. Amanhã, quinta-feira, excecionalmente, haverá votações regimentais no final do
debate.
Nada mais havendo a tratar, está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 16 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.