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Sexta-feira, 2 de março de 2018 I Série — Número 54
XIII LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2017-2018)
REUNIÃOPLENÁRIADE1DEMARÇODE 2018
Presidente: Ex.mo Sr. José Manuel de Matos Correia
Secretários: Ex.mos Srs. Emília de Fátima Moreira Santos Idália Maria Marques Salvador Serrão António Carlos Bivar Branco de Penha Monteiro Sandra Maria Pereira Pontedeira
S U M Á R I O
O Presidente (José de Matos Correia) declarou aberta a
sessão às 15 horas e 8 minutos. Procedeu-se ao debate conjunto dos seguintes diplomas: projeto de lei n.º 783/XIII (3.ª) — Sexta alteração ao
Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho (CDS-PP), que foi discutido na generalidade;
projeto de lei n.º 784/XIII (3.ª) — Segunda alteração à Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, (Julgados de Paz - Competência, Organização e Funcionamento) (CDS-PP), que foi discutido na generalidade;
projeto de lei n.º 785/XIII (3.ª) — Terceira alteração à Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, Lei da Organização do Sistema Judiciário (CDS-PP), que foi discutido na generalidade;
projeto de lei n.º 786/XIII (3.ª) — Quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprova o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (CDS-PP), que foi discutido na generalidade;
projeto de lei n.º 787/XIII (3.ª) — Quadragésima quinta alteração ao Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro, que
aprova a Lei Geral Tributária, e trigésima segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de outubro, que aprova o Código de Procedimento e Processo Tributário (CDS-PP), que foi discutido na generalidade;
projeto de lei n.º 788/XIII (3.ª) — Décima segunda alteração à Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, que aprova o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais — criação de equipas extraordinárias de juízes administrativos e tributários (CDS-PP), que foi discutido na generalidade;
projeto de resolução n.º 885/XIII (2.ª) — Recomenda ao Governo que aprove o diploma legal que define os casos, as formas e os termos em que os atos administrativos podem ser impostos coercivamente pela administração, em cumprimento do disposto no Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, que aprovou o Código do Procedimento Administrativo (CDS-PP);
projeto de resolução n.º 1291/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que submeta a debate, em Plenário da Assembleia da República, o relatório sobre a estratégia plurianual de
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requalificação e modernização do sistema prisional, de setembro de 2017, e apresente uma proposta de lei de programação de investimentos no parque prisional (CDS-PP);
projeto de resolução n.º 1355/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que dê execução ao disposto no artigo 182.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos em matéria de arbitragem administrativa (CDS-PP);
projeto de resolução n.º 1356/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo a reavaliação e a revisão do Plano de Ação Justiça+Próxima, tendo em conta as medidas propostas no documento Acordos para o Sistema de Justiça, de janeiro de 2018 (CDS-PP);
projeto de resolução n.º 1357/XIII (3.) — Recomenda ao Governo a criação de um grupo de trabalho, com o objetivo de estudar a revisão do Regime Geral de Contraordenações, constante do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro (CDS-PP);
projeto de resolução n.º 1362/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que constitua uma comissão de revisão da
legislação penal, nomeadamente do Código Penal e do Código do Processo Penal, estude e implemente um sistema de controlo de cumprimento que permita delimitar a responsabilidade penal das pessoas coletivas (CDS-PP).
Intervieram no debate, a diverso título, os Deputados Vânia Dias da Silva (CDS-PP), José Manuel Pureza (BE), Fernando Rocha Andrade (PS), António Filipe (PCP), Andreia Neto e Sara Madruga da Costa (PSD), Filipe Neto Brandão (PS), Carlos Peixoto (PSD), Fernando Anastácio (PS), Susana Amador (PS) e Telmo Correia (CDS-PP).
Entretanto, o Presidente assinalou a presença, na tribuna do corpo diplomático, do Presidente da República Federal da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos projetos de lei n.os 790 e 791/XIII (3.ª), da apreciação parlamentar n.º 54/XIII (3.ª) e dos projetos de resolução n.os 1364 a 1367/XIII (3.ª).
O Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 6 minutos.
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O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Sr.as e Srs. Deputados, está aberta a sessão.
Eram 15 horas 5 minutos.
Peço aos Srs. Agentes da autoridade que abram as galerias.
Srs. Deputados, a sessão de hoje, como é do conhecimento de todos, é marcada por um agendamento
potestativo do CDS-PP, no qual vamos proceder à apreciação, na generalidade, dos projetos de lei n.os 783/XIII
(3.ª) — Sexta alteração ao Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho (CDS-PP),
784/XIII (3.ª) — Segunda alteração à Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, (Julgados de Paz - Competência,
Organização e Funcionamento (CDS-PP), 785/XIII (3.ª) — Terceira alteração à Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto,
Lei da Organização do Sistema Judiciário (CDS-PP), 786/XIII (3.ª) — Quarta alteração ao Decreto-Lei n.º
10/2011, de 20 de janeiro, que aprova o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (CDS-PP), 787/XIII
(3.ª) — Quadragésima quinta alteração ao Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro, que aprova a Lei Geral
Tributária, e trigésima segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de outubro, que aprova o Código de
Procedimento e de Processo Tributário (CDS-PP) e 788/XIII (3.ª) — Décima segunda alteração à Lei n.º 13/2002,
de 19 de fevereiro, que aprova o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais — criação de equipas
extraordinárias de juízes administrativos e tributários (CDS-PP).
Estes diplomas vão ser discutidos juntamente com os projetos de resolução n.os 885/XIII (2.ª) — Recomenda
ao Governo que aprove o diploma legal que define os casos, as formas e os termos em que os atos
administrativos podem ser impostos coercivamente pela administração, em cumprimento do disposto no
Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, que aprovou o Código do Procedimento Administrativo (CDS-PP),
1291/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que submeta a debate, em Plenário da Assembleia da República, o
relatório sobre a estratégia plurianual de requalificação e modernização do sistema prisional, de setembro de
2017, e apresente uma proposta de lei de programação de investimentos no parque prisional (CDS-PP),
1355/XIII (3.ª) — Recomenda ao Governo que dê execução ao disposto no artigo 182.º do Código de Processo
nos Tribunais Administrativos em matéria de arbitragem administrativa (CDS-PP), 1356/XIII (3.ª) — Recomenda
ao Governo a reavaliação e a revisão do Plano de Ação Justiça+Próxima, tendo em conta as medidas propostas
no documento Acordos para o Sistema de Justiça, de janeiro de 2018 (CDS-PP), 1357/XIII (3.) — Recomenda
ao Governo a criação de um grupo de trabalho, com o objetivo de estudar a revisão do Regime Geral de
Contraordenações, constante do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro (CDS-PP) e 1362/XIII (3.ª) —
Recomenda ao Governo que constitua uma comissão de revisão da legislação penal, nomeadamente do Código
Penal e do Código do Processo Penal, estude e implemente um sistema de controlo de cumprimento que permita
delimitar a responsabilidade penal das pessoas coletivas (CDS-PP).
Para apresentar estas iniciativas, tem a palavra a Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva.
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em março de 2016, em
Gondomar, Assunção Cristas encerrava o Congresso onde acabava de ser eleita líder definindo as prioridades
do CDS para os dois anos seguintes — saúde, sistema de pensões, família, educação, emprego e empresas,
regulação e supervisão bancária, segurança e justiça.
Em setembro de 2016, o Sr. Presidente da República abria o ano judicial deixando um apelo ao entendimento
entre os agentes da justiça e os partidos políticos, que ficou conhecido pelo Pacto da Justiça.
Em janeiro de 2018, os agentes do sistema de justiça concluíram o seu trabalho e deram corpo aos acordos
para o Sistema de Justiça.
De março de 2016 até agora, o CDS trilhou exatamente o caminho que então havia traçado.
Estudámos e trabalhámos todas as matérias a que nos propusemos: da demografia e envelhecimento ativo
à lei de bases da educação, ao terrorismo ou à supervisão financeira, todas estas matérias foram alvo de
intervenção por parte do CDS.
Hoje, apresentamos as propostas para a justiça. Hoje, dia 1 de março de 2018, o CDS cumpre não só o seu
objetivo, como é o primeiro a responder ao repto lançado pelo Sr. Presidente da República, apresentando um
conjunto variado de propostas no âmbito da justiça.
Aplausos do CDS-PP.
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Embora aparentemente densas e algumas até volumosas, as propostas que hoje trazemos não pretendem
fazer uma revolução no sistema de justiça e muito menos trazer todo um «admirável mundo novo». Trata-se de
alterações mais ou menos pontuais em diversas áreas da justiça — algumas até cirúrgicas — e de propostas
que desenvolvem os sistemas, uniformizam e atualizam os processos. Várias pequenas coisas que, no fim do
dia, podem fazer a diferença na vida dos portugueses.
Todas estas iniciativas resultam, de resto, de uma reflexão profunda e aturada que fizemos dentro e fora do
Grupo Parlamentar, ouvindo vários especialistas em cada área, com ou sem filiação partidária, e não
necessariamente do CDS — pessoas que não têm a mínima preocupação com o símbolo ou com a cor partidária
e cujo único propósito é contribuírem para um Portugal melhor.
Note-se que muitas das iniciativas que aqui trazemos não são mais do que a natural evolução das reformas
que, no passado recente, foram feitas na justiça, algumas delas, aliás, com resultados muito positivos.
Basta olhar para os números dos últimos cinco anos, em que, pela primeira vez desde 2009, o rácio dos
processos cíveis entrados e findos é positivo. Ou seja, desde 2013, há mais processos acabados do que
entrados, o que revela a recuperação nos atrasos.
Mais: de 2014 para 2015, as pendências nos tribunais cíveis de 1.ª instância conheceram uma diminuição
na ordem dos 8%, que atingiu os 13% de 2015 para 2016.
Porém, e apesar destes avanços, a perceção de que a justiça continua má e lenta não é, infelizmente,
desmentida pelos mesmos números: a 31 de dezembro de 2016 continuavam pendentes nos tribunais cíveis de
1.ª instância mais de 1 milhão de processos, com a duração média de dois anos e nove meses. Isto é, desde a
entrada do processo até à sentença, em média, cada processo demora praticamente três anos, sem falarmos
em recursos.
Pior ainda é a situação que se vive nos tribunais administrativos e fiscais. O rácio de processos entrados e
findos é bastante negativo, com uma taxa de acumulações muito preocupante.
De facto, em 31 de dezembro de 2015, a entrada de processos superava em 20% o número de processos
findos, sendo certo que, com os meios que estão atualmente à nossa disposição, seria preciso que um ano
tivesse cerca de 1000 dias — o triplo dos dias de um ano, portanto — para que fosse possível recuperar todos
os atrasos.
Sabemos que não está tudo feito, sabemos que há ainda muito caminho a percorrer e sabemos, acima de
tudo, que a justiça é vista com desconfiança pela grande parte dos portugueses, que sentem que ela não dá
resposta ou a dá tarde demais.
Por isso mesmo, entendemos apresentar seis projetos de lei e seis projetos de resolução, que tocam, de
forma transversal, várias áreas da justiça.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, são cinco os eixos que definimos para um objetivo maior, a confiança
no sistema de justiça, desígnio que esperamos seja comum a todos nesta Câmara.
Simplificação, celeridade, eficácia, transparência e garantias dos cidadãos são os eixos que o CDS elegeu
como prioritários para este conjunto de iniciativas. Passo a exemplificá-los, para esclarecer ao que vimos.
Em matéria de simplificação, destaco duas alterações: a previsão de sentenças orais, proferidas
imediatamente no fim da audiência de julgamento, e a consagração da regra dos depoimentos escritos. Uma e
outra tornam o processo bastante mais ágil e fácil e evitam, no caso das sentenças, a expectativa — às vezes
agonizante — do veredito do juiz. No caso dos depoimentos escritos, não só livra as testemunhas do calvário
da espera pelos corredores dos tribunais, como permite ao juiz determinar, com maior facilidade e rapidez, a
prova a que se destinam.
Contudo, estas não são regras fechadas ou herméticas. Permite-se, naturalmente, que as partes ou o juiz
chamem as testemunhas a depor sobre factos de que tenham dúvidas ou que as sentenças sejam transcritas
sempre que a causa seja complexa ou que as partes dela queiram recorrer.
Quanto à celeridade, recuperámos a ideia da constituição das bolsas de magistrados para resolver os
processos parados há mais de cincos anos nos tribunais administrativos ou superiores a 1 milhão de euros no
caso dos processos tributários pendentes. Para além disso, propomos a remessa para arbitragem, a pedido dos
particulares, dos processos administrativos e fiscais parados há mais de dois anos, para o que é preciso, no
caso da arbitragem administrativa, que o Governo regulamente, coisa que também nós propomos.
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Acresce a isso medidas mais permanentes, quer no âmbito do processo administrativo e fiscal, quer no
domínio cível, como a criação de juízos especializados nos tribunais administrativos e fiscais, permitindo separar
as causas mais simples das mais complexas, e a obrigatoriedade de submeter aos julgados de paz as causas
da sua competência.
Entendemos que os julgados de paz devem ser uma verdadeira alternativa aos tribunais, retirando a estes o
tratamento das questões mais simples. Aí, nos julgados de paz, poderão julgar-se questões relativas a
condomínios ou a contratos, dando apenas dois exemplos, sendo certo que, para isso, não só é preciso que o
Governo amplie a respetiva rede, como terão de ser revistas algumas condições, designadamente a da formação
dos juízes de paz.
Note-se bem que, à semelhança do que acontece nos tribunais judiciais, passa a ser obrigatória a
constituição de advogado para causas superiores a 5000 €, sendo recorríveis todas as decisões a partir dos
2500 €.
Ou seja, é tratar de forma simples o que é simples, não diminuindo em nada as garantias de que atualmente
dispõem as partes.
Aplausos do CDS-PP.
A eficácia, essa, atinge-se com a contratação de assessores especializados para os gabinetes de apoio aos
magistrados, que devem ser constituídos rapidamente, pelo menos onde haja mais necessidades —lembro-me,
por exemplo, dos tribunais administrativos e fiscais e dos tribunais de comércio —, ou ainda com a fixação de
objetivos de gestão nos tribunais administrativos e fiscais, com controlo trimestral das pendências e, claro, com
o desenvolvimento de meios tecnológicos e digitais, que também instamos o Governo a incrementar.
No que à transparência concerne, propomos duas coisas muito simples mas reveladoras.
Em primeiro lugar, propomos que o Governo, tal qual acontece anualmente com a segurança interna,
apresente um relatório sobre o estado da justiça ao Presidente da República e à Assembleia da República. Esse
relatório deve conter informação sobre pendências, instalações e meios humanos e materiais. No fundo, deve
condensar a informação dispersa por vários relatórios e permitir um escrutínio rigoroso por parte da Assembleia
da República.
Em segundo lugar, propomos que apresente um outro relatório sobre o sistema prisional que dê a conhecer
as condições de detenção dos reclusos e instalações, os investimentos previstos e os meios humanos e
materiais alocados.
Friso que a necessidade destes relatórios é meridianamente evidente, mas, para os mais distraídos ou
incautos, limito-me a lembrar a notícia que saiu há dois dias que dá conta de que o Comité para a Prevenção
da Tortura fez um retrato muito negativo das prisões portuguesas e que, por isso mesmo, merece uma atenção
particular de todos nós, pelo que o escrutínio é um elemento essencial.
Finalmente, e não menos importante, evidencio três garantias dos cidadãos que nos parecem de elementar
justiça acautelar: desbloqueio, em 10 dias, dos montantes penhorados em excesso quando haja penhoras de
vários depósitos bancários, sob pena de responsabilidade civil para quem não o faça; alargamento das
possibilidades de impugnação das decisões da Autoridade Tributária ou a constituição de uma comissão de
revisão da legislação penal, designadamente para revisitar as regras do segredo de justiça ou para fixar um
prazo máximo para a duração do interrogatório do arguido.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, nem tudo será consensual, nem tudo estará absolutamente certo e
nem tudo será imediatamente exequível e muito menos temos a pretensão de achar que só nós é que sabemos
ou que só nós é que trazemos boas soluções.
O que queremos é deixar o nosso contributo para melhorar a qualidade da justiça portuguesa, para uma
justiça mais rápida, mais efetiva e que, sobretudo, não deixe a sensação de que já não há remédio.
Aplausos do CDS-PP.
Muitas das medidas que propomos agora, ou que propusemos no passado e que estavam à espera
precisamente deste debate — refiro o projeto de resolução que apresentámos no ano passado sobre o acesso
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ao direito e o regulamento das custas judiciais —, são o espelho do que os agentes do sistema de justiça
identificaram como prioritário nos acordos para o sistema de justiça.
O primeiro desafio do Presidente da República ficou, assim, cumprido, pelo que nos cabe, agora, dar-lhe
continuidade e aceitar o seu segundo desafio.
À pergunta que o Presidente da República deixou na abertura do ano judicial — «será tão difícil assim que
os partidos políticos cheguem a consenso, não direi nas 89 propostas, em muitas das propostas apresentadas?»
—, o CDS responde «presente», responde, sobretudo, aos anseios dos portugueses e diz «sim» às plataformas
de entendimento que são necessárias fazer em nome de um bem maior.
Não, o CDS não espera por 2019 para falar, juntar esforços, promover convergências, definir e tentar fazer
vingar objetivos; está perante esta Câmara, hoje, em março de 2018, de espírito aberto e disposto a ajudar a
construir um futuro melhor.
Juntamos à pergunta do Sr. Presidente da República a nossa pergunta: que resposta têm para dar as Sr.as
e os Srs. Deputados que compõem esta maioria? Está na hora de ela ser dada. É por ela que esperamos agora.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — A Mesa registou a inscrição, para pedidos de esclarecimento,
de quatro Srs. Deputados, aos quais a Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, segundo informou a Mesa, irá
responder dois a dois.
Sendo assim, tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado José Manuel Pureza.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, cumprimento o CDS
por ter agendado este debate e ter trazido à Assembleia uma das políticas mais importantes da nossa vida
democrática.
A Sr.ª Deputada introduziu a sua intervenção afirmando que — e passo a citar — «hoje apresentamos as
propostas do CDS para a justiça». Na verdade, este agendamento apareceu na vida parlamentar criando uma
enorme expectativa.
O anúncio da marcação deste debate, como a Sr.ª Deputada nos lembrou, foi feito pela Deputada Assunção
Cristas no final das jornadas parlamentares do CDS e previa-se que nas iniciativas apresentadas constassem
os principais pilares da política de justiça pretendida pelo CDS e uma resposta sua aos apelos do Presidente da
República sobre a atribuição de centralidade à justiça no debate público e no confronto político. Era isto que se
esperava.
Todavia, havemos de convir, Sr.ª Deputada, que, tendo em conta os seis projetos de lei e os seis projetos de
resolução que o CDS nos apresenta, a frustração diante destas expectativas é um sentimento que quero aqui
exprimir, porque se trata apenas de um conjunto de ajustamentos, com méritos diferentes entre si, pelo menos
do nosso ponto de vista, mas sem aquilo a que se poderia chamar de linha condutora de fundo com uma visão
de conjunto sobre o que deve ser o essencial da política de justiça em Portugal.
Dizia a Sr.ª Deputada, antecipando provavelmente esta leitura — vá-se lá saber porquê! —, que são várias
pequenas coisas que podem fazer uma grande diferença. São pequenas demais, Sr.ª Deputada! Portanto, valia
a pena, efetivamente, que nas pequenas coisas transparecessem as grandes coisas de que se faz uma política
de justiça.
Deixe-me dizer-lhe, com toda a franqueza, que, nesta matéria e com esta fórmula, o CDS fica muito
semelhante ao que tem sido o PSD nos últimos dias, porque verificámos que o novo líder do PSD veio anunciar
ao País, com pompa e circunstância, como cumpria, que a justiça seria claramente um dos domínios essenciais
de uma nova era que aí vinha. Aliás, coroou essa afirmação com a indicação para vice-presidente do partido de
alguém que ficou conhecido por ter acionado um processo-crime contra o Governo do PSD justamente por causa
da política de justiça.
Vinha aí, portanto, coisa grande! Mas, até agora, sem qualquer definição, nenhuma prioridade, nenhuma
linha condutora, nada que se possa parecer com isso.
Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, há aqui algo que nos parece claro e que as notícias hoje mesmo já
tornaram evidente: «Pacote da justiça: CDS responde a Marcelo e antecipa-se a Rio». É isto! Trata-se, na
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verdade, de uma jogada de antecipação, com toda a legitimidade, obviamente. É um campeonato entre o CDS
e o PSD, e nesse campeonato os senhores entender-se-ão da melhor maneira que quiserem.
Não é, todavia, o campeonato da justiça de que o País precisa, e essa é que é a questão que devíamos estar
hoje a debater.
Face a esse vazio do PSD, o CDS antecipa-se, marca um agendamento potestativo, apresenta projetos de
lei e projetos de resolução de valia muito diferente e, portanto, a pergunta que lhe deixo é: diante do enunciado
de prioridades que aqui nos deixou — simplificação, eficácia, transparência, rapidez —, nada sobre acesso,
nada sobre formação, nada sobre governação da justiça, nada sobre direitos dos mais fracos em processos de
insolvência. Nada, Sr.ª Deputada!
Gostava de a ouvir sobre tudo aquilo — e é tanto! — que falta de essencial nestas propostas do CDS.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Srs. Deputados, antes de prosseguirmos, queria anunciar que
se encontra entre nós, na tribuna do corpo diplomático, o Sr. Presidente da República Federal da Alemanha,
para quem pedia uma saudação da Câmara.
Aplausos gerais, de pé.
Queria ainda dizer que é intenção da Mesa deixar os grupos parlamentares gerirem os seus tempos como
entenderem. Portanto, utilizarão os tempos da forma que melhor lhes aprouver, nos pedidos de esclarecimento
e nas intervenções, desde que não excedam o tempo que lhes está alocado.
Srs. Deputados, peço ainda para manterem o ruído da Sala um pouco mais baixo.
Também para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rocha Andrade.
O Sr. Fernando Rocha Andrade (PS): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada
Vânia Dias da Silva, traz-nos um retrato da justiça em que o fator lentidão é relativamente consensual e
tradicional, mas esse retrato refere dados de 2015, porque, efetivamente, são os últimos dados disponíveis.
Queria chamar a sua atenção para que, eventualmente, para além dos defeitos das leis, há também algo que
é normalmente necessário para despachar processos e fazer sentenças: magistrados. Magistrados judiciais dão
imenso jeito para despachar processos e fazer sentenças.
Nesse aspeto, queria chamar a atenção para o facto de, nesse final de 2015 a que se refere, se terem
cumprido quatro anos em que o CEJ (Centro de Estudos Judiciários), durante esse tempo, abriu vagas para o
ingresso de 160 magistrados. Nos últimos três anos — que se referem aos três anos deste Governo —, foram
abertas 380 vagas, que é, aliás, o limite da capacidade de formação do CEJ. O que significa que, este Governo,
nessa matéria, não despicienda, de haver magistrados no sistema de justiça, fez mais do dobro em menos
tempo do que fez o Governo anterior.
Aplausos do PS.
Queria também chamar-lhe a atenção para o facto — e os vossos projetos referem, por exemplo, a maneira
como o Estado, nomeadamente o setor tributário, contribui para a morosidade através da litigiosidade — de que
não chegam as leis, porque é precisa a boa vontade dos governos, da administração, para as aplicar.
Por exemplo, na Legislatura passada, muito louvavelmente, esta Assembleia da República aprovou uma
alteração à Lei Geral Tributária prevendo que a administração tributária deve, sempre que possível, conformar-
se com a jurisprudência uniforme dos tribunais e, portanto, deixar de litigar constantemente contra a
jurisprudência. É muito louvável, só que era preciso que o comando político da administração tributária — que
por acaso pertencia ao CDS — tivesse dado execução à norma.
Recentemente, o Supremo Tribunal Administrativo veio assinalar como muito louvável o despacho inaugural
de cumprimento dessa norma de 2013, mas esse despacho inaugural não pertence ao Secretário de Estado do
CDS do Governo anterior, pertence a um outro Secretário de Estado do atual Governo da República.
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Portanto, ainda que haja boas intenções legislativas, é preciso que os governos atuem no mesmo sentido
dessas intenções.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Muito bem!
O Sr. Fernando Rocha Andrade (PS): — Sr.ª Deputada, são 12 projetos com muitas e díspares propostas
e com, talvez, pouca coerência. Há muitas com que, numa primeira leitura, concordo; há muitas que me parecem
inúteis, em que se mexe demais em artigos aparentemente apenas para se fazer aperfeiçoamentos ou, por
vezes, clarificações, creio eu, com pura inutilidade. Será preciso voltar a repetir, a meio do CPPT (Código de
Procedimento e de Processo Tributário), que o Código de Processo Civil é norma subsidiária para alguma coisa
qualquer quando o artigo 2.º do mesmo Código já diz que a norma subsidiária é para tudo?
A sentença oral que a Sr.ª Deputada refere na sua intervenção será assim tão diferente da sentença lida por
apontamentos que já hoje existe no Código de Processo Civil e é praticada?
Depois, há questões que merecem a nossa reserva ou a nossa não adesão. Merece a nossa reserva o
modelo proposto de o Governo monitorizar, juntamente com os conselhos superiores, a atuação dos tribunais.
Parece-nos que, a concretizar esse modelo de monitorização como está, há ali um problema qualquer de
configuração constitucional. Merece-nos imensas reservas a forma como os julgados de paz deixam de ser um
método alternativo de resolução de conflitos para passarem a ser um método forçoso de resolução de conflitos
e, portanto, passarem a ser como um tribunal. Merece-nos muitas reservas a forma como na jurisdição
administrativa e fiscal se pretende colmatar as deficiências do sistema privatizando, no fundo, para a arbitragem
a justiça tributária.
Aliás, neste aspeto, o CDS é o verdadeiro estereótipo da direita: no governo seca os recursos públicos para
que o sistema público não funcione e, depois, propõe a privatização desses mesmos serviços públicos.
Aplausos do PS.
Mas, Sr.ª Deputada, talvez a questão fundamental seja a seguinte: acredito que o CDS esteja a trabalhar
nestes projetos desde o princípio de 2016, mas eles deram entrada na sexta-feira passada. E quem, na sexta-
feira, tivesse levado os projetos para os ler chegava ao fim do dia de segunda-feira e via que os textos desses
mesmos projetos tinham sido substituídos por outros textos.
Portanto, não é possível fazer-se qualquer debate profundo e ponderado, nenhuma tomada de posição
consciente dos grupos parlamentares sem que tenha havido tempo para analisar a quantidade de projetos,
tempo para falar com os agentes, tempo para as várias discussões. E esse tempo não existiu por uma razão,
confessada na intervenção do CDS: a questão do CDS era ser o primeiro, a questão do CDS era, neste
campeonato à direita das propostas da justiça, dizer «nós pusemos aqui a nossa bandeirinha.» Essa era a
questão.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — É isso mesmo!
O Sr. Fernando Rocha Andrade (PS): — Os vários grupos parlamentares, na 1.ª Comissão, como a Sr.ª
Deputada sabe, face ao pacto da justiça, deliberaram, aliás, com o voto favorável do CDS, que se iria fazer um
conjunto de audições, não só às entidades que participaram na elaboração do pacto mas também, por exemplo,
aos Conselhos Superiores da Magistratura e do Ministério Público.
Pensamos que as propostas para a justiça merecem esse debate ponderado, esse debate participado antes
das tomadas de posição. Portanto, a minha pergunta, Sr.ª Deputada, é muito simples: está o CDS disponível
para não forçar uma votação destes projetos hoje ou amanhã e para deixar que baixem à Comissão, sem
votação, por forma a contribuírem para um debate que todos, por unanimidade, já tínhamos deliberado fazer?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para responder a estes dois pedidos de esclarecimento, tem
a palavra a Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva.
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Apelava ainda, de novo, às Sr.as Deputadas e aos Srs. Deputados que fizessem silêncio, porque o ruído de
fundo é imenso.
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr. Presidente, queria começar por agradecer as perguntas do Sr.
Deputado José Manuel Pureza e do Sr. Deputado Rocha Andrade.
Começando pelas questões que foram levantadas pelo Sr. Deputado José Manuel Pureza, que nos fez
algumas críticas, gostaria de lhe dizer que, para um monte de críticas tão grande, os senhores têm um deserto
de propostas.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Portanto, era preciso que tivessem propostas para virem dialogar
connosco e para falarmos sobre o que está bem, sobre o que está mal e sobre o que pode ser melhor.
O Sr. Deputado diz também que não temos um eixo condutor. Mas temos cinco eixos. Se o Sr. Deputado
disser que esses cinco eixos não são importantes, que a simplificação não é importante, fica com o senhor esse
ónus. Diz que a celeridade não é importante? Diz que a transparência não é importante? Diz que a eficácia não
é importante? Diz que as garantias dos cidadãos não são importantes? Ó Sr. Deputado, para nós, estas são as
coisas verdadeiramente importantes e que aportam confiança ao sistema de justiça. Se para os senhores não
são importantes, apresentem as vossas propostas e digam o que é importante, porque é disso que estamos à
espera.
Aplausos do CDS-PP.
Encetámos este diálogo com vontade disso mesmo, ou seja, de fazermos um diálogo construtivo. Estamos
aqui dispostos a fazê-lo.
Os que os Srs. Deputados têm de fazer é trazer as vossas propostas para falarmos sobre elas, porque é isso
que nós queremos e é isso que faz todo o sentido.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Assim será! Nós não temos campeonatos com ninguém!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — De resto, já trabalhamos há vários meses nestas propostas e
algumas delas foram apresentadas anteriormente, Sr. Deputado.
Fez-nos a crítica de que não temos uma palavra para o acesso ao direito ou o regulamento de custas. Temos
Sr. Deputado. Está parado, na 1.ª Comissão, um projeto de resolução que apresentámos há um ano, coisa que
os senhores não fizeram porque não quiseram tocar na questão.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Temos, temos!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Apresentámo-lo já há um ano, ainda antes de alguém vir falar no
assunto, porque tínhamos essa preocupação e sabíamos muito bem que esse era um problema.
Aplausos do CDS-PP.
E sabe tão bem quanto nós que as regras formais não nos permitem apresentar duas vezes a mesma coisa.
Por isso mesmo, esse truque não vale, Sr. Deputado.
Sr. Deputado Rocha Andrade, ouvi-o com muita atenção. Concordo consigo: magistrados dão imenso jeito.
E ainda bem que há mais magistrados, faltam é algumas coisas. Falta, por exemplo, o estatuto dos magistrados.
Os Srs. Magistrados esperam e desesperam, porque os senhores nunca mais o desencravam.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!
Protestos do Deputado do PS Filipe Neto Brandão.
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A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — De resto, quero dizer que gosto muito de ouvir as críticas que o PS
faz na área da justiça. Sabe porquê, Sr. Deputado? Porque, se formos ver o que este Governo fez na área da
justiça, há duas coisas para mostrar. Uma, é a reativação dos tribunais, que é uma coisa pouca, até pelo que
têm vindo dizer os profissionais da área e os cidadãos.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Os tribunais que os senhores fecharam!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Há notícias várias nesse sentido, dizendo que, afinal, não foi bem
uma reabertura. Pois não! Nós sabemos que não ia ser e os senhores também o deveriam saber.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Foi um truque!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — E há outra coisa que podem mostrar, que é a justiça mais próxima,
que tem cinquenta e tal medidas cumpridas das 150 que estavam prometidas.
Sr. Deputado, não é mau, mas não chega para nada, dizem os Srs. Agentes da justiça, que têm no pacto da
justiça mais de 15 medidas respeitantes a sistemas tecnológicos e de informação.
Portanto, se essas são as duas únicas coisas que os senhores entendem que se deve fazer em matéria de
justiça — foi o que fizeram durante dois anos e meio, e é a Sr.ª Ministra que o diz em todos os lados —, é muito
pouco, é muito curto. O CDS tem muito mais ambição e acha que é preciso fazer muito mais do que isso para
chegar a todos os portugueses.
Aplausos do CDS-PP.
Quero também dizer-lhe, Sr. Deputado, que estamos absolutamente disponíveis — coisa que também já
disse ao Sr. Deputado José Manuel Pureza — para dialogar com os senhores. Tragam-nos as vossas propostas,
venham elas!
O Sr. Deputado fez-nos também imensas críticas, dizendo que queríamos ser nós a trazer a bandeirinha. Ó
Sr. Deputado, não queremos trazer bandeirinha nenhuma, mas estava tão irritado com a nossa bandeirinha que
parecia mesmo que quem a queria trazer era o senhor.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exatamente!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Portanto, Sr. Deputado, nesse domínio, temos poucas
preocupações sobre que símbolo é que aparece no papel; o que nos importa são os portugueses e aquilo que
lhes responde.
O Sr. Hélder Amaral (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr. Deputado, diga-nos, pois, o que é que, das nossas propostas,
pode ser aceite pelos senhores. Nós também iremos ao vosso encontro quando apresentarem propostas. Vamos
conversar, tenham essa vontade. Façam algo pela justiça, coisa que não têm feito nos últimos tempos.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem, agora, a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr.
Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, a apresentação de
propostas, em matéria de justiça, tem muita relevância, é um propósito meritório, aliás, impõe-se que haja entre
nós discussões muito sérias sobre questões fundamentais que afetam o sistema de justiça e o funcionamento
da justiça, mas há que reconhecer que há momentos em que a forma pode prejudicar o conteúdo.
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Nós iremos apreciar as propostas que o CDS-PP aqui apresenta pelo seu mérito e, portanto, iremos votar
em função das concordâncias e discordâncias que possamos ter relativamente àquilo que é apresentado, mas,
convenhamos, a forma como este pacote de iniciativas é apresentado não o favorece.
Nós podemos perceber as razões do CDS em matéria de tática parlamentar. Ou seja, sabemos que houve
importantes reuniões entre os vários intervenientes no sistema de justiça, que chegaram a acordos importantes
relativamente a matérias relacionadas com o funcionamento da justiça, sabemos do apelo público que foi feito
pelo Presidente da República nesse sentido e percebemos que possa haver, da parte dos grupos parlamentares,
uma certa ânsia de serem os primeiros a apresentar propostas, procurando corresponder àquele apelo e, com
isso, ganharem espaço mediático e parlamentar. Podemos perceber isto, do ponto de vista da tática parlamentar,
embora, na nossa perspetiva, não seja isto, fundamentalmente, o que nos move.
Também podemos perceber, do ponto de vista da tática parlamentar, a ideia de podermos fazer um
agendamento sobre esta matéria e, depois, apresentarmos as iniciativas só na véspera. Podemos perceber,
porque há uma certa tendência para copiar as iniciativas uns dos outros e, portanto, pode haver aqui uma tática
anticópia da parte do CDS. Também podemos perceber isto.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Isso até é bom!
O Sr. António Filipe (PCP): — Agora, esta não é, de facto, a melhor forma de a Assembleia da República
legislar em matéria de sistema de justiça, porque este conjunto de iniciativas contém projetos de resolução,
sobre os quais podemos dizer que, do nosso ponto de vista, não são relevantes, e projetos de lei que,
concordemos ou não com eles, têm muita relevância.
Alterações significativas ao Código de Processo Civil ou à legislação de processo em matéria tributária, na
nossa opinião, não deveriam ser debatidas na Assembleia da República sem que houvesse os relatórios das
comissões, designadamente da 1.ª Comissão, e a respetiva nota técnica, bem como as audições que se impõem
em matéria desta relevância e desta natureza.
É por isso que dizemos que a forma como estas iniciativas são apresentadas, em catadupa e em vésperas
de serem agendadas em Plenário, para apreciação e votação na generalidade, não é a melhor forma de a
Assembleia da República se debruçar sobre temas da justiça, com a atenção que é devida a matérias tão
transcendentes e com tão grande relevância. Isto para dizer que, quando somos confrontados com 12 iniciativas,
apresentadas há poucos dias pelo CDS e para serem apreciadas hoje, sobre matérias com tanta relevância,
ficamos com a ideia, certa ou errada, de que o princípio geral que norteou o CDS neste debate foi o de que, em
matéria de iniciativas, à dúzia é mais barato. Porém, quer-nos parecer que não é essa a melhor forma de a
Assembleia da República debater estas matérias.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem, agora, a palavra, também para pedir esclarecimentos, a
Sr.ª Deputada Andreia Neto.
A Sr.ª Andreia Neto (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, em primeiro lugar, gostaria
de saudar o CDS-PP pela apresentação destas 12 iniciativas legislativas sobre a matéria da justiça.
O PSD reconhece, naturalmente, que a justiça tem um papel central na democracia e na própria estabilidade
social e atravessa todas as instituições, públicas e privadas. A própria credibilidade e a competitividade do País
estão diretamente ligadas, também elas, ao bom funcionamento da justiça.
Quero também aproveitar a minha intervenção para saudar todos aqueles que, na sequência de um desafio
lançado pelo Sr. Presidente da República, aquando da abertura do ano judicial, em 2016, conseguiram alcançar
um consenso, um consenso inédito, um consenso importante — estabeleceram acordos, estabeleceram
princípios —, enfim, um verdadeiro pacto da justiça, que é, efetivamente, relevante para a nossa justiça. Aliás,
permitam-me que diga que o documento em causa, dos agentes judiciários, merece, da nossa parte, da parte
do PSD, os maiores elogios, até porque entendemos que este também pode ser um caminho a seguir por outros
setores.
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Sr.as e Srs. Deputados, este pacto aborda, efetivamente, vários temas e propõe alterações importantes em
matérias como a da organização dos tribunais, a do custo do acesso à justiça por parte dos portugueses, a da
execução das sentenças dos tribunais, a da cobrança de dívidas e da justiça económica, as quais vão sempre
no sentido de simplificar e garantir o acesso à justiça pelos cidadãos, para além da sua proteção.
Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, permita-me que me concentre no projeto relativo aos julgados de paz.
A Lei dos julgados de paz, como todos sabemos, sofreu a primeira alteração em 2013 e essa alteração foi,
efetivamente, no sentido de reforçar a aproximação da justiça aos cidadãos, através da atribuição de maior
competência aos julgados de paz, eliminando situações de desaforamento e reforçando, assim, desta forma,
com estas verdadeiras alterações, a confiança dos cidadãos nestas instituições.
Mas o CDS-PP propõe hoje, aqui, uma segunda alteração à Lei dos julgados de paz e é sobre estas
alterações que quero concentrar-me, aliás, vou concentrar-me apenas numa delas, que é a que estabelece a
jurisdição obrigatória dos julgados de paz nas matérias para as quais sejam competentes, nos concelhos ou
agrupamentos de concelhos onde já tenham existência. A verdade é que, e é preciso ser dito aqui, nesta
Câmara, a presente lei não contém nenhuma norma expressa que defina se a competência dos julgados de paz
é alternativa ou exclusiva. E, Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, apesar de, durante bastante tempo, a
jurisprudência se ter dividido quanto à competência dos julgados de paz, no sentido de saber se ela era
alternativa ou exclusiva, a questão ficou resolvida num acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que acabou por
uniformizar jurisprudência, esclarecendo que a competência é alternativa aos tribunais judiciais de competência
territorial concorrente.
Aliás, acrescentando ainda mais, a própria Lei da Organização do Sistema Judiciário, também ela, não deixa
dúvidas, porque é bastante esclarecedora, Sr.ª Deputada, a Lei estabelece que os julgados de paz constituem,
efetivamente, uma forma alternativa de resolução de litígios.
Portanto, a questão que eu gostava de deixar aqui à Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva incide precisamente
sobre este aspeto da competência dos julgados de paz, tendo até em conta que, aquando da primeira alteração
à Lei dos julgados em paz, em 2013, foi o Partido Comunista que apresentou uma alteração neste sentido, mas
o CDS-PP, nessa altura, votou contra.
Portanto, a minha questão prende-se essencialmente com isto, Sr.ª Deputada: o porquê desta alteração de
posição, por parte do CDS, quanto a esta matéria e no que diz respeito à competência dos julgados de paz.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Tem, agora, a palavra, para responder, a Sr.ª Deputada Vânia
Dias da Silva.
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe e Sr.ª Deputada Andreia
Neto, agradeço as vossas perguntas.
Começo pelo fim, pelas questões da Sr.ª Deputada Andreia Neto e também, à semelhança do que fez na
sua intervenção, por saudar os agentes da justiça, que, aliás, já saudámos com a apresentação dos 12 diplomas
que aqui trouxemos, pelo entendimento a que conseguiram chegar, um entendimento histórico, que deve
continuar e que nós prezamos e entendemos que é de saudar.
Quero dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que percebo bem a questão que nos deixa, relativamente aos julgados de
paz. E percebo algumas preocupações de alguma classe profissional com esta questão, mas esta questão, Sr.ª
Deputada, na nossa opinião, está a ser colocada de forma errada.
Em primeiro lugar, Sr.ª Deputada, nós evoluímos na nossa posição. Sim, evoluímos, e não temos qualquer
problema em dizê-lo, porque estudámos, ouvimos, consultámos e percebemos que este era um caminho
importante para a celeridade, que é um dos eixos essenciais, de que toda a gente reclama, em matéria de
justiça.
Quanto aos julgados de paz, quero dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que se percorrer a Europa verá que há muitos
mecanismos semelhantes aos julgados de paz e que as questões mais simples são tratadas em sítios onde é
mais simples e mais barato o tratamento dessas questões. É precisamente isso que propomos. O que propomos
é que, com todas as garantias que as partes têm, atualmente, nos tribunais de 1.ª instância, a competência seja
transferida para os julgados de paz exatamente nas mesmas condições. O que é que isto quer dizer, Sr.ª
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Deputada? Quer dizer que aquilo que propomos é que, nas causas para as quais, hoje em dia, já têm
competência os julgados de paz, e sabe, tão bem como eu, que são apenas causas obrigacionais ou reais —
para que as pessoas percebam, são contratos e causas mais pequenas, com um valor até 15 000 euros —,
passe a ser obrigatória a jurisdição dos julgados de paz, nas comarcas onde haja, efetivamente, julgados de
paz. Para além disso, propomos, ainda, que os juízes de paz tenham uma formação um bocadinho mais
musculada, para que possam fazer o seu trabalho com mais vigor.
Mas propomos, ainda, que, à semelhança do que se passa nos tribunais de 1.ª instância, as partes tenham
de constituir obrigatoriamente advogado quando a causa ultrapasse os 5000 euros, exatamente como sucede
nos tribunais judiciais, e que, a partir dos 2500 euros, haja possibilidade de recurso, como também já hoje sucede
nos tribunais de 1.ª instância, onde só é possível recorrer a partir de 2500 euros.
Portanto, aqui, a diferença é nenhuma, Sr.ª Deputada.
Qual é a diferença? Separar as causas mais simples e colocá-las nos sítios onde elas são tratadas de forma
mais simples,…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — … agilizando e acelerando, assim, a justiça.
Quanto às garantias das partes, elas são precisamente as mesmas, repito, precisamente as mesmas.
Portanto, não ver esta questão e suscitá-la da forma como a suscitou parece-nos ser um bocadinho de
preconceito.
De resto, nós também entendemos que, se consideram que os julgados de paz não servem, então, os
julgados de paz têm de ser extintos, já que duplicar estruturas e custos não serve bem a ninguém. Esta é a
nossa opinião.
Queria, ainda, dizer-lhe que compreendemos a posição do tribunal, mas essa posição foi assumida à luz
daquela que era a lei então vigente. E agora? Agora, o que propomos é uma alteração à lei. É este o supremo
poder que temos: se quisermos alterar a lei, obviamente, o tribunal vincular-se-á e é isto que nos cabe, a nós,
fazer.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Queria, agora, dizer, ao Sr. Deputado António Filipe, agradecendo-
lhe outra vez as perguntas que nos deixou, que, às vezes, parece que os senhores não fizeram o trabalho de
casa e, por isso, depois, ficam como os maus alunos, preocupados em esconder a mão e a dizer: «Fomos
apanhados. Agora, o que vamos fazer? Vamos acusar os outros!».
Ó Sr. Deputado, o que tenho para lhe dizer neste domínio é que o CDS apresentou as suas propostas em
tempo útil, aliás, naquele que está estabelecido por todos nós. Se o Sr. Deputado não teve tempo de ler e de
estudar, esse é um problema que não é do CDS, é um problema do PCP e de quem elegeu o PCP, não é de
mais ninguém nesta Câmara.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Vá lá!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — Portanto, os senhores não têm propostas, e sei que ainda não têm,
mas nós trabalhámos muito e durante muito tempo nesta matéria. Se os senhores tivessem feito o trabalho de
casa, como nós, provavelmente, agora poderíamos estar aqui a fazer um diálogo de partes, com todas as
propostas em cima da mesa. Mas nós estamos cá para esperar, estamos cá para dialogar, estamos aqui para
fazer o melhor pela justiça e, portanto, estamos absolutamente dispostos a aguardar por todos os senhores
nesta Câmara, esperemos é que não demorem muito tempo e que não deixem para 2019 o que podem fazer
em 2018.
O Sr. Deputado fez-nos uma crítica por termos apresentado 12 projetos, dizendo que «à dúzia é mais barato»,
mas também disse que sabia que não era por isso. Sr. Deputado, também posso dizer-lhe que nós não quisemos
que fossem 13 porque 13 poderia dar azar.
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Risos do Deputado do PCP António Filipe.
Portanto, entendemos que o melhor era serem 12, mas não foi por ser mais barato, de facto. Foi por
entendermos que era o que era preciso, foi por entendermos que era este o nosso caminho, foi por entendermos
que era mais eficaz.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Não havendo mais inscrições para pedidos de esclarecimento,
dou a palavra, para uma intervenção, ao Sr. Deputado José Manuel Pureza.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queria, em primeiro lugar, registar
com agrado a disponibilidade do CDS para aceitar que esta discussão tenha o seu tempo próprio, com a
serenidade e a fundamentação que esta matéria exige.
Nesta intervenção, quero focar-me nas questões que consideramos essenciais e analisar criticamente as
propostas que o CDS aqui nos apresenta.
Antes de ser uma questão, digamos, de apuro técnico, o debate sobre a justiça tem de ser, evidentemente,
um debate sobre fins e é sobre isso que eu gostaria de me pronunciar nesta altura.
Para o Bloco de Esquerda, qualquer debate sobre a justiça tem de apontar para um suporte essencial e para
quatro eixos de materialização deste suporte. O suporte essencial tem de ser, só pode ser, a referência
fundamental à Constituição da República Portuguesa. Qualquer política para a justiça tem de assegurar, na
prática, o primado da Constituição e do seu modelo. E, portanto, do nosso ponto de vista, tem de apontar para
a concretização de um serviço nacional de justiça que se inspire no modelo que adotámos, e bem, em matéria
de Serviço Nacional de Saúde.
Isto tem quatro eixos de materialização: em primeiro lugar, o acesso universal, e é por isso que é tão
importante a questão do apoio judiciário, a questão das custas judiciais e a questão do mapa judiciário.
Vozes do BE: — É verdade!
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Em segundo lugar, os meios humanos para que a justiça funcione
adequadamente, funcionários judiciais. Esta é uma questão essencial para uma política de justiça que seja a
política digna de um serviço público para o nosso País.
Em terceiro lugar, uma alteração substancial àquilo que é a prática prisional e carcerária em Portugal.
Deixem-me dizer, com toda a franqueza, que, a este respeito, saudamos a proposta que o CDS nos apresenta.
É uma proposta correta aquela que vai no sentido de trazer a Plenário o relatório que foi publicado pelo Governo
sobre esta matéria, porque é um relatório que deve ser levado a sério. Portanto, saudamos esta iniciativa, como
saudamos, inclusivamente, a proposta de uma lei de programação de investimento em infraestruturas nesta
matéria — acompanhamos este propósito.
Em quarto lugar, uma formação dos atores judiciais. Qualquer debate sobre a justiça que não incida sobre a
formação dos atores judiciais é um debate que prescinde de uma parte essencial daquilo que é necessário.
Em relação às propostas do CDS, queria fazer três ou quatro observações fundamentais.
Primeira observação: entendemos que há várias iniciativas que propõem aquilo que já existe. Por exemplo,
gabinetes de apoio aos magistrados, uma possibilidade que já está hoje contemplada na lei, ou, por outro lado,
a pena de sanção de admoestação em matéria de contratações, que também está prevista na lei, pelo que esta
proposta é, de alguma maneira, redundante.
Segunda observação: queremos exprimir as nossas particulares reservas relativamente à intensidade com
que se fazem propostas de informalização e de desjudicialização. Entendemos que é um caminho muito
arriscado, designadamente em matéria de solução arbitral, porquanto, mesmo em matéria tributária, e sobretudo
em matéria tribuária, ela pode vir a revelar-se um prémio, um bónus, a quem alimenta a morosidade que
prejudica a parte mais fraca. E, assim, pode vir a revelar-se não como uma solução benéfica mas, sim, como
um prémio ao infrator. Ainda nesta matéria, na reforma proposta ou nas linhas orientadoras para a reforma do
processo civil apresentadas pelo CDS, queria chamar a atenção para o facto de haver, a nosso ver, uma
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diminuição de garantias que é inquietante. Designadamente, a hipótese da sentença oral, naturalmente para os
processos mais simples, oferece-nos as maiores dúvidas no que diz respeito ao rigor da decisão e, com isso,
aos direitos de defesa da parte que venha a ser condenada.
Ainda mais duas observações. Afastamo-nos também de algumas das propostas que o CDS faz em matéria
de julgados de paz, porque, por um lado, não tocam no essencial, na questão dos meios e na questão do
alargamento da rede em escala nacional, e, por outro, apresentam soluções que, aliás, nos parecem, devo dizer,
de duvidosa constitucionalidade. Por exemplo, a questão da competência exclusiva em matéria geral, digamos
assim, parece-nos ser uma solução de duvidosa constitucionalidade, para dizer as coisas da forma mais branda
que posso. Também a exigência de mestrado em Direito para os juízes de paz parece-me não acompanhar a
própria lógica dos julgados de paz. Muitos dos países que contemplam este sistema não exigem sequer a
licenciatura em Direito para os juízes de paz. E nós apoiamos esta hipótese como devendo ser considerada.
Finalmente, em matéria de legislação penal, uma última observação para dizer que a possibilidade de
alargamento da figura da suspensão provisória de processo, para processos aos quais esta figura não se aplica
hoje em dia, deve merecer-nos a maior cautela, porquanto a suspensão provisória de processo, em alguns dos
crimes já hoje habilitados a esta figura, tem-se revelado francamente perversa. Veja-se, por exemplo, aquilo que
acontece no crime de violência doméstica, com a possibilidade de suspensão provisória do processo e a
debilidade que isso introduz na relação entre as partes. Sobretudo em matéria de violência doméstica, como
compreenderão, tudo isto é muito sensível.
Em suma, o mérito das propostas do CDS, como eu disse logo no início, é um mérito variável. Há propostas
que acompanhamos, e fazemo-lo sem qualquer rebuço, e há propostas que nos merecem a maior reserva.
Portanto, aquando da especialidade, cá estaremos, com as propostas que já apresentámos e com outras que,
naturalmente, iremos apresentar, pois queremos acompanhar as propostas que nos merecem concordância,
reforçando-as, e colmatar aquilo que nos parece ser ou propostas erradas ou insuficiências das propostas do
CDS.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Sr. Deputado, a Mesa não regista qualquer inscrição para pedir
esclarecimentos ao Sr. Deputado José Manuel Pureza.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Oh!…
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Sr. Deputado, tal facto não depende da Mesa, no entanto a
Mesa regista o seu desencanto.
Tem agora a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Deixando agora as questões formais
e passando a aspetos ou méritos das propostas apresentadas, como afirmei no pedido de esclarecimento que
fiz há pouco, há matérias que nos merecem consideração, e até concordância, e outras não tanto.
Começaria, precisamente, pelo que nos parece ser justo e razoável, que é a criação de gabinetes de
assessoria aos juízes e ao Ministério Público junto dos tribunais. Parece-nos, efetivamente, que isto é razoável
e que deveria estar consagrado. Sabemos das dificuldades práticas a que a criação destes gabinetes de apoio
pode levar, mas, efetivamente, quer-nos parecer que isso faz sentido, e, portanto, é algo que merece a
consideração desta Câmara, obviamente com vista a que sejam criadas condições para que esta possibilidade
seja, de facto, concretizada na prática.
Deste modo, o projeto de lei que o CDS apresenta sobre a organização do sistema judiciário parece-nos
fazer sentido nesta parte, embora já não faça tanto sentido a exigência da existência de um relatório anual,
elaborado pelo Governo, em matéria do estado da justiça, porque, parece-nos, a avaliação do estado da justiça
carece da participação de entidades independentes e autónomas, que não propriamente o Governo, para que
possa haver uma avaliação rigorosa do estado do sistema de justiça. Aliás, os relatórios feitos pela Procuradoria-
Geral da República são, deste ponto de vista, muito valiosos e, portanto, não nos parece que esta matéria deva
ser governamentalizada. Pelo contrário, a avaliação sobre o estado da justiça deve poder contar com a
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participação de entidades que tenham uma participação muito relevante no funcionamento do sistema,
designadamente a Procuradoria-Geral da República e o Conselho Superior da Magistratura. Em todo o caso, no
que se refere aos gabinetes de apoio a magistrados, parece-nos que isto faz sentido.
Há uma série de iniciativas que o CDS apresenta e que, parece-nos, devem ter uma apreciação muito cuidada
e com a colaboração dos conselhos superiores e das entidades que intervêm no sistema de justiça, porque são
matérias complexas quanto à sua tecnicidade jurídica e também quanto às consequências relevantes das
alterações que são propostas. Estamos a falar, designadamente, das alterações ao Código de Processo Civil, à
Lei Geral Tributária ou ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Parece-nos que esta é uma matéria
que carece de uma apreciação aprofundada, para que esta Assembleia possa sentir-se segura e habilitada a ter
boas soluções para a mesma, e algumas delas devem ser cuidadosamente ponderadas. Portanto, relativamente
a algumas das propostas aqui apresentadas pelo CDS, damos o benefício da dúvida e pensamos que devem
ser merecedoras de uma análise muito atenta.
Porém, há matérias relativamente às quais queremos deixar, desde já, clara a nossa discordância, como a
que diz respeito à arbitragem, designadamente, quer em sede administrativa quer em sede tributária. O PCP
tem manifestado, nesta Assembleia, a sua discordância relativamente à desjudicialização da resolução de
litígios, particularmente quando estes envolvem o Estado e quando envolvem quantias avultadas. E percebemos
perfeitamente que o mecanismo da arbitragem em matéria fiscal, em matéria tributária, é algo que só beneficia
os grandes devedores.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Um cidadão que deixe de pagar o seu imposto único de circulação, nem que
seja por algumas horas, ou que, por incúria, não apresente uma declaração fiscal a tempo e horas é, enfim, logo
penalizado com coimas, que até podem ser, tendo em conta a situação económica de cada um, muito violentas.
Aqui não há apelo nem agravo, não há arbitragem que valha!
Porém, um devedor que deva milhões de euros ao fisco e que recorra à arbitragem em matéria fiscal,
provavelmente, ver-se-á livre de ter de pagar uma série de milhões. Ora, isto, para nós, é absolutamente
inaceitável num Estado de direito, pelo que contestamos absolutamente a existência de mecanismos de
arbitragem para a resolução de conflitos em matéria tributária.
Por outro lado, também pensamos que o Estado não deve recorrer à arbitragem nos contratos
administrativos, pois sabemos o que isto tem representado. Ou seja, invariavelmente, isto tem representado
que, quando estão em causa litígios entre o Estado e particulares com grande poder económico — e basta
pensarmos no que se passa em matéria de parcerias público-privadas —, o Estado sai penalizado e os
detentores do poder económico saem sempre a ganhar, à custa dos contribuintes, à custa dos cidadãos. Isto,
para nós, é inaceitável.
O Estado, para fazer valer os seus direitos, deve recorrer aos mecanismos do Estado de direito, deve recorrer
aos tribunais do Estado e não aceitar mecanismos que, como a experiência tem demonstrado, só prejudicam a
comunidade, só prejudicam os interesses do Estado português e dos cidadãos em geral.
Portanto, em matéria de arbitragem manifestamos a nossa discordância, relativamente àquilo que é,
efetivamente, proposto.
Há, depois, uma série de propostas que nos parecem relativamente irrelevantes, como as de recomendar ao
Governo que faça isto, aquilo ou aqueloutro, em matérias que, inclusivamente, poderia, e deveria, ser a
Assembleia a ter a iniciativa, designadamente no que se refere a matéria sancionatória.
Porém, no tempo que me resta, quero referir a questão dos julgados de paz. Valorizamos a existência de
iniciativas sobre julgados de paz, é algo que nos é muito caro — aliás, o PCP apresentou, nesta Assembleia, o
primeiro projeto de lei que deu lugar à existência dos julgados de paz —, e pensamos que vale a pena debater
o alargamento da rede de julgados de paz. Vale mesmo a pena fazer este debate.
Há aspetos da proposta do CDS com que não concordamos, porém, designadamente no que se refere à
jurisdição obrigatória dos julgados de paz e à obrigatoriedade da presença de advogado.
Pensamos que uma das vantagens dos julgados de paz é precisamente o facto de um cidadão, que não tem
recursos para custear uma lide judicial, nomeadamente para pagar honorários, poder recorrer a uma forma mais
acessível de ver resolvido o seu problema, caso a magnitude financeira do que está envolvido o permita.
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Portanto, achamos que não devemos criar mecanismos que tornem menos acessível, por razões económicas,
o recurso aos julgados de paz.
Já agora, quero anunciar que o PCP apresentará hoje mesmo um projeto de lei para o alargamento da
competência e da rede dos julgados de paz por considerarmos que é uma discussão que, efetivamente, vale a
pena ser travada nesta Assembleia.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — A Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa inscreveu-se para
fazer uma pergunta ao Sr. Deputado António Filipe?
A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD) — Não, Sr. Presidente.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, a Sr.ª Deputada inscreveu-se para colocar uma pergunta à
Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva, mas se já passou a fase das perguntas, a Sr.ª Deputada Sara Madruga da
Costa fará uma intervenção.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — A Mesa tinha o registo de que se tratava de um pedido de
esclarecimentos ao Sr. Deputado António Filipe, que já não dispõe de tempo para responder.
Tem, então, a palavra a Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa, para uma intervenção.
A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD) — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A democracia vive de
dissensos, mas também vive de consensos.
A justiça é uma das áreas em que, pela sua importância, se impõem consensos entre os diversos operadores
judiciários, mas também entre os partidos políticos. Foi também nesse sentido, e já foi aqui referido pelo PSD,
o apelo do Sr. Presidente da República a um verdadeiro pacto para justiça.
Sr.as e Srs. Deputados: Estamos sempre disponíveis para contribuir para a melhoria da justiça, concretamente
da justiça administrativa e fiscal, para uma intervenção construtiva e dialogante. Aliás, em 2015, o PSD deu um
importante contributo, contributo esse bastante significativo, para uma nova era na valorização da justiça
administrativa em Portugal, com a revisão, por exemplo, do Código do Procedimento Administrativo, do Estatuto
dos Tribunais Administrativos e Fiscais e com o Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
Estas reformas foram fundamentais para a melhoria do sistema jurídico-administrativo e fiscal, foram
imprescindíveis para uma maior confiança na justiça e para uma administração mais aberta, mais transparente
e mais eficiente.
O CDS-PP também fez parte do Governo que deu este importante contributo. É por isso que uma das nossas
primeiras curiosidades, e a questão que se imporia, é a de saber quais as razões ou motivações que levaram o
CDS-PP, neste momento, a propor alterações legislativas nesta sede, tendo em conta que se desconhece a
existência de uma avaliação ou de uma monitorização da reforma de 2015, que, como sabemos, foi presidida
pelo Prof. Dr. Fausto Quadros.
Sr.as e Srs. Deputados: Esta matéria é muito importante e por isso não deve ser encarada como uma mera
corrida em que interessa ser o primeiro a largar — aliás, numa corrida de fundo, nem sempre ganham os que
largam primeiro.
Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, é importante que haja uma nova abordagem, séria, a estas questões da
justiça administrativa. Como sabemos, há um consenso sobre o diagnóstico da justiça administrativa e fiscal em
Portugal. A resolução dos atuais problemas não parece depender única e exclusivamente de uma revisão da
legislação ou de uma verdadeira reforma da justiça, mas da necessidade de dotar os tribunais administrativos e
fiscais de mais meios, de mais juízes, de mais procuradores, de forma a, efetivamente, se recuperarem as
pendências administrativas dos processos mais antigos.
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Assim, era importante saber se o CDS concorda ou não com este diagnóstico e como é que estas medidas
que agora são propostas em matéria de justiça administrativa e fiscal podem efetivamente resolver estes
problemas gritantes que passam pela escassez de meios e de recursos dos tribunais administrativos e fiscais.
Sr.as e Srs. Deputados: Em que é que se baseiam verdadeiramente estas alterações legislativas propostas
pelo CDS? Por que razão o CDS propõe, por exemplo, a substituição do modelo dos juízos de pequena, média
e grande instância tributária pelo modelo do juízo tributário comum, de juízo de execução fiscal e de recursos
contraordenacionais? Em que se sustentam estas medidas?
Sr.as e Srs. Deputados: Deixo também uma nota em relação ao projeto de lei n.º 788/XIII (3.ª). O CDS propõe
aqui a criação de um novo capítulo sobre a gestão dos tribunais administrativos e fiscais e não se percebe, se
por lapso ou por já corresponder a uma certa tentativa de concretização de um anseio vertido nos acordos para
o sistema de justiça, que falem em objetivos processuais de comarca.
Ora, todos sabemos que as comarcas só existem na jurisdição comum, mas também sabemos que uma das
propostas constantes dos acordos para o sistema de justiça é a unificação da jurisdição comum com a jurisdição
administrativa e fiscal, criando uma ordem única de tribunais. Era importante também perceber qual é posição
do CDS-PP em relação a esta matéria e se concorda com a fusão entre estas duas jurisdições, administrativa e
fiscal.
Por fim, Sr.as e Srs. Deputados, é importante levantar algumas questões sobre as propostas do CDS relativas
à arbitragem administrativa e fiscal. Como sabemos, a arbitragem é muito complexa e delicada, em especial no
direito público, pois, no limite, pode permitir à administração e ao Governo abandonar os tribunais administrativos
e fiscais.
É por isso que estas propostas enfrentam desde logo, em nosso entender, um grande dilema: como
podemos, por um lado, pretender melhorar as condições dos tribunais administrativos e fiscais e dotá-los de
melhores meios e, ao mesmo tempo, incentivar a arbitragem administrativa ou tributária?
O CDS parece que privilegia a via da arbitragem. Não estará a desistir o CDS de conceder todos os meios
necessários para que os tribunais administrativos e fiscais possam efetivamente funcionar de forma plena, célere
e eficaz? A prioridade do CDS-PP não estará invertida?
A nosso ver, parece-nos que a prioridade deve ser sempre a de dotar os tribunais administrativos e fiscais
das melhores condições para que possam desenvolver a sua atividade. Eventualmente, como alternativa, pode
haver situações que possam ser remetidas à arbitragem, mas a prioridade deve ser sempre a de dar as melhores
condições para os tribunais administrativos e fiscais.
Deixo ainda uma nota final quanto à proposta do CDS de os magistrados jubilados poderem exercer funções
de árbitro em matéria tributária. Dada a falta de magistrados nos tribunais tributários, não seria mais relevante
que esses magistrados, se quisessem continuar a trabalhar, pudessem fazê-lo única e exclusivamente no sítio
em que realmente são precisos, ou seja, nos tribunais administrativos e fiscais e não na arbitragem?
Sr.as e Srs. Deputados, para concluir, o debate de ideias é fundamental sobretudo em matéria de justiça
administrativa e fiscal. Todos os contributos para uma justiça melhor são importantes e válidos, mas permitam-
nos referir que mais importante do que saber se as medidas do CDS-PP são ou não sexy para o PSD é saber
se são verdadeiramente eficazes e aptas para combater os reais problemas da justiça administrativa e fiscal em
Portugal.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe
Neto Brandão.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: «Quando eu nasci, as frases que
hão de salvar a humanidade já estavam todas escritas, só faltava uma coisa: salvar a humanidade». Almada
Negreiros, malgrado a natureza multifacetada da sua genialidade, consabidamente não era jurista. Dificilmente,
porém, outras palavras que não as suas poderiam caracterizar melhor uma perplexidade generalizadamente
instalada perante a sucessão de pactos, acordos, relatórios, diagnósticos ou outras reflexões que sobre a justiça
se vêm debruçando, quando cotejados com os seus resultados, persistindo a imagem de uma crise da justiça
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que, atenta a sua natureza estruturante do Estado de direito, não pode deixar de ter reflexos na qualidade da
nossa democracia.
É certo que não pode nem deve ser escamoteada a circunstância de, nestas quatro décadas, o nosso sistema
de justiça ter logrado atravessar com assinalável sucesso várias etapas, desde logo aquela que, como muitos
autores delimitam, se desenvolveu entre 1974 e 1976 e que correspondeu ao desenho das linhas de rotura —
e também de continuidade — com o sistema de justiça herdado do Estado Novo.
A essa, uma outra, balizada entre 1976 e 1987, subsequente à aprovação da Constituição, caracterizou-se
pela concretização dos princípios constitucionais e, de algum modo, se pode dizer que correspondeu à
construção do edifício jurídico do nosso sistema de justiça.
Daí, até ao início da década de 2000, sucederam-se permanentes ajustamentos incrementais que
procederam à consolidação daquele edifício, na sequência, aliás, da revisão constitucional de 1997.
Temos, porém, hoje, uma geração de portugueses — aos quais estará, nas próximas eleições legislativas,
pela primeira vez, aberta a possibilidade de exercer o seu direito de voto — que formaram a sua consciência
cívica integralmente num período que pode ser designado, e é-o amiúde, de crise da justiça. Um clima
generalizado de deceção, fundada ou não, com o sistema, em que a perceção pública é a de que a justiça
responde mal, ou deficientemente, às solicitações, clima entretanto acompanhado pela emergência de uma
opinião pública alimentada por casos mediáticos
A verdade é que, nestas quase duas décadas, ao coro de vozes qualificadas que protestam a necessidade
da construção de um compromisso, se tem sobreposto amiúde um imediatismo e resistências várias que
invariavelmente fizeram soçobrar os entendimentos que efemeramente se lograram alcançar ou propalar.
Ora, há apenas mês e meio, o Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, por inerência presidente do
órgão de gestão da magistratura judicial, teve a oportunidade de se pronunciar, na cerimónia de abertura do ano
judicial, sobre o documento recentemente construído pelos diversos agentes da justiça, elaborado em resposta
à convocatória que o Presidente da República, um ano antes, lhes dirigira. Exortando à necessidade de uma
resposta política que se impõe às questões de política suscitadas por tal documento, teve, porém, a sageza de,
ao mesmo tempo que invocou a necessidade dessa intervenção, ter alertado para a imprescindibilidade de,
sobre esse mesmo documento, ser feito um prévio olhar sobre o seu conjunto, que permita, e cito, vislumbrar
para «além das ideias avulsas ou de sugestões pragmáticas que nascem da circunstância e na circunstância
têm de ser resolvidas».
Por outras palavras, avisou aquele prestigiado jurista que seria um erro procurar retirar de uma leitura
atomística do acordo sobre questões de justiça um qualquer conjunto de propostas para as transformar em
propostas de lei, entrando os agentes políticos numa espécie de compita para ver qual deles faz suas mais
propostas ou qual deles as faz mais celeremente.
Preferiu o CDS ignorar tais avisados conselhos, optando por uma tentativa de marcação de agenda numa
área onde recentes alterações de protagonistas no principal partido da oposição poderiam, na sua ótica, abrir-
lhe espaço de manobra.
É certo que não nos envolveremos nesse campeonato da direita parlamentar. Pela nossa parte, reafirmamos
a nossa concordância com a necessidade de, previamente a quaisquer soluções legislativas, procedermos a
uma análise cuidada e ponderada, que permita dar a todas as propostas uma coerência intra-sistémica.
É por isso que o Partido Socialista requereu já a audição parlamentar de todos os agentes subscritores dos
acordos para o sistema de justiça e, bem assim, dos órgãos de gestão das magistraturas e da titular da pasta
governamental da justiça para, no final dessas audições, podermos convergir num conjunto coerente de
propostas que permitam, não a satisfação de quaisquer egos partidários mas, sim, a melhoria do nosso sistema
de justiça. Esse, sim, é um propósito que professamos e que o povo português certamente corroborará.
Para tal, importa não ceder a quaisquer pulsões populistas nem assumir como ponto de partida uma perceção
inquinada por processos que não representem, em si, o sistema e que, em rigor, contribuem apenas para
alimentar discursos fáceis mas que em nada ajudam para a construção das respostas que se impõem.
Há reformas que, seguramente, se imporão, mas não é menos verdade que para o sucesso da sua
implementação há que partir, não de erróneas perceções, que «não mudam nunca, mesmo quando confrontadas
com a evidência» — para novamente citarmos o Conselheiro Henriques Gaspar — mas, sim, do retrato que
resulta do conjunto dos relatórios de todas as comarcas e que, nas palavras do primeiro responsável do
Conselho Superior da Magistratura, revelam, e cito, «bons resultados em todos os indicadores de desempenho:
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na taxa de resolução, na taxa de recuperação, nos índices de descongestionamento e no tempo médio de
agendamento e decisão».
É justo dizer que tais resultados se deverão, em primeira linha, à generalidade dos juízes e funcionários
judiciais e demais agentes da justiça, que, muitas vezes em sobre-esforço, vêm dando o melhor de si para tal.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: De algumas das propostas hoje apresentadas parece poder retirar-
se a ideia de que a prossecução de um caminho de supressão da possibilidade de recursos nos conduzirá a
uma justiça mais célere e, por isso, mais eficaz. A experiência deveria, porém, levar-nos a reponderar a valia de
um tal entendimento.
É, nomeadamente, hoje indisfarçável que a criação sucessiva, nos últimos anos, de mecanismos de filtragem
do recurso para os nossos tribunais superiores tem transferido, quiçá demasiadas vezes, para os tribunais de
segunda instância a função de última instância.
Teremos, em consciência, de nos interrogar sobre o acerto da prossecução desse caminho. Teremos, aliás,
em bom rigor, de saber responder, enquanto legislador, ao repto daqueles — como é o caso do Presidente do
Supremo Tribunal de Justiça — que, repetidas vezes, vêm alertando em intervenções públicas para a
necessidade de se repensar o regime dos recursos, profundamente modificado a partir da segunda metade da
década de 2000.
Não precisaria aqui sequer evocar a perplexidade nacional — e internacional, já agora — a propósito da
infeliz fundamentação de um aresto que recentemente ocupou o espaço mediático, senão para recordar a
constatação, que acompanhou o seu público conhecimento, de ser o mesmo insuscetível de recurso, dando
assim razão aos que, desassombradamente, tinham já vindo sugerir que o legislador teria ido longe demais na
limitação do direito ao recurso.
A constatação, expressa pelo Presidente do próprio, de que o nosso Supremo Tribunal está hoje, mercê de
alterações legislativas sucessivas, afastado da possibilidade de intervir e decidir em matérias onde possa estar
em causa o respeito por direitos fundamentais, é algo que só pode instar-nos à revisitação desse regime.
Do mesmo modo, não poderemos ignorar que propostas de transformação da competência dos julgados de
paz, conferindo-lhes competência exclusiva onde hoje a têm alternativa, além de lhes transmutar a sua natureza
de meios de resolução alternativa de litígios e, com isso, os fazer integrar na área de competência e
especialização dos tribunais judiciais, prevista no artigo 211.º da Constituição — onde aqueles, manifestamente,
hoje se não integram —, poderia conduzir também, eventualmente, à colocação em crise de legitimidade
constitucional do seu órgão de gestão, o Conselho dos Julgados de Paz, separado que está do Conselho
Superior da Magistratura, a quem constitucionalmente incumbe a gestão do corpo único de magistrados judiciais.
Também sobre propostas que alegadamente procurariam imprimir celeridade através da subtração de litígios
aos tribunais estaduais, fazendo-os transferir ope legis para tribunais arbitrais, ou seja, transferindo processos
da jurisdição pública para a jurisdição privada, convirá não esquecer o que o Tribunal Constitucional sobre essa
matéria já sentenciou, nomeadamente quando fez recordar que «ainda que os tribunais arbitrais constituam uma
categoria de tribunais e exerçam a função jurisdicional, não pode perder-se de vista que essa é uma forma de
jurisdição privada (...). Ora, o direito fundamental de acesso aos tribunais constitui tendencialmente uma garantia
de acesso a tribunais estaduais em resultado da necessária conexão entre esse direito e a reserva de jurisdição,
que apenas poderá caracterizar uma reserva de jurisdição arbitral quando o acesso ao tribunal arbitral seja livre
e voluntário». Impor essa jurisdição a qualquer uma das partes, abandonando o seu caráter voluntário, seria,
assim, colocar a norma que tal previsse sob o risco de declaração de inconstitucionalidade.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estas observações são apenas algumas das que nos recomendam
maior ponderação sobre várias das propostas hoje apresentadas. A audição — já aprazada nesta Casa — dos
agentes da justiça servirá seguramente para o sucesso dessa ponderação.
Pela nossa parte, estaremos disponíveis para, procurando obter junto dos demais agentes políticos os
consensos necessários, contribuir para o reforço do prestígio da justiça e, com isso, o reforço do Estado de
direito democrático.
Porque hoje, como sempre, o principal desafio continua a ser o da democratização do sistema de justiça,
entendido na sua tríplice vertente de prestação de serviço público de justiça, proteção dos direitos, liberdades e
garantias e políticas constituintes do poder judicial, instituir mecanismos eficazes de prestação de contas e
escrutínio será aqui, como em todas as demais políticas públicas, essencial.
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Estou certo que, na diversidade dos nossos pontos de vista, todos saberemos estar à altura do que o País
espera de nós.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos
Peixoto.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Cumprimento, de forma particular, o
CDS e a Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva pelas iniciativas que nos trouxeram, mas sobre elas, ou sobre uma
parte delas, já lá iremos, porque nisso acompanhamos muito do que já aqui foi referido, diria que o mérito das
iniciativas não é uniforme.
Antes disso, queria começar por dizer o que me parece óbvio e que todos os portugueses sentem: a imagem
pública do sistema de justiça está desgastada e toda a gente reconhece o papel central na democracia, na paz
social, no crescimento e na competitividade do País deste sistema de justiça.
Talvez por isso os líderes dos dois partidos com maior representação parlamentar, o PSD e o PS, tentaram,
há uns anos, construir um pacto da justiça. Era assim que se chamava. Na altura, apesar de bem-intencionado,
esse pacto não logrou ter o resultado desejado.
O que na altura se pretendia era atribuir estabilidade e longevidade ao sistema e colocá-lo acima das querelas
partidárias e até do tempo de duração de uma Legislatura.
Isso, como se disse, não vingou e os partidos, à época, conjunturalmente, não estavam à altura de assumir
essa responsabilidade.
Por isso, outro caminho tem de ser trilhado e penso que chegou a hora, ou pode ter chegado a hora. Não se
trata de ser «docinho», como ontem alguém dizia, ou ser «azedo», como hoje posso dizer, com o Governo.
Trata-se de encarar os assuntos da justiça e o País com a elevação e a dignidade que eles têm.
Já aqui foi dito que o Presidente da República já deu o mote para esta discussão e foi por causa do desafio
que fez, interpelando várias entidades, que se estabeleceu o chamado «acordo para o sistema de justiça». Era
bom que pegássemos neste embrião e conseguíssemos todos — repito, todos os grupos parlamentares, não só
um, esporadicamente ou com um fogacho qualquer, com maiores ou menores iniciativas legislativas —
estabelecer um plano nacional para a justiça. Esta primeira premissa está cumprida.
Se os agentes do setor — e falo dos advogados, dos magistrados e dos funcionários judiciais — chegaram
a acordo relativamente a determinadas matérias, há lá alguma razão percetível para que quem está de fora do
setor, embora tenha o poder legislativo, não chegue também a um acordo? Ninguém entende isso, lá fora, fora
desta Casa. E isto independentemente das questões de forma ou das questões de conteúdo.
Há pouco, alguém disse — penso que foi o Sr. Deputado António Filipe —, em relação às iniciativas do CDS,
que, no conteúdo, as coisas até estavam a correr bem mas que a forma não tinha sido propriamente a mais
feliz. Posso concordar com isso, mas será que uma questão de forma consegue comprometer algo que é
substancial para a competitividade e a solidez de um sistema de justiça do País? Não acredito que continuemos
nesta querela partidária e estejamos amarrados, aprisionados a ela para sempre. Não acredito nisso e acho que
temos a obrigação de conseguir fazer melhor.
Bem sei, Sr.as e Srs. Deputados, que todos estaríamos mais tranquilos se o Governo exibisse uma
capacidade de reformar que não exibe, bem pelo contrário, tem personificado a antítese do que se pretende. E
acreditem que a lógica não é estar aqui a falar do passado, não é apontar o dedo nem responsabilizar ninguém.
O passa-culpas não resolve nada, até porque quem fala do passado não sabe o que fazer com o futuro. Não
sabe! Mas não é essa a lógica, eu só quero falar do presente. E no presente, Srs. Deputados, não há memória
de se ter visto um clima de crispação tão grande no setor da justiça. Não há essa memória e isso é uma
evidência. Nesta matéria, o Governo está mais ou menos em ponto morto, numa letargia aflitiva. Se isto fosse
um jogo de futebol, acho que o Governo, que já tem dois anos de mandato, não teria passado, na primeira parte,
nem sequer do meio-campo. Estamos assim, não chegámos sequer a meio do jogo.
Por isso, talvez, o líder do PCP disse há dias, penso que esta semana: «Quando não se sabe o que se faz
ou o que se deve fazer constitui-se um grupo de trabalho ou uma comissão».
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O que é que o Governo tem feito? Criou um grupo de trabalho para o Estatuto dos Magistrados Judiciais,
outro grupo de trabalho para o Estatuto do Ministério Público, outro grupo de trabalho para avaliação do
Regulamento da CPAS (Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores), outro grupo de trabalho para o
apoio judiciário e custas processuais, outro grupo de trabalho para a reforma da administração fiscal, etc. Ou
seja, está tão cheio de grupos de trabalho como de descontentamento dos agentes do setor! São os
magistrados, os advogados, os guardas-prisionais, os oficiais de justiça, os oficiais de registo e notariado, todos
eles contestam a ação, quando ela existe, ou, especialmente, contestam a inação, que existe quase sempre,
deste Governo.
Isto é assim com o Estatuto dos Magistrados Judiciais, que há muito tempo está prometido mas que ainda
não viu a luz do dia. Conclusão: ameaças sucessivas de greve. Com o Ministério Público é exatamente a mesma
coisa, e quanto aos advogados o Regulamento da CPAS continua a marinar, sem fim à vista. Conclusão:
manifestação de 4000 advogados no Terreiro do Paço.
Protestos do PS.
Isto é muito sério, Srs. Deputados!
Quanto aos guardas-prisionais, o relacionamento com os guardas-prisionais está como nunca esteve: a ferro
e fogo! Horas extraordinárias a mais; processos disciplinares «em barda»; reclusos com horas de visitas a
menos. Conclusão: greve já consumada.
Quanto ao Estatuto dos Funcionários Judiciais, havia a promessa de que entraria em vigor já em janeiro de
2018. Estamos em março e ainda não entrou. Conclusão: espera-se mais uma ameaça de greve.
Quanto ao apoio judiciário e custas processuais, o grupo de trabalho existe desde novembro de 2016. Mal o
Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados veio falar do preço das custas judiciais o Governo fraquejou, paralisou
e não conseguiu fazer literalmente mais nada sobre esta matéria, que é tão relevante que está nos acórdãos da
justiça.
Quanto à justiça administrativa e fiscal, o grupo de trabalho foi constituído em outubro de 2016, com
apresentação de propostas em 2017 e ainda nenhum de nós as conhece.
Quanto a inventários e partilhas, o Ministério da Justiça prometeu uma avaliação, que estaria concluída em
abril ou maio de 2017. Conclusão: já lá vai quase um ano e nada!
Sr.as e Srs. Deputados, por que é que estou a ocupar tanto tempo com isto?
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Ora aí está uma boa pergunta!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Porque a modernização e a evolução do setor parece não se bastarem com
os esforços individuais deste Governo. Nem deste Governo nem de nenhum partido individualmente!
Portanto, louvando-se aqui a iniciativa do CDS, temos a sensação clara de que temos de olhar para esta
matéria de forma muito mais abrangente, fazendo os tais pactos de regime. E nós sabemos as matérias para as
quais convocamos todos os partidos, todos os grupos parlamentares.
Srs. Deputados, acreditem: o CDS resolveu lançar estas iniciativas numa altura em que o PSD estava, se
quisermos, em reconstrução, estava num período de transição. Fez bem, aproveitou o momento, quis explorar
o momento. Mas acho que o PSD quer, com todos — com todos! —, explorar o tempo. Nós queremos marcar o
tempo, o tempo com a noção que nós temos dele, como algo que é perene, que é estável, que perdura, que
marca, que fica.
E neste caso acho que é importante percebermos o que é que todos pensam sobre o modelo da avaliação,
formação e seleção de magistrados, sobre os modelos de constituição e eleição dos Conselhos Superiores da
Magistratura e do Ministério Público, sobre a revisitação do mapa judiciário, sobre a justiça de proximidade e os
tribunais municipais, sobre uma nova revisão da ação executiva, sobre a reforma do processo penal e a eventual
extinção da fase de instrução, sobre a reforma do processo civil e a eventual extinção, ou não, da audiência
prévia, sobre a simplificação do Código do Procedimento Administrativo e do Código de Procedimento e de
Processo Tributário. E, mais do que isso, sobre uma abordagem que ainda ninguém fez, mas que acho que é
altura de fazer, sobre a violação do segredo de justiça, no sentido de se saber se deve ser descriminalizada,
como acontece no Reino Unido, ou se, em vez disso, devemos ter uma moldura penal ainda mais pesada, por
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forma a que sejam permitidas escutas na investigação dos crimes de violação do segredo de justiça, coisa que
hoje não acontece.
Sr.as e Srs. Deputados, termino dizendo isto: as iniciativas do CDS são louváveis. Isto, independentemente
de criticarmos ou não criticarmos aquilo que até o CDS já criticou. De facto, o líder parlamentar do CDS disse,
há dias, numa Conferência de Líderes que não devíamos discutir matérias estruturantes sem que,
simultaneamente, estivéssemos habilitados com notas técnicas dos serviços, com relatórios e com os pareceres
institucionais. Ora, isso é o que verdadeiramente estamos aqui a fazer e não temos cá nada disso. Mas também
já vi o Partido Socialista, e não só, fazer exatamente a mesma coisa.
Mais do que isso, este debate é importante — e continuo a frisá-lo — porque coloca o sistema de justiça
como uma prioridade nacional de entre aquelas que são as preocupações, penso, de todos os partidos
representados nesta Câmara.
Mas há algo com que não concordamos, algo que não acompanhamos. A Sr.ª Deputada Vânia Dias da Silva,
quando falou da reforma do processo civil, disse que uma das medidas que o CDS iria propor era introduzir
como regime-regra o depoimento por escrito e que só seria regime-exceção o depoimento presencial no tribunal,
quando o juiz o admitisse — não é quando as partes, é quando o juiz o admitisse.
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — As partes!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Mas não é isso que lá está, Sr.ª Deputada. O que lá está é quando o juiz o
admitisse. Seja lá como for.
Sr.ª Deputada, para quem anda há muitos anos nos tribunais a fazer julgamentos, esta proposta —
percebendo eu o seu mérito, porque joga bem com a questão da celeridade processual — arrepia o princípio da
oralidade e da imediação das provas.
Se fosse apenas uma questão de trocar palavras, ditas pela boca das pessoas, por letras, que estão inscritas
num depoimento, a coisa era fácil. Só que — sabe uma coisa? — os juízes olham para uma pessoa e percebem
se o que ela diz corresponde à verdade ou não com os movimentos corporais, com os gestos, com o tempo de
demora das respostas, enfim, com uma série de fatores que superam claramente aquilo que é inerte e que
resulta passivamente de um papel escrito.
Por isso, o que achamos é que devemos, todos nós, ponderar muito bem estas matérias. No âmbito do
acordo de justiça, que estamos já a discutir na 1.ª Comissão ou noutra sede qualquer, o PSD convoca, convida
todos os grupos parlamentares para apresentar, estudar e debater um verdadeiro plano nacional para a justiça,
em Portugal.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado
Fernando Anastácio.
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Peixoto, eu tinha algumas perguntas
para lhe fazer, mas o Sr. Deputado só tem 10 segundos para responder. Eu sei que é pouco tempo, mas, de
qualquer maneira, eu nunca faria o aproveitamento de uma situação, neste momento, de «reconstrução» do
PSD, para lhe colocar as dificuldades que os seus parceiros do CDS lhe colocaram.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Não há nenhuma dificuldade!
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Da parte do PS, não vai ter essa crítica, esse é um problema entre a
direita — aliás, é uma corrida por quem lidera a direita. Portanto, isso é convosco e nós não nos vamos meter
nisso. Da nossa parte, esteja descansado que não lhe criaremos problemas.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Já têm problemas que cheguem!
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O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Aliás, compreendo, de alguma forma, a dificuldade da sua intervenção
e os múltiplos caminhos que procurou ao longo dela e reconheço que se torna difícil abordar este tema. Não por
não se saber, por vezes — e isto é a resposta à questão que colocou —, o que se deve fazer no futuro, mas
pela dificuldade em falarmos daquilo que fizemos no passado. Aí sim, às vezes, alguns partidos políticos têm
dificuldades em falar daquilo que fizeram no passado, porque o que nos mostra a realidade, aquela realidade
daquele passado recente, não é muito abonatório aos olhos do povo português, particularmente, na justiça e
numa área que até foi tutelada pelo PSD no anterior Governo.
Referiu aqui o Sr. Deputado que nunca se viu tanta conflitualidade. Sinceramente, Sr. Deputado, a memória
não deve ser uma coisa que desapareça assim tão depressa. Por isso, recordo-lhe os últimos tempos do vosso
Governo, da vossa anterior Ministra da Justiça, que terminou o seu mandato em completo corte de relações
institucionais com magistrados judiciais, magistrados do Ministério Público, notários, advogados. Ou seja, uma
conflitualidade como nunca tinha acontecido na história do sistema judiciário português. Por isso, Sr. Deputado,
sobre conflitualidade, estamos conversados.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Exatamente!
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Quanto à questão dos estatutos, como é sabido, a sua revisão está em
curso e brevemente estará em vigor. Teremos, assim, oportunidade de fazer aquilo que os senhores não foram
capazes de fazer durante a vossa Legislatura.
Mas esse vosso discurso tem um grande problema, que é o facto de ele estar deslocado da realidade. E
quando se diz que, na justiça, nada acontece, nada mudou e que não se quer falar do passado, é, por vezes,
porque não queremos falar de alguns números. Ora, escolhi três ou quatro números, que me parecem
importantes, para lhe mostrar claramente a diferença entre o presente de quem faz e o passado de quem não
fez.
Por exemplo, falemos das pendências dos processos, particularmente na ação executiva, que é um tema
que é central para a economia e para a justiça. A pendência nas ações executivas registou uma quebra de 230
000 processos, entre o terceiro trimestre de 2015 e o trimestre homólogo de 2017.
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — É verdade!
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Esta é a diferença entre quem sabe o que está a fazer e quem não
soube o que tinha de fazer.
A pendência na insolvência, no mesmo período, teve uma quebra de 33%. São números objetivos.
No quadro global, nestas áreas, o ano de 2017 deverá terminar com cerca de menos 300 000 pendências
em relação a 2015. Sr. Deputado, isto é a realidade!
Mas se também quer falar das questões prisionais, também podemos fazê-lo. E podemos falar,
particularmente, do número de reclusos, que reduziu por força de um conjunto de medidas aprovadas por este
Governo. Assim, relativamente a finais de 2015, temos, neste momento, menos 767 presos, sendo que a
população prisional reduziu a sua ocupação de 111,9% para 103%. Estes são números objetivos.
Já se falou hoje, nesta Câmara, do número de magistrados. Vou repetir, porque este é um número que deve
ser repetido: entre 2012 e 2015, no Governo PSD/CDS, entraram 169 novos magistrados; entre 2016 e 2018,
no atual Governo, entraram 380 novos magistrados.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — E quantos saíram?!
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr. Deputado, também do ponto de vista dos funcionários judiciais,
entraram 400 novos oficiais de justiça. E, mais do que isso tudo, Sr. Deputado, reabrimos os tribunais que os
senhores fecharam. Esta é a diferença.
Sr. Deputado, queria terminar precisamente com uma pergunta e, se não puder responder nos 10 segundos
de que dispõe, poderá fazê-lo mais tarde, quando tivermos o debate sobre estes temas.
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Sr. Deputado, o Grupo Parlamentar do PSD quer vir para este debate de uma forma séria, aquela que está
prevista e que votámos por unanimidade na 1.ª Comissão, para a audição, já marcada, de quem subscreveu o
pacto para a justiça, isto é, dos Conselhos Superiores, e, na sequência desse debate, avançar com as suas
propostas, discutir e construir uma solução, ou quer continuar a seguir aquele caminho da competição pela
liderança da direita, por uma política que todos nós já percebemos que é aquela que está completamente
desfasada do povo português?
Deixo-lhe esta pergunta e este desafio.
Aplausos do PS.
Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Ferro Rodrigues.
O Sr. Presidente: — Para responder, em muito pouco tempo, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Peixoto.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, de forma muito telegráfica, queria apenas lembrar ao Sr.
Deputado Fernando Anastácio de que todos aqueles números de que ele falou como sendo números positivos,
embora relativamente truncados, provêm de reformas, de contratações e de abertura de concursos, feitas
durante a vigência do Governo PSD/CDS-PP. Foi esse o pormenor de que se esqueceu.
Por último, queria dizer-lhe que nós não estamos aqui em nenhuma competição com o CDS-PP, que, aliás,
é um partido que tem caminhado sempre ao nosso lado durante muitos e muitos anos.
Estamos apenas em competição por uma missão muito superior a essa, que é a de colocar o sistema de
justiça no centro do debate político. E o que nos interessa verdadeiramente é a competição pelo País, por
Portugal.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Susana Amador, do Grupo
Parlamentar do PS.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por saudar o CDS por trazer
a matéria da justiça a debate, um valor estruturante para um Estado de direito democrático como o nosso.
Porém, não podemos deixar de refrescar a memória relativamente àquilo que têm sido as prioridades certas
deste Governo e àquilo que tem sido feito na área da justiça.
Na verdade, depois de termos assistido durante quatro anos e meio a um tsunami de alterações legislativas,
muitas vezes em massa e não estudadas, numa redução sem precedentes do capital humano e do investimento
neste setor, vivemos hoje um tempo de prudência legislativa, mas também já de eficácia de reformas, como a
reforma das penas curtas, e também de reforço dos agentes judiciários, de meios humanos e de reforço
orçamental.
Devo recordar que já entraram 400 oficiais de justiça para o sistema e abriram também mais de 60% de
vagas, de que já aqui falámos, no que diz respeito ao Centro de Estudos Judiciários.
Uma nota final para referir a importância, que foi desvalorizada, no que diz respeito à modernização da
justiça, do Plano de Ação Justiça+Próxima.
Dr.ª Vânia Dias da Silva, Cara Deputada, são 52, sim, as medidas já concluídas e há um grande trabalho
feito com as secretarias e a sua reorganização, com os balcões únicos, a simplificação da linguagem nas
comunicações, a notificação eletrónica a mandatários, as certidões por via eletrónica, os mais de 33 000
certificados de registo criminal online, em 2017, uma desmaterialização crescente dos processos e outras
medidas em implementação, que nos permitem dizer que estamos a assistir, sim, a uma revolução tranquila,
que potencia a celeridade, favorece a aproximação e promove a transparência e a inovação.
Estou certa de que o CDS e o PSD reconhecem todo este percurso, toda esta revolução e todos estes
resultados, que não podem ser travados e, sobretudo, não podem ser interrompidos.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe que termine.
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A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sim, Sr. Presidente.
O mal foi que esta agenda de modernização foi travada durante quatro anos e meio e estas agendas são
suprapartidárias e têm de estar para além da Legislatura.
A nossa luta continuará a ser a luta pelo direito e, sobretudo, por uma justiça ao serviço da cidadania e do
desenvolvimento, ouvindo todos os agentes dos acordos para a justiça, como pedimos na 1.ª Comissão.
O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Será esse o nosso caminho, o de saber ouvir com humildade democrática
para construir uma justiça para todos e com todos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para terminar o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia, do Grupo
Parlamentar do CDS-PP.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No encerramento do debate sobre
as nossas propostas para a justiça, cumpre dizer, em primeiro lugar, que o CDS veio aqui, como se viu, com um
objetivo e um método.
O objetivo é o compromisso assumido — não agora, nem há um mês, nem há seis meses, mas há dois anos
— de termos propostas, ideias e soluções para melhorar a justiça em Portugal. Repito, melhorar a justiça em
Portugal e não revolucionar nem reformar tudo.
Para esse objetivo, escolhemos um método e, já agora, permitam-me que vos diga que o nosso método foi
sendo feito ao longo do tempo. Ouvimos a Academia, ouvimos professores, ouvimos profissionais do direito,
ouvimos profissionais do foro, juntámos as nossas equipas, trabalhámos e foi por isso que chegámos aqui com
12 propostas diferentes para várias áreas da justiça.
Aplausos do CDS-PP.
Escolhemos apresentar propostas amplas. Poderíamos ter escolhido uma ou duas questões concretas, mas
não fomos por aí. Escolhemos apresentar propostas no âmbito do Código Civil, do Código de Processo Civil, do
Direito Administrativo, dos tribunais fiscais, do processo penal, do Código Penal, dos julgados de paz e até da
situação nas prisões. Escolhemos amplitude nas nossas propostas com um pressuposto que, penso, esta
Câmara percebeu: não o de fazer grandes afirmações proclamatórias ou o de escolher grandes temas da agenda
mediática, mas, sim, o de mudar a justiça escolhendo, muitas vezes, pequenas soluções, pequenas resoluções,
pequenas mudanças e, ao mudar a justiça, mudar a vida das pessoas.
Fizemo-lo de uma forma cautelosa, até porque naquilo em que achamos que é preciso refletir, que é preciso
estudar e ir mais longe, propomos, por exemplo, que seja criada, com a colaboração do Governo, uma comissão
que faça algumas destas reformas importantes. Fomos, aí, cautelosos e até humildes no nosso pressuposto.
Como crítica, o que é que ouvimos? Bem, a crítica principal que ouvimos foi a de termos sido os primeiros e
é extraordinário que seja essa a crítica principal. Incomoda que o CDS tenha sido o primeiro, incomoda que o
CDS tenha apresentado propostas, mas, enfim, que culpa temos nós disso, Srs. Deputados? Nós fizemos o
nosso trabalho de casa e chegámos aqui com as nossas propostas.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Não fizeram, não!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Tínhamos um compromisso, que era o de tomar a ação, o de tomar a
iniciativa e apresentar propostas. Não tencionamos, nem agora nem nunca, pedir autorização a alguém, muito
menos a qualquer outra bancada que aqui esteja.
Aplausos do CDS-PP.
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É extraordinário que essa seja a grande crítica àquilo que aqui fizemos. Enfim, e veio de todo o lado…
Sr. Deputado Carlos Peixoto, peço-lhe que compreenda que nós até achávamos que a reconstrução do PSD
já tinha terminado, mas isso é só um pequeno detalhe.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Foi na semana passada!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Nós escolhemos a nossa agenda, escolhemos o nosso timing, fazemos
as nossas propostas e, se alguém quiser assumir que há uma competição, então, diremos: «Não queremos
ganhar a competição do centro-direita ou da direita, queremos ganhar a competição. Queremos ser os primeiros
e queremos ter as melhores propostas, as mais pensadas e mais estruturadas!». É esse o nosso objetivo e
pensamos que, desse ponto de vista, numa matéria que deve ser de diálogo e de convergência — estamos de
acordo quanto a isso! —, é bom que todas as outras propostas venham a debate, é bom que elas apareçam,
mas até agora ainda não sabemos quais são.
O que ninguém foi capaz de dizer neste debate — não ouvimos ninguém dizê-lo e isso é sinal de que, em
alguma medida, estamos a ganhar a competição — foi que as nossas propostas não são pensadas, não são
estudadas, não têm mérito, não são sólidas ou não são consistentes.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Fernando Rocha Andrade (PS): — Por acaso, eu disse!
O Sr. Filipe Neto Brandão (PS): — Pois disse!
O Sr. Fernando Rocha Andrade (PS): — Eu disse e não obtive resposta!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O Sr. Deputado Rocha Andrade disse que não concordava com as
propostas, disse que não teve tempo para as ler, mas, se calhar, foi por isso. Leia-as e vai ver que valem a pena,
leia-as e vai ver que fazem todo o sentido.
Aplausos do CDS-PP.
Não queremos que concorde sempre, mas, quando nos diz que temos uma grande amplitude, que temos
muitas coisas, que vamos a muitos temas, que apresentamos temas setoriais em várias áreas, recordo uma
entrevista que li, no passado fim de semana, de um antigo bastonário da Ordem dos Advogados — cuja opinião
prezo, de resto — em que lhe perguntam o que é preciso para a justiça e ele diz: «Mais do que uma grande
reforma, são necessárias atuações concretas em vários setores da justiça», exatamente aquilo que aqui viemos
fazer. E, quando lhe perguntam qual é a prioridade para a justiça, ele responde: «Simplificação», exatamente
aquilo que nós aqui viemos propor.
Portanto, algumas dessas críticas — que também existiram, concedo-vos essa justiça — não são, do nosso
ponto de vista, corretas, mas estamos cá para discutir.
Foram feitas citações e eu cito-vos uma frase muito conhecida do pensador e jurista brasileiro Rui Barbosa:
«A justiça atrasada não é justiça mas, sim, injustiça qualificada». Ou seja, a primeira preocupação é a celeridade.
Estamos, há muito tempo, a discutir a mesma coisa, estamos há muito tempo a discutir por que é que a justiça
demora tanto tempo e, como tal, não é justa mas injusta. Portanto, a celeridade é também a nossa primeira
preocupação.
Nos cafés, em todo o lado, a opinião pública diz que a justiça tem de ser célere, toda a gente fala em
celeridade, mas é preciso perceber que celeridade não é andar nem muito depressa nem muito devagar.
Celeridade é, exatamente, o tempo da justiça, é o tempo certo, o tempo justo, o tempo razoável e para isso
propomos soluções: uma bolsa de magistrados para responder às pendências — disse-nos a Sr.ª Deputada
Vânia Dias da Silva que havia um milhão de processos pendentes no final de 2016, o que é grave e
preocupante;…
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O Sr. Fernando Rocha Andrade (PS): — E quantos eram em 2015?
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … estimular os julgados de paz — foi aqui discordado, mas vamos discutir
e ver se há outro caminho pois, obviamente, ao estimularmos mais arbitragem, ao estimularmos mais meios
alternativos, estaremos a libertar dos tribunais aquilo que pode ser libertado para que a justiça decida melhor e
em tempo mais útil.
Porém, não se trata só de celeridade, porque, mais do que ser célere, é importante que a decisão seja justa,
que seja certa e, aqui, entramos no caminho da eficácia. O que propomos? Assessorias especializadas, técnicos,
ou seja, não se trata de assessores para fazerem o trabalho do juiz mas, antes, para fazerem o trabalho técnico
e para que o juiz possa dedicar-se àquilo que é mais importante para um magistrado, que é a tomada de decisão.
Isto melhoraria a eficácia dos tribunais, como é evidente, e teríamos também requisitos mais exigentes,
designadamente para os árbitros, garantindo essa justiça mais certa e mais justa, bem como — e isso advém
do pacto da justiça — mais meios tecnológicos.
Por outro lado, preocupamo-nos também com as garantias dos cidadãos quando defendemos, por exemplo,
que as penhoras excessivas têm de ser desbloqueadas em 10 dias ou que, em matéria penal, é preciso haver
um equilíbrio entre o que é contraordenacional — que era feito por bagatelas e que, hoje em dia, é muitas vezes
por milhares e milhões — e o que é direito penal, esse sim, e bem, garantístico. É preciso haver esse equilíbrio,
tal como é preciso que o arguido seja ouvido em tempo razoável ou, então, que lhe seja levantado o estatuto de
arguido.
Em matéria de justiça penal, somos cautelosos. Toda a gente diz, toda a gente fala, toda a gente reconhece
que a justiça penal precisa de mudanças e que precisa de uma reforma. O que propomos? Soluções nossas,
casuísticas, feitas em cima de casos concretos ou de notícias mediáticas?! Não! Propomos exatamente o
contrário: uma comissão que envolva o melhor da Academia, que envolva o melhor das ordens profissionais,
que envolva os magistrados, que envolva os conselhos superiores, que estude e reflita sobre a matéria penal,
mas não sem deixarmos de apontar caminhos, dizendo, por exemplo, que o segredo de justiça, questão sobre
a qual todos falam, pode ser revisto, mas é preciso que se diga que, na nossa opinião, ele tem primeiro de ser
protegido enquanto tal e, uma vez violado, tem de ser garantida a igualdade entre as partes;…
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … que o estatuto de colaboração nos processos deve levar a rever o
regime de suspensão do processo; ou, ainda, que, na criminalidade económica e financeira, há tipos criminais
que merecem atenção e revisão, designadamente o crime de infidelidade, tantas vezes usado mas cuja eficácia
não é sempre indiscutível.
Falemos, ainda, em relação àquilo a que eu chamaria «escrutínio da justiça». O que propomos — e tantas
vezes discuti, nesta Sala, com o Deputado Neto Brandão e com outros Deputados o Relatório Anual de
Segurança Interna (RASI) — não é um relatório do Governo mas que os vários relatórios setoriais da justiça,
incluindo o das prisões — que têm 140% de lotação e onde a situação que se vive atualmente é inaceitável —,
sejam subsumidos num grande relatório para que esta Câmara faça, anualmente, o escrutínio sobre as
pendências, o escrutínio sobre o funcionamento, o escrutínio sobre o número de juízes, o escrutínio sobre a
situação das prisões. Esta é a nossa proposta.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe para concluir.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Findo este debate, deixamos na Mesa as nossas propostas para que sejam avaliadas. Esperamos pelas
vossas e limitamo-nos, no fim deste debate, a pedir justiça.
O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Deputado.
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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Pedimos justiça para as nossas propostas, que elas sejam avaliadas pelo
mérito.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, faça favor de concluir.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Demos o primeiro passo, demos um passo em frente.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço também justiça para os tempos.
Chegados ao fim da nossa agenda de hoje, há pequenos anúncios a fazer, segundo diz o Sr. Secretário
Duarte Pacheco, embora, às vezes, não sejam tão pequenos como ele pensaria.
Faça favor, Sr. Secretário.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e
foram admitidos pelo Sr. Presidente, os projetos de lei n.os 790/XIII (3.ª) — Institui a obrigatoriedade e
gratuitidade de emissão do distrate e de declaração de liquidação do empréstimo, elimina comissões cobradas
pelo processamento de prestações de crédito, proibindo ainda as instituições de crédito de alterar
unilateralmente as condições contratuais dos créditos concedidos à habitação (primeira alteração ao Decreto-
Lei n.º 74-A/2017, de 23 de junho) (BE) e 791/XIII (3.ª) — Institui a obrigatoriedade e gratuitidade de emissão
do distrate e de declaração de liquidação do empréstimo, elimina comissões cobradas pelo processamento de
prestações de crédito, proibindo ainda as instituições de crédito de alterar unilateralmente as condições
contratuais dos créditos concedidos ao consumo (quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de junho)
(BE), que baixam à 5.ª Comissão, e a apreciação parlamentar n.º 54/XIII (3.ª) — Relativa ao Decreto-Lei n.º
13/2018, de 26 de fevereiro, que define o regime jurídico da formação médica pós-graduada, designada de
internato médico, e estabelece os princípios gerais a que deve obedecer o respetivo processo (BE).
Deram também entrada na Mesa os projetos de resolução n.os 1364/XIII (3.ª) — Requalificação da Escola
Secundária de Castro Daire (PSD), que baixa à 8.ª Comissão, 1365/XIII (3.ª) — Recomenda a ação do Governo
para garantir a continuação da laboração na antiga Triumph e no grupo Ricon (BE), que baixa à 6.ª Comissão,
1366/XIII (3.ª) — Recomenda a transferência para o património da Região Autónoma da Madeira dos imóveis
anexos ao farol de São Jorge (PSD), que baixa à 3.ª Comissão, e 1367/XIII (3.ª).— Recomenda ao Governo que
promova uma campanha nacional de esterilização de animais de companhia (PAN), que baixa à 7.ª Comissão.
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Secretário Duarte Pacheco.
Srs. Deputados, estamos, pois, em condições de anunciar a agenda da nossa reunião plenária de amanhã,
com início às 10 horas.
Do ponto um consta a reapreciação do Decreto da Assembleia da República n.º 177/XIII (3.ª) — Oitava
alteração à Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal
Constitucional), segunda alteração à Lei Orgânica n.º 2/2003, de 22 de agosto (Lei dos Partidos Políticos), sétima
alteração à Lei n.º 19/2003, de 20 de junho (Lei do Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas
Eleitorais), e primeira alteração à Lei Orgânica n.º 2/2005, de 10 de janeiro (Lei de Organização e Funcionamento
da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos).
De seguida, sem tempos, estão agendadas, no ponto dois, a proposta de resolução n.º 62/XIII (3.ª) — Aprova
a Convenção do Conselho da Europa relativa à Contrafação de Medicamentos e Infrações Semelhantes que
Envolvam Ameaças à Saúde Pública, aberta a assinatura em Moscovo, em 28 de outubro de 2011, e, no ponto
três, o projeto de resolução n.º 1351/XIII (3.ª) — Sexta alteração à Resolução da Assembleia da República n.º
20/2004, de 16 de fevereiro, que aprova a estrutura e competências dos serviços da Assembleia da República
(PSD, PS, BE, CDS-PP, PCP e Os Verdes).
Por fim, teremos votações regimentais no final do debate e, se correr tudo normalmente, penso que serão
antes do meio-dia, sendo bom que as bancadas estejam previamente informadas sobre essa grande
possibilidade.
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Muito obrigado e boa tarde a todos.
Está encerrada a sessão.
Eram 17 horas e 6 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.