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Quinta-feira, 19 de dezembro de 2019 I Série — Número 18

XIV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2019-2020)

REUNIÃOPLENÁRIADE18DEDEZEMBRODE 2019

Presidente: Ex.mo Sr. António Filipe Gaião Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Ana Sofia Ferreira Araújo Ana Cristina Cardoso Dias Mesquita

S U M Á R I O

O Presidente (António Filipe) declarou aberta a sessão às 15 horas e 5 minutos.

Deu-se conta da entrada na Mesa das Propostas de Lei n.os 4 a 6/XIV/1.ª, dos Projetos de Lei n.os 149 a 157 e 165 a168/XIV/1.ª e dos Projetos de Resolução n.os 159, 163, 165,167 e 168/XIV/1.ª.

Em declaração política, a Deputada Diana Ferreira (PCP) chamou a atenção para a necessidade do reforço dos direitos dos trabalhadores, com aumento geral dos salários, quer no setor público quer no privado, e melhoria das condições de trabalho. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Inês de Sousa Real (PAN), Lina Lopes (PSD), António Gameiro (PS), José Luís Ferreira (PEV), José Moura Soeiro (BE) e Cecília Meireles (CDS-PP).

Em declaração política, a Deputada Cecília Meireles (CDS-PP) criticou o Governo pela falta de ambição do Orçamento do Estado para 2020, com aumento da carga fiscal, e considerou haver discordâncias entre o Primeiro-

Ministro e o Ministro das Finanças e Presidente do Eurogrupo. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Duarte Alves (PCP), Fernando Anastácio (PS) e Duarte Pacheco (PSD).

Em declaração política, o Deputado André Silva (PAN) contestou que, no âmbito do Orçamento do Estado para 2020, apenas uma percentagem mínima das transferências do Fundo Ambiental seja para projetos de mitigação e adaptação às alterações climáticas, de recursos hídricos, de conservação da natureza, de tratamento de resíduos e de economia circular. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Nuno Miguel Carvalho (PSD), Nelson Peralta (BE) e João Miguel Nicolau (PS).

Em declaração política, a Deputada Mariana Silva (PEV) lamentou que os países presentes na Conferência do Clima — COP25 não tenham chegado a acordo no sentido de se atingir a neutralidade carbónica até 2050 e defendeu uma mudança de política, tendo, depois, respondido a pedidos de

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esclarecimento dos Deputados André Silva (PAN), José Maria Cardoso (BE), Alma Rivera (PCP), Bruno Coimbra (PSD) e Ricardo Pinheiro (PS).

Em declaração política, o Deputado João Paulo Correia (PS) salientou as prioridades consagradas no Orçamento do Estado para 2020, que considerou contribuírem para a consolidação dos progressos alcançados na anterior Legislatura. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Mariana Mortágua (BE), Afonso Oliveira (PSD), Duarte Alves (PCP) e João Pinho de Almeida (CDS-PP).

Em declaração política, o Deputado Luís Leite Ramos (PSD) fez um balanço do primeiro trimestre do ano letivo, tendo tecido várias críticas à política levada a cabo pelo Governo na área da educação. De seguida, deu resposta a pedidos de esclarecimento dos Deputados Bebiana Cunha (PAN), Ana Rita Bessa (CDS-PP), Ana Mesquita (PCP), Porfírio Silva (PS) e Joana Mortágua (BE).

Em declaração política, a Deputada Isabel Pires (BE) chamou a atenção para a situação das pessoas sem-abrigo, tendo considerado o direito à habitação como básico em termos de direitos humanos e destacado a ação de um vereador do seu partido na prossecução desse objetivo. Respondeu, no fim, a pedidos de esclarecimento dos

Deputados Inês de Sousa Real (PAN), Firmino Marques (PSD), Catarina Marcelino (PS) e Diana Ferreira (PCP).

Em declaração política, ao abrigo do n.º 2 do artigo 71.º do Regimento, o Deputado João Cotrim de Figueiredo (IL) abordou a necessidade de se combater a corrupção no País e anunciou a apresentação, pelo seu partido, de uma proposta no sentido da criação de uma comissão parlamentar eventual para debater o tema, tendo exortado outros Deputados a viabilizarem essa iniciativa. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento da Deputada Cláudia Santos (PS) e João Pinho de Almeida (CDS-PP).

Em declaração política, ao abrigo do n.º 2 do artigo 71.º do Regimento, o Deputado André Ventura (CH) indignou-se relativamente a afirmações acerca da liberdade de expressão na Câmara e à não aplicação da legislação relativa ao combate à corrupção, tendo também tecido diversas críticas ao Orçamento do Estado para 2020. Em seguida, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Inês de Sousa Real (PAN), Pedro Delgado Alves (PS), Cecília Meireles (CDS-PP) e Pedro Filipe Soares (BE), que também interpelou a Mesa sobre a condução dos trabalhos.

O Presidente (Eduardo Ferro Rodrigues) encerrou a sessão eram 18 horas e 47 minutos.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, muito boa tarde.

Vamos dar início aos nossos trabalhos.

Eram 15 horas e 5 minutos.

Peço aos Srs. Agentes da autoridade que abram as galerias.

Srs. Deputados, da nossa ordem do dia de hoje constam declarações políticas.

Antes disso, porém, a Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha vai anunciar a entrada de algumas iniciativas.

Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, muito boa tarde a todas e a todos.

Deram entrada na Mesa, e foram admitidas, várias iniciativas legislativas.

Refiro, em primeiro lugar, as Propostas de Lei n.os 4/XIV/1.ª (GOV) — Aprova as Grandes Opções do Plano

para 2020, que baixa a todas as comissões, sendo competente a 5.ª Comissão, 5/XIV/1.ª (GOV) — Aprova o

Orçamento do Estado para 2020, que baixa a todas as comissões, sendo competente a 5.ª Comissão, e 6/XIV/1.ª

(GOV) — Aprova o Quadro Plurianual de Programação Orçamental para os anos 2020-2023, que baixa a todas

as comissões, sendo competente a 5.ª Comissão.

Deram também entrada na Mesa os Projetos de Lei n.os 149/XIV/1.ª (PCP) — Plano de intervenção para a

construção, requalificação e modernização do edificado escolar, que baixa à 8.ª Comissão, 150/XIV/1.ª (PCP)

— Lei de programação plurianual de investimento para os estabelecimentos do SNS, que baixa à 9.ª Comissão,

151/XIV/1.ª (PCP) — Estabelece o regime para a reposição de freguesias extintas, que baixa à 13.ª Comissão,

152/XIV/1.ª (PCP) — Revoga o regime fundacional e estabelece um modelo de gestão democrática das

instituições públicas de ensino superior (primeira alteração à Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, que estabelece

o regime jurídico das instituições do ensino superior), que baixa à 8.ª Comissão, 153/XIV/1.ª (PCP) —

Financiamento do ensino superior público, que baixa à 8.ª Comissão, 154/XIV/1.ª (PCP) — Aprova a lei-quadro

da ação social escolar no ensino superior e define apoios específicos aos estudantes, que baixa à 8.ª Comissão,

155/XIV/1.ª (PCP) — Cria o plano nacional para a prevenção estrutural dos efeitos da seca e seu

acompanhamento, que baixa à 11.ª Comissão, em conexão com a 7.ª Comissão, 156/XIV/1.ª (PCP) — Faixas

de salvaguarda e regime de Avaliação de Incidências Ambientais (AIncA) de explorações agrícolas em regime

intensivo e superintensivo, que baixa à 7.ª Comissão, em conexão com a 11.ª Comissão, 157/XIV/1.ª (PCP) —

Alteração ao Regime do Arrendamento Apoiado para Habitação, que baixa à 6.ª Comissão, 165/XIV/1.ª (BE) —

Redução da idade da reforma das pessoas com deficiência, que baixa à 10.ª Comissão, 167/XIV/1.ª (BE) —

Isenção de propinas em todos os ciclos de estudos do ensino superior para estudantes com deficiência, que

baixa à 8.ª Comissão, e 168/XIV/1.ª (PEV) — Define o regime e as condições em que a morte medicamente

assistida não é punível, que baixa à 1.ª Comissão, em conexão com a 9.ª Comissão.

Deram ainda entrada na Mesa os Projetos de Resolução n.os 159/XIV/1.ª (PCP) — Estudo de avaliação sobre

as extensas áreas de produção agrícola em regime intensivo e superintensivo, que baixa à 7.ª Comissão,

160/XIV/1.ª (PCP) — Recomenda ao Governo a realização de um programa de emergência para o reforço da

resposta pública ao nível do património cultural e a valorização dos museus, palácios, monumentos e sítios

arqueológicos, que baixa à 12.ª Comissão, 161/XIV/1.ª (PCP) — Potenciar a redução tarifária para uma aposta

estratégica na promoção dos transportes públicos, que baixa à 6.ª Comissão, 162/XIV/1.ª (PCP) — Pela

articulação tarifária e promoção da redução de preços dos transportes nas ligações entre áreas metropolitanas

e comunidades intermunicipais limítrofes, que baixa à 6.ª Comissão, 163/XIV/1.ª (PCP) — Pelo investimento e

pela gestão pública na rede viária fundamental – reinício urgente das obras do IP2 e do IP8 e fim da PPP

rodoviária do Baixo Alentejo, que baixa à 6.ª Comissão, 165/XIV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que

suspenda as obras no Porto de Setúbal até à conclusão de questões ambientais e económicas, que baixa à 6.ª

Comissão, 167/XIV/1.ª (BE) — Recomenda ao Governo que promova medidas de garantia de caudais

verdadeiramente ecológicos no rio Tejo com informação regular às populações, que baixa à 11.ª Comissão, e

168/XIV/1.ª (BE) — Moratória à venda ou cessão de património do Estado em cidades em carência habitacional,

que baixa à 6.ª Comissão.

Terminei, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Muito obrigado, Sr.ª Deputada.

Srs. Deputados, vamos, então, dar início às declarações políticas.

A primeira de hoje é do Partido Comunista Português. Para o efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana

Ferreira.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A valorização do trabalho e dos

trabalhadores é condição essencial para o desenvolvimento do País e para uma sociedade de progresso e de

justiça social.

O dia a dia em muitas empresas e locais de trabalho continua a significar, para centenas de milhares de

trabalhadores, uma realidade de baixos salários, de precariedade, de desregulação de horários, de intensos

ritmos de trabalho, de abuso do trabalho por turnos e da laboração contínua, de sobrecarga de trabalho, de

limitação e impossibilidade de articulação da vida profissional, pessoal e familiar.

A esta realidade quotidiana, que degrada profundamente a vida dos trabalhadores, importa responder com

soluções que signifiquem, efetivamente, a elevação das condições de vida dos trabalhadores, seja no setor

público, seja no setor privado. E a melhoria das condições de vida dos trabalhadores é inseparável do aumento

geral dos salários para todos os trabalhadores e da valorização das profissões e das carreiras, que são uma

questão de emergência nacional. É inaceitável a realidade, que persiste, de centenas de milhares de

trabalhadores que empobrecem trabalhando — há mês a mais e há salário a menos.

É preciso responder às reivindicações já colocadas do aumento geral dos salários, de um aumento de 90 €,

em 2020, para todos os trabalhadores, da fixação de 850 € para o salário mínimo nacional.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — É necessário que os trabalhadores da Administração Pública, após 10 anos

de congelamento de salários, tenham uma resposta que contribua para a reposição do poder de compra,

exigência a que o Governo não responde com propostas de aumento de 2 € ou 3 € mensais para os

trabalhadores, uma proposta que choca e que não valoriza o trabalho que estes trabalhadores desenvolvem

todos os dias nos serviços públicos.

Atualmente, cerca de 56% da riqueza produzida no nosso País está nas mãos de 1% da população

portuguesa. A profunda injustiça na distribuição da riqueza fica evidente com estes números e a valorização

salarial é imprescindível para contrariar esta realidade, para combater as desigualdades e a pobreza, para

garantir dignidade na vida dos trabalhadores, para garantir, de futuro, pensões e reformas mais elevadas.

O aumento geral dos salários para todos os trabalhadores é possível e é necessário: valoriza os

trabalhadores, dinamiza a economia, reforça a segurança social, constrói reformas dignas de futuro para cada

um.

Importa também: garantir as 35 horas para todos os trabalhadores e reforçar os direitos dos trabalhadores

no regime de trabalho noturno e por turnos; fixar e cumprir o horário de trabalho e pôr fim a horários

desregulados, a alterações comunicadas de véspera, a desestabilizações da vida familiar e da saúde dos

trabalhadores; respeitar os tempos de descanso e assegurar e cumprir as respetivas condições de pagamento

e de compensação a quem trabalha por turnos e em horário noturno; revogar os mecanismos de adaptabilidade

e de banco de horas, instrumentos utilizados pelo patronato para aumentar o tempo de trabalho sem encargos

para as entidades patronais.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — É preciso garantir horários dignos e tempo para viver, para os trabalhadores

terem vida pessoal e familiar,…

O Sr. João Dias (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — … e isso exige a limitação do trabalho noturno e por turnos a situações que

sejam técnica e socialmente justificadas, como exige também limitações à laboração contínua.

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É preciso combater efetivamente a precariedade: concluir o PREVPAP (Programa de Regularização

Extraordinária dos Vínculos Precários na Administração Pública) rapidamente e regularizar a situação de todos

os trabalhadores que, tendo vínculos precários, respondem a necessidades permanentes nos serviços da

Administração Pública.

Mas importa também fazer o combate à precariedade de forma firme no setor privado — falsos recibos

verdes, contratos a prazo em abuso, trabalho temporário, outsourcing, estágios profissionais, tudo isto serve

para que, também no setor privado, o patronato, especialmente os grandes grupos económicos, fuja a garantir

direitos aos trabalhadores e possa, assim, substituir trabalhadores com direitos por trabalhadores sem direitos.

A precariedade laboral é um dos traços mais marcantes da situação social do País e da exploração sobre os

trabalhadores. Serão mais de 1 milhão e 200 mil os trabalhadores que, respondendo a necessidades

permanentes, têm um vínculo precário, oscilando repetidamente entre uma situação de instabilidade laboral e o

desemprego.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É uma vergonha!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — É urgente promover a estabilidade do emprego, cumprir e fazer cumprir o

direito ao trabalho e à segurança no emprego, previsto na Constituição, assegurando que a um posto de trabalho

permanente corresponde um vínculo de trabalho efetivo, bem como erradicar todas as formas de precariedade.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A realidade social e laboral vivida pelos trabalhadores atualmente resulta de

opções políticas concretizadas por diferentes Governos do PSD, do CDS e do PS, que, com sucessivas

alterações à legislação laboral, impuseram retrocessos nos direitos dos trabalhadores — facilitaram a

proliferação da precariedade, facilitaram e embarateceram os despedimentos, desregularam horários de

trabalho, reduziram direitos por via da caducidade da contratação coletiva.

Esta é uma realidade à qual é preciso pôr fim.

É preciso avançar nos direitos: revogar as normas gravosas que continuam no Código do Trabalho e na

legislação laboral da Administração Pública, melhorar as condições de trabalho, elevar as condições de vida dos

trabalhadores, o que é inseparável da sua valorização salarial, elemento fundamental para o desenvolvimento

económico do País.

O PCP não faltará a este combate. O compromisso que assumimos com os trabalhadores e com o povo

português tem já tradução num alargado conjunto de iniciativas legislativas que entregámos na Assembleia da

República. Cá estaremos, como sempre temos estado, para dar voz às reivindicações dos trabalhadores, para

defender os seus direitos e para construir, nessa defesa e nessa luta, uma sociedade mais justa, uma sociedade

de justiça social e de progresso social.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada Diana Ferreira, a Mesa regista as inscrições de seis Srs.

Deputados para pedirem esclarecimentos. Como pretende responder?

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Dois a dois, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Então, para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês

de Sousa Real, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, felicitamos o PCP por ter

trazido a debate o tema da precariedade laboral, algo que nos preocupa bastante igualmente.

De facto, o PAN apresentou, na Legislatura passada, diversas iniciativas que visavam combater a

precariedade laboral e garantir uma maior estabilidade no emprego. Temos propostas que foram aprovadas e

cuja aplicação continua ainda por monitorizar, como o reforço da proteção dos trabalhadores em caso de assédio

e medidas de promoção da igualdade remuneratória entre homens e mulheres.

Contudo, apresentámos diversas outras que, apesar da sua importância, continuam a encontrar resistência,

como a garantia do direito à desconexão profissional e medidas que permitam uma maior conciliação da vida

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familiar com a vida profissional, como, por exemplo, o alargamento das licenças parentais, a redução do horário

de trabalho para as 35h para todos os profissionais, o direito a 25 dias úteis de férias e a consagração do

carnaval como feriado obrigatório.

Preocupa-nos também o alargamento do período experimental no âmbito dos contratos de curta duração,

consequência da recente alteração ao Código do Trabalho, porque contraria, desde logo, um caminho que se

tem vindo a fazer de reposição de direitos laborais.

Ainda há muito a fazer para garantir a efetiva qualidade do emprego, que passa por uma aposta na formação

profissional dos trabalhadores, no pagamento de salários dignos e na erradicação de todas as formas de

precariedade laboral.

É fundamental limitar os critérios do recurso ao trabalho temporário pelo efeito negativo que tem na qualidade

do emprego, reforçar os direitos da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), garantir também os

direitos dos trabalhadores em regime noturno por turnos e garantir o número de efetivos nas entidades

fiscalizadoras, assegurando, assim, uma intervenção mais eficaz que impeça o recurso à contratação de

trabalhadores com vínculo precário para o desempenho de funções permanentes.

Para além disso, é essencial criar ambientes laborais mais saudáveis, com uma aposta clara na saúde mental

dos trabalhadores e adotar medidas que promovam a igualdade, tendo em conta a necessária melhoria da

empregabilidade dos imigrantes, bem como das pessoas com deficiência, as quais são ainda confrontadas com

muitos entraves no acesso ao mercado de trabalho e ao usufruto dos seus direitos no dia a dia.

Acresce que estamos perante aquilo que é a discussão de um novo Orçamento do Estado, sendo

fundamental repor direitos também na Administração Pública, que, neste momento, tem um crédito perante

todos nós.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Termino já, Sr. Presidente.

Posto isto, o que gostaríamos de saber é se o PCP acompanha, de facto, estas preocupações e se está

disposto a lutar ao lado PAN, também, para alcançar estes direitos.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Lina

Lopes, do PSD.

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, todos nós,

nesta Assembleia, temos conhecimento das posições e reservas do PCP relativamente ao Código do Trabalho

e às leis laborais. Porém, desde 2013 que o emprego tem vindo a aumentar e o desemprego a diminuir,…

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — … com esta legislação laboral aprovada nesta Assembleia e discutida em sede

de concertação social. Sr.as e Srs. Deputados, não podemos ignorar este facto irrefutável e tão importante para

o nosso País.

Gostaria também de reiterar aquela que tem sido a posição do PSD nestas matérias de natureza laboral.

Entendemos que todas estas matérias devem ser objeto de avaliação, de análise e de discussão em sede de

concertação social. Reiteramos também que deve ser o Governo a criar todas as condições para a valorização

salarial e para acabar, efetivamente, com a desigualdade salarial entre mulheres e homens.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Sr.as e Srs. Deputados, a Assembleia da República tem toda a legitimidade para

legislar sobre a matéria em questão. Contudo, é nossa opinião que tal só deve ser feito após ouvidas as

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confederações sindicais e as confederações patronais em sede de concertação social para, em conjunto com o

Governo, encontrarem as melhores soluções para os trabalhadores, para o mercado de trabalho e para Portugal.

Sr.ª Deputada Diana Ferreira, o PSD considera a concertação social um instrumento fundamental para

garantir a paz, a coesão social,…

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — … e sobre este facto não tenho dúvidas de que estamos todos de acordo.

Assim, o PSD considera fundamental que o diálogo em concertação social seja estimulado e encorajado,

pois ninguém nesta Assembleia duvida que não há empresas sem trabalhadores e não há trabalho digno sem

empresas. Logo, só é possível trabalho digno com diálogo e concertação entre as partes.

Sr.ª Deputada, em conclusão, vou deixar-lhe duas questões: é ou não verdade que o emprego tem

aumentado e o desemprego diminuído com a legislação laboral aprovada aqui, nesta Assembleia?

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Concorda ou não concorda que o diálogo e a concertação social são a melhor

forma de encontrar a paz social, a coesão social, e, acima de tudo, as soluções mais adequadas para o mundo

do trabalho e, principalmente, para Portugal?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, para responder.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, agradeço às Sr.as Deputadas Inês de Sousa Real e Lina

Lopes as questões que colocaram.

Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, o PCP tem um alargado conjunto de propostas no âmbito do reforço dos

direitos dos trabalhadores, seja na questão dos diretos de maternidade e de paternidade, que são para nós

também fundamentais, seja na reposição do direito aos 25 dias de férias, sobre a qual já apresentámos também

uma iniciativa na Assembleia da República, seja também no que se refere, por exemplo, às matérias da ACT,

em que, defendendo o seu reforço, entendemos, porém, que a ACT não tem de ter nenhuma ação pedagógica

junto das empresas.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — A ACT tem de ter uma ação de inspeção da atividade das empresas, sobre

infrações que possam ser cometidas pelas empresas no que se refere aos direitos laborais. Por isso, seria

também importante saber se o PAN acompanha a proposta do PCP para conferir o título executivo às decisões

condenatórias da ACT, fazendo com que um conjunto de processos nestas áreas do trabalho não se prolonguem

em tribunais e que isso não signifique que as empresas fiquem impunes depois de desrespeitar e atropelar

direitos dos trabalhadores que estão, aliás, consagrados em lei.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Há vários direitos na nossa legislação laboral que ainda estão consagrados,

mas vários governos, nomeadamente do PSD e do CDS, teriam ido muito mais longe na destruição desses

direitos se tivessem tido possibilidade. No entanto, ainda não destruíram o conjunto dos direitos que existem

relativos à proteção dos trabalhadores.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Exatamente!

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A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Esses direitos foram defendidos com a luta de milhares de trabalhadores

durante vários anos e foram também conquistados com essa luta. E nós cá estaremos também, tanto para

defender esses direitos como para apresentar propostas que os reforcem.

Porque são os trabalhadores que criam a riqueza do nosso País…

O Sr. João Dias (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — … e a riqueza das empresas, é mais do que justo que essa riqueza seja

bem distribuída, designadamente de uma forma mais justa, com um aumento geral dos salários, nomeadamente

de 90 € já no início, em 2020, tendo os 850 € como patamar para o salário mínimo nacional, fazendo,

naturalmente, com que um conjunto de outros salários subam também e que aqueles que estão acima do salário

mínimo nacional possam também continuar a subir e a ser valorizados, repondo assim situações de justiça.

Sr.ª Deputada Lina Lopes, registo que, no que se refere a um conjunto de situações que foram por mim

expostas da tribuna sobre a realidade concreta das empresas e dos locais de trabalho, o PSD nada teve a dizer.

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Esqueceu-se da concertação social?!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sobre as questões do trabalho por turnos, o PSD, por exemplo, nada teve a

dizer. Estamos a falar de cerca de mais de 760 000 trabalhadores que, neste momento — há dados que indicam

neste sentido —, trabalham por turnos, Sr.ª Deputada.

Protestos da Deputada do PSD Lina Lopes.

Estamos a falar de mais de 1 milhão de trabalhadores que trabalham ao domingo e mais de 2 milhões de

trabalhadores que trabalham ao sábado, no nosso País!

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sobre as questões do trabalho por turnos, do trabalho noturno, da articulação

entre a vida pessoal, a vida familiar e também a vida profissional, o PSD não disse nada.

Sr.ª Deputada, essas matérias são competência de legislação da Assembleia da República, que tem todas

as condições para decidir se quer reforçar os direitos dos trabalhadores. E a questão que se coloca…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Estou mesmo a terminar, Sr. Presidente.

Como estava a dizer, a questão que se coloca é de que lado se posiciona o PSD nessa matéria, porque até

agora tem-se posicionado contra os direitos dos trabalhadores,…

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Não é verdade!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — … atropelando um conjunto de direitos que já estão conquistados e

consagrados também.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado

António Gameiro, do PS.

O Sr. António Gameiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, nós gostaríamos de questionar

o PCP sobre a evolução daquilo que tem sido os indicadores do emprego em Portugal.

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A Sr.ª Deputada veio aqui falar-nos sobre precariedade, sobre políticas de salários e a primeira pergunta que

se nos põe é a de saber se o PCP reconhece ou não que mais 300 000 postos de trabalho criados nos últimos

quatro anos por este Governo são ou não uma boa amostra do trabalho que o PS tem feito em prol dos

trabalhadores, em prol dos assalariados, e do que foi o trabalho que veio da anterior Legislatura — também com

o apoio do PCP, do Bloco de Esquerda e do PS — de combate à precariedade no Programa PREVPAP.

Sr.ª Deputada, aumentámos o salário mínimo já para 600 €…

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Então, não era para 635 €?!

O Sr. António Gameiro (PS): — … e queremos chamar a atenção para uma promoção de trabalho digno,

que foi feita nos últimos quatro anos: combatemos o assédio no local de trabalho, implementámos novas formas

de trabalho, tomámos medidas quanto ao trabalho forçado e defendemos sempre um trabalho digno em termos

de igualdade no trabalho entre mulheres e homens.

Sr.ª Deputada, gostava de saber se reconhece ou não a reformulação das políticas ativas de emprego dos

últimos quatro anos, se deram ou não deram resultados efetivos, se houve ou não um combate ao défice de

qualificação dos portugueses nos últimos quatro anos, se estabelecemos ou não uma quota de acesso ao

emprego para pessoas com deficiência.

Relativamente ao que tem a ver com a função pública, Sr.ª Deputada, nos últimos quatro anos o Governo do

PS aumentou os funcionários públicos, em média, em 8%, 129 € de per si e per capita cada um dos 600 000

trabalhadores da administração central do Estado.

Aplausos do PS.

Portanto, recusámo-nos a despedir funcionários públicos, cumprimos os compromissos para com eles,

reduzindo o seu horário de trabalho para 35 horas, aprovámos o PREVPAP, que está em conclusão, revertemos

os cortes salariais, reforçámos a Administração Pública em mais 31 000 trabalhadores,…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. António Gameiro (PS): — … pelo que gostaria de saber se o PCP acompanha ou não o PS daqui

para a frente no reforço dessas políticas, no acompanhamento do trabalho deste Governo, paulatinamente, no

reforço dos salários e das condições de trabalho em Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

José Luís Ferreira, do PEV.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, Os

Verdes também consideram que a valorização salarial é absolutamente essencial, não só por questões de justiça

mas também porque a valorização dos salários é um fator importante no que diz respeito à dinamização da

procura interna. Se não há valorização dos salários quando a economia está boa, então, quando será a altura

certa para valorizar os salários?

O Sr. João Oliveira (PCP): — É um facto!

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Mas a Sr.ª Deputada também se referiu — e bem — ao combate à

precariedade laboral e nós também consideramos que ele deve ser assumido como uma prioridade por qualquer

Governo, não só porque a precariedade é socialmente injusta e degradante mas também porque o Estado, nesta

como em outras matérias, terá de dar o exemplo. Foi, aliás, com esse espírito, no sentido de o próprio Estado

dar o exemplo, que na Legislatura passada se avançou com o PREVPAP.

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Sucede que chegámos a esta altura, em que o Programa já há muito devia estar concluído, e as coisas

continuam a derrapar, havendo muitos dos trabalhadores continuam «pendurados» e com a sua vida suspensa.

São problemas que exigem resposta. O Estado tem de dar o exemplo não só para, de forma mais confortável,

poder exigir aos privados o mesmo comportamento mas também porque a precariedade laboral é injusta e

socialmente degradante, para além de estar sempre associada à mentira e à fraude. E tanto a fraude como a

mentira não podem ter lugar nas relações laborais e muito menos quando essas relações laborais têm o Estado

como parte, porque se o Estado não cumprir terá mais dificuldade em exigir aos privados que o façam.

Sr.ª Deputada, na anterior Legislatura, o PS e o PSD promoveram alterações à legislação laboral e uma

dessas alterações veio permitir a duplicação do tempo do período experimental. Ora, sabendo nós que o período

experimental representa o expoente máximo quando falamos de precariedade laboral, já que nesta situação a

entidade patronal pode despedir como muito bem entender, sem sequer ter necessidade de fundamentar seja o

que for e sem sequer haver lugar a qualquer tipo de indeminização para o trabalhador, aquilo que pergunto à

Sr.ª Deputada é se, na sua perspetiva, esta medida cozinhada entre o PS e o PSD veio contribuir ou não para

fomentar a precariedade que, pelos vistos, todos dizem querer combater, mesmo aqueles que passaram anos

e anos a promovê-la.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, para responder.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, agradeço também ao Sr. Deputado António Gameiro, do PS,

e ao Sr. Deputado José Luís Ferreira, do Partido Ecologista «Os Verdes», pelas questões que colocaram.

O Sr. Deputado António Gameiro colocou um conjunto de questões e é verdade que, na última Legislatura,

fizemos um caminho que significou reposição de direitos. As 35 horas na Administração Pública foi a reposição

de um direito que tinha sido retirado aos trabalhadores da Administração Pública. É disto que estamos a falar,

de um caminho de reposição de direitos e de rendimentos, que contou com uma intervenção significativa, uma

intervenção e uma luta ativa por parte do PCP para que isso pudesse ser realizado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Aliás, na anterior Legislatura estabelecemos logo o salário mínimo nos 650

€, e, não tivesse sido essa proposta do PCP, se calhar, hoje não estaríamos com o salário mínimo nos 600 €,

que não é suficiente mas que reconhecemos ser um acréscimo em relação ao salário mínimo nacional que

existia anteriormente.

O facto de ter havido esse acréscimo, seja do ponto de vista dos salários na Administração Pública ou no

setor privado, não inibe a necessidade e a emergência nacional que existe da valorização geral dos salários no

nosso País, condição essencial para garantir melhores condições de vida aos trabalhadores, mas, Sr. Deputado,

também condição essencial para garantir o desenvolvimento económico do nosso País…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — … porque, se os nossos trabalhadores tiverem mais salário, terão também

melhores condições para gastar dinheiro e assim também dinamizar a nossa economia. É disto que estamos a

falar, Sr. Deputado.

No que se refere à questão do PREVPAP, de que o Sr. Deputado também falou, consideramos que foi um

passo importante. Porém, dissemos sempre que o PREVPAP nunca poderia ser o fim das questões da

regularização dos vínculos precários na Administração Pública e o que importa também saber, Sr. Deputado, é

o que o PS pretende fazer, por exemplo, a um conjunto de trabalhadores que mantêm vínculos precários na

Administração Pública, que tiveram pareceres que não foram homologados e muitos não foram reconhecidos

como necessidades permanentes, mas continuam todos os dias, nos serviços públicos do nosso País, a

responder a necessidades permanentes e, por isso, deviam ter um vínculo efetivo. Importava saber também o

que é que o PS pretende fazer em relação a isso.

Sr. Deputado António Gameiro, no momento em que, aparentemente, o PS se sente muito mais de mãos

livres na atual Legislatura, o que é que o PS pretende fazer relativamente à valorização dos salários no setor

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privado, mas também na Administração Pública? Isto porque na Administração Pública, Sr. Deputado, o PS teve

já oportunidade de resolver esse problema mas não o quis fazer.

Importava saber se o Governo e o PS querem, neste momento, resolver o problema da valorização geral dos

salários na Administração Pública e, naturalmente, em sede de negociação coletiva, valorizar estes

trabalhadores que todos os dias estão nos serviços públicos do nosso País, nomeadamente nas escolas, nos

hospitais, nos centros de saúde, nas finanças, na segurança social, na justiça garantindo-nos o acesso a bens

e a serviços fundamentais.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Deputado José Luís Ferreira, mesmo para terminar, em relação à questão

muito concreta que me colocou, naturalmente que a facilitação dos despedimentos é um atropelo, uma

desumanização, até, e uma crueldade para com os trabalhadores.

Rejeitamos naturalmente esse caminho e temos propostas que também pretendem revogar normas gravosas

do Código do Trabalho…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — … e da legislação laboral da Administração Pública. Mesmo para terminar,

Sr. Presidente, diria que o combate a essas realidades é, naturalmente, um combate que o PCP continuará a

fazer.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro,

do BE.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Diana Ferreira, queria saudar o Partido

Comunista Português por ter trazido este tema ao debate, nomeadamente a questão dos salários que continuam

a atirar uma parte importante dos trabalhadores para uma situação de pobreza assalariada. É uma realidade na

qual se mantêm desigualdades ofensivas ao nível salarial e onde, sem termos verdadeiramente um equilíbrio

na contratação coletiva e nas condições em que é negociada, designadamente na questão da caducidade,

teremos a manutenção deste desequilíbrio.

Trouxe as questões da precariedade, do PREVPAP, que se arrasta nomeadamente nos laboratórios

associados, no IEFP (Instituto do Emprego e Formação Profissional), na RTP — só para dar alguns exemplos.

Falou dos tempos de trabalho, que se vão, cada vez mais, desregulando, encontrando-se novas formas de

serem prolongados, e referiu a conciliação com a vida familiar e as questões da parentalidade, às quais teremos

oportunidade de voltar dentro de dias.

Referiu também essa característica do mundo do trabalho em Portugal que é o hiato entre a lei escrita e a

prática, hiato esse que é alimentado pela impunidade com que as entidades patronais violam a lei, pela falta de

meios e de ação da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) e pelas dificuldades no acesso à justiça.

O Bloco de Esquerda já apresentou, nesta Legislatura, um pacote de medidas na área do trabalho para

eliminar os cortes da troica que permanecem na legislação laboral no que diz respeito a férias, horas extra e

despedimentos; para reduzir o horário de trabalho também no privado para as 35 horas; para combater a

precariedade e para relançar e equilibrar a contratação coletiva. Mas queria fazer-lhe uma pergunta mais

centrada num tema particular que é o do trabalho por turnos.

Na semana passada, ficámos a saber, pelos dados do INE (Instituto Nacional de Estatística) que há 835 000

trabalhadores em Portugal que trabalham por turnos. Desde que existe esta série estatística, que começou em

2011, é o maior valor de sempre.

Na verdade, o trabalho por turnos tem crescido mais de 5% a cada ano e isto acontece porque, entre outras

razões, existe um total abandalhamento nas autorizações para a laboração contínua e para este tipo de horários.

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Portanto, precisamos, por um lado, de regular a laboração contínua e também de proteger os trabalhadores por

turnos.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Concluo com isto, Sr. Presidente: precisamos de proteger os

trabalhadores por turnos com mais férias, reforma antecipada e subsídio de trabalho por turnos.

Pergunto-lhe, Sr.ª Deputada, se não entende que, perante esta necessidade e esta urgência, aquilo que o

Governo apresenta neste Orçamento é menos do que um compromisso e muito menos do que o necessário.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para concluir os pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, queria, em primeiro lugar,

cumprimentar a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, que ouvi com muita atenção.

Mas, ao ouvi-la, há uma primeira pergunta, para além de outras que já lhe farei, que me ficou na cabeça. É

que acabei por não perceber, afinal de contas, onde é que esteve a Sr.ª Deputada e o PCP nos últimos quatro

anos. Quem ouvisse o que disse na tribuna do orador imaginaria que o PCP não esteve a apoiar o Governo nos

últimos quatro anos, imaginaria que o PCP não assinou acordos com o partido do Governo para o viabilizar nos

últimos quatro anos e imaginaria também que os Orçamentos não foram viabilizados com o voto do PCP.

Portanto, o que gostaria de perguntar primeiro é: afinal de contas, de quem é a responsabilidade destes

últimos quatro anos? Não será também do PCP? Isto porque se os partidos são responsáveis para pôr em

outdoors as medidas simpáticas que conseguem, certamente também serão, depois, responsáveis para

assumirem aquilo que fizeram em conjunto com o Governo. Isso ficaria bem.

Acho que tenho moral para lhe fazer esta pergunta, porque o CDS, quando apoiou um Governo, sempre se

responsabilizou por ele e sempre foi solidário com o bom e com o mau. Portanto, acho que ficaria bem ao PCP

não dizer que tem os louros de tudo o que seja simpático para as pessoas e atirar para cima do PS tudo o que

seja antipático.

Em segundo lugar, e falando das alterações ao Código do Trabalho, gostava de lembrar que foi com este

Código do Trabalho, que os senhores tanto criticam, que o emprego começou a aumentar em Portugal e que,

felizmente, se iniciou um ciclo de recuperação do emprego.

O PCP preocupa-se com a precariedade e o CDS também se preocupa, embora as nossas soluções sejam

radicalmente diferentes, na medida em que as vossas passam por mais e mais regulações, mais e mais

proibições, e as do CDS passam, sobretudo, pela criação de mais oportunidades. O que gostava de lhe

perguntar, Sr.ª Deputada, que se preocupa com a precariedade, com as oportunidades e com o nível do salário

mínimo nacional e dos salários em Portugal — que, sim, são baixos e todos queremos que sejam mais altos —

é se consegue olhar para fora de Portugal e ver salários mínimos nacionais bastante mais altos do que os

nossos. Pergunto também se os países que têm salários e salários mínimos mais altos do que os nossos…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Com certeza, Sr. Presidente.

Pergunto se esses países têm governos que aplicam aquilo que defende o CDS ou se têm governos que

aplicam aquilo que o PCP defende.

Creio que o que verá nos países que aplicam aquilo que a Sr.ª Deputada prega é salários bem mais baixos.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, para responder.

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A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, agradeço também ao Sr. Deputado José Soeiro, do BE, e à

Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do CDS, pelas questões que colocaram.

Sr.ª Deputada Cecília Meireles, a senhora gosta muito de fugir para fora de Portugal, provavelmente para

não assumir as responsabilidades que o CDS tem…

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Não, não!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — … na realidade concreta do nosso País.

Aplausos do PCP.

Isto porque, Sr.ª Deputada, os trabalhadores do nosso País pagam hoje uma fatura que é responsabilidade

também do Governo do CDS e do PSD, pela destruição de centenas de milhares de postos de trabalho e pela

destruição de micro, pequenas e médias empresas que significaram o agravamento do desemprego.

Sabe, Sr.ª Deputada, há empresas, na indústria automóvel, que recorrem a duas empresas diferentes de

trabalho temporário, uma para garantir os trabalhadores durante a semana e outra para garantir outros

trabalhadores ao fim de semana. Sabe para quê, Sr.ª Deputada? É para não pagarem aos trabalhadores que

trabalham ao fim de semana aquilo a que eles teriam direito se fossem devidamente compensados pelo trabalho

ao sábado e ao domingo. Isto, Sr.ª Deputada, foi o que permitiram as alterações à legislação laboral que o PSD

e o CDS também propuseram no nosso País.

Aplausos do PCP.

Esta, Sr.ª Deputada, é uma responsabilidade do CDS, do PSD e também do PS, que não quis revogar um

conjunto de normas gravosas do Código do Trabalho quando, na passada Legislatura, teve oportunidade para

o fazer.

O Sr. João Oliveira (PCP): — É um facto!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr.ª Deputada, também importava saber aqui, uma vez que também falou

da valorização geral dos salários, como foi o voto do CDS relativamente a várias propostas do PCP para o

aumento do salário nacional. É que o CDS também deu a mão ao PS para rejeitar as propostas que o PCP

apresentou ao longo de anos para aumentar o salário mínimo nacional.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — É verdade!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Vamos ver como é que o CDS se posiciona perante a proposta que o PCP

já entregou de aumento do salário mínimo nacional quando a mesma for votada na Assembleia da República.

Sr.ª Deputada, em relação à precariedade, seja ela no setor privado, seja na Administração Pública, é muito

simples: todos os trabalhadores que constituem necessidades permanentes do Estado e das empresas privadas

do nosso País têm de ter um vínculo efetivo, com todos os direitos inerentes, e não podem andar a saltar, com

falsos recibos verdes e com abuso de contratos a prazo, estágios ou bolsas, como acontece em muitos setores

de atividade, na Administração Pública e no privado.

É muito simples a resolução da questão da precariedade: a necessidades permanentes tem de corresponder

um vínculo efetivo. É isso que o PCP tem defendido e apresentado aqui na Assembleia da República e que o

CDS tem rejeitado sucessivas vezes.

Sr. Deputado João Soeiro, mesmo para terminar, acompanho naturalmente o conjunto de preocupações que

aqui referiu. É preciso solucionar de vez a questão do PREVPAP, processo que já está em andamento, mas

também é preciso resolver a situação de um conjunto de outros trabalhadores que não foram abrangidos pelo

PREVPAP e que continuam com vínculos precários.

A ACT precisa de mais meios, mas precisa também que as suas decisões condenatórias possam ter um

título executivo para que as empresas possam efetivamente ser penalizadas por infrações que são cometidas.

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Naturalmente, em relação à questão do trabalho por turnos e da limitação da laboração contínua, o PCP já

entregou iniciativas sobre trabalho noturno e trabalho por turnos. Entendemos que é preciso limitar este tipo de

trabalho.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Para terminar, Sr. Presidente, entendemos também que é preciso reforçar

os direitos dos trabalhadores que trabalham por turnos, garantindo um conjunto de benefícios, face ao desgaste

e à penosidade a que estão sujeitos.

O compromisso que assumimos hoje é com os trabalhadores e com o povo português. As nossas propostas

refletem isso e esse é o combate que continuaremos a fazer.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — A próxima declaração política cabe ao CDS-PP. Para intervir, tem a

palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ontem, melhor dizendo, nas

últimas horas de anteontem, deu entrada no Parlamento o Orçamento do Estado.

Na entrada deste Orçamento tivemos poucas novidades. Pelo contrário, tivemos o cumprimento de alguns

usos e tradições deste Governo: primeiro, no tempo, com o teatro de horas à espera de uma conferência de

imprensa que só aconteceria no dia posterior, como, aliás, já tinha acontecido no ano passado e noutros anos,

mas, mais importante, na substância, com um documento praticamente sem reformas, sem rasgo e

completamente conformado ao papel de Portugal como um dos países que menos cresce na Europa,

sistematicamente a ser ultrapassado em rankings de PIB per capita por economias mais dinâmicas e mais

competitivas. A este problema grave da economia portuguesa, este Orçamento diz zero.

Em terceiro lugar, também como habitualmente, na receita para as contas equilibradas, temos mais e mais

carga fiscal. Nas palavras do Sr. Ministro Mário Centeno, «quem paga o excedente são os contribuintes». Mais,

acrescento eu, quem pagou as contas certas de que o Governo tanto se gaba foram exatamente os contribuintes

portugueses, com o seu esforço.

Neste Orçamento houve também um facto inédito. Pela primeira vez, no momento em que o Governo, que

tem, aliás, uma maioria relativa, devia estar concentrado a encontrar consensos no Parlamento que lhe

permitissem viabilizar o Orçamento, parece estar a ter uma estranha dificuldade em encontrar consensos dentro

de si próprio, designadamente entre o Primeiro-Ministro e o Ministro das Finanças. Este Orçamento entrou no

Parlamento num cenário de indisfarçável tensão dentro do Governo entre Ministro das Finanças e Primeiro-

Ministro.

Sr.as e Srs. Deputados, esta questão tem de ser esclarecida e não é uma questão pessoal, é uma questão

política. A 9 de outubro, o Presidente do Eurogrupo, Mário Centeno, anunciou que havia um acordo sobre um

orçamento para a zona euro. Anunciou também um instrumento financeiro para a convergência e

competitividade. Na altura, «tweetou» a dizer habemus deal.

Bom, sobre este mesmo instrumento, o Primeiro-Ministro português disse que, e cito, «não faz sentido, está

mal desenhado, tem de ser refeito.» Se a discordância entre ambos, de acordo com as descrições publicadas

na imprensa nacional e internacional, foi bastante constrangedora para os presentes no Conselho, tenho de

dizer que é ainda mais constrangedora para Portugal.

Mais surpreendente ainda é a explicação dada. O Sr. Primeiro-Ministro veio dizer assim: ao Primeiro-Ministro

compete-lhe representar os portugueses e os seus interesses — de acordo! —, ao Presidente do Eurogrupo

compete, e bem, representar a vontade geral do Eurogrupo.

A pergunta que fica por responder, Sr.as e Srs. Deputados, é: afinal de contas, a quem é que compete

representar Portugal no Eurogrupo? Quem é que, dentro do Eurogrupo, defende os interesses de Portugal? E

— pergunta também pertinente — o Ministro das Finanças ser Presidente do Eurogrupo implica que ninguém,

no Eurogrupo, defenda os interesses de Portugal?

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Seria bom que se explicasse também o seguinte: o Sr. Secretário de Estado do Tesouro esteve nesta reunião

do Eurogrupo que aprovou este instrumento. Portanto, de duas, uma: ou o Sr. Ministro das Finanças e o

Secretário de Estado do Tesouro votaram, no entender do Sr. Primeiro-Ministro, contra os interesses de Portugal

e contra as suas instruções, e, então, é bom que a questão seja esclarecida porque se trata da posição

internacional de Portugal, ou, então, votaram sem o Primeiro-Ministro saber e, tanto quanto se percebe, sem

mandato do Primeiro-Ministro. Este detalhe tem de ser esclarecido — aliás, não é um detalhe, é um facto

relevante e tem a ver com os nossos interesses.

Já agora, devo dizer que me parece que a posição do Primeiro-Ministro de Portugal é aquela que, de facto,

mais defende os interesses de Portugal. Primeiro, porque este assunto é relevante e, depois, porque é também

relevante perceber quem vai executar este Orçamento. Temos de perceber se o Ministro das Finanças está cá

para ficar ou se, à medida que os efeitos das suas políticas se vão tornando mais visíveis e à medida, sobretudo,

que as receitas e soluções — que são, basicamente, o aumento da carga fiscal e as cativações nos serviços

públicos — se vão tornar cada vez mais difíceis de aplicar, porque é difícil empurrar os problemas com a barriga

todos os anos, virá alguém para lidar com as consequências e ele seguirá outros caminhos e outras carreiras.

Sr.as e Srs. Deputados, a posição de Portugal e a defesa dos interesses de Portugal no exterior não é um

detalhe nem é uma questão pessoal entre membros do Governo, é uma questão de Estado e deve ser

esclarecida no Parlamento.

Por outro lado, a receita que este Governo tem utilizado Orçamento após Orçamento, ano após ano, resume-

se a duas coisas: uma, aumento da carga fiscal, sobretudo através de uma profusão de impostos indiretos, onde

tudo são desculpas para encontrar novas taxações da saúde ao ambiente, passando até pelo aumento das

coimas nas atividades económicas; outra, um adiamento constante da reforma dos serviços públicos e da

despesa através de cativações sem nunca tentar uma mudança, uma reforma ou sem ter exigência na

administração da coisa pública.

Esta é uma receita que não pode continuar e Portugal merece uma receita mais exigente.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada Cecília Meireles, inscreveram-se três Srs. Deputados

para pedir esclarecimentos. Como é que pretende responder?

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves, do PCP.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, o CDS-PP

traz a este debate o tema do Orçamento do Estado, cujo processo orçamental teremos tempo de discutir ao

longo de mais de um mês.

É curioso que o CDS se apresente preocupado com a chamada «carga fiscal» quando fez parte de um

Governo que aumentou brutalmente os impostos sobre a generalidade dos portugueses.

O Sr. João Dias (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Baixaram o mínimo de existência, reduziram o número de escalões do IRS

(imposto sobre o rendimento de pessoas singulares), de 10 para 5…

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Não é verdade! Isso é falso!

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Então, não baixaram? Não deixou de estar indexado ao salário mínimo e

passou a estar indexado ao IAS (indexante dos apoios sociais)?

Mais: agravaram os impostos sobre os rendimentos mais baixos e intermédios e aumentaram o IVA (imposto

sobre o valor acrescentado) da eletricidade de 6% para 23%.

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A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Muito bem!

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Ao mesmo tempo que exigiam um enorme esforço fiscal à esmagadora maioria

dos portugueses, o Governo decidiu baixar o IRC (Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas

Coletivas) de 25% para 21% às grandes empresas.

A memória é curta, mas não tanto!

Sr.ª Deputada, deixando os temas mais gerais do Orçamento para uma outra ocasião, queria aproveitar para

abordar uma proposta, que o CDS já entregou sob a forma de projeto de lei, com implicações orçamentais.

O projeto de lei do CDS prevê a redução da taxa de IRC de 21% para 17%. Mas há um elemento que talvez

tenha escapado a quem consulte o vosso projeto: é que, de caminho, o CDS propõe a revogação do n.º 2 do

artigo 87.º do Código do IRC, ou seja, propõe que as micro, pequenas e médias empresas deixem de ter acesso

a uma taxa reduzida nos rendimentos até 15 000 € — que, segundo a proposta do Orçamento do Estado,

apresentada pelo Governo, poderá ser estendida até aos 25 000 €.

Se a vossa proposta fosse aprovada, mesmo que as taxas ficassem iguais nas duas alíneas, a verdade é

que a eliminação do n.º 2 acabava com qualquer possibilidade de reduzir os impostos sobre as micro, pequenas

e médias empresas, como o PCP defende.

As micro, pequenas e médias empresas já se fartaram de sofrer por causa das políticas do CDS, desde logo

pela aplicação da chamada «lei das rendas», que levou ao despejo de centenas de pequenas empresas e que

agora iriam deixar de ter esta discriminação positiva em sede de IRC.

Só com esta proposta já ficamos a saber um pouco daquilo que seria o Orçamento do CDS: menos impostos

para as grandes empresas e acabar com uma das poucas discriminações positivas que as micro, pequenas e

médias empresas têm em matéria fiscal.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Por isso, a minha pergunta vai no sentido de saber se o CDS vai mesmo

avançar com esta proposta em sede de Orçamento e se não acha que as pequenas empresas já sofreram

bastante com as políticas de direita, sempre ao serviço dos grupos económicos e da concentração monopolista.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando

Anastácio, do PS.

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, ouvi a sua intervenção

e reparei que sobre Orçamento falou pouco e, então, entreteve-se a colocar um conjunto de questões à volta de

assuntos que serão importantes mas que não terão a ver propriamente com a temática orçamental.

Mas eu compreendo que terá alguma dificuldade em falar do Orçamento, de um Orçamento que apresenta,

novamente, um crescimento de rendimentos e melhores condições de vida para os portugueses. E isso é difícil

para o CDS! Aliás, nota-se alguma nostalgia. Se calhar, lembra-se ainda daqueles Orçamentos, daquele brutal

aumento de impostos dos Governos de que fez parte e que o seu partido apoiou e também daquele famigerado

e pretendido corte de pensões, que tanto defenderam.

Portanto, a nostalgia nota-se a respeito do Orçamento e, por isso, compreendem-se as dificuldades.

A Sr.ª Deputada falou também de carga fiscal. De uma vez por todas, o CDS tem de explicar qual é o País

que quer: é o País com 12%, com 13% ou com 14% de desempregados ou é o País com 6% dos desempregados

e a aumentar as contribuições para a segurança social?

Aplausos do PS.

Esta é a resposta que o CDS, de uma vez por todas, tem de dar. É porque o Partido Socialista, no anterior

Governo e no atual, não subiu nenhum dos impostos principais.

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A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Pois, subiu os acessórios!

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — A saber, reduzimos o IRC, reduzimos o IVA e reduzimos o IRS. O que

cresceu foram, efetivamente, as contribuições para a segurança social, e isto resulta do facto de haver mais 300

000 portugueses a trabalhar. Mas esta é a realidade com a qual o CDS parece não querer conformar-se, Sr.ª

Deputada.

Gostaria agora de lhe fazer uma pergunta, porque esta é a altura de esclarecermos estas matérias.

Compreendo que o CDS queira reduzir os impostos — também queremos reduzir os impostos, aliás, gostávamos

de os reduzir mais ainda —,…

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Então, reduza!

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — … mas é bom e, do meu ponto de vista, sério que se diga como é que

vamos fazê-lo.

Pergunto: o CDS, nomeadamente a Sr.ª Deputada, está disponível para explicar aos portugueses, sem fazer

demagogia e admitindo que não quer aumentar a dívida nem aumentar o défice e que defende que a dívida é

para pagar, onde é que, concretamente, vai cortar para reduzir os impostos? Vai ter de dizer se é nos transportes,

se é na ferrovia, se é na saúde, se é nos apoios sociais, se é nas reformas dos pensionistas.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — E depois teremos a resposta, porque é importante serem claros. É

preciso que expliquem ao Parlamento para que possam ser levados a sério; se não, irão ser, com certeza, como,

aliás, o foram nas últimas eleições, reduzidos àquilo que hoje são!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte

Pacheco, do PSD.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Cecília Meireles,

saúdo-a pela intervenção que aqui fez sobre o Orçamento do Estado e devo dizer-lhe que partilhamos das suas

preocupações.

Permita-me que lhe diga que este Orçamento é mais do mesmo, por duas situações: é repleto de anúncios

iguais aos de todos os anos deste Governo socialista, ou seja, está sempre a dizer «agora é que é!». Sobre

investimento na ferrovia, «agora é que é!»; sobre investimento nos transportes, «agora é que é!»; sobre

investimento nos barcos, «agora é que é!»; sobre investimento na saúde, «agora é que é!». Claro que quem tem

fé acredita; os outros portugueses ficarão à espera que seja mesmo «agora é que é!».

O Sr. Adão Silva (PSD): — Bem dito!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Por outro lado — e para isto não é preciso ter fé, vai acontecer mesmo —,

temos aumento de impostos.

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — No ano passado, o Governo aumentou 9 impostos. O Dr. Mário Centeno

deve ter pensado: «9 impostos? Ah, isso é uma coisa mixuruca». Por isso, neste ano, não propõe 9, nem 10,

nem 11, nem 12, nem 13, nem 14 mas, sim, 15 impostos agravados para todos os portugueses.

Por isso, este Orçamento é histórico. Claro que é!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Claro!

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O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Tem a carga fiscal mais alta de sempre na história de Portugal.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Por isso, é mesmo histórico!

Sr. Presidente, porque acho que, dentro do tempo de que disponho, não vou conseguir ler todos os impostos

que este Governo se prepara para aumentar, peço desculpa se ultrapassar esse tempo.

Então, vejamos: no IRS, o aumento dos escalões, que não alcança a inflação; no IRC, as atividades de

alojamento local; no IVA, as atividades tauromáquicas; o imposto de selo sobre o crédito ao consumo; o IMI

(imposto municipal sobre imóveis) para prédios em ruínas; o IMT (imposto municipal sobre a transmissão

onerosa de imóveis), com um novo escalão para casas de valor mais elevado; o ISV (imposto sobre veículos),

em que as taxas são agravadas em 0,3%; o IUC (imposto único de circulação), em que acaba a taxa intermédia

para veículos ligeiros de passageiros; o imposto sobre as bebidas açucaradas, cujas taxas são agravadas; o

imposto sobre o tabaco é agravado em 0,3%; os benefícios fiscais, que terminam para veículos movidos a GPL…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, deixe-me terminar a lista de impostos.

O ISP (imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos); o imposto sobre o jogo online;…

O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Nunca mais saímos daqui!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … a criação de novas contribuições extraordinárias…

O Sr. Presidente (António Filipe): — O Sr. Deputado reconheceu que não iria ter tempo para referir todos.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … sobre os fornecedores da indústria e sobre as embalagens de uso

único…

Sr.ª Deputada, tem toda a razão: este é um Orçamento histórico por ter a carga fiscal mais alta de sempre.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada Cecília Meireles, tem a palavra, para responder.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, queria agradecer aos Srs.

Deputados que me colocaram questões.

Começo por responder ao Sr. Deputado Duarte Pacheco dizendo-lhe que, de facto, este Orçamento destaca-

se pela carga fiscal.

Ao Sr. Deputado Fernando Anastácio, primeiro, tenho de o saudar pela crítica inédita. Eu já fui acusada de

muitas coisas; de não querer falar de Orçamento foi a primeira vez que me acusaram e não deixa de ser uma

crítica particularmente inédita. Creio que não a confirmará nos próximos meses!

Em todo o caso, devo dizer o seguinte: tenho muito orgulho de ter feito parte e de ter apoiado um Governo

no qual o desemprego começou a descer em Portugal.

Vozes do CDS-PP e do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Já o Sr. Deputado, infelizmente, poderia ter orgulho, se, por acaso,

não fizesse parte de um partido que apoiou o Governo no qual o desemprego começou a crescer, em Portugal.

Aliás, este caminho de baixa do desemprego, que se iniciou em 2013/2014, continuou nestes anos, e ainda bem

que continuou. Certamente, o Sr. Deputado nunca verá o CDS lamentar-se.

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O que eu lamento é que a receita para estas contas e o caminho que os senhores utilizaram para chegar a

estas contas — e note que eu nunca critiquei nem nunca pus em causa a necessidade de ter contas equilibradas

— tenha sido a de uma chuva de impostos indiretos. É por isso que a carga fiscal atinge um recorde nunca visto.

Nunca, em Portugal, uma parte tão grande da riqueza produzida pelos portugueses foi para o Estado. O Sr.

Deputado diz assim: «nós não aumentamos o IRC!» Pois não, mas aumentaram as tributações autónomas em

sede de IRC, o que aumentou substancialmente a receita de IRC.

Os senhores têm uma criatividade a inventar impostos que é perfeitamente… Tudo são desculpas! A uns vão

tributar por causa da saúde, a outros vão tributar para defender o ambiente — e lá vêm as embalagens de

plástico! Depois, tem de se aumentar as coimas sobre as atividades económicas?! Mas têm de se aumentar as

coimas porquê? As atividades económicas são assim uma coisa suspeita? À partida, estão a fazer algum mal?

É que eu tinha a ideia de que a criação de riqueza, para depois ser distribuída, era através das atividades

económicas.

A vossa visão é a de que qualquer coisa que esteja a correr bem na economia e que seja iniciativa privada

o Estado chega lá e cobra a parte de leão. A nossa visão é contrária: é a de que vai haver mais dinheiro para

distribuir e, sobretudo, para o Estado continuar a exercer as suas funções, se deixar a iniciativa privada respirar

e produzir riqueza. E isso implica que quem a cria também possa gozar de parte substancial da mesma.

Isto ajuda-me a responder ao Sr. Deputado Duarte Alves, do PCP, que perguntou se o CDS defende que se

deve cobrar menos impostos às empresas. Sim! O CDS defende que se deve cobrar menos impostos às

empresas.

Sobre os salários mínimos nacionais que o senhor defende, quero dizer-lhe que existem em países onde se

cobra menos impostos às empresas e, sim, em países em que há grandes e médias empresas, porque, Sr.

Deputado, os países em que partidos como o seu governam, de facto, só há micro empresas, porque as outras

são todas do Estado e a única coisa que há é salários de miséria, porque a sua receita, em nenhuma parte do

mundo, conduziu a nada que não fosse miséria.

E, já agora, à Sr.ª Deputada Diana Ferreira, que disse que eu queria sempre fugir de Portugal, digo-lhe que

eu não tenho problema nenhum em sair de Portugal. Eu acho que, em Portugal, devemos saber olhar para fora

e perceber o que corre bem e o que corre mal para podermos aprender, não há mal nenhum! Sempre que

Portugal olhou para fora, cresceu; sempre que não quis ver mais nada, teve mais problemas. Mas digo-lhe uma

coisa: isso é sair, não é fugir. Fugir é de países como a Coreia do Norte. Sabe porquê? Porque as pessoas bem

querem sair de lá, só que estão lá presas, a saída não é livre.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — A próxima declaração política cabe ao PAN.

Tem a palavra o Sr. Deputado André Silva.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não é novidade para ninguém que

estamos em plena crise climática. Não é novidade que Portugal é um dos países da Europa que mais vai sofrer

com os efeitos das alterações climáticas.

No contexto da discussão do Orçamento de Estado para 2020, vamos olhar para um dos principais

instrumentos de financiamento da política climática, o Fundo Ambiental, para percebermos de que forma é que

nos dá resposta a esse desafio. Cumpre, desde já, lembrar que o Fundo tem por finalidade apoiar políticas

ambientais para a prossecução dos objetivos do desenvolvimento sustentável, designadamente relativos às

alterações climáticas, aos recursos hídricos, aos resíduos e à conservação da natureza e da biodiversidade.

Para 2020, o orçamento do Fundo Ambiental é de 476 milhões de euros. De acordo com os dados do

Orçamento disponíveis, reverte para a EDP — para amortização do défice tarifário, para pagar custos de

produção de energia não repercutidos nas tarifas ao consumidor — um montante estimado em 110 milhões de

euros, ou seja, 23% do total das receitas do Fundo Ambiental.

O regime do Comércio Europeu de Licenças de Emissão (CELE), para o período de 2013-2020, passou pela

opção de criação de um regime de leilão de licenças gerido pela União Europeia, cujas receitas revertem para

os Estados — foi uma opção «pagar para poluir». De forma a minimizar os impactos da opção «pagar para

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poluir», a Comissão Europeia, na Diretiva CELE, defendeu, sem obrigar, que pelo menos 50% das receitas

deveriam ser direcionadas para ações de redução de emissões.

A opção, em Portugal, foi dirigir até 80% das receitas para a redução do défice tarifário da energia. O défice

tarifário da energia resultou de opções passadas, de suportar parte dos custos das empresas produtoras de

energia, onde se salientam os custos da EDP. Na prática, o que a EDP paga por emitir CO2, recebe para

amortizar custos passados, não refletidos nas tarifas ao consumidor. Acresce que a EDP, só em 2017, recebeu

cerca de 100 milhões de euros, a título de isenção de impostos, sobre os produtos petrolíferos, subsídio perverso

à redução de emissões.

Tendo em conta que, em Portugal, os consumidores pagam uma das maiores faturas de eletricidade da

Europa, mesmo com tantas isenções fiscais e apoios estatais, será de questionar a eficiência de custos das

produtoras de energia nacionais, nomeadamente da EDP. Apenas uma percentagem mínima das receitas sobre

as emissões de CO2 são gastas em efetivas ações que conduzam à redução de emissões, em Portugal. Em

2019, apenas cerca de 30% das receitas de licenças de emissão foram alegadamente dirigidas para esse fim.

A questão é que, na prática, a maioria dessas verbas foram aplicadas em ações de manutenção nos metros de

Lisboa e do Porto, não constituindo, por isso, ações que venham a produzir significativas reduções de emissões.

As ações suscetíveis de conduzir a redução de emissões representam, em 2019, apenas cerca de 10% do total

de receitas de licenças de emissões.

Para 2020, continuamos com a mesma tendência: o Fundo Ambiental transfere 23% do seu orçamento para

a EDP; transfere 19% para os orçamentos dos metropolitanos de Lisboa e do Porto, da CP, da Transtejo e do

fundo de transportes; reserva 4% para despesas de funcionamento da Agência Portuguesa do Ambiente; e irá,

também — pasme-se — suportar os custos relacionados com a ocupação americana da base das Lages.

E, no fim, Srs. Deputados, quanto sobra para projetos, em concreto, de mitigação e de adaptação às

alterações climáticas, de recursos hídricos, de conservação da natureza, de tratamento de resíduos e de

economia circular? Um montante máximo de cerca de 80 milhões de euros, ou seja, 17% do orçamento do

Fundo Ambiental. Sim, apenas 17% do orçamento do Fundo Ambiental será dirigido para os fins que

determinaram a sua constituição!

Sr.as e Srs. Deputados, ninguém sabe quanto é que o País terá de investir para enfrentar os efeitos das

alterações climáticas, mas, utilizando um indicador de investimento per capita de um estudo do Banco Mundial,

deveríamos estar a dedicar, anualmente, a ações de adaptação às alterações climáticas, 147 milhões de euros.

Não é com estas opções de gastos do Fundo Ambiental que lá chegaremos. Sr.as e Srs. Deputados, descubram

as diferenças entre as declarações de intenção do Governo e as suas ações!

Não esperamos, assim, em 2020, um reforço do investimento em ações de conservação das espécies. O

modo como estamos a explorar os recursos naturais tem vindo a provocar impactos irreversíveis na

biodiversidade, deparando-nos, neste momento, com a extinção de inúmeras espécies. Nos recentes dados

divulgados pela comunidade científica, há 1 milhão de espécies em risco de extinção, num universo de 8 milhões

de plantas, de insetos e de animais.

Se, por um lado, aliadas à má gestão dos recursos naturais, as alterações climáticas contribuem para a

redução da biodiversidade, por outro lado, os ecossistemas desempenham um papel fundamental no ciclo global

do carbono e na adaptação às alterações climáticas. Os solos, as florestas e os oceanos mantêm vastas

reservas de carbono. A forma como os habitats são geridos afetará a quantidade de carbono libertada para a

atmosfera, ou seja, as alterações climáticas reduzem a biodiversidade e a redução da biodiversidade aumenta

a intensidade das alterações climáticas.

A extinção das espécies coloca em causa o funcionamento dos ecossistemas, onde os seres humanos se

integram, e com a destruição dos ecossistemas colocamos em causa o equilíbrio do planeta, comprometendo a

nossa própria sobrevivência. Em Portugal, existem espécies fundamentais para o funcionamento dos

ecossistemas em estado de conservação ameaçado, como é o caso do coelho-bravo. Esta espécie a base da

alimentação de tantas outras espécies protegidas e também ameaçadas, como o abutre-negro, o bufo-real, a

águia-de-bonelli, a águia-imperial ibérica, o gato-bravo ou o lince ibérico.

Enquanto o Fundo Ambiental serve para financiar projetos vários, em nada condizentes com os seus

objetivos, acelera-se, em Portugal, a taxa de perda de biodiversidade e o risco de extinção de várias espécies.

Em fase de especialidade, temos de corrigir a distorção a que está sujeita esta ferramenta e o PAN não faltará

a esse compromisso.

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Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado André Silva, inscreveram-se dois Srs. Deputados. Dir-me-

á como tenciona responder.

O Sr. André Silva (PAN): — Respondo conjuntamente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Com certeza.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Carvalho, do PSD.

O Sr. Nuno Miguel Carvalho (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, muito obrigado, Sr. Deputado André

Ventura, pelo tema importante que traz.

Risos.

Perdão! O que vale é que não usei a palavra «vergonha», pelo menos.

Muito obrigado, Sr. Deputado André Silva, pelo tema que trouxe hoje aqui, acerca do Fundo Ambiental.

Este é um Fundo que congrega, efetivamente, diferentes tipos de fundos que existiam e que tinham diferentes

tipos de competência. Contudo, a competência que, neste momento, o Fundo Ambiental desempenha não é a

mesma que os outros desempenhavam. Há uma série de áreas que estão negligenciadas e estão-no porque,

efetivamente, falta músculo financeiro para que tenham uma verdadeira aplicação política. Há uma falta de

músculo financeiro em áreas, como é o caso, por exemplo, do uso eficiente de água e dos recursos hídricos, da

sustentabilidade dos serviços de água, da conservação da natureza e da biodiversidade, e muitos outros.

O Fundo Ambiental, efetivamente, não está a desempenhar o seu papel, não está a desempenhar a missão

para a qual foi desenhado. Aliás, dir-se-á até que de «Fundo» o único sentido que pode aqui utilizar-se é que

há políticas ambientais que bateram no fundo, é que a economia circular bateu no fundo, é que a investigação

e o desenvolvimento em matéria ambiental bateram no fundo, é que a descarbonização da indústria bateu no

fundo com este Governo. Essa é a única palavra que é aplicável quando falamos em Fundo Ambiental!

O financiamento de práticas para a económica circular, por exemplo, são fundamentais quando o Estado é

um grande consumidor e pode ajudar a influenciar a nossa indústria e o nosso tecido empresarial e económico

para que tenham práticas mais ambientais. A utilização dessas verbas não é minimamente praticada por parte

do Fundo Ambiental. A dimensão ambiental na economia do nosso País é igualmente importante e, quando

falamos da importação de energia, que agrava seriamente a nossa balança comercial, não temos, no Fundo

Ambiental, instrumentos suficientemente dotados do ponto de vista financeiro para que se consiga trabalhar na

transição energética da nossa indústria.

O atual estado do Fundo Ambiental, Sr.as e Srs. Deputados, efetivamente, é um Estado ambiental — repito,

é um Estado ambiental — que não consegue ter qualquer tipo de cálculo ou de medição face às políticas qua

aplica. Não conseguimos perceber se as medidas aplicadas têm o verdadeiro retorno ambiental que deveriam

ter. É opaco este Fundo Ambiental, mas também revela que as políticas do Governo, na prática…

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Miguel Carvalho (PSD): — Vou já concluir, Sr. Presidente.

As políticas do Governo, na prática, não são verdes, eu diria que são «verdinhas», que ainda são muito

«verdinhas».

Para concluir, Sr. Presidente, a questão que coloco ao Sr. Deputado André Silva, sobre o tema que hoje

trouxe aqui, o Fundo Ambiental, é a seguinte: acha que as verbas estão bem distribuídas pelos diferentes tipos

de pontos e pelos diferentes tipos de competência? Acha que isso, efetivamente, não afeta a coesão territorial

do nosso País?

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem mesmo de concluir, Sr. Deputado.

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O Sr. Nuno Miguel Carvalho (PSD): — Com certeza, Sr. Presidente.

Acha que isso não afeta, também, o que deviam ser políticas de uniformização ambiental, em todo o nosso

País?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Entretanto, inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, mais um Sr.

Deputado, tendo o Sr. Deputado André Silva comunicado à Mesa que responderá conjuntamente.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Peralta, do Bloco de Esquerda.

O Sr. Nelson Peralta (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado André Silva, as verbas

do Fundo Ambiental foram bastante importantes do ponto de vista social e ambiental para o programa de

redução do preço dos passes sociais, programa esse rejeitado, no Parlamento, pelo PSD, que, agora, enche a

boca com muitas palavras de amor pelo ambiente. Falharam aí, na defesa do ambiente!

Protestos de Deputados do PSD.

Mas o Fundo Ambiental é — ou deveria ser — essencial, também, para a proteção da natureza e aí tem

falhado decisivamente. Não considera o Sr. Deputado que seria importante que o Fundo Ambiental protegesse

ambientes essenciais na captura de carbono, desde logo as pradarias marinhas da ria de Aveiro, da ria Formosa

e de vários estuários, nomeadamente o estuário do Sado e a península de Troia, ecossistemas que estão hoje

ameaçados pelas dragagens?

Pois bem, devia o Fundo Ambiental preservar ecossistemas essenciais à captura de carbono, mas também

o próprio financiamento do Fundo Ambiental é um erro. Cobram a poluidores para terem o direito de poluir,

cobram taxas sobre embalagens, em vez de ser o Fundo Ambiental e o próprio Governo, através do Orçamento

do Estado, a reorganizar a economia para proibir certo tipo de embalagens, nomeadamente as embalagens

secundárias, mas também para garantir uma transformação mais ampla da economia, desde logo com a

eletrificação, a modernização e a expansão da ferrovia, que é essencial e necessária, através de um

investimento forte do Orçamento do Estado, e também com a reconfiguração da forma como produzimos

energia. Ainda bem que as centrais a carvão vão fechar, mas é preciso muito mais caminho para a energia

renovável e para programas de verdadeira eficiência energética, nomeadamente nas habitações das camadas

mais empobrecidas da sociedade.

É por isso que o Fundo Ambiental é curto e falha na proteção da natureza, porque não tem investimento

concreto para a proteção de habitats essenciais à captura de carbono e porque não transforma a economia para

garantir uma mudança na forma de produção de energia, na forma como nos deslocamos e na forma como as

camadas mais pobres da população vivem o conforto energético em suas casas. É por isso mesmo que são

necessárias verbas do Orçamento do Estado para esta transformação mais ampla da sociedade.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Nelson Peralta (BE): — É por isso que pergunto, Sr. Deputado, se não concorda com estas medidas

que acabo de enunciar.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para um último pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado

João Nicolau, do PS.

O Sr. João Miguel Nicolau (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado André Silva, desde

já, acredito que, por hoje ainda ser quarta-feira, os Deputados do PSD ainda não tiveram oportunidade de ler

atentamente o Orçamento do Estado…,

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Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.

… e de verificar a continuidade da política que o Partido Socialista está a implementar, de redução de

emissões e de descarbonização da economia portuguesa. Aliás, este é um dos pilares principais da atuação

deste Governo.

Sr. Deputado André Silva, quanto à conservação da natureza, como sabe, não está na matriz do Partido

Socialista fugir aos desafios e aos problemas do País. E o PS está cá para, de forma consciente, encarar os

problemas. Estamos cientes da necessidade de resolver, agora, uma situação que deveria estar resolvida há

vários anos. Estou a falar da Diretiva Habitats que veio, de facto, reforçar a necessidade de proteção de habitats

e da conversação da biodiversidade, de uma forma geral, em todos os Estados-Membros, e que, na prática, se

traduz na Rede Natura, que agrega quer as Zonas Especiais de Conservação, quer as Zonas de Proteção

Especial relativas à proteção de aves selvagens.

Sucessivos Governos têm aprovado diplomas que visam melhorar e transpor de forma mais eficaz a Diretiva

Habitats e implementar diferentes medidas que visam a conservação e a salvaguarda da fauna e flora, mas

sabemos que não tem sido suficiente. O Partido Socialista tem plena noção de que é necessário fazer ainda

mais e melhor! E é isso que o Governo do PS tem feito nas mais diversas áreas, mas também na conservação

da natureza, estando já em processo legislativo a publicação do decreto regulamentar que classifica os Sítios

de Interesse Comunitário em Zonas Especiais de Conservação, como define a Diretiva Habitats. Como sabemos

perfeitamente, tal não valerá de nada se não existirem, no terreno, orientações claras que salvaguardem a

aplicação de medidas de conservação e os habitats protegidos.

Para isso, o Governo lançou, e tem em execução, os planos de gestão e as cartografias em todas as Zonas

Especiais de Conservação. É um trabalho exaustivo de levantamento e de análise, mas, no primeiro semestre

de 2020, será publicado um primeiro pacote de 18 planos de gestão.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Miguel Nicolau (PS): — Vou já concluir, Sr. Presidente.

Sr. Deputado, deixe-me fazer-lhe uma pergunta: conhece alguma forma mais rápida de resolver este

incumprimento do que publicar o diploma sobre os Sítios de Interesse Comunitário e transformação em Zonas

Especiais de Conservação e executar os planos de gestão de cada área?

Julgo que não conhece e o Partido Socialista está cá para resolver os problemas que for necessário resolver,

nomeadamente na área de conservação da natureza.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, para responder.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, agradeço a intervenção dos Srs. Deputados Nuno Miguel

Carvalho, do PSD, e Nelson Peralta, do Bloco de Esquerda, e gostaria de dizer que convergimos,

genericamente, com as vossas considerações.

Relativamente à matéria de política fiscal e às taxas sobre as embalagens, discordamos do Bloco de

Esquerda. Entendemos que a política fiscal pode ser importante, e tem sido, na prática — os estudos

demonstram-no —, para estimular ou dissuadir consumos, seja pela positiva, seja pela negativa. E aqui

acreditamos que a taxa sobre as embalagens é positiva do ponto de vista da perspetiva ambiental.

Protestos do BE.

Sr. Deputado João Nicolau do Partido Socialista, a matéria que aqui trouxe a debate é a de uma distorção

enorme que se vive no Fundo Ambiental há vários anos, perpetuada pelo Governo do Partido Socialista.

O Fundo Ambiental tem por finalidade apoiar políticas ambientais, com vários objetivos. Vou elencar alguns

deles: mitigação das alterações climáticas; adaptação às alterações climáticas; sequestro de carbono; uso

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eficiente da água e proteção de recursos hídricos; prevenção e reparação de danos ambientais; cumprimento

dos objetivos e metas nacionais e comunitárias para a gestão de resíduos; transição para uma economia circular;

proteção e conservação da natureza.

Aquilo que se verifica é que apenas 17% do Fundo é utilizado nestes objetivos.

Se esse fosse o único aspeto negativo, estaríamos, eventualmente, bem, ou estaríamos menos mal, mas o

problema é que temos vários incumprimentos, nomeadamente, e como referiu, o incumprimento da Diretiva

Habitats.

De facto, Sr. Deputado do Partido Social Democrata, se eu me chamasse André Ventura, agora a si, Sr.

Deputado do Partido Socialista, dir-lhe-ia algo sobre a sua intervenção quando refere que «o PS está cá para

resolver». O PS é o Governo dos planos, é o Governo das estratégias, quando há uma diretiva que há mais de

seis anos está por cumprir, em que o Tribunal de Justiça da União Europeia já veio condenar o Governo e o

Estado português porque não declara 61 sítios para conservação especial, em cima dos quais estão a ser

realizadas atividades económicas altamente impactantes, como é o caso, por exemplo, das dragagens do Sado,

do aeroporto do Montijo, das estufas no Alentejo, etc., etc.

E por que razão os senhores continuam a incumprir a Diretiva e não declaram Zonas de Proteção Especial

esses 61 locais?! Precisamente para desenvolverem as vossas atividades económicas e, com isto, aumentar a

depredação de recursos, o esgotamento dos ecossistemas, o aumento da taxa de perda de biodiversidade e a

lista das espécies em risco de extinção, que continua a aumentar.

Por isso, lhe digo, Sr. Deputado do Partido Socialista, que, na discussão em sede de especialidade, contamos

particularmente com o Partido Socialista, e agora, pelos vistos, também com o Partido Social Democrata, com

cuja intervenção concordo inteiramente, para corrigir esta distorção e para, no fundo, fazer com que o Fundo

Ambiental cumpra os objetivos para os quais foi destinado e não apenas para tapar buracos orçamentais para

resolver outros problemas e outros expedientes, nomeadamente beneficiar atividades económicas altamente

poluentes.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Passamos à próxima declaração política, do PEV.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Silva.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Assistimos na COP25, que teve lugar

em Madrid, ao desfilar de discursos anunciando ações e decisões tomadas com vista ao combate às alterações

climáticas e ao cumprimento do Acordo de Paris, que determina a necessidade de medidas para que a

temperatura média do planeta não suba mais do que 1,5 °C.

No entanto, somos obrigados a acompanhar as palavras de António Guterres, Secretário-Geral da Nações

Unidas, que afirmou que a COP25 foi um fiasco e uma oportunidade perdida.

Apesar de se ouvir por todo o mundo um apelo à urgência na proteção do planeta ao qual chamamos casa,

duas centenas de países reuniram-se para discutir os compromissos de adaptação e de mitigação e não foram

capazes de chegar a um acordo final que assegurasse medidas efetivas para a defesa do ambiente e da

natureza.

Os apelos a que oiçam a ciência, a que observem as consequências que todos os dias se revelam um pouco

por todo o mundo e a que assumam, em conjunto, compromissos, mesmo que com um atraso de alguns anos,

caíram em saco roto.

A quem pedir responsabilidades? Ao próprio Sr. Secretário-Geral, António Guterres? À União Europeia, que

diz querer liderar o combate às alterações climáticas, anunciando a neutralidade carbónica para 2050, mas que

não foi capaz de assumir esse papel e que ainda há dias nos presenteou com o seu Pacto Ecológico Verde, que

nem sequer foi capaz de envolver todos os seus países e que não é mais que uma mão-cheia de nada e outra

de coisa nenhuma? Ou a todos os que, enchendo a boca com a defesa do ambiente, pensam é no

«esverdeamento» dos seus negócios e dos seus lucros, pensam é no mercado de carbono, pensam em comprar

e vender direitos e ganhar muito dinheiro com isso, ao mesmo tempo que garantem que os que podem pagar

podem poluir?

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As chuvas intensas e as graves e prolongadas secas, a subida da temperatura que contribui para o degelo

dos glaciares e a consequente subida dos mares não podem continuar a ser ignoradas. Não é possível continuar

a explorar os recursos naturais como se eles fossem infinitos, em nome de lucro para alguns.

Os países mais pobres e menos desenvolvidos, aqueles que menos contribuem para o total das emissões

globais de carbono, os que mais sofrem, nas declarações que fizeram na COP25, alertavam para as dificuldades

que estão a sentir na agricultura com a salinização dos solos, para as consequências para as pescas da poluição

dos oceanos e até para o turismo. Estas são as áreas mais importantes para a economia destes países e sem

elas a pobreza será maior. Onde estão os apoios adequados a estas realidades?

Sr.as e Srs. Deputados, Portugal foi à COP25 anunciar, mais uma vez, o objetivo de atingir a neutralidade

carbónica até 2050.

Importa, então, haver coerência entre objetivos e ações concretas. Podem publicar-se magníficos roteiros

para essa neutralidade, mas, quando as ações concretas contrariam esses objetivos, a incoerência impera e

coloca-se em causa um futuro sustentável.

O Primeiro-Ministro de Portugal foi mesmo à COP25 dizer que Portugal está na linha da frente das políticas

ambientais e o Ministro do Ambiente foi a Madrid afirmar que Portugal vai cumprir e que Portugal não vai admitir

que os outros falhem.

Será que estavam a falar da exploração de lítio em solos classificados como património agrícola mundial?

Ou do avanço na exploração de gás natural na Batalha e em Pombal? Ou dos apoios públicos à agricultura

intensiva, em detrimento de uma agricultura mais sustentável, como a agricultura familiar? Ou falavam da

construção de um aeroporto no Montijo, numa área de reserva natural do Tejo?

Para que a letra bata com a careta, é preciso fazer o que é necessário e não fazer o que é prejudicial.

Portugal tem já sofrido efeitos devastadores do processo de alterações climáticas, designadamente com

extremos climáticos severos, que têm consequências brutais, como as que, infelizmente, temos conhecido com

os fogos florestais ou com a tempestade Leslie. Temos, por isso, também uma grande responsabilidade em

apontar caminhos certos.

Mas há esperança: a inação dos Estados dentro da COP25 e a ação dos povos no exterior não foram

coincidentes. É cada vez maior o envolvimento dos jovens e da sociedade, que exigem medidas concretas para

conseguirmos fazer frente às consequências que já se vão sentindo um pouco por todo o mundo.

Onde tantos jovens exigem que o seu futuro seja assegurado, o Grupo Parlamentar de «Os Verdes» agirá

para a salvaguarda dos valores ambientais e económicos, para a segurança das populações e do território, para

o combate eficaz e consequente às alterações climáticas. Combate que se fará assegurando condições de vida

digna a todos os povos, que se garantirá com políticas de paz em todo o mundo, que será tão mais eficaz quanto

assente no combate a um sistema perverso que se alimenta da morte do planeta.

Assim se assegurará um presente e um futuro sustentável às gerações vindouras.

Aplausos do PEV e de Deputados do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr.ª Deputada, a Mesa está ainda a registar a inscrição para pedidos

de esclarecimento.

Chama-se a atenção dos Srs. Deputados para se inscreverem ainda durante as intervenções dos oradores.

Pausa.

Inscreveram-se cinco Deputados para formular pedidos de esclarecimento. Como pretende responder, Sr.ª

Deputada?

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, respondo em conjunto.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado André Silva.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, queria congratular a Sr.ª Deputada Mariana Silva e o Partido

Ecologista «Os Verdes» por trazerem este importante tema.

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Não tenho, propriamente, uma questão para colocar à Sr.ª Deputada, mas, antes, fazer um comentário à sua

intervenção.

Com efeito, a humanidade encontra-se à beira do abismo. A manter-se o atual nível de emissões, em menos

de nove anos ultrapassaremos o ponto de não retorno da estabilidade climática dos últimos 12 000 anos e da

vida, tal como a conhecemos.

Mais uma vez, a humanidade foi traída pelos governantes face aos interesses das indústrias poluidoras,

apesar dos sucessivos apelos da população e da grande maioria dos Estados.

É urgente a definição do artigo 6.º do Acordo de Paris, seja pela entrega das metas mais ambiciosas de

redução de emissões por parte dos Estados que permitam a limitação do aquecimento global a um máximo de

1,5 °C, seja pela definição de mecanismos de mercado que conduzam a reduções das emissões efetivas e que

garantam a integridade ambiental.

No que respeita ao futuro mecanismo de desenvolvimento sustentável, defendemos os princípios da não

contabilização dupla das reduções de emissões, da não utilização de reduções de emissão do período do

Protocolo de Quioto para o período de cumprimento do Acordo de Paris, da consideração de princípios

ambientais e sociais na implementação dos projetos e da transparência na monitorização e reporte das

emissões.

Não podemos continuar neste caminho que vai destruir a humanidade e a nossa casa comum. Os recursos

ambientais não podem continuar a ter valor nulo na economia mundial e só através da repercussão do valor dos

recursos do planeta nas opções dos agentes económicos será possível evitar a calamidade iminente.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Maria

Cardoso, do BE.

O Sr. José Maria Cardoso (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Silva, muito obrigado por ter

trazido este tema tão premente e tão atual a debate.

Gostaria de dizer, em jeito de consideração, que, depois de um ano em que o mundo assistiu a uma

mobilização à escala global sem precedentes, pedindo urgência na ação climática — grandiosas manifestações

de jovens se fizeram em todo o mundo —, gerou-se uma expectativa generalizada de que agora tinha de ser. O

que acontece é que os Governos mundiais, que tinham esta oportunidade perfeita para elaborar e acertar planos

de intervenção, tiveram como resposta algo muito frustrante em relação a esses objetivos.

Na verdade, a expectativa gorou-se e foi suplantada por essa mesma frustração.

Os líderes mundiais da conveniência, mais uma vez, valorizaram a economia, em detrimento da ecologia,

colocaram a política ao serviço dos interesses dos combustíveis fósseis, em detrimento das pessoas e do

planeta.

Houve, na realidade, muitos encontros, muitas conferências, muitos alertas. E é verdade que, neste aspeto,

a questão colocou-se, no âmbito mundial, em termos de agenda política e social. Mas, do resultado de tudo isto,

há uma evidência: é cada vez maior a desligação entre os interesses e as exigências das pessoas em relação

àquilo que é necessário fazer e aquilo que realmente os governantes estão dispostos a fazer.

O próprio slogan dizia que era «tempo de agir», e era nessa perspetiva que a ambição estava criada, de que

se chegasse a algum acordo, de que se chegasse, no fundo, a alguma concordância sobre aquilo que era

importante fazer-se. Na realidade, essa ambição foi mitigada.

Estive presente e assisti a muitos discursos presidenciais e ministeriais. Registei, por exemplo, que a palavra

«solidariedade» nunca fez parte do vocabulário desses discursos, que o assumir de responsabilidades próprias

nunca constou dessas obrigações.

Foi tudo, no fundo, um desfilar de interesses próprios, cada um no seu casulo, a discutir entre si a questão

de qual era o que mais estava a contribuir para as alterações.

É realmente frustrante perceber-se que nem sequer o famigerado artigo 6.º do Acordo de Paris, que consagra

o perverso mercado de carbono, foi capaz de ser alcançado. E até com uma consideração que acho

interessante, que é achar-se que de cinco em cinco anos é que as COP valem a pena, transitando estas

questões para Glasgow no próximo ano,…

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. José Maria Cardoso (BE): — … como se cada uma delas, intermédias, não se justificasse,

nacionalizando a questão e admitindo que ter estado na linha da frente dos anúncios da descarbonização, se

quisermos ser coerentes esses objetivos, implica a mudança de políticas de transição energética e a mudança

de paradigma.

Pergunto à Sr.ª Deputada do Partido Ecologista «Os Verdes» se concorda com a apresentação e aprovação,

hipotética, de uma lei de bases do clima que estabeleça metas e objetivos plurianuais e que crie uma comissão

de monitorização e acompanhamento das medidas a implementar.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Alma Rivera.

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Silva, a COP 25 escolheu exatamente

as que são, a nosso ver, as principais limitações na abordagem aos problemas ambientais. Para lá do habitual

adiamento de decisões, a COP 25 foi, como referiu a Sr.ª Deputada Mariana Silva, um desfile de intenções,

intenções essas que não são, também em Portugal, acompanhadas de uma apreciação crítica das razões que

levam à degradação do meio ambiente. Só isso e os interesses poderosos que gravitam à volta deste assunto

explicam que estejam a usar-se como solução exatamente os mesmos mecanismos de mercado, a mesma

desregulação, o mesmo desfasamento das necessidades reais que nos levam aqui mesmo a discutir.

Pergunto se a Sr.ª Deputada também partilha da sensação de que se poderia ter ido muito mais longe sem

se ter ficado pelo artigo 6.º do Acordo de Paris e o dinheiro que cada país teoricamente vai desembolsar.

Também pergunto se constatam que o problema do mercado de carbono não está na execução, mas na

ideia: comprar e vender o direito a poluir, num gigantesco negócio especulativo, com a União Europeia à cabeça,

com bancos a venderem aplicações financeiras de carbono. É isto que tem sido o alfa e o ómega das

negociações internacionais em matéria ambiental. Limitam-se a isto!

Ignora-se o modo de produção, a liberalização do comércio internacional, a logística necessária e os recursos

despendidos na produção quando orientada para o lucro. Assim não estamos a reduzir as emissões e a poluição.

Um país, uma região ou uma indústria que não cumpra as metas pode pagar a outro para compensá-las,

mantendo os seus níveis de poluição. Ganha créditos por investir em projetos ditos sustentáveis num país em

desenvolvimento. E aí, Srs. Deputados, falamos em comprometer o desenvolvimento soberano de parte do

mundo gerando eternas dependências.

Não, o problema do mercado de carbono não está na sua regulação nem na dupla contagem, que é absurda,

obviamente. Ele é ineficaz e perverso em toda a linha. Haverá sempre tendência a assumir metas não de acordo

com a real possibilidade e as necessidades ambientais, mas de acordo com os resultados económicos que se

pretendam produzir em cada momento.

O preço da tonelada de CO2 sujeito à oferta e à procura gera vários efeitos, o que explica parte dos bloqueios

negociais e contradições, mesmo entre potências, a que assistimos durante a COP 25. Aliás, há países cujo

principal objetivo é garantir que os créditos de Quioto transitem para o mercado de Paris.

Penso que concordaremos em concluir que para os grandes deste mundo, os senhores da finança, compensa

bem não adotar medidas de fundo, não transitar para energias mais limpas, não corrigir as desigualdades e

assimetrias e adiar a repartição correta das metas.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Faça favor de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — O que faz falta é um normativo justo, baseado no princípio da responsabilidade

partilhada, mas diferenciada, por serem históricas e cumulativas, que permitam o desenvolvimento dos países

de acordo com as suas necessidades, as do seu povo, harmonizadas com o nosso planeta.

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado

Bruno Coimbra, do PSD.

O Sr. Bruno Coimbra (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Silva, todos esperávamos certamente

mais desta COP: 2019 foi um ano de grande mobilização em todo o mundo em torno da ação climática e,

portanto, as pessoas, a sociedade civil, as organizações internacionais, nós próprios, todos esperaríamos

certamente mais desta COP.

Esta COP era a oportunidade para se avançar a passos largos e intensificar a ação climática, indo ao

encontro dos objetivos do Acordo de Paris. Contudo, os compromissos ficaram aquém do que a realidade exige.

Há um divórcio entre os países que reconhecem a urgência dessa ação climática e aqueles que a negam ou

que não a priorizam. Estávamos todos, certamente, à espera de mais, e os pequenos avanços obtidos não

chegam. Não chega a manifestação de intenções para a próxima COP, não chega reforçar os instrumentos

financeiros para ajuda aos países mais vulneráveis. É positivo, mas não chega, que haja mais países

comprometidos com a neutralidade carbónica ou que reconheçam a importância dos oceanos. Todos

esperávamos mais e é certo que, mesmo com menos força do que gostaríamos, a nossa Europa marcou uma

posição relevante com a apresentação do seu green deal.

No próximo ano, em Glasgow, vamos todos renovar o nosso compromisso com a ação climática. Pergunto

se Os Verdes se reveem na estratégia europeia e no green deal e pergunto como entende a Sr.ª Deputada que

nos devemos apresentar para evitar o fracasso da próxima COP.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Ainda para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr.

Deputado Ricardo Pinheiro, do PS.

O Sr. Ricardo Pinheiro (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, o Partido Socialista apoia perfeitamente as

declarações do Secretário-Geral das Nações Unidas em relação às conclusões da COP 25.

O Partido Socialista lamenta também que os mecanismos de controlo em relação às NBC dos vários países

da Europa e à escala mundial não tenham conseguido ser impostos nem ter-se chegado a acordo em relação

ao artigo 6.º nesta COP de Madrid.

O Partido Socialista lamenta também que, de facto, existam países produtores de créditos de carbono e não

queiram associar os seus níveis de poluição ao desconto desses mesmo créditos positivos.

O Partido Socialista lamenta também que, durante muitos anos, todos os mecanismos de cap-and-trade em

relação à limitação financeira dos mercados à volta do crédito do carbono não se tenham imposto de forma mais

rigorosa.

O Partido Socialista apresentou, no ano de 2018, um roteiro nacional para a descarbonização. Qualquer um

de nós que tenha a oportunidade de o ler perceberá as seis áreas da indústria onde Portugal e o Partido

Socialista querem fazer momentos de descarbonização: a agricultura, que são as medidas perfeitamente

descritas em cada um dos setores, bem como a energia.

Não posso deixar de relativizar uma questão importante: quando aplicamos verbas do fundo ambiental ao

investimento na mobilidade elétrica nos transportes coletivos, eu não sou capaz, se calhar pela minha

inexperiência parlamentar, de perceber se esse mesmo fundo ambiental não poderá ser utilizado na retirada de

carbono da mobilidade.

Achamos extraordinariamente importante que a economia consiga sair de um registo que retira valor somente

aos mercados financeiros e o introduza, de forma concreta e urgente, no renascimento da economia verde que

tem de existir à escala nacional.

O Partido Socialista aceita, mas questiona, o que para mim e para o Partido Socialista é extraordinariamente

importante: dentro do exercício que temos de fazer até 2030, de que forma e em que momentos devemos fazer

esta transição justa e de que forma vamos otimizar ou sacrificar setores que têm atividade industrial, mas que

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ao mesmo tempo devem fazer esta reconversão? Se calhar é desta forma que deveremos fazê-lo e pensar em

conjunto.

A nossa pergunta é, pois, a seguinte: como poderemos fazer a transição justa, cumprindo todos os níveis ou

todas as NBC que devemos apresentar em 2020 para a descarbonização à escala nacional?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Mariana Silva.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, começo por agradecer as questões colocadas pelos Srs.

Deputados André Silva, José Maria Cardoso, Alma Rivera, Bruno Coimbra e Ricardo Pinheiro.

Penso que todos concordam que a promoção e a adoção de políticas de adaptação ou mitigação das

alterações climáticas não podem ser olhadas como despesismo, porque estamos, sobretudo, a defender vidas

humanas, a preservar a biodiversidade e a defender a economia e as condições para o seu desenvolvimento.

Por isso, e respondendo ao Sr. Deputado Ricardo Pinheiro, acreditamos que é possível a compatibilização

da economia com a defesa da natureza, desde que se respeite a exploração dos recursos naturais e não se

acredite que eles possam ser infinitos.

Por outro lado, e respondendo também à questão colocada pelo Sr. Deputado Bruno Coimbra, de como

vemos a estratégia europeia: será que podemos concordar com uma União Europeia que quer liderar a

neutralidade carbónica até 2050, quando esta própria União Europeia defende e é favorável a políticas agrícolas

que favorecem o agronegócio, arrasando a agricultura familiar e promovendo a desertificação do interior? A

União Europeia que estabelece medidas de apoio a práticas agrícolas sustentáveis com benefícios ambientais,

com o respeito pela proteção do ambiente e da paisagem rural, dos recursos naturais e dos solos, como é o

caso do II Pilar da PAC, mas que — pasme-se ! — canaliza estes fundos para as grandes produções intensivas,

como é o caso do olival e do amendoal?

Indo ao encontro também do que dizia a Sr.ª Deputada Alma Rivera, será que podemos acompanhar a União

Europeia na defesa do mercado de carbono, onde os países ricos podem poluir porque têm dinheiro para pagar,

prejudicando o desenvolvimento dos países mais pobres e tornando-os ainda mais pobres?

Não vale a pena acenar só a bandeira, é necessária a mudança de políticas, e essa mudança não se escreve

só num programa de governo, não se escreve só num orçamento de Estado, não se escreve só nos roteiros

para a neutralidade carbónica de 2050. As pessoas continuam a viajar apinhadas, diariamente, no transporte

público coletivo, que é aquele que deverá ter prioridade de investimento, e, por isso, não basta dizer que se vai

fazer o investimento, tem de se passar das intenções à prática, e não é isso que está a acontecer.

Será que este Governo vai querer abrir serviços públicos no interior ou vamos continuar a acreditar que a

utilização de um passe apenas nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto a preços aceitáveis é suficiente?

Será que vamos ter a capacidade de levar a medida a todo o País? Será que vamos ter a capacidade de abrir

as linhas ferroviárias para o interior, que são tão necessárias, para que essas populações deixem de estar

isoladas?

Estas é que são as questões que devemos também referir no que poderá ser o nosso contributo para a

descarbonização.

Aplausos do PEV e do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Segue-se a declaração política do Partido Socialista.

Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Orçamento do Estado para

2020 aprofunda e desenvolve as boas políticas dos últimos quatro anos, atento às necessidades do presente e

de olhos postos no futuro.

É um Orçamento do Estado que reflete os compromissos do programa eleitoral do Partido Socialista e que

reflete as medidas previstas no Programa do Governo, discutido há semanas no Parlamento.

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É um Orçamento de continuidade, que salvaguarda os progressos alcançados na anterior Legislatura,

nomeadamente em matéria de recuperação de rendimentos e direitos sociais.

É um Orçamento que dá continuidade às boas políticas que levaram à criação de 350 000 postos de trabalho,

ao aumento do rendimento disponível das famílias e à diminuição das desigualdades sociais.

Aplausos do PS.

É um Orçamento que continua e reforça as políticas que impulsionaram o crescimento da nossa economia

que, há três anos consecutivos, cresce acima da média europeia.

É um Orçamento atento, virado para o reforço do apoio de quem mais precisa, como os jovens que ingressam

no mercado de trabalho, os idosos mais pobres e as pessoas com deficiência.

Aplausos do PS.

É um Orçamento que responde às necessidades do presente, com o reforço do investimento no Serviço

Nacional de Saúde, transportes e habitação.

É um Orçamento amigo das empresas, que reforça os apoios à internacionalização, às exportações e ao

reinvestimento dos lucros.

É um Orçamento com os olhos postos no futuro, que combate as alterações climáticas, responde ao desafio

demográfico e aproveita as oportunidades da sociedade digital.

Aplausos do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, este Orçamento tem prioridades bem definidas. O Serviço Nacional de Saúde é a

grande prioridade do Orçamento do Estado para o próximo ano. Nos últimos quatro anos, o investimento no

Serviço Nacional de Saúde ultrapassou 1000 milhões de euros, um esforço financeiro que permitiu inverter o

ciclo de degradação a que o Serviço Nacional de Saúde foi votado por PSD e CDS entre 2011 e 2015.

O caminho a seguir passa por reforçar o investimento na saúde. A dotação orçamental do Serviço Nacional

de Saúde para 2020 cresce 2000 milhões de euros face a 2015. No próximo ano, o Serviço Nacional de Saúde

terá mais médicos, mais enfermeiros e mais técnicos de diagnóstico e terapêutica.

O número de consultas e cirurgias continuará a aumentar. Serão construídos novos centros de saúde, outros

serão requalificados e serão criadas mais unidades de saúde familiar. Serão realizadas obras de requalificação

num conjunto de hospitais, serão reduzidas as taxas moderadoras na prestação de cuidados primários e

veremos o arranque dos projetos piloto de apoio aos cuidadores informais, em todo o território nacional, que

incluem a atribuição de um subsídio de apoio ao cuidador.

Aplausos do PS.

Outra prioridade será o investimento nos transportes públicos. O investimento nas infraestruturas ferroviárias

passará pelas linhas ferroviárias do Douro, do Oeste, do Algarve, do Minho e do Norte, …

O Sr. João Dias (PCP): — E o Alentejo? Onde está o Alentejo?

O Sr. João Paulo Correia (PS): — … pelos corredores internacionais Norte e Sul e pelas redes do Metro do

Porto, de Lisboa e pelo Sistema de Mobilidade do Mondego.

No próximo ano, novos autocarros, navios e automotoras da CP (Comboios de Portugal) estarão ao serviço

da melhoria do transporte público.

Uma terceira opção clara deste Orçamento traduz-se na melhoria das condições de acesso à habitação. O

Orçamento para as políticas de habitação é reforçado. O Programa 1.º Direito entrará em velocidade de cruzeiro

no próximo ano, uma pareceria entre a Administração Central e os municípios que está a criar soluções

habitacionais para pessoas que vivem em condições habitacionais indignas e que se encontram em situação

económica muito difícil.

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Aplausos do PS.

Os incentivos fiscais ao Programa de Arrendamento Acessível também serão reforçados de modo que mais

habitações sejam disponibilizadas no mercado de arrendamento a preços acessíveis, sobretudo para a classe

média.

Outra grande opção orçamental passa por intensificar o combate à pobreza, reforçando as ferramentas que

se têm demonstrado mais eficazes na redução da pobreza nos mais jovens e nos idosos. O salário mínimo é

aumentado para 635 €, as pensões mais baixas são aumentadas acima da inflação e o complemento solidário

para idosos é alargado de forma a que, a breve prazo, nenhum beneficiário desta prestação subsista abaixo do

limiar de pobreza. O abono de família é aumentado para crianças entre os 4 e os 6 anos de idade e a terceira

fase da prestação social de inclusão é aplicada a todas as pessoas com deficiência que beneficiam desta

prestação.

Aplausos do PS.

Uma quinta prioridade destina-se a apoiar o ingresso dos jovens no mercado de trabalho. O Orçamento prevê

que os jovens entre os 18 e os 26 anos que concluam o ensino secundário ou o ensino superior e ingressem no

mercado de trabalho possam beneficiar de uma redução significativa do IRS nos três primeiros anos de trabalho.

Ainda como prioridade deste Orçamento surge o reforço do apoio às empresas, nomeadamente às pequenas

e médias empresas (PME). As PME que decidirem reinvestir os seus lucros vão deduzir ainda mais no IRC —

a dedução máxima dos lucros reinvestidos aumenta 20% até ao máximo de 12 milhões de euros. As PME com

matéria coletável até 25 mil euros vão beneficiar de uma taxa reduzida de 17%.

Sr.as e Srs. Deputados, o Orçamento do Estado para 2020 não retrocede em nenhum medida adotada na

anterior Legislatura. Pelo contrário, todos os progressos alcançados desde 2016 são consolidados neste

Orçamento.

É um Orçamento que prossegue a política de melhoria de rendimentos, principalmente o das pessoas com

menor condição económica. Mais de 30 mil famílias deixarão de pagar IRS devido à atualização do mínimo de

existência. Será retomado o aumento salarial da Administração Pública, o que já não acontecia há 10 anos. Este

aumento salarial, somado ao impacto das medidas de progressão, promoção e combate à precariedade, faz

com que a remuneração média da Administração Pública em 2020 seja de 3,2%. A tarifa social de energia, a

oferta dos manuais escolares e o passe único são medidas que continuarão em 2020 a aliviar os encargos fixos

das famílias, melhorando assim o seu rendimento disponível.

É um Orçamento com uma forte aposta na valorização do interior. É um Orçamento que reforça a cooperação

com as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira. É um Orçamento que acelera o investimento público,

respondendo, deste modo, ao Plano Nacional de Investimentos, recentemente aprovado neste Parlamento.

É um Orçamento responsável e credível, com contas certas e equilibradas, e que continuam a ser essenciais

na trajetória de redução da dívida pública.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Vou concluir, Sr. Presidente.

Esta política orçamental tem permitido poupar, todos os anos, centenas de milhões de euros a favor do

investimento público. Hoje, os juros da dívida pública portuguesa estão mais baixos do que os juros de Espanha

e de Itália.

Defendemos que o Estado tem obrigação de acompanhar o esforço das famílias e das empresas na redução

do endividamento. Por isso, o excedente orçamental, para além de ser um marco histórico na consolidação das

contas públicas, é mais um avanço na redução da dívida pública, e reduzir a dívida pública significa combater a

maior ameaça à sustentabilidade da nossa economia.

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Sr.as e Srs. Deputados, estamos convencidos de que a linha de continuidade deste Orçamento é, pois,

merecedora de renovação do apoio de todos os que ajudaram a construir os progressos alcançados na anterior

Legislatura.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado João Paulo Correia, a Mesa regista a inscrição de quatro

Srs. Deputados para formularem pedidos de esclarecimento. Como pretende responder?

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Dois a dois, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem, então, a palavra, para um primeiro pedido de esclarecimento, a

Sr. ª Deputada Mariana Mortágua.

A Sr. ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado, fala-nos de continuidade, e a pergunta a

fazer é a seguinte: continuidade em relação a quê? Este Orçamento, como o anterior, é apresentado por um

Governo minoritário do Partido Socialista, mas isso não é continuidade.

O significado que o PS procura convocar quando fala em continuidade é outro. O PS procura convocar a

continuidade de Orçamentos aprovados no quadro de uma maioria parlamentar que já não existe, porque o PS

não quis fazer acordos de Legislatura; continuidade de Orçamentos negociados à esquerda, que acolheram

propostas da esquerda que deram passos visíveis na redução do IRS, na redução das propinas, no aumento

das pensões, nas reformas antecipadas.

Não foi esse o percurso desta proposta de Orçamento, que conhecemos na generalidade. Convenhamos

que a proposta é insuficiente, o investimento é insuficiente, não há compromissos concretos onde antes havia

acordos com a esquerda e não foram acolhidas as propostas que foram apresentadas nas negociações.

O Orçamento limita-se a fasear propostas que já tinham sido negociadas e aprovadas na anterior Legislatura,

condicionando a sua aplicação em 2020. Isso não é continuidade.

Este é o Orçamento do excedente orçamental, apresentado por um Governo minoritário do Partido Socialista.

Por isso, o que gostaria de perguntar é se considera mesmo que devemos deixar a Comissão Europeia

decidir por nós a redução do IVA da eletricidade, se considera mesmo que o Orçamento não tem de se

pronunciar sobre qual vai ser o aumento das pensões ou o regime de complemento solidário para idosos, se

considera mesmo — e pergunto-lhe se já viu os mapas do Orçamento — que temos de aceitar um Orçamento

que tem verbas para a habitação que são menos de metade daquilo que o PS prometeu em campanha eleitoral

e que não chegam para cumprir o Programa do 1.º Direito.

A Sr. ª Isabel Pires (BE): — Exatamente!

A Sr. ª Mariana Mortágua (BE): — Há, portanto, há uma inconsistência entre aquilo que é afirmado no

relatório do Estado e aquilo que está inscrito nos mapas dos Orçamentos para a habitação.

Considera mesmo que os trabalhadores por turnos têm de continuar à espera de ter uma resposta para poder

ter mais direitos?

Sr. Deputado — sem ameaças, porque quem não tem maioria absoluta não pode querer governar na base

da ameaça —, é a resposta a estas perguntas que vai decidir se este é ou não é um Orçamento de continuidade.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para formular um pedido de esclarecimento, o Sr.

Deputado Afonso Oliveira.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Paulo Correia, entusiasmou-se

excessivamente na sua declaração política. Relativamente ao Orçamento, utilizou três vezes a palavra

«continuidade» e, agora, a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua voltou a afirmar a continuidade.

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A Sr. ª Mariana Mortágua (BE): — Acho que não percebeu!

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Esse é que é o problema: este é um Orçamento de continuidade e não

deveria sê-lo, Sr. Deputado.

Ao longo de quatro anos, o Partido Socialista anunciou o fim da austeridade. O Partido Socialista e os partidos

à sua esquerda, a geringonça, anunciaram várias vezes o fim da austeridade. Anunciaram que tudo estava às

mil maravilhas, que Portugal era um exemplo a seguir, que vivíamos no melhor dos mundos e que os

portugueses iriam recuperar poder de compra.

Como sabemos, o problema do Partido Socialista, como hoje aqui constatámos nesta declaração política, é

a realidade. A realidade é que estraga tudo!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Exatamente!

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — A realidade impõe-se sempre, independentemente da narrativa. E a

realidade que os portugueses bem conhecem é a de que, cada ano que passa, suportam mais impostos. Todos

os anos o Governo consegue atingir novos recordesde carga fiscal e o Orçamento de 2020 será mais uma vez

recordista na carga fiscal.

A minha primeira pergunta, Sr. Deputado João Paulo Correia, é a seguinte: como é possível o Partido

Socialista e o Governo convencerem os portugueses a gostarem de um Orçamento que tem mais carga fiscal

do que o do ano anterior? Esta é a questão central!

Para além da continuidade, uma das questões centrais é percebermos como é possível apoiar um Orçamento

do Estado para 2020 em que a carga fiscal é muito maior que a do ano anterior?

Se fossemos Governo — não somos, é verdade, pois não ganhámos as eleições, embora haja quem tenha

governado sem ter ganho eleições —, o nosso caminho seria completamente diferente: evidentemente, faríamos

o caminho de, gradualmente, descer a carga fiscal, descer o IRS. Seria esse o nosso caminho.

Portanto, Sr. Deputado, esta é uma questão central sore a qual gostaria que me esclarecesse.

Sr. Presidente, já percebi que o meu tempo está a terminar, mas peço-lhe tolerância para colocar uma outra

questão.

Este quinto Orçamento de um Governo novo já com quatro anos — este é um Governo novo com quatro

anos, é um facto — é, mais uma vez, também, o Orçamento da falta de investimento público. Não vale a pena,

Sr. Deputado João Paulo Correia, vir dizer que vão apostar no investimento público, que vão apostar na saúde,

que «agora é que vai ser». Tenho uma grande expectativa para o ano de 2020, porque já percebi que vai ser o

ano em que «vai ser», mas a verdade é que para o ano de 2019 a previsão de investimento público era igual à

de 2020.

O problema é a realidade, o problema é a forma como cumpre esse Orçamento.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Vai ter de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — A pergunta é esta: este ano é que «vai ser» no investimento público? Este

ano é que «vai ser» nos impostos, Sr. Deputado João Paulo Correia?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado João Paulo Correia.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Afonso Oliveira, do PSD, gostaria de

começar por relembrar que a maior fatia da receita fiscal está sediada em três grandes impostos: o IVA, o IRS

e o IRC. Ao longo destes quatro anos, e também no Orçamento do Estado para 2020, nunca houve aumento de

nenhuma taxa do IVA, nenhuma taxa do IRS e de nenhuma taxa do IRC. Pelo contrário!

Aplausos do PS.

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A taxa do IVA para a restauração desceu, as taxas do IRS desceram, foram criados novos escalões do IRS,

foi eliminada a sobretaxa. Sabe como é que a direita votou todas estas propostas de descida do IRS e de descida

da taxa de IVA? Votou contra! Não estiveram a favor da baixa dos impostos!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Está baralhado!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Portanto, Sr. Deputado Afonso Oliveira, é importante que se faça aqui o

teste do algodão. O PSD também tem de se decidir.

Nestes dias, a propósito da entrega do Orçamento do Estado, ouvimos o PSD dizer, de manhã, que é preciso

baixar mais impostos e, à tarde, dizer que é preciso aumentar o investimento público.

Então, diga lá, Sr. Deputado, como é que vão fazer?

É que se baixam os impostos, descem a receita. Se aumentam ainda mais o investimento público, sobem a

despesa. Os senhores têm de dizer, se é para fazer isso, qual é a despesa que vão cortar ou que impostos é

que vão aumentar.

Aplausos do PS.

Vão aumentar impostos? Digam quais são os impostos!

Qual é a despesa que vão cortar? É a despesa com pessoal? É no Serviço Nacional de Saúde? Onde é que

vão propor cortar essa despesa, Sr. Deputado?

Sr. Presidente, respondendo agora à Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, direi que

acreditamos que este Orçamento do Estado é de continuidade porque ele tem uma forte carga de orientação de

esquerda política. Não temos a menor dúvida quanto a isso, porque reforçar o investimento no Serviço Nacional

de Saúde é dar continuidade àquilo que foi feito nos últimos quatro anos.

Aplausos do PS.

Reforçar o investimento nos transportes públicos, na ferrovia, na aquisição de material circulante, como está

a ser feito, é dar continuidade aos Orçamento do Estado da anterior Legislatura.

Reforçar a dotação orçamental no passe único é dar continuidade a uma das medidas emblemáticas da

anterior Legislatura.

E reforçar as prestações sociais, que têm ajudado a diminuir drasticamente a pobreza em Portugal, que têm

ajudado os mais jovens e os mais idosos, de aumento do abono de família — que é aumentado novamente em

2020, dando continuidade à Legislatura anterior —, do complemento solidário para idosos, da prestação social

para a inclusão, das pensões mais reduzidas, tudo isso são medidas que dão continuidade ao Orçamento

anterior.

Portanto, não temos a menor dúvida de que quem ajudou a construir as medidas que fizeram com que

Portugal e a sua economia conseguissem alcançar os resultados que são conhecidos, quer em matéria de

crescimento económico, quer em matéria de aumento do rendimento disponível das famílias, quer em matéria

de redução da pobreza, de certeza que não poderá estar contra as medidas que fazem parte e que constituem

a força política deste Orçamento do Estado para 2020.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Prosseguindo com os pedidos de esclarecimento, tem agora a palavra

o Sr. Deputado Duarte Alves.

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O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado João Paulo Correia, o PS decidiu

trazer a este debate o tema do Orçamento do Estado para 2020. Teremos muito tempo para discutir o

Orçamento, depois de analisarmos os seus conteúdos concretos.

Por agora, relativamente a esta proposta, que é da exclusiva responsabilidade do Governo PS, sublinhamos

que, não se registando retrocessos em muito do que foi possível alcançar nos últimos anos, a proposta

apresentada não prossegue e em diversos planos trava mesmo o necessário ritmo dos avanços que seriam

necessários para dar resposta aos problemas mais imediatos que a população enfrenta e aos problemas

estruturais do País.

Sr. Deputado, o Orçamento de que o País precisa não é um Orçamento de submissão às imposições de

Bruxelas, que ponha o objetivo de alcançar um excedente orçamental acima das reais necessidades do País.

O País precisa é de um Orçamento que dê resposta aos trabalhadores, valorizando os seus salários e

direitos; um Orçamento que dê resposta aos pensionistas, em que se assegure a continuidade dos aumentos

extraordinários das pensões, iniciados na anterior Legislatura por iniciativa do PCP, garantindo um aumento

mínimo de 40 € ao longo da atual Legislatura; um Orçamento que dê resposta à necessidade de investimento

nos serviços públicos, em particular na saúde, na educação, na cultura, nos transportes; um Orçamento que

reduza os impostos sobre os rendimentos mais baixos e intermédios e que tribute mais adequadamente os

rendimentos e património de elevado valor.

Dirá o PS que é preciso garantir o equilíbrio orçamental. Então, perguntamos: está o PS disponível para

acabar com as PPP (parcerias público-privadas), reduzindo a despesa de milhões de euros entregues aos

grupos privados? Está o PS disponível para avançar no englobamento obrigatório, acabando com a

possibilidade de rendimentos de capital serem tributados a taxas inferiores às de rendimentos de trabalho do

mesmo valor?

Como é que se justifica a opção de continuar a entregar centenas de milhões de euros ao Novo Banco, como

está previsto na proposta de lei de Orçamento?

Sr. Deputado, o PCP não desiste de nenhuma batalha antes de a travar. O compromisso do PCP é agir para

alcançar tudo o que seja positivo e necessário para responder aos interesses dos trabalhadores e do povo.

Neste Orçamento, como em todos os outros, é esse o nosso critério.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João

Pinho de Almeida.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Paulo Correia, vou colocar-

lhe três questões no início e outras três no final.

Sobre os últimos quatro anos — e uma vez que o Sr. Deputado disse que este era um Orçamento de

continuidade — queria colocar-lhe três questões muito simples. Se a governação do Partido Socialista e a gestão

orçamental do Partido Socialista têm o sucesso que o Sr. Deputado aqui anunciou, porque é que nós não

crescemos mais? Porque é que quase todos os países que se podem comparar connosco cresceram durante

os últimos quatro anos mais do que Portugal? E países que, há pouco tempo, antes da crise, tinham economias

muito mais frágeis do que a portuguesa.

Já vimos que as comparações, por exemplo no Relatório do Orçamento, são feitas da seguinte maneira: se

excecionarmos a Irlanda e os países do alargamento, Portugal teve um desempenho «assim ou assado», ou

seja, logo à partida, excecionamos quase metade da Europa para nos podermos comparar com alguém.

Portanto, os senhores têm de nos dizer onde é que está, do ponto de vista do crescimento económico, o

sucesso da gestão orçamental do PS.

A segunda questão que lhe coloco é a seguinte: por que razão há cada vez mais Estados da União Europeia

que têm um desempenho superior ao nosso? Nas últimas previsões, já só nos podemos comparar à Lituânia, já

não há mais ninguém com quem nos possamos comparar. Porque é que, por exemplo, no PIB per capita, no

rendimento por cada português, nós andámos a descer durante os últimos quatro anos e também estamos atrás

da esmagadora maioria dos países da União Europeia? Onde é que está o sucesso da governação do Partido

Socialista em matéria orçamental? Não está, certamente, no dia a dia dos portugueses, porque o dia a dia dos

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portugueses, segundo estes indicadores, não está suficientemente forte quando comparado com o dos parceiros

europeus.

As três perguntas que, a concluir, queria fazer-lhe sobre este Orçamento do Estado têm a ver com o seguinte:

é capaz de me dizer quantos agregados familiares têm dois filhos com menos de três anos? Isto é para sabermos

onde acaba a propaganda e onde começa a aplicação efetiva do Orçamento que os senhores aqui apresentam.

Quantas famílias é que podem beneficiar dessa medida?

Depois, quantos jovens, entre os 18 e os 26 anos, é que recebem o suficiente para beneficiar da medida que

lhes é conferida em sede de IRS? É que, para sabermos qual é o impacto das medidas que aqui nos trazem,

temos de saber — porque, para pagar IRS, é preciso ter rendimento suficiente para isso, pois, de outra maneira,

fica-se isento — quantos jovens, entre os 18 e os 26 anos, têm um nível de rendimento que permita beneficiar

disso. Isto é para sabermos, mais uma vez, onde é que acaba a propaganda e onde começa a aplicação efetiva

do Orçamento.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, tem de abreviar a última questão.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente. É já mesmo a última.

Por fim, gostaria de saber quanto vai descer a carga fiscal para sabermos em quanto, afinal, este Orçamento,

que beneficia tanto os portugueses, lhes vai desagravar a fatura fiscal. Isto é para sabermos onde é que acaba

a propaganda e onde começa a governação socialista.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, a redução da dívida pública é um objetivo maior para a

nossa economia.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Isso é verdade!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — A dívida pública é a maior ameaça para a sustentabilidade da nossa

economia. Fingir que não temos este problema pela frente é um erro clamoroso.

Aplausos do PS.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Quantos pontos percentuais cresceu em Governos socialistas?!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Por isso, é indisfarçável que um dos caminhos para se reduzir a dívida

pública é ter-se saldos positivos nas contas públicas, porque esse saldo positivo é totalmente canalizado para

reduzir a dívida pública. Ora, isso é fundamental para a sustentabilidade das gerações futuras, uma matéria que

certamente preocupa todas as bancadas parlamentares.

Mas esta consolidação das contas públicas e os bons resultados que temos tido em matéria de défice

orçamental — e, agora, de excedente — e também em matéria de redução da dívida pública têm permitido que

o nosso País pague cada vez menos juros da dívida pública, tendo essa poupança de juros da dívida pública

permitido aumentar o investimento público ano após ano.

Outra matéria fundamental que mostra a resistência da nossa economia — principalmente àqueles que têm

profetizado todos os anos que vem aí o diabo, apesar de ele nunca mais chegar — é que o peso do investimento

no PIB aumenta ano após ano, pelo que o peso do investimento no PIB, na nossa economia, em 2020, será

superior ao registado na média da União Europeia, o mesmo se passando em relação ao peso das exportações

no PIB, que crescerá acima da média da União Europeia.

Aplausos do PS.

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Protestos do CDS-PP.

Depois, é muito curioso ouvir agora o CDS preocupado com os jovens que outrora um Governo do qual fez

parte convidou a emigrar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Quantos são?!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — É curioso ouvir agora o CDS preocupado com os jovens, quando votou

contra medidas de Orçamentos anteriores que iam de encontro àquilo que os jovens mais precisavam: a sua

emancipação e o seu ingresso na vida ativa.

É também curioso ouvir agora o CDS preocupado com as famílias com filhos, porque os senhores foram os

responsáveis, com o PSD, pela introdução do quociente familiar no IRS, que levou a que as famílias com mais

dinheiro pudessem ter mais deduções em IRS do que as famílias com menor rendimento. E foi o anterior

Governo que introduziu a dedução específica por filho, o que permitiu que, em Portugal, entre 2016 e 2018, em

três anos, as famílias deduzissem, em sede de IRS, mais 500 milhões de euros do que deduziram nos anos

anteriores.

Aplausos do PS.

Protestos do CDS-PP.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — A base não é igual!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Este dado diz tudo acerca daquilo que foi o esforço em matéria de redução

de impostos sobre os rendimentos, designadamente de redução de impostos sobre os rendimentos daquelas

famílias que se encontram em situação económica muito difícil.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma declaração política, em nome do Grupo Parlamentar do PSD,

tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Luís Leite Ramos.

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Terminou ontem o primeiro período do

ano letivo 2019/2020. O balanço possível mostra que na educação — já o dissemos, repetimos e voltamos a

repetir — vive-se de propaganda, de experimentalismo iluminado, de meias-verdades, de números ficcionados,

de promessas sempre adiadas, de muitos cortes escondidos, no malabarismo da contabilidade.

Anuncia-se muito, concretiza-se poucochinho — «muita parra e pouca uva», como diz o nosso povo — e os

prejudicados são invariavelmente os mesmos: os alunos.

O que temos, efetivamente, é um Ministro da Educação que assume a sua não existência como receita para

a manutenção no cargo e que, ao sabor das notícias, diz o que não sabe, corta no que não deve, assume o que

não cumpre e não tem intenção de cumprir e promete o que não pode.

Foi assim durante os quatro anos do primeiro Governo socialista, em que o verbo que regeu a educação foi

«desfazer».

Tudo indica que a fórmula se irá manter nesta Legislatura. É a conclusão que podemos tirar deste primeiro

trimestre. Enquanto o Governo continua a congratular-se com o suposto bom arranque do ano escolar e os

alegados bons resultados da reforma educativa, temos os indicadores nacionais e internacionais a dar-nos

alertas. E, mais do que isso, temos a realidade, que toda a comunidade escolar se cansou de ver ser ignorada,

tendo ido para as ruas protestar.

Temos escolas fechadas por falta de funcionários, que este mesmo Ministro diz ter reforçado. Temos alunos

sem aulas e sem professores, que este Ministro diz ter valorizado. Com o mote de uma política de continuidade,

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temos efetivamente continuidade. Mas onde? No desinvestimento público, que se reflete em escolas não

intervencionadas com amianto degradado; na não substituição do parque tecnológico das escolas; nos serviços

e escolas estranguladas em recursos humanos e materiais, onde agora o que impera é o «jogo do empurra»

entre Governo e autarquias.

O Governo não assume a responsabilidade, não resolve. Só quem sofre as consequências é que está bem

identificado: mais uma vez, os alunos.

Agora, o argumento de que a culpa é do Governo anterior já não pode ser utilizado. O que é uma pena,

porque agora é que é efetivamente verdade! Foram o Governo socialista e os seus parceiros de esquerda que

fizeram as escolhas políticas de que hoje colhemos os resultados.

Aplausos do PSD.

O problema da falta de funcionários nas escolas não é novo, mas foi substancialmente agravado em 2016.

E, desde então, apesar da negação da realidade e da retórica oca do reforço, ainda não foi atingido o mesmo

nível de resposta funcional que existia em 2015.

Os últimos anos serviram para o mesmo Ministro da Educação desfazer políticas, retroceder, regredir nos

índices, sempre com um discurso invertido.

Foram quatro anos de logro que, a cada dia, atingem proporções mais expressivas. As falhas são óbvias e

fazem manchetes de jornais todos os dias. Mas o Sr. Ministro prefere ignorá-las e defender-se com cabalas.

Vem a este Parlamento anunciar reforço de meios, concursos para a contratação de pessoal, que ou não

arrancam ou são manifestamente insuficientes ou anulados. E, lá fora, as suas palavras fazem eco em cadeados

que fecham portões de escolas, que não funcionam por falta de condições mínimas para garantir o

acompanhamento e a segurança dos alunos.

O Sr. Adão Silva (PSD): — É verdade!

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — O Sr. Ministro vem a este Parlamento falar de números que só ele

conhece, jurando, a pés juntos, que o novo rácio estava a ser exemplarmente cumprido. E, lá fora, o que

sabemos é que são centenas as escolas onde os rácios não são cumpridos.

Os profissionais não chegam para acompanhar os alunos, muitos deles com necessidades educativas

especiais, não chegam para manter abertos laboratórios, bibliotecas, ginásios e outros serviços.

Em 2016, a tutela lá foi assumindo algumas faltas de pessoal, mas meramente pontuais. Estamos em 2019

e, agora, o argumento mudou para a má vontade das direções das escolas. Reconhecer a existência de

problemas reais nas escolas é coisa que não passa pela cabeça do Sr. Ministro. Sr. Ministro, o pior cego é

aquele que não quer ver!

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Alertámos para que o diploma da educação inclusiva impunha

necessidades acrescidas, rácios revistos, um efetivo conhecimento do terreno, o confronto com a realidade.

Fomos olimpicamente ignorados.

Diziam-nos o Governo e a bancada do PS que tudo tinha sido criteriosamente projetado, planeado, e todas

as necessidades acauteladas. Fomos, mais uma vez, apelidados de «arautos da desgraça». Infelizmente, os

factos voltaram a dar-nos razão.

Contudo, a tutela já afirmou que, em 2020, os rácios, afinal, terão de ser revistos. Talvez em 2021 possamos

esperar que o Governo socialista consiga repor o nível de resposta funcional de 2015 — seis anos depois! O

que mostra que a educação não foi, nem é, uma prioridade para este Governo, é um palco de experimentalismos,

de passos irrefletidos, de precipitações e de caprichos ideológicos, sem medir consequências, sem acautelar

necessidades.

Este primeiro trimestre foi marcado também pela continuidade do desinvestimento. Mais uma vez, a retórica

e a propaganda falam de modernização, de novas tecnologias, de transição digital. Mas a prática traduz-se num

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aumento de carga de trabalho burocrático para os professores, num parque tecnológico obsoleto e um Simplex+

que não chegou a passar os portões dos estabelecimentos de ensino.

Será em 2020! — é a promessa. Já o era em 2016 e, agora, continua em 2020. A pergunta óbvia é como é

que a promessa será cumprida, se o valor orçamentado para despesa na aquisição de bens de capital volta a

decrescer para 2020 — é de menos 17% face a 2019 — e as medidas Simplex+ diminuem 35% em relação a

2019.

O Sr. Adão Silva (PSD): — É verdade!

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — O balanço possível no final do primeiro período letivo é de uma crescente

preocupação das famílias com o estado de degradação de centenas de escolas e, em particular, com a presença

de amianto e placas de fibrocimento degradado, naturalmente prejudiciais para a saúde dos seus filhos.

Entre 2013 e 2015, foram intervencionadas 299 escolas. Em 2016, o Ministro de Educação afirmou que a

remoção de amianto era uma prioridade e que o que tem feito «é atuar para que todas as intervenções possam

resolver esta questão das placas de amianto».

O Sr. Primeiro-Ministro prometeu neste Hemiciclo que, depois de 2018, não haveria escolas com amianto.

Há! Muitas! Só não sabemos quantas porque o Governo se recusa a dizer a este Parlamento e ao País quantas

são.

Agora que a tutela da resolução do problema do amianto passou para as Finanças, será o rei das cativações

a decidir quando é que os nossos filhos deixarão de estar sujeitos a estudar em edifícios com amianto e com

placas de fibrocimento degradadas. Vamos aguardar.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Para terminar, Sr. Presidente, esta é a realidade das escolas portuguesas

e importa pouco que se escrevam promessas sobre prioridades e sobre a relevância estratégica da educação

para o futuro do País.

Este Governo não investe nas escolas, não valoriza nem credibiliza os professores, não acredita nos alunos.

Este Governo está a hipotecar o futuro dos nossos jovens neste País.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Sr. Deputado, a Mesa registou a inscrição de cinco Srs. Deputados para

formularem pedidos de esclarecimento.

Como pretende responder?

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Responderei, em conjunto, aos três primeiros e, depois, aos restantes.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana

Cunha.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, antes de mais, gostaria de saudar o Sr. Deputado Luís

Ramos por trazer a debate o tema da educação.

De facto, de norte a sul do País, têm sido inúmeras as dificuldades nas nossas escolas, levando a

encerramentos por falta de pessoal, por falta de transporte escolar, por falta de vontade política para resolver

problemas que já não são de agora e que se têm arrastado ao longo de sucessivos Governos.

Há muito para fazer no que diz respeito à educação, à colocação de diversos profissionais nas escolas, à

identificação e resposta às necessidades efetivas permanentes, à educação inclusiva, à retirada de amianto das

nossas escolas. Porém, gostávamos de lhe falar especificamente sobre o estudo do Conselho Nacional de

Educação relativo à seleção e recrutamento do pessoal docente, que conclui que Portugal não tem, nem teve,

um planeamento prospetivo para a profissão docente e alude à necessidade de uma reconstrução estrutural

premente nesta matéria.

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A atratividade da profissão da docência tem-se revelado cada vez mais baixa. É manifesta a insatisfação e o

estado de desgaste destes profissionais da educação, dos nossos docentes, perante colocações tardias e

distantes relativamente aos locais de residência, sem incentivos e horários reduzidos. Há, como já referi, falta

de incentivos ao nível da mobilização e da deslocação, falta de professores em determinadas zonas e

determinados quadros de recrutamento e um desaproveitamento da sabedoria dos professores com mais anos

de experiência.

Assim, Sr. Deputado Luís Ramos, gostávamos de lhe perguntar o que é que o Partido Social Democrata vai

propor para resolver estes problemas. Reconhece a importância da valorização, da dignificação e da

estabilidade destes profissionais e dará entrada de iniciativas que visem resolver estes mesmos problemas?

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Ana

Rita Bessa.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, agradeço ao Sr. Deputado Luís Leite Ramos por trazer

a debate a matéria que referiu na sua declaração política.

Gostava de recordar a audição de ontem do Sr. Ministro da Educação, em que falámos, por exemplo, do

tema dos funcionários. Soubemos ontem — diria eu, mas esta é apenas a minha opinião — que o Sr. Ministro

da Educação está um bocadinho perdido quanto a esta matéria. Senão, vejamos: no início de novembro, após

o arranque do ano letivo, o Sr. Ministro deu uma entrevista em que disse não haver nenhum problema estrutural

com a falta de funcionários nas escolas, mas que haveria, sim, problemas pontuais que tinham, sobretudo, que

ver com baixas por doença.

Relembro, já que estamos em tempo orçamental, que o Sr. Ministro da Educação tinha inscrito no Orçamento

do Estado para 2018 uma verba de 10 milhões de euros para o combate ao absentismo, o que seria uma

poupança que o Ministério iria fazer. No Orçamento para 2019, essa verba para o combate ao absentismo

continuou a estar inscrita e foi de 6 milhões de euros. Este ano, ao que parece, assim que se fez transpor para

as escolas o mecanismo de substituição por doença, já houve 600 substituições. Portanto, aparentemente,

pouco foi feito nos anos anteriores quanto ao combate ao absentismo, visto que já houve 600 substituições por

esta razão.

Diz o Sr. Ministro da Educação que, afinal, o problema já não é pontual. Agora, o problema é estrutural e é

por isso que no Orçamento do Estado volta a aparecer a ideia de rever a portaria de rácios, porque é preciso

uma nova portaria para se resolver de vez este problema. Gostava só de relembrar que esta novidade apareceu

numa segunda-feira, quando, na quinta-feira anterior, foi chumbada no Parlamento, pelo PS, uma série de

projetos, apresentados pelo PCP, pelo Bloco e pelo PAN, que visavam exatamente a revisão da portaria de

rácios.

Portanto, primeiro o problema era estrutural, depois tinha a ver com baixas e agora já é outra vez estrutural,

mas tem de ser o Governo a resolvê-lo. Não pode ser a Assembleia da República a fazê-lo através dos partidos

que eram parceiros, mas também já não o são.

Sr. Deputado, na verdade, nunca sabemos exatamente qual é o resultado da política do Governo em matéria

de educação, porque o Governo tem a má prática de não a tornar transparente. Mas a minha pergunta é mais

simples do que isso: qual lhe parece ser a capacidade de se confiar neste Ministro da Educação e na proposta

orçamental, quando vemos esta navegação à vista, que, consoante o momento político, tanto vai para um lado

como para o outro?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Mesquita para pedir

esclarecimentos.

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A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Leite Ramos, nestas questões, e permita-

me a analogia, o PSD é como o gato de Schrödinger — ora está vivo, ora está morto e até, em simultâneo, está

vivo e morto. Mas não deixa de ser gato, e mal escondido com o rabo de fora.

Vem cá, hoje, no papel de gato vivo, preocupado com a escola pública, com a falta de trabalhadores, com as

escolas que encerram por falta de auxiliares, de administrativos, de técnicos especializados, mas, na semana

passada, Sr. Deputado, fez o papel de gato morto…

O Sr. Duarte Marques (PSD): — O PCP fez de gato morto durante quatro anos!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — … quando um projeto do PCP esteve à votação recomendando a contratação

imediata dos trabalhadores em falta para a escola pública. E o que aconteceu? Votou a favor? Não! Preferiu

viabilizar o chumbo e deixar o problema por resolver.

O mesmo podemos dizer sobre a remoção de amianto e sobre tantos outros problemas que ficaram sem

resposta por parte do PSD.

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Com o PS, remoção de amianto, zero! E o PCP a aplaudir!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — Ou seja, vivo ou morto, o PSD não deixa de ser gato, tanto na oposição como

quando está no Governo, porque, no conjunto das opções políticas estruturantes para a escola pública, o que

defende, pratica e implementa são as soluções da política de direita que, ao arrepio da Constituição, impõem o

subfinanciamento, a precariedade, os despedimentos, a inexistência de gestão democrática, a desvalorização

social e profissional dos trabalhadores,…

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Está a falar para um espelho!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — … a elitização do ensino, o aprofundamento da estratificação social e a

reprodução das desigualdades.

Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.

Calma, Sr. Deputado! Calma.

Sr. Deputado Luís Leite Ramos, boas festas, mas não será com a ajuda do PCP que esse gato irá às filhós,

porque o que é preciso é uma política diferente, de insubmissão aos interesses privados que atacam a escola

pública. É nesse combate que poderá encontrar sempre o PCP, sem desistir de qualquer batalha antes de a

travar.

Como é que vão votar, Sr. Deputado, as propostas recorrentes do PCP sobre a carreira docente, sobre a

aposentação, sobre os horários de trabalho, sobre o combate à precariedade, sobre a reposição das carreiras

específicas, sobre o reforço da ação social escolar, sobre a gestão democrática?

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Estiveram quatro anos na box!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — Como é que o PSD vai votar?!

O Sr. Duarte Marques (PSD): — E como é que o PCP vai votar?

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — Já sabemos: vivo ou morto, o PSD continuará a ser gato.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Luís Leite Ramos.

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O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr. Presidente, agradeço às Sr.as Deputadas Bebiana Cunha, Ana Rita

Bessa e Ana Mesquita as perguntas que me fizeram.

Começando pela Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, queria dizer-lhe que consideramos que a única forma de

valorizar e de credibilizar a escola é, naturalmente, valorizando os professores.

Aplausos do PSD.

Sempre o dissemos e temo-lo defendido não na perspetiva como muitas vezes o Partido Comunista, o Bloco

de Esquerda e até o próprio Partido Socialista o querem fazer, ou seja, instrumentalizando de alguma forma a

escola pública, mas dando às escolas real autonomia e capacidade para gerirem o ensino e para, de algum

modo, o valorizarem.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, realmente, a audição do Sr. Ministro da

Educação foi exemplar e eu estava à espera que a Sr.ª Deputada Ana Mesquita viesse repetir aquilo que disse

ontem ao Sr. Ministro. Fico espantado e surpreendido até.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — O PSD é Governo? O PSD não está no Governo, ou está?!

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Mudou a cassete!

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — E sabe porquê, Sr.ª Deputada? Porque o gato do PCP tem o rabo preso.

Aplausos do PSD.

Tem o rabo preso e teve o rabo preso em quatro anos. Em quatro anos, repito.

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Muito bem!

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — E só agora, ao fim de quatro anos, é que descobriu que o Sr. Ministro não

existe, que é incompetente e incapaz.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — Está enganado! Tem estado muito desatento, Sr. Deputado!

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Andou, durante quatro anos, a suportar e a apoiar esta política de

educação e, naturalmente, compreendo o incómodo.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — Como é que vai votar o PSD?

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Compreendo a sua situação, querendo, desta forma, sacudir a água do

capote.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — Como é que vai votar o PSD?

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Durante os últimos quatro anos, enquanto a Sr.ª Deputada e os Deputados

do seu partido aprovaram religiosamente um Orçamento que depois não foi cumprido,…

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — Diga como é que vai votar o PSD!

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O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — … enquanto aprovaram e votaram favoravelmente um conjunto de

medidas que o Sr. Ministro veio cá prometer e depois não cumpriu, nós estávamos deste lado a denunciar essa

falácia.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — Como é que o PSD vai votar as propostas do PCP?

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — O PCP, com alguma pomposidade e cinismo até, ia dizendo que não

apoiava a política do Governo, mas no momento certo estava lá para votar Orçamentos e medidas fundamentais

para aprovar esta política.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — A muleta das políticas de direita sempre foi o PSD e o CDS!

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr.ª Deputada, não vale chegar aqui ao fim de quatro anos e dizer «nós

não temos nada a ver com o passado».

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — Está bem!

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — A política dos últimos quatro anos e os seus resultados são da

responsabilidade do Partido Socialista, do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista.

Aplausos do PSD.

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Os bons e os maus resultados!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP) — Mesmo não estando no Governo, sempre tivemos soluções para os

problemas!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Porfírio Silva.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Leite Ramos, a abordagem do PSD à escola

pública é mais do tipo «mixórdia de temáticas», ou seja, focar muita coisa para não falar do essencial. Mas nós

percebemos isso, porque é a técnica que o PSD usa para se esquecer e para nos tentar fazer esquecer das

suas responsabilidades.

É que, em matéria educativa, o passado não são quatro anos. Em matéria educativa, o passado são muito

mais anos, são gerações. Quem é que tirou mais de 20 000 professores da escola pública? O PSD e o CDS!

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Isso é uma aldrabice!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Quem é que precarizou o pessoal não-docente da escola pública e o despediu?

O PSD e o CDS!

Aplausos do PS.

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Isso é um disparate!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Quem é que destruiu o ensino…

Protestos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, peço que criem condições para que cada orador se

faça ouvir.

Sr. Deputado Porfírio Silva, queira continuar.

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O Sr. Porfírio Silva (PS): — Muito obrigado, Sr. Presidente.

Quem é que desvalorizou o ensino experimental das ciências na escola pública? O PSD!

Quem é que tentou destruir o Plano Nacional de Leitura? O PSD!

Quem é que fez metas curriculares completamente irrealistas e prejudiciais? O PSD!

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Quais são os resultados do PISA (Programa Internacional de Avaliação de

Alunos)? O PISA não diz isso!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Os senhores gritam muito, especialmente o Sr. Deputado Duarte Marques, para

evitar que os outros falem, mas ouçam. Custa ouvir, mas estas situações aconteceram e foi isto que os senhores

fizeram.

Aplausos do PS.

O PSD não se limitou a fazer maldades avulsas.

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Oh!…

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Durante o período de ajustamento, o PSD escolheu a escola pública para

sacrificar e,…

O Sr. Duarte Marques (PSD): — E agora qual é a sua desculpa?

O Sr. Porfírio Silva (PS): — … além do que estava previsto no Memorando de Entendimento, cortou para

cima de 1200 milhões de euros na escola pública. Porquê? Porque os senhores são contra a escola pública e

querem sacrificá-la.

Aplausos do PS.

Apesar de o PSD não falar daquilo que é estrutural, o PISA continua a mostrar três coisas essenciais de que

o Sr. Deputado não falou. Primeiro, que, desde 2000, a escola pública portuguesa tem vindo sempre a progredir.

Segundo, que há uma coisa que a escola pública ainda não está a fazer como deveria, que é compensar as

desigualdades sociais. O senhor não fala disso, mas deveria falar, porque isso é que nos deveria preocupar.

Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.

E há outra coisa que o PISA também mostra e da qual o senhor deveria falar. É que os anos do Crato,…

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Do Crato?!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — … que foram agora avaliados, mostraram — como eu próprio escrevi em 2016

— o que os senhores fizeram à educação em Portugal. Era sobre isso que os senhores deveriam responder,

mas o senhor só se dedica à espuma dos dias.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — O Sr. Deputado só se dedica a tentar estragar aquilo que se está a fazer, em

vez de olhar para a frente e tentar encontrar as convergências nacionais necessárias para valorizarmos aquilo

que tem de ser valorizado, que é a escola pública.

Vozes do PS: — Muito bem!

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O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Deputado, a minha pergunta é esta: quando é que acaba a campanha

eleitoral interna para começarem a dedicar-se a sério ao País?

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Ainda para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Luís Leite Ramos,

tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Mortágua.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Luís Leite Ramos,

todos nós temos um passado.

No passado do Bloco de Esquerda, na última Legislatura, está a vinculação de 7000 professores, a alteração

da norma-travão, o fim da BCE (bolsa de contratação de escola), o fim da requalificação dos professores com

horário zero, a vinculação de milhares de funcionários, a contratação de muitos técnicos de que a escola

precisava, a recuperação de bastantes obras que estavam congeladas — embora ainda não em medida

suficiente —, o direito aos manuais escolares gratuitos e a diminuição do número de alunos por turma.

No passado do Bloco de Esquerda está muita coisa da qual nos orgulhamos.

No passado do PSD estão manifestações, à porta da Assembleia, de camisola amarela. É isso que está no

passado do PSD: a defesa dos contratos de associação, a defesa das rendas, a transferência de dinheiro público

para colégios privados e desempregados, com subsídio de desemprego, a trabalhar na escola pública apenas

com direito ao subsídio de almoço.

Protestos da Deputada do PSD Cláudia André.

Mas o PSD, que tem, no seu passado, programas eleitorais que diziam que a escola pública devia ser

particular, cooperativa, privada, ou seja, tudo menos pública, agora quer defender a escola pública. Bem-vindos!

A Sr.ª Cláudia André (PSD): — Que hipocrisia!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — O PSD, que está preocupado com os funcionários, chumbou, não aprovou

a revisão da portaria de rácios que o Bloco de Esquerda aqui trouxe na semana passada.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — O PSD, que está preocupado com os alunos, não quis os manuais escolares

gratuitos, não quis a diminuição do número de alunos por turma.

Portanto, a única conclusão que podemos tirar, quando comparamos passados no presente e quando

comparamos coerências, é a de que a defesa da escola pública do PSD é instrumental, tão instrumental como

foi a defesa dos professores que o PSD tentou fingir que fazia na Legislatura anterior.

Por isso, depois de dizer que o PSD sempre defendeu os professores, amanhã terá a oportunidade de

mostrá-lo, pois iremos discutir um projeto de lei do Bloco de Esquerda sobre a recuperação do tempo de serviço

e da carreira dos professores. A pergunta que lhe faço é esta: como vai ser? Como vai votá-lo?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Luís Leite Ramos.

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr. Presidente, agradeço as perguntas dos Srs. Deputados Porfírio Silva

e Joana Mortágua.

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Sr. Deputado Porfírio Silva, compreendo — não sei se é incómodo — a forma um pouco agressiva até como

fez a sua intervenção, puxando a questão para um debate interno, relativamente a umas eleições no PSD, e

não discutindo, como deveria, aquilo de que estamos a falar.

Queria dizer duas coisas muito simples: eu defendo a escola pública — o PSD defende a escola pública! —

, mas os senhores defendem a escola estatal. Repito, os senhores defendem a escola estatal, o que é

completamente diferente!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Não somos cínicos como a Sr.ª Secretária de Estado, que defendia a escola pública mas tinha os filhos na

escola privada.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Nós não fazemos isso! O nosso conceito de escola pública é o conceito de escola acessível para todos, sem

restrições e gratuita. Os senhores defendem uma escola estatal. É, talvez, a sua costela mais esquerdista

relativamente àquilo que deve ser o serviço público.

O Sr. Deputado referiu uma série de números. Dou-lhe simplesmente um número, o qual pensava que o

senhor ia mencionar. Sabe qual foi a redução da taxa de abandono precoce entre 2011 e 2015?

O Sr. Porfírio Silva (PS): — E em 2018?

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — O senhor criticou a política do Governo do PSD, mas a taxa de abandono

precoce reduziu de 23% para 13,7%!

Sabe o que os senhores conseguiram entre 2015 e 2018? Passar essa taxa de 13,7% para 11,8%.

Poucochinho, poucochinho!

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Regrediram!

Protestos do PS.

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Portanto, a sua crítica de que houve, na anterior Legislatura, um ataque

à educação fica completamente desmontada com indicadores como este.

Mais: sabe quantos professores foram vinculados entre 2011 e 2015?

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Em crise, atenção!

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Foram 4000, com a troica que os senhores chamaram, durante a

bancarrota que os senhores criaram! Sabe quando é que foi isso?!

Aplausos do PSD.

Sr.ª Deputada Joana Mortágua, fiquei perplexo com a sua intervenção, porque estava à espera, como ontem

disse ao Sr. Ministro, que viesse colocar-se ao lado do PSD nas críticas concretas, objetivas e muito específicas

que fizemos relativamente à gestão da política de educação.

A Sr.ª Deputada perguntou-me — e eu já disponho de pouco tempo para responder — qual é o sentido de

voto do PSD. É o de sempre, Sr.ª Deputada!

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A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Ah!

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — É o de sempre, com as condições que sempre pusemos. Não é como o

Bloco de Esquerda quer. É dizendo que têm de ser salvaguardadas as condições financeiras para que tal possa

ser pago e garantindo, ao mesmo tempo, outras medidas que não são as que os senhores querem impor.

Protestos da Deputada do BE Joana Mortágua e da Deputada do PCP Ana Mesquita.

Não mudámos de opinião sobre essa matéria e manteremos sempre a mesma postura na defesa dos

professores, da recuperação do tempo de serviço e da valorização das carreiras.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Olhe que eles não acreditam nisso!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Vamos, então, passar à declaração política do Bloco de Esquerda.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Portugal tem níveis de

desigualdade e de exclusão social ainda preocupantes, mas há cidadãos cuja situação de vulnerabilidade é de

tal forma grave que não pode deixar de merecer a nossa atenção.

A situação de sem-abrigo, até há pouco tempo, era vista como uma fatalidade. Agora há, pela primeira vez,

o objetivo de dar resposta às pessoas que estão nesta situação e, para isso, precisamos de definir prioridades

com base na experiência nacional e internacional que tem sido desenvolvida e que tem funcionado.

As pessoas encontram-se numa situação de sem-abrigo por motivos complexos, que se cruzam com as

próprias consequências dessa condição. São problemas sociais, pessoais, familiares e até de saúde mental.

Por isso mesmo, as respostas devem ser articuladas, integradas e completas.

Com frequência, à situação de perda de emprego e de falta de uma rede de suporte familiar e social

coincidem casos de doença mental ou de consumo de drogas, que são obstáculos à recuperação e reintegração

social destas pessoas.

No entanto, há algo transversal a todos e a todas, que é a falta do mais básico direito dos direitos humanos:

o direito à habitação.

Portugal tem tido várias estratégias de integração das pessoas em situação de sem-abrigo, com o empenho

de muita gente, mas há ainda muito por fazer.

A estratégia que tinha o horizonte de implementação 2009-2015 foi interrompida em 2013 pelo Governo

PSD/CDS, o que significa que, nos anos em que Portugal foi mais afetado pela crise, quando o desemprego

estava no seu máximo e as prestações sociais foram cortadas, a resposta às pessoas em situação de sem-

abrigo foi simplesmente cortada pelo Governo de direita.

Entretanto, o Governo anterior criou a Estratégia Nacional para a Integração das Pessoas em Situação de

Sem-Abrigo, com o horizonte de implementação 2017-2023. Esta Estratégia prometia 131 milhões de euros para

responder à situação de exclusão social dos sem-abrigo até 2020. Passou o ano de 2017, o de 2018, o de 2019

e nem essa Estratégia saiu do papel, nem os 131 milhões de euros chegaram ao terreno.

Agora, o Governo vem anunciar um reforço de 7,5 milhões de euros para o País inteiro, contemplado no

Orçamento do Estado para 2020, para responder às necessidades das pessoas em situação de sem-abrigo.

Mas, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados, neste momento, apenas o município de Lisboa disponibiliza cerca de 4

milhões de euros por ano do seu próprio orçamento para esse mesmo apoio.

O valor agora anunciado perante o compromisso assumido é insuficiente para responder ao problema e para

cumprir este imperativo, assumido, inclusive, pelo próprio Presidente da República, que é o de oferecer uma

resposta social integrada a todas as pessoas que vivem na rua, que passará, natural e necessariamente, por

dar-lhes um teto.

O próprio Presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses e autarca do Partido Socialista,

Manuel Machado, denunciou que as câmaras municipais não têm sido apoiadas. O próprio Partido Socialista

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parecia, até agora, alheado deste problema e foi preciso uma forte pressão mediática sobre o tema para

existirem sinais de que a segurança social e o Governo estão a colocar em marcha um plano de longo prazo

dirigido ao combate à exclusão social e ao apoio aos cidadãos em situação de sem-abrigo. Só podemos lamentar

que tenha sido tão tarde, apesar das promessas.

Mas devemos sinalizar um facto importante. Apesar de insuficiente, a Câmara Municipal de Lisboa tem hoje

a resposta mais robusta a este problema e esta experiência deve servir de exemplo para o que pode ser feito

pelo Governo, que é recusar a resposta assistencialista e promover os direitos destas pessoas através da

reintegração numa casa, num trabalho e na sociedade.

Foi necessário um vereador do Bloco de Esquerda para a capital ter, finalmente, a resposta que esta questão

merece: até 2020, todas as pessoas em situação de sem-abrigo da capital vão ter uma resposta individual para

que possam sair da rua.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Ela está alicerçada na estratégia que tem tido melhores resultados a nível

internacional e que recusa a caridade como auxílio único. Chama-se Housing First, ou Casas Primeiro, e, até

2023, serão abertas 400 casas deste tipo na cidade de Lisboa.

A resposta habitacional neste modelo é o princípio base do programa, mas este inclui uma vertente de

integração social mais vasta para que cada pessoa construa o seu próprio projeto de vida. A casa é, assim, a

premissa fundamental para contruir um processo de autonomização, garantindo os restantes direitos.

Assinala-se a criação de uma bolsa de emprego, a projeção de programas de saúde geral, mental e oral,

mas também um apoio permanente, desde a empregabilidade à saúde, da formação à qualificação, à

reabilitação e à inserção na sociedade.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, ao contrário do que se tem vindo a fazer ao longo dos últimos anos,

numa lógica caritativa que poucos frutos deu, estamos hoje, felizmente, num momento de viragem. Iniciámos

um novo ciclo, com um novo paradigma que coloca a pessoa em situação de sem-abrigo no centro, dá-lhe as

ferramentas necessárias e promove a habitação e formas de recuperação de empregabilidade, entre outras,

sendo a promoção da habitação o cerne deste modelo.

Esperamos que as medidas adotadas em Lisboa possam fazer o seu caminho e inspirem o cumprimento,

por parte do Governo, da Estratégia Nacional. O combate à exclusão social tem de ser um compromisso claro

e assumido por todos e por todas e estes compromissos devem ser cumpridos rapidamente, pelo que se espera

uma resposta contundente e de execução concreta, incluindo da parte do Governo, com as promessas que fez.

Aplausos do BE.

Entretanto, assumiu a presidência o Presidente, Eduardo Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, cinco Srs. Deputados, sendo que a Sr.ª

Deputada Isabel Pires responderá em conjunto aos primeiros três e depois aos restantes.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Isabel Pires, com

toda a estima e consideração que merece, não posso deixar de me espantar com aquilo que ouvimos hoje. É

que parece que a Sr.ª Deputada vive numa realidade paralela, nomeadamente no que respeita à cidade de

Lisboa.

Lamento, mas, tendo também conhecimento direto daquelas que têm sido as dificuldades na cidade de

Lisboa, quer para implementar o projeto Housing First, quer para apoiar as associações que diariamente se têm

substituído à câmara ou ao Estado, não compreendo, de facto, que venha agora congratular-se por aqueles que

têm sido os avanços na cidade.

Recordo que, ainda no ano passado, quando o PAN pediu ao Executivo do PS, do qual o Bloco de Esquerda

fazia parte, que aumentasse a verba prevista para o alojamento — não era uma verba de 4 milhões de euros,

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como anunciou, mas de 700 000 € — para dar resposta às pessoas em situação de sem-abrigo, não só esta

proposta do PAN não foi acolhida, como não mereceu da parte do Executivo qualquer tipo de resposta.

Mais, Sr.ª Deputada: não preciso de recordar também um passado recente desta Assembleia, em que o

Bloco de Esquerda não acompanhou a preocupação do PAN em eliminar barreiras burocrático-administrativas,

que obstam a que as pessoas acedam ao cartão de cidadão.

Sejam bem-vindos, Sr.as e Srs. Deputados, porque ficamos muito satisfeitos por ver que acompanham aquela

que é, finalmente, uma vitória do PAN e uma preocupação da sociedade civil, com o projeto Housing First. Neste

aspeto, felicitamos o Governo por ter acolhido o pedido do PAN para alargar a todo o País a resposta do projeto

Housing First, para que, de facto, se deem garantias e se efetive aquele que deve ser um primeiro direito, o

direito à habitação — aquilo que permite retirar as pessoas da rua, dar-lhes um teto e garantir que, a partir daí,

reabilitamos o indivíduo.

Sr.ª Deputada, queremos saber se é desta que contamos com o Bloco de Esquerda para nos acompanhar

nesta preocupação. É que há múltiplos fatores que concorrem, efetivamente, para que as pessoas continuem

na rua, desde a pressão imobiliária à saúde, nomeadamente a saúde mental — o PAN pediu ao Governo que

reforçasse em 10 milhões de euros os programas de saúde mental, pois é importante que lhes seja dada

concretização, além da necessidade de apostarmos mais na prevenção —, e, também, a empregabilidade.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Empregabilidade? O problema é que os sem-abrigo não são empregáveis?!

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Não vivemos, de facto, num mundo cor-de-rosa, nem o País é Lisboa.

Portanto, Lisboa ser apontada como uma miragem a atingir, quando só hoje foi levado à Câmara Municipal o

plano para a reintegração das pessoas em situação de sem-abrigo, não é um bom exemplo. Compararmos

aquilo que é menos mau com a realidade má do País não é solução.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que termine, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Concluo já, Sr. Presidente.

Deve haver, de facto, um compromisso de todas e de todos no sentido de combatermos este flagelo, mas

não tapemos o sol com a peneira, Sr.ª Deputada.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Firmino Marques, do Grupo Parlamentar do PSD, para

pedir esclarecimentos.

O Sr. Firmino Marques (PSD): — Muito boa tarde, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados.

Sr.ª Deputada Isabel Pires, a questão que trouxe a Plenário não aconteceu nos últimos quatro anos. Numa

análise da coesão social na União Europeia, no período de 2001 a 2010, a Comissão apresentou, pela primeira

vez, ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões o projeto

de relatório conjunto sobre a inclusão social, um documento político sobre pobreza e exclusão social na União

Europeia. Já lá vão, pelo menos, 10 anos.

Podemos dizer que, em linha com esta preocupação e com a cooperação entre o Estado e as instituições

particulares de solidariedade social — ou instituições legalmente equiparadas —, assume uma importância

central e vital, ao nível do desenvolvimento de serviços, respostas e equipamentos sociais para a proteção social

dos cidadãos, o PROCOOP, Programa de Celebração ou Alargamento de Acordos de Cooperação para o

Desenvolvimento de Respostas Sociais, aprovado pela Portaria n.º 100/2017.

Sinal de que a questão dos sem-abrigo não está bem assumida é a atividade intensa do Sr. Presidente da

República à volta deste assunto, tal como a de cada um de nós.

A Sr.ª Clara Marques Mendes (PSD): — Exatamente!

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O Sr. Firmino Marques (PSD): — É necessário passar das palavras aos atos, como foi dito, lembrando que

se encontra em fase de preparação o próximo Orçamento do Estado.

Ao procurarmos ajuda na área da habitação, não podemos desligar a problemática dos sem-abrigo das

questões do emprego e da saúde, envolvendo a Segurança Social, o Instituto do Emprego e da Formação

Profissional e outras entidades, quer particulares, quer governamentais, com verdadeiros compromissos.

Identificados os problemas e a questão nacional dos sem-abrigo, o facto é que, em novembro de 2019,

decorreu a fase final de candidaturas ao PROCOOP para o enquadramento de uma resposta inovadora — que

é para isso que ele existe —, como o Housing First, ou Casas Primeiro, que, na sua origem, na Finlândia, mostra

que é possível obter uma redução de custos bem expressiva para cada beneficiário de assistência.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de terminar.

O Sr. Firmino Marques (PSD): — Vou concluir, Sr. Presidente.

Mas, quanto a este problema nacional, que a todos preocupa, não há nem uma linha de respostas concretas,

a não ser que continua em análise, uma resposta que já se obteve às candidaturas ao PROCOOP efetuadas

em 2017.

Sr. Presidente, para concluir, devo dizer à Sr.ª Deputada Isabel Pires que este é um estilo de avaliação e de

respostas aos problemas de governação a que, afinal, já estamos habituados.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que termine mesmo.

O Sr. Firmino Marques (PSD): — Pergunto: por esta via, é esta a ajuda real para retirar os sem-abrigo da

rua?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do Grupo Parlamentar do

Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, agradeço à Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real e ao Sr. Deputado

Firmino Marques as considerações e as questões sobre uma matéria que, para o Bloco de Esquerda, é da

máxima importância — e não o é agora, nos últimos dois anos ou nos últimos quatro anos, mas sempre foi.

Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, foi preciso um trabalho muito grande para perceber qual era a realidade

e quais eram as soluções existentes, porque, até há dois anos, o sistema vigente era puramente caritativo, que

não tinha uma resposta articulada às pessoas em situação de sem-abrigo.

Ninguém vive num mundo cor-de-rosa, especialmente na cidade de Lisboa, até porque o Bloco de Esquerda

não chegou agora à crise da habitação, não chegou agora aos problemas sociais que foram criados pela crise

da habitação ou à crise que sofremos durante o tempo da troica.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Portanto, desde essa altura que trabalhamos para resolver estes problemas. O

que não fazemos é acompanhar estereotipizações relativamente às pessoas em situação de sem-abrigo, que é

aquilo que o projeto do PAN faz relativamente à questão que aqui referiu, e bem.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — O programa Housing First parte de uma premissa absolutamente essencial — a

qual, já agora, está prevista na lei —, que tem que ver com a habitação, com a casa. Sem partirmos da premissa

de a pessoa ter um teto onde morar, não conseguimos passar para o resto.

Por isso é que, neste momento, as pessoas sem-abrigo já têm, por lei, direito ao cartão de cidadão, como

qualquer outra pessoa, e é assim que faz sentido. Já podem dar outra morada. A Lei de Bases da Habitação,

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no artigo 12.º, garante o direito a uma morada postal e, portanto, a resposta que tem de ser dada é a casa, é a

habitação.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — E é nesse sentido que a nossa intervenção vai.

Para responder também ao Sr. Deputado Firmino Marques, o objetivo desta declaração política é que, de

facto, se possa olhar para um programa que funciona e que tem resultados positivos internacionalmente e se

possa transformá-lo e operacionalizá-lo no Orçamento do Estado. Sabemos qual foi a proposta relativamente

ao reforço que está a ser feito no Orçamento do Estado, mas aquilo que dizemos é que é preciso ir mais além

nesse reforço, porque as autarquias necessitam deste apoio, que, até agora, não tem sido dado.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada Isabel Pires, há mais dois Srs. Deputados inscritos para pedir

esclarecimentos.

Em primeiro lugar, em nome do Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Marcelino.

A Sr.ª Catarina Marcelino (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, queria agradecer ao Bloco de

Esquerda e à Sr.ª Deputada Isabel Pires o tema da sua intervenção, que é muito importante e muito caro ao

Partido Socialista.

Gostava de salientar que o Partido Socialista, quando chegou ao Governo, em 2015, detetou que a Estratégia

tinha sido interrompida em 2013, período em que era mais necessário reforçar o apoio social, porque estávamos

num momento de crise. Ora, a Estratégia foi interrompida pelo Governo PSD/CDS e ainda hoje estamos para

perceber porquê.

Gostava de salientar ainda que foram as instituições sociais e alguns municípios, nomeadamente o de Lisboa,

que, durante o período em que não houve Estratégia, continuaram a trabalhar e a dar resposta, no terreno, às

pessoas sem-abrigo.

Também gostava de referir que a Estratégia que foi novamente posta no terreno — que se iniciou em 2017

e que termina em 2023 — foi aprovada através de uma resolução de Conselho de Ministros, o que dá uma força

política diferente à Estratégia.

Quanto ao financiamento da Estratégia, os 131 milhões de que falou não correspondem a dinheiro para

entregar aos municípios. Se for ver bem o financiamento da Estratégia, estamos a falar de dinheiro que as

instituições públicas, nomeadamente o SICAD (Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas

Dependências), o IEFP, a Segurança Social, alocam à Estratégia. Isso é que perfaz o total dos 131 milhões.

Não está previsto em lado nenhum que parte dessa verba seja entregue aos municípios.

O município de Lisboa integra agora 4 milhões — e bem —, que são o seu contributo para a Estratégia.

Queria saudar também esta iniciativa do município de Lisboa, através da qual uma câmara socialista, com a

Misericórdia de Lisboa, está a dar um exemplo ao resto do País, nomeadamente através do Housing First, de

que falou, e bem. De facto, é preciso um teto, porque, sem um teto, sem uma casa, não há solução para as

pessoas sem-abrigo.

Para terminar, queria perguntar-lhe, Sr.ª Deputada, se entende que esta iniciativa da câmara de Lisboa deve

ser um exemplo…

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, peço-lhe que conclua.

A Sr.ª Catarina Marcelino (PS): — Vou só mesmo fazer a pergunta, Sr. Presidente.

Pergunto à Sr.ª Deputada se a sua opinião é a de que este exemplo que a câmara de Lisboa deu ontem se

deve estender a todo o País e de que a coordenação das estratégias deve ser dos municípios e das redes

sociais.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: — Tem ainda a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, do

Grupo Parlamentar do PCP, e depois, então, a Sr.ª Deputada Isabel Pires responderá.

Faça favor, Sr.ª Deputada Diana Ferreira.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, gostaria de cumprimentar a Sr.ª Deputada Isabel Pires pelo

tema que referiu na sua declaração política.

Devo dizer, desde já, que, para o PCP, o problema das pessoas em situação de sem-abrigo é uma violação

de direitos humanos fundamentais, pelo que se exige naturalmente que sejam tomadas medidas eficazes,

medidas que deem resposta a este problema no imediato, mas também medidas de fundo que combatam que

estas realidades se venham a repetir, no futuro.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — É fundamental dar prioridade a ações que promovam a inclusão social das

pessoas em situação de sem-abrigo, de modo a garantir que ninguém dorme na rua e que a sua eventual

passagem por um alojamento temporário é limitada ao tempo estritamente necessário para que lhes possa ser

dado um alojamento digno e a sua própria habitação, que é também um direito fundamental e um direito

constitucional.

Esta problemática tem de ser integrada em vários domínios, com políticas transversais, na garantia de

emprego com direitos para estas pessoas, na garantia do reforço da proteção social, na garantia e no acesso a

um conjunto de direitos sociais, nomeadamente na área da saúde — saúde oral, saúde visual e também saúde

mental, que é uma necessidade bastante sentida nesta área. Naturalmente, isso exige uma resposta integrada

e medidas transversais.

Claro que, nesta realidade, as questões da habitação assumem uma importância absolutamente central. E,

Sr.ª Deputada, no concelho que referiu como exemplo, a estratégia para a habitação não faz qualquer referência

às pessoas em situação de sem-abrigo. Por isso, o pior que podia acontecer era que contribuíssemos, também

neste debate, para uma ideia de que seria através de uma multiplicidade de estratégias locais em todo o País

que se resolveria o problema das pessoas em situação de sem-abrigo, em Portugal.

O Sr. Firmino Marques (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Há, efetivamente, no nosso País, realidades diferentes entre as pessoas em

situação de sem-abrigo, mas esta tem de ser também uma responsabilidade do Estado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Desde logo!

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Há uma Estratégia Nacional para esta matéria, mas não podemos passar

de estratégia para estratégia sem resolver problemas de fundo e sem garantir a existência de medidas

estruturais que garantam que estas situações nunca mais se venham a repetir.

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Gostaria de conhecer a opinião do BE sobre esta mesma matéria,

perguntando-lhe se não acha que a Estratégia também deve vir acompanhada de medidas estruturais, para que

estas situações não se venham a repetir.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do Bloco de Esquerda.

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A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, agradeço à Sr.ª Deputada Catarina Marcelino e à Sr.ª Deputada

Diana Ferreira as questões colocadas.

Sr.ª Deputada Catarina Marcelino, aquilo que disse é bastante importante, porque o facto de, em 2013, se

ter interrompido a Estratégia, numa altura em que o País, provavelmente, mais necessitava de que estas

matérias pudessem ter concretização, é um sinal da posição do PSD e do CDS relativamente a esta questão. O

paradigma era errado, porque assentava na caridade e no assistencialismo, ao contrário do paradigma de que

agora estamos a falar, que assenta em dar competências às pessoas que estão em situação de sem-abrigo

para que possam refazer os seus projetos de vida através da questão de base, que é a habitação.

Por isso, também é verdade que é um sinal positivo que, em 2016, se tenha retomado a Estratégia, sendo

certo, como disse na minha intervenção, que, durante este tempo, várias pessoas continuaram a trabalhar nesta

matéria. Aliás, o próprio Parlamento, desde aí, nomeadamente na Comissão de Trabalho e Segurança Social,

tem tido vários posicionamentos e debates relativamente a esta matéria e à forma como a Estratégia foi ou não

aplicada e vai ou não ser aplicada, no futuro.

Sobre a questão do financiamento e da coordenação de estratégias, o que tem a ver também com a pergunta

que foi feita pela Sr.ª Deputada Diana Ferreira, há um aspeto que nos parece absolutamente essencial. É certo

que os modelos como o Casas Primeiro, mas também outros muito semelhantes a este, funcionam bem em

coordenação de estratégias a nível municipal, porque é mais fácil haver essa proximidade com as pessoas em

situação de sem-abrigo. Mas uma questão que, para nós, é fundamental: o Estado não se pode

desresponsabilizar relativamente a esta matéria.

Se existe um posicionamento e uma atitude no sentido de dizer que este é um problema nacional e que a

resposta tem de ser um desígnio nacional, então, o financiamento destas estratégias tem de ser também do

ponto de vista nacional. Claramente, os municípios fazem aquilo que conseguem, articulam as estratégias que

têm capacidade de articular, mas, sem dúvida nenhuma, há um papel fundamental de financiamento do Estado

relativamente a estes programas.

Portanto, é essa a posição que vamos continuar a marcar, porque achamos que, de facto, este programa,

como está a ser implementado, tem vantagens muito grandes, do ponto de vista social, para as pessoas que

estão em situação de sem-abrigo, especificamente. A única maneira de garantir que se chega de forma

igualitária a todo o País é, de facto, existindo essa ajuda por parte do Estado central para fazer cumprir este

desígnio, que se diz nacional.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Ao abrigo do n.º 2 do artigo 71.º do Regimento da Assembleia da República, tem a

palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não venho falar do

Orçamento. Há vida para além do Orçamento. Aliás, o melhor dos orçamentos serviria de pouco a Portugal hoje,

porque se não resolvermos antes um problema que tem décadas, que tudo bloqueia e tudo mancha, não poderá

haver verdadeiro desenvolvimento em Portugal. E é desse problema que venho aqui falar hoje, que é a

corrupção.

O Governo anunciou recentemente a criação de um grupo de trabalho para preparar uma estratégia nacional

contra a corrupção. Vem tarde mas, lá diz o povo, «mais vale tarde do que nunca».

Só que se esta estratégia se basear nas vagas medidas que estão no Programa de Governo, podemos

esperar mais do mesmo: intenções piedosas, medidas que ficarão bem em títulos de jornais e nenhuns

resultados práticos.

Esta é a radiografia do estado a que as coisas chegaram: no primeiro semestre deste ano, segundo noticiado,

94% — repito, 94% — das queixas de corrupção foram arquivadas, sobretudo por falta de meios humanos e

técnicos para obtenção de prova; a maioria das medidas anticorrupção aprovadas no pacto da justiça nunca

foram concretizadas; há mais de uma década que está prevista na lei a criação dos gabinetes de assessoria

técnica e, até hoje, nem vê-los; Portugal é o país que menos implementou as recomendações do GRECO (Grupo

de Estados Contra a Corrupção), o órgão anticorrupção do Conselho da Europa; a corrupção custa a Portugal,

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de acordo com um relatório, que aqui cito, da Associação Transparência e Integridade, cerca de 18 mil milhões

de euros por ano, mais de 8% do PIB e quase o dobro do orçamento da saúde.

Para além disso, Portugal é também o país cujo Governo agora quer uma estratégia nacional contra a

corrupção mas que quis, no princípio do ano, remover a palavra «corrupção» do relatório da OCDE, de acordo

com ex-Ministro Álvaro Santos Pereira.

Protestos do PS.

Portugal é um dos países que tem mais casos mediáticos de corrupção. Isto não é por acaso mas porque

existe demasiado poder concentrado no Estado, e esse poder, por sua vez, está concentrado num pequeno

número de pessoas.

O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Isso é no privado!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — É nos países liberais que há melhor posição no Índice de Perceção

da Corrupção (IPC), elaborado pela Transparência Internacional. Diminuir o tamanho do Estado, simplificar as

regras e reduzir o poder dos burocratas, diminui as oportunidades de corrupção.

Protestos do Deputado do PS Pedro do Carmo.

É por isso que o liberalismo funciona no combate aos corruptos: ao mesmo tempo que defende a liberdade

individual máxima, exige a máxima responsabilidade e fiscaliza em conformidade. O liberalismo é, assim, o

maior inimigo da corrupção.

Nesse sentido, o Iniciativa Liberal irá propor, em sede própria, medidas que facilitem a identificação, a

investigação e a acusação nestas matérias, como, por exemplo, a alteração à lei de financiamento dos partidos,

o reforço dos mecanismos de transparência das compras do Estado ou a expansão dos recrutamentos por

concurso público.

Protestos do PS.

E, por muito difícil que seja, não evitaremos a discussão de qualquer medida que possa ajudar a debelar este

flagelo, sejam ela a criação de tribunais especializados, o enriquecimento ilícito, os acordos de sentença ou a

colaboração premiada.

Protestos do Deputado do PS Pedro do Carmo.

Nenhuma destas discussões estará fora da mesa. E se alguma das soluções exigir que se mude a

Constituição, cá estaremos também para defender essa revisão. Entre insistir em não mexer na Constituição e

o combate firme à corrupção, o Iniciativa Liberal sabe bem de que lado está.

O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Dos privados!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Estamos conscientes de que não basta haver legislação adequada.

Precisamos de uma aplicação consistente, precisamos de forças de segurança e de investigação bem

qualificadas e bem apetrechadas e precisamos do escrutínio continuado de uma imprensa livre e independente.

Risos de Deputados do PS.

Por isso, para separar o trigo do joio entre quem quer e quem só finge que quer combater a corrupção, e

imbuídos de um certo espírito natalício, vimos aqui deixar três desafios a todos, a todos sem exceção.

Primeiro, o Iniciativa Liberal não acredita que deva ser um grupo de trabalho no Governo do Partido Socialista

a coordenar os esforços de combate à corrupção. Ser ingénuo ao ponto de acreditar que será o PS, que há

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décadas domina o sistema político português, que irá resolver este problema é como ser adulto e ainda acreditar

no Pai Natal.

Risos de Deputados do PS e do PCP.

Mas se o Governo insistir em manter este modelo, o primeiro desafio que aqui deixamos é o de que convide

uma personalidade de reconhecido mérito para liderar esse grupo. E desde já propomos o nome de Joana

Marques Vidal,…

O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Já cá faltava!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — … a ex-Procuradora-Geral da República não reconduzida no cargo

há pouco tempo por motivos ainda pouco claros. Está feita a proposta e aguarda-se a resposta.

O segundo desafio é que o exemplo tem de partir de nós mesmos nesta Casa. É lamentável que o Governo

ainda não tenha reagido ao escândalo noticiado há dias sobre a prescrição de multas de centenas de milhares

de euros à maioria dos partidos aqui presentes por via das alterações do ano passado à lei de financiamento

dos partidos, contra a qual, aliás, o Iniciativa Liberal sempre se bateu e continuará a bater.

Este é um caso de corrupção moral e da perda de credibilidade desta Assembleia e do regime.

No entanto, há multas relativas a outros anos que ainda não prescreveram. Eis, então, o segundo desafio:

em defesa dos portugueses e do bom uso do dinheiro dos seus impostos, instamos todos os partidos a não

utilizar manobras dilatórias e a não aproveitar a falta de meios da entidade fiscalizadora, que, aliás, este

Orçamento que apareceu ontem não reforça, e acabar com as prescrições das multas a partidos políticos. Seria

isso um exemplo excelente que daríamos ao País e um verdadeiro presente de Natal aos portugueses.

Finalmente, o terceiro desafio: como já dissemos, não confiamos em que o Governo trate destes assuntos

no seu grupo de trabalho à porta fechada. A frente do combate à corrupção tem de ser este Parlamento. Por

isso, iremos propor a criação de uma comissão eventual de combate à corrupção, com um mandato claro para

chegar a recomendações concretas num prazo definido. São precisos 10 Deputados para requerer esta

comissão. E daqui desafio mais 9, mais 99 ou mais 229 para se juntarem a nós no requerimento de criação

desta comissão.

São estes os três desafios de Natal do Iniciativa Liberal contra a corrupção. Aqui estaremos na frente do

combate responsável à corrupção e na frente da oposição irreverente aos que nada querem mudar.

Juntem-se a nós para dar estes três presentes de Natal aos portugueses.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se dois Srs. Deputados para pedidos de esclarecimento, a Sr.ª Deputada

Cláudia Santos, do Partido Socialista, e o Sr. Deputado João Pinho de Almeida, do CDS-PP.

Como pretende responder, Sr. Deputado?

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra a Sr.ª Deputada Cláudia Santos.

A Sr.ª Cláudia Santos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado João Cotrim de

Figueiredo, muito obrigada por nos trazer este tema, um assunto relativamente ao qual estamos todos de acordo:

a inegável danosidade social da corrupção.

Mas há outro ponto que parece também inegável, o de termos sistemas jurídico-penais mais punitivos do

mundo em matéria de corrupção e as alterações principais, que vou elencar de seguida, aconteceram com

governos do Partido Socialista. Portanto, se há partido que se pode orgulhar da sua herança em matéria de

repressão jurídico-penal da corrupção é o Partido Socialista.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e do CH.

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Vou elencar: em 2001, quando António Costa era Ministro da Justiça, criminalizou-se o recebimento indevido

de vantagem, que hoje está previsto no artigo 372.º do Código Penal e que significou a mais relevante inovação

em matéria de repressão jurídico-penal da corrupção,…

Protestos do PSD e do CH.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Não querem ouvir a verdade!

A Sr.ª Cláudia Santos (PS): — … porque significa que se tornou indispensável a prova do ato mercadejado

pelo agente público.

Foi em 2002 que se aprovou a Lei n.º 5/2002, que criou um regime processual penal extraordinariamente

eficientista, orientado para a repressão da corrupção. Vou dar exemplos: criou-se o confisco alargado, admitiu-

se a derrogação do sigilo bancário e fiscal, admitiram-se gravações de voz e imagem não autorizadas.

Protestos do CH.

Foi em 2001 que se alteraram os crimes de corrupção previstos nos artigos 372.º e seguintes do Código

Penal, eliminando a palavra «contrapartida» para evidenciar que era desnecessária a prova do sinalagma ou do

chamado «pacto de toma lá dá cá», no âmbito da corrupção.

Em matéria de repressão jurídico-penal da corrupção, os contributos que governos do Partido Socialista

deram pautam-se por se ter ido o mais longe possível do que é possível no âmbito da Constituição que temos.

Há uma série de outras…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para terminar, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cláudia Santos (PS): — Vou só fazer uma pergunta, Sr. Presidente.

O Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo trouxe-nos uma série de medidas que não são novas e que foram,

em grande parte, consideradas inconstitucionais. Refiro-me nomeadamente ao crime de enriquecimento ilícito.

Pergunto: é isso que defende? Medidas desconformes com a Constituição?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado João Pinho de Almeida, do

Grupo Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado João

Cotrim de Figueiredo, o tema que traz é muito relevante e o CDS também entende que é fundamental

conseguirmos dar resposta aos portugueses numa matéria como a da corrupção.

Elencar uma lista de medidas que já foram tomadas é nada mais, nada menos do que conseguir demonstrar

a ineficiência desse tipo de medidas perante aquilo que é a realidade existente, porque os portugueses não

reclamam, relativamente à corrupção, que haja mais medidas. Em relação à corrupção, os portugueses

reclamam que haja mais consequências.

Portanto, aquilo que deve preocupar qualquer responsável político é a eficácia da legislação existente. Não

nos adianta nada termos uma das melhores legislações do mundo se depois tivermos, do ponto de vista da

eficiência da aplicação dessas leis, uma taxa absolutamente insuficiente de condenações.

Portanto, queria perguntar-lhe três coisas. Primeira de todas: é ou não verdade que o primeiro inimigo do

combate à corrupção é o Estado grande demais…

Protestos do Deputado do PS Nuno Sá.

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… e, portanto, a multiplicação de intervenções do Estado, a necessidade de recurso ao Estado para qualquer

atividade que qualquer pessoa queira desenvolver, é ou não é, ela própria, fator de exponenciação das hipóteses

de corrupção? Assim, reforma do Estado e a diminuição da presença do Estado, a diminuição de atos, a

diminuição de taxas a pagar, a diminuição de procedimentos, é ou não um caminho fundamental para este

combate à corrupção?

Segunda questão: relativamente à comissão que propõe, não entende que, por vezes, essas comissões têm

junto da opinião pública o grande problema de parecer mais uma tentativa de resolver do que efetivamente uma

consequência clara para resolução do problema. Por isso, pergunto-lhe qual é o objeto que pretende para essa

comissão, para todos nós ponderarmos, na certeza de que para a constituirmos temos de garantir que,

efetivamente, acontece alguma coisa de diferente e melhor no combate à corrupção.

Por fim, se…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe para concluir.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É por fim mesmo, Sr. Presidente.

Sr. Deputado, entende ou não que é necessário mexer na relação entre o corrompido e o corruptor,

designadamente em sede de processo judicial, para que se consiga quebrar uma relação que, à partida, é uma

relação suficientemente forte, para que se consiga apurar a verdade e fazer prova em tribunal.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa

Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cláudia Santos, agradeço-lhe as

suas questões.

Sr.ª Deputada, penso que escreveu a sua pergunta antes de ouvir o meu discurso, porque nada do que

perguntou tem a ver com o que eu disse.

Protestos do PS.

Diz que temos um sistema legal mais punitivo, que já existem duas ou três leis, mas eu não falei na existência

de mais ou menos leis, disse que 94% dos processos de corrupção são arquivados, com o atual enquadramento

jurídico — é do primeiro semestre deste ano.

Protestos da Deputada do PS Cláudia Santos.

Falei no problema da aplicação das leis e nos meios e recursos atribuídos às forças de segurança e de

investigação que não estão a permitir que os processos cheguem onde devem chegar com celeridade, que é a

condenações.

Protestos do PS.

Finalmente, quando tenta pôr na minha boca posições inconstitucionais ou medidas inconstitucionais,

também não ouviu o que eu disse. O que eu disse, claramente, foi que não fechamos a porta a nenhuma das

questões difíceis; se alguma delas for considerada a melhor solução para acabarmos com este flagelo e se isso

implicar uma revisão constitucional, se a escolha for entre manter este estado de coisas e rever a Constituição,

não tenho dúvida nenhuma que é preferível rever a Constituição, repito, se for essa a melhor maneira de acabar

com este estado de coisas relativamente à corrupção.

Protestos do PS.

Sr. Deputado João Almeida, muito obrigado também pelas suas questões. Estamos de acordo relativamente

à oportunidade que sempre se gera de corromper e de ser corrompido quando há poder a mais, desde logo no

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Estado. De facto, desde logo no Estado, mas não ficaria por aí porque qualquer consideração de poder excessiva

cria oportunidades para corrupção. E sendo Portugal o país que é, isso é particularmente verdade nos poderes

do Estado. Aí estamos 100% de acordo.

Pergunta-me qual seria o objeto da comissão eventual. Aqui talvez eu peque por inexperiência parlamentar

mas pensei que este assunto tinha de ser trazido ao Parlamento e a figura mais digna que este Parlamento pode

ter, a importância maior que se lhe pode dar, é uma comissão criada especificamente para o efeito. E, como

âmbito, a ideia era que essa comissão se debruçasse sobre os muitos diagnósticos que foram feitos — e bem

—, aproveitasse até o trabalho que o Governo já iniciou, fazendo um relatório anual sobre corrupção, e fizesse

muito claramente um conjunto de recomendações concretas sobre quais são as melhores maneiras de obviar

àquilo que são os problemas que levam à não condenação, à interrupção de investigações, não chegando à

fase de acusação e de sentença em tempo útil. Quaisquer que fossem essas recomendações, essa comissão

teria a faculdade de lhes dar, digamos, a maior força deliberativa do Parlamento possível.

A relação entre corruptores e corrompidos, como é óbvio, é um elo que tem de ser quebrado para que

algumas dessas condenações aconteçam. Aí, mais uma vez, não vou antecipar a discussão. Há várias vias de

tentar obviar essa relação mas não me vou antecipar, até porque algumas delas coincidem com aquilo de que

a comissão deveria tratar.

Aproveito para fazer de novo o apelo para que se juntem nove bravos Deputados a este meu pedido de

constituição desta comissão.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, ao abrigo do mesmo n.º 2 do artigo 71.º do Regimento

da Assembleia da República, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta não era uma declaração política

que o Chega quisesse fazer, mas terá necessariamente de a fazer.

Vivemos tempos em que a liberdade de expressão é efetivamente colocada em causa. E é sobretudo

colocada em causa sempre e quando as instituições sentem que têm de responder aos desafios que lhes são

colocados. Seja com palavras proibidas, seja com figuras de qualquer tipo de regimento que procurem silenciar

partidos, esta é verdadeiramente uma forma e um cenário que só tem um nome: é um escândalo.

Como é um escândalo ouvir-se dizer que as principais e melhores medidas contra a corrupção vieram do

Partido Socialista. Tenho aqui e vou ler: junho de 2019 — repito, 2019, Srs. Deputados! —, Portugal é o País

que menos cumpre as recomendações em matéria de medidas anticorrupção. Deixem-me ver qual era o

Governo em 2019: era o Governo do Partido Socialista. É um escândalo que estejamos aqui a fingir que estamos

a falar para os cidadãos e por eles. É um relatório europeu!

Ora, é o mesmo relatório que, poucos dias depois, levou o Sr. Presidente da República a dizer que temos de

ter cuidado pois estamos muito atrás em matéria dos tais países que cumprem as medidas anticorrupção.

Deixem-me ver quem era o Presidente: Marcelo Rebelo de Sousa. E o Governo era do Partido Socialista.

Ouvir-se dizer aqui que o Partido Socialista está na luta contra a corrupção!? Quem está lá fora ri, sorri, volta

a rir, desliga a televisão, volta a ligar e pensa: será este o meu país? Será que estou a ver bem? Será que não

há um ex-Primeiro-Ministro — deixem-me ver de que partido é! — do Partido Socialista a ser julgado por

corrupção? E chegam aqui e dizem, com o maior desplante, que estão na liderança da luta contra a corrupção.

Protestos de Deputados do PS.

Isto só pode ter uma palavra, de facto, que é ser vergonhoso, em termos de discurso.

Mas, igualmente, na mesma luta, temos um documento apresentado a esta Casa, com algum atraso e com

algumas gralhas. É normal! As gralhas, depois, foram corrigidas pelo Sr. Ministro e, ostensivamente, o País é

apresentado como aquele que vai registar o grande crescimento acima da média europeia. Claro que, depois,

são feitas correções e percebemos também que há a tal maior carga fiscal europeia, ou a maior carga fiscal

relativamente ao PIB, em 35,1%.

É estranho que, num tempo e numa era em que há tanto crescimento económico, tenhamos também a maior

carga fiscal em termos de percentagem do PIB.

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É estranho, Srs. Deputados, que num tempo em que há tanto crescimento estejamos atrás no pagamento

dos fornecedores, e não por parte das câmaras municipais, não por parte das regiões autónomas, mas por parte

do Estado central que diz ter contas certas e que deixa assim empresas e famílias sem aquilo a que tinham

direito precisamente por fazerem negócios com o Estado.

É estranho vivermos num tempo em que há um crescimento tão acima da média, tão grande e tão próximo

de países que há uns anos estavam na antiga União Soviética, e não tenhamos dinheiro para o subsídio de risco

para os polícias ou para o subsídio de alojamento para os professores ou para dar um mínimo de dignidade aos

enfermeiros e aos profissionais de saúde. É estranho!

É estranho estarmos com o maior crescimento de sempre mas a atualização dos escalões do IRS ser feita

— imaginem! — abaixo da inflação, o que significa que estamos todos a perder poder de compra. Todos, desde

os senhores que aqui estão aos que estão ali e aos que estão atrás de mim, estamos todos a perder poder de

compra, e tantos a aplaudir essa perda de poder de compra. É como dizer: batam-me que eu gosto; continuem

a bater-me que eu gosto e aprecio.

Mas não deixa de ter também uma certa curiosidade ouvir as desculpas que a esquerda dá: «Ah, e tal, no

tempo do Passos era pior e há 20 anos era pior ainda e no tempo do Vasco Gonçalves, se calhar, ainda era

pior.»

É sempre a mesma desculpa. Estão há anos no Governo e mesmo assim a desculpa é sempre uma: Pedro

Passos Coelho, o PSD, o CDS e todos os que não estavam mas podiam estar.

Protestos do PS.

É sempre a mesma desculpa, com o mesmo nome: Pedro Passos Coelho.

Protestos do PS.

Sei que o nome Pedro Passos Coelho vos causa alguma indignação.

Protestos do PS.

Mas não deixa de ser estranho também…

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado continua no uso da palavra. Peço que haja tranquilidade na sala.

O Sr. André Ventura (CH): — Obrigado, Sr. Presidente.

Não deixa de ser estranho que um país com tal crescimento continue com tantos sem-abrigo na rua — ainda

agora aumentaram na Madeira — e tenha as portas abertas para a imigração ilegal, com hotéis e alojamentos,

mas não para os sem-abrigo portugueses e para os que tanto precisam.

Protestos de Deputados do PS.

Não basta olharmos para a televisão e vermos que metade da população está a pagar o IRS da outra metade,

mas sorrimos e dizemos que vai sempre ser assim. Há sempre metade do País a pagar à outra metade do País

aquilo que tem de fazer.

Já não é o país do crescimento, é o país do tirar a uns para dar a outros, do roubar aos mesmos para dar

aos mesmos de sempre, e esse não é certamente um país de crescimento.

Este não é um desafio de Natal, como dizia o meu antecessor neste palanque, é uma piada de Natal, já que

hoje acordámos e ouvimos o Sr. Primeiro-Ministro a dizer que não é de esquerda promover défices nem

aumentar a dívida. Por momentos, voltei a desligar a televisão, voltei a fechar os jornais e a lembrar-me se este

Primeiro-Ministro não era o Ministro da Justiça de José Sócrates que nos trouxe a troica e se este não é o partido

que trouxe três vezes a troica a Portugal.

Olhamos para isto e dizemos: que país é este em que estou, em que aparentemente aqueles que tinham a

responsabilidade de me governar são os primeiros a fazer piadas numa quadra tão importante como esta?

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Só uma última notícia para terminar, Sr. Presidente: podemos fazer as piadas que quisermos, podemos bater

palmas e podemos continuar, mas os portugueses, lá fora, não estão a bater palmas, estão preocupados com

a perda de poder de compra, com a insegurança, com a imigração ilegal.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir.

O Sr. André Ventura (CH): — É isso que a seu tempo será ajuizado. Este não é um desafio de Natal. Não

temos nenhum desafio de Natal. Quero apenas dizer-vos que fizeram a maior piada de Natal que este

Parlamento podia ter tido.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a Mesa regista quatro inscrições de Deputados para pedidos de

esclarecimento. Como pretende responder?

O Sr. André Ventura (CH): — Respondo dois a dois, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Portanto, no primeiro grupo de pedidos de esclarecimento estão os Srs. Deputados

Inês de Sousa Real, do PAN, e Pedro Delgado Alves, do PS.

Tem a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, quero dar apenas nota de que, uma vez que o tema é

transversal à intervenção do Sr. Deputado do Iniciativa Liberal e que, por lapso, não me inscrevi atempadamente

para o interpelar, irei reportar-me a ambas as intervenções.

Trago aqui uma preocupação que tem a ver com o momento que vivemos. Vamos começar a discutir, em

janeiro próximo, o Orçamento do Estado e em matéria de combate à corrupção existem algumas preocupações,

desde logo no que é o reforço do montante das verbas atribuídas ao Tribunal Constitucional, que verificamos

ser manifestamente insuficiente para constituir a Entidade da Transparência que está na lei mas que ainda não

existe.

Outra preocupação diz respeito ao pacto de justiça e à necessidade de um maior investimento, sobretudo a

nível da restruturação e da necessidade de instalação dos gabinetes de apoio nas comarcas. O reforço dos

quadros de juízes, procuradores e funcionários a par da criação de equipas multidisciplinares do DCIAP

(Departamento Central de Investigação e Ação Penal) e do DIAP (Departamento de Investigação e Ação Penal)

são também preocupações.

A corrupção, como bem sabemos, tem um custo para o País. O próprio grupo europeu de Os Verdes já disse

que Portugal perde cerca de 18 milhões de euros/ano com a corrupção. Portanto, deve ser um desiderato de

todas e de todos nós a luta contra a corrupção.

Pergunto aos Srs. Deputados, nomeadamente aos que fizeram as intervenções, se estão dispostos a

acompanhar-nos para, juntos, conseguirmos implementar todas estas medidas.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, do

Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado André Ventura,

obrigado pela sua declaração política, porque é uma oportunidade para colocar algumas questões importantes

sobre a forma como o Parlamento funciona, como deve trabalhar e como deve encarar os debates: sem exagero,

sem simplificação, sem falta de rigor e com os temas colocados como eles devem sê-lo.

O Sr. Deputado fala de palavras proibidas. Digo-lhe que, nos termos do nosso Regimento, nos termos do

Estatuto dos Deputados, nos termos do código de conduta desta Assembleia da República e dos Deputados, é

uma obrigação de todos respeitar a dignidade da Assembleia e dos Deputados. Penso que sempre que alguém

não o faz deve ser, de facto, objeto de uma advertência para procurar respeitar o que é a instituição parlamentar,

a Câmara, a democracia portuguesa.

Aplausos do PS.

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Por outro lado, já que vamos ao rigor, Sr. Deputado, perguntava-lhe: onde esteve ontem na reunião do Grupo

de Trabalho para a alteração do Regimento da Assembleia da República e onde estava hoje durante a reunião

da 1.ª Comissão, que discutiu as alterações do Regimento que aumentaram a capacidade de intervenção dos

Deputados únicos representantes de partidos?

Aplausos do PS.

É um trabalho que, concedemos, não satisfaz toda a gente. Havia propostas mais avançadas, há partidos

que não tiveram as suas propostas refletidas, mas o que é facto é que temos um Parlamento sem paralelo na

Europa naquilo que são os direitos que concede aos grupos parlamentares de pequena dimensão e aos

Deputados únicos representantes de partidos. Em todos os tópicos colocados em cima da mesa houve ou um

aumento de capacidade de intervenção ou a introdução de capacidade de intervenção onde ela antes não

existia.

A única exceção, que é a não participação na Conferência de Líderes, também não a encontramos em ponto

algum da Europa, mas é garantida através do direito à audição prévia em todos os debates em que é afixada a

ordem do dia. Assim, perguntava-lhe também porque é que faltou à chamada ao local certo para fazer vingar o

ponto de vista do Chega.

Aplausos do PS.

Tenho mais duas perguntas, Sr. Deputado. Já que traz à colação o assunto importante que já foi referido no

ponto anterior a propósito da corrupção, pergunto-lhe porque é que não estuda aprofundadamente o tema do

relatório GRECO que colocou em cima da mesa, reconhecendo que esse relatório se reporta ao ano anterior,

2018, e que não tem em conta o pacote legislativo aprovado nesta Câmara que responde a todas as questões

que estavam pendentes nesse relatório através da atividade do pacote da transparência.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Bem lembrado! É preciso seriedade!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Aguardaremos pelo relatório de 2019.

Aplausos do PS.

Mas bastaria fazer uma coisa: estudasse, Sr. Deputado, estudasse com atenção e verificaria a evolução.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Finalmente, uma última pergunta, Sr. Presidente.

O Sr. Deputado, muitas vezes, coloca questões importantes sobre a quebra de salários de professores, de

polícias, de enfermeiros, de médicos, sobre a austeridade que penaliza as pessoas. Há bocadinho referia o

Governo de Pedro Passos Coelho e dizia que esse é apontado…

O Sr. Presidente: — Tem mesmo de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Dizia que esse é apontado como o culpado de tudo. Mas perguntava, Sr. Deputado, quando isso aconteceu,

quando esses cortes tiveram lugar, onde é que o Sr. Deputado militava? Junto de quem é que o Sr. Deputado

afirmava o seu programa político? Quem é que o Sr. Deputado criticava então?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

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O Sr. André Ventura (CH): — Querem continuar a bater palmas ou posso responder?

Protestos do PS.

Se quiserem continuar, podem… É um hábito da tal cortesia da Casa…

Neste momento, o Deputado do CH André Ventura aplaudiu.

Podem continuar a bater palmas que vos fica muito bem. Os portugueses estão a adorar.

Protestos do PS.

Posso responder ou não?

Vozes do PS: — Está nervoso!

O Sr. André Ventura (CH): — Nervoso? Não estou nada nervoso, Srs. Deputados! Se há coisa que não

estou é nervoso!

Vamos por partes, começando pela primeira questão, da Sr.ª Deputada Inês Real. De facto, o reforço de

meios é fundamental…

Protestos de Deputados do PS.

Querem falar por mim também?!

Protestos do PS.

De facto…

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Fala tanto de liberdade de expressão e depois…

O Sr. André Ventura (CH): — Você a falar de liberdade de expressão?! É melhor nem…

Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, começo pelo reforço de meios, que efetivamente é fundamental, mas não

só ao nível judiciário, é também ao nível da Polícia Judiciária, do Ministério Público, que tantas vezes se têm

queixado, é ao nível dos funcionários judiciais, que tanta razão de queixa têm por atualizações que foram feitas

a outros setores mas não a eles.

Mas sabe o que também é preciso? É não haver ziguezague legislativo, é não vir falar de uma espécie de

delação negociada ou premiada e, como ouve críticas da própria bancada do Partido Socialista, agora já se diz

que, afinal, não é bem delação premiada, nem negociada. Já nem sabemos bem o que é, mas não é bom para

a política criminal, é negativo, é muito negativo.

Mas quer uma ideia? Olhe, incompatibilidades vitalícias. Faz sentido que quem faz negócios em nome do

Estado com empresas possa ir trabalhar para essas empresas? Olhem para as pessoas, lá fora, que veem isto

e dizem: «que escândalo enorme, alguém negociou pelo Estado e agora está a trabalhar lá». Coragem, é disso

que precisamos!

Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, deixe-me só dizer-lhe isto: aceito os seus bons e doutos conselhos sobre

cortesia, mas, com toda a franqueza e direção, devo dizer-lhe que se estas regras se aplicassem a si,

provavelmente, o Sr. Deputado já não estaria nesta Câmara.

Podem bater palmas agora também!

Não sei se o Sr. Deputado viu televisão nos últimos dias, mas ouvimos uma série de ilustres socialistas

usarem as mesmas expressões que eu, o mesmo estilo que eu e a mesma forma. Mas o Sr. Deputado deve ter

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desligado a televisão e dito: «Ai, Jesus, que eles estão a fazer o escrutínio que têm de fazer!» Chama-se

democracia, Sr. Deputado!

Sabe que a cortesia não serve só para uns, serve para todos. E os jornais e as televisões foram os primeiros

a fazer esse escrutínio. Basta ir ver o que se passou nos últimos anos do Governo PSD/CDS!

Protestos do PS.

Sr. Deputado, sobre os cortes dos salários, nunca escondi onde militava, nem qual é o passado político que

tenho, nem o partido a que pertenci. Nada disso me custa. Sabe o que é que me custa? Custa-me que um

partido que tenha chamado a austeridade agora olhe para ela como se fosse culpa destes colegas que estão

deste lado. Isso é que me custa, porque isso tem um nome: hipocrisia política!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — E as faltas às reuniões?! Não responde?!

Sr. Deputado, é muito simples: percebo que tenha estado desatento e não tenha acompanhado as notícias

— está muito ocupado e eu percebo isso —, mas, se tivesse visto ontem, verificaria que, logo que soubemos

que era vergonhoso o que ia ser feito em matéria de «não pertence à Conferência de Líderes»…

Protestos do PS.

Porque se começou por dizer assim: vamos partir de um pressuposto mínimo, que é o que foi dado ao PAN

na última Legislatura.

Protestos do PS.

Posso falar? Obrigado!

Vamos partir desse princípio. Ora, qual é o princípio de que partimos? Os partidos não pertencem à

Conferência de Líderes.

Portanto, nós dissemos logo…

O Sr. Presidente: — Peço que termine, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Nós dissemos logo que não iríamos estar presente em protesto, em protesto!

Risos do PS.

Mas vocês estão muito desatentos e, provavelmente, não viram esse protesto. Chama-se protesto! Protesto!

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou largamente o tempo de que dispunha, mas terá mais

oportunidade de falar, visto que estão inscritos mais dois Srs. Deputados para pedir esclarecimentos.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado André Ventura,

não é fácil dirigir-lhe a pergunta, dado o sítio em que estamos no Plenário,…

Protestos do PS.

… mas gostava de lhe pedir um esclarecimento…

Bom, se quiserem todos continuar a falar, acho que vai ser mais difícil entendermo-nos; no entanto, entendo

que este momento exige alguma serenidade, porque ele tem sido agitado e não deveria sê-lo.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

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A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Gostava de começar por dizer o seguinte: para o CDS e para mim

todos os Deputados que estão dentro deste Plenário foram eleitos pelos portugueses…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … e o respeito que mostramos por todos os Srs. Deputados, por todos

e cada um dos Srs. Deputados, é o respeito que mostramos por esses portugueses.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E digo isto ao Sr. Deputado André Ventura como digo ao Sr. Deputado

Pedro Delgado Alves, como digo a qualquer um dos Srs. Deputados que estão aqui sentados. Todos os

portugueses que nos elegeram merecem igual respeito e nós demonstramos o respeito por esses portugueses

com o respeito que demonstramos uns pelos outros.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Portanto, não pode haver aqui Deputados a quem tudo é permitido e

outros Deputados a quem nada é permitido.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — As regras, aqui dentro, têm de ser iguais para todos — aliás, já tive

oportunidade de o dizer ao Sr. Presidente, logo na tomada de posse.

Todavia, isto não quer dizer que tudo nos seja permitido a todos e que tenhamos carta livre para insultar seja

quem for aqui dentro; muito pelo contrário. Os Srs. Deputados hão de fazer-me a justiça de que eu, dentro desta

Sala, nunca insultei ninguém, mesmo quando, por vezes, ouvi dizer que fazia parte de um Governo que andava

a roubar, que roubava pensões às pessoas.

Vozes do CDS e do Deputado do CH André Ventura: — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Esse tal Governo de Pedro Passos Coelho de que eu, com muito

orgulho, fiz parte!

Aplausos do CDS-PP, do PSD e do IL.

Não acho que seja legítimo tê-lo dito. Lá está, aplico as mesmas regras a todos os Srs. Deputados, sejam

de direita, sejam de esquerda, sejam do centro, concorde eu com eles ou discorde deles.

Gostava, então, de fazer uma pergunta ao Sr. Deputado André Ventura, porque, digo-o com toda a franqueza,

estou um bocadinho cansada desta discussão sobre incidentes parlamentares. Eu ouvi-o muitas vezes dizer «os

portugueses lá fora…». Sr. Deputado, os portugueses lá fora também não estarão um bocadinho cansados

destes incidentes permanentes?

O Sr. Presidente: — Peço que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Com certeza, Sr. Presidente.

Eu percebo que o Sr. Deputado queira dizer o que entende, mas nós não fomos eleitos apenas para protestar;

nós fomos eleitos para resolver os problemas das pessoas.

O Sr. Presidente: — Peço que conclua, Sr.ª Deputada.

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A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Portanto, Sr. Deputado, eu percebi as questões que colocou, só não

percebi a solução para essas questões, e era isso que eu, afinal, gostava de saber.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do

Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado André Ventura,

apesar de representar quase a totalidade do oposto do que nós defendemos na política, consideramos que,

tendo sido democraticamente eleito, deve ter nesta Legislatura, pelo menos, os mesmos direitos que o PAN teve

na Legislatura anterior.

Batemo-nos por isso, votámos nesse assim e, portanto, até pode utilizar esse tempo que terá no futuro e que

foi reconhecidamente conquistado para esclarecer algumas das coisas que eu considero — e permita-me utilizar

as suas palavras —, uma «vergonha» na nossa democracia.

Por exemplo, nós aqui acabámos com o regime de pensões vitalícias, que eram, de facto, uma vergonha

para o regime democrático. Gostava de lhe perguntar se não considera uma vergonha que o seu porta-voz

nacional, um dos beneficiários deste regime de pensões vitalícias, Sousa Lara, que deixou de receber por essa

alteração legal, tenha dito que, por ele, continuaria a receber. Não considera que isto é uma vergonha, Sr.

Deputado?

Aplausos do BE e de Deputados do PS.

Sobre o candidato do Chega às eleições europeias, que é arguido por ter, alegadamente, montado um

esquema para sacar dinheiro ao Estado e que foi compulsivamente aposentado por ter mais de 80 dias de faltas

consecutivas ao trabalho, gostava também de lhe perguntar se não considera, de facto, uma vergonha que tenha

aqui o abrigo político do Chega, o seu partido político.

Aplausos do BE.

Por último, queria perguntar-lhe se não considera, utilizando os seus termos, uma vergonha — e digo isto

com toda a serenidade, porque apenas o senhor, creio eu, compreender-me-á pela utilização deste termo —

quando a PJ, a Polícia Judiciária, lhe bateu à porta para, no âmbito do caso Tutti-Frutti, lhe fazer perguntas

sobre se o Sr. Deputado estava ou não envolvido na contratação de um assessor fantasma para, alegadamente,

desviar dinheiro público para o saco azul partidário, levando a cabo aquilo que de pior existe nas práticas

partidárias nacionais.

Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se, no tempo que tem agora conquistado — e ainda bem! —, tem tempo para

responder a estas vergonhas que lhe mancham o currículo.

Aplausos do BE e de Deputados do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, começo por responder à Sr.ª Deputada Cecília Meireles

dizendo que, de facto, é importante que todos percebam que a legitimidade de uns é igual à legitimidade de

outros e que os partidos que são chamados a esta Casa o são por decisão e por voto popular e merecem ter os

mesmos direitos, quando equiparado. Por isso propúnhamos uma equiparação ponderada à aritmética do

Parlamento em relação aos direitos, naturalmente.

O que não podemos querer ter é cortesia para uns e não ter cortesia para outros. O que não podemos querer

é dizer que há um Governo que rouba pensões e que rouba a idosos e quando alguém chega e usa a expressão

«é uma vergonha», ai, meu Deus, não se pode usar esta expressão! O que não podemos é que venham dizer

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que uns têm sangue ou o que quer que seja nas mãos, mas, quando se chega aos outros, venham dizer que

tem de haver regras de cortesia. Isso é que não pode ser, Sr.ª Deputada!

Portanto, tem de haver regras que sejam, de facto, iguais para todos e que sejam cumpridas, porque só

assim é que os cidadãos compreendem o que se passa.

Sr.ª Deputada, estou completamente de acordo consigo: os incidentes não ajudam ninguém, mas, como

também deve imaginar, não tem sido o Chega a criá-los…

Risos do PS.

… têm sido os outros partidos a criar incidentes com o Chega. Esta é que é a verdade! Esta é que é a

verdade!

Sobre soluções é muito simples de ver e, em relação a uma delas, acabámos de a referir: tem a ver com as

incompatibilidades. Era algo que há muito tempo esta Casa deveria ter feito, e não o fez.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Está na lei!

O Sr. André Ventura (CH): — Já o propusemos. A reforma e a reformulação do enriquecimento…

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Está na lei!

O Sr. André Ventura (CH): — Não, não está, Sr. Deputado! Não! Está como vocês querem! Não está na lei!

Basta ver os casos vergonhosos que existem em Portugal e que, se estivesse na lei, não existiam. Quer que lhe

dê um, dois, três exemplos? Quantos quer? Posso dar-lhe os exemplos que quiser!

Mais, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, propusemos a reformulação do enriquecimento ilícito que pudesse ir

ao encontro daquelas que tinham sido as exigências do Tribunal Constitucional, mas, até agora absolutamente

nada. O que é que vimos? Vimos uma espécie de delação que não é nem premiada nem compensatória; é uma

espécie de uma brincadeira que nem sabemos bem o que é e que veremos a seu tempo.

Isto é apontar soluções; soluções que as pessoas querem ver, efetivamente, consagradas.

Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, tenho o maior gosto em responder-lhe às questões que colocou sobre em

que partidos é que eu militava e sobre o que se passou.

Sobre as subvenções vitalícias, sabe por que razão tenho mais moral do que o Sr. Deputado? Porque eu

andei à porta de todos a dizer-lhes para entregarem as subvenções vitalícias,…

Risos do BE.

… inclusive, aos militantes, aos apoiantes, a todos. A todos pedi que entregassem a subvenção.

E sabe uma coisa, Sr. Deputado? Quando eu andei…

Protestos do BE.

Posso continuar?

O Sr. Presidente: — Peço que mantenham a tranquilidade.

O Sr. André Ventura (CH): — Obrigado, Sr. Presidente.

Quando eu andei na Madeira à porta de instituições, na casa de pessoas — olhe, à porta do PCP —, na

comunicação social a dizer para se juntarem a nós na luta contra as subvenções vitalícias, inclusive em relação

àquelas que ainda continuavam em pagamento, onde é que o Bloco de Esquerda estava?

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — E o Sousa Lara onde é que estava?!

O Sr. André Ventura (CH): — Quando fomos à…

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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — E o Sousa Lara onde é que estava?

O Sr. André Ventura (CH): — Posso?

Quando fomos à prisão de Évora dizer que era uma vergonha um político condenado estar a receber

subvenções do Estado, onde é que os senhores estavam? Estavam aqui confortavelmente sentados! Isso é que

é uma vergonha!

Protestos do BE.

É esquecer o que se passa no País! Isso é que é uma vergonha!

Mas, Sr. Deputado, eu também podia falar-lhe, se quiser, de muitas coisas. Por exemplo, do caso Robles e

de muitos outros que os senhores, se calhar, não querem falar. Mas sabe, Sr. Deputado, quando se começa a

levantar casos…

O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Quando quiser falar de Polícia Judiciária, de tribunais, lembre-se sempre deste nome, durma com ele: Robles.

Durma com ele!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos

trabalhos.

O Sr. Presidente: — É mesmo sobre a condução dos trabalhos, que estão a terminar?

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sei que o Sr. Presidente não controla as respostas dos Srs. Deputados,

mas, dado que o Sr. Deputado André Ventura tinha tempo para responder, pelo menos, devia tê-lo usado para

responder às perguntas que foram colocadas…

O Sr. André Ventura (CH): — Mais ainda?!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — … e não para esta vergonha de fugir àquilo que lhe foi perguntado.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Como sabe, essa não é a prática parlamentar.

Aplausos do PS.

Srs. Deputados, terminada a ordem do dia, falta anunciar a agenda da reunião plenária de amanhã, quinta-

feira, com início às 15 horas, uma agenda longa.

No ponto 1, teremos um debate de atualidade, requerido pelo PSD, ao abrigo do artigo 72.º do Regimento,

sobre RTP – Serviço Público.

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No ponto 2, consta a discussão, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 179/XIII/4.ª (ALRAA) — Altera a Lei

n.º 17/2014, de 10 de abril, que estabelece as bases da política de ordenamento e de gestão do Espaço Marítimo

Nacional.

No ponto 3, proceder-se-á à apreciação das Petições n.os 452/XIII/3.ª (Sindicato Nacional dos Trabalhadores

dos Correios e Telecomunicações) — Reversão da privatização dos CTT Correios de Portugal e 611/XIII/4.ª

(Rogério da Costa Pereira e outros) — Solicitam o desenvolvimento das diligências necessárias ao

imprescindível e urgente processo de participação qualificada do Estado português no capital social dos CTT —

Correios de Portugal, em conjunto com, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 70/XIV/1.ª (PCP) – Estabelece

o regime de recuperação do controlo público dos CTT e 84/XIV/1.ª (BE) — Estabelece o regime para a

nacionalização dos CTT e com os Projetos de Resolução n.os 30/XIV/1.ª (PEV) — Reversão da privatização dos

CTT e 108/XIV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que salvaguarde a qualidade do serviço público postal

universal.

Segue-se, no ponto 4, a apreciação da Petição n.º 545/XIII/4.ª (Luís Miguel Machado Figueiredo e outros) —

Solicitam a abertura de um Inquérito Parlamentar sobre a utilização dos apoios prestados às vítimas dos

incêndios de Pedrógão Grande.

No ponto 5, consta a apreciação da Petição n.º 586/XIII/4.ª (Sílvia Maria dos Ramos Alves Sequeira e outros)

— Solicitam a adoção de medidas de defesa da Reserva Natural do Sado, em conjunto com os Projetos de

Resolução n.os 14/XIV/1.ª (PEV) — Sobre as dragagens no estuário do Sado, 33/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda

ao Governo que revogue a autorização concedida à Administração do Porto de Setúbal para avançar com as

dragagens no Sado e 46/XIV/1.ª (BE) — Recomenda a suspensão das dragagens no Porto de Setúbal.

Segue-se, no ponto 6, a apreciação da Petição n.º 607/XIII/4.ª (FENPROF – Federação Nacional dos

Professores) — Solicitam a adoção de medidas com vista à negociação do modo e prazo para a recuperação

de todo o tempo de serviço cumprido, conjuntamente com, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 98/XIV/1.ª

(PCP) — Contabilização integral de todo o tempo de serviço das carreiras e corpos especiais e 100/XIV/1.ª (BE)

— Recuperação integral do tempo de serviço cumprido.

No ponto 7, consta a apreciação da Petição n.º 316/XIII/2.ª (uAPHu - Associação de Pais Heróis) — Solicitam

a criação de legislação que colmate a falta de apoio financeiro e os direitos dos pais de crianças/jovens com

cancro, em conjunto com, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 91/XIV/1.ª (BE) — Alarga a proteção na

parentalidade aos progenitores com filhos com deficiência, doença rara ou doença oncológica e determina o

pagamento a 100% do subsídio para assistência a filho com deficiência, doença crónica ou doença oncológica,

95/XIV/1.ª (PCP) — Reforço de direitos e condições de acompanhamento a filho com doença crónica, oncológica

ou resultante de acidente, 102/XIV/1.ª (PAN) — Reforça a proteção social e laboral dos pais num quadro de

assistência do filho com doença oncológica e 111/XIV/1.ª (CDS-PP) — Acresce em 60 dias o período de licença

parental inicial, em caso de nascimento de criança com deficiência ou doença rara e aumenta o montante do

subsídio para assistência a filho com deficiência, doença crónica ou doença oncológica, procedendo à 15.ª

alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro (Código do Trabalho), à 7.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 91/2009,

de 9 de abril (Regime Jurídico de Proteção Social na Parentalidade) e à 4.º alteração Decreto-Lei n.º 89/2009,

de 9 de abril (Regime Jurídico de Proteção Social na Parentalidade dos Trabalhadores da Função Pública

Integrados no Regime de Proteção Social Convergente).

Por fim, no ponto 8, consta a apreciação da Petição n.º 497/XIII/3.ª (CGTP – Confederação Geral dos

Trabalhadores) — Contra a precariedade, pelo emprego com direitos, em conjunto com os Projetos de Lei n.os

11/XIV/1.ª (PCP) — Combate a precariedade laboral e reforça os direitos dos trabalhadores (16.ª alteração à Lei

n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova o Código do Trabalho) e 89/XIV/1.ª (BE) — Combate o falso trabalho

temporário e restringe o recurso ao outsourcing e ao trabalho temporário.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 47 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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