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Sexta-feira, 10 de janeiro de 2020 I Série — Número 21

XIV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2019-2020)

REUNIÃOPLENÁRIADE9DEJANEIRODE 2020

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Nelson Ricardo Esteves Peralta Ana Cristina Cardoso Dias Mesquita

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 6 minutos.

Deu-se conta da entrada na Mesa da Proposta de Lei n.º 8/XIV/1.ª, dos Projetos de Lei n.os 175 a 178/XIV/1.ª, dos Projetos de Resolução n.os 178 a 186 e 189 a 191/XIV/1.ª, da Apreciação Parlamentar n.º 6/XIV/1.ª e do Projeto de Regimento n.º 7/XIV/1.ª.

Foram anunciados os resultados das eleições que decorreram na anterior reunião plenária, tendo sido eleitos os candidatos propostos para o Conselho Superior do Ministério Público e para a Comissão Nacional de Eleições e não tendo sido eleitos o candidato proposto para Presidente do

Conselho Económico e Social e os candidatos propostos para o Conselho Superior da Magistratura.

Na abertura do debate conjunto, na generalidade, dasPropostas de Lei n.os 4/XIV/1.ª (GOV) — Aprova as Grandes Opções do Plano para 2020, 5/XIV/1.ª (GOV) — Aprova o Orçamento do Estado para 2020 e 6/XIV/1.ª (GOV) — Aprova o Quadro Plurianual de Programação Orçamental para osanos de 2020-2023, usou da palavra o Primeiro-Ministro(António Costa), que depois respondeu a pedidos deesclarecimento dos Deputados Rui Rio (PSD), Ana CatarinaMendonça Mendes (PS), Catarina Martins (BE), Jerónimo deSousa (PCP), Cecília Meireles (CDS-PP), André Silva (PAN),

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José Luís Ferreira (PEV), André Ventura (CH), João Cotrim de Figueiredo (IL), Joacine Katar Moreira (L), Duarte Pacheco (PSD), Marina Gonçalves (PS), Jorge Costa (BE), João Oliveira (PCP), Cristina Rodrigues (PAN), Mariana Silva (PEV), Álvaro Almeida (PSD), Lara Martinho (PS), Joana Mortágua (BE), António Filipe (PCP), Bebiana Cunha (PAN), Hortense Martins (PS), José Moura Soeiro (BE), Paula Santos (PCP) e Luís Monteiro (BE).

Durante o debate, usaram da palavra, a diverso título, além do Ministro das Infraestruturas e da Habitação (Pedro Nuno Santos), os Deputados Afonso Oliveira (PSD), João

Paulo Correia e José Luís Carneiro (PS), Carlos Peixoto e Luís Leite Ramos (PSD), Catarina Martins (BE), Emília Cerqueira (PSD), Fernando Anastácio (PS), Telmo Correia (CDS-PP), Luís Moreira Testa (PS), Inês de Sousa Real (PAN), André Ventura (CH), João Cotrim de Figueiredo (IL), Isabel Pires (BE), Cristóvão Norte (PSD), Carlos Pereira (PS), Maria Manuel Rola (BE), Filipa Roseta (PSD), Hugo Pires (PS), Mariana Silva (PEV), Cristina Rodrigues (PAN) e Bruno Dias (PCP).

O Presidente encerrou a sessão eram 21 horas e 5 minutos.

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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, está aberta a

sessão.

Eram 15 horas e 6 minutos.

Sr.as e Srs. Agentes da autoridade, podem — e devem — abrir as portas ao público.

Vamos dar início a esta sessão com uma série de avisos, que serão tornados públicos pela Sr.ª Secretária

Maria da Luz Rosinha, a quem agradeço desde já.

Sr.ª Secretária, tem a palavra para dar conta do expediente.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e

foram admitidas, várias iniciativas legislativas.

Refiro, em primeiro lugar, a Proposta de Lei n.º 8/XIV/1.ª (GOV) — Adapta os regimes sancionatórios

previstos nos regimes jurídicos aplicáveis às sociedades gestoras de fundos de investimento e às sociedades

gestoras de fundos de titularização de créditos, que baixa à 5.ª Comissão.

Deram também entrada na Mesa os Projetos de Lei n.os 175/XIV/1.ª (PAN) — Cria um observatório na

Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens para monitorização do

cumprimento das obrigações impostas pela Convenção dos Direitos da Criança (segunda alteração ao Decreto-

Lei n.º 159/2015, de 10 de agosto), que baixa à 1.ª Comissão, 176/XIV/1.ª (PS) — Procede à primeira alteração

ao Decreto-Lei n.º 91/2015, de 29 de maio, permitindo a aplicação do sistema de carreiras aos trabalhadores do

quadro de pessoal transitório, que baixa à 13.ª Comissão, 177/XIV/1.ª (PAN) — Altera o Decreto-Lei n.º 93/2009,

de 16 de abril, tornando mais eficaz o Sistema de Atribuição de Produtos de Apoio a pessoas com deficiência e

garantindo o acesso mais rápido a estes produtos, que baixa à 10.ª Comissão, em conexão com as 8.ª e 9.ª

Comissões, e 178/XIV/1.ª (CH) — Altera o Código Penal no seu artigo 274.º (Incêndio Florestal), agravando as

molduras penais aplicáveis aos sujeitos que preencham os requisitos desta conduta criminosa, e introduzindo o

artigo 274.º-B, consagrando a possibilidade de substituição da indemnização a pagar ao Estado e demais

lesados pela imposição de trabalho comunitário em prol da reflorestação da área ardida e/ou da reconstrução

do património destruído, que baixa à 1.ª Comissão.

Deram igualmente entrada na Mesa os Projetos de Resolução n.os 178/XIV/1.ª (PCP) — Recomenda ao

Governo que proceda à requalificação da Escola Básica Dr. António Augusto Louro, no concelho do Seixal,

179/XIV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que desencadeie o procedimento para conclusão da vinculação da

República Portuguesa ao Protocolo Adicional de 2014 sobre Trabalho Forçado, da Organização Internacional

do Trabalho, que baixa à 2.ª Comissão, 180/XIV/1.ª (IL) — Pela não atribuição de subsídios públicos aos órgãos

de comunicação social, mantendo a imprensa independente e como contrapoder do Estado, que baixa à 12.ª

Comissão, 181/XIV/1.ª (BE) — Recomenda ao Governo a construção de uma nova escola básica (2.º e 3.º ciclos)

na Trafaria, 182/XIV/1.ª (BE) — Pela criação de um grupo de recrutamento da área do teatro, que baixa à 8.ª

Comissão, 183/XIV/1.ª (BE) — Pela melhoria das condições da Barra de Esposende, 184/XIV/1.ª (CH) —

Recomenda ao Governo que, antes de qualquer legislação relativa à morte medicamente assistida, implemente

efetivamente a rede de cuidados paliativos legalmente prevista, que baixa à 1.ª Comissão, 185/XIV/1.ª (CH) —

Pela otimização do processo de prevenção e sancionamento das infrações ambientais, que baixa à 11.ª

Comissão, 186/XIV/1.ª (CH) — Alargamento da rede de creches públicas e apoio às famílias quando não existam

respostas no setor público, que baixa à 10.ª Comissão, 189/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que

formalize a constituição da comissão de avaliação e acompanhamento do SAPA, garantindo a efetiva

simplificação e desburocratização do processo de atribuição de produtos de apoio a pessoas com deficiência,

que baixa à 10.ª Comissão, em conexão com as 8.ª e 9.ª Comissões, 190/XIV/1.ª (PAR) — Deslocação do

Presidente da República a Jerusalém e 191/XIV/1.ª (BE) — Recomenda ao Governo a imposição de normas

antiabuso nos concursos públicos promovidos para contratação de empresas de segurança, limpeza e outros

serviços, garantindo o cumprimento da legislação laboral e do regime jurídico da transmissão de

estabelecimento, que baixa à 10.ª Comissão.

Deu ainda entrada na Mesa a Apreciação Parlamentar n.º 6/XIV/1.ª (PSD) — Relativa ao Decreto-Lei n.º

170/2019, de 4 de dezembro, que procede à décima primeira alteração ao Código dos Contratos Públicos,

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aprovado em anexo ao Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro, e à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º

111/2012, de 23 de maio.

Por fim, refiro a entrada na Mesa do Projeto de Regimento n.º 7/XIV/1.ª (IL) — Quarta alteração ao Regimento

da Assembleia da República n.º 1/2007, de 20 de agosto, de modo a regulamentar a emissão de votos, que

baixa à 1.ª Comissão.

Sr. Presidente e Srs. Deputados, resta-me dar conta das atas referentes às eleições para o Conselho

Superior do Ministério Público, para a Comissão Nacional de Eleições, para o Conselho Económico e Social e

para o Conselho Superior da Magistratura.

Passo a ler a primeira ata:

«Aos vinte dias do mês de dezembro de dois mil e dezanove, procedeu-se à eleição para o Conselho Superior

do Ministério Público.

O resultado obtido foi o seguinte:

Votantes — 209

Votos ‘sim’ — 134

Votos brancos — 70

Votos nulos — 5

Nos termos legais aplicáveis e face ao resultado obtido, declaram-se eleitos para o Conselho Superior do

Ministério Público os seguintes candidatos:

Lista A (PS/PSD)

Efetivos:

Manuel de Magalhães e Silva

Rui Manuel Portugal da Silva Leal

José Manuel Mesquita

António Manuel Tavares de Almeida Costa

Brigite Raquel Bazenga Vieira Tomás Gonçalves

Suplentes:

Vânia Gonçalves Álvares

Daniel Bento Alves

Pedro Gonçalo Roque Ângelo.»

A segunda ata é do seguinte teor:

«Aos vinte dias do mês de dezembro de dois mil e dezanove, procedeu-se à eleição para a Comissão

Nacional de Eleições.

O resultado obtido foi o seguinte:

Votantes — 209

Votos ‘sim’ — 181

Votos brancos — 26

Votos nulos — 2

Nos termos legais aplicáveis e face ao resultado obtido, declaram-se eleitos para a Comissão Nacional de

Eleições os candidatos propostos:

Mark Andrew Bobela Mota Kirkby (PS)

Cristina Vera Mendes Romeira Alves dos Santos Penedo (PSD)

Carla Sofia Franco Luís (BE)

João Manuel Rosa de Almeida (PCP)

João Tiago Galo Pedrosa dos Santos Machado (CDS-PP)

Sandra Maria Fernandes Teixeira do Carmo (PAN)

Álvaro José de Oliveira Saraiva (PEV).»

A terceira ata é do seguinte teor:

«Aos vinte dias do mês de dezembro de dois mil e dezanove, procedeu-se à eleição para o cargo de

Presidente do Conselho Económico e Social.

O resultado obtido foi o seguinte:

Votantes — 209

Votos ‘sim’ — 125

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Votos brancos — 73

Votos nulos — 11

Nos termos legais aplicáveis e face ao resultado obtido, declara-se não eleito Presidente do Conselho

Económico e Social António Fernando Correia de Campos.»

Passo a ler a quarta ata:

«Aos vinte dias do mês de dezembro de dois mil e dezanove, procedeu-se à eleição de vogais para o

Conselho Superior da Magistratura.

O resultado obtido foi o seguinte:

Votantes — 209

Votos ‘sim’ — 139

Votos brancos — 66

Votos nulos — 4

Nos termos legais aplicáveis e face ao resultado obtido, declaram-se não eleitos para o Conselho Superior

da Magistratura os seguintes candidatos:

Lista A (PS/PSD)

Efetivos:

Vítor Manuel Pereira de Faria

Fernando Licínio Lopes Martins

José António de Melo Pinto Ribeiro

António Alberto Vieira Cura

António José Barradas Leitão

Inês Vieira da Silva Ferreira Leite

André Filipe Oliveira de Miranda

Suplentes:

Paulo Rui da Costa Valério

Luís Paulo Elias Pereira

Telma Solange Silva Carvalho.»

Terminei, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha, pela capacidade de expressão,

embora o ruído na Sala fosse permanente.

Evidentemente, quero começar esta sessão, neste novo ano, saudando todos os Deputados, o Sr. Primeiro-

Ministro e demais membros do Governo, os funcionários e os jornalistas, desejando a todos um excelente ano

de 2020, com muito trabalho e prestígio para a Assembleia da República, a Assembleia democrática, a Casa da

democracia.

Vamos, pois, entrar na ordem do dia, que consta da apreciação conjunta, na generalidade, das Propostas de

Lei n.os 4/XIV/1.ª (GOV) — Aprova as Grandes Opções do Plano para 2020, 5/XIV/1.ª (GOV) — Aprova o

Orçamento do Estado para 2020 e 6/XIV/1.ª (GOV) — Aprova o Quadro Plurianual de Programação Orçamental

para os anos 2020-2023.

Para abrir o debate, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, António Costa.

O Sr. Primeiro-Ministro (António Costa): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Naturalmente, gostaria

de me associar ao Sr. Presidente nos votos de bom ano para todas as Sr.as Deputadas e todos os Srs.

Deputados, sublinhando que dificilmente poderíamos começar melhor o novo ano do que com o importante

debate parlamentar sobre o Orçamento do Estado para 2020.

Este é um Orçamento de continuidade e de progresso. É um Orçamento de continuidade da mudança que

iniciámos em 2016, assegurando mais crescimento, melhor emprego, maior igualdade e contas certas. É um

Orçamento de progresso na resposta aos quatro grandes desafios estratégicos da nova Legislatura: as

alterações climáticas, a demografia, a transição digital e o combate às desigualdades.

Com este Orçamento não há retrocessos, não ficamos a marcar passo nem mudamos de rumo. Com este

Orçamento continuamos a avançar na melhoria de rendimentos e direitos, na qualidade dos serviços públicos,

no reforço do investimento, na consolidação das finanças públicas.

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Os quatro anos da anterior Legislatura permitiram-nos reconstruir a confiança nas instituições e na economia

portuguesa: a confiança dos cidadãos numa política orçamental que respeita a Constituição; a confiança das

empresas numa gestão orçamental que promove a estabilidade financeira; a confiança internacional numa

economia que reduz para metade o desemprego e atinge o equilíbrio orçamental.

Aplausos do PS.

Chegados a 2020, temos de prosseguir, fazendo agora ainda mais e melhor. Por isso, apresentamos um

Orçamento que promove mais investimento, a qualidade dos serviços públicos, a melhoria dos rendimentos e

cada vez maior justiça social e que nos permite prosseguir o caminho de equilíbrio orçamental e de redução da

dívida.

Promover o investimento — público e privado — é fundamental para reforçar o crescimento económico

sustentado e partilhado, a criação de mais e melhor emprego e a qualidade dos nossos serviços públicos. O

crescimento da economia nos últimos quatro anos está associado ao forte crescimento do investimento, que é

mais do dobro da média da área do euro.

Foi por isso que reforçámos o investimento público, com destaque para o investimento em grandes projetos

estruturantes, que ultrapassará os 1300 milhões de euros em 2020. Estes investimentos darão um contributo

fundamental para a melhoria da qualidade dos transportes públicos, do Serviço Nacional de Saúde e da rede

escolar. Aprovámos ainda um plano plurianual de investimentos na área da saúde, num montante adicional de

190 milhões de euros. E reforçámos a dotação na área da habitação, quase duplicando, de 80 para 150 milhões

de euros, as verbas para prosseguir os objetivos de erradicação das carências habitacionais e de promoção

pública de habitação para arrendamento a custos acessíveis à classe média.

Aplausos do PS.

E foi também por isso que mantivemos a estratégia de promoção do investimento privado, garantindo, por

exemplo, que o IRC (imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas) baixará perto de 60 milhões de euros,

ajudando as pequenas e médias empresas que reinvestem os seus lucros, que apostam na inovação ou que se

instalam no interior, e garantindo que as empresas em início de atividade não vejam agravado o valor das

tributações autónomas em caso de prejuízos, numa fase tão importante do seu percurso.

Não há crescimento sustentado sem investimento. E os benefícios desse crescimento, conseguidos com o

esforço de todos, têm de ser também partilhados por todos. É por isso imperativo prosseguir a melhoria dos

rendimentos, promovendo a justiça social e reduzindo as desigualdades.

O caminho trilhado desde 2016 teve um impacto muito importante na garantia da dignidade das condições

de vida dos portugueses. Entre 2015 e 2019, houve mais de meio milhão de portugueses que deixaram de estar

em risco de pobreza ou de exclusão social.

Aplausos do PS.

Os números falam por si, mas também sabemos que temos de continuar este caminho.

Este Orçamento consolida todos os avanços sem qualquer retrocesso e consegue ainda novos avanços no

caminho do progresso social, num contexto de estabilidade e confiança nas expetativas de evolução dos

rendimentos. Pelo terceiro ano consecutivo, asseguramos um aumento real acima da inflação para cerca de

dois milhões de pensionistas e vamos mais longe no combate à pobreza entre os idosos, apostando no reforço

do complemento solidário para idosos (CSI), cumprindo, desde já, o compromisso que assumimos, até ao final

da Legislatura, de elevar o CSI ao limiar da pobreza.

Aplausos do PS.

Em 2020, iremos concluir o processo de descongelamento de carreiras da Administração Pública iniciado em

2018, repondo em apenas três anos os direitos de progressão que estiveram suspensos desde 2011.

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E retomamos — muito importante! — a normalidade dos aumentos salariais anuais da Administração Pública,

aumento que ocorre pela primeira vez desde 2009 e apenas pela segunda vez em 20 anos. É um esforço

orçamental muito significativo, que, entre progressões e atualização salarial, aumenta as remunerações na

função pública em 3,2%.

Este é, ainda, um Orçamento que promove maior justiça fiscal, desde logo através da atualização do mínimo

de existência, que fará com que mais 30 000 famílias de menores rendimentos passem a estar isentas de pagar

IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares), como já tinha acontecido no ano passado a 27 000

famílias e há dois anos a 140 000 famílias.

No conjunto desta isenção e das medidas de apoio às jovens famílias, o IRS pago pelas famílias portuguesas

baixará, neste ano de 2020, mais 50 milhões de euros.

Aplausos do PS.

É esta a matriz de uma política fiscal mais justa, que protege e alivia quem mais necessita, que promove a

competitividade das empresas e o emprego, em particular nas regiões de baixa densidade, através do programa

Trabalhar no Interior, e que garante um total alinhamento com objetivos absolutamente fundamentais de política

pública.

Refiro-me em concreto ao acesso à habitação, em que é preciso desincentivar o alojamento local em áreas

de contenção e fomentar a transferência desses imóveis para o mercado de arrendamento.

A Sr.ª AnaCatarina Mendonça Mendes (PS): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Refiro-me também em concreto à defesa do ambiente, em que é fundamental

eliminar progressivamente os benefícios fiscais à utilização de combustíveis fósseis, ao mesmo tempo que

reforçamos os incentivos com a criação de uma nova dedução fiscal para a instalação de equipamentos de

produção descentralizada e autoconsumo de energia renovável.

Mais investimento, melhor rendimento e maior justiça fiscal só são possíveis graças — e em paralelo — a

uma política orçamental responsável.

Este Orçamento prevê, pela primeira vez na nossa democracia, um excedente orçamental. Este é o resultado

da trajetória de consolidação prosseguida na anterior Legislatura e é também condição essencial para

prosseguirmos a nossa estratégia de prosperidade partilhada.

Aplausos do PS.

Alguns interrogam-se porque havemos de ter um excedente orçamental, quando há tantas necessidades a

satisfazer no imediato. Um bom Orçamento é o que garante o equilíbrio nas múltiplas necessidades a que temos

de responder. E este Orçamento responde a necessidades múltiplas de reforço da dotação orçamental —

necessidades em todas as prestações sociais, nas Forças Armadas e nas forças de segurança, na

modernização da justiça, no investimento na cultura, no incentivo à coesão territorial. Em suma, em todas, sem

exceção, as áreas da governação.

Aplausos do PS.

Mas este Orçamento não pode ignorar essa outra necessidade que é a de nos libertarmos, de modo

sustentável, da elevada dívida pública que ainda temos. Ao longo da última Legislatura, o peso da dívida no

produto interno bruto (PIB) caiu mais de 12 pontos percentuais — de 131,2% em 2015 para 118,9% em 2019.

E é nosso objetivo terminar a presente Legislatura próximo do limiar dos 100% do peso da dívida no produto

interno bruto.

Aplausos do PS.

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Só assim continuaremos a libertar, todos os anos, recursos afetos ao serviço da dívida para investir onde é

necessário. Em cinco anos, a despesa com juros da dívida reduziu 2 mil milhões de euros. Repito: em cinco

anos, a despesa com juros da dívida reduziu 2 mil milhões de euros! Uma poupança que nos permite reforçar o

investimento nos serviços públicos e reduzir a nossa exposição ao risco de uma nova crise internacional.

Aplausos do PS.

E este é o momento para fazer este esforço, porque é nesta fase de crescimento económico, forte criação

de emprego, melhoria de rendimentos e redução das desigualdades que devemos poupar os recursos de que

podemos vir a necessitar quando um novo ciclo económico nos exija uma política anticíclica. É neste momento

que devemos olhar, ainda mais e com mais confiança, para o nosso futuro. E é neste momento que devemos

agir, tomar as decisões certas, as políticas públicas certas e os instrumentos fiscais adequados para acautelar

o melhor futuro dos portugueses.

Aplausos do PS.

Não, não se trata de imposições da União Europeia. Trata-se do dever que nos impomos de preparar o futuro

e garantir que os portugueses não voltam a ter de suportar o custo de uma crise económica e financeira que

deixou marcas profundas na vida de todos aqueles que ficaram sem emprego, que viram os seus rendimentos

cortados ou que viram limitada a tão necessária proteção social. Trata-se de olhar para a nossa segurança social

e ver que, pela primeira vez, temos uma reserva financeira superior a 20 mil milhões de euros e que garantimos

a sustentabilidade do nosso sistema de pensões por mais 29 anos, face ao que estava projetado no Orçamento

do Estado em 2015.

Aplausos do PS.

Damos, assim, um sinal de esperança e uma garantia efetiva aos jovens de hoje que descontam para a

segurança social e que sabem que podem contar com as suas pensões, tal como repusemos as pensões dos

seus avós e dos seus pais, porque a solidariedade intergeracional assenta na confiança de que cada geração

faz tudo para desonerar as gerações futuras das responsabilidades futuras.

Aplausos do PS.

Rigor orçamental dá-nos liberdade, porque um Orçamento não deve ser nunca um fim em si mesmo. Há

mesmo mais vida para além do Orçamento. E o Orçamento é sobretudo um instrumento ao serviço das

prioridades políticas que são definidas em cada Legislatura e que, no caso concreto, definimos no Programa do

Governo.

É por isso que a saúde é a principal prioridade do Orçamento do Estado para 2020. Para servir melhor as

pessoas, continuaremos a investir no acesso aos cuidados de saúde, na motivação dos profissionais, na maior

autonomia dos hospitais e na melhoria das instalações e equipamentos do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

O orçamento da saúde para este ano ascende a mais de 11 mil milhões de euros, aumentando 941 milhões face

ao orçamento inicial de 2019.

Aplausos do PS.

Este ano, o reforço do orçamento inicial da saúde é mais de 50% do reforço do orçamento total da saúde nos

últimos quatro anos.

Aplausos do PS.

Trata-se do maior reforço de sempre no orçamento inicial da saúde e representa o começo de um «novo

ciclo» para o Serviço Nacional de Saúde.

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Este esforço permitirá dar sequência ao programa de melhoria da resposta do Serviço Nacional de Saúde

que aprovámos recentemente. Contrataremos mais 8400 profissionais e incentivaremos a redução das listas de

espera através da realização de mais cirurgias e mais consultas, incluindo ao sábado. Vamos também continuar

a alargar a oferta de médico de família e a rede de unidades de saúde familiar (USF), reforçando os cuidados

de saúde primários. O ritmo de investimento em cuidados continuados vai duplicar, com a abertura de 1000

novas camas, das quais 200 de saúde mental. E eliminaremos faseadamente as taxas moderadoras nos

cuidados de saúde primários e nos tratamentos prescritos no Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Temos, assim, um Orçamento ao serviço dos cidadãos e das

empresas que nos permite investir na execução de políticas públicas ambiciosas e coerentes com os quatro

desafios estratégicos identificados no Programa do Governo.

O primeiro prende-se com as alterações climáticas. Portugal foi o primeiro País a assumir, logo em 2016, o

objetivo da neutralidade carbónica em 2050. Neste Orçamento, reforçamos a adequação entre a política fiscal

e a sustentabilidade ambiental, por exemplo, através da eliminação faseada de benefícios fiscais prejudiciais ao

ambiente.

Sabemos também que a dimensão do desafio exige soluções inovadoras. E por isso solicitámos à Comissão

Europeia autorização para diferenciar a taxa de IVA da eletricidade em função dos níveis de consumo, de modo

a incentivar consumos ambientalmente responsáveis e a melhoria da eficiência energética, já tendo a Comissão

Europeia respondido com disponibilidade para avaliar o pedido e concordando com a adequação da política

fiscal aos objetivos da ação climática.

Mantemos também a aposta na mobilidade sustentável, nomeadamente com a promoção dos transportes

públicos em todo o território nacional, através do programa de apoio à redução de tarifários, mas também com

o apoio à densificação e reforço da oferta de transporte público e de um conjunto de instrumentos determinantes

para o reforço da rede, em especial na ferrovia e nos metros de Lisboa e Porto, bem como através da aquisição

e reparação de material circulante.

Aplausos do PS.

Este Orçamento aposta também num conjunto de medidas dirigidas às gerações mais jovens, dando, assim,

uma resposta determinada e integrada ao desafio demográfico que o País enfrenta. Os jovens que terminam os

seus ciclos de estudo e se lançam no mercado de trabalho poderão, nesse momento crítico, beneficiar de uma

redução significativa de IRS durante três anos, com uma isenção de 30% no primeiro ano, de 20% no segundo

e de 10% no terceiro, de modo a apoiá-los na sua autonomização.

Aplausos do PS.

Apostamos também na criação do complemento de creches e do aumento das deduções fiscais por filho,

que atingirão 900 € a partir do segundo filho, de modo a ajudar as famílias a concretizarem os seus projetos de

vida e a poderem ter o número de filhos que efetivamente desejam.

De olhos postos no futuro, este é também um Orçamento que potencia as oportunidades da sociedade digital

— o terceiro desafio estratégico que identificámos. Exemplos disso são a prorrogação do sistema de incentivos

fiscais ao investimento empresarial em investigação e desenvolvimento (I&D) e a restituição do IVA pago pelos

centros de investigação na aquisição de equipamentos e outros materiais destinados às suas atividades de

investigação e desenvolvimento.

Com o mesmo objetivo de potenciar a sociedade do conhecimento, celebrámos já um contrato de legislatura

com as instituições de ensino superior, garantindo-lhes um horizonte estável de financiamento ao longo dos

próximos quatro anos.

Finalmente, este é um Orçamento que está ao lado de quem mais necessita, aumentando salários, pensões

e prestações sociais,…

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Aplausos do PS.

… nomeadamente prosseguindo a estratégia de valorização do abono de família e dando um passo

importante para a erradicação da pobreza nos idosos, através da convergência progressiva do complemento

solidário para idosos com o limiar de pobreza e com uma alteração na sua condição de recursos.

Pretendemos implementar também os projetos-piloto e o subsídio de apoio ao cuidador informal, reforçando

o Modelo de Apoio à Vida Independente (MAVI) e as medidas de conciliação da vida profissional, pessoal e

familiar e as medidas de combate à desigualdade de género, e eliminando progressivamente as taxas

moderadoras nos cuidados de saúde primários, tal como previsto na Lei de Bases da Saúde. Pretendemos

renovar a aposta no interior e no seu potencial para que ninguém fique para trás, dando uma resposta firme ao

quarto grande desafio estratégico — o combate às desigualdades.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, já o disse e faço agora questão de repetir perante vós: este é o melhor

dos cinco Orçamentos do Estado que já apresentei a este Parlamento.

Aplausos do PS.

É o melhor porque vai além da reposição de rendimentos, acrescentando rendimento ao já reposto. É o

melhor porque vai além da recuperação dos cortes no investimento, trazendo novo investimento ao já

recuperado na anterior Legislatura. É o melhor porque vai além da reversão do enorme aumento de impostos,

avançando numa maior justiça fiscal. É o melhor porque, além da redução do défice, alcança o primeiro

excedente orçamental.

Este é mesmo o melhor dos cinco Orçamentos que já tive oportunidade de apresentar.

Aplausos do PS.

Mas é o melhor porque é herdeiro e continuador dos quatro Orçamentos da anterior Legislatura, abrindo um

novo ciclo para que, nesta Legislatura, de modo menos conjuntural, mais estrutural e ainda mais focado nos

desafios estratégicos, concretizemos um modelo de desenvolvimento assente no conhecimento e na inovação,

apostado na internacionalização, na dignificação do trabalho, no fortalecimento do tecido empresarial, que

assegure uma década de crescimento sustentado acima da média europeia.

Agora é chegado o momento de o Parlamento se pronunciar. E mesmo uma melhor proposta não deixa de

poder ser melhorada no trabalho de apreciação parlamentar.

Aquando da tomada de posse do atual Governo, tive ocasião de afirmar, e permitam-me que me cite, o

seguinte: «O claro reforço eleitoral do Partido Socialista não dispensa o Governo do dever de promover o diálogo

parlamentar e a estabilidade no horizonte da Legislatura. Do mesmo modo, a ausência de uma maioria absoluta

impõe aos partidos que têm sido — e queremos que continuem a ser — nossos parceiros o dever acrescido de

contribuírem de modo construtivo para o sucesso deste diálogo ao longo de toda a Legislatura».

Aplausos do PS.

Estas palavras ganham uma especial relevância e nitidez neste momento em que o primeiro Orçamento da

Legislatura é apreciado e será votado por esta Assembleia da República.

O Governo tem cumprido os seus compromissos. Em primeiro lugar, quanto à sua natureza geral, este é um

Orçamento que continua e aprofunda o caminho seguido desde 2016, apoiando as pessoas e as famílias,

incentivando o crescimento da economia e do emprego, promovendo o investimento, qualificando os serviços

públicos, reduzindo as desigualdades, privilegiando o conhecimento, a educação e a cultura.

Este Orçamento não contém nenhuma espécie de retrocesso, em nenhuma área. Pelo contrário, avança com

novas medidas para responder aos desafios do presente, com especial atenção aos jovens, aos idosos e às

classes médias. E é precisamente por ser orientado para o equilíbrio das contas públicas, cumprindo as nossas

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obrigações como Estado-Membro da zona euro, que este Orçamento permite, com realismo e determinação,

novos e importantes avanços no domínio social.

Em segundo lugar, o Governo tem cumprido a sua obrigação e vontade de abertura ao diálogo com os

parceiros parlamentares, com os quais queremos continuar a construir a solução de estabilidade política e

desenvolvimento social de que Portugal tanto tem beneficiado.

Na elaboração da proposta de Orçamento, adotámos uma postura de diálogo e de busca de compromisso,

indo ao encontro de prioridades e pretensões manifestadas pelos nossos parceiros. Já o tínhamos feito, aliás,

logo na discussão do Programa do Governo, com várias aproximações às posições defendidas por esses

partidos. Voltámos a fazê-lo na proposta original do Orçamento, na qual acolhemos várias das preocupações

manifestadas pelos partidos em reuniões prévias. Temos continuado a fazê-lo ao longo das últimas semanas,

através de um trabalho conjunto bastante profícuo que, certamente, continuará durante a discussão do

Orçamento na fase da especialidade.

Aplausos do PS.

É, pois, com este triplo compromisso que apresento aqui a proposta do Governo. É um compromisso com o

aprofundamento do caminho seguido desde 2016 e com o progresso económico e social que ele permite, o que

faz, logicamente, deste Orçamento o mais avançado de todos quantos já foram aprovados. É um compromisso

com os parceiros parlamentares que têm feito connosco este caminho e com quem procederemos, na fase de

especialidade, ao trabalho que possa ainda melhorar a proposta do Governo. É um compromisso com Portugal

e com os portugueses, respondendo às necessidades do País em saúde, educação, habitação, transportes e

mobilidade, respondendo aos desafios da economia e da sociedade portuguesa e assegurando as contas certas,

essenciais para a credibilidade internacional do País e para a redução da sua dívida pública e do encargo anual

com juros.

É muito importante que todos compreendamos que este é apenas o primeiro Orçamento da nova Legislatura.

É o começo, e não o fim, de um novo ciclo. É o começo de um novo caminho de quatro anos, ao longo do qual

faremos novos avanços e obteremos novos progressos.

Não é, pois, um orçamento suficiente que esgota o nosso Programa e o trabalho conjunto no Parlamento. É,

sim, um bom Orçamento, porque é um bom ponto de partida para uma Legislatura que vai caracterizar-se por

novos passos seguros na nossa trajetória de desenvolvimento e prosperidade.

Esta trajetória exige coerência programática e exige estabilidade política. Foi isso que os eleitores disseram,

com toda a clareza, em outubro passado. É isso que os portugueses desejam. É isso que vamos, mais uma vez,

conseguir, a bem de Portugal, a bem dos portugueses.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tendo a Mesa registado a inscrição de muitos Srs. Deputados

para pedirem esclarecimentos, como é hábito, numa primeira ronda, darei a palavra a cada um dos grupos

parlamentares e Deputados únicos, respondendo o Sr. Primeiro-Ministro um a um.

Para o primeiro pedido de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rio, do Grupo Parlamentar do

PSD.

O Sr. Rui Rio (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, diz que este Orçamento do Estado é o melhor

Orçamento que apresentou. Eu diria que nem é o melhor, nem é o pior, antes pelo contrário.

Risos do PSD.

Ou seja, este é um Orçamento do Estado de continuidade.

Vou colocar-lhe três questões, sendo que a primeira não podia deixar de ser sobre o quadro de continuidade,

isto é, o quadro do aumento da carga fiscal.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Exatamente!

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O Sr. Rui Rio (PSD): — A carga fiscal neste Orçamento do Estado aumenta 0,2% do PIB. Isto significa que

os portugueses vão pagar mais 434 milhões de euros de impostos do que aquilo que pagariam se a carga fiscal

ficasse ao mesmo nível em que estava em 2019.

Mas também fica claro, a propósito de quem diz que este é o melhor Orçamento do Estado, o que é que

pensa acerca dele. Se compararmos a proposta que o Governo fez de Orçamento do Estado para 2018 — há

muito pouco tempo! — com esta que agora está a fazer, verificamos que o aumento da carga fiscal é de 0,8%

do PIB. Ou seja, são 1740 milhões de euros que os portugueses vão pagar a mais de impostos em 2020 do que

pagariam se a carga fiscal fosse a que os senhores propuseram aqui em 2018.

Aplausos do PSD.

E, portanto, o melhor Orçamento é o que tem mais carga fiscal, porque tem sempre mais carga fiscal do que

os anteriores orçamentos…

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças (Mário Centeno): — Não é assim!

O Sr. Rui Rio (PSD): — É, é, Sr. Ministro!

O Sr. Adão Silva (PSD): — É, é! Já está baralhado com os números!

O Sr. Rui Rio (PSD): — Sr. Ministro, olhe que não estou a falar do Orçamento do Estado para 2018, estou a

falar da proposta de Orçamento que aqui fizeram. Eu tenho cuidado, eu tenho algum cuidado com aquilo que

digo.

Os senhores criticaram o brutal aumento de impostos que houve no tempo da troica e de lá para cá já fizeram

mais cinco aumentos de impostos, o que dá um aumento de impostos brutal em cima daquilo que os senhores

criticaram há seis anos.

Aplausos do PSD.

Um elemento da classe média em Portugal anda meio ano a trabalhar para o Estado e só ao fim de meio ano

é que começa a trabalhar para si próprio tal é a carga fiscal que temos em Portugal.

Aplausos do PSD.

A carga fiscal não é unicamente, e obviamente, da responsabilidade deste Governo e nem se pede uma

redução drástica, o que se pede é a inversão do caminho.

O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — O senhor quer é mais desemprego!

O Sr. Rui Rio (PSD): — Ou seja, pede-se que os senhores todos os anos tirem um bocadinho e não que

todos os anos acrescentem um bocadinho ou um bocadão, pois ao acrescentar todos os anos um bocadão dá

aquilo que temos agora.

A pergunta que tenho para lhe fazer — aliás, durante a campanha eleitoral fi-la diversas vezes e a resposta

nunca foi clara — tem a ver com a poupança de juros da dívida pública, que este ano vai ser de 160 milhões,

embora o Sr. Primeiro-Ministro tenha referido um número para cinco anos, que corresponde à verdade. Isso é

verdade! Mas, então, quando as taxas de juro subirem — vão ter de subir porque nunca estiveram tão baixas

como estão atualmente — e agora que o tal superavit é atingido exclusivamente à custa do aumento da carga

fiscal e da poupança de juros, quando não houver poupança de juros, o que é que vai fazer? Mais aumentos da

carga fiscal?

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A pergunta que lhe faço — a tal que que lhe fiz durante a campanha eleitoral e cuja resposta nunca foi clara

— é a seguinte: em sua opinião, em Portugal, a carga fiscal está ou não demasiado alta? Em Portugal, temos

ou não de fazer uma efetiva redução de impostos? Estas são perguntas claras. Qual é a sua opinião?

Aplausos do PSD.

Admito que me diga exatamente o que eu não quero ouvir, que é «acho que os impostos têm de subir», mas

tem de o dizer, porque todos anos acontece isto.

A segunda questão que lhe vou colocar é mais difícil que a anterior, porque em relação a essa pode dizer ou

não dizer o que pensa, mas pensa qualquer coisa, como é lógico. Já esta questão que lhe vou colocar é mais

complicada.

Risos do PSD.

Um Orçamento do Estado tem de ter uma estratégia, tem de ter uma linha, tem de ter um rumo, tem de definir

onde é que queremos estar daqui a três, quatro ou cinco anos e este Orçamento, tal como os anteriores, não

tem esse sentido estratégico.

Eu diria que um Orçamento do Estado em condições, para funcionar bem, tem de ser como um sistema de

rodas dentadas, ou seja, o Sr. Primeiro-Ministro mexeria na primeira roda dentada e as restantes funcionariam

até ao fim. Mas os Orçamentos que os senhores costumam apresentar não são como um sistema de rodas

dentadas, são como um saco de bolas que a geringonça abana de vez em quando para pôr isto a funcionar.

Esta é a comparação que pode haver entre algo devidamente programado e algo agitado.

O Governo não tem essa estratégia, mas eu tenho de fazer a pergunta e esta é de difícil resposta. Um dos

problemas da economia portuguesa é, obviamente, o elevado endividamento externo. As exportações

cresceram 2,5% no ano de 2019 e as importações 5,2%, tendo-se agravado o saldo externo. O que se prevê

para este ano é também um crescimento superior das importações relativamente às exportações e o

investimento, ainda por cima, abranda, ou seja, as importações não derivam do investimento.

O que é que temos de fazer para reduzir o endividamento externo se tivermos uma política de médio e longo

prazo? Temos de apostar nas pequenas e médias empresas e temos de apostar no reforço da poupança.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

O Sr. Rui Rio (PSD): — Este Orçamento tem uma ou outra medidazita para as pequenas e médias empresas,

mas não aposta nisso, e para a poupança não tem rigorosamente nada.

Portanto, a pergunta que faço é a seguinte: como é que o Governo pensa reduzir o endividamento externo

deste País, que é uma das condicionantes ao nosso desenvolvimento?

Aplausos do PSD.

Sr. Primeiro-Ministro, a última pergunta ainda é mais difícil, mas, como está ao seu lado o Sr. Ministro das

Finanças, todo sorridente, ele é capaz de lhe dar uma ajuda na resposta.

O Sr. AdãoSilva (PSD): — Ele é um sabichão! Um sabichão!

O Sr. Rui Rio (PSD): — A minha pergunta tem a ver com a transparência, ou a falta dela, no Orçamento do

Estado.

Do Orçamento do Estado consta o saldo do orçamento em contabilidade pública, que num dado quadro tem

um valor e noutro tem outro completamente diferente, havendo um diferencial de 590 milhões de euros.

Protestos do PS.

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Quando questionámos onde é que estavam estes 590 milhões de euros, que se evaporaram, o Sr. Ministro

das Finanças deu uma resposta eloquente. Disse que eu não sabia nada disto! A resposta, a explicação que

deu foi a de que eu não sabia nada disto!

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — E é verdade! Continua sem saber!

O Sr. Rui Rio (PSD): — Pois, então, eu não sei nada disto, mas é preciso perceber onde estão os 590

milhões de euros.

O Sr. Ministro de Estado e das Finanças:— Estão orçamentados!

O Sr. Rui Rio (PSD): — Não queremos saber «onde está o Wally?», queremos saber onde estão os 590

milhões de euros!

Aplausos do PSD.

Em relação à minha pergunta, vou dar uma ajuda ao Sr. Primeiro-Ministro, uma vez que estou convencido

— mas estou mesmo! — que o Sr. Ministro das Finanças até a si o enganou. Acho que até enganou o próprio

Primeiro-Ministro.

Risos do PSD.

Portanto, a minha pergunta nem sequer é para saber onde estão os 590 milhões de euros, é para saber se

o Sr. Primeiro-Ministro já percebeu onde estão ou se está como eu e também ainda não entendeu onde é que

eles estão?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Rio, agradeço-lhe por ter tido tempo para este

debate, atendendo à vida atarefada que tem tido nestes dias.

Protestos do PSD.

Queria começar pela primeira questão, a da carga fiscal.

Como o Sr. Deputado sabe, temos uma carga fiscal abaixo da média da União Europeia e abaixo da média

da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico). O que os portugueses vão pagar

a menos neste ano é muito simples: o IRC das pequenas e médias empresas vai baixar mais 60 milhões de

euros e o IRS das famílias vai baixar mais 50 milhões de euros. Os portugueses e as empresas vão pagar menos

IRS e menos IRC neste ano.

Aplausos do PS.

Na Legislatura que antecedeu a minha primeira Legislatura, a carga fiscal subiu dois pontos percentuais e,

ao longo da anterior Legislatura, com as sucessivas revisões em alta que o INE (Instituto Nacional de Estatística)

tem vindo a fazer do crescimento do PIB, esse grande discurso sobre o aumento da carga fiscal tem vindo a

perder muito a validade.

Neste momento, o Sr. Deputado quer discutir 0,2%. Acontece que, se olhar para as receitas fiscais, verificará

que não há qualquer alteração e que o aumento resulta das contribuições sociais. E porquê? Porque

aumentámos a TSU (taxa social única)? Ou porque criámos uma nova contribuição social? Não, Sr. Deputado!

Sabe o que está a fazer aumentar as contribuições sociais, melhorando a sustentabilidade da nossa segurança

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social, onde ganhámos nos últimos quatro anos 29 anos de sustentabilidade? Sabe o que é? A criação de

emprego e a melhoria do rendimento. É isso que está a fazer aumentar os rendimentos e as contribuições

sociais.

Aplausos do PS.

Portanto, quando me pergunta se eu quero reverter, eu respondo-lhe que, não, não quero reverter, porque

não quero nem baixar o rendimento, nem aumentar o desemprego. Não, Sr. Deputado, comigo não conta nem

para aumentar o desemprego nem para baixar o rendimento.

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado acha que é muito difícil responder à questão sobre a estratégia, mas entendamo-nos: a

estratégia é muito clara e está definida onde deve estar, que é no Programa do Governo.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O Orçamento é só um instrumento de execução do Programa do Governo. E a

grande prioridade que é dada é aos quatro grandes desafios estratégicos que já identificámos: a demografia, as

desigualdades, a transição para a sociedade digital e o combate às alterações climáticas.

Mas também temos um conjunto de medidas estruturais da maior importância. Se o Sr. Deputado está

preocupado com a dívida, digo-lhe que não há melhor forma de diminuir a dívida do que ter como objetivo um

excedente orçamental que permita reduzi-la todos os anos e desonerar o futuro.

Aplausos do PS.

Se está preocupado com o futuro, digo-lhe que não há melhor forma de garantir o futuro às jovens gerações

do que ter confiança no futuro do nosso sistema de segurança social.

Quando definimos como objetivo para esta Legislatura elevar o complemento solidário para idosos até ao

limiar de pobreza, significando isto que, até ao final da Legislatura, qualquer idoso no nosso País, seja qual for

o valor da sua pensão, não estará abaixo do limiar de pobreza, Sr. Deputado, isto é que é uma verdadeira

reforma na estrutura de rendimentos e na estrutura de desigualdades no nosso País.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, sobre as exportações, ainda hoje o INE publicou os dados relativos a novembro: voltámos a

subir 8% nas exportações. Portanto, estamos a subir nas exportações e estamos a ganhar quota de mercado.

Por outro lado, o aumento das importações é explicado, essencialmente, não pela importação de bens de

consumo corrente mas pelo investimento que as empresas estão a fazer na aquisição de bens de equipamento

para a modernização da sua estrutura produtiva.

Aplausos do PS.

Por isso, esse é um investimento virtuoso para a criação de melhores condições de produtividade da nossa

economia.

Finalmente, Sr. Deputado, a terceira pergunta revela bem não a nossa dificuldade mas, sim, a sua dificuldade.

Num Orçamento em que o conjunto da despesa representa 96 819 milhões de euros e a sua preocupação é

com 0,6% desta despesa, diz tudo sobre a sua dificuldade em criticar este Orçamento.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça

Mendes.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do

Governo, Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me que comece por dizer que este debate teve um início um

bocadinho estranho. É que o PSD continua em negação em relação àquilo que os portugueses escolheram a 6

de outubro.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Os portugueses escolheram dar uma derrota estrondosa

ao rumo do PSD para o País…

Aplausos do PS.

… e decidiram reforçar o Partido Socialista e o caminho que começámos em 2016, ou seja, um caminho de

reposição de rendimentos, de criação de emprego, de crescimento da economia, de credibilidade junto das

instituições. E, evidentemente, Srs. Deputados do PSD, Sr. Deputado Rui Rio, este tem de ser um Orçamento

que continua esse rumo e essa estratégia.

A estratégia é muito simples, Srs. Deputados. Nós não estamos a olhar para o interior e para os nossos

adversários dentro dos partidos, nós estamos a olhar para os portugueses e é para os portugueses que estamos

a discutir este Orçamento.

Aplausos do PS.

O Sr. Rui Rio (PSD): — Não, não é!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — É, Sr. Deputado!

O Sr. Deputado podia ter vindo aqui dizer que é contra o aumento do complemento solidário para idosos com

vista à erradicação da pobreza nos mais idosos, mas o Sr. Deputado não o diz. O Sr. Deputado não consegue

dizer que está a favor do reforço do Serviço Nacional de Saúde, porque o que o PSD quer é a privatização e a

degradação do Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do PS.

Protestos de Deputados do PSD.

Sim, Srs. Deputados, o Orçamento do Estado é um instrumento absolutamente essencial para dar resposta

aos problemas reais do País. Aliás, sobre os desafios estratégicos que temos no País, como, por exemplo, o

combate às alterações climáticas, o PSD diz zero — zero de ideias, nenhuma proposta, nenhum contributo!

Aplausos do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, há quatro anos, o Partido Socialista apresentou-se aos portugueses com uma Agenda

para a Década e com a ambição de convergir com a União Europeia, de continuarmos a crescer, de melhorar a

vida dos portugueses.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, este é um excelente Orçamento. É uma proposta de Orçamento do Estado

que, em sede de especialidade, seguramente, será ainda melhorada, mas é um Orçamento do Estado que,

desde logo, dá resposta a um dos problemas mais gritantes que temos em Portugal, o estado de degradação

do Serviço Nacional de Saúde, fruto das políticas do PSD e do CDS.

Aplausos do PS.

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Por isso, ao esforço que mantivemos durante quatro anos, acrescentamos uma prioridade e um esforço

decisivo neste Orçamento do Estado, com o reforço de verbas para que o Serviço Nacional de Saúde esteja ao

serviço das pessoas, porque é para isso que aqui estamos, para resolver os seus problemas.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, falemos de futuro. Este é um Orçamento do Estado que tem uma

palavra e uma visão para os mais jovens e para o futuro. É por isso que o chamado IRS jovem, para aqueles

que começam a trabalhar, deve ser aqui sublinhado, é por isso que o complemento-creche deve ser sublinhado

e é por isso que o abono de família deve ser, também, tido em conta como relevante e como fator positivo deste

Orçamento do Estado.

Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, a única pergunta que fica, neste momento de início de debate,

é a seguinte: para onde quer ir a direita, em particular o PSD? Deve querer continuar com cortes. Pois nós aqui

estamos para dizer que este é o primeiro Orçamento desta Legislatura porque os portugueses pediram mais

crescimento, mais emprego, mais igualdade e estabilidade política.

Aplausos do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, estamos a meio da década em que nos propusemos convergir, mas estamos

absolutamente convencidos, no Grupo Parlamentar, de que este Orçamento do Estado é mais um passo

significativo no caminho da convergência com a União Europeia. Foi para isso que nos propusemos aos

portugueses e foi por isso que os portugueses, também, reforçaram o peso do Partido Socialista nas últimas

eleições.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendes, afirmámos uma grande

ambição coletiva para o País. Retomámos a convergência e queremos 10 anos de convergência sustentada

com União Europeia. Pode parecer pouco, mas a verdade é que nunca aconteceu desde o início deste século.

Entre 2000 e 2017, divergimos sempre da União Europeia. Só retomámos a convergência em 2017, em 2018,

em 2019 e vamos continuar em 2020.

Aplausos do PS.

E temos de dar continuidade a este esforço, de forma a aproximarmo-nos dos países mais desenvolvidos.

Só assim podemos continuar a gerar, em Portugal, mais e melhor emprego e uma melhoria geral dos

rendimentos. Para isso, é fundamental garantir confiança a quem investe, para continuarmos a atrair

investimento direto estrangeiro, para continuarmos a fomentar a modernização do nosso tecido empresarial. O

investimento privado foi mesmo a base do grande crescimento económico, ao longo da última Legislatura. Se

formos verificar, tivemos, ao longo dos últimos quatro anos, um crescimento acumulado de mais de 8% do nosso

produto interno bruto, reduzimos a taxa de desemprego para metade, tivemos o maior crescimento do século,

em 2017.

Temos de prosseguir nesta trajetória porque, se arrepiarmos caminho, seguramente ficamos mais expostos

aos riscos que não controlamos e, sobretudo, frustramos a justa expetativa dos portugueses de poderem

prosseguir a trajetória de melhoria dos seus rendimentos, que conseguimos iniciar em 2016. Temos de fazê-lo

de forma sólida, sustentada, de forma a que não haja qualquer risco de qualquer retrocesso, de voltarmos a ter

de enfrentar cortes, quando o que temos de fazer é continuar a assegurar avanços. É nessa base sólida que

temos de construir o futuro.

É particularmente frustrante ver como o discurso da oposição, incapaz de apresentar uma visão alternativa

para o País — nem uma visão de ambição, nem de estratégia de desenvolvimento, nem de coisa nenhuma —,

se refugia no debate de minudências técnicas contabilísticas. Seguramente, amanhã, o Sr. Ministro das

Finanças terá um enorme prazer em dar uma pequena aula de contabilidade pública e nacional.

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Aplausos do PS.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Ah!...

O Sr. Primeiro-Ministro: — Agora, quando olhamos para a posição pública assumida pelo PSD no final das

suas jornadas parlamentares, vemos que, daqueles sete pontos, os únicos três pontos politicamente relevantes

são os que dizem tudo sobre a inconsistência que o PSD é hoje na sociedade portuguesa.

O PSD diz três coisas: quer mais investimento, quer menos impostos e quer um maior excedente orçamental.

Ora, é verdadeiramente um pensamento mágico!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — É!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Aliás, o pensamento mágico foi enunciado num artigo do atual grande inspirador

económico do PSD, que explicava o seguinte: baixem os impostos, o crescimento surge e, com o crescimento,

naturalmente, vão ter um maior excedente orçamental.

Este pensamento mágico já o vimos: foi o que inspirou Durão Barroso quando propôs o choque fiscal, foi o

que prometeu Passos Coelho e que se traduziu, simplesmente, no maior agravamento fiscal que o País teve e

sob a governação do PSD. Não, não queremos repetir, Dr. Rui Rio!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda. Sr.ª Deputada

Catarina Martins, faça favor.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o Governo decidiu apresentar a

proposta de Orçamento do Estado e entregá-la ao Parlamento antes de negociar. Isso foi um erro, até porque o

Partido Socialista não tem maioria absoluta, o que tem é um mandato popular para procurar entendimentos.

Vozes do PSD, do CDS-PP e do CH: — Ah!...

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Inevitavelmente, o Governo viu-se na necessidade de negociar, agora com

menos tempo e em condições mais difíceis. E se hoje começa este debate sabendo que a sua proposta de

Orçamento vai chegar à especialidade é porque aceitou ceder garantias mínimas de avanços na especialidade,

para as quais o Bloco trabalhou e continuará a trabalhar.

Falamos, no entanto, de mínimos. E falamos de mínimos porque o conjunto das medidas que constam da

proposta do Governo relativas a rendimentos de trabalho, de salários e de pensões são insuficientes para

responder por quem trabalha e por quem trabalhou toda uma vida.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Falamos de mínimos porque a sua opção de dar prioridade à obtenção de

um excedente orçamental mantém um défice na economia. O País inteiro sabe onde é que está o dinheiro desse

excedente, onde é que devia ser aplicado. São as grandes crises dos nossos dias: os serviços públicos, a

habitação, os transportes e a emergência climática. Para ter excedente, o Governo propõe um investimento

público que é insuficiente.

É também por isso que o debate na generalidade não encerra de modo nenhum o debate deste Orçamento

do Estado. Assinalamos o acordo a que conseguimos chegar, ontem e hoje mesmo, sobre matérias importantes

como a descida de propinas, a proteção dos pensionistas pobres e o programa para o Serviço Nacional de

Saúde. Há muitas matérias em aberto e, na fase de especialidade, vamos continuar a bater-nos pela valorização

de salários e de pensões, pela resposta aos cuidadores informais, pelo respeito pelas pessoas com deficiência,

pela garantia de apoios sociais, tanto na infância como no desemprego, que protejam verdadeiramente quem

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está mais vulnerável. Vamos continuar a bater-nos para reforçar o investimento na cultura e nos transportes,

para baixar a fatura da luz, para responder à crise da habitação, à crise do clima e à coesão territorial.

Mas quero perguntar-lhe sobre uma das matérias que é essencial para o País e que o Bloco de Esquerda

colocou no centro das negociações com o Governo: o Serviço Nacional de Saúde. Na anterior Legislatura, foi

criada uma nova lei de bases para salvar o SNS. Mas a lei serve de pouco se não previrmos o mecanismo da

sua concretização. E é neste Orçamento que a sua concretização começa.

Na proposta apresentada pelo Governo, há uma primeira resposta à suborçamentação crónica do Serviço

Nacional de Saúde, com um aumento orçamental, em 2020, na casa dos 800 milhões de euros, a que se junta

um esforço na redução da dívida, do ano passado e também deste ano. Este esforço é importante mas não

aumenta o peso do Serviço Nacional de Saúde no PIB nem chega para financiar todos os investimentos

considerados urgentes por todo o setor.

É por isso determinante, para o Bloco de Esquerda, o investimento adicional garantido no acordo que

fechámos hoje, ou seja, mais 180 milhões de euros centrados no investimento em meios complementares de

diagnóstico e terapêutica, permitindo responder melhor aos utentes e internalizar as respostas que hoje são

contratualizadas com o setor privado.

Este investimento não deve ser isolado e, portanto, a primeira questão que lhe coloco é se será acompanhado

pelo plano plurianual de investimentos já previstos na Lei de Bases da Saúde e que é essencial para o reforço

da resposta do SNS.

Em segundo lugar, chegámos a um entendimento para eliminar as taxas moderadoras nos cuidados

primários durante este ano. Nas consultas as taxas moderadoras acabam com a entrada em vigor do Orçamento

do Estado, nas análises e nos exames feitos no Serviço Nacional de Saúde acabam em setembro e em todos

os restantes meios complementares de diagnóstico e terapêutica prescritos nos cuidados primários terminam

no final deste ano.

Mas lembro que a Lei de Bases prevê o fim das taxas moderadoras em todos os atos médicos prescritos por

profissionais do Serviço Nacional de Saúde. Ficam a faltar as consultas em hospitais, entre muitas outras

matérias. Portanto, o Governo deve começar já a preparar esse caminho. O nosso acordo para este ano é um

passo importante, mas é apenas o primeiro do caminho para o fim das taxas moderadoras que a Lei de Bases

da Saúde determina.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Finalmente, queria destacar a importância do acordo que fizemos para a

concretização do Programa Nacional de Saúde Mental, uma das áreas essenciais em que falha a resposta no

nosso País, e registar os avanços no que toca aos profissionais.

Não há SNS sem profissionais da saúde. Na proposta apresentada ao Parlamento, o Governo compromete-

se a contratar mais 8400 profissionais para o Serviço Nacional de Saúde, em dois anos. A medida que agora

acordámos inicia o caminho para a dedicação plena, ou exclusividade, no Serviço Nacional de Saúde, aqui, com

os dirigentes médicos hospitalares. O Governo, também neste caso, deve preparar com as organizações

sindicais do setor os próximos passos para a aplicação da dedicação plena que a Lei de Bases da Saúde prevê.

Deixo duas questões: as contratações previstas representam um aumento de 8400 profissionais a trabalhar

no SNS ou incluem contratações de substituição para trabalhadores que, entretanto, saiam por reforma ou por

outro motivo? É que, se os incluírem, não estamos a ter o reforço de que precisamos.

Finalmente, terão as instituições do Serviço Nacional de Saúde a autonomia para contratar os profissionais

que faltam nos seus quadros? Porque, tantas vezes, se a execução acaba por chegar ao SNS, a autorização

para contratar, essa sim, tem tardado demais.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, este Orçamento é herdeiro e

continuador dos quatro Orçamentos anteriores. É herdeiro e continuador na melhoria de rendimentos, na

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reposição de direitos, na melhoria do investimento, na melhoria da qualidade dos serviços públicos e, também,

na solidez das nossas contas públicas.

É um Orçamento de continuidade da Legislatura anterior e é bom que assim seja, porque os resultados que

alcançámos foram resultados bons para o País, bons para a economia, bons para as pessoas em particular. É

essa continuidade que temos de assegurar. Por isso, desde a formação do Governo, nunca tivemos dúvidas

sobre com quem tínhamos de trabalhar, e assim falámos, antes da formação do Governo e antes da

apresentação do Programa do Governo — como aqui foi reconhecido no debate —, que espelhou algumas das

preocupações quer do Bloco de Esquerda, quer do PCP, quer do PAN, quer do Livre, em particular.

Mas fizemos também o mesmo relativamente a este Orçamento. Não podemos dizer que não negociámos,

podemos é não ter chegado a acordo, como chegámos ontem; dirá que a culpa foi nossa e eu poderia retribuir

dizendo que a culpa foi sua, mas, se calhar, foi de ambos. Agora, seguramente, na reunião que tivemos no dia

12 de novembro, poderíamos ter alcançado, talvez, o que acordámos ontem. Não sabemos! Mas houve um

esforço conjunto e esse esforço teve uma tradução, desde logo, na apresentação inicial do Orçamento.

Como a Sr.ª Deputada bem sabe, não consta do Programa do Governo qualquer tipo de redução do IVA da

eletricidade. Se temos a previsão da redução do IVA da eletricidade, embora de uma forma compatível com a

prioridade do combate às alterações climáticas e socialmente mais justa, foi porque fizemos um esforço para ir

ao encontro de preocupações, designadamente, do Bloco de Esquerda.

Se, no Orçamento, introduzimos a possibilidade da desconsideração dos filhos, no âmbito da avaliação da

condição de recursos para o complemento solidário para idosos, no 3.º escalão, foi para ir ao encontro, por

exemplo, de uma proposta muito antiga do Bloco de Esquerda sobre essa matéria.

E este Orçamento é um orçamento que, em matéria de rendimentos, faz avanços muito importantes. Há um,

da maior importância, que tem a ver com o restabelecimento do princípio da atualização anual dos vencimentos

na função pública. As pessoas, em geral, podem pensar que isso é uma regra, mas, pelo menos desde 2000,

deixou de ser regra e até houve um ano, que foi o de 2009, que foi a exceção que confirmou a regra. Ora, aquilo

que repusemos agora foi esse princípio, propondo já aos sindicatos não só uma atualização a partir deste ano,

como também uma nova atualização no próximo ano de 2021, dando-lhe continuidade em 2022 e 2023, e espero

que esse princípio se passe a manter para sempre.

Quando fixamos o objetivo da erradicação da pobreza entre os idosos, através do complemento solidário

para idosos, estamos mesmo a falar da melhoria dos rendimentos.

Quando reforçamos as medidas em matéria de habitação e em matéria de transportes públicos estamos a

responder a necessidades imediatas da nossa classe média, mas também a contribuir para combater as

alterações climáticas. É nesta conjugação de objetivos que temos de prosseguir e que temos, verdadeiramente,

de continuar.

O investimento público, do Orçamento do Estado para 2019 para o Orçamento do Estado para 2020, aumenta

18%, isto é, passa de 2% do PIB para 3% do PIB. Sr.ª Deputada, admito que me diga que tinha a ambição de

que crescesse ainda mais — todos a tínhamos —, mas há uma coisa que não me pode dizer, que é a de que

não é mais do que no ano passado ou que é um recuo relativamente ao ano passado. Aquilo que temos mesmo

de concluir é que este Orçamento, em qualquer vertente, é mesmo melhor do que o do ano passado.

Não discuto as opções políticas do Bloco de Esquerda e a decisão que tomou quanto ao sentido de voto que

amanhã aqui vai expressar, mas uma coisa é certa: este Orçamento é melhor do que o Orçamento que o Bloco

de Esquerda votou a favor em 2018, é melhor do que os Orçamentos que o Bloco de Esquerda aprovou em

2017 e em 2016, e é-o do ponto de vista do rendimento, do ponto de vista da melhoria do investimento, do ponto

de vista da justiça social. De todos os pontos de vista, é um Orçamento melhor.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Esse é o seu ponto de vista!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas, Sr.ª Deputada Catarina Martins e Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, tal

como ontem foi possível obter resultados concretos, ao contrário do que tinha acontecido em novembro, tenho

a certeza de que, durante as próximas semanas de debate neste Parlamento, poderemos, mais uma vez, contar

com o Bloco de Esquerda para melhorar aquela que já é a melhor proposta orçamental…

Vozes do CDS-PP: — Ah!

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O Sr. Primeiro-Ministro: — … que apresentei nestes cinco anos à Assembleia da República.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Cabe agora a vez ao Grupo Parlamentar do PCP, pelo que tem a palavra o Sr. Deputado

Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, na proposta de Orçamento que

hoje aqui discutimos o Governo do PS fez as suas opções. O seu objetivo central para a construção do

Orçamento é o de atingir um excedente orçamental, impondo uma travagem no ritmo dos avanços alcançados

na última Legislatura e continuando a adiar a resposta a problemas centrais do País. É uma opção errada, em

que se acentua a submissão do País às imposições da União Europeia e do euro e aos interesses do grande

capital.

Sr. Primeiro-Ministro, chamemos-lhe um «pífaro», se quiser, mas que há imposições da União Europeia e

que há submissão por parte do Governo é uma realidade incontornável.

Aplausos do PCP.

Não tinha de ser assim. O País tem problemas graves aos quais precisa de dar resposta, mas tem também

os meios e os recursos necessários para os resolver, meios e recursos que em vez de serem consumidos pela

dívida e pelos objetivos do défice, pelos buracos da banca privada ou pelas parcerias público-privadas, deveriam

ser canalizados para responder aos graves problemas com que estão confrontados os serviços públicos, para

o necessário aumento dos salários de todos os trabalhadores, para a subida das reformas e das pensões, para

o reforço do investimento público.

Quando ouvimos aqui falar dos méritos do excedente orçamental lembramo-nos do défice de médicos, de

enfermeiros e de outros profissionais no nosso Serviço Nacional de Saúde, das listas de espera, da falta de

equipamentos ou dos milhões de euros de recursos públicos que continuam a ser desviados para o negócio da

saúde privada.

O excedente orçamental tem, como reverso da moeda, o défice de milhares de assistentes operacionais nas

escolas ou a ausência de respostas aos problemas das forças e serviços de segurança e impede que se assuma

o aumento geral dos salários como uma efetiva emergência nacional.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É verdade que não estamos perante a política de terra queimada dos

Governos dos PEC (pactos de estabilidade e crescimento) e do pacto da troica, mas decididamente não estamos

perante a resposta plena de que o País necessita para os problemas nacionais.

Nos últimos quatro anos, em cada Orçamento do Estado, tivemos um ritmo de respostas a problemas que

não tem comparação com a proposta atual do Governo. O Sr. Primeiro-Ministro disse que esta era uma das

propostas mais avançadas dos últimos anos, mas bastaria referir três medidas que foram adquiridas nesse

processo: manuais escolares gratuitos, aumento extraordinário de pensões e reformas, tarifários com

abaixamento de preço nos transportes públicos. São três medidas que não são emblemáticas mas têm um

grande significado. Não encontramos nesta proposta de Orçamento algo de comparável com o avanço das três

medidas que referi.

Registamos que, fruto da nossa intervenção, se tenha aberto a possibilidade de avançar com medidas de

aumento das pensões, de dar passos na gratuitidade das creches, de concretização do fim das taxas

moderadoras, de reduzir os custos da energia, de aumentar prestações sociais como o abono de família ou o

subsídio de desemprego, de reforço do Serviço Nacional de Saúde ou da criação do Laboratório Nacional do

Medicamento, entre outras. Não deixaremos de trabalhar com determinação, na especialidade, para que estas

e outras possibilidades se venham a tornar uma realidade, mas não nos deixamos iludir com a ideia de que é

possível preparar o futuro do País a partir dos níveis de investimento público que este Orçamento propõe.

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Onde estão os meios para impedir que volte a acontecer às florestas portuguesas aquilo que se verificou em

2017 ou para concretizar obras que estão há décadas paradas, como as do Mondego?!

Onde estão os meios e as decisões para investir decididamente no transporte público, para comprar

comboios para o trajeto suburbano e de longo curso?

Onde estão os meios para ultrapassar as situações de rutura nos vários serviços públicos, incluindo na saúde,

onde não basta manter o Orçamento que em 2019 não chegou para resolver os problemas existentes?!

Onde estão os meios para a construção pública de habitações? Onde estão os meios para investir,

modernizar e preparar o País para o futuro, incluindo na sua dimensão produtiva?

É também preciso contratar milhares de trabalhadores para os serviços públicos para reforçar a sua

capacidade de resposta.

Que compromissos é que o Governo assume já para 2020? É que não basta inscrever objetivos genéricos.

A situação reclama respostas visíveis e concretas com impacto já no próximo ano.

A situação do País, a realidade com que estão confrontados milhões de portugueses é dura: salários baixos,

reformas baixas, precariedade, desemprego, rendas caras, desequilíbrios e assimetrias grandes no território.

A questão não está em saber se há ou não Orçamento, mas se este responde de facto às aspirações de

milhões de portugueses, desses portugueses que ainda não perderam a esperança de uma vida melhor.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, este Orçamento não resolve

todos os problemas, como os quatro Orçamentos anteriores não resolveram todos os problemas, o que importa

é saber se identificamos os problemas certos e se estamos no rumo certo para resolver esses problemas.

Aquilo que lhe posso dizer é que este Orçamento mantém o rumo, não tem retrocessos nem nos manuais

escolares, nem na redução do tarifário, nem nos aumentos extraordinários das pensões, nem em nenhum dos

direitos conquistados na última Legislatura, pelo contrário, tem avanços. Tem avanços para os jovens, que

passam a ter, nos primeiros três anos da sua atividade, uma isenção muito significativa no IRS, num momento

que é absolutamente decisivo para a sua autonomização; tem um grande avanço na erradicação da pobreza

entre os idosos, através do complemento solidário para idosos; tem uma grande resposta, com o maior reforço

de sempre da dotação inicial do Serviço Nacional de Saúde. Sim, temos avanços e é preciso continuar a avançar.

Este é o primeiro ano de uma nova Legislatura, onde temos de reiniciar um ciclo que dê continuidade ao que

iniciámos na Legislatura anterior. Tenho a certeza de que, com a colaboração do PCP e o empenho do PCP,

iremos conseguir, também na fase da especialidade, melhorar esta proposta, que é a melhor das propostas que

já aprovámos nos quatros anos anteriores.

Esse é o caminho que temos de prosseguir, porque, ao contrário daquilo em que o Sr. Deputado, às vezes,

parece acreditar, o excedente não é o objetivo que condiciona o Orçamento, o excedente é o resultado de uma

boa gestão orçamental, de um bom crescimento da nossa economia, de um sólido crescimento do emprego, e

obtemo-lo apesar de aumentarmos o investimento público, apesar de aumentarmos o rendimento pago em

pensões, em salários, em prestações sociais e na melhoria da qualidade dos serviços públicos.

É apesar disto tudo que temos excedente. Não se trata de uma imposição da União Europeia, é uma

imposição do nosso País e do nosso futuro, porque a obrigação que temos é para com as gerações futuras mas

é também para com as necessidades do País hoje.

Se hoje podemos fazer o reforço que fazemos no Serviço Nacional de Saúde — mais 941 milhões de euros

só na dotação inicial — é porque vamos poupar 2000 milhões de euros de juros relativamente àquilo que o País

pagava em 2015. E por que é que estamos hoje a pagar menos 2000 milhões de euros de juros do que

pagávamos há cinco anos? Estamos a pagar menos 2000 milhões de euros de juros porque recuperámos a

credibilidade internacional. E recuperámos a credibilidade internacional porque mantivemos uma política

orçamental sustentável.

Aquilo que provámos, e era isso que o PCP também devia valorizar, porque essa é a maior derrota histórica

da direita portuguesa, foi que era possível, efetivamente, ter finanças públicas sãs sem ser necessário cortar

salários e pensões nem realizar brutais aumentos de impostos, pelo contrário, com melhor rendimento, maior

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investimento e maior justiça social. Essa é a derrota histórica da direita em Portugal, a qual foi devida ao trabalho

que fizemos em conjunto e o PCP não deve desvalorizar o contributo que deu e o contributo desse resultado

para o combate político no nosso País.

Aplausos do PS.

É verdade que há défice de pessoal e ao défice de pessoal estamos a responder com novas contratações.

É por isso que o Orçamento do Estado prevê uma norma de programação plurianual dos recursos para as forças

de segurança; é por isso que o Orçamento do Estado prevê a contratação de mais 8400 profissionais para o

Serviço Nacional de Saúde; é por isso que está em curso a contratação de mais 1000 técnicos superiores para

a Administração Pública. É este processo de reforço que temos de prosseguir, passo a passo, mas, como o Sr.

Deputado bem sabe, muitas vezes, temos aberto mais concursos do que as vagas que têm vindo a ser

preenchidas. Portanto, o problema não tem estado do lado da cativação ou da autorização da abertura de

concursos, o problema é mais complexo, de falta de recursos humanos ou de dificuldade em competir com

outras ofertas mais atrativas. E o mesmo se diga relativamente ao investimento público.

É verdade que o investimento público tem tido uma baixa taxa de execução,…

O Sr. Adão Silva (PSD): — Ah!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … mas convido-o a ir ver o que acontece, por exemplo, na generalidade das

autarquias locais. Não vou individualizar nenhuma, mas a verdade é que o nível de investimento nas autarquias

locais, no ano passado, foi de 51%, em 2017, foi de 51% e, em 2016, foi de 49%. E porquê? Porque a destruição

do setor da construção, a carência de recursos humanos, as dificuldades dos processos de contratação,…

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Isso não desculpa nada!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … as dificuldades dos processos de controlo da legalidade, o contencioso que

se tem multiplicado em todos os concursos, tornam objetivamente difícil, muitas vezes, a execução do contrato.

Sabe quantos concursos tivemos de abrir para retomar as obras do Liceu Camões? Tivemos de abrir três

concursos. Sabe quantos concursos tivemos de abrir para retomar a obra da Escola Secundária Alexandre

Herculano ou do Conservatório? Tivemos de abrir dois concursos.

Ainda na semana passada uma providência cautelar paralisou um concurso para aquisição de composições,

mas a verdade é que estamos a fazer o nosso trabalho.

Quando fala do reforço da capacidade da produção nacional e do investimento, designadamente na área da

indústria ferroviária, convido-o a vir comigo, no próximo dia 15, à oficina de Guifões, que, depois de anos

paralisada, vai agora retomar a sua atividade e onde já pode ver comboios a serem reparados que vão poder

começar a circular na nossa ferrovia.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, permita-me que o cite: «enquanto houver caminho para andar, só temos

um dever, o de continuar a andar e seguir o rumo que iniciámos em 2016».

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do Grupo

Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as

e Srs. Deputados, queria começar por cumprimentá-los e por desejar um bom ano a todo o Governo e, em

particular, ao Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro começou por nos dizer aquilo que, aliás, já tínhamos ouvido várias vezes, que este é

um Orçamento de continuidade.

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Sr. Primeiro-Ministro, é, de facto, um Orçamento de continuidade, sobretudo, e infelizmente, no enorme

abismo que separa a propaganda do seu Governo, e as suas palavras aqui, da realidade do País e dos números.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Preparei, para estas perguntas que lhe queria fazer, quatro exemplos

de como, nesta matéria, a propaganda é muito diferente da realidade.

Começava pelos impostos, ou pela carga fiscal, como lhe queira chamar.

Risos do Deputado do PCP João Oliveira.

O Sr. Primeiro-Ministro anunciou aqui, como, aliás, já tinha feito na altura do Orçamento, que o IRS sobre as

famílias ia baixar 50 milhões de euros. Lembrei-me de fazer o teste dos números e ir ver em quanto é que o Sr.

Ministro previa que, de 2019 para 2020, aumentasse a receita fiscal, ou seja, os impostos cobrados às famílias

portuguesas. Vão aumentar 1799 milhões de euros em 2020, o que quer dizer que o Sr. Primeiro-Ministro prevê

arrecadar 35 vezes mais impostos do que prevê devolver em IRS às famílias portuguesas.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Exatamente!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Isto demonstra bem, Sr. Primeiro-Ministro, a diferença que vai entre a

sua propaganda e a realidade.

Também não deixa de ser extraordinário que, neste debate, o Sr. Primeiro-Ministro já tenha dito que 590

milhões de euros eram uma minudência contabilística.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Exato!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Então, 590 milhões de euros são uma minudência contabilística, mas

ter 50 milhões de euros de imposto em IRS já é uma grande medida?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ai é, é!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Primeiro-Ministro, não se pode ter um critério para o Governo e

outro para a oposição!

Gostava de lhe perguntar também — porque esta é a questão fundamental em Portugal — sobre a baixa de

impostos, que não é uma prioridade nem para o Governo nem para nenhum dos partidos que constituem esta

nova geringonça, em que o novo voto a favor é a abstenção, e, com franqueza, surpresa, Srs. Deputados, só se

for para os próprios,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … porque todo o País já tinha percebido, há muito, que havia uma

nova geringonça e que este Orçamento ia ser viabilizado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Tem de montar uma banca com uma bola de cristal!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Ficámos a saber que a baixa de impostos e a baixa de IRS não é uma

prioridade para nenhum destes partidos, porque nenhum exigiu uma diminuição da carga fiscal ou, sequer — o

mínimo dos mínimos —, uma manutenção da carga fiscal para viabilizar o Orçamento.

A Sr.ª Assunção Cristas (CDS-PP): — Muito bem!

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A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Em segundo lugar, o Sr. Primeiro-Ministro fala de contas. E, sim, contas

certas são importantes, o Sr. Primeiro-Ministro é que descobriu isso recentemente, nós sempre o soubemos.

Mas o Sr. Primeiro-Ministro veio gabar-se da poupança que fez em juros, de cerca de 2000 milhões de euros.

Fê-la de facto, Sr. Primeiro-Ministro, mas cobrou cinco vezes mais do que isto, nos últimos cinco anos, em

impostos. Houve mais de 9260 milhões de euros em impostos cobrados nesta Legislatura, cinco vezes mais do

que poupou em juros.

Segundo exemplo: qualidade dos serviços públicos. O Sr. Primeiro-Ministro veio aqui falar da saúde, mas

quem visse notícias, nos últimos dias — e o assunto é sério —, via notícias de que os profissionais de saúde

vão receber formação em defesa e que havia reuniões entre a Ministra da Saúde e o Sr. Ministro da

Administração Interna.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Hoje!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Há um enorme abismo, infelizmente, entre a propaganda sobre

serviços públicos e sobre investimento na saúde e a realidade da qualidade dos serviços públicos,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … onde os profissionais de saúde acham que a única coisa que podem

fazer para poderem ir trabalhar sem serem agredidos por doentes desesperados é terem aulas de autodefesa.

Isto é gravíssimo, Sr. Primeiro-Ministro!

Aplausos do CDS-PP.

Que o Governo não tenha nada para fazer além de anunciar grupos de trabalho e formação em autodefesa

é absolutamente lamentável.

Terceiro exemplo da enorme diferença entre a propaganda e a realidade, Sr. Primeiro-Ministro: ala pediátrica

do Hospital de São João, cujas obras o Sr. Primeiro-Ministro, antes das eleições, inaugurou, com pompa e

circunstância.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Inaugurei?! Não! Não inaugurei!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Visitou!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E que visitou.

Sr. Primeiro-Ministro, sabe quanto é que o Orçamento reporta como gasto com a ala pediátrica do Hospital

de São João no ano passado, em 2019, esse ano em que o Sr. Primeiro-Ministro visitou a ala e anunciou que já

havia obras? Zero euros, Sr. Primeiro-Ministro! Zero euros!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Pois é!…

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Por último, tenho um exemplo sobre justiça social para o Sr. Primeiro-

Ministro e também para os seus parceiros, porque falam muito das pensões mais baixas de entre as mais baixas,

e fazem-no com razão.

Estamos a falar da pensão mais baixa das mais baixas das mais baixas, da pensão social, de cerca de 210

€ por mês, Sr. Primeiro-Ministro.

Pois bem, dei-me ao trabalho de ver e o aumento destas pensões que a geringonça conseguiu fazer na última

Legislatura, Sr. Primeiro-Ministro, foi de 8,79 €. No tempo da troica, no tempo do Governo anterior, em que tudo

era mais difícil, estas pensões tiveram um aumento de 12,01 €.

Aplausos do CDS-PP.

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O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — E as outras?!

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — É esta a noção de justiça social do Partido Socialista e dos partidos da

geringonça: aumentarem menos as pensões mais baixas das mais baixas.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, não vale a pena fazermos

malabarismos com os números…

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Não vale?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … quando os dados são muito claros.

Aquilo que faz aumentar a carga fiscal não são as receitas fiscais, o que faz aumentar a carga fiscal são as

contribuições sociais.

As contribuições sociais não sobem por nenhum facto imputável nem ao aumento da taxa nem ao aumento

da sua base de incidência. A carga fiscal aumenta, simplesmente, fruto do crescimento do emprego e da

melhoria dos rendimentos.

Convido-a, aliás, a consultar um estudo do Banco de Portugal que analisa quais são os fatores que têm

contribuído para a variação da carga fiscal em Portugal, nos últimos anos. Esse estudo demonstra que da ação

do Governo só resultaram contributos para baixar a carga fiscal e da parte da economia só resultaram contributos

para aumentar a carga fiscal, devido à excelência do comportamento do mercado de trabalho.

Protestos das Deputadas do CDS-PP Assunção Cristas e Cecília Meireles.

Esta é a realidade, quer goste quer não.

Mas, Sr.ª Deputada, o que não é uma minudência, seguramente, para os contribuintes portugueses, em

particular para os jovens, é o facto de saberem que, se este Orçamento for aprovado, nos primeiros três anos

de atividade após a conclusão de um percurso educativo, ao entrarem no mercado de trabalho, terão forte

isenção do imposto sobre o seu rendimento como apoio fundamental à sua autonomização: 30% de isenção no

primeiro ano, 20% de isenção no segundo ano e 10% no terceiro ano.

Para esses jovens este apoio vai ser mesmo muito importante, para se fazerem à vida e para poderem ter

confiança no futuro e na capacidade que têm de construir o futuro entre nós, aqui, em Portugal.

Aplausos do PS.

As famílias vão beneficiar já com o aumento da dedução fiscal por filho, e não naquela base que o CDS tanto

apreciou na Legislatura anterior, em que os filhos dos ricos valiam mais do que os filhos dos pobres.

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.

Agora, com as crianças a valerem todas o mesmo, a verdade é que a dedução a partir do segundo filho já

será de 900 €.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Ah, bom!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Deputada, é isso que, efetivamente, pesará na realidade, na vida concreta

das pessoas. É isso que pesará na vida concreta das pessoas.

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Mas, Sr.ª Deputada, temos, de facto, uma visão diferente sobre a política fiscal.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Ai isso temos!

O Sr. Primeiro-Ministro: — A Sr.ª Deputada tem uma visão de que devemos ser um país que se coloque no

leilão da baixa fiscal para tudo e para todos; nós temos a visão de um país onde, para melhorar o rendimento

das famílias, para o desenvolvimento da economia, para a modernização das nossas infraestruturas, é

fundamental termos bons serviços públicos,…

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — São ótimos!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — … de saúde, de transportes, e boa política de habitação, que responda,

efetivamente, às necessidades das pessoas. Portanto, entre a melhoria da qualidade dos serviços públicos e a

baixa de impostos, sim, a nossa prioridade está na melhoria da qualidade dos serviços públicos.

Mas se me pergunta se deve haver uma redistribuição do esforço fiscal, digo-lhe que deve. Por isso, a nossa

prioridade é continuar a reduzir o imposto sobre quem trabalha, desde logo, em sede de IRS; é diminuir o esforço

fiscal das empresas que reinvestem os seus lucros para serem mais capitalizadas, que investem na

modernização tecnológica, que investem em investigação e desenvolvimento, que investem na qualificação dos

seus recursos humanos, que investem no interior. É aí que queremos concentrar o esforço fiscal porque é aí

que temos, efetivamente, vantagem em concentrá-lo e fazermos a diferença.

Aplausos do PS.

Finalmente, queremos fazer uma redistribuição da tributação sobre o trabalho, tributando o que é nocivo para

o ambiente, que tão acarinhado é pelo CDS, que está sempre a querer acarinhar os impostos que tributam o

consumo dos combustíveis fósseis, aqueles que mais penalizam o ambiente, aqueles que mais contribuem para

as emissões de CO2 e que temos de ter o compromisso coletivo de saber reduzir.

Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.

Por último, Sr.ª Deputada, afirmar que estamos a reforçar as necessidades de pessoal, que estamos a

reforçar as necessidades do investimento, não é ignorar os problemas, é precisamente o contrário. É assumir

que os problemas existem e responder-lhes.

Portanto, quando aumentámos, na última Legislatura, 1700 milhões de euros ao orçamento do Serviço

Nacional de Saúde não foi para fingir que não havia problemas,…

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Correu mal!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … foi para resolver os problemas que a falta desses 1700 milhões de euros só

podiam agravar.

Aplausos do PS.

Se estamos este ano, só este ano, a reforçar em mais 941 milhões de euros a dotação inicial do Ministério

da Saúde é porque sabemos que ainda temos de fazer mais e melhor e queremos continuar a fazer mais e

melhor. E é isso que iremos fazer.

Sr.ª Deputada, se quer combater, efetivamente, a pobreza entre os idosos, olhe para o complemento solidário

para idosos, porque esse é que é o instrumento efetivamente eficaz para combater a pobreza de quem necessita,

e não andar a distribuir dinheiro entre quem necessita e quem não necessita.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado André Silva, do

Grupo Parlamentar do PAN.

O Sr. André Silva (PAN): — Boa tarde, Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: na proposta do Orçamento que

começámos a debater constam medidas que sinalizámos e valorizamos, como a extensão a todo o País do

programa Housing First, que visa concretizar a Estratégia Nacional para a Integração de Pessoas Sem Abrigo;

o reforço da oferta de cuidados de psicologia e nutrição nos centros de saúde; o reforço da aposta na prevenção

da saúde mental; a garantia de verbas para projetos de produção agrícola em modo biológico; o aumento do

IVA das touradas; ou a elaboração de um estudo socioprofissional dos trabalhadores das centrais do Pego e de

Sines, com vista à sua requalificação profissional.

São, contudo, pequenos apontamentos avulsos adicionados a um documento que tem como desígnio um

objetivo contabilístico: o superavit.

Este é um «orçamento-avestruz». Aparentemente, por falta de coragem para afrontar alguns interesses, o

Governo prefere pôr a cabeça debaixo da areia para não ter de encarar o complexo desafio de enfrentar, de

forma consequente, os problemas do País.

O Primeiro-Ministro tem dito, e repetido, que este é o melhor Orçamento que já apresentou. Mais: disse ser

um Orçamento coerente com os desafios estratégicos assumidos pelo Governo, tais como o combate às

alterações climáticas ou reduzir as desigualdades.

Mas, quando lemos o mapa do Fundo Ambiental, com um montante previsto de 476 milhões de euros,

percebemos que este transfere um quarto do Orçamento para a EDP, para amortização do défice tarifário, e

suporta vários outros buracos orçamentais, como, por exemplo — pasme-se! — os custos relacionados com a

ocupação americana da Base das Lages.

E, no fim, quanto sobra para projetos de mitigação e adaptação às alterações climáticas ou de conservação

da natureza? Sobram 80 milhões de euros, ou seja, apenas 17% do montante do Fundo Ambiental.

Sr. Primeiro-Ministro, isto é o melhor que o Governo consegue fazer? São estas opções coerentes no

combate às alterações climáticas?

Atentos às promessas de descarbonização do Governo, fomos também analisar as opções políticas

respeitantes à eliminação dos subsídios perversos no âmbito dos combustíveis fósseis e constatámos uma

preocupante continuidade na política de isenções ao ISP (imposto sobre os produtos petrolíferos), com um custo

para o nosso País superior a 500 milhões de euros anuais.

Sr. Primeiro-Ministro, manter isenções fiscais à queima de carvão, à navegação marítima e ao transporte

aéreo é o melhor que o Governo consegue fazer? São estas as opções coerentes no combate às alterações

climáticas?

Mas não só de incoerências em matéria de alterações climáticas vive este Orçamento, também as

encontramos no Programa do Governo apresentado há tão pouco tempo.

Um dos tabus deste Orçamento é a questão da reformulação dos escalões do IRS, em especial dos escalões

que afetam, de forma mais evidente, os contribuintes da classe média, uma medida que asseguraria mais justiça

fiscal. Sr. Primeiro-Ministro, esta omissão é o melhor que o Governo consegue fazer? São estas opções

coerentes com a previsão de mecanismos que acentuem a progressividade do IRS, como refere no seu

Programa do Governo?

O Sr. Ministro das Finanças tem enfatizado a necessidade de existirem contas certas e de sermos

responsáveis nas propostas orçamentais que fazemos, procurando assegurar uma compensação de receita. O

PAN está totalmente de acordo com esta visão e tem apresentado ao Governo múltiplas possibilidades de receita

que os senhores rejeitam, porque entendem manter o modelo fiscal de tributar sobretudo quem trabalha, não

estando abertos a outras opções de política fiscal, nomeadamente a de taxar os combustíveis fósseis ou os

resíduos não reciclados.

Mas mais: Portugal é um dos poucos países europeus em que a taxa do IVA do alojamento hoteleiro é

reduzida. Aumentar a taxa do IVA de 6% para 13% é uma medida de «exportação fiscal», porquanto a subida

do imposto incide, sobretudo, sobre não residentes. Não fazer este ajuste custa ao País 235 milhões de euros

por ano, um montante que poderia contribuir para resolver o crónico subfinanciamento da cultura ou para

compensar os impactes ambientais do setor do turismo, sem pôr em causa as ditas «contas certas».

Infelizmente, a visão do Governo para o turismo está a ser como a história da galinha dos ovos de ouro.

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Representativo desta visão é, aliás, o projeto de construção do aeroporto do Montijo, uma opção política que,

Sr. Primeiro-Ministro, não se iluda, vai meter água. Quando isso acontecer, quanto muito, vai lá poder aportar

hidroaviões!…

Também nos merece destacar as distorções causadas pelo regime fiscal para residentes não habituais, uma

das causas que justifica o aumento dos preços da habitação em Portugal, especialmente em Lisboa, Porto e

Algarve. O fim deste regime não consta da proposta de Orçamento do Estado, o que faz com que este seja, de

facto, o melhor orçamento para os reformados europeus, que aqui encontram o El Dourado, mas o País perde

anualmente 550 milhões de euros de receita que poderiam trazer uma melhoria à vida das pessoas sem pôr em

causa as ditas «contas certas».

Por tudo isto, Sr. Primeiro-Ministro, o PAN vai apresentar um pacote de propostas de alteração à proposta

de Orçamento do Estado, para que seja ainda um melhor Orçamento do Estado, financeiramente equilibrado

entre despesas e receitas.

As propostas do PAN não terão em conta a salvaguarda dos interesses de setores que se julgam intocáveis,

serão coerentes com os objetivos de combate às alterações climáticas e conservação dos ecossistemas, com a

melhoria das condições de quem trabalha, com o direito a habitação digna e acessível para todos e com o

reforço da transparência no nosso País.

Um Orçamento do Estado que não tenha sinais de convergência com estes objetivos não poderá merecer a

nossa aprovação.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Silva, em primeiro lugar, este Orçamento do

Estado procura ser coerente com todos os objetivos estratégicos, a começar pelo objetivo estratégico de

combate às alterações climáticas.

É por isso que iniciamos, neste Orçamento — progressivamente, mas com passos sólidos —, a eliminação

dos subsídios ambientalmente nocivos, como no caso do imposto sobre os produtos petrolíferos e a taxa de

carbono sobre o carvão e o coque, que era de 100% e baixa para 50% já em 2020, passará para 75% em 2021

e será eliminada em 2022; do fuelóleo, com 25%, 50%, 75% e 100%; do gás, do petróleo e de outros

hidrocarbonetos gasosos, com uma diminuição até 40% ao longo da Legislatura. Portanto, estamos

comprometidos com essa proposta.

Como sabe, recusámos sempre a ideia de redução do IVA na eletricidade e procurámos condicionar essa

medida a um objetivo que fosse ambientalmente compatível, porque não compreendemos como é que é possível

que à segunda-feira, quarta-feira e sexta-feira andemos a manifestar-nos pela emergência climática e que à

terça-feira e quinta-feira digamos que a grande prioridade é a baixa do IVA na eletricidade, quando há outros

instrumentos efetivamente adequados ao combate à pobreza energética, como a fatura social da eletricidade o

demonstrou ser.

Mas o que propusemos à Comissão Europeia foi a abertura de um novo campo, que até hoje não foi utilizado

nunca em sede de IVA: a possibilidade de fazer variar a taxa do IVA em função dos escalões de consumo, de

forma a que não seja um incentivo ao consumo mas, pelo contrário, um incentivo à boa prática energética, à

melhoria da eficiência energética e do consumo responsável de energia.

Neste Orçamento temos uma prioridade clara ao reforço do investimento na floresta, quer através dos planos

de paisagem, quer dos recursos do ICNF (Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas), quer do

programa de reflorestação, porque a floresta é um elemento fundamental como sumidouro de CO2.

Há outras matérias que preocupam o PAN e cuja preocupação partilhamos, por exemplo, o combate à crise

da habitação. Desde logo, como reconheceu, e bem, expressámos logo na proposta inicial de Orçamento do

Estado a possibilidade de podermos escalar para todo o País a excelente experiência do município de Lisboa

em torno do Housing First, a única medida efetivamente eficiente para assegurar condições de vida aos sem-

abrigo.

Em segundo lugar, e como já disse no meu discurso, está previsto um forte aumento dos recursos para

investimento em habitação, mas, mais do que isso, há duas medidas fiscais muito importantes em matéria de

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incentivo a que imóveis afetos ao alojamento local possam ser reorientados para o mercado do arrendamento,

ao permitir-se que os municípios possam agravar a taxa de IMI (imposto municipal sobre imóveis) sobre o

alojamento local nas zonas que definiram como zonas de contenção e ao eliminar-se o pagamento do imposto

de mais-valia quando os proprietários quiserem transformar um imóvel que está em alojamento local em

alojamento destinado ao arrendamento, desde que celebrem um contrato de arrendamento por um mínimo de

cinco anos. Este é um forte incentivo para podermos aumentar a oferta pública e ajudar a combater a crise

habitacional.

Quanto ao mais, estou certo que o debate na especialidade permitirá enriquecer, com os contributos do PAN,

esta proposta de Orçamento que apresentámos para 2020.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — É agora a vez de Os Verdes.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, vou começar por partilhar com o

Sr. Primeiro-Ministro e com esta Assembleia duas situações — que tenho, até, dificuldade em qualificar e, à falta

de melhor, vou chamar-lhes «curiosidades» ou «inquietações» — decorrentes desta proposta de Orçamento do

Estado.

A primeira diz respeito à nossa soberania orçamental e à liberdade dos povos e dos seus representantes

poderem decidir em matéria orçamental o que melhor entenderem para o seu país. Desde logo, parece-nos

desprovido de qualquer sentido que o Governo português se sinta na obrigação ou tenha a obrigação de pedir

autorização à Comissão Europeia para poder diferenciar as taxas do IVA na eletricidade. Portanto, só por si,

esta necessidade de autorização deve preocupar qualquer cidadão com sentimentos democráticos, sobretudo

tratando-se de um país onde um terço dos portugueses não tem dinheiro para aquecer a sua casa.

Mas o mais curioso nem reside neste facto, ainda que ele seja igualmente preocupante. O mais curioso é

que se o Governo pretender combater a pobreza energética no País ou se pretender favorecer a poupança e a

eficiência energética para combater as alterações climáticas tem de pedir autorização à Comissão Europeia,

mas se o Governo decidir aumentar a sua despesa com as operações ligadas à NATO pode fazê-lo sem precisar

de qualquer autorização da União Europeia. Ora, isto não faz qualquer sentido! Há aqui alguma coisa que está

mal, Sr. Primeiro-Ministro!

A segunda «curiosidade» ou «inquietação» tem a ver com um exemplo da prioridade que este Orçamento

diz ter no combate às alterações climáticas e na promoção da utilização do transporte público.

Vejamos: o artigo 211.º da proposta de Orçamento do Estado refere-se à dedução dos custos com passes

sociais para as empresas que os paguem aos seus trabalhadores e, neste caso, a dedução é de 130%. Mas

quando vemos o artigo 258.º percebemos que as empresas e os trabalhadores independentes podem deduzir

140% dos donativos que fizerem para a fundação que vai organizar as Jornadas Mundiais da Juventude 2022.

Sr. Primeiro-Ministro, fica a ideia que, face à necessidade de combater as alterações climáticas, temos um

Orçamento de um Estado que é laico mas que, neste caso, parece valorizar mais as Jornadas Mundiais da

Juventude do que a promoção da utilização do transporte público e do combate às alterações climáticas! Por

isso, é necessário, no mínimo, elevar as deduções dos custos com os passes sociais para os 140%. No mínimo,

Sr. Primeiro-Ministro! Haja bom senso!

Além disso, Sr. Primeiro-Ministro, se a economia está a ter um bom desempenho, é justo que esse bom

desempenho tenha reflexos positivos na vida das pessoas exatamente na mesma proporção. E, quando falamos

de reflexos positivos, falamos não só dos direitos e rendimentos das pessoas mas também da qualidade dos

serviços públicos, porque se não se valorizarem os salários e se não se melhorarem os serviços públicos quando

a economia está a ter um bom desempenho, então, quando será o tempo de proceder à valorização real de

rendimentos e salários e de reforçar a qualidade dos serviços públicos?

Neste contexto, Sr. Primeiro-Ministro, tenho de lhe dizer que, para Os Verdes, aquilo que se perspetiva, tanto

para o aumento dos salários dos trabalhadores da Administração Pública, como para as reformas, é

absolutamente insuficiente a todos os níveis e em todas as dimensões. É insuficiente quando comparamos os

salários médios do nosso País com os dos outros países europeus, é injusto quando comparamos o valor desse

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aumento com o das verbas que estão previstas para financiar a banca — recordo que são mais 600 milhões de

euros só para o Novo Banco e mais 55 milhões de euros para o BPN — e é absolutamente injusto quando

comparado com os montantes que estão previstos para os custos das parcerias público-privadas.

Sr. Primeiro-Ministro, não lhe vou perguntar se acha isto justo ou injusto, mas pergunto-lhe se acha que este

aumento dos salários dos trabalhadores da Administração Pública e o aumento previsto para as reformas e

pensões estão em sintonia com o desempenho da nossa economia. E esta pergunta pressupunha, naturalmente,

a presença de, pelo menos, três dados importantes: por um lado, o facto de a devolução de direitos e

rendimentos às famílias — como, aliás, já foi reconhecido pelo Sr. Primeiro-Ministro hoje no debate — terem

sido decisivos para o desempenho da economia e, por outro lado, o facto de os salários dos trabalhadores da

Administração Pública estarem congelados há mais de uma década e o valor das pensões e reformas continuar

a ser de uma injustiça gritante.

Em síntese, o que lhe pergunto, Sr. Primeiro-Ministro, é se acha que os valores previstos para os aumentos

dos salários e das pensões acompanham o crescimento da economia.

Por fim, Sr. Primeiro-Ministro, desde o início da crise que os portugueses já pagaram mais de 20 000 milhões

de euros para tentar salvar a banca. Neste Orçamento estão previstos mais 600 milhões de euros para o Novo

Banco e mais 55 milhões de euros para o BPN. Podemos até dizer que este é um ministério abonado!

Mas os portugueses estão fartos de pagar a irresponsabilidade dos banqueiros e a fatura de gestões

danosas. Acham, e bem, que não deveriam ter essa obrigação, porque quando os bancos dão lucro também

não o repartem com os portugueses, ficam com o bolo todo — os bancos, claro!

O que lhe pergunto, Sr. Primeiro-Ministro, é se esta linha de apoio ao Novo Banco e ao BPN fica concluída

este ano ou se ainda vamos ter de a carregar durante os anos que aí vêm. E, nesse caso, até quando, Sr.

Primeiro-Ministro?

Aplausos do PEV e de Deputados do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Luís Ferreira, em primeiro lugar, o IVA, como

sabe, é um imposto que está regulado a nível europeu. Portanto, as suas alterações ou cumprem a letra da

jurisprudência do Tribunal de Justiça e a letra dos regulamentos — e têm de ter uma neutralidade absoluta,

portanto, não podemos diferenciar em função dos níveis de escalão de consumo —, ou, então, para que haja

essa mudança, ela tem de ter uma autorização.

Aliás, foi assim que, no ano passado, fizemos já a primeira redução relativamente à potência contratada,

graças a uma autorização que obtivemos da União Europeia, e esta é da maior importância estratégica não só

para nós mas para o conjunto da Europa.

Felizmente, na proposta de Green Deal que a Comissão Europeia já apresentou, também pela primeira vez

se assume a possibilidade de diferenciar as taxas de IVA em função da pegada ecológica — neste caso

relativamente aos produtos agrícolas. É essa lógica que queremos aplicar também à redução do IVA da

eletricidade, porque, sendo o senhor um Deputado Verde, acompanhar-me-á, seguramente, no reconhecimento

de que essa redução do IVA tem de ser ajustada aos escalões de consumo, para que não seja um incentivo

negativo do ponto de vista do combate às alterações energéticas. Tanto mais que as medidas mais eficazes,

como se tem provado, para combater a pobreza energética não passam por baixar o IVA mas, sim, por aumentar

a fatura social, como a aumentámos ao longo da última Legislatura.

As Jornadas Mundiais da Juventude não são só uma iniciativa religiosa. Trata-se de um grande programa de

requalificação da frente ribeirinha do concelho de Loures e, ainda, de parte do concelho de Lisboa, e este projeto,

que é uma grande oportunidade para requalificar toda aquela frente ribeirinha da Bobadela, tem vindo a ser

trabalhada intensamente, em conjunto, quer com o Patriarcado, quer com os municípios de Loures e de Lisboa.

Por isso, seguramente, requer toda a nossa atenção.

Relativamente a rendimentos, Sr. Deputado, as pensões vão aumentar, pelo terceiro ano consecutivo, acima

da inflação. Se me pergunta se isso está em sintonia com a nossa economia, direi que está mesmo em sintonia

com a nossa economia, porque, como sabe, com a fórmula que existe para a subida das pensões, só havendo

dois anos com uma média de crescimento superior a 2% é que fica garantido para todos aqueles que são

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abrangidos por esta medida um aumento acima da inflação. É graças ao facto de a economia ter crescido,

felizmente, em média, acima dos 2% nos últimos dois anos que temos este aumento acima da inflação. E é a

primeira vez, na nossa história, que temos três anos consecutivos com este aumento, desde que este regime

existe.

Finalmente, e quanto à função pública, chamo a atenção para o facto de que a mudança que fazemos é

histórica. Nós reintroduzimos um princípio que está abandonado há 20 anos e que é fundamental, que é o da

atualização anual dos salários. Nós não podemos confundir a atualização anual dos salários com todo o impulso

remuneratório que vai existir ao longo deste ano. Vamos ter, no conjunto, entre a conclusão do processo de

descongelamento e o processo de atualização anual dos salários, um aumento de 3,2% do conjunto das

remunerações na Administração Pública, em Portugal.

Ao contrário do que ouço muitas vezes dizer, à boleia da baixa taxa de inflação de 2019, a de que a proposta

era só de atualização em função da inflação verificada em 2019, propusemos, desde já, para ficar claro que

2020 não voltaria a ser, novamente, uma exceção, como 2019 foi para confirmar a regra, mas o primeiro de um

processo continuado de atualização anual, propusemos, repito, a atualização para 2021. E o que propusemos

foi muito simples: estando a inflação estimada para 2020 em 1%, o que propusemos é que ficasse desde já

garantido que a atualização para o próximo ano será, pelo menos, de 1%, sendo que o Governo fará acompanhar

a atualização se a inflação for superior a 1% e não a reduzirá se a inflação for inferior a 1%. Isso demonstra que

o princípio da reposição da atualização anual não é uma exceção, mas é um princípio que veio para ficar.

Finalmente, Sr. Deputado, quanto à banca, nós não criámos nenhum mecanismo. Limitámo-nos a consolidar,

a resolver e a estancar uma hemorragia que existia, fixando o limiar máximo da contribuição. Esse limiar está

fixado e daí não passará.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — É a vez de o Sr. Deputado André Ventura, do Chega, pedir esclarecimentos.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e demais Membros do Governo, antes

de mais, desejo votos de um bom Ano. Já tinha saudades de o ter aqui, Sr. Primeiro-Ministro, para responder

com realismo — espero que seja com realismo — a estas questões, porque de realismo este Orçamento tem

muito pouco.

Por isso, a nossa primeira questão é a seguinte: como é possível termos um Orçamento cuja base, em termos

de preços do petróleo, já está desatualizado no dia em que estamos aqui a discuti-lo? É qualquer coisa de

extraordinário que a desatualização seja quase mais rápida do que as palavras do Governo nesta matéria.

Protestos do PS e do BE.

Vejo o Bloco de Esquerda muito indignado com as questões do Partido Socialista. Tenham calma!

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Quem?!

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Primeiro-Ministro, é, ou não, verdade que esta é a maior carga fiscal de

sempre? É que Bruxelas diz que é e o seu Ministro diz que não! E, ainda na semana passada, tivemos a

Comissão Europeia a dizer que a carga fiscal será record em 2020. Alguém está enganado ou alguém está a

enganar os portugueses — é bom que isso fique aqui esclarecido!

Já agora, Sr. Primeiro-Ministro, agradecia que respondesse às seguintes questões com a maior objetividade

possível.

Vão, ou não, aumentar as cativações? É que tivemos a Unidade Técnica de Apoio Orçamental a dizer que

vamos ter um aumento de 25%. É que, se houver um aumento de 25% de cativações, podemos dar o dinheiro

que entendermos para a saúde, para as forças de segurança — para não se manifestarem novamente no dia

21, à frente do Parlamento —, a verdade é que, em 2019, só 31% da dotação inicial é que foi utilizada.

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Portanto, a questão que temos de colocar é esta: vão, ou não, aumentar as dotações neste Orçamento? É,

ou não, verdade que vamos ter mais instrumentos de tesouraria restritos à autorização do Sr. Ministro das

Finanças? É que se assim for, Sr. Primeiro-Ministro, este Orçamento só tem uma palavra: é um mero programa!

Não é mais do que isso. Não é um Orçamento, é um programa!

Gostava ainda de lhe perguntar, Sr. Primeiro-Ministro, se o incumprimento do Estado vai continuar. É que

começa a ser um pouco cansativo, não só para famílias como para empresas, que o Estado, dirigido por S. Ex.ª,

tenha criado um programa para que as câmaras municipais passassem a cumprir com fornecedores e que o

Estado seja, hoje, o principal incumpridor em matéria de obrigações financeiras em relação a todos, a todos —

famílias, empresas, etc. É importante saber se estas famílias e se estas empresas algum dia vão receber do

Estado. É que os cidadãos estão um pouco fartos de serem penhorados quando devem 15 ou 30 cêntimos e de

ver o Estado, quando lhes deve milhares de euros, demorar a pagar e de não pagar juros, quando paga,

finalmente.

Por fim, Sr. Primeiro-Ministro, porque o tempo não é muito e ainda gostaria de fazer outra intervenção,

pergunto: é, ou não, verdade que este Orçamento retira competências ao Tribunal de Contas? Então, o campeão

da transparência, o campeão dos instrumentos de fiscalização da legalidade retira, em matéria de negócios e

de obras, competências ao Tribunal de Contas?! É de uma gravidade extraordinária! Temos de lhe perguntar,

Sr. Primeiro-Ministro, se é verdade, ou não. Ontem, como sempre, uns diziam que sim e outros diziam que não.

A verdade é que no instrumento diz-se que passam a estar mais negócios fora do visto prévio, no âmbito do

Tribunal de Contas. E os cidadãos olham para si, que anunciou aqui, durante a discussão do Programa do

Governo, a tal grande luta contra a corrupção e pela transparência, e agora veem, no Orçamento, retirar

competências ao Tribunal de Contas. Onde e como é que ficamos? Gostava que me esclarecesse o mais

objetivamente possível.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Ventura, também vou ser telegráfico, uma

vez que o meu tempo também já não abunda.

Primeiro, sobre previsões em relação à carga fiscal, tenho só um critério: desde há cinco anos que me

habituei a haver divergência entre as previsões da Comissão Europeia e o Sr. Ministro das Finanças. Só lhe

respondo que o que tenho constatado sempre é que o Ministro das Finanças tem acertado sempre e a Comissão

Europeia tem falhado sempre.

Aplausos do PS.

Se este ano será a exceção que confirma a regra, espero que não, Sr. Deputado.

Não vai haver mais cativações e a norma deste ano é exatamente igual à do ano passado.

Relativamente ao incumprimento dos pagamentos, tem sido feito um esforço grande. Por exemplo, no setor

da saúde, em novembro tínhamos atrasos de pagamentos no montante de 800 milhões de euros. Pagámos, até

31 de dezembro, 550 milhões de euros e, até fevereiro, vamos pagar os restantes 250 milhões de euros.

Portanto, este reforço orçamental de 700 milhões de euros vai acrescentar a um sistema que começa o ano

menos endividado.

Finalmente, há algumas matérias em que, efetivamente, desaparece o visto prévio do Tribunal de Contas, o

que não significa retirar a fiscalização do Tribunal de Contas. Só que ela é feita a posteriori, ou seja, com maior

responsabilidade por parte de quem executa essa despesa. Trata-se de agilizar o investimento, não se trata de

diminuir a fiscalização e o controlo sobre esse investimento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — É a vez de o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, da Iniciativa Liberal, pedir

esclarecimentos.

Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e demais Membros do

Governo, muito bom ano a todos.

Sr. Primeiro-Ministro, vou ser cuidadoso porque vi o enlevo com que falou deste Orçamento — o melhor

Orçamento de sempre, o pai de todos os Orçamentos,…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não, não!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — … o nobel dos Orçamentos — e eu não quero ferir a sua

suscetibilidade, nem invocar a ira parlamentar, lendária, do Sr. Primeiro-Ministro.

Vou ser cuidadoso e vou dar-lhe, desde já, um ponto: coincidimos no objetivo de redução da dívida pública,

que é um objetivo de macroeconomia muito importante. Mas há de convir que a escolha política para lá chegar

pode ser discutida.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Claro!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — O PS quer chegar a essa redução da dívida pública, mantendo um

superavit, crescendo poucochinho — as projeções de longo prazo dão 1,5% ao ano —, e reduzindo a dívida

nominal. O PS não o quer, mas a Iniciativa Liberal quereria, que o excedente orçamental fosse devolvido aos

portugueses sob a forma de mais rendimento, que o crescimento pudesse ser superior e que a redução da dívida

pública se fizesse pelo rácio sobre o PIB, que é o que verdadeiramente interessa e o que seria muito mais rápido

do que no cenário que o PS escolhe.

E, Sr. Primeiro-Ministro, por favor, não venha responder com os choques fiscais de Durão Barroso, ou outros,

porque se não acredita que reduzir impostos acrescenta ao crescimento, se acredita que é subindo impostos

que gera crescimento, digo-lhe, desde já, que na sua Legislatura os dois anos em que a economia cresceu um

bocadinho mais foram os dois anos em que teve a carga fiscal mais baixa. Devo dizer, também, que se acha

que mais impostos produzem mais crescimento, acho bem avisarmos desde já os portugueses, a começar por

estes que estão aqui nas galerias, que isso vai acontecer e que nos próximos anos, para crescer mais, vamos

ter mais impostos. Ou, então, não!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Ou, então, não!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Ou, então, não!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, para responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, tenho a enorme tentação de lhe dizer «então,

não!», porque não vamos mesmo aumentar esses impostos!

Aplausos do PS.

Não partilhando desse pensamento mágico de que a baixa de impostos significa mais crescimento, que

nunca foi demonstrado em sítio algum, só lhe digo o seguinte: hoje, os portugueses pagam menos 1000 milhões

de IRS do que pagavam quando assumi as funções de Primeiro-Ministro. Este ano, vão pagar menos 50 milhões

de IRS se este Orçamento for aprovado, as empresas pagarão menos 60 milhões de euros do que pagaram no

ano passado e a famosa carga fiscal, mais uma vez, não tem subido pelo facto de ter havido aumento de

impostos, visto que a receita fiscal se mantém. Aquilo que se tem alterado é, efetivamente, o aumento das

contribuições sociais.

Em matéria de crescimento, Sr. Deputado, todos nós gostaríamos de, com o estalar dos dedos, crescer mais.

Há uma coisa que tenho certa — e isso ninguém pode discutir: os únicos anos em que Portugal tem convergido

com a União Europeia, ou seja, em que tem crescido acima da média da União Europeia desde que aderimos

ao euro, foram os de 2017, 2018 e 2019. Nessa altura, o Sr. Deputado ainda não era Deputado, mas estou certo

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de que em 2020, apesar de o senhor ser Deputado, também vamos continuar a crescer acima da média

europeia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — É a vez de a Sr.ª Deputada Joacine Katar Moreira, do Livre, pedir esclarecimentos.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Joacine Katar Moreira (L): — Obrigada, Sr. Presidente.

Sr. Primeiro-Ministro, este não é, minimamente, um Orçamento do Estado de um partido oficialmente de

esquerda, com uma ótica de esquerda, mas, especialmente, com objetivos de uma governação à esquerda.

Este Orçamento ilude e desilude imediatamente, quando o aumento do salário mínimo nacional não dignifica

os trabalhadores. Irei, sucessivamente, insistir, nesta Legislatura inteira, em relação a isto.

É-me indiferente se haverá um excedente orçamental. É-me indiferente se a União Europeia irá estar

satisfeitíssima. São-me indiferentes as óticas iniciais de reforçar algumas áreas, de investir em algumas áreas,

obviamente áreas úteis, tais como a saúde, a habitação, a educação e os transportes. Mas, enquanto o salário

mínimo nacional for este, absolutamente miserável, não há Orçamento do Estado que efetivamente seja um

Orçamento inédito, histórico, único. É necessário que haja um maior aumento do salário mínimo nacional, é

preciso que esse aumento seja, inicialmente, para 750 €.

A minha questão é esta: irá o Sr. Primeiro-Ministro fazer uma nova reflexão em relação a um real aumento

do salário mínimo?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Joacine Moreira, em primeiro lugar, quero dizer-

lhe que o salário mínimo nacional não é fixado no Orçamento do Estado, nem condiciona diretamente o

Orçamento do Estado. Aliás, este ano, o salário mínimo nacional foi fixado num montante que já era o montante

do vencimento mais baixo no conjunto da Administração Pública.

Em matéria de Administração Pública, vamos ter seguramente um aumento dos vencimentos — e um

aumento que seguramente os colocará acima do salário mínimo nacional.

Relativamente à evolução do salário mínimo nacional, definimos uma estratégia para a Legislatura que tem

de ser consonante com aquilo que é a dinâmica da economia e com aquilo que é a dinâmica da criação de

emprego.

A ambição que temos, se a cumprirmos, por muito baixa que lhe possa parecer, é a de, em duas Legislaturas,

aumentarmos em 50% o valor do salário mínimo nacional.

Se desejamos ir mais longe? Todos nós desejamos ir mais longe. Mas temos de ir de forma a que isso não

comprometa o bem fundamental, que é a criação de emprego, a sua estabilidade e a sua qualidade.

Agora, com o Orçamento do Estado, há outras matérias que têm a ver e se repercutem sobre quem ganha o

salário mínimo nacional. Essas matérias têm a ver, designadamente, com o facto de, com a elevação do mínimo

de existência, passarem a estar isentas de pagar IRS, neste ano de 2020, mais 30 000 famílias do que aquelas

que o estavam em 2019 — e, em 2019, foram mais 27 000 e, em 2018, tinham sido mais 140 000 famílias. E

isso, sim, tem a ver com o Orçamento do Estado, tem a ver com a melhoria da eficiência da justiça fiscal para

desagravar a tributação sobre quem menos ganha.

Mas há outras medidas no Orçamento do Estado. E quando a Sr.ª Deputada reconhece aqui que há um

reforço do investimento na habitação, na saúde, na educação e nos transportes, também reconhecerá que todas

as melhorias destes serviços públicos se traduzem no aumento do rendimento disponível das famílias. Só a

medida relativa à redução do preço do passe social traduziu-se, em muitas famílias, num aumento maior do

rendimento disponível mensal do que aquele que foi o aumento do salário mínimo nacional em toda a

Legislatura.

Por isso, quando olhamos para o rendimento das famílias, temos de olhar não só para os salários mas

também para aquilo que é a receita que o Estado lhes cobra através do sistema fiscal e aquilo que o Estado

lhes devolve através de transferências não monetárias, com os manuais escolares gratuitos, com a redução do

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tarifário dos transportes, com a criação da tarifa social da eletricidade e o combate à pobreza energética, com o

conjunto de prestações sociais que vão ser aumentadas. Assim como são fundamentais, para combater os

baixos rendimentos, o complemento de creche, a dedução em IRS a partir do segundo filho e a isenção de 30%,

20% e 10% em sede de IRS para os jovens nos primeiros três anos de atividade.

Ora, é isso que temos de continuar a fazer ao longo desta Legislatura. Mas para isso precisamos de uma

economia que seja sólida, que continue a gerar riqueza e que, sobretudo, continue a gerar emprego, emprego

de cada vez maior qualidade.

É desta forma integrada que temos de olhar para a política de rendimentos, não isolando o tema dos salários.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se ainda, para pedir esclarecimentos, mais 15 Srs. Deputados, aos quais

o Sr. Primeiro-Ministro responderá, em conjunto, num primeiro grupo, a oito e, num segundo grupo, a sete Srs.

Deputados.

O primeiro inscrito para o efeito é o Sr. Deputado Duarte Pacheco, do Grupo Parlamentar do PSD.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, o senhor

apresentou-nos aqui um País imaginário, que não sei se lhe hei de chamar «Costolândia» ou «Centenolândia»

— deixo essa designação à vossa consideração.

De facto, é um País verdadeiramente imaginário, um País que tem um Orçamento do Estado que aumenta

15 impostos — como o imposto do selo, o IMI, o IMT (imposto municipal sobre a transmissão onerosa de

imóveis), o ISV (imposto sobre veículos), o IUC (imposto único de circulação), o imposto sobre os produtos

petrolíferos, sobre o tabaco, sobre o jogo online, sobre as bebidas com açúcar —, que cria novas contribuições,

que atualiza o IRS abaixo da inflação, correspondendo a um aumento de impostos.

Mas o Governo acha que todos estes impostos são pagos pelos extraterrestres e que, por isso, a carga fiscal

não aumenta, baixa. É mesmo um País imaginário, Sr. Primeiro-Ministro!

Mais do que isso, o Sr. Primeiro-Ministro trouxe-nos aqui informações que não eram verdadeiras. Basta ir ler

a página oficial da OCDE para comprovar que, no último ano para que existem dados, em 2018, a carga fiscal

de Portugal é superior à da média dos países da OCDE. Porventura, o Sr. Ministro das Finanças cometeu um

engano, como já tem cometido outros no passado.

Mas este País imaginário, Sr. Primeiro-Ministro, é aquele em que, com o Orçamento do Estado, 590 milhões

de euros da despesa desaparecem e o Primeiro-Ministro não tem qualquer explicação, provando a falta de rigor

da peça orçamental que apresenta aos portugueses.

Este País imaginário é aquele que o Sr. Primeiro-Ministro diz que vai ser inundado de investimento público,

quando constatamos que o valor apresentado é um valor igual, em percentagem do PIB, àquele que nos

apresentou no ano passado e que, claro, não executou, porque não executou em 2016, nem em 2017, nem em

2018, nem em 2019, tendo ficado sempre 700 milhões de euros abaixo do previsto.

Mas, agora, o Sr. Primeiro-Ministro diz: «Acreditem na minha palavra, porque estou cheio de força e agora

vou realizar tudo!». Claro que nós não podemos acreditar nisso. E não podemos acreditar porque o seu passado,

infelizmente, não nos permite acreditar nessa palavra de confiança.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — E é ainda o País imaginário em que o Governo fala da maravilha dos

serviços públicos, mas em que as escolas encerram por falta de pessoal, em que na saúde as pessoas

desesperam para ser atendidas, em que nas forças de segurança as viaturas estão paradas, em que de

madrugada os portugueses fazem fila para serem atendidos na segurança social, em que os reformados

esperam meses e anos para terem a sua pensão deferida. Ora, este, sim, é País real, que é muito diferente do

País imaginário que aqui nos apresentou.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

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O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Este é um País em que todos os parceiros da zona euro, em paridade de

poder de compra, crescem mais em rendimento per capita do que nós, porque estamos estagnados.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Este País tão diferente é o País dos portugueses e aquele que aqui nos

apresentou é o País do PS, é o País socialista, é o País da Centenolândia ou da Costolândia, como quiser.

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Edite Estrela.

A Sr.ª Presidente: — Muito obrigada, Sr. Deputado.

Aproveito para cumprimentar as Sr.as Deputadas e os Srs. Deputados, os Srs. Membros do Governo e o Sr.

Primeiro-Ministro e para desejar a todos um bom ano.

Tem, agora, a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Marina Gonçalves, do PS.

A Sr.ª Marina Gonçalves (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.

Primeiro-Ministro, hoje, iniciamos a discussão do Orçamento do Estado para 2020, um Orçamento que é

efetivamente de continuidade, continuidade no progresso e na melhoria do Estado social, em linha, aliás, com o

trabalho que foi feito na anterior Legislatura pelo Governo e pelo Parlamento.

Estando ainda no início da discussão, podemos já retirar estas duas evidências: para o Partido Socialista e

para os partidos à nossa esquerda, interessa falar de propostas concretas, de avanços possíveis e de respostas

necessárias; já à nossa direita, continuamos a assistir a um vazio de propostas verdadeiramente alternativas a

um Orçamento do Estado que rejeitam liminarmente e a uma incapacidade de falar para as pessoas.

Digo isto porque, para o Partido Socialista, mais do que falar de números, falamos de pessoas, de medidas

concretas, de políticas públicas para o povo português.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Marina Gonçalves (PS): — Não nos escondemos na inevitabilidade do que não foi feito. Assumimos

o que está por fazer, traçamos objetivos, evoluímos a cada Orçamento e sempre com a mesma meta no final:

colocar as pessoas no centro da nossa ação política e melhorar a vida de todos os portugueses.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Marina Gonçalves (PS): — Sabemos que não será, nunca, um debate fácil para as bancadas do PSD

e do CDS, mas este é realmente o debate que interessa. E importa salientar que esta dicotomia discursiva é

também uma dicotomia claramente política. É que, enquanto os senhores aconselharam os nossos jovens a

emigrar, este Orçamento continua a promover medidas para a sua fixação estável e com condições,

nomeadamente ao nível da parentalidade.

Aplausos do PS.

E enquanto os senhores governaram sob a égide dos cortes e dos plafonamentos, este Orçamento do Estado

continua a promover melhores e mais dignas condições para os portugueses, com especial enfoque nos mais

idosos.

E enquanto os senhores cortaram rendimentos, aumentaram impostos e não priorizaram os portugueses,

este Orçamento continua a aumentar rendimentos, pensões e prestações, a respeitar pessoas e a promover

mais e melhor trabalho.

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Tudo isto é estranho ao PSD e ao CDS, que, durante quatro anos, rejeitaram quatro Orçamentos do Estado,

Orçamentos do Estado que repuseram direitos, aumentaram pensões, aumentaram prestações sociais,

promoveram melhorias na sustentabilidade do orçamento da segurança social, aumentaram a rede de

equipamentos e respostas sociais, entre muitas outras coisas.

Tudo isto é estranho ao PSD e ao CDS, que debatem a segurança social com uma mão cheia de nada, sem

nos dizerem qual seria a vossa alternativa para a prossecução de políticas para o povo português.

É por isso que também lhes é estranho discutir este Orçamento do Estado, um Orçamento que traz reais e

efetivos compromissos, a saber: aumento real das pensões da maioria dos pensionistas; aumento do

complemento solidário para idosos, com vista à sua convergência com o limiar da pobreza; reforço do abono de

família; reforço do serviço público de emprego; implementação de todas as fases da prestação social de

inclusão; reforço da rede de equipamentos sociais, das creches e criação de um complemento para as creches

Este é o Orçamento do Estado para 2020 que nos apresentam e este é o Orçamento do Estado que iremos

trabalhar, na especialidade, e que certamente sairá daqui mais benéfico.

Mas este é um Orçamento do Estado, repito, de progresso na promoção do Estado social.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto-lhe: qual é a trajetória que queremos seguir ao nível da proteção

social para reduzir as desigualdades e para combater a pobreza e qual é a alternativa aos cortes e

plafonamentos para promover uma melhor justiça social?

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

Jorge Costa, do Bloco de Esquerda.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro, saíram, há

dias, as estatísticas europeias sobre a pobreza energética e temos, além de um País em que as famílias dedicam

a maior fatia dos seus rendimentos aos custos energéticos, um País com a maior percentagem da sua população

sem capacidade de prover conforto térmico e onde se passa frio, razão pela qual temos uma mortalidade

excessiva no inverno.

Este problema tem sido uma batalha de longo fôlego que o Bloco de Esquerda tem travado aqui, no

Parlamento. E recordo que, logo no primeiro daqueles quatro Orçamentos piores do que este, na opinião do Sr.

Primeiro-Ministro, aprovámos uma medida sólida e que foi uma das respostas mais importantes que se deu até

agora a este problema: o alargamento e a conversão numa medida relevante da tarifa social, que passou a ser

atribuída de forma automática não a 100 000 pessoas, como era até àquela altura, mas a 800 000 pessoas,

como passou a ser, com um desconto de 30% na fatura elétrica.

Recordo esta medida, nesse tal Orçamento de 2016, para a comparar, de algum modo, pelo menos no seu

alcance e na sua definição, com esta que hoje o Governo vem propor, em sede de IVA (imposto sobre o valor

acrescentado), neste que seria o melhor Orçamento de sempre. E o contraste é flagrante, porque, onde tínhamos

uma medida quantificada com um impacto relevante na fatura elétrica, nomeadamente nas populações mais

carenciadas, temos hoje uma declaração de intenções incerta nos seus impactos e sem um compromisso claro

quanto ao perfil da redução de IVA que o Governo está a prever.

Olhamos para a proposta do Governo e ficamos sem saber que escalões se pretende criar, que taxas se

pretende aplicar a esses escalões. Afinal, que impacto pode ter essa descida de IVA? Qual é o efeito concreto

na fatura dos consumidores de eletricidade?

Quando chegamos ao artigo 218.º da proposta de Orçamento, o que encontramos não é uma resposta ao

Bloco de Esquerda, Sr. Primeiro-Ministro. O que encontramos não é uma resposta ao problema da pobreza

energética! O que encontramos é um enorme ponto de interrogação acerca do que, realmente, pode representar

esta intenção de uma descida de IVA.

As perguntas, muito simples, que lhe deixo são estas: será ao longo do processo orçamental, na fase de

especialidade, que o Governo esclarecerá a Assembleia da República e os portugueses acerca das suas

intenções quanto ao alcance e ao impacto que a descida do IVA pode ter? Quem será abrangido? Que

consumidores e com que descida de taxas?

São todas estas perguntas — todas as que contam, afinal! — que estão por responder.

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Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira,

do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, como já foi afirmado, há diferenças

substanciais entre esta proposta de Orçamento que foi apresentada e os Orçamentos aprovados nos últimos

anos, a começar pelas consequências da opção de dar ao excedente orçamental o que falta ao País. O

excedente orçamental não seria um problema se, ao mesmo tempo, os problemas do País fossem resolvidos,

nomeadamente no âmbito da Administração Pública. Ou seja, se todos os trabalhadores — e, sublinho, todos

os trabalhadores! — vissem o seu poder de compra reposto com os aumentos correspondentes dos salários; se

os serviços públicos tivessem o investimento e a contratação de trabalhadores de que necessitam para resolver

os seus problemas e melhorar a capacidade de resposta às necessidades dos utentes; se fossem valorizadas

as carreiras de forma a conseguir, por exemplo, valorizar o ensino na escola pública ou estancar a saída de

profissionais de saúde para os grupos privados; se as condições de trabalho fossem dignificadas e o risco da

missão fosse devidamente tido em conta, para se evitar, por exemplo, a exaustão e a sobrecarga dos

profissionais das forças e serviços de segurança, dos profissionais da justiça ou dos militares; ou se a

precariedade fosse erradicada de uma vez por todas, para que nas escolas, por exemplo, professores, pais e

estudantes pudessem saber que, todos os dias, existem auxiliares em número suficiente para garantir o seu

bom funcionamento.

Também no âmbito fiscal, o excedente orçamental não seria um problema se houvesse mais justiça fiscal,

com a continuidade das decisões que levaram a que houvesse menos IRS sobre quem trabalha e tem mais

baixos rendimentos e uma maior tributação dos rendimentos mais elevados; se o IRC não pesasse tanto sobre

as micro, pequenas e médias empresas e se os grupos económicos não pudessem fugir ao pagamento de

impostos em Portugal; ou, ainda, se o IVA da eletricidade e o preço dos combustíveis não pesassem como

pesam sobre as famílias e sobre a atividade produtiva nacional.

Por fim, Sr. Primeiro-Ministro, o excedente orçamental não seria um problema se as prestações sociais

fossem também reforçadas, como é necessário, para aumentar as reformas e pensões, para pôr fim às

penalizações do fator de sustentabilidade, para assegurar que as jovens famílias pudessem contar, com certeza

e segurança, ter vagas em creches, ter creches gratuitas para os seus filhos, ter abono de família reforçado e

melhores condições de gozo dos seus direitos de parentalidade.

Sr. Primeiro-Ministro, todas estas situações correspondem a problemas existentes que estão sem resposta,

correspondem a soluções necessárias e possíveis de concretizar e correspondem também a elementos da tal

continuidade de que se fala, mas que não se encontra na proposta de Orçamento. Enquanto estes e outros

problemas continuarem por se resolver, a opção de dar ao excedente o que falta ao País é uma opção errada,

uma opção que precisa de ser alterada.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, a questão que lhe coloco é a de saber que compromissos concretos assume

o Governo, no sentido de dar resposta a estes problemas que estão identificados.

Aplausos do PCP e do PEV.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina

Rodrigues, do PAN.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, um dos

grandes objetivos assumidos pelo Governo no quadro deste Orçamento é o de reforçar o direito à habitação e

combater a gentrificação das cidades. Naturalmente, o PAN saúda esse objetivo. Contudo, estranhamos a opção

do Governo de manter o programa de vistos gold inalterado no que toca ao investimento imobiliário e, ainda, de

procurar alargá-lo a outros domínios.

Sejamos claros, Sr. Primeiro-Ministro: a crise da habitação que vivemos é também causada pelo programa

dos vistos gold. Os dados do Eurostat e do INE demonstram que os vistos gold têm gerado em Portugal uma

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dinâmica especulativa no mercado imobiliário e que têm contribuído, entre outros fatores, para o aumento

acentuado dos custos da habitação desde 2012.

Os dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras demonstram que, entre 2012 e 2019, o valor do

investimento total acumulado ascende a quase 5000 milhões de euros, 90% dos quais foram canalizados para

a aquisição de imóveis. Apenas foram atribuídos 17 vistos gold por via do critério da criação de, pelo menos, 10

postos de trabalho, o que gerou pouco mais de 200 novos postos, e, curiosamente, em sete anos nunca se

atribuiu um visto gold por via das categorias ligadas ao investimento na investigação científica, no património

cultural ou artístico.

Fica claro que os beneficiários deste programa apenas têm interesse no acesso irrestrito à zona Schengen

e nas facilidades de deslocação sem necessidade de visto prévio a mais de 100 países. O programa dos vistos

gold constitui uma desigualdade na forma como permitimos que cidadãos estrangeiros com recursos financeiros

acedam ao nosso País, por oposição às dificuldades de acesso de quem procura o nosso País para trabalhar e

viver.

Este programa não só não cumpriu os objetivos de captação de investimento estrangeiro como ainda teve

um efeito perverso na economia e na vida dos portugueses, afastando-os das suas cidades, empurrando-os

para as periferias, levando mesmo muitas pessoas ao desespero por não encontrarem uma casa para viver, por

não terem capacidade económica para pagar as atuais rendas exorbitantes e totalmente desfasadas dos salários

médios.

Para além de tudo isto, o Parlamento Europeu, a Comissão Europeia, a OCDE e o Comité Económico e

Social Europeu apelaram à sua revogação devido aos riscos de corrupção, de branqueamento de capitais e de

evasão fiscal e de segurança que envolvem.

Assim, pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, porque insiste em manter em vigor no nosso País este programa,

que tantas críticas tem sofrido por parte das instituições europeias e da OCDE? Porque mantém um programa

que tem contribuído, de forma tão preponderante, para a bolha imobiliária no nosso País?

Aplausos do PAN.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Mariana

Silva, do PEV.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não podemos deixar de assinalar que

estamos perante um Orçamento do Estado preenchido de boas intenções e de muitos compromissos, que não

sabemos se se realizarão, nem como, mas que é realmente um Orçamento de continuidade, como gosta de

afirmar. Continuidade do compromisso com Bruxelas em ser bom aluno dos cortes no investimento, apesar de

a escola pública estar tão necessitada de investimento a todos os níveis. Um Orçamento de continuidade de

promessas do investimento no ambiente, na sustentabilidade, na adaptação e mitigação das alterações

climáticas.

No entanto, «palavras, leva-as o vento», Sr. Primeiro-Ministro. Como explica que, na proposta de Orçamento

do Estado para 2020, se fale da exploração sustentável de recursos minerais, nomeadamente de lítio? Estamos

a falar de que tipo de sustentabilidade? Da destruição dos solos, que são a subsistência das populações, que

são património agrícola da humanidade e que contribuem para a produção de produtos únicos e também eles

classificados?! Da destruição do acesso à água — um bem essencial —, que ficará comprometido com a

exploração, visto que só na prospeção em Morgade já secaram nascentes?! A que sustentabilidade se refere o

Governo?

Sustentabilidade é as populações de Montalegre e de Boticas manterem-se nas suas terras, mesmo quando

lhes fecham as escolas, quando lhes retiram os postos dos CTT, quando o transporte público coletivo é raro e

o direito à mobilidade é desrespeitado. Sustentabilidade é travar o secretismo em que este processo continua

envolvido, que só pode trazer desconfiança e descrédito.

Sr. Primeiro-Ministro, quais são as nove áreas em que serão lançados concursos públicos para prospeção e

exploração de lítio e minerais associados? É que pedidos há muitos, e continuaram a aumentar depois do

anúncio feito pelo Sr. Ministro do Ambiente destas tais nove áreas. Continuamos perante um processo nada

democrático em que as populações não são envolvidas nem ouvidas. Não basta a promessa de que a

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exploração dos recursos minerais trará criação de emprego, mais população e o desenvolvimento do interior.

Não passam de palavras que o vento levará.

Onde estão os pareceres que indicam que não haverá impacte ambiental negativo? A prospeção e a

exploração dos recursos minerais do nosso País, nomeadamente do lítio, não podem ser ditadas pelos mercados

ou pelas grandes multinacionais para grande prejuízo das populações e dos ecossistemas. O Governo tem de

zelar pelos direitos das populações e pela defesa e proteção dos valores naturais do País. De que

sustentabilidade fala o Orçamento do Estado se a prospeção e a exploração serão feitas por empresas privadas

que têm apenas em vista os grandes lucros?

Por fim, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto: de que sustentabilidade — ou até milagre! — estamos a falar, ao

nível do desenvolvimento económico, se o preço do lítio no mercado mundial baixou quase para metade?

Aplausos do PEV e do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro

Almeida, do PSD.

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, na sua intervenção inicial afirmou que

a saúde é a principal prioridade deste Orçamento do Estado para 2020. Esta mudança de opção política — e é

de uma mudança que se trata porque isso não acontecia em Orçamentos anteriores, onde não é que a saúde

não fosse uma preocupação, pois obviamente que era, mas aparecia diluída no meio de outras preocupações

—, esta elevação da saúde a prioridade, não foi uma surpresa porque, desde as eleições legislativas, temos

ouvido altos dirigentes do Partido Socialista reconhecer publicamente aquilo que o PSD vinha denunciando há

muito tempo e que os portugueses sabem há muito. Isto é, que a governação do Partido Socialista causou sérios

danos ao Serviço Nacional de Saúde e que o SNS está pior hoje do que estava quando o anterior Governo

socialista tomou posse em 2015.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Não foi nada disso que foi dito!

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — E não, Srs. Deputados socialistas, não é culpa do PSD.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Está a adulterar o que foi dito!

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Quando o Partido Socialista é Governo há mais de quatro anos e quando

foi Governo em 18 dos últimos 25 anos, tentar responsabilizar o PSD é sintoma do desespero e do embaraço

que esta questão coloca ao Partido Socialista.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Por isso, não posso deixar de felicitar o Sr. Primeiro-Ministro por essa opção política, pois, finalmente,

reconhece que existe um problema e declara a intenção de reverter essa situação. Já o deveria ter feito há

muito, pelo menos desde 2018, quando os sinais de degradação do SNS eram óbvios, mas mais vale tarde do

que nunca.

O problema é que a realidade de um Orçamento não é a intervenção do Sr. Primeiro-Ministro, não é o relatório

do Orçamento do Estado. Um Orçamento é um instrumento de obtenção de receitas e a manifestação de

escolhas na sua distribuição. A avaliação da efetiva prioridade concedida a uma área mede-se pelos recursos

disponibilizados e, nesse critério, a saúde não é, claramente, uma prioridade neste Orçamento do Estado.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não?!

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O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — E não o é, pelo seguinte: em primeiro lugar, o Sr. Primeiro-Ministro referiu

um aumento de 900 milhões de euros. É verdade que há esse aumento, mas não é na despesa de saúde! A

despesa de saúde aumenta apenas 303 milhões de euros, ou seja, 2,8%. Ao mesmo tempo, a despesa primária

total aumenta 4,9%. Isto é, nas outras áreas que o Governo controla, a despesa aumenta mais do que a despesa

de saúde e isso faz com que o peso da despesa do programa de saúde, no total da despesa primária, baixe de

12,9% para 12,6% neste Orçamento.

Protestos da Deputada do PS Hortense Martins.

Por isso, a minha primeira pergunta é a seguinte: como é possível o Sr. Primeiro-Ministro afirmar que a saúde

é a principal prioridade deste Governo quando, na distribuição das verbas, a fatia do bolo orçamental que vai

para a saúde é menor no Orçamento do Estado para 2020 do que foi no Orçamento do Estado para 2019?

Aplausos do PSD.

Em segundo lugar, o tal aumento de 900 milhões que o senhor referiu, um aumento que é real e importante,

é, primeiramente, para reduzir a suborçamentação, que em 2019 foi de cerca de 750 milhões de euros, o que

significa que só sobram 200 milhões para todas as medidas que o Sr. Primeiro-Ministro referiu na sua

intervenção.

Por isso, faço-lhe a segunda pergunta, Sr. Primeiro-Ministro: sabendo que, nos quatro anos anteriores, a

despesa do SNS cresceu mais de 4% ao ano, como é que, com um crescimento de 2%, consegue todos esses

ganhos de melhoria da qualidade do serviço, não havendo em 2020, pelo contrário, uma degradação do SNS

causada por um tão baixo crescimento da despesa?

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Par terminar este primeiro conjunto de pedidos de esclarecimento, tem

a palavra a Sr.ª Deputada Lara Martinho.

A Sr.ª Lara Martinho (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.

Primeiro-Ministro, estamos hoje a discutir este que é o primeiro de quatro Orçamentos desta Legislatura, um

Orçamento que consolida o que alcançámos nos anteriores quatro anos e que continua a fazer progressos,

como o Sr. Primeiro-Ministro bem aqui referiu na intervenção inicial. É um Orçamento que dá, assim,

continuidade a um caminho de crescimento sustentável, de diminuição das desigualdades sociais e de aumento

do rendimento das famílias e que, pela primeira vez desde o 25 de Abril, apresenta um saldo orçamental positivo.

Estamos no bom caminho, como bem expressam, aliás, as perspetivas económicas de crescimento da

economia portuguesa, a previsão de crescimento das exportações e do investimento e a redução do

desemprego, num quadro de consolidação das contas públicas. A realidade é que este quadro de equilíbrio

financeiro é também importante para os esforços regionais no processo de desenvolvimento económico, do

bem-estar e da qualidade de vida nas regiões autónomas.

A par desta envolvente, é importante destacarmos três pontos deste Orçamento, que são marcantes para os

Açores e para a Madeira: em primeiro lugar, o cumprimento integral da lei das finanças regionais, o que não

aconteceu com o Governo do PSD/CDS;…

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Bem lembrado!

A Sr.ª Lara Martinho (PS): — … em segundo lugar, a solidariedade nacional, que é demonstrada neste

Orçamento através da comparticipação em 85% na recuperação dos estragos provocados pelo furacão Lorenzo

ou, mesmo, na comparticipação financeira das obrigações de serviço público do transporte aéreo interilhas; e,

em terceiro lugar, o cumprimento claro dos compromissos do Estado com as regiões, em particular com os

Açores, como seja a revitalização económica e auxílios à ilha Terceira, ao estabelecimento prisional em São

Miguel, à rede de radares meteorológicos ou ao Aeroporto da Horta.

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Sabemos que a oposição manterá o seu registo, realçando que são promessas não cumpridas, ignorando os

passos que já foram dados em cada um destes compromissos e, acima de tudo, ignorando que falamos de

antigas reivindicações açorianas e que foi apenas com o anterior Governo socialista que viram a luz do dia.

Não deixamos, no entanto, de reconhecer a complexidade destes dossiers, mas temos provas dadas. O Sr.

Primeiro-Ministro tem provas dadas de solidariedade, de justiça e de trabalho em prol dos Açores e da Madeira.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, reconhecendo a complexidade de muitos destes dossiers regionais, pergunto

como vê o contributo deste Orçamento no esforço de implementação dos mesmos.

Para finalizar, e porque podemos sempre fazer ainda mais e melhor, instamos a que continue a dar passos

decisivos em prol do desenvolvimento das nossas regiões autónomas.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder às perguntas das Sr.as Deputadas e dos Srs. Deputados,

tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, a quem saúdo particularmente nesta ocasião, Sr.as e Srs.

Deputados, Sr. Deputado Duarte Pacheco, há uma coisa que quero garantir-lhe sobre o País: é que não o

deixaremos ir rio abaixo!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Já foi rio abaixo, com este Governo!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Temos mesmo de o manter no rumo certo.

Mas não deixa de ser comovente ouvir o Sr. Deputado Duarte Pacheco. O Sr. Deputado Rui Rio ainda pode

dizer que estava há muitos anos fora da Assembleia da República, agora o Sr. Deputado, que esteve aqui a

aprovar o Orçamento do Estado de 2012,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — O de 2013!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … com um gigantesco aumento de impostos, que votou na Legislatura anterior

contra todos os Orçamentos que acabaram com esse gigantesco aumento de impostos, vem falar sobre carga

fiscal?!

O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — É verdade! Aumentou mais!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado Duarte Pacheco, um mínimo de coerência!

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Jorge Costa, nós não temos no nosso Programa do Governo a redução do IVA da eletricidade

porque achamos ser socialmente injusto e ambientalmente irresponsável. Todos os estudos demonstram, aliás,

que essa redução só beneficia 16% as pessoas com baixo rendimento e todo o benefício vai para as pessoas

com maior rendimento. Se queremos, efetivamente, ter uma medida para atacar a pobreza energética, temos

de revisitar a medida que já adotámos no Orçamento da Legislatura anterior, no qual o Bloco de Esquerda teve,

aliás, um contributo decisivo nessa matéria.

Aquilo que procurámos fazer foi dar coerência estratégica a uma medida que, infelizmente, muitos partidos

tinham apresentado ao País, de forma a garantir que ela seja, socialmente, minimamente justa, diferenciando-a

em função dos escalões de consumo, e, ambientalmente, responsável, de forma a haver uma maior eficiência

energética e um consumo mais responsável. A resposta que tivemos da Comissão Europeia foi positiva, foi no

sentido de avançar. Vamos trabalhar para poder avançar e minorar os danos de uma medida errada, que foi

defendida, designadamente, pelo Bloco de Esquerda.

Sr. Deputado João Oliveira, o excedente orçamental responde, também, a um problema do País, e esse

problema do País chama-se «dívida». Este é um problema, aliás, no qual repetidamente o PCP tem posto o

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dedo na ferida sobre a sua gravidade. É hoje uma grande condicionante do futuro, mas é também uma

condicionante do presente, pelo montante que temos de pagar de juros. É graças a uma boa gestão orçamental

que temos vindo a libertar-nos desse peso e, assim, poder alocar recursos para aquilo que é necessário.

Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.

Portanto, no Orçamento, temos é de procurar responder positivamente aos vários problemas que temos de

resolver. Temos problemas de pessoal, é verdade, e, por isso, como sabe, alterámos o rácio de assistentes

operacionais em escolas, temos uma medida para aumentar em mais 8400 os profissionais no Serviço Nacional

de Saúde, temos uma norma no sentido de haver, pela primeira vez, uma programação plurianual de recursos

humanos nas nossas forças de segurança. E temos de prosseguir nessa resposta.

Falando das jovens famílias, este Orçamento dá-lhes respostas concretas. Dá respostas concretas em

matéria de isenção de IRS, nos primeiros anos de atividade; dá respostas concretas com a criação do

complemento-creche; dá respostas concretas nas medidas que adotámos para as políticas de habitação e estou

certo de que, no âmbito das conversações que temos mantido, poderemos melhorar esses apoios,

designadamente no que diz respeito à creche, assim como poderemos melhorar noutras matérias esta proposta

orçamental.

Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues, quanto aos vistos gold, o Orçamento do Estado contém uma proposta de

autorização legislativa. E estamos de acordo: é necessário revisitar este instrumento, para que deixe, sobretudo,

de ser um instrumento que tenha uma externalidade tão negativa no custo da habitação nos principais centros

urbanos.

Sr.ª Deputada Mariana Silva, temos muitas oportunidades para discutir a questão do lítio e durante a

discussão do Orçamento não é, com certeza, a melhor ocasião para o fazer. Mas há uma coisa que gostaria de

lhe dizer: não há cortes no investimento, há um aumento do investimento e esse aumento está traduzido no

Orçamento.

Sr. Deputado Álvaro Almeida, 60% da despesa da administração central na anterior Legislatura foi,

precisamente, com a saúde. Portanto, não é uma prioridade nova. O que aumenta é, efetivamente, a ambição

neste Orçamento. E aumenta por uma razão fundamental! É que, ao contrário do que procurou descrever o Sr.

Deputado Duarte Pacheco, nós não fingimos que os problemas não existem, nós não temos a visão do País

como um oásis, nós não temos a visão do País com os olhos cor-de-rosa. Temos a visão de um País que tem

problemas e a nossa função é a de resolver esses problemas. Por isso, quando reforçamos em 941 milhões de

euros o orçamento inicial da saúde, é porque achamos que há um problema para resolver. Quando antecipamos

o pagamento dos pagamentos em atraso para que este ano comece com um Serviço Nacional de Saúde

desonerado de uma carga de 700 milhões de euros de pagamentos em atraso, é porque reconhecemos que há

um problema e estamos a responder ao problema.

O que não fazemos é fingir que o problema não existe, nem acreditamos que é com um corte de 1400 milhões

de euros no investimento em saúde, como foi feito no Governo do PSD, que conseguimos resolver os problemas

da saúde.

Vamos resolvendo os problemas da saúde cada vez com mais investimento, cada vez com melhores recursos

humanos, com as reformas necessárias para aumentar a eficiência do sistema, quer com as unidades de saúde

familiar, quer com a criação dos centros de responsabilidade integrados. A prova de que vale a pena esta política

é a de que hoje temos mais consultas e mais cirurgias. Essa é a medida da ação deste Governo.

Aplausos do PS.

Sr.ª Deputada Marina Gonçalves, vamos prosseguir o combate às desigualdades e vamos fazê-lo numa

lógica de solidariedade geracional. Connosco não há «peste grisalha» nem há jovens que sejam convidados a

emigrar.

Protestos do PSD.

Todos são necessários e o País é só um.

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Aplausos do PS.

Sr.ª Deputada Lara Martinho, vamos prosseguir a nossa política de solidariedade ativa com as Regiões

Autónomas dos Açores e da Madeira, porque só assim reforçamos a unidade nacional, de que a Madeira e os

Açores são parte imprescindível.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Vamos continuar com os pedidos de esclarecimento.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Mortágua, do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, na apresentação, na generalidade, o

Sr. Ministro das Finanças deixou muito claro que o critério deste Orçamento é o superavit orçamental. Essa

opção por um excedente tem um preço: há um preço político, há um preço social, há um preço económico em

querer apresentar um Orçamento que limita a recuperação de rendimentos não às possibilidades do País, mas

ao capricho orçamental do Governo.

É muito difícil convencer os funcionários públicos de que, depois de uma década de cortes e de

congelamentos, o País só pode investir 40 milhões de euros líquidos na valorização dos recursos humanos, que

todos os dias garantem a segurança, a educação, a saúde e todos os serviços públicos de que o País precisa.

Aos funcionários públicos que perderam mais de 11% de poder de compra na última década, é muito difícil

explicar que aquilo que o Governo agora propõe é entrarem em 2020 em perda no seu poder de compra. Aquilo

que o Governo lhes propõe são aumentos de 6 cêntimos, ao dia, para assistentes operacionais ou assistentes

técnicos e de 8, 10, 12 cêntimos, ao dia, para milhares de técnicos superiores.

Os últimos quatro Orçamentos, piores do que este, segundo o Sr. Primeiro-Ministro, devolveram aos

funcionários públicos em progressões, em devolução dos cortes e em diminuição do IRS muitos mais

rendimentos, em termos líquidos, do que aquilo que este se propõe a devolver.

Portanto, a proposta de aumento de 0,3% nos salários dos funcionários públicos é inaceitável e é injusta,

sobretudo, em relação aos salários mais baixos da função pública. É uma provocação, porque os funcionários

públicos sabem que o País pode mais, e sabem-no não porque inventaram, mas porque ouviram o Sr. Ministro

das Finanças dizer que o País pode mais. Um aumento de 0,3% é insuficiente e o Bloco de Esquerda não se

tem cansado de o dizer. O Governo já deu notas de que reconhece que este aumento é insuficiente.

O que eu queria perguntar é se esse reconhecimento é para ser levado a sério, porque, se for, tem de ser

sentido no bolso das pessoas, e qual é o valor dessa intenção.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe,

do PCP.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, esta proposta de lei não poderia deixar

de reconhecer a falta de profissionais que asseguram funções sociais impreteríveis. O problema é que,

particularmente no que se refere a funções de soberania, esse reconhecimento não tira as devidas

consequências.

O artigo 22.º da proposta de lei refere que o Governo «elabora e divulga uma previsão plurianual das entradas

e saídas de trabalhadores na Administração Pública» e «programa as medidas necessárias ao suprimento das

necessidades».

Sr. Primeiro-Ministro, o que é preciso para que essas necessidades sejam identificadas? O Governo ainda

não identificou aspetos essenciais em que faltam manifestamente profissionais na Administração Pública, tendo

em conta o nível etário dos trabalhadores da Administração Pública e a previsibilidade de aposentações nos

próximos anos?

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Sr. Primeiro-Ministro, vamos ver: em funções de soberania, o Governo desconhece a falta de efetivos nas

forças e serviços de segurança?! O Governo não é capaz de dizer quantos profissionais da GNR (Guarda

Nacional Republicana) e da PSP (Polícia de Segurança Pública) é necessário admitir nos próximos anos para

suprir necessidades essenciais dessas forças e serviços de segurança?

Sr. Primeiro-Ministro, se compararmos o último Relatório Anual de Segurança Interna, que é de 2019, com o

de 2015, vemos que, nestes anos, não houve nenhum aumento no conjunto das forças e serviços de segurança;

pelo contrário, há um défice de 240 efetivos nestes anos. Os números não são nossos, são os números dos

relatórios de segurança interna apresentados pelo Governo.

Portanto, não basta o articulado do Orçamento do Estado reconhecer uma evidência. O que é necessário é

haver previsões, objetivos concretos a atingir em 2020 e, obviamente, nos anos seguintes.

Todos nós temos falado muito na necessidade de combater a corrupção, mas, Sr. Primeiro-Ministro, não

haverá um combate eficaz, em sede de investigação criminal, se se mantiver a penúria de quadros da Polícia

Judiciária, em que nem metade dos quadros de pessoal se encontram presentemente preenchidos.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — O Orçamento do Estado não pode ignorar esta realidade, não pode ignorar

o investimento necessário na segurança dos portugueses e na proteção civil, como não pode ignorar os mais

de 1000 funcionários que faltam nos tribunais, como não pode ignorar os 1500 funcionários que faltam nos

Registos e Notariado, como não pode ignorar as centenas de funcionários que faltam na reinserção e nos

serviços prisionais.

Sr. Primeiro-Ministro, a questão essencial que deve ser colocada hoje é a de saber qual a disponibilidade do

Governo para pôr os pontos nos ii no artigo 22.º, fixando objetivos concretos e mensuráveis a atingir

relativamente aos efetivos necessários para assegurar estas funções essenciais em questões de soberania, que

são impreteríveis.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana

Cunha, do PAN.

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Ministros, Sr. Primeiro-

Ministro, no nosso País, demos alguns passos em matéria de proteção dos animais, como o seu reconhecimento

como seres sensíveis, o fim dos abates nos canis municipais ou o fim do uso de animais no circo.

Este é o mesmo País onde o movimento social de luta pela proteção animal é cada vez mais forte, pelo que

é incompreensível um Orçamento em contraciclo com esta crescente sensibilidade social quanto à proteção

animal e que desconsidera as pessoas que têm um animal de companhia ou até as associações e os grupos

informais que diariamente se substituem ao papel do Estado.

Este é um Orçamento que não dá soluções aos animais abandonados, aos animais esquartejados em

contexto de violência doméstica, aos cavalos deixados a morrer à fome por todo o País, aos animais

encarcerados no circo, que estão a ser vendidos para países onde não há normas de proteção animal, porque

o Governo se esqueceu de regulamentar a lei; e este é um País em que a tutela da proteção animal se encontra

na DGAV (Direção-Geral de Alimentação e Veterinária), uma direção-geral refém dos interesses da tauromaquia,

da caça e da pecuária intensiva.

O Sr. André Silva (PAN): — Isso!

A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — O Sr. Primeiro-Ministro anunciou que este é o melhor Orçamento que o

País pode ter, o melhor que já apresentou. A verdade é que, para a dignidade dos animais, este Orçamento é

apenas mais um: é um Orçamento onde não há vontade política de fazer o que é necessário em matéria de

proteção animal.

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Sr. Primeiro-Ministro, a proteção dos animais tem de ter uma visão macro, estruturada, interministerial e a

proposta que este Governo nos traz está repleta de pontas soltas, porque não há uma estratégia nacional, não

há uma visão global das necessidades, dos intervenientes, dos vários animais que precisam de proteção e dos

meios que são necessários para que essa estratégia aconteça efetivamente. Não faltaram propostas do PAN

nesse sentido. Está o Governo disponível para discutir estes pontos em sede de especialidade?

Sr. Primeiro-Ministro, as pessoas em Portugal precisam de saber: irá o Governo garantir que há prevenção

do abandono, que não faltam médicos veterinários nos canis municipais, que há facilitação dos processos de

candidatura dos municípios às verbas disponibilizadas e que há um aumento das mesmas para dar cumprimento

às reais necessidades? Está o Governo disponível para baixar o IVA aplicável à aquisição de produtos

destinados à alimentação de animais de companhia e à prestação de serviços médico-veterinários?

Estas são apenas algumas questões, de entre as muitas que poderíamos colocar em matéria de proteção

animal, no sentido de, pelo menos, iniciar um caminho que tem de ser trilhado — haja vontade política!

Aplausos do PAN.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Hortense

Martins, do PS.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.

Primeiro-Ministro, a saúde é, sem dúvida, uma forte aposta para melhor responder aos portugueses e às

crescentes necessidades. Este é um bom Orçamento também por isso mesmo, porque tem a saúde como

prioridade reforçada. Dando continuidade aos Orçamentos anteriores, a saúde é assumidamente uma prioridade

reforçada neste Orçamento.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Isto traduz-se em medidas para a melhoria de resposta do SNS, no reforço

da dotação orçamental em mais 941 milhões de euros, na contratação de mais 8400 profissionais de saúde, na

definição do plano plurianual de investimentos, com 190 milhões, no reforço do investimento em instalações e

equipamentos, quer em novos hospitais quer na requalificação de urgências, centros de saúde e outros

equipamentos, e também no redobrado esforço de melhoria da gestão das unidades do SNS.

As portuguesas e os portugueses estimam o SNS e é porque nele confiam que exigem mais. Por isso, todos

temos a responsabilidade de o reforçar e de o valorizar. Não podemos concordar com aqueles que o querem

destruir, porque sabemos que o SNS é o instrumento de acesso à igualdade para todos os portugueses. Bem

sabemos que alguns só o colocam como prioridade quando estão na oposição. Basta ver as dotações

orçamentais no período de 2010 a 2015 para verificar que a despesa no SNS caiu muito mais do que a despesa

pública total — e digo isto ao PSD, que ainda agora afirmou o seu contrário!

Aplausos do PS.

Verificamos quem faz política assente apenas na «espuma dos dias», nas notícias, na política de casos e

pretende a privatização do SNS. Nós estamos aqui para defender o SNS e reforçar o serviço prestado aos

portugueses.

Aplausos do PS.

Isso faz-se com mais investimento e com melhor gestão, que é o que este Orçamento contém. Este Governo

e o Partido Socialista querem que assim continue a ser, que seja reforçado o serviço prestado para melhor

corresponder às necessidades dos portugueses, a diversos níveis.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, sendo este um Orçamento com um investimento na efetivação das políticas

públicas, estamos certos de que a sua execução será um desafio que se irá concretizar na melhoria da vida das

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pessoas, em maior coesão social e territorial e na prestação de melhores cuidados de saúde. É esse desafio

que lhe peço que concretize, porque, sem dúvida, é isso que os portugueses esperam.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro,

do Bloco de Esquerda.

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, há 166 000 pessoas que beneficiam

do complemento solidário para idosos.

A existência do CSI não substitui a necessidade de aumentarmos as pensões ou de pormos fim a cortes que

são injustos e que se mantêm, como o que resulta do fator de sustentabilidade. Mas é indiscutível que o CSI

tem uma enorme virtude: é uma prestação de combate à pobreza dos idosos, que acaba por ser um contrapeso

a pensões muito baixas e a carreiras contributivas curtas e pobres, sobretudo, e nomeadamente, de mulheres

que trabalharam muito, mas que têm poucos descontos.

A eficácia do CSI resulta de ser uma resposta concentrada nesse universo de idosos pobres e, nos últimos

anos, aumentámos o valor de referência e incluímos no complemento os pensionistas por antecipação, a que

chamamos «os lesados do ex-Ministro do CDS Mota Soares». Mas as regras deste complemento para idosos

têm dois grandes problemas.

O primeiro é que, ao contrário do que acontecia quando foi criado, o valor de referência do CSI descolou do

limiar de pobreza. Quem hoje recebe o CSI continua com um rendimento abaixo do limiar de pobreza. E essa é

a primeira alteração estrutural que é preciso fazer: indexá-lo, pelo menos, ao limiar de pobreza. Estamos a falar

de um aumento de 60 € por mês, e esse hiato tem de ser corrigido antes de 2023. Registamos que o Governo

aceitou que esse aumento seja feito neste ano e no próximo ano.

O outro problema é a atribuição do CSI continuar a depender não apenas da situação de pobreza do idoso

mas também do rendimento dos seus filhos. Há muitos anos que contestamos esta regra, que exclui da

prestação pessoas que dela precisam. Além do mais, esta é uma forma de humilhação dos idosos, que

desrespeita a sua autonomia, que os trata como se eles estivessem sob a dependência e a tutela de outros e

que sugere que os idosos processem os seus filhos em tribunal, caso estes não lhes paguem uma pensão de

alimentos.

Propusemos várias vezes a eliminação desta regra e, por mais do que uma vez, essa proposta foi votada e

chumbada, neste Parlamento, pelo Partido Socialista. Registamos, por isso, que o Governo alterou a sua posição

— aliás, a posição que teve nos últimos anos e nos anteriores Orçamentos — e aceitou agora que o rendimento

dos filhos deixe de ser considerado para efeitos da atribuição do CSI, não apenas no 1.º escalão mas também

nos 2.º e 3.º, já neste ano de 2020, dando-se assim um passo decisivo para acabar de vez com este critério,

que é completamente absurdo.

Não passamos, apenas por isto, a ter um Orçamento que responda a todos os problemas dos pensionistas

e da justiça social — são muitos os problemas por resolver —, mas registamos, Sr. Primeiro-Ministro, um dos

progressos que nos permitirá prosseguir para o debate na especialidade.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula

Santos, do PCP.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, na proposta do Orçamento não se

vislumbram compromissos concretos para responder à falta de investimento e de trabalhadores nas funções

sociais do Estado e nos serviços públicos. Esses compromissos concretos são essenciais para pôr fim aos

obstáculos no acesso dos utentes aos cuidados de saúde, à falta de condições de funcionamento nas escolas,

ao desinvestimento na cultura, à carência e à desvalorização profissional, social e remuneratória dos

trabalhadores.

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Na saúde, anuncia-se um orçamento do SNS que assegura as verbas que foram executadas em 2019, as

quais se revelaram insuficientes. É preciso ir mais longe no reforço do SNS: aumentando efetivamente a

capacidade de resposta, com horários de funcionamento alargados; reduzindo os tempos de espera para

consultas, cirurgias, exames e tratamentos; aumentando o número de equipas de cuidados continuados e

paliativos; alargando valências nos cuidados de saúde primários; substituindo equipamentos obsoletos;

construindo as unidades de saúde necessárias; e pondo fim à transferência de recursos públicos para os grupos

privados.

Refere-se o objetivo de contratar 8400 trabalhadores para a saúde, mas quais são as necessidades efetivas?

Quantos se irão aposentar nos próximos anos? Que medidas serão tomadas para evitar a saída dos

trabalhadores do SNS por se sentirem desmotivados e desvalorizados?

Noutro âmbito, a educação e a cultura não mereceram a atenção do Sr. Primeiro-Ministro na sua intervenção,

o que, por si só, é motivo de preocupação, sobretudo quando é preciso: contratar milhares de auxiliares de ação

educativa e técnicos especializados; valorizar efetivamente os professores, contabilizando todo o tempo de

serviço prestado e procedendo à sua vinculação; requalificar as instalações das escolas, incluindo a remoção

do amianto; reforçar os meios para uma verdadeira escola inclusiva; alargar a rede pública de educação pré-

escolar.

No que diz respeito à cultura, não basta parecer para ser. O orçamento da cultura está longe de alcançar o

1%. É preciso assumir o compromisso de reforçar o apoio às artes, começando por impedir que os resultados

do último concurso determinem o fim da atividade artística de muitas estruturas. É preciso investir na

requalificação do património e dotar os museus, palácios, monumentos e sítios arqueológicos dos meios

necessários.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, que compromissos assume, afinal, o Governo para a resolução definitiva

destes problemas?

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Luís

Monteiro, do Bloco de Esquerda.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-

Ministro, no passado Orçamento do Estado, chegámos a um acordo e o Bloco conseguiu garantir, nas

negociações com o Partido Socialista e o Governo, que o teto máximo das propinas do ensino superior público

fosse reduzido.

Ao fim de mais de 20 anos com as propinas sempre a aumentar, alcançámos uma vitória histórica, que apoia

as famílias e os estudantes e, mais do que isso, recentra o debate político e ideológico sobre o papel do Estado

social, no sentido de saber se serve apenas como uma montra para a caridade ou se serve realmente para

promover um ensino superior público gratuito, universal e de qualidade. Reforçámos, assim, os direitos dos

jovens que não desistem de estudar no nosso País.

Sabemos bem que os adeptos da lógica neoliberal do utilizador-pagador cerraram fileiras quando nos

aproximámos, aos poucos, da efetivação prática da Constituição da República Portuguesa, que refere, no seu

artigo 74.º, que o ensino é público e gratuito em todos os seus níveis. E isso só significa uma coisa óbvia:

estamos certos e o caminho só pode ser o de acabar com as propinas.

A medida, anunciada hoje pelo Bloco de Esquerda, de uma nova redução das propinas em 20% é mais uma

conquista, apesar de o Programa do Governo nada dizer em relação a isso. E ainda bem que chegámos a esse

acordo, porque é mais um momento histórico para o movimento estudantil, para o Estado social e para o ensino

superior português.

Temos agora a responsabilidade de dar corpo a uma das preocupações apresentadas no Estado da

Educação do CNE (Conselho Nacional de Educação). Somos um dos países onde o fosso entre o valor das

propinas e o das bolsas é mais alarmante. Por isso mesmo é que o acordo também contempla que a redução

das propinas seja ao mesmo tempo acompanhada pela manutenção do valor das bolsas para licenciaturas e

mestrados no valor máximo histórico das propinas.

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Só assim, Sr. Primeiro-Ministro, convergimos com os melhores exemplos onde o Estado social não é um

enfeite mas está bem presente na vida das pessoas.

Menos propinas e mais bolsas: sabemos bem que esta proposta é menor do que a do Orçamento do Estado

para 2019, pois no ano passado reduzimos as propinas em mais de 200 € e este ano a redução será de 170 €.

Mesmo assim, é uma conquista importante, ainda que tenha sido conseguida a ferros, praticamente no dia em

que começámos a fazer este debate.

Mas há uma coisa que é certa, Sr. Primeiro-Ministro: o caminho é, com certeza, o de acabar com as propinas.

Não concorda?

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder a este conjunto de perguntas, tem a palavra o Sr.

Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Joana Mortágua, primeiro, o excedente não é

uma obsessão, o excedente é…

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Opção!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Opção, opção!

Como estava a dizer, o excedente é o resultado de uma política e nós temos de saber qual foi o caminho. O

último excedente foi em 1973, mas nessa altura a despesa pública era de 20% do produto interno bruto. Hoje,

a despesa pública é de 43% do produto interno bruto — 43% do produto interno bruto! A última vez em que a

despesa pública foi tão elevada no Produto foi em 1981 e o défice foi de 12%.

Nós não alcançámos esse excedente à custa do corte na despesa nem à custa do aumento de impostos. Foi

assegurado graças a um bom crescimento da economia, a um bom crescimento do emprego e também, permita-

me que o diga, a uma boa gestão orçamental do Sr. Ministro das Finanças e de todos os colegas que com ele

e connosco trabalham.

Em segundo lugar, em matéria de rendimentos da Administração Pública, Sr.ª Deputada, o que foi

verdadeiramente novo foi passar a haver atualização anual. É verdade! Na Legislatura anterior, eliminámos os

cortes e eliminámos os congelamentos.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — E com este Orçamento?

O Sr. Primeiro-Ministro: — Este Orçamento vai continuar a eliminar os cortes, vai concluir os

descongelamentos e ainda vai acrescentar, o que é melhor, uma atualização anual, o que não estava previsto

nos Orçamentos anteriores. Portanto, aqui está um excelente exemplo de como é melhor.

Diz-me a Sr.ª Deputada que no ano passado a inflação foi baixa. É verdade! Não é necessariamente mau.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Também não é bom!

O Sr. Primeiro-Ministro: — A proposta que apresentámos é para 2020 e para 2021, com o objetivo de

garantir que o princípio da atualização anual veio para ficar, e fica mesmo, e já nos comprometemos a manter o

mesmo critério para o próximo ano. Obviamente, ainda estamos com o processo negocial em curso com os

sindicatos e estamos disponíveis para, com as organizações representativas dos trabalhadores, considerar

propostas que permitam ir mais além do que foi a nossa proposta inicial. Mas esse é um processo negocial que

está em curso e espero que chegue a bom porto.

Relativamente às perguntas colocadas pelo Sr. Deputado António Filipe, gostaria de lhe dizer que aquilo que

o relatório de segurança interna regista é que entre 2016 e 2019 tivemos um aumento global de 107% de

admissões nas forças e serviços de segurança, 23% na GNR, 319% na PSP e 100% nos inspetores do Serviço

de Estrangeiros e Fronteiras. Ainda em abril, tomaram posse 120 novos inspetores da Polícia Judiciária, os

quais, aliás, já vão beneficiar do novo estatuto de profissionais da Polícia Judiciária.

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Que temos de continuar esta trajetória, ambos sabemos que sim. Como sabe, já nos conhecemos com esta

conversa há muitos anos e eu já tive de gerir as mesmas carências por duas vezes em dois desses ministérios.

Não é um problema novo. O que é novo é que, pela primeira vez, temos uma trajetória continuada e orientada

para resolver estruturalmente este problema.

Por isso, sugiro-lhe que, para além do artigo 22.º, que leu, leia também o artigo 140.º, onde está prevista,

pela primeira vez, a existência de um plano plurianual de recursos humanos para as forças de segurança.

Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, obviamente, estamos disponíveis para tratar todos esses temas em sede de

especialidade e para aprovar alguns dos que referiu na sua intervenção. Tendo dois canídeos em minha casa,

até gostaria que fossem aprovados, mas receio que não sejam.

A verdade é que parte dos problemas que coloca não são da administração central. Peço-lhe que fale com

a sua colega Inês de Sousa Real, que tem uma larga experiência na área municipal e poderá testemunhar o

que, por exemplo, em tempos foi feito, e continua a ser, no município de Lisboa, que é, aliás, um exemplo de

boas práticas.

Sr. Deputado José Soeiro, ainda bem que convergimos quanto à melhoria das condições de recursos para a

atribuição do CSI, ainda bem que partilhamos a ambição de fazer convergir o CSI com o limiar de pobreza e,

sobretudo, ainda bem que reconhecemos que o CSI é o instrumento mais eficaz para o combate à pobreza entre

os idosos.

Sr. Deputado Luís Monteiro, sim, é verdade, ontem chegámos a acordo — foi pena não termos chegado a

acordo logo no dia 12 de novembro, quando reunimos pela primeira vez, mas mais vale tarde do que nunca —

e ainda há muito trabalho para fazer em sede de especialidade. Mas deixo só uma nota: a redução prevista para

as propinas é exatamente a mesma do ano passado, ou seja, 20%. Naturalmente, quando o valor incide sobre

uma base menor, é evidente que o produto é também, ele próprio, menor.

Sr.ª Deputada Paula Santos e Sr.ª Deputada Hortense Martins, a saúde é mesmo uma prioridade. E é uma

prioridade nas suas diferentes dimensões: melhorar o investimento, acelerar a eliminação das taxas

moderadoras, reforçar o pessoal e melhorar a gestão, valorizando, sobretudo, as unidades de saúde familiar e

os centros de responsabilidade integrada, de forma a termos uma gestão mais eficiente do Serviço Nacional de

Saúde.

Sr.as e Srs. Deputados, muito obrigado pelas diversas questões que tiveram a oportunidade de colocar. Mais

logo e amanhã terão a oportunidade de prosseguir o debate com o Sr. Ministro das Finanças, com o Sr. Ministro

das Infraestruturas e da Habitação, com a Sr.ª Ministra da Saúde e, provavelmente também, com a Sr.ª Ministra

do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.

Para concluir a minha intervenção neste debate, queria deixar como palavra final o seguinte: obviamente, o

Governo conta com a Assembleia da República, e com a sua contribuição, para termos um Orçamento ainda

melhor do que esta proposta que apresentou, que foi a melhor dos últimos cinco anos.

Muito obrigado, Sr.as e Srs. Deputados.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito obrigada, Sr. Primeiro-Ministro.

Vamos passar agora ao período de intervenções. Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Oliveira,

do PSD.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo,

Sr.as e Srs. Deputados: O que os portugueses hoje exigem de todos nós é que o debate do Orçamento do Estado

para 2020 se faça de forma séria e responsável e que coloque em primeiro lugar o interesse de Portugal e dos

portugueses. Foi este o compromisso que o PSD assumiu desde a sua apresentação e que conduziu a uma

análise, a uma avaliação e a uma decisão sobre o nosso sentido de voto.

O Orçamento do Estado para 2020 é apresentado por este Governo como um Orçamento de continuidade.

Continuidade, neste Orçamento, representa uma total ausência de ambição, ausência de compromisso com o

futuro, uma omissão de responsabilidades. E abdicar de uma estratégia para Portugal e para os portugueses é,

meus senhores, abdicar do futuro.

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Quando o Partido Socialista começou a governar em 2016, o PIB percapita em paridades do poder de

compra em Portugal era de 77,1% da média europeia. Isto significa que a riqueza produzida colocava o País na

18.ª posição na escala da prosperidade europeia. Havia, então, 17 países mais ricos e 10 mais pobres.

Em 2018, a riqueza produzida anualmente em Portugal tinha caído para 76,8% da média europeia. Em 2018,

tínhamos caído para o 21.º lugar na escala da prosperidade. Já só tínhamos 7, não 10, países atrás. Já não

tínhamos 17 países à frente, mas 20.

Nestes quatro anos de governação socialista, ao contrário do discurso do Governo, a verdade é que não

progredimos, regredimos.

Depois do mandato do Governo da gerigonça, que apregoa o maior crescimento do século, não estamos

mais ricos, estamos mais pobres. O que isto quer dizer é que não estamos em trajetória de convergência, mas

de divergência face à Europa.

Nos três primeiros anos de governação socialista, fomos ultrapassados sucessivamente pela Estónia, pela

Lituânia e pela Eslováquia. Se esta tendência não for invertida, em breve seremos ultrapassados pela Polónia

e pela Hungria. Esta é a realidade. E nós sabemos bem que olhar para a realidade tem sido uma dificuldade do

Governo ao longo dos últimos quatro anos.

Mas o que é que este Orçamento nos traz para invertermos esta tendência? Como é que este Orçamento

olha para o crescimento económico? A resposta a esta última pergunta é clara: não olha, ignora. Faz o discurso

da continuidade, o que significa que continua a manter Portugal na mesma trajetória de retrocesso, de

divergência com a Europa e de fechar os olhos às dificuldades reais que atravessam diariamente os

portugueses, que, apesar de ouvirem promessas de mais salário e melhores condições, são sujeitos a uma

maior carga fiscal, como já ouvimos aqui hoje no debate, e a uma menor qualidade dos serviços que o Estado

deve prestar.

Quando esta proposta de Orçamento fala de crescimento económico é para reafirmar a queda sucessiva de

Portugal para a liga europeia dos últimos. Não é este o caminho que pretendemos.

A atitude que o Partido Socialista fomenta é a falta de ambição para o País — uma ode ao poucochinho. Não

há sequer reconhecimento do problema, quanto mais mobilização dos instrumentos para o enfrentar.

Para podermos crescer e prosperar, temos de investir. Temos de investir muito mais do que investimos. Sem

mais investimento, é impossível a modernização tecnológica e o aumento sustentado da produtividade. E, sem

aumentarmos sustentadamente a produtividade, estaremos condenados ao empobrecimento e a divergir cada

vez mais dos nossos parceiros europeus.

Os níveis atuais de investimento mal chegam para repor o capital que se gasta anualmente. Não há mistério

nenhum no facto de a produtividade em Portugal estar a ter desempenhos verdadeiramente deprimentes. O

capital por trabalhador caiu todos os anos entre 2016 e 2019, não aumentou.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Só com uma drástica inversão desta tendência é possível retomar

ganhos de produtividade significativos que garantam futuro aos portugueses, que nos permitam escapar à

ameaça de empobrecimento e que nos assegurem que amanhã, e daqui a muitos anos, haja, por exemplo,

dinheiro para pagar as pensões que os portugueses acreditam — e bem — que lhes vão pagar.

Como olha este Orçamento para a doença da produtividade em Portugal? Não olha. Faz de conta que não

existe. Na verdade, se eu não reconhecer a doença, não me curo. Este é um facto e é o que traduz este

Orçamento.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para investir muito mais, é preciso de duas uma: ou poupar muito

mais ou recorrer às poupanças de outros, o que significa que me vou endividar.

Uma vez que Portugal é hoje um dos países mais endividados do mundo, o caminho lógico só pode ser o da

poupança.

É imperativo que prossigamos o processo de desendividamento externo iniciado em 2014. Não esqueçamos

que foi o enorme volume de dívida externa que nos arrastou para o colapso em 2010 e para o resgate em 2011.

Se estivermos conscientes disto, sabemos que não há margem para nos endividarmos mais.

Mas o problema é que nenhum país da Europa, salvo a Grécia, poupa tão pouco como nós. As nossas

famílias poupam metade do que poupam em média as famílias europeias. E a pergunta é: como olha o

Orçamento do Estado para a grave lacuna da poupança interna? Mais uma vez, Sr.as e Srs. Deputados, não

olha, ignora.

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Ficámos a saber pela UTAO (Unidade Técnica de Apoio Orçamental) que o cenário macroeconómico do

Ministério das Finanças assume que a poupança das famílias vai voltar a cair em 2020. Até quando é que a

poupança vai continuar a cair em Portugal, para que o Governo acorde para esta gravíssima restrição ao

investimento e a um crescimento sustentado?

Esta é uma realidade com demasiada importância para não olharmos para ela de frente. Mas sejamos claros:

para a poupança aumentar é preciso que o rendimento disponível das famílias também aumente e para que o

rendimento aumente mais do que o consumo — que é aquilo que o Governo sabe que não vai acontecer em

2020 — é preciso que haja incentivos. É preciso que olhemos para a poupança como devemos olhar, é preciso

que o Orçamento do Estado também olhe para esta realidade.

O Governo assume que sabe que este é o cenário para este ano, mas, sinceramente, Sr.as e Srs. Deputados,

não faz nada para o evitar. Pior: este Orçamento traz-nos exatamente o contrário do que o País hoje precisa.

Como já vimos hoje, o debate foi muito marcado por esta necessidade de afirmar a realidade e a verdade é que

há mais carga fiscal, o que significa menos rendimento disponível, logo menos poupança.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, podem chamar-lhe o que quiserem, mas o que este Orçamento traz,

já vimos hoje e ficou claro para todos, exceto para quem não quer ver, não tem outro nome se não aumento da

carga fiscal.

O Governo tem anunciado, ano após ano, que a carga fiscal vai baixar. Já houve anos em que anunciava

mesmo como eixo central da política orçamental a baixa da carga fiscal. Depois, para infelicidade de todos, isso

nunca se verificava.

Por isso, quando o Orçamento nos vem prometer, à cabeça, o aumento da carga fiscal é mais do que razão

para alarme. O Governo executou sempre ao contrário e com agravamento. É um Governo com um problema

de «impostodependência» e agora apresenta mais um aumento de 0,2% do PIB na carga fiscal. É mais

rendimento que vai para os cofres do Estado e que é retirado do rendimento dos portugueses.

Os portugueses sabem bem que há um aumento da carga fiscal. Os portugueses sentem bem no seu bolso

que o seu rendimento está a reduzir. Portanto, é preciso que isto fique muito claro neste debate do Orçamento

do Estado.

Aplausos do PSD.

Não há mistério nenhum no definhamento da poupança em Portugal. Como já vimos, com a parcela do

rendimento que os portugueses reservam para impostos e com as contribuições a aumentar todos os anos, é

natural que nada sobre para poupar ou que fique difícil a poupança.

Mas paremos um pouco para refletir e pensemos um pouco sobre o que é que este Orçamento nos traz.

Pagamos cada vez mais impostos porque temos serviços cada vez melhores? O que o Governo retira a mais

do rendimento dos portugueses é para lhes devolver em qualidade nos serviços que lhes presta?

Sr.as e Srs. Deputados, aqui não há números, indicadores, gráficos nem tabelas que possam ajudar o

Governo a esconder os factos. Não há como dizer aos cidadãos que os serviços estão a melhorar, quando essa

narrativa choca frontalmente com a perceção dos portugueses e de todos os profissionais, que nos serviços

públicos são as primeiras vítimas da quebra do contrato de serviço do Estado para com os cidadãos — na saúde,

na educação, na segurança, na proteção de pessoas e bens, na segurança social, na justiça.

Aqui não há forma de enganar os portugueses: o Estado está a falhar-lhes todos os dias e, ao apostar num

Orçamento de continuidade que não assume os erros, está a dizer que não tem intenções de deixar de lhes

falhar.

Esta é que é a verdade, este é que é um motivo de grande preocupação neste Orçamento do Estado e com

este Governo.

Aplausos do PSD.

O Governo diz que 2020 vai ser o ano da saúde, diz que vai reforçar a dotação para a saúde em cerca de

1000 milhões de euros, que afinal é menos de metade disso — uma fração do prometido que não chega para

pagar as dívidas, como já vimos hoje.

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Pagar dívidas não é reforçar coisíssima nenhuma, é pagar o que já se consumiu, o que já se gastou. É assim.

Não vale a pena dizermos uma coisa diferente. Como é que isto se traduz em colocar a saúde como prioridade?

Nenhum Governo fez tanto contra o SNS como o que deixou cair a saúde neste estado lamentável.

Aplausos do PSD.

E não são, Sr.as e Srs. Deputados, os discursos de reforços de dotação que vão alterar a realidade, como

também não são os discursos do Governo que vão resolver o défice gravíssimo de investimento público. Sem

investimento do Estado, é impossível estancar a deterioração alarmante dos serviços públicos.

O Governo promete para 2020 um esforço de investimento público exatamente igual ao que propôs no

Orçamento anterior, e que ficou largamente aquém de ser realizado, como também já vimos hoje no debate.

Se desta vez cumprir, o que este Executivo fará em 2020 é aquilo que o País realizou em 2015 — 2,3% do

PIB. É esta a ambição do Governo, a de fazer o mesmo que fizemos no tempo da austeridade?! Mas o pior é

que temos sérias dúvidas de que chegue sequer a atingir esse valor. Basta perceber o que aconteceu nos

últimos anos.

Para o PSD, este Orçamento também não responde a quatro objetivos essenciais: voltar a crescer, pelo

menos o suficiente, para nos aproximarmos dos níveis de bem-estar europeus e garantirmos o futuro; olhar para

a economia e para os estrangulamentos que esta enfrenta em domínios críticos como a poupança, o

investimento e a produtividade; iniciar a redução da carga fiscal e concentrar recursos para investir na melhoria

dos serviços públicos.

Nenhum destes quatro objetivos legítimos de todos os portugueses é reconhecido, acolhido e preconizado

neste Orçamento. A pior forma de fugir aos problemas é ignorá-los e é isso que este Orçamento faz.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, este é um Orçamento de desistência. Este não é o Orçamento de

que os portugueses precisam para hoje e para amanhã. Este Orçamento não serve aos portugueses que

trabalham e que investem. Este é um mau Orçamento para as famílias e para as empresas. Este é um

Orçamento que não tem estratégia nem rumo para Portugal.

O PSD tem uma alternativa a esta governação socialista com outro caminho para Portugal.

Aplausos do PSD.

Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, obviamente, votamos contra esta proposta de Orçamento do Estado.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, a Mesa registou a inscrição do Sr. Deputado João Paulo

Correia para pedir esclarecimentos, a quem dou, de imediato, a palavra.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Afonso Oliveira, na verdade, o PSD está

em visíveis dificuldades para criticar este Orçamento e justificar o seu voto contra.

O Sr. Deputado disse que o PSD tem alternativas, mas não apresentou uma única neste debate.

Aplausos do PS.

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Isso é a seguir!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Na especialidade!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Quem está em casa a assistir a este debate apercebe-se da tristeza de

alternativas políticas que o PSD tem para justificar o seu voto contra.

Sr. Deputado, andámos anos a ouvir o PSD dizer que o diabo estava no défice das contas públicas, que o

diabo estava no elevado encargo com os juros da dívida pública e que o diabo estava na dívida pública elevada.

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Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.

O certo é que, numa altura em que os juros da dívida pública estão em mínimos históricos, abaixo de Espanha

e de Itália, numa altura em que temos um Orçamento que apresenta um saldo positivo das administrações

públicas e numa altura em que temos uma trajetória descendente contínua da dívida pública, o PSD vê nisso

um problema e vê nisso o diabo.

É inaceitável, e era o que mais faltava, ouvir o PSD encontrar o diabo no excedente orçamental, na descida

da dívida pública e nos juros mínimos históricos da nossa dívida pública.

A nossa economia, Sr. Deputado, cresceu acima da média europeia nos últimos anos, cresceu acima da

média europeia em 2017, em 2018, em 2019 e vai crescer acima da média europeia em 2020. E sabe porquê,

Sr. Deputado? Porque as boas políticas, que contaram sempre com o voto contra do PSD e da direita, são

reforçadas neste Orçamento do Estado. Foram essas boas políticas que levaram ao crescimento da economia,

à criação de 350 000 postos de trabalho, à diminuição da pobreza e também ao aumento do rendimento

disponível das famílias.

Foram os senhores que disseram, em 2016, que nenhum investidor, quer nacional, quer estrangeiro, estava

disponível para investir num país governado pelo Partido Socialista com o apoio parlamentar do PCP e do Bloco

de Esquerda.

Pois bem, Sr. Deputado, vou dar-lhe dois números que são exemplificativos do que foram estes últimos

quatro anos e do que será o futuro próximo. Em março de 2019, o investimento direto estrangeiro bateu o recorde

histórico em Portugal. Isso diz bem da confiança e da credibilidade que esta governação tem no exterior do País.

Em 2019, bateu-se o recorde quanto ao número de novas empresas criadas em Portugal, número que cresce

há três anos consecutivos.

O aumento do rendimento disponível das famílias será novamente uma realidade no ano de 2020 — crescerá

3,2%, enquanto o consumo privado crescerá 2%, o que significa que entraremos num ciclo visível de

recuperação e de aumento do rendimento disponível das famílias para gerar mais poupança, que é aquilo que

se pretende. Isto não será feito através das vossas propostas, de que já conhecemos os resultados — falo do

período de 2011 a 2015 —, mas, sim, à conta das boas políticas que levaram Portugal novamente à senda do

crescimento económico.

Por fim, gostaríamos de desmascarar o discurso do PSD em relação à carga fiscal.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Não vai ser fácil!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Deputado, dentro do universo dos países da OCDE, o país que mais

subiu a carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho entre 2011 e 2015 foi Portugal.

Protestos do PSD.

Segundo a OCDE, em 2018, Portugal foi dos países que mais desceu a carga fiscal sobre os rendimentos

do trabalho.

Aplausos do PS.

Mais, Sr. Deputado: o Instituto Nacional de Estatística, no seu último boletim sobre a receita fiscal, diz

claramente que a receita fiscal subiu à conta do bom desempenho da nossa economia. Havendo mais 350 000

postos de trabalho, há mais pessoas a contribuir para a segurança social, embora as taxas se tenham mantido

inalteradas. Havendo mais 350 000 postos de trabalho, há mais pessoas a pagar IRS. É natural que, apesar de

o IRS descer, a receita fiscal cresça, porque há mais pessoas a trabalhar. É natural que a receita do IVA suba,

porque há mais consumo. Todos os anos o consumo sobe e sabemos que o IVA não subiu, pelo contrário, até

desceu na área da restauração.

Aliás, o PSD bate no peito a defender a descida da carga fiscal, mas votou contra o fim da sobretaxa de IRS

e a descida do IVA para a restauração.

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Aplausos do PS.

Portanto, Sr. Deputado, a realidade será esta em 2020: a carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho

continuará a descer e com isso aumentará o rendimento disponível das famílias. Assim, veremos a poupança

crescer, num novo ciclo que será certamente saudável para a nossa economia e para as contas públicas.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Oliveira, do PSD.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado João Paulo Correia,

agradeço muito as questões que colocou.

Vi-o, com algum entusiasmo, a defender o Orçamento do Estado, o que compreendo, mas também reparei

que foi o único que veio a jogo falar sobre ele, o que é um bocadinho estranho.

Já percebi que o Sr. Primeiro-Ministro, durante esta tarde, teve algum namoro, em público, com o Bloco de

Esquerda. Foi simpático perceber isso e também compreendo esse momento.

Em relação às questões que colocou, deixe-me que lhe diga, porque acho que é muito importante falar sobre

isso, o seguinte: não se esqueça de que, antes de 2011 — acho que se esqueceu —, quem estava no Governo

era o Partido Socialista.

A Sr.ª Marina Gonçalves (PS): — Há anos!

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Há anos, não é?!

Fomos nós que tivemos de recuperar o País por causa de um Governo do Partido Socialista que levou

Portugal à bancarrota.

Aplausos do PSD.

Portanto, é necessário tomar medidas a sério. É preciso dizê-lo! É preciso desmascarar!

Depois, deixe-me que lhe diga também, Sr. Deputado João Paulo Correia, que o que está aqui em discussão

hoje é o Orçamento do Estado do Governo, não é o Orçamento do Estado da oposição.

O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Ainda bem!

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Este não é o Orçamento do Estado que o PSD faria se fosse Governo.

Já dissemos aqui quais são as nossas propostas, mas penso que há pessoas do Partido Socialista que

estiveram um pouco desatentas. A campanha eleitoral foi muito longa, houve muita informação, muito detalhe,

mas, se o Sr. Deputado quiser, amanhã trago para a reunião plenária o nosso programa eleitoral e as nossas

propostas caso o Partido Social Democrata fosse Governo. Se quiser, faço isso.

O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Muito bem!

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Deixe-me também dizer-lhe uma coisa que me parece muito relevante. A

alternativa é muito clara, Sr. Deputado, e só quem está muito distraído é que não percebe que há uma alternativa

a estas políticas. Só quem está perfeitamente distraído! Defendemos a aposta no crescimento económico, de

forma definitiva e séria, e na redução gradual dos impostos que os portugueses suportam.

Repare, a questão dos impostos é muito importante. Quando se fala na carga fiscal — esta discussão é

permanente e já o Sr. Ministro das Finanças, na primeira audição acerca da proposta de Orçamento, teve

dificuldade em reconhecer, como sempre, que a carga fiscal aumenta —, refere-se os dados da OCDE em

relação à sua evolução. E os últimos dados, que são de 2018, Sr. Deputado, revelam que houve uma evolução

de 34,4% em 2017 para 35,4% em 2018. Portanto, a evolução da carga fiscal em Portugal é crescente.

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Claramente, há um crescimento do peso dos impostos e do peso que os portugueses dispõem do seu

rendimento para o Governo. Claramente, há uma opção com a qual não concordamos.

O Governo tem de perceber — e essa é uma diferença que nos separa — que não pode haver excesso de

peso do Estado nos rendimentos dos portugueses. Os portugueses têm de ter alguma libertação, alguma

capacidade de investir com o dinheiro que ganham, com o seu rendimento. Portanto, essa política é

completamente diferente da nossa e discordamos completamente da posição do Governo.

Nós defendemos libertar o excesso de peso do Estado sobre os cidadãos e as empresas, fomentar a

capacidade de criar riqueza, apostar no investimento público produtivo e necessário para a melhoria da oferta

pública aos portugueses, apostar na captação de investimento, como há pouco o Sr. Deputado disse, e muito

bem, para que haja crescimento do investimento em Portugal.

Concordamos, aceitamos isso e acho que é um facto positivo, é uma aposta que deve ser feita. Achamos é

que deve ser feito muito mais.

Libertar as empresas das dificuldades para se instalarem e trabalharem em Portugal é um facto, claramente,

indesmentível. Portugal tem problemas graves também a este nível e, portanto, há uma política diferente da

nossa parte.

A política que os senhores seguem, a política que segue o Partido Socialista, a política que segue o Governo

é sempre à custa de mais carga fiscal, mais peso do Estado na economia, mais incapacidade de responder às

necessidades dos portugueses, mais incapacidade de responder aos serviços públicos, menos capacidade de

investimento público, promessas de investimento público e um Orçamento de Estado que é fictício e que prevê

um excesso de despesa que, depois, não cumpre.

Sr. Deputado, a alternativa é muito clara. A nossa alternativa é completamente diferente da que o Partido

Socialista tem agora, no Governo.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Carneiro.

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta

de Orçamento cumpre com a palavra dada aos portugueses, consolida o caminho de desenvolvimento iniciado

na anterior Legislatura, prepara a sociedade e o Estado para os complexos desafios da vida internacional e

garante a solidariedade entre as gerações.

Aplausos do PS.

Este é o melhor Orçamento dos últimos cinco anos. Tem tudo o que de positivo havia nos anteriores e vai

mais longe na visão reformista do Estado e da sociedade.

Sr.as e Srs. Deputados, esta proposta de Orçamento de Estado mantém, consolida e desenvolve as linhas

de política que permitiram repor rendimentos; valorizar o trabalho; reduzir os impostos para as famílias e para

as pequenas e médias empresas; reduzir o desemprego; estimular a procura e a produção interna; aumentar

consecutivamente as exportações, o investimento direto estrangeiro e, desde 2017, crescer mais que a média

dos países da União Europeia; consolidar a trajetória de redução do défice e de amortização da dívida pública

e, ao fazê-lo, reforçar o investimento público de qualidade nas funções sociais, nas funções económicas e de

soberania.

Mas, para os que ainda têm dúvidas sobre a natureza do crescimento económico do País, lembro alguns dos

dados recentemente tornados públicos: a previsão de um crescimento de 7,3 % na formação bruta de capital

fixo, o que é um aumento sem precedentes desde 2010; o stock de investimento direto estrangeiro atingiu um

novo máximo no terceiro trimestre de 2019, ou seja, 143 000 milhões de euros; as exportações têm vindo a

crescer sustentadamente e as empresas nacionais têm vindo a diversificar mercados, representando hoje quase

44 % do PIB e envolvendo cerca de 90 000 milhões de euros; a receita externa do turismo terá ultrapassado em

2019, pela primeira vez, os 18 000 milhões de euros, valor que ilustra, de forma muito enfática, a importância

deste sector na economia nacional e a confiança que hoje tem no nosso País.

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Aplausos do PS.

Ora, Sr.as e Srs. Deputados, integrar na proposta de Orçamento do Estado o fim do imposto de selo para as

operações de crédito às exportações com garantia do Estado, trabalhar nos incentivos fiscais para promover as

exportações, para promover o reinvestimento dos lucros das pequenas e médias empresas e para apoiar a

digitalização, a inovação e o desenvolvimento são exemplos concretos do compromisso com a redução fiscal,

com o crescimento da economia e com a criação de emprego.

Sr.as e Srs. Deputados, esta proposta de Orçamento cumpre igualmente outros objetivos políticos

estratégicos: respeita o Programa do Governo, honrando, assim, os compromissos e a palavra dada ao povo

português.

Aplausos do PS.

Com esta atitude melhoramos a confiança dos cidadãos na vida política e tornamos mais estreita a porta da

demagogia e do populismo.

Este Orçamento assume, com clareza, as prioridades políticas que permitem enfrentar os problemas

estruturais da sociedade e do Estado, nomeadamente: a continuidade do esforço de valorização e de

qualificação das pessoas, por intermédio do reforço do investimento na escola pública, nas universidades e nos

politécnicos; a qualificação, a valorização e a modernização da Administração Pública, com a contratação de

recursos de qualidade e com formação especializada para que se apoie o Estado e as entidades públicas na

sua missão; a descentralização e a adoção dos mecanismos de legitimidade e de proximidade dos poderes

locais e regionais, aprofundando os instrumentos que melhor servem o desenvolvimento e a coesão.

Este é, de facto, um Orçamento que leva o poder às pessoas.

Há, ainda, a preparação da alta Administração Pública para o desafio da Presidência Portuguesa da União

Europeia e para melhor servir a inserção de Portugal na vida global, bem como a preparação das nossas Forças

Armadas para o desempenho de missões externas que credenciam e engrandecem o nome de Portugal no

mundo.

Com essa opção, consolidamos o reforço da presença da nossa voz nas instâncias internacionais,

engrandecemos o vínculo com as comunidades portuguesas e com o mundo de língua e cultura portuguesas e

lusófonas.

Este é, também por isso, um Orçamento que valoriza o prestígio de Portugal no mundo.

Aplausos do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, quero lembrar que a Legislatura é de quatro anos, que esta é a proposta de

Orçamento para o primeiro ano e que o modo como entrarmos na Legislatura determinará a confiança dos que

podem investir e criar riqueza no País.

Da riqueza criada e da sua justa repartição dependerão as condições de vida das nossas e dos nossos

concidadãos e da melhoria das suas condições de vida e resultará o reforço ou a degradação do nível de

confiança que depositam em nós.

Sr.as e Srs. Deputados, quero sublinhar que apresentar um saldo positivo e reduzir a dívida significa: preparar

o Estado para fazer face aos imponderáveis da vida internacional, que são muitos e que se acentuam a cada

dia que passa; garantir melhores condições para o financiamento das suas funções; ter maior autonomia para

as suas escolhas; e ter mais sentido de responsabilidade e de solidariedade com as gerações mais jovens, sem

esquecer os mais idosos e os mais carenciados.

Esta proposta de Orçamento de Estado assume todos estes desafios num claro compromisso com o

interesse nacional, mas, naturalmente, ela poderá ainda ser melhorada com o contributo das Sr.as e Srs.

Deputados, legítimos representantes do povo português.

Contamos, por isso, com o sentido de Estado de todas as forças políticas representadas neste Parlamento,

emanação da nossa democracia e da vontade popular, trabalhando para melhorar estas propostas, com clareza

de propósitos, sentido de interesse nacional e racionalidade nas escolhas que há a fazer.

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Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Inscreveram-se para pedir esclarecimentos dois Srs. Deputados.

Como é que o Sr. Deputado pretende responder?

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Em conjunto, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Com certeza, Sr. Deputado.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Peixoto.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Luís Carneiro, depois de duas semanas

em que se multiplicaram as agressões a profissionais de saúde nos hospitais deste País e em que se assassinou

um jovem nas ruas mais movimentadas de Bragança e um outro em Lisboa junto a universidades e a

estabelecimentos de restauração muito frequentados, é impressionante que, até agora, não tenhamos ouvido

uma palavra por parte do Partido Socialista relativamente a segurança e a forças de segurança, ou à falta delas.

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Porque falar em segurança e em forças de segurança é falar em investimento

público, que foi isso que os senhores não fizeram nos últimos anos.

Aplausos do PSD.

Só se ouviu o Sr. Ministro da Administração Interna hoje, ou ontem, numa televisão, anunciar um programa

de defesa pessoal para os profissionais de saúde…

Protestos do PS.

Foi mais ou menos assim… Se não foi isso, foi o que passou em todo o lado.

Protestos do PS.

Tenham lá calma! Mas há ou não programas de defesa pessoal para os profissionais de saúde? O Governo

quer ou não implementar esses programas? É que se quer, até faz bem! Sabem porquê, Srs. Deputados?

Porque os profissionais de saúde precisam de se defender das atrocidades que os senhores fizeram ao Serviço

Nacional de Saúde nos últimos quatro anos.

Aplausos do PSD.

Uma coisa pode não ter a ver com a outra, mas o esganar com cativações, pelo Ministro Mário Centeno e

pelo Governo, nos últimos anos, tem também repercussões muito graves nas polícias, tem um preço e esse

preço não traz bons resultados.

Os Srs. Deputados sabem, por acaso, que na PSP – e vamos falar de forças de segurança – 25% do ativo

tem mais de 50 anos? Sabem que há um défice permanente de 1500 agentes, porque as admissões nunca

superam as saídas? Sabem que mais de 60% das instalações das esquadras estão degradadas? Sabem que

há várias esquadras que não têm elementos para fazer patrulhas? Sabem há um colete balístico para 50 polícias

homens, porque as mulheres não têm direito a estes coletes, numa discriminação, que é completamente

absurda?

Mais: na GNR há um défice de 5100 agentes, os veículos amontoam-se em parques porque não há verbas

para a sua manutenção, há postos territoriais que operam em três concelhos e que só têm dois militares para

patrulhas.

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Na Polícia Judiciária (PJ) o que os senhores estimam neste Orçamento é de bradar aos céus! A Sr.ª Ministra

da Justiça elege como prioridade o combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira e, depois, os

senhores chegam aqui e apresentam um Orçamento que diminui as despesas de investimento na PJ em 22,8%.

Nem com o milagre das rosas os senhores conseguiriam, se o quisessem, combater a corrupção e a

criminalidade económica e financeira!

Aplausos do PSD.

A pergunta é esta, Sr. Deputado: perante este quadro, que é negro, os senhores não veem mal nenhum? Os

senhores não veem mal nenhum nisto nem sentem nenhum sobressalto?! Não se sentem incomodados,

indignados, com o que está a acontecer no País no que respeita às forças de segurança e ao investimento que

os senhores deviam fazer e não querem fazer?

Todavia, os senhores ainda estão a tempo de, em sede de especialidade, acolher algumas propostas que

reponham a justiça e que deem dignidade às forças de segurança deste País e à ordem pública que temos de

ter nos próximos anos.

É esta a pergunta a que quero que o Sr. Deputado nos responda: esta é ou não uma prioridade do Governo?

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Leite

Ramos.

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado José Luís Carneiro, quero saudá-lo pela

sua intervenção e dizer-lhe que o tom entusiasta com que se referiu ao Orçamento do Estado faz-me lembrar

um conhecido ditado popular: «Olha para o que eu digo, não olhes para o que eu faço.»

É que, olhando para as suas afirmações sobre o Orçamento do Estado e olhando para o que foram os quatro

anos de execução dos anteriores orçamentos, isso deixa-nos muito preocupados e até perplexos.

O Sr. Deputado diz que este é um Orçamento de continuidade, que traz mais investimentos, que tem menos

impostos, que traz mais rendimentos e melhores serviços públicos, mas, olhando para aquela que foi a prática

do Governo ao longo destes quatro anos, vem-nos à cabeça um outro ditado popular: «Gato escaldado de água

fria tem medo.»

Sabe, Sr. Deputado, os portugueses estão escaldados com quatro anos de cortes e de cativações, de

malabarismos contabilísticos, de mais impostos e de menos investimento público. Por isso, só podem desconfiar,

perante as suas palavras, do que vai ser o próximo Orçamento do Estado.

Acreditando que a continuidade significa mais do mesmo, este não é um Orçamento, Sr. Deputado, é uma

peça literária de pura ficção! Devíamos dizer que é exatamente assim. E para que, no futuro, ninguém venha

acusar o Governo, nem o Sr. Primeiro-Ministro, nem os membros deste Governo, nem os Deputados do Partido

Socialista de que foi enganado, acho que só lá falta aquela habitual declaração: «qualquer semelhança com a

realidade é pura ficção». É isto que acontece com este Orçamento do Estado!

Aplausos do PSD.

Este é um Orçamento sem ambição, este é um Orçamento sem visão de futuro, sem estratégia, sem rumo e

sem responsabilidade. É um Orçamento que sobrecarrega as famílias e as empresas com mais impostos e que,

em retorno, não traz nem mais investimento público, nem melhoria dos serviços públicos.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — E a criação de emprego?!

O Sr. Luís Leite Ramos (PSD): — É um Orçamento que não dá à economia as condições necessárias para

crescer, nem aos portugueses os serviços públicos a que têm direito e que merecem, quer na saúde, quer na

educação, quer na segurança.

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Vou falar-vos da educação, um setor sobre o qual, até agora, pouco ou nada ouvimos falar. A falta de

recursos, de meios, de financiamento e de investimento público no setor da educação é um problema

reconhecido por todos no País. Infelizmente, as soluções para resolver estes problemas não se encontram neste

Orçamento do Estado.

O Sr. Ministro, que tem um dom raro, o da invisibilidade, aparece de vez em quando em público, com a

habitual propaganda, para dizer que há um reforço de meios e de funcionários, quando temos escolas fechadas

por falta deles, que há mais investimento na valorização dos professores, quando temos alunos sem aulas por

falta de professores, e fala em modernização e em novas tecnologias, na transição digital, quando temos escolas

paralisadas por falta de meios, até às vezes para mudar uma lâmpada, para reparar um telhado ou até para

substituir um computador.

O Governo, neste ano, no Orçamento para 2020, vem com a conversa do costume. Diz que agora vai

atualizar, reforçar, diversificar os recursos e os meios para as escolas, diz que agora é que vai ser, que agora é

que vai haver o investimento público que durante quatro anos não foi realizado. Mas, ao mesmo tempo, faz algo

extraordinário: corta nas dotações orçamentais, quer para o funcionamento, quer para o investimento para 2020,

sobretudo quando comparado com o de 2019. Por exemplo, temos menos 17% nas verbas do programa

operacional do ensino básico e secundário, menos 10% nas verbas para o Parque Escolar, menos 13% nos

projetos para o ensino básico e secundário face a 2019.

Portanto, Sr. Deputado José Luís Carneiro, explique-me como vai acontecer este milagre? Como vai ser

possível, com este Orçamento, resolver os graves problemas de falta de investimento, de falta de recursos com

que se debatem as escolas no País, de norte a sul, se há menos dotação orçamental, se há, efetivamente,

menos recursos e menos dinheiro para o fazer? Explique-me lá, explique aos portugueses lá em casa como é

que este milagre vai ser operado.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Carneiro.

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, queria dizer que foi com alguma

estupefação que ouvi as perguntas que acabaram de formular ao Partido Socialista. Isto por uma razão muito

simples: porque acabámos de verificar que o líder do vosso partido não apenas não dialoga com os Deputados

regionais como também não dialoga com os Deputados da sua bancada. Só por isso é que podemos

compreender as perguntas que acabaram de fazer.

Explico o que quero dizer-

Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.

O Dr. Rui Rio colocou um conjunto de sete questões para aprovar este Orçamento e é curioso que nenhuma

dessas questões que colocou tenham sido agora aduzidas pelos Srs. Deputados.

Aplausos do PS.

Talvez os senhores não tenham o cuidado de ler as declarações da vossa liderança, mas eu vou lê-las para

que os Srs. Deputados possam conhecer o que disse o líder do vosso partido para garantir o apoio à proposta

de Orçamento apresentada pelo Partido Socialista.

O Sr. Dr. Rui Rio disse que se o Orçamento diminuísse a carga fiscal, se o Orçamento diminuísse a dívida

pública, se o Orçamento reduzisse o défice, se o Orçamento aumentasse o investimento público, se o Orçamento

propusesse a reforma da Administração Pública e se demonstrássemos que o Orçamento tem em vista melhorar

as condições de vida dos portugueses,…

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Mais! Mais!

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — … nós teríamos o voto favorável do Partido Social Democrata.

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Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.

Ora, eu queria lembrar que, quando o Dr. Rui Rio assumiu a sua liderança, a primeira declaração que fez foi

a de que primeiro estaria o País e só depois o Partido.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — E a política não é o País?

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Ora, ocorre que a proposta de Orçamento do Estado para 2020 reduz a

carga fiscal sobre as famílias e sobre as empresas, reduz a dívida pública, reduz o défice, faz mais investimento

público e propõe-se reformar a Administração Pública.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Devo dizer que foi com muita atenção que ouvi a declaração do Dr. Rui Rio e estava convencido…

Protestos do PSD.

Não sabia que provocaria tanta excitação!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, peço que criem condições para que todos se possam

exprimir.

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Queria dizer-vos que estava convencido de que, em função do interesse

do País…

Protestos do PSD.

Não fiquem excitados, Srs. Deputados!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, não há diálogo entre os Deputados. Peço que criem

condições para que cada um possa usar da palavra no seu tempo próprio.

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Estou convencido de que os senhores estão tão nervosos porque eu

ainda vou falar do IVA e da posição do PSD sobre o IVA!

Aplausos do PS.

Srs. Deputados, eu tive o gosto de participar num debate da rádio TSF com um dos vossos vice-presidentes

e pude ouvir a sua posição sobre a redução do IVA na eletricidade, assumindo por três vezes que o PSD ia

manter a sua proposta para a redução do IVA. Já que o Sr. Deputado o referiu e aqui quis invocar não um ditado

popular mas o frei Tomás, quando disse «Olha para aquilo que ele diz, mas não olhes para aquilo que ele faz»,

posso declarar, em sete capítulos, o modo como o PSD, em seis meses, alterou completamente a sua posição

relativamente ao IVA na eletricidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — E as perguntas?

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Vou responder às perguntas, Sr. Deputado!

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Sr. Deputado, permita-me dizer que, falando sobre o IVA, em julho, o PSD afirmou: «apresentaremos

medidas para o Orçamento do Estado, entre as quais a redução do IVA para 6%». Em novembro, reafirmou o

que disse: «o PSD vai apresentar propostas de redução do IVA na eletricidade». Depois, houve uma entrevista

do antigo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, onde se diz que o Governo não terá espaço

para acomodar a redução do IVA. Depois, em 20 de dezembro, ouvimos o Dr. Rui Rio afirmar que, afinal, só

aprovava a descida do IVA se a mesma não comprometesse as contas públicas, ou seja, a proposta de redução

do IVA ficou pelo caminho.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — E as forças de segurança?

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — O que é que isto significa? Significa que aquele tal interesse do País,

afinal, cede muito rapidamente ao interesse interno e ao interesse partidário.

Aplausos do PS.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — E as polícias não servem o País?

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Sr. Deputado, queria dizer-lhe que os investimentos previstos para a área

da segurança, no âmbito da Lei de Programação de Infraestruturas e Equipamentos,…

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — É melhor nem falar nisso!

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — … preveem mais de 100 milhões de investimento em infraestruturas,

equipamentos, na requalificação e na motivação dos profissionais da área da segurança interna.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Mais promessas!

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Quanto à questão que foi colocada relativamente ao investimento na

escola pública, quer no ensino básico e secundário, quer no ensino superior, diria que, em 2015, o investimento

no ensino superior estava na ordem dos 1804 milhões de euros e que, para 2020, prevê-se um investimento

superior a 2213 milhões de euros. Para o ensino básico e secundário, em 2015, tínhamos um investimento de

5792 milhões de euros e temos previsto, para 2020, 6443 milhões de euros. Isto significa mais investimento na

escola pública, mais investimento nos serviços do Estado.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins,

do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo,

Sr.as e Srs. Deputados, o Governo tem um novo mantra: fez o seu melhor Orçamento de sempre. Façamos,

então, esse debate para além do slogan.

Qual é o melhor Orçamento? Aquele que eliminou cortes nas pensões e nos salários ou este, que os atualiza

abaixo da inflação esperada? Os salários e as pensões são agora nominalmente mais altos, claro, mas só no

primeiro caso, eliminando os cortes, se recuperou poder de compra. Um Orçamento do Estado vale pela

resposta que em cada momento dá aos problemas do País, pela diferença que faz na vida das pessoas. E é por

isso que a proposta de Orçamento do Estado que o Governo apresenta hoje não é melhor do que os anteriores

Orçamentos. É sua herdeira, e ainda bem, mas nunca devemos viver só da herança.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Muito bem!

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A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Não há neste Orçamento cortes, são aplicados mecanismos de atualização

mínima automática de pensões, prestações sociais e escalões de IRS; repuseram-se apoios básicos para

combater a pobreza; os manuais escolares gratuitos garantem a universalidade da escolaridade obrigatória;

acabou-se com a subversão de transportes coletivos mais caros do que o carro particular. Este Orçamento

depende de uma economia que, com as suas dificuldades, funciona e não de receitas extraordinárias vindas de

privatizações ruinosas que pagaram despesas de curto prazo e hipotecaram o futuro do País. A segurança social

estabilizou e reforçou-se com a criação de emprego. É pouco? Não, foi muito! Está feito!

Esta recuperação do País foi das decisões mais importantes dos últimos anos e o Bloco orgulha-se de ter

participado neste caminho. Foi um caminho que deixou a direita sem programa e sem proposta até hoje, como

se viu nas eleições, como se vê neste debate. Mas o mais importante é que foi o caminho que recuperou o País,

respondendo pelas pessoas. O que está feito permite hoje construir um caminho mais sólido. Ainda bem! Mas

confundir o que se fez com que é preciso fazer é perigoso.

Estamos num novo ciclo: o ciclo marcado dolorosamente pela crise da habitação; o ciclo onde a resposta à

emergência climática tem de ser efetiva; o ciclo em que os serviços públicos não podem esperar mais, na saúde

ou nos transportes; o ciclo onde responder por quem trabalha exige a coragem das grandes mudanças na justiça

social e económica, como os direitos no trabalho, a erradicação da precariedade, o reforço do sistema de

pensões.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — O que falta a esta proposta de Orçamento não é apenas a disponibilidade

negocial que o Governo só mostrou muito tardiamente. Falta-lhe resposta e estratégia para os problemas de

hoje. Não chega viver do que já está feito nem celebrar o facto de não o desfazer.

O descongelamento de carreiras terá efeitos em 2020? Seguramente, já estava decidido. Os escalões de

IRS criados na anterior Legislatura far-se-ão sentir? Claro, são decisões tomadas. Há manuais escolares

gratuitos? Novidade seria se deixasse de haver. A atualização do indexante de apoios sociais tem efeito? Bem,

decidimos isso há muito tempo. Se assim não fosse, até os mais pobres perdiam com a inflação.

Mas, na verdade, somando todas estas medidas de recuperação de rendimentos, que na sua esmagadora

maioria mais não são do que a aplicação de decisões passadas, quem aqui vive e faz contas à vida para chegar

ao fim do mês não terá o aumento de que precisa e que é seu por direito.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — O mesmo se passa no investimento. Sobe 28%, é certo, mas 28% de pouco

não será nunca grande coisa. E, ao olhar para o investimento, mais uma vez, vemos o que vem do passado e

que não poderia deixar de lá estar, mas não vemos o que o futuro nos exige. Das obras em escolas à compra

de comboios, já estava tudo decidido e apenas se aguarda a execução.

Na habitação, há verba para o programa 1.º Direito — a resposta a quem precisa de realojamento urgente e

que foi identificado na anterior Legislatura —, mas não há investimento capaz de um mercado de arrendamento

público que combata a especulação e garanta o direito à habitação.

Na saúde, na proposta inicial do Governo, combate-se a suborçamentação mas não se aumenta a despesa

face ao executado.

Na verdade, há na proposta de Orçamento do Estado uma novidade: afirmar claramente que a timidez do

investimento serve a estratégia de excedente como forma de pagar a dívida pública. E esse é um mau sinal. É

um mau sinal não apenas porque limita o investimento e, portanto, a economia, é um mau sinal porque é um

recuo político explícito face ao caminho dos últimos quatro anos.

Afirmámos sempre que só o crescimento económico podia proteger o País. Assim se aumentaram salários e

pensões, contra as pressões de Bruxelas. E provámos que esse era o caminho certo.

Quando o Governo aparece centrado no objetivo do excedente e sem propor um outro horizonte

compreensível para a sua estratégia orçamental, planta a dúvida legítima: terá a recuperação de rendimentos

dos últimos quatro anos deixado também o Partido Socialista sem programa?!

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Aplausos do BE.

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, para o Bloco

de Esquerda as prioridades são claras: aumentar os rendimentos de quem vive do seu trabalho e aumentar o

investimento.

Afastada pelo Governo a alteração da legislação laboral, no imediato, a medida orçamental transversal capaz

de recuperar o poder de compra de quem vive do seu trabalho é a descida do IVA na energia. Menos despesa

na tarifa da luz é mais salário e mais pensão. Num dos países com a energia mais cara da Europa, é também

uma medida de justiça. Bem pode dizer agora o PS que, afinal, a subida do IVA da luz, em 2012, a que o PS,

na altura, se opôs, foi uma boa ideia, porque é política ambiental. Não é verdade! Não é verdade, porque a

implementação da tarifa social já provou que mais acesso não é mais consumo e não tem nenhum sentido que

o programa de combate pela emergência climática se faça discriminando pela carteira e penalizando os salários

médios.

Aplausos do BE.

A resposta para a neutralidade carbónica está, sim, em mais e melhores transportes públicos, em

investimento na eficiência energética, na proteção do território. E o Bloco não desistirá de nenhum destes

objetivos, como não desiste de recuperar os serviços públicos, como o Serviço Nacional de Saúde e a escola

pública, de tornar a justiça mais capaz, de investir na cultura e ciência, de concretizar o estatuto dos cuidadores

informais, de construir caminhos de dignidade contra a exclusão, de combater o privilégio e as desigualdades,

de responder à crise da habitação.

Não fechamos nenhuma porta a negociações. Assumimos toda a responsabilidade e não esperamos

facilidades. Que ninguém espere que o Bloco de Esquerda esqueça o seu mandato.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para formular um pedido de esclarecimentos à Sr.ª Deputada Catarina

Martins, tem a palavra a Sr.ª Deputada Emília Cerqueira, do PSD.

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Sr.ª Presidente, antes de mais, cumprimento-a e aos Srs. Membros do

Governo.

Sr.ª Deputada Catarina Martins, hoje vi-a fazer aqui um exercício não sei se de arrependimento, se de

amnésia, e de amnésia seletiva; antes, esquecia-se do que aconteceu até 2011, mas agora também já parece

querer passar uma esponja naquilo que fizeram nos últimos quatro anos.

O Sr. Adão Silva (PSD): — É verdade!

A Sr.ª Emília Cerqueira (PSD): — Vejo-a hoje, aqui, qual carpideira, a chorar pelos serviços públicos, pela

saúde, pela habitação, por tudo aquilo que não foi feito na anterior Legislatura, mas fizeram parte do Governo,

da solução, em quatro Orçamentos, Sr.ª Deputada, e nunca a vi com arrependimentos, pelo contrário, falou

sempre do que fizeram e de quanto era vosso mérito.

Hoje, para nosso espanto, vejo-a aqui a fazer uma contrição pública — só assim conseguimos entender a

sua posição — quanto àquilo que é necessário fazer, porque não está feito. E, então, pelos vistos, Sr.ª Deputada,

é preciso fazer tudo!

Vão ainda apostar na saúde, nos cuidados informais, nos serviços públicos — sim, aqueles que destruíram,

malgrado o vosso discurso durante quatro anos, e é bom que não o esqueçamos —, na educação, nos

transportes e, já agora, na linha férrea, nos comboios tão anunciados, aliás, anunciados uma, duas, três, quatro

vezes, e tudo cancelado depois, porque, afinal de contas, o Plano Ferrovia já não existia, conforme fomos vendo.

Mas existia, pelo menos, na concretização?! Sr. Ministro, não faça esse ar agastado, porque a verdade é a

verdade. Sei que, às vezes, não gosta dela nem lida bem com ela, mas esta é a verdade do que fizeram nos

últimos quatro anos.

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Reduziu-se a dívida pública. Sr.ª Deputada, sabe bem que isso foi muito graças à política do BCE e a uma

situação excecional das taxas de juro, felizmente, para todos nós, e não propriamente às brilhantes medidas

tomadas pela geringonça e, atualmente, por este Governo. Aliás, pelos vistos, os arrufos também são só

aparentes, uma vez que o namoro continua, como existiu durante quatro anos, e sempre foi assim: oposição à

segunda, à quarta e à sexta e poder à terça, à quinta e ao sábado, com descanso ao domingo. Assim nos

habituaram nos últimos quatro anos e assim continuam.

Temos um orçamento que, infelizmente — e aí concordo consigo, Sr.ª Deputada —, é de hoje. Não tem

estratégia, não tem futuro, não tem planos, não tem um pensamento para o desenvolvimento sustentado deste

País. Lamento-o muito e espero que isso a incomode e que pense nisso quando está a fazer estes discursos

tão bonitos de ouvir, tal como os do Governo, mas que não são para cumprir, porque anunciam, orçamentam e,

depois, não executam.

Gostava que refletisse sobre isto e nos dissesse alguma coisa.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Catarina Martins, tem,

ainda, a palavra o Sr. Deputado Fernando Anastácio, do PS.

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, pela sua intervenção

percebi que, afinal, o Governo e este Orçamento não são só um slogan, são uma realidade que a Sr.ª Deputada,

apesar de qualificar como slogan, acaba por reconhecer que é essencialmente boa, que vai ao encontro de um

percurso que fizemos e que tem tudo aquilo que perspetivamos continuar a fazer ao longo destes quatro anos.

Queria, no entanto, colocar-lhe duas ou três questões que são essenciais.

Falou do IVA da eletricidade, mas falar do IVA da eletricidade e deslocá-lo da questão das alterações

climáticas, perdoe-me, é um erro. É um erro porque é essencial perceber que a vossa medida, a medida que

defendem, de uma redução genérica do IVA de 23% para 6%, não tem em consideração esses pressupostos.

Aliás, penso que reconhecerá, com certeza, e esta é uma das questões que gostaria de lhe colocar, que as

diligências que o Governo tem feito, a nível da Comissão Europeia, no sentido de criar escalões nos consumos

da eletricidade, beneficiando os consumos mais baixos, na perspetiva, isto, sim, de uma ação sustentável nas

alterações climáticas, são, de facto, o caminho certo.

Falou também aqui de salários e de reposições salariais. Não quero pensar que a Sr.ª Deputada Catarina

Martins também não reconhecerá que os 8% de recuperação de rendimento que se verificaram na Administração

Pública nestes quatro anos e os 3,6% que estão já equacionados no Orçamento do Estado para 2020 são algo

que não justifica continuarmos a fazer esse trabalho, a desenvolver e a valorizar a Administração Pública,

porque, de facto, aqui, sim, não se trata de um slogan, trata-se de um desígnio, trata-se de fazer algo em função

da qualidade do serviço público.

Queria terminar, abordando um tema que tem sido transversal, porque, efetivamente, é um desígnio deste

Governo e penso ser um desígnio da esquerda, onde também, com certeza, o Bloco de Esquerda se posicionará:

o Serviço Nacional de Saúde. E, sobre isto, queria recordar-lhe algumas das suas intervenções, particularmente

quando, ainda antes da apresentação da proposta de Orçamento do Estado, entendia que 800 milhões de euros

de reforço da dotação e também o reforço de quadros no Serviço Nacional de Saúde seriam suficientes.

Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.

O Governo, na proposta inicial, tem 941 milhões de euros de reforço da dotação inicial e 8400 trabalhadores.

A pergunta que tenho de lhe fazer e de deixar à sua consideração é no sentido de saber se não considera que

há aqui, efetivamente, uma valorização do empenhamento do Governo no investimento no Serviço Nacional de

Saúde. É que ficou claro que o que fizemos nestes quatros anos, entre o Governo e a esquerda, em que

deixámos, isso, sim, a direita sem discurso, porque a direita não tem discurso nem programa, é um caminho

para continuar a percorrer, um caminho que o Bloco de Esquerda deveria continuar a fazer juntamente com o

PS, acompanhando a esquerda.

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Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, agradeço à Sr.ª Deputada Emília Cerqueira e ao Sr.

Deputado Fernando Anastácio pelas suas questões.

Devo dizer-lhe, Sr.ª Deputada Emília Cerqueira, e espero que não me leve a mal, que tenho uma enorme

dificuldade em responder à sua questão, porque dá-me ideia que a tinha preparado antes de eu intervir e,

portanto, não teve em atenção a minha intervenção. Talvez me tenha ouvido dizer do orgulho que o Bloco de

Esquerda tem no caminho dos últimos quatro anos, porque foi um caminho de recuperação do País. O que eu

também disse foi que não chega acabar com os cortes e as asneiras da direita, é preciso ter um programa de

esquerda para o País. E se durante quatro anos andámos a emendar os cortes e as enormes penalizações da

direita no País, este é o tempo de olhar para a frente, para novos desafios. A minha intervenção foi precisamente

sobre isto.

Aplausos do BE.

Sr. Deputado Fernando Anastácio, mais uma vez, ninguém acusa o Governo de não cumprir com o que foi

acordado em anos anteriores, o que o Bloco de Esquerda salienta é que um Orçamento do Estado feito só com

base em medidas que foram anteriormente aprovadas, por bondosas e importantes que essas medidas tenham

sido em cada momento — e são, e defendemo-las —, não chega para os desafios novos que hoje temos. É que

havia desafios de emergência a que respondemos e há hoje outros desafios de emergência à espera dessa

resposta. Aí é que está o problema.

Em relação à saúde, como sabe, foram precisamente os avanços que fizemos no Serviço Nacional de Saúde

que permitem que o Bloco de Esquerda, muito crítico desta proposta de Orçamento do Estado, a vá viabilizar,

através da abstenção. Tudo o resto está em aberto, na especialidade, e temos muito caminho para fazer.

Como disse, o Bloco de Esquerda não abdica de um orçamento que seja capaz de responder pelos

problemas de hoje e por uma estratégia para o futuro, que não se limite apenas a cumprir o passado, como é a

proposta agora apresentada.

Sobre o IVA da energia, noto que o Partido Socialista, em tempos, também propôs a baixa do IVA na energia.

Não sei se, na altura, desprezava o ambiente e, agora, que constrói novos aeroportos, o preza mais… Enfim, o

Sr. Deputado Fernando Anastácio saberá explicar isso, eu não sou capaz de o explicar, mas há uma outra coisa

que também não sou capaz de explicar: o impacto da medida que o Governo inscreveu no Orçamento. Fosse o

Bloco capaz de perceber esse impacto ou o Governo capaz de o explicar e talvez a negociação desta matéria

já estivesse bem mais avançada.

Aplausos do BE.

Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Eduardo Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia, do Grupo

Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Membros do Governo, Sr.as e

Srs. Deputados: Neste debate orçamental, o Sr. Primeiro-Ministro, no estilo cada vez mais modesto e menos

arrogante que o caracteriza, disse-nos só que este era o melhor Orçamento que já tinha apresentado. Diria o

povo, e provavelmente também o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, «gaba-te cesto», mas, enfim, não nos

fiquemos por aí.

Este Orçamento não será o melhor mas é, seguramente, o maior, é o maior exercício de propaganda desde

o último Orçamento apresentado pelo Sr. Primeiro-Ministro, só comparável com os exercícios de propaganda,

de que todos ainda nos recordamos, do ex-Primeiro-Ministro José Sócrates e dos seus famosos planos de 50

medidas para resolver o que quer que fosse.

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Aplausos do CDS-PP.

É também o maior Orçamento em carga fiscal — tem a maior carga fiscal de todos os Orçamentos.

Disse, não o Sr. Primeiro-Ministro mas o Sr. Ministro das Finanças, que este Orçamento era marcado, se não

estou em erro, por seis «e», de equilíbrio, estabilidade, economia, empresas, emprego e esquerda. Foram estes

os seis «e» que o Sr. Ministro referiu.

Bom, em relação à economia, o Orçamento que tem a maior carga fiscal de sempre não é seguramente um

bom orçamento para a economia ou para o crescimento.

Em relação às empresas, basta ouvir os empresários ou os seus representantes para perceber que estão

tão descontentes quanto possível com este Orçamento. E é ouvi-los a falar do Orçamento, não é, sequer, ouvi-

los a responder ao Ministro Santos Silva, porque, então, seria pior ainda. Portanto, para a economia não é, para

as empresas também não é.

A estabilidade, bom, essa é, no mínimo, menor, porque, enfim, tem menos apoio, tem uma maioria menos

sólida, portanto, a estabilidade também diminuiu.

Quanto ao emprego, veremos.

Sobram, portanto, a esquerda e o equilíbrio.

Na esquerda, não me meto, como é evidente.

Em relação ao equilíbrio, quero dizer que um Orçamento equilibrado é uma boa notícia, do ponto de vista de

uma boa regra de governação. Não é aí que está o problema. De resto, o Orçamento ter um superavit é algo

que nem a troica, nos seus maiores sonhos, alguma vez pensou que o País pudesse ter. Finalmente, alguém

que vá além da troica; já não era, se calhar, sem tempo.

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, faltam outros «e». Falta um «e» de «engano», falta um «e» de «embuste», falta

um «e» de «encenação».

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Isso é a sua parte!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sobre isso, daria dois ou três exemplos.

Curiosamente, não foi dito por mim, estou a olhar, por exemplo, para o Sr. Deputado António Filipe que aqui

disse, e bem, que o Orçamento não tem nada de concreto em funções de soberania, não tem nada de concreto

em funções de segurança e em funções do Estado. O Sr. Deputado disse-o há pouco e não me vai desmentir.

Inclusivamente, os partidos que apoiam o Governo vêm aqui dizer que não há nada de concreto para as

forças de segurança. É certo que o Governo percebeu que há um problema sério, que há um problema grave e

um desespero naqueles que, todos os dias, trabalham para garantir a nossa segurança e lança algumas

intenções: reforço de meios, recursos humanos, mais agentes. O Governo tem enunciada essa ideia, mas, de

concreto, não há nada!

Protestos do PS.

Planos a três anos. A pergunta é esta: quando? Quantos é que entram? Quantos é que entram este ano?

Onde é que vão estar os investimentos? Onde é que vão ser feitas as obras? Que material é que vai haver? A

dúvida que fica é a de saber quando é que o Governo está a dizer a verdade.

O CDS, na Legislatura passada, propôs, ano após ano, um plano de combate ao terrorismo, um plano para

as infraestruturas críticas… Aliás, o Governo vem agora dizer: «vamos ter um plano para as infraestruturas

críticas». Então, e nos últimos quatro anos? Nada! É a confissão de que, durante quatro anos, não fizeram nada!

Perguntámos pelos retroativos dos suplementos. Primeiro, o Sr. Primeiro-Ministro dizia que não eram para

pagar; depois, quando se viu mais apertado, veio dizer: «bom, vamos pagar, mas só uma parte, só a partir de

2019»; agora, vem dizer «vamos pagar tudo». Quando é que faltou à verdade? Tenho medo que seja das três

vezes, e esse é que é o problema. Tenho medo que tenha faltado à verdade na primeira vez, que tenha faltado

à verdade na segunda vez e que esteja agora a faltar à verdade, também.

O mesmo se pode dizer, por exemplo, sobre o equipamento de proteção dos homens de segurança. Quantas

vezes perguntei sobre as proteções? Quantas vezes eu disse que estavam inutilizáveis, que eram antigas, que

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não serviam, que eram insuficientes? Disseram que não, que estava tudo bem, que as proteções estavam lá,

tinham sido fornecidas não sei quantas e que não havia problema nenhum. Agora, no Orçamento, vêm dizer

que vão fazer um grande investimento em proteções. Não é possível!

Portanto, o Governo falta à verdade sistematicamente. E volta a fazê-lo agora.

E eu não pergunto, sequer, sobre a tal ideia de formação de defesa para profissionais de saúde. É que, enfim,

a ser verdade, estaríamos no domínio do anedótico absoluto. Portanto, esquivo-me a isso, não vou, sequer, por

aí.

Mas, nesta matéria, convém também perguntar o que é que, por exemplo, acontece na área da defesa

nacional, de que ainda ninguém falou aqui hoje. É porque, na área da defesa nacional, sabemos que o efetivo

é completamente insuficiente para Portugal assumir as suas responsabilidades. Com 25 000 homens e mulheres

não é possível, sequer, assumir, de forma eficaz e condigna, os nossos compromissos internacionais! Também

nesta área de soberania, o Governo não tem resposta.

Mais: onde é que está a verba, onde é que estão os meios para fazer justiça, de uma vez por todas, àqueles

que honraram a nossa bandeira e que serviram a nossa pátria, que são os ex-combatentes? Também aí não há

nada! Não há nada de concreto, mais uma vez.

Termino, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, dizendo o seguinte: há também aqui uma enorme

encenação. Aparentemente, o que é que este debate nos traz de novo?

Passamos de um Primeiro-Ministro que, tendo perdido as eleições — as anteriores, há quatro anos —, acaba

por formar uma maioria para um Primeiro-Ministro que agora ganhou as eleições e perdeu a maioria. É, no

fundo, politicamente, talvez o mais interessante deste Orçamento.

Mas, tendo perdido a maioria, ou não tendo conseguido construir uma nova maioria, porque, apesar do

namoro, não houve papel passado — percebemos aqui isso hoje, ao longo do debate —, não tendo havido

acordo, como é que o Governo faz e como é que legitima uma opção estratégica? Como é que faz? É muito

simples: dá umas coisinhas a uns, dá umas coisinhas a outros, negoceia aqui, negoceia ali.

O Sr. Primeiro-Ministro usou a expressão «leilão» e eu digo que isto não é um leilão, isto é uma barganha

orçamental absolutamente inaceitável e inqualificável.

Aplausos do CDS-PP.

Como é que isto se resolve? Para o PAN vai o IVA das touradas; depois, mais meio hospital para a Madeira;

depois, mais umas coisas para o PCP, para a CGTP e para a função pública e mais uns pequenos aumentos —

que eles, eventualmente, não querem, ou até acham pouco;…

O Sr. Jorge Costa (BE): — Já está a treinar para comentador!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … depois, para o Bloco de Esquerda, uma vez que ainda não havia

satisfação — de resto, o Bloco de Esquerda veio anunciar hoje a sua abstenção, quando o seu voto já era inútil

porque já havia uma maioria formada, como todos percebemos, mas estão no vosso direito, ninguém vos pede

que sejam mais rápidos —, há umas coisas sobre combate à gentrificação e ao alojamento local, que podem

não ser grande coisa mas, pelo menos, ajudam a ultrapassar o célebre «complexo Robles», ajuda um pouco a

esquecer e a esconder essa história.

É assim, basicamente, que se constrói um Orçamento.

Protestos do Deputado do PAN André Silva.

Sr. Deputado André Silva, a questão das touradas é uma vergonha e é uma indignidade!

Aplausos do CDS-PP.

Nós podemos gostar ou não gostar de touradas, temos todo o direito, Sr. Deputado…

Protestos do Deputado do PAN André Silva.

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Sr. Presidente, pedia que o Sr. Deputado André Silva me ouvisse com o mesmo gosto com que o ouço

sempre.

O Sr. André Silva (PAN): — Eu gosto de o ouvir!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Deputado, nós podemos gostar ou não gostar de touradas. O Sr.

Deputado até já propôs aqui a proibição das touradas, e está no seu direito.

O Sr. André Silva (PAN): — Claro!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — A tourada é uma tradição cultural portuguesa antiga. Antiga!

O Sr. André Silva (PAN): — É uma vergonha!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — O Sr. Deputado pode gostar ou não gostar e, se os senhores quiserem

proibir, proíbam. Mas há uma coisa que é associada à tourada. Sabe o que é? É a valentia.

Risos do Deputado do PAN André Silva.

O que os senhores fazem, ao dizer «não proibimos, mas asfixiamos fiscalmente», é uma cobardia!

Aplausos do CDS-PP.

Os senhores não tiveram a coragem de proibir e é por isso que dizem que agora vão tentar acabar com ela,

com uma asfixia fiscal.

E os mesmos Deputados do Partido Socialista, que reverteram dos 13% para os 16%, são, provavelmente,

aqueles que vão agora votar os 23%.

Portanto, é assim que a encenação continua.

Já houve tempos, Srs. Deputados, outros tempos, de que o País se lembra, em que a extrema-esquerda

tinha como sonho passar a formas superiores de luta. Hoje em dia, já estão só nas formas superiores de

hipocrisia.

E é assim que a encenação vai continuar em sede de especialidade. Com uma certeza: no fim, o Orçamento

será aprovado. É mais do mesmo! O País merecia bem diferente daquilo que tem hoje aqui para votar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, um Sr. Deputado.

Como o Sr. Deputado Telmo Correia, já ultrapassou o tempo atribuído para hoje ao seu grupo parlamentar

mas, porque a gestão do tempo global depende de cada grupo parlamentar, pergunto se quer responder ao

pedido de esclarecimento.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Quero, sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito bem.

Tem, então, a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Luís Testa.

O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados,

também quero cumprimentar o Sr. Deputado Telmo Correia, mas não, obviamente, pela sua modéstia, já que

essa é uma característica que V. Ex.ª não tem. Aliás, o Sr. Deputado é daquele tipo de pessoas que pensa que

há dois tipos de opinião: a sua e a errada.

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Aplausos do PS.

Relativamente à história que nos foi trazida aqui sobre os «e», ela é meramente proclamatória. Aquilo de que

estávamos à espera por parte do CDS, partido responsável, era que viesse a esta Câmara discutir o Orçamento

do Estado. Mas não. Fala, genericamente, da economia, sem apresentar dados, sem apresentar alternativas,

sem apresentar soluções, dizendo um conjunto de banalidades — perdoe-me a minha opinião sobre a sua

intervenção.

Gostaria de conduzir o Sr. Deputado à mera apreciação de um indicador, e só um indicador, para não o

enfastiar, o do clima de confiança económica, que Portugal atingiu nestes anos de Governo do Partido Socialista,

suportado, é verdade, pelos partidos de maioria de esquerda.

Quanto às empresas, Sr. Deputado, gostaria de o convidar a visitar ou a revisitar todos os instrumentos, por

exemplo, na área fiscal, que permitem que as empresas tenham, hoje, maior capacidade de investimento e

maior capacidade de se capitalizarem, uma vez que, no vosso tempo, no tempo em que VV. Ex.as constituíam

uma maioria, as empresas só tinham uma alternativa: abandonarem a atividade e encerrarem.

Quanto à estabilidade, há um pensamento que gostaria de partilhar com V. Ex.ª: nós, no Partido Socialista,

nunca pedimos a nenhum parceiro que se subsumisse na sua participação política e cívica, tornando-se

meramente um capacho do maior partido deste arco governativo.

Portanto, a participação dos partidos de esquerda na formação de maiorias é consciente e de pluralidade,

tendo em conta a diferença de opiniões que é considerada por nós, no Partido Socialista.

Relativamente ao equilíbrio, e para concluir, é certamente o objetivo de qualquer Governo a obtenção de

equilíbrio, mas deve ser o primado da construção do exercício orçamental.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Contudo, este tem sido um objetivo não muitas vezes conseguido e, em

democracia, foi conseguido pela primeira vez, agora.

Quero desiludir o Sr. Deputado e a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, dizendo que contas certas foi mesmo no

nosso tempo, não tendo havido necessidade de recorrer sistematicamente a Orçamentos retificativos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Testa, está completamente enganado

em relação à minha pessoa e à minha postura, mas, quanto a isso, meu caro amigo, não há nada a fazer,…

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — É da vida!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … cada um é como cada qual.

Eu não serei, eventualmente — se calhar, na política, nenhum de nós o é —, a pessoa menos convicta ou

mais modesta do mundo, para usar a sua expressão, mas acho que uma qualidade fundamental não só minha

mas dos portugueses em geral, do nosso povo em geral, é a humildade.

Ora, eu procuro cultivar essa humildade e, portanto, está errado desse ponto de vista.

Protestos do PS, do BE e do PCP.

Sim, eu procuro cultivar a humildade e a democracia, que é quando uma pessoa está a falar não a vaiar,

ouvir o que ela diz,…

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Elogiar essa humildade…

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … ter capacidade de ouvir, ter capacidade de achar que a minha posição

é uma, a do Sr. Deputado é a contrária, mas que é o povo que decide quem é que deve, em cada momento, ter

razão e governar.

Protestos do PS.

Chama-se, a isso, ser radicalmente democrata. E eu sou radicalmente democrata, ao contrário dos senhores.

Portanto, meu caro Deputado Luís Testa, está enganado nessa matéria.

Protestos do Deputado do PS Luís Moreira Testa.

No entanto, digo-lhe o seguinte: o que está aqui em causa, obviamente, são visões diferentes; são visões

diferentes do País e são visões diferentes da economia.

O Sr. Deputado faz uma comparação em que, pela trigésima vez, a resposta será a clássica: o Sr. Deputado

não pode comparar as circunstâncias em que o Partido Social Democrata e o CDS tiveram de governar, depois

de o seu partido ter levado o País à bancarrota,…

O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — O que é que isso tem que ver com o equilíbrio?!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — … com as condições de governação que os senhores tiveram agora.

O que fizemos foi um trabalho extraordinário, o de tirar o País da bancarrota em que os senhores o puseram,

e eu tenho muito orgulho em, nesta bancada, ter apoiado esse Governo liderado por Passos Coelho e por Paulo

Portas.

O Sr. Luís Moreira Testa (PS): — Tem o senhor e mais quatro Deputados! Vimos ao que isso levou!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não tenho nenhum problema com isso, antes pelo contrário.

Diz o Sr. Deputado, e já ouvimos aqui o Partido Socialista várias vezes dizê-lo: «os senhores não têm

proposta, os senhores não têm ideia…». Não é verdade, Sr. Deputado. Não somos nós que temos de apresentar

o Orçamento, é o Governo, é o Sr. Primeiro-Ministro, é o Sr. Ministro das Finanças.

Num Orçamento nosso, toda a gente sabe qual seria a prioridade. Mais: mesmo nessa altura, mesmo nesse

Governo, nós tínhamos um programa faseado de baixa do IRC. Essa era a nossa aposta, tal como seria a de

agora: baixar os impostos para as empresas, lançar a economia, lançar o crescimento, menos impostos para as

empresas e para as famílias e apostar seriamente em funções essenciais de soberania. Foi o que eu disse da

tribuna.

O senhor tem outra ideia? Está no seu direito.

Já agora, também nos vai explicar como é que desta vez vai votar a proposta do PAN sobre o IVA, porque

essa também é uma pergunta interessante, designadamente para si, uma vez que o Partido Socialista votou os

13%, depois baixou para 6%. E agora? Será que o meu amigo está disponível para votar os 23%? Tenho as

maiores dúvidas, mas isso é o Sr. Deputado que tem de esclarecer, não sou eu.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do Grupo

Parlamentar do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Ex.mo Sr. Primeiro-Ministro, restantes Membros do

Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal é um dos países da União Europeia com uma maior proporção de

trabalhadores a auferir somente o salário mínimo nacional e um dos piores em mobilidade social, o que significa

que estas pessoas, apesar de trabalharem, vivem diariamente em esforço.

Falamos da realidade de mais de 10% da população, que se encontra em situação de pobreza, apesar de

estar empregada; falamos de uma em cada cinco pessoas que ganha o salário mínimo, fixado atualmente nos

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600 €; falamos, também, de 21% da população, ou seja, 2,2 milhões de pessoas, que se encontram em risco

de pobreza ou de exclusão social, com maior incidência nas crianças e pessoas idosas, maioritariamente

mulheres.

Antes que nos respondam que o desemprego baixou, recordamos ainda os dados divulgados hoje: Portugal

continua a ter a sétima maior taxa de desemprego da União Europeia, ao que se soma a precaridade dos atuais

laços de emprego e os salários baixos que são praticados, onde se inclui o chamado «ordenado médio», que

se aproxima do salário mínimo nacional, porque, na realidade, não há uma melhoria geral dos ordenados.

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, convidávamo-lo hoje a fazer um exercício fundamental, um exercício do dia a dia

de tantas pessoas, como, por exemplo, o de uma família monoparental, em que uma mãe, que trabalha, ganha

apenas 600 € e desses 600 € tem de pagar 300 € da renda de uma casa — valor cada vez mais difícil de

encontrar no arrendamento — e tem de disponibilizar outro tanto para a creche do seu filho, pois dificilmente

terá vagas nas opções públicas disponíveis. Entre tantas outras necessidades, o que sobra, então, para garantir

o pagamento da alimentação, da água ou da eletricidade, para que não caiam também em situação de pobreza

energética?

Parece uma realidade distante, mas, na verdade, não o é. Infelizmente, basta vermos os estudos realizados,

abrir o Telejornal ou contactar com a população para perceber o quão distante estamos da média europeia e

que, com 600 € por mês, Sr. Primeiro-Ministro, o orçamento dos portugueses, claramente, não tem um superavit.

O Sr. Primeiro-Ministro referiu há pouco a necessidade de combater as desigualdades, mas não nos

iludamos: a desigualdade de rendimentos está ligada à pobreza e ao desenvolvimento do País, cujas assimetrias

regionais ainda persistem, em particular no interior, despovoado, envelhecido e pobre.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, um Orçamento de «contas certas» terá de ser, necessariamente, um

Orçamento que presta contas, em primeiro lugar, aos seus principais credores, as pessoas,…

A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Exatamente!

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — … e não um Orçamento que reserva 600 milhões de euros para cobrir

os erros da gestão danosa que tomou de assalto a banca, mas que é tão pouco ambicioso a dar resposta às

reais necessidades da população, população esta que enfrentou o esforço que lhe foi pedido, sobretudo

aquando da intervenção da troica, que passou pelo aumento do desemprego e do congelamento de salários e

pensões, assim como das progressões nas carreiras, até aos dias de hoje.

Apesar do caminho que tem sido feito e que reconhecemos, um Orçamento equilibrado e com um excedente,

necessariamente, em matéria de combate à pobreza, tem de estar disponível para resgatar as pessoas desta

situação.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, a pergunta que hoje se impõe ao analisarmos este Orçamento, neste debate,

é a seguinte: quem é que vai ficar, realmente, para trás?

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente: — A Mesa não regista pedidos de esclarecimento, pelo que dou a palavra ao Sr. Deputado

André Ventura, do Chega, para uma intervenção.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: A única novidade deste

Orçamento é um namoro escondido, um namoro escondido entre o Bloco de Esquerda e o Governo.

O Sr. Primeiro-Ministro aqui, hoje, sorri para a bancada do Bloco de Esquerda, a bancada sorri para o Sr.

Primeiro-Ministro, finge-se, mais ou menos, que a coisa está difícil —…

Vozes do BE: — Isso são ciúmes!

O Sr. André Ventura (CH): — … não, não são ciúmes, que fique claro! — e a coisa vai andando. É apenas

para dizer que há uma espécie de um conflito latente, quando todos sabemos o resultado que vamos ter e quem

vão são os cúmplices da aprovação deste Orçamento do Estado!

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O Sr. Deputado pode pedir a quem quiser para visitar o que seja. Vá visitar uma bomba de gasolina e vai ver

o País real, se há mais impostos ou menos impostos; vá ver uma esquadra de polícia e vai encontrar polícias a

arranjar o jardim e com material comprado por eles. Essa é a melhor prova do País real que temos!

Mas este é também o tal Orçamento que — não sei se é a maior carga fiscal de sempre ou não, a ver vamos?!

— anunciava a grande luta contra a corrupção, que, afinal, desaparece miraculosamente, sem mais meios para

a Polícia Judiciária e sem grandes meios efetivos no combate a este triste fenómeno dos nossos dias. A retirada

do visto prévio do Tribunal de Contas a negócios de câmaras municipais — é bom que o País todo oiça, a

negócios de câmaras municipais — é algo que só pode envergonhar um país, numa altura em que se quer lutar

contra a corrupção e contra todos os seus fenómenos adjacentes.

Este é o Orçamento mais palavroso da história de Portugal porque, na verdade, não passa de um programa

de intenções sem qualquer intenção de ser cumprido e com a batuta deste Sr. Ministro das Finanças, que vai

restringir a 30 ou a 40 aquilo que tiver de ser cumprido.

Sr.ª Deputada Catarina Martins, não sei se é possível, ou não, viver de heranças — isso não é para eu decidir

e acho-a, até, uma expressão um pouco infeliz, no contexto histórico em que estamos. Mas há uma coisa que

sei sobre heranças: aqueles que aprovarem ou viabilizarem este Orçamento do Estado serão cúmplices da

maior e mais grave herança que este País vai ter nos próximos anos, que é uma crise económica gravíssima. E

a direita cá estará para ver e, infelizmente, cá estará para corrigir, novamente, os desvarios que este Governo

socialista nos tem levado a ter.

O Sr. Jorge Costa (BE): — Está a assumir-se um bocadinho mais! Já está a falar «laranjinha»!

O Sr. Presidente: — A Mesa não regista pedidos de esclarecimento, pelo que tem a palavra, para uma

intervenção, o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, da Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo,

Srs. Deputados: Não espanta ninguém que a Iniciativa Liberal vá votar contra este Orçamento, aliás, foi o

primeiro partido a anunciá-lo. Também não deveria espantar que o próprio partido que suporta o Governo vá

votar a favor, mas, na realidade, espanta-me.

Espanta-me que o Partido Socialista vá votar a favor deste Orçamento porque, se olharmos para os pontos

transversais das quatro agendas do Partido Socialista, expostas no Programa do Governo, verificamos que há

medidas que, acho, não têm absolutamente nada a ver com a resposta a essas agendas.

Dizem-se muito preocupados com a demografia, mas temos, basicamente, uma dedução de 14,5 € por mês,

acrescida à coleta de IRS para cada agregado familiar, o que penso que vai ajudar «imenso» as famílias a

decidirem ter os segundos e terceiros bebés!…

Dizem que estão muito interessados em criar melhor emprego, mas, em vez de baixarem o IRC para que as

empresas possam contratar mais e melhor, basicamente acusam os empresários de serem de fraquíssima

qualidade.

Introduzem o IRS Jovem, que reduz o IRS em três anos consecutivos no primeiro emprego. O impacto prático

desta medida é que estes jovens licenciados ou esses jovens em primeiro emprego terão um aumento líquido

no salário na casa dos 2,5%, em média, nesses três anos. Dois e meio por cento! Muitos deles estão a pensar

emigrar para ganhar o dobro, pagando metade dos impostos. Portanto, mais uma vez, vai fazer uma diferença

enorme!…

Além disso, esta proposta de Orçamento não apresenta qualquer medida que favoreça o aumento da

produtividade no tecido empresarial, que é só, talvez, o principal problema da nossa economia.

O PS diz-se muito preocupado com a desigualdade, que é outro dos pontos da sua agenda, mas aumenta

os impostos em praticamente todo o lado, sobretudo os impostos indiretos, em que já somos o quarto país na

zona euro com o peso dos impostos indiretos mais alto.

Diz-se preocupado com a coesão, mas, em relação ao IRC que vai aplicar ao interior, basicamente o que

muda é o valor da isenção, que passa de 15 000 € para 25 000 € em matéria coletável, o que, mais uma vez,

não vai fazer diferença nenhuma quanto à atratividade do interior em termos de investimento.

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Por último, a transição digital, que é um tema importantíssimo, mas, francamente, mesmo depois do discurso

do Sr. Primeiro-Ministro, não me lembro de nenhuma medida que diga diretamente respeito a isto. E tanto

haveria a dizer relativamente à qualificação das pessoas necessárias para fazer esta transição digital!

Portanto, até o PS deveria votar contra este Orçamento, se levasse a sério as suas próprias prioridades. Mas

não leva. Não leva, porque, na verdade, só há uma prioridade neste Orçamento. E a prioridade é apresentar o

superavit, é alguém ficar na História por apresentar o primeiro superavit da democracia.

E os argumentos são: «não podemos deixar fardos para as próximas gerações» e «é preciso baixar a dívida

nominal, antes de podermos voltar a crescer». Quem sabe, antes de virar a metade do século!?

O Governo diz que não quer deixar fardo, mas, ao mesmo tempo, não reforma a máquina do Estado — que

vai ser o maior fardo deixado às gerações que nos seguem —, não vai fazer uma reforma nos serviços públicos,

já se percebeu introduzindo concorrência e liberdade de escolha, o que vai ser um fardo no futuro.

O Governo diz que não quer deixar fardos, mas vai deixar uma despesa pública no final desta Legislatura,

que, de acordo com o Quadro Plurianual de Programação Orçamental, vai ser superior em 8300 milhões de

euros à que tivemos no ano passado. São mais 16% de despesa pública no fim desta Legislatura, a fazer fé

nesse quadro orçamental.

Quanto à dívida pública, é preciso dizer — aliás, já o disse aqui hoje — que baixar o rácio em relação ao PIB

é o que interessa e ele desce mais depressa, mais equilibradamente e com mais liberdade se crescermos mais

do que uns parcos 1,5% ao ano, a percentagem que este Governo prevê de crescimento durante a Legislatura.

Por isso, a nossa visão é outra: dar prioridade ao crescimento acreditando que as pessoas e as empresas

sabem melhor o que fazer ao seu dinheiro do que o Estado. E vamos apresentar, em sede de especialidade,

todas as propostas que possam aproximar este Orçamento e o País dessa visão.

Porque acreditamos nos portugueses, vamos apresentar alterações profundas no IRS; porque respeitamos

as empresas, vamos apresentar alterações igualmente profundas no IRC, a começar pela eliminação da

derrama e pela eliminação da prescrição do prazo dos prejuízos fiscais; porque nos interessa a transparência,

vamos propor reduzir os benefícios fiscais, absolutamente injustos, para os partidos e reforçar as verbas para o

Tribunal Constitucional, para que, finalmente, a entidade da transparência, a entidade das contas e o

financiamento dos partidos possam funcionar.

É esta a visão que nos distingue: enquanto o PS apresenta um Orçamento que insiste em controlar e limitar

as escolhas e a vida dos portugueses, a Iniciativa Liberal defende um Orçamento que aposte claramente no

crescimento que pessoas livres serão capazes de gerar.

Este Orçamento não é nada disso e, portanto, iremos votar contra.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a Mesa não regista pedidos de esclarecimento à sua intervenção.

Para uma intervenção pelo Governo, tem a palavra o Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro

Nuno Santos.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação (Pedro Nuno Santos): — Ex.mo Sr. Presidente da

Assembleia da República, Sr.as e Srs. Deputados: O Orçamento é um instrumento fundamental de política para

o Governo. É através dele que traduzimos a nossa vontade em escolhas políticas concretas. Mas o Orçamento

é também o momento em que, com base nos nossos princípios e valores, refletimos sobre o que dá verdadeiro

sentido ao nosso trabalho de representantes do povo.

Os objetivos do nosso trabalho são simples: aumentar a liberdade de todos e não apenas de alguns, elevar

a dignidade do nosso povo e valorizar quem trabalha e cria riqueza.

Este é um Orçamento que aumenta o investimento em infraestruturas públicas, em habitação pública e em

serviços públicos de transporte. Com ele, procuramos acelerar a execução de uma nova geração de políticas,

um novo ciclo de investimentos estruturantes da nossa vida coletiva. Este ciclo será longo e não terminará no

quadro desta Legislatura nem da próxima, mas este é o momento em que precisamos, todos, de tirar lições

sobre o passado.

A primeira lição é sobre as consequências de opções tomadas por diferentes Governos ao longo da nossa

história recente. Por ação ou omissão, muitas foram opções erradas.

Hoje, está à vista de todos que as famílias estão a pagar bem caro as décadas de falta de aposta na ferrovia

ou na habitação pública. O desinvestimento na ferrovia não representou apenas a desvalorização de um meio

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de transporte que alguns, de forma míope, entenderam pertencer ao passado e não ao futuro. Representou,

também, o desinvestimento nos trabalhadores e nas suas famílias, a indiferença para com milhares de mulheres

e homens que dependem do comboio todos os dias para ir trabalhar, para ir à escola, para ir ao hospital ou

simplesmente para ir passear. Mulheres e homens para quem o transporte coletivo representa um instrumento

de acesso democrático ao espaço público — um instrumento de liberdade.

Da mesma forma, a ausência de investimento nas políticas de habitação resultou num parque habitacional

público de dimensão residual e, ao mesmo tempo, hipotecou a emancipação de jovens casais e impediu muitas

famílias de viverem na terra onde trabalhavam ou queriam viver.

Este duplo esquecimento da ferrovia e da habitação pública cavou mais o fosso entre aqueles que podem

viver e desfrutar das cidades e aqueles que, com menos dinheiro, foram obrigados a viver longe dos centros

urbanos; aqueles que, sem rendas a preços acessíveis, foram empurrados para a compra de casa a crédito;

aqueles que, sem comboios suficientes, são forçados a trazer o carro para vir trabalhar; ou aqueles que, sem

rendimentos para ter um carro, não têm mesmo outra alternativa aos transportes públicos.

A conclusão é fácil de tirar: onde há investimento público a menos na habitação e na ferrovia, há

desigualdades a mais no acesso a casas, na qualidade de vida e no usufruto do espaço público que as cidades

são e devem continuar a ser.

Sr.as e Srs. Deputados, podemos tirar uma segunda lição importante, agora sobre a progressiva convergência

a que assistimos sobre os fins destas políticas.

Hoje, apesar do que separa os partidos, a grande maioria parece aceitar ser imperativo melhorar a qualidade

de vida das famílias, facilitar a mobilidade dentro e entre as cidades, promover o transporte público,

descarbonizar a economia, proteger o ambiente e acelerar a transição energética.

Quando pensamos em investimentos estruturantes, daqueles que vão marcar o território e condicionar a

nossa vida coletiva por muitas décadas, esta é uma convergência importante. É essencial saber aproveitá-la

bem.

Mas parece haver hoje uma terceira lição, relativa a um aparente consenso recente sobre a importância do

investimento público.

Hoje, todos exigem investimento público nos hospitais, nos caminhos de ferro, nas estradas, nas escolas,

nas esquadras, nos quartéis, nos transportes. Mas, bem sabemos, nem sempre foi assim. Há ainda pouco

tempo, houve quem se tenha esforçado por diabolizar o investimento público. E quem o fez contribuiu para travar

projetos essenciais para o nosso desenvolvimento coletivo.

Aplausos do PS.

Precisamos de ser muito claros para que as pessoas entendam o que está aqui em debate.

Para nós, socialistas, o investimento público é uma tradução óbvia dos nossos princípios e valores. É a

extensão da ideia de que uma comunidade é feita de laços de dependência mútua entre os seus membros, laços

visíveis e invisíveis que nos ligam uns aos outros e criam direitos e deveres para todos nós. Tal como uma

comunidade não resulta da soma de indivíduos isolados, nenhuma comunidade vive só de direitos. Pelo

contrário: uma comunidade depende do cumprimento de deveres, do respeito de obrigações, da prestação de

tributos à coletividade.

Por isso, não podemos, com seriedade, dizer aos portugueses que queremos mais médicos, enfermeiros,

polícias, professores, hospitais, centros de saúde, tribunais, estradas, comboios, casas, transportes e energia

mais barata e, ao mesmo tempo, exigir que quem pode contribuir contribua menos.

Aplausos do PS.

Atenção! Não me interpretem mal: não estou a falar de equilíbrio orçamental. Estou a falar do equilíbrio entre

direitos e deveres. Este é um debate entre os direitos que queremos ter numa democracia avançada e a forma

que encontramos para os financiar.

Por isso, dizemos aos portugueses com honestidade: para financiar mais hospitais — os nossos hospitais —

, melhores escolas — as nossas escolas —, mais comboios — os nossos comboios —, precisamos que cada

um contribua de forma justa, em função da sua capacidade.

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O Sr. AndréVentura (CH): — Mais impostos!

O Sr. MinistrodasInfraestruturasedaHabitação: — E, se precisamos que todos prestem o seu tributo

em função do que podem pagar, não é para financiar o Estado, esse monstro distante que alguns gostam de

evocar. Não! É para financiar a comunidade como um todo, o conjunto de todos os seus membros.

Aplausos do PS e do Deputado do BE José Manuel Pureza.

Os hospitais, as escolas, os comboios são nossos, são dos portugueses, não apenas porque os pagam, mas

também porque os usam todos os dias para organizar a sua vida. Mas quando esses serviços ou essas

infraestruturas falham, é a vida das pessoas que fica desorganizada. E devemos, com humildade, saber

reconhecer quando tal acontece. Reconhecer com humildade, sermos capazes de nos colocar na posição dos

outros é o primeiro passo para, depois de perceber as causas e as razões, poder oferecer respostas e permitir

ao povo organizar-se nas soluções dos seus problemas. E é precisamente de respostas e de soluções que trata

este Orçamento.

Na habitação, depois de uma Legislatura em que criámos as bases de uma nova geração de políticas de

habitação, em que lançámos um programa para pôr fim às condições indignas em que vivem, ainda, dezenas

de milhares de famílias, em que criámos incentivos fiscais ao arrendamento a preços acessíveis e em que o

Parlamento aprovou, pela primeira vez, uma lei de bases da habitação, vamos agora partir para uma nova fase.

Aplausos do PS e do Deputado do BE José Manuel Pureza.

Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.

Estejam à vontade! Não deixaram falar o Deputado Duarte Marques e agora temos de levar com ele,

sistematicamente, ao longo das nossas intervenções!

Aplausos do PS e do Deputado do PSD Duarte Marques.

Uma fase de investimento, de reabilitação e de construção de um parque público de habitação a preços

acessíveis.

Usaremos, de forma inteligente, os recursos que já são públicos: ora reabilitando imóveis do Estado há muitos

anos devolutos, ora recorrendo a terrenos públicos para promover a construção de nova habitação pública —

seja por promoção direta, através da administração central ou autarquias, seja por promoção indireta, através

de cooperativas de habitação ou de privados.

Este ano lançaremos, assim, a primeira pedra de um parque habitacional público — um parque que permita

ao Estado ter uma verdadeira política de habitação, como acontece já, há várias décadas, em muitos países

europeus.

O Sr. André Ventura (CH): — Sempre a pagar mais impostos!

O Sr. MinistrodasInfraestruturasedaHabitação: — Quem pode mais, deve contribuir mais, para que

todos, enquanto comunidade, consigamos ter uma vida decente!

O Sr. André Ventura (CH): — Mais ainda?!

O Sr. MinistrodasInfraestruturasedaHabitação: — Sr.as e Srs. Deputados, se todos queremos serviços

e infraestruturas de qualidade, não é suficiente defender que precisamos de impostos para os pagar. É preciso

algo mais: defender uma economia que produza cada vez mais e cada vez melhor, porque só essa economia

permitirá pagar os investimentos de que a comunidade precisa.

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Nos últimos anos, muitos criticaram o Governo do Partido Socialista por estar mais interessado em gastar do

que em poupar, mais interessado em distribuir do que em produzir.

Hoje, convenhamos, é mais difícil acusar de despesismo o Governo que obteve o défice mais baixo da nossa

democracia. Mas muitos ainda insistem na ideia de que os socialistas não sabem fazer as reformas estruturais

criadoras de riqueza. Eu compreendo: quem pensa que o crescimento da economia depende da redução cega

de impostos sobre as empresas mais lucrativas terá sempre dificuldades em perceber como as nossas reformas

desenvolvem o País.

Aplausos do PS.

Para nós, fazer reformas não é privatizar, liberalizar, desregular — e depois ficar à espera que os milagres

aconteçam.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. MinistrodasInfraestruturasedaHabitação: — Para nós, reformas são aquelas que mobilizam os

setores público, privado, social e académico e criam as condições para que estes cooperem entre si.

O Sr. JoãoCotrimdeFigueiredo (IL): — Isso é que é pensamento mágico!

O Sr. MinistrodasInfraestruturasedaHabitação: — E aquilo que o Governo anterior fez e o presente

Governo continuará a fazer na CP (Comboios de Portugal) é um bom exemplo disso.

Depois de termos atribuído a absoluta prioridade à promoção da mobilidade coletiva; depois de termos

começado a recuperar o número de trabalhadores da CP e da EMEF (Empresa de Manutenção de Equipamento

Ferroviário); depois de termos assinado um acordo de empresa na EMEF, ao fim de 10 anos, e de estarmos

perto de assinar na CP, ao fim de 20; depois de, há um mês, o Estado ter assinado um contrato de serviço

público com a CP, pela primeira vez na história; e depois de, há uma semana, a CP e a EMEF terem voltado a

ser, um quarto de século depois, uma só empresa,…

O Sr. DuarteMarques (PSD): — Não votes mais no Pedro Marques!

O Sr. MinistrodasInfraestruturasedaHabitação: — … iremos, na próxima semana, reabrir as oficinas

de Guifões, em Matosinhos — um espaço fechado há quase uma década.

Aplausos do PS e do Deputado do PS Duarte Marques.

É nesse espaço que a CP está a trabalhar na recuperação de dezenas de comboios que estavam

encostados. Imaginem só: automotoras e carruagens que ainda hoje são usadas em países como a Suíça ou a

França e que cá estavam abandonadas, ao sol e à chuva.

Mas será também em Guifões que nascerá este ano o centro tecnológico ferroviário — o resultado de um

trabalho de cooperação exemplar entre universidades e empresas do setor público e privado. Este centro vai

permitir a Portugal recuperar capacidades tecnológicas e industriais que as nossas empresas já tiveram na

fabricação de comboios, num passado recente.

Este é um exemplo — só um exemplo — do que é preciso fazer para desenvolver Portugal: identificar

problemas e necessidades, juntar parceiros públicos e privados para cooperarem na procura de soluções e

aproveitar o que já hoje sabemos para aprender a fazer produtos e serviços cada vez mais sofisticados, amanhã.

Será com respeito pelo povo português, com humildade no exercício do nosso mandato e com orgulho nas

nossas capacidades coletivas para superar desafios que enfrentaremos o atual ano e a missão de construirmos

um País mais justo e melhor para todos.

Aplausos do PS e do Deputado do BE José Manuel Pureza.

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O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, inscreveram-se nove Srs. Deputados para pedir esclarecimentos. Como

pretende responder?

O Sr. MinistrodasInfraestruturasedaHabitação: — Em dois grupos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Então, um primeiro grupo de cinco Srs. Deputados e um segundo grupo de quatro Srs.

Deputados.

Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do Grupo Parlamentar do Bloco de

Esquerda.

A Sr.ª IsabelPires (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas, Sr. Ministro Pedro Nuno Santos,

falou de um novo ciclo para o serviço público de transportes e isso, para o Bloco de Esquerda, é relevante,

nomeadamente na área da ferrovia, mas, também nesta área dos transportes públicos e, especialmente, na

questão da ferrovia, se verifica que a opção pelo superavit é uma opção errada, porque os transportes públicos

devem ser vistos como prioridade; no entanto, demasiada coisa está atrasada e, como bem sabe, estas matérias

não sobrevivem apenas com intenções.

Teremos oportunidade de questionar o Sr. Ministro do Ambiente sobre aquilo que, na prática, é um

desinvestimento no programa de apoio à redução tarifária nos transportes, mas, na área da CP, da ferrovia e da

infraestrutura ferroviária, esta proposta de Orçamento deixa algumas preocupações.

Sobre o Ferrovia 2020, foi dito aqui, no Parlamento, pelo Presidente da Infraestruturas de Portugal (IP) que

os prazos que foram apresentados em 2016 eram otimistas demais — «otimistas» foi a palavra utilizada pelo

Presidente da IP —, o que não nos deixa tranquilos quanto aos novos prazos apresentados, nomeadamente no

Orçamento do Estado.

Quanto ao material circulante, tantos problemas e ainda nem sequer foi votada esta proposta de Orçamento.

Já se sabe que os barcos da Transtejo demorarão, pelo menos, um ano mais do que o previsto, as 22

automotoras da CP, sempre tão referidas pelo Ministro e pelo Primeiro-Ministro, viram o concurso impugnado

mesmo no final de 2019, tal como o de 14 unidades triplas para o Metro de Lisboa.

Estes são alguns dos exemplos em que podemos perceber que este não é, de facto, o melhor Orçamento do

Governo, como se quer apelidar, e que mantém alguns riscos para a prestação do serviço público, porque essa

deve ser, como bem disse, a grande preocupação.

Identificou, na sua intervenção, precisamente, a necessidade de respostas urgentes, mas a população

necessita de respostas urgentes na mobilidade, nomeadamente na mobilidade ferroviária, respostas que já

deviam, em alguns casos, ter sido dadas anteriormente.

Portanto, a questão que se coloca é a de saber de que forma está o Governo disponível para trabalhar em

matéria de mobilidade e de transportes públicos, para que se possa garantir que as obras necessárias na ferrovia

e na vinda de material circulante, com tantos problemas já anunciados, não vão continuar a ter os atrasos que

se viram até agora.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — É a vez de o Sr. Deputado Cristóvão Norte, do Grupo Parlamentar do PSD, pedir

esclarecimentos.

Faça favor.

O Sr. CristóvãoNorte (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros

do Governo, Sr. Ministro Pedro Nuno Santos, eu não tenho razões para descrer das suas boas intenções, não

fora o caso de uns lugares à sua direita se encontrar um Sr. Ministro, cognominado Ronaldo das Finanças, que,

no fim de contas, entre outras coisas, beneficia desse epíteto à custa do aumento da carga fiscal, da degradação

dos serviços públicos e a expensas de cortes brutais no investimento público.

E quando o Sr. Primeiro-Ministro anuncia, tal como fez hoje, que este é um Orçamento de continuidade, no

que respeita ao investimento em obras públicas e infraestruturas, isso traz-nos as maiores reservas e as maiores

preocupações.

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É que o truque, a encenação é sempre a mesma e tem dois passos fundamentais: o primeiro são as

proclamações como a do Sr. Ministro a respeito da importância determinante do investimento público e a sua

consequente previsão orçamental; o segundo, também necessário para que seja concluído com êxito esse

engano, é o investimento público previsto e não realizado. Vejamos o que aconteceu no que respeita à quebra

do investimento público na administração central: em 2016, 652 milhões de euros; em 2017, 878 milhões de

euros; em 2018, 876 milhões de euros; e, em 2019, 1183 milhões de euros. Ou seja, em quatro anos, foram

3587 milhões de euros a menos em investimento público. E, em 2019, no ano passado, quando já não havia

problemas, quando já ninguém se podia esconder invocando os projetos que não estavam feitos ou a má

negociação dos fundos comunitários, previram um crescimento de 48% no investimento público. Sabe quanto é

que se realizou até novembro, Sr. Ministro? Realizou-se 2,8%! E, naquilo que está sob a sua égide, estava

previsto um aumento de 19%, mas, até novembro de 2019, registou-se um decréscimo de 1,3%. Por isso, o Sr.

Ministro está a apelar demasiado à nossa fé, para que tenhamos a convicção de que o Orçamento do Estado

para 2020 vai ser cumprido, porque nenhum de nós, quatro anos volvidos, com esta encenação e com estes

truques, pode confiar em que tal será o caso.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — E poder-se-ia dizer que isto não importa, não tem custos na vida das

pessoas. Mas tem! Tem custos nos comboios que não passam, nos barcos que não navegam, nas taxas

miseráveis de execução da Ferrovia 2020, nas escolas que não são recuperadas, na emergência nacional que

é a saúde, na criação de riqueza, na economia, num modelo de consolidação que seja sustentável.

Portugal tem, hoje, um investimento público muito abaixo da média europeia. E se em momentos de

desespero orçamental tal é indesejável mas compreensível, aquilo que não é compreensível é que, volvidos

quatro anos, com maior carga fiscal, com maior receita do Estado, com todas essas circunstâncias e com ventos

favoráveis para a economia portuguesa talvez sem precedentes neste milénio, o investimento público que temos

não consiga estar ao nível do investimento público realizado em 2015.

Assim sendo, Sr. Ministro, desta vez, vou colocar-lhe uma questão ao contrário. Ou seja, desta vez, não lhe

pergunto o que vai fazer em 2020, pergunto-lhe, sim, o que é que o Governo vai deixar de fazer em relação

àquilo que tem previsto no Orçamento do Estado. Isto é, quantas centenas de milhões de euros não serão

investidos neste ano à custa do «Ronaldo das Finanças», à custa deste fenómeno que todos vangloriam, mas

que põe em causa os serviços públicos e o investimento público necessário para que a economia cresça.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pereira.

O Sr. Carlos Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Pedro Nuno Santos, quero fazer-lhe uma pergunta,

mas, antes disso, gostaria de deixar quatro notas que podem ser consideradas de balanço, tendo em conta o

adiantado do dia e tudo aquilo que ouvimos, sobretudo tudo aquilo que ouvimos à direita deste Hemiciclo e que

merece algumas observações.

A primeira nota tem a ver com aquilo a que, se me permitem, chamarei de «labirinto de contradições», de

que ouvimos falar durante o dia desse lado direito do Hemiciclo. Ora, a melhor forma de clarificar este «labirinto

de contradições» é lembrar o óbvio, aliás, já aqui lembrado várias vezes, que é o facto de esta direita do

Parlamento insistir na ideia de que é possível ter mais investimento público e ter menos impostos.

Protestos do Deputado do PSD Cristóvão Norte.

Esta ideia corre um grave risco e um grave problema: é que, como alguns dos senhores saberão, a economia

não é uma batata, nem é uma salada de brócolos, tem regras. E a verdade é que não é possível, como os

senhores dizem, aumentar o investimento, baixando todos os impostos, como diz, designadamente, o Deputado

Rui Rio, que quer baixar o IRS, o IRC, o IVA, e por aí fora. Esta é a primeira nota que gostaria de deixar.

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A segunda nota tem a ver com aquilo que o Sr. Ministro Pedro Nuno Santos referiu na sua intervenção, uma

espécie de ato de contrição da direita, que é a circunstância de a mesma chegar finalmente ao debate sobre as

virtudes do investimento público. Nós sabemos — e o Sr. Ministro Pedro Nuno Santos referiu-o — que nem

sempre foi assim. O PSD nem sempre veio a esta Assembleia falar sobre as virtudes do investimento público.

Protestos do Deputado do PSD Cristóvão Norte.

No entanto, sobre este aspeto, termino dizendo: ainda bem, são bem-vindos! Gostamos dessa vossa

perspetiva sobre a bondade do investimento público para a economia, não desdenhamos isso.

Aplausos do PS.

A terceira nota tem a ver com a falácia que a direita também tem vindo a expor neste Plenário, uma falácia

que, designadamente, o Sr. Deputado Cotrim de Figueiredo tentou, de alguma forma, demonstrar, quando

procurou encontrar um nexo de causalidade entre a carga fiscal e o crescimento. Ora, devo dizer-lhe, Sr.

Deputado João Cotrim de Figueiredo, que não viu bem aquilo que foram os resultados. De facto, falando já da

Legislatura do Partido Socialista, devo referir que, em 2016, o crescimento económico foi de 2 pontos

percentuais e a carga fiscal foi de 36,6% e que, em 2018, o crescimento foi de 2,4% e a carga fiscal foi de 37,2%.

Ou seja, esse nexo de causalidade que o Sr. Deputado quer encontrar não existe.

Aplausos do PS.

Mas vou dar-lhe uma informação mais consistente — e talvez até do agrado do PSD. Em oito anos, desde

2011 até 2018, sabem qual foi o ano em que a carga fiscal foi mais baixa? Foi em 2012, de 34,4%. E sabem o

que aconteceu ao produto interno bruto do País? Teve um tombo de 4,1%!

Aplausos do PS.

Portanto, os Srs. Deputados têm de clarificar esse nexo de causalidade de que falam.

A quarta e última nota tem a ver com o balanço. Há uma coisa que são os factos, Srs. Deputados. E os factos

não mentem. O investimento público, quando os senhores eram Governo, caiu, em 2011, 35,2%, em 2012,

32,3%, em 2013, 10% e, em 2014, 6,9%. Portanto, o investimento público caiu, nessa altura, sempre.

Protestos do Deputado do PSD Cristóvão Norte.

O esforço de crescimento do investimento público tem sido feito por este Governo, e vamos continuar a fazê-

lo, como se demonstra neste Orçamento.

Aplausos do PS.

Finalmente, vamos à ferrovia e àquilo que a este propósito gostaria de perguntar ao Sr. Ministro Pedro Nuno

Santos. Podemos dizer — e acho que é totalmente legítimo e que não me engano — que o Sr. Ministro corre o

risco de ser o rosto da revolução da ferrovia em Portugal. Nós fomos confrontados, ao longo de muitos anos,

com desinvestimentos sucessivos na ferrovia…

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Ah!

O Sr. Carlos Pereira (PS): — … por parte de todos os Governos, conforme referiu o Sr. Ministro. Felizmente,

hoje, temos um plano, um plano exigente, temos determinação e temos protagonistas para desenvolver esse

plano.

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Como é evidente, sabemos que nem tudo são rosas e que há obstáculos. Mas, conforme o Sr. Ministro

referiu, há ventos muito favoráveis, que podem ser apreciados pelo País e que têm a ver com este esforço em

relação à ferrovia.

A pergunta que gostaria de fazer-lhe, Sr. Ministro, é se há ou não condições para o País apostar num cluster

ferroviário que lhe permita não só responder às necessidades de Portugal em termos de ferrovia e de transportes

mas também diversificar a nossa economia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Maria Manuel Rola,

do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Sr. Presidente Sr. Ministro, parece que nós os dois concordamos em que

garantir habitação para quem vive dos seus rendimentos, em Portugal, é essencial. Aliás, eu poderia retomar o

exercício de memória que fez e recuar às propostas da nova geração de políticas de habitação, mas desconfio

que o Governo que as propôs, assim como aquelas metas, já não mora aqui. Estamos, de facto, muito longe

dos 170 000 fogos prometidos. Não vou tão longe para mostrar o malabarismo, vou apenas rever o último ano

e as metas mais recentes, porque nem estas batem certo com a discussão que estamos aqui a ter hoje.

Tenho aqui uma página do Relatório do Orçamento do Estado para 2019, onde, relativamente ao Programa

1.º Direito – Programa de Apoio ao Acesso à Habitação, se propõe, para 2020, uma verba de 126 milhões de

euros, ou seja, não o dobro de 40 milhões de euros, previstos para 2019, mas, sim, o triplo, e bem, dos 40

milhões de euros.

Depois, temos também, de setembro do ano passado, o impacto financeiro das medidas do Programa

Eleitoral do Partido Socialista, onde se fala de um programa que inscreve um parque habitacional público que

valerá 150 milhões de euros/ano.

Ora, um mais um são dois — e não um! E, nas contas certas, o investimento para 2020, no âmbito destes

dois programas, deveria ser de 276 milhões de euros. Mas não é, porque, neste momento, estão apenas inscritos

150 milhões de euros. E se acrescentarmos programas que foram varridos da proposta de lei do Orçamento do

Estado, como o da Porta 65 Jovem, este investimento deveria ascender pelo menos a 294 milhões de euros.

Volto a relembrar que o que está proposto são 150 milhões de euros e 294 milhões de euros é o dobro, apenas

o dobro. Era essa a primeira pedra, mínima, necessária para darmos a pedra de toque no lançamento das

políticas habitacionais, mas ela também não mora neste Orçamento do Estado.

A pergunta que deixo ao Sr. Ministro é esta: ela vai passar a morar? As propostas do Partido Socialista e

deste Governo vão passar a morar no Orçamento do Estado, relativamente às políticas de habitação?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para terminar este primeiro grupo de pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Filipa Roseta, do Grupo Parlamentar do PSD.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, em matéria de habitação, nos últimos quatro

anos, o Governo socialista produziu compulsivamente programas cujo efeito prático, até hoje, o Presidente da

República veio dizer que duvida que venham a ter algum sucesso.

Este Governo cavalgou a subida especulativa do mercado imobiliário com impostos e foram precisamente

estes que vieram contribuir para pintar a fábula das contas certas que nos tentam, e continuam a tentar, impingir.

Este Governo demitiu-se da responsabilidade de tratar das pessoas que estavam a ficar de fora do acesso à

habitação, empurrando essa responsabilidade para os privados.

Este Governo deixou os edifícios do Estado — e isto foi o mais grave e o Sr. Ministro falou nisso — vazios,

abandonados e a ruir, durante quatro anos, com pessoas à procura de casa e sem sítio para morar.

Protestos do Ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos.

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Isto, com três anos especulativos, ou seja, com o mercado a crescer a mais de 10%, nos últimos três anos

— o tal mercado que, agora, está a crescer especulativamente.

Este Governo não fez nada para enfrentar o monstro da burocracia, que é o terreno fértil da corrupção e que

é realmente o grande entrave ao crescimento económico neste País.

Aqui chegados, o Governo anuncia um enorme programa de obras públicas, chamado «Fundo Nacional de

Reabilitação do Edificado» (FNRE), para o qual se propõe, como foi anunciado pelo País, a atribuição de mais

de 1000 milhões de euros, que vão sair das pensões dos portugueses — é preciso dizer isto com muita, muita

calma.

Os 1000 milhões de euros para o programa de apoio ao acesso à habitação, o tal por que a Sr.ª Deputada

clamava, vão sair das pensões dos portugueses, do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social

(FEFSS). Ora, este Fundo vai ser gerido pela FUNDIESTAMO.

Sr. Ministro, já o ouvi dizer que este Fundo não ia seguir o Código dos Contratos Públicos. Porém, o artigo

104.º da proposta de lei que hoje nos apresenta diz que o mesmo Fundo vai ter de observar princípios gerais de

contratação pública. Portanto, fico na dúvida sobre o que isto quer dizer.

Por isso, Sr. Ministro, pergunto: o Fundo Nacional de Reabilitação do Edificado segue ou não segue o Código

dos Contratos Públicos? Esta é a minha primeira pergunta.

Com a crise imobiliária que vivemos em 2008, com a bolha imobiliária que rebentou nesse ano, em que se

esfumaram fundos de pensões por todo o mundo, parece-lhe inteligente depositar todas as esperanças no nosso

programa de habitação? É que são mais de 1000 milhões de euros — já ouvi falar em 1400 milhões e em 1700

milhões — que saem do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social. Estes são dados da

FUNDIESTAMO, portanto não é uma invenção, está na famosa Resolução do Conselho de Ministros. Vejam

todos a Resolução do Conselho de Ministros n.º 48/2016.

Pergunto: parece-lhe inteligente apostar todo o dinheiro das pensões dos portugueses em habitação, quando,

em 2008, desapareceram fundos de pensões por esse mundo fora?

Primeiro, acha bem que o grosso do dinheiro venha das pensões? Segundo, o Fundo Nacional de

Reabilitação do Edificado vai, ou não, cumprir o Código dos Contratos Públicos?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder a estes pedidos de esclarecimento, o Sr. Ministro das

Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Srs. Deputados, agradeço as questões que me

colocaram.

Em nenhum momento verão o nosso Governo esconder ou negar a realidade que enfrentamos.

Risos do PSD.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — As gargalhadas são merecidas!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Temos perfeita consciência das dificuldades que os

portugueses e as famílias portuguesas enfrentam no que diz respeito ao serviço ferroviário e ao transporte

ferroviário.

O Sr. Duarte Marques (PSD): — Isso é agora!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Foram décadas em que nós e a principal bancada

da oposição — que se faz ouvir muito —, coletivamente, em conjunto, fomos desinvestindo sucessivamente na

ferrovia. Infelizmente, não conseguiremos inverter décadas de desinvestimento na ferrovia em meia dúzia de

anos. Infelizmente, não conseguimos.

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Temos um parque de material circulante com comboios com 50, 60, 70 anos a circular em Portugal e, neste

momento, temos uma afluência recorde ao serviço ferroviário. Felizmente, a medida do PART (Programa de

Apoio à Redução Tarifária nos Transportes Públicos) teve resultado e só na CP temos 40% a mais de procura.

Temos consciência dos nossos problemas — problemas no material circulante e uma maior procura — e,

obviamente, à pressão que sofríamos antes, isto adiciona muito mais pressão sobre o serviço. Temos total

consciência e respeito por quem todos os dias tem de apanhar um comboio, na Linha de Sintra ou na Linha de

Cascais, para ir trabalhar, e enfrenta muitas vezes a dificuldade de que o comboio apareça ou chegue a horas.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Eu! Eu!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Se há alguém que tem consciência disto somos nós.

Agora, estamos a tentar dar resposta a este problema grave, resultante de décadas de desinvestimento. Aquilo

que fizemos e que outros também poderiam ter feito, mas não fizeram, foi olhar para o nosso parque material,

perceber que tínhamos dezenas — repito, dezenas! — de comboios encostados e pegar neles, repará-los e

colocá-los a circular.

Na próxima semana, vamos inaugurar a fábrica em Guifões e todos terão oportunidade de ver alguns

comboios já recuperados e prontos a ser «injetados». É assim que trabalhamos: com humildade, com

honestidade, perante as dificuldades que temos, mas a dar tudo, com os recursos que o País tem.

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do PSD Cristóvão Norte.

Não ouvirão nunca, da nossa parte, negar os atrasos que temos no Ferrovia 2020. Temos atrasos no

investimento público. O grande exercício que todos deveríamos estar a fazer é sobre as razões de termos

atrasos, pois só conseguiremos dar resposta aos nossos problemas se formos capazes de ir para lá de os

identificar.

Protestos do Deputado do PSD Rui Silva.

Se conversarem com alguns dos autarcas do vosso partido, perceberão rapidamente quais são as

dificuldades que hoje enfrentamos, em Portugal, para conseguirmos que o investimento público cumpra os

prazos e tenha o ritmo de que todos precisamos e pelo qual o povo português anseia.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Os outros não tinham razões, só vocês é que têm!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Ninguém está a dormir, à espera, sem fazer nada!

Nós estamos a trabalhar!

O Sr. André Ventura (CH): — Há quantos anos?!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Mas, se quisermos dar resposta, temos de perceber

o que é que aconteceu. Em 2008, tivemos uma crise financeira e económica profunda que destruiu o nosso

setor da construção.

Protestos da Deputada do PSD Filipa Roseta.

A recuperação desse setor demora. Está a acontecer, mas demora e temos muita dificuldade em obter

resposta, seja na fase de projeto, seja na fase de empreitada. Temos atrasos na fase de projeto e na fase de

empreitada, ou seja, não é o Estado que se está a atrasar.

Compreendemos as dificuldades que o nosso setor ainda enfrenta, mas temos de ter a humildade e a

seriedade de apresentar todos os elementos no nosso debate.

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No Estado, tal como nas autarquias, também temos concursos vazios. Enfrentamos — e bem! — todo um

processo de contratação pública, de fiscalização e monitorização do exercício das nossas funções, que os

privados não têm de seguir, o que, obviamente, aumenta os constrangimentos. Temos impugnações e a

responsabilidade não é nossa, é um direito de quem concorre.

Protestos do CH.

Todos estes momentos têm impacto no investimento público e, portanto, trabalharemos para que o Ferrovia

2020 esteja executado até 2023. Com dificuldades, com atrasos, mas sempre com muito empenho e com muita

seriedade na forma como enfrentamos o nosso trabalho.

Aplausos do PS.

Não posso deixar de dar uma nota sobre uma questão que o Sr. Deputado Carlos Pereira colocou, porque

referiu uma forma errada em relação ao modo como temos trabalhado, durante tantos anos, no nosso País.

Quando temos uma necessidade, que neste caso é de material circulante, o que fazemos sistematicamente,

seja neste setor ou noutros, é aquilo que sabemos fazer muito bem, que é importar. O que fazemos é comprar,

importar, sem que isso tenha consequência na nossa economia e na nossa indústria. Ora, o que queremos é

que o investimento e o esforço que fazemos em material circulante tenha consequências na nossa economia.

Há condições para um cluster ferroviário?! Nós já temos um cluster ferroviário, já temos empresas a trabalhar

no setor, o que queremos é que elas também trabalhem para acorrer à procura do Estado português, e não nos

limitarmos a ser compradores a outros países.

O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Só faltam os comboios! Temos tudo menos os comboios!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Quanto à habitação, Sr.as Deputadas, esta é outra

área em que, infelizmente, não se investiu durante anos. Tínhamos um instituto cuja missão era a de alienar

património público. O que estamos a fazer, e já o começámos na Legislatura anterior, é a recuperar uma política

pública de habitação que em Portugal não existia. Nós fizemos isso!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Aquilo que começámos na Legislatura anterior e que

queremos continuar é a construção de uma verdadeira política pública de habitação, que, infelizmente, não

existia no nosso País. Antes vendia-se património e agora queremos criar um parque público, reabilitar o nosso

património, reabilitar os nossos terrenos, porque esta era outra falha do nosso País — dezenas de milhares de

imóveis públicos encostados e terrenos públicos por aproveitar. Queremos colocar o património do Estado ao

serviço da nossa população.

A Sr.ª Deputada Filipa Roseta está enganada.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, tem mesmo de concluir.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Então, concluo, Sr. Presidente, e continuarei esta

resposta mais tarde.

O Sr. Presidente: — Este debate tem regras restritas, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Peço desculpa, Sr. Presidente. Continuarei a seguir,

então.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, tem mais quatro inscrições para pedidos de esclarecimento, sendo que o

primeiro a fazê-lo será o Sr. Deputado Hugo Pires, do Grupo Parlamentar do PS.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Hugo Pires (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e

Srs. Deputados, Sr. Ministro, o problema que vivemos hoje na habitação não é só das classes mais

desfavorecidas. A falta de habitação a preços justos e acessíveis atinge os nossos jovens, os nossos idosos, a

classe média.

Ao longo de 45 anos, a democracia deu aos portugueses uma das maiores conquistas de Abril, o Serviço

Nacional de Saúde; deu-nos uma escola pública que proporciona igualdade de oportunidade para todos,

independentemente do meio social em que se nasça; deu-nos uma segurança social pública que assegura

direitos básicos promovendo o bem-estar e a coesão social. Mas, apesar de todos estes avanços e conquistas,

enquanto pilar do Estado social, a habitação ficou de fora da agenda política durante décadas. A habitação é

um direito fundamental, a base de uma sociedade estável e coesa e o alicerce a partir do qual os cidadãos

constroem os seus projetos de vida.

Há quatro anos, quando assumiu a governação do País, o PS herdou uma situação dramática. A famosa «lei

dos despejos», do PSD e do CDS, acabou com vizinhanças, afastou famílias, rasgou laços e tirou pessoas das

casas onde moraram toda uma vida.

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada do PSD Filipa Roseta.

Aliás, a expressão «ir além da troica», usada e abusada pelo Governo do PSD e do CDS, não representou

só um brutal aumento de impostos — «ir além da troica» era todo um programa para o País —, representou um

programa de empobrecimento das famílias, de baixos salários, de precarização do mercado de trabalho, de

venda das empresas públicas mais rentáveis, de degradação dos serviços públicos. Mais: representou também

a desregulação do mercado de arrendamento, os despejos sem regra e uma voraz especulação imobiliária. Esse

foi o propósito da governação da direita, do Governo PSD/CDS-PP.

Aplausos do PS.

Mas essa insensibilidade social, esse desinteresse pelas pessoas e essa indiferença com os mais

desprotegidos também não passaram despercebidos ao povo português, que deu uma resposta à altura nas

últimas eleições legislativas, infligindo a maior derrota de sempre à direita em Portugal.

O Sr. André Ventura (CH): — Vamos ver!

O Sr. Hugo Pires (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, temos de

responder àquilo que é hoje uma emergência nacional, colocando no mercado mais casas, a preços mais baixos,

acessíveis às famílias portuguesas. Garantir o acesso geral a uma habitação adequada é um desígnio que nos

deve mobilizar e convocar a todos.

O PS tem demonstrado que é o único partido capaz de ter uma perspetiva transversal e global do problema.

Na anterior Legislatura, demos passos muito importantes nesse sentido, com a criação de uma Secretaria de

Estado exclusivamente dedicada à área da habitação, com a alteração à «lei dos despejos» do PSD e do CDS-

PP e com a aprovação da primeira Lei de Bases da Habitação, apesar de a direita ter votado contra.

Partimos agora para uma nova Legislatura, para um novo ciclo, com a ambição de fazer ainda mais e ainda

melhor em matéria de habitação. A meta é clara: erradicar todas as carências habitacionais no 50.º aniversário

do 25 de Abril, em 2024.

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A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Depois das eleições, lá está!

O Sr. Hugo Pires (PS): — Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação, Portugal só conseguirá uma

política pública de habitação eficaz se aumentar consideravelmente o seu parque habitacional público. A

pergunta que lhe faço é a seguinte: será que, finalmente, o Estado português irá assumir as suas

responsabilidades e aumentar esse parque habitacional público?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Silva, de Os Verdes, para pedir

esclarecimentos.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr. Ministro Pedro Nuno Santos, o Sr. Primeiro-Ministro disse

anteriormente que este Orçamento do Estado é melhor do que qualquer um dos últimos quatro anos. Não

admira, porque parte das verbas previstas neste Orçamento vêm da não execução do Orçamento anterior, como

por exemplo ao nível da não aquisição de material circulante ou, ainda, da não eliminação do amianto nos

edifícios públicos.

O Programa do Governo falava muito do combate às alterações climáticas e do desenvolvimento do interior.

Ora, como é sabido, a mobilidade ferroviária desempenha nestas duas matérias um papel fundamental. Não nos

parece que este Orçamento venha fortificar o impulso da Legislatura passada, na qual se verificou um virar de

página e em que o contributo de Os Verdes foi inegável.

Na anterior Legislatura, foi posto um ponto final sobre o encerramento de linhas da ferrovia, nomeadamente

com a simbólica reabertura da Linha do Leste aos passageiros e com a contratação de mais trabalhadores para

a EMEF, hoje fundida de novo com a CP. Saudamo-lo, mas sublinhamos que falta agora a contratação de mais

trabalhadores, tão necessários e sobretudo agora com a abertura de concursos para aquisição de material

circulante.

Nesta Legislatura, para além da resposta necessária aos problemas do transporte ferroviário nas áreas

metropolitanas, esperava-se um reforço desta orientação, nomeadamente através de um claro aumento da

verba para a modernização das linhas complementares, ou seja, as linhas que servem o interior, as áreas fora

do grande eixo Norte/Sul.

Os Verdes temem que o Governo não tenha apenas adiado, como fez nos últimos quatro anos, mas que

desta vez tenha mesmo esquecido a eletrificação da Linha do Alentejo e da Linha do Leste, a construção do

Ramal de Portalegre, a reposição da Linha do Corgo e da Linha do Tâmega, a reabertura da Linha do Douro até

Espanha, a reposição de uma mobilidade ferroviária na Lousã e o fim da modernização da Linha do Oeste.

Sr. Ministro, os ingredientes e as vitaminas continuam a faltar para dar uma «energia de ferro» a um caminho

de ferro que é uma resposta fundamental para servir as populações, para combater as assimetrias regionais,

para promover um turismo distribuído pelo País e para reduzir as emissões de CO2.

O compromisso anunciado por Portugal de combate, adaptação e mitigação das alterações climáticas deve

assumir forma mais concreta e objetiva. Não podemos fazer omeletes sem ovos e, por isso, é impensável que,

sem investimento, se consiga atingir o objetivo da descarbonização até 2050.

Durante anos, a aposta foi a do desinvestimento no transporte público coletivo, retirando o direito à

mobilidade dos cidadãos. Por isso, no presente, o investimento se apresenta tão primordial e necessário.

Os primeiros passos foram dados na última Legislatura, mostrando que, apesar de a proposta «ter barbas»,

ela manteve-se necessária ao longo dos anos e, mesmo que os «Velhos do Restelo» indicassem que não era

possível, aí temos o Programa de Apoio à Redução Tarifária nos Transportes Públicos (PART), que não só

traduz a opção pelo transporte público como permite um maior conforto na economia das famílias portuguesas,

permitindo sobretudo que se dê um grande avanço nas políticas de adaptação às alterações climáticas.

É urgente o investimento nos transportes públicos coletivos, mas o desenvolvimento da ferrovia é prioritário

e, por isso, questionamos se estas promessas de mais material circulante, que trará mais horários e mais

conforto para os cidadãos, não serão apenas mais palavras que o vento levará.

Aplausos do PEV e do PCP.

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O Sr. Presidente: — É a vez do PAN, através da Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues, que tem a palavra para

fazer um pedido de esclarecimento.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, gostaríamos de começar por colocar

algumas questões relativamente à habitação.

Portugal regista um conjunto de problemas multicausais em matéria de habitação que requerem respostas

não só diferenciadas mas, acima de tudo, coerentes, o que não nos parece resultar desta proposta de

Orçamento do Estado.

O exponencial aumento dos preços da habitação e a pressão económica sobre os habitantes das cidades

mais afetadas impelem os cidadãos a sair das cidades e a procurar residência nos concelhos confinantes.

O aumento de preços tem, por sua vez, vindo a ser associado aos processos de liberalização do mercado

de arrendamento, que resultam de diferentes medidas políticas, como a revisão do regime jurídico do

arrendamento urbano, e, também, das medidas de fomento da internacionalização do mercado imobiliário

português, através da criação do regime de residente não habitual, da atribuição de vistos gold e da proliferação

das atividades de alojamento local.

Está em causa a política de habitação, a discussão sobre o papel do Estado na regulação de um mercado

que facilmente estimula atividades e a financeirização do setor, afastando do acesso à habitação digna todos

aqueles que, devido aos rendimentos insuficientes, não podem participar de um mercado sobre-inflacionado.

Os baixos rendimentos das pessoas limitam a possibilidade de aquisição de habitação própria, pelo que lhes

resta o acesso ao mercado de arrendamento. Chegadas a este, são completamente asfixiadas pelo seu

rendimento disponível e pelos preços das rendas, sendo cada vez mais empurradas para a fronteira da pobreza

e da exclusão social.

Num país em que o rendimento médio anual por adulto equivalente está na casa dos 11 000 euros, o preço

médio anual de arrendamento de um apartamento para uma família de três elementos é de 8478 euros no Porto

e de 12 052 euros em Lisboa, refletindo, neste caso, uma taxa de esforço para as famílias de 65%.

Agora diga-nos, Sr. Ministro: como é possível que as pessoas consigam pagar uma casa, todas as despesas

inerentes, alimentarem-se e terem uma vida que vá além de trabalhar e pagar contas?! De que forma é que este

Orçamento vai, efetivamente, dar resposta a esta necessidade? É que o programa de Renda Acessível, por

exemplo, já deu mostras de ser claramente insuficiente para dar resposta às reais necessidades das pessoas.

Ainda que se reconheça no discurso oficial e nos preâmbulos das leis o imperativo de dinamizar o mercado

de arrendamento ou de assegurar habitação pública, a verdade é que, entre as palavras e os atos, evidenciam-

se contradições e uma grande falta de vontade política para realmente alterar o estado das coisas.

Em suma, aquilo que o Governo nos propõe neste Orçamento do Estado é insuficiente.

É necessário ir à raiz do problema. Por exemplo, o Governo poderia começar pela alteração do estatuto do

residente não habitual, já que, com este benefício atribuído a cidadãos estrangeiros, o País perde cerca de 548

milhões de euros em receita. É também premente avançar para alterações em matéria de política pública que

visem uma melhor regulação do mercado imobiliário e potenciem o surgimento de respostas ou o reforço das

respostas existentes.

Por outro lado, o afastamento entre o local de trabalho e a residência traz outras exigências, nomeadamente

o aumento de deslocações. Se é verdade que as políticas de habitação têm falhado, o Governo também não

tem conseguido acompanhar as necessidades dos cidadãos relativas aos transportes públicos.

Entram em Lisboa mais de 425 000 pessoas por dia, a maior parte delas utilizando o seu veículo automóvel,

com prejuízos evidentes para o ambiente mas também para a qualidade de vida das pessoas. Ninguém quer

passar duas horas a tentar chegar a Lisboa através da Ponte 25 de Abril, mas também ninguém quer passar

duas horas a chegar ao trabalho em autocarros ou carruagens atoladas de pessoas, sem qualquer articulação

com outros transportes públicos, ou correr o risco de ver a carreira de que depende para chegar ao trabalho

suprimida de um dia para o outro, sem qualquer justificação.

Sr. Ministro, é preciso fazer mais e melhor. Não precisa de nos dizer, pois já sabemos, que vão ser investidos

muitos milhões em transportes públicos e que, por isso, se estima que, talvez, daqui a três ou quatro anos, a

Transtejo tenha mais barcos ou a CP e o metro mais carruagens e melhores linhas. Mas e até lá, Sr. Ministro?!

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Assim, face às opções políticas plasmadas neste Orçamento, não podemos deixar de perguntar o seguinte:

para além dos vistos gold, há disponibilidade para rever o regime dos residentes não habituais? Quando serão

adotadas medidas fiscais que promovam, efetivamente, o mercado de arrendamento? Quando haverá um

investimento sério nos transportes públicos?

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente: — Para terminar esta ronda de pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado

Bruno Dias, do Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do

Governo, Sr. Ministro Pedro Nuno Santos, o investimento público é uma questão crucial para o desenvolvimento

do País, para a modernização das infraestruturas, com melhores condições para os setores produtivos e a

atividade económica. Há muitos anos que o PCP tem vindo a sublinhar, tantas vezes sozinho, esta mesma

questão, sobre a qual há um problema cada vez mais grave: o investimento orçamentado e aprovado que,

depois, não é executado e tarda em concretizar-se.

Os novos comboios para a CP ou os novos navios para a Transtejo que o Governo anuncia neste Orçamento

são os mesmos do debate orçamental de há um ano — ou, no caso da Transtejo, antes fossem! — e os

processos estão na mesma, ou pior. As carências de pessoal nas empresas são gritantes.

Por isso, é incontornável esta questão, Sr. Ministro: quantos comboios suprimidos, quantos barcos atrasados,

quanto tempo perdido à espera do metro ou do autocarro é que vale o excedente do Orçamento que o Governo

pretende obter?

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Concretamente, está ou não o Governo disponível para alargar o processo de

aquisição de novos comboios para a CP e iniciar novos processos para comboios suburbanos e de longo curso,

indispensáveis à ferrovia nacional?

Está ou não o Governo disponível para acabar de vez com as restrições absurdas à contratação de pessoal

para as empresas de transportes e repor a capacidade operacional nestes serviços públicos fundamentais para

as populações?

Está disponível para acabar com os bloqueios à redução tarifária no transporte ferroviário e intermodal entre

regiões?

Está disponível para alterar o artigo 181.º do Orçamento, que trata da redução tarifária nos transportes, para

que deixe de haver o corte orçamental em que se traduz a vossa proposta?

É que 129,7 milhões de euros para um ano é menos do que 104 milhões de euros para nove meses e o

investimento dos municípios não é alibi para o desinvestimento do Governo.

Sr. Ministro, o que é preciso é mais comboios e não menos cadeiras nos comboios. O que é preciso é reforçar

os serviços públicos e não prolongar as PPP (parcerias público-privadas). «Os comboios são nossos», diz o Sr.

Ministro, e muito bem! Nas PPP, os comboios são nossos e o lucro é deles!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — O PCP já deixou bem claro que a apreciação definitiva sobre o que de concreto

resultar de avanço na fase de especialidade e o quadro político em que o Orçamento será discutido determinarão

o sentido da votação final global que o PCP assumir.

É que, quando faltam os comboios, quando faltam os transportes, as pessoas não apanham o excedente

orçamental, de manhã, para ir trabalhar!

Por isso, a questão que se coloca é a das opções políticas que o Governo pretende assumir. É essa questão

que lhe colocamos neste debate.

Aplausos do PCP e do PEV.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro

Nuno Santos.

Peço-lhe para ser tão sintético quanto possível, visto que o tempo que era possível antecipar de amanhã

para hoje já está ultrapassado.

Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Sr. Presidente, vou fazer esse esforço e queria pedir,

desde já, desculpa aos meus colegas membros do Governo que ainda vão fazer intervenções. De facto, gastei

tempo demais.

Queria deixar duas notas e começar por responder ao Sr. Deputado Bruno Dias. Não lhe tinham «caído os

parentes na lama» se tivesse feito um elogio ao Governo por ter, finalmente, aumentado, do ponto de vista

líquido, o número de trabalhadores da EMEF e da CP. Não é ter travado a queda, é ter começado a aumentar

o quadro de pessoal da EMEF e da CP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — A própria CP pediu muito mais!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Também não lhe tinham «caído os parentes na

lama» se tivesse elogiado o Governo por ter feito a fusão da CP e da EMEF, há tantos anos exigida pelo PCP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Quem é que tinha razão, afinal?!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Não lhe tinha ficado mal também ter-nos elogiado

por termos feito, pela primeira vez na história, o contrato de serviço público da CP. Também não lhe ficava mal

elogiar o Governo por abrir, finalmente, ao fim de 10 anos, a fábrica em Guifões,…

Aplausos do PS.

… como também não lhe ficava mal elogiar o Governo por já termos, ao fim de 10 anos, um acordo de

empresa na EMEF e, ao fim de 20 anos, estarmos perto de ter um acordo de empresa na CP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Também não é preciso amuar!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Não ficava mal ao PCP. Ganhamos muito mais

credibilidade nas críticas que fazemos quando reconhecemos o bom trabalho que é feito.

Aplausos do PS.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — As políticas do PS é que podiam dar uma ajuda! Só respondeu com queixume!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Queria dar nota também, a propósito da habitação,

que a Sr.ª Deputada Filipa Roseta está enganada, porque não falei nunca do FNRE. Aqui, na minha intervenção,

nunca!

Protestos da Deputada do PSD Filipa Roseta.

Não, Sr.ª Deputada!

Em relação à dotação orçamental que temos neste Orçamento, para que fique claro, quando a Sr.ª Deputada

Maria Manuel Rola dizia que a expectativa era a de que a dotação para a habitação fosse maior, vou-lhe dizer

que eu também gostava de ter uma dotação maior. Mas construímos um Orçamento num quadro de múltiplas

necessidades e a verdade é que — não o posso omitir — o orçamento da habitação este ano é o dobro daquilo

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que foi no último Orçamento. O grande desafio vai ser conseguirmos executar — aliás, como vários Deputados

aqui referiram — o que temos orçamentado. Essa é a nossa principal tarefa e principal preocupação.

Temos 150 milhões de euros para despesa efetiva do Orçamento do Estado, não do Fundo de Estabilização

Financeira da Segurança Social. O imobiliário que vamos querer recuperar é com dotação do Orçamento do

Estado, não do FNRE.

Mas deixe-me dizer-lhe algumas coisas sobre o FNRE, o Fundo Nacional de Reabilitação do Edificado,

porque está enganada. Sabe onde está aplicado o dinheiro das pensões que estão no Fundo de Estabilização

Financeira da Segurança Social, em 90%? Está em títulos de dívida pública, repito, está em títulos de dívida

pública. Aquilo que o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social faz é investimentos que ofereçam

uma taxa de rentabilidade mínima…

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, peço-lhe para sintetizar, mais uma vez.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — … de 4%. Isso está assegurado.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Ai está?!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Se não estiver assegurado, não pode ser feito o

investimento. O Fundo de Estabilização está protegido.

Sobre o código de contratação pública e por que é que não se aplica, Sr.ª Deputada, é porque é um fundo

que está sujeito às regras do Banco de Portugal e da CMVM (Comissão do Mercado de Valores Mobiliários). É

assim que funciona a nossa lei, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Pois é!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — O escrutínio não é menor. O escrutínio é até maior,

porque tem a regulação da CMVM e do Banco de Portugal.

Mas isso é o FNRE e eu não falei do FNRE em nenhum momento na minha intervenção.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Falei eu!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — A aposta na ferrovia, nas infraestruturas e na

habitação é uma grande aposta para o próximo ano e revela apenas respeito pelo povo português.

Aplausos do PS.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Falta responder ao PEV!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Eu também não tive tempo para elogios!

O Sr. Presidente: — Chegamos, portanto, ao fim dos nossos trabalhos de hoje.

Amanhã, às 10 horas, começarão os trabalhos, sem quaisquer dúvidas, para ver se conseguimos deixar para

a parte da tarde só o encerramento.

Muito boa tarde a todos e até amanhã.

Eram 21 horas e 5 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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