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Sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020 I Série — Número 34
XIV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2019-2020)
REUNIÃOPLENÁRIADE27DEFEVEREIRODE 2020
Presidente: Ex.ma Sr.ª Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Nelson Ricardo Esteves Peralta Ana Cristina Cardoso Dias Mesquita
S U M Á R I O
A Presidente (Edite Estrela) declarou aberta a sessão às
15 horas e 2 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos Projetos de
Resolução n.os 268 e 269/XIV/1.ª. Procedeu-se à discussão conjunta dos projetos de lei (na
generalidade) e dos projetos de resolução seguintes: Projeto de Lei n.º 137/XIV/1.ª (BE) — Institui a
obrigatoriedade e a gratuitidade de emissão do distrate e de declaração de liquidação do empréstimo, elimina comissões cobradas pelo processamento de prestações de crédito, proibindo ainda as instituições de crédito de alterar unilateralmente as condições contratuais dos créditos
concedidos ao consumo (quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de junho), que foi aprovado;
Projeto de Lei n.º 138/XIV/1.ª (BE) — Institui a obrigatoriedade e a gratuitidade de emissão do distrate e de declaração de liquidação do empréstimo, elimina comissões cobradas pelo processamento de prestações de crédito, proibindo ainda as instituições de crédito de alterar unilateralmente as condições contratuais dos créditos concedidos à habitação (terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 74-A/2017, de 23 de junho), que foi aprovado;
Projeto de Lei n.º 139/XIV/1.ª (BE) — Consagra a proibição de cobrança de encargos pelas instituições de
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crédito nas operações realizadas em plataformas eletrónicas operadas por terceiros (primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 3/2010, de 5 de janeiro), que, a requerimento apresentado pelo BE, baixou à Comissão de Orçamento e Finanças, sem votação, por um prazo de 60 dias;
Projeto de Lei n.º 140/XIV/1.ª (BE) — Cria o sistema de acesso à conta básica universal, que foi rejeitado;
Projeto de Resolução n.º 143/XIV/1.ª (BE) — Recomenda a elaboração de orientações para a política de comissões bancárias da Caixa Geral de Depósitos, que foi rejeitado;
Projeto de Lei n.º 205/XIV/1.ª (PCP) — Procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 3/2010, de 5 de janeiro, alargando a proibição de cobrança de encargos pela prestação de serviços de pagamento e pela realização de operações às operações realizadas através de aplicações digitais, que, a requerimento apresentado pelo PCP, baixou à Comissão de Orçamento e Finanças, sem votação, por um prazo de 60 dias;
Projeto de Lei n.º 206/XIV/1.ª (PCP) — Procede à sexta alteração ao regime de serviços mínimos bancários, tornando-o mais adequado às necessidades dos clientes bancários, que foi rejeitado;
Projeto de Lei n.º 209/XIV/1.ª (PAN) — Limita a cobrança de quaisquer comissões, despesas ou encargos nos casos em que não seja efetivamente prestado um serviço ao cliente por parte das instituições de crédito (primeira alteração à Lei n.º 66/2015, de 6 de julho), que, a requerimento apresentado pelo PAN, baixou à Comissão de Orçamento e Finanças, sem votação, por um prazo de 60 dias;
Projeto de Lei n.º 213/XIV/1.ª (PS) — Adota normas de proteção do consumidor de serviços financeiros de crédito à habitação, crédito ao consumo e utilização de plataformas eletrónicas operadas por terceiros, que foi aprovado;
Projeto de Lei n.º 216/XIV/1.ª (PSD) — Sexta alteração ao Decreto-Lei n.º 27-C/2000, de 10 de março, que cria o
sistema de acesso aos serviços mínimos bancários, que foi aprovado;
Projeto de Lei n.º 217/XIV/1.ª (PSD) — Restringe a cobrança de comissões bancárias, procedendo à quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de junho, e à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 74-A/2017, de 23 de junho, que foi aprovado;
Projeto de Resolução n.º 263/XIV/1.ª (CH) — Pela clarificação da Lei n.º 66/2015 e pela proibição de cobrança de taxas e comissões nas transferências bancárias realizadas através da aplicação MB Way, que foi rejeitado.
Intervieram no debate, a diverso título, os Deputados Mariana Mortágua (BE), Hugo Carneiro (PSD), Miguel Matos (PS), Duarte Alves (PCP), André Silva (PAN), Vera Braz (PS), Isabel Pires (BE), Cecília Meireles (CDS-PP), Carlos Silva (PSD), Fernando Anastácio (PS), Ricardo Vicente (BE), André Ventura (CH), José Luís Ferreira (PEV), Carlos Brás (PS), Joacine Katar Moreira (N insc.), Marina Gonçalves (PS), João Cotrim de Figueiredo (IL), Álvaro Almeida (PSD), João Paulo Correia (PS) e Pedro Filipe Soares (BE).
O Deputado André Ventura (CH) interpôs recurso da decisão do Presidente da Assembleia da República de não admitir o agendamento da apreciação do Projeto de Lei n.º 144/XIV/1.ª — Agravação das molduras penais privativas de liberdade para as condutas que configurem os crimes de abuso sexual de crianças, abuso sexual de menores dependentes e atos sexuais com adolescentes e criação da pena acessória de castração química — que foi rejeitado —, tendo usado da palavra o Presidente e, em interpelação à Mesa, os Deputados Ana Catarina Mendonça Mendes (PS) e João Oliveira (PCP).
O Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 32 minutos.
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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados.
Vamos dar início à sessão.
Eram 15 horas e 2 minutos.
Peço aos Srs. Agentes da autoridade que abram as galerias ao público.
Peço também à Sr.ª Secretária da Mesa Maria da Luz Rosinha o favor de anunciar o expediente.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, muito boa tarde.
Deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os Projetos de Resolução n.os 268/XIV/1.ª (PEV) — Classificação
de tripulante de cabina como profissão de desgaste rápido, que baixa à 10.ª Comissão, em conexão com a 6.ª
Comissão, e 269/XIV/1.ª (PEV) — Pela urgente construção do novo hospital de Lagos.
É só, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.as e Srs. Deputados, da ordem do dia de hoje consta a discussão, na
generalidade, de diversos projetos de lei juntamente com dois projetos de resolução.
São os seguintes:
Projeto de Lei n.º 137/XIV/1.ª (BE) — Institui a obrigatoriedade e a gratuitidade de emissão do distrate e de
declaração de liquidação do empréstimo, elimina comissões cobradas pelo processamento de prestações de
crédito, proibindo ainda as instituições de crédito de alterar unilateralmente as condições contratuais dos créditos
concedidos ao consumo (quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de junho);
Projeto de Lei n.º 138/XIV/1.ª (BE) — Institui a obrigatoriedade e a gratuitidade de emissão do distrate e de
declaração de liquidação do empréstimo, elimina comissões cobradas pelo processamento de prestações de
crédito, proibindo ainda as instituições de crédito de alterar unilateralmente as condições contratuais dos créditos
concedidos à habitação (terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 74-A/2017, de 23 de junho);
Projeto de Lei n.º 139/XIV/1.ª (BE) — Consagra a proibição de cobrança de encargos pelas instituições de
crédito nas operações realizadas em plataformas eletrónicas operadas por terceiros (primeira alteração ao
Decreto-Lei n.º 3/2010, de 5 de janeiro);
Projeto de Lei n.º 140/XIV/1.ª (BE) — Cria o sistema de acesso à conta básica universal;
Projeto de Resolução n.º 143/XIV/1.ª (BE) — Recomenda a elaboração de orientações para a política de
comissões bancárias da Caixa Geral de Depósitos;
Projeto de Lei n.º 205/XIV/1.ª (PCP) — Procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 3/2010, de 5 de
janeiro, alargando a proibição de cobrança de encargos pela prestação de serviços de pagamento e pela
realização de operações às operações realizadas através de aplicações digitais;
Projeto de Lei n.º 206/XIV/1.ª (PCP) — Procede à sexta alteração ao regime de serviços mínimos bancários,
tornando-o mais adequado às necessidades dos clientes bancários;
Projeto de Lei n.º 209/XIV/1.ª (PAN) — Limita a cobrança de quaisquer comissões, despesas ou encargos
nos casos em que não seja efetivamente prestado um serviço ao cliente por parte das instituições de crédito
(primeira alteração à Lei n.º 66/2015, de 6 de julho);
Projeto de Lei n.º 213/XIV/1.ª (PS) — Adota normas de proteção do consumidor de serviços financeiros de
crédito à habitação, crédito ao consumo e utilização de plataformas eletrónicas operadas por terceiros;
Projeto de Lei n.º 216/XIV/1.ª (PSD) — Sexta alteração ao Decreto-Lei n.º 27-C/2000, de 10 de março, que
cria o sistema de acesso aos serviços mínimos bancários;
Projeto de Lei n.º 217/XIV/1.ª (PSD) — Restringe a cobrança de comissões bancárias, procedendo à quarta
alteração ao Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de junho, e à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 74-A/2017, de 23
de junho;
Projeto de Resolução n.º 263/XIV/1.ª (CH) — Pela clarificação da Lei n.º 66/2015 e pela proibição de cobrança
de taxas e comissões nas transferências bancárias realizadas através da aplicação MB Way.
Para apresentar o Projeto de Lei n.º 137/XIV/ 1.ª, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do Bloco
de Esquerda.
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A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ficámos ontem a saber que o
Novo Banco se prepara para pedir ao Estado, através do Fundo de Resolução, uma nova injeção de capital no
montante de 1037 milhões de euros, que irá somar-se aos 23 800 milhões de euros de fundos públicos que,
segundo o Banco de Portugal, foram disponibilizados aos bancos portugueses entre 2007 e 2018.
Nesta interminável conta de somar, devem ainda ser consideradas as ajudas de Estado ao capital da banca
sob a forma de benefícios fiscais, que em 2018 ascendiam a 3800 milhões de euros.
A fatura passada aos contribuintes com o sistema financeiro ainda não parou de aumentar, mas os bancos
querem mais e exigem agora recuperar as suas taxas de lucro à custa de comissões exorbitantes cobradas aos
clientes, que são também, ao mesmo tempo, os contribuintes.
Os bancos não têm sequer pudor em ameaçar o Parlamento com uma vaga de despedimentos, com mais
encerramentos de balcões, ou com disrupções no financiamento da economia, caso as comissões bancárias
venham a ser limitadas.
Quero, por isso, começar este debate por recusar a chantagem dos bancos. Durante mais de uma década,
a banca viveu como quis, financiou os negócios que entendeu, deu crédito aos amigos para jogos de poder na
Bolsa portuguesa, lucrou, pagou bónus chorudos aos seus administradores e até se organizou em cartel para
manipular os spreads cobrados. Tudo isto, claro, com a complacência generalizada dos partidos do poder, mas
também do Banco de Portugal.
Quando tudo lhes correu a favor, o resultado foi menos economia, menos investimento, menos produção,
mas mais dívida, mais imobiliário, mais negociatas. E é inaceitável que, depois de terem tido a liberdade para
cometer tantos erros, os bancos venham agora clamar que o seu bom comportamento depende da liberdade
para esmifrar os clientes com comissões bancárias!
O Sr. Jorge Costa (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Entre 2007 e 2019, os cidadãos em Portugal pagaram em média 8,8
milhões de euros em comissões bancárias por dia, o equivalente a 40 000 milhões de euros. Em 2019, o valor
cobrado em comissões ascendeu a 1500 milhões de euros, mais 40 milhões de euros do que em 2018.
Estes números refletem duas realidades. A primeira é o aumento ou a criação de comissões associadas a
serviços bancários básicos: a manutenção de conta à ordem, transferências bancárias ou operações ao balcão.
Na maior parte dos bancos, as isenções em caso de domiciliação de ordenado ou aplicáveis a jovens e a
reformados foram substituídas por novos produtos, que são as chamadas «contas pacote», que são muito mais
difíceis de comparar entre elas e muito mais exigentes nas suas condições. Hoje, é necessário ter saldos médios
superiores para se ter uma isenção de conta ou, então, é necessário utilizar outros produtos financeiros, como
cartões de crédito, para se ter esse desconto nas comissões.
Os clientes que não cumprem estas exigências são atirados para preçários que podem facilmente atingir os
60 € anuais pelo acesso a serviços bancários básicos.
Esta estratégia afetou, desde logo, as pessoas com rendimentos mais baixos, mas também afetou as
pessoas com mais dificuldade em aceder a serviços online e que estavam mais dependentes das operações
aos balcões, como as pessoas mais idosas.
Mais recentemente, assistimos ainda à introdução de comissões nas operações efetuadas através de
plataformas digitais, como é o caso da MB Way, que anteriormente eram disponibilizadas de forma gratuita.
A segunda realidade do aumento das comissões é a cobrança por operações que não têm qualquer serviço
diretamente associado. São comissões absurdas ou bizarras, como lhes chamou a DECO (Associação
Portuguesa para a Defesa do Consumidor), e incluem, na verdade, a cobrança de mais de 50 € pela emissão
de uma declaração oficial sobre a conta bancária, incluindo o comprovativo pela extinção da dívida. Já ninguém
deve nada ao banco, mas ainda tem de pagar por uma declaração que ateste que essa dívida foi extinta! E
incluem também uma comissão de 30 € anuais pelo processamento da prestação de crédito. Ou seja, o banco
cobra uma taxa de cada vez que debita na conta do seu cliente a prestação de crédito que já deveria incluir
todos os encargos.
É verdade que a lei já impede, em teoria, os bancos de cobrarem comissões que não têm serviços
diretamente associados, mas para que esta norma geral tivesse consequências práticas seria necessário que o
Banco de Portugal fosse o que não é: um supervisor interventivo e disciplinador dos comportamentos da banca.
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O facto é que os bancos continuam a usar e abusar da sua posição dominante, inclusive para alterar
unilateralmente as condições dos contratos de crédito. A concorrência, que sempre foi apontada como uma
solução para todos os males que advêm da privatização de serviços públicos em setores altamente
concentrados, teve na banca o mesmo resultado que verificámos nas telecomunicações ou nos combustíveis,
que foi a cartelização dos preços em prejuízo dos consumidores.
Não é demais recordar, a este propósito, que, em 2019, a Autoridade da Concorrência condenou 14 bancos
por prática concertada de troca de informação sensível durante um período de mais de 10 anos, entre 2012 e
2013. Escreve a acusação da Autoridade da Concorrência: «Cada banco sabia, com particular detalhe, rigor e
atualidade, as características da oferta dos outros bancos, o que desencorajou os bancos visados de oferecerem
melhores condições aos clientes, eliminando a pressão concorrencial, benéfica para os consumidores». Sobre
esta matéria, do Banco de Portugal, ao longo de mais de dez anos, nem uma palavra!
O Sr. Jorge Costa (BE): — Bem lembrado!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sabemos que existem, neste momento, no mercado alguns casos, aqui e
ali, de instituições que cobram comissões inferiores, mas também começa agora a ficar claro que esses
preçários promocionais escondem outros custos que muitas vezes só começam a ser cobrados mais tarde.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.as e Srs. Deputados, esta não é a primeira vez que o Parlamento é
chamado a decidir sobre a limitação de comissões bancárias. Isso já aconteceu no passado e nem sempre com
resultados produtivos. Alguns dos projetos que o Bloco de Esquerda traz hoje a debate e votação,
nomeadamente aqueles que pretendem eliminar a cobrança de comissões absurdas, foram rejeitados no
passado, com os votos contra do Partido Socialista e abstenções do PSD e do CDS.
Registaram-se, no entanto, ao longo dos últimos anos, alguns avanços com o objetivo de limitar a cobrança
abusiva de comissões bancárias e promover a inclusão financeira. A mais importante é o regime de serviços
mínimos bancários, que deveria oferecer, em teoria, uma alternativa viável para o acesso a serviços bancários
a custos controlados. Infelizmente, a aplicação prática deste regime fica muito aquém dos objetivos, aplicando-
se a menos de 80 000 contas bancárias no primeiro semestre de 2019 e, por isso, importa agora perceber que
mecanismos devem ser instituídos para garantir o acesso dos cidadãos a serviços básicos.
Sr.as e Srs. Deputados, o acesso a serviços bancários é hoje uma necessidade inultrapassável para qualquer
cidadão, e é dever das políticas públicas assegurar que este acesso seja feito em condições de justiça e
proporcionalidade. Nesse sentido, o Bloco de Esquerda apresentou cinco projetos que hoje coloca a debate e
que incidem sobre quatro pontos essenciais: o acesso a serviços bancários, a eliminação de cobranças
absurdas, a limitação do poder do banco nas renegociações contratuais e o papel do banco público, que é a
Caixa Geral de Depósitos.
A primeira proposta visa instituir a conta básica universal, que se propõe que substitua o regime de serviços
mínimos bancários, corrigindo falhas que foram identificadas. Assim, a conta básica universal irá disponibilizar
a todos os clientes bancários um conjunto alargado de serviços — uma conta à ordem, um cartão bancário, o
acesso ao homebanking, transferências — a um preço limitado e tabelado. Esta conta passa a estar disponível
a qualquer cliente bancário individual; qualquer cidadão passa a ter acesso a esta conta, independentemente
de ter outras contas bancárias ou ter contas bancárias associadas a créditos à habitação que já possam ser
existentes sem que haja lugar a uma perda de spread.
O segundo grupo de propostas pretende eliminar comissões absurdas, ou seja, que não têm nenhum serviço
associado. Propõe-se, assim, a gratuitidade da emissão de declaração de não dívida, da emissão do distrate e
a proibição de cobrança de comissões pelo processamento de prestação de crédito.
Adicionalmente, propõe-se que os bancos não possam cobrar taxas pelas transferências efetuadas através
de plataformas de intermediação, como o MB Way, porque também neste caso os bancos estão a cobrar uma
comissão por um serviço que não prestam, uma vez que a transferência é efetuada pelo próprio cliente através
de uma plataforma eletrónica operada por uma entidade terceira, neste caso a SIBS.
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O terceiro grupo de propostas visa proibir as instituições de crédito de alterar unilateralmente as condições
dos créditos concedidos à habitação ou ao consumo, de forma a que não possam ser aplicadas taxas e
comissões mais altas do que as que inicialmente foram contratualizadas.
Finalmente, e para terminar, uma quinta proposta: entendemos que é importante reconhecer, de uma vez
por todas, que a Caixa Geral de Depósitos, como banco público, tem responsabilidades acrescidas nesta
matéria. A Caixa deve reger-se por princípios claros de interesse público e posicionar-se como uma referência
de boas práticas no mercado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sabemos que, por falta de orientação política clara ou por influência de
interesses particulares, esse não foi o caso de muitas decisões de crédito da Caixa Geral de Depósitos no
passado. Apesar disso, para os depositantes, o banco público continua a oferecer condições mais vantajosas e
afirmou-se como um pilar de estabilidade no sistema.
Nos últimos anos, no entanto, muitos desses clientes têm vindo a ser confrontados com aumentos sucessivos
nas comissões bancárias. Sendo verdade, por um lado, que a Caixa não pode simplesmente abdicar de uma
fonte de receita como as comissões bancárias, é verdade também que lhe deve ser exigido pelo acionista Estado
que o faça de acordo com critérios claros de transparência e justiça. Não se trata aqui de controlar ou influenciar
operações específicas; trata-se, sim, de emitir diretrizes claras que protejam a Caixa da arbitrariedade e das
decisões de ocasião, que se revelaram desastrosas no passado. Trata-se, portanto, de proteger a legitimidade
da Caixa, garantindo que ela cumpre o seu papel de serviço público e que deixa de aparecer aos olhos dos
cidadãos como a instituição que favoreceu os negócios de grandes clientes como José Berardo, mas que não
hesita em imputar os custos dessas decisões aos pequenos depositantes.
Aplausos do BE.
Sr.as e Srs. Deputados, todos os partidos que estão sentados neste Hemiciclo já tiveram oportunidade de se
manifestar pelo fim do abuso instalado na cobrança de comissões bancárias em Portugal. O que o Bloco de
Esquerda vem propor é simples: travar os abusos da banca, eliminar comissões bancárias absurdas, acabar
com a imposição de condições leoninas aos clientes, garantir o acesso de todos a serviços bancários básicos e
trazer transparência e rigor à Caixa Geral de Depósitos. Não cederemos às chantagens e pressões da banca e
esperamos que, a bem dos consumidores e do interesse público, nenhum partido o faça.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada, a Mesa regista a inscrição do Sr. Deputado Hugo
Carneiro, do Grupo Parlamentar do PSD, para lhe pedir esclarecimentos.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, hoje,
parece existir um consenso relativamente a algumas das comissões que são cobradas pelo sistema financeiro,
parecendo que esta Assembleia parece concordar com que devem terminar. São elas as do distrate bancário,
da declaração de dívida e da cobrança de prestações de crédito. Sobre isto, estamos de acordo.
No entanto, aquilo que é trazido nas propostas do Bloco de Esquerda assenta no que poderíamos denominar
por «experimentalismo no sistema financeiro». Aquilo que o PSD propõe, que é o fim daquelas comissões, é
razoável, é justo e é equilibrado. Aquilo que o Bloco de Esquerda parece propor vai muito para lá disso e é
injusto, é irrazoável e é pouco equilibrado.
O Bloco de Esquerda parece entrar na demagogia, querendo proibir a banca de cobrar toda e qualquer
comissão, seja ela qual for. Poderíamos, no futuro, talvez, chegar aí. Para já, bastam-se com a limitação de
algumas comissões, como, por exemplo, as cobradas no MB Way. Mas não existe só o MB Way, existem outras
plataformas, algumas das quais fora de Portugal, que nunca estariam sujeitas à regulação que o Bloco de
Esquerda vem propor a esta Câmara.
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No que diz respeito à conta de serviços mínimos bancários, o Bloco de Esquerda propõe o seu fim, pura e
simplesmente, abandonando a construção desta Assembleia no melhoramento desse tipo de conta. Proclamam
que há poucas pessoas a aderir à conta de serviços mínimos bancários, mas ignoram que, por exemplo, de
2018 para 2019, houve um aumento de 75% do número de pessoas a aderir a este tipo de conta. Entretanto,
trazem uma nova conta, a conta básica universal, assente num ato de fé de que essa, sim, vem resolver o
problema da cobrança de comissões.
Lembro que serviços como o MB Way, à data de hoje, podem ser exportados, coisa que a proposta do Bloco
de Esquerda ignora, ignorando, portanto, que tecnologia nacional possa ser exportada. Com isto, não se eximem
de eventualmente contribuir para o aumento do desemprego no setor, o bloqueio ao processo de inovação ou a
invasão do mercado nacional por plataformas estrangeiras.
Pergunto: quem vai inovar em qualquer setor, e também no setor financeiro, se não existir a possibilidade de
essas instituições cobrarem aquele que seja um preço justo? Não é um preço qualquer, é um preço justo — aí,
estamos de acordo.
Como propõe o Bloco de Esquerda tributar, por exemplo, os operadores estrangeiros que operem em
Portugal a partir do estrangeiro, em detrimento dos operadores nacionais, que provavelmente desapareceriam
do mercado?
Como responde o Bloco de Esquerda à necessidade de as instituições continuarem a investir no combate ao
branqueamento de capitais, nas medidas de segurança informática, se não puderem cobrar pelos seus serviços?
O que acha o Bloco de Esquerda que a conta básica universal vem trazer de novo que a conta de serviços
mínimos bancários não tenha hoje? Esta não pode ser melhorada, como propõe, por exemplo, o Partido Social
Democrata?
O Partido Social Democrata defende um sistema legal justo e equilibrado. Aquilo que nos parece que a Sr.ª
Deputada apresentou é precisamente o oposto e é um sistema que, no fim do dia, não vai contribuir para a
defesa do consumidor.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, afinal, inscreveu-se mais um Sr.
Deputado para lhe pedir esclarecimentos. Pergunto se deseja responder já ao do Sr. Deputado Hugo Carneiro.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sim, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Então, tem a palavra para o efeito.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Hugo Carneiro, vou começar pela
demagogia do Bloco que referiu.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — É boa!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — O Sr. Deputado acabou de dizer que o Bloco quer proibir toda e qualquer
comissão. Portanto, sobre demagogia ficamos conversados, na medida em que as propostas do Bloco são muito
claras sobre quais as comissões que pretendemos eliminar e quais os serviços que pretendemos criar para
poder garantir serviços bancários aos cidadãos.
Relativamente ao MB Way, a proposta do Bloco visa eliminar a cobrança de taxas por parte dos bancos pela
utilização de plataformas digitais, sejam elas o MB Way ou tenham elas outro nome. Lamento que o PSD tenha
demorado tanto tempo para chegar ao consenso que diz haver sobre a cobrança de comissões absurdas.
Felicito-o, no entanto, por o ter feito. Se o tivesse feito mais cedo, hoje essas comissões já não existiriam, mas
mais vale tarde do que nunca.
Finalmente, sobre o que é injusto ou justo, o Sr. Deputado veio dizer que acha injusto limitar as comissões
que os bancos cobram, o que quer dizer que acha justo que os bancos estejam a esmifrar os clientes com
comissões bancárias por tudo e por nada.
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O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Eu não disse isso!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Ontem, uma pessoa dizia-me, em conversa, que qualquer dia os bancos
cobram uma taxa a alguém que ponha um pé dentro de um banco.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Não dê ideias!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — É precisamente isso que queremos limitar: o abuso na cobrança das
comissões bancárias.
Lamento que o Sr. Deputado, ao invés de se colocar ao lado de quem quer proteger os clientes bancários e
os consumidores, se tenha colocado no papel de trazer as ameaças da banca, dizendo que, se forem impostos
limites à cobrança de comissões, já não vão prevenir o branqueamento de capitais, já não vai haver inovação,
já não vai haver crescimento económico.
Sr. Deputado, os bancos andaram a cobrar comissões e nem por isso preveniram o branqueamento de
capitais até agora! Portanto, aconselho-o a não assumir com tanta facilidade a chantagem que a banca está a
fazer e a colocar-se ao lado da defesa dos interesses dos consumidores e dos clientes bancários.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr.
Deputado Miguel Costa Matos, do Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, houve
um tempo em que emprestar dinheiro à banca pagava, em que o banco ganhava o seu cobre a captar depósitos
e a aplicá-los em créditos, em que o banco recebia de bom grado o pagamento de empréstimos. Esse tempo
acabou.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Ah!…
O Sr. Miguel Matos (PS): — Hoje, é preciso pagar para depositar, pagar para devolver o que se deve e, não
chegando, uma certa banca preocupa-se em cobrar comissões por tudo em que mexe. O mundo está ao
contrário, tão pouco tempo depois de uma crise financeira que já custou aos portugueses mais de 20 mil milhões
de euros. O que essa crise demonstrou foi que a concorrência falha e que precisamos de regras que promovam
a estabilidade financeira e protejam os consumidores.
É esse o debate que aqui começa hoje, com consensos em geometria variável. Todos querem fazer algo
sobre os distrates e as declarações de dívida, para que todos possam saber e provar quanto devem ou mesmo
que nada devem. Tanto o Bloco como o PS querem proteger os cidadãos de alterações unilaterais aos contratos
de crédito, sendo que o PS propõe ainda incluir os produtos e serviços associados ao contrato de crédito.
Mas, porventura, o aspeto mais relevante para quem nos elegeu são as comissões no MB Way, esta
inovadora solução que já conta com 2 milhões de consumidores e que não será certamente a única. Depois de
um isco inicial de gratuitidade, um após um, os bancos começam a cobrar, nesta plataforma, comissões
desproporcionais e anticoncorrenciais, pois cobram na utilização da appMB Way, mas não cobram na utilização
do MB Way pela app do banco.
O PS propõe acabar com esta discriminação e com as comissões das pequenas operações para que a
inovação possa florescer, sim, e os seus proveitos possam ser partilhados entre os banqueiros e os
consumidores. Isto não pode ser motivo para ameaça de limitação da utilização do MB Way, de encerramento
de balcões ou de despedimento de trabalhadores. O interesse público e a vontade legislativa não podem ser
condicionados por esta chantagem.
O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!
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O Sr. Miguel Matos (PS): — Mas se o digital traz grandes benefícios, também traz grandes riscos, Sr.ª
Deputada, como a fuga ao fisco ou o branqueamento de capitais, algo, aliás, que o Bloco tem vindo a reconhecer
noutras instâncias. Neste caso, esse risco não está nas pequenas operações do dia a dia, mas no abuso da
solução para movimentar grandes somas de dinheiro de forma recorrente.
Nem fortes com os fracos nem fracos com os fortes. Pergunto, por isso, Sr.ª Deputada: será que vedar a
cobrança de comissões apenas para pequenas operações não é uma maneira mais segura, sensata e eficaz de
proteger a estabilidade financeira e o utilizador da banca e do MB Way?
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Miguel Matos, como disse na resposta
anterior, sobre distrates e comissões por extinção de dívida ou por cobrança de prestação, parece haver um
consenso. Essas comissões vão acabar, e bem, porque são absurdas, são bizarras e não fazem nenhum
sentido.
Mas há um outro problema, que é o de saber como é que se limita o poder dos bancos para cobrarem
comissões e para criarem novas comissões de forma desmesurada ou para alterarem condições contratuais,
quando os clientes não podem fugir desse contrato. Para isso é preciso ir mais longe.
A proibição de cobrança de comissão nas transferências através de MB Way é uma boa forma de o fazer.
Devo lembrar que a rede Multibanco portuguesa, que é única no mundo, foi desenvolvida sem cobrança de
comissões. Por lei, as operações efetuadas na rede Multibanco são gratuitas e nem por isso tal impediu que a
rede se desenvolvesse e criasse uma tecnologia nacional e própria.
O que os bancos estão a fazer é outra coisa. Na verdade, os bancos querem acabar com a plataforma MB
Way, porque estão a integrar nos seus serviços e nos seus sites as operações e os serviços proporcionados
pelo MB Way, de forma a extinguir a plataforma digital criada pela SIBS, essa, sim, produção nacional, essa,
sim, que pode ser exportada.
Os bancos, neste momento, têm um conflito e são um entrave ao desenvolvimento de tecnologia nacional no
que diz respeito ao MB Way. Por isso, desde já lhe digo que se é para desenvolver tecnologia nacional, se é
para apostar no desenvolvimento do MB Way ou de outras plataformas criadas em território nacional certamente
temos espaço e vontade para discutir essas questões em sede de especialidade.
O Sr. Jorge Costa (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Não me parece é que o controlo do branqueamento de capitais se faça
só porque se taxa transferências de montante mais alto. Há outros mecanismos para controlar o branqueamento
de capitais. Ainda assim, em sede de especialidade, certamente teremos espaço para discutir esta questão.
O que não resolve o problema é a proposta do PSD, que sabe que os serviços mínimos bancários só atingem
80 000 pessoas e, por isso, hipocritamente diz «queremos proibir as cobranças no MB Way, mas só para os
serviços mínimos bancários», ou seja, só para as 80 000 pessoas que têm serviços mínimos bancários.
Uma discussão mais interessante, Srs. Deputados, talvez seja sobre o que podemos fazer para garantir o
acesso de todos os cidadãos a serviços bancários básicos, porque reconhecemos que são um serviço público.
Aí, temos de discutir, sim, como alargar os serviços mínimos bancários e a proposta do Bloco é a de que se crie
uma conta bancária básica, gratuita, universal a que qualquer cidadão possa aceder.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves, do
Grupo Parlamentar do PCP.
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A titularidade de uma conta bancária à ordem
ou de um cartão de débito para a sua movimentação constitui, hoje, uma necessidade básica para a esmagadora
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maioria dos cidadãos. Como tal, o acesso a determinados serviços bancários não deve estar sujeito à
possibilidade de os bancos abusarem da sua posição para cobrarem comissões de manutenção excessivas.
O preço das comissões de manutenção das contas bancárias não tem parado de aumentar, assumindo
valores cada vez mais expressivos. Entre 1990 e 2018, as comissões bancárias triplicaram o seu peso na
estrutura do produto bancário, passando de um décimo, em 1990, para um terço, em 2018. Ao mesmo tempo,
a margem financeira baixou o seu peso de 80% para 68%. Estes dados demonstram que a banca se dedica
cada vez mais ao negócio da cobrança de comissões, em vez de se dedicar ao financiamento das famílias e da
economia nacional.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Seguindo as orientações de sucessivos Governos ou perante a passividade
destes, as administrações da Caixa Geral de Depósitos, em vez de afirmarem uma estratégia de diferenciação
da banca pública, adotam critérios de gestão em linha com a banca privada, também no que diz respeito às
comissões bancárias.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Duarte Alves (PCP): — O Governo não pode passar à margem destas opções da Caixa. O Estado é
o acionista único e, como tal, deve assumir essa posição de acionista,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Duarte Alves (PCP): — … um acionista que, como qualquer outro, se interessa e acompanha a gestão
e que não se desresponsabiliza, mas também um acionista que orienta as opções de fundo por critérios de
interesse público e não por critérios alheios ou mesmo contraditórios com o interesse público.
O PCP acompanhará os vários projetos que visam acabar com as comissões bancárias abusivas. É preciso
dar esse sinal e trabalhar na especialidade. Mas o problema manter-se-á até que seja permitido aos bancos que
continuem a inventar novos nomes para as comissões. Mesmo que se proíba, hoje, determinada comissão,
amanhã ela aparece com outro nome e o Banco de Portugal nada faz.
Por isso, a nossa opção foi vir a este debate com uma proposta para alargar e tornar gratuita a conta de
serviços mínimos bancários.
Os serviços mínimos bancários já existem e o seu regime foi melhorado no ano passado, em resultado de
diversas iniciativas legislativas, entre as quais uma do PCP.
Mas ficou por fazer uma medida que o PCP tem defendido e que volta a apresentar: acabar com a exigência
de exclusividade da conta de serviços mínimos bancários. Hoje, basta um cliente bancário ter outra conta em
qualquer banco para não poder aceder a uma conta de serviços mínimos bancários.
O que pretendemos é que essa limitação deixe de existir, sendo certo que cada pessoa poderia ter apenas
uma única conta de serviços mínimos bancários. Para nós, os serviços mínimos bancários não são uma espécie
de «conta bancária dos pobrezinhos».
O segundo projeto de lei que o PCP traz a este debate diz respeito às taxas que estão a ser cobradas em
plataformas digitais, designadamente no MB Way.
Propomos que, da mesma maneira que está proibida a cobrança de taxas no Multibanco, sejam também
proibidas as mesmas operações em plataforma digital.
A digitalização dos serviços bancários tem permitido aos bancos aumentar os seus lucros, uma vez que reduz
os seus custos operacionais.
É por isso que a banca tem amplamente promovido aplicações digitais para a facilitação de transferências,
pagamentos e outras operações, de que é exemplo o MB Way.
Estas aplicações, quando são promovidas, são apresentadas sem custos para o utilizador, o que lhes traz
uma assinalável expansão. Depois de generalizados, temos assistido à implementação de custos associados a
essas operações, que penalizam os clientes.
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O Sr. Bruno Dias (PCP): — É sempre a mesma coisa!
O Sr. Duarte Alves (PCP): — A introdução destas taxas não deixa de estar ligada à velha ambição da banca
de vir a cobrar pela utilização do Multibanco, o que terá o firme combate do PCP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Muito bem!
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Diferentemente das restantes propostas, a proposta do PCP não faz distinção
entre plataformas digitais operadas por terceiros, como é o caso do MB Way, e as plataformas desenvolvidas
pelos próprios bancos.
Que sentido faz que uma transferência no Multibanco seja isenta de custos, mas se for feita em homebanking
já passa a ter custos associados, sendo um meio ainda mais desmaterializado?
O Sr. Bruno Dias (PCP): — E de que maneira!
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Estamos confiantes de que, na especialidade, será possível melhorar os
aspetos de cada um dos projetos e chegar a uma solução que salvaguarde os clientes bancários que hoje usam
estas plataformas.
Srs. Deputados, falando de MB Way, falando de Multibanco, é justo relembrar que temos em Portugal um
dos sistemas mais avançados nesta matéria.
E quanto ao Multibanco, lembramos que este sistema pioneiro surgiu num momento em que a banca era
maioritariamente pública. Sim, foi a banca nacionalizada que fez esta inovação.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente! Isso mesmo!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Não é bem assim!
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Ao contrário do que ouvimos por aí, o Multibanco demonstra bem que a tese
de que só no privado é que há inovação é totalmente errada.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
Protestos do PSD.
O Sr. Duarte Alves (PCP): — E a realidade recente também demonstra que a banca privada, além de incapaz
de cumprir o seu papel de financiamento da economia, além de cada vez mais dominada pelo capital estrangeiro,
quando produz uma inovação — e reconhecemos o MB Way como uma boa inovação —, assim que tem o
produto massificado, passados poucos meses, já pensa logo em colocar comissões e taxas para se apropriar
dos excedentes resultantes dessa inovação.
Até isto demonstra bem que a opção de futuro, como o PCP tem reafirmado, é assegurar o controlo público
sobre a banca, colocando-a ao serviço da economia e do País.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, do
PAN.
O Sr. André Silva (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: 1 500 milhões de euros foi o valor que
a Caixa Geral de Depósitos, o BCP, o BPI e o Santander arrecadaram em comissões bancárias em 2019, o que
representa um aumento de 40 milhões de euros face a 2018.
Estes valores são exorbitantes e resultaram de sucessivos aumentos das comissões que se foram verificando
nos últimos anos. Só nos primeiros seis meses de 2019 as comissões bancárias subiram mais de 780 vezes em
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Portugal. Segundo a DECO PROTESTE, em 2019, mais de 60% das receitas da banca que opera em Portugal
advieram da cobrança das comissões bancárias.
Hoje, devido aos projetos do PAN e de outros partidos, discutimos a colocação de limites a estas práticas
excessivas, levadas a cabo pela banca para colmatar a conjuntura de juros historicamente baixos devido à ação
do Banco Central Europeu.
Estas práticas excessivas prejudicam pessoas idosas que não têm condições para mudar o modo como
consultam as suas contas ou para mudar de banco, prejudicam casais que, devido ao empréstimo para
habitação, têm de fazer contas a cada euro que sobra na conta ao fim do mês e empurram jovens que procuram
fazer as primeiras poupanças para soluções alternativas mais modernas e menos onerosas, como sejam as
contas PayPal.
É em nome destas pessoas que temos de procurar encontrar um consenso que alcance soluções com
alguma urgência. Temos de agir, porque já é evidente para todos que a banca está mais preocupada com o
lucro fácil de curto prazo do que com a estabilidade dos seus clientes, insistindo em não ver que este tipo de
postura vai pôr em causa a sua existência a médio prazo.
Com este projeto de lei que hoje aqui apresentamos, seguindo as recomendações da DECO PROTESTE, o
PAN propõe a eliminação de um conjunto de cinco comissões em que não existe propriamente como
contrapartida um serviço prestado pelos bancos, como, aliás, exige o artigo 7.º da Lei n.º 66/2015. Propomos a
clarificação necessária da referida lei para que os bancos não possam continuar a furtar-se ao seu cumprimento
e a cobrar indevidamente comissões bancárias.
Em concreto, com o nosso projeto de lei, propomos que se eliminem cinco comissões. Algumas destas já
foram classificadas pela DECO PROTESTE como sendo «comissões bizarras», pelo que importa, hoje, discorrer
um pouco sobre cada uma delas, de modo a que se perceba o que está em causa e porque têm de ser eliminadas
para que se cumpra, efetivamente, a Lei n.º 66/2015, de 6 de Julho.
Em primeiro lugar, comecemos pelas comissões associadas às plataformas de intermediação, como a MB
Way, que são as comissões mais recentes e que em grande medida afetam os clientes mais jovens. A utilização
destas plataformas por opção da SIBS, entidade gestora das plataformas, começou por ser gratuita. Contudo,
os bancos viram aqui uma fonte de rendimento e, portanto, apesar de este ser um serviço operado por terceiros
e de os montantes transacionados serem baixos, desde 2018 que os bancos vêm cobrando comissões
referentes a estas plataformas.
Hoje são cinco os bancos que o fazem: o BPI cobra 1,20 €, a Caixa Agrícola cobra 0,25 €, o Millennium BCP
cobra 1,20 €, o Santander cobra 0,90 € e a Caixa Geral de Depósitos cobra 0,85 € e mais 4% de imposto de
selo por cada transferência realizada.
Com que legitimidade pode um banco impor comissões bancárias por um serviço que não só não presta,
como, pior, é um serviço prestado por uma entidade que, por opção, nada quer cobrar por estes serviços? Para
o PAN, os clientes dos bancos têm o direito à modernização tecnológica sem que isso lhes traga mais custos e,
por isso, o caminho é o de impedir que os bancos cobrem comissões bancárias por estes serviços, algo porque
se deve aplicar o princípio que, por força do Decreto-Lei n.º 3/2010, de 5 de Janeiro, se aplicou e aplica
relativamente à utilização das caixas automáticas.
Em segundo lugar, temos as comissões bancárias associadas ao processamento das prestações de crédito
e à análise da renegociação das condições do crédito, nomeadamente do spread ou do prazo de duração do
contrato de crédito.
Conforme sublinhou a DECO PROTESTE, estas duas comissões incidem sobre meros procedimentos
informáticos em que não existe qualquer tipo de serviço prestado ao cliente, que no contrato de crédito já
acordou o pagamento do capital num certo número de prestações e que suporta o juro contratado. Contudo,
apesar de o cliente já ter pago este serviço quando assinou o seu contrato de crédito e apesar de a lei impedir
a cobrança de comissões em casos como este, o processamento das prestações de crédito custa entre 2,50 €
e 3 €, o que pode levar a que, por ano, um cliente bancário possa ter de pagar 30 € por um serviço que não
recebeu. É para que se respeitem os direitos dos clientes bancários e aquilo que dispõe a lei que agora o PAN
quer impedir a cobrança destas comissões.
Em terceiro lugar, gostaríamos de referir as comissões bancárias associadas à emissão do distrate por parte
do mutuante no final do contrato de crédito ou em caso de reembolso antecipado.
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Estas comissões são absolutamente incompreensíveis, porque o cliente bancário que já cumpriu todas as
suas obrigações para com o banco só poderá ver retirado do registo do seu imóvel o ónus da hipoteca se lhe vir
ser emitido o distrate por parte do banco. Contudo, apesar de este documento ser de obtenção obrigatória, de
a sua emissão se processar de forma automática e de o cliente ter cumprido todas as suas obrigações
financeiras para com o banco, o cliente só obterá este documento se pagar cerca de 160 €. Cá está, Sr.as e Srs.
Deputados, mais um caso em que urge garantir os direitos dos clientes bancários, porque os bancos não estão
a cumprir a lei.
Em quarto lugar, temos as comissões bancárias associadas à emissão de documentos declarativos de dívida,
respetivos encargos ou regularização.
Estas são comissões injustas, já que os clientes bancários, seja para efeitos fiscais, seja para a obtenção de
um apoio social, têm muitas vezes de obter, junto dos bancos, declarações de dívidas relacionadas com
empréstimos, seja o valor em dívida, seja o valor da prestação mensal suportada. Contudo, apesar de o cliente
já ter pago este serviço quando assinou o seu contrato de crédito e de este ser um documento de emissão
automática pelo banco sem custos operacionais relevantes, uma declaração do valor da prestação mensal custa,
em média, mais de 39 € e uma declaração que ateste o valor em dívida custa, em média, mais de 61 €. Mais
outro caso onde não deveria haver comissões bancárias, mas em que há porque os bancos continuam a fazer
tábua rasa do quadro legal aplicável.
Em quinto e último lugar, temos as comissões associadas à alteração de titularidade de conta de depósito à
ordem. Estas comissões ascendem a quase 5 € e servem apenas para que os bancos alterem a titularidade de
uma conta, colocando-lhe ou retirando-lhe um titular.
Estamos perante um mero ato burocrático, sem custos operacionais e que não implica a prestação de um
verdadeiro serviço por parte do banco. Prejudicados são os jovens casais que querem construir uma vida em
comum ou os pais que, por estarem mais idosos, precisam do auxílio dos filhos para a gestão das suas contas
bancárias.
Concluindo, o projeto do PAN, concretizando o quadro legal aplicável, impede a cobrança destas cinco
comissões que referi. Contudo, estamos abertos a que, em sede de especialidade, se possa ir mais longe e
procurar assegurar um consenso que introduza limitações a outras comissões que atualmente são cobradas
sem que seja verdadeiramente prestado um serviço ao cliente bancário. O que queremos é assegurar um reforço
dos direitos dos clientes bancários, pondo fim a comissões bancárias desproporcionadas, injustificadas e que
não têm a prestação de qualquer serviço como contrapartida.
Aplausos do PAN.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Vera Braz, do
Grupo Parlamentar do PS.
A Sr.ª Vera Braz (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O que nos traz aqui hoje é uma vontade conjunta,
bem visível pela existência de projetos dos vários partidos políticos que, apesar das suas diferenças, têm um
único propósito — o de proteger os consumidores.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Vera Braz (PS): — A crise económica e financeira de 2008 veio demonstrar-nos a importância do
reforço dos direitos dos consumidores no que diz respeito aos produtos financeiros. Efetivamente, nos últimos
anos, foi já implementado um conjunto de normativos com vista à sua prossecução.
Todos temos consciência de que, num contexto monetário exigente, com taxas de juro em mínimos, a banca,
através do seu modelo tradicional do negócio bancário, viu a sua rendibilidade, a sua palavra-chave afetada.
Por isso, tem recorrido a aumentos consecutivos das comissões bancárias como forma de obter proveitos que,
de outra maneira, não conseguiria obter.
No nosso quadro legislativo, já existe um conjunto de regras sobre produtos e serviços financeiros que
impõem diversos limites ou proíbem determinadas comissões com o propósito de defender os consumidores,
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nomeadamente quando preveem a mobilidade, tão importante, dos clientes bancários, a sua inclusão financeira
ou mesmo um incentivo à utilização de determinados serviços de pagamento.
No entanto, as mesmas parecem não ser suficientes. Continuamos hoje a assistir a inúmeras reclamações,
manifestações de preocupação por parte dos consumidores, que se sentem prejudicados com estes sucessivos
aumentos. E este Parlamento não pode ficar indiferente a esta problemática. Importa assegurar que existem
princípios de transparência, de proporcionalidade, de lealdade para com os consumidores. E esse é o
compromisso do Partido Socialista.
Adicionalmente, assistimos hoje a um novo paradigma, resultante da inovação e do desenvolvimento
tecnológico que, felizmente, atinge também o sistema financeiro.
Com esta nova era digital a aposta na capacidade tecnológica trouxe ao consumidor um acesso mais
cómodo, mais rápido e de menor custo, justificado pela compensação da diminuição da pressão sobre as
agências bancárias que, nesse seguimento, já se viram reduzidas, bem como diminuíram o número dos seus
colaboradores.
Este incentivo à utilização de novas plataformas, às quais os consumidores têm vindo a ser encorajados a
aderir, não pode agora ser quebrado, pelo que há que ser dada continuidade para que os serviços sejam
acessíveis, não só tecnológica mas também economicamente.
Mas não nos podemos distanciar da realidade já aqui falada: associados à inovação vêm também novos
desafios ao nível da segurança dos sistemas, da proteção de dados, do combate ao branqueamento de capitais.
Temos, por isso, de assegurar e de garantir que não é descurado o investimento por parte da banca, pois ele é
necessário para combater estes novos riscos. O sistema tem de, por si só, garantir a segurança e a confiança
essenciais para que utilizadores possam usufruir livremente destes serviços.
Por isso, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista procura encontrar o equilíbrio que permita manter a
sustentabilidade do sistema financeiro, condição essencial para o desenvolvimento económico do País, e,
simultaneamente, salvaguardar os interesses dos consumidores, pressupondo a existência de uma relação de
confiança entre estes e a banca.
Neste âmbito, a nossa proposta prevê a proibição de alterações unilaterais nas condições dos contratos de
crédito e serviços associados, a obrigatoriedade de emissão de distrate num prazo razoável sem necessidade
de requerimento do consumidor e a limitação nos custos decorrentes da emissão de declarações de dívida.
Permitam-me descrever, com maior detalhe, a medida contida na nossa proposta sobre a limitação das
comissões em plataformas eletrónicas de natureza financeira. Com esta proposta pretendemos dar resposta às
mais recentes indignações provocadas pelo aparecimento desproporcional de comissões a serem cobradas nas
transferências via MB Way.
A MB Way é um exemplo vivo da capacidade portuguesa de inovação e que a todos deve orgulhar. Foi a
primeira solução de pagamentos instantâneos na zona euro e conta atualmente com perto de 2 milhões de
utilizadores que se viram atraídos pela rapidez das transações, pela facilidade e pelo caráter intuitivo da
plataforma e pela inexistência de custos.
Não podemos, agora, permitir que a mesma seja encarada apenas como mais uma fonte de rendimento. Mas
porque temos consciência de que é necessário a banca continuar a investir e que não podem ser adotadas
medidas que possam ser inibidoras do investimento e da inovação, propomos não a isenção total do serviço
mas, sim, a atribuição de uma isenção até 100 € por operação, por transferência, neste caso, porque o MB Way
não permite apenas transferências tem muitas outras operações, com um limite mensal de 500 € e de 50
transferências.
Acreditamos que, desta forma, conciliamos e salvaguardamos três vetores essenciais: a estabilidade
financeira; o desenvolvimento tecnológico; e a proteção dos consumidores.
E com isto regresso ao início da minha intervenção, dizendo que o nosso projeto de lei tem um único
propósito: defender, salvaguardar e preservar os direitos dos consumidores.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — A Sr.ª Deputada tem dois pedidos de esclarecimento. Como é que
pretende responder?
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A Sr.ª Vera Braz (PS): — Em conjunto, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Com certeza.
Tem, então, a palavra, para o primeiro pedido de esclarecimento, a Sr.ª Deputada Isabel Pires.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Vera Braz, o tema e os
projetos que o Bloco de Esquerda traz hoje a debate não são novos. O valor de comissões bancárias que os
contribuintes têm pago cresce de ano para ano e só no ano de 2019 os principais bancos em Portugal
arrecadaram mais de 1500 milhões de euros em comissões bancárias. Não podemos dizer que estes números
são desconhecidos e por isso já na Legislatura passada trouxemos este debate para cima da mesa. Na altura,
projetos que eliminavam as comissões pelo processamento de prestação de crédito, por exemplo, foram
rejeitados com os votos contra do PS e abstenções do PSD e do CDS-PP.
Registamos os avanços que existiram neste debate, nomeadamente a posição do PS, que é a novidade do
debate. Pela nossa parte, já o dissemos, poderíamos e deveríamos ter avançado para a proteção dos
consumidores mais cedo, na altura em que rejeitaram estes projetos. Registamos esse avanço, mas não
esquecemos que os comportamentos do sistema bancário, apesar disso, não mudaram, havendo um avanço
significativo, que tem a ver com o MB Way, que a Sr.ª Deputada também referiu na sua intervenção.
No entanto, na nossa perspetiva, não vale a pena manter a chantagem de que eliminar a cobrança de taxas
vai impedir o desenvolvimento tecnológico português. Achamos que o debate devia ter sido ao contrário, ou
seja, como é que trabalhamos para que a eliminação dessa cobrança, que é justa, não oprima esse
desenvolvimento. Nisso, sim, devemos todos trabalhar, pelo que lhe pergunto como é que o Partido Socialista
pretende trabalhar nesse sentido, sem a chantagem do desenvolvimento tecnológico.
Depois, há duas matérias que nos parece que ficam aquém neste debate por parte do PS, em primeiro lugar,
o regime de serviços mínimos bancários. Na nossa perspetiva, ele deve ser alargado a todos e a todas, deve
chegar a toda a gente, porque significa uma necessidade que hoje em dia é incontornável. Pretende o PS ir ao
encontro desta necessidade?
Em segundo lugar, refiro-me à Caixa Geral de Depósitos. Apesar de todos os ataques que têm sido feitos, o
Bloco de Esquerda sempre pugnou pela defesa da banca pública e o que falta perceber, na nossa perspetiva,
da posição do PS neste debate, é se acha ou não que a Caixa deve cumprir o seu papel de serviço público de
proteção dos clientes mais desfavorecidos, da economia produtiva e da defesa da igualdade no acesso aos
serviços bancários.
Por fim, partindo de algumas das considerações que a Sr.ª Deputada fez na sua intervenção, que vão ao
encontro de algo que também já referimos, pergunto-lhe se o PS está disponível para aprovar todas as propostas
do Bloco de Esquerda.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília
Meireles.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Muito obrigada, Sr.ª Presidente.
Sr.as e Srs. Deputados, os projetos que hoje discutimos têm como objetivo tentar, embora, do meu ponto de
vista, sem sucesso, resolver dois problemas: primeiro, o da cobrança de comissões em plataformas eletrónicas,
como é o caso da MB Way, de forma manifestamente abusiva e desproporcionada cobrando um valor que é
muito excessivo por cada transação. Numa plataforma de transferências, sobretudo de baixos montantes, não
faz nenhum sentido haver comissões que correspondam, por exemplo, a 25% do valor transferido. É
completamente desproporcional. O segundo problema tem a ver com a cobrança de comissões bancárias sem
que haja serviço efetivamente prestado.
Aquilo que não está a ser discutido e que não vai ser resolvido por nenhum destes projetos tem a ver com
vários factos. Primeiro: muitas destas comissões já são atualmente ilegais.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!
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A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — O que temos é um supervisor e um supervisor bancário que não
funciona e uma regulação que ou não funciona ou não funciona em tempo útil.
Vou lembrar alguns factos: Sr.as e Srs. Deputados, em Portugal, em 2012, houve um banco que denunciou
práticas graves de distorção da concorrência e da existência de um cartel na banca. Durante sete anos — sete
anos, Srs. Deputados! — houve uma investigação e, finalmente, pela primeira vez, foi tomada uma decisão, sete
anos depois.
Poderemos ser otimistas e imaginar que a boa notícia é que, finalmente, aconteceu alguma coisa, mas a
verdade é que sete anos não é tempo útil para se tomarem decisões, nem sobre isso nem sobre coisa nenhuma,
e também é verdade que o banco que denunciou a situação já não opera no mercado português.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Exatamente!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — É, pois, preciso que este Parlamento reflita bastante sobre a
inoperância dos reguladores.
Também convém não esquecer que quer a rede Multibanco quer a plataforma MB Way são desenvolvidas
pela SIBS e que a SIBS é detida pelos bancos. Pergunto se não haverá aqui um problema de concorrência e se
não devemos olhar para isto com seriedade.
Em terceiro lugar, gostava de lembrar que no Banco de Portugal está a supervisão prudencial e
comportamental e não pode, sistematicamente, a supervisão comportamental fechar os olhos, porque a
supervisão prudencial se sobrepõe. Vou traduzir isto: não é aceitável que o Banco de Portugal diga «deixem lá
os bancos fazerem o que entenderem nas comissões, porque senão há falências e vai ser preciso que os
contribuintes ponham lá dinheiro de outra maneira». Isto não é aceitável, mas há, pelo menos, da minha parte,
a perceção de que isto pode, em muitos casos, acontecer.
Portanto, o que estes projetos vêm dizer é que, como não há supervisão e regulação que funcionem em
condições, vamos tentar por lei fazer a função do supervisor e do regulador, ou seja, vamos tentar prever tudo
e mais alguma coisa, vamos tentar proibir tudo e mais alguma coisa e vamos, através da hiper-regulamentação,
substituir-nos ao Banco de Portugal.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Quanto à supervisão, gostava de dizer que o CDS tem não apenas
abertura para trabalhar o tema como apresentará propostas sérias, como já o fez no passado, sobre supervisão
financeira e separação destes dois pilares da supervisão, a saber o comportamental e o prudencial.
Srs. Deputados, é importante perceber que estas propostas podem ter boas intenções ou podem querer
parecer que têm boas intenções, mas, na verdade, estão a enganar as pessoas na maior parte dos casos.
O PS dizia que esta proposta vinha dar resposta às indignações. Ó Srs. Deputados, nós não devemos legislar
para dar resposta às indignações; devemos legislar para evitar que as pessoas tenham motivo para se indignar
com a inoperância dos supervisores e dos legisladores.
A raiz deste problema é a falta de concorrência e a falta de regulação no mercado.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Ah, quer mais bancos?!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Se o modelo dos bancos não consegue ser lucrativo em concorrência
ou sem abusos, então alguma coisa está aqui, seriamente, errada.
É também preciso perceber que, em alguns casos, estas propostas vão agravar o problema e não vão
resolvê-lo, como estão a alertar as fintech que podem ver-se afastadas do mercado.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Exatamente!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Continuar a fechar o mercado aos bancos e a alienar empresas novas
e dinâmicas que estão a melhorar a concorrência, como estas propostas farão ao proibir, pura e simplesmente,
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o comissionamento, que é a única fonte de financiamento destes novos modelos de negócio, significa que estão
a fazer um enorme favor aos bancos. Ou seja, à boleia de querer responder às indignações que muitos sentem,
justamente, contra os bancos, aquilo que vão fazer é fechar o mercado à nova concorrência e deixar que
continue o monopólio da banca.
O Sr. Jorge Costa (BE): — Tão preocupada com a concorrência…!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Gostava ainda de salientar que o mundo não está parado, nem parou
há 10 anos. Ao querer híper-regulamentar, ao querer tudo legislar e ao querer tudo fechar, este Parlamento
corre o risco de passar completamente ao lado dos novos modelos de negócio que vêm, precisamente,
beneficiar o consumidor.
Por último, gostava de lembrar a última falha: a legislação não prevê tudo, nem pode nunca prever tudo.
Mostro-vos, pegando no preçário da Caixa Geral de Depósitos, com 93 páginas, que a lei diz que é entregue ao
Banco de Portugal, portanto o Banco de Portugal vê isto tudo.
Os senhores resolvem o absurdo, digamos assim, da comissão de distrate e da comissão de processamento
de prestação. Estou absolutamente de acordo em que estas comissões são ilegítimas e, do meu ponto de vista,
hoje em dia, ilegais, mas, a título de exemplo, refiro as comissões associadas a atos administrativos por créditos
à habitação onde temos: declaração de dívida, 50 €; declaração de encargos de dívida, 30 €; extratos de conta
de empréstimos em vigor, 100 €; renúncia ao ónus de inalienabilidade ou outros ónus, 100 €; extinção de
procurações irrevogáveis, valores que vão desde os 82 €… Nenhum destes problemas é resolvido com a vossa
legislação.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — E com a vossa?
O Sr. Jorge Costa (BE): — Qual nossa? Ainda não há!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Quanto a comissões durante a vigência do contrato — na locação
financeira imobiliária, que não é crédito hipotecário, mas é semelhante — temos valores, por exemplo, para a
carta-mandato de representação do cliente no condomínio, 30 €, tratamento de processo com advogado do
condomínio que necessite de parecer técnico/jurídico, 250 €.
O Sr. Miguel Matos (PS): — E onde está a vossa proposta? Zero!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr.as e Srs. Deputados, nós não somos o Banco de Portugal! O que
precisamos é de um Banco de Portugal que saiba fazer supervisão comportamental.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — E o que é que propõem?
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Termino dizendo que não inviabilizaremos o estudo destas questões,
que são sérias, mas não contem connosco para tentar construir legislação que não só não vai resolver os
problemas como se arrisca a fechar o mercado a novas empresas.
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada Cecília Meireles, queria dizer que não interrompi a sua
intervenção porque o tempo usado para pedir esclarecimentos foi descontado no tempo global do CDS-PP.
Para responder a este conjunto de pedidos de esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Vera Braz,
do Grupo Parlamentar do PS.
A Sr.ª Vera Braz (PS): — Sr.ª Presidente, agradeço às Sr.as Deputadas as questões que me colocaram.
No início da minha intervenção comecei por referir algo de muito importante e que supostamente nos uniria
a todos: a proteção dos consumidores.
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Vozes do PS: — Muito bem!
A Sr.ª Vera Braz (PS): — Fico satisfeita ao perceber que o CDS também está neste barco e só tenho pena
que, neste seguimento, não tenha apresentado também um projeto com que pudesse contribuir para essa
mesma proteção.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Pois é!
Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.
A Sr.ª Vera Braz (PS): — Aquilo que nos une e com que todos estamos de acordo é que os constantes
aumentos das comissões bancárias precisam de ser travados. Todos sabemos que os bancos são os acionistas
da SIBS, como bem referiu, e portanto, sendo o MB Way uma plataforma da SIBS, parte do seu desenvolvimento
e inovação tecnológica passou pelos bancos e teve o apoio destes. É importante que os bancos continuem a
contribuir para este avanço tecnológico, pois é fundamental que ele não seja descurado.
Relativamente à Caixa Geral de Depósitos, atuou em concorrência com os bancos nacionais e estrangeiros
e, nesse sentido, nenhuma iniciativa pode implicar distorções a nível competitivo entre a Caixa Geral de
Depósitos e os outros bancos. Aquilo em que todos pretendemos trabalhar é na defesa dos consumidores e dos
seus interesses e estamos disponíveis para, em sede de especialidade, podermos melhorar a nossa proposta,
para que ela tenha um único caminho que nos defenda a todos, que proteja os consumidores, com o único
propósito de não deixar que a banca continue estes aumentos consecutivos das comissões sem ter de dar
explicações a ninguém.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Silva, do
Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Vai dizer que o Novo Banco foi uma invenção de Passos Coelho!
O Sr. Carlos Silva (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As reformas decorrentes do processo
de integração financeira, consolidado na União Económica e Monetária, tiveram em vista criar e harmonizar um
mercado único europeu de serviços financeiros e este processo teve como consequência profundas alterações
no setor bancário. Acresce uma forte pressão competitiva por parte de instituições financeiras sediadas em
países europeus de maior crescimento económico. Acresce, ainda, o desenvolvimento dos mercados financeiros
em torno do digital, que acarretou consequências muito positivas para os consumidores por via de um acesso
mais cómodo, mais rápido e a muito menor custo aos mercados e produtos financeiros, mas com custos muito
elevados de adaptação por parte da banca.
É neste contexto da União Económica e Monetária que atualmente se move o setor bancário português, de
cujos contornos o resultado mais visível foi o da redução muito significativa das taxas de juro, com
consequências muito positivas para quem necessita de crédito mas com consequências negativas ao nível da
poupança.
Por outro lado, a compressão das margens de juro líquidas levou a que a intermediação financeira, tal como
a conhecíamos, tenha deixado de ser uma fonte de recursos para os bancos, obrigando-os a procurar novas
fontes de receita. Os bancos reestruturaram-se e hoje as comissões bancárias sobre os serviços financeiros
prestados aos clientes são um ponto crítico da sua atividade. A venda de serviços, com a consequente cobrança
de comissões que lhe está associada, era, até há bem pouco tempo, uma atividade não cobrada ou, em
alternativa, isenta de pagamento, mas tornou-se hoje uma das principais fontes de receita da banca. Estamos,
assim, a assistir a uma transição clássica de um setor em atividade que, em teoria, não deveria constituir um
problema.
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Sucede, porém, que, na prática, a banca acabou por ser mais papista do que o Papa. Cobra comissões por
tudo e por nada, às vezes ridículas quanto à natureza da cobrança ou ainda de forma totalmente injustificada
para o consumidor. É inaceitável que um banco aplique uma comissão por cobrar a prestação do crédito, numa
espécie de «o cliente ter de pagar para poder pagar». É inaceitável que os bancos cobrem, por vezes, por
serviços não prestados.
Assim se criou a perceção junto dos portugueses de que pagam demasiado pelos serviços financeiros, para
mais numa altura em que o dinheiro depositado nos bancos praticamente não é remunerado.
Sr.as e Srs. Deputados, é aqui que o Estado não pode dispensar um papel ativo por parte das entidades de
regulação e de supervisão. Mais do que intervenções do Parlamento no sentido de legislar, é crítico haver um
papel mais interventivo dos fiscalizadores e também dos reguladores. Os consumidores só beneficiam de preços
verdadeiramente justos e suficientemente baixos se os mercados forem devidamente transparentes e
concorrenciais.
Sr.as e Srs. Deputados, o que está em causa não é acabar com as comissões. É evidente que os portugueses
sabem que alguma coisa terão de pagar pela contrapartida dos serviços fundamentais que lhes são prestados.
O que está em causa é saber se determinadas comissões fazem algum sentido e se o seu preço é justo,
proporcional e equilibrado. É sobre isto que o PSD quer falar, é sobre estes aspetos que incidem as propostas
do projeto de lei do PSD. Estamos a dar passos seguros, já o fizemos no passado, estamos a fazê-lo agora
também.
Por isso, estamos a propor alterações que restrinjam comissões associadas ao processamento das
prestações de crédito, à emissão do distrate e à emissão de declaração de dívida alheia à vontade do cliente,
nomeadamente para cumprimento de obrigações fiscais ou de outra natureza perante o Estado. Ainda propomos
uma alteração aos serviços mínimos bancários, no sentido de estes acompanharem a crescente inovação
tecnológica, propondo o alargamento do leque de operações disponíveis no serviço de modo a contemplar
também transferências através do serviço MBWay ou outro de idêntica natureza.
O PSD sempre esteve na primeira linha das reformas que, de resto, se traduziram em alterações com efeitos
muito positivos para o acesso, a custos reduzidos, dos consumidores bancários a serviços considerados
essenciais. Por exemplo, foi por ação do PSD que, na prática, se tornou obrigatória a oferta, por todos os bancos,
das contas de serviços mínimos bancários a todos os portugueses, contribuindo para que ninguém fosse
excluído do sistema bancário e financeiro. Não foi por acaso que se assistiu a um crescimento exponencial, de
sete vezes e meia, do número de contas de serviços mínimos bancários existentes em final de 2014. São hoje
mais de 100 000 contas de serviços mínimos bancários.
Demos passos certos e seguros no sentido de beneficiar os portugueses e, simultaneamente, de contribuir
de forma responsável para a sustentabilidade do sistema, mas, acima de tudo, demos passos prudentes perante
fatores que, no futuro, se pudessem tornam perniciosos para os contribuintes e consumidores.
Sr.as e Srs. Deputados, a esquerda do Parlamento opta sempre por introduzir soluções fáceis de implementar
no curto prazo, mas tende a ignorar a possibilidade da existência de custos irreparáveis e perniciosos a médio
e longo prazos.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Se fossem fáceis o PSD aprovava-as!
O Sr. Carlos Silva (PSD): — Ninguém compreenderá que uma economia frágil como a portuguesa venha
introduzir inovações em matéria legislativa que fragmentem a capacidade dos bancos portugueses face aos
congéneres europeus. Por isso, perguntamos se estão devidamente analisadas as consequências de algumas
das medidas propostas pela esquerda no preço que os portugueses terão de pagar, no futuro, para poderem
adquirir uma habitação com o apoio de um banco.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Estão todas analisadas. Todas!
O Sr. Carlos Silva (PSD): — A que spread o vão efetuar quando as taxas de juro da Euribor voltarem a subir,
contrariamente ao que acontece hoje em dia? Quantas mais comissões vão ser cobradas para além das que já
pagam? Com a implementação de algumas medidas que pudemos observar, quantos mais trabalhadores da
banca terão de ser despedidos ou de ver negociadas saídas precárias?
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O PSD não estranha que a esquerda mais radical não tenha este tipo de preocupações. De acordo com a
vossa cartilha, quando existem problemas de necessidades de capital do sistema financeiro, os senhores têm
sempre um remédio, decretam a nacionalização dos bancos.
Protestos do Deputado do BE Jorge Costa e do Deputado do PCP Bruno Dias.
Com isso, no final da linha, colocam os contribuintes portugueses a arcar com a fatura da vossa
irresponsabilidade. Estranhamos, isso sim, a imprudência e a demagogia do Partido Socialista, mas esta é a
diferença que nos separa.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — É, é!
O Sr. Carlos Silva (PSD): — Somos contra a criação de mais riscos para Portugal não para proteger a banca
mas, sim, para proteger os contribuintes, no futuro, dos problemas relacionados com a vossa imprudência.
Sim, queremos uma banca competitiva no mercado concorrencial.
Protestos do Deputado do BE Jorge Costa e do Deputado do PCP Bruno Dias.
Só assim será possível financiar as famílias e as empresas, contribuindo para o crescimento da economia
sem criar desequilíbrios face a concorrentes externos que coloquem em risco o País e os portugueses.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Há duas inscrições para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Carlos
Silva.
Como deseja responder, Sr. Deputado?
O Sr. João Oliveira (PCP): — Pode responder um a um! Não paga comissão por isso!
O Sr. Carlos Silva (PSD): — Respondo em conjunto, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito bem, Sr. Deputado.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Anastácio, do Grupo Parlamentar do
PS.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Vai perguntar qual é a banca portuguesa!
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, não quero começar a minha
intervenção sem formular o mais veemente repúdio pelos termos do comunicado da Associação Portuguesa de
Bancos (APB).
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Não é com comunicados a roçar a chantagem sobre o Parlamento e
sobre os portugueses que o sistema bancário se credibiliza.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — No nosso entendimento, esta nota deve ser feita aqui e agora, no
decorrer deste debate.
Aplausos do PS.
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O Sr. João Oliveira (PCP): — É uma boa pergunta para colocar ao PSD!
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Ciente de que todos estamos empenhados em pôr cobro ao abuso que
tem sido a prática dos bancos quanto a comissões bancárias, destaco da sua intervenção, Sr. Deputado Carlos
Silva, alguma preocupação que evidenciou relativamente aos sucessivos aumentos que essas comissões têm
vindo a sofrer nos últimos anos e o impacto que esse acréscimo de custos teve, e tem, junto dos consumidores
portugueses, em suma, dos clientes dos bancos.
Mas também registei que expressou alguma preocupação com a sustentabilidade do sistema financeiro.
Períodos como os que vivemos há alguns anos, e de que hoje continuamos a sentir os efeitos, estão bem
presentes junto dos contribuintes e não se podem repetir de forma alguma.
Sr.as e Srs. Deputados, todos estamos de acordo com a ideia de que banca não pode continuar a agravar
sistematicamente os custos do acesso ao sistema financeiro, olhando para os consumidores como um poço sem
fundo. Esta não pode ser a permanente e recorrente resposta do sistema financeiro para fazer face à atual
conjuntura da atividade bancária.
Numa economia de mercado, genericamente, os custos dos serviços financeiros devem ser pagos tal como
os de quaisquer outros serviços. Porém, o custo do acesso a esses serviços tem de ter uma base justificada na
qual assenta o seu cálculo, base essa em que haverá, com certeza, espaço para fazer repercutir esses custos,
tendo em consideração a atividade desenvolvida pelos bancos.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Muito bem!
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Mas aquilo a que estamos a assistir é que não pode continuar, pois, no
nosso entendimento, ultrapassa os limites do razoável. A título de exemplo, e sem confundir, até mesmo o
Estado, quando fixa o valor de uma taxa, deve ter em consideração, na sua determinação, os encargos com a
prestação de serviço a que a mesma se reporta, o que, aliás, se compreende perfeitamente.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem.
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Este raciocínio leva-nos a concluir que se deve garantir que a fixação
do valor das comissões bancárias a praticar no setor financeiro deve ser efetuada dentro dos limites razoáveis
e com respeito pelos princípios que norteiam a atividade do setor bancário em Portugal, nomeadamente o
princípio da proporcionalidade, com preocupações de sustentabilidade do sistema financeiro. Mas deve também
procurar promover a inclusão financeira, especialmente através dos canais digitais que hoje desempenham um
papel crucial na sociedade portuguesa.
Sr.as e Srs. Deputados, estamos cientes de que há diferentes projetos e que todos eles evidenciam uma
preocupação com o acesso ao sistema financeiro. Portanto, serão, com certeza, elementos úteis para trabalhar
e, em sede de especialidade, iremos dar o necessário contributo àqueles que hoje merecerem aprovação no
Plenário, para que encontremos as melhores soluções.
Não queria terminar esta intervenção sem colocar uma questão muito concreta ao Sr. Deputado Carlos Silva.
Nós, no Partido Socialista, temos algumas reservas no que concerne a algumas das soluções contidas nas
vossas propostas, mas encaramo-las como um contributo positivo, um contributo para uma reflexão global sobre
esta matéria, a desenvolver no trabalho na especialidade.
Partindo deste pressuposto, termino com a seguinte questão: está o PSD disponível para acolher o princípio
da proporcionalidade na determinação do valor das comissões bancárias? Está o PSD aberto a trabalhar na
preparação do necessário enquadramento legislativo que permita estabelecer uma base legal na definição
objetiva de tais custos, criando a obrigação de justificação dos mesmos e criando condições para que o regulador
não se possa eximir das suas responsabilidades, ficando este habilitado a verificar o cumprimento dessas
obrigações por parte dos diferentes agentes do sistema financeiro?
Estamos cientes de que esta questão será essencial e de que a resposta positiva à mesma permitirá termos
sucesso numa efetiva proteção e defesa dos consumidores.
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Aplausos do PS.
Entretanto, assumiu a presidência o Presidente, Eduardo Ferro Rodrigues.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Ricardo Vicente, do Bloco
de Esquerda.
O Sr. Ricardo Vicente (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Silva, as instituições bancárias estão a
funcionar de forma contrária ao que seria de esperar no normal funcionamento da economia.
Nas últimas décadas, o desenvolvimento tecnológico aumentou as produtividades e, com isso, a
generalidade dos produtos e dos serviços tornaram-se mais baratos. Curiosamente, no setor bancário, está a
acontecer o contrário. Muitos serviços, que antes eram tratados ao balcão de forma gratuita, hoje são garantidos
pela internet, com menos despesa para os bancos, mas são cobrados caro aos clientes e de forma abusiva. São
exemplo disso a cobrança de mais de 50 € pela emissão de declarações oficiais sobre contas bancárias ou os
30 € anuais pelo processamento da prestação de crédito. Encontramos, também, cobranças abusivas nos custos
de manutenção de conta ou numa simples transferência bancária. As comissões bancárias são um exemplo de
negócio para os bancos que, só em 2019, cresceu 40 milhões de euros.
Hoje, o Parlamento volta a votar um conjunto de propostas que podem trazer mais justiça à vida das pessoas.
O Bloco propõe a criação de uma conta básica universal, que disponibilizará a todos os clientes bancários um
conjunto alargado de serviços básicos a um preço tabelado. Propomos, também, a eliminação de comissões
abusivas, por exemplo a cobrança de comissões por processamento de prestações de crédito ou a proibição de
cobrança de taxas pelas transferências realizadas através do MB Way e de outras plataformas.
O PSD tem aqui uma segunda oportunidade para votar favoravelmente nestas propostas e para reconhecer
que esta situação é abusiva. Está o PSD disponível para o fazer? É que, no passado, o voto do PSD, assim
como o do PS, já falharam ao País neste sentido.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para responder a estes pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos
Silva, do PSD.
O Sr. Carlos Silva (PSD): — Sr. Presidente, gostaria de agradecer as questões que foram colocadas pelos
dois Srs. Deputados, do Partido Socialista e do Bloco de Esquerda.
Sr. Deputado do Partido Socialista, Fernando Anastácio, quanto aos princípios estamos de acordo. O
princípio que enunciou parece-me um princípio correto e, naturalmente, no âmbito da especialidade, podemos
aprofundá-lo. Não é aí que se encontra a nossa divergência. A nossa divergência coloca-se porque o que o
Partido Socialista diz é uma coisa, o que o Partido Socialista escreve no papel é outra. Nessa circunstância, o
Partido Socialista engana os portugueses. Por isso é que ficamos preocupados!
Protestos do PS.
Não podemos acompanhar muitas das vossas sugestões. É inaceitável, como todos aqui disseram, que se
coloquem a um serviço português como o MB Way os limites que os senhores colocaram. A própria DECO, que
não é contra a existência de comissões no serviço de MB Way, vem dizer que o serviço deveria ser proporcional.
Concordamos todos com o princípio! Os preços têm de ser feitos de forma justa, proporcional, de forma a que
possam servir melhor os portugueses. Não é isso que aparece nas vossas propostas!
É evidente que quando se colocam os limites que os senhores colocaram ao serviço de MB Way acabam
com esse serviço na hora! Mais do que isso, nem as plataformas internacionais se interessarão por operar em
Portugal. Isto leva a que, naturalmente, a concorrência se torne mais difícil e a que os portugueses não
beneficiem dessa concorrência.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — O Sr. Eng.º Faria de Oliveira está cá?
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O Sr. Carlos Silva (PSD): — Quanto à questão do Sr. Deputado do Bloco de Esquerda… Peço desculpa por
não saber o seu nome.
O Sr. Ricardo Vicente (BE): — Ricardo Vicente.
O Sr. Carlos Silva (PSD): — Sr. Deputado Ricardo Vicente, não concordamos com o vosso princípio de
borlas para todos.
O Sr. Ricardo Vicente (BE): — É só para os bancos!
O Sr. Carlos Silva (PSD): — O Bloco de Esquerda permanentemente vem a esta Assembleia da República
tentar acabar com um serviço de banca em Portugal, um serviço que sirva os portugueses. É evidente que,
quando se colocam borlas para toda a gente, alguém há de pagar e, normalmente, são os contribuintes que
pagam.
Risos do BE.
Portanto, não podemos concordar com as vossas propostas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, foi e é enternecedor ouvir o Partido Socialista sobre esta
matéria. Para ficar melhor, faltava só o Sr. Deputado André Pinotes Batista repetir novamente que o PS é
completamente impermeável aos interesses privados para a Câmara ficar ainda com mais energia.
Esta é que a verdade: a Diretiva n.º 2014/92/UE deveria ter sido transposta pelo Governo socialista, esteve
em atraso e quase fomos multados por não a termos transposto a tempo. O que dizia a diretiva? Permitia aos
portugueses saber quais eram as comissões que, efetivamente, pagavam nesta matéria.
Temos mais: em 2014, o agora Primeiro-Ministro disse que ia limitar de forma brusca as comissões bancárias.
Passaram quatro, cinco anos e o que tivemos? Nada! Tivemos, sim, notícias do Jornal de Negócios desta
semana que nos diziam que o próprio Ministério das Finanças ia fugir às comissões bancárias e centralizar os
pagamentos, ou seja, paguem os outros, pois nós, se pudermos fugir, fugimos.
Este é o princípio sempre básico. O que aconteceu? O Partido Socialista viu-se encurralado pelos seus
amigos da geringonça e agora vem com a história de que, afinal, também quer reduzir as comissões bancárias,
etc.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o seu tempo.
O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente.
A Sr.ª Deputada Vera Braz diz que é preciso salvaguardar o investimento bancário, etc.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Onde está o projeto do Chega? Onde?
O Sr. André Ventura (CH): — O projeto do Chega é muito claro.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Zero! Zero!
O Sr. João Paulo Correia (PS): — E o Chega tem projeto?
O Sr. André Ventura (CH): — Temos, sim.
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O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço que conclua.
O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente.
O Chega estará ao lado daqueles que querem, efetivamente, reduzir as comissões bancárias,…
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Então vai votar a favor do projeto do PS!
O Sr. André Ventura (CH): — … porque não faz sentido haver bancos em Portugal que as aumentam 16
vezes em apenas três meses. Essa é que é uma verdade indiscutível!
O Sr. Miguel Matos (PS): — É só palheta!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes.
O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Fruto da evolução tecnológica,
mas também da própria sociedade, alguns serviços, que há umas décadas ainda poderiam considerar-se
inacessíveis à esmagadora maioria da população, hoje constituem, para a generalidade dos cidadãos, um dado
adquirido e, em grande parte dos casos, representam mesmo uma necessidade.
Os serviços bancários são um exemplo claro destes novos serviços que, aos poucos, mas progressivamente,
acabaram por se transformar em reais necessidades e, para a generalidade das pessoas, num facto corrente
da sua vida quotidiana, tornando a sua utilização um ato comum e banal.
Podemos até dizer que, nos dias de hoje, é muito difícil ou bastante mais complicado viver sem os serviços
bancários. Na verdade, chegámos a esta situação de dependência dos serviços bancários não por pressão ou
por exigência dos cidadãos, sem prejuízo das vantagens e dos benefícios que daí possam advir para os
mesmos, mas sim por pressão, por um lado, das instituições financeiras bancárias, interessadas em aumentar
a sua carteira de clientes, e, por outro, por parte de entidades públicas e privadas, designadamente as
responsáveis pelos pagamentos de salários, subsídios ou pensões, interessadas, naturalmente, em reduzir as
despesas relativas a essas transferências ou a essas operações.
Sucede que os valores que os cidadãos são obrigados a pagar em comissões bancárias têm vindo a
aumentar de ano para ano, atingindo valores que começam a pesar nos orçamentos familiares e de forma
significativa e mais intensa nos orçamentos das famílias mais fragilizadas do ponto de vista económico. Só
durante o ano de 2019, os principais bancos arrecadaram mais de 1500 milhões de euros em comissões
bancárias. Foi este o montante despendido pelos portugueses num único ano, pela utilização de cartões de
crédito ou de débito e pela utilização de aplicações digitais ou plataformas eletrónicas para proceder a
transferências ou a pagamentos, como é o caso do MB Way.
É também perante estes números que Os Verdes consideram necessário tomar medidas no sentido não só
de estabelecer, no plano legal, limites às cobranças das comissões bancárias, como também alargar a proibição
de cobrança de encargos pela prestação de serviços de pagamento e pela realização de operações com recurso
a aplicações digitais.
Mas, para além dos valores que ganham já proporções assustadoras, temos assistido, relativamente às
aplicações digitais, ao facto de, normalmente, os bancos as apresentarem como não tendo custos para o
utilizador, já que promovem reduções dos custos operacionais dos bancos. Sucede que, depois de essas
aplicações entrarem no circuito e de se afirmarem como recurso, e numa espécie de publicidade enganosa
dilatada no tempo, os mesmos bancos, que as promoveram sem custos para o utilizador, começam a impor
comissões atrás de comissões pela sua utilização, obrigando os utilizadores a suportar despesas por um serviço
que lhes havia sido «vendido» pelos bancos, sem quaisquer custos.
Por outro lado, no plano legal, está consagrada a proibição da cobrança de encargos aos utilizadores nas
operações efetuadas nas caixas Multibanco e, por maioria de razão, o recurso a estas aplicações digitais
também não deve estar sujeito a quaisquer encargos para o utilizador. Tal significa que a proibição atualmente
existente para a utilização de operações, através dos terminais de Multibanco, na perspetiva de Os Verdes, deve
estender-se também às aplicações digitais.
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Relativamente ao conjunto de iniciativas que hoje estão em discussão, queria também, em nome de Os
Verdes, deixar três notas. A primeira é para dizer que a apresentação de projetos de lei, por parte do PS e do
PSD, é um bom sinal, porque incidem ou sugerem uma evolução na forma como, tanto o PS como o PSD, têm
olhado para o problema. Recordo que o PS e o PSD inviabilizaram, por exemplo, com o seu voto contra, um
projeto de lei apresentado por Os Verdes, durante a X Legislatura, e que propunha exatamente impor limites à
cobrança de despesas de manutenção de contas bancárias. E, portanto, é caso para dizer: PS e PSD bem-
vindos ao clube!
A segunda nota é para dizer que Os Verdes vão acompanhar todas as iniciativas legislativas em discussão
que, a nosso ver, venham proteger os consumidores, nomeadamente, através da imposição de limites às
cobranças das comissões bancárias ou através da proibição de cobrança de encargos pelas prestações de
serviços de pagamento e pela realização de operações com recurso a aplicações digitais.
Por fim, queria dizer que Os Verdes acompanham a leitura que o Partido Socialista hoje fez, através do Sr.
Deputado Fernando Anastácio, relativamente à chantagem feita pela Associação Portuguesa de Bancos, como
resposta à discussão que fazemos neste Plenário, acrescentando agora que, na perspetiva de Os Verdes, esta
chantagem da Associação Portuguesa de Bancos é absolutamente inaceitável.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brás, do Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. Carlos Brás (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Um Estado de direito tem a obrigação de
proteger os seus cidadãos e uma maioria parlamentar de esquerda tem o dever de criar condições, através do
seu poder legislativo, que garantam a igualdade de circunstâncias perante as instituições, regulando os
desequilíbrios criados pelo mercado e pelos agentes económicos. Assim é, também, no acesso a produtos
financeiros e bancários.
A sociedade foi-se estruturando de forma a tornar indispensável e incontornável a utilização destes serviços
bancários. Por sua vez, estes viram nesta evolução a oportunidade de diversificar, complexificar e,
consequentemente, cobrar, criando franjas de população excluídas e, por vezes, alvo de alguns abusos.
Todos percebemos que o negócio bancário tem vindo a evoluir da intermediação financeira para o
comissionamento, e também todos percebemos que, se não há atualmente, já houve concertação entre bancos
subvertendo os princípios da livre concorrência, com prejuízo óbvio dos clientes. Sabemos, ainda, que têm vindo
a ser criados produtos e serviços de fácil acesso e utilização e que, generalizada a sua divulgação, logo após
aparecem as taxas para os cobrar.
Acresce a isto que os portugueses têm vindo a alterar a forma como olham para os bancos. Estes eram, até
há poucos anos, instituições credíveis e de total confiança. Mas, fruto de diversas vicissitudes, de escândalos e
de casos de corrupção no setor, hoje, os portugueses olham para os bancos com desconfiança e com muitas
dúvidas.
Sendo os bancos e o sistema financeiro peças fundamentais de uma economia desenvolvida e moderna,
importa, pois, que o poder legislativo intervenha regulando a relação entre bancos e público e, sobretudo, em
favor da proteção dos mais frágeis e desfavorecidos. Assim aconteceu com o Decreto-Lei n.º 27-C/2000, de 10
de março, que veio criar o sistema de acesso aos serviços mínimos bancários. Esta é uma lei que tem vindo a
ser aperfeiçoada, foi-o em 2011, em 2012, em 2015, em 2017 e em 2018. Portanto, verifica-se aqui uma
significativa evolução legislativa.
Assistimos hoje, aqui, à apresentação de algumas propostas no sentido de alterar esta lei, criando a conta
básica universal, por exemplo, no caso do Bloco de Esquerda, mas todas militam num pressuposto errado, que
é o do número de contas abertas. Foi aqui dito por diversas bancadas que havia 78 000 contas de serviços
mínimos bancários abertas. Ora, tomei a liberdade de trazer aqui um gráfico, publicado no site do Banco de
Portugal no dia 13 de fevereiro — já tem alguns dias —, o qual demonstra precisamente que o pressuposto de
que partiram é o do 1.º semestre do ano passado, faltando contabilizar o 2.º semestre. Mas, no 2.º semestre,
houve também um acréscimo de 32%, sendo que, neste momento, são já 103 000 as contas abertas. Portanto,
não nos podemos agarrar a dados parciais, temos de fazer a análise dos dados totais.
Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.
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Mas diga-se em abono da verdade que este é um bom exemplo em que tem havido colaboração entre todas
as bancadas parlamentares, porque, na anterior Legislatura, foi possível aprovar alguns projetos por
unanimidade, o que significa que houve concertação.
Há, eventualmente, disponibilidade do Partido Socialista para melhorar as propostas que cheguem à
especialidade e estaremos sempre abertos a contribuir de forma positiva para a defesa dos consumidores e,
neste caso, dos clientes bancários.
Antes de terminar, queria deixar aqui uma nota em relação ao que o Sr. Deputado André Ventura, do Chega,
disse. É que, Sr. Deputado, aqui, nesta Câmara, anuncia-se, de facto, trabalho — e nós não temos visto anúncios
de trabalho da sua parte —, mas, depois, é preciso concretizá-lo nas comissões, com propostas, com
colaboração, e é aí que o Sr. Deputado tem falhado.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Bem lembrado!
O Sr. Carlos Brás (PS): — Permita-me que lhe diga que faz aqui anúncios demagógicos e mediáticos, mas,
depois, no concreto e no trabalho, não está lá.
Aplausos do PS.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Não vai a uma reunião! Tem faltado a todas as reuniões!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joacine Katar Moreira.
A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: É necessário unirmo-nos para
evitar aquilo que é uma lógica muito colonial da relação entre uma instituição e os seus clientes. É esta lógica
colonial que é sucessivamente praticada pelas instituições bancárias, numa ótica em que um só deseja servir-
se do outro, usar o outro e o que é do outro, explorar o outro até ele não aguentar minimamente.
É necessário salvaguardar os direitos dos consumidores e é necessário não apenas limitar mas eliminar
estas cobranças de comissões bancárias, que, na minha opinião, são cobranças absolutamente coercivas. Mas
é igualmente necessário usar o desenvolvimento tecnológico, a tecnologia, para aumentar o bem-estar e a
igualdade e não para roubar ainda mais o que nos pertence.
É necessário salvaguardar os cidadãos, num ambiente em que os ordenados são miseráveis, num ambiente
em que ter uma habitação, hoje, é considerado um enorme luxo.
É necessário que o Estado e cada um de nós…
O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Joacine Katar Moreira (N insc.): — … salvaguarde que o lucro não se sobreponha ao direito.
O Sr. Presidente: — Segue-se, no uso da palavra, também para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Marina
Gonçalves, do PS.
A Sr.ª Marina Gonçalves (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O debate de hoje é uma evidência da
importância que a proteção dos direitos dos consumidores assume na política nacional, sobretudo quando nos
referimos a um setor fulcral para a estabilidade económico-financeira e a um setor que vive muito da relação
que estabelece com os seus clientes e com os cidadãos.
Numa sociedade de consumo cada vez mais massificada e enquadrada na modernização e na inovação
tecnológica, é importante adaptar os atuais mecanismos de proteção dos consumidores, sobretudo quando, ao
longo dos anos, se evidencia uma política bancária assente, de forma substancial, na proliferação de comissões,
muitas vezes por prestações de serviços dúbias e desproporcionais face ao efetivamente prestado.
É por isso que o Governo e este Parlamento têm tomado posições muito concretas para proteger os
consumidores. Basta recordar diplomas muito recentes que vieram facilitar o acesso à conta de serviços mínimos
bancários, com comissões limitadas por lei, e com resultados visíveis, que vieram melhorar a eficácia do sistema
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de monitorização e de reclamação das comissões cobradas e disponibilizar informação sobre comissões de
forma agregada, quer publicamente, quer aos clientes, individualmente.
É por isso que continuam a ser assumidos novos compromissos, nomeadamente nas Grandes Opções do
Plano, aprovadas recentemente nesta Casa, que referem expressamente o objetivo de avaliar o quadro
regulatório das comissões bancárias, salvaguardando a transparência ao consumidor e a proporcionalidade face
aos serviços efetivamente prestados e garantir a inexistência de comissões associadas ao levantamento de
dinheiro e outros serviços disponibilizados no Multibanco.
É também por isso que apresentamos hoje medidas de reforço da proteção do consumidor.
A relevância que damos a este tema deve-se, essencialmente, ao reconhecimento da importância da relação
entre o setor bancário e os seus clientes e ao reconhecimento de que essa relação passa pela confiança, pela
transparência, pela proporcionalidade e pelo equilíbrio entre as partes. Não se trata de desequilibrar a banca,
trata-se, sim, de equilibrar a relação entre esta e os cidadãos.
E, Sr.ª Deputada Cecília Meireles, efetivamente, temos o dever de garantir aqui respostas para a indignação
dos portugueses, mas não ficamos de olhos fechados quando o funcionamento do mercado provoca indignação
nos portugueses. E é isso que estamos aqui a fazer. Não é um direito nosso, é um dever que temos o de dar
resposta aos cidadãos.
Vozes do PS: — Muito bem!
A Sr.ª Marina Gonçalves (PS): — O que queremos, efetivamente, é garantir a confiança dos cidadãos na
banca. Esta é que é a nossa preocupação.
Se isso é enganar os portugueses, Sr. Deputado Carlos Silva, então, seja, mas nós continuaremos a pugnar
pela confiança na banca por parte dos cidadãos. E quando falamos de confiança não nos referimos apenas ao
papel dos gestores no comando das várias instituições bancárias, falamos de confiança nos serviços que são
prestados e contratualizados e na previsibilidade das comissões associadas.
É neste sentido que debatemos hoje um conjunto de propostas que, afinal, acabam por ter, ou assim
esperamos, o mesmo objetivo já aqui repetido por diversas vezes: proteger o consumidor. E isto, sobretudo,
porque a realidade nos demonstra que na necessária e esperada modernização, massificação e simplificação
de serviços por parte dos bancos é tendencialmente assumida sempre uma parcela de esforço por parte dos
clientes, através da aplicação de comissões muitas vezes desproporcionadas e quando subsistem ainda
desequilíbrios na relação contratual, seja no que respeita a alterações contratuais, seja no que respeita ao
acesso à informação.
Os dados do Banco de Portugal respeitantes ao 1.º semestre de 2019 referem que foram reportadas
alterações ao conteúdo de 788 folhetos de comissões e despesas, as quais decorrem, por exemplo, da
modificação do montante das comissões a serem cobradas e da disponibilização de novos produtos.
O Banco de Portugal refere também que, no mesmo período, as principais reclamações dos consumidores
prendem-se precisamente com a cobrança de comissões e encargos.
A importância crescente das comissões no funcionamento e na sobrevivência da atividade bancária não é
desvalorizada pelo Partido Socialista, mas a proporcionalidade na sua fixação, face aos serviços que são
prestados e, sobretudo, face à necessária proteção dos direitos dos consumidores, deve continuar a ser a
prioridade da nossa ação.
É nesta base que hoje nos apresentamos a debate: disponíveis para debater as medidas em concreto na
especialidade mas sempre enquadrados pelo mesmo fim, que é o de reequilibrar a relação entre a banca e o
consumidor.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, ainda para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do CDS-
PP.
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A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, de forma muito breve, quero só informar o Partido
Socialista que o CDS não apenas vai apresentar como também já apresentou não uma mas várias propostas
sobre supervisão. Foi, aliás, o primeiro partido a fazê-lo na anterior Legislatura …
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — … e nesta Legislatura faremos também propostas inovadoras. Pena é
que, na anterior Legislatura, elas tenham ficado mais de dois anos em comissão, à espera que o Governo se
lembrasse de ter opinião sobre supervisão.
O mundo não começou no momento em que os Srs. Deputados tomaram posse, já começou há muitos anos,
antes de todos nós termos nascido.
Mas, Srs. Deputados, nesta matéria, não se trata de acreditar no mercado sem mais, trata-se de acreditar
num mercado com regras, de boa fé e de proteção dos consumidores.
Os senhores querem substituir-se aos reguladores, mas, pela minha parte, gostava de vos dizer que não
temos obrigação de dar respostas às indignações, sobretudo quando essas respostas são absolutamente
falaciosas, temos é a obrigação de lutar por aquilo em que acreditamos e de trabalhar para que deixem de haver
abusos e razões para indignações. É isto que o Partido Socialista tem muita dificuldade em perceber.
É que não se trata de aprovar aqui uma ou outra medida «para inglês ver» e, depois, os abusos continuarem,
todos, trata-se, de facto, de resolver alguma coisa, e isto passa por mudanças a sério na supervisão, que muitos
partidos, aqui, nesta Casa, já quiseram fazer mas que não aconteceram porque o Governo e o Partido Socialista
resolveram cruzar os braços.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Não é verdade!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Foi isto que se passou na última Legislatura e que já se havia passado
noutras legislaturas. Se os Srs. Deputados não foram estudar o que aconteceu no passado, bom, a culpa não é
minha, mas foi, de facto, isto que aconteceu. Se agora mudaram de ideias, ainda bem. O CDS cá está, com
propostas para este debate e disponível para estudar este assunto.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Estamos à espera!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Agora, para hiper-regulamentações que não vão resolver problema
rigorosamente nenhum, como vos comprovei aqui com este discurso a que ninguém respondeu, para isso, Srs.
Deputados, para enganar as pessoas, não estamos cá.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do
Iniciativa Liberal.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate sobre as
comissões bancárias parece um concurso entre quem consegue ser mais populista e, portanto, vou dedicar este
«minuto liberal» aos populismos de várias cores.
Os populistas de todas as cores dizem tudo o que acham que vai ser popular: abaixo as comissões bancárias,
serviços bancários gratuitos — dizem!
Os populistas de todas as cores apresentam soluções que são entre o simplista e o autoritário: proíba-se,
obrigue-se, decrete-se!
Os populistas de todas as cores optam por não ligar às consequências do que vai ser aqui decidido hoje. E
se os bancos decidirem compensar as receitas, o que é que acontece? E se decidirem não compensar as
receitas, o que é que acontece? Não se sabe e ninguém parece interessado em saber.
Os populistas de todas as cores agitam papões dos mais variados tipos: uns, os papões das minorias, do
medo, da insegurança; outros, os papões dos privados, do lucro — o lucro, esse papão horrível!… —,
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esquecendo-se que sem lucro não há empregos que paguem salários decentes, esquecendo-se que sem lucro
não vai haver inovação e, sobretudo, esquecendo-se que sem lucro estão criadas as condições para o próximo
resgate de bancos privados com dinheiro público.
Se os populistas de todas as cores estivessem verdadeiramente interessados em ter serviços bancários
inovadores e baratos, o que estavam aqui a defender era o fortalecimento da concorrência — o máximo possível
—, o fortalecimento da regulação e da supervisão, para que não fosse possível que passassem impunes quer
as práticas abusivas, quer os cartéis que já se verificaram e para que não existisse uma supervisão suscetível
à chantagem a que ainda ontem assistimos,…
O Sr. Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou terminar, Sr. Presidente.
Como estava a dizer, se os populistas de todas as cores estivessem verdadeiramente interessados em ter
serviços bancários inovadores e baratos, disponibilizavam muito mais informação para que as pessoas
pudessem escolher informada e livremente os seus serviços bancários e, sobretudo, tornavam claríssimo, nesta
Câmara, que nunca mais haveria um resgate público ou uma nacionalização de um banco com prejuízos
privados.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Álvaro Almeida, do Grupo
Parlamentar do PSD.
O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As propostas que foram
apresentadas e o debate que hoje aqui fizemos demonstram que há alguma convergência em alguns aspetos,
nomeadamente em termos de objetivos, pelo menos declarados, mas há muitas diferenças, muitas divergências,
em termos de soluções apresentadas.
Comecemos pelo lado mais à esquerda do Parlamento: para o Bloco de Esquerda e para o PCP, o Estado
deve controlar tudo, deve definir os valores das comissões, deve impor todas as restrições, sem se preocupar
com as consequências e o alcance dessas restrições. O que estes partidos vêm propor — não nalguns aspetos,
que são mais ou menos pacíficos, mas na proibição de comissões, por exemplo, do MB Way — são limites a
preços de serviços que são efetivamente prestados.
O que estes partidos vêm propor é a essência do populismo. O populismo o que é? É apresentar um problema
e, depois, arranjar uma solução fácil: se o problema são as comissões bancárias muito elevadas, a solução fácil
é proibirem-se as comissões.
Só que essa não é uma solução. Não é uma solução porque, quando impomos restrições de preço desse
tipo, as consequências são inexoráveis e são sempre as mesmas. Se algum governo decidir fixar
administrativamente o preço do leite ou o preço do papel higiénico, sabem o que é que vai acontecer, Srs.
Deputados? O leite e o papel higiénico vão desaparecer das prateleiras dos supermercados. Como é que nós
sabemos isso? Sabemos isso porque isso já foi tentado muitas vezes, a mais recente das quais na Venezuela,
de que vocês tanto gostam, e o resultado foi sempre o mesmo!
VozesdoPSD: — Muito bem!
O Sr. ÁlvaroAlmeida (PSD): — Foi sempre o de acabar com o serviço! Se os senhores quiserem proibir a
cobrança de comissões, em serviços que são serviços de valor para os consumidores, serviços que os
consumidores valorizam, o que vão fazer não é proteger o consumidor, é, pelo contrário, prejudicar o
consumidor.
O Sr. MiguelMatos (PS): — Deve comer papel higiénico ao pequeno-almoço!
O Sr. ÁlvaroAlmeida (PSD): — Sr. Deputado, estamos a falar de comissões, está bem?
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Dizia eu que o que vão fazer é acabar com um serviço que os consumidores querem e não estão a protegê-
los, dessa forma, estão a prejudicá-los. Aliás, essa é a sina — a triste sina, diria eu — das políticas da extrema-
esquerda: sob a capa da defesa do consumidor, acabar por prejudicar aqueles que mais precisam.
O Sr. BrunoDias (PCP): — Triste sina é o senhor dar aulas na faculdade!
O Sr. ÁlvaroAlmeida (PSD): — Sr. Deputado, fico surpreendido como é que 100 anos depois da Revolução
Bolchevique e de mais de 30 experiências falhadas de comunismo, ainda insistem em não reconhecer o erro.
O Sr. CarlosSilva (PSD): — Muito bem!
O Sr. BrunoDias (PCP): — Não consegue melhor do que isso?!
O Sr. AfonsoOliveira (PSD): — Ouçam, ouçam!
O Sr. ÁlvaroAlmeida (PSD): — Já a proposta do Partido Socialista…
Pausa.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, deixem o Sr. Deputado terminar a sua intervenção, por favor.
O Sr. ÁlvaroAlmeida (PSD): — Já a proposta do Partido Socialista também segue a tradição das propostas
do Partido Socialista: nem é sim, nem é não. Ficamos aqui a saber, hoje, que a razão pela qual o Partido
Socialista apresenta a sua proposta é porque há indignação popular — mais uma vez, uma resposta populista.
A Sr.ª CecíliaMeireles (CDS-PP): — Toca a atirar areia para a cara das pessoas!
O Sr. ÁlvaroAlmeida (PSD): — Como resposta populista que é, não é uma solução.
Agora, o Partido Socialista, diferentemente do Bloco de Esquerda, como é um partido de governo, tem
alguma noção das consequências. Como sabe que a imposição de limites às comissões vai ter um impacto
muito negativo no sistema financeiro, o que faz é dizer: «bom, vamos proibir, mas só algumas, porque assim a
gente minimiza os danos e, no final, se calhar, o custo não é muito grande».
Só que, Srs. Deputados do Partido Socialista, o problema é que os senhores andam a fazer isso há 18 dos
últimos 25 anos. De facto, pequenas restrições desse tipo, isoladamente, têm pouco impacto, mas todas juntas
têm um impacto muito grande. Sabem qual é? É, por exemplo, aquele que esta semana a Comissão Europeia
nos veio lembrar: a produtividade em Portugal não cresce e, por causa disso, a economia portuguesa não
converge. Porquê? Graças a essas restrições pequeninas, todas somadas, que põem a economia e as empresas
portuguesas em desvantagem competitiva face aos seus concorrentes.
Protestos do PS.
O que temos é um problema, de facto, e temos um problema que merece uma solução ponderada. O
problema é este: se tivéssemos no sistema financeiro um sistema concorrencial em que a liberdade contratual
fosse completa, aí não seria precisa intervenção nenhuma, porque as comissões que resultariam do
funcionamento do mercado seriam certamente comissões justas.
A Sr.ª MarianaMortágua (BE): — Guarde lá esse manual, é muito antiquado!
O Sr. ÁlvaroAlmeida (PSD): — É verdade que pode haver problemas de concorrência, mas sabe como se
combatem problemas de concorrência, Sr.ª Deputada? Os problemas de concorrência combatem-se em sede
de concorrência.
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Há uma questão que o Bloco de Esquerda gosta muito de colocar mas que ainda não compreendeu, que é
esta: quando há um erro, fazer um erro de sentido contrário não resolve o problema. O que faz é com que haja
dois erros. Temos mais erros do que tínhamos antes.
Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.
Portanto, do que precisamos é de regulação que se faça naquelas áreas onde, por alguma razão, a liberdade
contratual não existe.
O Sr. AfonsoOliveira (PSD): — Muito bem!
O Sr. ÁlvaroAlmeida (PSD): — É isso que acontece nas propostas do PSD. As propostas o PSD visam
resolver duas situações em que não há liberdade contratual da parte do consumidor, e por essa razão, porque
o consumidor não é livre de dizer «não quero!», aí, é preciso que haja alguma proteção do consumidor.
É o caso de todas aquelas comissões sobre prestações que não existem, sobretudo quando estão
associadas a créditos de longo prazo. É que aí a liberdade do consumidor não é nenhuma porque já tem com
um crédito e não pode, no final, dizer «eu não quero o crédito». Nesse caso, de facto, é preciso proteger o
consumidor.
É também o caso dos serviços mínimos bancários, porque, hoje em dia, é essencial que se tenha acesso a
esses serviços e, de facto, há muitos consumidores que não têm a liberdade de dizer que não querem serviços
bancários. Como não têm liberdade de dizer que não querem, ficam na dependência de lhes cobrarem o que os
bancos quiserem.
É por isso que os serviços mínimos bancários com limitações de custos são uma medida positiva e aquilo
que o PSD vem fazer é reconhecer que essa medida é positiva e adaptar os serviços mínimos bancários à
realidade atual.
Portanto, o que temos de garantir é que aquilo que precisa de ser regulado, isto é, aquelas áreas em que o
mercado não funciona, seja devidamente regulado e que o que não precisa de ser regulado não o seja.
Não é impondo restrições na atividade dos bancos que vamos proteger o consumidor. Ao impor restrições
na atividade dos bancos o que estamos a fazer é a prejudicar o consumidor, porque, a prazo — é esse o vosso
problema, nunca se lembram do futuro, acham sempre que o mundo vai acabar amanhã e não vai acabar
amanhã —, o que vai acontecer é que os serviços bancários vão ser menores ou, então, vão ser mais caros
outros serviços para compensar a perda de receitas com esses.
A nossa diferença, Srs. Deputados, é que o PSD pensa no futuro, pensa no futuro da economia portuguesa
e, por isso, não pode acompanhar as vossas propostas, que iriam pôr em causa a competitividade das empresas
portuguesas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Paulo Correia, do Grupo
Parlamentar do PS.
O Sr. JoãoPauloCorreia (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, para que os
portugueses saibam, os partidos políticos com iniciativas legislativas que querem travar o abuso das comissões
bancárias são o Partido Socialista, o PCP, o Bloco de Esquerda, o PAN e o PSD.
O CDS bateu no peito mas não tem uma iniciativa legislativa; o Chega também fez aqui uma série de
proclamações mas também não tem uma iniciativa legislativa — apresentou uma proposta de recomendação, à
última hora, para vir a este debate — e o Iniciativa Liberal também se pôs de fora e também não tem iniciativa
legislativa.
Aplausos do PS.
O Sr. JoãoOliveira (PCP): — Gostam muito de trabalhar!
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O Sr. JoãoPauloCorreia (PS): — Só se defende o interesse dos clientes e dos consumidores de produtos
de serviços financeiros se trouxermos a debate, no Parlamento, iniciativas legislativas, e nem o CDS, nem o
Chega, nem o Iniciativa Liberal o fizeram.
Em segundo lugar, a Associação Portuguesa de Bancos não faz parte deste debate, não tem iniciativas
legislativas, não tem assento parlamentar, mas o discurso da Associação Portuguesa de Bancos esteve muito
visível nas vozes do CDS, do Chega e da Iniciativa Liberal.
Aplausos do PS.
A Sr.ª CecíliaMeireles (CDS-PP): — Isso é falso! É falso! Não seja mentiroso!
O Sr. JoãoPauloCorreia (PS): — Há aspetos que nos unem neste debate: une-nos a defesa e a proteção
dos direitos dos consumidores e dos clientes bancários; une-nos a visão que temos dos falhanços do Banco de
Portugal, de há muitos anos a esta parte, quer em matéria de supervisão prudencial, em matéria de supervisão
comportamental ou em matéria de regulação financeira.
Une-nos também o facto de o Parlamento ter tido um papel decisivo na defesa dos consumidores e dos
clientes dos produtos e dos serviços bancários. Foram os partidos políticos com assento parlamentar que
trataram do combate à criminalidade económica e financeira, que trataram do reforço da supervisão financeira
e que trataram também do pacote da transparência, como, por exemplo, a informação relacionada com os
grandes devedores à banca.
Protestos do CDS-PP e do CH.
O Parlamento tem feito o seu papel e o Partido Socialista tem estado sempre na dianteira na defesa destes
interesses públicos.
Aplausos do PS.
Mas aquilo que está em cima da mesa é decidir se vamos travar ou não o abuso da banca naquilo que diz
respeito a comissões bancárias nas plataformas eletrónicas de natureza financeira. A proposta do Partido
Socialista visa isentar determinado número de operações e determinados montantes, para que os clientes
destes serviços fiquem isentos do pagamento de comissões.
Esperemos que o Parlamento, hoje, a seguir ao debate, na votação, aprove o projeto de lei do Partido
Socialista e estamos disponíveis para que, na especialidade, se caminhe para uma convergência em matéria de
limitação de comissões bancárias por parte da banca.
Sabemos quem está no debate, sabemos quem tem iniciativas legislativas e sabemos também quem não
quis vir a debate, quem não está interessado em travar o abuso da banca, e esses que não querem travar o
abuso da banca chamam-se CDS, Chega e Iniciativa Liberal.
Aplausos do PS.
O Sr. AndréVentura (CH): — Qual Chega?!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Duarte Alves, do Grupo
Parlamentar do PCP.
O Sr. DuarteAlves (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, as intervenções do PSD, do CDS e
dos respetivos sucedâneos não nos surpreendem por defenderem exatamente a posição da banca e a posição
da APB.
Foi esse o vosso contributo para este debate: foi trazer a posição da banca e mais nada!
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O Sr. JoãoOliveira (PCP): — Exatamente!
Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.
O Sr. DuarteAlves (PCP): — Relativamente às preocupações e argumentos que aqui trouxeram — já vou a
alguns deles —, não queria deixar de fazer alguns comentários.
Segundo um dos argumentos, os bancos não conseguem sobreviver sem estas comissões. Relembro que a
banca tem lucros de 5,2 milhões de euros por dia — isto, atualmente. É disso que estamos a falar!
O Sr. JoãoOliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. DuarteAlves (PCP): — Outro argumento é o de que, com juros negativos, as comissões bancárias
são inevitáveis. Relembro que, em 2008, só os quatro maiores bancos, mesmo em tempo de crise, tinham lucros
de 1270 milhões de euros e já nessa altura as comissões bancárias representavam 21,3% do produto bancário.
Ora, nessa altura não havia juros negativos.
Depois, outro argumento é o de que os projetos em cima da mesa poderiam, eventualmente, prejudicar a
banca portuguesa face à banca estrangeira. Pergunto: qual banca portuguesa?
O Sr. JoãoOliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. DuarteAlves (PCP): — Só se estiverem a falar da Caixa Geral de Depósitos, porque toda a banca
privada, toda a banca que os senhores privatizaram, foi parar ao capital estrangeiro,…
Aplausos do PCP.
… o que demonstra, mais uma vez, que a banca ou é pública ou não é nacional.
Outro argumento, que o CDS também aqui trouxe, foi o de que estes projetos iriam prejudicar as novas
formas de pagamento, como o Revolut e outras aplicações.
Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.
O que é preciso é percebermos bem quem é que está a fazer o controlo destas plataformas ou se só no final
do desastre é que vamos dar por ele.
O PS diz que as taxas do MB Way servem para evitar a fraude. Sinceramente, não consigo perceber qual é
a relação entre a cobrança de taxas e o combate à fraude. A fraude tem de ser combatida através dos órgãos
de fiscalização e não através de taxas. Aliás, até há bem poucos meses o MB Way não tinha qualquer taxa e
não é por isso que se conhece grandes fraudes.
O CDS diz que a proibição da taxa de MB Way poderia afetar a concorrência. Relembro que, hoje, é proibida
a aplicação de qualquer taxa à utilização do Multibanco. Pergunto: isso afeta a concorrência? Não afeta a
concorrência, os bancos não têm qualquer problema com o facto de não ser permitida qualquer taxa no
Multibanco.
Protestos do CDS-PP.
Srs. Deputados, a questão que se coloca neste momento é a de saber se há, ou não, vontade política para
alargar o regime de serviços mínimos bancários, que é a proposta do PCP: por um lado, alargar o regime de
serviços mínimos bancários, deixando estes de ser exclusivos, isto é, que uma pessoa, só por ter uma outra
conta, não deixe ter acesso à conta de serviços mínimos bancários, e, por outro, proibir as taxas no MB Way e
em todas as aplicações digitais. Do nosso ponto de vista, não é só no MB Way que se devem proibir as
comissões mas em todas as aplicações digitais, até para evitar que os bancos as possam vir a cobrar nas suas
aplicações.
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A questão aqui é a de saber se existe, ou não, vontade política para avançar no sentido de proteger os
consumidores contra os abusos e contra o esbulho que tem sido aplicado pela banca, ao longo dos anos, com
a concordância aparente, neste debate, do PSD e do CDS.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para encerrar o debate, o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do Grupo
Parlamentar do Bloco de Esquerda.
O Sr. PedroFilipeSoares (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, em boa hora o Bloco de Esquerda
marcou este debate. Fizemo-lo com uma abertura enorme, dando espaço para cada grupo parlamentar, cada
partido, pudesse vir a este debate fundamental porque havia uma conclusão que nos chegava, perpassando
todo o País: há um abuso do sistema financeiro perante as pessoas, com taxas, taxinhas e comissões que
rapam o dinheiro que as pessoas têm nos bancos.
Ainda bem que fizemos este debate. Se hoje há uma esperança para mudar a lei e proteger as pessoas
deve-se à coragem e à abertura que o Bloco de Esquerda teve neste agendamento.
Sabemos que os banqueiros e a banca têm leis pelas quais se devem reger e têm até reguladores que
deveriam fazer cumprir essas leis e esses regulamentos. Mas é quando a Assembleia da República se reúne
para legislar que o sistema financeiro treme, porque do Banco de Portugal vive sem nenhum tipo de medo. É
que sabe que lá tem alguém que é complacente com as taxas, as taxinhas e as comissões.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É, por isso, inaceitável aquilo que hoje ouvimos da parte da Associação
Portuguesa de Bancos, que fez chantagem sobre um órgão de soberania do nosso País democraticamente
eleito ao dizer que não poderia legislar sob pena de despedimentos no setor financeiro, sob pena de fecharem
balcões. Eles, banqueiros, que nada mais têm feito do que tirar dinheiro público para seu uso privado, dizem
que vão despedir pessoas que trabalham no sistema financeiro e vão encerrar balcões. Isso nós não aceitamos!
Por isso, com as votações que se vão seguir, poderemos responder à pergunta: quem é que tem medo dos
banqueiros?
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sabemos que alguns já se amedrontaram e alguns até mais pareciam
banqueiros a falar na Assembleia da República. Bastou ouvir a intervenção do CDS, do Iniciativa Liberal ou do
Chega, e bastou ler o projeto que apresentou.
O Chega leva bem à letra aquele ditado popular que diz «quem quer faz, quem não quer manda».
O Sr. João Oliveira (PCP): — Ele não gosta de trabalhar!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — O Sr. Deputado chegou mais de meia hora atrasado ao debate — mas
ainda bem que cá está! — e o seu diploma também chegou atrasado.
O Sr. André Ventura (CH): — Mas chegou!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Mas, lendo o seu diploma, perguntamo-nos: ele propõe alguma coisa?
Não propõe nada, manda — o Governo que faça alguma coisa, o Banco de Portugal que faça alguma coisa. A
Assembleia da República pode e deve legislar em relação a leis que a própria produziu e o Sr. Deputado pode
e deve ter iniciativa legislativa. Mas pergunto: o Sr. Deputado apresentou alguma alteração à lei? Propôs a
proibição de comissões? Não! Zero! Zero!
O Sr. André Ventura (CH): — Como é que vão votar?
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A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Fala, fala, fala!…
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Fala, fala, fala, fala, mas, quando chega à altura de fazer, não faz nada,
manda. Já percebemos, Sr. Deputado: quem quer faz, quem não quer manda.
Aplausos do BE.
Ouvir o CDS — tão imobilista que ele está que parece esconder até que teve mão na colocação de Carlos
Costa no Banco de Portugal — é ouvir os argumentos estafados da Associação Portuguesa de Bancos.
Se perguntássemos ao CDS: «Há um problema?». Responderia: «Pode haver, se calhar há, se calhar não».
Se disséssemos: «Mas as pessoas estão a ser roubadas. Elas sentem no bolso que estão a ser roubadas!».
Responderia: «Se calhar sim, se calhar não. É melhor deixar tudo como está, não vá a coisa ficar ainda pior».
O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Não ouviu nada do que dissemos!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — E o Deputado do Iniciativa Liberal, que hoje poderia vir dizer «bem, mas
o mercado não, o mercado está a funcionar e há uma concorrência que garante que as pessoas estão
salvaguardadas», entrou a falar fininho e até já saiu do debate. O Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo não
reconhece que a sua ideologia faliu no sistema financeiro.
Aplausos do BE.
Protestos do CDS-PP, do CH e do IL.
Onde está a concorrência? Está no roubo das comissões! Onde está a defesa dos consumidores? Está no
roubo das comissões! É isso que defende.
Sr. Deputado, o «minuto liberal» mais parecia o filme Titanic: a afundar, aqui, como o sistema financeiro.
É que nós lembramos esta situação mas, acima de tudo, as pessoas sentem no bolso o que significa o peso
do sistema financeiro na sua realidade.
Concluo referindo números que são brutais — brutais! — e que mostram como há um setor que se sente
acima do País, o que é algo que não podemos suportar.
Num ano, mais de 3600 milhões de euros só em comissões, taxas, taxinhas. Porquê? Pelo facto de as
pessoas terem o seu dinheiro nos bancos. Têm lá o dinheiro e ainda cobram 3600 milhões de euros!
De fundos públicos, numa década, 23 800 milhões de euros — 23 800 milhões de euros! Um outro CDS
saberia que isso equivale a mais de 40 submarinos que foram para o sistema financeiro. Mais de 40 submarinos!
Protestos do CDS-PP.
Só para o Novo Banco vão 3900 milhões de euros! A pergunta que se coloca é: isto basta? Isto chega? Não!
O sistema financeiro diz que quer ainda mais.
Protestos do CDS-PP e do CH.
Perguntamos: há aqui, na Assembleia da República, Deputados e Deputadas que concordam com o que o
nosso povo diz, ou seja, «não queremos pagar mais para este sistema financeiro, não aceitamos mais este
roubo»?
Uma última palavra sobre aquela ideia de que quem paga manda. Quem detém um banco público tem a
obrigação de exigir desse banco que tenha uma política pública e não replique o pior que fazem os privados.
Entre as comissões a cujo pagamento obriga e a forma como às vezes toma a dianteira para ser protagonista
nesse roubo, a Caixa Geral de Depósitos, imaginem — chegou-nos esta notícia —, cobra comissões às escolas,
serviços públicos, que recebem dinheiro em numerário e que vão lá depositar as moedas. Na Caixa Geral de
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Depósitos, as escolas tem de pagar comissões por estes depósitos! Isto mostra bem o absurdo da gestão que
a Caixa Geral de Depósitos está a fazer.
Por isso, a pergunta que se coloca também é a seguinte: o que queremos para o banco público? Queremos
«lavar as mãos» e achar que é mais um banco que deve ser gerido como os privados, ou queremos, sim, que
tenha uma política pública em defesa do nosso País?
Em todas estas matérias, o Bloco de Esquerda diz «estamos cá para defender os interesses das pessoas».
Fizemos este agendamento, por isso estaremos ao lado de todos os projetos que visam limitar o abuso da
banca e temos a pretensão de que, na especialidade, sejam rápidos os trabalhos para que a lei defenda as
pessoas, já que o Banco de Portugal não o faz.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, passamos agora à votação dos diplomas que acabaram de ser
discutidos.
Vamos, pois, proceder à verificação do quórum, utilizando o sistema eletrónico.
Pausa.
O quadro eletrónico regista 211 presenças, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Peço aos Srs. Deputados que não se puderam registar eletronicamente que o indiquem à Mesa, oralmente,
no final da sessão.
Começamos por votar, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 137/XIV/1.ª (BE) — Institui a obrigatoriedade e
a gratuitidade de emissão do distrate e de declaração de liquidação do empréstimo, elimina comissões cobradas
pelo processamento de prestações de crédito, proibindo ainda as instituições de crédito de alterar
unilateralmente as condições contratuais dos créditos concedidos ao consumo (quarta alteração ao Decreto-Lei
n.º 133/2009, de 2 de junho).
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do CH e da Deputada
não inscrita Joacine Katar Moreira, o voto contra do IL e abstenções do PS, do PSD e do CDS-PP.
Este diploma baixa à 5.ª Comissão.
Segue-se a votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 138/XIV/1.ª (BE) — Institui a obrigatoriedade e a
gratuitidade de emissão do distrate e de declaração de liquidação do empréstimo, elimina comissões cobradas
pelo processamento de prestações de crédito, proibindo ainda as instituições de crédito de alterar
unilateralmente as condições contratuais dos créditos concedidos à habitação (terceira alteração ao Decreto-Lei
n.º 74-A/2017, de 23 de junho).
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do CH e da Deputada
não inscrita Joacine Katar Moreira, o voto contra do IL e abstenções do PS, do PSD e do CDS-PP.
Este diploma baixa à 5.ª Comissão.
Votamos agora um requerimento, apresentado pelo BE, solicitando a baixa à Comissão de Orçamento e
Finanças, sem votação, por 60 dias, do Projeto de Lei n.º 139/XIV/1.ª (BE) — Consagra a proibição de cobrança
de encargos pelas instituições de crédito nas operações realizadas em plataformas eletrónicas operadas por
terceiros (primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 3/2010, de 5 de janeiro).
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 140/XIV/1.ª (BE) — Cria o sistema de acesso à
conta básica universal.
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Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP e do IL, votos a favor do
BE, do PCP, do PAN, do PEV e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e a abstenção do CH.
Vamos proceder à votação do Projeto de Resolução n.º 143/XIV/1.ª (BE) — Recomenda a elaboração de
orientações para a política de comissões bancárias da Caixa Geral de Depósitos.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP, votos a favor do BE, do
PCP, do PAN, do PEV, do CH e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e a abstenção do IL.
De seguida, votamos um requerimento, apresentado pelo PCP, solicitando a baixa à Comissão de Orçamento
e Finanças, sem votação, por 60 dias, do Projeto de Lei n.º 205/XIV/1.ª (PCP) — Procede à primeira alteração
ao Decreto-Lei n.º 3/2010, de 5 de janeiro, alargando a proibição de cobrança de encargos pela prestação de
serviços de pagamento e pela realização de operações às operações realizadas através de aplicações digitais.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Vamos votar, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 206/XIV/1.ª (PCP) — Procede à sexta alteração ao regime
de serviços mínimos bancários, tornando-o mais adequado às necessidades dos clientes bancários.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP e do IL e votos a favor do
BE, do PCP, do PAN, do PEV, do CH e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.
Passamos à votação de um requerimento, apresentado pelo PAN, solicitando a baixa à Comissão de
Orçamento e Finanças, sem votação, por 60 dias, do Projeto de Lei n.º 209/XIV/1.ª (PAN) — Limita a cobrança
de quaisquer comissões, despesas ou encargos nos casos em que não seja efetivamente prestado um serviço
ao cliente por parte das instituições de crédito (primeira alteração à Lei n.º 66/2015, de 6 de julho).
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Vamos proceder à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 213/XIV/1.ª (PS) — Adota normas de
proteção do consumidor de serviços financeiros de crédito à habitação, crédito ao consumo e utilização de
plataformas eletrónicas operadas por terceiros.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PAN, do CH e da Deputada não
inscrita Joacine Katar Moreira e abstenções do PSD, do PCP, do CDS-PP, do PEV e do IL.
Este diploma baixa à 5.ª Comissão.
Segue-se a votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 216/XIV/1.ª (PSD) — Sexta alteração ao Decreto-
Lei n.º 27-C/2000, de 10 de março, que cria o sistema de acesso aos serviços mínimos bancários.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PAN, do CH e do Deputado do PS Ascenso
Simões e abstenções do PS, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PEV, do IL e da Deputada não inscrita Joacine
Katar Moreira.
O projeto de lei baixa à 5.ª Comissão.
Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 217/XIV/1.ª (PSD) — Restringe a cobrança de
comissões bancárias, procedendo à quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de junho, e à terceira
alteração ao Decreto-Lei n.º 74-A/2017, de 23 de junho.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PAN, do PEV e do CH, o voto contra do
IL e abstenções do PS, do BE, do PCP, do CDS-PP e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.
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O projeto de lei baixa à 5.ª Comissão.
Vamos votar o Projeto de Resolução n.º 263/XIV/1.ª (CH) — Pela clarificação da Lei n.º 66/2015 e pela
proibição de cobrança de taxas e comissões nas transferências bancárias realizadas através da aplicação MB
Way.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do PAN e do IL, o voto a favor do CH
e abstenções do BE, do PCP, do PEV, do CDS-PP e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.
Srs. Deputados, estamos a chegar ao fim dos nossos trabalhos de hoje, não sem antes anunciar a ordem do
dia da sessão plenária de amanhã, com início às 10 horas.
Primeiro ponto, eleições a realizar para vários órgãos externos à Assembleia da República: de dois juízes
para o Tribunal Constitucional, do Presidente do Conselho Económico e Social e de sete vogais (e suplentes)
para o Conselho Superior da Magistratura.
Do segundo ponto consta a apreciação do Projeto de Lei n.º 187/XIV/1.ª (PS) — Procede ao reforço do
quadro sancionatório e processual em matéria de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de
menores, cumprindo a Diretiva 2011/93/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de
2011, e estabelece deveres de informação e de bloqueio automático de sites contendo pornografia de menores
ou material conexo.
No terceiro ponto, será discutido o Projeto de Resolução n.º 198/XIV/1.ª (PSD) — Faz várias recomendações
ao Governo decorrentes da venda anunciada pela EDP, Energias de Portugal, SA, de seis barragens nos
distritos de Bragança e Vila Real.
Segue-se, no quarto ponto, a apreciação, conjunta, dos Projetos de Resolução n.º 191/XIV/1.ª (BE) —
Recomenda ao Governo a imposição de normas antiabuso nos concursos públicos promovidos para contratação
de empresas de segurança, limpeza e outros serviços, garantindo o cumprimento da legislação laboral e do
regime jurídico da transmissão de estabelecimento, e 252/XIV/1.ª (PCP) — Recomenda ao Governo que trave
os atropelos laborais no sector da vigilância e limpeza.
Do quinto ponto, consta a discussão, conjunta, dos Projetos de Lei n.os 6/XIV/1.ª (PCP) — Altera o Código
do Processo Civil, estabelecendo um regime de impenhorabilidade da habitação própria e permanente e fixando
restrições à penhora e à execução de hipoteca, e 210/XIX/1.ª (BE) — Institui a impenhorabilidade do imóvel
próprio de habitação permanente (altera o Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de
junho).
No sexto ponto, consta a discussão do Projeto de Resolução n.º 17/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao
Governo que proceda a uma revolução na formação profissional para que ela se adapte aos novos tempos.
Seguem-se, no sétimo ponto, votações regimentais, no final do debate.
O Sr. André Ventura (CH): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado André Ventura, pediu a palavra para que efeito?
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, é para dar conta de que o Chega pretende recorrer da ordem
do dia estabelecida para amanhã, atendendo a que o seu projeto de lei foi retirado da ordem de trabalhos.
O Sr. Presidente: — Com base em que artigo?
O Sr. André Ventura (CH): — Com base no facto de…
O Sr. Presidente: — É que tenho a informação de que o Sr. Deputado iria recorrer com base no n.º 4 do
artigo 59.º do Regimento. É isso?
O Sr. André Ventura (CH): — Sim, é com base no artigo 59.º do Regimento.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
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A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Sr. Presidente, a decisão que está em causa ou é
fundamentada aqui ou, tanto quanto se sabe, é sobre a não admissibilidade de uma iniciativa legislativa.
O Sr. Presidente: — Temos de ouvir o Sr. Deputado.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Não, Sr. Presidente.
Nos termos regimentais, esse recurso obedece às normas do artigo 16.º, n.º 1, alínea c), do Regimento que,
conjugado com o artigo 81.º, n.º 5, do mesmo Regimento, é suscetível de apenas votação em Plenário e não de
intervenções, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Muito bem. Em qualquer caso, o Sr. Deputado André Ventura tem a palavra.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Não!
O Sr. Presidente: — Não? Então, porquê? Porque deverá ser só amanhã?
Sr.ª Deputada, peço desculpa, mas, com a velocidade com que o fez, não acompanhei os números e as
alíneas dos artigos do Regimento por si citados. Mas diga de sua justiça, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Sr. Presidente, eu já disse quais eram as normas
regimentais em causa, se quisermos cumprir o Regimento. Peço à Mesa que verifique.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, hoje, estamos aqui todos presentes, pelo que há quórum para votarmos.
Amanhã, quando os trabalhos se iniciarem ou mesmo quando houver votações, não sabemos.
Portanto, penso que esta questão se pode resolver hoje.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado João Oliveira, tem a palavra.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, deixe-me tentar ajudar a resolver este problema.
Julgo que a questão que está colocada não á a de resolvermos hoje ou amanhã. A questão pode ser resolvida
hoje.
O Sr. Presidente, hoje de manhã, fez um despacho de não admissibilidade de um projeto de lei. Dessa
decisão, cabe recurso, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 16.º do Regimento, e aquilo que diz o n.º 5 do
artigo 81.º do Regimento é que, havendo esse recurso que o Sr. Deputado André Ventura acabou de interpor,
ele é imediatamente votado sem discussão.
Portanto, a questão pode ser resolvida já hoje, de acordo com estes procedimentos regimentais.
O Sr. Presidente: — Muito bem. É a minha interpretação. De qualquer forma, penso que o Sr. Deputado tem
o direito de invocar as razões pelas quais interpõe recurso.
Vozes do PS: — Não!
O Sr. André Ventura (CH): — Não? Mas o PS é que manda aqui?! O PS é que manda nisto?!
O Sr. Presidente: — Peço desculpa, mas, Sr. Deputado André Ventura, com o mesmo direito que tive de
indeferir o agendamento da sua iniciativa para a ordem do dia de amanhã, dou-lhe a palavra por 2 minutos.
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Faça favor.
O Sr. André Ventura (CH): — Obrigado, Sr. Presidente. Parece que o Partido Socialista não está muito
habituado a isto, mas vai ter mesmo de se habituar. Parece que não estão muito habituados a isto, mas não
mandam no País, nem mandam nesta Câmara.
Protestos do PS.
Sr. Presidente, foi retirado da ordem do dia o projeto de iniciativa legislativa do Chega que visava — aliás,
por arrastamento de um projeto apresentado pelo Partido Socialista — não só aumentar as molduras penais
para agressores sexuais, como instituir como pena acessória a castração química para os mesmos.
Essa proposta foi considerada pela 1.ª Comissão, por maioria, como aparentemente inconstitucional, mas é
nosso entendimento de que, à semelhança de outras iniciativas que foram discutidas e votadas na Assembleia
politicamente — apesar das reservas de inconstitucionalidade que foram anunciadas e indicadas —, a nossa
também o deve ser.
Se permitirmos que o parecer ou a consideração da 1.ª Comissão acabe por fazer com que a iniciativa não
chegue a Plenário, estamos a abrir um precedente gravíssimo na nossa democracia e a permitir que se crie uma
espécie de primeira câmara de censura neste Parlamento, e isso nós não podemos tolerar.
Há pessoas que concordam e há pessoas que discordam da nossa iniciativa legislativa. Mas há uma coisa
que os portugueses querem ver. Os portugueses querem ver o assunto discutido aqui, porque ele é discutido
no mundo inteiro. Uma Câmara que insiste em negar a discussão é uma Câmara que vira as costas à
democracia, vira as costas ao pluralismo de ideias e ao pluralismo de opiniões.
Não é esse o Parlamento que nos habituámos a ver e não é esse o Parlamento quer queríamos ver discutir.
Por isso, Sr. Presidente, recorremos para que se vote em Plenário e esta Câmara decida se mantém a ordem
do dia anunciada ou se o projeto do Chega é inserido e votado amanhã de manhã.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
Embora reconhecendo, em linha com a prática dos Presidentes que me antecederam nestas funções, que o
poder de rejeição de iniciativas é absolutamente excecional e não deixando de assumir todas as minhas
responsabilidades, porque são minhas, suscitei, logo no ato de admissão do projeto de lei em referência, dúvidas
acerca da conformidade do teor desta iniciativa com a Constituição da República Portuguesa. Dúvidas que
foram, aliás, confirmadas pelo parecer de várias entidades consultadas no decurso do processo legislativo como
o Conselho Superior da Magistratura. Dúvidas que, aliás, foram respondidas no parecer, que pedi, aprovado
pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, do qual resulta clara a
desconformidade constitucional da iniciativa, nomeadamente depois dos esclarecimentos solicitados por mim,
mandatado pela Conferência de Líderes.
Como estarão todos recordados, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
emitiu uma adenda ao seu parecer anterior, concluindo, sobre as duas perguntas que fiz, primeiro, «(…) existe
neste específico projeto de lei um elemento nuclear cuja desconformidade constitucional parece inultrapassável,
e que é a pretensão de se criar uma pena acessória de castração química»; segundo, «(…) é entendimento da
Comissão que, do ponto de vista constitucional, o Projeto de Lei n.º 144/XIV/1.ª (CH) não preenche os requisitos
para a subida a Plenário».
Resultando claro que o projeto de lei não reúne os requisitos constitucionais para ser discutido em Plenário,
ao abrigo das disposições aplicáveis, decidi, sem prejuízo, aliás, do direito de recurso para o Plenário que o Sr.
Deputado está a exercer com toda a legitimidade, que ficava sem efeito o seu agendamento para Plenário,
assumindo — e quero que fique claro —, em todos os momentos deste processo, a responsabilidade como
Presidente da Assembleia da República. A responsabilidade desta decisão não é da 1.ª Comissão, a que pedi
um parecer, a responsabilidade é do Presidente da Assembleia da República.
Diria só, a título acessório, que no dia em que o Presidente da Assembleia da República agendar, sem mais,
sem qualquer consulta, projetos inconstitucionais, como se poderia evitar que fossem apresentados aqui, neste
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Plenário, por exemplo, projetos pela legalização da pena de morte ou projetos pela demissão do Presidente da
República? Comigo, como Presidente da Assembleia da República, não acontecerá.
E, portanto, vamos votar.
Aplausos do PS, do PCP e do PEV.
Srs. Deputados, vamos votar o recurso, apresentado pelo Sr. Deputado André Ventura, do Chega.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP, do PEV e da Deputada não inscrita
Joacine Katar Moreira e votos a favor do PSD, do BE, do CDS-PP, do PAN, do CH e do IL.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, não há pedidos de palavra para declarações de voto orais nestes
recursos.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, é só para informar a Câmara que entregaremos uma
declaração de voto escrita sobre esta matéria.
O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr. Deputado.
Sr. Deputado Telmo Correia, tem a palavra.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, é também para, em nome do CDS, dizer que
apresentaremos uma declaração de voto por escrito.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, tem a palavra.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — É para o mesmo efeito, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente:— Sr.ª Deputada Mónica Quintela, tem a palavra.
A Sr.ª Mónica Quintela (PSD): — É para o mesmo efeito, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, fica registado que vão apresentar declarações de voto, assim como o
PS e o PCP.
Portanto, vai haver várias declarações de voto sobre esta rejeição.
O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Cristóvão Norte, pede a palavra para que efeito?
O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Sr. Presidente, é para registar a minha presença.
O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr. Deputado. Fica registada a sua presença.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Peixoto.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, é exatamente para o mesmo efeito.
O Sr. Presidente: — Fica registada a sua presença, Sr. Deputado.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mónica Quintela.
A Sr.ª Mónica Quintela (PSD): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito.
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O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr.ª Deputada. Fica registada a sua presença. Aliás, já a tínhamos ouvido.
Srs. Deputados, chegámos, assim, ao fim desta sessão plenária.
Uma vez que a ordem do dia da sessão de amanhã já foi anunciada, declaro encerrada esta sessão.
Eram 17 horas e 32 minutos.
———
Declaração de voto enviada à Mesa para publicação
Relativa ao Projeto de Lei n.º 144/XIV/1.ª:
A decisão de desagendamento do Projeto de Lei n.º 144/XIV/1.ª, do CH, é uma decisão perigosa e muito
pouco avisada.
Vale a pena recordar os factos que aqui conduziram.
Após a sua apresentação, o Presidente da Assembleia da República proferiu despacho de admissão, embora
suscitando dúvidas acerca da conformidade com a Constituição, determinando, ainda assim, a sua baixa à
Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para relatório e parecer.
No Parecer que lhe compete produzir, a Comissão assinalou com clareza nas conclusões «dificuldades
manifestas no que respeita à sua conformidade constitucional, nomeadamente por colisão com os artigos 1.º,
18.º, n.º 2, 25.º e 30.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa».
Entendeu a Comissão, em coerência com essa conclusão, não referir em tal parecer o preenchimento dos
requisitos constitucionais da iniciativa para a sua discussão e votação em Plenário, como habitualmente
acontece.
Entretanto, na sequência da Conferência de Líderes do dia 12 de fevereiro, o Projeto de Lei n.º 144/XIV/1.ª
foi incluído na fixação da ordem do dia da reunião plenária do dia 28 de fevereiro, por arrastamento do Projeto
de Lei n.º 187/XIV/1.ª, do PS.
Veio o Grupo Parlamentar do PS requerer, posteriormente, o desagendamento do Projeto de Lei n.º
144/XIV/1.ª, requerimento na sequência do qual o Presidente da Assembleia da República propôs que se
solicitasse uma aclaração do Parecer à 1.ª Comissão.
Na resposta ao solicitado, a 1.ª Comissão reiterou o seu entendimento de inconstitucionalidade do projeto,
recordando, no entanto, que esse Parecer não determina o agendamento ou o não agendamento da iniciativa,
uma vez que a competência da sua fixação é do Presidente da Assembleia da República ouvida a Conferência
de Líderes, e não das Comissões.
Por fim, pelo seu Despacho de 27 de fevereiro, determinou o Presidente da Assembleia da República que o
Projeto de Lei n.º 144/XIV/1.ª fosse retirado da ordem do dia anteriormente fixada.
Desde logo, é importante referir que esta decisão do Presidente da Assembleia da República colide com a
garantia de estabilidade da ordem do dia, consagrada no artigo 61.º do Regimento da Assembleia da República,
que expressamente determina que, uma vez fixada, a ordem do dia apenas pode ser preterida por deliberação
do Plenário e não do Presidente da Assembleia da República.
Em qualquer caso, apresentado recurso desse despacho irregular relativo à fixação da ordem do dia, como
o CH fez, cabe-lhe o direito de apresentar verbalmente os respetivos fundamentos, nos termos do n.º 4 do artigo
59.º do Regimento da Assembleia da República, e até este direito regimental o PS procurou denegar, felizmente
que sem sucesso, invocando normas relativas à admissão que não se aplicam ao caso vertente.
Mas o mais grave de todo este processo são os dois pesos e as duas medidas com que o caso foi tratado.
O PS, que pediu este desagendamento e o Presidente da Assembleia da República que irregularmente o
decidiu desagendar, com o argumento do Parecer de inconstitucionalidade da 1.ª Comissão, são os mesmos
que também face a um Parecer de manifesta inconstitucionalidade da 1.ª Comissão, a um projeto de lei que
pretendia criar tribunais com competência exclusiva em matéria de violência doméstica (o Projeto de Lei n.º
978/XIII/3.ª, do BE), nada propuseram e não desagendaram a iniciativa em causa, que então seguiu para
discussão e votação em Plenário.
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A única diferença entre as duas situações não é a pronúncia da 1.ª Comissão, que em ambos os casos foi
no sentido de existirem manifestos problemas de inconstitucionalidade dos projetos de lei.
A única diferença é que no caso não desagendado, o projeto de lei era do BE, então parceiro do PS na
maioria de apoio ao Governo, e o agora desagendado é de um partido da oposição.
Esta dualidade de critério é inaceitável.
Trata-se de uma decisão muito infeliz do Presidente da Assembleia da República, contrária à posição que
anteriormente adotara, e que abre um perigoso e discricionário precedente de desprezo, ou ao menos
desrespeito, pelas normas regimentais que defendem o regular funcionamento da Assembleia da República.
Uma maioria conjuntural, qualquer que ela seja, não pode ter a arrogância de impor regras à la carte,
decidindo uma coisa ou o seu contrário conforme politicamente lhe der jeito.
Por isso, o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata votou a favor do recurso desta arbitrária e
temerária decisão do Presidente da Assembleia da República, pese embora entenda, como já entendera na
iniciativa do BE atrás referida, que o projeto de lei em causa é inconstitucional e como tal sempre mereceria o
voto contra desta bancada, como o da criação de tribunais com competência exclusiva nos mereceu.
Assembleia da República, 2 de março de 2020.
O Grupo Parlamentar do PSD.
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Nota: As declarações de voto anunciadas pelo Deputado do BE Pedro Filipe Soares, pelo Deputado do CDS-
PP Telmo Correia e pela Deputada do PAN Inês de Sousa Real referentes a esta reunião plenária não foram
entregues no prazo previsto no n.º 3 do artigo 87.º do Regimento da Assembleia da República.
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Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.