O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

Sexta-feira, 13 de março de 2020 I Série — Número 40

XIV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2019-2020)

REUNIÃOPLENÁRIADE12DEMARÇODE 2020

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretárias: Ex.mas Sr.as Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Helga Alexandra Freire Correia Ana Cristina Cardoso Dias Mesquita Ana Sofia Ferreira Araújo

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 2

minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa do Inquérito

Parlamentar n.º 2/XIV/1.ª, dos Projetos de Lei n.os 235, 238, 240 a 243, 248 e 249, 251 e 256 a 258/XIV/1.ª e dos Projetos de Resolução n.os 313 a 318/XIV/1.ª.

Na abertura do debate da Interpelação ao Governo n.º 2/XIV/1.ª, requerido pelo BE, sobre a crise no serviço postal e a recuperação do controlo público dos CTT, proferiram intervenções a Deputada Isabel Pires (BE) e o Ministro das Infraestruturas e da Habitação (Pedro Nuno Santos).

Intervieram, depois, durante o debate, a diverso título, além daqueles oradores, os Deputados Eduardo Teixeira

(PSD), José Maria Cardoso (BE), José Luís Ferreira (PEV), Nuno Fazenda (PS), João Vasconcelos (BE), João Dias (PCP), Márcia Passos (PSD), João Paulo Correia (PS), Bruno Dias (PCP), João Pinho de Almeida (CDS-PP), João Cotrim de Figueiredo (IL), Jorge Salgueiro Mendes (PSD), Luís Monteiro (BE), Hugo Oliveira e Hugo Costa (PS), André Ventura (CH), Cristina Rodrigues (PAN), Carlos Pereira (PS) e Isabel Lopes (PSD).

No encerramento do debate, intervieram a Deputada Mariana Mortágua (BE) e o Ministro das Infraestruturas e da Habitação.

A Presidente (Edite Estrela) encerrou a sessão eram 17 horas e 40 minutos.

Página 2

I SÉRIE — NÚMERO 40

2

Página 3

13 DE MARÇO DE 2020

3

O Sr. Presidente: — Boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Funcionários,

Sr.as e Srs. Jornalistas. Cumprimento a todos.

Eram 15 horas e 2 minutos.

Srs. Agentes da autoridade, peço o favor de abrirem as portas das galerias ao público.

Hoje, temos uma ordem do dia preenchida com uma interpelação ao Governo, requerida pelo Bloco de

Esquerda, sobre a crise no serviço postal e a recuperação do controlo público dos CTT.

Antes de entrarmos na ordem do dia, a Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha vai dar conta das iniciativas

legislativas que deram entrada na Mesa.

Tem a palavra, Sr.ª Secretária.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Muito obrigada, Sr. Presidente, e muito boa tarde a todas e a

todos.

Passo a anunciar as iniciativas que deram entrada na Mesa e foram admitidas pelo Sr. Presidente.

Refiro, em primeiro lugar, que deu entrada na Mesa o Inquérito Parlamentar n.º 2/XIV/1.ª (PSD) — Comissão

Eventual de Inquérito Parlamentar à atuação do XXI Governo Constitucional no que respeita ao processo de

atribuição de apoios na sequência dos incêndios rurais ocorridos em 2017, nos concelhos de Pedrógão Grande,

Castanheira de Pera, Ansião, Alvaiázere, Figueiró dos Vinhos, Arganil, Góis, Penela, Pampilhosa da Serra,

Oleiros e Sertã.

Deram também entrada na Mesa os Projetos de Lei n.º 235/XIV/1.ª (CDS-PP) — Altera a Lei n.º 19/2003, de

20 de junho (Lei do Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais), eliminando o benefício

de isenção de imposto municipal sobre imóveis (IMI) para os partidos políticos, que baixa à 1.ª Comissão, n.º

238/XIV/1.ª (PCP) — Suplemento remuneratório dos elementos femininos das forças e serviços de segurança

por motivo de gravidez, que baixa 1.ª Comissão, n.º 240/XIV/1.ª (IL) — Elimina os benefícios fiscais dos partidos

políticos e reduz o valor das subvenções públicas (oitava alteração à Lei de Financiamento dos Partidos

Políticos, Lei n.º 19/2003, de 20 de junho), que baixa à 1.ª Comissão, n.º 241/XIV/1.ª (BE) — Procede à oitava

alteração à Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, introduzindo medidas de justiça fiscal e igualdade de tratamento,

que baixa à 1.ª Comissão, n.º 242/XIV/1.ª (BE) — Procede à nona alteração à Lei Eleitoral dos Órgãos das

Autarquias Locais, aprovada pela Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto, que baixa à 1.ª Comissão, n.º

243/XIV/1.ª (BE) — Impede o apoio institucional à realização de espetáculos que inflijam sofrimento físico ou

psíquico ou provoquem a morte de animais, que baixa à 12.ª Comissão, n.º 248/XIV/1.ª (PAN) — Revoga

benefícios fiscais atribuídos aos partidos políticos, diminui os limites das despesas de campanha eleitoral e

reestabelece limites das receitas de angariação de fundos (oitava alteração à Lei n.º 19/2003, de 20 de junho),

que baixa à 1.ª Comissão, n.º 249/XIV/1.ª (BE) — Estabelece a moratória aos processos de despejo decorrentes

da liberalização da Lei do Arrendamento Urbano, até à construção de um robusto parque habitacional público,

que baixa à 6.ª Comissão, n.º 251/XIV/1.ª (CH) — Pela defesa da liberdade de expressão e da dignidade da

pessoa humana, que baixa à 1.ª Comissão, n.º 256/XIV/1.ª (PAN) — Determina a necessidade de avaliação de

impacto da prática agrícola em modo intensivo e superintensivo de espécies arbóreas, que baixa à 7.ª Comissão,

n.º 257/XIV/1.ª (PAN) — Pela não utilização de dinheiros públicos para financiamento de atividades

tauromáquicas, que baixa à 12.ª Comissão, e n.º 258/XIV/1.ª (PEV) — Garante a gratuitidade da Linha SNS 24

e para os demais serviços prestados por entidades públicas e empresas que prestam serviços públicos impõe

alternativas aos números de valor acrescentado para o consumidor/utente, baixa à 13.ª Comissão, em conexão

com a 6.ª, a 9.ª e a 11.ª Comissões.

Deram, ainda, entrada na Mesa os Projetos de Resolução n.os 313/XIV/1.ª (BE) — Recomenda ao Governo

que não transfira mais verbas para o Fundo de Resolução com vista à injeção de capital no Novo Banco até que

a auditoria às suas contas esteja concluída, que baixa à 5.ª Comissão, n.º 314/XIV/1.ª (PCP) — Pela abolição

de portagens na A13, entre Atalaia e Ferreira do Zêzere, que baixa à 6.ª Comissão, n.º 315/XIV/1.ª (CDS-PP)

— Recomenda ao Governo que agende e execute a urgente retirada das placas de fibrocimento existentes nas

coberturas da EB 2,3 Dr. António Augusto Louro, do Seixal, e programe as necessárias obras de requalificação,

n.º 316/XIV/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que antecipe o período de férias escolares da Páscoa,

como medida preventiva da propagação do novo coronavírus – COVID-19, que baixa à 9.ª Comissão, n.º

Página 4

I SÉRIE — NÚMERO 40

4

317/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo a disponibilização de uma linha de contacto específica para o

aconselhamento e orientação relativa à COVID-19, que baixa à 9.ª Comissão, e n.º 318/XIV/1.ª (BE) — Medidas

de apoio aos trabalhadores, designadamente trabalhadores a recibo verde, no âmbito do plano de contingência

da COVID-19, baixa à 10.ª Comissão, em conexão com a 9.ª Comissão.

Terminei, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha.

Srs. Deputados, vamos dar início à ordem do dia, que tem como ponto único a Interpelação ao Governo n.º

2/XIV/1.ª, requerida pelo BE, sobre a crise no serviço postal e a recuperação do controlo público dos CTT.

Para abrir o debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª IsabelPires (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Ministros e Sr. Secretário de Estado:

A história recente dos CTT é a história de uma privatização profundamente errada.

Levada a cabo pelo último Governo PSD/CDS e concluída em 2014, a partir daí tudo se alterou na qualidade

de prestação de serviço postal, e para pior.

A 5 de setembro de 2014, apenas um dia depois da aprovação da operação, concretizou-se a venda

relâmpago dos últimos 31% de ações dos CTT que a PARPÚBLICA ainda detinha, por 343 milhões de euros.

Um ano antes, cerca de 70% do capital dos Correios já tinha ficado em mãos de alguns bancos internacionais

como a Goldman Sachs e o Deutsche Bank.

Foi em menos de um ano que PSD e CDS venderam os CTT, não sem antes aplicar a receita conhecida:

«reestruturar» e «emagrecer» a empresa pública, encerrando balcões, vendendo edifícios, despedindo

funcionários e degradando o serviço, ao mesmo tempo que se começou a abrir espaço para utilizar a rede de

balcões de correio para a venda de produtos financeiros.

Vale a pena sublinhar que esta empresa, quando pública, dava lucros a cada ano, gerando receita para o

Estado. Numa década, entre 2005-2014, os CTT geraram 577 milhões de euros de lucros.

A partir de 2014, apenas quatro meses depois da conclusão da privatização, os dados começaram a inverter-

se. Desde então, até 2019, os dividendos distribuídos são superiores aos resultados líquidos.

O esbulho do que deveria ser de todos e de todas está à vista de quem quiser ver e só não se impediu já por

falta de coragem política.

Os CTT eram uma empresa pública rentável, que geria um monopólio natural da distribuição do correio com

grandes graus de eficácia e de eficiência. Foi por isso que se tornou tão apetecível nas operações de

privatização perpetradas pela direita e postas em marcha assim que a direita chegou ao poder.

Independentemente de opções políticas, é inegável que os Correios sempre foram vistos como uma entidade

pública que presta um serviço público essencial. É uma empresa com mais de 500 anos de história, é parte do

imaginário coletivo do País, tendo passado por vários regimes políticos e crises financeiras e económicas

mundiais. Quinhentos anos para se construir um ativo tão importante e bastaram poucos anos de política de

direita para privatizar e destruir este ativo.

Desde a privatização, o cenário não podia ser pior para a prestação de serviço público: centenas de estações

e postos de correio encerrados; a externalização da entrega do correio a empresas em regime de outsourcing;

a distribuição de cartas deixou de ser diária em muitos locais do País; o aumento significativo da dimensão dos

percursos de cada giro de distribuição.

Mas também no que toca aos direitos dos trabalhadores, o cenário é negativo. Houve uma redução de mais

de 1000 trabalhadores, inclusivamente ainda antes da privatização; um aumento do número de trabalhadores

com vínculo precário, que atinge quase os 2000; o aumento do itinerário que cada carteiro, do período de

trabalho e dos ritmos de trabalho em todas as áreas de atividade; o não cumprimento dos períodos de descanso

e o não pagamento do subsídio por horário descontínuo.

E o que dizer da gestão da empresa pelas administrações que por lá têm passado?

Essa gestão pautou-se pela venda ao desbarato de património imobiliário, muitas vezes histórico. A

administração dos CTT recebeu, por exemplo, em 2017, salários na ordem das muitas centenas de milhares de

euros. À cabeça desses salários encontrava-se o do seu presidente, à época, Francisco Lacerda, cuja

remuneração anual foi de 900 000 € — o sétimo mais bem pago da lista do PSI-20 (Portuguese Stock Index),

nesse mesmo ano. O propósito da administração de Francisco Lacerda foi transformar a esmagadora maioria

Página 5

13 DE MARÇO DE 2020

5

das estações em agências bancárias do Banco CTT e apostar apenas nos segmentos lucrativos dos negócios

que estão integrados nos CTT. A metodologia de repartição de custos usada pela administração de Francisco

Lacerda permitiu que parte dos custos com a atividade do Banco fosse imputada ao serviço universal postal,

empolando os custos desta atividade, em detrimento da do Banco, que está fora, obviamente, do âmbito do

serviço público.

Mas também a perceção dos e das utentes relativamente ao serviço prestado tem atingido níveis muito

baixos. Olhando apenas para o ano de 2019, a ANACOM (Autoridade Nacional de Comunicações) registou 28

000 queixas sobre serviços postais, no geral. Dessas, 23 000 queixas visaram os CTT e o maior motivo de

queixa são os atrasos nas entregas de encomendas, números no seguimento do que já vinha acontecendo em

2018.

Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, em praticamente todos os indicadores que conseguimos

utilizar se comprovam, ano após ano, as consequências gravosas do erro que foi a privatização.

Os CTT desempenham, há 500 anos, um papel essencial de coesão territorial, seja pelo serviço postal

universal e distribuição domiciliária de correio, seja pelas atividades que, entretanto, se desenvolvem nos seus

postos, tais como o levantamento de pensões ou o pagamento de diversos serviços essenciais.

As estações de correio representam, em muitas localidades do País, o único serviço público e de proximidade

ao dispor das populações, desempenhando, deste modo, uma função social incalculável.

Facilmente percebemos que Portugal, ao privatizar os CTT, optou por estar com uma minoria de países que

têm a totalidade da empresa de serviço postal privada. De 24 países analisados pela ANACOM, 19 têm

empresas totalmente públicas e apenas 4 têm empresas totalmente privadas. É um erro! Foi um erro a

privatização!

Em Portugal, é o próprio regulador que admite que, ao ser privatizada, a empresa deixou de estar orientada

exclusivamente pela promoção do interesse público. É mais do que óbvio, e até decorre da legislação portuguesa

e comunitária, que os serviços de correio não podem ser deixados exclusivamente à iniciativa privada, porque

o mercado não presta esse serviço de forma satisfatória e porque não é esse o seu intuito.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apenas um serviço totalmente público consegue garantir um serviço

que chegue a toda a população, em todo o território, a preços acessíveis ou gratuito, com qualidade, sem

discriminação e sem critérios empresariais e de gestão totalmente desadequados para esse serviço.

Esta interpelação ao Governo pretende que se clarifiquem posições e decisões de que as populações tanto

necessitam.

O contrato de concessão termina no final deste ano, 2020. Não se podem continuar a ignorar os

incumprimentos constantes ao contrato, nem tão-pouco o sucessivo incumprimento de promessas das

administrações, por exemplo, no que toca à reabertura de estações.

Um próximo contrato de concessão do serviço postal universal tem de oferecer garantias concretas e da

parte do Governo ainda não se conseguiu perceber que instrumentos pretende utilizar para o efeito. Por isso,

Sr. Ministro, deve hoje tomar uma posição clara sobre esta matéria, clarificando qual é o plano de ação concreto

que tem.

Outra clarificação que é cada vez mais premente tem a ver com quem detém os CTT. Sobre isto, muitas

declarações temos visto mas pouca ação.

Da parte do Bloco de Esquerda, conhecem a nossa posição: os CTT nunca deveriam ter sido privatizados e

a renacionalização é a única decisão possível.

Aplausos do BE.

A esse respeito, a Inspeção-Geral de Finanças (IGF) veio já indicar que as decisões tomadas aquando da

privatização foram completamente erradas e poderão lesar ainda mais o erário público.

Precisamos, enquanto País, de garantir que os setores e as empresas estratégicas estão nas mãos de todos

e todas nós e, portanto, do Estado.

Isto não é por qualquer preconceito ideológico — aliás, é o único argumento da direita, que arruinou a

capacidade estratégica do nosso País, quer em relação aos CTT, quer em relação a outras áreas —, é porque

tem ficado cada vez mais comprovado pela realidade que só o serviço público consegue chegar a todos e a

Página 6

I SÉRIE — NÚMERO 40

6

todas, sem discriminações, sem olhar para a carteira de cada utente e estando em todo o território sem

estratégias de lucro por detrás de cada decisão.

Em 2019, parte do Partido Socialista pressionou o Governo para ter uma posição diferente e avançar para a

reversão da privatização dos CTT. Também nesse ano, o Secretário de Estado e o Ministro afirmaram que, e

cito, «o Estado deveria ter participação nos CTT» e que «a entrada de capital não está excluída, apesar de não

estar em cima da mesa». Sol de pouca dura, Srs. Deputados! Estas declarações não tiveram qualquer

concretização, a não ser a votação contra dos projetos do Bloco de Esquerda que propunham exatamente a

nacionalização desta empresa.

Sr. Ministro, pois bem, o debate está em cima da mesa e está na hora de o Governo se posicionar

definitivamente. Quer ou não ter o Estado um papel fundamental nesta empresa estratégica para o País?

Quando se tomam decisões profundamente erradas para o nosso País, é nosso dever não desistir de as

reverter. A reivindicação sobre os CTT e o serviço postal tem sido feita por muitos e muitas no País, em todo o

território. Os relatórios sobre a má gestão são mais do que aqueles que deveriam ser permitidos por qualquer

Governo.

Portanto, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, não há mais desculpas para adiar a decisão da

nacionalização dos CTT.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Ainda no período de abertura, tem a palavra o Sr. Ministro das Infraestruturas e da

Habitação, Pedro Nuno Santos, a quem também aproveito para cumprimentar.

Pausa.

Peço aos Srs. Deputados que estão de pé, a conversar, que façam o favor de se sentar ou de abandonar a

Sala por alguns segundos.

Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação (Pedro Nuno Santos): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs.

Deputados: Há, naturalmente, outros temas que nos preocupam bem mais e que têm concentrado a nossa

atenção e preocupação, mas é evidente que o Parlamento e o Governo não param o seu trabalho e, porque o

tema que o Bloco de Esquerda escolheu trazer também é de grande importância e o debate é necessário,

cumprimento o Bloco de Esquerda pela iniciativa.

Este tema é importante não apenas pela empresa em causa, os CTT, mas também porque ele permite

partilhar convosco cinco ideiastão curtascomo essenciais.

Primeira ideia: nas últimas duas décadas e meia, o País privatizou demasiadas empresas públicas e

privatizou mal — mesmo, não há problema em admiti-lo, quando foram Governos do Partido Socialista a fazê-

lo.

Segunda ideia: o País privatizou empresas que, em muitos casos, eram não apenas lucrativas mas também

queridas do povo, empresas que não só davam dividendos orçamentais mas que mantinham os laços simbólicos

do Estado com as populações. Um Estado que serve o povo com o seu património ganha legitimidade e depende

menos de impostos para se financiar.

Terceira ideia: a regulação, vista como solução para corrigir problemas que resultam da privatização, é, em

muitos setores-chave da economia, uma alternativa fraca, porque, quando uma empresa pública é privatizada,

fica mais difícil aos cidadãos exercerem o seu controlo democrático. O escrutínio popular de uma empresa

pública é mais fácil do que no caso de uma empresa privada regulada por uma entidade independente. No

primeiro caso, podemos sempre pedir contas ao Governo.

Quarta ideia: a regulaçãoé também uma alternativa pobre, porque, uma vez uma empresa pública

privatizada, fica mais difícil a um Governo impor exigências e garantir que a empresa forneça um melhor serviço

ao povo. Um Estado regulador é um Estado menos eficaz.

Página 7

13 DE MARÇO DE 2020

7

Quinta ideia: a privatização de empresas públicas é ainda mais gravosa e errada quando essas empresas

atuam em setores que são monopólios naturais, ou seja, onde é impossível existir concorrência entre diferentes

empresas.

Estas cinco ideias resultam de uma avaliação serena e tranquila do nosso passado recente. Elas são

essenciais para compreender o que de profundamente errado se passou com a privatização dos CTT e em que

situação estamos hoje.

Trata-se de uma empresa que dava dividendos ao Orçamento do Estado, que desempenhava um papel

ímparna garantia simbólica da unidade e coesão territorial e que opera num setor onde o mercado não funciona

como nas utopias simplistas dos liberais.

Aplausos do PS.

Bem sei que o PSD e o CDS vão dizer: «A sua privatização estava prevista no Memorando da troica,

negociado e assinado pelo PS».

Vozes do PSD: — É verdade!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Seja! Essa privatização estava mal prevista!

Aplausos do PS.

Uma vez privatizada a empresa…

Protestos do PSD.

Pausa.

O Sr. Presidente: — Faça favor de continuar, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Uma vez privatizada a empresa, o Estado perdeu

capacidade de intervenção e de garantir que as populações são bem servidas com qualidade, dignidade e

igualdade.

Se a privatização foi errada, o resultado final da negociação do contrato de concessão não foi melhor.

Caras e Caros Deputados, já dissemos várias vezes que o cenário de entrada no capital dos CTT não está

excluído pelo nosso Governo. A renegociação do contrato de concessão e o seu resultado em termos de

obrigações para o prestador do serviço universal será determinante para qualquer decisão que venhamos a

tomar.

Assim, ainda há caminho a percorrer até uma decisão mais impactante na vida de uma empresa que ainda

recentemente foi alvo de mudanças societárias radicais, que são sempre muito perturbadoras.

Uma parte fundamental desse trabalho passa, por exemplo, por estudar, por antecipar o impacto que as

inevitáveis mudanças no modelo de negócio postal tradicional terão numa empresa como os CTT.

O negócio da troca de cartas está em forte declínio há vários anos e tudo o que sabemos, hoje, sobre a

sociedade diz-nos que não regressaremos, no futuro, a padrões que marcaram o negócio postal no passado.

Isto significa que, ao lado de um serviço universal tradicional de qualidade, capaz de servir os portugueses em

todo o território nacional, uma empresa como os CTT, tenha capitais maioritariamente privados ou públicos, terá

de saber agarrar oportunidades comerciais de futuro.

Por exemplo, terá de reorientar progressivamente a sua estratégia comercial para negócios emergentes,

como é o de transporte e entrega de encomendas, aproveitando o crescimento do comércio eletrónico, que tem

ainda um potencial de progressão muito relevante em Portugal.

Caras e Caros Deputados, as privatizações de empresas públicas em setores nucleares para o País pagam-

se caro. Nuns casos, esses custos são difusos, escondidos e precisamos de indicadores estatísticos para os

Página 8

I SÉRIE — NÚMERO 40

8

medir; noutros casos, os custos são visíveis e sentidos todos os dias por milhões de portugueses, e este é um

desses casos.

A privatização dos CTT, sabe hoje muito bem o País, foi um erro grave que não acautelou o interesse do

povo.

Aplausos do PS.

Cabe-nos a nós ter a humildadepara saber tirar as lições sobre decisões passadas. Por isso é que, sem

fechar a porta, sem excluir nenhum cenário, sem antecipar qualquer decisão sobre uma eventual entrada do

Estado no capital da empresa, podemos afirmar que, independentemente da estrutura societária dos CTT, o

futuro contrato de concessão de serviço postal universal terá de garantir níveis decentes de qualidade, de

relação com o poder local e de presença no território, a começar pela garantia mínima de uma estação de

correios por concelho.

Aplausos do PS.

Este é o nosso compromisso: trabalharmos no quadro do contrato de concessão para que se garanta a

qualidade no serviço postal e que a densidade territorial proteja a coesão; uma relação mais justa entre os CTT

e o poder local; e o respeito pelos direitos dos trabalhadores. Ao mesmo tempo que assumimos este

compromisso, não excluímos o eventual recurso a medidas mais ousadas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Estão inscritos vários Srs. Deputados para formularem pedidos de esclarecimento à

Sr.ª Deputada Isabel Pires e ao Sr. Ministro.

O primeiro pedido de esclarecimento cabe ao Sr. Deputado Eduardo Teixeira e é dirigido à Sr.ª Deputada

Isabel Pires.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Eduardo Teixeira (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª

Deputada Isabel Pires, vem novamente a debate parlamentar, por interpelação do Bloco de Esquerda, o modelo

de privatização dos CTT, Correios de Portugal.

Mas quantas vezes, Sr.ª Deputada, tomou o Bloco de Esquerda, nos últimos cinco anos, iniciativas

parlamentares, reapresentadas ciclicamente, sobre esta matéria? Nem quando acordaram, por via parlamentar,

uma geringonça com o Partido Socialista e tinham maioria nesta Câmara conseguiram reverter esta decisão que

vigora desde setembro de 2014.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Os senhores votaram contra!

O Sr. Eduardo Teixeira (PSD): — Sim, é verdade.

Porquê insistir? Será que o Partido Socialista pode virar mais à esquerda? Hoje, o Sr. Ministro disse que

tinha, porventura, algumas medidas mais ousadas.

Independentemente de ser um serviço prestado por uma empresa pública ou privada, para nós, os CTT —

Correios de Portugal sempre tiveram, e têm de ter, como objetivo central a qualidade e a eficiência ao serviço

dos portugueses, como empresa, se calhar a única, que chega a todas as casas do nosso País.

Mas, mais uma vez, a motivação subjacente a este debate é essencialmente política e ideológica, pois

sabemos bem que, quer o Bloco de Esquerda, quer o Partido Comunista Português — apesar de, sim, Sr.

Ministro, o Memorando da troica ter previsto a privatização e ainda que diga que ela foi mal prevista —, sempre

se opuseram a este modelo, e não o Partido Socialista.

Trata-se de um modelo de privatização em que competia ao Governo e ao regulador, a ANACOM, auditar e

fiscalizar a concessão atribuída. E esperemos que o tenham feito, pois o final do ano esta quase aí e poderá ser

Página 9

13 DE MARÇO DE 2020

9

legítimo ter dúvidas nesta matéria. Mas agora urge apenas tomar decisões governativas, por termos pouco mais

de nove meses.

O Bloco de Esquerda quer, após pouco mais de cinco anos da finalização da privatização, recuperar o

controlo público dos CTT e defende aqui, hoje, que existe uma crise no serviço postal. Mas o que defende,

efetivamente, o Bloco de Esquerda neste novo debate parlamentar?

Em matéria de qualidade de serviço e de postos de atendimento nos concelhos, saberá o Bloco de Esquerda

que foi enquanto esta empresa era pública que se concretizou o maior número de encerramentos de postos de

correios?

Saberá o Bloco de Esquerda que a atual administração já está a fazer a reabertura de postos — haverá seis

reaberturas este ano — e que garante que estarão presentes em todos os nossos concelhos até ao final de

2020?

É ou não, então, ideológico o debate político generalizado acerca das empresas privatizadas?

Faltando poucos meses para o terminus da concessão, será que o Bloco de Esquerda vai concertar esta

matéria com o Partido Socialista? Estão em contacto para alguma reversão que não seja só a ideológica?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Eduardo Teixeira, agradeço as questões que pôs.

Começo por responder à primeira questão, dizendo que o Bloco de Esquerda vai trazer este tema a debate

as vezes que forem necessárias até os CTT voltarem a ser públicos.

Aplausos do BE.

Relativamente às motivações que nos trazem a este debate, faço a pergunta ao contrário: quais foram as

motivações que estiveram por detrás da posição do PSD e do CDS em relação às privatizações?

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Isto porque, na verdade, o modelo de privatização que foi utilizado pelo Governo

PSD/CDS tinha por detrás motivações muito claras e aquilo que fizeram foi destruir empresas estratégicas para

o nosso País, não só os CTT, e fizeram-no de muito bom grado, Sr. Deputado.

Relativamente à estratégia utilizada — e muito bem disse que, antes da privatização, já tinham começado a

encerrar alguns postos, já tinham começado a ser despedidos trabalhadores —, recordo o nome Sérgio

Monteiro, que utilizou esta mesma estratégia tanto nos CTT como noutras empresas que se preparava para

privatizar, e algumas dessas privatizações, felizmente, conseguimos parar.

Protestos do PSD.

Portanto, todas as empresas que tiveram o cunho desta estratégia Sérgio Monteiro tiveram o mesmo fim,

que foi destruir as empresas para as preparar para a privatização.

Sr. Deputado, é isto que efetivamente nos divide e, sim, temos motivações ideológicas bastante diferentes,

porque não é a mesma coisa um serviço, como é o serviço postal universal, ser prestado por uma entidade

pública ou por uma entidade privada. É isso que nos tem dividido, e ainda bem. Por isso mesmo é que

conseguimos parar privatizações e por isso mesmo é que trazemos este debate aqui, ao Parlamento, as vezes

que forem necessárias até esta empresa e outras serem novamente nacionalizadas.

Protestos do PSD.

Porquê? Porque o serviço público só pode ser prestado com qualidade e com eficiência e chegar a todo o

território e a todas as pessoas, sem qualquer discriminação, se for gerido pelo público, porque o privado não

Página 10

I SÉRIE — NÚMERO 40

10

tem a motivação de fazer serviço público. Nunca teve e, como o PSD e o CDS, quando estiveram no Governo,

bem mostraram, nunca vai ter. A única solução para estas empresas é a renacionalização.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se nove Srs. Deputados para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro, que

responderá, em primeiro lugar, a um grupo de quatro Srs. Deputados.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Maria Cardoso, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. José Maria Cardoso (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, quando, em 2014/2015, se deram os

encerramentos massivos das estações de correio e em que muitos movimentos locais de contestação se criaram

— lembro os que acompanhei mais de perto no meu distrito, o distrito de Braga, como foi o caso de Riba de

Ave, Lousada e Famalicão, Terras de Bouro, Vila Verde —, o argumento reivindicativo dizia o seguinte: «O

encerramento de estações dos CTT tem de ser travado e não se pode permitir o desmantelamento de uma

empresa que tem um papel histórico no País e constitui um serviço público essencial e de proximidade para as

populações.»

Volvido este tempo, o que é que vemos? Vemos que foi exatamente isto que aconteceu. Ainda agora, o Sr.

Ministro afirmou que foi um erro crasso, por assim dizer, o processo de privatização.

Se é verdade que o Governo PSD/CDS tem de ser responsabilizado pelo crime social da privatização deste

serviço, o Governo PS também tem de ser responsabilizado porque, até ao momento, nada fez pela

renacionalização deste serviço.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Muito bem!

O Sr. José Maria Cardoso (BE): — Acresce dizer que uma boa parte destes encerramentos ocorreram em

terras do interior e na sequência de um conjunto de esvaziamento de outros serviços — centros de saúde,

balcões da Caixa Geral de Depósitos, comboio, escolas —, dizendo-se, com alguma desfaçatez, às pessoas

que continuassem nas suas terras, ao que elas respondiam, e muito bem, «então, se nos levam tudo, porque é

que havemos de continuar cá?».

Ora, é este processo que tem de ser percebido porque, na maior parte dos casos, estamos perante

populações envelhecidas que, muitas vezes, desesperam, inclusive, pelas suas parcas reformas, tendo ainda

de suportar despesas com deslocações. Ainda hoje, mesmo nos concelhos e nas freguesias mais distantes onde

existe balcão dos CTT, há um desfasamento no tempo em relação a esta mesma distribuição. Chegam a estar

mais de uma semana, 15 dias, à espera para distribuição do correio. E, mesmo nas freguesias que não são tão

distantes e não têm de ser do interior, falo concretamente do concelho de Guimarães, isso acontece.

Na verdade, não podemos falar em coesão territorial com medidas mitigadas e avulsas, como tem sido

anunciado pelo Governo. O problema é estrutural e tem de ser tratado como tal.

O Bloco de Esquerda apresentou, neste Plenário, um projeto de resolução sobre um programa de reabertura

de serviços públicos nos territórios de baixa densidade, que deve ser estruturado, em colaboração com os

municípios e de acordo com a avaliação do seu efeito no povoamento do território. Qual foi a posição do Partido

Socialista? Rejeitou esse projeto. Portanto, não basta falar em coesão, é preciso criar medidas estruturais para

que tal aconteça.

Por outro lado, sabendo-se que ainda há, hoje, 33 concelhos que continuam sem este serviço e, mesmo com

a recomendação da ANACOM, em 2019, para, num prazo de 20 dias úteis, a empresa apresentar uma proposta

para que todos os concelhos do País tenham, pelo menos, uma estação ou um posto de correios com

características equivalentes às da estação, nada disto aconteceu, até ao momento.

Perante todas estas lamentáveis realidades, pergunto ao Sr. Ministro: está o Governo na disposição de instar

a administração dos CTT a reabrir postos dos correios em localidades cujo serviço deixou de ser prestado?

Por outro lado, considera o Governo que, perante todas estas evidências de fuga de responsabilidades em

assegurar o contratualizado como serviço público, estas são razões suficientes para que o Estado seja chamado

a recuperar o controlo público do serviço universal dos correios?

Página 11

13 DE MARÇO DE 2020

11

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os

Verdes.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, a empresa CTT tem cerca de 100 anos,…

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Tem 500 anos!

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — … mas eu acho que podem passar mais 100 anos que ninguém há de

compreender os reais motivos que levaram o Governo PSD/CDS a privatizar uma empresa que prestava um

serviço público de altíssima qualidade, que respeitava os seus trabalhadores e que todos os anos contribuía

com importantes receitas para os cofres do Estado.

Hoje, sete anos após a privatização dos CTT, é perfeitamente notória a crescente degradação dos serviços

de correio. A saber: encerram estações e postos de correios; foram vendidos os edifícios; foram despedidos

trabalhadores; os vínculos precários aumentaram, bem como os percursos de cada giro de distribuição e os

tempos de espera para atendimento; há falta de dinheiro disponível nas estações para pagamento de pensões

e de outras prestações sociais; registam-se atrasos substanciais na entrega de vales postais e as situações em

que o correio deixou de ser distribuído diariamente acabaram por se generalizar.

Em resumo, a privatização trouxe menos qualidade, menos estações de correios, menos distribuição, menos

receitas para o Estado, delapidação do património, mais encargos para as pessoas e os trabalhadores viram as

suas condições de trabalho sofrer um substancial retrocesso.

É este o resultado da decisão do Governo PSD/CDS de privatizar os CTT.

O nobel do interesse público não seria desajustado para esse Governo e, já agora também, uma medalha

de lata para o campeão do interesse público, o ex-secretário de Estado Sérgio Monteiro, também não ficaria mal

neste contexto!

Protestos do PSD.

Mas, como se fosse pouco, vem agora a auditoria da IGF dizer: primeiro, o serviço público alimenta ou

engorda os ganhos dos CTT; segundo, as alterações legislativas que o Governo PSD/CDS promoveu em 2012

instalaram a dúvida sobre a titularidade dos bens da concessão, após terminar o contrato; e, por fim, que o

interesse público não foi tido em conta, não foi, de todo, acautelado.

Sr. Ministro, destas conclusões, apenas uma é novidade. Já todos sabíamos que o interesse público esteve

ausente neste processo, como também sabíamos, de resto, que o serviço público estava a engordar os ganhos

dos CTT. O que não sabíamos era do «jeito» que, consciente ou inconscientemente, o Governo PSD/CDS

acabou por atribuir aos privados.

Incógnitas ou incertezas legais sobre a titularidade dos bens da concessão que integram a rede postal, depois

de terminar o contrato? Mas o que é isto, Srs. Deputados? Isto não lembra a ninguém, muito menos a pessoas

com responsabilidades governativas.

Garantir a esta empresa privada a possibilidade de se eternizar num monopólio que só não é natural porque

foi construído pelo Governo PSD/CDS é absolutamente estranho num Estado de direito.

Mas, Sr. Ministro, não é apenas o interesse público que está em causa neste processo, são também os

padrões de qualidade que são exigidos e que se degradaram de forma acelerada, depois da privatização. Ou

seja, a privatização trouxe menos qualidade, menos postos de trabalho, menos estações de correio, menos

distribuição, menos receitas para o Estado, delapidação do património e mais encargos para as pessoas.

Já são, portanto, razões de sobra para trazer novamente os CTT para a esfera pública, como Os Verdes têm

vindo a defender.

O que eu pretendia saber, Sr. Ministro, é se essa possibilidade está a ser equacionada pelo Governo, no que

diz respeito ao futuro dos CTT, sobretudo depois de o Governo reconhecer, como o Sr. Ministro hoje fez quando

da sua intervenção na tribuna, que a privatização foi um erro grave e que não acautelou o interesse do povo

português.

Página 12

I SÉRIE — NÚMERO 40

12

Aplausos do PEV e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Fazenda, do Grupo

Parlamentar do PS.

O Sr. Nuno Fazenda (PS): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro,

Portugal é um País profundamente desigual em termos territoriais, e são vários os factos e os números que o

demonstram.

O litoral concentra cerca de 70% da população residente, 83% de riqueza produzida e quase 90% dos alunos

inscritos no ensino superior.

Ora, o que estes factos e números nos revelam é que precisamos de políticas mais efetivas a favor do interior,

o que nem sempre se verificou nas últimas décadas. Aliás, em alguns casos, constatou-se mesmo a

implementação de medidas penalizadoras para as gentes do interior, como foi o caso do fecho de tribunais e de

outros serviços de natureza pública, onde se inclui, também, o encerramento de estações de correio, o tema do

debate de hoje.

Na última Legislatura, que se reforçou na atual, passámos a ter uma agenda política para a valorização do

interior com ação em vários domínios-chave. Por exemplo: nos benefícios fiscais para as empresas; nos fundos

comunitários, onde tem havido — e bem! — uma discriminação positiva do interior; no ensino superior, onde o

número de alunos inscritos cresceu 11% nos últimos quatro anos; no turismo, onde pela primeira vez foi criada

uma linha de apoio à valorização turística do interior; no investimento público; na rodovia e na ferrovia. Porém,

a verdade é que, apesar do esforço que tem vindo a ser realizado, é preciso continuar e reforçar as políticas de

discriminação positiva do interior, incluindo na prestação de serviços públicos às populações.

É, hoje, sabido que a privatização efetuada nos CTT não acautelou o interesse público e não o salvaguardou

por duas grandes razões.

Em primeiro lugar, a qualidade do serviço público degradou-se, por exemplo, nos prazos de entrega ou na

fiabilidade e regularidade dos serviços. E não é nenhuma destas bancadas do Parlamento que o refere, nem da

direita, nem da esquerda, quem o atesta são duas entidades independentes, a ANACOM, a entidade reguladora,

e também a Inspeção-Geral de Finanças, no âmbito de uma auditoria feita ao processo de privatização dos CTT,

de que a imprensa deu ontem conta.

Em segundo lugar, e não menos importante, a privatização efetuada aos CTT não salvaguardou, também, o

interior do País, pois permitiu o encerramento de várias estações de correio.

Ora, tendo em conta que, no final deste ano, termina o contrato de concessão dos CTT, as questões que

coloco ao Sr. Ministro são as seguintes: a qualidade do serviço postal estará assegurada no próximo contrato

de concessão dos CTT? Segundo, consegue garantir a esta Assembleia não só que todos os concelhos do País

vão passar a ter uma estação de correios, mas também que não haverá concelhos que vão ficar para trás?

Consegue garantir a esta Assembleia que as gentes do interior não vão ser esquecidas?

Em suma, numa questão: no próximo contrato de concessão, o interesse público dos CTT passará a estar

salvaguardado?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Vasconcelos, do Grupo

Parlamentar do Bloco de Esquerda. Informo os Srs. Deputados que temos ainda mais cinco inscrições para pedir

esclarecimentos.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Vasconcelos (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.

Ministro, quando o Governo PSD/CDS privatizou os CTT, em 2014, a administração desta empresa aplicou,

melhor dizendo, redobrou de intensidade o tratamento de choque que já vinha dos anos anteriores:

despedimento de cerca de 1000 trabalhadores e encerramento de centenas de estações; aumento do número

de trabalhadores com vínculos precários; aumento dos ritmos e períodos de trabalho; não cumprimento dos

Página 13

13 DE MARÇO DE 2020

13

períodos de descanso e não pagamento do subsídio de horário descontínuo; externalização da entrega de

correio a outras empresas em regime de outsourcing; diminuição do número de giros; degradação acentuada

do serviço público e prejuízo para as populações; o Estado ficou sem uma empresa histórica de referência, e

lucrativa; e distribuição de milhões em dividendos pelos administradores, que assim canibalizaram uma empresa

pública de referência.

O desmantelamento da rede de estações e postos de correio dos CTT e a degradação dos seus serviços,

em particular nos concelhos do interior e territórios de baixa densidade, agravaram as dificuldades de quem lá

vive e, muito em especial, dos mais idosos, cujos problemas de mobilidade e outros são bem notórios. Há mesmo

concelhos que ficaram sem estações dos CTT.

No sul do País, e em particular no Algarve, também encerraram dezenas de estações dos CTT e outras

ameaçaram encerrar. Refiro apenas alguns exemplos: Portimão, Lagos, Loulé, Sagres, Praia da Luz, Alcoutim,

Estoi, Aljezur, Montenegro, Ferragudo, Carvoeiro, Praia da Rocha.

Esta situação levou mesmo a que a Associação de Municípios Terras do Infante, que junta as Câmaras

Municipais de Aljezur, Lagos e Vila do Bispo, intentasse uma providência cautelar para travar o encerramento

de estações das estações dos CTT na zona.

O encerramento destes serviços, crucificados no altar do lucro dos investidores privados, significou a

destruição, a degradação e a desqualificação de um serviço público essencial, constitui uma sobrecarga para

os magros orçamentos das autarquias e penaliza gravemente as populações, as pequenas e médias empresas

e os visitantes.

O encerramento e a degradação do serviço público postal constitui, assim, um ataque à qualificação do

território, com mais incidência nos territórios de baixa densidade, como já referi, o que prejudica, em muito, o

desenvolvimento social e económico dessas regiões.

Há, assim, vários incumprimentos ao contrato de concessão do serviço público postal universal por parte dos

CTT.

Os principais responsáveis são o Governo PSD/CDS, que privatizou a empresa, mas também o Governo

anterior do PS e o Governo atual, da responsabilidade do PS, que não operaram o que se exige, isto é, a

recuperação do controlo público dos CTT.

As questões que queria colocar, Sr. Ministro, são as seguintes: vai o Governo impedir o encerramento de

novas estações dos CTT no Algarve e noutras regiões do sul do País? Vai intervir no sentido da reabertura

desses serviços? Finalmente, Sr. Ministro, vai, ou não, reverter para a esfera pública o serviço postal dos CTT?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado João Dias, do Grupo

Parlamentar do PCP, a quem peço desculpa por ter havido esta alteração da ordem de uso da palavra.

O Sr. João Dias (PCP): — Não há problema, Sr. Presidente.

Sr. Ministro, tanta responsabilidade tem quem privatizou os CTT como quem, podendo renacionalizar os

CTT, não o faz.

Por isso, quando falamos em coesão económica e social e no combate às assimetrias regionais, este serviço

público seria uma boa medida para responder às necessidades de combate a essas assimetrias.

Por isso, Sr. Ministro, não se compreende a passividade do Governo do PS, nem a sua incoerência! Ou seja,

no plano da retórica, o Governo faz declarações proclamatórias sobre o desenvolvimento do interior e do mundo

rural e, depois, assiste, impávido e sereno, à destruição do serviço postal, ao abandono das populações, à

destruição de instrumentos de coesão territorial, como são os CTT, tudo em nome do lucro de uma empresa

privada que tomou conta dos CTT.

Inadmissível é que o Governo seja complacente com uma empresa que põe à frente dos interesses e das

necessidades das populações os seus lucros.

Por isso, Srs. Deputados, tenham a certeza de que, por cada estação dos CTT que encerra e por cada dia

que se mantém encerrada, ou por cada necessidade de serviço postal que não é satisfeita, é mais gente que

abandona o interior e o mundo rural!

Página 14

I SÉRIE — NÚMERO 40

14

E qual é a resposta do Governo perante a indignação das populações? Uma manobra ou, melhor, uma

operação mediática! Um processo de reabertura de estações a conta-gotas, mas só nas sedes de concelho, não

tendo resposta para as estações que existiam nas freguesias rurais, pelo que isto não passa de uma manobra

mediática!

Não é assim que se vai resolver o problema da reabertura de estações de correio e o problema da distribuição

postal continua com muitas dificuldades.

Sr. Ministro, só com uma gestão pública efetivamente ao serviço da população é que se responde às suas

necessidades, nomeadamente no que se refere à distribuição postal.

Por isso, quero deixar-lhe esta questão: principalmente no que respeita às estações de correio nas freguesias

onde foram encerradas para serem convertidas em «postos de correio de mercearia», vai o Governo responder

às necessidades das populações e reabrir as estações que existiam nessas freguesias?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, muitas das

questões que colocaram, e às quais vou responder, são comuns. Há também uma ideia, que é comum às

intervenções dos Srs. Deputados José Maria Cardoso, do Bloco de Esquerda, e João Dias, do PCP, que é a de

que, independentemente daquilo que possamos dizer, a responsabilidade pelo estado dos CTT é de quem

privatiza e de quem se recusa a nacionalizar. Parece-me injusto, mas legítimo, que seja essa a vossa posição.

De qualquer forma, não me parece que possamos acusar de manobra mediática a abertura de estações de

correio que não estava previsto serem abertas, estava previsto, sim, serem encerradas. Entretanto, não há mais

estações de correio para encerrar, e algumas estão a ser abertas — diz o Sr. Deputado que estão a ser abertas

a conta-gotas, e eu concordo.

Mas se a privatização foi mal feita, a negociação do contrato de concessão também foi. E o contrato de

concessão, tal como está, em vigor até ao final deste ano, não impediu, e não impede, a empresa de ter feito o

que fez, isto é, de ter encerrado essas estações. O contrato de concessão, em matéria de níveis de qualidade

de serviço, também não exigiu inicialmente os níveis de qualidade a que os portugueses estavam habituados e

a que têm direito.

Portanto, mesmo na relação entre os CTT e o poder local que presta o serviço — o que acontece em muitas

freguesias, como sabemos —, também não foi acautelada a defesa de uma relação mais justa entre os CTT e

as juntas de freguesia no contrato de concessão, contrato de concessão esse que termina este ano.

Ora, aquilo que sempre dissemos foi que iríamos exigir que, no contrato de concessão, estivesse, desde

logo, acautelado, pelo menos, uma estação de correios por concelho. E a verdade é que também tivemos

oportunidade de exigir isso aos CTT. Se se recordarem, nas primeiras intervenções que fiz no Parlamento a

esse propósito, referi que nunca nos iríamos esconder atrás de contratos de concessão e que, mesmo sendo

eles firmes naqueles que são os direitos ou as possibilidades da empresa, obviamente que nós, representando

o Estado, também poderíamos ter uma relação firme com a empresa.

Se foi por nossa causa, ou não, que as estações deixaram de ser encerradas e começaram a ser abertas,

não é questão que nos preocupe. O que nos interessa é que elas estão a ser abertas e, se não o forem até ao

fim das negociações para o novo contrato de concessão, podem ter a certeza de que, no novo contrato de

concessão, isso estará assegurado.

Mas não me parece que possamos chamar de «manobra mediática» a abertura de estações de correio em

Vila Flor, ou em Alpiarça, ou em Melgaço, ou em Redondo, ou em Aljustrel.

Protestos do Deputado do PCP João Dias.

Sr. Deputado, o senhor é que disse que era uma manobra mediática. Portanto, se tem a coragem de repetir

isso, faça-o junto das populações de Vila Flor, de Alpiarça, de Melgaço, do Redondo, de Aljustrel, de Manteigas.

Faltam ainda muitos concelhos, onde essa abertura tem de ser feita, Sr. Deputado. Quem é que vai garantir

a abertura em todos? É o Governo do Partido Socialista!

Página 15

13 DE MARÇO DE 2020

15

Aplausos do PS.

Será também o Governo do Partido Socialista que vai garantir que o contrato de concessão tenha exigências,

em termos de qualidade de serviço, que não teve no último contrato de concessão.

E será também o Governo do Partido Socialista a exigir, no novo contrato de concessão, uma relação mais

justa entre os CTT e as autarquias locais, neste caso as juntas de freguesia.

A todos os Srs. Deputados que colocaram questões quero dizer o seguinte: independentemente de a

empresa ser pública ou privada, um contrato de concessão tem de existir. Tem de existir, porque deve existir

uma relação transparente entre o Estado e as suas empresas, sejam elas privadas ou, neste caso, públicas.

Portanto, o contrato de concessão tem de existir, nós queremos que continue a existir, independentemente do

outro debate que os senhores legitimamente trazem aqui e que nós não excluímos.

Face às questões de regresso, ou não, do Estado aos CTT, digo-vos aquilo que já disse na intervenção

inicial: nós não o excluímos. Mas há ainda um caminho a fazer, um caminho muito importante para percorrermos,

que acautele todas as questões que os senhores colocaram aqui. Se não conseguirmos acautelar essas

questões, não tenham dúvidas de que não hesitaremos em tomar as medidas necessárias para defender uma

empresa que, para nós, é importante e que é importante para o povo português, para defender os postos de

trabalho, para defender a qualidade do serviço e para defender uma densidade que garanta a coesão territorial.

Portanto, quando perguntam se vamos impedir o encerramento, com certeza, no contrato de concessão com

certeza, mas a verdade é que elas já não estão a encerrar. Quando perguntam se vamos garantir que abram

todas, no mínimo, uma estação de correios por concelho — digo estação de correios, para não haver aqui

confusão de palavras —, nós vamos garantir isso no contrato de concessão. E, relativamente às juntas de

freguesia, vamos fazer o mesmo.

Quero ainda dar nota de que, se é verdade que o serviço postal, em Portugal, tem 500 anos, os CTT são um

herdeiro desse serviço postal. Portanto, podemos dizer que o serviço postal, em Portugal, tem uma relação de

500 anos com o povo português, com o Estado. Queria deixar esta nota, porque, há pouco, falou-se de 100 anos

relativamente aos CTT, mas o serviço postal existe há cinco séculos no nosso País.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Eu falei dos CTT!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Assim sendo, as vossas preocupações,

nomeadamente em termos de densidade, em termos de qualidade, em termos de respeito pelas juntas de

freguesia, tratarão de ser trabalhadas no quadro da negociação do contrato de concessão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, há mais cinco Srs. Deputados inscritos para pedir esclarecimentos.

Para o efeito, tem a palavra, em primeiro lugar, a Sr.ª Deputada Márcia Passos, do Grupo Parlamentar do

PSD.

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, a concessão do serviço postal universal assenta

em bases sólidas desde 19 de novembro de 2013, com a publicação do Decreto-Lei n.º 160/2013, de 19 de

novembro. Desde então, é incumbência do Governo, por um lado, e da entidade reguladora ANACOM, por outro,

proceder à fiscalização da concessão.

O que urge perguntar é se o Governo fez essa fiscalização e esse acompanhamento. Se fez, teve a

oportunidade de ponderar alterações legislativas e de lançar mão de todos os mecanismos existentes para

corrigir irregularidades e para travar o que correu menos bem. Mas não vimos iniciativas do Governo nesse

sentido, pelo que ou não fez a fiscalização que lhe incumbia ou, tendo-a feito, não concluiu pela necessidade

de fazer ou impor correções e ajustes.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Página 16

I SÉRIE — NÚMERO 40

16

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Por sua vez, a entidade reguladora, na sequência da opção da privatização

e concessão, decorrente de imposição do Memorando da troica, fiscalizou, monitorizou e reviu indicadores de

acompanhamento, tornando-os mais abrangentes e exigentes, e induziu alterações positivas da parte da

administração dos CTT.

Impõe-se, por isso, perceber como irá posicionar-se o Governo no final da concessão, que ocorrerá em 31

de dezembro do corrente ano. Será que vai resistir à tentação do que pretendem os partidos mais à esquerda?

O Governo já fez estudos para avaliar, com ponderação, a questão? Já fizeram a análise custo-benefício,

face aos cenários que se podem colocar?

Sr. Ministro, decorreram seis anos e, agora, faltam apenas poucos meses para o fim da concessão. É agora

que vão ser feitos esses estudos? É agora que o Governo se vai preocupar em saber se o modelo fracassou,

ou não?

Srs. Deputados, o PSD não alimenta mitos ideológicos quanto a esta matéria. A sua preocupação é assegurar

que os serviços postais, tais como outros, se pautem por critérios de rigor e de excelência e sirvam os

portugueses.

Impõe-se, assim, perguntar: Sr. Ministro, o que pretende o Governo para o futuro, após 31 de dezembro de

2020?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado João Paulo Correia,

do PS.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, em boa hora, este Parlamento solicitou uma

auditoria à Inspeção-Geral de Finanças sobre a concessão do serviço postal universal à empresa CTT e ao

processo e à forma de privatização da empresa CTT nos anos de 2013 e de 2014.

Essa auditoria é hoje já do conhecimento deste Parlamento. E as conclusões dessa auditoria são muito

claras: a privatização dos CTT foi um erro colossal que lesou imensamente o interesse público dos cidadãos e

as empresas.

Aplausos do PS.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Cite onde isso está escrito!

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Vamos às conclusões, três conclusões fortíssimas e claras desse

relatório. A primeira é a de que o serviço postal universal se degradou após o ano de 2013, ano em que a

empresa foi privatizada, ano em que o serviço postal universal ficou concessionado à empresa privada CTT. A

segunda conclusão é a de que a sustentabilidade financeira desta empresa privada é o serviço postal universal,

porque são os ganhos que advêm do serviço postal universal que compensam as margens negativas das

restantes atividades desta empresa. Uma terceira conclusão, aquela que menos esperávamos, mas aquela que

é ao mesmo tempo a mais preocupante, diz respeito à titularidade dos bens afetos à concessão do serviço postal

universal, neste caso debaixo da responsabilidade da empresa privada CTT.

A este respeito, a Inspeção-Geral de Finanças diz que importa clarificar, porque, por um lado, quem fez

alterações legislativas, como diz o relatório da Inspeção-Geral de Finanças, nos anos de 2012, 2013 e 2014,

quem governava e quem tinha maioria eram o PSD e o CDS, autores dessas alterações legislativas, e que

conduziram essas alterações legislativas para que hoje se tenha dúvidas sobre a titularidade dos bens afetos à

concessão.

A partir do ano de 2013, a partir da privatização da empresa, esses bens passaram a constar do balanço da

empresa privada CTT. E, a partir de 2013, a Direção-Geral do Tesouro e Finanças passou a emitir uma

declaração à empresa, dizendo que o Estado não tem bens do seu domínio público e do seu domínio privado

afetos a essa concessão. Ou seja, a forma como o PSD e o CDS fizeram a privatização transformou este

mercado num monopólio natural, porque quando o Governo, no final do período de concessão, reabrir o

processo negocial só existe, neste momento, uma empresa capaz de concorrer a esta concessão, que é a

Página 17

13 DE MARÇO DE 2020

17

empresa CTT privatizada, porque nenhuma outra empresa tem a rede de balcões que, neste momento, está em

posse da empresa privada CTT.

Por isso, a pergunta que gostaríamos de colocar, Sr. Ministro, é se no final da concessão, cujo contrato

termina no final deste ano, os bens afetos à concessão do serviço postal universal à empresa privada CTT

reverterão para o Estado, como diziam, inicialmente, as bases de concessão feitas e aprovadas anos antes da

privatização, ou se ficarão na empresa CTT, conforme as alterações legislativas operadas pelo anterior Governo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro

Pedro Nuno Santos, antes de passar a colocar algumas questões em função da intervenção que o Sr. Ministro

fez, gostaria de pegar, desde já, na questão que foi levantada pelo Sr. Deputado João Paulo Correia.

O Sr. Deputado disse que, em boa hora, a Assembleia da República solicitou à IGF uma auditoria sobre os

CTT. Quem diz «em boa hora» refere-se a fevereiro de 2018. Portanto, há dois anos que a Assembleia da

República pediu essa auditoria. Estes resultados e estas conclusões que o Sr. Deputado João Paulo Correia

acaba de mencionar e destacar chegaram à Assembleia da República em dezembro passado e no dia 13 de

janeiro, se o Sr. Ministro está recordado, o PCP fez-lhe uma pergunta precisamente sobre esta matéria, tendo

em conta os alertas do relatório da IGF.

Não mencionámos o relatório porque não queríamos trocar o acessório pelo essencial. Não queríamos

discutir a confidencialidade do relatório, mas ele estava cá. E levantámos essa questão, de termos uma gestão

privada de um serviço público, que tem a faca e o queijo na mão sobre a informação do próprio património que

lhe está atribuído.

O Sr. João Dias (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Levantámos essa questão e o Sr. Ministro reconheceu a dificuldade em que o

País se encontra nessa matéria.

Mas, também nessa matéria, o que é relevante questionar é porque é que uma auditoria que é solicitada pela

Assembleia da República em fevereiro de 2018 chega à Assembleia da República em dezembro de 2019, mais

de um ano depois, quando em dezembro de 2018 já estava no Governo. Porque é que esta auditoria, que é

pedida pela Assembleia há dois anos, chegou agora, quando estava há mais de um ano disponível para o

Governo? Que conclusões é que, neste último ano, foram retiradas destes alertas e que medidas foram tomadas

oportunamente?

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Pois é! Pois é!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É que foi essa a pergunta que o PCP colocou há mais de dois meses, Sr.

Ministro.

Aplausos do PCP.

Protestos do CDS-PP.

Quanto à sua intervenção, o Sr. Ministro foi absolutamente claro na crítica à privatização dos CTT e chegou

a ensaiar uma autocrítica sobre a posição de defesa da privatização que o PS assumiu no passado,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Claro!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — … quer no pacto de agressão das troicas, quer no PEC IV (Plano de Estabilidade

e Crescimento), nomeadamente.

Página 18

I SÉRIE — NÚMERO 40

18

O problema é que essa clareza com que falou sobre o passado é a clareza que falta ao Governo para falar

sobre o futuro,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ora!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — … sobre o futuro dos CTT, dos seus trabalhadores, do serviço que prestam às

populações, às empresas e ao País.

Sr. Ministro, o PCP reafirma — e reafirma-o as vezes que forem precisas — que o problema central não é a

concessão, é a privatização!

O Sr. João Dias (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É que, quando a aposta é a degradação do serviço público para garantir o lucro

privado, não há concessões nem contratos à prova de bala que garantam, por si só, o interesse do povo e do

País.

Dou-lhe três ou quatro exemplos muito recentes destes últimos tempos. Os envelopes de correio azul

deixaram de estar disponíveis, com os utentes a serem empurrados a pagarem mais 30 cêntimos no correio

verde, ou então mais 400% no correio expresso. E isto tem a ver com um serviço de entrega em 24 horas, que,

outrora, nos tempos da gestão pública, os CTT chegaram a garantir para a esmagadora maioria do correio

normal. Com as tecnologias, isto ficou tudo muito mais lento.

O Sr. João Dias (PCP): — Pois!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — O preço dos vales postais aumentou de 1,48 € para 2 €, cerca de 35%; a

renovação de um apartado nos correios passou de 30 € para 46 €; o serviço de reexpedição — utilizado por

pessoas que mudam de endereço, por exemplo — passou de 9,84 € para 30,75 €, um aumento superior a 300%.

E, Sr. Ministro, não ignoramos a reabertura das estações de correios que, a conta-gotas, se está a verificar.

Daqui saudamos as populações, os utentes e os trabalhadores, porque vale mesmo a pena lutar!

O que dizemos é que o País tinha mais de 1000 estações de correios e hoje tem menos de 500 e estamos

muito aquém daquilo que é indispensável fazer.

O Sr. João Dias (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Por isso, dizemos que é importante ir mais longe e assumir, de uma forma

efetiva, o interesse nacional como prioridade, escolher o País e não os lucros dos grupos económicos.

Para isso, pode contar com o PCP, mas não para manter tudo na mesma.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado João Almeida, do Grupo

Parlamentar do CDS-PP.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados, Sr. Ministro, nas respostas à primeira ronda de pedidos de esclarecimento, o Sr. Ministro chegou a

considerar uma injustiça a responsabilidade que se atribui ao Partido Socialista nesta matéria.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Não é igual à vossa?!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Acho que era importante, sem qualquer problema da

responsabilidade que temos na privatização da empresa — e discutimos a responsabilidade que temos na

privatização da empresa —, lembrarmos a responsabilidade do Partido Socialista.

Refiro só alguns dados. Foi durante um Governo do Partido Socialista que houve uma maior redução dos

estabelecimentos postais em Portugal, em 2010.

Página 19

13 DE MARÇO DE 2020

19

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isso não é verdade! Foi em 2012!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade, é. Em nenhum ano…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Foi em 2012!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Falo de estabelecimentos postais!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não foram estabelecimentos postais, foram estações!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Refiro-me ao encerramento de estabelecimentos postais em

2010. Esse foi o ano em que houve maior redução de estabelecimentos postais.

Depois, foi devidamente…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Os estabelecimentos postais podem ser mercearias!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Deputado, estabelecimentos postais são estabelecimentos

postais. E a maior redução foi em 2010.

Depois, foi o Partido Socialista que inscreveu a privatização dos CTT no Memorando da troica. Não foi a

primeira vez que o Partido Socialista defendeu a privatização dos CTT!

Protestos do PS.

Portanto, não se venha, sequer, dizer que foi uma questão da emergência do Governo da troica, porque o

Partido Socialista já a tinha defendido antes.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Mal!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Ministro, ainda bem que diz isso, porque essa era a pergunta

final.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Mal!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Então o Sr. Ministro vem aqui, em nome do mesmo partido que

aqui propôs, dizendo que era «bem», dizer agora «mal»?!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Porque é mal!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — E os Deputados que, no passado, bateram palmas a José

Sócrates, que dizia «bem», batem agora palmas ao Sr. Ministro, que diz «mal»!

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

O que perguntamos é o seguinte: qual é a credibilidade do Partido Socialista, quando, com as mesmas

pessoas sentadas na sua bancada, uma vez falam em privatizar e dizem «bem» e batem palmas, e, numa outra

vez, o Sr. Ministro diz que foi mau privatizar e essas mesmas pessoas voltam a dizer «bem» e batem palmas?

A questão é exatamente essa! É que se queremos discutir responsabilidade, temos de saber o que se

defende.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — É aprender!

Página 20

I SÉRIE — NÚMERO 40

20

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — E esta discussão não se coloca só relativamente ao tempo,

coloca-se também em relação ao objeto, porque tudo aquilo que o Sr. Ministro aqui disse quanto a não tomar

medidas mais fortes — como aquelas que, como referiu no final da intervenção, poderia vir a tomar — foi tudo

aquilo que o Governo do Partido Socialista achou que não havia problema nenhum em fazer, de forma diferente,

na TAP.

Então, afinal de contas, porque é que os senhores acham que, relativamente aos CTT, é impossível fazer

qualquer coisa até ao fim deste ano e até ao fim do contrato de concessão e o fizeram na TAP?

Já agora, faço uma pergunta adicional: quanto à melhoria do serviço postal em Portugal, podemos ter a

expectativa de que o resultado da ação do Governo — com as medidas que venham a tomar nos CTT para

melhoria da situação — seja o mesmo que tivemos na TAP, em relação ao serviço aéreo, depois de os senhores

tomarem medidas?

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — É a mesma coisa!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É que, se os senhores querem fazer nos CTT o mesmo que

fizeram na TAP, se calhar, mais vale ficarem quietos.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para formular o último pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado João

Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, tem toda a

razão quando diz que hoje não devíamos estar aqui a falar disto, que há problemas bem mais sérios.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Não disse que não devíamos!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Mas a sua intervenção inicial, aquelas tiradas neomarxistas

revolucionárias encheram-me de esperança de que, no fim daquelas cinco ideias, houvesse aqui um programa

de renacionalizações brutal.

Mas nem os 20%, ou os 10%, ou os 15% dos CTT assume! Parece aquelas crianças que atiram a pedra e

escondem a mão. Pior, parece aquelas crianças que começam a comer peixe porque faz bem ao cérebro, que

encontram uma espinha e nem se dão ao trabalho de aprender a tirar a espinha e deixam de comer peixe. Mas

faz falta o cérebro. E faz falta o cérebro para tratar de matérias como esta.

O Sr. João Dias (PCP): — Isso nem é carne nem é peixe!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Deixe-me fazer uma pequena resenha do que se passou com os

CTT.

Em 2013/2014, privatizou-se uma empresa, avaliada, na melhor das hipóteses, em 580 milhões de euros,

por 900 milhões.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade! Já lá vamos!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Foi o Estado, outros partidos, mas o mesmo Estado — espero que

a unidade do Estado se mantenha para além desta Legislatura.

Portanto, temos uma empresa com um negócio a cair 7%, 8%, 9% ao ano, vendida por 900 milhões. Até

aqui, soube bem. Depois, é preciso cérebro para ver aquilo que continua a correr bem nos CTT e aquilo que

continua a correr mal nos CTT.

Dizem que os privados foram os que mais despediram. Mentira! Nos últimos cinco anos da gestão pública,

foram 3000 os postos de trabalho perdidos.

Página 21

13 DE MARÇO DE 2020

21

O Sr. João Dias (PCP): — Era para a privatização!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Nos primeiros cinco anos da gestão privada, foram criados 200

postos de trabalho.

Dizem que foram os privados que mais encerraram estabelecimentos e postos. É mentira! Nos últimos cinco

anos de gestão pública, houve 430 encerramentos; nos primeiros cinco anos de gestão privada, houve 54

aberturas ou reaberturas.

Dizem que os privados não investem. É mentira! Nos últimos cinco anos de gestão pública, houve 100

milhões de euros de investimento; nos primeiros cinco anos de gestão privada, temos 151 milhões de euros de

investimento.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Parte dele deve ter sido para o seu salário!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Dizem que os preços aumentaram loucamente. É mentira! Nos 28

países da União Europeia, foram os oitavos que menos cresceram e continuam a ser os terceiros preços mais

baixos da União Europeia.

Depois, dizem que deterioraram o serviço. Não é bem verdade. Em 2018, o índice global de qualidade de

serviço foi cumprido, teve um máximo desde 2016. E, dos 11 indicadores na altura existentes, 9 foram

cumpridos, 2 não foram, mas com melhorias.

O que é que a ANACOM faz? Aumenta os 11 indicadores para 26. Vamos ver se esses reguladores, que não

prestam para nada, que são fracos, etc., estão agora a conseguir fazer alguma coisa.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Podia fazer algumas perguntas também!

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Ministro, é importante, nestas matérias, ser rigoroso. O que

está profundamente errado nos CTT é o modelo de concessão e a forma de concessão que foi atribuída.

Esse modelo está profundamente errado e o Iniciativa Liberal reconhece-o aqui, desde já.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Qual é? Qual é?

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Portanto, tenhamos a coragem, no final do ano, na renovação, de

estabelecer um modelo de concessão que funcione efetivamente, não só do ponto de vista do serviço postal

universal, mas também do ponto de vista daquilo que os contribuintes despendem nesse serviço postal.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder a este conjunto de cinco pedidos de esclarecimento, o

Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Silva, não vamos

falar de bitola, não se preocupe.

Sr.as e Srs. Deputados, a Sr.ª Deputada do PSD, partido que, com a companhia ativa do CDS, fez a

privatização dos CTT nos moldes em que foi feita, está a perguntar ao Governo atual se fiscalizou a ação dos

CTT.

Portanto, os senhores acharam que o Estado deveria sair totalmente dos CTT, e que…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não, não!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Bom, não adianta nada…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Peço aos Srs. Deputados para deixarem o Sr. Ministro concluir o raciocínio e responder.

Página 22

I SÉRIE — NÚMERO 40

22

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — O Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo podia

ensinar-vos algumas coisas.

No modelo de regulação que os senhores quiseram, e que tanto defendem, quem faz a fiscalização, no vosso

modelo, no modelo do PSD e do CDS,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É o regulador!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — … é a entidade reguladora.

Os senhores já governaram, também sabem. Portanto, não é o Governo que fiscaliza. No entanto, nunca

deixámos de reconhecer aquilo que os senhores tiveram uma grande dificuldade em reconhecer: degradação

de serviço, encerramento de postos, relação com as juntas de freguesia em que as coloca a financiar os CTT.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Os senhores não foram capazes de reconhecer!

Aplausos do PS.

O Sr. Deputado João Almeida, à imagem da velha política de acusação de dizer «foi o PS e o PSD, foi o PS

e o CDS e o PSD…»…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não está a responder!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Sr. Deputado, não foi. É que o Sr. Deputado do CDS

João Almeida, se for ver,…

Protestos do Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida.

Se o Deputado João Almeida for ver outra vez a intervenção, em nenhum momento,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não foi na resposta!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Sr. Deputado, em nenhum momento ataco

diretamente o PSD e o CDS. O que faço — e é o que temos de fazer todos! — é avaliar, analisar o que fizemos

de errado e aprender.

Risos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Deputado diz: «O PS defendeu a privatização dos CTT! Estava inscrito no memorando da troica,

constava lá a privatização dos CTT.» Ora, passaram cinco a seis anos, o serviço degradou-se, as estações

encerraram, os trabalhadores têm-se queixado. Os senhores não aprenderam nada; nós aprendemos!

Aplausos do PS.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — E há aqueles que aprenderam logo na altura!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Sr. Deputado João Cotrim, um radical respeitável,

vem aqui defender os CTT e o acionista dos CTT melhor do que os CTT se têm defendido a si próprios na

relação connosco.

Aplausos do PS.

Página 23

13 DE MARÇO DE 2020

23

Risos do BE.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Cada um é para o que nasce!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, liberal e

radical, que é hoje Deputado à Assembleia da República, representando o povo português e não o acionista —

que, acredite, não precisa da sua defesa —, gostava eu, enquanto governante, que, da mesma forma que somos

exigentes com eles, o Sr. Deputado, quando eles lhe passaram essa informação, esse texto, também fosse

exigente e que o Sr. Deputado pudesse…

O Sr. André Ventura (CH): — Eh!…

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — «Eh»?!…

Protestos do CDS-PP, do CH e do IL.

Gostava que o Sr. Deputado fosse também capaz de questionar os CTT sobre a degradação do serviço, que

é afirmada pela ANACOM e pela IGF, sobre o encerramento de estações «a torto e a direito», como é confirmado

pela ANACOM e pela IGF. Também fez essas questões ao privado?! É que, sobre elas, não disse nada aqui,

porque gastou todo o seu tempo a defender um acionista que não precisa da sua defesa e que, na realidade,

na liderança dos CTT, não tem prestado o serviço a que o povo português, que todos os Srs. Deputados

representam, estava habituado.

Aplausos do PS.

Tem uma vantagem, Sr. Deputado: diz ao que vem, mostra bem quem representa, e isso é fundamental na

vida política, ou seja, que tenhamos a capacidade e a coragem de assumirmos quem representamos, aquilo em

que acreditamos.

O Sr. Deputado usa a sua intervenção contra um Governo que, na realidade, vem constatar que há problemas

com os CTT aos quais tem de dar resposta. E, se não o conseguirmos na relação direta com eles, então, terá

de ser através da negociação do contrato de concessão.

Protestos do Deputado do PCP João Dias.

O que o Sr. Deputado vem dizer perante esta Casa é que está tudo bem e que os privados têm gerido de

forma impecável os CTT.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Seja honesto! Como é que acabou a intervenção?! Seja honesto!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Peça a palavra e fale outra vez.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Isso é memória seletiva!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Sr. Deputado, há uma coisa que lhe vou dizer: o

Governo da República defenderá sempre o povo, os utilizadores dos CTT.

Aplausos do PS.

Não excluímos a medida que o PCP, o Bloco de Esquerda, o PEV e, porventura, o PAN defendem.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não tenho a certeza!

Página 24

I SÉRIE — NÚMERO 40

24

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Não a excluímos! Há, no entanto, um trabalho

importante para desenvolvermos que permita acautelar os interesses do povo português que não foram

acautelados nem pela privatização, nem pelo contrato de concessão.

A privatização não foi bem feita, a privatização é um problema. Mas estamos a falar de uma empresa que foi

alvo de uma alteração societária radical há alguns anos, que provocou perturbações sérias na vida da empresa,

e, antes de fazermos o trabalho que os senhores aqui estão a exigir, ainda há muito caminho para percorrer.

Obviamente, em matéria de densidade, se impusermos um limite mínimo ou máximo, se impusermos

condições em matéria de cobertura do território, se impusermos condições em matéria de níveis de qualidade

mais ambiciosas do que aquelas que existiam no início da concessão,…

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Não resolvem o problema!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — … se garantirmos, através da concessão, melhor

relação com as autarquias locais, estamos a dar um grande contributo.

Não estamos a dizer que a nossa intervenção termina aí. Estamos a dizer que, na relação com os CTT, a

esse nível, há muito trabalho para fazermos ainda.

A questão não se limita ao ataque sistemático entre nós, mas à capacidade de olharmos para trás e de

conseguirmos perceber em conjunto o que correu bem e o que correu mal. Na vida, como na política, como na

governação, temos sistematicamente de ir aprendendo e retirando lições do que foi feito.

Várias das privatizações feitas foram erradas e o povo está a pagar da pior maneira essas privatizações. E

mal continua quem não tem a capacidade de ler o passado, de conseguir retirar conclusões sobre ele e de

defender as medidas corretas. É o que estamos a fazer neste momento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Vamos entrar no período das intervenções.

Para uma intervenção, tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do PSD, o Sr. Deputado Jorge Mendes.

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro, Srs.

Secretários de Estado: A interpelação ao Governo, da iniciativa do Bloco de Esquerda, tem, como tema, a «crise

no serviço postal e a recuperação do controlo público dos CTT». Esta vem no seguimento de outras iniciativas

parlamentares, com destaque para o Projeto de Lei n.º 84/XIV/1.ª, que pretendia estabelecer o regime para a

nacionalização dos CTT, chumbado, por ampla maioria, em dezembro passado, nesta Assembleia.

O Bloco de Esquerda tem invocado, sistematicamente, uma alegada degradação contínua do serviço público

prestado pelos CTT desde a sua privatização,…

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — «Alegada»?!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Acha que não está comprovada?!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — … como justificação para a sua nacionalização ou controlo público,

posição contrariada pelos indicadores apresentados pela ANACOM, em especial em 2017, 2018 e 2019.

O PSD, partido que sempre assumiu as suas responsabilidades aquando da governação do País, está e

estará disponível para este debate, porque não está amarrado a posições dogmáticas nem extremistas,…

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Pois! Só está amarrado às privatizações!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — … em nome do proclamado interesse público, no caso em apreço

o serviço público postal universal. Para a esquerda, sempre que invoca o interesse nacional, este serviço só

poderá ser público.

Página 25

13 DE MARÇO DE 2020

25

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Isso não é desculpa!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Sr.as e Srs. Deputados, da análise das várias iniciativas legislativas

das esquerdas, que deram entrada nesta Casa e que já foram debatidas nesta Legislatura, algumas ilações

podemos e devemos retirar: o que está em causa não é a qualidade dos serviços prestados pelos CTT, com a

pretensa degradação dos mesmos, após a privatização, como a esquerda radical nos quer fazer crer, relegando

para segundo plano alterações profundas e substantivas que o setor postal está a atravessar a nível mundial,

resultado da aceleração da digitalização nos últimos anos, que todo o espetro político aplaude, com benefícios

ambientais evidentes, mas com efeitos colaterais no negócio do serviço postal universal.

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Muito bem!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — O que aqui está em causa não é o contributo para a resolução de

alguns problemas ou dificuldades com que os CTT se confrontam no âmbito da gestão da concessão do serviço

público postal universal, independentemente da propriedade do capital, quer seja público ou privado, porque são

inerentes às dificuldades do setor num mundo em permanente mudança. Quando os CTT eram 100% públicos

não encerraram dezenas de balcões e de postos por todo o País, especialmente no interior?

O que aqui está em causa são questões ideológicas de fundo, porque o debate entre serviços públicos ou

de interesse público é essencialmente ideológico.

A esquerda radical defende que o serviço público tem de ser prestado por entidade pública e, no limite, só

há bons serviços públicos se forem prestados por entidades públicas.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Se são públicos, queria o quê?!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — O que aqui está em causa é que a esquerda radical não perdoa a

privatização dos CTT levada a cabo pelo Governo do PSD/CDS, no cumprimento do Programa de Assistência

Económica e Financeira, acordado com a União Europeia, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Central

Europeu, assinado em maio de 2011 pelo PSD e pelo PS, que este último sistematicamente renega ou

desvaloriza como sendo «um documento». No ponto 3.31, Privatizações, são bem explícitos os termos dos

compromissos que o Governo do PS assumiu. Refere-se que oGoverno acelerará — acelerará! — o programa

de privatizações, que já vinha dos PEC. O plano existente para o período que decorreu até 2013 abrangia

transportes — aeroportos, TAP e CP Carga —, energia — Galp, EDP e REN (Redes Energéticas Nacionais) —

, comunicações — CTT — e seguros — Caixa Seguros —, bem como uma série de empresas de menor

dimensão.

A decisão do Governo do PSD/CDS de privatizar os CTT não foi um mero capricho ou malvadez, nem foi

para castigar os portugueses, como insistentemente nos querem fazer crer. Foi para honrar os compromissos

assumidos com o resgate do País da bancarrota, a que o Governo do Partido Socialista nos tinha conduzido.

Vozes do PSD: — Muito bem!

Protestos do PS.

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — O que está aqui em causa, Srs. Deputados, não é a delapidação

do património dos CTT, bandeira do Bloco de Esquerda, porque o ativo dos CTT, entre 2013 e 2019, até

aumentou 600 milhões de euros,…

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — É para os salários milionários do Lacerda!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — … mas, sim, o timing da agenda política e mediática da esquerda

radical, que precisa de trazer ao debate, quiçá, temas fraturantes para vincar posições em contraponto à

estratégia, ou à ausência desta, da parte do Partido Socialista.

Página 26

I SÉRIE — NÚMERO 40

26

Existindo inação do Governo, pelo menos aparente, fica o campo aberto a protestos e a fake news para

consumo noticioso, tudo do interesse do PS, em especial da sua ala mais radical, que alimenta o debate na

ânsia de encontrar nos partidos da extrema esquerda os equilíbrios decisivos para a sua sobrevivência

parlamentar e governativa. Ou uma putativa nacionalização dos CTT não permitiria aos partidos da esquerda

alcançar novas esferas de poder ou influência, que não têm conseguido nas urnas?!

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Muito bem!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Têm dúvidas, Sr.as e Srs. Deputados?! É estarem atentos às

intervenções do Governo, em especial do Sr. Ministro aqui presente, Pedro Nuno Santos. São intervenções que

mostram a clarividência da posição do PS ao longo de 2019 e 2020, idêntica, ou quase, ao discurso de sempre

dos últimos cinco anos do Governo do Partido Socialista: «Sim, talvez, vamos ver».

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Muito bem!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Repito: «Sim, talvez, vamos ver».

Aplausos do PSD.

É neste contexto ambivalente, em que o PS parece gostar de uma coisa e do seu contrário, que poderemos

encontrar justificações para o Projeto de Resolução n.º 108/XIV/1.ª, desta Legislatura, em que o Partido

Socialista recomenda ao Governo que salvaguarde a qualidade do serviço público universal,…

O Sr. Hugo Costa (PS): — Vocês votaram contra!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — … quando deveria exigir que o Governo apresentasse o plano de

trabalhos e a sua calendarização para a tomada de decisão acerca dos moldes da renovação ou não da

concessão dos CTT.

O contrato de concessão do serviço postal está em vigor e o PSD exige que ele seja cumprido, nos termos

contratados, sob vigilância da ANACOM e do Governo. Mais do que qualquer outra força política, o PSD espera

do regulador ANACOM rigor e bom senso e que exerça cabalmente as suas funções de regulador, ao invés de

se comportar, como parece em algumas intervenções sobre o setor, como ator político. Ao Governo cabem a

definição e as orientações políticas para o serviço postal universal em Portugal, tendo em conta o

enquadramento comunitário.

Em consequência, o Primeiro-Ministro, numa resposta proferida durante o debate aqui trazido em dezembro

pelo PCP, foi claro: «No momento próprio, o Governo tomará posição sobre a concessão ou não concessão do

serviço público». Ou seja, no final de 2020.

Por sua vez, o Sr. Ministro das Infraestruturas, secundado pelo Sr. Secretário de Estado das Comunicações

recentemente, não coloca de parte a participação no capital dos CTT, ou, em alternativa, conseguir um contrato

de concessão robusto.

São afirmações que valem o que valem. Mas, Sr. Ministro, Srs. Deputados, por acaso o Governo já solicitou

estudos técnicos fundamentados acerca da avaliação da concessão e dos caminhos a seguir? Estudos

comparativos sobre o setor, em Portugal e na União Europeia? Análises de custo/beneficio sobre as

alternativas?

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — E vocês, não privatizaram?!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Ou está o Governo a deixar correr o tempo para depois sermos

confrontados com outro caso, como o do aeroporto do Montijo, e a continuar a arranjar novos álibis para uma

qualquer decisão, remetendo de novo para o processo de privatização?

Página 27

13 DE MARÇO DE 2020

27

Sr.as e Srs. Deputados, no passado, quando foi necessário e imperioso tomar decisões difíceis, mas de

salvação nacional, com impacto na vida dos portugueses, o PSD disse «presente». Agora, é a vez de o PS e de

o Governo honrarem os compromissos assumidos pelo Estado.

O PSD cá estará para futuros debates sobre a matéria.

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência a Vice-Presidente Edite Estrela.

A Sr.ª Presidente: — Cumprimento as Sr.as e os Srs. Deputados e os Srs. Membros do Governo.

Inscreveram-se dois Srs. Deputados para pedir esclarecimentos, tendo o Sr. Deputado Jorge Salgueiro

Mendes informado a Mesa de que pretende responder em conjunto.

Para um pedido de esclarecimento, tem, então, a palavra o Sr. Deputado Luís Monteiro, do Bloco de

Esquerda.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jorge Mendes, durante a governação do PSD e

do CDS, foi privatizado o que restava dos CTT públicos, uma privatização na era da troica, que vendeu, na

verdade, o País a preço de saldo, sem qualquer problema.

Protestos do Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida.

Garantiram a transformação do serviço postal em Portugal num balcão para venda de produtos financeiros.

Entregaram os CTT a uma gestão privada, que tem trabalhado mais como comissão liquidatária da empresa do

que como um verdadeiro serviço a todos os portugueses.

Os mesmos que fizeram tudo isso bateram palmas aos resultados. Dizem que, «alegadamente», há uns

problemas que a esquerda coloca neste debate. Estão satisfeitos com a manobra de desvalorização de

empresas estratégicas. Foi esse o seu papel político durante a sua governação: desmontar a capacidade pública

dos serviços e a produção estratégica para, a seguir, vender.

Não tiveram nenhum problema em fazer isso! Aliás, lembramo-nos bem que os governantes dos governos

da direita usavam aquele pin da bandeira portuguesa ao peito, que era, na verdade, o pin das privatizações

fáceis, o pin do patriotismo que, na hora da verdade, vendia o País a preço de saldo.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Muito bem!

Protestos de Deputados do PSD.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Conhecemos bem a estratégia da direita no que toca à defesa do Estado

enquanto Estado social e enquanto responsável pelos serviços para os portugueses.

Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.

O Sr. Deputado tem o descaramento de vir ao debate, com total à-vontade, justificar o problema da gestão

dos CTT com a inovação tecnológica…

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — E isso não muda nada?!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Foi isso que disse!

O Sr. Luís Monteiro (BE): — … e, depois, diz que a esquerda tem um problema ideológico em relação aos

serviços dos CTT. Ou seja, no privado, a empresa já tem capacidade para fazer essa transição digital, mas, no

público, era sempre impossível ela acontecer, não é, Sr. Deputado?

Página 28

I SÉRIE — NÚMERO 40

28

Percebemos bem até onde vai a ortodoxia ideológica do PSD. O problema não é o papel que assinaram em

2011, o problema é que, em 2019 e 2020, continuam a defender exatamente a mesma estratégia para o País:

privatização dos setores essenciais. Não fazem nenhuma reflexão sobre o que foi vender o País a preço de

saldo! E o mais interessante é que o partido que vendeu os CTT de forma completamente irresponsável tem

agora a coragem de pedir decência e estudos nas próximas decisões. Haja decoro, Sr. Deputado!

Aplausos do BE e da Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo

Oliveira, do PS.

O Sr. Hugo Oliveira (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.

Deputado Jorge Mendes, se o debate que hoje estamos a realizar é da responsabilidade do Bloco de Esquerda,

já o tema do mesmo debate, esse,…

O Sr. Hugo Costa (PS): — É da vossa!

O Sr. Hugo Oliveira (PS): — … é da total responsabilidade do PSD.

Aplausos do PS.

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Oh! Já se estava mesmo a ver!

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — É da responsabilidade do Partido Socialista!

O Sr. Hugo Oliveira (PS): — A crise do serviço postal e a recuperação do controlo público dos CTT, esse

tema, é mesmo da vossa responsabilidade.

Vozes do PS: — Muito bem!

Risos de Deputados do PSD.

O Sr. Hugo Oliveira (PS): — Essa responsabilidade do PSD advém da forma irresponsável como, em 2014,

privatizaram uma empresa pública prestadora de um serviço postal universal em todo o nosso território; uma

empresa com elevadíssimos níveis de desempenho que, historicamente, sempre teve um papel fulcral na

coesão territorial; uma empresa que, entre os anos de 2005 e 2012, deu mais de 500 milhões de euros de lucro

ao Estado e que era uma referência a nível europeu em matéria de serviços postais.

Protestos de Deputados do PSD.

Acresce a esta privatização dos CTT uma concessão do serviço postal sem ter sido feito um estudo sério e

completo do interesse público na prestação do serviço postal, uma vez perdida a participação do Estado nos

CTT. A consequência desta venda ruinosa e irresponsável foi a degradação do serviço postal, o encerramento

de estações, a diminuição alarmante do número de funcionários e a perda progressiva do maior património dos

CTT: a confiança e o respeito dos portugueses.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Hugo Oliveira (PS): — Por isso, a pergunta que se impõe fazer ao Grupo Parlamentar do PSD é esta:

como é que ousam apresentar-se a este debate como paladinos da defesa do serviço postal universal e do

superior interesse público,…

Página 29

13 DE MARÇO DE 2020

29

Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.

… quando são os inegáveis responsáveis por dar o nome «a crise no serviço postal» ao debate de hoje?!

A posição do PSD neste debate é um triste exercício de amnésia seletiva,…

Protestos de Deputados do PSD.

… mas os portugueses não esquecem que o PSD foi o protagonista da degradação do serviço postal no

nosso País.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o

Sr. Deputado Jorge Mendes.

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, agradeço as questões colocadas,

que só vão enriquecer o debate.

Srs. Deputados, em dezembro de 2017, o meu Colega Luís Leite Ramos referiu nesta Casa, em relação aos

CTT, que «a falta de memória não é uma doença rara nos Deputados do Partido Socialista». E é terrível, porque

os senhores fazem tábua rasa do acordo que assinaram em 2011, onde consta a privatização dos CTT.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Quer gostem quer não gostem, foram os senhores que o

escreveram. Foram vocês que cometeram o pecado mortal!

Aplausos do PSD.

Nós assumimos as nossas responsabilidades e, por isso, o PSD alienou uma empresa que constava do

Pacto de Estabilidade…

O Sr. João Dias (PCP): — Isto já não é uma questão de responsabilidade, é a necessidade da população!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — … por um valor de 900 milhões de euros, quando a avaliação era

entre 450 e 550 milhões. Acho que dizer que foi um mau negócio, que foi um negócio ruinoso para o Estado é

um crime de lesa-pátria e que, sobretudo, choca os portugueses pelos sacrifícios que fizeram num período difícil,

de 2011 a 2014.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Venderam uma caixa registadora cheia de dinheiro!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Mas, se há erros, compete à ANACOM e ao Governo, que têm o

poder fiscalizador sobre o setor, resolvê-los.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — É verdade! Muito bem! A concessão não previa o fecho!

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Resolvam!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — O PSD não vendeu nada?!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Portanto, é o Governo que agora tem de resolver esse problema,

mas nós cá estaremos, disponíveis para o debate e para dar os nossos contributos.

Página 30

I SÉRIE — NÚMERO 40

30

Aplausos do PSD.

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Foi fraquinho, isso!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Costa, do

PS.

O Sr. Hugo Costa (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Grupo

Parlamentar do Bloco de Esquerda marcou esta interpelação ao Governo sobre o serviço postal universal, um

tema que consideramos da mais importante relevância para a vida dos portugueses, mesmo que, nos dias de

hoje, muitas outras preocupações estejam na mente dos portugueses, do Governo e da Assembleia da

República. Sr.as e Srs. Deputados, deixo o meu apelo para que nos foquemos no debate aqui trazido e nas

consequências que daí advêm para as nossas populações.

A empresa CTT tem uma longa história, uma história que conta com 500 anos de serviço postal, que são

completados em novembro deste ano, tendo na sua origem um decreto do rei D. Manuel I. São 500 anos de

uma referência de soberania, integração e coesão territorial.

Em vários momentos de dificuldade, os CTT foram um pilar importante da nossa soberania, mostrando ainda

a sua resiliência, manifestada na capacidade de resistir ao desafio dos tempos. Era uma instituição que, até

muito recentemente, chegava a todos os concelhos do nosso território, independentemente de serem no litoral

ou no interior ou de estarmos numa das duas regiões autónomas.

Os CTT sempre tiveram, sob gestão pública, resultados muito relevantes, quer na perspetiva económica,

quer na ótica do serviço público prestado, funcionando sempre como um instrumento de coesão social e

permitindo a aproximação de territórios e pessoas. Os níveis de eficácia e eficiência eram claros e positivos.

Contudo, no ano de 2013, o Governo da época alienou 70% do capital e, em 2014, numa lógica liberal, em

que o mercado resolve tudo, decidiu erradamente alienar o restante capital. O encaixe financeiro total seria de

cerca de 900 milhões de euros.

A Assembleia da República solicitou à Inspeção-Geral de Finanças um relatório sobre este processo de

privatização e suas consequências, sendo que, para o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, este mesmo

relatório deveria ser público, numa lógica de transparência. Mais do que procurar culpados, este processo de

privatização só pode ser classificado, em letras gordas, como um manifesto erro, colocando Portugal como um

dos poucos países com um serviço postal universalmente privatizado.

Aplausos do PS.

Sim, nem os países do expoente máximo do liberalismo económico alguma vez tornaram o serviço postal

universal totalmente privado. Bem sabemos que muitas vezes é dito em debate que o serviço postal, como está,

é um negócio em queda, mas, segundo dados tornados públicos, entre 2013 e 2017, foi este mesmo serviço

público postal universal que financiou outros setores de atividade do grupo.

Sr.as e Srs. Deputados, obviamente, com a transição digital e as mudanças na sociedade, está a diminuir o

envio de correspondência escrita,…

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Ah! Afinal havia outra!…

O Sr. Hugo Costa (PS): — … mas ela não deixa de ser uma necessidade. Ressalvo a particular importância

de olharmos para o interior e para as regiões mais envelhecidas, onde muitas vezes o manuseamento das

tecnologias de informação não é fácil ou não está, sequer, acessível a um conjunto significativo da população.

Aplausos do PS.

A partir do processo de privatização, os CTT passaram a uma lógica de encerramento de estações,

nomeadamente no interior do País, e de diminuição do número de trabalhadores e da qualidade de serviço. Dos

dados existentes, e segundo o regulador do serviço, a ANACOM, desde o processo de privatização, a qualidade

Página 31

13 DE MARÇO DE 2020

31

do serviço diminuiu nos prazos de entrega, na densidade de pontos de acesso, na regularidade e na fiabilidade

do serviço.

Esta história, assim como os responsáveis pela mesma, acaba por ser um dos pontos mais negros nesta

cronologia de 500 anos da empresa postal nacional. Ao longo dos últimos tempos, e também no seguimento

das recomendações aprovadas na Assembleia da República, temos vindo a assistir a uma reabertura das

estações nos concelhos que tinham ficado sem as mesmas. A Assembleia da República aprovou — com o voto

contra do PSD, sublinhe-se — uma iniciativa para que fosse assegurado que todos os concelhos do País

beneficiassem de, pelo menos, uma estação de correios no seu território, salvaguardando a reabertura das

estações de correios encerradas nos concelhos que estavam sem serviço postal universal.

No final de 2020, terminará a concessão do serviço postal universal. Caberá ao Governo garantir que,

qualquer que seja o modelo a implementar, os CTT tenham capacidade de assegurar a qualidade do serviço

público universal e que as populações sejam respeitadas na concretização deste serviço de proximidade.

Da parte do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, todos os cenários estão em aberto, com a

responsabilidade da defesa do interesse público e da qualidade do serviço, e seremos sempre intransigentes na

defesa das nossas populações e da obrigatoriedade do serviço público universal.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do

Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Hoje, o País debate-se com uma

enorme crise de saúde pública. Debate-se, lá fora, com um enorme pânico nas nossas comunidades, nas nossas

aldeias, nas nossas cidades, e o que temos neste Parlamento é a discussão sobre renacionalizar os CTT.

Será interessante quando os portugueses, à noite, ligarem a televisão e virem que o Parlamento esteve hoje

a discutir a renacionalização dos Correios. Que bela imagem vai dar o Parlamento! No dia em que a Europa e o

mundo debatem um dos maiores problemas de saúde pública dos últimos anos, Portugal dá um péssimo

exemplo no combate a uma das maiores crises de saúde das últimas décadas que o mundo enfrenta! O que é

que nós discutimos? Recomprar os Correios!

No momento em que o Presidente do Partido Socialista admite que vamos ter um Orçamento retificativo, o

Bloco de Esquerda quer pôr mais dinheiro nos CTT. No dia em que a maior parte dos analistas, ministros e ex-

ministros diz que vamos ter de injetar mais dinheiro na saúde pública, mais dinheiro na luta contra esta epidemia,

aqui discutimos pôr milhões, vários milhões, para recomprar os CTT.

Protestos do Deputado do PS Santinho Pacheco.

São estas as prioridades para quem as define e, hoje à noite, os portugueses vão ficar muito contentes por

saber o que estivemos a fazer aqui, durante a tarde: discutir a recompra dos CTT.

Sr. Ministro, não podia deixar de o citar, porque são várias as vezes em que merece ser citado. Hoje, disse:

«Não excluímos a nacionalização.» Há um mês e meio, disse: «Admitimos qualquer solução, mas não está em

cima da mesa a nacionalização.»

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Mais uma cambalhota!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Afinal também discute os CTT!

O Sr. André Ventura (CH): — Há dois meses e meio, disse ainda que esta era uma possibilidade, mas que

o PS vai apostar antes na renegociação e na aprovação de um novo modelo de concessão para os Correios.

O Sr. Ministro disse aqui que representa o povo. Pois, então, se o representa, comece por explicar a este

povo quanto é que custaria renacionalizar os CTT, quanto é que os impostos aumentariam e quanto é que todos

os portugueses pagariam por isso. Era um bom serviço que prestaria a esses contribuintes e a esse povo que

diz representar.

Página 32

I SÉRIE — NÚMERO 40

32

Mais curioso ainda é que foi o próprio PS que, em 2017, apresentou um projeto, dizendo: «Admitimos o

regresso dos CTT ao controlo público.» A extrema-esquerda não percebe que é sempre a mesma estratégia:

«Admitimos, mas não fazemos. Talvez pensemos, mas não vamos concretizar. Pode estar em cima da mesa,

mas não vai acabar.» E há de ser sempre assim, continuaremos sempre com o PS a dizer que talvez um dia,

talvez nunca.

A verdade dos factos é esta: houve menos despedimentos agora do que houve nos últimos anos de gestão

pública dos CTT.

O que é que podemos negociar? Um novo contrato de concessão, um novo modelo de concessão para os

Correios, a imposição de que estejam em todos os concelhos deste País, a necessidade — e isso pode ser feito

por concessão — de que sejam efetivamente cumpridos os direitos dos trabalhadores e que sejam abertas

estações em todos os concelhos do País. Isso é possível.

Renacionalizar põe Portugal ao nível de uma Venezuela ou de uma Cuba, onde a negociação é sempre a

mesma…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Protestos do BE.

Como estava a dizer, nesses países a discussão é sempre a mesma: paguem, ponham mais dinheiro para

os contribuintes e para os impostos! E nós não temos a maior carga fiscal da Europa nem nada! Portugal não

tem a maior carga fiscal de sempre, nem nada…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. André Ventura (CH): — … e, por isso, pode estar aqui um Ministro sorridente, a dizer «Vamos pôr

mais impostos, os portugueses vão pagar»…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir.

O Sr. André Ventura (CH): — Mas, no final do dia, o que vamos ter é um serviço muito pior e os portugueses

a pagar mais impostos!

Protestos do PS.

Essa é que é a verdade! Essa é que é a verdade dos factos!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, agradeço-lhe que conclua e agradeço também que tome

atenção às indicações da Mesa.

Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues, do PAN.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O

Parlamento discute hoje, pela segunda vez nesta Legislatura, a questão do modelo de concessão do serviço

postal universal a implementar a partir de 2021.

No entanto, esta é a primeira vez que contamos com a presença do Governo e em que temos conhecimento

do resultado da auditoria ao funcionamento do serviço postal universal, requerida em 2017 à Inspeção-Geral de

Finanças, e que só este ano chegou à Assembleia da República.

O PAN tem alertado para a falta de responsabilidade e de transparência do Governo na gestão do processo

de negociação do contrato de concessão do serviço universal postal. O interesse público, a qualidade do serviço

postal e a garantia dos cidadãos fazem com que seja urgente que o Governo assuma, de uma forma clara, qual

a perspetiva que vai adotar relativamente ao modelo de concessão.

Página 33

13 DE MARÇO DE 2020

33

Contudo, e apesar de o contrato de concessão se aproximar a passos largos do seu fim, da parte do Governo

e do PS, o que temos tido até agora é incerteza sobre o tema, parecendo-nos cada vez mais certo que esta

decisão estruturante para o País e para os cidadãos vai, conforme temíamos, ficar mesmo para a 25.ª hora.

Neste debate, o PAN apresenta-se com uma posição bem clara: a concessão deve ser atribuída aos CTT e

a sua atual estrutura deve manter-se, mas o Governo deve assegurar uma participação determinante do Estado

no seu capital social, de modo a garantir uma gestão orientada para a qualidade do serviço e a salvaguarda do

interesse dos utentes.

Esta proposta foi apresentada num projeto de resolução, que aguarda a votação pelo Parlamento, e que

procura assegurar uma solução equilibrada que garanta a recuperação de um papel ativo do Estado na gestão

dos CTT, evitando custos demasiado elevados e sem que se comprometa a sustentabilidade financeira do País.

A degradação da qualidade dos serviços é hoje clara no dia a dia dos cidadãos.

Vejamos: a ANACOM assinalou recentemente que em 2019 as reclamações relativamente aos CTT

aumentaram em 12%, perfazendo um total de 23 000 reclamações. De resto, o incumprimento sucessivo dos

indicadores de qualidade do serviço público universal no ano de 2018 obrigou a ANACOM a reduzir os preços

dos CTT.

Também a DECO (Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor) apresentou publicamente dados

que apontam para o descontentamento dos cidadãos com os serviços prestados, demonstrando que o tempo

de espera é o que causa mais insatisfação aos utentes, que, em média, esperam 18 minutos para serem

atendidos.

A auditoria feita pela Inspeção-Geral de Finanças vem confirmar a degradação da qualidade dos serviços da

empresa, o que, de resto, já era do conhecimento geral. Segundo esta auditoria, os padrões de qualidade

exigidos na satisfação do serviço postal universal evidenciam uma degradação da qualidade do serviço após

2013, mais acentuada em 2016 e 2017.

Para além disto, com esta auditoria ficámos a saber que os dados contabilísticos dos CTT demonstram que,

entre 2013 e 2017, as margens de lucro do serviço postal universal são o que compensa o prejuízo das restantes

atividades levadas a cabo pela empresa, que a avaliação da empresa, no momento da privatização, foi feita

abaixo do valor líquido que acabou por se obter no final de todo o processo e que o Estado, antes da privatização,

abdicou de mais de 12 milhões de euros provenientes da redução de capital, que acabaram por reverter para

os privados.

Estes problemas no serviço postal universal são, em grande medida, justificados por uma opção dos gestores

privados, que têm procurado maximizar o seu lucro por via da venda património imobiliário, da diminuição do

número de trabalhadores, da secundarização dos serviços de distribuição postal, devido à aposta no Banco CTT

e na vertente comercial, e do fecho de estações pelo País.

Neste debate, não podemos esquecer a responsabilidade do Governo PSD/CDS-PP na privatização total

dos CTT em 2014. Esta foi uma medida desnecessária, pois era uma empresa rentável. Para além disso, o

memorando da troica não exigia a sua privatização total. Os 5,5 mil milhões de euros exigidos pela troica já

tinham sido alcançados e os 9,2 milhões de euros de receita líquida da privatização deram um contributo

insignificante para a redução da dívida pública nesse ano.

Sr.as e Srs. Deputados, não foi para salvar o País ou para pagar a dívida que se privatizaram os CTT, foi para

impor uma visão ideológica de Estado mínimo. Mas não posso deixar de referir com surpresa as reações do PS

relativamente aos resultados da auditoria da Inspeção-Geral de Finanças.

Quando estávamos convencidos de que o PS não fechava a porta à reversão da privatização total dos CTT

e que a divulgação da auditoria iria dar força a essa posição, verificámos, por notícias divulgadas nos últimos

dias, que o Partido Socialista terá submetido a questão ao Governo, aparentemente revelando que está mais

preocupado com a reversão para o Estado dos bens dos CTT no final do contrato de exploração e com a

possibilidade dessa circunstância poder impedir a atribuição da concessão a outro privado, do que

verdadeiramente com a reversão da privatização total da empresa.

Se as questões do PS quiserem significar aquilo que parecem, isto é, a defesa da atribuição da concessão

a outro privado, aquilo que concluímos é que, em vez de se estar a trabalhar para melhorar o serviço postal

universal em Portugal, se está a trabalhar para mais um negócio cujo interesse público não é a preocupação

principal.

Página 34

I SÉRIE — NÚMERO 40

34

Parece que queremos passar do mau para o péssimo e isso é inaceitável. Esperamos, sinceramente, que

esta tenha sido uma manifesta má interpretação da nossa parte.

A estrutura dos CTT e o know-how dos seus milhares de trabalhadores é algo que o País não se pode dar

ao luxo de perder. Os CTT não são uma empresa qualquer ou um privado normal, têm largos anos de história

ao serviço dos cidadãos e têm, inclusivamente, o estatuto de membro honorário da Ordem do Mérito, atribuído

pela Presidência da República.

Devemos, por isso, evitar entrar em novos experimentalismos e tratar os CTT com a dignidade que merecem.

De resto, estamos mais alinhados com a visão do PS/Porto e de Manuel Pizarro que defende, diga-se, de forma

responsável, o regresso do Estado ao capital social dos CTT.

Por outro lado, em 20 de janeiro, o Sr. Ministro Pedro Nuno Santos disse que a entrada do Estado no capital

social dos CTT seria uma possibilidade, mas tal solução não estaria em cima da mesa. Contudo, o Secretário

de Estado Adjunto e das Comunicações, Souto de Miranda, afirmou no mês passado que é fortemente provável

que os CTT venham a ser parceiros do Estado na nova concessão do serviço postal universal, o que pode abrir

a porta à reentrada do Estado na empresa.

Ora, gostaria de perguntar ao Sr. Ministro das Infraestruturas qual é, afinal, a posição do Governo sobre a

concessão do serviço postal universal?

Em suma, importa esclarecer se o Governo está ou não a ponderar a reentrada do Estado no capital social

dos CTT.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do

Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas, Srs. Ministros: Já vamos a

mais de meio deste debate e cremos, de facto, que o marcámos em boa hora. Reiteramos que traremos este

debate ao Parlamento as vezes que forem necessárias, até que possamos estar perante um serviço público

postal que chega a todo o território e que chega com qualidade a todos os utentes.

Mas este debate também nos tem servido para mostrar algumas coisas. Por exemplo, da parte do PSD e do

CDS, percebemos que há um peso na consciência enorme.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — O Governo não somos nós! Pergunte ao Governo!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — E é um peso na consciência tão grande relativamente à decisão que foi tomada

que, hoje em dia, nem sequer sabem o que se passa.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Pergunte ao Governo!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — O PSD não viu, o PSD não ouviu, o PSD, se calhar, nunca entrou numa estação

de Correios…

Protestos do PSD.

Para vir aqui dizer que alegadamente existem problemas, quer dizer… Este peso na consciência é tão grande

que não veem nada, não ouvem nada, não leem os relatórios da ANACOM, nem sequer falam com os seus

próprios autarcas, já agora, para perceber qual é o ponto da situação!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E muitos são ex-autarcas!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Portanto, temos aqui um grave problema de peso na consciência que,

aparentemente, também provoca amnésia nos Srs. Deputados do PSD.

O Sr. José Maria Cardoso (BE): — Muito bem!

Página 35

13 DE MARÇO DE 2020

35

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Mas também temos um peso na consciência grande do Sr. Deputado André

Ventura, do Chega, que hoje tomou as dores do PSD de Passos Coelho e veio defender o modelo de privatização

que foi feito…

O Sr. José Maria Cardoso (BE): — Já foi embora!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Foi embora porque o peso na consciência, de facto, é muito grande.

Mas, Sr. Ministro, como já foi dito nas suas intervenções, é preciso ter responsabilidade ao olhar para esta

matéria.

Protestos de Deputados do CDS-PP.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Isto é a síndrome de Estocolmo!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — É preciso ter a responsabilidade de olhar para os relatórios que têm saído todos

os anos sobre os índices de qualidade e para a informação acerca da prestação de serviço público.

E porque é de serviço público que estamos a falar neste debate, do serviço público que deve ser prestado

em todo o território, de igual forma, a toda a população, de novo, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, defendemos

que uma gestão privada não pode, na sua essência, responder a isto, porque não é o seu âmbito de atuação.

O serviço público com caráter universal só pode ser perfeitamente garantido através de uma gestão pública. E

de novo, Srs. Deputados, sim, isso separa-nos verdadeiramente, porque se não fosse assim não estaríamos

neste debate.

Queria colocar algo no debate que nos parece importante e que tem a ver, também, com a intervenção que

o Grupo Parlamentar do PS fez há pouco, e com algumas declarações do próprio Ministro, que não são novas.

É importante sublinhar, inclusivamente, que, em fevereiro de 2020, a Federação Distrital do PS/Porto veio

defender, numa carta enviada ao Governo, a entrada de capital do Estado na empresa CTT, fazendo, e bem, a

mesma análise que tem sido feita, até agora, da degradação do serviço.

Temos de ter a consciência e a responsabilidade de olhar para esta análise e perceber que ela é verdadeira

e, portanto, precisamos de responder a esta questão. Aquilo que fica — e daí a marcação deste debate — é que

as populações e os autarcas precisam de uma resposta concreta.

Algumas matérias já foram aqui referidas, nomeadamente o novo contrato de concessão e as garantias que

o Governo pretende incluir na negociação. Mas, como também já foi dito, há uma matéria de fundo que é

essencial e que tem a ver com a entrada do Estado no capital dos CTT e com a sua nacionalização. E aí, sim,

é necessário haver — porque as populações e os autarcas precisam — uma definição clara por parte do Partido

Socialista nesta matéria, seja do Grupo Parlamentar, seja do próprio Governo.

É isso também que tem de ser respondido ainda ao longo deste debate. Isto porque ainda não ficou claro

qual é, afinal, a posição do Governo: se vai manter, apenas, declarações de interesse relativamente à entrada

nos CTT ou se, finalmente, se vai deixar de declarações de interesse e passar à ação, a um plano concreto,

para a renacionalização dos CTT.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Infraestruturas

e da Habitação, Pedro Nuno Santos.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pedi a

palavra porque o Sr. Deputado André Ventura, que não tinha tido a coragem de me fazer uma pergunta, fez uma

intervenção, em jeito de pergunta, mas saiu tão rápido do Parlamento como do PSD para o Chega.

Risos do PS.

Página 36

I SÉRIE — NÚMERO 40

36

O líder da extrema-direita portuguesa mais uma vez nos presenteou, no Parlamento, com uma intervenção

em nome dos políticos que respeitam o povo. E estamos a ver o respeito que o Sr. Deputado André Ventura tem

pelo povo português!

Aplausos do PS e de Deputados do BE.

Aliás, Sr. Deputado André Ventura, caso esteja a ver o debate, protegido no seu gabinete, era importante

que nos ouvisse e percebesse que, tendo em conta as vezes…

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Está com o António Costa!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Não está, não. A reunião é às 17 horas e 30 minutos

e está atrasada. Essa foi a desculpa que vos deu.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Está atrasada?!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Está, está. Foi uma desculpa que vos deu. O

Deputado André Ventura deve estar no seu gabinete a ouvir-nos, neste momento.

E era importante que o Sr. Deputado André Ventura, que respeita tanto o povo português e que não fica aqui

mais do que os 3 minutos da sua intervenção, tivesse cuidado com as afirmações muito firmes que faz. Isto

porque estamos perante um político que já defendeu tudo e o seu contrário e que, portanto, se hoje defende a

privatização dos CTT, amanhã pode defender a nacionalização. Assim, deveria ter mesmo mais cuidado com

as posições que defende porque, obviamente, amanhã pode mudar.

Mas a ignorância atrevida leva a que se passem lá para fora ideias que são profundamente erradas face à

realidade que enfrentamos no espaço europeu. Disse aqui o Sr. Deputado, líder da extrema-direita portuguesa,

que uma reentrada do Estado no capital da empresa era colocarmos Portugal ao nível da Venezuela e de Cuba.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Está a rivalizar com o PS!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Esta ignorância atrevida faz com que tenhamos mais

dificuldade em discutir a sério em Portugal.

A verdade é que nós também temos casos. Sr. Deputado André Ventura — espero que esteja a ouvir-nos,

escondido e protegido no seu gabinete ou, então, a preparar algum programa para a Correio da Manhã TV —

,…

Aplausos do PS.

… ouça-nos com atenção e fique já a saber que Estados com 100% no capital dos Correios são apenas a

Holanda, Malta, Chipre e Portugal.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — E Reino Unido!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — A não ser que Espanha, França, Alemanha, Áustria,

Bélgica, Dinamarca, Finlândia, Noruega, Suécia e por aí fora,…

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — E os Estados Unidos!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — … sejam países socialistas como a Venezuela e

Cuba.

Obviamente, estamos aqui perante um líder da extrema-direita portuguesa a revelar toda a sua ignorância

perante o País e perante o povo.

Página 37

13 DE MARÇO DE 2020

37

Aplausos do PS e de Deputados do BE.

Bom, espero ter oportunidade de contar com ele em outro debate, como, apesar de tudo, podemos contar

com o Sr. Deputado João Cotrim, do Iniciativa Liberal.

Caros Srs. Deputados, na ótica do Partido Socialista, que não tem de ser necessariamente a do PSD e a do

CDS, partidos, obviamente, num campo político-ideológico diferente, achamos que a privatização foi um erro

tremendo que os anos comprovam.

Obviamente que, perante o processo traumático que foi a privatização total dos CTT, queremos, com

acuidade e com atenção, analisar o que aconteceu e quais as verdadeiras razões e tentar, ainda antes da

decisão que nos é pedida e exigida aqui por vários partidos, nomeadamente o PCP, o BE e Os Verdes, fazer

um trabalho importante, que não deve ser desvalorizado, e que é garantirmos, na relação e na negociação com

os acionistas, com a empresa CTT, as condições que os Srs. Deputados exigiram em matéria de cobertura do

território e de qualidade e de respeito pelo poder local.

Não fugimos ao debate da privatização, que foi claro sobre os seus aspetos negativos e as suas

desvantagens, mas há muito trabalho a fazer e que não se esgota numa reentrada do Estado no capital da

empresa.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, do

Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro Pedro Nuno Santos, o senhor

acabou de reafirmar esta ideia central do discurso do Governo de que há muito trabalho e muito caminho a

percorrer antes de tratarmos da questão concreta do controlo público dos CTT.

Mas há um problema que não podemos ignorar: enquanto se vai fazendo essa discussão e se fala no caminho

que há a percorrer, a gestão privada dos CTT vai desmantelando o serviço público e os próprios ativos da

concessão. Inclusivamente, o relatório da IGF, que o Governo já tinha há mais de um ano e só há pouco tempo

chegou à Assembleia — e essa é uma questão que tenho de reiterar…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ora bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): … e talvez o Sr. Ministro possa esclarecer no encerramento do debate —, diz que

vai havendo uma degradação do serviço público, da própria concessão e dos seus ativos e a retirada das áreas

mais rentáveis colocando-as no âmbito dos serviços financeiros, nomeadamente no Banco CTT, etc.

É por isso que ficamos com um serviço público e um serviço postal universal profundamente descaracterizado

face à situação inicial, mas, enquanto isso, vamos fazendo o tal trabalho que há a fazer e vamos percorrendo o

tal caminho que há a percorrer.

Ora, mesmo a imagem de marca dos CTT, uma das imagens mais conhecidas e até acarinhadas pelos

portugueses — o símbolo dos correios — foi sujeita a uma operação de descaracterização, de apagamento da

identidade do serviço ao longo dos tempos. Isto não é uma coincidência, nem é inocente; é um elemento

instrumental na estratégia de uma agenda de desmantelamento do serviço público que é urgente travar, derrotar

e inverter.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Conversa!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Já não é surpreendente, mas continua a ser, verdadeiramente, revoltante ver —

como, mais uma vez, aqui vimos — o desprezo do PSD e do CDS e dos seus sucedâneos para com a situação

das populações e o abandono que sofrem com esta gestão privada dos CTT. Quando se toca nos interesses

dos grupos económicos, tocam os alarmes todos e põem-se em sentido. O problema é que tem sido, até agora,

com estas forças políticas que o PS tem contado para rejeitar o regresso dos CTT ao controlo público.

Página 38

I SÉRIE — NÚMERO 40

38

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Não é connosco, é convosco!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Ora, é nessa medida que não queremos deixar de sublinhar a importância de

travar, rejeitar, inverter, romper, de facto, com essa política de direita e não mantê-la com esses parceiros do

passado.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pereira, do

Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Carlos Pereira (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Deputados:

Nesta última intervenção do Grupo Parlamentar do Partido Socialista gostaria de tentar sintetizar algumas das

questões que foram hoje debatidas neste importante debate sobre os CTT.

Não posso deixar de fazer um primeiro comentário, sabendo que não é muito confortável fazê-lo sobre um

Deputado que não se encontra na Sala mas, tendo em conta as circunstâncias e as declarações do Sr. Deputado

André Ventura e o facto de ser mais ou menos habitual que o Sr. Deputado chegue tarde e saia cedo, nós, e eu,

em particular, vou arriscar fazê-lo.

O Sr. Deputado André Ventura saiu do seu lugar e foi para o púlpito esbracejar muito, dizendo ao povo e a

esta Casa que devíamos estar a discutir o tema do momento, que todos sabemos qual é e que preocupa todos

os Deputados que aqui estão, estou certo disso.

Ora, ficámos todos, e o povo português também ficou, com certeza, na expectativa de ouvir o Sr. Deputado

André Ventura, de alguma forma, explicar quais são as suas ideias, os seus projetos, as suas iniciativas sobre

esta matéria e sobre esta crise tão importante. Foi um desapontamento, Sr. Deputado André Ventura! O Sr.

Deputado acabou no circo habitual, mas, pior do que acabar no circo habitual, acabou a falar daquilo que achava

que esta Casa não devia estar discutir, ou seja, a privatização dos CTT. Isto é absolutamente lamentável e não

podemos deixar de registar este tipo de comportamento, intolerável para a Assembleia da República.

A segunda nota que queria deixar tem a ver com um tema que foi transversal neste debate e que tem a ver

com a posição do Partido Socialista. Gostaria de sublinhar algo que me parece muito relevante e que é

importante deixar claro: o Partido Socialista está onde sempre esteve.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Isso é que é preciso!

O Sr. Carlos Pereira (PS): — Nós estamos onde sempre estivemos.

Sr. Deputado André Silva, Sr.ª Deputada Isabel Pires, Sr. Deputado João Almeida, Sr. Deputado João Dias,

estamos onde sempre estivemos, porque há uma linha que separa o Partido Socialista do PSD e do CDS e essa

é uma linha muito clara e que os senhores compreenderão: o que nos move na política é mesmo o interesse do

povo.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

E, como é o interesse do povo que nos move, os senhores estranham. Estranham que haja pessoas capazes

de dizer que, em algumas circunstâncias e em determinados contextos, a opção que tomámos não foi a melhor.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Carlos Pereira (PS): — Foi isso que fizemos e fizemo-lo com transparência, com verticalidade e para

defender o interesse do povo de Portugal. É isso que fazemos mas os senhores não compreendem.

Aplausos do PS.

Página 39

13 DE MARÇO DE 2020

39

Os senhores não compreendem isso, porque não está muito claro para vós que o que nos move é a

população. Muitas vezes, somos nós que não sabemos bem o que é que vos move, verdadeiramente. Essa é a

diferença entre o Partido Socialista e o PSD e o CDS.

Queria também dizer, em jeito de conclusão, e isto parece claro neste debate, que a privatização foi, de facto,

um erro — e não vale a pena, sequer, caminharmos para debates ideológicos. Todos sabemos que este setor

em que os CTT se movem tem, atendendo, inclusive, à forma como a empresa estava posicionada, enormes

barreiras à entrada. É um monopólio natural, como, aliás, vários estudos já demonstraram, e, ao sê-lo, a

privatização não faz aquilo que os senhores tanto defendem e tanto gostam, que é a imersão nas verdadeiras

vantagens da concorrência.

Não há vantagens da concorrência num setor em monopólio, ponto! Portanto, é um erro privatizar um

monopólio natural, mas foi o que os senhores fizeram. Ora, é também por isso que na Europa e no mundo inteiro

quase não há privatizações em companhias desta natureza.

Aplausos de Deputados do PS.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — A bancarrota foi um erro!?

O Sr. Carlos Pereira (PS): — Portanto, esta é a conclusão que os senhores não querem assegurar, não

querem admitir e quando aqui vêm procuram defender o indefensável, embora, aqui e ali, sempre digam que

estão preocupados com a população, com a qualidade e com a densidade dos CTT no País.

A terceira conclusão que queria comentar tem a ver com a questão do contrato de concessão. Em cima desta

privatização a mata-cavalos, cujo interesse era, e todos nós sabemos, garantir mais receitas para pagar a dívida,

o que os senhores fizeram foi um contrato de concessão com um caderno de encargos completamente

inquinado, porque não tinha exigências, não tinha compromissos, não assegurava o que era essencial: termos

uma estação de Correios, pelo menos, em cada concelho.

Os senhores não garantiram nada disso, porque não vos preocupava; queriam, pura e simplesmente,

assegurar que 900 milhões de euros entravam nos cofres do Estado e mais nada! Nunca quiseram saber da

população, e é isto o que nos distingue dos senhores do PSD e do CDS.

Uma última nota, para terminar: temos hoje perfeita consciência — e, provavelmente, os CTT são um

exemplo bom — de que, provavelmente, é um erro fazermos uma discussão sobre boa gestão pública ou boa

gestão privada. Talvez devêssemos fazer apenas a discussão sobre boa gestão ou má gestão…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que termine, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Pereira (PS): — Termino já, Sr.ª Presidente.

Isto porque, hoje, quando olhamos para os resultados dos CTT e observamos as opções de gestão dos CTT

e da equipa que lá está, percebemos que houve muitos erros, seja do ponto de vista estratégico, seja do ponto

de vista da visão, seja do ponto de vista operacional.

Ora, é por isso que os resultados são o que são e é por isso que não estamos satisfeitos e que vamos

equacionar, conforme o Governo disse, todos os aspetos que sejam possíveis para melhorar a situação desta

companhia.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Lopes.

A Sr.ª Isabel Lopes (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O

funcionamento do serviço de correios é uma peça fundamental em qualquer sociedade bem estruturada e

organizada. O acesso, a disponibilidade, a continuidade, a quantidade dos serviços públicos às populações e a

todas as entidades a que elas recorrem constitui um instrumento insubstituível para a coesão social, económica

e territorial do nosso País.

Página 40

I SÉRIE — NÚMERO 40

40

Essas exigências assumem particular importância quando nos referimos às populações de territórios de baixa

densidade, particularmente às aldeias mais isoladas.

O PSD não tem nenhum problema ideológico sobre se os CTT são uma empresa privada ou pública.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Tem, tem! Tanto tem que privatizou!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Pois, é o que se vê!

A Sr.ª Isabel Lopes (PSD): — O PSD exige é que os CTT prestem um serviço de elevada qualidade às

populações, um serviço que tem de ser prestado, e bem, independentemente de quem o presta.

Aplausos do PSD.

E, como qualquer serviço público, devem ser devidamente auditados e fiscalizados. É neste âmbito que se

exige ao Governo que seja diligente e que não esqueça as populações que podem ficar excluídas desses

serviços.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Foram vocês que privatizaram!

A Sr.ª Isabel Lopes (PSD): — Volvidos quase cinco anos é tempo mais do que suficiente para o Partido

Socialista assumir as suas responsabilidades e não se esconder por detrás da privatização.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Isabel Lopes (PSD): — Mas há uma pergunta, Sr. Ministro, essencial à qual o Governo não respondeu

no final deste debate: afinal, o que é que o Governo vai fazer no final desta concessão, que termina no fim deste

ano?

Aplausos do PSD.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Essa é que é a pergunta! Nem o Governo sabe!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Almeida, do

Grupo Parlamentar do CDS.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as

e Srs. Deputados: Este debate, agendado pelo Bloco de Esquerda, tinha como pontos de discussão a crise do

serviço postal e a questão da reversão da privatização.

Falou-se pouco, acho eu, sobre a crise do serviço postal, e isso é relevante, porque este não é um setor

qualquer ou um setor em que a realidade seja estanque. Há uma alteração substancial do que é o serviço postal

de há 20 anos para cá e, portanto, obviamente, podemos discutir quando é que aconteceu cada uma das

situações, que opção é que tomou cada Governo, e isso é legítimo.

O que não é legítimo é fazermos essa discussão abstraídos do facto de, hoje, o serviço postal não ter nada

a ver com aquilo que era há 20 anos. Portanto, a primeira questão que tem de se colocar é esta: sendo pública

ou privada, como é que uma empresa que tem o serviço postal como principal atividade funciona hoje?

Do ponto de vista do Estado, tem de se colocar ainda outra questão, porque quem hoje mais depende do

serviço postal é o próprio Estado. Em volume, o maior cliente do serviço postal, seja pela AT (Autoridade

Tributária), seja pelos tribunais, é o próprio Estado, mas em necessidade são principalmente os cidadãos

dispersos pelo País. Portanto, é necessário pensar não só na questão do volume para a gestão da empresa e

na capacidade de gerar resultados como, também, na questão de serviço público, onde a dispersão dos balcões

é o critério mais importante.

Do nosso ponto de vista, não saímos daqui e se todos querem falar de coerência neste debate,…

Página 41

13 DE MARÇO DE 2020

41

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Isso é só uma desculpa para não querer discutir isto!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — … a nossa coerência é esta: discutir o serviço postal como ele

está e discutir a natureza público-privada da empresa que gere o serviço postal em função da realidade do

serviço, não condicionando a realidade do serviço a um preconceito inicial, do ponto de vista ideológico, de

querer que ele seja público ou privado.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Está bem, está!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Depois, os que querem que seja serviço público, enfiam o

serviço postal no «fato» que definiram à partida como público, e quem defende exclusivamente o privado faz a

mesma coisa.

Acontece que Portugal não escolheu fazer a privatização dos CTT…

Protestos do Deputado do BE Luís Monteiro.

Foi Portugal, e não este ou aquele Governo.

Portugal não escolheu fazer a privatização dos CTT em função destes critérios, fê-la em situação de

necessidade.

O Sr. Deputado Carlos Silva disse aqui uma grande verdade, mas por acaso também já cá não está.

Vozes do PSD: — Não está cá?!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Está?!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Foi o Deputado Carlos Pereira.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sim, o Deputado Carlos Pereira já cá não está. Quando

criticamos os outros por não estarem, se pudermos, é capaz de não ser pior ficarmos 5 minutos a seguir a os

termos criticado por isso.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

Disse o Sr. Deputado Carlos Pereira que a privatização dos CTT foi para ter uma receita para pagar dívida.

Pergunto isto ao Sr. Deputado Carlos Pereira: foi para pagar que dívida? Que dívida seria essa? Que dívida é

que era preciso pagar quando foram privatizados os CTT? Quando um Governo do Partido Socialista inscreveu

no Memorando que era necessário privatizar os CTT, fê-lo para pagar que dívida? A dívida que tinha deixado.

Portanto, é fundamental que, quando faz a sua reflexão, o Partido Socialista perceba duas coisas: primeiro,

foi efetivamente para pagar a dívida, e não foi uma decisão fundamentada por critérios ideológicos; depois, a

dívida foi gerada por um Governo do Partido Socialista, a emergência foi gerada pelo Partido Socialista e a

solução foi escolhida pelo Partido Socialista.

Vozes do CDS-PP: — Exato!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — A dívida, a emergência e a solução!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Está a falar de tudo menos dos CTT!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Portanto, quem gerou a dívida, quem gerou a emergência e

quem gerou a solução vem agora dizer «nós respeitamos muito o povo; respeitámos o povo quando dissemos

Página 42

I SÉRIE — NÚMERO 40

42

que era preciso fazer aquilo e agora respeitamos ainda mais o povo ao dizer que aquilo que dissemos que era

preciso fazer, afinal, era uma asneira».

Os Srs. Deputados até podem achar que respeitam o povo, mas no fim do dia é o povo quem paga as vossas

opções. Portanto, convém ter a responsabilidade de perceber que a melhor forma de respeitar o povo é não

gerar dívida que crie estas situações de emergência e não escolher soluções que, quatro anos depois, se tenha

de dizer que afinal eram erradas.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Vou terminar, Sr.ª Presidente.

Também não vale o Partido Socialista vir dizer «somos transparentes e somos capazes de assumir que

cometemos um erro», quando depois vem fundamentar o erro com questões de princípio. Ou seja, tudo aquilo

que o Sr. Deputado Carlos Pereira aqui disse sobre o erro da privatização dos CTT era a razão para que o

Partido Socialista sempre tivesse defendido que eles não fossem privatizados.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Acontece que não foi assim e, portanto, o que está em causa

não é só a incoerência do Partido Socialista em relação ao passado como também em relação ao futuro.

Aplausos do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Srs. Deputados, como não há mais pedidos de inscrição, vamos passar

à fase do encerramento do debate. Para o efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, do Bloco de

Esquerda.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: Vamos falar sobre os CTT. Há pouco, o Sr. Deputado João Almeida disse que o grande problema é

que não se fala sobre o serviço postal e durante toda a sua intervenção acabei por não ouvir falar nada sobre o

serviço postal, pois passou mais tempo a falar sobre a dívida pública.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Então não falei?! Falei de o Estado ser o maior cliente, falei da

dispersão territorial…

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Para falarmos sobre os CTT temos de assumir racional e conscientemente

que a sua privatização foi um desastre. Foi um desastre para as contas públicas futuras, porque o País e o

Estado perderam dividendos de uma empresa que era saudável e que dava lucros.

Vozes do BE: — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Esses lucros não eram entregues a acionistas privados, não saíam do

País, prejudicando a balança de pagamentos, ficavam cá dentro e financiavam o Estado e os serviços públicos.

A privatização dos CTT foi um desastre para a própria empresa, que foi sangrada pelos seus acionistas.

Veja-se: a empresa lucra menos hoje, que é privada, mas distribui muito mais aos acionistas. Em 2016 e 2017

a empresa distribuiu aos acionistas até os lucros que não tinha. O que quer isto dizer? Quer dizer que os

acionistas privados foram às reservas dos CTT e repartiram o saque entre si.

Vozes do BE: — Exatamente!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Saquearam a empresa e repartiram o saque entre si. E isto sem falar nos

salários milionários com que os administradores dos CTT se autorecompensaram pelo bonito serviço que

andaram a fazer na empresa.

Página 43

13 DE MARÇO DE 2020

43

Em 2018, Francisco Lacerda, que foi aqui tão bem representado pelo Sr. Deputado da Iniciativa Liberal,

ganhou 925 000 euros. O modesto salário de Francisco Lacerda era de 77 000 euros por mês, 3000 euros por

dia. O administrador que levou os CTT à ruína, que distribuiu lucros que não tinha aos seus acionistas,

permitindo um saque, e que prejudicou o serviço público, ganha mais de quatro salários mínimos nacionais por

dia por este belo serviço.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas foi nomeado pelo PSD e pelo CDS!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Srs. Deputados, a privatização dos CTT foi também um desastre para o

País e para a população porque o serviço é pior, mais irregular e menos credível. E aparecem-nos agora PSD

e CDS a dizer que enquanto era uma empresa pública também houve estações dos CTT que fecharam…

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Mais!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Fecharam mais!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — … e que, enquanto era uma empresa pública, também se despediram

trabalhadores dos CTT. Dizem isto sem se lembrarem de que, enquanto era uma empresa pública que despediu

gente e fechou estações, quem estava a despedir gente e a fechar estações era um Governo PSD/CDS.

Aplausos do BE.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não, não! Está enganada!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Vocês só cortaram salários!

Protestos do CDS-PP.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — O que PSD e CDS nos vêm dizer é que privatizaram os CTT para proteger

a empresa da má governação do PSD e do CDS.

Aplausos do BE.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, expliquem-nos, porque até hoje não conseguimos perceber o porquê da privatização.

Os Srs. Deputados do PSD vêm dizer-nos o seguinte: «nós não temos preconceito ideológico, queremos o

melhor serviço público». Mas os CTT prestavam um mau serviço público?

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Prestavam!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Algum dos Srs. Deputados veio aqui dizer que, ao longo destas centenas

de anos de história, os CTT prestaram um mau serviço público ou um serviço público pior do que aquele que

prestam hoje?!

Vozes do CDS-PP: — Prestavam!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Prestavam?! Srs. Deputados, os CTT prestavam à população portuguesa

um pior serviço público do que prestam hoje?! Os Srs. Deputados querem convencer alguém de que os CTT

davam prejuízo às contas públicas?

Por que é que privatizaram os CTT? Privatizaram os CTT para encher os bolsos de uma mão cheia de

acionistas?! Privatizaram os CTT para que se abrisse mais um banco em Portugal que enviasse e-mails às

Página 44

I SÉRIE — NÚMERO 40

44

pessoas a oferecer crédito ao consumo?! É que Portugal não precisa de mais um banco, Portugal precisa de

um serviço postal universal que sirva a sua população, que seja eficiente e exigente. Hoje, esse serviço já não

existe e a responsabilidade é dos partidos que privatizaram os CTT, é do PSD e do CDS.

Srs. Deputados, quem quer controlar os setores estratégicos do País — os serviços postais, as

comunicações, a energia, os aeroportos —, quem quer defender os setores estratégicos, que são o garante da

democracia, da soberania e da proteção nacional quando tudo corre mal, não o faz por preconceito ideológico.

Quem quer manter monopólios naturais na esfera do Estado, porque sabe que não há concorrência nesses

setores e que quem vai sofrer as consequências é a população, não o faz por preconceito ideológico. Quem

quer oferecer aos cidadãos deste País o melhor serviço público possível não o faz por preconceito ideológico.

Preconceito ideológico é entregar os Correios à J. P. Morgan; preconceito ideológico é entregar a Portugal

Telecom nas mãos de Ricardo Salgado;…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — … preconceito ideológico é entregar o Grupo Galp a Isabel dos Santos;

preconceito ideológico é entregar a EDP e a REN ao capital chinês; preconceito ideológico é destruir empresas

que eram lucrativas, que eram um garante de soberania e de democracia, apenas por isto mesmo: por

preconceito ideológico.

Hoje, ao olhar para essas empresas, o que vemos são empresas destruídas às mãos dos seus acionistas,

joguetes nas mãos dos acionistas que fizeram delas o que quiseram, que viveram à custa de rendas garantidas

pelo Estado e à custa da exploração dos consumidores e do povo português.

Vozes do BE: — É verdade! Bem lembrado!

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Isso é preconceito ideológico e foi usado contra os interesses da

população.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Termino, Sr.ª Presidente.

Vimos aqui PSD e CDS sem pronunciarem uma palavra de crítica sobre este processo e vimos até o Chega

a defender Passos Coelho. Afinal, já foi do partido de Pedro Passos Coelho.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.ª Deputada, tem de concluir.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Termino, Sr.ª Presidente.

E vimos também a falta de coragem de certos partidos, como a Iniciativa Liberal ou o Chega, a demonstrar

que o seu radicalismo ideológico vai tão mais longe porque querem fazer à saúde e à educação o mesmo que

PSD e CDS fizeram aos CTT.

Aplausos do BE.

Protestos da Deputada do CDS-PP Ana Rita Bessa.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para o encerramento do debate, tem a palavra o Sr. Ministro das

Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados:

Sinceramente, no debate sobre os CTT, a questão ideológica que vai sendo usada por todos nós para nos

atacarmos mutuamente é um dado, e é um dado neste debate como o é em todos. Quer dizer, quem defende a

nacionalização tem uma determinada perspetiva da sociedade e quem privilegia a privatização tem outra.

Página 45

13 DE MARÇO DE 2020

45

Portanto, deste ponto de vista, as motivações ideológicas existem de um lado e de outro e o que nos cabe fazer

é defender aquelas em que acreditamos.

Não há aqui uma espécie de oposição entre o pragmatismo e a ideologia. Não! Cada uma das posições que

os Srs. Deputados defendem tem na sua base, obviamente, uma motivação ideológica. Isso não é um problema

nem está mal. Aliás, é assim que é suposto ser.

A determinada altura, ouvi dizer da bancada do CDS que não tinham fechado mais estações do que num

Governo do PS e, de facto, não pedi à nossa equipa no Ministério para fazer esse cálculo porque não seria uma

contabilidade em que nos saíssemos muito bem. O CDS, pelo visto, não fecha estações dos Correios, corta

salários ou fecha outras coisas.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não, não!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Acho que esse é um campeonato muito pouco

interessante.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Neste caso fecham escolas!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Exatamente.

Independentemente da motivação ideológica ou do objetivo de cada um no que diz respeito à medida política,

o Sr. Deputado João Pinho de Almeida falou num tema importante que tem a ver com a seguinte constatação:

o modelo de serviço postal alterou-se profundamente e, nos últimos 10-15 anos, o volume de tráfego postal em

Portugal caiu para metade. Não podemos ignorar este facto que, obviamente, levanta desafios à gestão, seja

ela privada ou pública.

Se temos uma estrutura construída para um determinado volume de tráfego postal e ele deixa de ter essa

dimensão, ficamos com uma estrutura desfasada para as necessidades. Esse desafio existe, seja numa gestão

privada ou numa gestão pública, isto é, se a empresa fosse, ou vier a ser novamente do Estado, estaríamos, ou

estaremos, confrontados com esse desafio e com essa tensão, o que não quer dizer que a empresa precise de

diminuir o quadro de pessoal.

O que é que os CTT têm que mais nenhuma empresa em Portugal tem? Uma capilaridade na sua rede que

mais ninguém tem e que permite uma proximidade e um contacto que, obviamente, dá à empresa a possibilidade

de fornecer um conjunto de outros serviços que não são fornecidos.

Só para terem uma ideia do caminho que podem fazer os Correios diria que, na Andaluzia, em Espanha,

quando se depararam com o mesmo fenómeno, o que os correios de Espanha começaram a fazer foi vender

outros serviços. A determinada altura, começaram a vender licenças de caça e de pesca do governo autonómico

e, depois, paralelamente, começaram também a vender seguros privados para a posse de arma. O que quero

dizer com isto é o seguinte: a alteração do modelo de serviço postal não é suficiente para explicar a redução da

sua rede nem do pessoal, porque, obviamente, a empresa tem de usar o ativo que tem, ou seja, a presença no

território, para fornecer outro tipo de serviços.

Mas mesmo que não fôssemos neste sentido, todos sabemos que o comércio eletrónico tem ainda uma fraca

penetração em Portugal e que tem uma margem de crescimento muito significativa. Ora, se formos avaliar com

atenção a distribuição do mercado de encomendas todos concordamos que os CTT, nos últimos seis anos, não

estiveram bem.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Claro!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Isto é, a gestão privada dos CTT não soube

aproveitar — temos de dizer isto com a mesma frontalidade com que dizemos que o Estado se portou mal aqui

ou acolá — o crescimento do comércio eletrónico em Portugal.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade!

Página 46

I SÉRIE — NÚMERO 40

46

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Portanto, as mais-valias que alguns veem no

potencial fabuloso de serem os privados a gerir não se comprovou, nestes últimos seis anos, à frente dos CTT.

Falharam, na gestão privada, e não só falharam como, obviamente, a degradação do serviço se acentuou.

Hoje, os CTT têm um nível de reclamações sem precedentes na sua história, o que quer dizer que as

alterações e o ajustamento que foram sendo feitos durante a gestão pública foram muito mais bem percebidos

e aceites pelas populações do que o ajustamento que, supostamente, está a ser feito pela gestão privada.

Não é por acaso que a gestão privada tentou, no último ano, a partir de setembro ou de outubro de 2019,

alterar a política, pois perceberam que uma política de gestão contra a população degrada a marca CTT, tem

consequências reputacionais graves, porque obviamente a relação que o povo português tinha com os CTT era

uma relação de confiança que se perde, também, pelas decisões que foram sendo tomadas, com dividendos

acima dos lucros, fecho indiscriminado de estações, degradação da qualidade, aumento das reclamações.

É pouco interessante saber quem é que é mais à esquerda ou mais à direita, se o PS virou ou não virou!

Todos pertencemos a campos ideológicos diferentes, com orgulho para vocês e para mim,…

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Ainda bem!

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — … mas isso não deve impedir-nos de olhar para o

que aconteceu e tomar decisões.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Ministro, peço-lhe que conclua.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Ainda bem que o Sr. Deputado Afonso Oliveira fez esse aparte, porque queria responder à Sr.ª Deputada

Isabel Lopes.

Afinal, o que é que o Governo vai fazer? É o que fui dizendo durante a intervenção. Os senhores é que são,

mais uma vez, injustos.

Risos do PSD.

Vou dizê-lo rapidamente, em 10 segundos, Sr.ª Presidente.

Recebemos, há poucos dias, o relatório final da ANACOM sobre a consulta pública que foi feita e na qual

participaram muitas entidades: sindicados, DECO, o prestador de serviços atual. Vamos agora analisar todo

esse trabalho e vamos preparar a nossa negociação com a empresa, pública ou privada. Portanto, vamos

preparar a nossa negociação com a empresa e, nessa negociação, vamos querer acautelar um conjunto de

condições que não estavam acauteladas — não quero ir atrás e a quem tem as culpas, mas não estavam —,

tais como presença no território, níveis de qualidade, relação mais justa com o poder local que presta serviço e

financia serviços dos CTT.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Ministro, peço que conclua.

O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação: — Peço imensa desculpa, Sr.ª Presidente. Está,

obviamente, a fazer cumprir o Regimento, mas eu tinha-me esquecido disto: vamos analisar o relatório, vamos

começar a negociação, vamos acautelar o que não está acautelado e o debate sobre a entrada no capital

continuará.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr.as e Srs. Deputados, chegámos ao fim da nossa ordem do dia.

Despeço-me dos Srs. Membros do Governo e peço às Sr.as e aos Srs. Deputados que deem atenção ao facto

de amanhã a nossa sessão começar às 9:30 horas e não às 10 horas, como habitualmente.

Como primeiro ponto da ordem do dia temos o debate de atualidade, requerido pelo CDS-PP, sobre a

resposta do País ao coronavírus — COVID-19, ao abrigo do artigo 72.º do Regimento.

Página 47

13 DE MARÇO DE 2020

47

Do segundo ponto consta a discussão conjunta dos Projetos de Lei n.os 196/XIV/1.ª (BE) — Altera a

composição do Conselho Nacional de Bombeiros, possibilitando a representação da Associação Portuguesa

dos Bombeiros Voluntários (primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 45/2019, de 1 de abril) e 203/XIV/1.ª (PAN) —

Altera a composição do Conselho Nacional de Bombeiros, regulada pelo Decreto-Lei n.º 45/2019, de 1 de abril

(primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 45/2019, de 1 de abril).

O terceiro ponto da ordem do dia prevê a discussão conjunta dos Projetos de Resolução n.os 115/XIV/1.ª

(CDS-PP) — Criação de um conselho consultivo do mundo rural e 204/XIV/1.ª (PCP) — Cria a comissão de

desenvolvimento do interior e do mundo rural.

No quarto ponto serão discutidos, conjuntamente, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 145/XIV/1.ª (PAN)

— Determina a restrição da realização de voos noturnos, salvo por motivo de força maior, e 212/XIV/1.ª (BE) —

Interdita a ocorrência de voos civis noturnos, salvo aterragens de emergência ou outros motivos atendíveis.

Do quinto ponto consta a apreciação da Petição n.º 620/XIII/4.ª (Armando José de Oliveira Teixeira

Fernandes e outros) — Solicitam a adoção de medidas com vista à defesa do Miradouro da Senhora do Monte.

Do ponto sexto consta a apreciação conjunta da Petição n.º 320/XIII/2.ª (Luís Amaral e outros) — Solicitam

a criação da categoria profissional de agente único de transportes, e dos Projetos de Resolução n.os 212/XIV/1.ª

(BE) — Recomenda a criação da carreira especial de agente único de transportes coletivos e 254/XIV/1.ª (PCP)

— Recomenda ao Governo a criação da carreira de agente único de transportes coletivos.

Por fim, do sétimo e último ponto constam as votações regimentais, no final do debate.

Chegámos, assim, ao final dos nossos trabalhos. Muito boa tarde e até amanhã.

Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 40 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

Páginas Relacionadas
Página 0019:
13 DE MARÇO DE 2020 19 O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isso não é verdade!
Página 0020:
I SÉRIE — NÚMERO 40 20 O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): —

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×