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Quinta-feira, 29 de outubro de 2020 I Série — Número 19
XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)
REUNIÃOPLENÁRIADE28DEOUTUBRODE 2020
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Nelson Ricardo Esteves Peralta
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 3
minutos. Foi aprovado um parecer da Comissão de Transparência
e Estatuto dos Deputados relativo à renúncia ao mandato de um Deputado do PS e à assunção do mandato correspondente e foi também aprovado um outro parecer da
mesma Comissão sobre a suspensão do mandato de um Deputado do PSD e a respetiva substituição.
Concluiu-se o debate conjunto, na generalidade, das Propostas de Lei n.os 60/XIV/2.ª (GOV) — Aprova a Lei das Grandes Opções para 2021-2023 e 61/XIV/2.ª (GOV) — Aprova o Orçamento do Estado para 2021. Usaram da
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palavra, a diverso título, além dos Ministros de Estado e das Finanças (João Leão), da Saúde (Marta Temido) e do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (Ana Mendes Godinho), os Deputados João Oliveira (PCP), Mariana Mortágua (BE), Fernando Anastácio (PS), Duarte Pacheco (PSD), Cecília Meireles (CDS-PP), João Cotrim de Figueiredo (IL), Inês de Sousa Real (PAN), André Ventura (CH), José Luís Ferreira (PEV), Duarte Alves (PCP), Lara Martinho (PS), Sara Madruga da Costa (PSD), Bruno Dias (PCP), Hugo Costa (PS), Alberto Fonseca (PSD), Miguel Matos (PS), António Ventura (PSD), Pedro Filipe Soares (BE), Carlos Pereira (PS), Carlos Silva e Cristóvão Norte (PSD), Ana Rita Bessa (CDS-PP), Hortense Martins (PS), Paula Santos (PCP), Moisés Ferreira (BE), Rui Cristina (PSD), João Dias (PCP), Mariana Silva (PEV), Bebiana Cunha (PAN), Joana Lima e Tiago Estevão Martins (PS), Cláudia André, Adão Silva e Ricardo Baptista Leite (PSD), José Moura Soeiro (BE), João Pinho de Almeida (CDS-PP), António Filipe (PCP), Helga Correia (PSD), Tiago Barbosa Ribeiro (PS), Jorge Costa (BE), Diana Ferreira (PCP), Ofélia Ramos (PSD), Elza Pais (PS), Alma Rivera (PCP) e Isaura Morais (PSD).
No encerramento do debate, intervieram os Deputados João Cotrim de Figueiredo (IL), André Ventura (CH), José Luís Ferreira (PEV), Inês de Sousa Real (PAN), Cecília Meireles (CDS-PP), João Oliveira (PCP), Catarina Martins (BE), Rui Rio (PSD), Ana Catarina Mendonça Mendes (PS) e o Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital (Pedro Siza Vieira), tendo, no final, aquelas propostas de lei sido aprovadas na generalidade.
Foi lido o Projeto de Voto n.º 361/XIV/2.ª (apresentado pelo PS e subscrito por uma Deputada do PSD) — De pesar pelo falecimento da escritora e jornalista Helena Marques. Após ter sido aprovada a respetiva parte deliberativa (a), a Câmara guardou 1 minuto de silêncio.
Foi aprovada a parte deliberativa (a) do Projeto de Voto n.º 356/XIV/2.ª (apresentado pela Comissão de Educação, Ciência, Juventude e Desporto e subscrito por Deputados do PS e uma Deputada do PSD) — De congratulação a António Félix da Costa, vencedor do Campeonato do Mundo FIA de Fórmula E de 2020.
Foi aprovado o Projeto de Resolução n.º 699/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo a simplificação do regime legal de emissão de atestados médicos de incapacidade multiuso, bem como a adoção de medidas de urgência para acelerar a emissão e a revalidação desses atestados.
Foi rejeitado o Projeto de Resolução n.º 664/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que mantenha uma política integrada ao nível da sanidade e do bem-estar animal para os animais de companhia, reforçando a Direção-Geral de Alimentação e Veterinária, foi aprovado o Projeto de Resolução n.º 704/XIV/2.ª (PCP) — Medidas para dotar a Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária dos meios financeiros, humanos e técnicos necessários para cumprir as competências que lhe estão atribuídas e foi rejeitado o Projeto de Resolução n.º 711/XIV/2.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que mantenha a Direção-Geral de Alimentação e Veterinária e todas as suas funções sob tutela do Ministério da Agricultura.
Foram aprovados, na generalidade, os Projetos de Resolução n.os 624/XIV/1.ª (PCP) — Requalificação da Escola Secundária de Serpa, 633/XIV/2.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que proceda à imediata requalificação da Escola Secundária de Serpa, 655/XIV/2.ª (BE) — Recomenda ao Governo a realização urgente de obras na Escola Secundária de Serpa, 676/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que promova, com urgência, a requalificação da Escola Secundária de Serpa, 681/XIV/2.ª (PEV) — Requalificação urgente da Escola Secundária de Serpa e 703/XIV/2.ª (PS) — Recomenda ao Governo a requalificação da Escola Secundária de Serpa.
Foi aprovado um parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados relativo à suspensão do mandato de uma Deputada do PS e à respetiva substituição.
Deu-se conta da apresentação do Projeto de Resolução n.º 746/XIV/2.ª.
O Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 52 minutos.
(a) Estas votações tiveram lugar ao abrigo do n.º 10 do
artigo 75.º do Regimento.
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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, Sr.as e Srs. Agentes da autoridade, muito bom dia a todos. Está aberta a sessão.
Eram 10 horas e 3 minutos.
A Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha vai dar conta de algum expediente.
Faça favor, Sr.ª Secretária.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, muito bom dia a todas e a todos.
Passo a dar conta de um parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados relativo à
renúncia ao mandato do Deputado José Apolinário, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, eleito pelo
círculo eleitoral de Faro: «A renúncia do Deputado José Apolinário cumpre os requisitos legais, sendosubstituído
por Francisco José Pereira de Oliveira, a partir do dia 28 de outubro de 2020, inclusive.»
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar este parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do CH e das Deputadas não
inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira.
A Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha vai ainda dar conta de um outro parecer da mesma Comissão.
Faça favor, Sr.ª Secretária.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o parecer refere-se à suspensão do mandato do Deputado Bruno Coimbra, do Grupo Parlamentar do PSD, eleito pelo círculo eleitoral
de Aveiro.
É o seguinte: «A suspensão do Deputado do PSD Bruno Coimbra cumpre os requisitos legais, sendo
substituído por Rui Miguel Rocha da Cruz a partir do dia 4 de novembro de 2020 até 3 de dezembro de 2020,
inclusive.»
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar este parecer.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do CH e das Deputadas não
inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira.
Sr.as e Srs. Deputados, da ordem do dia de hoje consta a continuação do debate conjunto, na generalidade,
das Propostas de Lei n.os 60/XIV/2.ª (GOV) — Aprova a Lei das Grandes Opções para 2021-2023 e 61/XIV/2.ª
(GOV) — Aprova o Orçamento do Estado para 2021.
Como o Governo ainda não se encontra presente, vamos aguardar alguns minutos.
Está inscrito para usar da palavra, em primeiro lugar, o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, João Leão.
Também várias Sr.as Deputadas e vários Srs. Deputados de diversas bancadas já se inscreveram para
intervir.
Assim que chegar o Governo, daremos imediatamente início aos trabalhos.
Pausa.
Já chegaram o Sr. Primeiro-Ministro e demais membros do Governo, que cumprimento.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, João Leão.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças (João Leão): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No início de 2020, Portugal tinha acabado de atravessar um período de quatro anos de forte crescimento da economia e
de convergência com a União Europeia, de grande crescimento do emprego, de aumento do rendimento
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disponível dos portugueses, em que se atingiu o primeiro excedente orçamental da democracia, o que
demonstrou que os resultados não só eram positivos, como sólidos e sustentáveis.
Foi um caminho percorrido de recuperação económica do País, que contribuiu para a melhoria de vida dos
portugueses e para o prestígio internacional de Portugal.
Sr.as e Srs. Deputados, no início deste ano, o surgimento da COVID-19 lançou, subitamente, o mundo numa
crise de saúde pública e numa crise económica e social sem precedentes.
Prevê-se que, depois de um crescimento de 2,2% em 2019, a economia portuguesa contraia cerca de 8,5%
neste ano, uma redução da atividade económica semelhante, aliás, ao que se espera para a Europa.
Simultaneamente, antecipa-se um agravamento da taxa de desemprego de 6,5%, em 2019, para 8,7%, neste
ano.
Esta queda da atividade económica constitui uma ameaça ao rendimento dos portugueses, em particular dos
que, por causa da pandemia, perderam o emprego ou tiveram uma queda acentuada da atividade.
Sr.as e Srs. Deputados, neste contexto, os quatro grandes desafios imediatos que o País enfrenta são:
enfrentar a pandemia, recuperar a economia, proteger o emprego e proteger o rendimento dos portugueses.
Por isso, o Orçamento do Estado para 2021 está construído em torno destas quatro grandes prioridades.
A primeira prioridade é a de ajudar o País a enfrentar a pandemia, através do reforço do SNS (Serviço
Nacional de Saúde) e de outros serviços públicos.
Aplausos do PS.
O Orçamento do Estado para 2021 prevê um enorme aumento do orçamento do SNS, de 1200 milhões de
euros, face a 2020.
Para combater a pandemia e reforçar o investimento, o OE (Orçamento do Estado) inclui um valor próximo
dos 500 milhões de euros dos novos fundos europeus, dos quais 220 milhões de euros são para testes, vacinas
e equipamentos de proteção individual, financiados pelo REACT-EU (Assistência à Recuperação para a Coesão
e os Territórios da Europa).
Prevê-se, para 2021, um reforço muito substancial do número de profissionais, com a contratação de mais
4200 profissionais, em termos líquidos, para o SNS e de mais 260 trabalhadores para o INEM (Instituto Nacional
de Emergência Médica).
Inclui, ainda, um grande reforço de verbas para investimento no sistema de saúde, prevendo-se o
investimento no equipamento e no alargamento da rede de cuidados de saúde primários, a expansão da Rede
Nacional de Cuidados Continuados, a construção de novos hospitais e a atribuição de um subsídio de risco para
os profissionais de saúde.
Aplausos do PS.
A saúde é, portanto, uma das grandes prioridades deste Orçamento.
Este OE tem, também, como prioridade, o reforço na área da educação. A pandemia veio acentuar as
necessidades de recursos e de profissionais nas nossas escolas. Por isso, o OE para 2021 responde com um
ambicioso programa de digitalização das escolas, num valor de mais de 400 milhões de euros, não só para
melhorar a aprendizagem, mas também para assegurar a continuidade da aprendizagem, no contexto da
pandemia.
Responde, também, com a contratação de mais 3000 assistentes operacionais para as nossas escolas, a
par do reforço de docentes, para ajudar a recuperação de aprendizagens, que se tornou premente devido à
pandemia.
Sr.as e Srs. Deputados, a segunda grande prioridade deste Orçamento do Estado é a recuperação da
economia portuguesa.
Do lado fiscal, preveem-se três medidas principais que contribuem para a dinamização da procura interna e
da economia e que colocam, em 2021, mais 550 milhões de euros na economia e nos bolsos dos portugueses:
a redução das retenções na fonte de IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares), em 200 milhões
de euros; a redução do IVA (imposto sobre o valor acrescentado) da eletricidade em 150 milhões de euros; a
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devolução do IVA, no montante de 200 milhões de euros, suportado pelos consumidores na restauração, no
alojamento e na cultura, três dos setores mais afetados pela pandemia.
A nível fiscal, para as empresas, prevê-se, ainda, além da estabilidade fiscal, a eliminação do agravamento
das tributações autónomas para as PME (pequenas e médias empresas) e, como estímulo para que as
empresas continuem a investir, o Crédito Fiscal Extraordinário ao Investimento de 20% em IRC (imposto sobre
o rendimento das pessoas coletivas).
Para promover a recuperação da economia e ajudar as empresas a enfrentar os desafios que esta realidade
atípica lhes coloca, é também fundamental assegurar o financiamento das empresas. Por isso, importa sublinhar
a extensão das moratórias de crédito bancário até setembro de 2021 e a promoção de linhas de crédito para as
empresas com garantias de Estado até 6000 milhões de euros.
O investimento público constitui uma outra ferramenta de política económica fundamental e determinante
nesta fase para a recuperação da economia. O Orçamento do Estado para 2021 prevê um forte crescimento do
investimento público, de cerca 23% face a 2020, o que representa um aumento superior a 1000 milhões de
euros.
Aplausos do PS.
Sr.as e Srs. Deputados, a proteção e a criação de emprego é a terceira das grandes prioridades deste
Orçamento do Estado para 2021. Para além de um conjunto de medidas muito ambiciosas de dinamização da
procura e da atividade económica, temos medidas específicas direcionadas para o apoio à manutenção e à
criação do emprego no valor de quase 1000 milhões de euros. Este conjunto de medidas constituem não só um
apoio direto ao emprego, mas também um forte apoio às empresas e à manutenção da sua capacidade
produtiva.
Nesta altura de incerteza, queria aproveitar para deixar, uma vez mais, uma mensagem de confiança às
empresas e aos trabalhadores: enquanto durar a pandemia, o Governo não deixará de continuar a apoiar o
emprego, ajudando as empresas a suportar parte dos custos do trabalho nos setores mais atingidos pela crise.
Aplausos do PS.
Esperamos, já em 2021, em resultado da recuperação da economia, voltar à trajetória de diminuição do
desemprego dos últimos anos com a taxa desemprego a diminuir de 8,7% para 8,2%.
Sr.as e Srs. Deputados, na resposta à crise, a proteção do rendimento das famílias é a quarta grande
prioridade deste Orçamento. Assim, o Orçamento do Estado para 2021 tem um conjunto muito significativo de
medidas dirigidas à melhoria e à proteção do rendimento dos portugueses. Estas medidas são também muito
importantes para a própria recuperação da economia e para as empresas.
No plano fiscal, temos as três medidas referidas que, no seu conjunto, se traduzem num aumento do
rendimento disponível das famílias no montante de 550 milhões de euros, através da redução do IVA e da
retenção na fonte do IRS.
Ao nível de salários e pensões, procede-se a um aumento extraordinário das pensões mais baixas em 10 €,
logo em janeiro, em resultado do compromisso assumido com o PCP. Em 2021, pela primeira vez nos últimos
anos, o aumento será de 10 € para todas as pensões até 1,5 IAS (indexante dos apoios sociais) e abrange
quase 2 milhões de pensionistas. Será a medida com maior impacto na despesa permanente do Orçamento
para 2021 com um custo anual de 279 milhões de euros.
O salário mínimo deverá aumentar significativamente, em linha com o aumento médio da anterior Legislatura.
Na Administração Pública, a massa salarial deverá aumentar cerca de 800 milhões de euros, em resultado do
desenvolvimento das carreiras e da contratação de novos profissionais.
No contexto desta crise, é fundamental o compromisso de não deixar ninguém para trás e de estar atento a
quem está mais vulnerável, a quem perde o emprego devido à pandemia ou a quem tem prestações de
desemprego mais baixas.
Por isso, o Orçamento do Estado para 2021 procede ao aumento do limite mínimo do subsídio de
desemprego de 438 € para 504 € para trabalhadores a tempo inteiro,…
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Aplausos do PS.
… cria uma prestação social extraordinária com o valor do limiar da pobreza dirigida a quem, neste momento
difícil, terminou o período de duração do subsídio de desemprego ou perdeu o emprego e não tem acesso ao
subsídio de desemprego, ou ainda para um trabalhador com perda de atividade. Espera-se que esta prestação
possa abranger mais de 200 000 trabalhadores.
Além disso, o Orçamento do Estado para 2021 alarga a gratuidade das creches até ao 2.º escalão, reduz em
25% as portagens no interior, reduz as taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde e introduz um
suplemento remuneratório de insalubridade e penosidade, entre outras medidas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, com a aprovação deste Orçamento e com o conjunto de políticas
muito ambiciosas de resposta à crise que ele determina, antecipamos que, no próximo ano, o País e o SNS
terão os meios necessários para enfrentar a pandemia, antecipamos uma recuperação robusta da economia em
2021, com um crescimento de 5,4%, antecipamos que a taxa de desemprego comece já em 2021 a trajetória de
diminuição e asseguramos a proteção dos rendimentos dos trabalhadores afetados pela crise e que o
rendimento dos portugueses volte a melhorar.
Em resultado da recuperação da economia e do emprego, prevê-se uma redução do défice orçamental de
7,3% para 4,3% em 2021 e uma redução da dívida pública de 134% para 130%.
Aplausos do PS.
Esta evolução das finanças públicas contribuirá para dar confiança aos portugueses, demonstrando que o
País está no bom caminho e que segue uma trajetória segura e sustentável.
O desempenho económico e orçamental dos últimos anos deu margem para que Portugal enfrente hoje, pela
primeira vez, uma crise económica sem aplicar austeridade. Pelo contrário, somos dos países europeus que
assumimos uma política económica claramente anticíclica que combate a crise, em vez de acrescentar crise à
crise.
Fazemo-lo com elevado sentido de responsabilidade, de forma a assegurar o objetivo primordial da
recuperação da economia e de proteção do rendimento dos portugueses e de, ao mesmo tempo, garantir a
estabilidade do financiamento da economia portuguesa e a continuação da redução da despesa com os juros
da dívida pública suportados por todos os portugueses, uma poupança em juros que, em 2021, deverá atingir
um valor anual de 2750 milhões de euros em relação a 2015.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD disse, nesta semana, que vota contra este Orçamento, porque
— e cito — «é um Orçamento de distribuição para agradar no imediato, esquecendo o futuro». Consideram que
é um Orçamento baseado em premissas irrealistas e que vai dar num orçamento retificativo. É uma visão oposta
à nossa, mas que temos de respeitar. Coerente com esta visão, o PSD disse que, na especialidade, ia ser
«responsável, caso contrário, era mau para o País».
Compreendemos este comportamento do PSD. De facto, o País e os portugueses não entenderiam que o
PSD viesse agora propor e aprovar medidas que aumentassem ainda mais a despesa relativamente a um
Orçamento que — e cito — «distribui o que tem e o que não tem e que conduz a um défice orçamental mais alto
do que devia».
Aplausos do PS.
Seria ir contra tudo o que o PSD defendeu. Como disse o líder do PSD na última semana, não seria honesto
para com a sua visão deste Orçamento.
Sr.as e Srs. Deputados: Nos últimos dias, o PSD, coerente consigo próprio, voltou a defender, como, aliás,
sempre fez no passado, que a austeridade é a forma correta de reagir a uma crise económica.
Consistente com esta visão, o PSD está contra o conjunto de medidas sociais previstas neste Orçamento:
contra o aumento do salário mínimo, contra a política de aumento dos rendimentos e das pensões, contra maior
proteção social para os que perdem o emprego e estão a ser afetados por esta crise.
Em 2015, a maioria parlamentar de esquerda juntou-se para mostrar que existia uma alternativa a esta visão
de austeridade. Uma alternativa responsável que apostava na recuperação da economia, dos rendimentos dos
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portugueses e na reposição da confiança, uma alternativa que se revelou um sucesso, reconhecido não só pelos
portugueses, mas também internacionalmente.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A pandemia causou em toda a Europa uma crise económica e social
sem precedentes. Este é um período de enorme responsabilidade para todos nós. Os interesses de Portugal e
dos portugueses estão à frente das disputas e dos interesses individuais de cada partido. Não podemos ter
receio de enfrentar os momentos difíceis. Não é o momento de desistir. Os portugueses não o entenderiam.
Tal como em 2015, estamos prontos para, em conjunto, voltar a fazer o caminho de recuperação da economia
e da melhoria da vida dos portugueses. Já mostrámos que o conseguimos fazer!
Neste momento difícil e de ansiedade, os portugueses esperam de nós um elevado sentido de
responsabilidade e que nos voltemos a juntar para aplicar a estratégia que tanto sucesso teve na saída da
anterior crise.
A aprovação deste Orçamento é o primeiro grande passo dessa estratégia de recuperação económica e da
recusa da alternativa da austeridade.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, inscreveram-se nove Srs. Deputados para formularem pedidos de esclarecimento.
Entretanto, a Mesa foi informada que o Sr. Ministro responderá em dois grupos, um de cinco e outro de quatro
pedidos de esclarecimento.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira, do Grupo Parlamentar do PCP.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, esta proposta de Orçamento comporta um conjunto de disposições programáticas para enquadrar problemas que precisam de decisão efetiva
e solução eficaz.
A prática tem demostrado que inscrever objetivos em normas programáticas dos Orçamentos do Estado ou
fazer depender esses objetivos de decisão ou de regulamentação posterior do Governo tem como resultado o
adiamento ou a não concretização desses objetivos por falta de vontade política do Governo, ficando os
problemas por resolver.
Assim, o que queremos do Governo, Sr. Ministro das Finanças, não é saber das justificações para os atrasos
e para os incumprimentos; o que queremos saber do Governo é de compromissos concretos para concretizar
em 2020 o que ficou decidido para 2020.
Começo por falar da referência que é feita no Orçamento do Estado à construção de dois hospitais: o hospital
do Seixal e o hospital central do Alentejo. Desde 2016 que esses investimentos aparecem em sucessivos
Orçamentos do Estado, sendo que, em relação ao hospital do Seixal, estamos exatamente no mesmo ponto em
que estávamos em 2011 quando foi adjudicado o concurso para a elaboração do projeto, e, em relação ao novo
hospital central do Alentejo, estamos ainda pior, porque temos, desde março, uma proposta de adjudicação da
obra que até agora ainda não foi concretizada, e nós queremos saber porquê. Porque é que não se dá
concretização ao que já ficou decidido, não em 2020, mas em 2016, relativamente a estes hospitais?
Sobre a gratuitidade das creches para famílias abrangidas pelo 1.º escalão, a decisão que foi tomada no
Orçamento de 2020 era para ter sido concretizada em setembro. O Governo disse-nos que estava a trabalhar
para que a decisão fosse concretizada mesmo com eficácia retroativa. Qual é o ponto de situação relativamente
à gratuitidade das creches?
Sobre a reforma dos trabalhadores das pedreiras, o compromisso que o Governo tinha era o de, em 2019,
aprovar um diploma que pusesse fim às penalizações dos trabalhadores deste regime especial de reforma, mas
o Governo não só não regulamentou em 2019, fê-lo em 2020 e, ainda por cima, fez depender a eficácia daquele
diploma com produção de efeitos só a partir de 2020, o que é uma situação de injustiça inaceitável que não
corresponde ao compromisso que o Governo tinha. Pergunto: como é que o Governo vai resolver este problema?
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Sobre a prestação social para a inclusão, ficou fixado no artigo 147.º do Orçamento o alargamento dessa
prestação para profissionais com missões de proteção e socorro, particularmente os bombeiros quando são
vítimas de acidentes em trabalho, mas não há nada sobre essa matéria em 2020.
Sobre o acesso à reforma das pessoas com deficiência e a revisão do sistema de atribuição dos produtos de
apoio nada foi feito. Nem o trabalho com as associações de pessoas com deficiência foi feito para concretizar o
que ficou inscrito no Orçamento do Estado.
Sobre admissão nas forças e serviços de segurança, no Orçamento do Estado estava inscrita a contratação
de 2500 profissionais, contratação essa que não foi feita e, em alguns serviços, há um risco de as reservas de
recrutamento caducarem com seis trabalhadores contratados e 150 vagas abertas. Queremos saber, em 2020,
quais as medidas que o Governo vai tomar para garantir a concretização da contratação destes 2500
profissionais, para garantir que as reservas de recrutamento não se extinguem e que os saldos transitam para
2021.
Sobre o investimento na saúde pública, o reforço na resposta em cuidados paliativos, o reforço de
profissionais de saúde nas unidades de intervenção local em comportamentos aditivos e de dependências e nas
equipas comunitárias de saúde mental, qual é o ponto de situação relativamente ao que ficou inscrito no
Orçamento do Estado para 2020 e que ainda não foi concretizado?
Também o reforço em 1,5 milhões de euros do orçamento da Lusa ainda não chegou.
Relativamente à carta de risco de intervenções de salvaguarda e valorização do património cultural, apenas
algumas intervenções, que eram classificadas como urgentes foram feitas, mas nem a lista das intervenções
urgentes foi concretizada e a requalificação das estruturas a cargo da OPART (Organismo de Produção Artística)
continua por fazer.
Sr. Ministro, não queremos saber das justificações para os atrasos e para os incumprimentos, queremos
saber de compromissos concretos para concretizar em 2020 aquilo que ficou inscrito no Orçamento para 2020.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, na semana passada, fiz-lhe algumas perguntas sobre as verbas que estão
inscritas no Relatório do Orçamento do Estado. Desde então, o Governo tem fornecido, publicamente até, um
conjunto de dados, um conjunto de imagens que agradecemos. Mas elas não desmentem os números que citei
nem nos tranquilizam.
Perguntei-lhe, na semana passada, porque é que, no total, o Governo não executou, sequer, uma parte da
despesa que estava autorizada no Orçamento Suplementar. E não posso aceitar que a resposta do Governo
seja a de que as dotações orçamentais não são para gastar.
Perguntei-lhe também porque é que o reforço das despesas com pessoal em toda a saúde — em toda a
saúde! — é inferior ao do ano passado em 100 milhões, mesmo depois de todos os anúncios de novas
contratações, por parte do Governo.
E perguntei-lhe, igualmente, como é que se explica uma dotação orçamental para o SNS inferior à do
Orçamento Suplementar.
Estes números são indesmentíveis, porque foram inscritos pelo Governo no Relatório do Orçamento do
Estado.
Mas, na sexta-feira passada, o Sr. Ministro apresentou-nos, aqui, um gráfico e uma tabela sobre o número
de médicos do SNS. Agradeço a tabela e também o gráfico pela informação que traz e que reproduzo. Penso
que foi este gráfico que o Sr. Ministro nos apresentou na semana passada.
A oradora exibiu o gráfico que mencionou.
É um gráfico importante e que não devemos esquecer.
Este gráfico que o Sr. Ministro apresentou confirma o que o Bloco tem dito: não negamos uma evolução
positiva no número de médicos ao longo do tempo, o que dizemos é que há menos médicos hoje do que havia
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no início da pandemia e que há menos médicos hoje do que havia em janeiro, quando nos sentámos para
identificar as necessidades de médicos e de profissionais no SNS, e por isso concordámos com o número de
mais 8400 médicos e profissionais de saúde, sem sabermos de uma pandemia que, entretanto, chegaria, pondo
tanta pressão no SNS.
O gráfico que o Sr. Ministro apresentou vai até junho. Entretanto, o site do SNS publicou, no menu
«transparência», novos gráficos, que vão até setembro.
Mostro-lhe o panorama entre janeiro de 2019 e, neste caso, setembro de 2020.
A oradora exibiu outro gráfico.
A saída de médicos continua ao longo do ano e dá-se até o caso de, em setembro de 2020, haver menos
médicos no SNS do que havia em janeiro de 2019. Segundo o site do SNS, são 29 566 médicos em setembro
de 2020 e 29 598 médicos em janeiro de 2019.
Entretanto, houve uma pandemia, e sabe-se que o SNS está sob enorme pressão.
Os números que apresentou são os números que apresentei, e eles não podem ser desmentidos. Mas a
nossa discussão não é sobre os números, é sobre a situação do SNS e é sobre soluções para essa situação.
Depois destes dados de setembro, houve um concurso para médicos de família: abriram 435 vagas, 284
foram preenchidas, ficando as restantes por preencher. Entretanto, decorreu um concurso para 911 vagas de
especialidade, com pessoas que já estão, neste momento, no SNS e que vão transitar de uma função para
outra, mas que não acrescentam números líquidos ao SNS.
Repito, não discutimos os dados, mas temos um problema: faltam médicos no SNS quando mais precisamos
deles. O Bloco procurou um acordo para criar carreiras profissionais e exclusividade no SNS, para atrair e reter
médicos e profissionais de saúde.
A pergunta que gostaria de lhe fazer, Sr. Ministro, é como é que explica uma recusa orçamental para estas
propostas que fizemos para reter os médicos no SNS.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Fernando Anastácio, do Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, ao longo destas últimas semanas, o Partido Social Democrata tem vindo a sustentar uma narrativa assente na ideia de que, na
proposta de Orçamento do Estado para 2021, não há uma preocupação com medidas para as empresas.
Todos estaremos de acordo que uma das premissas mais valorizadas pelos empresários é a estabilidade
fiscal.
Risos do PSD.
Ora, a estabilidade fiscal é uma realidade nesta proposta de Orçamento.
Os impostos não serão aumentados, as percentagens manter-se-ão inalteradas em todas as taxas de
imposto e não haverá qualquer atualização de impostos indiretos.
Aplausos do PS.
Falemos, então, de investimento, outra realidade determinante para o crescimento económico.
Neste Orçamento, temos medidas como, por exemplo, a de um crédito fiscal extraordinário ao investimento,
que continuará em vigor em 2021, permitindo deduzir à coleta, em sede de IRC, até 20% das suas despesas de
investimento, até 5 milhões de euros. Dou um outro exemplo: será criado um incentivo fiscal dirigido às pequenas
e médias empresas para investimento em ações de internacionalização.
Tudo isto conjugado com o aumento do investimento público em 23%, que é um motor, uma alavanca e uma
efetiva oportunidade para o tecido económico nacional.
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Mas, se há investimento, também há medidas efetivas de desagravamento fiscal. Por exemplo, será
eliminado o agravamento das tributações autónomas a micro, pequenas e médias empresas que, habitualmente,
não tinham prejuízos e que irão tê-los, forçosamente, por força da pandemia.
Serão, também, eliminadas as mais-valias dos imóveis aquando da transferência entre o património pessoal
e a afetação a uma atividade comercial, medida com particular significado no setor do turismo e, particularmente,
no alojamento local.
Nesta linha, inserem-se medidas como, por exemplo, o programa «IVAucher», que será uma despesa fiscal
e um efetivo estímulo à atividade económica em setores como o alojamento, a restauração e a cultura, através
da dedução do IVA pago e reinvestimento neste setor.
Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, falar de apoios às empresas neste Orçamento é também falar de novas
linhas de crédito, com garantias públicas para apoio ao financiamento das empresas; da prorrogação do prazo
das moratórias bancárias, até setembro de 2021; é garantir, como o Governo faz, que, em 2021, estará
disponível para manter os apoios à atividade empresarial, para preservar postos de trabalho e salvaguardar a
capacidade produtiva das empresas que continuem a ser afetadas pela crise pandémica.
Não será isto olhar para as empresas?
Vozes do PSD: — Não!
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Economia, empresas e retoma económica são realidades que não dispensam o mercado interno. A questão que tem de se colocar é saber se, para o PSD, estímulos ao mercado
interno são ou não essenciais para a retoma económica. E, se o são, então não compreendemos a
desvalorização permanente que o PSD faz de medidas como, por exemplo, as do aumento do salário mínimo,
do aumento das pensões, do aumento do subsídio de desemprego, da redução do IVA da eletricidade, da
redução das tabelas de retenção de IRS, dos novos apoios sociais, dos benefícios nos passes sociais, nos
manuais escolares e nas creches. Todas estas medidas contribuem para um efetivo aumento do rendimento
disponível das famílias.
Sr. Ministro, os exemplos e as medidas concretas que acabei de referir são uma realidade deste Orçamento
do Estado. Portanto, a pergunta final que lhe coloco é a seguinte: como é que interpreta o discurso do PSD
sobre a falta de preparação ou falta de medidas para as empresas? Terá este discurso alguma aderência à
realidade? Não será mais uma narrativa do PSD, porque agora não pode dizer, de facto, ao que vem e não pode
dizer qual o seu verdadeiro programa? Programa esse que é aquele a que sempre nos habituou, ou seja, o
regresso da receita austeritária, os cortes nos salários e nas pensões e o aumento de impostos. Este é o
programa oculto do Partido Social Democrata.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Duarte Pacheco, do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Ministro de Estado e das Finanças, após meses a cozinhar este Orçamento, o Sr. Ministro entregou-nos uma peça
orçamental que, outrora, podia ser conhecido como «Orçamento Limiano», mas agora, à pesca de apoios, penso
que poderemos apelidá-lo de «Orçamento Strogonoff», para ter o apoio dos camaradas do PCP, mas «vegan»,
para ter também o apoio do PAN,…
Risos do PSD.
… mostrando as qualidades de mestre Michelin do Prof. João Leão.
E, Sr. Primeiro-Ministro, este prato especial que nos trouxe é tão especial que ninguém consegue, com
justiça, perceber o que é que ele contém. É aquilo que nos diz o Conselho das Finanças Públicas ou a UTAO
(Unidade Técnica de Apoio Orçamental): falta de transparência, dados misturados entre medidas novas e
medidas antigas, para dificultar a leitura, um rol de anúncios que, como já aqui foi explicitado, no passado não
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foram respeitados nem cumpridos — porque é que agora passavam a ser? — e, pior ainda, mesmo antes de
ser votado já sabemos que há novas medidas que vão ser incorporadas.
Logo, ao fim da tarde, quando votarmos, já não vamos votar um défice que o senhor aqui nos apresentou. A
Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social foi a primeira a reconhecer que o défice já não é
este, porque, precisamente no cozinhado que está a ser feito, antes, sequer, de votá-lo, aquele já não será o
prato que nos trouxe.
Isto prova a irresponsabilidade da vossa gestão ao longo deste processo.
Protestos do Deputado do PS João Paulo Correia.
Mas, Sr. Ministro, poderíamos pensar algo mais. Poderíamos pensar: este Orçamento resolve os problemas
estruturais do País; este Orçamento vai procurar melhorar a produtividade dos portugueses e da economia
portuguesa; vai procurar melhorar os atrasos na justiça, para que ela seja mais célere e responda aos cidadãos;
vai melhorar a qualidade dos serviços públicos, para que as pessoas tenham o cartão de cidadão ou acesso à
sua pensão de reforma a tempo e horas; vai melhorar os atrasos nas listas de espera da saúde. E a resposta é:
não! Nada está aqui contemplado que demonstre isso.
A seguir, podemos pensar que este Orçamento está concentrado na pandemia e na crise económica e,
portanto, vai responder aos problemas imediatos. E o que é que constatamos? Vai responder à crise económica,
quando não tem nada para apoiar as empresas — tirando o momento de humor que o Sr. Deputado Fernando
Anastácio nos trouxe, dizendo que «os empresários já devem estar felizes; não aumentamos os impostos, é o
melhor apoio que lhes podemos dar!»?
Ao que chegou a gestão socialista! É esta a perspetiva que tem da economia e das empresas em Portugal,
Sr. Ministro?!
Portanto, o Orçamento não apoia as empresas.
Podemos, então, pensar que este Orçamento apoia a situação da saúde, que há medidas concretas para
que milhares de consultas que foram abandonadas e que cirurgias aos doentes não-COVID que foram
abandonadas sejam rapidamente recuperadas, para que as pessoas não morram à porta dos hospitais ou em
casa, à espera de serem tratadas. Mas não, não tem nada sobre isso!
Finalmente, podemos pensar que este Orçamento vai responder à pandemia. Também não, porque,
infelizmente, teve de ser o Sr. Presidente da República a agarrar este dossiê, para que haja uma gestão eficiente
do problema.
Por isso, Sr. Ministro, aquilo que nos traz é uma mão cheia de nada, que só tem um objetivo: pescar votos à
linha e preservar o poder.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, o PS falava aqui em programas ocultos, e eu gostava de lhe deixar uma pergunta sobre o que eu chamaria de «Orçamento oculto», porque, de facto, este
Orçamento que aqui entra é oculto em coisas fundamentais.
Por isso, deixava-lhe duas perguntas, telegráficas e muito simples.
A primeira pergunta é a seguinte: quanto é que foi o impacto orçamental das medidas COVID? Quanto é que,
em 2020, está previsto gastar com as medidas COVID e quanto é que se prevê que, de facto, tenha sido gasto
com as medidas COVID?
A UTAO e o Conselho das Finanças Públicas são claros a dizer que o Orçamento não responde a esta
pergunta tão simples.
Sr. Ministro, não é possível vir dizer que Portugal atravessa uma crise como nunca conhecemos — o que é
verdade —, pedir responsabilidade e, depois, recusar-se a responder a uma pergunta tão simples, tão clara e
tão evidente quanto esta.
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A segunda pergunta, questão que a UTAO também diz que o Sr. Ministro e o Ministério das Finanças se
recusaram esclarecer, é a seguinte: qual será o impacto orçamental das medidas COVID neste ano? Ou seja,
quanto é que elas vão custar neste ano?
As perguntas que lhe deixo são tão simples, tão claras e tão concretas quanto isto.
Já agora, porque vejo muito, entre o PS, parceiros, ex-parceiros, parceiros que já não se sabe se são ou não,
muito preocupados em discutir a dicotomia entre público e privado em muitas áreas, em particular na saúde —
quando acho que a discussão que fica de fora, mas que é a única que vale a pena ter, é se os doentes estão a
ser tratados ou não —, gostava de lhe deixar uma pergunta sobre o hospital de Braga.
Ouvi muito falar deste hospital, o Governo acabou com uma PPP (parceria público-privada) no hospital de
Braga, o Bloco clamava contra esses privados «que andam a ganhar dinheiro com a saúde dos portugueses»,
dizia que estas PPP eram mais caras.
Gostava de saber por que razão, neste Orçamento do Estado, está previsto gastarem-se mais 2,8 milhões
de euros em despesas com pessoal no hospital de Braga. Afinal, se as PPP na saúde ficam mais caras, porque
é que está previsto que o Estado gaste mais dinheiro, e não menos, para prestar exatamente os mesmos
cuidados de saúde?
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para responder a este conjunto de cinco pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, João Leão.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, muito obrigado pelas questões que colocaram.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado do PCP, João Oliveira, a quem agradeço, queria
primeiro dar uma nota de enquadramento. O Orçamento do Estado para 2020 entrou em vigor mais tarde, em
abril, exatamente no momento em que ocorreu a pandemia.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — E 2020 acaba em dezembro!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Como disse, e bem, o ano de 2020 acaba em dezembro e temos tempo, ainda, para concluir e para concretizar os compromissos que assumimos, nomeadamente os
compromissos que assumimos com o PCP, no âmbito da aprovação do Orçamento do Estado para 2020.
Um compromisso muito importante assumido foi o da gratuitidade das creches. Contamos, em novembro,
poder concluir o acordo com as IPSS (instituições particulares de solidariedade social) e, nesse sentido, pagar
retroativamente a setembro o valor, de forma a garantir a gratuitidade para os agregados no primeiro escalão,
bem como para o segundo filho dos agregados no segundo escalão, como estava previsto no Orçamento do
Estado para 2020.
Por outro lado, é importante ainda referir a questão que colocou sobre o hospital de Évora, que é uma questão
que o PCP tem colocado. O Governo tem tentado concluir o processo de contratação e, ainda nesta semana,
até em resultado de conversações que teve com o PCP, que dá uma especial prioridade ao avanço deste
concurso, conseguimos também fazer um reforço extraordinário de verbas para dar seguimento a esta
empreitada. Esperamos, muito em breve, que o contrato vá para o Tribunal de Contas e que a obra comece no
hospital de Évora. Queria aqui destacar também o papel importantíssimo do PCP ao chamar a atenção para
esta questão, para garantir que este processo avança rapidamente.
Em relação à questão da contratação de profissionais para as forças de segurança, este é um compromisso
que assumimos com o PCP para este Orçamento e iremos cumprir, neste ano, tal como previsto, o acordado.
Em relação às equipas de saúde mental, já foi aprovada a constituição de cinco equipas para todas as
regiões, tal como estava previsto no Orçamento do Estado para 2020.
Há outras questões mais específicas às quais podemos fazer chegar, depois, as respostas.
Em relação às questões colocadas pela Sr.ª Deputada do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, a quem
também agradeço, queria referir — sei que não o fez — que o Orçamento do Estado para 2021, em relação ao
Serviço Nacional de Saúde, aumenta 1200 milhões de euros face a 2020. Sei que não quis…
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A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — A orçamentação toda?
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — O orçamento do SNS. Sei que não gosta de o referir.
Protestos do BE.
Sei que o Bloco de Esquerda faz referência ao Orçamento Suplementar e esquece-se de que, no âmbito
desse Orçamento, o reforço de 500 milhões de euros não foi exclusivamente feito através de transferências do
OE. Desses 500 milhões, 300 são transferências do OE. Portanto, tendo isso em consideração, que não o
tiveram nas vossas contas, mostra-se que, mesmo relativo ao Orçamento Suplementar, o orçamento do SNS,
da parte de transferências do OE, também aumenta em 2021 face a 2020. O Bloco de Esquerda enganou-se
nas contas, a meu ver.
Vozes do BE: — Não, não!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — A única forma de chegarmos aos vossos cálculos é considerar isso.
Aplausos do PS.
Por outro lado, também é importante referir a este nível que, para fazer face à pandemia, tal como as verbas
do Suplementar, temos também em 2021 — o Bloco de Esquerda não o quer reconhecer — verbas dos novos
fundos europeus, nomeadamente do programa REACT-EU, que estão vocacionadas para fazer exatamente o
que o Suplementar fez, ou seja, dar financiamento ao SNS para pagar equipamentos de proteção individual,
vacinas, testes. São verbas de fundos europeus extra, que o Bloco de Esquerda não quer considerar na sua
análise, mas que também têm que ver com a questão de fazer face à pandemia. Isto para além das verbas
adicionais que também temos dos novos fundos europeus para os investimentos no SNS, neste caso no âmbito
do PRR (Plano de Recuperação e Resiliência).
Em relação à questão dos médicos, volto a mostrar o gráfico que há pouco a Sr.ª Deputada também mostrou
e que apresenta a todos os portugueses a evolução do número de médicos ao longo dos anos — há um aumento
de 18% no número de médicos.
Aplausos do PS.
Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, reconheço-a como uma boa economista — até nos conhecemos do mundo
académico —, e para a boa economista que é confesso que não é sério fazer uma análise e comparar variações
interanuais.
Protestos do BE.
Qualquer economista sabe que tem de fazer comparações em termos homólogos e que não é correto nem
sério fazer apenas uma análise interanual.
Aplausos do PS.
Como sabemos, a grande entrada de médicos no SNS é em janeiro e não podemos proibir, durante um ano,
a saída dos médicos para a reforma. Isso não é possível! Não vivemos num Estado totalitário, onde se proíbe a
saída dos médicos para a reforma!
Aplausos do PS.
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Em relação às despesas com pessoal, é muito importante que tenha referido essa questão. Repare, em 2021,
as despesas com pessoal aumentam mais de 300 milhões de euros face a 2020, ou seja, é um aumento superior
a 6%, mais do que acomoda toda a contratação. São mais de 300 milhões de euros em 2021, em cima do valor
de 2020. Para o reforço de 4200 profissionais, juntamente com os 260 do INEM, são necessários 125 milhões
de euros. Os 300 milhões de euros são mais do que necessários! Nenhum português entende que os 300
milhões de euros não sejam necessários e que se cobre mais do dobro do custo necessário à contratação de
novos profissionais. Como sabe, as questões de pessoal não são apenas sobre os novos profissionais, também
é importante a verba para a valorização do desenvolvimento das carreiras e, nesse âmbito, pressupõe
igualmente o aumento das despesas com pessoal.
Em relação à questão colocada pelo PSD, é curioso que, segundo a sua visão, este Orçamento dá o que
tem e o que não tem, mas, depois, é preciso cortar o aumento de 10 € nas pensões para poder dar ainda mais
às empresas. Para o PSD, dá o que tem e o que não tem, não pensa no futuro, mas, depois, não se pode
aumentar o salário mínimo, proteger quem perdeu o emprego e quem está em dificuldades por causa da
pandemia.
Queria também dizer que, para além das medidas todas que referimos, temos também, no âmbito do
Programa de Recuperação e Resiliência, mais 4000 milhões de euros para as empresas a fundo perdido. São
verbas muito importantes, que não estão no Orçamento do Estado, mas que vão começar a ser canalizadas no
próximo ano. Será um valor importante para as empresas.
Em relação às questões colocadas pela Sr.ª Deputada Cecília Meireles, queria referir que…
O Sr. André Ventura (CH): — Também tem de agradecer!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Também agradeço à Sr.ª Deputada as questões que me colocou.
Risos.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, peço um pouco de silêncio para que o Sr. Ministro possa responder.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Queria dizer à Sr.ª Deputada que, neste ano, prevemos uma despesa, no âmbito da proteção social e da saúde, superior a 3000 milhões de euros, mas invoco também as
despesas muito significativas com o layoff,que tivemos no segundo trimestre.
Em relação a todas as restantes verbas, prevemos, na área da saúde e nas outras áreas também, o reforço
dessas verbas. Prevemos uma menor execução em 2021, em relação a 2020, nas despesas do layoff, porque
não estamos a pressupor uma paragem total, durante três meses, como ocorreu no segundo trimestre deste
ano.
Queria referir que, para reagir à crise e para proteger os rendimentos dos portugueses, temos mais de 1000
milhões de investimento, mais 600 milhões de euros para o apoio social e temos, também, uma redução de
impostos e da receita fiscal, em 550 milhões de euros, para as famílias.
Todas estas medidas vão ser as medidas para 2021.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Vamos passar ao segundo grupo de pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro das Finanças.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, chegou ontem o plano de liquidez da TAP (Transportes Aéreos Portugueses). Quatro meses depois de o termos pedido aqui, até
através da própria Comissão de Orçamento e Finanças, chegou o plano de liquidez da TAP. São três folhinhas:
na realidade, a primeira é um ofício, a segunda tem os enquadramentos, que não interessam muito, e, depois,
há uma folhinha com o plano de liquidez da TAP, que mal consegue ler-se.
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Sr. Ministro das Finanças, pergunto se, de facto, leu esta folhinha e se foi com base nisto que decidiu enterrar
1700 milhões de euros na TAP.
Há, no Orçamento do Estado, 300 páginas; no relatório das GOP (Grandes Opções do Plano), 300 páginas;
no relatório do próprio Orçamento do Estado, outras 300 páginas … Ou seja, em quase 1000 páginas, não foi
possível justificar o investimento determinado na recuperação da economia e não foi possível justificar o
investimento para acabar com as listas de espera e com os atrasos do SNS, mas com uma folhinha do plano de
liquidez da TAP foi possível justificar 1700 milhões enterrados nesta companhia!
A pergunta é a seguinte: como é que é possível, Sr. Ministro?
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do PAN.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e restantes membros do Governo, antes de tudo, não posso deixar de responder ao PSD.
De facto, o PSD vem aqui vestir o papel de quem ficou à porta do restaurante. Os Srs. Deputados do PSD
mais parecem aquelas pessoas que têm dificuldade em escolher: esperam e esperam e, quando se decidem, o
restaurante já fechou.
Sr. Deputado Duarte Pacheco, deixe-me dizer-lhe que se este Orçamento, no final, quando sair da
Assembleia da República, tiver, de facto, um toque vegano ficaremos muito satisfeitos, pois não só faz bem à
saúde, como faz bem ao ambiente e também sabe muito bem!
Risos do PSD.
Relativamente à discussão deste Orçamento, Sr. Ministro, não podemos deixar de lhe dizer que há uma
fatura que, de facto, tem tardado a ser paga, que não tem entrado nas contas públicas e que, mais tarde ou mais
cedo, vai bater-nos à porta. Sr. Ministro, esta fatura é precisamente a das alterações climáticas e irá literalmente
bater à porta do Terreiro do Paço, com a subida das águas, por força do aquecimento global.
O PAN, por diversas vezes, seja no rescaldo da discussão deste Orçamento, seja nos vários trabalhos da
Assembleia, tem colocado várias questões relacionadas com a descarbonização do País, que é urgente que
seja feita. O mundo e a própria União Europeia já têm vários compromissos internacionais sobre as metas da
descarbonização, mas cada país tem de fazer a sua parte e Portugal não pode ficar para trás, sobretudo antes
do ponto de não retorno.
Por isso mesmo, para o PAN, o caminho é claro: os impostos, sobretudo, e os sacrifícios devem recair sobre
o carbono e não sobre os salários ou sobre as empresas. Nesse sentido, para nós, o caminho deve ser o da
transição energética e não o da repetição de receitas do passado.
Por isso mesmo, Sr. Ministro, antes até de lhe colocarmos algumas questões relativamente a este
Orçamento, há também matérias sobre as quais não queremos deixar de fazer perguntas. Desde logo, quanto
à execução do próprio Orçamento de 2020, pois há matérias que são muito importantes para a vida das pessoas,
nomeadamente a da tarifa social de energia. Gostaríamos de perceber quando é que, efetivamente, vai ser
executada esta medida. Outro exemplo é o da licença para a reestruturação da vida familiar das vítimas de
violência doméstica.
Sr. Ministro, entrando no Orçamento do Estado para 2021, gostaríamos de lhe perguntar se vai continuar a
dizer à classe média que não há dinheiro para aliviar a carga fiscal, nomeadamente através da revisão dos
escalões do IRS, ao mesmo tempo que vai continuar a dar borlas às atividades e às indústrias poluentes, como
o imposto sobre os produtos petrolíferos. Os apoios para a economia, no entender do PAN, têm de garantir a
transição energética com vista à adoção de práticas ambientais mais sustentáveis. Ouvimos hoje aqui falar da
TAP e deixe-me dizer-lhe que há 500 milhões de euros previstos para a TAP, mas continuam a não existir, por
exemplo, contrapartidas ambientais.
Sr. Ministro, está ou não disponível para trabalhar, junto do seu Governo, no sentido de ir ao encontro de
uma medida que o PAN vai propor e que visa, precisamente, que existam estas contrapartidas ambientais?
Isto porque o Governo não pode, de facto, fechar os olhos à transição ecológica, que tem de ser feita e que
passa, necessariamente, por incentivos diretos às empresas nas diferentes áreas, seja na navegação e na
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aviação ou seja, por exemplo, na agricultura, sobretudo intensiva e superintensiva, para a reconversão em
modelos mais sustentáveis de produção.
Nesse sentido, gostaríamos também de saber se o Sr. Ministro nos acompanha ou não na criação de
incentivos e de apoios diretos para estas empresas e para a agricultura, por exemplo, para a recuperação de
habitats e de ecossistemas, para a recuperação e gestão adequada do habitat agrícola, porque, como é sabido,
há muito tempo que o PAN defende a necessidade de serem criadas ferramentas fiscais que exijam mais a
quem mais polui. Algo que, assim, permitiria precisamente cumprir com o Roteiro e as metas da neutralidade
carbónica, aliviando, ao mesmo tempo, impostos sobre o trabalho.
Uma outra questão que não podemos deixar de lhe colocar prende-se com a mobilidade, muito em especial
com a aposta na ferrovia.
Como o Sr. Ministro sabe, parte considerável das emissões de gases com efeito de estufa tem origem no
setor dos transportes. O PAN tem insistido particularmente nesta questão e, por isso mesmo, vamos propor a
criação de uma taxa de carbono aplicada às viagens aéreas e marítimas, cujo valor anual pode ascender a mais
de 100 milhões de euros.
Nesse sentido, Sr. Ministro, gostaríamos de saber se está ou não disponível para, com o Governo, nos
acompanhar no sentido de reverter esta taxa para o Fundo Ambiental e para que também possa ser aplicado o
desiderato de estender a ferrovia no plano nacional, nomeadamente a todas as capitais de distrito, ou, por
exemplo, na própria melhoria da qualidade da ligação ferroviária.
Sr. Ministro, não podemos terminar este debate sem trazer o tema das PPP rodoviárias, que têm sido um
negócio ruinoso para o País e que têm, neste Orçamento, mais 117 milhões de euros para o próximo ano, um
custo três vezes superior ao das estruturas que lhes estão associadas. Tal como sucedeu no Orçamento do
Estado de 2013, o PAN vai propor uma renegociação das PPP rodoviárias. Gostaríamos de saber se o Sr.
Ministro está ou não disponível para, na especialidade, trabalhar numa proposta que possa reduzir este encargo,
este ónus para o Estado.
Aplausos do PAN.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, eu não sei se é o Orçamento vegan ou se é outro qualquer. Sei uma coisa: sei que é o Orçamento mais fraco da história do Partido Socialista. E digo «mais fraco»
porque ele é aprovado nesta Assembleia, unicamente e exclusivamente, com o apoio de Deputados não inscritos
de um partido que nunca foi a eleições. Isso já devia dizer muito ao Partido Socialista sobre o resultado que aqui
teremos esta tarde em relação ao Orçamento do Estado!
Mas também nos devia fazer pensar porque é que, neste Orçamento que aqui nos traz, o Sr. Ministro aparece
hoje perante o País a dizer que a saúde é uma das grandes prioridades deste Orçamento. Mal seria se não
fosse, Sr. Ministro! No meio de uma pandemia, mal seria que a saúde não fosse a grande prioridade deste
Orçamento!
Mas, já que fala de saúde, o que é que este Orçamento nos dá para os mais de 1000 dias, em média, de
espera para consultas, que continua a existir no SNS? Absolutamente nada!
Protestos do Deputado do PS Porfírio Silva.
O Sr. Ministro falou de municípios, disse que eram fundamentais para o combate à pandemia. Então, como
explica que este seja o primeiro Orçamento que reduz as verbas para o Fundo Social Municipal, numa altura em
que os municípios enfrentam um aumento enorme de despesas em termos de transportes escolares e em termos
de refeições? Como é que vamos diminuir as verbas para os municípios no momento em que lhes pedimos que
lutem, finalmente, contra a COVID-19?
Protestos de Deputados do PS.
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Mas digo-lhe mais, Sr. Ministro: 40% da hotelaria e do turismo teve de despedir funcionários este ano —
40%. Nunca aconteceu na história de Portugal — 40%! E a medida que o Governo apresenta para recuperar
esses despedimentos é um «IVAucher». Parece brincadeira, mas não é, Sr. Ministro. Como é que vai ajudar
este setor? Qual é o impacto desta medida? Qual vai ser a liquidez do aumento que vai haver para este setor?
Praticamente nula, porque, como o Sr. Ministro sabe, todo o setor lhe pediu a descida do IVA da restauração, e
o Sr. Ministro não o fez porque o Sr. Primeiro-Ministro não o permitiu e, muito provavelmente, porque sabe que
o Governo não se aguentaria. Essa é que é a verdade!
Portanto, não pode vir aqui dizer que a saúde é uma prioridade, que a hotelaria, o turismo e a restauração
são uma prioridade e que os municípios são uma prioridade, quando nestas três áreas fundamentais reduz
significativamente a verba em relação a todas.
Este é o Orçamento mais frágil da história do Partido Socialista! E só vai ser suportado porque há muitos
partidos nesta Câmara que têm medo de ir a eleições. António Costa tornou-se numa espécie de «agarrem-no,
senão ele vai-se embora», porque se ele se for embora, todos os outros partidos que aqui estão têm medo de
levar os portugueses às urnas, novamente. Quem vai apoiar este Orçamento do Estado só tem uma razão: o
medo de eleições em Portugal.
É a única razão para suportar este Orçamento do Estado.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes, para pedir esclarecimentos.
O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr. Ministro das Finanças, na discussão deste Orçamento do Estado com o Sr. Ministro começo por registar, com agrado, o facto de o Governo ter acolhido, no texto da
proposta de lei que agora estamos a debater, uma norma para excluir as entidades ligadas a offshore dos apoios
públicos criados no âmbito das medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia.
Trata-se de uma medida cuja preocupação foi insistentemente manifestada por Os Verdes junto do Governo
e que vem congelar, digamos assim, a injustiça e a imoralidade que o mecanismo dos paraísos fiscais
representa, pelo menos, a nível dos apoios públicos no âmbito da pandemia. De facto, se o nosso País não
serve para essas empresas aqui estabelecerem a sua sede fiscal, também as mesmas não devem servir para
receber apoios públicos do Estado.
De resto, todos estamos fartos de saber que as entidades que recorrem a este mecanismo fazem-no com o
propósito claro de não pagar impostos ou até de esconder a origem desse dinheiro, e muitas vezes com esses
dois objetivos. Não é, aliás, por acaso que o recurso a paraísos fiscais representa uma das formas mais comuns
de evasão fiscal internacional, estimando-se que haja uma concentração de 26% da riqueza mundial nos
paraísos fiscais.
Acresce, ainda, que os paraísos fiscais fragilizam, de forma substancial, as bases financeiras do Estado e
não criam riqueza para o País, colocando em causa as suas receitas e recursos que, de outro modo, poderiam
ser canalizados para investimento público em áreas absolutamente prioritárias, como serviços públicos e
políticas sociais. Por isso, Sr. Ministro, esta medida é importante, é muito importante, mas seria ainda mais
importante que o Governo se empenhasse em acabar com esta imoralidade, que permite que uns poucos vivam
em paraísos fiscais e que a generalidade viva num verdadeiro inferno fiscal.
Bem sabemos que o Governo português não pode acabar com os paraísos fiscais fora das suas fronteiras,
mas também sabemos que o Governo português poderia assumir um papel importante junto da União Europeia
e de outras organizações internacionais de que faz parte para, definitivamente, colocar um fim a esta imoralidade
que os paraísos fiscais representam também do ponto de vista da evasão fiscal.
Mas, Sr. Ministro, por falar em evasão e fraude fiscal, como certamente estará de acordo, mais justiça fiscal
pressupõe uma maior equidade fiscal, o que, naturalmente, exige um grande esforço no combate à fraude e à
evasão fiscais. E, como é referido, aliás, no Programa de Governo, o sucesso do combate à fraude e à evasão
fiscais constitui um pressuposto essencial para uma mais adequada repartição do esforço entre as famílias e as
empresas, condição para uma maior equidade fiscal.
Ora, estamos completamente de acordo com aquilo que é referido no Programa do Governo, mas o que
gostaríamos de saber, Sr. Ministro, é que medidas e que instrumentos se preveem em concreto, neste
Orçamento, para combater a fraude e a evasão fiscais.
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Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do PCP, o Sr. Deputado Duarte Alves.
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro das Finanças, o Orçamento proposto pelo Governo dá ao défice aquilo que falta na resposta ao País.
Os 6000 milhões de euros de redução do défice num só ano, sobretudo num ano em que enfrentamos uma
grave situação económica e social e, ainda por cima, num ano em que as restrições da União Europeia estão
suspensas, são a marca das opções do Governo PS que impedem a resposta aos problemas do País. A resposta
à necessidade de investir no SNS, concretizando a renovação e modernização de equipamentos ou a construção
de hospitais, há muito reclamados pelas populações que deles precisam e há muito anunciados às populações;
a resposta ao investimento na escola pública e nos serviços públicos, em geral; a resposta à necessidade de
valorizar os rendimentos dos trabalhadores e de apoiar quem mais precisa e também a resposta a uma política
fiscal mais justa.
E a medida da retenção na fonte não resolve nada nesse sentido. O que é preciso é atualizar os limites dos
escalões de IRS; prosseguir o caminho de reposição dos 10 escalões, que existiam antes de o Governo
PSD/CDS ter agravado brutalmente o IRS; e, sobretudo, são precisas medidas que desagravem a tributação
sobre os rendimentos mais baixos e intermédios. Isso faz-se com o aumento do mínimo de existência e da
dedução específica, que está congelada desde 2010, em prejuízo dos contribuintes.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!
O Sr. Duarte Alves (PCP): — O mínimo de existência e a dedução específica são os mecanismos que permitem desagravar a tributação, incidindo proporcionalmente mais nos rendimentos mais baixos.
É precisamente num momento como o que vivemos, de agravamento da situação económica e social, que é
preciso aumentar o rendimento disponível real das famílias, dinamizando a economia. Isso faz-se pelos salários,
pelas prestações sociais, mas também por uma política fiscal mais justa.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!
O Sr. Duarte Alves (PCP): — O PCP intervirá no sentido de avançar em 2021 por uma redução real do IRS, mas também por uma tributação mais adequada dos grandes lucros e do património de elevado valor.
A questão essencial é a de garantir que os lucros realizados em Portugal são taxados em Portugal, em vez
de se refugiarem em paraísos fiscais e offshore,…
O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Muito bem!
O Sr. Duarte Alves (PCP): — … que rendimentos sujeitos a taxas liberatórias não são taxados a percentagens inferiores à dos rendimentos do trabalho de valor idêntico ou até inferior.
Se os grandes pagarem os impostos que devem, é possível baixar os impostos para todos, particularmente
para quem tem rendimentos mais baixos e intermédios. É essa a política fiscal que defendemos. E o Governo?
Vai cumprir com o compromisso, assumido, de baixar o IRS em 2021? Vai acompanhar as medidas de alívio
fiscal sobre os trabalhadores e sobre os rendimentos mais baixos e intermédios? Vai defender que os lucros
gerados no País sejam tributados em Portugal, sem alçapões?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder a este bloco de questões, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, João Leão.
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O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Muito obrigado, Sr. Presidente. Agradeço igualmente aos Srs. Deputados as questões que me colocaram.
Em relação às questões da Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real sobre as alterações climáticas, sublinho que
as alterações climáticas e o ambiente são uma das grandes prioridades deste Orçamento e do próprio Plano de
Recuperação e Resiliência português e que, para isso, tiveram um contributo muito importante do PAN.
Queria ainda destacar, a esse nível, o contributo do PAN para caminharmos no sentido do fim das isenções
no ISP (imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos) que serão uma utilização poluente na produção
de eletricidade, e também a abertura do Governo para a questão colocada sobre a taxa de carbono na parte de
viagens aéreas e marítimas.
Também queria reafirmar o compromisso do Governo na aplicação da tarifa social de energia para os
desempregados, que foi um compromisso assumido com o PAN para 2020.
Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado do Chega em relação aos municípios, queria referir que,
apesar da crise económica e do impacto que está a ter nas contas públicas, as transferências para os municípios
aumentam 10% no próximo ano.
Aplausos do PS.
O Governo não hesitou em cumprir, pela primeira vez, as verbas previstas para o Fundo de Equilíbrio
Financeiro — transferências para as autarquias.
O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Não, não!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Pela primeira vez, o Governo cumpre as verbas previstas de transferência para o Fundo de Equilíbrio Financeiro. É um aumento de mais 10% das verbas neste contexto.
O Sr. André Ventura (CH): — Não é verdade!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Em relação aos setores de que o Sr. Deputado falou, há uma preocupação muito grande do Governo não só em estimular a atividade desses setores, mas também em os
apoiar na manutenção do emprego. Portanto, há uma dupla preocupação: a de dar mecanismos para ajudar
esses setores a manter os seus trabalhadores e, ao mesmo tempo, ter a atividade, fundamental para quererem
manter esses trabalhadores.
Relativamente às questões colocadas pelo PEV, Sr. Deputado José Luís Ferreira, queria destacar que no
Orçamento para 2021, e também em resultado da intervenção do PEV, já existe uma medida para vetar o apoio
às empresas localizadas em offshore, vedar-lhes o acesso aos apoios públicos — o PEV teve um papel
importante nesta medida.
Ainda no Orçamento para 2021, há uma medida de combate à evasão fiscal — e aproveito para também
responder a uma questão colocada pelo PCP — para empresas sem estabelecimento estável em Portugal, mais
uma medida que permite combater a evasão fiscal.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado Duarte Alves, do PCP, de facto, o Orçamento do
Estado para 2021 tem como prioridade responder à pandemia e à crise económica e social que ela coloca, pelo
que o Governo, e também em conversação com os parceiros, teve de centrar as grandes prioridades na resposta
não só à pandemia mas também à crise económica e social.
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Pois, exatamente!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Daí algumas opções que foram tomadas no sentido de recanalizar determinadas medidas para centrar toda a prioridade na resposta à pandemia e a quem foi mais
afetado por esta crise.
Relativamente às questões que colocou sobre o défice orçamental, é importante referir que a redução do
défice é feita exclusivamente pela via do crescimento da economia e do emprego.
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Excluindo os juros e as medidas do layoff que têm a ver com os subsídios, toda a restante despesa primária
cresce no próximo ano, para responder à crise, 4% face a 2020. Portanto, é uma medida do lado da despesa,
para financiar o investimento público, para financiar o SNS, para financiar a educação, ou seja, temos um reforço
bastante significativo da despesa nos serviços públicos, e também para apoiar as pensões e as prestações
sociais.
Queria também dizer que Portugal é dos poucos países — e isso também tem a ver com a forma como
chegámos a esta crise — que, na Europa, apresenta um Orçamento que é claramente anticíclico, que não tem,
ao contrário de outros países, uma redução do défice estrutural, porque estamos apostados na recuperação da
economia e do emprego e na proteção dos rendimentos.
E fazemo-lo de uma forma que é sustentável e responsável.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Vamos passar a um terceiro bloco de pedidos de esclarecimento, aos quais o Sr. Ministro das Finanças já informou a Mesa de que responderá em conjunto.
Para esse efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lara Martinho, do Grupo Parlamentar do PS.
A Sr.ª Lara Martinho (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro das Finanças, gostaria de começar por saudá-lo pela apresentação deste Orçamento,
neste momento tão difícil, acima de tudo, por não ter optado por uma política de austeridade, que penalizaria
ainda mais as famílias, as empresas e os trabalhadores, mas, sim, por um reforço no combate à pandemia, na
proteção das famílias e no apoio às empresas.
Este é, sem dúvida, o Orçamento mais social dos últimos anos, que reforça o caminho que temos percorrido.
E, por isso, é tão impercetível que, à partida, o Bloco de Esquerda tenha desistido deste caminho.
Este é um Orçamento social, que apoia ainda mais as famílias e os trabalhadores quando aumenta o salário
mínimo nacional, diminui o IVA da eletricidade ou aumenta as pensões.
Mas não é apenas um Orçamento social, o que era já muito positivo tendo em conta o momento difícil que
vivemos, é também um Orçamento que olha para a economia, para as empresas, quando cria linhas de crédito
com o aval do Estado, quando prorroga as moratórias dos créditos bancários e as medidas de apoio ao emprego
ou quando não aumenta os impostos.
Sr.as e Srs. Deputados, vivemos um tempo muito difícil, um tempo em que ninguém pode ficar para trás, em
que nenhuma região pode ficar para trás. E porque é nos momentos difíceis que sabemos quem está ao nosso
lado, é importante enaltecer que, mesmo estando o País a viver esta tormenta, não esquece as regiões
autónomas.
Uma vez mais, este Governo demonstra que está ao lado dos Açores e da Madeira quando cumpre a Lei das
Finanças Regionais, quando transfere um volume nunca antes visto de fundos europeus, quando garante que o
financiamento para o combate à COVID-19 não é contabilizado para o nível de endividamento, quando
cofinancia em 50% o novo hospital da Madeira e comparticipa os estragos provocados pelo furacão Lorenzo nos
Açores ou quando comparticipa as ligações aéreas interilhas ou financia o subsídio social mobilidade.
Este é o caminho que iniciámos há cinco anos e que queremos continuar. É o caminho que garante que os
Açores e a Madeira dispõem dos instrumentos necessários para ultrapassarem com confiança os grandes
desafios que têm pela frente.
Mas, Sr. Ministro das Finanças, como todos os bons Orçamentos, este Orçamento pode e deve ser
aperfeiçoado e melhorado na especialidade, e é isso que faremos nas próximas semanas, em defesa dos Açores
e da Madeira.
É que ainda existem preocupações que persistem. É importante salvaguardarmos e concretizarmos, de forma
clara, questões como a continuação e o aprofundamento da descontaminação na ilha Terceira, o
desenvolvimento da segunda fase da construção do Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada, a aceleração
da construção da nova esquadra de Machico ou a garantia do acesso das universidades das regiões autónomas
aos fundos europeus.
Sr. Ministro das Finanças, estes, entre outros, são importantes investimentos para as nossas regiões e, por
isso, é tão relevante o Governo continuar a demonstrar o seu apoio aos Açores e à Madeira.
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Estamos certos de que assim será.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Entretanto, o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo pediu a palavra. Para que efeito?
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, antes da nova ronda de pedidos de esclarecimento, pedi a palavra porque penso que estas sessões…
O Sr. Presidente: — Qual é a figura regimental que pretende usar?
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — A da interpelação à Mesa, porque o Sr. Ministro das Finanças, certamente por lapso, espero eu, e não por outro motivo…
O Sr. Presidente: — Qual é a figura regimental que está a utilizar?
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — A da interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos. Sr. Presidente, gostaria de pedir ao Sr. Ministro das Finanças que respondesse à pergunta que fiz sobre a
TAP.
O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro, depois, se entender, responderá na altura devida.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Era melhor que fosse não só «se entender», porque é uma pergunta importante para as finanças públicas e para o dinheiro dos contribuintes.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa, do Grupo Parlamentar do PSD.
A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Ministro das Finanças, o seu Governo continua a comportar-se muito mal com a Madeira e a ser muito pouco
solidário com os madeirenses.
Depois de, no início da pandemia, ter recusado todos os pedidos de ajuda da Madeira, pois recusou a
moratória ao PAEF (Programa de Assistência Económica e Financeira) e recusou a concessão do aval ao
empréstimo COVID-19, vem agora apresentar uma péssima proposta de Orçamento do Estado para a Madeira.
Uma proposta que, entre outras coisas, contém uma norma anti-Madeira e que nenhum madeirense pode
aceitar.
Nenhum madeirense pode aceitar, Sr. Ministro, que o seu Governo, em plena pandemia, pretenda transferir
encargos e competências da República para a Madeira, sem o correspondente envelope financeiro, como os
relativos aos cuidados de saúde e aos medicamentos da PSP (Polícia de Segurança Pública), da GNR (Guarda
Nacional Republicana) e das Forças Armadas. Sr. Ministro, nenhum madeirense pode aceitar este
comportamento, nenhum madeirense pode aceitar que o Governo continue sem pagar os 20 milhões de euros
que deve à Madeira relativamente a estes subsistemas.
Sr. Ministro, esta atitude do empurra para a Madeira é de uma enorme gravidade e injustiça e já deveria ser
mais do que suficiente para justificar o voto contra de qualquer madeirense a este Orçamento.
Mas, Sr. Ministro, ainda há mais a lamentar para a Madeira, neste Orçamento. O seu Governo continua a
prever menos de 50% para o novo hospital da Madeira e, ilegitimamente, a deduzir aos 50% prometidos o valor
de duas unidades hospitalares da Madeira.
O seu Governo continua sem pagar um único cêntimo para o helicóptero da Madeira e a dizer no Orçamento
que apoia o reforço do combate aos incêndios na Madeira — vá lá saber-se como…
O seu Governo continua a ignorar e a omitir 10 compromissos aprovados por este Parlamento para a Madeira
no Orçamento de 2020, como a regulamentação do subsídio social de mobilidade, o ferry, o acesso a fundos
europeus por parte da Universidade da Madeira.
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O seu Governo continua sem pagar os gastos de saúde dos retornados da Venezuela.
Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Ministro das Finanças, a pergunta que os madeirenses fazem é quando, quando é
que o seu Governo vai mudar de estratégia e deixar de prejudicar a Madeira? E, já agora, Sr. Ministro, quando
é que o seu Governo vai pagar o que deve à Madeira e aos madeirenses?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, do Grupo Parlamentar do PCP.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças, o PCP já afirmou com toda a clareza que não desiste deste combate e
deste trabalho no debate orçamental para enfrentar os problemas nacionais e confrontá-los com a alternativa
que existe para lhes dar resposta.
Tal como temos sublinhado, é perante as opções concretas que o Governo tem de clarificar se é com o PCP
que vai convergir ou se é com outros que pretende alcançar entendimentos e convergências.
É sobre as opções concretas em relação às micro, pequenas e médias empresas que o questionamos.
Quando se torna cada vez mais evidente a urgência de apoiar estas empresas, de não abandonar estes
pequenos e microempresários e os trabalhadores, é preciso que o Governo se defina quanto às medidas
concretas que, afinal, vai assumir neste Orçamento para responder aos problemas gritantes que estão a
enfrentar.
Vão, finalmente, ser garantidos os apoios e, principalmente, a eficácia da sua aplicação, a chegar ao terreno,
lá nas empresas onde fazem falta? Vai haver vontade política para verdadeiramente passar à prática sem mais
perdas de tempo? Ou vão continuar as respostas limitadas, insuficientes, tarde e a más horas, empurrando os
problemas para a frente?
É essa a questão que nesta matéria precisamos de ter bem clara no debate orçamental, Sr. Ministro!
Vão convergir com o PCP para acabar com as exclusões e discriminações no acesso das empresas aos
apoios? Ou vão continuar os critérios absurdos a afastar milhares e milhares de empresas e empresários, nas
normas regulamentares, nos regimes contabilísticos, nas decisões dos bancos?
Vão convergir com o PCP no reforço e na efetiva concretização das medidas de apoio aos sócios-gerentes
das micro e pequenas empresas? Ou vão manter-se os obstáculos, as burocracias, as complicações
processuais com que estes empresários são confrontados?
O Governo vai convergir com quem relativamente às questões da fiscalidade para as micro, pequenas e
médias empresas?
Vai assumir, outra vez, a visão restritiva, limitativa, de retrocesso até face à lei desta Assembleia, desde logo,
quanto à suspensão do pagamento por conta de IRC? Ou vai rever essa posição e aceitar finalmente essa
medida, tal como foi aprovada em junho deste ano, por proposta do PCP?
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Bem lembrado!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — A lei aprovada em junho, Sr. Ministro. Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo, não vale a pena falar genericamente em «proteger rendimentos» ou
em «apoiar as empresas», se, depois, no concreto, nas opções e nas medidas da política orçamental e da
política económica, as «convergências» forem, afinal, para impedir e não para concretizar as respostas aos
problemas do País, da economia nacional, dos setores produtivos e das micro, pequenas e médias empresas.
É por isso que, desde já, importa que o Governo assuma claramente de que lado se quer posicionar neste
debate orçamental. É que isto não é como começa, Sr. Ministro, é como acaba.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Costa, do Grupo Parlamentar do PS.
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O Sr. Hugo Costa (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro das Finanças, ao longo de um período significativo da nossa história mais recente, a
direita parlamentar tentou fazer-nos acreditar no Estado mínimo e insistiu no ataque ideológico ao investimento
público, tentando diabolizá-lo — o famoso diabo que aí vinha!
Hoje, alguns clamam por mais Estado, porque a crise torna qualquer defensor do neoliberalismo num
autêntico keynesiano.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Isso é que era bom!
O Sr. Hugo Costa (PS): — Veremos certamente isso nas próximas semanas, no debate na especialidade. Hoje, até o insuspeito Dr. Vítor Gaspar assina um estudo do também insuspeito Fundo Monetário Internacional,
a sublinhar que este é o momento do investimento público. Só o PSD, aparentemente, continua a acreditar na
austeridade, excetuando quando pede tudo e o seu contrário.
Esta afirmação não é mais do que a assunção plena do erro económico e social que foi a célebre estratégia
de «ir além da troica» e este é, reconhecidamente, o momento de afirmar as políticas públicas pela positiva,
apostando no investimento público de qualidade, com efeitos multiplicadores na nossa economia.
A atual situação pandémica criou uma crise económica e social, com causas externas. Esta situação colocou
novos e importantes desafios: são tempos de dificuldade mas, simultaneamente, de confiança, de resiliência e
de aposta na recuperação económica. A proposta de lei de Orçamento do Estado para o ano 2021, que hoje
debatemos, na generalidade, segue em direção a essa linha, assente numa política económica contracíclica,
que visa a recuperação económica e social.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Muito bem!
O Sr. Hugo Costa (PS): — Sr.as e Srs. Deputados, esta é uma proposta de Orçamento que, apesar da crise, não se poupa a esforços para apoiar os portugueses, nem deixa de aumentar o investimento nas áreas críticas
de serviço público, tendo a saúde como prioridade das prioridades. A aposta em novos hospitais é, por isso, um
exemplo. Além disso, devemos sublinhar o investimento na escola pública. O Orçamento que hoje aqui
discutimos prevê um forte crescimento do investimento público superior a 23%, um acréscimo de 1000 milhões
de euros. É por isso que a direita é contra este Orçamento. A direita é contra o investimento público, é contra
dar dinheiro ao Serviço Nacional de Saúde e é contra dar dinheiro à escola pública.
Queremos saber, Sr. Ministro, o que leva o Governo a adotar uma política contracíclica num momento de
crise, contrariando o modelo adotado na anterior crise. Não acha estranho que forças à esquerda prefiram neste
Orçamento entrar na fotografia de quem defende o Estado mínimo?
Os próximos anos serão decisivos para Portugal, tendo em conta que, em resultado das negociações
europeias, o País vai receber o maior pacote financeiro europeu de sempre, que pode chegar a 58 000 milhões
de euros.
Esta proposta de Orçamento dá continuidade a uma estratégia de aposta na ferrovia, crucial para a
descarbonização e para a mobilidade.
Este é, igualmente, um Orçamento que prevê o reforço do valor previsto para apoiar os passes sociais e a
redução das portagens do interior.
Outro setor que vai assistir ao maior investimento de sempre é o da habitação, assegurando o aumento da
oferta pública, que vai traduzir-se no avanço da concretização de um direito consagrado constitucionalmente.
Sr. Ministro, por fim, questiono-o se este é o Orçamento do Estado que lança a estratégia do Plano de
Recuperação e Resiliência e se o investimento público não é crucial para garantir o emprego e apoiar as
empresas.
Como é possível a direita parlamentar continuar a não compreender que esta é única solução para responder
a esta crise.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do PSD. Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Fonseca.
O Sr. Alberto Fonseca (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, naquela que será a maior crise económica das nossas vidas, e quando mais é preciso estimular
o crescimento da economia portuguesa, a principal bandeira deste Governo é uma não ação: não vamos
aumentar impostos.
O normal já não é só cobrar impostos, agora a nova normalidade para os Governos socialistas é aumentar
impostos. De tal forma que sente a necessidade de o anunciar como a sua principal bandeira.
Sr. Ministro e Sr. Deputado Fernando Anastácio, era o que mais faltava que, perante uma crise desta natureza
que o próprio Governo não se cansa de dizer que é diferente de todas as outras, o Governo aumentasse ainda
mais os impostos aos portugueses, naquela que já é a maior carga fiscal de sempre, e os afundasse ainda mais.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Não é verdade!
O Sr. Alberto Fonseca (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Ministro, por favor, não insultem a inteligência dos portugueses.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Alberto Fonseca (PSD): — Portugal já é dos poucos países em que não se baixam os impostos para responder a esta crise.
Se passarmos para a segunda medida que o Governo anuncia no seu Relatório do Orçamento do Estado, a
eliminação do agravamento das tributações autónomas, ela tem um impacto de 10 milhões de euros. Num
Orçamento de 100 000 milhões de euros, o Governo alivia a carga fiscal das empresas em 10 milhões de euros.
Esta grande medida corresponde a 0,01% do Orçamento, não do PIB (produto interno bruto), mas do Orçamento
do Estado.
Quando o Governo dedica esta imensa quantidade de dinheiro para apoio às empresas, é quase como se
quisesse apagar um incêndio com um borrifador. Parece mesmo que este Governo se está a borrifar para as
empresas, mas não para todas, porque há uma que escapa a esta clamorosa falta de apoios.
Trata-se de uma empresa que, nestes dois anos, e sozinha, recebe praticamente o mesmo apoio que todas
as outras empresas juntas. Chama-se TAP que, no entender do Governo, são os Transportes Aéreos da Portela
que, em 2020, recebeu 1200 milhões de euros e, em 2021, receberá um apoio de mais 500 milhões de euros, e
o Conselho das Finanças Públicas alerta para o facto de podermos não ficar por aqui.
O Governo intervém na TAP sem ter um plano de recuperação, mas o pior é que parte deste dinheiro nem
sequer está a ser aplicado em Portugal, mas no Brasil. Ao contrário do que fizeram outros países na Europa,
Portugal não salvaguardou que esse dinheiro fosse aplicado apenas em Portugal.
Na passada sexta-feira, na audição no âmbito da apreciação na generalidade, o Sr. Secretário de Estado
assumiu que, com o dinheiro que o Governo transferiu para a TAP, foram pagos custos operacionais no Brasil.
Recorde-se que a TAP tem lá mais de 750 trabalhadores e que se trata de uma operação permanentemente
negativa.
Por isso, porque isto é um escândalo e porque os portugueses merecem saber, pergunto: quanto dinheiro do
Estado português foi investido e gasto no Brasil?
Sr. Ministro, faço-lhe apenas uma pergunta e espero que responda mesmo: quantos milhões dos impostos
dos portugueses foram transferidos para o Brasil?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — É a vez de o Sr. Deputado Miguel Matos, do Grupo Parlamentar do PS, pedir esclarecimentos.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
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O Sr. Miguel Matos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr. Ministro das Finanças, o que quer dizer o PSD quando nos afirma que é contra um Orçamento de distribuição,
que apoie o rendimento?
O que está aqui em jogo é o que aprendemos da anterior crise, ou seja, se, como achavam, é preciso
empobrecer para sair da crise e, para isso, importa cortar, cortar, cortar ou se percebemos que não há procura
sem rendimento e que sem procura não há oferta.
O que está aqui em causa é se vencemos esta crise defendendo o rendimento dos portugueses ou se a
vencemos cortando no seu rendimento.
Protestos do Deputado do PSD João Moura.
Sim, foi isso que tentaram entre 2010 e 2015.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — 2010?!
O Sr. Miguel Matos (PS): — O rendimento disponível dos portugueses ajustado para a inflação caiu 10% e foi isso que revertemos a partir das eleições legislativas de 2015.
E, sim, quando chegaram as eleições legislativas de 2019, já tínhamos recuperado o rendimento disponível
real das famílias. E isto não reflete nem manuais gratuitos, nem passes mais baratos, nem outras medidas que
fizeram tanta diferença para o orçamento das famílias.
Não! O crescimento económico não foi um milagre, nem uma boleia da Europa. Foi graças à recuperação do
rendimento que voltámos a crescer mais do que a União Europeia, pela primeira vez desde que aderimos ao
euro.
Aplausos do PS.
Se isso nos deu um melhor ponto de partida para enfrentar esta crise, sabemos que é valorizando o
rendimento disponível que vamos voltar a crescer outra vez. E é isso que faz este Orçamento.
Fá-lo para quem trabalha — e, sim, Sr. Deputado André Ventura, para quem já tanto trabalhou, aumentando
o salário mínimo e as pensões mais baixas —, mas também o faz para quem perdeu o seu rendimento e o seu
trabalho e que precisa de mais e de novos apoios sociais, acima do limiar da pobreza.
Fá-lo aliviando o esforço fiscal, reduzindo o IRS retido na fonte e o IVA da eletricidade e fá-lo para quem
apoia a nossa cultura, a nossa hotelaria, a nossa restauração, através da devolução do IVA no «IVAucher».
Fá-lo para quem vive no interior, com descontos nas portagens, fá-lo para as jovens famílias, em que 11 000
crianças vão passar a ter creche gratuita.
Fá-lo também no acesso à saúde, com o fim das taxas moderadoras nos exames e fá-lo nos apoios à
contratação de jovens, com mais estágios e bolsas maiores. E tem de o fazer também com o investimento
público que, prevendo-se crescer 56%, pode igualmente criar muito rendimento.
Sr. Ministro, com a porta aberta a fazermos mais, em conjunto, à esquerda, na especialidade, não há dúvidas
de que este é um Orçamento totalmente diferente do que o que a direita fez na resposta à anterior crise, que
rejeita a austeridade, que combate a pandemia, investindo no SNS, que protege o emprego e cuida da economia.
Este é um Orçamento que, na sua conceção, valoriza as pessoas e o seu rendimento.
Podem estes ser os alicerces de uma recuperação tão rápida quanto duradoura e, sobretudo, inclusiva?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para formular o último pedido de esclarecimento ao Sr. Ministro, tem a palavra o Sr. Deputado António Ventura, do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. António Ventura (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, no passado domingo, o povo açoriano retirou a maioria absoluta ao Partido Socialista nos Açores.
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Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. António Ventura (PSD): — Esta derrota também é uma derrota do Governo da República,…
Aplausos do PSD.
… porque tem vindo a prometer e a comprometer-se com os açorianos desde finais de 2015 sem cumprir.
Sr. Ministro, é este o Orçamento que colmata o défice do POSEI (Programme d’Options Spécifiques à
l’Éloignement et l’Insularité) para os Açores em cerca de 10 milhões de euros?
Sr. Ministro, é este o Orçamento que tem verbas para a descontaminação total dos solos e aquíferos da ilha
Terceira?
Protestos do Deputado do PS Miguel Matos.
Sr. Ministro, é este o Orçamento que prevê os investimentos no Porto da Praia da Vitória?
Sr. Ministro, é este o Orçamento que reconhece a Universidade dos Açores como uma academia de uma
região ultraperiférica?
Sr. Ministro, é este o Orçamento que tem verbas para a construção efetiva dos dois radares meteorológicos
que faltam nos Açores?
Sr. Ministro, é este o Orçamento que cumpre o Plano de Revitalização Económica da ilha Terceira?
Sr. Ministro, fale aos açorianos, não opte pelo silêncio, porque os açorianos também são portugueses. Os
senhores acabaram de levar uma lição, uma derrota do povo açoriano!
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e das Finanças, João Leão.
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, em relação à questão colocada sobre a TAP, queria referir que, como está previsto este ano, serão emprestados à TAP 1200 milhões de euros,
no âmbito do acordo com a Comissão Europeia. A generalidade dos países europeus estão a dar, tal como
Portugal, apoios a estas empresas que foram muito afetadas por esta crise. São as empresas mais afetadas por
esta crise e esse apoio é dado de forma generalizada nos países europeus.
Mas sabemos que o PSD e a Iniciativa Liberal, pelos vistos, querem fechar a TAP, querem fazer com que
Portugal não tenha acesso a uma empresa que é tão importante não só para ligar Portugal às diferentes áreas
do mundo, mas também para a competitividade de Portugal e para ligar Portugal à diáspora.
Outro aspeto muito importante prende-se com a questão colocada pela Sr.ª Deputada Lara Martinho
relativamente às regiões autónomas. Aproveito para responder também ao Sr. Deputado António Ventura e à
Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa, dizendo que, apesar da crise e das condições financeiras mais difíceis,
o Governo cumpre a lei das finanças regionais no próximo ano, reforçando as verbas quer para os Açores, quer
para a Madeira, cria exceções ao limite de endividamento para ajudar essas regiões a fazer face à pandemia,
reforça, tem verbas e reafirma o compromisso em financiar o hospital do Funchal e, relativamente aos Açores,
reafirma o compromisso de financiar as despesas tidas no âmbito do furacão Lourenço.
Por outro lado, também é importante referir que haverá fundos europeus significativos para as regiões
autónomas, para além de outros. E, sim, este Orçamento tem verbas para concluir os novos radares, a
descontaminação, a obra do Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada, entre outros projetos que foram
referidos.
Em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado do PSD Alberto Fonseca, queria referir que o PSD é contra
um Orçamento que, diz, dá o que tem e o que não tem, dá tudo a todos. Mas só para o PSD é que se devia
cortar no aumento do salário mínimo, não se devia aumentar as pensões a dois milhões de pensionistas, ou
seja, não se devia criar este apoio extraordinário a pensionistas, não se devia fazer um novo apoio social que
protege quem ficou mais frágil.
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Para o PSD o que é, de facto, relevante é reduzir os impostos sobre as grandes empresas com lucros, as
poucas empresas que não foram afetadas por esta crise.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas os apoios são maiores!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Mas até o próprio FMI (Fundo Monetário Internacional) recomenda que, no contexto da crise, essa não deve ser a prioridade. Até o FMI de Vítor Gaspar reconhece que
essa não deve ser a prioridade.
Aplausos do PS.
Mas é essa a única preocupação do PSD.
Sr. Deputado, não é essa a forma de recuperar a economia no próximo ano. Recuperar a economia no
próximo ano é proteger os postos de trabalho das empresas, é ajudar as empresas que mais foram afetadas
pela crise a manter os postos de trabalho,…
O Sr. Duarte Marques (PSD): — Isso não está no Orçamento!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — … é ajudar ao financiamento das empresas e ter uma política económica contracíclica que apoie a economia, os portugueses e as empresas.
Em relação à questão colocada pelo Sr. Deputado do PCP Bruno Dias, queria também referir que, na parte
do apoio aos sócios-gerentes, já em setembro se conseguiu concretizar os primeiros apoios, que foram
aprovados no âmbito do Orçamento Suplementar. Podemos, neste âmbito, falar com o PCP no sentido de trocar
informação para perceber a importância desses apoios.
Também é importante destacar aqui uma medida que foi aprovada com o PCP, que foi o fim do PEC
(pagamento especial por conta), em 2019, e que foi muito importante para as micro e pequenas empresas.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isso foi pré-COVID!
O Sr. Ministro de Estado e das Finanças: — Queria também referir que, no âmbito do financiamento das empresas, em particular das micro e pequenas empresas, estamos disponíveis — e o Orçamento do Estado
prevê uma verba muito importante para empréstimos com garantias do Estado — para ajudar o financiamento
das empresas. Queremos fazê-lo com celeridade para ajudar as empresas a atravessar esta crise.
Finalmente, queria dar uma nota sobre a reação à crise, que foi referida pelos Srs. Deputados do PS Hugo
Costa, Lara Martinho e Miguel Matos. De facto, a nossa resposta à crise é muito diferente da resposta do PSD.
É bom haver alternativas. O PSD, quando chega a uma crise económica, entra em modo automático, em modo
austeritário. O PSD é contra uma política económica anticíclica, é a favor de uma política económica que
acrescenta crise à crise e que vai agravar as condições de vida dos portugueses e acentuar o desemprego.
Aplausos do PS.
Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.
Nós temos uma resposta alternativa que mostrou ser um grande sucesso quando, juntamente com os outros
partidos da esquerda, ajudou o País a sair da anterior crise.
Nesse sentido, mostrámos, na altura, que o conseguimos fazer e que tínhamos razão. Queremos, mais uma
vez, em conjunto com os outros partidos de esquerda, mostrar que existe uma alternativa a esta visão do PSD.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos a meio do debate orçamental. Esta tarde o Orçamento do Estado para 2021
será votado na generalidade.
Do debate tido até agora, podemos já concluir que daquilo que vemos à direita não há qualquer alternativa
para o Orçamento do Estado. Até agora, não apresentaram ideias e remeteram-se ao papel de comentadores.
O voto contra não será de oposição, será de resignação, a desistência de quem sabe que não conta para as
decisões determinantes do País. Mas engana-se quem pensa que o voto do Bloco de Esquerda se confunde
com o voto da direita. Nem se confunde ideologicamente, ao contrário do que sempre se passou quando o PS
se levantou com a direita para votar contra os direitos de quem trabalha ou para defender os benefícios do setor
financeiro, nem se confunde na renúncia à afirmação de uma alternativa.
Esta esquerda está longe da resignação ou da rendição. O nosso voto é pelo futuro, não pelo regresso ao
passado. Lutamos por aquilo que é essencial ao futuro do País e do nosso povo: reforço do Serviço Nacional
de Saúde; segurança para quem está aflito no desemprego e na miséria; defesa do emprego; proteção do Estado
da pilhagem financeira.
Como se percebeu ao longo do debate, o único partido que tem uma alternativa a este Orçamento do Estado
é o Bloco de Esquerda. Essa alternativa é um conjunto de reformas que a crise provou, de novo, serem urgentes
e que, ainda assim, o PS quer adiar mais uma vez.
Engana-se quem considera que é uma guerra, da mesma forma que está enganado quem acha que são
questões de pormenores. Estão em causa visões diferentes sobre a resposta que devemos dar às pessoas na
maior crise das nossas vidas.
Vamos, então, discutir, a sério, essas diferenças e mostrar como a proposta do Governo falha onde não
podia falhar.
O Sr. Primeiro-Ministro já reconheceu que esta crise expôs a excessiva desregulação do chamado «mercado
de trabalho», mas, quando o Bloco de Esquerda fez propostas concretas, o Governo respondeu com um
documento que mantém as regras da troica e da direita, que tiraram direitos aos trabalhadores.
O Governo não aceitou repor o valor das compensações por despedimento, que foi defendido pelo próprio
PS em 2012, mantendo os despedimentos low cost, impostos por Passos Coelho, que desprotegem os
trabalhadores.
Rejeitaram que ninguém fosse tratado abaixo da lei, recusando a reintegração do princípio do tratamento
mais favorável e nem a recente invenção do alargamento do período experimental, que foi negociado com os
patrões e com a direita, aceitaram retirar.
Perante uma crise que mostra a fragilidade das relações laborais e desprotege o emprego, o Governo quer
manter o essencial como está.
Estamos a assistir a uma enorme onda de despedimentos e o Governo prefere deixar as leis da troica em
vigor do que defender o emprego. Não o podemos aceitar! E, perante a crise social que se agiganta, a proteção
social que o Bloco de Esquerda propôs foi transformada no apoio extraordinário, pontual, que revê em baixa os
apoios sociais criados em 2020.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Em baixa?!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — A prova da sua fragilidade é que deixa sem resposta um casal de trabalhadores independentes em que ambos tivessem o salário médio antes da crise e, agora, um deles tenha
perdido os rendimentos. Ficam na pobreza e de fora deste apoio. Sabendo desta fragilidade, não a podemos
ignorar.
Mas há mais: a resposta social do Governo tem um impacto muito negativo na construção das carreiras
contributivas e pensões, mantendo, novamente, os cortes da troica no subsídio de desemprego. Porquê insistir
neste erro, sabendo a brutalidade da crise que estamos a enfrentar?
Na saúde, o Governo faz muitos anúncios, mas poucas concretizações. Para não entrar numa disputa de
números com o Governo, pusemos as ferramentas que temos à nossa disposição para perceber o que é
verdadeiro, e deve ser levado a sério, e o que é falso e, por isso mesmo, não deve ser considerado.
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Verificação dos factos, fact-checking: a Deputada Catarina Martins já aqui lembrou que não basta lançar
concursos, porque há vagas que ficam sempre desertas. Cerca de um terço das vagas ficam por preencher.
Isso deve-se às baixas remunerações no SNS face aos valores praticados no privado, explicando-se, também,
pela degradação das condições de trabalho, que levam à exaustão. O Bloco de Esquerda falou verdade.
O Sr. Primeiro-Ministro anunciou, ontem, que o orçamento do SNS aumentará 805 milhões de euros, em
2021. A conclusão é a de que os números do Governo são enganadores. A transferência para o SNS, no próximo
ano, com todas as exigências que a pandemia vai colocar, tem reforço de apenas 0,03% face ao executado. Irá
o Sr. Ministro das Finanças dizer que nos enganamos? É que é isso mesmo que está no Relatório do Orçamento
do Estado. E lá também diz que o reforço das despesas com pessoal é menor do que o previsto em 2020. Será
que são estes os enganos do Bloco de Esquerda, Sr. Ministro das Finanças?!
Nesse mesmo Relatório, os dados dizem ainda que, no total, não foi usado 1 cêntimo da despesa prevista
no Orçamento Suplementar para o Serviço Nacional de Saúde. É mais um engano nosso, Srs. Membros do
Governo?! É que, de cada vez que o Governo tenta desmentir o Bloco de Esquerda, o que está a atacar é o
Relatório do Orçamento do Estado que o próprio Governo apresentou. É a credibilidade dos dados do Governo
que fica em causa.
Já quanto aos profissionais do Serviço Nacional de Saúde, o Orçamento do Estado promete o reforço líquido
de 4200 profissionais, dos quais 1500 médicos.
Analisemos, então, como é que o Governo se propõe cumprir essa meta. Ontem, foi entregue ao jornal
Público a mesma calendarização que nos tinha sido entregue. Ainda bem que essa informação foi tornada
pública pelo próprio Governo, pois permite-nos agora constatar que o objetivo previsto no Orçamento do Estado
não será cumprido. Vejamos: dos 4342 profissionais com contrato anunciado, 1500 vagas para médicos vão a
concurso e cerca de um terço ficará por preencher, como o próprio Governo reconhece.
Estamos a falar, ainda, de uma aposentação de 434 médicos especialistas ao longo de 2021.
No total, falamos de um reforço apenas de cerca de 600 médicos no Serviço Nacional de Saúde, ao longo
do próximo ano.
E nas restantes profissões? O Governo vai regular o vínculo de 2200 profissionais, mas estas pessoas já
trabalham no Serviço Nacional de Saúde com contratos de quatro meses. Devemos-lhe o contrato, é certo, mas
não são um reforço líquido dos serviços. Do reforço líquido de 4200 profissionais, anunciado pelo Governo,
teremos, na melhor das hipóteses, apenas 1500 pessoas a entrar no SNS e, na sua maioria, só no último
trimestre de 2021. Enganar-se nas contas, é isto, Sr. Ministro, João Leão.
Isto quer dizer que o Orçamento do Estado não vai ser cumprido. E, já agora, desafio o Sr. Primeiro-Ministro
ou a Sr.ª Ministra da Saúde a provarem que estamos errados. É que já dissemos tudo isto ao Governo e nunca
nos conseguiram dar explicações.
Mais: nunca esclareceram, sequer, devidamente porque é que rejeitam propostas como a da dedicação
exclusiva dos profissionais, por exemplo.
Nós lembramo-nos do que foi a geringonça. Apoucada pela direita, teve a coragem de mostrar que havia um
caminho que permitia recuperar rendimentos e direitos, mas foi o Governo que há um ano recusou renová-la,
optando pela negociação anual dos Orçamentos sem metas comuns para a Legislatura. Pois bem, é isso mesmo
que estamos aqui a fazer.
Menos compreensível é que o próprio PS, que se desinteressou pela geringonça em 2020, a substitua pelo
anátema e pela hostilidade em 2021.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Isso é falso!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Aliás, os melhores momentos do debate de ontem foram quando quase todos os partidos, Governo incluído, tentaram falar aqui em nome dos eleitores do Bloco. Nós agradecemos a
preocupação de todos e de todas com os sentimentos do eleitorado do Bloco de Esquerda, mas é precisamente
porque respeitamos o mandato que dele recebemos que não podemos ignorar as falhas deste Orçamento do
Estado, num momento tão exigente.
Vozes do BE: — Muito bem!
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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Esta é a esquerda que cumpre a sua palavra. E à luz dessa exigência que o País pede, como se pode qualificar este Orçamento do Estado? Como diriam os fact-checkers, este é um
Orçamento enganador!
Parece ter uma nova prestação social, mas tem o apoio extraordinário e limitado que não chega a todas as
pessoas que dele precisarão. Parece defender o SNS, mas não lhe garante os meios e os profissionais para
fazer face à pandemia. Parece preocupar-se com quem trabalha, mas mantém a direita e a troica a mandarem
nas relações laborais. Parece defender o Estado do saco financeiro, mas continua a ter a porta aberta ao fundo
abutre Lone Star. Parece ser um Orçamento para enfrentar a crise, mas falha em áreas essenciais.
Pode este Orçamento deixar de ser enganador e passar no teste da realidade? As nossas propostas são
públicas e decorrem de um processo negocial, em que fomos absolutamente transparentes, já o disse: reforço
do SNS; defesa do emprego e proteção do Estado da pilhagem financeira; segurança para quem está aflito no
desemprego e na miséria; não deixar ninguém para trás.
São essas mesmas propostas que voltarão à mesa do Partido Socialista. A clarificação política será a
resposta a estas medidas urgentes.
Aplausos do BE.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente António Filipe.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não há pedidos de esclarecimento, pelo que vamos passar à próxima intervenção.
Pelo PS, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pereira.
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: No final de 2015, Francisco Louçã escreveu um artigo de opinião cujo título era Tudo depende da
Perspetiva e dava o exemplo da Torre de Pisa para concluir que: «O que é preciso é escolher porque a torre
continuará inclinada como antes. Mas nós teremos escolhido o que queremos».
Ora, lembro esta passagem para sublinhar precisamente que a perspetiva não altera a realidade. O Bloco de
Esquerda escolheu o que quis, conforme advoga o seu mentor. Escolheu a perspetiva de não valorizar o
Orçamento com mais apoios sociais desta democracia; escolheu a perspetiva de fingir que este não é o
Orçamento com mais investimento público desde 2010 e escolheu a perspetiva de ignorar o Orçamento do
Estado com o maior reforço do Serviço Nacional de Saúde desde 2015.
Foi esta a perspetiva que o Bloco de Esquerda escolheu, mesmo que a sua realidade tivesse sido pedir tudo
isto num processo negocial interrompido a meio numa peculiar e insólita desistência daquela que é hoje a
realidade do País. O anunciado voto contra é, por isso, o anúncio da desistência do País.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Já o líder do PSD ressuscitou o diabo. Votará hoje contra porque,
segundo ele, há tudo para todos e, ainda por cima, há aumento de salário mínimo. Para o Deputado Rui Rio um
Orçamento de crise, a pior das nossas vidas, não deve tentar dar o que pode ser dado para aliviar o sofrimento,
para combater a degradação dos indicadores sociais e para proteger a economia e o emprego.
Nas escrituras do líder do PSD, as políticas em tempo de crise devem ser aquelas que acrescentam mais
crise: a famosa e já cansativa estratégia da austeridade que, quando o consumo cai, escolhe o caminho de
retirar rendimentos; quando o mercado não gera condições de crescimento económico, o caminho é cortar na
despesa, negligenciando a relevância do investimento publico.
É verdade que o líder da bancada do PSD lembrou, numa entrevista a um jornal nacional, que o voto contra
no Orçamento do Estado é apenas uma birra do seu partido, numa espécie de crise de ciúmes encapotada,
abandonando os portugueses e juntando-se à perspetiva de Louçã e do seu Bloco e contra a realidade do País,
contra a realidade do Orçamento e sem nenhuma consideração pelo princípio da responsabilidade que os
tempos exigem.
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Se havia dúvidas sobre a realidade deste Orçamento, o Bloco de Esquerda e o PSD ousaram mostrá-la com
as perspetivas que decidiram escolher: um diz que é expansionista, porque dá tudo a todos, e o outro diz que é
contracionista, porque não dá o suficiente. Já o povo português, do alto da sua sabedoria, questiona porque uns
votam contra um Orçamento para cuja elaboração contribuíram, estrondosamente e à vista de todos, e outros
porque se arrogam de pilares da responsabilidade, como se fosse responsável abandonar trabalhadores e
empresas, sonegando rendimentos aos primeiros por dificuldades dos segundos.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o debate em torno do Orçamento do Estado para 2021 encerra outra
falácia que importa esclarecer e até desmontar.
Segundo algumas vozes, do PSD mas não só, não há nada para as empresas. É claro que se trata de uma
proclamação infundada. De resto, a avaliação desta questão não pode ser feita, aliás, não deve ser feita apenas
pelo que consta na proposta de Orçamento do Estado, mas também pelo Plano de Recuperação e Resiliência,
pelo Quadro Financeiro Plurianual e, não menos importante, pelo Orçamento Suplementar.
Aliás, ninguém compreende que o PSD não queira aproveitar todos os meios disponíveis para estimular a
atividade económica, venham da Europa ou venham do Orçamento do Estado. É, por isso, mais uma
proclamação incompreensível do baú da sua propaganda.
O Grupo Parlamentar do PS e este Governo têm consciência da importância dos estímulos à atividade
económica como eixo central para a recuperação do País. Por sua vez, não temos nenhuma dúvida do papel
das empresas na agenda que estamos a construir para o crescimento económico e para a criação de emprego.
Contudo, contrariamente à visão monolítica de alguma oposição, entendemos que os incentivos à atividade
empresarial não são apenas, nem devem sê-lo, de índole fiscal ou, mais especificamente, de redução do IRC.
A demonstração desta falácia está clara no balanço dos últimos quatro anos da anterior Legislatura, em que o
investimento privado bateu recordes em democracia e cresceu bastante acima da média da União Europeia,
tudo isto sem qualquer redução de IRC e com as políticas públicas que recuperaram a confiança das empresas,
confiança que estava completamente esfrangalhada com as políticas da direita.
Risos do Deputado do PSD Cristóvão Norte.
Sr. Presidente, em nossa opinião, demonstrada por factos, há um mix de políticas que podem contribuir, de
forma decisiva, para o crescimento económico através do dinamismo empresarial. Além disso, neste tempo de
pandemia em que a proteção da atividade económica tem estado na primeira linha de combate deste Governo,
os mecanismos que foram bem sucedidos na primeira fase da crise sanitária serão mantidos e, em alguns casos,
reforçados, porque demonstraram ser os mais adequados às circunstâncias, designadamente o layoff, que já
beneficiou mais de 115 000 empresas, mais de 80% de micro empresas e quase um milhão e quatrocentos mil
trabalhadores, além, naturalmente, das moratórias bancárias e fiscais ou da aceleração nos pagamentos de
fundos europeus.
Para esta fase que se segue, o caminho é para prosseguir, com medidas concretas, a saber: em resposta às
dificuldades na procura, serão introduzidos mais de 500 milhões de euros de incentivo ao consumo, em que se
destaca o «IVAucher», é claro, mas também um conjunto de medidas que aumenta o rendimento disponível,
onde se destacam mais salário mínimo ou mais pensões ou até creches e passes, que deixam de pesar tanto
no orçamento familiar; para as dificuldades de investimento privado, reforça-se o crédito extraordinário ao
investimento e afeta-se quase 6000 milhões de euros do PRR para mecanismos de incentivo às empresas; para
a exiguidade do mercado, reforça-se o tremendo esforço de investimento público (são mais 23%, o que gera a
procura que o setor privado não tem hoje condições, nesta fase, de criar); para promover a internacionalização
e combater a queda nas exportações é introduzido um incentivo fiscal temporário; para o necessário reforço da
capitalização das empresas são lançadas, em 2021, novas linhas de crédito com garantia pública de 6000
milhões de euros (estamos a falar em triplicar as garantias já concedidas a juntar ao que já existe); para a
eficácia e justa distribuição destas medidas cria-se o Banco de Fomento, que a direita nunca foi capaz de
concretizar.
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Sr. Presidente, é esta a resposta às necessidades das empresas. Não é proclamatória, é factual e pode ser
demonstrada.
Aplausos do PS.
Protestos do Deputado do PSD Jorge Paulo Oliveira.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para formular um pedido de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Silva, do PSD.
O Sr. Carlos Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Carlos Pereira, uma coisa é discurso, outra coisa é a verdadeira realidade dos factos,
a verdadeira realidade da vida das pessoas e das empresas.
O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Muito bem!
O Sr. Carlos Silva (PSD): — Os senhores insistem num discurso proclamatório, panfletário, anunciam bazucas financeiras, projetos faraónicos — muitos deles nem um simples estudo prévio têm —, mas, Sr.
Deputado, temos mesmo de ir à realidade e vou dar-lhe alguns números do que é a realidade da economia. Não
são números meus, são números do INE (Instituto Nacional de Estatística).
Regista-se a maior queda de sempre, catastrófica, do PIB no segundo trimestre de 2020, 16,3%, e face ao
primeiro trimestre, 13,9%. A procura interna decresceu.
Protestos de Deputados do PS.
Há 6000 milhões de moratórias na banca à espera de serem pagas e o Sr. Deputado anuncia um País
maravilhoso, anuncia investimento público.
Os senhores foram responsáveis, depois de um mandato a impedir a modernização dos serviços públicos,
como os transportes, deixando concursos na gaveta, desinvestimento na saúde, com consequências negativas
brutais no combate à pandemia, seja nos centros de saúde,…
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — É verdade!
O Sr. Carlos Silva (PSD): — … seja nos hospitais, e vem o senhor dizer aqui, hoje, que agora é que é, que temos investimento público, depois de terem impedido o País de evoluir!
Protestos do PS.
Mas vamos mais longe: o senhor fala na TAP. Sr. Deputado, sabe quanto está a custar a TAP aos
portugueses, por mês? São 100 milhões de euros!
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
O Sr. Carlos Silva (PSD): — Sabe quanto é que vai custar em dívida para o próximo ano, em princípio? Mais de 500 milhões de euros — isto no cenário-base do Sr. Ministro das Finanças. Sabe o que representa um
cenário-base? Representa, com certeza, outro tipo de cenários, muito superiores.
O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — É verdade!
O Sr. Carlos Silva (PSD): — O meu colega Alberto Fonseca colocou questões importantes sobre a TAP ao Sr. Ministro das Finanças. Gostaria que lhe respondesse.
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Mas ainda sobre o PRR — e agora volto-me para o Sr. Primeiro-Ministro —, ele é uma espécie de programa
para fazer o que ainda não foi feito. O Sr. Primeiro-Ministro, durante seis meses, não o fez,…
Protestos do PS.
… mas vem agora com investimento público, para os serviços públicos, fundamentalmente — por exemplo,
a estratégia de hidrogénio verde, que ninguém sabe o que é —, tentar tapar o sol com a peneira.
Sr. Deputado Carlos Pereira, pergunto-lhe se é através da bazuca financeira, que vai demorar alguns anos
a chegar, que vai acudir à crise financeira grave e à crise social e económica com que os portugueses se
defrontam no dia a dia.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pereira.
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Carlos Silva, obrigado por ter colocado uma pergunta.
Queria começar por lhe dizer que estou de acordo consigo, é preciso separar o discurso da realidade, e
começo exatamente por aí, começo, exatamente, pelo investimento público.
O Sr. Deputado parece querer esquecer-se de que o investimento público, na legislatura que o Sr. Deputado
apoiou, a do PSD/CDS, caiu 2000 milhões de euros, ou seja, 34%; na legislatura do PS, o investimento público
caiu 1% — 1%! Portanto, Sr. Deputado, penso que sobre investimento público estamos conversados.
Protestos do PSD.
O Sr. Carlos Silva (PSD): — Diga a verdade aos portugueses!
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Queria também referir ao Sr. Deputado o que disse sobre a TAP. Já foram amplamente discutidas neste Plenário as questões da TAP, mas ainda não ouvi — e muitas
oportunidades tiveram os Deputados do PSD — o que quer o PSD fazer sobre a TAP.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — A pergunta é: e o que quer o Governo fazer?
O Sr. Carlos Pereira (PS): — O Governo e o Grupo Parlamentar do PS são muito claros: queremos apoiar a companhia TAP, não queremos deixar cair a TAP. E sabe porquê, Sr. Deputado? Porque ela representa 2,6
mil milhões de euros das exportações portuguesas, aquilo de que os senhores tanto gostam, e se o que querem
é criar uma companhia estrangeira perdemos logo 2,6 mil milhões de euros, que faltam, naturalmente, para o
investimento público e para a atividade social.
Portanto, o que é verdadeiramente relevante aqui é que o PSD não saia deste debate, depois de tantas
perguntas sobre a TAP, sem dizer o que quer fazer com ela: se quer acabar com a TAP, se quer despedir os
trabalhadores todos ou se quer encontrar uma solução para a TAP.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Sobre as empresas, que me parece um debate muito relevante, é muito importante também que o PSD
esclareça se não quer os meios financeiros que foram obtidos com grande esforço pelo País e com grande
determinação pelo Primeiro-Ministro junto da União Europeia. O PRR significa uma grande conquista para o
País, são mais de 12 000 milhões de euros que estão disponíveis e o Primeiro-Ministro já disse, de forma muito
clara, que quase 50% desses meios são para apoiar as empresas.
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Sr. Deputado, vou dizer-lhe uma coisa: sabe quanto é que o País executou no PT 2020 em relação às
empresas? Executou 6000 milhões de euros. O que estamos a fazer é duplicar esse valor, o que significa que
o País vai ter de executar 2000 milhões de euros por ano para apoio às empresas.
Aplausos do PS.
Termino dizendo o seguinte, Sr. Deputado: não nos esquecemos que os Srs. Deputados e o Governo anterior
incluíram no PT 2020 16 000 milhões de euros em instrumentos financeiros. Chegámos a 2018 e não tínhamos
gasto nada!
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Zero!
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Tivemos de fazer uma reprogramação senão perderíamos o dinheiro! E estou a dizer isto porquê? Porque temos todos de entender que há um limite pelo qual o setor privado e as empresas
não conseguem utilizar os meios públicos, portanto, o que está aqui em causa é um esforço colossal dos
diferentes programas para apoiar a atividade empresarial. E não é apenas isto. É natural que haja um conjunto
de apoios neste Orçamento do Estado que são de índole fiscal e que têm, obviamente, como consequência um
apoio direto e imediato à economia portuguesa.
Termino lembrando ao Sr. Deputado que o combate a esta crise foi feito, sobretudo, protegendo a economia:
foram utilizados 2000 milhões de euros para o layoff, além de moratórias fiscais e moratórias bancárias, e
continuará no próximo ano com mais 1000 milhões de euros do novo layoff. Portanto, parece evidente que as
empresas que estão lá fora estão conscientes do esforço que o Governo está a fazer e não querem pôr em
causa os apoios financeiros que venham da Europa ou que venham de outro sítio qualquer.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, a Iniciativa Liberal já o disse: este é um Orçamento que atrasa a recuperação e adia
Portugal.
O Governo do Partido Socialista disse que o combate à crise teria três fases: a fase de emergência, a de
estabilização e a de recuperação. Supunha-se que estas fases teriam uma ordem cronológica, ou seja, viriam
uma após outra, mas a triste realidade é que estamos a andar às voltas, a andar para trás, a andar para os
lados, tudo menos andar para a frente.
Na fase de emergência não se aprendeu nada. Durante meses alertámos que, acorrendo à pandemia o SNS,
se deixou de cuidar de centenas de milhares de portugueses, 7000 dos quais entraram tragicamente na lista
das mortes a mais por explicar, mas só agora a Ministra da Saúde aceita recorrer ao restante sistema de saúde,
privado e social, uma teimosia ideológica que custou vidas, o que num país com outra exigência já teria tido
consequências políticas.
A fase seguinte, que nos disseram que seria de estabilização, afinal era, e é, de confusão. É difícil encontrar
algo mais errático do que as orientações sucessivamente emanadas pelo Governo. Nem teria tempo para as
listar aqui, hoje, mas todos se lembram das inexplicáveis diferenças de tratamento quanto às máscaras, às
visitas a idosos, aos aviões, arraiais, «Avantes!», touradas, futebol, grávidas, Fórmula 1 e menores em risco.
E o delírio continua: as medidas de limitação de circulação para este fim de semana estão tão bem pensadas
que significa que é possível ir ao concelho ao lado para ver um filme de artes marciais, mas não é possível ir
visitar os pais confinados que vivam ao lado desse mesmo cinema.
Protestos do Deputado do PS João Paulo Correia.
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Quer dizer, eu, enquanto titular de cargo político, poderia, porque querem atribuir-me um privilégio de político,
mas, desde já, recuso esse privilégio.
Agora, pensava eu, estaríamos na fase de recuperação. Mas qual recuperação? O País não vai recuperar
nem se vai desenvolver sem empresas privadas cada vez mais inovadoras, ágeis e produtivas, capazes de
pagar melhores salários às pessoas. Para estas empresas este Orçamento do Estado é uma mão-cheia de
nada!
Há dinheiro para tudo menos para a verdadeira recuperação da economia. Para a TAP há 1700 milhões de
euros — e não vai ficar por aqui —, o que é mais do dobro do que custou a medida de layoff para toda a
economia.
Para a função pública, que é uma clientela de sindicatos com votos, há 795 milhões de euros para aumentar
a massa salarial, o que é o dobro do alocado ao «IVAucher» e ao crédito fiscal ao investimento e 20 vezes —
20 vezes! — do alocado ao IRS Jovem e ao IRS para o segundo filho. Estamos conversados sobre as prioridades
deste Orçamento.
O Sr. João Oliveira (PCP): — A sua intervenção deveria ser espalhada pelos hospitais!
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Mas não há só medidas tímidas, há também medidas cínicas, aquelas que fingem que são o que não são.
A redução da retenção na fonte, que finge que é uma redução de impostos; a majoração fiscal dos custos da
internacionalização, que finge que alguém vai passar a investir na internacionalização porque vai poupar 2% ou
3% daqui a um ano; as injeções de capital no Novo Banco, que fingem que 476 milhões de euros vão ser
suficientes e que a Caixa Geral de Depósitos não é dos contribuintes.
Há uma frase no Relatório do Orçamento, logo ao princípio, que diz tudo sobre o que as empresas podem
esperar deste Orçamento. No capítulo «apoiar as empresas», a primeira medida é esta: os impostos não vão
ser aumentados. Obrigado, Partido Socialista! É muita generosidade vossa.
Este é o Orçamento em que fica clara a fatura da geringonça, em que fica claro o que tem custado ao País
o apoio do Bloco e do PCP aos Governos do PS. Nas dezenas de medidas propostas pela extrema esquerda
não há uma que não aumente a despesa e não há uma que favoreça o investimento ou o emprego qualificado.
Este é, também, um Orçamento tecnicamente fraco e muito pouco transparente. Há dezenas de reparos da
UTAO e do Conselho das Finanças Públicas à solidez dos pressupostos, aos erros e à inconsistência dos
mapas, aos esclarecimentos que não chegaram e, por birra do Governo, segundo o próprio Ministro das
Finanças, há a eliminação do anexo dos impactos orçamentais que, a bem da transparência, continha a
quantificação das medidas orçamentais.
Neste ano, para o PS, acabou a transparência e devo dizer que hoje, neste debate, tivemos mais um exemplo
disso. Perante a pergunta concreta quanto ao que se passava em relação ao plano de liquidez da TAP, a
resposta foi zero, porque o Sr. Ministro das Finanças nem sequer se dignou a reconhecer a pergunta.
Tudo isto demonstra que o Governo e o PS estão desorientados. Há demasiadas eleições a distrair os
Ministros e os Deputados socialistas, sejam as presidenciais, as autárquicas, a sucessão de António Costa e,
agora, até as regionais dos Açores.
Numa altura em que Portugal precisava de um Governo mais esclarecido e determinado, o que temos é um
Governo e governantes desorientados e a pensar no seu próprio futuro político.
Portugal não se pode atrasar mais, nem a mudança pode ser adiada. Por isso, assumimos o nosso voto
contra este Orçamento, um Orçamento que atrasa a recuperação e adia Portugal.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Cristóvão Norte, do PSD.
O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Em tempo de crise, é imperdoável que este Orçamento ignore o papel central das empresas no relançamento da
economia, na criação de emprego e na construção de um País melhor. E isso é patente, de modo caricato,
mesmo ofensivo, quando o Governo se vangloria de que a razão que atesta a prioridade em apoiar as empresas
e proteger o emprego é a ausência de aumento de impostos. Ou seja, diz o Governo «sosseguem, o Orçamento
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socorre as empresas. Sosseguem, as empresas são prioridade. Sosseguem», diz, pelo desarmante motivo de
que não aumenta os impostos, o que é uma insólita audácia no meio deste naufrágio e traduz uma visão que
diminui a iniciativa privada como motor da sociedade.
Para este Governo, não aumentar impostos — num País no sufoco fiscal, quando as empresas lutam
desesperadamente para sobreviver, salvar os empregos, honrar os seus compromissos e ter determinação para
enfrentar o futuro — não é um direito, é uma clemência; não é um dever, é uma dádiva. Talvez este menosprezo
pelas empresas, a sua menorização, surja da necessidade do Governo em reestabelecer a maioria parlamentar
que lhe dá significado, cedendo, ano após ano e cada vez mais, aos impulsos de quem retrata as empresas
como meios de exploração orientados por propósitos perversos.
Pode ser também, simplesmente, que o PS seja outro, que tenha excluído a importância de promover a
criação de riqueza e o emprego por meio das melhores energias da sociedade.
Sei que, pelo contrário, o PSD encara as empresas, os postos de trabalho que criam e a economia social de
mercado como uma das mais felizes e libertadoras realizações do espírito humano,…
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — … que é essencial para construir uma sociedade justa, para uma adequada organização da comunidade e cuja prosperidade colabora na realização do catálogo de direitos sociais nucleares
como a saúde ou a educação. É nisto que dá, neste afastamento das empresas e, por via disso, na desproteção
do emprego, esta entorse de princípios basilares de uns, o PS, a favor de preconceitos datados de outros.
Portugal, presente e futuro, empresários e trabalhadores, todos sofremos com isto. Este é um Orçamento
hipotecado à solução política da geringonça, sacrificando o País.
O Governo é frugal para com os empresários e as empresas. O nosso Governo! Basta verificar o que se está
a fazer noutros países da União Europeia também em fase de debate orçamental. A esmagadora maioria, seja
mais de direita, de centro ou de esquerda, tem nos seus orçamentos medidas temporárias de reforço de
benefícios fiscais ao investimento e à criação de postos de trabalho, enquanto em Portugal o crédito fiscal
extraordinário caduca no fim do primeiro semestre de 2021.
Em Portugal, quando se alega a penúria de medidas para as empresas, o Governo, de pronto, responde:
«Não estão no Orçamento, estão nos fundos europeus, no Fundo de Recuperação e noutros». É o mesmo que
dizer que não há medidas ou que, se as há, é como se não houvesse, porque ninguém sabe quando virá o
Fundo de Recuperação nem quanto será possível executar em 2021, como e em quê.
As empresas e o emprego não podem esperar. Não podemos viver eternamente à espera de que venha de
fora o que tem urgência em ser resolvido cá dentro.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — E no que prevê, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o Orçamento do Estado desilude: a redução da tributação autónoma, que nem é para todas as empresas; o «IVAucher» para os
setores do alojamento e da restauração, que, pelos contornos da medida e pela representatividade dos setores
que se propõe abarcar, é escasso e por apenas três meses — esta medida está muito longe de firmar uma
resposta forte para minorar as dificuldades deste setor —; e até o programa específico para o Algarve, um
desígnio nacional anunciado também pelo Sr. Presidente da República, aqui anunciado em julho, ainda está por
apresentar e nem consta no Orçamento.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Bem lembrado!
O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Enquanto isso, por todo o lado, as empresas definham, o desemprego alastra e em determinadas regiões, como é o caso do Algarve, assiste-se a uma torrente avassaladora de
falências e à brutal destruição de emprego, uma região que, a nada ser feito agora, corre o risco de se
transformar num monte de escombros.
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O País está numa quebra sem precedentes e o Governo não é, obviamente, culpado dessa quebra. O
Governo é, sim, culpado de não cumprir a sua palavra e de fazer pouco para mitigar este desenlace socialmente
cruel e economicamente desnecessário.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!
O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — À COVID-19 junta-se o Governo. As empresas podem não aguentar tamanha conjugação de adversidades.
Aplausos do PSD.
O Governo tem de dar sinais às empresas e não palavras. É essa esperança que o Governo não dá, porque
as empresas, a capacidade instalada, têm de sobreviver para que, quando o tempo chegar, seja possível ter
uma recuperação mais veloz e ter melhor emprego, mais bem remunerado e com valor acrescentado. Mas o
Governo não só não apoia, ou apoia de forma insuficiente, como também castiga e impõe custos que fragilizam
as empresas.
Todos nós desejamos melhor emprego, mas, hoje, tão importante quanto isso é ter emprego, é preservá-lo,
é criar condições para que as empresas sobrevivam e não tornar a sua posição mais insustentável do que já é.
Isto não se resolve impedindo as empresas de se reestruturarem, mas ajudando-as a resistir. Por decisões
irrefletidas, não prejudiquemos a subsistência das micro, pequenas e médias empresas nem a sobrevivência
dos postos de trabalho. Não lhes apliquemos a pena capital.
Há uma grande diferença política. O PSD acredita nas melhores energias da sociedade, no papel das
empresas como motor de recuperação e num País que saiba balancear o presente e o futuro. E esse futuro só
se realiza com empresas que criem mais valor e melhor emprego.
Neste dilúvio que enfrentamos, que nada se recuse no cuidado às pessoas, mas muito mais se faça para
sobreviverem as empresas e para que se crie uma atmosfera em que outras nasçam e prosperem.
Não é isso que este Orçamento visa. As empresas estão desaparecidas em combate.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!
O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Este é um Orçamento que tem Siza de menos e Pedro Nunes de mais.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Não havendo pedidos de esclarecimento, tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Ministra da Saúde, Marta Temido.
Faça favor, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra da Saúde (Marta Temido): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de Orçamento do Estado que o Governo apresenta ao Parlamento reafirma a saúde e o Serviço Nacional de Saúde
como prioridades políticas, com reflexo nas escolhas financeiras para o País. Afirmamo-lo desde já, que os
portugueses não se enganem.
Num tempo em que todos os dias o Serviço Nacional de Saúde é duramente posto à prova, ao enfrentar uma
pandemia sem precedentes nos últimos 100 anos, os que escolhem votar contra este Orçamento fazem-no por
uma de duas razões: porque há muito preferiram procurar outro modelo de sistema de saúde ou porque
decidiram desistir de melhorar os serviços públicos de saúde. Definitivamente, nenhuma destas é a nossa
escolha, porque nenhuma delas serve o interesse do País e dos portugueses.
Aplausos do PS.
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Não desistimos de melhorar o Serviço Nacional de Saúde no futuro, como não o fizemos no passado. Não
foi para desistir daquilo em que acreditamos que tantos de nós fizemos o difícil caminho da aprovação da nova
Lei de Bases da Saúde.
Recordo que, entre 2015 e 2020, as dotações iniciais do Serviço Nacional de Saúde tiveram um reforço
médio anual de 6%, que reverteu a tendência de decréscimo anterior e permitiu que a despesa do Serviço
Nacional de Saúde aumentasse cerca de 2300 milhões de euros.
Esse crescimento traduziu-se, sobretudo, em investimento nos profissionais de saúde, o que justificou um
aumento da despesa de quase 1200 milhões de euros, um investimento em mais profissionais de saúde que
permitiu que, em setembro de 2020, o SNS tivesse mais 20 884 profissionais do que em dezembro de 2015, dos
quais só 5459 contratados desde dezembro de 2019.
Mas foi também um investimento em melhores condições de trabalho para esses profissionais de saúde,
porque os 140 882 profissionais de saúde que hoje trabalham no SNS já não estão sujeitos a reduções de
salários, a reduções do pagamento por trabalho suplementar e horas incómodas, à imposição de um horário de
40 horas semanais ou ao congelamento das suas carreiras.
Os 140 882 profissionais de saúde que hoje trabalham no SNS puderam ver, ainda na anterior Legislatura,
o esforço da criação da carreira especial de técnico de emergência pré-hospitalar, da carreira de técnico superior
de diagnóstico e terapêutica e da carreira farmacêutica; o esforço da abertura de concursos de progressão na
carreira médica, com 400 lugares para assistente graduado sénior e 2400 lugares para o grau de consultor; e,
já em 2020, recentemente, o esforço da abertura de concurso para mais de 900 vagas de promoção na carreira
de técnico superior de diagnóstico e terapêutica.
O que é isto senão investimento nas carreiras dos profissionais de saúde?
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Ministra da Saúde: — Tratou-se de um investimento em pessoas para servir melhor as pessoas.
Aplausos do PS.
E o resultado foi visível na atividade assistencial realizada pelo Serviço Nacional de Saúde, em 2019.
Nos cuidados de saúde primários, onde mais de 9,5 milhões de inscritos nos cuidados de saúde primários
tiveram médico de família atribuído, mais de 8,8 milhões tiveram enfermeiro de família atribuído e foram
prestadas mais de 31,5 milhões de consultas médicas.
Nos hospitais, onde as consultas externas aumentaram cerca de 2% e as intervenções cirúrgicas
ultrapassaram, pela primeira vez, as 700 mil.
Nos cuidados continuados integrados, onde o número de camas de internamento cresceu 5,4%, totalizando
mais de 9000 camas, e o atendimento de doentes subiu 3,7%; do mesmo modo que, nos cuidados paliativos, o
número de doentes admitidos na rede aumentou cerca de 8% e foram criadas mais três equipas intra-
hospitalares de suporte em cuidados paliativos-pediátricos.
O ano de 2020 trouxe o início da nova Legislatura e um Orçamento do Estado que cresceu 941 milhões de
euros face ao ano anterior, criando as condições para aplicar a nova Lei de Bases da Saúde.
Mas a emergência de saúde pública internacional, decorrente da pandemia de COVID-19, atrasou a
implementação de medidas planeadas.
A virtude de o sistema de saúde português ser baseado num SNS, maioritariamente financiado por impostos,
com prestação predominantemente pública e tendencialmente gratuito no ponto de contacto permitiu-lhe
capacidade de ajustamento à dinâmica das novas necessidades.
Aplausos do PS.
Há um ano, a linha SNS 24 atendia uma média de 3500 chamadas; hoje, atende uma média de 17 500.
Há um ano, os atendimentos não presenciais representavam 30% das consultas médicas não urgentes em
cuidados de saúde primários; hoje, representam 56%.
Há um ano, o número de ventiladores no SNS era de 1142; hoje, é de 1889.
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Há um ano, a lotação de camas de cuidados intensivos de adultos de nível III era de 463; hoje, é de 570,
numa capacidade flexível que tem em curso um plano de reforço de mais 200 camas.
Há um ano, quem não tinha a sua situação de residente regularizada não tinha número de utente do SNS;
hoje, todos aqueles que demonstrem ter dado início ao seu processo de legalização podem obter número de
utente.
Aplausos do PS.
O SNS demonstrou resiliência, e continuará a fazê-lo com novas respostas.
Em 2021, a dotação orçamental do SNS será reforçada em 1210 milhões de euros, face ao orçamento inicial
do ano anterior, o que significa 805 milhões de euros a mais, face ao Orçamento Suplementar.
Aplausos do PS.
O Sr. Primeiro-Ministro (António Costa): — Muito bem!
A Sr.ª Ministra da Saúde: — A sua execução será um exercício exigente, num contexto económico complexo. Mas as prioridades da ação governativa mantêm-se: qualificação do acesso; motivação dos
profissionais; investimento na rede do Serviço Nacional de Saúde.
Por isso, continuaremos o processo de eliminação faseada das taxas moderadoras, com a sua dispensa
também nos meios complementares de diagnóstico e terapêutica prescritos nos cuidados de saúde primários e
realizados no exterior, o que, conjuntamente com as opções já tomadas em 2020, terá um impacto de 94 milhões
de euros de perda de receita.
Por isso, continuaremos a oferecer uma carreira no SNS a todos os médicos recém-especialistas que
formámos e que, em 2021, estimamos que sejam 1700.
Aplausos do PS.
Discutiremos a possibilidade de aumentar, pela segunda vez, os incentivos financeiros para vagas médicas
carenciadas e a possibilidade de celebração de contratos de trabalho por tempo indeterminado com médicos
que não tiveram acesso à formação especializada.
Por isso, continuaremos a reforçar a força de trabalho em saúde, com a contratação líquida de 4200
profissionais para o SNS e de 260 para o Instituto Nacional de Emergência Médica, de acordo com o calendário
estabelecido.
Por isso, continuaremos a promover a organização do trabalho em unidades de saúde familiar e em centros
de responsabilidade integrados, associando incentivos a resultados de desempenho.
Por isso, continuaremos a investir nas condições de segurança dos profissionais de saúde, nomeadamente
reconhecendo o seu trabalho na primeira linha de combate à pandemia com a atribuição de um subsídio
extraordinário.
Por isso, continuaremos o programa de investimentos no Serviço Nacional de Saúde, que já permitiu que o
Hospital Pediátrico Integrado do Centro Hospitalar de São João, o Serviço de Urgência do Centro Hospitalar de
Tondela-Viseu, os novos aceleradores lineares do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra saíssem do
papel, permitindo, agora, que o processo de construção do novo Hospital Central do Alentejo e o lançamento do
concurso para a construção do novo Hospital de Proximidade do Seixal também se concretizem em 2021.
Aplausos do PS.
Também por isso, manteremos a saúde mental como prioridade política da Legislatura, dando continuidade
à implementação do Plano Nacional de Saúde Mental, com 19 milhões de euros de investimento inicial, num
esforço sem precedentes.
Muitas das escolhas que este Orçamento reflete resultam de um caminho percorrido com aqueles com quem
sempre pudemos contar para defender o Serviço Nacional de Saúde.
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Nas escolhas que cá não estão, separam-nos o tempo e não o modo, face a um momento em que a prioridade
é ultrapassar a pandemia.
Por isso, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, temos pela frente os dias mais exigentes das nossas vidas.
Este é o momento de estarmos juntos, pelos doentes COVID e pelos doentes não-COVID, pelos profissionais
de saúde, pela confiança na ciência, pela luta contra o medo e a intolerância.
É isso que se espera de nós, é isso que o SNS espera de nós.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Ministra, 11 Srs. Deputados e a indicação que foi dada à Mesa foi a de que a Sr.ª Ministra responderá em dois grupos, um
primeiro de 5 Deputados e um segundo de 6 Deputados.
Assim, tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, do CDS-PP.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra da Saúde, o ponto de partida deste Orçamento do Estado para a saúde é, inevitavelmente, a crise
pandémica, que hoje já não é um imprevisto.
Sabíamos que, sem confinamento, que ninguém deseja, e com a chegada do outono-inverno, a probabilidade
de aumento dos contágios era grande, e assim tem acontecido; que haveria um crescente número de
internamentos, quer internamentos hospitalares, quer em UCI (unidade de cuidados intensivos), o que tem, de
facto, acontecido.
Sabemos que há consultas, exames e cirurgias não-COVID por realizar, o que é reconhecido no texto do
Orçamento do Estado e na realidade, a que se acrescentam as listas de espera que já existiam previamente e
que ultrapassavam, largamente, os tempos máximos de resposta.
Era a isto, Sr.ª Ministra, que a ação governativa e o Orçamento do Estado deviam dar resposta.
No dia 21 de setembro, véspera do outono, a Sr.ª Ministra apresentou o Plano Outono-Inverno, totalmente
centrado no SNS, numa versão não consolidada, que também acabou por nunca ser consolidada, e da qual, na
verdade, nunca mais ouvimos falar.
Os números vão aumentando e também nunca mais ouvimos falar dos Srs. Secretários de Estado que tinham
sob a sua responsabilidade a coordenação regional da evolução dos números da pandemia. Seguramente,
andarão ocupados com outras coisas.
Apresenta agora o Orçamento do Estado, que, numas páginas do sumário executivo, diz que há um aumento
de 200 mil milhões de euros, noutras, mais à frente, há um aumento de 468, mas o que é facto é que o quadro
que refere quais são as transferências do Orçamento do Estado para o SNS mostra-nos que o aumento, este
ano, é zero, e é zero em ano de COVID.
Depois, aqui, temos tido este carrocel dos gráficos, com escalas bastante criativas — e, perdoem-me o inciso,
num Governo que tanto apregoa a transição digital, se calhar, não ia sendo má altura de projetar os gráficos nos
grandes ecrãs, porque não se conseguem ver e, afinal de contas, estamos aqui num anacronismo, mas também
não devem ser para nós vermos, porque isto é uma coisa entre os senhores e o Bloco e, portanto,
provavelmente, não é para termos de ver coisa nenhuma —, para nos dizerem que, desde 2015, houve um
aumento de 17% dos profissionais de saúde, mas nunca têm a seriedade de nos dizer que houve uma alteração
de monta, que foi a das 35 horas, e nunca nos dizem que muitos desses profissionais têm vinculações e não
contratações e, já agora, que, de facto, temos menos médicos no sistema do que tínhamos em janeiro, porque
o concurso de especialistas ou os concursos de medicina geral e familiar estão muito atrasados.
O Orçamento do Estado só fala no SNS e está tudo muito certo. Num dia, o Sr. Secretário de Estado Serra
Lopes vem dizer-nos que é mesmo assim, para estarmos descansados porque o SNS é elástico e, cinco dias
depois, vem a Sr.ª Ministra dizer-nos que a situação está a chegar perto do limite — e adivinhe-se porquê —
porque o SNS não é elástico.
Qual é a consequência que os senhores retiram desta gravidade? Sr.ª Ministra, onde é que está a task-force
prometida para a resposta não-COVID? Quando, no dia 4, chegarmos a esse limite da capacidade de
internamento, o que é que vai fazer? Vai montar tendas à entrada dos hospitais? Mas se, ainda por cima, 20%
dos profissionais de saúde estão infetados ou em isolamento profilático, quem é que vai cuidar das pessoas
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nessas tendas? Onde é que está um plano nacional de gestão integrada de todo o sistema de saúde, incluindo
privado e social, para que ninguém fique para trás? E, Sr.ª Ministra, eu sei, como a Sr.ª Ministra sabe, que não
houve, realmente, contactos para fazer esta contratualização.
Neste momento, Sr.ª Ministra, não há plano, não há coordenação e, em cada hospital, é o salve-se quem
puder. E o Orçamento do Estado, na opinião do CDS, não traz uma solução cabal.
Enquanto os senhores não acionarem o sistema de forma integrada e especializada, a variável de controlo
orçamental é a saúde das pessoas. E digo isto de uma forma muito simples: como não há mais dinheiro e a
solução está só dentro do SNS, a única hipótese é pôr as pessoas à espera.
A obstinação do Governo em não decidir vai pagar-se com pessoas à espera de cuidados de saúde, em
listas ou fora delas. Esta não é a nossa escolha, no CDS, nem de política pública, nem de política orçamental.
E lembro que cada dia que passa, cada dia em que o Governo não decide, há 5500 pessoas que ficam sem
consulta. Isto também dava um belo gráfico para o Sr. Ministro das Finanças aqui mostrar.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem, agora, a palavra, para pedir esclarecimentos, em nome do PS, a Sr.ª Deputada Hortense Martins.
A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Saúde, estamos, neste momento, num contexto complexo e todos temos de ter a responsabilidade de
responder às necessidades e aos problemas dos portugueses. E, Sr.as e Srs. Deputados, este Orçamento é
essencial! É essencial como instrumento de resposta às pessoas, às famílias e às empresas, e não se trata de
mera retórica!
Como todos nos recordamos, esta crise apanhou o mundo desprevenido. Mas Portugal pôde contar com o
nosso SNS, que tinha vindo a ser reforçado pelo Governo do PS e pela maioria de esquerda, que aprovou os
anteriores Orçamentos e defendeu o seu reforço de meios.
Naturalmente, isso foi essencial para responder à primeira fase da pandemia, para termos mais
equipamentos de proteção individual, ventiladores, laboratórios, vacinas, e conseguirmos mais profissionais de
saúde. São estes profissionais de saúde que, com a sua dedicação, cuidam das pessoas e as salvam.
E o que fazem, agora, alguns? Ignoram esta conjuntura difícil e querem pôr em risco este caminho. Os
portugueses não compreenderão isto, Sr.as e Srs. Deputados, não compreenderão aqueles que vão voltar as
costas ao reforço do SNS, não compreenderão aqueles que, neste Orçamento, lhes vão falhar e que vão votar
contra! Descolar desse caminho é não defender o SNS. Da direita, já o esperávamos, já conhecemos as receitas
do PSD, do CDS e dos restantes partidos que, agora, se juntaram à direita no nosso Parlamento. Mas o Bloco
de Esquerda escolheu voltar costas às dificuldades e, portanto, ao País.
Pelo muito que separa as soluções das governações de esquerda das soluções de direita, não
compreendemos esta situação. E não basta protestar, é preciso contribuir para as soluções.
Não esquecemos o ponto de partida, em 2015, quando o orçamento do SNS tinha despesa anual abaixo do
nível da de 2010 em 906 milhões de euros.
Não esquecemos que houve quem tivesse diminuído a despesa em saúde de tal forma que representava
uma austeridade ainda mais forte do que a contração do total da despesa pública. Isso foi feito sempre pelos
Governos de direita, repito, sempre pelos Governos de direita!
Quem sempre apoiou o SNS e o reforço do serviço de saúde foi o PS e os Governos apoiados pela esquerda.
É isso que queremos com este Orçamento, a continuidade desse caminho.
O PS inverteu o retrocesso que vinha a ser feito no Serviço Nacional de Saúde pelos Governos de direita. E,
neste Orçamento do Estado para 2021, alcançamos um valor de 12 100 milhões de euros para a saúde.
Estão, pois, errados os que não querem valorizar tudo o que foi feito, os que preferem não se comprometer
com estas soluções, que também são de apoio à economia e ao emprego.
Claro que não nos conformamos com o que ainda há para fazer. Por isso, temos de continuar a trabalhar
para alcançar esses objetivos. É este Orçamento que irá permitir melhorias nos cuidados de saúde primários,
na saúde mental e maior capacidade de resposta à pandemia. E não é só este Orçamento. Temos de nos
lembrar que temos mais instrumentos de apoio ao Serviço Nacional de Saúde e à saúde.
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Quero concluir referindo o Programa de Recuperação e Resiliência, que tem verbas importantes para a
saúde, no valor de 1038 milhões de euros, portanto, uma aposta na continuidade da prioridade à saúde.
Quem quer estar com o Serviço Nacional de Saúde e se importa com a melhoria da resposta prestada aos
portugueses tem de apoiar este Orçamento. E é isso que nós esperamos: continuar a fazer o caminho para
prestarmos melhores cuidados de saúde aos portugueses, que é o que os portugueses esperam de nós e desta
Câmara.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, a Sr.ª Deputada Paula Santos, do PCP.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): ⎯ Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Saúde, a solução para combater a pandemia, recuperar os atrasos na prestação de cuidados de saúde e assegurar o adequado
acompanhamento de todos os utentes é o Serviço Nacional de Saúde e não empurrar a prestação de cuidados
para os grupos privados, que estão a montar, juntamente com os partidos de direita, uma gigantesca campanha
para descredibilizar o SNS, com um único objetivo: aumentar os lucros à custa da saúde dos utentes.
Vozes do PCP: ⎯ Exatamente!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): ⎯ E a forma de não contribuir para esta campanha passa pelo urgente reforço do SNS com soluções concretas.
Uma das prioridades é o reforço do número de profissionais de saúde. O Governo fala da contratação de
4200 trabalhadores, mas, recordamos, este era o número que tinha sido previsto ainda antes da pandemia. Com
a pandemia, as necessidades aumentaram; por isso, insistir nos 4200 não é suficiente. A questão que lhe deixo
é se assume, ou não, o compromisso de contratar mais trabalhadores para garantir que os cuidados aos utentes
são de facto prestados.
Uma outra questão prende-se com o seguinte: foi aberto o concurso para a contratação de médicos para os
cuidados intensivos, o que é positivo, mas estamos a falar de contratações de pessoas que já estão no Serviço
Nacional de Saúde, não se trata de um acréscimo. Portanto, reforça-se de um lado, mas, depois, é necessário
adotar as medidas para que esses serviços não fiquem fragilizados. Que garantias dá que há um efetivo aumento
do número de trabalhadores?
O Governo tem feito malabarismo com os números. A calendarização com que o Governo se comprometeu
não corresponde à discussão que teve com o PCP. É importante vincular os trabalhadores com vínculo precário,
vinculação que deve abranger todos os trabalhadores nesta situação, como propomos. Mas não podemos
considerar como novas contratações a contratação de trabalhadores que já estão no Serviço Nacional de Saúde.
Por isso, mais uma vez, perguntamos: que garantias dá que as contratações que refere são mesmo as de novos
trabalhadores a acrescer?
Quantos médicos, enfermeiros, técnicos, assistentes técnicos e auxiliares técnicos de saúde serão
acrescidos efetivamente, considerando que há um elevado número de profissionais de saúde que estão em
condições de se aposentar num curto espaço de tempo e que as entradas não estão a suprir as saídas, em
particular no que diz respeito aos médicos?
Por exemplo, no último concurso de médicos de medicina geral e familiar houve mais candidatos que vagas,
mas o resultado final foi o de que ficaram 125 vagas por preencher. A questão volta a colocar-se: que medidas
pretende o Governo tomar para fixar os profissionais no SNS?
É preciso valorizar profissional, social e remuneratoriamente os profissionais de saúde para que queiram ficar
no Serviço Nacional de Saúde. Não é com contratos de quatro meses que se garante condições de trabalho
mas, sim, com direitos e estabilidade. Por exemplo, propomos a valorização dos trabalhadores que prestam
cuidados no Serviço Nacional de Saúde, através da atribuição de um suplemento remuneratório, não como o
Governo propõe, só para alguns, mas para todos os trabalhadores no Serviço Nacional de Saúde.
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É preciso valorizar e dignificar as carreiras, assegurar condições de trabalho, avançar no sentido da
implementação da dedicação exclusiva. Que compromissos assume o Governo nesse sentido? No Orçamento
do Estado não vemos uma única linha sobre isto.
Vivemos um problema de saúde pública e quer na sua intervenção, quer no Orçamento do Estado que foi
apresentado não se vislumbra uma medida concreta para reforçar as equipas de saúde pública.
A estrutura de saúde pública precisa urgentemente de ser reforçada, de ter capacidade de intervenção com
rapidez e eficácia. Por isso, perguntamos: vai proceder à contratação de enfermeiros e de técnicos de saúde
ambiental para reforçar estas equipas? Vai proceder à contratação de médicos indiferenciados para estas
equipas, possibilitando que possam, de facto, fazer a sua formação médica especializada nessa área? O
Governo está disponível para assegurar o pagamento do suplemento devido ao exercício das funções de
autoridade de saúde?
Aplausos do PCP e do PEV.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra, para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Moisés Ferreira, do BE.
O Sr. Moisés Ferreira (BE): ⎯ Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra da Saúde, o ano de 2021 será um ano sem igual e será o ano do maior desafio da vida do Serviço Nacional de Saúde.
Infelizmente, a proposta de Orçamento que o Governo apresenta não responde às exigências do momento,
nem às necessidades do Serviço Nacional de Saúde. Sabemos que, em 2021, o SNS tem de continuar a
combater a epidemia ⎯ como tem feito ⎯ e ela está a crescer. Mas sabemos também que tem de manter a sua
capacidade de atividade programada, porque não podem ficar à porta dos hospitais e dos centros de saúde os
utentes que necessitem de cuidados de saúde não relacionados com a COVID-19. E sabemos que tem de
recuperar milhões de consultas, de cirurgias e de exames que não foram feitos durante o ano de 2020. Tem de
fazer tudo isso e o Governo deveria dar ao SNS os recursos para o fazer.
Infelizmente, não dá, porque não é anunciando os mesmos investimentos que já estavam em Orçamentos
anteriores que se aumenta os recursos do Serviço Nacional de Saúde para o ano de 2021.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): ⎯ Muito bem!
O Sr. Moisés Ferreira (BE): ⎯ Não é prevendo uma transferência de mais 0,03% para o Serviço Nacional de Saúde que se vai responder aos desafios de 2021, não é anunciando a contratação de trabalhadores que já
estão no Serviço Nacional de Saúde que se vai aumentar a capacidade de resposta desse mesmo Serviço
Nacional de Saúde e não é recusando a autonomia de contratação das instituições, recusando a criação de
carreiras profissionais, recusando a valorização dos profissionais do Serviço Nacional de Saúde que vamos dar
recursos aos SNS.
A Sr.ª Ministra disse que a pandemia fez atrasar a implementação de algumas medidas. Até acreditamos que
seja mesmo assim. No entanto, o Orçamento que o Governo apresenta fez desaparecer várias medidas que já
constaram em Orçamentos anteriores, como, por exemplo, a exclusividade. Isso não é culpa da pandemia, é
culpa da proposta de Orçamento que o Governo trouxe a esta Assembleia.
Vozes do BE: ⎯ Muito bem!
O Sr. Moisés Ferreira (BE): ⎯ Não dar ao Serviço Nacional de Saúde os recursos que são os necessários é ⎯ e toda a gente sabe isso ⎯ acabar por transferir para os privados cada vez mais recursos. Não dar ao
Serviço Nacional de Saúde os recursos de que o Serviço Nacional de Saúde precisa é ⎯ e toda a gente sabe
isso ⎯ drenar os recursos para os transferir para o setor privado. Isso é que é desistir do Serviço Nacional de
Saúde, isso é que é desistir do nosso serviço público de saúde.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): ⎯ Desinvestir nas pessoas!
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O Sr. Moisés Ferreira (BE): ⎯ Com este Orçamento, e esta é que é a questão a que é importante responder, como pensa o Governo responder a quem espera, há meses, para aceder a uma junta médica? Como pensa o
Governo responder a quem não consegue contactar o seu centro de saúde? Dizendo que vai aumentar a
transferência para o SNS em 0,03%?! É poucochinho!
Com este Orçamento, como pensa o Governo responder ao aumento da pandemia ou aos profissionais do
SNS que estão com milhões de horas extraordinárias de trabalho às costas e que dizem «precisamos
urgentemente de reforços para conseguir aguentar o barco»? É anunciando, novamente e sempre, a contratação
das mesmas pessoas que já estão no Serviço Nacional de Saúde?! Não me parece que essa seja a resposta.
Infelizmente, com esta proposta de Orçamento, o SNS não terá os recursos para o enorme desafio de 2021.
Infelizmente, com esta proposta de Orçamento, o que acontecerá é uma transferência gigantesca de recursos
para o setor privado.
O Bloco, obviamente, não dará o seu voto a esta estratégia, mas, se o Governo estiver ainda disponível para
alternativas, o Bloco é, e tem, essa alternativa.
Aplausos do BE
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para concluir esta ronda de perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Cristina, do PSD.
O Sr. Rui Cristina (PSD): ⎯ Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra da Saúde, os portugueses vivem tempos dramáticos.
A COVID-19 já ceifou milhares de vidas humanas. O aumento da mortalidade no nosso País está confirmado
e reconfirmado pelos relatórios do Instituto Nacional de Estatística. Segundo dados oficiais do INE, de 2 de
março a 4 de outubro registaram-se 7474 óbitos acima da média do período homólogo dos últimos cinco anos.
Quase 7500 mortos, contudo, apenas 2018 resultaram da COVID-19.
Significa isso que, só em 7 meses deste ano, morreram mais de 5456 pessoas, em Portugal, do que no
mesmo período dos últimos cinco anos, sem estarem infetadas pelo SARS-CoV-2.
Anteontem, o Governo deliberou declarar o dia 2 de novembro como dia de luto nacional em memória das
vítimas da pandemia da COVID-19. Fez bem em homenagear os falecidos, mas a homenagem só é válida se o
País conhecer as verdadeiras causas do aumento do número de óbitos e questionar se este se deve ao
envelhecimento demográfico, às condições meteorológicas, a falhas nos cuidados de saúde provocadas, ou
não, pela pandemia da COVID-19 ou a recusas ao acesso do SNS.
Sr.ª Ministra, é fundamental conhecer a verdade. Por isso, pergunto-lhe se está realmente interessada em
conhecer as verdadeiras razões do aumento da mortalidade no nosso País, este ano, e agir rapidamente para
evitar que se repitam os erros grosseiros que se têm vindo a verificar.
Nas duas últimas semanas, o número de doentes com COVID-19 internados nos hospitais do SNS quase
duplicou: passou de 877 para quase 1700, num universo de 2120 camas afetas à COVID-19, o que representa
uma taxa de ocupação de cerca de 80% e, em muitos casos, mesmo superior a 90%.
Anteontem, a Sr.ª Ministra admitiu que já na próxima semana o número de doentes com COVID-19 internados
pode subir para 2634 ⎯ isso já para não referir a gravidade de haver 434 doentes internados em cuidados
intensivos, o que significa um aumento de quase 60% relativamente à data de anteontem. A verdade é que o
Governo tem dito, e tem repetido, que o SNS disporia de mais 17 000 camas susceptíveis de também receberam
doentes COVID-19, mas nunca advertindo que muitas dessas camas já estão ocupadas por outros doentes
internados.
O que lhe pergunto, Sr.ª Ministra, é se sabe quantas das referidas 17 000 camas estão neste momento
efetivamente vagas, isto é, disponíveis para poderem ser eventualmente afetadas aos doentes com COVID-19.
A Sr.ª Ministra afirmou que o novo centro hospitalar do Algarve iria deixar de ser uma miragem. Acontece
que, na proposta de lei do Orçamento do Estado para 2021, o novo hospital do Algarve permanece uma
miragem, e não sei se será uma mera alucinação. Sr.ª Ministra, pergunto-lhe se nos pode dar uma razão ⎯ que
não seja insultuosa para os algarvios ⎯ para não constar nada no Orçamento para 2021 sobre a construção do
novo hospital central do Algarve, porque há um ano a construção do hospital deixava de ser uma miragem e,
hoje, na proposta de Orçamento, é uma verdadeira omissão.
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Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem agora a palavra, para responder a estes pedidos de esclarecimento, a Sr.ª Ministra da Saúde.
A Sr.ª Ministra da Saúde: ⎯ Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, vamos ver se nos entendemos: de um lado, dizem-nos que não investimos no setor privado; do outro lado, dizem-nos que investimos a mais no setor
privado. De facto, acho que há aqui muita confusão que não aproveita a ninguém, ou, se calhar, aproveita a
alguns.
Passando ao que interessa: todos os sistemas de saúde — Portugal não é exceção — confrontaram-se com
aquilo a que se vai chamando «desprogramação da atividade». As Sr.as Deputadas e os Srs. Deputados leem a
comunicação internacional, leem sobre a evolução dos sistemas de saúde de outros países, portanto, constatam
isso com facilidade. A preparação para a pandemia obrigou à suspensão de atividade assistencial.
Neste momento, a oradora exibiu um mapa.
Sei que a letra deste mapa é pequena e que o mapa é ainda mais pequeno…
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares pede-me para dizer que todos os gráficos serão
disponibilizados no final, através da forma própria.
Mas este é um mapa que poderão encontrar no site da Organização Mundial da Saúde e do Observatório
Europeu dos Sistemas e Políticas de Saúde, que mostra, de facto, aquilo que cada país fez, na primeira fase da
pandemia, em termos de desprogramação de atividade assistencial.
Todos tiveram de fazer esse caminho, caminho esse que procurámos contornar durante os meses em que a
pandemia foi mais suave. Foi por isso que investimos no Serviço Nacional de Saúde não no Orçamento para
2021, mas no Orçamento Suplementar. E foi por isso que, no Orçamento Suplementar, afetámos uma verba
significativa à realização de atividade adicional pelos profissionais do Serviço Nacional de Saúde, dentro do
Serviço Nacional de Saúde!
Aplausos do PS.
Essa atividade adicional está a ser realizada por profissionais inexcedíveis, que têm tido a capacidade de
fazer aquilo que parece que os senhores têm tanta dificuldade em compreender e que, na verdade, é um
exercício difícil, que é a gestão flexível de camas. É assim que, no dia a dia, se passa a vida nos hospitais,
garantindo que cada doente tem a melhor resposta, com os meios disponíveis, face à sua exigência clínica.
Foi esta circunstância que permitiu que o desvio, face ao acumulado no período homólogo, em termos de
consultas médicas de cuidados de saúde primários, tivesse vindo a aproximar-se progressivamente. Se é certo
que, em maio, tínhamos um desvio, face ao período homólogo, de um milhão e quatrocentas mil consultas de
cuidados de saúde primários em 31 milhões, agora vamos com um desvio de 620 000 consultas em cuidados
de saúde primários face ao período homólogo. É muito, bem sei, mas continuamos a trabalhar para melhorar
esta situação, e contamos com os profissionais de saúde.
Em termos de atividade hospitalar, gostava de dizer-vos que, apesar de todas as dificuldades, os dados
provisórios do esforço que fizemos com o Programa de Estabilização Económica e Social, com investimento na
atividade adicional — o mesmo é dizer no pagamento por peça aos profissionais de saúde do SNS que se
disponibilizaram a colaborar na recuperação de atividade desprogramada —, permitem já verificar que foram
realizadas 6160 cirurgias e 12 189 consultas em atividade adicional. Mas, mesmo assim, precisamos de fazer
mais, e é por isso que nunca negámos o recurso a outros setores, quando os nossos hospitais, os tais que
acusam de não ter autonomia, precisam de recorrer ao setor privado e social.
Por isso, volto a mostrar-vos — parece que há dificuldade em ver — o clausulado-tipo para a adesão ao
acordo entre as ARS e as entidades privadas, que permite às nossas instituições recorrerem ao setor privado e
ao setor social, como estão a fazer. E estão a fazer bem e farão sempre bem desde que respondam às
necessidades assistenciais dos doentes!
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Aplausos do PS.
Sr.as e Srs. Deputados, a despesa pública em saúde tem aumentado, mas a despesa privada continua a
representar 26% do nosso esforço.
Claro que o nosso objetivo é o da internalização das respostas e claro que o fazemos, não por um preconceito
ideológico, mas porque acreditamos que isso responde melhor às portuguesas e aos portugueses. Mas, daqui
até lá, continuaremos a utilizar complementarmente os outros setores de atividade.
Em resposta ao Sr. Deputado Moisés Ferreira, direi que compensa ao Governo responder às questões que
lhe são colocadas como sempre tem feito: com dedicação plena. Com a mesma dedicação plena que utilizou
quando levei ao Conselho de Ministros um regime excecional de contratação de profissionais de saúde que
permite que cada instituição os contrate diretamente enquanto durar esta situação.
Aplausos do PS.
Com a mesma dedicação plena com que respondeu quando levei ao Conselho de Ministros a necessidade
de adquirir o medicamento Remdesivir, no valor de 35 milhões de euros.
Com a mesma dedicação plena com que aceitou investir na aquisição de uma vacina, que estará estimada
em 130 milhões de euros.
Ou com a mesma dedicação plena com que assumiu pagar 60 milhões de euros para todos termos os
equipamentos de ventilação invasiva que, durante anos e anos, não foi possível comprar.
Aplausos do PS.
Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, de facto, há muito para fazer, e este é um momento de enorme dificuldade,
em que muitas coisas permanecerão por executar no Orçamento para 2021. Mas estamos a agir rapidamente e
acreditamos que, para agir rapidamente, é fundamental conhecer a verdade, e a verdade é aquela que consta
deste Orçamento: um investimento nos serviços públicos na convicção de que são eles que melhor servem os
portugueses.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Vamos passar à segunda ronda de pedidos de esclarecimento. Tem a palavra, pelo PCP, o Sr. Deputado João Dias.
O Sr. João Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, a situação que se vive, hoje, nos cuidados de saúde primários é muito preocupante. Quando devíamos estar a caminhar no sentido de atribuir, a cada um
dos portugueses, médico e enfermeiro de família, estamos precisamente a engrossar a fila daqueles que não
têm médico e enfermeiro de família. Neste Orçamento, não vimos uma resposta a esta grande dificuldade, que
é a de atribuir médicos e enfermeiros de família, o que compromete a principal via de acesso ao Serviço Nacional
de Saúde.
Não faz sentido que os médicos de medicina geral e familiar recentemente admitidos estejam alocados às
estruturas COVID-19 sem que lhes tenha sido atribuída uma lista de utentes. Entendemos que lhes deve ser
atribuída uma lista de utentes, para combater, precisamente, estas filas de utentes que não têm médico e
enfermeiro de família.
Nesse sentido, quantos médicos estão nestas condições, sem lhes ter sido atribuída uma lista?
Quanto à redução das consultas nos cuidados de saúde primários, Sr.ª Ministra, jamais os contactos
telefónicos poderão substituir uma consulta presencial e ter a sua importância. Não é através de contactos
telefónicos que se recuperam consultas em atraso. É preciso reabrir as inúmeras extensões de saúde, enquanto
elemento fundamental de garantia dos cuidados de proximidade às populações, e é necessário criar condições
para que as chamadas telefónicas sejam atendidas nos centros de saúde, dotando-os de recursos humanos e
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de meios técnicos adequados. É, também, fundamental que os utentes que ficam horas à espera, no exterior do
centro de saúde, ao frio, ao vento e à chuva, tenham condições de conforto e dignidade.
Por isso, Sr.ª Ministra, a pergunta que lhe faço é a seguinte: que garantias dá o Governo de que este
Orçamento possa vir a responder com estas medidas urgentes e necessárias?
A suspensão da atividade programada levou ao adiamento de consultas, de cirurgias e de tratamentos,
criando, hoje, uma situação absolutamente desesperante para quem delas precisa. Essa suspensão representa,
claramente, uma falta de cuidados à população e é uma oportunidade de negócio para os estabelecimentos
privados do setor da saúde.
É necessário dotar o SNS, para recuperar tudo o que se perdeu. A luta contra o cancro é um exemplo. É
preciso rastrear e diagnosticar os muitos casos que estão por identificar e é preciso acompanhar os doentes
com doenças crónicas que descompensam, criando mais e novas necessidades.
Vai o Governo dotar o SNS de recursos humanos e de meios para responder à urgente e necessária
recuperação de todos os atos que ficaram sem resposta?
A rede nacional de cuidados continuados integrados e paliativos não responde às necessidades da
população, mas, sim, às das IPSS que se candidatam aos apoios financeiros para a sua criação e gestão.
Vai o Governo disponibilizar os milhares de camas em falta na rede, criando uma necessária resposta pública
que não existe?
Nos cuidados paliativos, vai o Governo colocar equipas no terreno e disponibilizar centenas de camas nas
novas unidades públicas de internamento?
E quanto à saúde mental, Sr.ª Ministra?! A saúde mental nunca teve um investimento de forma a responder
às necessidades reais da população. É necessário, Sr.ª Ministra, que a prevenção da doença mental seja uma
realidade a nível dos cuidados de saúde primários. Precisamos de equipas comunitárias de saúde mental que
não sejam apenas de projetos-piloto, mas que sejam efetivamente dotadas de profissionais para trabalhar no
terreno.
Vai o Governo, de uma vez por todas, fazer o investimento na saúde mental, concretizando, finalmente, o
Programa Nacional para a Saúde Mental?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, pelo PEV, a Sr.ª Deputada Mariana Silva.
A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, o Serviço Nacional de Saúde enfrenta um dos maiores desafios de sempre.
Apesar das preocupações do presente e apesar das dificuldades, é preciso sublinhar que o SNS esteve à
altura deste gigantesco desafio de resposta à epidemia, mas quem acusa verdadeiramente o cansaço são os
profissionais de saúde. Aquilo que acusa verdadeiramente o desgaste e a fragilidade são os poucos meios
disponíveis nos hospitais e nos centros de saúde.
Sim, o sucesso do SNS deve-se, sobretudo, ao reforço dos seus profissionais, que têm de ser valorizados
nos salários, com acesso ao subsídio de risco, com progressão na carreira e com vínculos efetivos, em vez da
perpetuação da precariedade.
Assim sendo, Sr.ª Ministra, não podemos deixar de lhe perguntar qual é a estratégia do Governo para
conquistar a confiança dos profissionais de saúde — dos médicos, dos enfermeiros, dos técnicos de diagnóstico
e de outros profissionais do Serviço Nacional de Saúde —, para que escolham, efetivamente, ficar no Serviço
Nacional de Saúde, porque o seu trabalho é reconhecido e são respeitados os seus direitos.
Um outro problema que está identificado é o da insuficiência dos serviços de saúde pública. Estes eram já
insuficientes antes da epidemia, mas isso hoje tornou-se gritante.
A pergunta é simples, Sr.ª Ministra: está, ou não, previsto para este ano o reforço dos meios humanos,
designadamente de médicos de saúde pública?
A resposta do Serviço Nacional de Saúde não pode apenas ser uma resposta eficiente à COVID-19. É
necessário que continue a ser uma resposta para as diversas doenças que não foram anuladas com o vírus.
Preocupa-nos, particularmente, a situação dos cuidados de saúde primários.
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Por que razão é que a solução, no presente, passa por obrigar os utentes, muitos deles idosos, a esperar à
porta dos centros de saúde, debaixo de telheiros improvisados ou ao ar livre, sujeitos às intempéries, às
temperaturas baixas, à chuva e ao vento? Não conseguimos perceber como é que tantos setores se
conseguiram adaptar e só os centros de saúde ainda não se adaptaram.
É urgente que os centros de saúde possam acolher todos os utentes que tenham necessidade de recorrer
aos cuidados primários. É urgente que as pessoas possam esperar pela sua consulta de forma segura e
confortável. Basta de serem empurrados para o postigo, para a janela, para os meios digitais que não dominam
e para o setor privado, que não conseguem pagar!
Por isso, Sr.ª Ministra, pergunto-lhe: para quando a reabertura da totalidade dos centros de saúde, com
horários alargados, com mais profissionais de saúde e outros, e com mais recursos humanos?
É, hoje, necessário, mais do que no passado, afastar os utentes do recurso às urgências hospitalares. É
mesmo necessário, Sr.ª Ministra, que particularmente os idosos possam sentir-se acompanhados nas suas
doenças, no esclarecimento das suas dúvidas e retirados do isolamento a que estão votados desde março.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra, pelo PAN, a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha.
A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, sem negar que, de facto, há um caminho que tem sido feito, podemos dizer que ainda há muito por fazer, e poderia elencar uma série de
exemplos.
Refiro, desde logo, os técnicos auxiliares de saúde, que, em 2008, viram ser retirada a sua carreira e que
continuam a ser tratados como se fossem assistentes operacionais, quando são técnicos especializados. Refiro,
também, por exemplo, a questão dos enfermeiros com 18 anos de serviço, que, em termos remuneratórios,
recebem tanto quanto um enfermeiro que acabou de entrar. Refiro ainda as consultas a ficarem para trás,
inclusivamente de doentes oncológicos ou com doenças crónicas, bem como refiro as pessoas com
incapacidade superior a 60% a não terem acesso ao atestado multiuso por suspensão das juntas médicas.
Portanto, poderia elencar uma série de aspetos que ainda falta resolver. Nomeadamente, até sabemos que,
em agosto, por exemplo, deveria ter havido formação para os profissionais aprenderem a lidar com
equipamentos novos, porque os equipamentos não trabalham sozinhos.
Acrescento que, de facto, temos enfermeiros disponíveis no mercado, mas, se calhar, não estão é disponíveis
para contratos a curto prazo.
Parece-nos fundamental que a Sr.ª Ministra da Saúde garanta que o Terreiro do Paço não obstaculize as
matérias essenciais a implementar neste tempo, em que se aprendeu com o caminho feito, com uma visão de
longo prazo para as políticas públicas de saúde.
Nesse sentido, gostaria de fazer quatro perguntas muito cirúrgicas, dizendo a primeira respeito à visão do
Orçamento do Estado em relação ao rejuvenescimento dos médicos no SNS.
Para nós, essa visão não consta deste Orçamento do Estado. Sabemos — os dados falam por si — que,
numa visão a médio prazo, são mais os médicos que irão sair do que os médicos que irão entrar. Sabemos
também que a média de idades dos nossos médicos está acima dos 50 anos, já para não falar nos médicos
especialistas, o que ainda aumentaria esta média de idades.
Portanto, gostaríamos, desde logo, de saber se está disponível para um plano de rejuvenescimento da classe
médica no Serviço Nacional de Saúde.
Passo a referir-me, em segundo lugar, à rede de cuidados continuados. As entidades da rede de cuidados
continuados manifestam muita preocupação com o que vem previsto no Orçamento, uma vez que aquilo que
lhes é proposto é que por cada milhão de euros a fundo perdido tenham de ter um investimento próprio de 1,5
milhões. O Orçamento do Estado fala num alargamento e preocupa-nos a manutenção da atual rede.
Terceiro aspeto: modernização das redes de comunicação no SNS.
A Sr.ª Ministra saberá bem, e nós também sabemos, a dificuldade que é comunicar com os serviços de
cuidados primários. Estas redes de comunicação necessitam, de facto, de ser revistas, de ser modernizadas,
de ser garantida a transição digital nos cuidados primários de saúde, pelo que gostaríamos de saber se o
Governo está disponível para o fazer.
A quarta e última questão tem a ver com subsídios de risco dos profissionais de saúde.
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A Sr.ª Ministra deu-nos boa nota da existência desta medida — aliás, já em março o PAN a tinha proposto
—, mas gostaríamos, de facto, de obter uma clarificação desta norma, pois parece-nos que, em sede de
especialidade, deverá haver abertura para que esta norma seja trabalhada, uma vez que ela não é clara e,
parece-nos, traz aqui algumas injustiças, nomeadamente até para com técnicos auxiliares de saúde e
assistentes operacionais de saúde, ou administrativos, que também trabalham em contexto COVID-19. Portanto,
parece-nos fundamental haver essa abertura em sede de especialidade.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Lima, do Grupo Parlamentar do PS.
A Sr.ª Joana Lima (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, Dr.ª Marta Temido, ouvindo a Sr.ª Ministra todos nós percebemos que não omitiu que há algumas dificuldades, mas todos percebemos — os portugueses
lá em casa também perceberam — os avanços inigualáveis que tem havido no Serviço Nacional de Saúde com
o Governo socialista a liderar os destinos de Portugal.
Importa fazer um balanço dos últimos anos.
Durante o período da crise económica, o Serviço Nacional de Saúde esteve sujeito a uma forte pressão de
contenção da despesa, em que todos assistimos a um forte desinvestimento no SNS com efeitos nefastos para
os portugueses. Aliás, a direita deve ter bem presente no seu currículo este desinvestimento durante os quatro
anos em que esteve no Governo e que esta mancha não passará.
Com a entrada em funções, em 2015, do Governo socialista e com o apoio da esquerda essa tendência
inverteu-se e iniciou-se um ciclo de reforço financeiro afeto ao SNS. Prova disso são os reforços das dotações
iniciais do SNS nos sucessivos Orçamentos, onde se verificou um crescimento médio de 6% no período de
2015-2020, revertendo, assim, a tendência de decréscimo entre 2010 e 2015.
Estes reforços permitiram o aumento efetivo na despesa de cerca de 2300 milhões de euros entre 2015 e
2020, incluindo o previsto na proposta de Orçamento do Estado para 2021.
No Orçamento do Estado para 2020 houve um reforço de mais 900 milhões de euros e mais cerca de 550
milhões no Orçamento Suplementar, ou seja, um total de cerca de 1500 milhões de euros. Como o BE e a Sr.ª
Deputada Catarina Martins se lembrarão, foi uma exigência do BE a dotação dos 900 milhões de euros, mas,
sem dúvida alguma, o Governo da República não só cumpriu com a sua palavra como superou essa verba
exigida pelo Bloco de Esquerda.
Aplausos do PS.
Mas, hoje, confrontamo-nos com o voto contra do Bloco de Esquerda, apontando falhas na área da saúde.
E eu pergunto, Sr.as e Srs. Deputados: essas falhas serão o suficiente para o Bloco virar as costas aos
portugueses e votar contra as medidas de que os portugueses precisam para fazer face à qualidade de vida,
nomeadamente na área da saúde? Não, Srs. Deputados! Para nós, não! Para nós, é imperativo, é importante
que votemos este Orçamento do Estado, que vai fazer face às necessidades do Serviço Nacional de Saúde.
A proposta que hoje aqui debatemos tem uma dotação orçamental acrescida de cerca de 470 milhões de
euros face ao Orçamento anterior, dando assim ênfase ao compromisso do Governo no qual o Bloco de
Esquerda deveria pôr os olhos e manter esse compromisso, porque nós queremos um SNS mais justo e mais
inclusivo. Este é o lema do Partido Socialista!
Com este reforço financeiro, a resposta do SNS será ainda mais intensificada. Está prevista a contratação
de cerca de 8400 profissionais de saúde em dois anos e de mais 4200 no ano de 2021 e está previsto um reforço
de investimento em instalações e equipamentos. E quero aqui realçar o investimento na nova ala pediátrica do
Hospital de São João, que está quase concluída, relativamente à qual herdámos uma trapalhada de
procedimento — entretanto, a direita, que tanto falava nesta obra, calou-se para sempre.
Risos do PSD.
Não, connosco ninguém se cala! Nós levamos os dossiers até ao fim até que consigamos concluir as obras.
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Aplausos do PS.
Há um conjunto de situações que podia elencar, mas a Sr.ª Ministra já as referiu, bem como a Sr.ª Deputada
Hortense Martins e outros aqui nesta bancada.
Iremos sempre, sempre, votar favoravelmente as propostas do Governo, porque, essas sim, são importantes,
são importantíssimas para podermos ter um Governo mais forte e um Portugal mais capaz. Os portugueses
sabem que podem contar com o Partido Socialista!
Sr.ª Ministra, não posso deixar de lhe fazer uma pergunta relativamente aos profissionais de saúde. Nós
ouvimos dizer, à direita e à esquerda, que há menos profissionais de saúde, que não aumentou o número de
profissionais de saúde no SNS. Ora, eu queria perguntar se os profissionais de saúde em 2019 são os mesmos
de 2020, ou se houve um acréscimo nesta área. E também gostaria de lhe perguntar qual a despesa prevista
no SNS em recursos humanos.
Para terminar, pergunto-lhe se esta previsão do aumento de profissionais vem ajudar a fazer face às
necessidades para repor a atividade programada que acabou por ficar suspensa devido ao reforço das respostas
à COVID-19.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves.
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Saúde, uma das questões essenciais que se coloca quando discutimos este Orçamento é a questão do investimento e, em particular, do investimento no
SNS. O investimento no SNS, na construção de novos hospitais e na modernização de outros, na substituição
de equipamentos obsoletos e na sua modernização, além de operações de reparação e manutenção, que é
absolutamente imperioso assegurar, são medidas essenciais para que o Orçamento dê resposta às
necessidades do SNS e ao reforço da sua capacidade de resposta.
É preciso inscrever no Orçamento as verbas de investimento que não deixem margem para dúvidas quanto
a esse objetivo de reforço do SNS, mas é igualmente essencial que o Governo clarifique as suas opções quanto
às decisões que é preciso concretizar.
É preciso saber que compromissos vai o Governo assumir quanto a investimentos em edifícios,
designadamente construção e ampliação de hospitais, como, por exemplo, o hospital central do Alentejo, o
hospital do Seixal, a maternidade de Coimbra, o novo hospital do Oeste, o hospital central do Algarve, o hospital
da Póvoa de Varzim e Vila do Conde, o hospital de Barcelos, a ampliação do hospital de Beja, a reconstrução
do Pavilhão 5 e a segunda fase do hospital Sousa Martins, na Guarda.
É necessário que este Orçamento, além das verbas, dê garantias de como e quando é que vão ser
executadas estas verbas para construir estes hospitais, que tanta falta têm feito.
É preciso saber que compromisso vai o Governo assumir quanto a medidas de investimento urgente para
recuperar consultas, tratamentos e cirurgias em atraso.
É preciso saber que compromissos vai o Governo assumir quanto a investimentos em equipamentos e em
dispositivos médicos, que garantias de verbas e decisões expeditas para garantir investimentos em RX e em
ecografias que possam ser realizados nos centros de saúde, por forma a que não se tenha de recorrer a hospitais
para realizar esses exames complementares de diagnóstico.
Investir na modernização em meios complementares de diagnóstico e de terapêutica e no alargamento desta
capacidade no SNS é dar um contributo decisivo para acabar com os atrasos nos exames médicos e com os
atrasos nas consultas e atos clínicos, que precisam de ser recuperados.
Por isso, perguntamos: quais são os compromissos assumidos para que tudo isto saia do papel e seja uma
realidade em 2021?
Sr.ª Ministra, o artigo 183.º do Orçamento tem como epígrafe «Implementação do Plano Plurianual de
Investimentos para o Serviço Nacional de Saúde e do Plano Nacional de Saúde Mental». O que gostaríamos de
perguntar é se considera que 90 milhões para os cuidados de saúde primários, dois hospitais que já estão
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planeados há anos, 19 milhões para saúde mental e 27 milhões para a rede de cuidados continuados constituem
um verdadeiro plano plurianual de investimentos no SNS.
Não que estejamos contra estas medidas, o que exigimos é que elas sejam acompanhadas de garantias da
sua execução. Mas, perante as necessidades que hoje se verificam, e num plano plurianual, não considera o
Governo que as necessidades do País exigem que se vá muito além do que está proposto?
Sr.ª Ministra, o SNS precisa de mais investimento, de mais profissionais para poder continuar a ser o garante
da saúde dos portugueses, como se revelou nesta pandemia, precisa de ser reforçado e precisa de coragem
para acabar com o saque dos grupos económicos, e a proposta apresentada não dá essa resposta.
É preciso que o Governo coloque a saúde como uma grande prioridade nacional e dê garantias de que os
investimentos são mesmo para levar por diante.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — A concluir os pedidos de esclarecimento à Sr.ª Ministra da Saúde, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, que já não dispõe do seu tradicional minuto liberal, mas só
de alguns segundos.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Obrigado, Sr. Presidente. Sr.ª Ministra da Saúde, vou fazer-lhe uma pergunta rápida sobre escolhas, que é a essência da política.
Se o seu Governo não tivesse escolhido entregar 1700 milhões de euros à TAP, se o seu Governo escolhesse
entregar 1700 milhões ao seu ministério, qual seria, nesse cenário, a sua escolha, Sr.ª Ministra? Chegariam
esses 1700 milhões para acabar com os atrasos em consultas, cirurgias e exames? Chegariam esses 1700
milhões para acabar com as filas de idosos à porta dos centros de saúde e para acabar com os atrasos no
atendimento na Linha SNS 24? Chegariam para pagar e reduzir as dívidas a fornecedores e para injetar algum
dinheiro desse lado da economia? Chegariam para construir o hospital central do Algarve, que desapareceu do
Orçamento? Ou chegariam para antecipar a expansão da urgência do hospital de Évora, que arranca esta
semana para estar pronto em março, com sorte? Qual seria a sua escolha, Sr.ª Ministra?
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.
A Sr.ª Ministra da Saúde: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Relativamente aos nossos compromissos, eles são muito claros e vêm de trás.
Quanto aos profissionais de saúde, não posso deixar de repetir que o Serviço Nacional de Saúde contratou,
desde a anterior Legislatura até a data, mais de 20 000 profissionais de saúde. E não repito este número para,
tal como já nos acusaram no passado, repetir um mantra, mas porque, de facto, estes números estão expressos
nas folhas de assiduidade. São pessoas reais, são profissionais de saúde que estão lá, que têm um percurso
profissional e que estão disponíveis para prestar cuidados de saúde.
Se dividirmos este número pelos anos de trabalho que leva o Governo, veremos que os números que agora
querem que assumamos como compromisso não são nada de extraordinário, são apenas a continuação de um
percurso, de um percurso no reforço do SNS.
Aplausos do PS.
Portanto, é com natural tranquilidade que vos digo que sim, que vamos ter mais 4200 profissionais de saúde
neste ano e que contamos admitir mais 4200 profissionais de saúde no ano que vem, e que, sim, reafirmo que
sim, estamos a procurar o rejuvenescimento das carreiras, designadamente ao nível dos médicos, e que é por
esse facto que temos aberto mais vagas do que aquelas que se formam em termos de recém-especialistas em
cada ano, que procuramos garantir que os concursos se realizam nos 30 dias subsequentes à homologação das
notas, que quando nos pedem contratações diretas procuramos autorizá-las, que procuramos melhorar os
salários de todos, que procurámos melhorar a majoração do trabalho suplementar e que majorámos
efetivamente.
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Gostava de vos recordar alguns números: em 2015 — às vezes, esquecemo-nos, porque o tempo passa
depressa —, o salário mensal mais baixo no SNS era de 505 € e agora é de 635 €; o salário mensal mais alto
era de 5211 € e hoje é de 5664 €; um médico que fizesse um turno de 12 horas no serviço de urgência, um
assistente graduado sénior, numa noite de sábado para domingo, nessa altura recebia 171 € de trabalho
suplementar e hoje recebe 357 €.
É este o nosso investimento, são estes os números, é nisto que temos posto o investimento dos portugueses.
Aplausos do PS.
Relativamente à questão que foi colocada sobre o investimento, gostava de ser muito clara: infelizmente, não
basta prever investimentos no Orçamento do Estado, também é preciso ter capacidade de execução. E temos
tido dificuldades. Foi por isso que alterámos algumas regras, que tanta contestação mereceram. Quem nunca
fez obra não consegue perceber o que são as dificuldades procedimentais e julga sempre que estamos a tentar
enganar alguém.
Aplausos do PS.
Quanto a escolhas, a nossa escolha é clara: é o SNS.
A linha SNS 24 tem tido, nos últimos dias, uma pressão de chamadas que ultrapassa as 30 000. E continua
a responder.
Relativamente às dívidas aos fornecedores do SNS, elas nunca foram tão baixas.
O Serviço Nacional de Saúde tem procurado resistir. E tem-no conseguido, felizmente, devido à excelência
dos seus profissionais e dos seus dirigentes, que continuam a trabalhar empenhadamente para responder aos
portugueses e às portuguesas.
É por isso que continuamos a prosseguir os nossos objetivos, desde logo com a atribuição de médico de
família a mais portuguesas e a mais portugueses. E, sim, embora os inscritos em centros de saúde a aguardar
a atribuição de médico especialista de medicina geral e familiar sejam mais, estão, neste momento, a ser
atribuídas as listas aos 287 médicos recém-contratados, que iniciarão agora a sua função. Esperamos que, no
final do ano, mesmo considerando aposentações, tenhamos mais 340 000 portugueses com médico de família
atribuído.
Depois, vamos continuar a trabalhar noutras áreas, nos hospitais, nos cuidados intensivos, na contratação
dos profissionais, na sua passagem de trabalhadores com contrato a termo a trabalhadores por tempo definitivo,
porque é disto que se faz o SNS: de muito esforço, de muito trabalho, de muita dedicação e de não lhe virarmos
as costas quando ele mais precisa de cada um de nós.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos agora interromper os nossos trabalhos. A Mesa sugere que recomecemos às 15 horas e 15 minutos, se não houver objeções.
Está, pois, interrompida a sessão.
Eram 13 horas e 35 minutos.
Após a interrupção, assumiu a presidência a Vice-Presidente Edite Estrela.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 15 minutos.
Boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas.
Cumprimento também o Sr. Primeiro-Ministro e os restantes membros do Governo presentes.
Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.
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O Sr. André Ventura (CH): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Este é um Orçamento que, na saúde, deixa todos para trás. Volta a não resolver o problema fundamental que temos
de médicos de família e de enfermeiros de família, que o próprio Primeiro-Ministro e a Ministra da Saúde tinham
afirmado resolver. Mas, mais grave do que isso, deixa para trás os centros de saúde fechados, que continuam
sem resposta, sem dotação orçamental para conseguir enfrentar um dos momentos mais difíceis de sempre.
Mas, em matéria de saúde, este Orçamento tem uma particularidade: é que remete para não sei quantos
meses depois o levantamento das necessidades dos profissionais de saúde, quando passaram quatro anos a
convencer os seus parceiros de esquerda…
Protestos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.
O Sr. André Ventura (CH): — Vou concluir, Sr.ª Presidente. Como dizia, passaram quatro anos a convencer os seus parceiros de esquerda de que iriam resolver o
problema da falta de meios no Serviço Nacional de Saúde.
Este é o Orçamento da hipocrisia…
Protestos do PS.
… porque consegue olhar para a frente sem resolver os problemas do passado e deixa os portugueses mais
frágeis perante a crise de saúde e de pandemia que vivemos em Portugal.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Tiago Estevão Martins, do Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. Tiago Estevão Martins (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Portugal vive um dos momentos mais difíceis da nossa história recente.
Os alunos, os professores, os técnicos, as famílias têm-no sentido nas escolas, nas instituições de ensino
superior e também nas suas casas.
O desafio do isolamento, o crescimento das desigualdades, a brutalidade das mudanças a que todos fomos
sujeitos põem a nu uma realidade que nos convoca para uma resposta forte e determinada.
Desde o início da pandemia que a escola pública e o ensino superior nos têm demonstrado a sua centralidade
e resiliência nesta resposta. Mas dizê-lo é também reconhecer a ambição de quem quer um sistema de
investigação e ensino mais capaz, em que o caminho tem de ser feito de avanços e nunca de recuos.
Temos de ter a humildade de reconhecer que não podemos, nunca, dar os avanços como garantidos e que,
em vez de discutirmos aumentos para a escola pública, há quem queira, para ela, discutir cortes.
Fundamentalmente, é importante reconhecer que houve avanços, com resultados materiais, no sistema
educativo e de ciência, que têm de ser assinalados.
Aplausos do PS.
Dizer que houve avanços é falar de quatro indicadores absolutamente fundamentais, que não se conseguem
de um dia para o outro: é falar de termos atingido a percentagem mais baixa de sempre de abandono escolar
no último ano; é falar na redução em 30% da taxa de insucesso escolar desde 2015; é dizer que, desde 1996,
não existiam tantos estudantes a entrar no ensino superior; é dizer que o número de investigadores por cada
1000 ativos aumentou 30% nos últimos cinco anos.
Aplausos do PS.
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Falar deste caminho é falar de uma visão de um Portugal da ciência, da cultura e do conhecimento. E é
reconhecer que este é um caminho coerente com as opções políticas suportadas pelo Orçamento que temos
construído nos últimos cinco anos e que mantemos para 2021: do investimento no Programa Nacional de
Promoção do Sucesso Escolar; da vinculação de professores e descongelamento de carreiras; da autonomia e
flexibilização curricular; da criação das tutorias; do reforço do número de assistentes operacionais; e do
investimento na gratuitidade dos manuais escolares em todos os níveis de ensino. É reconhecer que se, hoje,
temos um ensino superior com mais estudantes, o devemos ao alargamento das vias de acesso ao superior aos
estudantes do ensino profissional; que tal se deve a uma opção política de fundo, de valorização do papel social
do ensino superior politécnico. É reconhecer que se, hoje, há um ensino superior mais acessível, é porque os
estudantes pagam menos cerca de 400 € de propinas do que pagariam se não tivéssemos iniciado este caminho
e porque há mais bolsas e bolsas mais altas.
Aplausos do PS.
E se também temos mais investigadores é porque temos feito um caminho de investimento continuado na
FCT (Fundação para a Ciência e a Tecnologia), que, no último ano, teve a sua maior execução orçamental de
sempre; é porque apostámos na formação dos investigadores e aumentámos o número de bolsas de
doutoramento em 140% desde 2015; é porque apostámos na dignificação da figura do investigador e instituímos
o contrato de trabalho como o regime regra de contratação de doutorados; é porque contratámos, desde 2017,
mais de 6000 investigadores e docentes doutorados.
Trata-se de opções políticas com resultados reais na vida do País.
É, por isso, importante que se diga que, em cinco anos de governação, aumentámos o orçamento para a
educação em cerca de 25%. Repito: em cinco anos de governação, aumentámos o orçamento para a educação
em cerca de 25%, com este Orçamento do Estado.
Aplausos do PS.
São números que falam por si próprios e que demonstram uma política continuada de investimento no ensino
público e na ciência que não podem ser ignorados.
Neste caminho trilhado, é fundamental que tenhamos a capacidade de não deixar o trabalho a meio, que
tenhamos a capacidade de saber que existe muito caminho para fazer e que o que nos move é a convicção de
que só um Estado forte é a resposta para que ninguém fique para trás.
Por isso, a escolha na votação deste Orçamento do Estado é simples e só tem dois sentidos possíveis: a
primeira, de aprofundar o caminho seguido nos últimos cinco anos, ou a segunda, de desistir agora, quando o
País mais precisa.
Aplausos do PS.
A forma como respondermos à crise marcará o Portugal que encontraremos quando esta acabar.
Da parte do Partido Socialista podem os portugueses estar certos de que estaremos onde sempre estivemos:
na defesa de um Estado forte e de um Portugal da educação, da ciência, da cultura e do conhecimento.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado Tiago Estevão Martins, a Mesa regista uma inscrição para formular pedidos de esclarecimento.
Assim, tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Cláudia André, do Grupo Parlamentar do
PSD.
A Sr.ª Cláudia André (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Ministros, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, tem sido comum ouvirmos anúncios e anúncios no que respeita a toda a política económica do País, em especial
no que respeita à educação e à ciência, que não são exceção. Estamos habituados a isso.
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No entanto, quando vemos qual é a despesa efetiva na educação — aquela que vão buscar à riqueza do
País e que investem em educação —, percebemos perfeitamente, como qualquer aluno do ensino básico ou
secundário, que a evolução desta linha, da linha que começa em 2015 e acaba em 2019, não foi de aumento,
mas sim de decréscimo. É clara a sua evolução.
A oradora exibiu um gráfico.
No entanto, percebemos que se trata um pouco de «ouve o que eu digo, não olhes para o que eu faço».
Todos os anos, temos ouvido muitos anúncios, anúncios de recursos humanos, anúncios de equipamentos.
Refiro, em especial, o último anúncio que o Sr. Primeiro-Ministro fez, em abril de 2020, e que, sabemos bem,
não cumpriu em setembro, não cumpriu em outubro, no entanto, é agora, em novembro, que vai ser cumprido:
meia dúzia de computadores atribuídos a alguns alunos e anuncia-se seguidamente «nós começámos a
distribuir computadores em novembro».
Pergunto: onde estão os concursos públicos para aquisição de equipamentos informáticos, de todos os
computadores? Mais: onde está a cobertura de rede, tão prometida, no interior do País, onde alunos tiveram de
andar a ter aulas na rua, a descoberto, com qualquer temperatura e em qualquer situação?
Pergunto: onde está o reforço da rede, onde está a negociação para que isto aconteça?
Por isso, perguntamos: este investimento, Sr. Deputado, é para levar a sério? Estes anúncios que V. Ex.ª
referiu aqui são para levar a sério?
Pergunto, muito sinceramente: é desta que vão cumprir o que têm vindo a prometer nestes últimos cinco
anos?
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Tiago Estevão Martins.
O Sr. Tiago Estevão Martins (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Cláudia André, reparei que, até agora, o PSD não falou sobre ciência, o que considero ilustrativo. Mas gostava de referir que o que é absolutamente
ilustrativo é o facto de o PSD continuar a insistir neste milagre das laranjas.
O Sr. Adão Silva (PSD): — É dos computadores!
O Sr. Tiago Estevão Martins (PS): — É que o PSD vem aqui pedir aumentos para tudo ao mesmo tempo que acusa o Governo de despesismo, mas agora com uma inovação: é que a Sr.ª Deputada veio aqui mostrar
gráficos, mas não referiu um único número, o que é absolutamente espantoso.
Diria mais, que é preciso algum atrevimento, tenho de reconhecê-lo. Houve algum atrevimento do PSD para
vir aqui «rasgar as vestes» e dizer que este Orçamento não chega para a educação e para o ensino superior.
E, neste caso, como não falou sobre ensino superior, fica mesmo registado o vazio total da parte do PSD, neste
debate, sobre esta matéria.
Mas dizer que um Orçamento que aumenta em 7% as verbas para a educação não chega é algo que fica um
pouco aquém daquilo que se esperava. E, pior, é que, no seu discurso, «não joga a bota com a perdigota»,
porque este aumento de 7% soma à diferença que temos de investimento feito na escola pública na educação.
Nestes anos de governação, e com este Orçamento, aumentámos o orçamento para a educação em 25%!
Vozes do PS: — Exatamente!
Aplausos do PS.
O Sr. Tiago Estevão Martins (PS): — Por isso, Sr.ª Deputada, não se entende, não se entende!
Aplausos do PS.
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Mas sabe porque é que não se entende?
É que, mesmo gastando muito menos, o último Governo do PSD, no seu último Orçamento, gastava mais
35% com transferências para o ensino particular e cooperativo do que este Orçamento do Estado gasta. Assim
se vê este amor à escola pública!
Aplausos do PS.
Termino dizendo algo que é muito claro, e não adianta mostrar gráficos que não dizem nem a fonte, nem os
números.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Exatamente!
O Sr. Tiago Estevão Martins (PS): — Este Orçamento é como água e azeite para um Orçamento de direita. Seria bom que, pela primeira vez, o PSD viesse a este debate dizer realmente ao que vem e que tem, de facto,
uma política diferente para a educação, porque, até agora, não se ouviu absolutamente nada. É um silêncio
ensurdecedor!
Protestos do PSD.
Por isso, termino dizendo que votar contra este Orçamento do Estado é votar contra um Orçamento do Estado
que aumenta em 7% o orçamento para a educação. O nosso caminho é muito claro e está definido — é o de
um Portugal da ciência, da cultura e do conhecimento. Nós ficamos à espera de perceber que Portugal é esse
que o PSD quer.
Aplausos do PS.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado Adão Silva, pede a palavra para que efeito?
O Sr. Adão Silva (PSD): — Sr.ª Presidente, é para uma interpelação à Mesa.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Como o Sr. Deputado do Partido Socialista pôs em causa a verdade, a origem e a fonte destes nossos documentos…
Protestos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, isso não é uma interpelação à Mesa. À Mesa é à Mesa, não é ao Sr. Deputado do Partido Socialista.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Sim, Sr.ª Presidente. Queria só dizer à Sr.ª Presidente que gostávamos muito que mandasse distribuir os documentos que farei chegar à Mesa, para que não seja posto em dúvida o que a
nossa colega disse.
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sim, Sr. Deputado. Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Baptista Leite, do Grupo Parlamentar do PSD.
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O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Portugal está em guerra. Estamos em guerra contra o vírus da COVID-19, que tudo arrasa, da saúde à
economia.
É verdade que ninguém antevia a pandemia, mas a má gestão do Governo, nestes últimos cinco anos,
deixou-nos mais mal preparados do que os demais países europeus para combater esta guerra que estamos a
perder. Sem controlar a pandemia, não salvamos a economia!
Se, no início da guerra contra a COVID-19, não se sabia como reagir, hoje não há desculpas. Sabemos o
que funciona: testar massiva e sistematicamente; identificar e isolar, em tempo real, todos os infetados e os seus
contactos. Isto é muito simples, mas muito importante: testar e isolar. O Governo teve um verão inteiro para
preparar o outono e o inverno e não o fez. O Governo simplesmente desistiu.
O Sr. Adão Silva (PSD): — É verdade!
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Sr.ª Ministra da Saúde, Marta Temido, porque é que desistiu? Sabia que tinha de investir na saúde pública de modo a contactar, em tempo real, as pessoas infetadas e
suspeitas. Porque é que desistiu?
Avisámos que os 700 000 € do Orçamento Suplementar para a saúde pública eram uma gota num oceano
de necessidades. Porque é que desistiu?
Sabia que deixava mais de 1 milhão de portugueses sem acesso a médico de família e, agora, puseram
esses médicos a contactar telefonicamente todos os doentes COVID, em vez de tratarem dos doentes com
outras doenças. Porque é que desistiu, Sr.ª Ministra?
Milhões de consultas, milhares de cirurgias e de exames complementares cancelados e adiados, milhões de
pessoas sem acesso à saúde e é agora, só agora, em pleno outono, em plena crise, que começam a pensar em
como vão responder? Não há um único plano de ação nem há contratos assinados para ativar de imediato, em
situação de emergência, o setor privado e social. Porque é que desistiu, Sr.ª Ministra?
Sabe bem que, apesar de ainda não estarmos no inverno, os profissionais de saúde já estão exaustos. Os
médicos, os enfermeiros, os farmacêuticos, os técnicos superiores, os administrativos, os auxiliares estão
exaustos! Não prepararam o SNS para o momento que estamos a viver e nem o prémio, que esta Assembleia
aprovou, foi o Governo capaz de pagar aos profissionais! Porque é que desistiu, Sr.ª Ministra? Porque é que
desistiu dos profissionais de saúde?
Sr.ª Ministra, sabia que ia haver um aumento de procura da vacina da gripe nesta época e, agora, as pessoas
não têm acesso à vacina, nem nos centros de saúde nem nas farmácias. Porque é que desistiu?
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Sabia que faltavam camas de cuidados intensivos e profissionais intensivistas. Sabia! Prometeu mesmo, em maio, nesta Casa, que iríamos ter, neste inverno, mais 400 camas
com os respetivos intensivistas, mas nada aconteceu. Porque é que desistiu?
Sabia que, para vencer a guerra contra a COVID-19, é necessário passar da defesa para o ataque, é preciso
tudo fazer para evitar novos casos. Não havendo um tratamento ou vacina eficazes, resta fazer a única coisa
que funciona: testar e isolar. E isto não está a acontecer! Porque é que desistiu, Sr.ª Ministra?
Mas também à Sr.ª Ministra da Segurança Social, Ana Mendes Godinho, pergunto o mesmo: porque é que
desistiu?
Os lares são o principal foco de mortalidade por COVID-19 e a verdade é que os idosos lá residentes se
sentem abandonados. O Governo decidiu, então, criar brigadas de resposta a surtos, uma por distrito, que nada
previnem. Ao invés de se evitar que o vírus entre pelos lares dentro, acontece que o vírus entra, infeta todos os
residentes e só depois o Governo decide atuar. Porque é que desistiu, Sr.ª Ministra?
Estima-se que tenhamos mais de 35 000 cidadãos portugueses idosos a residir em lares ilegais. Oito meses
volvidos desde o início da pandemia, o Ministério da Segurança Social ainda nem sequer conseguiu mapear
estes lares, onde estes idosos estão absolutamente desprotegidos. Porque é que desistiu, Sr.ª Ministra?
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Num momento em que a crise económica empurra milhares de portugueses para a pobreza, em vez de
reforçar os mecanismos de resposta social existentes, decidiu criar ainda mais programas, mais burocracia, no
fundo, criar mais atrasos no acesso à ajuda de quem mais precisa. Uma ajuda de que as pessoas precisam
hoje, não daqui a 8 ou 10 meses. Porque é que desistiu, Sr.ª Ministra?
Protestos do Deputado do PS Santinho Pacheco.
Sr. Ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, porque é que desistiu? Porque é que assumiu o papel
de negacionista do Governo dizendo que os transportes públicos não são um local de potencial contágio da
COVID-19?
O Sr. Adão Silva (PSD): — Ele não sabe!
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Toda a evidência científica é clara e demonstra que esse risco existe. Percebe-se, simplesmente, que não quer investir o que é necessário para proteger as pessoas. Porque é que
desistiu, Sr. Ministro?
Aplausos do PSD.
Pergunto o mesmo ao Ministro da Economia, Pedro Siza Vieira: porque é que desistiu? Este é um momento
que exige a proteção dos empregos. O ano de 2021 deve ser um ano de criação de novos empregos. Precisamos
de mais emprego e quem cria os empregos são as empresas. São essas mesmas empresas que geram riqueza
para se distribuir e são também os impostos das empresas que ajudam a pagar o Serviço Nacional de Saúde.
Mas o Governo apresenta-nos um Orçamento que não apoia as empresas; pelo contrário, o Governo fez
uma proposta de Orçamento de Estado para 2021 que é contra as empresas. E, também por isso, o PSD só
pode votar contra esta proposta de Orçamento do Estado.
O Sr. Ministro das Infraestruturas e da Habitação (Pedro Nuno Santos): — Mau era!
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Na maior crise das nossas vidas, o Governo escolheu o ano de 2021 para sugar as empresas até ao tutano. Mantêm a carga fiscal,…
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Mantêm a carga fiscal? É mentira!
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — … exigem a devolução de todos os apoios recebidos no contexto da COVID e são «zero» os apoios para a competitividade. Aliás, o Governo simplesmente desistiu das empresas,
entregou-se, num ato de fé, à espera do dinheiro vindo da Europa e de que este faça aquilo que este Orçamento
não fará. Desistiram e esperam agora por um milagre europeu que, assim, não irá acontecer. Porque é que
desistiu das empresas, Sr. Ministro?
E, nessa senda, pergunto ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva: porque é que
desistiu? Se é verdade que precisamos de mais emprego no imediato, temos de garantir as condições para que
a nossa economia possa gerar melhor economia e melhor emprego. Emprego mais qualificado, mais bem
remunerado e que contribua para a economia com maior valor acrescentado.
Protestos do PS.
Para isso, precisamos que as nossas empresas invistam em novos mercados e na criação de novas cadeias
de valor. E o que fez o Ministério dos Negócios Estrangeiros, responsável que é pela diplomacia económica?
Cortaram as verbas da AICEP (Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal), a agência de
investimentos que poderia ajudar as empresas a fazer isso mesmo! Porque é que desistiu, Sr. Ministro?
Aplausos do PSD.
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No final do dia, a gestão desta crise demonstra que o Governo desistiu como um todo. E, por isso, pergunto:
Sr. Primeiro-Ministro, António Costa, porque é que o senhor desistiu?
Risos do PS.
Porque é que o Sr. Primeiro-Ministro decidiu abandonar os portugueses, no momento em que eles mais
precisavam de um Governo liderante?
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Quando o Primeiro-Ministro desiste do País, todos os ministros desistem com ele. Mas nós, portugueses, não vamos desistir! Não podemos desistir! Se não podemos contar
com este Governo, então façamos tudo para vencer esta guerra, apesar deste Governo. Vamos ser nós,
cidadãos anónimos portugueses, os soldados no terreno que, mesmo sem os generais deste Governo, tudo
faremos para esmagar a COVID-19!
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
Não fiquemos à espera que nos digam o que fazer, não fiquemos à espera do telefonema que não vai chegar.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Cancelem tudo!
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Tomemos o futuro pelas nossas mãos, vamos nós testar e isolar! Cada vez que um de nós se infeta e decidimos ficar em casa, não estamos a desistir. Cada vez que temos um
contacto com alguém infetado e decidimos ficar isolados, não estamos a desistir. Cada vez que um filho nosso
fica doente e decidimos não o mandar para a escola, não estamos a desistir. Cada vez que tomamos a decisão
difícil de nos afastarmos, com os nossos filhos, dos nossos pais e dos nossos avós para os proteger do vírus,
não estamos a desistir.
O Sr. Santinho Pacheco (PS): — Isso é ridículo!
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Como povo, passemos da defesa ao ataque. Vamos salvar o nosso futuro, pelos nossos pais, pelos nossos avós, pelos nossos filhos.
Não podemos desistir! Não vamos desistir!
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho.
A Sr.ª Ministrado Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (Ana Mendes Godinho): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje, decidimos aqui quem luta pelo País e pelas pessoas e quem baixa os braços e
desiste de lutar.
Aplausos do PS.
Continuar a lutar implica construir soluções e não apenas apresentar problemas, num espaço de diálogo
permanente para encontrar soluções para as pessoas. Pergunto ao Sr. Deputado Baptista Leite e ao PSD se
desistiram da seriedade e da responsabilidade.
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Aplausos do PS.
Nos tempos de incerteza que atravessamos, a discussão do Orçamento ganha ainda mais relevância. Para
além do desenvolvimento das linhas programáticas para o futuro do País, o que está agora em causa é a
definição da estratégia de resposta aos efeitos da crise: uma crise inédita, que interpela a nossa capacidade
coletiva — em Portugal, na Europa e no mundo — de enfrentarmos desafios de incomparável magnitude. Para
além de controlar uma pandemia, temos de ser capazes de reforçar o nosso contrato social. Para isto,
precisamos de continuar a proteger as pessoas e relançar a economia.
A proposta de Orçamento do Estado que o Governo apresenta ao Parlamento visa, exatamente, isto:
fortalecer o Estado social na sua missão elementar de estar ao lado de quem precisa, quando mais precisa,
protegendo os rendimentos e apoiando o emprego.
Portugal, depois de anos marcados por políticas de austeridade, iniciou, com o anterior Governo PS, um
percurso de recuperação de rendimentos e de recuperação do emprego.
Em 2019, a taxa de desemprego desceu para 6,5%, por oposição aos valores de que já nos esquecemos,
de16,2%, em 2013, ou 12,4%, em 2015.
Protestos do Deputado do PSD Paulo Neves.
O salário mínimo chegou, no início de 2020, a 635 €, um valor que em muito contrasta com os 505 € de
2015,…
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Bem lembrado!
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — … o período mais longo de valorização do salário mínimo e o aumento mais significativo do século.
Como país, fizemos um caminho de mais emprego, de mais trabalho, trabalho mais valorizado, com uma
menor incidência de trabalhadores a auferir o salário mínimo, com fortes políticas ativas de emprego, com uma
contratação coletiva mais dinâmica. Este caminho está a ser desafiado de forma abrupta pela situação
pandémica que hoje vivemos.
Vivemos tempos para os quais ninguém estava preparado, em nenhuma parte do mundo.
De um momento para o outro, uma pandemia com efeitos imprevistos colocou em risco o normal
funcionamento das sociedades, das famílias, do emprego, da economia, exigindo uma forte resposta por parte
do Estado na saúde, na educação, na proteção social, no apoio ao emprego, no apoio às famílias, no apoio às
pessoas mais vulneráveis, no apoio às empresas. A dimensão da exigência e da resposta mostrou a importância
do Estado social.
Num curto espaço de tempo, foram postas em prática múltiplas medidas e apoios extraordinários aos vários
níveis.
Em Portugal, o Estado social foi a primeira linha de resposta, implementando medidas e criando apoios
excecionais para responder às situações que foram surgindo. Nestas medidas, criadas pelo Governo e
implementadas pelo Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, chegaram apoios a 2 milhões e
200 mil pessoas e a 150 000 empresas, num valor global, incluindo isenções contributivas, de 2000 milhões de
euros, até ao momento.
O Orçamento do Estado 2021 segue este caminho de apoio aos rendimentos e às famílias, apoio ao emprego,
apoio ao investimento nas qualificações e na proteção dos mais vulneráveis, porque acreditamos e sabemos
que a resposta à crise pandémica que atravessamos não está na austeridade, mas na recuperação económica,
assente na defesa dos rendimentos dos trabalhadores e em políticas responsáveis de apoio ao emprego, de
proteção das famílias e dos mais vulneráveis.
Por isso, este orçamento da segurança social para 2021 tem mais 1960 milhões de euros face ao orçamento
de 2020.
Aplausos do PS.
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A política não são números, mas os números traduzem opções políticas.
O crescimento do orçamento da segurança social traduz prioridades políticas claras de garantir o apoio às
famílias, às pessoas reais, aos trabalhadores reais do nosso País, que o Estado não pode deixar para trás.
Negar-lhes este apoio, deixá-los fora desta rede de proteção seria negar o nosso propósito como sociedade
solidária, coesa e justa.
Este é um Orçamento de mobilização da República para a proteção dos rendimentos, para o regresso ao
crescimento e ao apoio ao emprego. Um Orçamento que cria uma prestação social extraordinária destinada a
proteger os rendimentos dos trabalhadores, uma nova prestação que resultou de um diálogo enorme com os
partidos de esquerda, que foi sendo contruída para responder às situações que em 2021 mais necessitarão
desta resposta e que abrangerá um universo de 258 000 pessoas.
Este é também um Orçamento que aumenta estruturalmente para 504 € o valor mínimo do subsídio de
desemprego e que atribui a quem recebe o subsídio social de desemprego um complemento adicional.
Aplausos do PS.
É um Orçamento que também contempla a prorrogação até dezembro de 2021 do apoio a trabalhadores
informais em situação de desproteção social, que foi previsto no Orçamento Suplementar de 2020 e que, neste
momento, tem cerca de 6000 pedidos.
Este Orçamento continua a garantir, também, do lado das famílias e da proteção dos mais vulneráveis, o
pagamento a 100% das baixas por COVID e do isolamento profilático, mas também a assistência a filhos
menores de 12 anos que tenham de ficar em isolamento e que, neste momento, já abrangem um total de 150
000 pessoas.
Estas são medidas necessárias, urgentes, que têm de ser aprovadas agora, porque há milhares de pessoas
que irão beneficiar delas.
Este é também um Orçamento que, mais uma vez, reforça o rendimento dos pensionistas com pensões mais
baixas e que, com este aumento que acontecerá nas pensões até 650 €, já a partir de janeiro, abrangerá 1
milhão e 900 mil pessoas.
Aplausos do PS.
Este é também um Orçamento que aumenta em 120 milhões de euros a ação social, para o reforço das
respostas de proximidade e do setor social e para o desenvolvimento de novas respostas e equipamentos sociais
que a pandemia evidenciou, que são mesmo necessárias, além de garantir a duplicação da capacidade de
resposta do programa alimentar e novas respostas para as pessoas em situação de sem-abrigo.
Estas são medidas necessárias, urgentes, que têm de chegar ao terreno em 2021, porque é para isso que
temos um Estado social e foi para o reforçar que as esquerdas se uniram nos últimos anos.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — Alguém pode compreender que a esquerda, que se soube unir contra os devaneios da austeridade, se divida no momento atual?
Aplausos do PS.
Estamos aqui para ser a esquerda que luta durante toda a vida.
O Estado social existe para apoiar quem precisa, quando precisa.
E é agora, Sr.as e Srs. Deputados, que é preciso. Que é preciso o que este Orçamento promove, de forma
estrutural, em termos de inclusão; que é preciso o que este Orçamento investe em medidas de apoio à criação
e à manutenção do emprego, mas também de apoio à formação e à reconversão, com um reforço do IEFP
(Instituto do Emprego e Formação Profissional) em 49%, atingindo um Orçamento record no valor de 1300
milhões de euros, com foco especial em programas dedicados aos jovens que ficaram desempregados e que
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foram dos primeiros a ser afetados durante a pandemia e também com programas de reconversão dos
desempregados, capacitando-os para um mercado de trabalho naturalmente diferente e exigente.
É agora que é preciso. E por isso, também, os compromissos que assumimos durante todo o diálogo com os
partidos de esquerda quanto a matéria laboral: continuar o aumento do salário mínimo; combater fortemente a
precariedade; regular as novas formas de trabalho e do teletrabalho; o reforço dos direitos dos trabalhadores
nas plataformas digitais; o reforço dos meios de fiscalização; o reforço da ACT (Autoridade para as Condições
do Trabalho); o reforço da segurança social; o reforço das relações coletivas de trabalho;…
Aplausos do PS.
… a garantia de que, durante os momentos de crise, não são colocados em risco os contratos coletivos de
trabalho, estabelecendo legalmente uma moratória de 24 meses relativamente à caducidade; a obrigação de
manutenção do nível de emprego nas grandes empresas com lucros para acesso a benefícios fiscais e linhas
de crédito; a proibição de despedimentos por parte de empresas abrangidas por apoios públicos associados à
pandemia e ao emprego, como fizemos em 2020.
Estas são medidas de um Orçamento que, naturalmente, faz escolhas. Escolhas responsáveis e necessárias,
de um país solidário. Escolhas erradas já tivemos nas crises passadas e sabemos bem onde isso nos levou.
Vivemos tempos de enorme incerteza, com uma crise evidente na procura. Importa atuar, e é isso que
estamos a fazer. Recusar estas políticas, urgentes e necessárias, perante uma crise histórica é colocar-se do
lado errado da História.
Este, Sr.as e Srs. Deputados, é um Orçamento para tempos de emergência, mas é também um Orçamento
que não se limita a olhar para a emergência.
É um Orçamento coerente, com um caminho já feito, que se orgulha desse caminho e que o quer continuar
no futuro, com investimentos estruturais.
Temos de mudar o que tem de ser mudado, assumindo novas respostas que melhor se adeqúem à realidade
e aos desafios que temos, promovendo uma segurança social mais robusta, mais justa, mais digital, mais
próxima das pessoas, com soluções adaptadas às necessidades de cada um e abandonando modelos de
funcionamento e de respostas obsoletos. Por isso, também o nosso compromisso com o investimento numa
revolução digital e no atendimento, também, da segurança social.
As respostas que hoje damos não são só para hoje, são os pilares do nosso futuro.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este é um Orçamento para as mulheres e para os homens que não
baixam os braços, que não desistem de lutar,…
O Sr. Santinho Pacheco (PS): — Que grande resposta!
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — … que todos os dias estão ao serviço dos outros.
Este é o tempo do Estado social e da união de todos os que nele acreditam. Estou certa de que todos
saberemos estar à altura das enormes responsabilidades que os tempos de hoje nos exigem.
Seremos, como sociedade, aquilo que conseguirmos responder em conjunto.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — A Mesa regista 12 inscrições para pedidos de esclarecimento. Entretanto, a Sr.ª Ministra informou que pretende responder em dois conjuntos.
Para formular o primeiro pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Silva, do Grupo
Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes».
A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, os impactos diretos da COVID-19 e a sua utilização como pretexto — e temos de lhe lembrar as alterações à legislação laboral, designadamente o
alargamento do período experimental promovido pelo anterior Governo do PS — levaram a um crescimento
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assustador do desemprego. Há dezenas de milhares de novos desempregados, e os que já estavam nessa
situação não conseguem agora ingressar no mundo do trabalho.
Neste período, muitos dos que estavam desempregados viram as prestações sociais a que tinham direito
caducar. Houve uma prorrogação dos prazos, mas a falta de clareza da legislação levou a interpretações
diversas pelos serviços da segurança social.
A questão que lhe colocamos é a de saber se a Sr.ª Ministra pode garantir que todos os que estavam a
receber uma prestação por situação de desemprego vão ver essa prestação renovada e se aqueles a quem os
serviços indeferiram os pedidos vão poder recuperar essas prestações.
Sr.ª Ministra, o Estatuto da Agricultura Familiar foi criado pelo Decreto-Lei n.º 64/2018, de 7 de agosto, e
regulamentado pela Portaria n.º 73/2019, de 7 de março. Este Estatuto garante o acesso a um conjunto de
direitos a quem for reconhecido pelo mesmo.
Porém, a verdade é que a não disponibilização, por parte do Estado, de meios financeiros, humanos e
técnicos necessários para a concretização desses direitos acaba por os inviabilizar na prática, não se
prosseguindo, assim, os objetivos de proteção da agricultura familiar.
Um desses direitos estabelecidos pelo Estatuto passa pelo acesso a um regime de segurança social
adequado à agricultura familiar. Desse modo, no âmbito do Orçamento do Estado para 2020, Os Verdes
apresentaram uma proposta para garantir a redução em 50% das contribuições para a segurança social aos
agricultores que detêm este Estatuto. Contudo, tal proposta veio a ser rejeitada.
Sr.ª Ministra, tendo em consideração que já decorreram dois anos sobre a publicação do diploma que cria o
Estatuto da Agricultura Familiar sem que tivesse existido uma medida significativa a nível da segurança social,
o Governo vai, em 2021, reduzir as contribuições para a segurança social dos agricultores que detêm este
Estatuto?
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, há dezenas de milhares de trabalhadores precários que já ficaram sem emprego em 2020, e em 2021 essa vaga
vai, provavelmente, agravar-se. Isto aconteceu mesmo em empresas que beneficiaram do layoff simplificado e
de outras medidas e apoios para a manutenção do emprego.
Essas medidas, que têm de existir naturalmente, tinham como contrapartida a proibição do despedimento,
mas nesta proibição o Governo não incluiu os trabalhadores precários. Ou seja, as contrapartidas exigidas às
empresas deixaram de fora todos os trabalhadores precários. Trabalhadores com contrato a prazo,
trabalhadores com contrato efetivo em período experimental, trabalhadores a recibos verdes, trabalhadores em
outsourcing, trabalhadores temporários ficaram de fora de qualquer proteção.
As primeiras vítimas da crise não foram protegidas e não serão protegidas em 2021 com este Orçamento.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — E, no entanto, era a esses trabalhadores precários que a esquerda tinha obrigação de responder…
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — … e é a esses trabalhadores precários que nós queremos responder. Sobre eles, não baixamos os braços, a eles respondemos com o nosso mandato.
Na realidade, Sr.ª Ministra, o modelo da direita para responder à crise em 2011 foi facilitar, desproteger e
embaratecer os despedimentos e cortar a duração do subsídio de desemprego.
Este Orçamento do Estado propõe que o País enfrente a crise de 2021 com as mesmíssimas regras que a
direita inscreveu na lei e cujas consequências já conhecemos: desproteção no desemprego, transferência de
rendimento do trabalho para o capital, empobrecimento.
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Como pode a esquerda aceitar que se enfrente esta crise sem nenhuma alteração nas regras da direita
quanto ao subsídio de desemprego e ao subsídio social de desemprego?
E mesmo a majoração a que o Sr. Primeiro-Ministro ontem se referia e que consta do artigo 111.º da proposta
de lei de Orçamento do Estado é uma majoração que não significa uma alteração à lei do subsídio de
desemprego — basta ler esse artigo do Orçamento para confirmá-lo. É uma majoração para este ano, que vigora
enquanto vigorar a lei do Orçamento e que não indexa em permanência o subsídio de desemprego ao limiar de
pobreza. Cria é uma nova proporção do IAS, o que não é uma alteração estrutural, a menos que estejamos a
brincar com as palavras. Contudo, Sr. Primeiro-Ministro, penso que devemos fazer este debate com o mesmo
rigor com que fizemos as negociações, com que sempre dialogámos, centrando-nos nas respostas e nos
conteúdos concretos.
E se neste debate insistimos no detalhe e na concretização das respostas reais é porque conhecemos os
hiatos entre as proclamações e as concretizações.
O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Duarte Cordeiro): — Mas agora está na lei!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Está na lei e nas cartas que receberam!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Não vale a pena inflacionar os milhões nos anúncios para fazê-los minguar na execução, como acontece, Sr. Primeiro-Ministro, com os trabalhadores informais. Sabe quantos
trabalhadores informais estão a receber, hoje, o apoio que nós negociámos no Orçamento Suplementar? Sabe
quantos são, Sr.ª Ministra? Zero! Zero trabalhadores informais estão a receber esse apoio!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Discutíamos isso, Sr.ª Ministra, há dois dias, na audição que fizemos. O Estatuto do Cuidador Informal, em 2020, devia ter chegado a 200 000 pessoas, em todo o território. No entanto,
o que há são 484 pedidos aprovados. E o subsídio de apoio que, assim, só se aplicava nos 30 concelhos dos
projetos-piloto, deveria ter chegado aos 38 000 cuidadores que estão nesses concelhos. Sabe quantas pessoas
receberam o subsídio de apoio ao cuidador? Foram 32 pessoas — e, Sr.ª Ministra, estes números são seus,
são os últimos que nos deu. Por isso, estamos a falar de uma percentagem absolutamente irrisória em relação
àquilo que era a expectativa.
Nós precisamos de respostas que sejam diferentes das da direita e que tenham efeitos sociais concretos,
muito mais do que efeitos publicitários. É que, Sr. Primeiro-Ministro e Sr.ª Ministra do Trabalho, essa é a
responsabilidade da esquerda para com o povo que aqui representa.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Almeida, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, o Partido Socialista, desde que governa, e as esquerdas que o apoiam na aprovação dos
Orçamentos têm promovido uma injustiça tremenda para com um grupo de pensionistas em concreto.
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
E que pensionistas são esses? Citando o artigo 59.º da proposta de lei de Orçamento do Estado, são os
pensionistas que tenham uma pensão cujo montante tenha sido atualizado no período entre 2011 e 2015, ou
seja, os pensionistas cujas pensões foram aumentadas durante o Governo PSD/CDS-PP.
Que pensionistas são estes? Exatamente aqueles de que o Sr. Primeiro-Ministro falava ontem, aqueles que
têm as pensões mais baixas das mais baixas: os pensionistas da pensão mínima, os pensionistas da pensão
social e os pensionistas da pensão rural. A estes pensionistas, o PS e as esquerdas aumentaram as pensões
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em cerca de metade do que aumentaram aos restantes. Porquê? Porque tinham o «pecado grave» de ter visto
a sua situação reconhecida pelo Governo PSD/CDS.
Protestos do Deputado do PS Tiago Barbosa Ribeiro.
É verdade, mesmo governando depois da bancarrota em que o Partido Socialista nos deixou, mesmo
governando cumprindo as regras do Memorando de Entendimento que obrigava a cortes impostos devido à
governação do anterior Governo socialista, nós não deixámos ficar para trás os pensionistas com as pensões
mais baixas das mais baixas. E nunca pensámos que um Governo de esquerda que viesse a seguir penalizasse
e castigasse esses pensionistas.
Dir-me-á a Sr.ª Ministra, agora, em resposta: «Mas, no acordo deste ano, já acordámos em que, afinal,
recebem todos o mesmo». Só que acordaram isso porque precisavam de votos e não porque perceberam que
socialmente era injusto o que estavam a fazer. Isso diz muito sobre a sensibilidade social deste Governo.
Protestos do Deputado do PS Porfírio Silva.
A sensibilidade social deste Governo é ter votos suficientes para aprovar o Orçamento. Ora, se para isso for
necessário aumentar as pensões mínima, social e rural, muito bem; já se não estiver em causa ter votos para
aprovar o Orçamento, os pensionistas das pensões mínima, social e rural ficam para trás, porque isso não
interessa nada ao Partido Socialista.
Sr.ª Ministra, o CDS fará uma proposta que dará oportunidade ao Partido Socialista de dizer se o que quer
são os votos ou se o que quer é fazer justiça social. A proposta será muito simples e visa devolver a estes
pensionistas o prejuízo que o Governo do Partido Socialista lhes impôs nestes quatro anos. Se aprovarem esta
proposta do CDS, aí sim, estarão a reconhecer a importância dos pensionistas com as pensões mais baixas das
mais baixas.
A segunda questão, Sr.ª Ministra, tem a ver com o seguinte: na audição, realizada anteontem, perguntei-lhe
pelas brigadas de intervenção rápida, que poderão ser rápidas na intervenção, mas na criação é que não o
foram certamente, porque o Governo esperou mais de seis meses para as criar. Perguntei-lhe, em concreto,
sobre a brigada do distrito da Guarda. A Sr.ª Ministra disse-me que existia e que tinha oito pessoas. No mesmo
dia, o Presidente da Câmara Municipal da Guarda pediu que fosse imediatamente criada essa brigada, porque
ela não existia e não estava a trabalhar no terreno.
Neste momento, orador exibiu uma notícia alusiva ao tema.
E se não basta a palavra do Presidente da Câmara Municipal da Guarda, passo a citar o que disse a
vereadora do Partido Socialista, Cristina Correia, da mesma Câmara Municipal: «As brigadas de intervenção
rápida estão a arrancar tardiamente, já deviam estar preparadas antes, porque toda a gente sabia que a situação
ia piorar». Quem o diz é a vereadora do Partido Socialista da Câmara Municipal da Guarda. Toda a gente sabia
— é verdade! — que a situação ia piorar. Os senhores comprometeram-se com a criação destas brigadas. Na
Guarda, estas brigadas não estão a funcionar.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Agradeço que conclua, Sr. Deputado.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Vou terminar, Sr.ª Presidente. O que é que a Sr.ª Ministra pode dizer a estes idosos, que estão no interior, que têm ainda mais dificuldades
e que, obviamente, não podem ficar expostos, como estão hoje, a ouvir os anúncios do Governo e a saber que,
na prática, nada muda com esses anúncios.
Aplausos do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, do Grupo Parlamentar do PCP.
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O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, os problemas na área do emprego e segurança social não nasceram com a COVID-19, mas agravaram-se de uma forma dramática, como sabemos.
Os trabalhadores, os desempregados, os reformados e pensionistas, os idosos e os cidadãos com
deficiências já se encontravam numa situação de fragilidade.
A legislação laboral não está melhor do que nos tempos da troica e o mau funcionamento da segurança
social continua a suscitar profundas preocupações e a acentuar injustiças, como um recente relatório da
Provedora de Justiça veio sublinhar. A reposição de direitos e rendimentos a partir de 2015 não foi irrelevante
— e não a desvalorizamos —, mas a situação em 2020 não é de molde a justificar retrocessos em 2021. Bem
pelo contrário, o que se impõe é uma política audaciosa, de combate aos baixos salários, à precariedade laboral,
à pobreza, às discriminações, às desigualdades e injustiças, que continuam a marcar profundamente a realidade
do nosso País.
Com a COVID-19, o Orçamento do Estado para 2021 passou a ser de emergência nacional, recaindo sobre
a área do emprego e segurança social uma enorme responsabilidade.
Este não pode ser um Orçamento de continuidade, porque não há nenhuma continuidade na situação em
que o País se encontra. Não basta dizer que, na crise em que o País se encontra, o que é preciso é ter um
Orçamento, seja ele qual for, sob pena de agravar a crise. Não, o que pode agravar a crise é ter um Orçamento
que não esteja à altura de lhe dar resposta.
A dimensão da crise que o País atravessa exige uma resposta à altura, não apenas no plano sanitário, mas
também, e incontornavelmente, na resposta aos gravíssimos problemas sociais que estão criados.
As pessoas que passam por tremendas dificuldades não podem ser deixadas para trás. Não é possível
enfrentar esta crise, mantendo políticas de baixos salários e de degradação das condições laborais.
A resposta à crise exige um apoio decidido às camadas sociais mais fragilizadas. O alargamento da rede de
equipamentos sociais de apoio à terceira idade, cujas imensas fragilidades têm sido postas em evidência nos
últimos tempos, e o alargamento da rede de creches e a sua gratuitidade são necessidades sociais
incontornáveis.
Tal como são inadiáveis medidas de reforço do complemento solidário para idosos, o aumento das pensões,
particularmente das mais baixas, a eliminação de penalizações no acesso à reforma por parte de trabalhadores
com longas carreiras contributivas ou por desempregados de longa duração, o alargamento das condições de
atribuição do subsídio de desemprego ou o apoio a trabalhadores que viram os seus rendimentos
dramaticamente afetados pela paralisação da sua atividade económica.
O Orçamento do Estado para 2021 não pode esquecer o reconhecimento que é devido aos trabalhadores
que têm garantido o funcionamento ininterrupto de serviços sociais indispensáveis, em condições de elevada
penosidade, insalubridade e risco, e não pode pactuar com situações em que a COVID-19 seja um pretexto para
despedir ou para cortar salários e direitos aos trabalhadores.
Não basta, Sr.ª Ministra, elogiar os trabalhadores que estão na linha da frente a combater a epidemia, os
trabalhadores que garantem serviços essenciais, os que correm o risco de usar os transportes públicos para ir
trabalhar ou os que, por razões sanitárias, estejam impedidos de ir trabalhar. Os elogios não bastam.
Este Orçamento, para ser socialmente aceitável, tem de dar uma resposta clara, uma resposta que as
pessoas sintam, perante a gravidade dos problemas que as afetam no seu dia a dia. A questão que está em
cima da mesa, Sr.ª Ministra, é a de saber da disponibilidade do Governo para fazer esse caminho durante o
debate na especialidade.
Esperamos uma resposta clara do Governo a este respeito.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helga Correia, do Grupo Parlamentar do PSD.
A Sr.ª Helga Correia (PSD): — Começo por cumprimentar a Sr.ª Presidente, os Srs. Membros do Governo e as Sr.as e os Srs. Deputados.
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Sr.ª Ministra, na sua intervenção inicial, referiu que este Orçamento do Estado deve mobilizar a República,
deve mobilizar todos nós.
Permita-me que lhe diga que este é mais um Orçamento de muitos anúncios e de pouca concretização. Este
é um Orçamento claramente marcado pela ausência do setor social, por uma total ausência e referência ao
papel importantíssimo da economia social — e não somos nós, Grupo Parlamentar do PSD, que o dizemos, di-
lo também a Unidade Técnica de Apoio Orçamental e o Conselho Económico e Social.
Sr.ª Ministra, é importante que se quebrem as barreiras ideológicas. Quem o diz, além de nós, são também
as entidades do setor social. A esse propósito, passo a citar uma frase dita pelas mesmas: «O Estado não apoia
o setor social, é o setor social que apoia o Estado».
Aplausos do PSD.
O Sr. Duarte Marques (PSD): — Bem lembrado!
A Sr.ª Helga Correia (PSD): — Sr.ª Ministra, estas palavras descrevem a falta de atenção dada pelo Estado a um setor importante e que dá um apoio essencial às pessoas que sofrem neste momento com esta pandemia.
A Sr.ª Ministra tem feito anúncios e mais anúncios. Ainda na segunda-feira, anunciou aqui a questão da
Adenda ao Compromisso de Cooperação para o Setor Social e Solidário com um aumento de 3,5% e, depois, o
reforço do apoio aos lares e do apoio domiciliário em 5,5%, quando nós, Grupo Parlamentar do PSD,
questionámos sobre o subfinanciamento do setor social. Sr.ª Ministra, estes anúncios são insuficientes para
fazer face às despesas de um setor tão importante, que se substituiu ao Estado no apoio às pessoas. O Estado
tem de dar essa resposta e não pode deixar as pessoas e esse setor para trás.
A Sr.ª Ministra, na sua audição, falou das falhas das brigadas de intervenção rápida. Admitir essas falhas é
um princípio, Sr.ª Ministra, é verdade. Agora, essas brigadas deveriam estar no terreno atempadamente para
dar apoio às entidades do setor social que estiveram na linha da frente no apoio às pessoas, substituindo-se ao
próprio Estado.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Helga Correia (PSD): — A Sr.ª Ministra veio, mais uma vez, a este Parlamento anunciar um conjunto de medidas para as pessoas, assente numa receita irrealista, porque se baseia em contribuições e quotizações
que são superiores àquelas que foram arrecadadas em 2019 — e estamos a falar de um período em que a
economia crescia. Ora, neste momento, a economia não cresce e o desemprego aumenta, prevendo-se que
aumente ainda mais. Perante isto, como pensa concretizar estas medidas?
Nesta senda de anúncios que tem feito no Parlamento, um outro foi o da atribuição de 30 milhões de euros
para os cuidadores informais. Sr.ª Ministra, 30 milhões de euros para os cuidadores informais é a verba não
executada de 2020, que é transferida para 2021 — é preciso falar verdade!
Continuando ainda nesta senda de anúncios, Sr.ª Ministra, como está a questão da diminuição do prazo de
garantia de acesso ao subsídio de desemprego que está em vigor desde julho de 2020 e que ainda não chegou
às pessoas?
Sr.ª Ministra, o Governo tem obrigação de apoiar as pessoas, tem obrigação de apoiar a ação social, tem
obrigação de apoiar as entidades do setor social, tem obrigação de apoiar as pessoas e de não deixar ninguém
para trás.
Diga-me, Sr.ª Ministra, diga às pessoas como vão concretizar esses anúncios.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Tiago Barbosa Ribeiro, do Grupo Parlamentar do PS.
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O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.ª Ministra, vivemos tempos muito difíceis e incertos nos quais é necessário ter determinação e cabeça fria, aquilo
que revelou, precisamente, na sua intervenção.
Ao final de dois dias de debate, neste momento, já sabemos, não há qualquer dúvida, que este é um
Orçamento do Estado de resposta à crise pandémica, de reforço do Estado social, de estímulo às empresas, de
aumento do investimento público, de valorização dos rendimentos, de fortalecimento do SNS e de apoio social
a quem mais precisa.
De facto, não precisávamos de saber mais para, com um Orçamento destes, saber que o PSD estaria contra.
Aplausos do PS.
O PSD e a direita só sabem reagir à crise e às crises com austeridade. Não aprenderam nada com o que
aconteceu desde 2015. Ouvimos, hoje de manhã, o PSD dizer aqui que este é um Orçamento do Estado de
estilo strogonoff/vegan. Isto não é verdade, repito, não é verdade. Mas, mesmo que fosse, teria certamente
muito mais substância do que o prato vazio de austeridade que serviram aos portugueses durante os quatro
anos em que governaram.
Aplausos do PS.
O PSD não consegue dizer mais nada do que austeridade, do que aumento de impostos, quando olha para
uma crise. Já disseram o mesmo em 2016, disseram o mesmo em 2017, em 2018, em 2019 e dizem agora o
mesmo em 2020.
Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.
Pois se continuarem a errar como erraram ao longo dos últimos anos, o País pode estar confiante no rumo
escolhido, porque o sucesso da nossa governação tem sido, ano após ano, e este não será exceção, a medida
do vosso falhanço enquanto oposição.
O Sr. Deputado João Almeida, na sua intervenção, falou de pensionistas. Sr. Deputado, pensei que o CDS
só falava de pensionistas e de reformados neste Parlamento para lhes pedir desculpa por aquilo que o Sr.
Ministro Mota Soares fez enquanto esteve no Governo.
Aplausos do PS.
Protestos do Deputado do CDS-PP João Pinho de Almeida.
Sabe o que é que aconteceu? Os senhores fizeram cortes de pensões, fizeram cortes de RSI (rendimento
social de inserção). Os senhores cortaram 25% aos beneficiários do complemento solidário para idosos (CSI).
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — E porquê?!
O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Os senhores mantiveram congeladas todas as pensões acima de 262 € e só não fizeram mais porque o Tribunal Constitucional vos impediu de continuarem com os vossos cortes.
Aplausos do PS.
Com isso aumentou a pobreza entre idosos. É esse o vosso legado de políticas sociais para idosos. É esse
o legado da direita.
Protestos do CDS-PP e do CH.
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Não aprenderam nada, mas também não dizem porque é que estão contra. Ouvimos o Sr. Deputado Baptista
Leite dizer que o Governo desistiu disto e daquilo. Mas o que parece é que o PSD desistiu de dizer por que é
que está contra, talvez porque tenha vergonha de o dizer.
Aplausos do PS.
Se está contra, por que razão é que não dizem porquê? Estão contra o aumento do salário mínimo nacional?
Certamente, nenhum Deputado do PSD conseguiria viver com o salário mínimo nacional tal como existe. Estão
contra, talvez, o aumento das pensões? Estão contra as políticas sociais? Estão contra o reforço do SNS? Estão
contra a valorização da escola pública? Talvez estejam contra tudo isto, mas não sabemos. Os senhores
desistiram e têm vergonha de dizer ao País por que razão é que estão contra este Orçamento do Estado.
Aplausos do PS.
Temos mesmo outro caminho. Ouvimos ontem o CDS dizer aqui que este é um Orçamento à esquerda. Pois
é, pois é! E temos muito orgulho nisso. Este é um Orçamento à esquerda.
Aplausos do PS.
É um Orçamento que dá sequência ao caminho que firmámos desde 2015 com o Partido Comunista
Português, com o Bloco de Esquerda, com o PEV e com o PAN. Aprofunda várias das suas dimensões e vai
mais além, o que é tão mais significativo perante a dimensão da crise que hoje vivemos.
As prioridades do Orçamento na área do trabalho e da segurança social foram devidamente explanadas e
aprofundadas pela Sr.ª Ministra. Não as vou repetir.
Protestos do Deputado do PSD Duarte Marques.
Posso dizer que todas as medidas representam 22 385 milhões de euros, o que demonstra bem a prioridade
que damos ao reforço dos nossos sistemas de proteção social.
Infelizmente, repito, infelizmente, nada disto foi suficiente para a viabilização do Orçamento por parte do
Bloco de Esquerda. Compreendemos, politicamente, o voto contra do PSD e da direita, porque o Orçamento do
Estado se posiciona à esquerda, porque o defendemos nesse campo. Mas apenas podemos registar com
desilusão a posição que foi assumida e anunciada pelo Bloco de Esquerda.
O Sr. André Ventura (CH): — Oh!
O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Nós, Partido Socialista, para a especialidade, não queimamos nenhuma ponte, não perdemos o foco da nossa orientação. Não está em causa a preservação das diferenças
que animam naturalmente os diferentes partidos, as suas identidades. Elas continuarão a fazer parte da
identidade de cada partido. Mas está em causa a convergência em torno de um programa comum de
recuperação económica e de combate à crise que não deixa de reforçar os serviços públicos, a proteção social,
os rendimentos e os direitos dos trabalhadores.
Aplausos do PS.
Assim termino, Sr.ª Ministra, pedindo-lhe que aprofundasse os compromissos em matéria social e laboral e
dissesse de que forma estas marcas distintivas na sua área do Orçamento do Estado nos posicionam claramente
no espírito, no caminho e na identidade do programa político que, sob a liderança do Partido Socialista, vimos
construindo em conjunto desde 2015.
Aplausos do PS.
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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para responder a este primeiro conjunto de pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho.
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Mariana Silva, antes de mais, quero concordar com aquilo que transmitiu sobre a forma como a
pandemia pôs a nu as fragilidades que temos, do ponto de vista do número de pessoas que ficaram a descoberto
em termos de proteção social.
Temos procurado, ao longo destes meses, responder a todas as situações das pessoas que estão sem
proteção social. Basta dizer que, neste momento, já temos cerca de 2 milhões e 200 mil pessoas abrangidas
pelos apoios extraordinários que já foram pagos, muitos deles refletindo muitas situações que estavam
completamente a descoberto, nomeadamente quanto aos trabalhadores informais.
Em termos da prorrogação de situações de proteção de desemprego, neste momento, já foram abrangidas
cerca de 60 000 pessoas por essas prorrogações extraordinárias de subsídio de desemprego, inicialmente até
julho, e também de subsídio social de desemprego.
Também abrangemos, com estas medidas extraordinárias, 170 000 trabalhadores independentes, que, se
não tivessem sido criadas estas medidas, estariam completamente a descoberto.
Evidentemente, a nossa preocupação tem sido conseguir responder às necessidades das pessoas, por um
lado, e, por outro, também criar mecanismos extraordinários e operacionalizá-los da forma mais ágil possível.
Verdadeiramente tem sido um desafio enorme por parte da segurança social. Basta pensarmos que a
segurança social paga, anual e regularmente, prestações a cerca de 4 milhões de pessoas para percebemos o
esforço que teve de fazer para, em dois meses, pagar a 2 milhões e 200 mil pessoas.
Pergunto se haveria outro sistema que não o da segurança social pública que conseguisse pagar o que a
segurança social conseguiu, com todas as dificuldades que teve e que tem, naturalmente.
Aplausos do PS.
Por isso a nossa grande aposta no investimento forte e numa revolução digital na segurança social, com um
investimento previsto de 200 milhões de euros no plano de recuperação com esta prioridade.
Queria manifestar também a nossa disponibilidade para trabalhar no âmbito do estatuto da agricultura
familiar, durante o processo do Orçamento, em colaboração com o Ministério da Agricultura. Portanto, o Governo
estará disponível para trabalhar.
Sr. Deputado José Soeiro, de facto, temos tido um processo de diálogo sério, longo, profundo, com
resultados. E esses resultados também estão refletidos naquela evolução que temos feito na construção deste
Orçamento e deste caminho que temos traçado. Confesso que sinto alguma incompreensão em perceber como
é que não conseguimos chegar a este diálogo e continuar o caminho que traz melhores soluções para as
pessoas.
Exemplo deste diálogo foi exatamente a forma como fomos evoluindo na criação desta prestação
extraordinária, fruto da identificação de problemas que fizemos em conjunto, mas também ao nível da evolução
da própria norma relativamente à manutenção do nível de emprego, em que incluímos os trabalhadores
independentes economicamente dependentes precisamente para salvaguardar a situação destas pessoas.
Protestos do Deputado do BE José Moura Soeiro.
Por outro lado, reitero que, com o layoff simplificado, foram abrangidas cerca de 890 000 pessoas, tendo os
seus contratos de trabalho ficado protegidos através deste apoio que tinha como contrapartida a proibição de
despedimentos coletivos e de extinção de posto de trabalho, coisa que manteremos.
Aplausos do PS.
Mas quero dizer também que o nosso diálogo foi mais longe, na medida em que também se fez ao nível das
relações laborais e daquilo que nos move no sentido do combate à precariedade.
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Temos de olhar para a frente e não para trás. Temos de conseguir construir soluções que respondam aos
desafios de hoje e que os jovens também sintam que é para eles que estamos a construir respostas e a criar
condições para termos, cada vez mais, relações de trabalho estáveis e emprego sustentável. É esse o nosso
compromisso e foi nesse sentido, aliás, que apresentámos muitas medidas muito concretas, relativamente às
quais penso que todos os trabalhadores têm a ganhar.
Também em relação aos cuidadores informais, todos sabemos que a pandemia atrasou o processo,
nomeadamente até nos pedidos. Tivemos, até agora, cerca de 2700 pedidos, no universo que o Sr. Deputado
identificou de universo potencial. Percebemos que tem havido também uma dificuldade de mobilização das
pessoas para fazerem os pedidos nos momentos que vivemos, mas estamos sempre a procurar evoluir e a
simplificar o processo.
Ainda hoje foi publicada a portaria, que assinei na segunda-feira. para simplificar o processo. No momento
em que a emissão de atestados por parte dos médicos era mais difícil, eliminámos também esse passo para,
nesta fase, ser mais fácil o processo.
Sr. Deputado João Almeida, penso que sobre as pensões estamos entendidos, nomeadamente porque se
esqueceu do que o CDS e o PSD fizeram em tempos idos.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ai estamos?!
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — Sr. Deputado António Filipe, não podia estar mais de acordo sobre a necessidade de investimento nos serviços públicos e de termos serviços públicos
mais robustos e mais fortes.
Tivemos um reforço de 200 pessoas para a segurança social, mas é preciso continuar esse caminho,
reforçando o papel e a capacidade de resposta da segurança social, e também alargar a capacidade de resposta
em termos de equipamentos sociais, seja através do alargamento desses equipamentos públicos, seja através
da rede social.
É nesse sentido, aliás, que temos um compromisso, através do Plano de Recuperação e Resiliência, em que
temos um programa de 420 milhões de euros dedicados ao aumento da capacidade de resposta, tendo ficado
evidente que é algo crítico no momento que vivemos.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Vamos continuar com os pedidos de esclarecimento. Para o efeito, tem a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do Grupo Parlamentar do PAN.
A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, de forma muito breve, em 36 segundos, queria focar um dos temas que nos traz várias preocupações neste Orçamento do Estado: políticas para pessoas com
deficiência.
Entendemos que é necessário ir mais além e gostaríamos de saber se, em sede de especialidade, a Sr.ª
Ministra e o seu Governo estão disponíveis quer para um plano estratégico para pessoas com deficiência a
médio prazo, numa perspetiva, por exemplo, de 10 anos, quer para medidas cirúrgicas, quer para dar mais
condições aos cuidadores de pessoas com incapacidade superior a 60%.
Dar-lhe-ia um exemplo muito simples: estas pessoas têm muita dificuldade no seu trabalho, pelo regime
laboral, sendo, muitas vezes forçadas a trabalhar por turnos. Sabemos que os equipamentos sociais têm um
horário próprio e, portanto, parece-nos que seria fundamental rever, no fundo, estas condições para os
cuidadores de pessoas com mais de 60% de incapacidade.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Costa, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
O Sr. Jorge Costa (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, o debate já vai longo. De tão repetidas, já sabemos de cor as alterações à lei laboral que a troica plantou há anos e o efeito que tiveram no empobrecimento e na
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vulnerabilização da classe trabalhadora em Portugal. O peso dos salários caiu sempre nos anos da troica e
nunca mais recuperou, fruto dessas regras que não mudaram.
Ao longo destes dois dias, não se ouviu uma única palavra de explicação do Governo para recusar qualquer
alteração àquelas leis do trabalho.
Portanto, nesta fase final, peço-lhe que quebre esse tabu e nos explique porquê. Porquê a sistemática recusa
do Partido Socialista em repor as regras que defendeu em 2012 sobre a indemnização por despedimento? Por
que razão é que é tão importante suspender por dois anos a caducidade da contratação coletiva, que é uma
forma de o Governo reconhecer o perigo que esta caducidade representa para os trabalhadores numa fase
destas, mas é impossível acabar de vez com ela? Portanto, é má durante estes dois anos e deve ser suspensa,
mas passa a ser boa ao fim de dois anos e deve ser reposta. Qual é a dificuldade de reconhecermos o erro que
foi a caducidade dos contatos coletivos na norma imposta no tempo da troica e de acabar com ela?!
Sr.ª Ministra, peço-lhe que convença o Parlamento e convença os portugueses de que a troica tinha razão.
Ainda não se ouviu aqui essa explicação e é isso que lhe peço. Convença o País que Passos Coelho nos deixou
uma lei laboral melhor do que aquela que tínhamos antes e que, por isso, o Governo recusa as propostas do
Bloco.
Por favor, Sr.ª Ministra, não nos responda com o famoso acordo sobre trabalho no horizonte da Legislatura,
que, ainda ontem, o Sr. Primeiro-Ministro aqui referiu novamente. Esse documento, afinal, não é mais do que a
proposta que o próprio Governo entregou já à concertação social há duas semanas e que hoje a Sr.ª Ministra
aqui apresentou nas suas medidas essenciais. Talvez por isso, por não tocar em nada daquilo que é central e
que o Bloco de Esquerda colocou, a reação, fosse de patrões, fosse de sindicatos, tivesse sido apenas de
empatia.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Diana Ferreira, do Grupo Parlamentar do PCP.
A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra: A situação vivida diariamente pelos trabalhadores e pelas famílias, no nosso País, exige, de forma ainda mais urgente, o reforço de direitos,
da proteção social e de respostas públicas que assegurem o cumprimento de direitos sociais.
Registamos o que o Governo assumiu em matéria de aumento extraordinário das pensões, 10 €, em janeiro,
como, aliás, o PCP vem defendendo há já vários anos, sendo que o PCP defende que o aumento extraordinário
tem de abranger todos os pensionistas.
O aumento do limite mínimo do subsídio de desemprego, a medida de apoio extraordinário, registamo-la, Sr.ª
Ministra, mas tal não inibe, não esconde nem substitui a necessidade de se ir bem mais longe na proteção social.
É a realidade quotidiana dos trabalhadores do nosso País que o exige.
Dos mais de 410 000 desempregados registados, cerca de 37% são desempregados de longa duração.
Somam-se as largas dezenas de milhares de desempregados que não estão inscritos nos centros de emprego.
Aos trabalhadores sem a devida proteção social, que sofreram cortes nos salários, que ficaram, de um dia
para o outro, sem remuneração, é urgente dar resposta. É preciso reforçar os montantes das prestações por
desemprego, reduzir os prazos de garantia, melhorar as condições de acesso, prolongar o tempo de pagamento
e articular prestações por desemprego com uma prestação para quem não tem acesso a qualquer mecanismo
de apoio social, indo muito mais além do que está considerado, de forma a abranger mais trabalhadores e
garantir mais proteção social.
A precariedade do trabalho é a precariedade da proteção social e são muitos os trabalhadores com vínculo
precário que estão excluídos do acesso a prestações sociais — falsos recibos verdes, trabalhadores
temporários, outsourcing, que são pagos à peça, ou à hora, em período experimental, trabalhadores informais.
É preciso garantir que todos têm a justa e necessária proteção social.
É preciso assegurar aos trabalhadores dos serviços essenciais (incluindo os do setor privado) um subsídio
que reconheça o risco acrescido a que estão expostos neste contexto.
É preciso eliminar de vez a caducidade da contratação coletiva — não é moratória, não é suspensão, é
revogação da caducidade da contratação coletiva.
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É preciso resolver o problema dos desempregados de longa duração, que sofrem pesadas penalizações no
acesso à reforma, porque são considerados velhos para trabalhar e novos demais para se reformar.
É preciso corrigir injustiças para quem já se reformou com brutais penalizações; melhorar o complemento
solidário para idosos, reforçar os direitos das pessoas com deficiência.
É preciso alargar e reforçar a proteção social, como o PCP tem defendido e não será por falta de proposta
do PCP que estes problemas não serão resolvidos.
A questão que se coloca é que resposta quer dar o Governo a estes trabalhadores, aos reformados e às
pessoas com deficiência no nosso País.
Sr. Ministra, o PCP tem-se batido pela gratuitidade das creches, por uma resposta universal que garanta este
direito a todas as crianças.
Por insistência do PCP, assegurou-se essa gratuitidade no primeiro escalão, estando neste momento inscrita
a abrangência ao segundo escalão, mas é preciso alargar essa gratuitidade aos demais escalões, aliando o
objetivo de criação de uma rede pública de creches, reforçando a capacidade existente com vagas em resposta
pública, como o PCP defende.
E o mesmo para os equipamentos de apoio a idosos, nomeadamente lares. É preciso reforçar o número de
trabalhadores nos lares, garantindo-lhe um vínculo laboral com direitos, mas não podemos tratar esta questão
com remendos. É preciso intervir para resolver o problema de fundo, assumindo o Estado as suas
responsabilidades.
É fundamental a criação de uma rede pública de lares, que alargue o número de vagas para responder às
listas de espera e até a situações em que muitos são empurrados para respostas ilegais.
Vai o Governo assumir esse compromisso e acompanhar as propostas do PCP que solucionam efetivamente
todos estes problemas?
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ofélia Ramos, do Grupo Parlamentar do PSD.
A Sr.ª Ofélia Ramos (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje tivemos conhecimento de um relatório da Provedoria de Justiça que denuncia um gravíssimo atropelo aos
direitos dos cidadãos por parte do Estado.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade!
A Sr.ª Ofélia Ramos (PSD): — Refiro-me ao relatório que resultou da inspeção levada a cabo pela Provedoria de Justiça às seções de processo executivo da segurança social, na sequência de inúmeras denúncias que
chegaram àquela entidade.
No âmbito desta inspeção, foram detetadas um conjunto de práticas irregulares e altamente lesivas dos
direitos dos cidadãos, no âmbito das execuções fiscais promovidas pela segurança social. Aqui refiro-me —
quem o diz é a Provedoria — a práticas que se reportam, entre outras, a situações de cobrança de dívida
inexistente, a penhoras de contas bancárias acima do legalmente permitido, à demora injustificada na restituição
de valores indevidamente cobrados ou, ainda, à não notificação atempada e correta dos prazos de pagamento
de dívidas.
Se esta situação já é grave por natureza, mais grave se torna num momento particularmente difícil para as
famílias e para as empresas como aquele que atualmente vivemos.
Estas práticas lesivas levadas a cabo pela segurança social contribuem, em muito, para agravar a difícil
situação económica e social de todos aqueles que viram as suas contas bancárias penhoradas indevidamente
ou, ainda, de todos aqueles que pagaram dívidas à segurança social que não eram devidas.
Ora, isto não é o que se espera do Estado, espera-se, sim, respeito pelos direitos e interesses legalmente
protegidos dos cidadãos. Que confiança podem ter as famílias e as empresas na segurança social quando esta
atua de forma lesiva dos seus direitos e interesses?
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Sr.ª Ministra, a Provedoria de Justiça recomenda à segurança social e ao Governo uma rápida correção das
práticas mais gravosas detetadas e ainda que seja cobrado tudo o que é devido mas apenas o que é devido,
pois esta é a única forma de conciliar eficiência na cobrança com o respeito pelos direitos dos cidadãos.
Sr.ª Ministra, perante este gravíssimo atropelo aos direitos dos cidadãos, pergunto o que tem a dizer aos
milhares de famílias e empresas que confiam na segurança social e que viram os seus direitos lesados? Do
Estado espera-se confiança e segurança, mas aqui com o que podemos contar é com incerteza e insegurança.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elza Pais, do Grupo Parlamentar do PS.
A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje, os portugueses e as portuguesas esperam que este Orçamento, com forte pendor social, seja aprovado. Esperam que encontremos
as melhores soluções para as suas vidas, que foram severamente atingidas por esta crise, esperam que
rapidamente voltemos ao rumo de crescimento de prosperidade, mas sobretudo de confiança e esperança no
futuro.
É imperativo ganhar o futuro e este é um Orçamento que combate as desigualdades em diversos domínios
de governação, desde logo, como a Sr.ª Ministra já disse, assegura o nível digno de rendimentos para as
pessoas severamente afetadas pela crise; dá prioridade ao combate a situações de pobreza e de exclusão
social; protege os idosos em todo o território com novas respostas sociais; garante mais creches gratuitas;
dispensa o pagamento de taxas moderadoras nos cuidados de saúde primários; reforça o valor da bolsa para
os estudantes, mas reforça também o combate à violência doméstica, à xenofobia e ao racismo.
Este é um Orçamento para combater as desigualdades estruturais que a crise pôs a nu. É um Orçamento de
esquerda? Sim! É um Orçamento que não abandona ninguém? Sim! É um Orçamento que reconstrói a
economia, que recusa a austeridade e o empobrecimento. Votar contra este Orçamento é que é abandonar as
pessoas que neste momento precisam de nós.
Por isso, Sr.ª Ministra, relativamente a um grupo muito vulnerável, que são as famílias monoparentais, para
quem as políticas socialistas muito se têm virado, no sentido de as apoiar, deixo-lhe a seguinte pergunta: como
é que vamos apoiar estas famílias monoparentais, tendo em conta as suas dificuldades de conciliação, que
foram tão afetadas por esta crise?
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para formular o último pedido de esclarecimento à Sr.ª Ministra, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alma Rivera, do Grupo Parlamentar do PCP.
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, ter um vínculo de trabalho precário quer dizer não poder fazer planos, não poder
exercer direitos, não contar com a estabilidade no trabalho como elemento estruturante na vida, não ter
tranquilidade, não ter segurança, não ter perspetivas.
A precariedade é um dos grandes problemas do nosso País e impede as novas gerações de concretizarem
sonhos e de construírem a sua vida.
Cerca de 45 000 dos trabalhadores desempregados têm menos de 25 anos e desses muitos são
trabalhadores que oscilam entre precariedade e desemprego, porque a lei permite, porque a lei não é cumprida
nem feita cumprir.
Ter um vínculo precário é estar numa situação de desproteção social. Com a epidemia, aquelas centenas de
milhares de trabalhadores que foram descartados porque estavam a recibos verdes, em trabalho temporário ou
no período experimental ficaram duplamente prejudicados porque ficaram sem emprego e sem apoios.
A verdade é que sempre que alguém perde outro alguém ganha e a fragilidade dos vínculos, a desregulação
do trabalho, a precariedade serve para engrossar lucros, tornando o trabalho mais barato. Sacrificam-se famílias,
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sacrificam-se os mais jovens e a sua possibilidade de projetar e de construir, mas sacrifica-se também o País
como um todo.
A precariedade sai cara, desperdiça energias e conhecimentos, desperdiça também receita, porque são os
rendimentos que alimentam o circuito económico e resulta, também, em menos contribuições para a segurança
social.
A proposta de Orçamento do Estado, apresentada pelo Governo, não dá resposta a este como a outros
problemas e necessidades do País. Quando devia ser o Governo, logo na Administração Pública, a assumir o
combate à precariedade e a dar o exemplo, é precisamente o Governo a recorrer a contratos emprego-inserção
e a todas as formas de trabalho precário para colmatar insuficiências nos serviços públicos.
Faltam milhares de funcionários nas escolas, como também faltam nos centros de saúde, nos hospitais e
noutros serviços e o Governo opta por meter pessoal a fazer uns meses e umas horas.
O princípio de que a que cada necessidade permanente deve corresponder um vínculo efetivo tem de valer,
tanto no setor público, como no setor privado. O Orçamento, não sendo o único instrumento para combater o
problema estrutural da precariedade, é um dos instrumentos disponíveis. Para lá das alterações de fundo, desde
logo no Código do Trabalho, o Orçamento do Estado para 2021 é um desses instrumentos de combate à
precariedade e o Governo não está a utilizá-lo, e ao não assumir como elemento central da sua política o
combate à precariedade não está a assumir esta batalha.
É o Governo que tem a faca e o queijo na mão. Vai ou não vincular os trabalhadores que foram chamados
para responder ao vírus na Administração Pública, que foram contratados a prazo e com recurso a todas as
formas de trabalho precário?
Vai ou não ultrapassar a falta de pessoal nos serviços públicos, na educação e na saúde, preenchendo as
necessidades permanentes com vínculos efetivos?
Vai ou não reforçar a ACT e dar-lhe os meios para controlar o cumprimento dos direitos de quem trabalha?
Quanto é que concretamente está alocado à luta contra a precariedade? Que meios?
Vai ou não vai haver uma orientação política clara e firme de combate à precariedade?
São estas as opções que centenas de milhares de trabalhadores, tantos jovens, famílias inteiras, precisam
de ver clarificadas e são essas as opções de fundo que o PCP desafia a Governo a assumir.
Aplausos do PCP.
Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Eduardo Ferro Rodrigues.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, procurando fazer aqui um resumo das várias perguntas que me foram colocadas, diria que, de facto, este
Orçamento do Estado vem responder exatamente aos problemas e às fragilidades que a pandemia pôs a nu no
domínio da proteção social, na quantidade de situações que estavam a descoberto, e a que, com este
Orçamento do Estado, vimos responder através da nova prestação social.
Mas, além da nova prestação social, que abrangerá cerca de 258 000 pessoas, temos também aqui o
aumento do valor mínimo do subsídio de desemprego, que abrangerá 130 000 pessoas, ou, ainda, o pagamento
do diferencial para aqueles que recebem o subsídio social de desemprego, que abrangerá 16 000 pessoas, ou
para os trabalhadores sem proteção social, que, neste momento, apresentaram pedidos ao abrigo da medida
excecional criada, que também abrangerá 16 000 pessoas.
Procurámos, de facto, encontrar formas de, por um lado, responder a quem estava sem proteção mas, por
outro lado, também a quem tinha os seus rendimentos desprotegidos, através de reforço das medidas de
proteção social, a par, naturalmente, do combate à pobreza, nomeadamente dos idosos, através do aumento
das pensões até 1,5 IAS, ou do reforço do abono de família para apoio às famílias, além da medida da
gratuitidade das creches.
Em relação às fragilidades no mercado laboral, que ficaram evidentes face à pandemia, o nosso compromisso
tem sido o de sempre. Aliás, já houve alterações à legislação laboral, elogiadas, inclusivamente, pela OIT, sobre
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a forma como temos conduzido uma política de combate à precariedade, mas, claramente, essa tem de ser uma
das nossas prioridades globais como País, seja com alguns instrumentos concretos que propusemos ao longo
das negociações com os partidos de esquerda, nomeadamente o combate ao recurso abusivo ao trabalho
temporário, como o alargamento da ação especial para reconhecimento do contrato de trabalho nas situações
de utilização indevida do trabalho temporário. São medidas muito concretas e é isso que queria frisar.
Claramente, este combate à precariedade tem de ser uma missão conjunta, coletiva, do País, mas com
medidas concretas e sem andar para trás, andando para a frente, respondendo aos problemas e desafios
presentes e futuros, regulando as novas formas de trabalho, protegendo os trabalhadores das plataformas, sem
linhas vermelhas. O que nos interessa é dar respostas concretas às pessoas, que mudem as suas vidas e lhes
garantam estabilidade no emprego.
O Orçamento do Estado também procura dar resposta às pessoas mais vulneráveis, seja às pessoas com
deficiência, seja às pessoas mais velhas, e também aqui com um reforço do apoio ao setor social e às instituições
que respondem em primeira linha a estes públicos. Só a título de exemplo, mostro-vos este gráfico,…
Neste momento, a oradora exibiu um gráfico.
… para relembrar ao PSD e ao CDS o que foi a evolução dos apoios ao setor social, que, certamente, já não
têm presente. Nos últimos anos, reforçámos em 300 milhões de euros o orçamento dedicado aos acordos de
cooperação.
Aplausos do PS.
Contas feitas, o Governo CDS/PSD reforçou-o em 117 milhões de euros, nós reforçámo-lo no triplo. E o
Governo CDS/PSD certamente lembra-se do que fez: aumentou o número de camas em lares, mantendo os
mesmos equipamentos, portanto, enchendo os equipamentos.
Aplausos do PS.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não sabe o que está a dizer!
A Sr.ª Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social: — Em relação às pessoas com deficiência, apresentamos uma medida estrutural para o programa Valor T, para inclusão no mercado de trabalho das
pessoas com deficiência como fator crítico para promoção da sua independência. Além disso, temos também,
cada vez mais, uma grande preocupação em criar e melhorar medidas que, de facto, discriminem positivamente,
nomeadamente em termos de discriminação das licenças, para que haja uma maior e efetiva conciliação da vida
pessoal, familiar e profissional.
Termino, dizendo que muitas foram as medidas concretas que fomos negociando e apresentando aos
partidos de esquerda e espero que seja um caminho que continuemos a trilhar em conjunto, porque é isso que
o País espera de nós.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — A Mesa regista ainda um pedido de intervenção, da Sr.ª Deputada Isaura Morais, do Grupo Parlamentar do PSD.
Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Isaura Morais (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A história do PSD é indissociável da sua ligação ao poder local, assente no protagonismo dos seus
autarcas e na importância que sempre deu às autarquias.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
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A Sr.ª Isaura Morais (PSD): — Os cidadãos e as empresas reconhecem o seu papel de administração de proximidade e têm uma relação direta e quotidiana com a atividade das autarquias locais.
A emergência de saúde pública ocasionada pela doença COVID-19 constituiu uma calamidade pública que
exigiu medidas excecionais da administração local e deveria, como tal, ter tido respostas excecionais por parte
do Governo.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
A Sr.ª Isaura Morais (PSD): — O poder autárquico é, porventura, uma das maiores conquistas do Portugal democrático, sempre presente ao serviço das populações, em especial quando os outros poderes falham ou
estão ausentes dos territórios.
A ação dos autarcas, neste contexto de emergência de saúde pública, foi e continua a ser um trabalho notável
e imprescindível, quer em termos de apoio, quer de empenho e proximidade, multiplicando-se em esforços e
soluções, mobilizando meios, recursos e organização. O seu contributo na reação à situação epidémica e na
mitigação dos seus impactos sociais e económicos é inquestionável e tem sido evidenciado praticamente por
todas as forças políticas.
O Governo, como lhe compete, tomou medidas extraordinárias e de caráter urgente dirigidas às autarquias,
para resolver a situação pandémica, materializadas em vários diplomas, que foram alvo de sucessivos
aperfeiçoamentos, medidas que neste Orçamento do Estado são prorrogadas até 31 de dezembro de 2021,
através de autorização legislativa. Só que a maioria desta legislação direcionada às autarquias apenas se cinge
a um conjunto de diplomas que procedem a um mero ajustamento das medidas necessárias à adaptação da
administração local às atuais circunstâncias, para viabilizarem o seu adequado funcionamento, sem quaisquer
indicações de valores ou concretização de medidas excecionais aplicáveis às autarquias locais e entidades
intermunicipais, o que contraria o discurso do Sr. Primeiro-Ministro, António Costa, e da Sr.ª Ministra Alexandra
Leitão relativamente ao papel destas entidades no combate a esta pandemia.
Esta proposta de Orçamento do Estado não traz medidas que contribuam para um efetivo e necessário apoio
à liquidez das autarquias e para atenuar o enorme esforço financeiro em que as mesmas incorreram para
responder à situação que vivemos.
Por isso, não nos surpreendeu que ontem, no dia em que o Orçamento do Estado começou a ser discutido
na generalidade, o Conselho Geral da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) tenha aprovado,
por unanimidade, uma resolução relativa à proposta de lei do Orçamento do Estado para 2021 concordando
com o parecer desfavorável proposto pelo Conselho Diretivo da Associação.
A ANMP considera que é fundamental que o Orçamento do Estado para 2021 inclua os meios que permitam
que os municípios sejam ressarcidos das despesas que estão a suportar no âmbito da COVID-19, para evitar
que os municípios sejam colocados numa situação de défice orçamental. O Orçamento do Estado para 2021
não pode colocar em causa o enorme esforço de estabilização financeira que tem sido feito na generalidade dos
municípios.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, a proposta de Orçamento do Estado para
2021 é uma proposta que revela o incumprimento de vários preceitos legais relacionados com as autarquias,
quer no que respeita à Lei das Finanças Locais, quer no que respeita ao processo de descentralização.
Em matéria do Fundo Social Municipal (FSM) verifica-se a não observância das regras de cálculo. Apesar de
o Orçamento do Estado para 2020 determinar a constituição de um grupo de trabalho para apurar os montantes
relativos à repartição do FSM até ao terceiro trimestre de 2020, de modo a que o mesmo possa já estar refletido
nas transferências a realizar no Orçamento do Estado para 2021, por que razão é que o valor expresso na
proposta de lei do Orçamento do Estado para 2021 representa o mesmo valor de 2015, ou seja, igual ao de
2020 e inferior ao de 2019?
Esta questão é tão mais importante em contexto da situação que se vive, dado que este fundo tem finalidade
social, nomeadamente, para apoios sociais na educação e apoios para despesas no âmbito da COVID-19.
Em relação ao financiamento da descentralização, por que razão continua a não ser inscrita a previsão dos
montantes globais envolvidos no Fundo de Financiamento da Descentralização e dos montantes discriminados
que caberão a cada município que já aceitou competências?
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Verificam-se dois pesos e duas medidas: por um lado, consta na proposta de Orçamento do Estado para
2021 o montante das transferências de verbas para financiar novas competências das freguesias, discriminado
por concelho e freguesia, mas o mesmo não acontece quanto aos municípios, pois não aparece no orçamento
global nem aparece discriminado por município.
Não posso terminar, Sr. Presidente, sem realçar que as autarquias estão na linha da frente do esforço coletivo
para debelar os devastadores efeitos desta crise desencadeada pela pandemia. Este é um facto que não é
passível de ser ignorado. Também não podem ser ignoradas as nefastas consequências dessa ação nos
orçamentos e gestão financeira municipais, seja no curto, seja nos médio e longo prazos.
Se também os autarcas portugueses se manifestam de forma desfavorável a este Orçamento do Estado para
2021, mais um argumento, entre tantos outros apresentados, para o PSD votar contra. Mas, no mínimo, os
autarcas merecem mais do Governo.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Não havendo mais inscritos para intervir, podemos passar ao segundo ponto da nossa agenda de hoje, o encerramento da discussão, na generalidade, das Propostas de Lei n.os 60/XIV/2.ª (GOV) —
Aprova a Lei das Grandes Opções para 2021-2023 e 61/XIV/2.ª (GOV) — Aprova o Orçamento do Estado para
2021.
Para abrir esta fase final, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate orçamental, na generalidade, confirmou que a recuperação económica de
Portugal e a construção das bases para um País mais desenvolvido não é uma prioridade deste Governo, nem
do PS, nem da extrema-esquerda.
Nestes dois dias tivemos arrufos públicos na geringonça, tivemos uma barganha despudorada para se
agarrarem ao poder, tivemos exercícios de retórica pouco convincente. O que não tivemos foi um debate sobre
o que o País tem de fazer para iniciar efetivamente a recuperação e sair desta crise mais forte.
Só que estes arrufos e esta barganha têm custos bem reais para os portugueses. Para que a extrema-
esquerda volte para os braços do PS, o Governo está disposto a tudo. Só ontem, aqui, já concordou em rever a
abrangência da nova prestação social e antecipar o aumento das pensões para janeiro. Num só dia, mais de
300 milhões de euros de despesa adicional. Isto promete ser um maná, mas só para alguns.
Há dinheiro para clientelas eleitorais ou políticas; há dinheiro para investimento público de retorno inexistente
ou duvidoso; não há dinheiro para um plano concreto para recuperar os atrasos do SNS e salvar vidas, mas
enterram-se 1700 milhões de euros na TAP; não há medidas que estimulem o investimento privado, mas
reservam-se quase 800 milhões de euros para aumento das clientelas da função pública; não há, sequer, uma
tentativa de evitar a emigração de talento jovem, mas há dinheiro para obras faraónicas.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Portugal deixou de crescer sustentadamente há 20 anos, ou mais.
Enquanto outros países da União Europeia cresciam e se desenvolviam, Portugal estagnou e viu-se
ultrapassado. A pergunta é: porquê?
Será que os países que nos ultrapassaram têm gigantescos recursos naturais? Não têm. Será que não
estiveram sob ditaduras comunistas no século passado? Estiveram, sim senhor. Será que esses povos são mais
capazes do que nós? Não são. Pelo menos para o Iniciativa Liberal, não são.
A explicação para o nosso retrocesso é simples: temos demasiado Estado nas nossas vidas, nas nossas
empresas e na nossa sociedade. Um Estado pesado, caro, incompetente e gerador de dependências e
compadrios que impede os portugueses de darem o melhor de si.
A visão que o Iniciativa Liberal tem para Portugal é bem diferente. Porque confiamos nos portugueses,
queremos libertá-los das limitações excessivas que o Estado hoje lhes impõe.
Queremos um País com pessoas cada vez mais autónomas, menos dependentes de um Estado que devia
ser mais pequeno mas muito mais eficaz na proteção dos direitos e das liberdades dos portugueses.
Por isso, vamos apresentar as nossas propostas de cariz liberal durante a fase da discussão na
especialidade. Propostas para que o sistema de saúde dê resposta à pandemia sem esquecer as outras doenças
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e se prepare para dar liberdade de escolha aos portugueses, propostas para desagravar e simplificar os
impostos das pessoas e das empresas, para equilibrar as relações das pessoas com o Estado, para reduzir
custos de contexto, para reformar e descomplicar o Estado, para tornar, também, a justiça mais célere e
combater eficazmente a corrupção.
Portugal não se pode atrasar mais nem a mudança pode ser adiada. Porque este Orçamento trata mal o
nosso presente e ignora o nosso futuro, assumimos o nosso voto contra um Orçamento que atrasa a
recuperação e adia Portugal.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega. Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas: Este é o Orçamento do medo e dos amedrontados. É o Orçamento do medo porque teve sempre
subjacente a ameaça de que se não o aprovam vem aí uma crise terrível. Usando as palavras do Sr. Primeiro-
Ministro, se não aprovarmos este Orçamento, em março estaremos a discutir o inevitável, ou seja, quando é que
se dissolve a Assembleia da República.
Mas não é só o Orçamento do medo, é também o dos amedrontados, daqueles que, perante a ameaça de
saída do maior Governo da história, têm o medo irremediável de um novo ciclo político que seja capaz de dar
resposta aos portugueses. E o medo levará hoje à aprovação deste Orçamento, perante parceiros que já não
são parceiros, perante novos parceiros que têm medo de ir a votos e até perante alguns outros que, não estando
de nenhum lado da barricada, o que não querem é votos, porque os votos complicam sempre a nossa vida.
Da nossa parte, os votos são tudo e é os portugueses que queremos ouvir, logo que seja possível.
Mas este é também o Orçamento do malabarismo fiscal, de uma técnica, nunca antes vista em Portugal, de
se dizer que se baixam impostos para depois se cobrarem em maio ou em agosto, ou de se dizer que cai a
carga fiscal, não porque diminuem impostos, mas porque há menos receita, menos trabalho e menos
investimento. «Receita António Costa», que sempre funciona e que sempre há de continuar a funcionar
enquanto, aqui, uma onda gigante continuar a alimentar esta fantochada fiscal em que continuamos a viver.
Mas este é também o Orçamento que deixou as empresas e a classe média de fora. Todas as associações
empresariais disseram o mesmo: «este Orçamento não serve». Claro que há alguns entendidos, na área
socialista, que dizem «não é tão mau assim, vamos esperar, em maio ou em junho…». Em maio ou em junho
poderemos estar no charco da nossa economia e já não teremos tempo de nos levantarmos para responder.
Este é o Orçamento que, mais uma vez, ataca as forças de segurança e que manda a reforma, a pré-reforma,
a reserva e a disponibilidade serem novamente suspensas, enquanto milhares de homens e mulheres, milhares
de famílias em Portugal continuam com os seus direitos suspensos. Ao mesmo tempo que fazemos isto, damos
mais aos mesmos de sempre, a muitos que nunca contribuíram com 1 cêntimo para Portugal e que gozam com
quem trabalha e com quem sustenta este País.
Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, fomos ultrapassados por todos ou quase todos os países de Leste no
nosso crescimento. Vergonha — é esta a palavra que define uma economia que não consegue crescer e que
se prende aos fantasmas do passado, os mesmos de sempre, agora apoiados pelo Partido Comunista e pelo
Partido dos Animais e da Natureza!
Mas este é também o Orçamento que, tendo prometido lutar contra a corrupção, não apresenta um único
caminho, não aumenta o esforço de dotação da Polícia Judiciária ou do Ministério Público, num momento em
que tantos milhões vão cair em Portugal, para continuarmos a alimentar o mesmo circo de sempre.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente. Este era o momento em que tínhamos de lutar contra a corrupção, mas não o fazemos. Estamos à beira de
ter novas medidas, provavelmente de confinamento, e o que é que o Governo nos dá? Um Orçamento cheio de
nada.
O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Deputado.
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O Sr. André Ventura (CH): — Uma mão cheia de nada, que nos vai levar à maior crise das nossas vidas, e nós cá estaremos, como sempre, para a resolver.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes.
O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e demais membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A discussão deste Orçamento acontece num período de grande exigência, com os
problemas sociais, económicos e ambientais a agravarem-se a cada dia que passa, sobretudo em virtude da
crise pandémica que atravessamos.
O desemprego não para de aumentar, a economia continua a patinar, as dificuldades para pagar as contas
do dia a dia das famílias são cada vez mais uma realidade e a pobreza instala-se. Instala-se e alastra, bate à
porta dos lares, cada vez mais e cada vez com mais intensidade, até à porta das pessoas que trabalham, porque,
apesar de haver forças políticas nesta Assembleia que são contra o aumento do salário mínimo nacional,
infelizmente, no nosso País empobrece-se a trabalhar.
É uma crise que exige respostas e opções que não deixem ninguém de fora do radar dos apoios sociais e
que dê sinais claros que apontem para a exploração dos recursos do planeta sem hipotecar os recursos do
futuro.
Diz-nos o bom senso que é preciso aprender com os erros do passado e, por isso, hoje, mais do que nunca,
se exige um Estado interventivo e determinado nos investimentos necessários, desde logo que não coloque a
cegueira do défice à frente das respostas necessárias de que os cidadãos precisam e que são fundamentais
para o desenvolvimento do País.
Por outro lado, esta crise convida-nos a olhar para ela como uma oportunidade de repensar as prioridades
que têm norteado as nossas vidas, a forma como vivemos, produzimos e consumimos e a forma como nos
relacionamos com a natureza. É, portanto, tempo de reequacionar este modelo económico, que assenta na
exploração desenfreada dos recursos naturais, que potencia elevados riscos para a saúde e que promove fortes
impactes ambientais, para além de aprofundar de forma dramática as desigualdades sociais.
A crise climática, a assustadora perda de biodiversidade e o uso insustentável de recursos naturais não
podem deixar de estar presentes nas preocupações de hoje. Também por isso, esta pandemia não pode servir
de desculpa para reduzir o investimento em áreas determinantes para garantir o equilíbrio ecológico, como seja
a conservação da natureza ou o setor dos transportes.
Não é, aliás, por acaso que Os Verdes insistem na necessidade de dotar o País de uma maior cobertura em
termos de transportes públicos, com maior relevância na ferrovia, e de alargar a abrangência do passe social,
mas também de favorecer a utilização de modos suaves de transportes, nomeadamente com a implementação
de uma rede nacional de ciclovias com ligação entre municípios e regiões.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, como temos afirmado desde o início, para Os Verdes seria
absolutamente determinante que este Orçamento, por um lado, não promovesse qualquer recuo relativamente
aos avanços que se conseguiram nos últimos anos e que, por outro lado, assumisse um combate determinado
à pobreza, que ganhou dimensões ainda mais preocupantes na sequência da pandemia. Ou seja, seria
determinante que este Orçamento promovesse um reforço substancial ao nível dos serviços públicos, em
particular na saúde, na educação e na justiça; uma aposta forte na nossa produção, com particular destaque
para a agricultura familiar e a canalização de meios para garantir a sobrevivência das micro e pequenas
empresas; e, por fim, uma resposta séria à crise climática que estamos a enfrentar.
Se é verdade que, a nosso ver, este Orçamento não promove recuos relativamente aos avanços que se
foram construindo, também é verdade que o que se perspetiva, tanto ao nível do reforço dos serviços públicos
como no combate à pobreza, fica muito longe dos mínimos desejáveis.
Quanto ao combate à pobreza, falamos dos milhares de trabalhadores que, no texto da proposta, ficam sem
acesso a qualquer apoio social, sobretudo os trabalhadores com vínculo precário e todo o universo dos
trabalhadores informais. Mas falamos também dos aumentos dos salários dos trabalhadores da Administração
Pública e dos valores das reformas, e aqui teremos de ter presente alguns dados com muita relevância nesta
matéria: por um lado, o facto de a devolução de direitos e rendimentos às famílias ter sido decisiva para o
desempenho da economia e, por outro lado, o facto de os salários dos trabalhadores da Administração Pública
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terem estado congelados durante mais de uma década e de terem levado umas migalhas este ano, com a
promessa de um aumento mais justo em 2021. Uma promessa, recorde-se, assumida pelo Governo na
discussão do Orçamento do Estado para 2020.
Quanto ao reforço nos serviços públicos, os investimentos previstos não se mostram capazes de garantir o
necessário, muito em particular ao nível da saúde, da educação e da justiça.
Feito o balanço, a leitura que Os Verdes fazem é a de que este Orçamento está longe de responder aos
problemas que persistem no País e que os portugueses continuam a sentir.
Embora reconhecendo que este Orçamento, tal como se apresenta, está longe de responder ao conjunto de
problemas que temos pela frente, Os Verdes decidiram-se pela abstenção na generalidade. Mas esta abstenção
e esta postura de abertura agora manifestada por Os Verdes tem o propósito muito claro de dar mais uma
oportunidade ao PS para também ele assumir uma postura de abertura para com outras preocupações de Os
Verdes, as quais ficaram mais do que identificadas durante este debate na generalidade.
É certo que a abertura do PS para acolher esses contributos não tornaria este Orçamento num bom
Orçamento, mas torná-lo-ia menos insuficiente nas respostas aos problemas que o País vive.
Mas que não restem dúvidas de que esta abstenção na generalidade em nada compromete e em nada
condiciona o sentido de voto do Partido Ecologista «Os Verdes» no que diz respeito à votação final global, cuja
avaliação será feita na devida altura. Mas isso é mais para a frente. Para já, fica a oportunidade de o PS poder
reavaliar as prioridades e perceber as reais necessidades do País e dos portugueses. É esta a tradução prática
da abstenção, na generalidade, do Partido Ecologista «Os Verdes», e só assim deve ser entendida.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do PAN, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A este tempo, não é difícil de imaginar o grande desafio que temos pela frente, ainda que não saibamos por quanto
tempo mais teremos de viver com esta crise sanitária e, menos ainda, quais as totais consequências da crise
socioeconómica. É por isso que este Orçamento não pode ser encarado apenas como um Orçamento para
2021, mas sim como um instrumento que deve servir para o País alicerçar a sua recuperação e a transição
ecológica que urge ser feita.
O fim do debate na generalidade em torno do Orçamento do Estado constitui apenas o início de um longo
caminho para um Orçamento que esteja à altura de fazer face aos maiores desafios do nosso tempo para que
o País não paralise; para que possa funcionar e dar resposta às necessidades dos profissionais de primeira
linha e aos empresários mais afetados pela crise; para evitar o agravamento do desemprego e da precariedade;
para assegurar o acesso ao Serviço Nacional de Saúde; para responder às pessoas que, tendo perdido os seus
rendimentos, necessitam que o Estado não lhes falte; para que se responda à crise climática, que nos chega
cada vez mais na forma de eventos climatéricos extremos; para que se garanta proteção aos animais. Para tudo
isso é preciso fazermos este caminho, mais exigente, de diálogo e de debate de propostas.
Para tal, é também necessário que o Governo e o Partido Socialista tenham a capacidade de cumprir e de
fazer avançar a construção dos alicerces das pontes criadas.
No que ao PAN diz respeito, chegamos a esta fase da discussão com a consciência de que fizemos a nossa
parte. Mas que fique claro que, se este fosse o Orçamento final, não poderia o PAN ter a mesma posição na
votação que terá hoje.
Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, precisamos de um Orçamento verdadeiramente mais ambicioso
para o País, um Orçamento ciente e alinhado com as prioridades do coletivo e com coragem para a mudança
que se impõe. Desde logo, quanto à preocupação de não deixar ninguém para trás, pois neste momento tão
complexo que atravessamos podemos estar todos a navegar nas mesmas águas, mas não estamos,
certamente, todos no mesmo barco. Já o dissemos e não nos cansamos de o repetir: o Governo tem de escolher
a quem quer dar a mão, se às pessoas e a uma economia assente nos princípios do desenvolvimento
sustentável, com uma gestão transparente, se aos interesses que têm capturado e comprometido o progresso
e o bem comum.
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É também por isso que, mais do que nunca, o mantra «não deixar ninguém para trás» deve significar — sob
pena de se tornar num chavão estéril e para adornar cartazes e discursos — um forte compromisso com o
combate às desigualdades sociais e regionais, que ainda persistem, e às múltiplas formas de discriminação, em
particular da população socialmente mais vulnerável ou em situação de privação material, como as pessoas em
situação de sem-abrigo, as crianças, as pessoas idosas ou as mulheres.
Aqui chegados, não podemos negar que os impactos da crise são muitas vezes invisíveis e afetam de forma
desproporcional esta população, já para não falar no combate à violência doméstica, um flagelo que não
desapareceu e que importa prevenir e combater.
Outra matéria estrutural para o PAN, relativamente à qual este Orçamento se revela deficitário, prende-se
com a resposta a dar às legítimas preocupações dos jovens. Não é compreensível que uma das gerações mais
afetadas por esta pandemia, porventura aquela que tem mais a perder com a falta de perspetivas futuras, esteja,
senão totalmente, praticamente alheada deste Orçamento. Precisamos de dar aos jovens um sinal claro no
sentido de que o caminho da recuperação não vai ser o da precariedade, que foi precisamente o caminho que
os colocou numa situação de desproteção durante os últimos meses. Não podemos continuar a ter apenas para
oferecer aos jovens estágios profissionais encapotados de «primeiro emprego», quando os deveríamos estar a
apoiar e a lançar para uma vida profissional ativa, plena e com direitos.
Este Orçamento também não é para os jovens naquilo que respeita à crise climática, em parte devido a
opções que roçam a dissonância política e que se traduzem em preferências, como a prospeção de lítio em
áreas protegidas, a «estufização intensiva» da Costa Vicentina ou a construção de um novo aeroporto no
Montijo. Tudo opções do Governo que comprometem o futuro das próximas gerações e que estão em
contraciclo, como temos denunciado, com os valores proclamados no próprio Plano de Recuperação e
Resiliência e, pior, nos acordos internacionais firmados por Portugal.
Temos aqui ouvido, amiúde, que se este Orçamento contempla propostas no domínio do ambiente em muito
se deve ao contributo decisivo do PAN, o que, sendo verdade, não nos tranquiliza, Sr. Primeiro-Ministro,
justamente porque sabemos o quanto ainda há para fazer e o quão grande é a resistência para se darem os
passos necessários a uma eficaz descarbonização da economia e ao cumprimento das metas, não as que nos
autoimpusemos, mas aquelas que o planeta delimitou e que a ciência já há muito identificou.
Um País que se diz comprometido a combater a crise climática não pode, como tem feito, fechar os olhos a
quem mais polui, com o argumento de que a economia assim o exige. Mais: não pode esbanjar dinheiros
públicos a fomentar a poluição, para, depois, alocar mais recursos a corrigir essas más opções. Esta é a
perversão total das políticas públicas!
Bem sabemos que não é convidativo afrontar quem lucra com a depredação dos recursos naturais. Mas,
Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, estar comprometido com a descarbonização é isso mesmo:
não olhar a nomes na hora de aplicar políticas, que, mais do que necessárias, são absolutamente vitais.
É fundamental exigir mais, a este tempo, a quem mais continua ostensivamente a explorar os recursos
naturais e a poluir aquilo que é de todos nós, o nosso bem comum, esta casa comum que é o planeta e que é o
nosso próprio País, como sucede, por exemplo, com a pecuária intensiva e superintensiva.
É fundamental não incidir no erro de continuar a ver como uma resposta aquele que tem sido vendido como
a «galinha dos ovos de ouro» para o País — o turismo de massas — e que mais não tem sido do que um placebo
com que enfrentamos os nossos problemas.
O planeta não suporta, acima de tudo, tanto consumo, e a nossa economia também não, como a crise
sanitária fez questão de demonstrar.
O mesmo se aplica a um crescimento económico que teima em atropelar questões éticas que, a este tempo,
já deveriam estar mais do que ultrapassadas. Veja-se o exemplo do transporte de animais vivos, em condições
absolutamente degradantes, que, há muito, foram denunciadas e descritas como desumanas, ou a permissão
de que haja quem continue a divertir-se à custa do sofrimento animal, expondo até crianças e jovens à violência
grotesca da tauromaquia.
Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro: Estamos perante a necessidade de
mudança de paradigma e de assentarmos o desenvolvimento do País em modelos mais sustentáveis e éticos,
não só do ponto de vista ecológico, como também do ponto de vista social. Mas, para tal, é preciso investimento
e compromisso. E o ponto de retorno é precisamente este, Sr. Primeiro-Ministro.
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Na especialidade, o PAN não se demitirá de continuar a fazer o seu trabalho. Foi para isso que aqui
chegámos!
Não podemos deixar de salientar que, a partir de amanhã, começa uma nova fase e, com ela, saberemos o
grau de compromisso de cada um, mas em particular do Governo, em acolher mais do que aquilo que projetou
na generalidade. É a derradeira oportunidade para que este Orçamento saia melhor do que entrou, mas, acima
de tudo, a derradeira oportunidade para que venhamos a ter um Orçamento.
Aplausos do PAN.
O Sr. Presidente: — Passamos ao Grupo Parlamentar do CDS-PP. Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Quando o País precisava de responsabilidade, de coerência e de visão, a geringonça, ou o
que ainda dela resta, ofereceu um Orçamento trapalhão, incoerente e de vistas curtas.
No presente, o Orçamento fica-se, na prática, pela distribuição de subsídios e por sinais absolutamente
contraditórios e erráticos entre as necessidades de incentivar a economia e de conter a pandemia.
Para o futuro, este Orçamento devia ser o primeiro de uma estratégia que abrisse caminho para que Portugal
não continuasse nas próximas décadas a disputar os últimos lugares de crescimento na Europa, como fez,
infelizmente, nos últimos 20 anos.
Em vez disso, o que temos é a ausência de qualquer visão. A única estratégia real de investimento que se
descortina, no meio de tudo isto, é muito simples, mas não é nada nova, Sr. Primeiro-Ministro: gastar dinheiro
em obras públicas. Mais nada!
A propósito de estratégia, ou da falta dela, na semana passada, o Sr. Ministro Pedro Nuno Santos, sem
dúvida um dos rostos da geringonça, anunciava que — e cito — «o tempo das autoestradas terminou».
Esqueceu-se foi de explicar que, infelizmente, o tempo de pagarmos as autoestradas só vai terminar em 2039.
Repito: em 2039.
E falo nisto não para fazer a pequena maldade de perguntar ao Sr. Ministro Pedro Nuno Santos onde estaria
ele quando as mais caras destas PPP rodoviárias foram aprovadas, em 2008, em 2009 ou em 2010. Não, falo
nisto para levantar uma questão que é profunda, e que é de fundo, porque não me conformo, e Portugal não
pode nem deve ser eternamente o País em que as estratégias duram muito menos de metade do tempo que
demora a pagá-las.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — E o que se está a preparar agora é exatamente isto: reciclar uma estratégia de grandes obras que dificilmente resistirão ao teste do tempo e consagrar uma estratégia de
investimento que desconfia da iniciativa privada, que não acredita nos empresários e, sobretudo, que não
acredita em incentivos transversais a todas as empresas. Não acredita em nada que seja privado e que funcione
sem avales, decididos caso a caso, em processos complexos, por entidades públicas, e que antes prefere
apostar em megainiciativas, decididas por iluminados em gabinetes ministeriais.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Não é apenas o futuro que este Orçamento falha, ele também falha o presente.
Num Orçamento que olha apenas para a distribuição do rendimento sob a forma de subsídios, esquecendo
por completo a criação desse rendimento, a promessa que o PS escolheu não cumprir e que os parceiros, todos,
escolheram esquecer foi uma redução de IRS de 200 milhões de euros.
O único — repito, o único! — alívio fiscal realmente consagrado no articulado para a classe média é uma
medida chamada «IVAucher», que é, como quem diz, uma medida que dá um desconto fiscal às famílias que
possam — sublinho «que possam» — escolher gastar o seu dinheiro em restaurantes, hotéis e cultura.
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Percebo a necessidade de não deixar morrer o setor do turismo, mas temos de convir que, deste ponto de
vista, esta medida é simultaneamente ineficiente e, sobretudo, insuficiente e, muito mais do que isto, é também
uma medida absolutamente incoerente.
Sr.as e Srs. Deputados, vivemos num País em que é possível ter um fim de semana de Fórmula 1, com
ajuntamentos de dezenas de milhares de pessoas vindas do País inteiro, de todos os concelhos e distritos, e
até de fora do País, e, no fim de semana a seguir, logo no fim de semana a seguir, todas as pessoas estarem
proibidas de se deslocar, nem que seja ao concelho do lado, para honrarem os seus mortos.
Estes contrastes mostram a falta de preparação, mas, sobretudo, a falta de bom senso do Governo, que
parece apostado numa política de sinais e de abanões completamente errática e infantilizadora dos cidadãos. E
é esta política de excessos e esta ausência de bom senso que tem consequências que serão desastrosas,
infelizmente, em simultâneo, para a saúde e para a economia, no pior dos dois mundos.
É assim que este Orçamento acha normal criar uma vantagem fiscal para as pessoas irem a restaurantes ou
a espetáculos ao mesmo tempo que vai cancelar a promessa de alívio fiscal para as famílias que escolhem e
para as famílias que são obrigadas, pelo próprio Estado e pelas necessidades de saúde pública, a ficar em casa,
ou para as famílias que se veem aflitas para ter dinheiro, sequer, para irem ao supermercado, quanto mais para
irem a hotéis. É um contraste, Sr.as e Srs. Deputados, que não se percebe.
É também, no meio de uma pandemia, um Orçamento de enorme insensibilidade social. Em julho, havia já
quase menos 1 milhão de consultas, contando presenciais e não presenciais, e menos 99 000 cirurgias. A
alternativa, aqui, é muito clara: deixar os doentes à espera ou aproveitar a capacidade que já existe para os
tratar nos setores solidário e privado. A escolha dos partidos da geringonça é, também ela, infelizmente, muito
clara: deixam, sim, os doentes à espera e, em troca, preservam os seus preconceitos.
Aplausos do CDS-PP.
As consequências são de vida e de morte para quem precisa. Não conheço maior insensibilidade social e
até humanitária do que esta.
É por tudo isto que este Orçamento só pode merecer um voto: um voto que defenda estes doentes que
esperam e desesperam; um voto que lute, sim, pelos trabalhadores e pelas empresas que todos os dias se
esforçam para conseguirem ganhar a vida, num cenário que é extraordinariamente difícil; e um voto que não
desista, sobretudo, de um futuro melhor para Portugal. Esse voto é um voto contra o Orçamento.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do PCP. Para intervir, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Membros do Governo: A questão não está em saber se há ou não Orçamento para 2021, mas, sim, se o próximo Orçamento, bem como
outras medidas e opções que têm de ser tomadas respondem, de facto, à resolução de problemas estruturais
que se arrastam há anos e aos novos problemas determinados pelo impacto da epidemia.
O exemplo do Orçamento Suplementar mostra bem que é o conteúdo do Orçamento aquilo que
verdadeiramente importa.
Em vez de dar resposta às necessidades do povo e do País, o Orçamento Suplementar chancelou os cortes
nos salários e determinou medidas de privilégio aos grupos económicos. Os resultados estão à vista, com o
agravamento de todos os problemas que já em julho se identificavam e que teria sido possível travar.
Chegados aqui, é preciso que se passe das palavras aos atos e que a invocação da gravidade da situação
tenha consequência na resposta global aos problemas nacionais, dentro e fora do Orçamento do Estado.
Já percebemos que PSD, CDS e os seus sucedâneos mais reacionários procuram cavalgar a situação de
crise para recuperar toda a tralha ideológica com que justificaram durante anos a política de assalto aos direitos,
aos salários, às pensões, às condições de vida dos trabalhadores e do povo e aos recursos públicos, incluindo
ao orçamento do Serviço Nacional de Saúde.
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O Sr. António Filipe (PCP): — Exatamente!
O Sr. João Oliveira (PCP): — A saída que procuram agora é a da justificação da sua política e opções antissociais e antipopulares, de deixar degradar a situação económica e social do País, à espera de poder
retomar a política de desastre nacional dos PEC (Programa de Estabilidade e Crescimento) e da troica.
A situação que atravessamos não simplifica nem facilita a construção do Orçamento do Estado nem a sua
aprovação, pelo contrário, torna-as mais exigentes.
A situação do País e a recuperação daquele discurso e posicionamento mais à direita acentuam a
necessidade de o Governo e o PS optarem por dar verdadeira resposta aos problemas nacionais.
Não enfrentar os problemas estruturais do País avolumará dificuldades económicas, dependências externas,
desigualdades e injustiças sociais.
Deixar os serviços públicos sem capacidade de resposta às necessidades dos utentes e das populações
contribuirá para a liquidação de direitos sociais e o sucesso dos grupos económicos, na operação de saque que
têm em curso, especialmente em relação ao SNS.
Deixar os trabalhadores e o povo sem resposta aos seus problemas, permitir o avolumar do desemprego,
deixar salários congelados ou mesmo cortados e desempregados sem proteção social, deixar idosos e crianças
sem respostas sociais, marginalizar bombeiros criará o pasto que a direita mais reacionária incendiará com os
seus discursos de ódio, de ataque à democracia, de arrasamento de direitos, de segregação social e racial.
A proposta de Orçamento do Estado, apresentada pelo Governo, não dá garantias de inverter o rumo que
está em curso e não responde aos problemas nacionais.
A prioridade que o Governo dá à redução do défice nega 6000 milhões de euros, que são indispensáveis
para as medidas de resposta à situação económica e social.
O adiamento e o incumprimento de várias medidas aprovadas em sucessivos Orçamentos, incluindo no
Suplementar, e até o incumprimento de outras decisões que foram tomadas para fazer face à epidemia ⎯ com
o exemplo flagrante de medidas de apoio aos pequenos empresários não concretizadas ⎯, acentuam a
preocupação com o objetivo de reduzir o défice a todo o custo, apesar da situação que o País atravessa.
O Governo e o PS têm a responsabilidade de garantir um Orçamento que, na sua versão final, contribua para
a resposta global que é necessária, invertendo opções erradas, construindo soluções adequadas e fazendo as
convergências correspondentes.
A abstenção do PCP não é um ponto de chegada, é assumida com o objetivo de abrir a discussão que falta
fazer, confrontando as necessidades do povo e do País com as medidas que lhes garantem resposta, apesar
da sistemática recusa do Governo em lhes corresponder. O voto contra, nesta fase, não permitiria essa
possibilidade.
Vamos para a discussão na especialidade: sabendo que não se responde a uma recessão económica, nem
à dinamização da economia, sem a valorização do trabalho, o aumento geral dos salários para todos os
trabalhadores, designadamente do salário mínimo nacional, e a revogação das normas gravosas da legislação
laboral; lutando para que o Serviço Nacional de Saúde tenha os meios e recursos necessários, seja para
enfrentar a epidemia, seja para responder a tudo o resto que tem ficado para trás; exigindo soluções específicas
para o recrutamento de trabalhadores em setores e carreiras onde a contratação enfrenta maiores dificuldades,
como são os casos de médicos e enfermeiros, para além de medidas gerais de valorização dos salários e das
carreiras, como instrumento indispensável para a valorização dos trabalhadores e a melhoria da prestação do
serviço público;…
O Sr. António Filipe (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — … intervindo para que se reforcem os serviços públicos, contratando os milhares de trabalhadores que estão em falta, além da saúde, nas escolas, na segurança social, na justiça, nas
forças e serviços de segurança; propondo que os trabalhadores dos serviços essenciais tenham direito a um
suplemento remuneratório que abranja todos os profissionais dos setores da saúde, das forças e serviços de
segurança, dos bombeiros, dos equipamentos sociais, da limpeza e higiene urbana, da recolha de resíduos, das
águas e saneamento e outros; reafirmando a necessidade da valorização do subsídio de desemprego com o
alargamento da sua abrangência, o reforço dos montantes e o alargamento dos prazos de pagamento; lutando
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para que a resposta às necessidades das jovens famílias e aos idosos seja definida com medidas e objetivos
concretos relativos à criação de vagas em rede pública de creches e lares, a concretizar em 2021, e definindo-
se com clareza a responsabilidade da segurança social em ambas as áreas; propondo para o aparelho produtivo,
as MPME (micro, pequenas e médias empresas), os setores das pescas e da agricultura as medidas específicas
que assegurem preços justos à produção e, simultaneamente, garantam a articulação entre o desenvolvimento
da atividade produtiva e a elevação do poder de compra dos trabalhadores e do povo.
Não desistimos de lutar por uma justa política fiscal, aliviando a tributação em IRS dos rendimentos mais
baixos e intermédios e, simultaneamente, pondo fim à fuga para o estrangeiro de grupos económicos que devem
pagar em Portugal os impostos sobre os lucros gerados no País.
Interviremos para assegurar que o acesso à cultura, ao desporto e à fruição da vida não estejam suspensos
ou condenados a desaparecer perante as dificuldades colocadas pela epidemia.
Interviremos para que os setores estratégicos do País não continuem à mercê dos interesses dos grupos
monopolistas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Membros do Governo: Os problemas sanitários estão
longe de estar ultrapassados e introduzem elementos de incerteza quanto à evolução futura, perante o
agravamento de todos os indicadores económicos e sociais.
Face à dimensão dos problemas, o País não compreenderia que fossem recusadas as respostas que se
impõem. O País não compreenderia que se continuasse a colocar os interesses do grande capital à frente da
melhoria das condições de vida dos trabalhadores e do povo. O País não compreenderia que as soluções
necessárias continuassem adiadas, subordinadas ou dependentes do défice ou da dívida.
Os trabalhadores e o povo português não devem temer as ameaças e chantagens que se possam fazer a
propósito do Orçamento. O que é e será preocupante é o Orçamento do Estado e outras opções do Governo
amarrarem a vida de milhões de portugueses à degradação económica e social.
A resposta de esquerda à situação económica e social tem de ser a do aprofundamento da democracia, da
igualdade, da justiça social e dos direitos do povo, com a subordinação do poder económico ao poder político,
seja no combate à corrupção, seja na recuperação do controlo público das empresas e setores estratégicos.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — Tal como na votação na generalidade do Orçamento Suplementar, agora, com a nossa abstenção na generalidade do Orçamento para 2021, abrimos a possibilidade da discussão que é
preciso fazer na especialidade. O sentido de voto final no Orçamento dependerá da avaliação dessa versão final
do Orçamento face à resposta global aos problemas nacionais e das garantias quanto a opções do Governo em
matérias fundamentais no domínio dos salários, dos direitos dos trabalhadores ou da recuperação de
instrumentos indispensáveis à condução de uma política de desenvolvimento económico e social ao serviço do
País.
É este o nosso compromisso.
Aplausos do PCP e do PEV.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Catarina Martins, pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): ⎯ Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O País notou o tom com que o Primeiro-Ministro se dirigiu ao Bloco de Esquerda neste
debate.
Na verdade, não é novo. Foi assim há um ano na campanha eleitoral, exigindo uma maioria absoluta para
poder evitar uma nova geringonça. Mas esses estados de alma, já sabem, nunca nos demoveram do nosso
caminho.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): ⎯ Muito bem!
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A Sr.ª Catarina Martins (BE): ⎯ No dia das eleições, há um ano, voltámos a propor ao PS um acordo escrito para a Legislatura. Sem surpresa, ouvimos a resposta de que a geringonça estava morta e de que o PS recusava
qualquer acordo.
A Sr.ª AnaCatarina Mendonça Mendes (PS): ⎯ Não! É falso!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): ⎯ Propusemos esse acordo porque queríamos abrir um novo caminho, que respondesse aos maiores défices sociais.
O Sr. Porfírio Silva (PS): ⎯ Estamos a ver!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): ⎯ Queríamos esse acordo porque esperávamos que o PS pudesse afastar-se do pacto com a direita e com os grandes patrões para manter a legislação laboral da troica. Desejámos esse
acordo porque Portugal precisa de políticas que tragam confiança e segurança para quem trabalha.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): ⎯ Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): ⎯ O PS recusou, mas o Bloco não desistiu. Nunca desistimos. Não somos de desistir.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): ⎯ Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): ⎯ O Serviço Nacional de Saúde tem sido a nossa prioridade. Não previmos a tormenta, mas conhecemos a realidade. Antes da pandemia, já sabíamos que eram precisos muito mais
profissionais, mais investimentos, mais meios de diagnóstico.
Viabilizámos o Orçamento do Estado que está em vigor, após vários acordos com o Governo, sobretudo para
reforçar o Serviço Nacional de Saúde, mas também para defender a escola pública, proteger os pensionistas
pobres, cuidar dos cuidadores.
Nenhum dos acordos foi cumprido no tempo certo, muitos foram pura e simplesmente esquecidos, e isso
ensinou-nos a sermos exigentes até ao detalhe das letras mais pequenas.
Mesmo depois das recusas e incumprimentos, nunca desistimos. Demos ao Governo tudo o que pediu a este
Parlamento nos últimos meses: no Orçamento do Estado para 2020, na emergência e no Orçamento
Suplementar, apoiámos todo o reforço de verbas e de meios e todas as condições que nos pediu.
Agora, o Governo pede-nos que viabilizemos o Orçamento do Estado para 2021 de olhos fechados. Apenas
porque sim. Porque se aprovámos antes, teremos de aprovar depois, mesmo que saibamos que o Orçamento
não responde à emergência da crise. Pedem-nos que votemos anúncios sem suporte. Isso sim, seria desertar
de Portugal. Não o faremos!
Vozes do BE: ⎯ Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): ⎯ No Orçamento do Estado para 2021, temos de decidir como defender Portugal no próximo ano. E para um Orçamento ser de esquerda, não basta o Governo dizê-lo; tem de ter
políticas de esquerda, soluções de esquerda. Bem sei que foram sempre limitadas as aproximações à esquerda
nos anteriores Orçamentos. É certo que o PS se levantou sempre ao lado da direita nas matérias estruturais em
que era necessário impor regras ao sistema financeiro e defender o trabalho.
O Sr. Porfírio Silva (PS): ⎯ Agora é que vamos ver quem se levanta ao lado da direita!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): ⎯ Mas não é menos certo que existiu, até hoje, um campo de progressão à esquerda, na defesa de rendimentos do trabalho, do respeito pelas pensões e carreiras contributivas, do Estado
social, e orgulhamo-nos desse caminho.
Tragicamente, chegados à crise, o Governo deserta até desse estreito campo de entendimento.
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A Sr.ª AnaCatarina Mendonça Mendes (PS): ⎯ Quem deserta é o Bloco de Esquerda!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): ⎯ Não podendo escudar-se na Europa, que este ano até suspendeu as regras orçamentais absurdas e que, embora cinicamente, vem recomendando a valorização do trabalho e do salário, o
Governo esconde-se na manipulação, na hostilidade, na chantagem. Não responderemos a nada disso, mas
respondemos ao País sobre como se protege o nosso povo no meio da tempestade.
Risos do Deputado do PS Pedro do Carmo.
Respondemos sobre a emergência social e como enfrentar a vaga de despedimentos. E sabemos que uma
resposta de esquerda defende a carreira contributiva de quem perdeu o emprego, estendendo o subsídio de
desemprego. Impõe regras à economia, para que os apoios públicos às empresas não possam ser indiferentes
ao destino dos trabalhadores precários, para que a compensação por despedimento seja reforçada e o
despedimento deixe de ser a opção mais fácil e mais barata. A resposta de esquerda apoia quem está mais
desprotegido, com uma proteção desenhada para não deixar ninguém para trás.
Aplausos do BE.
Ao recusar alterar as regras do despedimento ou do apoio social da direita ⎯ «além da troica», lembram-se?
⎯, o que o Governo nos diz é que enfrentará esta crise com as leis de 2012 no trabalho e na proteção social,
leis desenhadas precisamente para que os custos da crise recaiam sobre os trabalhadores. A mesma receita
não terá outro efeito. Se a recusámos no passado, se tudo fizemos para a enfrentar, se o nosso entendimento
até hoje foi sempre para a afastar, como pode agora o Governo pensar sequer que, diante de uma nova crise,
a aceitaríamos? Como pode o PS aceitar essa receita?
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): ⎯ Muito bem!
Protestos do Deputado do PS Pedro do Carmo.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): ⎯ Durante todo este debate, nem por uma vez o Governo ou o Partido Socialista disseram porque se opõem à recuperação do período de concessão do subsídio de desemprego ou
porque acham má ideia voltar à compensação por despedimento, que aqui defenderam em 2012.
Mais: o Primeiro-Ministro anunciou que a moratória sobre a caducidade unilateral da contratação coletiva
protege milhões de trabalhadores e não ouvimos um argumento para que uma medida que ataca assim o
trabalho seja apenas suspensa e não revogada.
O Sr. Ascenso Simões (PS): ⎯ O que é que isso tem a ver com o Orçamento?!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): ⎯ Sr. Primeiro-Ministro, se não fosse suficientemente grave que a solução do Governo não responda à emergência social ⎯ e não é isto, de facto, quase tudo? ⎯, também não responde à
crise sanitária. No meio da pandemia, o Governo conforma-se com a falta de recursos do Serviço Nacional de
Saúde e abandona o caminho construído arduamente para o defender.
Com um Orçamento em vigor que prevê o aumento do número de profissionais no Serviço Nacional de
Saúde, verificamos dolorosamente que o SNS tem, hoje, menos médicos do que tinha em março, quando a
pandemia chegou a Portugal.
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): ⎯ Outra vez?!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): ⎯ E choca-nos que o Primeiro-Ministro repita sempre, como ontem repetiu, que há mais médicos, quando, se abrirmos a página do portal oficial SNS Transparência, se olharmos para os
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números que o Ministro das Finanças confirmou no Parlamento, aí está a realidade difícil: há mesmo menos
médicos do que no início da pandemia. O que pergunto é como é que pode um Primeiro-Ministro que ignora a
realidade corrigir um problema que acha que não existe.
O Bloco apresenta solução: criar carreiras no SNS com exclusividade, salários decentes e condições
exigentes. Isso foi o que propuseram António Arnaut e João Semedo e consta da Lei de Bases da Saúde que
construímos, em conjunto, na passada Legislatura.
O Sr. Ascenso Simões (PS): ⎯ Não misturem as coisas!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): ⎯ E não, Sr.ª Ministra Marta Temido, ninguém duvida aqui da sua dedicação no cumprimento das suas responsabilidades.
O Sr. Ascenso Simões (PS): ⎯ Que falta de juízo!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): ⎯ Mas a dedicação plena que está no programa eleitoral do PS e na Lei de Bases não é essa: é mesmo um regime de compensação aos profissionais, esse regime a que, agora, o Governo
se opõe.
Propõe-nos que aprovemos um Orçamento de promessas, com muitos concursos que, sabe, vão ficar meio
vazios. Propõe-nos remendos, quando Portugal precisa de soluções.
Não trocamos soluções por anúncios.
Aplausos do BE.
Se insisto na questão do Serviço Nacional de Saúde é porque fora destas paredes há uma pandemia que
está a crescer. Para a vencermos, precisamos de profissionais, de hospitais e de centros de saúde.
Ninguém nega que Portugal terá de mobilizar toda a sua capacidade instalada na saúde, incluindo a privada
e social, para responder à crise — dissemo-lo desde o primeiro momento —, mas terá de fazê-lo com regras,
transparência e, sobretudo, planeamento, que garantam cuidados hoje e no futuro, para que o Serviço Nacional
de Saúde não acabe destruído.
O Sr. João Azevedo Castro (PS): — Parece o Chega!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Olhamos para o anúncio que a Ministra da Saúde fez hoje no debate: o Serviço Nacional de Saúde já tem autonomia para contratualizar com os privados.
O Sr. João Azevedo Castro (PS): — É mau demais!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Mas, então, porque não tem também autonomia para contratar os profissionais de que precisa para os seus quadros? Porque se resigna o Governo à rutura do Serviço Nacional
de Saúde?
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — O Governo vai adiando o mais que pode as contratações que acordámos ainda antes da pandemia — 4200 profissionais a cada ano —, condenando o Serviço Nacional de Saúde a
trabalhar com lugares de quadro vazios, enquanto lida com as necessárias baixas dos mais de 6000 profissionais
afetados com COVID, nesta crise.
Se o Governo quer desistir de ir buscar médicos ao privado e de fixar os que são formados no Serviço
Nacional de Saúde, não conte com a nossa anuência. Não aceitamos que se multipliquem os encerramentos de
serviços, quando são mais precisos.
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Sabemos, tanto o Bloco como o Governo, qual é a solução: técnicos qualificados. E essas pessoas não são
números, são quem vai salvar o Serviço Nacional de Saúde. Se não houver uma carreira com condições, elas
não vêm, e nós precisamos delas, hoje!
Vozes do BE: — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, faça os jogos políticos que quiser.
Risos do Primeiro-Ministro.
Acuse-nos,…
Protestos do PS.
… ameace-nos, aplauda quem nos insulta. O Bloco não mudará de voz. Insistiremos na exclusividade do
Serviço Nacional de Saúde, no apoio social de quem perdeu tudo com a crise, na proteção contra o
despedimento, na exigência contra a fraude financeira.
Levante-se o Partido Socialista com a esquerda nestas matérias estruturais e o Bloco lá estará para viabilizar
um bom Orçamento.
Protestos do PS.
Aprovaremos um Orçamento que responda à emergência. Recusamos um Orçamento que desista de
Portugal.
Com medidas confiáveis, concretizáveis e que mobilizem respostas sólidas, conta connosco. Sem medidas
confiáveis e concretizáveis, conte com quem quiser, mas o Bloco de Esquerda não desiste de Portugal.
Aplausos do BE.
O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Até o André Ventura aplaude!
O Sr. Presidente: — É a vez de o Sr. Deputado Rui Rio, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, usar da palavra.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Rui Rio (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A Assembleia da República debateu hoje o Orçamento do Estado para 2021, num quadro de fortes
constrangimentos económicos, sanitários e sociais. Estamos todos conscientes do quanto a pandemia que
estamos a viver o condiciona e nos obriga a um acréscimo de rigor e de preocupação para com o nosso futuro
coletivo.
A par desta realidade, que ninguém pode negar, temos também os óbvios condicionamentos decorrentes da
política económica e orçamental dos últimos cinco anos.
Quatro desses cinco anos foram períodos de ambiente económico favorável, que deveriam ter merecido uma
governação mais virada para o futuro do País e menos preocupada em agradar às clientelas eleitorais do PS e
dos partidos que com ele desenharam a linha de rumo que o País tem seguido.
Aplausos do PSD.
A história e a ciência económicas ensinam-nos que as crises são cíclicas e que, por isso, um Governo
responsável sabe que, em épocas de crescimento, tem de preparar a economia para que ela consiga a robustez
necessária para enfrentar os períodos de recessão, ou seja, para estar capaz de minorar os problemas sociais
deles decorrentes.
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Foi isso que o Governo não fez. Não fez o necessário esforço para fortalecer a nossa economia e as nossas
finanças públicas no período de crescimento económico que tivemos entre 2015 e 2019. Pior ainda: não lhe
bastando usufruir da política monetária do Banco Central Europeu, que provocou uma grande baixa da fatura
de juros da dívida pública e a subida dos dividendos do Banco de Portugal, o Governo resolveu aumentar a
carga fiscal e baixar o investimento público para, assim, poder subir ainda mais os seus gastos.
O valor da dívida pública baixou relativamente ao Produto, mas subiu claramente em valor absoluto.
Desperdiçámos um ciclo favorável não só para tentar trazê-la para patamares mais razoáveis, como,
principalmente, para dinamizar a nossa economia do ponto de vista estrutural.
Estes objetivos não foram prosseguidos e, por isso, a margem de manobra de que o País hoje dispõe para
enfrentar a crise económica e social é bem menor do que aquela que, em boa verdade, poderia ser.
Em paralelo, deixaram-se degradar os serviços públicos, designadamente a nível do Serviço Nacional de
Saúde, que foi colecionando disfunções, cujo início remonta ao momento em que, de forma irresponsável, o
Governo decidiu alterar o horário de trabalho da função pública sem cuidar de preparar o sistema para tal.
Aplausos do PSD.
Hoje, temos um SNS com graves falhas na sua capacidade de resposta e com maiores dificuldades para
responder à pandemia.
Podemos e devemos ter compreensão para muita coisa, mas não é possível tê-la para tudo. A desorientação,
a falta de diretrizes, as contradições permanentes ou a falta de recursos humanos não são falhas que se possam
aceitar numa área tão sensível para a vida de todos nós. Também não é minimamente aceitável os centros de
saúde não receberem as pessoas e, em muitas circunstâncias, nem sequer lhes atenderem o telefone.
Faltará planeamento, mas falta, acima de tudo, consideração e respeito, designadamente por quem não tem
outros meios para se tratar que não seja o serviço público de saúde.
Em março e em abril, quase tudo se poderia desculpar pela incerteza e pelo nível de desconhecimento de
todos nós para responder com eficácia e segurança ao início da pandemia. Mas, a partir daí, a sociedade foi
adquirindo conhecimentos e o Governo foi começando a ter meios para preparar melhor o combate a uma
segunda vaga, que, com alta probabilidade, se desenhava no nosso horizonte. Eu próprio tive oportunidade de,
em devido tempo, questionar aqui, diretamente, o Sr. Primeiro-Ministro sobre esta questão.
Infelizmente, constatamos que essa preparação não foi devidamente programada durante os meses de verão
e, por isso, o País tem hoje mais dificuldades no combate à COVID-19 do que aquelas que, por natureza, sempre
teria.
É justo dizer-se que nunca seria possível um País estar totalmente preparado, mas também é justo afirmar-
se que era obrigação de quem nos governa fazer um adequado planeamento da melhor resposta possível à
segunda vaga.
Aplausos do PSD.
Não é fácil entender que coerência pode existir, por exemplo, entre a realização da Festa do Avante! ou
milhares de pessoas lado a lado num autódromo e as medidas restritivas que, em paralelo, temos de impor à
vida quotidiana dos portugueses.
Aplausos do PSD.
Acresce que, pela incerteza e pela angústia que geram, as falhas na resposta sanitária em nada ajudam à
recuperação económica, marcada pela imperiosa necessidade de combater o desemprego e de reforçar o nosso
tecido empresarial.
Este objetivo estratégico implica ter, necessariamente, uma política económica e orçamental de apoio às
empresas, que são as que, em primeira linha, podem combater a elevada taxa de desemprego com que nos
debatemos.
Por influência ideológica da esquerda comunista, o Governo optou por apresentar uma proposta de
Orçamento que esquece a importância determinante das empresas no relançamento da nossa economia.
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O Sr. Duarte Alves (PCP): — Não é verdade!
O Sr. Rui Rio (PSD): — São elas que produzem, que criam emprego, que exportam e que investem e são também elas que, em sentido inverso, se não forem defendidas, irão produzir mais falências, mais desemprego
e mais dificuldades sociais a muitos portugueses.
Esta proposta de Orçamento que o PS construiu com quem decidiu partilhar o seu projeto político não olha
para o nosso futuro. Tal como nos Orçamentos anteriores, limita-se a olhar para o presente. E quem vier atrás
que feche a porta!
Aplausos do PSD.
Em plena e gravíssima crise económica e sanitária, o Governo anunciou dar tudo ao mesmo tempo, com
pouca lógica e fraco critério. Para ele, importante é tentar convencer os portugueses de que não há austeridade.
Pode haver desemprego e falências; pode haver milhares de trabalhadores em layoff, com cortes de um terço
no seu vencimento; pode haver empresas sem capacidade para pagar os seus salários; pode haver setores da
economia estagnados; pode haver regiões socialmente devastadas; pode haver famílias inteiras no
desemprego; pode haver portugueses sem acesso às consultas médicas e às intervenções cirúrgicas de que
necessitam; pode, até, a taxa de mortalidade por patologias não-COVID estar muito acima do normal que, para
o Governo, o importante é ter o descaramento de dizer que, com ele, não há austeridade.
Aplausos do PSD.
Chamemos-lhe, então, outro nome, porventura mais feio, porque o que estamos a viver é, indubitavelmente,
um período de angústia, de incerteza e de sofrimento por parte de muitos milhares de portugueses.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Rui Rio (PSD): — O discurso vazio, obsessivo e sem sentido, repetido em cada canto e em cada esquina de que não há austeridade, em nada a resolve. O que, efetivamente, ajudaria a resolver estas graves
dificuldades seria termos um Governo com a capacidade para apresentar um Orçamento sem complexos
ideológicos, que combatesse com a melhor eficácia possível os problemas que estão a massacrar o quotidiano
dos portugueses.
Aplausos do PSD.
Distribuir o que se tem por quem mais precisa é justo e merece o nosso apoio e incentivo.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Rui Rio (PSD): — Mas distribuir tudo ao mesmo tempo, o que se tem e o que se não tem, é empenhar o futuro e enganar as pessoas. É dar a falsa ilusão de uma facilidade que não é real e que, mais tarde, poderá
ter de ser paga com desnecessário sofrimento.
É nas alturas difíceis que se vê quem tem a frieza e a coragem de, em nome do futuro, suportar com
estoicidade as dificuldades do presente. São precisamente estes atributos que não encontramos nesta proposta
de Orçamento do Estado. Nela encontramos, sim, a incapacidade para, em nome do futuro, enfrentar com
coragem a realidade do presente.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD continua a defender os seus objetivos de sempre, como o
equilíbrio orçamental, o alívio fiscal sobre os contribuintes, a redução do endividamento, a capitalização das
empresas, o apoio às exportações e ao investimento, a reforma da Administração Pública ou a redução da
despesa pública estrutural.
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Tudo matérias que um Governo suportado politicamente pela esquerda comunista despreza e combate,
optando sempre pelo caminho inverso.
Conhecemos bem os constrangimentos que hoje espartilham a margem de manobra da política orçamental.
Sabemos que não seria sério exigir o impossível, mas é decisivo defender a mudança de rumo.
Não é possível, neste momento, uma enorme redução dos impostos, do défice ou da dívida, nem uma política
agressiva de apoio à exportação e ao investimento, mas, como disse, é absolutamente imprescindível mudar de
rumo. É possível acabar com uma política que apenas olha para o presente e iniciar, na justa medida do possível,
um novo caminho de apoio coerente à produção e à competitividade da nossa economia.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Rui Rio (PSD): — Um novo caminho que, a médio prazo, consiga taxas de crescimento económico mais elevadas, que nos permitam ter melhores empregos e melhores salários para todos os portugueses, que
nos permitam ter uma classe média maior, mais robusta e com melhor nível de vida, que, ao contrário das
opções ideológicas da denominada «geringonça», ou do que dela resta, nos permita acabar com os pobres e
não com os ricos.
Aplausos do PSD.
Aquilo que aflige um social-democrata não é a existência de ricos, é a existência de pobres.
Aplausos do PSD.
Por isso, apostar no futuro é apostar em elevar os mais desfavorecidos ao patamar de uma classe média de
nível europeu.
Apostar apenas no presente é perpetuar, com ligeiras variações, a situação de pobreza e de baixos salários
que temos vivido em Portugal.
Aplausos do PSD.
Sr. Presidente, por todas as razões que enunciamos, o PSD vai votar contra esta proposta de Orçamento do
Estado para 2021.
Fazemo-lo, também, com a tranquilidade de quem foi informado, por quem de direito, que o seu projeto tem
de ser à esquerda e que, por isso, qualquer outro sentido de voto do PSD não teria qualquer efeito em matéria
de estabilidade económica ou de prevenção de uma inoportuna crise política.
Temos os pés bem assentes na terra. Guiamo-nos pelo interesse nacional e, assim sendo, renunciaremos
sempre à demagogia, ao populismo e ao facilitismo. É esta a nossa linha de rumo. Foi, pois, com ela bem
presente que, em consciência, tomámos a nossa decisão.
Aplausos do PSD, de pé.
O Sr. Presidente: — É agora a vez do Grupo Parlamentar do PS. Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Catarina Mendonça Mendes.
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Há cinco anos escolhemos os parceiros parlamentares à esquerda. Este
caminho, recorde-se, permitiu, nos últimos cinco anos, um caminho de crescimento da economia, de criação de
mais de 350 000 postos de trabalho, de aumento de rendimentos dos portugueses, de aumento das pensões,
de aumento do salário mínimo nacional, tivemos o melhor défice de sempre, uma dívida pública que começava
a descer e ganhámos credibilidade nas instâncias internacionais.
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A 6 de outubro de 2019 os portugueses votaram, aumentaram o Grupo Parlamentar do Partido Socialista e
pediram que houvesse uma junção de esforços à esquerda para prosseguirmos o caminho da anterior
Legislatura.
O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — E não, Sr.ª Deputada Catarina Martins, nunca ouviu da parte do Partido Socialista ou da parte do Governo a desistência de continuarmos os esforços à esquerda neste
Parlamento. Nunca!
Aplausos do PS.
Aliás, a Sr.ª Deputada deve recordar-se bem que o Bloco de Esquerda, logo em outubro de 2019, disse: «não
queremos uma coisa para a Legislatura, faremos medida a medida, orçamento a orçamento».
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Bem lembrado!
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Nós não desistimos da junção de esforços à esquerda e é assim que temos trabalhado.
Aplausos do PS.
Protestos do BE.
Foi assim, interpretámos os resultados eleitorais e por isso o Orçamento do Estado para 2020 foi construído
à esquerda.
Nenhum de nós supunha que, em março de 2020, fossemos atingidos, de forma ainda incalculável quanto
aos seus efeitos, por uma pandemia que traz consequências graves na saúde e que, por causa dela, trouxe
consequências económicas e sociais.
Foi assim, neste contexto, que apresentámos um Orçamento Suplementar, porque tínhamos excedente
orçamental, para responder aos efeitos da pandemia, e respondemos com o reforço do Serviço Nacional de
Saúde, com proteção social para quem nada tinha, com a escola pública e com o apoio às empresas e ao
emprego.
O Orçamento para 2021 é, Sr.as e Srs. Deputados, um Orçamento prudente, responsável, em tempo de
incertezas, sem recuos e com reforço do Estado social e da economia.
Aplausos do PS.
É um Orçamento que responde aos desafios com que estamos confrontados nesta pandemia, é bom para
as famílias, é bom para os trabalhadores, é bom para as empresas, é bom para o Estado social, reforça o Serviço
Nacional de Saúde, a escola pública, a segurança social. Não aumenta impostos, não corta rendimentos, não
tem austeridade.
Sr.as e Srs. Deputados, desde julho que temos tido negociações entre o Governo e os nossos parceiros à
esquerda. Sim, continuamos a privilegiar a construção das soluções com a esquerda parlamentar, sem esquecer
que é o PS que governa.
Aplausos do PS.
E, Srs. Deputados, negociar não é ceder, negociar é fazer compromissos e é por isso que a proposta que
está em apreciação neste Parlamento é fruto das negociações. Este é o princípio do caminho e não o fim do
caminho que o Bloco de Esquerda quer impor.
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Muitas das medidas que o PCP, o PEV, o BE e o PAN colocaram em cima da mesa das negociações estão
incluídas nesta proposta de Orçamento do Estado e é também contra as suas propostas que o Bloco de
Esquerda vai votar.
Aplausos do PS.
Da parte do PS, manteremos até ao fim o nosso compromisso de negociar em sede de especialidade até à
votação final global, porque ninguém compreenderá que se abandone o País num momento difícil como o que
vivemos. Não basta chorar lágrimas de crocodilo, dizer que ninguém fica para trás e daqui lavar as mãos como
se não houvesse a responsabilidade de responder com este Orçamento à maior crise dos nossos tempos.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados; Há oito meses entrámos num terreno desconhecido. Todos nós, como
portugueses, fomos chamados ao combate das nossas vidas, a esta guerra desconhecida, traiçoeira, invisível.
Combatemos o inimigo comum que circula pelas nossas ruas, que irrompe pelos jantares de família, que adia
abraços e prolonga saudades.
Foi por isso que, perante o desconhecido, não desistimos, nem nunca desistiremos, perante o medo,
resistimos e, perante a emergência, agimos.
Numa situação única, jamais comparável com qualquer período da nossa história, reforçámos, sem
precedentes, o Serviço Nacional de Saúde: mais profissionais de saúde, mais equipamentos, mais investimento.
Na corrida por equipamentos de proteção individual reinventámo-nos enquanto País. As fábricas do nosso
País juntaram-se ao esforço nacional para termos ventiladores, máscaras, luvas, zaragatoas. Os trabalhadores
tiveram a garantia de que não cairiam no desespero de não ter como pôr comida na mesa. As escolas avançaram
anos na adaptação às novas tecnologias e, desde casa, garantiram educação e conhecimento aos nossos
jovens e às nossas crianças.
A forma, a força, a determinação com que, desde a primeira hora, combatemos a pandemia assenta também
nas decisões do passado, trilhadas em comum. Ao longo dos últimos cinco Orçamentos do Estado valorizámos
os serviços públicos, equilibrámos as contas públicas, diminuímos a dívida pública, trabalhámos para termos
juros baixos como nunca.
Foi um trabalho do Partido Socialista, mas foi um trabalho ao qual o Bloco de Esquerda, o Partido Comunista
Português e o Partido Ecologista «Os Verdes» não faltaram, e não faltaram porque, perante as nossas
divergências, soubemos convergir contra a austeridade e não faltaram quando percebemos todos que havia
uma esperança, uma alternativa para o País que não passasse pela continuação do empobrecimento, uma
estratégia que gerou desemprego, miséria, dor e fome.
A nossa estratégia de combate à crise é, por isso, em toda a sua extensão, diferente daquela da direita. E é
nesta dicotomia de estratégias que aguardamos o natural e óbvio apoio dos nossos parceiros à esquerda. Esta
é a estratégia que construímos juntos nos últimos cinco Orçamentos e que este Orçamento reforça.
Hoje, que a necessidade é mais premente, que a exigência é imediata, que o interesse nacional mais precisa
de nós, hoje é hora de ninguém faltar à chamada, tal como não faltámos em 2015.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado Rui Rio, não nos iludimos com o discurso que acaba de fazer, porque o PSD já disse ao que
vem ao longo destas semanas: quer repetir a receita, quer, estranhamente, ajudar as empresas empobrecendo
o País. A solução, Sr. Deputado, não é regressar à austeridade, a solução não é o Estado mínimo, a solução
não é privatizar funções básicas e serviços públicos, a solução não é o Estado virar as costas aos portugueses.
Protestos do Deputado do PSD Cristóvão Norte.
A sensibilidade social deste Orçamento afasta, naturalmente, a direita parlamentar das soluções propostas.
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Quem tivesse dúvidas de que a direita parlamentar nada aprendeu desde os tempos em que tinha como ideia
e como programa ir além da troica poderia tê-las desfeito ouvindo, ontem e hoje, o PSD e o CDS neste debate,
mas também os novos partidos da direita, que teriam batido palmas à estratégia ruinosa então seguida, em
2011.
Aplausos do PS.
Para o Dr. Rui Rio, darmos tudo a todos, um orçamento de distribuição, é, para o PSD, bem o sabemos, uma
regalia. Sabemos que direitos, para o PSD, são regalias; que aumentar o salário mínimo nacional, para o PSD,
é uma regalia; que aumentar pensões, para o PSD, é uma regalia; que aumentar os salários da função pública
— dos nossos professores, dos nossos médicos e enfermeiros —, para o PSD, é uma regalia.
Protestos do PSD.
Não há, portanto, qualquer surpresa no voto da direita parlamentar e é por isso que, em democracia, há
sempre alternativa e a alternativa que o PS propõe é contrária à da direita.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, já o disse e repito: os portugueses esperam do PS e da esquerda
parlamentar que procurem os entendimentos para melhores soluções, para respondermos ao difícil tempo que
vivemos.
Pode falar-se muito desta proposta de Orçamento, mas não se pode dizer que o Governo não negociou, não
buscou aproximações, não incorporou ideias que lhe são apresentadas. Há cinco anos que é assim! Há cinco
anos que o Governo vem ao Parlamento com uma proposta concertada com os parceiros à esquerda e dá a
este Parlamento a oportunidade de a melhorar pelo trabalho de convergência que aqui fazemos.
Porque havia de ser diferente este ano? Não é diferente! Buscar aproximações foi sempre um exercício
possível em tempos normais, mas é uma obrigação absoluta em tempos excecionais.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, na bancada do Partido Socialista não vemos nenhuma razão para
que o caminho de convergência dos últimos cinco anos não possa e não deva ser continuado, mais uma vez,
pelas mesmas forças que mudaram as políticas a partir de 2015.
Leio e releio o Orçamento,…
O Sr. André Ventura (CH): — Foi muito bem lido!… É melhor reler!
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — … e, a cada leitura, encontro um reforço do caminho da dignificação, da melhoria dos serviços públicos, de busca de maior coesão social, de partilha justa da riqueza,
de promoção da modernização da economia e do aumento da competitividade do País.
Este ano, num exercício excecionalmente difícil, os portugueses pedem que as forças progressistas
continuem juntas.
Sei que custa à direita, porque, para uns, há portugueses de primeira e de segunda,…
Vozes do PSD: — Ah!…
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — … que não deviam ter nenhuma prestação social. Mas, Sr. Deputado André Ventura, essa não é a política do Partido Socialista.
Aplausos do PS.
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Ao votar contra este Orçamento, o Bloco de Esquerda desertou do campo de batalha e coloca-se,
incompreensivelmente, ao lado da direita.
Vota contra uma nova prestação social de proteção do rendimento, que abrange 258 mil pessoas. Vota contra
o reforço de mais de 1000 milhões de euros no SNS e a contratação de mais 4 200 profissionais de saúde. Vota
contra o subsídio de risco dos profissionais de saúde que estão na linha da frente da luta contra a COVID-19.
Vota contra o aumento das pensões mais baixas, já a partir de janeiro. Vota contra um Orçamento que não
transfere — aliás, note-se, a ausência total deste tema, neste debate, depois de tantas semanas a ouvir falar
dele — dinheiro público para o Novo Banco.
O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Bem lembrado!
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Vota contra o combate à precariedade.
Aplausos do PS.
Vota contra a obrigação de as grandes empresas com lucros, e que tenham benefícios fiscais, manterem o
nível de emprego. Vota contra o aumento do subsídio de desemprego. Vota contra as suas próprias propostas,
que estão nesta proposta de lei.
Porque votará, afinal, o Bloco de Esquerda contra? Será por ser mais fácil? Será por ser mais cómodo estar
fora das soluções quando a situação é difícil?
Aplausos do PS.
Ou porque não quer partilhar o risco da gestão desta crise?
Digam o que disserem, escolher este momento para abandonar toda a esquerda e ir para os braços da direita
é um sinal de tremenda irresponsabilidade, de quem tem medo de enfrentar a maior crise que todos vivemos.
Aplausos do PS.
Sim, Sr.ª Deputada, o Bloco de Esquerda desistiu das pessoas.
Hoje, cada um de nós assumirá, plenamente, a sua responsabilidade, neste momento particularmente difícil.
Lá fora está um País que espera de nós, de cada um de nós, que respondamos às suas angústias, ao seu
sofrimento, à sua dor, que não lhes voltemos as costas e lhes demos esperança para manter os seus
rendimentos, o seu emprego, a sua empresa, a comida na mesa todos os dias, a escola dos seus filhos,…
Protestos de Deputados do PSD.
… o cuidado com os mais velhos, a proteção social, que só uma sociedade decente é capaz de dar.
Lá fora está um País que sabe que aqui, hoje, dentro de instantes, se votam duas opções distintas para o
País: de um lado, a opção do Governo, do PS, do PCP, do PEV, do PAN e das duas Deputadas não inscritas,
para prosseguir o caminho dos últimos cinco anos, de proteção dos rendimentos, valorização do trabalho, reforço
dos serviços públicos — em particular do SNS —, criação de riqueza com mais qualificações e mais
competitividade das nossas empresas.
Do outro lado, a outra opção: contra o aumento do salário mínimo nacional, contra a nova prestação social,
contra o esforço do investimento no Serviço Nacional de Saúde, contra a proteção do emprego, contra a resposta
à emergência social com aumento do subsídio de desemprego, contra as medidas que garantem que nenhum
português ficará abaixo do limiar da pobreza,…
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Ai não?!
A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — … contra o aumento do investimento público.
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Como é óbvio, quando, daqui a minutos, o PSD, o CDS, o Iniciativa Liberal e o Chega se levantarem para
chumbar esta proposta de Orçamento, na generalidade, o Bloco de Esquerda estará de pé, na fotografia, a votar
ao lado desta direita e desta opção.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CH.
Lá fora há um País que pede respostas, sem medo de governar, sem medo de vencer o inimigo invisível,
sem medo de partilhar o risco da gestão da maior crise que cada um de nós vive e que nunca imaginámos viver.
Em democracia há sempres alternativas. A escolha do Grupo Parlamentar do Partido Socialista é clara:
estamos ao lado dos portugueses, a trabalhar arduamente, com o Governo, para vencer esta crise. Este é o
Orçamento que protege os rendimentos. É o Orçamento que protege o poder de compra e que protege a
atividade económica.
O Partido Socialista não foge à exigência do momento. Votaremos pela recuperação da economia, pela
proteção do emprego e dos rendimentos, pelo combate à pandemia, votaremos pelo SNS, votaremos pela escola
pública. Votaremos a favor, por Portugal e pelos portugueses!
Aplausos do PS, de pé.
O Sr. Presidente: — Para concluir a fase de encerramento do debate, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital, Pedro Siza Vieira.
O Sr. Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital (Pedro Siza Vieira): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No passado dia 2 de março foi confirmado o primeiro caso de infeção por SARS-CoV 2 no
nosso País. Nos escassos oito meses que decorreram desde então, a nossa vida coletiva tem sido,
essencialmente, determinada pelo impacto da pandemia.
Em Portugal, como no resto da Europa, como no resto do mundo, o combate à doença tornou-se central no
modo como cada um de nós se relaciona com os outros, como as nossas empresas se organizam, como
decidimos alocar os recursos do Estado.
Em todo o lado, os Governos procuraram, inicialmente, conter a propagação da doença pelo método mais
antigo conhecido, a quarentena, o confinamento. Em consequência, a atividade económica mundial conheceu
a mais abrupta e violenta contração desde que há registos. Uma crise de saúde pública converteu-se numa crise
económica e social à escala global.
Recursos inéditos, em tempos de paz, foram utilizados para reforçar a capacidade de resposta dos serviços
de saúde; apoios massivos foram utilizados para apoiar as empresas e preservar o emprego; respostas novas
foram utilizadas para proteger o rendimento daqueles que se viram privados de atividade profissional. A dívida
pública, em todo o mundo ocidental, subiu para níveis que só encontram paralelo na II Guerra Mundial.
Hoje, sabemos muito mais sobre este vírus, conhecemos melhor os seus mecanismos de propagação,
melhorámos a capacidade de tratamento da doença que ele causa e foi mobilizado um esforço inédito de
investigação científica e industrial em todo o mundo, com vista a desenvolver, produzir e distribuir uma vacina
segura e eficaz, a partir do início do próximo ano.
E, no entanto... No entanto, este vírus continua a surpreender-nos e a condicionar toda a agenda política.
Até ao momento, a doença já afetou 43 milhões de pessoas em todo o mundo e o número de mortes já atinge
1,2 milhões.
Uma segunda vaga, que todos esperavam para o inverno, surgiu umas semanas mais cedo, com uma
intensidade e uma rapidez que surpreendeu populações e Governos. Por toda a Europa e nos Estados Unidos,
os números de novos contágios batem recordes todos os dias, os internamentos e óbitos ultrapassam os
números desta primavera. Países que tinham sido relativamente poupados na primeira vaga figuram agora entre
aqueles em que o crescimento é maior. Aquelas nações mais afetadas no início do ano voltam a ser fustigadas
por novos e intensos casos da doença.
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Perante este cenário, os Governos procuram conter a progressão da doença e anunciam novas e exigentes
restrições, perante o cansaço dos povos e a oposição crescente de algumas franjas da opinião pública. Mas,
por toda a Europa, independentemente de sistema de governo ou de orientação partidária, os números crescem
e as sociedades procuram responder à emergência.
A situação é grave em toda a Europa. Por muito planeamento, por muitos recursos que tenham à sua
disposição, Alemanha e França acabam de anunciar medidas mais restritivas.
Por isso, no mundo, em Portugal, o combate à pandemia, na frente sanitária e na frente económica e social,
continua a constituir a questão central que a nossa sociedade enfrenta e na discussão e votação do próximo
Orçamento do Estado tem de ser esta, também, a questão central.
Na frente sanitária, o reflexo desse objetivo, no Orçamento, está no reforço substancial dos serviços públicos,
com o SNS à cabeça; na frente económica e social, sublinha-se o reforço dos apoios ao emprego, dos estímulos
às empresas e das políticas sociais inovadoras.
Durante este debate, muito se discutiu o modo como a proposta de lei do Orçamento responde — mal,
disseram alguns — às necessidades dos serviços públicos e aos problemas sociais.
Agora, permitam-me que me detenha com mais atenção sobre a resposta na frente económica, cuja
discussão me pareceu singularmente distorcida nestes dois dias. E, para isso, tenho de partilhar com as Sr.as e
os Srs. Deputados três notas distintas, que são também respostas a questões levantadas durante o debate.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Benzam-se os liberais!
O Sr. Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital: — A primeira nota diz respeito à forma como são afetadas as nossas empresas, na frente económica. Para uma nação fortemente exportadora, como
Portugal se tornou nos últimos anos, a quebra da procura nos nossos principais mercados determinou um
impacto devastador.
As exportações caíram, de janeiro a agosto, 23,6% em termos homólogos. O investimento privado, perante
a incerteza da evolução da situação sanitária, decresceu significativamente e o consumo privado, tendo em
conta a quebra de rendimentos e o receio do futuro, contraiu para níveis de há vários anos.
Durante o debate, ouvimos alguns Srs. Deputados referirem que o Orçamento se esqueceu da economia,
que apenas «distribui o que tem e o que não tem» e se esquece da criação de riqueza, que as empresas é que
investem e criam emprego e que o Governo devia ter optado por apoiar as empresas através da redução de
impostos, ao invés de reforçar a despesa pública ou as transferências sociais.
Temos, no entanto, de ser francos. Se, nos últimos cinco anos, o crescimento da nossa economia foi
impulsionado pelas empresas, que investiram, exportaram, criaram emprego, a verdade é que, nos próximos
tempos, perante a incerteza da situação sanitária, não será o setor privado a puxar pela retoma.
Perante uma economia que cai, as empresas, se entregues a si próprias, cortariam custos — a começar
pelos custos do trabalho, despedindo ou reduzindo salários — e adiariam decisões de investimento. As
empresas mais sólidas poderiam, talvez, aguentar, à espera de melhores dias. As demais, particularmente as
micro, pequenas e médias empresas, que constituem 99% do nosso tecido empresarial, viriam a encerrar ou a
tornar-se insolventes, deixando de cumprir os seus compromissos com terceiros.
Em qualquer caso, as consequências económicas seriam devastadoras: desemprego galopante, destruição
de poupanças e de conhecimento acumulado, pobreza em crescimento e crise duradoura.
Perante uma economia que cai, as empresas não terão lucros; baixar o IRC, um imposto sobre os lucros, em
ano em que a crise vai apagar a rentabilidade, seria não só inútil, seria uma ironia cruel.
Hoje, as empresas sabem que não encontram num mercado em retração a possibilidade de sustentar a sua
atividade. Pelo contrário, empresas bem geridas, que vinham crescendo e criando empregos antes da pandemia,
reclamam, hoje — e bem! —, apoios do Estado: apoios ao pagamento de salários, apoios à dinamização da sua
atividade, apoios à sua capitalização, apoios à adaptação das suas instalações às novas regras sanitárias.
Por isso, perante uma economia em contração, é necessário que a política económica sustente o tecido
empresarial de uma forma que não pode vir do mercado. E é essa, precisamente, a opção do Governo.
Aplausos do PS.
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Ao contrário do que sucedeu na última crise, o Estado não irá agravar uma situação económica débil,
demitindo-se de apoiar a economia ou bastando-se com reduzir impostos. Pelo contrário, o Estado dispõe-se a
aumentar a despesa, a transferir recursos para a economia e a estimular a atividade económica, assumindo a
vocação contracíclica deste Orçamento.
A segunda nota prende-se com os instrumentos à nossa disposição para o combate à crise. Os Srs.
Deputados discutiram a proposta de Orçamento e encontraram nela faltas e insuficiências, dizendo que faltaria,
sobretudo, apoio à economia. É normal, pois o Orçamento do Estado para 2021 não esgota os instrumentos à
disposição do País para o combate à crise. Os Srs. Deputados esqueceram, desde logo, a possibilidade de as
empresas recuperarem integralmente os prejuízos fiscais, incorridos em 2020 e 2021, nos 12 anos seguintes,
uma medida já aprovada no Orçamento Suplementar de 2020. Trata-se de uma medida que, por si só,
corresponde à mais significativa redução do esforço fiscal das empresas nas últimas décadas, que terá impacto
não em 2021, mas ao longo dos próximos anos, quando as empresas regressarem à atividade.
Aplausos do PS.
Mas, por outro lado, para além dos recursos nacionais de que o Orçamento é expressão, Portugal conta com
um conjunto inédito de recursos da União Europeia para o combate à crise. Entre esses recursos está o
programa Next Generation EU, que inclui o instrumento de recuperação e resiliência europeu. Para Portugal,
este programa transfere cerca de 15 mil milhões de euros em subvenções, já a partir do próximo ano. E temos
ainda o envelope nacional do programa Invest EU, a ser canalizado para as empresas, através do Banco
Português de Fomento. Todas estas são verbas que, ao serem disponibilizadas aos Estados-Membros sem
contrapartida nacional e sob a forma de subvenções, permitem apoiar a retoma sem disparidades entre países
nas condições de financiamento no mercado.
Junte-se a estes instrumentos o programa SURE, que financia as respostas dos Estados-Membros à crise
sanitária e social, designadamente em programas para a manutenção do emprego. No PRR, constam recursos
para ajudar as empresas a recuperar o seu papel como criadoras de emprego e de investimento, após a
normalização da economia. Estamos preparados para mobilizar todos os recursos se a situação económica
assim o exigir para o apoio ao emprego e às empresas.
Perante a retração da procura, cumpre também ao Estado dinamizar a economia, através do investimento
público e, entre outros, iremos financiar investimentos que, servindo objetivos de longo prazo da nossa
comunidade, contribuem, no imediato, para a dinamização das nossas empresas e para a criação de emprego,
como sucede com o investimento em lares e creches, com a melhoria da eficiência energética nos edifícios
privados, com a eliminação de barreiras arquitetónicas nos edifícios públicos, ou com o reforço do parque
habitacional público, que contará com o maior envelope financeiro da história da nossa democracia.
Este é um Orçamento contracíclico, em que a despesa primária aumenta pelo menos 4% relativamente ao
ano transato, adicionando-se a isso os apoios sociais extraordinários. Mas, como vimos, a despesa pública
financiada pelo Orçamento do Estado está longe de esgotar, antes pelo contrário, os recursos que serão
colocados ao dispor da economia para estimular o crescimento económico. Por forma a que esses recursos
sejam utilizados o mais cedo possível, ao serviço dos cidadãos e das empresas, a proposta de lei do Orçamento
do Estado prevê que possa ser antecipada despesa por conta desses fundos logo a partir do início do ano.
A minha terceira nota serve para referir o modo como o Governo propõe que os recursos públicos sejam
mobilizados nos próximos tempos. A proposta de Orçamento do Estado assume uma clara opção de resposta
à crise, e essa opção é determinada pelos valores que perfilhamos. Esses valores são, antes de tudo, os da
solidariedade e da proteção coletiva da dignidade de todos os cidadãos, independentemente das suas
circunstâncias pessoais ou das circunstâncias da economia. Uma sociedade decente mobiliza-se sempre, em
particular em tempos de crise, para proteger os mais frágeis e apoiar aqueles que ficam subitamente privados
do seu trabalho.
Por isso, a proposta de Orçamento reforça o subsídio de desemprego e propõe a criação de uma prestação
social extraordinária, que assegura que aqueles que se veem privados de outras fontes de rendimentos não
ficam abaixo do limiar de pobreza. Houve quem, neste debate, e a este propósito, falasse de subsídios para
quem não quer trabalhar. Que horrível expressão! Estamos a falar de trabalhadores independentes que
deixaram de encontrar no mercado a possibilidade de angariarem o seu sustento próprio e o das suas famílias.
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Aplausos do PS.
Estamos a falar de jovens trabalhadores que caíram no desemprego antes de reunirem o tempo necessário
para receber o respetivo subsídio; estamos a falar de trabalhadores do serviço doméstico que perderam
rendimentos nesta altura. Falar em subsídios para quem não quer trabalhar, a este propósito, é uma forma de
negar os valores mais básicos de uma comunidade civilizada!
Aplausos do PS.
Mas, ao avançar-se com a proposta desta prestação, não se está apenas a reafirmar valores essenciais de
solidariedade com os nossos concidadãos, estas medidas são também boa política económica. Aprovar uma
prestação social extraordinária que evite que muitos dos nossos concidadãos caiam na pobreza, tal como reduzir
as retenções na fonte, tal como aumentar o salário mínimo, todas estas medidas permitem aumentar o
rendimento disponível das famílias e evitar uma queda do consumo interno, indispensável para sustentar as
nossas micro, pequenas e médias empresas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Nos próximos meses, o País e o mundo continuarão focados no
combate à pandemia. Não tenhamos dúvidas de que a situação sanitária vai continuar a exigir-nos a adoção de
medidas restritivas que terão impactos negativos sobre a economia e a sociedade. Por isso, mais do que nunca,
o Estado precisará de ter ferramentas para mitigar esse impacto e para proteger as famílias, os trabalhadores e
as empresas. O Orçamento é uma dessas ferramentas e o País não pode correr o risco de enfrentar esta crise
sem essa ferramenta.
Votar contra este Orçamento não garante mais recursos, melhores respostas à crise, mais flexibilidade ou
mais investimento, apenas condena o País a navegar os próximos e incertos tempos sem apoios para famílias,
trabalhadores e empresas. E isso não assegura clarificação política, mas apenas mais incerteza, mais angústia,
mais sofrimento.
Há, talvez, quem pense que pode retirar vantagens políticas da degradação das condições sociais e
económicas e há também quem, em momento de dificuldade, não desista e assuma a responsabilidade de
trabalhar para resolver os problemas com que nos confrontamos. Não criámos esta crise, mas cabe-nos, a todos
nós, combatê-la.
No nosso sistema democrático, compete ao Governo elaborar uma proposta de Orçamento e ao Parlamento
compete discuti-la e aprová-la. Perante esta pandemia — surpreendente e avassaladora — e perante o seu
impacto económico e social, o Governo apresenta à Assembleia da República uma proposta de Orçamento que,
conjugada com todos os demais recursos, assume uma resposta à crise que é, assumidamente, oposta à de há
10 anos.
Tenho a profunda convicção de que a resposta à última crise — a famosa ideia da «austeridade
expansionista» — agravou a situação económica do País, destruiu milhares de empresas e prolongou
inutilmente o sofrimento de muitas famílias. Agora, as opções políticas refletidas nesta proposta de Orçamento
são simples e claras: reforçar as verbas necessárias à saúde pública e ao tratamento dos doentes; assegurar a
manutenção do emprego através de apoios às empresas, permitindo a estas preservar a sua capacidade
produtiva e os recursos humanos críticos; lançar apoios à liquidez e à solvência das empresas, evitando
encerramentos generalizados; apoiar o rendimento daqueles que se viram privados do seu trabalho ou da
atividade profissional independente. Estas medidas devem manter-se tanto tempo quanto se mostre necessário
e devem ser alargadas, na medida das necessidades, até à normalização da economia e à estabilização da
situação sanitária. É simples e é claro!
Cabe agora aos Srs. Deputados a próxima palavra, para decidir se pretendem apreciar esta proposta e
prosseguir a discussão sobre ela, oferecendo, assim, ao País a oportunidade de atravessar esta crise com um
referencial de segurança. O Governo mantém toda a disponibilidade para continuar essa discussão, em
benefício de Portugal.
Tenho toda a confiança em que, ultrapassada esta pandemia que não criámos, demonstrando e continuando
a demonstrar a determinação e o sentido de comunidade de que, até agora, temos dado provas, os portugueses
venham, uma vez mais, a superar esta crise e a retomar o caminho sustentado de construção de uma sociedade
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mais justa, em que a nossa prosperidade coletiva assente na aposta nas qualificações, no conhecimento e na
inovação e ofereça a todos a oportunidade de aqui, neste nosso País, realizarem as suas aspirações pessoais
e profissionais. E esse, estou certo, é um propósito em que todos nos podemos reconhecer.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, estamos em condições de passar ao último ponto da nossa agenda de hoje, ou seja, as votações regimentais.
Estando já, há muitas horas, garantida a existência de quórum, vamos, pois, iniciar as votações.
Começamos por votar, na generalidade, a Proposta de Lei n.º 60/XIV/2.ª (GOV) — Aprova a Lei das Grandes
Opções para 2021-2023.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PSD, do BE, do CDS-PP, do
CH e do IL e abstenções do PCP, do PAN, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine
Katar Moreira.
Esta proposta de lei baixa à 5.ª Comissão.
Passamos à votação, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 61/XIV/2.ª (GOV) — Aprova o Orçamento do
Estado para 2021.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PSD, do BE, do CDS-PP, do
CH e do IL e abstenções do PCP, do PAN, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine
Katar Moreira.
Aplausos do PS, de pé.
A proposta de lei que acabámos de votar baixa, também, à 5.ª Comissão.
Segue-se o Projeto de Voto n.º 361/XIV/2.ª (apresentado pelo PS e subscrito por uma Deputada do PSD) —
De pesar pelo falecimento da escritora e jornalista Helena Marques.
Peço à Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha o favor de ler este projeto de voto.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, é do seguinte teor: «Faleceu na passada semana a jornalista Helena Marques. Nascida em Carcavelos, filha de pais
madeirenses, Helena Marques dedicou-se ao jornalismo, profissão que exerceu durante 36 anos, começando a
sua carreira no Diário de Notícias da Madeira e terminando o seu percurso profissional no Diário de Notícias, no
qual exerceu funções como diretora-adjunta. O seu percurso rico e diversificado pelo jornalismo valeu-lhe, em
1986, o Prémio Jornalista do Ano, da Revista Mulheres, e o prémio Gazeta de Mérito, em 2013.
Paralelamente, enquanto escritora, ficou conhecida por diversas obras de ficção, a primeira das quais O
Último Cais, de 1992, que lhe valeu o Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de
Escritores, o Prémio Revista Ler/ Círculo de Leitores, o Prémio Máxima de Revelação, o Prémio Procópio de
Literatura e o Prémio Bordallo de Literatura da Casa da Imprensa. Seguiram-se, nos anos seguintes, outros
títulos, nomeadamente A Deusa Sentada, Terceiras Pessoas, Os Íbis Vermelhos da Guiana, Ilhas Contadas e
O Bazar Alemão, que fizeram de Helena Marques uma das escritoras portuguesas consagradas e acarinhadas
pelo público.
Em 2001, a escritora e jornalista foi agraciada pelo Presidente da República com o grau de Comendador da
Ordem do Infante D. Henrique.
Assim, a Assembleia da República presta a sua homenagem a Helena Marques, pelo seu percurso
profissional e pela intervenção cultural, transmitindo ao seus familiares e amigos as suas mais sentidas
condolências.»
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar a parte deliberativa do projeto de voto que acaba de ser lido.
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Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.
Srs. Deputados, vamos guardar 1 minuto de silêncio.
A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.
Segue-se o Projeto de Voto n.º 356/XIV/2.ª (apresentado pela Comissão de Educação, Ciência, Juventude e
Desporto e subscrito por Deputados do PS e por uma Deputada do PSD) — De congratulação a António Félix
da Costa, vencedor do Campeonato do Mundo FIA de Fórmula E de 2020.
Vamos votar.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
Votamos, agora, o Projeto de Resolução n.º 699/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo a simplificação
do regime legal de emissão de atestados médicos de incapacidade multiuso, bem como a adoção de medidas
de urgência para acelerar a emissão e a revalidação desses atestados.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PAN, do CH, do IL e da
Deputada não inscrita Cristina Rodrigues e abstenções do PS, do BE, do PCP, do PEV e da Deputada não
inscrita Joacine Katar Moreira.
Passamos à votação do Projeto de Resolução n.º 664/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que
mantenha uma política integrada ao nível da sanidade e do bem-estar animal para os animais de companhia,
reforçando a Direção-Geral de Alimentação e Veterinária.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do BE e do PAN, votos a favor do PSD, do PCP,
do CDS-PP, do PEV, do CH, do IL e do Deputado do PS Ascenso Simões e abstenções das Deputadas não
inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e dos Deputados do PS Francisco Rocha e Joaquim Barreto.
O Sr. Joaquim Barreto (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Joaquim Barreto (PS): — Para anunciar que entregarei uma declaração de voto escrita.
O Sr. Presidente: — Muito bem. Fica registado. Vamos votar o Projeto de Resolução n.º 704/XIV/2.ª (PCP) — Medidas para dotar a Direcção-Geral de
Alimentação e Veterinária dos meios financeiros, humanos e técnicos necessários para cumprir as competências
que lhe estão atribuídas.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PEV, do IL
e do Deputado do PS Ascenso Simões, votos contra do PS e do PAN e abstenções do CH, das Deputadas não
inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e dos Deputados do PS Francisco Rocha e Joaquim Barreto.
Passamos à votação do Projeto de Resolução n.º 711/XIV/2.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que
mantenha a Direção-Geral de Alimentação e Veterinária e todas as suas funções sob tutela do Ministério da
Agricultura.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PAN, votos a favor do PSD, do PCP, do
CDS-PP, do PEV, do CH, do IL e do Deputado do PS Ascenso Simões e abstenções do BE, das Deputadas não
inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e dos Deputados do PS Francisco Rocha e Joaquim Barreto.
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Srs. Deputados, podemos votar em conjunto os projetos de resolução que se seguem no guião de votações,
que se referem à mesma matéria?
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, por nós, podemos votar em conjunto todos os projetos de resolução, com exceção do último, que pedimos para ser votado separadamente.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Sendo assim, e como não há objeções, vamos votar, em conjunto, na generalidade, os Projetos de Resolução n.os 624/XIV/1.ª (PCP) — Requalificação da Escola Secundária de Serpa, 633/XIV/2.ª
(CDS-PP) — Recomenda ao Governo que proceda à imediata requalificação da Escola Secundária de Serpa,
655/XIV/2.ª (BE) — Recomenda ao Governo a realização urgente de obras na Escola Secundária de Serpa,
676/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que promova, com urgência, a requalificação da Escola
Secundária de Serpa e 681/XIV/2.ª (PEV) — Requalificação urgente da Escola Secundária de Serpa.
Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.
Votamos agora, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 703/XIV/2.ª (PS) — Recomenda ao Governo a
requalificação da Escola Secundária de Serpa.
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e da Deputada não inscrita Cristina Rodrigues,
votos contra do BE, do PCP e do PEV e abstenções do PSD, do CDS-PP, do PAN, do CH, do IL e da Deputada
não inscrita Joacine Katar Moreira.
Estes projetos de resolução baixam à 8.ª Comissão.
Entretanto, a Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha vai dar algumas informações à Câmara.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um relatório e parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados, que se refere à suspensão do
mandato, nos termos dos artigos 3.º e 7.º do Estatuto dos Deputados, da Sr.ª Deputada Sónia Fertuzinhos (PS),
círculo eleitoral de Braga, sendo substituída por Pompeu Miguel Noval da Rocha Martins, com efeitos a partir de
2 de novembro de 2020 até ao dia 2 de dezembro do mesmo ano.
O parecer é no sentido de a suspensão da Deputada e de a substituição em causa serem de admitir, uma
vez que se encontram verificados os requisitos legais.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.
Pausa.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.
Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Deu ainda entrada na Mesa, e foi admitido, o Projeto de Resolução n.º 746/XIV/2.ª.
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a nossa próxima reunião plenária terá lugar no dia 24 de novembro, às 10 horas, com o início da discussão, na especialidade, das Propostas de Lei n.os 60/XIV/2.ª (GOV) — Aprova
a Lei das Grandes Opções para 2021-2023 e 61/XIV/2.ª (GOV) — Aprova o Orçamento do Estado para 2021.
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Muito obrigado a todos pelo bom trabalho nestes dois dias, no Plenário. Também agradeço aos serviços, à
Mesa e a todos os que estiveram aqui presentes. Bom trabalho para todos, agora na especialidade.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 52 minutos.
———
Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação
Nota: A declaração de voto anunciada pelo Deputado do PS Joaquim Barreto, referente a esta reunião
plenária, não foi entregue no prazo previsto no n.º 3 do artigo 87.º do Regimento da Assembleia da República.
———
Relativa aos Projetos de Lei n.os 484/XIV/1.ª (BE), 492/XIV/1.ª (PCP) e 497/XIV/1.ª (PAN) [votados na reunião
plenária de 2 de outubro de 2020 — DAR I Série n.º 9 (2020-10-03)]:
O Projeto de Lei n.º 484/XIV/1.ª, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, o Projeto de Lei n.º
492/XIV/1.ª, do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, e o Projeto de Lei n.º 497/XIV/1.ª, do Grupo
Parlamentar do Pessoas-Animais-Natureza, visam promover alterações nos valores de propinas aplicáveis ao
ensino superior, ainda que com incidências e estratégias distintas.
Os Deputados subscritores concordam com os princípios gerais das diversas propostas, nomeadamente no
que se refere à necessidade de garantir um ensino superior público gratuito, de garantir progressividade na
redução de propinas e de resolver a disparidade de valores de propinas praticados em particular nos 2.º e 3.º
ciclos, bem como em pós-graduações. Contudo, entendemos que a avaliação de um projeto de lei não se basta
pela leitura do princípio enunciado, necessitando de uma ponderação sobre o seu desenho legislativo e sobre
se este permite concretizar os fins a que se propõe. Desse modo, esses mesmos Deputados votaram
favoravelmente o Projeto de Lei n.º 497/XIV/1.ª, votando desfavoravelmente os outros dois projetos de lei pelos
motivos que em seguida se expõe.
O Projeto de Lei n.º 497/XIV/1.ª, do Grupo Parlamentar do Pessoas-Animais-Natureza, introduz uma restrição
à alteração do valor de propina de cursos técnicos superiores profissionais (CTESP) e cursos dos 2.º e 3.º ciclos
de estudos das instituições de ensino superior públicas durante o período de frequência de cada estudante. Esta
proposta vem contribuir para impedir alterações de propina durante o período de estudo de cada estudante,
impedindo alterações que excedam o índice geral de preços no consumidor (IPC), promovendo estabilidade ao
longo do percurso académico e limitando que impactos financeiros extraordinários possam resultar em
abandono escolar. Esta contribuição tem também um efeito positivo de forma mais generalizada, promovendo
a estabilização de valores de propinas, evitando que os cursos não regulados por limiar mínimo e máximo
possam ser utilizados como tampões de perda de receita através de alterações em alta dos valores praticados.
Esta medida vem contribuir para um ensino superior público que limite de forma natural e adequada os valores
praticados nos CTESP, bem como nos 2.º e 3.º ciclos.
O Projeto de Lei n.º 484/XIV/1.ª, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, pretende estabelecer a criação
de um teto máximo do valor de propina aplicável aos 2.º e 3.º ciclos de estudos e pós-graduações no ensino
superior público. Remete ainda toda a responsabilidade de regulação da medida para o Governo, conferindo-
lhe uma competência que atualmente se encontra na esfera do Parlamento. Este é o primeiro motivo que nos
leva a votar contra o referido projeto. Entendemos que os equilíbrios políticos momentâneos não nos impedem
de antever efeitos potencialmente negativos se a discussão sobre propinas se vier a fazer à revelia das maiorias
construídas em sede parlamentar. Tal aprovação implicaria que o poder executivo poderia, arbitrariamente,
definir valores a praticar ou impedir a fixação dos mesmos, o que não resultaria na proteção de um avanço no
controlo de valores praticados; pelo contrário, esta proposta pode traduzir-se numa blindagem política da
discussão pública de propinas, em sentido contrário à intenção manifestada no projeto de lei e contrária à
vontade dos Deputados que subscrevem esta declaração.
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O segundo motivo relaciona-se com a falta de enquadramento da proposta, que não propõe qualquer
alteração concreta. Com efeito, não estabelece qualquer teto definido ou variável, qualquer prazo ou
enquadramento de execução, pelo que se basta na intenção proposta. Ora, tal opção não corresponde, de facto,
a um projeto de lei, assemelhando-se a um projeto de resolução ou a um mero manifesto. A sua aprovação,
para além de significar a desresponsabilização do Parlamento nesta matéria, resultaria num sinal negativo para
a população que representamos nas nossas funções, que não reconheceria nesta proposta nem uma resolução
do problema identificado, nem o desenvolvimento técnico mínimo de que um projeto de lei deve estar dotado.
O terceiro motivo prende-se com os efeitos da proposta, mesmo que se ultrapassadas as duas primeiras
dificuldades. A limitação dos valores de propina praticados nos 2.º e 3.º ciclos deve ser feita de forma
acompanhada com a limitação de alterações de valores atualmente praticados, tal como se prevê no Projeto de
Lei n.º 497/XIV/1.ª. A definição de um teto único sem acompanhamento destas transformações faz antever dois
efeitos negativos. A imposição de um teto pode resultar numa subida do valor médio dos cursos de 2.º e 3.º ciclo
em função da fixação generalizada do valor máximo para estes cursos, o que já acontece de forma quase total
nos cursos de 1.º ciclo. Ademais, há o risco de inflação de valores destes cursos em momento prévio à
introdução de limitação, resultando numa compensação financeira às instituições de ensino superior públicas
acima do valor devido.
O Projeto de Lei n.º 492/XIV/1.ª, do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, prevê a eliminação
de todas as propinas de todos os ciclos de estudos num prazo de 2 anos. A proposta não é suficientemente
progressiva para que se permita antever a possibilidade da sua execução, especialmente tendo em conta o
alargamento da gratuitidade total a todos os níveis de ensino. Essa é uma dificuldade acrescida no atual contexto
económico e social, em que o reforço inevitável dos mecanismos de ação social escolar é imperioso para que
se evite o abandono escolar generalizado. Assim, face às dificuldades dos estudantes e suas famílias, é
importante garantir que a necessária redução de valor de propina não se faça em condições que não garantam,
ao mesmo tempo, a dotação de recursos necessária às instituições de ensino superior.
Lisboa, 6 de outubro de 2020.
Os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, Eduardo Barroco de Melo — Maria Begonha —
Joana Sá Pereira — Miguel Matos — Filipe Pacheco — Olavo Câmara.
[Recebida na Divisão de Redação em 29 de outubro de 2020].
———
Relativa ao Projeto de Lei n.os 570/XIV/2.ª (PSD) [votado na reunião plenária de 23 de outubro de 2020 —
DAR I Série n.º 17 (2020-10-24)]:
No âmbito da crise sanitária causada pela COVID-19, o PAN tem tido uma posição que privilegia a prevenção
e tem trazido propostas para que sejam acauteladas as situações de contágio e de descontrolo da transmissão
na comunidade, como sejam o reforço de profissionais de saúde pública, a implementação e melhoria dos
mecanismos de vigilância epidemiológica nas fronteiras ou o reforço de medidas de prevenção em contextos
educativos e equipamentos sociais.
Sabemos, nesta lógica, que no outono-inverno há medidas adicionais que têm de ser tomadas, entre as quais
o uso de máscaras de forma mais recorrente. Sem deixar de reconhecer que o uso de máscara pode comportar
um ataque às liberdades e garantias individuais dos cidadãos a partir do momento em que se torna um requisito
para circular na via pública, acreditamos, porém, que este é daqueles momentos em que o bem comum e o bem
individual têm de se compatibilizar. O mesmo será dizer que entendemos a necessidade de uso de máscara em
espaços públicos, que eram já uma exigência de saúde pública nos espaços fechados, quando e apenas não
existirem condições de segurança sanitária e de distanciamento recomendável entre as pessoas.
Não obstante termos votado a favor da iniciativa acima melhor identificada, consideramos que esta proposta
— que inicialmente surgiu com 120 dias, depois com 90 dias e mais tarde com 70 dias — deveria entrar em
vigor e ser revogada em função da situação epidemiológica. Mais, paralelamente a esta medida — que exige
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tanto de cada um dos cidadãos e cidadãs —, consideramos que cumpre ao Governo implementar todos os
mecanismos necessários para que não se voltem a repetir medidas restritivas difíceis, nomeadamente condições
de transporte em que as pessoas que garantam o distanciamento de segurança, o reforço das carreiras dos
transportes públicos, a colocação de álcool gel nos pontos de acesso, entre outras. Mais, exige-se que sejam
dadas informações claras e coerentes aos cidadãos, para que medidas como estas sejam compreendidas e
aceites, não impostas. Importa ainda garantir o acesso a máscaras reutilizáveis e sensibilizar as pessoas para
o correto descarte das máscaras que se estão a tornar um verdadeiro problema ambiental.
Quanto ao mais, das três propostas de alteração que apresentou à iniciativa do Governo, o PAN viu
aprovadas duas que foram no sentido de acautelar a disponibilização gratuita de máscaras reutilizáveis e da
sensibilização para a utilização consciente e responsável de máscara, algo que cumpre um papel importante no
momento absolutamente excecional que vivemos coletivamente.
Palácio de S. Bento, 29 de outubro de 2020.
Os Deputados do PAN, André Silva — Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real.
[Recebida na Divisão de Redação em 29 de outubro de 2020].
———
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.