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Sábado, 19 de dezembro de 2020 I Série — Número 32

XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)

REUNIÃOPLENÁRIADE18DEDEZEMBRODE 2020

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretárias: Ex.mas Sr.as Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Helga Alexandra Freire Correia

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 4

minutos. Procedeu-se à discussão conjunta, na generalidade, da

Proposta de Lei n.º 64/XIV/2.ª (GOV) — Altera o regime excecional para as situações de mora no pagamento da renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano habitacional e não habitacional, no âmbito da pandemia

COVID-19, que foi aprovada, e dos Projetos de Lei n.os 575/XIV/2.ª (BE) — Regime excecional de renda não habitacional para lojistas e retalhistas sob o novo Regime de Arrendamento Urbano afetados na sua atividade por força da COVID-19, que foi rejeitado, 576/XIV/2.ª (BE) — Normas interpretativas que clarificam a aplicação e retroatividade ao período de confinamento da suspensão da aplicação de

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rendas fixas, que foi rejeitado, 596/XIV/2.ª (BE) — Alarga o regime extraordinário de proteção dos arrendatários (Sétima alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março), que foi aprovado, 599/XIV/2.ª (PCP) — Estabelece para 2021 o regime excecional aplicável a formas específicas de contratos de exploração de imóveis para comércio e serviços em centros comerciais, que foi rejeitado, 600/XIV/2.ª (PCP) — Regime excecional de pagamento das rendas, que foi rejeitado, 601/XIV/2.ª (PCP) — Regime extraordinário de proteção dos arrendatários, que foi rejeitado, 602/XIV/2.ª (PAN) — Clarifica o regime excecional aplicável aos contratos de exploração de imóveis para comércio e serviços em centros comerciais, procedendo para o efeito à aprovação de uma norma interpretativa relativamente à Lei n.º 2/2020, de 31 de março, que foi aprovado, e 603/XIV/2.ª (BE) — Extensão dos contratos de arrendamento para fins comerciais no período de retoma da economia, no caso de perdas de faturação consideráveis (Terceira alteração à Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril), que foi rejeitado. Usaram da palavra, além dos Secretários de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor (João Torres) e da Habitação (Marina Gonçalves), os Deputados Maria Manuel Rola (BE), Bruno Dias (PCP), Bebiana Cunha (PAN), Márcia Passos (PSD), José Luís Ferreira (PEV), João Gonçalves Pereira (CDS-PP), Hugo Carvalho (PS), André Ventura (CH) e João Cotrim de Figueiredo (IL).

Foi apreciado o Decreto-Lei n.º 81/2020 de 2 de outubro, que adequa os instrumentos criados no âmbito da Nova Geração de Políticas de Habitação e a Lei Orgânica do IHRU, I.P., à Lei de Bases da Habitação, no âmbito do Programa de Estabilização Económica e Social [Apreciação Parlamentar n.º 33/XIV/2.ª (PCP)]. Proferiram intervenções, além da Secretária de Estado da Habitação, os Deputados Bruno Dias (PCP), Inês de Sousa Real (PAN), João Gonçalves Pereira (CDS-PP), Maria Manuel Rola (BE), José Luís Ferreira (PEV), Filipa Roseta (PSD) e Maria Begonha (PS). No encerramento do debate, usaram de novo da palavra o Deputado Bruno Dias (PCP) e a Secretária de Estado da Habitação, tendo sido anunciada pela Mesa a apresentação, pelo PCP e pelo BE, de propostas de alteração ao decreto-lei.

Foram apreciados em conjunto, e aprovados na generalidade, os Projetos de Resolução n.os 784/XIV/2.ª (CDS-PP) — Colocar a crise humanitária e o problema de terrorismo vivido em Moçambique nas prioridades da Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia e 779/XIV/2.ª (PAN) — Recomenda ao Governo a mobilização da comunidade internacional no sentido de travar os crimes perpetrados contra a humanidade em Moçambique. Usaram da palavra os Deputados Inês de Sousa Real (PAN), Telmo Correia (CDS-PP), João Cotrim de Figueiredo (IL), Nuno Miguel Carvalho (PSD), Alexandra Vieira (BE), Paulo Pisco (PS), André Ventura (CH), João Oliveira (PCP) e Isabel Meireles (PSD).

Foi discutido, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 169/XIV/1.ª (PAN) — Determina a declaração da filiação ou ligação a organizações ou associações «discretas» em sede de obrigações declarativas (segunda alteração à Lei n.º 52/2019, de 31 de julho), o qual, a requerimento apresentado pelo seu autor, baixou à Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados, sem votação, por 60 dias. Proferiram intervenções os Deputados André Silva (PAN) (a), João Cotrim de Figueiredo (IL), José Manuel Pureza (BE), André Ventura (CH), José Luís Ferreira (PEV), João Oliveira (PCP), Telmo Correia (CDS-PP), Pedro Delgado Alves (PS) e André Coelho Lima (PSD).

Foi lido o Projeto de Voto n.º 426/XIV/2.ª (apresentado pelo PS, pelo PSD, pelo BE, pelo CDS-PP, pela Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, pelo PCP, pelo PAN, pelo PEV, pelo IL e pela Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) — De pesar pelo falecimento do agente da PSP António José Pinto Doce. Após ter sido aprovada a respetiva parte deliberativa (b), a Câmara guardou 1 minuto de silêncio.

Foi aprovada a parte deliberativa (b) do Projeto de Voto n.º 425/XIV/2.ª (apresentado pela Comissão de Assuntos

Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e subscrito por uma Deputada do PS) — De saudação pelo Dia Internacional dos Direitos Humanos.

Foi aprovado o Projeto de Resolução n.º 652/XIV/2.ª (BE) — Pela disponibilização de testes COVID-19 gratuitos a professores, trabalhadores não docentes e alunos.

Foram rejeitados os Projeto de Resolução n.os 658/XIV/2.ª (BE) — Pela regulamentação da atividade de trabalhador da manutenção e montagem de aerogeradores com vista à redução do desgaste resultante do exercício da atividade, à garantia das condições de segurança e saúde no trabalho e à adequação do acesso à reforma e 718/XIV/2.ª (PCP) – Recomenda ao Governo que tome medidas para a definição e regulamentação de um regime laboral e de aposentação específico para os trabalhadores da manutenção e montagem de aerogeradores.

Foi aprovado o Projeto de Resolução n.º 770/XIV/2.ª (PS) — Recomenda a adoção de medidas para travar o aumento das desigualdades estruturais de género desencadeadas pelos impactos socioeconómicos da COVID-19;

Foram rejeitados os Projetos de Resolução n.os

809/XIV/2.ª (PSD) e 810/XIV/2.ª (PCP) — Cessação de vigência do Decreto-Lei n.º 92/2020, de 23 de outubro, que altera o regime geral da gestão de resíduos [Apreciações Parlamentares n.os 32/XIV/2.ª (PSD) e 34/XIV/2.ª (PCP)].

Foi rejeitado, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 478/XIV/1.ª (BE) — Repõe o regime de remuneração das centrais de produção de energia eólica (Revoga o Decreto-Lei n.º 35/2013, de 28 de fevereiro).

Foi aprovado, na generalidade, na especialidade e em votação final global, o Projeto de Lei n.º 594/XIV/2.ª (PS) — Alarga até 30 de junho de 2021 o prazo para a realização por meios de comunicação à distância das reuniões dos órgãos das autarquias locais e das entidades intermunicipais, procedendo à sétima alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que aprova medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19.

Foi rejeitado o Projeto de Resolução n.º 573/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que atue no sentido da correta classificação energética e promoção da diminuição da utilização de gases fluorados nos aparelhos de ar condicionado e a durabilidade dos mesmos e foi aprovado o Projeto de Resolução n.º 673/XIV/2.ª (BE) — Recolha e tratamento eficaz dos gases de refrigeração das unidades de ar condicionado, frigoríficos e outros equipamentos de frio.

Foram aprovados, na generalidade, os Projetos de Resolução n.os 620/XIV/1.ª (CH) — Recomenda ao Governo que estabeleça o dia 25 de setembro como o Dia Nacional da Sustentabilidade, 621/XIV/1.ª (Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira) — Institui o dia 25 de setembro como o Dia Nacional da Sustentabilidade e 670/XIV/2.ª (CDS-PP) — Instituição do Dia Nacional da Sustentabilidade a 25 de setembro.

Foi rejeitado o Projeto de Resolução n.º 765/XIV/2.ª (BE) — Pela prorrogação do prazo de validade da avaliação de Impacto Ambiental do Novo Aeroporto de Lisboa.

Foram rejeitados os Projetos de Resolução n.os 667/XIV/2.ª (BE) — Recomenda medidas de mitigação das emissões de navios de comércio e de cruzeiro cujas emissões agravam a crise climática, o ambiente e a saúde humana e 798/XIV/2.ª (PEV) — Mitigação e controlo das emissões poluentes provenientes do transporte marítimo.

Foi rejeitado o Projeto de Resolução n.º 674/XIV/2.ª (IL) — Pela abertura gradual ao público de estádios, pavilhões e demais recintos de todas as modalidades.

Foram aprovados, na generalidade, os Projetos de Resolução n.os 759/XIV/2.ª (PCP) — Retoma da prática desportiva e normalização gradual das competições e 783/XIV/2.ª (PEV) — Recomenda ao Governo medidas com vista à retoma da prática desportiva em contexto de pandemia.

Foi aprovado, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Ambiente, Energia e

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Ordenamento do Território, relativo aos Projetos de Resolução n.os 437/XIV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que condicione a emissão de licença de exploração das novas centrais de biomassa ao cumprimento de rigorosos padrões ambientais e de sustentabilidade, 511/XIV/1.ª (BE) — Utilização sustentável e ecológica da biomassa florestal residual e 531/XIV/1.ª (PEV) — Reformulação do modelo e apoios públicos a atribuir às centrais de biomassa florestal em função da sua sustentabilidade.

Foi aprovado, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Educação, Ciência, Juventude e Desporto, relativo aos Projetos de Resolução n.os 624/XIV/1.ª (PCP) — Requalificação da Escola Secundária de Serpa, 633/XIV/2.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que proceda à imediata requalificação da Escola Secundária de Serpa, 655/XIV/2.ª (BE) — Recomenda ao Governo a

realização urgente de obras na Escola Secundária de Serpa, 676/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que promova, com urgência, a requalificação da Escola Secundária de Serpa, 681/XIV/2.ª (PEV) — Requalificação urgente da Escola Secundária de Serpa e 703/XIV/2.ª (PS) — Recomenda ao Governo a requalificação da Escola Secundária de Serpa.

Deu-se conta dos Deputados que estiveram presentes, por videoconferência, na reunião plenária.

O Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 28 minutos.

(a) Durante esta intervenção foram projetadas imagens. (b) Estas votações tiveram lugar ao abrigo do n.º 10 do

artigo 75.º do Regimento.

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O Sr. Presidente: — Bom dia, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, Srs. Agentes da autoridade.

Vamos dar início à nossa reunião plenária.

Eram 10 horas e 4 minutos.

Do primeiro ponto da ordem do dia consta a discussão conjunta, na generalidade, da Proposta de Lei n.º

64/XIV/2.ª (GOV) — Altera o regime excecional para as situações de mora no pagamento da renda devida nos

termos de contratos de arrendamento urbano habitacional e não habitacional, no âmbito da pandemia COVID-

19 e dos Projetos de Lei n.os 575/XIV/2.ª (BE) — Regime excecional de renda não habitacional para lojistas e

retalhistas sob o Novo Regime do Arrendamento Urbano afetados na sua atividade por força da COVID-19,

576/XIV/2.ª (BE) — Normas interpretativas que clarificam a aplicação e retroatividade ao período de

confinamento da suspensão da aplicação de rendas fixas, 596/XIV/2.ª (BE) — Alarga o regime extraordinário de

proteção dos arrendatários (sétima alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março), 599/XIV/2.ª (PCP) —

Estabelece para 2021 o regime excecional aplicável a formas específicas de contratos de exploração de imóveis

para comércio e serviços em centros comerciais, 600/XIV/2.ª (PCP) — Regime excecional de pagamento das

rendas, 601/XIV/2.ª (PCP) — Regime extraordinário de proteção dos arrendatários, 602/XIV/2.ª (PAN) —

Clarifica o regime excecional aplicável aos contratos de exploração de imóveis para comércio e serviços em

centros comerciais, procedendo para o efeito à aprovação de uma norma interpretativa relativamente à Lei n.º

2/2020, de 31 de março e 603/XIV/2.ª (BE) — Extensão dos contratos de arrendamento para fins comerciais no

período de retoma da economia, no caso de perdas de faturação consideráveis (terceira alteração à Lei n.º 4-

C/2020, de 6 de abril).

Para abrir o debate, em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços

e Defesa do Consumidor, João Torres.

O Sr. Secretáriode Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor (João Torres): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo tem hoje a oportunidade de apresentar à Assembleia da

República uma proposta de lei que, fundamentalmente, aporta duas dimensões.

Em primeiro lugar, refere-se aos estabelecimentos comerciais e a todos os contratos de arrendamento não

habitacional na perspetiva de prolongar uma proteção que já está, neste momento, em vigor e que vigorou,

naturalmente, desde um período muito inicial da pandemia, com o objetivo fundamental de suspender a

produção de alguns efeitos associados aos contratos, designadamente no que diz respeito à sua cessação.

Significa isto que, caso a proposta mereça a aprovação da Assembleia da República, se um contrato de

arrendamento terminar em janeiro ou fevereiro de 2021, pode o inquilino — neste caso, o empresário —

prosseguir a sua atividade, desde que pague a respetiva renda, até 30 de junho do próximo ano.

Esta proposta tem ainda uma segunda dimensão que me parece ser muito importante e que se prende com

os estabelecimentos que estão encerrados desde o mês de março, os quais, estando encerrados desde essa

altura, presumivelmente, continuarão encerrados durante um período de tempo ainda possivelmente significativo

do ano de 2021. Para esses, há, do meu ponto de vista, a necessidade de revisitar as soluções que foram

encontradas no que diz respeito às moratórias que foram criadas durante o ano de 2020.

Simultaneamente, sugerimos à Assembleia da República que seja prorrogado o contrato de arrendamento

pelo período equivalente ao do encerramento e nunca por menos do que seis meses após a reabertura destes

mesmos estabelecimentos, que são, fundamentalmente, bares, discotecas e parques infantis.

Por último, Sr.as e Srs. Deputados, com a vossa permissão, queria ainda transmitir-vos que esta proposta de

lei vai em linha e tem de ser perspetivada no âmbito de outras medidas de apoio que o Governo já teve

oportunidade de anunciar publicamente. Portanto, o Programa APOIAR, o incentivo a fundo perdido para o

pagamento de rendas, no valor de 300 milhões de euros, e mesmo outras medidas que foram tomadas durante

o ano de 2020 e que se encontram ainda em vigor devem ser perspetivados em conjunto com esta proposta de

lei, que, do nosso ponto de vista, reforça e prolonga um escudo económico que nos parece ser muito relevante

para um vasto conjunto de atividades económicas, não apenas durante o ano de 2020, mas, com a eventual

aprovação da Assembleia da República, prorrogando-se para o ano de 2021.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para apresentar os projetos de lei do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda e participar no debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Manuel Rola.

A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A crise habitacional que já se fazia sentir foi agravada por esta pandemia.

Mas, se pedimos às pessoas que levem uma vida mais caseira e que tenham uma série de cuidados no

contacto com o exterior, só com a garantia de uma habitação digna é que terão condições para o fazer.

Imaginamos sequer o que é viver numa casa com infiltrações ou sem água ou luz? Ou a pagar valores tão

altos, que tememos a cada dia não ter onde dormir? Esta é a realidade vivida, e não imaginada, de um largo

conjunto de pessoas no nosso País. E esta é também uma falha nossa.

A habitação e as nossas cidades nunca deveriam ter ficado entregues ao mercado. O direito a viver

condignamente não se entrega aos mercados. Foi por isto que, em setembro, por proposta do Bloco de

Esquerda, aprovámos o prolongamento de vários prazos que regulam os contratos de arrendamento até 31 de

dezembro de 2020.

Esta não teria sido a nossa opção inicial. Mas, de facto, o Partido Socialista não esteve disponível, na altura,

para o que agora se constata ser evidente e uma urgência: à incerteza da pandemia temos de responder com a

certeza da proteção social.

Saudamos o Governo por ainda o ter constatado a tempo. Se Portugal é o país da Europa onde se fez sentir

maior perda de salário nos setores mais frágeis, também tem sido o país com menor mobilização de apoios.

Sentimos cada vez mais intensamente os efeitos de uma crise económica e só agora o Governo constata que a

pandemia não é facilmente controlável.

O Sr. Ministro Siza Vieira disse, neste Parlamento, na nossa última sessão plenária, que as decisões que

tomamos podem ter um impacto adverso que não calculamos, mas não decidir e não interferir tem também

impactos que o Governo não calculou. O Governo decidiu, assim, não apoiar as rendas comerciais das inúmeras

lojas no nosso País altamente dependentes do turismo. Controlou, e bem, os seus horários, mas não criou

nenhuma regra que reduzisse a especulação imobiliária e permitisse baixar o valor das rendas nesse mesmo

período.

É que, ao mesmo tempo que o País parava, que as pessoas ficavam sem trabalho, que os turistas não

vinham ou que as pessoas não gastavam, a especulação imobiliária continuou a faturar. No comércio ou na

habitação, os vistos gold estão como antes e os fundos imobiliários quiseram manter as suas rendas, a sua

voracidade. As empresas e os trabalhadores que criam riqueza em Portugal foram deixados às mãos dessas

entidades.

E perguntamos: é esta a economia frágil e desigual que queremos? O que aprendemos com a vulnerabilidade

agora evidente? Pois não podem os rentistas continuar a ganhar como se nada fosse, num país a braços com

uma brutal contração económica.

É isto que propomos: seja no comércio de rua ou no dos centros comerciais, se não há fruição do local

arrendado, é evidente que não se pode manter o nível de ganho com as rendas. Para além disto, não podemos

deixar o comércio nas mãos de entidades especulativas com poder de chantagem. Estender o período dos

contratos na mesma medida do tempo da redução da atividade económica não é apenas justo, Sr.as e Srs.

Deputados, é essencial para que estas empresas possam retomar a sua atividade sem a guilhotina do despejo

sobre os seus pescoços no período da retoma.

Salvar as empresas e os comerciantes do despejo, dar-lhes tempo e espaço para terem o mínimo de

capacidade negocial é também salvar a economia. Por fim, e porque o conflito e a ameaça têm sido uma

constante nestes processos de arrendamento, vemo-nos hoje chamados também a clarificar uma norma que

esta Assembleia aprovou, tornando claro que esta se aplica desde o início do primeiro estado de emergência.

Sr.as e Srs. Deputados, nada do que aqui discutimos hoje é novidade para nós. A necessidade de intervenção

do Estado está mais do que nunca evidente, da direita à esquerda. Ora, o que não se compreenderia era que

desperdiçássemos este momento, agora que está nas nossas mãos garantir justiça e proteção a quem vive e

trabalha em Portugal.

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O Bloco de Esquerda apresenta, assim, estas propostas, que são o contrário de cruzar os braços. A nossa

responsabilidade é agir agora. Não intervir seria não proteger e, para essa irresponsabilidade, claro que não

podem contar com o Bloco de Esquerda.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Também para apresentar os respetivos projetos de lei e participar no debate, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: As medidas de emergência na resposta à crise pandémica e às suas consequências no domínio da habitação e do

arrendamento, em particular, não são uma emergência apenas agora, são uma emergência desde março.

Aliás, isto é verdade para as situações dramáticas que se colocaram na habitação, mas também para as

situações dramáticas de milhares e milhares de micro, pequenas e médias empresas do comércio, dos serviços,

da restauração, que, durante meses, foram confrontadas com situações da maior gravidade do ponto de vista

da atividade económica e que tiveram, na mesma situação, a obrigatoriedade de cumprir os seus compromissos

do ponto de vista do arrendamento e dos seus pagamentos.

Desde o início desta crise, chamámos a atenção e alertámos para a necessidade urgente de uma resposta

rápida e efetiva que salvaguardasse a situação destas famílias, destas empresas, destes trabalhadores, uma

resposta que não ficasse reduzida à possibilidade de adiar pagamentos, acumular dívida, deixar os problemas

avolumar-se para depois. Era preciso apoiar diretamente o pagamento de rendas, fazê-las reduzir na justa

proporção dos rendimentos perdidos nesta situação excecionalmente grave.

Naturalmente, a compensação dos senhorios foi sempre uma questão presente nas propostas do PCP desde

o início, uma compensação justa e adequada que não subsidiasse rendas especulativas, mas que não deixasse

os senhorios sem qualquer compensação. Esta questão sempre fez parte das propostas do PCP e sempre foi

ignorada por aqueles que as chumbaram ao longo dos meses.

Em abril, alertámos o Governo, dizendo que, certamente, o pior não estava ultrapassado. Era preciso agir e

rapidamente. À medida que o tempo foi passando, os problemas tornaram-se mais graves. Aquilo que hoje está

a acontecer é a demonstração de que estas respostas vêm tarde e podiam ter sido tomadas oportunamente, na

altura certa.

Neste momento, a proposta do Governo é circunscrita, no essencial, às rendas não habitacionais e ao apoio

a esse pagamento, colocando em cima da mesa a questão da prorrogação do prazo até ao fim do primeiro

semestre de 2021 no que diz respeito às medidas de proteção dos arrendatários nas circunstâncias que estão

atualmente em vigor, as quais apoiámos e que estão em vigor porque o PCP também tomou medidas e

apresentou propostas nesse sentido.

A questão de fundo que colocamos é não apenas a de clarificar a situação do que está em vigor em relação

aos centros comerciais, clarificar a situação no que diz respeito às dívidas vencidas e não pagas desde o início

da crise pandémica e do estado de emergência, eventualmente a serem pagas em 2021, mas também a da

necessidade de haver uma resposta concreta, que não signifique apenas o acumular de dívida, tanto para as

rendas não habitacionais como para as da habitação.

Finalmente, deixamos um sublinhado muito importante também relativamente a esta medida cautelar de

proteção e salvaguarda das famílias, das pequenas empresas, dos arrendatários que estão, neste momento,

perante a iminência de poderem ter de sair por o contrato terminar, na sequência de o senhorio ter decidido

revogá-lo ou não lhe dar continuidade. Essa situação, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo, não deveria

ficar salvaguardada até ao fim do primeiro semestre, mas deveria ser assegurada durante o ano de 2021. É

essa a proposta do PCP e deve ser esse o sentido resultante do debate e da decisão da Assembleia da

República.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do Grupo Parlamentar do PAN, também para apresentar o projeto de lei respetivo e participar no debate.

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A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A crise sanitária e os seus impactos sociais e económicos colocaram ainda mais na agenda do debate político a

necessidade já premente das políticas para o arrendamento e de proteção dos inquilinos habitacionais e não

habitacionais.

Várias foram as vezes em que o PAN alertou para a necessidade de os prazos de vigência não serem

demasiado fechados para se assegurar alguma previsibilidade e estabilidade. Esse não foi o caminho escolhido

pelo Governo e, por isso, hoje voltamos a discutir o prolongamento das medidas excecionais no contexto do

arrendamento.

Nesta matéria, o PAN sempre tem afirmado que a chave está no equilíbrio dos interesses das duas partes

da relação contratual, protegendo, obviamente, o lado mais frágil, esteja ele de que lado estiver. Não se deveria

optar por um caminho de excesso, que onerasse em demasia uma das partes, ou que pecasse por defeito

relativamente à outra parte. Foi essa a visão que sempre colocámos nas propostas que até agora apresentámos.

A proposta de lei que o Governo nos traz cumpre de uma maneira geral essas premissas, ao prolongar até

ao final da primeira metade do próximo ano o período de suspensão dos efeitos da cessação dos contratos de

arrendamento, com a condição de os inquilinos terem a renda em dia.

Parece-nos, também, positivo o regime para os estabelecimentos que tenham sido encerrados em março e

que, a 1 de janeiro, ainda permaneçam encerrados, bem como a previsão da atribuição de apoios aos senhorios

não habitacionais.

Nunca é demais lembrar, Sr.as e Srs. Deputados, que foi o PAN o primeiro partido a propor a criação de

apoios aos senhorios não habitacionais, em abril, no âmbito da Proposta de Lei n.º 21/XIV/1.ª (GOV) e do Projeto

de Lei n.º 368/XIV/1.ª (PS). Passados todos estes meses, finalmente há a adesão do Governo a esta solução

mais do que justa, que já defendemos desde abril. Mais vale agora do que nunca.

Mas não pudemos deixar de nos apresentar a este debate sem uma proposta referente ao arrendamento

não habitacional, que surge com um objetivo muito simples e muito claro e que cumpre a vontade da Assembleia

da República expressa em sede de Orçamento Suplementar. Fazemo-lo, simplesmente, porque, no Orçamento

Suplementar, se deixou previsto que as rendas devidas nos contratos de exploração comercial em conjuntos

comerciais são calculadas em função do volume de negócios gerado e assegurado o dever de os lojistas

pagarem as despesas comuns desde o início da crise sanitária.

Contudo, na prática, o que se verificou foi que alguns senhorios não habitacionais fizeram uma interpretação

abusiva desta lei, que afirmava que a medida de proteção aprovada apenas se aplicava a partir da data da

entrada em vigor da Lei n.º 27-A/2020, defraudando por completo as intenções do legislador e pondo em causa

os direitos e as garantias dos inquilinos não habitacionais.

Estes abusos tiveram efeitos muito concretos na vida dos inquilinos, agravando as suas dificuldades, uma

vez que estes senhorios, que assim o interpretaram, não só exigiram o pagamento de todas as rendas de março

a julho, como ainda exigiram a renúncia à aplicação da lei, sob pena de verem revogadas todas e quaisquer

reduções ocorridas entre março e julho.

Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, para travar estes abusos, para apoiar os inquilinos não habitacionais e para

garantir que a vontade desta Assembleia da República é plenamente cumprida, o PAN traz esta proposta.

Esta clarificação é fundamental para muitos dos comerciantes e lojistas, pelo que esperamos o devido

acompanhamento dos outros partidos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do PSD, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Márcia Passos.

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A ânsia de protagonismo dos partidos de esquerda que os leva a mexer no arrendamento a qualquer custo, seja em tempo de pandemia, seja sem

estarmos em tempo de pandemia, é tal que está instalada a verdadeira confusão. Os oito projetos de lei que

foram apresentados nos últimos dias, maioritariamente do Bloco de Esquerda e do PCP, refletem isso mesmo.

Os Srs. Deputados têm tanta pressa que, um dia, apresentam uma proposta; no dia seguinte, têm mais uma

ideia e apresentam outra; no dia seguinte, veem que o vizinho do lado apresentou um projeto de lei e vêm

apresentar um também. E é isto. Até se perdem no que escrevem! Propõem soluções que já existem e outras

que esquecem medidas aprovadas recentemente em sede de Orçamento do Estado.

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Srs. Deputados, sabemos que, no Orçamento do Estado, foram apresentadas centenas de propostas.

Tivemos milhares de páginas de guiões de votação para aprovar. Mas, Srs. Deputados, deviam estar mais

atentos, saber o que foi votado, o que foi aprovado, e parar, parar para pensar e deixar de criar tanta confusão

aos portugueses.

Por acaso faz sentido, Srs. Deputados, que se prolongue por mais meses um contrato de arrendamento de

um arrendatário que faleceu, estando a casa completamente desocupada? Faz sentido que se prolongue a

entrega deste imóvel? Mas quem é que percebe esta solução? Só se for o de cujus, lá em cima, no céu, porque

aqui, na terra, Srs. Deputados, ninguém compreende esta solução.

O mesmo podemos dizer dos inquilinos para quem os senhorios já acautelaram o realojamento. Os Srs.

Deputados conhecem o regime jurídico das obras em prédios arrendados, o RJOPA? Sabem que as denúncias

dos contratos nesse regime jurídico dependem de uma de duas condições: ou a indemnização ou o

realojamento? E sabem que há muitos senhorios que já acautelaram o realojamento e estes arrendatários não

entregam os bens, quando já podiam estar em casas muito melhores?

Estamos a prolongar isto no tempo porquê, para quê e para quem?! É confundir as pessoas, é confundir os

arrendatários, é confundir os senhorios.

Mas, Srs. Deputados, neste aspeto, não são só o Bloco de Esquerda e o PCP maioritariamente que

confundem. Neste aspeto, também o Governo, Srs. Secretários de Estado, tem sido rei, não só a confundir,

como também a iludir e a faltar à verdade. O Governo andou, desde março até agora, sem efetivamente apoiar

de forma concreta e clara os arrendatários comerciais.

O PSD alertou por várias vezes. Tentámos introduzir mecanismos de apoio e um deles até foi conseguido

em sede de especialidade: uma linha de crédito a custos reduzidos para os senhorios, cujos arrendatários

deixassem de pagar as rendas. Foi uma solução equilibrada conseguida por proposta do PSD, em sede de

especialidade.

Srs. Deputados, o que é que aconteceu a esta linha de crédito? Não aconteceu nada, porque não existe!

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Pois claro!

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — O Governo tinha de legislar. Está na lei, mas não cumpre, não legisla. Porquê?! É só um anúncio.

Isto não é sério, Srs. Secretários de Estado. Repito, isto não é sério!

Aplausos do PSD.

Não é sério vermos finalmente anunciadas medidas de apoio às rendas, medidas a fundo perdido — que,

naturalmente, são de aplaudir —, e verificarmos que as mesmas não foram incluídas na proposta de lei que o

Governo apresenta a esta Assembleia.

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Se é para ser anunciado e não é para ser concretizado, como a portaria que devia ter saído em agosto, então, não vale a pena. Andamos a brincar com as pessoas!

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — Estamos a brincar com os portugueses e isso não vamos admitir. Se é para cumprir, Srs. Secretários de Estado, que se coloque já na lei. Não depende de nada. A medida

está anunciada, os critérios estão definidos, são claros. Porque é que não está na proposta de lei?

Se é sério, Srs. Deputados, escreve-se. Quem quer cumprir, assina. Quem quer cumprir, escreve. Obriga-se

de forma expressa e clara.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!

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A Sr.ª Márcia Passos (PSD): — O Governo não está a fazer isso. Não é só vir para a televisão fazer uns floreados. É preciso escrever aquilo que se quer cumprir e é isso que

se propõe.

O PSD está como sempre esteve neste processo, com responsabilidade, com medidas e disponível para,

apesar desta confusão que está instalada, continuarmos a apresentar soluções que sejam equilibradas, que

sirvam as pessoas e que não deixem ninguém para trás.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos um conjunto de propostas em torno do arrendamento, seja habitacional, seja não habitacional.

Sobre o arrendamento habitacional, importa recordar que a nossa Constituição inclui o direito à habitação no

elenco dos direitos fundamentais. Este elemento não pode ficar esquecido neste debate, sobretudo quando, nos

termos do texto da lei fundamental do País, resulta de forma expressa que, para assegurar o direito à habitação,

incumbe ao Estado «adotar uma política tendente a estabelecer um sistema de renda compatível com o

rendimento familiar».

Se essa é uma responsabilidade do Estado em circunstâncias normais, mais relevância assume em períodos

como aquele que vivemos hoje.

De facto, a pandemia está a provocar efeitos a todos os níveis e em todas as dimensões das nossas vidas.

Sem surpresas, veio provocar um conjunto de problemas a milhares e milhares de famílias, também em termos

de habitação.

A verdade é que um universo muito alargado de pessoas ficou sem trabalho e outras tantas viram os seus

rendimentos substancialmente reduzidos, sobretudo aquelas pessoas que, contra a sua vontade, mas por

exigências do interesse público, ficaram em layoff e, portanto, com perdas acentuadas dos seus rendimentos.

Nesta circunstância, milhares e milhares de famílias ficaram objetivamente sem possibilidade de dar resposta

aos compromissos que assumiram, também a nível da habitação, porque o magro orçamento familiar não lhes

permite fazer face ao conjunto de despesas para manter o essencial.

O mesmo está a acontecer à generalidade dos micro e pequenos empresários que, com o nível de

encomendas ou de vendas a cair de dia para dia, não conseguem pagar a renda do respetivo estabelecimento

ou das instalações onde produzem o seu trabalho. Isto já para não falar das paragens forçadas da sua atividade,

ou até da redução de horários, a que foram sujeitos ou que estão a ser obrigados a fazer por determinação das

autoridades, tendo em vista o combate à pandemia.

Seja a nível do arrendamento habitacional, seja a nível do arrendamento não habitacional, estes problemas

exigem respostas justas e sustentáveis.

Se pretendemos respostas sustentáveis, teremos de procurá-las, não com recurso a soluções que

hipotequem o futuro dessas famílias e desses pequenos empresários, porque isso representaria um acumular

de dívidas, muitas delas objetivamente impagáveis no futuro, mas, sim, com soluções que passem pela redução

proporcional do valor da renda face à respetiva perda de rendimentos, sendo o senhorio eventualmente

compensado no valor em causa pelo Estado, com regras muito claras para evitar que o Estado pague ou ajude

a pagar rendas especulativas.

Para terminar, refiro que o Regime Extraordinário de Proteção dos Arrendatários, que foi estabelecido no

âmbito da pandemia, que está em vigor até ao final deste mês e que o Governo propõe estender apenas aos

primeiros seis meses do próximo ano, deverá, a nosso ver, por todos os motivos que se conhecem, continuar

em vigor durante todo o ano de 2021.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — É a vez do Grupo Parlamentar do CDS-PP. Tem a palavra o Sr. Deputado João Gonçalves Pereira, para uma intervenção.

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O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Temos em apreciação uma proposta do Governo que pretende dar continuidade às respostas à

crise pandémica e aos seus efeitos no arrendamento habitacional e não habitacional.

O que o Governo vem propor, em grande medida, é, no fundo, alargar o período de suspensão dos efeitos

da cessação dos contratos de arrendamento, dando, assim, continuidade à política de resposta aos últimos 10

meses de pandemia.

Mas o Governo vem tarde e a más horas. Só agora, em dezembro, é que apareceram os apoios a fundo

perdido, precisamente para o pagamento de rendas.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — A gente propôs e vocês chumbaram!

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Tirando isso, o que é que o Governo anuncia? Mais linhas de crédito, mais endividamento, seja para as famílias, seja para as empresas.

No entanto, há um número elucidativo, que é o dos empréstimos que foram concedidos no apoio ao

arrendamento: 713 empréstimos.

As perguntas que devemos fazer são estas: mas há um problema, ou não há um problema, em matéria de

habitação?! Há um problema, ou não há um problema, a nível do arrendamento e da capacidade que as famílias

têm, ou não têm, de honrar os seus compromissos, designadamente com os seus senhorios?! Como é evidente,

há!

Isto indica, Srs. Membros do Governo, que os tais 713 empréstimos não significam o sucesso de uma política,

mas significam que algo, na resposta, não pode estar, seguramente, a funcionar.

Tenhamos consciência do seguinte: o mundo parou com esta pandemia. Muitos portugueses viram-se

forçados a parar. Mas é certo que os seus compromissos e as suas obrigações não pararam. Esses foram-se

acumulando, mês após mês, e, certamente, no próximo ano, no ano de 2021, virá a fatura, seja para as famílias,

seja para as empresas.

Sr.as e Srs. Deputados, passaram 10 meses. Nestes 10 meses, muito foi exigido aos senhorios e é tempo de

o Estado dar as respostas concretas. Os senhorios já tiveram o seu papel, já deram o seu contributo. É o

momento de o Estado pagar e suportar a fatura social.

Há que não esquecer o seguinte: há muitas famílias que dependem do rendimento que vem do seu

património, das suas rendas. Não são os tais especuladores de que a esquerda muitas vezes fala. Estamos a

falar, muitas vezes, de famílias ou de agregados familiares que têm um ou dois…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Prédios!

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Não são prédios, Sr. Deputado, são andares! É daí que vem o seu rendimento e é este que lhes permite pagar as contas no final do mês.

Portanto, há aqui um esforço por parte dos senhorios, atingindo-se um limite. Já percebi que o Sr. Deputado

concorda e ainda bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não leu o projeto!

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Com as máscaras, às vezes, não dá para perceber, mas ainda bem que há uma evolução no PCP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não há nada! Vocês não leem os projetos?

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Há, há!

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o seu tempo.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, só para terminar, queria dizer o seguinte: o Estado exige aos outros o que não pratica para si.

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O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente. Vou dar um exemplo relacionado com a regularização de dívidas ou pagamento de rendas vencidas, entre

2020 e 2021. Neste caso, o Estado prevê que, até ao final de 2023, possa regularizar-se essa dívida em

prestações. Mas, quando é no seu caso, já não permite esse prazo tão alargado.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Estou a terminar, Sr. Presidente. Portanto, no seu caso, o Estado não o faz, mas o que diz aos senhorios? Diz: «Endividem-se!». Essa não é,

seguramente, uma boa saída.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Carvalho, do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Hugo Carvalho (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Debatemos hoje, neste Plenário, um tema importante para milhares de cidadãos, para milhares de empresas, porque

estamos a debater mais uma ferramenta para fazer face a esta situação difícil.

Nos últimos tempos, temos tido boas notícias sobre este aspeto. A existência de uma vacina que chegará

mais cedo e de forma mais generalizada do que imaginaríamos no passado é, claramente, uma luz ao fundo do

túnel que não pode ser esquecida quando fazemos este tipo de debates. Mas, antes de iniciar este debate,

também é importante puxar atrás a fita do tempo e perceber, no que diz respeito a políticas de habitação, quem

representou quem no passado, porque isso também nos ajuda a fazer o debate que, agora, realizamos.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Também é bom lembrar!

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Muito bem!

O Sr. Hugo Carvalho (PS): — Pouco tempo antes da pandemia, quando aqui discutíamos uma maior regulamentação por via fiscal do alojamento local, em particular nas zonas onde esta atividade mais crescia e

mais provocava carências habitacionais, sabemos bem quem esteve ao lado dos empreendedores e quem

esteve aqui para proteger quem precisava de habitação.

Nós, o Partido Socialista, sabemos o que fizemos. Respeitámos a iniciativa privada, mas com a imposição

de regras que trouxeram maior equilíbrio a uma relação que estava desequilibrada. Defendemos todos, mas,

em primeiro lugar, defendemos quem mais precisava. Esse foi o nosso posicionamento, mas sabemos que esse

não foi o posicionamento do PSD, do CDS, do Iniciativa Liberal ou do Chega.

Também sabemos que, numa altura difícil de crise económica, houve partidos, em coligação no Governo,

que aplicaram o maior ataque à estabilidade das rendas e à promoção de despejos. Esses também estão aqui

sentados à nossa direita, no Plenário.

Vozes do PS: — Muito bem! Lei das rendas!

O Sr. Hugo Carvalho (PS): — Mas, Sr.ª Deputada Márcia Passos, também acho caricato dizer que a esquerda confunde as políticas de habitação. Devo dizer-lhe o seguinte: o PSD não confunde, o PSD faz mesmo

aquilo em que acredita e desrespeita, sempre, a parte mais fraca nos contratos de arrendamento.

Aplausos do PS.

Sr.as e Srs. Deputados, se é importante falarmos do passado, é muito importante debatermos o futuro e estas

propostas. Pelo combate à pandemia e pela defesa da vida dos portugueses, vimos, nos últimos meses, algumas

empresas a serem forçadas a encerrar temporariamente e a abrir no mês seguinte, outras a retomar a sua

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atividade de forma condicionada, outras a reabrir apenas em junho e outras que, infelizmente, nas circunstâncias

atuais, ainda não conseguiram abrir em plenitude.

Consideramos, por este motivo, que o documento trazido a debate pelo Governo é uma proposta feliz, por

ser correta no diagnóstico e acertada na ação.

Em primeiro lugar, porque responde a diferentes exigências, próprias das dinâmicas distintas de diversos

setores de atividade, protegendo aqueles que ainda não podem reabrir a sua atividade, não os onerando com o

pagamento de rendas vencidas desde março de 2020, que, apenas faseadamente, retomarão em janeiro de

2022.

Em segundo lugar, este diploma protege a não cessação de contrato até junho de 2021, isto é, temos a

garantia de que ninguém, neste período, fica sem a possibilidade de lutar pelo seu negócio e de continuar a

prosseguir a sua atividade.

Em terceiro lugar, e porventura o aspeto mais relevante, este diploma tem de ser lido em conjunto com outros

programas e com outras medidas do Governo, em particular o Programa APOIAR, no qual existem linhas

específicas de apoio ao pagamento de rendas vencidas no valor de 400 milhões de euros — sendo 300 milhões,

destes 400, a fundo perdido —, pelo próprio Estado.

Aqui, também está visível uma opção política. Nós não apostamos em exigências de perdão de rendas que

sejam apetecíveis para quem paga, mas, porventura, também injustas para quem recebe. Nós não demarcamos

o Estado do envolvimento direto neste processo e, por isso, promovemos mecanismos de esforço tripartido entre

os senhorios, os arrendatários e o próprio Estado português.

Sr.as e Srs. Deputados, se é verdade que nós representamos todos os portugueses, também é verdade que

também temos obrigação de defender, em primeiro lugar, quem mais precisa de nós.

A Sr.ª Ana Catarina Mendonça Mendes (PS): — Muito bem!

O Sr. Hugo Carvalho (PS): — Com estas medidas, estamos a dar justiça a quem quer continuar com os seus negócios, estamos a dar tempo e estabilidade para que estas pessoas possam superar este momento

difícil, com apoio do Estado, maioritariamente a fundo perdido, e com respeito pelas relações contratuais que

foram estabelecidas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: As propostas que nos trazem, hoje, em matéria de rendas, vão do absurdo ao inqualificável, em alguns casos.

Temos propostas que querem prolongar no tempo contratos que já nem as partes querem prolongar e isso é

um tipo de aberração para a qual, um dia, olharemos para ver ao ponto em que vão.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não é verdade! É falso!

O Sr. André Ventura (CH): — Mas mesmo o projeto do PAN, que protege e acautela interesses em jogo, não trata devidamente do problema da retroatividade que vai colocar-se no Tribunal Constitucional, com toda a

certeza. Assim como não clarifica o que quer clarificar, pois diz que vai clarificar o âmbito de extensão, mas,

depois, diz: «outlets, retail parks, entre outros». Como é que clarificamos, dizendo «entre outros»? Vamos ter

exatamente o mesmo problema com esta expressão na relação da regulação comercial.

Mas é no Governo que devemos centrar as nossas preocupações, porque, há uma semana, o Sr. Secretário

de Estado disse, nesta Casa, que iríamos ter as tais linhas a fundo perdido e que estas estariam, em breve,

consagradas, mas, nesta proposta de lei, não estão consagradas nenhumas linhas a fundo perdido. O que está

e o que há, na sua proposta, é mais endividamento e mais crédito, o que irá levar as famílias, novamente, a

endividarem-se, numa estratégia que todos conhecemos em matéria fiscal.

O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr. Deputado.

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O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente. Vão buscar empréstimos, para pagar impostos, dizendo: «Endividem-se mais e, depois, não consigam

pagar» — são estas as soluções que apresentam aos portugueses.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, pelo grupo Parlamentar do PCP, o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, o PSD confunde-se com aquilo que é simples.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Então?

O Sr. Bruno Dias (PCP): — O PSD confunde-se com a apresentação de propostas que visam traduzir e visar as soluções para os problemas das pessoas, nas quais cada partido contribui com a sua proposta,

trabalhando de forma construtiva, aberta e empenhada para alcançar a melhor solução comum, no texto final da

lei. Para nós, isto é uma expressão da democracia, para o PSD, é uma confusão.

Vozes do PSD: — Oh!…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Salta à vista, de forma particularmente evidente e chocante, o desprezo com que a direita observa a situação dos inquilinos, das populações, das famílias que enfrentam dificuldades, o que

é, aliás, tributário e herdeiro da atitude que levou à aprovação da famosa «lei dos despejos» no Governo do

PSD/CDS-PP. É a continuação da mesma política!

Vozes do PCP: — Muito bem!

Protestos do CDS-PP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Aliás, há quem veja quem já estava, nessa altura, no Partido Social Democrata e agora está fora; há quem veja até, como partes que estavam de acordo, aqueles que, afinal, são apenas uma

das partes. Só têm olhos para um lado e não têm olhos para o outro!

Risos do Deputado do PEV José Luís Ferreira.

Sr. Deputado João Gonçalves Pereira, mais vale ler os projetos antes de os discutir. O PCP, desde o

princípio, antes do verão, no início desta crise pandémica, vinha propondo que este aspeto fosse legislado no

sentido de diminuir o peso do pagamento das rendas, isto é, que diminuíssem as rendas compensando,

justamente, os senhorios.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente. Esta era a proposta do PCP e continua a ser. Sr. Deputado, quando votar no projeto de lei do PCP vai estar

a votar nessa proposta que disse que nós não tínhamos.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Nós? Não!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É mesmo preciso ler as propostas!

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Na Coreia do Norte é que a habitação é boa!

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Maria Manuel Rola, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE) — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Márcia Passos, terá lido com tanta atenção os nossos projetos como leu o Programa de Recuperação Económica do próprio PSD.

Esse programa do PSD levantava a necessidade de suspensão dos prazos dos contratos durante um ano.

Não sei se o terá lido, mas a verdade é que, se votasse em consonância com o que propõe, de facto, teria

votado nesta proposta favoravelmente, já em setembro, e votaria novamente, agora, favoravelmente.

Sr. Deputado Hugo Carvalho, a justiça e o equilíbrio são, de facto, necessários, mas eu gostava de perguntar-

lhe que justiça e equilíbrio conseguem garantir-se com o cutelo dos fundos imobiliários…

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem de concluir.

A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE) — … que se encontram sediados nas Ilhas Caimão que, neste momento, está sobre os lojistas dos centros comerciais.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Por lapso, deixámos para trás a intervenção do Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo. Assim, Sr. Deputado, tem direito a intervir agora.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, muito obrigado por não me deixar para trás. Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje, temos novamente, em várias

propostas, a questão da retroatividade da lei do variável em arrendamentos não habitacionais, apesar do seu

recente chumbo no Orçamento.

Daqui, só podemos concluir que esta insistência é uma reafirmação do ódio que a extrema-esquerda tem por

tudo o que é privado. Aliás, convém recordar que os privados merecem proteção constitucional. Esta

retroatividade proposta pela extrema-esquerda não só iria agravar uma medida já de si desproporcional, mas é

claramente inconstitucional. Não somos só nós que o dizemos.

Há três semanas, a Provedora da Justiça pediu ao Tribunal Constitucional que declarasse a

inconstitucionalidade da norma subjacente a esta proposta, por violação do direito à propriedade privada e da

liberdade de iniciativa económica privada. Segundo a Provedora, a norma não cumpre as exigências decorrentes

dos princípios da proporcionalidade e da igualdade, até porque se verificam discriminações, em termos legais,

entre lojistas de rua, de centros comerciais e mesmo entre diferentes tipos de lojistas de centros comerciais.

É, por isso, muito irónico que haja partidos que andam sempre com a Constituição na boca, mas que, pelos

vistos, se ficam só pelo preâmbulo, naquela parte do «rumo ao socialismo». Quando chega a realidade tapam

os olhos e repetem propostas inconstitucionais, chumbadas, vez após vez.

Concluindo, enquanto Deputados, devemos manter o equilíbrio que respeita todas as partes e devemos,

também, garantir a estabilidade contratual e legal.

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Por isso, obviamente, votaremos contra as propostas que contrariem este sentido.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, queria apenas fazer uma interpelação à Mesa.

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Queria que ficasse esclarecido que os lapsos acontecem de uma forma perfeitamente natural e que ninguém

deve ser incriminado por causa disso. Na condução dos trabalhos, pode haver um pequeno lapso, mas queria

só dizer que teria todo o gosto em responder à intervenção do Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a responsabilidade é da Mesa.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sim, Sr. Presidente. Estas questões não deviam ficar sem resposta, mas, porque os lapsos acontecem, cá estaremos para o fazer em outra altura.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado. Na altura expliquei que tinha havido um lapso, quando dei a palavra.

Tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Habitação, Marina Gonçalves.

A Sr.ª Secretária de Estado da Habitação (Marina Gonçalves): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei que trazemos, hoje, ao Parlamento, em matéria de arrendamento habitacional, assenta numa

prorrogação e num reforço aos instrumentos de apoio ao direito à habitação.

O direito à habitação é um direito constitucionalmente consagrado e, portanto, neste equilíbrio de direitos

constitucionais que estamos a salvaguardar, diria que este tem uma prioridade extrema, sobretudo num

momento de pandemia como o que vivemos.

A medida que trazemos, de suspensão de alguns dos efeitos dos contratos de arrendamento, tem, sobretudo,

em conta o estado e a evolução da pandemia nos últimos meses. Por isso, desde abril, não assumimos uma

prorrogação por períodos muito longos, precisamente para se poder fazer essa avaliação seja no Governo, seja

no Parlamento. É isso que temos feito e, em última instância, o que importa é que, efetivamente, temos

acautelado a importância do direito à habitação em função do estado em que estamos na pandemia.

Queria dar uma nota, relativamente à questão das rendas e do apoio que é dado por via do IHRU (Instituto

da Habitação e Reabilitação Urbana). Esta proposta não está incluída na proposta de lei, porque decorre de

uma norma aprovada aqui no âmbito do Orçamento e vai ser transposta para decreto-lei nas próximas semanas,

e visa prorrogar o apoio e atribuir, a fundo perdido, parte deste empréstimo para as famílias com mais carências

habitacionais e, sobretudo, com taxas de esforço mais elevadas.

Estamos a ter em conta, sobretudo, a importância de acautelar que as famílias que, não tendo rendimentos,

não têm de estar oneradas com um subsídio que o Estado deve acautelar. É nesse sentido que vai ser

apresentado um decreto-lei, bem como a prorrogação do regime.

Sr. Deputado do CDS-PP, para mim, é sempre um espanto ver que está preocupado com a extensão do

nosso regime de rendas, quando, num período de crise, que não foi assim há tanto tempo, portanto a nossa

memória está bastante fresca, a solução que o CDS e o PSD, sejamos justos porque foi uma solução partilhada

entre os dois partidos, apresentaram foi a de aprovar uma lei das rendas. Foi uma lei que veio liberalizar o

mercado, veio despejar muita gente e que, em vez de apoiar o direito à habitação, colocou as pessoas fora da

habitação, fora de um direito constitucionalmente consagrado.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Isso é treta! É conversa!

A Sr.ª Secretária de Estado da Habitação: — O que estamos a fazer com as nossas medidas, Sr. Deputado, desde abril, desde o início da pandemia, é,…

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Nada!

A Sr.ª Secretária de Estado da Habitação: — … precisamente, salvaguardar o direito à habitação, sem prejudicar o trabalho que estamos a fazer, e pelo qual nos responsabilizamos, de encontrar respostas a longo

prazo, em matéria de direito à habitação. Isto porque, efetivamente, identificámos um problema, para o qual

criámos instrumentos e no qual estamos a trabalhar, sem prejudicar a resposta que está, neste momento, em

execução, para salvaguardar, em momento de pandemia, os rendimentos das famílias, com respostas

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enquadradas nesses rendimentos e, sobretudo, na defesa de um direito intransigente, essencial e fundamental

como é o direito à habitação para todos os portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para encerrar o debate, em nome do Governo, o Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor, João Torres.

O Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostava de transmitir-vos algo que fiz questão de referir na minha primeira intervenção, mas

que julgo que seria importante reforçar.

Esta proposta de lei que o Governo submete à discussão da Assembleia da República é um de três elementos

que foram anunciados, na semana passada, no que diz respeito ao tema do arrendamento não habitacional.

Temos esta proposta de lei, temos uma linha de crédito de 100 milhões de euros para proprietários e

arrendatários e temos um subsídio, ou um programa de subsídios, a fundo perdido, no valor de 300 milhões de

euros, a dinamizar no primeiro semestre do ano de 2021 e com pagamentos em duas tranches, que vão ocorrer

ao longo desse período.

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Onde é que está o programa?

O Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor: — Por isso, queria, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, agradecer aos Srs. Deputados que me recordaram da minha última

intervenção na Assembleia da República.

A mesma intervenção pode ser transcrita e vai exatamente ao encontro daquilo que o Governo teve

oportunidade de anunciar na semana passada:…

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Mas onde é que está?!

O Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor: — … que iríamos ter subsídios a fundo perdido e que estaríamos disponíveis para apresentar uma proposta de lei à Assembleia da

República,…

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Perdeu-se no caminho!

O Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor: — … no sentido de reforçar a proteção dos estabelecimentos comerciais — na perspetiva do arrendamento —, o que fazemos com especial

cuidado para os estabelecimentos encerrados desde março de 2020.

Quero ainda dizer que não temos apenas 300 milhões de euros a fundo perdido para o arrendamento não

habitacional, temos já mais de 750 milhões de euros, no âmbito do Programa APOIAR.PT. Estando, neste

momento, a preparar a regulamentação do apoio às rendas, temos a ambição de que esse programa possa ser

operacionalizado de forma tão célere como foi o Programa APOIAR.PT, que hoje já transferiu milhões de euros,

dezenas de milhões de euros, para empresas que estão a passar por sérias dificuldades.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para terminar, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado do Comércio, Serviços e Defesa do Consumidor: — Portanto, queria dizer, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, que, sobre esta matéria, como, aliás, sobre todas as outras, temos

cumprido, temos encontrado soluções equilibradas para proteger os diferentes interesses em causa e vamos

continuar a trabalhar muito arduamente para apoiar os setores mais afetados da nossa economia.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: — Chegámos, assim, ao fim deste primeiro ponto. Vamos entrar no segundo ponto da nossa ordem do dia, com a apreciação do Decreto-Lei n.º 81/2020, de 2

de outubro, que adequa os instrumentos criados no âmbito da Nova Geração de Políticas de Habitação e a Lei

Orgânica do IHRU, I.P., à Lei de Bases da Habitação, no âmbito do Programa de Estabilização Económica e

Social [Apreciação Parlamentar n.º 33/XIV/2.ª (PCP)].

Para abrir o debate tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, do Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados: Como o Sr. Presidente acabou de referir, o Decreto-Lei n.º 81/2020, de 2 de outubro, em apreço, vem fazer uma adequação

de diversos diplomas legais relevantes na política de habitação, desde a Lei Orgânica do IHRU, I.P. até ao

enquadramento legal dos programas 1.º Direito ou Porta de Entrada, entre outros diplomas, no sentido de fazer

corresponder essa legislação ao quadro que resulta da aprovação da Lei de Bases da Habitação nesta

Assembleia da República.

O PCP considera importante essa adequação e considera que a aprovação do Decreto-Lei n.º 81/2020, de

2 de outubro, é um passo positivo no sentido da regulamentação da lei que foi aprovada pela Assembleia. E o

PCP empenhou-se positivamente, no sentido de contribuir para que essa lei fosse a melhor possível. Temos

uma lei que, agora, se deve traduzir no concreto, do ponto de vista desta regulamentação.

No entanto, este Decreto-Lei n.º 81/2020 e as alterações que veio introduzir, colocam, do nosso ponto de

vista, duas questões: uma que justifica o acerto relativamente a algumas das matérias plasmadas na própria

alteração que o decreto-lei veio trazer; e outra — que não vamos dirimir aqui, conhecendo os limites materiais

do processo da decisão parlamentar — que tem a ver com aquilo que falta tratar ainda, do ponto de vista destes

diplomas que são alterados.

Portanto, há um trabalho que fica por fazer e seguramente que teremos de voltar a este tema, mais à frente,

não em sede de apreciação parlamentar, mas no sentido do enriquecimento, desenvolvimento e

aprofundamento dessas operações e opções.

O PCP apresenta, desde já, propostas concretas, no sentido do aperfeiçoamento e da melhoria do texto do

decreto-lei em causa, relativamente às alterações que vem introduzir.

Fazemo-lo, desde logo, no que diz respeito ao Decreto-Lei n.º 175/2012, que aprova a orgânica do IHRU,

Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, I. P., para assegurar, em primeiro lugar, que o IHRU pode,

eventualmente, participar em sociedades e fundos de investimento imobiliário, mas de capital público ou no

âmbito do Fundo Nacional para Reabilitação do Edificado, delimitando de uma forma mais clara o âmbito de

intervenção do IHRU, com a questão do capital público, não permitindo, nesta matéria, a entrada do IHRU em

outros domínios do ponto de vista do setor financeiro, que têm mostrado, em muitos casos, problemas que

conhecemos bem.

Por outro lado, no Decreto-Lei n.º 37/2018, que enquadra o chamado programa 1.º Direito, salvaguardamos

também, no n.º 5 do artigo 62.º, no que diz respeito à intervenção das entidades que podem ser envolvidas nos

processos, o âmbito em que devem ser envolvidas, na falta de estratégia local de habitação — aprovada ou de

onde não constem esses apoios —, para que seja assim, do ponto de vista do processo que os municípios

devem ter, e não em alternativa ou em substituição ao envolvimento prioritário.

Portanto, estas entidades não devem substituir, devem estar presentes, de forma complementar, mais

abrangente, integrada e participativa.

Por outro lado, colocamos também aqui, neste âmbito, o envolvimento no processo, bem como a emissão

de parecer, do Conselho Nacional de Habitação, relativamente à questão do prazo de 20 anos para a capacidade

de desafetação das habitações cuja aquisição, reabilitação ou construção tenha sido financiada com

comparticipações concedidas neste âmbito.

Esta chamada Nova Geração de Políticas de Habitação estabeleceu, em 2018, as principais metas

quantitativas a atingir a médio prazo.

Com a lei de bases, compete ao Programa Nacional de Habitação estabelecer os objetivos, prioridades,

programas e medidas de política nacional de habitação, e esse programa é proposto pelo Governo.

A questão é que, no próprio Decreto-Lei n.º 81/2020 — e por isso é que dizemos que teremos de voltar a

esse assunto —, importa garantir que na legislação agora alterada, se possa ir mais longe, no sentido de garantir

e salvaguardar a capacidade de resposta, através da adaptação necessária para a intervenção ao nível de

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concretização e para levar a cabo esse instrumento de planeamento tão importante que é o Programa Nacional

de Habitação.

Portanto, consideramos que essas medidas não devem ficar por meras alterações processuais, e por isso

essa intervenção tem de ir mais longe.

Para já, do ponto de vista da alteração em sede de apreciação parlamentar, as propostas concretas do PCP

são um contributo para aperfeiçoar o texto do decreto-lei.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente António Filipe.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Secretária de Estado da Habitação, Marina Gonçalves.

A Sr.ª Secretária de Estado da Habitação: — Sr. Presidente e Srs. Deputados: Antes de mais, queria agradecer ao PCP a possibilidade de vir aqui discutir e debater as alterações que estão no Decreto-Lei n.º

81/2020, de 2 de outubro, que teve, efetivamente, como objetivo enquadrar os instrumentos já em curso na

política pública de habitação, com a Lei de Bases da Habitação e os seus principais princípios e objetivos.

O decreto-lei não altera as respostas que estavam em curso, antes vem reforçá-las e adaptá-las. Felizmente,

não há aqui uma constante mudança de paradigma, há, sim, um reforço e uma celeridade e simplificação das

respostas que damos, nas várias vertentes, nomeadamente através do 1.º Direito, e também através de

programas mais assentes nas necessidades urgentes e no arrendamento acessível.

Queria referir também que este diploma — aproveitando que estamos aqui a falar dele — prevê uma

majoração do papel do Estado no financiamento das soluções habitacionais ao abrigo do 1.º Direito. E é

importante salientar também, nesta perspetiva de articulação com os municípios, para facilitar e acelerar o

investimento em habitação, que há umas majorações previstas neste diploma precisamente para reforçar a

intervenção, assim como, reforçando a intervenção e a resposta, se garante que todas as necessidades

habitacionais de todas as habitações indignas são identificadas, num papel mais ativo das organizações, do

terceiro setor, não como alternativa, mas em complemento da resposta que existe e, precisamente, para

salvaguardar que todas as situações são identificadas.

Refiro ainda que este diploma altera, também, a orgânica do IHRU — para a qual foi feita também uma

proposta de alteração —, mas altera no sentido de adaptar às novas competências que são dadas pela lei de

bases — esta ainda vai ser objeto de portaria —, para reforçar o papel do IHRU em complemento, obviamente,

com o reforço dos recursos humanos, que é essencial para garantir a correta execução dos instrumentos que

estão em curso em matéria de habitação.

Relativamente à Bolsa Nacional de Alojamento Urgente e Temporário, queria ainda referir que a redação

prevista no decreto-lei não implica que a resposta não deva ser dada e que não assente nesta articulação com

as entidades do Estado, ao nível da administração central e da administração local, nomeadamente com os

municípios; o que não implica o envolvimento destas entidades.

Aliás, esta bolsa vai ter uma concretização legislativa, vai estar assente num decreto-lei que teremos

oportunidade de apresentar no início do ano, e vai, precisamente, focar-se nesta resposta. Esta redação prevê

que, independentemente de não estar feita a identificação na estratégia local de habitação — obviamente o

objetivo é que esteja tudo assente na identificação feita na estratégia local de habitação —, seja, efetivamente,

dada a resposta e que isso fique salvaguardado.

Esta identificação aqui prevista não prejudica que a primeira resposta, ainda que seja no âmbito da bolsa,

seja dos municípios, do IHRU e das entidades envolvidas, nomeadamente em função de cada grupo vulnerável

que a bolsa vai incluir.

Já tive aqui oportunidade de ver quer as propostas do PCP quer as do Bloco de Esquerda, relativamente ao

decreto-lei, e estamos disponíveis para as avaliar. Há aqui algumas questões — como aquela de que estávamos

a falar — que são de clarificação de redação, de salvaguardar que o que está ali em causa é, efetivamente, a

execução das medidas em concreto e a solução para as famílias.

Portanto, da minha parte, assumo esse compromisso de avaliarmos as propostas para podermos,

obviamente, melhorar a redação, dentro dos princípios e das bases em que estão definidos os diplomas, naquilo

que for possível, para salvaguardar o direito à habitação que, no fundo, é o objetivo final que todos temos.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Inês Sousa Real, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O direito à estabilidade no acesso à habitação e o direito a uma habitação digna para viver é, sem dúvida, um

direito absolutamente fundamental do nosso ordenamento jurídico, mas que tem de passar do papel para as

políticas públicas, de uma forma mais célere e eficaz.

Nesse aspeto, saudamos o PCP por trazer a apreciação, à Assembleia da República, este decreto-lei, pois,

apesar de termos abordado, ao longo do ano, estas matérias da habitação, o momento especial e complexo que

vivemos, da COVID-19, veio agudizar os problemas no acesso à habitação.

Se antes, sobretudo nas áreas urbanas, havia uma pressão muito significativa por força do turismo, hoje em

dia, a COVID-19 veio aumentar o desemprego e a perda de rendimentos, o que vai, consequentemente, levar a

uma maior dificuldade no acesso à habitação.

Considerando esta circunstância, olhando para o diploma agora em apreciação, há, de facto, algumas

matérias que continuam a estar de fora e para as quais já temos alertado.

Refiro-me, por exemplo, ao IHRU, que persiste no incumprimento com as necessidades de habitação para

comunidades migrantes em Portugal. Veja-se, por exemplo, o caso dos trabalhadores agrícolas do sudoeste

alentejano, que já foram várias vezes alertar para este problema, mas que continuam alojados em contentores,

ou os inúmeros casos de refugiados alojados em hostels, sem condições, conforme amplamente noticiado pela

comunicação social.

Por outro lado, subsiste e até se agrava a problemática dos jovens e do seu acesso à habitação. Os jovens

portugueses elegem o acesso à habitação como uma prioridade, preocupação que o PAN, naturalmente,

acompanha, devendo tomar-se medidas urgentes para que seja consagrado o direito a este seu 1.º Direito

(Programa de Apoio ao Acesso à Habitação), tendo em conta o elevado preço das habitações, as condições de

trabalho precárias que continuamos a dar aos jovens e os parcos apoios que também lhes temos dado na área

da habitação.

Também a sustentabilidade ambiental do edificado leva a um enorme problema de pobreza energética, que

tem de ser eficazmente combatido, o que também, de alguma forma, não encontra escopo naquilo que possa

ser a visão para esta realidade.

Uma outra área de fragilidade social, que não podemos deixar de apontar, é a das pessoas em situação de

sem abrigo ou a das vítimas de violência, seja ela a violência doméstica ou o casamento forçado, entre tantas

outras.

Apesar do caminho que tem sido feito em Portugal, e de este ter de ser feito, bem sabemos, juntamente com

as autarquias locais, tem de haver um esforço mais efetivo por parte do Governo. Sobretudo quando temos tanto

imobiliário edificado que pertence ao Estado, não faz qualquer sentido que não exista uma maior aposta na

reconversão destes fogos, uma identificação do património que está disperso pelas nossas cidades, para que

se consiga, de forma estrutural, combater esta realidade.

Por via dos Orçamentos do Estado, quer de 2020 quer de 2021, fizeram-se avanços nestas matérias,

nomeadamente com a previsão dos projetos de Housing First.

Mas, Sr.ª Secretária de Estado, queremos aproveitar a sua presença para também perceber quando é que

isto vai ser uma realidade no nosso País e quando é que, de forma estrutural, vamos conseguir dar resposta a

estes problemas.

Iremos, evidentemente, acompanhar estas iniciativas, mas fica um alerta para o caminho que ainda tem de

ser feito nesta matéria.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Gonçalves Pereira, do CDS-PP.

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O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP traz a debate, com esta apreciação parlamentar, uma preocupação em matéria de habitação,

preocupação essa que acompanhamos, pelo que saudamos o PCP por ter permitido que façamos aqui esta

apreciação.

Este debate tem a ver com a própria capacidade que o IHRU tem ou não tem, com as competências que tem

e com os recursos que tem disponíveis para poder responder às necessidades que existem — e são muitas —

no País. Ora, nesta matéria, o CDS tem as maiores reservas.

Quando falamos de políticas de habitação — e, há pouco, a Sr.ª Secretária de Estado falava nas grandes

respostas do Governo, questão a que me referirei mais à frente —, o Fundo Nacional de Reabilitação do

Edificado (FNRE), por exemplo, lançado em 2016, tinha a ambição de recuperar 7500 habitações e de ter preços

acessíveis. Ora, ainda recentemente, a Sr.ª Secretária de Estado disse que, desde 2016, o Governo ainda não

tinha arranjado tempo para fazer sequer um inventário. Portanto, a resposta é zero!

O Estado tem um conjunto de património, que poderia ser colocado à disposição, para responder às

necessidades de habitação do País. De facto, temos um parque habitacional público que representa cerca de

2% do mercado, mas o certo é que o Governo responde do modo habitual. E qual é esse modo? É com planos

e mais planos, programas e mais programas, promessas e mais promessas, propaganda e mais propaganda! E

quando falamos de ação ou de execução, ela, normalmente, é sempre igual a zero.

Mas queria também aproveitar para trazer aqui à discussão aquilo que foi — e já que falamos de propaganda

e de promessas — uma meta, uma ambição do Sr. Primeiro-Ministro, ao proferir certas declarações. Devo dizer

que, quando li isso e ouvi essas declarações do Sr. Primeiro-Ministro, pensei: se fosse o Ministro Pedro Nuno

Santos, que é quem tem a tutela, a fazer uma afirmação destas, até acharia normal, não estou a vê-lo nos bairros

sociais, pelo que permitia-se fazer um determinado tipo de afirmações. Ora, o que é que o Sr. Primeiro-Ministro

veio dizer? O Sr. Primeiro-Ministro acredita que é possível cumprir uma meta. E qual é a meta do Sr. Primeiro-

Ministro? A meta é celebrar os 50 anos do 25 de Abril, em 2024, tendo erradicado da sociedade portuguesa as

situações de pobreza indigna.

Acontece que este mesmo Primeiro-Ministro foi Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, pelo que sabe

as condições que existem em matéria de habitação, precisamente na capital, como também conhece bem essa

realidade o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares por ter sido Vice-Presidente da Câmara

Municipal de Lisboa — já quanto ao Ministro Pedro Nuno Santos tenho dúvidas que conheça —, e ambos sabem

uma coisa: é que, para se ter acesso a uma habitação social ou a uma habitação municipal, não chega viver-se

numa situação de pobreza, é preciso viver-se numa situação de miséria.

Sr.as e Srs. Deputados, só quem vive numa situação de miséria, na nossa capital, é que pode ter acesso a

uma habitação municipal!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Vou já terminar, Sr. Presidente. Portanto, o Sr. Primeiro-Ministro, quando fala numa habitação digna, não sabe que essa é uma habitação

onde não existem infiltrações, onde não há problemas de humidade, onde a questão da eficiência energética

está assegurada, onde os elevadores funcionam. Isto é que é dar dignidade a quem vive indignamente nesses

mesmos bairros.

Posto isto, Sr.ª Secretária de Estado, faça menos propaganda e, se calhar, é melhor, antes de vir à

Assembleia da República, ir mais ao terreno falar de respostas aos problemas ligados à habitação.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Manuel Rola, do BE.

A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Sr.ª Secretária de Estado, apresentámos, esta manhã, cinco medidas que pretendem aprofundar a capacidade do

IHRU como autoridade nacional e serviço público na área da habitação.

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Para uma efetiva aplicabilidade, quer da Lei de Bases da Habitação, quer da própria Constituição, as

competências do IHRU têm de ser claras e reforçadas. Este decreto-lei vai nesse sentido, mas poderia ir mais

longe.

Entendemos que, quer pela sua territorialização, quer pelo funcionamento dos próprios organismos que

apoiam o seu trabalho, quer pela articulação com outros serviços públicos, quer pela transparência que deve

acompanhar todas as políticas de habitação, o IHRU poderia sair ainda mais reforçado neste decreto-lei.

Assim, damos aqui os nossos cinco contributos para que se constitua uma autoridade no âmbito da

habitação.

Em primeiro lugar, propomos que se garantam serviços desconcentrados, tal como já ocorre na Autoridade

para as Condições do Trabalho (ACT) e na segurança social. Isso porque as políticas de habitação têm uma

implementação muito forte a nível local e têm também características que influenciam toda uma região. Nesse

sentido, não se entende que se mantenha uma estrutura centralizada que não consegue dar respostas

localmente e intervir nas regiões de forma autónoma. O IHRU não pode manter-se centralizado.

Em segundo lugar, propomos que se aprofunde o Conselho Consultivo para que seja mais operante, regular,

participado e transparente. O Conselho Consultivo já teve um funcionamento bem mais definido, com mandatos

limitados e reuniões periódicas. O último Conselho Consultivo foi nomeado em 2013 e claramente foi

abandonado nos últimos anos. Isto ilustra não só a desconsideração a que os diferentes organismos que

acompanham a habitação foram votados, mas também a falta de perspetiva de construção dos serviços que,

entretanto, foram postos em prática na lei. Nem o Conselho Consultivo, nem o Observatório da Habitação, nem

o Serviço de Injunção em Matéria de Arrendamento funcionam neste momento, e seriam essenciais para garantir

um corpo crítico e de atuação, repondo o funcionamento anterior à ação devastadora da ex-ministra Assunção

Cristas. É também essencial garantir a transparência através da publicação de atas e documentos que este

Conselho venha a emitir.

Em terceiro lugar, propomos que se articule a informação com a segurança social. Percebemos, durante esta

pandemia, e com a criação do apoio emergencial do IHRU, que, se houvesse uma articulação entre o IHRU e a

segurança social, muita da informação que ficou a faltar ao IHRU seria garantida através dos pedidos de apoio

da segurança social. Esta é uma medida evidente e é necessária para que o IHRU possa ter a componente de

apoio social e dirimir as dificuldades que se levantaram com a aprovação das candidaturas. De facto, este

programa não conseguiu responder e a segurança social tem uma capacidade completamente diferente do IHRU

para poder atribuir essa informação.

Em quarto lugar, propomos que se atribuam poderes de autoridade na prossecução das novas funções de

fiscalização da legislação do arrendamento. Uma entidade a quem se quer dar poderes de fiscalização tem de

ter capacidades para o fazer. É necessário garantir trabalhadores, ainda mais trabalhadores, mas é também

necessário que uma parte desses trabalhadores possa, de facto, ter prerrogativas de autoridade. É assim na

ACT, é assim na segurança social e deve ser também assim no IHRU.

Por fim, em quinto lugar, propomos que se mantenha a publicitação anual do programa 1.º Direito. Os

programas de habitação têm sido pouco escrutináveis e têm pouca informação acessível. Aliás, este é um

problema em todas as políticas de habitação: existe pouca informação sistematizada que permita identificar os

problemas. Não existe também transparência. O programa 1.º Direito parecia querer vir alterar isto. Aliás, temos

tido informação disponibilizada sobre este programa. Ora, tem de se manter a redação inicial, com a instituição

periódica da apresentação desta informação não só publicamente, mas também à própria Assembleia da

República, como aprovámos no Orçamento do Estado para 2020.

A lógica das políticas de habitação tem de se alterar radicalmente. Muito trabalho foi feito nesta Assembleia

nos últimos quatro anos, mas pouco mudou no concreto.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Vou concluir, Sr. Presidente. Cumprir a Constituição e a Lei de Bases da Habitação pede que sejamos mais exigentes e responsáveis

para que o medo de não ter onde viver deixe de ser uma realidade em Portugal. É este o compromisso do Bloco

de Esquerda, aqui, na Assembleia da República, e para o qual estamos dispostos a contribuir, desde logo com

estas propostas.

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Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, do PEV.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Quero deixar duas notas muito breves sobre a apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 81/2020, de 2 de outubro,

que o Partido Comunista Português hoje nos traz para discussão e que, a nosso ver, tem toda a oportunidade.

De facto, com a entrada em vigor da Lei Bases da Habitação — a Lei n.º 83/2019, de 3 de setembro —, torna-

se absolutamente imperioso criar as condições para que o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana,

enquanto «entidade pública promotora da política nacional de habitação» possa desenvolver as suas

importantes atribuições.

Para isso, é necessário não só dotar o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana das competências

necessárias para o efeito, mas também dos meios, ou daquilo a que podemos designar de «capacidade

operativa», para que este Instituto possa desenvolver o seu trabalho, como, de resto, resulta da Lei n.º 83/2019

e, mais concretamente, do n.º 7 do seu artigo 16.º.

Por outro lado, não é necessário grande esforço para se perceber que tanto os programas como os

instrumentos que dão corpo à Nova Geração de Políticas de Habitação (NGPH) são orientados por critérios que

são tudo menos uniformes e que, inclusivamente, em alguns casos, não só se desviam como se mostram mesmo

contrários à Lei n.º 83/2019, a Lei de Bases da Habitação.

Aliás, do que se conhece, tanto os programas como os instrumentos dessa Nova Geração de Políticas de

Habitação (NGPH) têm-se mostrado absolutamente insuficientes ou mesmo incapazes de transformar as

políticas públicas de habitação em verdadeiros e efetivos instrumentos para dar resposta aos enormes

problemas e às colossais carências que o País vive em termos de habitação.

Se dúvidas houvesse a esse respeito, bastaria olhar para os poucos resultados dos relatórios de execução

desses programas, nomeadamente para o Relatório de Execução do Programa 1.º Direito e para a taxa de

execução que apresenta, para ficarmos devidamente esclarecidos sobre a importância desses programas,

enquanto contributos para dar resposta aos problemas com que nos confrontamos no que diz respeito às

carências habitacionais.

Ora, perante este cenário, o que se impõe é procurar aperfeiçoar o quadro legal existente, de forma a que se

consiga estabelecer uma certa sintonia entre, por um lado, a Nova Geração de Políticas de Habitação e, por

outro, a Lei de Bases da Habitação de 2019, porque, como já todos testemunhámos, as medidas previstas no

decreto-lei, cuja apreciação agora fazemos, deixam muito a desejar, ou melhor, deixam tudo a desejar.

Por isso, acompanhamos, de uma forma global, as propostas de alteração ao Decreto-Lei n.º 81/2020, de 2

de outubro, que também estão em discussão, juntamente com a apreciação que agora fazemos.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Filipa Roseta, do PSD.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Diz o PCP, na exposição de motivos do seu pedido de apreciação parlamentar, que «(…) os programas e instrumentos da

chamada NGPH (…) já demonstraram, de forma inequívoca, serem incapazes de dar às pretendidas políticas

públicas de habitação as saídas necessárias para a resolução dos gravíssimos problemas (…) com que o País

se confronta». Ora, nós concordamos absolutamente.

O Partido Socialista, o Partido Comunista Português e o Bloco de Esquerda são incapazes de dar às

pretendidas políticas públicas de habitação as saídas necessárias para a resolução dos gravíssimos problemas

com que o País se confronta.

Protestos do PS, do BE e do PCP.

Estamos absolutamente de acordo.

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O que andamos a ouvir desde 2016 é o Governo a dizer «vamos rapidamente e em força». Mas para onde,

senhores? Para onde é que os senhores estão a ir, rapidamente e em força?! É que nós não sabemos e

pensávamos que era por opacidade. Mas não é. E nós chegamos à conclusão de que os senhores também não

sabem. Os senhores também não sabem! Isto é uma loucura.

Aplausos do PSD.

O grande problema é que, desde 2016, andam a correr, rapidamente e em força, não sabem para onde. O

Dr. Mário Centeno não vos deu o dinheiro que pediram! Dos 250 milhões que pediram passou para 7 milhões,

Sr.ª Secretária de Estado da Habitação, não foi zero, ao contrário daquilo que o Ministro disse! E o único

programa que tinha, o Fundo Nacional para a Reabilitação do Edificado, tem 7 milhões, Sr.ª Secretária de

Estado, não é zero, com os quais fez nada, fez zero! Tinha 7 milhões e fez zero!

Mas agora, para o ano que vem, já são 150 milhões! E para quê? Qual é a política nacional de habitação

neste País? Qual é? Não existe!

Como é que estão a fazer isto? Estão à espera que os municípios peçam, município a município. Vejam lá

se faz algum sentido que os municípios que chegam primeiro sejam os que recebem primeiro. E quem é que

chegou primeiro? O município de Arruda dos Vinhos! Ora, é em Arruda dos Vinhos que há a maior urgência de

habitação no nosso País?! Em Arruda dos Vinhos?! Vinte fogos de habitação social?!

Protestos do PS, do BE e do PCP.

Srs. Deputados, falemos de Lisboa…

O Sr. Hugo Costa (PS): — A cabeça de lista do PSD por Lisboa está contra Lisboa! É preciso registar-se isso!

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Falemos de Lisboa, Srs. Deputados. A Câmara Municipal de Lisboa tem 60 edifícios vazios, a cair de podres, desde 2016, do Fundo Nacional

para a Reabilitação do Edificado!

Aplausos do PSD.

A Câmara Municipal de Lisboa tem 300 milhões em IMT (imposto municipal sobre as transmissões onerosas

de imóveis). Para que é que a Câmara de Lisboa precisa dos 18 milhões que vocês lhe estão a dar quando

temos pessoas em Bragança a morrer de frio porque não têm dinheiro para aquecer as casas? Qual é a lógica

disto?

A Câmara Municipal de Lisboa tem um mercado dinâmico e consegue resolver sozinha os problemas se tiver

um executivo capaz. O que é que vocês estão aqui a fazer com isto? Não tem sentido nenhum!

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — E a Câmara de Cascais?

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Querem que eu fale da Câmara de Cascais? O Bairro Marechal Carmona é exatamente aquilo que nós queremos para o programa nacional de habitação.

Aplausos do PSD.

A Câmara de Cascais não precisa de pedir dinheiro ao Estado como a de Arruda dos Vinhos ou a de Lisboa,

porque a Câmara de Cascais tem um programa nacional de habitação autossustentável, em que dois terços das

rendas acessíveis se pagam ao preço da construção, que é o que está no nosso programa eleitoral.

Srs. Deputados, há uma grande pergunta que temos para vos fazer. Não há programas, já toda a gente

percebeu; não sabem para onde vão, já toda a gente percebeu. A questão é a de saber qual é a capacidade

instalada nas propriedades públicas do Estado. Isto é obrigatório saber-se, e nós não sabemos qual é a

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capacidade instalada. É mais importante saber quantas propriedades temos do que qual é a necessidade dessas

propriedades. E nós não sabemos, não fazemos ideia.

Mas, acima de tudo, Sr.as e Srs. Deputados, qual é a cidade que vocês querem construir? Vocês querem

construir uma cidade de bairros sociais? É isso que vocês querem fazer no século XXI? Mais habitação social?!

Mais guetos sociais?! É isso?!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Convém que se saiba onde se está!

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Nós queremos que se saiba lá fora que é isso que o Partido Socialista, o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista querem fazer, isto é, mais bairros sociais. Não, não é essa a solução;

precisamos de uma solução integrada de mobilidade social verdadeira onde não há guetos, onde há inclusão,

há solidariedade, há justiça social e há liberdade.

Os senhores já demonstraram ser incapazes de dar alguma resposta aos graves problemas que o País

enfrenta, como os próprios vêm agora reconhecer.

Por isso, caros senhores, 2021 é o ano para acabarmos com o socialismo em Portugal.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Begonha, do PS.

A Sr.ª Maria Begonha (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Srs. Deputados: Quando debatemos a importância do direito à habitação como direito constitucional e indispensável para a concretização

de um verdadeiro Estado social, sabemos de que lado está a esquerda, nomeadamente o PCP, que requer esta

apreciação parlamentar, como não há também dúvidas de que esse é um dos grandes desígnios que o Partido

Socialista elegeu desde o início da sua governação. É, de facto, à esquerda que partilhamos esse desígnio.

Quando reconhecemos que o direito à habitação sofreu um desinvestimento durante anos, ano após ano,

Governo após Governo, não há dúvidas sobre quem se empenhou, desenhou e concretizou os instrumentos e

políticas para interromper, de uma vez por todas, um capítulo de desvalorização da política pública de habitação

e de desvalorização do papel do Estado em todas as áreas, mas também na habitação.

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada do PSD Filipa Roseta.

É que enquanto a direita votava contra a Lei de Bases da Habitação, enquanto a direita falha sempre, como

hoje aqui neste debate, em apresentar propostas positivas e reconhecer as suas responsabilidades, foram os

Governos do PS e os partidos de esquerda representados nesta Assembleia, onde se inclui o PCP, desde 2015,

que, a cada Orçamento apresentado, a cada Orçamento viabilizado, reforçaram o acesso e o investimento à

habitação.

Tem sido o Governo do Partido Socialista a implementar a estratégia que vai permitir ao nosso País, a médio

prazo, no futuro, acabar com as carências de habitação e corrigir injustiças do mercado.

Não há nenhum partido ou setor que não conheça a clareza e a justiça das prioridades seguintes: acabar

com as carências de habitação indigna, aumentar o parque habitacional público e aliar esse esforço a políticas

de arrendamento acessível, assumir uma perspetiva intervencionista do mercado de habitação, combatendo o

desajuste entre o rendimento das pessoas, das famílias e dos jovens face aos preços do mercado.

Estes são os grandes objetivos que queremos alcançar e temos, agora, resultados concretos.

Não há nenhum partido ou cidadão que não conheça a gravidade da situação social e económica que

vivemos…

Protestos da Deputada do PSD Filipa Roseta.

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… e o seu profundo impacto na dificuldade de manter a casa ou pagar a renda. Este não é, por isso, o

momento — ao contrário do que foi dito — de recuar na estratégia criada, mas o de prosseguir, sob todas as

vias, com todos os meios, para concretizar os direitos concretos e as responsabilidades concretas do Estado

vertidas na Lei de Bases da Habitação e enquadradas numa nova geração de políticas, cujos instrumentos de

atuação são adequados com o decreto-lei do Governo que estamos a apreciar.

No momento em que começamos a consagrar a derrota de uma visão economicista da habitação com

políticas que produzem — ao contrário do que quer dizer o PSD num exercício demagógico — resultados

concretos com impacto na vida dos portugueses, não é o momento para desmobilizar todos os esforços, desde

o Estado, aos municípios e ao terceiro setor, de um verdadeiro desígnio nacional.

Não podemos apelidar de ineficácia o ritmo, que todos gostaríamos que fosse mais célere, a que as políticas

têm de ser implementadas; não vamos apelidar de inexistente o maior esforço…

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Qual esforço?!

A Sr.ª Maria Begonha (PS): — … que o Estado já fez com o parque habitacional público, porque demora a sua disponibilização; e não vamos, certamente, chamar de irresponsável o Estado central por partilhar com os

municípios a magnitude da resposta que precisa de ser dada nesta matéria.

É justo dizer que o nível de resposta não atingiu o que queremos alcançar, e não ouvirão o Partido Socialista

conformado, ou calado, ou pouco disponível para propostas que sejam apresentadas que venham a melhorar

as soluções e respostas, desde logo, a informalidade do mercado de arrendamento, desde logo, os demasiados

jovens ou famílias que ficam excluídos destas respostas. Mas o que não faremos é abandonar o nosso grau de

compromisso e convicção no valor da reforma estrutural e a médio prazo que estamos a fazer e que era inadiável

e urgente. Esperamos que também aqui possamos estar do mesmo lado e a partilhar um desígnio para o

presente e para o futuro.

Na verdade, o decreto-lei que apreciamos adequa instrumentos e políticas, como o programa 1.º Direito, que

responde hoje a mais de 10 000 famílias, a que acrescem estratégias de habitação local já aprovadas e as

muitas que se lhe seguirão, como o aumento da bolsa de imóveis do Estado para arrendamento acessível no

âmbito do IHRU. Responde a famílias que encontram resposta no arrendamento acessível e a jovens que

encontram resposta no Porta 65. E também não foram deixados para trás aqueles para quem foi fundamental o

apoio às rendas e a suspensão da caducidade dos contratos neste tempo de emergência e crise social que

vivemos. Cumprimos e estamos a cumprir as nossas responsabilidades e ambição, e a apreciação a que nos

dedicamos neste debate não faz senão aprofundar soluções — e agora recolher outras — para que a habitação

seja verdadeiramente um pilar garantido do Estado democrático.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — O Governo ainda dispõe de tempo nesta fase do debate. Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Habitação.

A Sr.ª Secretária de Estado da Habitação: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Fico sempre muito admirada quando venho fazer debates ao Parlamento e percebo que, da parte dos partidos à direita, as únicas coisas que

trazem ao debate são demagogia, falácias e um conjunto de desprezo brutal para com o trabalho que os

municípios e o Estado estão a fazer.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Sr.ª Deputada Filipa Roseta, estive muito atenta àquilo que disse, estive muito atenta ao que o CDS disse e

não ouvi uma única proposta do vosso lado.

Aplausos do PS.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Não ouviu?!

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A Sr.ª Secretária de Estado da Habitação: — A Sr.ª Deputada, que gosta tanto de falar, ouça agora. Ouvi os Srs. Deputados dizerem que falta o inventário. Não, faltava o inventário, o que nós fizemos no

Governo foi começar o inventário. E, se não sabe, vá ler o anexo do Decreto-Lei n.º 94/2019 ou o Decreto-Lei

n.º 82/2020, onde encontra alguns imóveis. Se quer saber o que factualmente está no inventário, aí está a base

do inventário.

Mas, mais: fizemos programas.

A Sr.ª Deputada pode desrespeitar Arruda dos Vinhos, pode desrespeitar as famílias de Arruda dos Vinhos,

mas eu não desrespeito.

Aplausos do PS.

Arruda dos Vinhos foi a primeira autarquia a apresentar uma estratégia local de habitação. Depois de Arruda

dos Vinhos, houve mais nove autarquias já com acordos assinados, para além dessas há 12 autarquias que já

têm a estratégia aprovada pelo IHRU e há, ainda, mais 28 que já aprovaram as suas estratégias na câmara

municipal e na assembleia municipal. Os municípios estão a trabalhar e têm a preocupação de dar resposta à

população. O Estado está a trabalhar e tem verdadeiramente a preocupação de dar resposta à habitação.

Tomáramos nós que a resposta fosse mais rápida, mas a verdade é que a resposta tem passos, passos que

têm de ser dados e que estão a ser dados.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Passos de passarinho!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Secretária de Estado.

A Sr.ª Secretária de Estado da Habitação: — Sr.ª Deputada, não ficámos parados, não apresentámos uma estratégia a dois meses de acabar o mandato; apresentámos no início e, neste momento, estamos a concretizá-

la. É isso que estamos a fazer.

Quanto ao Fundo Nacional para a Reabilitação do Edificado e aos 7 milhões, quando o Sr. Ministro disse que

não foi executado nada foi porque estávamos a falar do ano de 2020, portanto, Sr.ª Deputada, vamos ser

corretos na informação que passamos.

O FNRE tem muito trabalho dado e eu esperava que a Sr.ª Deputada tivesse um bocadinho mais de

informação hoje e viesse aqui com dados concretos sobre o trabalho que o FNRE está a fazer. A Sr.ª Deputada

sabe muito bem que está a fazer, porque tem essa informação e, de facto, não me lembro de ter ouvido a Sr.ª

Deputada falar aqui desse trabalho.

Aplausos do PS.

Falou apenas de um conjunto de conceitos vagos e de demagogias com zero propostas para a habitação.

Zero!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, vamos passar à fase de encerramento do debate. Tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Bruno Dias, do PCP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Há uma opção política que se coloca de forma urgente e indispensável, que é assumir, efetivamente, o reforço da

resposta e da responsabilidade do Estado no cumprimento das tarefas que lhe estão atribuídas, desde logo nos

termos do artigo 65.º da Constituição.

Esta necessidade é reconhecida e é, até, afirmada na apresentação destes diplomas legais por parte do

Governo. Ora, o que nós defendemos é que, ao nível do investimento, ao nível do esforço orçamental e da

repartição do esforço financeiro entre o poder central e os municípios haja aqui coerência e consequência na

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tradução efetiva desses valores orçamentais, até porque com tanta «bazuca» e tanto armamento que aí está

colocado, ao nível de financiamento, nós demonstramos, claramente, a necessidade e a possibilidade de o

Estado central assumir as suas responsabilidades.

No início, eu tinha dito que há uma questão que tem a ver com os limites materiais, nos termos da lei e da

Constituição, da apreciação parlamentar dos decretos-leis. As propostas que foram apresentadas por parte do

PCP respeitam esse limite material, nós não fomos além daquilo que foram as alterações introduzidas pelo

Decreto-Lei n.º 81/2020, de 2 de outubro, e dizemos que, quanto ao resto, teríamos de voltar a esse debate em

sede própria.

Há uma questão em que a igualdade de armas e a igualdade de circunstâncias da capacidade proposta não

pode ser ignorada para que não haja aqueles que parece que têm as ideias e os outros que parece que não têm

porque colocam-nas na altura certa. Portanto, não podemos deixar de fazer esta observação. Temos um trabalho

de especialidade para fazer e continuamos a dizer que é preciso que haja um trabalho sério, construtivo, de

aperfeiçoamento da lei quer do ponto de vista desta apreciação parlamentar, quer daquilo que o decreto-lei não

consagra e que é preciso levar mais longe.

Quanto à intervenção do PSD, não podemos deixar de lamentar que a ausência total de propostas ou de

contributos tenha sido resolvida com a gritaria e o insulto. Já nem vale a pena recomendar que se saiba onde

se está, nem sequer vale a pena apelar à memória e ao pudor a quem fez tudo para desmantelar o IHRU e

deixou na habitação a marca da destruição e do desmantelamento; basta apenas, talvez, recomendar a alguns

que vão visitar o Bairro Novo do Pinhal ou o Bairro da Torre para se recordarem do que estão a falar.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para encerrar o debate, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Habitação, Marina Gonçalves.

A Sr. Secretária de Estado da Habitação: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Voltando ao que nos interessa, que é, efetivamente, falar sobre as políticas de habitação, os instrumentos em curso e as respostas

que são dadas, quero reiterar o que disse no início do debate, ou seja, que estamos, obviamente, disponíveis

para avaliar as propostas apresentadas no âmbito da apreciação parlamentar. Obviamente que se trata de um

trabalho do Parlamento, mas se quiserem ouvir as nossas opiniões estamos disponíveis para as discutir.

É importante reforçar — nós sabemos isso — que as propostas apresentadas têm como objetivo central

tornar eficaz a política pública de habitação. Isso é algo que nos une, ou seja, dar habitação a todos. Esse é um

objetivo.

Falamos não apenas das famílias mais carenciadas, da habitação social — este é um foco importante da

política pública de habitação —, mas também de uma resposta para a classe média, para as necessidades

evidentes que existem no nosso País.

Portanto, o nosso grande compromisso é o de continuarmos a trabalhar nas políticas públicas em curso. Não

iremos suspender o nosso trabalho em função do maior ou menor avanço das políticas.

Todos gostaríamos que a política de habitação se resolvesse de um dia para o outro, mas, infelizmente,

temos um ónus muito grande daquilo que foi o passado, que também responsabiliza o Partido Socialista. Mas

houve um passado de completa desresponsabilização daquilo que era o direito à habitação enquanto pilar

fundamental do Estado social.

Também assumimos a falta de celeridade na resposta, mas assumimos a resposta, e o que interessa é que,

em conjunto, continuemos a trabalhar e a criar instrumentos que sejam, efetivamente, eficazes na proteção do

direito à habitação de forma a que, daqui a um ano ou a um mês ou dois, quando voltarmos a debater a

habitação, reforcemos sempre esta nossa perspetiva conjunta de trabalhar em prol de um direito fundamental

como é o direito à habitação. No final de contas, é isso que interessa, é isso que deveria interessar a todos os

partidos no Parlamento e que também interessa ao Governo: fazer políticas robustas, trabalhar nelas e não

desprezar o trabalho feito nem desprezar a vontade de dar resposta a toda a população, desde a famílias com

menores rendimentos, da habitação social, ao arrendamento acessível.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Devia ser!

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A Sr. Secretária de Estado da Habitação: — Podem contar connosco para tal, podem contar com o nosso empenho no sentido de encontrar respostas, mas não contem connosco para demagogia barata, encontrando

apenas problemas e pondo em causa o que é feito. Não é esse o nosso caminho, não é esse o nosso

compromisso, não é essa a nossa responsabilidade, nem deve ser essa, penso eu, a do Parlamento.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, informo que, durante este debate, deram entrada propostas de alteração ao decreto-lei que esteve em apreciação, apresentadas pelo PCP e pelo BE, que

baixarão à respetiva comissão para apreciação e votação.

Vamos agora passar ao terceiro ponto da ordem de trabalhos, que consta da apreciação conjunta dos

Projetos de Resolução n.os 784/XIV/2.ª (CDS-PP) — Colocar a crise humanitária e o problema de terrorismo

vivido em Moçambique nas prioridades da Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia e 779/XIV/2.ª

(PAN) — Recomenda ao Governo a mobilização da comunidade internacional no sentido de travar os crimes

perpetrados contra a humanidade em Moçambique.

Para apresentar o projeto de resolução do CDS-PP, tem a palavra o Sr. Deputado do CDS João Pinho de

Almeida.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Gonçalves Pereira (CDS-PP): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado João Pinho de Almeida não se encontra presente, mas penso que deve estar mesmo a chegar, pelo que pedia a consideração da Câmara em

esperar cerca de 30 segundos ou 1 minuto.

Pausa.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Se não houvesse oposição do CDS nem de mais ninguém, sugeria que, primeiro, usasse da palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, que apresentaria já o projeto de resolução do

PAN.

Pausa.

Não havendo objeção, tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No mês em que celebramos o Dia Internacional dos Direitos Humanos, não poderíamos deixar de trazer aqui um assunto de suma importância

neste âmbito, como é o caso da situação absolutamente dramática que vive a população de Cabo Delgado, no

norte de Moçambique.

Consideramos fundamental que Portugal dê o exemplo na consciencialização para a intervenção humanitária

nesta situação, não apenas pelos valores humanitários e o dever moral que nos pauta nesta matéria, mas,

sobretudo, pela relação de especial proximidade que existe entre Portugal e Moçambique, ambos parte da

Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

A situação em Moçambique é extremamente grave, conforme relatam a imprensa internacional e as

organizações não governamentais. Além da população aterrorizada diariamente com assassinatos levados a

cabo com extrema crueldade e do desaparecimento de um número elevado de crianças que são raptadas pelos

grupos terroristas, e cujas denúncias nos dizem serem até sujeitas a violações e casamentos forçados, a

Amnistia Internacional estima que 350 000 pessoas correm agora o risco de passar fome naquele país, pelo que

não podemos esperar mais tempo para intervir e mobilizar a comunidade internacional para este flagelo, que já

fez meio milhão de refugiados.

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A comunidade internacional e Portugal não devem demorar mais tempo a agir, nem seria justificável, perante

as populações portuguesa e moçambicana, que não fizéssemos chegar um sinal claro de apoio e solidariedade

para com todos os afetados na efetiva concretização de ações que visem atingir esse objetivo.

Também não podemos falhar na total e absoluta condenação de todos os atos de assassinato, tortura e

violência que têm acontecido naquele país e no total repúdio das organizações que predam os seres humanos

mais frágeis e desprotegidos nas zonas mais vulneráveis do mundo, — embora, curiosamente, uma das zonas

mais ricas em gás natural e pedras preciosas —, já de si fustigadas por desastres naturais ou crises económicas,

como neste caso, agravando de forma inaceitável o sofrimento humano.

Com a certeza de que sempre agiremos em conjunto para recriminar estas práticas e prestar auxílio a todos

os povos em dificuldade perante ataques e violações dos direitos humanos, não podemos também deixar de

refletir sobre o sofrimento que podemos evitar se agirmos com antecedência, procurando evitar que estas

situações atinjam tamanhas proporções.

É este mesmo sofrimento, desespero e fome de milhares de pessoas em Moçambique, que nos faz não ficar

indiferentes nem minimizar este drama humanitário, sob pena de assumirmos a cumplicidade com os crimes

hediondos que, neste preciso momento, estão a ser cometidos. Se o mundo se vê hoje a braços com uma

situação extremamente complexa provocada pela COVID-19, que nos mobilizou a todos de forma solidária, há,

de facto, quem esteja numa situação muito mais complexa e que tenha visto movimentos extremistas a

aproveitarem-se desta situação global para fazerem avançar as suas agendas e cometerem crimes contra a

humanidade que não podem ser tolerados pela comunidade internacional.

É por isso que o PAN apresentou esta iniciativa, para que se recomende ao Governo que, através dos

diversos canais diplomáticos, interceda junto da comunidade internacional no sentido de serem promovidos

todos os esforços necessários para ajudar a travar os crimes contra a humanidade que estão a ocorrer em

Moçambique e, assim, socorrer as populações afetadas, no sentido do restabelecimento da paz e do apoio às

populações. É o que esperam os valores humanitários que pautam o nosso País e é o que espera também o

nosso povo irmão.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar o projeto de resolução do CDS-PP, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero sublinhar que o CDS pediu o agendamento desta matéria para a sessão de hoje por uma razão que é facilmente percetível.

A questão da província de Cabo Delgado e do norte de Moçambique tem, obviamente, uma dimensão global

e à escala internacional. A situação é absolutamente dramática, como aqui foi dito. Estamos a falar de qualquer

coisa como um número superior a 2000 assassinatos, pessoas mortas, e podemos estar a falar de um número

muito próximo já hoje do meio milhão de pessoas refugiadas ou deslocadas em função desta crise.

Estamos a falar de uma organização terrorista, de células ligadas ao Daesh e de ataques sistemáticos que,

nalguns casos, levam ao rapto de dezenas de jovens e crianças que depois são sujeitas a todo o tipo de sevícias.

Isto tem uma implicação internacional. E creio que Portugal não pode esquecer que, recentemente, os

Estados Unidos da América se quiseram assumir como parceiro privilegiado nesta matéria e que o próprio país,

Moçambique, oscila entre o pedido de apoio à Commonwealth ou a outra qualquer realidade.

Ora, nós perguntamos — e o Secretário-Geral das Nações Unidas, o português António Guterres, já o disse,

e bem — e também Portugal deve perguntar: então, e a União Europeia? É que a União Europeia tem aqui uma

relação especial, não só por se tratar de um Estado que fala a mesma língua que um dos seus Estados, como

também tem uma relação de irmandade, de laços históricos com Portugal, que são, obviamente, indesmentíveis.

Isso, em nossa opinião, implica uma responsabilidade da União Europeia.

Quero deixar claro que esta não é uma questão religiosa, não estamos a falar de um conflito religioso. De

resto, os líderes das várias comunidades, designadamente os líderes da comunidade islâmica, são os primeiros

a pedir auxílio. Estamos a falar de terrorismo, de terrorismo violento, agressivo, que está a causar este problema.

Do ponto de vista português e do ponto de vista da CPLP — e tendo a CPLP as limitações que conhecemos

nesta matéria e neste campo de atuação —, o que é que Portugal pode fazer? Pode ajudar a colocar a questão

nos fóruns internacionais.

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É evidente que uma morte é uma morte. Se um cidadão for esfaqueado numa rua de Paris, Bruxelas ou

Londres trata-se de uma morte e, portanto, em valor, isso é sempre uma morte e um ato inaceitável se ele for

vítima do terrorismo. Mas reparem na diferença que há entre a atenção internacional e a atenção mediática dada

a um qualquer atentado cometido em solo europeu — e o escândalo que isso provoca do ponto de vista

internacional — e a atenção dada a centenas ou milhares de pessoas a serem mortas, nos mesmos termos, por

organizações terroristas em Moçambique. É isso que não podemos permitir. Essa atenção tem de ser igual, tem

de ser maior, tem de ser uma preocupação real. A União Europeia tem mecanismos de estabilização, de paz e

de segurança na sua relação com África. Portugal vai assumir a Presidência e, portanto, o que propomos é que

Portugal coloque, claramente, esta matéria na agenda da Presidência europeia e o que pedimos hoje ao

Parlamento é um apoio inequívoco para que este seja um tema importante da próxima Presidência da União

Europeia, assumida pelo Governo português.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há mais de dois meses, neste Hemiciclo, num debate prévio a um Conselho Europeu, disse ao Primeiro-Ministro que era urgente uma

resposta da União Europeia ao conflito em Moçambique e que Portugal deveria liderar esse processo. Mas, para

além da muito recente visita do Ministro da Defesa a Moçambique, não vi nada mais ser feito sobre esta matéria,

apesar dos avisos, apesar das notícias frequentes que a todos preocupam e chocam.

Moçambique pediu, oficialmente, ajuda humanitária e militar à União Europeia, porque não consegue travar

a escalada de grupos armados que estão a espalhar o terror na zona norte do país. Portanto, espero que alguns

à esquerda não venham agora dizer que ajudar Moçambique é uma nova forma de imperialismo ou colonialismo,

quando não é mais do que humanismo. É um país que nos é próximo, membro da CPLP, com milhares de

mortos e centenas de milhares de deslocados, a pedir-nos ajuda, e estou certo de que ninguém nesta Casa

deseja mais mortes de pessoas, mais abusos dos direitos humanos e mais destruição de infraestruturas.

Por isso, para a Iniciativa Liberal é claro que Portugal e a Europa têm o dever de ajudar Moçambique, usando

os devidos canais diplomáticos, incluindo a relação com a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral.

Portugal deve liderar esse processo, especialmente agora, que assumirá a Presidência do Conselho da União

Europeia. Liderar é isto: tomar a iniciativa, a nível europeu e global, e correr riscos em nome dos direitos

humanos de todos os moçambicanos. Por isso, a Iniciativa Liberal irá votar a favor das propostas hoje

apresentadas.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Nunca foi a esquerda que fechou portos a refugiados! Tem de procurar na bancada ao seu lado!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Carvalho, do PSD.

O Sr. Nuno Miguel Carvalho (PSD): — Sr. Presidente, começo por cumprimentá-lo a si e às Sr.as e Srs. Deputados.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta matéria é fundamental para o País, porque Portugal concentra

grande parte da sua ajuda pública ao desenvolvimento, da sua cooperação e da sua política bilateral nos PALOP

(Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa).

É preciso sublinhar que Moçambique tem sido dos países que mais apoios tem recebido de várias

instituições, como do Instituto Camões e da Fundação Aga Khan, que tem uma delegação em Moçambique e

que tem desempenhado um papel crucial. O Instituto Camões tem também desenvolvido um trabalho muito

importante em Moçambique, tal como outras entidades têm desempenhado um papel de grande valor ao nível

da cooperação e de ajuda ao território moçambicano.

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A ajuda tem de ocorrer mediante o pedido de um Estado soberano e Portugal deve responder em função

desse pedido. É, pois, crucial que Portugal utilize os instrumentos que tem ao seu dispor, como o Instituto

Camões ou como a SOFID (Sociedade para o Financiamento do Desenvolvimento), que tem desenvolvido

projetos muito importantes para o financiamento e apoio de empresas portuguesas que criam riqueza e que, em

termos simples, capacitam a população através do acesso à literacia, à saúde e a um maior rendimento.

A falha no acesso a estes níveis socioeconómicos é o que causa situações que permitem atos como estes,

que se vão instalando e incrementando, ganhando uma escala e uma dimensão evidentemente preocupantes.

Este Parlamento dá hoje um importante sinal de uma disponibilidade histórica de Portugal que esperamos

possa corresponder através dos instrumentos que existem, porque esses instrumentos de cooperação são

fundamentais não só para poder ajudar a médio e longo prazo mas também para garantir que não voltemos a

esta mesma situação.

Pena é que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros não tenha dado esse sinal quando aqui esteve aquando

da discussão do Orçamento do Estado e tenha apenas feito comentários sobre a política nacional. É muita pena

ter-se perdido essa oportunidade, e muito bem está hoje este Parlamento, enquanto órgão de soberania, ao

fazer a presente discussão para corrigir essa falha no que é uma política histórica na cooperação que Portugal

tem com Moçambique e que é fundamental reforçar a cada passo.

É essencial que Portugal olhe também para a Presidência da União Europeia e consiga manter esta rota de

importância nos PALOP. É fundamental que Portugal o faça em cooperação com Moçambique e através das

instituições que tem no terreno e que são muito valiosas no sentido da vontade de a União Europeia alargar a

sua ótica de intervenção em Moçambique através da cooperação delegada.

Muito bem, pois, esteve este Parlamento. Infelizmente, outros estiveram muito mal e desajustados face à sua

intervenção no Parlamento.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alexandra Vieira, do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Alexandra Vieira (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Cabo Delgado está, desde há três anos, sob ataque de insurgentes. A violência tem provocado uma crise humanitária, e já há a lamentar 2000

mortes e 500 mil pessoas deslocadas. Sem habitação, sem alimentos, apenas com a roupa que trazem no corpo,

as pessoas concentram-se junto da capital da província.

A complexidade da situação e as graves violações dos direitos humanos resultam da ação de diferentes

grupos armados: extremistas religiosos, contrabandistas, unidades e forças de segurança do Estado, empresas

de segurança privada ao serviço das grandes empresas extratoras de gás, rubis, ouro e grafite. Há ainda a

presença de mercenários internacionais, como o Grupo Wagner.

A província é apetecível por causa dos recursos naturais. As companhias mais poderosas dos países mais

ricos já porfiam a exploração das reservas de gás.

África já foi dada como o continente perdido. É mais do que certo que guerras, ditaduras, plutocracias,

nepotismos, fomes, doenças, epidemias são consequências da colonização, que nunca reconheceu os povos e

as nações.

Milhões de pessoas foram escravizadas ao longo de mais de cinco séculos e usadas como mão de obra nas

grandes plantações do continente americano. Só este facto já deveria dar direito a reparações aos povos

africanos para todo o sempre.

O advento da industrialização exigiu a posse de territórios em África. As riquezas naturais são extraídas

utilizando mão-de-obra local barata, de uma população que vive de um modo já distante dos ancestrais.

Depois da independência, o continente continua apetecível para parte dos países mais ricos e para grandes

empresas. O saque continua até aos dias de hoje e quase nada reverte para as populações.

A mortalidade infantil é assustadora, faltam cuidados básicos de saúde e a fome grassa. Muitos fogem da

fome e da guerra e buscam locais onde possam criar os seus filhos. Ironicamente, os locais mais seguros estão

nos países que se desenvolveram à custa da exploração das suas riquezas.

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Este facto deveria pesar nas consciências de todos os decisores. Há uma dívida imensa para com os povos

de África, mas continuamos a considerar que tudo o que aconteceu após a descolonização é culpa dos africanos.

É possível que este saque continue eternamente sem que as populações reajam? Não é. Moçambique é o

sétimo país mais pobre do mundo. Cabo Delgado é a província mais pobre de Moçambique. Os insurgentes

atuam sobretudo junto dos jovens, que, sem esperança numa vida melhor, se deixam seduzir.

Para o Bloco de Esquerda, a solução tem de ser encontrada no multilateralismo, no âmbito da comunidade

internacional, de pendor humanitário e com medidas de prevenção e de mediação de conflitos.

A União Europeia tem de exercer o controlo das empresas que operam na região, no âmbito da transparência

da indústria extrativa.

A força das armas pode resolver o episódio de violência que ocorre na região, mas será sempre uma solução

temporária.

A solução definitiva passa por medidas estruturais e planeadas com o Governo moçambicano, tais como um

plano de desenvolvimento que tenha como condição que uma parte substancial da riqueza gerada pela

exploração do gás fique na região e seja investida na melhoria das condições de vida, assim como a criação de

um fundo destinado às gerações atuais e vindouras de Moçambique que acabe de vez com a pobreza.

A comunidade internacional deve assumir a responsabilidade histórica e tem de ter uma resposta eficaz de

longo prazo para o desenvolvimento em África, reparando séculos de exploração de pessoas e de recursos.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Pisco, do PS.

O Sr. Paulo Pisco (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Desde há muito tempo que o Grupo Parlamentar do PS considera que a situação na província de Cabo Delgado não pode ser ignorada pela

comunidade internacional. Mas também consideramos que a abordagem de um problema tão complexo e

sensível como este exige a devida sobriedade diplomática no respeito pela soberania de Moçambique, o que

parece que nem sempre é bem compreendido por alguns.

Moçambique é um país irmão, membro da CPLP, com o qual Portugal tem uma amizade profunda.

Conhecemo-nos bem e por isso somos parceiros privilegiados na cooperação para o desenvolvimento em vários

domínios e temos cimeiras bilaterais regulares. E Moçambique sabe que pode contar com Portugal, que sempre

tem sido um seu ativo defensor nas instâncias internacionais, muito particularmente na União Europeia.

Nada do que acontece neste país nos é estranho, onde também devemos realçar a importante comunidade

portuguesa que merece igualmente toda a atenção.

Por isso, à medida que surgiam as notícias de ataques terroristas no norte de Moçambique, sobretudo desde

há três anos a esta parte, fragilizando populações já de si com vidas muito precárias, a perceção sobre a

necessidade de apoiar Moçambique foi-se tornando cada vez mais inadiável.

A situação é dramática e desenrola-se em várias frentes, mas as que suscitam maior preocupação são: a

expansão territorial da ameaça jihadista, com os seus métodos bárbaros que massacram populações e destroem

aldeias, e a grave crise humanitária que esses ataques têm provocado, fazendo já cerca de 2000 mortos e cerca

de meio milhão de deslocados.

Causa também muita preocupação a participação de insurgentes estrangeiros, que faz recear uma

internacionalização do conflito, a crescente sofisticação do seu material bélico e das táticas de combate, a

ameaça à integridade e à soberania do Estado moçambicano, os interesses ilegítimos que se cruzam no terreno,

a violação dos direitos humanos ou as limitações à liberdade de imprensa, tudo questões já perfeitamente

identificadas quer pela União Europeia quer pelas Nações Unidas.

É natural, portanto, que haja cada vez mais vozes a manifestar a sua preocupação que não devem ser

ignoradas, seja das autoridades religiosas, como o bispo de Pemba, ou das organizações da sociedade civil em

Cabo Delgado e no resto do país.

Os apelos das Nações Unidas, da União Europeia, de Portugal, de outros países e de outras organizações

regionais pretendem tão-só ajudar a parar a barbárie e o sofrimento de muitos moçambicanos sem nunca pôr

em causa o respeito pela soberania do país.

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É necessário, por isso, que haja um esforço concertado da comunidade internacional e estruturado em várias

frentes, tanto em termos de segurança como de desenvolvimento e apoio humanitário.

Os vários países e organizações regionais podem dar o seu contributo, e também a CPLP deve ter um papel

relevante a desempenhar, como de resto já o assumiu na última reunião dos ministros dos negócios

estrangeiros. Esta concertação é fundamental e urgente para evitar que a instabilidade alastre no país e a nível

regional.

O terrorismo internacional já atinge de maneira dramática outros países limítrofes, como a Somália, o Quénia

ou a Tanzânia. E, por isso, a situação é muito perigosa e muito preocupante.

Gostaria ainda de sublinhar que foi da maior importância que o Governo moçambicano tenha decidido pedir

formalmente ajuda à União Europeia, numa carta datada de 16 de setembro, o que abriu claramente as

perspetivas de apoio da comunidade internacional.

O Primeiro-Ministro António Costa transmitiu recentemente ao Presidente Nyusi a disponibilidade para apoiar

bilateralmente e, no quadro da União Europeia, nos esforços de combate ao terrorismo em Cabo Delgado. Há

uma semana, o Ministro da Defesa Nacional, João Gomes Cravinho, numa deslocação a Moçambique,

assegurou que, a partir de janeiro, ao abrigo da cooperação na área da defesa, será enviada uma equipa de

militares para dar formação em vários domínios táticos às forças de segurança e defesa moçambicanas, com o

único objetivo de ajudar as autoridades a exercer a sua soberania, sem soldados no terreno.

Por isso, não devem existir quaisquer dúvidas de que, para o Governo português, é uma prioridade apoiar

Moçambique no combate ao terrorismo, no domínio humanitário e noutras áreas de cooperação, mobilizando

todos os recursos diplomáticos ao seu dispor, obviamente a começar pelo imprescindível apoio que pode ser

dado pela União Europeia, tal como será, inevitavelmente, uma das prioridades da Presidência portuguesa da

União Europeia, como, de resto, já está determinado. O próprio alto representante para a política externa, Josep

Borrel, pediu já ao Ministro Augusto Santos Silva que se deslocasse a Moçambique, em representação da União

Europeia, para definir melhor as formas de cooperação.

Portugal não se esquece de Moçambique nem deixará que a comunidade internacional o faça. Sempre, mas

sempre, no respeito pela sua soberania, estaremos na linha da frente para apoiar este país irmão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A situação que se passa em Moçambique é dramática. Mas enquanto nos perdemos na discussão sobre se devemos agir mais rápido ou

menos rápido deveríamos colocar os olhos numa imagem de terroristas armados, à porta de uma esquadra, a

dizer «tomámos o controlo da esquadra, em breve tomaremos o controlo do país». E aqueles que discutem hoje

se devemos ou não ter tropas no terreno, se devemos honrar ou não compromissos históricos ou os que dizem

que a culpa é da colonização europeia deveriam olhar para o exemplo da Síria e do Iraque para saber que,

quanto mais tarde agirmos nesta matéria, maior a machadada que podemos dar na humanidade.

Quando a crise começou na Síria, uns disseram «é melhor não intervir, é melhor respeitar o Governo de

Bashar Al-Assad». E o que aconteceu foram cinco anos de luta interminável, que só terminou quando uma

coligação armada pôs fim ao grupo Daesh. Não foi nem a Síria nem o Iraque que puseram fim ao Daesh, foi

uma coligação de forças europeias e norte-americanas que pôs fim ao terrorismo na região.

Temos uma responsabilidade histórica e não podemos permitir que num país de língua portuguesa se instale

um novo foco de terrorismo em todo o continente. A história não nos perdoará se, enquanto discutimos —

compromissos ou soberania? —, os terroristas forem tomando mais controlo do país e lançando as suas ferozes

garras sobre a economia, o tráfico de droga e o contrabando.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente.

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Não teremos duas oportunidades. Portugal não deve só dizer, deve liderar antes que outros o venham fazer

e assumir essa vitória.

É tempo de agir em Moçambique, e devemos fazê-lo já!

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira, do PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em nome do Grupo Parlamentar do PCP, começo por expressar o nosso mais absoluto repúdio pela ação terrorista, pelos bárbaros assassinatos,

pela brutalidade de massacres que têm fustigado a população da província de Cabo Delgado, em Moçambique.

Trata-se de uma situação humanitária verdadeiramente dramática, com centenas de milhares de deslocados no

País, com populações em fuga nas condições mais difíceis do ponto de vista humano e com a difícil circunstância

de se pintar o futuro com cores de muito pouca esperança para milhões de cidadãos em Moçambique.

Por isso, queremos também expressar a nossa solidariedade para com o povo moçambicano e para com as

suas instituições políticas e autoridades nacionais, não esquecendo o esforço que têm feito na identificação das

linhas de intervenção em torno deste problema, para que verdadeiramente se ponha fim a esta ação terrorista

e desestabilizadora e à crise humanitária que enfrentam. Assim, o povo moçambicano poderá, de facto,

encontrar uma perspetiva de desenvolvimento, de progresso e de paz para o seu futuro.

O Estado português tem a obrigação de afirmar a sua disponibilidade para corresponder aos apoios que lhe

sejam solicitados pelo Estado moçambicano e parece-nos que essa deve ser a primeira premissa para abordar

as soluções que têm de ser encontradas para este problema.

É fundamental, nesta fase, o estreitamento dos laços políticos e diplomáticos entre o Estado português e o

Estado moçambicano e entre o Governo português e o Governo moçambicano, pois permitirão encontrar a linha

de cooperação e de solidariedade internacional que deve ser levada à prática de modo a garantir uma resposta

que trave aquela situação que se está a viver e que permita criar condições para que o povo moçambicano e,

em particular, o da província de Cabo Delgado, possa ter a paz assegurada, bem como condições para o seu

desenvolvimento, o seu progresso e para a justiça social com que desejam construir o seu futuro.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, queríamos expressar a nossa preocupação relativamente a dois

aspetos que nos parecem centrais nesta situação que se vive na província de Cabo Delgado e que, de resto,

não são exclusivos nem da situação que lá se vive nem da situação que se vive noutros países, infelizmente,

do continente africano.

A primeira preocupação tem a ver com os apetites pelas riquezas naturais de Moçambique e pelos interesses

económicos que por detrás deles se movem e que podem estar na origem desta ação terrorista que vem sendo

desenvolvida já há algum tempo, sendo que também poderão estar a aproveitar-se dela como pretexto para a

instalação de uma situação que, na prática, permita a apropriação das riquezas naturais de Moçambique contra

os interesses do povo moçambicano.

Se na origem desses interesses houver uma posição de aproveitamento da desestabilização que resulta

desta ação terrorista, a nossa preocupação tem de ser assegurada para que a intervenção dirigida a este

problema não se transforme, afinal, na concretização desses objetivos, em prejuízo dos interesses da soberania

do povo moçambicano.

Por outro lado, a segunda preocupação tem a ver com os apetites políticos que, lamentavelmente, já estão

à vista, isto é, com o aproveitamento desta situação para o combate político e partidário dentro de Moçambique,

a partir da ação externa a Moçambique.

São múltiplas as circunstâncias em que encontramos dirigentes políticos, dirigentes partidários, responsáveis

políticos — não só em Portugal, mas pelo mundo fora —, que, procurando utilizar a abordagem a este problema

criado na província de Cabo Delgado, não deixam de ir afirmando alguma tentativa de intervenção interna na

situação política e partidária de Moçambique, o que, naturalmente, da nossa parte, merece inteiro repúdio.

Para concluir, gostaria de dizer que o sentido das preocupações expressas nas iniciativas apresentadas pelo

CDS e pelo PAN não suscita objeção da parte do PCP, mas consideramos que devia ficar referida a

circunstância de, havendo ações a desenvolver, ser considerado o respeito pela soberania do povo

moçambicano e pelas suas instituições políticas. Não nos parece que isso seja difícil de introduzir na redação

das iniciativas, caso baixem à especialidade.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Meireles, do PSD.

A Sr.ª IsabelMeireles (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Recordo que o PSD foi o primeiro partido, neste Parlamento, através de um projeto de resolução, a recomendar ao Governo que sensibilizasse a União

Europeia no sentido de ser ativada, com urgência, a cooperação humanitária na luta contra o terrorismo em

Moçambique.

O Sr. Nuno Miguel Carvalho (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª IsabelMeireles (PSD): — Esse projeto de resolução foi aprovado a 13 de julho deste ano. Infelizmente, esta iniciativa caiu completamente em saco roto, porque o serviço de ação externa da União

Europeia e o seu alto representante, Josep Borrell, recentemente interpelado pelos parlamentares europeus,

disse que não tinha tido tempo para ir a Cabo Delgado, disse que não sabia quais eram os recursos que

poderiam ter sido enviados para a região e disse que não fazia mesmo ideia de qual era a situação lá. E delegou,

assim, esta missão no Ministro dos Negócios Estrangeiros português, no âmbito da Presidência portuguesa do

Conselho, que esperemos que dê a devida atenção a esta crise.

De facto, como já aqui foi dito, esta situação é extraordinariamente grave. As mulheres e as crianças são as

principais vítimas, com mortes, com violações todos os dias. Jovens sem esperança são recrutados pelo

terrorismo islâmico radical e pessoas estão a ser expulsas das suas aldeias. Há muitos milhares de refugiados,

tal como milhares de pessoas deslocadas.

A crise sanitária é brutal. Não há equipas logísticas da União Europeia, não há médicos da União Europeia.

Malária, cólera, COVID — é tudo aquilo que parece existir. Não há sequer alojamento, não há ajuda para levar

a Cabo Delgado. A União Europeia não pode votar Moçambique ao ostracismo, tem de ter consciência de que

esta crise existe há mais de três anos e só agora está a ser remetida para o palco mediático.

Invetivamos, assim, a Presidência portuguesa a fazer a sua parte, porque o povo moçambicano vive, de

facto, dias dramáticos, vive uma crise humanitária, sanitária e de segurança brutal. Por isso, iremos votar

favoravelmente estes projetos de resolução, mas basta de banalidades políticas e de disfarce de ação. É preciso

agir já, com meios, com vontade política e, sobretudo, com sensibilidade humana.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Vamos passar à fase de encerramento deste debate. Tem a palavra, para o efeito, o Sr. Deputado Telmo Correia, do CDS-PP.

O Sr. TelmoCorreia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pretendo dizer, de uma forma muito breve, que o facto de termos colocado este assunto na agenda demonstra a nossa preocupação. E, tendo sido

o CDS o primeiro partido a apresentar uma iniciativa sobre este tema, registo o consenso parlamentar que aqui

se gerou, de todas as bancadas que tivemos ocasião de ouvir, em relação a um assunto que realmente é

importante e fundamental.

Importa que olhemos para o exemplo de outros países que têm laços de língua, laços históricos e outros

laços com países africanos. Por exemplo, quando estão em causa questões relacionadas com a francofonia

elas não deixam de estar na agenda, inclusive é forçada a agenda internacional, obrigando a que essas matérias

sejam discutidas. E isso é o que Portugal pode fazer em relação aos nossos irmãos de Moçambique, como fez

quando foram atingidos por uma tempestade e por uma intempérie recentemente. Aí Portugal foi um catalisador

de apoio e de ajuda.

Com todas as diferenças e paralelismos que podemos estabelecer, não esqueçamos que foi Portugal,

quando houve a situação de Timor-Leste, de que estamos bem recordados, que colocou essa questão na

agenda internacional e foi Portugal que ajudou a que ela fosse resolvida.

É o que podemos fazer agora em relação a Moçambique, é o que se pede ao Governo português. De facto,

as boas intenções não são suficientes, é preciso passar à ação, e a Presidência portuguesa do Conselho da

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União Europeia é uma enorme oportunidade para isso. É que, coincidentemente, no momento em que este

assunto está tão dramático e tão grave, Portugal assumirá a Presidência e poderá colocar esta questão na

agenda, devendo deixar claro — como o fez o Bispo de Pemba, uma voz muito importante nesta matéria — a

dramaticidade da situação. De facto, esta não é uma questão religiosa, mas tem, obviamente — e aí estaremos

todos de acordo —, apetências várias sobre as riquezas deste país, aproveitando as próprias fragilidades.

Temos de ajudar as autoridades moçambicanas a terem meios e capacidade de resposta. É isso que se pede

e não o contrário. Não estamos a falar de uma intervenção externa, feita por quem não conheça ou não queira

compreender a realidade; estamos a falar de como é que podemos ajudar as autoridades moçambicanas a lidar

com este problema.

Da parte do CDS, atendendo ao último repto do Sr. Deputado João Oliveira, não existe nenhuma limitação a

que se refira, no diploma, o absoluto respeito pela soberania do Estado moçambicano e que se coloque essa

questão na essência da Presidência portuguesa. Portanto, para nós, não há qualquer problema.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Concluímos, assim, o debate sobre estes projetos de resolução, que serão votados no período regimental de votações.

Vamos passar ao quarto ponto da nossa ordem de trabalhos, que consiste na apreciação, na generalidade,

do Projeto de Lei n.º 169/XIV/1.ª (PAN) — Determina a declaração da filiação ou ligação a organizações ou

associações «discretas» em sede de obrigações declarativas (segunda alteração à Lei n.º 52/2019, de 31 de

julho).

Para a apresentação deste projeto de lei, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva.

O Sr. AndréSilva (PAN): — Bom dia, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados. Hoje, o PAN traz a debate mais uma proposta que procura fazer um caminho no sentido de deixar claro que

os cidadãos podem confiar na neutralidade e independência dos seus representantes face aos interesses

privados que se cruzam com o interesse público.

O que queremos é que se crie um novo campo de preenchimento facultativo que permita aos titulares de

cargos políticos e altos cargos públicos declarar no seu registo de interesses a filiação em organizações

maçónicas.

No que toca à filiação em organizações maçónicas, a legislação em vigor traduz-se num verdadeiro convite

à indiferença. Isto porque, embora exista um campo aberto, que, em teoria, tudo permite declarar, na prática, o

facto de não existir uma orientação clara quanto às questões a declarar nessa sede faz com que, em regra, esse

campo acabe por ficar vazio, não sendo mencionada a filiação maçónica.

Mas vamos a casos práticos. Na atual Legislatura, segundo uma investigação jornalística, apenas um

Deputado declarou a sua pertença à Maçonaria e fê-lo por imposição legal, por estar em causa a pertença a

órgãos sociais. Mas, noutras legislaturas, a história repete-se. João Soares, um Deputado assumidamente

maçon, nas XII e XIII Legislaturas não declarou essa sua filiação no tal campo aberto e o mesmo sucedeu na

XII Legislatura com Rui Paulo Figueiredo, um Deputado que, inclusivamente, concorreu a grão-mestre de uma

loja maçónica.

Casos como estes sucedem não por uma vontade de opacidade mas por insuficiência do atual quadro legal,

e esta insuficiência obriga-nos a agir. Assim, o PAN traz hoje a debate uma proposta que se inspira no modelo

existente no Reino Unido e que inclusivamente foi reclamada por importantes nomes da Maçonaria, tais como

João Cravinho.

António Arnaut, nome histórico do regime democrático e da Maçonaria, defendeu que um maçon deveria

revelar a sua filiação de forma voluntária, tal como agora o PAN procura permitir. Mário Martin Guia, antigo grão-

mestre da Grande Loja Legal de Portugal, defendeu que, e passo a citar, «nas sociedades democraticamente

mais evoluídas, os maçons não têm qualquer dúvida em manifestar a sua qualidade de maçon».

A proposta do PAN é responsável, uma vez que não sobrecarrega com novas competências a entidade da

transparência, algo que ocorreria se houvesse a obrigação de declaração de filiação em todas as associações.

A proposta do PAN assegura o pleno respeito pela Constituição, já que não pretende alterar o funcionamento

destas organizações, proibir a participação de políticos nas mesmas ou obrigar à publicitação da filiação. Apenas

quer assegurar a criação de um incentivo adicional à transparência.

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Como afirmou Jorge Miranda, um dos pais da nossa Constituição, a proposta do PAN é constitucional e

consagra «uma exigência de ética republicana», que concretiza um «princípio geral de transparência que deve

dominar a vida política».

A proposta do PAN é útil, porque, conforme afirmou Vital Moreira, em apoio a esta proposta, a «integração

de ‘irmandades’ com alto grau de solidariedade pessoal entre os seus membros constitui um risco sério para a

isenção e a imparcialidade no exercício dos cargos públicos».

A proposta do PAN dá resposta às preocupações expressas, da esquerda à direita deste Parlamento, ao

longo dos anos, sobre a insuficiência do atual quadro legal e a necessidade de aprofundar a transparência da

filiação maçónica dos titulares de cargos políticos: no PSD, pela mão de Teresa Leal Coelho, que foi pioneira

no alerta para esta questão; na esquerda, Jerónimo de Sousa e Francisco Louçã defenderam a transparência

da filiação maçónica dos titulares de cargos políticos; no PS, Santos Silva foi até mais longe e disse que quem

não estiver em condições de poder revelar este tipo de interesses não tem condições para o exercício de cargos

políticos. Tivemos no passado, inclusivamente, posições de Marcelo Rebelo de Sousa e de Ana Gomes, os dois

principais candidatos às próximas eleições presidenciais, no sentido da defesa deste aprofundamento de

transparência.

Estas ideias e preocupações têm agora a oportunidade de ser efetivadas sob a forma de lei. É sabido que

há oportunidade de se realizar uma discussão aprofundada e de se introduzirem melhorias em sede de

especialidade. Por isso, só por falta de vontade política, sectarismo ou aversão à mudança é que o Parlamento

poderá inviabilizar esta proposta que o PAN traz à discussão.

Durante a intervenção, foram projetadas imagens, que podem ser vistas no final do DAR.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, da Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Faço este minuto liberal com o particular à-vontade de quem nunca usou avental fora da cozinha, cilícios em qualquer divisão da casa,

nem mesmo pins na lapela, embora respeite a escolha livre de quem o faz.

As organizações que o PAN pretende abranger com este diploma estão legalmente constituídas e a atual

declaração de interesses para titulares de cargos públicos já impõe — e bem! — que se declare quando se faz

parte de órgãos sociais das mesmas, sejam elas quais forem. Ir mais além passa a linha da transparência e

entra no domínio do voyeurismo.

Mesmo assim, não se percebe bem o alcance da proposta apresentada, que não pretende impor qualquer

obrigatoriedade para além das já existentes, querendo apenas criar um campo de preenchimento voluntário. Se

acham mesmo que o problema é sério, tinham de ter a coragem de tornar o preenchimento obrigatório.

Resta saber o seguinte: quais as associações que se pretende que os titulares de cargos políticos venham

a elencar? O que são as promessas de fidelidade? São a maçons? Opus Dei? Associações de antigos alunos?

Juras de amigos? Associações em que os seus membros fazem raids noturnos, encapuzados, para resgatar

animais? Há secretismos do bem e secretismos do mal?!

Infrações e ilegalidades por parte de entidades secretas, discretas ou patetas devem ser lidadas da mesma

forma, com um Estado competente que atue e puna, quando for caso disso, sem voyeurismos e sem populismos.

Por isso, vamos viabilizar esta iniciativa na expetativa de a melhorar substancialmente na especialidade.

O Sr. Presidente (António Filipe): — O Sr. Deputado José Manuel Pureza, por ocasião do seu 62.º aniversário, que hoje se completa, vai usar da palavra para intervir.

Muitos parabéns, Sr. Deputado!

Aplausos gerais.

Tem a palavra.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Muito obrigado, Sr. Presidente.

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O Sr. João Oliveira (PCP): — É um aniversário discreto!

O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Um aniversário discreto!

Risos.

Ontem, o Sr. Presidente, na justificação de um pequeno lapso que teve na presidência da sessão, referiu-se

à sua provecta idade e eu não pude deixar de sorrir com inveja. A inveja fica agora redobrada e muito lhe

agradeço.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Bloco de Esquerda empenhou-se plenamente nos trabalhos que

conduziram às mais recentes alterações legislativas ao regime do exercício de funções por titulares de cargos

políticos e de altos cargos públicos. Das muitas propostas que aí apresentámos, várias não vieram a ser

aprovadas, com especial destaque para a da regra da exclusividade no exercício das funções de Deputado. Não

só por isso, mas por uma razão de princípio, o Bloco de Esquerda entende que a afinação daquele regime é —

deve ser! — uma tarefa sempre em aberto porque o combate pela transparência em nome de uma democracia

que dê garantias de toda a confiança aos cidadãos tem de ser permanente e de ter a máxima exigência.

A malha dos potenciais conflitos de interesse deve ser concebida com tanta determinação quanta sensatez.

Sendo o bem a defender o da exclusiva dedicação do titular de cargo político ou alto cargo público à defesa do

interesse público, é por demais evidente que a previsão legal dos conflitos de interesse deve ser capaz de atingir

todas as situações em que outras fidelidades possam sobrepor-se àquela.

Há um limite para isso e bem o conhecemos. A determinação que temos de ter para que a lei cubra todas

essas situações de cumplicidade de grupo não pode servir de justificação para leis-medida, que visam pôr no

alvo algumas entidades concretas e não outras, disfarçando essa estratégia atrás de conceitos indeterminados.

Entendamo-nos bem: o conceito de «sociedades discretas» é um eufemismo para falar de Maçonaria e de

Opus Dei, e, ao usá-lo, o projeto do PAN perde ambição, porque estreita o campo que deve ser coberto. As

lealdades que colidem com o primado absoluto do interesse público estão muito longe de se limitar à filiação

formal numa dessas duas entidades. Há uma malha imensa de relações, formais umas, informais a maioria, em

que se geram culturas de proteção preferencial e de defesa de soluções em que o grupo se sobrepõe à

democracia. De sociedades de advogados a clubes de futebol, passando por tantas outras entidades, há redes

de afinidade ou mesmo de cumplicidade que, na sua informalidade, são o verdadeiro fundamento de muitas

propostas e de muitas decisões.

A limitação desta proposta do PAN às chamadas «sociedades discretas» é, por isso, redutora da ambição

que devemos ter para proteger a democracia da sua captura por grupos de interesse.

Mas há uma segunda escolha deste projeto que lhe rouba força na defesa do interesse público. Entre a

obrigação de declarar a filiação nas chamadas «sociedades discretas» e a faculdade de o fazer ou não, o PAN

escolheu esta, uma escolha que se arrisca a ser inócua. Primeiro, porque a legislação em vigor já contempla a

faculdade de o titular de cargo político ou alto cargo público declarar voluntariamente outros vínculos para além

dos cargos sociais que exerça e que sejam suscetíveis de gerar incompatibilidades ou impedimentos previstos

na lei. Depois, porque, ao deixar ao critério de cada um declarar ou não essa filiação, não garante ganhos de

transparência e talvez garanta perdas de bom nome a quem, não sendo membro dessas sociedades, não

declare por isso nada, ficando, apesar disso, envolto em suspeitas lamacentas que a faculdade enunciada ajuda

a alimentar.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, concluo dizendo que o Bloco de Esquerda está do lado daqueles que

são coerentes na luta pelo primado do interesse público e contra a opacidade e o não controlo de laços e de

pertenças que o ponham em causa. Estamos do lado da máxima exigência a este respeito e, por isso, caso

venha a haver trabalho de especialidade desta iniciativa, o Bloco apresentará propostas que afastem dela

redundâncias e lhe acrescentem ambição e eficácia. A posição final que viermos a adotar está condicionada

pela incorporação dessas melhorias que consideramos imprescindíveis.

Aplausos do BE.

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O Sr. Presidente (António Filipe): — Srs. Deputados, apelo aos grupos parlamentares que queiram intervir que se inscrevam.

Pausa.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente: Esta proposta do PAN tem dois alvos preferenciais, que são, naturalmente, a Maçonaria e o Opus Dei. E, se era esse o objetivo do partido, resta fazer a seguinte pergunta,

à qual o PAN deveria hoje responder: por que não colocar como obrigatória essa menção?

Se ultrapassados os problemas de constitucionalidade, já referidos por reputados juristas, então, era o

momento de o PAN avançar, se quisesse mesmo fazer a diferença, e obrigar a que ficasse claro na declaração

se há, ou não, pertença a organizações discretas. Mas também convinha definir o que eram essas organizações

discretas, porque todos sabemos em que é que vai dar dizer simplesmente «organizações discretas». Vai dar

em absolutamente nada, porque ninguém vai considerar que a organização a que pertence é discreta!

Portanto, o projeto que aqui temos é absolutamente inócuo e, como foi dito ainda agora, ainda por cima, já

está prevista na atual declaração a possibilidade de fazer registo de pertença a outras entidades.

Vamos ser claros: esta era uma grande iniciativa do PAN que, provavelmente pela aproximação ao Partido

Socialista, se tornou numa iniciativa inócua do PAN, porque, todos sabemos, o Partido Socialista não quer que

esta menção seja obrigatória no registo de declaração feito na Assembleia da República.

Sr. Deputado André Silva, desafio-o a alterar a sua proposta de modo a que possa obrigar todos os membros

desta Casa a declarar se pertencem, ou não, a organizações discretas.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou concluir, Sr. Presidente. Mas vá mais longe, Sr. Deputado, e permita que na sua proposta se refiram todas as organizações, não só

a Maçonaria e o Opus Dei. Se calhar, talvez algumas associações e organizações animalistas lá possam estar

e talvez o Sr. Deputado possa também, eventualmente, inscrever-se.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Luís Ferreira, do PEV.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PAN apresenta-nos para discussão uma iniciativa legislativa propondo uma alteração à Lei n.º 52/2019, de 31 de julho, que estabelece o

regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos.

Ao olharmos para a designação ou para o título deste projeto de lei, que, segundo os autores, determina a

declaração da filiação ou ligação a organizações ou associações discretas, em sede de obrigações declarativas,

ficamos com a perceção, a nosso ver errada, de que o regime atualmente em vigor, ou seja, a Lei n.º 52/2019,

não prevê a possibilidade de declaração da filiação ou ligação a organizações ou associações discretas, em

sede dessas obrigações declarativas. Mas a verdade — facto, aliás, reconhecido pelos próprios autores da

iniciativa, como, de resto, se pode constatar na própria exposição de motivos — é que a Lei n.º 52/2019 já prevê

a existência de um campo para a menção de atividades suscetíveis de gerar incompatibilidades e impedimentos.

Se é verdade que o regime atual atribui uma natureza facultativa à menção dessas atividades, também é

verdade que esta proposta mantém, nessa matéria, o essencial ao nível dessa natureza facultativa. Ou seja,

atualmente, essa referência é facultativa e, com a proposta que estamos a discutir, facultativa continua. Por isso,

a nosso ver, o projeto de lei não determina coisa alguma, o que faz é alterar a forma de se fazer uso dessa

menção, que, recordo, continua a ser facultativa nesta proposta do PAN.

Quanto ao resto, acompanhamos as preocupações do PAN relativamente às considerações e até à

motivação desta proposta, mas também quanto à necessidade de reforçar a transparência em sede de

cumprimento das obrigações declarativas dos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos. Apesar

dos avanços que têm sido dados nesta matéria, nomeadamente através do Código de Conduta dos Deputados

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à Assembleia da República, mas não só, a defesa da transparência no exercício de funções públicas é um

caminho que importa e se impõe continuar por todos os motivos e até por uma cultura de responsabilidade

democrática. Uma defesa, aliás, que é ou deve ser um dever central num Estado de direito democrático.

Portanto, face ao que fica dito, temos muitas reservas sobre o contributo real e efetivo desta proposta no que

se refere à transparência que deve nortear o exercício de cargos políticos e de cargos públicos. Essas reservas

não decorrem do facto de a proposta consagrar um campo autónomo para a menção negativa da filiação em

associações ou organizações discretas, no âmbito da declaração única de rendimentos, património, interesses,

incompatibilidades e impedimentos, mas, sim, pelo facto de essa proposta manter a natureza facultativa dessa

referência ou menção.

De qualquer forma, dando o benefício da dúvida, Os Verdes não votarão contra esta proposta do PAN.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Apelo aos Srs. Deputados presentes que ainda não tenham tido oportunidade de se registar que o façam, para que se proceda à verificação final do quórum, embora tenhamos

já quórum mais do que suficiente.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta iniciativa do PAN é um contributo para uma reflexão que devemos procurar continuar a fazer em torno das condições que garantam a máxima

transparência possível no exercício de cargos políticos e altos cargos públicos. Diria que essa reflexão nunca é

negativa, mesmo que não haja concordância com as iniciativas propostas.

Naturalmente, há situações que têm de balizar a discussão que estamos a fazer, porque julgo que alguns

dos exemplos dados e das situações concretas trazidas a debate fugiram muito à discussão que teremos de

fazer a partir da proposta do PAN. Situações que constituam a prática de crimes de corrupção, de tráfico de

influências e outras que tais não são objeto desta iniciativa. Essas situações terão de ter o devido combate e

repressão do ponto de vista penal, e é nesse ponto de vista que têm de ser colocadas.

Não é do ponto de vista da transparência que se pode encontrar resposta a problemas criminais, da prática

de corrupção e tráfico de influências, até porque a resposta a esses problemas estaria muito para lá daquilo que

a iniciativa do PAN propõe. Manifestamente, esta iniciativa não seria adequada para combater essas situações,

porque, em termos penais, era preciso muito mais do que o que o PAN propõe.

O que o PAN propõe remete-se a uma outra matéria, que tem que ver com as condições de transparência

no exercício de cargos políticos e altos cargos públicos, o que justifica uma reflexão aprofundada.

Queria, agora, partir para a clarificação de uma interpretação errada, que registei em algumas intervenções

e que acho que deve ser corrigida. Aquilo que já hoje existe não é uma declaração facultativa relativamente às

matérias que o PAN aqui traz, aquilo que hoje existe na obrigação declarativa que já está prevista na lei é uma

declaração obrigatória. Repito, obrigatória! O preenchimento daquele quadro que já hoje existe, nas outras

situações, não tem caráter facultativo, tem caráter obrigatório e refere-se a situações que possam gerar

incompatibilidades e impedimentos.

Portanto, o que hoje existe é a obrigação de preenchimento de um quadro relativo a outras situações que

podem gerar incompatibilidades e impedimentos.

Ora, aquilo que o PAN propõe não se sobrepõe a isto. O que o PAN propõe pode ser, quando muito,

complementar ao que já hoje existe e que é uma declaração facultativa da pertença a determinado tipo de

organizações, que o PAN caracteriza como «discretas», e que vai para lá das incompatibilidades e dos

impedimentos, já não se remete apenas a estes aspetos. Portanto, seria uma declaração que permitiria a

menção, ainda que negativa, à filiação ou à ligação a associações ou organizações que exijam aos seus

aderentes a prestação de promessas de fidelidade ou que, pelo seu secretismo, não assegurem a plena

transparência sobre a participação dos seus associados.

Ainda assim, aquilo que o PAN descreve como uma realidade à qual se aplica esta possibilidade de

declaração não é uma realidade homogénea, é uma realidade, digamos assim, que comporta dois tipos de

circunstâncias relativamente à pertença a determinado tipo de organizações.

Primeiro problema que temos pela frente: a declaração deve ser facultativa ou obrigatória? O PAN apresenta

a solução possível, porque, criando uma obrigação declarativa relativamente a estas situações, dificilmente se

consegue ultrapassar problemas de inconstitucionalidade, que são fáceis de identificar e que, em alguns

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pareceres, nomeadamente o da Comissão da Liberdade Religiosa, já foram identificados. E, sendo facultativa,

a declaração tem sérios problemas de eficácia, que, naturalmente, não podem deixar de ser considerados, tendo

em conta os objetivos que o PAN propõe na sua iniciativa.

Segundo problema: quem pretende o PAN verdadeiramente visar com esta iniciativa? Como se definem as

associações discretas?

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente. Tendo em conta os exemplos que são dados pelo PAN, perguntamos se o PAN não admite incluir no rol de

organizações, uma vez que deu algumas como exemplo, a intervenção e resgate animal, pela organização e

prática que assume.

Para concluir, Sr. Presidente, queria deixar uma última observação, que tem a ver com um problema que

dificilmente pode ser ultrapassado: ou há secretismo e não há declaração, ou há declaração e não há secretismo.

Desse ponto de vista, há uma contradição, de facto, que é insanável nos termos em que o PAN propõe esta

iniciativa.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem mesmo de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.as e Srs. Deputados, não nos opomos aos objetivos que o PAN apresenta relativamente ao reforço das condições de transparência no exercício de cargos políticos e de altos cargos

públicos, mas temos muitas dúvidas de que esta iniciativa deixe de ser um Melhoral — não faz bem nem mal —

, ainda que haja muito caminho a fazer para alcançar mais transparência.

Estamos disponíveis para o debate, se, eventualmente, ele vier a ocorrer em sede de especialidade.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de dizer, em relação a esta matéria, que o objetivo da transparência e o de deixar claro os vínculos existentes e as

obrigações é um objetivo louvável e, portanto, a nossa posição de princípio é a de que tudo o que possa contribuir

para uma maior transparência e uma maior clareza merece, à partida, o nosso apoio e a nossa concordância. E

com um pressuposto que é muito evidente e que passou aqui pela discussão: a transparência, mais do que

proteger as instituições e mais do que tranquilizar a opinião pública, protege os próprios, porque deixa claro o

tipo de obrigações, de vínculos e aquilo que cada um de nós tem. Quem não tem nada a esconder não deve,

de facto, esconder.

Dito isto, é evidente que a proposta tem alguns problemas, logo à partida o de se perceber que organizações

são estas, a quem é que isto se aplica e em que circunstâncias. As próprias organizações assumem que são

secretas ou discretas? É que elas podem dizer que não são. E, a partir daí, pergunto como é que resolvemos o

problema.

O PAN, pela voz do Sr. Deputado André Silva, dirigiu esta questão para a Maçonaria. Mas, Sr. Deputado,

quem faz parte não diz, como é evidente, precisamente pela natureza secreta; quem não faz parte, como é o

meu caso, não sabe muito bem o que se passa lá dentro, precisamente pela natureza secreta. Portanto, estamos

aqui perante um problema que não é fácil de resolver, sendo que, no meu caso — eventualmente, até nem me

fica bem dizer isto, mas é verdade, Sr. Deputado Cotrim de Figueiredo —, nem na cozinha…

Risos do CH, do IL e de Deputados do PSD.

Estou particularmente à vontade para dizer que nem na cozinha uso avental — infelizmente, mas é mesmo

ausência de talento. Aliás, já tentei e não resultou.

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Depois, há outras questões para salientar. Esta proposta também não concretiza da melhor forma o objetivo

a que se propõe. Porquê? Porque, a ser, então que fosse obrigatório, como aqui foi dito. Se não for obrigatório,

também não resolve completamente o problema.

Mais: qual é, de facto, a natureza das organizações? E as outras associações? E os clubes, associações

ambientalistas, animalistas, desportivas, solidárias? Ficam de fora? Também não é muito evidente.

Há, ainda, uma outra coisa que queria deixar claro: para nós — e, isto, sim, seria inconstitucional —, não se

pode envolver nesta matéria, em circunstância alguma, organizações de natureza religiosa. É uma fronteira

intransponível, porque está na Constituição, e, historicamente, percebe-se porquê. Perguntar às pessoas se

perfilham ou não determinada religião é inaceitável, inclusive historicamente, independentemente da confissão

ou da religião a que pertençam. Portanto, neste caso, há uma fronteira.

Por outro lado, a declaração negativa causa-nos alguma confusão. Ou seja, eu, cuja declaração acabei de

fazer — são conhecidas as minhas filiações partidárias e clubísticas, e mais não tenho —, sou obrigado a

declarar que não tenho filiação a organizações ou associações? Não me faz muito sentido, pelo que tenho

algumas dúvidas.

Para terminar, achamos, ainda assim, que a iniciativa é louvável e permite um debate que é importante e

relevante. E que fique aqui muito claro que não será pelo CDS que esta iniciativa não terá aprovação e não

chegará à especialidade. Por nós, esta iniciativa deve ser aprovada e chegar à especialidade, para aí tentarmos

limar estas dúvidas, arestas e dificuldades e chegarmos a uma solução que seja consensual e traga mais

transparência.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate para o qual hoje fomos convocados, através do projeto de lei apresentado pelo PAN, é, efetivamente, importante no quadro daquilo que

deve ser a forma como as instituições parlamentares e as outras instituições públicas encaram a transparência.

Muitas vezes me é dito, até, que tenho fama de ser daqueles que quer ir longe demais na transparência e,

às vezes, «levo na cabeça» do meu grupo parlamentar — penso que não é vergonha nenhuma dizê-lo, pois não

concordamos todos com o nível de extensão a que se chega em determinadas matérias —, pelo que,

seguramente, posso puxar de alguns galões para dizer que não se deve confundir, como o Sr. Deputado João

Cotrim de Figueiredo bem disse, transparência e voyeurismo.

Em matéria de direitos fundamentais, é necessário identificar — e é disso que se trata —, com clareza,

quando operamos restrições e quando as introduzimos na lei e, mais do que isso, é importante conhecer a

História, é importante conhecer o impacto da simbologia que colocamos nas iniciativas que fazemos.

Estranha forma esta de comemorarmos o bicentenário do constitucionalismo, sob o olhar atento de Manuel

Fernandes Tomás, uma obsessão minha nesta Câmara. Não é só o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo

que elogia os liberais de 1820, também eu acho que lhes devemos a construção da democracia e do liberalismo,

a construção do constitucionalismo, a construção da República. Aliás, a iconografia que podemos ver nesta Sala

não é alheia às opções que tomamos e vertemos nas iniciativas legislativas.

De facto, o PAN apresenta-nos uma iniciativa sobre associações secretas ou «discretas». O Sr. Deputado

André Silva — ia chamar-lhe José Cabral, mas corrigi-me a tempo —, quando usou da palavra, deu nota, com

clareza, daquilo que identifica como alvo fundamental da sua iniciativa, que é a Maçonaria, tendo colocado em

cima da mesa argumentos que podem ser atendíveis sobre transparência, sobre a forma de sabermos se

vinculações externas à função parlamentar, ou a qualquer função política, devem ou não ser escrutinadas.

Mas, como já foi dito nesta Câmara por muitos Srs. Deputados, se o objetivo é pôr tudo a nu e em cima da

mesa — toda e qualquer filiação, toda e qualquer possível fonte de um constrangimento ao exercício do mandato

parlamentar —, então, esta iniciativa peca, manifestamente, por defeito. Pergunto onde estão as referências à

filiação clubística, tantas vezes tradutora de uma muito maior irracionalidade, tantas vezes tradutora de um muito

maior conflito de interesses, tantas vezes tradutora daquilo que pior a sociedade portuguesa tem, em

contraponto, eventualmente, com instituições, tenham elas pessoas boas ou más — todas têm, infelizmente, e

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sem excessivo pessimismo antropológico —, sejam elas mais «discretas» ou menos «discretas», sejam elas

partidos, sejam elas instituições da sociedade civil, sejam elas confissões religiosas. Todas, aliás, padecem do

mesmo mal.

Portanto, se o ponto é precisamente este, o de tudo ter de ser absolutamente transparente e ter de se verter

no momento em que se exercem funções públicas, sem qualquer limite, sem qualquer restrição, então que

assuma com coerência isso mesmo e que proponha algo que não é violador do princípio da igualdade,

apontando o dedo especificamente a uma determinada localização, que, obviamente, também não estará isenta

de críticas, como não estão as várias instituições que aqui encontramos.

Aquilo que lemos na exposição de motivos da iniciativa em discussão é, de facto, uma tentativa de construir

um argumentário, que, embora pareça sólido, não é, na realidade. São citados incompatibilidades e

impedimentos, quando, na verdade, na melhor das hipóteses, aquilo que temos em cima da mesa são conflitos

de interesse, porque, como o Sr. Deputado João Oliveira bem apontou, já há um campo obrigatório para

incompatibilidades e impedimentos.

Se não é isso que o Sr. Deputado André Silva pretende, porque não quer proibir coisa nenhuma, então, o

que está aqui em causa é uma matéria de transparência mas ao nível do conflito de interesses. E, se o conflito

de interesses existe, também já é obrigatório que, antes de qualquer intervenção em Plenário ou votação, o

Deputado em causa tenha de identificar esse conflito de interesses. Portanto, não traz nada de novo.

O PAN invocou e projetou na tela, durante a sua intervenção, posições de ilustres pessoas que já se

expressaram no passado sobre esta matéria, como, por exemplo, as do meu camarada António Arnaut, que foi

Grão-Mestre do Grande Oriente Lusitano e que deu nota da obrigação de, voluntariamente, se introduzir essa

filiação.

Mas não confundamos as posições referidas por várias pessoas, aqui mencionadas pelo Sr. Deputado, sobre

o imperativo ético de cada um dar nota daquilo que lhe parece relevante sobre o exercício do mandato, com a

criação de uma obrigação, a fazer constar na lei de forma um pouco estranha, uma vez que é uma obrigação

voluntária e que, ainda assim, é diferente no plano, mais uma vez, da invasão daquilo que pode ser a esfera

privada.

Depois, é referida a legislação sobre os membros do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações

da República Portuguesa, que têm de fazer uma declaração de todas as associações de que são membro e não

especificamente só de algumas. E porquê? Nesse contexto, face à imensa sensibilidade dos temas abordados,

face ao facto de ser fundamental preservar aquela função, entende-se que o equilíbrio de poderes é outro e para

aquela função, para aquela proteção, entendeu-se criar este exemplo concreto de uma declaração e de uma

obrigação identificada por todos.

A indeterminação do conceito é outro problema. O que é «discreto»? O que é secreto? Como é que

conseguimos garantir, agora não a igualdade, a proporcionalidade na forma como esta restrição tem lugar? Ela

é adequada? Ela consegue resolver os objetivos a que se propõe? Ela consegue ser clara e determinável? Ela

é razoável? Temos seríssimas dúvidas de que assim seja.

Finalmente, temos o próprio parecer que a Comissão da Liberdade Religiosa deu sobre esta matéria, que

deve pesar na forma como a encaramos. As dúvidas de constitucionalidade não são de pormenor, não são de

somenos e não são apenas um detalhe, porque, efetivamente, está em causa, naqueles casos em que

expressamente se invocam organizações religiosas, um atentado direto à liberdade religiosa e, noutros, que não

digam respeito a organizações religiosas, tem muito a ver com a consciência individual de cada um, com os

sistemas filosóficos a que se adere.

Então, se há lugar a esta invasão — e uso mesmo esta palavra — da esfera individual de cada um, ela deve

estar bem fundamentada e deve ficar bem comprovada a forma como deve ter lugar.

Portanto, para concluir, neste contexto, perante aquilo que é apresentado, e não descartando a importância

que a transparência tem cada vez mais no nosso dia, não podemos caricaturar a transparência, não podemos

utilizá-la e descredibilizar o esforço que muitos fazem por ela, com iniciativas que ou são inócuas ou que são,

pelo menos, provocatórias e que não têm em conta o real significado da História, tendo o significado negativo

de apontarem a determinados conjuntos da sociedade, a determinados locais, de forma não ad hominem mas

ad institutionem.

Olhemos para aquilo que inspira o legislador em cada momento e tomemos uma decisão ponderada. Por

estas razões, não acompanharemos a iniciativa legislativa apresentada pelo PAN.

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Aplausos do PS.

Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Eduardo Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Coelho Lima.

O Sr. André Coelho Lima (PSD): — Sr. Presidente. Sr.as e Srs. Deputados: O PAN propõe a este Parlamento a segunda alteração à Lei n.º 52/2019, que aprova o regime do exercício de funções por titulares de cargos

políticos e altos cargos públicos, recomendando, sumariamente, que qualquer titular desses cargos que pertença

a associações «discretas», como são designadas no projeto de lei, possa, se assim o entender, informar dessa

circunstância.

Coloca-se-nos, pois, um primeiro prisma de apreciação de âmbito jurídico, porque há quem defenda que a

possibilidade facultativa de comunicação já existe no diploma que se pretende alterar. Não concordamos com

essa perspetiva, mas sejamos francos: mesmo que na lei já existisse a possibilidade de, facultativamente, tal

declaração ser feita, a verdade é que a existência dessa possibilidade não cumpre, manifestamente, a sua

finalidade. A possibilidade de comunicar pode até existir, mas a comunicação não existe, pelo que o escudo

jurídico para não aprovar este projeto de lei não colhe, porque, obviamente, todos percebemos o que com ele

se pretende e todos sabemos que ele pode ser melhorado na especialidade.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, vamos, então, ao âmbito substantivo do diploma, começando pela

apreciação da sua constitucionalidade e, nesta dimensão, contrariamente à dimensão opinativa de que agora

usou o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, vou limitar-me a citar o Prof. Jorge Miranda, cuja autoridade, neste

campo, creio dispensar considerações: «Não vejo nenhuma razão para duvidar da não inconstitucionalidade da

iniciativa. Trata-se, tão-só, de um corolário do princípio geral de transparência que deve dominar a vida política

no âmbito de uma democracia pluralista e aberta, em que nada há a esconder ou a ocultar na esfera pública dos

titulares de órgãos públicos».

Trata-se, aqui, da consagração constitucional de um princípio de meridiana compreensão: quaisquer

matérias que possam ser suscetíveis de enquadrar interesses ou posicionamentos relevantes para julgar a

equidade de um servidor público devem, naturalmente, ser de todos conhecidos.

Aliás, é preciso dizer que, para o PSD, só faz sentido a aprovação deste diploma se a comunicação que com

ele se exige não for meramente facultativa, mas antes obrigatória. Nem se percebe que possa ser de outra

forma! Naturalmente, poder-se-á afirmar que esta obrigatoriedade de comunicação acaba por contrariar a

natureza eventualmente secreta das organizações que assim se pretendam manter. Isso é verdade! Mas a

natureza secreta das organizações não pode servir de escudo aos seus membros.

O Prof. Jorge Miranda, a este propósito, diz-nos, ainda, o seguinte: «Uma coisa é, como bem se sabe, o

direito à reserva da intimidade da vida privada e outra coisa é a intimidade associativa. São realidades diferentes

as associações prosseguirem livremente os seus fins sem interferência das autoridades públicas ou

prosseguirem-nos à margem do conhecimento da comunidade».

Esta questão parece, inclusive, ser consensual nas organizações que o PAN, no seu projeto de lei, selecionou

como podendo estar abrangidas por este diploma. Dispenso-me de as citar na integralidade, porque essas

afirmações foram já referidas na intervenção do PAN, mas quer António Arnaut quer Mário Martin Gui afirmaram

ser favoráveis a que, nas respetivas organizações, os maçons se devam afirmar voluntariamente como tal e

que, sem qualquer dúvida, devem manifestar a sua qualidade. E também, já agora, Monsenhor José Rafael

Espírito Santo, vigário regional do Opus Dei, em pronúncia sobre este mesmo diploma, afirmou: «A prelatura do

Opus Dei exclui, intrinsecamente, qualquer tipo de secretismo e de falta de transparência».

Pois, se assim é, Sr.as e Srs. Deputados, que hesitações poderá haver em prosseguir este caminho? Com

franqueza, não vemos que hesitações ou dúvidas possam surgir, porque, enfim, diz a sabedoria popular que

«quem não deve não teme», e assim será, de facto, para organizações que têm, com esta iniciativa, a melhor e

mais cristalina oportunidade de combater suspeições, porventura injustas, que sobre elas possam recair e

demonstrar os interesses legítimos que perseguem.

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Trata-se, em nossa opinião, de um imperativo ético ou, como refere, mais uma vez, o Prof. Jorge Miranda,

de «uma exigência de ética republicana». De tal modo que terminarei com as reflexões que organizações de

magistrados, consultadas para este efeito, fizeram a propósito deste diploma.

Diz a Associação Sindical dos Juízes Portugueses: «Ainda que o Estatuto dos Magistrados Judiciais não

proíba, como talvez devesse, a participação em tais organizações, consideramos que as obrigações declarativas

dos juízes devem incluir a revelação da sua pertença às mesmas. Trata-se de revelar publicamente uma

condição que pode, em abstrato, condicionar a perceção social sobre a imparcialidade do juiz.»

Diz o Conselho Superior do Ministério Público: «Entendemos que o projeto de alteração em análise poderá

ser o local adequado para que a Procuradoria-Geral da República se pronuncie quanto a uma eventual alteração

de regime jurídico, também aplicável aos magistrados do Ministério Público, no sentido de defender que, quanto

a estes, se torne obrigatória essa declaração, obrigatoriedade que deriva de um imperativo ético».

Sr.as e Srs. Deputados, creio que estas declarações se bastam a si próprias. Por isso, os dados estão

lançados: quem considere não dever revelar publicamente uma condição que pode, em abstrato, condicionar a

perceção social sobre a sua imparcialidade, deverá, obviamente, rejeitar esta proposta; quem, por outro lado,

considere ser das boas regras de transparência a existência desta declaração, deverá aprová-la. É obviamente

desse lado que o PSD estará.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Deputado André Silva, do PAN.

O Sr. André Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Agradeço a todos os Srs. Deputados que fizeram intervenções.

Gostaria de esclarecer algumas matérias.

Relativamente à questão sobre a opção da obrigatoriedade, desafiamos o Parlamento e todos aqueles que

colocaram em causa esta opção a apresentarem ou melhorarem as propostas em sede de especialidade. Essa

foi a nossa opção. Parece-nos um bom ponto de partida.

Há uma preocupação relativamente às eventuais filiações dos Deputados do PAN a determinadas

associações, mas elas são claras e estão todas nos nossos registos de interesses, para quem as quiser

consultar.

Quanto à extensão desta medida a outras associações de cariz ambientalista, animalista e clubes de futebol,

evidentemente, todas aquelas associações que tenham fins ou atividades que não sejam claras, porque são

todas distintas, devem ser incluídas. Mais uma vez, estamos absolutamente disponíveis para, em especialidade,

trabalhar esta matéria.

O Sr. Deputado Pedro Delgado Alves falou em clubes de futebol. Sobre essa matéria, apresentámos uma

proposta — já deu entrada na Assembleia da República e o Sr. Deputado conhece-a — que visa criar mais um

impedimento relativamente aos titulares de cargos políticos que também ocupem lugares em órgãos sociais de

clubes de futebol. Portanto, teremos oportunidade para debater, uma vez mais, o alargamento de

incompatibilidades e para assistir ao Partido Socialista a votar contra.

Relativamente ao argumento falacioso de que esta iniciativa do PAN pode colocar em causa a liberdade

religiosa, parece-nos que Jorge Miranda, constitucionalista e católico, é insuspeito, não pode ser favorável a

ataques à liberdade religiosa e não vê qualquer violação.

Aliás, o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, que aqui fez uma inside joke maçónica, o que revela que conhece

bem o mundo, disse, há pouco, que há pareceres que referem que esta iniciativa legislativa será, porventura,

inconstitucional. O Sr. Deputado deve ter visto e consultado, com certeza, pareceres referentes a outras

iniciativas legislativas. Não há nenhum parecer, de nenhum constitucionalista, relativamente a esta iniciativa do

PAN, a falar de inconstitucionalidade, pelo contrário, retiram esse cenário da questão.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr. Deputado.

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O Sr. André Silva (PAN): — Para nós, é muito claro, Srs. Deputados: quem não está em condições de poder revelar os interesses defendidos por associações a que pertençam, sejam elas secretas ou discretas —

podemos afinar essa definição em especialidade —, não tem condições para o exercício de cargos públicos.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já lhe pedi para terminar.

O Sr. André Silva (PAN): — Auscultados todos os partidos políticos e analisado o debate parlamentar, percebemos que o único partido que iria votar contra esta iniciativa é o Partido Socialista. Todos os outros

partidos ou são favoráveis ou viabilizam uma clarificação em sede de especialidade.

Portanto, iremos baixar este projeto à especialidade, porque o País precisa, e merece, de mais ética e

transparência na vida política.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, chegámos, assim, ao final da nossa agenda no que diz respeito a debates.

Vamos, agora, passar ao período regimental de votações, uma vez que temos todas as condições para

começar desde já, pois estão registados quase 200 Deputados.

Começamos com o Projeto de Voto n.º 426/XIV/2.ª (apresentado pelo PS, pelo PSD, pelo BE, pelo CDS-PP,

pela Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira, pelo PCP, pelo PAN, pelo PEV, pelo IL e pela Deputada não

inscrita Cristina Rodrigues) — De pesar pelo falecimento do agente da PSP António José Pinto Doce. Peço ao

Sr. Secretário Nelson Peralta que proceda à sua leitura.

O Sr. Secretário (Nelson Peralta): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o projeto de voto é do seguinte teor:

«No sábado passado, 12 de dezembro, em Évora, o agente da Polícia de Segurança Pública (PSP) António

José Pinto Doce, de 45 anos, ao tentar impedir a fuga de um homem que agredia a companheira em plena via

pública, foi atropelado pela viatura do agressor e arrastado cerca de 40 metros, ficando em estado muito grave.

Infelizmente, devido à gravidade das lesões sofridas, viria a falecer nas primeiras horas do dia seguinte,

domingo, dia 13 de dezembro, deixando mulher e dois filhos.

O agente António Doce, que pertencia ao Comando Distrital de Évora da PSP, não estava em serviço, mas

interveio para fazer cessar o crime em curso quando presenciou as agressões.

A violência doméstica é um crime público inscrito no artigo 142.º do Código Penal, inaceitável e intolerável,

com o qual não se pode ter qualquer tipo de complacência e que, apesar de todos os avanços, continua a ter

elevada incidência. Só este ano já morreram 20 pessoas vítimas de violência doméstica. Esta podia ter sido

mais uma, que o gesto do agente da Esquadra de Trânsito de Évora evitou, em detrimento da sua própria vida,

contrariando corajosamente a ainda existente desvalorização da violência contra as mulheres.

António José Pinto Doce dignificou a farda que não vestia no momento dos atos por não se encontrar de

serviço, representando um Estado que não ignora as vítimas de violência e as pessoas em situação de

vulnerabilidade e demonstrando igualmente um sentido de missão exemplar, permanente e merecedora, por

isso mesmo, do reconhecimento da Assembleia da República, perante a evidência do elevado risco que envolve

o desempenho da sua missão por parte de todos os profissionais das forças de segurança e os inerentes riscos

imponderáveis para a sua integridade física e para a sua própria vida.

Assim, a Assembleia da República manifesta o seu pesar pelo falecimento do agente António Doce e enaltece

e louva o seu profundo sentido de missão, expressando as suas condolências, respeito e solidariedade aos seus

familiares, amigos, colegas de profissão da Polícia de Segurança Pública e aos Comandos Nacional e Distrital

daquela força de segurança.»

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, evidentemente, associo-me a este voto. Vamos votar a parte deliberativa do projeto de voto que acaba de ser lido.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Srs. Deputados, na sequência da votação a que acabámos de proceder, vamos guardar 1 minuto de silêncio.

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A Câmara guardou, de pé, 1 minuto de silêncio.

Passamos ao Projeto de Voto n.º 425/XIV/2.ª (apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais,

Direitos, Liberdades e Garantias e subscrito por uma Deputada do PS) — De saudação pelo Dia Internacional

dos Direitos Humanos, que será lido pela Sr.ª Secretária Ana Mesquita.

A Sr.ª Secretária (Ana Mesquita): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o projeto de voto é do seguinte teor:

«Assinalar o Dia Internacional dos Direitos Humanos, proclamado pelas Nações Unidas, a 10 de dezembro

de 1948, também assinalado em Portugal, é uma forma de homenagear todos e todas as defensoras dos direitos

humanos e de repudiar todo o tipo de discriminações que têm impedido a igualdade entre todos os seres

humanos.

A salvaguarda dos direitos humanos é fator de desenvolvimento e paz, não sendo possível impulsionar o

desenvolvimento sustentável sem dignidade humana, pelo que os direitos humanos estão no centro dos

Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) — Agenda 2030 e a sua visão comum para a humanidade.

A crise pandémica atingiu em particular os mais vulneráveis e expôs as desigualdades estruturais. Assistimos

a violações aos direitos humanos e a ameaças às liberdades e garantias na sequência do crescendo de derivas

populistas e autoritárias em diversos locais. Os migrantes e refugiados têm sido, em particular, as vítimas

preferenciais dessas narrativas.

As pessoas e os seus direitos têm de constituir a prioridade absoluta neste tempo de pandemia, como disse

o Secretário-Geral das Nações Unidas, não podendo ninguém ser deixado para trás.

É fundamental que os direitos humanos sejam protegidos, que se reforce a ação climática e se assegure a

transição digital, evitando novos focos de exclusão. Todos e todas contamos e temos um papel fundamental na

construção de uma sociedade com dignidade e direitos para todas as pessoas.

É fundamental que se cumpra a Plataforma de Ação de Pequim, para se garantir uma efetiva implementação

dos direitos das mulheres e raparigas como parte integrante, inalienável e indivisível de todos os direitos

humanos.

Assim, a Assembleia da República assinala o Dia Internacional dos Direitos Humanos e a importância de

continuarmos a promover os direitos humanos e a impedir quaisquer retrocessos que ponham em causa o seu

cumprimento.»

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar a parte deliberativa do projeto de voto que acaba de ser lido.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Passamos à votação do Projeto de Resolução n.º 652/XIV/2.ª (BE) — Pela disponibilização de testes COVID-

19 gratuitos a professores, trabalhadores não docentes e alunos.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do

PEV, do CH, do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos contra do

PS.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, para informar que apresentaremos uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado.

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Vamos votar, agora, o Projeto de Resolução n.º 658/XIV/2.ª (BE) — Pela regulamentação da atividade de

trabalhador da manutenção e montagem de aerogeradores com vista à redução do desgaste resultante do

exercício da atividade, à garantia das condições de segurança e saúde no trabalho e à adequação do acesso à

reforma.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do PAN,

do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do CDS-PP,

do CH e do IL.

Segue-se a votação do Projeto de Resolução n.º 718/XIV/2.ª (PCP) — Recomenda ao Governo que tome

medidas para a definição e regulamentação de um regime laboral e de aposentação específico para os

trabalhadores da manutenção e montagem de aerogeradores.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do BE, do PCP, do PAN,

do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do CDS-PP,

do CH e do IL.

Votamos, de seguida, o Projeto de Resolução n.º 770/XIV/2.ª (PS) — Recomenda a adoção de medidas para

travar o aumento das desigualdades estruturais de género desencadeadas pelos impactos socioeconómicos da

COVID-19.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do CDS-PP, do PAN, do CH,

do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PCP e do PEV.

Vamos proceder à votação do Projeto de Resolução n.º 809/XIV/2.ª (PSD) — Cessação de vigência do

Decreto-Lei n.º 92/2020, de 23 de outubro, que altera o regime geral da gestão de resíduos [Apreciação

Parlamentar n.º 32/XIV/2.ª (PSD)].

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do BE, do PAN e das Deputadas não inscritas

Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos a favor do PSD, do PCP, do CDS-PP, do PEV, do CH e do

IL.

Vamos passar à votação do Projeto de Resolução n.º 810/XIV/2.ª (PCP) — Cessação de vigência do Decreto-

Lei n.º 92/2020, de 23 de outubro, que altera o regime geral da gestão de resíduos [Apreciação Parlamentar n.º

34/XIV/2.ª (PCP)].

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do BE, do PAN e das Deputadas não inscritas

Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e votos a favor do PSD, do PCP, do CDS-PP, do PEV, do CH e do

IL.

Segue-se a votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 478/XIV/1.ª (BE) — Repõe o regime de

remuneração das centrais de produção de energia eólica (Revoga o Decreto-Lei n.º 35/2013, de 28 de fevereiro).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP, votos a favor do BE, do

PCP, do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções

do PAN e do IL.

O Sr. Hugo Costa (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Hugo Costa (PS): — Sr. Presidente, queria anunciar a entrega de uma declaração de voto sobre esta última votação em meu nome e em nome da Sr.ª Deputada Ana Passos, do Sr. Deputado André Pinotes Batista

e do Sr. Deputado Luís Moreira Testa.

O Sr. Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado. Passamos à votação, na generalidade, na especialidade e final global, do Projeto de Lei n.º 594/XIV/2.ª (PS)

— Alarga até 30 de junho de 2021 o prazo para a realização por meios de comunicação à distância das reuniões

dos órgãos das autarquias locais e das entidades intermunicipais, procedendo à sétima alteração à Lei n.º 1-

A/2020, de 19 de março, que aprova medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica

provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do CDS-PP, do PAN, do CH,

do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PCP e do PEV.

Vamos votar agora, na generalidade, a Proposta de Lei n.º 64/XIV/2.ª (GOV) — Altera o regime excecional

para as situações de mora no pagamento da renda devida nos termos de contratos de arrendamento urbano

habitacional e não habitacional, no âmbito da pandemia COVID-19.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do BE, do PCP, do PAN, do PEV e das

Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PSD, do CDS-PP, do CH

e do IL.

Votamos, de seguida, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 575/XIV/2.ª (BE) — Regime excecional de renda

não habitacional para lojistas e retalhistas sob o Novo Regime de Arrendamento Urbano afetados na sua

atividade por força da COVID-19.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH e do IL, votos a

favor do BE, do PCP, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a

abstenção do PAN.

Vamos proceder à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 576/XIV/2.ª (BE) — Normas interpretativas

que clarificam a aplicação e retroatividade ao período de confinamento da suspensão da aplicação de rendas

fixas.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH e do IL e votos a

favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira.

Segue-se a votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 596/XIV/2.ª (BE) — Alarga o regime extraordinário

de proteção dos arrendatários (Sétima alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PCP, do PAN, do PEV e das

Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra do PSD e do CDS-PP e

abstenções do CH e do IL.

Este projeto de lei baixa à 6.ª Comissão.

Vamos passar à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 599/XIV/2.ª (PCP) — Estabelece para 2021

o regime excecional aplicável a formas específicas de contratos de exploração de imóveis para comércio e

serviços em centros comerciais.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH e do IL, votos a

favor do BE, do PCP, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a

abstenção do PAN.

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I SÉRIE — NÚMERO 32

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Vamos votar, de seguida, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 600/XIV/2.ª (PCP) — Regime excecional de

pagamento das rendas.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP, votos a favor do BE, do

PCP, do PEV, do CH e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções

do PAN e do IL.

Votamos agora, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 601/XIV/2.ª (PCP) — Regime extraordinário de proteção

dos arrendatários.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP, do CH e do IL e votos a

favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira.

Vamos proceder à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 602/XIV/2.ª (PAN) — Clarifica o regime

excecional aplicável aos contratos de exploração de imóveis para comércio e serviços em centros comerciais,

procedendo para o efeito à aprovação de uma norma interpretativa relativamente à Lei n.º 2/2020, de 31 de

março.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do PAN, do PEV e das

Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra do PS, do CDS-PP e do IL e

a abstenção do CH.

Este projeto de lei baixa à 6.ª Comissão.

Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 603/XIV/2.ª (BE) — Extensão dos contratos de

arrendamento para fins comerciais no período de retoma da economia, no caso de perdas de faturação

consideráveis (Terceira alteração à Lei n.º 4-C/2020, de 6 de abril).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP, votos a favor do BE, do

PCP, do PAN, do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções

do CH e do IL.

Vamos votar, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 784/XIV/2.ª (CDS-PP) — Colocar a crise

humanitária e o problema de terrorismo vivido em Moçambique nas prioridades da Presidência portuguesa do

Conselho da União Europeia.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do CDS-PP, do PAN, do CH,

do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PCP e do PEV.

Este projeto de resolução baixa à 2.ª Comissão.

Segue-se a votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 779/XIV/2.ª (PAN) — Recomenda ao

Governo a mobilização da comunidade internacional no sentido de travar os crimes perpetrados contra a

humanidade em Moçambique.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do CDS-PP, do PAN, do CH,

do IL e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PCP e do PEV.

Este projeto de resolução baixa, também, à 2.ª Comissão.

Temos, agora, para votação um requerimento, apresentado pelo PAN, solicitando a baixa à Comissão de

Transparência e Estatuto dos Deputados, sem votação, por 60 dias, do Projeto de Lei n.º 169/XIV/1.ª (PAN) —

Determina a declaração da filiação ou ligação a organizações ou associações «discretas» em sede de

obrigações declarativas (Segunda alteração à Lei n.º 52/2019, de 31 de julho).

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Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Votamos, de seguida, o Projeto de Resolução n.º 573/XIV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que atue no

sentido da correta classificação energética e promoção da diminuição da utilização de gases fluorados nos

aparelhos de ar condicionado e a durabilidade dos mesmos.

Submetido à votação, verificou-se um empate, tendo-se registado votos a favor do PSD, do BE, do CDS-PP,

do PAN e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira, votos contra do PS e

abstenções do PCP, do PEV, do CH e do IL.

Srs. Deputados, dada a situação de empate, vamos proceder a uma segunda votação do projeto de

resolução.

Submetido de novo à votação, verificou-se o mesmo resultado.

Tendo-se verificado novo empate, o projeto de resolução foi rejeitado.

Vamos proceder à votação do Projeto de Resolução n.º 673/XIV/2.ª (BE) — Recolha e tratamento eficaz dos

gases de refrigeração das unidades de ar condicionado, frigoríficos e outros equipamentos de frio.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN,

do PEV e das Deputadas não inscritas Cristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do CH e do IL.

Este projeto de resolução baixa à 11.ª Comissão.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, queria só dar nota de que a baixa à comissão estava dependente da aprovação de ambos os Projetos de Resolução n.os 573/XIV/1.ª (PAN) e 673/XIV/2.ª (BE). Como

só foi aprovado este último, não há lugar a baixa à comissão.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado pela observação, Sr. Deputado. Portanto, o Projeto de Resolução n.º 673/XIV/2.ª (BE) não baixa à 11.ª Comissão, ao contrário do que tinha sido anunciado.

Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 620/XIV/1.ª (CH) — Recomenda ao

Governo que estabeleça o dia 25 de setembro como o Dia Nacional da Sustentabilidade.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do CDS-PP, do PEV, do CH, do IL e da

Deputada não inscrita Cristina Rodrigues e abstenções do PSD, do BE, do PCP, do PAN e da Deputada não

inscrita Joacine Katar Moreira.

Vamos votar, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 621/XIV/1.ª (Deputada não inscrita Joacine Katar

Moreira) — Institui o dia 25 de setembro como o Dia Nacional da Sustentabilidade.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O projeto de resolução baixa à 11.ª Comissão.

Vamos votar, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 670/XIV/2.ª (CDS-PP) — Instituição do Dia

Nacional da Sustentabilidade a 25 de setembro.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

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O projeto de resolução baixa, também, à 11.ª Comissão.

Segue-se a votação do Projeto de Resolução n.º 765/XIV/2.ª (BE) — Pela prorrogação do prazo de validade

da Avaliação de Impacte Ambiental do novo aeroporto de Lisboa.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV

e da Deputada não inscritaJoacine Katar Moreira e abstenções do PSD, do CDS-PP, do CH, do IL e da Deputada

não inscrita Cristina Rodrigues.

Vamos votar o Projeto de Resolução n.º 667/XIV/2.ª (BE) — Recomenda medidas de mitigação das emissões

de navios de comércio e de cruzeiro, cujas emissões agravam a crise climática, o ambiente e a saúde humana.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do BE, do PAN, do PEV e das

Deputadas não inscritasCristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PSD, do PCP, do CDS-

PP, do CH e do IL.

Segue-se a votação do Projeto de Resolução n.º 798/XIV/2.ª (PEV) — Mitigação e controlo das emissões

poluentes provenientes do transporte marítimo.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV

e das Deputadas não inscritasCristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PSD, do CDS-PP,

do CH e do IL.

Vamos votar o Projeto de Resolução n.º 674/XIV/2.ª (IL) — Pela abertura gradual ao público de estádios,

pavilhões e demais recintos de todas as modalidades.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do PSD, do PCP, do CDS-PP, do

PAN, do PEV, do CH, do IL e da Deputada não inscrita Cristina Rodrigues e abstenções do BE e da Deputada

não inscrita Joacine Katar Moreira.

Vamos votar, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 759/XIV/2.ª (PCP) — Retoma da prática desportiva

e normalização gradual das competições.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do CH, do IL e das

Deputadas não inscritasCristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do PS, do PSD e do CDS-

PP.

O projeto de resolução baixa à 8.ª Comissão.

Vamos votar, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 783/XIV/2.ª (PEV) — Recomenda ao Governo

medidas com vista à retoma da prática desportiva em contexto de pandemia.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PSD, do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do

PEV, do CH, do IL e das Deputadas não inscritasCristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e a abstenção do

PS.

O projeto de resolução baixa também à 8.ª Comissão.

A Sr.ª Maria Begonha (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, pede a palavra para que efeito?

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A Sr.ª Maria Begonha (PS): — Sr. Presidente, era só para informar que, a propósito da votação destes últimos dois projetos, o Partido Socialista já submeteu uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Fica registado, Sr.ª Deputada. Vamos votar, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Ambiente, Energia e

Ordenamento do Território, relativo aos Projetos de Resolução n.os 437/XIV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo

que condicione a emissão de licença de exploração das novas centrais de biomassa ao cumprimento de

rigorosos padrões ambientais e de sustentabilidade, 511/XIV/1.ª (BE) — Utilização sustentável e ecológica da

biomassa florestal residual e 531/XIV/1.ª (PEV) — Reformulação do modelo e apoios públicos a atribuir às

centrais de biomassa florestal em função da sua sustentabilidade.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do PCP, do PAN, do PEV, do

IL e das Deputadas não inscritasCristina Rodrigues e Joacine Katar Moreira e abstenções do CDS-PP e do CH.

Vamos votar, em votação final global, o texto final, apresentado pela Comissão de Educação, Ciência,

Juventude e Desporto, relativo aos Projetos de Resolução n.os 624/XIV/1.ª (PCP) — Requalificação da Escola

Secundária de Serpa, 633/XIV/2.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que proceda à imediata requalificação

da Escola Secundária de Serpa, 655/XIV/2.ª (BE) — Recomenda ao Governo a realização urgente de obras na

Escola Secundária de Serpa, 676/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que promova, com urgência, a

requalificação da Escola Secundária de Serpa, 681/XIV/2.ª (PEV) — Requalificação urgente da Escola

Secundária de Serpa e 703/XIV/2.ª (PS) — Recomenda ao Governo a requalificação da Escola Secundária de

Serpa.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado André Ventura, pede a palavra para que efeito?

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, é apenas para dar conta de que, em relação ao Projeto de Lei n.º 602/XIV/2.ª (PAN), que já votámos e cujo sentido de voto do Chega foi de abstenção, o Chega fará chegar à

Mesa uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado. O Sr. Secretário Nelson Peralta vai agora dar conta dos Srs. Deputados que estiveram presentes por meios

não de telepatia, mas de teleconferência.

Faça favor, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Nelson Peralta): — Sr. Presidente, passo a anunciar as Sr.as e os Srs. Deputados que estiveram presentes por videoconferência, nesta sessão plenária: do Grupo Parlamentar do Partido Socialista,

estiveram presentes a Sr.ª Deputada Isabel Rodrigues, eleita pelo círculo eleitoral dos Açores, a Sr.ª Deputada

Marta Freitas, eleita pelo círculo eleitoral da Madeira, e o Sr. Deputado Paulo Porto, eleito pelo círculo eleitoral

de Fora da Europa; do Grupo Parlamentar do PSD, estiveram presentes a Sr.ª Deputada Ilídia Quadrado, eleita

pelo círculo eleitoral dos Açores, a Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa e o Sr. Deputado Sérgio Marques,

eleitos pelo círculo eleitoral da Madeira.

Ainda por outros motivos, estiveram presentes o Sr. Deputado Jorge Gomes, do PS, e os Srs. Deputados

Hugo Martins de Carvalho e Hugo Carneiro, do PSD.

É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr. Secretário. Falta ainda anunciar a agenda da sessão plenária da próxima terça-feira, dia 22. Chamo a atenção para o

facto de que a sessão começará às 14 horas e 30 minutos.

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Da agenda, consta, no primeiro ponto, um debate de urgência, requerido pelo PSD, ao abrigo do artigo 72.º

do Regimento, sobre educação.

No segundo ponto, consta a discussão do Projeto de Resolução n.º 771/XIV/2.ª (PEV) — Salvar a Casa do

Alentejo.

Segue-se, no terceiro ponto, a discussão da Petição n.º 642/XIII/4.ª (Fernando Maria Rodrigues Martins e

outros) — Solicitam a alteração da legislação relativa ao complemento solidário para idosos, juntamente com,

na generalidade, os Projetos de Lei n.os 521/XIV/2.ª (BE) — Altera o regime do complemento solidário para

idosos, fazendo depender a sua atribuição da situação de pobreza do idoso e não do rendimento dos filhos e

garantindo a convergência do valor de referência com o limiar de pobreza, 567/XIV/2.ª (PCP) — Melhora as

condições de atribuição do complemento solidário para idosos, e 583/XIV/2.ª (PEV) — Condições de atribuição

do complemento solidário para idosos (Alteração ao Decreto-Lei n.º 232/2005, de 29 de dezembro).

No quarto ponto, procederemos à discussão da Petição n.º 12/XIV/1.ª (José Manuel Rodrigues de Oliveira)

— Idade legal de reforma dos trabalhadores do setor de transportes, comunicações e telecomunicações aos 55

anos, juntamente com o Projeto de Resolução n.º 659/XIV/2.ª (BE) — Pela regulamentação da atividade dos

trabalhadores do setor dos transportes, comunicações e telecomunicações, com vista à redução do desgaste

resultante do exercício da atividade, à garantia das condições de segurança e saúde no trabalho, bem como a

um acesso à reforma adequado ao desgaste da profissão.

No quinto ponto, consta a discussão da Petição n.º 19/XIV/1.ª (Eduardo Bernardino e outros) — Enfermeiros:

Pela criação de um estatuto oficial de profissão de desgaste rápido e atribuição de subsídio de risco, juntamente

com, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 404/XIV/1.ª (BE) — Medidas de valorização e proteção dos

profissionais da saúde, e os Projetos de Resolução n.os 785/XIV/2.ª (PCP) — Reconhece a penosidade e risco

da profissão de enfermagem e recomenda ao Governo que tome medidas para a definição e regulamentação

de um regime laboral e de aposentação específico para os enfermeiros, 786/XIV/2.ª (PAN) — Recomenda ao

Governo que proceda à criação de um grupo de trabalho para a alteração do enquadramento legal das profissões

de desgaste rápido, que defina critérios para a atribuição desta qualificação e identifique um elenco

exemplificativo das profissões com tal qualificação, 118/XIV/1.ª (CH) — Recomenda ao Governo a atribuição do

estatuto de profissão de desgaste rápido e o subsídio de risco às forças de segurança, 385/XIV/1.ª (CH) — Pela

atribuição de um subsídio de risco aos profissionais que se encontram na linha da frente ao combate da

pandemia, e 392/XIV/1.ª (CH) — Pela criação da carreira profissional de técnico auxiliar de saúde.

No sexto ponto, procederemos à discussão da Petição n.º 22/XIV/1.ª (Movimento de Cidadãos) — Pela

construção de uma escola básica do 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e ensino secundário em Fernão Ferro,

Seixal, juntamente com os Projetos de Resolução n.os 260/XIV/1.ª (BE) — Recomenda ao Governo a construção

de uma escola básica (2.º e 3.º ciclos) e secundária em Fernão Ferro, 615/XIV/1.ª (PCP) — Recomenda ao

Governo a construção de uma escola de ensino básico de 2.º e 3.º ciclos e de uma escola do ensino secundário

na freguesia de Fernão Ferro, no concelho do Seixal, 634/XIV/2.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que

proceda à construção de uma escola de 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e de uma escola do ensino secundário

na freguesia de Fernão Ferro, no Seixal, 637/XIV/2.ª (PEV) — Construção de uma escola dos 2.º e 3.º ciclos do

ensino básico e de uma escola do ensino secundário na freguesia de Fernão Ferro, no concelho do Seixal,

643/XIV/2.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que inicie os processos tendentes à construção de uma escola

básica para os 2.º e 3.º ciclos e para o ensino secundário na freguesia de Fernão Ferro, 646/XIV/2.ª (Deputada

não inscrita Cristina Rodrigues) — Pela construção de uma escola básica de 2.º e 3.º ciclos e secundária na

freguesia de Fernão Ferro, no concelho do Seixal, e 666/XIV/2.ª (PSD) — Construção de uma escola básica dos

2.º e 3.º ciclos e de ensino secundário, na freguesia de Fernão Ferro.

No sétimo ponto, sem tempos de discussão, está agendado o Projeto de Lei n.º 607/XIV/2.ª (PSD) —

Renovação da imposição obrigatória do uso de máscara em espaços públicos.

No oitavo ponto, teremos votações regimentais no final desta extensa agenda.

O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, pede a palavra para que efeito?

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O Sr. Cristóvão Norte (PSD): — Sr. Presidente, é só para informar a Mesa de que, em razão de a minha conta estar bloqueada no computador, vim ao Plenário para certificar a minha presença.

Muito obrigado.

O Sr. Presidente: — Muito bem. Fica registada a sua presença. Muito obrigado, bom fim de semana para todos e até terça-feira.

Está encerrada a sessão plenária.

Eram 13 horas e 28 minutos.

———

Imagens projetadas pelo Deputado do PAN André Silva no decurso da intervenção que proferiu no debate

do Projeto de Lei n.º 169/XIV/1.ª (PAN).

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———

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação

Relativa ao Projeto de Resolução n.º 652/XIV/2.ª:

O Grupo Parlamentar do PCP votou a favor do Projeto de Resolução n.º 652/XIV/2.ª, que recomenda ao

Governo que disponibilize testes COVID-19 gratuitos a professores, trabalhadores não docentes e alunos.

O PCP concorda com a realização de testes e não se opõe a esse princípio. Aliás, o PCP tem afirmado a

necessidade de garantir e alargar o número de testes a realizar para detetar pessoas infetadas e de testes

serológicos que ajudem a medir a imunidade da população.

Igualmente, vimos alertando para que a situação que se vive em Portugal exige, da parte de todos, a

observação do conjunto das orientações emanadas da autoridade de saúde pública, não alimentando notícias

especulativas nem adotando decisões casuísticas à margem das entidades competentes.

Ao mesmo tempo, o PCP insiste na necessidade de valorização da estrutura de saúde pública, elemento

fundamental na direção e coordenação no combate a surtos epidémicos.

Mais, o PCP considera que cabe ao Governo a disponibilização de todos os meios necessários,

inclusivamente ao nível da testagem considerada relevante por critérios científicos e de saúde pública, até para

que se garanta uma resposta justa e adequada em todo o território nacional, por oposição a uma solução

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desigual e desarticulada fornecida às populações que dependa sobretudo ou exclusivamente dos meios

disponíveis das autarquias locais.

Além disso, o PCP defende que as medidas mais eficazes na prevenção do contágio em meio escolar passam

pelo reforço do número de trabalhadores e de meios técnicos e financeiros da escola pública.

É, por isso, fundamental garantir a contratação urgente de 5000 trabalhadores não docentes para as escolas,

assegurar a existência de equipamentos de proteção individual adequados e em número suficiente, proceder à

limpeza, higienização e desinfeção regulares, diminuir o número de alunos por turma, fornecer todos os recursos

pedagógicos e didáticos necessários, garantir as condições físicas adequadas das instalações de todos os

espaços escolares, entre outras medidas que o PCP tem proposto.

O PCP considera ser da maior importância a adoção de um conjunto de medidas de prevenção face à

evolução do surto epidémico de COVID-19 e reafirma a necessidade de o Governo tomar todas as medidas

adequadas para garantir a tranquilidade da comunidade escolar.

Assembleia da República, 18 de dezembro de 2020.

A Deputada do PCP, Paula Santos.

———

Relativa ao Projeto de Lei n.º 478/XIV/1.ª:

Os Deputados signatários desta declaração de voto representaram o Grupo Parlamentar do Partido Socialista

(GPPS) na Comissão Parlamentar de Inquérito ao Pagamento de Rendas Excessivas aos Produtores de

Eletricidade na XIII Legislatura, tendo desta forma votado a favor do relatório final da comissão supracitada.

Um dos temas de maior debate foi o regime de remuneração aos produtores de eólicas, aprovado pelo

Governo PSD-CDS em 2013. Sobre esse assunto a conclusão aprovada no relatório é a seguinte:

«Em 2013, o Governo propôs aos produtores eólicos a adesão a um sistema de remuneração alternativo

para o período posterior à vigência das tarifas feed-in atualmente em pagamento. A lei aprovada em 2005 previa

cinco anos adicionais de remuneração à tarifa da última central licenciada. O novo regime aprovado em 2013

vem garantir uma remuneração que acompanhará o mercado dentro de uma banda entre os 68 € e os 90 €/MWh

e por dois anos adicionais. Aderindo a este regime, os produtores aceitaram pagar ao SEN uma ‘contribuição

voluntária’ (que totalizará 200 M€ pagos entre 2013 e 2021). A ERSE, em 2013, pronunciou-se favoravelmente

e, em 2017, registou ganhos para o SEN no curto prazo (encaixe da contribuição voluntária paga pelos

produtores) e perigos no longo prazo. A comparação entre o regime de 2005 e o de 2013 demonstra a grande

probabilidade de futuras perdas para o SEN, que atingem centenas de milhões de euros em diversos cenários

plausíveis.»

Em relação à recomendação aprovada sobre o assunto, ela é a seguinte:

1- «Para tentar evitar situações de litigância, será procurada uma solução negociada com os produtores

para a revisão deste regime mediante adaptações legislativas para a reposição do equilíbrio económico

do regime anterior ao Decreto-Lei n.º 35/2013 e para a devolução aos produtores das contribuições

voluntárias pagas até hoje, acrescidas dos juros respetivos.

2- Em caso de recusa à negociação ou na falta de um acordo satisfatório, o Governo definirá os termos

da concretização daqueles objetivos;».

Desta forma, a versão final do relatório não define a revogação do decreto-lei de forma automática e sem

negociação, conforme proposto pelo projeto de lei do Bloco de Esquerda. Essa era uma versão inicial do

relatório, alterada por proposta de alteração do Grupo Parlamentar do PS. O Grupo Parlamentar do PS defendeu

que nada fosse feito sem negociação.

Acresce ainda o seguinte, a declaração de voto escrita do Grupo Parlamentar do PS que é anexo ao relatório

citado:

«O período de assistência financeira esteve particularmente na retina da CPI. Foi neste período que se

assistiu a denuncias públicas, reiteradas nesta Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), pela então Secretário

de Estado com a pasta da Energia, Henrique Gomes, de censura aos seus discursos e ao desenvolvimento da

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I SÉRIE — NÚMERO 32

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sua política energética por parte do governo que integrava, por força de alegadas e reiteradas pressões da EDP

ao qual o Executivo estaria permeável.

É também neste período que o Governo abandona a tentativa de reforma do sistema elétrico, desistindo da

CESE, em prol da privatização da EDP.

É neste contexto que surge o Decreto-Lei n.º 35/2013, pelas mãos do Secretário de Estado Artur Trindade,

lesivo para os interesses do SEN.

No que respeita aos serviços de sistema, o GPPS subscreve a posição elencada no relatório, considerando

que a proposta de integração dos serviços de sistema, em termos de política energética e planeamento

estratégico para o SEN em modelos concorrenciais que propiciem a redução de custos para os consumidores e

a maximização da integração da produção de fonte renovável, merece a nossa concordância.

A ERSE pronunciou-se favoravelmente ao Decreto-Lei n.º 35/2013, embora ressalvando os custos a médio

prazo que este implicaria. Em 2013, o Governo propôs aos produtores eólicos a adesão a um sistema de

remuneração alternativo para o período posterior à vigência das tarifas feed-in atualmente em pagamento. O

novo regime aprovado em 2013 vem garantir uma remuneração entre os 68 € e os 90 €/MWh e por dois anos

adicionais, contra o pagamento voluntário de um valor pelos produtores.

Concluiu esta CPI que este decreto-lei provoca prejuízos a médio prazo, pagando acima do valor de mercado,

quando outros valores eram possíveis e consentâneos com a realidade que se estava a disciplinar.

Não obstante, devem as soluções apresentadas respeitar as devoluções devidas aos produtores, zelar pelo

Estado de Direito, prevenir putativas litigâncias potencialmente danosas para o erário público e reduzir ao

máximo o risco de criar custos que sobrecarreguem os consumidores.

É por tal que consideramos que os montantes apurados nesta CPI devem ser cautelosamente observados,

respeitando o Estado de Direito e por isso não rasgando contratos nem aplicando medidas de efeitos retroativos

— sendo o alcance das alterações ao quadro regulatório para o futuro e não para o passado —, à exceção das

que convoquem nulidades e ilegalidades, dando preferência a soluções negociadas e por isso recusando

decisões unilaterais, prevenindo custos para os consumidores decorrentes de possível litigância.»

Esta declaração de voto (regimentalmente prevista) demonstra a posição que o PS apresentou em maio de

2019.

Pelo exposto, os Deputados signatários acompanharam o voto contra do Grupo Parlamentar do Partido

Socialista no projeto de lei do Bloco que, ao contrário do que tentaram transmitir, não corresponde ao aprovado

na Comissão Parlamentar de Inquérito.

Por fim, os Deputados signatários lamentam as acusações do Bloco de Esquerda de se terem furtado ao

debate e as incorreções factuais na exposição de motivos da iniciativa e do debate.

Os Deputados do PS, Hugo Costa — Luís Moreira Testa — Ana Passos — André Pinotes Batista.

———

Relativa aos Projetos de Resolução n.os 759 e 783/XIV/2.ª:

Considerando que:

A pandemia provocada pela COVID-19 gerou uma crise sanitária com violentas repercussões

económicas e sociais em diversos setores de atividade;

Estes impactos afetaram clubes e associações desportivas sem fins lucrativos, de base local, os quais

são importantes dinamizadores da prática desportiva sénior e sobretudo ao nível dos escalões de

formação, e os quais têm um papel decisivo na promoção da atividade física e na diversificação da oferta

desportiva e por isso na coesão social e territorial do País;

A atividade desportiva foi, pela sua natureza e características, um dos setores de atividade que num

primeiro momento de combate à pandemia foi necessário e imperioso restringir e limitar;

A retoma progressiva da atividade desportiva, já iniciada, enfrenta desafios complexos, tendo neste

momento, para salvaguarda da saúde pública de todos e todas, ainda muitos condicionamentos e regras

apertadas, tal como definido pelas autoridades de saúde pública;

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19 DE DEZEMBRO DE 2020

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Com a consequente perda de receitas, reconhecemos, pelo exposto, as dificuldades que este setor

atravessa e a necessidade de aprofundamento de apoios adicionais para lá dos apoios já existentes

para a atividade desportiva ou transversais a vários setores, mas com reflexos nesta;

De todo o modo, não pode ser confundida a retoma progressiva da atividade desportiva com os apoios

ao desporto de formação e não profissional;

Reconhecemos e partilhamos a preocupação com o número de jovens que neste momento não praticam

desporto no âmbito dos clubes e que por isso reduziram a sua atividade física, com potenciais

consequências para a saúde física e mental;

Não obstante, a retoma da atividade desportiva deve estar condicionada à evolução epidemiológica e

aos critérios definidos pelas autoridades de saúde pública, nomeadamente em função dos níveis de

risco assumidos pelos especialistas e vertidos em orientações da Direção-Geral da Saúde (DGS);

A via parlamentar não prescinde da concertação necessária com as autoridades de saúde pública, que

devem ser escrupulosamente respeitadas no processo de evolução da retoma desportiva;

Partilhamos, por isso, genericamente, as necessidades identificadas pelas iniciativas ao nível dos apoios

à atividade desportiva e aos clubes não profissionais, embora os termos em que esses apoios venham

a ser concretizados mereçam um amadurecimento do debate, temos, quanto ao disposto para a retoma

da atividade desportiva, fundadas reservas que se prendem com a salvaguarda da saúde pública e a

necessidade de concertação com a DGS.

Entendeu o GPPS, assim, pelos motivos expostos, abster-se na votação do Projeto de Resolução n.º

759/XIV/2.ª (PCP) — Retoma da prática desportiva e normalização gradual das competições e do Projeto de

Resolução n.º 783/XIV/2.ª (PEV) — Recomenda ao Governo medidas com vista à retoma da prática desportiva

em contexto de pandemia. Este posicionamento não obstaculiza a tramitação da iniciativa para especialidade e

viabiliza uma discussão mais profunda e profícua sobre os termos em que estes apoios podem ser

concretizados.

Os Deputados e as Deputadas do Grupo Parlamentar do PS.

———

Nota: A declaração de voto anunciada pelo Deputado do CH André Ventura, referente a esta reunião

plenária, não foi entregue no prazo previsto no n.º 3 do artigo 87.º do Regimento da Assembleia da República.

———

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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