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Quinta-feira, 11 de novembro de 2021 I Série — Número 21
XIV LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2021-2022)
REUNIÃOPLENÁRIADE10DENOVEMBRODE 2021
Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Ana Cristina Cardoso Dias Mesquita Ana Sofia Ferreira Araújo
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 6 minutos.
De seguida, na sequência dos incidentes processuais de cariz técnico verificados durante as votações regimentais da reunião plenária anterior, o Presidente deu conta de que a Mesa promoveu uma reunião com os serviços para
apuramento do sucedido, tendo anunciado a realização de uma auditoria ao sistema informático do Plenário.
Foi anunciada a entrada na Mesa da Proposta de Lei n.º 118/XIV/3.ª, das Propostas de Resolução n.os 34 e 35/XIV/3.ª, dos Projetos de Lei n.os 1012 a 1017/XIV/3.ª e dos Projetos de Resolução n.os 1499 a 1503/XIV/3.ª
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Foram discutidos em conjunto, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 920/XIV/2.ª (IL) — Revoga o cartão do adepto, pela não discriminação e estigmatização de cidadãos em recintos desportivos (Quarta alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho), que foi aprovado, 1012/XIV/3.ª (PCP) — Procede à quarta alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, eliminando o cartão do adepto e as zonas com condições especiais de acesso e permanência de adeptos, e 1016/XIV/3.ª (CH) — Procede à quarta alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, e pela revogação da Portaria n.º 159/2020, de 26 de junho, que define as normas aplicáveis sobre o abreviadamente designado cartão do adepto, que foram rejeitados. Intervieram os Deputados João Cotrim de Figueiredo (IL), Alma Rivera (PCP), André Ventura (CH), Luís Monteiro (BE), Nelson Silva (PAN), Tiago Estevão Martins (PS), Mariana Silva (PEV), Miguel Arrobas (CDS-PP), Emídio
Guerreiro (PSD), Eduardo Barroco de Melo (PS), Carla Madureira (PSD) e Miguel Matos (PS).
Procedeu-se ao debate, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 118/XIV/3.ª (GOV) — Altera as taxas previstas no Código do Imposto Único de Circulação e prorroga as medidas de apoio ao transporte rodoviário previstas no Estatuto dos Benefícios Fiscais. Intervieram, além do Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais (António Mendonça Mendes), os Deputados Alexandre Poço (PSD), Nelson Silva (PAN), Cecília Meireles (CDS-PP), André Ventura (CH), Duarte Alves (PCP), Isabel Pires (BE), Fernando Anastácio (PS), Sara Madruga da Costa (PSD) e Carlos Pereira (PS).
O Presidente encerrou a sessão eram 16 horas e 59 minutos.
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O Sr. Presidente: — Boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, Sr.as e Srs. Agentes de autoridade.
Vamos começar a nossa reunião plenária.
Eram 15 horas e 6 minutos.
Peço que sejam abertas as portas das galerias.
Antes de entrarmos propriamente na agenda, queria dizer às Sr.as Deputadas e aos Srs. Deputados que, na
sequência dos incidentes processuais verificados na sessão plenária da passada sexta-feira, especialmente
durante as votações regimentais, a Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha, a quem agradeço, promoveu uma
reunião com os serviços, em que participaram outros Secretários da Mesa, com o objetivo de apurar as causas
do sucedido e, mais importante, encontrar formas de ultrapassar as dificuldades que todos sentimos nessa
reunião, em especial a Mesa, como poderão compreender, sobretudo estando em causa votações sobre
matérias muito sensíveis.
Tendo sido identificados os problemas de cariz técnico, quer quanto ao registo de quórum, quer quanto à
votação eletrónica, dizem-me que estes se encontram solucionados.
Relativamente a outras deficiências de funcionamento apuradas, foram determinadas pela Mesa medidas de
implementação imediata com vista a evitar que situações semelhantes voltem a suceder, a bem da imagem do
Parlamento e dos seus serviços, cuja dedicação e competência sempre destaquei publicamente.
Estas garantias não fazem com que, naturalmente, se prescinda da realização de uma auditoria exaustiva a
todo o sistema informático do Plenário, a qual já se iniciou e cujos resultados brevemente levarei ao
conhecimento de todas e de todos.
Muito obrigado.
Vamos, pois, entrar no primeiro ponto da ordem do dia, cuja fixação foi feita pelo Iniciativa Liberal, com a
discussão conjunta, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 920/XIV/2.ª (IL) — Revoga o cartão do adepto,
pela não discriminação e estigmatização de cidadãos em recintos desportivos (Quarta alteração à Lei n.º
39/2009, de 30 de julho), 1012/XIV/3.ª (PCP) — Procede à quarta alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho,
eliminando o cartão do adepto e as zonas com condições especiais de acesso e permanência de adeptos, e
1016/XIV/3.ª (CH) — Procede à quarta alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, e pela revogação da Portaria
n.º 159/2020, de 26 de junho, que define as normas aplicáveis sobre o abreviadamente designado cartão do
adepto.
Antes, porém, vou dar a palavra à Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha, que tem várias informações
importantes para vos transmitir.
Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Muito boa tarde a todas e a todos. Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas pelo Sr. Presidente, várias
iniciativas legislativas.
Em primeiro lugar, refiro a Proposta de Lei n.º 118/XIV/3.ª (GOV), que baixa à 5.ª Comissão, e as Propostas
de Resolução n.os 34/XIV/3.ª (GOV) e 35/XIV/3.ª (GOV), que baixam à 2.ª Comissão.
Deram também entrada na Mesa, e foram admitidos pelo Sr. Presidente, os Projetos de Lei n.os 1012/XIV/3.ª
(PCP), que baixa à 8.ª Comissão, 1013/XIV/3.ª (PAN), que baixa à 7.ª Comissão, 1014/XIV/3.ª (PCP), que baixa
à 6.ª Comissão, 1015/XIV/3.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues), que baixa à 1.ª Comissão, em conexão
com a 7.ª Comissão, 1016/XIV/3.ª (CH), que baixa à 8.ª Comissão, e 1017/XIV/3.ª (CH), que baixa à 1.ª
Comissão.
Finalmente, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os Projetos de Resolução n.os 1499/XIV/3.ª (PAN),
que baixa à 1.ª Comissão, 1500/XIV/3.ª (PCP), que baixa à 8.ª Comissão, 1501/XIV/3.ª (PAN), que baixa à 8.ª
Comissão, 1502/XIV/3.ª (PSD), que baixa à 9.ª Comissão, e 1503/XIV/3.ª (PSD), que baixa à 9.ª Comissão.
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha.
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Vamos, então, entrar no primeiro ponto da nossa agenda e, para abrir o debate, tem a palavra o Sr. Deputado
João Cotrim de Figueiredo.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos aqui hoje, não para falar de futebol, mas para falar de liberdade. Estamos aqui hoje para acabar com esta bizarria que é o
cartão do adepto. Estamos aqui para dizer «não» ao cartão.
Dizer «não» ao cartão é importante. É importante resistirmos a todas as limitações, pequenas ou grandes,
que o Estado quer impor às nossas liberdades individuais. São limitações sempre decretadas supostamente
para o nosso bem, para a nossa segurança, para o nosso bem-estar. Mas não nos deixemos enganar: esta
legislação do cartão do adepto limita direitos fundamentais das pessoas, limita a sua liberdade de aceder a
certas zonas dos recintos desportivos, limita a idade de quem acede a essas zonas e impede grupos familiares
ou de amigos de ver os jogos juntos.
Dizer «não» ao cartão é combater a discriminação entre adeptos. O que este cartão faz é, efetivamente,
discriminar pessoas e estigmatizar certos grupos de cidadãos. É inadmissível que o Estado, que se devia
preocupar em preservar o princípio da presunção de inocência, ache normal assumir nesta lei a presunção de
culpabilidade.
Dizer «não» ao cartão é também urgente. A época desportiva já vai a meio e as bancadas vazias que temos
visto em todos os estádios não são só um atestado à ineficácia da medida, são também um atentado à
sustentabilidade financeira dos clubes, em especial dos mais pequenos, que, depois de duas épocas dramáticas,
passam bem sem mais este rombo nas suas finanças.
Dizer «não» ao cartão é corrigir o que não funciona, nem funcionará no combate à violência no desporto.
Basta, aliás, ver o que se passou em todos os países que experimentaram soluções parecidas: Bélgica, Polónia,
Croácia, Hungria e Chipre voltaram atrás; Itália e Turquia estão a fazê-lo; e Dinamarca e Reino Unido
ponderaram a ideia no passado e optaram por nem avançar. Todos perceberam que não funciona. O Governo
decidiu ignorar todos estes exemplos — hoje, ainda não se sabe porquê.
Para perceber que o cartão do adepto não funciona, bastaria olhar para as bancadas vazias nos estádios;
bastaria saber que já há clubes a pedir a redução da lotação das chamadas «zonas com condições especiais
de acesso», porque perceberam que vão continuar vazias; bastaria ter atenção à oposição unânime de clubes,
de SAD (Sociedades Anónimas Desportivas) e de organizações de adeptos (ainda ontem, 31 organizações de
adeptos assumiram uma posição conjunta contra o cartão do adepto) e também a opinião pública, em geral. Até
a sempre titubeante Liga de Clubes se mostra contra o cartão. Ninguém defende esta lei, mas o Governo acha
que ele é que está certo.
O problema da violência, do racismo e da xenofobia no desporto é real e tem de ser combatido. Mas qualquer
pessoa de bom senso percebe que os elementos mais violentos, por vezes com motivações extradesportivas,
nunca, mas nunca, aderirão ao cartão do adepto, continuarão a ir aos estádios, dispersos entre a restante
assistência, assim contribuindo para que se torne impossível qualquer prevenção prévia ou identificação
posterior. Este cartão não só não resolve o problema, como o piora.
Não dizer «não» ao cartão é não levar a Constituição a sério. É que, se levarmos a sério o princípio da
igualdade do artigo 13.º, o princípio da proporcionalidade do artigo 18.º, se levarmos a sério a liberdade de
associação do artigo 46.º, então, não podemos levar a sério este cartão do adepto.
A aberração jurídica vai mais longe: o Governo introduziu, por portaria, um diploma de natureza
administrativa, uma limitação de acesso aos menores de 16 anos. Em Portugal, em 2021, temos direitos
constitucionais a serem limitados por portaria — é inaceitável!
Dizer «não» ao cartão é evitar o ridículo. Esta lei prevê que, para aceder a determinadas zonas dos recintos,
sejam necessários nada mais, nada menos do que até quatro papéis: o bilhete de jogo, o cartão de cidadão, o
cartão de sócio e o cartão do adepto. Já o disse nesta Casa, este Governo conseguiu transformar a ida a um
jogo de futebol numa experiência mais desagradável do que uma ida a uma repartição de finanças. Só mesmo
o PS, para tirar o gosto ao que devia ser um prazer.
Ridículo é, também, o papel da Autoridade para a Prevenção e o Combate à Violência no Desporto (APCVD).
Serve exatamente para quê? Para além de instalar uns boys do PS na cidade natal do Secretário de Estado, a
APCVD cobra a taxa — é o amor do PS às taxas! — de emissão do cartão e faz umas campanhas de que
ninguém se lembra. O resto é o exercício de funções que não lhe deveriam competir. As funções inspetivas e
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fiscalizadoras competem às autoridades policiais, enquanto as funções sancionatórias deviam competir às
autoridades jurisdicionais.
A APCVD tem competências que não devia ter e, mesmo assim, ainda as extravasa. O seu presidente
confessa, por exemplo, que o objetivo do cartão do adepto é controlar as claques e facilitar a identificação de
infratores.
Ou seja, o Estado confessa-se incapaz de fazer o seu papel de garante da segurança pública e a solução
que encontra é restringir a liberdade de certos cidadãos, presumindo a sua culpabilidade, discriminando e
estigmatizando. O Estado falha e quem paga é o cidadão. É este tipo de prepotência estatal que o Iniciativa
Liberal nunca aceitará.
Perante tudo isto, é possível dizer que, no campeonato da argumentação, o «não» ao cartão ganha por 15-
0. Mantendo a metáfora futebolística, esta lei não pode apurar-se nem passar à fase seguinte. Esta lei só pode
ser despromovida, aliás, esta lei só pode ser eliminada.
O Iniciativa Liberal, que não estava no Parlamento aquando da aprovação desta lei, tem, desde sempre,
manifestado a sua frontal oposição à mesma. Outros partidos acordaram agora para a necessidade da
revogação e arrastaram também iniciativas. São bem-vindos, já que «mais vale tarde do que nunca», mas não
contem connosco para proporcionar motivos para que esta decisão não seja tomada antes da dissolução do
Parlamento.
Para que o processo, na especialidade, seja rápido, optámos, Iniciativa Liberal, por apresentar apenas uma
proposta de revogação de duas normas da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, e da Portaria n.º 159/2020, de 26 de
junho, sem alterar outros aspetos importantes desta legislação e que consideramos errados.
Teremos, certamente, oportunidade de, na próxima Legislatura, voltar a este assunto, para propor outras
alterações à lei que eliminem requisitos limitadores da liberdade individual ao nível da obrigatoriedade de
registos ou de associação e a partilha de bases de dados. E, também, para acabar como uma inacreditável
equiparação no tratamento das designadas manifestações de ideologia política a atos violentos, racistas ou
xenófobos.
O que estes novos censores de hoje defendem teria, por exemplo, tornado impossível a manifestação dos
adeptos da Académica de Coimbra no Estádio do Jamor em plena crise académica de 1969. A memória das
lutas pelas liberdades, ao longo dos tempos, conta, conta muito, e não se pode perder.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Este Parlamento tem, hoje, uma oportunidade de mostrar que, nos estádios,
pode haver bancadas vazias de adeptos, mas aqui não há bancadas vazias de bom senso.
Basta dizer «não» ao cartão. Basta dizer «sim» à revogação proposta pelo Iniciativa Liberal.
O Sr. Presidente: — Para apresentar o projeto de lei do PCP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alma Rivera.
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Cometer um ato de vandalismo, cometer um ato violento, xenófobo ou racista é crime. Apoiar um clube, uma equipa ou até um atleta não é crime, nem
pode ser sequer um indício.
Por isso, puna-se o crime cometido, previnam-se os comportamentos, mas não se sacrifiquem direitos dos
cidadãos, à boleia de supostas medidas de segurança, que, ainda por cima, não são sequer eficazes. Isto
resumiria o que está em causa nesta discussão em torno do cartão do adepto e das zonas com condições
especiais e foi precisamente isto que o PCP disse quando a proposta de lei do Governo, do regime jurídico do
combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, foi discutida aqui
mesmo, a 4 de janeiro de 2019.
Perante problemas complexos e situações de violência, que é preciso combater, foi adotado o caminho mais
fácil, mas nem por isso mais eficaz, que é responder pela via repressiva com medidas de controlo ainda mais
apertadas do que as que já existiam.
Dos vários problemas identificados na proposta, que, entretanto, virou lei, destacamos: a aplicação
indiscriminada de normas a realidades totalmente diferentes, o cartão do adepto, as zonas com condições
especiais de acesso e permanência de adeptos, a equiparação de uma manifestação de ideologia política a um
ato criminoso de racismo ou xenofobia.
A conjugação destas questões torna a Lei n.º 113/2019, de 11 de setembro, uma afronta aos direitos de
associação e manifestação e às liberdades de todos nós.
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Entretanto, seguiu-se um processo de especialidade, em que o PCP tentou retirar da lei estas referidas
questões e alterações negativas. Chamou a atenção ⎯ sim, não acordou agora para esta questão! ⎯, mas as
propostas que eliminavam a figura do cartão do adepto e a zona com condições especiais de acesso e
permanência de adeptos, entre outras, foram rejeitadas pelos restantes partidos.
Pelas piores razões, com a pandemia e as medidas de confinamento decretadas, os impactos da lei e da
respetiva portaria que regulamenta o cartão do adepto e das zonas especiais vieram sentir-se mais à frente.
Não que não tivesse havido avisos e alertas, porque, além do PCP, desde a primeira hora, associações e grupos
de adeptos se fizeram imediatamente ouvir, como é o caso da Associação Portuguesa de Defesa do Adepto.
Mas, enfim, hoje estamos aqui e temos oportunidade de corrigir este erro e impedir que tome proporções
maiores. As consequências destas medidas são várias e não resolvem nenhum dos problemas a que se
propunham.
O que hoje se decide é se devemos insistir numa má solução. Decide-se se um adepto deve ser discriminado
e tratado com suspeição pelo facto de o ser. Decide-se se queremos dividir os adeptos em bons e maus, se
queremos zonas em que não podem entrar jovens com menos 16 anos, afastando-os das suas famílias. Decide-
se se queremos limitar, ainda mais, a utilização de bandeiras e outras formas de expressão. Decide-se se um
adepto, que o queira ser em toda a plenitude, tem de registar-se e fornecer dados, de forma desproporcionada
e sem justificação. Decide-se se só se pode ser adepto mediante o pagamento de 20 € pelo próprio registo, se
fica dificultada a participação dos adeptos em jogos fora de casa e se, em última instância, queremos ver as
bancadas vazias e o desporto cada vez menos ligado à vida e ao povo.
Estão em causa um conjunto de coisas e nenhuma delas tem que ver com o combate à violência, ao racismo
ou à xenofobia.
Srs. Deputados, a violência e as discriminações são graves problemas que existem na sociedade e que se
revelam em vários contextos, dentro e fora dos recintos desportivos e a montante destes.
Por isso, em vez de soluções fáceis e injustas, procure-se resolver os problemas sociais, económicos e
culturais que estão na origem desses problemas e do aproveitamento dos mesmos e procure-se sempre
soluções que sejam adequadas, proporcionais e eficientes.
Este é o compromisso e, simultaneamente, o desafio que o PCP aqui deixa nesta discussão e no dia em que,
desejavelmente, enterramos o cartão: que se desfaça o que está mal feito e que se faça uma verdadeira
discussão sobre o problema com todos os agentes desportivos, não contra eles, mas com eles. Abaixo o cartão
do adepto!
Aplausos do PCP e do PEV.
O Sr. Presidente: ⎯ Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente e Srs. Deputados: Revogar o cartão do adepto é não só uma questão de liberdade como de eficácia.
Todos os exemplos que temos na União Europeia e fora dela, de instrumentos semelhantes a este, mostram
que foi ineficaz no combate aos fenómenos que pretende combater e que aumentou, consideravelmente, os
custos de quem quer assistir ao fenómeno desportivo.
O socialismo conseguiu uma coisa extraordinária: até no desporto, consegue cobrar taxas! É um fenómeno
tão intrínseco ao socialismo a ideia de que até para se divertir e para disfrutar do desporto é preciso pagar! Mas,
em Portugal, isso tem uma agravante, pois o fenómeno do racismo e da xenofobia são pretextos para cobrar 20
€ ou 30 € aos adeptos de futebol.
Os projetos que aqui foram apresentados deviam ter ido mais longe, porque o regime sancionatório que
temos nesta lei é absolutamente absurdo na forma como aplica e permite sanções no âmbito do desporto.
Qualquer pessoa que olhe para este regime com olhos jurídicos, de análise, percebe o erro e o excesso que
estes projetos contêm.
O projeto de lei do Chega vai mais longe e reforça a videovigilância no fenómeno do desporto. Se hoje temos
muitos problemas de violência dentro dos estádios de futebol e de outros recintos, meus senhores, não é preciso
cartão do adepto, nem mais burocracia, nem mais custos, é preciso mais segurança, mais transparência e mais
videovigilância.
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É isso que o Chega traz a esta Assembleia e é para isso que pede a aprovação desta Câmara.
O Sr. Presidente: ⎯ Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Monteiro.
O Sr. Luís Monteiro (BE): ⎯ Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em 2009, a Assembleia da República fez o que lhe competia, ou seja, não fechou os olhos a nenhum problema e, por isso, interveio sobre um processo
legislativo da maior importância.
Na altura, a Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, veio, em boa hora, reunir e densificar um conjunto de normativos
legais relativos ao combate ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos eventos desportivos.
Esse regime jurídico enquadrou mecanismos para o funcionamento destes eventos, apresentando como
objetivo principal a garantia da segurança de todos os espectadores, agentes e atletas envolvidos neste
fenómeno.
Esse debate, já revisitado pelo Parlamento em 2013, voltou em 2019, através de uma proposta de lei, que,
aprovada na Assembleia da República, após processo de discussão na especialidade, representa alguns
avanços significativos no combate aos vários tipos de violência que existem no desporto.
O desporto é, e tem de ser, um espaço de inclusão e é por isso que devemos ser, absolutamente, claros: as
várias entidades, do Estado aos clubes ou às organizações que tutelam cada modalidade desportiva, têm o
dever de garantir tolerância zero para com a violência e a exclusão.
Nesse pacote de medidas estava incluída, entre outras coisas, a criação do cartão do adepto e,
subsequentemente, a criação de zonas específicas de adeptos em cada recinto desportivo.
Se a Assembleia da República deu o benefício da dúvida a esta lei, também com o voto do Bloco de
Esquerda, este também é o momento de fazer um balanço prévio da sua aplicação e esse balanço, três meses
passados sobre a sua aplicação efetiva, é muito simples: o cartão do adepto é, em suma, uma medida ineficaz,
porque não resolveu nenhum dos problemas e até pode ter vindo a criar alguns problemas novos.
Apesar desta última alteração à lei de 2019, a crise pandémica e o consequente encerramento ao público
dos espetáculos desportivos, durante mais de um ano, implicaram que a necessária reflexão sobre a aplicação
desta medida tardasse. Ainda assim, podemos assumir que, nos três meses da sua aplicação efetiva, há traços
gerais que já podem ser analisados e que, em nosso entender, são indicativos de que é necessário encontrar
novas soluções num futuro próximo.
A solução criada em 2019 tinha como objetivo identificar membros de grupos organizados de adeptos com o
intuito de reservar setores específicos para estes nos recintos desportivos. Esses objetivos não só não foram
alcançados como mantiveram ou aprofundaram a desresponsabilização dos clubes pelos grupos organizados
de adeptos afetos a si.
Um clube, por obrigação legal, cria zonas especiais para grupos organizados de adeptos, mas, se esses
grupos organizados de adeptos, formal ou informalmente, decidem não adquirir bilhetes para essa zona,
ocupando outros setores do estádio, a lei tem como única consequência deixar setores dos estádios vazios.
Essa circunstância não convida apenas a uma reflexão sobre a aplicabilidade ou não da lei em vigor, mas
implica um especial cuidado para o legislador quando é percetível que esses grupos organizados de adeptos,
ocupando setores do recinto desportivo destinados a qualquer outro espectador, estão, muitas vezes, a impedir
que toda essa massa adepta possa assistir ao evento com segurança, visibilidade e os confortos necessários.
Desde o primeiro momento em que teve assento parlamentar, o Bloco esforça-se para encontrar as melhores
soluções legais e sociais para o fenómeno da violência no desporto e temos cada vez mais a certeza de que só
uma responsabilização conjunta dos clubes e das claques pode vir a dar frutos.
Não se trata, por um lado, de obrigar as direções dos clubes a representar criminalmente todo ou qualquer
adepto, nem, por outro, de obrigar qualquer conjunto de pessoas a constituir-se enquanto entidade coletiva.
Porém, é necessário garantir toda a transparência na relação dos clubes com as suas claques, nomeadamente
em que condições é que acedem aos bilhetes, em que condições é que têm ou não acesso a zonas especiais e
que deveres é que esses grupos de adeptos apresentam perante os clubes e a utilização dos recintos.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
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O Sr. Luís Monteiro (BE): — O cartão do adepto, em suma, não veio garantir mais transparência nesses processos, veio, ao invés, englobar a participação de todo e qualquer espectador de eventos desportivos num
debate que, em grande medida, deve incidir sobre a clarificação da relação entre clubes e claques.
No mesmo sentido, com o propósito de combater o racismo, a xenofobia e a intolerância, proibir todo e
qualquer tipo de manifestação política pode revelar-se um passo atrás. O que é necessário, isso sim, é fazer
cumprir a Constituição da República Portuguesa no que toca ao combate às expressões de cariz fascista e
racista.
Sabemos que, desde 2009, esta lei já foi revista duas vezes e, com o debate de hoje, podemos caminhar
para uma terceira. O importante é que consigamos aprofundar um caminho que já foi iniciado há mais de uma
década e com a certeza de que o futebol se faz um desporto popular, porque no dia em que perder os seus
adeptos deixa de ser futebol.
É isso que deve sempre manter-se no debate que queremos aqui: um desporto popular e inclusivo, sem
violência e sem exclusão.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: ⎯ Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Silva, do PAN.
O Sr. Nelson Silva (PAN): ⎯ Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Desde que foi criado, o cartão do adepto tem gerado mais problemas do que soluções. Num contexto de desconfinamento e de alívio das restrições
ligadas à crise sanitária, a implementação do cartão do adepto veio complicar desnecessariamente o que deveria
ser simples ao implicar mais restrições e burocracias à simples participação num evento desportivo.
Este cartão surgiu com a ideia nobre de combater o racismo e a intolerância nos eventos desportivos, no
entanto, este objetivo foi completamente falhado. A delimitação de uma zona, que tem como objetivo conter
adeptos problemáticos, além de discriminar e segmentar os adeptos, que, simplesmente, optam por essa zona
do estádio, acaba por fazer o contrário.
No estádio da Luz ou em Alvalade, no estádio da capital do móvel ou no estádio municipal de Arouca, as
zonas designadas do cartão do adepto encontram-se predominantemente vazias, espalhando-se os supostos
adeptos problemáticos por todo o estádio.
Além disso, os indivíduos que optem por adquirir o cartão do adepto, além de terem que pagar um bilhete
para o evento, os 20 € do cartão e preencher todas as burocracias adicionais que lhe estão associadas, acabam
por se ver separados da restante massa associativa do seu clube, apagando por completo a chama de apoio
que reside dentro de cada adepto.
Estas complicações tornam-se ainda mais gritantes quando o adepto pretende ir ver o seu clube num jogo
fora de casa.
Desde a criação do cartão, o apoiante tem de possuir este documento se quiser comprar bilhete para a zona
atribuída ao seu clube no estádio do rival. Mais uma vez, este cartão complica o que não devia ser complicado
e acrescenta uma burocracia desnecessária a quem pretende apoiar o seu clube.
O veredicto é unânime e, entre adeptos e clubes, dirigentes e claques, a impopularidade desta medida é
quase palpável. Mais palpável do que isto só a falta de consideração do Governo ao ter promovido uma medida
que sabia que ia ser contestada pelos adeptos e ao dificultar a vida aos clubes num contexto de reabertura ao
público e de alívio das medidas de combate à pandemia.
Mais: se o Governo tivesse feito o seu trabalho de casa, saberia que em Itália e em Inglaterra foram
promovidas medidas semelhantes à do cartão do adepto e que estas também se destacaram pelo seu insucesso.
O PAN acredita que o racismo, a xenofobia e a intolerância devem ser combatidos tanto dentro como fora
dos estádios e, apesar de saudarmos a intenção de o Governo entrar neste combate, é visível que o cartão do
adepto em nada ajuda nesta batalha e apenas piora a experiência de lazer do adepto.
Com isto, acompanhamos a abolição do cartão do adepto, mas não baixamos os braços no combate ao
racismo no futebol.
O PAN olha com interesse para medidas semelhantes às que foram implementadas, por exemplo, em
Espanha, e esperamos poder lançar esse debate com mais tempo e ponderação na próxima Legislatura, de
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forma a combatermos o racismo e a intolerância no desporto, mas sem nunca discriminar a esmagadora maioria
dos adeptos que quer, simplesmente, assistir ao jogo e apoiar o seu clube nos estádios.
Face ao exposto, o PAN votará a favor dos projetos do PCP e do IL, apesar de se focarem na resolução do
problema no curto prazo, por terem a resposta transversal que defendemos e que deverá ficar para discutir na
próxima Legislatura, por falta de tempo.
No caso da proposta do Chega, vamos abster-nos, não só porque a proposta não está, técnica e
juridicamente, rigorosa em diversos aspetos — por exemplo, revoga o cartão do adepto, mas não elimina a
existência de zonas nos estádios destinadas apenas a portadores deste documento —, mas também porque
pode ter consequências negativas para a segurança dos adeptos e recintos desportivos, ao propor, por exemplo,
o fim da proibição de circulação entre os setores.
O Sr. André Ventura (CH): — Não existe proibição da circulação!
O Sr. Presidente: — Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Tiago Estevão Martins, do PS, queria, desde já, que todo o Plenário soubesse que vamos ter votações no final da sessão, ou seja, vamos ter de nos inscrever
para haver quórum de deliberação e para votarmos.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Tiago Estevão Martins.
O Sr. Tiago Estevão Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em democracia não há setor da sociedade que viva em estado de exceção, que possa viver como se as normas não lhe fossem aplicadas,
como se tudo fosse permitido ou como se a autoridade do Estado ficasse à porta.
Precisamos de ser claros. O combate à violência no desporto não pode ser romanceado e deve ser tratado
como aquilo que representa: como o combate ao ódio, como o combate ao racismo e à marginalidade que corrói
os alicerces da nossa sociedade.
Aplausos do PS.
Os episódios lamentáveis a envolver o meio desportivo têm-se sucedido ao longo dos anos, crescendo para
fora dos estádios e recintos desportivos, com situações particularmente graves e de má memória.
O episódio envolvendo Marega, a invasão de Alcochete, a morte de Marco Ficini, os apedrejamentos a
autocarros de jogadores, as agressões a árbitros, adeptos e jornalistas são sintomas que não devemos ignorar,
porque mancham o bom nome do desporto e de todos os adeptos, mas, decisivamente, os mais básicos
princípios de convivência democrática.
A necessidade de estancar este fenómeno na origem foi entendida por todos como urgência. Precisamente
por isso, decidiu este Parlamento intervir, aprovando uma legislação que mereceu, à data, a aprovação de todos
os partidos, com a exceção do Partido Comunista Português.
Esta lei permitiu robustecer o quadro legal de combate à violência no desporto, através de um entendimento
político alargado, fruto do trabalho conjunto entre esta Assembleia, as forças de segurança e os organizadores
de eventos desportivos.
É certo que não há legislação perfeita ou à prova de crítica e mesmo uma lei construída de forma madura,
alargada e responsável por todos os intervenientes deve ser escrutinada. Prova disso é que, das muitas medidas
que constam desta lei, existe uma que tem sido alvo de intensa discussão e que motiva o debate de hoje, que
saudamos.
Podemos questionar as motivações de alguns dos seus maiores promotores e não devemos ignorar os
interesses de muitos dos seus maiores críticos, mas, fundamentalmente, devemos colocar-nos a verdadeira
questão: existe ou não espaço para melhorias, o cartão do adepto é, na prática, aquilo que se pretendia?
A implementação generalizada do cartão do adepto tem, à data, pouco mais de três meses, mas isso não
nos deve impedir de avaliarmos, sem medos, a sua implementação e as suas fragilidades. Devemos ter esta
abertura, mas qualquer alteração deve ser pensada e discutida de forma ponderada e com a envolvência de
todos os agentes relevantes, tal como aconteceu com a alteração de 2019.
Vozes do PS: — Muito bem!
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O Sr. Tiago Estevão Martins (PS): — É nosso dever fazê-lo porque é de segurança que falamos e temos uma obrigação para com todas as famílias e para com todos aqueles que amam o desporto e que têm o direito
de se sentir seguros.
Não devemos ter medo das palavras e não devem existir equívocos. A abertura para avaliar a implementação
desta medida não poderá nunca ser uma vitória para quem espera um passo atrás nos meios de combate a este
fenómeno. Tem de ser mais uma oportunidade para robustecermos a resposta aos fenómenos de violência no
desporto e para garantirmos que a segurança, a liberdade e a dignidade de todos os adeptos é respeitada, seja
em que sítio for.
Aplausos do PS.
Sr.as e Srs. Deputados, cabe-nos a nós a responsabilidade, mas também a coragem de não darmos tréguas
a esta realidade. Fora desta Casa há quem, perante a violência no desporto, prefira encolher-se, porque tem
medo, porque é mais cómodo ou porque é uma matéria sensível e complexa. Essa não é a nossa posição.
Perante as dificuldades, a solução é o passo em frente e perante a complexidade, a solução será sempre a
procura de mais e melhores contributos.
Só assim estaremos a cumprir com o nosso dever e com aquilo que a sociedade nos exige. A luta contra a
violência no desporto não acaba por decreto, mas nada fazer é continuar a compactuar com o intolerável.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Mariana Silva, de Os Verdes.
A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os projetos de lei que temos hoje a debate respondem a uma questão muito sentida por milhares de adeptos de futebol, que, depois de quase dois
anos sem poderem acompanhar os seus clubes, são agora confrontados com estas limitações nos estádios.
Podemos dizer que a experiência feita, na linha, aliás, do que aconteceu noutros países, falhou. Não foi por
falta de aviso de quem sabe do assunto, mas o Governo fez «ouvidos de mercador». A pretexto do combate à
violência no desporto, a pretexto do combate à venda ilegal de bilhetes, o Governo impõe uma solução que não
resolve problema nenhum, pelo contrário.
Assegurar um ficheiro centralizado de informações sobre adeptos não resolve os problemas de violência e
pode até agravá-los, ao empurrar os adeptos para locais dispersos no estádio e fora dele. Sendo uma operação
voluntária, o mais certo é atingir apenas os adeptos considerados ordeiros e disciplinados, deixando todos os
outros de fora.
É o próprio Governo que reconhece o que se tem verificado, e passo a citar, «em grande parte dos estádios
(...) as zonas com condições especiais de acesso e permanência de adeptos (afetos ao cartão do adepto) não
foram ocupadas, observando-se, inclusive, uma anormal dispersão de adeptos e uma alteração de
comportamentos nos acessos aos recintos desportivos e áreas envolventes».
Com esta situação, o Governo causa também problemas aos clubes, que estão a perder receitas por
centenas de lugares que não estão a ser preenchidos.
A questão, Sr.as e Srs. Deputados, é que a violência no desporto, exatamente como a violência na sociedade,
não se resolve com medidas burocrático-administrativas nem com a estigmatização de uma parte dos mais
fervorosos apoiantes do desporto.
Sabemos que o mais fácil é decidir uma medida qualquer, seja um cartão, seja regras de controlo e limitação,
seja reforçar o policiamento. O mais difícil são as medidas de política pública, de formação de monitores e de
facilitadores, é a intervenção em problemas sociais, que desembocam no fenómeno desportivo.
É necessário a promoção da tolerância, do desportivismo, da fraternidade no desporto. A violência no
desporto combate-se a partir das mais tenras idades, com a generalização do desporto escolar e da prática
desportiva, com a promoção da amizade no desporto entre adeptos das mesmas equipas, mas também entre
adeptos de equipas opostas.
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O que é preciso é uma estrutura pública para o desporto no nosso País que fale com os grupos de apoiantes
e que os ponha a falar entre si, que conheça e acompanhe a realidade e sobre ela intervenha.
Não é do cartão do adepto que precisamos. É de outra política para o desporto nacional, em todas as suas
vertentes.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Arrobas, do Grupo Parlamentar do CDS-PP.
O Sr. Miguel Arrobas (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Se a segurança nos recintos e nos espetáculos desportivos é algo que nos move a todos na procura de soluções e medidas que previnam
quaisquer práticas limitadoras dessa mesma segurança, face a acontecimentos que, aqui e ali, mancham o
desporto nacional, também é certo que nos deve cada vez mais preocupar apelando a um esforço comum, de
políticos, órgãos de polícia e agentes desportivos, o combate a todas as formas de violência que atentam contra
ela.
Em relação a racistas, xenófobos ou quaisquer tipos de demonstrações de intolerância, seja em que área
for, mas, no que respeita à matéria hoje em discussão, nos espetáculos desportivos, todos devemos ser
chamados a procurar soluções.
Há que reconhecer o esforço legislativo que tem sido feito ao longo dos tempos, tendo o legislador vindo a
clarificar conceitos que, no caso do Direito do Desporto, vêm sendo cada vez menos indeterminados.
Contudo, em 2019, no entender do CDS, o legislador foi muito além do que devia, dando um passo maior do
que a perna, defraudando, com a criação do cartão do adepto, todas as expectativas que agentes e empresários
desportivos, mas também todos os amantes do desporto em geral, tinham em relação a esta matéria.
Desde logo, a lei entra por um caminho errado, presumindo que a violência apenas existe nas manifestações
desportivas, tendo o setor sido discriminado em relação a outros não desportivos, como o de concertos, festas
e romarias, ou, porque não, de bares e discotecas, onde também ocorrem desacatos, de tempos a tempos.
A lei que consagra o cartão do adepto é mesmo, no entender do CDS, uma lei que põe em causa liberdades
individuais e até princípios constitucionais, que deviam estar bem enraizados. Desde logo, o princípio da
igualdade, mas também o da proporcionalidade e da legalidade na restrição a direitos fundamentais. Como
exemplo, refira-se um cartão do adepto que faz uma segregação entre adeptos visitantes e visitados,
promovendo uma diferenciação entre estes, que não só é injustificável, mas inqualificável, na medida em que
fomenta desigualdades.
Porque não dizer que a medida é, ela própria, uma ameaça à liberdade de associação de cada um, uma vez
que vem impor aos detentores do cartão do adepto a obrigação de informarem sobre a pertença ou não a
determinadas organizações?
Como se tudo o que foi referido não bastasse, estas medidas podem impedir a sempre salutar presença de
famílias nos espetáculos desportivos, deixando de promover o encontro familiar e intergeracional, tão importante
a tantos níveis, e ainda mais em ambiente de festa.
São, em suma, muitas as reservas e indignações que o cartão do adepto tem provocado em todo o meio
desportivo, levando ainda a um decréscimo na afluência de público às bancadas, dificultando ainda mais a
sustentabilidade da atividade desportiva.
O legislador apresenta soluções que já demonstraram não fazer sentido ou que se mostraram totalmente
ineficazes na resolução do problema e por isso têm sido, em outros ordenamentos jurídicos da Europa,
abandonados. Não se entende porque Portugal continua a acreditar nesta solução.
É urgente promover sem limite o fair play, começando pelos mais jovens. Quanto mais tempo ainda é preciso
esperar para implementar o safe standing ou o lugar seguro?
Ao invés de investir em sistemas de videovigilância, que detetem todos e quaisquer infratores nos recintos
desportivos, e em normas punitivas — essas, sim! —, que visem restringir a liberdade de acesso a espetáculos
desportivos a quem faça do desporto um campo de batalha, físico ou verbal, o Governo dá-nos mais burocracia
e medidas de antipatia! E o adepto, que é também contribuinte, é que paga.
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Por tudo isto, e por muitas outras razões que o tempo aqui não permite desenvolver, não vemos quaisquer
razões para que esta medida do cartão do adepto não seja imediatamente apagada do nosso ordenamento
jurídico e para que a sua revogação seja mesmo uma forma de apaziguar o setor e dar a nova esperança de
retoma, que os agentes desportivos tanto desejam.
Há um combate a travar contra a violência no desporto. As armas que estão a ser utilizadas não nos
permitirão vencer esse combate, quanto mais ganhar esta guerra!
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro, do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quanto aos princípios, estamos sempre todos muito de acordo. Há que combater a violência, há que impedir que o espaço desportivo seja um
local onde se promova a xenofobia, a discriminação. Estamos sempre todos muito de acordo.
A dificuldade é quando passamos à fase de implementar medidas e aqui já temos um histórico vasto. Desde
2009, procurou criar-se um regime legal que, de alguma forma, pudesse construir balizas para que cada um de
nós, com a sua família, pudesse usufruir de um evento desportivo em segurança, sem ter de se incomodar. O
objetivo é este ponto, no qual todos nos revemos.
Quero recordar que, entre 2009 e 2013, houve uma alteração da legislação e já havia problemas. Porquê?
Porque já se previa ser necessário registar as claques, os grupos organizados de adeptos. O que aconteceu aí?
Aconteceu aquilo que todos nós sabemos, mas que, às vezes, fingimos não saber. É que os clubes não têm
claques nem têm grupos organizados de adeptos, mas têm as sedes dos mesmos nos seus estádios, e outros
têm um conjunto residual de adeptos inscritos. É por isso que há um continuum, uma evolução e, quando
discutimos este assunto, durante muito tempo, em 2019, isto foi tudo ponderado.
Também quero dizer que a lei de 2013 previa que, ao fim de dois anos, ela fosse revista. Ou seja, a própria
lei tinha um mecanismo que apelava a que, dois anos depois da sua entrada em vigor, se fizesse uma reflexão,
para fazermos alterações. É aqui que, se calhar, os problemas começam.
Este dossier do início da revisão da legislação de 2013 era o primeiro dossier no processo de transição entre
os Governos. Fui eu próprio que dei ao meu sucessor, ao então Secretário de Estado do Desporto, um conjunto
de matérias, sendo que a primeira era qual?! Era o ponto de situação do início da revisão desta lei. Ou seja, as
reuniões já tinham sido efetuadas com os vários participantes do setor desportivo e o ponto de situação também.
Por isso, no Parlamento, ficámos todos à espera de que o Governo fizesse aquilo que a própria lei dizia, ou seja,
a revisão à avaliação da lei de 2013.
Passou 2016, 2017, 2018 e, já em 2019, em setembro, ou seja, já no final da Legislatura, veio esta legislação.
Perdemos quatro anos, se calhar, para fazer uma ponderação que poderíamos fazer em duas horas ou em
menos tempo. Esta é a realidade de fundo.
O que é que aconteceu?! Todos participámos — tirando os partidos que não estavam cá — na avaliação
desta legislação e ela mereceu um amplo consenso, mas tinha coisas experimentais, sendo o cartão do adepto,
que é uma peça nesta legislação toda, uma questão experimental. É um facto.
Contudo, durante uma época e meia, não houve espectadores, logo, não houve problemas nos estádios,
precisamente porque não havia espectadores.
Quando esta época começou, e só estamos ainda a menos de um terço, começou a evidenciar-se um
conjunto de problemas.
Neste processo, até já tem havido respostas, porque tem havido alterações sucessivas para facilitar o acesso
aos estádios.
Ora, o que é que falhou?! É que, ao longo do ano de 2020, em que houve desporto sem espectadores, devia
ter havido o cuidado, por quem tem a responsabilidade — ou seja, o Governo, que até, se calhar, devia estar
aqui, para participar neste debate connosco, e não está —, de preparar a implementação das medidas!
Aplausos do PSD, do CDS-PP e do CH.
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Sr.as e Srs. Deputados, o processo de 2019 foi altamente debatido e maturado no Parlamento, e não teve
nenhum voto contra. Porquê?! Porque houve, de facto, um voto de confiança para se criar mais uma resposta,
ou melhor, para dar continuidade na resposta que era precisa para combater estes fenómenos, mas não foi isso
que foi feito.
O que se fez foi deixar andar. A COVID-19 paralisou o Governo no desporto. Já todos sabemos que, em
diversas áreas, foi assim, infelizmente.
Nesta matéria essencial, nova e experimental, o Governo falhou redondamente no envolvimento dos
parceiros, dos clubes que organizam os jogos, dos adeptos, de todos, criando, de facto, esta situação que
estamos a viver hoje.
Aplausos do PSD.
São diagnosticados, de facto, comportamentos que não deviam acontecer, questões erradas e respostas que
não estão a aparecer.
Assim sendo, gostaria de dizer que o PSD esteve sempre do lado das soluções nesta matéria e, quando teve
funções governativas, sempre esteve do lado das soluções. O Euro 2004 foi um sucesso de organização, sem
incidentes — o PSD estava no Governo.
O PSD, em 2013, preparou uma legislação que tinha de ser revista em 2015. O Governo de António Costa
resolveu fazê-lo em 2019 e temos um problema com a lei de 2019. Esta é que é a grande verdade.
Aplausos do PSD.
Contudo, não posso deixar de tecer alguns comentários relativamente àquilo que estamos a discutir. O
Iniciativa Liberal tinha razão antes do tempo, porque, no dia 5 de agosto, já estava a pedir a revogação do cartão
do adepto. Ainda não havia campeonato, ainda não havia um jogo feito, mas já se sabia que ia haver problemas.
O Partido Comunista volta a pisar aquilo que já tinha dito em 2019. O que é que preocupa o Partido
Comunista?! É que o IPDJ (Instituto Português do Desporto e Juventude) desapareceu e apareceu uma
autoridade. Não gosta de autoridades. Diz que há um reforço do papel da segurança privada. Não gosta do
reforço da segurança. Diz que não deve haver criação de zonas específicas e diz uma coisa, na sua exposição
de motivos, que…
Protestos do PCP.
Desculpem, Srs. Deputados do Partido Comunista, mas não posso deixar passar em claro os senhores
dizerem, e vou ler o vosso diploma, o seguinte: «Note-se que esta lei, focada apenas na realidade das grandes
competições desportivas, aplica-se indiscriminadamente a uma realidade heterogénea, a qualquer nível
competitivo.»
Srs. Deputados, explico, já que não leram: isto aplica-se às competições profissionais e àquelas não
profissionais, em que é decretado o estado de risco do próprio jogo. Por isso, não se aplica indiferenciadamente
a todo o setor desportivo.
Convém estudar um bocadinho antes, para não criar falsidades no debate político.
Aplausos do PSD.
Protestos do PCP.
O que vocês escrevem, no vosso diploma, é mentira! Não existe em legislação nenhuma, nem na de 2009,
de 2013, ou de 2019.
Posto isto, temos um problema que está sinalizado, está diagnosticado. Estamos disponíveis, como no
passado, para aquela que for a vontade da Assembleia, para contribuir para que a solução seja melhorada e
reforçada. Foi sempre esse o nosso compromisso.
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Não posso deixar, também, neste aspeto, de recordar ao Iniciativa Liberal e aos demais partidos que
apresentaram propostas que a comissão parlamentar, no seu relatório, concluiu, e bem — foi aprovado por
unanimidade —, que, havendo a aprovação deste diploma, teríamos de ouvir o Secretário de Estado da
Juventude e do Desporto, o Instituto do Desporto de Portugal, as federações, as ligas profissionais, as
sociedades desportivas, os clubes desportivos, as associações de vários desportos, os conselhos de arbitragem,
o Comité Olímpico de Portugal, o Comité Paralímpico de Portugal, a Confederação do Desporto de Portugal, as
forças de segurança, os grupos organizados de adeptos, a Associação de Coordenadores de Segurança de
Portugal, a Associação Portuguesa de Defesa do Adepto, a Procuradoria-Geral da República e o Conselho
Superior do Ministério Público.
São estas as entidades que temos de ouvir, para dar cumprimento à deliberação da comissão parlamentar,
relativamente a estas iniciativas.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Chega, para uma intervenção.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: É preciso partirmos do pressuposto que o que aconteceu com o caso Marega ou com Marco Finici nada tem que ver com o cartão do adepto. É preciso ter
muita má-fé para trazer a este Plenário casos que ocorreram fora de recintos desportivos, como se tivessem
que ver com o cartão do adepto, para cobrar 20 € aos portugueses, como se isso fosse resolver qualquer
problema de racismo ou de xenofobia que os senhores veem no futebol e acham um problema relevante.
Sr. Deputado Nelson Silva, a circulação entre setores nos estádios não pode ser imposta cegamente. É uma
questão técnica evidente. Há estádios onde não é possível proibir a circulação entre setores.
O que propomos nesta lei é básico: revogamos uma norma, porque o fim dessa mesma norma diz que tem
de se aplicar o regulamento de cada um dos recintos desportivos. Isso basta perfeitamente para que, nos casos
em que haja circulação, esta possa ser garantida e, nos outros casos, não o seja.
Finalmente, Sr. Deputado, desculpe dizer-lhe isto, mas não leu bem a proposta. É que o n.º 13 do artigo 16.º-
A que está em vigor estabelece uma série de casos em que se aplicam sanções e diz «e» em vez de «ou», o
que quer dizer que teriam de ser todas as condições cumulativamente a levar a uma sanção.
Não era esse o espírito do legislador. O espírito do legislador era o de permitir que, em qualquer dos casos
de incumprimento, possa haver uma sanção. A proposta do Chega, o que faz é resolver um problema técnico e
jurídico, que faz todo o sentido, face à lei que temos em vigor.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.
O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente. Podemos ver racismo e xenofobia em todo o lado, mas não façam os adeptos de futebol e do desporto pagar
pelas vossas visões deturpadas do mundo e de Portugal.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Eduardo Barroco de Melo, do Grupo Parlamentar do PS, para uma intervenção.
O Sr. Eduardo Barroco de Melo (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Somos convocados a este debate porque, em 2019, a Assembleia da República aprovou a Lei n.º 113/2019 e, portanto, estabeleceu o
regime jurídico da segurança e combate ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos,
que alterou essa lei de 2009.
É importante dar essa nota, porque, em primeiro lugar, é preciso perceber que estamos a discutir uma lei
que partiu da Assembleia da República e que, como já foi dito, teve amplo consenso.
Chegados a 2021, é preciso reconhecer que as alterações que se introduziram nesse regime jurídico deram-
lhe uma robustez que não possuía nessa altura e que nos permite, hoje em dia, responder de forma mais eficaz
aos fenómenos que não se coadunam com a prática e os princípios desportivos.
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Aliás, a única inovação neste debate é a de que parece que temos partidos que não compreendem que travar
os problemas de violência associados ao fenómeno desportivo faz-se a partir do momento em que eles se
originam, que é precisamente nos locais de prática desportiva. Não podemos fazer de conta que os fenómenos
associados à prática desportiva que acontecem fora dos recintos desportivos não tiveram o seu início na
aglomeração de pessoas, que se juntaram com esse propósito.
A prova de que, atualmente, temos um regime mais robusto, é a de que, hoje, não estamos a discutir a lei,
mas estamos a discutir, sobretudo, um único aspeto que consta dessa lei.
Hoje, já não estamos a pôr em causa a Autoridade para a Prevenção e o Combate à Violência no Desporto,
nem o Ponto Nacional de Informações sobre Desporto, por exemplo. Reconhecemos, até, que o trabalho de
elaboração da Lei n.º 113/2019 foi feito de forma suportada. Foram ouvidas autoridades de segurança, os clubes
desportivos e outras entidades desportivas. Os grupos parlamentares, na Assembleia da República, à época,
empenharam-se neste debate de forma bastante aprofundada, daí ter sido aprovada praticamente com
unanimidade, não merecendo votos contra.
Este reconhecimento tem, também, respaldo nos números. Se olharmos para aquilo que aconteceu entre a
época desportiva de 2013/2014 e a de 2017/2018, tivemos 90 decisões judiciais e 32 administrativas sobre
interdição de acesso a recintos desportivos. Só em duas épocas, de 2017/2018 para a frente, houve 176
interdições judiciais e 411 administrativas.
Portanto, houve uma enorme evolução. Para quem diz que não se fez nada, houve uma enorme evolução
do ponto de vista da eficiência da lei para combater estes fenómenos.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Eduardo Barroco de Melo (PS): — Aquilo que temos, atualmente, como disse há pouco, é uma lei mais eficaz, mais robusta, que resolve os problemas que nós, na Assembleia da República, tomámos por missão
resolver.
O Sr. André Ventura (CH): — Não é verdade!
O Sr. Eduardo Barroco de Melo (PS): — Acho que esse é o ponto de partida para esta discussão. Mas avaliar políticas públicas é um exercício de responsabilidade e não pode ser feito sem atender a que
estes são temas difíceis, complexos, que não podem ser tratados na base do maniqueísmo. Lamentamos, por
isso, que as avaliações que estamos a discutir hoje, apresentadas pelos diversos proponentes, não façam uma
discussão sobre a lei, mas se limitem a revogar, sem qualquer proposta de melhoria.
Portanto, hoje, a Assembleia da República não é chamada a decidir construtivamente sobre esta lei, mas é
chamada a revogar uma das medidas nela adotada. Não nos revemos no determinismo de quem imagina que
o combate à violência no desporto se faz revogando o cartão do adepto. Da nossa parte, não esperarão
respostas fáceis para resolver problemas complexos.
O Partido Socialista está onde sempre esteve: aberto à avaliação de todas as medidas, disponível para
melhorar qualquer aspeto que se julgue necessário, mas nunca ignorando os problemas concretos que surgem
a cada momento.
Defender o desporto é recusar a violência, a discriminação, a intolerância, sem medo de continuar a procurar
as melhores soluções.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — A Sr.ª Deputada Carla Madureira, do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra, para uma intervenção.
A Sr.ª Carla Madureira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quase no final deste debate sobre o cartão do adepto, é preciso avaliar as fragilidades deste cartão, sem medo de perceber os interesses de cada
uma das partes envolvidas, reconhecer os erros e o que houver a melhorar, proteger incessantemente a
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liberdade dos adeptos, afastar os instigadores da violência e, simultaneamente, conceber espaços acolhedores
e seguros para todos os setores da sociedade que queiram usufruir de um jogo de futebol, dos 8 aos 88 anos.
Mas, neste contexto de operacionalização deste cartão, a verdade é que esta sofreu dois grandes reveses:
uma equipa governativa inepta e completamente alheada das reais necessidades do setor desportivo e quase
duas épocas desportivas de ausência do público nos estádios por força da pandemia.
Importa, portanto, perguntar: o que fez o Governo?! Não fez nada! O que deveria ter feito?! Deveria ter
trabalhado para que as alterações à legislação fossem absorvidas pelos organizadores e promotores
desportivos. Houve um ano inteiro em que os estádios estiveram sem público.
Importa, também, perguntar: será que faz sentido, no final de uma Legislatura, no decurso de uma época e
com pouco tempo de operacionalização do cartão do adepto, revogá-lo intempestivamente?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Costa Matos, do Grupo Parlamentar do PS, para uma intervenção.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta é uma discussão importante sobre liberdade e segurança, para garantir que todos, de facto, tenham a liberdade e a segurança para poderem
usufruir dos jogos do desporto que todos amamos.
O preceito que todos subscrevemos é o de que a minha liberdade termina onde começa a liberdade dos
outros. É por isso que é tão fundamental, depois da ocorrência de um conjunto de incidentes, depois de uma
reflexão apurada nesta Assembleia, termos constituído uma legislação que tenha conseguido consagrar maior
equilíbrio e melhores meios para podermos combater a violência no desporto.
No entanto, este tem sido um debate que tem trazido ao de cima as dificuldades a que temos vindo a assistir
ao longo dos últimos meses. E o que o PS tem para dizer é isto: vamos ouvir, vamos estudar, vamos refletir,
vamos fazer o balanço, sério, sem pressa, ouvindo as entidades, considerando todas as opções sem excluir
nenhuma, com a garantia de que essa é a melhor maneira de procurar as melhores soluções.
Não podemos alinhar em debates pouco sérios ou alicerçados em mitos. Este é um caminho no qual o
Governo tem feito muitas coisas, na articulação entre entidades, mas também assegurando que haja hoje mais
interdições do que houve no passado.
Mas é importante que façamos este debate de forma séria, sem alimentar os mitos que alguns, fora desta
Casa, quiseram alimentar, dizendo que o cartão era para todos os adeptos, quando é só para alguns e em
determinadas circunstâncias, que isto é tentar controlar, quando anteriormente já o próprio regime previa que
os bilhetes tinham de ter o nome do titular, mesmo que nem sempre isso fosse cumprido. Ou ainda o mito de
que isto abrange também os adeptos visitantes, como alguns partidos aqui disseram, quando, na verdade, isso
resultou de um equívoco no início da implementação e que hoje em dia está ultrapassado, porque os visitantes
podem assistir a um jogo sem terem o cartão do adepto.
Por isso, é importante que agora prossigamos com um balanço sério e um debate honesto, ouvindo as
entidades, para que cheguemos à melhor solução e salvaguardemos a liberdade e a segurança, valores que,
felizmente, reúnem aqui o maior consenso, para protegermos e defendermos o desporto e os adeptos.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, vamos entrar na fase final do debate. Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alma Rivera, do Grupo Parlamentar do PCP.
Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Ainda não conseguimos perceber, de nenhuma das intervenções — que, aliás, são uma data de mistificações, de confusões —, do âmbito de aplicação
da lei, pois não é só ao futebol, naturalmente, e mesmo aí há realidades totalmente diferentes, desde um nível
muito mais profissionalizado e massificado, até outro, onde há competições que acontecem também noutros
contextos e com outros recursos. Portanto, não convém fazer mistificações que em nada ajudam ao debate.
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O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — A lei não se aplica aí!
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Quanto ao PSD, falou, falou, falou, mas não conseguiu explicar qual é a sua posição e porque é a favor de um cartão de fichagem, de cadastragem dos adeptos, que faz lembrar o tempo
da «outra senhora», e em que é que isso combate a violência, o racismo ou a xenofobia. Não conseguiu!
Protestos do PSD.
Aliás, o PSD faz uma coisa espantosa: vem para este debate falar de uma proposta que não está em votação
— isso foi em 2019! O PSD pega na proposta de 2019 para não se pronunciar, porque não tem coragem de se
pronunciar sobre a proposta de 2020!
Aplausos do PCP.
Aliás, o que ninguém conseguiu aqui explicar é de que forma o facto de um adepto, para se poder manifestar
livremente, para poder ter uma bandeira, tenha de se dirigir a uma determinada zona e pagar 20 € — e não pode
levar um filho consigo — é combate ao racismo, à xenofobia e à violência. Não conseguimos perceber e espero
que alguém consiga aqui explicar isto.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo. Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-me que dirija daqui a primeira palavra aos adeptos que possam estar a seguir este debate em direto ou um pouco mais tarde,
em gravação.
Meus caros adeptos, está quase, está quase! Falta apenas aquilo a que hoje aqui assistimos — que só
alguns, entre eles e à cabeça o Iniciativa Liberal, fizeram —, ou seja, que todos reconheçam a morte do cartão
do adepto e estejam disponíveis para lhe passar a certidão de óbito.
A que é que temos assistido durante este debate? O PS até há dias tinha a teoria de que três meses de
aplicação da lei era pouco para avaliar os seus resultados. Faz lembrar o Primeiro-Ministro que, neste Hemiciclo,
há um mês, também fazia de conta que não sabia o que se estava a passar e um mês não foi suficiente para
que se apercebesse da total inutilidade do cartão do adepto.
Convém não fazer confusão: no combate ao racismo, à xenofobia e à violência no desporto, a importância
do cartão do adepto é zero, absolutamente zero! Atrevo-me até a dizer que o cartão do adepto tende a piorar as
condições de assistência aos espetáculos desportivos e, com isso, a aumentar as condições para a existência
de violência no desporto.
Quanto ao PSD, fiquei na dúvida. O Sr. Deputado Emídio Guerreiro listou 20 entidades que foram ouvidas
da última vez. Se está a querer dizer que vão ser ouvidas 20 entidades desta vez, quero avisar também os
adeptos que isto significa que vamos continuar a ter cartão do adepto até ao fim da época.
O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Foi o que a Comissão aprovou!
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Portanto, muita atenção: o compromisso do Iniciativa Liberal é que vamos manter a pressão para que o cartão do adepto chegue ao fim até ao Natal, pois será um belo presente
que daremos a todos os que gostam de assistir a espetáculos desportivos.
O Sr. Deputado diz: «O Iniciativa Liberal parece presciente; a 5 de agosto já pedia a revogação do cartão do
adepto». Não precisámos de ver a aplicação prática do cartão para saber que se tratava de uma evidente,
evidente, repito, infração dos direitos fundamentais das pessoas, de uma manobra discriminatória e,
provavelmente, inconstitucional. E também não precisávamos de ser prescientes para saber — basta conhecer
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a realidade desportiva — que não havia nenhum adepto de um grupo organizado digno desse nome que alguma
vez fosse subscrever o cartão do adepto. Não era preciso ser bruxo, Sr. Deputado, para saber que não ia
funcionar e, mais uma vez, a realidade deu-nos razão.
Agora que chegámos a este ponto não dá para esperar, não dá para ter um processo na especialidade
durante meses, não dá para esperar para a próxima Legislatura. Nenhum dos seus Deputados, evidentemente,
é sócio ou dono de um clube de futebol ou de uma coletividade desportiva que esteja a sofrer na pele pelos
milhares de lugares que têm de ficar vazios de cada vez que há jogo.
As finanças desses clubes, a organização dos jogos desses clubes, exigem, de facto, urgência. Vamos
acabar com o cartão do adepto, vamos acabar com ele nesta Legislatura. Isto é o que os adeptos querem e do
que Portugal precisa.
Aplausos do Deputado do PS Bacelar de Vasconcelos.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, chegámos ao fim deste ponto da ordem do dia, sobre o cartão do adepto.
Vamos passar à apreciação, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 118/XIV/3.ª (GOV) — Altera as taxas
previstas no Código do Imposto Único de Circulação e prorroga as medidas de apoio ao transporte rodoviário
previstas no Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Para abrir o debate, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais, António
Mendonça Mendes, que aproveito para cumprimentar.
Faça favor, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais (António Mendonça Mendes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei que o Governo traz hoje à Assembleia da República integra-
se no quadro de medidas excecionais de apoio em função do aumento do preço dos combustíveis.
Esse conjunto de medidas excecionais destina-se ao setor dos transportes, quer ao de passageiros, quer ao
de mercadorias, e, por outro lado, há também uma medida destinada, de uma maneira geral, às famílias, que,
aliás, entrou hoje em vigor, possibilitando a todos os possuidores de número de identificação fiscal (NIF) e de
cartão bancário, que se registem através da plataforma «IVAucher», de aceder a um desconto nos combustíveis
equivalente a um depósito de um carro utilitário, 50 lt, por mês, no montante de desconto de 10 cêntimos por
litro. Esses 10 cêntimos correspondem à diferença entre o preço de venda ao público em 2019 e o preço médio
de venda ao público em 2021, cobrindo integralmente essa mesma diferença de preço.
A mitigação do preço dos combustíveis é também feita por via do apoio ao setor dos transportes, como disse.
No setor dos transportes de passageiros, quer para os autocarros, quer para os táxis, o Governo determinou a
aplicação de uma medida que implica a atribuição de um subsídio por cada táxi e por cada autocarro.
No que diz respeito ao transporte de mercadorias, procurámos reforçar as medidas estruturais que já existiam
e que agora, como disse, são reforçadas, quer pelo aumento dos limites para aplicação do gasóleo profissional,
quer também através desta proposta de lei que aqui temos, da diminuição em metade — repito, a diminuição
em metade — do IUC (imposto único de circulação) relativo aos transportes de mercadorias por conta de outrem
e, por outro lado, a prorrogação da majoração dos custos com aquisição de combustível para efeitos de IRC
(imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas), que é uma medida aplicável ao transporte de mercadorias
e também ao de passageiros.
Ficarei, naturalmente, à disposição das Sr.as e dos Srs. Deputados para responder a todas as questões que
entendam relevantes.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Poço, do Grupo Parlamentar do PSD.
Faça favor, Sr. Deputado.
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O Sr. Alexandre Poço (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais, com esta proposta que nos traz hoje, o Governo demonstra duas coisas: primeiro, que
está perdido e, segundo, que está desorientado na resposta à crise dos combustíveis.
Aliás, todos nos lembramos da reação do Governo, da reação do Sr. Primeiro-Ministro e do Sr. Ministro do
Ambiente quando a crise dos combustíveis já se fazia sentir na carteira dos portugueses. E parece que foi quase
preciso que o preço em alguns postos de abastecimento ultrapassasse os 2 € por litro para que o Governo
começasse a tomar algumas medidas, que consideramos claramente insuficientes.
Veja-se: hoje mesmo, o Governo inicia um novo programa que classificamos como uma falta de respeito para
com os portugueses.
Aplausos do PSD.
Aliás, o Governo, para evitar mexer nos impostos, quase que só lhe falta anunciar uma parceria com
hipermercados para garantir que os portugueses não sentem tanto na sua carteira o custo da gasolina, do
combustível.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. João Paulo Correia (PS): — O PSD está contra?!
O Sr. Alexandre Poço (PSD): — Sr. Secretário de Estado, os portugueses pagam hoje os impostos que os senhores decidiram, que os senhores não cumpriram face às vossas promessas de 2016. Senão, vejamos: sem
a elevada carga fiscal, Portugal teria um preço médio de venda dos combustíveis em linha com a União Europeia
e com o nosso vizinho ibérico Espanha. Aliás, no caso da gasolina até seria mais baixo do que em Espanha, se
não fosse o peso dos impostos. Mas a elevada carga fiscal, que os senhores se recusam a baixar, faz com que,
por exemplo, os portugueses, no terceiro trimestre de 2021 tivessem pagado 59% de impostos na gasolina ou
54% no gasóleo, o que resulta nos combustíveis mais caros na União Europeia.
Os portugueses pagam hoje a quinta gasolina mais cara da Europa e o sexto gasóleo mais caro. Os mesmos
portugueses que, como temos dito inúmeras vezes, recebem dos salários mais baixos da Europa, pagam hoje
combustíveis com um preço mais alto do que os alemães, os franceses, os espanhóis ou os italianos.
Por isso, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, estas medidas que apresentam hoje, como
aquelas que têm apresentado, são claramente insuficientes. E se percebemos a revolta dos portugueses, não
conseguimos perceber a vossa relutância em baixar a carga fiscal, no momento de escalada do preço dos
combustíveis.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Silva, do PAN. Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Nelson Silva (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O debate de hoje é um exemplo de tudo aquilo de que, de facto, não precisamos, no plano
fiscal.
O Governo, à boleia da crise dos combustíveis, traz-nos — vejam bem! — uma medida que mais do que não
é um subsídio perverso, mais um, aos combustíveis fósseis. Desta feita, propõe-nos duas coisas: uma redução
para metade das taxas de IUC e a prorrogação da majoração dos gastos das empresas com a aquisição dos
combustíveis, ou seja, propostas completamente em contraciclo com a retórica do Governo quanto à
necessidade de adoção de medidas tendentes a opções de mobilidade mais sustentável e de combate às
alterações climáticas.
A crise dos combustíveis não pode ter as costas tão largas a ponto de ser a justificação para que, mais uma
vez, se meta a crise climática na gaveta e para que não se aposte mais em medidas de descarbonização.
A outra proposta é um completo passe de mágica, pouco refletido, sobre a aplicação — mais uma vez! — do
«IVAucher», que tem servido para tudo um pouco e mais alguma coisa.
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Não se pode aceitar que a política fiscal do nosso País continue, ano após ano, a ignorar os apelos da OCDE
(Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) e da ONU (Organização das Nações Unidas)
no sentido de pôr fim aos subsídios perversos aos combustíveis fósseis. Se o Governo quisesse realmente
combater os efeitos da crise dos combustíveis sem comprometer as juras de amor feitas na COP, em Glasgow,
deveria, por exemplo, estar a apresentar soluções que apostassem na melhoria dos transportes coletivos, na
cobertura transmodal, nomeadamente no interior, e na criação de mais horários, contribuindo assim para acabar
com a lógica de feijão em lata nas horas de ponta, que domina o dia a dia dos utentes, ou para o fim das idas
de táxi aos centros de saúde por falta de transporte público coletivo.
O PAN tem insistentemente defendido a melhoria e o alargamento da oferta de transportes públicos, bem
como uma estratégia séria, integrada e sustentável de revitalização do interior ou dos conceitos «cidade de 15
minutos» e «mobilidade suave».
Defendemos, igualmente, a reconversão de veículos a combustão para veículos de emissões zero e a
descentralização da produção e distribuição energética. Estas são opções completamente válidas que o
Governo poderia adotar de forma séria e que garantem não só as metas ambientais como também criam novos
modelos económicos, contribuindo para um crescimento ambientalmente responsável. Por outro lado, também
garantem a soberania energética do nosso País.
Nenhuma destas opções o Governo decidiu abraçar de forma séria e, em vez disso, dedica-se a incentivar,
mais uma vez, os combustíveis fósseis. Para o PAN, este projeto resolve um problema a muito curto prazo, mas
alarga outros a médio e a longo prazos.
O Sr. Presidente: — Peço aos serviços para prepararem os nossos ecrãs para nos podermos registar para efeitos de quórum, visto que teremos votações daqui a pouco tempo.
Para uma intervenção, tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Meireles, do Grupo Parlamentar do CDS-
PP.
A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: A proposta que o Governo apresenta chega tarde e, francamente, em face das necessidades, é muito pouquinho
— para não utilizar outra expressão mais preferida, talvez, do Sr. Primeiro-Ministro — e passa muito ao lado
daquilo que é preciso.
Sr.as e Srs. Deputados, acho que convém falarmos um bocadinho de história, porque, neste momento, temos
um problema de preços muito altos no gasóleo e na gasolina, ou, melhor, de uma forma geral, temos preços
muito altos nos combustíveis, e isso tem duas explicações: uma explicação é o aumento do preço do petróleo,
e essa, de facto não é da responsabilidade do Governo; a outra é uma fiscalidade que está acima da fiscalidade
praticada na maior parte dos países, explicação essa que é, sim, da responsabilidade do Governo.
Gostaria de voltar a lembrar que, em fevereiro de 2016, perante um preço do petróleo histórica e
transitoriamente baixo, o Governo decidiu aumentar o ISP (imposto sobre os produtos petrolíferos e
energéticos). E fê-lo dizendo o quê? Dizendo que, quando o preço do petróleo voltasse a aumentar, iria diminuir
o ISP. Porém, até hoje, não o diminuiu neste montante e nunca devolveu aquilo que, ao longo dos anos, tem
vindo a cobrar a mais.
Agora, ao invés de optar por pura e simplesmente baixar a fiscalidade, ou seja, por baixar o ISP, vem fazer
uma série de medidas cirúrgicas que passam ao lado do que me parece essencial.
Em primeiro lugar, relativamente àquilo a que, tanto quanto percebi, chamou de medida do «IVAucher», Sr.
Secretário de Estado, gostava de entender uma coisa. A medida do «IVAucher» vai funcionar de maneira
semelhante ao «IVAucher» do turismo, que, no ano passado, foi a grande medida de alívio fiscal na proposta
de Orçamento? Eram 200 milhões de euros. Confirme, Sr. Secretário de Estado, que, em novembro, ainda nem
10% disso está executado, pelo que já se vê a fiabilidade e a capacidade de previsão do Governo nestas
matérias. Já estou mesmo a ver o que daqui sairá! E depois, Sr. Secretário de Estado, confirme que o que está
a propor são, no máximo, 5 € por mês, durante 5 meses, ou seja, um máximo de 25 €. Estamos a falar de cerca
de 133 milhões de euros, o que não chega a ser nem metade do que o Governo cobrou a mais em ISP com este
aumento em 2016 — isto só para entendermos a grandeza do que está a ser proposto.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, o desafio que lhe deixava era o de eliminar o adicional — a sobretaxa ou
o que lhe queira chamar — do ISP. Vou ser concreta, desafio-o a eliminar o aumento que o seu Governo fez em
2016 e, a partir daí, talvez possamos começar a falar de outras medidas.
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Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra para uma intervenção o Sr. Deputado André Ventura, do Chega.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado: Acho que convinha que o Governo começasse por se entender a si próprio. Disse o Sr. Secretário de Estado João Galamba o seguinte: «Quando
o preço do petróleo subir, vamos baixar os impostos sobre os combustíveis». Disse também o Sr. Secretário de
Estado António Mendonça Mendes que iria baixar o ISP em 0,2 € e que isso estaria em vigor até ao final do ano.
Porém, o Sr. Ministro Siza Vieira disse o seguinte: «Não creio que baixar impostos sobre os combustíveis seja
a solução para o problema do combustível». E o Sr. Ministro Pedro Nuno Santos ainda nos disse que é uma
visão pequena de política económica achar que é baixando os impostos que resolveremos esta questão.
Portanto, o Chega começava por aconselhar ao Governo que se entendesse. Já que não se entendem com
os seus parceiros, ao menos que se entendam dentro do Governo sobre o que querem fazer em relação ao IUC,
ao adicional de imposto e ao ISP. Esta seria uma medida básica de política fiscal.
Depois, Sr. Secretário de Estado, ninguém pode esconder que isto é pura propaganda. Tal como disse o Sr.
Deputado Alexandre Poço, só falta uma parceria com um supermercado ou com bombas de gasolina locais. É
o «IVAucher», é metade do IUC, são dois terços do imposto de não sei quê… Lá fora, ninguém percebe porque
é que o Governo não acaba com o adicional, que foi o Governo que criou. É tão simples como isto: acabar com
o adicional!
Sr. Secretário de Estado, tem um bom exemplo. Sabe qual é? É a Madeira. A Madeira conseguiu reduzir,
efetivamente, para os madeirenses os custos sobre o combustível e o Governo deveria seguir o mesmo exemplo
em vez de vir ao Parlamento fazer manobras de maquilhagem, por estarmos a 70 dias das eleições, fingindo
que faz alguma coisa. Era isso que deveria fazer e era isso que os eleitores esperavam do Governo, que desse
um sinal de que temos a quinta gasolina mais cara da Europa e de que não podemos continuar a ter estes
preços em Portugal.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção pelo Grupo Parlamentar do PCP, o Sr. Deputado Duarte Alves.
O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Secretários de Estado: A proposta em apreço é apresentada pelo Governo como uma medida de resposta ao aumento do preço dos combustíveis,
criando uma redução fiscal de 50%, em sede de IUC, aos automóveis da categoria D, ou seja, aos automóveis
afetos ao transporte público de mercadorias, e prolongando no tempo benefícios fiscais já existentes.
Falando destas medidas em concreto, podemos, desde já, identificar o seu alcance profundamente limitado,
não só pelo impacto concreto, que é diminuto para a maioria das empresas, como pela injusta exclusão que
coloca, à partida, a vários sectores.
Além da situação grave e dos problemas concretos das empresas de transportes, pergunta-se: mas, então,
as mesmas razões, os mesmos critérios que justificam esta medida não justificam que ela seja também aplicada
a outras áreas de atividade? Em alguns casos, até, por maioria de razão!
Veja-se o caso de setores como o dos reboques de pronto-socorro ou das escolas de condução, em que a
fatura dos combustíveis assume um peso avassalador nos custos operacionais e onde a escalada dos preços
trouxe problemas não menos gritantes, com a agravante de não terem, ainda hoje, acesso a um conjunto de
medidas de apoio que lhes fazem falta.
Estes setores — tal como o conjunto das micro, pequenas e médias empresas de setores produtivos, do
comércio, dos serviços ou da restauração — ficam completamente arredados do acesso a este apoio que o
Governo propõe, porque os veículos que utilizam não estão abrangidos. O apoio, em si, não é injusto, o que é
injusta é a exclusão destas empresas.
Por outro lado, não podemos deixar de lamentar a falta de uma resposta mais robusta e com efeitos práticos
no que diz respeito ao preço dos combustíveis, contrariando os aumentos especulativos dos últimos meses, que
pesam sobre as micro, pequenas e médias empresas e sobre os consumidores domésticos, agravando em geral
a situação económica do País.
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É preciso baixar o preço dos combustíveis e, para isso, é necessário conjugar medidas de alívio fiscal com a
implementação de um regime de preços máximos, para que não volte a acontecer a situação de uma redução
fiscal ser imediatamente consumida pelos aumentos seguintes, como quando o Governo baixou 0,2 € no ISP.
Sim, é preciso pôr fim ao adicional ao ISP decretado pelo Governo, em 2016, por portaria, com o pretexto da
baixa do preço do petróleo, e é preciso acabar com a dupla tributação do IVA (imposto sobre o valor
acrescentado) sobre o ISP. Mas, para que essas medidas não caiam em saco roto, também é preciso questionar
os próprios fundamentos do esquema de formação de preços, das margens das grandes petrolíferas, da falsa
concorrência e dos preços cartelizados, como está à vista de todos.
Não é aceitável a manutenção de um mecanismo de formação de preços cuja base não assenta no preço
real do barril de petróleo no momento da sua aquisição, mas, antes, nas cotações da Praça de Roterdão, um
índice artificial controlado e decidido pelas grandes petrolíferas.
Não é aceitável que as margens de comercialização das petrolíferas subam quando essas cotações estão
em alta, o que significa que lucram mais quando o preço do petróleo está em alta nessas cotações.
Por isso, o PCP apresentou, há meses — em julho! —, uma proposta para que se criasse um regime de
preços máximos que garantisse um mecanismo de formação de preços baseado nos custos reais de aquisição,
refinação, transporte e comercialização dos combustíveis e não nos falsos mecanismos da «financeirização»
deste setor energético, mas esta proposta foi rejeitada, com o PS a juntar-se ao PSD, ao CDS, ao PAN, ao
Iniciativa Liberal e ao Chega no voto contra.
Entretanto, o Governo apresentou um mecanismo mais limitado para uma eventual intervenção nas margens,
mas, até agora, o resultado prático ainda não foi sentido pelos portugueses. Aproveitando esta oportunidade,
perguntamos: que intervenção tem sido, afinal, a do Governo sobre as margens?
Sendo urgente dar uma resposta a este entrave ao desenvolvimento económico do País — mais uma
resposta que o Governo continua a rejeitar, a não ser com paliativos como este que apresenta ou como o do
voucher de 5 € em cartão —, o PCP não deixará de se bater pelas medidas que levem à redução real do preço
dos combustíveis e, também para esse objetivo, pela recuperação do controlo público sobre o setor energético,
o qual tem um carácter estratégico, como mais uma vez se comprova.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, para uma intervenção.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas, Sr. Secretário de Estado: Esta proposta de lei do Governo vem introduzir duas medidas muito específicas relativamente ao setor dos
transportes rodoviários de mercadorias e de passageiros, com vista, segundo o Governo, a compensar o
aumento do preço dos combustíveis. Aliás, estas propostas foram já discutidas com os representantes do setor,
depois de várias semanas com uma subida de preços que, a aliar à crise provocada pela pandemia, fez diminuir
a procura por parte de muitas empresas de transporte de passageiros. Estas propostas poderiam,
eventualmente, mitigar ou responder às necessidades existentes.
Já foi explanado quais são, muito concretamente, estas medidas que foram aprovadas em Conselho de
Ministros, às quais se somam outras de natureza fiscal a que o Sr. Ministro se referiu na sua intervenção,
nomeadamente a do «IVAucher» aplicado aos combustíveis. Trata-se de uma medida que o Bloco de Esquerda
já teve oportunidade de criticar em várias ocasiões porque nos parece que não vai à raiz do problema, além de
nos parecer que representa muito pouco para o bolso das famílias.
Pensamos ser muito importante sublinhar algumas questões que voltamos a trazer a este debate, como já
trouxemos em outras ocasiões, sobre os combustíveis. Quanto à evolução do preço dos combustíveis, os dados
da Direção-Geral de Energia e Geologia revelam que, apesar de alguma estabilização na última semana, os
preços continuam muito elevados. Sabemos também que, do ponto de vista internacional, mantemos um modelo
de concentração da produção de petróleo liderado pelos países da OPEP (Organização dos Países
Exportadores de Petróleo), que há décadas têm vindo a determinar os preços internacionais e ainda na passada
quinta-feira confirmaram que irão manter o ritmo de produção, o que poderá prolongar esta alta de preços.
É por isso mesmo que temos vindo a alertar para este sistema internacional e para os seus impactos, mas
também, e em conformidade, a apresentar medidas e propostas estruturais alternativas que não olham só para
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as margens de lucro das empresas petrolíferas — o Governo, segundo temos conhecimento, acabou por nunca
utilizar a lei que aprovou aqui e que já era muito mitigada —, mas, também, para responder à necessidade de
assegurar preços justos, estáveis para a economia e para as famílias, através de mecanismos de formação de
preços, proposta essa que também foi rejeitada.
Lembramos novamente que os dados demonstram que é mais por causa das elevadas margens do que por
qualquer outro fator que os preços têm subido da forma que temos visto, um fenómeno explicado pela elevada
concentração no setor. Por isso mesmo, o controlo de preços seria a medida mais eficaz para termos limites aos
aumentos brutais que temos vindo a sofrer nos últimos meses, que favorecem um mercado especulativo e que
tem prejudicado, ainda para mais neste momento de crise, famílias e empresas, nomeadamente empresas do
setor dos transportes, em particular do setor dos transportes rodoviários de passageiros, e muitas micro e
pequenas empresas deste setor têm continuado a queixar-se.
Sabemos também que, na opinião dos representantes destes setores, as medidas que agora o Governo
apresenta, podendo ser importantes por terem um impacto imediato, apesar de temporário, não são suficientes.
Falamos ainda de outros setores que continuam sem resposta. Tem chegado ao Governo, com certeza, como
chega ao Parlamento, a notícia de que o setor dos reboques, as escolas de condução, alguns veículos de
emergência continuam a ter muita dificuldade em responder a este aumento de preço de combustível para a sua
atividade normal.
Portanto, achamos que é importante reforçar que o Governo tem necessariamente de olhar para as medidas
que o Bloco de Esquerda já apresentou aqui e pelas quais continua a bater-se. Sem mexer na fixação dos preços
e nos mecanismos de fixação dos preços de combustíveis, não estaremos a responder de forma eficaz e a longo
prazo a este problema, que se manterá. Não será apenas com medidas mitigatórias ou com medidas como as
que o Governo tem apresentado que iremos chegar a bom porto.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Anastácio, do Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Todos temos a noção de que o aumento do custo dos combustíveis, particularmente do petróleo, nos mercados
internacionais, lançou uma imprevisibilidade nos mercados e materializou-se, à escala global, precisamente num
aumento muito significativo do custo dos combustíveis, com significativo impacto na economia e na vida dos
cidadãos.
O Governo português, cumpre aqui salientar, foi o primeiro, a nível europeu, a tomar medidas para minimizar
os impactos do agravamento do custo dos combustíveis.
A proposta de lei que o Sr. Secretário de Estado, hoje, já teve oportunidade de apresentar insere-se
precisamente num pacote muito mais robusto de medidas que extravasam claramente esta proposta de lei e
que se destinam a mitigar estes efeitos, particularmente, no caso concreto, no setor dos transportes rodoviários.
O objetivo da proposta é mitigar, como disse, os efeitos adversos do aumento do preço dos combustíveis
nas estruturas de empresas do setor de transporte de mercadorias por conta de outrem. Portanto, a medida em
concreto é a redução do imposto único de circulação em 50%, reduzindo o encargo fiscal que é, de facto, muito
relevante para aquelas empresas.
Adicionalmente, tendo em consideração a caducidade do benefício fiscal previsto no artigo 70.º do Estatuto
dos Benefícios Fiscais, que seria em dezembro de 2021, também há uma proposta para fazer a prorrogação
deste mecanismo. Este prevê uma majoração, em sede de IRC, destes custos, em 2026, no caso concreto para
o custo de combustível nas empresas com transportes públicos de passageiros, nos veículos afetos ao
transporte rodoviário de mercadorias e também nos veículos afetos ao transporte de táxis. Portanto, o objetivo,
como disse, é mitigar estes custos e responder também às empresas nestes setores particularmente atingidos.
Esta é uma importante medida, mas, como disse há pouco, tem de ser vista num quadro mais geral e mais
global. Queria salientar precisamente que este pacote global — e hoje já foram minimizados a sua importância
e o seu valor — ascende a mais de 300 milhões de euros e, por isso, vamos pôr as coisas na sua devida
dimensão.
Já aqui foi referido, mas não podemos deixar de salientar, o ganho extra com o IVA pelo aumento do preço
final, que teve um impacto na redução de 0,2 € e de 01 €, respetivamente na gasolina e no gasóleo, com uma
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redução de 90 milhões de euros; o AUTOvoucher, independentemente das apreciações aqui feitas, terá um
impacto de 0,10 € por litro e um custo previsível de 132 milhões de euros; a criação de um mecanismo de
compensação ao setor do transporte público rodoviário de passageiros — autocarros e táxis — é uma medida
one-off que prevê, precisamente, um impacto de 190 € por cada táxi licenciado e de 1050 € por cada autocarro
de transporte público. É ainda importante — não posso deixar de o dizer e, aliás, é uma resposta efetiva, apesar
de haver vários setores que não concordarão — termos presente o momento presente e referir a medida através
da qual o Governo decidiu congelar, até março de 2022, o valor da taxa de carbono, que podia vir a refletir um
aumento do preço do combustível de cerca de 0,5 € por litro, uma medida com um impacto aproximado de 95
milhões de euros.
Portanto, este é um conjunto de medidas e é neste quadro que estas têm de ser feitas e avaliadas. Na sua
generalidade, são medidas que têm uma lógica global e que pretendem, de forma sistematizada e responsável,
responder aos problemas com que os diferentes agentes económicos e os consumidores se confrontam perante
o impacto do aumento de preço dos combustíveis que se tem verificado muito em particular no último semestre
deste ano.
Srs. Deputados, termino com a seguinte referência: reitero a completa disponibilidade do Grupo Parlamentar
do Partido Socialista para, em sede de especialidade, concluir este processo legislativo em tempo útil, para que
não faltemos, com a aprovação destas medidas já aguardadas pelos setores, a quem espera de nós uma atitude
responsável e eficaz na resposta aos problemas e a este tipo de custo, minimizando os encargos das empresas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, pelo Grupo Parlamentar do PSD, a Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa.
A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de falar de vontade política, ou da falta dela, no que diz respeito a este Governo do Partido Socialista, com dois exemplos.
Primeiro exemplo: o Governo apresentou uma iniciativa que já se percebeu que não resolve o problema dos
combustíveis. O Governo não seguiu o bom exemplo da Madeira de baixar o ISP — estamos a falar de menos
7% na gasolina e de menos 9% no gasóleo.
Sr.as e Srs. Deputados, o segundo exemplo é a zona franca da Madeira. Não fosse o bloqueio, a
intransigência e a irresponsabilidade do Partido Socialista, estaríamos a discutir conjuntamente com esta
iniciativa uma proposta que é absolutamente crucial para a Madeira, a saber: a prorrogação do prazo para que
possam ser admitidas novas licenças, na zona franca, a partir de 1 de janeiro.
Sr.as e Srs. Deputados, esta iniciativa esteve agendada e foi excluída porque o PS invocou uma interpretação
muito restritiva do Regimento, que não exige a si próprio quando solicita outros arrastamentos.
O Sr. Adão Silva (PSD): — É verdade!
A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Sr.as e Srs. Deputados, fica assim, uma vez mais, evidente que o Partido Socialista continua a fazer tudo, mas mesmo tudo para prejudicar a Madeira. Esta matéria é importante
e é urgente, quer para o CINM (Centro Internacional de Negócios da Madeira), quer para a nossa região, por
aquilo que representa em termos de manutenção de postos de trabalho e pela receita fiscal que possibilita. O
PS revelou-se manifesta e absolutamente indiferente a essas circunstâncias, tal a sua saga contra a Madeira.
Sr.as e Srs. Deputados, esta é uma atitude absolutamente deplorável da parte do Partido Socialista, que
merece o nosso repúdio e a nossa denúncia pública.
Sr.as e Srs. Deputados, fica uma vez mais evidente, em todo este processo, a má-fé e a má vontade deste
Governo em resolver dois problemas muito importantes para a população: a baixa do ISP nos combustíveis e a
prorrogação de novas licenças para operar na zona franca da Madeira.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Carlos Pereira, do Grupo Parlamentar do PS, inscreveu-se agora para intervir.
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Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Pereira (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Sr.ª Deputada Sara Madruga da Costa tentou ensaiar aqui um simulacro de preocupação com a Madeira, ainda por cima tendo
sido avisada, antes de tudo isto acontecer, de que poderia, de facto, ocorrer o que está a ocorrer.
Protestos da Deputada do PSD Sara Madruga da Costa.
E nada mais grave, depois do erro grave do PSD Madeira ao não ter ajudado a dar condições para que o
Orçamento do Estado fosse aprovado e para que, por essa via, não houvesse eleições antecipadas nem o
problema da prorrogação dos benefícios fiscais,…
Protestos do PSD.
… do que ainda encontrar um outro erro, agora do PSD, que é o de arrastar um diploma que não tinha
nenhuma conexão material com o diploma que está a ser discutido.
Portanto, Sr.ª Deputada, é lamentável que, na altura certa, na altura em que é preciso, de facto, defender os
madeirenses, na altura em que é preciso estar ao nível das responsabilidades,…
A Sr.ª Sara Madruga da Costa (PSD): — Não é lamentável, é uma vergonha!
O Sr. Carlos Pereira (PS): — … a Sr.ª Deputada e o seu Governo Regional, que tanto dizem que estão ao lado dos madeirenses, não tenham tido a coragem de fazer o que tinha de ser feito para impedir uma crise
política, impedir que o Orçamento caísse e impedir, de alguma maneira, que houvesse eleições e se fizesse o
que tinha de ser feito.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, peço que façam um pouco de silêncio. Tem a palavra, para encerrar o debate, o Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais.
O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de assinalar três notas.
Em primeiro lugar, gostaria de assinalar que, de todas as bancadas, não assisti a nenhuma crítica
relativamente à proposta de lei que temos em apreciação. Como tal, o Governo espera que a Assembleia da
República possa aprovar a descida do IUC em 50% para o transporte de mercadorias e também a prorrogação
da majoração dos custos com combustíveis, que aproveitará ao setor dos transportes de mercadorias e ao setor
dos transportes de passageiros. Penso que é uma boa decisão que o Parlamento tomará.
Aplausos do PS.
Em segundo lugar, quero também registar que o maior partido da oposição gastou 40% do seu tempo, num
debate sobre a mitigação dos custos com combustíveis, com a defesa da zona franca da Madeira. Penso que
isso diz tudo sobre o estado do maior partido da oposição.
Protestos do PSD.
Em terceiro lugar, gostaria muito que a discussão sobre o imposto sobre os combustíveis fósseis pudesse
ser menos apaixonada e mais com os olhos postos em Glasgow, de forma real. O Parlamento aprovou, muito
recentemente, a Lei de Bases do Clima, por unanimidade. Estou mesmo em crer que, sem ser o Iniciativa Liberal,
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que não a aprovou e votou contra ela, e um partido, penso que o PCP, que se absteve, o Parlamento
maioritariamente aprovou essa lei de bases.
Sr. Deputado Nelson Silva, compreendo aquilo que disse, mas veja bem também a discussão que aqui temos
e que obriga o Governo a este equilíbrio. Veio aqui — e bem — manifestar-se contra os subsídios perversos ao
ambiente, algo que, desde Glasgow, desde qualquer debate sobre as alterações climáticas e sobre a
necessidade da sustentabilidade do ambiente, é entendido por todos. Seguramente, estamos nesse caminho de
retirada dos subsídios perversos ao ambiente, mas tivemos uma situação excecional, numa altura em que ainda
não é possível termos a transição energética absolutamente feita.
Sr. Deputado, aqueles que aprovaram também a lei do clima são os primeiros a virem dizer que se baixem
os impostos sobre os combustíveis fósseis. São os primeiros! Mas, Srs. Deputados, fazem-no muitas vezes com
muito pouco rigor. Quando comparamos Portugal com outros países, por exemplo com Espanha, se calhar era
bom também lembrarmos que Espanha, na aprovação do seu PRR (Plano de Recuperação e Resiliência), se
comprometeu a subir em 0,20 € os impostos sobre os combustíveis, exatamente porque têm uma fiscalidade
em contraciclo com as suas práticas ambientais.
Aplausos do PS.
Mas nós temos o equilíbrio de perceber que estamos num momento em que o aumento anormal do preço
dos combustíveis implica tomar uma medida excecional e transitória. Srs. Deputados, é por isso que, face ao
aumento médio que houve de 0,10 € na gasolina e de 0,3 € cêntimos no gasóleo, o Governo aprovou um apoio
que cobre este diferencial de aumento de preço de 0,10 €, tanto para o transporte de mercadorias, como para o
transporte de passageiros, sejam táxis ou autocarros, como também para as famílias, de uma maneira geral.
Sr.as e Srs. Deputados, entendamo-nos, mais uma vez, sobre a questão do ISP. O ISP tem uma receita que
não é apenas decorrente do imposto.
Protestos da Deputada do PSD Sara Madruga da Costa.
O ISP tem quatro componentes na receita: uma diz respeito ao imposto; a outra diz respeito à contribuição
do setor rodoviário; a outra diz respeito ao adicional do ISP, criado por um Governo liderado pelo Dr. Durão
Barroso; e a outra diz respeito à taxa de carbono, criada por um Governo liderado pelo Dr. Pedro Passos Coelho.
Sr.as e Srs. Deputados, tudo o que é a receita de ISP que não corresponde ao imposto, corresponde a um
terço da receita cobrada. E é também importante que as Sr.as e Srs. Deputados percebam que uma parte
substancial da receita do ISP está consignada quer à Infraestruturas de Portugal, para conservação rodoviária,
no que diz respeito à contribuição do setor rodoviário, quer ao Fundo Ambiental, no que diz respeito à taxa de
carbono, que paga a diminuição dos passes, e ainda o adicional do ISP — repito, o adicional do ISP, criado num
Governo do Dr. Durão Barroso —, que financia o Fundo Florestal Permanente.
Sr.as e Srs. Deputados, o Governo português foi o primeiro a ter um conjunto de medidas muito significativo
para mitigar o aumento do preço dos combustíveis.
Protestos do PSD.
Fazemo-lo pela sustentabilidade financeira e com sustentabilidade ambiental.
Aplausos do PS.
Não somos aqueles que um dia vêm gritar pela Lei de Bases do Clima e no dia a seguir têm uma posição
completamente desajustada e completamente demagógica só porque estão a pensar nas eleições.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, tem de terminar.
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O Sr. Secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, termino dizendo o seguinte: é esta posição responsável e equilibrada que pode fazer com que o País tenha
futuro, e é por isso que aqui estamos.
Muito obrigado.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Chegámos, assim, ao final do segundo ponto da ordem do dia e vamos entrar no terceiro ponto, votações.
Como sabem, os registos para efeitos de quórum estão abertos há bastante tempo. Temos 202 Sr.as e Srs.
Deputados inscritos, havendo, portanto, 28 Deputados que não estão inscritos.
Vamos começar pela votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 920/XIV/2.ª (IL) — Revoga o cartão do
adepto, pela não discriminação e estigmatização de cidadãos em recintos desportivos (quarta alteração à Lei
n.º 39/2009, de 30 de julho).
Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do BE, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do PEV, do CH,
do IL, da Deputada não inscrita Cristina Rodrigues e dos Deputados do PS André Pinotes Batista, Bacelar de
Vasconcelos, Carlos Brás, Constança Urbano de Sousa, Isabel Alves Moreira, Joana Lima, Rosário Gambôa e
Tiago Barbosa Ribeiro e abstenções do PS e do PSD.
A iniciativa que acabámos de votar baixa à 8.ª Comissão.
Segue-se a votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 1012/XIV/3.ª (PCP) — Procede à quarta alteração
à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, eliminando o cartão do adepto e as zonas com condições especiais de acesso
e permanência de adeptos.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do CDS-PP, votos a favor do BE, do PCP, do
PAN, do PEV, do IL, da Deputada não inscrita Cristina Rodrigues e dos Deputados do PS Bacelar de
Vasconcelos, Carlos Brás, Constança Urbano de Sousa, Isabel Alves Moreira, Joana Lima, Rosário Gambôa e
Tiago Barbosa Ribeiro e abstenções do PSD, do CH e do Deputado do PS André Pinotes Batista.
O Sr. Deputado Pedro Pinto pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Pedro Pinto (PSD): — Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Pedro Pinto (PSD): — Peço desculpa, Sr. Presidente, mas não me consegui registar.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, é difícil registar-se se não estiver aqui.
O Sr. Pedro Pinto (PSD): — É verdade, Sr. Presidente, cheguei tarde. Mas já agora gostava de explicar que foi porque vim do hospital.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Fica confirmado que está cá. Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 1016/XIV/3.ª (CH) — Procede à quarta alteração
à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, e pela revogação da Portaria n.º 159/2020, de 26 de junho, que define as
normas aplicáveis sobre o abreviadamente designado cartão do adepto.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do BE, votos a favor do CH e da Deputada não
inscrita Cristina Rodrigues e abstenções do PSD, do PCP, do CDS-PP, do PAN, do PEV e do IL.
Sr.ª Deputada Joana Lima, pediu a palavra para que efeito?
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A Sr.ª Joana Lima (PS): — Sr. Presidente, é para anunciar à Camara que será apresentada uma declaração de voto escrita em meu nome e em nome dos Srs. Deputados Bacelar de Vasconcelos, Carlos Brás, Rosário
Gambôa e Tiago Barbosa Ribeiro.
O Sr. Presidente: — Fica registado, Sr.ª Deputada. Srs. Deputados, amanhã teremos reunião plenária, com início às 15 horas, cuja fixação da ordem do dia foi
requerida pelo CDS-PP, com a discussão dos Projetos de Lei n.os 886/XIV/2.ª (CDS-PP) — Cessação de
vigência do regime excecional de medidas de flexibilização da execução das penas e das medidas de graça no
âmbito da prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da
doença COVID-19, constante da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, e 885/XIV/2.ª (PSD) — Revogação da Lei n.º
9/2020, de 10 de abril, relativa ao regime excecional de flexibilização da execução das penas e das medidas de
graça, no âmbito da pandemia da doença COVID-19, a que se seguirá uma eventual votação no final dos
trabalhos.
Muito obrigado a todos e até amanhã.
Eram 16 horas e 59 minutos.
———
Nota: A declaração de voto anunciada pela Deputada do PS Joana Lima, referente a esta reunião plenária,
não foi entregue no prazo previsto no n.º 3 do artigo 87.º do Regimento da Assembleia da República.
———
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.