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Quinta-feira, 17 de março de 2022 I Série — Número 37

XIV LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2021-2022)

COMISSÃO PERMANENTE

REUNIÃODE16DEMARÇODE 2022

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Helga Alexandra Freire Correia Diogo Feijóo Leão Campos Rodrigues

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a reunião às 15 horas e 4

minutos. Procedeu-se a um debate com a participação da Ministra

da Administração Interna sobre as eleições do círculo da Europa, tendo usado da palavra, além da Ministra (Francisca Van Dunem), os Deputados José Silvano (PSD), Pedro Filipe Soares (BE), António Filipe (PCP), Pedro Morais Soares (CDS-PP), Inês de Sousa Real (PAN), Mariana Silva (PEV), André Ventura (CH), João Cotrim de Figueiredo (IL) e Pedro Delgado Alves e José Luís Carneiro (PS).

No final do debate, o Deputado José Silvano (PSD) usou da palavra em defesa da honra da bancada relativamente a afirmações do Deputado Pedro Delgado Alves (PS), que também deu explicações.

Foi aprovado um parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados, autorizando um Deputado do PS a intervir em tribunal.

O Presidente (Fernando Negrão) encerrou a reunião eram 16 horas e 49 minutos.

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O Sr. Presidente: — Boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Funcionários, Sr.as e Srs. Jornalistas, Sr.as e Srs. Agentes da autoridade.

Vamos dar início a esta reunião da Comissão Permanente da Assembleia da República.

Eram 15 horas e 4 minutos.

A ordem do dia para hoje tem dois pontos: um segundo ponto com votações e um primeiro que consta de um

debate com a participação da Ministra da Administração Interna sobre as eleições no círculo da Europa.

Como sabem, a repetição das eleições ocorreu no final da passada semana e, portanto, para não interferir

com o período eleitoral, por consenso na Conferência de Líderes, marcámos o respetivo debate para hoje.

Para apresentar este tema, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Administração Interna, Francisca Van Dunem, a

quem quero saudar, aproveitando este momento para lhe dizer como o nosso relacionamento, político e pessoal,

foi sempre muito importante.

Faça favor, Sr.ª Ministra.

A Sr.ª Ministra da Administração Interna (Francisca Van Dunem): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na arquitetura do sistema eleitoral português cabe ao Governo, através da administração eleitoral, que está

sediada na área da Administração Interna, a responsabilidade pela organização e apoio técnico à execução dos

processos eleitorais, pela difusão de informação pública sobre o sistema e os atos eleitorais e, ainda, pela

promoção da participação eleitoral.

A administração eleitoral, enquanto órgão executivo, não tem poderes. A administração eleitoral não tem

título habilitante para a tomada de decisões sobre questões materialmente eleitorais. Limita-se, por isso, na

componente de informação — em que produz, nomeadamente, cadernos informativos e folhetos —, a

esquematizar procedimentos e a transcrever a lei ou interpretações que são feitas dessa mesma lei pelos órgãos

que, para tanto, detêm habilitação, nomeadamente a Comissão Nacional de Eleições (CNE). E tem, sobretudo,

um papel relevantíssimo na organização da logística de todo este processo.

No que se refere à votação postal dos cidadãos nacionais residentes no estrangeiro no processo eleitoral em

curso — e é disso que estamos a falar —, a administração eleitoral teve de assumir um conjunto de

procedimentos que eu gostaria de realçar. Primeiro, a constituição de um grupo de trabalho multidisciplinar,

integrando a Direção-Geral dos Assuntos Consulares e das Comunidades Portuguesas, a Imprensa Nacional-

Casa da Moeda, os CTT (Correios de Portugal) e a empresa contratada para a produção dos chamados

«pacotes de envio». Este grupo de trabalho acompanhou, desde novembro de 2021, todo o processo de

divulgação, produção, expedição e distribuição da documentação eleitoral para o voto por via postal.

A administração eleitoral garantiu também a produção dos materiais e subsequente expedição para um total

de 1 515 075 eleitores das cartas contendo o boletim de voto, assim como o envelope de devolução e informação

prática para facilitar o procedimento.

Em todos os envelopes enviados foi inserido um folheto explicativo, muito simples, muito claro, apontando

para a necessidade de envio de cópia do documento de identificação.

No âmbito do grupo de trabalho a que aludi, a administração eleitoral articulou-se com os CTT no sentido da

divulgação, através da União Postal Universal, da realização deste ato eleitoral, da divulgação da informação de

que iriam ser expedidos estes pacotes, com os documentos pertinentes, pedindo-se a atenção para o seu

processamento e rápida distribuição.

Além disso, em articulação com a administração eleitoral, os CTT tomaram ainda uma iniciativa autónoma

de se dirigirem diretamente aos 10 países em que temos maior concentração das nossas comunidades, que

reúnem cerca de 85% dos eleitores, e foi disponibilizado a todos os eleitores o acesso ao portal eletrónico, criado

depois das eleições legislativas de 2019, que permite fazer o acompanhamento do percurso da correspondência

expedida para os vários países.

Queria recordar, porque o tempo passou e a memória é seletiva, que tudo isto aconteceu na fase mais aguda

da pandemia, num momento em que os serviços se debatiam com extremas dificuldades associadas ao elevado

número de ausências por doença ou confinamento. Foi um período em que, por necessidade de reduzir o

número de pessoas nos vários espaços, foi preciso organizar equipas de trabalho em espelho e garantir

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intervalos de paragem entre as mudanças de turno, para que as equipas não se cruzassem e também,

obviamente, para permitir a higienização dos espaços.

O empenhamento e a total dedicação da administração eleitoral neste processo ficam patentes,

nomeadamente, no aumento exponencial do número de boletins de voto enviados aos eleitores residentes no

estrangeiro — mais cerca de 55 000 do que em 2019 — e é preciso recordar, também, que na eleição para 2015

estava em causa um universo de aproximadamente 300 000 eleitores.

O empenhamento da administração eleitoral é também visível: na criação deste portal, que permitiu aos

eleitores residentes no estrangeiro fazer o tracing das comunicações que lhes foram enviadas; na criação de

cadernos eletrónicos para facilitação do processo de descarga de votos; no grande aumento do número de

mesas de apuramento; na identificação de um espaço que permitisse realizar as operações de apuramento final,

com respeito pelas limitações associadas ao controlo da pandemia.

Os 260 118 envelopes de resposta recebidos representam um aumento de participação eleitoral de 76,6%,

por comparação com 2019. Posso, por isso, afirmar que a administração eleitoral cumpriu o seu dever com brio,

cumpriu o seu dever com honra, e, para mim, constitui uma obrigação de consciência afirmá-lo, aqui e agora,

sem ambiguidades.

Não estamos a falar de uma realidade abstrata ou de uma ficção, mas de uma estrutura composta por

mulheres e homens que deram o melhor que sabiam e podiam, que foram capazes de superar um momento de

singular dificuldade e que se podem orgulhar de terem realizado o feito de, congregando esforços e vontades,

organizar um ato eleitoral com os mais elevados níveis de participação das últimas décadas.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a administração eleitoral e o Governo são, de todo — repito, de todo!

—, alheios aos factos que originaram a decisão do Tribunal Constitucional, mas, mal essa decisão foi conhecida,

bem como a deliberação da Comissão Nacional de Eleições, que definiu uma nova data para a repetição do

voto no círculo eleitoral da Europa, a administração eleitoral preparou, num tempo recorde e de forma

profundamente empenhada e profissional, todo o processo conducente à repetição da votação. Para isso, foi

preciso: produzir e fazer aprovar um novo boletim de voto por parte dos partidos e coligações concorrentes;

garantir a impressão urgente de mais impressos para votos pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda, pois,

recorde-se, a eleição que agora acontece não era previsível e, portanto, esta segunda votação ocorre já num

contexto em que, de alguma maneira, a imprevisibilidade é maior; produzir mais materiais informativos, de

distintos formatos, para um grande universo de eleitores, tendo sido enviadas cerca de 926 000 cartas para os

eleitores recenseados no círculo da Europa, num total de 36 países, num processo que teve início a 21 de

fevereiro; alterar os modelos dos envelopes de envio e dos envelopes de resposta, para assegurar que não

houvesse confusão com os envelopes anteriores e que não se gerassem equívocos; e garantir a «envelopagem»

automática de toda a documentação a enviar aos eleitores.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, nem tudo o que fazemos corre bem. Ao agir, acertamos, mas também

erramos. O importante é que sejamos capazes de reparar o erro e de melhorar a margem de acerto.

Estou aqui, Sr.as e Srs. Deputados, para responder às questões que me queiram colocar e para, no final, se

for caso disso, reconhecer responsabilidades que, até agora, os factos que conheço não me permitem identificar.

Neste momento em que me dirijo a VV. Ex.as, anima-me a convicção fundada de que o Governo tudo fez e tudo

continua a fazer para que as eleições para a Assembleia da República decorram com o mínimo de

constrangimentos e com a máxima participação possível dos nossos concidadãos eleitores, independentemente

do local da sua residência.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para fazer perguntas pelo Grupo Parlamentar do PSD, o Sr. Deputado José Silvano.

O Sr. José Silvano (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr.as e Srs. Deputados, o PSD não pode deixar de lamentar que só agora, um mês e quatro dias depois, seja possível discutir um tema tão importante, quando

já se encontra praticamente esgotada a discussão sobre o assunto no espaço público e mediático.

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O que o PSD queria evitar com o agendamento deste debate parece que voltou a acontecer, numa das

partes, com milhares de emigrantes a não receberem o boletim de voto, como sinalizou o Presidente do

Conselho das Comunidades Portuguesas na Europa.

Os eleitores portugueses residentes no estrangeiro não são cidadãos de segunda, são tão portugueses

quanto os cidadãos nacionais residentes em Portugal.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

O Sr. José Silvano (PSD): — Por isso, os votos válidos dos emigrantes não poderiam ter sido misturados com os votos inválidos, que não continham a fotocópia do cartão de cidadão ou do bilhete de identidade. As

mesas de voto não tinham esse direito.

De nada valeu o PSD ter apresentado protestos para evitar tal procedimento ilegal das mesas, pois a maioria

delas não quis saber disso e o resultado ficou à vista de todos: foram considerados nulos mais de 80% dos votos

dos emigrantes do círculo da Europa.

O que se passou nos dias 8 e 9 de fevereiro de 2022 ficará nos anais da história como tendo sido dias trágicos

para os emigrantes portugueses e para a democracia portuguesa. Foi uma vergonha nacional! Foram dois dias

em que a maioria das mesas, num total de 151, cometeram a manifesta ilegalidade de considerar como válidos

os votos que vinham desacompanhados da fotocópia do cartão de cidadão. Ora, a Lei Eleitoral para a

Assembleia da República é muito clara e não deixa margem para dúvidas: para que o voto seja válido, o envelope

branco terá de conter no seu interior a fotocópia do cartão de cidadão ou do bilhete de identidade; se não o

contiver, o voto é nulo.

É preciso não esquecer que esta exigência legal visa assegurar a pessoalidade do voto e a prevenção de

eventuais fraudes eleitorais, razões pelas quais a mesma não pode ser dispensada. Trata-se, por isso, no

entender do PSD, de uma exigência que deve ser mantida na lei, devendo ser assegurado o seu cumprimento.

Não concorda, Sr.ª Ministra?!

A pergunta é pertinente, porque alguns Deputados e dirigentes do Partido Socialista já afirmaram

publicamente que o objetivo é eliminar este requisito legal.

As mesas valeram-se de um acordo «grosseiramente ilegal», para usar a qualificação dada no acórdão do

Tribunal Constitucional, em que os representantes de alguns partidos consensualizaram, numa reunião a 18 de

janeiro, aceitar como válidos todos os boletins de voto, mesmo que o envelope não contivesse cópia do cartão

de cidadão ou do bilhete de identidade, já que, e nesta parte a ata reproduz uma frase da deliberação da CNE,

de 15 de outubro de 2019, «a remessa pelo eleitor de cópia do documento de identificação serve, afinal e

apenas, como reforço das garantias do exercício pessoal do voto».

Tal acordo tem por base uma deliberação da CNE que não diz aquilo que os representantes de alguns

partidos achavam que dizia, com isso influenciando outros que achavam que o parecer da CNE era claro. A

própria CNE viria a reconhecer que o teor dessa deliberação foi truncado por alguns partidos, interpretando-a

incorretamente como a dispensa da fotocópia do documento de identificação para se aceitar o voto como válido,

quando, na verdade, o que essa mesma deliberação disse foi que a identificação não relevava para a descarga

do eleitor nos cadernos eleitorais, mas relevava para efeitos da validade do voto.

Os representantes de alguns partidos não só desconsideraram o prescrito na lei como deturparam a posição

assumida pela CNE. Foi por isso que os representantes do PSD vieram, na reunião seguinte, a 4 de fevereiro,

informar os representantes dos demais partidos de que não era possível manter o acordo, uma vez que este era

manifestamente contrário à lei e o PSD não poderia pactuar com tamanha ilegalidade.

Pior do que errar é persistir no erro. Infelizmente, foi isso que fizeram os representantes dos demais partidos,

que acabaram por dar instruções aos membros das mesas, por si designados, no sentido de considerarem

válidos os votos desacompanhados de fotocópia do documento de identificação. Foi por isso que a maioria das

mesas validou tais votos, que a lei determina serem nulos, misturando-os com os votos válidos.

Não temos dúvidas nenhumas em afirmar que alguns membros das mesas o fizeram deliberada e

conscientemente, razão pela qual o PSD apresentou uma queixa-crime junto da Procuradoria-Geral da

República.

Onde é que entra, então, a responsabilidade do Governo e, em particular, da Sr.ª Ministra? Passamos a

explicar: desde logo, nas ações de formação que deu aos membros das mesas, o MAI (Ministério da

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Administração Interna) não foi capaz de explicar o procedimento a adotar caso a fotocópia do documento de

identificação civil do eleitor não estivesse contida no interior do envelope branco, não lhes tendo transmitido, de

forma perentória, que a lei considerava tais votos nulos. Ao invés, o MAI preferiu insistir na afirmação de que as

mesas eram soberanas para, nesses casos, decidirem como entendessem, dando assim fôlego ao que se viria

a passar nos dias 8 e 9 de fevereiro.

Sr.ª Ministra, quando cabe ao MAI a missão de apoiar tecnicamente os processos eleitorais, como explica

esta falta de informação? Não se esqueça de que os membros das mesas são, na sua maioria, cidadãos

comuns, sem qualquer conhecimento jurídico, pelo que se impunha esse esclarecimento legal por parte do MAI.

Não acha, Sr.ª Ministra, que, nessas ações de formação, foi incendiário o MAI ter atirado para as mesas de

voto a responsabilidade de decidirem sobre a validade dos votos desacompanhados de fotocópia do cartão do

cidadão, sem sequer ter advertido que a soberania das mesas tem por limite último a obediência e o respeito da

lei?

Mas a responsabilidade do Governo não se fica por aqui. O MAI elaborou uma nota, que enviou a 13 de

fevereiro, onde considerou deplorável a anulação de um número tão elevado de votos, nunca se pronunciando

sobre as ilegalidades cometidas pelas mesas e que estiveram na origem dessa anulação, passando a ideia de

que seria procedimento normal as mesas misturarem votos válidos com inválidos.

Sr.ª Ministra, como pôde o MAI passar essa ideia e não ter censurado inequivocamente, nessa nota, tal

procedimento seguido pelas mesas?! Não se esqueça de que o próprio MAI também truncou, nessa nota, a

deliberação da CNE, de outubro de 2019, considerando que a aceitação dos boletins de voto,

independentemente de virem ou não acompanhados de cópia do documento de identificação, era, e passo a

citar, «uma opção que a própria CNE subscreveu numa deliberação aprovada em outubro de 2019», o que não

é verdade e que a própria CNE desmentiu.

Sr.ª Ministra, não se arrepende do envio dessa nota à comunicação social?

Pela parte do PSD, estamos de consciência tranquila porque, dias antes da contagem dos votos, alertámos

para a necessidade do cumprimento da lei, protestámos os votos que vieram desacompanhados de fotocópia

do cartão de cidadão ou do bilhete de identidade, por serem nulos, e o Tribunal Constitucional veio a dar-nos

razão.

Determinada a repetição dos atos eleitorais, iniciou-se uma nova fase neste processo, sendo imprescindível

garantir que desta vez tudo corra bem. Era, por isso, urgente esta audição, sendo ela agora perfeitamente

extemporânea.

Sr.ª Ministra, estão previstas novas ações de formação aos membros das mesas antes da contagem dos

votos, nos dias 22 e 23 de março? Ser-lhes-ão explicadas as implicações do acórdão nos procedimentos a

adotar nas mesas?

Uma outra questão que pode ser levantada e que precisa de mais explicações, sob pena de poder originar

uma nova impugnação, é a seguinte: por que razão o MAI procedeu à remessa dos boletins de voto aos eleitores

recenseados em todo o círculo eleitoral da Europa quando o acórdão do Tribunal Constitucional apenas mandou

repetir a votação nas 151 mesas cujos votos foram declarados nulos por ter havido mistura de votos válidos com

inválidos?

Risos do Deputado do PS Pedro do Carmo.

Como a Sr.ª Ministra bem sabe, se o Tribunal Constitucional mandasse repetir a votação em 50 mesas de

um círculo eleitoral nacional, a repetição da votação far-se-ia, apenas e exclusivamente, nessas 50 mesas e não

em todo o território nacional.

Qual a razão de o MAI agir de forma diferente em relação ao círculo eleitoral da Europa? Por muita justificação

que tenha, e que com certeza terá, é preciso dar uma explicação mais objetiva para que isto não seja um entrave

a que o processo corra normalmente. Não é possível que os cadernos eleitorais desmaterializados tenham

menor grau de informação do que os cadernos eleitorais impressos em papel, e que tal impeça, nos círculos da

emigração, a identificação dos eleitores por mesa?!

Sr.ª Ministra, é imprescindível que explique esta situação para que não reste a mínima desconfiança sobre a

legalidade da segunda votação.

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Termino, sublinhando que o PSD é, e continuará a ser, um partido empenhado em valorizar os cidadãos

portugueses residentes no estrangeiro e que não desistirá de incrementar soluções legislativas que aumentem

a sua participação eleitoral, nomeadamente, alargando-lhes a possibilidade de opção pelo voto por

correspondência em alternativa ao voto presencial, nas eleições presidenciais e nas eleições europeias, e

ponderando mesmo a possibilidade de introdução do voto eletrónico, uma medida que resolveria definitivamente

todos estes problemas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Administração Interna.

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Silvano, colocou questões de ordens diferentes. Aquela que tem que ver, basicamente, com a anulação dos votos prende-se com uma

matéria que foi discutida e articulada entre os partidos políticos e relativamente à qual o Governo não teve, nem

poderia ter, nenhuma intervenção. É verdade que, numa primeira fase, o espaço físico em que as decisões

foram tomadas foi o de uma sala do Ministério da Administração Interna, uma sala cedida pela administração

eleitoral, mas essa foi a única intervenção que o Governo teve nesta matéria, cumprindo o seu dever.

Portanto, Sr. Deputado, há uma parte da sua intervenção que, como lhe digo, não tem o Governo como

destinatário. Terá, seguramente, como destinatários os partidos políticos com os quais, na altura, os senhores

negociaram este acordo, que acabou por determinar este resultado final.

Mas há questões que o Sr. Deputado, legitimamente, levantou que têm que ver com a administração eleitoral.

A primeira tem que ver com os emigrantes que não receberam os boletins de voto, e o Sr. Deputado referiu-se

a milhares de emigrantes que ainda não os receberam. Sr. Deputado, os últimos dados que tenho apontam no

sentido de que entre 72% e 99% dos emigrantes receberam, efetivamente, os boletins de voto e, portanto, temos

uma percentagem muito elevada de pessoas que já os receberam. Obviamente, quer nesta eleição, quer

noutras, pode haver falhas nas entregas ou nas respostas e vamos indagar as razões pelas quais algumas

pessoas podem não ter recebido os boletins de voto.

Já na anterior votação houve uma situação análoga e temos o relatório relativo às causas que determinaram

que as pessoas não tivessem recebido o boletim de voto.

Quanto à questão da eliminação do requisito legal, também lhe digo que não é propriamente matéria que o

Governo venha discutir. Penso que essa é uma questão que deve ser discutida pelos partidos políticos e, mais

do que isso, até, na próxima Legislatura.

Quanto às ações de formação, gostava de dizer que, de facto, a administração eleitoral realizou ações de

formação junto dos membros das mesas. Mais do que isso, produziu até um manual para as mesas, o Manual

dos Membros das Mesas Eleitorais — Assembleias de Recolha e Contagem de Votos dos Residentes no

Estrangeiro, que entregou a todos os membros das mesas de voto.

A oradora exibiu o manual que mencionou.

A páginas tantas deste manual está um documento que eu trouxe em tamanho visível.

A oradora exibiu o documento que mencionou.

Neste documento, no capítulo relativo aos votos válidos, votos nulos e votos em branco, é claramente dito o

seguinte: «Considera-se voto nulo aquele que não contenha fotocópia do cartão de cidadão ou do bilhete de

identidade.» Isto está no manual e foi isto que a administração eleitoral disse na formação que fez aos membros

das mesas.

Quanto a isso, Sr. Deputado, estou à vontade para considerar que não houve, da parte da administração

eleitoral, omissão ou erro que lhe possam agora ser assacados.

O Sr. Deputado referiu-se ainda a um comunicado que o MAI emitiu e eu gostava de lhe dizer que,

considerando as regras eleitorais, que as mesas têm um poder semelhante ao poder de um tribunal e que,

obviamente, o Governo não vai censurar aquilo que foi feito pelas mesas, o que o Governo fez foi uma

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declaração de lástima com a descrição do que tinha acontecido, não emitindo juízos de valor relativamente a

uma situação ou a outra. Portanto, o Governo foi absolutamente neutro e rigoroso naquilo que disse.

Aplausos do PS.

A referência que o Sr. Deputado faz à nota com a indicação de que a CNE subscreveu o entendimento é

uma referência feita à descarga de votos. O parecer da CNE relativo à descarga de votos diz, a determinada

altura, que, para efeitos de descarga, se pode considerar que o documento de identificação é um plus

relativamente aos já frágeis elementos de identificação preexistentes. Esse foi o enquadramento em que o

Ministério da Administração Interna produziu essa nota.

É óbvio que faremos novas ações de formação em que teremos o cuidado de identificar todas as áreas em

que consideramos que podem subsistir dúvidas, fazendo uma orientação muito forte no sentido do seu

esclarecimento.

Depois, fez-me outra pergunta que, confesso, Sr. Deputado, me deixou um pouco espantada. Perguntou-me

por que razão o MAI resolveu enviar votos a todo o círculo da Europa. Sr. Deputado, tanto quanto sei — e a

própria CNE reconheceu-o —, os votos estavam todos misturados, o que quer dizer que não era possível

fazermos uma distinção. Repare, isto aconteceu na quase totalidade das mesas do círculo eleitoral da Europa

e, portanto, não era possível fazer a distinção para se autonomizar. Se isso fosse possível, para nós era ótimo,

dava-nos muito menos trabalho.

Se, da parte do MAI, tivesse sido possível tomar essa opção, isso ter-nos-ia sido claramente mais favorável.

Portanto, só não a tomámos porque, materialmente, era impossível fazê-lo.

Finalmente, quanto à questão do voto eletrónico, não quero, nem devo, pronunciar-me sobre o futuro. A

questão do voto eletrónico será, seguramente, debatida na próxima Legislatura, e a única coisa de que é possível

falar — o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares está aqui e em condições de o fazer — é da

evolução que houve e da apresentação que foi, até, feita no Parlamento relativamente à experiência de voto

eletrónico para o Conselho das Comunidades Portuguesas. Não houve mais avanços quanto a isso.

O que se fez foi uma experiência-piloto para perceber qual era o limite e a possibilidade de se avançar com

esse modelo. Houve um relatório, foi feita uma apresentação e, portanto, esse é o estado da Nação nessa

matéria. Quanto ao futuro, os senhores cá estarão — os que estiverem — para decidir.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para formular perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Filipe Soares, do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate é, em primeiro lugar, uma tentativa de lavagem da consciência pesada que o PSD tem

por todo o imbróglio que foi criado e, em segundo lugar, uma parte — creio eu — do pedido de desculpas que

deveria existir aos portugueses e às portuguesas que viram os seus votos invalidados, que se sentiram

achincalhados por um processo a que estão totalmente alheios. Por isso, na intervenção que o PSD fez neste

debate, faltou esse pedido de desculpas a todas e a todos os emigrantes portugueses que viram os seus votos

anulados por esta brincadeira em que o PSD transformou umas eleições.

O PSD não explicou, sequer, como é que no meio de tanta retidão que existiu e que exigiu, no meio de tanta

transparência, no meio de tanta certeza, teve afinal dois pesos e duas medidas. O mesmo PSD aceitou umas

regras para o círculo fora da Europa que rejeitou no círculo da Europa. É absolutamente incompreensível! Repito:

é absolutamente incompreensível!

Se há coisa que as pessoas não compreendem, no que diz respeito à lei — e já lá irei —, são os dois pesos

e as duas medidas do PSD, porque mais parece que olham para as eleições não como o ato mais nobre de um

espaço democrático, mas apenas e só com a intenção de ver quais os dividendos que vão retirar do ato eleitoral.

Essa é a forma errada de ver um ato eleitoral, que não é um jogo, é o espaço mais nobre da nossa democracia

e era assim que deveria ter sido visto por todas e por todos, com esse respeito, não o respeito para com os

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partidos, não o respeito para com outra coisa que não as pessoas que votaram e as dezenas de milhares de

votos, que foram indevidamente anulados.

Este é o primeiro ponto que gostava de deixar em cima da mesa, bem como a crítica firme e direta a todo o

papel do PSD neste contexto.

Em segundo lugar, deixo, da parte do Bloco de Esquerda, um pedido de desculpas a todos os portugueses

e a todas as portuguesas que vivem fora do País, aos nossos emigrantes, às nossas comunidades. Pelo menos

da nossa parte, assumimos aquilo que nos é imputável, deveríamos ter preparado de forma diferente estas

eleições e creio que este é um ponto de frontalidade que devemos ter também aqui.

A lei estava errada, deveria ter sido mexida e o Bloco de Esquerda tentou mexer na lei. Conseguimos colocar

na lei a alteração que acabou com a existência de portugueses de primeira e portugueses de segunda,

consoante votassem no território nacional ou votassem fora do País. Isto porque, se votassem fora do País e

por correio, teriam de pagar esse voto e nós acabámos com isso. Conseguimos que essa vontade fosse

acompanhada por outras bancadas — e ainda bem!

Alterámos a forma de recenseamento e com isso trouxemos para o recenseamento devido mais de 1 milhão

de pessoas, e orgulhamo-nos disso, mas não conseguimos mudar na lei o que deveria ter sido mudado, que é

a parte da apresentação da cópia do cartão de cidadão.

Há aqui uma pergunta que fica em cima da mesa e que é séria: como é que, não havendo essa obrigação,

há uma garantia da idoneidade do voto? Creio que essa pergunta é seria, porque ouvi o PSD a mudar de opinião,

na sua intervenção de ainda há pouco, quando nunca colocou em cima da mesa o voto eletrónico. Em várias

discussões que tivemos sobre esta matéria, o PSD sempre rejeitou o voto eletrónico e agora veio dizer que o

defendia, coisa que eu nunca tinha ouvido. No entanto, o próprio voto eletrónico não é isento de perigos, como

vimos em vários países, recentemente.

Da mesma forma, sabemos que o voto presencial também não é isento de perigos, mas tudo o que se

distancie desse voto presencial aumenta o risco. Por isso, percebemos que o que vinha de trás na lei, de forma

muito antiga — quando o voto era exercido por correio, devia trazer uma cópia do cartão de cidadão — tinha

esta preocupação de dar mais idoneidade, dar mais segurança àquele voto.

Porém, creio que não é a única solução e é uma solução que até conflitua com outras leis neste contexto.

Conflitua até com garantias de salvaguarda de dados, porque ter cópias de documentos oficiais a circular entre

os correios de países estrangeiros é algo que pode pôr em causa a idoneidade dessa informação.

No entanto, atualmente, no relacionamento que temos com o cartão de cidadão, com as formas de assinatura

digital, há garantias de validação da identidade que servem como exemplos onde podemos aprender para

melhorar a lei. Este é outro tópico sobre o qual gostava de deixar a disponibilidade do Bloco de Esquerda para

cirurgicamente mudar a lei para garantir que ela fica mais clara, que mantém, do ponto de vista da garantia de

segurança, todos os princípios que atualmente tem e que dá uma maior fidelidade à expectativa que as pessoas

têm para poderem exercer o seu direito de voto, quando o fazem fora do País.

Essa disponibilidade do Bloco de Esquerda é uma parte que creio que faltou aqui ao PSD, no sentido da

humildade de ouvir para essa melhoria. Esse aspeto que todos devemos aos portugueses e às portuguesas fora

do País, que é a humildade, também faltou na intervenção do PSD.

Sr.ª Ministra, ouvi a sua intervenção de início e devo dizer-lhe que há uma parte que a mim me desagradou

e sou muito frontal a dizer-lhe qual foi: já ouvimos de tudo na vida, e só faltava agora, sobre o processo eleitoral,

dizer-nos que a culpa é da pandemia. Bem, a pandemia tem costas largas! Neste País, uma parte considerável

dos problemas atualmente advém da pandemia, mesmo que a pandemia não tenha nada que ver com isso.

Percebo: houve equipas «espelho», houve pessoas de baixa, houve um conjunto de problemas que, de facto,

a pandemia trouxe. Mas ela não tem costas tão largas em que todas as responsabilidades neste contexto são

assacáveis à pandemia. Isso não me parece.

Há coisas que devíamos ter aprendido com 2019 e não aprendemos. No que diz respeito ao relacionamento

com serviços postais de outros países, algo deveria ter sido feito para garantir essa celeridade nas cartas e o

respeito por este tipo de correio. Era preciso ter havido a garantia da gratuidade, pois tivemos exemplos do

Reino Unido em que a gratuitidade do correio foi colocada em causa por que não reconheciam o RSF (resposta

sem franquia) de devolução da carta. Estes são exemplos concretos que deveriam ter sido acautelados.

A Sr.ª Ministra diz: «Bem, mas nós tivemos um tempo recorde para fazer estas eleições». Mas, Sr.ª Ministra,

como se costuma dizer, «o seguro morreu de velho» e, nesta matéria, o MAI deve estar permanentemente ativo

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para garantir que, em qualquer momento, quando houver umas eleições, porque elas não chegam sempre na

hora marcada, está à altura para responder às necessidades e creio que aqui essa cautela não existiu.

Mais uma vez, a Sr.ª Ministra dirá que a culpa é da pandemia, mas não me parece que a pandemia tenha

culpas na preparação que deveria ter existido e, já agora, parece-me que esta preparação não advém só do

MAI, o próprio MNE (Ministério dos Negócios Estrangeiros) deveria estar envolvido nesta operação diplomática

com outros países.

Sr. Presidente, termino, dizendo que espero que possamos todos aprender para que no futuro estes erros

não se repitam.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Administração Interna, Francisca Van Dunem.

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, quanto à questão das desculpas, creio, que, obviamente, não me era dirigida, mas queria sinalizar que o Sr. Primeiro-Ministro, logo na altura em

que isso aconteceu, teve o cuidado de, em nome do Governo, apresentar as suas desculpas aos nossos

concidadãos que viram, de facto, defraudada a sua intenção de participação naquele ato eleitoral.

Quanto à questão dos cartões de cidadão, queria, apenas, dar nota do seguinte: aquilo que a administração

eleitoral conseguiu apreender, no que diz respeito a esta matéria, é que há, efetivamente, muitas situações em

que os eleitores se sentem condicionados no envio do cartão de cidadão. Obviamente, há o receio da utilização

abusiva, do desvio da correspondência. Há casos em que, nos países, há proibição de extração de fotocópias

de documentos de identificação ou em que isso é visto com alguma desconfiança, nomeadamente nos países

afetados por questões de terrorismo e em que existem redes de documentos para utilização de organizações

de caráter terrorista.

Portanto, percebo que possa haver, ainda, segmentos relevantes de eleitores que, no momento e apesar da

indicação de que devem enviar o cartão de cidadão, tenham dificuldades ou dúvidas em fazê-lo. Acho que vai

ser preciso caminhar ou encontrar, de facto, respostas para isso e, mais uma vez, digo que, seguramente, o

próximo Parlamento as encontrará.

Sr. Deputado, há um equívoco quando diz que atribuí as culpas todas à pandemia. Não o fiz. Aquilo que fiz

foi dizer que entendia que aquele grupo de pessoas, de mulheres e de homens, membros da administração

eleitoral, que são 31, e que, naquele contexto, teve de preparar e realizar este ato eleitoral, teve dificuldades

acrescidas, mas, não obstante isso, fê-lo. E, mais do que isso, explicitei tudo aquilo que, do meu ponto de vista,

se devia enaltecer relativamente à ação dessas pessoas.

Introduzi aqui o fator pandemia apenas porque, por vezes, é fácil — e as memórias são seletivas! — esquecer

o contexto concreto em que tudo isto se passou. Quando isto acontece, estamos a atravessar em Portugal o

pior período da pandemia, temos 600 000 pessoas confinadas e, do ponto de vista geral, há dificuldades quer

no que diz respeito ao transporte aéreo, quer no que diz respeito, até, às questões da distribuição do correio a

nível local. Assim, chamo a pandemia apenas para dizer, primeiro, que estas pessoas da administração eleitoral

não merecem este reparo, elas, pelo contrário, merecem um elogio, porque, em condições particularmente

difíceis e em número reduzido, conseguiram obter este resultado.

Aplausos do PS.

Quer nós queiramos quer não este é um resultado final que nos honra.

Não nego que possa haver dificuldades, que possa haver áreas em que seja necessário aperfeiçoamento,

mas isso não justifica aquilo que eu tenho ouvido: apelidar o MAI de incompetente, apelidar de incompetente a

administração eleitoral,…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Isso foi daquele lado!

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: —… e outras coisas que, do meu ponto de vista, são de uma profunda e grave, e mais do que grave, injustiça.

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Agora, na minha intervenção, tive o cuidado expresso de dizer, relativamente ao relacionamento com os

outros serviços postais, que foi criado um grupo de trabalho que tinha a intervenção não só do Ministério dos

Negócios Estrangeiros, como também dos CTT, sendo certo que, desse ponto de vista, ficou, efetivamente, tudo

acautelado.

E ficou porquê? Por um lado, porque tínhamos uma plataforma que prometia fazer o tracing da

correspondência, por outro lado, porque os CTT, à partida, emitiram uma comunicação para a União Postal

Universal, o que significa, em princípio, para um número muito elevado de associados a explicitar que ia haver

aquela eleição naquele período, que iam ser enviados aqueles envelopes — até mandaram cópia dos envelopes!

— e a pedir que, a nível dos vários associados, houvesse cuidado na tramitação e na rápida distribuição desse

material.

Mas fizemos mais do que isso: simultaneamente, os CTT, também no quadro desse grupo de trabalho e com

tudo aquilo que foi organizado pela administração eleitoral, fizeram, expediram, além disso, comunicações

específicas para as suas congéneres das áreas em que há maior concentração de comunidades portuguesas.

São 10 países que cobrem cerca de 85% deste eleitorado e os serviços postais desses 10 países receberam,

todos, dos CTT uma carta com um pedido de atenção, um pedido de divulgação e, mais do que isso, cópias até

dos próprios envelopes, quer do envelope de envio, quer do envelope de retorno, para facilitarem e agilizarem

esse processo.

Quanto à última questão que referiu e que tem que ver com alguns países que não aceitam o porte pago,

assim que tivemos notícia dessa indicação procedemos aos pagamentos. Houve intervenção do MNE,

intervenção dos consulados e rapidamente se procedeu aos pagamentos, pelo que não foi por isso que houve

dificuldades.

Obviamente, teremos de trabalhar no sentido de, na próxima vez, não se verificarem essas dificuldades, mas

também devo dizer que, neste contexto, elas existiram, mas foram superadas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para intervir e formular perguntas, pelo Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados, este debate decorre de uma circunstância infeliz e há aqui uma soma de infelicidades.

É uma infelicidade que a Assembleia da República, eleita no dia 30 de janeiro, só seja instalada dois meses

depois dessa eleição. Esta é uma situação evidentemente indesejável e que decorre de um acordo feito entre

vários partidos, um acordo que, na verdade, é infeliz.

Temos de compreender que a decisão não foi tomada de má-fé, assentou, sim, na convicção de que muitos

cidadãos, por desconhecimento, não enviaram cópia do seu cartão de cidadão ou bilhete de identidade, como

é legalmente exigível, e de que havia um número muito significativo de votos considerados nulos por essa

circunstância.

Portanto, encontraram uma forma, consensualizada, mas, de facto, infeliz, porque não resiste a um

imperativo legal, que é o facto de essa exigência constar da lei e dever ser respeitada.

Depois, soma-se uma infelicidade que é o facto de um partido — neste caso, o PSD —, que tinha dado

consenso a que assim se procedesse, pensar melhor e vir dizer que, afinal, esse consenso não é dado, criando

condições para que o Tribunal Constitucional, aplicando a lei, que é incontornável, tenha tomado a decisão de

obrigar à repetição da eleição.

E há mais uma infelicidade: é que essa eleição é repetida no círculo eleitoral da Europa, mas, como o PSD

não fez idêntica reclamação relativamente ao círculo eleitoral de fora da Europa, alguns dos votos relativos a

este último foram anulados e assim ficaram, pelo que só se fez a repetição das eleições no círculo eleitoral da

Europa. Ora, esta é mais uma infelicidade. Como disse antes, há aqui uma soma de infelicidades.

Nós também consideramos que esta exigência faz sentido, ela não acontece por acaso e não é nova. Aliás,

a exigência de que os cidadãos devem acompanhar o seu voto da cópia do seu cartão de cidadão — na altura,

bilhete de identidade e, agora, cartão de cidadão ou bilhete de identidade para quem ainda o detenha — é muito

anterior ao alargamento do universo eleitoral dos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro. É muito

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anterior por se reconhecer que o voto por correspondência tem fragilidades, daí que se tenha entendido que era

aconselhável haver um reforço do caráter pessoal do exercício do sentido de voto através da junção da cópia

de um documento de identificação do cidadão eleitor.

Do nosso ponto de vista, faz sentido que assim seja e que essa exigência deva manter-se, porque a mesma

foi reconhecidamente necessária não agora, mas há mais de 20 anos — não sei precisar exatamente qual foi o

momento dessa alteração, mas ela ocorreu seguramente há cerca de duas décadas. Portanto, do nosso ponto

de vista, essa exigência justifica-se.

Outra circunstância infeliz foi o facto de o PSD ter decido apresentar queixa-crime contra os membros das

mesas de voto, o que é lamentável. Desde logo, porque os membros das mesas de voto certamente não atuaram

de má-fé, não atuaram com dolo, pelo contrário, o seu desejo era o de que o voto dos cidadãos pudesse ser

validado o mais possível. Claro que o fizeram de uma forma que não resistiu a um imperativo legal, mas daí até

apresentar uma queixa-crime contra esses cidadãos vai uma distância muito grande.

Além disso, acho que o País é credor de um reconhecimento aos cidadãos que asseguram o funcionamento

do processo eleitoral, fora do País e também no território nacional, o que muitas vezes é esquecido. Nós vemos

muito facilitismo no discurso sobre esta matéria, quando se diz, por exemplo, que o voto antecipado devia ser

independente de qualquer inscrição, votando o cidadão no domingo que entendesse.

Ora, isto é desconsiderar o esforço enorme que dezenas de milhares de cidadãos fazem para assegurar o

bom funcionamento do processo eleitoral. E aí também é devida uma homenagem aos partidos políticos no seu

conjunto, porque estes também desenvolvem um esforço muito grande de mobilização dos cidadãos para

assegurar o funcionamento do processo eleitoral e a fiscalização necessária do mesmo.

Portanto, apresentar uma queixa-crime contra estes cidadãos é, do nosso ponto de vista, absolutamente

lamentável.

Já que se referiram aqui, ainda que um pouco à margem deste debate, alguns aspetos relacionados com o

processo eleitoral, queria deixar muito claro que as eleições em democracia não são um campo para

experimentalismos que possam ter consequências muito negativas.

No nosso País, realizamos eleições livres, em democracia, há 47 anos, e, independentemente de algumas

dificuldades, de poder haver reclamações, protestos, de termos tido dificuldades em alguns momentos em que

houve mudanças súbitas, como aconteceu, por exemplo, com o fim do cartão de eleitor, temos tido a sorte de

nunca as eleições, em Portugal, terem sido postas em causa.

O Sr. Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.

O Sr. António Filipe (PCP): — Termino já, Sr. Presidente. Ora, isto é um grande valor, porque no dia em que, por experimentalismos, de votos eletrónicos ou de

facilitação excessiva do processo eleitoral, alguém venha questionar a democraticidade do sistema eleitoral, aí

poderemos dizer que, em democracia, «temos o caldo entornado» e isso será profundamente negativo para a

saúde do regime democrático.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente: — Antes de dar a palavra, para responder, à Sr.ª Ministra da Administração Interna, queria dizer aos Srs. Deputados que devemos agora registar-nos para efeitos de quórum de votação, uma vez que

haverá votações no final desta reunião.

Tem a palavra, Sr.ª Ministra.

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, no essencial, estou de acordo com as referências que fez, a saber, no reconhecimento que é essencial que o País faça aos

cidadãos que participam nas mesas das assembleias de voto, assim como aos partidos políticos e à intervenção

que têm no campo eleitoral ao nível da dinamização e da mobilização das pessoas para votar.

Quanto às questões associadas ao caráter pessoal do voto e à necessidade de se assegurar a genuinidade

e a pessoalidade do voto por correspondência, aí também penso que é preciso que haja um nível de segurança

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suficientemente adequado para que possamos manter este regime democrático, com eleições que não

conhecem, de facto, grande sobressalto.

É verdade que temos uma lei eleitoral que é muito prescritiva, mas, independentemente disso, os avanços

que tem sido possível fazer têm permitido que, até agora, tenhamos tido sempre processos eleitorais sem

grandes convulsões. Acho que esse é um valor que deve ser preservado e relevante para a estabilidade da

nossa democracia.

Basicamente, era isto que queria dizer quanto à intervenção do Sr. Deputado António Filipe.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Morais Soares, do Grupo Parlamentar do CDS-PP, para formular perguntas.

O Sr. Pedro Morais Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Administração Interna, Sr.as e Srs. Deputados, o CDS considera que este debate é prematuro. No momento em que estamos a fazer este mesmo

debate sobre as eleições do círculo eleitoral da Europa, as mesmas foram já repetidas, presencialmente, no

passado fim de semana por determinação do Tribunal Constitucional. De facto, já decorreu a eleição presencial

nos locais de voto, mas está ainda a decorrer o período de receção do voto postal até dia 23 de março.

Ou seja, não conseguimos ainda saber qual será a influência que a trapalhada criada em território nacional

com o voto dos nossos concidadãos vai ter sobre o exercício do direito de voto por parte desses mesmos

concidadãos. Mas já sabemos, à data de hoje, que muitos eleitores ainda não receberam o boletim de voto.

Portanto, os atrasos continuam a existir, pelo que talvez tivesse sido mais prudente adiar mais uma semana

para dar mais prazo.

No entanto, estes problemas não são de agora, pois já ocorreram nas eleições legislativas de 2019, altura

em que o processo eleitoral no estrangeiro também não decorreu da melhor maneira.

Nesse ato eleitoral, centenas de milhares de portugueses residentes no estrangeiro foram impedidos de votar

por problemas no decurso do processo eleitoral, problemas esses que levaram a que apenas um terço dos

emigrantes portugueses tivesse conseguido exercer sem dificuldade o seu direito de voto, ao passo que outro

terço dos emigrantes portugueses não chegou, sequer, a receber o boletim de voto e o terço restante teve o

boletim de voto devolvido pelos correios.

Foram, sobretudo, razões como os atrasos na distribuição do correio ou erros na entrega da correspondência,

mesmo com a morada correta, que determinaram que muitos dos portugueses não tivessem conseguido votar.

Na altura, estamos a falar de 22,33% de votos nulos, nos círculos eleitorais da Europa e de fora da Europa.

Nessa altura, o Sr. Ministro Santos Silva apresentou várias justificações para o processo de votação no

estrangeiro ter falhado: desde o facto de o porte pago ter de estar em francês por imposição da União Postal

Universal, até às greves postais. Quer na expedição para lá, quer no envio para cá, tudo serviu de desculpa.

Mas lembramo-nos de uma coisa que, na altura, o Sr. Ministro Santos Silva disse, que foi, e cito, «tudo isto

são questões técnicas que são facilmente aperfeiçoáveis», fim de citação.

A Sr.ª Ministra também apresentou hoje um conjunto de justificações, o que nos leva a perguntar o seguinte:

que aperfeiçoamentos foram realizados, de 2019 para cá, ao processo eleitoral no estrangeiro? O processo

eleitoral no estrangeiro, na sua opinião — gostaria de sabê-lo, apesar de a Sr.ª Ministra já nos ter dito que não

queria comentar essa matéria —, deve continuar a apostar no modelo do voto por correspondência? Ou tem a

administração eleitoral — a que V. Ex.ª preside neste momento, enquanto Ministra da Administração Interna —

um modelo alternativo em desenvolvimento?

Muito concretamente, e tendo em conta as propostas formalizadas pelo Conselho das Comunidades

Portuguesas a esse respeito, qual é a posição da administração eleitoral quanto à desmaterialização dos

cadernos eleitorais e ao voto eletrónico descentralizado?

Também gostaríamos que nos explicasse, Sr.ª Ministra, por que razão não mais foi considerado o voto

eletrónico, após a experiência-piloto que ocorreu, em 2019.

A Sr.ª Ministra também falou aqui, há pouco, de um grupo de trabalho, com representantes dos negócios

estrangeiros e da administração interna, que teria como missão analisar o relatório que caracterizou o modo

como decorreu a votação para a Assembleia da República no estrangeiro, em outubro de 2019, e propor

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alterações e ajustamentos. Assim, perguntamos também o seguinte: que conclusões foram apresentadas por

tal grupo de trabalho? Que propostas foram formuladas por este grupo de trabalho?

Quero ainda deixar esta nota: em 2019, a justificação apresentada pelo Governo assentou na novidade que

representava a Lei Orgânica n.º 3/2018, de 17 de agosto, que expandiu o universo eleitoral de cerca de 300 000

para 1,4 milhões de eleitores recenseados, mercê do recenseamento automático dos cidadãos que tivessem

morada no estrangeiro.

A Lei Orgânica n.º 3/2018 causou algumas «dores de crescimento» eleitorais, e o CDS até pode concordar

que a mesma ajudou a criar este estado de coisas, em 2019 e agora.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Fernando Negrão.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, queira terminar.

O Sr. Pedro Morais Soares (CDS-PP): — Termino já, Sr. Presidente. Aliás, na altura, parece que já adivinhávamos a confusão que vinha a caminho, quando dissemos, e cito,

«para um sistema que já está beliscado, perturbado com alguma descrença, desconfiança, afastamento e

indiferença, não há nada pior do que introduzir mais mecanismos de desconfiança. Uma qualquer falha, ainda

que pequenina, pode ter consequências graves e gerar mais e maior desconfiança», que foi o que sucedeu.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Muito boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra e Sr. Secretário de Estado.

Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Ministra da Administração Interna.

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Muito obrigada, Sr. Presidente, que aproveito para cumprimentar.

Sr. Deputado Pedro Morais Soares, o Sr. Deputado colocou-me três ou quatro questões, às quais gostava

de dar resposta. Em primeiro lugar, quanto à questão de este debate ser, ou não, prematuro, diria que, em rigor,

aquilo que faria sentido era que se deixasse terminar o processo eleitoral para, depois, se fazer uma avaliação.

Aliás, devo dizer que, quanto à votação inicial, que agora irá ser repetida, há um relatório, feito pela

administração eleitoral, explicitando todas as dificuldades que surgiram, nomeadamente aquelas que são

associadas à circunstância de as pessoas não terem conseguido votar ou não terem conseguido votar

presencialmente, e aí, na maior parte dos casos, essa impossibilidade teve que ver com a circunstância de as

pessoas pensarem que era possível votar em qualquer altura, portanto, que não havia um limite de data para

irem exercer o direito de voto nos consulados.

Depois, houve as questões associadas às pessoas que não receberam as comunicações — e, em relação à

não receção das comunicações, penso que pudemos rastrear cerca de 100 000 casos de pessoas que não

receberam as comunicações — e, no essencial, as causas que identificámos para isso foram, primeiro, o caso

de cartões de cidadão que não foram ativados do ponto de vista eletrónico. Como sabem, no contexto da

pandemia, criou-se um modelo de cartão de cidadão em que as pessoas recebem o cartão de cidadão em casa,

mas, depois, têm de ativar as suas potencialidades, do ponto de vista eletrónico e muitas pessoas não fizeram

isso.

Por outro lado, o recenseamento eleitoral fechou no dia 5 de dezembro, se a memória não me falha. E todas

aquelas pessoas que, entretanto, mudaram de morada — aqui não é tão frequente assim as pessoas mudarem

de morada, mas no estrangeiro é bastante mais —, a partir do dia 5 de dezembro, deixaram de ter a morada

atualizada e, portanto, as cartas foram enviadas para a morada que tínhamos anteriormente e não para as novas

moradas.

Há também um número muito grande de pessoas, de acordo com o tracing que fizemos, cujas comunicações

chegaram às respetivas casas, mas elas não estavam — é natural, estão a trabalhar. Nesse caso ficou aposto

ou depositado um aviso, porém as pessoas não foram levantar as cartas ao correio.

Há ainda, e agora estou a voltar atrás, situações em que as moradas estão incompletas — estão atualizadas,

mas incompletas — e que têm apenas a indicação do bairro ou não têm, por hipótese, o andar.

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Portanto, há um conjunto de situações que identificámos e, obviamente, trabalharemos no sentido de alertar

os nossos concidadãos para a necessidade de atualizarem estes dados no cartão de cidadão, sendo certo que

hoje já o podem fazer por eles próprios, eletronicamente, através da plataforma, nem sequer se coloca aqui um

problema de complexidade maior.

Obviamente que, nesta repetição de votação, iremos ter um número menor de votantes. É essa a perspetiva

que temos, porque, efetivamente, as pessoas fizeram um grande esforço de participação num ato nacional, no

qual se empenharam, e viram esse esforço gorado, frustrado, e, portanto, muitas estão incomodadas, como é

compreensível, porque consideram que o País não as respeitou. Assim, há muita gente, seguramente, que não

vai voltar a votar.

O que lhe posso dizer é que até ao dia de hoje, por comparação com o período idêntico do primeiro período

de votação, temos menos 43% de pessoas a votar e, nas projeções que fazemos, provavelmente, esse número

andará pelos 50%. Vai haver seguramente bastante menos pessoas a votar no círculo da Europa do que aquelas

260 000 que votaram da primeira vez.

Antes de me referir à questão do voto por correspondência, deixe-me passar para aquilo que o MAI fez a

seguir a 2019.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.ª Ministra, chamo a sua atenção para o tempo.

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente, já ultrapassei o meu tempo? Ah, peço imensa desculpa!

Ó Sr. Deputado, o que posso fazer é entregar-lhe este documento que tenho aqui, com aquilo que foi feito.

Peço desculpa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Muito obrigado, Sr.ª Ministra, e quanto ao facto de ter ultrapassado o tempo, não se preocupe porque é uma coisa muito regular que acontece nesta Casa.

Cumprimento a Sr.ª Ministra, bem como os Srs. Secretários de Estado, o que devia ter feito há pouco e não

fiz.

Dou agora a palavra à Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do PAN, para colocar perguntas.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, o voto dos portugueses no círculo eleitoral da Europa, e também no mundo, não pode, de facto,

continuar a ser desprezado.

Estarmos aqui a debater os cerca de 80% dos votos que foram anulados significa, de facto, uma perda para

a democracia, é lastimável. Este debate, em nosso entender, não é precipitado, é, aliás, tardio. É um debate

que quer esta Assembleia da República, quer o Governo já deveriam ter feito, para que a lei fosse alterada e

para que efetivamente as pessoas tivessem acesso ao voto.

Mais: é um debate que até deveria ir mais longe, porque estamos a falar, neste caso, da anulação de 80%

dos votos dos emigrantes, mas temos de nos perguntar por que razão é que 42% dos eleitores não exerceram

o seu direito de voto nas últimas eleições; por que razão é que 4 em cada 10 jovens continuam a dizer que não

lhes interessa minimamente a política no seu País ou também que sentido faz que pessoas com mobilidade

reduzida continuem a não conseguir votar — não conseguem, sequer, sair de casa, nem aceder à própria mesa

de voto, o que é absolutamente incompreensível em pleno século XXI.

Temos de refletir também porque é que nestas eleições um em sete votos não é convertido em mandato.

Porém, tudo isto são reflexões que não se limitam a uma intervenção cirúrgica no que diz respeito aos votos no

estrangeiro.

Quanto ao voto emigrante, que é isso que aqui nos traz, Sr.ª Ministra, neste imbróglio, de facto, só o Tribunal

Constitucional andou bem. Aliás, não nos podemos esquecer que o acordo informal que ocorreu entre o PS, o

PSD, o BE, o IL, o Livre, a CDU, o Volt e a Aliança é manifestamente vergonhoso. Não faz nenhum sentido que

tenha havido este acordo informal que prejudicou o exercício do direito de voto por parte destes nossos

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concidadãos, votos esses que deveriam ter sido considerados se as pessoas tivessem sido devidamente

esclarecidas.

Sr.ª Ministra, porque talvez não se tenha apercebido, reavivo-lhe aqui a memória sobre uma questão. É que,

em plena campanha para a repetição do ato eleitoral, já depois da pronúncia do Tribunal Constitucional, na

televisão, os anúncios que continuavam a circular diziam aos nossos concidadãos para enviarem apenas o

boletim de voto, nada diziam quanto a ser acompanhado pelo cartão de cidadão.

Portanto, depois de termos feito um erro grosseiro, que prejudicou o voto destes nossos concidadãos, volta-

se a cair no mesmo erro e os esclarecimentos que estavam a ser prestados…

Neste momento, a Ministra da Administração Interna disse que não com a cabeça.

Sr.ª Ministra, não diga que não com a cabeça, aconselho-a a ir atrás ver o anúncio que passou na televisão.

Eu tive o cuidado de ver e não estaria aqui a afirmar isto se, de facto, assim não fosse.

Efetivamente, não podemos desprezar o voto destas pessoas. Em democracia, todos os votos contam para

que ela saia reforçada. Mais, o problema, manifestamente, não é apenas esse: é que tivemos pessoas que

foram à sua mesa de voto e não puderam votar, porque embora constassem nos cadernos eleitorais, não tinham

feito o registo prévio, o que a Sr.ª Ministra já deu quase como uma inevitabilidade das burocracias inerentes à

ativação do cartão de cidadão ou até mesmo dos registos.

Tivemos pessoas que queriam votar por correspondência, mas que não receberam a carta, porque a morada

constante do registo do cartão de cidadão não estava atualizada ou por outra razão. Houve pessoas que queriam

votar via postal e a carta para o efeito não chegou, até porque os serviços postais do país de residência não

compreendiam o registo postal. Houve também pessoas que votaram por voto postal e o seu voto foi devolvido,

porque os serviços postais do país de origem também não sabiam que o porte era pago.

Por isso, Sr.ª Ministra, deixo-lhe duas questões muito concretas. Por um lado, pergunto para quando a revisão

e alteração desta lei, no sentido de garantir que se ultrapassa a questão da cópia do cartão de cidadão, que

colide, até, com questões da proteção de dados, do RGPD (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados).

Isto tendo em conta que aquilo que existe hoje em termos de mecanismos de validação do cartão de cidadão,

do ponto de vista eletrónico, já nos permitiria ultrapassar isto.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.ª Deputada, faça favor de terminar.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Estou mesmo a concluir, Sr. Presidente. Por outro lado, Sr.ª Ministra, há toda uma dimensão do voto no estrangeiro que tem de ser alterada. Portanto,

para quando estas alterações, para que efetivamente se consiga aproximar as pessoas do seu direito ao voto,

ao invés de continuarmos a desprezar estes votos?

Seria mesmo muito importante que esta transição, que tem de ser feita, fosse executada pelo Governo.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.ª Ministra, tem a palavra para responder.

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente, prometo agora ser disciplinada, respondendo em 3 minutos.

Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, para quando a revisão desta lei? A pergunta não deve ser dirigida a mim.

Em princípio, é uma pergunta que deve ser dirigida ao Parlamento, ao próximo Parlamento.

O Sr. André Ventura (CH): — Ao PS! Tem maioria absoluta!

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Depois, quanto à questão de que falou, de acesso ao voto, não houve um problema de acesso ao voto. Aquilo que deu origem à situação que temos hoje não foi um

problema de acesso ao voto. Nós podemos melhorar as condições de acesso ao voto. Podemos, de facto,

caminhar no sentido de procurar melhorar essas condições, mas o problema que temos hoje não tem que ver

com isso e o grande debate que a Sr.ª Deputada pretende fazer é um debate que, obviamente, deve ter lugar

nesta Casa, no momento em que os Srs. Deputados assim entenderem.

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Queria chamar a atenção da Sr.ª Deputada para a circunstância de a abstenção ter baixado

substancialmente, quer no interior, quer no exterior, contra todas as expectativas. Não se esqueça de que

estávamos no período de pandemia — e não me venham dizer que eu responsabilizo a pandemia por tudo! —

e que essa circunstância levaria, em princípio, a que muitas pessoas não fossem sequer votar. Pelo contrário,

houve muito mais gente que foi votar.

Quanto aos anúncios, vou verificar, mas aquilo que a administração eleitoral tem efetivamente colocado em

anúncios é um folheto informativo, que é um folheto de instruções, em que claramente se diz que se deve juntar

a cópia do cartão de cidadão.

Mas, se a Sr.ª Deputada me diz que viu anúncios que não tinham esta informação, aquilo que me comprometo

a fazer é verificar se efetivamente assim foi, para se reforçar essa componente numa próxima ocasião.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Dou agora a palavra à Sr.ª Deputada Mariana Silva, do PEV, para formular perguntas.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, chegámos a este debate a partir de duas realidades indesmentíveis.

Por um lado, registou-se uma menor participação eleitoral dos emigrantes, face aos números globais da

abstenção, facto a que não são alheias as dificuldades objetivas, designadamente a de ir votar em mesas de

voto que distam, muitas vezes, 200, 300 ou mais quilómetros das residências dos portugueses que decidiram

ou foram forçados a trabalhar e viver longe da sua pátria.

Por outro lado, verificou-se uma vontade indesmentível dos cidadãos portugueses na diáspora de

participarem na vida nacional, que tem expressão no recente aumento significativo do número de votantes.

É por isso que as minhas primeiras palavras são para todos os emigrantes que decidiram participar na vida

do País, votando.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Muito bem!

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Mesmo perante as dificuldades que já enfrentavam, a que se somaram neste ato eleitoral os episódios que levaram à sua repetição, deslocaram-se, em pequeno número, é certo, aos locais

de voto presencial ou votaram por correspondência.

Mas deixamos uma palavra também a todos aqueles que, tendo esse desejo, por alguma razão, não o

conseguiram fazer.

A participação das comunidades emigrantes na vida política nacional, bem como a sua representação nesta

Assembleia da República, que consideramos adequada, é de um valor inestimável.

É certo que a esmagadora maioria das decisões que aqui se tomam afetam particularmente aqueles que cá

vivem. É certo que alguns emigrantes não pensam regressar ou que as suas vidas os encaminharão para essa

decisão.

Mas não é menos verdade que cada português que vive no estrangeiro é um embaixador da nossa língua,

da nossa cultura, dos nossos costumes e tradições e que cada um mantém relações mais ou menos próximas

com Portugal. Por isso lhes é conferido — e bem! — o direito a decidir.

Como assegurar, então, dois elementos essenciais num ato eleitoral com características especiais?

Primeiro, em relação à mobilização do maior número de votantes, de acordo com as regras estabelecidas, é

sabido que o Governo não empenhou os meios necessários para divulgar a informação e para o esclarecimento

de que há procedimentos indispensáveis para a validação do voto.

Em boa verdade, temos a ideia de que o Governo nem fez os esforços necessários para fazer chegar a todos

os emigrantes a informação de que havia eleições. Também aqui se sentem os efeitos da redução das

representações de Portugal no estrangeiro, do encerramento de embaixadas e de consulados e a redução do

pessoal diplomático.

As dúvidas que se mantêm são as seguintes: como vamos promover o voto dos emigrantes? Que medidas

tenciona o Governo tomar até ao próximo ato eleitoral com esse objetivo? Pondera o Governo promover mais

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locais de votação presencial no estrangeiro, além dos consulados e embaixadas? Pondera promover um maior

esclarecimento, quer para o voto presencial quer para o voto postal, para que não aconteça o problema com a

mesma dimensão?

Em segundo lugar, sobre a individualidade e a garantia da natureza secreta do voto, é central que o voto seja

exercido, apenas e só, pelo próprio eleitor e garantindo o seu segredo. Isso no voto presencial é fácil de garantir.

No voto à distância é mais difícil. Como vamos garantir essa individualidade?

Ora, é na convergência destes dois elementos que é necessário assegurar o direito dos emigrantes ao voto.

É nisso que Os Verdes estão empenhados.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.ª Ministra, tem a palavra de novo para responder.

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Mariana Silva, muito obrigada pelas suas perguntas.

Basicamente, a Sr.ª Deputada diz que o Governo não fez os esforços necessários para chegar a toda a gente

e eu digo-lhe que o Governo fez os esforços necessários para chegar a toda a gente. Enviou a todos os cidadãos

que estavam recenseados uma carta com toda a documentação necessária para votar.

Já agora, por acaso, estive aqui a ver o anúncio feito pela administração eleitoral relativo à votação e, no

final, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, talvez seja bom revermos, porque está aqui a indicação do cartão de

cidadão.

Mas, como dizia, não só se fez isso como, a nível dos vários consulados e das embaixadas, foram feitas

algumas ações de promoção do voto, ações com as comunidades, no sentido de se alertar para a existência do

ato eleitoral, e também para as condições que havia para exercerem o seu direito de voto.

É verdade, dir-me-á, que nós temos 900 000 pessoas que não votaram. Sim, é verdade, temos 900 000

pessoas que não votaram, mas provavelmente muitas destas pessoas receberam, efetivamente, a carta para

votar.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Não chegaram!

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Da mesma maneira como temos, aqui, do ponto de vista do território nacional, muitas pessoas que sabiam que havia eleição e que também decidiram, pura e simplesmente,

não exercer o seu direito de voto, ou que não puderam ou não quiseram, pronto! Não podemos é associar uma

coisa imediatamente à outra.

Obviamente, a promoção do direito ao voto junto dos emigrantes deve ser feita, sim, pelo Governo, mas deve

ser feita também pelos partidos, pelos grupos parlamentares, que têm um papel importante tanto na promoção

do ato eleitoral, como obviamente na mobilização dos cidadãos para votarem, tal como fazem no interior do

País.

Coloca-me a questão de saber como garantir a individualidade do voto. É verdade que, neste momento, a

questão do cartão de cidadão se prende essencialmente com isso. E, das experiências que foram feitas, não

conheço nenhuma que me permita, neste momento, dizer que é possível avançar com um determinado

mecanismo eletrónico com segurança integral.

O trabalho que foi feito foi experimental, foi aqui apresentado no Parlamento, foi muito circunscrito, tinha só

a ver, justamente, com o Conselho das Comunidades Portuguesas.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — É o presencial!

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Mas sabe que nestas coisas a tecnologia evolui com grande rapidez, os níveis de segurança e confiança, seguramente, também vão aumentando e acho que compete,

depois, ao Parlamento ir aproveitando esses espaços de melhoria e de maior capacidade tecnológica para

incorporar, eventualmente, novas formas de autenticação, novas formas de verificação da identidade.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Dou agora a palavra, para fazer perguntas, ao Sr. Deputado André Ventura, do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, pode tentar retirar a responsabilidade do Governo deste processo, mas há uma questão em que todos estamos de acordo: isto foi uma lástima e uma vergonha

para a democracia portuguesa e a verdade é que, segundo as notícias que conhecemos, PS e PSD terão tentado

retirar o protesto que tinham feito, junto das mesas de voto, quando viram que iam perder subvenções e que

iam perder número de votos no círculo da Europa.

Isso foi o que saiu e a Sr.ª Ministra, hoje, deve confirmar a este Parlamento se é ou não verdade: António

Costa e Rui Rio tentaram ou não anular o protesto que tinha sido feito junto das mesas de voto? É isto que as

pessoas querem saber: se só vale quando o dinheiro está em causa ou se, quando já não interessa, interessa

o voto das pessoas.

Mas a Sr.ª Ministra vem aqui e diz o seguinte: «Não se preocupem, 72% a 92% terão recebido» — ó Sr.ª

Ministra, também posso dizer que entre 0% e 100% terão recebido; «vamos indagar» — eles estão a ouvir

indagar há 47 anos. Há 47 anos que este processo não funciona!

Portanto, sim, há responsabilidade do Governo. E, sim, há responsabilidade dos dois maiores partidos neste

processo, porque, na verdade, foram eles que protestaram e, depois, deixaram de protestar ou quiseram deixar

de protestar, quando as atas já estavam feitas e já não se podia voltar atrás.

Mas, Sr.ª Ministra, acho que devia entender-se com o seu Secretário de Estado, com o Dr. Antero Luís. É

que, no dia 11 de março, há cinco dias, o seu Secretário de Estado disse o seguinte: «Até ao momento, as

cartas que têm vindo a ser devolvidas não apontam uma redução da votação. Admitimos até que possa

acontecer uma votação próxima da que ocorreu na primeira votação e que tenhamos o mesmo número de

votos.» E a Sr.ª Ministra vem aqui, hoje, e diz que vão votar menos 43%. Portanto, por amor de Deus, pelo

menos entre vocês, entendam-se! É que um diz, cinco dias antes, que vai haver muito mais votos ou votos

iguais; a Sr.ª Ministra diz, cinco dias depois, que vamos ter metade da votação… Quer dizer, acho que pelo

menos uma Ministra e um Secretário de Estado têm de se entender numa matéria tão importante como esta.

Não andamos aqui a brincar, não andamos aqui a brincar! A Sr.ª Ministra não pode vir aqui dizer que vão votar

metade dos emigrantes…

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado, chamo a atenção para o tempo usado.

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente. Como dizia, a Sr.ª Ministra não pode vir aqui dizer que vão votar metade dos emigrantes e, há cinco dias, o

seu Secretário de Estado ter dito que vai votar o mesmo número de pessoas. Vamos lá ser sérios! E vamos lá

dizer às pessoas quantos é que vão votar e quantos é que não vão votar e o que é que esperamos, seriamente,

disto. Senão, o que as pessoas pensam é que PS e PSD, nesta matéria, estão sempre com a mesma coisa, que

é o mesmo interesse que o PCP tem, que é a de que não se aumente a representatividade do voto dos

emigrantes.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Mas se alguém achar digno que 1 milhão de eleitores tenha dois Deputados, então, é porque não está a ver bem como é que as contas se fazem em matéria de representatividade.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Então, têm mais Deputados ou menos Deputados?!

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.ª Ministra, tem, novamente, a palavra, para responder.

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Ventura, disse, textualmente, «a Sr.ª Ministra veio aqui tirar a responsabilidade do Governo, mas a verdade é que o PS e o

PSD» tal e tal… Ora bem, venho aqui enquanto membro do Governo e o Sr. Deputado, como Deputado da

Nação e jurista ilustre, que é, sabe, seguramente, separar os partidos e o Governo.

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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Não sabe nada!

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Portanto, nessa perspetiva, não vejo como juntar as duas coisas.

Depois, disse também que este processo não é novo, que estamos nisto há 47 anos. Não, Sr. Deputado, não

é verdade, este processo conheceu alterações, e alterações muito significativas, sobretudo nos últimos anos.

Estávamos a falar em trabalhar com um universo de pessoas que iria, no máximo, até às 300 000 e, neste

momento, estamos a trabalhar com 1 500 000 pessoas. Esta diferença, que parece meramente quantitativa,

introduz, efetivamente, uma dimensão qualitativa.

Depois, finalmente, no que diz respeito às divergências que pretende apontar entre mim e o Sr. Secretário

de Estado, ó Sr. Deputado, como o Sr. Deputado sabe, estes processos são dinâmicos. Portanto, há um dia em

que as coisas têm uma determinada referência, há um número que é determinado…

O Sr. André Ventura (CH): — Metade dos votos em cinco dias?!

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Ah, cinco dias fazem diferença! Sr. Deputado, cinco dias fazem diferença! Cinco dias fazem diferença, como calculará.

Portanto, cinco dias antes podia haver uma tendência e essa tendência, entretanto, ter-se alterado. Foi

exatamente isso que aconteceu e foi por isso, também, que vim a este Parlamento dar esta indicação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem agora a palavra, para formular perguntas, o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo, do Iniciativa Liberal.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, vou voltar à carga.

Sr.ª Ministra, ouvi-a dizer ali, no púlpito, que aqui estaria, no final deste debate, para reconhecer as

responsabilidades do Governo, se as houvesse, porque até aqui não as tinha visto, dando, no fundo, a entender

que estava tudo bem. Mas, Sr.ª Ministra, não está tudo bem e, na sua própria intervenção e em algumas

respostas que aqui ouvi, deu outra vez mais razões para achar que não está tudo bem, a começar — e vou

insistir nisto — pelo relatório que indica a taxa de entrega dos boletins nesta segunda edição das eleições e que

aponta para uma taxa entre 72% e 99%. Estes 27% não são um somenos, são 260 000 ou 270 000 pessoas

que aqui estão envolvidas e que podem não ter recebido o boletim. É preciso rigor neste número. Qual é o

número e quando é que se vai saber, exatamente, que pessoas receberam ou não?

Disse que, relativamente às eleições de 2019, nos mesmos moldes, o relatório de não entrega de boletins foi

já entregue, não foi discutido, e deu aqui alguns dados sobre os motivos pelos quais os boletins, na altura, não

terão sido recebidos, um problema que agora, nesta segunda edição, terá, eventualmente, piorado. E a pergunta

que quero fazer é esta: o que é que foi feito, de 2019 a 2022, para obviar aos motivos que, entretanto, foram

identificados no relatório anterior?

Depois, durante a sua intervenção, deixou cair a menção ao voto eletrónico no Conselho das Comunidades

Portuguesas, sem dar a entender se era favorável ou não. Agora, acrescentou um pouco mais, dizendo que tem

dúvidas sobre a segurança e que acredita que a tecnologia vai evoluir, mas o que é facto é que países muito

mais evoluídos do que o nosso já tentaram o voto eletrónico e recuaram ou abandonaram essas tentativas, pelo

que a única esperança que, em termos tecnológicos, parece haver é a de que a tecnologia blockchain possa

ajudar a encontrar uma solução. Mas, neste momento, migrar para sistemas tecnológicos — e o Iniciativa Liberal

não é, certamente, suspeito de não aderir às novas tecnologias — é algo que estamos muito longe de poder

considerar um método seguro.

Um outro aspeto que soubemos, ainda na semana passada, no dia 8, foi o de que a Comissão Nacional de

Eleições…

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O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Chamo a atenção para o tempo usado, Sr. Deputado.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Vou concluir, Sr. Presidente. Como estava a dizer, um outro aspeto de que soubemos, ainda na semana passada, foi o de que a Comissão

Nacional de Eleições veio dar instruções a dizer que devem ser aceites os votos, mesmo que tenham carimbo

postal posterior ao dia 12 de março. São informações opostas ao que está no Portal do Eleitor e àquelas que

tinham sido dadas anteriormente, dando azo a mais uma eventual impugnação. Porquê? Não sabemos, Sr.ª

Ministra.

Por isso lhe digo que há responsabilidades do Governo e há muito a aprender com este processo.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.ª Ministra, tem a palavra, para responder.

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Cotrim de Figueiredo, acho que não basta afirmar que há responsabilidades do Governo, é preciso fazer a demonstração. E V. Ex.ª, infelizmente,

não a fez. Disse várias coisas, falou dos assuntos mais avulsos, desde a votação eletrónica à posição que eu

tinha ou não sobre a votação, à questão da avaliação feita sobre o relatório de 2019, às ações que,

eventualmente, foram praticadas ou não… Como disse há pouco, não tive tempo, mas tenho aqui o documento

a explicar tudo aquilo que foi feito desde 2019, ou seja, tem havido um processo de aprendizagem contínuo e

de procura efetiva. E, aqui, estou a ser completamente genuína. Estou no Ministério da Administração Interna

por um período absolutamente transitório, estou a trabalhar com pessoas que nunca antes tinha visto, que não

conhecia e que fizeram um trabalho extraordinário.

Aplausos do PS.

E o que me custa é chegar aqui, ao Parlamento, e por razões meramente de tática política ouvir as maiores

críticas a estas pessoas. Isto não pode ser, Sr. Deputado, não pode ser! Tem de se deixar disto!

Protestos do IL.

Podem fazer as críticas que quiserem, mas procurem ser justos, procurem ser minimamente objetivos.

O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Então, está tudo bem?

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Ninguém disse que estava tudo bem! Nem nunca ninguém dirá que está tudo bem! Aquilo que digo é que, no fundamento da minha chamada a este Parlamento — e os

senhores sabem qual foi —, o Governo está absolutamente de fora, o Governo não tem nada, rigorosamente

nada, a ver com as razões que determinaram a repetição da votação no círculo eleitoral da Europa.

Aplausos do PS.

E, portanto, nessa perspetiva, não vejo como pode dizer-me que não retiro responsabilidades. É óbvio que

retiro responsabilidades, quando digo que há, seguramente, fatores a melhorar, há elementos em que se pode

melhorar. Mas, relativamente a este imbróglio que resultou na decisão do Tribunal Constitucional, pelo amor de

Deus, resolvam-se! O Sr. Deputado esteve nos acordos, ou alguém em sua representação, portanto, talvez seja

melhor conversarem entre vós…

Aplausos do PS.

… para assumirem as responsabilidades, em vez de as atirarem para o Governo.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem, agora, a palavra, para formular as suas perguntas, o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, do Partido Socialista.

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O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, este debate, agora que nos aproximamos da reta final, é, acima de tudo, uma oportunidade perdida pelo PSD, que o requereu,

para explicar aos eleitores e aos nossos emigrantes os seus ziguezagues e a situação em que colocou o País,

a ter de aguardar quase dois meses para ver concluído um processo eleitoral.

O que tivemos hoje, num dia cheio de poeira no ar, é mais uma tentativa de pôr ainda mais poeira nos olhos

dos nossos emigrantes. Acho que chega de falta de rigor e de falta de capacidade para olharmos os problemas

como eles se colocaram verdadeiramente.

Aplausos do PS.

Vejamos: o PSD acordou, primeiro, em não impugnar as decisões que viessem a ser tomadas.

Não se trata de alterar a lei por uma reunião à socapa, trata-se apenas de os partidos dizerem que não vão

exercer o seu direito de impugnação, em circunstâncias em que — todos sabemos — não foi possível alterar a

lei a tempo. Havia caminhos que estavam em curso, mas a Assembleia foi dissolvida, como é sabido.

Depois disso, o PSD mudou de ideias, no arranque da contagem, pondo em causa aquilo que era, de boa-

fé, um compromisso assumido por quem tinha estado presente nessa mesma reunião.

Depois, de seguida, protestou e reclamou nas mesas e na mesa de apuramento geral, mas, depois, e aqui,

sim, como já foi referido pelo Sr. Deputado André Ventura, tentou retirar os protestos que apresentou. E faço

uma precisão: quem tentou retirar os protestos foi o PSD, porque foi o único que protestou. Já agora, não tente

meter no mesmo saco quem não se confunde: PS e PSD não estão no mesmo patamar. Obviamente, o Partido

Socialista não podia retirar reclamações, precisamente porque as não tinha apresentado.

Protestos do Deputado do PSD José Silvano.

O PSD, nessa mesma noite, nessa mesma noite, e isto tem passado despercebido… E, se o Sr. Deputado

tiver oportunidade, quando sair, pode dizê-lo à comunicação social. Explique ou não, diga ou não se é verdade

que o PSD, arauto da moralidade neste debate, tentou recuar e deixar fora da agenda os protestos e as

reclamações que tinha apresentado.

Aplausos do PS.

Depois disso, ainda, dualidade novamente: «impugnamos os resultados num círculo eleitoral, mas no outro

já não»; «apresentamos queixa-crime…» — vamos ao ponto de pôr em causa a honorabilidade das pessoas

que estão nas mesas e que, da República, deviam ter apenas um agradecimento e não o achincalhamento que

o PSD lhes fez —…

Vozes do PS: — Muito bem!

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — … «… e tratamos, mais uma vez, diferentemente, porque, aparentemente, a colocação dos votos numa determinada circunstância é merecedora de uma queixa-crime e,

na outra, enfim, ficamos caladinhos, porque ganhámos a eleição e, portanto, nesse caso, não nos vamos

atravessar por aquilo que, aparentemente, seria a nossa moralidade na defesa destes resultados».

Acima de tudo, este debate, da parte dos partidos que o encararam seriamente, passa, coletivamente, por

um pedido de desculpas às comunidades que viram a impossibilidade de o seu voto ser contado. E todos nós,

porque não fomos a tempo de alterar a lei, assim devemos fazer.

Mas essa humildade que aqui temos não significa que não se tenha tentado evitar o dano maior, e o dano

maior foi, de facto, o de que esses votos não tivessem sido contados. E, tanto quanto possível, foi com boa-fé

que todas as pessoas que estiveram na mesa tentaram assegurar que todos os votos expressos fossem

contados. Não foi possível.

Teremos uma Legislatura que se abre para corrigir na lei os aspetos que será necessário corrigir, mas, acima

de tudo, no debate de hoje, o tal pedido de desculpas e a explicação que era devida ao País, sobre o caos em

que nos encontramos, e que é imputável diretamente ao Partido Social Democrata, deveria ter tido um

esclarecimento diferente neste debate.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Ministra.

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, basicamente aquilo que esteve aqui em causa foi uma discussão em torno do que está por detrás deste resultado.

Queria apenas dizer que é lastimável, porque, efetivamente, tínhamos tido aqui um nível de participação

nunca antes havido, muito significativo e num contexto de grande dificuldade, e, num certo sentido, quebrámos

a confiança dos nossos concidadãos ao conseguir que a votação tivesse de ser repetida.

Não me compete a mim apontar responsabilidades nem discutir os termos em que as questões foram

organizadas entre os partidos que partilharam um acordo inicial e, depois, na fase subsequente, tiveram

entendimentos diferentes. Compete-me apenas dizer que é óbvio que o Governo lastima profundamente o que

aconteceu, o que já disse em comunicado público e me valeu uns insultos, mas o Governo lastima, efetivamente,

aquilo que aconteceu. E o Governo considera que, efetivamente, esta situação poderia ter sido evitada, se

tivesse havido algum equilíbrio e sentido de responsabilidade e patriotismo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado José Silvano, tinha pedido a palavra para que efeito?

O Sr. José Silvano (PSD): — Sr. Presidente, é para a defesa da honra da bancada, porque foi dita aqui uma coisa pelo Sr. Deputado do Partido Socialista que é demasiado grave para a poder deixar passar.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado José Silvano, dar-lhe-ei a palavra para esse efeito no fim do debate.

Tem agora a palavra, para formular as suas perguntas, o Sr. Deputado José Luís Carneiro.

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, neste processo de repetição das eleições no círculo da Europa, se há quem não merece reparo são, certamente, os nossos compatriotas que

votaram, e que votaram em número em que nunca tinham votado, e viram os seus votos anulados e

desconsiderados.

Também não nos merecem reparo as conclusões do Tribunal Constitucional, desde logo pelo respeito que

nos merece aquele supremo tribunal e, depois, pela estrita fundamentação legal onde as mesmas assentaram.

O mesmo já não se poderá dizer do PSD, que, sem pôr em questão a integralidade e a vontade expressa em

cada um dos votos, desencadeou uma suspeição generalizada sobre o processo, sobre os voluntários que nele

participaram e, indesculpável, sobre o seu resultado, chegando ao ponto de apresentar queixa-crime contra

dezenas de voluntários que acompanharam a operação do sufrágio eleitoral.

Ao desvalorizar as razões que levaram muitos dos nossos compatriotas, apesar de cumprirem o dever cívico

de votarem, a não juntarem a cópia do seu cartão de identificação, seja por uma questão de princípio, seja para

darem cumprimento à legislação vigente nos países em que residem, seja por receio de extravio da

correspondência, com utilização abusiva dos seus dados, ou, ainda, por a considerarem desnecessária, face a

leituras que foram sendo propaladas de pareceres da Comissão Nacional de Eleições, embora esta tenha

considerado que seriam nulos, o PSD valorizou a forma, mas desprezou o conteúdo e a vontade de milhares de

eleitores.

E, considerando a extrema gravidade da sua ação, de duas uma, ou o PSD tinha razões suficientes para

duvidar da integralidade de cada um dos votos expressos — cada voto é uma vontade — ou, não tendo, é

forçoso concluir que atuou por puro calculismo político.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — O maior partido da oposição não pode desconhecer as regras e os procedimentos adequados para reclamar de decisões tomadas pelas mesas de apuramento, das quais fazem

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parte representantes de todos os partidos, com as quais não concorde. Essas regras são claras e estão assentes

há muito.

Por isso, se tinha razões para duvidar da genuinidade de cada um dos votos, deveria tê-lo denunciado em

concreto e, mais importante, deveria ter carreado os elementos de evidência dessa suspeição. Não o fez, nunca

o fez e nem o pode fazer, porque, pura e simplesmente, não existem.

O que fez o PSD, isso, sim, foi lançar sobre todos, inclusive, e mais importante, sobre os que votaram, um

labéu de suspeição, de desconsideração, revelando a sua total indiferença pelo notável esforço de participação

das nossas comunidades, que, pela primeira vez, alcançaram mais de 250 000 votantes a participar neste ato

eleitoral.

Sabemos que a situação de ausência de cópia do cartão de cidadão não é nova. Sabíamos todos, inclusive

a CNE, e, por isso, se queria fazer a revisão da lei eleitoral.

A omissão da cópia do documento de identificação, podendo ser sancionada como nulidade, só o será se a

declaração de nulidade for requerida no ato por membros da mesa.

Foi com esse enquadramento, de que a própria CNE admitiria que a identificação do eleitor feita através do

código de barras impresso no envelope de devolução do voto era suficiente para validar a identificação de quem

votava, que todos os partidos formaram a convicção e se puseram de acordo em não questionar a validade dos

votos e não usar o direito de impugnação que lhes assistiria nas decisões que as mesas, sempre soberanas nas

decisões do procedimento eleitoral, viessem a tomar.

O PSD tomou parte nesse acordo e integrou esse consenso até que alguém, algures, decidiu que assim não

seria e que passariam a impugnar as deliberações das mesas que viessem a considerar válidos aqueles votos.

Essa decisão foi tomada já no dia da contagem e — pasme-se! —, apesar do seu grande apego à legalidade,

o PSD só impugnou as eleições das mesas da Europa, onde perdeu, e pactuou com aquilo que, agora, considera

uma ilegalidade nas mesas do resto do mundo, onde obteve mais votos e ganhou as eleições.

Não foi só a irresponsabilidade que ficou patente no volte-face do PSD, foi também a escancarada

duplicidade e dualidade de critérios, aliadas a uma enorme insensibilidade e desconsideração pelos eleitores do

círculo da Europa.

Porque contrariou o PSD o entendimento conjunto de todos os partidos concorrentes, incluindo do próprio

PSD? Porque não impugnou, igualmente, o PSD, a votação do círculo de fora da Europa? Porquê a dualidade

de posições? Seja qual for a resposta, houve duplicidade no comportamento, ao assumir um acordo e, na hora,

agir em sentido contrário.

Tudo isto poderia ter sido evitado, porque o PSD tem resposta para as razões que levam muitos dos eleitores

a não juntar a cópia do documento de identificação. Elas são conhecidas de todos. Não se trata de as pessoas

não se quererem dar ao trabalho de juntar a cópia do cartão de cidadão, mas de dificuldades reais e de dúvidas

legítimas que perpassam a imaginação de quem envia pelo correio cópia de um documento de identificação.

Sabe, o PSD, no mínimo — se não, deveria saber —, o que pensam muitos dos nossos emigrantes? Conhece

— se não, deveria conhecer — as condições em que exercem o seu direito de voto? Cuidasse de querer saber

e saberia, em vez de pensar nelas apenas nos atos eleitorais. Saberia, por exemplo, que muitos têm receio de

serem identificados no seu sentido de voto, se juntarem a cópia do cartão de cidadão. Saberia que muitos

entendem que a mesma não é legitimamente exigível. Saberia que muitos não têm condições, porque as vidas

são duras, de proceder à realização dessas cópias ou que muitos vivem em países onde essa prática tem graus

de censura e, até, de impedimento legal. Tudo isto o PSD sabe ou poderia saber, se cuidasse de saber, mas

cremos que sabe.

Do nosso lado, do lado do Partido Socialista, embora alheios ao sucedido, fica, de novo, o pedido de desculpa

já formulado pelo Primeiro-Ministro e o compromisso de total empenhamento com as soluções legais que

venham impedir a repetição desta desconsideração de milhares de votos.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Chamo a atenção para o tempo de que dispõe, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Carneiro (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente. Em nome do interesse do País, apelamos à responsabilidade de todos os partidos na futura receção,

descarga e validação do ato eleitoral para servir a comunidade nacional, que está aqui, mas também está no

estrangeiro.

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Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Ministra da Administração Interna.

A Sr.ª Ministra da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, não tenho nada a acrescentar relativamente às declarações que acabaram de ser feitas pelo Sr. Deputado José Luís Carneiro.

Gostaria apenas de fazer uma declaração, uma declaração que pretende, no final, dizer o seguinte: este

debate constituiu uma excelente oportunidade para o Governo explicar, de viva-voz, aquilo que foi feito pela

administração eleitoral no sentido de tornar este ato eleitoral não só o mais participado possível, como também

o mais mobilizado possível.

Como disse, na minha declaração inicial, nem tudo o que fazemos corre bem, por vezes, as coisas correm

efetivamente mal. Eu habituei-me a agir, habituei-me a acertar, a errar, a admitir o erro e a corrigi-lo.

Ao longo do tempo que este debate durou, e já lá vai 1 hora e 40 minutos, não foi, de facto, identificado

nenhum facto, nenhuma situação que possa ter estado na génese da atual situação de semiparalisia das

instituições do poder legislativo e executivo em que nos encontramos. Não foi identificada a falha, não foi

identificada a omissão causadora deste resultado, que o Governo já lastimou publicamente e que, seguramente,

todos nós deploramos. Pretender responsabilizar o Governo ou a administração eleitoral por este estado de

coisas é não só injusto, como politicamente errado. É profundamente injusto, porque não assenta em factos, e

é politicamente errado, porque abre uma fenda que expõe uma genuína pulsão autofágica.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, está agora em curso, como é do conhecimento de todos, a repetição

da votação dos cidadãos do círculo da Europa. E o que deixo aqui, para finalizar, é um apelo ao bom senso, um

apelo aos consensos possíveis, e consensos consistentes, no sentido de as decisões que vierem a ser tomadas

politicamente, no contexto desta eleição, respeitarem o esforço dos portugueses e das portuguesas que vieram,

mais uma vez, repetir o seu voto, reconciliando-se, desta maneira, com a manifesta desconsideração que o ato

de anulação desta eleição já representou para esses cidadãos nacionais.

Deixo-vos este apelo, na expectativa e com a confiança de que os partidos políticos com representação

parlamentar e as coligações formadas para este ato eleitoral terão o sentido de responsabilidade para encontrar

soluções que obviem a um novo impasse neste processo eleitoral.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado José Silvano, do PSD, para defesa da honra da bancada.

O Sr. José Silvano (PSD): — Sr. Presidente, invoco a defesa da honra, porque o Deputado Pedro Delgado Alves fez aqui a afirmação de que o PSD tentou retirar a impugnação que teria apresentado nas mesas de voto.

Como esta questão é sensível e até pode ter alguma importância partidária, que eu saiba, em termos de PSD,

o que foi aqui afirmado não é verdade. Mas o Sr. Deputado pode completar essa informação, se quiser, pedindo

aos dirigentes do seu partido que lhe expliquem metade dessa situação.

Aplausos do PSD.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem agora a palavra, para ripostar, o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, não é para ripostar, é para prestar esclarecimentos adicionais.

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17 DE MARÇO DE 2022

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O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Depende do entendimento que der à palavra «ripostar». Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, citando notícia da Rádio Renascença, de 10 de fevereiro de 2022, «é madrugada dentro que a delegação social-democrata terá, aparentemente, recuado e, junto da

mesa de apuramento geral, tentado retirar o protesto, mas já não terá ido a tempo, uma vez que as atas das

dezenas de mesas de contagem de votos já estavam fechadas.»

Haverá prova testemunhal destes factos e, curiosamente, o comportamento seguinte do PSD é

particularmente concludente, porque, se estava convicto da legalidade, teria, seguramente, impugnado o

resultado eleitoral fora da Europa. Portanto, é perfeitamente compatível, e concludente, não só não ter

impugnado o resultado eleitoral em que as circunstâncias eram exatamente as mesmas, como ter tentado retirar

os protestos, de que se arrependeu, quando se apercebeu das consequências quer reputacionais para o

processo eleitoral, quer para as comunidades cujos votos não eram contados, quer, até, para a qualidade da

democracia e para a necessidade do início de funções da Assembleia da República.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Terminado que está este debate, cumprimento a Sr.ª Ministra da Administração Interna e os Srs. Secretários de Estado, e passamos, agora, ao segundo ponto da nossa ordem

de trabalhos, que é o das votações.

Assim, temos, para votação, um parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados, que a

Sr.ª Deputada Secretária Maria da Luz Rosinha lerá.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, a solicitação do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Central Cível de Braga — Juiz 1, Processo n.º 2119/19.5T8BRG, a

Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Deputado

Hugo Pires (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos referidos autos.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.as e Srs. Deputados, o parecer está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Sr.as e Srs. Deputados, passarei, agora, a dar conta da ordem de trabalhos da reunião da Comissão

Permanente que terá lugar no próximo dia 22 de março, às 15 horas, mas, em primeiro lugar, informo que, nesse

mesmo dia, às 11 horas, haverá Conferência de Líderes.

A ordem de trabalhos tem como ponto único o debate preparatório do Conselho Europeu, a realizar nos dias

24 e 25 de março, com a participação do Primeiro-Ministro, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da lei

relativa ao acompanhamento, apreciação e pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do processo de

construção da União Europeia.

Srs. Deputados, podemos dar por encerrados os nossos trabalhos.

Muito obrigado e uma boa tarde.

Eram 16 horas e 49 minutos.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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