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Quinta-feira, 23 de junho de 2022 I Série — Número 26

XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)

REUNIÃOPLENÁRIADE22DEJUNHODE 2022

Presidente: Ex.mo Sr. Augusto Ernesto Santos Silva

Secretários: Ex.mos Srs. Palmira Maciel Fernandes da Costa Lina Maria Cardoso Lopes Diogo Feijóo Leão Campos Rodrigues Joana Isabel Martins Rigueiro de Sá Pereira

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 3

minutos. Deu-se conta da não admissão do Projeto de Lei n.º

143/XV/1.ª e da entrada na Mesa da Proposta de Lei n.º 17/XV/1.ª, dos Projetos de Lei n.os 149 a 162, 164 a 175 e 178 a 180/XV/1.ª e dos Projetos de Resolução n.os 104, 107 a 121

e 123 a 130/XV/1.ª O Presidente assinalou a presença, nas galerias, de uma

delegação da Comissão de Ética Parlamentar da Assembleia da República de Moçambique, que foi aplaudida, de pé, pela Câmara.

Ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do artigo 224.º do

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Regimento, procedeu-se a um debate com o Governo sobre política geral, tendo o Primeiro-Ministro (António Costa) respondido às perguntas formuladas pelos Deputados Paulo Mota Pinto (PSD), André Ventura (CH) — que também interpelou a Mesa —, João Cotrim Figueiredo (IL), Jerónimo de Sousa (PCP), Catarina Martins (BE), Inês de Sousa Real (PAN), Rui Tavares (L), Eurico Brilhante Dias e João Torres (PS), André Coelho Lima e João Marques (PSD), Pedro Pinto (CH), Joana Cordeiro e Rodrigo Saraiva (IL), Paula Santos (PCP) e Catarina Martins (BE).

Procedeu-se ao debate preparatório do próximo Conselho Europeu, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei de Acompanhamento, Apreciação e Pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do Processo de Construção da União Europeia. Proferiram

intervenções, além do Primeiro-Ministro (António Costa), que abriu e encerrou o debate, os Deputados João Paulo Rebelo e Rui Lage (PS), Tiago Moreira de Sá (PSD), Rui Paulo Sousa e Pedro Pessanha (CH), Bernardo Blanco (IL), Diana Ferreira (PCP), Mariana Mortágua (BE), Inês de Sousa Real (PAN) e Rui Tavares (L).

Foi aprovado o Projeto de Resolução n.º 89/XV/1.ª (L) — Recomenda o adequado acompanhamento do pedido da Ucrânia de adesão à UE, favorecendo a atribuição do estatuto formal de candidato à UE a este país.

Deu-se conta dos Deputados que estiveram presentes, por videoconferência, na reunião plenária.

O Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 45 minutos.

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O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, muito boa tarde.

Estamos em condições de iniciar a sessão, visto que temos quórum e estão já presentes representantes de

todas as bancadas parlamentares.

Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 3 minutos.

Peço aos Srs. Agentes da autoridade que abram as galerias ao público.

Peço à Sr.ª Deputada Secretária da Mesa Palmira Maciel o favor de proceder à leitura do expediente, que

hoje é um pouco demorada. Peço, por isso, silêncio na Sala, para que todos possamos escutar a Sr.ª Deputada

Palmira Maciel.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Secretária (Palmira Maciel): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, começo por anunciar que deu

entrada na Mesa, e não foi admitido pelo Sr. Presidente, o Projeto de Lei n.º 143/XV/1.ª (CH).

Deram entrada na Mesa, e foram admitidas, várias iniciativas legislativas.

Refiro, em primeiro lugar, a Proposta de Lei n.º 17/XV/1.ª (ALRAM), que baixa à 10.ª Comissão.

Deram, também, entrada na Mesa os Projetos de Lei n.os 149/XV/1.ª (CH), que baixa à 10.ª Comissão,

150/XV/1.ª (CH), que baixa à 1.ª Comissão, 151/XV/1.ª (BE), que baixa à 13.ª Comissão, em conexão com a 9.ª

Comissão, 152/XV/1.ª (BE), que baixa à 8.ª Comissão, 153/XV/1.ª (PCP), que baixa à 6.ª Comissão, 154/XV/1.ª

(PCP), que baixa à 8.ª Comissão, 155/XV/1.ª (PAN), que baixa à 7.ª Comissão, 156/XV/1.ª (CH), que baixa à 1.ª

Comissão, 157/XV/1.ª (PAN), que baixa à 1.ª Comissão, 158/XV/1.ª (BE), que baixa à 13.ª Comissão, em

conexão com a 9.ª Comissão, 159/XV/1.ª (BE), que baixa à 6.ª Comissão, em conexão com a 11.ª Comissão,

160/XV/1.ª (PCP), que baixa à 6.ª Comissão, em conexão com a 11.ª Comissão, 161/XV/1.ª (BE), que baixa à

10.ª Comissão, 162/XV/1.ª (BE), que baixa à 10.ª Comissão, 164/XV/1.ª (BE), que baixa à 10.ª Comissão,

165/XV/1.ª (BE), que baixa à 10.ª Comissão, 166/XV/1.ª (BE), que baixa à 10.ª Comissão, 167/XV/1.ª (BE), que

baixa à 10.ª Comissão, 168/XV/1.ª (BE), que baixa à 10.ª Comissão, 169/XV/1.ª (L), que baixa à 10.ª Comissão,

170/XV/1.ª (L), que baixa à 10.ª Comissão, 171/XV/1.ª (PAN), que baixa à 6.ª Comissão, em conexão com a

11.ª Comissão, 172/XV/1.ª (PAN), que baixa à 13.ª Comissão, em conexão com a 9.ª Comissão, 173/XV/1.ª

(PAN), que baixa à 5:ª Comissão, em conexão com a 2.ª Comissão, 174/XV/1.ª (PAN), que baixa à 10.ª

Comissão, 175/XV/1.ª (PAN), que baixa à 10.ª Comissão, 178/XV/1.ª (IL), que baixa à 10.ª Comissão, 179/XV/1.ª

(IL), que baixa à 1.ª Comissão, e 180/XV/1.ª (PS), que baixa à 1.ª Comissão.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Secretária Lina Lopes, para continuar a leitura

do expediente.

A Sr.ª Secretária (Lina Lopes): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, deram ainda entrada na Mesa os

Projetos de Resolução n.os 104/XV/1.ª (CH), que baixa à 8.ª Comissão, 107/XV/1.ª (PAN), que baixa à 6.ª

Comissão, 108/XV/1.ª (PAN), que baixa, também, à 6.ª Comissão, 109/XV/1.ª (L), que baixa à 6.ª Comissão,

110/XV/1.ª (L), que baixa à 2.ª Comissão, em conexão com a 11.ª Comissão, 111/XV/1.ª (L), que baixa à 11.ª

Comissão, 112/XV/1.ª (L), que baixa à 11.ª Comissão, 113/XV/1.ª (BE), que baixa à 9.ª Comissão,

114/XV/1.ª (BE), que baixa à 6.ª Comissão, 115/XV/1.ª (PCP), que baixa à 9.ª Comissão, 116/XV/1.ª (PCP), que

baixa à 6.ª Comissão, 117/XV/1.ª (PCP), que baixa à 6.ª Comissão, 118/XV/1.ª (PCP), que baixa à 6.ª Comissão,

119/XV/1.ª (CH), que baixa à 6.ª Comissão, 120/XV/1.ª (BE), que baixa à 9.ª Comissão, 121/XV/1.ª (PCP), que

baixa à 13.ª Comissão, 123/XV/1.ª (PSD), que baixa à 12.ª Comissão, 124/XV/1.ª (CH), que baixa à 1.ª

Comissão, 125/XV/1.ª (PAN), que baixa à 12.ª Comissão, 126/XV/1.ª (PS), que baixa à 11.ª Comissão,

127/XV/1.ª (IL), que baixa à 1.ª Comissão, 128/XV/1.ª (IL), que baixa à 9.ª Comissão, 129/XV/1.ª (IL), que baixa

à 9.ª Comissão, e 130/XV/1.ª (IL), que baixa à 9.ª Comissão.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a ordem do dia da sessão de hoje compõe-se de dois debates, um

sobre política geral e outro preparatório do Conselho Europeu, com a participação do Sr. Primeiro-Ministro, que

saúdo, assim como os demais membros do Governo.

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Recordo à Câmara que, no fim desses debates, teremos um período de votações.

Quero também informar que nos dá o prazer de assistir aos nossos trabalhos uma delegação da Comissão

de Ética Parlamentar da Assembleia da República de Moçambique. Nas pessoas do seu Presidente, da sua

Vice-Presidente e demais membros da delegação, em nome do Parlamento, saúdo a vossa presença.

Aplausos gerais, de pé.

Srs. Deputados, vamos, então, iniciar a primeira ronda do debate com o Primeiro-Ministro sobre política geral,

ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do artigo 224.º do Regimento.

Cabendo ao PSD a abertura do debate, tem a palavra, para formular perguntas, o Sr. Deputado Paulo Mota

Pinto.

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, começo pela

situação na saúde, que muito preocupa os portugueses e cujos problemas são evidentes.

É certo que já não são de hoje, mas depois de sete anos do seu Governo, as queixas são muitas e crescentes:

consultas com listas de espera indignas; cirurgias a realizarem-se com mais de um ano de atraso; mais do dobro

de utentes sem médico de família em relação ao momento em que o PS assumiu o Governo, apesar da sua

promessa eleitoral; mortalidade excessiva não-COVID, cujas causas não estão identificadas; vários serviços de

urgência encerrados em todo o País; falta de médicos de diversas especialidades, e não só em ginecologia e

obstetrícia.

Mas a situação atingiu, nas últimas semanas, extremos nunca antes vistos, com a degradação da cobertura

de urgências de obstetrícia no SNS (Serviço Nacional de Saúde) e, desde logo, com a degradação da imagem

do SNS nessas áreas.

Ainda ontem, foi anunciado que uma cidade da região com a importância de Braga não teria urgência de

obstetrícia durante dois dias esta semana.

Tudo isto revela claros problemas de falta de organização, de gestão e de planeamento a um nível tão básico

como o da previsão de recursos humanos disponíveis em semanas com feriados sucessivos, falta de eficiência,

falta de remuneração competitiva de recursos humanos.

Sr. Primeiro-Ministro, a primeira pergunta que lhe quero fazer é a seguinte: considera aceitáveis estas falhas

de cobertura, com o encerramento de serviços essenciais nos hospitais do SNS, como se fossem serviços de

saúde de um país do terceiro mundo? Assume a responsabilidade por tais deficiências de organização e de

serviço?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro (António Costa): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Mota Pinto, não considero

aceitáveis, obviamente, estas falhas de serviço e quero chamar a atenção para alguns aspetos.

Em primeiro lugar, o Serviço Nacional de Saúde conseguiu dois grandes sucessos civilizacionais no nosso

País: primeiro, a redução drástica da mortalidade infantil; segundo, o aumento da esperança de vida.

Aplausos do PS.

E estes sucessos do Serviço Nacional de Saúde criam um novo quadro demográfico que exige, obviamente,

reformas estruturais no Serviço Nacional de Saúde.

Tem razão, não basta reforçar o Serviço Nacional de Saúde. De 2016 até hoje, aumentámos, em 30%, o

orçamento do Serviço Nacional de Saúde; aumentámos, em termos líquidos, quase 25 000 profissionais no

Serviço Nacional de Saúde e, só na especialidade de ginecologia e obstetrícia, o número de especialistas

aumentou 13,7%. No entanto, nas duas últimas semanas, faltou o número de profissionais necessário para

poder funcionar.

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É por isso que é necessário termos uma gestão em rede, uma reorganização da rede e uma estrutura de

referenciação, para que, nestes momentos, em que há férias, «pontes» ou feriados,…

Protestos do Deputado do PSD João Moura.

… a qualidade do serviço seja assegurada a todas e a cada uma das portuguesas e a todos e a cada um dos

portugueses. É isso que é necessário e é isso que temos de fazer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra, para formular perguntas, o Sr. Deputado Paulo Mota Pinto.

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, falou em sucessos do SNS, é verdade, mas queria

recordar-lhe que se tem registado um aumento da mortalidade materna para níveis de há 38 anos.

Queria também recordar-lhe que está no Governo há sete anos. Um estudante que tivesse entrado em

Medicina quando tomou posse, hoje, já estaria no internato.

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — «Quando tomou posse», era difícil!…

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — A causa destes problemas está na falta de planeamento, de capacidade

de gestão e de organização.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Esta falta de padrões exigentes de gestão e de eficiência é, em grande

parte, responsabilidade sua, e do seu Governo, não só por governar há sete anos, mas porque teve todas as

condições de tempo e dinheiro para prevenir ou remediar estas situações, e dificultou as condições para uma

resposta articulada com os prestadores privados de cuidados de saúde.

Estes problemas têm uma raiz comum. O seu antigo Ministro da Saúde disse que a resposta pública tem de

ser articulada com a resposta privada, mas o seu Governo acabou com as formas de prestação de serviços mais

baratas e eficientes, por exemplo com a gestão de unidades por privados, por razões de preconceitos puramente

ideológicos.

É só perguntar aos utentes de Braga, de Vila Franca de Xira ou de Loures se estavam mais bem servidos

antes ou se estão melhor agora,…

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — … que acabou com a gestão de unidades de saúde por privados, cujos

custos eram menores, por razões apenas ideológicas.

Por isso, preciso de lhe perguntar o seguinte: acha que não teve tempo nem condições, nestes sete anos,

para prevenir as falhas do SNS, que estão à vista de todos? Arrepende-se de, por mero capricho ideológico, ter

acabado com acordos de gestão privada em hospitais do SNS, que asseguravam uma gestão mais eficiente e

com menores custos? E arrepende-se de não ter conseguido assegurar formas de resposta articulada de

prestação de cuidados de saúde por privados? Concretamente, uma pergunta concreta: está disposto a aceitar

a contratação de médicos exteriores ao SNS para assistência a utentes do SNS que ainda não disponham de

médico de família, como o PSD propôs?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Mota Pinto, não terá reparado, porventura,

que nos últimos dois anos o Serviço Nacional de Saúde foi sujeito ao maior teste de stresse a que alguma vez

poderia ter sido, enfrentando a pandemia. E se há dúvida que os portugueses não têm é a de que, quando esse

teste chegou, o Serviço Nacional de Saúde respondeu à altura do que era necessário e que os portugueses

reconhecem.

Aplausos do PS.

Ao contrário do que o Sr. Deputado diz, não foi o Governo que decidiu não renovar as três parcerias público-

privadas que mereceram avaliação positiva pelo Tribunal de Contas, foram os três concessionários privados que

não aceitaram manter o contrato nos termos previstos pelo Tribunal de Contas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Paulo Mota Pinto.

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, cito algumas pessoas que, com

certeza, conhece.

O Sr. Ministro das Finanças disse que «o que está a acontecer não decorre de nenhum condicionamento

financeiro que tenha sido imposto».

Um conhecido Deputado do seu partido disse: «O País já não tem confiança na atual titular da saúde. Já não

se acredita que ela possa vir a ser, depois de tudo o que vivemos, protagonista de qualquer esforço reformista»

— nós concordamos.

O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Manuela Arcanjo, antiga ministra socialista da saúde, disse: «A atual

Ministra da Saúde, apesar de ser muito simpática, está a fingir que o problema não existe» — também

concordamos.

Maria de Belém disse: «Para mim, é um problema estrutural, que rebentou com a morte do bebé nas Caldas

da Rainha. Fiquei muito surpreendida, estava à espera de bastante mais» — também concordamos, embora

aqui só em parte, porque não ficámos tão surpreendidos.

Sr. Primeiro-Ministro, segundo um estudo recente, os portugueses consideram que há áreas urgentemente

carecidas de reformas estruturais — saúde e justiça —, mas também se recusam a acreditar que o Sr. Primeiro-

Ministro e o seu Governo tenham capacidade ou, desde logo, vontade para as fazer.

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Veja o Programa do Governo!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — O problema é, justamente, o de que o Sr. Primeiro-Ministro e o seu

Governo não revelam sequer consciência ou intenção de fazer reformas estruturais; pelo contrário, consideram-

nas um anátema que é preciso evitar. Mas o problema da saúde não se resolve com pensos rápidos, com planos

de contingência. Estes só denunciam que o Governo só pensa em gerir a próxima crise que, no caso, é a do

verão.

Os portugueses estão a perceber que, por esta via, o SNS se degradará, porventura, de forma irreversível.

Os profissionais votam com os pés, migram para outros prestadores, perante a inércia do Governo. As

administrações hospitalares têm avisado dos problemas. Os utentes, com esta imagem do SNS, também irão

sair. E o que é que teremos, então? A verdadeira destruição do SNS, de degradação às mãos do Governo

socialista e só um SNS para quem não tem alternativa, para os mais pobres e com menores recursos,…

Protestos de Deputados do PS.

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… pois quem tiver alternativa recorrerá a seguros privados ou a prestadores alternativos. É preciso evitar

isto!

Por isso, pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro: o que é que será mais preciso que realmente aconteça para

que, como até já foi pedido por pessoas do seu partido, reconheça a responsabilidade política da Ministra da

Saúde e a substitua por incapacidade de gestão ou de promover reformas que mantenham o nível do SNS,

incapacidade que se tornou por demais evidente?! Ou será que, afinal, a opção é sua e a responsabilidade

política também é sua?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Mota Pinto, a responsabilidade política de

tudo o que ocorre no Governo é, obviamente, do Primeiro-Ministro.

Aplausos do PS.

Respeito, naturalmente, a opinião de todos: aqueles que nunca foram membros do Governo e aqueles que,

tendo sido membros do Governo, opinam sobre quem é atualmente membro do Governo. Mas, até prova em

contrário, só há uma pessoa que escolhe os membros do Governo e, neste momento, sou eu.

Portanto, assumo a responsabilidade por tudo o que fazem ou não fazem os membros do Governo que

escolhi.

Aplausos do PS.

Quanto à vontade dos portugueses, seguramente, eles expressam-na nas sondagens, mas tiveram uma

extraordinária sondagem, ainda recentemente expressa, no passado dia 30 de janeiro.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Paulo Mota Pinto, faça favor de continuar no uso da palavra.

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, queria mudar de tema.

Num contexto em que a inflação subiu, e está a acentuar-se, os preços dos combustíveis aumentam, os juros

estão a subir nalguns setores, como na habitação, em que os preços nas grandes cidades são incomportáveis

para a maioria dos portugueses, o Sr. Primeiro-Ministro aparece a prever ou a prometer — não se percebeu

bem — um aumento dos salários médios, de 20%, até 2026.

Sinceramente, não entendo a sua surpresa com o facto de ninguém ter levado isso muito a sério.

Por isso, começaria por lhe perguntar, só para não ficarmos a nível da atoarda ou do mero embuste, o

seguinte: Sr. Primeiro-Ministro, pode ser mais preciso e esclarecer se isso era realmente uma promessa e se se

referia a aumentos de salários, de 20%, em termos nominais, ou a aumento de salários reais. Pedia-lhe que me

esclarecesse isso para podermos prosseguir o debate de forma minimamente séria.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, o senhor surpreende-me não conhecendo o

Programa do Governo!

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — É isso!

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O Sr. Primeiro-Ministro: — É que o Programa do Governo, tal como já constava, aliás, do programa eleitoral,

fixa um objetivo, entre vários, que é o de fazer convergir o peso dos salários no produto interno bruto (PIB) com

a média europeia.

O peso dos nossos salários no PIB é, neste momento, de 45%. A meta é chegar até aos 48%, que é a média

europeia. Para essa trajetória temos de ter uma evolução do salário médio. Essa evolução que refere é

absolutamente compatível com a evolução do salário médio que temos tido nos últimos anos. Ou o Sr. Deputado

ignora qual tem sido a evolução do salário médio nos últimos anos?!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Paulo Mota Pinto.

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, queria só notar que esses dados

sobre o peso dos salários estão desatualizados, dizem respeito a 2019. Mas passemos sobre isso.

Perante a resposta que me deu, queria perguntar-lhe: sendo um aumento real, tem consciência de que o que

está a exigir aos empresários, com uma inflação acumulada, segundo as previsões, até 2026, superior a 15%,

será um aumento nominal dos salários superior a 35%? Como acha que isso pode ser credível? Como pode

considerar que o seu Governo criou condições para isso?

Temos o Governo menos reformista do século, o mais imobilista das últimas quatro décadas; tem um discurso

em que se especializou até 2021, contrário às necessidades das empresas, para acompanhar os seus sócios

comunistas e bloquistas; chegou mesmo a anunciar medidas sem as comunicar às associações empresariais;

sempre se recusou a diminuir os custos fiscais das empresas; não aliviou os custos de contexto; reage a todos

os problemas com mais regulamentação.

Apesar de não criar condições mínimas para as empresas prosperarem, para poderem pagar salários mais

altos, vem exigir que aumentem, em quatro anos, em 20%, os salários reais. E, já agora, se está tão preocupado

com a subida dos salários reais, porque é que não começou por dar o exemplo, no que toca aos trabalhadores

da função pública, e nem sequer previu no Orçamento do Estado um aumento correspondente à inflação

prevista?!

Aplausos do PSD.

Começou por infligir à função pública uma perda que, na altura, já se sabia que era de 4% — meio subsídio

de férias — e, segundo as previsões atuais, de 7% ou 8%, ou seja, próxima de um subsídio de férias.

Compare a exigência que está a fazer aos empresários, de 35%, até 2026, em aumentos nominais, com a

perda que, logo no primeiro ano, infligiu aos trabalhadores da função pública.

É fácil prever ou prometer subidas de salário real à custa dos custos de produção ou do dinheiro dos outros,

e é por isso que estas políticas socialistas acabam quando acaba o dinheiro dos outros.

O Sr. André Coelho Lima (PSD): — Muito bem!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Mas não acha que deveria começar por dar o exemplo quanto aos

funcionários públicos? Como é que pretende conseguir estes aumentos nas empresas? Impondo-os às

empresas, criando o «Ministério dos Salários e dos Preços», à soviética?!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Mota Pinto, o «como» também está no

Programa do Governo: acordo de competitividade e rendimentos.

Não é exigido, não é imposto, é negociado: acordo de competitividade e rendimentos. Todos os parceiros

sociais estão, aliás, de acordo com a prioridade quanto a esta negociação.

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Em segundo lugar, quanto à função pública: reposição de vencimentos que tinham sido cortados; reposição

das carreiras que estavam congeladas; e princípio da atualização anual. Foi assim que fizemos, é assim que

continuaremos a fazer e é assim que negociaremos com os sindicatos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Dou, agora, a palavra ao Sr. Deputado Paulo Mota Pinto.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, registo que nada disse sobre a

função pública,…

O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Nada! Não responde a nada!

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — … mas quero terminar com uma pergunta sobre uma questão concreta.

Perguntei-lhe, em abril passado, na primeira vez em que aqui nos encontrámos, se conhecia a invalidação

pelo Tribunal de Justiça da União Europeia da contribuição sobre o serviço rodoviário — o imposto sobre os

combustíveis, que contribui para o seu preço elevado — e o que iria fazer para resolver a situação. Respondeu-

me que tinha andado muito ocupado e não tinha tido tempo para estudar essa jurisprudência.

Entretanto, foi noticiada a decisão, que poderá ter um custo de vários milhares de milhões de euros para o

Estado português, em devolução de contribuições, e o preço dos combustíveis continua a subir.

Aqui perguntado, o Sr. Ministro das Finanças respondeu apenas que confiava que as empresas que pagaram

tal imposto ilegal não iriam pedir a devolução.

Pergunto-lhe, novamente: já teve tempo para se informar? O que é que o Governo vai fazer sobre isto? Vai

realmente esperar que os interessados não reajam para depois ter de devolver a mais e com juros?

Sr. Primeiro-Ministro, se fosse numa empresa privada, esta última opção não andaria já mesmo perto da

qualificação como gestão danosa?!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Paulo Mota Pinto, muito obrigado pela generosa

gestão que fez do seu tempo, permitindo-me agora responder pausadamente às diferentes questões importantes

que a resposta de toca-e-foge não permitiu responder.

Primeiro, vamos a um problema sério, o da saúde, que muito apoquenta os portugueses.

O nosso Programa do Governo prevê que haja duas reformas centrais no nosso sistema de saúde: a reforma

dos cuidados de saúde primários e a reforma dos cuidados continuados.

Os cuidados de saúde primários são absolutamente essenciais, porque, se queremos diminuir a pressão

sobre as urgências hospitalares, temos de assegurar respostas de proximidade aos diferentes utentes. É por

isso que, se reparar, no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), onde os investimentos que existem estão

ao serviço das reformas que prevê, um dos investimentos fundamentais na área da saúde é precisamente o de

dotar as unidades de saúde familiar dos equipamentos necessários à análise e ao diagnóstico, de forma que se

possam despistar muitas das situações na medicina de proximidade, evitando a pressão sobre as urgências

hospitalares.

Esta é uma reforma de fundo da maior importância, como a dos cuidados continuados também, porque

graças ao aumento da esperança de vida, cada vez mais temos pessoas idosas a quem temos de assegurar

qualidade e saúde na velhice. E muitas vezes isso exige cuidados continuados, que não devem consumir

recursos hospitalares, mas, pelo contrário, devem, na parceria que estamos a fazer com o terceiro setor — com

as misericórdias, as IPSS (instituições particulares de solidariedade social), as mutualidades —, assegurar a

existência desses cuidados continuados integrados com uma resposta de qualidade aos nossos idosos.

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Além disso, nos cuidados de saúde primários temos de introduzir outra componente da maior importância:

generalizar, ao longo desta Legislatura, e a todo o País, um modelo de unidades de saúde familiar. Porquê?

Porque é o que permite gerir melhor, com recursos de forma mais competitiva, que ajudem a fixar talento,

profissionais, e a remunerá-los de forma mais justa, relacionando com o aumento da prestação dos cuidados de

saúde aos diferentes utentes do Serviço Nacional de Saúde.

Portanto, ao contrário do que diz, não é uma semana de conjugação de feriados e de escalas de serviço que

compromete uma estratégia de reforma que está em curso e que vamos prosseguir, Sr. Deputado!

Aplausos do PS.

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sete anos!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sim, poderíamos ter ido mais depressa se não tivéssemos tido dois anos de

pandemia. Poderíamos ter ido mais depressa se não tivéssemos tido nove meses de uma crise política

absolutamente inútil,…

Aplausos do PS.

… mas, apesar de tudo, Sr. Deputado, o que o Sr. Deputado terá de reconhecer é o seguinte: se não

tivéssemos feito, ao longo destes seis anos, o reforço de 30% do orçamento do SNS, o reforço de 25 000

profissionais no Serviço Nacional de Saúde, garanto-lhe que o Serviço Nacional de Saúde estaria hoje ainda

pior do que está…

Vozes do PSD: — Pois está, pois está!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e com mais necessidades do que hoje continuamos a ter. Nós não temos

falta de consciência do que é necessário fazer, mas temos muito orgulho do que já fizemos para repor o que os

senhores cortaram no SNS!

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, sei que tem essa cassete da obsessão ideológica, mas essa obsessão ideológica, desculpar-

me-á, onde existe é mesmo aí, porque quem votou contra a criação do Serviço Nacional de Saúde foi o PSD;…

Protestos do PSD.

… quem quis acabar com o Serviço Nacional de Saúde, e foi travado pelo Tribunal Constitucional, foi o PSD;

e quem votou contra a Lei de Bases da Saúde foi o PSD!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Em matéria de rendimentos, Sr. Deputado, o maior desafio que a nossa sociedade hoje enfrenta é o de

termos a capacidade de assegurar que a nova geração vá ser a geração mais realizada de sempre no nosso

País.

Vozes do PSD: — Vai, vai!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Por isso, Sr. Deputado, é que a meta que fixámos está indexada ao crescimento.

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Quando dizemos que a nossa meta é o peso do salário no produto, queremos assegurar que o peso do

salário solicitado não é maior do que o crescimento da economia, mas que o crescimento da economia é

distribuído com justiça, combatendo a desigualdade…

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — É isso mesmo!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e assegurando o salário justo a quem trabalha.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do Chega, para fazer perguntas,

o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, penso que já é tempo

de o Sr. Primeiro-Ministro se deixar da conversa do Orçamento para o PS, da conversa das conquistas

civilizacionais, do que o PS fez nos anos 70 e 80, que todos gostamos muito de ouvir, e que a culpa é do PSD,

do Passos, do Cavaco, ou de quem quiser. Assuma a sua responsabilidade!

Vozes do CH: — Muito bem!

O Sr. André Ventura (CH): — O senhor é Primeiro-Ministro de Portugal, não é historiador, é Primeiro-Ministro

de Portugal!

Aplausos do CH.

Com esta conversa sobre o que foi há 20 anos, há 30 anos, quem nos está a ver deve pensar assim:

«Devemos estar perante um historiador e não perante um Primeiro-Ministro». Mas não, é um Primeiro-Ministro.

Sabe o que é isto que tenho aqui, Sr. Primeiro-Ministro?

O orador exibiu folhas com recortes de jornais.

É o resultado do desastre da sua gestão, dos últimos dias. São folhas e folhas de jornais: as urgências

paradas; as viaturas de emergência paradas; o hospital de Setúbal vai fechar, durante 21 dias, no verão —

quero que vejam, particularmente os senhores que estavam a bater palmas —, repito, 21 dias no verão. Não foi

a pandemia, Sr. Primeiro-Ministro, nem é a guerra, o hospital de Setúbal vai estar parado 21 dias no verão.

O Hospital de Braga, à medida que o Sr. Primeiro-Ministro e o Governo todo estão aqui sentados, está

encerrado!

Aplausos do CH.

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Encerrado?!

O Sr. André Ventura (CH): — A mortalidade não-COVID subiu 30% em junho.

Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, a ideia de que isto é tudo culpa da COVID-19, do Passos Coelho, do Cavaco

Silva, da guerra ou do Putin não lhe fica muito bem.

Por isso, queria perguntar-lhe isto diretamente: assistiu à sua Ministra da Saúde aqui, no Parlamento, na

passada sexta-feira? Viu? Eu sei que, no estrangeiro, não gosta muito de falar de política nacional, mas

pergunto-lhe se a viu.

Chamada a dar respostas a este Parlamento, não disse absolutamente nada. Por isso, vou perguntar-lhe se

pode manter a confiança nesta Sr.ª Ministra da Saúde,…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

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O Sr. André Ventura (CH): — … quando a saúde está um caos e o Sr. Primeiro-Ministro mais não faz do

que falar de história aos portugueses.

Aplausos do CH.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, vou ser muito direto: não faça o País passar por outro caso como o que

aconteceu com os incêndios de Pedrógão, com o seu Ministro da Defesa, que também não ia sair e acabou por

sair, e com o Ministro Eduardo Cabrita, que também já não está no Governo e,…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — É verdade!

O Sr. André Ventura (CH): — … hoje, nem sei se está aqui, provavelmente não.

Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, por favor, tome uma decisão! Seja Primeiro-Ministro por um dia! Seja

Primeiro-Ministro e não «último-ministro».

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Ventura, fico algo surpreso ao vê-lo tão

ansioso para que eu seja Primeiro-Ministro. Mas, para lhe ser sincero, eu sou Primeiro-Ministro porque os

portugueses me escolheram, não por vontade sua.

Aplausos do PS.

O Sr. André Ventura (CH): — Ah, isso é verdade!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E faço-lhe a justiça de que, se fosse o senhor a escolher, não seria eu o Primeiro-

Ministro.

O Sr. André Ventura (CH): — Não seria, não seria!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ficamos, aliás, quites, porque, se fosse eu a escolher, o senhor também não

seria Primeiro-Ministro.

Risos do PS.

Quanto ao mais, o senhor repetiu a pergunta — é verdade que com um tom mais exaltado — que o Sr.

Deputado Paulo Mota Pinto já fez. Portanto, seria, agora, indelicado para com a Câmara estar a consumir tempo

para voltar a repetir a resposta que já dei ao Sr. Deputado Paulo Mota Pinto.

Aplausos do PS.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Já que não respondeu ao PSD!…

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto-lhe, novamente, se assistiu ao

debate de urgência na passada sexta-feira e se ficou satisfeito com as respostas da Sr.ª Ministra da Saúde.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

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O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, não convido os membros do Governo para os

avaliar em função do que eles respondem à Assembleia da República, mas do trabalho que realizam.

Aplausos do PS.

O Sr. André Ventura (CH): — Mas são responsáveis perante a Assembleia da República!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, volto a perguntar-lhe se viu o debate de

urgência e o que acha da resposta da sua Ministra da Saúde.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado André Ventura, manifestamente, o Sr. Deputado já fez essa pergunta e o

Primeiro-Ministro já respondeu,…

Protestos do CH.

… mas o Sr. Primeiro-Ministro tem a palavra, se quiser responder.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Ventura, não vi o debate de urgência.

Vozes do CH: — Ah!

O Sr. André Ventura (CH): — Não viu?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, fico incrédulo! Um Primeiro-Ministro que

não se importa com a morte de um bebé nas Caldas da Rainha,…

Protestos do PS.

… que não se importa com a morte de pessoas e que, por isso, diz que não vê os debates de urgência e que

não quer saber do que diz a sua Ministra da Saúde no Parlamento não é, certamente, o Primeiro-Ministro de

que Portugal precisa e não é, certamente, o Primeiro-Ministro que os portugueses, neste momento, gostariam

de ter presente.

Protestos do PS.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, sem querer voltar a insistir nesta questão, porque já percebi que não viu e

não quer saber do que diz a sua Ministra da Saúde no Parlamento, pergunto-lhe o que acha disto.

O orador exibiu uma folha com um artigo de jornal.

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Já que fala tanto de educação e, há pouco, respondeu ao PSD que queria criar a geração mais qualificada

de sempre, olhe, mais um desastre da sua gestão: os cursos superiores em Portugal rendem menos do que o

ensino secundário em 12 países, Sr. Primeiro-Ministro.

Sr. Primeiro-Ministro, não é a mim, nem ao PSD, nem ao Chega, nem ao Iniciativa Liberal, nem ao PCP, nem

ao Bloco de Esquerda que tem de responder, é aos portugueses! É um desastre de gestão e, se não quer

responder, assuma, ao menos! Como é que chegámos aqui se, em 27 anos de Governos, após 2000, 20 anos

foram do Partido Socialista?!

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Ventura, se não estivesse tão exaltado e tão

preocupado em abrir os telejornais…

O Sr. André Ventura (CH): — Estou preocupado é com o País!

Vozes do PS: — Está, está!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e em fazer aqueles números que o senhor adora fazer para as televisões,

teria reparado que eu, na sexta-feira passada, estive todo o dia a ouvir os diferentes grupos parlamentares,

incluindo o seu, sobre a questão da adesão da Ucrânia à União Europeia. E, efetivamente, não tenho o dom de

estar a falar com as pessoas e a ouvi-las e, simultaneamente, a seguir os debates parlamentares através da

televisão.

Aplausos do PS.

Em segundo lugar, não sei onde é que o Sr. Deputado se perdeu naquela parte em que temos insistido e

repetido que tem de haver um aumento significativo dos salários, em função, aliás, da qualificação, e que

definimos como prioritária, no acordo de competitividade e rendimentos, a subida significativa das posições de

entrada, em particular dos jovens, e em função da sua qualificação.

É que aquilo que o estudo da Fundação José Neves, que ontem foi publicado, vem demonstrar é que as

prioridades políticas que definimos, em matéria de política de rendimentos, estão absolutamente certas.

É absolutamente inaceitável, no nosso País, um erro trágico para o futuro do nosso País e um erro trágico

para o futuro das nossas empresas andarem a sub-remunerar o talento que, graças ao esforço dos jovens e das

suas famílias, foi formado pelo País, ao longo das últimas décadas, e que tem direito a ter, agora, um vencimento

compatível com a formação.

Esse é um esforço geral que os países têm de fazer e as empresas que, hoje, não forem competitivas a

contratar o talento desses jovens não pensem que vão ser competitivas a vender, porque vão perder, vão ser

cada vez menos produtivas e cada vez menos competitivas.

Por isso, Sr. Deputado, o que tem de ver nesse estudo é precisamente aquilo que temos de fazer e de obter

no acordo de competitividade e rendimentos.

É por isso que o Estado também tem uma parte a fazer. É por isso que as creches têm de ser gratuitas, os

manuais escolares têm de ser gratuitos, o IRS Jovem tem de existir, porque temos de aumentar o rendimento

disponível dos jovens, aumentando as possibilidades de eles se realizarem em Portugal, para além do esforço

que as empresas têm de fazer, que é o de melhorar os seus vencimentos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. Luís Soares (PS): — Já acabaram os jornais?!

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O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, compreendo que tenha estado ocupado

na sexta-feira e que haja, para si, coisas mais importantes do que a saúde dos portugueses — todos

compreendemos isso —,…

Protestos do PS.

… mas, e talvez o Sr. Primeiro-Ministro não saiba disto, há uma aplicação, nos comandos, que dá para voltar

atrás.

Chegamos à noite, a casa, voltamos atrás e vemos o debate de urgência.

Risos e aplausos do CH.

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Voltar atrás é do que o Chega mais gosta! A 24 de abril…

O Sr. André Ventura (CH): — Não sei se o Sr. Primeiro-Ministro está familiarizado com isso, mas não é

difícil.

Sr. Primeiro-Ministro, deixe-me só dizer-lhe isto: todos gostamos de o ouvir, Sr. Primeiro-Ministro, «só que

não» — lembra-se?! —, como os miúdos dizem, só que não é verdade. Portanto, o Sr. Primeiro-Ministro pode

repetir aqui as vezes que quiser, pode ter os aplausos da Câmara — as pessoas que estão nas galerias não

podem, mas, se pudessem, também batiam palmas e alguns, na comunicação social, se pudessem, também

batiam palmas, se pudessem, mas, Sr. Primeiro-Ministro, não sou eu que abro telejornais todos os dias. Isso,

deixo-o para si e para o seu Governo.

Aplausos do CH.

Isso é tudo muito bonito, Sr. Primeiro-Ministro, só que não. Está nos jornais! O salário dos licenciados caiu

11%, durante o seu Governo! Por isso, escusa de nos vir dar conversa, porque a verdade é esta.

Portanto, a pergunta é esta, e é muito simples: assume, ou não, a responsabilidade por este maior desastre

de sempre de queda proporcional do salário dos licenciados em Portugal?!

Aplausos do CH.

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Isso é anterior! É da altura do PSD!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, quanto à política de rendimentos, creio que já ficou

claro. Temos repetido n vezes que a prioridade muito clara é a da necessidade de haver um aumento geral de

salários.

O maior desafio que a nossa sociedade tem é mesmo o de conseguirmos fixar o talento que o País conseguiu

formar nos últimos anos. Isto é absolutamente decisivo.

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Exatamente!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Agora, devo dizer-lhe, e espero que não me leve a mal, que, quando chego a

casa, a última coisa de que tenho vontade é de andar para trás…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — É de ouvir a Ministra da Saúde?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … para o ouvir a si na televisão.

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Aplausos do PS.

Risos do CH.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, compreendo perfeitamente que, de facto,

ouvir a Ministra da Saúde ao fim de semana é uma coisa terrível.

Risos e aplausos do CH.

Não foi a mim que me chamaram de urgência, Sr. Primeiro-Ministro! Estou aqui todos os dias, a Sr.ª Ministra

é que foi aqui chamada e é um pouco deselegante, para a Sr.ª Ministra da Saúde, ouvi-lo dizer que, quando

chega a casa, não gosta de a ouvir, ou não gosta de andar para trás, na televisão.

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Não!

O Sr. André Ventura (CH): — Mas esse é um entendimento que o Governo fará internamente, e verá o que

há para discutir internamente.

Sr. Primeiro-Ministro, mais um embaraço para si, e grande: o Primeiro-Ministro espanhol, o seu grande

modelo, aliás, são os dois grandes modelos um do outro, acaba de baixar o IVA (imposto sobre o valor

acrescentado) da eletricidade para 5%, repito, 5%.

Sr. Primeiro-Ministro, respeito muito a sua conversa de que o IVA da eletricidade ia baixar, para um certo

consumo, em dezembro de 2020; de que o IVA dos combustíveis não ia baixar, mas havia o «AUTOvoucher»;

depois, era o ISP (imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos) que ia baixar; depois, conversa disto e

conversa daquilo.

Por que razão não baixamos o IVA para 6%?! Espanha baixou-o para 5%! É isso que os portugueses nos

pedem!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

O Sr. André Ventura (CH): — Baixe os impostos! Temos a maior carga fiscal de sempre! Acho que era isso

que o Governo devia fazer.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Ventura, quando comparamos as decisões

de cada um dos Estados, convém saber qual é a realidade de cada um dos Estados.

Se o for fazer, verifique primeiro qual é o preço em Espanha e qual é o preço em Portugal, que medidas já

adotámos no ano passado em Portugal e que medidas estão agora a ser adotadas em Espanha.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, de facto, basta chegar a uma bomba de

gasolina em Espanha para percebermos onde pagamos mais e onde pagamos menos.

Aplausos do CH.

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Sr. Primeiro-Ministro, vai ou não baixar o IVA da eletricidade?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, chamo a atenção do Sr. Deputado para o facto de que a

competência em legislação fiscal é mesmo da Assembleia da República.

Protestos do CH.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

Continuação dos protestos do CH.

O Sr. André Ventura (CH): — Nem o seu grupo parlamentar bateu palmas!

Protestos do PS e contraprotestos do CH.

O Sr. Presidente: — Peço silêncio para podermos ouvir o orador.

Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, tinha dito que os portugueses seriam

dos menos afetados com a guerra na Ucrânia e com a dependência externa.

Pergunto-lhe como reage à notícia, que também conhecemos ontem, de que Portugal é o terceiro país da

zona euro onde o preço dos alimentos mais cresceu, e o que é que o Governo pensa fazer sobre isso.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, responderei agregadamente a todas as questões do Sr.

Deputado André Ventura, porque, senão, não tenho forma de utilizar o tempo.

Aplausos do PS.

O Sr. André Ventura (CH): — Era o que faltava! Isso não é possível!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, agradecia que não descontassem esta intervenção no tempo

de que disponho, porque quero fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, gostaria de lembrar o Sr. Primeiro-Ministro que não é

presidente do Parlamento.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Claro!

O Sr. André Ventura (CH): — O Sr. Primeiro-Ministro não é a segunda figura do Estado, é a terceira! Por

isso, há um presidente da Assembleia da República a quem tem de respeitar e há um grupo de portugueses que

votaram no Chega e a quem tem de respeitar.

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O Sr. Pedro Pinto (CH): — Claro!

O Sr. André Ventura (CH): — Não é o Sr. Primeiro-Ministro que decide se responde agregadamente ou não.

Neste debate regimental, e de acordo com o Regimento, o Sr. Primeiro-Ministro responde imediatamente a

seguir à pergunta do orador e não se pode escudar em responder no fim.

Este é o meu pensamento e deixo a palavra ao Sr. Presidente da Assembleia da República.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado usou livremente da palavra, o Sr. Primeiro-Ministro usou livremente da

palavra, quando foi a sua vez, e, agora, é a vez do Sr. Deputado André Ventura.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o que pensa fazer sobre a questão que

lhe coloquei?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra para responder, Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, como sabe, há um conjunto de medidas que foram

adotadas no Orçamento do Estado, o qual entra agora em vigor.

Aplausos do PS.

O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Isto não é um debate…!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, gostava que nos dissesse quais são

essas medidas.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, o senhor conhece-as bem, porque votou contra.

Aplausos do PS.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, peço desculpa, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado André Ventura pede a palavra para que efeito?

O Sr. André Ventura (CH): — Para fazer uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, não me lembro, em democracia, de um desrespeito tão grande

à instituição Parlamento…

Aplausos do CH.

Vozes do PS: — Ah…!

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O Sr. André Ventura (CH): — … como este, que o Sr. Primeiro-Ministro aqui teve. Não me lembro de um

desrespeito tão grande.

Aplausos do CH.

Não me lembro de um Primeiro-Ministro tão obcecado com a gestão do tempo que está no quadro eletrónico,

com medo de que eu seja o último a falar e para ser ele…

Protestos de Deputados do PS.

… — ele, o Sr. Primeiro-Ministro —…

Vozes do PS: — Ah, bom!

O Sr. André Ventura (CH): — … o último a responder, e eu acho, Sr. Presidente, se me permite, que,

enquanto Deputado e sendo o Sr. Presidente o primeiro entre os Deputados, deve chamar a atenção do Sr.

Primeiro-Ministro para este desrespeito enorme à instituição parlamentar.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, eu intervenho ao abrigo dos meus poderes regimentais quando entendo

que devo intervir e não a pedido de terceiros.

O Sr. Deputado André Ventura dispõe, ainda, de 18 segundos para usar da palavra, pelo que tem a palavra.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, gostava que o Sr. Primeiro-Ministro elencasse as medidas com

que vai combater o aumento do custo de vida em Portugal.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Tem muito tempo para responder!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, dou-lhe um exemplo: amanhã, o Conselho de

Ministros aprovará que a medida extraordinária de apoio ao cabaz alimentar vigorará por mais três meses, ou

seja, com mais 60 €…

O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Pois, uma bênção!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … a serem pagos às pessoas que beneficiam da tarifa social da eletricidade e a

todos os beneficiários das prestações mínimas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, reconhece que tirou, sem critério, a

muitas famílias, o cabaz alimentar?

Protestos do PS e contraprotestos do CH.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, a medida abrangerá cerca de 1 milhão de famílias.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não foi essa a pergunta que fiz, o que

perguntei foi se reconhecia que milhares de famílias ficaram sem acesso ao cabaz alimentar.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, acabei de dizer que o Conselho de Ministros

renovará amanhã a medida do cabaz alimentar, que tem abrangido 1 milhão de famílias.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura, que ainda dispõe de 3 segundos e

pretende utilizá-los.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, vou deixar o Sr. Primeiro-Ministro contente com o último

momento para poder, então, falar, depois deste brutal desrespeito à instituição Parlamento.

Aplausos do CH.

Não queria fazer mais nenhuma pergunta, mas apenas dizer isto, Sr. Presidente: lamento mesmo muito que

uma maioria absoluta, apenas com poucos meses, se tenha tornado numa prepotência absoluta neste

Parlamento.

Aplausos do CH.

E pior: que se tenha tornado numa enorme prepotência, permita-me dizê-lo, Sr. Presidente, com a sua

complacência. Isto é o pior a que uma instituição parlamentar pode assistir.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Ventura, como é sabido, nos últimos 12

meses, tivemos uma inflação registada de 3,5%. Esta inflação acelerou muito em consequência da guerra,

embora tivesse origem na disrupção das cadeias de valor, em resultado da pandemia.

Ao longo deste ano, temos adotado um conjunto vasto de medidas de apoio, com um impacto total de 1300

milhões de euros, medidas, essas, que vão desde a redução do ISP, num valor equivalente à descida do IVA,

ao apoio às empresas mais afetadas pelo consumo de energia, como as do setor têxtil, do vidro e da siderurgia,

à criação de um apoio extraordinário às famílias mais carenciadas, de 55 milhões de euros, o qual vai ser

renovado amanhã para a sua continuação no próximo trimestre, à criação de um apoio de 65 milhões de euros

ao setor da agricultura, à redução do IVA nos fertilizantes, precisamente para diminuir o impacto no setor da

agricultura, e à introdução de um mecanismo ibérico de controlo de preços que, só nesta primeira semana, já

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permitiu uma redução de 10% do preço que seria pago se não estivesse em funcionamento, e com uma descida

média de 26 €/MWh.

É isto, Sr. Deputado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para formular perguntas, pelo Grupo Parlamentar do Iniciativa

Liberal, o Sr. Deputado João Cotrim Figueiredo.

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr.

Primeiro-Ministro, antes de colocar as minhas questões, tenho de assinalar que é lamentável aquilo a que

acabámos de assistir aqui, neste Parlamento, e é lamentável de parte a parte. A gestão tática de tempo e a

forma provocatória como se trataram um ao outro dão razão àqueles que acham que os debates quinzenais não

são mais do que um circo. E, para mim, que acho que o Parlamento é a sede da fiscalização e do escrutínio da

atividade governativa, o que se passou foi uma vergonha.

Aplausos do IL.

Estava a preparar-me para dizer que a espera de 85 dias para termos o primeiro debate quinzenal tinha sido

uma espera que não era a espera mais angustiante que o País está a sofrer, porque um pouco por todo o País,

um pouco por todos aqueles que recorrem aos serviços públicos, a palavra de ordem tem sido «esperar»! Na

saúde, como já foi aqui muito debatido, «esperar» é a palavra de ordem! São as listas de espera propriamente

ditas, as esperas pelas consultas, as esperas e as desesperas e o que se reza por uma urgência da qual se

necessita, e quem necessita das urgências são os que não têm alternativa, não são os que podem pagar os

hospitais privados.

Aplausos do IL.

Esses, que vão às urgências, esperam e desesperam para que essa urgência esteja aberta nesse dia, e

esperam e desesperam para que, sobre um diagnóstico que foi adiado, não cheguem lá um dia e lhes digam:

«Desculpe, mas foi tarde demais.» Essa espera é indigna!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Espera-se, também, na educação! Espera-se que os atrasos de

aprendizagem, acumulados nestes anos de pandemia, não se tornem permanentes e uma quebra de rendimento

para a vida toda destes jovens que foram afetados.

Espera-se que a falta de professores no secundário, que já se sabe que irá acontecer, a qual vai afetar mais

de 100 000 jovens no próximo ano letivo, se resolva sozinha, porque medidas em relação a isto temos visto

zero.

Na justiça, também se espera! E também se espera que se resolva sozinha, e já se sabe hoje que irá

acontecer a falta de mais de 1000 funcionários judiciais e de mais de 120 procuradores do Ministério Público.

Este problema há de resolver-se sozinho…! Continuamos a esperar, embora a esperar sentados.

Na segurança social, esperamos! Esperamos para saber qual a nossa reforma, esperamos para saber

quantos meses vamos ter de esperar pela confirmação do valor, esperamos pelo pagamento dos apoios sociais.

Espera-se!

No fisco, até no fisco, que é a máquina burocrática favorita dos socialistas, já vieram os sindicatos dizer que

há falta de funcionários e que talvez tenhamos de esperar até para pagar impostos, porque há serviços que vão

fechar.

No controlo de fronteiras, esperam-se horas para entrar em Portugal. Ao menos não esperam só os

portugueses, esperam também os pobres dos estrangeiros que querem entrar em Portugal.

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E podia continuar: espera-se na execução do PRR, e vamos lá ver se se consegue recuperar o ritmo que

nos prometeram; espera-se para saber o que é que o Governo vai fazer no dia em que Bruxelas disser que,

realmente, não vai mais 1 € para a TAP (Transportes Aéreos Portugueses) e o que vamos fazer às centenas de

milhões de euros que lá enterrámos; e espera-se para saber se um dia vamos ter um presidente do Banco

Português de Fomento, que é uma coisa que não deve interessar absolutamente nada, é só a peça fundamental

da recapitalização do tecido empresarial português…!

Podia continuar aqui minutos e mais minutos a falar sobre isto: estamos à espera! Mas, na realidade, o País

não está à espera, Sr. Primeiro-Ministro, o País está é parado!

Já sei que, chegado aqui, a máquina de propaganda do PS vai dizer: «São uns céticos! O País está excelente,

mas há um vírus do ceticismo. É a oposição, é o Iniciativa Liberal a ser cético.»

Pois, quando usa este argumento e diz «não, o País está excelente, o salário médio até subiu 22%», devo

dizer-lhe que o estudo da Fundação José Neves, que ainda há pouco citava, diz muito claramente que só tem

subido o salário para aqueles que têm qualificações baixas, porque nas qualificações médias e nas qualificações

altas o salário tem descido.

Portanto, quando alguém se espanta, porque os nossos melhores, a tal geração mais qualificada, emigram,

eles fazem-no exatamente por causa disto, porque aqui não há condições para fazer vida.

Aplausos do IL.

Sr. Primeiro-Ministro, o problema de Portugal não é o ceticismo do povo; o problema de Portugal é o

conformismo que o senhor introduziu nesse mesmo povo. As pessoas deixaram de achar normal exigir ao

Governo que faça, que resolva os problemas. Os tais portugueses que, na sondagem da Intercampus, também

já aqui citada, dizem que querem que se passe alguma coisa, a nível de reformas estruturais, são 93%. E

quantos acreditam que o Governo as fará? De 93%, 18% acreditam!

Ceticismo há, mas é em relação à sua capacidade, Sr. Primeiro-Ministro, de fazer reformas neste País. Esta

é a razão do ceticismo e essa é, também, a razão do conformismo em Portugal.

O senhor conseguiu uma coisa notável, nestes 85 dias, desde que tomou posse: pegou numa maioria

absoluta, num Governo que devia entrar cheio de energia e não tem nem energia nem vontade reformista, nem

demonstra a menor capacidade de gerir o caos generalizado nos serviços públicos e tem um País à espera, um

País parado, à espera.

Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, resumo todas estas perguntas, sem preocupações de gerir o tempo — não

faça esse jogo comigo! —, no seguinte: o Sr. Primeiro-Ministro está à espera de quê? Está à espera de quê,

para tirar a cabeça da areia e encarar estes problemas e, sobretudo, para tirar o País desta lista de espera do

desenvolvimento que nunca mais chega a Portugal?!

Aplausos do IL.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Cotrim Figueiredo, muito obrigado pelas

questões que colocou.

Não posso deixar de assinalar que fico surpreso, desde logo por culpar o povo. O povo?! O povo são os

cidadãos, os cidadãos que são detentores da soberania e que escolhem livremente qual a orientação política

que desejam. O povo é responsável? Não, o povo decidiu, escolheu livremente e formou uma maioria que está

aqui, nesta Assembleia da República.

Aplausos do PS.

O Governo responde perante a Assembleia da República, mas, até prova em contrário, a Assembleia da

República responde perante o povo e não o povo perante a Assembleia da República.

Portanto, se tem contas a acertar, acerte-as com o Governo, não as acerte com o povo.

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O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — É o que estou a fazer!

O Sr. Primeiro-Ministro: — O povo está de consciência tranquila,…

Aplausos do PS.

… votou seguramente e, daqui a quatro anos, avaliará se é de continuar ou se é altura de mudar de caminho.

Segunda perplexidade: nunca imaginei que os campeões do «Estado menos» centrassem toda a sua

mensagem, aqui, na necessidade de termos «Estado mais», como aqui enunciou:…

Aplausos do PS.

… «mais Estado na saúde», «mais Estado na educação», «mais Estado na justiça», mais Estado em todo o

sítio.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado, coerência, coerência! Do nosso lado, também procuramos manter a coerência e energia

reformista, sim, mas as nossas reformas não são as suas reformas. Dou-lhe só o exemplo deste mês: nós

aprovámos, logo no início do mês, uma reforma fundamental, que já está aqui, na Assembleia da República,

que é a Agenda do Trabalho Digno — combater a precariedade, assegurar um trabalho digno, dinamizar a

negociação coletiva, regular o trabalho nas plataformas digitais, regular o trabalho nas empresas de trabalho

temporário. Sim, trata-se de uma reforma de fundo para a dignificação do mercado de trabalho,…

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e é uma reforma estrutural. O senhor não gosta é dessa reforma, porque a

reforma que gostava que trouxéssemos era a de uma maior desregulação do mercado de trabalho.

O que nos distingue não é o maior ou menor ímpeto reformista. O que nos distingue são as reformas que

cada partido quer fazer. Aliás, honra a democracia que assim seja.

Aplausos do PS.

Entrará, ainda hoje, na Assembleia da República uma segunda reforma, da maior importância, do sistema

de entrada de cidadãos estrangeiros no nosso País, de forma a assegurar o cumprimento integral do acordo de

mobilidade no seio da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) e reforçar o pilar de cidadania no

âmbito da CPLP. Trata-se de algo absolutamente vital e de mais uma reforma estrutural.

Muito brevemente, o Conselho de Ministros vai aprovar um pacote — aliás, ficará bastante invejoso por não

ser aprovado por um governo liberal — em matéria de licenciamentos e de agilização da atividade económica.

Sim, temos um programa extenso de reformas e proveremos, também, o Estatuto do Serviço Nacional de

Saúde, peça fundamental para estruturar a reforma que estamos a fazer do Serviço Nacional de Saúde e peça

também essencial e prevista na Lei de Bases da Saúde, que aqui aprovámos com uma maioria de que a direita

se excluiu, porque é, efetivamente, contra a existência do Serviço Nacional de Saúde.

Sr. Deputado, a Fundação José Neves fez um estudo muito importante. Esse estudo é, aliás, curioso, porque

avalia o que ocorreu numa década — não se trata de fazer de historiador, mas é o que está nesse estudo — e

sinaliza quando é que houve essa quebra de rendimentos. Sabe quando é que se deu essa quebra de

rendimentos? Foi na primeira metade da década e não na segunda metade da década.

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Nem mais!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Na segunda metade da década, os rendimentos, felizmente, têm estado a

recuperar, os mais baixos e também os superiores.

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Aplausos do PS.

Sr. Deputado, gostaria ainda de sinalizar o seguinte quanto ao aeroporto: peço-lhe que atualize os dados

relativamente à última semana e aos resultados do plano de contingência que está a ser implementado.

Pergunte à ANA (Aeroportos de Portugal) — é privada, ficará, seguramente, confiante nos números que lhe

derem — e vai ver que as notícias são melhores do que aquelas que espera, felizmente.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado João Cotrim Figueiredo.

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o senhor pede-me coerência,

eu peço-lhe uma coisa bastante mais básica, que é verdade.

Não pus qualquer espécie de responsabilidade no povo português, citei-o a si, dizendo que há uma espécie

de vírus, uma doença, que é o ceticismo do povo português. Eu, pelo contrário, defendi o povo que nos elegeu

a todos e que todos, aqui, representamos.

Vozes do PS: — Nós também!

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Diz também que o Iniciativa Liberal quer Estado zero ou menos

Estado. O que nós queremos, isso posso garantir-lhe, é muito melhor Estado do que aquele que temos tido.

Muito melhor Estado! E temos a noção, porque não enfiamos a cabeça na areia, que o que se está a passar na

generalidade dos serviços públicos é altamente preocupante e que a degradação da qualidade de serviço é

quase uma constante em todos eles.

O Sr. Primeiro-Ministro, perante esta análise, se quiser, esta crítica, responde: «Não, estamos a fazer

imensas reformas, trazemos a Agenda do Trabalho Digno e vamos falar de relações internacionais e de

migrações.»

Quanto a reformas sobre aquilo que está efetivamente a preocupar os portugueses, na educação ou na

saúde, diz que tem um Estatuto do Serviço Nacional de Saúde.

Vozes do IL: — Muito bem!

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Quando se espreme, não altera nada na estrutura do Serviço Nacional

de Saúde e tem um Diretor-Geral cujas funções — já aqui interroguei a Sr.ª Ministra — ninguém me sabe dizer

e, pior, volta a centralizar as decisões.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Vou concluir, Sr. Presidente.

O Sr. Primeiro-Ministro, depois, diz uma coisa — e espero para ver se esse adjetivo de «liberal»,

relativamente aos licenciamentos, é merecido — que é uma afirmação prometedora e cá estarei para ser o

primeiro a dizer: «Finalmente, o Governo de António Costa, o terceiro, faz alguma coisa de que nos podemos

orgulhar.»

O Sr. Presidente: — Tem de acabar, Sr. Deputado.

O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Para acabar, Sr. Presidente, diria que, de resto, o que ouvimos — e

tem de acabar com isto — é contingência atrás de contingência: contingência no aeroporto, contingência no

SNS, contingências em tudo o que, certamente, está a preocupar os portugueses, lá em casa.

Aplausos do IL.

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O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Cotrim Figueiredo, há raros momentos onde

até convergimos nas reformas que são necessárias.

Vozes do PCP: — Oh!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Um desses raros momentos — e fundamental, aliás, para responder a muitos

dos problemas que temos estado a tratar — tem que ver com uma iniciativa legislativa, que foi, aliás, assumida

pela bancada do Partido Socialista, sobre a reforma do regime das ordens profissionais.

Não sou tão radical quanto o Sr. Deputado, que exterminava quase dois terços das ordens, mas julgo que

esta reforma é muito importante, é uma reforma estrutural para o País, que até já estava prevista no Orçamento

do tempo da troica e até nessa altura as ordens conseguiram sobreviver. Trata-se, de uma vez por todas, de

assegurar, de facto, a liberdade do acesso às profissões, acabar com a cartelização no acesso às profissões e

permitir, efetivamente, que as ordens cumpram sua função de regulação deontológica e profissional do exercício

da profissão, sem condicionar nem o acesso à formação, nem o acesso à profissão. Esse é um dos raros

momentos em que coincidimos.

Sr. Deputado, além de melhor Estado, queremos melhor economia e julgava até que, quando falou do PRR,

ia sinalizar o facto de, ainda ontem, ter chegado a uma fase conclusiva um dos programas mais importantes e

transformadores do Programa de Recuperação e Resiliência, que se foca na formação de consórcios entre o

sistema empresarial e o sistema científico. São 51 consórcios que vão investir, até ao final de 2026, 7700 milhões

de euros na criação de 2200 novos produtos, novos serviços, novas patentes,…

Aplausos do PS.

… e, isso sim, tem um potencial de transformação do perfil da economia portuguesa que vai permitir

responder de forma positiva a essa radiografia do que tem sido a evolução do nosso emprego, da produtividade

das nossas empresas, porque só assim teremos emprego mais qualificado e justamente remunerado.

É para isso que é preciso ter melhor Estado, mas também melhor economia, com melhores empresas e é

isso que, em conjunto, iremos fazer.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, do Grupo Parlamentar do

PCP.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, as preocupações com o acesso à

saúde justificam a insistência nas soluções para salvar o Serviço Nacional de Saúde.

O SNS é a garantia da igualdade entre todos os cidadãos no acesso à saúde, sejam ricos, pobres ou

remediados, mas, para isso, é preciso que a resposta do SNS seja universal, atempada e de qualidade.

A defesa do SNS não se resolve com proclamações, mas, sim, com opções políticas e medidas concretas e

urgentes. É preciso aumentar a capacidade de formação dos profissionais de saúde, reforçar o número de

profissionais ao serviço, garantir-lhes condições de estabilidade profissional, carreiras e salários valorizados,

horários de trabalho adequados, que evitem a exaustão, criar um regime de dedicação exclusiva e pôr fim às

medidas desastrosas da contratação temporária de tarefeiros a empresas de prestação de serviços,

assegurando uma gestão e organização dos serviços e unidades de saúde competente e adequada às

necessidades dos utentes. É preciso modernizar edifícios e equipamentos e internalizar serviços que, hoje, são

contratados fora do Serviço Nacional de Saúde, com mais custos e morosidade.

Lembrar-se-á, Sr. Primeiro-Ministro, que estes foram pontos de bloqueio na discussão do Orçamento em

outubro de 2021 e continuaram a sê-lo em junho de 2022.

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O SNS está «sob ponto de mira» dos grupos económicos privados, a ser desmantelado dia a dia e o Governo

e o PS continuam a recusar as medidas necessárias para o salvar.

Os grupos económicos do negócio da doença retiram profissionais ao SNS e diminuem a sua capacidade de

resposta para depois se proporem fazer serviço nas condições que lhes garantam ainda mais lucros e apenas

a quem os possa pagar.

A pergunta que se impõe é a de saber se o Governo vai concretizar as soluções para salvar o SNS ou vai

ser responsável pelo seu desmantelamento e pelas desigualdades sociais no acesso à saúde.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, em primeiro lugar, não

transformemos em divergência o que é uma convergência. A convergência em torno do Serviço Nacional de

Saúde ficou, aliás, consolidada na maioria que aprovou a Lei de Bases da Saúde.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Também se aprovou na Constituição!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Como se recorda, foi um processo difícil, onde foi necessário não só negociar

aqui uma maioria parlamentar, mas assegurar, também, que essa maioria parlamentar não enfrentaria um veto

presidencial. E a forma como se obteve um acordo, aqui, na Assembleia da República, e como o diploma foi

promulgado, sem veto, foi um momento muito importante para haver uma base social muito alargada de apoio

à consolidação do Serviço Nacional de Saúde.

Essa base social de apoio não é irrelevante, tendo em conta a história. É que, de facto, na história, houve

sempre uma fratura, que persistiu na Assembleia da República, porque a direita votou contra a Lei de Bases do

Serviço Nacional de Saúde.

Essa Lei de Bases tem de ser regulamentada. Logo no princípio do próximo mês, o Conselho de Ministros

aprovará o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, peça fundamental para a regulamentação da Lei de Bases

da Saúde.

Depois, temos outras componentes do SNS que são a componente orçamental e a componente dos recursos.

Como sabe, ao longo destes seis anos, o orçamento do Serviço Nacional de Saúde cresceu 30%. O orçamento

do Serviço Nacional de Saúde deste ano é de 13 mil milhões de euros. Falamos muitas vezes dos fundos

comunitários: são 14 mil milhões de euros de fundos extraordinários — a chamada «bazuca» — para quatro

anos, mas só este ano o SNS vai gastar 13 mil milhões de euros.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Para o privado!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Este aumento da dotação orçamental traduziu-se, também, num aumento dos

recursos humanos. Sr. Deputado, temos mais 25 000 profissionais do que tínhamos precisamente há seis anos,

entre mais 5000 médico internos, mais 3000 especialistas, mais enfermeiros, mais técnicos de diagnóstico, mais

pessoal auxiliar. Portanto, esse aumento de verba tem-se traduzido num aumento de recursos humanos.

Esse aumento de recursos humanos tem-se também traduzido num aumento da atividade assistencial. Se

compararmos a atividade já verificada neste momento, não com 2021 e 2020, que são anos, obviamente,

atípicos por causa da pandemia, mas com 2019, já tivemos um aumento das consultas totais de 14%. Ou seja,

já estamos a aumentar o número de consultas e o número de cirurgias e é esse esforço que temos de continuar

a fazer.

Chegámos ao fim do caminho? Não, pela nossa parte, não chegámos ao fim do caminho e vamos continuar

a fazê-lo, não só reforçando os meios, como melhorando a gestão, trabalhando em rede, de forma a podermos

aproveitar plenamente os recursos que temos.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Primeiro-Ministro, julgo que todos nós temos uma dose de

ingenuidade, mas a inocência já a perdemos todos.

Risos do PCP.

Fazer estes planos de fundo e, depois, não os concretizar, verificando que continuam os bloqueios que

existiram no Orçamento que levou ao desfecho conhecido, garantindo-nos que houve um grande investimento

no Serviço Nacional de Saúde, enfim, é verdade, mas o que sublinhamos com muita força é, em primeiro lugar,

a sua insuficiência.

Vozes do PCP: — Claro!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — E faz mal o Governo em não ouvir o que, hoje, emana da sociedade —

o protesto, o desalento, a crítica —, que exige que essas tais medidas, insuficientes, tenham outra visão por

parte do Governo e que este consiga medidas de salvação do Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do PCP.

Sr. Primeiro-Ministro, não é só na recusa de soluções para o SNS que as opções do Governo prejudicam o

povo e o País, também em relação ao aumento do custo de vida as opções do Governo são insustentáveis.

Para não enfrentar os grupos económicos, o Governo recusa-se a tomar medidas de controlo e fixação de

preços, permitindo uma espiral de aumentos, incluindo nos bens e serviços essenciais. Simultaneamente,

continua a recusar aumentos de salários e pensões, impondo, na prática, uma política de perda de poder de

compra. O resultado é óbvio: os grupos económicos acumulam lucros de milhões e o País sofre com a

degradação das condições de vida. O aumento dos combustíveis, em particular, é um escândalo!

Há uns meses, o Governo recusou as soluções de controlo e fixação dos preços propostas pelo PCP e

anunciou medidas de redução de impostos para enfrentar o problema. Desde então, o Estado tem perdido

receita fiscal, mas os preços dos combustíveis continuaram a aumentar e os lucros das petrolíferas a multiplicar-

se.

É uma contradição insanável, Sr. Primeiro-Ministro, para que tem de encontrar uma resposta.

Quem está a ser atingido pelas opções do Governo são os trabalhadores, os reformados, os pensionistas,

os micro, pequenos e médios empresários, os agricultores e pescadores, as corporações de bombeiros, as

coletividades e as instituições sociais. É o País real e a economia nacional que estão a ser sacrificados, em

benefício dos lucros dos grupos económicos e das multinacionais.

É tempo de o Governo tomar medidas de controlo e fixação dos preços e aumentar salários e pensões. É a

urgência da situação que o impõe, mas é também o futuro que o País exige. Não podem ser sempre os mesmos

a pagar e poucos a ganhar!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, voltando ainda à saúde, diria

que temos bem consciência — e por isso estamos a trabalhar com os sindicatos — de que é necessário adotar

medidas que tornem as carreiras mais atrativas e fixar pessoal no Serviço Nacional de Saúde. Creio que hoje

mesmo haverá uma reunião, no Ministério da Saúde, entre a Sr.a Ministra da Saúde e os sindicatos

representativos das carreiras dos médicos, no âmbito do processo de negociação que está em curso, sobre as

urgências.

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Mas, para além disso — como o Sr. Deputado sabe —, está previsto no Programa do Governo quer

avançarmos na dedicação plena, quer avançarmos no novo regime das unidades de saúde familiar, que são

medidas absolutamente fundamentais para poder fixar e remunerar justamente os profissionais.

Relativamente à questão da inflação, o Governo tem procurado controlar os preços da forma que pode e

deve fazer, controlando e procurando controlar os fatores que têm contaminado o aumento dos preços.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Está a ser espetacular!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Um fator essencial tem a ver com a energia e, por isso, adotámos as medidas

de apoio às empresas de transporte, quer de mercadorias, quer de passageiros, para evitar a contaminação

geral dos preços por via do aumento dos custos dos transportes. Por isso, fizemos uma redução, para toda a

população e também para as empresas, daquilo que é o montante do ISP, correspondente a uma redução de

10 pontos do IVA.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Agora já não tem mais!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Em terceiro lugar e mais importante, é que, para além das medidas de apoio

direto a todas as empresas eletrointensivas, conseguimos trabalhar conjuntamente com Espanha, na Comissão

Europeia, para obter o chamado regime ibérico.

O regime ibérico entrou em vigor no passado dia 15. A variação da poupança é diária, tendo em conta o

diferente mix energético em cada dia; mas vou dizer o seguinte: no dia 15, houve uma poupança de 15 € por

MW/h; no dia 16, outros 15 € por MW/h; no dia 17,33 € por MW/h; no dia 18, 61,19 € por MW/h; no dia 19, 65,57

€ por MW/h; no dia 20, 24,91 € por MW/h; ontem, 16,04 € por MW/h; no dia de hoje, 14,07 € por MW/h, e amanhã

haverá ainda uma poupança de 16,83 € por MW/h.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem de concluir.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Vou já concluir, Sr. Presidente. Ou seja, ao longo desta semana houve uma

redução média de 10% do custo, com uma média de poupança de 26 € por MW/h.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — No mercado grossista!

O Sr. Primeiro-Ministro: — É através desta via que podemos controlar a subida dos preços e a sua

contaminação geral ao conjunto da atividade económica.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para intervir em nome do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, tem a palavra a

Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, repare que nos veio aqui dizer que vai

aprovar o Estatuto do SNS três anos depois da Lei de Bases da Saúde e que a Sr.a Ministra vai negociar

carreiras, coisa que já nos diz há anos.

Convenhamos: a pandemia, sim, foi uma grande disrupção no SNS, mas o que exigia era mais atenção ao

SNS e não adiar mais problemas. Na verdade, o Governo chega aqui, no meio de uma crise de urgências, sem

nenhuma proposta concreta para resolver o problema e acho que talvez comece a ficar mais claro que as

divergências entre o Bloco de Esquerda e o PS sobre o Serviço Nacional de Saúde, nos últimos anos, nunca

foram um problema de intransigência do Bloco, mas, sim, a situação de rutura iminente do Serviço Nacional de

Saúde e a nossa responsabilidade em o salvar.

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Aplausos do BE.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade! Muito bem!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Em junho de 2019, numa audição pedida pelo Bloco sobre o encerramento

de urgências obstétricas, avisávamos a Ministra da Saúde de que o problema da falta de profissionais estava

mais agudo, que ia continuar a existir e eram necessárias medidas estruturais e de contratação. A Ministra

respondeu que iria estudar — o mesmo que agora.

Em novembro de 2019, poucos dias depois de o Sr. Primeiro-Ministro ter recusado um acordo de Legislatura

com o Bloco, também sobre o Serviço Nacional de Saúde — e eu lembro que 2019 também foi ano de

encerramento de urgências de serviços de obstetrícia —, eu disse-lhe aqui: «Não se contrata mais pessoas,

depois gastam-se milhões de euros em horas extraordinárias sobre aqueles que estão muito cansados; não há

mais vagas, não há exclusividade, mas há, só em pagamentos de prestação de serviços a médicos, 105 milhões

de euros — números de 2018.» Lembra um anúncio antigo: «o barato sai caro»; não deixamos de gastar, mas

gastamos muito pior.

Respondeu-me, na altura, com a promessa de programar sustentadamente a suborçamentação do SNS, e

disse até que o Bloco de Esquerda não tinha razões de preocupação porque até iria ter uma surpresa agradável.

Ora, sabemos que a suborçamentação não desapareceu, para 2022 — números do Governo — está acima dos

1100 milhões de euros, e o Serviço Nacional de Saúde numa situação cada vez mais degradada.

Em julho de 2020, no debate do estado da Nação, disse-lhe que, sem reforço concreto e sem mecanismos

de vinculação ao SNS, o Governo acabaria por abandonar os profissionais e os utentes. Na altura, o Sr. Primeiro-

Ministro preferiu ignorar o problema e, pura e simplesmente, não respondeu.

Em setembro de 2020, alertei-o novamente aqui para a exaustão dos profissionais de saúde e recordei-o de

que, só nos meses de verão, tinham feito mais de 100 milhões de horas extraordinárias e que, havendo cada

vez menos médicos no SNS, a pressão ia aumentar.

Registei, na altura, que o SNS já tinha perdido 600 médicos especialistas. Na altura, o Sr. Primeiro-Ministro

escolheu não assumir qualquer compromisso concreto e o resultado é que a situação se agravou e no ano

passado foram feitos mais de 21 milhões de horas extraordinárias.

Em outubro de 2021, alertei-o de novo, aqui, para a urgência de mudar as regras de fixar profissionais do

Serviço Nacional de Saúde e com isso evitar a situação a que assistimos nas últimas semanas.

Perguntei-lhe, na altura, se o Governo considerava mexer nas carreiras para reter no Serviço Nacional de

Saúde as pessoas que o SNS forma. Respondeu-me que era preciso desenhar medidas para evitar que os

concursos fiquem desertos, mas, na negociação orçamental, recusou todas as medidas que o Bloco propôs para

evitar a saída de profissionais e proteger o SNS, e os concursos continuaram a ficar desertos.

Por isso, hoje repito aqui o que lhe disse há meio ano, num debate eleitoral que tivemos os dois: há mais de

1 milhão de utentes sem médico de família; faltam anestesistas no Algarve, obstetras no Alentejo e pediatras

em Almada; o Governo continua a prometer concursos que ficam meio vazios e até para formar especialistas

houve dezenas de vagas que ficaram por preencher. Repito, por isso, Sr. Primeiro-Ministro, e continuo a

perguntar: porque recusa a proposta de António Arnaut para a valorização de carreiras e de salários com

exclusividade dos profissionais?

Na altura, preferiu «assobiar para o lado» e falar sobre outro assunto. Espero que hoje dê uma resposta, se

não a mim, pelo menos ao País.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, a história destes seis anos, ao

contrário do que diz, regista um reforço, tanto orçamental como de recursos humanos e materiais do Serviço

Nacional de Saúde.

O que a Sr.ª Deputada não diz — e devia dizer — é que o número de utentes do Serviço Nacional de Saúde

felizmente tem aumentado, e esse aumento dos utentes do Serviço Nacional de Saúde resulta quer do aumento

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do saldo migratório no nosso País, quer do facto de terem deixado de estar na clandestinidade muitos daqueles

que viviam entre nós e não tinham acesso ao Serviço Nacional de Saúde e hoje, felizmente, têm. Portanto, hoje

temos mais utentes no Serviço Nacional de Saúde.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Já sabíamos que íamos ter!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Temos problemas estruturais no Serviço Nacional de Saúde, a que temos

procurado responder, quer com recursos financeiros, quer com recursos humanos. Temos de o fazer também

reinventando e reorganizando o Serviço Nacional de Saúde.

Por isso, o Estatuto do SNS é fundamental, a generalização do modelo das USF (unidades de saúde familiar)

é fundamental, uma rede de referenciação nas urgências é fundamental, e todas essas reformas de fundo não

foram inventadas agora, nem a necessidade foi sentida agora.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Ah, pois não!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Acontece que, como se recorda — e bem — houve o bom senso geral de

compreender que não era em plena pandemia que nos íamos meter a fazer reformas de fundo.

O Público hoje noticia que houve um relatório que foi encomendado em 2017 e que ainda não foi entregue.

Não é verdade. Foi entregue em 2019 e entendemos precisamente que, em 2020 e em 2021, não era altura de

andarmos a fazer alterações de fundo na rede de referenciação.

A Sr.ª Ministra, para além de estar neste momento a negociar com os sindicatos as medidas que são

necessárias para responder às urgências e para termos um estatuto digno para os profissionais que fazem as

urgências, reativou, simultaneamente, a comissão nacional que está a preparar a implementação e a execução

daquilo que deve ser a rede nacional de referenciação.

Portanto, temos de perceber que há medidas que devem ser tomadas no momento certo e que o momento

certo não foi, seguramente, nestes anos de 2020 e 2021.

A Sr.ª Deputada diz: «No último Orçamento, não foram adotadas medidas.» Uma medida fundamental que

foi adotada foi, por exemplo, permitir um aumento de 60% da remuneração dos médicos nas zonas mais

carenciadas.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — E depois não abriram as vagas que eram necessárias!

O Sr. Primeiro-Ministro: — E é por isso que temos de continuar a trabalhar. Agora, entre as medidas serem

tomadas e elas produzirem efeito, há um hiato temporal — há, é assim! Há esse hiato temporal!

Depois, temos de aumentar — como disse, e bem, o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa — a capacidade

formativa. Temos de alterar as regras que existem para a possibilidade de abertura de vagas de médicos

especialistas e temos de continuar a fazer o esforço que temos vindo a fazer e que tem permitido evoluir

positivamente quanto à fixação e à retenção de médicos recém-especialistas no Serviço Nacional de Saúde. Em

2017, estávamos em 82%, em 2021 já chegámos aos 89%, e temos de continuar a trabalhar nesse sentido.

Portanto, percebo o recurso ao tremendismo, mas concentremo-nos nas soluções práticas e efetivas.

E a Sr.ª Deputada omitiu também um outro pequeno dado: é que a solução mágica que o Bloco de Esquerda

tinha para resolver o problema da fixação dos médicos no SNS — que foi um ponto de divergência entre nós e

levou ao chumbo, pelo Bloco de Esquerda, do Orçamento do Estado para este ano — era que, em vez da

dedicação plena, negociada e contratualizada com os profissionais, o que o Bloco de Esquerda pretendia era

decretar e impor a exclusividade, ou seja, a proibição de os médicos poderem exercer livremente a sua atividade.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Então e onde é que está a dedicação plena?

O Sr. Primeiro-Ministro: — O que a Sr.ª Deputada queria, efetivamente, não era mais médicos no SNS, o

que a Sr.ª Deputada queria, efetivamente, era que houvesse menos médicos nos hospitais privados,…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Isso é o que Governo está a querer!

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O Sr. Primeiro-Ministro: — … e aquilo que nós queremos é que haja mais médicos no SNS, mas garantindo

aos médicos e aos outros profissionais a liberdade do exercício da sua profissão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Inês Sousa Real, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Membros do Governo, Sr.

Primeiro-Ministro, gostaria de começar por secundar as palavras do Sr. Deputado João Cotrim Figueiredo

porque, de facto, ter acabado com os debates quinzenais foi um erro, mas voltarmos a este modelo nos moldes

em que começámos hoje o seu arranque, é muito pouco para aquilo que as pessoas lá em casa esperam de

todos nós, sobretudo quando temos problemas estruturais do País, desde a habitação ao emprego, à violência.

Ainda esta semana morreu mais uma menina — o seu nome era Jéssica —, estando sinalizada na comissão

de proteção de menores; ontem morreu mais uma mulher vítima de violência doméstica, e continuamos a falhar

em matérias estruturais para o País.

Por isso mesmo, temos de garantir que temos debates, sejam eles quinzenais ou noutros modelos, que nos

permitam, com dignidade e com aquilo que os portugueses esperam de nós, debater todas estas questões.

Nesta primeira ronda, gostaria de deixar duas questões muito claras. Uma primeira pergunta prende-se com

o Serviço Nacional de Saúde, porque o Sr. Primeiro-Ministro já reconheceu que há um problema estrutural,

reconheceu também que temos de garantir a fixação dos profissionais no SNS, mas ainda esta semana ouvimos

a Sr.ª Ministra da Saúde a não reconhecer se vai ou não aumentar os salários para a valorização destes

profissionais no SNS e continuamos também à espera do reconhecimento da carreira dos técnicos auxiliares de

saúde.

Portanto, as duas questões que tenho para lhe colocar em relação ao SNS prendem-se com estas duas

circunstâncias, porque não podemos, de facto, abrir concursos como os do ano passado, que acabaram por

ficar com vagas desertas. Basicamente, também acabámos por ter um terço dos lugares para médicos de família

que não ficaram preenchidos e continuamos a adiar uma solução para uma carreira absolutamente estrutural

para o SNS.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, para quando? Ou é como as obras de Santa Engrácia e vamos continuar a

esperar para ver quando é que temos, finalmente, um plano de contingência e uma reforma estrutural do SNS,

no nosso País?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Inês Sousa Real, o modelo dos debates não tem

que ver com a sua periodicidade, tem que ver com o estilo com que o debate é formado, o que, obviamente,

condiciona o seu exercício. Quando quiser, um dia, ouvir a minha opinião sobre os debates, tendo já uma larga

experiência quer desse lado do Hemiciclo quer deste lado do Hemiciclo, também tenho uma opinião sobre essa

matéria.

Quanto às duas questões que colocou, primeiro sobre carreiras, como lhe disse, ainda hoje está uma

negociação em curso, havendo hoje uma nova reunião.

Quanto à carreira de técnicos auxiliares de saúde, isso está previsto no Orçamento do Estado que foi

recentemente aprovado e para cuja viabilização a Sr.ª Deputada, aliás, contribuiu.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para formular perguntas ao Sr. Primeiro-Ministro, o Sr. Deputado

Rui Tavares, do partido Livre.

O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, hoje discutiremos o País primeiro, a Europa

já a seguir, e concluiremos com a votação de uma resolução do Livre sobre a atribuição do estatuto formal de

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candidato à União Europeia à Ucrânia, que constituirá, no fundo, a posição da Assembleia da República sobre

este tema.

Gostaria de registar uma rápida evolução do PS e do Governo sobre o voto, que não sobre a Ucrânia: na

semana passada era importante que o voto fosse só depois de ouvir todos os partidos e agora o Sr. Primeiro-

Ministro já disse ao Presidente Zelenskyy que Portugal apoia o estatuto formal de candidato da Ucrânia, 24

horas antes de a Assembleia da República se pronunciar. É uma evolução no sentido positivo e dou-lhe os

parabéns por isso. Mas o objeto da minha intervenção é não ter de dar os parabéns por qualquer coisa diferente

daqui a 10 anos.

Façamos todos juntos este exercício. Portugal tem um PIB per capita em torno dos 20 000 €, o da União

Europeia está acima dos 30 000 € e o da Ucrânia não chega a 3500 €. Se, daqui a 10 anos, a Ucrânia e os

Balcãs ocidentais — a Geórgia e a Moldávia — tiverem entrado na União Europeia, uma coisa terá acontecido:

acabou-se a conversa da cauda da Europa, porque Portugal estará firmemente não na cauda mas nas costas

da Europa. E até daremos um pulo para cima na mediana da União Europeia em termos de rendimentos, talvez

até na média da União Europeia, com um pouco de sorte e saber.

Só que há uma coisa que não muda e outra que muda decisivamente. A que muda é que este critério, que,

provavelmente, já está desatualizado — é um velho debate entre nós —, ficará obsoleto, porque mudará zero

na pressão que sentem os nossos jovens para emigrar, porque eles não se comparam com um critério abstrato

mas com a realidade dos países mais avançados da União Europeia. Não teremos sido nós a convergir com a

média, terá sido a média a regredir e a convergir connosco, e isso não muda nada para a vida dos jovens

portugueses.

Mas há outra coisa que muda, e essa muda decisivamente. É que acaba também a conversa de este PRR

se tratar de fundos europeus como, se calhar, nunca tivemos e talvez tenhamos pela última vez. Passará a ser,

certamente, pela última vez.

Portanto, a Ucrânia terá de se reformar — falaremos disso daqui a pouco —, a União Europeia terá de se

aprofundar — falaremos disso daqui a pouco —, mas Portugal terá de se reinventar e temos de falar disso agora.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Então ele pode falar o tempo que quiser?!

O Sr. Rui Tavares (L): — Qual é o seu plano? Como é que vai fazer para haver um debate de urgência sobre

o novo modelo de desenvolvimento de que Portugal precisa? Como é que vai fazer para que um seu sucessor

não tenha de fazer as mesmas queixas que o Sr. Primeiro-Ministro fez, ao falar da entrada no euro ou do anterior

alargamento a leste, e dizer «não estávamos preparados»? Está preparado para evitarmos esse destino?

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Ah, afinal tem 3 minutos!

Tem o dobro do tempo para falar! É sempre igual!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Tavares, em primeiro lugar, a convergência é

mesmo um objetivo que temos de prosseguir. E lamento desiludi-lo mas tenho de recordá-lo, sendo o Sr.

Deputado um historiador,…

O Sr. Rui Tavares (L): — Não é uma ofensa, é um elogio!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … de que, de facto, desde o início do século XX, Portugal teve 16 anos em que,

com exceção de 2007, ou esteve em recessão ou em divergência com a União Europeia. Esse ciclo terminou

em 2016, porque em 2016 crescemos acima da média europeia, em 2017 crescemos acima da média europeia,

em 2018 crescemos acima da média europeia, em 2019 crescemos acima da média europeia e este ano vamos

crescer acima da média europeia outra vez.

Portanto, Sr. Deputado, esse ciclo de divergência terminou em 2016 e temos de assegurar, pelo menos, uma

década de convergência. É essa uma das metas que temos no nosso Programa do Governo. E essa

convergência não é porque a média baixa, é porque temos de crescer mais. Se for verificar, o PIB per capita de

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Portugal, ao longo dos últimos seis anos, aumentou 20%. Ao contrário do que a direita gosta de dizer, Portugal

não empobreceu nos últimos seis anos.

Vozes doPS: — Muito bem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Portugal, nos últimos seis anos, cresceu e o PIB per capita aumentou 20%. Esta

é a realidade dos últimos seis anos.

Aplausos do PS.

Daqui a pouco, teremos oportunidade de falar das consequências da adesão da Ucrânia. O que o Governo

fez, como lhe competia, foi aguardar para ouvir os partidos — o que fizemos na sexta-feira —, aguardar pela

publicação do relatório de avaliação da comissão — o que fizemos —, que foi publicado na sexta-feira, e, na

própria sexta-feira, ao final do dia, o Governo anunciou qual era a posição de Portugal: favorável a acompanhar

o parecer da Comissão Europeia no sentido de reconhecer o estatuto de candidatos à Ucrânia e à Moldávia.

O que é que isso tem de consequências? Daqui a pouco discutiremos, mas foi por isso que sublinhámos,

desde a primeira hora, que estas adesões têm de ser levadas a sério porque não se podem criar falsas

expectativas, que sejam inconsequentes. Mas, para serem levadas a sério e serem consequentes, a União

Europeia precisa de uma nova arquitetura institucional e orçamental, sob pena de esta integração não ser um

reforço da União Europeia mas a sua implosão, e, portanto, não um apoio à Ucrânia mas uma armadilha para a

Ucrânia.

Ora, como queremos apoiar a Ucrânia, não podemos criar nem falsas expectativas nem sermos

inconsequentes nas decisões que tomamos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para formular perguntas, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tem a

palavra o Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias.

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e demais Membros do Governo,

Sr.as e Srs. Deputados: O Partido Socialista entra neste debate orgulhoso do trabalho que o Governo tem feito

na defesa do Serviço Nacional de Saúde.

É preciso dizer que não somos surdos nem cegos ao que acontece na sociedade portuguesa, em particular

nos hospitais portugueses. Mas não duvidamos, nem um minuto, nem um segundo, em defender um património

único da democracia portuguesa, um património único que, sim, foi gerado a partir da conceção de António

Arnaut, e em particular do Partido Socialista e das forças progressistas que, neste Parlamento, permitiram a

criação do Serviço Nacional de Saúde, ainda quando Mário Soares era Primeiro-Ministro.

Aplausos do PS.

Temos muito orgulho no Serviço Nacional de Saúde e sabemos bem que aquilo que disse o Sr. Deputado

Paulo Mota Pinto, por exemplo, é bem verdade: os problemas não começaram agora. Sublinhou-o com

honestidade.

Mas sabemos que só há uma forma de enfrentar os problemas: juntando recursos, juntando gestão e

juntando vontade de defender o Serviço Nacional de Saúde como um património único para permitir igualdade

de oportunidades.

Por isso, quando temos mais 24% de profissionais, mais médicos e mais enfermeiros, quando temos mais

3,2 mil milhões de euros de orçamento no Serviço Nacional de Saúde sabemos que, apesar de todas as

restrições financeiras, o PS e os Governos do PS nunca transigiram, estiveram sempre ao lado do Serviço

Nacional de Saúde.

Aplausos do PS.

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E acrescento: sabemos que é normal que os profissionais da saúde, quase no fim deste combate à pandemia,

estejam cansados, é normal porque a luta durante estes dois anos foi difícil e exigiu de todos um grande

empenho.

Percebemos bem que há reformas estruturais a fazer — aliás, estão no Programa Eleitoral do PS e estão no

Programa do Governo —, que o Plano de Recuperação e Resiliência contempla 1,3 mil milhões de euros de

investimento para aumentar a resiliência do SNS. Sabemos tudo isso, mas não confundimos — nunca! — aquilo

que é um contexto, uma conjuntura, com os problemas estruturais do Serviço Nacional de Saúde.

Vozes doPS: — Muito bem!

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — E aquilo que a direita, em particular, quer fazer é aproveitar-se de uma

conjuntura para pôr em causa o Serviço Nacional de Saúde, que é um património de todos.

O Sr. André Ventura (CH): — Ainda acredita nisso?!

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Não deixaremos que essa confusão seja feita. O SNS é de todos e

continuará a ser para todos.

Aplausos do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, há um elemento que tenho de adicionar hoje porque a direita, especialmente, debate

este tema a partir de um conceito, o dogma ideológico, como se o Partido Socialista estivesse preso a um dogma

que não o deixa avançar.

Terei de recordar que o Partido Socialista, sempre que foi Governo, inovou na gestão dentro do SNS. Foi o

Partido Socialista, por exemplo, que lançou algumas das PPP (parcerias público-privadas). As quatro PPP de

que os senhores sempre falam — e dizem que o Partido Socialista quis acabar com elas — foram lançadas, em

tempo, por Governos do PS.

Mas quando falamos, por exemplo, dos Centros de Responsabilidade Integrados do SNS, que foram

lançados aqui para dar mais autonomia às equipas num Governo liderado por António Costa,…

O Sr. João Dias (PCP): — Cada tiro, cada melro!

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — … quando falamos, por exemplo, das USF tipo B, que dão mais

autonomia às equipas, pergunto: quem os lançou? Governos do Partido Socialista!

Vozes doPS: — Muito bem!

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — E devo dizer que, como disse o Sr. Primeiro-Ministro ainda hoje, as

PPP que acabaram nos quatro hospitais — nos três hospitais, sendo que relativamente a Cascais ainda veremos

— são PPP que acabaram porque não houve acordo entre o Governo e os privados e temos de perceber que o

Governo tem o dever de defender o interesse público, não estando muitas vezes de acordo com os privados.

Vejam: quanto ao Hospital de Braga, a José de Mello Saúde recusa renovar o contrato de gestão; quanto à

PPP de Vila Franca, o Grupo Mello rejeita proposta de prolongar a PPP, os donos da Luz Saúde rejeitam

continuar com a PPP em Loures…

Vozes doPS: — Pois é!

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — … e a Lusíadas Saúde desiste de concorrer à PPP do Hospital de

Cascais. São quatro exemplos!

Aplausos do PS.

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Meus Senhores, o Governo, defendendo o interesse público, quis negociar as PPP. Aliás, a Lei de Bases da

Saúde considera que as PPP podem ser supletivas e foi esta bancada, noutra legislatura, que ajudou a aprovar

essa Lei de Bases da Saúde.

Mas devo dizer mais: os senhores poderiam dizer-nos, por exemplo, que o Partido Socialista e os Governos

do PS — apoiados, aliás, na altura, pelo PCP, pelo Bloco de Esquerda e pelo PEV — tinham acabado com as

PPP lançadas pelos governos da direita, pelos Governos do PSD e do CDS, que até alguns dos Deputados mais

à direita, na altura, apoiavam, quer do IL quer do CH.

O Sr. André Ventura (CH): — Deixe-se lá disso!

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Isso significaria que a direita tinha uma abordagem completamente

diferente. Mas, Srs. Deputados, a verdade é que podemos ir à procura do número, de saber quantas PPP foram

lançadas pelos Governos de direita. Querem que eu responda qual é o número? Posso matar a curiosidade? O

número de PPP lançadas pelos Governos de direita foi zero. Zero! Nenhuma! Zero é o número de PPP lançadas

pelos Governos de direita.

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do PCP João Dias.

Como é que podem dizer que o Partido Socialista tem um dogma ideológico porque não chega a acordo com

os privados, quando as PPP que foram renegociadas e não chegaram a bom porto foram lançadas por Governos

do PS e o PSD e o CDS, no Governo, aprovaram e lançaram zero?!

Mas, devo dizer, é menos do que zero, porque não havia só quatro PPP, eram seis. Por exemplo, em 2013,

o Centro de Medicina de Reabilitação do Sul, no Algarve, em S. Brás de Alportel, era uma PPP. O Governo

liderado por Passos Coelho — e bem, seguramente — acabou com a PPP. Lançou um novo concurso? Não

lançou um novo concurso. O que é que fez? Integrou este centro de reabilitação na ARS Algarve (Administração

Regional de Saúde do Algarve), dentro do Serviço Nacional de Saúde.

Portanto, Srs. Deputados, o dogma ideológico de que se fala é sempre o mesmo.

Protestos do PCP.

A direita já não estava satisfeita quando foi criado o Serviço Nacional de Saúde, votando contra, mas não

ficará satisfeita enquanto não aproveitar cada problema conjuntural para atacar estruturalmente o Serviço

Nacional de Saúde, e isso o Partido Socialista não deixará. A nossa opção não é essa.

Aplausos do PS.

Protestos do PCP.

Devo dizer, Sr. Primeiro-Ministro, que a pergunta é evidente. Se a nossa opção é defender o SNS, se a nossa

opção é também ter inovação na gestão do SNS, se a nossa opção é estar ao lado dos profissionais do SNS

para garantir bons serviços aos portugueses — porque é isso que procuramos, bons serviços aos portugueses

—, há uma pergunta evidente: no nosso programa eleitoral, no Programa do Governo, onde estão — porque

estão! — as medidas para reforçar estruturalmente o SNS em Portugal?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias, como sabemos, aqueles que

dizem sempre que já não há diferenças ideológicas são os que querem disfarçar o discurso da direita como um

discurso natural, inócuo e de senso comum. Ora, a razão pela qual a democracia é diversa e há pluralidade é

porque há, de facto, diferentes visões do mundo e essas diferentes visões do mundo corporizam-se em

diferentes ideologias. Essa é, aliás, a riqueza da democracia.

Percebo que há partidos que têm crises existenciais. Quiseram rebatizar-se numa família ideológica que não

era a sua, que nunca os reconheceu e onde eles nunca conseguiram entrar. O PPD, que era PPD, quis inventar-

se PSD,…

O Sr. André Ventura (CH): — O Canal História!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … mas obviamente não cabem lá. Não cabem lá, não são e, portanto, não

cabem!

Aplausos do PS.

Essa confusão fez com que até o Deputado André Ventura tenha sido militante e candidato desse partido

ainda há muito poucos anos, tal a confusão que é o PSD!

Protestos da Deputada do PSD Joana Barata Lopes.

Finalmente, o País dispõe agora de uma alternativa clara, que não se esconde nos seus nomes e diz que é

liberal e tem orgulho em ser liberal. Devo dizer que é um contributo muito importante para a riqueza da nossa

democracia, porque tornou as coisas claras. Há uma esquerda à esquerda do PS, há a esquerda que o PS

sempre representou em Portugal — a esquerda social-democrata, trabalhista, do socialismo democrático —, há

uma direita que finalmente se diz aquilo que é, liberal, e outra direita que ainda não diz o que é, mas já chega o

que chega e há de dizê-lo um dia, e depois há o PPD, que assim devia ser.

Risos do PS e do CH.

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — PPD/PSD!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas, sempre que chegamos à verdade dos factos, o PPD/PSD não hesita em

saber qual é o seu lado. Quando se discutiu a criação do Serviço Nacional de Saúde, qual foi a posição do

PPD/PSD? Foi contra a criação do Serviço Nacional de Saúde. Quando o PPD/PSD esteve no Governo, o que

é que fez? Aprovou uma lei onde, parecendo mera semântica, descaracterizou o Serviço Nacional de Saúde

como Sistema Nacional de Saúde, estabelecendo uma lógica que, aliás, entendia concorrencial entre o setor

público, o setor privado e o setor social. Foi o Tribunal Constitucional que declarou a inconstitucionalidade dessa

lei e garantiu a persistência do Serviço Nacional de Saúde tal como ele é previsto na Constituição: público,

universal e tendencialmente gratuito. É o que está na nossa Constituição.

Aplausos do PS.

Protestos de Deputados do PSD.

Depois, o PPD/PSD descapitalizou o Serviço Nacional de Saúde. A Legislatura de 2016 a 2019 foi mesmo

para repor a totalidade dos cortes que tinham sido feitos no Governo do PSD e do então CDS-PP. Depois disso,

temos vindo a reforçar o Serviço Nacional de Saúde em recursos financeiros, em recursos materiais e em

recursos humanos.

Mas não basta reforçar sempre com mais, é preciso fazer diferente. E é por isso que a nova Lei de Bases da

Saúde vem enquadrar o equilíbrio que deve existir entre aquilo que é o Serviço Nacional de Saúde e outras

formas de organização e de prestação de saúde.

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Como disse, e bem, não foi o Governo que recusou a renovação das PPP que foram avaliadas positivamente

pelo relatório do Tribunal de Contas. O Governo dispôs-se a manter as PPP, tentou manter essas PPP, nos

termos da avaliação positiva pelo Tribunal de Contas. Não foi uma intransigência do Governo, não foi o Governo

que disse não, foram os privados que, legitimamente, disseram: «Nestas condições que o Tribunal de Contas

entendeu boas, nós não estamos em condições de continuar a desenvolver a nossa atividade». E assim não

foram renovadas as diferentes PPP.

Mas temos investido também na origem. Precisamos de mais recursos humanos e, por isso, os sucessivos

Governos do PS têm aumentado as vagas nos cursos de Medicina, para que haja mais jovens a poderem entrar

nesses cursos. Ainda recentemente, permitimos a abertura de um curso de Medicina, que custou muito a abrir,

numa universidade que, não sendo privada, é concordatária, a Universidade Católica Portuguesa. Foi já com

um Governo presidido por mim que a Faculdade de Medicina da Universidade Católica Portuguesa iniciou a sua

atividade com um novo curso de Medicina.

Sim, apesar de termos uma orientação ideológica muito clara e de sabermos bem qual é o Serviço Nacional

de Saúde, que tem de garantir a saúde de todas e de todos os portugueses, nunca combatemos outras formas

de formação ou de desenvolvimento dos cuidados de prestação de saúde. É por isso que entendemos que a

dedicação plena é o modelo adequado para termos o equilíbrio na dedicação que todos os profissionais do SNS

devem ter com ele, mas também a liberdade para poderem praticar a sua atividade profissional.

Portanto, vamos aprovar o estatuto do Serviço Nacional de Saúde; vamos prosseguir a reforma dos cuidados

de saúde primários, que é absolutamente fundamental, vamos avançar com a reforma dos cuidados continuados

integrados e vamos cumprir a reforma da saúde mental. Este é o conjunto de prioridades que identificámos no

Programa do Governo.

Vamos melhorar a gestão, algo que passa desde logo, neste Orçamento do Estado, por uma maior autonomia

na gestão hospitalar. Passa também pela criação desta rede nacional de referenciação, que é absolutamente

essencial. É essencial no dia a dia, mas sobretudo naqueles períodos de pico de solicitação pelos utentes —

como é tradicionalmente o período de inverno e as vagas de gripe — ou em períodos em que, legitimamente,

os profissionais de saúde, como quaisquer outros profissionais, desejam exercer o seu direito a férias ou

aproveitar a oportunidade que a existência de feriados e pontes oferece para ter o seu devido descanso. Nessas

circunstâncias, obviamente, o sistema tem de se reajustar para, sem perda da capacidade de resposta, se

organizar de uma forma diferente daquela que existe no dia a dia.

A melhor demonstração de que o Serviço Nacional de Saúde é capaz de se readaptar e ajustar à contingência

foi mesmo o que aconteceu em março de 2020, quando tivemos o primeiro caso de COVID. A verdade é que o

SNS — que todos diziam que ia entrar em colapso, que estava num caos — rapidamente se reorganizou e

respondeu à COVID como poucos a nível mundial.

Aplausos do PS.

Portanto, independentemente das agendas mediáticas — sem ignorar os problemas reais que existem e que

não podemos fingir que não existem nem disfarçar a sua existência, porque temos de os assumir para os

podermos enfrentar —, a verdade é a seguinte: não é um Serviço Nacional de Saúde que durante dois anos

combateu uma pandemia que não é capaz de se gerir e de se reorganizar para responder aos picos de urgências

ou a períodos em que, legitimamente, tem menor número de profissionais em atividade. Claro que vamos fazer

isso e é claro que vamos conseguir responder.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Iniciamos agora a 2.ª ronda do debate, sendo o Partido Socialista que a inaugura. Tem

a palavra o Sr. Deputado João Torres.

O Sr. João Torres (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e

Srs. Deputados: Sr. Primeiro-Ministro, iniciaria a minha intervenção por lhe perguntar, sem desconsiderar os

temas da maior importância que hoje aqui já foram discutidos, se não achou estranho, nesta primeira ronda de

perguntas que lhe foram dirigidas, não termos ouvido em particular a direita falar sobre aqueles habituais

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indicadores estatísticos que tão habilmente costuma maquinar, adulterando as séries estatísticas para mostrar

ao País uma realidade que, na verdade, não corresponde à factualidade desses mesmos indicadores

estatísticos.

Protestos de Deputados do PSD e do IL.

É que ouvimos muito pouco a direita falar sobre economia. Aliás, recordo-me bem, e o Sr. Primeiro-Ministro

recordar-se-á melhor, de que, na campanha eleitoral, falávamos sobre a importância de colocar o País numa

trajetória de crescimento económico e de convergência, mas, simultaneamente, de valorizarmos os rendimentos,

de adotarmos políticas de valorização dos rendimentos.

De que é que ouvimos aqui, hoje, a direita falar? Sobre rendimentos, mas não sobre economia. E há uma

razão para isso acontecer. Há uma razão ideológica, desde logo, que o Sr. Primeiro-Ministro acabou de enunciar.

É que as políticas e as mensagens políticas neoliberais são muito interessantes até ao momento em que colidem

com a realidade. Aí é um dilema, é um problema, é uma chatice!

Aplausos do PS.

Se calhar há uma segunda razão, porque o Sr. Deputado Cotrim Figueiredo acusou o Partido Socialista de

ter uma brutal máquina de propaganda, mas aquilo que parece é que a máquina de propaganda do Iniciativa

Liberal gripou para este debate com o Sr. Primeiro-Ministro.

Aplausos do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, no Partido Socialista, registamos que a economia foi o grande ausente do debate até

agora, mas seria bom saber o que pensam as oposições sobre alguns indicadores que temos vindo a conhecer,

a saber: a revisão em alta do crescimento económico para 2022, que o Banco de Portugal cifra hoje nos 6,3%;

não menos importante, o crescimento das exportações de bens e serviços nos primeiros quatro meses deste

ano em 31,8%, sendo que só as exportações de bens cresceram sensivelmente 17% nos primeiros quatro meses

de 2022; a subida superior a 27% das transações acumuladas do investimento em empresas e, não menos

importante, também a redução do número de desempregados inscritos em mais de 26% no mês de maio, face

a 2021, e de 5,7% em comparação com o mês anterior.

Sr. Primeiro-Ministro, acho que era muito importante ouvir também a sua avaliação sobre estes indicadores

económicos, porque nós, no Partido Socialista, não temos ilusões.

Sabemos que há dificuldades, sabemos que há adversidades, não estamos conformados, queremos mais,

queremos melhor e foi também por isso que os portugueses confiaram no PS nas eleições legislativas de dia 30

de janeiro.

Aplausos do PS.

Sr. Primeiro-Ministro, nunca fomos naquela narrativa concorrencial entre países, com base em gráficos muito

bonitos, como os que tive oportunidade de mencionar, mas já que a direita fala tantas vezes sobre esse assunto

— ainda que de forma enviesada —, seria também importante saber o que pensam o PSD e o Iniciativa Liberal

sobre o facto de, já em 2022, segundo as previsões mais atuais, Portugal ultrapassar a Polónia e a Hungria em

PIB per capita.

Aplausos do PS.

O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Não se querem comparar com outros países?!

O Sr. João Torres (PS): — Nós não alimentamos essa narrativa, mas seria importante, repito, saber o que

pensa a direita sobre esta matéria.

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Protestos do IL.

Eu sei, até pelo ruído que está a gerar a minha intervenção, que vão ser muito expeditos naqueles sábios

truques estatísticos, mas, uma vez mais, permitam-me que insista: a direita é muito eficaz a maquinar as

estatísticas, mas quando se confronta com a realidade é mesmo um dilema para a vossa narrativa política.

Aplausos do PS.

Protestos do IL.

Sr. Primeiro-Ministro, não menos importante, esta é a primeira vez que vem a esta Casa depois de o

Sr. Presidente da República ter promulgado o Orçamento do Estado para 2022.

Queria sinalizar e reafirmar o empenho do PS perante os compromissos que assumimos na campanha

eleitoral. Sim, ao longo dos anos em que o Sr. Primeiro-Ministro tem chefiado o Governo, tornou-se normal

cumprir os compromissos, mas nem por isso devemos deixar de o salientar, que é também o que o PS quer

fazer.

Sabemos que, com este Orçamento do Estado e com o Sr. Primeiro-Ministro, vamos poder aumentar

extraordinariamente as pensões, com efeitos retroativos a 1 de janeiro.

O Sr. Bruno Nunes (CH): — Eh!…

O Sr. João Torres (PS): — Sabemos que o IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares) vai

descer para as classes médias, para as famílias com dois filhos ou mais e, ainda, para os jovens, em particular

com o IRS Jovem.

Sabemos que vai prosseguir o combate à pobreza infantil, que é uma das chagas que ainda subsiste e que

motiva a nossa energia e determinação na sua resolução, com a criação da garantia para a infância.

O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — E médico de família para toda a gente?!

O Sr. João Torres (PS): — Sabemos que vamos continuar a combater a precariedade — aliás, como o Sr.

Primeiro-Ministro bem ilustrou —, tendo o Governo aprovado a proposta de lei da Agenda do Trabalho Digno.

E, como também resultou claro deste debate, sabemos que vamos continuar a valorizar os serviços públicos,

porque, para o Partido Socialista, a saúde, a educação, o Estado social são pilares fundamentais da nossa

conceção de liberdade e que muito nos afastam das bancadas à direita neste Hemiciclo.

Aplausos do PS.

Protestos de Deputados do CH.

Sr. Primeiro-Ministro, para terminar, houve dois estudos que talvez tenham passado despercebidos à direita,

ao longo das últimas semanas. Dois estudos que colocam Portugal — imagine-se, Portugal governado por um

Partido Socialista tão, alegadamente, inimigo da iniciativa privada, como se isso fosse verdade! —…

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Não é «alegadamente»!

O Sr. João Torres (PS): —… como um dos países mais atrativos em matéria de investimento direto

estrangeiro.

Aplausos do PS.

Protestos do Deputado do PSD Jorge Paulo Oliveira e do Deputado do CH Bruno Nunes.

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Bom, é assim em dois estudos e até a insuspeita revista The Economist diz que Portugal é um bom exemplo

na atração de investimento direto estrangeiro e estamos focados, também, na reforma da nossa economia. É

também isso que o PRR vai habilitar o Governo a fazer, importando lembrar que o PRR também existe, pelo seu

empenho e o cunho pessoal, nas instituições europeias.

Aplausos do PS.

Em particular, ontem, o Sr. Primeiro-Ministro teve a oportunidade de comparecer num evento importante que

deu mais um passo no sentido da concretização das agendas mobilizadoras para a inovação empresarial.

Risos do Deputado do CH Pedro dos Santos Frazão.

Penso que as agendas mobilizadoras são uma boa fonte de inspiração da economia em que nós acreditamos,

numa economia e numa sociedade não assentes em mão-de-obra barata, capazes de inventar, de conceber e

de produzir os bens e os serviços de futuro no nosso País.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, a pergunta que lhe colocava…

O Sr. André Ventura (CH): — Vá lá, uma pergunta…!

O Sr. João Torres (PS): —… é a seguinte: de que forma considera que as agendas mobilizadoras podem

ser um fator de inspiração para esse modelo económico em que nós, socialistas ou verdadeiros social-

democratas, nos revemos no nosso País?

Mesmo para terminar, gostava ainda de levantar uma questão sobre a importância do rigor orçamental.

Risos do CH e do IL.

As gargalhadas da direita só podem ser de má memória ou de alguma contrição em relação ao passado!

Aplausos do PS.

Ao longo dos últimos anos, o Sr. Primeiro-Ministro sempre alertou para a importância do rigor orçamental,

mesmo quando fomos capazes de alcançar um superávite, coisa que a direita não conseguiu nos anos em que

governou.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD e de Deputados do IL.

Num momento de incertezas, perguntava-lhe, ainda, sobre a importância de mantermos o rigor orçamental

sem, mesmo assim — como o Sr. Primeiro-Ministro e o seu Governo já demonstraram —, perdermos a ambição

na construção de um País e de um futuro melhores para as portuguesas e para os portugueses.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Paulo Mota Pinto pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Presidente, era só para pedir que fossem distribuídos dois documentos

ao Partido Socialista. Um é o memorando sobre políticas orçamentais, assinado, em 10 de maio de 2011, por

governantes socialistas,…

Protestos do Deputado do PS Porfírio Silva.

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… onde se lê, no ponto 3.17: «Evitar entrar em qualquer novo acordo de PPP antes de finalizar a revisão das

PPP existentes (…)».

O segundo documento, que peço que seja distribuído ao Sr. Deputado João Torres, é a lei orgânica do atual

Governo e do anterior — isto a propósito do liberalismo e da social-democracia —, da qual resulta que a

Secretaria de Estado da Defesa do Consumidor foi extinta depois de ele ser dela titular.

Aplausos do PSD.

Protestos do Deputado do PS João Torres.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, os documentos são públicos, mas se a bancada parlamentar do Partido

Social Democrata entende ser útil distribuí-los, eles serão distribuídos.

Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Torres, a direita tem tido uma enorme

dificuldade em posicionar-se porque, relativamente aos critérios que auto definiram como sendo distintivos da

boa e da má governação, nós temos cumprido sempre com todos aqueles que eles inventaram como sendo da

boa governação e temos tido sempre melhores resultados do que eles tiveram.

Protestos da Deputada do PSD Joana Barata Lopes.

O primeiro é o mais evidente de todos e tem que ver com as contas certas, com a boa gestão orçamental. A

direita fala, fala, que se fez um gigantesco aumento de impostos, cortes nas pensões e nos salários, mas, mesmo

assim, o único excedente orçamental que foi possível obter na nossa democracia foi com o PS no Governo, sem

aumento de impostos, sem cortes nos salários, sem cortes nas pensões e repondo os rendimentos.

Aplausos do PS.

Protestos de Deputados do PSD e do IL.

Depois, a direita fixou um segundo objetivo: a atratividade internacional do País para o investimento. O que

é uma enorme frustração para a direita é que, ano após ano, desde que o PS é Governo, o País tem vindo a

bater novos recordes no investimento contratualizado, tendo estabelecido um novo recorde de atração de

investimento, ainda em 2021, em plena pandemia, o qual vamos bater em 2022.

Aplausos do PS.

Finalmente, a fiscalidade.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Ah!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mesmo comparando a receita fiscal destes anos com a anterior, em relação ao

seu peso no produto, verificamos que, hoje, os impostos pesam menos no produto do que pesavam quando a

direita governava.

Vozes do PS: — Essa é que é essa!

Protestos do Deputado do PSD Hugo Carneiro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — É perante estes três critérios que a direita tem, então, de passar à maquinação.

O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Nós mandamos-lhe os dados!

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O Sr. Primeiro-Ministro: — A maquinação da estatística começa precisamente aqui, matraqueando o

conceito da carga fiscal.

Protestos do Deputado do PSD Hugo Carneiro.

Porque é que recorrem sistematicamente à carga fiscal e não falam dos impostos? Porque, além dos

impostos, a carga fiscal inclui as contribuições para a segurança social e — sim! — nós não aumentámos a taxa

de contribuição para a segurança social, mas o rendimento da segurança social tem aumentado, ou seja, a

receita das contribuições para a segurança social tem aumentado.

Mas tem aumentado porque aumentámos as taxas? Não, tem aumentado porque o desemprego caiu de 13%

para 5,7% e o salário médio subiu 20% ao longo dos últimos anos. É por isso que aumentam as receitas da

segurança social.

Aplausos do PS.

Portanto, neste conceito de carga fiscal, se retirarmos a componente das contribuições para a segurança

social, verificamos que a tributação, em fiscalidade, diminuiu com a nossa governação, enquanto houve um

enorme aumento de impostos durante a governação da direita.

Aplausos do PS.

O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Em 2022 vai aumentar tudo!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Há outra maquinação, que é a do crescimento, com o discurso de que Portugal

está a empobrecer e a ficar para trás. Então, o que é que fazem? Fazem a média da última década para

disfarçarem aquilo que não querem mostrar, que é a média dos últimos seis anos.

Protestos da Deputada do PSD Joana Barata Lopes.

Na média da última década, temos que contar com: o ajustamento do triplo choque do euro; o alargamento

a leste; a entrada da China no mercado internacional; uma brutal crise económica em 2008; uma crise financeira

em 2010 e 2011; e os anos da troica.

O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Só desgraças!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Depois — grande azar da direita! —, quando é que pusemos fim a esse ciclo de

recessão e divergência? Foi no ano de 2007, em que o Governo era do PS e, depois, em 2016, 2017, 2018,

2019 e — este ano, outra vez! — em 2022.

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada do PSD Joana Barata Lopes.

Quando crescemos acima da média não andamos para trás! Quando crescemos acima da média,

aproximamo-nos do pelotão da frente, aproximamo-nos dos países mais desenvolvidos.

Protestos de Deputados do PSD.

Mais: não foi por efeito da redução da média, foi porque progredimos e, como há pouco tive oportunidade de

dizer, o PIB per capita português aumentou 20% nestes seis anos. Esta é a realidade: nós não empobrecemos,

nós estamos a enriquecer.

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O Sr. Pedro Pinto (CH): — Ah!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Menos do que gostávamos, com certeza, mas é por isso que aqui estamos a

trabalhar, para que o crescimento seja maior e mais sustentado.

Aplausos do PS.

O Sr. André Ventura (CH): — Como é possível dizer-se uma coisa destas?

O Sr. Primeiro-Ministro: — A direita não consegue perceber que não há uma antinomia entre crescimento

e rendimento.

O Sr. André Ventura (CH): — Canal de comédia!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — É evidente que a melhoria do rendimento, para ser sustentado, tem de assentar

no crescimento, mas a melhoria do rendimento também contribui para o crescimento económico e, a partir de

2016, demonstrámos que a melhoria dos rendimentos dos pensionistas e dos assalariados não trouxe o diabo.

Aquilo que trouxe, e fortaleceu, foi a dinâmica de crescimento, de recuperação e de convergência económica de

Portugal.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Os dois grandes motores para o nosso desenvolvimento são as qualificações e a inovação. Nas qualificações,

de que a direita nunca fala, a maior mudança estrutural que o País teve, nas últimas décadas — não tenho a

menor das dúvidas —, foi a redução do abandono escolar precoce, que se verificou entre 2015 e 2021. Caímos

de 13% para cerca de 5%, ultrapassando as metas, que estavam contratualizadas com a União Europeia, de

redução do abandono escolar precoce.

Aplausos do PS.

Ora, isto é absolutamente fundamental, porque significa que as famílias, mesmo perante todas as

dificuldades, perante a incerteza da pandemia, continuaram a investir na educação dos seus filhos e que os

nossos jovens continuarem a investir na sua própria educação. Quer seja no abandono escolar precoce, quer

seja por, em todos os anos, termos fixado novos máximos de alunos a frequentarem o ensino superior.

Esta é uma diferença capital, porque, quando compara o ritmo de crescimento de algumas economias de

leste com o ritmo de crescimento de uma economia como a portuguesa, a direita omite sempre um dado, que é

o seguinte: o ponto de partida de cada um em 2004.

Em 2004, quando todos esses países entraram para a União Europeia, 75% da sua população tinha, pelo

menos, o ensino secundário. Em 2004, em Portugal, só 25% da população tinha, pelo menos, o ensino

secundário.

Esta diferença de qualificações explica, em grande medida, a diferença de produtividade, mas não só. Há

outra explicação, que tem que ver com o tipo de produtos e serviços que a nossa economia produz e, também,

com a qualidade da gestão, como a Fundação José Neves sinaliza no estudo que ontem apresentou.

É por isso que as agendas mobilizadoras, que ontem foram apresentadas, são da maior importância. De uma

vez por todas, passámos da fase do discurso, em que o sistema científico e as empresas têm de dialogar, para

uma fase em que foi forçada a constituição de consórcios, tendo-se juntado empresas e entidades do sistema

científico e tecnológico para formarem 51 consórcios.

Aplausos do PS.

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São 51 consórcios que mobilizam mais de 1200 entidades e se propõem a investir 7700 milhões de euros,

nos próximos anos, para conseguirem produzir mais 2200 novos produtos, serviços ou patentes.

O apoio máximo do financiamento público é de 3000 milhões de euros, sendo que cerca de dois terços são

para investigação e desenvolvimento e metade desse valor se destina, exclusiva e diretamente, às entidades do

sistema científico e tecnológico.

Este é o maior investimento concentrado feito em poucos anos e tem um enorme potencial transformador do

perfil da economia portuguesa.

Se usarmos o modelo, utilizado pela Comissão Europeia, de impacto deste investimento em concreto a 20

anos, o contributo que dará para a transformação da economia portuguesa é absolutamente gigantesco.

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem de concluir.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Concluo, Sr. Presidente, pedindo desculpa pelo meu entusiasmo.

O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Foi uma promessa!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Isto significa que é mesmo neste caminho que temos de prosseguir, resistindo

com nervos de aço aos problemas do dia, para continuarmos a seguir, com coerência e determinação, a

estratégia que definimos para a década e que, passo a passo, temos prosseguido.

Contra ventos e marés, com COVID ou sem COVID, não desistimos. Vamos prosseguir e levar essa

estratégia até ao fim.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para fazer perguntas em nome do Grupo Parlamentar do PSD, o

Sr. Deputado André Coelho Lima.

O Sr. André Coelho Lima (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo,

surpreendentemente, o debate fugiu para a semântica ideológica. Ou seja, o Sr. Primeiro-Ministro está a dizer-

nos que o PSD tem dificuldades em definir-se — foi atrás da coordenadora do Bloco de Esquerda! Todos querem

ser sociais-democratas! —, esquecendo-se do próprio partido a que preside, que é o Partido Socialista. O espaço

da social-democracia, Sr. Primeiro-Ministro, está muito bem preenchido pelo PSD.

Aplausos do PSD.

Risos do Primeiro-Ministro.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Já não se vê a diferença entre o Partido Social Democrata e o Partido Socialista!

O Sr. André Coelho Lima (PSD): — Disto isto, Sr. Primeiro-Ministro, e porque também falou em boa

governação, queria falar-lhe de um tema que tem quase dois meses, mas que é muito importante. É sobre o que

aconteceu em Setúbal, na receção a refugiados ucranianos.

Vou deter-me nos factos. O primeiro facto é o de que essa receção foi feita por cidadãos russos,

concretamente pelo Sr. Igor Kashin.

O segundo facto é o de que, nesse acolhimento, foram fotocopiados documentos — procedimento que, como

o Sr. Primeiro-Ministro sabe, não é aconselhado — e feitas perguntas manifestamente desnecessárias e

incómodas, como a do paradeiro dos maridos das senhoras que estavam a ser recebidas no nosso País.

O terceiro facto é o de que Igor Kashin foi presidente do Conselho de Coordenação dos Compatriotas Russos

e, ainda, presidente da Casa da Rússia, sendo também conhecidas as suas ligações à Embaixada da Rússia.

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O quarto facto é o de que o Estado, através do IEFP (Instituto do Emprego e Formação Profissional), da

segurança social e do Alto Comissariado para as Migrações, tem relações habituais com este gabinete, neste

município.

Apresentados estes factos, digo o óbvio, Sr. Primeiro-Ministro: não há nenhuma desconfiança relativamente

a cidadãos russos ou com dupla nacionalidade — sendo uma delas russa e a outra portuguesa — residentes

em Portugal, mas estes factos são, por si só, naturalmente merecedores, pelo menos, da atenção do Estado

português.

Sr. Primeiro-Ministro, o PSD tem plena consciência da delicadeza desta matéria, sabe muito bem os limites

do segredo de Estado e tem, igualmente, o maior respeito pelos serviços de informações e pela natureza

classificada da sua atuação, mas esta é uma questão da maior importância. Está em causa a imagem

internacional de Portugal — como já disse noutro debate —, está em causa a confiabilidade do nosso País aos

olhos do mundo e, devo dizê-lo, está em causa a nossa própria confiança na competência das nossas

instituições.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, o PSD fez o seu papel na Assembleia da República, entidade fiscalizadora,

requerendo a audição de um conjunto de entidades, que foram ouvidas.

Dessas audições resultou, em primeiro lugar, que os serviços de informações tinham as atividades destas

organizações e cidadãos devidamente monitorizadas. Recordo o que é público do relatório do Conselho de

Fiscalização do SIRP (Sistema de Informações da República Portuguesa), que diz, e cito, que «testemunha

ainda o quanto o atual conflito na Ucrânia permitiu revelar, em diferentes momentos — necessariamente

classificados —, a qualidade dos serviços de informações de Portugal», e permitiu ainda concluir, em segundo

lugar, que essas informações foram transmitidas a quem de direito, isto é, ao Sr. Primeiro-Ministro, que, como

sabe, tem a tutela direta dos serviços de informações.

Leio-lhe as passagens do que foi público nessas audições: «Não podendo dizer que informações em concreto

foram passadas, se me pergunta se alguma informação não foi passada, respondo que não. O mecanismo de

fluxo comunicacional está a funcionar, não houve nenhuma informação que deixasse de circular por onde tem

de circular e por quem tem de circular.» Foi ainda dito que os serviços cumpriram as suas competências —

acompanharam e informaram —, e que os relatórios foram feitos e transmitidos. Tudo resultou destas audições.

Em função disto, Sr. Primeiro-Ministro, resta fazer a pergunta sacramental: o que fizeram o Sr. Primeiro-

Ministro e o seu gabinete com essas informações?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Coelho Lima, vou responder.

Vozes do PSD: — Ah!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Em primeiro lugar, relativamente aos relatórios dos serviços de informações que

me são disponibilizados, faço o que me compete fazer. Compete-me, designadamente, não dizer mais, porque,

como o Sr. Deputado sabe, há formas próprias de a Assembleia da República acompanhar a atividade dos

serviços de informações e de conhecer a informação por estes produzida.

Se o Sr. Deputado tem dúvidas sobre se o Primeiro-Ministro de Portugal agiu adequadamente, ou não, em

função de uma informação específica, a única coisa que lhe posso dizer, em boa consciência, é que, nestes seis

anos, tenho agido sempre adequadamente em função das informações que me foram disponibilizadas.

Aplausos de Deputados do PS.

Quanto ao que ocorre na Câmara Municipal de Setúbal, somos um Estado de direito democrático em que

vigora o princípio da autonomia do poder local e, portanto, a fiscalização da atividade dos diferentes municípios

decorre de uma forma própria.

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Perante esse caso, aquilo que o Governo fez foi o que lhe competia: como sabe V. Ex.ª, que é um ilustre

jurista, o Governo só tem uma tutela de mera legalidade, pelo que a Sr.ª Ministra da Coesão Territorial ordenou

à IGF (Inspeção-Geral de Finanças) que procedesse a uma verificação para aferir se houve alguma ilegalidade

cometida pelo município de Setúbal. Aguardamos conclusões da IGF e, portanto, não tiramos ilações

antecipadas.

Também foi suscitada uma dúvida sobre uma violação da lei de proteção de dados, e isso foi participado à

Comissão Nacional de Proteção de Dados para que verificasse se houve alguma violação.

Foi isto que aconteceu e é isto que tenho a dizer relativamente a esse caso.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado André Coelho Lima, do Grupo Parlamentar

do PSD.

O Sr. André Coelho Lima (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o artigo 17.º da Lei Quadro do

SIRP, a Lei n.º 4/2014, diz que é competência do Primeiro-Ministro manter especialmente informado o Sr.

Presidente da República sobre estas atividades.

Pergunto-lhe, muito diretamente: informou o Presidente da República da perigosidade de alguma destas

atividades?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Coelho Lima, em primeiro lugar, o

entendimento que tenho sobre os meus deveres perante a lei do segredo de Estado impede-me de lhe dizer se

recebo ou não recebo relatórios sobre esta ou aquela matéria, se os relatórios incidem sobre esta ou aquela

instituição ou se incidem sobre esta ou aquela pessoa. Entendo que é meu dever não me pronunciar

publicamente sobre essa matéria.

O Sr. Deputado leu um relatório da Comissão de Fiscalização do SIRP, que elogia, aliás, os serviços que

estão na minha dependência pela qualidade do desempenho da sua atividade. Fico muito satisfeito que a

Comissão de Fiscalização faça essa avaliação positiva de um serviço que depende diretamente de mim.

Quanto às relações entre o Primeiro-Ministro e o Presidente da República, são precisamente isso: relações

entre o Primeiro-Ministro e o Presidente da República, que decorrem estritamente entre nós. Ao longo destes

seis anos, quer com o ex-Presidente da República, quer com o atual Presidente da República, não me recordo

de alguma vez algum de nós ter comentado publicamente aquilo que foi, ou não, dito nas conversações que

mantemos. Pela minha parte, mantenho essa regra.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado André Coelho Lima.

O Sr. André Coelho Lima (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, à pergunta que fiz respondeu o

Sr. Presidente da República, tendo dito que se dizia publicamente que a Presidência da República teria tido

conhecimento da existência de intervenções específicas de Estados terceiros na matéria de acolhimento de

refugiados e conhecimento antecipado do caso de Setúbal. «Não tivemos», disse o Sr. Presidente da República.

Quanto à obrigatoriedade de o manter informado, li a lei e penso que basta.

Em seguida, relativamente àquilo que o Sr. Primeiro-Ministro disse, temos bem noção — eu disse isso no

início! — dos limites do segredo de Estado. Não queremos saber o conteúdo desses relatórios, não queremos

nenhuma informação que esteja a coberto do segredo de Estado nem sequer queremos saber se recebeu esses

relatórios, porque nós já sabemos.

Sr. Primeiro-Ministro, nós já o sabemos, tanto por aquilo que referi como pelas declarações do Sr. Presidente

da República, que disse, e cito: «Depois de a comunicação social ter falado na questão de Setúbal, nós» —

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Presidência da República — «tivemos conhecimento e tivemos confirmação daquilo que veio na comunicação

social.» Portanto, isto é claro!

A partir deste momento, Sr. Primeiro-Ministro, a não ser que considere — o que seria inédito! — que o

Sr. Presidente da República violou, também ele, o segredo de Estado, sabemos que: primeiro, o Sr. Presidente

da República confirmou o recebimento da informação e, segundo, ela confirma o que veio na comunicação

social.

Posto isto, volto a perguntar: o que fez o Sr. Primeiro-Ministro com essa informação?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado André Coelho Lima, não quero ser desagradável,

mas não vou acrescentar rigorosamente mais nada àquilo que disse.

Se o Sr. Deputado entende que eu não cumpri os meus deveres, faça o favor de agir em conformidade junto

das autoridades competentes.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para fazer perguntas, tem agora a palavra o Sr. Deputado João Marques, do PSD.

O Sr. João Marques (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, passaram-se

cinco anos dos grandes incêndios de 2017 e o balanço das políticas públicas prometidas e anunciadas para o

território é, infelizmente, uma desilusão. Nem mesmo o PRR parece ir no caminho do rejuvenescimento dos

territórios afetados pelos incêndios nem dos desafios no âmbito da propriedade rústica de ocupação florestal.

Que resposta tem o Sr. Primeiro-Ministro para o País, em particular para aquelas regiões onde, passados

cinco anos, está tudo na mesma ou pior do que em 2017?

Mais: que resposta tem para os proprietários que estão a ser pressionados por algumas empresas de energia

fotovoltaica para arrancarem e cortarem as árvores, aceitando, no seu lugar, mediante renda ou venda, a

colocação de painéis fotovoltaicos?

Sendo a floresta de produção um contribuinte líquido para o sequestro de carbono, qual a lógica desta opção

sem a obrigatoriedade de compensação de plantação de floresta devidamente ordenada, múltipla e respeitadora

da biodiversidade em área igual à ocupada pelos painéis fotovoltaicos?

Para o PSD, o Governo esquece o essencial, que é a promoção de formas que tornem a floresta rentável,

para que gere um rendimento atrativo, e, assim, inverter a tendência de abandono do território, mudar a

paisagem e suster o crescente risco de incêndio. Economia, ambiente e floresta de produção e de conservação

não podem ser incompatíveis.

Sr. Primeiro-Ministro, além da formalidade da assinatura dos protocolos para a constituição das AIGP (Áreas

Integradas de Gestão da Paisagem), qual é o modelo de gestão e constituição dos seus órgãos? Quando

começam as ações no terreno? Que anda a fazer a Florestgal e quantos hectares já conseguiu contratualizar?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Marques, fico feliz por, pela primeira vez,

alguém olhar para o tema dos incêndios florestais na ótica segundo a qual se deve olhar: do ponto de vista

estrutural, sobre a estrutura da floresta.

Aquilo que temos feito, de 2017 em diante, é executar, paulatinamente, a estratégia definida e que, aliás, foi

inspirada na comissão criada nesta Assembleia da República, tendo em vista a transformação estrutural da

floresta portuguesa. Essa transformação estrutural tem diferentes componentes: uma, básica e essencial,

relacionada com a conclusão do processo de cadastro, que tem vindo a ser desenvolvido através do BUPi

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(Balcão Único do Prédio), no Ministério da Justiça; através das políticas de definição de planos de paisagem,

por parte do Ministério do Ambiente; por novas formas de gestão florestal que têm vindo a ser implementadas

no terreno; e pela execução das redes estruturais de proteção da floresta, que têm, aliás, uma dotação

significativa no âmbito do PRR para poderem ser concluídas.

Esse é, como sabemos, um trabalho em contrarrelógio, porque, infelizmente, o fogo tem um ciclo, e temos

de prosseguir com esse trabalho porque o ciclo também se esgota. É um trabalho que temos vindo a fazer, que

iremos continuar a desenvolver e para o qual temos contado com a colaboração preciosa das autarquias locais.

Relativamente à instalação e ao licenciamento de painéis fotovoltaicos, a União Europeia prevê, agora,

agilizar bastante o processo de licenciamento desses projetos, designadamente, dispensando a existência de

estudos de impacto ambiental projeto a projeto e passando a permitir que eles sejam feitos por áreas vastas,

por zonas e por regiões. Isso é absolutamente essencial para assegurarmos o processo de transição energética.

Sim, a floresta é um sumidouro de carbono, mas temos de ter uma floresta ordenada, porque, senão, ela

torna-se num grande emissor de carbono, e, nos últimos anos, as grandes emissões de carbono no nosso País

têm tido como fonte os grandes incêndios florestais. A melhor forma de o prevenir é fazendo, mesmo, a reforma

da floresta.

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada do PSD Cláudia André.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado João Marques, do PSD.

O Sr. João Marques (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, debrucemo-nos, agora, sobre a

prevenção e o combate aos fogos rurais. Finalmente, o Governo abriu, ou vai abrir, um concurso para a gestão,

funcionamento e atualização do SIRESP (Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de

Portugal) para os próximos cinco anos, o que saudamos.

Mas, pergunto: tendo em conta os prazos e os procedimentos da contratação pública e tendo em conta que

o atual contrato termina no final de 2022, no final deste ano, garante que não haverá atrasos? Será adjudicado,

face à instabilidade e subida de preços do mercado? Vem a tempo de estar operacional em 2023? Qual o plano

do Governo se tal situação vier a ocorrer?

Relativamente às comunicações, pergunto: a fibra ótica cobre todo o território nacional? Foi colocada nas

calhas técnicas subterrâneas existentes e devolutas para evitar a sua destruição pelo fogo? E os drones — para

não falar da novela dos Kamov — estão todos operacionais, ou continua metade no estaleiro?

Sr. Primeiro-Ministro, também temos conhecimento de muitas dificuldades em operacionalizar alguns meios

constantes do dispositivo de prevenção e combate. É que não há pessoal disponível e devidamente formado

para constituir as EIP (equipas de intervenção permanente) e os centros de meios aéreos, também com os

sapadores, e, quando se constituem, faltam bombeiros para outras ações e necessidades.

Esta situação está a ser dramática em muitos concelhos do interior de baixa densidade demográfica. Como

ultrapassar o problema, Sr. Primeiro-Ministro? Não será necessário revisitar a sua carreira profissional e

remuneratória para a tornar mais aliciante e apelativa? É que, se nada for feito, Sr. Primeiro-Ministro, o problema

vai, certamente, agravar-se nos próximos anos.

Por fim, relativamente à carta de perigosidade, em que ficamos, Sr. Primeiro-Ministro? Está suspensa para

constituição de um grupo de trabalho e para discussão com as organizações do setor e autarquias, como

garantiu a Sr.ª Ministra da Coesão Territorial? Ou está em vigor e, obrigatoriamente, a ser integrada nos planos

diretores municipais, como dizem outros membros do Governo e Deputados do Partido Socialista?

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. João Marques (PSD): — É fundamental para todos que o Sr. Primeiro-Ministro esclareça esta

confusão, a bem das autarquias. Naturalmente, os nossos autarcas muito agradecem.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, quanto ao dispositivo, o Sr. Ministro da

Administração Interna teve oportunidade, ainda recentemente, de o apresentar publicamente, com o seu reforço

e a sua operacionalidade. Portanto, é uma informação pública que foi prestada ainda recentemente.

Relativamente à questão concreta que colocou, sobre a carta de perigosidade, aquilo que o Governo

entendeu foi prorrogar o prazo, para dar mais tempo aos municípios para poderem integrá-la nos PDM (planos

diretores municipais).

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para formular perguntas, o Sr. Deputado Pedro Pinto, do Grupo

Parlamentar do Chega.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados, no

princípio, quando olhámos para o Governo, vimos alguns ministros a prazo. Dou-lhe três exemplos, Sr. Primeiro-

Ministro: Fernando Medina, um amigo da Rússia que foi para Ministro das Finanças numa altura em que a

Ucrânia e a Rússia estavam em guerra, numa altura em que a Europa estava em guerra; a Ministra da Saúde,

que já estava a prazo antes da COVID-19; e o Ministro dos Negócios Estrangeiros, que só não é Ministro da

Defesa porque o Sr. Presidente da República não deixou.

Creio que será histórico, bastaram dois meses e meio para deixar o País no caos. Nem José Sócrates,

saudoso para tantos socialistas, o conseguiu. Caos na saúde, caos no aeroporto, caos na segurança do País.

Este é o Governo que só procura fazer alguma coisa quando o caos está instalado.

Hoje, até já vimos uma coisa curiosa, um piscar de olho de António Costa ao Iniciativa Liberal. Foi bonito!

Pela nossa parte, ficamos satisfeitos por não nos piscar o olho, porque é sinal de que estamos no caminho certo.

Aplausos do CH.

Depois, ouvimos também o Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias, assessorado pelo Sr. Deputado João

Torres,…

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Assessorado?!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — … dizer que estão muito orgulhosos do SNS. Há 1 milhão e 300 mil pessoas sem

médico de família, que orgulho! Trezentos dias à espera de uma consulta, que orgulho!

Protestos do Deputado do PS Eurico Brilhante Dias.

Há doentes nos corredores dos hospitais e, por vezes, nas garagens. Que orgulho, Srs. Deputados! Bebés

do distrito de Portalegre — onde o PS tem dois Deputados eleitos, os únicos do distrito de Portalegre — que vão

nascer a Espanha. Que orgulho, Srs. Deputados, neste Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do CH.

Não, Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias, a culpa não é da COVID-19, como o senhor disse.

Vejamos, em 2018: «Caos nas urgências. O que se está a passar nos hospitais portugueses?»; «Enfermeiros

denunciam caos nas urgências de Faro»; em Guimarães, «macas até na receção do hospital»; em Leiria,

«enfermeiros denunciam falta de condições»; «Dez doentes internados em macas nas urgências do hospital de

Gaia.» Em janeiro de 2020, quando ainda não havia COVID-19, notícia de Portalegre: «Doentes em ‘cadeirões’

por falta de macas nas urgências.»

O orador exibiu documentos impressos com os títulos de notícias que citou.

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É este o legado do Partido Socialista, é este o SNS de que tanto se orgulha o Partido Socialista.

Aplausos do CH.

Sr. Primeiro-Ministro, depois de umas eleições onde havia grandes outdoors, com a sua cara e também com

o símbolo do Partido Socialista, a dizer «vamos contratar milhares de profissionais de saúde», pergunto-lhe:

onde estão esses profissionais de saúde? Para onde é que foram contratados? E porque é que está o caos

montado nos hospitais portugueses?

Aplausos do CH.

A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — São 25 000!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Pinto, a resposta à sua pergunta é bastante

fácil: de dezembro de 2015 até maio deste ano, foram contratados mais 24 674 profissionais para o Serviço

Nacional de Saúde.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — São entradas automáticas das PPP!

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado Pedro Pinto, do Chega.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, quero dizer-lhe apenas que as pessoas que

estão numa lista de espera, a aguardar por uma consulta, não conseguem perceber essas suas palavras, não

conseguem perceber onde estão os profissionais de saúde e também não percebem porque é que, nas

urgências pediátricas dos hospitais de Portimão e de Faro, por exemplo, as crianças não conseguem ser

atendidas durante a noite.

Portanto, ou esses números não são reais ou, se o são, pelo menos não se veem nem se sentem nos

hospitais portugueses.

Vamos falar do caos no aeroporto. Percebeu-se, claramente, que a extinção do SEF (Serviço de Estrangeiros

e Fronteiras) — que não sabemos se o Sr. Primeiro-Ministro vai reverter ou não, mas esperamos que sim — é

um problema ideológico. Foi um favor que o Partido Socialista e o seu Governo fizeram ao Bloco de Esquerda.

Todos nós sabemos isso, pois é uma coisa que está na cara de toda a gente.

Pergunto: como é que vê as declarações do seu Ministro da Administração Interna, que ameaça com a

demissão dos responsáveis do SEF se houver novo caos no aeroporto?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, vejo como é óbvio: quando há incumprimento de

uma orientação superior deve-se agir. É isso que existe numa cadeia hierárquica.

O que aconteceu naquele dia foi o incumprimento de uma orientação e a ausência de comunicação à direção

nacional do SEF para ativação da equipa de contingência, tendo em conta que tinha havido um desembarque

simultâneo de 3000 passageiros e, portanto, seria necessário haver um reforço. Isso não foi comunicado, foi

uma falha. O Sr. Ministro sinalizou o que lhe competia sinalizar e, repetindo-se isto, haverá demissão.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Pinto.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, ficámos, então, a saber que houve um

incumprimento por parte do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e que foi por isso que aconteceu o caos no

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aeroporto. Esperemos que isso não volte a acontecer, senão teremos de tirar algumas ilações também sobre o

SEF.

Sr. Primeiro-Ministro, se aconteceu o que aconteceu com o SEF em funcionamento, imaginando que vamos

extingui-lo e que vamos lá meter elementos da PSP (Polícia de Segurança Pública) e da GNR (Guarda Nacional

Republicana), pergunto-lhe se acha possível, em dois meses, dar formação a esses elementos para que

consigam substituir os elementos do SEF, que têm mais de 30 anos de carreira?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, primeiro, ao contrário do que diz, a extinção do

SEF não foi uma ideia do Bloco de Esquerda nem do PCP ou do Partido Ecologista «Os Verdes». Se for ver o

programa eleitoral do Partido Socialista e o Programa do Governo do PS de 2019, o que se previa era a

separação entre as funções policiais e as funções administrativas, atribuindo as funções policiais a um conjunto

de outras polícias: Polícia Judiciária, Guarda Nacional Republicana e Polícia de Segurança Pública.

Ainda ontem, os Srs. Deputados tiveram oportunidade de ouvir os dirigentes máximos destas forças e

serviços de segurança e todos confirmaram estarem em condições e a preparar-se para exercerem em pleno

estas funções.

Devo dizer-lhe que, entre atribuir estas funções a instituições que têm 23 000 homens e mulheres nos seus

quadros ou mantê-las numa instituição que tem cerca de 1000 inspetores, nós entendemos que a capacidade

de resposta é bastante diferenciada e que as sinergias geradas pela integração das competências que estão

atribuídas ao SEF, em matéria de investigação criminal, numa única polícia — como a Polícia Judiciária, com

um corpo superior de polícia altamente especializado no crime mais complexo, organizado e transnacional —

são muito significativas para o combate à criminalidade em Portugal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado Pedro Pinto.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, ainda bem que falou da criminalidade em

Portugal. É que, nos últimos dias, quem acompanha as notícias sente que existe um grande aumento da

criminalidade em Portugal, particularmente nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, com gangues de

jovens, entre os 12 e os 16 anos, a espalharem o terror em algumas zonas.

A pergunta que lhe faço é muito simples: que reforço irá dar à PSP para combater esses gangues?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, o Sr. Deputado Pedro Pinto conhece o Relatório Anual de

Segurança Interna, acerca da evolução da criminalidade, e certamente que deposita total confiança na

capacidade das nossas forças de segurança para lidarem com os nossos fenómenos criminais. Se dúvidas

houvesse, saiu hoje o novo relatório sobre o índice de segurança internacional e Portugal recuperou, passando

da 4.ª para a 3.ª posição. Portanto, voltámos a ser o terceiro país mais pacífico e seguro do mundo.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Pinto.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, percebo que o PS goste muito desses

números e de falar de relatórios do ano passado, disto e daquilo, mas estamos a falar da atualidade.

O Sr. Primeiro-Ministro: — É de hoje!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Mas o relatório não foi feito hoje, obviamente!

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A Sr.ª Ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares (Ana Catarina Mendes): — O relatório saiu hoje!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Estamos a falar de uma coisa muito simples. Ainda ontem, na Praia da Rocha,

no Algarve — sei que o Sr. Primeiro-Ministro sabe muito bem onde é e que também gosta bastante da Praia da

Rocha — um bar foi destruído e um posto da PSP, ali ao lado, estava fechado. Sabe porquê? Porque não havia

elementos das forças de segurança, ou seja, não têm homens para estar ali.

Foi notícia: «Marina de Vilamoura, ex-libris do Algarve, onde se trafica droga à luz do dia.» Sabe porquê?

Porque não há elementos, nem da PSP, nem da GNR, para controlar isso.

Este é o problema, este é o País real. Não são números, não são relatórios, é o que existe neste momento

em Portugal. Faltam meios, faltam homens, faltam viaturas. Falta tudo às forças de segurança. Faltam

condições, àqueles homens que estão ali em cima nas galerias, para trabalhar e é isto que temos de resolver.

A PSP, a GNR e todas as forças de segurança têm de ter condições para trabalhar, mas o Governo do Partido

Socialista não lhas dá.

O que é que o Sr. Primeiro-Ministro pensa fazer nesta região do Algarve, por exemplo, ou até noutras regiões

do País, onde sabemos que, no verão, a população aumenta muito?

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, há várias formas de analisar a evolução da

criminalidade. Uma é lendo as notícias do dia e definindo uma política criminal em função das mesmas.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — É o dia a dia! É importante.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Num dia há um assalto a um banco e passamos a achar que o grande problema

da criminalidade em Portugal são os assaltos a bancos. Noutro dia a notícia é de que houve um assalto a um

bar e passamos a achar que o grande problema da criminalidade são os assaltos a bares.

Ora, as políticas criminais não são feitas com a notícia do dia. As políticas criminais têm de assentar em

informação consolidada e é por isso que o nosso sistema de segurança interna criou o Relatório Anual de

Segurança Interna, para permitir, precisamente, ter informação consolidada. Cada um desses eventos criminais

é registado pela competente força de segurança e podemos ver, não só, qual é o resultado em cada ano, como

também a evolução ao longo dos anos. É isso que nos permite definir uma política criminal.

Felizmente, em Portugal, há quase 15 anos, diria eu, as políticas criminais são bastante consensuais e, aliás,

é essa estabilidade que tem permitido que as forças de segurança tenham as condições, que o País criou, para

alcançar estes resultados.

Não somos o terceiro país mais seguro do mundo hoje, temo-lo sido ao longo dos vários anos anteriores,

antes até de eu ser primeiro-ministro, e é essa continuidade de estabilidade da política criminal que nos tem

permitido ter bons resultados.

Isto significa que não há crimes? Claro que há crimes. Há carteiristas, assaltos a bancos, violações,

homicídios, há todos esses crimes. Claro que existem, mas temos de enquadrar cada um desses factos criminais

no seu conjunto e analisá-los. É em função disso que se define uma política criminal e que as forças de

segurança organizam a sua estratégia de ação policial, que, felizmente, tem garantido o nível de segurança que

o País tem.

É assim que se tem de trabalhar, Sr. Deputado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Pedro Pinto ainda dispõe de 9 segundos. Quer usá-los?

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sim, Sr. Presidente.

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O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, é isso que queremos, forças de segurança

com condições para trabalhar, mas é isso que, por vezes, não existe. Temos viaturas que são quase do século

passado, esquadras da polícia onde chove lá dentro… Enfim, poderia enumerar uma série de coisas, mas não

tenho tempo para isso agora.

Creio que a frase deste debate foi dita pelo Sr. Primeiro-Ministro há pouco: «Os portugueses estão mais

ricos.» Acho que quem está lá em casa não quer acreditar naquilo que ouviu! Nós próprios, que estávamos aqui,

não acreditámos, pois Portugal tem 2 milhões de pobres e 4 milhões a caminho da pobreza. Está aqui, não é

uma notícia do Chega, é uma notícia do que acontece neste momento em Portugal!

O orador exibiu a notícia que mencionou.

A pergunta que lhe faço é a seguinte: consegue dizer a estes 4 milhões de portugueses no limiar da pobreza

que estão mais ricos hoje?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Pinto, concluindo a conversa sobre as forças

de segurança, devo dizer-lhe que este ano entrarão mais 1600 efetivos na Guarda Nacional Republicana e mais

1000 efetivos na Polícia de Segurança Pública. Temos vindo, sempre, a aumentar o número de efetivos e vamos

continuar a fazê-lo.

Sr. Deputado, não brinque com as palavras, porque estamos a falar de coisas muito sérias. A pobreza não é

retórica!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Exatamente! Por isso é que não pode dizer que os portugueses estão mais ricos!

O Sr. Primeiro-Ministro: — A pobreza não são aqueles fantasmas que os senhores agitam na campanha

eleitoral, das pessoas que recebem subsídios e têm Mercedes e Porches à porta. A pobreza não é isso, a

pobreza são pessoas que estão, efetivamente, em situação de carência ou de carência extrema.

O que eu disse foi que o conjunto do País enriqueceu. O conjunto do País tem hoje mais riqueza do que tinha

em 2015 e foi por isso que o PIB percapita aumentou 20%. O PIB percapita ter aumentado é uma estatística,

ou seja, não foi o seu rendimento nem o meu que aumentaram 20% nestes anos — o meu tem estado congelado

—, mas é essa a realidade do País.

Essa realidade não esconde nem elimina outra realidade do País, porque isto acontece apesar de haver

esses níveis de pobreza. É por isso que a redistribuição da riqueza é um elemento fundamental para a coesão

nacional, para a coesão social, porque o País não pode estar a enriquecer com uns a ganharem muito e outros

a continuarem na pobreza.

Felizmente, ao longo dos últimos anos, mesmo apesar da COVID, os níveis de pobreza têm-se reduzido, em

especial nos segmentos sociais para os quais têm sido dirigidas políticas direcionadas.

Protestos do Deputado do CH Pedro Pinto.

Os senhores, que são os campeões contra as prestações sociais,…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Somos, somos!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … deveriam ter a noção de qual seria a percentagem de portugueses que

estariam abaixo do limiar de pobreza sem essas prestações sociais. Sabe qual seria? Seria de 43%!

Protestos dos Deputados do CH Bruno Nunes e Pedro Pinto.

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O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem de concluir, por favor.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Isto é para que os senhores tenham consciência da importância das prestações

sociais como instrumento de combate à pobreza.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para fazer perguntas, a Sr.ª Deputada Joana Cordeiro, do Grupo

Parlamentar do Iniciativa Liberal.

A Sr.ª Joana Cordeiro (IL): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs.

Deputados, em julho de 2019, o Sr. Primeiro-Ministro afirmou, e cito, que o SNS «merece todo o carinho e que

seja a joia da coroa do investimento do PS na próxima Legislatura. Temos de ter um SNS mais próximo dos

cidadãos e com mais recursos para prestar melhores serviços aos portugueses.»

Passou a anterior Legislatura, iniciou-se esta, o senhor continua a ser primeiro-ministro e, passados três anos

destas suas declarações, o SNS está no estado em que todos sabemos, conforme foi evidente nos últimos dias.

Fernando Araújo, ex-Secretário de Estado da Saúde de um Governo seu, disse e cito: «A paixão pelo SNS

está a desaparecer, o orgulho de pertencer a esta equipa dissipa-se diariamente. Salários baixos, progressão

lenta ou inexistente, (…) trabalho insano, sem um fio condutor. O sistema está burocrático, (…) nada focado na

excelência da gestão.»

Adalberto Campos Fernandes, ex-Ministro da Saúde de um Governo seu, disse e cito: «É preciso definir o

caminho e prioridades, porque não vamos conseguir fazer tudo para todos. As pessoas pagam impostos, pagam

muitos impostos e por isso têm a legítima expectativa e o legítimo direito de ver as suas necessidades satisfeitas,

independentemente do local e da forma como elas são satisfeitas.»

Marta Temido, sua Ministra da Saúde desde 2018, disse, em 2016, numa entrevista: «Os meus pais foram

ambos operados no privado porque eram beneficiários da ADSE (Instituto Público de Gestão Participada). Foi

uma opção expressa por causa dos tempos de espera.» Nesse seguimento, disse também que «ninguém que

tenha 60 anos e esteja ativo está disponível para ficar com dores à espera de uma prótese da anca» e, ainda,

que «as pessoas que podem vão à procura de soluções alternativas». A mesma Marta Temido que, em 2020,

já Ministra, afirmou que não acredita num «modelo de saúde de supermercado, baseado em vales, vales-

consulta, vales-cirurgia», nega, assim, essa solução alternativa a todos o que não têm dinheiro para a pagar do

seu bolso.

Sr. Primeiro-Ministro, o que quer, afinal, o PS para o SNS? Em que ficamos? Para o Sr. Primeiro-Ministro, o

SNS é a joia da coroa ou é uma bijuteria barata?

Aplausos do IL.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Joana Cordeiro, para o PS, o SNS é, seguramente,

a joia da coroa.

A Sr.ª Joana Cordeiro (IL): — Não se nota!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Foi por isso que foi o PS que criou o SNS e é precisamente por isso que é com

o PS que o SNS tem vindo a melhorar.

Seguramente que o SNS não seria assim com o Iniciativa Liberal, porque o que o Iniciativa Liberal queria era

uma saúde de vale de correio…

A Sr.ª Maria Antónia de Almeida Santos (PS): — Como nos Estados Unidos!…

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O Sr. Primeiro-Ministro: — … e não uma saúde como a prestada pelo Serviço Nacional de Saúde, pública,

universal e tradicionalmente gratuita, como está previsto na Constituição.

O SNS tem problemas? Tem e é por isso que estamos cá, para continuar a trabalhar, para melhorar e

resolver, um a um, esses problemas. É o que continuaremos a fazer, Sr.ª Deputada.

O Sr. Presidente: — Para fazer perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Rodrigo Saraiva, do Iniciativa

Liberal.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.

Primeiro-Ministro, já causou um mal-estar no Deputado Pedro Pinto, que fez uma cena de ciúmes porque o

senhor andaria a piscar o olho ao Iniciativa Liberal.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Graças a Deus!

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Estejam à vontade! Sigam em frente!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Graças a Deus, a realidade dos factos demonstra bem quem é próximo de

quem, como vimos, ainda recentemente, por ocasião da discussão do Orçamento do Estado, em que o partido

que mais votou a favor as propostas do PS foi o Chega e quem mais votou contra foi o Iniciativa Liberal.

Aplausos do IL.

Protestos do Deputado do CH Pedro Pinto.

Sr. Primeiro-Ministro, temos de falar sobre a questão do acolhimento dos refugiados em Setúbal.

Como o Sr. Deputado André Coelho Lima já falou — e bem! —, este é um tema que, infelizmente, teve de vir

a debate em Plenário. E teve de vir, não apenas porque o PSD se lembrou, mas, sim, porque o Partido Socialista

inviabilizou que o Sr. Primeiro-Ministro viesse ao sítio que achamos ser o adequado para falarmos e

escrutinarmos este tema, que seria em comissão, onde as questões do segredo de Estado estariam garantidas.

Mas aqui estamos, por culpa do PS.

Ouvi muito bem — e penso que para bom entendedor poucas palavras bastam — a análise que o Sr.

Deputado André Coelho Lima fez do que aconteceu nas audições e também ouvi bem o que o Sr. Primeiro-

Ministro acabou de dizer aqui. Queremos acreditar que as pessoas estão a falar verdade e, ao que parece, as

coisas fluíram bem.

Mas há pouco, quando respondeu ao PSD, o Sr. Primeiro-Ministro cumpriu o guião do Partido Socialista e

do Governo nas audições e «apontou a espingarda» apenas à Câmara de Setúbal. Porém, os factos dizem que

aquele casal russo, que foi monitorizado pelos serviços secretos, manteve relações, protocolos, remunerações

com o IEFP ou o SEF, relativamente aos quais não há autonomia, pois dependem do Governo. Gostaria, então,

de saber porque é que não atuaram relativamente ao IEFP e ao SEF.

Aplausos do IL.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rodrigo Saraiva, se me permite um conselho, não

repita aquele exercício que o PSD fez durante toda a campanha eleitoral, de procurar competir com o Chega,…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — É um conselho de amigo!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … porque isso não dá votos, faz perder votos. Já tiveram uma boa maquia, não

a desperdicem nessa competição inútil com o Chega.

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Quanto à questão que me colocou, vou procurar responder-lhe de forma a manter-me, em consciência, no

perímetro da legalidade do segredo de Estado. De tudo o que é do meu conhecimento, nem o SEF nem o IEFP

cometeram qualquer ato ilegal ou sequer censurável.

Aplausos do PS.

Deixem-me só ser mais preciso: neste caso.

O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra o Sr. Deputado Rodrigo Saraiva.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, não vou voltar ao tema dos refugiados.

É demasiado grave para estarmos aqui, em Plenário, a esmiuçá-lo ainda mais.

Sr. Primeiro-Ministro, uma vez que, nos últimos tempos, a expressão «rolos compressores» voltou muito ao

léxico político, deve estar recordado de que, no dia 14 de janeiro, em debate, na televisão, com João Cotrim de

Figueiredo, este confrontou-o com um dos rolos compressores com que o Partido Socialista esmaga Portugal e

os portugueses, que é o das suas promessas.

Tenho de lhe falar, hoje, de outro rolo compressor, que aqui tenho, que é o do manancial de comissões de

acompanhamento, task forces e grupos de trabalho que existem neste País.

O orador exibiu, desenrolando até ao chão, uma longa folha de papel.

Risos do IL e de Deputados do PSD e do CH.

Vozes do PS: — Ah!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — É vasto, é longo, vou enrolá-lo, para não ficarem muito incomodados, mas é

vasto e longo.

Protestos do PS.

Vamos só destacar alguns: Grupo de Trabalho para Acompanhamento da Execução do Plano de

Recuperação e Resiliência — como se não houvesse um Governo! Grupo de Trabalho de Revisão da Despesa

Pública — como se não houvesse um Governo!

Continuação deprotestos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, peço condições para ouvir o Sr. Deputado Rodrigo Saraiva. Os Srs.

Deputados têm…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — De ir para a rua!

O Sr. Presidente: — … de se comportar.

Sr. Deputado Rodrigo Saraiva, faça favor de prosseguir.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sei que vos incomoda a diferença: é que nós desenrolamos e vocês enrolam

os portugueses.

Aplausos do IL.

Voltando à enumeração dos grupos de trabalho: Comissão para Acompanhamento da Execução do Regime

Jurídico do Internamento Compulsivo — como se não houvesse um Ministério da Saúde! Comissão de

Acompanhamento das Intervenções ao abrigo do Plano de Gestão Ambiental da Lagoa de Óbidos — como se

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não houvesse um Ministério do Ambiente! Grupo de Trabalho destinado à análise, revisão e implementação da

Carreira de Administração Hospitalar; Grupo de Trabalho para o desenvolvimento das Unidades de Cuidados

na Comunidade; Grupo de Apoio Técnico à Implementação das Políticas de Saúde. E gostei, particularmente,

destes dois: Grupo de Trabalho «Novo Bauhaus Europeu», que até tem como competência articular-se com a

Comissão de Acompanhamento da Arquitetura e da Paisagem, e Comissão com a missão de avaliar e

apresentar medidas concretas que promovam a utilização mais racional de todos os espaços do edifício-sede

do Ministério das Finanças.

Sr. Primeiro-Ministro, reconheço que, às vezes, é necessário criar alguns grupos de trabalho — de vez em

quando! —, mas, perante este manancial, que é uma autêntica banalização, não acha que esta banalização de

grupos de trabalho, de task forces, de subcomissões, é uma certidão de óbito à credibilidade dos serviços

públicos?!

Aplausos do IL.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rodrigo Saraiva, vejo que a imaginação dos

rolinhos se esgotou…

O Sr. Rui Rocha (IL): — As comissões e os grupos de trabalho é que não!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e, portanto, repete o número do Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo,

mas eu conservo o outro, para podermos fazer a prova dos factos.

Sr. Deputado, a única resposta que verdadeiramente me ocorre, porque é tão difícil a sua pergunta, é a de

que vou constituir um grupo de trabalho…

Risos do PS.

… para analisar se todos esses grupos de trabalho e task forces são efetivamente necessários.

Aplausos do PS.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sr. Presidente, é só para que fique registado, porque tentei cumprir e ser

poupado no meu tempo de intervenção, que aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro acabou de dizer até era uma

pergunta retórica que eu tinha para lhe fazer, que era a de saber se ele não iria sugerir a criação desse grupo

de trabalho.

Risos do IL.

O Sr. Presidente: — Para intervir, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, tem, agora, a palavra a Sr.ª

Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, a gratuidade das

creches continua a preocupar milhares de jovens famílias. A preocupação que está colocada é a de saber se o

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Governo vai ou não cumprir o que ficou estabelecido, por iniciativa do PCP, com as primeiras medidas tomadas,

em 2020, e, depois, com a lei aprovada nesta Assembleia, em novembro de 2021.

Vai ou não o Governo garantir a gratuidade das creches às crianças já anteriormente abrangidas e a todas

as que entrem no primeiro ano de creche? Que vagas vai o Governo considerar para esse objetivo e em que

instituições? Que critérios vai o Governo utilizar para assegurar às instituições o respetivo financiamento?

São questões simples e objetivas, que exigem respostas claras.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Paula Santos, sim, o Governo vai cumprir

exatamente o que consta do que foi aprovado na lei e o que consta do Orçamento do Estado. E isso começará

no próximo dia 1 de setembro.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, esperemos que, de facto, assim seja,

que aquilo que foi aprovado seja efetivamente cumprido e que nenhuma das crianças que seja abrangida por

esta medida fique de fora, por o Governo não pretender cumpri-la.

Sr. Primeiro-Ministro, depois de dois anos letivos atípicos, devido à epidemia, a recuperação de

aprendizagens assumia a maior relevância. E, mais uma vez, o Governo não assegurou as condições para que

as escolas dispusessem dos meios adequados. Estamos a falar de mais professores, de técnicos

especializados, da redução do número de alunos por turma.

Agora, que se está a preparar um novo ano letivo, importa saber o que está a fazer para assegurar que, no

início do próximo ano letivo, os estudantes tenham todos os professores, de todas as disciplinas.

A solução para este problema não passa pela retirada de direitos aos professores, como é exemplo o novo

regime de mobilidade por doença. São necessárias medidas imediatas, de que são exemplos as soluções

adiantadas pelo PCP, e que o PS recusou, ainda agora, na discussão do Orçamento do Estado, como a

atribuição de um apoio para os professores deslocados ou a vinculação de todos os professores com três ou

mais anos de serviço. Mas também são necessárias soluções estruturais a que o Governo resiste, como a

valorização da profissão e da carreira docente.

O que afastou milhares de professores do ensino foi o ataque aos seus direitos, a precariedade, a

desvalorização da carreira docente e da profissão. Isso levou, inclusivamente, muitos jovens a não optar pela

formação de professor. O resultado está à vista: o envelhecimento dos professores e a gritante falta de

professores. Se não forem tomadas medidas estruturais num curto intervalo de tempo, serão mais de 100 000

estudantes que não terão todos os professores.

O que tem o Governo a dizer aos professores que andam há anos e anos a percorrer o País e não são

integrados na carreira? Vai ou não vinculá-los? Vai ou não fazer o que é preciso e valorizar a profissão e a

carreira docente?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Paula Santos, em primeiro lugar, quanto ao plano

de recuperação das aprendizagens, a decorrer entre 2021 e 2023, tem um total de 900 milhões de euros

atribuídos e já tem uma primeira e uma segunda fases executadas. Neste momento, temos uma taxa de

execução de 60% deste plano de recuperação de aprendizagens.

Quanto à questão dos professores, há duas medidas de fundo, que estão definidas no Programa do Governo:

a alteração do modelo de concurso e a alteração do modelo de vinculação dos professores à escola.

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Foi, entretanto, anunciado um conjunto de medidas, que foram postas em prática, tendo em vista permitir

uma melhor gestão dos efetivos. São elas: o levantamento das penalidades pela recusa da aceitação de

horários; a distribuição das horas não letivas sobrantes; a autorização de acesso a pessoas que não tenham

ainda a habilitação profissional; a conclusão do concurso externo em curso, permitindo a vinculação de mais

3259 docentes; a possibilidade da renovação dos contratos; a remuneração dos estágios; o reforço do

acompanhamento das escolas; a revisão dos quadros de zona pedagógica.

Portanto, há um conjunto de medidas que tem vindo a ser adotado e há uma questão de fundo a ser

negociada com os sindicatos, relativamente ao modelo de concurso e ao modelo de vinculação à escola.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos, do PCP.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, aquilo que conhecemos e o que nos tem

chegado é, de facto, um conjunto de dificuldades grandes por parte das escolas. Mesmo no que diz respeito à

recuperação das aprendizagens, vale a pena fazer uma avaliação da implementação dessas medidas na

aprendizagem por parte dos estudantes. Essa avaliação é fundamental e é necessária.

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, registamos que, sobre o problema da falta de professores, não houve uma palavra

sobre aquele que é o aspeto fundamental: as carreiras, a valorização das carreiras, a valorização da profissão

de professor, para que os jovens possam, de facto, tomar essa opção e para que possamos formar mais

professores. É que aquilo que está previsto é que haja, de facto, um número elevado de professores em

condições de se aposentar nos próximos anos e se não forem tomadas medidas… Já vamos tarde e por isso é

que é urgente a adoção destas medidas, que são absolutamente estruturais.

Registamos que o Sr. Primeiro-Ministro tenha feito referência à alteração do modelo do concurso e das

questões do recrutamento. É pena que nunca tenha votado favoravelmente as propostas que o PCP trouxe à

Assembleia da República relativamente a essa matéria.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Se o tivessem feito, seguramente, hoje estaríamos numa situação muito

melhor…

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … do que aquela em que estamos.

Aplausos do PCP.

Gostaria ainda de trazer uma outra questão, que é a do aeroporto de Lisboa.

A situação em que o aeroporto se encontra é o resultado do desinvestimento nos meios do SEF, da

privatização da ANA, da consequente gestão danosa da VINCI e dos atrasos na construção do novo aeroporto

de Lisboa no Campo de Tiro de Alcochete.

Por um lado, a ANA/VINCI transformou o aeroporto num enorme centro comercial, sacrificando a população

de Lisboa e subordinando as necessidades operacionais aos interesses comerciais, só com o objetivo de

maximização do lucro.

Por outro lado, a capacidade do aeroporto de Lisboa está praticamente esgotada, o que exige a construção

faseada de um novo aeroporto, de acordo com as conclusões do LNEC (Laboratório Nacional de Engenharia

Civil), homologadas pelo Governo português.

O que impede o Governo de o fazer?! Esta é a questão que tem de ser colocada. Não há nada que o impeça,

a não ser a falta de vontade política para enfrentar os interesses da ANA/VINCI.

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Lançou concurso para a avaliação ambiental estratégica. Entretanto, o Governo diz que a decisão depende

de um acordo entre o PS e o PSD. Parece que o Governo anda à procura de um caminho para não confrontar

a VINCI.

O que sabemos é que não avançar com a solução que dá resposta às necessidades do País é comprometer

o futuro. E a solução, como bem sabe o Sr. Primeiro-Ministro, é a construção faseada do novo aeroporto no

Campo de Tiro de Alcochete.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Paula Santos, em primeiro lugar, sobre as

carreiras, sabe que, durante muitos anos, se desenharam carreiras maravilhosas, que, depois, eram

sistematicamente congeladas e não eram efetivamente exercidas pelos profissionais que tinham direito a elas.

O que temos procurado fazer é descongelar as carreiras, mantendo um quadro em que damos segurança às

pessoas, em que as carreiras permanecem descongeladas, em que as pessoas têm direito às progressões e às

promoções, com estabilidade, com previsibilidade, com segurança, sem riscos de voltar para trás.

Creio que nunca, repito, nunca tivemos tantos anos consecutivos de carreiras descongeladas, como aqueles

que temos vivido desde 2018.

O trabalho que todos os dias fazemos é para continuar a garantir que o País mantém as suas contas certas,

que o País tem os recursos necessários para investir no SNS, para investir nos programas de recuperação e

melhoria da qualidade do ensino, para podermos manter as carreiras devidamente descongeladas.

Houve professores que viram frustrado para sempre o seu direito à carreira, porque atingiram o limite de

idade antes do descongelamento da carreira.

Termos descongelado as carreiras em 2018 — tendo passado a COVID-19 e havendo, hoje, a incerteza da

guerra —, não haver sequer qualquer receio ou dúvida de que as carreiras vão voltar a ser congeladas é um

bem absolutamente fundamental, e é esse bem que temos de saber preservar. Temo-lo feito e vamos continuar

a trabalhar para assim o manter.

Sobre a questão do aeroporto, Sr.ª Deputada, o País anda há décadas a discutir a localização do novo

aeroporto de Lisboa. Durante décadas, discutiu-se se era em Ota, se era em Rio Frio. Finalmente, houve uma

iniciativa da CIP (Confederação Empresarial de Portugal), patrocinada pelo, então, Presidente da República,

que gerou um grande consenso nacional para que não fosse nem Ota, nem Rio Frio, mas uma terceira solução

que nunca tinha sido pensada, que era Alcochete. Então, gerou-se um grande consenso sobre Alcochete.

Depois, caiu o Governo, houve eleições antecipadas e veio um novo Governo, que disse que os números em

que tudo isso assentava eram fantasia, que não se justificava nem era necessário nenhum novo aeroporto, que

nada disso era necessário.

Entretanto, o tempo passou e, em muito pouco tempo, verificou-se que os números não só não eram

fantasiosos, como o crescimento do movimento aéreo e do turismo implicavam uma outra decisão mais rápida.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — E vai daí?!…

O Sr. Primeiro-Ministro: — Esse Governo, mal ou bem, tomou uma decisão, que foi a de compatibilizar

Lisboa/Portela com Montijo.

Quando me tornei Primeiro-Ministro defendi, em geral, que as grandes obras públicas deviam ser objeto de

consenso aqui, na Assembleia da República, pelo menos, por dois terços dos Deputados, de forma a garantir

estabilidade e continuidade nas políticas.

Foi por isso que trouxemos cá o Plano Nacional de Infraestruturas, para que tivesse esse amplo apoio, que,

felizmente, teve, superior a três quartos.

Quanto ao aeroporto, porque sabíamos que não havia tempo a perder, não reabrimos a discussão e

decidimos executar a decisão que tinha sido tomada pelo Governo anterior ao meu.

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Não é verdade!

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Acontece que, quando houve uma interpretação legal absolutamente absurda,

por parte da autoridade que é responsável sobre essa matéria, não houve possibilidade de alterar essa lei na

Assembleia da República, porque parte dos partidos eram contra a solução Montijo, e queriam Alcochete, e o

partido que tinha suportado o Governo que havia tomado essa decisão passou a ter uma dúvida existencial

sobre se essa era a melhor solução e pôs a condição de que se realizasse uma avaliação ambiental estratégica.

Foi o que fizemos, ou seja, encomendámos a avaliação ambiental estratégica.

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, agradecia que concluísse.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Vou já concluir, Sr. Presidente.

Neste momento, estando em perspetiva, creio que até ao próximo fim de semana, uma nova mudança na

liderança do PSD, aguardo serenamente que a nova liderança diga qual é a sua posição: se é a de exigir a

avaliação ambiental estratégica, se é a de retomar a decisão do Governo do Dr. Passos Coelho, se é uma outra

nova decisão, de forma a que haja o consenso nacional suficiente. Aquilo que não quero é tomar hoje uma

decisão sobre um processo, que nunca estará concluído antes de outubro de 2026, e que haja o menor risco de

vir a haver um outro Governo e uma nova maioria que revertam os passos que agora vão ser dados, porque os

passos que agora forem dados…

Protestos de Deputados do PSD.

… têm de ser os passos para uma decisão final e irreversível, para termos, de uma vez por todas, um novo

aeroporto na região de Lisboa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para formular perguntas, em nome do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, vai perdoar-me, mas vou voltar ao

Serviço Nacional de Saúde, porque, depois de intervenções sobre tantas coisas e até várias piadolas, ficámos

sem perceber o que é que vai acontecer nos próximos dias para garantir que o SNS funciona e tem os

profissionais de que precisa.

Registo que hoje o Sr. Primeiro-Ministro já não trouxe aquele gráfico que me mostrou, ao longo de meses,

para me tentar provar que estava tudo bem e registo, até, que o Governo, finalmente, reconhece que há falta de

especialistas no Serviço Nacional de Saúde; o que eu não registei foi uma única proposta concreta, no curto

prazo, para termos especialistas no Serviço Nacional de Saúde.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Veja bem, o Sr. Primeiro-Ministro diz que é preciso formar mais. Podemos

discutir a formação, mas a questão é que demora 10 anos a formar um obstetra.

Protestos da Deputada do PS Maria Antónia de Almeida Santos.

É daqui a 10 anos que vai ter o problema resolvido? É melhor não!

Nós temos médicos, a questão é que boa parte deles está no privado e, portanto, temos um problema: os

médicos estão a sair do SNS para o privado, é preciso retê-los no Serviço Nacional de Saúde e é preciso

convencer a voltar médicos que saíram do Serviço Nacional de Saúde.

O Bloco de Esquerda apresenta-lhe, desde há quatro anos, duas propostas muito concretas: uma é a de que

as instituições tenham autonomia para contratar para lugares do quadro, de modo a que, no momento em que

tenham possibilidade, possam, logo, contratar e não percam essa possibilidades, como tem acontecido tantas

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vezes; outra é a de que seja oferecido, a quem está no SNS — e a quem está fora, mas pondera voltar —, um

regime de exclusividade com majoração de 40% do salário, para que as pessoas queiram dedicar-se ao Serviço

Nacional de Saúde. Isto não proíbe ninguém de nada, mas atrai pessoas para o SNS!

A pergunta que tenho para si, Sr. Primeiro-Ministro, é esta: no concreto, o que é que vai fazer? É que dizer-

me, como diz há quatro anos, que vai haver negociações com os sindicatos para um regime de dedicação plena,

que, aliás, nunca disse exatamente o que seria nem em que condições,…

Protestos da Deputada do PS Maria Antónia de Almeida Santos.

… ou que há um plano de contingência, que não é mais do que o fecho rotativo de urgências, nada adianta.

E era tão triste se chegássemos ao fim deste debate sem saber o que é que o Governo vai fazer para reter e

fixar especialistas no SNS!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, desculpe lá, mas não vale a

pena exaltar-se nem pôr esse tom de voz,…

Protestos do BE.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — É do teatro!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … para ver se convence os portugueses de que tinha razão quando chumbou o

Orçamento e provocou uma crise política, porque os portugueses não lhe reconheceram essa razão.

Aplausos do PS.

E sabe porque é que os portugueses não lhe reconheceram essa razão? Porque a Sr.ª Deputada bem pode

reconstruir a história, mas não foi o Bloco de Esquerda que fundou o Serviço Nacional de Saúde. E até lhe posso

dizer mesmo mais: o Serviço Nacional de Saúde não deve nada ao Bloco de Esquerda para a sua melhoria.

Aplausos do PS.

Vozes do CH: — Toma!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Não, não deve nada ao Bloco de Esquerda para a sua melhoria.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Deve estar enganado!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Aquilo que, efetivamente, a Sr.ª Deputada não quer dizer é o que distingue o

seu regime de exclusividade do regime de dedicação plena.

A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Zangam-se as comadres…!

O Sr. Primeiro-Ministro: — É que o seu regime de exclusividade impede, efetivamente, os profissionais de

exercerem livremente a sua profissão. E a Sr.ª Deputada sabe muitíssimo bem que, se for essa a condição, o

enorme risco que temos é o de o Serviço Nacional de Saúde não ter os recursos humanos suficientes.

Por isso, estamos mesmo a negociar as medidas que são necessárias, iremos mesmo avançar com a

dedicação plena e iremos mesmo adotar as medidas para que as USF sejam generalizadas a todo o País.

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Este é um conjunto de medidas que permitiu, como eu, há bocado, disse e vou voltar a repetir, que a taxa de

retenção de recém-especialistas tivesse melhorado, de 2017 para 2021, de 82% para 89%. Uma taxa de

retenção não é uma prisão, reporta-se a profissionais que quiseram voluntariamente continuar a trabalhar no

Serviço Nacional de Saúde, porque defendem o Serviço Nacional de Saúde e porque têm condições para

trabalhar no Serviço Nacional de Saúde. Que esses profissionais ambicionam melhores condições, com certeza

que sim; que nós vamos continuar a trabalhar para que tenham melhores condições, com certeza que sim. Mas,

como sabe, esse trabalho não se faz com retórica, esse trabalho faz-se trabalhando, governando, administrando,

gerindo, tomando as devidas decisões e aprovando os Orçamentos que a senhora chumbou.

Aplausos do PS.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Deem-lhe mais a mão!…

O Sr. Presidente: — Tem, novamente, a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Obrigada, Sr. Presidente.

Sabe, Sr. Primeiro-Ministro, pode não gostar do que eu digo e pode até querer reescrever a história sobre o

trabalho do Bloco de Esquerda no Serviço Nacional de Saúde,…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — … mas não consegue esconder ao País os problemas do SNS.

Aproveito para ler o que Fernando Araújo, Presidente do Hospital de São João e ex-Secretário de Estado da

Saúde de um Governo PS, escreveu: «O mesmo Estado que não dá autonomia às instituições para a

contratação e não qualifica os vencimentos, oferece valores cinco vezes superiores a quem se disponibilize a

trabalhar em prestação de serviços», ou seja, nas empresas privadas que já estão dentro dos hospitais públicos.

«O sinal pode não ser o pretendido,…» — continua Fernando Araújo — «… mas a direção é clara e aponta-lhes

a porta de saída, desestruturando, de forma irremediável, o SNS.»

O que lhe digo, Sr. Primeiro-Ministro, pode não lhe agradar, mas é a realidade no terreno, comprovada por

quem defende o SNS.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Exatamente!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — E há algo que este debate trouxe. Pode não ter trazido soluções para o

SNS, porque o Sr. Primeiro-Ministro continua a dizer que há de fazer não se sabe o quê nem se sabe quando,

mas trouxe clareza, porque, depois de ouvir a intervenção do Deputado Eurico Brilhante Dias, entusiasmado

com as parcerias público-privadas na saúde, dizendo «nós fizemo-las todas, a direita nunca fez nada», ou a do

Sr. Primeiro-Ministro, que é incapaz de dizer que vai qualificar os vencimentos e as carreiras do SNS, mas diz

que o grande passo é a formação na saúde nos privados, fica claro o que quer o PS, mas também fica claro

porque é que a direita não consegue trazer uma única proposta concreta a este debate: é que o sonho da direita,

de desestruturação do Serviço Nacional de Saúde, sim, está a ser feito pelo Partido Socialista!

Aplausos do BE.

Neste momento, 40% do orçamento da saúde já vai para o negócio privado da saúde.

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Quando o PSD chegar ao Governo, vai lembrar-se do que está a dizer!

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — E, sabem, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas, quando o Serviço Nacional

de Saúde não tiver capacidade e estiver tudo nas mãos dos privados, aí, estaremos como nos Estados Unidos

da América, onde se gasta 20% do PIB na saúde para se ter dos piores indicadores de saúde da população de

um País dito desenvolvido.

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Sim, o PS está a fazer o trabalho da direita e é por isso que a direita também vem aqui sem nenhuma proposta

para o Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, muito obrigado, mais uma vez,

pelas suas perguntas.

O seu tom é inflamado…

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — É por eu ser mulher que lhe incomoda o meu tom?! É bom que não seja!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Como?

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — É por eu ser mulher?!

O Sr. José Moura Soeiro (BE): — É, é! Não diz isso dos outros Deputados!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Ó Sr.ª Deputada, há limites para demagogia, mesmo por parte do Bloco de

Esquerda.

Mas o tom inflamado, como sabe, substitui a convicção. E porque é que substitui a convicção? Porque a Sr.ª

Deputada diz «são contra a autonomia das instituições», mas a Sr.ª Deputada sabe que votou contra um

Orçamento que deu autonomia às instituições para poderem contratar.

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Não podem contratar médicos!

O Sr. Primeiro-Ministro: — A Sr.ª Deputada disse que nós não queremos valorizar as carreiras, mas…

O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Sejam amigos!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … a Sr.ª Deputada sabe que votou contra um Orçamento que prevê um aumento

de 60% da remuneração dos médicos de saúde geral e familiar nas localizações carenciadas.

A Sr.ª Deputada sabe que foi contra um Programa do Governo que prevê a generalização das unidades de

saúde familiar, modelo B, o que permite uma melhoria significativa da forma de remuneração.

A Sr.ª Deputada sabe bem que estamos, neste momento, a negociar com os sindicatos…

O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Só agora?!

O Sr. Primeiro-Ministro: — … um novo modelo de remuneração das urgências.

A Sr.ª Deputada sabe bem que o orçamento do Serviço Nacional de Saúde aumentou 30% ao longo destes

seis anos.

A Sr.ª Deputada sabe bem que, ao longo destes quatro anos, temos mais 25 000 profissionais no Serviço

Nacional de Saúde.

E a Sr.ª Deputada sabe que nós não fingimos que não existem problemas, o que sabemos é que, para cada

problema, é preciso não uma intervenção, mas uma solução…

A Sr.ª Catarina Martins (BE): — E qual é a solução?

O Sr. Primeiro-Ministro: — … e, portanto, a solução é a que vamos encontrando para cada um dos

problemas que se identifica.

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A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Mas qual é a solução?

O Sr. Primeiro-Ministro: — Já aqui lhe referi a generalização do modelo de gestão das USF; a autonomia

de gestão dos hospitais; o reforço da remuneração da medicina geral e familiar nas zonas carenciadas; uma

nova estrutura remuneratória das urgências… Portanto, são essas as soluções que permitem responder, efetiva

e concretamente, aos problemas. É num tom menos inflamado — sim! —, mas resolve.

Aplausos do PS.

Risos do BE.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Nota-se!

O Sr. Presidente: — Dou, agora, a palavra à Sr.ª Deputada Inês Sousa Real, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, queria, nesta segunda ronda,

falar-lhe da seca extrema que o País atravessa e deste problema estrutural.

Quando se impõem soluções que sejam, também elas, estruturais e de médio e longo prazo, não podemos

limitar-nos a ter campanhas de sensibilização ou apenas a ter fé em que vamos ter água para dois anos.

Tendo em conta não só as condicionantes em relação à escassez dos recursos hídricos, mas também o

desperdício da água, nomeadamente por força do uso intensivo que continua a existir, a falta de estratégia para

os mecanismos de retenção, onde são essenciais e sem pôr em causa valores naturais, e, evidentemente, a

eliminação de barreiras onde ela é obsoleta, o PAN propôs, nesta Assembleia, e recomendou ao Governo, uma

revisão do Plano Nacional da Água. Assim, e como ainda agora o ouvimos dizer que são necessárias soluções,

a pergunta que, desde já, lhe dirijo, Sr. Primeiro-Ministro, é a seguinte: para quando a revisão do Plano Nacional

da Água e a sua adaptação ao plano de combate às alterações climáticas?

Por outro lado, já aqui ouvimos falar da floresta, e sabemos que a seca vai ter uma consequência inevitável

no combate aos grandes incêndios, mas não falámos de um dos fatores mais problemáticos do nosso País, que

é o da dimensão da plantação de eucalipto. Portugal tem, neste momento, uma ocupação superior à de Espanha,

em matéria de eucaliptal, sendo que 80% dos eucaliptos da Europa estão, precisamente, na Península Ibérica.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, a pergunta que lhe faço é esta: considerando que temos de aprender com a

história, que já passaram cinco anos desde Pedrogão Grande, que foi, de facto, uma tragédia absolutamente

lamentável, que temos, neste momento, cidadãos a dizerem que só não há plantação de eucalipto no alcatrão,

porque, de facto, não conseguem fazê-lo, para quando um plano de ordenamento florestal adequado, que passe

também por imputar responsabilidades às grandes celuloses, que, neste momento, continuam a não gerir

adequadamente? É que não basta falar no eucalipto que está ao abandono, temos também que imputar

responsabilidades a quem continua a tratar a nossa floresta como um bem única e exclusivamente económico,

sem ter respeito pelas populações e pelo grande sumidouro de carbono que deve ser a floresta.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, é precisamente pela floresta

ter deixado de ter valor económico que foi sendo deixada ao abandono. Por isso, temos de devolver valor

económico à floresta e o valor que a floresta pode ter não pode ser só o das árvores de crescimento rápido que

alimenta a fileira do papel e das celuloses. Temos de pôr valor na floresta que é sustentável.

É por isso que a reforma estrutural da floresta é absolutamente essencial e é por isso que tem de ser cruzada

com os planos de desenvolvimento do interior, porque é partir dessa valorização da floresta como um recurso

endógeno que reforçamos, simultaneamente, os territórios de baixa densidade e asseguramos a proteção da

floresta.

Se verificar qual é a taxa de ignição e, sobretudo, a área ardida nas áreas de gestão da indústria da celulose

e nas áreas que estão sem gestão, porque estão ao abandono, verificará que as áreas que são geridas têm,

obviamente, uma taxa de ignição e, sobretudo, de área ardida muitíssimo inferior.

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Ora, a solução não passa pela generalização da gestão da floresta pela indústria da celulose, passa pela

generalização do princípio de que é necessário valorizar a floresta como um recurso reconhecido pelas

populações, que as populações gerem e em que as populações podem, efetivamente, ter valor.

É isso que, aliás, fixa as populações. Porque é que a floresta ficou abandono? A floresta ficou ao abandono

por causa de um ciclo de pobreza que gerou um ciclo de migração interna e externa, do qual resultou o

empobrecido, o abandono. Ora, o que temos de recuperar é esse valor económico e esse valor económico

encontra-se de várias formas.

Nas ditas agendas mobilizadoras, que ontem foram apresentadas, um dos projetos mais interessantes é a

utilização das fibras florestais para a produção de têxtil, do calçado ou de biocombustíveis, de forma a

encontrarmos novas formas de valorização económica, quer da madeira, quer, sobretudo, da biomassa, que

permitam, efetivamente, uma gestão adequada da floresta.

O problema da água passa também pela floresta, porque a floresta é um fator fundamental na capacidade

de retenção dos solos e na sua permeabilização.

Já não tenho tempo para avançar mais, mas, sobre a floresta, é mesmo preciso deixar de ter-se essa ideia

de que a floresta não precisa ter valor económico. Não, a floresta precisa mesmo de ter valor económico para a

ser sustentável.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Tavares, do partido Livre.

O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Há pouco, perguntei-lhe o que contava fazer

para reinventar Portugal, num cenário de nunca mais termos fundos europeus a esta escala. Não tive sorte

nessa resposta, porque não houve, mas espero ter nas perguntas que vou fazer, agora, sobre saúde, num

debate em que já se abordou muito esse tema mas em que, creio, estas perguntas não foram feitas.

No início da pandemia, o Mecanismo Europeu de Estabilidade teve um programa de apoio à crise pandémica

que iria até os 4 mil milhões de euros para os sistemas de saúde. Portugal não o quis utilizar, por ter medo das

condicionalidades ligadas a esse programa, mas o próprio Ministro das Finanças, na altura, disse que não havia

condicionalidades. A pergunta é: terão feito falta esses fundos para resolver os problemas que temos hoje?

Os profissionais de saúde são dos que mais recorrem ao Programa Regressar e vimos, ainda agora, o Sr.

Presidente da República, em Londres, falar disso mesmo e dizer que temos recursos para poder resolver os

problemas de saúde. Não estará na altura de desenhar um programa «Regressar Saúde»? Nós temos muita

gente que aproveita o Programa Regressar genérico, e ainda bem, mas, para abrir lojas, temos, felizmente,

muita gente. Para os profissionais de saúde, queremos mesmo que voltem para os hospitais e para os centros

de saúde e precisamos de um programa específico «Regressar Saúde». Está o Governo disposto a acompanhar

as propostas do Livre nessa área?

Para quando um Estatuto de Desgaste Rápido para os profissionais de saúde? Para quando um acordo

coletivo de trabalho para os médicos do INEM (Instituto Nacional de Emergência Médica)? Para quando a

revisão do regime de parentalidade dos profissionais de saúde? A melhor maneira de não perder profissionais

de saúde do SNS é tratar bem os que temos. A melhor maneira de recuperá-los não consiste em esperar sete

anos pela formação de novos médicos, mas, sim, em ir buscar aqueles que já formámos e que estão no

estrangeiro.

Uma última pergunta: o Sr. Primeiro-Ministro disse que o sistema nacional de saúde tem de se repensar face

a feriados e a férias.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. Rui Tavares (L): — Concluirei, Sr. Presidente, muito rapidamente.

Já não temos muito tempo para isso. Pode garantir que não vamos passar o verão com urgências fechadas?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

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O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Tavares, em primeiro lugar, há pouco não lhe

respondi porque a seguir temos um debate sobre a questão da Ucrânia e os seus impactos sobre os fundos

europeus.

A minha ambição não é a de reinventar o País que perde capacidade de atrair recursos para aumentar o seu

investimento, tendo em conta a carência de investimento que o País tem, quer de investimento público, quer de

investimento privado, mas quero um País e, sobretudo, uma União Europeia que saibam reinventar a sua

arquitetura, de forma a que, no momento em que toma a decisão de acolher, no seu seio, um país com 44

milhões de habitantes e com o nível de destruição que a Ucrânia tem, tenha condições para assegurar uma

estrutura orçamental pós-2027 que não seja uma frustração nem para a Ucrânia, nem para os 27 Estados-

Membros, nem para o conjunto de outros Estados que, seguramente, acompanharão a Ucrânia nesse

movimento.

Relativamente ao Programa Regressar, ele dirige-se transversalmente a todos. O que temos de fazer

relativamente aos profissionais de saúde que querem regressar é, para além do Programa Regressar, melhorar

as condições de trabalho de todos os profissionais de saúde dentro do Serviço Nacional de Saúde, ou seja, dos

que vão lá fora, dos que estão cá, dos que saíram e querem voltar, dos que estão e querem continuar.

É para todos eles que temos de criar condições, é para isso que temos de trabalhar e temos de trabalhar em

conjunto, necessariamente, com as estruturas sindicais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Chegamos, assim, ao fim do primeiro ponto da ordem do dia.

Para garantir o bom andamento dos trabalhos, vamos fazer uma pequena interrupção e retomaremos a

ordem do dia às 18 horas e 50 minutos.

Até já.

Eram 18 horas e 41 minutos.

Srs. Deputados, já estamos em condições de retomar os nossos trabalhos. Todos os grupos parlamentares

estão representados.

Eram 18 horas e 54 minutos.

O segundo ponto da ordem do dia consiste no debate preparatório do Conselho Europeu, com a participação

do Primeiro-Ministro, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei do Acompanhamento, Apreciação e

Pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do Processo de Construção da União Europeia.

Peço às Sr.as e aos Srs. Deputados que tomem os seus lugares para que haja condições de iniciar esse

debate.

Pausa.

Para abrir o debate, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Conselho Europeu tem uma questão

essencial em cima da mesa, que é a apreciação da recomendação da Comissão Europeia para a atribuição do

estatuto de candidato à Ucrânia e a Moldova.

Já procedemos, na sexta-feira passada, à audição de todos os grupos parlamentares e, tendo em conta a

apreciação feita pela Comissão Europeia, Portugal entende dever acompanhar a recomendação da Comissão

Europeia.

Isto dito, é fundamental que todos tenham consciência de que a atribuição deste estatuto não pode ser feita

com reserva mental, nem pode ser feita na expectativa de que se trata apenas de mais um país candidato.

Sempre que a União Europeia fez isso gerou falsas expectativas, frustrações, que tiveram um efeito de ricochete

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muito grande na perspetiva europeia de todos esses Estados e na relação desses Estados com a União

Europeia.

Sendo esta candidatura para levar a sério, significa isto que a União Europeia tem de assumir,

simultaneamente, a consciência de que é preciso iniciar uma reflexão sobre a arquitetura institucional e

orçamental da União Europeia. Se não o fizer, dificilmente poderá cumprir a expectativa legítima que desenvolve

nos países a quem, agora, atribui o estatuto de candidato.

Por outro lado, a atribuição do estatuto de candidato tem, naturalmente, um efeito político importante, mas

não tem consequências imediatas. Significa isso que não se pode tratar de uma forma de a União Europeia lavar

a sua consciência quanto às responsabilidades concretas e imediatas que tem no apoio financeiro, no apoio

militar e no apoio humanitário à Ucrânia.

Significa isso, portanto, em primeiro lugar, apoiar a recomendação da Comissão Europeia, em segundo lugar,

entender que, simultaneamente, a União tem de fazer uma reflexão sobre a sua arquitetura institucional e

orçamental e, em terceiro lugar, que a União não se pode desobrigar do que é fundamental e urgente, que é o

apoio imediato e concreto à Ucrânia do ponto de vista financeiro, do ponto de vista militar e do ponto de vista

humanitário.

Aplausos PS.

O Sr. Presidente: — Para intervir no debate, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, começo

por dar a palavra ao Sr. Deputado João Paulo Rebelo.

O Sr. João Paulo Rebelo (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.ª Ministra, Sr. Ministro, Sr.as e

Srs. Deputados: Já tive oportunidade de o dizer nesta Assembleia mas quero, hoje, na presença do Sr. Primeiro-

Ministro, repeti-lo: desde a nossa adesão à União Europeia, há quase quatro décadas, o desenvolvimento social

e económico do nosso País está intimamente ligado ao resultado da aplicação das políticas europeias e das

suas estratégias.

É por isso que o Partido Socialista conhece bem, e, sobretudo, reconhece, o papel determinante que a União

Europeia teve e tem na vida dos portugueses. Assim, a sua decisão de, neste Governo, ter a tutela direta dos

assuntos europeus, Sr. Primeiro-Ministro, merece o nosso aplauso. A transversalidade da pasta justifica

plenamente a centralidade que V. Ex.ª lhe quis dar.

Em vésperas do Conselho Europeu, com este debate preparatório, estamos aqui a cumprir a lei, mas

igualmente relevante é que discutamos este processo, sempre em curso, da construção deste inigualável projeto

político que integramos, a União Europeia.

O Conselho Europeu dos próximos dias, tal como já disse o Sr. Primeiro-Ministro, será marcado pela

discussão de temas de enorme relevância para a União e vou focar-me também neste incontornável tema da

guerra e nos pedidos de adesão de vários países, como sabemos, mas, particularmente, no pedido da Ucrânia.

Portugal, as suas instituições, o Governo e o seu povo estão solidários com a Ucrânia, desde a primeira hora.

O Sr. Primeiro-Ministro tem sido um intérprete e mesmo um porta-voz deste sentimento que o País tem

demonstrado na condenação ao bárbaro ataque que foi perpetrado pela Rússia. No apoio com material militar,

na ajuda humanitária, nas dezenas de milhares de cidadãos ucranianos a quem concedemos asilo, no apoio às

medidas sancionatórias que procuram enfraquecer o país invasor, o Governo tem estado solidário, presente e

atuante.

Como sabemos, o processo de adesão de um Estado à União Europeia é um processo que implica o

cumprimento de critérios políticos, critérios económicos e critérios jurídicos. Estes critérios são o garante da

coesão, no fundo, e da coerência de que um projeto político desta natureza não só precisa como mesmo exige.

Depois de conhecido o parecer da Comissão, entendemos estarem criadas as condições para o estatuto de

candidato ser reconhecido à Ucrânia.

Dito isto, Sr. Primeiro-Ministro, acompanhamo-lo no que tem dito, e ainda agora, nesta Câmara, o disse:

efetivamente, os problemas concretos da Ucrânia não são resolvidos com esta atribuição de estatuto de

candidato. Os problemas não vão desaparecer desta maneira e, portanto, é essencial que nos concentremos,

de facto, na ajuda concreta de que a Ucrânia precisa.

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Mas, Sr. Primeiro-Ministro, também o acompanhamos na outra questão que aqui trouxe: se é clara a nossa

posição relativamente ao alargamento da União, é igualmente clara a necessidade que entendemos haver de,

já neste Conselho Europeu, se começar a aprofundar a discussão sobre o nosso futuro e, nomeadamente, sobre

a arquitetura institucional e orçamental da União, com futuros alargamentos, como o Sr. Primeiro-Ministro referiu,

porque, de facto, pugnar pela coesão implica planear e planear com antecipação.

Por último, relativamente a um outro tópico que será discutido, muito sucintamente, uma nota simples mas

que encerra em si muito de substantivo e caro ao Partido Socialista: não podemos permitir — falo, no fundo,

sobre o Semestre Europeu — que as nossas sociedades carreguem o peso das atuais pressões inflacionistas

e, sobretudo, que esse peso seja carregado injustamente.

A nossa resposta deve assentar nos princípios da sustentabilidade e da solidariedade e nunca na base da

austeridade e do retrocesso. O Sr. Primeiro-Ministro representou, numa fase muito importante para o nosso

País, justamente isto. Temos a certeza de que o vai continuar a representar nas instâncias europeias e desde

já neste próximo Conselho Europeu: não à austeridade, não ao retrocesso, e sim à sustentabilidade e ao

progresso.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma segunda intervenção em nome do Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra

o Sr. Deputado Rui Lage.

O Sr. Rui Lage (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:

Ao longo de um ano, milhares de cidadãos oriundos dos quatro cantos do nosso continente estiveram reunidos

na Conferência sobre o Futuro da Europa e aí deram corpo a um sentimento de pertença ao espaço europeu e

a essa identidade europeia que muitos consideram um mito. Disseram de sua justiça e aquilo que pudemos

verificar foi uma convergência de objetivos e uma confluência de vontades entre a cidadania e as instituições

europeias.

Não há como deixar de notar que muitas das recomendações dos cidadãos encontram já ressonância em

políticas europeias em curso ou a serem planeadas, mas, se as vontades se encontraram, o tempo da cidadania

e o tempo das instituições europeias continuam aparentemente desencontrados e os cidadãos querem hoje uma

Europa mais ágil e mais rápida, uma Europa que não se atrapalhe e que não se bloqueie a si própria e pedem

melhorias no processo democrático para que possamos ter uma União Europeia mais atuante.

Em contraciclo com mitologias nacionalistas que vão ressurgindo um pouco por todo o lado, no fundo, os

cidadãos aspiram a uma soberania europeia que, longe de enfraquecer as soberanias nacionais, as amplifica e

as protege dos autocratas. Os cidadãos sabem isto e, na sua maioria, querem mais Europa e não menos Europa.

Por isso, a questão é a de saber se, para corresponder aos seus anseios, é inevitável uma revisão dos

tratados ou se isso é alcançável no quadro da atual arquitetura jurídica do Tratado de Lisboa.

Nos últimos anos, a União Europeia acordou da sua autocomplacência e mobilizou energias e meios inéditos

para dar resposta à crise migratória, ao Brexit, à pandemia e agora ao drama da Ucrânia, dando razão,

porventura, a Jean Monnet, que, nas suas memórias, escrevia que «a Europa vai forjar-se nas crises e será o

conjunto de respostas que conseguir dar a essas crises».

Mas cabe perguntar, na perspetiva deste Conselho Europeu, se o projeto europeu, após 15 anos de

tormentas e de crises existenciais — que muitos, aliás, anunciavam como sendo o fim da linha —, poderá

prosseguir uma navegação segura, no fundo, com cartas de marear que foram pensadas para uma época de

estabilidade e de paz que já não é manifestamente a nossa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o

Sr. Deputado Tiago Moreira de Sá.

O Sr. Tiago Moreira de Sá (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr.as e

Srs. Deputados: Este é o momento que fala das nossas maiores aspirações, porque, apesar de toda a crueldade

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e dificuldades do nosso mundo, não somos meros prisioneiros do destino. As nossas ações são importantes e

podem virar a história na direção da justiça; se perdermos essa fé, se a rejeitarmos como tola e ingénua, se

divorciarmos as decisões que tomamos em questões de guerra e paz, perdemos o que há de melhor na

humanidade, perdemos o nosso sentido de possibilidade, perdemos a nossa bússola moral.

Como fizeram muitos em gerações anteriores a nós, devemos rejeitar esse futuro, devemos alcançar o

mundo tal como deve ser.

«Em algum lugar, hoje, aqui e agora, no mundo como é, um soldado está desarmado, mas permanece firme

para manter a paz. Em algum lugar, hoje, aqui e agora, no mundo como é, uma jovem manifestante aguarda a

brutalidade do seu governo, mas tem a coragem de continuar a marchar. Em algum lugar, hoje, aqui e agora,

no mundo como é, uma mãe que enfrenta a pobreza dedica tempo para ensinar o seu filho, junta as poucas

moedas que tem para o enviar para a escola, porque acredita que, mesmo num mundo cruel, ainda há lugar

para os sonhos dessa criança.»

Aplausos do PSD.

O Sr. André Coelho Lima (PSD): — Muito bem!

O Sr. Tiago Moreira de Sá (PSD): — Recordei-me desta passagem do discurso de Barack Obama na

aceitação do Prémio Nobel da Paz a propósito do atual debate acerca do pedido da Ucrânia de adesão à União

Europeia.

Importa que todos sejam claros na posição que defendem. Nós defendemos que devemos conferir à Ucrânia

o estatuto de candidato a Estado-Membro da União Europeia, com todas as suas consequências.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Tiago Moreira de Sá (PSD): — Abrir a porta da nossa casa europeia aos ucranianos não é só um

elementar ato de decência moral, é também o passo acertado a dar na construção de uma nova ordem europeia

que garanta a nossa segurança, sendo capaz de travar, de modo duradouro, o revisionismo russo.

O que está em causa é a Ucrânia, mas é também a Bielorrússia, a Moldávia, o Cáucaso, o Báltico, os Balcãs,

está em causa a União Europeia e a NATO (North Atlantic Treaty Organization), que a Rússia quer dividir — se

não mesmo, se possível, destruir —, está em causa o futuro da democracia liberal, que trava uma guerra contra

o autoritarismo.

As ações da Rússia, sob o regime de Putin, destruíram a antiga ordem de segurança europeia, fundada na

Ata Final da Conferência de Helsínquia, de 1975. O compromisso de Helsínquia comprometeu a União Soviética

com o equilíbrio de pesos na Europa e com um conjunto de princípios fundamentais — o respeito pela

autodeterminação dos povos, a soberania dos Estados, a inviabilidade das suas fronteiras, a resolução pacífica

de disputas e o respeito pelos direitos humanos — e reconheceu que, apesar de ser uma adversária ideológica

das democracias liberais, a URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas) era um parceiro fundamental

para a segurança e estabilidade da Europa.

Após o fim da Guerra Fria, a Parceria para a Paz, da NATO, reconheceu na Federação Russa a mesma

essencialidade para a paz na Europa, procurando integrá-la na sua arquitetura de segurança.

Infelizmente, temos de reconhecer que as muitas tentativas de incluir a Rússia na ordem regional europeia

falharam. A détente, embora desejável, não é possível, pois o Kremlin não quer. Não podemos acreditar que é

possível uma solução para a agressão russa, baseada em princípios destruídos pelos tanques e pela artilharia

da Rússia.

É necessária uma nova ordem na Europa, uma ordem que reconheça o facto — indesejado, mas inegável

— de que a Rússia é uma grande ameaça à segurança regional e temos de nos defender; uma ordem baseada

em firmes compromissos de segurança, que assegurem uma contenção e uma dissuasão eficazes contra o

expansionismo russo; uma ordem assente em sólidos princípios políticos, jurídicos e éticos.

O alargamento da NATO, especialmente no acolhimento das candidaturas da Suécia e da Finlândia à

adesão, é um primeiro passo decisivo no reforço do pilar militar da nossa defesa comum.

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O alargamento da União Europeia dará corpo a um segundo pilar político, económico, normativo e, cada vez

mais, também securitário.

O Governo ucraniano, respondendo ao desejo manifesto do seu povo, expressou a sua vontade de aderir à

União Europeia. Neste contexto, o dever de todos os líderes europeus é claro: por um lado, deve ser

reconhecido, sem hesitações, o estatuto de candidato à Ucrânia e iniciar-se o processo que leve à sua adesão,

no futuro; por outro lado, deve-se olhar para os critérios de Copenhaga não como entraves à adesão, mas antes

como mais uma oportunidade para os ucranianos fazerem o que precisa de ser feito para cumprirem esses

critérios. Se o fazem ou não, e com que ritmo, isso só diz respeito ao Governo de Kiev e ao seu povo.

O desejado tratado de adesão da Ucrânia pode estar ainda a uns anos de distância, mas aceitar desde já o

estatuto de candidato à adesão não só não impede como facilita que seja dado, sem perda de tempo, todo o

apoio à reconstrução económica, política, institucional e humana do país.

Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados, esta é a nossa posição. Foi a

nossa posição desde a primeira hora, sem ambiguidades ou oscilações, é a posição certa do ponto de vista

ético, mas também geopolítico, e é a tradição da política externa portuguesa, que faz coincidir o interesse

nacional com princípios universalistas, com o bem da democracia e com o interesse da Europa.

Infelizmente, o Sr. Primeiro-Ministro optou até recentemente por uma posição diferente, colocando várias

dificuldades à adesão da Ucrânia, e fê-lo sem concertar com o PSD, o que não é consentâneo com o consenso

que existe em política externa entre os partidos que têm governado Portugal desde o regime democrático.

Sr. Primeiro-Ministro, pergunto-lhe se podemos agora esperar todo o seu empenho na batalha por um legado

que esteja à altura da obra das gerações pós-Segunda Guerra Mundial e pós-Guerra Fria, que pela sua

capacidade política e coragem moral nos ofereceram o mais longo tempo de paz da nossa história. Acreditamos

que estamos num desses momentos, igual ao pós-1945 e ao pós-1991. O mundo mudou e temos de estar à

altura desse grande desafio.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para intervir em nome do Grupo Parlamentar do Chega, tem a palavra o Sr. Deputado

Rui Paulo Sousa.

O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs.

Deputados: Na passada sexta-feira, a Comissão Europeia recomendou aos Estados-Membros que confirmem

a Ucrânia com o estatuto de país candidato à adesão à União Europeia. Esta recomendação já era expectável,

uma vez que a Comissão Europeia, os povos europeus e a esmagadora maioria dos líderes dos Estados-

Membros se empenharam seriamente nesta aspiração, mais do que legítima, de um povo violentado pela

barbárie da invasão russa.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Temos de dar um sinal claro e inequívoco de apoio à Ucrânia num momento

em que estão em causa dois valores basilares do direito internacional: o respeito escrupuloso pela soberania e

a independência dos Estados e a resolução pacífica dos diferendos garante a paz, a segurança e a justiça

internacionais.

A invasão da Ucrânia é demasiado grave para que a União Europeia fique indiferente. A Ucrânia tem de

resistir e esta recomendação da Comissão Europeia é um alento nesse sentido.

Será um golpe fatal nas ambições imperialistas do atual regime russo. No fundo, e nas palavras do Alto

Representante da União para os Negócios Estrangeiros e Política de Segurança, «não é possível que haja

segurança na Europa sem segurança na Ucrânia».

Já do ponto de vista económico, a guerra na Ucrânia e a subsequente instabilidade para esta jornada estão

a provocar uma crise sem precedentes, em que os portugueses e os povos europeus e do mundo estão a sofrer

diretamente.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

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O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — A escalada dos preços dos combustíveis e os aumentos dos preços da

energia, das matérias-primas, dos cereais e dos produtos alimentares em geral degradam as condições de vida,

sobretudo dos mais desfavorecidos.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Exatamente!

O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Mas apesar de toda esta terrível situação em que vivemos atualmente na

Europa, nos últimos dias veio a lume o ceticismo de alguns líderes europeus em relação a esta recomendação

da Comissão Europeia, dos quais o Sr. Primeiro-Ministro foi talvez a face mais visível, o que, no nosso entender,

colocou Portugal numa posição de um certo desconforto diplomático em relação aos restantes parceiros.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Mas, Sr. Primeiro-Ministro, o que queremos perguntar é o porquê da

hesitação. Será que foi pelo que aconteceu com a entrada dos anteriores países da Europa de leste, países

como a República Checa, Estónia, Hungria, Lituânia, Eslovénia, todos eles países saídos do anterior bloco

comunista e que nos ultrapassaram economicamente no espaço de 15 anos?

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Volto a perguntar, Sr. Primeiro-Ministro: foi esse facto que levou à sua

hesitação inicial quanto à possível entrada da Ucrânia, da Moldávia e eventualmente da Geórgia?

É que não temos a menos dúvida que, se continuarmos com os atuais planos de desenvolvimento e aplicação

dos milhares de milhões de euros referentes ao Plano de Recuperação e Resiliência, tal como fizemos

relativamente aos fundos comunitários que recebemos ao longo dos últimos 36 anos, dentro de 10 anos, ou

menos, também seremos ultrapassados pela Ucrânia, pela Moldávia e até mesmo pela Geórgia.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Exatamente!

O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Sr. Primeiro-Ministro, o atual desafio não é apenas ajudar a Ucrânia a vencer

a guerra e a ultrapassar a crise económica e humanitária que cresce a cada dia que passa. Não, Sr. Primeiro-

Ministro, o atual desafio é para todos nós que aqui estamos, representantes eleitos do povo português: ou de

uma vez por todas embarcamos no comboio da Europa ou vamos perdê-lo para sempre.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Na tal Europa de que se fala a duas ou três velocidades, se não mudarmos

de vez a nossa atitude em relação à economia, à justiça e à saúde — ou seja, em todas as áreas de atuação do

Governo —, não tenho a menor dúvida de que vamos acabar na cauda do último comboio ou despejados numa

estação a meio do caminho.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

O Sr. Rui Paulo Sousa (CH): — Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, por muita apreensão que este

processo possa suscitar — seja devido a razões motivadas por incertezas relacionadas com o conflito, seja

devido a possíveis alterações de fronteiras, assim como pelos impactos que um país de Leste com mais de 40

milhões de habitantes possa trazer à geometria e dinâmicas da União Europeia —, é nosso dever moral, ético

e humano ser a favor deste caminho recomendado pela Comissão Europeia.

O povo ucraniano merece-o pela bravura demonstrada em combate e na resistência contra um inimigo muito

mais poderoso e pelo total empenho e compromisso com os valores europeus de liberdade, igualdade e

democracia.

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Aplausos do CH.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para uma segunda intervenção em nome do Chega, tem a palavra o Sr. Deputado

Pedro Pessanha.

O Sr. Pedro Pessanha (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs.

Deputados: A Sr.ª Ministra da Defesa revelou, na última reunião da NATO, em Bruxelas, que não está em cima

da mesa o envio de mais material militar para a Ucrânia. Isto apesar de, recentemente, o Presidente Zelenskyy

ter pedido um reforço nesse sentido, principalmente no que diz respeito a armamento de longo alcance.

A primeira pergunta é a seguinte: qual a razão desta recusa?

A outra questão que lhe queria colocar, ainda a este respeito, é a seguinte: nessa mesma reunião, a

Sr.ª Ministra da Defesa disse que, em vez de material militar, admitia a possibilidade de ser dada formação às

forças armadas ucranianas em Portugal, nomeadamente, por exemplo, para manobrarem carros de combate

Leopard.

Sr. Primeiro-Ministro, a Ucrânia não tem carros de combate Leopard. O que se dizia era que a Espanha iria

fornecer estes carros de combate, mas seria a própria Espanha a dar formação aos militares ucranianos na

Lituânia, mas, entretanto, como é de conhecimento de todos, a entrega deste material foi bloqueada pela

Alemanha.

Sr. Primeiro-Ministro, para concluir, ajude-nos a resolver este mistério: vamos fornecer material de guerra de

que não dispomos ou vamos dar formação em carros de combate que não existem na Ucrânia?

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, em nome do Iniciativa Liberal, o Sr. Deputado Bernardo Blanco.

O Sr. Bernardo Blanco (IL): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro: Bons olhos o vejam, há muito tempo

que não tinha o prazer de o ter aqui. Peço-lhe que vá apontando as perguntas, porque tenho cinco.

O Sr. Primeiro-Ministro esteve pela Europa, num tour tão grande que até achei que não era a Ucrânia, mas

sim o Sr. Primeiro-Ministro, que estava em busca do estatuto de candidato à União Europeia.

Obviamente que a posição mudou e há menos de 10 dias o Sr. Primeiro-Ministro tinha uma posição mais

cética. Partilho algumas dessas preocupações, da sua intervenção inicial, mas a verdade é que, depois de

França e Alemanha terem mudado de posição, Portugal foi atrás e mudou também a sua posição.

Por isso, a minha pergunta inicial, muito simples, é esta: o Sr. Primeiro-Ministro mantém esse ceticismo ou

estamos a reboque das mudanças de vontade do Governo francês?

Queria fazer duas perguntas, simples, relativamente ao novo pacote de ajuda macrofinanceira que a União

Europeia vai disponibilizar à Ucrânia. Destes 9000 milhões de euros, quanto irá de Portugal? E, no Conselho

Europeu, qual será a posição defendida pelo Governo português? Será uma posição só de subvenções, de

empréstimos, ou um modelo misto?

Relativamente ao ponto quatro do Conselho Europeu, que também já foi falado — a Conferência sobre o

Futuro da Europa —, serão discutidas algumas das propostas e gostaríamos de saber qual a posição do Governo

em duas delas: na proposta relativa a uma União Europeia para a Saúde, com competências partilhadas entre

os Estados-Membros e a União relativamente aos cuidados de saúde; e na proposta relativa às listas

transnacionais para as eleições europeias.

Gostaríamos, então, de saber qual a posição que o Governo português vai ter no âmbito do Conselho

Europeu.

Relativamente ao debate económico, o ponto três do Conselho Europeu, como já foi dito, no âmbito do

Semestre Europeu haverá um debate onde se incluem as recomendações feitas pela Comissão Europeia. Nas

recomendações a Portugal há várias críticas, nomeadamente a de que temos um sistema fiscal — como já foi

falado — muito burocrático e complexo, que afasta empresas, e de que temos um sistema de proteção social

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que, devido à sua ineficiência e à sua burocracia, tem tirado menos pessoas da pobreza do que seria desejável,

sobretudo face à média europeia.

Mas a crítica mais importante, a nosso ver, é relativa à máquina do Estado, que a Comissão diz ser muito

burocrática. A Comissão diz que Portugal atingiu, nesta década, um novo pico, um novo recorde. São já 740 000

funcionários públicos, um número que só tinha acontecido uma vez, com o Eng.º José Sócrates. Os gastos,

obviamente, têm aumentado. São já 12% do PIB, acima da média da União.

Diria que tal seria compreensível se os problemas de novos professores ou da falta de atração de

profissionais de saúde, por exemplo, tivessem sido resolvidos. Mas o que a Comissão diz é que há graves

problemas nestes dois setores, cujos serviços, como já discutimos amplamente no debate anterior, estão a

piorar, e que temos uma máquina muito burocrática, que exige muita gente — temos cerca de 180 000 pessoas

a trabalhar em burocracia e na administração geral — e que urge simplificar.

A posição do Iniciativa Liberal, obviamente, é de concordância com esta recomendação e de relembrar que

uma das condições europeias do PRR — coisa que também é relembrada neste documento da Comissão — é,

exatamente, o novo pacote legislativo de reorganização da Administração Pública.

Por isso, a pergunta que lhe faço é esta: como está esse trabalho e quando é que poderemos ver o que vai

o Governo propor numa, volto a repetir, exigência para o PRR que vamos receber?

Aplausos do IL.

O Sr. Presidente: — Para intervir, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Diana Ferreira.

A Sr.ª Diana Ferreira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: No âmbito do próximo

Conselho Europeu, há matérias que se relacionam com as condições de vida dos trabalhadores e das famílias

que entendemos que devem ser abordadas neste debate.

Desde logo, começo por reiterar as preocupações que o PCP tem manifestado com a acentuada degradação

da situação económica e social, com o brutal aumento do custo de vida, sem que se vislumbrem quaisquer

medidas efetivas para atacar esta situação. Muito pelo contrário, já que continua a imposição, por parte da União

Europeia, de trajetórias de ajustamento, por exemplo, relativamente à dívida, que prejudicam o crescimento, a

que se juntam a recusa em aumentar os salários e as pensões de forma a repor o poder de compra perdido e a

ausência de medidas de regulação dos preços.

Além dos efeitos diretos das sanções, são também visíveis, não só em Portugal, mas por toda a Europa,

aproveitamentos vários, evidentes na ação de grupos económicos que, a pretexto da guerra, fomentam a

especulação e oneram fortemente os trabalhadores e as populações.

Relativamente à necessidade de combater esses aproveitamentos, o Conselho Europeu tem primado pelo

silêncio e o Governo português também.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, chegados ao sexto pacote de sanções, pergunto: que avaliação é feita dos

seus impactos diretos e indiretos? Vai o Governo colocar no próximo Conselho Europeu a necessidade dessa

mesma avaliação? Procedeu o Governo também a algum tipo de avaliação desses impactos? Tem o Governo

noção do impacto estimado das sanções no aumento dos custos com a energia e no aumento do custo de vida

em geral?

Temos 8% de inflação, salários e pensões que não chegam ao fim do mês, preços de bens essenciais,

incluindo alimentares, que não param de aumentar — muitos duplicaram o preço nas prateleiras dos

supermercados — e não é nem aos agricultores, nem aos pescadores, nem aos produtores que esse aumento

é entregue. Ele fica, mesmo, nas mãos dos grandes grupos económicos, nomeadamente da grande distribuição.

Importava saber o que o Governo tem a dizer sobre isto.

Vai o Governo, no próximo Conselho Europeu, abordar o impacto do redireccionamento da dependência

energética europeia, em especial no que toca aos combustíveis fósseis e ao gás?

Importava perceber também o impacto do aumento do preço do gás natural, da eletricidade e do petróleo

nas contas externas do País. Sr. Primeiro-Ministro, considera o Governo tomar medidas para o controlo e a

fixação de preços, o que, aliás, a realidade tem demonstrado ser determinante para travar esta escalada?

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Para terminar, tenho uma questão muito concreta sobre as taxas de juro. Qual o impacto da provável subida

das taxas de juro pelo BCE (Banco Central Europeu)? Que medidas estão previstas face à possibilidade de

regresso de um padrão de instabilidade das taxas de juro?

Quem vai sofrer as consequências serão as micro, pequenas e médias empresas e também as famílias, de

forma muito particular no que se refere ao crédito à habitação, pelo que pergunto: o que pretende o Governo

fazer para garantir que nenhuma família perde a sua casa?

Esse é um risco que existe, Sr. Primeiro-Ministro, e que assume proporções significativas com a conjugação

do aumento das taxas de juro, do aumento do custo de vida e da perda do poder de compra dos trabalhadores

e das famílias.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção em nome do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Mariana Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro: Vimo-lo,

recentemente, a fazer as pazes com o Conselho das Finanças Públicas, criado pela troica, e não pudemos

deixar de notar que aproveitou também esse momento para se reconciliar com as regras orçamentais europeias.

As mesmas regras que impuseram a austeridade a Portugal, as mesmas regras que condicionam o

desenvolvimento dos serviços públicos são agora consideradas pelo Primeiro-Ministro como ajustadas e

suficientemente flexíveis.

O Governo do Partido Socialista, que, em 2016, dizia que as regras condicionavam o crescimento económico

e precisavam de evoluir, chegou agora à conclusão de que, afinal, está tudo bem, que não é preciso levantar

ondas e não há nada a mudar nas regras orçamentais europeias.

Dir-me-á o Sr. Primeiro-Ministro que os grilhões de ontem ganharam uma nova flexibilidade com a suspensão

das regras orçamentais, mas também saberá que o fim desta bondosa flexibilidade é uma questão de tempo.

Afinal, quando o Governo se apressou a trazer o défice abaixo dos 3% ao ano, no mesmo ano em que houve

três vagas de COVID que se abateram sobre o País e o SNS, porque é que o fez?

Quando o Governo se recusou a aumentar os salários dos funcionários públicos, apesar da inflação,

enquanto cortava o défice de 2022, porque é que o fez?

Na Europa, não sabemos o que defendeu o Governo, mas, em Portugal, o argumento do Ministro das

Finanças foi o de que era necessário poupar, porque os holandeses se preparavam para acabar com a tal

bondosa flexibilidade em 2022.

Afinal, a flexibilidade manteve-se até 2023 e o que não percebemos até hoje, Sr. Primeiro-Ministro, é quantas

caras tem o Governo nesta matéria. Em que é que ficamos? O Governo queria mudar as regras europeias, mas

agora já não quer. Defende flexibilidade na Europa, mas em Portugal age como se essa flexibilidade não

existisse.

O que pensa o Governo português das regras europeias e o que pretende fazer com elas?

Tenho uma segunda pergunta, Sr. Primeiro-Ministro, sobre a Ucrânia. Antes da guerra, a Ucrânia já era o

país mais pobre da Europa e um dos mais endividados: 12% do Orçamento já correspondia ao pagamento de

juros de dívida externa, em boa parte ao FMI (Fundo Monetário Internacional) e à Comissão Europeia, que não

se coibiram de impor condicionalidades e austeridade à Ucrânia.

Com a guerra, esta dívida só tem vindo a aumentar, já que muita da suposta solidariedade, nomeadamente

do apoio militar, é feita sob a forma de empréstimos. Não há doações à Ucrânia. A cada dia que passa, a Ucrânia

fica um país mais endividado.

Nenhum povo e nenhum país se ergue e reconstrói com uma gigantesca dívida às costas.

No final desta guerra — ou mesmo agora, nas zonas que não estão ocupadas — a Ucrânia não pode trocar

o jugo russo por uma dominação silenciosa de credores externos.

O cancelamento de dívida da Ucrânia — em especial a dívida ao FMI, à Comissão Europeia e a outros países

— é uma condição, hoje, de solidariedade e de recuperação daquele país.

O que gostaríamos de perguntar ao Sr. Primeiro-Ministro é se o povo ucraniano conta com o Governo

português para defender o cancelamento da dívida ucraniana na União Europeia e nas suas instituições.

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Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Inês Sousa Real, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: O

facto de ter havido um consenso generalizado quanto ao reconhecimento do estatuto de aderente à União

Europeia da Ucrânia foi um passo importante e coloca-nos do lado certo da história. Mas isso não chega, é

preciso irmos mais longe nas medidas e não se pode transformar a adesão da Ucrânia numa travessia do

deserto.

São precisas medidas que sejam tomadas com mais agilidade e menos burocracia. Desde logo, que se

ponha em cima da mesa a possibilidade de a Ucrânia ser admitida no mercado europeu o mais depressa

possível, para assim ajudarmos a galvanizar a sua economia.

Em segundo lugar, no entendimento do PAN, é também preciso que Portugal e os demais Estados-Membros

ponderem o perdão da dívida ou, pelo menos, a sua renegociação.

Se olharmos para a dívida em relação a Portugal, 462 milhões de dólares de dívida dariam para pagar 17%

das despesas da Ucrânia com a saúde. Ora, estar a exigir o pagamento de uma dívida à Ucrânia seria, não só,

absolutamente imoral, como também estarmos, em contexto de guerra, a ajudar Putin a travar a sua guerra.

Por isso mesmo, Sr. Primeiro-Ministro, perguntamos-lhe se vai avançar para esta renegociação da dívida

ucraniana e se vai defender a sua adesão rápida ao mercado interno.

Por outro lado, não podemos ficar indiferentes à subida desmesurada das taxas de juro da dívida e da Euribor.

Há riscos para o nosso País, em particular para as famílias, que vão ver as prestações do seu crédito à habitação

subir, em média, 38 €/mês só neste ano.

O que lhe perguntamos, Sr. Primeiro-Ministro, é se prevê que, a nível europeu, possam existir medidas, tais

como moratórias parciais, que possam ajudar a aliviar este encargo que as famílias vão ter.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Tavares, do Livre.

O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs.

Deputados: No fim deste debate, votaremos um projeto de resolução do Livre que apoia a concessão do estatuto

de candidato à União Europeia à Ucrânia. É um projeto de resolução que apresentámos no dia 2 de junho,

antecipando um debate que sabíamos que teria de se fazer na sociedade portuguesa.

É um debate no qual vamos ouvir muitas vezes que a Ucrânia tem de se reformar, mas a verdade é que a

União Europeia tem de se reforçar.

O Sr. Primeiro-Ministro disse, ainda agora, que a União Europeia tem de cuidar da sua credibilidade

institucional e financeira, para não haver ricochetes na sua credibilidade no futuro. Foram as suas palavras.

Pergunto: no futuro, Sr. Primeiro-Ministro?!

A credibilidade da União já está em jogo, no presente, quando vemos um Estado em regressão autoritária,

como na Hungria do Sr. Orbán. E não foi por falta de aviso, nos últimos 10 anos, em relação a essa regressão

autoritária.

Sem a ativação do artigo 7.º, de defesa dos valores da União, ou sem a ativação do artigo 259.º do Tratado

sobre o Funcionamento da União Europeia para levar a tribunal o Governo do Sr. Orbán — ações, aliás, que o

Sr. Primeiro-Ministro pode tomar, em nome do Governo português, sem esperar por mais ninguém —, a

mensagem que estaremos a fazer passar a todos os candidatos à União Europeia é esta: «Entrem, porque a

União Europeia não é uma união de valores, é um clube de democracias e algumas ditaduras.»

É por isso que não é mais possível ignorar as conclusões da Conferência sobre o Futuro da Europa ou a

resolução recente do Parlamento Europeu, que nos dizem que é preciso reabrir os tratados e revê-los, para

reforçar uma união democrática e de Estado de direito.

O Livre apresentará, nesta Casa, uma resolução nesse sentido e esperamos o apoio dos mesmos partidos

que apoiarem a resolução de hoje.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.

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O Sr. Rui Tavares (L): — Concluo, Sr. Presidente.

Prometer um alargamento sem se estar disposto a rever os tratados e aprofundar a União Europeia é uma

irresponsabilidade. Quem hoje votar a favor da resolução, dando o estatuto de candidato à Ucrânia, que se

lembre bem disso e que apoie a próxima resolução sobre a revisão dos tratados.

O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal expressou, às 4 horas e 30

minutos do passado dia 24 de fevereiro, uma posição clara e inequívoca sobre a guerra desencadeada pela

Rússia com a invasão da Ucrânia: a condenação absoluta da invasão por parte da Rússia e o apoio incondicional

à Ucrânia.

Esse apoio não ficou na retórica e tem-se concretizado, desde logo, no apoio humanitário, com a adoção de

uma medida extraordinária para acolhimento daqueles que buscam, em Portugal, a proteção internacional.

Fizemo-lo e, em menos de um mês, duplicámos a população ucraniana residente em Portugal.

Expressámo-lo também no apoio militar, disponibilizando à Ucrânia, primeiro, meios não letais e, depois,

letais de que dispúnhamos, bem como meios expressamente adquiridos para esse efeito.

Na minha deslocação a Kiev, tive oportunidade de assinar, com o meu homólogo, um acordo de apoio

financeiro que prevê um apoio direto do Estado português à Ucrânia no valor de 250 milhões de euros, não em

empréstimo, mas, efetivamente, em transferência, 100 milhões de euros dos quais imediatamente este ano.

Este apoio excede a nossa quota no apoio macroeconómico previsto, de 9 mil milhões de euros, aprovada

pelo Conselho Europeu e honraremos, naturalmente, o compromisso assumido com a Ucrânia.

Por isso, o apoio de Portugal expressou-se, concretamente, do ponto de vista humanitário, do ponto de vista

militar e do ponto de vista financeiro.

Perguntam-me se fui ou se sou cético quanto à atribuição à Ucrânia do estatuto de candidato. Não, não sou

cético, mas a atribuição do estatuto de candidato à Ucrânia não é uma questão de fé nem um ato menor. Só é

um ato menor para aqueles — e eu espero que não existam! — que julgam que atribuir hoje o estatuto de

candidato à Ucrânia significa o mesmo que, no passado, atribuir este estatuto a países como a Turquia ou alguns

países dos Balcãs ocidentais.

Aplausos do PS.

O Sr. Marcos Perestrello (PS): — Existem, existem!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Portanto, se não temos reserva mental e se estamos preocupados, como o Sr.

Deputado Rui Tavares está, com a credibilidade, não só futura, mas também presente, da União Europeia, temos

de estar bem cientes do que significa atribuir o estatuto de candidato à Ucrânia.

Foi precisamente por isso que, na minha deslocação a Kiev, tive oportunidade de dizer ao Governo ucraniano

que Portugal disponibilizava, desde logo, todo o apoio técnico e a abertura para partilhar a experiência e troca

de informações sobre o nosso próprio processo de adesão.

Quando, recentemente, acolhemos em Portugal o representante pessoal do Presidente Zelenskyy, ele já teve

oportunidade de ter uma sessão de trabalho — longa, aliás! — na Direção-Geral dos Assuntos Europeus. Está

a desenvolver-se um trabalho bilateral de apoio técnico à Ucrânia, porque, se a Ucrânia tem o estatuto de

candidato, sabemos que esse processo é longo, exigente e incerto. Portanto, disponibilizámos também esse

apoio.

Não é uma questão de ceticismo. É uma questão de, em primeiro lugar, entender que os procedimentos

devem ser respeitados. E o procedimento é claro. Há uma pré-avaliação, que compete à Comissão Europeia

fazer e à qual ela procedeu. No mesmo dia, aliás, procedemos à audição de todos os partidos políticos

representados nesta Assembleia da República e expressámos publicamente que Portugal acompanharia a

recomendação da Comissão Europeia para a atribuição do estatuto de candidato à Ucrânia e à Moldova.

Mas havia outra preocupação, a de que esta matéria não fosse um fator de divisão na União Europeia e que

esta, pelo contrário, mantivesse a unidade inquebrantável que tem demonstrado, desde o dia 24 de fevereiro,

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sobre a mesma. Felizmente, tem havido condições para que essa unidade se construa em torno do parecer da

Comissão Europeia.

Isto dito, quem apoia o estatuto de candidato não pode deixar de colocar a seguinte questão: a União

Europeia pode acomodar estes países, ora candidatos, com a atual arquitetura institucional e orçamental ou não

o pode fazer? No meu entender, a resposta é muito clara: não o pode fazer.

Se, até há bem pouco tempo, eu entendia e partilhava o entendimento de que a revisão dos tratados não era

uma prioridade — e, tal como acontece com o tratado orçamental, o Tratado de Lisboa confere a flexibilidade

necessária para se poder responder ao que é necessário —, hoje, não tenho a menor das dúvidas de que, com

um desafio desta dimensão, não temos as condições institucionais nem orçamentais para manter a atual

arquitetura.

Esta é uma consequência que espero que todos os meus colegas que já se expressaram publicamente no

apoio à atribuição do estatuto de candidato venham a ter em conta. Espero também que nesta Assembleia todos

tenhamos bem presente quais são essas consequências.

Como há pouco enunciou, a meio caminho, o Sr. Deputado Rui Tavares, essas consequências significam,

designadamente, que, conhecendo hoje os valores do PIB per capita de cada um e não podendo, em rigor,

antecipar qual será ele em 2026, seguramente, o Alentejo, uma das regiões atuais de convergência, deixaria de

o ser e três outras ficariam na fronteira de deixarem de ser regiões de coesão.

Essa é uma consciência que todos temos de ter para se compreender que, quando dizemos que é necessário

ter uma nova arquitetura orçamental, devemos ter em perspetiva aquilo que será Portugal em 2026 e nos anos

seguintes. Isto, tendo em conta, designadamente, a importância e a imprescindibilidade para o nosso País de

manter elevados níveis de investimento, quer público, quer privado, para os quais as contribuições orçamentais

da União Europeia desempenham um papel absolutamente essencial.

Portanto, não estou cético, estou é determinado em que todos tenham consciência do passo que vamos dar.

Fico muito contente de ver essa consciência transversalmente compreendida na Assembleia da República e

espero que ela também exista no Conselho Europeu e que seja consequente e duradoura ao longo dos próximos

anos. Espero ainda que aqueles que deixaram de ser frugais não se lembrem de o voltar a ser na altura em que

as necessidades serão bastante maiores do que as de hoje. É preciso que todos tenham bem essa consciência.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem de concluir.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, permita-me só duas respostas finais.

Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, sim, foram as regras que impuseram a troica, mas foram também as regras

que permitiram a «destroiquização» de Portugal, que iniciámos em novembro de 2015. Foram também essas

mesmas regras que possibilitaram uma resposta extraordinária à COVID e que permitiram à União Europeia dar

um passo histórico de emissão de dívida em nome de todos nós.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Se pediu a opinião, pediu a opinião!

O Sr. Primeiro-Ministro: — São, seguramente, regras que nunca, a 27, haverá acordo para podermos

alterar.

A saúde das nossas finanças públicas e a vontade e determinação de assegurar uma trajetória de redução

da nossa dívida pública para 100% do Produto no final desta Legislatura não resultam da imposição das regras

orçamentais. É uma vontade política própria e legitimada neste Parlamento.

Aplausos do PS.

A última palavra é para a Sr.ª Deputada Diana Ferreira. Tem toda a razão na preocupação e na sinalização

das gravíssimas consequências que esta situação está a provocar no custo de vida e na crise energética. Só

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divergimos num ponto: a causa não está nas sanções, está em quem desencadeou e prossegue esta guerra

ilegítima e brutal na Ucrânia.

Aplausos do PS.

O Sr. Marcos Perestrello (PS): — A causa está na guerra!

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, chegámos ao fim deste ponto da ordem de trabalhos e despedimo-nos

do Sr. Primeiro-Ministro, da Sr.ª Ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares e do Sr. Ministro dos Negócios

Estrangeiros.

Vamos agora proceder à verificação do quórum para a votação que se vai realizar.

Pausa.

Srs. Deputados, temos quórum, não se tendo verificado quaisquer dificuldades de registo.

Vamos, então, proceder à votação do Projeto de Resolução n.º 89/XV/1.ª (L) — Recomenda o adequado

acompanhamento do pedido da Ucrânia de adesão à UE, favorecendo a atribuição do estatuto formal de

candidato à UE a este país.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CH, do IL, do BE, do PAN e do L

e votos contra do PCP.

A Sr.ª Deputada Paula Santos pediu, entretanto, a palavra para que efeito?

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, é para anunciar que entregaremos uma declaração de voto

por escrito.

O Sr. Presidente: — Fica registado, Sr.ª Deputada.

O Sr. Deputado Pedro Filipe Soares pediu também a palavra. É para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É para o mesmo efeito, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr. Deputado.

O Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — É também para o mesmo efeito, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Não havendo mais pedidos de palavra, a Sr.ª Secretária da Mesa Maria da Luz Rosinha

passará a anunciar os nomes dos nossos colegas que participaram nesta sessão por via remota.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, passo a anunciar à Câmara que os Srs.

Deputados do Partido Socialista Miguel Matos e Ana Bernardo, os Srs. Deputados do Partido Social Democrata

Joaquim Miranda Sarmento e Sónia Ramos e a Sr.ª Deputada do Chega Rita Matias acompanharam os

trabalhos por videoconferência, em virtude de estarem em isolamento profilático.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a próxima sessão plenária é amanhã, quinta-feira, com uma ordem do

dia composta por vários pontos.

No primeiro ponto, teremos a apreciação do Projeto de Lei n.º 40/XV/1.ª (PSD) — Décima alteração à Lei n.º

37/81, de 3 de outubro, que aprova a Lei da Nacionalidade, revogando o artigo 14.º dessa lei, juntamente com

as iniciativas que sobem a Plenário por arrastamento, os Projetos de Lei n.os 28/XV/1.ª (PCP) — Determina a

cessação de vigência do regime de concessão da nacionalidade portuguesa por mero efeito da descendência

de judeus sefarditas expulsos de Portugal em 1496 (10.ª alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, que aprova

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a Lei da Nacionalidade), 122/XV/1.ª (BE) — Altera a Lei da Nacionalidade e o Regulamento Emolumentar dos

Registos e Notariado (10.ª alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, e 37.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 322-

a/2001, de 14 de dezembro), 126/XV/1.ª (L) — Alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, na sua redação atual,

que aprova a Lei da Nacionalidade – revogação da norma que faz depender os efeitos da nacionalidade da

filiação estabelecida durante a menoridade, 127/XV/1.ª (L) — Alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, na sua

redação atual, que aprova a Lei da Nacionalidade – atualização dos requisitos de que depende a concessão de

nacionalidade, por naturalização, aos descendentes de judeus sefarditas portugueses, 132/XV/1.ª (IL) — Décima

alteração à Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, que aprova a Lei da Nacionalidade, 133/XV/1.ª (PS) — Define as

circunstâncias em que a filiação estabelecida após a menoridade pode produzir efeitos relativamente à

nacionalidade, procedendo à 10.ª alteração à Lei da Nacionalidade, aprovada pela Lei n.º 37/81, de 3 de outubro

e 134/XV/1.ª (PAN) — Revoga o artigo 14.º da Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, que aprova a Lei da Nacionalidade.

Depois, teremos em debate a Proposta de Lei n.º 120/XIV/3.ª (ALRAA) — Primeira alteração ao Decreto-Lei

n.º 109-B/2021, de 7 de dezembro, que aprova a atualização do valor da Retribuição Mínima Mensal Garantida

e cria uma medida excecional de compensação.

Srs. Deputados, não gosto de ler com tanto ruído à minha volta.

Pausa.

Se me permitem, estava a dizer que, no terceiro ponto, teremos a discussão do Projeto de Lei n.º 809/XIV/2.ª

(Cidadãos) — Valorização do ensino politécnico nacional e internacionalmente, em conjunto com as iniciativas

que com ele sobem a Plenário, os Projetos de Lei n.os 115/XV/1.ª (PCP) — Valorização e reconhecimento do

Ensino Superior Politécnico, reconhecendo a possibilidade de conferir o grau de doutor e 125/XV/1.ª (BE) —

Cria a possibilidade de administração de doutoramentos no subsistema de ensino superior politécnico, através

da alteração da Lei de Bases do Sistema Educativo e do regime jurídico das instituições do ensino superior.

De seguida, será apreciada a Petição n.º 216/XIV/2.ª (Arlindo Ferreira e outros) — Pelo fim das vagas no

acesso ao 5.º e 7.º escalões da carreira docente, em conjunto com os Projetos de Resolução n.os 54/XV/1.ª

(PCP) — Recomenda ao Governo a eliminação da imposição administrativa de vagas para a progressão aos 5.º

e 7.º escalões da carreira docente, 56/XV/1.ª (BE) — Pela remoção dos obstáculos à progressão de docentes

para os 5.º e 7.º escalões e 80/XV/1.ª (PAN) — Procede à revogação do atual sistema de acesso aos 5.º e 7.º

escalões da carreira docente, procedendo à alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos

Professores dos Ensinos Básico e Secundário.

Depois, teremos em apreciação a Petição n.º 145/XIV/2.ª (Célia Cristina Martins dos Santos Freire) — Pela

requalificação urgente do IC8, juntamente com os Projeto de Resolução n.os 57/XV/1.ª (PCP) — Requalificação

do IC8, 68/XV/1.ª (CH) — Recomenda ao Governo a requalificação do IC8, 70/XV/1.ª (BE) — Requalificação

urgente do IC8, 77/XV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo a adoção de medidas de requalificação do IC8,

83/XV/1.ª (PAN) — Requalificação urgente do IC8 e 86/XV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que execute

com urgência o troço do IC8 entre Pombal e Avelar (Ansião), com inclusão de desnivelamentos dos acessos, e

proceda à cabimentação dos recursos financeiros necessários.

No final do debate, possivelmente, haverá votação, se assim continuar a ser requerido pela Assembleia

Legislativa da Região Autónoma dos Açores.

Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 45 minutos.

———

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação

Relativa ao Projeto de Resolução n.º 89/XV/1.ª:

Entre outros importantes aspetos, de que são exemplo as condições e exigências impostas a um país no

processo de adesão à União Europeia — que, como a realidade demonstra, visam, no fundamental, assegurar

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um caminho de abdicação de soberania desse país e da sua submissão ao domínio económico e político das

grandes potências e dos seus grupos económicos e financeiros —, o processo de adesão da Ucrânia à União

Europeia não deve ser dissociado do contexto político em que se insere, questão que assume uma acrescida

relevância tendo em conta a situação na Europa e a guerra neste país.

O PCP considera que é urgente parar a política de instigação do confronto, que só levará ao agravamento

do conflito, à perda de mais vidas humanas, a maior sofrimento e destruição.

O PCP considera que são necessárias iniciativas que contribuam para a desescalada do conflito na Ucrânia,

para o cessar-fogo e para um processo de diálogo, com vista a uma solução negociada, à resposta aos

problemas de segurança coletiva, ao desarmamento na Europa e ao cumprimento dos princípios da Carta da

ONU (Organização das Nações Unidas) e da Ata Final da Conferência de Helsínquia.

Ora, o atual processo de adesão da Ucrânia à União Europeia parte de pressupostos divergentes destas

preocupações, inscrevendo-se na escalada de guerra e confrontação.

Com este enquadramento e objetivo subjacentes, consideramos que não faz sentido o debate sobre a

atribuição do estatuto de candidato à União Europeia à Ucrânia e, por idêntica razão, à Moldova ou à Geórgia.

Além do mais, o PCP entende que a integração de um país na União Europeia, além de dever resultar de

uma decisão soberana, democrática e informada de cada povo, face à natureza neoliberal, federalista e

militarista deste processo de integração europeu, deve ter como condição o acautelar dos seus impactos

económicos, assegurando antecipadamente os adequados meios financeiros que garantam, efetivamente, uma

convergência económica e social no sentido do progresso, sem penalizar países como Portugal.

Assembleia da República, 23 de junho de 2022

A Deputada do PCP, Paula Santos.

———

Nota: As declarações de voto anunciadas pelos Deputados do PS Eurico Brilhante Dias, e pelo Deputado

do BE Pedro Filipe Soares não foram entregues no prazo previsto no n.º 3 do artigo 87.º do Regimento da

Assembleia da República.

———

Relativa ao Projeto de Resolução n.º 22/XV/1.ª [votado na reunião plenária de 9 de junho de 2021 — DAR I

Série n.º 23 (2022-06-11)]:

O Grupo Parlamentar do PCP votou contra este projeto de resolução por não acompanhar (nem neste

momento, nem em outros momentos anteriores em relação a outras situações semelhantes) a aplicação de

sanções que têm consequências profundamente negativas sobre os povos dos países envolvidos na guerra,

sobre povos do continente europeu e do resto do mundo.

Esta espiral de sanções arrasta o mundo para uma ainda mais grave situação económica e social. O

aproveitamento da guerra e das sanções pelo grande capital — a exemplo do que sucedeu com a epidemia —

torna-se cada vez mais evidente com a espiral de especulação, o aumento dos preços da energia, dos alimentos

e de outros bens de primeira necessidade, o ataque às condições de vida e o agravamento da pobreza e da

fome no plano mundial, traduzindo-se num aumento colossal dos lucros das multinacionais.

Sanções que têm consequência no agravamento das condições de vida dos trabalhadores e do povo do

nosso País — o que é confirmado pelo atual momento económico e social que o nosso País enfrenta.

Numa situação de profunda dependência externa como é a portuguesa, a evolução da situação económica

no plano internacional não pode deixar de ser vista com profunda preocupação.

A situação de dependências externas não se resolve transferindo dependências para outros pontos do globo

e a dependência externa ao nível da energia do nosso País também não se resolve transferindo essa

dependência. Resolve-se fazendo um caminho que assegure a nossa independência e soberania, inseparável

da reindustrialização que o PCP tem defendido e do controlo público de setores estratégicos como os da energia

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(eletricidade, gás, combustíveis, energias renováveis,…), aliado ao controlo de preços em bens fundamentais,

tanto no plano energético como no plano alimentar, necessidade que ganha cada vez mais expressão face ao

momento atual.

Também não acompanhamos um caminho de fomento da corrida aos armamentos, o incremento de alianças

e parcerias belicistas ou a banalização do militarismo nas relações internacionais.

O caminho para acabar com a guerra na Ucrânia (uma guerra que nunca deveria ter começado) passa pelo

desenvolvimento de iniciativas e medidas que possibilitem um cessar-fogo, que garantam o apoio humanitário

às populações e aos refugiados, que promovam o diálogo com vista a uma solução negociada para o conflito.

Simultaneamente, é fundamental trabalhar para uma arquitetura de segurança na Europa, assente em garantias

de segurança mútua, na paz, na cooperação entre os povos e no respeito do direito internacional, da Carta das

Nações Unidas e da Ata Final da Conferência de Helsínquia. Entendemos que deve ser neste caminho que o

Governo se deve empenhar, bem como a União Europeia, e nada disto se encontra refletido neste projeto de

resolução.

Assembleia da República, 23 de junho de 2022.

A Deputada do PCP, Diana Ferreira.

[Recebida na Divisão de Redação em 23 de junho de 2022.]

———

Relativa ao Projeto de Resolução n.º 46/XV/1.ª [votado na reunião plenária de 3 de junho de 2021 — DAR I

Série n.º 21 (2022-06-04)]:

O PCP votou contra este projeto de resolução, não acompanhando opções de sanções ou embargos em

relação a nenhum país.

Este projeto de resolução refere a dependência externa da União Europeia em matéria de importação de gás

russo, propondo o fim dessa importação, mas não fazendo qualquer referência quanto a dependências que se

criarão em relação a outros países e não apontando a necessidade de fomento à produção nacional de forma a

combater dependências externas.

A situação de dependências externas não se resolve transferindo dependências para outros pontos do globo,

nem no âmbito da União Europeia, nem em relação a Portugal. Estas dependências resolvem-se com um

caminho que assegure a nossa independência e soberania, inseparável da reindustrialização que o PCP tem

defendido e do controlo público de setores estratégicos como os da energia (eletricidade, gás, combustíveis,

energias renováveis), aliado ao controlo de preços em bens fundamentais, tanto no plano energético como no

plano alimentar, necessidade que ganha cada vez mais expressão face ao momento atual.

Neste projeto de resolução nada disto é referido, pelo que não o acompanhamos.

Assembleia da República, 23 de junho de 2022

A Deputada do PCP, Diana Ferreira.

[Recebida na Divisão de Redação em 23 de junho de 2022.]

———

Relativa ao Projeto de Resolução n.º 49/XV/1.ª [votado na reunião plenária de 9 de junho de 2021 — DAR I

Série n.º 23 (2022-06-11)]:

O Grupo Parlamentar do PCP votou contra este projeto de resolução por as suas recomendações apontarem

num caminho de aprofundamento federalista da União Europeia e de colocarem em causa a independência e

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23 DE JUNHO DE 2022

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soberania de Estados-Membros num conjunto de dimensões, de que são exemplo as propostas quanto a

referendos europeus, à criação de um Senado da União Europeia e mesmo a referência às listas transnacionais.

Aliás, a propósito das listas transnacionais, importa dizer que as mesmas significam uma intromissão em

competências dos Estados, na sua organização do ato eleitoral e tradições eleitorais próprias.

O PCP rejeita a criação de um círculo eleitoral comum e de listas transnacionais para as eleições para o

Parlamento Europeu, o que, além de acentuar desequilíbrios e distorções já hoje existentes, representaria uma

criação artificial, sem correspondência com a realidade na Europa ou com os interesses dos povos, que

contribuiria para um maior afastamento de eleitores e eleitos, afastando-nos de um projeto de cooperação entre

Estados soberanos e iguais em direitos.

Criar melhores condições para uma mais genuína expressão da vontade de cada povo e pluralidade de

representação de cada Estado-Membro deve ser alcançado através de uma redistribuição do número de

mandatos por Estado-Membro no Parlamento Europeu, compensando aqueles que, em termos relativos, mais

mandatos perderam no contexto dos sucessivos processos de alargamento e que mais foram prejudicados pela

desequilibrada distribuição de mandatos fixada pelo Tratado de Lisboa.

Este projeto de resolução alude ainda à dependência externa da União Europeia em matéria energética,

colocando a questão no âmbito do fim de dependências da Federação Russa, mas não manifestando

preocupação quanto a dependências que se criarão em relação a outro país, e refere a necessidade do combate

à dependência energética num quadro da União Europeia.

A situação de dependências externas não se resolve transferindo dependências para outros pontos do globo

e a dependência externa ao nível da energia do nosso País também não se resolve transferindo essa

dependência. Resolve-se fazendo um caminho que assegure a nossa independência e soberania, inseparável

da reindustrialização que o PCP tem defendido e do controle público de setores estratégicos como os da energia

(eletricidade, gás, combustíveis, energias renováveis,…), aliado ao controle de preços em bens fundamentais,

tanto no plano energético como no plano alimentar, necessidade que ganha cada vez mais expressão face ao

momento atual.

Os Deputados do PCP.

[Recebida na Divisão de Redação em 23 de junho de 2022.]

———

Relativa aos Projetos de Lei n.os 7/XV/1.ª, 52/XV/1.ª e 91/XV/1.ª [votados na reunião plenária de 9 de junho

de 2021 — DAR I Série n.º 23 (2022-06-11)]:

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista (GPPS) votou contra as iniciativas assinaladas em epígrafe, em

votação realizada no passado dia 9 de junho de 2022.

Estas iniciativas, da autoria do Chega, PCP e BE, pretendiam, por um lado, atribuir um complemento especial

de pensão no valor de 300 € por mês aos antigos combatentes e, por outro, estabelecer um complemento

vitalício de pensão e uma pensão mínima de dignidade aos antigos combatentes.

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista não desvaloriza a bondade destas medidas. No entanto, não pode

ignorar o seu elevado peso orçamental, representando um acréscimo financeiro muito considerável, na ordem

das centenas de milhões de euros anuais. Além disso, são medidas que, em alguns casos, não beneficiariam

necessariamente aqueles que mais precisam, podendo até mesmo provocar situações de iniquidade.

Por outro lado, são propostas que promovem uma inversão total da lógica contributiva do sistema de pensões

vigente em Portugal, promovendo injustiças no sistema que o GPPS não pode aceitar. O seu impacto financeiro

coloca em causa, inclusive, a sustentabilidade da própria segurança social e das finanças públicas — uma

preocupação que não é exclusiva do GPPS, sendo partilhada e compreendida por vários antigos combatentes

com quem tem reunido ao longo dos últimos meses.

Além disto, não podemos ignorar que o complemento especial de pensão foi atualizado a 1 de janeiro de

2021, com a entrada em vigor do Estatuto do Antigo Combatente, crescendo de 3,5% para 7%, tendo com isto

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I SÉRIE — NÚMERO 26

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duplicado o seu valor e beneficiado sobretudo aqueles que mais precisam, aumentando o valor da prestação

social aos antigos combatentes com pensões mais baixas.

No mesmo sentido, não se deixa de relembrar que a generalidade das medidas previstas no referido Estatuto,

que foi objeto de um amplo consenso na passada Legislatura, se encontra efetivamente implementada e em

execução, como é o caso do Cartão de Antigo Combatente, da gratuitidade dos transportes públicos nas áreas

metropolitanas e comunidades intermunicipais, da isenção de taxas moderadoras, da gratuitidade da entrada

nos museus e monumentos nacionais, da insígnia nacional do antigo combatente ou da Unidade Técnica para

os Antigos Combatentes.

O voto contra do GPPS não implica nem significa, no entanto, que não estejamos disponíveis para, em

conjunto com as restantes forças políticas e com o Governo, ao longo dos próximos quatro anos de Legislatura,

rever os apoios e benefícios consagrados aos antigos combatentes, por temos plena consciência e

determinação de que é possível fazer mais e melhor e continuar a avançar neste domínio, valorizando e

honrando aqueles que honraram e cumpriram o seu dever militar, em muitos casos contra sua vontade.

Palácio de São Bento, 9 de junho de 2022.

As Deputadas e os Deputados do PS.

[Recebida na Divisão de Redação em 23 de junho de 2022.]

———

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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