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Quinta-feira, 27 de outubro de 2022 I Série — Número 54
XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)
REUNIÃOPLENÁRIADE26DEOUTUBRODE 2022
Presidente: Ex.mo Sr. Augusto Ernesto Santos Silva
Secretárias: Ex.mas Sr.as Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Lina Maria Cardoso Lopes Palmira Maciel Fernandes da Costa Helga Alexandra Freire Correia
S U M Á R I O
O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 6 minutos.
Deu-se conta da entrada na Mesa dos Projetos de Resolução n.os 277 a 279/XV/1.ª, do Inquérito Parlamentar n.º 3/XV/1.ª e do Projeto de Lei n.º 363/XV/1.ª
Na abertura do debate conjunto, na generalidade, das Propostas de Lei n.os 37/XV/1.ª (GOV) — Aprova a Lei das
Grandes Opções para 2022-2026 e 38/XV/1.ª (GOV) — Aprova o Orçamento do Estado para 2023, usou da palavra o Primeiro-Ministro (António Costa), que respondeu depois a pedidos de esclarecimento dos Deputados Joaquim Miranda Sarmento (PSD), Eurico Brilhante Dias (PS), André Ventura (CH), João Cotrim Figueiredo (IL), Jerónimo de Sousa (PCP), Catarina Martins (BE), Inês de Sousa Real (PAN), Rui
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Tavares (L), João Torres (PS), Rui Cristina (PSD), Rui Afonso (CH), Paula Santos (PCP), José Moura Soeiro (BE), Luís Gomes (PSD), Jamila Madeira (PS), Afonso Oliveira (PSD), Miguel Matos (PS), Alexandre Poço (PSD), Pedro Pinto (CH), Vera Braz (PS), Patrícia Dantas (PSD), Tiago Barbosa Ribeiro (PS), Paulo Moniz (PSD), Maria de Fátima Fonseca e Pedro Cegonho (PS).
Usaram ainda da palavra, durante o debate, a diverso título, os Deputados Ricardo Baptista Leite (PSD), Porfírio Silva e Tiago Brandão Rodrigues (PS), Hugo Patrício Oliveira
(PSD), Alma Rivera (PCP), Rita Matias (CH), Carlos Guimarães Pinto (IL), Pedro Anastácio (PS), Bruno Dias (PCP), Eurídice Pereira e Joana Sá Pereira (PS), Paula Cardoso (PSD), Inês de Sousa Real (PAN), Ivan Gonçalves (PS), Filipe Melo (CH), Rui Rocha (IL) e Pedro Pessanha (CH).
Deu-se conta do Deputado que esteve presente, por videoconferência, na reunião plenária.
O Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 4 minutos.
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O Sr. Presidente: — Muito boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e demais Sr.as e Srs. Membros do Governo.
Temos quórum, pelo que podemos dar início à sessão.
Eram 15 horas e 6 minutos.
Peço aos Srs. Agentes da autoridade que abram as galerias ao público.
A Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha, assim que houver condições, irá proceder à leitura do expediente.
Faça favor, Sr.ª Secretária.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, muito boa tarde a todas e a todos. Passo a anunciar que deram entrada na Mesa, e foram admitidas pelo Sr. Presidente, as seguintes iniciativas:
Projetos de Resolução n.os 277/XV/1.ª (PS), que baixa à 4.ª Comissão, em conexão com a 11.ª Comissão,
278/XV/1.ª (CH), que baixa à 11.ª Comissão, em conexão com a 2.ª Comissão, e 279/XV/1.ª (PSD), que baixa
à 12.ª Comissão; Inquérito Parlamentar n.º 3/XV/1.ª (CH); e Projeto de Lei n.º 363/XV/1.ª (PSD), que baixa à
12.ª Comissão.
É tudo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Secretária. A nossa ordem do dia é dedicada ao início da apreciação, na generalidade, das Propostas de Lei
n.os 37/XV/1.ª (GOV) — Aprova a Lei das Grandes Opções para 2022-2026 e 38/XV/1.ª (GOV) — Aprova o
Orçamento do Estado para 2023.
Para apresentar as propostas de lei, em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro (António Costa): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há duas formas essenciais de enfrentar a situação que estamos a viver, ou esgotarmo-nos na mera resposta à emergência, à
emergência da guerra, da inflação, da crise energética, da seca severa, ou continuarmos a enfrentar, lado a lado
com os portugueses, estes pesados desafios do presente sem nunca deixar de olhar mais além, focados no
futuro e na ambição reformista que definimos para a Legislatura.
A opção do Governo é muito clara: cuidar do presente sem perder o rumo do futuro.
Aplausos do PS.
Temos, naturalmente, de responder à emergência do presente. Por isso, mobilizámos já 5,6 mil milhões de
euros, entre medidas de apoio ao rendimento das famílias e medidas de controlo do custo da energia; por isso,
propomos a atualização do indexante dos apoios sociais e do salário mínimo nacional acima da inflação; por
isso, prosseguimos o aumento do complemento solidário para idosos para o fazer convergir com o limiar da
pobreza; por isso, congelámos o preço dos transportes públicos e limitámos a 2% o aumento das rendas das
casas; por isso, vamos aprovar legislação que protege as famílias com crédito à habitação.
Sim, cuidamos de responder às necessidades do presente ao mesmo passo com que mantemos, com toda
a determinação, o rumo que traçámos para esta Legislatura.
Aplausos do PS.
Respeitamos, assim, a vontade dos portugueses, que votaram para garantir um horizonte estável de
governação, e acompanhamos os parceiros sociais, que assinaram, precisamente, um acordo de médio prazo
para a melhoria dos rendimentos, dos salários e da competitividade. Cumprimos o nosso dever, o nosso
compromisso com o presente e o futuro de Portugal.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Por isso, esta proposta de Orçamento é muito mais do que a proposta de Orçamento para o próximo ano. Este será o primeiro dos quatro Orçamentos que, ao longo de 2023, 2024, 2025
e 2026, vão dar execução à visão estratégica e às metas que nos propusemos alcançar: garantir que todos os
anos continuamos a crescer acima da média da União Europeia, aproximando-nos, a cada ano, dos países mais
desenvolvidos da Europa;…
Aplausos do PS.
… promover que este crescimento seja partilhado de forma mais justa, com o aumento da riqueza distribuída
em salários; aumentar a margem das opções orçamentais, com a redução do peso da dívida pública.
Sim, mantemo-nos firmes no cumprimento das metas que quantificámos e nos propusemos alcançar até
2026: crescer anualmente, em média, 1 ponto percentual acima da zona euro; aumentar de 45% para 48% o
peso dos salários no produto interno bruto (PIB); reduzir a dívida pública para menos de 100% do produto interno
bruto em 2026.
Aplausos do PS.
E vamos alcançar estas metas continuando a responder às diversas necessidades do País.
Com este Orçamento: reforçamos de novo o Serviço Nacional de Saúde (SNS), com um crescimento de
7,8% da sua dotação face à previsão de execução neste ano de 2022; vamos instalar os primeiros 108 dos 365
centros tecnológicos especializados que vão modernizar o ensino profissional até 2025; aumentamos o apoio
sustentado às artes em 114%;…
O Sr. Miguel Matos (PS): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … o investimento na Lei de Programação de Infraestruturas e Equipamentos das Forças e Serviços de Segurança cresce 33%;…
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … a Polícia Judiciária (PJ) tem o maior reforço de sempre em meios humanos e capacidade pericial para dar combate à criminalidade económica e financeira, em especial à corrupção;…
Aplausos do PS.
Risos do Deputado do CH Pedro Pinto.
… e robustecemos o orçamento da defesa, fortalecendo as nossas Forças Armadas e honrando os nossos
compromissos internacionais, num contexto marcado pela guerra da Rússia contra a Ucrânia.
Em suma, estamos a cumprir o nosso mandato, estamos a cumprir com os portugueses e estamos a cumprir
com Portugal.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O acordo de médio prazo assinado em sede de concertação social
assume como meta para 2026 acelerar para 2% o crescimento da produtividade. Esta é uma condição
necessária para garantirmos melhores empregos com melhores salários. Para produzirmos mais e com mais
valor acrescentado, estabelecemos como prioridades os investimentos nas qualificações e na inovação.
Quanto a qualificações, pretendemos, até ao final desta década, aumentar para 60% a percentagem de
jovens com 20 anos a frequentarem o ensino superior, incluindo um especial impulso às áreas das ciências,
tecnologias, engenharia, artes e matemática, e também elevar para 60% a proporção de adultos que todos os
anos participam em ações de formação profissional.
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Temos vindo a alargar a base social do ensino superior por via da redução das propinas e do reforço da ação
social escolar, permitindo aumentar o número de jovens inscritos no ensino superior,…
Aplausos do PS.
… e neste Orçamento do Estado para 2023 aumentamos o financiamento às instituições do ensino superior
e reforçamos, mais uma vez, a ação social escolar, designadamente no apoio aos estudantes deslocados.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Prosseguimos também o maior investimento de sempre em alojamento estudantil, acelerando as operações de construção, aquisição e renovação das residências para estudantes.
Quanto à inovação, fixámos como meta aumentar o peso da investigação e desenvolvimento no produto
interno bruto para 3%, em 2030, sendo um terço em investimento público e dois terços em investimento privado.
Aplausos do PS.
A autonomia financeira das empresas encontra-se em máximos e o investimento empresarial tem vindo a
superar recordes. O número de investigadores nas empresas mais do que duplicou face a 2015 e a despesa em
investigação e desenvolvimento atingiu um novo máximo, mas queremos acelerar este caminho.
O financiamento às empresas aumenta 90% face ao Portugal 2020 em relação ao conjunto de verbas que
lhes são destinadas, no PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) e no Portugal 2030, para apoiar a sua
modernização e internacionalização e ainda para as apoiar na dupla transição energética e digital.
No acordo firmado com os parceiros sociais, reforçámos as medidas de redução seletiva do IRC (imposto
sobre o rendimento das pessoas coletivas), que, no seu conjunto, representam uma descida de impostos sobre
as empresas superior àquela que resultaria de uma descida transversal de 2 pontos percentuais na taxa de IRC.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Desde já, neste Orçamento do Estado: melhoramos os incentivos fiscais à inovação, ao investimento, à localização no interior e à capitalização do nosso tecido empresarial; apoiamos as
pequenas e médias empresas, reduzindo a sua carga fiscal; reforçamos os incentivos a que as empresas
ganhem dimensão e escala, alargando a taxa reduzida das pequenas e médias empresas a todas as empresas
que tenham até 500 trabalhadores; e asseguramos que as empresas que resultem da fusão de pequenas e
médias empresas e passem a ter maior dimensão manterão, transitoriamente, a taxa reduzida de IRC.
Aplausos do PS.
Estes são os incentivos certos para as empresas melhorarem a sua produtividade, mas é essencial
acompanhar o esforço das empresas com o reforço do investimento público, para melhorar a competitividade e,
assim, elevar o peso das exportações no produto interno bruto para 53% até 2030. Este Orçamento do Estado
assegura o maior nível de investimento público dos últimos 12 anos, com especial destaque para o investimento
nas infraestruturas de transporte, muito em particular na ferrovia, construindo um território mais coeso
internamente e mais competitivo externamente.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O acordo alcançado em sede de concertação social inclui um outro
grande objetivo para 2026, o de elevar o peso das remunerações no produto interno bruto, convergindo com a
média da União Europeia. Ou seja, queremos garantir uma mais justa repartição da riqueza produzida com os
trabalhadores.
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De acordo com as atuais previsões económicas, este objetivo traduz-se numa valorização da remuneração
média em cerca de 20% até 2026.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Em 2023, o compromisso tripartido assumido no acordo é o de os aumentos salariais no setor privado atingirem os 5,1%, com enfoque no salário médio, e o aumento do salário mínimo
nacional ser de 7,8%.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — O acordo garante também, para os anos seguintes, uma trajetória de previsibilidade que dá confiança às empresas e aos trabalhadores.
O Estado contribui para este esforço de valorização real dos rendimentos, desde logo, com a atualização das
pensões e prestações sociais e com o acordo de valorização plurianual de salários e carreiras, que, nesta
semana, assinámos com os sindicatos da função pública — o primeiro acordo plurianual de sempre, o primeiro
acordo sobre rendimentos na função pública desde o início deste século.
Aplausos do PS.
Mas quando falamos de rendimentos não falamos só de aumento de salários, de pensões ou de prestações
sociais, falamos também da política fiscal e de outras políticas públicas essenciais para melhorar o rendimento
disponível das famílias.
Protestos do Deputado da IL Carlos Guimarães Pinto.
No Orçamento do Estado criamos um incentivo fiscal inovador para as empresas que aumentem os salários
em linha com o estabelecido no acordo de concertação social, ou acima, e promovemos uma redução transversal
dos impostos pagos pelas famílias, por via da atualização dos escalões, da redução da taxa média a partir do
segundo escalão do IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares) e também, em resultado da
reformulação do mínimo de existência, da taxa média para quem ganhe até 1000 € por mês.
Dou um exemplo: para um casal com o salário médio e com dois filhos pequenos, as reformas do IRS — que
temos vindo a fazer, em 2018 e em 2022, e que agora propomos para 2023 — representam já um
desagravamento fiscal anual de 1288 €.
Aplausos do PS.
Uma atenção muito especial é dedicada ao reforço do rendimento dos jovens, porque queremos que possam
concretizar em Portugal os seus projetos de vida.
Assim, nesta proposta de Orçamento, reforçamos o IRS Jovem, criamos um programa de apoio à contratação
de jovens qualificados com salários iguais ou superiores a 1320 €. Na habitação, reforçamos o apoio ao
arrendamento e para as jovens famílias prosseguimos o caminho de reforço do abono de família, da Garantia
para a Infância e da dedução fiscal a partir do segundo filho, ao mesmo tempo que vamos alcançar, no mês de
setembro, 70 000 crianças com a universalização progressiva da gratuitidade das creches.
Aplausos do PS.
Em suma, este é um Orçamento que garante mais rendimentos e menos impostos para as famílias.
É com o investimento na inovação, com mais emprego e com melhores salários que robustecemos a nossa
economia e melhoramos a vida no dia a dia dos portugueses, e é com contas certas que asseguramos
previsibilidade e estabilidade às nossas políticas, criando, simultaneamente, margem para podermos acorrer às
despesas inesperadas.
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A nossa estratégia de prudência orçamental, amiga do crescimento, permite-nos dispor da margem
necessária para aliviar o impacto da inflação na vida das famílias e na atividade das empresas e do setor
agrícola.
Já demonstrámos que é possível compatibilizar responsabilidade orçamental com crescimento e com mais
justiça social,…
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … ao mesmo tempo que respondemos às exigências do presente, sejam elas uma pandemia ou os efeitos de uma guerra no continente europeu.
Aplausos do PS.
Neste Orçamento e nos próximos três, até 2026, não irá ser diferente. Em face da instabilidade externa,
apresentamos ao País um horizonte de estabilidade, de confiança e de compromisso.
O Orçamento do Estado para 2023 apoia o presente e constrói o futuro do nosso País e dos portugueses. É
um Orçamento que reforça o investimento e a inovação, um Orçamento que aumenta os rendimentos do
trabalho, as pensões e as prestações sociais.
Queremos, assim, consolidar a trajetória de convergência que iniciámos em 2016 e que foi interrompida,
apenas em 2020, por força da pandemia. Ou seja, queremos convergir em 2022, 2023, 2024, 2025 e 2026, como
já o conseguimos fazer em 2016, 2017, 2018, 2019 e 2021.
Aplausos do PS.
Dez anos de convergência! Dez anos a aproximarmo-nos dos países mais desenvolvidos da zona euro,
depois de praticamente 15 anos de continuada divergência.
Aplausos do PS.
Protestos dos Deputados do CH André Ventura e Pedro Pinto e do Deputado da IL Carlos Guimarães Pinto.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Faz precisamente amanhã um ano que, no encerramento do debate
orçamental para 2022, tomei a liberdade de pedir emprestadas as palavras de Jorge Palma para garantir, desta
tribuna, que «enquanto houver ventos e mar/a gente não vai parar».
Protestos de Deputados do CH.
Tentaram parar-nos, mas não parámos.
O Sr. André Ventura (CH): — Não conseguiram!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Um ano volvido,…
O Sr. André Ventura (CH): — Cá estamos!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … repito as mesmas palavras e garanto: não vamos parar!
Aplausos do PS, de pé.
O Sr. Presidente: — Na primeira ronda de pedidos de esclarecimento, como acertado, a ordem será a seguinte: primeiro, intervém o maior partido da oposição, depois, os restantes, por ordem decrescente. Serão
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perguntas com a duração máxima de 5 minutos, seguidas imediatamente de resposta, também com a mesma
duração. Desde já, peço o cumprimento dos tempos.
Para formular o primeiro pedido de esclarecimento, dou a palavra ao Sr. Deputado Joaquim Miranda
Sarmento, do PSD.
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, iniciamos hoje o debate sobre o Orçamento do Estado para 2023, poucos dias depois de sair um estudo sobre a pobreza em Portugal.
Esse estudo diz que a pobreza está a aumentar, que há mais de 4 milhões de portugueses em risco de pobreza
e quase 1,5 milhões efetivamente em pobreza.
A pergunta tem de ser esta: que ambição tem este Orçamento do Estado para combater o empobrecimento
a que o País está votado, para combater a degradação dos serviços públicos e para combater a estagnação
económica?
Este Orçamento, que é a continuação da política dos últimos sete anos, tem quatro características principais.
A primeira é a de ser um Orçamento que continua a política de empobrecimento.
Protestos do Deputado do PS Miguel Matos.
Sr. Primeiro-Ministro, o seu Governo cortou meia pensão a todos os pensionistas e reformados.
Vozes do PSD: — É verdade!
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — Com o seu Governo, apenas um quinto dos funcionários públicos não perde poder de compra, todos os outros perdem, pelo menos, meio salário de poder de compra
real. As famílias do setor privado estão também a perder poder de compra.
O segundo aspeto deste Orçamento é o de que continua a política da voracidade fiscal.
Protestos do Deputado do PS Miguel Matos.
Desde 2016 que a carga fiscal não para de subir, mas em 2022 atingiu todos os records possíveis. Neste
ano, o Governo vai cobrar aos portugueses, em impostos, mais 4000 milhões de euros do que aquilo que previa
cobrar no Orçamento que entregou apenas em maio.
Aplausos do PSD.
Em apenas um ano, os impostos aumentam 0,7 pontos percentuais do PIB e os portugueses estão cada vez
mais asfixiados por impostos, taxas e taxinhas.
O terceiro aspeto deste Orçamento é o de que continua a política de degradação da qualidade dos serviços
públicos. Na saúde é o caos, com o encerramento das urgências, o aumento das listas de espera para cirurgias
e consultas…
Vozes do PSD: — Bem lembrado!
Protestos do Deputado do PS Eurico Brilhante Dias.
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — … e cada vez mais portugueses sem médico de família. Na educação, há dezenas de milhares de jovens que não têm professor a, pelo menos, uma disciplina. E os
tribunais já nem sequer têm papel para imprimir as peças processuais.
Vozes do PSD: — Muito bem! Uma vergonha!
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — Os portugueses pagam cada vez mais impostos e têm cada vez menos e piores serviços públicos.
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O Sr. Primeiro-Ministro já disse — e imagino que o vá repetir — que estes ministérios têm mais orçamento,
têm mais verbas, têm mais pessoal, mas isso é a prova do falhanço da gestão deste Governo e a prova das
consequências de um Governo que não tem ímpeto reformista.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Pois, pois! Sim, sim!
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — Gastamos cada vez mais recursos e temos cada vez piores serviços.
A Sr.ª Catarina Rocha Ferreira (PSD): — Muito bem!
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — E sabe porquê, Sr. Primeiro-Ministro? Porque quando se atira dinheiro para cima de um problema, uma das duas coisas desaparece e raramente é o problema.
Aplausos do PSD.
O quarto aspeto deste Orçamento é o de que continua a estagnação económica. Entre 2016 e 2021, Portugal
cresceu, em termos acumulados, 7%. Os países da coesão, aqueles que concorrem diretamente connosco e
que recebem fundos europeus, cresceram, em termos acumulados, em média, 18%.
Protestos dos Deputados do PS Eurico Brilhante Dias e Miguel Matos.
Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, os nossos concorrentes diretos tiveram um crescimento médio de quase o
triplo do de Portugal.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Com o PSD foi sempre a descer!
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — Mas, se Portugal foi o segundo pior dos países da coesão, nos últimos seis anos, em matéria de crescimento económico, o pior são as projeções do Fundo Monetário
Internacional (FMI).
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — É sempre o FMI!
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — Entre 2022 e 2027, Portugal vai ter o pior desempenho económico dos países da coesão, em termos de crescimento económico.
Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto: que ambição tem este Orçamento para combater o
empobrecimento? Que ambição tem este Orçamento para combater a degradação dos serviços públicos? Que
ambição tem este Orçamento para combater a estagnação económica?
Sr. Primeiro-Ministro, o tempo de que disponho está a terminar, mas peço-lhe que não seja previsível e
repetitivo nas suas respostas e escusa de falar da direita e da austeridade.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Ah!…
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — Escusa de falar da direita, porque, nos últimos 27 anos, o Partido Socialista governou durante 20!
Vozes do PSD: — Muito bem!
Protestos do PS.
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — Escusa de falar de austeridade e da troica, porque foram os senhores que, em 2010 e 2011, trouxeram a austeridade e a troica.
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Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
Os portugueses querem discutir os problemas de 2022, de 2023 e dos anos seguintes,…
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Sim, não falemos de austeridade!
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — … querem discutir as políticas económicas do Governo, aquilo que o Governo fez e aquilo que o Governo não está a fazer.
Aplausos do PSD.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Estamos cá para discutir!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Miranda Sarmento, de facto, é difícil não repetir as respostas quando não deixam de repetir as mesmas perguntas.
Risos de Deputados do PS.
Protestos do PSD.
Mas vamos começar pelo primeiro tema: de 2015 até 2019, Portugal cresceu, em média, 2,8% ao ano,…
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Foi!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … sete vezes mais do que nos 16 anos anteriores!
Aplausos do PS.
Pela primeira vez desde o início do século, recomeçámos a aproximar-nos dos países mais desenvolvidos
da União Europeia…
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — Pois, lá para trás!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … em 2016, 2017, 2018, 2019, 2021, 2022 e para ano também, em 2023. Assim vamos continuar.
Aplausos do PS.
O Sr. Rui Cristina (PSD): — Estamos na cauda!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Esta melhoria traduziu-se no PIB per capita, que cresceu 20% desde 2015. E isso significa, Sr. Deputado, que, ao longo da minha governação — se assim se pode dizer —, crescemos mais
do que no período de governação da direita.
Mas posso dizer-lhe mesmo mais: em cada período de governação do PS, crescemos mais do que em
qualquer período de governação da direita.
Aplausos do PS.
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Nos Governos de António Guterres, crescemos mais do que nos Governos de Cavaco Silva; nos Governos
de José Sócrates, crescemos mais do que nos Governos de Durão Barroso e de Passos Coelho; e agora
voltamos a crescer mais do que quando VV. Ex.as governaram. Esta é a realidade, Sr. Deputado, são factos,
são números e, por mais que os torça, é isto que dá.
Aplausos do PS.
É precisamente por termos esta trajetória de crescimento, sustentada no emprego e, felizmente, na melhoria
do rendimento das famílias, em particular dos trabalhadores,…
Protestos do Deputado da IL Carlos Guimarães Pinto.
… que as contribuições para a segurança social têm continuadamente subido ao longo destes anos,
robustecendo a segurança social e permitindo-nos responder a situações de crise duríssima, como a da
pandemia ou aquela que estamos a viver.
Quando fala da voracidade fiscal e da carga fiscal, o Sr. Deputado tem, aliás, a estrita obrigação — sendo o
ilustre economista que é — de fazer a distinção sobre o que tem aumentado na receita do Estado.
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — São os impostos!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Não é a receita dos impostos, não! O peso dos impostos no PIB é hoje inferior ao que era em 2015.
Aplausos do PS.
O peso que é superior é o das contribuições para a segurança social, porque, felizmente, o desemprego caiu
para metade e os rendimentos têm vindo a aumentar.
Sr. Deputado, falemos de pobreza. De facto, se VV. Ex.as governassem, com todo o programa que
efetivamente gostariam de aplicar, Portugal teria, nessa situação, 4 milhões e meio de pobres. Esse número,
como sabe, é a estimativa da pobreza antes das transferências sociais,…
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Os 125 €?!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … antes mesmo de se contabilizarem as pensões. Só com o pagamento das pensões, já reduziríamos em 23% este universo.
Protestos da Deputada do PSD Clara Marques Mendes.
Sr. Deputado, sei que vos custa, mas a verdade é esta: de 2015 para 2021, a taxa de pobreza ou exclusão
social baixou de 26,4% para 22,4%.
Aplausos do PS.
Até 2019, Sr. Deputado, saíram da pobreza 700 000 pessoas.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — E quantas é que entraram?!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Infelizmente, com a pandemia e a difícil recuperação que estamos a ter com a inflação provocada pela guerra, hoje já não temos menos 700 000 pessoas na pobreza do que tínhamos em
2015. Mas, de qualquer forma, se quer comparar com 2015, temos menos 430 000 pessoas na pobreza do que
tínhamos em 2015.
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Protestos do Deputado da IL Bernardo Blanco.
A pobreza não aumentou, a pobreza está a baixar e vai continuar a baixar.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado, não vou falar outra vez de quanto já reforçámos o Serviço Nacional de Saúde, quer em meios
humanos, quer em recursos financeiros, nem vou repetir o que já disse a partir da tribuna, de que, no próximo
ano, vamos aumentar em 7,8% o orçamento do SNS face ao executado neste ano.
Protestos do PSD.
Repito, face ao executado neste ano! O que significa, Sr. Deputado, que este ano não haverá discussões
sobre suborçamentação, porque a dotação inicial é superior à dotação executada no ano anterior.
Aplausos do PS.
Mas a verdadeira medida está em saber o que se produz no Serviço Nacional de Saúde, e aquilo que vemos
é simples: temos hoje mais 2 milhões e 600 mil consultas nos cuidados de saúde primários e mais 40 000
cirurgias do que em 2019. Hoje produz-se mais, graças a um maior investimento e a uma maior disponibilidade
de recursos humanos que fazem funcionar o Serviço Nacional de Saúde.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para formular um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias, do PS.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, chegou a ser com alguma ternura que ouvimos o Sr. Deputado Miranda Sarmento a pedir-nos, por favor, para não falarmos da austeridade. O Sr.
Deputado pedia ao Sr. Primeiro-Ministro — e presumo que à bancada do Partido Socialista — que não falasse
da austeridade e nós percebemos bem porque é que não querem falar da austeridade.
Protestos do PSD.
É que há um aspeto muito importante, que os portugueses percebem: contas certas não são austeridade e
a austeridade nunca trouxe, nem traz, contas certas.
Aplausos do PS.
Mas percebo o problema central desta bancada à nossa direita. Repare, vivemos de forma muito dura o
período de governação do PPD/PSD. Foi muito duro, mas sem resultados e, por isso, o compromisso do
Governo com as contas certas é mesmo a melhor forma de proteger o rendimento e de não ter políticas de
austeridade, porque as políticas de austeridade foram a resposta do PPD/PSD sempre que não teve as contas
certas.
Protestos de Deputados do PSD.
Vamos começar com um exemplo. O Governo do PPD/PSD, liderado por Passos Coelho e aplaudido por
Luís Montenegro, na primeira fila,…
O Sr. João Torres (PS): — Pois é, pois é!
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O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — … apresentou no Orçamento do Estado para 2012 uma previsão de dívida pública de 110,5%, mas chegámos ao fim de 2012 e a dívida pública foi de 129%.
Em 2013, previam 123,7%, mas chegaram ao fim do ano com 131,4%.
Protestos do PSD.
Em 2014, previam 126,7%, mas chegaram ao fim do ano com 132,9%. Em 2015, a previsão era de 123,7%,
mas chegaram ao fim do ano com 131,2%.
Chegaram ao fim do período de governação com mais 21% do peso da dívida no PIB, sempre com contas
erradas — repito, sempre com contas erradas!
Aplausos do PS.
Poderia ir mais longe e dizer que, em todos os anos, o défice também não bateu certo. Propunham um défice
e ele era sempre maior.
Apresentaram, entre 2012 e 2015 — podemos dizer que foi até 2015, porque, por causa do BANIF (Banco
Internacional do Funchal), houve um Orçamento retificativo do PPD/PSD —, quatro Orçamentos e sete
Orçamentos retificativos, sempre com contas erradas.
Aplausos do PS.
Protestos do Deputado do PSD Paulo Rios de Oliveira.
As contas estavam erradas. Em setembro de 2012, dizia-se: «Passos Coelho defende mexidas na TSU (taxa
social única)». Dizia mesmo que os custos de trabalho deveriam ser mais baixos. Contas erradas!
Fevereiro de 2013: «Passos Coelho avisa que é preciso cortar ainda mais, muito mais» e, depois, «anuncia
cortes na segurança social, na saúde e na educação».
O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — E o futuro? Isso é que é da vossa responsabilidade!
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Finalmente, chegou aquele momento único, em 2014, em que, afinal, o Governo do PPD/PSD aumentou os impostos e cortou as pensões. Em 2014!
Contas erradas, mais austeridade — Repito, contas erradas, mais austeridade!
Aplausos do PS.
É isto o essencial, Sr. Primeiro-Ministro: as contas certas são para não termos austeridade e para não
regressarmos às políticas de empobrecimento do PPD/PSD.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Percebo, não era para falar da austeridade! Só estou a falar das consequências da austeridade e de quem
foram os protagonistas dessa austeridade.
Protestos do PSD.
Sr. Presidente, poderei prosseguir?
O Sr. Presidente: — Peço silêncio.
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O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, nos dias de hoje, a política é diferente: proteção dos rendimentos, diminuição dos impostos…
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Cortes nas pensões!
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — … e, acima de tudo, a ideia de que, com contas certas, podemos proteger os portugueses do impacto desta guerra, neste momento de pós-pandemia.
Mas há um elemento que preocupa muito os portugueses. Há um elemento que não está nas nossas mãos,
Sr. Primeiro-Ministro, que é a política monetária do BCE (Banco Central Europeu). Podemos procurar mitigar o
efeito do aumento de alguns produtos: da energia, da eletricidade, do gás. Podemos ter uma trajetória de
aumento de rendimentos até 2026, com aumentos reais, mas a política monetária do BCE não controlamos.
O Governo e o Partido Socialista têm apelado fortemente para que o BCE seja prudente, para que não
permita que a economia europeia entre em recessão, mas, Sr. Primeiro-Ministro, gostava de lhe dizer que essa
não é a opinião de todos.
O Partido Popular Europeu (PPE), de que faz parte o PPD/PSD e de que faz parte, por exemplo, o
Eurodeputado Paulo Rangel, que é o tesoureiro do PPE, apresentou, no fim de setembro, um documento de
política. Este documento de política — que aqui tenho e poderei distribuir, se assim entenderem — tem, numa
epígrafe sobre política monetária, a seguinte frase: «O PPE pede ao Banco Central Europeu para manter a
determinação em aumentar as taxas de juro.»
Esta é a política do PPE, de que faz parte o PPD/PSD, de que faz parte o Dr. Paulo Rangel e de que faz
parte o Dr. Luís Montenegro.
Aplausos do PS.
Cá está ele, um documento do dia 29 de setembro.
O orador exibiu o documento que mencionou.
Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, a pergunta é muita clara. Temos dito que o BCE tem de ser muito cauteloso
na forma como olha para as taxas de juro, porque isso toca nas prestações dos empréstimos que as pessoas,
lá em casa, pagam e porque isso é importante para o financiamento das empresas. Em Lisboa, o PPD/PSD quer
mitigar os efeitos, mas, em Bruxelas, aprova e dá guarida a um papel da direita mais conservadora que temos
na Europa, dos «falcões» do BCE, que quer aumentar as taxas de juro, mesmo que isso coloque em causa o
crescimento económico e a recessão.
Sr. Deputado Miranda Sarmento, não vale a pena dizer que é a favor do crescimento, tem de ser
consequente. Não podem apoiar estes documentos, da vossa família política, que exigem ao BCE o aumento
das taxas de juro.
Aplausos do PS.
Sr. Primeiro-Ministro, a pergunta é clara: não sendo este o caminho, que caminho teremos de trilhar, com o
BCE, para que não aumentem as taxas de juro?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias, também neste caso não há surpresas, porque já estamos habituados a que o PPD/PSD diga uma coisa a Bruxelas e outra aos portugueses.
Aplausos do PS.
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Protestos do PSD.
Foi assim que esconderam dos portugueses o compromisso escrito que tinham assinado para resolver o
BANIF, antes das eleições. Esconderam-no para não comprometerem o resultado eleitoral de 2015.
Aplausos do PS.
Protestos da Deputada do PSD Mónica Quintela.
Foi assim que apresentaram, em Bruxelas, em 2015, o último Programa de Estabilidade, prometendo um
novo corte de mais 600 milhões de euros nas pensões que estavam a pagamento.
Aplausos do PS.
Sem jogo de palavras, cortar é mesmo cortar. Onde se pagava 500 € é passar a pagar 400 €!
Cortes, lembramo-nos todos o que é que foram. Foram os cortes no subsídio de Natal e no subsídio de férias,
foram os cortes nas pensões por via da contribuição extraordinária de solidariedade para todos os pensionistas
que ganhavam acima de 1350 €.
E só não foi pior porque, por cinco vezes — por cinco vezes! —, o Tribunal Constitucional declarou
inconstitucionais as normas de cortes de pensões e de salários na função pública.
Aplausos do PS.
Agora, fazem este papel de «crocodilo lacrimejante»,…
Vozes do PSD: — Ah!…
O Sr. Primeiro-Ministro: — … querendo discutir se as pensões devem subir mais ou se devem subir menos, quando, verdadeiramente, a política da direita foi sempre uma: cortar salários, cortar pensões.
Aplausos do PS.
A razão pela qual o PPD/PSD nos pediu para não falarmos de austeridade foi por o Prof. Miranda Sarmento
saber o que significa «austeridade». Foi por saber que, quando não estamos em recessão económica — pelo
contrário, estamos, este ano, a ser o país da União Europeia com mais forte crescimento — e não estamos a
adotar medidas para redução do poder de compra, mas sim a adotar medidas para procurar aliviar a perda de
poder de compra por via da inflação, não estamos a fazer austeridade. Estamos a combater a inflação e a gerir
bem as contas públicas, mas não estamos a fazer austeridade.
Aplausos do PS.
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Ah!…
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sim, temos de manter contas certas, porque não queremos ser como o PPD/PSD, o partido das contas erradas.
Protestos da Deputada do PSD Joana Barata Lopes.
Temos de ser mesmo o partido das contas certas. Queremos ser o Governo das contas certas, porque
Portugal precisa de ter as contas certas.
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Portugal precisa de ter as contas certas, porque, neste contexto em que o Banco Central Europeu e os outros
bancos centrais vão adotando medidas de aumento das taxas de juro para procurar responder à inflação, temos
uma dívida pública muito elevada e temos de fazer o esforço de reduzir o peso dessa dívida pública para nos
protegermos, às empresas portuguesas e às famílias portuguesas. A melhor proteção que podemos dar às
famílias que têm crédito à habitação é não deixar que a taxa de referência da República suba para níveis que
contagiem as demais taxas de referência pagas na economia em Portugal.
Aplausos do PS.
Sim, queremos ter contas certas, mas dizemos que é preciso compreender bem a natureza específica desta
crise inflacionista — a que existe na Europa é muito distinta, aliás, da que existe nos Estados Unidos. Não resulta
de uma particular afluência da massa monetária em circulação, resulta mesmo da rutura das cadeias de
abastecimento e do brutal aumento dos custos da energia. Portanto, não é através de consecutivas subidas das
taxas de juro que se responde de modo mais eficaz a esta tensão inflacionista.
Temos de saber gerir com prudência para não pormos em causa a credibilidade da República. Temos de
saber gerir com prudência para não alimentar a espiral inflacionista, mas sucessivas subidas da taxa de juro não
contribuem para o controlo da inflação, contribuem antes para aumentar o risco de recessão nas economias
europeias.
Ora, há uma coisa que demonstrámos, desde 2015, a de que a melhor forma de termos contas públicas
certas não é com austeridade, é com crescimento, com emprego e com melhores salários. É assim que
consolidamos a nossa economia e a trajetória de crescimento sustentável que temos mantido e é esse o caminho
que vamos manter, recusando esta campanha do PPE, do PPD/PSD, para um aumento das taxas de juro por
parte do Banco Central Europeu.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Joaquim Miranda Sarmento pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — Sr. Presidente, é para uma interpelação sobre a condução dos trabalhos.
O Sr. Presidente: — Faça favor.
O Sr. Joaquim Miranda Sarmento (PSD): — É apenas para recordar que o atual governador do Banco de Portugal, que representa Portugal no Conselho de governadores do BCE, foi nomeado por este Governo e é um
ex-Ministro das Finanças do Partido Socialista.
Aplausos do PSD.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — E o que é que isso tem que ver com a condução dos trabalhos?!
O Sr. Presidente: — A interpelação não teve nada que ver com a condução dos trabalhos e, portanto, peço a todos que o evitem.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Ora aí está!
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias também pediu a palavra. Deseja fazer uma interpelação?
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Sim, Sr. Presidente, farei, estritamente, uma interpelação sobre a condução dos trabalhos.
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O Sr. Presidente: — Faça favor.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Para ajudar todos os Srs. Deputados, faremos chegar-lhes o documento do Partido Popular Europeu para que fique claro que, no segundo parágrafo da segunda epígrafe, está lá
mencionada a vontade de aumentar as taxas de juro.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para formular um pedido de esclarecimento, em nome do Grupo Parlamentar do Chega, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.
O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Ministros e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, penso que é relativamente pacífico que chega ao segundo Orçamento do Estado desta Legislatura com um Governo
fragilizado, recheado de casos, todos os dias, de incompatibilidades e de contradições que envolvem ministros
do seu Governo.
O Sr. Miguel Cabrita (PS): — Isto não é o Orçamento?
O Sr. André Ventura (CH): — Isto não é um bom sinal para um Governo que apenas em janeiro venceu as eleições, um Governo que todos os dias perde credibilidade junto da opinião pública e que todos os dias perde
confiança da opinião pública.
Tenho muitas dúvidas, Sr. Primeiro-Ministro, que chegue a 2026, como disse.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
O Sr. André Ventura (CH): — Mas o futuro a Deus pertence e nós cá estaremos para ver se chega ou se não chega. Há uma coisa que é já certa, é que aquele Governo coeso, forte e credível que prometeu aos
portugueses não é este Governo que está hoje no Parlamento a apresentar o Orçamento.
Aplausos do CH.
Vai-me permitir fazer um curto interregno nesta inquirição para me dirigir ao Sr. Deputado Eurico Brilhante
Dias.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Inquirição?
O Sr. André Ventura (CH): — Inquirição no bom sentido! Dirijo-me ao Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias, sobre o que disse. Estamos um pouco fartos — e acho que
quem nos está a ver em casa também estará um pouco farto — do «canal História» do Parlamento. Sempre que
há um debate qualquer, o PS vem dizer: «Mas o PSD fez muito pior do que nós!»
Protestos de Deputados do PS.
Sr. Primeiro-Ministro, acho que não estamos aqui a discutir o que é que o PSD fez, se foi melhor ou pior.
Acho que deveríamos, e que era isso que os portugueses quereriam, estar a discutir o futuro.
Aplausos do CH.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Não quer ouvir falar em austeridade!
O Sr. André Ventura (CH): — Os portugueses não estão em 2013, nem em 2014, nem em 2015, estão em 2022, e era sobre isso que queriam ouvir o Partido Socialista!
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O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Era do PPD/PSD, na altura, e batia palmas!
O Sr. André Ventura (CH): — Já agora, Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias, já que gosta tanto de história, é um pouco constrangedor, sem que ninguém lhe diga nada, que venha falar — imagine-se! — de dívida pública.
O PS a falar de dívida pública!? Se isto não fosse uma piada seria uma tragédia. Mas é que é mesmo uma
tragédia!
Sr. Deputado, em abril deste ano, Portugal teve a 12.ª maior dívida pública do mundo. O Primeiro-Ministro
era António Costa. Não era Pedro Passos Coelho nem nenhum outro, era António Costa!
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
Protestos do Deputado do PS Eurico Brilhante Dias.
O Sr. André Ventura (CH): — Digo-lhe mais, Sr. Deputado: no 3.º trimestre de 2021, a dívida pública atingiu, pela primeira vez em Portugal, os 130,5% do PIB. Sabe quem era o Primeiro-Ministro? Não era Pedro Passos
Coelho, nem Cavaco Silva, nem António Guterres. Era António Costa!
Aplausos do CH.
Protestos de Deputados do PS.
Assumam! Assumam isso, porque só vos fica bem assumi-lo.
Sr. Primeiro-Ministro, este Orçamento é uma fraude e uma ilusão para os portugueses, para os trabalhadores
e para os pensionistas. Podia ser só isto, mas consegue ser também uma enorme trapalhada.
Hoje, acordámos todos com a indignação de milhões de contribuintes que tinham visto o seu IBAN
(International Bank Account Number) alterado, sem consentimento, pelas finanças. A trapalhada é tão grande,
a ânsia de fazer chegar as coisas acima da velocidade é tão grande que dá em trapalhadas como aquela a que
hoje assistimos.
Certamente que o Chega fará chegar ao Ministério Público aquilo que hoje aconteceu, por ser grave demais
que contribuintes vejam os seus dados alterados com a chancela do Ministério das Finanças.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Vergonha!
O Sr. André Ventura (CH): — Mas hoje, Sr. Primeiro-Ministro, quando chegou a este Parlamento, usou esta frase: «Este é o Orçamento da recuperação dos rendimentos.» Repito, pois gostava que ouvissem isto em casa:
«Este é o Orçamento da recuperação dos rendimentos.»
Sr. Primeiro-Ministro, podemos dar a volta que quisermos, mas 72% dos funcionários públicos vão perder
poder de compra — 72%! Não são 22% nem 12%, são 72% que vão perder poder de compra.
Digo-lhe mais, Sr. Primeiro-Ministro, um dado que poderá confirmar ainda esta tarde: com o seu truque das
finanças e das pensões, pomposamente anunciado como o maior aumento — que, na verdade, é um dos
maiores retrocessos em matéria de pensões em Portugal —, os pensionistas vão ter o segundo maior corte real
das pensões em 15 anos. Este é o legado para os próximos anos do Partido Socialista.
Não podem estar a dizer «vamos aumentar rendimentos e vamos aumentar pensões» quando os números
dizem tudo o contrário daquilo que o Sr. Primeiro-Ministro aqui disse.
Reiteramos e mantemos: este Orçamento é uma fraude, é uma ilusão e está a enganar os portugueses sobre
o mais importante das suas vidas.
Aplausos do CH.
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Sr. Primeiro-Ministro, milhões de portugueses enfrentam, como disse o Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias,
um problema gigantesco com as prestações de crédito à habitação e o Sr. Primeiro-Ministro prometeu medidas
pontuais, mas incisivas, sobre o crédito à habitação.
Vou ler o que disse a UTAO (Unidade Técnica de Apoio Orçamental) sobre isso e sobre as mexidas fiscais
para ajudar o crédito à habitação. «Para os contribuintes, esta medida…» — isto não é do Chega, é da UTAO
— «… não corresponde a uma redução de impostos, mas sim a um aumento temporário de liquidez, que será
anulado com o acerto de contas em 2024.»
Sr. Primeiro-Ministro, se há uma palavra que determina o que é fraude, é isto, é fingir que estamos a ajudar
as pessoas com o crédito à habitação, para depois, no próximo ano, lhes dizer que vão voltar a ter de pagar.
Há milhões com dificuldades em pagar as suas casas, milhões que sustentaram os bancos, que andaram a
pagar resgates a bancos e que agora sentem que os bancos lhes querem tirar tudo sem que o Governo faça
nada. Isso tem uma palavra, não é fraude, nem ilusão, é roubo. É roubo o que vocês estão a fazer aos
portugueses!
Aplausos do CH.
Em Portugal, a subida média dos contratos de prestação de crédito à habitação é de 15%, para 93% dos
portugueses. Gostava que aqueles que nos estão a ouvir em casa soubessem que, hoje, o seu Primeiro-Ministro,
eleito com maioria absoluta, lhes deu uma explicação do que é que vai fazer — mas ainda não o conseguiu
dizer! — para melhorar a sua vida em matéria de crédito à habitação. Isto é o que eles querem saber.
Os portugueses não querem saber o que é que o PSD fez em 2013 ou 2014, ou o que o CDS fez em 1988.
O Sr. Primeiro-Ministro não é professor de História, é Primeiro-Ministro, em 2022.
O que quem nos está a ver quer saber é o seguinte: quanto é que isto vai significar no bolso da minha família,
hoje, amanhã e no próximo mês. Com quem é que posso contar? O que é que me diz o Primeiro-Ministro,
António Costa, sobre o meu crédito à habitação, que subiu 200 €, 300 €, 400 € e que já não tenho condições
para pagar, de tal forma que tenho de escolher entre medicamentos e alimentação?
Essa é a maior vergonha que podemos dar aos nossos compatriotas em Portugal.
Aplausos do CH.
Termino, Sr. Primeiro-Ministro, com dois apontamentos que me parecem importantes.
Em primeiro lugar, a imprensa noticiou hoje que Fernando Medina pediu mais 500 milhões de euros para
pagar à EDP (Energias de Portugal) e para pagar os custos das PPP (parcerias público-privadas). É um pouco
constrangedor que a uma empresa que tem os lucros que tem, que tem esmifrado os portugueses como tem
feito, ainda lhe estejamos a dar no Orçamento do Estado 240, 416 ou 500 milhões de euros.
A empresa que tem tido lucros extraordinários, fruto da crise, sem nada fazer por isso, chega ao Orçamento
do Estado e vê que o Governo do Partido Socialista está a dizer: «Mais 500 milhões para a EDP. Para os
subsídios de risco? Ai, não há! Para os suplementos de pensões? Ai, isso não pode ser! Para atualizar pensões
ao nível da inflação? Para isso, não temos dinheiro! Mas para a EDP temos dinheiro.»
O Sr. Primeiro-Ministro sabe muito bem o que é que a Comissão Parlamentar de Inquérito sobre as rendas
excessivas da EDP apurou: milhares de milhões pagos a mais à EDP. São centenas de milhões de lucros, só
este ano. É e continuará a ser um aproveitamento indevido desta crise e, em vez de pedirmos o reequilíbrio
financeiro dos contratos, estamos a pagar-lhes ainda mais.
Sr. Primeiro-Ministro, isto não tem que ver com mercado, com esquerda ou com direita. Isto é uma hipocrisia
política tremenda e ninguém lá em casa consegue compreender porque é que estamos atolados em impostos
enquanto as grandes empresas como a EDP continuam a viver à nossa conta.
Aplausos do CH.
Em segundo lugar, Sr. Primeiro-Ministro, termino com um dado sobre o qual gostava que refletisse. O Sr.
Primeiro-Ministro respondeu que a pobreza não está assim tão mal e que até desceu nos últimos meses.
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Anos!
O Sr. André Ventura (CH): — Nos últimos anos, sim. Sr. Primeiro-Ministro, no último ano, tivemos mais 250 000 pessoas em risco de pobreza em Portugal. Não é
um dado do Chega, nem é um dado de nenhum partido. É um dado objetivo: mais de 250 000 pessoas estão
em risco de pobreza em Portugal.
Neste momento, à hora em que estamos a falar, há 2,5 milhões de pessoas em risco de pobreza em Portugal.
Acho que isso deveria ser mais do que uma arma de arremesso histórico entre o PS e o PSD, deveria ser o
nosso pedido de desculpas àqueles que estão em casa, porque foi para isso que nos elegeram, para
combatermos a pobreza e não para a aumentarmos.
Infelizmente, nesta dialética histórica entre PS e PSD, a pobreza não para de aumentar, o que não deveria
gerar discussão, mas sim um pedido de desculpa aos portugueses sobre essa situação. Pedir desculpa,
reconhecer que falhámos e reconhecer que queremos fazer melhor.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, o Sr. Deputado André Ventura fica sempre muito emocionado quando se fala do que aconteceu até 2015 porque fica incomodado ao recordar que faz parte desse passado,
porque foi militante, candidato e autarca do PPD/PSD durante esses anos.
Aplausos do PS.
Protestos de Deputados do CH.
O Sr. Deputado André Ventura devia ter algum respeito pelo rigor e, portanto, vamos cingir-nos aos factos.
A dívida pública, em 2021 e 2022, recua 20 pontos percentuais. Vamos concluir este ano com um peso da dívida
no produto em 115%.
O objetivo que temos para o próximo ano é reduzi-lo para 110% do produto e chegarmos ao final desta
Legislatura, como dissemos quando fomos a eleições, com a dívida pública abaixo dos 100%. É esta a meta
que temos, é esta a meta que vimos a cumprir e é esta meta que, ano a ano, vamos alcançar.
Aplausos do PS.
Esta é a melhor condição para que todos aqueles que têm créditos, sejam famílias com crédito à habitação,
sejam empresas que contraíram empréstimos, podem ter: que o País tenha estabilidade financeira e
credibilidade internacional, que vá reduzindo o peso da sua dívida, que vá melhorando o seu rating, de forma a
que, elas próprias, possam ficar mais protegidas.
Sabemos que, neste contexto, muitas famílias estão, neste momento, preocupadas, e com razão, sobre o
que pode acontecer à sua prestação da casa. Por isso, temos estado a acompanhar, permanentemente, junto
do Banco de Portugal, junto dos bancos, a evolução das situações do crédito. Recordo que, já durante a
pandemia, vivemos essa preocupação e, felizmente, foi possível superar a pandemia sem dramas sociais. De
qualquer forma, no próximo Conselho de Ministros iremos aprovar um diploma que ajuda a proteger as famílias,
obrigando os bancos a renegociar os créditos quando os juros subam para além do teste de stress a que as
famílias foram sujeitas, aquando do momento da contratação do crédito.
As famílias têm um risco, mas a atividade bancária também tem um risco. Esse risco deve ter sido, aliás,
avaliado, para uns e para outros, nos testes de stress, no momento da celebração do contrato e, quando os
juros subam, se os juros subirem acima desses limites que foram testados, os bancos devem ser obrigados a
renegociar os contratos.
Sr. Deputado, neste Orçamento temos várias medidas de redução de impostos. Quando reformulamos o
mínimo de existência, quando atualizamos os escalões aos 5,1%, quando procedemos à redução da taxa do 2.º
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escalão do IRS, tendo um efeito vertical sobre toda a taxação de IRS acima do segundo do 2.º escalão, essas
são medidas de redução da tributação, existindo várias também para as empresas.
A medida que refere não é uma medida de redução de impostos. É uma medida de melhoria da liquidez das
famílias, que podem requerer a redução de 1 ponto no escalão da retenção na fonte, de forma a melhorar a sua
liquidez, num ano onde, porventura, haverá, por via do aumento das taxas de juro, maiores encargos com a
habitação.
O Sr. André Ventura (CH): — É temporário!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Dizemos um ponto e não dois porquê? Para que as pessoas possam, em média, aumentar a sua liquidez, sem o risco de, no ano a seguir, terem de pagar mais do que habitualmente pagam. É,
por isso, que temos um equilíbrio e não descemos dois pontos nos escalões da taxa de retenção.
O Sr. André Ventura (CH): — É temporário!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sim, é uma medida de melhoria da liquidez, mas as pessoas precisam de liquidez, neste momento, precisamente, que é este o momento em que há o risco da taxa de juro poder vir a
aumentar.
Duas notas finais sobre a pobreza. Em primeiro lugar, quero congratular-me por, ao contrário, do líder
parlamentar do PSD, que se referiu aos 2,5 milhões de pobres que existem em Portugal, apesar das prestações
sociais. Isso demonstra bem, Sr. Deputado, e deve refletir sobre isso, como as prestações sociais são mesmo
essenciais à vida das pessoas, à vida dos nossos compatriotas, e que o apoio que o Estado dá às pessoas não
é para financiar vícios.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Para alguns é!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Quando o Sr. Deputado e os Srs. Deputados do Chega dizem os 125 € não podem servir para comprar tabaco, droga e álcool devem meditar, precisamente, no facto de haver mais de 2
milhões de pessoas em Portugal que só não estão em situação de pobreza graças às medidas de apoio social
e das prestações sociais que a nossa segurança social, solidária, garante a todos aqueles que são mais
carenciados.
Aplausos do PS.
Mas, sim, Sr. Deputado, não nos podemos conformar com a nível de pobreza que hoje existe. Temos menos
430 000 pessoas em situação de pobreza ou exclusão do que tínhamos em 2015, mas cada uma que exista é
algo intolerável numa sociedade decente.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Por isso, a Estratégia Nacional de Combate à Pobreza fixa metas bem claras para a redução da pobreza que desejamos ao longo desta década, em particular, a redução, para metade, da
pobreza monetária de quem é trabalhador e a redução, para metade, da pobreza monetária das crianças, de
forma a travar uma renovação geracional dos limiares de pobreza.
É mesmo esse o combate que temos de fazer e, infelizmente, esse é um combate que tem de prosseguir.
Uma última nota, Sr. Deputado: não vou utilizar os seus adjetivos, porque não creio que dignifiquem a
democracia, mas o que ilude os portugueses é esse discurso segundo o qual não aumentamos as pensões para
dar dinheiro à EDP.
O Sr. André Ventura (CH): — É verdade!
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Como sabe, Sr. Deputado, um Orçamento tem de prever as despesas contingentes. Como o Sr. Deputado tem obrigação de saber, quando o Estado decidiu cancelar um contrato com
a EDP para a construção da barragem do Fridão, incorreu em responsabilidade e os tribunais condenaram o
Estado a pagar-lhe uma indemnização.
Portanto, Sr. Deputado, não estamos a dar dinheiro à EDP. Não podemos é esconder do Orçamento as
obrigações que temos, impostas por decisão judicial, seja à EDP, seja a qualquer pessoa. O Estado de direito é
assim!
Aplausos do PS.
Protestos do CH e contraprotestos do PS.
O Sr. Presidente: — Peço silêncio, Srs. Deputados. Para formular um pedido de esclarecimento, em nome da Iniciativa Liberal, vou dar agora a palavra ao Sr.
Deputado João Cotrim Figueiredo.
Peço atenção a toda a Câmara.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro, tenho de começar por dizer que a maneira como escolheu iniciar este debate é triste e é
deprimente.
Vozes do PS: — Oh!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — A única vantagem que tem é que permite perceber, finalmente, o que é que era aquela história do lamaçal de que o senhor, há dias, falou. Lamaçal é aquilo em que o Sr. Primeiro-
Ministro está atolado, porque a argumentação que usa, vez após vez, para que contestar qualquer crítica que
lhe fazem está presa no atoleiro das políticas de há sete anos. Isso, Sr. Primeiro-Ministro, é triste e é deprimente
e julgo que já era altura, passados sete anos de poder, de se deixar dessa argumentação.
Na mesma medida, deixe-me que lhe diga, fiquei embevecido com a cobertura que dá à postura do seu líder
parlamentar, que vem aqui invocar as posições do partido europeu a que pertence o PSD. É que, recordo-lhe,
a primeira proposta legislativa que a Iniciativa Liberal apresentou neste Parlamento, em 2019, foi de condenação
de regimes autoritários, como o fascismo e o comunismo, à semelhança do que o Parlamento Europeu tinha
feito com os votos socialistas europeus. O que é que fez o PS? Recusou-se votar!
Aplausos da IL.
A Europa serve de exemplo, menos quando se trata de defender as liberdades.
Riso do Primeiro-Ministro.
É verdade, Sr. Primeiro-Ministro: está há sete anos no poder. Este é o seu oitavo orçamento, um Orçamento
de que não consta qualquer reforma estrutural.
Protestos do Deputado do PS Eurico Brilhante Dias.
Alguém que não reforma e não quer mudar nada, ao fim de oito anos, só pode julgar que está tudo bem. Está
satisfeito com o que existe e basta reverter umas medidas do tempo do tal memorando do PS ou basta fazer
uns remendos nas atuais políticas. Tenho de dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que não basta. E pergunto-lhe:
está satisfeito com o quê?
Vai dizer-me que está satisfeito com o crescimento — já apresentou esse argumento aqui pela vigésima vez
— e eu vou explicar-lhe pela vigésima primeira, que, talvez, desta vez fique: o senhor diz que Portugal convergiu
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com a Europa naquele período. Volto a lembrá-lo que Portugal só convergiu porque as três maiores economias
da Europa, pela primeira vez na história, estavam em recessão ou em declínio.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Não, não!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Se comparar com a média de todos os outros países da Europa — todos! —, Portugal, nesse período, cresceu 2,8%.
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!
Protestos do PS.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Todos os outros países, fora desse top 3, cresceram 3,9%. Isto é que é verdade! Portugal convergiu, mas não convergiu mais do que todos os outros países com os quais nos
deveríamos comparar.
Vozes da IL: — Muito bem!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — É com isso que está satisfeito, Sr. Primeiro-Ministro? A outra coisa com que parece estar muito satisfeito é com o estado das contas públicas. Faz um brilharete
com o défice e com a dívida, mas não conta a verdade toda. A verdade é esta: em 2015, quando este Governo
tomou posse, a despesa pública era cerca de 80 mil milhões de euros. Para 2023, está orçamentada em 113
mil milhões de euros.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Então não há austeridade!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — A despesa pública, consigo, aumentou 40%, numa altura em que a inflação não chegou a crescer metade desse valor. E, ao mesmo tempo, os serviços públicos estão uma
autêntica desgraça. Então, de onde vêm os brilharetes orçamentais? Vêm de, no mesmo período, as receitas
fiscais terem passado 38 800 milhões de euros para 53 500 milhões de euros.
Protestos do Deputado do PS Eurico Brilhante Dias.
Este ano, dou-lhe os parabéns, pois, Portugal vai, com certeza, mais uma vez, bater o recorde de carga
fiscal. Deve ser por vergonha que nas 444 páginas do relatório do Orçamento do Estado não se fala uma vez
de carga fiscal — uma! Portanto, os brilharetes orçamentais estão a ser conseguidos à custa dos sacrifícios dos
portugueses, incluindo dos tais 4,5 milhões de portugueses em risco de pobreza. É com isso que está satisfeito,
Sr. Primeiro-Ministro?
O Sr. Primeiro-Ministro também diz que está muito satisfeito com o estado da saúde — investe muito mais
na saúde, contratou muito mais profissionais —, mas, mais uma vez, não se trata da verdade toda.
Em 2016, o SNS custava cerca de 9 mil milhões de euros. Para o ano, o Orçamento prevê que vá custar
14 800 milhões de euros, mais 5800 milhões de euros, fora o aumento das dívidas a fornecedores, que também
ocorreu no mesmo período. E, após este aumento brutal de 64% no SNS, o que é que temos? Um SNS a brilhar?
Infelizmente, não! Temos mais 550 000 pessoas sem médico de família, continuamos com enormes listas de
espera, temos o caos das urgências, que é o que todos os dias vemos, a quebra no número de atos médicos,
por profissional, e o valor recorde daquilo que os portugueses pagam, pela sua saúde, do seu próprio bolso. E
o senhor acha que basta continuar a atirar dinheiro para cima do problema? É com isto que está satisfeito, Sr.
Primeiro-Ministro?
O Sr. Primeiro-Ministro também afirma estar muito satisfeito com o estado da educação. Insiste na frase
batida de que temos a geração mais qualificada de sempre. A verdade toda não é essa. Esta geração mais
qualificada de sempre também é aquela que tem sido forçada a emigrar mais do que todas, porque o País não
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cresce, não lhes dá as oportunidades de que eles precisam e, mais, tem um sistema fiscal que desincentiva
fortemente quem quer subir na vida a trabalhar.
O Governo sabe disto. Por isso é que faz o IRS Jovem, por isso é que faz o programa Regressar, mas isso
é para aqueles que já lá estão. Nós deveríamos era evitar que eles quisessem, de facto, emigrar.
Vozes da IL: — Muito bem!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Na educação, a verdade é esta: em 2016, não havia 100 mil alunos sem professores no horário escolar completo. É com isso que está satisfeito, Sr. Primeiro?
Diz que está satisfeito com o estado da segurança social, mas se estivesse, não tinha cortado a base de
atualização das pensões para 2024, o que lhe vai permitir poupar 1000 milhões de euros, sem nunca admitir
que os quer poupar e sem nunca sequer referir a autêntica trapalhada das contas à volta da segurança social.
Já tivemos as contas do relatório do Orçamento do ano passado, já tivemos a resposta ao requerimento que
fizemos há cerca de 15 dias nesta Assembleia, já tivemos as contas do relatório deste Orçamento para 2023 e
tivemos uma outra conta que ainda ontem apareceu. Já houve quatro contas diferentes sobre a segurança social
e o Sr. Primeiro-Ministro continua a querer enganar os portugueses. Ainda há bocado, daquela tribuna, o fez.
Na página 53 do Relatório deste ano, lê-se esta coisa notável: a atualização das pensões vai ser histórica, é
a mais alta desde a entrada em vigor do euro. O Sr. Primeiro-Ministro não acha que esta é uma frase desenhada
para enganar as pessoas? É óbvio que se trata da maior atualização desde que se entrou no euro porque se
trata da maior inflação desde há 30 anos! Do que é que estava à espera?
Aplausos da IL.
A verdade é esta: o Governo não faz ideia de qual é, exatamente, o período de sustentabilidade do sistema
e a certeza que podemos dar aqui a todos é a de que os aumentos de 2023, sejam eles os que forem, não serão
um aumento real das pensões. É com isso que está satisfeito, Sr. Primeiro-Ministro?
A IL não se conforma com o estado a que o País chegou. Aquilo que precisa de ser reformado deve ser, de
facto, reformado: na saúde, na educação, na segurança social, mas também na Administração Pública, cuja
qualificação e valorização são essenciais para a qualidade das decisões públicas.
Por isso, durante este debate, será importante ver a sua reação e a reação da bancada do PS às propostas
que a Iniciativa Liberal apresentará. Destaco, por exemplo, as seguintes três.
Primeira proposta: desagravar fortemente o IRS de quem está nos cinco primeiros escalões — e não aqueles
remendos do 2.º escalão que constam da proposta do Orçamento —, um verdadeiro desagravamento do IRS
das pessoas que trabalham e ganham menos. Nesta nova versão, deste ano, a nossa proposta responde a
todos os argumentos que no ano passado usaram para justificar a sua não aprovação. Vamos ver que
argumentos é que vão usar este ano. Acho que não vão sobrar argumentos e a razão é só uma: o PS, de facto,
não gosta de baixar impostos.
Vozes da IL: — Muito bem!
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Segunda proposta: ajudar aqueles que têm dificuldade em suportar os custos da habitação, através da isenção de imposto sobre valores destinados especificamente a esse fim, ou
seja, isenção de imposto sobre esses rendimentos.
Finalmente, acabar com a discriminação injusta daquela franja de trabalhadores independentes com
profissões liberais, tão maltratados no que toca às taxas de retenção, ao desconto para a segurança social e à
aplicação do regime simplificado.
Se calhar, a aprovação destas medidas não lhe daria grande satisfação, mas aos portugueses a quem elas
se dirigem certamente trariam motivos para os deixarem satisfeitos.
Sr. Primeiro-Ministro, estas são as minhas perguntas. Peço-lhe que, com a elegância que conseguir,
responda a estas questões sem mostrar capas de jornais que não lê, sem falar doutros partidos desta
Assembleia, nem contribuir, mais uma vez, para aquilo a que chama lamaçal.
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Aplausos da IL.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Cotrim Figueiredo, como se viu, quando quer competir com o Dr. André Ventura, fica aquém. Não consegue!
Vozes do CH: — Muito aquém!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Não consegue! O que, aliás, não é um defeito, devo-lhe dizer.
Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.
Do meu ponto de vista, é mesmo uma qualidade. Portanto, acho bem e compreendo bem que entenda que
deve dar a vez a outro que se possa assemelhar mais ao Deputado André Ventura.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado, eu não estou satisfeito. Se tivesse satisfeito ia-me embora. Mas não me vou embora, porque
não estou satisfeito.
Temos um compromisso com os portugueses e vamos prosseguir esse compromisso com os portugueses.
Esse compromisso com os portugueses assenta naquilo que tem provado bem ao longo destes anos.
O Sr. Deputado diz que, com as políticas que temos tido, temos resultados maus.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Crescemos menos do que os outros, sim!
O Sr. Primeiro-Ministro: — O que eu constato é que, entre 2000 e 2016, Portugal cresceu sempre abaixo da média europeia ou, pior, afastou-se para baixo, na média europeia.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Lá está!… Está satisfeito?
O Sr. Primeiro-Ministro: — Desde 2016 para cá, com exceção do ano de 2020, Portugal sempre cresceu acima da média da União Europeia. Ora, crescer acima da média significa aproximarmo-nos dos que são mais
desenvolvidos, os que estão acima da média da União Europeia.
Aplausos do PS.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — A descer?!
O Sr. Primeiro-Ministro: — O pensamento económico liberal ficou, aliás, bem demonstrado muito recentemente com a aplicação prática dessa receita mágica do choque fiscal.
Protestos da IL.
Bem sei que o Sr. Deputado já provou que resiste mais tempo do que a sua parceira Liz Truss resistiu como
Primeira-Ministra do Reino Unido, mas, efetivamente, só resistiu mais porque não teve oportunidade de pôr em
prática o seu programa.
Protestos da IL.
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Se tivesse tido a oportunidade de pôr em prática o seu programa, o seu resultado era exatamente o mesmo
do que aquele que teve o Reino Unido.
Aplausos do PS.
Sr. Deputado, a realidade é esta: com a aplicação do programa liberal num país como o Reino Unido,…
Protestos da IL.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Liberal onde?! O aumento da despesa alguma vez é liberal?!
O Sr. Primeiro-Ministro: — O quê? Também querem competir com o Chega na vozearia? Têm de crescer muito ainda! Têm de crescer muito, ó meninos!
Aplausos do PS.
Protestos da IL.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Que mal! Sempre a elogiar o Chega!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, ao longo destes anos, aquilo que fez aumentar a receita do Estado não foi o enorme aumento de impostos que V. Ex.ª apoiou.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Não apoiei!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Apoiou! Foi a redução quer de IRS, quer de IRC. O que fez aumentar a receita pública foi o crescimento da economia, o crescimento do emprego, o crescimento dos salários, ou seja, o
contrário da visão liberal da economia.
Aplausos do PS.
O Sr. Miguel Cabrita (PS): — Exatamente! Tudo ao contrário!
O Sr. Primeiro-Ministro: — E, sim, não basta atirar dinheiro para cima dos problemas.
Vozes da IL: — Ah!…
O Sr. Primeiro-Ministro: — É por isso que a reforma principal que fizemos, e estamos a fazer, no Serviço Nacional de Saúde é, ao mesmo tempo que desenvolvemos a rede de cuidados de saúde primários de forma a
assegurar acesso de proximidade aos cidadãos, sem os forçar a ir ao hospital, a criar a Direção Executiva do
Serviço Nacional de Saúde para melhorar a gestão de um sistema complexo, assegurar que funciona em rede,
assegurar que a rede de referência existe e que podemos ter melhores resultados com os recursos que os
portugueses disponibilizam para o funcionamento do Serviço Nacional de Saúde.
Sim, isso é uma reforma, mas não é a reforma que VV. Ex.as queriam.
Aplausos do PS.
Protestos do Deputado da IL Rui Rocha.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, dou agora a palavra ao Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, do PCP.
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O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, os problemas que o povo e o País enfrentam, nomeadamente aqueles que resultam do crescente agravamento das condições de vida e que urge
resolver, não encontram respostas na Proposta de lei do Orçamento do Estado para 2023.
A situação do País exige soluções urgentes no Orçamento, e para lá dele, de reposição e valorização do
poder de compra, de aumento dos salários e das pensões, de controlo dos preços, de reforço dos serviços
públicos e das funções sociais do Estado, de dinamização do investimento público de apoio aos setores
produtivos, aos agricultores, às micro, pequenas e médias empresas.
Não foi esta a opção do Governo do PS. O Governo apresenta uma proposta de lei que acelera o
empobrecimento dos trabalhadores, dos reformados e pensionistas, ao recusar recuperar o poder de compra
perdido, e agrava as desigualdades e injustiças ao mesmo tempo que favorece grupos económicos com a
atribuição de mais benefícios fiscais e recursos públicos avultados.
O Sr. João Dias (PCP): — Muito bem!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É uma proposta que alimenta o negócio dos grupos privados da doença, em detrimento do SNS, que se desresponsabiliza da escola pública, do investimento na cultura, que não
responde aos problemas da habitação nem avança nos direitos das crianças e dos pais.
Quando é cada vez mais urgente aumentar os salários e valorizar as pensões, o Governo determina o corte
das pensões a que os reformados e pensionistas tinham direito nos termos da lei. Sim — e esta é a primeira
pergunta que lhe faço —, não é um corte nas reformas aquele que se faz quando um pensionista, com uma
reforma de 400 €, devia ter um aumento de 34 €, de acordo com a lei, e apenas vai receber 17 €, desvalorizando
o real valor da reforma, ou quando, por exemplo, um pensionista com uma reforma de 600 € devia ter um
aumento de 48 € e apenas vai ter 24 €, cortando metade?
Quer dizer, a opção do Governo é a desvalorização dos salários. É isto que, na realidade, sobressai. O Sr.
Primeiro-Ministro não pode falar de aumentos salariais quando o que se impõe aos trabalhadores é a continuada
perda do poder de compra.
Já para os grupos económicos não faltam benesses. A isso junta-se a opção de não revogar a caducidade
da contratação coletiva e de outros aspetos negativos da legislação laboral.
Portanto, nesta matéria, o Governo fez uma clara opção pela defesa dos interesses dos grupos económicos.
Perante a escalada inflacionista e o aumento especulativo dos preços pelos grupos económicos, seja em bens
alimentares, seja nos combustíveis, seja na eletricidade, seja no gás, o Governo continua a recusar controlar os
preços e as margens, permitindo que esses grupos económicos continuem a acumular lucros chorudos à custa
do empobrecimento do povo.
Ainda esta semana, a Galp anunciou mais de 600 milhões de euros nos últimos nove meses. Os preços dos
combustíveis não param de subir.
Perante este escândalo — sim, Sr. Primeiro-Ministro, 600 milhões de euros de lucro em nove meses!—, não
acredito que esteja de acordo com esta realidade brutal: tanto para quem tanto tem, mas pouco, quase nada,
para quem não tem.
Aplausos do PCP.
Dão-se muitas explicações para a inflação, mas o que fica evidente é que os preços sobem, e sobem muito,
atingindo os trabalhadores, os reformados, as populações, ao mesmo tempo e ao mesmo ritmo a que sobem —
e sobem bem! — muitos dos lucros dos grupos económicos e das multinacionais.
Afinal, alguém ganha com isto. Alguém está a enganar alguém. Não se venha com a retórica de que não há
dinheiro para salários. Há, está é mal distribuído!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É possível assegurar a recuperação do poder de compra dos trabalhadores e reformados. É possível travar a especulação dos preços, tal como há onde ir buscar dinheiro
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para aumentar as receitas do Estado e dar resposta aos problemas do País, nomeadamente através da
tributação dos lucros dos grupos económicos, dos grandes proprietários, das grandes fortunas.
A questão que se coloca é se o Governo vai continuar a comprometer o futuro e a permitir que sejam os
trabalhadores e o povo a pagar a especulação, a gula do lucro dos grupos económicos, ou se vai, com coragem
e audácia políticas para os confrontar, fazer a opção da valorização das condições de vida do povo e da solução
dos problemas do País.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra ao Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, em primeiro lugar, em janeiro de 2023, nenhum pensionista receberá menos do que em dezembro de 2022.
Protestos do PCP.
Não, Sr. Deputados. Entre dezembro deste ano e janeiro do próximo ano, todos os pensionistas terão
aumentos que variarão entre 4,43% e 3,53%.
Protestos do Deputado do PCP João Dias.
Entre o suplemento extraordinário que os pensionistas já receberam, agora, em outubro, e a atualização
anual que vão ter no próximo ano— os aumentos até final de 2023 —, o rendimento de cada pensionista
aumentará entre 7,1% e 8% até final de 2023.
Antecipámos esse suplemento extraordinário, sim, de forma a garantir que as pessoas têm o dinheiro quando
mais precisam do dinheiro, que é neste momento.
Risos do PCP.
O Sr. Deputado pode salientar um ponto que é rigoroso, que é dizer: «com este aumento em 2023, se nada
acontecer durante o ano, o aumento em 2024 vai ser inferior, em termos reais, àquele que seria».
Por isso é que temos dito que iremos continuar a acompanhar com muita atenção a evolução da situação
económica, do poder de compra dos pensionistas, da nossa economia e da capacidade da segurança social
para podermos responder, em 2024, em função daquilo que for necessário responder em 2024.
Protestos do BE.
Mas gostaria de chamar a atenção, Sr. Deputado, para o facto de que, nestes 16 anos, a fórmula de
atualização de pensões aprovada em 2007 só quatro vezes foi aplicada em termos rigorosos: em 2007, em
2008, em 2009 e em 2016. Os Governos do PPD e do CDS nunca aplicaram esta fórmula.
Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias.
E desde 2017, em acordo com o PCP, também nunca aplicámos esta fórmula porque procedemos sempre à
atualização extraordinária das pensões, inclusive neste ano de 2022, e afastámo-nos da fórmula.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Porque é que havemos de aplicar agora?!
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — A lei não estava suspensa!
Aplausos do PS.
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O Sr. Primeiro-Ministro: — E, Sr. Deputado, esse afastamento da fórmula foi absolutamente essencial porque, se não nos tivéssemos afastado da fórmula, os pensionistas que ganham hoje 500 € não ganhariam
hoje 500 €.
Portanto, com o mesmo sentido de responsabilidade com que temos avançado neste percurso desde 2015
até agora, iremos continuar a avançar, não reduzindo o que as pessoas recebem, aumentando-o e esperando
poder mesmo superar a expectativa das pessoas. Assim o permita a economia, assim o permita a
sustentabilidade futura da segurança social.
Sr. Deputado, a trajetória destes anos tem sido de melhoria efetiva do rendimento de quem trabalha, de quem
é pensionista, de quem beneficia das prestações sociais. Aliás, quando hoje falamos de pobreza, não falamos
da mesma pobreza de que falávamos em 2015. A pobreza é uma noção relativa, corresponde a 60% do
rendimento mediano, e o limiar da pobreza, nestes anos, subiu 31%, desde 2015 até agora. E subiu porque o
rendimento mediano da sociedade portuguesa, felizmente, melhorou.
Não significa isto que tenhamos menor determinação em combater a pobreza; significa que, hoje, o limiar da
pobreza está 132 € acima do que era o limiar da pobreza há sete anos. É esta trajetória que temos de prosseguir
com os salários e, por isso, os acordos que assinámos em concertação social e com os trabalhadores da função
pública são acordos plurianuais, que permitem que, ao longo desta Legislatura, haja uma valorização de 20%
dos respetivos salários, num cenário em que se prevê que a inflação acumulada ao longo da Legislatura seja
de 10%, ou seja, com um ganho efetivo do salário real dos trabalhadores ao longo de todo o período da
Legislatura.
Sim, para aumentar os salários é necessário mudar o regime da caducidade. Mas, Sr. Deputado, nós temos
— já tínhamos na anterior Legislatura — uma proposta de lei para alterar o regime da caducidade. Temos
pendente, na Assembleia da República, uma proposta de lei para mudar o regime da caducidade, para que
antes da caducidade possa haver arbitragem voluntária obrigatória e impedir que, antes de haver caducidade,
haja a determinação de qual é o regime salarial.
E, sim, mal termine este debate orçamental, espero que a Assembleia da República tenha disponibilidade
para discutir a proposta de lei — que tem que estar fora do Orçamento, é para aplicar aos rendimentos de 2022
e não aos lucros de 2023 — que vamos apresentar para a tributação dos lucros não esperados no conjunto das
empresas não só do setor energético, mas também do setor da distribuição, que devem pagar aqueles lucros
que estão a ter injustificadamente por via desta crise de inflação.
Sim, iremos apresentá-la na Assembleia da República e esperamos contar com o voto do Partido Comunista
Português.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para formular um pedido de esclarecimento, em nome do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, bem sei que o Governo não escolheu a crise internacional, mas escolhe a resposta que lhe dá. E nesta crise há quem ganhe e há quem esteja a
perder, mas o Governo, com este Orçamento, está a premiar quem ganha e está a deixar que quase todos
empobreçam.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — O senhor veio aqui hoje ao debate, e registei-o, anunciar uma série de medidas que nem sequer incluiu no Orçamento do Estado.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Todas!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Além disso, antes anunciou acordos sobre salários que são uma verdadeira miragem, enganou os pensionistas. Quando olhamos para o que está escrito no Orçamento, vemos borlas
fiscais, e outras, para o Novo Banco, para a EDP, para PPP e até medidas que vão fazer com que o preço da
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habitação continue a subir. Essa é a escolha do Governo e eu queria deixar-lhe sete notas de porque é que
achamos que este é um mau Orçamento.
Em primeiro lugar, este é um Orçamento que desconhece a inflação. Até agora, a regra era que em cada
Orçamento — dizia-nos o Governo — faziam-se atualizações tendo em conta o Orçamento do ano anterior. Mas,
na primeira curva da estrada, essa regra já não vale e agora o que conta é a inflação prevista para o próximo
ano. Quem ouvir o Governo falar até parece que em janeiro de 2023 os preços vão estar como em janeiro de
2022. Só que não, a inflação é acumulada. E como o Governo não quer olhar para a inflação de 2022 — mas
mesmo que o Governo não olhe, ela não desaparece por passe de mágica da vida das pessoas —, temos uma
inflação acumulada acima de 12%.
Diz o Governo que não há cortes. Bem, mas os cortes reais não têm de ser cortes nominais.
Sr. Primeiro-Ministro, acompanhe: uma pessoa tem um salário de 1000 €, tem uma atualização de 5%. Diz o
Governo: «Acima da inflação do próximo ano», como se este ano não tivesse existido inflação. Façamos de
conta que esta ideia do Governo é passível de ser aceite. O salário sobe para 1050 €, mas só em duas idas ao
supermercado, para o cabaz essencial, e já o cabaz essencial aumentou 60 €. Isto quer dizer que esta pessoa,
em vez de ter um aumento real de 50 €, já perdeu 10 €. Se lhe juntarmos a prestação da casa, que aumentou
100 € nestes dois últimos meses, a pessoa já está a perder 110 € por mês. Ainda não chegámos à conta da luz
e, por ano, esta pessoa já perdeu o subsídio de Natal e 1/3 do subsídio de férias. Isto são cortes, Sr. Primeiro-
Ministro, chame-lhe o que lhe chamar!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Acresce — e aqui chega a segunda nota — que não é sequer certo que estes aumentos de 5% existam, porque o Governo anuncia um acordo com os trabalhadores do Estado, da
função pública, em que diz que haverá até um acréscimo de massa salarial de 5% mas no Orçamento do Estado
só prevê 3,6% para os aumentos. O resto são novas contratações e alteração nas carreiras. O que quer dizer
que se não muda os números do Orçamento, então, não há atualizações destas na função pública. E de duas,
uma: ou o acordo não é para estar válido em 2023 ou, então, vai deixar mesmo muita gente de fora. O que não
nos pode dizer é que com a atualização abaixo da inflação vai dar aumentos acima da inflação aos funcionários
públicos, porque isso é um truque e é mentir aos trabalhadores.
Vamos aos trabalhadores do privado. Fez um acordo com os patrões e com a UGT, e disse: «Vamos ter
aumentos de 5% para os trabalhadores do privado.» Chega aqui o Ministro das Finanças, à audição, e
perguntamos: «Então, como é?». E diz o Ministro das Finanças: «Ah, depende! Umas empresas sobem mais,
outras empresas sobem menos.» Ou seja, o acordo não garante nada a nenhum trabalhador, não garante que
nenhum trabalhador tenha sequer estes 5% de aumento, que, mesmo assim, seria uma perda real de salário.
Mas mais: o Governo tem tão pouca expectativa neste acordo que o apoio, a dedução fiscal que indexou aos
aumentos é mínima. Sabe que não vai acontecer. Mas sabem o que é máxima? Máxima é a borla fiscal que dá
aos patrões, quer aumentem os salários, quer não os aumentem.
E chego ao meu quarto ponto. A dedução dos prejuízos em sede de IRC passa a ser por tempo ilimitado.
Ora bem, as PME já beneficiavam disso por 12 anos, as grandes empresas é que só beneficiavam por 5 anos,
o que quer dizer que as grandes empresas, aumentem ou não aumentem os salários, vão ter uma borla fiscal
gigantesca. E, garanto-lhe, o Novo Banco vai ser o primeiro a agradecer.
Há uma coisa que registo: o Ministro das Finanças não foi capaz de dizer quanto é que custa esta gigantesca
borla fiscal aos patrões. Portanto, sei que, contas certas, o Governo só tem quando é para cortar nos salários e
nas pensões.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Claro!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Mas vamos a uma quinta nota, sobre as pensões. Sr. Primeiro-Ministro, os pensionistas já perceberam que o que lhes dá agora é o que lhes vai tirar para o
ano, o que vai significar uma atualização das pensões sempre em baixo e os pensionistas sempre a perderem
poder de compra. Digo-lhe uma coisa: registei que o Sr. Primeiro-Ministro achasse normal que a Ministra do
Trabalho enviasse ao Parlamento, aos Deputados, números que sabe que são mentira.
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O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — É verdade!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Acho, pessoalmente, que é mesmo muito grave que uma Ministra minta assim aos Deputados.
Em sexto lugar, a habitação. Quanto à habitação, o Governo não tem nada previsto no Orçamento, mas tem
medidas que significam um aumento do preço da habitação.
Vejam bem: com esta crise, com menos salários, menos habitação, os preços, tanto no arrendamento como
para compra de casa, continuam a aumentar. Dizem-nos as imobiliárias que é graças aos investidores
estrangeiros. O que faz o Governo? Dá borlas a fundos de investimento e, claro, borlas fiscais aos residentes
não habituais. O Governo vai gastar 1000 milhões de euros em borlas fiscais aos residentes não habituais — o
que faz com que o preço da habitação, em Portugal, aumente —, que é o mesmo valor que está a cortar aos
pensionistas.
Em sétimo lugar, Sr. Primeiro-Ministro, os suspeitos do costume continuam a ganhar. É a EDP, que vai
ganhar o resultado de uma multa. E sabe porquê? Porque um governante fez correspondência que apoia
objetivamente a EDP no seu processo em tribunal.
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — É verdade!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Isto é, aliás, extraordinário, porque os negócios entre o Estado e a EDP têm este racional: ou a EDP ganha, ou se, por acaso, a EDP estiver a perder, há um governante que lhe faz logo o
favor, para garantir que a EDP ganha sempre. E ela já pagou o imposto do selo das barragens? Acho que não,
pois não?
Entretanto e mais uma vez, também nas PPP o Estado está sempre a perder.
Neste Orçamento do Estado há duas garantias: quem vive do seu trabalho vai empobrecer, mas os que têm
sido privilegiados por estes regimes de privilégio, de exceção, vão continuar a ganhar.
Sabe, Sr. Primeiro-Ministro, porque é que a direita faz tudo para falar de qualquer coisa exceto do Orçamento,
das contas concretas do Orçamento? É que a direita faria igual.
Aplausos do BE.
O Sr. André Ventura (CH): — Não, não faria igual!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Catarina Martins, muito obrigado. Sr.ª Deputada, como sabe, desde o Orçamento do Estado para 2021 que o Bloco de Esquerda considera
que os orçamentos que apresentamos são de direita. Por isso, votou contra o de 2021, votou contra o de 2022,
voltou a votar contra o de 2022 e vai votar contra o de 2023. É assim! O Bloco de Esquerda resolveu mudar de
orientação política.
Aplausos doPS.
Vozes doBE: — Não, não! Quem mudou foi o Governo!
O Sr. Primeiro-Ministro: — E a cegueira do ódio ao PS é tão grande, tão grande, que a Sr.ª Deputada até consegue, no discurso que fez, estabelecer uma equivalência entre um aumento menor das pensões do que o
que propõe com um corte nas pensões a pagamento que a direita fez enquanto governou. E a Sr.ª Deputada
acha que é o mesmo!
Aplausos doPS.
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Sr.ª Deputada, nos últimos anos, tivemos uma inflação muito baixa — a média foi de 0,8% nos últimos cinco
anos — e tivemos sempre crescimento dos rendimentos reais, felizmente, muito acima da inflação. Este ano,
como sabemos, estamos a viver um ano absolutamente atípico, um ano anómalo. Há 30 anos que não tínhamos
uma inflação desta dimensão. Prevemos que a inflação para este ano seja de 7,4%. A mais próxima que temos
é de 6,9%, em 1993 — 6,9%!
Portanto, não podemos organizar a resposta e o conjunto das medidas de política em função de um ano
absolutamente atípico. Temos de procurar responder às necessidades das pessoas e das famílias, neste ano
atípico, sem comprometer o futuro, como se o futuro fosse sempre assim.
A Sr. Catarina Martins (BE): — E, vai daí, borlas fiscais!
O Sr. Primeiro-Ministro: — No futuro, temos de fazer todos um esforço muito grande para, tão rapidamente quanto possível, fazer convergir a taxa de inflação para o objetivo de médio prazo fixado pelo Banco Central
Europeu, de 2%. É esse esforço que temos de fazer. Entretanto, temos de apoiar, com medidas extraordinárias,
as famílias, para que possam viver estes tempos particularmente difíceis mas que têm uma natureza
extraordinária. É isso que temos procurado fazer ao longo deste ano.
Tem sido sempre fácil? Não, seguramente que não é fácil, como não o foi no tempo da pandemia, como não
o foi no tempo em que tivemos de sair do procedimento por défice excessivo, mas temos procurado corresponder
a essa necessidade.
Sr.ª Deputada, até julho, entre medidas de apoio aos combustíveis, os 120 € pagos a todos os que viviam
com prestações sociais mínimas, os apoios no consumo de gás às empresas intensivas, a redução do IVA sobre
os fertilizantes e as rações e as medidas adotadas para apoiar o transporte de mercadorias, o Estado despendeu
1682 milhões de euros.
Em setembro, quando anunciámos o conjunto de medidas do pacote Famílias Primeiro, juntámos mais 2400
milhões de euros.
Quando o Sr. Ministro da Economia apresentou o programa para as empresas Energia para Avançar
somámos mais 1000 milhões de euros, e neste Orçamento do Estado para 2023 somamos mais 2150 milhões
de euros em medidas de apoio aos combustíveis, às rendas de casa, à redução do IVA sobre a eletricidade, ao
congelamento de preços dos transportes públicos. Sim, é um conjunto de medidas que temos para continuar a
apoiar as famílias e que somam àquelas que já adotámos anteriormente.
Quando diaboliza o nosso sistema regulatório, a verdade é que, para 2023, entre reforço das medidas do
Estado e mobilização das receitas do regulador da energia, temos a mobilização de mais 7100 milhões de euros
— mais 7100 milhões de euros! — para controlar a subida do preço da eletricidade e a subida do preço do gás
perante a escalada internacional galopante que a energia está a ter e a que temos de responder, apoiando as
famílias e as empresas, como no passado fizemos e como vamos continuar a fazer, no futuro.
Aplausos doPS.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Ah, pois!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Deputada, neste equilíbrio, fizemos um acordo plurianual, quer em sede de concertação social, quer com os sindicatos da função pública, para, num quadro da plurianualidade desta
Legislatura, garantir a todos os trabalhadores uma melhoria efetiva do seu rendimento, um ganho real.
Nesse acordo, para além do aumento salarial, temos um conjunto de outras medidas de política pública que
ajudam a compensar esse aumento do custo de vida das famílias, ou, pelo menos, a aliviar esse custo.
Quando congelamos o preço dos transportes públicos, quando limitamos a 2% a subida das rendas das
casas, quando reforçamos a rede de creches gratuitas, quando mantemos o conjunto de medidas de política
que mantemos, estamos a complementar o rendimento das famílias.
Sr.ª Deputada Catarina Martins, quando reduzimos o IRS para todas as famílias, tal como fizemos este ano,
o rendimento disponível das famílias portuguesas, no próximo ano, vai ser maior do que aquele que resulta
exclusivamente do aumento dos salários.
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É neste equilíbrio entre, por um lado, proteger o rendimento das famílias e, por outro, assegurar que as
empresas não encerram, não destroem postos de trabalho, mas conservam os seus trabalhadores, que temos
de conseguir ultrapassar esta crise, que é uma crise dificílima e muito dura.
Claro, Sr.ª Deputada, é fácil fazer como fez, quando lavou as mãos em plena pandemia. De facto, não
esperava de si, agora, qualquer solidariedade, quando estamos a enfrentar, novamente, uma crise tão dura
como aquela que se está a desencadear, fruto da guerra da Rússia contra a Ucrânia.
Aplausos do PS.
Protestos da Deputada do BE Catarina Martins.
Sr.ª Deputada Catarina Martins, o tempo escasseia, mas não queria deixar de lhe dizer duas coisas.
Em primeiro lugar, gostaria de lhe dizer que, até 31 de dezembro de 2023, nenhum pensionista vai deixar de
receber o que receberia se a fórmula das pensões fosse estritamente aplicada.
Em segundo lugar, queria dizer-lhe que cá estaremos, daqui a um ano, para ver o que é que é possível fazer
relativamente a 2024. Não faço promessas nem crio ilusões, mas há uma coisa que digo e na qual os
pensionistas sabem que podem confiar: comigo, no mês seguinte, nunca receberão menos do que receberam
no mês anterior, e tudo farei para que recebam mais do que recebiam anteriormente. É isso que assumo.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, dou agora a palavra à Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do PAN.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo aqui presentes, Sr. Primeiro-Ministro, começava por registar que iniciou este debate dizendo que as propostas que
traz são para a atualidade. No entanto, a atualidade de que falamos é a de um País onde, em primeiro lugar, já
tivemos o contexto da pandemia e, precisamente por essa razão, apesar do excedente orçamental, não houve
aumentos. Depois, quando chegou a guerra e os seus impactos, também o Governo não foi mais longe nas
medidas para não aumentar o défice. Agora, com a inflação, que bem sabemos ser uma externalidade, e com a
asfixia que isso está a causar às famílias, o Governo também não vai mais longe para não aumentar a dívida.
A verdade, Sr. Primeiro-Ministro, é que as famílias e as necessidades do País ficam sempre para trás. Ano
após ano, as promessas são adiadas e as ditas contas certas, de que tanto fala, servem mais para uns — para
a Galp, para a EDP, para o Novo Banco, para as grandes poluidoras — e menos para as famílias e para o que
realmente importa, como, por exemplo, o tecido empresarial português.
Não podemos continuar a ter um País onde temos de esperar cinco gerações para quebrar o ciclo da
desigualdade, onde continuamos a ter, como já foi aqui dito, 2 milhões de pessoas a viverem em risco de
pobreza, inclusive, um quinto das quais trabalha, mas não tem o que comer todos os dias.
O salário médio é, também, cada vez mais o salário mínimo. A autonomia dos jovens é uma miragem: ter
acesso à habitação, ter acesso ao emprego, tudo isso acaba por ser um sonho por realizar.
A própria igualdade é um fosso cada vez mais difícil de ultrapassar. Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, aquilo
que gostaria de fazer e de lhe pedir que fizesse connosco, é um exercício muito simples.
Há pouco, o Sr. Primeiro-Ministro disse que a pobreza é uma noção relativa, pelo que gostaria de lhe
apresentar o seguinte: hoje, o cabaz essencial é um cabaz que não tem IVA zero nem medidas extraordinárias;
um simples pacote de massa em espiral custa 2,15 €, tendo o preço aumentado 12%, só na semana passada;
um quilo de laranjas, como as que tenho aqui, custa 1,79 €, com um aumento de 31% desde o início da guerra;
outros alimentos essenciais, tais como os vegetais, aumentaram os preços em 48% desde o início da guerra e,
hoje, um molho de brócolos custa 3,49 €.
A oradora exibiu os produtos alimentares que mencionou.
Risos do CH.
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Sr. Primeiro-Ministro, estes três alimentos que lhe trago hoje, que não compõem sequer uma refeição
completa, custaram 4,33 €, ou seja, quase 5 €, que é o equivalente, por exemplo, ao aumento do megawatt-
hora na eletricidade.
Sr. Primeiro-Ministro, como é que, perante esta realidade — uma refeição completa custa mais do que 5 €
—, não há abertura, como já ouvimos o Sr. Ministro das Finanças dizer, para discutir uma medida extraordinária
como o IVA zero para o cabaz essencial?
Quando temos, também, o aumento da despesa com os animais de companhia, com 200% de aumento na
sua alimentação, como é que não temos acesso a uma linha de apoio extraordinário ou abertura para reduzir o
IVA, por exemplo, nos serviços médico-veterinários e nas rações?
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Os gatos comem brócolos?!
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Primeiro-Ministro, quando é que vamos, de facto, estender as mãos às famílias portuguesas? No contexto deste Orçamento do Estado, está ou não disponível para trabalhar, na
especialidade, este tipo de medidas com o PAN?
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, sabe que a linguagem se inventou para podermos falar das coisas sem ter necessariamente de mostrá-las.
Risos.
Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, ninguém tem dúvidas nenhumas que estamos a sofrer um choque inflacionista brutal. Há mais de 30 anos que não tínhamos este
choque inflacionista.
Acontece, como toda a gente sabe, que a inflação que estamos a sofrer não resulta de medidas de política
interna, mas resulta do impacto que estamos a sofrer de uma guerra desencadeada pela Rússia contra a
Ucrânia, que se somou uma situação de crise já existente, resultado da rutura das cadeias de abastecimento
durante a pandemia. Portanto, estamos a sofrer uma situação dramática.
Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, nos últimos 12 meses, a inflação subiu 6% em Portugal. A nossa previsão
é que, até ao final deste ano, venha a subir 7,4%. É também nossa previsão que, no próximo ano, a inflação
comece a desacelerar.
Assim sendo, temos de gerir, e é isso que temos procurado fazer, um conjunto de medidas para controlar e
tentar mitigar a subida de preços. Foi o que fizemos na área da energia, foi o que fizemos com as rações e com
os fertilizantes, na agricultura, e foi também o que fizemos com as medidas de apoio, em primeiro lugar, às
famílias mais carenciadas, com 120 €, e, agora, para todas as pessoas que recebam até 2700 € de rendimento
bruto mensal, bem como com o suplemento extraordinário para os pensionistas.
É por isso que, no próximo ano, aumentaremos acima da inflação o salário mínimo nacional e o indexante
de apoios sociais.
No que diz respeito à Administração Pública, o acordo que celebrámos tem uma dupla dimensão: atualização
e valorização de carreiras.
Em média, o acordo resulta num aumento salarial de 5,1%. Mas, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, se for
ver com atenção, esse aumento médio vai variando: para um assistente operacional o aumento médio é de
7,5%, já para um técnico superior o aumento médio é de 5,6%.
Em matéria de valorização de carreiras, há duas medidas muito importantes. Por um lado, por via da
diferenciação, no leque salarial, entre os assistentes operacionais e os assistentes técnicos, estes últimos terão
um aumento, não de 52 €, mas de 104 €. Por outro lado, por via da reposição da diferenciação entre os
assistentes técnicos e os técnicos superiores, os técnicos superiores vão ter um aumento de 104 €.
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Estas medidas servem para resolver um problema que foi criado pelo aumento do salário mínimo nacional,
em mais de 40%, ao longo destes anos, criando uma enorme compressão nas grelhas salariais. A
descompressão das grelhas salariais será agora introduzida.
Relativamente aos assistentes operacionais — a Sr.ª Deputada já terá ouvido muitos casos, nas escolas —,
vamos introduzir a valorização da carreira, de forma a permitir que, para além do aumento de um nível salarial
que todos vão ter, haja um outro aumento, correspondente a um nível salarial, para quem tem 15 anos de
atividade, e um aumento de dois níveis salariais para quem tem 30 anos de atividade, de forma a evitar a situação
injusta de quem entra hoje ter o mesmo vencimento de quem já está há 15 ou 16 anos a trabalhar naquela
escola ou em qualquer outro lugar da Administração Pública.
É por isso que é necessário olhar para o acordo no seu conjunto e não, simplesmente, para a taxa da
atualização do próximo ano.
Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, aquilo que gostaria de lhe dizer, tal como já fizemos no passado, é que
temos plena disponibilidade para discutir com o PAN as propostas que tenha a apresentar, em sede de
especialidade, naquele esforço de boa-vontade e de boa-fé em que temos sempre trabalhado, procurando o
ponto de encontro e não o de desencontro. Espero que nos encontremos na especialidade.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Com a concordância de todos os líderes parlamentares e excecionalmente, vamos permitir ao Sr. Deputado Rui Tavares que possa intervir no debate, prelevando o seu pedido de esclarecimento
por via remota.
Peço aos serviços que assegurem a ligação.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Tavares, que tem de ligar o microfone.
O Sr. Rui Tavares (L): — Muito obrigado, Sr. Presidente. Obrigado, também, à Conferência de Líderes, por permitir esta solução excecional, que não é a melhor das soluções mas que, tendo em conta as regras
atualmente vigentes, foi a melhor possível.
Srs. e Sr.as Deputadas, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro, numa situação inflacionária
e com indícios já muito claros de uma recessão, um orçamento não deve apenas possibilitar as contas certas
do Estado, mas assegurar as contas certas das pessoas, das famílias e dos trabalhadores.
Algumas das medidas que aqui foram anunciadas — tais como o aumento do indexante de apoio social, o
aumento do salário mínimo nacional ou o complemento solidário para idosos —, tendo em conta o nível da
inflação esperada, não são suficientes quando vemos que, neste momento, o frango, o óleo ou as laranjas,
enfim, o valor do cabaz essencial, aumenta acima dos 25%.
Se, por um lado, as pessoas poderão acompanhar a inflação, perderão, pelo outro, se não tivermos medidas
que sejam não-inflacionárias ou, até, anti-inflacionárias, medidas como as que o Livre proporá neste Orçamento
do Estado, na especialidade: por exemplo, a criação de um passe ferroviário nacional, que permita a toda a
gente que foi expulsa pelo aumento das rendas nas suas cidades ter acesso a um passe único para se deslocar
no País, através da ferrovia, ou a mera inventariação, que não tem custos acrescidos para o Estado, de quartéis
e outro património do Estado, praticamente esvaziado, que pode servir, pelo menos temporariamente, para
residências universitárias. Esta medida beneficia os estudantes, as suas famílias e, também, de forma indireta,
toda a gente que procura casa e que não terá de se confrontar com a pressão sobre o mercado da habitação
que representa a procura dos estudantes universitários, nas nossas maiores cidades.
O Governo não pode dizer que tem todas as boas ideias quando não apresenta suficientes medidas
inovadoras, em termos de políticas públicas, que permitam às pessoas pagar menos e conseguir poupar. Sem
contas certas das famílias, dos trabalhadores e de toda a gente, também não aparecerão as contas certas do
Estado.
Para podermos discutir o Orçamento do Estado de 2023, tendo em conta que temos indicadores que já nos
dizem que podemos estar em período de recessão — com o índice dos gestores de compras abaixo dos 50
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pontos, desde julho, o que representa um claro indício nesse sentido —, o Governo, se não está, agora, disposto
a apoiar as pessoas, não conseguirá evitar essa recessão nem que ela seja mais profunda do que necessitaria.
Lembro-me do que disse há 10 anos. Lembro-me e, pelos vistos, o Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias
também se lembra do que disse. Mas, agora, é preciso fazer aquilo que na altura disse que não estava a ser
feito, ou seja, é preciso apoiar as pessoas para evitar a recessão.
Para discutir o Orçamento do Estado para 2023 na especialidade é preciso, também, que façamos o ponto
de situação sobre as medidas já aprovadas para 2022.
Hoje, tivemos a notícia de que, no último trimestre, tivemos 9 000 queixas de violência doméstica no nosso
País. Em setembro, ouvi a Sr.ª Ministra dos Assuntos Parlamentares dizer-nos que iria sair o decreto que,
finalmente, regulamentaria o compromisso — através da proposta do Livre, que foi aprovada — de que estas
pessoas tivessem acesso ao subsídio de desemprego de forma alargada, ou seja, por sua própria iniciativa.
Quando é que sai esse decreto, para que estas pessoas possam, finalmente, ter mais autonomia financeira para
refazerem as suas vidas?!
Ouvimos hoje que um banco, que teve 124% de lucros só até setembro, diz que vai deixar de ter empréstimos
a taxa fixa disponíveis para os mutuários, precisamente quando as pessoas mais precisam de se abrigar das
variações na taxa de juro. Pois bem, neste momento, há uma lei aprovada na Assembleia da República, sob
proposta do Livre, que diz que a banca não pode penalizar nem criar obstáculos a quem queira mudar da taxa
variável para a taxa fixa. O que é que o Governo vai fazer para que esta lei seja respeitada?
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Tavares — a quem desejo uma rápida recuperação —, queria registar a posição construtiva com que se apresenta neste debate.
Vamos analisar e debater o conjunto de propostas que refere e trabalhar, como fizemos no ano passado,
para ver se temos um ponto de entendimento sobre essas propostas.
Quanto à questão de fundo, creio que partilhamos a mesma visão: é evidente que é preciso apoiar as
pessoas, é preciso apoiar as empresas para que resistam a este choque brutal que estamos a sofrer com a
inflação, e temos de o fazer, como bem disse, sem alimentar a própria espiral inflacionista.
Para isso, é preciso, perante situações extraordinárias, adotar medidas extraordinárias e não medidas que
se consolidem permanentemente perante os compromissos do Estado para com o futuro, porque não podemos
comprometer o futuro.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Assim, finalizamos a primeira ronda de pedidos de esclarecimento. Passamos à segunda ronda, na qual contamos com 17 pedidos de esclarecimento.
Para formular o primeiro pedido, tem a palavra o Sr. Deputado João Torres, do Grupo Parlamentar do PS.
O Sr. João Torres (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Sr. Deputados, penso que este debate tem sido amplamente esclarecedor: a esquerda, à esquerda do Partido
Socialista, na verdade, ainda não se encontrou, depois do erro que cometeu há sensivelmente um ano, mas
também estamos a compreender bem que a direita se tem revelado cada vez mais extraordinária.
Acho absolutamente notável que se tenha falado hoje de empobrecimento do País. O Sr. Primeiro-Ministro
já desmontou bem essa narrativa do empobrecimento com os Governos do Partido Socialista, mas há um dado
que gostava de partilhar com a bancada do PSD, sob a forma de duas novidades para a direita e, felizmente,
não para a generalidade dos portugueses.
A primeira novidade que gostaria de transmitir ao PSD, em particular, é a de que houve um Primeiro-Ministro,
em democracia, que deixou o Governo mais pobre do que quando o encontrou, deixou o País mais pobre do
que quando o encontrou.
Vozes do PSD: — Sócrates!
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O Sr. João Torres (PS): — Esse Primeiro-Ministro foi Pedro Passos Coelho, que o líder atual do PSD, então, líder parlamentar, aplaudia nesta Câmara.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Mas há uma segunda novidade que quero dar ao PSD. É que o segundo Primeiro-Ministro que, porventura,
deixará o País mais pobre do que o encontrou não terá, seguramente, o nome António Costa.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
E, por isso, Sr. Primeiro-Ministro,gostaria de lhe dizer que é absolutamente inaceitável a forma como a direita é incapaz de concordar com o Governo.
Não sei se o Sr. Primeiro-Ministro reparou que o PSD, em particular ao longo das últimas semanas, tem
fugido do debate concreto do Orçamento do Estado «como o diabo foge da cruz».
Protestos do PSD.
É absolutamente inacreditável! São incapazes de dizer algo de positivo que seja sobre a atualização do
indexante dos apoios sociais, sobre a valorização do salário mínimo nacional, são até incapazes de dizer
qualquer coisinha de construtiva sobre a capacidade que o Sr. Primeiro-Ministro revelou, e o seu Governo
também — e que, aqui, quero reconhecer e elogiar —, de fazer dois acordos da maior relevância para o nosso
País.
Aplausos do PS.
Acordos, esses, Sr. Primeiro-Ministro, que significam melhorias concretas na vida dos trabalhadores e
melhores condições de competitividade e inovação empresarial.
Mas, Sr. Primeiro-Ministro, há um líder da oposição à espreita no nosso País — um líder da oposição que
parece que, de vez em quando, é autarca em Lisboa —, que diz que quer ser um incómodo para o Governo.
Para o Governo, não será seguramente; a direita e o PSD lá saberão para quem é que o Dr. Carlos Moedas
quer ser um incómodo.
Mas aquilo que é notável, também, é perceber que o «bota-abaixismo» da oposição chegou a um ponto tal
que é impossível ao PSD disfarçar a sua infelicidade com as vitórias para o País e com as boas notícias para
os portugueses.
Já reparou, Sr. Primeiro-Ministro, nos contorcionismos que o PSD faz, quando o Governo paga uma meia
pensão adicional aos pensionistas?!
Protestos do PSD.
Já reparou, Sr. Primeiro-Ministro, no contorcionismo que faz o PSD quando se inicia uma transferência
importante para os trabalhadores com salários até 2 700 €?!
Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.
E, em ambos os casos, no momento em que esses apoios fazem mais falta aos portugueses?!
Aplausos do PS.
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É um contorcionismo que, de facto, Sr. Primeiro-Ministro,não pode deixar de merecer a estupefação do Partido Socialista.
Continuam a insistir, depois de um ligeiro interregno, na lógica do rolo compressor. É mais uma «inventona»
da direita, como aquela que foi criada no passado fim de semana, a propósito do corredor verde europeu.
Com a liderança do Dr. Luís Montenegro, no PSD, há três coisas que sabemos: primeira, há uma enorme
tentação de branquear o passado;…
Risos do PSD.
… segunda, há uma enorme tentação de normalizar a extrema-direita; a terceira é a de que o recurso a
manobras de diversão, para afastar a atenção daquilo que é importante, não terá limites com esta liderança do
PPD/PSD em Portugal.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Sr. Primeiro-Ministro,terminaria com uma questão, não sem antes utilizar a gíria futebolística para lhe dizer o seguinte: com os acordos que assinou, em conjugação com este Orçamento do Estado, o Sr. Primeiro-Ministro
marcou um hat-trick a favor de Portugal e a favor dos portugueses.
E queria dizer-lhe mais, Sr. Primeiro-Ministro: num momento como aquele que estamos a atravessar, que é
um momento de dificuldades, do ponto de vista económico e social, à escala europeia e à escala mundial, o que
era suposto era que, com as normais diferenças que fazem, saudavelmente, parte da democracia, pudéssemos
todos jogar na mesma equipa, face a um adversário comum, que é a guerra e a inflação. Não é isso que está a
acontecer, e não é isso que, infelizmente, acontece com o PSD, porque, na prática, em relação a soluções
concretas para os portugueses,…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de terminar.
O Sr. João Torres (PS): — … ficou «fora de jogo» no debate deste Orçamento do Estado. Por isso, pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, muito diretamente e para terminar…
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, caminha para triplicar o tempo que lhe foi atribuído. Faça favor de concluir.
O Sr. João Torres (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente. Pergunto-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, qual é a importância dos acordos que o seu Governo assinou e deste
Orçamento para melhorar a vida concreta dos trabalhadores do nosso País?
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Cristina.
O Sr. Rui Cristina (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, trago-lhe várias perguntas, para as quais peço respostas diretas.
Em 2016, o senhor disse que o ano de 2017 seria, de uma vez por todas, o ano em que todos os portugueses
teriam um médico de família atribuído.
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Vozes do PSD: — É verdade!
O Sr. Rui Cristina (PSD): — Hoje, passados seis anos, 1,3 milhões de portugueses não têm médico de família, ou seja, são mais 200 000 portugueses do que em 2015.
Vozes do PSD: — Mais uma promessa!
O Sr. Rui Cristina (PSD): — Pergunto-lhe: assume agora, o Sr. Primeiro-Ministro, mais algum prazo para dar médico de família a todos os portugueses ou este é mais um caso de palavra dada, palavra não honrada?!
Aplausos do PSD.
O Sr. Primeiro-Ministro apregoou aqui, há pouco, no debate, que é um homem de contas certas e, nos últimos
anos, prometeu que iria baixar a despesa com os chamados «médicos tarefeiros», mas a verdade é que a
despesa subiu, de 90 milhões de euros, em 2015, para 142 milhões de euros, em 2021. Isto é que são as suas
contas certas, Sr. Primeiro-Ministro?!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Rui Cristina (PSD): — E não se desculpe com a pandemia,…
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Não aconteceu!…
O Sr. Rui Cristina (PSD): — … porque, em 2019, a despesa do SNS já ia em 119 milhões de euros.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Agora, é a seca!
O Sr. Rui Cristina (PSD): — Por isso, pergunto-lhe se o Orçamento do Estado tem algum objetivo quantificado de redução da despesa do SNS em prestações de serviços de cuidados de saúde.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Rui Cristina (PSD): — Uma última questão: fruto da incapacidade do seu Governo para atrair e reter profissionais de saúde no SNS, as grávidas portuguesas têm a angústia de não saberem a que maternidade ir
— o que acontece muitas vezes —, uma vez que muitas urgências de obstetrícia e blocos de partos dos hospitais
públicos estão sempre a fechar, funcionando de forma intermitente. Em junho passado, o senhor disse que era
um problema de feriados e que estaria resolvido no espaço de dias. Passaram meses, e a verdade é que perdeu
uma Ministra pelo caminho, mas os problemas continuam. Ainda esta semana, voltou a fechar o bloco de partos
do Hospital de Portimão, para só abrir na próxima sexta-feira. Uma vez mais, palavra dada e palavra não
honrada!
Aplausos do PSD.
Sr. Primeiro-Ministro, para terminar, como vai resolver o problema dos serviços de obstetrícia e convencer
os médicos a ficarem no SNS? Vai valorizar as carreiras ou vai fechar maternidades?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, em nome do Grupo Parlamentar do Chega, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Afonso.
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O Sr. Rui Afonso (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, por mais que lhe custe, a este Orçamento do Estado ficará associada para sempre a palavra «austeridade»,…
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
O Sr. Rui Afonso (CH): — … porque a vossa proposta não consegue devolver na íntegra o rendimento aos portugueses. E, como há muitas dúvidas sobre se este Orçamento segue ou não a linha da austeridade, vou ler-
lhe o que diz o dicionário da Wikipédia:…
Risos do PS.
«Austeridade é um conjunto de políticas político-financeiras que visam reduzir os défices orçamentais do
Governo por meio de cortes de gastos, aumentos de impostos ou uma combinação de ambos». E temos aqui
exemplos de Governos austeros: «Jimmy Carter, Roger Douglas, Pedro Passos Coelho e António Costa».
Risos do PS.
«Atual Primeiro-Ministro de Portugal, eleito pelo Partido Socialista em 2015, reeleito em 2019 e em 2022.»
Vocês riem-se, mas os portugueses não se devem estar a rir!
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
O Sr. Rui Afonso (CH): — «Devido às consequências da invasão da Rússia na Ucrânia, a Europa enfrenta uma pesada vaga de inflação. Para a combater, o atual Governo implementou medidas de austeridade com
cortes nas pensões e nos salários em geral» — isto é o que diz o dicionário da Wikipédia.
Risos do PS.
Eu sei que tem piada!…
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Isso é ridículo!
O Sr. Rui Afonso (CH): — Sim, sim, sim, é ridículo… Eu sei, eu sei! É ridículo para si, mas para o resto dos portugueses, lamentavelmente, não deve ser.
O Sr. Presidente: — Peço aos Srs. Deputados que criem condições para o orador se fazer ouvir, como é seu direito.
Sr. Deputado, pode prosseguir.
O Sr. Rui Afonso (CH): — É incrível! Quando lhes toca é um problema. Bom, mas este Orçamento também ficará associado à palavra show-off,…
O Sr. Miguel Matos (PS): — Qual é a definição da Wikipédia para isso?!
O Sr. Rui Afonso (CH): — … porque mais parece um orçamento concebido para agradar aos mercados internacionais do que para ajudar as famílias e as empresas portuguesas.
A vossa proposta para o Orçamento do Estado, mais do que ignorar um cenário macroeconómico
preocupante, fica marcada pela profunda desigualdade nas medidas sociais. É um orçamento muito focado no
apoio às famílias mais desfavorecidas, esquecendo por completo a grande franja da população que são as
classes médias. Esquece por completo a ampla maioria dos pensionistas portugueses e esquece por completo
a esmagadora maioria das empresas portuguesas.
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O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
O Sr. Rui Afonso (CH): — Face ao exposto, Sr. Primeiro-Ministro, quais são as medidas efetivas que V. Ex.ª irá adotar para apoiar as nossas classes médias, já que são estas famílias as que mais contribuem para a receita
fiscal e contributiva do Estado?!
Quais são as medidas efetivas que V. Ex.ª irá adotar para compensar os pensionistas portugueses, que vão
sofrer um corte permanente nas suas pensões por via da nova fórmula de cálculo?!
E, por fim, quais são as medidas efetivas que VV. Ex.as irão adotar para ajudar as empresas portuguesas a
combater a crise, além de lhes oferecerem mais endividamento?!
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos, do PCP.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, utilizou uma manobra de comparar as pensões de dezembro com as de janeiro para dizer que não há corte, mas a comparação que o Sr. Primeiro-
Ministro devia fazer era entre o valor de atualização da pensão de acordo com a lei e aquele que o Governo
decidiu aplicar. E não a faz propositadamente, para esconder que há, de facto, um corte de metade do valor que
é devido aos reformados e pensionistas.
Diz que entre 2017 e 2022 a lei não foi aplicada. É verdade, Sr. Primeiro-Ministro, mas não foi aplicada, neste
caso em concreto, a favor dos reformados e pensionistas, porque houve a determinação, por parte do PCP, para
um aumento extraordinário. E isto é substancialmente diferente daquilo que o Governo de maioria absoluta do
PS está a impor aos reformados e pensionistas, que é uma perda de poder de compra.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Primeiro-Ministro, faltam trabalhadores nos serviços públicos, não são garantidas condições de trabalho, não há valorização das carreiras e das profissões, não há uma opção pelo
reforço da contratação de trabalhadores, muito pelo contrário. Aquilo que vemos na proposta é a promoção da
precariedade e o recurso à externalização de serviços.
Referiu, na sua intervenção, que há um aumento do orçamento do SNS, mas gostaria de lhe perguntar para
onde vai ser canalizado esse aumento, se vai ser transferido para os grupos privados ou se vai utilizar essas
verbas para contratar e fixar profissionais no SNS.
O que encontrámos na proposta foi o alargamento do financiamento aos grupos privados da saúde. Só nos
últimos dois anos, as verbas atribuídas à aquisição de serviços de saúde aumentaram 1700 milhões de euros.
Quer isto dizer que o Governo vai continuar a ser cúmplice dos interesses dos grupos privados que lucram à
custa da doença?! Como pretende o Governo resolver o problema da falta de médico e enfermeiro de família?
Como vai assegurar a realização de consultas, cirurgias, tratamentos e exames nos tempos recomendados?
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vai avançar com o encerramento das seis maternidades, como está proposto?!
Hoje, ficámos a saber que, em outubro, se irão aposentar cerca de 300 professores — que se juntam aos
260 que se aposentaram em setembro — e que, ao longo do ano letivo, é previsível que haja mais aposentações.
Não há medidas concretas para assegurar que todos os alunos têm professores a todas as disciplinas.
Por outro lado, aquilo que é adiantado no plano da ação social escolar é manifestamente insuficiente, face
ao agravamento das condições de vida das famílias. O Governo garante as condições para que nenhum
estudante abandone o ensino por falta de condições económicas?
Sabemos também que há mais crianças com fome. Que respostas prevê o Governo?
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As verbas alocadas à medida «cultura» nem sequer alcançam 0,5% do Orçamento, o que é bem elucidativo
do lugar que a cultura ocupa nas opções do Governo.
Face às crescentes dificuldades relacionadas com a habitação, no que diz respeito ao acesso dos jovens, à
subida especulativa dos preços do arrendamento, à subida galopante das taxas de juro, com as previsíveis e
brutais consequências no empobrecimento de milhares de famílias com crédito à habitação e os subsequentes
riscos de incumprimento e execução de hipotecas, que respostas concretas dá o Governo? É que são vários os
anúncios de programas e medidas criados pelo Governo, mas, das duas uma, ou não estão a ser concretizados
ou são insuficientes, porque os problemas da habitação continuam a avolumar-se dia após dia.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, em nome do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, a lei de atualização das pensões de Vieira da Silva esteve suspensa apenas entre 2010 e 2015. Em 2016, 2017, 2018, 2019, 2020, 2021 e 2022, a
lei esteve em vigor e somaram-se-lhe complementos. A lei não foi suspensa.
Quem mudou de opinião sobre esta matéria não foi o Bloco de Esquerda, foi o Governo, quando, em
setembro, anunciou que não ia cumprir a lei e que queria antecipar metade do aumento que a lei previa,
incorporando um corte correspondente a esse valor nas pensões futuras de forma perpétua. Foi isso que o
Governo fez e, quando decidiu fazê-lo, usou um argumento tremendista: cumprir a lei de Vieira da Silva iria tirar
13 anos de vida ao sistema da segurança social.
Quando pedimos as contas dessa afirmação inusitada, veio aquele documento martelado e inapresentável,
que foi entregue aqui, no Parlamento. E não vale a pena dizer, como fez a Sr.ª Ministra, que a culpa é dos
técnicos do Gabinete de Estratégia e Planeamento. O documento era do Governo, foi o Governo que não quis
pôr lá os 1500 milhões de receita extra, que já sabia que existia, pelo menos desde julho. Foi, de facto, uma
fraude e o oposto de contas certas.
Queria falar-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, de contas certas, porque fica muito mal ao Governo, e é feio, culpar
os trabalhadores do Ministério do Trabalho pelos argumentos fraudulentos e até irresponsáveis que foram
utilizados pela Sr.ª Ministra do Trabalho, de que a segurança social estava à beira do colapso, argumentos que,
aliás, o Sr. Primeiro-Ministro repetiu. É que o atual relatório de sustentabilidade que consta da proposta de
Orçamento do Estado desmente impiedosamente os argumentos que foram utilizados por si e pela Sr.ª Ministra,
em setembro. E não foi o mundo que mudou entre o dia 18 de setembro e o dia 10 de outubro; o que mudou foi
o rigor e a seriedade das contas que foram apresentadas.
A pergunta que lhe faço, que é simples, é a seguinte: uma vez que os pressupostos de setembro não estavam
certos, eram uma fraude; uma vez que, ao contrário do que foi dito em setembro, cumprir a lei de Vieira da Silva
não faria o sistema perder 13 anos de vida nem poria em causa a sustentabilidade da segurança social — e não
sou eu que o digo, é o relatório que consta da proposta de Orçamento do Estado —, vai recuar na decisão de
cortar metade da atualização das pensões e vai fazer o que se exige, que é cumprir a lei e aumentar os 8% que
a lei determina, que é dos pensionistas por direito, que é seu pela lei? É a esta pergunta que o Sr. Primeiro-
Ministro tem de responder.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Gomes.
O Sr. Luís Gomes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, em 2017, o Sr. Primeiro-Ministro referiu que a descentralização era a pedra angular da reforma do Estado. O senhor sabe
perfeitamente a função de uma pedra angular numa edificação: quando cai, a edificação cai também. Foi por
isso mesmo que a descentralização falhou e, tendo falhado, falhou também a reforma do Estado, que era uma
promessa sua, quando iniciou funções em 2015. Chamarmos reforma do Estado ou descentralização ao
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empurrar das faturas do Governo para os municípios, como se diz na minha terra, Sr. Primeiro-Ministro, e peço
desculpa, «vou ali e já volto».
Aplausos do PSD.
É por esta falta de reformas que, cada vez mais, o nosso País está a empobrecer e é pelo facto de o Estado
não ter reformas, mas estar reformado pela inércia do Partido Socialista, que o PRR não consegue arrancar. E
é por essa mesma circunstância que o próprio Sr. Primeiro-Ministro já pediu para prorrogar o prazo para a
concretização do PRR.
Mas é este Estado que, apesar do nível de pobreza que temos, tira os fundos aos municípios, só porque não
apresentam a primeira reunião relativa à revisão dos PDM (planos diretores municipais) até 31 de outubro,
quando o Governo tem todos, ou quase todos, os seus planos em atraso. Só a título de exemplo: o Algarve tem
16 municípios. Pois, a partir da semana que vem, 11 dos 16 municípios vão deixar de ter acesso aos fundos
comunitários. Que país é este, Sr. Primeiro-Ministro?
Mas queria colocar-lhe as seguintes questões: está o Sr. Primeiro-Ministro disponível para fazer uma
descentralização com pés e cabeça, em que se permita que os municípios possam participar efetivamente na
tomada de decisão estratégica setorial em cada um dos seus territórios? Que reformas é que o Sr. Primeiro-
Ministro tenciona implementar para que o Estado deixe de ser um custo de contexto para o País e um empecilho
para a vida das empresas e para a vida das pessoas?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, em nome do Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra a Sr.ª Deputada Jamila Madeira.
A Sr.ª Jamila Madeira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Caros Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, ouvindo a última pergunta, ficamos com a certeza de que o PSD não defende a
descentralização, defende, antes, a privatização. Já sabíamos isso, mas ficou aqui, uma vez mais, bem vertido
nas palavras do Sr. Deputado Luís Gomes.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Mas também sabemos — e permitam-me que volte um bocadinho ao início deste debate — que esta questão
da austeridade ou da não austeridade cria muitos constrangimentos no PSD, e é uma questão a que vale a pena
voltar.
Lá fora, quando circulamos pelas estradas e ruas deste País, parece que o PSD acha que os portugueses
têm memória curta e que não ficam absolutamente perplexos quando veem os outdoors com que presenteou o
País, decorando-o aqui e ali com as suas mensagens. Ora, quando o PSD fala em austeridade naqueles
outdoors, esquece-se, com certeza, de títulos de dezembro de 2012, que dizem «Privados perdem um mês de
salário. Reformados e função pública ficam sem dois».
A oradora exibiu cópia de uma notícia do Diário de Notícias.
Aplausos do PS.
Com certeza, o PSD esqueceu-se de pôr lá que essa é a austeridade do PSD.
De facto, aquilo que os portugueses sabem, e têm a certeza, das comparações entre o PSD e o PS, é que
do PSD vem, sim, austeridade; ao contrário, do PS vem solidariedade, vem apoio e garantia de que não
deixamos ninguém para trás.
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O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Jamila Madeira (PS): — E os portugueses sabem que a austeridade do PSD significa bolsas disponíveis na função pública para depois, rapidamente, promover despedimentos; ao contrário, a política de
governação socialista é de descongelamentos e progressões de carreira, crescimentos reais dos salários,
sobretudo dos mais baixos na função pública.
Sabem que o PSD levou ao corte do subsídio de férias e de Natal; ao contrário, a política de governação
socialista devolveu subsídios de férias e de Natal…
O Sr. João Torres (PS): — Muito bem!
Protestos do PSD.
A Sr.ª Jamila Madeira (PS): — … e fez, agora, um acordo de crescimento de rendimentos para quatro anos, no público e no privado. Volto a dizer: o PSD não o valoriza, mas os portugueses valorizam-no!
Protestos do PSD.
Sabem também que do PSD vem a sobretaxa, que significa austeridade; ao contrário, com a política do PS,
têm aumento do mínimo de existência, têm a proteção dos rendimentos de quem tem menores salários e têm a
atualização dos escalões de IRS e a redução do 2.º escalão de IRS, tão impactante que é nas famílias
portuguesas.
Sabem que do PSD veio o convite para os jovens saírem do País…
O Sr. Miguel Matos (PS): — Bem lembrado!
A Sr.ª Jamila Madeira (PS): — … e, já agora, pela conversa recente, para nem voltarem; com a política do PS, têm o Programa Regressar, têm o aprofundamento do IRS jovem, têm a gratuitidade dos manuais escolares
e têm a gratuitidade das creches.
Aplausos do PS.
Sabem que, com o PSD, terão congelamento de pensões, corte de pensões e diminuição das prestações
sociais.
Protestos do PSD.
Afinal, não era para combater a pobreza que elas existiam, mas apenas para a caridadezinha.
Ao contrário, do Governo do PS, têm o maior aumento de pensões dos últimos anos e têm o maior aumento
do indexante de apoio social, de 8%, que nunca tinha acontecido antes.
E, na habitação, os portugueses sabem que o PSD — verbalizado, aliás, por múltiplos autarcas do PSD —
tem a famosa perspetiva de que o problema da habitação será resolvido pelo mercado; ao contrário, a política
do PS tem assegurado o contínuo reforço do Porta 65 e a criação do maior programa nacional de habitação com
custos controlados que alguma vez aconteceu em democracia.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Jamila Madeira (PS): — Sabem que, com o PSD, a austeridade foi ameaçar os consumidores com multas pesadas — e há múltiplas notícias sobre isso, para avivar a memória dos Srs. Deputados — se não
entrassem rapidamente no mercado livre de eletricidade e gás; ao contrário, o PS protege os consumidores,
permite o regresso ao mercado regulado…
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Aplausos do PS.
… e permite, criando um teto, a proteção para que este preço do gás não afete o preço da eletricidade.
Sim, e ainda mais: tudo isto — pasme-se! — com contas certas, com o País a crescer e a convergir com a
União Europeia.
Os portugueses sabem que do PS têm solidariedade e sabem o que é a austeridade do PSD.
E é isto que os portugueses também sabem: o PSD dá corpo aos paladinos da troica.
Protestos da Deputada do PSD Joana Barata Lopes.
Aliás, não são os paladinos da troica, são os paladinos daqueles que querem ir além da troica e que, aliás,
foram além da troica;…
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Fale do Orçamento do Estado!
A Sr.ª Jamila Madeira (PS): — … os que têm um líder parlamentar que, aliás, se me permitem, se arroga de ser também o Mário Centeno, mas nós sabemos que não é, e de ser o defensor de muitas políticas de direita,
como aqui foi dito pelo nosso líder parlamentar, mas, lamentavelmente, estarem muito incomodados com o
objetivo de redução da dívida pública.
Sr. Primeiro-Ministro, pode, por favor, esclarecer o PSD, e já agora o líder parlamentar do PSD, porque é que
é tão importante continuar a apoiar os portugueses e porque é que, para continuar a apoiar os portugueses, é
tão importante Portugal sair do «top três» do nível de dívida pública.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Oliveira, do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados, o Sr. Primeiro-Ministro integrou um anterior Governo do Partido Socialista. Recorda-se disso, é um facto?!
O PSD liderou o Governo que teve como objetivo salvar o País da falência em 2011.
Vozes doPSD: — Muito bem!
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Deixá-lo mais pobre!
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — No memorando estava prevista a privatização da TAP (Transportes Aéreos Portugueses); a TAP estava prevista no memorando.
Protestos do PS.
A TAP foi privatizada pelo Governo liderado pelo PSD, como estava previsto pelo Governo do Partido
Socialista. É um facto! É a história! Já que falámos em história no início do debate, aqui temos a história.
Aplausos do PSD.
Em 2015, Sr. Primeiro-Ministro, o PS perdeu as eleições, mas formou Governo — também é história! —,
formou a geringonça. E a geringonça resolveu desprivatizar a TAP, nacionalizar a TAP. Foi o processo que fez
imediatamente a seguir.
Não havia pandemia, nesse momento, salvo erro — se bem me lembro, em 2015, não havia pandemia —,
mas houve uma intenção clara de devolver a TAP ao espaço público. O Governo é que tinha de liderar a TAP!
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Diziam: «A TAP tem de ser pública». Diziam e continuam a dizer, às vezes. Há momentos: há dias em que
dizem, há dias em que não dizem.
Protestos do Ministro das Infraestruturas e da Habitação.
Calma, Sr. Ministro! Hoje é com o Sr. Primeiro-Ministro, não é com o Sr. Ministro. Calma!
Chega a pandemia e decidem injetar 3,2 mil milhões de euros na TAP.
Agora, para acabar a história, decidem privatizar a TAP.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — O PSD nem sabia o que fazia! Não punha dinheiro?!
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Portanto, há aqui uma história que é um bocado complicada de contar, mas espero bem que os portugueses saibam, pelo menos, que é isto que está a acontecer.
Porém, há aqui uma dificuldade enorme em perceber o que é que o Governo pensa, o que é que pensa o Sr.
Primeiro-Ministro.
Argumentam que a privatização da TAP é a melhor solução para a TAP. Agora, privatizar já é a melhor
solução para a TAP.
Vozes doPSD: — Muito bem!
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Isto é muito estranho, é uma história estranha, mas é uma história verdadeira. É verdadeira, é factual.
Sr. Primeiro-Ministro, pode explicar aos portugueses o que o fez mudar de ideias? Pode explicar aos
portugueses quando avança essa privatização, em que termos, como, quando? Diga! É importante dizê-lo aqui,
hoje.
O PSD também gostava que dissesse se a TAP vai ou não vai devolver os 3,2 mil milhões de euros que o
Governo lá colocou. São 3,2 mil milhões de euros e, portanto, é importante que explique aos portugueses se a
TAP os vai devolver, como e quando.
A última pergunta sobre este tema é esta: quer explicar aos portugueses toda esta trapalhada à volta da
TAP? Era importante que explicasse.
Vozes doPSD: — Muito bem!
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Um segundo aspeto que quero mencionar aqui hoje, Sr. Primeiro-Ministro, tem a ver com a CP (Comboios de Portugal) — tudo temas importantes para o País, para os portugueses, que
fazem parte da discussão do Orçamento do Estado, que têm a ver com o dinheiro que os portugueses vão
colocando nas empresas públicas e, portanto, é importante que haja aqui este reporte.
Como sabe, há notícias, nos últimos dias — e reporto-me às notícias que têm surgido nos jornais, na
comunicação social —, que referem que o montante que estava previsto no Orçamento do Estado para 2022,
de 1,8 mil milhões de euros, para o Governo português colocar na CP, de modo a resolver o tema do seu
passivo, ainda não foi colocado na CP.
Também dizem — se não for verdade, o Sr. Primeiro-Ministro pode explicar aqui isso, porque é importante
que explique — que há algum desentendimento entre alguns membros do Governo em relação a este tema.
Não sei se é verdade ou não, mas gostava de saber se é verdade ou não, porque é importante sabermos isto,
para percebermos só uma coisa muito simples: porque é que ainda não entrou esse dinheiro na CP, se é que
não entrou? Se entrou, diga, por favor, para percebermos.
Também dizem os jornais que, por esse motivo, não é possível comprar já alguns equipamentos para a CP.
Gostava que isto fosse explicado, é fundamental que se explique, porque andam sempre a dizer que há aqui
um grande desafio, um grande desígnio, da parte do Governo, com a ferrovia, com a CP.
Ó Sr. Primeiro-Ministro, quem vem do Porto para Lisboa ou vai de Lisboa para o Porto sabe que, há 35 anos,
demorava menos tempo a chegar do que demora hoje.
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Aplausos do PSD.
Demorava menos 15 minutos, há 35 anos!
Os portugueses não andam de comboio em PowerPoint, andam mesmo de comboio — é na vida real que
isto lhes acontece — e não são os PowerPoint que resolvem o problema diário dos portugueses.
O meu último tema, Sr. Primeiro-Ministro — e termino já — é um tema muito importante, que tem a ver com
a forma como o Governo se tem comportado na intervenção nas empresas.
Como sabe, Sr. Primeiro-Ministro, em julho de 2020, o então Ministro da Economia, Pedro Siza Vieira,
anunciou a nacionalização da Efacec: 71,73% foi a percentagem dessa intervenção. E, nessa altura, o Sr.
Ministro Siza Vieira afirmou, e cito, que era «uma empresa centenária, com uma reputação de excelência na
engenharia portuguesa», tendo dito ainda que era «uma empresa com viabilidade no mercado».
Sr. Primeiro-Ministro, não há ninguém que esteja em desacordo, penso eu, em relação à valia da empresa
no momento. Acho que é sensato.
O Governo lançou o processo de reprivatização da empresa e, até hoje, não foi ainda capaz de devolver a
empresa à iniciativa privada. Portanto, a grande dúvida é sobre o que se passa, neste momento, com a Efacec.
Passaram mais de dois anos — dois anos e meio —, tanto quanto se sabe há já um acordo ou uma intenção de
uma empresa de comprar a Efacec e, portanto, gostava de perceber, de forma muito clara, o que é que se passa
com a Efacec. Em que estado está a Efacec? O que é o Governo fez com a Efacec? O que vai fazer a seguir?
Porque é que não privatizou ainda? Porque é que não devolveu esta empresa ao privado?
Vozes doPSD: — Muito bem!
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — É o Estado que vai gerir a Efacec? A minha pergunta é: como é que está a Efacec hoje? Qual foi o montante que o Governo colocou na Efacec? E o que fará a seguir?
Estas questões são fundamentais, Sr. Primeiro-Ministro.
Há aqui um aspeto — e termino, Sr. Presidente — que me parece relevante. O Sr. Primeiro-Ministro vai
responder a 17 perguntas dos Srs. Deputados. Foram 17 questões colocadas em 17 intervenções. Tenho muitas
dúvidas sobre o interesse que tem em responder a todas as questões, repito, tenho muitas dúvidas, mas espero
bem que haja tempo para responder às questões, que são centrais, TAP, Efacec e CP.
Aplausos do PSD.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Sr. Presidente, é para uma interpelação à Mesa sobre a condução dos trabalhos.
Vozes do CH: — Já chega!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Sr. Presidente, naturalmente, tenho de ter grande condescendência…
Vozes doCH: — Condescendência?!
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — … com algumas das intervenções.
Protestos do CH.
Ouço, de facto, aquilo de que não gosto. Mas não desvalorizem as perguntas das outras bancadas.
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Parece-me de mau gosto que o Sr. Deputado se dirija às outras bancadas — e, diretamente, à do Partido
Socialista, porque foi isso que fez — e diga que algumas perguntas não têm interesse.
Peço desculpa, os Deputados que apoiam o Governo têm tanto direito de fazer perguntas como V. Ex.ª!
Aplausos do PS.
Por isso, Sr. Presidente, peço desculpa, mas o Sr. Primeiro-Ministro responde às perguntas que entender.
Não é o PSD que escolhe as perguntas!
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, permite-me o uso da palavra?
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Afonso Oliveira pede a palavra…
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, é para o mesmo efeito.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, a única preocupação que tive, nesta intervenção do Grupo Parlamentar do PSD, foi no sentido de que o Sr. Primeiro-Ministro respondesse às questões de todos os Srs.
Deputados.
Vozes doPSD: — Exatamente!
O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Não fiz nenhuma referência, em nenhum momento, em relação à importância de cada intervenção. Todas são muito importantes! Se tivesse de o fazer, não quereria ouvir aquilo
que iria dizer.
Aplausos do PSD.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: — Vamos prosseguir, Srs. Deputados. Estávamos a prosseguir em boa ordem. Não há aqui nenhuma lei de equilíbrio homeostático que leve a que,
numa sessão em que o Grupo Parlamentar do Chega se distingue pela civilidade,…
O Sr. Pedro Pinto (CH): — É sempre assim!
O Sr. Presidente: — … outros grupos parlamentares tragam agitação. Portanto, vamos prosseguir com os nossos trabalhos.
O próximo orador, para dirigir um pedido de esclarecimento ao Primeiro-Ministro, é o Sr. Deputado Miguel
Costa Matos.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Miguel Matos (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados, por muito que o queiram negar, além de ser um orçamento que responde à conjuntura, este é um
orçamento reformista.
Risos do PSD e do CH.
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Podíamos falar do combate às alterações climáticas; podíamos até falar de este ser o maior investimento
social na nossa história; ou do reforço do apoio à capitalização das empresas; ou do investimento importante na
cultura e na saúde.
Protestos do Deputado do CH Filipe Melo.
Mas aquilo de que quero mesmo falar é do investimento naqueles que tantas vezes dizem ser o futuro do
País, que são os jovens.
Ora, este é um orçamento que prossegue a democratização estrutural do ensino superior.
Duplicamos o número de estudantes que recebem complemento de alojamento, de 15 000 para 30 000, e
congelamos as propinas em todos os ciclos — sim! —, sem esquecer o nosso compromisso eleitoral de
baixarmos as propinas nesta Legislatura e sem esquecer a urgência de aumentarmos o número de camas e
termos mais apoios para quem não tem lugar nas residências universitárias.
Quando um em cada seis jovens não consegue encontrar emprego e, entre aqueles que encontram emprego,
dois terços têm contratos precários, o Governo cria um incentivo à contratação, de contratos sem termo e de
salários acima dos 1 320 €.
Quando três em cada quatro jovens ganham menos de 950 €, o Governo assinou um acordo para aumentar
os rendimentos em 20% — numa altura em que a inflação é de 10% — e assinou um outro acordo para valorizar
os salários da função pública.
E vamos mesmo devolver no IRC metade daquilo que as empresas gastam a cumprir esses aumentos
salariais. Isto é um choque fiscal, sim, mas é um choque fiscal que não é cego, como outros queriam, é um
choque fiscal que tem um compromisso claro com os jovens e com o País, e isso é de suprema importância.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, não nos lembrámos agora de baixar os impostos para os jovens.
Vozes doPS: — Muito bem!
O Sr. Miguel Matos (PS): — Em 2020, criámos o «IRS jovem»; no ano passado, alargámos o «IRS jovem» para cinco anos e alargámo-lo para os trabalhadores independentes.
Protestos do Deputado do CH Filipe Melo.
E este ano estamos a aumentar o «IRS jovem», devolvendo um salário a mais no primeiro ano e até três
salários a mais ao longo dos cinco anos.
Ora, quando apenas um em cada quatro jovens tem casa própria, este é um orçamento que reforça o
investimento em construção de habitação pública, que reforça o Porta 65, com mais de 30% de orçamento.
E quando os jovens têm o primeiro filho apenas depois dos 30 anos, este também é um orçamento que
aposta na natalidade, com mais dedução por dependentes, com creches gratuitas também no setor privado,
com 500 000 famílias a verem reforçado o abono de família.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Ah, pois!
O Sr. Miguel Matos (PS): — Mais: o aumento, em 8%, do indexante dos apoios sociais não eleva só o subsídio de desemprego, eleva também as bolsas de estudo, as bolsas de investigação e as bolsas dos estágios
profissionais.
Aplausos do PS.
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Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, este é um orçamento de respostas imediatas e duradouras para os
jovens que, no ensino, no emprego, no salário, na habitação, na natalidade, responde estruturalmente aos
desafios que a minha geração ainda enfrenta.
Temos, por isso, uma pergunta.
Segundo o Eurobarómetro, a preocupação número um dos jovens é a saúde mental:…
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Isso é verdade!
O Sr. Miguel Matos (PS): — … 40% têm depressão e um em cada quatro já pensou ou tentou o suicídio. Que respostas apresenta o Governo para esta pandemia silenciosa que tanto afeta a nossa geração?
Aplausos do PS.
O Sr. Filipe Melo (CH): — Então, mas não está tudo tão bem?!
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Poço.
O Sr. Alexandre Poço (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, vamos a uma imagem simples da vida real.
Vamos pensar numa jovem que, hoje, 26 de outubro de 2022, faça 25 anos. Chamemos-lhe Ana, dos Olivais,
aqui, no concelho de Lisboa.
Quando a Ana nasceu, o senhor já era Secretário de Estado.
Um mês depois, a Ana ainda não comia sopa e o senhor já era Ministro. E como Ministro ficou até a Ana
fazer 5 anos, quase a entrar na primária.
Quando a Ana tinha 8 anos, em 2005, o senhor voltou a ser Ministro. E Ministro ficou até a Ana entrar no 5.º
ano.
Nesse mesmo ano, em 2007, o Sr. Primeiro-Ministro tornou-se Presidente da câmara municipal da cidade da
Ana e ficou nessa condição até a Ana acabar o secundário.
Quando a Ana entrou para a faculdade, em 2015, o senhor ficou em segundo lugar nas eleições, mas acabou
por formar Governo, em novembro de 2015, já a Ana estava no 1.º ano do seu curso.
Entretanto, a Ana acabou a licenciatura, tirou um mestrado, começou a trabalhar. E que país — este País, o
nosso País — deixou o Sr. Primeiro-Ministro António Costa, sempre presente nos últimos 25 anos, à Ana?
A Ana, mesmo tendo um mestrado — tal como um em cada três jovens —, provavelmente, recebe o salário
mínimo.
A Ana, segundo a média nacional — aliás, a pior da Europa —, só quando tiver mais de 33 anos, portanto
daqui a oito anos, é que irá conseguir sair de casa dos pais. E, por sair tão tarde de casa dos pais, a Ana
provavelmente só conseguirá ter um filho, como acontece na média nacional. Aliás, ainda é mais provável — e
mais triste, Sr. Primeiro-Ministro — que a Ana, por já não suportar esta situação, acabe, como um em cada cinco
jovens portugueses, por emigrar.
Por isso, a pergunta que lhe tenho a fazer, Sr. Primeiro-Ministro, é muito concreta: antes que a Ana apanhe
um avião e não volte mais a Portugal, o que é que tem para lhe dizer, além de um pedido de desculpas?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, em nome do Grupo Parlamentar do Chega, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Pinto.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as Ministras, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados, prometo que vou desiludir o Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias, não vou fazer aquelas perguntas
cómodas, como o Partido Socialista gosta, vou fazer perguntas incómodas, como é lógico, e isso é fazer
oposição.
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Também não vou aqui falar na Ana, mas vou referir, em relação às duas últimas intervenções, de dois jovens
— um do PS e outro do PSD —, que o gritante é termos uma taxa de desemprego jovem mais alta do que a
média europeia, particularmente na Madeira, onde mais de 20% dos jovens estão desempregados, no Algarve,
onde mais de 19% dos jovens estão desempregados e, nos Açores, onde mais de 17% dos jovens estão
desempregados. Isto é que tem de nos preocupar! Foi pena que nenhum dos Srs. Deputados tenha falado nisto.
Aplausos do CH.
O Sr. Primeiro-Ministro citou aqui, neste debate, Jorge Palma. Não é a primeira vez que o faz e eu, não sendo
também a primeira vez, vou citar António Variações: «É p’ra amanhã/ Bem podias fazer hoje/ Porque amanhã
sei que voltas a adiar». É este o reflexo deste Governo do Partido Socialista, é isto que temos: um País adiado,
um Governo à deriva, um barco à deriva.
Aplausos do CH.
E temos também um mau Orçamento.
Enganou os pensionistas, enganou os portugueses, em geral, com 125 € dados no mês de outubro. Mas,
depois, em novembro, dezembro, janeiro, fevereiro, sabe-se lá como é que vão pagar as contas.
O que se passou aqui hoje e que se está a passar é propaganda socialista. Lá em casa, ninguém acreditou
em si, Sr. Primeiro-Ministro. Ninguém! Falou em contas certas, estabilidade e aliviar impostos, mas diga isso a
quem vai pôr gasóleo ou gasolina para ir trabalhar.
Chegou-se ao escândalo, em Portugal, de, na passada semana, aumentarem o gasóleo e a gasolina em 8
cêntimos e fazer-se uma propaganda tal que, na passada segunda-feira, o gasóleo baixou meio cêntimo.
O Sr. Rui Afonso (CH): — Uma vergonha!
O Sr. Pedro Pinto (CH): — O problema das famílias portuguesas está resolvido: baixou-se o gasóleo meio cêntimo, na passada segunda-feira.
Quanto ao aumento da criminalidade, o Sr. Primeiro-Ministro dizia aqui, há uns meses, neste Parlamento,
quando o confrontámos, que não era verdade. Hoje, infelizmente, está à vista de toda a gente: gangues juvenis
proliferam pelas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto.
Aplausos do CH.
Sr. Primeiro-Ministro, o que este Orçamento dá às forças de segurança é pouco ou nada. O subsídio de risco
aumenta uma miséria, o subsídio de alimentação é vergonhoso — com os presos a ganharem quase mais de
subsídio de alimentação do que os polícias —…
O Sr. Rui Afonso (CH): — É verdade!
O Sr. Pedro Pinto (CH): — … e faltam meios e agentes. Repare, Sr. Primeiro-Ministro, levamos quase três horas de debate e não há uma palavra sobre o interior do
País. Não há uma palavra sobre o interior do País, que o Partido Socialista esqueceu, que o seu Governo
esqueceu e onde também fazem falta as forças de segurança.
Aplausos do CH.
Falemos sobre os bombeiros.
Agora que já chove, já esquecemos os incêndios. Já ninguém fala em bombeiros, já ninguém fala em
incêndios, tudo está bem! O que é que este Orçamento prevê para prevenir os incêndios em Portugal? O
subsídio de risco para os bombeiros continua sem existir. Nem uma palavra neste Orçamento! Continua sem
existir este subsídio de risco.
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Quanto à isenção de portagens, é escandaloso que, em Portugal, os carros de bombeiros e as ambulâncias
continuem a pagar portagens. É isso que o seu Governo tem de retirar. É vergonhoso!
Aplausos do CH.
Vamos falar do SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras).
Sr. Primeiro-Ministro, vai ou não extinguir o SEF? Os portugueses precisam de saber.
Entraram, agora, em Portugal — não sei como é que entraram e, se calhar, também ninguém sabe —,
centenas, para não dizer milhares, de timorenses. Estão, por exemplo, nas ruas de Lisboa. Aquelas imagens
que vimos nas reportagens envergonham-nos a todos, devem envergonhar a classe política e, particularmente,
o seu Governo, Sr. Primeiro-Ministro.
Aplausos do CH.
Agora, vai resolver o problema. Lê-se numa notícia: «Governo envia inspetores do SEF para Timor para
travar imigração ilegal».
O orador exibiu cópia da notícia que mencionou.
Está resolvido o problema, é assim que o seu Governo resolve este problema.
A pergunta a que tem de responder é: vai ou não extinguir o SEF?
A frase do debate, de António Costa, é esta: «existe uma melhoria do rendimento das famílias, em especial
dos trabalhadores». Mas, então, Sr. Primeiro-Ministro, queria que melhorasse o rendimento de quem? Daqueles
que não fazem nada? Daqueles que, mais uma vez, têm as regalias? É que, mais uma vez, aumenta 8% —
mais do que a inflação — aquilo que vai para os subsídios e o RSI (rendimento social de inserção).
Protestos do PS.
Para terminar, Sr. Primeiro-Ministro, diga hoje aos portugueses, àqueles que estão lá em casa: quanto é que
custaram os Kamov aos contribuintes portugueses? Esta é a pergunta a que o Sr. Primeiro-Ministro não
responde. Tem vergonha dela. E sabe porquê? Porque, em 2006, era ministro do Governo de José Sócrates e
comprou os Kamov.
Quanto é que os Kamov custaram aos portugueses?
Agora, foi oferecê-los à Ucrânia, porque já não sabia o que havia de fazer.
Aplausos do CH.
Para terminar, percebo que, na bancada do Partido Socialista, tendo cinco Deputados eleitos pelo Algarve,
tenham vergonha de fazer uma pergunta, mas eu não tenho: Sr. Primeiro-Ministro, quando é que vai cumprir a
sua promessa de 2015, que era a de extinguir as portagens na A22, a Via do Infante?
Afinal, a sua palavra está muito longe de ser palavra honrada.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Vera Braz, do Grupo Parlamentar do PS.
A Sr.ª Vera Braz (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, começo por congratular o Sr. Primeiro-Ministro, porque parece que, finalmente, a nossa direita
concorda com as medidas de apoio às nossas empresas, uma vez que, até agora, no decorrer deste debate,
não houve nem uma palavra para as nossas empresas.
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Aplausos do PS.
Mas também não precisamos, porque as nossas empresas — das quais mais de 99% são micro, pequenas
e médias empresas, maioritariamente empresas familiares — sabem que, desde 2015, os Governos do Partido
Socialista apostam na nossa recuperação económica e apostam em ter as empresas como parceiras, porque
só assim teremos um crescimento económico resiliente e sustentável. E não, não nos limitamos a descer
transversalmente o IRC, como se essa fosse mesmo uma solução milagrosa para termos um tecido empresarial
competitivo.
Protestos do Deputado do PSD Alexandre Poço.
Não, Srs. Deputados, porque acreditamos que as políticas públicas devem servir um propósito de redistribuir,
de uma forma justa, a riqueza do nosso País.
Por isso, sim, são adotadas medidas direcionadas, que sirvam os interesses do País, das nossas famílias e
das nossas empresas.
Neste Orçamento do Estado para 2023, os apoios às empresas — alguns já referidos aqui pelo Sr. Primeiro-
Ministro — vão desde incentivos fiscais a taxas especiais, impactos nas contas de energia, medidas que
abrangem os mais diversos setores da nossa economia, importantes apoios para o setor agrícola, mas não
esquecendo também o exigente retorno à sociedade do setor energético ou da banca. São mesmo medidas que
vão contribuir para apoiar as nossas empresas.
Tenho de reforçar e voltar a referir o importante incentivo, no IRC, para o aumento de salários, consagrado
no acordo de rendimentos e competitividade. Bem sei que os Srs. Deputados não querem falar sobre isto, mas
este é mesmo um acordo histórico para o nosso País,…
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Vera Braz (PS): — … que permite dar mais dinheiro às famílias, no fim do mês, mas também permite que as nossas empresas mantenham as suas rentabilidades e que, desta forma, continuem a apostar no
investimento e na sua produtividade.
É importante para o Partido Socialista, é importante para o Governo e é importante para o País que as nossas
empresas continuem a apostar no investimento privado e que a aposta na captação de investimento estrangeiro
continue a ser uma realidade.
Este ano, em Portugal, já se angariaram 2500 milhões de euros em projetos de investimento, através da
captação de 42 novas empresas para o mercado português e, com os mecanismos previstos, espera-se que o
ano de 2023 seja igual ou melhor ainda.
Isto, Sr. Primeiro-Ministro, é o resultado do trabalho desenvolvido, de medidas estruturantes de apoio ao
investimento e de medidas de estímulo à capitalização das nossas empresas, que nos dão um setor privado
sólido e sustentável que contribua para a riqueza do País e para a melhoria das condições de vida dos
portugueses.
Assim, Sr. Primeiro-Ministro, este é também um Orçamento que, mais uma vez, reforça o investimento
público, em mais 3400 milhões de euros.
Considera que esta aposta contribuirá para alavancar a produtividade do investimento privado, que serão
complementares e não concorrentes e, portanto, benéficos para o crescimento da nossa economia?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra, para um pedido de esclarecimento, a Sr.ª Deputada Patrícia Dantas, do Grupo Parlamentar do PSD.
A Sr.ª Patrícia Dantas (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e demais presentes, encontramo-nos aqui, no mesmo local, seis meses depois, para a discussão do Orçamento do Estado, na generalidade, desta
feita, o de 2023.
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Infelizmente, o cenário não é o ideal e deparamo-nos com uma política de gestão da dívida fortemente
associada à cobrança de impostos e reativa ao que vai acontecendo pelo mundo.
No que concerne à Madeira — sim, é obvio que iria falar da Madeira —, este Orçamento do Estado omite
inúmeras situações e promessas suas, o que me preocupa. Não as vou elencar aqui e convido-o à leitura das
53 páginas do parecer da Região Autónoma da Madeira sobre o Orçamento agora em apreciação.
Por esta omissão, pela perda efetiva de poder de compra e por faltarem medidas de crescimento económico,
este Orçamento não convence a Região. Assim, apresentaremos, obviamente, propostas de alteração.
Para além do referido, sabendo que a capacidade de intervenção não se esgota no exercício orçamental,
numa perspetiva estratégica, de futuro e de crescimento do País e com o perfil de ambição que carateriza os
povos insulares, contamos com o envolvimento e o compromisso do Governo da República para dois temas
relevantes para o País.
O primeiro tema é o da revisão da Lei das Finanças Regionais, pois tem-se registado um peso cada vez
menor das regiões autónomas na despesa do Estado. Em sete anos, passou de 0,73% para apenas 0,64%, o
que pode revelar uma paulatina desresponsabilização do Estado para com as populações insulares. E isto
acontece quando se assiste a um crescendo nos encargos com as obrigações do Estado, tais como a saúde e
a educação.
O segundo tema é o da negociação, em Bruxelas, do novo programa de atratividade fiscal do País — que
por sinal tem a sua base de atuação na Madeira —, por forma a aproveitar o novo contexto geoestratégico do
País e da Europa, que se orientará para o espaço atlântico, tirando partido da periferia de Portugal e da
ultraperiferia da Madeira.
Sr. Primeiro-Ministro, a Região pode contar consigo para, no âmbito da manutenção de um bom
relacionamento entre a República e a Região, aprovar propostas que, por exemplo, permitam que a Madeira
seja fiscalmente mais competitiva?!
Sr. Primeiro-Ministro, a Região pode contar consigo para se comprometer na melhoria das condições da
Região, a nível financeiro e fiscal?
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, em nome do Grupo Parlamentar do PS, tem agora a palavra o Sr. Deputado Tiago Barbosa Ribeiro.
O Sr. Tiago Barbosa Ribeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as Ministras, Srs. Ministros, Srs. Deputados, gostaria de voltar a trazer a este debate algo central no Orçamento do Estado, que o Sr.
Primeiro-Ministro referiu na sua intervenção inicial, algo central na política do Governo e do PS e que é
fundamental para o País: a política de valorização dos rendimentos, o acordo de médio prazo, obtido em sede
de concertação social, para a melhoria dos rendimentos, dos salários e da competitividade, a que acresce o
acordo plurianual de valorização salarial, que foi obtido para os trabalhadores da Administração Pública e,
convém dizer, é o primeiro acordo salarial deste século, transpondo o acordado na concertação.
Aplausos do PS.
Com este acordo, é possível prosseguir com a valorização dos rendimentos para todos os trabalhadores,
demonstrando ainda que esta é uma maioria de diálogo, é uma maioria que não se esgota sobre si própria,
aberta a pontes e a compromissos.
Sabemos que a oposição não gostou deste acordo. Em particular, o PSD, que continua a confundir a
oposição ao PS com a oposição ao País, prefere atacar o acordo e os parceiros da concertação,…
Protestos da Deputada do PSD Joana Barata Lopes.
… ao invés de valorizar o contributo que foi dado para o objetivo estratégico de valorização dos rendimentos,
considerando — estou a citar o PSD — «limitado e pouco ambicioso» um acordo que assegura 11 anos de
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crescimento real dos rendimentos, que reforça ainda mais o salário mínimo e que puxa significativamente pelo
aumento do salário médio dos portugueses.
Aplausos do PS.
Mas não espanta esta posição do PSD. Primeiro, porque o PSD não consegue, de forma alguma, conceber
uma maioria que é dialogante e que é capaz de estabelecer pontes com o País e com os agentes sociais e
económicos do País.
Protestos do PSD.
Mas, mais importante, talvez, o conteúdo concreto do acordo contradiz tudo aquilo que o PSD defende e tudo
aquilo que levou ao empobrecimento generalizado dos portugueses, quando o PSD teve responsabilidades
governativas. É bom lembrar que essas medidas tiveram o apoio entusiástico de alguém que não está aqui hoje,
mas que está a assistir a este debate e a ver mais ou menos como é que ele corre ao PSD — o Dr. Luís
Montenegro —, cuja responsabilidade não pode ser esquecida, porque, enquanto líder parlamentar dessa
bancada, levantou-se vezes sem conta para defender e votar cortes de salários, cortes de subsídios de férias,
cortes de subsídios de Natal, cortes nos feriados, cortes nas prestações sociais, cortes nas pensões,…
Aplausos do PS.
… os cortes que levaram à pobreza e ao esmagamento salarial dos portugueses, numa política de terra
queimada, Srs. Deputados,…
Protestos do PSD.
… que só não foi mais longe, porque foi travada pelo Tribunal Constitucional, não uma vez, não duas vezes,
não três vezes, não quatro vezes, mas cinco vezes, evitando mais cortes para os portugueses, como os
senhores queriam fazer.
Aplausos do PS.
Portanto, esse não é o nosso caminho, essa não é a ideia do Partido Socialista.
Sr. Primeiro-Ministro, o acordo de médio prazo para a melhoria dos rendimentos, dos salários e da
competitividade tem, em nosso entendimento, uma extrema importância no cenário em que vivemos, num
contexto de enorme incerteza, em tempos de grande exigência, demonstrando um Governo comprometido com
o interesse nacional, com a atuação pelo diálogo, estabelecendo objetivos e metas concretas que se traduzem
numa melhoria da produtividade da economia portuguesa, sem nunca esquecer uma efetiva valorização da vida
e dos rendimentos de quem trabalha.
As medidas são muitas — não tenho tempo para as aprofundar na globalidade —, mas, em matéria de
salários, este acordo concretiza um aumento do salário mínimo nacional para 760 €, um aumento de 50% face
a 2015, com uma perspetiva de aumento de 80% até 2025. Mais: ao mesmo tempo, este acordo promove a
valorização do rendimento médio por trabalhador em 20% para garantir a convergência com a média da União
Europeia do peso das remunerações do PIB durante o período de vigência deste acordo até 2026. E aqueles
que acham isso impossível devem olhar para o entendimento do Estado e para o acordo que foi feito com os
sindicatos da função pública para aumentar já no próximo ano os salários em 5,1%.
Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, termino questionando-o sobre a importância que atribui a este acordo, sobre
a sua evidência, enquanto uma maioria de diálogo, mas também quanto ao seu conteúdo, que versa sobre a
defesa dos rendimentos dos trabalhadores e a perspetiva de melhoria de vida para os nossos compatriotas.
Aplausos do PS.
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O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Moniz.
O Sr. Paulo Moniz (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, vou, naturalmente, abordar a dimensão dos Açores neste Orçamento e, de facto, esta
proposta de Orçamento…
O Sr. Primeiro-Ministro: — Não quer falar de interconexões?
O Sr. Paulo Moniz (PSD): — De interconexões, Sr. Primeiro-Ministro? Não, porque elas não correram bem. Vamos centrar-nos nos Açores.
Aplausos do PSD.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Não correram bem, não!
O Sr. Paulo Moniz (PSD): — Tentei ajudá-lo e até valorizei a capacidade de sedução dos seus olhos, mas, na prática, Sr. Primeiro-Ministro, foi o que se viu.
Vamos centrar-nos no Orçamento e nos Açores, que são os temas mais importantes da minha intervenção.
Nessa matéria, este Orçamento, de facto, infelizmente, vira novamente as costas aos Açores e aos açorianos.
Deixe-me dizer que a Comissão de Economia do Parlamento dos Açores, da direita à esquerda, com a exceção
do PS, chumbou esta proposta de Orçamento por ela não responder às necessidades dos Açores em matéria
de Orçamento para 2023.
Repare no seguinte: eu sei que este Orçamento cumpre a lei e que tem mais 7 milhões para a lei das finanças
regionais, mas esses 7 milhões nem a inflação cobrem.
Ora, nós esperávamos que o Governo, e em particular o Sr. Primeiro-Ministro, revelasse uma sensibilidade
que fosse além do estrito cumprimento da lei das finanças regionais e tivesse a abrangência de entender que
os Açores, por circunstâncias estruturais, reais e concretas, mereciam uma majoração que fosse além do estrito
cumprimento desses 7 milhões de euros.
Repare que, além disso, continuam as menções a um conjunto de intenções que se perpetuam no texto do
Orçamento — tem intenção de substituir os cabos de fibra ótica, tem intenção de continuar os estudos —, mas
a maioria das coisas importantes desapareceu das intenções. Sr. Primeiro-Ministro, o maior problema deste
Orçamento reside nas obrigações de serviço público para as ligações aéreas com as ilhas de Santa Maria, Faial
e Pico.
O Sr. Primeiro-Ministro falou da sua intenção e enlevo em relação à ferrovia de Portugal. Como sabe, a única
forma de ligação aos Açores é por via aérea. É desta forma que as pessoas se movimentam, é desta forma que
a economia floresce e é desta forma que os Açores exibem e sentem uma pertença a uma dimensão nacional
global, fazendo parte dela e não sendo filhos de um deus menor.
E a questão que se põe aqui é que, infelizmente, essas obrigações de serviço público, para serem cumpridas,
têm um custo de 10 milhões de euros. Então, repare na subtileza: inscreve no Orçamento 3,5 milhões de euros
para cumprir essas obrigações de serviço público e dá-nos 7 milhões a mais, ou seja, os 7 milhões a mais que
aparentemente dá tira-nos pela suborçamentação na obrigação de serviço público essencial. Sr. Primeiro-
Ministro, isto de dar com uma mão e tirar com a outra começa a ser uma imagem de marca.
Aplausos do PSD.
Ao contrário do que ouvimos aqui, principalmente do Partido Socialista, os problemas da sua governação
não tiveram início no tempo dos fenícios, tiveram início há sete anos, com a sua governação e incompetência
governativa.
Aplausos do PSD.
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O Sr. Presidente: — O penúltimo pedido de esclarecimento pertence à Sr.ª Deputada Fátima Fonseca, do PS.
Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Maria deFátima Fonseca (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, permita-me que traga de volta ao debate o tema da Administração Pública, porque é
inevitável olhar um pouco mais de perto para as escolhas que o Governo aqui nos apresenta. É inevitável porque
o Estado, enquanto empregador, pretende assumir, e bem, um papel exemplar junto do setor privado e é
inevitável porque a forma como o Governo gere a Administração Pública traduz uma opção política que devemos
assumir sem demagogia, com clareza e com coragem para fazer aquilo que é necessário,…
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muto bem!
A Sr.ª Maria deFátima Fonseca (PS): — … coragem que, no caso dos Governos do Partido Socialista, significa não fazer cortes, mas valorizar salários e rendimentos.
Aplausos do PS.
E fá-lo com sustentabilidade, porque os Governos do Partido Socialista sabem que investir na Administração
Pública é investir no futuro dos portugueses e do nosso País.
A Sr.ª Susana Amador (PS): — Muito bem!
A Sr.ª Maria deFátima Fonseca (PS): — Com esses investimentos, assentes em contas públicas sólidas, equilibradas e sustentáveis, desde 2016, os Governos do PS têm vindo a reverter a dura situação a que os
trabalhadores da Administração Pública foram submetidos no passado e a fazer um caminho de valorização das
trabalhadoras e dos trabalhadores da Administração Pública.
Por isso, falar em temas como o descongelamento das carreiras, a reversão dos cortes salariais e a reposição
da atualização anual dos salários não significa nenhuma obsessão com o passado, não significa nenhuma
obsessão com o canal História, significa simplesmente recordar o caminho que tem sido feito, o caminho que
nos permite chegar aqui hoje, que nos permite ir mais além no futuro, sem retrocessos.
Em 2022, o Governo do Partido Socialista já deu um primeiro sinal para a valorização remuneratória dos
trabalhadores das carreiras gerais e dos trabalhadores mais qualificados, dando mais um passo sólido nesse
caminho esta semana, tal como já foi por diversas vezes referido. Foi assinado um acordo plurianual, o primeiro
deste século, que cria um quadro de valorização salarial e das carreiras assente em premissas simples, lógicas
e responsáveis — previsibilidade, equidade e olhos postos não só no presente mas também no futuro.
Por isso, comecei por falar em escolhas, porque só com escolhas informadas, responsáveis e realistas será
possível abordar tudo o que há para fazer na Administração Pública, e haverá sempre muito para fazer. Pela
sua importância estratégica para o País, o sucesso deste caminho só poderá ser efetivo com o contributo de
todas as partes interessadas dentro e fora deste Parlamento, pelo que importa também destacar o diálogo social
enquanto marca da governação do Partido Socialista e aspeto central nas escolhas feitas neste caminho de
valorização das pessoas que trabalham na Administração Pública no presente e para o futuro.
Assim, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto-lhe: em que medida é que as ações concretas, previstas no acordo
referido e previstas na proposta de Orçamento do Estado para 2023, continuam a concretizar com efetividade
este caminho de valorização dos salários? Em que medida chegam a todas as carreiras da Administração
Pública? Em que medida contribuirão para uma gestão racional, responsável e mobilizadora das pessoas que
trabalham na Administração Pública de modo a abordar todos os desafios necessários?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — O último pedido de esclarecimento pertence ao Sr. Deputado Pedro Cegonho, do PS. Faça favor, Sr. Deputado.
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O Sr. Pedro Cegonho (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, esta proposta de Orçamento do Estado continua a promover uma melhor relação dos cidadãos
com o Estado porque não só comporta importantes mecanismos de motivação e valorização da Administração
Pública, conforme já vimos, resultante de um histórico acordo importante com os sindicatos, como continua a
permitir simplificar, uniformizar e desmaterializar.
Modernizar a máquina administrativa tem de ser sinónimo de simplificar e, para isso, importa continuar a
utilizar e desenvolver soluções tecnológicas, mas também importa continuadamente reformular, melhorar,
otimizar procedimentos, utilizar dados e utilizar tecnologias disruptivas que antecipem e permitam aos cidadãos
e às empresas uma interação eficiente, segura e eficaz com a Administração Pública.
Em 2023, confirmamos que será dada continuidade à reconfiguração dos serviços públicos, disponibilizando-
os numa lógica omnicanal através do portal único de serviços digitais de centro de contacto das lojas do cidadão
ou dos Espaços Cidadão.
Com esta proposta de Orçamento do Estado, as iniciativas Simplex serão orientadas para a antecipação de
problemas e para a criação de soluções inovadoras, habilitando o Estado a dar respostas mais efetivas e
satisfatórias que permitam simplificar e agilizar as interações com a Administração Pública.
Mas, além das medidas concretas, há um caminho de definição ou de atualização de estratégias que
continuamos a percorrer: a prossecução da Estratégia Cloud para a Administração Pública, com o compromisso
para a adoção de soluções de computação em nuvem no formato cloud pública que garanta a soberania e a
segurança dos dados; a conclusão da Estratégia Nacional de Blockchain; a atualização da Estratégia Nacional
de Inteligência Artificial, à luz das novas realidades geopolíticas e técnico-jurídicas; a prossecução da Estratégia
Nacional SmartCities; a conclusão da Estratégia Nacional de Dados Abertos, para identificar iniciativas
concretas de promoção da partilha e reutilização de dados, bem como o reforço da cibersegurança nacional,
melhorando os níveis de resiliência da Administração Pública e da sociedade em geral.
Sr. Primeiro-Ministro, este caminho tem anos e conduz-nos a um melhor Estado. Pergunto se concorda que
a implementação de mecanismos de digitalização e de modernização do setor público beneficia também a
economia e a sociedade em geral, sendo esta a mais importante razão de ser desta estratégia e que a todos
nós deve convocar e que todos nós devemos apoiar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, infelizmente, por falta de tempo, não vou poder responder individualmente a cada Sr. Deputado, mas seguramente que nos debates setoriais e amanhã,
com o Sr. Ministro das Finanças, terão oportunidade de esclarecer algumas matérias.
No entanto, há algumas questões centrais que foram abordadas por todas as bancadas e em relação às
quais não queria deixar de responder.
Em primeiro lugar, a direita confunde, obstinadamente, boa gestão orçamental com austeridade, o que
percebo, porque os senhores sempre acreditaram que só havia uma forma de reduzir o défice e a dívida. Ou
seja, se há redução do défice e da dívida, para os senhores, só há uma explicação: adotámos austeridade!
Acontece que, como os Srs. Deputados bem aqui citaram, para que haja austeridade não basta dizer e, além
disso, austeridade não é um conceito abstrato, é um conceito concreto. Portanto, não há neste Orçamento do
Estado, como não houve em nenhum dos Orçamentos do Estado dos últimos seis anos, aumento de impostos
ou cortes nos rendimentos.
Aplausos do PS.
Aquilo que temos demonstrado desde 2015 é que, ao contrário do que a direita dizia, o aumento do salário
mínimo nacional, o aumento do salário médio, o aumento dos rendimentos não têm trazido o diabo; pelo
contrário: têm trazido prosperidade à nossa economia, convergência com a União Europeia e contas certas.
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Aplausos do PS.
Há uma perda de poder de compra? Há. Claro que há uma brutal perda de poder de compra este ano, fruto
de uma enorme inflação que resulta, por um lado, ainda, das cicatrizes da pandemia e, por outro lado, da guerra
desencadeada pela Rússia contra a Ucrânia.
A inflação que vivemos não é uma ilha de Portugal, nem fruto das políticas internas, é uma inflação importada.
A perda de poder de compra resulta de aumentarmos os impostos ou de estarmos a cortar os rendimentos?
Não! Tudo o que temos feito ao longo deste ano — com o esforço enorme dos contribuintes portugueses, com
a boa gestão orçamental que temos feito — é reduzir e controlar os aumentos dos preços o mais possível, em
particular da energia, e, por outro lado, compensar as famílias, sobretudo as de menores rendimentos, face ao
que seria a perda de poder de compra.
Se não fosse essa boa gestão orçamental, não teríamos apoiado em 120 € as famílias mais carenciadas,
não estaríamos agora a apoiar todas as pessoas que têm um rendimento bruto até 2700 €, não teríamos feito o
pagamento antecipado do que foi designado como «aumento das pensões do próximo ano já em outubro», para
que as pessoas possam ter, neste momento, o rendimento quando mais precisam dele para fazer face ao
aumento dos preços.
Falam muito dos cortes das pensões, mas o Sr. Deputado José Moura Soeiro enunciou a fórmula mais feliz
que já ouvi para descrever a situação: aumentaram metade do aumento do próximo ano para outubro.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Não foi isso que disse!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Cortaram!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, eu não diria melhor! Depois, disse que cortaram do próximo ano aquilo que antecipámos para outubro. Sim, antecipámos mesmo!
Protestos do BE.
É agora que as pessoas precisam de dinheiro, é agora que as pessoas precisam de fazer face ao aumento
do custo de vida.
Aplausos do PS.
Sim, Sr.ª Deputada Paula Santos, nós temos atenção e estamos focados no combate à pobreza infantil e às
necessidades efetivas…
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — E as contas?
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — E a aldrabice nas contas?
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, mantenhamos a compostura.
O Sr. José Moura Soeiro (BE): — Eu estou composto!
O Sr. Primeiro-Ministro: — «Aldrabice» é um insulto. E creio que a má-consciência do Bloco de Esquerda pela traição ao eleitorado da esquerda portuguesa, que cometeu em 2020, não deve levar a que passemos a
dialogar na base do insulto.
Aplausos do PS.
Protestos do BE.
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Deixemos essa linguagem fora do campo da esquerda e com o monopólio da extrema-direita neste
Parlamento.
Protestos do CH e do BE.
Sr.ª Deputada Paula Santos, sobre crianças, sim, este Orçamento tem três medidas fundamentais para
responder às necessidades das famílias com crianças. Em primeiro lugar, o aumento do abono de família no
mínimo de 50 € por mês para todas as crianças que beneficiam de abono de família. Em segundo lugar, o
aumento de 750 € para 900 € na dedução fiscal para o segundo filho. Em terceiro lugar, o aumento de 70 € para
100 € por mês da prestação para o combate à pobreza infantil, através da Garantia para a Infância. São três
medidas concretas de melhoria do rendimento das famílias com filhos.
Aplausos do PS.
Creio que todos temos consciência que o maior desafio que a nossa sociedade tem é o de corresponder às
expectativas dos jovens de hoje. É por isso que os dois acordos plurianuais que foram assinados são da maior
importância, porque em tempos de incerteza é fundamental dar previsibilidade a quem trabalha e também às
empresas. E é por isso que o acordo de médio prazo, feito em sede de concertação social, garante a todos os
trabalhadores uma melhoria de 20% do seu rendimento ao longo dos próximos quatro anos, incluindo aos
trabalhadores da função pública; garante às empresas que vamos adotar as políticas necessárias para que a
produtividade possa aumentar para o objetivo de 2% de crescimento anual; e garante que possam ter uma
redução efetiva do IRC correspondente ao que seria uma redução transversal de dois pontos percentuais na
taxa de IRS, se investirem no interior, se investirem na inovação, se fizerem os aumentos salariais em linha com
ou acima do acordado.
Sim, é nestas políticas que nós acreditamos.
Aplausos do PS.
Quero aqui louvar a coragem dos parceiros sociais que, perante a vozearia geral, se concentraram naquilo
que é fundamental: dialogar e procurar acordo.
Mas, para as novas gerações, temos efetivamente resposta, nomeadamente para a Ana. A Ana faz parte de
uma geração que, tendo crescido com António Guterres como Primeiro-Ministro, já beneficiou da universalização
do ensino pré-escolar e de um Governo que apostou a longo prazo na ciência como política central.
Aplausos do PS.
Aliás, se hoje estamos a ter capacidade de atrair investimento direto estrangeiro foi porque, há 25 anos,
houve quem definisse a política de ciência como uma política estratégica para o futuro do País.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Verdade!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Não teríamos hoje o número de licenciados que temos, o número de mestres que temos, o número de doutores que temos se não tivesse havido essa aposta há 25 anos.
Aplausos do PS.
A Ana também faz parte da geração que beneficiou da extensão da obrigatoriedade do ensino até ao 12.º
ano. Provavelmente, a Ana foi das primeiras alunas a ter o ensino do inglês no 1.º ciclo.
Aplausos do PS.
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A Ana beneficiou ainda de ter crescido numa cidade que não estava a cair aos bocados, mas numa cidade
que se reconstruiu, que se reabilitou, que se tornou cosmopolita e que não esperou pela Web Summit para
apostar no empreendedorismo. Foi por ter apostado no empreendedorismo que hoje pode receber a Web
Summit, como vai receber na próxima semana.
Aplausos do PS.
Até lhe digo mais, Sr. Deputado: se a Ana vive nos Olivais, até já beneficiou das piscinas recuperadas,
reabilitadas e não encerradas, como estiveram enquanto a direita governou o município de Lisboa.
Aplausos do PS.
Protestos de Deputados do PSD.
E o que podemos dizer agora à Ana, que já acabou o seu curso?
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Que não há trabalho nenhum!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Tendo acabado o seu curso, podemos dizer à Ana…
O Sr. Pedro Pinto (CH): — A Ana já emigrou!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … que é graças ao Orçamento do Estado para 2023 que, nos primeiros cinco anos de atividade, vai ter uma forte redução da tributação de IRS.
Protestos do PSD, do CH e da IL e contraprotestos do PS.
Se a Ana tiver, por exemplo, um salário médio, beneficiará, logo no primeiro ano, de uma poupança de 1586 €
no seu IRS e, em cinco anos, beneficiará de uma poupança de 5390 €.
Dirão que é difícil a Ana ter este vencimento, e é verdade. Mas, neste Orçamento do Estado, temos um
programa de contratação para os jovens com valores estipulados acima de 1320 €. Fixámos a posição de
entrada de técnico superior na Administração Pública em 1320 €, precisamente para que a Ana, se entrar na
Administração Pública, tenha esse vencimento.
Aplausos do PS.
E mais: fazendo este aumento do salário para a categoria de técnico superior na Administração Pública,
estamos a pressionar o setor privado a ir a jogo se não quiser perder para a Administração Pública o melhor
talento que é formado.
Protestos do CH e da IL.
Se a Ana quiser procurar habitação, vai ter, no próximo Orçamento, um reforço de 30% no programa Porta
65 para que possa beneficiar de apoio ao arrendamento.
Protestos do PSD, do CH e da IL.
Há, sobretudo, um grande conselho que tenho a dar à Ana.
Vozes do CH: — Que emigre!
O Sr. Primeiro-Ministro: — É que a Ana nunca vote no PSD.
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Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Porque, se votar no PSD, arrisca-se a ter um Primeiro-Ministro que a convide a emigrar.
Aplausos do PS.
Se não votar no PSD, continuará a ter um Primeiro-Ministro que vai lutar para que ela não precise de emigrar
de modo a realizar todo o seu potencial e todos os seus sonhos, na nossa pátria que é Portugal.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Passamos, agora, à fase das intervenções dos diferentes grupos parlamentares. Para fazer uma intervenção em nome do Grupo Parlamentar do PSD, dou a palavra ao Sr. Deputado Ricardo
Baptista Leite.
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: De facto, o Partido Socialista arrancou com uma campanha — temos visto os cartazes por aí nestes últimos dias —, e isso percebeu-se nesta
intervenção do Sr. Primeiro-Ministro, pois não respondeu a uma única pergunta e está em modo de propaganda.
Aplausos do PSD.
O cartaz do Sr. Primeiro-Ministro diz «Juntos Seguimos e Cumprimos». Temos de reconhecer uma coisa: o
Sr. Primeiro-Ministro, António Costa, prometeu que iria mudar o Ministro da Saúde, mas que não iria mudar as
políticas de saúde. Realmente, nada mudou — prometeu e cumpriu.
O Sr. Primeiro-Ministro disse que a substituição de um membro do Governo seria uma mudança de
personalidade ou de estilo e realmente só mudou a estética governamental. Portanto, prometeu e cumpriu.
No fundo, o que o Primeiro-Ministro disse é que vai continuar tudo na mesma, e o Orçamento do Estado é a
prova disso mesmo: por pior que esteja o Serviço Nacional de Saúde, com o PS é para continuar assim.
Mas vamos às promessas que o Primeiro-Ministro e o Governo fizeram e não cumpriram, começando pelos
médicos de família. Disseram que todos os portugueses teriam médico de família atribuído em 2017, mas hoje
há mais de 1,2 milhões de portugueses que não têm médico de família atribuído. E olhamos para este Orçamento
do Estado e vemos que retiraram até os incentivos financeiros que tinham colocado no Orçamento anterior, para
tentar reter os médicos e para atrair mais médicos de família.
Ficaram por cumprir todas as promessas de carreiras e salários dignos para os médicos, para os enfermeiros,
para os farmacêuticos, para os técnicos de saúde. Aliás, o novo Ministro da Saúde, Manuel Pizarro, dizia que a
primeira prioridade, assim que assumisse funções, seria iniciar o processo negocial sobre as carreiras. Até hoje,
nem uma reunião negocial houve.
Aplausos do PSD.
Este Orçamento do Estado não oferece uma única pista sobre como é que irão reter os profissionais, sobre
como é que irão atrair profissionais de saúde. É um enorme vazio. Aliás, percebe-se hoje porque é que o
Governo decidiu enterrar 3,2 mil milhões de euros dos impostos dos portugueses na TAP: é para que haja aviões
para os médicos continuarem a emigrar, que é exatamente o que está a acontecer hoje.
Aplausos do PSD.
Poderíamos presumir que não querem investir nos profissionais de saúde porque estão a pagar as dívidas.
Aliás, o Primeiro-Ministro disse aqui várias vezes: «Somos, agora, o partido das contas certas.» O que é que
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nos diz o Portal da Transparência do Serviço Nacional de Saúde? Em agosto de 2022, a dívida total do SNS era
de quase 2,2 mil milhões de euros, quase 1,3 mil milhões de euros de dívida vencida, ou seja, dívida cujo prazo
de pagamento já expirou. Sete anos depois, quando comparamos com os dados de 2015, o Governo apresenta,
em 2022, um aumento brutal da dívida no SNS. Face a 2015, é um aumento de mais de 20% de pagamentos
em atraso, um aumento de mais de 50% da dívida vencida, um aumento de 52,7% da dívida total. Isto não são
contas certas, Sr. Primeiro-Ministro, isto são contas de um Governo mal pagador.
Aplausos do PSD.
Podíamos dizer que o Governo não quer investir nos profissionais de saúde nem pagar as dívidas porque vai
melhorar as respostas do Serviço Nacional de Saúde. Mas, infelizmente, também não. Persistem as listas de
espera e, nalguns casos, são superiores a um ano para uma consulta de especialidade. O número de cirurgias
hospitalares está longe de recuperar as mais de 125 000 cirurgias interrompidas entre 2019 e 2021.
Continuamos com mais de 1 milhar de doentes internados nos hospitais já com alta médica porque os serviços
da segurança social não conseguem encontrar soluções. O empobrecimento é uma realidade cada vez mais
presente.
A mortalidade excessiva continua a apresentar valores elevados, com particular enfoque para as doenças
oncológicas. E, falando nos doentes com cancro, é simplesmente vergonhoso que muitos tenham de continuar
a esperar meses, senão mesmo anos, para terem acesso a uma junta médica. Sem junta médica, não
conseguem ter acesso a um atestado multiusos e, sem atestado multiusos, não conseguem ter acesso aos
direitos e benefícios sociais a que gozam por lei.
Já perdemos a conta ao número de vezes que trouxemos este tema a debate, e não queremos mais
promessas. Sr. Ministro da Saúde, ao invés de utilizar os doentes oncológicos como arma de arremesso político,
resolva os problemas destes cidadãos de uma vez por todas.
Dizia o Sr. Primeiro-Ministro que é verdade, não conseguiram motivar os profissionais de saúde para
continuar no SNS, aumentaram a dívida no Serviço Nacional de Saúde e há uma degradação do serviço público
de saúde — «mas não se preocupem, agora é que isso se vai resolver, o estatuto do SNS e o novo diretor
executivo é que vão salvar isto tudo, o famoso CEO (chief executive officer) da saúde vai resolver todos os
problemas».
Aplausos do PSD.
Protestos do Deputado do PS Eurico Brilhante Dias.
Aliás, falando nesse CEO, já ouvi alguns falarem no «céu» do SNS em vez do CEO, numa espécie de nirvana
socialista que vai resolver todos os problemas da saúde.
Ainda na última audição com o Ministro da Saúde, fizemos algumas perguntas básicas. Quem é que vai fazer
os contratos com os hospitais? É a ACSS (Administração Central do Sistema de Saúde)? É a direção executiva?
É o Ministro da Saúde? Não sabem! É uma desorganização completa, ninguém sabe quem manda. Num sistema
tão complexo, quem paga perante a desorganização governamental são os doentes.
Sr.as e Srs. Deputados, vivemos hoje no SNS uma situação impensável há duas décadas: para se ter acesso
a algumas das primeiras linhas terapêuticas para determinadas doenças oncológicas, os doentes têm de ir para
o privado, porque esses tratamentos já não estão disponíveis no setor público.
Protestos da Deputada do PS Jamila Madeira.
Pior: há hoje famílias que se encontram em situação de bancarrota financeira porque, para tratar da sua
saúde ou da saúde de um familiar, têm de vender os seus bens para poderem ir para o privado, visto que não
encontram resposta no setor público. Antes, orgulhávamo-nos do que nos distinguia de outros sistemas de
saúde, como o sistema americano, em que as pessoas têm de apresentar um cartão de crédito para acederem
à saúde; hoje, as pessoas já podem entrar numa situação de bancarrota pelo simples facto de ficarem doentes.
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Num momento de crise económica, sabendo nós que a pobreza é o maior causador de doença, este
Orçamento vai no sentido errado, empobrecendo este País, cortando nos pensionistas, cortando na capacidade
de compra dos funcionários públicos e dos demais portugueses. Promove, efetivamente, mais pobreza e, por
tudo isto, este Orçamento e este Governo exigem uma oposição firme e determinada. Quem não vai parar, Sr.
Primeiro-Ministro, somos nós!
Aplausos do PSD.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Adão Silva.
O Sr. Presidente: — Cumprimento o Sr. Primeiro-Ministro, os Srs. Membros do Governo, as Sr.as e os Srs. Deputados e anuncio que o Sr. Deputado Ricardo Baptista Leite tem um pedido de esclarecimento do Grupo
Parlamentar do Partido Socialista, por parte do Sr. Deputado Porfírio Silva, a quem dou, de imediato, a palavra.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Sr. Deputado Ricardo Baptista Leite, enfim, usar os doentes como armas de arremesso político não é a nossa prática.
Vozes do PSD: — Oh!
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Repetir aquilo que o Sr. Deputado, aliás, já fez durante a pandemia, que foi usar isso e o alarmismo como arma política, não vamos por aí. Portanto, vou concentrar-me…
Protestos do CH, da IL e de Deputados do PSD.
Os Srs. Deputados têm passado a tarde toda a fazer barulho para ver se não ouvem aquilo que os outros
dizem, mas vão ter de ouvir.
Aplausos do PS.
Protestos do CH.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Peço a compreensão da Câmara para que o Sr. Deputado Porfírio Silva possa fazer o seu pedido de esclarecimento. Queira continuar, Sr. Deputado.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Deputado, como acho que o senhor talvez não tenha vontade de responder às minhas perguntas, vou começar com uma pergunta que o Presidente do seu partido fez no discurso de
abertura do vosso último congresso. O Sr. Dr. Luís Montenegro dizia nessa altura: «Como é que o PS faz tudo
mal e continua a ganhar eleições?» E acrescentava: «Alguma coisa tem de estar mal connosco.» Connosco,
PSD. «Não são os eleitores que estão errados, os eleitores tomaram a opção que para eles era a melhor!», dizia
o Sr. Presidente Montenegro.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Ah, pois!
O Sr. Porfírio Silva (PS): — É uma questão muito pertinente. Curiosamente, os senhores gastaram o congresso todo sem nunca darem nenhuma resposta a essa pergunta. Gostava de sugerir uma resposta a essa
pergunta do vosso Presidente, que é uma pergunta muito interessante: como os senhores adotaram um estilo
de oposição de bota-abaixismo e de «está tudo mal!», se calhar os portugueses perceberam isso e perceberam
que não podiam esperar nada deste PSD. É por isso que continuam a perder eleições, continuam a não ter o
voto dos portugueses.
Aplausos do PS.
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Sr. Deputado, o problema nem são as opiniões do PSD. O problema é que há milhentas opiniões dentro do
PSD. É uma cacofonia!
Protestos do CH, da IL e de Deputados do PSD.
Um dia destes estava a ouvir rádio e ouvi alguém dizer «(…) este novo PS travestido de furioso adepto das
contas públicas saudáveis (…)». Pensei «lá está o Bloco de Esquerda a criticar o PS», mas não, era o Presidente
do PSD a dizer que o Governo do PS estava a manter as contas públicas saudáveis.
Protestos de Deputados do PSD.
Não era…
Pausa.
Neste momento, o orador tossiu e ficou momentaneamente sem voz.
Protestos de Deputados do PSD.
Agora, de facto, ao fazerem barulho, impedem-me de falar.
Aplausos e risos do PS.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Peço realmente que haja algum silêncio e alguma aquietação da parte da Câmara, para que o Sr. Deputado Porfírio Silva possa concluir o seu pedido de esclarecimento.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — O problema não era o PSD ter passado a ser contra as contas públicas saudáveis. O problema é que é o mesmo PSD que ainda há pouco dizia que o PS dava tudo a todos ao mesmo
tempo. Portanto, entendam-se!
Sr. Deputado, há outros casos. O PSD já aqui veio dizer nesta Câmara: «Este acordo de médio prazo até
não era mau.» Mas, precisamente no dia em que foi apresentada a proposta de Orçamento do Estado aqui na
Assembleia da República, o Sr. Deputado Hugo Carneiro, ali nos Passos Perdidos, disse o seguinte sobre esse
acordo de médio prazo: «O problema é que de certeza que essa história dos aumentos salariais foi o Governo
que obrigou os parceiros a assinar.» Pois, estavam muito escandalizados porque o acordo de rendimentos e
competitividade previa aumentos salariais e supuseram que foi o Governo que os obrigou a assinar.
Protestos de Deputados do PSD.
Isto porque acham que os parceiros sociais são uns tontos, não sabem o que assinam. É o Governo que os
assina. Portanto, o grande problema deste PSD é que há imensos PSD,…
Protestos de Deputados do PSD.
… mas mesmo assim…
O orador voltou a ficar momentaneamente sem voz.
Tenho mesmo de terminar, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Sr. Deputado, compreendo a sua dificuldade, é uma dificuldade física e orgânica.
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Risos de Deputados do PSD.
Srs. Deputados, estamos numa situação em que, mais do que nada, se exige respeito pelo nosso colega.
Aplausos do PS.
Já vi muitas situações destas no Parlamento, acontece a qualquer uma das Sr.as e dos Srs. Deputados,
portanto, acho que, nesta circunstância, alguma tolerância acrescida da nossa parte é boa.
Também vou pedir ao Sr. Deputado que, de alguma maneira, vá abreviando o seu pedido de esclarecimento,
porque, obviamente, o seu tempo está a correr e já o ultrapassou largamente.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Presidente, vou terminar, mas até acho que isto é um bom augúrio, porque a primeira vez que o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa foi à televisão ficou sem voz e teve muitos e bons anos
de carreira política a seguir a isso. Pode ser que eu tenha a mesma sorte!
Risos do PS.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não basta tossir!
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Termino com a pergunta que quero fazer ao Sr. Deputado Ricardo Baptista Leite.
Vozes do PSD: — Ah!
O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sabem o que diferencia um partido que só quer dizer mal e não quer fazer nada pelo País de um partido que é construtor, que quer ser Governo e que também quer ter soluções? É que a
primeira categoria de partidos diz mal de tudo, está tudo mal, «não há nada na proposta que se aproveite, o
Orçamento é tão mau, tão mau, tão mau, que, da primeira à última página, nada se aproveita». Já os partidos
que querem ser alternativos e que querem ser Governo distinguem aquilo que acham que está mau daquilo que
acham que está bem.
O que gostaria que o Sr. Deputado Ricardo Baptista Leite dissesse é: neste Orçamento do Estado, afinal,
está tudo mal ou há uma meia dúzia de coisinhas que se aproveitam?
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Adão Silva): — Sr. Deputado Porfírio Silva, louvo obviamente o seu esforço e empenho para formular a pergunta e dou, de imediato, a palavra ao Sr. Deputado Ricardo Baptista Leite para responder
a V. Ex.ª
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Porfírio Silva, apesar das várias afirmações que fez, se precisar de uma ajuda médica, estarei aqui disponível para o ajudar.
Não é por ser socialista!
Aplausos do PSD.
Devo dizer, Sr. Deputado, que conseguiu fazer um pedido de esclarecimento inteiro relativo a uma
intervenção centrada na saúde sem falar uma única vez na saúde. Falei da falta de médicos de família, dos
doentes oncológicos que não têm acesso aos benefícios sociais, das listas de espera e a resposta do Sr.
Deputado foi: «Nós ganhámos as eleições! Tivemos uma maioria absoluta!» Ora, esta politiquice não responde
às necessidades efetivas dos portugueses.
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Mas o Sr. Deputado ainda falou na questão das contas certas e, de facto, demonstrei — os dados não são
meus, são do Portal Mais Transparência, que é do Governo — que hoje a dívida é muito superior àquela que os
senhores herdaram no Serviço Nacional de Saúde.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Portanto, sobre a questão das dívidas, só tenho duas palavras para si: «banca» e «rota». Juntas, dão «bancarrota»!
Aplausos do PSD.
Foi aquilo que os senhores do Partido Socialista trouxeram para o País, juntamente com a troica.
O Sr. Deputado perguntou então o que é que o PSD vê de alternativa. É muito simples, aquilo que dissemos
desde sempre: acabem com as administrações regionais de saúde — não nos opomos necessariamente a que
haja um CEO, um diretor executivo —, universalizem as unidades locais de saúde e permitam que as unidades
de saúde familiares que são hoje de modelo A passem a modelo B. Não se vê nada disto no Orçamento do
Estado! E o modelo C, que o Sr. Ministro tanto defendeu no passado, pode agora ser implementado para garantir
que conseguimos atrair os profissionais para o Serviço Nacional de Saúde.
Protestos do Deputado do PS Eurico Brilhante Dias e do Deputado do PCP João Dias.
Aquilo que eu dizia sobre os doentes como arremesso é que houve uma greve de farmacêuticos, como sabe,
e a resposta do Sr. Ministro ficou muito aquém do que seria desejável na luta dos farmacêuticos pelos seus
direitos laborais, utilizando os doentes nessa causa.
O Sr. Deputado invoca a questão da pandemia dizendo que eu era um motor de alarmismo. Aliás, a atual
Sr.ª Ministra, antigamente Deputada, Ana Catarina Mendes, na altura acusou-me de utilizar dados falsos no
âmbito da morte de um conjunto de doentes num hospital de Cascais onde fui voluntário durante mais de um
ano. Um conjunto de cidadãos militantes socialistas fez uma queixa contra mim, tendo citado a Sr.ª Ministra Ana
Catarina Mendes e pedido a minha suspensão da Ordem dos Médicos. Mais de um ano depois, o conselho
disciplinar da Ordem dos Médicos emitiu um acórdão com mais de 20 páginas a demonstrar que eu tinha toda
a razão naquele mês em que morreram quase 6000 pessoas com COVID-19 neste País.
Aplausos do PSD.
Protestos da Deputada do PS Maria Antónia de Almeida Santos.
O senhor é Deputado da República. Comece a servir primeiro os portugueses antes de servir os seus
interesses pessoais e os do seu partido.
Aplausos do PSD.
Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Augusto Santos Silva.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção em nome do Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Tiago Brandão Rodrigues.
O Sr. Tiago Brandão Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Nós, Deputados, e os portugueses em geral, incluindo a Ana, temos fundamentadas razões para estarmos
inquietos com as consequências sociais e económicas da imprevisibilidade com a surpresa trágica da guerra na
Europa, três quartos de século depois, e com a inflação que daí provém, inflação em valores como não víamos
desde que eu não tinha ainda idade para votar.
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Mas temos razões — eu, os Srs. Deputados, os portugueses, incluindo a Ana — para confiarmos que, mais
uma vez, juntos seguimos e conseguimos. E este Orçamento do Estado para 2023 dá-nos estas razões: razões
fundadas num forte sentido de estabilidade que os portugueses, justamente pelo exercício soberano do voto,
privilegiaram face ao ruído do bota-abaixo que, felizmente, ganha mais microfones do que votos; razões também
expressas no compromisso, transparente e responsável, que este Orçamento celebra entre quem governa e
quem é governado; e, sobretudo, razões sentidas na nítida confiança que este Orçamento do Estado para 2023
deposita em Portugal e nos portugueses.
Se encontramos essas razões para seguirmos, conseguirmos e, assim, cumprirmos o que prometemos aos
portugueses em todas as áreas governativas, encontramo-las, de forma cristalina e sem nenhuma poluição, no
Orçamento que caberá ao Ministério do Ambiente e da Ação Climática cumprir em 2023.
Já foi tempo em que o discurso sobre o ambiente, o clima e a energia era coisa de técnicos ou era coisa de
jovens que nos alertavam para estas temáticas. Hoje, é coisa minha, é coisa vossa, é coisa da Ana, porque deve
ser coisa mesmo de todos. Isso não diminui, nem por um segundo, a nossa responsabilidade de quem governa,
como de quem apoia o Governo, em estar à altura desta centralidade.
É com muita honra que aqui recordo a força com que Orçamento do Estado para 2023 reforça a centralidade
do ambiente e da ação climática para a nossa vida comum. Uma centralidade expressa nos mais de 5000
milhões de euros que traz de investimento de todos os portugueses no ecossistema que nos acolhe e que, por
isso, por nós é cuidado. Um investimento que representa uma progressão de 50% face ao já ambicioso
Orçamento executado este ano de 2022. Um Orçamento que enfrenta de frente os desafios que o presente nos
traz no campo dos custos da energia, através de um conjunto amplo de medidas mitigadoras, e que cuida do
futuro, apostando numa estratégia de diversificação de fontes e de fornecedores do sistema, robustecendo a
resiliência de todos e de todo o sistema energético nacional.
Medidas mitigadoras, essas, que totalizam já 5,3 mil milhões de euros, distribuídos entre 2000 milhões de
euros dirigidos para consumo das empresas e 3300 milhões de euros pensados para aliviar o fardo energético
das famílias.
Aplausos do PS.
Este cuidar do hoje e do amanhã, mesmo contra as vozes de Cassandra, que tudo rejeitam cá dentro, mesmo
que todos celebrem lá fora, continua o trabalho já feito com a aprovação, que se conseguiu em Bruxelas, do
Mecanismo Ibérico, traduzindo uma poupança de 220 milhões de euros só entre 15 de junho e 31 de agosto,
através de uma redução tarifária que ultrapassa os 18%. Também aqui seria certamente mais confortável nada
fazer, nada propor a Bruxelas, porque nos pouparia as picaretas bruxuleantes desta vida.
Apesar deste ruído visto pelos portugueses, por mais estridente e até trauliteiro que ele seja, vamos continuar
a investir no futuro da transição energética, alocando-lhe mais de 2100 milhões de euros no próximo ano. Para
isso, devemos celebrar, também nesta Casa, o que Espanha e França têm celebrado, sem reservas, estes dias:
ligações energéticas por mar e ligações energéticas por terra, de gás e de eletricidade. É uma vitória inequívoca
da nossa diplomacia económica, da diplomacia do nosso Governo.
Aplausos do PS.
Mas deixemos o ruído de lado, deixemos a negociação internacional fazer o caminho, que, naturalmente,
calará esse ruído e destapará todo o seu ridículo, e falemos do que neste Orçamento se continua, para que
ninguém o esqueça.
Continua a aposta na promoção do transporte coletivo, seja concretizando obras fundamentais de mobilidade
pesada, ferrovia metropolitana e fluvial, em ambas as áreas metropolitanas, seja nos milhões de pessoas que
têm acesso aos passes mensais, com preço fortemente reduzido em 2019 e que não aumentará em 2023.
Prossegue a promoção das energias renováveis em muitos tabuleiros, desde logo na ação de cada cidadão
e no chamado «autoconsumo», com isenções fiscais sobre a energia excedente produzida, que favorecem a
redução da fatura energética dos lares portugueses. Este caminho faz sentido e acrescenta novos sentidos à
nossa viagem comum, uma viagem, não o esqueçamos, rumo à neutralidade carbónica que nos
comprometemos alcançar em 2050.
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Em debate democrático, contínuo, mas não caindo na armadilha que eleva a voz para disfarçar a fraqueza
da palavra, continuaremos neste grupo parlamentar a convocar todos os setores da sociedade, todas as famílias,
incluindo a família da Ana, as empresas e o Governo para que 2023 seja uma etapa firme e irreversível rumo a
2050, que, bem o sabemos, é já depois de amanhã.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem dois pedidos de esclarecimento. Para formular o primeiro pedido, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Oliveira, do PSD.
O Sr. Hugo Patrício Oliveira (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr. Deputado, numa visão real do nosso País, onde impera o verdadeiro empobrecimento imposto
por este Governo, digo, de uma forma muito rápida, que nas IPSS (instituições particulares de solidariedade
social) está em causa a sustentabilidade de milhares de instituições que lutam diariamente para continuar a
prestar apoio a milhares de utentes com falta de financiamento com o aumento da energia e custos de contexto.
Quanto à energia, os portugueses, com a chegada do inverno, já tremem de medo com aquilo que aí vem e
também vão tremer de frio porque não terão meios para fazer face ao aumento do custo da energia. Só falta
mesmo o Governo dizer «aproveitem os 125 € e comprem cobertores». A incompetência do Governo na gestão
dos recursos hídricos é brutal. Só falta o Governo vir dizer aos portugueses para se aquecerem ou, então,
tomarem banho apenas uma vez por semana.
Na saúde, veja-se o empobrecimento do SNS, onde milhares de utentes mendigam serviços mínimos. E são
milhões os portugueses que, no fim do mês, fazem contas à vida.
Podia continuar este rol de empobrecimento, mas, ao ouvir o Sr. Deputado falar claramente no Mecanismo
Ibérico, ainda gostava de perceber, se quiser explicar, exatamente quem é que vai pagar, em última linha, a
diferença. Quem é que vai pagar? São os portugueses! Como? Gostava de o ouvir. Não vou falar-lhe do acordo,
porque acho que temos falado muito sobre ele e é, de facto, muito prejudicial para o nosso País.
Vozes do PS: — Oh!
O Sr. Hugo Patrício Oliveira (PSD): — Já que Jorge Palma foi citado aqui hoje, ele também canta uma música muito conhecida, Deixa-me Rir, a qual se aplica claramente a este Governo. No entanto, neste caso,
apenas posso dizer «deixem-me chorar», porque é aquilo que sinto com este Governo.
Risos do PS.
Há outra música de Jorge Palma que o Sr. Primeiro-Ministro gosta tanto de citar e que se aplica claramente
ao Governo de Portugal, que é Frágil, «sinto-me frágil». É assim que o Governo se apresenta ao País.
Sr. Deputado, peço-lhe, mais uma vez, que explique exatamente o Mecanismo Ibérico e quem é que vai
pagar a grande diferença, se são os portugueses, e de que forma o vão fazer.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alma Rivera, do PCP.
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Tiago Brandão Rodrigues, de facto, ainda bem que falou nos custos da energia, porque os preços da eletricidade, combustíveis e gás de botija
são dos maiores problemas das pessoas, mas também porque esse é um tema em que as opções do PS e do
seu Orçamento são claras.
É que o tal Orçamento das contas certas tem um problema com a realidade: há o Orçamento do Governo,
do PS, e, depois, há o Orçamento das pessoas, das famílias, com o qual elas têm de sobreviver.
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Nesse Orçamento, Sr. Deputado, há tudo menos contas certas. O que há é um resultado negativo entre os
rendimentos, que o Governo se recusa a aumentar de forma real, e as despesas, que não param de subir, num
aumento brutalmente especulativo e descontrolado dos preços, em que aquilo que se paga a mais na fatura vai
direitinho para os bolsos dos acionistas das empresas energéticas.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Essa é que é essa!
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — E as opções do PS, do seu Governo e do seu Orçamento ficam claras quando toda a gente empobrece, mas os lucros da Galp e da EDP multiplicam-se. Isso mostra bem que há setores que
estão a aproveitar a situação para especular e aumentar as suas margens de lucro e que é opção o Governo
não intervir nos preços e nas margens de lucro, um Governo que não tem coragem política para enfrentar os
interesses destes grupos económicos.
Aliás, o Governo até faz mais: coloca, em teoria, 3000 milhões de euros no sistema para grandes empresas,
sem beliscar margens de lucro, pondo o Orçamento do Estado a servir de almofada para estes aumentos de
preços.
Tal contrasta com o que é feito para os consumidores. Para os consumidores, para o comum dos cidadãos,
o que é que temos neste Orçamento? Na melhor das hipóteses, 9 €. E o Governo anda nisto, de medida
inconsequente em medida inconsequente.
Pergunto: a energia é ou não é um bem essencial para o Partido Socialista? Se é um bem essencial, porque
é que continuam com medidas parciais que não levam a lado nenhum, em vez de, uma vez por todas, baixarem
o IVA para 6%, como propõe o PCP?
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — É que ele já esteve na taxa mínima até o Governo PSD o subir, o que, mais uma vez, demonstra que, afinal, PS e PSD não divergem assim tanto.
Tendo os senhores pulso rigoroso para os trabalhadores e para o povo, para os seus rendimentos, para não
os aumentar de forma real, pergunto porque é que não o usam para limitar os preços e definir margens máximas
de lucro na energia.
Srs. Deputados, se esta não é política de direita, se esta não é uma proposta cheia de injustiças e
desigualdades, é o quê? Ou vão dizer à Ana que esta é a política de direita mais à esquerda de sempre?
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Tiago Brandão Rodrigues.
O Sr. Tiago Brandão Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço as perguntas. O Sr. Primeiro-Ministro falou de Jorge Palma, o Sr. Deputado Hugo Oliveira falou de Jorge Palma e eu
asseguro aos Srs. Deputados que não lhes vou pedir para se «encostarem a mim».
Risos do PS.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Já estiveram encostados!
O Sr. Tiago Brandão Rodrigues (PS): — Podia aqui cantar o Encosta-te a mim e teríamos uma tarde valiosíssima e poderosíssima.
Aplausos do PS.
Não me esqueço daquilo que passámos durante a pandemia, não me esqueço do que temos passado com
a guerra atual, não me esqueço também da instabilidade política que tivemos durante largos meses, tendo os
Srs. Deputados sido coautores ativos.
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Protestos do PCP.
Se temos agora capacidade para dar resposta na área da energia, significa que tivemos de ultrapassar a
pandemia, tivemos de ultrapassar todos os problemas com a guerra na Europa, os quais não acabaram, mas
ainda temos de ultrapassar esse período de instabilidade que existiu e que teve, naturalmente, consequências.
Nós queremos ser, este Governo quer ser, e tem sido, um Governo com contas certas — a Sr.ª Deputada
ainda agora estava a dizer que não havia contas certas — e com estratégias de políticas públicas no ambiente
e na energia.
Falando somente de energia, não nos esquecemos, e quem está do lado da bancada do Governo também
não se esquece — o Sr. Primeiro-Ministro pode recordá-lo —, que o PPD/PSD foi contra as energias renováveis
e todas as políticas para as apoiar há década e meia.
Aplausos do PS.
O Sr. Hugo Patrício Oliveira (PSD): — Isso é mentira!
O Sr. Tiago Brandão Rodrigues (PS): — Há década e meia aconteceu um momento absolutamente central para sermos hoje mais competitivos e podermos responder mais à crise energética. E, bem mais recentemente,
há aproximadamente cinco anos, falavam e tratavam o hidrogénio verde como se fosse um verdadeiro Belzebu
das fontes de energia. Têm memória disso, Srs. Deputados? Eu tenho, e estava na bancada do Governo.
Aplausos do PS.
Imaginemos todos o que teria sido um País, em 2022, com as apostas trocadas, sem energias renováveis e
sem o trabalho contínuo destas novas fontes de energia. Imaginemos o que seria o nosso País com outra aposta
orçamental e não a atual aposta orçamental, num País que, em 2019, teve a possibilidade de contar —
desculpem o coloquialismo — com os «passes do Costa» e tem a possibilidade de dizer, em 2023, que esses
passes não vão sofrer nenhum aumento.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Os «passes do Costa»?!
A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — E do PCP, não?
O Sr. Tiago Brandão Rodrigues (PS): — Os Srs. Deputados do PCP lembrar-se-ão daquilo que fizeram em conjunto com o PS e lembrar-se-ão também da crise que provocaram e do que não podem continuar a fazer. É
uma pena!…
Aplausos do PS.
Os passes são do «Costa», porque era quem liderava o Governo.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Agora os passes são do «Costa»?!
O Sr. João Dias (PCP): — Que descaramento!
O Sr. Tiago Brandão Rodrigues (PS): — Imaginemos um País onde não houvesse a aposta deste Orçamento em metros, em transporte fluvial e em transporte ferroviário.
Imaginemos um País que não aliviasse a fatura energética das famílias, das empresas, do setor social e
solidário, de que falaram os Srs. Deputados, mas também da família da Ana, que vai poder usufruir desse alívio.
Imaginemos — e esta é para si, Sr. Primeiro-Ministro — um país que não tivesse a capacidade de fazer a
diplomacia económica que o Sr. Primeiro-Ministro fez na última sexta-feira.
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Na última sexta-feira, Portugal — e a Europa — teve uma grande vitória. Em França celebrou-se, em Espanha
celebrou-se e, lembro-me bem de como, durante o fim de semana, fui ouvindo o PSD, que, primeiro em Bruxelas,
parecia aquele avançado-centro, uma nova figura que trazíamos para campo para marcar muitos golos. Tinha
um fantástico aspeto, as melhores caneleiras, mas não conseguiu marcar nenhum golo. Mais, não prestou ajuda
a nenhum dos militantes do PSD, como não prestou nenhuma ajuda ao País.
Aplausos do PS.
Protestos do Deputado do PSD Hugo Patrício Oliveira.
Em vez de irem a Bruxelas, quero convidar o Grupo Parlamentar do PPD/PSD, na qualidade de Presidente
da Comissão de Ambiente e Energia — que conta, e desculpem-me todos os Srs. Deputados, com os melhores
Deputados desta Casa, tanto os do PS, como os do PSD e também os do PCP, que são os que estão neste
diálogo —, a, numa outra ocasião, ligar a um desses Deputados, pois tem excelentes Deputados no seu grupo
parlamentar. Assim, muito provavelmente, não teriam gritado no fim de semana e não cantavam agora fininho,
como têm feito nestes dias.
Aplausos do PS.
Srs. Deputados, façam isso porque vão ganhar muito mais.
Aplausos do PS.
Protestos do Deputado do PSD Hugo Patrício Oliveira.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção em nome do Grupo Parlamentar do Chega, tem a palavra a Sr.ª Deputada Rita Matias.
Peço silêncio, por favor.
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se procurarem as palavras «jovem» ou «jovens» no nosso Orçamento do Estado, verão que aparecem nada mais nada menos que três entradas. Bem sei que
este não é um argumento de autoridade, mas é o espelho do desprezo a que as novas gerações estão votadas,
nomeadamente no Orçamento que discutimos hoje.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Bem lembrado!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Ouvimos, hoje, o líder da Juventude Socialista afirmar que este Orçamento responde estruturalmente aos problemas que os jovens e a sua geração vivem, mas pergunto-me: onde é que
o Sr. Deputado viverá e de que Orçamento é que fala?
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Certamente, não pode viver em Portugal e não pode estar a falar deste Orçamento.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Falou numa democratização estrutural do ensino superior. Pergunto: para quem? É que não bastará alargar o número de vagas no ensino superior se os jovens não tiverem capacidade para
o frequentar, e nunca o ensino superior foi tão elitista como atualmente.
Vozes do PS: — Oh!…
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O Sr. Pedro Pinto (CH): — É verdade!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Mais de 40% dos jovens que não acedem ao ensino superior não o fazem por falta de condições financeiras.
Aplausos do CH.
Mais, 10% dos estudantes desistem no primeiro ano de licenciatura e fazem-no por falta de condições
financeiras. Mais de 5000 estudantes que foram colocados, este ano, na primeira fase não realizaram a sua
matrícula por falta de condições financeiras.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — E o senhor vem a esta Câmara dizer que o ensino superior está democratizado?! Não brinque connosco.
Vozes do CH: — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Num ano em que a oferta privada de quartos reduziu cerca de 80%, os valores das rendas aumentaram abruptamente, de tal forma que, atualmente, os alunos pagam, em média, 400 € por
um quarto em Lisboa e 350 € por um quarto no Porto.
O Governo responde, neste Orçamento, com um apoiozinho de 200 € por mês que vai chegar a um universo
reduzido de jovens universitários e que peca por tardio, porque o ano letivo já começou.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — É a isto que os Srs. Deputados chamam «democratização do ensino superior»? Mas o Partido Socialista vai mais longe e diz que também responde ao drama da habitação jovem com mais
habitação pública, nomeadamente com o programa Porta 65.
No entanto, importa dizer que, no Orçamento do Estado do ano passado, prometeram atualizar os valores e
não o fizeram. Por isso, a pergunta que deixo é esta: como é que um jovem pode confiar no Partido Socialista?
O Sr. Bruno Nunes (CH): — Não pode!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Gostava também de frisar que, em matéria de jovens, os feitos socialistas são apenas os seguintes: um em cada quatro jovens tem sintomas elevados de depressão; 52% dos jovens não se
sentem realizados profissionalmente; os jovens portugueses são os que tendem a sair mais tarde de casa dos
pais.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Verdade!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Portanto, o Sr. Primeiro-Ministro vir a debate dizer que o sucesso das políticas do Partido Socialista para os jovens se vê no número de licenciados, mestres e doutores não servirá de nada
se, depois, os jovens estiverem condenados à míngua.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Concluo, dizendo que não deixou de ser irónico ver o Sr. Primeiro-Ministro mencionar o grande feito do Partido Socialista de ter dotado os jovens portugueses com o ensino obrigatório de
inglês. Infelizmente, 20% dos jovens portugueses necessitam desta ferramenta porque têm de trabalhar no
exterior.
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O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
O Sr. Pedro do Carmo (PS): — Como é que é possível falar assim?
A Sr.ª Rita Matias (CH): — Portanto, pior do que convidar os jovens a emigrar é forçá-los a esta triste realidade, nomeadamente devido à falta de respostas para os jovens neste Orçamento.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção em nome da Iniciativa Liberal, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Guimarães Pinto.
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Iniciativa Liberal apresentou a sua proposta de taxa única, que foi rejeitada por esta Casa com a desculpa de que reduzia a taxa marginal nos
escalões mais altos. Então, no último Orçamento, propusemos reduzir a taxa marginal apenas nos escalões
mais baixos, mas isso foi rejeitado com o argumento de que os trabalhadores mais bem pagos também
beneficiariam, um pouquinho, por arrasto.
Neste Orçamento, insistimos em unificar os cinco primeiros escalões, mas alterámos a proposta de forma a
eliminar qualquer ganho nos rendimentos mais altos. Repito: esta é uma proposta que, reduzindo as taxas
marginais nos rendimentos mais baixos, será neutral nos rendimentos mais altos. Esta é uma taxa única para
os trabalhadores que estão entalados entre a inflação e a elevada carga fiscal, é uma proposta que irá aliviar a
carteira daquelas pessoas, com rendimentos médios e baixos, que o próprio Governo reconheceu que
precisavam de ajuda ao enviar-lhes um cheque de 125 €, sem nunca lhes dizer que era o dinheiro delas que
lhes estava a ser devolvido.
O Sr. Rui Rocha (IL): — É verdade!
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Este é um alívio que não depende de ter o IBAN atualizado nas finanças,…
Aplausos da IL.
… porque a nossa política é fazer com que esse dinheiro nunca lhes chegue a sair do bolso.
Esta não é uma proposta de esmola, é uma proposta que permite aos trabalhadores enrascados ficarem com
uma parte maior daquilo que é seu, daquilo que ganharam com o suor do seu trabalho.
Aplausos da IL.
Portugal é um país onde é demasiado comum ser pobre trabalhando, e não é alheio a esta realidade termos
taxas marginais confiscatórias para pessoas com rendimentos líquidos muito baixos.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Isso não é verdade!
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Nesta Casa, defende-se uma progressividade agressiva com o argumento de que os ricos devem pagar mais, mas se eu perguntar a cada um de vocês se é rico, se tem um
salário de rico, dir-me-ão que não. E se o nosso salário não é um salário de rico, muito menos serão ricas as
pessoas que ganham metade do nosso salário.
Aplausos da IL.
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Então, se aceitam que as pessoas que ganham metade do nosso salário não são ricas, porque é que aceitam
uma taxa marginal de 35% de IRS, a que se soma a TSU, para estas pessoas que, sozinhas, não conseguem
alugar uma casa e ter uma vida desafogada, mas que têm de entregar ao Estado metade de qualquer aumento
que consigam receber do seu empregador?
Aplausos da IL.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Isso é mentira!
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Digam-me em que outro país da União Europeia, mesmo aqueles países com salários baixos como os nossos, uma pessoa que ganhe 1200 € líquidos está exposta a uma taxa
marginal superior a 30%. Digam um país da União Europeia em que isso aconteça!
Vocês até podem fingir que as contas do Estado estão certas, mas não há nada de moralmente certo nestas
contas das pessoas. É uma injustiça, é um abuso, é um confisco e é hora de acabar com isso!
Aplausos da IL.
Neste Orçamento, vamos ter uma decisão para tomar: queremos ter trabalhadores dependentes, à espera
dos 125 € de esmola quando o Sr. António Costa decidir distribuí-la, ou queremos trabalhadores emancipados,
autossuficientes, mais bem pagos, não graças a uma esmola do PS, mas apenas recebendo o que é deles,
aquilo a que têm direito?
Aplausos da IL.
Iremos também propor a introdução de um subsídio de habitação,…
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Um subsídio?!
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — … com o mesmo tratamento fiscal dado ao subsídio de alimentação.
Protestos do Deputado do PS Eurico Brilhante Dias e da Deputada do BE Mariana Mortágua.
Um subsídio voluntário que qualquer empregador possa dar aos seus empregados. Hoje, se um trabalhador
que ganha 1200€ líquidos…
Protestos da Deputada do BE Mariana Mortágua.
Tenham calma! Ouçam, percebam!
Aplausos da IL.
Hoje, quando um trabalhador que ganha 1200 € líquidos consegue convencer o seu empregador a gastar
mais 100 € com ele, para o ajudar com as despesas de habitação, esse trabalhador fica com menos de 50 €.
Ou seja, por cada aumento de 100 € na renda, na mensalidade da prestação da casa, o trabalhador tem de
conseguir negociar um aumento de 200 € para colmatar essa perda.
O nosso regime fiscal duplica o esforço necessário dos trabalhadores com o aumento do preço da habitação.
Iremos, por isso, propor que o trabalhador possa receber o subsídio de habitação por inteiro, para fazer face às
despesas de habitação, dando-lhe o mesmo tratamento fiscal que é dado ao subsídio de alimentação.
Quem está preocupado com o aumento do preço da habitação, certamente, não poderá rejeitar uma proposta
que acabará com esta duplicação de esforço que os trabalhadores têm de fazer face aos preços da habitação.
Aplausos da IL.
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O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado tem um pedido de esclarecimento. Para formulá-lo, dou a palavra ao Sr. Deputado Pedro Anastácio, do PS.
O Sr. Pedro Anastácio (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e demais membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Carlos Guimarães Pinto, como ainda não sei se é candidato à Iniciativa Liberal,
vou esperar que isso se defina nas próximas semanas para responder a todos os pontos que aqui tocou.
O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Está desatento!
O Sr. Pedro Anastácio (PS): — Mas como este é o debate do Orçamento do Estado, o que deveríamos discutir hoje era qual seria o Orçamento do Estado da Iniciativa Liberal.
O Governo da República disse «Famílias Primeiro» e nós sabemos bem qual seria a escolha de VV Ex.as.
Falam de impostos cobrados versus os 125 € atribuídos, ignorando tudo o que o Estado dá à comunidade.
Protestos de Deputados da IL.
Querem um imposto único para todos — que, entretanto, mascararam —, mas desconsideram que esse
esforço contributivo não é igual para todos.
O Sr. Rui Rocha (IL): — Ouviu a intervenção? Já trazia isso escrito.
O Sr. Pedro Anastácio (PS): — Em vez de saúde pública, querem assegurar renda privada. Querem o cheque-ensino, mas não têm uma única prova dos seus resultados. Comparam-nos com os países de Leste,
sem refletirem sobre o nível de qualificação dessas populações, para nos proporem o endividamento dos nossos
jovens estudantes.
O Sr. Bernardo Blanco (IL): — Não ouviu a intervenção!
O Sr. Pedro Anastácio (PS): — E no vosso credo anti-impostos, naquela comunicação catita em que VV Ex.as são bons, afirmam a incapacidade de ir além de qualquer liberal contemporâneo e daqueles que, como
Friedman ou Hayek se demonstraram disponíveis para suprimir a democracia em nome da ordem de mercado.
Protestos da IL.
É por isso que o seu legado, Sua Ex.ª, é disputar o lugar onde se senta, não vá haver confusão com o porta-
voz da mesma agenda económica, caduca e falhada.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!
Protestos da Deputada da IL Patrícia Gilvaz.
O Sr. Pedro Anastácio (PS): — Sabemos bem as diferentes visões de projetos de Orçamento que temos nesta Casa. O Orçamento da IL seria o de «cada um por si», do «salve-se quem puder», um instrumento de
alívio para os ricos e um esquecimento para os pobres.
Para nós, o Orçamento é uma resposta comum, plural e coletiva, um instrumento para reduzir as
desigualdades, para devolver esperança e dignidade às pessoas.
Por isso, Srs. Deputados, recentemente criticaram o modelo implementado no Reino Unido — o que
advogam, e foram sérios porque disseram o que pensam realmente — porque não fazia um corte brutal na
despesa. Como VV Ex.as foram tão sérios nesse momento, a pergunta que tenho para vos fazer é sobre…
O Sr. Bernardo Blanco (IL): — Ah!…
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O Sr. Pedro Anastácio (PS): — … se a Iniciativa Liberal já escolheu qual seria o Orçamento que apresentaria a Portugal, onde, em vez de «Famílias Primeiro», diria «desigualdade primeiro»
Aplausos do PS.
VV. Ex.as têm aqui uma oportunidade — nos cortes entre receita e despesa, que já não disfarçam — para
demonstrarem as finalidades do vosso projeto político, porque, mesmo que envergonhadas, elas são mesmo a
destruição do Estado social.
Aplausos do PS.
O Sr. Bernardo Blanco (IL): — A pergunta não tem nada que ver com a intervenção.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Guimarães Pinto.
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Sr. Presidente, Sr. Deputado, ando cá há pouco tempo, mas, do que percebo destes debates, primeiro ouve-se a intervenção e depois faz-se uma pergunta sobre essa intervenção.
Aplausos da IL.
Do que sei, funciona assim.
Vi o Sr. Primeiro-Ministro muito preocupado com a vida da Iniciativa Liberal, mas deixe-me dizer-lhe, Sr.
Deputado, que temos muito orgulho, mas mesmo muito orgulho por defendermos a ideologia que defendemos
nesta Casa.
Aplausos da IL.
Temos muito orgulho de nos sentarmos aos ombros de gigantes como Locke, Adam Smith ou Bastiat, ao
contrário de outros que se sentam aos ombros de carniceiros como Che Guevara, Mussolini, Lenine ou Salazar!
Aplausos da IL.
O Sr. Pedro Anastácio (PS): — Ou Pinochet!
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Ou de outros que se sentam em ombros menos dignos, de corruptos. Nós sentamo-nos aos ombros de gigantes.
A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Tenha calma!
O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — O liberalismo já anda por cá há 300 anos, a espalhar prosperidade, e continuará por cá quando as vossas ideologias, quando os vossos partidos já estiverem no caixote do lixo da
história.
Aplausos da IL.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção em nome do Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: A proposta de Orçamento do Estado que o Governo apresenta para 2023 é um fator de agravamento
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das desigualdades e das injustiças. Não é um Orçamento de confiança no futuro, como diz o Governo, mas um
Orçamento de comprometimento do futuro.
Se em relação aos salários, reformas e pensões o Governo assume a perda de poder de compra e a limitação
das funções sociais do Estado, já em relação aos grupos económicos este Orçamento abre a porta a
escandalosos benefícios fiscais, a uma nova redução do IRC — que beneficia, sobretudo, as grandes empresas
—, e a novas transferências de recursos públicos que se juntam aos milhares de milhões de euros que, por via
do PRR, lhes estão a ser entregues.
Já havia razão para preocupações antigas, face às muitas fragilidades que o País apresenta, seja o seu
elevado grau de dependência e atraso económico, os seus crónicos défices estruturais, as profundas e
persistentes desigualdades sociais e regionais, os agravados problemas ambientais ou a degradação do próprio
regime democrático, com a subordinação do poder político ao poder económico. Problemas que continuam,
todos eles, a pesar como chumbo na vida nacional.
Agora há razão para preocupações acrescidas, preocupações que se avolumam a cada dia que passa, com
o agravamento das condições de vida da imensa maioria da população. Mas a proposta de Orçamento que o
Governo apresenta não é a resposta necessária, nem aos problemas urgentes que os portugueses sentem no
dia a dia, nem aos problemas estruturais que subsistem no País.
Há apenas cinco meses, no Orçamento do Estado para este ano de 2022, o Governo fez as suas escolhas.
O PCP alertou para a urgência de opções políticas e de medidas concretas e substanciais para responder aos
problemas nacionais, a começar pela exigência de aumentos de salários, reformas e pensões. Mas o Governo
ignorou esses alertas e manteve o rumo do seu Orçamento, o tal que proclamou ser «o mais à esquerda de
sempre».
O Sr. João Dias (PCP): — Muito bem!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — O resultado está à vista. Os números e as previsões do Governo já foram desmentidos pela realidade deste ano. O que os portugueses tiveram foi um aumento brutal do custo de vida,
com os salários reais a caírem 2,6%, enquanto o produto interno bruto cresce 6,5% e a produtividade aumenta
4,5%.
Os trabalhadores estiveram e estão a criar mais riqueza, mas, enquanto isso, empobrecem trabalhando. Com
este Orçamento sabem que para o ano terão mais do mesmo.
Para onde vai o dinheiro? Vai para o saldo orçamental e, principalmente, para os lucros dos grandes grupos
económicos, que aproveitam para ganhar milhões com o sacrifício de quase todos.
Ora, são esses grupos económicos que, com este Orçamento, passam a poder, no futuro, reduzir
drasticamente, ou mesmo anular, os impostos que têm de pagar, utilizando sem limite temporal o reporte de
prejuízos fiscais, entre outros favorecimentos. Para isso já há dinheiro e o défice não é problema!
Não há problema em aumentar 1,7 mil milhões de euros em aquisições de serviços a privados na saúde,
enquanto o investimento público marca passo na execução. Não há problema com os pagamentos às PPP no
valor de 1,41 mil milhões, mais as centenas de milhões em reequilíbrios financeiros, incluindo para a VINCI, com
os aeroportos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com este Orçamento, a redução da dívida e do défice faz-se por conta da
redução do valor real dos salários, reformas e pensões, pela degradação dos serviços públicos e do
investimento, pelo agravamento das injustiças e desigualdades.
Reafirmamos: havia e há alternativa! A redução da dívida e o equilíbrio orçamental poderiam ser alcançados
por medidas de estímulo ao mercado interno, pelo incremento do investimento público, pela aposta na produção
nacional, pela redução da dependência externa. Mas não é esse o caminho que está a ser seguido.
De tantas vezes ouvirmos o refrão das «contas certas» repetido à exaustão, fica a pergunta que tem de ser
feita: contas certas para quem? Para os trabalhadores, que se conformam e confrontam com a vida cada vez
mais cara, com um salário que não dá para pagar a comida, a renda e as faturas? Contas certas para os
reformados, que ficam sem o aumento das pensões que lhes era devido por lei e que, uma e outra vez, têm de
escolher se o dinheiro vai para comida ou para medicamentos, quando não basta para uma coisa nem outra?
Contas certas para os jovens que desistem de estudar porque não têm onde ficar e o mais que encontram é
uma vaga num beliche a 300 €?
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Não! Com este Orçamento e com esta política, as contas certas são, antes de mais, para os grandes grupos
económicos com os maiores lucros de sempre! Preços e especulação sem controlo, lucros e dividendos sem
limite, exploração e empobrecimento sem fim à vista, são estas as opções deste Orçamento. Contas certas de
milhões para o poder económico, vida incerta para os trabalhadores, os jovens, os reformados.
Ora, o Governo pretendeu apresentar, como uma espécie de prefácio a este Orçamento, o acordo assinado
com as grandes confederações patronais e a UGT, que reflete a opção de classe do Governo PS.
Mais do que ouvir o Governo falar do acordo que foi apresentado, é ouvir o entusiasmo com que os próprios
representantes dos grupos económicos o encaram. A unanimidade dos elogios — desde logo, a avaliação
positiva do patrão dos patrões da Confederação da Indústria Portuguesa — confirma o que temos afirmado
sobre a ação do Governo, cada vez mais inclinado para a direita e dando inquestionável expressão às exigências
do grande capital.
Perante estas opções políticas, reclama-se à direita por ainda mais borlas fiscais para o poder económico.
De resto, a posição do PSD não se fez esperar, tentando, o mais que pôde, enxertar no Orçamento que aí vem
a discussão sobre o tema dos gasodutos que hão de vir. Não se sabe se é falta de assunto, lá terão as suas
razões.
Por parte do PCP, não deixamos nem deixaremos de marcar com a nossa oposição o debate orçamental.
Uma oposição que se fará, também, com propostas que marcam a opção por uma política alternativa e que
confrontarão o Governo com as soluções que existem para responder, de facto, aos problemas que atingem os
trabalhadores, o povo e o País.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O País exige medidas de emergência, que não
podem continuar a ser adiadas, tal como precisa de soluções para os seus crónicos e agravados problemas de
fundo, o que exige a concretização de uma outra política em rutura com as atuais orientações.
O PCP reafirma que os trabalhadores e o povo português não estão condenados à degradação das
condições de vida, ao aumento da exploração e das injustiças sociais e que é necessário e possível construir e
alcançar uma vida melhor, uma sociedade mais justa, um Portugal soberano e desenvolvido.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Relembro que todos os grupos parlamentares, à exceção do PS, do PSD e do próprio Governo — que só podem mobilizar 30% do seu tempo —, podem gerir livremente os seus tempos entre hoje e
amanhã.
Sr. Deputado Bruno Dias, a Mesa regista uma inscrição para um pedido de esclarecimento. Para formulá-lo,
dou a palavra à Sr.ª Deputada Eurídice Pereira, do PS.
A Sr.ª Eurídice Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, restantes Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Sr. Deputado, sem surpresas, foi mais uma intervenção absolutamente previsível. E não se
pode dizer que seja exatamente pela coerência, porque não consta que o hábito da crítica seja sinónimo de
coerência.
Sr. Deputado, este Orçamento é muito mais do que o possível. É, acima de tudo, um grande desafio, em face
dos efeitos do contexto internacional, em resultado da guerra da Rússia sobre a Ucrânia.
Protestos do Deputado do PCP João Dias.
Este é um Orçamento que, apesar do contexto, preserva e reforça rendimentos, preserva as medidas
vantajosas para os portugueses tomadas nos últimos anos, alarga muitas e introduz outras. É por isso
incompreensível que não haja uma única palavra relativamente ao quadro de guerra, um quadro provocador de
incertezas e de imensas exigências que, obviamente, se refletem no Orçamento.
A intervenção que proferiu é uma intervenção com demasiado «apontar de dedo» para quem há cerca de um
ano deu menos atenção aos trabalhadores e ao povo, a favor do calculismo eleitoral. Só que os trabalhadores
e o povo trocaram as voltas a VV. Ex.as…
O Sr. João Dias (PCP): — Ainda? Outra vez?!
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A Sr.ª Eurídice Pereira (PS): — … e escolheram, de facto, uma política patriótica, do socialismo democrático e progressista.
Esta escolha foi clara e, portanto, cabe ao Partido Socialista, através do Governo, na Assembleia da
República — ouvindo, como é evidente, porque estamos em democracia —, encontrar as melhores soluções
para as solicitações que se colocam. É para isso que os senhores também estão convocados e não podem fugir
desta convocação.
Estão convocados para não repetirem o erro de se recusarem a ir ao debate do Orçamento na especialidade
— agora com a diferença de que não está nas vossas mãos, mas ficava-vos bastante bem.
Dito isto, nesta linha, a pergunta que deixo é uma pergunta que já vos deveria ter sido feita, no meu entender,
há muito tempo: o PCP volta a optar pelo exacerbar da crítica a servir de biombo para não ir a jogo com os pés
assentes na terra?
Certo, para os portugueses, é que o Partido Socialista, no Governo e na Assembleia da República, não lhes
vai falhar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Eurídice Pereira, para quem começa a falar acusando os outros de serem previsíveis, digamos que a sua pergunta não surpreendeu
ninguém.
Risos de Deputados do PSD.
Ora, o que observamos, da parte de quem refere e qualifica este Orçamento como «mais do que possível»,
é que tudo é relativo e depende da perspetiva. Para os grandes grupos económicos, que passam a poder, sem
limite, reportar prejuízos fiscais e ganhar borlas fiscais como nunca ganharam, naturalmente que este
Orçamento é mais do que o possível!
Para os 9,7 mil milhões de euros de contratação externa a privados para o Serviço Nacional de Saúde, os
grupos económicos da doença de certeza que acham que este é um Orçamento mais do que o possível!
Mas para os trabalhadores, os reformados, os jovens, que vão perder poder de compra, como assumido pelo
próprio Governo neste mesmo debate, este Orçamento não é o possível, é o que torna uma vida ainda mais
impossível!
A Sr.ª Deputada, pelos vistos, já se esqueceu da aprovação do Orçamento para este ano de 2022. Não foi
há um ano nem há dois, foi em final de maio! Já havia guerra, já havia sanções, já tinha havido COVID e, nessa
altura, os senhores disseram e repetiram que a inflação era «conjuntural e transitória». Vai daí, aprovaram
aquela vergonha dos 0,9% de aumento!
E não ouviu o Sr. Primeiro-Ministro, ainda agora, reconhecer que «houve uma perda brutal de poder de
compra, agora sim»? Então, vai daí, e continuam a aumentar os salários e as pensões abaixo da inflação?! Até
os escalões do IRS são atualizados abaixo da inflação! E vem dizer que este é um «Orçamento mais do que o
possível»?!
Tenha prudência — recomendo eu — quando fala em calculismo político sobre o que se passou há um ano,
porque bem nos lembramos que no dia seguinte ao Presidente da República ter dito que se não houvesse
Orçamento haveria eleições, deixou de haver resposta por parte do Governo a qualquer proposta que o PCP
apresentasse!
O Sr. João Dias (PCP): — Essa é que é essa!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Aí deixou de haver conversa! Não tente reescrever a história, porque ainda nos lembramos bem!
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Aplausos do PCP.
Os senhores podem achar que valeu a pena ter maioria absoluta e fazer aquele calculismo político, mas a
questão que se coloca é que as medidas que os senhores propagandeiam neste Orçamento nem alteram, nem
disfarçam o rumo de empobrecimento da imensa maioria dos portugueses, enquanto alguns continuam a
ganhar, amealhando milhões de lucros e ganhando ainda mais com este Orçamento.
Portanto, quando a Sr.ª Deputada Eurídice Pereira diz que o PS não vai falhar para milhões de portugueses,
o PS já está a falhar e já falhou na vida concreta e diária que as pessoas estão a enfrentar.
Sr. Presidente, para terminar, não estando cá o auto, para se defender, não posso deixar de fazer um apelo
para que deixem o Jorge Palma em paz, porque, certamente, não tem culpa nenhuma dos disparates que aqui
são ditos e feitos.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Sá Pereira.
A Sr.ª Joana Sá Pereira (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Neste Orçamento do Estado, encontramos uma aposta clara de investimento num dos pilares mais importantes de um
Estado de direito democrático: a justiça.
Só uma justiça mais próxima dos cidadãos, mais eficiente e ao serviço dos direitos e do desenvolvimento
social concretiza uma das tarefas fundamentais do Estado, que é a garantia de efetivação dos direitos e das
liberdades fundamentais dos cidadãos.
O orçamento neste setor — o mais elevado dos últimos 13 anos — prevê um crescimento de cerca de 7%
face ao orçamentado para 2022, e procura responder a alguns desafios que se colocam.
O primeiro diz respeito ao fortalecimento da democracia e ao combate à corrupção. A saúde da nossa
democracia e a afirmação de um Estado transparente e justo exigem uma ação contínua. Não
instrumentalizamos o discurso do flagelo da corrupção para atacar a democracia e o Estado de direito. A
corrupção combate-se, continuando a melhorar e a aperfeiçoar os instrumentos que já existem, tal como o Grupo
Parlamentar do PS tem vindo a fazer.
Aplausos do PS.
Saudamos, por isso, o reforço que encontramos nesta proposta de orçamento para a investigação criminal.
As despesas com os serviços integrados da Polícia Judiciária aumentam cerca de 24% e os investimentos em
projetos da PJ passam de cerca 20 milhões para 33 milhões de euros, o que representa um aumento de 67%,
face a 2022.
São estes números que nos permitem concretizar as medidas previstas de reforço da capacidade da
investigação da PJ; o novo plano plurianual de recrutamento de pessoal para as carreiras da PJ, que, até 2026,
prevê a entrada gradual de 1100 efetivos; a aplicação do novo regime geral de prevenção da corrupção e,
também, a concretização do Mecanismo Nacional Anticorrupção. Continuamos, por isso, a avançar.
O segundo desafio é o reforço da modernização do sistema de justiça.
O recurso às novas tecnologias, designadamente nos tribunais e nos registos, e a simplificação de
procedimentos, tem-se revelado absolutamente central. Talvez já poucos se recordem das filas e das
deslocações que os cidadãos tinham de fazer para renovar o cartão de cidadão, pedir certidões, fazer registos,
etc.
A verdadeira reforma digital na justiça, que mudou todo este paradigma, operada pelo Governo do Partido
Socialista, permitiu que, hoje, o registo de nascimento se faça online ou que a renovação do cartão de cidadão
se faça a partir de casa. Somos mesmo, nesta área, uma referência internacional. Vemos, por isso, como
importante para a melhoria contínua deste setor, o reforço em cerca de 40 milhões de euros da dotação para o
Instituto dos Registos e do Notariado. Continuamos, por isso, a avançar.
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O terceiro desafio remete para o combate sem tréguas à violência doméstica. A luta contra este flagelo deve
ser um desígnio coletivo e é uma prioridade que este grupo parlamentar escolheu para esta Legislatura.
Aplausos do PS.
Apesar do número de participações criminais ter diminuído 4%, face a 2020, a violência doméstica continua
a ser o crime mais participado em Portugal e isso preocupa-nos profundamente.
Mas o desafio que se coloca é o de procurar vias alternativas à resposta penal, que combata este chão
desigual que ainda pisamos, concedendo mais autonomia às vítimas. Sabemos que pessoas com mais
formação, mais rendimentos e mais auxílio do Estado social são pessoas mais independentes e, por isso, menos
vulneráveis.
Destacamos, por isso, a opção de destinar 22,5 milhões de euros para os programas de violência doméstica
e proteção à vítima, transversal a todas as áreas governativas, e que na justiça, em particular, mais que duplica,
face a 2021. A violência doméstica combate-se com ações concretas e é isso que estamos a fazer. Continuamos,
por isso, a avançar.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, continuamos a ser um dos países mais seguros e mais pacíficos do
mundo.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Isso é verdade!
A Sr.ª Joana Sá Pereira (PS): — Como escreveu Eduardo Lourenço, «mais importante que o destino é a viagem». Estamos mesmo a melhorar a vida das pessoas e esse é o melhor farol para continuarmos a fazer
este caminho permanentemente inacabado.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — A Sr.ª Deputada tem um pedido de esclarecimento. Para formulá-lo, dou a palavra à Sr.ª Deputada Paula Cardoso, do PSD.
A Sr.ª Paula Cardoso (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e restantes Membros do Governo, Sr.ª Deputada Joana Sá Pereira, depois de a ouvirmos, já que se falou tanto em músicos, apetecia-me citar um outro,
para não ser sempre o mesmo: o que nos mostrou foi o bonito lado da justiça, mas falta mostrar o «lado lunar»,
que Rui Veloso tão bem apregoa, uma vez que o lado lunar não foi aqui trazido.
Vou-lhe explicar qual é o lado lunar: é a dificuldade que os portugueses têm no acesso ao direito. É, também,
a morosidade e o preço das taxas e das custas judiciais. O lado lunar é a pendência nos tribunais administrativos
e fiscais, que têm os prazos que toda a gente conhece. Estes assuntos, a Sr.ª Deputada não trouxe aqui.
Claro que sabemos que há um incremento, por força do PRR, na informatização e na renovação da
componente informática da justiça, que bem era necessária. Mas o Orçamento também prevê uma revisão do
Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado. Perguntamo-nos para que efeito? Para aumentar as
taxas, pagas pelos portugueses, no notariado e nos registos predial e comercial. O Orçamento prevê um
aumento de 11,2% para o notariado, 15,2% para o registo predial e 11,6% para o registo comercial.
Sr.ª Deputada, isto significa que, na generalidade, o cidadão português vai pagar, por estes serviços, uma
média de mais 10% do que pagou até agora.
Se isto são medidas para ajudar o cidadão a ter um efetivo acesso à justiça, como a Sr.ª Deputada aqui
apregoou, explique-me como é que, pagando mais, vai ter melhor acesso à justiça.
Lanço-lhe, ainda, outro desafio: o de rever, finalmente, o Estatuto dos Funcionários de Justiça, que está
calendarizado e prometido desde o Orçamento de 2020 e que é completamente esquecido neste Orçamento do
Estado, onde nem sequer se faz menção. Gostaria, se não se importa, de saber o que é que aconteceu ao
Estatuto dos Funcionários de Justiça e à sua revisão.
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Lanço-lhe, igualmente, um repto. O acesso à justiça e a justiça em Portugal são, de facto, um problema
gravíssimo. Os equipamentos de justiça estão degradadíssimos e, para além da falta de papel, chove e há
condições degradantes em muitos tribunais, do Minho ao Algarve.
Olhando para o cidadão e para a dificuldade que tem em aceder, hoje, à justiça — uma vez que o preço de
acesso é elevadíssimo e os portugueses que me estão a ouvir em casa sabem que o que eu estou a dizer é
verdade, que as custas judiciais e as taxas de justiça são elevadas —, vamos apresentar uma proposta, que
espero que a Sr.ª Deputada acompanhe, para baixar efetivamente as custas e as taxas judiciais, para os
cidadãos sentirem, no seu bolso, essa baixa.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Sá Pereira.
A Sr.ª Joana Sá Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Paula Cardoso, devo dizer que até tenho alguma compaixão pela intervenção que acabou de fazer.
Tenho alguma compaixão porque senti, verdadeiramente, quando fez a pergunta, o desconforto e a angústia
com que a fez, por duas razões muito claras: a primeira é por causa da herança do PSD em matéria de justiça.
Aplausos do PS.
Vamos falar da herança do PSD em matéria de justiça.
Hoje, felizmente, a escolha que temos à frente, com esta proposta de Orçamento, é sobre que tribunais
podemos reforçar. Na altura em que os senhores estavam no Governo, sabe qual era a escolha? Era a escolha
sobre que tribunais tínhamos de encerrar.
Felizmente, hoje, é diferente. O tempo é outro!
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Mais ainda, Sr.ª Deputada: todos nos lembramos que foi com o vosso Governo que aconteceu o maior caos
informático na história da justiça e como paralisou verdadeiramente o sistema de justiça.
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Foi com o Citius!
A Sr.ª Joana Sá Pereira (PS): — Portanto, Sr.ª Deputada, sobre justiça, devo confessar-lhe que o Grupo Parlamentar do PS não recebe lições do Grupo Parlamentar do PSD.
Protestos do PSD.
Há também uma outra razão para eu sentir compaixão pela angústia e o desconforto com que a Sr.ª Deputada
fez a sua intervenção. É que, a partir de amanhã, terá de explicar aos portugueses que esta proposta de
Orçamento é incómoda. Será difícil, percebo isso — aliás, hoje, durante este debate orçamental, o PSD passou
a maior parte do tempo a falar de outras coisas, de tudo menos sobre o Orçamento, e nós percebemos porquê
—, porque esta proposta é incómoda para quem vê a política do «quanto pior, melhor». Sobre isso, Sr.ª
Deputada, somos mesmo muito diferentes.
Protestos do PSD.
Porque é que eu senti — estava há pouco a dizê-lo — angústia e desconforto na sua intervenção? Porque a
Sr.ª Deputada vai ter de explicar aos portugueses porque é que vai votar contra este Orçamento. Vai ter de
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explicar porque é que vai votar contra o aumento dos recursos humanos da Polícia Judiciária, vai ter de explicar
porque é que vai votar contra o aumento dos apoios para as vítimas de violência doméstica.
Protestos do PSD.
Quando, ainda há pouco, falava das condições degradantes dos edifícios do Ministério da Justiça, a Sr.ª
Deputada vai ter de explicar, agora, porque é que, juntamente com o seu grupo parlamentar, se prepara para
votar contra um Orçamento que tem 45 milhões de euros para o financiamento de obras no parque do Ministério
da Justiça.
Aplausos do PS.
Sobre tudo isto, Sr.ª Deputada, devo dizer-lhe uma coisa: acho que o seu grupo parlamentar tem, de facto,
um desafio muito complexo, ou seja, no meio disto tudo, tem de explicar como é que os portugueses podem
confiar no PSD para, um dia, governar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do PAN.
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-Ministro: Muito se ouviu falar, aqui, de música, mas acho que, a este tempo, os
portugueses já estão fartos que lhes deem cantigas e que se fale em contas certas.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Cantigas de amigo!
A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Na verdade, quando as famílias acabam por ser deixadas para trás, as contas estão cada vez menos certas e a aumentar de dia para dia, seja no cabaz de alimentação, seja no preço
da eletricidade, seja nas prestações do crédito à habitação, ou até em matérias de extrema vulnerabilidade e
pobreza, quando vemos os projetos Housing First desaparecerem do texto do Orçamento.
Para as famílias, este Orçamento aposta no conservadorismo fiscal e em golpes de magia, por exemplo, em
matéria de IRS, quando dá com uma mão, em 2023, o que vai tirar com a outra mão, em 2024.
É preciso mais, é preciso muito mais: precisamos de baixar o IRS da classe média, ter um IVA zero no cabaz
alimentar essencial, alargar a tarifa social da energia e do gás natural, baixar os passes sociais, devolver, via
IRS, parte dos juros pagos no crédito à habitação.
Por outro lado, o ambiente também fica para trás e as contas só estão mesmo certas para as grandes
empresas poluentes. Enquanto o relógio do clima se aproxima, a passos largos, do ponto de não retorno, temos
25 milhões de euros de isenção de ISP (imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos) para as grandes
empresas poluidoras, incentivos fiscais ao uso de combustíveis fósseis, em alguns casos com um custo de 40
milhões de euros, e, ainda, um regime fiscal de dedução de prejuízos, que trata de igual modo uma grande
poluidora — como a EDP ou a Galp — e pequenas ou médias empresas que tenham boas práticas ambientais.
Sr. Primeiro-Ministro, somam-se, ainda, os impactos da seca, de norte a sul do País. Ao invés de medidas
que promovam a eficiência hídrica, ainda vemos, neste caso, a aposta no regadio, ao arrepio da sustentabilidade
ambiental ou, imagine-se, a promoção da compra de água.
É preciso mais, precisamos de começar, desde logo, por acabar com as borlas fiscais às grandes poluidoras,
apostar na reforma da floresta, na agricultura sustentável, na transição energética, a partir, também, das
energias renováveis, e, acima de tudo, na mobilidade suave e na economia verde.
Para trás ficam ainda, infelizmente, os animais. Enquanto para o baronato da caça e para o lóbi da
tauromaquia as contas estão sempre certas e o Governo não perde tempo a atribuir apoios, já para a proteção
animal as contas nunca se acertam.
Precisamos de mais porque vemos neste Orçamento os apoios à proteção animal aumentarem apenas
1,25%, um valor bem distante da inflação atual, vemos descer a verba atribuída aos centros de recolha oficial,
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vemos desaparecer os hospitais veterinários públicos e, mais, não vemos uma redução do IVA para a
alimentação veterinária ou os cuidados médico-veterinários, quando para a pecuária já houve esse cuidado.
Sr.as e Srs. Deputados, este Orçamento tem de ser diferente, tem de ser um Orçamento que dê resposta às
famílias, mas que lance também as bases para uma reforma estrutural.
O Sr. Primeiro-Ministro disse há pouco que está disponível para se encontrar a meio caminho, em sede de
especialidade. Aquilo que lhe pergunto é se está disponível para que os seus ministros e a sua bancada
parlamentar não venham, depois, mais uma vez, fazer tábua rasa daquilo que é a «palavra dada, palavra
honrada» e reverter medidas negociadas no Orçamento do Estado.
O Sr. Presidente: — Para a antepenúltima intervenção desta sessão, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe… O Sr. Deputado Eurico Brilhante Dias está a pedir a palavra para que efeito?
O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Sr. Presidente, penso que tínhamos uma inscrição para um pedido de esclarecimento à Sr.ª Deputada do PAN, que iria ser formulado pelo Sr. Deputado Ivan Gonçalves.
O Sr. Presidente: — Os senhores tinham, mas a Mesa não. Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Ivan Gonçalves, para formular o pedido de esclarecimento.
O Sr. Ivan Gonçalves (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, não citarei nenhum cantor, mas quero dizer-lhe que partilhamos um conjunto de valores e
preocupações que entendo serem civilizacionais.
Essas preocupações prendem-se com a sustentabilidade ambiental, com a necessidade de encontrar
modelos de crescimento que não ponham em causa as gerações futuras, com os efeitos das alterações das
alterações climáticas ou com a procura de soluções para energias alternativas e limpas, com o bem-estar animal
— e já abandonámos a conceção retrógrada segundo a qual os animais eram considerados coisas —, com
outros temas, até mais transversais, como é o caso da promoção da igualdade de género e da garantia de que
as mulheres ocupem na sociedade um lugar que é seu por direito e de que tenham as mesmas oportunidades
que os homens, e partilhamos muitas outras preocupações.
Portanto, parece-nos que há um caminho comum, que tem vindo a ser trilhado, e que pode ser trilhado, entre
o Partido Socialista, o seu Governo, e o PAN. Recordo-me da intervenção que a Sr.ª Deputada fez da tribuna,
há mais ou menos um ano, aquando do chumbo do Orçamento do Estado para 2022, apelando à
responsabilidade de todas as forças políticas naquele momento decisivo para o País. Recordo-me também de
que, quando os restantes partidos da oposição faltaram aos portugueses, no momento em que o País passava
pela maior crise de saúde pública dos últimos 100 anos, o PAN foi o partido político que esteve ao lado do
Governo do Partido Socialista e viabilizou o Orçamento, que acabou por ser chumbado, dando lugar às últimas
eleições legislativas.
Sr.ª Deputada, tendo em conta os desafios que também já nos colocou — e quero dizer-lhe que a bancada
do Partido Socialista não fará deles tábua rasa, parecendo-nos importante que, em sede de especialidade,
possamos chegar a esses mesmos entendimentos —, aquilo que faço é devolver-lhe a pergunta no sentido de
saber se, da sua parte, existe disponibilidade para que possamos continuar a ter o PAN como partido que está
ao lado não só deste Orçamento, mas, fundamentalmente, ao lado dos portugueses e da resolução dos seus
problemas do dia a dia.
Aplausos do PS.
O Sr. Paulo Rios de Oliveira (PSD): — Foi fofinho, foi!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, que me vai permitir que lhe lembre que, neste momento, só tem disponíveis, no total, para hoje e amanhã, 2 minutos e 14 segundos.
Faça favor, Sr.ª Deputada.
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A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, em função da escassez de tempo, limito-me a responder agradecendo a pergunta do Sr. Deputado e dizendo que o PAN esteve e continuará a estar ao lado dos
portugueses, pelo que não se demitirá de fazer o trabalho que cabe a cada partido — incluindo, sobretudo, aos
da oposição — fazer em sede de especialidade.
O Sr. Presidente: — Então, agora, rumamos à antepenúltima intervenção, que cabe ao Sr. Deputado Filipe Melo, do Grupo Parlamentar do Chega.
Faça favor.
O Sr. Filipe Melo (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e demais Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Durante mais de 1 hora, o Sr. Primeiro-Ministro falou, nesta Casa, sobre o Orçamento. Esqueceu-
se foi de explicar a esta Câmara e aos portugueses por que razão, atravessando o País uma crise económica e
social gravíssima, decidiu atribuir mais de metade do Orçamento à gestão da dívida pública. Certamente, prefere
ver os portugueses na desgraça e ficar bem na fotografia que vai enviar para Bruxelas, mas já estamos
habituados a esse número mediático.
O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Muito bem!
O Sr. Filipe Melo (CH): — Relativamente ao orçamento de um ministério cujo valor vimos dobrar, o das Infraestruturas e da Habitação, gostava de lhe deixar duas breves palavras.
A habitação é um dos temas que mais preocupam os portugueses atualmente. Ora, o senhor, tendo dobrado
o orçamento desse Ministério para quase 7000 milhões, tem o descaramento de tirar apenas 2% — 2%! —
dessa verba para a habitação. Ou seja, dos quase 7000 milhões, o Sr. Primeiro-Ministro tira 126 milhões de
euros para a habitação.
Mas falar de infraestruturas e habitação e não falar da TAP seria desagradável, e o seu Ministro Pedro Nuno
Santos não iria gostar de ser esquecido por esta Câmara. É muitas vezes esquecido pelo Sr. Primeiro-Ministro,
mas não por esta Câmara!…
Então, vamos ver uma coisa: no Orçamento para 2022 ficou adjudicada mais uma tranche de 900 milhões
para a TAP. Ela não vem neste Orçamento, é verdade, mas estava no outro, e a fatura vai ser paga em 2023.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
O Sr. Filipe Melo (CH): — O Sr. Primeiro-Ministro, desse lugar, defendeu a TAP com unhas e dentes, mas, há duas semanas, desse mesmo lugar, veio dar o dito por não dito e declarou que a TAP é para vender, e já em
2023.
Aplausos do CH.
Sr. Primeiro-Ministro, é importante relembrar que, com a venda da TAP, vamos perder um ativo estratégico
muito importante para o País: o hub de Lisboa — sim, aquele que vai ser absorvido pelo de Madrid ou por outro
qualquer.
É importante perceber quanto é que a TAP contribui, em impostos diretos e indiretos, para o Estado. É
importante perceber o que é que vamos fazer aos mais de 10 000 trabalhadores da empresa e como é que
vamos fazer a ligação às nossas comunidades e à nossa diáspora. São estas as questões que importa
esclarecer, o que o senhor não fez no dia de hoje.
É importante perceber que 3000 milhões foram tirados aos portugueses para meter na TAP. É importante
perceber que o senhor vai vender a TAP com a empresa limpa e que quem a absorver vai ficar com ela 100%
operacional. Ponha os olhos na Alemanha, onde o Estado vendeu a Lufthansa com mais de 700 milhões de
euros de lucro.
Aplausos do CH.
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27 DE OUTUBRO DE 2022
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Concluo, Sr. Primeiro-Ministro, dizendo, em relação a este Orçamento e às contas certas do Governo, já que
querem tanto citar Jorge Palma nesta Casa, «deixa-me rir».
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — A penúltima intervenção cabe à Iniciativa Liberal, pelo que tem a palavra o Sr. Deputado Rui Rocha.
O Sr. Rui Rocha (IL): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e demais Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A governação socialista trata mal, em geral, o sucesso, o mérito e o trabalho e trata mal,
particularmente nos últimos tempos, os profissionais liberais e os trabalhadores independentes.
A Iniciativa Liberal tem quatro propostas para aliviar a vida dos trabalhadores independentes e dos
profissionais liberais: a primeira proposta consiste na redução da taxa de retenção de IRS de 25% para 20% —
uma taxa de 25% é uma barbaridade para aquele que é o rendimento médio dos profissionais liberais —; a
segunda proposta consiste na redução da taxa de contribuição para a segurança social de 21,4% para 20%; a
terceira proposta consiste na recuperação do regime simplificado,…
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Parece a Liz Truss!
O Sr. Rui Rocha (IL): — … que permitia que as despesas fossem automaticamente admitidas, sem justificação, para determinados rendimentos; e a última proposta consiste na isenção de contribuição para a
segurança social até 25 000 €, nos casos de acumulação de rendimentos de trabalho dependente e
independente.
Estas são as nossas propostas, Sr. Primeiro-Ministro. O senhor ri-se e tem tido atitudes inaceitáveis nos
últimos tempos. O senhor está descontrolado e alguém tem de lho dizer. A Iniciativa Liberal está a apresentar
propostas sérias e a seriedade das propostas merece a seriedade do seu comportamento. O senhor tem tido
comportamentos inqualificáveis e tem contribuído para a degradação do debate democrático — aliás, é das
pessoas que mais têm contribuído para essa degradação —,…
O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!
O Sr. Rui Rocha (IL): — … e alguém tem de lho dizer, Sr. Primeiro-Ministro. É particularmente grave que o senhor, como Primeiro-Ministro, com o seu comportamento, contribua para a degradação das instituições.
Aplausos da IL.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção em nome do Grupo Parlamentar do Chega, o Sr. Deputado Pedro Pessanha.
O Sr. Pedro Pessanha (CH): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e demais Membros do Governo — que cumprimento —, Sr.as e Srs. Deputados: Apesar do conflito que estamos a viver na Europa e da ameaça real
aos Estados europeus por parte da Rússia, verificamos que este Orçamento do Estado se mantém praticamente
inalterado relativamente ao anterior. E não me venha dizer que cresceu 8%, porque a inflação elimina qualquer
ganho nesse sentido.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Exatamente!
O Sr. Pedro Pessanha (CH): — A pergunta que lhe faço é a seguinte: como é que isto é possível? Com a ameaça real que a Europa enfrenta, com as nossas terríveis carências a todos os níveis — que são transversais
aos três ramos das Forças Armadas —, como podemos nós deixar tudo na mesma?
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
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I SÉRIE — NÚMERO 54
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O Sr. Pedro Pessanha (CH): — Portugal continua afastado do objetivo assumido perante a NATO de atingir os 2% do PIB no investimento em defesa. O que gostaríamos de saber, Sr. Primeiro-Ministro, é qual a razão
para esta rutura do compromisso com a NATO e quando é que iremos alcançar esta meta, se é que algum dia
isso irá acontecer.
O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!
O Sr. Pedro Pessanha (CH): — Para terminar, são do conhecimento público diversas situações gravíssimas dentro das Forças Armadas, que suscitam grandes preocupações. Estamos a falar da falta de recursos
humanos, do calvário dos deficientes das Forças Armadas, nomeadamente daqueles que precisam de próteses,
da degradação de infraestruturas militares, equipamentos, etc., e podíamos continuar aqui a tarde toda. O que
gostaríamos de saber é quando é que estas situações irão ficar sanadas de uma vez por todas, porque
claramente ainda não será com este Orçamento do Estado que iremos conseguir resolver todos estes
problemas.
Aplausos do CH.
O Sr. Presidente: — Assim chegamos ao fim da nossa sessão de hoje. A sessão de amanhã começará às 10 horas e terá a mesma ordem do dia, finda a qual procederemos a votações regimentais.
A Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha tem ainda um anúncio a fazer à Câmara. Faça favor.
A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, informo que o Sr. Deputado Rui Tavares, do Livre, seguiu o Plenário por videoconferência.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado. Muito boa noite e até amanhã.
Está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 4 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.