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Quinta-feira, 20 de abril de 2023 I Série — Número 115

XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)

REUNIÃOPLENÁRIADE19DEABRILDE 2023

Presidente: Ex.ma Sr.ª Edite Fátima Santos Marreiros Estrela

Secretárias: Ex.mas Sr.as Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Lina Maria Cardoso Lopes Palmira Maciel Fernandes da Costa Joana Isabel Martins Rigueiro de Sá Pereira

S U M Á R I O

A Presidente (Edite Estrela) declarou aberta a sessão às

15 horas e 5 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa da Proposta de Lei n.º

73/XV/1.ª, dos Projetos de Resolução n.os 628 e 629/XV/1.ª e dos Projetos de Lei n.os 716 a 732/XV/1.ª

Ao abrigo do artigo 74.º do Regimento, procedeu-se a um debate de atualidade, requerido pelo PCP, sobre o tema «A

situação da ferrovia nacional». Depois de o Deputado Bruno Dias (PCP) e o Ministro das Infraestruturas (João Galamba) terem aberto o debate, usaram da palavra, a diverso título, os Deputados Pedro Coimbra e José Pedro Ferreira (PS), António Topa Gomes (PSD), Filipe Melo (CH), Rodrigo Saraiva (IL), Duarte Alves (PCP), Isabel Pires (BE), Inês de Sousa Real (PAN), Rui Tavares (L), Fátima Correia Pinto e

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José Carlos Barbosa (PS), Jorge Salgueiro Mendes e Carla Madureira (PSD), Pedro Pinto (CH) e João Dias (PCP). No encerramento do debate intervieram o Secretário de Estado das Infraestruturas (Frederico Francisco) e a Deputada Paula Santos (PCP).

Foram apreciados, conjuntamente, na generalidade, a Proposta de Lei n.º 39/XV/1.ª (GOV) — Clarifica a intervenção dos municípios nos procedimentos de construção, ampliação ou modificação de um aeródromo e o Projeto de Lei n.º 704/XV/1.ª (CH) — Altera o Decreto-Lei n.º 186/2007, de 10 de maio, que fixa as condições de construção, certificação e exploração dos aeródromos civis nacionais. Intervieram, a diverso título, além do Ministro das Infraestruturas (João Galamba), os Deputados Inês de Sousa Real (PAN), André Ventura (CH), André Pinotes Batista (PS), João Barbosa de Melo (PSD), Rui Tavares (L), Joana Mortágua (BE), Paula Santos (PCP) e Carlos Guimarães Pinto (IL).

Procedeu-se ao debate conjunto, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 72/XV/1.ª (BE) — Reforça a proteção da orientação sexual, da identidade e expressão de género e das características sexuais (quinquagésima quinta alteração ao Código Penal), 359/XV/1.ª (BE) — Reforço da garantia de exercício do direito à autodeterminação da identidade de género, da expressão de género e do direito à proteção das características sexuais no âmbito escolar, 21/XV/1.ª (PAN) — Procede à primeira alteração à Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, que estabelece o direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e o direito à

proteção das características sexuais de cada pessoa, e à aprovação da respetiva regulamentação, 209/XV/1.ª (L) — Proibição e criminalização das «práticas de conversão», que visam a repressão da orientação sexual, da identidade de género ou da expressão de género, 332/XV/1.ª (PS) — Estabelece o quadro para a emissão das medidas administrativas que as escolas devem adotar para efeitos da implementação da Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, 699/XV/1.ª (PAN) — Prevê a criminalização de práticas com vista à alteração, limitação ou repressão da orientação sexual, da identidade ou expressão de género, e promove o estudo destas práticas em Portugal e a garantia de mecanismos de apoio e resposta, 705/XV/1.ª (CH) — Reforça a proteção e privacidade das crianças e jovens nos espaços de intimidade em contexto escolar e 707/XV/1.ª (PS) — Proíbe práticas atentatórias contra pessoas LGBT+ através das denominadas «terapias de conversão sexual». Usaram da palavra, a diverso título, os Deputados Joana Mortágua (BE), Inês de Sousa Real (PAN), Rui Tavares (L), Isabel Alves Moreira e Miguel dos Santos Rodrigues (PS), Rita Matias (CH), Lina Lopes (PSD), Carla Castro (IL), Alma Rivera (PCP) e Joana Cordeiro (IL).

Deu-se conta da entrada na Mesa das Propostas de Lei n.os 71 e 72/XV/1.ª, dos Projetos de Lei n.os 714 e 715/XV/1.ª e dos Projetos de Resolução n.os 624 a 627/XV/1.ª

O Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 44 minutos.

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A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Já temos quórum, por isso vamos dar início aos nossos trabalhos.

Eram 15 horas e 5 minutos.

Cumprimento as Sr.as e os Srs. Deputados, as Sr.as e os Srs. Funcionários, as Sr.as e os Srs. Jornalistas e os

Srs. Agentes da autoridade, pedindo-lhes que abram as portas das galerias ao público. Muito obrigada.

Pausa.

Antes de entrarmos na nossa ordem do dia, dou à palavra à Sr.ª Secretária da Mesa Maria da Luz Rosinha,

para ler o expediente.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, deu entrada na Mesa, e foi

admitida pelo Sr. Presidente, a Proposta de Lei n.º 73/XV/1.ª (GOV) — Aprova as Grandes Opções para 2023-

2026, que baixa à 5.ª Comissão.

Deram ainda entrada na Mesa os Projetos de Resolução n.os 628/XV/1.ª (PSD), que baixa à 1.ª Comissão, e

629/XV/1.ª (CH), que baixa à 3.ª Comissão.

Refiro, de seguida, os Projetos de Lei n.os 716/XV/1.ª (BE), que baixa à 10.ª Comissão, 717/XV/1.ª (PCP),

que baixa à 12.ª Comissão, 718/XV/1.ª (BE), que baixa à 5.ª Comissão, 719/XV/1.ª (L), que baixa à 1.ª Comissão,

720/XV/1.ª (L), que baixa à 3.ª Comissão, em conexão com a 6.ª, 721/XV/1.ª (L), que baixa à 5.ª Comissão,

722/XV/1.ª (PAN), que baixa à 3.ª Comissão, 723/XV/1.ª (PAN), que baixa à 5.ª Comissão, 724/XV/1.ª (PAN),

que baixa à 1.ª Comissão, 725/XV/1.ª (PAN), que baixa à 12.ª Comissão, 726/XV/1.ª (PAN), que baixa à 10.ª

Comissão, 727/XV/1.ª (PAN), que baixa à 5.ª Comissão, 728/XV/1.ª (CH), que baixa à 1.ª Comissão, 729/XV/1.ª

(CH), que baixa à 5.ª Comissão, 730/XV/1.ª (CH), que baixa à 10.ª Comissão, 731/XV/1.ª (BE), que baixa à 1.ª

Comissão, e 732/XV/1.ª (CH), que baixa à 1.ª Comissão.

É tudo. Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Vamos, então, entrar na nossa ordem do dia.

O primeiro ponto será um debate de atualidade, requerido pelo PCP, sobre «A situação da ferrovia nacional».

Pausa.

Vamos esperar uns minutos porque, daqui de cima, não conseguíamos ver que ainda não estavam os

representantes do Governo para este debate. Vamos esperar uns momentos.

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Sr.ª Presidente, o Governo vem de comboio?!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — O comboio do Governo foi suprimido!

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — É que a CP está em greve!

Pausa.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Cumprimento o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Rui Rocha (IL): — Estiveram numa reunião secreta e atrasaram-se!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Estiveram numa reunião de preparação!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Vamos, então, dar início ao debate de atualidade, requerido pelo PCP,

sobre a situação da ferrovia nacional.

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Para introduzir este debate, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, do Grupo Parlamentar do PCP. Faça

favor, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo:

Teoricamente, há hoje um amplo consenso sobre a importância da ferrovia, e dizemos que há hoje um amplo

consenso, porque não esquecemos os anos em que PS e PSD alternavam alegremente na destruição da ferrovia

nacional, no encerramento de linhas, na pulverização da CP, na destruição da SOREFAME (Sociedades

Reunidas de Fabricações Metálicas), na montagem de PPP (parcerias público-privadas) que exauriram os

recursos públicos e na liberalização da ferrovia, a mando dos pacotes ferroviários da União Europeia.

Mas mesmo agora, em que, na teoria, existe um consenso sobre a necessidade de investir na ferrovia, na

prática os investimentos arrastam-se, os concursos marcam passo, os financiamentos e os processos de

recrutamento são bloqueados pelo Governo e a ferrovia nacional continua a degradar-se em vez de responder

às necessidades do País.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — É verdade!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sucedem-se atrasos, problemas e incidentes nas intervenções em curso na rede

ferroviária nacional, a suscitar preocupações e perplexidades sobre as opções que estão a ser seguidas. São

inúmeras as situações de comboios suprimidos por falta de pessoal ou por falha de material circulante.

Nas oficinas, chega a haver situações aflitivas. Algumas seriam até caricatas se não fossem tão graves. Não

há peças e é preciso autorização para as adquirir; depois, vem a peça e falta pessoal para o trabalho. Em

Guifões, há pouco tempo, estavam compradas todas as rampas de acesso para cadeiras de rodas e a sua

instalação continuava em suspenso, porque a prioridade era, naturalmente, a instalação dos rodados nos

comboios.

As estações estão cada vez mais desguarnecidas, sem trabalhadores, sem informação afixada ou antecipada

sobre a entrada de comboios. Muitos dos problemas que existem hoje na operação ferroviária poderiam ser

evitados se não houvesse uma separação entre CP (Comboios de Portugal) e IP (Infraestruturas de Portugal,

SA). Mas o Governo recusou-se sempre, e continua a recusar-se, a reverter a fusão da REFER (Rede Ferroviária

Nacional) com a EP (Estradas de Portugal).

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Muito bem!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É fundamental reconstruir a REFER, ligá-la à CP e reforçar a sua capacidade

operacional na área de projeto, de fiscalização, de manutenção e até de construção.

A pergunta continua a colocar-se de forma incontornável: como é possível desligar, desta forma, a roda e o

carril? De que serve eletrificar uma linha sem adquirir o material circulante elétrico para nela circular e para que

o aumento e a modernização da oferta façam crescer a procura?

Mas essa descoordenação continua a prejudicar a ferrovia nacional. Está anunciado um ambicioso plano de

investimentos na ferrovia, mas, por exemplo, apenas 15 % do Ferrovia 2020 está concluído, dois anos depois

da data da sua previsível conclusão total.

O derrapar do investimento público foi uma estratégia permanente. Anúncios e promessas sistemáticas de

milhões que são repetidos uma e outra vez, até que se dá o anúncio do projeto da obra, o anúncio do caderno

de encargos, o anúncio do lançamento do concurso, o anúncio do vencedor do concurso, a inauguração da

primeira pedra, a inauguração do primeiro troço, a inauguração do segundo troço, até à eventual inauguração

final. Uma estratégia propagandística de criar e gerir expetativas e, ao mesmo tempo, acumular esses milhões

anunciados, mas não aplicados, para ir reduzindo o défice à custa da ferrovia.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Exatamente!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Na Linha do Norte, principal eixo ferroviário do País, ocorreram no início deste

ano quatro abatimentos em três semanas. É uma situação que é indissociável do sistemático recurso à

subcontratação, aos concursos em que se contrata pelo preço mais baixo, em que até a fiscalização é feita em

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outsourcing, em que a competência técnica na operação ferroviária é gradualmente substituída por uma precária

gestão de contratos à moda da IP, à moda liberal.

Por coincidência, no dia em que estava marcado este debate, foi anunciado nos jornais que a CP obteve um

resultado líquido positivo em 2022. O resultado das empresas públicas de transportes é sempre o reflexo do seu

modelo de financiamento. Nos anos em que o Estado as subfinancia, elas têm prejuízo e acumulam dívida,

como aconteceu com a CP ao longo de demasiados anos. Quando estas são devidamente financiadas, obtêm

resultados operacionais equilibrados.

Ora, perante esta perspetiva, ganha mais força a exigência de medidas que o PCP defende há muitos anos,

como sejam a resposta urgente às carências gritantes de pessoal em todas as áreas e o investimento nas

oficinas e no reforço da oferta. Desde logo, este resultado vem evidenciar a justeza e a importância de resolver

o problema financeiro de fundo, que não foi criado pela CP, mas pelos sucessivos Governos. É que o

saneamento financeiro da CP, retirando da CP a dívida que o Estado nela parqueou, foi uma medida que o

Governo PS prometia solenemente na véspera das últimas eleições, mas que continua por concretizar.

Só com uma CP una, pública e nacional será possível dinamizar uma política de promoção do transporte

ferroviário, incluindo na vertente de construção nacional de material circulante e da sua articulação com o

equilíbrio territorial e o desenvolvimento do País.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, não é possível ter ferrovia sem

ferroviários. Em Portugal, faltam ferroviários na operação, na manutenção, na fiscalização, no projeto e na

construção. Falta preparar a saída de muitos ferroviários que se aproximam da reforma e têm de transmitir o

seu saber. Falta formar, motivar e valorizar os ferroviários, desde logo valorizar a carreira do ponto de vista

remuneratório, acabando com as políticas de congelamento ou redução salarial, que estão a degradar as

remunerações reais de um vasto conjunto de trabalhadores e técnicos altamente especializados.

Segundo dados da própria CP, 42,3 % dos trabalhadores da empresa ganham até 960 €. Mais de 82 %

recebem menos de 1250 €. As remunerações dos ferroviários estão, na prática, congeladas há quase 15 anos.

Fala-se muito nas greves, mas fala-se pouco nesta realidade, que é a que leva os ferroviários à luta. Sem

esquecer os muitos milhares de trabalhadores, eles também ferroviários, que foram empurrados para

prestadores de serviços, na limpeza, na vigilância, na manutenção e nos bares dos comboios, cuja justa luta

daqui saudamos e cuja integração na CP se coloca como exigência que o Governo não pode ignorar: a ferrovia

de que Portugal precisa tem de assentar na criação de emprego de qualidade.

Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Isto não pode continuar assim e não tem de ser assim. Não estamos

condenados a esta degradação. É possível, é urgente, é indispensável uma política alternativa que defenda a

ferrovia, que defenda o interesse das populações e o interesse do País. É disso que iremos tratar neste debate

que o PCP convocou.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para intervir na abertura deste debate, por parte do Governo, tem a

palavra o Sr. Ministro das Infraestruturas, João Galamba.

O Sr. Ministro das Infraestruturas (João Galamba): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O

Parlamento debate, hoje, pela terceira vez em poucas semanas, temas relacionados com o estado da ferrovia

em Portugal.

O simples facto de a ferrovia ser, hoje, um tema de atualidade política não é alheio à centralidade que o

Governo tem dado a este setor tão importante para a vida das pessoas e para o nosso futuro coletivo.

Começo, por isso, por saudar o facto de todos, ou quase todos, os partidos estarem, hoje, a dar atenção ao

estado da ferrovia em Portugal, porque, no passado e ao longo das últimas décadas, nem sempre foi assim. De

facto, ninguém pode negar que foi com este Governo que a ferrovia regressou ao centro do debate político.

Risos do Deputado do CH André Ventura.

É claro que alguns dos resultados demoram a aparecer. É o que acontece quando se fazem projetos. Para

fazer obras é preciso, antes, fazer projetos. E é importante dizer que, quando iniciámos o Programa Ferrovia

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2020, não havia praticamente nenhum desses projetos a lançar. Para ter novos comboios é preciso encomendá-

los, é preciso preparar os cadernos de encargos, é preciso lançar os concursos e, depois, é preciso esperar que

eles sejam desenvolvidos, produzidos e certificados.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — Oito anos!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Mas foi precisamente por sabermos que todas estas coisas demoram

tempo que tomámos medidas que, não sendo suficientes, têm um impacto mais rápido e muito significativo. Falo

da reabertura das oficinas de Guifões, da recuperação de material circulante ou da contratação de novos

quadros na CP e na IP.

Foi com estas medidas que conseguimos estabilizar o serviço ferroviário, reduzir as supressões e acelerar o

ritmo a que conseguimos fazer obra na ferrovia. Repito, obra na ferrovia, uma novidade que já não se assistia

há algumas décadas. Só assim é que é possível, hoje, termos mais de 500 km de linhas ferroviárias em obras,

correspondendo a 1200 milhões de euros de obras em curso nas Linhas do Norte, da Beira Alta, do Oeste, de

Évora, de Cascais, de Sines e do Algarve.

Pela primeira vez, em muito tempo, estamos a inverter o ciclo de encerramento de linhas e de redução de

serviço. Aproveito para dar alguns exemplos: na Linha da Beira Baixa, entre a Covilhã e a Guarda, que se

encontrava encerrada desde 2010, concluímos as obras e reabrimos a Linha; Viana de Castelo, Valença e toda

a Linha do Minho têm hoje serviços diretos para Lisboa, servidos também por comboios confortáveis e

modernos; o Alto Alentejo estava sem nenhum serviço de passageiros na Linha do Leste e foi introduzido

primeiro um e, depois, um segundo comboio diário em cada sentido.

Já ouvi alguns queixarem-se de que o serviço é medíocre.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Medíocre? Medíocre é favor!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Seguramente, podemos melhorar muito este serviço, mas é

claramente melhor do que o serviço nulo que existia antes de o reiniciarmos e antes de o reforçarmos.

Aplausos do PS.

Sabemos que em vários pontos do território estamos longe de poder oferecer o serviço ferroviário de que o

País precisa. Mas é de inteira justiça reconhecer não só que o estamos, de facto, a melhorar, mas, também, que

isso representa uma inversão total e absoluta de ciclo, face aos anos e anos de declínio da ferrovia em Portugal.

Sr.as e Srs. Deputados, o Governo tem um compromisso com a recuperação do poder de compra dos

trabalhadores do setor público. No caso da Administração Pública, este compromisso está refletido no acordo

plurianual que foi alcançado e que prevê, durante a Legislatura, a recuperação total do poder de compra perdido

para a inflação. Este princípio orienta, com as devidas adaptações, a evolução dos salários em todo o setor

público empresarial e, naturalmente, abrange os trabalhadores das empresas públicas do setor ferroviário.

Este princípio de recuperação do poder de compra não fica fechado em percentagens de aumentos salariais

acordadas para cada ano, mas tem a capacidade de se adaptar à evolução dos números da inflação. E foi por

isso que o Governo já aprovou um aumento salarial adicional para a Administração Pública e que, em breve,

serão dadas orientações para reabrir negociações nas empresas públicas, uma vez que o aumento decidido

para a função pública — como, aliás, já tinha acontecido no passado — tem implicação direta na massa salarial

disponível para as negociações que ocorram e que vão ser reabertas, nomeadamente na CP e no setor

empresarial do Estado.

É neste quadro que o Governo e as empresas públicas mantêm um espírito de diálogo e de valorização

daqueles que diariamente asseguram que os comboios se mantêm a circular e sem os quais a ferrovia não terá

futuro.

Sr.as e Srs. Deputados, estes debates dão-nos mais alento para não desistir e para continuar a trabalhar.

Pode haver atrasos, mas não desistimos de nenhuma das obras que foi anunciada, até porque atrasos em obras

significa apenas, e só uma coisa: que há obras no terreno, coisa que, de facto, durante muito tempo não houve,

e não desvalorizemos esse facto.

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O Sr. André Ventura (CH): — É para bater palmas! Não batem palmas?!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Um país que não investe em ferrovia durante 20, 30 ou 40 anos perde

capacidades. Perde capacidades o Estado, perdem capacidades as empresas e, sim, estes projetos demoram.

Aplausos do PS.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Agora, batem!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Só os senhores, que nunca desenharam um projeto e nunca fizeram

nenhum projeto de ferrovia, é que têm a ousadia de criticar o Governo, que reiniciou este processo, por atrasos

ou demoras de obras que nunca realizaram, nunca planearam e nunca viriam a realizar, caso estivessem no

Governo.

Aplausos do PS.

A componente que falta no setor ferroviário ao serviço do País é precisamente a componente industrial, e foi,

por essa razão, que criámos o Centro de Competências Ferroviário. Foi por essa razão que começámos pela

recuperação das carruagens, usando 90 % de incorporação nacional — aquelas carruagens que alguns, num

espírito de deslumbramento algo parolo, dizem «ou é novo ou não vale de nada».

Todos estes passos convergem para que as nossas empresas, a nossa indústria e os seus trabalhadores

tenham a capacidade de fabricar comboios em Portugal, e nós, hoje, temos todas as razões para acreditar que

essa capacidade existe.

É, hoje, público que dois dos principais concorrentes ao concurso, que irá ser finalizado e ser adjudicado

muito brevemente, anunciaram, publicamente, que incluíram nas suas propostas uma dimensão industrial, para

além do fornecimento de comboios. É por essa razão que o Governo disse, e repete, que, na pior das hipóteses,

teremos de volta a indústria da ferrovia em Portugal, para além das oficinas já existentes, porque há mais do

que um concorrente com projetos apresentados e podem ter a certeza de que o que será escolhido será o mais

robusto e o mais sólido.

Portugal, portanto, poderá enfrentar o futuro industrial, nesta área, de uma forma completamente diferente

do que tinha feito no passado, nomeadamente, tendo-a — coisa que não tinha. E é por obra e graça deste

Governo e das iniciativas que este Governo tomou,…

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — … do modo como este Governo escolheu comprar comboios…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço-lhe que conclua, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Este Governo poderia ter escolhido comprar comboios. Este Governo

escolheu comprar comboios e dotar o Governo de capacidade industrial para os produzir no futuro, Srs.

Deputados, e é isso que estamos a construir.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Concluo, assim, Sr.as e Srs. Deputados, dando nota do empenho do

Governo em prosseguir, como é evidente, esta estratégia de recuperação e desenvolvimento do setor ferroviário,

cujo resultado continuaremos a ver no futuro próximo.

E o Governo acredita, também, que as medidas recentemente anunciadas e as discussões que temos

mantido com os sindicatos da CP, nomeadamente com o dos maquinistas, dão boas perspetivas de acabar

rapidamente com a greve e retomar o trabalho.

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Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Coimbra,

do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Pedro Coimbra (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, Sr. Ministro:

O ano de 2023 está a dar continuidade a um ambicioso programa de investimentos na requalificação e

modernização da nossa ferrovia nacional, que tem por base o programa Ferrovia 2020.

Num valor global superior a 2000 milhões de euros, o programa Ferrovia 2020 tem 367 milhões de euros em

obras já concluídas, 1225 milhões de euros em obras em curso, 164 milhões de euros de obras em concurso e,

ainda, 286 milhões de euros de obras a lançar nos próximos tempos.

Há, neste momento, um pouco por todo o País, importantes e relevantes investimentos em curso que vão

modernizar, de forma muito significativa, a nossa linha férrea. Por outro lado, o Governo está também a dar

continuidade à elaboração dos programas de investimento incluídos no PNI 2030 (Programa Nacional de

Investimentos 2030), com um investimento previsto de cerca de 8,8 mil milhões de euros, até 2030, em que 80

milhões de euros serão executados ainda este ano.

Também no material circulante, o investimento será muito significativo. Com a adjudicação de 117 novas

automotoras elétricas, no valor global de 819 milhões de euros — dos quais 81,9 milhões de euros também em

2023 — e, ainda, com o lançamento do concurso para a aquisição de 12 novos comboios de alta velocidade, no

valor de 336 milhões de euros.

Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Por tudo isto, há que sublinhar o

investimento privado anunciado para a construção de uma fábrica de comboios em Portugal, que só é possível

por estes investimentos terem sido lançados pelo Governo.

Hoje mesmo, ficámos também a saber que, pela primeira vez na sua história, a CP fecha um ano com

resultados positivos, pelo cumprimento do contrato de serviço público, é certo, mas também pelos ganhos de

gestão e de eficiência, do lado da despesa, com destaque para a fusão da EMEF (Empresa de Manutenção de

Equipamento Ferroviário) com a CP, gerando, assim, sinergias que resultaram nestes bons resultados.

É ainda de referir a abertura das oficinas de Guifões, que permitiu recuperar material circulante, que eliminou

o problema das supressões de comboios, aumentando o número de passageiros, bem como a devolução a

Espanha de material alugado à Renfe (Red Nacional de los Ferrocarriles Españoles), que foi substituído por

material português renovado e em perfeitas condições de qualidade e circulação.

Quando, em 2015, António Costa tomou posse, herdou uma ferrovia ao abandono. Hoje, em Portugal, está

em curso o maior investimento na ferrovia dos últimos 100 anos, e essa é uma realidade factual.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para intervir, também em nome da bancada do Grupo Parlamentar do

PS, tem a palavra o Sr. Deputado José Pedro Ferreira.

O Sr. José Pedro Ferreira (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O desinvestimento e a degradação

progressiva do caminho de ferro em Portugal foi uma realidade durante décadas, baseada numa visão errada

de desvalorização da ferrovia, em total contraciclo com as preocupações crescentes de estímulo à mobilidade

verde.

Todos temos memória, todos sabemos quem iniciou este desinvestimento. As recentes alterações na política

de transportes, estimulando o uso do transporte público, traduziram-se no maior investimento jamais realizado

na ferrovia, que permitirá a recuperação progressiva do atraso. No entanto, este atraso não ocorrerá de um dia

para o outro, face à extensão do investimento e à disponibilidade do equipamento.

O plano de recuperação traçado pelo Governo está em marcha, incluindo a modernização e a ampliação da

rede ferroviária nacional e a requisição e requalificação de material circulante.

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O plano prevê a recuperação de locomotivas, carruagens e automotoras, incluindo as conhecidas carruagens

compradas à Renfe. O processo de recuperação definido pelo Governo será menos oneroso, mais célere e

envolve a participação ativa da indústria nacional.

A oficina da CP de Guifões, já referenciada, está no epicentro desta renovação de material. Dados recentes

apontam para gastos três vezes menores para a recuperação de uma carruagem, comparativamente a países

como a Suíça e a Alemanha, que, recentemente, iniciaram processos semelhantes de remodelação, aquilo que

alguns por cá apelidam de «sucata».

O Sr. Bruno Nunes (CH): — Fala até às 4 horas!

O Sr. José Pedro Ferreira (PS): — A existência de mão de obra altamente qualificada formada em Portugal

— eletricistas, serralheiros, soldadores técnicos, eletromecânicos — e a aposta no mercado nacional para a

aquisição de peças,…

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — A Sr.ª Presidente está distraída!

O Sr. José Pedro Ferreira (PS): — … em alternativa à importação, constitui um passo importante na redução

de custos.

Aplausos do PS.

Os conversores de tensão, produzidos em Portugal, e a reabilitação dos estofos das carruagens, realizada

por empresas do centro do País, como a Solfaestofo, face à excelência do trabalho realizado, permitiram o

estabelecimento de novos contratos, com impacto bastante interessante a nível regional.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. Filipe Melo (CH): — Fala até às 4 horas!

O Sr. José Pedro Ferreira (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, estas iniciativas, as iniciativas

relacionadas com a abertura do concurso…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, tem mesmo de concluir. Já ultrapassou muito o seu tempo.

O Sr. Filipe Melo (CH): — Deixem falar o José Carlos Barbosa, que é o único que sabe alguma coisa disto!

O Sr. José Pedro Ferreira (PS): — Sr.ª Presidente, gostaria apenas de terminar dizendo que a isto se chama

«estímulo à economia nacional».

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Topa

Gomes, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. José Carlos Barbosa (PS): — Só sabem dizer mal!

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Ministros, Sr. Secretário

de Estado: Em 2015, o PS assumiu o Governo de Portugal, depois de uma saída limpa. Era, segundo o PS, o

fim da austeridade, o que permitia a retoma do investimento público, sobretudo em infraestruturas ferroviárias

prioritárias.

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Simultaneamente, na Europa e em Portugal, há um amplo consenso na necessidade de investimento no

transporte ferroviário, como um dos instrumentos mais eficazes para reduzir as emissões de gases de efeito de

estufa e atingir a neutralidade carbónica.

Por fim, visando o anterior objetivo, muitos dos fundos europeus são dirigidos para a ferrovia. Este Governo

usufruiu, e usufrui, de um volume de fundos europeus nunca antes visto, o que lhe permitiria apostar,

definitivamente, na ferrovia.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — É, portanto, um Governo com condições únicas, quer políticas quer

financeiras, para o investimento na ferrovia.

Perguntamos, pois: porque falha o Governo do PS, sistematicamente, no investimento na ferrovia?

Aplausos do PSD.

Olhemos então para o Ferrovia 2020. Sr. Ministro, se tivemos ousadia, foi a ousadia de acreditar nos

governantes do PS.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Erro!

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Em 2016, já em pleno Governo PS, prometia-se que o plano de

investimentos do Ferrovia 2020 previa a sua conclusão no final de 2021 e um total de investimentos de mais de

2000 milhões de euros.

Em fevereiro de 2019, o Ministro do Planeamento Pedro Marques, em plena campanha eleitoral, afirmava

que a taxa de execução do programa era de 40 %…

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — … e que, seguramente, em 2021, teríamos executado a totalidade.

Aplausos do PSD.

Pois, pasme-se: em 2021, dois anos depois das palavras do Sr. Ministro Pedro Marques, apenas executámos

28 %. Conseguimos regredir relativamente às palavras do Ministro Pedro Marques.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — A sério?!

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Não admira, pois, que o atraso geral seja de bem mais de dois anos,

que, no Corredor Internacional Sul, o atraso seja de mais de seis anos e que, no Algarve, seja um atraso de

quatro anos. Portanto, como podemos confiar neste Governo?

Se o Governo investiu, nestes seis anos, cerca de 600 milhões de euros, o que prometeu e não investiu foi

mais de 1500 milhões de euros.

Esta é a medida de falhanço do Governo PS. O que não fez foi 2,5 vezes aquilo que fez. É nisto que falha.

Aplausos do PSD.

E como estaria a nossa ferrovia se os 2,1 mil milhões de euros prometidos tivessem, efetivamente, sido

investidos? Ficará para outras núpcias.

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Mas falha também o Governo porque o défice de manutenção da ferrovia, importante para a segurança

ferroviária, se atrasa. Pela primeira vez, no último ano de que há registos, em 2020, não há redução do défice

de manutenção ferroviária. Temos cerca de 450 milhões de euros de défice de manutenção ferroviária.

Hoje, meus senhores, foi plantada uma notícia cómoda sobre os resultados da CP, num dia em que não

conhecemos ainda o relatório e contas da CP e, portanto, não nos podemos pronunciar sobre as notícias.

Mas não é só na execução física que falha o Governo. O Governo falha também na operação e na gestão

da CP. O que se espera de um serviço ferroviário é que seja fiável, previsível e eficiente. E o que é o nosso

serviço ferroviário? Fiável não é, como indicava a própria notícia hoje. No ano passado, foram suprimidos 11 000

comboios em Portugal.

O Sr. Jorge Paulo Oliveira (PSD): — O que é isso?!

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — O nosso índice de regularidade dos comboios é apenas de 97,5 %,

bem aquém do objetivo que a própria CP estabelece.

A Sr.ª Sónia Ramos (PSD): — Muito bem!

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Previsível também não é. Como demonstra o Relatório da Qualidade

de Serviço CP e Satisfação do Cliente, o índice de pontualidade é hoje de 87 %.

O Sr. Bruno Nunes (CH): — Não combinaram na reunião preparatória!

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Pasme-se: pior do que em 2015, o tal ano em que as coisas estavam

muito mal. Conseguimos tornar as coisas ainda piores.

Aplausos do PSD.

Eficiente também não é. Olhemos, por exemplo, para o comboio Porto-Lisboa. O Alfa Pendular demora hoje

quase 3 horas. O Intercidades demora 3 horas e 22 minutos. Demora hoje mais o Intercidades do que uma

viagem de autocarro e, por isso, crescem os passageiros do autocarro e não crescem, ou praticamente não

crescem, os passageiros do comboio.

Aplausos do PSD.

Estamos hoje pior do que há 28 anos, quando o PS começou a governar.

Com toda a necessidade de transporte público ferroviário, e atendendo à condição de empobrecimento a que

o PS nos trouxe, o número de passageiros transportados, em 2022, é praticamente igual ao de 2019, muito

residualmente superior.

Onde está, portanto, o incentivo ao transporte ferroviário do PS?

A novela dos contínuos anúncios do PS, dado o falhanço do Ferrovia 2020, fala agora de amanhãs que

cantam com o PRR (Plano de Recuperação e Resiliência), com o PNI 2030, do Plano Nacional Ferroviário,

quando ainda não vamos a meio da execução do plano Ferrovia 2020.

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Muito bem!

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Mas pode alguém acreditar na capacidade de realizar deste PS? Não,

meus senhores, não pode. E o PSD cá está para ser a alternativa.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Filipe Melo,

do Grupo Parlamentar do Chega.

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O Sr. Filipe Melo (CH): — Sr.ª Presidente em exercício, Sr.ª Ministra, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado,

Srs. Deputados: Ainda bem que a CP não funciona como o Sr. Ministro. A CP parte a horas, o Sr. Ministro

chegou com um atraso de 14 minutos, que prejudica todos os trabalhos da Assembleia.

Risos do Deputado do CH Pedro Pinto.

O Sr. Rui Rocha (IL): — A CP chega normalmente com atrasos! O Filipe não anda de comboio.

O Sr. Filipe Melo (CH): — Eu quero recordar o que disse o seu secretário de Estado, numa audição na

Comissão de Economia, e passo a citar: «Só há atraso, porque há obra».

Sr. Ministro, deixe-me dizer-lhe que só em Portugal é que assistimos a uma declaração destas, porque obra

há em todo o lado; em Portugal, há pouca, funciona mal, e o atraso é uma constância do seu Governo. Portanto,

essas declarações são infelizes…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

O Sr. Filipe Melo (CH): — … e, mais uma vez, dizem muito sobre o estado da ferrovia, deste Ministério e

deste Governo: atrasos constantes e nunca se chega a bom resultado.

Aplausos do CH.

Depois, deixe-me que lhe diga outra coisa, que também me parece importante. Quando nos referimos, nessa

mesma Comissão, à palavra «sucata», reforço — aliás, ainda vou mais longe — que o seu Ministério

engrandeceu tanto a compra por 150 000 €, mas não foi de sucata. Vocês deram 150 000 € por amianto, que

trazia umas carruagens de sucata por arrasto.

O Sr. José Carlos Barbosa (PS): — Ah!

O Sr. Filipe Melo (CH): — Portanto, vocês gastam 150 000 € em amianto, que traz sucata. E isso posso

mostrar-lhe com imagens que o comprovam.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Era melhor com números!

O Sr. Filipe Melo (CH): — Sr. Ministro, não me interrompa, ouça com atenção, para depois saber responder,

dentro do possível.

Depois, quanto às obras da alta velocidade, como o Sr. Ministro sabe, as obras já estiveram adjudicadas, e

depois foram canceladas, porque alguém que o senhor até conhece bem, chamado José Sócrates, levou este

País à bancarrota. E aí, já nesse ano, as obras ficaram suspensas. Portanto, mais uma vez, chegamos à

conclusão de que a alta velocidade, que vocês reclamam para vocês próprios, foram vocês que destruíram.

Foram vocês que não deixaram que se avançasse. Foi o ex-governante que o senhor conhece bem, José

Sócrates, que arruinou este País e também a alta velocidade.

Portanto, Sr. Ministro, antes de fazerem publicidade à alta velocidade, lembre-se de que foi um Governo

socialista que matou a alta velocidade, à nascença.

Por fim, e para que a sua bancada não fale tanto e tantas vezes e não faça uma bandeira da ferrovia, vou

dizer-lhe em que lugar Portugal está no último ranking apresentado pelo Boston Consulting Group.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — É verdade!

O Sr. Filipe Melo (CH): — Estamos em antepenúltimo, na Europa. Até na ferrovia temos de estar na cauda

da Europa! Estamos em tudo, e a ferrovia não podia ser exceção. Abaixo de nós temos apenas a Roménia e a

Bulgária. Todos os outros têm uma melhor rede ferroviária que a nossa.

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Sr. Ministro, isto não é para rir, isto é para o senhor se envergonhar e não para se rir.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Exatamente!

O Sr. Filipe Melo (CH): — A juntar a isto, as pessoas pagam um balúrdio por viagens de comboio e não têm

sequer um bar onde possam ir buscar uma água ou beber um café, porque até os bares tiveram de fechar.

E as greves que vocês fazem! O que é que o Governo faz para impedir isto?

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Nada!

O Sr. Filipe Melo (CH): — O que é que o Governo faz em relação a segurança? Quantas vezes já dissemos,

nesta Casa, que era obrigatório termos câmaras CCTV (closed-circuit television) dentro dos comboios? Não

existem. Vemos esfaqueamentos, vemos pessoas a saltar do comboio com o comboio em andamento, vemos

agressões, vemos maus-tratos. É isto que o PS quer para a ferrovia?

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Bem lembrado!

O Sr. Filipe Melo (CH): — Sr. Ministro, tal como em muita coisa, a ferrovia não é exceção, é o desastre do

Partido Socialista e, pior que tudo, é um desastre — mais um! — do Ministério das Infraestruturas, que continua

a ser gerido pelo senhor.

Aplausos do CH.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodrigo Saraiva,

do Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Começo

por dar os parabéns ao PCP, por fazer o agendamento deste debate sobre a ferrovia. É, de facto, um tema que

tem sido muito debatido nesta Casa, nos últimos tempos, e não, Sr. Ministro, não é porque o Governo decidiu

dar uma centralidade à ferrovia. Se estivesse tudo bem com a ferrovia, estes debates não estavam a existir, e

os debates estão a existir, porque não está tudo bem na ferrovia.

O Sr. Rui Rocha (IL): — Muito bem!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — E um desses debates foi um debate de urgência, até proposto e agendado

para esta Casa pela Iniciativa Liberal. Tivemos também um agendamento com propostas da Iniciativa Liberal.

E debatermos ferrovia é, de facto, muito amplo, e todos estes debates não serão suficientes, porque podemos

debater temas relativamente aos utentes, ao serviço, seja na sua qualidade seja no seu modelo, equipamentos,

infraestruturas, oficinas, trabalhadores, dos vários tipos de trabalhadores que existem. A Iniciativa Liberal já o

fez, já trouxe propostas a esta Casa, infelizmente chumbadas — e podemos recordar quem é que as chumbou,

além da maioria absoluta do PS —, mas hoje o Sr. Ministro também disse que era preciso haver projetos.

Eu acho que é mais do que isso: o que é preciso é capacidade de execução. Capacidade e condições!

O Sr. Rui Rocha (IL): — Muito bem!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Por isso, queria cingir esta minha primeira intervenção à questão da gestão e

execução do investimento público, que é, obviamente, necessário.

Para tal, vou comentar e partilhar convosco uma entrevista recente, que, mais do que uma entrevista, é um

autêntico tratado. É uma entrevista dada pelo Sr. Vice-Presidente da Infraestruturas de Portugal a um podcast

do Público, que tem como título Não estamos muito atrasados no Ferrovia 2020.

Vou começar com algumas citações, em que este rosto da Infraestruturas de Portugal, que é quem tem a

responsabilidade da gestão e execução do Ferrovia 2020, começa por se demarcar de quem, em 2016, anunciou

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ao País um Ferrovia 2020 impossível de concretizar em quatro anos, do qual só 18 % das obras estão

concluídas. Acrescenta que a IP propôs um calendário de execução totalmente desajustado.

Ele «sacode a água do capote», mas recorda, e bem, o Público de que este Vice-Presidente da

Infraestruturas de Portugal era, na altura, assessor do então Ministro das Infraestruturas, Pedro Marques.

Diz várias coisas e, depois — lá está, o PS no seu melhor! —, começa a dizer: «Face ao tempo que as obras

e os projetos estão a demorar, não estamos desajustados daquela que é a prática normal e a prática

internacional.» Portanto, aquele clássico do Partido Socialista do «está tudo bem».

Logo a seguir, fala das culpas, que nunca são do PS! Fala da troica, fala da pandemia, fala da guerra na

Ucrânia, fala da inflação…

O Sr. Rui Rocha (IL): — As alterações climáticas!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Tudo serve, menos assumir qualquer responsabilidade.

Mas, depois, de facto, o Sr. Vice-Presidente refere mais algumas razões, o que nos leva, então, para o

modelo de gestão e de execução, que é onde começamos a perceber porque é que estes planos têm as taxas

de execução que têm: diz que era preciso aprovação das tutelas, que eram duplas, e fala das obras que precisam

de estudo de impacto ambiental.

E lá está a questão: ainda antes de começar a tecer considerações quanto ao Programa Nacional de

Investimentos, onde diz que tem de haver uma aposta na ferrovia — muito bem —, refere que recorrerá às

parcerias público-privadas. Vou mesmo citar isto: «Porque foi graças às PPP rodoviárias que o País construiu,

em poucas décadas, milhares de quilómetros de autoestradas.» Este senhor quer mesmo que nos recordemos

das PPP rodoviárias feitas pelos Governos do Partido Socialista?! É, talvez, melhor não irmos por aí. Tudo isto

é preocupante.

Mas passemos à questão do modelo de gestão: a Infraestruturas de Portugal precisa de pedir autorização à

tutela das Infraestruturas e à tutela das Finanças. Perde meses e meses nisto para, depois, ainda ter de

coordenar coisas com o IMT (Instituto da Mobilidade e dos Transportes), com a APA (Agência Portuguesa do

Ambiente), com o LNEC (Laboratório Nacional de Engenharia Civil)…

O Sr. Rui Rocha (IL): — Tem de tirar senha!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — É tudo uma confusão!

Este Governo, que é conhecido, como também já comprovámos, como o campeão das task forces, dos

grupos de trabalho e das unidades de missão…

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

Como estava a dizer, este Governo, que é o campeão das task forces, não consegue criar as condições para

que, por exemplo, a Infraestruturas de Portugal tenha boas taxas de execução numa urgência consensual, que

é termos uma ferrovia, por exemplo, que ligue todas as capitais de distrito deste País.

Aplausos da IL.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves, do

Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A

concretização de muitos dos investimentos e contratações planeados na ferrovia tem esbarrado

sistematicamente no garrote das Finanças.

Esta é uma situação que se tem vindo a generalizar na Administração Pública — não é um exclusivo da

ferrovia — e são muitos os instrumentos utilizados para isto: as cativações; o atraso ou a não publicação dos

decretos-lei de execução orçamental; a imposição do visto prévio das Finanças.

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A verdade é que temos assistido a uma concentração das decisões sobre investimentos no Ministério das

Finanças, e a ferrovia não é exceção a essa realidade.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Esta constatação não serve para canalizar a responsabilidade no Ministro das

Finanças — neste ou nos anteriores — e muito menos para ilibar os restantes membros do Governo das

responsabilidades que têm nesta matéria, até porque esta concentração de poder nas Finanças é uma opção

política, que responsabiliza todo o Governo e que se insere na lógica de dar prioridade, acima de tudo, à redução

acelerada do défice e não aos investimentos de que o País precisa, em tantas áreas.

Como resultado desta política orçamental, em 2022, ficaram 1400 milhões de euros de investimento público

por executar. Que falta que fariam para tantos investimentos necessários, em todo o País!

Por exemplo, estivemos, na segunda-feira, no Entroncamento, onde verificámos muitas dessas necessidades

e onde seria preciso que este dinheiro fosse investido. Por exemplo: na requalificação da própria estação do

Entroncamento, que serve milhares de utentes, assim como das estações de Riachos, Santarém, Abrantes e

outras; na reabertura de estações encerradas no distrito de Santarém; na construção de passagens

desniveladas, para aumentar a segurança.

São muitas as medidas que estes 1400 milhões de euros para investimento público, que ficou por executar,

face ao orçamentado, poderiam concretizar.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente!

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr.as e Srs. Deputados, é comum, nestes debates sobre a ferrovia, vir a lume

a questão da chamada «dívida histórica da CP» e de como o Estado vai agora pagar essa dívida.

A direita gosta de usar a chamada «dívida histórica» como forma de atacar a empresa pública. Aliás, todas

as empresas públicas. Ora, é preciso desmistificar esta questão da dívida. É que, ao contrário do que é dito, é

o Estado português que tem uma dívida de anos para com a CP, por todos os anos que não pagou nem um

cêntimo pela contratação de serviço público, ao mesmo tempo que a única operadora privada, a Fertagus,

sempre recebeu esse montante de compensação de serviço público.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É um facto!

O Sr. Filipe Melo (CH): — Onde estiveram nos últimos seis anos?!

O Sr. Duarte Alves (PCP): — A dívida da CP decorre dessa opção política de privilegiar um pequeno

operador privado e não remunerar o serviço público — que, em certas ligações, não tem de ser lucrativo —, que

sempre foi prestado pela CP.

A direita, que agora reclama da chamada «dívida histórica», é a mesma direita que privatizou a parte mais

lucrativa da CP, a CP Carga — hoje, Medway —, decisão essa que o Governo do PS não reverteu, quando

ainda ia a tempo. É a mesma direita que, juntamente com o PS, tem apostado, ao longo dos anos, em estratégias

de redução da capilaridade da rede ferroviária, reduzindo a atração para novos utentes e, dessa forma,

aumentando também as receitas da CP.

A ferrovia precisa de investimento, de estabilidade e previsibilidade orçamental. Precisa não só de uma

estratégia política, mas também de autonomia na gestão e de uma gestão orientada para critérios de serviço

público. No fundo, precisa de uma política alternativa.

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do

Bloco de Esquerda.

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A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Nós sabemos, e

temo-lo dito à saciedade, que a ferrovia é, sem dúvida nenhuma, um dos instrumentos mais poderosos que

existem, do ponto de vista das políticas públicas. É um instrumento poderoso não só para a área da mobilidade,

mas também para a área do ambiente, e tem um impacto significativo nas questões de coesão territorial e do

próprio rendimento que as famílias têm disponível.

Mas a verdade é que, ao longo de várias décadas, a opção foi sempre a de desinvestir brutalmente na

ferrovia, e isto implica o PSD, o CDS e também o PS, que tomou essa decisão, ao longo de várias décadas.

A Sr.ª Sónia Ramos (PSD): — E o Bloco e o PCP!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Na altura, a opção foi a de desinvestir na ferrovia para investir na rodovia. Se é

certo que isso permitiu ligar determinados territórios, a verdade é que, hoje, em 2023, verifica-se que fazê-lo à

custa da ferrovia foi o maior erro do ponto de vista da mobilidade que este País cometeu.

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Não!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Na verdade, continuamos a ter o investimento em ferrovia no papel, mas ele

avança com uma tal lentidão que não responde às necessidades das populações.

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Ah! Agora falou bem!

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Durante os últimos anos, em várias audições regimentais, em várias audições

específicas sobre este tema, temos levantado a questão da execução do Ferrovia 2020. Enfim, os números

variam sempre um bocado, mas nunca passam dos 20 %. Portanto, independentemente de ser 15 %, 18 % ou

17 %, nunca passa dos 20 %, e isto não é aceitável!

Já agora, sobre o argumento que o Governo e o Partido Socialista agora utilizam, de que «só há atraso

porque há obra», lamento, mas este não é um argumento que justifique o que se está a passar há anos com a

ferrovia em Portugal. Na verdade, são duas as justificações para os atrasos: por um lado, as opções, de décadas,

de desinvestimento e de encerramento das linhas ferroviárias no nosso País e, por outro lado, o mau

planeamento.

Já foi referida a entrevista do Sr. Vice-Presidente da Infraestruturas de Portugal, que, a determinada altura,

diz: «No dia seguinte ao da apresentação daquele calendário — o calendário da Ferrovia 2020 —, alguns dos

projetos já estavam quatro anos atrasados.»

Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados, isto não é aceitável num País que se diz democrático e nem sequer é

aceitável para um Governo que diz que tem a ferrovia como prioridade. Portanto, gostaríamos de compreender

como é que é possível o Governo ter aprovado um plano cujo calendário sabia, à partida, que não era exequível.

Mas vamos a alguns exemplos que desmistificam aquilo que o Governo tem vindo a dizer: a Linha da Beira

Alta está encerrada por nove meses, para execução de obras. Já foi anunciado o prolongamento desse

encerramento por mais dez meses, e vamos ver se esses meses chegam!

Protestos do Deputado do PSD Jorge Salgueiro Mendes.

Na Linha do Norte, o principal eixo ferroviário do País, tivemos quatro abatimentos em três semanas. Isto

leva a cortes de via, a acrescer aos atrasos que já existiam na Linha do Norte. A linha entre Casa Branca e Beja

continua por eletrificar. Sobre a ligação Porto-Vigo, extremamente importante, ninguém sabe de nada. Barca

d’Alva não tem financiamento. Na Linha do Vouga, continua um impasse sobre a questão da bitola e, na verdade,

a promessa da requalificação integral está por cumprir. Não há ligação direta entre Barcelos, Braga, Guimarães

e Famalicão.

Nem sequer vou falar dos distritos de Vila Real e de Bragança, porque é absolutamente inadmissível haver

partes do País que têm acesso mínimo a um serviço essencial como este.

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Portanto, Sr. Ministro, é, de facto, urgente uma política de promoção do transporte ferroviário, mas isto implica

um compromisso político sério, que não tem sido aquele que o Governo do Partido Socialista tem tido, porque

se baseia em anúncios, em planos que sabe que não vai cumprir.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Vou concluir, Sr.ª Presidente.

No final, quem está a sofrer são os territórios que continuam a não ter acesso ao transporte ferroviário, os

utentes que precisam desse transporte e o ambiente, porque continua a não haver esta política importantíssima

para fazer face às alterações climáticas.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa

Real, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: No

que diz respeito à ferrovia, continuamos a ter um País a duas velocidades. Por um lado, todos concordamos

com o discurso de que a ferrovia é essencial numa perspetiva social e também do ponto de vista do combate às

alterações climáticas. Mas, quando olhamos para o País, aquilo que verificamos é que não existem ligações

entre todas as capitais de distrito e, se fizermos as contas para perceber onde é que conseguimos chegar em

menos de 5 horas, verificamos que dificilmente vamos para além do centro do País.

Mais: não conseguimos ir sequer até Madrid, não conseguimos, por exemplo, ir de Faro até ao Porto em

menos de 5 horas, e somos amplamente batidos na expansão da ferrovia pela vizinha Espanha.

Depois, quando olhamos para além da realidade distrital, para a realidade urbana, continuamos a ver

comboios atolados, a má qualidade dos transportes públicos. Continuamos a ter o problema de, apesar do

contexto de saúde financeira que a CP vive, não se estar a pagar a trabalhadores, como é o caso dos

trabalhadores dos bares da CP. Isto, a nosso entender, é absolutamente inadmissível.

Mas, para além da aposta financeira que tem de ser feita, do ponto de vista das infraestruturas, aquilo que

seria também importante ouvirmos hoje, por parte do Sr. Ministro, tem a ver não apenas com a possibilidade de

dedução dos bilhetes no IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares), que já foi alcançada, mas

com aquilo que foi também, de alguma forma, prometido, que tem a ver com a criação de um cartão de

mobilidade pré-carregado, através do qual as empresas poderiam participar nas despesas de mobilidade dos

seus trabalhadores, que continua na gaveta.

Portanto, hoje seria importante ouvirmos, por parte do Ministro, quando é que este tipo de propostas,

essenciais não só para a coesão social e territorial, mas também para a descarbonização, se tornam realidade.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Tavares, do

Livre.

O Sr. Filipe Melo (CH): — Para quê?!

O Sr. Rui Tavares (L): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado, Sr. Ministro: O

que é verdadeiramente trágico no desinvestimento de décadas na ferrovia em Portugal é ele ter sido

autoinfligido. Há muitos setores nos quais Portugal partiu com atraso. Há outros setores nos quais Portugal se

foi atrasando. Este é um daqueles setores em que Portugal desfez o que já tinha feito. Isso é que é

verdadeiramente trágico e, não nos enganemos, não se resolve de um dia para o outro.

Independentemente de podermos querer um plano ferroviário nacional mais densificado pelo País ou mais

centrado na alta-velocidade, a verdade é que temos de querer um, de o fazer e de o implementar. Não podemos

continuar só a debater o futuro do Plano Ferroviário Nacional, sem o ver no terreno.

Mas, entretanto, enquanto discutimos esse futuro mais ou menos longínquo, há coisas que podemos fazer

já hoje, e é nisso que centraria as minhas perguntas ao Sr. Ministro.

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No Orçamento do Estado para este ano, negociado ainda com o seu antecessor, ficou clara a meta, o

objetivo, de ter um passe ferroviário nacional, começando pelos comboios regionais, até ao mês de junho deste

ano. Estamos em linha com o calendarizado?

Sobre os comboios noturnos para Espanha, já houve várias cimeiras luso-espanholas, creio que algumas já

com o Sr. Ministro. É tema de cimeira, ou não, voltarmos a ter comboios noturnos entre Portugal e Espanha?

O Livre apresentou recentemente uma proposta para incluir trabalhadores no Conselho de Administração

tanto da CP, como da IP. O PS chumbou-a. O Ministro da Economia do seu Governo diz que o modelo do

capitalismo europeu, que tem os trabalhadores no Conselho de Administração, é o que funciona melhor.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Tavares (L): — Gostaria de ouvir a sua opinião acerca disso. Porque é que não podemos ter, na

IP e na CP, os trabalhadores no Conselho de Administração?

Por último, uma pergunta que já foi feita: quando é que teremos um plano para o pagamento da dívida

histórica à CP? Não digo da CP, mas à CP, porque é assim que se deve dizer.

Muito obrigado, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para concluir esta primeira ronda, tem a palavra o Sr. Ministro das

Infraestruturas, João Galamba.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo a pretexto das

intervenções do Bloco de Esquerda e do PCP, nas quais me revejo bastante. Não percebo é em que medida é

que as declarações e as intervenções do Bloco de Esquerda e do PCP são sobre a realidade do País e sobre

este Governo.

Srs. Deputados, podemos ter todas as divisões, podem dizer que é insuficiente, que é preciso mais, que não

chega, que deve ser mais rápido. Mas, Srs. Deputados, perante o Governo que decide travar a realidade bem

denunciada por vocês, não haver uma palavra de reconhecimento para um Governo que concordou com o

diagnóstico feito pelo Bloco de Esquerda e pelo PCP e inverteu a situação de abandono histórico a que foi

votada a ferrovia, desculpem, Srs. Deputados, não é forma de travar um debate seriamente.

Os Srs. Deputados podem achar que este Governo podia ter feito mais, que não é suficiente, podem dizer

isso tudo. Mas ao não fazer uma distinção e continuar a criticar este Governo como se tivesse feito tudo igual

ao que todos os Governos anteriores fizeram, desculpem, Srs. Deputados, assim não dá para levar a sério as

vossas palavras.

Aplausos do PS.

É que pouco, muito, bom, perfeito ou imperfeito, Srs. Deputados, este Governo foi aquele que fez o que os

senhores disseram que era necessário fazer: acabar com décadas de abandono, acabar com décadas de

negligência, parar a destruição da ferrovia em Portugal e fazer o oposto.

Protestos do PCP.

Há um Governo que o fez, Srs. Deputados! Pode-vos custar dizê-lo, mas foi este e mais nenhum! Foi este!

Aplausos do PS.

Podemos fazer melhor?! Certamente. Acreditem, temos todo o gosto e todo o interesse em ouvir críticas

construtivas, porque o nosso objetivo é mesmo o de fazer melhor.

Nesse discurso abstrato sobre décadas de abandono, a crítica dirigida a este Governo é como se este

Governo fosse de 2005, de 1995 ou dos anos 80, altura em que, sim, os Governos eram do PSD ou do PS,

repito, do PSD ou do PS, e fizeram aquilo que os senhores, e bem, criticam. A única coisa a que leva manterem

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esse discurso sobre este Governo do PS é a não dar para levar a sério o vosso discurso. É um discurso abstrato,

desligado da realidade e, já agora, desculpem, injusto, manifestamente injusto.

O Sr. João Dias (PCP): — Isso é o discurso do «menos mal»!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Nesse aspeto, concordo inteiramente com a frase que o Sr. Deputado

Rui Tavares disse. De facto, Portugal, em muitas áreas, partiu com atraso, seja na literacia, seja na formação

dos trabalhadores. Portugal, em 1974, tinha a taxa de literacia que a Suécia tinha no século XIX. Isso é um

atraso!

Na ferrovia, houve, de facto, uma amputação, concordo com o Sr. Deputado. E concordo com o Sr. Deputado,

também, sobre a importância de reconhecer que não é fácil reerguer após a destruição. Temos instituições

públicas descapitalizadas de meios e de conhecimento e, já agora — e esta é para a Iniciativa Liberal —, temos

também um setor privado descapitalizado, com falta de capacidade e muita dificuldade em concretizar projetos.

O Sr. Deputado da Iniciativa Liberal, como acredita numa ideologia da geração espontânea, em que todos

os problemas se resolvem com redução de impostos, tem alguma dificuldade quando avança por mares nunca

antes navegados pela Iniciativa Liberal, leia-se, todos!

Como a única coisa que a Iniciativa Liberal concebe é, quando há um problema, reduzem-se os impostos,

eu penso que isto, genericamente, resume a posição política da Iniciativa Liberal sobre todas as matérias.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Não! Vá estudar!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Aliás, até me estranha como é que, para acelerar as obras, ou para

haver mais comboios e não serem só 117, mas o dobro, ainda não propôs uma reduçãozinha de impostos. Sr.

Deputado, certamente encontrará alguma redução de impostos que, na lógica e no raciocínio da Iniciativa

Liberal, era mesmo certeira para Portugal ter mais comboios.

Sr. Deputado, vou-lhe dar uma novidade: é que os projetos são mesmo difíceis de fazer e são, também,

difíceis para as empresas privadas. Sabe que grande parte dos atrasos nas obras se deve a pedidos de

empresas privadas? Portanto, não têm nada a ver com o diagnóstico que o senhor aqui fez!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Nada, nada, nada!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Sr. Deputado, também lhe vou dar outra novidade: o Estado, para

executar certas políticas e para fazer certas despesas, sim, tem de articular entre diferentes entidades. É assim

que funciona. Não é uma burocracia desnecessária, não é uma coisa como uma redução de impostos ou uma

qualquer reforma estrutural — que, certamente, a IL tem bem presente qual é que seria — que acelerava tudo

isso. Sr. Deputado, as coisas não funcionam assim.

Por falar em grupos parlamentares e Srs. Deputados que não percebem nada de projetos nem de obra,

concluo também que o Chega nem sequer sabe o que é um comboio.

Risos do Deputado do CH Filipe Melo.

O Sr. Deputado do Chega não sabe o que é um comboio, nunca deve ter posto os pés num.

Vou-lhe dar uma novidade, que deve ser certamente celebrada no seu partido. O Sr. Deputado apresentou

a grande medida para a ferrovia no País, que é a necessidade de haver câmaras CCTV em todos os comboios.

Vou-lhe dar uma novidade: já há!

O Sr. Filipe Melo (CH): — Não funcionam!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Sabe onde é que há mais também? Nos comboios, nos autocarros,

nos elétricos, nos metros.

Aplausos do PS.

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Consegue não falar de ferrovia e o que diz mostra que nunca lá pôs os pés. Em relação ao grande pedido

do Chega, Sr. Deputado, olhe, as câmaras já existem há anos. O que é que quer que lhe diga?!

O Sr. Filipe Melo (CH): — Mas não funcionam!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Sobre a sua dificuldade em fazer contas, não me leve a mal: o Sr.

Deputado falou de imagens, mas, para contas, é mesmo preciso números. Não sei como é que faz contas lá em

casa ou no seu partido, mas, no meu, e a generalidade dos portugueses, quando queremos ter debate sobre

contas, apresentamos números e não rabiscos ou desenhos.

O Sr. Filipe Melo (CH): — São as contas certas!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Portanto, o Sr. Deputado não consegue fazer uma conta elementar

de somar e subtrair, com a qual se conclui que uma coisa que custa X e rende Y, com Y maior do que X, dá

lucro.

O País, a CP e os portugueses ganharam por ter comprado carruagens em segunda mão,…

O Sr. Filipe Melo (CH): — Sucata! Compraram sucata!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — … por ter usado indústria nacional, materiais nacionais e

trabalhadores nacionais para recuperar.

Aplausos do PS.

Protestos do CH.

O Sr. Filipe Melo (CH): — Já pagaram a sucata?!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Sabe o que é que acontece agora? É que quem as vendeu não as

quer vender outra vez, porque percebe que o País que as comprou fez um excelente negócio. Se o Sr. Deputado

não percebe isso, temos pena, mas os portugueses percebem e as contas da CP refletem-no, porque os

resultados da CP, hoje, são da maior importância.

O Sr. Filipe Melo (CH): — Está paga a sucata?!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Finalmente, os Srs. Deputados do Bloco de Esquerda e do PCP, em

particular o Sr. Deputado Duarte Alves, disseram, e muito bem, que grande parte da dívida da CP e de outras

empresas públicas se deve ao facto de lá ter sido parqueada e de não terem sido feitas as indemnizações

compensatórias. Tem toda a razão, Sr. Deputado. Só lhe faltou dizer que foi este Governo que corrigiu esse erro

e que pôs termo a essa situação.

Protestos do PCP.

Mas, mais uma vez, o Sr. Deputado demorou muito tempo a apontar o dedo ao que o Governo X, Y, Z e H

não fez, esquecendo-se de um pequeno pormenor, que foi identificar que este Governo resolveu, ou pôs em

prática a resolução de grande parte dos problemas que aqui identificou.

Protestos do PCP.

Se eu não tenho qualquer problema em dar muita razão às críticas feitas pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda,

não me levem a mal, mas também tenho alguma razão em chamar o PCP e o Bloco de Esquerda à razão. Se

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querem ter um debate construtivo, em que se avalie a sério as opções tomadas, o que está em curso e o que

podemos melhorar, Srs. Deputados, temos de reconhecer que este Governo não é igual aos Governos que

desinvestiram na ferrovia; é exatamente o oposto! É este o primeiro a investir!

Aplausos do PS.

Investimos na ferrovia e continuaremos a investir na ferrovia, com muito orgulho, porque é um projeto que

faz sentido, de que o País precisa, e o PS cá está para o concretizar.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): ⎯ Passamos à segunda ronda de intervenções.

Para intervir, em nome do Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra a Sr.ª Deputada Fátima Correia Pinto.

A Sr.ª Fátima Correia Pinto (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: Fico estupefacta com o descaramento, ou até mesmo a desfaçatez, com que o PSD se apresenta

a este debate.

Protestos do PSD.

Mas talvez o problema seja meu, porque já devia estar habituada à falta de memória dessa bancada.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Mas não se preocupem, Srs. Deputados. Eu avivo-lhes a memória e vou-me referir especificamente à

herança do PSD na região de onde sou natural: Trás-os-Montes e Alto Douro.

A Linha do Corvo está sem serviço ferroviário entre Vila Real e Chaves desde o dia 1 de janeiro de 1990.

Quem era Governo?! O PSD, com Cavaco Silva.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — E hoje, o que é que existe? Nada!

A Sr.ª Fátima Correia Pinto (PS): — A Linha do Tua está sem serviço ferroviário entre Mirandela e Bragança,

desde o dia 15 de outubro de 1992. Quem era Governo?! O PSD de Cavaco Silva.

Protestos do PSD.

O Sr. Filipe Melo (CH): — E o Sócrates?!

A Sr.ª Fátima Correia Pinto (PS): — A Linha do Douro está sem serviço ferroviário entre o Pocinho e Barca

d’Alva desde o dia 18 de outubro de 1988. E quem estava no Governo, Sr.as e Srs. Deputados?! Era o PSD de

Cavaco Silva.

Protestos do PSD.

Os Srs. Deputados deviam seguir o exemplo do vosso ex-Ministro Miguel Cadilhe e reconhecer os erros que

cometeram, pois o PSD é o verdadeiro responsável pelo desinvestimento na linha férrea no interior Norte e pelas

consequências socioeconómicas que daí advieram.

Aplausos do PS.

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Sim, Srs. Deputados, Cavaco Silva foi, indubitavelmente, o coveiro da linha férrea entre Trás-os-Montes e

Alto Douro.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

O Sr. Filipe Melo (CH): — Então e o Sócrates?!

A Sr.ª Fátima Correia Pinto (PS): — Agora, apresentam-se a este debate, contestando o Governo que maior

investimento se encontra a fazer na ferrovia.

Relembro, então, o que está previsto e o que se está a fazer, relativamente à mesma região: a eletrificação

da Linha do Douro em toda a sua extensão, uma obra estruturante e há muito ansiada, assim como o reforço

da operação desta mesma linha; a reabertura da ligação entre o Pocinho e Barca d’Alva e a possibilidade da

internacionalização da Linha do Douro que daí resulta; a criação, no Plano Ferroviário Nacional, de uma nova

linha, designada Linha de Trás-os-Montes, com ligação do Porto a Vila Real e Bragança, duas capitais de distrito

que, atualmente, não têm qualquer ligação ferroviária, o que fará a diferença no desenvolvimento e crescimento

desta região.

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Plano, plano, plano!

O Sr. Filipe Melo (CH): — Mas não têm!

A Sr.ª Fátima Correia Pinto (PS): — Mas vão ter, Sr. Deputado!

O Sr. Filipe Melo (CH): — Quando?!

A Sr.ª Fátima Correia Pinto (PS): — Por isso, Sr.as Srs. Deputados, entre um Governo que tem planeado e

executado, pese embora os normais atrasos que daí advêm, e um Governo que preferiu desinvestir e encerrar

linhas, conforme o legado do PSD durante décadas, penso que a escolha — a minha e a dos portugueses — é

evidente.

Aplausos do PS.

O Sr. Filipe Melo (CH): — Vão ter! Só não sabemos é quando!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): ⎯ Também para intervir em nome do Grupo Parlamentar do PS, tem a

palavra o Sr. Deputado José Carlos Barbosa.

O Sr. José Carlos Barbosa (PS): ⎯ Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Eu tinha fé que o Deputado António

Topa nos viesse dar algumas novidades sobre as suas ideias para a ferrovia, mas ele quis seguir o caminho do

líder do PSD, que, esta semana, andou de comboio para verificar os problemas e para apresentar ideias, e

apenas nos deixou uma ideia, que vou citar: «Afinal, os problemas hoje eram no metro.» São estas as ideias

que o líder do PSD tem para o País: «Afinal, era no metro.»

Aplausos do PS.

O jornalista termina, dizendo: «[…] brincou Luís Montenegro.» Afinal, o líder do PSD não tem ideias para o

País. Anda a brincar com o País!

Aplausos do PS.

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Pergunto que ideias querem continuar para o País. Querem continuar a fechar oficinas? Querem continuar a

parar material circulante?

Trouxe aqui a tabela de material circulante que andámos a recuperar e que vocês abandonaram.

O orador exibiu o documento que mencionou.

Este material circulante circula na Suíça. São 150 milhões de euros…

Protestos do PSD.

Eu gostava de continuar, Srs. Deputados.

Como estava a dizer, são 150 milhões de euros de material circulante que estava encostado, abandonado

— uma vergonha nacional e mundial —, e que nós recuperámos por 15 milhões de euros e metemos ao serviço.

Aplausos do PS.

Mas o que queremos saber, Srs. Deputados, é se concordam connosco, por exemplo, quando queremos

quadruplicar a linha entre o Areeiro e Braço de Prata. Para quê?! Para aumentar a frequência, para aumentar a

oferta, para acabar com os problemas de circulação.

Concordam com, por exemplo, fazer mais uma TTT (Terceira Travessia do Tejo)? Ou, por exemplo, falar do

TGV (train à grande vitesse)? Ou, por exemplo, falar do Plano Ferroviário Nacional? Ou, por exemplo, uma coisa

simples, que é garantir que os comboios são construídos em Portugal? Há duas empresas, das três

concorrentes, que querem cá construir os comboios!

Aplausos do PS.

Sr. Deputado António Topa, termino — porque, como sabe, não sou muito especialista em infraestruturas,

mas também quero falar aqui de infraestruturas, que é aquilo que você gosta — dizendo-lhe que Pedro Passos

Coelho pediu aos ferroviários para se reformarem, para emigrarem e para irem embora. Com isto, perdemos

mão-de-obra, perdemos capacidade produtiva.

Todas as empresas nacionais têm 100 % de carga em obra. Há atrasos, mas todas as empresas nacionais

estão a fazer obra. Os atrasos devem-se a vocês, que mandaram as pessoas emigrar.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): ⎯ Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem a

palavra o Sr. Deputado Jorge Salgueiro Mendes.

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: Depois desta intervenção enérgica do Sr. Deputado Carlos Barbosa, já nem sei o que dizer!

Risos do PS e do Deputado do PCP Duarte Alves.

Mas, realmente, é triste, hoje, continuarem a revisitar os anos 80, 50 anos depois! É triste.

Aplausos do PSD.

Sr. Deputado, há cerca de um ano, tivemos, aqui, um debate com o Ministro anterior, Pedro Nuno Santos,

acerca do programa Ferrovia 2020. Na altura, o Governo tinha uma grande preocupação: estava muito

preocupado com o enorme atraso do Ferrovia 2020, que tinha uma execução de 15 %. E, na altura, saiu a sua

célebre frase: «Agora é que vai ser! Agora é que vai ser!»

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Risos do Deputado do PSD António Topa Gomes.

Na falta de resposta aos argumentos do PSD, a culpa era sempre da troica e do Governo de Passos Coelho.

Mais uma vez, há um ano, a culpa ainda era do Governo de há 10 anos atrás.

Passado um ano, o Ferrovia 2020 — sabemo-lo hoje, com toda a certeza —, a correr bem, nunca estará

completo antes de 2025.

Com o Sr. Ministro, o Vice-Presidente da IP, Carlos Fernandes, perante os atrasos, diz: «Não estamos muito

atrasados. O problema é o cronograma otimista e desviado da realidade lançado em 2016.» Lançado por quem?!

Por Pedro Marques, do Governo do Partido Socialista.

Voz do PSD: — Muito bem!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Para os atuais Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado, os enormes

atrasos até se justificam, porque há obras.

Sr.as e Srs. Deputados, simultaneamente, os problemas do transporte ferroviário de passageiros agravam-

se. Só 30 % dos passageiros avaliam o serviço como positivo. A greve dos trabalhadores dos serviços de bar

nos comboios perdura — quatro meses sem salários — e a CP não encontra uma solução. A greve dos

trabalhadores da IP está sem fim à vista, com transtornos mais do que evidentes para os passageiros, mas

gerou uma novidade: gerou um autêntico comboio expresso entre Lisboa e Porto, um BRT (bus rapid transit)

entre Lisboa e Porto!

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Baptista-Bastos celebrizou uma expressão relativa ao 25 de Abril, por muitos

conhecida: «Onde é que estava no 25 de Abril?» Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr. Deputado José

Carlos Barbosa, onde é que estavam a 26 de junho de 2011, quando o jornal Público divulgou o relatório que

José Sócrates e o Ministério das Finanças propuseram à troica, com o encerramento de 800 km de linhas férreas

não rentáveis, por todo o País, à revelia da REFER e da CP?

Aplausos do PSD.

Onde é que estavam, em fevereiro de 2019, quando o Ministro Pedro Marques afirmou que o Ferrovia 2020

atingiria 40 % de execução no final do ano? Hoje, ainda nem sequer chegou aos 30 %.

Ó Sr.ª Deputada Fátima Correia Pinto, o comboio Alfa foi adquirido e a decisão foi tomada há mais de 25

anos, por acaso, pelo Prof. Cavaco Silva.

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Finalmente, falando de um futuro próximo, Sr. Ministro, quando se

reúne com o Ministro das Finanças, para sanear a dívida da CP, que a asfixia? O primeiro trimestre de 2023 —

para quando tal foi prometido — já lá vai e a dívida encontra-se por resolver, bem como a asfixia financeira da

CP.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para intervir, também em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem a

palavra a Sr.ª Deputada Carla Madureira.

A Sr.ª Carla Madureira (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Sr.

Ministro, trago-lhe, hoje, uma manchete de um jornal diário, de há dias, que nos deixou perplexos. Diz o jornal:

«Novos comboios da CP sem acesso para deficientes.»

Sr. Ministro, são 117 novos comboios e um investimento de 819 milhões de euros, de um Governo socialista

que tanto apregoa a inclusão e a vida independente das pessoas com deficiência. Terá sido esquecimento, Sr.

Ministro? Terá sido desconsideração? Terá sido ignorar os mais frágeis, ou, pelo contrário, esta é uma fake

new? Aliás, vimos esta notícia, mas não vimos nenhum desmentido do seu Governo.

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Aplausos de Deputados do PSD.

Por isso, hoje, aqui, o que lhe queremos perguntar, Sr. Ministro — desta forma, tem a oportunidade de

esclarecer quer o Grupo Parlamentar do PSD, quer as pessoas que, todos os dias, se deparam com esta

dificuldade —, é se vai, de facto, garantir que as pessoas com mobilidade reduzida vão poder usufruir, sem

qualquer problema, destes novos comboios, ou se, pelo contrário, vão prolongar esta dificuldade no tempo, que

é real, já nos dias de hoje.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para continuar a intervir em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem

a palavra o Sr. Deputado António Topa Gomes.

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Para encerrar

esta nossa intervenção, falaria de dois assuntos. O primeiro é o facto de o Sr. Ministro descobrir, agora, que as

obras precisam de planeamento de projeto e de obra, e que nunca fizeram projetos.

Aplausos do PSD.

Por deformação profissional, tenho uma vida ligada às obras, Sr. Ministro, e o que vemos é, pura e

simplesmente,…

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): — Um atestado de incompetência!

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — … a definição de incompetência, pois um Governo que não se

compromete com prazos e com custos é um Governo que, a gerir obras, é incompetente. No caso da gestão de

obras, na parte da ferrovia, o nome para o Governo é, pura e simplesmente, incompetência.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço que conclua, Sr. Deputado.

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Concluo já, Sr.ª Presidente, só queria referir uma última questão, para

a Deputada Fátima Pinto, quanto à desfaçatez. Desfaçatez é o Governo estar há seis anos, ou melhor, há oito

anos — até me distraio! — em funções e não tentar perceber o que é que falha, isto porque falha todos os dias

na ferrovia, e anda a fazer o diagnóstico do que se fazia há 40 anos, quando as situações eram completamente

diferentes.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem mesmo de terminar, Sr. Deputado.

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Para terminar, Sr.ª Presidente, como dizia Ortega y Gasset, «eu sou

eu e as minhas circunstâncias». Bastava ao PS conhecer um bocadinho mais de filosofia e fazia melhor as

obras.

Muito obrigado, Sr.ª Presidente.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Pinto, do

Grupo Parlamentar do Chega.

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O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados:

Creio que, mais uma vez, a frase que marca este debate é a mesma que marcou o debate da semana passada

sobre ferrovia. É que «existem atrasos, porque há obra no terreno».

Não sei se há obra no terreno ou não, o Sr. Ministro disse que temos 500 km de linha em obras. Aquilo que

sabemos, e que todos os dias nos reportam, é que há atrasos e mais atrasos, prejudicando a vida dos

passageiros, e este é que é o fator mais importante.

Na verdade, os portugueses que apanham o comboio estão a chegar tarde ao trabalho, ou então não

chegam, também por causa das greves — e o direito à greve é fundamental —, por causa da falta de condições

dos comboios.

É quase faltar ao respeito às pessoas, quando se diz: «Não, os atrasos existem porque há obra no terreno.»

Na semana passada, apresentámos um projeto de resolução para que, nos dias de greve, o dinheiro fosse

devolvido às pessoas. Não deixa de ser curioso — o Partido Socialista votou contra, como, aliás, tem feito com

todos os projetos do partido Chega, isso já é normal — que o PCP, o Bloco de Esquerda e o Livre também

tenham votado contra. Isto é que é curioso, pois tínhamos falado da ferrovia e de defender as pessoas, mas,

depois, na altura de votar os projetos, votam contra e alinham-se com o Partido Socialista. Esta é a grande

verdade!

Aplausos do CH.

Protestos do L.

Sr. Ministro, preocupa-me que o sindicato venha dizer que não existe diálogo entre o Governo e os sindicatos

— é uma notícia de há poucos dias —, e que achem inacreditável a falta de reação do Ministro João Galamba

e do Ministro Fernando Medina. Gostaria, pois, que comentasse isto.

Ó Sr. Ministro, eu ouvi-o falar sobre a Linha do Leste com atenção, como se fosse o grande homem dos

comboios que está farto de andar na Linha do Leste.

Risos do Deputado do CH Filipe Melo.

Pergunto-lhe: quantas vezes andou na automotora que está na Linha do Leste?

O Sr. Filipe Melo (CH): — Não andou nenhuma!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sabe quantas vezes, Sr. Ministro?

O Sr. Filipe Melo (CH): — Zero! Bola!

Risos dos Deputados do PSD António Topa Gomes e Jorge Salgueiro Mendes.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Zero! Nem em campanha eleitoral lá foi. E sabe porquê?! Porque não sabe o que

está a dizer.

Dizer que aquele transporte é medíocre é um favor. Aquilo não é medíocre, aquilo é quase indigno de seres

humanos andarem lá dentro, isto porque, no verão, faz 40 ºC no Alentejo e, na maior parte das vezes, o ar-

condicionado está variado. O Sr. Ministro sabe o que é isso? Não, não sabe, e esse é que é o problema! Vem

para aqui falar e criticar os outros por não andarem de comboio. Então e o senhor?! Depois, aquela automotora

tem tido muitas, demasiadas avarias.

Também me lembrei, na mesma região, do Ramal de Cáceres, cuja sentença de morte foi assinada por José

Sócrates e terminada por Pedro Passos Coelho. Na verdade, esse ramal era importantíssimo para a região, pois

passava o comboio que ia para Madrid. Sabe o que é agora o Ramal de Cáceres, Sr. Ministro? É um museu.

Agora, as estações de comboio são museus.

Ainda no Alentejo — já se falou disso, não vale a pena estarmos a tocar sempre no mesmo assunto —, temos

o caso da linha entre Casa Branca e Beja, sem eletrificação. O que é que o Governo pensa fazer sobre isto?

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Sr. Ministro, também disse que se revê muito nas declarações do PCP e do Bloco de Esquerda. Ó Sr.

Ministro, nós já sabíamos que se revê muito no PCP e no Bloco de Esquerda — aliás, faz parte da ala da

extrema-esquerda que está incutida no Partido Socialista —, mas eu pensei que fosse por causa de a maior

parte das carruagens dos comboios em Portugal, particularmente do interior do País, ser do tempo da União

Soviética. Não sei se tem alguma coisa a ver com isso.

Aplausos do CH.

O Sr. Filipe Melo (CH): — Esta doeu-vos!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Também disse, e vou recordá-lo disso, que este Governo já tem oito anos. Ó Sr.

Ministro, este Governo tem oito anos, apesar de saber que o Sr. Ministro é Ministro há pouco tempo, porque era

o braço direito de Pedro Nuno Santos. O que é certo é que este Governo tem oito anos, mas parece que chegou

hoje, parece que é a primeira vez que estamos a falar sobre ferrovia!

Em relação às declarações que teve para com o Deputado Filipe Melo, gostaria de referir que, há pouco, ouvi

falar um organizador do 50.º Aniversário do Partido Socialista, que disse que o Partido Socialista precisa de

humildade democrática. Se calhar essa humildade democrática tinha-lhe feito bem, e não deveria ter dito aquilo

que disse, da maneira como disse, porque sabe que não é verdade. O Sr. Ministro sabe que a maior parte das

carruagens, em Portugal, não têm as tais câmaras de CCTV, ao contrário do que disse. Essa é que é a grande

verdade. Têm aqui, na região da Grande Lisboa, e podem ter na região do Grande Porto, mas, no resto do País,

onde é que estão? Diga lá onde é que estão! Olhe, esta automotora de que falámos, da Linha do Leste, tem

câmaras? Claro que não tem, Sr. Ministro, e sabe bem que não tem! Portanto, estas são as falsidades deste

Governo e do Sr. Ministro João Galamba.

Vozes do CH: — Muito bem!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Termino, Sr.ª Presidente, só para falar nas estações de comboio sem condições.

Olhe, tenho aqui fotos.

O orador exibiu fotografias de várias estações de comboios.

Esta é uma estação de comboios no Alentejo. O Sr. Ministro não conhece, mas está aqui, passa a conhecer.

Se quiser, depois entrego-lhe a fotografia.

Esta é outra estação de comboios, em Portalegre, capital do Alto Alentejo. Está aqui a estação de comboios.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Tem mesmo de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Termino mesmo, Sr.ª Presidente.

Só para terminar mesmo, gostaria de referir uma notícia sobre a Câmara de Loures, que é socialista. Diz o

seguinte: «Câmara de Loures insta Governo a reabilitar as estações de comboio próximas da Jornada Mundial

da Juventude.» Isto significa que nem na região da Grande Lisboa as estações de comboio estão preparadas

para receber, por exemplo, a Jornada Mundial da Juventude. Acho que era importante o Governo começar a

trabalhar nisso.

Aplausos do CH.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodrigo Saraiva,

do Grupo Parlamentar da IL.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro: Como se dirigiu à

Iniciativa Liberal, nesta segunda ronda, naturalmente, também me irei dirigir ao Sr. Ministro.

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Se me permite, sugiro-lhe que, da próxima vez, não traga para aqui esse estilo, basta cingirmo-nos aos

conteúdos. É que trazer, para o debate, esse estilo de animal feroz recorda-nos aqueles tempos dos quais só

mesmo o Sr. Ministro ainda é um dos poucos saudosistas, mas dos quais Portugal não tem qualquer saudade.

O Sr. Rui Rocha (IL): — Não deu grande resultado!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Portanto, vamos seguir em frente.

Como eu, na minha primeira intervenção, quase me cingi a citar a entrevista, as declarações e a opinião do

Sr. Vice-Presidente da Infraestruturas de Portugal, a pergunta que lhe quero fazer — tendo em conta as

considerações que fez, como se tivesse sido eu a defender aquilo que estava a dizer — é se vai demitir o Sr.

Vice-Presidente da Infraestruturas de Portugal, uma vez que esteve quase a dizer que era uma questão de

incompetência e de incapacidade.

Se tem um Vice-Presidente da Infraestruturas de Portugal que é incompetente e incapaz,…

Protestos do Deputado do PS Eurico Brilhante Dias.

… só tem uma coisa a fazer, quando chegar ao seu gabinete, que é demitir o Vice-Presidente da

Infraestruturas de Portugal.

Protestos do Deputado do PS José Carlos Barbosa.

Depois, também atacou a iniciativa privada, com todos esses espantalhos que trouxe para aí, esses bichos-

papões que trouxe para aí. Nem vale a pena estar a responder! Porém, já que tem tantos problemas com a

iniciativa privada, mas também tem de gerir a ferrovia — nomeadamente as coisas que o Estado não faz —,

sugiro que vá ler uma notícia do Jornal de Negócios de há pouco tempo, de 13 de abril, da qual vou ler apenas

o título: «Cinco empresas aliam-se para modernizar o sistema de sinalização ferroviária em Portugal.»

O Sr. Rui Rocha (IL): — Bem lembrado!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Portanto, se fosse pela iniciativa privada, já íamos além das taxas de execução

na ferrovia.

Este debate também trouxe duas curiosidades: a primeira foi o Partido Socialista a falar de Aníbal Cavaco

Silva. Estavam sempre a falar da troica — já estamos habituados a esse filme, ao Sei o Que Fizeste no Verão

Passado, a esse ping-pong —, mas vir falar de Aníbal Cavaco Silva, quando são o partido que esteve no Governo

em 20 dos últimos 27 anos!…

Protestos da Deputada do PS Fátima Correia Pinto.

Os senhores é que são os — não é responsáveis! — irresponsáveis pela situação que existe em Portugal,

nomeadamente na ferrovia. Não vale a pena irem para o passado.

O Sr. Rui Rocha (IL): — Muito bem!

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Depois, temos outra curiosidade. Num debate que é marcado pelo PCP,

achávamos que íamos chegar ao fim do debate e ver alguém gritar: «Assim se vê a força do PCP!» Mas, depois,

vem o Sr. Deputado José Carlos Barbosa e parece que está a gritar: «Assim se vê a força da CP!» É a

curiosidade destes debates.

Risos dos Deputados do PSD António Topa Gomes e Jorge Salgueiro Mendes.

Sr. Ministro, vou agora ler um pouco devagar, para dar tempo de pedir a informação aos seus assessores.

No dia 22 de fevereiro, o Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal submeteu uma pergunta formal ao Governo —

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uma questão relativamente ao Plano Ferroviário Nacional — que está consultável no site da Assembleia da

República, mas, entretanto, já passou o mês de prazo que teria para nos responder, e ainda não respondeu. A

pergunta tem a ver com a supressão — expressão adequada! — da ligação ferroviária entre Braga e Guimarães,

do Plano Ferroviário Nacional.

Portanto, vou ler as perguntas, para dar algum tempo para, depois, me fazerem chegar as respostas, porque,

certamente, como já passou o prazo regulamentar, algum atraso deve haver.

Primeira pergunta: «Qual foi o processo de tomada de decisão e que critérios foram considerados para excluir

esta ligação do Plano Ferroviário Nacional?»

Segunda pergunta: «Houve alguma análise de impacto económico e social da exclusão desta linha?»

Terceira: «Existem planos para a sua inclusão no futuro?»

Sr. Ministro, porque é que ainda não nos responderam no prazo regimental? Para responder aos partidos

também é preciso articular-se com alguma outra entidade?

Aplausos da IL.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Dias, do

Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. João Dias (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro: Em todo

o debate desta tarde não lhe ouvi uma única palavra sobre a Linha do Alentejo. Certamente, o Sr. Ministro terá

ouvido falar da Linha do Alentejo, duvido é que a conheça. Mas ela existe, Sr. Ministro, a Linha do Alentejo existe

e não pode ser ignorada.

Sr. Ministro, sabe porque é que ela não pode ser ignorada? Porque representa uma segunda ligação entre

Lisboa e Faro. É uma redundância de segurança, relativamente à Linha do Sul, porque representa uma segunda

ligação entre o complexo de Sines e a fronteira do Caia, o estrangeiro.

É uma redundância, novamente, uma segurança, relativamente ao transporte de mercadorias crescente.

Representa uma fiabilidade pela qual também não pode ser ignorada. Ela não pode ser ignorada, porque

garantirá o desenvolvimento económico daquele território bastante debilitado, nomeadamente da agricultura, da

agroindústria, das explorações mineiras, do crescente turismo e a dignificação do transporte ferroviário.

A ligação, inexistente, entre Beja e Faro é inaceitável nos dias de hoje, Sr. Ministro, por isso, vou falar-lhe

desta Linha que não é só o Sr. Ministro que não conhece.

O Sr. Filipe Melo (CH): — Não tem, mas vai ter!

O Sr. João Dias (PCP): — Os Srs. Deputados também não a conhecem, porque falam sempre da ligação,

do troço entre Casa Branca e Beja e esquecem-se da ligação entre Beja e Funcheira, nomeadamente entre

Ourique e Funcheira.

Estão previstos, para o final do ano, os projetos de execução, mas faltam os projetos e os procedimentos

ambientais que o Governo prevê terminar no final do ano de 2024. É importante que se antecipe essa data para

o primeiro semestre de 2024, para que as obras avancem o quanto antes.

Quanto à ligação ao aeroporto, falta o projeto de execução. Sr. Ministro, porque é que não está no terreno o

projeto de execução da variante ao aeroporto?

No troço entre Beja, Ourique e Funcheira, uma linha desativada, não está no terreno o projeto de execução.

O que é que impede de se colocar no terreno o projeto de execução, até no quadro da reprogramação do PRR

(Plano de Recuperação e Resiliência), da dita bazuca? Porque é que não se avança, também, com a

reprogramação e a cabimentação neste troço, aliás, em toda a Linha do Alentejo?

Sr. Ministro, no que diz respeito à eletrificação da Linha do Algarve, a obra está em prática. É uma obra que

está no terreno, mas que sabe a pouco, porque fica por tratar e por pôr também em projeto de execução aquilo

que tem a ver com a ligação ao aeroporto de Faro e à Universidade.

Sr. Ministro, para quando considerar esta importante ligação?

Protestos do Deputado do PSD António Topa Gomes.

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E a Linha do Leste? Sr. Ministro, para quando a aproximação da estação à cidade de Portalegre? Para

quando o aumento da oferta?

Já veio orgulhar-se de ter colocado no terreno mais oferta, mas ela é absolutamente insuficiente. Para quando

mais oferta e para quando a reposição das ligações a Madrid?

Aplausos do PCP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Pires, do

Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr.ª Presidente. Srs. Deputados, Sr. Ministro: Apesar de tudo, elenquei alguns

casos concretos sobre os quais gostaríamos de ter algumas respostas, porque gostávamos de saber o que é

que se passa com as situações específicas da Linha da Beira Alta, da Linha do Norte, com a questão, ainda

agora referida, de Beja, de Barca de Alva, com a Linha do Vouga, com a Ligação Porto-Vigo.

Não vamos, sequer, falar de Trás-os-Montes porque se é certo que o PSD encerrou, também é certo que o

PS não reabriu.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade!

Protestos de Deputados do PS.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Portanto, a verdade é que, no cômputo geral da região, na sua totalidade, há

uma falha tremenda nessa região, Srs. Deputados.

Mas, Sr. Ministro, queria falar-lhe da questão dos trabalhadores, que é absolutamente essencial quando

falamos de ferrovia. Inclusivamente, apresentámos uma pergunta, por escrito, já no início de março de 2023,

relativamente à necessária e urgente valorização não só de salários, mas de carreiras, também, dentro da CP.

Sabemos que tem existido uma dificuldade de diálogo muito grande com o Governo relativamente a esta

matéria. Assim, a questão essencial que, desse ponto de vista, gostávamos de deixar, pois acho que era

importante, é porque é que o Governo, especialmente — pelo menos é a ideia com que ficamos —, desde que

o Sr. Ministro tomou posse, tem um diálogo tão difícil com os trabalhadores ferroviários da CP? Para quando

uma valorização efetiva dos salários destes trabalhadores?

Por fim, já referi isto algumas vezes, queria falar-lhe da situação dos trabalhadores dos bares da CP.

Num anterior debate de declarações políticas trouxemos aqui especificamente esse assunto e o Sr. Deputado

Carlos Barbosa, do PS, até referiu que haveria, inclusivamente, a hipótese de a CP estar a estudar a

internalização destes trabalhadores. A verdade é que vai, praticamente, para três meses em que 130 famílias

não têm salário.

Soubemos, e toda a gente que tem acompanhado soube, que, no final da semana passada, era suposto

haver uma resposta aos sindicatos sobre o tal concurso urgente de que o Sr. Ministro falou da última vez que

foi à Comissão. A verdade é que, enfim, essa resposta não existiu.

Falava-se de um suposto interessado, mas, afinal, não houve nenhum interessado neste concurso. Na

segunda-feira, foi cancelada a reunião que estava prevista entre a CP e trabalhadores.

A questão essencial é continuarmos a ter 130 trabalhadores, há praticamente três meses, sem qualquer fonte

de rendimento. Espero que o Sr. Ministro compreenda, de uma vez, a gravidade da situação por que estas

pessoas e estas famílias estão a passar, neste momento.

Há a possibilidade ⎯ e essa escolha política é possível ⎯ de a CP internalizar estes trabalhadores e resolver,

de uma vez por todas, o problema dos bares da CP e, concretamente, dos salários destes trabalhadores, mas

estamos a 19 de abril e não há qualquer resposta.

Sr. Ministro, o Bloco de Esquerda voltará a trazer este tema a debate. O PS chumbou a audição do Sr.

Ministro, concretamente, sobre este tema, mas nós insistiremos em todas as oportunidades que tivermos.

Estamos à espera que seja agendada a audição à CP, mas a verdade é que estas famílias não podem esperar

mais, estes trabalhadores não podem esperar mais.

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São quase três meses sem qualquer fonte de rendimento, Sr. Ministro, e, portanto, esperamos que, hoje,

possa ter uma resposta para dar a estes trabalhadores, porque, das duas, uma, ou a CP resolve a situação ou

a CP resolve a situação. Resume-se, pura e simplesmente, a isso. Tem de haver uma escolha política sobre a

resolução da vida destes trabalhadores, e é essa a resposta que estes trabalhadores querem e que o Bloco de

Esquerda pede, novamente, e assim fará as vezes que forem precisas até esta situação estar resolvida.

Aplausos do BE.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa

Real, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro: Há pouco, houve perguntas que ficaram

sem qualquer resposta, desde logo a questão dos trabalhadores dos bares que estão sem receber o seu

vencimento. E isto, quando existem lucros por parte da CP, pela primeira vez, é absolutamente incompreensível.

Também nada disse quanto à ligação de todas as capitais distrito, um dos objetivos fundamentais em termos de

coesão territorial.

Mas, nesta segunda ronda, gostaria de lhe colocar duas questões. Uma primeira prende-se com a articulação

com as soluções aeroportuárias. Não faz sentido termos infraestruturas, como, por exemplo, em Beja, e não

haver um melhoramento da linha e, mais ainda, alta velocidade para que, efetivamente, possamos encurtar as

distâncias.

Por outro lado, também, o Plano Ferroviário Nacional não pode significar a destruição de valores ambientais,

como temos verificado que acontece nalguns traçados. Basta olharmos para o caso da Linha do Vouga, em que

está já previsto o abate de mais de 300 sobreiros, ou, até mesmo, para Sines, em que está previsto o abate de

mais de 10 000 sobreiros por causa do transporte ferroviário de mercadorias.

Ora, as reivindicações dos ambientalistas, das organizações não-governamentais e da própria população

têm sido muito claras: todos estão a favor da ferrovia, mas não sob estas condições, com uma fatura ambiental

que vai ser insustentável com a destruição deste tipo de património natural.

Por isso, Sr. Ministro, apelo que lhe deixo é para que responda se estão, ou não, disponíveis para reavaliar

os traçados e garantir a preservação daquele que é um símbolo do nosso País e património natural.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Tavares, do

Livre.

O Sr. Rui Tavares (L): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Vamos com uma hora e meia debate e noto que,

até agora, fica para memória futura, não ouvi nenhum partido defender a privatização da CP.

Estranho, porque parece que a CP deu lucro e alguns partidos acham que é quando as empresas públicas

dão lucro que estão mesmo madurinhas para privatizar.

Protestos do Deputado da IL João Cotrim Figueiredo.

Esperemos que isso não queira dizer que, quando se apanharem no Governo, uma das primeiras coisas que

vão fazer é privatizar a CP.

Fico contente por o Sr. Ministro ter concordado com o diagnóstico, mas vamos, agora, ao prognóstico e

gostaria de ouvir a resposta a algumas perguntas que lhe fiz, porque sei que gosta de dar a sua opinião.

Não consigo perceber o que é que o Governo tem contra trabalhadores nos Conselhos de Administração de

empresas públicas.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Outra vez?!

O Sr. Rui Tavares (L): — Trata-se de quem conhece o terreno, de quem conhece a empresa e de quem tem

um interesse maior na sua preservação. Noutros países, dentro e fora da União Europeia, funciona bem. Olhe

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que, na Suíça, por exemplo, não está na lei que é obrigatório e a empresa ferroviária tem trabalhadores no

Conselho de Administração. Gostaria de ouvir a sua resposta.

Gostaria de saber, também, se temos compromisso firme para que o passe ferroviário nacional esteja no

terreno em junho, como está no Orçamento do Estado, e se há um plano para o pagamento da dívida histórica

à CP.

Digo isto, porque essa dívida é o resultado de muitos anos em que a CP não recebeu aquilo que deveria.

Essa pergunta também já foi feita pelo PCP, a quem saúdo pela marcação do debate, porque as empresas

descapitalizadas, de que falava o Sr. Ministro na resposta anterior, têm resultados dramáticos para o País.

O Sr. Filipe Melo (CH): — Tens até às 17 horas!

O Sr. Rui Tavares (L): — Reduzem-se as empresas, perdem-se trabalhadores, recorre-se ao outsourcing e,

no fim disto tudo, pasme-se, os custos aumentam. É que nem para aquilo que é suposto ⎯ deixar as empresas

mais enxutas ⎯ isso serve. Acabamos a pagar mais por ter um pior serviço.

Portanto, é agora, na altura em que, aparentemente, estamos a caminho de um superavit, que o Governo

nos deve dizer com que prazo, com que ritmo, é que pretende pagar a dívida histórica do Estado português à

CP.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para encerrar esta segunda ronda, tem a palavra o Sr. Ministro das

Infraestruturas, João Galamba.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: ⎯ Sr. Presidente, Srs. Deputados, vou tentar responder de forma

sistematizada, começando pelo PSD.

Sr. Deputado, o Governo não tem nenhum problema em reconhecer que a programação de 2016 era

irrealista, tanto que, a seguir, a reviu. Sabe porque é que era irrealista, Sr. Deputado? Porque o Governo, quando

assumiu funções, em 2015, tomou duas decisões sobre os planos passados, que foi não os alterar, mantê-los e

executá-los. Isto em duas áreas: no aeroporto, onde herdou uma decisão do anterior Governo, Montijo, e, na

ferrovia, onde herdou os supostos planos e projetos e assumiu que, por uma questão de execução e rapidez,

iria manter o que veio do Governo anterior.

Sr. Deputado, não quero aqui arranjar desculpas, mas tenha bem presente que, nestas duas decisões, em

que o Governo decidiu manter e não alterar os compromissos do Governo anterior, numa, quem roeu a corda

foi o PSD, que passou a ser contra aquilo que tinha defendido.

O Sr. Jorge Salgueiro Mendes (PSD): ⎯ Oh!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: ⎯ Na outra, Sr. Deputado, ao menos reconheça que aquilo que o

Governo de 2016 decidiu manter era um planeamento, de facto, irrealista ⎯ concordo consigo ⎯, mas que era

um plano irrealista que vinha do Governo anterior. Aqui, se quiser, Sr. Deputado, há responsabilidades

partilhadas.

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — ainda não é desta que me vai responder!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: ⎯ Se calhar, o Governo devia ter suspeitado dos planos passados e

devia tê-los revisto ou, se calhar, o Governo passado deveria ter executado esses planos, o que não fez.

De qualquer forma, este é um debate ultrapassado, Sr. Deputado, porque este mesmo Governo,

reconhecendo que a programação de 2015 e 2016 era irrealista, alterou-a e o que está agora em curso, e em

obra, não resulta de um planeamento eficiente de 2016 ou de 2015.

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Houve um planeamento em 2019…

O Sr. Ministro das Infraestruturas: ⎯ Resulta de um novo planeamento e, face a esse planeamento, não,

Sr. Deputado, não há atrasos: a obra está em curso e está a decorrer com normalidade.

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Aplausos do PS.

O Sr. Deputado António Topa veio aqui dizer que é especialista em obras.

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Não disse isso!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: ⎯ Acredito que seja, mas também convém que saiba que os comboios

não voam, Sr. Deputado, porque, se é especialista em obras, tem de reconhecer duas coisas: se há obras na

Linha do Norte, é natural que os comboios que circulem na Linha do Norte tenham atrasos, Sr. Deputado.

Porquê? Porque está lá a obra a decorrer e só há uma Linha do Norte, não há duas.

Portanto, Sr. Deputado, das duas, uma: ou o Sr. Deputado não reconhece que há obra ⎯ e aí, estaria a faltar

à verdade, porque a obra efetivamente existe ⎯…

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Um terço do prometido!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: ⎯ … ou, se reconhece que a obra existe, ao menos, reconheça que,

havendo obra, como os comboios não voam, é natural que se demore, hoje, um pouco mais a fazer essa linha.

Mas, lá está, é por causa daquilo que o Sr. Deputado não gosta de ouvir: neste caso é mesmo verdade.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Neste caso!? Só neste caso!!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: ⎯ Há atrasos, apenas e só, porque há obra e a razão única desses

atrasos deve-se à obra e a nada mais. A razão é simples, Sr. Deputado, é porque os comboios não voam.

A seguir, o Chega, acho que não fez nenhuma pergunta, portanto, também não irá responder a nenhuma.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Perguntei se andava de comboio!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: ⎯ O Sr. Deputado apresentou como a grande causa para os comboios

as câmaras CCTV (closed-circuit television) ⎯ foi o que disse.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Está a confundir as intervenções!! Perguntei pelas greves!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: ⎯ Limitei-me a dizer que sou obrigado a concluir, Sr. Deputado, que

nunca pôs um pé num comboio, porque não percebeu que a generalidade dos comboios e, já agora, de metros,

de elétricos e de autocarros, têm essa tecnologia que o Sr. Deputado diz ser a grande falha na ferrovia em

Portugal.

Portanto, não tenho muito mais a dizer, até porque não foi feita mais nenhuma pergunta.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Confundiu os Deputados!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Na questão da Iniciativa Liberal, Sr. Deputado, não houve aqui

nenhuma diabolização da iniciativa privada. Não diabolizei ninguém.

O que disse foi que o Sr. Deputado apontou demora ou atrasos de obras a problemas no setor público e ao

modelo de financiamento — já não me lembro de qual era o termo que tinha utilizado. O que estou a dizer é que

não há aqui diabolização nenhuma, a não ser que o Sr. Deputado considere que a perspetiva no setor privado

é a da santificação e que, sequer, ousar apontar uma falha é inadmissível e é, de facto, um atentado à ortodoxia.

Como não partilhamos da mesma religião, neste caso, Sr. Deputado, não me leve a mal, mas não entendo

que apontar uma crítica ou um problema qualquer a uma empresa privada seja diabolizar o setor privado, porque

também sou capaz de apontar críticas ao funcionamento do Estado, sem que isso constitua a diabolização do

Estado.

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O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Responda lá às perguntas!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Não responde a nada!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Portanto, Sr. Deputado, limitei-me a dizer uma coisa muito simples:

a descapitalização e a demora também afetam empresas privadas no País, assim como a covid também afeta

empresas privadas.

Sobre a notícia relativa à questão dos atrasos e do risco de a obra derrapar — acho que foi o Sr. Deputado

do PSD que falou de 2025, que veio numa notícia na semana passada —, sobre isso, tenho a dizer duas coisas:

não, não há risco nenhum de a obra derrapar para 2025, ela será toda executada em 2024; e atrasos que

possam existir, e a dúvida é se será mesmo no início de 2024 ou se será em março, portanto, qualquer atraso

dessa natureza, como a própria notícia diz, é total e exclusivamente imputável a problemas nos privados.

São eles que dizem, portanto, não estou a diabolizar ninguém, Sr. Deputado. Agora, convém que não se

parta para estas análises com uma espécie de postura de santidade, em que os problemas e dificuldades estão

só do lado do Estado. Estão dos dois lados, Sr. Deputado.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — E Braga e Guimarães?

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — E uma posição equilibrada reconhece-os em ambos os lados.

Não me leve a mal, mas, aparentemente, quem está aqui a ter uma posição equilibrada sou eu, porque o Sr.

Deputado ficou logo todo abespinhado com a possibilidade de se ter apontado uma falha ou um problema no

setor privado.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Eu?!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Não fiz aquilo que aqui disse.

Sobre a consulta pública, Sr. Deputado, o Governo respeita os procedimentos que o próprio Governo escolhe

lançar — e, já agora, também respeita outros procedimentos, não apenas aqueles que o Governo escolhe lançar.

Neste caso concreto, o Governo optou por elaborar um plano ferroviário, recorrer à figura da discussão

pública e pô-lo em discussão. Isto responde à pergunta que fez. Sr. Deputado, na altura, não respondemos

porque estava em curso a discussão pública — não sei se a Iniciativa Liberal participou ou não na discussão

pública.

Protestos do Deputado da IL Rodrigo Saraiva.

O que a Iniciativa Liberal não pode fazer, até por respeito aos portugueses todos que participaram, é, a meio

de uma consulta pública, exigir um debate que irá ocorrer no fim, como deve ocorrer. E aí, Sr. Deputado, terá

todas as condições para perceber, em primeiro lugar, as escolhas que o Governo fez.

O Governo colocou o plano ferroviário em discussão não para fingir que quer ouvir as pessoas, mas porque

as quer ouvir. As pessoas participam, e foram muitas, e ainda bem. Agora, estamos a processar essas

participações, para depois fazer as alterações que se considerem justificadas. E, a seguir, o Governo trará o

plano ferroviário ao Parlamento, irá debatê-lo, inclusive com a Iniciativa Liberal, e pretende aprovar, neste

Parlamento, o plano ferroviário.

Se quer que lhe diga, gostava muito que a maioria dos partidos o apoiassem, porque, quanto mais partidos

apoiarem e se revirem no Plano Ferroviário Nacional, dado que ele não é um plano de execução de

investimentos a dois ou três anos, mais satisfeito fica o Governo. Isso significa que é um verdadeiro plano, que

é duradouro e que tem o respaldo num número suficientemente alargado de partidos e Deputados. Queremos

um plano credível, válido por bastante tempo e que pode, sem prejuízo de cada Governo tomar, depois, as suas

opções concretas e ter as suas prioridades, permitir termos um chapéu no qual a generalidade dos partidos se

reveem e que dá ao País um horizonte de concretização de um plano. Acho isso positivo.

Portanto, Sr. Deputado, o Governo trará o plano para discussão no Parlamento, teremos, certamente, um

longo debate e os partidos podem fazer novas sugestões.

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Aqueles que agora reconhecem que deviam ter participado na consulta pública e feito propostas, mas não o

fizeram, e estão arrependidos, têm ainda a oportunidade de o fazer. Sei que é o seu caso, Sr. Deputado …

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — O PS chumbou a nossa proposta!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — …, e do seu partido que está arrependido de não ter participado na

consulta pública, mas terá oportunidade para o fazer e, certamente, o Plano Ferroviário Nacional que o Governo

do Partido Socialista irá trazer a este Parlamento sairá daqui mais rico e melhor, já agora, também com a

participação e o contributo da Iniciativa Liberal.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — O PS chumbou!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Quanto ao PCP, houve aqui várias perguntas — feitas, também, pelo

Sr. Deputado Rui Tavares — sobre a dívida histórica.

Sim, estamos a trabalhar na resolução desse problema. A resolução desse problema não irá, como foi

sugerido agora pelo Sr. Deputado Rui Tavares, ser faseada. Vai ser de uma vez, e estamos a muito poucos dias

de fazer a notificação necessária para avançar com este projeto à Comissão Europeia.

Portanto, sim, estamos a trabalhar e o nosso objetivo é resolver este problema este ano,…

O Sr. João Dias (PCP): — E a Linha do Alentejo?

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — … para que, nomeadamente, a CP tenha condições para, através

dos seus próprios fundos e dos seus próprios meios, poder concorrer à alta velocidade, coisa que não poderá

fazer sem o saneamento da dívida.

Portanto, essa é uma questão prioritária para o Governo e, como consta do Orçamento do Estado, é para

concretizar este ano e, como disse, a coisa está bem encaminhada e estamos muito próximos de fazer a

notificação, que é obrigatória nos termos da legislação, à Comissão Europeia.

Quanto ao passe ferroviário, estamos a trabalhar nisso e, portanto, será também durante este ano.

O Sr. João Dias (PCP): — E a Linha do Alentejo? Não conhece?!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Sr. Deputado, estou a responder.

A Sr.ª Deputada Isabel Pires fez aqui uma coisa que o Bloco faz muitas vezes — e que, já agora, o PCP

também faz e fez neste debate — que é misturar vários temas, o que, de facto, não contribui para o debate.

A Sr.ª Deputada Isabel Pires misturou aqui projetos em obra, projetos cujo concurso está prestes a ser

lançado e projetos que constam de uma proposta para um plano futuro. Misturou tudo e disse que estava tudo

atrasado.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Estão todos atrasados!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Sr.ª Deputada, a bem do debate, há uma diferença entre obras que

estão, neste momento, em obra, no terreno, e que podemos discutir se estão atrasadas ou se não estão

atrasadas,…

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — E estão!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — … obras que estão em vias de ser lançadas, e que podemos discutir

se deviam ter sido lançadas mais cedo ou mais tarde, e obras propostas no Plano Ferroviário Nacional por este

Governo, que estão em consulta pública.

Sr.ª Deputada, não podemos misturar as três coisas. Tenho todo o interesse, e acredite que o Governo tem

todo o interesse, em debater cada uma delas, de forma séria.

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O Sr. João Dias (PCP): — Nota-se tão bem!!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Agora, a Sr.ª Deputada brandiu estas três realidades, misturando

tudo, tentando sugerir que estava tudo um caos e nada a acontecer.

Protestos da Deputada do BE Isabel Pires.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço que conclua, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Há umas que estão em obra e, portanto, estão efetivamente a

acontecer, outras estão a acontecer, no sentido de estar tudo preparado para lançar o concurso como estava

previsto, e outras colocámos para debate público do Plano Ferroviário Nacional.

Mas é o próprio modo como a Sr.ª Deputada coloca a questão que nem me permite que lhe responda, porque,

muito sinceramente, nem percebi a sua pergunta. Ao misturar tudo, efetivamente, acabou por não fazer nenhuma

pergunta.

Protestos da Deputada do BE Isabel Pires.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Peço que conclua, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Estou só a terminar, muito rapidamente, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — E os trabalhadores dos bares da CP sem três meses de salário?!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — A Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real falou aqui do Plano Ferroviário

Nacional e parecia que queria a concretização toda, a ligação dos comboios a todas as capitais. Vou dar-lhe

uma novidade, Sr.ª Deputada: se esse plano fosse construído amanhã, iriam ser abatidos muitos sobreiros,

porque é impossível encher o País de linhas de comboios.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Ah!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Ou seja, ouvindo a Sr.ª Deputada, parece que ou é zero sobreiros ou

é um crime.

Protestos do PAN.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Ministro, tem mesmo de concluir.

O Sr. João Dias (PCP): — Isso é porque o comboio vai ao comprido!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Sr.ª Deputada, convença-se de uma coisa: um ambientalismo que

constrói não é um ambientalismo que opina. O futuro verde é um futuro com obras, com coisas, com ferrovia,

com parques solares, com parques eólicos.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Muito obrigada, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Portanto, se a Sr.ª Deputada entende que só se pode construir essas

coisas que a Sr.ª Deputada quer sem derrubar um único sobreiro, tenho uma má notícia para si: não é possível.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Ministro, tem mesmo de concluir!

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O Sr. Ministro das Infraestruturas: — E é por essa razão que existem regras e procedimentos para se

avaliar como é que isso será feito, garantindo sempre que o impacto será o mínimo possível.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Isabel Pires (BE): — E os trabalhadores sem salário há três meses? O que é que lhes vai acontecer?!

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Passamos à fase de encerramento.

Para intervir em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Infraestruturas, Frederico

Francisco.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Agora vai responder às perguntas!

O Sr. Secretário de Estado das Infraestruturas (Frederico Francisco): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs.

Deputados: No final deste debate, acho que importa reafirmar o nosso compromisso com a ferrovia, em cinco

vertentes diferentes.

Reafirmo, em primeiro lugar, o compromisso com o investimento que está em curso, nas obras que estão no

terreno, sobre as quais já foram aqui dados números, no debate anterior. Neste aspeto, desafio quem quiser a

identificar quando é que foi a última vez que tivemos tantos quilómetros de linha em obra e tantas empreitadas,

em simultâneo, em todo o País, e quando é que tivemos investimento no material circulante, na recuperação

daquilo que existia e que podia ser colocado ao serviço rapidamente — e que foi — e permitiu estabilizar o

serviço e reduzir drasticamente as supressões, mas também na aquisição de novos comboios, que é algo que

não se fazia há mais de 20 anos em Portugal.

Em segundo lugar, sublinho o compromisso com o reforço do setor e das empresas públicas que atuam na

ferrovia: o contrato de serviço público com a CP que deu certeza e estabilidade à prestação desse serviço e que

foi determinante para que a CP pudesse ter apresentado os resultados que foram hoje conhecidos; e, depois, a

peça que falta na viabilização futura da CP enquanto empresa pública que é o saneamento da sua dívida

histórica, que acumulou ao longo de décadas, em que o serviço público não foi devidamente pago à CP pelo

Estado.

Estancámos a perda de quadros que se verificava na CP e na IP, com múltiplas contratações que têm sido

feitas ao longo dos últimos anos e com a estabilização dos quadros das empresas, que transformou estas duas

empresas em executores de investimento e não em empresas que estavam progressivamente a definhar.

Capacitámos as autoridades, o IMT (Instituto da Mobilidade e dos Transportes), para cumprir as suas funções

de supervisão técnica e de segurança do setor ferroviário.

Em terceiro lugar, o compromisso com a valorização das carreiras do setor ferroviário, que o Sr. Ministro

também já aqui mencionou, na sua intervenção inicial, e no qual trabalhamos numa base plurianual para, no

quadro desta Legislatura, recuperar a totalidade do poder de compra que foi perdido para a inflação.

Em quarto lugar, temos o compromisso com a indústria. Para isto, para que consigamos dar condições à

indústria, seja na infraestrutura seja nas obras ou no fabrico de material circulante e de outros equipamentos,

aquilo que temos de dar é estabilidade e perspetiva de investimento. Portanto, nesse aspeto, trabalhamos para

dar sustentabilidade e para dar certeza às empresas, para se instalarem em Portugal, para contratarem quadros,

para investirem em equipamento e para investirem em instalações.

E, finalmente, reafirmo o compromisso com o futuro da ferrovia, com um futuro próximo. Aí, aprendemos com

as falhas, que reconhecemos que existiram na execução do atual quadro de investimento e no planeamento

deste ciclo de investimentos, e foi por isso que começámos a lançar os projetos para o próximo ciclo de

investimentos, para o PNI (Plano Nacional de Investimentos) 2030, para os investimentos que são financiados

pelo próximo quadro europeu, ainda antes do próprio planeamento e de a própria programação dos fundos

europeus estar fechada.

Depois, para médio e longo prazo, o Plano Ferroviário Nacional, que é o instrumento que permitirá estabilizar

no País a rede ferroviária de que ele precisa. Recebemos centenas de contributos, muitos deles já foram e serão

integrados no plano, plano esse que depois, naturalmente, virá a este Parlamento, para que ele se pronuncie.

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Mas há uma coisa de que temos de ter consciência: não será em cinco, nem em dez anos que vamos

compensar as décadas de desinvestimento e chegar a todas as capitais de distrito e ter a rede totalmente

modernizada e conseguir ter uma rede que consiga acabar com os voos domésticos no território continental.

Falamos, muitas vezes, das décadas de investimento e podemos falar em várias escalas de tempo. Podemos

falar nos 10 anos, desde que o investimento na infraestrutura praticamente parou e paralisou. Podemos falar

em 20 anos, desde que foi encomendado e entregue o último comboio novo em Portugal. Podemos falar em

mais de 30 anos, desde que se atingiu o pico do número de passageiros transportados em ferrovia. Ou podemos

falar de 80 anos, desde que praticamente parou a expansão da rede ferroviária em Portugal e, na verdade,

desde que se iniciou o ciclo de contração da rede ferroviária, que estamos agora, pela primeira vez, a inverter.

Portanto, qualquer que seja a escala de tempos que escolhermos,…

O Sr. António Topa Gomes (PSD): — Depois de oito anos, lembraram-se! É agora!

O Sr. Secretário de Estado das Infraestruturas: — … qualquer que seja o número de décadas que

escolhermos, aquilo que estamos a fazer é a inverter todas estas tendências com linhas novas, com obras em

curso, com modernização das linhas existentes, com modernização dos comboios existentes e com a aquisição

dos comboios novos.

Concluo na mesma nota em que o Ministro iniciou a sua intervenção. O facto de sermos chamados a este

Parlamento várias vezes em poucas semanas para debater este tema é sinal de que, finalmente, o País está a

dar a atenção que é devida ao caminho de ferro e a exigir mais dele e a exigir mais de nós, no trabalho sobre o

caminho de ferro.

Da nossa parte, só podemos garantir que continuamos a trabalhar para dar resposta a essas exigências e

para que o País não volte a virar costas ao comboio, como aconteceu no passado. No que depender de nós,

este é um comboio que já saiu da estação e já não vai mais parar.

Aplausos do PS.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado Pedro Pinto, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr.ª Presidente, é para uma interpelação à Mesa.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sr.ª Presidente, é só para pedir que se distribua pelo gabinete do Sr. Ministro

das Infraestruturas as perguntas feitas pelo Chega, porque ele não ouviu todas as perguntas que o Grupo

Parlamentar do Chega fez. Assim, pedimos à Mesa que as faça chegar ao gabinete do Sr. Ministro, porque é

importante que não passe essa falsa questão de que nós não fizemos perguntas. Fizemos bastantes, o Sr.

Ministro é que não quis — ou então não sabia — responder.

Aplausos do CH.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Sr. Deputado, a Mesa não faz distribuir pelo gabinete do Sr. Ministro,

pode é fazer chegar as perguntas à bancada do Governo.

Para encerrar este debate tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos do Grupo Parlamentar do PCP.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro: Os problemas da ferrovia

não se resolvem com discursos mais ou menos eloquentes, mas sim com a concretização dos investimentos

que estão por fazer. Não bastam anúncios e promessas, é preciso muito mais.

Neste debate, o Governo não se comprometeu com a valorização de carreiras e das profissões dos

ferroviários, nem com a recuperação do poder de compra destes trabalhadores.

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O Sr. João Dias (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Onde está a contratação dos ferroviários que são necessários, a integração

dos trabalhadores dos bares dos comboios na CP? Onde está a modernização e eletrificação das Linhas do

Oeste ou do Alentejo — pergunta à qual não respondeu? Onde está a reabertura dos troços encerrados, a

requalificação das estações e a sua guarnição, a reversão da PPP do comboio da ponte?

Não está, Sr. Ministro. Esta é a realidade no terreno. Por mais que queira, não consegue esconder esta

realidade que, deixe-me que lhe diga, não é muito diferente dos anteriores Governos.

O País não precisa de proclamações. O País precisa de investimentos para a modernização da ferrovia,

precisa do alargamento da rede e da oferta de transporte público ferroviário com mais comboios e mais horários.

O que é preciso é romper com as opções políticas que têm vindo a ser seguidas. Nem o PS, nem o PSD,

nem o CDS, nem a Iniciativa Liberal e o Chega dão resposta, porque no essencial, todos defendem as mesmas

políticas responsáveis pelo desinvestimento, a degradação e o abandono da ferrovia: a sua liberalização e a

privatização.

É preciso uma política alternativa, patriótica e de esquerda, como o PCP propõe, que encare a ferrovia como

elemento estratégico para o desenvolvimento do País, para a sua modernização e progresso, mobilizando os

recursos financeiros disponíveis por via do Orçamento do Estado e de fontes de financiamento comunitárias que

garantam o adequado investimento assente em vários eixos, a saber, na reconstrução do setor ferroviário

nacional, com a reconstituição de uma CP única, pública e nacional, que assuma a exploração comercial de

toda a rede, que reintegre a REFER (Rede Ferroviária Nacional), as mercadorias e os terminais rodoferroviários,

com a reconstituição da capacidade pública de construção e manutenção da infraestrutura e com o reforço do

quadro técnico e operacional das empresas ferroviárias. É neste âmbito que se enquadra, também, a reversão

da parceria público-privada do comboio da ponte.

Outro dos eixos é o da concretização de um plano nacional para o material circulante, que planifique os

investimentos na frota para as próximas décadas, tendo em conta o tempo de vida expectável do material

existente, assim como as necessidades de aumento da oferta de transporte público ferroviário, garantindo, na

fase de construção, uma maior incorporação nacional.

É necessária também a valorização dos ferroviários, nas suas carreiras e profissões, no aumento dos

salários, na recuperação do poder de compra — a decisão do Governo é insuficiente — no reforço de direitos.

É preciso que se proceda à contratação dos trabalhadores para pôr fim a estações abandonadas, para suprir as

necessidades operacionais na manutenção, para promover o crescimento da operação e para reconstruir uma

engenharia ferroviária, e que se internalizem todas as atividades, dos bares nos comboios à manutenção das

infraestruturas.

É inaceitável que o Governo ainda não tenha dado resposta aos trabalhadores dos bares dos comboios em

luta há mais de dois meses. É responsabilidade do Governo assumir os contratos de trabalho com os 123

trabalhadores e integrá-los na CP, assim como proceder ao pagamento dos salários devidos.

É necessário também melhorar a intermodalidade na bilhética e a progressiva gratuidade do sistema.

Também importa concretizar investimentos na rede e serviços, nomeadamente na modernização e eletrificação

da rede ferroviária nacional nas Linhas do Algarve, do Oeste, da Beira Alta, do Douro, do Leste, de Cascais, do

Alentejo, de Casa Branca a Beja e a Ourique, com a variante ao aeroporto de Beja, bem como a quadruplicação

entre Roma-Areeiro e Braço de Prata, na Linha de Cintura e de Contumil a Ermesinde na Linha do Minho.

Não esqueçamos a construção da terceira travessia rodoferroviária sobre o Tejo, bem como a construção

faseada da nova linha para alta velocidade Lisboa-Porto e a conclusão da ligação Évora-Elvas, assegurando o

seu pleno aproveitamento para o transporte de passageiros e de mercadorias, com a construção de terminais

rodoferroviários.

Importa repor os comboios noturnos para Madrid e Hendaya, bem como o aumento da oferta na Linha do

Sul, recuperando a ligação a Alcácer do Sal. É necessária a criação de um serviço regular entre a Guarda, a

Covilhã e o Fundão, bem como a construção de ligações de Braga a Guimarães e a Barcelos ou a reposição

das ligações ferroviárias a Vila Real e Bragança, entre outras.

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Finalmente, é necessária a requalificação das estações e apeadeiros, o reforço da sua guarnição e a retoma

do processo de supressão de passagens de nível, introduzindo melhoramentos reclamados pelos utentes,

trabalhadores e populações.

Esta é a política alternativa necessária na ferrovia, que contribui para a dinamização da atividade económica

do País e do aparelho produtivo, para a criação de emprego, para a coesão territorial, para a promoção do

ambiente e do transporte público, reduzindo a utilização de transporte individual, para a modernização e o

desenvolvimento do País.

É com esta política alternativa que o PCP está comprometido: com o reforço do investimento na ferrovia,

mas, sobretudo com a promoção do transporte público ferroviário para os utentes, alargando esta resposta tão

essencial para o nosso País.

Aplausos do PCP.

Neste momento, assumiu a presidência o Presidente, Augusto Santos Silva.

O Sr. Presidente: — Boa tarde a todos.

Assim terminamos o ponto 1 da nossa ordem do dia.

Passamos ao ponto 2, que consiste na apreciação da Proposta de Lei n.º 39/XV/1.ª (GOV) — Clarifica a

intervenção dos municípios nos procedimentos de construção, ampliação ou modificação de um aeródromo, que

arrasta o Projeto de Lei n.º 704/XV/1.ª (CH) — Altera o Decreto-Lei n.º 186/2007, de 10 de maio, que fixa as

condições de construção, certificação e exploração dos aeródromos civis nacionais.

Para apresentar a Proposta de Lei n.º 39/XV/1.ª (GOV), tem a palavra o Sr. Ministro das Infraestruturas, João

Galamba.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A presente proposta de lei

visa proceder à segunda alteração ao Decreto-Lei nº 186/2007, de 10 de maio, que consagra as condições de

construção, certificação e exploração de aeródromos civis nacionais. Estabelece os requisitos operacionais,

administrativos, de segurança e de facilitação a aplicar nessas infraestruturas e procede também à classificação

operacional dos aeródromos civis nacionais para efeitos de ordenamento aeroportuário.

A presente iniciativa, considera o Governo, é determinante para resolver os problemas no setor e tem por

objetivo rever e clarificar a legislação atualmente em vigor, com o intuito de garantir a concretização de

investimentos considerados de superior interesse nacional, em particular a construção de aeroportos.

Esta alteração cria um sistema diferenciado de certificação para aeródromos e aeroportos, considerando que

o parecer dos municípios é indispensável no que concerne a projetos locais. Clarifica-se que os pareceres dos

municípios não podem produzir efeitos jurídicos com fundamento político no que concerne a projetos de âmbito

regional ou nacional.

Esta alteração clarifica que os pareceres dos municípios são relevantes, embora não vinculativos, quando se

trate de infraestruturas de âmbito regional ou nacional. Aliás, o direito de veto não constitui nenhum

reconhecimento da autonomia do poder político, porque se pergunta o que aconteceria num caso em que o

município veta e todos os outros estão a favor.

É por essa razão que existem diferentes níveis de poder, e é por essa razão que existe o poder local, o poder

nacional e, já agora, o poder europeu. É exatamente porque se reconhecem diferentes esferas de jurisdição e

que os poderes devem ser articulados e exercidos em determinadas condições e não noutras.

É claro para todos que as condições de construção, de certificação e de exploração de aeródromos civis não

podem dispensar a intervenção dos municípios cujos territórios são afetados pela sua construção e operação,

mas também é óbvio que o País não pode ficar refém do poder de veto de um único município.

Respeitar a autonomia do poder local não é dar soberania e poder absoluto a um município. É, antes,

reconhecer a especificidade dos municípios, o seu âmbito de atuação, o modo como o poder local se articula

com o poder nacional e definir esferas de atuação próprias onde esses poderes se podem exercer sem conflito.

O País não é a soma de 308 municípios. Tem 308 municípios, mas não resulta da soma dos 308 municípios,

pela simples razão de que um Estado é mais do que a soma das partes.

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Isto não constitui, de modo algum, uma crítica ou desvalorização do poder local, mas o seu reconhecimento,

a sua importância na esfera própria e, sobretudo, a sua compatibilização com o Governo da República, porque

um Estado funcional reconhece isso. É isso também que esta proposta de lei faz.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro tem um pedido de esclarecimento. Para formulá-lo, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Inês de Sousa Real, do PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, relativamente a esta matéria, parece-nos

que, mais uma vez, estamos a mudar as regras após o jogo ter sido distribuído. Há, de facto, aqui uma manobra

por parte do Governo, nomeadamente para que consiga construir o aeroporto no Montijo. É essa,

inevitavelmente, a perceção da opinião pública.

Porém, para além de deixar de ser vinculativo o parecer das autarquias locais, não vemos qualquer tipo de

contrapartida. O Sr. Ministro falou na importância da questão nacional e de não haver esta obstaculização por

parte do poder local, mas, tendo em conta o impacto ao nível do ruído, do ambiente, entre outras matérias

igualmente relevantes, seria importante percebemos, no caso de impactar com a biodiversidade, porque não

propõe o Governo, por exemplo, um parecer vinculativo por parte do ICNF (Instituto da Conservação da Natureza

e das Florestas)?

Ou até mesmo, tendo em conta o impacto na neutralidade climática, porque não avançar com o Conselho da

Ação Climática, que está pendente, de momento, nesta Assembleia da República? Porque não solicitar um

parecer a outras entidades, como à própria Autoridade dos Transportes, considerando o impacto que as

soluções aeroportuárias necessariamente vão ter do ponto de vista das infraestruturas?

Também nos poderia trazer, por exemplo, uma proposta para que a Autoridade da Mobilidade dos

Transportes (AMT) e o IMTT (Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres) tenham um parecer

vinculativo.

Por isso, Sr. Ministro, a nossa preocupação vai no sentido de perceber se queremos estar todos limitados à

vontade hegemónica por parte do poder Governo ou se, de facto, vai permitir que, em sede de especialidade,

possam ser chamadas à colação outras entidades para não termos aqui mais uma vez o rolo compressor da

maioria absoluta a passar por cima das autarquias locais…

O Sr. Presidente: — A Sr.ª Deputada tem de concluir.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Estou mesmo a concluir, Sr. Presidente.

Importa saber se o Governo pretende passar por cima também de outros valores ambientais — se bem que

já deixou clara a sua posição em relação aos valores ambientais.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Infraestruturas.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: —Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, obrigado pelas perguntas.

Não me leve a mal, mas todas as situações que identificou estão previstas na lei e têm procedimentos

próprios.

Protestos do PAN.

A Sr.ª Deputada diz que era importante que houvesse um parecer do ICNF: a lei já determina em que

condições é que há um parecer do ICNF; fala em contrapartidas: o regime de AIA (Avaliação de Impacto

Ambiental) já prevê tudo isso.

A Sr.ª Deputada parece desconhecer os procedimentos de avaliação que ocorrem para abate de árvores e

para a realização de determinados projetos. Tudo isso já existe, Sr.ª Deputada.

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Sobre a lei do ruído, diga-me uma coisa: porque é que acha que existe um procedimento de AIA com uma

comissão de avaliação, onde os municípios relevantes participam e são consultados? A Sr.ª Deputada acha que

o município devia dar um parecer ambiental autónomo do regime de AIA?

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Acho!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Acha? Percebe o absurdo que isso é?!

Imagine a situação em que há um regime de AIA que decorre, nos termos da lei, com o envolvimento de

todas as entidades, nomeadamente das entidades que a Sr.ª Deputada referiu, e que diz x. A seguir, um

município que participou pode inclusivamente dizer y? E depois, como é que gere os dois?

Protestos do PAN.

As coisas têm procedimentos e regras próprias, e tudo o que a Sr.ª Deputada aqui identificou já tem

procedimentos e regras próprias onde isso é tratado nos termos adequados. Multiplicar pareceres e

procedimentos levaria, no limite, a um conflito, e quando há um conflito entre duas partes, temos de criar uma

terceira para o gerir.

Portanto, o que a Sr.ª Deputada está a propor é um encher de procedimentos, quando já os temos. Abater

sobreiros consta da lei, está definido como é que é possível, quem é que autoriza, em que termos é que é

autorizado e que mecanismos compensatórios é que existem — idem no regime de AIA.

Devemos levar a sério as leis que aprovamos — ou o Parlamento, ou o Governo —, porque esses

procedimentos devem ser respeitados também por quem os aprova!

A Sr.ª Deputada parece reclamar-se grande defensora ambiental, mas depois desvaloriza, minimiza ou então

simplesmente desconhece — às vezes fico sem saber, muito sinceramente! — os procedimentos que vão

exatamente ao encontro daquilo que a Sr.ª Deputada defende.

Protestos do PAN.

Tenho alguma dificuldade em compreender.

Sr.ª Deputada, não há nenhum rolo compressor de nada, havia uma anomalia. Não faz sentido ter

infraestruturas de âmbito nacional sujeitas ao poder de veto de um município.

Imagine o que seria, Sr.ª Deputada, se tivéssemos de ter pareceres de todos os municípios para construir a

autoestrada A1 e a autoestrada A2? Acho que ainda estávamos a meio do projeto e teríamos uma autoestrada

assim, porque, se cada município…

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, tem de concluir.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Repare no que é que a Sr.ª Deputada defende. A Sr.ª Deputada

defende, acha muito bem, que cada município, individualmente, que tenha um poder de veto sobre

infraestruturas de âmbito nacional.

Isso só tem uma conclusão: torna-se inviável para o País deliberar, decidir e construir infraestruturas de

âmbito nacional.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Chamem-se elas aeroportos,…

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, vou repetir, o Sr. Ministro tem de concluir. Muito obrigado.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — … autoestradas ou qualquer outra coisa.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: — Para apresentar a iniciativa do Chega, tem a palavra o Sr. Deputado André Ventura.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: A proposta que o Governo nos

traz aqui, hoje, transmite a ideia ao País de que quando alguma coisa se põe no caminho do PS, há duas formas

de resolver, mas, a mais fácil, a mais habitual, a permanente, é só uma: remove-se o que temos pela frente para

se cumprir a vontade que temos.

Eu não queria começar a apresentação deste projeto sem trazer a este Parlamento — não é nada sobre o

Brasil, Sr. Presidente — a Associação Nacional de Municípios e o parecer que entregou sobre este projeto.

Como é que é possível que uma associação que devia defender os municípios, quando um projeto do

Governo é para tirar o poder de veto aos municípios, vem dizer que não tem nada a obstar? É o bom exemplo

de como os tentáculos do PS pelo aparelho de Estado, pelas associações e pelos organismos estão a destruir

a democracia em Portugal.

Aplausos do CH.

É um bocado como esta história do juiz Ivo Rosa. Quando não se gosta de um juiz ou do Tribunal Central de

Instrução Criminal ou do Ministério Público, desmantelam-se tribunais, destroem-se juízes, tiram-se meios à

justiça. Aqueles de quem gostamos, vão para a Europa, para cargos de luxo propostos pelo Governo. É assim

que o PS faz e, por isso, há de ser sempre assim que o PS faz, porque quando não gosta de alguma coisa, só

sabe revogar, destruir e depois pôr à sua mercê.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — 50 anos!

O Sr. André Ventura (CH): — Claro que este projeto tem vários problemas para os quais o PS preferiu não

olhar.

Em relação à legislação europeia nesta matéria, há um parecer claríssimo da Autoridade Nacional da Aviação

Civil (ANAC), que dá ao PS e ao Governo a possibilidade de alterações que, essas sim, iriam ao encontro

daquela que é a legislação europeia nesta matéria, nomeadamente ao poder dos municípios. O PS prefere fazer

só uma coisa, que é dizer: «Se não querem a minha localização do aeroporto, então eu não mudo a localização,

não mudo o teor dos pareceres, tiro-vos a vocês o poder de dar qualquer parecer e desse parecer ser tido em

conta.» É a forma socialista de trabalhar, que é dizer: «Ou concordam connosco ou levarão à mesma com as

coisas, concordem ou não concordem connosco.»

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem!

O Sr. André Ventura (CH): — Isto não se chama democracia; chama-se ditadura e povo socialista a encher

o aparelho do Estado.

Aplausos do CH.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — E está a defender a democracia, imagine-se se não estivesse!

O Sr. André Ventura (CH): — Claro que esta foto ficará para os anais parlamentares, em que Pedro Nunes

Santos respondia ao Chega dizendo: «Não se enganem, Srs. Deputados, Sr. Deputado André Ventura, sou eu

que decidirei a localização do novo aeroporto.»

O orador exibiu o documento que mencionou.

Eu agora não o vejo aqui neste debate,…

Risos do CH.

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… estará, provavelmente, ou na Comissão de Inquérito à TAP ou escondido debaixo da mesa, mas podia

estar aqui, o jovem turco podia estar aqui, mas não está. Não está, e sabem porquê? Porque tal como nesta

localização do aeroporto, é trapalhada atrás de trapalhada, engano atrás de engano, mentira atrás de mentira,

sempre com o mesmo objetivo: satisfazer o PS, prejudicar Portugal.

Aplausos do CH.

É sempre esse o objetivo do Governo socialista.

Por isso, Sr. Presidente, nós não acreditamos — e eu quero deixar aqui claro —, não acreditamos nem

confiamos que o PS faça a coisa certa nesta matéria. Não confiamos, nem acreditamos que, sem o parecer das

câmaras e sem a sua obrigatoriedade, o PS cumpra aquele que é o interesse regional, o interesse local e o

interesse ambiental.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Mas as câmaras existem.

O Sr. André Ventura (CH): — Por isso, propomos neste projeto de lei que, quando o PS invocar o superior

interesse nacional, ele tenha de ser validado por esta Assembleia da República e não apenas por uma escolha

à porta fechada, entre o Ministro João Galamba e o Primeiro-Ministro, António Costa, ou numa troca de

conversas do WhatsApp entre o Ministro João Galamba e o seu secretário de Estado, ou entre alguma empresa

pública.

Preferimos que seja com o apoio do Parlamento e com a aprovação parlamentar. Fazer o contrário é dar azo

a continuar as trapalhadas a que estamos a assistir e que o País todo está a ver.

Agora foi na TAP, daqui a uns anos estaremos a discutir uma comissão de inquérito à construção do

aeroporto. Não contem connosco para isso.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, em nome do Grupo Parlamentar do PS, o Sr. Deputado André

Pinotes Batista.

O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado:

Permita-me, antes de mais, que faça uma referência ao dia de hoje em que se celebram os 50 anos da fundação

do Partido Socialista.

Aplausos do PS.

Que grande orgulho pertencer a um partido e a uma força parlamentar que nos permite, por exemplo,

constatar o seguinte: já no debate anterior, da ferrovia, tínhamos percebido que o alfa da noção não tinha

passado em todos os apeadeiros parlamentares, mas agora ficou confirmado também neste debate.

A democracia permite-nos isto, permite-nos dizer aquilo que pensamos, lutar por aquilo em que acreditamos

e até, Sr. Presidente, nesta Casa, que é chão comum de todos os democratas, ouvir coisas em que custa muito

acreditar.

Disse a Deputada Inês de Sousa Real, na sua intervenção, que não se podem mudar as regras a meio do

jogo. Antes de mais, Sr. Deputada, isto não é um jogo, é o desenvolvimento da economia nacional, é o

desenvolvimento de todo um setor. Mas, ainda que a Sr.ª Deputada o quisesse considerar um jogo, não poderia

deixar de ter a noção do seguinte: o jogo da economia joga-se em permanência.

Protestos do PAN.

E quando nós nos apaixonamos pelos nossos próprios soundbites, quando os repetimos tantas vezes —

porque o Grupo Parlamentar do Partido Socialista tem ouvido esta ideia, de que esta é uma alteração à medida

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de uma localização —, o que vos acontece nesta ligação PAN e Chega, que não é nova, mas que ainda espanta,

tem a ver com o seguinte: os senhores desligam da realidade.

Risos do Deputado do CH André Ventura.

Nós não estamos a alterar para nenhuma localização, nós estamos a fazer uma alteração com ponderação

e com bom senso.

O Sr. Deputado André Ventura já nos tinha habituado a querer ser ele a dizer que era a voz do povo, mas

hoje quer ser mais, quer ser ele a dizer o que é que o Governo diz ao povo. Não lhe permitimos, Sr. Deputado,…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Faz parte do Governo?!

O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ … e não lhe permitimos pelo seguinte: se fosse real aquilo que o Sr.

Deputado André Ventura aqui disse, que só havia um bom juízo quando o juízo fosse feito pelas autarquias, na

sua teoria do tentáculo, uma novidade tinha para lhe dar: a maioria dos autarcas é socialista.

O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ E o que está implícito no seu raciocínio é que o senhor tem uma visão

tentacular de tudo aquilo em que manda, de tudo aquilo em que lidera.

O Sr. António Caracol (PS): ⎯ Muito bem!

O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ Nós não. Nós respeitamos mesmo a autonomia do poder local,…

O Sr. André Ventura (CH): — Respeitam, respeitam!

O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ … porque nós temos o maior número de autarcas a liderar câmaras,

mas também temos muitíssimos autarcas de qualidade que estão na oposição.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Alguns estão na prisão!

O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ Eu percebo que o Sr. Deputado não compreenda o que é que é o

poder local democrático, mas é preciso fazer este sublinhado.

Esta Proposta de Lei n.º 39 vem clarificar um decreto-lei, que tinha razão de ser, que vem regulamentar como

é que nós podíamos construir, certificar e explorar aqueles que eram aeródromos do tipo I, II, III e IV, a que o

Sr. Deputado não aludiu, misturou tudo, mas isso também faz parte da dialética populista.

O Sr. André Ventura (CH): — É o IV!

O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ O que vamos, agora, fazer é clarificar o seguinte: algum português

compreende que para se tomar uma decisão estratégica, para se fazer uma planificação estratégica de um País,

se possa ficar refém de um interesse de um só território?

O Sr. André Ventura (CH): — Para o seu território!

O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ Olhe, deixe-me dizer-lhe, acho que os interesses desses territórios

são legítimos, mas tem de ser com ponderação e com bom senso, em que, no arco daquela que é a nossa

Constituição e o nosso ordenamento jurídico, cada autarquia cumpra o seu papel.

Quero dizer-lhe, aliás, o seguinte: é falso que deixem de ser auscultadas. Pelo contrário, naqueles que são

os aeródromos do tipo I, II e III, continuarão a ser auscultadas e a ter parecer vinculativo; e nos de tipo IV,

também continuarão a ser consultadas, mas nós não fazemos confusão entre o que é participação e o que é

imposição.

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O Sr. André Ventura (CH): — Claro, claro!

O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ Compreendemos bem a sua prática política e, não querendo fazer

publicidade a nenhum órgão de comunicação social, há um podcast de Vítor Matos muito interessante para

compreender como é que vê a realidade política, mas não é assim que nós a vemos.

O Sr. André Ventura (CH): — Podia passar aqui o podcast!

O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ Nós respeitamos mesmo todas as forças partidárias e todos os níveis.

Protestos do CH.

Mas deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado, aquilo que estava como espírito do legislador, em 2007 — num mundo

ainda menos globalizado do que aquele em que vivemos hoje, num mundo menos concorrencial entre as

companhias aéreas, onde mesmo a geopolítica económica era diferente —, foi um progresso. E o que nós

queremos hoje é melhorar esse progresso, é tornar as coisas mais balanceadas e equilibradas.

Sr. Deputado, a proporcionalidade da nossa arquitetura jurídica devia interessar o Prof.º André Ventura, mas

como eu estou a dirigir-me ao Deputado André Ventura, já percebi que isso assim lhe interessa pouco.

O Sr. André Ventura (CH): — Mas há, ou não, regras europeias? Não sabe!

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Sabe lá ele!

O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ E é importante dizer o seguinte: para que nós possamos, finalmente,

ter o que todos proclamam, mas apenas o Grupo Parlamentar do Partido Socialista tem dado passos, que é a

expansão da capacidade aeroportuária de Lisboa, este é um passo indispensável.

Os Srs. Deputados não podem continuar a vir à segunda, quarta e sexta queixar-se de que o aeroporto que

bloquearam à terça e quinta não está feito.

Mais, esta não é só uma questão do setor aeroportuário, porque se o Sr. Deputado quiser ir pegando naquele

que foi o exemplo dado pelo Sr. Ministro João Galamba, quer imaginar o que era termos 308 queijos Limiano?

Faz sentido e é normal que os autarcas de cada sítio o façam,…

O Sr. André Ventura (CH): — Foi o PS!

O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ … mas o Sr. Deputado gosta, com certeza, de fazer essas críticas à

segunda, quarta e sexta, não pode esquecer-se, depois, do que disse na terça e quinta-feira.

Imagine, então, que em relação ao TGV (train à grande vitesse), em vez de ser pensado como uma estrutura

modernizadora da nossa economia, da nossa mobilidade e do nosso território, tinha de se começar, no norte do

País, a perguntar a cada município se sim ou se não, e depois faria o ziguezague.

E o Sr. Deputado faria a viagem que está a convidar-nos a fazer, que é a da irresponsabilidade.

O Sr. André Ventura (CH): — Que vocês aprovaram!

O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ Pois, Sr. Ministro, eu termino com isto: às vezes, para ser estadista, é

preciso ser estadista. É tautológico, mas é mesmo assim.

Para tal, mudamos uma lei, porque ela tem de ser mudada. É só isto, Sr. Ministro. A mudança desta lei terá

o voto favorável do Partido Socialista,…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — A sério? Vão votar a favor de uma proposta de lei do Governo?! Perderam a

cabeça!

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O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ … porque é uma alteração ponderada, de bom senso e que os outros

partidos, fora desta bolha parlamentar, um dia também apreciarão.

Aplausos do PS.

O Sr. João Dias (PCP): — Deviam pensar igual para a saúde e para a educação!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o Sr.

Deputado João Barbosa de Melo.

O Sr. João Barbosa de Melo (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A proposta de lei do Governo

visa, como já vimos, no essencial, retirar aos municípios uma espécie de direito de veto que o tal Decreto-Lei

n.º 186/2007 lhes deu nas decisões de construção e ampliação de aeroportos.

No tempo que corre, os principais visados são os municípios afetados pela futura solução aeroportuária de

Lisboa, que ninguém sabe ainda onde ficará localizada, até, pelo menos, a comissão técnica terminar o seu

trabalho.

A responsabilidade de quem governa há sete anos e meio — nunca é demais lembrá-lo — não pode, porém,

continuar a diluir-se em comissões, em pandemias, na guerra ou naquela lengalenga habitual da

corresponsabilidade ou da responsabilidade dos que governaram antes. Já passou, aliás, hoje por este debate

essa lengalenga, como é costume.

Ninguém aqui tem dúvidas de que a nova solução aeroportuária para Lisboa já era urgente há dez anos, não

é agora,…

Protestos do Deputado do PS André Pinotes Batista.

… e que a situação piora de dia para dia, colocando em risco o hub de Lisboa e a própria TAP.

Partilho só o que aconteceu ontem, num voo que chegou de Caracas, bem cedo de manhã, o voo TP173. A

viagem correu bem, os passageiros estavam satisfeitos, porque o voo chegou antes da hora, vejam lá!

A passageira Maria ia, finalmente, conseguir apanhar a ligação para Munique, sem problema; o passageiro

Manuel ia conseguir vir para casa, apanhar os filhos e levá-los à escola. Tudo satisfeito, cinco estrelas para a

TAP.

Eis senão quando, depois de uns minutos dentro do avião parado, o comandante vem aos microfones explicar

que aguarda indicações para estacionar. O relógio vai correndo, o tempo vai passando e, finalmente, quando as

portas do avião se abriram, 300 passageiros tinham estado 1 hora e 40 minutos — repito, 1 hora e 40 minutos

— à espera num avião parado. E lá perdeu a Maria o voo de ligação e lá ficou o Manuel sem levar os filhos à

escola.

Mesmo que haja explicação para este caso concreto, uma coisa já há muito experimentámos: situações deste

tipo acontecem vezes demais no aeroporto de Lisboa. E acontecem, claro, porque o aeroporto está a rebentar

pelas costuras, está incapaz de resolver coisas que, normalmente, noutros aeroportos se conseguem facilmente

resolver. E nem se vislumbra a solução, nem sequer se vislumbram cuidados paliativos para isto nos próximos

tempos.

Depois de décadas a ponderar, a estudar, ainda nem sequer conseguimos chegar à localização, mas já lá

vamos. Será que, então, ao fim de sete anos e meio de uma governação socialista viciada em culpar quem

esteve antes, será que é agora que o Governo vai mesmo decidir? Esperamos que sim, oxalá seja assim.

Com esta proposta que está aqui hoje em debate, o Governo prepara o caminho para que nenhum município

se atreva a meter paus na roda, daqui para diante. Mexer em questões como esta, de qualquer forma, devia

exigir muito bom senso. Para o PSD, a autonomia do poder local é um ponto-chave da nossa arquitetura.

Aplausos do PSD.

Protestos do Deputado do PS André Pinotes Batista.

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Tem de continuar a ser assim. Há uma esfera local, uma esfera regional e uma esfera nacional, e as três têm

de ser chamadas às decisões. Assim, e no respeito por esta autonomia, acreditamos que os municípios afetados

não podem deixar de ser ouvidos, consultados e envolvidos ativamente nas decisões.

Para o PSD, é fundamental, em opções de política pública como esta, que se ponderem os interesses de

todos os afetados,…

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Isso está na lei!

O Sr. João Barbosa de Melo (PSD): — … que se clarifiquem as condicionantes que vão ser lançadas sobre

o território, nomeadamente as que resultam de constrangimentos de uso do solo ou de riscos ambientais. Daí

que não faça sentido nenhum afastar os municípios deste processo.

Acompanhamos, assim, os reparos que tanto a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP)

como o município de Lisboa fazem à proposta de lei, quando afirmam que «o Governo devia instituir um

mecanismo que indicasse os fundamentos, […] um mecanismo que evitasse que a posição dos municípios fosse

“suprimida ou esvaziada”», diz a Câmara de Lisboa.

Como também diz a Associação Nacional de Municípios Portugueses, o que se devia instituir era «um

mecanismo de concertação e harmonização de interesses, que propicie que o Estado e os municípios articulem

as políticas e os interesses a proteger, (…) à semelhança do que ocorre em matérias de ordenamento do

território».

Finalmente, o PSD também acompanha os dois pareceres referidos no que se refere à eliminação da

«possibilidade de projetos de interesse nacional serem obstaculizados por meras razões de divergência

política».

Estando o nosso País neste compasso de espera, até ao final dos trabalhos da comissão técnica

independente, há tempo para fazer uma lei melhor que esta. Havia tempo para fazer uma lei melhor que esta,

sem atribuir poderes de veto injustificáveis — sim —, mas salvaguardando o envolvimento e a participação de

todas as pessoas e entidades que têm interesses no território.

Para resolver o problema dos vetos injustificados, pode fazer-se melhor. É com mais participação cívica e

mais envolvimento municipal — e não o contrário! — que podemos ter melhor decisões públicas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Rui Tavares, do Livre.

O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se há coisa que não se deve fazer — aprende-se

isto nas escolas — é legislar ad hominem, ou seja, para uma pessoa em concreto. Aqui, neste caso, temos uma

legislação que é ad municipium, ou seja, é para um município, aliás, para dois — para a Moita e para o Montijo.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Era Moita e Seixal! Não tem nada a ver com o que está a dizer!

O Sr. Rui Tavares (L): — Portanto, o Sr. Ministro diz-nos aqui: «imaginemos que um município decide ter

uma tal falta de solidariedade que decide travar o desenvolvimento do País. O que é que nós faríamos?» Sr.

Ministro, não é preciso imaginar, pois não estamos a falar de uma coisa em abstrato, estamos, sim, a falar de

uma coisa em concreto. São dois municípios, em particular um — o Montijo —, que é contra a localização do

aeroporto no Montijo. E é por causa disso que estamos aqui e, portanto, mais vale assumi-lo.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — O Montijo era a favor, Sr. Deputado!

O Sr. Rui Tavares (L): — Ainda por cima, o município em causa tem razão nas questões ambientais, tem

razão na pressão sobre o estuário, tem razão na pressão sobre aquela população.

Portanto, se se quer evitar a impressão de que se está a legislar para um caso concreto, então feche-se a

decisão do aeroporto e, depois, legisle-se, ou seja — como já foi aqui dito, e bem —, mudem-se as regras depois

do jogo jogado.

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Há pouco, o Sr. Deputado André Pinotes Batista dizia, com o entusiasmo dos 50 anos do PS — parabéns ao

PS pelos seus 50 anos! —, que a lei tem de mudar porque tem de mudar, mas este não é o argumento certo.

Acho que o PS, com os seus 50 anos, já devia ter aprendido uma coisa: quando muda a lei para evitar sarilhos

pequenos — Sarilhos Pequenos são na Moita —, acaba por se meter em sarilhos grandes — Sarilhos Grandes

ficam no Montijo. Ou seja, muda a lei porque há uns autarcas que são chatos, mas, depois, tem os cidadãos

que veem e que se apercebem de que há um Governo…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. Rui Tavares (L): — … que muda a lei porque tem de ser mudada, porque passa por cima de toda a

gente, e, dessa forma, é que se mete nos sarilhos grandes que aqui já vimos.

O Sr. Presidente: — Para intervir, em nome do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana

Mortágua.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Falou-se de Sarilhos Grandes, um sítio,

aliás, conhecido pelas suas enguias, e de Sarilhos Pequenos. Por aqui, também não faltam posições que mais

parecem posições de enguias.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — De enguias, gosto!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Falemos sobre desconhecimento de legislação e vamos deixar de fingir que

chegámos aqui, vindos do nada — tal como disse o Sr. Deputado Rui Tavares —, e que esta não é uma alteração

da lei feita à medida, para uma decisão que é a de fazer um aeroporto num sítio em concreto.

Mas, antes disso, vamos falar sobre desconhecimento da lei, sobre desconhecimento das obrigações

ambientais, internacionais e nacionais, do Governo de Portugal. Vamos falar do facto de o Governo ter ignorado

que era obrigado a fazer uma avaliação ambiental estratégica para a decisão do aeroporto de Lisboa e de se ter

comprometido com um aeroporto no Montijo que, no mínimo, viola um conjunto enorme de normas e de regras

de proteção ambiental, nomeadamente a obrigação de uma avaliação ambiental estratégica.

Vamos falar do facto de o Governo ter ignorado que existe — bem ou mal, mas existe! — uma lei que dá

poder de veto aos municípios que se sintam afetados por uma infraestrutura desta dimensão, com este impacto,

e de ter sido a ANAC que veio dizer que não dava parecer sobre o aeroporto no Montijo, porque o projeto do

aeroporto não cumpria sequer a lei que dava poder de veto aos municípios. Neste caso, gostava de perguntar

ao Sr. Ministro João Galamba se foi desconhecimento, foi irresponsabilidade, o que é que foi?

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Desconhecem a lei ou, pura e simplesmente, resolveram ignorá-la a ver se

ninguém dava por ela, até que a ANAC veio dizer que não pode ser, porque há um município, ou vários

municípios, que não se pronunciaram? Este é o primeiro ponto: se há alguém que incumpriu e desconhece a lei,

nesta matéria, foi o Governo.

Segundo ponto: temos 308 municípios, mas a sua soma não faz um País — não faz, é verdade! —, mas

ainda bem que houve um que teve o bom senso de impedir o Governo de tomar uma decisão que corresponde

a um crime ambiental para o País, que é fazer um aeroporto, supostamente um grande aeroporto internacional.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Os crimes ambientais não se resolvem com vetos!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Entretanto, veio a provar-se que — e nem sequer vou entrar nas

incongruências do «decreto vai e decreto vem», de ministros e secretários de Estado que já nem sequer cá

estão, não vou entrar nem aí! —, na verdade, aquilo que o Governo planeava fazer no Montijo era um crime

ambiental, com a construção de um aeroporto numa das áreas húmidas mais importantes da Europa, certamente

a maior da Península Ibérica, protegida, com características de biodiversidade que fariam corar o Sr. Primeiro-

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Ministro sempre que vai às grandes cimeiras pelo clima dizer que Portugal é um país que se orgulha das suas

políticas verdes e da sua guerra contra as alterações climáticas.

Portanto, ainda bem que houve um município que decidiu usar o seu poder de veto para proteger o ambiente

e para proteger as suas populações. Se eu fosse autarca no Barreiro, Sr. Deputado André Pinotes Batista, tinha

muitas cautelas em defender aquilo que o Sr. Deputado aqui defende, porque eram precisamente as populações

do Barreiro e da Moita que mais iam sofrer com este projeto.

Por último, queria dar uma outra nota estereográfica, digamos assim, sobre este processo, que tem que ver

com o PSD. Quando a ANAC decidiu não autorizar o projeto, porque ele não cumpria a lei, o Sr. Primeiro-Ministro

fez um acordo com o anterior presidente do PSD Rui Rio, em que trocaram o voto a favor desta lei por uma

avaliação ambiental estratégica. Ficámos sem saber se a nova direção do PSD cumprirá ou não o acordo que

foi feito com Rui Rio.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem de terminar.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, termino.

«Rei morto, rei posto», isso é uma decisão do PSD.

Protestos da Deputada do PSD Sónia Ramos.

O que nós queremos garantir é que a lei não é feita à medida de um aeroporto que é uma má opção, mas

que preserve o equilíbrio de poderes, porque, senão, quem perde é o ambiente e o clima.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos, do Grupo Parlamentar do PCP.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr. Ministro: Não vale a pena

procurar enfatizar esta proposta com um conjunto de argumentos, porque todos sabemos como é que ela

aparece, aqui, a debate.

Não é um processo que tenha ocorrido porque se entendeu que havia necessidade de melhorar a lei. Não.

Esta proposta aparece porque o Governo quer contornar a posição de um município que é contrária aos

interesses da ANA/Vinci.

Esta é a questão que está em cima da mesa, porque, na defesa dos interesses das populações, na defesa

do interesse nacional, na defesa, também, do nosso ambiente, do desenvolvimento do nosso País, houve um

município que considerou que o aeroporto do Montijo não era solução. E está à vista de todos que não é a

solução. Só o Governo — não é só o Governo, mas também o PSD! —, mantem uma posição de subalternização

perante as orientações e os interesses da ANA/Vinci.

O Sr. João Dias (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — É um Governo que mantém uma posição de submissão e que quer, com esta

alteração legislativa, continuar a manter intocáveis os milhares e milhares de lucros que a ANA/Vinci tem obtido

nos últimos anos.

Quando a ANA era pública, as receitas das taxas aeroportuárias eram investidas no desenvolvimento dos

nossos aeroportos, na sua modernização, na melhoria destas nossas infraestruturas, mas, agora, vemos quais

são os investimentos e também vemos qual é a acumulação de lucro por parte da ANA.

Isto contraria os princípios gerais da elaboração das leis, que não devem ser destinadas a casos concretos,

mas, antes, têm de ser pensadas para o geral e abstrato. Aliás, a própria Associação Nacional de Municípios

Portugueses refere exatamente isso no seu parecer.

Isto que o Governo aqui traz — esta proposta de lei — procura, de facto, contornar este princípio da

elaboração das leis e procura contornar a posição dos municípios, contrária à construção do aeroporto no

Montijo.

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Protestos do Deputado do PSD António Cunha.

Gostaria de acrescentar o seguinte: há uma decisão que está tomada, há mais de uma década, da construção

do novo aeroporto de Lisboa no Campo de Tiro, em Alcochete, mas essa mesma decisão e essa construção

foram, entretanto, suspensas. A opção pelo aeroporto no Montijo só surge após a privatização da ANA/Vinci.

Não deixa de ser curioso esta mesma coincidência.

Quem está a bloquear a construção do novo aeroporto é o PS, o PSD e o CDS, que não só não concretizaram

a decisão que já foi tomada — que não foi revertida e que é consensual no nosso País, com um conjunto de

estudos realizados pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), por especialistas técnicos — como

também o Governo, com o PSD, decidiu um novo adiamento, comprometendo o futuro e o desenvolvimento do

nosso País.

Protestos do PSD.

Esta é a vossa responsabilidade: não construir um aeroporto e a infraestrutura necessária para o

desenvolvimento do nosso País, bem como manter uma posição de total subalternização aos interesses da

ANA/Vinci, em vez de defender os interesses do nosso País.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Carlos Guimarães Pinto, do Grupo Parlamentar

da IL.

O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo por saudar

democraticamente o Partido Socialista pelos 50 anos que celebra hoje, esperando que o partido seja fiel à sua

origem, de partido criado para manter os extremos longe do poder e não para os usar como muletas para se

manter dentro dele.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Muito bem!

O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Em relação ao tema em discussão, é da mais elementar justiça que

uma população possa ter uma palavra a dizer quando um qualquer investimento — seja ele um aeroporto ou

uma mina de lítio — possa criar significativas externalidades na sua região.

É da mais elementar justiça que a população espere ser recompensada por essas externalidades negativas.

É da mais elementar justiça que, só perante o acordo da população local, se perceber que essas

compensações ultrapassam as externalidades negativas, esse investimento deve ser levado avante.

A mudança que o Governo propõe implica que o Governo nacional possa impor uma infraestrutura a um

município, sem que as suas populações concordem ou que os seus representantes tenham uma palavra

vinculativa a dizer.

Se tudo isto já não fosse suficiente, é evidente que esta lei tem um propósito concreto, que é o de ultrapassar

as objeções à construção do novo aeroporto de Lisboa.

Se esta proposta não tivesse mais nenhum problema, apenas o facto de ser uma proposta feita à medida de

um caso concreto, e não uma lei geral e abstrata, como devem ser todas, isto já seria suficiente para não a

aceitar.

Além disto, esta proposta permitirá que seja imposta à população uma infraestrutura que viola planos

municipais, aprovados democraticamente, uma infraestrutura que pode levar à violação de regras ambientais,

ou, mesmo, uma infraestrutura rejeitada por grande maioria num referendo local.

Não pode valer tudo para mostrar obra. A Iniciativa Liberal estará sempre ao lado da subsidiariedade e dos

direitos das populações locais a terem uma palavra a dizer sobre aquilo que acontece na sua vizinhança, no seu

território, sobre aquilo que lhes pode causar danos e externalidades negativas. Desrespeitar a opinião das

populações locais é desrespeitar as pessoas.

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Aplausos da IL.

O Sr. Presidente: — Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado André Ventura, do Grupo Parlamentar do Chega.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Chega já não ia intervir mais, mas, dada a

intervenção do Sr. Deputado André Pinotes Batista, decidiu fazê-lo.

Sr. Deputado, eu não estava a tentar ensinar-lhe nada, porque tenho sérias dúvidas de que consiga

apreender, em toda a extensão, tudo o que eu tenho para lhe dizer,…

O Sr. André Pinotes Batista (PS): ⎯ Muito obrigado!

O Sr. André Ventura (CH): — … mas bastava o Sr. Deputado fazer uma análise dos regulamentos europeus

que existem nesta matéria — que eu imagino que não tenha feito, nem perceba muito —, bastava ver o

Regulamento (UE) 2018/1139 do Parlamento Europeu e do Conselho, e percebia o emaranhado e o absurdo

que é esta proposta. Bastava isso.

Portanto, olhe, já que queria falar com o Prof. André Ventura, o Prof. André Ventura vai dar-lhe um conselho

que, em direito, se diz muito.

Risos do CH.

Sabe qual é? E é também para o Sr. Ministro João Galamba. É que é a lei deve mudar por pertinência, não

deve mudar por conveniência, Sr. Deputado. E é isso que o PS faz sempre, é mudar por conveniência.

Aplausos do CH.

Está a ver, Sr. Deputado? Já aprendeu qualquer coisa hoje, o que já é muito bom, já é muito bom!

O Sr. André Pinotes Batista (PS): — Muito obrigado, Sr. Professor!

O Sr. André Ventura (CH): — Agora, Sr. Deputado, há uma coisa que não posso deixar passar, que é o Sr.

Deputado acusar-nos, falar do chão comum da democracia, que o PS está aqui — não vamos dar os parabéns

ao PS, como fez a Iniciativa Liberal, não é esse aqui o nosso papel —, mas não fui eu que falei numa rede

tentacular sobre o Estado,…

O Sr. André Pinotes Batista (PS): — Foi, foi!

O Sr. André Ventura (CH): — … da asfixia das instituições e do controlo absolutista da degradação do

Estado.

Sabe quem foi? Eu vou dizer-lhe quem foi, e vai aprender.

O Sr. André Pinotes Batista (PS): — Vou aprender!

O Sr. André Ventura (CH): — Foi António Campos, fundador do Partido Socialista.

Aplausos do CH.

Sr. Deputado, foi fundador do Partido Socialista!

Eu sei que ele não vai ao vosso jantar, hoje, e vocês estão tristes com isso.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.

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O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Sei que o Dr. António José Seguro também não vai e o Engenheiro — engenheiro com parênteses — também

parece que não vai.

Risos do CH.

O Sr. André Pinotes Batista (PS): — Para quem não liga nada ao PS, já sabe quais são os convidados

todos!

O Sr. André Ventura (CH): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Disse este fundador ilustre do PS o seguinte: «Hoje, é a degradação total. Todas as instituições, todas

aquelas que nos deram imenso trabalho a criar, estão todas a desmoronar-se. O combate por que eu lutei, por

que tantos lutámos, para garantir direitos, liberdades e garantias, todos aqueles por quem lutámos, hoje, estão

em causa. Todas as instituições estão em crise com este Governo socialista.»

Sr. Presidente, como a frase é de um fundador do PS, eu abstenho-me de mais comentários e devolvo-a ao

Grupo Parlamentar do Partido Socialista.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Ministro das Infraestruturas, João Galamba.

O Sr. André Ventura (CH): — Vai falar do José Sócrates!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por rejeitar por completo

a visão instrumental das instituições revelada pelo Bloco de Esquerda e pelo PCP neste debate. Esta proposta

de lei ou é certa ou é errada, ou é boa ou é má.

Protestos do PCP e do BE.

O que os Srs. Deputados aqui disseram é que esta lei existente vos deu muito jeito, porque como os senhores

não gostam do aeroporto no Montijo…

Protestos do PCP e do BE.

O Sr. João Dias (PCP): — Mas vocês também não gostam da lei!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Srs. Deputados, estamos a debater a pertinência ou a impertinência

de uma lei, e a debatê-la pelos seus méritos substantivos. A lei faz sentido ou não faz sentido.

O que os Srs. Deputados aqui disseram é que, na vossa opinião, uma lei mede-se pelo valor instrumental

que ela possa ter em cada momento. O que os senhores disseram foi: «Ainda bem que ela existia, deu-nos jeito,

porque, neste caso, como a gente não gostava do aeroporto no Montijo, ainda bem que a lei deu poder de veto

a quem também concordava connosco».

Discordo da intervenção do Sr. Deputado Carlos Guimarães Pinto, acho que revela um conceito errado de

liberdade. Discordo do que disse, mas o Sr. Deputado Carlos Guimarães Pinto não defendeu uma visão

instrumental das instituições. Defendeu a lei existente, ou, pelo menos, criticou a atual, porque entende que ela

é errada. Pronto, tudo bem, temos uma discordância.

Srs. Deputados, e dirijo-me também ao Sr. Deputado Carlos Guimarães Pinto: discordo completamente do

que disse da violação do direito das pessoas. O que o Sr. Deputado está a propor é uma visão impossível sobre

a liberdade, porque não é possível cada município ter aquilo que o Sr. Deputado quer reconhecer a um

município.

O Sr. André Pinotes Batista (PS): — Claro!

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O Sr. Ministro das Infraestruturas: — É uma impossibilidade.

O Sr. Deputado não pode respeitar a dignidade e a soberania de todos os municípios sem antes qualificar

de que modo, em que termos e com que abrangência é que esse poder é exercido.

Repare, basta partir da noção liberal de liberdade. A minha liberdade acaba onde a do outro começa.

O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Mas foi isso que eu disse!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — E, portanto, a autonomia e o poder de veto de um município, numa

infraestrutura de âmbito nacional, termina onde? Onde a liberdade e a autonomia de cada um dos municípios

começa. E qual é a única maneira, Sr. Deputado, de consagrar uma visão harmoniosa, complementar, articulada

e complexa de liberdade onde esse valor que o senhor quer reconhecer é possível? É aquela que reconhece a

autonomia do poder local em determinados âmbitos, a importância de haver uma entidade capaz de agir em

nome do interesse nacional, com procedimentos próprios, legais, como é evidente…

O Sr. André Pinotes Batista (PS): — Claro, como é evidente!

Protestos do Deputado da IL Carlos Guimarães Pinto.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — Sr. Deputado, o Sr. Deputado é contra a expropriação por interesse

público?

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro tem de concluir.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — O Sr. Deputado é contra a figura da expropriação por interesse

público?

O Sr. Carlos Guimarães Pinto (IL): — Nesse caso, o Estado compensa os proprietários!

O Sr. André Ventura (CH): — Mas isso paga-se!

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — O Sr. Deputado é contra a suspensão dos PDM (planos diretores

municipais) decretada pelo Governo, que sempre existiu, para a possibilidade de realizar…

É que tudo isso, Sr. Deputado, são instituições, leis e procedimentos existentes, exatamente para,

reconhecendo a autonomia do poder local e um conjunto de outros valores, os harmonizar e ter um todo

funcional.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — A sua proposta, se fosse seguida, Sr. Deputado,…

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro,…

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — … seria a total disfuncionalidade,…

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro,…

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — … por manifesta impossibilidade concreta de realizar…

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, V. Ex.ª…

O Sr. Ministro das Infraestruturas: — … o valor que o Sr. Deputado defendia.

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Aplausos do PS.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Já só cinco Deputados é que batem palmas!

O Sr. Presidente: — Peço à Sr.ª Ministra dos Assuntos Parlamentares que tome as diligências que entender

para que todos os membros do Governo que vêm a esta bancada compreendam a função do Presidente e a

respeitem.

A Sr.ª Joana Barata Lopes (PSD): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Vamos, agora, entrar no terceiro ponto da ordem do dia, que consta da discussão, na

generalidade, dos Projetos de Lei n.os 72/XV/1.ª (BE) — Reforça a proteção da orientação sexual, da identidade

e expressão de género e das características sexuais (quinquagésima quinta alteração ao Código Penal),

359/XV/1.ª (BE) — Reforço da garantia de exercício do direito à autodeterminação da identidade de género, da

expressão de género e do direito à proteção das características sexuais no âmbito escolar, 21/XV/1.ª (PAN) —

Procede à primeira alteração da Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, que estabelece o direito à autodeterminação

da identidade de género e expressão de género e o direito à proteção das características sexuais de cada

pessoa, e à aprovação da respetiva regulamentação, 209/XV/1.ª (L) — Proibição e criminalização das «práticas

de conversão», que visam a repressão da orientação sexual, da identidade de género ou da expressão de

género, 332/XV/1.ª (PS) — Estabelece o quadro para a emissão das medidas administrativas que as escolas

devem adotar para efeitos da implementação da Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, 699/XV/1.ª (PAN) — Prevê a

criminalização de práticas com vista à alteração, limitação ou repressão da orientação sexual, da identidade ou

expressão de género, e promove o estudo destas práticas em Portugal e a garantia de mecanismos de apoio e

resposta, 705/XV/1.ª (CH) — Reforça a proteção e privacidade das crianças e jovens nos espaços de intimidade

em contexto escolar e 707/XV/1.ª (PS) — Proíbe práticas atentatórias contra pessoas LGBT+ através das

denominadas «terapias de conversão sexual».

Para apresentar os projetos de lei do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Mortágua.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, aguardarei só pela…

O Sr. Presidente: — Sim, Sr.ª Deputada, peço-lhe que espere um pouco, enquanto as bancadas

reconstituem as suas equipas.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Foi eleita uma nova Assembleia?!

Pausa.

O Sr. Presidente: — Creio que está em condições, agora, de poder intervir. Faça favor.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A luta do movimento LGBTIQIA+ (Lésbicas,

Gays, Bissexuais, Transgénero, Queer, Intersexo, Assexuais e outros) — cujos ativistas saúdo — conseguiu,

apesar da resistência, de discriminações e de preconceitos, tornar o nosso País num país mais livre para toda

a gente.

É uma conquista de liberdade, mas é uma conquista, também, de direitos. Esses direitos são consagrados

por leis. A lei de autodeterminação da identidade de género é uma dessas enormes conquistas, uma lei aprovada

em 2018, que falta regulamentar nas escolas. Falta regulamentar nas escolas, não porque o tribunal tenha dito

que essa lei não era adequada à Constituição ou que ela era, de alguma forma, inconstitucional, pelo contrário,

falta regulamentar nas escolas porque o Tribunal Constitucional entendeu que não era o Governo que tinha

competências para o fazer e que era o Parlamento que o deveria fazer.

É isso que o Bloco de Esquerda aqui propõe hoje, a regulamentação dessa lei nas escolas, para que as

escolas sejam um espaço de segurança e de igualdade, sem discriminações, nem ódio, nem violência.

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Para isso, propomos medidas de prevenção e promoção da não discriminação em toda a comunidade

escolar, medidas de formação, mecanismos de comunicação, canais de denúncia — tão importantes e tão

falados, bem, agora, pelos dias que correm, em relação ao assédio sexual —, obrigação de comunicação à

CPCJ (Comissão de Proteção de Crianças e Jovens) em relação a discriminações e assédio, medidas de

proteção da identidade e da expressão de género, respeito pelo nome autoatribuído nos documentos

administrativos, sobretudo nos documentos públicos, respeito pela utilização do vestuário, por nos podermos

vestir da maneira que quisermos, e garantia de que toda a gente, todas as pessoas, acedem a casas de banho

e balneários, tendo em conta a sua vontade expressa e assegurando segurança e bem-estar da comunidade

escolar.

O segundo projeto de lei que aqui apresentamos tem a ver com a proibição das práticas de reconversão, ou

seja, todas as práticas que visam alterar ou corrigir a orientação sexual, a identidade de género ou as

características sexuais de qualquer pessoa.

Todas estas práticas são uma forma de violência e de tortura, sejam mais físicas ou mais psicológicas. Todas

elas devem ser criminalizadas para proteger as nossas crianças, os nossos jovens, para proteger toda a gente.

Devem ser criminalizadas, na medida em que a ideia de que a orientação sexual ou a identidade de género é

uma doença também é uma ideia, ela própria, que é crime.

Essa proibição já existe noutros países, essa proibição é pedida pelo Parlamento Europeu, é pedida pela

ONU (Organização das Nações Unidas), essa proibição é uma exigência de direitos humanos, e o

desconhecimento de que este tipo de práticas existe em Portugal não é desculpa para a conivência, porque

muitas das organizações, como a ILGA (Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual, Trans e Intersexo), têm

denunciado a existência dessas práticas, mesmo que as entidades públicas não recebam as suas denúncias.

Sr.as e Srs. Deputados, não digo que não possa haver oposição a estes projetos, nesta Assembleia, na

medida em que a homofobia, a transfobia e o preconceito também existem, ainda, na sociedade.

A única coisa que digo é que eles terão a nossa oposição firme na defesa dos direitos humanos e na defesa

da Constituição.

Aplausos do BE, do L e de Deputados do PS.

O Sr. Presidente: — Para apresentar as iniciativas do PAN, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa

Real.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria de começar por saudar

as associações aqui presentes — a ILGA, a AMPLOS (Associação de Mães e Pais pela Liberdade de Orientação

Sexual), a rede Ex-Aequo e, também, a Opus Gay —, não só pelo trabalho que têm desenvolvido em prol da

inclusão, da igualdade e da não discriminação, mas também, mais uma vez, pela sua resiliência do ponto de

vista da salvaguarda dos direitos humanos.

Sr.as e Srs. Deputados, o debate de hoje é sobre direitos humanos, é sobre a forma como pretendemos, ou

não, reforçar o direito à autodeterminação e expressão de género em Portugal. Um debate em que

demonstramos tolerância zero para convicções e práticas que violam os direitos das pessoas LGBTI e que nos

coloca do lado certo da História, sobretudo num contexto de uma União Europeia em que países farol da

extrema-direita parlamentar, como a Hungria ou a Polónia, perseguem e estigmatizam de forma desumana a

comunidade LGBTI e as suas famílias.

O debate de hoje não é sobre casas de banho, é sobre o reconhecimento das pessoas naquilo que elas são.

É sobre como assegurar que uma criança e um jovem no ensino básico, de uma pequena vila ou cidade, não

têm de esperar para ir para a universidade, em Lisboa, no Porto ou Coimbra, para ser quem é. Ou melhor

dizendo, não têm de romper com o mundo que conhece para poder ser quem é.

Por isso mesmo, o PAN propõe uma lei que, prosseguindo os avanços da própria lei da autodeterminação

de género, de 2018, toma as medidas necessárias para que as escolas sejam um porto seguro e uma voz amiga

para uma criança ou jovem trans, num processo difícil, em que têm de passar por uma série de questões

emocionais, físicas e, ainda, pelo olhar discriminatório dos outros, tantas vezes, até, por parte da própria família.

O debate de hoje não se faz num País perfeito, naquilo que diz respeito aos direitos das pessoas LGBTI,

bem o sabemos. Faz-se num País onde os estudos nos dizem que 3 % das pessoas LGBTI já foram sujeitas a

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terapias de conversão sexual, em que 11 % das pessoas LGBTI já viram a sua homossexualidade tratada como

uma doença que precisa de cura.

Em Portugal, em pleno século XXI, continua a haver curas gay, como a prescrição de medicação de

antidepressivos para limitar a líbido, o internamento em clínicas psiquiátricas ou o uso de hipnose e de

eletrochoques, em exercícios e práticas que enfrentam desejos, e que mais não são do que abuso físico, sexual

e também da liberdade e autodeterminação de cada um e de cada uma.

Estas práticas são cruéis, são tortura e atentam contra os mais básicos valores de dignidade da pessoa

humana. E é, por isso mesmo, que acompanhando não só aquilo que são as recomendações consolidadas da

Organização Mundial da Saúde, mas também da sociedade civil e do devir civilizacional do nosso País, o PAN

propõe hoje que se preencha este vazio legislativo, criminalizando e proibindo estas práticas cruéis.

Aplausos do BE e de Deputados do PS.

O Sr. Presidente: — Para apresentar a iniciativa do Livre, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Tavares.

O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta Casa tem uma certidão de nascimento —

trata-se da Constituição de 1822, que está representada nesta Sala e que comemorámos recentemente — e

tem um primeiro ato, a extinção da Inquisição — passamos todos os dias, ao pé da Sala do Senado, pela pintura

do Deputado que a propôs —, que era uma máquina de conversão forçada que durou séculos neste País e que

dizia: «tu és judeu, tens de ser cristão; tu és protestante, tens de ser católico; tu és ateu, tens de acreditar em

Deus».

Portanto, aquilo de que estamos a tratar aqui hoje é da função primordial de um Parlamento, de qualquer

Parlamento, de garantir o direito à livre consciência, à autonomia, ao desenvolvimento da personalidade. Que

ninguém possa dizer, agora, no século XXI, «tu tens esta orientação sexual, tens de ter outra, tu tens esta

identidade de género, tens de ter outra, e, para isso, vamos submeter-te a uma conversão forçada».

Portanto, isto que estamos a discutir aqui, hoje, não são modernices, é modernidade, é aquilo para que serve

esta Casa desde que esta Casa nasceu. Ao estarmos a discuti-lo aqui, hoje, nas várias propostas que foram

apresentadas — incluindo uma do Livre, que pretende alterar a Lei n.º 38/2018, que estabelece o direito à

autodeterminação de identidade, e alterar o Código Penal, para que passe a ser crime o que é evidentemente

crime, que é querer forçar a consciência e a orientação de alguém —, estamos a fazer aquilo para que os

Parlamentos servem, que é para defender o que está na Constituição, o direito à livre expressão e ao livre

desenvolvimento da personalidade.

Depois de passarem 40 anos, apenas, desde que a homossexualidade em Portugal deixou de ser crime, 30

anos depois de deixar de ser considerada doença, depois de um século XX em que o talvez maior génio da

matemática, que nos livrou do nazismo na Segunda Guerra Mundial, Alan Turing, foi sujeito a práticas de

conversão forçada, a castração química, entrou em depressão e suicidou-se — foi a paga que ele teve por ter

decifrado os códigos dos nazis na Segunda Guerra Mundial —, o século XXI tem de ser diferente.

Por isso, apelo a todos os partidos representados nesta Câmara que aprovem várias destas propostas, que

as deixem ir até à especialidade, que não escolham uma sobre as outras e que façamos uma proposta de lei

que sirva a este Parlamento, nos 200 anos daquela Constituição, para fazer aquilo para que os Parlamentos

servem.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Tavares (L): — Não se cura o que não é doença, não se cura o que não é crime e nunca, nunca

se pode forçar a consciência.

Muito obrigado.

Aplausos do BE e de Deputados do PS.

O Sr. Presidente: — Para apresentar os Projetos de Lei n.os 332 e 707/XV/1.ª, do Partido Socialista, tem

agora a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Moreira.

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A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, organizações aqui presentes

defensoras dos direitos LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, transgénero e intersexo): Estamos aqui a cumprir

uma decisão simples do Tribunal Constitucional. Em 2021, foi declarada a inconstitucionalidade meramente

orgânica de algumas normas da lei da autodeterminação da identidade de género. Essas normas, já testadas

nas escolas, passam assim a constar de lei, em vez de ato regulamentar.

As escolas, inevitavelmente, concretizam direitos fundamentais previstos na Constituição e na lei, e os

direitos destas crianças e jovens são direitos fundamentais, são direitos humanos.

O Estado de direito tem de proteger o exercício do direito à identidade e expressão de género e das

características sexuais dos estudantes. Estamos a falar de bem-estar e de desenvolvimento saudável dos e das

estudantes.

Cumprindo a decisão do Tribunal Constitucional, procede-se à criação de um regime legal que garante isso

mesmo: o respeito pela singularidade de cada criança e jovem, a prevenção e promoção da não-discriminação,

a adoção de mecanismos de deteção e de intervenção sobre situações de risco, a criação de condições para

uma proteção adequada da identidade de género, da expressão de género e das características sexuais das

crianças e dos jovens e a formação dirigida a docentes e demais profissionais.

O ódio de campanhas comuns a Bolsonaro ou a Trump transformou leis complexas, que asseguram a

autonomia, a privacidade e a autodeterminação dos estudantes, em discussões sobre casas de banho. Ofendem

crianças e jovens, criando um mundo imaginário em que estas pessoas concretas, esta gente concreta,

perseguida e discriminada, ganha coragem, na escola, para dizer quem sente ser para — imagine-se! — invadir

casas de banho e cometer crimes.

Crime é espalhar essa mensagem.

Esta lei é sobre vidas humanas. Pelas suas especificidades, precisam de tudo, menos de desinformação e,

sobretudo, da desinformação dos fracos.

Contra este horror, contra quem gosta de Orbán e da sua perseguição às pessoas LGBTI, continuamos na

rota firme da informação e da sensibilização.

Que a escola seja um espaço de liberdade e de respeito, que seja a escola da Constituição de Abril, a que

vem dizendo que a igualdade está certa e que a discriminação é inaceitável.

Aplausos do PS, do PCP, do BE e do L.

O Sr. Presidente: — Ainda para apresentar as iniciativas do Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado

Miguel Rodrigues.

O Sr. Miguel dos Santos Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Saúdo igualmente

todas as organizações de direitos humanos aqui presentes.

Sr.as e Srs. Deputados, o avanço da liberdade e da igualdade no nosso País foi um processo duro, muitas

vezes cruel e, como todos, construído tragicamente sobre o sofrimento de muitas pessoas.

Quer falemos de discriminação com base na etnia, no sotaque com que se usa o português ou na orientação

sexual, o trajeto foi invariavelmente o mesmo.

Os acessos à autodeterminação de género, ao casamento, à adoção e até à dádiva de sangue foram

progressos lentos, mas justos. Todos estes direitos gozam de um fator comum: a liberdade do indivíduo em

afirmar-se livremente como é ou como deseja ser.

Por isso, o debate de hoje é um pouco distinto. Distinto, porque versa sobre a tentativa de negar a um ser

humano a possibilidade de se desenvolver, crescer e gozar da sua liberdade, procurando convertê-lo ou subjugá-

lo, como se a identidade de género ou a orientação sexual de alguém fossem doença passível de ser curada.

As designadas terapias de conversão não têm nada de terapêutico. São o último recurso — se quiserem,

são o último reduto — daqueles que procuram impor aos outros os seus próprios preconceitos.

Para as pessoas LGBTQIA+ (lésbicas, gays, bissexuais, transgénero, queer, intersexo, assexuais e outros),

esta não é uma realidade nova. É, infelizmente, mais um atentado quotidiano, ao qual fomos habituados desde

que Antínoo se afogou no Nilo, há tantos séculos atrás.

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O Partido Socialista, juntamente com outras forças nesta Casa, cujas iniciativas saudamos, criminalizará

estas práticas. Não é aceitável, em nenhuma parte, que, por agressão física, psicológica ou com recurso a

medicamentos, se procure reprimir ou forçar a orientação sexual de outrem. Hoje, acabamos, de uma vez por

todas, com este flagelo.

Aplausos do PS.

Seria da mais profunda arrogância que uma palavra não fosse dada a tantos e tantas cuja vida está para

sempre maculada por estas supostas curas, aqueles que foram vítimas e decidiram falar e aqueles e aquelas

que foram vítimas, mas não conseguiram encontrar as palavras. Corajosos como o Rui, como o Pedro — ou

Saza, para quem o conhece melhor — e como tantos ativistas, dentro e fora desta Assembleia da República,

cujos esforços de todos os dias são para nós uma escada para o futuro.

Hoje, em honra de todos, de todas as pessoas, subimos essa escada, para nunca mais voltar para trás.

Aplausos do PS.

Este não é um debate novo, mas tenho mesmo a esperança de que seja o último, porque caminhámos —

ou, melhor dizendo, marchámos — demasiado para aqui chegar.

Hoje, neste cinquentenário de combate pela liberdade, debatemos e, com alguma esperança e alguma sorte,

amanhã, como sempre, acordaremos mais livres.

Aplausos do PS, do BE e do L.

O Sr. Presidente: — Para apresentar o Projeto de Lei n.º 705/XV/1.ª, do Chega, tem a palavra a Sr.ª

Deputada Rita Matias.

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: No ano passado, 26 000 alunos estiveram sem

aulas.

Os professores estão na rua e pedem a dignificação da sua carreira.

Sete anos de Governo socialista depois, não há nenhuma resposta para estes problemas, que são os

problemas reais. E o que é que o Partido Socialista nos traz, hoje? Casas de banho mistas.

Nas escolas, faltam terapeutas da fala, faltam professores de língua gestual, faltam até psicólogos — e o

Chega pediu isto no mês passado, pedido esse que foi vetado por esta Assembleia.

Vozes do CH: — Muito bem!

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Mas o que é que esta Assembleia se apressa a fazer em nome da inclusão?

Apressa-se a trazer para as escolas o responsável ou o conselheiro para a identidade de género.

Portanto: profissionais, nomeadamente profissionais de saúde, nas escolas, não; ativistas da ideologia de

género, sim — País de prioridades invertidas.

Portugueses, os vossos filhos estão a ser erotizados e hiperssexualizados nas escolas, desde o pré-escolar.

Aplausos do CH.

Protestos do PS e de Deputados do PSD.

Aos vossos filhos, distribuem questionários do caderno PRESSE (Programa Regional de Educação Sexual

em Saúde Escolar), convidando-os a responder a questões como «quantas posições existem no sexo?» ou

«porque é que as mulheres gostam de fazer sexo oral?».

Escusam agora de ficar incomodados, porque, se é indigno uma parlamentar dizer isto no Parlamento, mais

indigno é um professor ter este tipo de conversas pornográficas, numa escola, com alunos.

Aplausos do CH.

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E depois de toda esta bandalheira, dizem ao estudante: «Vai à casa de banho que quiseres, como te

apetecer.»

Depois desta bandalheira toda, reduzem a identidade do vosso filho à sexualidade e à forma como o

incentivam a praticá-la.

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Mas o que é isto?!

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Que os animais sejam catalogados pela forma como se reproduzem, ou não,

entendo, mas a identidade humana é bem mais vasta do que essas características, e reduzi-la é um atentado.

Portanto, não se deixe enganar por estas palavras bonitas. O que estes partidos propõem hoje é que na casa

de banho aonde o seu filho vai possam entrar também mulheres; que no balneário onde a sua filha de 11 anos

se despe e toma banho possam entrar também colegas homens, corpulentos, de 18 anos e em fim de

puberdade.

Esta Câmara escolhe a ideologia de género e a doutrinação do seu filho como algo prioritário, e só o Chega

tem feito oposição firme a esta tragédia.

Aplausos do CH.

E, sim, falo de doutrinação, falo de novos hábitos, de uma nova linguagem que em nada traduz e que nada

responde quanto aos reais problemas dos portugueses.

Limitam as possibilidades das famílias que optam pelo ensino doméstico, perseguem judicialmente as

famílias que querem proteger os seus filhos, mas nunca o fizeram pelas meninas vítimas de casamentos

forçados, infantis, que são impedidas de concluir os seus estudos — País de prioridades invertidas.

Aplausos do CH.

Dizem-se pelas mulheres, mas ignoram deliberadamente que, nos Estados Unidos, as atletas de natação

universitária dizem que se sentem agredidas e invadidas na sua intimidade por serem expostas a atletas com

genitália masculina.

Dizem-se pelas mulheres, mas ignoram que, no Reino Unido, debatem agora o fim destas casas de banho,

uma vez que os dados de 2018 demonstram que o número de assédios e abusos sexuais que aconteceram

nestas casas de banho correspondeu a 90 % dos abusos totais.

Portanto, o que tem de ser dito, hoje, nesta Casa, é que a responsabilidade pelos abusos e violações que

poderão ocorrer nestas casas de banho é vossa e de quem aprovar, de forma irresponsável, estas medidas.

Aplausos do CH.

Os dados estão em cima da mesa e os senhores estão a escolher ignorar. Não tenham a mínima dúvida de

que, quando o Chega chegar ao Governo de Portugal, vamos reverter esta e todas as leis iníquas que não

protegem e não dignificam as nossas crianças.

Aplausos do CH, com Deputados de pé.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Não fazem nada!

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção em nome do Grupo Parlamentar do PSD,

a Sr.ª Deputada Lina Lopes.

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Hoje, são apresentados oito projetos de

lei sobre orientação sexual, identidade de género e características sexuais, bem como sobre a proibição e

criminalização das práticas de conversão, da autoria dos partidos BE, PAN, L, PS e CH.

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Queria iniciar este debate sublinhando que, segundo a Organização das Nações Unidas, a identidade de

género é a maneira como um indivíduo se reconhece e como percebe a sua própria identidade.

Os projetos de lei do BE, do PAN, do Livre e do PS condenam as chamadas «terapias de conversão» e

preconizam a sua penalização e proibição por as considerarem práticas atentatórias contra as pessoas LGBTI.

Durante vários anos, as diferentes terapias de conversão foram encaradas como algo necessário para ajudar

os pacientes a curar-se da homossexualidade e os esforços para evitar a mudança eram promovidos de forma

agressiva, com a crença de que a homossexualidade era uma doença curável.

Sr.as e Srs. Deputados, existem vários estudos científicos realizados, quer a nível nacional, quer internacional,

que desaconselham estas terapias de conversão. Realço que já são vários os países que penalizam estas

práticas abusivas. Recentemente, países como o Canadá, Israel, França e Nova Zelândia também

criminalizaram estas terapias.

Sr.as e Srs. Deputados, em conformidade com o disposto na alínea b) do artigo 9.º da Constituição, uma das

incumbências prioritárias do Estado consiste em garantir os direitos e liberdades fundamentais e o respeito pelos

princípios do Estado de direito democrático. Assim, cabe-nos também a nós, enquanto Deputados, garantir e

respeitar os direitos fundamentais dos cidadãos LGBTI.

Como dizia Oscar Wilde, «egoísmo não é viver à nossa maneira, mas desejar que os outros vivam como nós

queremos».

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Muito bem!

A Sr.ª Lina Lopes (PSD): — No fundo, é impor aos outros a nossa vontade, as nossas ideias feitas, os

nossos estereótipos, a nossa maneira de ver as coisas — e sublinho a palavra «impor». Não é explicar ou

defender algo, é impor.

Sobre orientação sexual, identidade de género e características sexuais, são quatro os projetos de lei

apresentados pelo BE, pelo PAN, pelo PS e pelo CH que, supostamente, vêm ultrapassar a inconstitucionalidade

dos n.os 1 e 3 do artigo 12.º da Lei n.º 31/2018, de 7 de agosto.

Gostaria de relembrar que a inconstitucionalidade encontrada pelo Tribunal Constitucional nada tem a ver

com qualquer conteúdo específico do diploma do Governo. Trata-se apenas do facto de o diploma ter tido a sua

génese no Governo e não na Assembleia da República.

Se os projetos de lei apresentados foram aprovados com as atuais redações, é previsível que as escolas

venham a ser confrontadas com a necessidade de introduzirem modificações apreciáveis na organização de

alguns espaços e equipamentos e na forma como os seus dirigentes e funcionários devem abordar os assuntos

de género.

Se olharmos, por exemplo, ao projeto de lei do PS, este apenas refere, no seu artigo 4.º, que a escola deve

dispor de agentes responsáveis e com a formação adequada e, no artigo 6.º, que devem ser capazes de apoiar,

e cito, «crianças e jovens que manifestem uma identidade ou expressão de género que não corresponde à

identidade de género à nascença». E devemos fazê-lo, e cito, «em articulação com os pais, encarregados de

educação ou com os representantes legais».

Sr.as e Srs. Deputados, penso que estamos todos de acordo que o objetivo da escola é assegurar que a

autonomia, a privacidade e a autodeterminação dos jovens sejam respeitadas e que os atos de discriminação

ou desrespeito pela expressão de identidade dos mesmos sejam evitados, e não que se pretenda induzir ou

forçar qualquer orientação de género. Aliás, seria intolerável exigir tal atuação por parte dos agentes escolares.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, a escola é, de facto, muito importante na vida das crianças e dos

jovens, mas a sua finalidade não é definir o que eles podem ou não podem fazer. A escola deve, sim, ensinar

as crianças e os jovens a aprender a aprender, como dizia Humboldt, de forma a desenvolverem a autonomia e

a autodeterminação necessárias para saberem o que podem vir a fazer por si e pelos outros.

Sr.as e Srs. Deputados, o Governo terá de alocar verbas no Orçamento do Estado para a formação dos

dirigentes e funcionários das escolas. Também será necessário projetar e executar obras de alteração de vários

espaços nas escolas.

O Orçamento do Estado tem um artigo intitulado «Orçamento com perspetiva de género», que estipula a

obrigatoriedade de elaboração de planos e avaliações de género nos vários ministérios. Até à data, a sua

execução tem tido altos e baixos.

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Assim, seria um ato de transparência assinalável se o Governo clarificasse a verba que decide atribuir todos

os anos ao desígnio da igualdade de género. Ora aqui está uma rúbrica orçamental que poderia incluir o

montante que o Governo pretende atribuir para realizar a formação de docentes e funcionários e para as obras

nas escolas, que irão ser necessárias para implementar o estipulado nos vários projetos de lei.

A pergunta que devemos colocar é se existem recursos para efetivar as alterações impostas pelos vários

projetos de lei.

Em conclusão, o PSD considera que, primeiro, o Estado deve garantir os direitos e liberdades fundamentais

e o respeito pelos princípios do Estado de direito democrático e, por isso, deve intervir para proibir e evitar as

terapias de conversão. Segundo, a escola deve assegurar as condições para que a autonomia, a privacidade e

a autodeterminação dos jovens sejam respeitadas e os atos de discriminação ou desrespeito pela expressão de

identidade dos mesmos sejam evitados.

O PSD considera também que, num ato de transparência, o Governo clarifique a verba anual destinada a

promover o desígnio da igualdade de género.

Aplausos do PSD e da Deputada do BE Joana Mortágua.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra para intervir a Sr.ª Deputada Carla Castro, da Iniciativa Liberal.

A Sr.ª Carla Castro (IL): — Sr. Presidente, Srs. Deputados e associações aqui presentes: Começo por

relembrar o artigo 13.º da Constituição, em que «todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais

perante a lei».

Reforço que todos, sem exceção, têm direito ao mesmo tratamento e dignidade, independentemente da sua

orientação sexual, identidade de género ou expressão de género, bem como de viverem no usufruto das suas

liberdades individuais.

Do ponto de vista da educação, é importante, desde logo, educarmos para uma sociedade inclusiva, tolerante

e não discriminatória. A luta, por exemplo, contra a homofobia, a transfobia, a xenofobia e tantas outras fobias

são, claramente, lutas inacabadas e temos de ser intransigentes.

É fundamental para os liberais o profundo respeito pelas liberdades individuais e isso significa, exatamente,

lutarmos pela liberdade de todos.

Nos projetos que hoje estão em apreço, importa realçar todos os direitos em questão, que incluem também

os direitos à privacidade e à intimidade. E essa luta, essa promoção é muito mais do que um tema de género.

Nas nossas votações, teremos o princípio de rejeitar soluções extremistas, desenhadas para rentabilizar

eleitoralmente nichos radicalizados que promovem o confronto social. Lembramos que a defesa dos direitos de

uns não pode ser feita à conta dos direitos de outros e exigimos que os direitos de todos sejam igualmente

promovidos.

Sabemos que a luta pelo exercício das diversas liberdades, direitos e garantias está inacabada em muitas

frentes, e os liberais lutam incessantemente por essa construção.

Aplausos da IL.

O Sr. Presidente: —Tem agora a palavra, para intervir em nome do PCP, a Sr.ª Deputada Alma Rivera.

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Está hoje em discussão um conjunto

de projetos que, no fundamental, tratam a questão do exercício do direito à autodeterminação da identidade,

expressão de género e características sexuais em ambiente escolar, bem como projetos que procuram combater

as práticas de conversão da orientação sexual.

Apesar de cada uma destas questões merecer uma apreciação, importa dizer que estes projetos têm em

vista a concretização da igualdade que a Constituição da República Portuguesa reconhece a todos os cidadãos.

Quando diz que todos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei, que ninguém pode ser

privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito em função de, entre outras, a orientação

sexual — num elencar que não, é evidentemente, taxativo e que abarca os mais variados fatores de

discriminação —, o que se diz é que todos devem ser tratados com igualdade e a todos devem ser garantidas

as condições para o livre desenvolvimento da sua personalidade.

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A proibição das discriminações é ainda positivada quando, no artigo 26.º, se diz que a todos são reconhecidos

os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade e, entre outros, à proteção legal contra

quaisquer formas de discriminação.

Portanto, por mais que haja quem procure mistificar o debate e reduzi-lo às casas de banho, aquilo que hoje

se debate são medidas que o Estado deve adotar para concretizar a igualdade e combater as discriminações

que atingem as pessoas LGBT.

Relativamente à primeira questão, relacionada com o contexto escolar, consideramos que, para a prevenção

e combate contra a discriminação, o contexto escolar é absolutamente fundamental e tem um papel importante

na promoção da cidadania e da igualdade, devendo ser implementadas medidas que capacitem as escolas para

combater as discriminações e não as reproduzirem.

Aliás, um dos problemas que identificamos nesta frente é a falta de implementação da educação sexual, que

resultou de uma proposta do PCP, mas que continua uma miragem, na grande maioria das escolas, e uma

ínfima parcela daquilo que a lei procurou abarcar.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — É preciso que a escola seja um espaço de democracia, de inclusão, um espaço

seguro para todas as crianças e jovens, pelo que acompanhamos a generalidade das propostas, sem prejuízo

de poderem ser melhorados, neste ou naquele aspeto, em especialidade.

Relativamente às práticas de conversão da orientação sexual, e independentemente das dúvidas que se

possam suscitar sobre se o direito penal é o instrumento mais adequado e se criar um novo tipo penal se justifica,

na medida do que hoje já está previsto no Código Penal, não há dúvidas — não pode haver dúvidas! — de que

isto é uma prática inaceitável, incompatível com um País assente na dignidade da pessoa humana e muito

menos com uma sociedade livre, justa e solidária.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — De todo modo, é de referir ainda a necessidade de formação específica dos

diversos profissionais, nomeadamente dos profissionais de saúde, para as necessidades e para a realidade

concreta das pessoas LGBT.

Há ainda um caminho muito longo a percorrer, na escola, na saúde, em todos os serviços que o Estado

presta, para reconhecer e capacitar as pessoas para estas realidades.

Aquilo que hoje tratamos, no fundo, é do direito a desenvolver livremente a personalidade, a identidade e a

viver uma sexualidade plena, feliz e assumida, e é para isso que vamos contribuir.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Joana Mortágua, do Bloco

de Esquerda.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente. Sr.as e Srs. Deputados: Nos anos 40, o primeiro bailarino

internacional português, Valentim de Barros, foi deportado da Alemanha nazi. Em 1949, foi internado no hospital

psiquiátrico Miguel Bombarda com o diagnóstico de homossexualidade, tendo sido sujeito a uma lobotomia e a

choques elétricos.

Morreu no dia da sua alta hospitalar, 48 anos depois — já depois do 25 de Abril, já depois de a

homossexualidade ter deixado de ser considerada uma doença. Morreu sozinho, transtornado e gay.

O horror que esta história nos provoca tem de ter reflexos na lei que queremos para o século XXI, porque

todas as tentativas de práticas de conversão de orientação, de identidade ou de características sexuais, todos

os atentados à autodeterminação são filhos deste mesmo preconceito que levou a que o bailarino Valentim de

Barros fosse internado, em 1949, no Hospital Miguel Bombarda.

Não é possível dizer que esta história nos provoca um horror tal que a podemos considerar inaceitável, mas

depois não dizer que esse horror tem de ser refletido no Código Penal com uma criminalização clara destas

práticas; com uma criminalização clara de qualquer profissional, ou pessoa que clame ser profissional, que o

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faça; e com agravantes em determinadas circunstâncias, em que daí decorram prejuízos e danos — até físicos

e morais — ou em que as vítimas sejam particularmente vulneráveis.

É natural que todos os projetos sejam diferentes, e ainda bem. Significa que não andamos todos a reboque

uns dos outros, mas o que nós esperamos é que daqui saia não apenas um quadro legal de proteção de todas

as pessoas e de autodeterminação, mas também um quadro penal de punição destes crimes que seja um sinal

muito claro para a nossa sociedade.

Aplausos do BE e de Deputados do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Joana Cordeiro, da Iniciativa Liberal, para uma

intervenção.

A Sr.ª Joana Cordeiro (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Neste tempo que resta, é um desafio

falar nas várias propostas sobre as denominadas «terapias de conversão».

Este é um debate que, a nosso ver, confronta dois direitos fundamentais: o direito de o indivíduo, muitas

vezes menor de idade, não ser, nunca, obrigado a submeter-se a uma determinada prática contra a sua vontade;

e o direito de o indivíduo adulto, consciente e responsável aceder a uma determinada prática.

Mas este debate envolve também o direito individual à autodeterminação sexual, o respeito pelos direitos

humanos e o princípio da dignidade humana. É um debate sobre práticas que atentam contra estes direitos sem

qualquer base científica, que apresentam consequências muito negativas na saúde mental e física de quem a

elas se submete e que, entre relatos de coação, ameaça e intimidação procuram mudar aquilo que não pode

ser mudado, a identidade e a intimidade de um ser humano.

Neste Parlamento, por diversas vezes, como a propósito da covid-19, debateu-se — e debateu-se muito! —

sobre como impor a vontade do Estado ao indivíduo, e a Iniciativa Liberal esteve e tem estado sempre do lado

certo.

Assim, não podemos hoje, sobre o mesmo princípio de defesa do indivíduo, compactuar com situações em

que alguém possa obrigar outro a seguir uma prática que este não quer.

As propostas em discussão carecem de alterações. Existem melhorias que podem ser feitas, que melhor

defendem a liberdade individual e que reforçam os mecanismos de apoio e de proteção a todos os que nascem

e vivem em ambientes que não lhes permitem ser quem são em total liberdade.

A Iniciativa Liberal está disponível para este trabalho.

Aplausos da IL.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Alves Moreira, para intervir pelo Grupo

Parlamentar do PS.

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, queria apenas constatar, com

celebração, o enorme, quase, consenso que existe nesta Câmara em torno da necessidade de proteger os

direitos humanos das crianças e dos adultos trans, que são os direitos humanos em causa. Proteger na escola

e proteger estas pessoas da tortura.

Na verdade, o único projeto que foi apresentado e que tem como objeto único «casas de banho» foi o projeto

apresentado pelo Chega. Talvez fosse indicado dizer à Sr.ª Deputada Rita Matias, relativamente a tudo aquilo

que disse e que não corresponde à verdade, mas que vem na senda de um discurso de desinformação e de

ódio,…

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Diga-me nos olhos, se tiver coragem!

A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — … que, se quiser, pode informar-se com uma nova militante do Chega,

a ex-Deputada Cristina Rodrigues, que tantas propostas apresentou sobre a comunidade LGBTI, sobre a

criminalização de falsas terapias, sobre espaços inclusivos para pessoas trans.

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Baixinha! Baixinha!

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A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Agora que está no seu partido, fale com ela. Ela vai informá-la.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª Deputada Rita Matias, do Chega.

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: De facto, esta salada de fruta de temas que foi

trazida a debate dá muito jeito para que a verdade seja ocultada e, portanto, falar em radicalização de discurso

e em informações falsas de quem não citou um único parecer ou um único estudo nas suas propostas é, no

mínimo, uma grande hipocrisia.

Aplausos do CH.

Mas já que querem dados e informações, vou dá-los. Tenho aqui uma notícia — que depois será distribuída,

Sr.ª Deputada Isabel Moreira —, de 14 de março de 2023, nos Estados Unidos, onde se lê: «Mãe denuncia

estudante que tenta forçar a abertura do cubículo onde a sua filha estava e a porta atinge a cabeça da menina.»

Mais: «Uma mulher foi violada numa casa de banho mista no Reino Unido e o homem alegou que se sentia

como mulher e, portanto, estava no uso da sua legitimidade a frequentar aquele espaço.»

O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): ⎯ Casa de banho mista! Isso é contraditório!

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Isto é aquilo que os senhores tentam ocultar. Mas também tentam ocultar, e não

citam, nomeadamente, o parecer do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, citado apenas pelo

Partido Chega, que diz que a defesa dos direitos de uns…

Protestos do PS.

Pausa.

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — O tempo está a contar, Sr. Presidente! O tempo está a contar!

O Sr. Presidente: — A Sr.ª Deputada pode continuar a sua intervenção.

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Muito obrigada, Sr. Presidente.

Reunidas as condições,…

Vozes do PS: — Ah!…

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Acho que os Srs. Deputados ainda não perceberam que não têm legitimidade

para mandar calar os Deputados do Chega. Têm de levar connosco, aqui, porque temos a representação

legítima de mais de 400 000 portugueses.

Aplausos do CH.

Vozes doPS: — Vocês nunca deixam falar!

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Eu quero mesmo concluir, Sr. Presidente, se me deixarem.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr.ª Deputada.

Protestos do PS.

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A Sr.ª Rita Matias (CH): — Muito obrigada, Sr. Presidente.

O parecer do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, parecer esse que apenas o Partido

Chega citou, diz que a defesa dos direitos de uns não pode ser feita à custa dos direitos dos outros; que devem

ser mantidas as casas de banho mediante o sexo feminino e o sexo masculino; e que se devem criar, no máximo,

espaços individualizados para outro tipo de frequência — proposta essa que o Chega traz aqui, para defender

as meninas e as mulheres que estão a ser vítimas de assédio e de abusos nas casas de banho.

Aplausos do CH.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Isso não é do Chega!

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Não podemos dizer uma coisa à segunda-feira e à terça-feira dizer outra. Não

podemos rasgar as vestes mediante alguns casos de assédio, mas depois querer viabilizar outros casos de

assédio.

E, portanto, os dados não jogam a vosso favor. Aquilo que eu tenho para dizer, da parte do Chega, é

tolerância zero a todo o tipo de assédio e legitimação do mesmo.

Aplausos do CH.

O Sr. Presidente: — Para encerrar o debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Mortágua, do Bloco de

Esquerda.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Muito obrigada, Sr. Presidente.

Para encerrar este debate, também gostava de «desocultar» uma verdade. Conheço bem os discursos da

Sr.ª Deputada Rita Matias sobre este tema e, portanto, foi com muita curiosidade que li o projeto de lei do Chega

sobre a questão das casas de banho e da autodeterminação de género.

Li que apresentavam este projeto por respeito aos movimentos de cidadãos que se tinham mobilizado sobre

este tema e citavam um movimento de cidadãos em particular, o movimento chamado «Deixem as Crianças em

Paz».

Fui, então, ao Facebook deste movimento de cidadãos para perceber o que é que eles pensavam sobre este

tema — já que não os consegui identificar, mas que serão, certamente, militantes mais anónimos ou mais

conhecidos do Chega — e encontrei muitas coisas. Encontrei muitos debates sobre se as crianças devem ou

não comer insetos; encontrei debates sobre se as crianças devem, ou não, ser expostas a estátuas gregas do

período clássico, por estarem nuas; encontrei muito saudosismo da educação de Salazar; encontrei também um

post a dizer que era doentio que a Câmara de Lisboa agora tivesse bebedouros inclusivos!

Risos de Deputados do PS e do PCP.

Era doentio que até já os bebedouros fossem inclusivos! Veja-se lá que as pessoas em cadeiras de rodas

possam aceder a um bebedouro!…

Encontrei também a proibição absoluta da palavra «género».

Portanto, foi com este espírito que fui ler a proposta do Chega.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Para ver se aprendes alguma coisa!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Quando encontrei a proposta do Chega e a fui ler, entendi que o Chega não

propõe apenas casas de banho que sejam distinguidas por género, e não por sexo — apanharam a Sr.ª

Deputada Rita Matias fora do Parlamento e substituíram «sexo» por «género»! —,…

Risos dos Deputados do PS Isabel Alves Moreira e Pedro Delgado Alves.

… o que pressupõe que as pessoas transgénero, na proposta do Chega, continuem a poder frequentar as

duas casas de banho, como, além disto, ainda propõe uma casa de banho mista.

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O único partido que propõe casas de banho mistas neste Parlamento é o Chega, e isto é uma fraude que

tem de ser «desocultada».

Aplausos do BE, do PS, do PAN e do L.

Porque, Sr. Presidente, há uma coisa que eu quero deixar clara: isto não diz nada sobre o Chega nem sobre

a sua transfobia; isto diz muito sobre a nossa sociedade, quando já nem o Chega consegue transpor o seu

discurso transfóbico e homofóbico para projetos de lei nesta Câmara porque sabe que a nossa sociedade não

tolera as chamadas «terapias de conversão», não tolera a transfobia, não tolera a discriminação.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Podes continuar a ofender-me! A ti ninguém te ofende!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Portanto, hoje, quero saudar a sociedade portuguesa para que, no debate

constitucional que nós estamos a fazer agora, todos estes direitos estejam consagrados com o consenso que

parecem merecer nos projetos aqui apresentados.

Aplausos do BE, do PS e do Deputado do PCP Manuel Loff.

O Sr. Presidente: — Chegamos, assim, ao fim da ordem do dia de hoje.

Antes de passarmos ao expediente, queria felicitar o Grupo Parlamentar do Partido Socialista por ocasião do

50.º aniversário da fundação do PS.

Passo agora a palavra à Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha para ler o expediente.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, passo a dar conta da entrada na Mesa de várias

iniciativas legislativas, que foram admitidas pelo Sr. Presidente.

Em primeiro lugar, refiro as Propostas de Lei n.os 71/XV/1.ª (GOV) — Aprova medidas no âmbito do plano de

intervenção «Mais Habitação», que baixa à 6.ª Comissão em conexão com a 5.ª Comissão, e 72/XV/1.ª (GOV),

que baixa à 1.ª Comissão.

Deram, também, entrada os Projetos de Lei n.os 714/XV/1.ª (IL), que baixa à 5.ª Comissão e 715/XV/1.ª (IL),

que baixa à 1.ª Comissão.

E, finalmente, deram entrada na Mesa os Projetos de Resolução n.os 624/XV/1.ª (CH), que baixa à 11.ª

Comissão, 625/XV/1.ª (PCP), que baixa à 13.ª Comissão, 626/XV/1.ª (PCP), que baixa à 12.ª Comissão, e

627/XV/1.ª (PSD), que baixa à 7.ª Comissão.

É tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Secretária.

Srs. Deputados, a sessão plenária de amanhã contém a leitura da mensagem do Presidente da República,

dirigida a esta Assembleia, sobre a devolução sem promulgação do Decreto da Assembleia da República n.º

43/XV, que «Regula as condições em que a morte medicamente assistida não é punível e altera o Código

Penal», seguindo-se a ordem do dia fixada pelo PSD, que é um debate político sobre o tema «Justiça».

Srs. Deputados, até amanhã.

Eram 18 horas e 44 minutos

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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