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I SÉRIE — NÚMERO 137

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Por isso, o que não podemos ter é a criminalização do piropo. O que temos de ter é mecanismos de denúncia,

de prevenção e uma lei que funcione e cujos prazos de prescrição não impeçam na prática qualquer

investigação.

O que é que não podemos ter em Portugal? Um assédio sexual em duas dimensões. Se é cometido por

portugueses contra pessoas minoritárias, é um escândalo nacional. Se é cometido por imigrantes contra

portugueses, ninguém quer saber, é uma prática absolutamente normal.

Aplausos do CH.

É isto que não podemos ter. Não podemos ter uma situação em que, quando as vítimas são de direita, não

interessa, é uma questão cultural. Quando o perpetrador, ou alegado perpetrador, é uma figura de esquerda, aí

é uma questão que temos de tolerar, que temos de compreender. E é até, cito, «uma perseguição do

neoliberalismo internacional».

O Sr. Pedro Pinto (CH): — É verdade!

O Sr. André Ventura (CH): — Isto é o que não podemos ter.

Se queremos combater verdadeiramente o assédio, temos de começar por tratá-lo de igual para igual,

olhando para vítimas e agressores como aqueles que têm de ser, uns, protegidos pela lei, e outros, sejam

migrantes ou não migrantes, sejam de esquerda ou de direita, punidos por ela.

É isso que queremos, porque a lei é dura, mas é para cumprir.

Aplausos do CH.

A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Loff, do

Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Manuel Loff (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A prática do assédio sexual, com esse

nome ou outro, em contextos de relação de trabalho, tem muito de sistémico.

Enquanto exercício de um poder que intimida sobretudo as mulheres — e, secundariamente, homens — que

estão sujeitas a relações hierárquicas e, em geral, de poder, o assédio sexual materializa-se em várias formas

de coação sexual, que podem passar por ataques à autodeterminação sexual ou por aquilo que, no Código

Penal, se tem designado como «importunação sexual».

Os estudos e os dados do quotidiano demonstram que uma proporção muito significativa de mulheres foi,

em algum momento das suas vidas — ou em vários —, vítima de assédio sexual, num contexto, portanto, que

tem uma fortíssima dimensão de género e de cultura de dominação patriarcal que está muito longe de estar

erradicada da nossa sociedade.

Na esfera académica, estes comportamentos revestem-se de uma natureza própria, é certo, mas num

contexto que, contudo, não difere muito do de todas as relações de poder marcadas por lógicas de desigualdade

social e de identidade.

O abuso de poder exercido por quem detém uma superioridade legal ou institucional sobre as vítimas tende

a ser comum no contexto de instituições como as de ensino superior, que permanecem fortemente

hierarquizadas e onde há uma cultura institucional tendencialmente corporativa que, até há ainda poucos anos,

assegurava um ambiente mais ou menos difuso de impunidade.

Se as relações de trabalho reproduzem, nestas instituições, o mesmo contexto de qualquer outra instituição

ou empresa pública ou privada, há dimensões específicas que se prendem com relações de dependência relativa

entre, de um lado, professores, avaliadores, supervisores científicos ou gestores de projeto, e, por outro,

estudantes e investigadores cujo sucesso escolar, obtenção de bolsa e/ou contrato de investigação depende do

respeito efetivo pela sua identidade, dignidade e direitos.

Os projetos hoje em discussão, relativos ao assédio sexual em contexto académico, propõem, por um lado,

esquemas mais ou menos formais que facilitem a denúncia de práticas desta natureza, num quadro em que,

nas instituições de ensino superior como em quaisquer outros locais de trabalho, a grande maioria das vítimas

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