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Quarta-feira, 20 de dezembro de 2023 I Série — Número 31

XV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2023-2024)

REUNIÃOPLENÁRIADE19DEDEZEMBRODE 2023

Presidente: Ex.mo Sr. Augusto Ernesto Santos Silva

Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Palmira Maciel Fernandes da Costa Lina Maria Cardoso Lopes

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e

9 minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa dos Projetos de Lei n.os

984 a 987 e 990 a 993/XV/2.ª e dos Projetos de Resolução n.os 965 e 966/XV/2.ª.

A requerimento do L, foi fixada a ordem do dia sobre o tema «Solução de dois Estados e o reconhecimento da

independência da Palestina», no âmbito do qual foram discutidas e posteriormente votadas, na generalidade, as seguintes iniciativas legislativas:

Projeto de Resolução n.º 943/XV/2.ª (L) — Recomenda ao Governo que avance para o reconhecimento da independência da Palestina, que foi aprovado;

Projeto de Resolução n.º 944/XV/2.ª (L) — Contra a

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escalada da guerra em Israel e na Palestina: recomendações urgentes ao Governo na defesa do cessar-fogo, ajuda humanitária e libertação de reféns, que foi aprovado;

Projeto de Resolução n.º 946/XV/2.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que adote medidas que promovam a integração em instituições de ensino nacionais de estudantes, investigadores e docentes, provenientes de instituições de ensino superior de Israel, da Faixa de Gaza e da Cisjordânia, que foi aprovado;

Projeto de Resolução n.º 950/XV/2.ª (BE) — Recomenda ao Governo que reconheça o Estado da Palestina, que foi rejeitado;

Projeto de Resolução n.º 957/XV/2.ª (PS) — Recomenda ao Governo que encete todos os esforços diplomáticos para defender a criação do Estado da Palestina, a par da existência do Estado de Israel, lado a lado, a viver em paz e segurança, tal como previsto no Plano de Partilha das Nações Unidas de 1947, que foi aprovado;

Projeto de Resolução n.º 961/XV/2.ª (PCP) — Recomenda ao Governo que reconheça o Estado da Palestina, que foi rejeitado;

Projeto de Resolução n.º 964/XV/2.ª (BE) — Boicote e sanções a Israel pelo fim do genocídio em Gaza, que foi rejeitado;

Projeto de Resolução n.º 966/XV/2.ª (PAN) — Pelo fim imediato do conflito israelo-palestiniano e por uma paz duradoura, com a efetivação da solução dos dois Estados em conformidade com o Plano de Partilha das Nações Unidas de 1947, que foi aprovado.

Intervieram no debate, a diverso título, os Deputados Rui Tavares (L), Inês de Sousa Real (PAN), Joana Mortágua (BE), Edite Estrela (PS), Bruno Dias (PCP), André

Ventura (CH), Tiago Moreira de Sá (PSD), Rodrigo Saraiva (IL), Pedro Roque (PSD), Ivan Gonçalves (PS), Diogo Pacheco de Amorim (CH), Pedro Delgado Alves e Paulo Pisco (PS), Alexandre Poço (PSD) e Pedro Pessanha (CH).

Seguiu-se a apreciação conjunta, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 982/XV/2.ª (PS) — Adapta as regras de determinação do resultado fiscal, em sede de IRC, que foi aprovado, na generalidade, na especialidade e em votação final global, com as alterações entretanto introduzidas, tendo ainda sido aprovado um requerimento, apresentado pela Deputada Susana Amador (PS), solicitando a dispensa de redação final e do prazo para apresentação de reclamações contra inexatidões, 990/XV/2.ª (PSD) — Altera a Lei n.º 22-A/2007, de 29 de junho, corrigindo a afetação das receitas do imposto único de circulação, designadamente da parte dessas receitas que por direito cabe aos municípios, que foi rejeitado na generalidade, e 993/XV/2.ª (PAN) — Cria incentivos fiscais para que as empresas promovam a mobilidade ciclável dos seus trabalhadores, procedendo à alteração do Código do IRC, que foi rejeitado na generalidade. Intervieram, a diverso título, além do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Nuno Santos Félix), os Deputados Carlos Brás (PS), Duarte Pacheco (PSD), Rui Afonso (CH), Inês de Sousa Real (PAN), João Cotrim Figueiredo (IL), Duarte Alves (PCP), Pedro Filipe Soares (BE) e Filipe Melo (CH). No final, proferiram declarações de voto os Deputados Hugo Carneiro (PSD), Miguel Cabrita (PS) e João Cotrim Figueiredo (IL).

Deu-se conta de um Deputado do PS que esteve presente, por videoconferência, nesta reunião plenária.

O Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 38 minutos.

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O Sr. Presidente: — Muito boa tarde, Sr.as e Srs. Deputados, estamos em condições de iniciar os nossos trabalhos.

Está aberta a sessão. Eram 15 horas e 9 minutos. Solicito aos Srs. Agentes da autoridade o favor de abrirem as galerias ao público. Muito obrigado. Passo a palavra à Sr.ª Deputada Maria da Luz Rosinha para a leitura do expediente. A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Muito obrigada, Sr. Presidente. Deram entrada na Mesa, e foram admitidos, os Projetos de Lei n.os 984/XV/2.ª (BE), que baixa à 10.ª

Comissão, 985/XV/2.ª (BE), que baixa à 13.ª Comissão, 986/XV/2.ª (BE), que baixa à 10.ª Comissão, 987/XV/2.ª (BE), que baixa à 10.ª Comissão, 990/XV/2.ª (PSD), que baixa à 5.ª Comissão, 991/XV/2.ª (PAN) e 992/XV/2.ª (PAN), que baixam à 10.ª Comissão, 993/XV/2.ª (PAN); e os Projetos de Resolução n.os 965/XV/2.ª (PSD), que baixa à 2.ª Comissão, e 966/XV/2.ª (PAN).

É tudo, Sr. Presidente. O Sr. Presidente: — Muito obrigado. Vamos, então, passar à nossa ordem do dia, cujo primeiro ponto resulta da fixação, requerida pelo Livre,

sobre o tema «Solução de dois Estados e o reconhecimento da independência da Palestina», no âmbito do qual serão discutidos, na generalidade, os Projetos de Resolução n.os 943/XV/2.ª (L) — Recomenda ao Governo que avance para o reconhecimento da independência da Palestina; 944/XV/2.ª (L) — Contra a escalada da guerra em Israel e na Palestina: recomendações urgentes ao Governo na defesa do cessar-fogo, ajuda humanitária e libertação de reféns; 946/XV/2.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que adote medidas que promovam a integração em instituições de ensino nacionais de estudantes, investigadores e docentes, provenientes de instituições de ensino superior de Israel, da Faixa de Gaza e da Cisjordânia; 950/XV/2.ª (BE) — Recomenda ao Governo que reconheça o Estado da Palestina; 957/XV/2.ª (PS) — Recomenda ao Governo que encete todos os esforços diplomáticos para defender a criação do Estado da Palestina, a par da existência do Estado de Israel, lado a lado, a viver em paz e segurança, tal como previsto no Plano de Partilha das Nações Unidas de 1947; 961/XV/2.ª (PCP) — Recomenda ao Governo que reconheça o Estado da Palestina; 964/XV/2.ª (BE) — Boicote e sanções a Israel pelo fim do genocídio em Gaza; e 966/XV/2.ª (PAN) — Pelo fim imediato do conflito israelo-palestiniano e por uma paz duradoura, com a efetivação da solução dos dois Estados em conformidade com o Plano de Partilha das Nações Unidas de 1947.

Para apresentar as iniciativas do Livre, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Tavares. O Sr. André Ventura (CH): — Não vem ninguém do Governo? O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Tanta coisa para se discutir em Portugal e vai gastar tempo com

isto! O Sr. Presidente: — Peço silêncio para podermos escutar o orador. Faça favor, Sr. Deputado. O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Caras e Caros Colegas, Caras e Caros Concidadãos nas galerias,

escreveu o poeta palestiniano Refaat Alareer: «Se eu tiver de morrer / terás de viver tu / para contar a minha história / para vender as minhas coisas / para comprares um pedaço de tecido / e uns quantos fios / fá-lo branco com uma grande cauda / para que uma criança, algures em Gaza / ao olhar para o céu, olhos nos olhos / à espera do seu pai que partiu numa explosão / sem dizer adeus / nem à sua própria carne, nem a si mesmo sequer / veja o papagaio, o meu papagaio que tu fizeste / a voar lá em cima / e pense, por um momento, que é um anjo trazendo amor / Se eu tiver de morrer / que isso traga esperança / que isso seja uma história.»

Refaat Alareer morreu assassinado num bombardeamento em Gaza, no passado dia 6 de dezembro de 2023. Começo com as suas palavras porque ele pediu assim a todos os leitores do seu poema: se ele tivesse de

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morrer, que isso trouxesse esperança, que isso fosse uma história, que cada um de nós pudesse trazer esperança aos olhos de uma criança em Gaza.

Não comecei com as palavras de Refaat Alareer por concordar com ele em tudo — Refaat Alareer considerou os ataques do Hamas do passado dia 7 de outubro justificados e eu aqui, na primeira ocasião, nesta tribuna, disse que eram completamente injustificados —, comecei com as palavras de um poeta de Gaza porque em alguma coisa havemos de concordar e aquilo em que havemos de concordar é que as palavras ainda nos salvam e pelas palavras nos entendemos.

Poderia ter começado com a história do Prof. Alex Danzig, um historiador que, tendo nascido na Polónia e sendo um sobrevivente do Holocausto, dedicou a sua vida a falar da Polónia em Israel, a falar de Israel na Polónia e em trazer amizade entre as gerações daqueles que se tinham chacinado e massacrado. O Prof. Danzig foi sequestrado no dia 7 de outubro e ainda está refém em Gaza. As últimas notícias que tivemos é que o Prof. Danzig estava a dar aulas de História aos seus companheiros reféns e a quem o quisesse ouvir, como fizeram, ao longo da história, tantos historiadores quando foram reféns, quando estiveram nos guetos, quando estiveram nos campos de concentração, fazendo desse dom da palavra uma maneira de criar futuro relembrando o passado.

O poema de Refaat Alareer fala-nos de uma criança em Gaza, mas também poderia ter começado pela história de Almog. Almog é o filho de dois anos de Or Levy. Or Levy é um refém israelita que está há 74 dias preso, cuja mulher, a mãe do pequeno Almog, foi assassinada no dia 7 de outubro. E, portanto, o pequeno Almog não vê o seu pai há 74 dias. O seu tio, Michael, que encontrei ontem, não sabe sequer dizer ao seu sobrinho se voltará a ver o pai.

Podíamos começar por muitas histórias e temos de começar pelas histórias das pessoas, porque ninguém pode ter a certeza de que dirá tudo certo num debate sobre Israel e a Palestina. Mas há, talvez, uma maneira de nos enganarmos menos, que é começar pelas vítimas, sejam as vítimas dos ataques hediondos do Hamas a 7 de outubro, sejam as vítimas dos bombardeamentos desproporcionais, brutais, injustificados à Faixa de Gaza.

Depois de falar das vítimas, temos de falar dos perpetradores e, independente da posição que tenhamos, saber nomear os perpetradores e não ter medo de o fazer; saber designar o Hamas como entidade terrorista, que oprime o povo palestiniano e que tem um culto antissemita da morte, que só quer um Estado do Jordão até ao mar; saber nomear o exército de Israel e o Governo de Israel de Netanyahu, que violam o direito internacional ao promover este cerco a Gaza e este bombardeamento, e onde há elementos que também só querem um Estado do Jordão até ao mar.

Protestos do Deputado do CH Pedro dos Santos Frazão. Nomeando as vítimas, nomeando os perpetradores, devemos dizer aquilo que ouvimos, como aquilo que

ouvi num campo de refugiados na Síria. Lá havia crianças palestinianas do Iraque que, para sobreviver, tinham de mentir acerca da sua própria identidade, dizendo que eram xiitas quando eram sunitas. Contaram aos Deputados ali presentes a sua história e, no fim, estávamos todos praticamente lavados em lágrimas, como estaríamos também se ouvíssemos a história das famílias dos reféns e dos assassinados de 7 de outubro.

Depois de ouvir essas histórias e ouvir os responsáveis políticos — reunimos para preparar este debate com o representante diplomático da Palestina e o representante diplomático de Israel —, sabemos que aquilo com que todos nós concordamos é que é preciso um compromisso e que esse compromisso tem que ver com o território, com o reconhecimento de um Estado, com o reconhecimento da capital de um Estado e de outro Estado, porque não há solução de dois Estados sem reconhecermos ambos. Isso, na verdade, é o mais fácil. O mais difícil vai ser estas duas sociedades conseguirem recuperar e reconciliarem-se nas próximas gerações.

Quando olhamos para as fotografias de israelitas e palestinianos, vemos que eles são, afinal, tão parecidos, e tão parecidos com libaneses, e tão parecidos com cipriotas e, na verdade, tão parecidos com portugueses, dos mesmos povos mediterrânicos que há milhares de anos vivem nesta região. Uma criança, quando nasce, não escolhe nascer de um lado ou do outro de uma fronteira.

Temos de começar por estas histórias, porque estas histórias dizem-nos que, num debate em que naturalmente haverá espaço à discordância, em alguma coisa temos de concordar. E nestas coisas fundamentais temos de concordar ou perdemos a nossa humanidade.

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Mas há outras coisas com que nesta Assembleia da República concordamos. Esta Assembleia da República, não nesta Legislatura, mas antes, já votou uma recomendação, em 2014, na altura até com uma maioria de direita, pelo reconhecimento da independência da Palestina. Portugal já reconhece, na sua política externa, que a solução de dois Estados é a solução possível. Não é a ideal, não será a mais justa, não será a perfeita, é aquela em que morre menos gente, é aquela em que mais vidas salvamos. E Portugal é a favor dessa solução de dois Estados.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — É? Não sei se é! O Sr. Rui Tavares (L): — Portugal reconhece também que os colonatos são ilegais, que a ocupação da

Cisjordânia e da Faixa de Gaza são ilegais, que o Estado da Palestina, ao ser reconhecido como Estado independente, tem de ter um território e tem de ter condições de viabilidade. E, agora, se Portugal já tem essa posição, chegou a altura de a assumir com mais força e com mais urgência.

Se há algo que vemos na desproporção desta guerra é que há quem esteja interessado, com esta guerra, em impedir a solução dos dois Estados. Se Portugal defender a solução dos dois Estados, deixando de estar à espera de ser o último para avançar e, juntamente com outros países, como Espanha e a Bélgica, dinamizar e até a liderar, dentro da União Europeia, o reconhecimento da independência da Palestina, leva duas mensagens muito importantes.

A todos aqueles que não fazemos ideia se concordariam uns com os outros — do Prof. Danzig a Refaat Alareer, que são a favor do compromisso ou que eram a favor do compromisso e da solução dos dois Estados —, gostaria de dizer que o mundo e países na União Europeia e na Europa ocidental estão a favor desse compromisso agora e que o acham mais urgente do que nunca. Já a quem queira que haja apenas um Estado e que esse Estado tenha de vir ou da limpeza étnica, ou do genocídio, ou do apartheid, ou da discriminação constante, ou do fanatismo religioso, gostaria de dizer que não vão conseguir os seus intentos mudando os factos no terreno, criando uma política de facto consumado e tornando impossível a autodeterminação da Palestina.

Um país como Portugal, que lutou pela autodeterminação de Timor-Leste, que defende a autodeterminação do Sara Ocidental, que defende a autodeterminação e a integridade territorial e a soberania da Ucrânia, não pode deixar de defender a autodeterminação da Palestina e reconhecer o Estado da Palestina enquanto Estado independente.

Um país como Portugal não pode deixar de fazer o máximo que pode para salvar vidas. Já houve luso-palestinianos assassinados durante esta guerra, já houve luso-israelitas assassinados no ataque terrorista, mas há ainda gente que podemos salvar. Há, neste momento, luso-israelitas que são reféns. Se ontem me encontrei com Michael Levy é porque o seu irmão tem pendente o processo de pedido da nacionalidade portuguesa, e há, pelo menos, mais quatro ou cinco outros israelitas que têm condições, segundo a lei atual, para serem portugueses. E nós sabemos que a dupla nacionalidade tem sido, apesar de tudo, uma ajuda a que estas pessoas sejam libertadas.

O país que quis pôr Aristides Sousa Mendes no Panteão não pode deixar, a mais breve trecho possível, de dar a nacionalidade portuguesa, se as pessoas têm esse direito e assim podem ser salvas.

O Livre fixou esta ordem do dia porque não lhe pareceu aceitável que esta Assembleia, tendo já discutido outras guerras — discutiu, duas vezes nesta Legislatura, a invasão da Ucrânia pela Federação Russa de Putin —, fosse dissolvida sem nunca ter tido um debate em Plenário, com toda a solenidade possível, sobre o reconhecimento da Palestina como Estado independente e sobre um cessar-fogo imediato em Gaza, como tem pedido o Secretário-Geral Guterres.

Não seria aceitável que esta Assembleia fosse dissolvida sem tomar posição, debater ou votar o acontecimento mais importante da atualidade internacional. Quisemos que fosse possível outros partidos trazerem as suas próprias iniciativas a este debate. Poderíamos, regimentalmente, ter dito que este debate seria completamente monopolizado pelas iniciativas do Livre, mas assim não o quisemos. Acolhemos todos os projetos que venham a debate e achamos que é importante ter esse debate, porque nenhum partido, nenhum país, nenhuma pessoa individualmente pode ter a certeza de ter a razão toda neste conflito.

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Mas todas as histórias juntas farão um caminho para a paz e alguma coisa a Europa pode dizer: há 80 anos, nós, na Europa, fazíamos o mesmo que lá se faz hoje e as sociedades europeias conseguiram, às vezes pior, às vezes melhor, reconciliar-se. Talvez seja essa uma lição que ainda possamos dar ao mundo.

O Sr. Presidente: — Para apresentar a iniciativa do PAN, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real. A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, membros do público aqui

presentes, comunicação social e demais funcionários: Começo por agradecer ao Livre por nos trazer este tema, que nos fala, acima de tudo, sobre humanidade.

No final do debate de hoje, não poderemos deixar de ter presente nas nossas mentes que terão morrido, pelo menos, 15 crianças na Faixa de Gaza, às mãos da reação desproporcional de Israel aos ataques criminosos do Hamas. E falamos de Israel e do Hamas porque não podemos confundir o povo da Palestina com o Hamas nem, menos ainda, o povo israelita com Netanyahu.

Decorridos mais de três meses e perante toda esta barbaridade, também não podemos deixar de referir que um terço dos hospitais de Gaza estão fechados. Existe, em média, um chuveiro para cada 700 pessoas; os cortes de luz, de água e de internet são constantes; e as imagens de crianças a verem as suas famílias, os seus próprios irmãos, morrerem diante dos seus olhos não podem deixar qualquer uma ou qualquer um de nós indiferente.

O PAN não nega o direito a Israel de se defender, mas sempre dissemos que esse direito tem de ser exercido com proporcionalidade, não pode ser uma carta em branco para o genocídio e tem de respeitar também os limites do direito internacional humanitário, o que não tem acontecido. Destruir escolas e hospitais, bombardear campos de refugiados e fazer de Gaza aquilo a que António Guterres chamou «um cemitério de crianças» é algo cruel, perverso e que tem de ser punido.

Não se pode responder à barbárie com mais um capítulo daquilo a que José Saramago chamou «um monumento à indignidade dos povos».

Sr.as e Srs. Deputados, é por isto mesmo que nos apresentamos a debate defendendo a solidariedade para com todos os que sofrem, sem fronteiras; a responsabilização dos autores desta barbaridade; o cessar-fogo imediato; a procura de uma paz duradoura entre Israel e a Palestina; mas também o reconhecimento da independência da Palestina.

Solidariedade, porque queremos que o nosso País honre o seu passado humanista e esteja de braços abertos a todos os que sofrem na Faixa de Gaza, na Cisjordânia e em Israel. Estando neste momento as universidades fechadas, Portugal pode e deve ter também um papel na atribuição de bolsas para estes territórios.

Responsabilidade perante a barbárie, porque não aceitamos que as violações ao direito internacional e aos direitos humanos fiquem impunes e queremos, assim, que o Governo manifeste o seu total apoio à investigação iniciada pelo procurador do Tribunal Penal Internacional sobre todos estes crimes que estão a ocorrer, bem como que a Comissão Independente de Inquérito da ONU (Organização das Nações Unidas) possa proceder também à investigação junto da Faixa de Gaza para recolha de provas.

Queremos o cessar-fogo por todas as partes envolvidas, com a libertação dos reféns dos dois lados e a criação de acessos seguros rápidos e diretos à Faixa de Gaza para ajudar as vítimas inocentes.

E queremos também, por fim, falar de paz, Sr.as e Srs. Deputados. O planeta e o mundo precisam de paz, mas a Faixa de Gaza, mais do que nunca, precisa que esta paz seja instaurada. Queremos por isso que Portugal, em linha com aquela que tem sido a sua política diplomática, reafirme esta necessidade e demostre estar do lado certo da história, com a resolução relevante de iniciativas como as da Assembleia Geral das Nações Unidas, do Conselho de Segurança das Nações Unidas e em acordos anteriormente firmados entre israelitas e palestinianos no seu total cumprimento.

O mundo precisa de paz, precisamos de humanidade e, acima de tudo, precisamos que os direitos humanos não tenham, finalmente, fronteiras.

O Sr. Presidente: — Para apresentar as iniciativas do Bloco de Esquerda, tem agora a palavra a Sr.ª

Deputada Joana Mortágua.

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A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: «Este Natal não há festa em Jerusalém ou Belém»,…

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Há, há! A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — … escreveu Alexandra Lucas Coelho, no Público. O patriarcado dos católicos está em choque com o ataque israelita a uma igreja em Gaza. Um sniper israelita

matou duas mulheres dentro da paróquia da Sagrada Família, onde se refugiavam 600 cristãos, e um tanque atingiu um edifício que abrigava pessoas deficientes.

A Sr.ª Rita Matias (CH): — Agora já há perseguições aos cristãos! A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Os acontecimentos do dia 7 de outubro chocaram o mundo e, desde então,

não houve um dia de descanso para o horror. Quase 20 000 palestinianos foram mortos pelos ataques israelitas na Faixa de Gaza, 70 % dos quais mulheres e crianças.

A maioria dos 2 milhões de pessoas no território está deslocada, e estima-se que metade da população esteja a morrer de fome. Não há água, não há energia.

As unidades hospitalares entraram em falência. Trezentos dos seus profissionais foram mortos, assim como dezenas de jornalistas e de funcionários humanitários internacionais. Não há cuidados maternos ou neonatais, e, entre os que ainda não morreram, há milhares de feridos sem acesso a tratamento, crianças a serem operadas sem anestesia e um profundo desespero.

«Gaza transformou-se num cemitério para crianças», disse a porta-voz da Unicef. «Gaza é o inferno na Terra», disse o diretor da Agência das Nações Unidas para a Palestina.

Todos os horrores que possamos nomear estão a acontecer em Gaza. O Sr. Pedro Pinto (CH): — É o terrorismo! A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Nesta enorme prisão a céu aberto chamada Gaza, há mais de 2 milhões de

pessoas a serem eliminadas por todos os meios. O Sr. Pedro Pinto (CH): — E no Irão, as mulheres?! A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — E há uma palavra para isto: genocídio. A questão é saber se queremos fazer

parte de um mundo sentado, um mundo que assiste ou, no máximo, lamenta um genocídio transmitido em direto ou se queremos ser um mundo que se levanta para fazer calar as armas, para fazer a paz e para trazer justiça.

Até agora, e vergonhosamente, tem imperado a posição dos que assistem. Honrosas exceções devem ser reconhecidas, como a de António Guterres, que tem sido incansável nos apelos a um cessar-fogo e na denúncia de crimes de guerra.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem! A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — No dia 8 de dezembro, no seguimento de um pedido inédito do Secretário-

Geral da ONU, os Estados Unidos vetaram a adoção de uma resolução do Conselho de Segurança para um cessar-fogo humanitário imediato na Faixa de Gaza. A Assembleia Geral da ONU aprovou a mesma resolução por maioria expressiva, mas sem poder vinculativo.

Hoje, o tema regressará ao Conselho de Segurança. Portugal e a União Europeia não podem continuar a olhar para o outro lado.

Permitam-me citar uma carta aberta, subscrita por vários políticos europeus, que dizia: «O nosso continente sabe demasiado bem quão frágil é o fino véu da humanidade. A história julgará severamente os líderes da União Europeia pelo seu apoio “incondicional” à carnificina do Governo de extrema-direita de Israel.»

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Neste momento, há mais de 2 milhões de pessoas condenadas à morte pela passividade internacional. Fazer o que estiver ao nosso alcance para travar o massacre indiscriminado de homens, mulheres e crianças é um imperativo de quem não abandona posições pela paz e pelo bem.

Portugal não pode ficar sentado, apenas a assistir; não pode ficar do lado da carnificina. Mas o que fazer? Propomos dois derradeiros gestos de humanidade.

Primeiro, é preciso fazer tudo por um cessar-fogo. Perante o projeto do Governo israelita de destruição total de Gaza, de extermínio de quem ali vive, é preciso que a comunidade internacional obrigue Israel a parar com a violência, tanto na Faixa de Gaza como nos territórios palestinianos ocupados. Como?

O Sr. Pedro Pinto (CH): — E condenar os terroristas?! A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Através da condenação inequívoca das ações de Israel contra a Palestina,

além da defesa do direito internacional e humanitário; além de levar os responsáveis políticos e militares israelitas a Tribunal Penal Internacional, assim como todos os crimes de guerra, tenham eles sido cometidos pelo exército israelita ou pelo Hamas.

É preciso avançar para a aplicação de sanções e de boicotes a Israel para que a agressão pare de imediato. Defendemos e propomos a elaboração de sanções a Israel enquanto persistir uma política de punição coletiva, de expansão colonialista e de limpeza étnica.

O Estado português deve recusar qualquer colaboração militar ou logística em operações que envolvam as forças de defesa israelitas. As empresas israelitas ligadas à indústria de armamento que financiem as atividades do Governo e do exército, ou que sejam cúmplices da ocupação de territórios palestinianos, devem ser alvo de um boicote nacional e internacional.

Somos claros: Israel deve ser alvo de sanções políticas e económicas enquanto durar o massacre. França já assumiu o compromisso de aplicar sanções a colonos israelitas pelos atos de extrema violência contra palestinianos na Cisjordânia. Outros países europeus, e até os Estados Unidos da América, estão a discutir medidas similares.

Tendo em conta que, da parte do Governo de extrema-direita, não há intenção de parar a agressão, quer em Gaza quer na Cisjordânia, as sanções e o boicote internacional têm de avançar. Não exigimos menos do que a pressão internacional que vergou o regime do apartheid na África do Sul.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — «Exigimos»?! Vocês são cinco! Como uma equipa de futsal! A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Mas travar o genocídio é apenas o primeiro passo. É preciso construir a

paz. São 139 os países representados na Assembleia Geral da ONU que já reconhecem o Estado da Palestina,

e Portugal não é um deles. Portugal continua, a medo, a sustentar uma posição hipócrita de quem diz defender a solução dos dois Estados, mas depois só reconhece um, o Estado de Israel. Uma posição subserviente, dependente, que acabará por ser ultrapassada, se não mesmo atropelada pela realidade.

A política da hipocrisia, do medo, da subserviência é uma forma calculista de compactuar com aquilo que está a acontecer em Gaza. É preciso reconhecer a Palestina e defender em todas as instâncias internacionais o seu reconhecimento. Foi isso que a Assembleia da República já votou, por maioria, e que deve hoje voltar a aprovar e exigir que o Governo faça.

Reconhecer o Estado da Palestina e aplicar sanções a Israel para travar um genocídio são gestos de derradeira humanidade que o Bloco de Esquerda aqui propõe. Porque a Palestina livre e o fim do projeto colonial israelita, isso sim, é o caminho para a paz.

Aplausos do BE. O Sr. Pedro Pinto (CH): — Nem a Mariana veio! O Sr. Presidente: — Para apresentar a iniciativa do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tem a palavra

a Sr.ª Deputada Edite Estrela.

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A Sr.ª Edite Estrela (PS): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: O conflito no Médio Oriente

preocupa-nos e ocupa a agenda política e mediática de todo o mundo. Não por ser inusitado, mas pela dimensão de horror, sofrimento e morte.

Este não é apenas mais um conflito entre Israel e Palestina, a somar aos muitos que ocorreram ao longo das décadas. Foram tantos e começaram há tanto tempo que, provavelmente, ninguém nesta Sala era nascido quando tudo começou. Ainda nem sequer tinha sido criado o Conselho da Europa, a mais antiga instituição europeia e a principal organização dos direitos humanos, e já o conflito israelo-palestiniano preocupava o mundo.

Como é possível? É a pergunta que perpassa pela mente de muitos de nós. É a realidade, impensável e dolorosa.

Heródoto dizia que é preciso pensar o passado para compreender o presente e idealizar o futuro. O conhecimento da história devia evitar que os erros do passado se repetissem no presente e no futuro. Sabemos que não é assim. Nem sempre a humanidade soube aprender com a história e dela retirar lições e ilações, mas não é por isso que devemos desistir de retirar ensinamentos do passado para melhor acautelar o futuro.

O conflito entre Israel e a Palestina é um dos mais longos e complexos da história contemporânea, atravessa décadas de tensões e confrontos, cuja génese mergulha na história, na religião e na geopolítica do Médio Oriente. A religião tem, aliás, desempenhado um papel central na criação e manutenção deste conflito, acrescentando obstáculos ao, de si já muito complexo e difícil, caminho da paz.

No início de 1947, a Grã-Bretanha, que administrava a Palestina após a Primeira Guerra Mundial, reconheceu a impossibilidade de resolver o crescente conflito entre árabes e judeus e defendeu a criação de dois Estados, um árabe e um judeu. Essa proposta de partilha da Palestina foi aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, através da Resolução 181, em novembro de 1947, atribuindo-se cerca de 56 % do território aos judeus e 44 % aos árabes.

Desde o fim do mandato britânico e da criação do Estado de Israel, em 1948, a região tem sido palco de conflitos intermitentes, esforços de paz frustrados, mudanças várias, deslocamento de populações, ciclos de violência renovados.

A década de 1990 trouxe esperança com os acordos de Oslo, que visavam estabelecer um Estado palestiniano na Cisjordânia e na Faixa de Gaza. O início do século XXI testemunhou mais conflitos e a situação tornou-se ainda mais complexa com a emergência de grupos extremistas islâmicos como o Hamas, o Hezbollah e o Estado Islâmico, por um lado, e a ascensão ao poder em Israel de uma direita prepotente que não acredita na solução de dois Estados e que tudo tem feito para a boicotar.

É assim que, apesar de décadas de esforços e negociações internacionais, a paz na região parece estar cada vez mais distante. Os acordos de Oslo, já o afirmei, representaram um passo importante, mas a intransigência de setores radicais dos dois lados tem dificultado a construção de uma solução duradoura.

Perda de terras, colonatos ilegais com mais de 700 000 colonos — contra todas as resoluções das Nações Unidas, diga-se —, controlo das fontes de água e energia, restrições de movimentos, dificuldades económicas, escassez de bens essenciais, como alimentos e medicamentos, e a constante presença militar israelita tornam as condições de vida dos palestinianos mais do que precárias e inaceitáveis. A Faixa de Gaza e a Cisjordânia transformaram-se no que muitos apelidam de prisões a céu aberto, o que representa uma gritante violação dos direitos humanos.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, os acordos de paz negociados e assinados foram sistematicamente ignorados e esquecidos pelos intervenientes nos processos e pela comunidade internacional.

Assim, chegámos ao trágico dia 7 de outubro, que nunca deveria ter acontecido. O ataque terrorista perpetrado pelo Hamas tem de ser condenado sem reservas, como todos os atos terroristas. Israel tinha e tem o direito de se defender. Ninguém põe em causa o direito de Israel a defender a sua população e o seu território; ninguém põe em causa o direito de Israel a viver em paz.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas é o que está a acontecer! A Sr.ª Edite Estrela (PS): — Mas agora já não se trata disso. Aquilo a que estamos a assistir é muito mais

do que isso. Por maiores que tenham sido as atrocidades cometidas pelo Hamas, e foram, estas não se resolvem

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com mais atrocidades. A violência é condenável, venha ela de que lado vier. A guerra não é solução para nada. Como afirmou o Papa Francisco, «a guerra apaga o futuro».

As atrocidades cometidas pelo Hamas, de uma violência extrema contra civis indefesos, matando indiscriminadamente mais de um milhar de israelitas, muitas mulheres e crianças, fazendo 240 reféns, incluindo estrangeiros, semeando o mal num total desrespeito pelos direitos humanos, ficaram gravadas na pedra como um dos momentos mais tenebrosos da humanidade. Mas a resposta de Israel, legítima se respeitasse o direito internacional, transformou-se numa reação de vingança, numa matança indiscriminada de que o assassinato dos três reféns israelitas é paradigmático. Homens indefesos, de tronco nu e acenando com roupa branca a sinalizar a sua condição de civis a pedir paz foram abatidos como se de um grupo armado se tratassem.

O Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, não tem poupado esforços para que a ajuda humanitária chegue a quem dela precisa e tudo tem feito para apelar à moderação, pedindo a libertação de todos os reféns do Hamas e lembrando que até as guerras têm regras. Os seus apelos ao desenvolvimento de uma solução diplomática têm também sido uma constante. No Dia Internacional dos Direitos Humanos, a 10 de dezembro, António Guterres lamentou que o Conselho de Segurança da ONU não tenha votado a favor de um cessar-fogo em Gaza e não poupou nas palavras. Cito: «A situação está a evoluir rapidamente para uma catástrofe, com implicações potencialmente irreversíveis para os palestinianos como um todo e para a paz e segurança na região.»

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, estamos todos e todas de acordo: a guerra não é solução para nada, nunca é. Estamos todos de acordo que é preciso evitar o sofrimento inútil de seres humanos de ambos os lados, pessoas que têm rosto e nome, que têm direito a viver em segurança e liberdade. Estamos todos de acordo que é urgente pôr termo à barbárie. Estamos todos de acordo que é preciso percorrer rapidamente o caminho da paz. Estamos todos de acordo que a paz, mais do que nunca, pressupõe a existência de dois Estados: o Estado de Israel e o Estado da Palestina.

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem! A Sr.ª Edite Estrela (PS): — Há hoje uma convicção muito profunda e partilhada de que a única solução é

mesmo esta: reconhecer o Estado da Palestina. Mas não devemos repetir os erros do passado. O passado diz-nos que gestos simbólicos, até românticos,

de reconhecimento isolado não serviram para nada. O reconhecimento isolado por parte de Portugal seria inconsequente. Para ter impacto, temos de evoluir para um reconhecimento conjunto.

Sei que Portugal e vários países europeus estão a trabalhar num roteiro para o reconhecimento conjunto do Estado da Palestina. Por isso, o projeto de resolução do PS recomenda ao Governo que encete todos os esforços diplomáticos para defender a criação do Estado da Palestina, a par da existência do Estado de Israel, lado a lado, a viver em paz e segurança, tal como previsto no plano de partilha das Nações Unidas de 1947.

É esta a via que preconizamos, para que, tal como no dia 14 de maio de 1948, em que foi possível proclamar a criação do Estado de Israel e David Ben-Gurion disse, e cito, que «este é o direito natural do povo judeu — ser como qualquer outra nação», o mesmo se possa dizer em breve sobre a Palestina: «Este é o direito natural do povo palestiniano — ser como qualquer outra nação.»

Aplausos do PS. O Sr. Presidente: — A Sr.ª Deputada tem um pedido de esclarecimento. Para o formular, tem a palavra o

Sr. Deputado Rui Tavares, do Livre. O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Edite Estrela, estamos de acordo quanto ao fundo

da questão. Há duas nacionalidades naquele território, duas identidades nacionais que têm o mesmo direito à autodeterminação. Essa é uma posição clássica do Estado português, mas, se o Estado português é a favor da solução de dois Estados, não pode continuar reconhecendo apenas um deles.

Compreendo também o que diz em relação ao pragmatismo do exercício desse reconhecimento. O reconhecimento de um Estado faz-se uma vez. É uma carta que se joga uma vez e que não deixa de se jogar

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depois de ter sido jogada. Portanto, Portugal deve querer, nos interesses da paz, da segurança e do respeito pelo direito à autodeterminação, que esse seu exercício seja feito num momento em que possa ajudar mais.

A pergunta que lhe faço é se há outro momento em que possa ajudar mais do que este, uma vez que, se Portugal demorar, acontece que pode já não haver Estado da Palestina para reconhecer, porque sabemos muito bem que há planos, simplesmente, de fazer uma limpeza étnica em Gaza e enviar os palestinianos para o deserto do Sinai, e porque sabemos que a Cisjordânia está cada vez mais longe de poder constituir uma entidade independente, autónoma e sustentável, com todos os colonatos que dividem o seu território. Se o Estado português, à espera de uma unanimidade, se deixa prender pela posição daquele que andar mais devagar, evidentemente que exercerá esse seu direito de reconhecimento da Palestina enquanto Estado tarde demais.

Aquilo que o Livre propõe é que o Estado português dê sinais concretos, passos para avançar para o reconhecimento da Palestina como Estado independente. O Estado português não precisa de esperar pelo último Estado da União Europeia para o fazer. Pode liderar em conjunto com outros Estados que têm essa disponibilidade. O Estado português pode criar um grupo de trabalho para ver as implicações jurídicas de reconhecer de facto a Autoridade Palestiniana como uma autoridade internacionalmente reconhecida do Estado palestiniano, excluindo o Hamas de qualquer tipo de reconhecimento e, portanto, reconhecendo só de jure a soberania sobre a Faixa de Gaza. Isso deve ser estudado por quem é de direito internacional.

O Estado português pode também marcar este debate no Conselho da Europa e no Conselho da União Europeia. Pergunto-lhe se acha que está na altura de o Estado português o fazer.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Edite Estrela, do Grupo Parlamentar do

PS. A Sr.ª Edite Estrela (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Tavares, muito obrigada pela sua pergunta. Julgo que ouviu com atenção aquilo que eu acabei de dizer, sobretudo a parte final da minha intervenção,

em que afirmei que Portugal não está à espera de ser o último a reconhecer o Estado da Palestina, não está à espera de unanimidade e nem sequer está à espera de uma decisão da União Europeia. Daquilo que tenho conhecimento, está, em conjunto com um grupo de outros países europeus, a trabalhar um roteiro para o reconhecimento do Estado da Palestina.

Ou seja, Sr. Deputado, a diferença, digamos, entre as nossas posições não é substantiva e nem sequer é adjetival, é adverbial: tem a ver com o tempo e com o modo. Não é já e não é isoladamente. O que defendemos é que seja em conjunto, que é para ter impacto, como, aliás, o próprio Sr. Deputado reconheceu.

Portanto, consideramos que uma ação concertada é o melhor caminho para atingir o objetivo da criação do Estado da Palestina, e Portugal está a ter um papel liderante neste trabalho conjunto, junto das instituições europeias e presumo que não só.

Aplausos do PS. O Sr. Presidente: — Para apresentar o Projeto de Resolução n.º 961/XV/2.ª (PCP) — Recomenda ao

Governo que reconheça o Estado da Palestina, tem agora a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias. O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Comecemos pelo tema do agendamento

desta sessão plenária, o tema do reconhecimento do Estado da Palestina pelo Governo português. Começamos por esse tema que aqui hoje nos convoca para constatar o que é uma evidência: é que este debate, sobre a decisão ou não de reconhecer o Estado da Palestina, é um debate que já não devíamos estar a fazer há muito tempo. É um absurdo, é uma vergonha que, num país onde supostamente se preconiza e apoia uma solução de dois Estados no cumprimento das resoluções das Nações Unidas, nesse mesmo país, Portugal, o Governo não reconheça um desses dois Estados e reconheça apenas o Estado ocupante, ao arrepio das resoluções da Assembleia Geral das Nações Unidas e da Assembleia da República de Portugal.

Há mais de 12 anos que a Assembleia da República se pronunciou sobre essa matéria. O PCP contribuiu ativamente nesse processo, com o Projeto de Resolução n.º 72/XII/1.ª — Recomenda ao Governo que reconheça o Estado da Palestina, a 14 de setembro de 2011, e no debate que essa iniciativa então suscitou nesta Assembleia.

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O povo palestiniano aguarda há décadas pela concretização do seu legítimo e inalienável direito a um Estado soberano, independente e viável. Desde 1947, com a Resolução 181, a Assembleia Geral das Nações Unidas estabeleceu o princípio da existência de dois Estados, o da Palestina e o de Israel, princípio reafirmado por órgãos da Organização das Nações Unidas, ao longo das mais de sete décadas que desde então decorreram, e que Israel se recusa a cumprir.

A questão palestiniana foi objeto de decisões do Tribunal Internacional de Justiça — de que é exemplo o pronunciamento, em 2004, sobre o muro ilegal construído por Israel —, decisões essas que Israel se recusa a cumprir. Apesar de ser clara a determinação da criação do Estado da Palestina, à luz dos princípios da Carta das Nações Unidas e das múltiplas resoluções adotadas no seu âmbito, há mais de 70 anos que esta determinação continua por cumprir.

Haja memória, para não ignorar, das inúmeras ações militares e dos seus muitos milhares de vítimas; da sistemática e metódica construção de colonatos que mais do que duplicaram desde os acordos de Oslo, igualmente não cumpridos por Israel; da ocupação efetiva do território palestiniano; da limitação do acesso a recursos naturais e a atividades económicas; da destruição de infraestruturas e equipamentos; da restrição da mobilidade da população palestiniana; do bloqueio à Faixa de Gaza; da construção do muro ilegal, entre tantas outras ações sistemáticas — tudo para Israel inviabilizar e impedir, de facto, a existência de um Estado da Palestina soberano, independente, viável, sendo responsável pelas dramáticas condições de sobrevivência a que, ao longo dos anos, foram e continuam a ser submetidas as populações da Palestina.

Mas uma solução justa para o conflito passa, inevitavelmente, pelo reconhecimento e criação do Estado da Palestina e pela efetivação do direito ao retorno dos refugiados palestinianos, conforme determinado pelas resoluções pertinentes da ONU, assim como pelo desmantelamento dos colonatos, o fim dos bloqueios, nomeadamente à Faixa de Gaza, e a libertação dos detidos, dos presos políticos e das crianças palestinianas presas nos cárceres de Israel.

Aplausos do PCP. O Sr. Pedro Pinto (CH): — E Cuba?! O Sr. Bruno Dias (PCP): — São 138 países. Eu repito: 138 países já reconheceram o Estado da Palestina,

ou seja, mais de 70 % dos Estados-Membros da ONU, a imensa maioria da humanidade. Destes países que reconheceram o Estado da Palestina, 10 são países que integram a União Europeia. Srs. Deputados, não nos venham falar em reconhecimento isolado.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Exatamente! O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isolados estão aqueles que se recusam a reconhecer o Estado da Palestina. Vozes do PCP: — Muito bem! O Sr. Bruno Dias (PCP): — A Constituição da República estabelece, no artigo 7.º, que, nas relações

internacionais, o Estado português se orienta, entre outros, pelos princípios do respeito pelos direitos dos povos, designadamente, à autodeterminação, à independência e ao desenvolvimento.

O reconhecimento do Estado da Palestina, conforme preconizado nas resoluções das Nações Unidas, é uma decisão soberana da exclusiva competência dos Estados e, nomeadamente, do Estado português. Esse reconhecimento — o que, de resto, releva da importância e da necessidade do respeito pelos princípios da Carta da ONU, assim como da solução política para o conflito que o direito internacional há muito determina — é tão mais relevante quando se verifica um brutal agravamento no conflito, quando se verifica o massacre que está hoje a acontecer e quando responsáveis do Estado de Israel declaram abertamente o objetivo da violenta expulsão da população palestiniana da Faixa de Gaza e de outros territórios palestinianos ocupados.

O problema central desta tragédia não está nos fatores conjunturais, culturais, religiosos. O problema está no colonialismo. O problema está na ocupação.

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O Sr. João Dias (PCP): — Claro! O Sr. Bruno Dias (PCP): — Esta tragédia dura há 75 anos e só vai terminar, só vai haver paz, quando houver

uma solução política, com o fim da ocupação por Israel, com o fim da violação do direito internacional. É preciso acabar com este massacre, com estes crimes de guerra, com esta impunidade, e Portugal tem de

acabar com este humilhante seguidismo e subserviência do Governo. Aliás, não deixamos de registar que, em relação à proposta apresentada pelo Partido Socialista a este debate, a formulação do seu projeto de resolução, propositadamente ambígua — passo a citar: «[…] e defender a existência de dois Estados viáveis e sustentáveis, na base de uma repartição de território justa e mutuamente aceite […]» —, fica de fora do quadro de cumprimento das resoluções da ONU que determinam a criação do Estado da Palestina, com as fronteiras de 1967 e capital em Jerusalém Leste. Isto é, abre a possibilidade de haver ainda maiores cedências e recuos no processo.

É por isso que, tendo sido já assumido e aprovado o Projeto de Voto n.º 497/XV/2.ª, do PCP, congratulando-se com a adoção pela Assembleia Geral da ONU de uma resolução que preconiza uma trégua humanitária imediata, duradoura e sustentada, chamamos a atenção para a necessidade de reconhecer o Estado da Palestina, de assumir essa posição no âmbito da ONU e noutras instâncias internacionais em que Portugal participa e de conduzir a ação do País nas relações internacionais com vista à efetiva concretização de um Estado da Palestina soberano, independente, viável, conforme determinado pelas resoluções das Nações Unidas.

É essa a proposta do PCP. Aplausos do PCP. O Sr. Presidente: — Para intervir, em nome do Grupo Parlamentar do Chega, tem a palavra o Sr. Deputado

André Ventura. O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente de algumas bancadas deste Parlamento, Srs. Deputados que

aqui marcaram este debate, Srs. Membros do Governo ausentes deste debate, mas que estarão certamente em atividades muito importantes num Governo em gestão: O País, hoje, deveria estar a discutir a crise na habitação e na saúde, deveria estar a discutir o emprego, que não existe, deveria estar a discutir o futuro destes jovens que aqui estão, nas galerias, e que não encontram futuro para o seu País. Deveria discutir, hoje, a crise profunda em que este País vive.

Aplausos do CH. Sim, hoje deveríamos estar a discutir o país que não temos, o país que nos prometeram e ao qual falharam.

Hoje, deveríamos estar a discutir os pensionistas que já não têm dinheiro para comprar medicamentos, mas não. Estamos a discutir se Portugal deve ou não reconhecer o Estado soberano da Palestina.

Vamos começar como começou o Deputado Rui Tavares: o poeta assassinado na Palestina. Podia ser, também, a história da mulher violada pelos sequestradores de Gaza, ou daqueles que foram violados e mortos, ou dos bebés queimados após o ataque do Hamas a Israel.

Vozes do CH: — Muito bem! O Sr. André Ventura (CH): — Não deixa de ser curioso ver esta nova cultura de esquerda falar de cristãos

perseguidos, quando há anos apoia regimes como o do Irão, o da Palestina e outros que perseguem todos os cristãos que podem encontrar.

Aplausos do CH. Não deixa de ser curioso ver uma mulher defender o regime da Palestina, quando as mulheres não têm

quaisquer direitos, nem na Faixa de Gaza, nem na Palestina.

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A Sr.ª Rita Matias (CH): — Muito bem! O Sr. André Ventura (CH): — Não deixa de ser curioso ver a esquerda defender a Faixa de Gaza e o seu

Hamas, que, ainda em 2007, 2008, 2009, 2010 e 2011, condenou à morte homossexuais, pela única razão de serem homossexuais. Repito: pela única razão de serem homossexuais!

Aplausos do CH. Talvez um lençol de vergonha pudesse estar aí por cima de quem sempre andou a encher a boca a defender

os mais pobres, a defender as mulheres, a defender as minorias, e hoje está aqui a defender os povos que fazem tudo o que querem e tudo o que não deviam fazer a essas minorias.

Vergonha desta esquerda, que nos envergonha cá em Portugal e fora de portas. Aplausos do CH. Sr. Presidente e Srs. Deputados, talvez o País deva saber isto. No Conselho de Segurança da ONU, há dois

Estados que reconhecem a soberania da Palestina e os seus direitos. São eles a China e a Rússia. Sublinho, são eles a China e a Rússia.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Oiçam! Oiçam! O Sr. André Ventura (CH): — Não sei que companheiros vocês querem que tenhamos, não sei com que

companhias vocês gostam de nos ver andar na cena internacional, mas certamente não é ao lado do Presidente russo, nem ao lado do Presidente chinês, nem ao lado de todas as piores ditaduras que o mundo tem produzido.

Vozes do CH: — Muito bem! O Sr. André Ventura (CH): — Não deixa de ser curioso, também, ver o PCP bater no peito, falar de dois

Estados, falar de agressores, quando andou a suportar a Rússia na maior barbárie contra a Ucrânia na Europa do século XXI.

Aplausos do CH.Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias. É vergonhoso como conseguem vir aqui e bater com a mão no peito, quando suportam, sustentam e

defendem os regimes mais violentos, mais autocráticos, mais ditatoriais e menos respeitadores dos direitos humanos no mundo inteiro. Querem ajuda humanitária para Gaza, mesmo reconhecendo que o Hamas fica com uma grande parte dela e a usa para sustentar as suas redes de terrorismo. Querem mais infraestruturas, mesmo sabendo que o Hamas desenvolveu a rede mais complexa de túneis para financiar o terrorismo. Querem dar dinheiro ao terrorismo, que um dia nos virá a bater à porta, como já o fez em Espanha, em França, em Itália e na Alemanha.

Nesse dia, cá estarão os outros, como sempre, para defender a Europa e a sua civilização daqueles que andaram a suportar ditadores, daqueles que andaram a suportar os que nos querem destruir.

Aplausos do CH. Sr. Presidente e Srs. Deputados, quando a Rússia invadiu a Ucrânia, não tivemos dúvidas de que lado

estávamos. Estamos do lado daqueles que defendem a democracia, os direitos humanos, do lado daqueles que foram atacados sem qualquer razão. No dia 7, Israel foi atacado sem qualquer razão. Mulheres foram violadas, bebés foram queimados, centenas de homens e mulheres continuam sequestrados.

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Ronald Reagan dizia: «Nunca negociamos com terroristas e, quando começamos a negociar com eles, é o início da nossa fraqueza.»

O Sr. Francisco César (PS): — Nós fartámo-nos de negociar com terroristas! O Sr. André Ventura (CH): — Não sei que esquerda temos, nem sei que domínio querem que Portugal tenha

na Europa, mas sei uma coisa: sei que, quando começamos a ceder ao terrorismo, sobretudo aquele pior, que não respeita os direitos humanos de ninguém, sobretudo das minorias — é nesses sítios que são atacadas violentamente —, começamos a apresentar a nossa própria derrota.

Vozes doCH: — Muito bem! O Sr. André Ventura (CH): — Diz a esquerda: «Haja memória.» Haja mesmo memória, porque sabemos

quem, nos últimos anos, tem provocado o terror no mundo inteiro. Sem dúvida, Israel tem de cumprir o direito humanitário internacional. Sem dúvida, Israel tem direito a

defender-se. Mas não nos peçam, nunca nos peçam, porque não o faremos, para apoiar terroristas, que só sabem usar como palavra uma bazuca ou uma pistola.

Aplausos do CH.Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Adão Silva. O Sr. Presidente: — Cumprimento todas as Sr.as e Srs. Deputados. Se me permitem, apresento um cumprimento muito especial ao Sr. Deputado Pedro Nuno Santos, eleito

Secretário-Geral do Partido Socialista. O Sr. André Ventura (CH): — Ninguém bate palmas?! O Sr. Presidente (Adão Silva): — Saúdo também os cidadãos que participam, nas galerias, nesta nossa

sessão, particularmente os jovens. É sempre um prazer ter-vos connosco nestes trabalhos parlamentares. Agora, tem a palavra o Sr. Deputado Tiago Moreira de Sá, para uma intervenção. O Sr. Tiago Moreira de Sá (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Corria o ano de 1927. Em

França, crescia o sentimento de insegurança perante uma Alemanha em acelerado rearmamento, através da revisão das cláusulas do Tratado de Versalhes. Incapazes de encontrar alternativas credíveis para atenuar a ameaça à sua segurança, os dirigentes franceses trocaram a orientação estratégica pelas proclamações espetaculares de princípios e boas intenções, tendo o Ministro dos Negócios Estrangeiros Aristide Briand proposto ao seu homólogo norte-americano, Frank Kellogg, uma espécie de compromisso universal e perpétuo de paz.

No ano seguinte, em Paris, foi assinado com pompa e circunstância o Pacto Briand-Kellogg, que consagrava a renúncia coletiva à guerra nas relações entre os Estados. Onze anos depois, começava a II Guerra Mundial.

Com boa vontade e ignorando, por momentos, que alguns apenas pretendem trazer um viés ideológico para a política externa e atacar certos países, podemos considerar que, por estes dias, está de regresso, com grande vigor, o espírito idealista, dos idealistas do período entre guerras mundiais, cuja ingenuidade acabou em tragédia.

Para o idealista, a política consiste em atingir o ideal sem olhar a meios, a contextos e a realidades de poder e segurança. O idealista abandona-se à fantasia dos seus ideais, desprezando a realidade. O idealista vê o mundo como queria que ele fosse e não como ele é, e, ao fazê-lo, adota políticas erradas que, na maioria das vezes, acabam muito mal.

Mesmo que nunca devamos abdicar de lutar pelo mundo como ele deve ser, não podemos jamais ignorar o mundo como ele é. Isso é ainda mais importante neste tempo de regresso da guerra e da anarquia ao centro do sistema internacional.

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Internacionalmente, as potências totalitárias revisionistas, como a Rússia, o Irão e a Coreia do Norte, estão empenhadas em aproveitar o fim da estabilidade unipolar para atacar em várias frentes a ordem internacional liberal e democrática. O projeto de paz, liberdade, democracia, Estado de direito, direito internacional e direitos humanos a que dedicámos grande parte das nossas vidas está hoje existencialmente ameaçado.

O Médio Oriente, em particular, vive permanentemente no mundo de Marte, Deus da Guerra, estando hoje sujeito à cada vez maior assertividade do Irão. O Irão é, hoje, o grande estabilizador da região, estando apostado em criar um arco de crise e caos que inclui o Iémen, o Iraque, a Síria, o Líbano e Gaza, usando para isso, sobretudo, os seus proxies, como o Hamas, o Hezbollah, a Jihad Islâmica e os Houthis.

Israel, a única democracia na região, encontra-se ameaçada existencialmente pelas forças mais sinistras, defensoras de práticas dignas dos momentos mais bárbaros da Idade Média, como ficou patente no ataque terrorista do Hamas, no dia 7 de outubro.

É dentro deste contexto mais vasto que devemos olhar para os projetos de resolução apresentados pelo PS, pelo Bloco de Esquerda, pelo PCP, pelo Livre e pelo PAN, recomendando ao Governo que avance para o reconhecimento do Estado da Palestina.

Sejamos muito claros na posição que defendemos: somos convictamente a favor da solução de dois Estados. As decisões que tomámos no passado, quando fomos Governo, são inequívocas. Recordo que foi durante um Executivo liderado pelo PSD que, em novembro de 2012, Portugal votou a favor o voto que reconheceu os territórios palestinianos como um Estado não-membro das Nações Unidas, com o estatuto de observador. Acreditamos profundamente que a solução de dois Estados é o único caminho possível para uma paz duradoura na região e a única forma de os dois povos viverem a vida digna e decente que ambos merecem. Todavia, não ignoramos nem o tempo, nem o contexto internacional e regional, nem as intenções mais ou menos veladas de cada um.

Desde logo, não ignoramos que este é o pior momento para avançar para o reconhecimento do Estado da Palestina. Não se percebe como isso pode ser realista, quando está a ocorrer uma guerra entre Israel e o Hamas na Faixa de Gaza. Se se reconhecer agora o Estado da Palestina, o que se faz com a Faixa de Gaza?

Acresce que esse reconhecimento, na sequência do ataque terrorista de 7 de outubro, parece compensar o ato bárbaro do Hamas, e isso é inaceitável.

Também consideramos que a solução de dois Estados deve fazer parte do processo negocial de paz. Ela pode ser, de resto, um dos mais poderosos incentivos ao espírito negocial e de boa-vontade entre as partes interessadas em viver em paz e segurança.

É, para nós, fundamental que o reconhecimento do Estado da Palestina seja feito no quadro de uma posição comum europeia ou, pelo menos, quando existir uma esmagadora maioria de Estados-Membros da União Europeia a favor. A pior coisa que pode acontecer à União Europeia é aparecer, uma vez mais, toda dividida na sua política externa.

Consideramos mesmo uma irresponsabilidade pensar num reconhecimento unilateral por parte de Portugal ou mesmo no quadro de uma coligação ultraminoritária e radicalizada, impulsionada por motivos de política interna de outro Estado.

Portugal tem, há muito tempo, uma posição clara e inequívoca sobre este assunto e não deve nem pode alinhar com a posição de outros Estados, muito menos com a atual política externa de Espanha.

O reconhecimento do Estado da Palestina tem também de ser articulado com os principais aliados de Portugal e da União Europeia, sendo para nós especialmente importante considerar as posições dos nossos aliados e amigos atlânticos.

Tudo isto é ignorado por todos os projetos de resolução apresentados, com exceção do do Partido Socialista. Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias. O projeto do PS, não sendo prefeito, acautela vários pontos sensíveis, é moderado e recomenda ao Governo

para agir de forma concertada com os nossos aliados, para que seja retomado o processo negocial de paz que culmine na solução de dois Estados. Concordamos com esta linha, embora ainda tenhamos várias preocupações que não estão totalmente acauteladas no projeto do PS, pelo que devemos continuar a conversar.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Certamente que o PS vai agradecer estes elogios!

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O Sr. Tiago Moreira de Sá (PSD): — De resto, da nossa parte, estamos muito empenhados em manter o

consenso nacional em torno da política externa portuguesa e em deixá-la de fora da luta político-partidária. Este consenso traduziu-se num voto recentemente aprovado aqui, na Assembleia da República, a condenar

os ataques terroristas do Hamas em Israel, a reconhecer o direito de Israel a defender-se, a exigir a libertação de todos os reféns, a reafirmar o nosso compromisso sagrado com o direito internacional e humanitário e os valores da humanidade e a manifestar o nosso apoio a todos os esforços que procuram alcançar uma paz duradoura na região, através da resolução do conflito israelo-palestiniano, com base na solução de dois Estados.

Acreditamos que esse consenso é desejável e possível, desde que o PS não ceda aos partidos à sua esquerda e não alinhe, como fez recentemente, com textos radicais contrários à posição oficial do Estado português.

Partilhamos o essencial: a mesma dor pelo sofrimento dos povos inocentes, seja em Israel seja na Palestina; a noção de que todas as vidas são sagradas e têm o mesmo valor; o compromisso com o direito internacional sem exceções; e o amor aos valores humanistas, que consideramos universais e perpétuos.

Protestos do Deputado do PCP Duarte Alves. A posição de Portugal tem sido a de defesa da solução de dois Estados. O Sr. Bruno Dias (PCP): — Vai daí?! O Sr. Tiago Moreira de Sá (PSD): — Acreditamos profundamente nessa solução e no futuro de paz entre

Israel e a Palestina. Aplausos do PSD.Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias. Como disse Simon Schama, no final da magnífica série da BBC (British Broadcasting Corporation) A História

dos Judeus, inspirada no seu livro com o mesmo nome, e cito: «A Bíblia está cheia de encontros entre homens e Deus, entre homens e homens e entre irmãos desavindos.»

Aplausos do PSD.Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias. O Sr. Presidente (Adão Silva): — Sr. Deputado Tiago Moreira de Sá, V. Ex.ª tem um pedido de

esclarecimento, por parte do Sr. Deputado Rui Tavares, do Livre, a quem dou já a palavra. O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, as minhas saudações, Sr. Deputado Tiago Moreira de Sá, obrigado

pela sua intervenção. Eu gostaria de ver esclarecidos alguns pontos, que me parecem importantes. Faz-nos o Sr. Deputado uma distinção entre idealismo e realismo. Eu colocar-lhe-ia, pelo contrário, uma

distinção entre conformismo e inconformismo. Podemos conformar-nos perante o facto de que, desde os tempos da Bíblia, há muitas histórias de irmãos

desavindos ou podemos lutar pelo futuro daqueles que ainda estão vivos. Lutar por esta juventude que está aqui, nas galerias, é também lutar por um Portugal que não tenha vergonha

de assumir posições no plano internacional, que não tenha vergonha de trazer estes debates aqui à Assembleia da República.

O primeiro pedido de esclarecimento que faço ao PSD é: uma vez que o PSD não se revê em nenhum dos projetos de resolução apresentados — nem sequer no do PS, que me parece que veem mais favoravelmente, mas consideram que não é perfeito —, como é que um grupo com tantas dezenas de Deputados, como o PSD, não apresenta o seu próprio projeto de resolução?

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O Livre nunca fez caixinha deste debate, nem nunca o quis cartelizar, pelo contrário. É altura de o PSD — que, ainda por cima, quer conduzir a política externa portuguesa dentro de muito pouco tempo — dizer ao que vem e apresentar o seu projeto de resolução.

Diz o Sr. Deputado que é importante que Portugal não esteja isolado dos seus aliados. Pergunto eu: a Comunidade de Países de Língua Portuguesa, fazem dela parte certamente aliados nossos? Fazem dela parte aliados nossos? Quantos países dessa comunidade é que ainda não reconheceram a independência da Palestina? Não preciso de lhe fazer esse pedido de esclarecimento, eu próprio posso esclarecer: um, que é Portugal. Só faltamos nós.

É intenção do PSD ficar conformado com uma situação na qual a solução de dois Estados será tornada inviável — e já ouvimos representantes do Governo israelita dizer, hoje em dia, que ela morreu, que ela não é viável — ou está o PSD capaz de dizer aos extremistas de um lado e de outro que não, que o mundo luta pela solução de dois Estados, e que, aliás, abandonar a solução de dois Estados é o melhor prémio que o Hamas poderia ter, porque sabe precisamente que, dentro da sociedade palestiniana, o Hamas foi sempre quem se lhe opôs?

Portanto, se dizemos «agora não, porque o Hamas fez qualquer coisa», não só estamos a dar esse prémio ao Hamas, como estamos a dizer que, de cada vez que a solução de dois Estados estiver em cima da mesa, é fazerem outro ataque terrorista, para a fazerem descarrilar.

Pelos seus próprios princípios de realismo político, não considera que Portugal deve dar sinais já, concretos, estudando precisamente os critérios que definiu para reconhecimento de onde é que a soberania palestiniana, de facto, tem a sua extensão territorial e onde é que, por o Governo ser exercido pelo Hamas, não deve ser reconhecida de facto? Ou, já que acha que o debate se deve fazer no plano europeu, está o PSD disponível para apoiar que Portugal, na agenda do Conselho Europeu, do Conselho da União Europeia, traga o tema do reconhecimento da Palestina?

É disto que se trata, Sr. Deputado, e não há teoria sobre idealismo e realismo que nos possa deixar sem resposta a perguntas que são muito concretas.

O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Tiago Moreira de Sá. O Sr. Tiago Moreira de Sá (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado, obrigado pelas suas questões. Em

relação à primeira questão, do projeto de resolução, enfim, parece-me claro que com o que eu disse fica esclarecido que o timing nos parece que não é propriamente famoso.

É uma questão que deve ser discutida e estamos disponíveis para a continuar a discutir, e o que eu disse é que estávamos disponíveis para continuar a discutir em sede da 2.ª Comissão, que é o que acho que faz sentido.

Em relação ao Portugal isolado, eu não disse que Portugal estava isolado. O que eu disse é que era importante haver um conjunto de critérios para o reconhecimento dos dois Estados e que era importante haver — e o Sr. Deputado devia ser o primeiro sensível a isso, pelo seu histórico — uma maioria, pelo menos, muito clara, para não dizer unanimidade, que percebo que não possa haver, da União Europeia nesse sentido. O pior que a União Europeia pode fazer é partir-se.

Mas não é só a União Europeia, são também os nossos aliados transatlânticos. Acho que também devemos negociar com eles e acautelar as suas posições.

Portanto, no fundo, não se trata de ficar isolado, trata-se de conseguir criar o maior consenso, o maior grupo possível de Estados, para reconhecer e não ser uma medida unilateral de Portugal ou de uma ultraminoria, de uma posição ultraminoritária.

A terceira pergunta acho que levanta um ponto importante. Alerto é para o facto de se ter cuidado no reconhecimento apressado, por poder parecer um prémio aos ataques terroristas do Hamas.

Agora, a sua questão é uma boa questão e deve-nos levar a refletir, porque também não podemos ficar reféns dos radicais, que podem, a qualquer momento, pôr em causa o processo de paz. É uma boa questão que coloca, e confesso que não tenho uma resposta para isso.

Acho é que devemos ter cuidado com as duas coisas: com a questão que coloca, mas também que possa parecer que estamos a premiar uma ação como aquela absolutamente inaceitável do dia 7 de outubro.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para uma intervenção pelo Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal, tem a

palavra o Sr. Deputado Rodrigo Saraiva. O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os vários projetos de resolução hoje

em debate neste Plenário dizem respeito a um conflito mais antigo do que alguns imaginam. Não deixa de ser também sobre vidas — muitas vidas, demasiadas vidas que já acabaram, muitas vidas que

estão suspensas, oprimidas, em sofrimento —, mas esperemos que seja sobretudo sobre as vidas que ainda merecem ter futuro.

É um dos temas mais complexos e sensíveis da geopolítica, senão o mais sensível e com inúmeras variáveis. A atual configuração deste conflito remonta à primeira metade do século XX, tendo-se ampliado depois da

Segunda Guerra Mundial, do Holocausto e do Mandato Britânico da Palestina. É um conflito com origem na Grande Guerra de 1914–1918, que envolveu o Acordo Sykes-Picot, a Declaração Balfour e a revolta árabe liderada por Thomas Edward Lawrence, o famoso Lawrence da Arábia.

Já antes, durante a Terceira República Francesa, no final do século XIX, tinha ocorrido o caso Dreyfus, com a sua mancha de antissemitismo, estimulando também a grande migração judaica no final do século XIX para o Medio Oriente.

E, nos 400 anos anteriores, houve ocupação do mesmo território, ocupação ora otomana ora egípcia. Existiram também as Cruzadas, que, por sua vez, estiveram relacionadas com as invasões islâmicas do século VII.

Poderíamos olhar ainda mais atrás, para a gestão bizantina do território, para a província da Judeia dentro do Império Romano e para os vários impérios de que fez parte antes disso, os persas, babilónios, assírios, até o reino de Israel, no século X a.C.

Se nem os últimos 75 anos podem ou devem ser condensados e simplificados em eventos que aconteceram nos últimos 74 dias, imaginem tentarmos fazer o mesmo a uma história que ultrapassa já largamente os três milénios.

Feita esta contextualização, que entendemos necessária, chegamos, então, ao tema-base do agendamento de hoje: a solução dos dois Estados e o reconhecimento da independência da Palestina.

A solução de dois Estados é a proposta defendida por muitos, incluindo a Iniciativa Liberal, na linha e em consonância com a posição que o Estado português fixou há bastante tempo. É, por isso, um tema relativamente pacífico entre a maioria dos partidos com representação parlamentar.

A solução deve e tem de passar, ou melhor, concluir-se com a existência de dois Estados. Ambos os povos, tanto o judeu como a população árabe palestiniana, têm o legítimo direito a aspirar a um futuro naquela região e a gerir ali os seus próprios destinos.

Pode haver pontos de divergência, sim, nos detalhes dessa solução, mas esses detalhes devem, acima de tudo, ser debatidos entre as partes.

Caso seja estabelecido um acordo entre ambos os lados, deve existir o reconhecimento e a respetiva aprovação do Estado português, independentemente do resultado dessa negociação e das soluções mais queridas aos vários partidos nesta Casa.

Sobre a segunda parte, o reconhecimento da independência da Palestina, podemos julgar que existem muitas divergências entre os partidos, mas aqui, novamente, as divergências estão nos detalhes.

Sendo a Iniciativa Liberal favorável à solução dos dois Estados, também o é no que se refere ao reconhecimento da independência da Palestina. Onde divergimos de alguns partidos e onde convergimos com outros é, essencialmente, no «quando».

Sr.as e Srs. Deputados, ao falar-se na ocupação da Palestina, talvez devêssemos falar nas diversas ocupações da Palestina, todas elas negativas. Sim, porque a Palestina não foi só ocupada por colonatos na Cisjordânia, foi também ocupada pela organização terrorista que é o Hamas, em Gaza.

Esta ocupação não é só territorial. Basta lembrar que todas as forças políticas não subordinadas à agenda do Hamas foram expulsas de Gaza, através da violência e do terrorismo.

Gaza, onde uma grande parte do dinheiro e das doações de mantimentos, remédios e água oferecidos pelo Ocidente ao povo palestiniano tem vindo a ser sistematicamente recolhida e sonegada por operacionais do Hamas e distribuída mediante os seus objetivos.

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Também as infraestruturas, como, por exemplo, canos de água, têm vindo a ser reutilizadas para a criação de plataformas de lançamento de rockets para território israelita.

Mas falamos também de uma ocupação social, cultural e mental, uma doutrinação que começa bem cedo, em crianças com idade pré-escolar. Ali se ensina a odiar Israel, a odiar os judeus, a odiar os outros que são diferentes, ali se ensina que morrer para matar cidadãos inocentes do país vizinho é bom e até receberá a recompensa divina.

Também se tem assistido, às mãos do atual Governo de Israel, a um empoderamento progressivo das fações ultraortodoxas, alimentando também o ódio, e este aumento da intolerância e do ódio compromete a diplomacia e compromete uma solução viável para todos os que naquele território habitam.

Voltando ao tema do «quando»: analisadas algumas resoluções, nomeadamente do Bloco de Esquerda, ao exigirem que esse reconhecimento seja imediato, é importante lembrar as palavras do Ministro dos Negócios Estrangeiros, numa recente audição neste Parlamento, quando diz que Portugal considera que o reconhecimento do Estado da Palestina é algo que deve acontecer, mas em coordenação com alguns parceiros próximos e num momento com consequência para a paz.

Recordando as próprias palavras do Ministro, e passo a citar: «Nós olhamos para o reconhecimento não como algo que pode acontecer, mas como algo que deve acontecer, sendo ainda para já indeterminado o momento correto em que deve acontecer.» E a Iniciativa Liberal revê-se nestas palavras. É uma posição consistente dos órgãos de soberania de Portugal.

Se olharmos para o nosso passado recente, nesta Casa, concluímos que, há precisamente nove anos e uma semana, foi aqui votado e aprovado o Projeto de Resolução n. º1173/XII/4.ª (PSD, PS, CDS-PP) — Recomenda ao Governo que reconheça o Estado da Palestina em coordenação com a União Europeia.

Esta resolução vai ao encontro precisamente da posição da Iniciativa Liberal, do Ministério dos Negócios Estrangeiros e do Estado português, nomeadamente quando refere, no ponto 1, «Reconhecer, em coordenação com a União Europeia, o Estado da Palestina […]» e, no ponto 2, «Em conjunto com os seus parceiros da União Europeia e internacionais, continuar a promover o diálogo e a coexistência pacífica de dois Estados democráticos, Israel e Palestina […]».

Aproveito para recordar aos Srs. Deputados que todas as bancadas parlamentares de então votaram favoravelmente o ponto 2 e nenhuma votou contra o ponto 1, tendo o projeto de resolução sido, consequentemente, aprovado.

Em suma, a posição da Iniciativa Liberal não é recente; é a mesma posição defendida há muitos anos por vários partidos e pelo Estado português. A nossa posição não se alterou, tem-se mantido constante, porque as circunstâncias deste grave problema não mudaram na sua essência. A nossa posição não é nova, é assim como sempre foi a posição do nosso País, a posição do Estado português, que subscrevemos, sem reservas de qualquer espécie.

Quem defende o direito à autodeterminação dos povos expresso livremente, só poderá concordar que o reconhecimento da existência, bem como da independência de um Estado, é um passo formal que deve ser dado na altura certa, para que esse passo formal tenha implicações concretas para as populações. Na altura certa, para que os desejos dos povos se possam exprimir. Na altura certa, para promover o desenvolvimento. Na altura certa, para contribuir para a paz.

Que a paz e esse dia sejam alcançados, é o desejo da Iniciativa Liberal. Aplausos da IL. O Sr. Presidente (Adão Silva): — V. Ex.ª tem um pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Rui Tavares,

do Livre, a quem dou de imediato a palavra. Tem a palavra, Sr. Deputado Rui Tavares. O Sr. Pedro Pinto (L): — Hoje farta-se de falar! O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rodrigo Saraiva, nós não estamos nesta Casa para

concordarmos todos em tudo, estamos, precisamente, porque discordamos em muitas coisas, e é natural e legítimo que haja discordâncias acerca do «quando» do exercício do reconhecimento da Palestina como Estado independente. É natural que haja essa diferença entre o Livre e a Iniciativa Liberal.

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O meu pedido de esclarecimento não versa, então, sobre essa diferença, versa sobre algo que gostaria de conhecer melhor por parte da Iniciativa Liberal, que não é o «quando», mas é o «como». Ou seja, quais é que são os passos necessários a dar antes desse reconhecimento? Percebo o que diz quando cita o Ministro dos Negócios dos Estrangeiros — não é muito habitual vê-lo de acordo, mas registo —, que diz que essa carta deve ser jogada no momento certo.

Mas uma coisa é não mostrar a carta e outra coisa é dizer que estamos prontos para a jogar e, para isso, é preciso que o Estado português, do ponto de vista jurídico e técnico, tenha preparados todos os dossiês necessários para que esse reconhecimento seja feito quando o Estado português o decidir. Isso pede o projeto de resolução do Livre, gostaria de saber se é a sua opinião.

Para sabermos de uma posição coordenada a nível europeu, que seria evidentemente mais desejável, e até o ideal, é preciso debatê-la a nível europeu. E, por isso, o projeto de resolução do Livre pede que Portugal insira esse tema na agenda do Conselho Europeu ou do Conselho da União Europeia, do Conselho de Negócios Estrangeiros. E, portanto, pergunto-lhe se nesse «como» estamos de acordo.

E também, para que tudo isto se faça, há o que é mais imediato. E concordo consigo, cada vida a ser salva, nós, por muito longe que estejamos, por muitas diferenças que tenhamos, numa coisa temos de estar em acordo: não podemos descansar enquanto não fizermos tudo para a salvar, seja essa vida israelita ou palestiniana.

Pergunto-lhe, então, se está de acordo que temos de instar o Governo português a finalizar o processo de reconhecimento da nacionalidade aos reféns, que já o tinham pedido antes de serem feitos reféns e que, segundo a nossa lei atual, têm direito à nacionalidade portuguesa e que podem, por isso, ser libertados.

E pergunto-lhe, também, se defende um cessar-fogo imediato em Gaza, porque neste momento o que está a acontecer com os bombardeamentos impiedosos sobre aquela população é que não se está a destruir o terrorismo, está-se provavelmente a criar as condições para mais terrorismo ainda, que tornará ainda mais difícil a solução de dois Estados, e isso também faz parte de um projeto de resolução apresentado hoje a este debate, por um cessar-fogo imediato e por medidas humanitárias, e pergunto como é que a Iniciativa Liberal votará nesse projeto.

O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rodrigo Saraiva. O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Tavares, como disse ali em cima, na tribuna,

o tema é bastante complexo e, portanto, se algum de nós nesta Casa, neste debate, achar que está a dar uma resposta rápida, fácil, para aquilo que se passa, que se tem passado e que se virá a passar naquele território, estará a mentir porque a resposta nunca será a certa nem a profunda.

Tentando resumir, eu diria que há duas coisas essenciais para o reconhecimento do Estado da Palestina: a primeira é parar o conflito que existe naquele momento, e qualquer coisa que seja feita, neste momento, pode potenciar ainda mais o conflito que existe do que o inverso.

Protestos do Deputado do CH Pedro dos Santos Frazão. E, portanto, só depois de aquele conflito parar — em que há um Estado democrático a combater uma

organização terrorista, não é uma guerra entre dois Estados que está a acontecer —, quando aquele conflito acabar, sim, poderá passar-se à segunda fase. E depois, penso que há um critério macro, maior, que é haver as condições para aquilo que é um Estado. E acho que nenhum de nós, aqui, consegue afirmar, convictamente, que há neste momento condições para que a Palestina seja um Estado. Acho que não há; se alguém o disser, eu irei discordar.

Protestos do L. Relativamente ao cessar-fogo, era mais fácil se estivéssemos a falar de um conflito entre dois Estados. Como

disse, não estamos. Aplausos da IL.

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O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Há 15 anos que não fazem eleições! Grande Estado! O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para uma intervenção pelo Grupo Parlamentar do PSD, tem a palavra o

Sr. Deputado Pedro Roque. O Sr. Pedro Roque (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A conceção de dois povos, dois

Estados, israelitas e palestinianos, vivendo lado a lado em duas nações, é um postulado assumido internacionalmente e a condição fundadora para uma paz com justiça no Médio Oriente.

As circunstâncias atuais, funestas, com que o Médio Oriente se encontra confrontado não podem inibir a compreensão global da questão. Este conflito, retomado uma vez mais, demonstra tragicamente que a solução dos dois Estados é o único caminho, embora difícil e doloroso de alcançar.

O direito à autodeterminação é reconhecido na Carta das Nações Unidas, e aplica-se tanto a israelitas como a palestinianos e traduz-se no direito de estabelecerem os seus próprios Estados independentes. Foi por isso que a Resolução n. º181, já aqui citada, aprovada em 1947 pela Assembleia Geral das Nações Unidas, previa a partição do Mandato Britânico da Palestina, a divisão do seu território, com vista à criação de um Estado hebraico e outro árabe.

De resto, já na própria Declaração Balfour, de 1917, o Reino Unido avançava com a promessa da criação de uma pátria para o povo judeu, mas afirmava também claramente que tal desiderato não poderia prejudicar os direitos civis e religiosos das comunidades não hebraicas existentes no território.

As circunstâncias político-militares ditaram que, em 1948, o povo judeu tenha alcançado essa pátria, doravante, Israel, objetivo que os árabes não conseguiram. Desde então, paz e guerra sucedem-se. A comunidade internacional tem afirmado, repetidamente, o direito dos palestinianos à autodeterminação, incluindo nos Acordos de Oslo, de 1993, ou na Iniciativa de Paz Árabe, de 2002.

Nos Acordos de Oslo, firmados livremente entre as partes, isto é, o Governo de Israel e a Organização para a Libertação da Palestina — único representante legítimo do povo palestiniano —, o caminho ficou traçado com clareza: dois Estados e dois povos, vivendo lado a lado, em segurança e em fronteiras internacionalmente reconhecidas, equivalente grosso modo às anteriores ao conflito de 1967. Falta, apenas, concretizá-lo.

Infelizmente, forças radicais de ambos os lados procuraram sempre minar o consenso internacional e os acordos firmados. De facto, naquela zona do mundo, o ódio parece sempre falar mais alto do que a moderação; aqueles que corajosamente o ultrapassam e ousam acordar a paz pagam amiúde um preço muito elevado: foi assim com Anwar al-Sadat, Presidente egípcio, após Camp David, mas também assim com Yitzhak Rabin, Primeiro-Ministro de Israel, após os Acordos de Oslo, ambos assassinados por aqueles que, de um lado ou de outro, não aceitam a paz e o entendimento; antes, o irredentismo cego e a violência.

Aplausos do PSD. E tem sido assim com tantas vítimas inocentes, hebraicas, árabes ou cristãs, que engrossam a tragédia e

cuja perda nos afasta mais da paz e do entendimento. Assim se constata que a questão do estatuto do Estado da Palestina é indubitavelmente complexa e está

ligada a uma história de conflitos e de manobras políticas. Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, as aspirações do povo palestiniano à autodeterminação são, pois,

inegáveis. Todavia, um reconhecimento a destempo pode pôr em risco a própria perspetiva de uma resolução pacífica. Tem sido esta a visão da União Europeia, que tem evitado reconhecimentos unilaterais precipitados.

Os reconhecimentos por parte de Estados-Membros foram feitos, sobretudo, enquanto esses países não eram membros da União Europeia. Em boa parte dos casos, ainda na vigência de regimes autocráticos, como os casos de 1988, da antiga Checoslováquia, da Roménia, da Bulgária ou da Polónia, por exemplo.

O Sr. Rui Tavares (L): — E a social-democrata Suécia? O Sr. Pedro Roque (PSD): — Neste quadro, um reconhecimento por parte de Israel do Estado da Palestina

seria extemporâneo e desrespeitaria os compromissos internacionais do nosso País e a sua condição de

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membro da União Europeia, em cujo seio se têm de concertar posições, no sentido de ajudar construtivamente a encontrar uma solução definitiva para o processo de paz.

Apesar da difícil situação no presente, o processo de paz continuará a ser o fator crucial para determinar o estatuto da Palestina. Antes de se considerar o reconhecimento, é essencial um plano de paz concreto, vinculativo, que aborde as raízes profundas do conflito, incluindo o estatuto de Jerusalém, a questão dos colonatos, a definição de fronteiras, segurança e acesso à água, assim como a liberdade de movimentos palestinianos e o direito de retorno de refugiados de conflitos anteriores.

O papel internacional da União Europeia, dos Estados Unidos ou da Liga Árabe são fundamentais para que a sua implementação seja efetiva e que o direito à paz seja finalmente alcançado.

Aplausos do PSD. O Sr. Presidente (Adão Silva): — Sr. Deputado, V. Ex.ª não regista pedidos de esclarecimento e, por isso,

passamos para uma intervenção do Grupo Parlamentar do Partido Socialista. Tem a palavra o Sr. Deputado Ivan Gonçalves.

O Sr. Ivan Gonçalves (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.as Deputadas: Ao longo das últimas

décadas, o povo palestiniano tem sido vítima de uma «ocupação sufocante». Estas são as palavras do Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, que acrescenta que os palestinianos viram as suas terras serem continuamente devoradas por colonatos e assoladas pela violência, que a sua economia foi sufocada, as suas pessoas foram deslocadas, as suas casas demolidas, e que as suas esperanças de uma solução política para a situação têm vindo a desaparecer.

Não precisamos de olhar para a Faixa de Gaza, basta-nos a Cisjordânia. No final do passado mês de junho, o Governo do Estado de Israel, liderado por Benjamin Netanyahu, aprovou a construção de mais 5000 casas em colonatos ilegais em regiões da Cisjordânia que, à luz dos acordos internacionais, não pertencem ao Estado de Israel.

Soldados veteranos do exército israelita têm vindo a denunciar abusos, violações de lei e as humilhações diárias a que palestinianos são sujeitos em regiões ocupadas. Denunciam também a proteção que o exército israelita faz a colonos ultraortodoxos que utilizam a violência para ocupar mais terras.

A Amnistia Internacional denuncia as autoridades israelitas, que fazem uso recorrente da detenção administrativa de cidadãos palestinianos na Cisjordânia e de tortura, de forma reiterada, nos seus centros de detenção.

As evidências estão à vista, comprovadas por diversas e credíveis organizações internacionais. Há poucas semanas, recebemos aqui, no Parlamento, uma delegação de diversos autarcas portugueses —

presidentes de câmaras municipais, eleitos por diversos partidos políticos — que, em representação da Associação Nacional de Municípios Portugueses, visitaram a Cisjordânia e relataram aquilo que é facilmente constatável no terreno: que os civis palestinianos não podem viver as suas vidas de forma livre, como fazemos em Portugal.

No dia 7 de outubro deste ano, a organização terrorista Hamas desencadeou diversos ataques em cidades israelitas próximas da Faixa de Gaza e do centro de Israel, com recurso ao lançamento de milhares de rockets contra centros populacionais israelitas, matando cerca de 1200 israelitas, ferindo e raptando inúmeros civis indefesos. Estes brutais ataques sobre civis merecem uma condenação clara e inequívoca.

Desde então, o Estado de Israel desencadeou uma ofensiva sobre a Faixa de Gaza que não tem poupado civis palestinianos. Segundo o Ministério da Saúde, quase 19 000 palestinianos foram já mortos nestes ataques. Destes, cerca de 70 % são mulheres e crianças. A Unicef classificou Gaza como o local mais perigoso do mundo para ser criança. Cerca de 115 menores estão a ser mortos, em média, diariamente naquele território.

«Não há água, não há eletricidade, não há medicamentos» e «não há condições para que se previna o alastramento de doenças», afirmou Jorge Moreira da Silva, diretor-executivo da UNOPS (United Nations Office for Project Services), que reconheceu o total colapso das infraestruturas da Faixa de Gaza.

Segundo a Organização Mundial de Saúde, o último hospital funcional no Norte daquela região é uma zona de desastre humanitário. Do Norte ao Sul, não há hoje nenhuma zona segura em Gaza. São já quase dois milhões de pessoas deslocadas, cerca de 80 % da população daquele território.

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Portanto, a pergunta que se coloca é como é que, com estes acontecimentos, se pode preparar o caminho para a paz.

A violência, a vingança e a repressão geram ódio e mais violência e nunca trouxeram nada de bom à humanidade. Isto é algo que a extrema-direita não compreende, mas que deve estar na cabeça de qualquer um dos democratas deste Parlamento.

A solução para a questão do território palestino é, por isso, política, não militar, e não pode passar por outra coisa que não seja o cumprimento das resoluções da ONU e do direito internacional, pressupondo a convivência entre estes dois povos e o seu direito ao estabelecimento do seu próprio Estado. Ou seja, pela efetivação da conhecida solução de dois Estados, que não é, com certeza, uma bala de prata, mas que é um passo imprescindível.

Uma das partes está feita. A existência do Estado de Israel não está nem pode ser colocada em causa e deve ser defendida. O que está por cumprir é a outra face da moeda, o reconhecimento de um Estado palestiniano livre.

O caminho que Portugal deve seguir é, por isso, o de assegurar, de forma multilateral e nas organizações em que está inserido, nomeadamente na União Europeia, que as ações têm consequências e um impacto real na procura de uma solução política para o conflito.

Portanto, Sr.as e Srs. Deputados, é fundamental trabalhar para que o reconhecimento do Estado da Palestina seja uma realidade, de forma a garantir uma repartição de território justa, para que estes dois povos possam viver lado a lado, em paz e em segurança.

Aplausos do PS. O Sr. Pedro Pinto (CH): — Só tiveste seis palmas! Só seis palmas! O Sr. Presidente (Adão Silva): — Passamos agora a uma intervenção do Sr. Deputado Diogo Pacheco de

Amorim, pelo Grupo Parlamentar do Chega. O Sr. Diogo Pacheco de Amorim (CH): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Vamos ao essencial. O

essencial é a perceção do contexto geopolítico em que se inscreve o conflito dito «israelo-palestiniano», mas que, na realidade, é israelo-iraniano. Conflito este no qual, por sua vez, se inserem as medidas concretas propostas nos projetos hoje trazidos a debate.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem! O Sr. Diogo Pacheco de Amorim (CH): — A sua discussão deverá ter em conta o presente contexto

geopolítico, o de uma aliança reunindo um arco de países que se estende da China e da Coreia do Norte até à Venezuela, passando pela Rússia, pelo Irão e, de forma incipiente, pela Turquia, na sua maior parte antigos impérios que se pretendem reconstruir como tais num mundo a caminho de se tornar multipolar. Ora, para além do muito que separa estas autocracias, e muito é, une-as a guerra ao que sobra do multissecular predomínio mundial do Ocidente e dos seus valores.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Já foi! O Sr. Diogo Pacheco de Amorim (CH): — É uma guerra surda e larvar, mas que se tornou clara e aberta

em dois atuais campos de batalha, Ucrânia e Israel, com o perigo de duas novas batalhas desta guerra poderem eclodir: Taiwan, invadida pela China, e a Coreia do Sul, invadida pela Coreia do Norte.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Essa é que é essa! O Sr. Diogo Pacheco de Amorim (CH): — Ora, caso se abram, em simultâneo com os outros, estes dois

campos de batalha, o futuro do Ocidente, dos seus valores e das suas democracias liberais, será mais do que incerto.

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Mas estes dois novos campos de batalha apenas se abrirão se o Ocidente se não mostrar firmemente unido no apoio a Israel, como o está com a Ucrânia, porque é nesses dois teatros de guerra que se joga hoje o futuro do Ocidente.

Disse-o, aqui, há um mês, repeti-o há uma semana e reafirmo-o hoje, aqui também: as democracias ocidentais mostram-se unidas atrás da Ucrânia, o que está longe de acontecer com Israel.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Exatamente! O Sr. Diogo Pacheco de Amorim (CH): — Bem pelo contrário. E esta diferença de posições não encontra

justificação, desde logo porque, ao contrário da Ucrânia, Israel é um membro da NATO (North Atlantic Treaty Organization). E depois, porque este conflito não é meramente israelo-palestiniano, mas sim, de facto, israelo-iraniano, ou seja, um conflito maior.

Aplausos do CH. O Hamas é apenas mais uma das milícias armadas controladas direta ou indiretamente pelo Irão, que age

visivelmente em estreita aliança com a Rússia. Veja-se que esta nova frente de combate ao Ocidente veio, dividindo esforços, retirar pressão sobre a frente ucraniana.

Tendo em conta esta inultrapassável questão de fundo, e no que principalmente toca aos projetos em debate, vemos que praticamente todos eles se focam na necessidade do reconhecimento da independência da Palestina ou da promoção da existência de dois Estados.

Nada a opor quanto ao objetivo,… O Sr. Pedro Pinto (CH): — Exatamente! O Sr. Diogo Pacheco Amorim (CH): — … mas entende o Chega que não existem condições para o simples

início de negociações enquanto os palestinianos, e entre eles os de Gaza, forem meros reféns de milícias armadas que os usam ora como escudo, ora como arma de arremesso, com o único fim de aniquilar o Estado de Israel por conta do Irão, que já disse, sem pestanejar, ser Israel um tumor maligno a ter de ser extirpado.

Aplausos do CH. Enquanto estes movimentos existirem e forem apoiados por quem são, é uma ilusão pensar em negociações

que jamais levarão a lado algum. Negociações proveitosas pressupõem boa-fé negocial entre as partes. Enquanto não existir em uma das partes essa boa-fé, essas negociações servirão apenas para agravar o problema, nunca para o resolver.

E enquanto o Irão for governado por quem é, da forma que é, com os fins em relação a Israel que publicamente apregoa, e enquanto os palestinianos forem reféns das milícias armadas que obedecem ao Irão, quaisquer negociações funcionarão apenas contra Israel.

Devia ser de outra forma? Devia. Mas a política — e, particularmente, a política externa —, obedece a juízos de realidade, não a juízos de valor. É o reino do que é, não o reino do que devia ser.

Israel tem o equivalente à população de Portugal concentrado num território equivalente a dois terços do Alentejo, cercado de inimigos enquadrados por milícias armadas por quase todas as fronteiras. Um erro de análise dos seus dirigentes e será uma hecatombe para Israel e uma grave derrota para o Ocidente, ou seja, para todos nós.

Compreendendo, muito embora, a bondade e as boas intenções dos projetos aqui trazidos, em nome do indispensável realismo, temos de dizer que em nada ajudam para a resolução da situação no terreno.

Aplausos do CH. O Sr. Presidente (Adão Silva): — Passamos agora a uma intervenção em nome do Grupo Parlamentar do

PS. Para tal, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.

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O Sr. Pedro Pinto (CH): — É Deputado único! É o único Deputado que fala! O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate que hoje, em boa

hora, o Livre marcou convoca-nos, naturalmente, muitas opiniões diferentes, muitas delas à distância, muitas vezes sem a proximidade e sem o detalhe que seria indispensável para um debate com estas características.

O Primeiro-Ministro do Estado de Israel, aliás, sublinhava que grande parte do conflito radica no facto de haver muita história para tão pouca geografia. E assim é também no debate, como temos visto hoje: diversidade de pontos de vista, mesmo dentro das mesmas bancadas, posturas diferentes relativamente às várias questões que, ao longo dos últimos 70 anos, em primeira linha, e mais atrás até, em relação a outros aspetos, dividem opiniões públicas, dividem os debates nos parlamentos nacionais.

Mas, se calhar, devíamos começar precisamente pelo inverso, por aquilo que nos une e pelos pontos em que estamos, tendencialmente, transversalmente de acordo, como o Sr. Deputado Rui Tavares há instantes afirmava.

Em tempos em que tudo, aparentemente, nos divide, em que tudo é um pretexto para a divisão e para o conflito, encaremos o debate, em primeiro lugar, a partir dos dois pontos em que penso que todos estamos de acordo.

É fundamental, é a única garantia para a paz naquele território, a existência de dois Estados com segurança e com viabilidade para ambos.

Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias. E é fundamental salvar todas as vidas inocentes que estão, há várias décadas, reféns de extremismos de

lado a lado e de dificuldades de construção de soluções. Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias. Em primeiro lugar, aqueles que foram as vítimas, a 7 de outubro, daquilo que é talvez comparável a uma

soma de eventos similares aos pogroms do século XIX, como o 11 de setembro, um Bataclan e um ataque do Estado Islâmico, tudo a acontecer no mesmo local, no mesmo momento, motivado por antissemitismo.

E, logo a seguir, evidentemente, as muitas vítimas civis dos bombardeamentos, da utilização como escudos humanos, do lançamento de rockets de parte a parte,…

Protestos da Deputada do BE Joana Mortágua. … que tem feito perder vidas incontáveis, que tem feito cessar a existência de milhares e milhares de pessoas

e que, por essa razão, evidentemente, a todos nos devem mobilizar da mesmíssima forma. É, parece, reiterar o óbvio. A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Só um lado é que é abusador! O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Mas, em alguns debates, reiterar o óbvio, às vezes, também é

fundamental. E reiterar o óbvio também seria indispensável quando olhamos para parte daquilo a que estamos a assistir. O que o Hamas praticou no dia 7 de outubro tem um grau de barbárie e de rejeição de valores comuns que a todos nos deviam unir, que não deveria ter margem para dúvidas na condenação. E felizmente, em Portugal têm sido poucas as dúvidas e as hesitações, não comparável ao que assistimos noutros Estados.

Mas, na verdade, neste momento em que fazemos o debate, o Hamas é o único agente no território que está a ter tudo o que queria dos ataques que provocou: radicalizou o debate, fez extremistas em Israel ganharem espaços que não teriam de outra forma e fê-los cair na armadilha de promover uma forma e uma reação desmesurada e desequilibrada, que em nada contribui para a solução do conflito.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Ivan, estás a ouvir?

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O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): —Para além disso, Europa fora, Estados Unidos fora, em vários pontos

do mundo, têm garantido um recrudescimento do antissemitismo como não se via desde a década de 30 do século passado.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Este é um debate entre o PS! Protestos do Deputado do PCP Bruno Dias. O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — E é isso que nos deve fazer pensar sobre os monstros que soltamos e

que voltamos a colocar na rua. Desde a islamofobia, aproveitada pelas extremas-direitas da Europa fora como forma de marcar pontos, ao antissemitismo que cresce em vários locais e onde hoje temos comunidades judaicas que voltam a ter medo. Voltam a ter medo porque as suas sinagogas são atacadas, voltam a ter medo porque as paredes das suas escolas são pichadas com dizeres que os atacam e voltam a ter medo porque são discriminadas, quando pensávamos que, na Europa, não tínhamos de assistir a isto de novo.

E tudo isto é alimentado porque, de lado a lado e em muitos locais… Isto, obviamente, sem generalizações: quando se diz «de lado a lado», não estamos a tentar culpabilizar os palestinianos e os israelitas, que só querem viver uma vida decente, só querem chegar vivos ao final da semana. Não são esses os culpados do que está a acontecer, mas são aqueles que os instrumentalizam, a si, à sua dor e ao seu sofrimento, para alcançar algo de si diferente.

Como eu dizia, aquilo a que hoje, pela Europa e pelo mundo fora, assistimos deve-nos fazer refletir que este é um debate sobre o Estado da Palestina, mas é também um debate sobre o Estado de Israel. E não esqueçamos, também, que eles têm de existir os dois. Portanto, é importante não esquecer e tentar perceber algo que é talvez tão difícil de fazer nestes tempos, a capacidade de nos colocarmos no lugar do outro — e do «outro» é dos «outros», dos outros dois — e tentar perceber porque é que Israel, ao fim de tantos anos de existência, ainda se sente cercado e ainda sente a necessidade de defender o seu Estado nacional.

É que trata-se de uma aspiração com dois milénios. Trata-se de uma aspiração daqueles que, todos os anos, repetiam: «para o ano em Jerusalém», porque queriam e aspiravam à sua origem.

Mas, naturalmente, isso não se pode fazer ao arrepio dos direitos dos outros, que ambicionam ter o seu Estado nacional. Portanto, não reescrevamos a história em conveniência dos argumentos que vamos querer usar em cada um dos momentos, e façamos um exercício mais difícil: percebamos porque é que os israelitas também continuam a ter, todos os dias, um sentimento de que têm de lutar pela garantia de que há, no planeta, um Estado onde os judeus se podem sentir em segurança.

O que sabemos, quando ouvimos gritar «do rio ao mar» em manifestações ou em discursos políticos, é que do rio até ao mar significa que não há espaço para o Estado de Israel. Do rio até ao mar significa que alguém se quer substituir àqueles que ali vivem há 75 anos,…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Essa é que é essa! O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — … àqueles que ali vivem há 100 anos, àqueles que ali vivem também

há milhares de anos — porque existem judeus no território de Israel e da Palestina há milhares de anos, ininterruptamente. E, se não atendermos a estes dois lados, a estas duas realidades, a estes dois povos que têm e vão ter de conviver naquele local, não estaremos a fazer um serviço adequado a esta causa.

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem! O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Mas, tendo eu dito isto, também é importante não esquecer que hoje,

em Israel, o extremismo do seu Governo é o pior inimigo da paz e de uma solução duradoura. O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem!

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O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Temos um Primeiro-Ministro acossado judicialmente que não estava a hesitar em destruir o Estado de direito para polarizar a sociedade e para sobreviver politicamente. Um Primeiro-Ministro que assenta a sua coligação governativa em radicais extremistas que reiteradamente querem expandir os colonatos naquilo a que chamam Judeia e Samaria e que instigam ódios em relação aos palestinianos — encontrando, efetivamente, do lado contrário, extremistas que o fazem em relação aos israelitas.

Deste modo, se não tivermos a capacidade de, lado a lado, olhar para os problemas e para os decisores — que não estão à altura da história do momento, não estão à altura daqueles que no passado fizeram a paz e que, como já foi dito neste debate, perderam a vida pela paz, porque foram assassinados por terem a coragem de ir contra as opiniões públicas dos seus países e faleceram vítimas de extremistas do seu próprio lado —, se não tivermos nós essa capacidade de ajudar a acalmar o nível da discussão e de ajudar a fazer este debate, também não teremos a capacidade de construir um debate.

Por isso é que a utilização de conceitos que não são rigorosos deve ser evitada. Quando olhamos para este conflito, podemos claramente criticar Israel pelo excesso de recurso à força no

que está a acontecer em Gaza sem ter de usar expressões que não têm aqui adequação como: apartheid, colonialismo, genocídio ou limpeza étnica. Acho que podemos e devemos, ou melhor, temos o dever de ser rigorosos com os conceitos porque, de outra forma, não ajudaremos em nada.

Se assim não for, nós, que estamos tranquilamente, confortavelmente, à distância daquele confronto, não estaremos a contribuir para resolver qualquer um dos problemas.

Podemos e devemos denunciar o uso excessivo da força. Podemos e devemos repudiar a ausência de preocupações humanitárias. Acima de tudo, devemos construir a paz e, volto a dizer, não cavar um fosso que cria mais distância, demonstrando ter mais juízo do que muitas vezes temos na forma como encaramos estes debates.

Cresci num tempo de esperança enganadora, em que se pensava que se calhar o fim da história estava ao virar da esquina e em que Oslo foi essa esperança quanto a este conflito, que foi arrasada, assassinada, numa praça em Telavive, quando Yitzhak Rabin foi baleado por um extremista do seu próprio povo, tendo terminado ali as esperanças de muitos.

A história voltou, com toda a força demolidora que tinha; voltou em Israel, voltou na Ucrânia, volta na América Latina e na Europa. Parece que estamos a viver os piores anos e as piores décadas do século XX novamente.

Volto a dizer, este não é só um debate sobre o Estado da Palestina ou sobre o Estado de Israel. Este é um debate sobre o Estado da Palestina e sobre o Estado de Israel. Portanto, tudo o que achamos a que os israelitas têm direito, que é ter um Estado com defesas seguras e garantia de vida a todos os seus cidadãos, é exatamente o mesmo que temos de garantir aos palestinianos, assegurando o seu reconhecimento e o fim de uma ocupação e de um aumento de colonatos que há muito tarda.

Recordo as palavras do escritor israelita Amos Oz, que nos seus escritos sobre fanatismo talvez tenha dado dos melhores contributos a este debate. De facto, o fanático é aquele que a certa altura perde a empatia, perde a humanidade, perde a capacidade de avaliar o complexo e só está centrado em ter o ganho de causa daquelas horas, daquele dia e daquele final.

Assim, o que hoje o Partido Socialista aqui propõe é que apresentemos uma resolução que não só aponte o caminho certo, mas que seja consequente com esse caminho, porque de palavras, enfim, este debate já está cheio.

Para terminar, recordando as palavras do Eclesiastes — embora não citando por ordem —, que muitas vezes são convocadas para aqui, há um tempo de matar e um tempo de curar, um tempo de derrubar e um tempo de edificar, um tempo de amar e um tempo de odiar, um tempo de estar calado e um tempo de falar.

Este é um tempo de falar porque, acima de tudo, há um tempo de guerra e um tempo de paz, e o nosso papel, a nossa pequena contribuição para isso deve ser equilibrada e deve reconhecer a todos os que estão no terreno a sofrer hoje a capacidade de construir um Estado.

Aplausos do PS. O Sr. Presidente (Adão Silva):  V. Ex.ª tem um pedido de esclarecimentos do Sr. Deputado Rui Tavares,

a quem dou de imediato a palavra.

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O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Delgado Alves, disse na sua intervenção que em debates como este, às vezes, é preciso reiterar o óbvio, e estou plenamente de acordo com isso. Em debates de humanidade, às vezes, é preciso reiterar o óbvio.

No entanto, quero perguntar-lhe acerca de uma coisa que após a sua intervenção, que foi longa, não ficou nada óbvia para mim e que é o seguinte: se há um tempo para tudo, temos de saber qual é o tempo do Parlamento, deste Parlamento.

Entendamo-nos todos: quem irá um dia reconhecer o Estado da Palestina como Estado independente e soberano — se houver Palestina ainda para reconhecer — será o Governo de Portugal, não será o Parlamento. Mas o que este Parlamento pode fazer, como já fez no passado, é recomendar que o Governo reconheça esse Estado independente.

O projeto de resolução do Livre é isso, porque propõe que o Estado português dê os passos apropriados, os passos adequados, oportunos, para fazer esse reconhecimento tão breve quanto possível, no tempo adequado; que não esteja numa posição nem de arrastar os pés, nem de ir atrás de outros; e que se prepare, do ponto de vista técnico-jurídico, para, quando for necessário, ter todas as cartas na mão para poder fazer esse reconhecimento.

O projeto de resolução do Livre também diz que há um tempo para debater e que há um tempo para debater no seio do Conselho da União Europeia.

Portanto, a pergunta é muito simples; é se o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves acha que é legítimo, que é aceitável, podermos estar de cabeça erguida fora deste Parlamento.

Digo isto porque duas das coisas mais importantes que aconteceram durante esta Legislatura foram: a invasão da Ucrânia pela Federação Russa de Putin, sobre a qual falámos e debatemos, e tivemos várias ocasiões para o fazer, tendo aprovado uma resolução; e a outra, que é a atual fase do conflito israelo-palestiniano, em relação à qual não teríamos tido sequer um debate se o Livre não tivesse fixado a agenda de hoje. Repito, não teríamos tido um debate sobre este tema do reconhecimento da Palestina em Plenário.

O Sr. Alexandre Poço (PSD): — Isso não é verdade! O Sr. Rui Tavares (L): — A Assembleia da República está em vias de ser dissolvida e ninguém tinha marcado

este debate, em favor de temas, legítimos, alguns dos quais foram marcados cinco, seis, 10 vezes durante esta Legislatura.

Daí que lhe pergunte: é legítimo podermos encerrar o nosso mandato e dizer que a Assembleia da República não disse o que achava?!

Quanto ao Governo, fará o que entender. O Governo tem a condução da política externa, o Governo tem a condução da diplomacia. Mas o Parlamento tem uma voz política. E o Portugal em que eu acredito é um em que o Parlamento não tem medo de falar e de dizer aquilo que deveria ser feito e que será feito pelo Executivo.

Portanto, a pergunta que lhe faço é se é legítimo sequer que, na atual fase do conflito — mais aguda ainda do que outras —, Portugal, através desta Assembleia da República, não tenha uma posição política e parlamentar que é no limite daquilo que pode ter, mas sem a qual não podemos olhar para os nossos concidadãos e dizer: «O mundo lá fora estava a arder e nós aqui estávamos a fazer de conta que nada acontecia».

O Sr. Presidente (Adão Silva):  Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves. O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Rui Tavares, podemos estar de cabeça

erguida com um debate sério e reconhecendo que a complexidade e a dificuldade do tema não nos permitem ir mais além do que aquilo que aqui apresentamos.

Não esquecemos a escala de intervenção e de influência que podemos ter, achamos que ela deve fazer-se no local próprio, através das instituições europeias, e especialmente por estarmos na fase mais crítica é que devemos ter mais cuidado e mais ponderação, ao invés de nada contribuir com matérias que são, no limite e na forma como as encaramos, ainda extemporâneas.

Aplausos do PS.

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O Sr. Rui Tavares (L): — Um Governo ponderado! O Sr. Presidente (Adão Silva):  A Mesa não regista inscrições neste momento… Pausa. A Mesa regista o pedido de palavra, para uma intervenção, do Sr. Deputado Paulo Pisco, do PS. O Sr. Paulo Pisco (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Dizia um jornalista britânico que, enquanto

o fantasma de 1948 continuar a pairar, não haverá esperança de paz no Médio Oriente. Por isso, a discussão que hoje fazemos no Parlamento deve ser entendida como um modesto contributo para

a paz, para um cessar-fogo imediato, para a libertação dos reféns e para que israelitas e palestinianos possam construir um futuro de segurança e de mútuo reconhecimento, sem radicais nem radicalismos.

A história mostra que, à medida que o tempo vai passando, a criação do Estado da Palestina fica mais difícil de concretizar, designadamente devido à construção constante e persistente de colonatos na Cisjordânia, em Jerusalém Oriental, que as próprias Nações Unidas consideram uma ocupação ilegal.

Foram também as Nações Unidas que, em 1974, reafirmaram o direito inalienável do povo palestiniano à autodeterminação, soberania e independência e o direito ao regresso de todos os refugiados ao seu território.

Ao longo de décadas já houve vários êxodos. Esperemos que agora, em Gaza, não ocorra outro para o Egipto, onde mais de um milhão e meio de palestinianos fogem das bombas sem saber onde se abrigar.

Se não for por via da criação de um Estado da Palestina, eventualmente com uma autoridade palestiniana reforçada e renovada e sem interferência de grupos terroristas, plenamente reconhecedor do Estado de Israel, provavelmente nunca mais haverá paz, e as sociedades sofrerão também as consequências desse fracasso.

O maniqueísmo, que não consegue ver mais do que bons de um lado e maus do outro, só alimenta o ódio e a desumanização, que impede de ver o humano que existe por trás da vida de cada palestiniano e de cada israelita.

Aos bárbaros ataques terroristas do Hamas, que espalharam a dor e a angústia em Israel, seguiu-se, depois, uma ofensiva brutal das forças israelitas, que provocou uma situação humanitária que as organizações de apoio e as agências das Nações Unidas consideram apocalíptica.

Os civis não podem, em circunstância alguma, ser alvo de ataques indiscriminados nem privados de ajuda humanitária para sobreviver — o que é uma violação do direito humanitário internacional.

Depois da solução dos dois Estados ter estado relativamente esquecida na opinião pública nos últimos anos, eis que volta a irromper com toda a força no contexto desta guerra, mesmo pela voz daqueles que nunca a deveriam ter abandonado, como os Estados Unidos e a União Europeia.

Durante demasiado tempo, a solução dos dois Estados pouco mais foi do que uma proclamação retórica, sem que quaisquer passos concretos tenham sido dados, tolerando assim a fragmentação e a diminuição progressiva do território, a perda de autonomia da Faixa de Gaza, Cisjordânia e Jerusalém Oriental, o aumento do ressentimento e a rejeição da criação do Estado da Palestina.

Por isso, há agora urgência. Mas é preciso mudar a abordagem para fazer valer a necessidade da criação do Estado da Palestina, com os ajustes que as partes considerem mutuamente aceitáveis.

Já se percebeu que, apesar de haver 139 Estados-Membros das Nações Unidas que foram reconhecendo o Estado da Palestina, numa tentativa de acabar com a persistente violação dos direitos humanos e das resoluções das Nações Unidas, a verdade é que isso em nada contribuiu para a resolução do problema ou teve qualquer efeito prático, nem mesmo quanto àqueles que decidiram fazer o reconhecimento unilateralmente dentro da União Europeia, como foi o caso da Suécia em 2014.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas não tem vergonha do que está a dizer?! O Sr. Paulo Pisco (PS): — Pelo contrário, a situação é hoje muito pior e há quem considere mesmo que já

não existem condições para a criação do Estado da Palestina.

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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas acredita mesmo nisso?! O Sr. Paulo Pisco (PS): — O atual Governo de Israel, o mais extremista de sempre, opõe-se à sua criação

e muitas vezes surgem publicamente responsáveis governamentais israelitas enquadrados por um mapa em que a Palestina já não existe. Gaza está arrasada e os mortos não param de aumentar, 60 % dos quais mulheres e crianças, sem contar com os que estão nos escombros. Nunca tantos jornalistas, funcionários das Nações Unidas e pessoal de saúde foram vítimas de um conflito.

Ao mesmo tempo, e à boleia do drama em Gaza, na Cisjordânia prossegue a guerra dos colonos contra os palestinianos, que continuam a ser mortos, expulsos das suas terras, desapossados dos seus bens, sem qualquer escrúpulo de humanidade.

Portanto, a criação do Estado da Palestina, que Portugal sempre defendeu e que agora tem um Governo que tem sido diligente nesta matéria é um derradeiro grito de apelo para evitar mais mortes, destruição e sofrimento, para que seja dado ao povo palestiniano o mesmo direito que o povo israelita já teve e ambos possam ter o seu Estado a viver lado a lado, em paz e segurança. Mas é preciso o empenho da comunidade internacional e convencer Israel a fazer parte desse objetivo, trabalhando com assertividade e sentido de urgência, devendo a União Europeia, os Estados Unidos e as Nações Unidas estar na linha da frente da criação das condições para o reconhecimento de um Estado da Palestina viável. Para que acabem, de uma vez por todas, a agressão, o ódio, a insegurança e para que a tragédia do conflito israelo-palestiniano não fique como um fardo moral insuportável para a posteridade.

Por isso, apesar de compreendermos a intenção de algumas das propostas aqui apresentadas pelos diferentes grupos parlamentares para o reconhecimento unilateral e imediato do Estado da Palestina, consideramos que não têm qualquer eficácia e que isso seria diplomaticamente inconsequente, porque não pode haver Estado sem território,…

O Sr. Presidente (Adão Silva): — Tem de concluir, Sr. Deputado. O Sr. Paulo Pisco (PS): — … sem as fronteiras definidas, sem autonomia, sem independência para tomar

as suas decisões e decidir sobre o seu destino e os seus recursos, sem uma entidade que administre soberanamente e, assim, ser integrado no direito internacional e no concerto das nações.

Protestos do Deputado do PCP Duarte Alves. Termino já, Sr. Presidente. Defendemos que o Governo de Portugal — o atual e o próximo — assuma o compromisso de colocar todo o

seu empenho na mobilização do maior número possível de países e instituições para esta causa, criando as condições políticas e o enquadramento internacional adequado para que um Estado da Palestina possa ver realmente e finalmente a luz do dia.

Aplausos do PS. O Sr. Presidente (Adão Silva): — A Mesa não regista nenhum pedido de esclarecimento. Por isso, para uma

intervenção, passamos agora a palavra ao Sr. Deputado Alexandre Poço, do Grupo Parlamentar do PSD. O Sr. Alexandre Poço (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo esta intervenção por

destacar que, ao contrário do que já ouvimos hoje, aqui, o Grupo Parlamentar do PSD trouxe este tema a debate durante o passado mês de outubro, na sequência dos ataques do Hamas contra os civis israelitas e, portanto, nesse sentido, Sr. Deputado Rui Tavares, é falso que estejamos apenas a debater este assunto por iniciativa do Livre. Não é muito o meu registo, mas já que foi dito tantas vezes, não poderíamos deixar de salientar que também o Grupo Parlamentar do PSD teve esta preocupação há cerca de dois meses.

O Sr. Rui Tavares (L): — Do reconhecimento da independência da Palestina?

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O Sr. Alexandre Poço (PSD): — Mas, Sr.as e Srs. Deputados, caminhamos para o fim deste debate e o PSD não poderia deixar de reafirmar, mais uma vez, a sua posição.

Somos convictamente a favor da solução dos dois Estados, conforme preconizado na Resolução 181 das Nações Unidas, de 1947, que previa a criação de um Estado árabe e de um Estado judeu no território da Palestina. Acreditamos que esta solução, além de ser justa e a mais historicamente sustentada, é também aquela que permitirá uma convivência pacífica e segura, para que milhões de pessoas possam viver a sua vida em paz. Quando alcançarmos esta solução, estarão finalmente acauteladas as legítimas aspirações de Israel e da Palestina, reconhecendo a ambos os povos o seu direito à autodeterminação.

Acreditamos, também, que esta deve ser a posição de Portugal na comunidade internacional e, quando formos Governo, trabalharemos com os nossos aliados europeus e atlânticos para avançar num caminho concertado, nomeadamente na retoma do processo negocial de paz que culmine na solução dos dois Estados.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Dizem isso há 20 anos, mas nunca o fizeram! O Sr. Alexandre Poço (PSD): — O PSD participa neste debate e em todos os que envolvem esta questão,

reconhecendo a complexidade do conflito israelo-palestiniano. Não fazemos leituras simplistas que nos levem a conclusões apressadas ou sonsas, procurando colocar num dos lados todas as culpas e todas as responsabilidades de um assunto sério, que já custou a vida a milhares e milhares de pessoas ao longo das últimas sete décadas. Estaremos sempre do lado da solução que culmine na paz e não procuraremos, com as nossas posições, contribuir para inflamar ou dividir, particularmente quando sabemos que a perpetuação deste conflito serve os interesses dos grupos terroristas, serve os interesses dos grupos radicais de ambos os lados e daqueles que querem a destabilização do Médio Oriente, tudo isto com um custo demasiado trágico — a perda continuada de vidas de ambos os lados e a destruição de famílias e comunidades inteiras.

O PSD, Sr.as e Srs. Deputados, nunca pactuará com a vitória do ódio. Mas hoje, também podemos dizer mais: para nós, ser amigo de Israel significa dizer aos nossos amigos israelitas que temos orgulho na democracia que construíram,…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Têm orgulho no apartheid! O Sr. Alexandre Poço (PSD): — … e que a sua segurança é fator de preocupação de todos nós; que o povo

judeu deve ter um lar nacional para viver em paz e liberdade,… O Sr. Bruno Dias (PCP): — Na legalização da tortura! O Sr. Alexandre Poço (PSD): — … sem ser sujeito a perseguições como as que foram alvo ao longo de

toda a história da humanidade, vivendo no passado dia 7 de outubro o maior pogrom desde os horrores da II Guerra Mundial, com um ataque bárbaro para o qual não há justificação.

Ser amigo de Israel significa estar ao lado da sua dor e na exigência de que todos os mais de 130 reféns, feitos pelo Hamas, voltem às suas casas e sejam entregues às suas famílias.

Ser amigo de Israel significa ajudar à criação e continuação de laços de amizade e de reconhecimento do seu direito a existir por parte dos países árabes, como é o caso do Egito e da Jordânia, com quem tem tratados de paz, e, mais recentemente, através dos acordos feitos com o Bahrein, com os Emirados Árabes Unidos, com Marrocos ou com o Sudão.

Mas ser amigo de Israel também significa dizer aos nossos amigos israelitas que afastar-se da solução dos dois Estados, que acautela a autodeterminação dos palestinianos, também acabará por prejudicar e colocar em causa a sua própria segurança, a segurança e a vida dos seus cidadãos e a sustentabilidade futura do seu Estado.

Sr.as e Srs. Deputados, por outro lado, ser amigo da Palestina significa, para nós, dizer aos nossos amigos palestinianos que concordamos com o seu objetivo e com a sua autodeterminação, que permita a criação do Estado da Palestina.

Ser amigo da Palestina significa, para nós, apoiar a sua autoridade, reconhecida internacionalmente, para que consiga estabelecer-se como legítima e pacífica interlocutora da vontade do povo palestiniano.

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Ser amigo da Palestina é reconhecer que os palestinianos não são o Hamas nem qualquer outro grupo terrorista que mina e dificulta as aspirações nacionais dos palestinianos.

Aplausos do PSD. Mais ainda, ser amigo da Palestina significa expressar a nossa solidariedade por todos os civis que são

vítimas deste conflito e da atual guerra, afirmando, também, que o legítimo combate ao terrorismo deve minimizar ao máximo o custo das vidas civis na Faixa de Gaza ou na Cisjordânia.

Ser amigo da Palestina significa continuar a defender o apoio humanitário às populações que sofrem com a guerra, procurando sempre garantir que esse apoio chegue efetivamente àqueles que dele necessitam e que não fica nas mãos dos terroristas.

Mas ser amigo da Palestina significa, também, dizer aos nossos amigos palestinianos que devem recusar o terrorismo e o fundamentalismo, as visões que defendem a abolição do Estado de Israel ou as soluções que dizem que a Palestina deve ser livre do rio até ao mar, porque entre o rio Jordão e o mar Mediterrâneo há outro Estado, que também tem direito a existir na solução dos dois Estados.

Sr.as e Srs. Deputados, com esta declaração, o PSD reafirma o seu compromisso passado, presente e futuro. Apoiamos a solução dos dois Estados e apoiamos o direito à existência de Israel e da Palestina. Defendemos que essa solução seja parte de um processo de paz. Defendemos o reconhecimento do Estado da Palestina no quadro de uma posição comum europeia e apoiaremos todas as soluções que alarguem a convivência pacífica dos dois povos naquela região.

Para terminar, e como já dissemos hoje, nós não ignoramos o mundo como ele é, mas lutamos sempre pelo mundo como ele deve ser. Tal como um dia disse o estadista Shimon Peres: «Eu apoio a solução dos dois Estados nacionais: o Estado judeu, Israel, um Estado árabe, a Palestina. Os palestinianos são os nossos vizinhos mais próximos e eu acredito que um dia serão os nossos melhores amigos.»

Aplausos do PSD. O Sr. Presidente (Adão Silva): — A Mesa regista um pedido de esclarecimento por parte do Sr. Deputado

Rui Tavares, a quem passo de imediato a palavra. O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Alexandre Poço, poderia pedir uma daquelas

interpelações à Mesa em que se pede a distribuição de documentos, para que, simplesmente, comparássemos o título do debate que tivemos e o título do debate que temos.

Não tivemos, claramente, nenhum debate marcado pelo PSD sobre o reconhecimento da independência da Palestina como parte da solução de dois Estados. Tivemos um debate legítimo no qual, aliás, trabalhámos num texto comum, que não chegámos a assinar em comum, precisamente porque o PSD achava que, naquele texto, se deveria falar apenas do rescaldo do ataque terrorista de 7 de outubro, perpetrado pelo Hamas.

O Sr. Pedro Pinto (CH):  Exatamente! Os terroristas! O Sr. Rui Tavares (L): — Também considerava que era extemporâneo falar, por exemplo, de violações do

direito internacional, na ofensiva e na escalada que se anunciava sobre Gaza. Portanto, Sr. Deputado Alexandre Poço, peço-lhe esse esclarecimento: se era extemporâneo falar do tema do debate de hoje há dois meses, não pode dizer que o debate de hoje, afinal, já foi falado há dois meses e que o PSD o marcou.

Mas, então, pergunto-lhe algo que agora, dois meses volvidos, já é possível responder: há ou não violações do direito internacional humanitário em Gaza? Há ou não crimes de guerra no bloqueio de acesso a mantimentos, a água e a eletricidade, no bombardeamento das estruturas de primeira necessidade? Se há crimes de guerra, podemos dizer que — tal como dizemos na Ucrânia, em relação aos crimes de guerra perpetrados por quem quer que seja, mas em particular pelas milícias Wagner ou pelo exército russo —, onde há crimes de guerra, há criminosos de guerra. E onde há criminosos de guerra, eles devem ser julgados.

Está o Sr. Deputado Alexandre Poço preparado para dizer que houve crimes de guerra em Gaza e que os seus responsáveis devem ser julgados, incluindo no Governo israelita?

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Finalmente, não ouvi isso na sua intervenção, mas gostaria de perceber se se defende que deva haver um cessar-fogo, porque se há violações do direito internacional e se há crimes de guerra, eles devem cessar e, para isso, é preciso um cessar-fogo. Gostaria, pois, de perceber a sua posição sobre este assunto.

O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Poço. Dispõe

ainda de 48 segundos. O Sr. Alexandre Poço (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Rui Tavares, fiz

questão de salientar aquele tópico inicial, na minha intervenção, porque entendo que nenhum partido tem o exclusivo da preocupação sobre os temas. É que o Sr. Deputado passou a tarde toda a gabar-se de que, se não fosse o Livre, este assunto nunca seria discutido.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — É verdade! O Sr. Alexandre Poço (PSD): — Sr. Deputado, este assunto nunca seria discutido nos termos do projeto de

resolução do Livre, mas, nos termos da nossa preocupação com este conflito, o PSD teve o cuidado de agendar um debate sobre a matéria no passado mês de outubro, e, por isso, deixámos claro, então como agora, alguns compromissos que para nós são essenciais.

Nós entendemos que um Estado, quando é atacado, tem o legítimo direito a defender-se. Dissemos, também, que todos os reféns deviam ser...

Protestos do L. O Sr. Pedro Pinto (CH): — Deixa ouvir, é sempre a mesma coisa! O Sr. Alexandre Poço (PSD): — Ó Sr. Deputado Rui Tavares, eu fiquei calado a ouvi-lo. Só está a fazer

aquilo que está sempre a criticar nos outros. Aplausos do PSD. Nós dissemos algumas coisas com as quais concordámos num texto que teve o apoio maioritário desta Casa:

condenar o terrorismo, reconhecer que aqueles que são atacados têm o direito a defender-se, e que têm o direito a defender-se de acordo com a lei internacional. E, portanto, o que é que isto significa? Que devem minimizar ao máximo o número de perdas civis e de pessoas que são afetadas por uma situação de guerra, que é o que está neste momento a acontecer.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — E se não minimizarem?! O Sr. Presidente (Adão Silva): — Tem de concluir, Sr. Deputado. O Sr. Alexandre Poço (PSD): — Termino, Sr. Presidente. Também salientámos preocupações como a devolução imediata de todos os reféns e a garantia de que a

Faixa de Gaza tinha um apoio humanitário que chegasse efetivamente à população, e que não ficasse esse apoio nas mãos de organizações terroristas e de terroristas que impedem que o mesmo chegue à população. Esta foi a posição do PSD: respeito pelo direito internacional, respeito pelas pessoas e minimização de perdas civis. Foi esta e continuará sempre a ser esta a nossa posição.

Aplausos do PSD. O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Pessanha, do

Grupo Parlamentar do Chega.

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O Sr. Pedro Pessanha (CH): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo que acabaram de se juntar a este Parlamento, Sr.as e Srs. Deputados: O facto é que, independentemente das iniciativas que possam vir a ser aprovadas — seja nesta Assembleia ou noutra assembleias, onde a ditadura e o terrorismo do Hamas tenham mais adeptos do que a democracia de Israel —, Israel vai prosseguir com todas as operações militares necessárias quer para desmantelar a estrutura física de túneis e abrigos do Hamas, quer para eliminar a sua estrutura humana de comando. Se nem o Hezbollah ou o Irão conseguem parar Israel, não é com certeza esta iniciativa do Livre que o vai conseguir.

Portanto, este conflito vai continuar, e o que nos temos de perguntar é como irá evoluir. Num plano mais próximo de nós, como é que nos pode afetar e o que é que podemos fazer para prevenir as suas consequências para Portugal e para os portugueses?

Não é muito plausível que os combates diretos entre o exército de Israel e os terroristas do Hamas cheguem ao território nacional, mas é muito possível que a guerra suja do Hamas, feita de atentados a civis e de massacres a pessoas indefesas, alastre pela Europa.

Londres, Paris e Madrid já foram cenário de ataques cobardes do terrorismo islâmico que visam apenas e unicamente espalhar o terror, matando gente indefesa.

O Sr. Presidente (Adão Silva): — Tem de concluir, Sr. Deputado. O Sr. Pedro Pessanha (CH): — O que podemos fazer a nível nacional para minimizar este risco? Primeiro,

e antes de tudo, interditar a entrada em Portugal de terroristas islâmicos. Tivemos, já em outubro deste ano, um terrorista que matou em Bruxelas, depois de ter passado à vontade por Portugal.

O desmantelamento do SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras), que funcionava como primeiro crivo de vigilância, foi um passo errado nesse sentido. O que o Chega recomenda fortemente é a elevação do nível de alerta dos serviços de informação nesta matéria. Que tudo seja feito para que Portugal não venha a ser acusado pelos seus parceiros da União Europeia como cúmplice do agravamento da insegurança europeia.

Aplausos do CH. O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para uma intervenção pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, tem

a palavra a Sr.ª Deputada Joana Mortágua. A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados:

«Estamos a lutar contra animais e agimos de acordo com isso.» Esta é a frase do Ministro da Defesa de Israel. Se esta frase ajuda a perceber a brutalidade e a violência a que assistimos, ajuda também a explicar a morte de três reféns israelitas pelo próprio Exército de Israel. Estavam vestidos com túnicas brancas, levantavam um lenço branco e foram executados. O Exército israelita pensou que eram civis palestinianos.

O episódio é paradigmático. A desumanização é total. Os reféns israelitas são vítimas de uma sede de vingança. Face a esta brutalidade, o que é que nos dizem? Em brutalidades similares, disseram-nos que a Ucrânia tinha de aderir à União Europeia para proteger os direitos do povo ucraniano; na Palestina, só depois de a guerra acabar. Na Ucrânia colocam primeiro, e bem, a defesa do povo, mas os mesmos critérios não se aplicam ao reconhecimento do Estado palestiniano.

Quanto ao que foi trazido aqui, aos argumentos do Sr. Deputado André Ventura — que, entretanto, saiu —, eu responderia que a Argentina, o Vaticano, a Hungria, também reconheceram o Estado da Palestina. A Deputada Rita Matias, que é especialista no assunto,…

O Sr. Pedro Pinto (CH): — A Mariana não apareceu! A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — … talvez possa explicar ao Sr. Deputado André Ventura porque é que estes

países reconheceram o Estado da Palestina. Ventura tem má consciência neste debate, porque não quer que se lembre que o Chega é o partido-irmão do corrupto Likud, responsável pela morte de centenas de cristãos palestinianos.

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O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — É verdade! A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Ou pelos bebés que estavam nos cuidados neonatais nos hospitais de Gaza,

a quem Israel desligou a tomada. Talvez a morte desses bebés não emocione tanto o Deputado André Ventura como a morte de outras crianças.

Aplausos doBE.Protestos do Deputado do CH Pedro Pinto. A mim emociona-me a morte de qualquer criança e indigna-me a violação dos direitos das crianças, seja

onde for. Os palestinianos são, aliás, as únicas crianças no mundo que são sistematicamente processados por tribunais militares. Crianças de 6 anos são presas, crianças de 12 anos são condenadas a 20 anos de prisão. O Estado de Israel, em tribunal militar, condena crianças de 14 anos a prisão perpétua;…

O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Isso é mentira! A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — … ou ativistas como Munther Amira, assistente social do Aida Youth Camp,

que foi raptado no domingo em sua casa, o seu irmão foi violentamente espancado. Será mais um dos 4000 presos na Cisjordânia.

O Sr. Presidente (Adão Silva): — Tem de concluir, Sr.ª Deputada. A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Termino, Sr. Presidente. Tudo o que aqui propomos tem um único objetivo: salvar vidas, salvar vidas inocentes cuja única culpa é

terem nascido numa armadilha mortal chamada Faixa de Gaza. Aplausos doBE. O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — Tanta mentira! O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias, do PCP. O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O que é revoltante é que os anos vão

passando, as violações do direito internacional por parte do Estado de Israel vão sucedendo — e não é só do direito humanitário internacional, falamos da ilegalidade e do crime, nada menos do que isso —, e o PS e os partidos da direita ao seu lado continuam a dizer que ainda não é agora que é a altura para reconhecer o Estado da Palestina.

Alguns podem reativar a retórica dos autoproclamados Comandos de Defesa da Civilização Ocidental, ou trazer para aqui, traduzido para português do hebraico, os discursos da extrema-direita israelita. Mas, mesmo que não entrem nessa retórica, tivemos aqui o PS, com o Sr. Deputado Paulo Pisco, que chegou ao ponto de afirmar que o que fizeram os 138 países que reconheceram o Estado da Palestina  têm relações diplomáticas, de cooperação, de solidariedade com a Palestina e com a Autoridade Palestiniana  não serviu para nada. Foi o que o PS teve para nos dizer. Falam da ineficácia de quem tem voz para justificar a cumplicidade de quem se cala perante a ocupação.

Srs. Deputados, 1,9 milhões de pessoas, na vasta maioria da população de Gaza, foram deslocadas. Informação de há horas — horas! — dada pelas Nações Unidas: 19 400 palestinianos assassinados, 70 % deles mulheres e crianças; 52 000 palestinianos feridos; mais de 1000 crianças em Gaza perderam as duas pernas; dos 36 hospitais, 24 completamente destruídos; utilização de armas proibidas, como bombas de fragmentação ou fósforo branco.

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Isto não é ausência de preocupações humanitárias, Srs. Deputados, isto são crimes de guerra. Isto é uma prática comprovada de limpeza étnica, já demonstrada nos relatórios dos enviados especiais da ONU ao Médio Oriente.

Srs. Deputados, reafirmamos aqui a questão central neste debate: o direito dos povos da Palestina e de Israel à paz e à segurança pode ser alcançado sem uma solução política e sem o fim da ocupação? Não pode, Srs. Deputados!

O Sr. Presidente (Adão Silva): — Tem de terminar, Sr. Deputado. O Sr. Bruno Dias (PCP): — Termino, Sr. Presidente. Quanto aos assassinatos dos palestinianos em Hebron ou em Jenin — como sabem, isto não é em Gaza —

pelo exército de ocupação, não é o combate ao Hamas que está em causa. O PS, lado a lado com os partidos da direita, pode continuar a pôr o Estado português na posição vergonhosa de seguidismo em que se coloca, mas não vão pôr o povo português, porque o povo português está a fazer ouvir a sua voz em solidariedade com o povo da Palestina.

Aplausos do PCP. O Sr. Presidente (Adão Silva): — Para encerrar o debate, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Tavares. E para

que não se diga que a Mesa não é generosa, o Sr. Deputado Rui Tavares tem 7 minutos e 37 segundos para o fazer.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Ninguém merece! O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Não é a Mesa, é o Regimento! O Sr. Rui Tavares (L): — Sr. Presidente, Caras e Caros Colegas, Caros Membros do Governo: Lamentando,

no entanto, que tenham vindo para outro debate em agenda e que aqui, quando se discutiu, entre outras coisas, como dar tudo por tudo para salvar cidadãos também portugueses, luso-israelitas, luso-palestinianos, não tenha estado o Governo para nos dizer que esforços está a envidar e esperemos que sejam muitos e urgentes.

Neste debate falou-se muito de História. Falou-se de história bíblica, falou-se do Império Bizantino, falou-se da linha de Sykes-Picot e falou-se do caso Dreyfus. Julgo que não surpreendo ninguém ao dizer que gosto muito de História. É a minha vocação, dediquei ao seu estudo a minha vida. Gosto de História mesmo quando ela é terrível e não deixa de ser fascinante. Mas, Srs. Deputados, mais do que gostar de História, temos de gostar de crianças vivas. Temos de gostar de crianças que vão ver os seus pais; que os pais reféns vão ser libertados; que não vão ver, como no poema de Refaat Alareer, que li no início, o pai desaparecer numa explosão. E, portanto, falar de História não pode ser desculpa para dizer que o problema é muito complexo.

Claro, a existência humana é muito complexa, mas há coisas que são simples. Não é dizer que o problema é muito difícil. Não fomos eleitos, Sr.as e Srs. Deputados, para falar dos problemas fáceis, fomos eleitos para falar dos problemas difíceis. Não fomos eleitos para estar à mesa do café a dizer: «Porque é que eles não se entendem? Quando é que aquilo se resolve?» Nós fomos eleitos para Portugal ter uma voz, uma voz política.

Aplausos dos Deputados do PS Carla Sousa e Miguel Matos. Não fomos eleitos, Sr.as e Srs. Deputados, para dizer que num tempo vindo o Governo há de resolver. Onde

é que está aquele Parlamento orgulhoso, com brio parlamentar, com capacidade de trazer um Governo à sua fiscalização, capaz de assumir uma posição política e depois o Governo faça a sua diplomacia, que é o papel dele? Para isso fomos eleitos.

Não fomos eleitos, Sr.as e Srs. Deputados, para ouvir aqui dizer, há dois meses apenas, que era preciso condenar o terrorismo sem «mas» — é uma coisa que está bastante na moda dizer-se, «não se pode dizer “mas”». Caras e caros colegas, do PS ao PSD, à Iniciativa Liberal, ao Chega, a estes grupos parlamentares certamente ouvi aqui tantas versões «mas» e «todavia» e «contudo» e «porém» e «no entanto» e «não é o

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tempo», que poderia usar aqui o dicionário de sinónimos. «Precisamos de uma solução dos dois Estados, mas por agora só reconhecemos um»; «a Palestina tem de ver reconhecida a sua independência, contudo, não é o tempo»; «sem dois Estados não há a paz, porém, nós, que queremos a paz e a queremos já, não vamos fazer nada para reconhecer os dois Estados já»; «a Palestina não é viável».

Mas o que dissemos nós, orgulhosos defensores do direito à autodeterminação de Timor-Leste, quando nos disseram «Timor-Leste não é viável, é muito longe, é lá no fundo do arquipélago da Indonésia»? O que diremos nós, então, quando nos dizem «não sabemos se a Palestina é viável, tem duas partes que são geograficamente descontínuas»? E Timor-Leste não tinha? O Oecussi-Ambeno não é descontínuo do resto de Timor-Leste? Alguma vez nós dissemos «não é viável, vamos esperar para discutir a independência de Timor-Leste daqui a 20 ou 30 anos, quando já não houver independência para discutir»?

Ouvi dizer aqui que reconhecer a independência da Palestina é premiar os terroristas e os fanáticos. É exatamente o contrário! Sabemos todos que o Hamas foi beneficiado porque dificultava a solução dos dois Estados. Sabemos todos que foi um mecanismo utilizado precisamente para que este debate se não fizesse. Se dissermos «agora não é o tempo» de reconhecer o Estado da Palestina, no qual é a Autoridade Palestiniana, a Organização da Libertação da Palestina, da qual o Hamas não faz parte, da qual são as organizações civis laicas palestinianas, que o Hamas chacinou em Gaza, que serão os legítimos representantes internacionais, como é que se pode dizer que isso seria um prémio ao Hamas?

Reconhecer a Palestina como Estado independente, exercendo a sua autoridade de facto na Cisjordânia, e de jure na Faixa de Gaza, até que o Hamas seja tirado do cenário político palestiniano e a Autoridade Palestiniana possa exercer a sua autoridade legítima e internacionalmente reconhecida, sobretudo à Palestina, é a melhor resposta que a comunidade internacional que quer a paz pode dar aos que querem impedir a paz, aos que querem impedir a solução dos dois Estados, aos que querem impedir o reconhecimento da independência da Palestina.

Aplausos dos Deputados do PS Carla Sousa e Miguel Matos. Por isso, chamemos as coisas pelos nomes. Portugal tem de ser um país que ande de cara levantada no

mundo e que condene um ataque terrorista quando o há; chame uma organização de extrema-direita fanática religiosa, fascista, na prática, na Palestina, como é o Hamas, de tudo isto; que também diga que quando o Exército israelita comete crimes de guerra são crimes de guerra, que esses crimes de guerra têm criminosos de guerra e que os criminosos de guerra o lugar que têm é serem julgados no Tribunal de Haia.

O Portugal que nós temos de ser, a Assembleia da República que temos de ser, tem de ser coerente consigo mesmo e dizer em relação à Palestina o mesmo que dizia em relação a Timor-Leste, o mesmo que diz em relação ao Sara Ocidental, o mesmo que diz em relação à Ucrânia.

O Portugal que nós temos de defender, que nós jurámos defender, tem autodeterminação na sua Constituição. O Portugal que nós todos dizemos defender, quando discutimos agora na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional a nossa Constituição, tem de ser um Portugal incansável na defesa dos direitos humanos e, portanto, não pode aceitar que os direitos humanos se cumpram um bocadinho menos num sítio e um bocadinho mais no outro, não pode aceitar outra coisa senão que eles sejam universais e indivisíveis.

Por último, o Portugal que temos de querer tem de ser um Portugal descomplexado e sem medo. Os outros vêm connosco, conseguimos uma posição unânime da União Europeia? Pois muito bem. Os outros arrastam os pés ou estão presos em questões que têm, elas também, a sua história, que me escusarei aqui a detalhar? Estaremos à espera de que a Alemanha resolva a sua história para que nós possamos fazer o que é justo? Ou devemos reconhecer, respeitar a história que a Alemanha tem consigo e nas suas relações com Israel e, no entanto, dizer que Portugal e outros países da União Europeia têm obrigação de se manterem coerentes com a sua história, com o que disseram em relação a Timor-Leste, com o que dizem em relação ao Sara Ocidental, com o que dizem em relação à Ucrânia?

Este é o Portugal que em nós votou para defendermos estes princípios, que são os constitucionalmente consagrados.

Tenho muita pena de neste debate não termos ouvido o Governo, porque sabemos que se no plano dos princípios do direito internacional o Governo diz que defende a solução dos dois Estados — e gostaríamos de ouvir, então, que preparação está a fazer para essa solução —, no plano dos direitos individuais há algo

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inultrapassável, há vidas que estão em jogo ainda. Há vidas que, dependendo da concessão da nacionalidade portuguesa, podem ser salvas. Há esforços diplomáticos a fazer, junto, por exemplo, de um governo como o do Qatar, que tem feito essa diplomacia com o próprio Hamas, porque com ele tem um diálogo direto, e tem conseguido libertações de cidadãos que têm dupla nacionalidade.

Reafirmo, um Parlamento que pôs Aristides Sousa Mendes no Panteão não pode senão dizer uma coisa: essa nacionalidade deve ser reconhecida, reconheçam-na a todos os que têm direitos, para que possamos salvar vidas. Que possamos salvar vidas também de todos os palestinianos da Faixa de Gaza, das crianças, que têm direito a ver também os seus pais, como as israelitas.

Acreditemos que essas crianças, de um lado e do outro, conseguirão fazer aquilo que nós, na Europa, podemos ao menos dizer que temos alguma experiência em fazer; depois de massacres hediondos entre irmãos, saibamos fazer a reconciliação e a paz, que demorará, mas que virá a partir do momento em que dermos os passos necessários e urgentes.

Aplausos de Deputados do PS. O Sr. Pedro Pinto (CH): — Olha, já tens um grupo parlamentar, já não estás mal! Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Augusto Santos Silva. O Sr. Presidente: — Passamos, assim, ao segundo ponto da ordem do dia, que consiste na apreciação

conjunta, na generalidade, dos Projetos de Lei n.os 982/XV/2.ª (PS) — Adapta as regras de determinação do resultado fiscal, em sede de IRC, 990/XV/2.ª (PSD) — Altera a Lei n.º 22-A/2007, de 29 de junho, corrigindo a afetação das receitas do imposto único de circulação, designadamente da parte dessas receitas que por direito cabe aos municípios, e 993/XV/2.ª (PAN) — Cria incentivos fiscais para que as empresas promovam a mobilidade ciclável dos seus trabalhadores, procedendo à alteração do Código do IRC.

Para apresentar o projeto de lei do PS, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brás. O Sr. Carlos Brás (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado: A

3 de outubro passado, deu entrada na Assembleia da República a Proposta de Lei n.º 108/XV/2.ª (GOV), que pretendia adaptar as regras de determinação do resultado fiscal em sede de IRC (imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas), integrando as alterações produzidas pelas normas internacionais de relato financeiro conhecidas por IFRS 17 (International Financial Reporting Standards).

Acontece que o período de debate orçamental, que tomou a maior parte dos meses de outubro e novembro, interrompeu os restantes processos legislativos, como sempre acontece e como todos sabem, e, neste momento, a circunstância política de termos um Governo de gestão determina a necessidade de se converter a proposta de lei em projeto de lei, pela importância de se adaptar a legislação fiscal, no caso do IRC, e também para dar resposta à solicitação da Associação Portuguesa de Seguradores.

Esta associação endereçou uma carta à Comissão de Orçamento e Finanças no passado dia 18 de outubro, alertando para a urgência da aprovação e publicação desta legislação. Trata-se de empresas sujeitas à supervisão da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF), de empresas para as quais está prevista a aplicação de planos de contabilidade específicos, como o Plano de Contas para as Empresas de Seguros.

Este é um processo de convergência com as normas internacionais de contabilidade que decorre desde 2008 e que ficará agora completo. Essencialmente, altera o artigo 50.º do Código do IRC, no que respeita à definição do lucro tributável e integração de demais elementos na respetiva formação, e cria um regime transitório de adaptação às novas regras de determinação do lucro tributável. A própria norma IFRS 17, já atrás citada, prevê a entrada em vigor no primeiro exercício financeiro posterior a 1 de janeiro de 2023.

Em Portugal, como é sabido, em regra, o ano fiscal coincide com o ano civil, e daqui se infere a necessidade deste agendamento. Trata-se apenas e só de adaptar o Código do IRC às melhores práticas e às recomendações internacionais para o setor dos seguros. A associação representativa das empresas do setor solicita também essa aprovação e, assim sendo, afigura-se ser uma matéria isenta de polémica, pelo que estou certo de que será aprovada com o voto favorável de todas as bancadas.

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Aplausos do PS. O Sr. Presidente: — Para apresentar a iniciativa do PSD, tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco. O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Este

debate que estamos a realizar evidencia que estamos mesmo em fim de ciclo. E estamos em fim de ciclo, Sr. Presidente, porque as trapalhadas sucedem-se na bancada do Partido Socialista.

Falam-nos da transposição de uma diretiva que é fundamental para a pátria, mas, durante meses, nem se lembraram que ela existia. Foi preciso surgir a dissolução para rapidamente perceberem que era mesmo importante a sua aprovação. Como caiu a iniciativa do Governo, o Partido Socialista teve de a repescar e apresentar. E a pergunta é: porque é que andaram tanto tempo à espera? Se o Sr. Presidente da República não tivesse promovido a dissolução do Parlamento, nem sequer se iria discutir esta matéria? É que parece que só devido àquele ato é que finalmente estamos a ter este debate.

Aplausos do PSD. Já agora, Sr. Presidente e Srs. Deputados, faço esta pergunta direta: têm consciência das dúvidas sobre a

constitucionalidade de fazer com que esta norma entre em vigor, retroativamente, a 1 de janeiro de 2023? Têm consciência dessas dúvidas que existem e que devem ser esclarecidas?

Sr. Presidente, como uma trapalhada nunca vem só da parte da bancada do Partido Socialista, temos uma segunda trapalhada,…

Vozes do PSD: — É verdade! O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — … que evidencia também o modo muito próprio de atuar dessa bancada:

«Temos uma maioria absoluta, a proposta vem da oposição, o nosso voto é contra. O conteúdo não interessa, o que lá está não interessa; basta ver um símbolo de um partido da oposição para o nosso voto ser contra.»

Foi assim em sede orçamental. Quando o PSD apresentou a proposta de eliminar todo o artigo do IUC (imposto único de circulação), o Partido Socialista, como é que votou? Contra. A seguir, veio a descobrir que, com esta sua atitude, o que restou do artigo do IUC retira dinheiro aos municípios. A verdade é essa. Portanto, é preciso reverter esse erro, mas não têm coragem de o assumir.

Primeira tentativa: vamos resolver isto em redação final. O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Claro! O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Aquilo que sabemos é que, em redação final — e o Sr. Presidente, que é

o primeiro garante do cumprimento do Regimento, é o primeiro que nunca iria aceitar isso —, não se pode reverter uma votação que ocorreu em Plenário.

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Parece que é a primeira vez! Ó, Duarte, tens tanta experiência! O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Portanto, isso nunca poderia acontecer. Às vezes, até me pergunto se o Partido Socialista merece uma oposição responsável, como é aquela que o

PSD faz. O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — É, é! E o Chega, a Iniciativa Liberal… O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — O PSD disse, naquele momento: «Nós estamos disponíveis para encontrar

uma solução.» O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Devem estar disponíveis em redação final, e não acontece!

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O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Estamos disponíveis para que entre uma iniciativa legislativa que reverta

todo aquele artigo do IUC, podendo fazer com que o erro que vocês cometeram não venha a sacrificar os municípios; estamos disponíveis para que esse agendamento seja feito de uma forma rápida e expedita; estamos disponíveis para que ele ocorra sem discussão; estamos disponíveis para que as três votações ocorram; estamos disponíveis para resolver o problema.

O que é que o Partido Socialista diz a isto? Não. Porquê? Porque vem da oposição e não estão nunca disponíveis para encontrar soluções, do alto da vossa maioria absoluta.

Surge então aquilo a que podemos chamar o ovo Kinder: numa proposta em que estamos a discutir o IRC para as empresas de seguros, os senhores põem uma alteração que visa mudar o IUC. Porque não pôr uma alteração para falarmos da reposição do IVA zero (imposto sobre o valor acrescentado) para o cabaz alimentar, já que estamos a falar de uma norma fiscal e cabe lá tudo, na vossa ótica? É que a similitude do objeto entre o IRC e o IUC é muito vaga, mas, a partir do momento em que abrem essa porta, até podemos entrar com todas as alterações ao sistema fiscal português!

Ora bem, isso só prova a vossa predisposição para tentar resolver as coisas à força, de supetão, utilizando a força da maioria absoluta.

As trapalhadas sucedem-se, mas vão terminar muito em breve, no dia 10 de março. Aplausos do PSD. O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do Grupo Parlamentar do Chega, tem a palavra o Sr.

Deputado Rui Afonso. O Sr. Rui Afonso (CH): — Sr. Presidente de algumas bancadas, Sr.as e Srs. Deputados: Se a análise do

projeto de lei em apreço não nos levanta grandes questões, já a inexplicável persistência dos sucessivos Governos em manter uma elevada taxa de IRC é uma matéria da maior importância, sendo a elevada carga fiscal que recai sobre as empresas e sobre as famílias portuguesas — nomeadamente, no caso das famílias, o IRS (imposto sobre o rendimento das pessoas singulares) — uma grande preocupação do partido Chega.

Mas Portugal debate-se agora com um grave problema de produtividade nas empresas. Isto implica que elas precisam, claramente, que haja economias de escala. Em Portugal, temos uma multiplicação de micro, pequenas e médias empresas (PME) e temos muito poucas empresas grandes, poucas empresas com escala internacional. Mas, se olharmos para o IRC, há um claro desincentivo à aquisição de escala, à fusão de empresas, pelo facto de as empresas pagarem uma taxa de IRC mais alta, se tiverem resultados mais altos.

Em suma, o nosso sistema fiscal penaliza quem consegue resultados mais elevados e, por outro lado, desincentiva a aquisição de escala.

Mas foi acordado internacionalmente, por iniciativa do Presidente dos Estados Unidos da América, Joe Biden, uma taxa de IRC mínima de 15 %. Não temos dúvidas de que, mais tarde ou mais cedo, os países irão convergir nesse sentido. No futuro, dificilmente existirão países que venham a ser competitivos com taxas que se afastem deste referencial. Nós estamos com mais do dobro e os consecutivos Governos socialistas nem sequer tocam na base de tributação ou nas derramas.

Sr.as e Srs. Deputados, parece, por isso, haver um esquecimento generalizado por parte dos sucessivos Governos socialistas e sociais-democratas de que são as empresas que empregam as pessoas e que geram riqueza.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Bem lembrado! O Sr. Rui Afonso (CH): — Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, cada ano que passa em que os sucessivos

Governos recusam libertar as nossas empresas da brutal e complexa carga fiscal a que estão sujeitas é mais um ano perdido para elas crescerem, ganharem escala e serem competitivas.

Aplausos do CH.

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O Sr. Pedro dos Santos Frazão (CH): — E a Mariana hoje não vem? Já há quatro dias que não aparece! Está a beber café?!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do PAN, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa

Real. A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A justiça fiscal nos dias de hoje

tem de ser, sem dúvida, sinónimo de uma justiça não apenas social, mas também ambiental. Não há combate às alterações climáticas se não reduzirmos as emissões no setor da mobilidade e dos

transportes e sem reduzir a dependência dos combustíveis fósseis, o que passa por incentivos fiscais para esse mesmo objetivo.

Um dos caminhos para alcançar esses objetivos passa pela aposta na transição para a mobilidade ciclável, o que pode significar uma redução de emissões de 3,2 kg de CO2 por dia e por pessoa.

Se o caminho parece ser óbvio, as políticas não têm tido, até aqui, a ambição necessária para o conseguir. Nos últimos 10 anos, a quota modal de viagens em bicicleta no País foi de apenas 0,5 %, e o Governo quis apenas dar 1 milhão de euros no próximo ano para promover a mobilidade ciclável e pedonal. Em termos de recursos humanos, sabemos que fica muito aquém daquilo que tem sido reivindicado. Esta verba é manifestamente baixa, porque se olharmos, por exemplo, para países como a Irlanda, vemos que, apesar de ter metade da população de Portugal, investe esta verba por dia e não por ano.

Tem sido pela mão do PAN, no entanto, que nos últimos anos têm surgido uma série de benefícios e incentivos à mobilidade ciclável, como a descida do IVA das bicicletas ou até mesmo das cadeirinhas para criança de 23 % para 6 %. Houve também a criação de apoios à aquisição de bicicletas no âmbito do Fundo Ambiental ou a inclusão do acesso a sistemas de bicicletas partilhadas no âmbito dos espaços grátis. Estas foram vitórias muito importantes para termos uma mobilidade suave e para incentivarmos um estilo de vida mais ativo.

Mas é preciso ir mais longe e é isso mesmo que o PAN quer conseguir neste debate, propondo uma alteração ao Código do IRC que visa criar uma dedução de 150 % para os gastos das empresas com a aquisição de passes para a utilização de sistemas de bicicletas partilhadas e de bicicletas para os seus trabalhadores.

Aprovar esta proposta do PAN, mais do que um contributo sério para a redução das emissões, é uma forma de dar às empresas um impulso para que implementem os seus planos de mobilidade sustentável, que o Governo previu no Plano de Poupança de Energia 2022-2023, mas nunca executou.

Aprovar esta proposta é ainda uma garantia de justiça, já que o Código do IRC não pode criar incentivos apenas para o uso de transportes públicos, nem tão-pouco continuar a dar borlas fiscais a quem mais polui e mais beneficia, mas deve, sim, criar benefícios que ajudem os trabalhadores que prefiram a mobilidade ciclável.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome da Iniciativa Liberal, tem a palavra o Sr. Deputado

João Cotrim Figueiredo. O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: Este projeto de lei é mais uma daquelas transmutações de propostas de lei que, entretanto, tiveram de ser transformadas em projetos de lei. Neste caso concreto, trata-se da Proposta de Lei n.º 108/XV/2.ª (GOV).

Se fosse só a transposição ou a transmutação dessa proposta de lei, não haveria muito a dizer. Vem tarde, mas isso já é costume do PS, não me preocupava muito, apesar de, ainda assim, vir a horas.

No fundo, esta iniciativa está a fazer o quê? Está a adaptar o Código do IRC de maneira que as alterações já introduzidas no Plano de Contas para as Empresas de Seguros, desde o princípio deste ano, possam ter repercussão exatamente no Código do IRC.

Não terem feito isto é um sinal da complexidade do nosso sistema. Temos de ficar à espera do último dia do ano, praticamente, para corrigirmos uma coisa que, em bom rigor, já deveria estar corrigida desde 1 de janeiro, porque era uma coisa óbvia. Ao não corrigir isto, aumenta-se a diferença entre o resultado que é sujeito a impostos e o resultado contabilístico que as empresas apresentam. É muito complexo o nosso sistema e este é um sinal disso.

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O outro sinal de complexidade vem da parte que já não tem a ver com a Proposta de Lei n.º 108/XV/2.ª (GOV); é a parte em que o PS sentiu necessidade de fazer aquele enxerto do IUC. E porque é que o PS fez o enxerto do IUC? Porque precisava de corrigir uma asneira. Foi uma asneira que não quis reconhecer — já aqui foi explicado o processo — e enxertou estas duas tentativas de alteração do Código do IUC através deste diploma.

Portanto, o que é que fez? O PS, que ia aumentar o IUC por motivos de justiça social, resolveu, por motivos que não podem deixar de ser eleitoralistas, voltar atrás no aumento do IUC por motivos de quê? Justiça social também! Serve para as duas coisas.

Risos do Deputado do CH Pedro Pinto. Acontece o quê? Acontece que se esqueceu de retirar o resto do artigo. Melhor, esqueceu-se de votar a favor

de duas propostas que havia para tirar o resto do artigo, uma do PSD e uma da Iniciativa Liberal. Esqueceu-se! É um grau de incompetência tal, que é mais uma evidência de que, apesar de tudo, o PS é bastante melhor a aumentar impostos do que a reduzi-los ou, neste caso, até a mantê-los na mesma.

O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Factos! O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Agora, tudo isto — que comento en passant, porque é bom que fique

registado — traz uma lição, porque estamos perante um processo de harmonização de uma série de critérios e procedimentos fiscais em toda a Europa. Este, das regras contabilísticas, é mais um. Na semana passada, discutimos aqui um importante, o das PME, que passam a poder declarar, liquidar e pagar impostos num sítio da sua sede social; se esse sítio não for mais complexo, se não for mais oneroso, saem certamente do sítio onde neste momento estão, e Portugal não está muito bem posicionado nesses rankings.

Sempre dissemos — andamos há anos nisto! — que os nossos impostos não só precisam de ser mais baixos, como precisam de ser mais simples. Senão, vai acontecer isto: quando a harmonização destes critérios e destes procedimentos se generalizar, a nossa complexidade e a nossa onerosidade ficarão mais óbvias para todos.

Vai correr mal a Portugal e, por isso, já devíamos ter começado este esforço de desoneração e de simplificação há mais tempo, mas não será, certamente, por falta de aviso da Iniciativa Liberal. Vamos começar já a partir de 10 de março.

Aplausos da IL. O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, pelo Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado

Duarte Alves. O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O projeto

de lei em apreço ajusta o Código do IRC às alterações dos planos de contas do setor segurador decorrentes da implementação de normas internacionais de relato financeiro como a IFRS 17.

Quanto à IFRS 17, trata-se de uma norma que alterou profundamente a forma como as seguradoras contabilizam as provisões de riscos contratuais e, por essa via, os seus lucros e prejuízos. É uma norma que melhora a capacidade do Estado e de eventuais investidores de conhecerem e compararem, a nível internacional, os resultados e a solidez financeira das seguradoras.

Dito isto, não podemos deixar de assinalar dois aspetos: em primeiro lugar, a aplicação desta norma de forma cega, sem a consideração das especificidades de pequenas seguradoras e de seguradoras de cariz cooperativo.

As mútuas de seguros — embora em Portugal só exista uma —, no seu cariz cooperativo, não têm vocação para serem sequer cotadas ou consideradas para serem compradas por investidores e, portanto, a aplicação desta norma revela-se demasiado exigente para estas pequenas entidades.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Claro! Bem observado!

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O Sr. Duarte Alves (PCP): — O princípio da proporcionalidade deveria ter sido considerado para evitar custos para as mútuas e pequenas seguradoras, o que na prática significa aprofundar o caminho de concentração do setor, com impactos profundamente negativos também para os consumidores, mais expostos ao poder oligopolista e a formas diretas ou indiretas de cartelização.

Em segundo lugar, a norma IFRS 17 não resolve os problemas de complexidade ou de falta de transparência, nem toca no essencial, não resolve o conflito entre o interesse privado e o interesse coletivo.

No Código do IRC não faltam benefícios fiscais, isenções, subterfúgios que beneficiam os grandes grupos económicos e, em particular, o setor financeiro. As grandes seguradoras, a par da banca, têm aumentado os seus lucros à custa dos sacrifícios das famílias.

No período mais severo da pandemia, as seguradoras não baixaram os prémios de seguros pagos pelos consumidores, mas tiveram muito menos despesas, devido à paragem da atividade económica.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Isso é que foi! O Sr. Duarte Alves (PCP): — Tiveram nesse período e têm agora lucros extraordinários. O PCP propôs

medidas para tributar esses lucros e, até hoje, tanto o Governo como o regulador, a ASF, continuam a ignorar a desproporção dos lucros obtidos naquele período, lucros que hoje continuam a aumentar por outras razões, mais uma vez em prejuízo da grande maioria da população.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exatamente! O Sr. Duarte Alves (PCP): — Esta iniciativa ajusta o IRC a uma norma contabilística, mas não aborda este

problema maior: a profunda injustiça fiscal da qual as seguradoras e, em geral, o setor financeiro são os principais beneficiários, ao passo que a maioria da receita fiscal continua a recair sobre o trabalho, sobre rendimentos mais baixos e intermédios, sobre o consumo de bens essenciais, sobre as micro, pequenas e médias empresas, ou seja, sobre a grande maioria da população, que não aceita que esta injustiça fiscal continue.

Relativamente a outras iniciativas em apreço, quanto à iniciativa do PAN, não podemos concordar com o alargamento de mais um benefício fiscal para as empresas, que se aplica também às grandes empresas; e, relativamente à alteração do IUC, assim como votámos contra a proposta que acabou por ficar no Orçamento e que prejudica os municípios, votaremos a favor das alterações que corrigem este abcesso que ficou na versão final do Orçamento, mas que não faz qualquer sentido, acabando por prejudicar a receita dos municípios.

Portanto, acompanharemos as iniciativas que vão no sentido de corrigir esse problema. Aplausos do PCP. O Sr. Presidente: — Para intervir, em nome do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, tem a palavra o

Sr. Deputado Pedro Filipe Soares. O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs.

Deputados: Este debate é mais um exemplo de um pesadelo que assola os contabilistas. O que eles mais temem é que, no final de um ano civil, que é também um ano fiscal, se alterem as regras do ano em curso, obrigando-os a todos a revisitar contas.

Neste caso concreto, trata-se do setor segurador, mas entendamo-nos: no setor segurador há peixe graúdo e peixe miúdo! O peixe graúdo até pode ter grandes escritórios de contabilidade e isto é absolutamente irrelevante, mas as pequenas seguradoras, essas, vão ter mais dificuldades em responder.

Estão a pagar, portanto, o quê? Estão a pagar o laxismo do Governo em não ter legislado quando deveria ter feito a transposição desta diretiva, que agora é agarrada pelo Partido Socialista, fruto de estarmos num período de pré-dissolução da Assembleia da República e de um Governo em gestão. Mas estas responsabilidades existem e, a bem do debate, devem ser plenamente anunciadas, para que as pessoas saibam também como se preparar para o próximo dia 10 de março.

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No que toca à iniciativa, ela é uma obrigação de atualização de normas contabilísticas, e nada há a apontar-lhe de extraordinário, a não ser esta exiguidade de temporalidade para a sua aplicação.

No que toca às outras duas iniciativas — e para não repetir argumentos, porque me parece que já estão mais do que estafados neste momento —, a proposta do PSD em relação ao IUC revela a reposição do que estava anteriormente na distribuição desse imposto e que só foi mexido porque alguém no Ministério das Finanças teve a brilhante ideia de achar que era aos pobres que deveria exigir o pagamento da transição energética, veja-se lá! Uma ideia milagrosa que foi rapidamente metida na gaveta, e ainda bem, porque fazia mal ao mau nome do PS, mas fazia muitíssimo mal à transição energética, que é necessária. Foi um mau serviço que o PS prestou a esse objetivo.

No que toca à proposta do PAN, entendemos que, no fundo, é coerente com o conjunto de isenções fiscais que atualmente existem no País. Apesar de não acharmos que elas sejam brilhantes, há aqui alguma coerência que tem de ser realçada e, em nome disso, votaremos a favor dessa proposta.

Aplausos do BE. O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para intervir, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais,

Nuno Félix. O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Nuno Santos Félix): — Sr. Presidente, Srs. Deputados:

Esta proposta relativa à aplicação de uma norma transitória, em sede de IRC, para o setor segurador vem na senda daquela que tem sido a tradição em Portugal, quando temos alterações significativas a nível dos planos de contas, a nível dos referenciais contabilísticos, de fasear a sua aplicação em matéria fiscal.

Este mesmo princípio foi seguido aquando da aplicação do sistema de normalização contabilística e foi seguido também, já especificamente no âmbito do setor segurador, aquando do anterior plano de contas para o setor.

Neste domínio, tendo sido levantadas dúvidas sobre o momento da apresentação desta proposta, sobre se a mesma se teria seguido ou não ao anúncio da demissão do Governo, é importante termos presentes os factos, Srs. Deputados. A proposta deu entrada nesta Assembleia no passado dia 3 de outubro, no culminar de um circuito legislativo interno do Governo, e creio que, no dia 3 de outubro, ainda estávamos todos a trabalhar na normalidade da plenitude de funcionamento das instituições.

Esta proposta deu entrada nesta Assembleia no dia 3 de outubro, no culminar daquele que foi um processo legislativo interno do Governo. Os diplomas anteriores neste domínio, e falo especificamente no caso do setor segurador, aquando do anterior plano de contas, também foram aprovados no mês de dezembro do ano em que produziram efeitos essas mesmas alterações.

Do ponto de vista constitucional, o nosso Tribunal Constitucional tem vindo a estabelecer uma distinção muito clara entre o conceito da retroatividade e o conceito da retrospetividade, sendo que, neste caso, o facto tributário considera-se verificado a 31 de dezembro, portanto, a legislação que se aplica nesta matéria é aquela que estiver em vigor no final deste ano.

Portanto, quando aqui se invoca o alegado pesadelo para os contabilistas, também é importante estarmos cientes de que estas são alterações profundas do ponto de vista contabilístico e são também alterações contabilísticas que resultam de uma norma internacional de contabilidade — aliás, neste caso, de duas normas, a IFRS 9 e a IFRS 17 — com que os contabilistas estão a trabalhar neste domínio.

Do ponto de vista fiscal, o que temos é que, em vez de ser de uma forma imediata, num único ano, a tradução destas alterações contabilísticas no resultado fiscal é faseada ao longo de um período mais alargado. Trata-se, por isso, de assegurar a necessária previsibilidade quer para os operadores do setor, quer para o próprio Estado, evitando que alterações meramente contabilísticas que não resultem de uma evolução favorável ou desfavorável da atividade destes operadores económicos tenham um impacto significativo do ponto de vista do imposto, seja no sentido de pagar mais ou menos, porquanto estas normas internacionais de contabilidade vão ter um impacto muito diferenciado em diferentes agentes do setor.

Sr.as e Srs. Deputados, estamos assim a cumprir, uma vez mais, aquele que tem sido o compromisso com as empresas e com a economia.

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Aplausos do PS. O Sr. Presidente: — O Sr. Secretário de Estado tem um pedido de esclarecimento. Para o formular, em

nome do Grupo Parlamentar do Chega, tem a palavra o Sr. Deputado Filipe Melo. O Sr. Filipe Melo (CH): — Sr. Presidente de algumas bancadas, Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário

de Estado, a principal questão que gostava de colocar prende-se com o seguinte: estas empresas só têm obrigações. Só têm obrigações! Para com o Estado, só têm obrigações.

Não sei se o Sr. Secretário de Estado conhece ou desconhece esta questão. Percebemos que haja esta uniformização contabilística, esta normalização, mas as seguradoras não são só as grandes empresas, têm intermediários. Os bancos também têm intermediários de crédito, e são esses mais pequenos que padecem diariamente.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Verdade! O Sr. Filipe Melo (CH): — Foram esses que, durante o tempo da covid, não tiveram 1 cêntimo de apoio do

seu Governo. Vozes do CH: — Bem lembrado! O Sr. Filipe Melo (CH): — Foram esses que, durante o tempo da covid, tiveram de fechar as portas e de

continuar a pagar aos funcionários. E foram esses também — as seguradoras — que prolongaram o prazo, dilataram o prazo do pagamento das apólices. Sabia disso? Era importante saber.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem! O Sr. Filipe Melo (CH): — Sabia também que são essas as empresas que o seu Governo impede de

concorrer a fundos europeus, a linhas de financiamento? E porquê?! São empresas que servem para pagar, servem para suportar a máquina do Estado, mas, quando é altura de concorrerem, não podem.

Não têm funcionários? Têm. Não pagam rendas? Pagam. Não pagam luz, água, gás, comunicações? Pagam. O Sr. Pedro Pinto (CH): — Muito bem! O Sr. Filipe Melo (CH): — Só têm deveres, só têm obrigações para com o Estado. Quando é a altura de manter os seus postos de trabalho, quando é a altura de continuarem a produzir e a

prosperar, o Estado, e neste caso o Governo socialista, corta-lhes as pernas. É isto que é a justiça fiscal? É a isto que as empresas no nosso País, que têm a segunda carga fiscal mais elevada da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico), estão sujeitas?

Sabia que, a seguir à Colômbia, somos nós que temos a carga fiscal mais elevada, o sistema tributário mais injusto e mais complexo da OCDE?

Aplausos do CH. Sabia disso? Sabe com certeza. É o sistema tributário mais complexo da OCDE, e é com isto que os nossos

empresários têm de viver. Sabe quantos milhares — milhares! — de mediadores de seguros e intermediários de crédito há no País?

Milhares! E são pessoas que têm as suas pequenas empresas, que sustentam as famílias com esse dinheiro, que sustentam as famílias com esse negócio que têm.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Olhe o tempo! Olhe o tempo!

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O Sr. Filipe Melo (CH): — Portanto, Sr. Secretário de Estado, antes de pôr isto em causa, pense nos milhares de famílias que vivem e subsistem deste tipo de negócios. Não são as grandes marcas, são os pequenos intermediários.

Aplausos do CH. O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais. O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Presidente, Sr. Deputado, Portugal não só foi um

dos Estados-Membros que mais apoiou as famílias e as empresas no contexto da pandemia, e veja-se o lay-off simplificado,…

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem! O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — … e não só somos um dos Estados-Membros que,

no contexto da crise energética e do pico inflacionista que se lhe seguiu, teve um conjunto mais amplo de apoios, como também os números internacionais não suportam a sua conclusão ao nível da carga fiscal.

Portugal não tem uma carga fiscal superior à média da União Europeia ou superior à média da zona euro. Aliás, se olharmos para aquele que é o esforço fiscal das famílias, o tax wedge da OCDE, em 2022 é inferior ao que era em 2015. Se olharmos para os estudos da OCDE sobre aquela que é a tributação efetiva das empresas, vemos que, segundo a OCDE, a taxa efetiva em Portugal é de 17,1 %, enquanto que, na vizinha Espanha, é de 21,5 %.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — É socialista, o Governo em Espanha! O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Porquê, Sr. Deputado? Porque temos um conjunto

de benefícios fiscais que são orientados para promover o investimento, para promover a criação de emprego, para promover a inovação e o desenvolvimento, dando valor acrescentado à nossa economia.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Umas borlas fiscais para os grandes grupos económicos! O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Mas, Sr. Deputado, se não lhe agradarem os números

da OCDE, pode olhar para os da Comissão Europeia. A Comissão Europeia, quando analisa aquela que é a taxa efetiva média de IRC das empresas, diz que, em 2022, em Portugal, é de 21 %; na vizinha Espanha, é de 29 %.

Mais do que este número, temos a trajetória. Sr. Deputado, em 2015, eram 27 % e agora está nos 21 %. O Sr. Filipe Melo (CH): — Não, não! O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Mas posso continuar,… O Sr. Filipe Melo (CH): — Pode responder à questão. Responda objetivamente à questão sobre estas

empresas! O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — … podemos olhar também para aqueles que são os

estudos da Comissão Europeia a nível da tributação sobre o trabalho, segundo os quais a taxa implícita em Portugal é de 30 % face a 36 % na vizinha Espanha.

O Sr. Presidente: — O Sr. Secretário de Estado tem de concluir.

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O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Concluirei, Sr. Presidente, relembrando que, ao longo dos últimos anos, esta Casa, por proposta do Governo, tem aprovado um conjunto muito significativo de medidas de descida do IRS das famílias portuguesas superior a 4 mil milhões de euros.

Aplausos do PS. O Sr. Filipe Melo (CH): — Estamos a falar de empresas. Não respondeu a nada! Não consegue responder!

Era melhor dizer que não sabe! O Sr. Presidente: — Não havendo mais pedidos de intervenção, passamos ao encerramento do debate e a

Mesa precisa de saber quem encerra pelo Partido Socialista, que é o partido proponente. O Sr. Pedro Pinto (CH): — É o Pedro Nuno Santos! O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Carlos Brás, tem a palavra. O Sr. Carlos Brás (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Sr. Secretário de Estado: Com este debate, há uma

conclusão que podemos tirar e que é óbvia. É que há uma imensa confusão de conceitos fiscais, de uma forma transversal, pelas bancadas.

Em primeiro lugar, convém esclarecer, Sr. Deputado do PSD, que o IRC é um imposto anual e, portanto, sendo anual, estamos dentro do exercício. Qualquer alteração tem repercussão para o ano inteiro, não é só para o remanescente até ao final do ano. Essa é que é a diferença entre um imposto anual e um imposto não anual.

Queria dizer também, sobre esta matéria, e como o Sr. Secretário de Estado já bem referiu, que entrou uma proposta de lei a 3 de outubro, que estaria perfeitamente em condições de ser votada nesta Assembleia se não houvesse o fenómeno da dissolução.

Depois, de uma forma transversal, também para todas as bancadas, a importância da atualização do IRC e da transposição desta diretiva tem também a ver não só com a simplificação, mas também com um princípio que é muito caro a todos os Deputados, que é o princípio da harmonização fiscal dentro da União Europeia. Portanto, é disso que se trata, é de continuar um processo de harmonização fiscal que, neste caso em concreto, foi iniciado em 2008.

Aplausos do PS. O Sr. Presidente: — Encerramos, assim, o segundo ponto da ordem do dia e vamos passar ao período de

votações. O Sr. Pedro Pinto (CH): — O PS deixou 4 minutos por usar! O Sr. Presidente: — Peço aos serviços que abram o período de verificação de quórum e aos Srs. Deputados

que se registem. Pausa. Pergunto se alguma Sr.ª Deputada ou Sr. Deputado não conseguiu registar-se eletronicamente. Pausa. Todos conseguiram. Peço aos serviços que encerrem o período de verificação do quórum e publicitem o

resultado. Sr. Deputado André Ventura, pede a palavra? Faça favor. O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, não consegui registar-me.

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O Sr. Presidente: — Fica registado manualmente. O Sr. Deputado Rui Tavares pede a palavra para o mesmo efeito? O Sr. Rui Tavares (L): — Sim, Sr. Presidente. O Sr. Presidente: — Peço aos serviços que acrescentem mais dois ao quórum. Temos quórum, podemos passar às votações. Estamos em condições de votar. Sr. Deputado Hugo Carneiro, pede a palavra para que efeito? O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, é só para levantar aqui uma questão

relativamente ao guião. Tivemos várias versões do guião ao longo da tarde, e este projeto do Partido Socialista que acabou de ser discutido, o Projeto de Lei n.º 982/XV/2.ª (PS), está num agendamento em que tem dois arrastamentos, um do PSD e outro do PAN, e o do PSD toca profundamente com outras propostas que devem ser apreciadas na especialidade.

O nosso entendimento é que deve fazer-se primeiro a generalidade e, portanto, deve ser votado o projeto de lei do PS, o projeto de lei do PSD e o do PAN, e só depois fazermos a especialidade.

Foi dado um acordo sobre esta questão em Conferência de Líderes, dada a urgência que existia na transposição de normas sobre o setor segurador, e foi relativamente a essas normas que demos o acordo para que se fizessem as três votações hoje, mas não prejudicando, naturalmente, a precedência das votações que deve ser feita, nomeadamente, primeiro, a generalidade e, depois, a especialidade.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, muito obrigado. Eu próprio ia fazer essa proposta, porque parece lógico

que sejam votados na generalidade os projetos de lei que estão em causa e que foram agora mesmo apreciados. Depois, para os que passarem à especialidade, faremos a votação na especialidade e a votação final global. Julgo que esta interpretação não merece a discordância de nenhum grupo parlamentar e, portanto, assim faremos.

Vamos então proceder à votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 943/XV/2.ª (L) — Recomenda ao Governo que avance para o reconhecimento da independência da Palestina.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do BE, do PAN e do L, votos contra do PSD e

do CH e abstenções da IL e do PCP. Tendo sido aprovado, baixa à 2.ª Comissão. Sr.ª Deputada Susana Amador, pede a palavra para que efeito? A Sr.ª Susana Amador (PS): — Para indicar que vamos apresentar uma declaração de voto por escrito, Sr.

Presidente. O Sr. Presidente: — Está registado, Sr.ª Deputada. Segue-se a votação na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 944/XV/2.ª (L) — Contra a escalada da

guerra em Israel e na Palestina: recomendações urgentes ao Governo na defesa do cessar-fogo, ajuda humanitária e libertação de reféns.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, da IL, do PCP, do BE, do PAN e do L, votos

contra do CH e a abstenção do PSD. O projeto de resolução baixa à 2.ª Comissão. Votamos agora, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 946/XV/2.ª (PAN) — Recomenda ao Governo

que adote medidas que promovam a integração em instituições de ensino nacionais de estudantes, investigadores e docentes, provenientes de instituições de ensino superior de Israel, da Faixa de Gaza e da Cisjordânia.

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Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor da IL, do PCP, do BE, do PAN, do L e de 13 Deputados

do PS (Ana Isabel Santos, André Pinotes Batista, Carla Sousa, Eduardo Alves, Ivan Gonçalves, Jamila Madeira, Maria Begonha, Miguel dos Santos Rodrigues, Miguel Matos, Pedro Anastácio, Sobrinho Teixeira, Tiago Brandão Rodrigues e Tiago Soares Monteiro) e abstenções do PS, do PSD e do CH.

Tendo sido aprovado, baixa à 2.ª Comissão. De seguida, votamos, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 950/XV/2.ª (BE) — Recomenda ao

Governo que reconheça o Estado da Palestina. Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CH e da IL, votos a favor do PCP,

do BE, do PAN, do L e de 15 Deputados do PS (Alexandra Leitão, André Pinotes Batista, Bárbara Dias, Carla Sousa, Diogo Cunha, Diogo Leão, Eduardo Alves, Jamila Madeira, Maria Begonha, Miguel dos Santos Rodrigues, Miguel Matos, Pedro Anastácio, Susana Barroso, Tiago Brandão Rodrigues e Tiago Soares Monteiro) e abstenções de 5 Deputados do PS (Ana Isabel Santos, Ivan Gonçalves, João Paulo Rebelo, Luís Graça e Tiago Barbosa Ribeiro).

Segue-se a votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 957/XV/2.ª (PS) — Recomenda ao

Governo que encete todos os esforços diplomáticos para defender a criação do Estado da Palestina, a par da existência do Estado de Israel, lado a lado, a viver em paz e segurança, tal como previsto no Plano de Partilha das Nações Unidas de 1947.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, da IL, do BE, do PAN e do L e

abstenções do CH e do PCP. Tendo sido aprovado, baixa à 2.ª Comissão. Segue-se a votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 961/XV/2.ª (PCP) — Recomenda ao

Governo que reconheça o Estado da Palestina. Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CH e da IL, votos a favor do PCP,

do BE, do PAN, do L e de 25 Deputados do PS (Alexandra Leitão, Ana Isabel Santos, André Pinotes Batista, Bárbara Dias, Carla Sousa, Clarisse Campos, Cláudia Santos, Diogo Cunha, Eduardo Alves, Ivan Gonçalves, Jamila Madeira, Joana Sá Pereira, João Paulo Rebelo, José Carlos Barbosa, José Pedro Ferreira, Luís Graça, Maria Begonha, Miguel Costa Matos, Miguel dos Santos Rodrigues, Pedro Anastácio, Romualda Nunes Fernandes, Susana Barroso, Tiago Barbosa Ribeiro, Tiago Brandão Rodrigues e Tiago Soares Monteiro) e a abstenção da Deputada do PS Rosário Gambôa.

Vamos agora votar, na generalidade, o Projeto de Resolução n.º 964/XV/2.ª (BE) — Boicote e sanções a

Israel pelo fim do genocídio em Gaza. Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CH e da IL, votos a favor do PCP,

do BE, do PAN e do L e abstenções de 10 Deputados do PS (Ana Isabel Santos, André Pinotes Batista, Bárbara Dias, Carla Sousa, Ivan Gonçalves, Jamila Madeira, Miguel Costa Matos, Rosário Gambôa, Tiago Barbosa Ribeiro e Tiago Brandão Rodrigues).

Passamos à votação, na generalidade, do Projeto de Resolução n.º 966/XV/2.ª (PAN) — Pelo fim imediato

do conflito israelo-palestiniano e por uma paz duradoura, com a efetivação da solução dos dois Estados em conformidade com o Plano de Partilha das Nações Unidas de 1947.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, da IL, do PCP, do BE, do PAN e do L e votos

contra do PSD e do CH.

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O projeto de resolução baixa à 2.ª Comissão. Vamos votar, na generalidade, o Projeto de Lei n.º 982/XV/2.ª (PS) — Adapta as regras de determinação do

resultado fiscal, em sede de IRC. Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, da IL e do L e abstenções do PSD, do CH, do

PCP, do BE e do PAN. Procederemos à votação deste mesmo projeto de lei, na especialidade, já de seguida. Passamos agora à votação, na generalidade, do Projeto de Lei n.º 990/XV/2.ª (PSD) — Altera a Lei n.º 22-

A/2007, de 29 de junho, corrigindo a afetação das receitas do imposto único de circulação, designadamente da parte dessas receitas que por direito cabe aos municípios.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e votos a favor do PSD, do CH, da IL, do PCP,

do BE, do PAN e do L. O Sr. Deputado Hugo Carneiro pede a palavra para que efeito? O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Sr. Presidente, apenas para anunciar que apresentarei, em nome do PSD,

uma declaração de voto oral sobre esta votação que acabámos de fazer. O Sr. Presidente: — Muito bem. O que faz sentido é que a declaração de voto oral seja no fim das votações,

se o PSD não tiver objeção. De seguida, vamos votar, na generalidade, o Projeto de Lei n. 993/XV/2.ª (PAN) — Cria incentivos fiscais

para que as empresas promovam a mobilidade ciclável dos seus trabalhadores, procedendo à alteração do Código do IRC.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do PCP e votos a favor do CH, da IL,

do BE, do PAN e do L. Vamos agora proceder à votação, na especialidade, da proposta de alteração, do PS, de aditamento de um

artigo 5.º-A ao Projeto de Lei n.º 982/XV/2.ª. Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.É a seguinte:

Artigo 5.º-A Alteração à Lei n.º 22-A/2007, de 29 de junho

O artigo 3.º da Lei n.º 22-A/2007, de 29 de junho, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 3.º […]

1 — É da titularidade do município de residência do sujeito passivo ou equiparado a receita gerada pelo IUC

incidente sobre os veículos da categoria A, E, F e G, bem como 70 % da componente relativa à cilindrada incidente sobre os veículos da categoria B, salvo se essa receita for incidente sobre veículos objeto de aluguer de longa duração ou de locação operacional, caso em que deve ser afeta ao município de residência do respetivo utilizador.

2 — […].

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3 — A receita gerada pela componente do IUC relativa ao nível de emissão de dióxido de carbono incidente sobre os veículos da categoria B, bem como 30 % da componente relativa à cilindrada incidente sobre os mesmos veículos, é da titularidade:

a) […]; b) […]. 4 — […].» O Sr. Presidente: — Agora, passamos à votação, na especialidade, da proposta do PS, de substituição do

artigo 7.º do Projeto de Lei n.º 982/XV/2.ª. Segundo me informam, há um requerimento, apresentado pelo PSD, que é consensual, solicitando a votação

em separado dos dois números desta proposta de alteração. Portanto, vamos começar por votar o n.º 1. Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, da IL e do PAN e abstenções do PSD, do CH,

do PCP, do BE e do L.É o seguinte: 1 — A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeitos a 1 de janeiro de 2023,

com exceção do disposto no número seguinte. O Sr. Presidente: — Passamos à votação do n.º 2. Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CH, da IL, do PCP, do BE e do L

e a abstenção do PAN.É o seguinte: 2 — O disposto no artigo 5.º-A da presente lei entra em vigor no dia 1 de janeiro de 2024, considerando-se

prejudicadas as mesmas disposições aprovadas em momento anterior no âmbito do processo legislativo do Orçamento do Estado para 2024, independentemente da respetiva entrada em vigor.

O Sr. Presidente: — Agora, passamos à votação, também na especialidade, das restantes normas do Projeto

de Lei n.º 982/XV/2.ª. Submetidas à votação, foram aprovadas, com votos a favor do PS e da IL e abstenções do PSD, do CH, do

PCP, do BE, do PAN e do L. Procedemos, agora, à votação final global do Projeto de Lei n.º 982/XV/2.ª. Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, da IL e do L e abstenções do CH, do

PCP, do BE e do PAN. A Sr.ª Deputada Susana Amador pede a palavra para que efeito? A Sr.ª Susana Amador (PS): — Sr. Presidente, é para solicitar a dispensa de reclamação e de prazo de

redação final deste diploma. O Sr. Presidente: — Pergunto se há objeção de alguma bancada. Pausa.

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Não havendo oposição, está concedida quer a dispensa de redação final, quer a dispensa de prazo para reclamações.

Vamos escutar agora a declaração de voto oral do PSD, a cargo do Sr. Deputado Hugo Carneiro. Faça favor. O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, porque é que fazemos a nossa declaração

de voto sobre as votações a que assistimos dos Projetos de Lei n.os 982/XV/2.ª e 990/XV/2.ª? No âmbito do Orçamento do Estado, como aqui foi explicado durante o debate, o PSD e a Iniciativa Liberal

apresentaram propostas separadas para corrigir esta trapalhada do Partido Socialista que visava retirar aos municípios cerca de 40 milhões de euros relativamente à distribuição de verbas do IUC. Como é que votou o Partido Socialista? Contra. Porquê que votou contra? Porque as propostas vinham da oposição.

Na redação final, como também já foi aqui explicado, tentaram meter, de supetão, uma eliminação integral do artigo que falava sobre esta distribuição, depois de terem percebido o erro que cometeram. Ora, em redação final seria ilegal, seria uma vigarice parlamentar, se os Deputados tivessem autorizado semelhante alteração, porque estaríamos, em redação final, a contrariar a vontade do legislador que, em Plenário, tinha dito por duas vezes, expressamente, que era contra a eliminação desse artigo. Aí, em sede de redação final, apresentámos uma solução: vamos fazer um projeto de lei, e o PSD está disponível para dispensar o debate — portanto faríamos um agendamento, se fosse consensual, sem tempos — e para fazer as três votações em simultâneo. O que fez o Partido Socialista, apesar de o e-mail ter ido para todos os grupos parlamentares? Nada disso.

Ora, o PSD já tinha feito o trabalho de casa para emendar esta situação, na semana passada, com a apresentação de um projeto de lei, cujo arrastamento pedimos para este debate — uma vez que o PS alargou, para lá daquilo que estava consensualizado em Conferência de Líderes, o tema do próprio debate, incluindo neste a norma do IUC —, mas depois de termos feito este arrastamento, ainda antes da votação das propostas do PS, o que é que verificámos? O PS votou contra a proposta do PSD para corrigir esta norma do IUC, o que demonstra que o PS, usando o seu rolo compressor, vota contra tudo o que vem da oposição.

Protestos do Deputado do PCP Duarte Alves. Para terminar, Sr. Presidente, gostaria de explicar apenas porque é que nos abstivemos na transposição de

normas relativamente ao IRC, mas, depois, votámos a favor da versão final do Projeto de Lei n.º 982/XV/2.ª? Porque, para nós, era essencial a resolução do problema dos municípios e, por isso, votámos a favor desse diploma.

Aplausos do PSD. O Sr. Presidente: — Entretanto, inscreveu-se também para uma declaração de voto oral, em nome do Grupo

Parlamentar do PS, o Sr. Deputado Miguel Cabrita, que tem a palavra. O Sr. Miguel Cabrita (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o debate sobre o imposto único de

circulação foi claro e foi um debate sobre uma nova componente do IUC, em sede de Orçamento do Estado, que caiu. E caiu, aliás, por iniciativa do Grupo Parlamentar do PS.

Ora, tendo caído o objeto do debate, cairiam todas as suas componentes e, de facto, só por uma conjugação de votações isso não aconteceu.

O Sr. Pedro Pinto (CH): — Grande lata! O Sr. Miguel Cabrita (PS): — Foi isso que procurámos resolver e clarificar em sede de redação final do

Orçamento do Estado. É preciso dizer que todos os grupos parlamentares, com exceção de um, o do PPD/PSD,…

O Sr. Hugo Carneiro (PSD): — Exatamente!

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O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Trapalhada do PS! O Sr. Miguel Cabrita (PS): — … estiveram disponíveis para, nessa sede, clarificar e resolver algo que era

claro como a água para todo este Hemiciclo. No fundo, o que o PSD quis fazer, depois de não ter querido resolver onde se poderia resolver, por consenso

entre todos, esta situação, foi vir aqui hoje resolver um problema que ele próprio não deixou resolver na sede em que o poderia ter feito, criando um facto político inexistente.

Aplausos do PS. Ora, para o fazer, criou uma nova iniciativa legislativa, quando tal não era necessário. Tínhamos aqui uma

iniciativa legislativa que, sem necessidade de criar um novo processo legislativo autónomo, permitiria resolver esse problema.

Foi isso que anunciámos que íamos fazer, na Comissão, e cumprimos. Está resolvido o problema e assegurado o mais importante, que é que os municípios não serão prejudicados.

O Sr. Eurico Brilhante Dias (PS): — Muito bem! O Sr. Rodrigo Saraiva (IL): — Não, não! O Sr. Miguel Cabrita (PS): — Para concluir e defender o nosso sentido de voto, gostaria apenas de dizer

que esse argumento da maioria não colhe. Vozes do PSD e da IL: — Colhe, colhe! O Sr. Miguel Cabrita (PS): — Porque em apenas um ano e meio de Governo, pouco mais do que isso, em

apenas três Orçamentos do Estado, esta maioria aprovou mais propostas de alteração da oposição do que a maioria de direita aprovou ao longo de quatro anos de Governo.

Aplausos do PS. Por isso, não colhe, e essa será também uma marca desta maioria, a maioria de diálogo e que aprova

propostas da oposição. Aplausos do PS. O Sr. Presidente: — Entretanto, inscreveu-se para uma declaração de voto oral o Sr. Deputado João Cotrim

Figueiredo. Tem a palavra para fazê-la em nome da Iniciativa Liberal. O Sr. João Cotrim Figueiredo (IL): — Sr. Presidente, é uma declaração de voto sobre uma aprovação que

fizemos, porque também achamos que os últimos que devem ficar prejudicados com esta trapalhada são, de facto, os municípios.

Queria dizer-lhe com toda a amizade, Sr. Deputado Miguel Cabrita, que, de todas as palavras que disse, faltaram duas — não são duas, são para aí quatro —: o PS enganou-se. Houve duas votações em que se enganou. Tinha dito isso na Comissão, tinha dito isso aqui, e não passava pela vergonha de ter-lhe chamado a atenção de que faltou essa honestidade de dizer: «Enganámo-nos a votar o Orçamento, e isso deu origem a esta enorme confusão». Era só isso.

Aplausos da IL.

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O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra a Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha para prestar informações à Câmara.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, é unicamente para tomarem

conhecimento de que o nosso Colega Miguel Iglésias assistiu a esta sessão por videoconferência. O Sr. Presidente: — Assim fica encerrada a sessão. A próxima reunião plenária será amanhã à tarde, pelas 15 horas. Do primeiro ponto, consta a fixação da

ordem do dia, requerida pelo PCP, em que se discutirão, na generalidade, os Projetos de Lei n.os 964/XV/2.ª (PCP) — Repõe o princípio do tratamento mais favorável do trabalhador (vigésima alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro), 965/XV/2.ª (PCP) — Revoga o regime de caducidade da contratação coletiva, 968/XV/2.ª (PCP) — Reforça os direitos dos trabalhadores no regime de trabalho noturno e por turnos e 969/XV/2.ª (PCP) — Repõe os valores de pagamento do trabalho suplementar, para todos os trabalhadores (vigésima alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova o Código do Trabalho, e décima sétima alteração à Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que aprova a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas).

No segundo ponto, teremos votações regimentais. Muito boa noite e até amanhã. Está encerrada a sessão. Eram 18 horas e 38 minutos.

———

Declarações de voto enviadas à Mesa para publicação Nota: A declaração de voto anunciada pela Deputada do PS Susana Amador não foi entregue no prazo

previsto no n.º 4 do artigo 87.º do Regimento da Assembleia da República.

——— Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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