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II Série — Número 9
Sábado, 27 de Outubro de 1984
DIÁRIO
da Assembleia da República
III LEGISLATURA
2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)
SUMÁRIO
Acta da repnião da Comissão de Economia, Finanças e Plano de 26 de Outubro de 1984 —Proposta de lei n.° 87/111 (orçamento suplementar para 1984).
O Sr. Presidente (João Salgueiro):— Srs. Deputados, temos quórum, pelo que está aberta a reunião.
Eram 11 horas e 15 minutos.
Estavam presentes, além dos Srs. Secretários de Estado do Tesouro (António de Almeida) e do Orçamento (Alípio Dias), os seguintes Srs. Deputados:
Lista de presenças:
João Maurício Fernandes Salgueiro (PSD); Almerindo da Silva Marques (PS); Octávio Augusto Teixeira (PCP); João Carlos Dias Monteiro C. Lencastre (CDS); Américo Albino da Silva Salteiro (PS); António Domingues de Azevedo (PS); Fernando Alberto Pereira de Sousa (PS); Maria Luísa Banha Modas Daniel (PS); António José dos Santos Meira (PS); Virgílio Higino Gonçalves Pereira (PSD); Guido Orlando de Freitas Rodrigues (PSD); Manuel Maria Portugal da Fonseca (PSD); Mário Martins Adegas (PSD); José Augusto Silva Marques (PSD); Joaquim António Miranda da Silva (PCP); Maria Ilda da Costa Figueiredo (PCP); João António de Morais Leitão (CDS); Luís Eduardo da Silva Barbosa (CDS); João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE); Joaquim Jorge Magalhães Mota (ASDI).
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, dentro do que tinha sido acordado com o Governo, temos hoje connosco o Sr. Secretário de Estado do Orçamento e o Sr. Secretário de Estado do Tesouro para avançarmos no esclarecimento das questões que os senhores depu-
rados entenderem necessário ser aprofundadas em ordem à votação da proposta de lei relativa ao orçamento suplementar para 1984 — e suponho que em princípio podemos finalizar hoje.
Agradeço que os Srs. Deputados que desejem inscrever-se para formular pedidos de esclarecimento o façam desde já.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP):—Sr. Presidente, julgo que valeria a pena, até pela complexidade de que se reveste esta matéria das operações de tesourariB, que houvesse uma intervenção micial do Sr. Secretário de Estado, ainda que relativamente sucinta, a fim de dar uma explicação mínima de como se processa esta problemática das operações de tesouraria e de eventualmente avançar os valores que possua posteriores a 30 de Junho. A manterem-se dúvidas, julgo que depois poderíamos formular os respectivos pedidos de esclarecimento.
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado dp Tesouro, aceita esta sugestão?
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro (António de Almeida):—Aceito, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem então a palavra o Sr. Se-, cretário de Estado do Tesouro, a fim de produzir a referida intervenção.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: São aqui levantadas duas questões: como é que funcionam as operações de tesouraria e os montantes após Junho.
Quanto às operações de tesouraria, elas assumem basicamente dois tipos completamente distintos. As operações de tesouraria normais são aquelas em que a Secretaria de Estado do Tesouro faz adiantamentos
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aos vários departamentos do Estado por conta de verbas que estão inscritas no Orçamento, constituindo, portanto, adiantamentos de muito curto prazo, normalmente com o fim de se ultrapassarem algumas dificuldades de natureza burocrática. E utilizamos este método de dotações para empresas públicas — diria que se não em 100 % em 99 % dos casos— e quase sempre pela pressão do final do mês. Na maioria dos casos as empresas públicas têm também que utilizar essas verbas para pagamento de salários. Nós fazemos as operações de tesouraria e elas são liquidadas, 15 dias ou 1 mês depois, através do cumprimento das formalidades burocráticas.
O outro ripo de operações de tesouraria tem a ver com encargos que podemos considerar como activos do Estado. Aqui funcionamos um pouco como se fôssemos um banco. Da mesma maneira que os bancos emprestam dinheiro e depois têm uma expectativa de poderem vir a receber esse dinheiro em exercícios futuros, também o Estado, relativamente a alguns departamentos e a algumas empresas públicas, faz adiantamentos por conta de verbas que não estão inscritas no Orçamento numa perspectiva de banco e não de orçamento, com uma probabilidade de poder vir a receber esse dinheiro no futuro.
Estas operações ganharam uma grande dimensão no ano de 1984 no que se refere à dívida externa das empresas públicas e continuaram a assumir uma grande dimensão no que respeita à dívida de Cabora Bassa. O caso típico é o de Cabora Bassa: há uma dívida externa elevada e, desde há vários anos a esta parte, o Governo faz o pagamento sempre que essas prestações se vão vencendo e converte esses pagamentos em empréstimos a Cabora Bassa, na expectativa de que seja possível retomar o fluxo normal de abastecimento de energia e, portanto, de o Estado poder ressarcir-se desses montantes.
Também se poderia adoptar como metedologia incluir-se logo essa verba no Orçamento, considerando-a como uma verba a fundo perdido, mas entendemos que isso seria agravar o défice do Orçamento, talvez de forma desajustada, uma vez que há de facto uma expectativa de poder receber esses montantes.
No que se refere às empresas públicas, fazemos dois tipos de adiantamentos. O Estado faz adiantamentos a empresas que estão a funcionar com relativa normalidade, actuando aí como banqueiro, no bom sentido, e, portanto, tendo a expectativa de que, através de uma reestruturação, de uma consolidação de dívida ou de uma melhoria das condições de exploração das empresas, seja possível recuperar esse dinheiro num futuro mais ou menos próximo. Quando o Estado faz operações de tesouraria para pagar o endividamento externo da QUIMIGAL ou da TAP, que são empresas que estão a funcionar com dificuldade, mas em condições de normalidade no que se refere à exploração, ficamos constituídos na expectativa de que o Estado possa vir a recuperar esses montantes a prazo mais ou menos longo.
Fazemos também operações de tesouraria a empresas que estão em grande dificuldade e em que a probabilidade de recuperação desses montantes é de facto muito baixa. Estou a referir-me nomeadamente às operações de tesouraria que têm sido feitas nestes últimos anos, mas, de forma muito significativa, em 1984, às companhias de navegação — a CTM e a CNN. É evidente que, sendo já do conhecimento público a intenção de
o Governo fazer desaparecer essas duas empresas, há uma forte probabilidade de que essas verbas se transformem em prejuízo para o Estado. Era todo o caso, entendemos que também aqui deveremos actuar da mesma forma que actuam os bancos, ou seja, só deveremos considerar como prejuízo depois de decíarada a falência ou feita a extinção dessas empresas. Pensamos que não faria sentido o Estado estar ;'á z considerar um prejuízo e, portanto, não poder utilizar os mesmos direitos que têm os outros credores de se poderem ressarcir através da massa falida.
Relativamente a operações de tesouraria, diria que desde Junho até agora têm sido estas basicamente as operações que temos realizado. Foram feitas operações de tesouraria às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira. Quanto aos Açores, fez-se uma operação de tesouraria por conta do donativo dos Americanos, que já foi regularizada. Relativamente à Madeira, fizeram-se algumas operações de tesouraria por conta do empréstimo obrigacionista, que foi também colocado e liquidado.
Poderei dizer que de Junho até hoje tem havido um rigor absoluto nesta matéria e que não temos feito operações de tesouraria de outro tipo. Garanto que não há mais operações de tesouraria ao Sporting Clube de Portugal como se fizeram no passado nem mais operações de tesouraria à SALVOR ou à TORRALTA ou a outro tipo de empresas. De Junho de 1983 até hoje as operações de tesouraria realizadas pelo Ministério das Finanças e do Plano, nomeadamente pela Secretaria de Estado do Tesouro, são, única e exclusivamente, ou adiantamentos de verbas que estão no Orçamento ou a liquidação de compromissos externes de empresas públicas ou do Estado, uma vez que o Estado não tem outra alternativa que não seja a de honrar esses compromissos.
Também tenho que referir aqui que alguns compromissos de empresas públicas que não têm o aval do Estado têm sido liquidados através de operações de tesouraria. E temo-lo feito por dois motivos: por um lado, porque, como é do conhecimento dos senhores deputados, os contratos de empréstimos externos feitos à República contêm cláusulas de que se uma empresa pública falhar a liquidação de um desses compromissos na ordem externa toda a dívida externa é considerada vencida e, portanto, sempre que uma situação dessas se depara a Secretaria de Estado do Tesouro imediatamente procede à sua liquidação; por outro lado, porque às vezes se nos deparam situações deveras caricatas, que põem em perigo o próprio prestígio e o bom nome do País — e entendemos que não temos alternativa senão a de fazermos as operações. Quando a Secretaria de Estado do Tesouro recebe um telex ao fim do dia a dizer que o navio Funchal está retido en Gibraltar com turistas a bordo, porque a CTM tem uma dívida aos Cubanos e o navio está arrestado, entendemos que não há outra alternativa, em nome oo bom nome do País, que não seja a de proceder imediatamente à liquidação para que o navio possa continuar a navegar e a funcionar em condições.
Portanto, em termos de operações de tesouraria, penso que caracterizei a situação.
Relativamente aos números, a partir de Junho temo--los. Aliás, às vezes os arquivos desaparecem — por exemplo, fui descobrir no Ministério das Finanças e do Plano que o arquivo da Secretaria de Estado do Tesouro rinha sido parcialmente comido pelos rates. Fe-
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lizmente, o arquivo referente às operações de tesouraria não desapareceu: temos os registos de todas as operações de tesouraria feitas num passado recente e, portanto, não é muito difícil reconstituirmos, operação por operação, essas operações. É extremamente fácil fazer este levantamento, pelo que, se for de interesse dos Srs. Deputados, poderemos fazê-lo.
No tocante aos números a partir de Junho, infelizmente os mapas que me deram estão organizados por anos e não por meses, pelo que tenho muita dificuldade ...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP):—Sr. Secretário de Estado do Tesouro, pedi a número a partir de Junho, mas pode ser o acumulado. O elemento de que dispomos dá-nos os valores até 30 de Junho, mas admito que tenha valores posteriores. Não pretendo propriamente aqueles que tenham sido realizados efectivamente entre junho e dada altura, mas sim o acumulado.
O Orador: — Sr. Deputado Octávio Teixeira, temos aqui os números reportados a 30 de Setembro e, portanto, podemos facultá-los e actualizar os elementos. Fizemos uma estimativa que, em nossa opinião, é muito prudente. A estimativa dos 37 milhões de contos tem uma margem de segurança bastante grande: tínhamos uma verba global de 80 milhões de contos autorizada pela Assembleia da República e tínhamos utilizado aproximadamente 30 milhões de contos, pelo que temos um saldo de 50 milhões de contos.
Esta verba de 37 milhões de contos tem uma certa margem de segurança, mas, com o tipo de informação de que dispomos no Ministério das Finanças e do Plano, é muito difícil fazer neste momento, apesar de estarmos no final do ano, uma estimativa dos montantes que vão ser necessários, porque tentámos obter com bastante antecedência junto das empresas públicas a informação relativamente aos compromissos externos que elas consideravam que poderiam liquidar sem recurso ao sistema bancário ou à Secretaria de Estado do Tesouro. Esse tipo de informação não nos tem sido fornecido por uma razão simples: é que as empresas públicas tentam primeiro renegociar esta dívida externa e em segundo lugar obter crédito junto do sistema bancário. Normalmente só depois, quando estas duas vias falham, é que recorrem à Secretaria de Estado do Tesouro — e recorrem ou no dia anterior ao vencimento, ou no próprio dia do vencimento, ou, quando os pagamentos têm de ser feitos, por exemplo, nos Estados Unidos, e há diferença de fuso horário, às vezes recorrem muito em cima da hora, a contarem com essa possibilidade da diferença de fuso.
Portanto, não tivemos possibilidade de ter esta estimativa. Partimos do princípio de que as dívidas de algumas empresas, nomeadamente a CNN, a CNP, a TAP, a EPSI e a BRISA, não seriam liquidadas, de que estas empresas não teriam possibilidade de fazer £ üquidação dos encargos que têm na ordem externa, que totalizam cerca de 27 milhões de contos. Por isso, utilizámos uma margem de segurança de 37 milhões de contos.
A nossa ideia é a de que, se de facto tivermos de pagar compromissos na ordem externa, utilizaremos esta faculdade que eventualmente venha a ser concedida ao Governo; se não tivermos de fazer pagamentos na ordem externa, ou porque as empresas têm possibilidade de recorrer ao crédito externo ou porque têm possibilidade de recorrer ao crédito interno, não utilizaremos naturalmente esta margem dos 37 milhões de contos. >
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado do Tesouro, quero agradecer-lhe a sua intervenção e felicitá-lo porque fez um resumo bastante rigoroso da situação em poucas palavras. Suponho que é do interesse do País e desta Comissão que se esclareça esta realidade, porque é das realidades mais fluidas que temos na prática orçamental portuguesa.
Designadamente, o Sr. Secretário de Estado do Tesouro falou em três tipos de operações. As primeiras — as de muito curto prazo — não levantam problemas, porque, de acordo com a lei, são regularizadas até final do ano. As outras duas é que podem levantar problemas, pelo que conviria fazermos uma destrinça.
Como o Sr. Secretário de Estado muito bem referiu, uma situação é a dos empréstimos em que há uma probabilidade significativa de virem a ser cobrados. O segundo tipo de empréstimos, em que essa probabilidade é muito pequena, devia ter uma tradução orçamental, como se tem vindo a fazer, regularizando as situações à medida que a probabilidade passa a baixo daquilo que é aceitável como crédito.
Diz-nos o Sr. Secretário de Estado que isto é uma estimativa até ao final do ano de situações em que as empresas podem vir a ter de recorrer à Secretaria de Estado do Tesouro para solverem os seus compromissos na ordem externa. Penso que deveríamos também aprofundar um pouco este problema, porque isto é uma via difusa de se misturar a realidade das empresas públicas com a do Estado. Naturalmente que o Estado tem responsabilidades em relação às empresas públicas, mas deve tê-las de uma forma clara, e não por esta via das dificuldades de solvência que as empresas vão apresentando.
Mas não queria estar a antecipar pedidos de esclarecimento, pelo que só o farei, se entretanto ficar com alguma dúvida, depois de os senhores deputados estarem esclarecidos.
Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP):—Sr. Secretário de Estado do Tesouro, quero formular-lhe alguns pedidos de esclarecimento decorrentes da sua intervenção.
O primeiro relaciona-se com a informação que temos neste momento sobre as operações realizadas até 30 de Junho. Os desembolsos já efectuados e outras operações ainda não desembolsadas mas já contratadas dão-nos um valor de 29,7 milhões de contos, portanto um número redondo de 30 milhões de contos, e aparece-nos agora, na revisão orçamental, o pedido de 37 milhões de contos. Pergunto-lhe se estou a pensar bem quando considero que estes 29,7 milhões de contos fazem parte da cobertura que é solicitada agora, no valor de 37 milhões de contos, ou se são para ser cobertos com este valor de 37 milhões de contos.
A segunda pergunta, directamente relacionada com esta, é a de saber se, perante as estimativas do Go-
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verno, os 7 milhões de contos que vão destes 30 milhões para os 37 milhões darão efectivamente para a cobertura de novas operações na segunda metade do ano, entre 30 de Junho e 31 de Dezembro.
A terceira questão, relacionada ainda com este valor, é a de saber se isso significa que só agora vão ser regularizadas as operações contratadas até 31 de Dezembro de 1983, que neste momento têm o valor de 23,6 milhões de contos, em termos de cobertura financeira autorizada pela Assembleia.
Aliás, julgo que a maior parte dessas operações foram realizadas ainda antes de o actual Governo ter entrado em funções, mas julgo que neste momento esse é um problema de somenos importância. Interrogo, portanto, o Sr. Secretário de Estado sobre se estes 23,6 milhões de contos referentes a operações contratadas até 31 de Dezembro de 1983 significam que a regularização só vai ser feita agora.
A questão seguinte vem a talhe de foice, porque foi referida pelo Sr. Secretário dé Estado. Já agora, colocaria a pergunta ou ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro ou ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento. Falou-se nas operações de tesouraria realizadas com a Região Autónoma dos Açores por conta de donativos dos Estados Unidos da América. A questão que coloco —não sei qual dos Srs. Secretários de Estado me poderá responder— é a seguinte: quanto a estes donativos dos Estados Unidos e a toda a problemática relacionada com a matéria financeira do Acordo da Base das Lajes, tal como eventualmente ao Acordo da Base de Beja, onde é que aparecem estas receitas em termos orçamentais?
Passando a uma outra questão, o Sr. Secretário de Estado referiu que há cláusulas em alguns empréstimos do Ministério a empresas públicas segundo as quais o não cumprimento de uma prestação implica o vencimento de toda a dívida externa. A minha dúvida é esta: quando o Sr. Secretário de Estado se referiu a toda a dívida externa, pretendeu referir-se à dívida externa da empresa ou à dívida externa do País?
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias): — Do País!
O Orador:—Para finalizar, pelo menos para já, coloco-lhe outra questão, que está muito relacionada com a minha primeira questão. A determinada altura, o Sr. Secretário de Estado referiu que estas operações, designadamente em relação às empresas públicas, para solver os compromissos na ordem externa, se verificaram principalmente em 1984. Ora, se o meu raciocínio inicial está correcto —admito que esteja errado—, na medida em que dos 37 milhões previstos 23,6 milhões de contos são de 1983, parece-me qüe o essencial destas operações de tesouraria, pelo menos até este momento, se verificou em 1983, e não em 1984. Isto relaciona-se, ao fim e ao cabo, com a primeira questão que lhe coloquei de saber se estas verbas estão ou não incluídas nos 37 milhões de contos.
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado do Tesouro, deseja responder à medida que lhe forem formulados os pedidos de esclarecimento ou pretende responder após todos eles terem sido formulados, caso haja mais?
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: — Respondo já, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Nesse caso, tem V. Ex." a palavra, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: — Sr. Deputado Octávio Teixeira, os 37 milhões de contos que pedimos são a adicionar e, portanto, não incluem os 27 milhões de contos. São operações que, segundo julgamos, terão de ser efectuadas até ao final do corrente ano.
Quero também dizer que as operações de tesouraria são sempre regularizadas no final do ano, porque ou são regularizadas através do Orçamento ou através da transformação em empréstimos. Portanto, não há operações de tesouraria que, pelo menos formalmente, transitem para os exercícios seguintes sem estarem regularizadas.
O problema que se levanta refere-se às operações de tesouraria que são regularizadas através de empréstimos. E aí funcionam como os empréstimos bancários: ao ser assinado um contrato de empréstimo, a utilização dessas verbas é feita segundo determinado calendário de utilização, ê perfeitamente possível regularizar uma situação em termos de empréstimo no exercício e a utilização dos montantes ser feita posteriormente.
Já lhe respondi que, de facto, as cláusulas dos contratos externos são nesse sentido. Quer dizer, se uma empresa pública não honrar um compromisso na ordem externa, vence-se toda a dívida da República e, portanto, faz com que não haja alternativa neste momento que não seja a de se honrarem pontualmente os compromissos assumidos por empresas públicas na ordem externa, ou através da renegociação ou negociação de uma dívida externa, ou através de uma operação de crédito bancário, ou ainda através de uma operação da Secretaria de Estado do Tesouro.
Quanto à questão das verbas dos Açores, elas são receitas das regiões autónomas, pelo que não entram no Orçamento.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP):— Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP):—Tem toda a razão, Sr. Secretário de Estado, as verbas dos Açores entrarão no orçamento dos Açores. Simplesmente, estou a recordar-me — pelo menos pelo que li nos jornais — que no último acordo estabelecido sobre a Base das Lajes há uma verba para o Governo Regional dos Açores e outra para o Governo da República. Não tenho os números bem presentes, mas sei que era qualquer coisa como 40 milhões de dólares para um lado e 60 milhões de dólares para o outro. Portanto, o que me estava a referir era a essa parte que é pertença do Governo da República.
O Orador: — Não, as operações de tesouraria que fazemos é por conta da verba que não é pertença do Governo da República.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —
Essa unidade a que se refere são empréstimos que são
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feitos para as Forças Armadas. Depois o que hé, isso sim, são donativos, isto é, há uma verba que realmente é citada, mas que não se chega a traduzir em numerário. O que entram são equipamentos, tais como tanques, aviões, etc. Portanto, não se trata propriamente de uma verba.
Penso que, quanto a esta questão, o Sr. Deputado Octávio Teixeira tem razão, e nós próprios temos discutido esta matéria e achamos que tudo isto deve, realmente, ser reflectido no Orçamento sob a forma de donativo. Quer dizer, teremos que enveredar por essa política; portanto, julgo que o senhor deputado está a levantar a questão correctamente.
Como sabe, o orçamento das Forças Armadas só praticamente há um ano a esta parte é que começou a ser trabalhado em novos moldes e até aqui escapava bastante ao Ministério das Finanças e do Plano (o que não quer dizer que agora esteja já totalmente sob controle). Mas, enfim, temos vindo a trabalhar nessa via — e julgo que esta proposta vai, de algum modc. ao encontro das suas preocupações— de também reflectir os donativos no Orçamento do Estado. E isto porque, inclusivamente para a compra de equipamento militar, teríamos um activo, que seriam os equipamentos militares, e teríamos depois duas origens, pois há empréstimos externos e há donativos. Portanto, penso que, de facto, isso deve passar a ser reflectido no Orçamento.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): — Sr. Secretário de Estado, são tradicionais, pelo menos na história financeira portuguesa, algumas implicações entre o Tesouro e o Orçamento e transposições que acabam por se traduzir, ao fim e ao cabo, numa dificuldade parlamentar de controle da realidade orçamental.
Gostaria de conhecer melhor algumas operações de tesouraria efectuadas e penso que será de interesse para a Comissão de Economia, Finanças e Plano conhecer concretamente uma operação de tesouraria realizada pelo Estado Português a favor de um clube desportivo, concretamente o Sporting. Gostaria, efectivamente, de conhecer essa operação, as razões que a determinaram, as suas implicações e as suas motivações. Aliás, também gostaria de saber se há mais operações com outros clubes desportivos que envolvam o Estado Português.
Por outro lado, gostaria de conhecer o montante dos títulos que serão entregues no final do ano ao Banco de Portugal, pois penso que este número também nos interessa.
Gostaria ainda de saber se é a Secretaria de Estado do Tesouro que acompanha os vários acordos de saneamento financeiro celebrados com algumas empresas públicas e qual o tipo de controle que é adoptado para traficar a execução desses acordos.
Há, concretamente, um acordo de saneamento financeiro, de que todos nós temos conhecimento, que é extremamente elástico. Refiro-me, por exemplo, ao acordo de saneamento financeiro que os vários governos têm utilizado com a Radiotelevisão Portuguesa, que funciona, alternadamente, como um processo de oferecer facilidades à RTP, a qual possivelmente paga depois essas facilidades em tempo de antena, ou como um modo de apertar a Radiotelevisão Portuguesa
quando alguma das suas actividades se torna mais incómoda. Será que existe essa mesma elasticidade em relação a outros acordos de saneamento financeiro? Ê possível que na Radiotelevisão Portuguesa um gestor, como, por exemplo, o Dr. Proença de Carvalho, utilize toda a verba do acordo de saneamento financeiro, por exemplo, para realização de novos investimentos (alguns dos quais já contratados para finalidades inteiramente diversas), sem que ninguém lhe vá à mão e sem que tenha qualquer espécie de tradução, embora no caso concreto se tenha traduzido em 3 milhões de contos utilizados de outra maneira que não aquela que estava prevista no acordo de saneamento económico e financeiro?
Por outro lado, uma vez que são conhecidas as consequências que a falta de pagamento de obrigações externas contraídas por empresas públicas gera para o Estado Português, gostaria de conhecer exactamente a situação de dívida para com o exterior das várias empresas públicas. Pensamos que este dado interessa ser conhecido pela Assembleia da República e, portanto, pediria ao Sr. Secretário de Estado que no-lo facultasse, se possível, através de um mapa, donde constem também as datas em que se vencem as próximas obrigações, o que tornaria esse conhecimento ainda mais útil.
Ainda a propósito da questão das operações de tesouraria relacionadas com despesas militares, creio que todos estaremos de acordo em apoiar a ideia do Sr. Secretário de Estado do Orçamento de que toda essa matéria deve revestir-se da maior transparência e ter reflexos orçamentais, mesmo em termos de donativos. Contudo, gostaria de chamar a atenção para o facto de que há donativos simples e donativos que têm algumas obrigações, os quais se repercutem depois na actividade do Estado Português. Refiro-me, por exemplo, à necessidade de as reparações em equipamento oferecido — por exemplo, material de guerra — serem efectuadas no país que o oferece. Ê o caso dos aviões oferecidos à Força Aérea Portuguesa, que são obrigatoriamente reparados nos Estados Unidos, ainda que as Oficinas Gerais de Material Aeronáutico, de Alverca, estejam apetrechadas para fazer essas reparações e sejam tecnicamente consideradas unidades particularmente bem cotadas, mesmo em termos mundiais. Ora, esta necessidade de as reparações serem feitas no estrangeiro traduz-se num dispêndio muito grande de divisas.
Mas, se isto acontece em relação aos donativos, no que diz respeito aos empréstimos, parece-me evidente que estes têm de ter uma repercussão e uma tradução em termos orçamentais, uma vez que têm de ser pagos.
A última questão que queria colocar diz respeito à moratória concedida ao Govemo Regional da Madeira.
Acontece que essa moratória foi negociada entre o governo central e o Governo Regional, mas não foi sequer transmitida à Assembleia da República nem colhido o seu parecer. Em termos concretos, ela traduziu-se, portanto, numa negociação directa entre o govemo central e o Governo Regional, embora as suas aplicações tenham sido depois traduzidas ao nível da banca nacionalizada.
A este respeito, gostaria de saber quais as consequências a médio e a longo prazo dessa moratória para a situação geral do País, uma vez que já vimos que
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há uma implicação muito directa entre a situação devedora das empresas públicas e a do próprio Estado, não tendo, nalguns casos, esta situação imbricada uma tradução directa ao nível do nosso controle.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, embora não queira influir demasiado na orientação dos nossos trabalhos, tenho a impressão de que o Sr. Deputado Magalhães Mota levantou aqui problemas de vária ordem, alguns dos quais são muito mais profundos, nomeadamente sobre a situação das empresas públicas, que extravasam bastante o problema das relações das empresas com o Estado. Penso, portanto, que talvez outros membros do Governo devessem estar presentes, uma vez que as responsabilidades das empresas públicas não são inteiramente controladas por via do Secretário de Estado do Tesouro.
Em todo o caso, julgo que poderemos avançar nesta matéria, pelo que dou de imediato a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro para responder.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: — Srs. Deputados, efectivamente, terei dificuldade em responder sobre algumas das matérias que aqui foram abordadas, dado que não trouxe elementos comigo. Relativamente a outras questões que não são da área da Secretaria de Estado do Tesouro, procurarei esclarecer, ponto a ponto, aquilo que me for possível.
A primeira pergunta que me foi feita era no sentido de saber se apenas houve operações de tesouraria relativamente ao Sporting, e devo dizer que o facto de a capa deste meu dossier ser verde não tem nada a ver com a questão.
Trata-se de uma operação que foi feita em 1980 num montante de 1700 contos e que ainda está em aberto. Não conheço em pormenor qual foi a motivação que levou a que em 1980 se fizessem operações de tesouraria com o Sporting Club de Portugal, mas terei possibilidade de, através dos arquivos do Ministério, procurar algum dado que permita obter essa informação. Devo dizer, aliás, que também tive a mesma curiosidade em saber se, para além do Sporting, o Benfica ou o Porto teriam tido também alguma operação de tesouraria. Mas penso que não, penso que foi apenas o Sporting e mais nenhum clube.
Quanto à segunda pergunta, relativa aos títulos do Banco de Portugal, não a percebi bem, pelo que peço ao Sr. Deputado Magalhães Mota o favor de a repetir.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI):—A pergunta era no sentido de me indicar qual o montante aproximado que se estima poder ser entregue ao Banco de Portugal no final do ano. Ê que o Banco de Portuga! tem-se queixado em diversos relatórios de que recebe da parte do Tesouro, por volta do dia 15 de Dezembro ou mesmo mais tarde, uma grande remessa de títulos do Tesouro. Portanto, gostaria de saber qual será o montante estimado para este ano.
O Orador: — Sr. Deputado, se bem percebi a sua pergunta, apenas lhe posso dizer que o montante estimado vai estar muito dependente da verija dos 37 milhões de contos. Quer dizer, só muito no final do ano é que teremos uma ideia precisa do montante de apoio que o Banco de Portugal terá de facultar ao Tesouro. Se a CNP e a TAP conseguirem renego-
ciar alguns dos encargos que têm na ordem externa,, então r.ão teremos de fazer operações de tesouraria e, portanto, não teremos necessidade de recorrer ao apoio do Banco de Portugal. Assim, o montante de títulos da dívida pública a entregar ao Banco de Portugal será substancialmente diverso.
De facto, o Banco de Portugal queixa-se err. virtude de a entrega dos títulos só ser feita muito no final do ano, mas penso que ainda nenhunt governo que tenha passado pelo Ministério das Finanças conseguiu resolver esse problema. Também este &no nêo íeremos possibilidade de alterar esse método.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): — Portanto, era princípio, essa entrega de títulos está dependente do comportamento das empresas públicas, no que diz respeito às suas relações exteriores, e da necessidade ou não de cobrir, através de operações de tesouraria, a falta de cumprimento...
O Orador: — Repare, se as empresas públicas conseguirem renegociar a dívida que têm com o exterior ou se conseguirem crédito bancário não teréb ce recorrer ao Tesouro. Se lhes falharem essas duas vias, uma vez que esses compromissos têm de ser liquidados, teremos de fazer operações de tesouraria. For-tanto, é uma verba que, praticamente, só no fina! dc ano é que se poderá ...
C Sr. Magalhães Mota (ASDI): — Mas essa verba oscilará entre que valores? Isto é, qual poderá ser o valor máximo?
O Orador: — Bom, há aqui outro elemento importante que gostaria de referir: é que este ripo de operações de apoio às empresas públicas também pede ser efectuado sem ser através de operações de tesouraria. Por exemplo, à semelhança do que aconteceu no ano passado — e penso que em exercícios anteriores— relativamente a determinadas empresas públicas, poderemos recorrer à utilização do aval do Estado para montar algumas operações de crédito para essas empresas. Assim, se enveredarmos para uma solução deste tipo, não precisaremos de agravar o endividamento junto do Banco de Portugal, e, portanto, o montante de títulos será inferior.
Na realidade, neste momento tenho muita dificuldade de, em relação a estes 37 milhões de contos, poder dizer se vamos utilizar 30 ou 25 ou se vamos ficar nos 35 milhões de contos. É um volante de segurança que temos necessidade de ter no Tesouro para evitar situações do tipo de se vencerem compromissos na ordem externa e não termos um instrumento para podermos actuar, ficando, portanto, o País nunca situação de grande dificuldade.
Quanto aos acordos de saneamento financeiro dts empresas públicas, devo dizer que desde 1980 que o controle dessa área não está no Tesouro. Esteve ao Planeamento desde 1980, passou para as Finanças em 2983 e há cerca de 2 ou 3 meses passou novameets para o Planeamento. Portanto, todo o acompsnha-mertto das empresas públicas, no que diz respeito eos acordes de saneamento financeiro, tem sido efectuado pelo Planeamento. O Tesouro ficou responsável pelo acompanhamento das empresas privadas, c, portanto, não tenho informações relativamente a essa mataria.
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Quanto à elasticidade da RTP, o que posso dizer--lhe é que desde Junho de 1983 não tem havido operações de tesouraria à Radiotelevisão Portuguesa que permitam determinado tipo de desvios em relação aquilo que estava fixado nos acordos de saneamento. Porém, isto não significa que não seja possível através áa utilização de verbas de dotações de capital conseguir esse mesmo objectivo. Mas o facto é que isso não é controlado pelo Tesouro.
Relativamente à situação de dívida das empresas públicas com o exterior, não temos dificuldade nenhuma em preparar esse mapa que o Sr. Deputado me pede, e, inclusivamente, vou pedir ao Banco de Portugal que me envie os dados, que julgo estarem já informatizados. Portanto, esses elementos poderão ser rapidamente facultados à Assembleia da República, incluindo as prestações que vencem durante o ano de 1985.
No que diz respeito ao problema da moratória da dívida do Governo Regional da Madeira, gostaria de esclarecer o seguinte: que seja do meu conhecimento — e eu estive em reuniões onde este assunto foi tratado, e não sei se foram feitas outras—, não há nenhum acordo entre o Governo da República e o Governo de Região Autónoma da Madeira relativamente à reestruturação da dívida da Região Autónoma da Madeira. A situação que se nos depara neste momento é a de que, por força de empréstimos obrigacionistas que começaram a ter um grande empolamento, que se iniciaram em 1980-1981 e que se arrastaram até finais de 1983, empréstimos esses que têm todos o aval do Estado, a situação é a de que, dizia, a Região Autónoma da Madeira chegou a um nível de endividamento que é completamente incomportável e a Madeira não tem hipótese nenhuma, com o volume de receitas do seu orçamento, de satisfazer o serviço da dívida, nem sequer o serviço dos juros desse empréstimo.
O problema que se levanta, e isso, sim, foi debatido,.é que, se nós utilizarmos aquilo que seria normal e ortodoxo em relações deste tipo — na data do vencimento do empréstimo obrigacionista o Governo da Região Autónoma da Madeira não o liquidou e há já algumas prestações vencidas ...—, os bancos que fizeram esse apoio têm total legitimidade de exigir do avalista, que é o Estado, o pagamento desses montantes. Portanto, o Estado depois teria, pela via que julgasse mais adequada, de ressarcir-se perante o Governo da Região Autónoma da Madeira.
O que foi considerado mais adequado pelo Ministério das Finanças e do Plano (mas não é nenhuma decisão) foi que seria preferível fazer-se uma renegociação entre o Governo da Região Autónoma e os bancos, mantendo-se o aval do Estado. Portanto, a nossa ideia é a de que, em vez de exigirmos ao Governo da Repúbica a liquidação imediata aos bancos de alguns milhões de contos, agravando a liquidez dos bancos — que não é o problema do sistema bancário neste momento—, será preferível o Governo da Madeira e os bancos fazerem uma reestruturação dessa dívida, mantendo-se o aval do Estado, em condições que façam prever uma certa possibilidade de o Governo da Madeira poder satisfazer esses encargos.
Devo dizer também que, mediante as contas que nós fizemos, mesmo com uma liquidação da dívida a bastante longo prazo e com a manutenção da taxa de
juro actualmente prevista nos empréstimos, o total da dívida, que ascende agora a cerca de 19 ou 20 milhões de contos, ao fim de 15 anos subirá para qualquer coisa como 120 ou 130 milhões de contos, o que faz prever, com a taxa de crescimento das receitas da Madeira a manter-se, uma total impossibilidade de satisfação desta dívida.
Portanto, a renegociação entre o sistema bancário e o Governo Regional da Madeira tem de ser assistida, em minha opinião, pelo Ministério da Finanças e do Plano, no sentido de se encontrarem soluções de curto prazo e condições que evitem que o Estado tenha de substituir-se à Região Autónoma da Madeira, porque sempre o terá de fazer se os banccs exigirem o que o Estado no aval prestou.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): — Ó Sr. Secretário de Estado, julgo que é fatal que o Estado tenha de substituir-se à Região Autónoma da Madeira; parece-me é que isso terá de ser programado e terá de ser submetido à Assembleia da República, o que terá necessariamente repercussões.
Agora, o que gostaria de saber é que medidas de acompanhamento foram já introduzidas para que o Governo Regional da Madeira não continue a endividar-se, e não continue a endividar-se ainda por cima criticando indevidamente o Estado Português, o que é curioso e revela a impunidade com que algumas práticas políticas se podem processar em Portugal. Mas, concretamente, gostaria de saber que medidas de acompanhamento têm sido tomadas e que tipo de intervenções serão possíveis para que esta situação, pelo menos, se não agrave, visto que a gravidade dela e as suas repercussões já as conhecemos.
O Orador: — Bom, o Governo da Região Autónoma da Madeira só tem, quanto a mim, 3 vias de agravar o seu endividamento: recorrendo ao sistema bancário português, recorrendo ao crédito externo ou adjudicando obras sem ter cobertura, portanto agravando o seu endividamento junto dos empreiteiros.
Não creio que o sistemo bancário português esteja a fazer algum tipo de apoio sem o aval do Estado. Aliás, não há nenhuma operação de apoio ao Governo Regional da Madeira do actual governo; mesmo o último empréstimo obrigacionista de 3 milhões de contos, que lhe foi concretizado na vigência deste governo, foi autorizado aqui pelo meu vizinho da esquerda, o Dr. João Salgueiro, numa portaria publicada em 20 de Junho de 1983 no Diário da República. Portanto, nós não demos nenhum apoio, não há nenhum pedido de novos avales para crédito à Região Autónoma da Madeira, pelo que, a menos que o sistema bancário esteja a fazer apoio sem o aval do Estado, isso não é possível.
Relativamente ao crédito externo, não creio que os bancos estejam a dar apoio ao Governo Regional da Madeira.
Há uma terceira hipótese, que é a de um endividamento junto de fornecedores, nomeadamente junto de empreiteiros. Aí a situação escapa completamente ao Tesouro, e, sinceramente, não sou capaz de responder. No entanto, admito, e admito com forte probabilidade de certeza, que nenhum acompanhamento está a ser feito e admito ainda como possível que dentro de algum prazo os empreiteiros acabem por exercer pres-
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são junto do Governo, dada a sua situação financeira degradada, dados os créditos que têm relativamente à Região Autónoma da Madeira; daí a necessidade de se montar uma operação de crédito para satisfazer esses compromissos. Não excluo essa possibilidade, porque ela é bastante realista.
O Sr. Presidente: —Uma vez que o Sr. Secretário de Estado me citou, gostava de acrescentar que esse problema devia ser realmente equacionado na medida em que os Srs. Deputados o entenderem. No entanto, é preciso vermos os mecanismos que foram adoptados, porque uma grande parte do serviço da dívida foi suportado pela própria dívida. Recentemente suponho que se adoptou outro esquema, que é o de a negociação se fazer marginalmente. No entanto, uma vez que não está agora em análise esse problema, iríamos continuar a responder às perguntas.
Se o Sr. Deputado Octávio Teixeira quer formular alguma questão, tem a palavra.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de de Estado, gostaria ainda de lhe colocar mais algumas questões, relacionando-se a primeira ainda com o problema dos 29,7 milhões de contos que foram desembolsados até 30 de Junho de 1984.
A minha dúvida prende-se com o facto de, se não me falha a memória, ser a primeira vez que se pede — e bem— autorização à Assembleia para a cobertura financeira necessária a estas operações de tesouraria.
Neste momento, na proposta de revisão do Orçamento, solicita-se essa cobertura financeira no valor de 37 milhões de contos, e, como o Sr. Secretário de Estado teve a oportunidade de esclarecer, é uma verba relacionada com operações que se prevê, em princípio, serem, realizadas até ao final do ano.
A minha questão é esta: como é que se vai fazer a cobertura financeira dos outros 29,7 milhões de contos, na medida em que não é solicitada essa cobertura na revisão orçamental? Mesmo que até ao final do ano algumas delas desapareçam —até ao final do ano. como o Sr. Secretário de Estado do Tesouro referiu, em princípio, todas elas desaparecerão, transformar-se-ão em empréstimos, serão pagas, etc.—, onde é que o Estado tem possibilidade de ir buscar esse dinheiro, na medida em que não tem autorização da Assembleia?
Uma outra questão relaciona-se com dois fundos e eu solicitava-lhe algumas informações, na medida em que há aqui uma curta margem de fluidez entre a tutela directa do Banco de Portugal, entre a Secretaria de Estado do Tesouro e o Ministro directamente. A pergunta é relativa ao problema do Fundo de Garantia de Riscos Cambiais e ao Fundo de Compensação: é que, se houver algumas informações que o Sr. Secretário de Estado possa avançar, designadamente quanto à evolução recente de ambos, agradeço-lhe que o faça.
Mais do que isso, existe ainda o problema dos relatórios destes Fundos e dos orçamentos. Com efeito, tenho tentado procurar em tudo o que é livro, estatística, etc, e, para além de uma referência muito pequena que vem sempre nos relatórios do Banco de Portugal acerca destes Fundos, não consigo descobrir nada. E tem interesse, nomeadamente para os últimos 2 ou 3 anos, termos a possibilidade de analisar tais
elementos. Não é que esteja em discussão agora na revisão do Orçamento, mas para o Orçamento de 1985 julgo que se vai pôr a questão de analisarmos muito aprofundadamente a situação de todos os fundos que existem ao nível do Estado.
Gostaria ainda de colocar-lhe uma questão relacionada com o Instituto Nacional de Habitação. Não tinha reparado que era da tutela do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e a própria Comissão fez um pedido, não para V. Ex.", mas para o Ministério do Equipamento Social, sobre o orçamento deste Instituto para 1984 e a sua execução orçamental até ao momento.
Estando na tutela do Sr. Secretário de Estado, talvez V. Ex.8 nos pudesse avançar alguma coisa sobre a situação do Instituto Nacional de Habitação.
Na sequência das palavras do Sr. Presidente, uma outra questão a colocar-lhe será a das empresas públicas. E julgo que isto seria uma sugestão minha para a Comissão, no sentido de podermos, a curto prazo, depois de solicitarmos e obtermos elementos básicos fundamentais sobre as empresas públicas, fazer uma discussão apenas sobre essa matéria com vários elementos do Governo relacionados com a matéria. Necessitaríamos, nessa altura, como é óbvio, de elementos sobre a situação real em que se encontra todo o sector para que a discussão pudesse ser pro-fíqua.
Nessa perspectiva, tomei a liberdade de lançar a sugestão, porque a necessidade de arranjar os elementos também terá alguma coisa a ver com os Srs. Secretários de Estado que estão presentes. Já agora, refiro concretamente um elemento que aparece no relatório do Banco de Portugal de 1983 e que consiste na referência a terem sido lançados novos quadros de distribuição do crédito por empresas públicas; simplesmente, nem no relatório anual nem nos trimestrais posteriores aparece esse quadro que é um elemento que poderia ter interesse nós conhecermos, ao menos para esta discussão.
Finalmente, colocarei uma questão já posta a vários membros do Governo, designdamente ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, tendo este último tentado dar a informação possível para ela, dentro dos seus conhecimentos. E colocarei a questão a V. Ex.tt porque, eventualmente, poderá o Sr. Secretário de Estado estar um pouco mais ligado a ela, pois relaciona-se com o sistema bancário, em termos da concessão de empréstimos, o que não quer dizer que seja obrigatoriamente do seu conhecimento.
Este problema é o da verba de 775 000 contos que foi distribuída pelo MAI às autarquias locais para cobertura de encargos no último trimestre deste ano com os transportes escolares e a acção social escolar. Nós temos colocado a seguinte dúvida: pelos elementos de que o Sr. Secretário de Estado já dispõe, trata-se de um empréstimo intercalar, eventualmente coberto pelo orçamento do MAI de 1985? Quem é que vai suportar os encargos financeiros desse empréstimo intercalar? Serão as autarquias, o Estado, quem?
Em relação ao Instituto Nacional de Habitação, gostaria de colocar ainda uma questão que me tinha «passado». Quanto às recentes alterações nas bonificações das taxas de juro para a construção de habitação social pelas autarquias, e relacionado com o programa PRID, eu gostaria de saber quem vai supor-
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tar essas bonificações. Coloco-lhe a questão, embora julgue que será o Estado, pois poderá não ser. No caso de as bonificações virem a ser suportadas directamente pelo Estado, por que é que o efeito decorrente dessa alteração da bonificação não aparece contemplado na revisão do Orçamento do Estado para 1984?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Secretário do Estado.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: — Quanto à primeira questão levantada acerca dos meios financeiros para a cobertura de cerca de 23 milhões de contos, se me permitissem, diria o seguinte: o Estado, ou o Tesouro, tem outro tipo de meios financeiros que vão provir à sua disposição e que não são apenas os que resultam, no caso concreto aqui discutido, da colocação de títulos no Banco de Portugal. Determinado tipo de verbas —por exemplo, os chamados lucros da amoedação, que agora, neste Orçamento, passam a constituir receita do Orçamento— foram até agora verbas que ficavam no Tesouro e que este último utilizava para fazer operações de tesouraria.
Uma segunda fonte de financiamento do Tesouro são alguns empréstimos externos, nomeadamente do Fonds du Rétablissement, que faz os desembolsos imediatos. Estes são convertidos em escudos, mas a sua aplicação não é simultânea. Portanto, o Tesouro fica com disponibilidades, que pode utilizar transitoriamente em determinadas operações de tesouraria.
Em terceiro lugar, nenhuma caixa, nenhum tesouro, parte de um saldo zero. Daí que no início do ano haja sempre qualquer saldo no Tesouro. Trata-se, portanto, do somatório do saldo inicial. Entre estes apoios de empréstimos exfernos —que não têm aplicação imediata, mas que, por razões de cobertura da balança, são imediatamente convertidos em escudos, e, por isso, entram no Tesouro— e outro tipo de receitas, como as comissões de aval e as da COSEC, que são cobradas, há todo um fluxo de dinheiro que entra no Tesouro e que é utilizado para este tipo de operações.
Portanto, para a cobertura de tais operações —e embora não tenha aqui números exactos, pois não vinha preparado para responder, estas são as fontes de financiamento — não temos necessidade de ir agravar a dívida do Estado, correndo ao Banco de Portugal, uma vez que dispomos de meios financeiros para fazer essas operações.
Relativamente à segunda questão que foi levantada, sobre o Fundo de Garantia de Riscos Cambiais e do Fundo de Compensação, há a dizer o seguinte: em relação ao primeiro, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento tem-no acompanhado e poderá dizer alguma coisa sobre ele; quanto ao segundo, de facto, os relatórios existem. Não comprendo por que é que os Srs. Deputados não têm tido acesso a eles, mas vou imediatamente tomar providências nesse sentido, pois não há razão para não lhes serem facultados os relatórios quer de um fundo quer do outro.
A situação do Fundo de Compensação não tem nada de especial. O Fundo tem largas disponibilidades e, portanto, vou solicitar, através da minha Secretaria de Estado, que ele seja remetido imediatamente para a Assembleia.
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, peço licença para interrompê-lo; é que a Mesa da Assembleia pede-nos para participarmos numa votação. Deve haver falta de quórum para votação!...
Está suspensa a reunião.
Eram 12 horas e 8 minutos.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos recomeçar os nossos trabalhos.
Eram 12 horas e 37 minutos.
O Sr. Presidente: — Antes de conceder de novo a palavra ao Sr. Secretário de Estado, porque creio que é do interesse de todos que não prolonguemos excessivamente a sessão, atrevo-me a pedir-lhes que vão directos às questões para que querem obter esclarecimentos.
Tem então a palavra o Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: — Relativamente à pergunta que o Sr. Deputado Octávio Teixeira fez, há ainda duas questões às quais não respondi. Dizem respeito ao Instituto Nacional de Habitação (INH) e a uma verba de cerca de 760 000 contos que foi atribuída ao Ministério da Administração Interna (MAI),
Por sua vez, relativamente ao Instituto Nacional de Habitação, há duas questões: a relativa ao seu orçamento e a relativa às bonificações que foram atribuídas recentemente. Quanto ao orçamento do Instituto, direi que ele foi aprovado e obedeceu, no tocante às despesas, a critérios bastante rigorosos; no tocante a pessoal, foi imposto como condição que não se fizessem admissões e se aproveitasse o pessoal do ex-Fundo de Fomento da Habitação. Algumas despesas de investimento que estavam previstas foram eliminadas e estão ali previstas aplicações de crédito que estavam já contempladas nos pedidos que tinham sido apresentados ao ex-Fundo de Apoio ao Investimento (FAI).
Relativamente às bonificações, o Governo, recentemente, decidiu aumentar as bonificações de determinado tipo de operações. A pergunta que aqui foi feita consistia em saber se estas bonificações eram suportadas pelo orçamento do Fundo ou se eram suportadas pelo Orçamento do Estado e se, sendo suportadas pelo orçamento do Fundo, esses meios financeiros seriam também postos à disposição pelo Estado. Direi que o que se pretendeu com este reforço de bonificações foi o seguinte: o Instituto Nacional de Habitação tem verbas, que foram atribuídas pelo Orçamento, que funcionam com o capital social do referido Fundo. A esses recursos —que são garantidos— para o Instituto acima citado foi feita uma previsão inicial e estabeleceu-se que seriam aplicados a uma taxa de 25 %\ e a administração do Fundo propôs que esses recursos próprios pudessem ser aplicados a uma taxa de 21 %, o que permitiu, para esses montantes, aumentar a bonificação em 4 pontos. Portanto, não está prevista, segundo cálculos .que foram feitos, a necessidade de o Orçamento do Estado ter de suportar directamente este agravamento de bonificação ou ter de reforçar os meios financeiros do Instituto Nacional de Habitação para fazer
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face a este agravamento de encargos. Vai haver uma mais lenta capacidade de autofínancimento do Instituto em causa e, consequentemente, de poder melhorar os seus capitais próprios. Foi uma opção que foi feita, nomeadamente para permitir que algumas operações que estavam prometidas há já algum tempo a algumas autarquias, relativamente às quais tenha sido prometida uma taxa de juro bastante mais favorável, fossem concretizadas, até porque se tratava, em muitos casos, de projectos que estavam adiantados, isto é, onde já tinham sido investidos montantes bastante elevados. Foi considerado de interesse para o País acabar esses projectos para permitir a utilização dessas habitações.
Não sei se relativamente ao Instituto Nacional de Habitação ficou respondido.
Quanto à operação financeira do Ministério da Administração Interna (MAI), foi-lhe concretizada nova operação, que, por sua vez, foi veiculada para as autarquias para fazerem face a estas despesas com os transportes escolares. Á operação foi concebida na seguinte base: as autarquias solicitaram um empréstimo à Caixa Geral de Depósitos e esta tentaria concretizar essa operação o mais rapidamente possível, mas, dado que estas despesas começavam a concretizar-se a partir do início do ano escolar, foi solicitado ao Tesouro que fizesse adiantamento para permitir ocorrer a estas necessidades das autarquias locais.
Agora, levantam-se aqui várias questões: ou as autarquias pedem o empréstimo, isto é, solicitam o empréstimo à Caixa, ou não o solicitam. Se o solicitam, temos garantido que a Caixa concederá esse empréstimo; se as autarquias não solicitarem esse empréstimo, !evanta-se aqui um problema de liquidação da operação de tesouraria, e essa liquidação terá de ser efectuada —segundo a informação que foi prestada pela Sr.0 Secretária de Estado da Administração Autárquica— através de verbas do Orçamento para 1985, que serão (retiradas da verba global que virá a ser proposta para o Orçamento para 1985 para as autarquias. Se não for possível retirar essa verba, ou seja, se não se puder montar a operação de crédito, só há duas soluções: ou deixar a operação em aberto, o que é ilegal, ou reforçar o Orçamento com 760 000 contos e suportar este encargo ou no Orçamento para 1984 ou no Orçamento para 1985. Não há alternativa para este problema.
O Sr. Pjestdeaie: — Mais algum dos senhores deputados deseja pedir algum esclarecimento? Tem a palavra, Sr. Deputado Basílio Horta.
O Sr. Basííio Horta (CDS): —Muito obrigado, Sr. Presidente. Começo por pedir desculpa se algumas das perguntas que vou pôr —das duas questões que foram colocadas— já o tinham sido. Se o foram, são dadas como respondidas.
Em primeiro lugar, gostávamos de saber, em relação às bonificações para a agricultura, qual o montante, qual o regime e como é que elas se têm processado ou como é que se vão processar no futuro.
A segunda questão tem a ver com empresas privadas que tenham recorrido a operações de tesouraria— empresas privadas, não empresas públicas. Quais as empresas privadas e o montante dos respectivos adiantamentos?
O Sr. Presidente: — O Sr. Secretário de Estado deseja já responder?
O Sr. Secretário de Estado do Tessucro: — Há aqui duas questões: uma relativamente a bonificações para a agricultura e outra de operações de tesouraria que foram efectuadas a empresas privadas. Na primeira questão, das bonificações à agricultura, há também dois aspectos a serem referidos: um é relativo ès bonificações que são suportadas directamente pelo Tesouro. Durante estes últimos anos foram criadas variadíssimas linhas de crédito, através de decretos que concederam bonificações ao crédito agrícola para determinadas finalidades. Essas operações, que a banca fez, estão hoje em duas situações: uca parte está regularizada através de verbas que foraia inscritas v.o Orçamento, outra parte encontra-se em dívica, em virtude de insuficiência de verbas orçamentais, o que, aliás, é uma tradição em orçamentos portugueses de há vários anos a esta parte.
Relativamente às bonificações à agricultora suportadas pelo Banco de Portugal através do crédito CITAP, foi recentemente publicado um aviso que alterou a sua filosofia: diminuíram-se as bonificações ao crédito de campanha e aumentaram-se as bonificações ao crédito ao investimento. Quanto a essas bonificações, não há qualquer problema, porque o Banco de Portugal continua a liquidar pontualmente ao sistema bancário esse tipo de bonificações.
Quanto a operações de tesouraria a empresas privadas, são de montante muito reduzido; a grande maioria das operações de tesouraria —como tive oportunidade de referir no início deste debate— são operações que foram concedidas a empresas públicas. No entanto, existem algumas operações a empresas privadas e, tanto quanto a memória me permite recordar, penso que há duas operações à TORRALTA em 1981, uma concedida à SALVOR, saivo erro também em 1981, e uma outra concedida à CENTREL. De memória não me recordo de todas as operações concedidas a empresas privadas, mas, se existireaa mais, serão apenas uma ou duas operações, não mais do que isso.
Dispomos da relação dessas operações, mas não a trouxe comigo, pois não sabia que iríamos abordar este assunto.
O Sr. Presidente: — Existe uma operação concedida à Fundição de Oeiras.
O Orador: — Exactamente, existe uma operação concedida à Fundição de Oeiras.
O Sr. Basílio Horta (CDS): — E qual o montante, Sr. Secretário de Estado? Algum desses montantes já foi liquidado?
O Orador: — As operações de tesouraria, que assumem a forma de contrato de tesouro às empresas — sejam públicas, sejam privadas —, têm uma característica comum: é que nem as privadas nem as públicas liquidam seja o que for.
ê a situação tout court, ê espantoso, mas é verdade!
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O Sr. Presidente: — Mais algum dos senhores deputados deseja pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário
de Estado?
Entretanto, e a propósito do que acabou de ser dito, devo dizer que me parece que talvez seja esta a regra, mas, que eu me lembre, há algumas excepções.
Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.
O Sr. Magalhães Mota (ASDI): — Queria pegar precisamente nesta última parte da resposta do Sr. Secretário de Estado para lhe perguntar até que ponto r.ão estamos a laborar numa outra ficção ao pensar que temos operações de tesouraria ou até empréstimos, quando, de facto, temos de inserir despesas no Orçamento do Estado.
E perguntar-me-ia: até que momento vamos adiar esta questão? Até que momento vamos considerar que, por exemplo, os empréstimos concedidos à CP ou à CTM ou à Região Autónoma da Madeira ou toda uma série de despesas desta natureza são, efectivamente, despesas, e não empréstimos ou operações de tesouraria? Penso que só nesse momento clarificaremos a nossa situação orçamental e só nesse momento conheceremos, com realidade, qual é o défice cem que iodos nos enfrentamos.
Gostaria de saber qual é a posição do Governo sobre esta matéria: pelo menos, há alguma possibilidade de distinguir, de entre os mpréstimos, a existência de alguma expectativa de cobrança relativamente àqueles sobre os quais já não há qualquer expectativa de cobrança e que, portanto, o mais natural seria serem inseridos como despesa?
Depois, e ainca a propósito de bonificações, falámos da agricultura e das bonificações para a habitação,. de que ontem tivemos o número exacto. Sobre isto, pergunto o seguinte: em relação a outros créditos borificaüos, há situações semelhantes àquelas que ocorreram com a primeira residência e com os empréstimos para habitação própria, ou seja, há situações devedoras acumuladas junto da banca?
Á terceira e ú1.thr.a questão é a de me parecer estar a existir uma mudança de posição qualitativa do Tesouro dentro da estrutura financeira portuguesa. Quero dizer que me parece que deixou de ser propriamente uma caixa para passar a ter operações tão viátcsas que se justificaria fossem objecto de uma rnsioi transparência e de um maior controle parlamentar.
E perguntaria se, designadamente agora, que as receitas da ancedaçêo vão para o Tesouro e as operações têm todo este vulto, não se pensa enviar para t Assembleia da República relatórios —pelo menos nteoseis — para podermos acompanhar exactamente estas situações, e não apenas uma vez por ano.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: — Julgo que a primeiro questão levantada pelo Sr. Deputado Magalhães Mota já foi aqui debatida durante esta manhã.
De facto, vos referido por mim que, no tocante a empréstimos concedidos pelo Tesouro, existem duas situações: existes empréstimos cuja probabilidade de cobrança não direi que seja muito elevada, mas existe, çuar.íc miais r.ãc seja por medidas de saneamento ou
de reconversão de algumas empresas. Portanto, a sua classificação como empréstimo é tecnicamente correcta.
Existe uma segunda situação relativa a empréstimos concedidos pelo Tesouro a empresas —e referi o caso das empresas de navegação (CTM e CNN) — cuja probabilidade de recuperação desse montante é muito baixa. Portanto, será menos aceitável tecnicamente considerá-los como empréstimos.
Mas referi também que a posição que assumimos é perfeitamente idêntica à posição assumida por qualquer banco, ou seja, é a de que os bancos também têm créditos sobre a CTM e a CNN — e não apenas o Estado— e só considerarão tais montantes como prejuízo quando as empresas forem extintas ou consideradas falidas.
Portanto, no momento em que uma empresa devedora do Tesouro for declarada insolvente, o Estado não terá outra alternativa que não seja a de inscrever, nessa altura, no Orçamento as verbas indispensáveis para regularizar a operação de tesouraria.
Também a CP deve, neste momento, muito dinheiro à banca, tal como outras empresas, e nós não vamos pedir à banca que considere já como prejuízo os créditos que tem sobre essas empresas. Mas, necessariamente, a banca terá de o fazer, ou por utilização de provisões, ou por outra via, logo que se considere, por qualquer motivo, que uma empresa pública ou privada não está em condições de pagar.
Ê, portanto, esta a metodologia que estamos a adoptar no Tesouro; é uma metodologia precisamente igual à que é usada pelo sistema bancário.
No tocante a bonificações, a situação é a seguinte: estas linhas de crédito que têm vindo a ser criadas através do tempo e que normalmente produzem um grande efeito do curto prazo, pelo impacte político que têm no seu anúncio, não produzem um grande efeito financeiro no primeiro e no segundo anos, dado que o crescimento dos encargos é em exponencial; a partir do quarto e quinto anos acabam por se acumular e produzem, de facto, um efeito tremendo nas contas do Estado.
Tenho pena de não ter aqui a evolução nos últimos anos, mas não sabia que íamos discutir as bonificações.
É um quadro extraordinariamente curioso, porque se nota a partir de 1977-1978 que a evolução das bonificações é espectacular, em termos de nos poder levar a perspectivar que, a manter-se este ritmo, a partir dos próximos anos a situação será de muito difícil controle.
"O Sr. Magalhães Mota (ASDI): — Sr. Secretário de Estado, se fosse possível enviar esse quadro para a Comissão, seria útil.
O Orador: — Com certeza, Sr. Deputado.
Quanto a números, a situação prevista para o final de 1984 é a de que existem em dívida cerca de 64 milhões de contos de bonificações. Destes 64 milhões de contos cerca de 63 milhões são relativos ao crédito à habitação e à poupança-crédito, dizendo o restante respeito a duas operações: a uma operação de crédito subsequente ao sismo dos Açores e a uma outra de uns títulos de indemnização cuja mobilização junto do Tesouro foi autorizada em Fevereiro de 1983.
A política que, de carta maneira, tem .vindo a ser seguida pelos vários 'governos —e que também está
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contemplada neste Orçamento— é a seguinte: todas as bonificações, excepto as da habitação e da pou-pança-habitação, têm sido (ou procura-se que sejam) liquidadas no ano a que dizem respeito e têm-se acumulado as restantes.
Entretanto, yio Governo pensa-se — e estamos a trabalhar, estando os estudos nesse sentido bastante adiantados— que, se não atacarmos o problema na raiz, no elemento que está a gerar,as bonificações, ou seja, nos decretos que as criam, este problema acaba por não ter solução. Daí o estarmos a trabalhar nas várias linhas de crédito, no sentido de tentarmos ou reduzir bonificações ou tornar mais rigorosa a sua utilização.
No tocante à livre liquidação dos montantes que estão em dívida, é nossa ideia que não é possível, nem nos parece realista, que um único exercício tenha de fazer face a todas as bonificações acumuladas no passado. E, eventualmente, a solução que vai ser apresentada — uma vez que não foi ainda discutida no Governo —.. será a de se formular um pedido à Assembleia da República no sentido de se emitir um empréstimo obrigacionista para se poder liquidar ao sistema bancário o montante de ^bonificações que estão em dívida.
Isto porque admitimos que no final de 1985, a manter-se este ritmo, o montante de bonificações em dívida ao'sistema bancário ultrapassará os 100 milhões de contos, o que significa que este sistema não tem possibilidade de aplicar esses montantes no mercado interbancário de títulos, significando isto, ípor sua vez, que o sistema bancário está a ser sangrado de cerca de 25 milhões no seu cash flow. Creio que, a partir daí, é fácil tirar conclusões.
Relativamente à última questão que foi levantada sobre a mudança qualitativa do Tesouro para fazer mais operações, queria dizer que concordo em que se está a processar uma mudança qualitativa, mas penso que ela vai precisamente no sentido inverso.
Tive o cuidado de referir hoje de manhã que o Tesouro, neste momento, faz praticamente só operações de tesouraria que têm a ver com a liquidação no exterior de compromissos assumidos por empresas públicas. E não temos feito mais operações do que essas.
Deixámos de fazer operações de tesouraria, por exemplo, para o Instituto Nacional de Habitação (ex-Fundo de Fomento da Habitação), em relação ao qual foram feitas, num passado recente, operações no valor de 9 ou 10 milhões de contos. Pela nossa parte, não o faremos seguramente, pois não será pela via das operações de tesouraria que este Instituto se irá financiar, assim como não faremos estas operações para empresas públicas para outras finalidades que não sejam a liquidação de compromissos na dívida externa. Não haverá também mais operações de tesouraria para acabar petroleiros, nem tão-pouco faremos essas operações em relação às empresas privadas para pagamento de juros de alguns dos seus participantes.
Portanto, há, de facto, uma mudança qualitativa que tem significado no comportamento do Tesouro relativamente às operações de tesouraria, mas não no sentido do seu alargamento.
Antes pelo contrário, penso que essa mudança vai no sentido de reduzir a actuação do Tesouro neste campo àquilo que entendemos ser o indispensável para manter a dívida do Estado em condições de não ser exigida por parte dos credores externos.
O Sr. Presidente: — Mais algum dos senhores deputados pretende fazer pedidos de esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro?
Pausa.
Entretanto, pela minha parte, só gostava de deixar ficar aqui uma observação relativa ao problema das bonificações.
Em anos anteriores e relativamente a este problema, como o Sr. Secretário de Estado já disse —e eu, particularmente, tive alguma experiência nesse campo em 1981 e 1982 —, havia a ideia de que os montantes fossem satisfeitos no período a que respeitavam. Os sistemas «poupança-crédito» e «habitação própria» atingiam já volumes tais que se tratava de um problema de regularização do passado.
Mas as situações aí também são bastantes diferentes e estava previsto um esquema que chegou a ser objecto de um projecto de decreto-lei para regularizar a situação da Caixa Geral de Depósitos —que era a mais avultada — sem agravar a situação de endividamento do Estado.
E isto porque a regularização assumindo o Estado a dívida, se é uma maneira de pôr transparente este problema —o que já é bom—, não conduz à sua resolução, na medida em que ela acaba por cair sobre o Estado.
Não sei se depois foi abandonada essa hipótese, por ser impossível ou porque se considerou outra mais recomendável, mas era esta observação que pretendia deixar aqui ficar.
A situação em relação a todo este problema sofre alterações qualitativas, no final deste ano, de acordo com o que está previsto na lei do enquadramento do orçamento, uma vez que as informações que são dadas como anexos ao Orçamento e à Conta de 1983 obrigam a um esclarecimento de uma grande parte destas questões que se levantam.
Portanto, admito que os senhores deputados, naquela matéria que não for necessária para o esclarecimento da votação das alterações ao Orçamento de 1984, possam ter uma melhor oportunidade de debater esse assunto com base nos elementos que terão de ser fornecidos.
Posto isto, passo de imediato a dar a palavra ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, que, entretanto, se inscreveu para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Vou ser muito breve, Sr. Secretário de Estado.
Das suas palavras, fiquei com a impressão de que não teria conhecimento de uma solicitação que já aqui foi feita relativamente aos subsídios da dívida por subsídios, cujos elementos nos conviria ter até terça-feira próxima.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro:— Refere-se a elementos por bonificações ou por subsídios?
O Orador: — Por bonificações totais de juro, exactamente! Mas interessava-nos obter esses elementos por anos, Sr. Secretário de Estado.
Por outro lado e aproveitando a sua presença aqui, gostaria ainda de me referir ao problema da informação trimestral sobre a dívida externa que tem sido
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27 DE OUTUBRO DE 1984
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enviada, justiça seja feita, mas que neste momento está já com um pouco de atraso.
E levanta esta questão porque, para além do facto de irmos necessitar desses elementos para o debate do Orçamento do Estado para 1985, a própria discussão que aqui temos processado sobre o nível do pagamento de juros este ano relativo à dívida externa leva-me a esta conclusão: embora não possa, nem queira, duvidar dos elementos que me são fornecidos, a verdade é que nós, em 1983, já tínhamos passado, em termos de dívida externa do Estado, com uma dívida contratada e não utilizada, de um montante da ordem dos 417 milhões de dólares e estou convencido de que, perante esta situação, os números con-duzem-nos a que em 1984-1985 vamos passar como uma não utilização ainda superior.
Ora, isto começa a tornar os encargos das comissões de mobilização certamente progressivamente mais elevados.
Solicitava-lhe, por isso, que me fornecesse essa informação mais actualizada logo que lhe seja possível.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: — Foram pedidos 2 elementos e, relativamente à evolução das dívidas sobre bonificações, queria dizer que temos esses elementos perfeitamente disponíveis por linhas de crédito e por anos, de modo que eles poderão ser facultados aos senhores deputados já esta tarde.
Em relação aos últimos elementos que foram solicitados sobre a dívida contratada e não utilizada, aproveito para dizer que igualmente dispomos deles.
Mas, como será do conhecimento dos senhores deputados, isto refere-se praticamente a linhas de crédito do Banco Mundial ou do Banco Europeu de Investimentos — embora mais à primeira destas instituições — e, de facto, a situação é aquela que foi referida, ou seja, uma percentagem muito pequena de crédito contratado está utilizado.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Almerindo Marques pediu a palavra também para um pedido de esclarecimento?
O Sr. Almerindo Marques (PS): — Não é tanto um pedido de esclarecimento, mas um ponto que gostaria que o Sr. Secretário de Estado focasse.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Almerindo Marques (PS): — Nas empresas que citou, quer sejam públicas ou privadas, como sendo intervenientes de operações de tesouraria com a Secretaria de Estado do Tesouro, existem algumas que estão em situações difíceis e por isso essas operações se fazem. Ora, quando se equaciona a nível do sistema bancário em geral a situação dessas empresas, essas verbas estão transparentes, sabe-se quais são essas operações, etc.?
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra, Sr. Secretário de Estado do Tesouro.
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: — Completamente, Sr. Deputado.
Temos perfeito conhecimento e quando se faz o saneamento de uma empresa, seja pública, seja privada, nós entramos com esses elementos e temos a informação das dívidas dessas empresas, das operações, do capital, do juro, das comissões de aval que estão em dívida, etc.
O Sr. Almerindo Marques (PS): —Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Presidente: —Como ainda agora tive oportunidade de dizer, admito que uma grande parte das interrogações que os senhores deputados ainda terão para fazer venham a ser esclarecidas com os elementos que depois terão de ser fornecidos regularmente.
De qualquer modo, penso que a maneira como o Sr. Secretário de Estado equacionou o problema, que se traduz, em certa medida, em assegurar uma prática que não difere muito da prática bancária, será um bom critério.
E, felizmente, o número de operações de tesouraria nas contas do Estado, ou melhor, de empréstimos na conta do Tesouro, é suficientemente pequeno e as empresas são suficientemente conhecidas que penso não vale a pena estar a classificá-las. A simples divulgação dessas operações permite que qualquer pessoa faça um juízo sobre a probabilidade de cobrança que elas representam.
Na banca é costume classificar os créditos em várias rubricas, conforme o grau de incumprimento e de probabilidade de não virem a ser cobrados, ao passo que nas operações tituladas em empréstimos a médio prazo nas relações do Estado com estas empresas, normalmente públicas, a probabilidade de cobrança é claramente julgável sem a necessidade de uma tal classificação.
Penso que, entretanto, o Sr. Secretário de Estado do Tesouro pretende usar da palavra, não é verdade?
O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: — Se me
permite, Sr. Presidente, apenas queria deixar claro que todas as operações do Tesouro que são feitas em empresas têm um pressuposto: é que essas empresas têm dificuldade em obter o crédito na banca e. por conseguinte, são empresas que, à partida, têm uma classificação menos boa.
O Sr. Presidente: — Pois, mas não sei se o Sr. Secretário de Estado terá compreendido o alcance daquilo que eu estava a dizer.
Ê que estar a classificar em bem ou mal parados estes empréstimos não me parece necessário, uma vez que são operações em que são nominalmente fornecidas as listas, o que não acontece na banca.
Fica-nos o problema que já foi aqui aventado por alguns senhores deputados e que é este: na medida em que o volume das operações — e isto porque uma grande parte do antigo volume de operações também era meramente contabilização de juros e o rolar das operações — implique que seja necessário o endividamento — até porque as receitas da própria tesouraria do Estado ficam mais reduzidas, nomeadamente pela alteração das regras em relação à amoedação— passa a estar mais perto do que já está um regime de funcionamento quase bancário, na medida em que, por um lado, tem de haver a criação de receitas de endividamento e, por outro, a criação das operações.
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E isto creio que seria, pelo menos para alguns de nós, mais uma razão para acompanharmos o evoluir da situação. Mas isso já está previsto na própria lei do enquadramento do orçamento e, portanto, penso que não teremos que acrescentar mais nada.
Entretanto, o Sr. Deputado Basílio Horta pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Basílio Horta (CDS): — Se me dá licença, Sr. Presidente, queria apenas fazer uma breve consideração para eu próprio poder entender aquilo que V. Ex." acabou de dizer.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Basílio Horta (CDS): — Penso que há uma diferença profunda entre as operações de tesouraria e as operações do sistema bancário, pois, a não ser assim, mal iria todo este tipo de operações. Até porque o Sr. Secretário de Estado do Tesouro começou por dizer que essas operações não eram pagas e pensa-se, como é óbvio, que as operações do sistema bancário são para ser pagas. Ou, por outras palavras: todas as operações de tesouraria feitas em empresas são operações mal paradas, no fim de contas, uma vez que parece que não há perspectivas de virem a ser cobradas.
Em relação a este problema, porém, não gostaria de deixar ainda de referir o seguinte: quando há um destino público evidente das acções dessas empresas, quer sejam privadas ou públicas, ainda se poderia, em tese, admitir —embora incorrectamente— o recurso a operações de tesouraria. Quando, porém, esse destino público não exista, penso que é um procedimento manifestamente inadequado e seria útil sabermos quais os critérios com que essas operações foram feitas em relação a determinadas empresas.
Porquê a essas e não a outras? O que é que esteve na base da preferência por algumas empresas em detrimento de outras? Como é que a concorrência funciona? Como é que o sistema bancário tem ao seu lado a funcionar o Tesouro em operações que, no fim de contas, não são de empréstimos, uma vez que não são pagas?
Isto tem que ser esclarecido, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Bom, Sr. Deputado, se esse problema não fosse esclarecido acho que, realmente, seria mau. Mas aquilo que eu quis dizer foi que penso que esse ponto está já automaticamente esclarecido.
Aliás, como sabem, não tenho intervindo nos esclarecimentos, e, intencionalmente, excepto quando sou citado.
Mas tive oportunidade de fazer um ligeiro aparte quando disse que essa é uma regra que tem muitas excepções. Designadamente, a maior, para citar um caso, é a questão das operações de Cabora Bassa e em relação a esta nós não podemos dizer que não
é para cobrança! Ninguém tomará essa responsabilidade de dizer que as operações de Cabora Bassa são» para passar um risco.— e são, de longe, es maiores!
E há outros casos desse tipo também.
Agora o Sr. Secretário de Estado releriu — e penso que muito bem — que, normalmente, a tesoiraria ¿3 Estado tem funcionado em situações de emergência. E emergência porque as responsabilidades que o Estado tem, directa ou indirectamente, são de tal ordem que o não cumprimento das obrigações, designadamente na ordem externa, criavam uma ruptura em que o Estado era, de qualquer modo, chamado a intervir.
A natureza das operações, por si própria — s essa é a razão por que digo que a sua publicação era útil — revela isso mesmo. Ou seja, as datas em que elas ocorreram revelam que houve não cumprimento por parte de empresas em que o Estado, por aval expresso ou implícito, tinha que intervir de qualquer madeira.
Aliás, o Sr. Secretário de Estado do Tesouro, nos exemplos que deu, já referiu que no caso da Companhia dos Transportes Marítimos o Estado é o único accionista e, na prática internacional das empresas de navegação, o Estado tinha que ser chamado a honrar esses compromissos ou então era declarado em falência e todas as empresas públicas entravam em falência, dadas as cláusulas que existem em alguns empréstimos.
Há também uma certa especulação sobre isto que não tem tanto fundamento como se parece, porque a listagem das operações é suficiente para o esclarecimento de toda esta questão.
Bom, e se mais nenhum Sr. Deputado dessje intervir por hoje, vamos suspender os nossos trabalhos.
Antes, porém, lembro aos senhores deputados que está prevista a nossa próxima reunião para terça-feira, às 10 horas e 30 minutos, e que a maior parte dos elementos que foram pedidos, se não estão já rx Assembleia, devem estar ao nosso dispor antes da próxima reunião.
Neste momento não está solicitado quaquer esclarecimento adicional a nenhum membro do Governo de modo a justificar que marquemos, desde já, qualquer hora solicitando a sua presença, mas supondo que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento terá disponibilidade para estar connosco, uma vez qtís haverá que tomar opções e todos ganharíamos em ter a possibilidade de manter um diálogo imediato com o representante do Governo mais qualificada nesta matéria.
Convoco, portanto, todos os senhores debutados membros desta Comissão para a reunião da próxima terça-feira, em princípio para votação, sen prejuízo de, caso seja preciso algum esclarecimento adicional, o fazermos também.
Está encerrada a reunião.
Eram 13 horas e 10 minutos.
PREÇO DESTE NÚMERO 35$00
Imprensa Nacional - Casa da Moeda