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II Série — Número 45
Quarta-feira, 30 de Janeiro de 1985
DIÁRIO
da Assembleia da República
III LEGISLATURA
2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)
SUMÁRIO
ACTA DA REUNIÃO DA COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO DE 29 DE JANEIRO DE 1985
O Sr. Presidente (Almerindo Marques): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 10 horas e 30 minutos.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, de acordo com o processo e o plano de trabalho, plano já distribuído a todos, vamos iniciar os trabalhos da Comissão de Economia, Finanças e Plano com o Ministério da Cultura.
Como o Sr. Ministro se encontra presente, vou abrir um período destinado às perguntas que os Srs. Deputados pretendam fazer, seguindo-se as respostas e os esclarecimentos do Sr. Ministro.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Sr. Presidente, julgo que seria curial uma intervenção inicial do Sr. Ministro relativamente ao Orçamento, designadamente para justificação das verbas que nos são apresentadas, uma vez que, dessa forma, poderia aplainar caminho e deixar algumas pistas úteis ao debate.
Todavia, se essa não for considerada a melhor metodologia, inscrevo-me para formular desde já umas quantas questões.
O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr. Deputado. Se o Sr. Ministro pretende fazer uma intervenção inicial, tem V. Ex.a a palavra.
O Sr. Ministro da Cultura (Coimbra Martins): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: É evidente que não é com alegria, ainda menos em euforia, que defendo este Orçamento. Não sei, de resto, se algum dos meus colegas ministros pode, em ocasião semelhante, manifestar esses sentimentos.
No entanto, sendo o Orçamento o que é e defendendo-o eu, como defendo, assumo inteiramente a solidariedade que cada ministro deve ao Governo de que faz parte.
Em matéria de números, o Orçamento sobe, enquanto que em percetagem, relativamente às «fatias»
dos outros ministérios, o Orçamento desce, tal como acontece em termos reais.
Por falha técnica, não é possível reproduzir esta passagem.
[. . .] este ano não vou ter menos, mas aceito-as.
Considerando o balanço das acções de 1984, eu defenderia, perante a Assembleia, que o Ministério da Cultura foi integralmente fiel ao programa que defendeu inicialmente na Assembleia da República e que a taxa de realização desse programa é animadora: administrou-se conforme os objectivos proclamados e aprovados e realizaram-se muitas coisas das que se tinham planeado.
Este balanço é uma espécie de reconforto quando o Ministério da Cultura aborda um novo que, neste sector, não vai ser menos difícil do que o precedente.
Podem vir concursos extra-orçamentais — essa é uma esperança com fundamento —, os quais darão uma possibilidade de intervenção acrescida ao Ministério da Cultura, intervenção essa que será exercida de acordo com as ideias que os Srs. Deputados conhecem e com o programa que os Srs. Deputados aprovaram.
No Ministério da Cultura, temos 2 grandes sectores que reclamam, um e outro, especial cuidado: o do património e o da acção cultural.
O sector do património, no início das discussões e do diálogo entre o Ministério da Cultura e o Ministério das Finanças e do Plano, não se achava mal, depois levou cortes sucessivos e substanciais e, quando a situação era verdadeiramente dramática, houve uma correcção que permitiu confortar algum tanto o PID-DAC do Instituto Português do Património Cultural.
Creio que este ano, no sector do património, se fará mais, nitidamente mais, do que se fez o ano passado: continuar-se-ão as acções principais em curso e inaugurar-se-á um certo número de museus.
Espero, pois, que o ano não seja mau do ponto de vista do património — e este é, evidentemente, um dos cuidados principais do Minstério e do Ministro da Cultura.
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Pela parte que toca à acção cultural, não posso dizer o mesmo, sendo legítimas as inquietações sobre a eficácia da intervenção da acção cultural durante o ano de 1985. Foi este o departamento que relativamente mais sofreu com esta austeridade que se prolonga.
Evidentemente que esta é uma amputação sensível e dolorosa, porque é a acção cultural que tem a seu cargo a intervenção do Ministério de norte a sul do País. Aí, vamos ter sérias dificuldades — é um facto. Vamos ter sérias dificuldades com o teatro, vamos ter sérias dificuldades com as bandas, vamos ter sérias dificuldades com o apoio às associações, mas, enfim, temos de as assumir.
Por outro lado, o Instituto Português do Livro acha--se também em muito más condições. De facto, tendo a seu cargo, como tem, a coordenação e execução de dignas comemorações do cinquentenário da morte de Fernando Pessoa, ele verá, com o empenho das verbas necessárias para essas comemorações, as suas possibilidades de acção muito diminuídas.
Entretanto, quanto ao apoio ao livro e à difusão do livro português no estrangeiro, alguns resultados aparecerão a muito breve prazo, como consequência do que empenhámos neste sector em 1984.
Estes são os principais cuidados: por um lado, uma certa [. . .] não direi alegria, porque seria de mais, mas reconhecimento, pois graças ao PIDDAC algumas verbas poderão ser aplicadas no património, permitindo assim fazer alguma coisa; por outro lado, uma inquietação muito forte quanto à acção cultural. Se através de concursos extra-orçamentais se puderem confortar alguns departamentos do Ministério, a acção cultural será, evidentemente, a primeira de que cuidarei.
Em termos de percentagens — e passamos para a síntese após este esboço de análise —, verifica-se qua a cultura mais uma vez desceu no quadro do Orçamento Geral do Estado, facto que não é animador.
Em 1980, a cultura tinha 0,25 % do Orçamento, em 1981, tinha 0,36 <% e em 1982 teve 0,42 Este foi, se não estou em erro, o grande ano de apoio generoso ao teatro, mas que não surtiu efeito. A política de largo empenho de verbas no teatro foi — facto reconhecido até por aqueles que as aplicaram — um fracasso. Depois deste ano relativamente bom, começámos a descer, tendo obtido em 1983 0,36 <7o do Orçamento, embora tenha havido o grande empenho que excedeu o Ministério da Cultura e que não o afectou directamente, que foi o da XVII Exposição Europeia de Arte, Ciência e Cultura. Assim, se fizermos a conta ao que se empenhou na cultura, adicionando esta percentagem à «XVII Exposição», este ano de 1983 foi ainda um ano de relativa abundância.
Em 1984 — ano em que não houve acção cultural característica fora do Ministério, não houve nenhuma «XVII Exposição» que se tenha processado fora do Ministério (de resto, no Programa do Governo tínhamos assumido a posição de, sem combater as acções de prestigio, não lhe dar uma prioridade importante) — continuámos a descer, tendo-nos sido atribuído 0,35 % do Orçamento e em 1985 temos, se as contas estão certas, apenas 0,28 °7o, o que em termos de percentagem, é realmente muito pouco. E também o é em termos de valores absolutos.
Se os jornais, se a imprensa, se os Srs. Deputados, se a oposição quiserem criticar, creio que não há ministério mais criticável que o meu. De facto, por muito bem que consigamos administrar estas verbas, até
mesmo no património, haverá sempre, e com justificação, um grito de alarme por um castelo a cair, outro por uma igreja onde chove, outro por teatros onde não há segurança e por ai fora.
Devo dizer que, considerando as verbas de que o Ministério da Cultura dispõe — e mesmo que fossem duplicadas —, seria um presente que a oposição nos daria se «atacasse» este sector, pondo o seu responsável, que sou eu mesmo, em xeque.
Acho que este esboço de análise e estas generalidades poderão ter constituído a minha introdução preliminar, que foi pedida pelo Sr. Deputado José Manuel Mendes, pelo que remeterei agora a minha atenção para as perguntas dos Srs. Deputados.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro. Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Sr. Ministro da Cultura, suponho que, no diagnóstico da situação relativa ao seu Ministério, não será muito difícil estarmos todos de acordo, conquanto se me afigura que, em larga medida, as «tintas» deveriam ser ainda um pouco mais negras.
Se é verdade, como referiu, que a análise comparativa do orçamento do Ministério da Cultura com o Orçamento de Estado in totum desfavorece a acção cultural do Governo, não é menos verdade quem dentro do próprio Ministério da Cultura, procedendo a uma leitura transversal e nem sequer muito exaustiva, encontraremos distorções e deficiências de tomo que não podem deixar de suscitar indignações e, em alguns casos, apreensões muito sérias.
O facto é que, para além do já aludido, verificamos que porventura não será muito por acaso que, a partir de 1980, as verbas distinadas à Direcção-Geral da Acção Cultural têm vindo a diminuir de modo drástico. E verdade: desde 1980 que as verbas têm vindo a de-minuir de modo drástico!
É claro que, como sabe o Sr. Ministro, na Direcção--Geral da Acção Cultural se situa toda uma esfera amplíssima de actividades do seu departamento, aquelas onde, de modo mais diversificado, descentralizado e plural, os portugueses se organizam, visando realizações de actividades culturais: no teatro centralizado ou na descentralização nas bandas, nas filarmónicas, em tudo o que pulula ao nível dos centros culturais, os quais, com as verbas que lhes são destinadas este ano, encontrarão uma situação de real penúria, que é, sob todos os aspectos, deveras inquietante.
Com efeito — e o Sr. Ministro comprovará que não vai nisto qualquer assomo de demagogia —, a Direcção-Geral da Acção Cultural, que em 1984 teve 383 200 contos, tem, em 1985, 356 204 contos, o que dá uma diferença de 26 996 contos, ou seja, uma percentagem na ordem dos 7,04 % a menos, quando se imporia que, independentemente da necessidade do acompanhamento da taxa de inflação prevista, estas verbas fossem fortemente reforçadas, em termos da própria dinâmica de descentralização do Ministério.
Por outro lado, não pode ignorar-se que se situa aqui muito do que é o pulsar do coração cultural do País, sem com isto negar as acções nas quais o Sr. Ministro e o seu Ministério têm posto algum empenho e sem com isto negar, inclusivamente, outras necessárias frentes de intervenção.
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Numa sociedade democrática, liberta e desconstran-gida como deveria ser a nossa em todos os seus domínios, compreende-se algo mal que, por exemplo, continuemos numa situação muito próxima daquela que se pôde diagnosticar e segundo a qual, entre 1976 e 1980, a Fundação Calouste Gulbenkian gastou, em fins artísticos e científicos, sensivelmente metade da verba atribuída pelo Orçamento do Estado à Secretaria de Estado da Cultura de então.
Ora, este panorama mantém-se, ou melhor, na realidade, se virmos as coisas com rigor, terá até piorado, quando se impunha inverter a marcha, independentemente do carácter positivo da acção da Gulbenkian e de fundações ou associações congéneres.
Em suma, suponho que o corte nas verbas, especialmente sentido na Direcção-Geral da Acção Cultural, terá de ser revisto em termos categóricos, não só por opção do Sr. Ministro da Cultura mas por opção dos Srs. Deputados aqui presentes e, naturalmente, daqueles que têm a seu cargo a elaboração do Orçamento do Estado (está aqui o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, que eu bem gostaria que estivesse atento a estas coisas).
A palavra inicial com que o Sr. Ministro Coimbra Martins se nos dirigiu foi de alerta, de preocupação e, para além do mais verdadeira — afirmando que o orçamento da cultura continua a baixar na sua relação com os outros departamentos do Estado. Devo dizer que, para nós, tal situação é, desde logo e à cabeça, inteiramente inaceitável. Impor-se-á que o Sr. Ministro da Cultura, tal como os Srs. Deputados aqui presentes, consigam inflectir este caminho e dizer aos tutores do Orçamento do Estado que este não é o modo de tratar a cultura numa sociedade democrática e civilizada e que urge seguir por outras vias. É um pouco isso o que nós pretendemos ao longo desta intervenção, facto que, em geral, não pode deixar de merecer algum atendimento por parte de outras bancadas.
Referi, de entre os problemas graves, o que se está a passar com a Direcção-Geral da Acção Cultural. O Sr. Ministro terá oprotunidade de especificar melhor aquilo que entender relativamente a este domínio, mas no Orçamento desenvolvido vemos que existem algumas verbas que nos sucitam dúvidas, e por isso o questionava.
Desde logo e relativamente aos 20 000 contos para aquisição de serviços não especificados, pergunto-me se esta verba não poderá ser discriminada, embora se constate não ser avultada se a compararmos com as suas similares, por exemplo, do Ministério de Rosado Correia. De qualquer modo, 20 000 contos são 20 000 contos, pelo que é bem capaz de ser necessário sabermos o que é que se vai fazer com eles.
Adiante, apenas 113 000 contos vêm sob a rubrica das transferências para instituições particulares. Creio que é com este montante que pensa vir a poder responder às solicitações dos centros culturais e às diversificadas necessidades que se situam neste sector, ficando para o Fundo de Teatro 97 800 contos, o que, pelas contas que fiz, corresponde a 12% de aumento relativamente ao ano transacto, bastante abaixo, portanto, da taxa de inflação prevista. Isto para um sector extremamente sensível e com uma enorme carência de apoio ao nível da capital do Pais, da cidade do Porto — onde está a realizar-se uma actividade teatral de grande relevo — e também na esfera da descentralização, uma vez que ainda admito não se ter «perdido
o pé» dessa boa perspectiva de trabalho no Ministério a que o Sr. Dr. Coimbra Martins preside.
Se esta moldura de penúria é pouco menos do que angustiante na Direcção-Geral da Acção Cultural, não podemos deixar de considerar que, do mesmo modo, há outras bastante pouco lisonjeiras: diminuem as verbas da Direcção-Geral dos Espectáculos e do Direito de Autor, diminuem as verbas do Gabinete das Relações Culturais Internacionais, aumentam, de maneira muito leve, as verbas relativas aos arquivos e bibliotecas e mesmo aos museus e há um efectivo aumento dos investimentos do Plano, que há pouco foi referido e não pode deixar de ser detectado, mas que continuo a considerar altamente insuficiente, pelo que teremos algumas propostas de reforço a fazer dentro de momentos. Assim, embora haja consignações justas e adequadas na especificação, na discriminação das verbas dos investimentos do Plano, o indesmentível é que há outras que estão ausentes.
E se é verdade — digamos isto num parêntesis — que será sempre possível afirmar que há um castelo com uma pedra a cair e uma igreja com um buraco por onda entra a chuva, não o é menos que é preciso ir, tanto quanto possível, diminuindo essas possibilidades. Há uma dialética óbvia entre o impossível e o possível. Como disse o Jorge Amado, já há longos anos — e todos nós o sufragaremos, pelo menos os que estamos na vida com uma certa aposta de transformação e de consolidação de conquistas —, o importante é tentar mesmo o impossível, porque por esse caminho acabaremos por tornar o impossível possível.
Bom, mas este foi apenas um parêntesis em relação à observação que o Sr. Ministro fez há pouco.
Iria continuar para, nalguma discriminação, apontar outras questões para as quais bem desejaria de uma resposta sua.
O teatro fica, como se viu, drasticamente penalizado e o cinema não deixará de ter constrições significativas — o Ministério continua a adoptar o critério de subsidiação de uma grande fita, que este ano será a de Paulo Rocha (será? não será? vai ter oportunidade de me dizer), ou, pelo menos, de apoiar uma grande realização, como fez com o Soulier de Saíin, de Manoel de Oliveira, e, paralelamente, de ajudar à realização de outros projectos apresentados a concurso pelos cineastas portugueses.
Mas o Instituto Português de Cinema vai ver-se a braços com uma crise terrível: a suscitada pelo imposto sobre o valor acrescentado. Aliás, apelo mais uma vez ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento para as rés-teas de sensibilidade cultural que tenha no sentido de estar bem atento a isto.
É que não vai acontecer nada de animoso nem sequer de perdoável. Tudo é de uma extraordinária gravidade e o Sr. Ministro tem obrigação de desnudar o que vai acontecer neste domínio. O que adiantou como solução na reunião que tivemos em comissão não passa de uma medida de natureza precária, como, de resto, reconheceu atempadamente. Já que estou a falar das consequências do novo imposto, outro tanto se diga no tocante à sua aplicação ao livro.
Tem-se feito uma enorme mistificação na televisão, na rádio e nos jornais relativamente ao IVA — ele vem substituir outros impostos, ná é mais um, diz-se aí na «moxinifada» de propaganda que tem estado a ser feita.
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Bom, mas a verdade é outra. Em Portugal, o livro nunca esteve sujeito a imposto algum, o que se justificava, por um lado, por um factor de aculturação e, por outro, pela necessidade de entender o livro como algo distante de qualquer artigo de luxo.
Diz-se, então, que é por necessidade de integração na CEE — sabemos que essa integração será um mal para o País — mas o indiscutível é que nem sequer é por necessidades da integração pois há países, como é o caso da Irlanda e da Grã-Bretanha, em que o IVA se não aplica aos livros e razões bastantes, sobejas, existem para que assim seja.
Chamo a atenção para isto pois será um grande pomo de batalha que a minha bancada travará incessantemente, decerto também com outros Srs. Deputados, no sentido de eliminar o que nos parece um autêntico atentado contra a cultura.
Impõe-se, pois, ouvir o Sr. Ministro da Cultura pronunciar-se sobre este problema.
A propósito de cinema, detectei uma verba de 19 000 contos de apoio à exibição. Segundo a indicação que tenho, ela destinar-se-á ao fomento de pequenas salas para a passagem de filmes. No entanto, pedir-lhe-ia mais especificação, uma vez que gostaria de estar inteiramente informado sobre o assunto.
Em situação de penúria estão, pois, as bandas, as filarmónicas, as charangas, as realizações populares mais nítidas, desde os jogos populares que têm estado, em grande parte, sob a alçada dos centros culturais, àqueles que surgem por toda a parte; em situação de penúria irá continuar, penso eu, a muitíssimos níveis, o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido no âmbito dos museus, das orquestras, dos arquivos e bibliotecas.
Dentro de dias irá ser inaugurado o Museu do Teatro; 10 000 contos foram investidos numa primeira fase, e embora haja alguma discriminação nas verbas «comidas» pelo aparelho burocrático, a grande questão que se coloca é a de saber, em concreto, quais os outros museus que em 1985 irão andar para a frente e a que animação efectiva irá proceder-se nos já existentes, uma vez que partilho, em absoluto, do ponto de vista de que não deve fazer-se com que o Museu seja um túmulo, de morte ainda mais definitiva das coisas. Pelo contrário, deve ser vivo, profundamente ligado à fruição das populações, como, de resto, é óbvia injunção do Estado, constitucionalmente consagrada.
Quanto a arquivos e bibliotecas, o Sr. Ministro sabe tão bem como eu, que, por todo esse país, há riquíssimos espólios a perderem-se, bibliotecas onde as coisas estão profundamente mal, onde a simples catalogação está com anos e anos de atraso, onde há extravio de depósitos, livros, jornais e outras publicações, a impor uma urgente viragem de atitude por parte do Governo.
Para além das despesas correntes, não sei como é que o Sr. Ministro vai conseguir fazer frente à necessidade de instalação de novos arquivos, de novas biliotecas, de municiamento das actuais, de aviventaçâo do que existe, não sei se como é que o Sr. Ministro Coimbra Martins vai conseguir fazer frente a todas essas necessidades com os 102 000 e poucos contos que vêm designados no Orçamento do Estado!
Seguem-se aspectos sobre os quais já tivemos oportunidade de falar em sede de subcomissão de cultura mas que nunca será demais aqui recolocar. Deparamos com verbas perfeitamente simbólicas que bem importaria que o não fossem. Os 1000 contos para o circo
e os 1000 contos para o património etnológico são perfeitamente simbólicos e, todavia, as realidades a que estão afectados não podem deixar de ter-se como centrais, qualquer que seja o ângulo sob que as olhemos. O reforço, neste domínio, impõe-se de modo definitivo.
É questionada a verba para o Teatro D. Maria II. O apoio a este Teatro tem sido posto em causa de muita maneira e creio que uma das formas, apesar de tudo mais generalizadas, é aquela que diz: «não há verdadeiramente que opormo-nos às verbas para o dé D. Maria II, o que há é que exigir mais verbas para o teatro que não está no de D. Maria II».
Ora bem, confrontando os números, constato o seguinte: para o Teatro de D. Maria II, o Orçamento do Estado, sob o capítulo «Outros serviços», consigna perto de 130 000 contos e para o restante teatro, o teatro independente, as verbas são inferiores a 100 000 contos. Ou seja, o Teatro de D. Maria II, consome, em si, mais do que todo o outro teatro.
É isto que não está bem. Independentemente de considerar que as verbas para o Teatro de D. Maria II são de mais ou são de menos, porventura até nem serão de menos, a questão é saber se as outras verbas bastarão.
Voz inaudível do Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Orador: — Queria dizer, exactamente, que, porventura, não serão de mais.
Quando o discurso da cultura falha, o discurso de economia do meu camarada Octávio Teixeira, provando bem os méritos do trabalho em equipa, prontamente corrige!
No Teatro de D. Maria II há um peso enorme de gastos com remunerações. Por um lado, as remunerações certas e permanentes do pessoal dos quadros aprovados por lei, que importam em 16 800 contos e, por outro lado, com as chamadas remunerações de pessoal diverso, da ordem dos 44 000 contos, que se deduz serem para pagamento de actores e de outros trabalhadores do teatro em serviço naquela casa. Depois volta a aparecer uma verba para aquisição de serviços não especificados, que é alta, de 13 097 contos. Por que nào especificar até um esmiuçamento maior que permita sabermos com rigor as afectações de todo este dinheiro, nào deixando assim, num saco sem fundo, quantias que, apesar de tudo, são significativas?
Do Gabinete do Sr. Ministro saem várias actividades e a elas já tive oportunidade de me referir. O Gabinete foi reforçado em cerca de 65%, o que é positivo dado o conjunto de realidades a que tem de fazer face.
No Ministério está, porém, a ser criado «o espaço Carlos Seixas», para o qual se prevêem 85 000 contos que não estão em dotação plurianual, que são para consumir de imediato, isto independentemente de quaisquer considerações sobre o objectivo em si de criar um espaço cultural no próprio Ministério para que este não seja aquela fria entidade burocrática que tem sido. Este elevado montante pode desequilibrar um pouco toda a justiça relativa da exiguidade com que nos estamos a defrontar. Seria, assim, importante ouvir o Sr. Ministro, o seu ponto de vista quanto à questão com que o confronto.
Por outro lado, aproveito para lhe perguntar se é verdade o que tem aparecido nalguns jornais — que, às vezes, acertam, apesar de normalmente errarem, bas-
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tante, e de se terem tornado especialistas na pequena e na média intriga —, segundo os quais o Ministério da Cultura iria deixar de existir, passando a haver so-mente urna Secretaria de Estado na dependencia do Primeiro-Ministro. Esta degradação das verbas da cultura é capaz de indiciar um caminho que leva a tal e não sei se até mesmo à erradicação da Secretaria de Estado, no conspecto geral dos departamentos do Executivo. Era importante que aqui tivéssemos informa-, ções firmes quanto a isso.
Há questões sobre as quais falámos no ano passado e de que seria curial voltarmos a falar. Sei que a lei orgânica da Torre do Tombo, que, sem dúvida, melhorará o seu funcionamento, está para sair, mas quanto à sua instalação, o que se passa? As obras prosseguem a um ritmo célere ou posso contar com elas para os meus netos?
O mesmo tipo de perguntas pode fazer-se em relação a várias outras obras e empreitadas. De qualquer modo, há um problema concreto que, desde já, gostaria de lhe colocar e que é o seguinte: técnicos do Gabinete de Planeamento do seu Ministério deslocaram--se, há uns tempos, a Almada e visitaram o Palácio Quinta da Cerca que, para quem não sabe, foi uma casa onde viveu Frei Luís de Sousa e que tem uma rara importância arquitectónica e uma impregnação de história relativamente incomum.
Pretende-se que esta casa venha a ser adoptada como uma casa da criança, na qual se desenvolveriam actividades de relevo em domínios como os da educação, os do recreio e também da cultura, o apoio às actividades de expressão artística, às actividades ligadas à vida animal e vegetal, à animação sócio-educativa, à promoção do livro, à feira infantil do livro, à ocupação de tempos livres com teatro e outras iniciativas lúdicas relevantes. O Sr. Ministro se vê possibilidade, no Orçamento para 1985, de se encontrar alguma verba, designadamente nos investimentos do Plano, que possa acudir à necessidade da aquisição do imóvel e dos terrenos anexos, a qual, segundo os cálculos feitos pelos técnicos do Centro Cultural de Almada, não excederia os 50 000 contos?
A este nível há também, como sabe, um movimento bastante vivo e positivo de opinião no sentido da recuperação e conservação do património edificado do bairro de Alfama. Estão previstas verbas na ordem dos 100 000 contos como indispensáveis para levar a cabo o projecto e vamos apresentar uma proposta de aditamento no sentido do reforço dos investimentos do Plano, na rubrica das despesas comuns do seu Ministério, para lhe fazer face também a esta realidade. No entanto, seria importante que o Sr. Ministro da Cultura dissesse, desde já, qualquer coisa relativamente ao assunto.
Na sua intervenção inicial foi referido o conjunto de erros sobre o património, praticados por esse país fora — são grandes, conhecidos e existem paralelamente à boa actividade em defesa do património que também tem sido feito pelas autarquias e pelas associações de defesa do património.
O conjunto de verbas para o Instituto Português do Património Cultural, na dependência do seu Gabinete, dá, em minha opinião, possibilidades de acção maiores do que aquelas que o Instituto tem tido até aqui, mas, de todo o modo, continua a colocar-se a questão de saber se, perante o estado de grande descuido, e nalguns casos de descalabro, em que se encontra todo o
nosso património, designadamente monumental, mas também de outra ordem, se não imporia, da parte do Estado, uma dotação bastante mais elevada, ou se, constatando nós que não se pode, de facto, de um dia para o outro alterar tudo e que sempre haverá o tal palácio onde algumas pedras caem e a tal igreja onde a chuva entra, se, apesar de tudo, entendemos que não vale a pena lutar por mais e exigir mais.
Ocorre-me que o Dr. Coimbra Martins, pouco tempo depois de ter tomado posse como Ministro da Cultura, falava com frequência na necessidade de o seu Ministério passar cada vez mais de um Ministério com acções de resposta a um Ministério com acções de proposta.
Suponho que deverá sentir-se bastante frustrado neste domínio, e com bastante razão, porque, no plano da proposta — alguma coisa tem sido feita, isso não se pode negar — muito do essencial continua por fazer e far-se-á cada vez menos, pois, com a diminuição real das dotações orçamentais para 1985, o seu Ministério está condenado a ser cada vez mais um Ministério de resposta — de resposta parcimoniosa, deficiente, precária e, em alguns casos, de não resposta — em vez de um Ministério propositivo, a não ser entendendo por proposta o sentido global das Grandes Opções irrealizáveis contidas no texto que nos foi entregue, grandes opções essa que, permita-me que lhe diga, são grandes de mais: isto é. as Grandes Opções do Plano aqui consignadas são as grandes opções do Ministro Coimbra Martins em 1985, e seguramente serão as grandes opções de um outro qualquer eventual ministro em 1988 ou em 1990, como certamente já eram, em 1976, as do Secretário de Estado da Cultura.
Penso que talvez houvesse vantagem em não cair numa inespecificidade tão grande e em esmiuçar um pouco mais o que se pretende fazer no plano das realizações globais. Claro que não é esta a sede para um programa de Governo, mas há sempre um justo equilíbrio entre aquilo que é um programa de Governo e aquilo que são as grandes acções de um plano, antes de um orçamento que depois as traduzira em verbas e as procurará levar por diante.
Duas palavras a ultimar, uma relativa às comemorações de Fernando Pessoa e de Aquilino Ribeiro e outra relativa às razões das propostas que irei fazer chegar à mesa, no sentido do reforço de algumas das dotações do Ministério.
As comemorações de Fernando Pessoa e de Aquilino Ribeiro deveriam revestir-se de uma grande dignidade pois trata-se de personalidades centrais da nossa cultura, bastante diferentes uma da outra, mas igualmente representativas e igualmente ricas — Fernando Pessoa mais conhecido na Europa e no mundo, Aquilino Ribeiro, hoje um dos grandes injustiçados da literatura portuguesa.
Gostaria, caso fosse possível, que me adiantasse, em concreto, as verbas que, neste momento, prevê para levar por diante este projecto, pois começo e ficar preocupado com o facto de não se falar em quantias concretas e de haver sobre isto algumas significativas dúvidas por parte de muita gente.
Irei apresentar na mesa uma proposta de aditamento que envolve seis dos capítulos do Ministério da Cultura, referentes ao Instituto Português do Livro, à Direcção-Geral de Acção Cultural, à Direcção-Geral dos Espectáculos e do Direito de Autor, do Gabinete
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de Relações Culturais Internacionais, dos arquivos e bibliotecas e aos museus.
Há um critério para as verbas que aqui estão apresentadas. Esse critério é o de procurar acompanhar, tanto quanto possivel, com pequeninos acertos, a taxa de inflacção prevista. Num ou noutro caso foi-se um tudo-nada além disso, na medida em que se nos afigura impor-se, por exemplo, no que concerne ao Instituto Português do Livro, à Direcção-Geral dos Espectáculos e dos Direitos de Autor, e, sobretudo, à Direcção-Geral de Acção Cultural, que a base seja bastante alteada.
Pelo que disse relativamente à Direcção-Geral de Acção Cultural, pelo que disse relativamente aos arquivos, bibliotecas e museus, e mesmo em relação aos outros departamentos, suponho estar já a proposta suficiente fundamentada. Em relação ao Instituto Português do Livro, cuja actividade é, em geral, bastante desconhecida dos cidadãos, inclusivamente dos cidadãos deputados, impunha-se ter conhecimento concreto da relevância da sua actividade na difusão interna de muita obra essencial e na difusão da cultura portuguesa no estrangeiro, para além de todo o outro amplo escopo de iniciativas a que tem lançado mão.
Sabemos, por exemplo, que está em stand by — para usar um «palavrão» inglês que se usa muito na linguagem tecnológica dos economistas — no Instituto Português do Livro, uma colecção de romances, de poesia, de ensaio e crónica, de textos literários de autores portugueses desde os primórdios da literatura até aos nossos dias — a chamada biblioteca básica —, que só não anda porque, por um lado, está bloqueada pelas verbas e, por outro, tem suscitado algumas dificuldades na implementação.
Impunha-se que o Sr. Ministro me dissesse se esse projecto, enquanto tal, independentemente das verbas, lhe merece sensibilidade e apoio e, caso afirmativo — como espero seja, para lá das dúvidas que possam ser levantadas e que também eu tenho —, se está ou não disponível para a necessidade de, uma vez por todas, desbloquear a iniciativa.
É, pois, no sentido de desbloquear também essa iniciativa, a par do fazer face a toda uma série de necessidades absolutamente inalijáveis, que o reforço, do Instituto Português do Livro excede, de facto, a taxa de inflação prevista.
Será também entregue na mesa uma proposta de 100 000 contos para reforço dos investimentos do Plano, visando a conservação e recuperação do património edificado no bairro de Alfama, e vão para a mesa outras propostas que serão formuladas pelo meu camarada Carlos Brito e pela minha camarada Ilda de Figueiredo. Para já, Sr. Ministro, como início de troca de impressões sobre este departamento onde tanta coisa há a dizer, suponho que e suficiente.
O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro poderá responder a cada um dos Srs. Deputados individualmente ou no fim, globalmente. Creio, porém, que se respondesse apenas no fim se ganharia eficácia.
O Sr. Ministro da Cultura: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Lembraria aos Srs. Deputados que tínhamos previsto que às 11 horas e 30 minutos aqui estivesse o Sr. Ministro da Qualidade de Vida.
Acontece, porém, que se torna inviável, apesar da meia hora de atraso com que começámos os nossos trabalhos, pois são agora 11 horas e IS minutos.
Assim, darei agora a palavra aos outros Srs. Deputados inscritos, pedindo-lhes um esforço de síntese sem o que não será possível cumprirmos o mínimo de calendário.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Dá-me licença, Sr. Presidente? -
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Presidente, creio que em 15 minutos será extremamente difícil terminarmos esta audiência com o Sr. Ministro da Cultura. Seria talvez mais avisado adiar a deslocação ao Sr. Ministro da Qualidade de Vida para um outro dia ou outra hora; caso contrário o Sr. Ministro vai esperar pelo menos 1 hora, com certeza.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado Sr. Deputado, era exactamente essa diligência que ia fazer depois da recomendação que fiz à Comissão. Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.
O Sr. José Vitorino (PSD): — Sr. Presidente, a questão é importante porque logo na primeira matéria aqui analisada se verifica haver problemas quanto à questão de tempo.
Obviamente que este debate, que está previsto para 2 semanas, pode demorar 2 meses, bastando para isso que cada Sr. Deputado fale meia hora ou 1 hora sobre cada matéria. Porém, não podemos também entrar num sistema em que os assuntos não são minimamente discutidos. Por isso parece-me muito mais avisado usarmos um esquema mais formal embora corn alguma flexibilidade. Por exemplo, no início do debate de cada um dos temas com a presença de cada um dos Srs. Membros do Governo, quem quiser inscrever-se, inscreve-se e faz-se uma primeira distribuição do tempo, partindo a meio ou a dois terços o tempo disponível para todo esse debate e fazendo-se depois o rateio por cada Sr. Deputado.
Propunha isso à Mesa porque, a não ser assim, passaremos aqui algumas semanas e adiaremos sucessivamente a discussão dos orçamentos dos diversos Ministérios. Ora, como os membros do Governo têm também compromissos, nunca mais sairemos daqui e julgo que sem grande utilidade nalguns casos.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, no momento em que esteja só a Comissão reunida discutiremos esse tema. Vou dar a palavra aos Srs. Deputados que estão inscritos a seguir mas é óbvio que uma primeira conclusão deve ser tirada.
(Por deficiência técnica não é possível a reprodução desta passagem)\...] donde penso que antes de entrarmos numa proposta formal desse tipo se pode fazer aqui um esforço de ordenação das coisas, para que ganhemos tempo e cumpramos no essencial o calendário que está traçado para as reuniões com os membros do Executivo.
Se virmos que essa metodologia, seguida na prática, não tem os resultados que esperamos, então sim, temos que entrar numa via mais formal de discussão, usando
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como que um regimento interno para o desenvolvimento destes trabalhos.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Niza.
O Sr. José Niza (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados. Começaria por fazer uma sugestão ao Sr. Presidente, que não tem a ver com a discussão mas com o som desta sala. Penso que com este equipamento que aqui está se pode conseguir um som mais audível, que nos deixe menos a «flutuar no ar», que é a sensação que tenho, pois as colunas estão voltadas para o tecto fazendo aí ressonância. E vou tirar desta sugestão o ponto de partida da minha intervenção, porque penso que com os mesmos meios e com um pouco de imaginação ou de rigor técnico se conseguem melhores resultados.
A minha intervenção será muito breve e será dedicada, exclusivamente, à área da música. Não vale a pena estar aqui a repetir aquilo que já foi dito, inclusivamente pelo Sr. Ministro — que o Orçamento é um orçamento apertado — e talvez com alguma imaginação se consiga contornar algumas dificuldades que ele comporta.
Daria o exemplo de uma, pedindo desde já a opi-não do Governo, designadamente a do Sr. Secretário de Estado Alípio Dias, porque a proposta que iremos avançar terá incidências ao nível da cobrança de impostos.
E um lugar comum, dizer-se que em relação ao ensino, aprendizagem e execução da música, se não houver instrumentos não há música e que é, portanto, uma condição sine qua non de que a música possa ser praticada a de que haja acesso a instrumentos musicais. A situação neste momento, em Portugal, em relação à compra de instrumentos musicais caracteriza-se por uma recessão de cerca de 50 % verificada no ano de 1984, isto é, as casas que importam e vendem instrumentos musicais tiveram quebras de vendas de cerca de 50 %, o que não admira, na medida em que o alto custo dos instrumentos e a sua oneração leva a um retraimento da procura.
É realmente preocupante a quebra deste movimento de vendas, sabendo-se que o parque instrumental, se assim se lhe pode chamar, está deteriorado, pois é constituído por instrumentos antigos de todos os tipos e o facto de não haver renovação e possibilidade das camadas jovens terem acesso à sua compra, mais complica esta situação.
Adicionalmente, penso que em relação ao Orçamento de 1985 teria interesse sublinhar dois acontecimentos, um ao nível europeu e outro a nível mundial, que se realizam também em 1985 e que têm a ver com a questão que coloco: por um lado, a celebração do Ano Internacional da Juventude — e a juventude será o futuro de toda a civilização, designadamente da música — e, por outro, de uma maneira mais próxima, o Ano Europeu da Música, patrocinado pelo Conselho da Europa.
Penso que este Orçamento poderia, de uma forma um pouco mais do que simbólica e para além das comemorações que vão ter lugar, dar um pequeno contributo no sentido de que a música seja mais apoiada.
É evidente que o consumo de instrumentos se faz a vários níveis. O consumo das próprias escolas de ensino musical — que é um largo consumo com instrumentos
específicos e característicos — tem sido reduzido dada a carência de funcionamento dessas mesmas escolas e do Conservatório Nacional, que são quem verdadeiramente tem feito o ensino da música neste país. Refiro--me às bandas filarmónicas, que são algumas centenas, e cujas escolas de música anexas são, no fim de contas, quem tem nos últimos anos formado músicos novos, sendo hoje frequente ver-se a integração de várias gerações musicais nas próprias bandas de música.
Este é o plano mais generalizado porque abarca todo o País e as regiões autónomas e é também o plano mais modesto em termos de capacidade de compra. É vulgar ouvir-se dizer que o orçamento anual de uma banda filarmónica fica comprometido pela compra de um único instrumento, já não falando, portanto, nas dificuldades existentes em relação ao fardamento, etc.
Por outro lado, as camadas jovens que hoje têm, como é conhecido, largas dificuldades, designadamente nos sectores urbanos, teriam na música a consumação de um interesse que lhe ocuparia tempos livres e lhes daria uma cultura adicional em relação àquela que levam das escolas e das universidades. Há uma grande procura por parte dos jovens na aprendizagem da música, que é totalmente bloqueada pelo custo dos instrumentos.
Antes desta reunião fiz alguns contactos, inclusivamente visitei casas que vendem e importam instrumentos musicais e, para vos dar um exemplo, diria que o piano mais barato que se vende hoje em Portugal é um mini-piano — sendo portanto um piano rudimentar, logicamente japonês — que custa 470 contos. Ora, é praticamente impensável, a não ser em casos que percentualmente contam pouco, uma família comprar para o seu filho um piano que custa 500 contos. Só realmente famílias com grande poder de compra o podem fazer!
Instrumentos que mais corriqueiros como guitarras, violas, acordeões, etc, têm altíssimos custos, tudo ao nível das muitas dezenas de contos, o que realmente afasta os jovens da possibilidade da sua compra. De tal maneira esse afastamento é feito que, por exemplo, na aprendizagem e no ensino da música — e cito aqui um exemplo pessoal de uma filha minha — a solução é a flauta de plástico, que custa 300 ou 400 escudos e que está portanto ao nível das bolsas dos alunos. Estes, em vez de aprenderem piano ou outro instrumento qualquer, aprendem flauta de plástico e fica o problema resolvido já que não há realmente capacidade de aquisição de outros instrumentos.
É evidente que toda esta situação se complicou também com a valorização do dólar e no caso dos instrumentos musicais com a valorização do iene, porque a grande importação de instrumentos para o nosso país é hoje feita a partir do Japão, na medida em que são os japoneses que estão a tomar conta do mercado e a produzir a preços mais baratos. Ora, a valorização do dólar, por um lado, e a do iene, por outro, levou realmente a uma subida muito grande dos custos dos instrumentos. Portanto, para não estar a levar muito tempo, pergunto ao Governo a sua opinião sobre a nossa proposta. É evidente que sem haver movimento de vendas não há cobrança de impostos; os impostos têm um significado meramente teórico e o Estado não retira daí nenhum rendimento. Esta é uma área, tal como há pouco já foi dito e penso que isso é consensual em relação à questão do apoio ao livro, que penso não dever ser onerada com impostos equivalentes a pro-
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dutos de natureza sumptuária ou de luxo porque se trata de um investimento cultural, independentemente de favorecer um consumo, que garantirá, pelo menos ao nível dos jovens e ao nível do «metabolismo basal» de todas as organizações e pessoas que executam música, a manutenção do sector. Não sendo assim, este sector entrará numa crise grave.
Penso que este raciocínio, além de ser simplista, é um raciocínio com fundamento real: partindo do princípio que as baixas de vendas foram tais que o Estado acabou por não cobrar impostos — o que teria feito se houvesse vendas e neste caso concreto isso não aconteceu, ou quase — a incidência desta diminuição de receitas orçamentais será uma gotícula de água mesmo ao nível do orçamento da Cultura. Ora, penso que seria até psicologicamente estimulante, pois estas questões têm também uma dimensão psicológica, o acesso ou a renovação do interesse em relação à questão de execução musical. Não vamos, no fundo, avançar nenhuma proposta acabada exactamente porque, antes disso, gostaríamos de ouvir a opinião do Governo para que, em consequência, chegássemos a uma solução.
Penso que é perfeitamente possível criar um sistema de isenção de impostos e eu defenderia a isenção na sua globalidade, pelo menos em relação a toda a área das bandas filarmónicas e dos ranchos folclóricos, e uma isenção relativa quanto a outro tipo de comércio de instrumentos. Penso que estas isenções em relação às receitas do Estado, como disse, são uma gotícula e têm um significado cultural mais importante do que o significado financeiro, além de uma certa dimensão de pedagogia em relação à juventude.
Este ano é o Ano Internacional da Juventude, o Governo tem iniciativas a tomar nesse sentido e esta seria mais uma; seria uma forma marginal mas concreta e eficaz de comemorar essa celebração.
Quanto ao Ano Europeu da Música, o Orçamento reserva uma verba de 20 000 contos para essa comemoração, mas penso que só se pode falar de música e de concertos desde que haja música e, realmente, para isso é preciso que haja instrumentos. Recordo que aquele festival que teve lugar aqui em Lisboa há 2 anos, patrocinado também pelo Governo mas sobretudo pela Gulbenkian, foi um festival de excelente qualidade mas, lamentavelmente, a qualidade dos músicos foi importada porque a participação de músicos portugueses foi mínima e sobretudo feita à custa de solistas e não de orquestras, pois estas entraram também em crise já há alguns anos.
Penso que o essencial está dito e gostaria de ouvir a opinião do Sr. Ministro e do Sr. Secretário de Estado. Julgo que nesta matéria o Sr. Ministro da Cultura estará logicamente de acordo pois já trocámos impressões e é a «barreira» das finanças que, para este efeito, tem talvez mais interesse ouvir; da troca de impressões e das conclusões a que chegamos resultará depois uma proposta que formalizaremos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr, Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Ministro muito do que queria dizer já foi dito. Não posso, no entanto, deixar de lamentar que este orçamento do Ministério da Cultura seja realmente diminuto, o que vem comprovar que a cultura continua a ser olhada com certo desprezo pelos técnicos, que só
olham aos números e às questões financeiras, colocando num plano inferior todos os aspectos culturais.
De qualquer forma, Sr. Ministro, gostava de lhe fazer algumas perguntas.
Muito embora tenha havido um aumento de 400 e tal mil contos no Gabinete do Ministro, gostaria que desse uma informação a esta Comissão de como é que pensa aplicar essa verba que no ano passado era de 634 000 contos e este ano aumentou 409 000 contos.
Em relação à Direcção-Geral dos Espectáculos e dos Direitos de Autor, verificamos uma diminuição de 7000 contos (no ano passado a verba era de 77 000 contos e este ano ela baixa para 70 000 contos) numa área extremamente delicada e gostaria realmente de saber se há possibilidade ou não de dotar essa Direcção-Geral com uma verba superior.
Em relação ao Instituto Português do Livro, o Sr. Ministro já disse claramente as dificuldades que vai ter e referiu concretamente que vai desenvolver as publicações a propósito do cinquentenário de Fernando Pessoa; já agora gostaria de saber também se este ano não está nada previsto para Aquilino Ribeiro. A verdade é que o Instituto Português do Livro tem apenas mais 5000 contos, o que me parece ser uma verba extremamente diminuta.
Apesar dos investimentos do Plano terem aumentado realmente 380 000 contos, se fosse possível, gostaria que me informasse mais concretamente sobre a aplicação e sobre os investimentos referidos no Plano relativamente à quantia de 850 000 contos que foi atribuída este ano a Cultura.
Já foi referida aqui, pelo Sr. Deputado José Nisa, a questão da música, e gostaria de perguntar ao Sr. Ministro o que é que se vai passar em relação às orquestras sinfónicas do Porto e de Lisboa, de São Carlos e da RDP. Temos realmente orquestras com lacunas de vária ordem, nomeadamente com falta de instrumentos capazes e com muitas vagas por preencher no leque de violinos e não só. Gostaria realmente de saber o que é que se vai fazer em relação a estas orquestras sinfónicas, se há algum plano para a aplicação de verbas suficientes de forma a tentar evitar-se a hemorragia, como já foi dito e muito bem, de bons músicos e de bons dançarinos portugueses para o estrangeiro.
Em relação ao célebre IVA e não é por acaso que nós ouvimos o Sr. Ministro responsável por este novo imposto declarar aqui há dias na televisão que o livro, que vai ser realmente atingido pelo IVA, não é um produto prioritário. Vemos, assim, como os homens que funcionam nas finanças cuidam da cultura em Portugal e gostaria de saber, Sr. Ministro, se o Instituto Português do Livro, nomeadamente as publicações sobre Fernando Pessoa, Aquilino Ribeiro e outras iniciativas, vão também sofrer este imposto violento e se o mesmo sucede ao Instituto Português de Cinema e à Cinemateca.
No discurso do Programa do Governo, o Sr. Ministro propôs-se trabalhar em alfabetização e nessa altura nós saudámos claramente essa ideia. Creio que até agora nada foi feito nesse campo, que embora pretença ao Ministério da Educação foi referido pelo Sr. Ministro da Cultura como intenção de trabalho. Gostaria de saber se para 1985 e apesar de verificarmos que este Orçamento é extremamente reduzido, o Ministério pensa enveredar por esse campo e se vai tentar qualquer tipo de iniciativa.
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Em relação ao Teatro de São Carlos foi-lhe atribuída uma verba de 250 000 contos e gostava de perguntar se esta verba se justifica tal qual como tem sido aplicada.
A verdade é que o Teatro de São Carlos tem um papel fundamental da difusão da cultura mas fá-lo de maneira geral, para uma população extremamente reduzida. Apresenta meia dúzia de óperas e creio que não há uma escola de ópera, nem sequer uma escola de bailado no Teatro de São Carlos. Será que este ano vamos, outra vez, ter uma dotação para este Teatro de forma a que meio dúzia de privilegiados beneficiem de algumas boas óperas (que este ano, por acaso, foram até muito boas)?
A propósito, o Sr. Ministro tinha dito em tempos que pensaria melhor esta área (tentou-se no ano passado levar a música ao Coliseu do Porto e Coimbra) e que pretendia promover entradas gratuitas para jovens, nomeadamente a partir de 1985. Gostaria de saber se os jovens vão realmente ter essa possibilidade, que é essencial para eles.
Outros aspectos haveria e focar, como por exemplo em relação ao circo, a que foi atribuída uma verba de 1000 contos.
Relativamente a esta questão, gostaria de saber também se vai haver ou não, quando e como, qualquer política do Ministério da Cultura. O circo não é apenas um festival de diversão, é algo mais, é uma manifestação cultural muito importante; em alguns países há cursos de circo onde se aprendem cadeiras que vão da Filosofia à Psicologia. Sr. Ministro, iremos ter alguma vez o desenvolvimento de uma política sobre o circo em Portugal?
Finalmente, gostaria de saber se o Ministério da Cultura pensa deitar a mão à Casa José Relvas, pois, tanto nós como as autarquias, receamos a sua ruína imediata, na medida em que está em péssimas condições de conservação.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): — Sr. Ministro, Srs. Deputados: Vou ser muito breve pois o meu camarada José Manuel Mendes falou já do essencial das nossas posições. Queria só sublinhar que, para nós, é prefei-tamente inaceitável o orçamento da Cultura continuar a diminuir. Mal vai um país quando se acha natural cortar verbas na cultura. Creio que é o exemplo mais característico de uma gestão sem horizontes e sem perspectivas.
Não queria deixar de insistir ainda num outro ponto: se não damos à cultura, ao menos não lhe tiremos! Quero, portanto, apoiar aqui o que já foi adiantado por outros Srs. Deputados relativamente ao IVA e à sua aplicação ao livro e aos instrumentos musicais e creio que a sua má aplicação nestes casos era o mínimo de justiça que poderia ser feito em relação à cultura.
Sr. Ministro, Srs. Deputados: A vida cultural tem as suas experiências e faz os seus desafios, em relação aos quais não podemos ficar indiferentes nem alheios.
Este ano é o ano do quinquagésimo aniversário da morte de Fernando Pessoa; os «meios pessoais» de todo o mundo estão a preparar significativas homenagens. Como homem muito ligado à cultura francesa sabe certamente o Sr. Ministro o que se prepara em
França e nós não poderemos ficar num lugar muito secundário e afastado, pois é uma exigência da nossa própria cultura e da sua irradiação no mundo.
Fez o Sr. Ministro alusão às verbas mas, não tendo nós a noção exacta de quais as verbas previstas, gostaríamos que fosse um pouco mais concreto e que, portanto, considerasse aqui até que ponto podemos reforçar as verbas dedicadas a esse aniversário.
Queria, por outro lado, referir uma questão regional que tem também alguma significação nacional. No decorrer deste ano dirigi-lhe um requerimento em relação ao Palácio de Estói. Muitos Srs. Deputados conhecerão este palácio que é, sem dúvida, um valor importante do património histórico e artístico algarvio e que está num estado de degradação muito adiantado.
Fala-se da possibilidade da sua venda — e, enfim, sabemos que há quem trate disso — a uma entidade espanhola. A Assembleia Distrital do Algarve também já se pronunciou firme e muito claramente a favor da aquisição e do restauro do palácio, e mais, da instalação no Palácio de Estói do Museu do Algarve, que é uma necessidade para o Algarve, como alguns dos Srs. Deputados bem sabem.
O Sr. Ministro respondeu-me, no ano passado, que a aquisição do referido palácio se encontrava prevista ainda para esse ano. Portanto, ela não se concretizou apenas pela redução das verbas do Ministério.
Este ano procurámos nos documentos que nos foram distribuídos e não encontrámos qualquer verba destinada a este objectivo. Portanto, gostaria que o Sr. Ministro nos esclarecesse, mas desde já anuncio que enviámos para a Mesa uma proposta de reforço do orçamento do Ministério da Cultura, tendo em vista a aquisição do Palácio de Estói.
Srs. Deputados, digo-lhes isto no sentido de os sensibilizar para o facto de que não se trata de uma reclamação, digamos, regionalista, no sentido mais estrito desta palavra — pelo contrário. Portanto, não se trata apenas de recuperar esse valor que é o Palácio de Estói e os seus jardins; a recuperação deste palácio é a recuperação de uma grande parte do património histórico e artístico do Algarve.
Um dos problemas fundamentais com que se debate o património histórico e artístico do Algarve é a falta de um museu onde ele possa ser defendido e organizado. Por isso mesmo o que está aqui em causa não é só o Palácio de Estói mas o próprio património artístico e cultural do Algarve. Assim, gostaria que os Srs. Deputados tivessem isso em atenção no momento em que formos votar a proposta que apresentámos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.a Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.8 Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro: Como o Sr. Ministro sabe, o Porto é uma cidade com tradições culturais, embora, infelizmente, nem sempre tenha tido os apoios, por parte do Ministério da Cultura, que o povo do Porto bem merecia.
Sem perder tempo com algumas considerações que têm a ver com as companhias de teatro existentes no Porto e com todas as dificuldades e faltas de apoio que elas têm tido — refiro apenas algumas, desde o teatro experimental até às cooperativas de teatro existentes no Porto em geral, companhias que lutam com imensas dificuldades —, queria aqui referir casos mais especí-
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ficos apenas para frisar também algumas considerações já feitas quanto à Orquestra Sinfónica do Porto, com todos os problemas que tem. Por último, apresentarei uma proposta concreta que visa a aquisição do Teatro de São João, que é uma velha aspiração do povo do Porto.
Todos sabemos que o Teatro de São João tem tradições muito vivas, que remontam ao século xvui. Depois do incêndio de que foi vítima, sobre as pedras do antigo teatro, foi construído, no início deste século, o actual Teatro de São João, onde colaboraram artistas do Porto de inegável mérito — Diogo de Macedo, Henrique Moreira e outros. Por esse teatro passaram companhias nacionais e internacionais de teatro, de ópera e de bailado. Portanto, é fundamental que ele não se perca e, estando classificado como imóvel de interesse público desde 1982, é urgente a sua aquisição.
Sabe-se que já houve diligências nesse sentido, nomeadamente por alturas da realização do I Festival de Teatro Ibérico, do FITEI. Em geral, todos os anos, quando" se realiza o FITEI, é prometida, por parte de entidades governamentais, a compra do Teatro de São João, mas a realidade é que, até hoje, isso nunca aconteceu.
Nesse sentido, digamos que como uma primeira contribuição para que seja desbloqueada esta situação e se proceda, este ano, às negociações e à compra do Teatro de São João, propomos um reforço de verba de 75 000 contos nos investimentos do Plano que respeitam ao Ministério da Cultura, o que certamente permitirá desbloquear esta situação, embora ela possa não ficar ainda completamente desenvolvida. No entanto, deste modo garante-se, pelo menos, que o problema é encarado de frente e é resolvido, se houver vontade política para que assim aconteça.
Para terminar, apenas uma breve referência ao Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica que anualmente se tem realizado no Porto e que tem inegável interesse para a região norte, e até para o País, pois é um Festival de Teatro que já se impôs ao País e ao estrangeiro pela qualidade que tem assumido, embora não tenha tido os apoios que necessitava para, digamos, uma expansão ainda maior.
Não faço nenhuma proposta concreta de reforço de verbas no que se refere a esta questão, apenas deixo aqui a recomendação para que se tenha em conta a sua realização anual, para que se lhe dê a dignidade que merece e uma expansão maior de que a que já tem.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Peço à Mesa o favor de transferir o meu tempo para o meu colega de bancada Gomes de Pinho.
O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Em relação a este orçamento do Ministério da Cultura, a primeira questão, a questão fundamental que se pode pôr é a de saber em que medida é que este orçamento traduz a política do Governo, a política que foi anunciada pelo Governo e a que ele se comprome-
teu em matéria de Cultura. Do nosso ponto de vista, não há qualquer coincidência entre a política e o orçamento!
A segunda questão, que me parece fundamental, é a de saber como é que é possível compatibilizar um orçamento que, em termos reais, diminui efectivamente os meios financeiros postos ao serviço da Cultura em Portugal, com uma política de maior intervenção do Estado na Cultura.
O Sr. Ministro tem anunciado com frequência a criação de novos instrumentos de intervenção do Estado na Cultura e eu pergunto como é que é possível conciliar a criação desses novos instrumentos de intervenção com uma diminuição, em termos reais, dos meios financeiros à sua disposição.
É claro que podíamos aqui discutir interminavelmente as carências da Cultura em Portugal. Estamos todos de acordo com isso e facilmente poderíamos, em teoria, propor um novo orçamento para a Cultura, bastante mais volumoso e, mesmo assim, seguramente insuficiente para as necessidades.
No entanto, a questão que se deve pôr agora aqui não é essa. A questão que se tem de pôr aqui é a de como realizar um conjunto de objectivos culturais, que são inadiáveis, com os meios financeiros de que o Estado dispõe, seja com este orçamento, seja com outro. E isto porque se nós temos consciência de que este Ministério da Cultura não conseguiu sequer ser dos mais reivindicativos na distribuição do bolo global do Orçamento, também temos consciência de que qualquer que fosse o seu poder de reivindicação, o poder de afirmação política do Sr. Ministro, os meios que seriam postos à sua disposição seriam insuficientes.
Então, a questão que se tem de pôr é esta: que outros meios será possível obter para a Cultura, para além dos meios do Orçamento do Estado e como é que será possível gerir de outra maneira os meios que o OGE confere à Cultura?
Aqui, Sr. Ministro, é que nos parece estarmos perante uma confrangedora realidade.
Primeiro, o Ministério da Cultura não alterou fundamentalmente a forma de gestão dos meios financeiros que lhe estão afectos e, assim, continuamos a verificar que num orçamento escasso como é este, uma percentagem extremamente elevada — indevidamente elevada — é gasta em pessoal, em despesas de funcionamento, em serviços puramente burocráticos que consomem mais na sua própria gestão do que aquilo que distribuem. É o caso evidente da Direcção-Geral da Acção Cultural, que continua a ser um serviço macrocéfalo do Ministério da Cultura, cuja rentabilidade cultural é reduzida e que bem mais valia que os seus recursos fossem efectivamente afectos ao investimento cultural do que à autofagia em que essa Direcção-Geral actualmente se consome.
Por outro lado, continuamos a não encontrar — involuindo, aliás, em relação a uma politica que estava definida e que reunia um consenso significativo dos agentes culturais — fórmulas institucionais que permitam a captação de fundos para além dos fundos públicos e que, portanto, facilitem ou aumentem os meios disponíveis para a cultura. É, por exemplo, o que se passa em relação ao Instituto Português do Património Cultural e à gestão de todo o complexo do património cultura] e, designadamente, dos museus, em que só uma ousada politica de transformações institucionais poderia conciliar as necessidades urgentes de ac-
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tuação sobre o património cultural com a disponibilidade de novos meios financeiros de que o Estado não será capaz de dispor nos próximos anos, nem talvez nas próximas décadas.
Perante esta situação e este desafio, que nos diz o Ministério da Cultura? Diz-nos que tudo continua na mesma, que todas as estruturas se mantêm, que não há qualquer ideia de alteração estrutural profunda. E mais: aquilo que nos anuncia, aquilo que nos propõe, é a criação de mais serviços públicos, de novas direcções-gerais, de novos institutos, enfim, uma maior burocratização para a cultura, maior dispêndio de verbas com o funcionamento dos serviços e menores meios disponíveis para os agentes culturais!
Esta é, Sr. Ministro, a crítica fundamental que fazemos, com a consciência de que, num momento de crise como aquele que atravessamos, a cultura devia ser um investimento prioritário. E isto porque, porventura, seria através de um amplo consenso cultural que tivesse a ver com uma identificação comum das nossas origens, da nossa realidade e da nossa própria identidade, que talvez o nosso país pudesse encontrar o ânimo e alguns meios para poder relançar a sua própria actividade, não apenas no plano económico, mas no plano social e em outros que são condição indispensável à recuperação e à regeneração do País.
Não é, infelizmente, isto que acontece. Este Orçamento é um orçamento de crise para a cultura: é um orçamento que vai agravar as dificuldades dos agentes culturais e que nem sequer tem a imaginação de saber gerir a crise. E isso, Sr. Ministro, parece-nos extremamente grave!
Estou convencido de que se pudéssemos dispor deste Orçamento e dizer aos agentes culturais que fizessem a sua gestão, eles teriam sido bem mais imaginativos e, portanto, teriam encontrado formas bem mais rentáveis de gerir estes meios.
No fundo, Sr. Ministro, apesar de tudo, isto não é para nós uma surpresa porque, para além de V. Ex.a e da sua personalidade — que não está em causa —, o que se reflecte neste orçamento da cultura é também e ainda uma visão socialista da cultura e uma visão socialista da cultura não poderia dar outra coisa senão esta. Por isso também não nos surpreende que seja este Governo aquele que, de uma forma mais evidente, reúne um consenso crítico dos agentes culturais. É talvez surpresa para alguns mas não o é para nós, que, aliás, não esperávamos muito mais dele.
Sabemos que nesta matéria, como em outras, este Governo não é mais original do que os outros governos socialistas que, por essa Europa fora, são acusados de remeter a cultura para a última das prioridades e de, inclusive, terem uma das actuações mais anticul-turais das últimas décadas na Europa.
É com alguma tristeza que dizemos isto porque, independentemente do Governo, entendemos que a cultura em Portugal devia ter outro tratamento e que os agentes culturais, pela importância que se lhes reconhece como elementos indispensáveis da regeneração do País, deviam realmente ser considerados de outra maneira. Não foi, infelizmente, isso que aconteceu.
Sr. Ministro, apesar de tudo e apesar desta crítica global que fazemos ao seu orçamento, não nos dispensaremos de apresentar algumas propostas de alteração que pensamos que, apesar de tudo, poderão ainda melhorar a forma de distribuição e evitar o agravamento destes males que aqui enunciámos.
Pensamos que será também possível, através da articulação da política de despesas com uma política de receitas e, designadamente, com algumas inovações no plano fiscal, minimizar os efeitos negativos deste orçamento. No entanto, fazêmo-lo com a consciência de que, perante aquilo que nos é apresentado, pouco há realmente a fazer, pouco há a melhorar. A nossa crítica é global: pensamos que com este Governo não pode haver uma política de cultura muito diferente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.
O Sr. José Vitorino (PSD): — Sr. Presidente, pedi a palavra para uma intervenção breve e adiei-a em virtude de necessidades inadiáveis de sair. De qualquer forma, a questão é breve mas é importante e relaciona--se com o problema do Palácio de Estói.
Já tinha falado ontem com o Sr. Ministro sobre esta questão e hoje volto a pô-la porque, realmente, este é um problema que nos preocupa e não só a nós, sociais-democratas, não só à população do concelho de Faro, pois esse palácio é património cultural e histórico do interesse de todo o distrito e até do próprio País, de um distrito que, em termos culturais e em termos de monumentos, foi fortemente afectado pelas ondas sísmicas e pelos estragos que elas provocaram.
A degradação desse palácio é perfeitamente insustentável. A questão tem-se adiado e várias hipóteses se põem agora: ou o Estado compra ou autoriza a venda, com um determinado objectivo bem delimitado e preciso.
Penso que o Estado não pode consentir na venda daquele património, enfim, com uma perspectiva meramente comercial, que vá degradar ou que vá pôr fim ao que resta da riqueza histórica.
Obviamente que a solução ideal, solução adequada, será aquela que permita que entidades públicas tomem a seu cargo, sob sua responsabilidade, aquele património e o explorem. E quando digo entidades públicas, obviamente que aqui entra o Estado e, eventualmente, outras entidades. Portanto, penso que, até numa perspectiva de descentralização, o Estado, a nível central, e autoridades regionais podem, digamos que numa acção conjunta, resolver este problema, o que é aliás proposto por diversas entidades regionais.
Portanto, mais do que definir precisamente uma verba, o que realmente nos preocupa é o facto de não constar da proposta do Governo qualquer referência a esse assunto e, pelo que sei, a previsão não está feita.
Por parte do PSD e também do PS, afigura-se-nos que se deveria avançar com a posição muito clara de que o Estado iria, com as demais entidades que fosse possível congregar — penso que haverá disponibilidade para isso, conforme já foi demonstrado —, avançar na aquisição do Palácio de Estói, sem mais delongas, e, para esse efeito, devia ser prevista desde já uma verba, ainda que não fosse a verba que se supõe ser o valor de aquisição, que marcasse definitivamente o início do processo, que seria irreversível.
Portanto, pensamos que, em relação a esta proposta feita pelo PCP — nós não tínhamos a ideia de uma verba precisa, queríamos apenas a determinação de que isto avançasse —, se podem fazer aqui algumas reduções sem pôr em causa a aquisição, até porque, como se sabe, ha várias maneiras de fazer o contrato de compra, e, portanto, isso é perfeitamente possível. Assim,
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iríamos estudar aqui um outro tipo de proposta que, no fundo, salvaguardasse aquela que é uma preocupação comum, que é a defesa daquele património e, sobretudo, que ele seja posto ao serviço da colectividade.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): — Sr. Ministro, pedi a palavra para, muito brevemente, me circunscrever a uma única questão que se prende com a necessidade, geralmente sentida, de compressão de despesas, nomeadamente num Ministério em que, como todos vimos e a começar pelo Sr. Ministro, as verbas existentes são escassíssimas.
O ponto a que me quero referir é o das horas extraordinárias, relativamente ao qual se pode chegar à conclusão de que são largos os milhares de contos que no orçamento de despesa do Ministério da Cultura são atribuídos a horas extraordinárias dos mais diversos serviços.
Na rubrica «Despesas com horas extraordinárias» as verbas vão de um mínimo de 5 a um máximo de 1056 contos, a saber: 1056 contos na Direcção-Geral dos Serviços Centrais e 5 contos apenas para o Arquivo Distrital de Santarém, sendo certo e falando agora de arquivos distritais, que nos aparecem discrepâncias do género de os Arquivos de Aveiro, Faro, Portalegre e Setúbal não terem prevista uma única verba de despesa com horas extraordinárias, enquanto que já, por exemplo, o do Porto tem 150 contos, o de Viseu tem 68 contos e os outros arquivos distritais têm verbas que oscilam entre um mínimo de 5 contos, como já disse, e o máximo de cerca de 20 contos.
Relativamente às bibliotecas e aos museus passa-se outro tanto, desconhecendo-se a razão das discrepâncias, como, por exemplo no seguinte caso: nem um centavo se prevê de horas extraordinárias no funcionamento da Torre do Tombo; pelo contrário, em bibliotecas de secundaríssima categoria prevêm-se elevadas despesas com horas extraordinárias.
Gostaria de perguntar ao Sr. Ministro se, efectivamente, se encontram justificadas todas as verbas de horas extraordinárias previstas como despesa nos diferentes serviços do seu Ministério, o que perfaz, feitas bem as contas, larguíssimos milhares de contos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Américo Salteiro.
O Sr. Américo Salteiro (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha intervenção é apenas um protesto às declarações do Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Deputado Gomes de Pinho, na sua intervenção, aproveitou para criticar a ideologia socialista como responsável da falta de acções culturais.
O Sr. Deputado tem direito a criticar qualquer insuficiência de verbas, mas não lhe reconhecemos qualquer autoridade para fazer críticas a uma ideologia, responsabilizando-a pela situação que se vive na cultura.
O que se passa, e tão-só, é que o PS, por vontade popular, está a gerir, em conjunto com o PSD, um país que está em crise.
O Sr. Presidente: — Para um contraprotesto, tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): — Sr. Presidente, só queria perguntar ao Sr. Deputado Américo Salteiro se este orçamento traduz ou não a política do seu partido. É só isso!
O Sr. Deputado recusa o meu direito de criticar a ideologia socialista. É estranho, desde já, que o recuse, mas, enfim, eu não me vou envolver nessa polémica, pois não lhe reconheço o direito de me impedir de criticar a ideologia socialista. No entanto, o que me espanta mais é que o Sr. Deputado esteja a pôr em causa que este orçamento traduza a ideologia do seu partido. Se assim é o problema é seu.
Julgo que, apesar de tudo, neste orçamento é bem patente, não apenas uma ideologia, mas uma prática, uma forma de encarar o mundo da cultura por um governo que, de facto, é um governo socialista.
O Sr. Presidente: — Eu só pdia aos Srs. Deputados que não demorassem muito tempo neste tema, dado que ele é complementar em relação aos aspectos que discutimos, ou seja, as despesas do Ministério da Cultura.
Tem a palavra o Sr. Deputado Américo Salteiro.
O Sr. Américo Salteiro (PS): — Necessariamente que reconhecemos que as verbas inscritas para o Ministério da Cultura são insuficientes; é lógico que sim. Mas, num país em crise como estamos, não foi possível alterá-las.
O Sr. Presidente: — Se a Comissão não visse inconveniente, dava agora a palavra aos membros do Governo. O Sr. Ministro desculpar-me-á mas o Sr. Secretário de Estado do Orçamento manifestou-me a conveniência em sair um pouco mais cedo. Assim, darei primeiro a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento e depois ao Sr. Ministo.
A Comissão estará de acordo?
Pausa.
Tem, então, a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Serei extremamente breve, uma vez que a matéria de que me vou ocupar voltará, provavelmente, a esta Comissão, numa fase mais adiantada dos trabalhos.
Foi aqui abordado, designadamente, o problema do IVA e eu gostaria de salientar o seguinte: foram citados, nomeadamente, os casos da Irlanda e da Inglaterra e devo dizer que tivemos a preocupação de tentar alargar a base tributável, diminuindo simultaneamente as taxas. De facto, na Irlanda, há uma isenção relativamente aos livros, só que aí a taxa reduzida é de 22 % e a taxa normal é de 32,5 %. Ora, as taxas que estamos a utilizar em Portugal são taxas de 8 % e de 16 %. Julgo que é este binómio base tributável — mais ou menos alargada, ou mais ou menos estreita — e taxas que tem de ser ponderado; julgo também que as taxas de matéria especial devem ser abordadas com mais especialidade e um pouco mais de fundamento.
A preocupação do Governo foi realmente a de caminhar no sentido de alargar a base tributável. Os bens essenciais, obviamente ficaram sujeitos á taxa zero e,
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portanto, há uma isenção completa; mas sendo o livro, de facto, um bem essencial, ele é menos essencial que os alimentos, é cultural.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Sr. Secretário de Estado, obrigado por me ter permitido a interrupção.
A questão que lhe coloco é a seguinte: por um lado, o caso irlandês não é tão expressivo, do ponto de vista do mero confronto de taxas e de números, como é, por exemplo, o caso inglês, onde a opção foi feita e abandonada dados os graves riscos que comportou.
Independente disso, eu gostaria que o Sr. Secretário de Estado pudesse analisar a realidade portuguesa, a situação da cultura em Portugal, o problema gravíssimo que é, para a esmagadora maioria dos portugueses — para não dizer para a totalidade dos portugueses, porque, evidentemente, haverá sempre uma minoria possidente, com capacidade para comprar tudo o que quer —, nos domínios gerais do livro e particularmente nos domínios do livro escolar, comportar aquilo que é um ónus acrescido em relação a tudo o que foi feito no decurso dos anos e que não é minimamente compatível com a necessidade (essa sim uma verdadeira obrigação do Estado, verdadeira função da cultura) de levar a toda a parte, a preços acessíveis, o livro como instrumento de aquisição de conhecimentos, e também, como é óbvio, como instrumento de ludicidade e de criação do prazer da vida e do gosto pela leitura quê cada português deve ter.
É que a realidade é completamente distinta. Se formos comparar os índices económicos portugueses com os ingleses ou com os irlandeses, naturalmente que temos diferenças absolutamente abissais. Ora, em sede do Orçamento do Estado que estamos a discutir é o caso português, a realidade portuguesa que nos compete considerar e em face desta, não há hipótese nenhuma de deixar de dizer que o IVA não deve ser aplicado ao livro, aos instrumentos musicais, ao cinema e a outras realidades quejandas.
É para esta questão que eu queria sensibilizá-lo, fazendo, tanto quanto possível, aquilo que é útil: tentar, junto do Secretário de Estado do Orçamento — responsável por este tipo de problemas — inflectir o rumo que a barca leva, que é, realmente, de naufrágio.
O Orador: — O Sr. Deputado, está a partir do princípio de que, necessariamente pelo facto de estar prevista a aplicação de uma taxa reduzida sobre o livro através do IVA, os preços dos livros têm que aumentar 8 %. Julgo que está subjacente ao seu raciocínio este tipo de conclusão. Discordo e faço-o pelo seguinte: neste momento, quando uma livraria compra uma cadeira, uma máquina de escrever, enfim, qualquer equipamento, grande parte destas compras vêm oneradas pelo IT e o que acontece é que, com o método IVA, a situação não funciona nestes termos. Há aqui uma compensação entre o IVA pago a montante e o IVA pago a jusante.
Portanto, não vale a pena, não é possível, não é legítimo intuir-se e concluir-se, necessariamente, que a con-
sagração e a aplicação do IVA aos livros, determina, só por si, um agravamento do preço do livro em 8 %. Isso não é correcto e em sede própria havemos de demonstrar que, efectivamente, assim não é.
Sr. Deputado, isto é um aspecto que deve ser analisado em termos globais, julgo que noutra sede. Porque a alternativa é esta: ou realmente temos uma base tributável mais alargada e taxas menores, ou — se começamos a apertar a base —, Sr. Deputado, as taxas têm de saltar!
Está provado que neste país taxas altas favorecem a evasão e a economia paralela e nós temos de ter coragem porque não é possível ter um fiscal em cada esquina. Neste momento temos 33 milhões de contos em execução fiscal, em menos de um ano aumentámos em 10 milhões de contos os processos de execução fiscal e, de facto, temos de caminhar no sentido correcto, combatendo a evasão e a fraude. Ora, isso faz-se, do nosso ponto de vista, também com reduções de taxas dos impostos. É, um pouco, esta a filosofia que estamos a tentar implementar e vamos ver se realmente conseguimos levá-la a efeito.
Relativamente à questão levantada pelo Sr. Deputado José Niza, eu gostaria de avançar o seguinte: irei fazer os cálculos correctos — neste momento não os tenho de memória nem tenho aqui as tabelas — designadamente quanto aos instrumentos musicais, tendo em conta os direitos aduaneiros que pagam, a sobretaxa e o impostos de transacções, e talvez possamos encarar aqui (julgo que da parte do Governo há abertura para isso), não direi uma isenção, porque em Portugal temos que pagar alguns impostos, mas talvez, em tom de contraproposta, se me é lícito usar esta expressão, uma redução, pois podemos trabalhar aqui com reduções.
O Sr. José Niza (PS): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Niza (PS): — Sr. Secretário de Estado, eu só queria precisar um pouco mais a questão.
Em termos de ter o Governo de V. Ex.a mais ele-tos em relação a esta matéria? Logicamente o Sr. Secretario de Estado não os terá agora, mas poderia-mos adiar o assunto para uma troca de opiniões posterior, isto é, para a altura em que o Sr. Secretário de Estado tivesse esses elementos.
Em relação à medida em si própria, penso que, pelo menos quanto às filarmónicas e às bandas musicais, se pode ir perfeitamente para a isenção total dos direitos.
Em relação a outro tipo de comércio de instrumentos, junto de outras camadas da população ir-se-ia para um esquema selectivo, que custou a realidade. Penso que não é difícil calculá-lo, pelo menos, em termos de aproximação.
Penso, pois, que há abertura da parte do Governo para que esta medida possa avançar até por que, como disse no início, independentemente dos resultados que o Sr. Secretário de Estado obtenha, vai verificar que é uma gotícula de água em relação a receitas efectivamente cobradas: as vendas foram mínimas, logo as receitas têm que ser ainda menores!
Gostaria de concluir, pois julgo tem muita importância ouvir o Sr. Ministro da Cultura. Como quer que seja, julgo que amanhã de manhã poderei entregar ao
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Sr. Presidente da Comissão a estrutura das taxas que existem ,e, eventualmente, uma sugestão de uma contraproposta, que os Srs. Deputados farão também o favor de comentar e de reformular como entenderem.
De qualquer modo, serão aqui discutidas outras matérias — por exemplo a matéria de reforços de verbas para aquisições — e o Sr. Ministro da Cultura, para além doprograma que terá para expor sobre esta matéria, julgo que atenderá ao que o Sr. Presidente da Comissão vai propor, no sentido de todas as propostas de agravamento de despesas serem analisadas numa fase posterior, para termos uma envolvente global para ver o que será possível aceitar, sem perder de vista aquele equilíbrio instável ou precário que desejamos ter no Orçamento.
O Sr.. Presidente formulará, certamente, essa proposta e qualquer que ela seja — do nosso lado todos temos ã,consciência de que o défice é elevado —, julgo que o espaço de manobra não é grande, mas mesmo assim sendo, gostaria que nos encontrássemos aqui 1 hora, uma tarde ou uma noite, como fosse julgado convenientemente, para se tentar fazer uma apreciação global desse tipo de propostas que viessem a ser formuladas.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Digamos que não há grandes esperanças em que os livros não venham a ser onerados com o IVA!
Já agora, fazia-lhe a pergunta que fiz, muito claramente, ao Sr. Ministro da Cultura: pensa o Governo alargar essa classe tributável, por exemplo, as iniciativas do Instituto Português do Livro — nomeadamente às publicações sobre Aquilino Ribeiro e sobre Fernando Pessoa — ou a outro tipo de iniciativas culturais?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.
O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): — O Sr. Secretário de Estado disse que a percentagem apresentada para aumento do preço do livro era menos elevada do que aquela que estava aqui a ser focada e a argumentação que deu parece-me cabal. Mas tem o Sr. Secretário de Estado uma ideia, em termos de estrutura média e ponderando essa estrutura, dos custos de produção e distribuição de livros? Esta aplicação do IVA quanto é que dará em termos do encarecimento do preço do livro? Certamente que, no quadro da Secretaria de Estado do Orçamento, terá sido feita essa estimativa.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —
Relativamente à questão posta pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca eu diria que uma das características das normas jurídicas é a de serem gerais e abstractas e é muito difícil estar, pois, a conceber situações de isenção para casos típicos. As normas têm de ser gerais e abstractas e, ou as aplicamos ou não, não podendo sair deste âmbito.
Relativamente à questão posta pelo Sr. Deputado Hasse Ferreira, eu estimaria — partindo de um valor acrescentado à volta de 30% ou 40% — um agrava-
mento de 3% a 4% em matéria do preço dos livros. Julgo que não será este agravamento que virá afectar gravemente os interesses da população.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Cultura.
O Sr. Ministro da Cultura: — Vou tentar responder a cada uma das intervenções, ponto por ponto.
Começo, portanto, por responder ao Sr. Deputado José Manuel Mendes, do PCP. O Sr. Deputado achou que eu não tinha pintado a situação do Ministério da Cultura, com tintas suficientemente carregadas. Claro que isto depende, também, do gosto e do carácter de cada qual.
Porém, não me parece que eu tenha sido optimista, nem que tenha mostrado, com esta verba — que não pode ser outra —, um grande contentamento.
Falou de distorções dentro do Ministério, e achou que a partir de 1980 as verbas da acção cultural têm vindo a ser reduzidas de modo drástico. Não é bem assim, Sr. Deputado!
No ano passado, em 1984, as verbas da acção cultural sofreram um aumento significativo. É, realmente, este ano que a acção cultural se vai encontrar em maior dificuldade; mas o ano passado empenhámo-nos, com êxito, no privilegiamento da acção cultural. Aliás, anunciei até — e o Sr. Deputado terá certamente retido, pois disse-o em várias intervenções — que a minha política era justamente a de não empolar o prestígio e a de atender a esta necessidade de resposta (neste caso foi de resposta) que a acção cultural representa.
O Sr. Deputado fez comparações entre o Ministério da Cultura e a Fundação Calouste Gulbenkian que, pelos vistos, estão muito na moda e até na televisão se apresentam de maneira hilariante. Mas o argumento que emprega e vai em 2 sentidos: o Sr. Deputado comparou a exiguidade, relativa, das verbas do Ministério da Cultura com aquelas de que vem dispondo a Fundação Gulbenkian. Porém, também se pode empregar esta constatação noutro sentido e dizer: sempre há a Fundação Gulbenkian!
Falou depois do caso do Fundo de Teatro, que este ano vai ter graves dificuldades porque, precisamente, baixaram as verbas da acção cultural e as do Fundo de Teatro são, infelizmente, muito escassas. De qualquer modo quero lembrar ao Sr. Deputado que o teatro, e mais exactamente o teatro independente, necessita de uma intervenção cultural, e não apenas de subsídios. Em 1982 tivemos, realmente, uma larga distribuição de subsídios — nunca tinha sido a esse nível — pelos grupos de teatro e não houve melhoria qualitativa no teatro profissional!
Temos de meditar sobre os ensinamentos deste facto. Penso, realmente, que a verba que temos possibilidade de empregar em socorro do teatro independente é muito escassa, direi até insuficiente; mas também penso, Sr. Deputado, que há que intervir com coragem no problema do teatro independente. Isto porque nós temos, realmente, um número e uma dispersão tal de companhias de teatro — às vezes com uma atomização que provém de zangas — que se não optarmos pelo remédio de valor inverso, no sentido da concentração das verbas nas companhias realmente válidas, naquelas que no seu diálogo com o público se mostram de facto capazes de uma resposta popular, continuaremos a errar no domínio do teatro, isto independentemente das verbas serem curtas, serem exíguas.
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Penso que relativamente ao teatro temos que fazer 2 coisas e eu tentarei fazê-las. Se não me engano, é agora a altura de «atacar» no sector do teatro, porque a sobrevivência — e foi essa a minha primeira política, como foi a política seguida na esteira das políticas anteriores, inclusivamente do Sr. Secretário de Estado Gomes de Pinho —, repito, porque a sobrevivência ou uma facilidade para a sobrevivência não chegam, são necessárias opções e é necessário proceder-se a uma concentração.
Falou também o Sr. Deputado da exiguidade das verbas da Direcção-Geral de Espectáculos e do Direito de Autor e da exiguidade das verbas do Gabinete de Relações Culturais Internacionais. É verdade que na DGEDA a exiguidade de verbas é inquietante porque a DGEDA tem uma missão de fiscalização a exercer em todo o País, que concerne à segurança das casas de espectáculos, à aplicação dos regulamentos do espectáculo tauromáquico, etc., e, com tal parcimônia, vamos ter dificuldade em enviar por exemplo, para as diversas praças de touros os representantes da DGEDA, que seriam necessários e imprescindíveis para se moralizar o espectáculo taurino em Portugal, que bem necessitado disso está!...
O Orador: — O Sr. Deputado falou — e a expressão é bela — de tentar o impossível.
Eu gostaria de realizar o possível e de, nesse possível, não deixar que haja perdas.
Quanto ao IPC e ao IVA, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento não se alongou. Porém, eu poderei dizer-lhe o que penso desta introdução do IVA, que evidentemente vai afectar o Instituto Português de Cinema.
Sem dúvida que o remédio será proceder a outra distribuição, que privilegie principalmente — e até se possível exclusivamente — o cinema, não se continuando com a distribuição das verbas do adicional, que são empenhadas nas mais diversas finalidades.
Se conseguirmos uma repartição do que vai ser o adicional em prol do cinema, creio que teremos anulado os inconvenientes do IVA. Em todo o caso, há um problema quanto ao subsídio ao cinema, isto é, quanto ao subsídio para assegurar a actividade cinematográfica.
Talvez eu possa lembrar que em 1984 e nos começos de 1985, com uma gestão estrita, se puseram em exibição uma dezena de filmes portugueses e que isso significou uma certa coragem, um certo risco, apesar de alguns desses filmes portuguees terem uma qualidade apreciável.
Se compararmos o que sucedeu no cinema, quanto a filmes portugueses, em 1984 e em 1983, desculpar--me-á o Sr. Deputado Gomes de Pinho mas tenho a impressão de que o balanço será muito favorável ao que se passou sob a minha gestão. Mas nós vamos organizar — o Instituto Português do Património Cultural e o Ministério da Cultura, ou melhor, o IPPC como instituto tutelado pelo Ministério da Cultura e o Ministério da Cultura — um colóquio sobre o financiamento e os problemas do cinema hoje, na perspectiva da adesão à CEE, e contamos reunir em Lisboa representantes do cinema nos países da CEE.
Sei que para o Sr. Deputado a integração na CEE será um mal, mas não vou discutir este ponto, pois esta questão é muito geral. Em todo o caso, eu gostaria de inverter a análise.
As alternativas são integrarmo-nos ou não nos integrarmos e o Sr. Deputado e os seus correlegionários políticos têm dito e analisado com insistência os inconvenientes da adesão à CEE. Porém, salvo erro, a contrapartida não tem sido assegurada e não se têm analisado os inconvenientes da não adesão à CEE.
É certo que há inconvenientes na opção por um ou por outro dos termos desta alternativa, mas acho que os devemos analisar comparativamente e tenho para mim que a adesão à CEE tem muito menos inconvenientes do que a não adesão. Mas esta é uma questão larga, em que eu não gostaria de entrar, embora, evidentemente, o problema da adesão à CEE tenha também implicações no sector da cultura, nas importantes reformas e opções que temos de fazer.
Disse-me o Sr. Deputado que os espólios estão a perder-se.
Há sempre coisas a perder-se neste país, como há sempre coisas a perder-se noutros países, mas já lembrei ao Sr. Deputado, na precedente reunião que tivemos, que este ano comprámos o espólio de Florbela Espanca, que vai ser ultimada a operação para aquisição do espólio de Giacometti e que comprámos os três quartos do espólio de Vitorino Nemésio. Isto, apenas falando dos que directamente me passaram pela mão!...
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — E o espólio de Raul Brandão?
O Orador: — Quanto ao espólio de Raul Brandão não lhe sei dizer ao certo, mas parece-me que não.
Estas questões eram questões que se vinham atrasando por falta de opção. Foi esse o caso dos espólios de Vitorino Nemésio e de Florbela Espanca. Aliás, neste último caso, a questão vinha-se arrastando ha muito tempo e, de facto, após a análise directa das peças do espólio, pensei que, culturalmente, esta aquisição seria muito rentável.
Sei que a imprensa saiu a dizer que o detentor do espólio o tinha comprado por uma bagatela e que o vendia caro. Mas é muito difícil — o Sr. Deputado convirá nisso — aquilatar-se do valor cultural de um espólio e eu creio, ou melhor, tenho a certeza, de que o espólio Florbela Espanca vai dar uma dimensão maior, e muito importante, à obra de Florbela, permitindo expurgar dessa obra intervenções de terceiros, as quais, por serem sobretudo intervenções em sonetos, podemos dizer que, sem dúvida nenhuma são «piores as emendas que o soneto».
A Biblioteca Nacional está «confortada» este ano. Aliás, é um dos departamentos que estão «confortados» com um aumento de verba importante. No ano passado houve grandes dificuldades e durante o ano orçamental foi necessário prestar-lhe socorro. Este ano temos, de facto, a possibilidade de associar a Bibliteca Nacional — e aqui antecipo-me a outra questão — às comemorações do centenário do nascimento de Aquilino Ribeiro, o que, sem dúvida, será feito.
O Sr. Deputado diz que não entende que seja exagerada a verba para o Teatro Nacional de D. Maria II, mas devo dizer-lhe que, pelo menos, para lá caminha, em comparação com as verbas que beneficiam ou, melhor, que não chegam a beneficiar suficientemente o teatro independente.
É claro que certamente encontrará esta desproporção nos outros países. O Teatro Nacional de
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D. Maria II é o nosso museu vivo do teatro, é o nosso teatro nacional e esse não podemos, de maneira nenhuma, pôr em questão.
Quanto às verbas, houve, de facto, um aumento relativamente significativo, mas peço ao Sr. Deputado o favor de ter em conta que estas verbas asseguram também a possibilidade de se retribuir o festival de teatro e música espanhola que teve lugar em Lisboa com um êxito que, creio, o Sr. Deputado reconhecerá.
Ainda sobre o Teatro Nacional de D. Maria [...]
Em virtude de ter intervindo sem usar o microfone, não é possível a transcrição da fala do Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Orador: — Não sei se está ou não discriminado. Consegui um aumento para o Teatro Nacional de D. Maria II à última da hora.
Ainda agora um dos Srs. Deputados disse que não me tinha batido suficientemente pelo aumento do orçamento do Ministério da Cultura. Creio que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, Alípio Dias — que teve de sair — não será da mesma opinião.
Em virtude de ter intervindo sem usar o microfone, não é possível a transcrição da fala do Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Orador: — Pois, tem as suas razões.
Ainda sobre o Teatro Nacional de D. Maria II, gostaria de dizer que em 1984 a taxa de realização foi muito superior à que se verificou em 1983. Empregámos actores do Teatro Nacional como «actores--conselho» em alguns pontos do País — por exemplo no Porto —, creio que com um êxito assinalável.
No Ministério da Cultura estamos, realmente, a tentar utilizar os espaços que podem servir como espaços culturais. Temo-lo feito com insistência — e creio que com uma boa resposta do público —, com exposições de artes plásticas, que têm sido várias. Começámos já a fazê-lo também com a actividade musical e este ano vamos inaugurar o Auditório Carlos Seixas.
O Sr. Deputado referiu o empenho de verbas, mas devo dizer-lhe que se há alguma coisa que fica, apesar desta parcimônia e desta dificuldade em assegurar a gestão do Ministério da Cultura, é a Torre do Tombo, é o Auditório Carlos Seixas e é São Bento da Vitória. São coisas que não se gastarão como o fumo, nem irão com o vento!
Antes mesmo de podermos inaugurar o Auditório Carlos Seixas, porque estamos, como lembrou o Sr. Deputado José Niza, no Ano Europeu da Música, começámos com as actividades musicais no próprio espaço da galeria enquanto as não podemos acondicionar melhor no auditório, cuja inauguração será um dos actos com que contribuiremos para a consagração deste ano como o Ano Europeu da Música.
As comemorações do centenário do nascimento de Aquilino Ribeiro e do cinquentenário da morte de Fernando Pessoa têm o meu compromisso de que serão asseguradas com dignidade.
Já que o Sr. Deputado distinguiu entre resposta e proposta, e retomando uma oposição que eu próprio tenho feito, poderia apresentar as comemorações de Fernando Pessoa como uma resposta a um interesse larguíssimo e internacional e as comemorações de Aquilino Ribeiro como um teste e uma proposta, porque, como disse, a reputação e o conceito acerca de Aqui-
lino não estão, neste momento, em época farta, embora não sejam tão baixos quanto se pode pensar.
O Sr. Deputado falou depois do Instituto Português do Livro e dos seus critérios. Devo dizer-lhe que alterei em alguma medida os critérios do Instituto Português do Livro [... ]
O Sr. Carlos Brito (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Brito (PCP): — Relativamente às comemorações do cinquentenário da morte de Fernando Pessoa, o Sr. Ministro não referiu nenhuma verba, não é verdade?
O Orador: — A verba é de 20 000 contos.
O Sr. Carlos Brito (PCP): — Já agora, gostaria de saber que acções é que essa verba contempla.
O Orador: — Vai ser feita uma conferência pública e, aliás, já empossei a comissão que está a tratar das comemorações do cinquentenário da morte de Fernando Pessoa. Esta comissão foi constituída de tal maneira que espero que todos os partidos a reconheçam, isto é, com isenção. Com efeito, foram inventariados os organismos com legítima ligação a estas comemorações e pediu-se a cada um deles que nomeasse um representante. São, pois, esses representantes, nomeados cada qual pelo seu organismo, que estão a tratar das comemorações.
Haverá, inclusivamente, interferências entre as comemorações de Fernando Pessoa e o Ano Europeu da Música. Lançaremos um grande concurso, que muito brevemente vai ser anunciado, de composições sobre poemas de Fernando Pessoa. Embora haja já alguma criação musical sobre poemas de Fernando Pessoa, essa maneira de valorizar o escritor não é tão grande, clara e culturalmente válida como muitas outras.
Insistiremos, pois, nesse ponto da realização de um concurso de composições musicais sobre poemas de Fernando Pessoa. Estamos empenhados numa grande edição de Fernando Pessoa, nomeadamente com a realização de um grande colóquio, reunindo os mais significativos especialistas internacionais de Fernando Pessoa.
O Sr. Carlos Brito (PCP): — Dá-me licença que o interrompa de novo, Sr. Ministro?
O Orador: — Com certeza, Sr. Deputado, faça favor.
O Sr. Carlos Brito (PCP): — Sr. Ministro, há uma famosa exposição sobre Fernando Pessoa que esteve patente em Madrid e depois no Brasil. Neste momento está depositada no Ministério e o que lhe pergunto é se não seria este ano a altura oportuna para essa exposição ser mostrada ao público português.
O Orador: — Sem dúvida, Sr. Deputado, embora pense que para o* povo português essa exposição não venha a ter o mesmo impacte que teve no estrangeiro. De facto, essa exposição de Fernando Pessoa está gizada como uma apresentação do escritor. Ora, em Portugal, Fernando Pessoa não precisa propriamente de ser
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apresentado. O conhecimento de Fernando Pessoa é que precisa de ser aprofundado e discutido.
Quanto aos critérios do Instituto Português do Livro, creio que, fundamentalmente, este Instituto deve difundir a cultura portuguesa, o livro português, no estrangeiro e estimular ou provocar as traduções e as edições. Nos países de língua portuguesa, nomeadamente no nosso, o Instituto Português do Livro deve velar sobretudo pela reposição do património.
Assim, alterei alguma coisa nos critérios do Instituto Português do Livro. Não estou de acordo com o auxílio para edição de obras — que, embora de grande valor cultural, têm a sua saída normal e o seu público assegurados —, pois isso pode prejudicar os editores e livreiros, não constituindo, do ponto de vista do Ministério da Cultura, um grande benefício.
Não gostaria que o Instituto Português do Livro — e já impedi isto mesmo — se aplicasse a subsidiar os Maias, de Eça de Queirós, ou o Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco. Não encontro justificação para tal. Os Maias, de Eça de Queirós, e o Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco — que são apenas exemplos, uma vez que se pôs a questão sobre estes dois casos —, não necessitam de subsídios. Se estão integrados em colecções, só admito que o subsídio seja processado se essas colecções forem escolares e se a obra não vier em edição integral.
E já que mais uma vez me atribuem uma famosa ligação com a França, refiro o que sucede nesse país: em colecções escolares ou mesmo em colecções para a Universidade, os clássicos, não são editados, no caso do grande romance e da obra com saída comercial, em versão integral. Não encontra Le père Goriot, de Bal-zac, nem Os Miseráveis, de Victor Hugo, em versão integral.
Portanto, em relação aos romances, que têm uma saída comercial, não vale a pena estarmos a subsidiar aquilo que normalmente tem o seu curso assegurado e que o público adquire.
Há 1000 empregos para o subsídio do Instituto Português do Livro, em obras ou em preparação de edições cuja oportunidade é indiscutível e cuja necessidade se faz sentir.
Posso dar-lhe o exemplo de um caso em que me empenhei junto do Instituto Português do Livro, que é o da obra de Gomes Leal. A obra de Gomes Leal não existe hoje senão em alguns alfarrabistas e relativamente a muitos dos seus livros não há sequer uma edição geral cronológica. Ninguém conhece hoje a obra em prosa de Gomes Leal. É, pois, necessário preparar uma edição geral das obras de Gomes Leal — e creio que o critério deverá ser um critério cronológico —, a qual trará, realmente, um conhecimento novo e uma nova dimensão à poesia de Gomes Leal.
Parece-me que nisto é que se deve empenhar o Instituto Português do Livro, pois estas 2 linhas são fundamentais: a difusão no estrangeiro de obras portuguesas e a reposição do património.
O Sr. Deputado José Niza também focou o papel da imaginação — como, aliás, o Sr. Deputado Gomes de Pinho —, mas guardarei os meus comentários sobre esta imaginação para um pouco mais tarde.
O Sr. Deputado falou, igualmente, do Ano Europeu da Música e pediu algumas precisões sobre o que se fará.
Posso dizer-lhe que, desde as altas torres às caves do Ministério da Cultura, teremos uma comemoração
do Ano Europeu da Música. Quando falo das altas torres estou a referir-me às torres de Mafra, aos carrilhões de Mafra, cujos concertos, finalmente, começam a ser assegurados este ano, e quando falo das caves do Ministério refiro-me ao Auditório Carlos Seixas.
Falou-me, ainda, o Sr. Deputado, do problema da transformação qualitativa das orquestras sinfónicas e do meu empenho nisso. Duas das coisas que vamos fazer é o preenchimento de vagas e um salto salarial.
Quanto à ideia que avançou, devo dizer-lhe que é também a minha e, se houver receptividade por parte das Finanças, aplaudirei de contentamento essa receptividade para a isenção ou redução dos impostos que oneram os instrumentos musicais.
Talvez até possamos usar um outro argumento, que é o de que esses instrumentos que serão adquiridos com redução ou isenção não o seriam — e, portanto, não há prejuízo — se não houvesse essa redução ou isenção. Portanto, não há nenhuma perda de receita.
Quanto ao Festival de Lisboa, devo dizer-lhe que o retomaremos em 1986. O Governo não terminou com o Festival de Lisboa, apenas o espaçou.
Gostaria, evidentemente, que nesse festival não actuassem apenas orquestras estrangeiras, as quais vêm e nos habituam, de facto, a ouvir uma alta qualidade musical, e depois deixam o deserto, que funciona em detrimento da música que somos capazes de fazer.
Queria, portanto, acudir primeiro a esta prioridade, a esta ordem, pois parece-me ser muito importante acudir primeiro às necessidades ou, pelo menos, a grande parte delas, destas 2 orquestras e só depois renovar o festival. Mas renovar o festival incluindo as nossas orquestras, sem excluir que venham orquestras estrangeiras cujos modelos são, evidentemente, de considerar.
Gostaria que, após o festival, não acontecesse — como, por vezes, se tem verificado — uma espécie de «varrer de feira». Os grandes músicos das orquestras estrangeiras fazem as malas e depois é o deserto. Isto não me parece admissível, no interesse da música portuguesa. Portanto, creio qUe nesse caso o investimento não se justifica e temos de corrigir a concepção dos grandes festivais de música.
O mesmo se fez — e parece-me que os resultados estão à vista ou, melhor, estão ao ouvido — relativamente ao Teatro Nacional de São Carlos. Os Srs. Deputados terão, talvez, assistido a uma ópera de Wagner, Tristão e Isolda, e com certeza que reconhecem que há um ano atrás era impossível a orquestra do São Carlos tocar esta ópera. Decerto que não foi uma perfeição e algumas pessoas me têm dito, felicitando-me, mas com meias palavras, «bem, lá houve umas coisinhas...». Mas isto, ainda assim, é extremamente lisonjeiro, pois não houve apenas «umas coisinhas», houve muitas, muitas coisas! Porém, isto não impede o facto de que há um ano a orquestra não tocaria nem o Tristão e Isolda, de Wagner, nem o Casse-Noisettes, de Tchaikovsky.
Ora, o que se fez em 1984 foi apenas diminuir os grandes elencos e investir em seis violinistas! E o resultado percebe-se bem!...
O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca lamentou, mais uma vez, a exiguidade das verbas da Direcção-Geral dos Espectáculos e pediu precisões, se não me engano, quanto ao emprego do PIDDAC.
Posso dar-lhe esses dados na medida em que tenho comigo os quadros onde estão bem precisados os diver-
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sos empregos do PIDDAC. Por exemplo, vão ser feitos investimentos em estudos e projectos de instalação de museus, como a Casa Museu Anastácio Gonçalves, o Museu Abade de Baçal, o Museu da Agricultura, etc. Quanto ao Museu de Alcobaça, ele é um comprometimento meu, muito especial.
Devo ainda dizer que vai ser inaugurado dentro em breve o Museu do Teatro, que, infelizmente, não corresponde muito à minha concepção do que deveria ser um museu de teatro — mas, enfim, é uma herança. Parece-me mais um recinto para exposições sobre teatro do que um verdadeiro Museu Nacional de Teatro. Não creio que num museu nacional de teatro não possa haver uma evocação séria de Gil Vicente ou de Almeida Garrett.
Irão ver as exposições sucederem-se, com aquele perfume do retro que é muito agradável, aquele retro que vai até ao início do século, talvez mesmo até aos fins do século passado, começando com a exposição sobre Chaby Pinheiro, que, aliás, tem sido muito pouco invocado. Depois, são as personagens que temos na memória, são as melodias que temos no ouvido...
Contudo, penso que um museu nacional de teatro deveria ser qualquer coisa de mais substancial. Mas, enfim, congratulemo-nos com a inauguração de um museu nacional de teatro. Só lamento, a este propósito, que no Museu Nacional de Teatro haja uma bela plateia e em frente desta uma parede e que entre a plateia e a parede não haja um estrado, não haja um palco onde se possa retomar ou exercer a actividade teatral. Podem ver-se ali diapositivos e cinema, mas não se pode fazer teatro. E se eu ficar neste Ministério, corrigirei este grande desacerto.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca está a pedir-me a palavra, presumo que para uma intervenção.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Presidente, não sei se devo interromper agora o Sr. Ministro ou se não será melhor fazer novas perguntas no final, para esclarecimento de algumas questões que formulei.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, acontece que já há uma inscrição e são quase 13 horas. Portanto, teremos de ponderar primeiro como é que vamos gerir as inscrições.
O Orador: — Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, o que tinha aqui anotado é que V. Ex.a insistiu, se não me engano, nas isenções fiscais.
O que lhe posso dizer a este respeito é que se alargarmos muito as isenções, se não me engano, teremos de aumentar as taxas, o que é uma alternativa dolorosa.
O Sr. Presidente: — Desculpe-me interrompê-lo, Sr. Ministro, mas gostaria de chamá-lo à atenção para o facto de já serem 13 horas.
O Orador: — Sim, mas já agora gostaria de chegar ao fim das respostas.
O Sr. Presidente: — Com certeza, Sr. Ministro, faca favor. Peço-lhe apenas que as abrevie.
O Orador: — Depois, o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca falou ainda a respeito do Teatro
Nacional de São Carlos e disse que neste teatro se reúne uma camada de população — talvez um grupo social — privilegiada e que isto lhe parece ser uma crítica ao cuidado que se tem tido com o nosso teatro de ópera.
Devo dizer-lhe que quando vou ao São Carlos encontro sempre o teatro cheio; cheio e com público de pé, ladeando a sala. Ora, isto é algo de reconfortante em comparação com outras situações em que, como tantas vezes me sucedeu, quero ir a um teatro para meu prazer e também para ver o que se está a fazer, como é que está a ser empregue o subsídio do Ministério, e vou uma vez, duas vezes, três vezes e não há espectáculo por falta de público. Diversas vezes a companhia ou o grupo de teatro me perguntou se eu queria que fizessem um espectáculo para mim, mas eu nunca quis. A verdade é que há aqui uma desordem qualquer, há aqui qualquer coisa que não está certa.
Contudo, o Teatro Nacional de São Carlos tem estado invariavelmente cheio.
Quanto à escola de ópera, de facto ela devia funcionar. Em todo o caso, a escola de bailado funciona.
Tentarei, tomando a via das reformas — e julgo que, quanto a isto, estou de acordo com o Sr. Deputado Gomes de Pinho, pois irei no sentido que ele aponta —, integrar, com as devidas precauções, a Companhia Nacional de Bailado no Teatro Nacional de São Carlos. Acho que, pelo menos neste momento, não temos possibilidade de manter uma Companhia Nacional de Bailado, que tem um grande repertório de bailados, que sonha com os bailados românticos — aos quais, aqui entre nós, não sei porque fenómeno se chamam sempre bailados clássicos —, como o Lago dos Cisnes e o Casse-Noisettes, de Tchaikovsky, etc, quando, por outro lado, é necessário existir no Teatro Nacional de São Carlos, como bem próprio, um corpo de baile para as óperas, pois geralmente não se consegue que a Companhia Nacional de Bailado queira actuar. Ora, isto não pode acontecer.
O que se conseguiu com o Casse-Noisettes, de Tchaikovsky, foi significativo, porque os bailarinos tiveram uma sensação nova — e, do meu ponto de vista, muito agradável — ao dançar com a orquestra e sentiram a diferença entre dançar com a orquestra e dançar com uma banda sonora.
Hoje, da parte dos bailarinos há uma admissão da integração, o que contribuirá muito para a permitir e tornar fecunda.
É claro que também temos de conseguir que não haja subordinação do bailado à ópera e que a Companhia Nacional de Bailado, com as suas duas formações — a de ópera e a de grande bailado — não seja amputada desta última. Isto não é muito fácil, pois a Companhia Nacional de Bailado tem a sua escola de bailado. Aliás, as escolas de bailado têm proliferado em Portugal e não creio — e com certeza que o Sr. Deputado também não — que essa proliferação seja benéfica, porque algumas estão a ensinar bailado de uma maneira bastante comprometedora para os jovens bailarinos.
Quanto ao circo, bato no peito e digo mea culpa. Já no outro dia tive oportunidade de dizer que ainda não consegui encontrar verbas e um terreno que me dê alguma garantia ao ser pisado para agir de uma maneira significativa — para não dizer decisiva porque seria pretensioso — em prol do circo.
Contudo, estou inteiramente de acordo com a análise que os Srs. Deputados fizeram do circo e com o
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sentimento que têm para com ele. Acho que é uma actividade artística fundamental, que tem de ser estimulada. Porém, até aqui não tive nem dinheiro nem
— também devo dizê-lo — ciência para o fazer, não soube ainda como entrar nesse terreno extremamente movediço. Aliás, os que me precederam também não o souberam, visto que não houve lançamento de uma verdadeira política de circo e eu ainda não a encontrei.
Portanto, os Srs. Deputados e a imprensa poderão criticar-me por isso e tal crítica não será senão perfeitamente justa.
O Sr. Deputado Carlos Brito falou da isenção do IVA no caso do livro e dos instrumentos musicais e aplaudiu-a.
Devo dizer-lhe que, no caso do livro, garanti o diálogo dos editores e livreiros com a comissão que tratou do IVA e que está a regular os problemas que o IVA põe.
O meu empenho será evidentemente o vosso. Penso mesmo que é um empenho unânime desta Assembleia que o livro não seja onerado de uma forma que prejudique culturalmente o povo português. Assim, este diálogo está planeado e está em curso. Temos de o desenvolver e acompanhar, pois talvez saia alguma coisa dele.
O Sr. Deputado referiu ainda — aliás, tal como o Sr. Deputado José Vitorino — o caso do Palácio de Estoi.
Pois o Palácio de Estoi esteve inscrito nas verbas do Ministério, não este ano, e depois foi retirado. Eu abundo na opinião do Sr. Deputado José Vitorino, pois tratava-se de um bem a preservar.
É claro que nós temos de conceber alternativas. E se eu lhe puser esta alternativa, Sr. Deputado: Estoi ou Tibães? Qual é que o Sr. Deputado sacrifica?
A verdade é que não posso fazer uma recuperação pura de Estoi e de Tibães. E só há uma maneira de tentar acrescer significativamente o número dos edifícios recuperados: é a utilização com rendibilização. Aliás, já sucedeu comigo ter chegado a determinada localidade e ver um edifício inteiramente restaurado, como novo em folha, sem que as autoridades locais saibam o que hão-de fazer dele. Ou seja, o edifício foi recuperado, investiram-se dezenas de milhares de contos e depois.vai continuar a degradar-se, visto que está vazio.
Acho que isto não pode suceder. Temos de caminhar
— e estamos a tentar isso com um certo número de edifícios — para uma utilização turístico-cultural ou sócio-cultural. É essa a possibilidade que queremos dar ao Palácio de Estoi.
Sei que o Sr. Deputado José Vitorino ficou muito emocionado quando lhe disse qual a finalidade que neste momento pode estar prometida para o Palácio de Estoi, mas garanto-lhe que, relativamente à utilização desse palácio, os técnicos do património se pronunciarão de uma maneira séria e que, assim que tivermos os planos, haverá um estudo e uma opção por parte desses mesmos técnicos.
Tentarei não fazer atentados contra o património, atentados que são frequentes, que sucedem muito no nosso País como em todos, aliás. Tentarei não os fazer!
O Sr. Deputado Carlos Brito falou da recuperação do palácio para aí se instalar um Museu do Algarve.
Ora, não queria que sucedesse com este museu o que nalguns casos tenho constatado: foi o museu que precedeu as colecções, e depois, quando aquele está
pronto, ressaltou a exiguidade e a relativa insignificância das colecções.
Não podemos admitir, portanto, a proliferação dos museus!
Não estou a dizer que seja aquele o caso do Algarve e que não se deve criar um museu do Algarve. Só que, Srs. Deputados Carlos Brito e José Vitorino, gostava de ver primeiro o museu antes de ele ter casa, gostava de ver primeiro o acervo antes de o acondicionar. Não vamos recuperar, pôr tudo a luzir (é o termo) pára depois verificarmos que aquilo que temos são meia dúzia de coisas, um museu doméstico ou um museu simpático, mas sem nível.
O Sr. Carlos Brito (PCP): — Posso interrompê-lo, Sr. Ministro?
O Orador: — Faz favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Brito (PCP): — Podíamos até encarar o regresso ao Algarve de colecções que estão actualmente em Lisboa e em relação às quais haveria o maior interesse em que voltassem para lá.
Bom, e é conveniente não esquecer que, particularmente no domínio da arqueologia, o Algarve foi pioneiro em relação a outras regiões do País. Pelo menos aí, há alguma coisa.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, peço desculpa, mas estamos a ouvir a exposição do Sr. Ministro, à qual se poderão seguir, então sim, as perguntas de desejarem efectuar.
Faz favor de continuar, Sr. Ministro.
O Orador: — Sr. Presidente, vou abreviar um pouco a minha exposição, para permitir que se efectuem tais perguntas.
A Sr.a Deputada Ilda Figueiredo falou de uma «criança» e dos apoios ao Porto.
Creio que não tem grande razão.
Tenho-me empenhando bastante na acção, no âmbito do Porto, e levar para lá o Centro Nacional de Música é justamente uma proposta no sentido de acordar os brios — o Sr. Deputado Carlos Brito perdoar--me-á — da burguesia do Norte e de, tanto quanto possível, pô-la a contribuir para o financiamento, por exemplo, da Orquestra Sinfónica do Porto, que provavelmente dentro em pouco terá o seu estatuto de régie cooperativa. Mas seria necessário aumentar os cooperantes e não pô-la inteiramente às costas do Estado. Nisso estou de acordo.
O Centro Cultural projectado para a região que circunda a delegação regional do Norte começa este ano a ser construído e tem uma verba que permite avançar de uma maneira importante nessa construção ...
A Sr.8 Ilda Figueiredo (PCP): — 15 000 contos não ! é muito!
O Orador: — Pois, mas, enfim, cria-se o irreversí- , vel. Se este meu projecto for avante a Orquestra Sin- j fónica do Porto terá a sua sede e o seu local de ensaio ; no mosteiro de São Bento da Vitória. Temos um pro- ' blema com os monges beneditinos, que espero resol- j ver a contento de ambas as partes, sobretudo se puder recuperar o mosteiro de Tibães, pois o grande sonho dos monges beneditinos é voltarem à casa-mãe. Diga-
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-se de passagem que estes, tanto quanto posso julgar, não têm direito de posse sobre o mosteiro de São Bento da Vitória, que lhes foi cedido, a título precário, pelo ministro Santos Costa dos tempos que já lá vão.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Dá-me licença, Sr. Ministro?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Quanto a Tibães, a questão patrimonial está resolvida? Isto é, a questão que se colocava em relação à titularidade do património de Tibães está resolvida?
O Orador: — Não está. Trata-se de uma grande dificuldade que temos. Há uma opção da câmara, que o Sr. Deputado Gomes de Pinho conhece certamente, no sentido da expropriação, mas isso não é assim tão fácil de processar, pois, como no caso do São João do Porto, os que têm título de posse sobre o edifício não estão de acordo entre si.
Quanto ao caso do São João do Porto há dois interlocutores, estando um deles pronto a negociar. Quem me dera obter isso e criar o Teatro Nacional do Porto no São João pois é uma sala com a reputação de ter uma maravilhosa acústica e cujas tradições remontam a pouco mais da segunda metade do século xvin.
A aquisição do Teatro de São João é um empenho meu, aliás, várias personalidades estão a tentar ajudar--me nisso. Não estou em condições de prometer seja o que for, mas isso queria eu fazer.
A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — E o FITEI?
O Orador: — Temo-lo ajudado de uma forma significativa. Eu próprio lá estive e vi um trabalho que, tendo muitas vezes conotações ideológicas, é, todavia, teatralmente válido e o que conta é que teatralmente eíe seja válido.
Sr. Deputado Gomes de Pinho, se me permite que o diga, tem uma grande confiança no PS, que ressalta da sua exposição. O Sr. Deputado encarrega o PS de realizar e assegurar aquilo que o Sr. Deputado, enquanto esteve à testa do Ministério da Cultura, não conseguiu fazer e, nesse sentido, seria majs natural que o tivesse feito V. Ex.a do que eu, que sou socialista, não é verdade? Ou não será assim? De certa maneira isso é um cumprimento para o Governo.
Na sua crítica aquando da moção de censura discutida no Parlamento, o Sr. Deputado Lucas Pires disse que havia uma acção desestabilizadora do Governo em vários sectores e nomeadamente no sector cultural.
Na altura não pude intervir por já não haver tempo, pois da parte da manhã disseram-me que eu ainda intervinha e à tarde mudaram tudo.
De qualquer modo, fiquei um bocado inquieto com esta afirmação do Sr. Deputado Lucas Pires. Terei eu desestabilizado a Cultura em Portugal? Como? Tenho a grande maioria dos directores-gerais que os senhores tinham quando lá estavam e não creio que me tenha caracterizado por uma actuação sectária.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): — Posso interrompê--lo, Sr. Ministro?
O Orador: — Faz favor, Sr. Deputado.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): — O Sr. Ministro sabe se nós mudámos algum director-geral?
O Orador: — Essa resposta pode ser muito boa mas, em todo o caso, os actuais directores-gerais são aqueles que os senhores lá deixaram e a acção cultural que o Sr. Deputado critica — aquele grande complexo que é a acção cultural — foi a acção cultural que o Sr. Deputado me deixou!
Sei que os senhores tinham um projecto de reestruturação de acção cultural, que esse projecto é possível e que, quanto a alguns casos, ele é mesmo eminentemente necessário. Temos, por exemplo, um serviço de música dentro do sector da acção cultural e um outro no sector do património, e isto não me parece ser de manter. Agora, desarticular a Direcção-Geral da Acção Cultural — que foi, se não me engano, o vosso projecto — subentende criar novos organismos, a não ser que em certos tipos de intervenção se renuncie a eles.
Agora, quero criar a direcção-geral de música, por exemplo, conglobando o que há, isto é, o serviço de música do património e o da acção cultural, mas lá se vai criar um novo organismo. Portanto, ou se mantém aquele estado de grande nebulosa ou criamos os sistemas solares. Não vejo saída para este dilema: ou uma coisa ou outra! Evidentemente que há um outro tipo de intervenção cultural ou de fomento à cultura: o do tipo liberal ou neo-liberal, anglo-saxónico ou mais exactamente americano. Por que é que os senhores não o fizeram?!
O que não posso é, no estado actual da nossa legislação, deixar de intervir desta maneira, pois esta é a maneira possível!
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): — Posso interrompê--lo, Sr. Ministro?
O Orador: — Faz favor, Sr. Deputado.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): — Sr. Ministro, o que está em causa é de facto o modelo de intervenção que se tem, depois uma certa tradução orçamental e este Orçamento traduz o reforço do modelo de intervenção.
O Sr. Ministro acaba de dizer que vai, a partir de uma direcção-geral, fazer várias. A alternativa a isso, Sr. Ministro, é acabar com a direcção-geral, é acabar com as direcções-gerais e limitar a função do Estado àquela que ele deve ter enquanto subsidiar a Cultura, que é a de mera entidade financiadora. E aí, Sr. Ministro, fizeram-se muitas coisas, estavam muitas outras em curso e infelizmente o que aconteceu foi que tudo regrediu.
Cito-lhe, por exemplo, as formas de financiamento e quando o Sr. Ministro falar em imaginação...
O Orador: — Foi o Sr. Deputado que falou!
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): — Pois, reportava--me à minha imaginação. Por exemplo, é ou não uma atitude de imaginação financiar as comemorações de Fernando Pessoa e é ridículo que disponham de 21 000 contos com a emissão de uma moeda como se fez a propósito da XVII Exposição Europeia de Arte e Cultura?! É ou não uma forma possível? É ou não possí-
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vel fazer protocolos com outras entidades para financiar a Cultura? O que é que foi feito, Sr. Ministro? Nada!
A questão é que se está a retroceder a um modelo de intervenção excessivo, com custos de funcionamento superiores e o Sr. Ministro vai ter cada vez menos verbas para distribuir aos agentes culturais. E é nisto que se traduz a política do Ministério da Cultura!
Por agora é tudo, Sr. Ministro, e peço desculpa por me ter alongado na minha intervenção.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado será obviamente desculpado, mas eu também tenho de ser desculpado.
A questão é esta: estamos a discutir este assunto há 1 hora e 15 minutos, não sei de quanto tempo o Sr. Ministro necessita ainda e temos mais 4 pessoas inscritas.
Como têm visto, tenho utilizado na condução dos trabalhos a maior possibilidade de diálogo.
Porém, acontece que não temos tido, até este momento, possibilidade de cumprir o nosso programa e, assim, tenho de perguntar desde já à Comissão o que pensa fazer, uma vez que há ainda 4 oradores inscritos: podemos ou não suspender os trabalhos? Se, na realidade, vamos continuar a reunião, pergunto como.
E isto porque a realidade é esta: há 4 Srs. Deputados inscritos, o Sr. Ministro ainda não terminou as respostas às primeiras inscrições e é óbvio que temos de encontrar uma saída para a situação criada.
Para continuar a dar as suas respostas, tem a palavra o Sr. Ministro da Cultura.
O Sr. Ministro da Cultura: — Bem, eu conheço duas maneiras principais de financiar a Cultura: ou pelos dispositivos legislativos ou pelo subsídio investido.
Agora, Sr. Deputado, contra esta última modalidade, o subsídio investido, [...] (falha na gravação) [...] mas é que os dispositivos legislativos também. E isto porque as isenções e as facilidades fiscais se traduzem em quebra de receitas e, então, o Estado, prevendo as receitas, não tem o direito de optar; perde o direito de optar e de escolher o investimento, o que não é gratuito para o Estado, evidentemente. No entanto, se me puder sugerir todas as formas de financiar a Cultura, se me puder dar contributos, agradeço.
Sr. Deputado, que tal vai essa fundação para o património que o Sr. Deputado anunciou na Assembleia da República quando tivemos ocasião de discutir, ambos, a lei de bases?
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): — Penso que é muito importante ...
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, dá-me licença...
O Orador: — Sr. Presidente, a culpa foi minha.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, eu peço desculpa, mas ... (falha na gravação) ... o Sr. Deputado intervirá, basta tê-lo pedido ... (falha na gravação) ... a Comissão pondere como vai conduzir os trabalhos: se eles vão até às 13 horas e 30 minutos, até às 14 horas, 14 horas e 30 minutos ou até às 15 horas. A Comissão dirá como quer conduzir os trabalhos porque, de facto, estou a apelar para a vossa colaboração e não
estou a tê-la. Ora, preciso de saber como é que vamos terminar os nossos trabalhos.
Já pedi ao Sr. Ministro a possibilidade da síntese, o que também já pedi aos Srs. Deputados e, portanto, vamos continuar os nossos trabalhos.
Faça o favor de continuar, Sr. Ministro.
O Orador: — Ainda sobre este grande complexo, esta grande nebulosa da acção cultural, é preciso talvez lembrarmo-nos de que a Direcção-Geral de Acção Cultural tem os seus quadros preenchidos a 55 %, o que não me parece que seja exagerado.
Diz-me o Sr. Deputado que a cultura é um terreno de consenso. Tenho tentado isso mesmo, mas, muitas vezes, na vossa intervenção, no vosso discurso cultural — se me permite o Sr. Deputado —, há uma confusão entre as duas acepções da palavra cultura: umas vezes os senhores empregam-na em stricto sensu, outras vezes empregam-na em lato sensu e é claro que o Governo, ou o Ministério da Cultura, age sobre a cultura stricto sensu e não provoca a grande mentali-zação cultural que muitas vezes — quase sempre — é sujeita a caução.
Esses grandes movimentos culturais, esses desígnios culturais que certas épocas acordam, essas novas formas culturais, isso não é, de facto, da responsabilidade do Ministério da Cultura. O Ministério da Cultura tem de agir segundo a concepção stricto sensu da cultura, ou seja, tem de responder às necessidades das bandas, da ópera, etc. Essa é a intervenção cultural do Ministério da Cultura, o resto são concepções muito largas que requerem uma ponderação muito cuidada, pois, como o Sr. Deputado sabe, isto da cultura — ou pelo menos certo conceito de cultura — tem servido, às vezes, para levar a água a vários moinhos — que acredito não sejam os seus, bem entendido!
Sabe como a França tardou em criar um departamento especialmente encarregado da cultura. Havia como que uma desconfiança relativamente à prática cultural da Alemanha, à Kultur dos alemães. Temos de fazer bem a destrinça entre o stricto sensu e o lato sensu, e há um discurso cultural, ou cultural e político, pró-nacionalista, estimulante, exaltante, mas que, em meu entender, encerra alguns perigos para a estabilidade e para a democracia.
Poderia perguntar ainda sobre esta intervenção se enquanto o Sr. Deputado foi Secretário de Estado, a taxa de realização no teatro nacional foi mais alta? Se o teatro nacional teve mais público? O funcionamento do Teatro Nacional de São Carlos foi mais regular? Quantas greves tiveram? Quantas óperas ficaram inutilizadas? A actividade musical foi mais intensa? Determinou o Sr. Deputado o desencadeamento do processo de construção da Torre do Tombo? O Sr. Deputado deixou as orquestras a tocar?
O Sr. Deputado falou, há pouco, da XVII Exposição de Arte, Ciência e Cultura. Se me permite uma confidência, digo-lhe que se fosse o Sr. Deputado não falava desse assunto.
Falou-me das moedas que cunhou para a XVII Exposição. De facto, apesar das moedas, dessa imaginação, o Sr. Deputado, paradoxalmente, com essa valorização da imaginação, lembra-me os estribilhos de Maio de 1968. É uma associação surpreendente — demander 1'impossible, imaginer, vo/erf Bem, não continuarei! Acho que respondi, talvez, ao principal e também não quero abusar da palavra.
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O Sr. Presidente: — Estão inscritos os Srs. Deputados José Manuel Mendes, João Corregedor da Fonseca, Gomes de Pinho e José Vitorino.
São 13 horas e 20 minutos e, se por acaso os Srs. Deputados estiverem de acordo, prolongamos a sessão até às 13 horas e 30 minutos, hora a que terminaríamos. É a compatibilização possível com o estarmos cá às 15 horas.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, dá-me licença que o interrompa?
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Suponho que é irrelevante esse prolongamento. Um prolongamento de 10 minutos não nos adianta praticamente nada. Suponho que poderíamos interromper agora, visto que chegámos ao termo da intervenção resposta do Sr. Ministro — que ainda por cima foi muito bem-humorada. Vamos almoçar com o bom humor do Sr. Ministro e depois regressamos à tarde e recomeçamos às 15 horas, com o Sr. Ministro, a quem pedíamos o favor de voltar.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, não creio que essa seja uma boa solução, uma vez que às 15 horas já está marcado outro Sr. Ministro para estar aqui.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Outro Sr. Ministro?
O Sr. Presidente: — Com certeza, já estava marcado para as 11 horas e 30 minutos. Assim, não creio que essa seja uma solução, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — É o Sr. Ministro da Agricultura?
O Sr. Presidente: — Exactamente, Sr. Deputado. Tem a palavra o sr. Ministro da Cultura.
O Sr. Ministro da Cultura: — Se o Sr. Deputado Nogueira de Brito pede o meu apoio eu dou-lho e até lhe dou os meus votos de bom apetite.
Contudo, devo dizer que tenho um problema. Às 15 horas tenho a reunião do Conselho de Teatro, que vai ser bastante problemática.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Ai sim, Sr. Ministro?
O Sr. Ministro da Cultura: — É claro que a assembleia está primeiro.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, teremos de equacionar uma outra solução, pois essa não é mesmo possível.
O Sr. José Vitorino (PSD): — As intervenções iniciais foram bastante prolongadas — ou, pelo menos, o suficiente — e estão ainda 4 oradores inscritos. Julgo que 1 ou 2 minutos por cada um será suficiente — pelo menos pela minha parte esse tempo basta-me. Portanto, propunha que, realmente, se chegasse ao fim deste debate, sob pena de isto se eternizar.
É claro que proponho isto no pressuposto de que cada orador falará no máximo 3 minutos! O problema é estabelecer um limite para as intervenções. Se cada um falar um quarto de hora, obviamente que se deve interromper imediatamente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes, e eu limitar-me-ei a acompanhar o desenrolar dos trabalhos, pois todos os presentes conhecem os problemas de tempo.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Sr. Ministro, em estilo telegráfico, dado o condicionalismo existente, gostaria de voltar a colocar-lhe algumas perguntas às quais não me respondeu na intervenção que acaba de produzir, bem como duas ou três novas questões.
É possível dizer-nos qual é o montante das verbas destinadas às comemorações do centenário do nascimento de Aquilino Ribeiro?
Aquilo que disse relativamente à política de subsi-diação da edição pelo Instituto Português do Livro, e independentemente de outras considerações, leva-o a admitir que o projecto de biblioteca básica deve ficar congelado ou definitivamente anulado?
Por outro lado, em relação à Torre do Tombo, perguntaria se estava assegurada, pelas verbas inscritas no Ministério do Equipamento Social, a continuação da obra e para quando se prevê o final da mesma, uma vez que nessas mesmas verbas se estabelece a continuação para além de 1998 e há 12 000 contos saídos do Orçamento do Estado e 300 000 contos vindos directamente da Fundação Calouste Gulbenkian.
Gostaria de colocar-lhe algumas questões relacionadas com as autarquias e com o problema de se saber se havendo muito poucos investimentos centrais na actividade cultural das autarquias e um grande esforço de investimentos locais, se não imporia, de forma decisiva, um reforço dos investimentos centrais neste domínio, com o correspondente reforço do orçamento do seu Ministério.
Finalmente — dada a exiguidade do tempo —, quando o Sr. Ministro fala na resposta popular ao teatro, é para si critério definitivo e assente que só merece subsídio o teatro que tem largo público e não aquele que, por exemplo, pesquisa em áreas de alguma inovação? Isto é, é a política do Parque Mayer para todos os teatros? Ou é alguma coisa no sentido do equilíbrio entre essa, expurgada de erros, e uma outra que não deixe de apoiar a pesquisa, o teatro de intervenção e o teatro de vanguarda, assim considerado um pouco talvez acriticamente?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Ministro, gostaria de começar por lhe agradecer a sinceridade das suas respostas. Esperemos que todos os ministros tenham a mesma sinceridade do Sr. Ministro da Cultura.
Porém, queria ainda colocar-lhe, muito rapidamente, três questões.
Em primeiro lugar, gostaria de saber se vamos ou não adquirir a casa José Relvas.
Em segundo lugar, o Sr. Ministro disse que, possivelmente, a Orquestra Sinfónica do Porto seria uma régie cooperativa e falou no aumento de salários e no
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preenchimento de vagas. Contudo, como sabe, o problema das orquestras, dos instrumentos, etc, é muito grande e, portanto, pergunto-lhe que tipo de política se vai seguir para as orquestras sinfónicas e se, em relação à música, temos ou não música gratuita para os jovens em 1985. Cito, por exemplo, as óperas importantes que decorreram no Teatro Nacional de São Carlos e alguns bons espectáculos que não foram proporcionados a uma grande massa de auditores, nomeadamente de jovens, quer no Coliseu, como havia sido prometido, quer no Porto, em Coimbra, etc.
Em relação àquele programa do Governo que o Sr. Ministro anunciou sobre uma participação na alfabetização, gostaria de saber se o Ministério da Cultura já desistiu dessa ideia perante as dificuldades orçamentais.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.
O Sr. Gomes de Pinho (CDS): — Sr. Ministro, em primeiro lugar, gostaria de dizer que, de facto, a avaliação da acção do Ministério da Cultura de que fiz parte já foi feita por esta Assembleia — aliás, em devido tempo e em termos bastante lisonjeiros — e pelos próprios agentes culturais.
Portanto, nesse domínio não receamos qualquer tipo de comparação, mas também este momento não é o mais oportuno para o fazer.
Gostaria de lhe colocar algumas questõs concretas e de responder a algumas perguntas que o Sr. Ministro me fez.
Em primeiro lugar, relativamente à Fundação Nacional do Património Cultural, instrumento alternativo para a política de património cultural, que enquanto estivemos no Ministério da Cultura tentámos desenvolver e lançar — e cuja proposta depois apresentámos nesta Assembleia —, pediria apenas ao Sr. Ministro que, sobre essa matéria, interrogasse o Sr. Primeiro--Ministro, dado que ele desde há vários meses (suponho que há quase um ano) ainda não respondeu a uma carta que lhe dirigimos e que era um pressuposto para o desenvolvimento das diligências necessárias para a criação dessa fundação, em que, obviamente, o Governo deveria ter uma participação activa.
Em segundo lugar, em relação ao bailado, devo dizer que fiquei um tanto espantado porque o que o Sr. Ministro da Cultura nos veio aqui anunciar foi, de facto, a extinção da Companhia Nacional de Bailado e a sua integração no Teatro Nacional de São Carlos.
Gostaria de saber se essa intenção tem apoio em alguns dos responsáveis pelo bailado em Portugal e se não é um perigoso retrocesso em relação à autonomização da companhia, sem pôr em prática a possibilidade de cooperação entre as 2 entidades autónomas.
Em terceiro lugar, gostaria de lhe perguntar o que aconteceu à Escola Nacional de Circo. Isto porque havia uma política nacional de circo e um protocolo que permitia implementar essa política. Tudo isso parece ter sido paralisado desde que o Sr. Ministro foi para o Ministério da Cultura.
Em quarto lugar, gostaria de saber a razão pela qual o Sr. Ministro não continuou a política de procura de financiamentos alternativos que vinha a ser prosseguida e que tinha tradução na celebração de um conjunto de protocolos com outras entidades públicas e privadas. Embora o tempo seja escasso — e é pena que dispo-
nhamos de tão pouco tempo para discutir problemas tão importantes —, salientaria, por exemplo, o protocolo com o Ministério do Trabalho, em que, pela primeira vez, se relacionava a política de cultura com a política de emprego, de modo a permitir o restauro de importantes monumentos e bens culturais e a formação de uma nova geração de restauradores. O que é que se passa com este protocolo? O que é que se passa com o protocolo das Misericórdias? O que é que se passa com um processo de cooperação com entidades privadas, designadamente com a Igreja, não apenas ao nível de inventariação mas também do restauro de bens culturais?
De facto, Sr. Ministro, aí houve retrocessos graves que resultam, porventura, de alguns pressupostos ideológicos, mas que nada têm a ver com o interesse do património cultural português.
Gostaria ainda de colocar mais uma ou duas questões.
Diz o Sr. Ministro que tem pouco dinheiro, é verdade e infelizmente que não conseguiu ter mais. Realmente, este é um dos orçamentos mais negativos do ponto de vista cultural. No entanto, o Sr. Ministro continua a lançar novos investimentos.
Daí que lhe pergunte o seguinte: o que justifica que numa cidade, como por exemplo o Porto, em que há espaços culturais desaproveitados, degradados, em que é necessária uma intervenção do Estado para a sua recuperação ou para a sua aquisição, se vá lançar um novo centro cultural? E, sobretudo, o que justifica que o Sr. Ministro diga que ele se insere numa zona da cidade bastante carenciada?
Por tudo isto, perguntaria ao Sr. Ministro se conhece a cidade do Porto e a zona social onde se vai inserir o Centro Cultural do Porto.
Sr. Ministro, queria ainda colocar o seguinte problema: V. Ex.a diz que a cultura deve ser uma área de consenso. E assim é, realmente. Porém, acrescenta que a intervenção do Ministério da Cultura deve ser entendida em sentido estrito. E também assim é, de facto.
Se essa é a sua prática, Sr. Ministro, pergunto-lhe qual a razão por que em todos os sectores, designadamente no cinema, nas artes plásticas, na literatura, há uma crítica generalizada dos criadores da cultura e dos agentes culturais contra a política deste Ministério.
Para terminar, dado que o Sr. Ministro procurou muito a comparação entre o passado e o presente, pensando que ela lhe é favorável, pergunto-lhe, em relação ao cinema, ao abrigo de que planos, de que projectos e de que orientações foram feitos os filmes até agora estreados em Portugal. E o que se passa com a Tóbis, da qual o Ministério da Cultura tem a tutela, que, tendo passado de uma administração de 3 para 5 membros em nome da eficiência, não vê o seu programa de reestruturação apresentado e muito menos aprovado, quando o Sr. Ministro prometeu apresentá--lo no prazo de 6 meses? E o que se passa em relação ao financiamento do cinema português, que suscitou de todos os grandes realizadores portugueses, talvez com a excepção do realizador Manuel de Oliveira, uma rejeição completa, quer quanto aos montantes atribuídos, quer quanto aos critérios, quer quanto à filosofia do próprio programa?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.
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O Sr. José Vitorino (PSD): — Vou ser rápido para recuperar o tempo que o Sr. Deputado Gomes de Pinho gastou a mais...
Concordo com o Sr. Ministro quando refere que não se pode recuperar por recuperar, sobretudo se a recuperação for feita na perspectiva de a degradação continuar e se o aproveitamento não for o adequado.
Não me repugna uma solução mista desde que a recuperação e a preservação do património estejam salvaguardadas e simultaneamente este esteja aberto como sala de visitas que deve ser.
Agora o que parece fundamental é desbloquear-se o problema. Fizemos essa proposta dos 60 000 contos e pensamos que isso dá espaço de manobra suficiente para uma solução mista que preserve o essencial. Se se considerar que todo o palácio é excessivo para museu, penso que talvez alguma parte deva ser estritamente destinado a esse fim. Creio haver várias soluções possíveis, mas o necessário é equacioná-las e como não há verba alguma, bom, se do Orçamento não constar verba alguma para o palácio de Estoi, obviamente que o Governo terá pouco espaço de manobra e acabará por submeter-se a opções que não são as mais adequadas na perspectiva da defesa do património e na perspectiva cultural.
Daí a verba que propomos que, sendo muito mais reduzida que a proposta pelo PCP, permite, quanto a nós, a maleabilidade e o poder de negociação suficientes ao Governo para optar pelas soluções ideais ou pelas melhores possíveis, sem ficar escravo de propostas que eventualmente será obrigado a aceitar por falta de verba, para poder condicionar o que lhe é apresentado.
O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr. Deputado. Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Cultura.
O Sr. Ministro da Cultura: — Quanto aos 60 000 contos, compreende, isto é recusar os presentes das recherches, é uma atitude especial, mas se realmente houvesse um consenso e se as Finanças admitissem um recurso, pergunto a mim mesmo se esses 60 000 contos deveriam ser realmente empregues prioritariamente em Estoi, pelo menos enquanto o património não tiver seriamente analisado o plano de utilização que, neste momento, se prevê. Estes 60 000 contos podem ser muito úteis em muitos monumentos portugueses e em muitos monumentos da maior relevância...
Em virtude de terem intervindo sem usar o microfone, não é possível a transcrição da fala dos Srs. Deputados Carlos Brito e José Vitorino.
O Orador: — Não, prevê-se uma utilização médico--social do palácio de Estoi, segundo planos que estão a chegar ao património mas que ainda não estão completos.
É prematuro tomar-se posição sobre esses planos antes da reflexão pelos peritos.
Em virtude de ter intervindo sem usar o microfone, não é possível a transcrição da fala do Sr. Deputado José Vitorino.
O Orador: — Em albergue, Sr. Deputado? A palavra é forte.
Admiro muito o palácio de Estoi, ele é uma jóia arquitectónica do século xvui, mas comparativamente
com outros edifícios espalhados pelo País não sei se terá a primazia. Creio que não, não está na primeira linha dos nossos edifícios...
Em virtude de ter intervindo sem usar o microfone, não é possível a transcrição do Sr. Deputado José Vitorino.
O Orador: — Sem dúvida, mas assim também valerá. Com a utilização prevista também valerá.
As comemorações de Aquilino Ribeiro serão sobretudo asseguradas pelos organismos tutelados pelo Ministério da Cultura. Prevejo para essas comemorações uma verba inferior à das comemorações de Fernando Pessoa, o que é sujeito a crítica, de 10 000 contos.
Quanto à biblioteca básica, ela não figura entre as minhas prioridades e a discoteca básica é também um conceito que me parece muito falível.
Em virtude de ter intervindo sem usar o microfone, não é possível a transcrição da fala do Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Orador: — Não hoje. Quanto à contribuição da Fundação Gulbenkian para a Torre do Tombo, o seu número não é exacto. São 570 000 contos.
Quanto ao critério para o auxílio do teatro, Sr. Deputado, é evidente que o único factor a ter em conta não é o êxito junto do público, embora não nos possamos abstrair dele; o teatro, por melhor que seja — e não será o caso, muito generalizadamente —, se não tiver nenhuma ou quase nenhuma resposta do público não é teatro!
Em virtude de ter intervindo sem usar o microfone, não é possível a transcrição da fala do Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Orador: — Ah, não, não é o único critério, de modo algum; isso, então, seria muito fácil! A Casa José Relvas é pertença da autarquia, não é verdade?
Em virtude de ter intervindo sem usar o microfone, não é possível a transcrição da fala do Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Orador: — Pois, mas enfim, nós não vamos auxiliar directamente as autarquias.
A Casa José Relvas e o Museu-Casa dos Patudos são problemas difíceis, de facto, mas um auxílio directo à autarquia não é possível.
Quanto à política para as orquestras, creio ter dito o essencial: autonomia; personalidade mais independente da orquestra de Lisboa e da orquestra do Porto; preenchimento de vagas; salto salarial. E, concumitan-temente, com isto uma exigência nova. Não se trata apenas de melhorar o estatuto ou de o racionalizar, mas também de exigir mais, porque os nossos músicos ganham miseravelmente, não relativamente aos concertos que produzem, que são pouco eficazes.
Quanto à música gratuita ela tem existido, Sr. Deputado. V. Ex.a falou ainda há pouco nas saldas da Companhia do São Carlos e perguntou se elas se tinham verificado. Devo dizer que sim, para ir ao Porto, o que não é raro, a Coimbra, o que é mais raro, e ao Coliseu; por outro lado, houve também ópera gratuita para a juventude, o que vai continuar a verificar-se.
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O Sr. Deputado Gomes de Pinho falou numa crítica generalizada ao Ministério no meio do cinema e das artes plásticas. Tem certamente uma revista de imprensa muito bem feita! Ainda agora fizemos comparação mas devo dizer que o Ministério da Cultura é muito criticado, creio que o é sempre e não sei se na actual fisionomia é realmente mais criticado do que nas gestões anteriores. Deixo ao seu cuidado o discernimento dessa diferença.
Quanto aos pressupostos ideológicos, receio não ter entendido bem. O Sr. Deputado ao falar das relações com a Igreja disse que teria havido pressupostos ideológicos da minha parte. Refere-se concretamente a quê? Ao caso do Museu Machado de Castro? Nesse caso havia realmente um regresso à Igreja de um número de objectos de arte, que anunciava uma outra restituição e a seguir seriam 199 os objectos a restituir. Mas esses objectos não estavam nas reservas, estavam à entrada do Museu, e evidentemente que me opus peremptoriamente a esse regresso e não estou arrependido por o ter feito. Se vamos agora fazer essas restituições onde é que acabamos? E os quartéis também voltam às ordens religiosas?
Assinei um protocolo justamente para a restituição à Igreja dos objectos caracterizadamente ligados ao culto, o que não é o caso nem das estátuas nem das obras de arte!
Disse também o Sr. Deputado que todos os autores do cinema português falam contra esta gestão. O Sr. Deputado conhece o meio do cinema; é um meio turbulento e ainda bem, e de uma maneira geral existem sempre críticas. Como é que não havia de as haver se nós temos apenas possibilidade de subsidiar 10 filmes, o que é ridículo tendo em conta os pedidos que entram. Como é que isto pode não dar origem a um certo borburinho?
Este ano, de facto, puseram-se cá fora um número importante de filmes portugueses; foi um número mais significativo que no ano anterior, disso não há dúvidas.
Quanto à Tóbis, aguardo as conclusões da gerência, que ainda não me foram apresentadas e será sobre essas conclusões que teremos de fazer opções. Os estúdios da Tóbis têm estado em plena actividade, como sabe, com o filme Les Soulier de Satin, que está com 2 dias de adiantamento sobre o plano de filmagem, que terminam nos primeiros dias de Março, com os filmes e os spots publicitários habituais. Há uma utilização plena dos estúdios da Tóbis mas quanto à sua rentabilidade, creio que, de facto, ela não está assegurada. É um problema grave, que teremos de estudar, mas, como ainda não me foram apresentadas as contas, não posso ainda fazer uma análise.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.
O Sr. Carlos Brito (PCP): — Sr. Ministro, pedi a palavra para um brevíssimo protesto, no sentido de manifestar a minha estupefacção.
Forma-se aparentemente uma maioria para reforçar o orçamento da cultura, bem sei que apontada por um objectivo concreto: a aquisição e a recuperação do Palácio de Estói.
Ora, o Sr. Ministro parece não a querer aceitar, parece querer recusá-la, o que não pode deixar de me surpreender. Sem querer magoar, creio que é caso para dizer: pobre e mal agradecido!
O Sr. Presidente: — Para um contraprotesto, tem a palavra o Sr. Ministro da Cultura.
O Sr. Ministro da Cultura: — Sr. Deputado, eu tinha muito prazer em aceitar mais 100, 200 ou 300 mil contos ou mesmo mais 1 milhão de contos, acredite! Porém, tenho a noção da solidariedade governamental, que todos os membros devem ter, o que me impede de tomar essa atitude.
Não seria mais grato para ninguém do que para mim poder dispor dessas verbas, acredite, Sr. Deputado!
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro. Agradeço os esclarecimentos que teve a amabilidade de prestar à Comissão de Economia, Finanças e Plano, agradeço a colaboração prestada por todos os Srs. Deputados e estou certo de que à tarde vamos continuar os nossos trabalhos com a mesma eficácia e com a mesma dedicação aos esclarecimentos necessários aos nossos trabalhos.
Srs. Deputados, a nossa reunião recomeçará às 15 horas.
Está suspensa a reunião. Eram 13 horas e 50 minutos.
O Sr. Presidente: — Está reaberta a sessão. Eram 15 horas e 20 minutos.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, encontram-se connosco o Sr. Ministro da Agricultura e os Srs. Secretários de Estado do Comércio e Indústria Agrícolas e o da Produção Agrícola. Deste modo, estão reunidas as condições para iniciarmos os trabalhos, uma vez que também todos os grupos e agrupamentos parlamentares- estão representados.
Como método, vamos fazer um esforço de desenvolvimento dos nossos trabalhos, tendo presente a experiência da manhã, e tendo também presente o facto de o Sr. Ministro, às 16 horas e 30 minutos, ter de se ausentar. Se não esgotarmos os pontos que temos a tratar, teremos de combinar uma nova reunião com o Sr. Ministro que já se pôs à disposição.
Assim, peço para fazermos um esforço de eficácia e, se não vissem inconveniente, dava, desde já, a palavra ao Sr. Ministro para fazer uma prévia apresentação das questões.
O Sr. Ministro da Agricultura (Álvaro Barreto): — Queria dar a seguinte explicação aos Srs. Deputados: na realidade, fui convocado para uma reunião inadiável onde terei de estar às 16 horas e 30 minutos. Contudo, como já disse ao Sr. Presidente, voltarei depois dessa reunião e se esta ainda prosseguir ou, se os Srs. Deputados por bem entenderem que assim seja feito, noutro dia qualquer, mesmo que seja depois do jantar, terei o maior prazer em voltar a esta Comissão para dar os esclarecimentos que forem considerados como necessários.
Relativamente aos problemas principais do Orçamento do Estado de 1985, irei, de certa maneira — e peço desculpa aos Srs. Deputados que estiveram presentes na Comissão de Agricultura —, repetir um pouco a exposição que fiz na reunião dessa Comissão, para dizer quais são as linhas mestras que nos têm orientado no Ministério da Agricultura e que, no fundo, se traduzem no Orçamento que está presente para 1985.
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O primeiro problema que teremos que resolver, com clareza, é o da própria organização do Ministério da Agricultura.
Nos últimos anos, o Ministério da Agricultura tem sofrido todo um conjunto de reformulações e, neste momento, muitas das leis orgânicas dos seus diversos departamentos ainda não têm aprovação formal. Vive--se numa situação, de certa maneira, muito especial sem ligação permanente à função pública. No levantamento que fizemos, existem 13 000 funcionários de carácter permanente e cerca de 5000 de carácter não permanente ou tarefeiros. No que diz respeito às leis orgânicas do Ministério são poucas as que estão aprovadas.
Assim, iremos fazer um grande esforço, não só de aprovação das respectivas leis orgânicas mas, simultaneamente, de recionalização dessas mesmas leis orgânicas.
Penso que o Ministério da Agricultura, com 18 000 pessoas, em especial com um número elevado de pessoas situadas em Lisboa, não está a cumprir a função que devia cumprir, e que é a de dar um maior apoio directo à agricultura e aos agricultores.
Neste esforço de racionalização, iremos tentar diminuir o peso do Ministério a nível central e reforçá-lo a nível regional. Já temos preparadas diversas leis orgânicas e, ao longo do ano de 1985, iremos fazer uma racionalização nesse sentido, porque nos parece muito importante.
Na nossa concepção, o Ministério da Agricultura tem uma função de serviço de apoio aos agricultores, ou seja, tem de os ajudar a resolver os seus problemas, não devendo ser um serviço que funciona para si próprio. É, portanto, esta a nova orientação que pretendemos dar ao funcionamento do Ministério da Agricultura.
Simultaneamente, verifica-se que os investimentos feitos na agricultura, nos últimos anos, têm sido bastante reduzidos. A taxa de investimento no sector agrícola, comparado com a taxa de investimento noutros sectores, é por demais diminuta. Não nos parece estar de acordo com o que se considera ser — e todos os governos assim o têm considerado — um sector prioritário. Inclusive, temos à nossa disposição um sem número de financiamentos externos de diversos países com os quais o Governo tem vindo a assinar acordos bilaterais, cuja utilização, de acordo com a nossa visão, não tem sido a melhor.
Portanto, vamos organizar o Ministério para que esses empréstimos sejam devidamente utilizados, aplicados e contribuam para um maior investimento na agricultura. Esta é outra das linhas mestras que pretendíamos levar para a frente no Ministério da Agricultura.
Um outro sector a que iremos dar o maior apoio é ao movimento cooperativo, no sentido do seu fortele-cimento.
O movimento cooperativo, em Portugal, no sector agrícola, é bastante débil. Existem muitas cooperativas, mas todas elas têm grandes problemas e dificuldades. A adesão dos agricultores às suas próprias cooperativas não é um modelo de exemplo e, neste momento, temos problemas graves, não só financeiros, em muitas das cooperativas.
Parece-nos que temos de fazer um esforço no sentido de um apoio ao movimento cooperativo, de modo a que ele exerça funções e mobilize os agricultores em volta das suas organizações. Este é também outro dos
parâmetros que nos parece importante virmos a desenvolver no próximo ano de 1985.
Como já há pouco disse, quanto ao investimento, há investimentos para factores produtivos, mas há também muitos investimentos em infra-estruturas, nomeadamente caminhos rurais, trabalhos de electrificação rural, irrigação e drenagem, no qual pretendemos fazer um esforço grande, porque sem elas a nossa agricultura não poderá vir a desenvolver-se.
Entramos depois no campo da transformação e comercialização dos produtos agrícolas, onde também toda a organização do sector não pode dizer-se que seja modelar. No campo da intervenção, inclusive, há adaptações profundas que têm de ser feitas, principalmente adaptação a regimes, de acordo com aqueles que são os compromissos já assumidos pelo País face à adesão à Comunidade Económica Europeia. Falo, por exemplo, nos organismos de intervenção e sua criação, organismos interprofissionais, ou seja, um conjunto de organismos que irão substituir funções que hoje são efectuadas por outras entidades, nomeadamente pelos organismos de coordenação económica.
Fala-se muitas vezes na extinção dos organismos de coordenação económica, mas nós gostamos mais de falar na transformação desses organismos, de forma a que exerçam funções de acordo com aquilo que, neste momento, temos acordado com a Comunidade e que nos parece servir melhor a agricultura portuguesa.
Relacionado também com a comercialização e com a industrialização, põe-se o problema dos circuitos comerciais que, neste momento, como é sabido, são também deficientes. Há, pois, uma necessidade de criar toda uma infra-estrutura, que implica investimentos grandes, quer na criação de mercados — concentração de origem, quer na criação de mercados de abastecimento às principais cidades.
No projecto de investimento que temos, isto é, no PIDDAC, para 1985, locámos as verbas correspondentes para o início de um processo do lançamento de todo esse conjunto de investimentos, como é o caso do Mercado Abastecedor de Lisboa e também do Mercado Abastecedor do Porto.
Como peça fundamental de todo o desenvolvimento da agricultura, encontramos também o problema do créito. Já há pouco disse que o crédito à agricultura, principalmente ao investimento, é diminuto relativamente à formação bruta de capital fixo geral. Parece--nos que há que reaquacionar este problema, não só sob o ponto de vista institucional. Até agora existiu IFADAP, mas há, no entanto, as Caixas de Crédito Agrícola Mútuo que têm tido um desenvolvimento bastante importante e que nos compraz assinalar, havendo ainda a próxima criação da própria Caixa Central.
Na realidade, há que reaquacionar o sistema do IFADAP e optar pelo investimento, através da banca comercial ou através de qualquer alternativa intermédia.
Simultaneamente, parece-nos que o SIFAP, depois de alguns anos de funcionamento, deverá ser reformulado, no sentido de se marcarem opções mais claras e mais evidentes para os agricultores, de modo a que eles possam fazer as suas próprias opções de investimento. Isto não pode ser feito através do SIFAP, sistema que até há pouco tempo existiu, mas que por ter a pretensão de ser demasiado perfeito, teria sido, talvez, um pouco complexo no seu próprio manejamento. Parece--nos, pois, que há aí trabalho importante a efectuar.
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Vamos também trabalhar — como, aliás, se tem estado a fazer no último ano e meio — no problema do fomento da qualidade dos produtos agro-alimentares através da publicação de normas e da actuação do Instituto de Qualidade Alimentar. Isto porque temos que ter em linha de conta que, mais cedo ou mais tarde
— e penso que rapidamente! —, iremos ter que concorrer com produtos agrícolas de outros países, cuja qualidade está, hoje, bastante mais avançada do que a dos nossos produtos que aparecem nos mercados.
Quanto à parte florestal, o PIDDAC tem verbas bastante importantes. Como é sabido, o fomento florestal é uma das principais prioridades de desenvolvimento que se oferece ao nosso país. Temos cerca de 3 milhões de hectares com aptidão não agrícola, ou seja, com aptidão clara para o fomento florestal.
O Governo está empenhado num trabalho de fomento florestal através do seu acordo com o Banco Mundial. O Governo já promoveu a florestação de uns milhares de hectares, trabalho que se irá intensificar bastante ao longo do ano de 1985. Espera-se atingir um valor da ordem dos 18 000 ha a 19 000 ha de florestação, pelo próprio Estado, em 1985.
Ao contrário do que muitas entidades referem, trata--se de uma florestação que, de maneira nenhuma, vai concentrar-se numa única espécie de folhosas. Pelo contrário, o principal esforço vai exactamente ser feito no campo das resinosas e no da sobericultura, apresentando o esforço que foi feito na parte das folhosas um aspecto reduzido em relação ao esforço total. Há empresas de carácter industrial que estão hoje a fazer um esforço importante de florestação nesse sector, mas mesmo essas empresas, no seu cômputo geral, representam 55 % desse esforço.
Portanto, no cômputo, geral do País, as folhosas têm um aspecto bastante diminuto em relação a todo o programa de florestação.
Continuaremos a fomentar e a apoiar a parte de investimento e de apoio ao desenvolvimento da agricultura portuguesa, na medida em que, cada vez mais, não é possível a melhoria da nossa agricultura sem se avançar nesse campo, tal como na escolha de espécies especiais de sementes, e de diversa investigação. Também iremos reformular o funcionamento de todo o conjunto do Ministério na área da investigação, pois, de acordo com o levantamento que fizemos, entendemos que há, talvez, uma excessiva centralização e não uma libertação dos diversos centros de investigação com capacidade de actuação mais autónoma.
Vamos, portanto, caminhar no sentido de um maior contacto dos centros de investigação com a vida real
— e não uma investigação em circuito fechado —, no sentido de proporcionar um maior desenvolvimento nesse campo.
Tudo isto enquadrado, evidentemente, com uma política, que alterámos profundamente, de não mais encararmos o problema dos preços dos produtos agrícolas isoladamente, mas de os encararmos enquadrados numa política de rendimentos dos agricultores.
Pensamos que, no passado, se tomaram medidas muitas vezes não coordenadas, no sentido da fixação de preços e fixação dos custos dos factores de produção.
Por isso, aprovámos um calendário de fixação de preços agrícolas simultaneamente e em coordenação com um calendário de fixação dos custos dos factores de produção, no sentido de que a análise seja feita em
relação aos rendimentos dos agricultores e não somente em relação ao factor preço. Muitas vezes, o aumento de um preço, em percentagem elevada, pode não corresponder a um aumento do rendimento ou, pelo menos, à manutenção dos rendimentos dos agricultores se, simultaneamente, não houver o cuidado de fazer a sua coordenação com os factores de custo de produção.
Nesse sentido — e penso que é importante salientar isto —, já para 1985, teve-se em linha de conta, por exemplo, a fixação do preço do gasóleo para a agricultura, em que o Governo acordou que o gasóleo iria ser fornecido ao preço de custo, ou seja, sem qualquer contribuição para o Fundo de Abastecimento. Isso permitirá que o gasóleo para a agricultura, ao longo do ano de 1985, aumente muito pouco, ou praticamente nada, em relação ao preço que foi fixado em 1984.
Em 1984, o preço fixou-se em 44$50; em 1985, a previsão aponta para um preço à volta dos 46$, 47S, o que é um aumento bastante diminuto em relação àquilo que foi a experiência do passado. Acima de tudo, definiu-se a política para o futuro, ou seja, o gasóleo que será, para sempre, fornecido à agricultura ao preço do seu custo real, sem que o Estado lance sobre ele qualquer imposto ou qualquer contribuição.
A mesma política foi feita em relação aos adubos, na qual houve também uma preocupação, talvez até um pouco por «embalagem» do passado. E que a indústria sempre foi fortemente subsidiada em vários milhões de contos por ano, dentro de uma perspectiva de apoio à agricultura.
Mandámos fazer uma comparação dos preços dos adubos em Portugal com os preços dos adubos nos países europeus com os quais estamos a concorrer e verificámos que o subsídio aos adubos não é mais um subsídio à agricultura portuguesa, é, sim — e terá todo o direito de o ser — um subsídio feito à indústria portuguesa produtora de adubos. Os nossos adubos tinham, pois, os seus preços mais elevados do que nos restantes países europeus. De memória, direi que, em relação à França, era de 12 %, muito mais em relação à Grécia e cerca de 8 % a 10 % em relação à Alemanha.
Assim, ao decidirmos um aumento de 18 % nos adubos para o ano de 1985, isso representa que, em 18 meses — de Junho de 1984 até 31 de Dezembro de 1985 —, se faz um aumento geral de 18 %, ou seja, um aumento anual inferior a 12 %, o que permitirá que os nossos adubos não aumentem de preço em relação aos seus congéneres estrangeiros e, acima de tudo, fiquem mais ou menos nivelados em relação aos adubos de Espanha, impedindo, deste modo, fenómenos de contrabando que têm existido no passado. Mas, acima de tudo, houve uma grande preocupação de fazer uma comparação com outros valores europeus.
O mesmo se fez em relação, por exemplo, às rações para animais onde, apesar dos aumentos que recentemente se fizeram em alguns componentes importantes das rações — como o caso do milho, no qual se fez um aumento de 26 %, e também noutros componentes, em que se fizeram aumentos de cerca de 20 %, como é o caso dos produtos secundários —, se optou também por acompanhar esses aumentos com a autorização da incorporação de outros produtos secundários, economicamente mais baratos, na composição da ração. Ora, isto faz com que o aumento geral da ração para 1985 se cifre à volta de 5 °7o ou 6 % do seu valor
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total, o que é muito inferior à taxa de inflação, beneficiando assim toda a pecuária que lança mão dos alimentos compostos para os animais.
Ora, o mesmo será feito em todos os outros campos. Por exemplo, durante esta semana serão fixados os preços referentes a todas as culturas de Primavera--Verão. Portanto, até ao fim do mês de Janeiro — e ao contrário do que se tem vindo a fazer no passado — serão fixados os preços do milho, do arroz e de todos os outros produtos de cultura, dando assim claras ideias de orientação a todos os produtores agrícolas.
Também houve um aumento de preços muito substancial à produção agrícola no que respeita ao ramo florestal — ramo esse que consideramos prioritário no desenvolvimento do País —, que é de 35 %, e que estará em vigor apenas até 1 de Outubro de 1985. Portanto, ambiciona-se atingir um aumento de cerca de 40 % em relação ao que tinha sido decidido no ano anterior.
Todas esta medidas foram tomadas no sentido de encarar o problema dós rendimentos dos agricultores e de garantir que estes irão aumentar durante o ano se 1985.
Um país como Portugal não poderá continuar a suportar uma situação de estagnação da agricultura, situação essa que se tem mantido nos últimos 30 anos. Portanto, ao declararmos politicamente que ela é prioritária, temos que actuar nesse sentido.
Ao analisar as verbas que estão inscritas no Orçamento, tal como já fiz na Comissão de Agricultura e Mar, queria chamar a atenção dos Srs. Deputados para o facto de que elas também têm que ser vistas em conjunto com outros elementos — que não sei se foram fornecidos aos Sr. Deputados — e que dizem respeito ao orçamento do Fundo de Abastecimento.
Isto porque o orçamento do Fundo de Abastecimento contém valores importantes de apoio à agricultura que, do meu ponto de vista, devem ser vistos em conjunto com o Orçamento de Estado que neste momento está em discussão.
No que diz respeito ao Orçamento corrente, ordinário, devo dizer que a verba prevista é de cerca de 9 milhões de contos, verba essa que está calcudada para fazer face à reestrutuaração do Ministério e à aprovação das diversas leis orgânicas. Nesta verba estão incluídos os valores referentes ao pessoal permanente e ao pessoal eventual que ao longo de 1985 irá ser integrado nos diversos serviços.
Foi também atribuída uma verba de cerca de 6,5 milhões de contos, verba essa que manifesta um aumento substancial em relação ao ano anterior — penso, pois, que esse aumento é da ordem dos 60 % —, e que demonstra o interesse e a ênfase que foram postos no investimento das infra-estruturas e no apoio da liberalização das infra-estruturas agrícolas.
Uma outra verba que também tem que ser considerada no total é a chamada conta de ordem, que diz respeito às receitas que os diversos ministérios têm para fazer face a diversas despesas que somam cerca de 6 054 000 contos.
Foram também atribuídas outras verbas importantes no orçamento do Fundo de Abastecimento, que somam cerca de 19 milhões de contos. São verbas com vista a atingirem-se objectivos diferentes, como, por exemplo, as que são destinadas para subsídios aos cereais, para subsídios ao gasóleo, para garantir que os
diversos organismos possam fazer intervenções em condições importantes, etc.
Portanto, estar a discutir o orçamento do Ministério da Agricultura sem se analisar o orçamento do Fundo de Abastecimento será um semiexercício, na medida em que uma importante parte dos recursos vem desta fonte.
Em resumo, devo dizer que a orientação que damos no Ministério é no sentido de atribuir uma grande ênfase ao investimento e à tentativa de redução de despesas correntes não produtivas, já que penso que é isso que é essencial para o futuro da agricultura portuguesa.
Creio que esta introdução poderá servir de «aperitivo» e com a continuação do debate terei muito prazer em referir detalhadamente, ponto por ponto, as questões que forem surgindo.
O Sr. Presidente: — Inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados Rogério de Brito, José Vitorino, Vilhena de Carvalho, Corregedor da Fonseca e Bento Gonçalves.
Portanto, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério Brito, a quem desde já peço o favor de fazer um esforço de síntese ao formular os pedidos de esclarecimento, esforço esse que é costume no Sr. Deputado.
O Sr. Rogério de Brito (PCP): — Sr. Presidente, creio que V. Ex.a está a bricnar ao atribuir-me essa qualidade de síntese porque, na realidade, tenho muita dificuldade em sintetizar e mais dificuldade terei quando se está a discutir uma questão como a presente que, apesar de tudo, envolve uns milhões de contos e um melhor aproveitamento das dotações que já de si são tão parcas.
Sr. Ministro, julgo que não seria honesto da nossa parte virmos aqui propor alterações às dotações orçamentais sem estarmos devidamente fundamentados. Nessa medida, tentámos analisar o mais profundamente possível a proposta do Governo relativa à agricultura, sendo certo que em relação a algumas áreas temos manifestas dificuldades dada a carência de uma maior informação. Como o Sr. Ministro teve que se deslocar ao estrangeiro, tal facto deve ter dificultado, certamente, o cumprimento da disponibilidade que manifestou na reunião da Comissão de Agricultura e Mar, no sentido de nos enviar a relação dos projectos que o Ministério tem programados. De algum modo, isso dificultou uma parte substancial da análise que tentámos fazer.
Contudo — e agora procurando ser mais preciso —, há algumas áreas que quanto a nós seria importante que fossem esclarecidas para podermos ter em conta se elas contemplam ou não algumas das propostas que possamos vir a fazer de alterações à dotação orçamental.
Referimo-nos, pois, às verbas que estão atribuídas ao Gabinete do Ministro. Em relação a algumas delas o Sr. Ministro deu-nos um esclarecimento das suas atribuições, mas a verdade é que no cômputo geral e relativamente às acções prioritárias estruturais falta-nos o mínimo de informação para podermos fazer uma análise. O mesmo se passa em relação ao próprio programa de lançamento de infra-estruturas de agricultura associada, pois embora admitamos que este programa signifique apoio ao cooperativismo não sabemos em que áreas.
Estes são, pois, dois aspectos que para nós é importantes que sejam esclarecidos.
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Alguns esclarecimentos que consideramos necessariamente prévios, para depois podermos avançar em termos de propostas, dizem respeito ao Programa de Apoio ao Desenvolvimento Agrícola Regional. Estão atribuídas algumas verbas em relação a este programa, mas a verdade é que não é possível determinar, minimamente, a que é que elas se destinam. Assim, ficamos impossibilitados de manusear uma verba que corresponde a 240 e tal mil contos.
Quanto às dotações que se destinam de uma forma directa à produção vegetal, há dois aspectos que nos parecem relevantes. Numa altura em que há toda uma série de projectos de lei tendentes a criar regiões demarcadas de vinhos e em que está mesmo pendente um projecto de lei quadro das regiões demarcadas, aparece--nos nesta área apenas uma verba de 75 000 contos para reconversão da vinha na região dos vinhos verdes e um programa de cadastro de 41 000 contos. No entanto, há outras áreas importantes que ficam sem qualquer hipótese de virem a ser dotadas, no sentido de se criarem as infra-estruturas devidas à própria criação das regiões demarcadas.
Em relação aos PIDRs e no que respeita ao Algarve há a rubrica «Programa de produção e comercialização de hortícolas e citrinos» que está dotada com 45 440 contos. Ora, deste dinheiro, quanto é que se destina ao programa de produção e quanto é que se destina ao programa de comercialização?
Ainda no que diz respeito ao PIDR para o Algarve há uma outra questão que se refere ao aprimoramento da produção e comercialização de hortícolas. O que é que se destina ao aprimoramento da produção e o que é que se destina ao aprimoramento da comercialização?
Em relação a isto, a verba global é de 36 000 contos.
É importante sabermos isto porque só a partir do momento em que estas verbas sejam desdobradas é que podemos fazer uma apreciação de qual é o montante que está atribuído para a dotação de estruturas e infra--estruturas ao nível dos circuitos de mercado e comercialização.
A verba atribuída para a reconversão de olivais é de 30 000 contos. Porém, a minha dúvida consiste em saber se esta reconversão de olivais se destina a substituir o olival por outras culturas alternativas ou se se destina a uma reconversão no sentido tecnológico. Se se tratar desta última hipótese, devo dizer que 30 000 contos é uma verba extremamente baixa. Em termos de olivicultura nacional e numa perspectiva de integração europeia, esta é uma área com alguma importância e que não me parece estar devidamente contemplada.
O subsídio destinado à produção do milho é de 4386 contos. Ora, esta verba é irrisória em termos de uma política que vise incentivar a produção do milho. Creio, pois, que haveria toda a vantagem em se criar uma verba que dotasse de secadores as principais áreas de produção do milho, dado que este tem sido um dos factores de condicionamento da própria cultura. Estamos certos que aquilo que os agricultores perdem anualmente, em termos de desvalorização do milho por execesso de humidade, seria muito mais compensado se fossem criadas condições para os dotar de secadores de milho, pelo menos ao nível das cooperativas, que permitissem tratar as produções que, tal como se verificou este ano, se traduzem em perdas de muitos milhares de contos.
No que se refere à florestação, creio que a verba que lhe foi atribuída é importante. Contudo, parece-me que ela não corresponde a uma distribuição equilibrada em função das necessidades do País. Na rubrica destinada à arborização de áreas ardidas aparece uma verba de 23 986 contos que é unicamente destinada a plantações no Cabeço da Rainha. Sabendo nós que as áreas ardidas contam umas largas dezenas de milhares de hectares — para não dizer centenas de milhares de hectares —, é estranho que para a recuperação destas áreas ardidas apareça uma verba inferior a 24 000 contos. Ao analisarmos isto suscitou-se-nos a dúvida sobre se esta irrisória dotação não decorre do facto de o Governo ter a intenção de atribuir as acções de florestação destas áreas ardidas às indústrias das celuloses. Seria bom que isto fosse esclarecido, Sr. Ministro!
Um outro aspecto tem que ver com o facto de, em termos de florestação efectiva, e no que se refere ao programa do Banco Mundial, aparecer aqui um valor da ordem dos 900 000 contos, sem contar com aquele que será entregue para a arborização por parte das celuloses — a parte da Direcção-Geral das Florestas será à volta de 20 000 ha e a das celuloses será à volta de 30 000 ha. Curiosamente, não aparece nada para a florestação de zonas degradadas, com particular acuidade no que respeita às zonas que se encontram em desertificação humana. Poderíamos dar vários exemplos, mas apenas indicarei as áreas ardidas que deveriam beneficiar de uma rápida recuperação: toda a zona da serra do Algarve da área de Monchique e a recuperação de áreas em acentuada degradação e desertificação humana, como o Nordeste algarvio, para onde o PIDR apenas prevê 20 000 contos, o que não é nada. E isto para não falar noutras áreas que se encontram em situação semelhante.
Também retemos que para a utilização múltipla da floresta, designadamente silvo-pastorícia e introdução de pastagens, apenas será prevista uma dotação de, aproximadamente, 27 000 contos.
A partir desta expressão, e na falta de melhores elementos, somos levados a concluir, quer por nada ser proposto para florestação de zonas degradadas, quer pelo que não existe em termos de utilização múltipla da floresta, que estamos, francamente, perante uma estrita situação de florestação industrial.
Em relação à produção animal, e embora também aqui seja apresentada uma dotação orçamental que é importante no conjunto do Orçamento para o Ministério da Agricultura e que se aproxima de 1 200 000 contos, haverá, contudo, que ter em conta que destes 1 200 000 contos, 490 000 contos destinam-se à perip-neumonia e 325 000 contos à peste suína. Daí resulta que o que resta para efeitos de fomento e desenvolvimento da produção animal é francamente pouco.
A propósito da atribuição de uma verba de 48 000 contos para «programa de estabelecimento e modernização de explorações pecuárias» para produção de leite para a região de Entre Douro e Minho, gostaria de saber quais as explorações que poderão ser beneficiadas com este tipo de financiamento.
É que, como ele é escasso, certamente que a sua atribuição terá de obedecer a um critério selectivo. Pergunto, pois, quais as prioridades nesta selectividade?
Uma outra questão refere-se ao programa de viabilização de empresas leiteiras da Beira Litoral. Que empresas leiteiras são estas?
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E o que é que se entende por programa de viabilização?
Vou agora referir-me à construção de salas de ordenha mecânica colectiva. No Orçamento, para o PIDR de Trás-os-Montes aparece uma dotação global de 383 000 contos. Ora, como estão incluídas na mesma rubrica desde acções de regadio a salas de ordenha colectiva não podemos saber, minimamente, qual vai ser a distribuição destes 380 000 contos.
Já há bocado falámos no problema das estruturas de mercado. O próprio Sr. Ministro relevou a importância de se avançar nesta área.
Daqui que tenhamos feito a pergunta relativamente ao desdobramento daquelas dotações para produção e comercialização. É que elas poderão ou não ser incluídas ao nível do esforço orçamental para as estruturas do mercado.
Parece-me, também, extremamente importante que para as estruturas de mercado apenas seja aqui atribuído um valor de 237 300 contos, dos quais uma parte substancial, que ultrapassa os 100 000 contos, se destina apenas a serviços. Não é que os serviços não sejam importantes, mas o que sobra para implementação de infra-estruturas é que é muito pouco.
Chamo agora a atenção para um dos grandes problemas que condiciona fortemente a produção neste país, que provoca oscilações tremendas em certos produtos, de ano para ano, que é responsável por taxas de inflação extremamente grandes e que é até responsável, provavelmente, por mais de 50% do agravamento dos custos entre o produtor e o consumidor. Isto é, afinal, o problema da estrutura de mercado: mercados abastecedores, rede de concentração e de preparação de produtos, etc.
Ora, o que verificamos é que aparece aqui uma ampliação e renovação do Matadouro de Lisboa, aparece um programa relativo ao Mercado Abastecedor de Lisboa (que não é implementação do mercado) e apareceu apenas 25 000 contos para estações de embalagem de produtos hortícolas, 20 000 contos para construção dp unidades de destilação, rectificação e construção de armazéns para fins agrícolas e para aquisição de equipamento, ao nível do PIDR do Nordeste algarvio, 3000 contos.
Portanto, não há aqui investimentos que, em termos de infra-estruturas, possam concorrer para sanear os circuitos de mercado, para os encurtar e para permitir uma maior participação dos agricultores na formação dos preços. Não há aqui nada que nos indique que é essa política que vai ser seguida.
Em relação ao aproveitamento dos recursos hídricos, é certo que o Orçamento revela um esforço de 1 700 000 contos, o que é uma verba importante no contexto das dotações para o Ministério da Agricultura. De qualquer modo, se tivermos em conta que o Baixo Mondego, a Cova da Beira e Macedo de Cavaleiros levam mais de 1 300 000 contos, chegamos à conclusão que, efectivamente, há problemas quanto a outras áreas importantes, no resto do País.
Aqui, levanto 2 tipos de problemas.
O primeiro tem a ver com o tipo de drenagem dos nossos solos agrícolas. Apenas está prevista uma verba de 40 000 contos para o Alentejo. Se ela já é diminuta para o Alentejo, para o resto do país o problema é ainda mais grave.
Não estão previstas quaisquer dotações orçamentais para os vales do Tejo e do Sorraia, onde os prejuízos,
quase que ciclicamente anuais, justificariam perfeitamente um esforço financeiro, no sentido de se conseguir conter uma situação de degradação e de se poder efectivamente lançar as obras de regularização destas áreas. É que aquilo que se perde anualmente em subsídios, em produção e em prejuízos causados às populações destas zonas tem certamente um custo bem mais elevado do que aquele que uma dotação orçamental poderia custar.
Ao nível da investigação e da experimentação, que são áreas importantes, gostaria de levantar uma ou duas questões.
O Sr. Ministro levantou o problema dos custos da produção pecuária, designadamente no que respeita ao fabrico de alimentos compostos.
Pôs a questão da necessidade da acção que o Ministério está a desenvolver, no sentido de poder reduzir os custos através da substituição de determinados produtos de custos mais elevados por outros sucedâneos. É certo que se trata de uma perspectiva que visa a busca de uma alternativa — o que é, sem dúvida, útil —, mas essa alternativa depende de importações do estrangeiro.
Ora, nós temos alternativas possíveis ao nível da produção nacional. Não se verifica neste Orçamento nem nas Opções do Plano qualquer esforço no sentido de fomentar e de desenvolver essas áreas alternativas de produção, que não são apenas relativamente aos Cereais e às oleaginosas mas também, e em minha opinião, em relação à produção de proto-oleaginosas.
É uma área importante e que devia ser tomada em consideração, não apenas em termos de fomento de produção mas também em termos de estudo da investigação e da experimentação relativa à composição de alimentos concentrados na base destes produtos alternativos.
Temos, por exemplo, uma indústria de rações tecnologicamente colonizada. Temos de sair deste círculo vicioso e penso que esta seria uma área em que o investimento se justificava.
Vou terminar — não quero monopolizar a discussão — referindo-me às acções de emparcelamento. Aliás, a questão tanto pode ser entendida em termos de emparcelamento como em termos de aproveitamento de recursos hídricos. Caberá ver qual é o mais adequado. De qualquer modo, há 2 casos que nos parecem extremamente caricatos e, de algum modo, reveladores de uma situação que se pode generalizar ao resto do país e que importava efectivamente ultrapassar. Refiro-me concretamente aos emparcelamentos de Cabanelas e Estorões.
Durante a visita realizada a Cabanelas, o ano passado, pela Comissão de Agricultura, chegou-se à conclusão de que cerca de 300 ha com aptidão para regadio, que já dispõem de conduta principal de água, estão inutilizados por falta de obras que, segundo nos disseram os técnicos do local, custam cerca de 10 000 contos. Ora, é absolutamente incrível que, por causa de 10 000 contos, se esteja a perder 300 ha de culturas regadas.
A outra questão, de algum modo semelhante, respeita ao emparcelamento de Estorões.
Penso que se trata de casos que, até pelo pequeno montante de orçamento necessário, deviam ser atendidos.
Finalmente, refiro-me ao apoio aos jovens agricultores cujas verbas nos parecem francamente baixas.
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Penso que se justificaria um maior esforço financeiro neste sentido, desde que, depois, fosse devidamente atribuído.
Sr. Ministro, farei algumas perguntas que, sem deixarem de ser profundas, procurarei expressar de forma breve.
A adesão ao Mercado Comum é uma preocupação grande, mesmo muito grande. Pergunta-se, designadamente em termos de horto-frutícolas, que acções estão previstas quanto a um estudo de mercados na Europa, face à nossa actual produção e às potencialidades de que dispomos.
A formação e a informação dos agricultores, de forma sistemática e com um plano previamente definido quanto à exigência de qualidade dos mercados europeus, exigência de qualidade do produto e também em matéria de embalagem, isto é, tudo quanto respeita à comercialização, é de enorme importâncoa.
Também interessa perguntar em que medida se poderá desenvolver uma acção — a que eu chamaria de orientação cultural — para informação dos agricultores, na perspectiva daquelas culturas que temos, mas que terão pouco futuro na perspectiva de adesão e, eventualmente, até para consumo interno, face à concorrência da Espanha, e daquelas outras culturas que poderão ser incentivadas desde já, para que quando a adesão for plena — e nalgumas parece termos grandes possibilidades — possam já estar em fase de plena produção ou, pelo menos, de produção razoável.
O Sr. Ministro falou na florestação; o Sr. Deputado Rogério de Brito abordou o assunto de raspão, porque lhe pegou de outro ângulo. Eu ponho a questão mais frontalmente: nos últimos anos, absolutamente nada tem sido avançado na florestação de toda a serra do Algarve, onde, pelo contrário, tem vindo a diminuir com os sucessivos incêndios.
Acontece que existe uma questão gravíssima, que já expus na Assembleia da República várias vezes, e que é a de os financiamentos do Banco Mundial abrangerem o Norte, o Centro e uma parte do Sul, mas não abrangerem a outra parte do sul, designadamente o Algarve e uma parte do Alentejo.
Esta situação é gravíssima e, por isso, coloca-se a questão de saber se já foram tomadas algumas medidas com vista à reflorestação, em face dos incêndios ocorridos no último Verão, designadamente na serra de Monchique, em Silves e Portimão.
Na altura houve uma certa «agitação» sobre a matéria, e o PSD apresentou um requerimento na Assembleia da República, mas temos a convicção de que não se fez coisa nenhuma para além do levantamento da situação.
Portanto, para além deste caso concreto, o que importa sobretudo saber é, em primeiro lugar, se é possível estender ao resto do País as possibilidades de financiamento, por parte do Banco Mundial, para a florestação.
Em segundo lugar, e no caso de tal não ser possível, parece-me que — e neste caso já se trata de uma exigência — terá de ser o Governo português a dotar essas zonas ou regiões dos meios que permitam que elas estejam em igualdade de circunstâncias face ao resto do País.
Se assim não for, é uma questão perfeitamente dramática que, aliás, já se está a verificar.
A última questão, é a de saber se através dos financiamentos ou das verbas actualmente disponíveis no
Ministério da Agricultura, há a possibilidade de dotar as zonas atingidas pelas geadas, recentemente ocorridas, dos apoios de que carecem — desde a zona Oeste, Centro, Algarve e, enfim, todas as zonas que foram atingidas, pois, como é óbvio, não pode haver discriminação.
Portanto, interessa saber o que está previsto, em termos gerais, para apoiar os agricultores afectados por estas calamidades meteorológicas.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura.
O Sr. Ministro da Agricultura: — Sr. Presidente, começarei, pelas vastas, largas e detalhadas perguntas do Sr. Deputado Rogério de Brito.
O Sr. Deputado Rogério de Brito começou por fazer a pergunta sobre qual a aplicação das verbas que estão incluídas no Gabinete do Ministro, ou seja, as verbas, que parecem ser bastante elevadas, de 353 000 contos. Ora, para funcionamento do Gabinete do Ministro são somente 25 000 contos, destinando-se o resto a subsídios para apoio a cooperativas agrícolas, ou seja, uma verba de 161 000 contos para subsídios a fundo perdido a dar a algumas cooperativas com maiores necessidades imediatas e que precisam, muitas vezes, de balões de oxigénio para ocorrerem a dificuldades que têm.
Gostaria, no entanto, de deixar aqui bem claro que não me parece que seja esta a maneira definitiva de resolver essas questões. Nos últimos anos, foram gastos largas centenas de milhares de contos neste tipo de apoios, e as diversas cooperativas não mostram melhorias evidentes no seu funcionamento. Desta forma, estamos, neste momento, a equacionar o problema mais no sentido da criação de uma linha de crédito em condições especialmente bonificadas, cuja bonificação terá uma perspectiva de médio prazo e que será, evidentemente, suportada pelo Ministério. Não será, portanto, um subsídio, pois muitas vezes ele é dado de uma forma arbitrária e nem sempre é fácil estar a seriar as suas propriedades. De qualquer maneira, ainda este ano se previu aqui uma verba de 161 000 contos para esse fim.
Depois, há também uma verba de 150 000 contos, incluída no Gabinete do Ministro, que tem por fim um fundo de compensação para o seguro de colheitas. Como sabe, Sr. Deputado, está instituído um seguro de colheitas, que cobre diversas produções. Ora, para que os prémios desses seguros sejam mais baixos, de forma a que os agricultores possam ter interesse em fazê-los, o Governo comparticipa nesses seguros de colheita com uma verba de 150 000 contos — há, até, um acordo feito com o Instituto Nacional de Seguros.
Estas são, digamos, as aplicações principais das verbas que constam no Gabinete do Ministro. Resumindo: 161 000 contos para subsídios a fundo perdido, mais 150 000 contos para comparticipação nos seguros de colheita.
Em relação ao PLIAA (Programa de Lançamento de Infra-estruturas da Agricultura Associada), trata-se também de um apoio dado ao movimento cooperativo, mas de uma outra forma, ou seja, é para projectos de melhoramentos das diversas cooperativas, para projectos de investimento. Entende-se, assim, que o Governo deverá participar, a fundo perdido, com uma verba que torne viável, mais rentável — ou mais facilmente ren-
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tável —, esses próprios investimentos. Daí a verba de 350 000 contos que no Orçamento do Estado está prevista para esse programa.
Gostaria de, nesta altura, me penitenciar porque, na realidade, tinha prometido à Comissão de Agricultura enviar um documento com alguns dos projectos que estão, neste momento, em negociação com o Mercado Comum. Não o fiz por razões diversas, mas deixarei, hoje, aqui, uma cópia, para não dizerem que me escusei a essa informação. Queria, ainda, esclarecer esta Comissão, tal como o fiz na Comissão da Agricultura, que a verba de 600 000 contos que aparece sobre a denominação «Programas de Acções Prioritárias Estruturais» é a comparticipação a fundo perdido que o Governo pensa fazer ao longo do ano de 1985, que virá da chamada «comparticipação da CEE», que atinge 50 milhões de ECUs. Ou seja, além destas verbas que estão aqui para investimentos, haverá cerca de 6 milhões de contos postos à disposição de Portugal para investimentos a fundo perdido em diversos sectores e para muitas das actuações que aqui, por exemplo, já foram referidas, como o melhoramento das estações de classificação e escolha de produtos hortícolas, de mercados de origem ou, até, por exemplo, como se vê aqui para o Mercado Abastecedor do Porto — aparece uma referência a este mercado, embora no PID-DAC não apareça qualquer valor, uma vez que é um projecto que será incluído no conjunto dos projectos apresentados a Bruxelas.
Portanto, o total dos investimentos a fazer na agricultura ficará muito incompleto se não se fizer a análise deste conjunto de projectos. Já foi entregue em Bruxelas uma carteira de projectos que no total somam 4 milhões de contos e, neste momento, estamos a preparar outros tipos de projectos, para os quais o Ministério montou toda uma equipa de recolha, de forma a fazer-se a sua classificação e a análise da sua viabilidade. É que, muitas vezes, aparecem-nos projectos que de projecto só têm, praticamente, «o desejo de eles virem a ser». De qualquer maneira, o Ministério já conseguiu seriar um total de 4 milhões de contos de projectos a apresentar.
É essa lista que deixarei hoje, aqui, à Comissão. Nesse documento aparecem também outros projectos que, neste momento, estão em preparação, destinando--se a grande maioria deles à parte da comercialização e transformação de produtos agrícolas, o que é uma comparticipação muito importante.
Em relação ao PADAR, o Sr. Deputado perguntou
0 que era. É um projecto que está incluído nas ajudas de pré-adesão, que está já em negociação há algum tempo com a Comunidade e para o qual está prevista uma verba total de 1 470 000 contos de contribuição da Comunidade, contribuindo a parte portuguesa com
1 500 000 contos.
É um projecto a fazer ao longo de vários anos e que tem por objectivo a instalação das zonas agrárias. Ou seja, trata-se da instalação dos serviços e do desenvolvimento efectivo da extensão rural, com a garantia de que o apoio aos agricultores vai passar a ter uma actuação eficiente. É um projecto ao qual damos grande importância e que esperamos ter aprovado muito brevemente. A verba que aparece no Orçamento de 1985 é uma verba que será o complemento do que, em 1985, o Governo português dará para o início desse projecto de instalação e arranque das instalações de extensão rural nas diversas zonas agrárias.
Em relação às regiões demarcadas, como o Sr. Deputado sabe, parte importante das suas verbas são verbas próprias, pois está previsto que elas, através do lançamento de diversas taxas próprias, tenham verbas próprias.
Aparece aqui o projecto de reconversão do vinho verde, porque é o projecto que já está, neste momento, em vias de análise. Não quer dizer que, em outros anos, não venha a lançar-se a reconversão de outras áreas.
É evidente, Sr. Deputado, que do ponto de vista do Ministro da Agricultura (e isto era, de certa maneira, uma análise que faria à sua intervenção), se tivéssemos o dobro das verbas que nos foram atribuídas, pois, certamente, que não deixaríamos de as utilizar. O problema é que, perante a escassez de recursos com que hoje o País se debate, temos de fazer a sua seriação, no sentido de as aproveitar o mais eficientemente possível.
A Comissão da Região Demarcada do Vinho Verde é aquela que, inclusive, tem os seus estatutos praticamente prontos, está a funcionar, e tem projectos — alguns deles incluídos nos projectos apresentados em Bruxelas.
Aparecem também outras componentes, tais como a instalação de laboratórios, no pacote de projectos de investimentos que já foram apresentados em Bruxelas. Essa foi uma contribuição vinda do PIDDAC que, de certa maneira, penso ser importante.
Em relação à olivicultura, a verba não se destina a arrancar com este sector, mas, sim, a fazer a reconversão para espécies mais produtivas e com maiores rendimentos. Como sabe, na Comunidade, hoje em dia, há problemas de excesso de produção de azeite, situação que se agravará, em especial, depois da entrada da Espanha. Ora, Portugal, de certa maneira, tem direito a desenvolver e a manter a área que actualmente está coberta por olivicultura, que são cerca de 450 000 ha, mas cujo rendimento por hectare é muitíssimo baixo, porque o tipo de espécies que estão plantadas dá produções bastante reduzidas. Estão já hoje a ser experimentadas na Estação de Olivicultura e numa das suas instalações na região do Ribatejo/Oeste diversas outras espécies muito mais produtivas — espécies, enfim, técnicas. Lembro-me, quando visitei essa estação, de uma que se chamava «Galega», com produtividade 3 a 4 vezes superior às actuais.
Portanto, esta reconversão destina-se a dar um incentivo e a pagar um determinado valor por cada árvore que os agricultores se dispuserem a reconverter. Isto é, pela reconversão de determinada árvore e, simultaneamente, como o incentivo à venda da própria espécie, através de um preço que é altamente subsidiado.
A experiência está, pois, feita! Com o projecto iniciado no ano passado, a procura desta reconversão foi muitíssimo elevada, mas a verba que temos aqui é aquela que pensamos ser compatível com a própria disponibilidade de espécies que, neste momento, temos a nível nacional. Seria difícil, de um ano para o outro, alargar mais este projecto, pelo que a verba — até porque há estufas de produção instaladas que irão ser entregues aos agricultores com um número de pés limitado —, não dizendo embora que ela não pudesse ser de mais de 10 000 contos ou de menos de 15 000 contos, não é significativamente diferente da que estava inicialmente pensada.
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Em relação ao subsídio à produção de milho, Sr. Deputado, a verba destina-se a pagar dívidas do passado. Foi uma campanha lançada no passado, com prémios para os produtores de milho com melhores produtividades e que, por dificuldades financeiras, em anos anteriores, não houve a possibilidade de satisfazer. Portanto, vão agora pagar-se, embora tarde!
Daí a verba que está prevista e o valor irrisório de 4500 conto que aqui aparece. Não se destina, de maneira nenhuma, a incentivar a produção de milho, mas a honrar compromissos do passado! Se me perguntar se valia ou não a pena recomeçar um programa deste tipo, tendo em atenção as carências de milho que o País tem, diria, pois, que é uma acção que em anos futuros deverá ser encarada como uma política de rendimentos. Volto a insistir neste ponto muito importante: uma política de rendimentos aos agricultores e, portanto, de incentivo através do rendimento poderá vir a encorajar a cultura do milho que, apesar de tudo, e com a política seguida no ano transacto, já teve um incremento muito grande — como o próprio Sr. Deputado reconhece, quando refere a falta de secadores de milho com que este ano nos debatemos. Isto traduz--se, exactamente, no facto de ter sido coroada de êxito a campanha lançada no ano anterior, através da política de rendimentos, criando um incentivo ao produtor de milho. Houve uma produção muitíssimo grande e largamente superior àquela que se previa, apesar das dificuldades com o clima que, de certa maneira, levaram os agricultores a rapidamente quererem colher os seus milhos, temendo que mais tarde não pudessem entrar com os seus equipamentos nos campos de milho, e apesar de certas dificuldades com os secadores.
É evidente que, do nosso ponto de vista, não é através do PIDDAC ou através do Orçamento do Estado que se deverá fazer o incentivo dos secadores. Existe, por exemplo, a EPAC — que, como empresa pública, não tem o seu orçamento incluído no Orçamento do Estado — que fez grande parte da secagem.
Há, também, que promover o incentivo, nesse sentido, às empresas privadas, porque pensamos que elas também deverão contribuir para esse facto. Mas há outras disponibilidades. Ainda recentemente — e na Comissão da Agricultura tive ocasião de o dizer —, ao visitar a Estação de Melhoramentos de Plantas, verifiquei a existência de secadores, que vão ser postos ao serviço da agricultura portuguesa.
Portanto, concordo com o Sr. Deputado quando diz que o aumento da produção de milho necessita do investimento em secadores. Não me parece que seja ao Estado — que até nem tem estruturas para o fazer —, que deva competir esta função. Há que fazer um incentivo, por exemplo, através da EPAC.
Quanto à parte florestal e à questão das empresas de celulose, gostaria de dar os valores exactos daquilo que é o esforço florestal que está a ser feito.
O Banco Mundial prevê, na sua globalidade, que 55% do investimento do plano florestal seja feito em resinosas, sendo 35% feitos em eucaliptos e 10% em outras folhosas. Interessa ver, aqui, qual tem sido a função da Direcção-Geral das Florestas. Até 31 de Dezembro de 1984 foram já florestados cerca de 24 500 ha de resinosas, somente 3800 ha de eucaliptos e cerca de 4400 ha de outras folhosas, nomeadamente, nogueiras, castanheiros, carvalhos, etc. Portanto, é certamente por falta de informação, que é produzida a afirmação de que o esforço é feito basicamente na cha-
mada «floresta florestal». Ora, isso não tem fundamento!
No campo das empresas, a florestação feita não é, de maneira nenhuma, mais do que aquela que o Estado está a fazer. Está previsto que as empresas, até ao final de 1987, terão de arborizar 33 000 ha, enquanto que a Direcção-Geral das Florestas irá arborizar somente 18 000 ha, já no ano de 1985.
Isto mostra que o esforço feito é basicamente mais reduzido por parte das empresas industriais do que propriamente pela referida Direcção-Geral. Por exemplo, as empresas com capital do Estado arborizaram até agora 27 000 ha, dos quais 55 % são eucaliptos e os restantes 45% são pinheiros-bravos. Se se fizer a soma disto com os restantes totais, o Sr. Deputado verá que o cômputo geral vai cumprir as metas acordadas com o Banco Mundial, na qual 55% são resinosas.
Portanto, do meu ponto de vista, não é correcto dizer-se que o esforço é só feito através das empresas de produção industrial.
No que diz respeito à produção animal, uma vez mais temos verbas do PIDDAC bem como as que advêm do total das verbas do Fundo de Abastecimento. De qualquer maneira, penso que o montante de 1 milhão e tantos contos que está atribuído a este último Fundo é um esforço importante. Pela primeira vez, vão ter-se claramente, no princípio do ano, as verbas disponíveis para a importante acção que é a luta contra a peripneumonia, já que terá de ser atacada frontalmente e de modo rápido. Isto para que, se houver necessidade de um abate imediato do gado, se possa fazer o pagamento atempado e também para obviar que os agricultores não fujam ao problema de ter de abater as suas reses por saberem que não vão ter o seu pagamento. Foi feito um acordo com o Fundo de Abastecimento, estando as verbas necessárias para tal à sua disposição, tendo-se feito, inclusivamente, uma alteração na estrutura do Ministério para garantir uma maior eficiência desta acção. A Direcção-Geral da Pecuária ficou responsabilizada a 100% pela luta contra a peripneumonia como elemento fundamental da parte higio-sanitária. Assim, o gabinete da peripneumonia, após o trabalho importante que realizou de levantamento da situação e de propositura de um conjunto de medidas, foi extinto, passando toda a sua respon-sabiliade para a Direcção-Geral da Pecuária, ficando esta com uma função importante.
O Sr. Deputado Rogério de Brito referiu o problema da comercialização, e nisso estou de acordo consigo, pois sem haver uma rede eficiente de comercialização não é possível termos circuitos transparentes. É que, muitas vezes, os agricultores são os principais penalizados pelo facto de existirem muitos intermediários e circuitos pouco claros. Como já lhe referi, vamos fazer um esforço nesse sentido, não só através da racionalização da rede de matadouros, onde estão em curso bastantes empreendimentos importantes. Na verdade, estão já formadas 6 sociedades mistas, em que o Governo mais as autarquias e outras entidades vão criar matadouros regionais. Prevê-se que a rede geral de abate venha a conter cerca de 30 matadouros no País inteiro e estamos neste momento, com a preocupação de encerrar alguns daqueles que não têm as condições higio-sanitárias aceitáveis para abastecer o País, até porque após a nossa adesão à Comunidade Económica Europeia somente aos matadouros que satisfaçam determinados níveis higiénicos será permitido usufruir de
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intervenção sanitária. Nesse sentido, está a fazer-se um esforço muito grande. Por exemplo e só para lhe dizer estava prevista, igualmente, nos planos de pré-adesão, a criação do matadouro do Algarve que já está construído, estando em vias de conclusão outros 6 matadouros.
Quanto à questão dos mercados de concentração de origem, devo dizer que estamos neste momento a fazer estudos no sentido de criar uma rede de mercados de concentração de origem, tendo este problema a ver com os mercados abastecedores de Lisboa e do Porto.
Para o mercado abastecedor de Lisboa a verba que aparece é diminuta, mas isso acontece quando se inicia um projecto ou se fazem os seus estudos. O montante escasso de 30 000 contos aqui previsto é praticamente para se fazerem os estudos de projecto e implantação. Já estão feitos trabalhos muito importantes e fez-se, também, a selecção de vários terrenos alternativos. Neste momento, a comissão, que teve a participação dos presidentes de todos os municípios da Grande Lisboa, entregou os seus relatórios, indicando duas ou três alternativas para a sua localização. Portanto, vai comerçar-se a trabalhar e a verba que está prevista é para atender a essa finalidade.
O Sr. Deputado Rogério de Brito tocou, em seguida, no problema dos alimentos compostos. Referi que o Governo, simultaneamente com o aumento dos preços de alguns produtos, permitiu a introdução de produtos alternativos, sendo todos eles de importação e não de produção própria, ao contrário da orientação que V. Ex.a entende que deveria adoptar-se. É evidente que a alimentação animal em recursos próprios é uma directriz que o Governo tem, no sentido do fomento das pastagens e de forragens. Mas são sempre investimentos na agricultura cujo prazo de execução é demorado. Para este ano, tornou-se claro que a opção a tomar era a introdução de alimentos alternativos, que por serem importados, ao fim e ao cabo, vêm substituir outros alimentos que também eram importados.
Portanto, não se fez qualquer substituição de produção própria, fez-se, sim, a substituição de produtos que já eram importados por outros de valor nutritivo ou proteico análogo, mas de valor mais baixo. Estou a referir-me, por exemplo, ao problema da mandioca, da tapioca e do glúten de milho e de outros produtos que hoje, em qualquer sociedade mais avançada, fazem parte da alimentação animal, ao contrário de nós que fazemos um uso excessivo de cereais de valor mais elevado, originando assim um desperdício dos nossos recursos.
Como já lhe disse, e segundo cálculos realizados no Ministério, se não se fizesse essa alteração para produtos alternativos o aumento das rações teria sido de 18%. Assim, o aumento será entre 5% e 7%, já que é pouco difícil de prever, uma vez que as oleaginosas têm os seus preços estabelecidos nos mercados internacionais e há que ter em conta conjunto de flutuações, sendo desse modo totalmente impossível prever o valor que elas vão ter ao longo do ano de 1985. Mas o que eu quero dizer prende-se com a ideia de que houve uma preocupação de redução dos alimentos compostos, dentro daquela perspectiva de garantir um rendimento mínimo aos agricultores.
Em relação às acções de emparcelamento, o Sr. Deputado referiu-se ao problema de Cabanelas e de Estorões. Ora, como V. Ex." sabe estas obras são feitas, muitas vezes, numa ligação íntima entre os Mi-
nistérios da Agricultura e o do Equipamento Social e, frequentemente, essa articulação — na minha opinião pessoal — não joga, às vezes, a 100% e há alguns desfasamentos. Infelizmente, sabemos que há várias situações lamentáveis — ainda ontem, na Comissão de Agricultura, foi-nos chamada a atenção por um Sr. Deputado de Trás-os-Montes para a situação de um aproveitamento agrícola que está praticamente pronto desde 1978, mas que ainda não começou a ser utilizado — que iremos fazer o possível para corrigir, no sentido de obviar a esses inconvenientes. Em geral, parte dessas obras estão a cargo do Ministério do Equipamento Social, uma vez que o Ministério da Agricultura, com a Direcção-Geral de Hidráulica Agrícola, tem somente por função fazer as obras complementares de rega que estão geralmente a juzante desses empreendimentos. É também o que se passa com os projectos da Cova da Beira, do vale do Mondego, de Macedo de Cavaleiros, sendo tudo projectos agrícolas cuja obra principal compete à Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos, sendo as obras complementares de rega de competência da Direcção-Geral da Hidráulica Agrícola.
Fazer a coordenação entre estas duas direcções-gerais tem sido uma preocupação grande, pelo que, somente para lhe referir essa nossa preocupação, o actual director-geral da Hidráulica Agrícola era subdirector--geral da Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos. Por se tratar de uma pessoa competente, entendemos adoptar este procedimento, no sentido de garantir que esta unidade vai funcionar.
Sr. Deputado, não terei respondido a todas as suas perguntas, mas tentei responder ao maior número delas. Concluiria, dizendo que, evidentemente — como já referi há pouco —, se dispuséssemos de verbas mais importantes não teríamos dúvidas nenhumas que as poderíamos aplicar mais eficientemente. Mesmo assim, pensamos fazer das verbas que possuímos uma utilização eficiente e racional.
O Sr. Deputado José Vitorino colocou o problema da adesão à Comunidade Económica Europeia e levantou o problema das horto-frutícolas e da necessidade de se preparar realmente esse sector para a dita adesão. Diria que não é só esse sector que necessita de ser preparado para tal. Sei que V. Ex.a se referia mais ao sector que está em maior ligação com o Algarve e, portanto, só mencionou esse. Neste momento, é uma das nossas grandes preocupações e, aliás, as discussões que estamos a ter com Bruxelas efectuam-se dentro de uma perspectiva de defesa intransigente dos interesses nacionais no campo da agricultura. Temos consciência das grandes dificuldades que vão surgir para a agricultura portuguesa do impacte que se verificará com estruturas produtivas muito mais adiantadas e preparadas que as nossas, mas referia que as horto-frutícolas, têm tido no Algarve um desenvolvimento bastante positivo. Alguns dos projectos que já foram lançados estão integrados nas ajudas de pré-adesão como, por exemplo, a produção e comercialização de hortícolas e citrícolas do Algarve. Foi uma preocupação que houve logo que estiveram disponíveis nas ajudas de pré-adesão, portanto, aquelas que foram contratadas em 1980, de incluir esse sector.
Sr. Deputado, já houve queixas, especialmente de Trás-os-Montes, de que — e o Sr. Deputado Alexandre Reigoto chegou-se logo para a frente para saber qual era a queixa — o Ministério da Agricultura teria feito nos projectos já entregues em Bruxelas uma dis-
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criminação regional a favor do Algarve, na medida em que vários projectos, dos que constam do primeiro pacote de projectos entregues em Bruxelas, estariam ligados a este ramo, são projectos relativos a calibragem e a estações de fruticultura, no sentido de garantir a qualidade, isto é, de ir fazendo corresponder a juzante todo o esforço que tem sido feito a montante.
Portanto, não está esquecido, antes pelo contrário, pois se V. Ex.a fizer a análise dos projectos que estão já neste momento incluídos verificará que existe verdadeiramente uma preocupação importante de se preparar esse sector.
Em relação à informação aos horticultores, existe já neste momento — e penso que com grande importância, mas, talvez, ainda não com a devida divulgação — um elemento que será muito importante para os agricultores, inclusive, não virem a ser tão prejudicados com o problema dos chamados intermediários e dos circuitos comerciais, que é o sistema de informação dos mercados agrícolas. O Ministério da Agricultura publica, semanalmente, uma documentação com os preços de todos os produtos agrícolas, bem como os preços de venda, não só nos diversos mercados abastecedores como também os preços pelos quais aqueles estão a ser vendidos na produção. Ora, uma consulta atenta desse elemento mostrará que ele tem uma função de orientação muito importante para os agricultores, pelo que, muitas vezes — e graças a Deus que é assim —, os nossos agricultores já sabem fazer valer os seus produtos e vendê-los a preços bastante mais animadores do que faziam no passado.
É evidente que tencionamos, inclusivamente, colocar esse tipo de informação na televisão e divulgá-lo o mais possível, porque é um elemento muito importante de informação e divulgação.
De qualquer maneira, o Sr. Deputado José Vitorino colocou o problema da informação aos horticultores e, de certa maneira, o apoio às suas exigências de apoio técnico. Isto está bastante relacionado com o problema da extensão rural, do funcionamento das direcções regionais e do apoio directo que têm dado aos agricultores. Este é um dos sectores que, como comecei por dizer, o Governo pensa investir cerca de 1,5 milhões de contos através do PADAR. Pensamos fazer um esforço importante nesse campo e será a partir daí que se poderá fazer a orientação cultural e o apoio aos agricultores.
As diversas direcções regionais têm vindo a funcionar, mas não todas em boas condições. Na verdade, como já disse, muitas delas têm problemas de grande instabilidade, porque a grande maioria do pessoal que está ainda hoje nas direcções regionais é pessoal tarefeiro, sem ligação de vínculo que, de certa maneira, poderá não ser o modo mais eficiente de motivar as pessoas. Tencionamos, pois temos já muito adiantadas as leis orgânicas das diversas direcções regionais, vir a fazer a aprovação delas e a institucionalizar o seu funcionamento, através de um apoio à extensão rural e ao desenvolvimento cultural e formação dos agricultores. É também dos sectores prioritários, pois o Sr. Deputado verá que em todas as direcções regionais existem verbas importantes de orientação do PADAR.
V. Ex.a levantou o problema da florestação, que o Sr. Deputado Rogério de Brito tinha já colocado e que já referi ser uma das principais preocupações, podendo dizer-lhe que na renegociação da segunda fase do projecto do Banco Mundial o Governo exigiu — e está
bem encaminhado e, de certa maneira, aceite — que as verbas do Banco Mundial se pudessem aplicar a todo o País. Portanto, através disso, pensamos poder atacar problemas de florestação noutras zonas a sul do Tejo, o que, de certa maneira, não estava incluído na primeira fase.
Não lhe sei responder, Sr. Deputado, se a reflorestação da serra de Monchique está neste momento prevista nas actuações para 1985. Não tenho essa informação, mas terei muito prazer em tentar obtê-la da parte da Direcção-Geral das Florestas e depois transmiti-la em outra ocasião.
V. Ex." levantou o problema das geadas ocorridas e dos apoios de que carecem. Ainda ontem tive ocasião de analisar essa questão e devo dizer que é um problema delicado. Há realmente muitos agricultores que foram prejudicados por essas geadas. No entanto, não podemos esquecer que existe institucionalizado, há já alguns anos, um seguro agrícola que muitos agricultores fizeram, pagando os prémios, mas há muitos outros que o não fizeram. Acontece que o não fizeram, por um lado, por negligência e, por outro lado, porque para se fazer tal seguro é necessário um mínimo de exigências técnicas, por exemplo, nas características das chamadas estufas. Ora, muitos dos agricultores entenderam que não quereriam satisfazer tais exigências, talvez por razões de economia de primeiro investimento, mas o que é certo é que o não fizeram.
Uma atitude do Governo de acorrer, a fundo perdido e indiscriminadamente, a este tipo de acidentes tem de ser pesada com as desvantagens que advirão de um sistema que deve ser aquele em relação ao qual se incentiva o agricultor, isto é, de se equipar com as características mínimas de protecção da sua produção e, simultaneamente, fazer uso dos mecanismos que o Governo elabora, pois, como disse há pouco, é o próprio Governo que subsidia o seguro de colheita no valor de 450 000 contos. Assim, era de certa maneira muito injusto, em relação a todos os agricultores que fizeram o seguro agrícola, que o Governo viesse agora pura e simplemente premiar essa situação. Alguma coisa será feita, pois estamos neste momento a estudar a situação. Uma equipa do Ministério da Agricultura, juntamente com a Secretaria de Estado do Tesouro, estará hoje reunida para, até ao fim desta semana, decidirmos o que é que vamos fazer. Mas devo dizer, desde já, que não estamos inclinados a acorrer, na totalidade, a fundo perdido, premiando, de certa maneira, aqueles que não tomaram as medidas que deveriam tomar.
Em 1982, em situação semelhante, o Governo de então estabeleceu uma linha de crédito a juro bonificado de 12 % mas, na altura, preâmbulo dessa resolução, chamava-se a atenção para que os agricultores fizessem o seguro de colheita e satisfizessem todo o conjunto do regulamento. Do levantamento que fizemos constatámos a existência de muitos agricultores que respeitaram tal directriz, mas outros não o fizeram. Assim, é deste contrapeso entre estas duas questões que sairá uma solução. Qualquer coisa será feita, na medida em que é um sector muito importante da produção do nosso país e que afecta muitos milhares de agricultores. Mas não seremos certamente tão generosos como noutras alturas em que a protecção feita através de seguro agrícola não existia.
Sr. Presidente, pedia neste momento desculpa para me retirar, voltando logo que possa.
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Os Srs. Secretários de Estado ficarão e, repito uma vez mais, se por qulquer questão entenderem que o debate que fizerem com os Srs. Secretários de Estado não é suficiente ou que gostarão da minha presença em outra ocasião, estou inteiramente à vossa disposição — hoje ou amanhã à noite, isto é, quando VV. Ex.as quiserem. Na verdade, não poderei perder essa reunião de urgência para a qual fui convocado e a que não posso, de maneira alguma, deixar de estar presente. Portanto, peço a maior das desculpas aos Srs. Deputados.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro, não só pelos esclarecimentos que se dignou prestar, mas também pela disponibilidade que manifestou.
Vamos continuar os nossos trabalhos, continuando os Srs. Deputados inscritos a fazer as suas intervenções, e logo veremos, depois, se se torna ou não necessário qualquer esclarecimento complementar com a presença do Sr. Ministro.
Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): — Sr. Secretário de Estado, começo por registar a afirmação e a preocupação manifestada pelo Sr. Ministro — que aliás aplaudo —, no sentido de que o Ministério da Agricultura estará empenhado em apoiar e em servir os agricultores. Serviço que, constato pela leitura do Orçamento do Estado, não é apenas um serviço ordinário mas também extraordinário.
Refiro-me, naturalmente, à pevisão que no Orçamento se faz de despesas com horas extraordinárias. Despesas essas que somam — se as minhas contas estão certas — 27 843 contos.
Em primeiro lugar, gostaria de perguntar ao Sr. Secretário de Estado se entende que estas verbas para horas extraordinárias representam o pagamento de serviços prestados para além do período normal de serviço ou se-o entende como pagamento devido a pessoas que não fazem parte dos quadros.
Em segundo lugar, chamaria a atenção para algumas dessas verbas, que me causam alguma surpresa.
Por exemplo, em relação às direcções regionais existem discrepâncias deste género. Na Direcção Regional de Entre Douro e Minho não se prevê o dispêncio de um único centavo com horas extraordinárias; mas já, por exemplo, nas Direcções Regionais do Ribatejo e Oeste, Alentejo e Algarve se prevê, respectivamente, um dispêndio de 2000 contos, de 1000 contos e de 700 contos.
Imediatamente, e com a maior parcimônia já para a Beira Litoral se prevêm apenas 250 contos e para a Beira Interior 390 contos.
Depois, para se ver e não se compreender — que é o meu caso — essas disparidades, encontramos, ao nível dos mais diversos serviços do Ministério da Agricultura, diferenças, com a verificada na Direcção-Geral de Administração e Orçamento em que se prevê uma despesa sobre essa rubrica de 5 726 000 contos, na Direcção-Geral da Agricultura de apenas 350 contos, no Gabinete da Secretaria de Estado do Comércio e Indústrias Agrícolas 1620 contos, na Direcção-Geral das Florestas 4260 contos.
Assim, verifica-se que só quanto à Direcção-Geral da Agricultura é que se prevê uma despesa de apenas 350 contos.
De modo que, até pelas diferentes formas como estas verbas são apresentadas nos mais diversos serviços, a minha interrogação justifica-se sobretudo devido a essa circunstância.
Para além deste pedido, gostaria de fazer um outro ao Sr. Secretário de Estado.
Já foi chamada a atenção do Sr. Ministro para as zonas demarcadas vitivinícolas e já foi indagado sobre qual seria o empenho do Ministério a este respeito. O Sr. Ministro deu como resposta que as diferentes zonas demarcadas teriam receitas próprias e teriam de prover que a demarcação acarreta.
Só que gostaria de perguntar ao Sr. Secretário de Estado, o que é que se prevê relativamente às zonas em vias de demarcação e, concretamente, em relação ao cadastro, sem que o que não se deverá providenciar na demarcação dessas zonas. Lembraria, a título de exemplo, que as zonas já demarcadas, quer do Algarve, quer da Bairrada da região da Anadia, foram demarcadas vai para 5 anos e ainda não têm o seu cadastro nem em metade da sua realização. Melhor diria, pelo ritmo por que vão, o Algarve não estará demarcado senão daqui a 10 anos.
Naturalmente que, se me preocupa a situação das regiões já demarcadas, mais me preocupa ainda a das zonas em vias de demarcação e estou concretamente a pensar na zona demarcada de Pinhel.
Assim, perguntaria se se encontra assegurada, e em que medida, a continuação dos trabalhos de cadastro dessas zonas demarcadas.
O Sr. Presidente: — Visto que o Sr. Secretário de Estado prefere responder no final, dou de imediato, a palavra para formular pedidos de esclarecimento, ao Sr. Deputado Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Secretário de Estado, gostaria de lhe pedir alguns esclarecimentos.
Por exemplo, gostava de saber que tipos de serviço, grupos de trabalho ou similares saíram do Gabinete do Ministro, uma vez que, no anterior Orçamento, o Gabinete do Ministro tinha sido dotado com 511 500 contos, enquanto que no actual, é dotado apenas com 360 000 contos.
Gostava também de saber o mesmo a respeito do Gabinete do Planeamento, porque também há uma quebra de 23 000 para 21 476 contos. A Direcção-Geral das Florestas — e tem-se falado muito aqui na sua florestação — baixou também 12 300 contos. O Instituto Nacional de Investigação Agrária e Extensão Rural, que tinha 346 600 contos passa a dispor de 346 000, quando pensávamos que esta, por exemplo, seria uma área que deveria ser compensada com uma verba mais elevada.
Gostaria de saber, realmente, se me podia esclarecer sobre esta verba. E já que estamos a falar em verbas gostaria também, se possível, de obter mais um esclarecimento.
Em todo o orçamento para a agricultura sobressaem «aquisição de serviços não especificados» e numa breve resanha que tive o cuidado de verificar, encontrei verbas de 50 000 contos, 40 000 contos, 20 000 e tal contos, 20 000 contos, etc, qualquer coisa como mais de 500 000 contos, que aliás se pode verificar através dos documentos que nos mandaram.
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Gostava de saber, Sr. Secretário de Estado, o que significa, por exemplo, 50 000 contos para aquisição de serviços não especificados da Direcção-Geral das Florestas, ou 40 000 contos no capítulo de investimentos do Plano e para outras verbas que aqui aparecem. Gostaria de ser esclarecido sobre este aspecto.
Passando agora a outras questões. O Sr. Ministro disse que os circuitos comerciais são deficientes. Falou, até, na necessidade de se garantir os preços ao agricultor e referiu a existencia de um calendário.
Assim sendo, perguntar-lhe-ia o que é que está previsto para garantir o escoamento dos produtos agrícolas. E ainda, em relação a esse calendário, que tipo de garantia de preços é que realmente está prevista para este ano.
V. Ex.a falou na existencia de um calendário muito vago e gostaria de saber o que se passa em relação a este aspecto.
Em relação ao sistema de crédito, e todos estamos de acordo, com certeza, de que é necessário desburocratizar o sistema de crédito à agricultura, gostaria de saber se está previsto qualquer tipo de crédito em espécie, à agricultura. Creio que esta é uma necessidade do sector agrícola e, então, gostaria de saber se está previsto este tipo de crédito.
Sr. Secretário de Estado, perguntar-lhe-ia também, que tipo de apoio é que as pequenas e médias explorações vão beneficiar no Orçamento deste ano.
Todos sabemos — e temos aqui alguns números — que 77,7 % das explorações agrícolas têm menos de 4 ha e 84 % são empresas' agrícolas.
O Sr. Ministro falou na necessidade de fortalecer o movimento cooperativo — não sei se o pensa ou não fazer —, e simultaneamente, falou também da entrada na CEE. Tendo em conta o choque da entrada na CEE e o facto de o Sr. Ministro ter dito que havia uns projectos entregues em Bruxelas no valor de 4 milhões de contos, não especificando o tipo de projectos, alargava esta pergunta em relação aos apoios às pequenas e médias empresas, para saber que tipo de iniciativas estão a ser promovidas para fazer face ao choque da entrada de Portugal na CEE.
Assim, em relação ao tipo de comercialização, de transformação de produtos agrícolas, a melhoria de todo o sector agrícola, gostaria de saber o que se está a pensar fazer, e creio que estar a pensar e não estar a fazer, já revela um certo atraso em todo o processo.
Para finalizar, e a propósito dos programas integrados de desenvolvimento regional, em que o Governo se mostra empenhado, gostaria de saber que tipo de programas estão pensados nesses programas integrados de desenvolvimento regional.
Existindo, também, uma forte indefinição e não existindo sequer critérios em relação à tributação de imposto sobre indústria agrícola e contribuição predial, gostava de saber, Sr. Secretário de Estado, qual a sua resposta para este assunto, que me parece bastante preocupante.
O Sr. Ministro falou também na Cova da Beira, falou na falta de coordenação existente entre duas direcções-gerais e o Ministério, tendo começado o Sr. Ministro, imediatamente, por declarar que estão por utilizar, ou são mal utilizadas, uma série de empréstimos estrangeiros.
Gostaria que me dessem o maior número de informações possível sobre o que está previsto, este ano, para o desenvolvimento da Cova da Beira, aprovei-
tando, realmente, empréstimos que estamos em vias de perder.
O Sr. Presidente: — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Bento Gonçalves.
O Sr. Bento Gonçalves (PSD): — Sr. Secretário de Estado: Visto que não está cá o Sr. Ministro, gostaria de, na pessoa do Sr. Secretário de Estado, agradecer ao Sr. Ministro os esclarecimentos que nos deu e que foram importantes, nomeadamente no que toca a algumas dúvidas com que eu fiquei pela leitura dos documentos, e que dada a sua explicação esclareci.
Queria colocar-lhe a questão, que a comunicação social também divulgou, de o Sr. Ministro da Agricultura não ter previsto a componente do Estado Português para as ajudas de pré-adesão à CEE.
Isso foi esclarecido — e ainda bem — dizendo ainda o Sr. Ministro que iria fornecer a lista possível dos projectos de pré-adesão, que também no Plenário foi objecto de diversas intervenções. Penso que o fornecimento dessa lista é importante.
Quanto à questão que foi colocada e que se prende com o problema das regiões demarcadas, penso que há uma preocupação muito grande no sector da agricultura, nomeadamente naquelas regiões que até têm uma boa qualidade de vinho, mas cujo teor de álcool é mais baixo do que aquele que a desactualizada lei neste momento obriga, no sentido de se permitir, para algumas zonas do País, através de decreto-lei ou de portaria, que esse vinho fosse vendido ao público com o teor de álcool habitual na respectiva produção.
Isto porque, actualmente, para que esse vinho seja comercializado — e é-o na prática — adiciona-se um grande volume de álcool, que até tira qualidades ao próprio vinho, para que fique de acordo com a lei. Caso contrário, é considerado um produto ilegal.
Penso que o Ministério chegou a ter uma portaria preparada sobre isso e que a devia publicar.
Existem na CEE algumas zonas em que isto é permitido. Na Espanha até são imensas as zonas, que sem serem regiões demarcadas, se permite este tipo de actuação. Ora, isto permitiria que, nalgumas zonas agrícolas, se fizesse o aproveitamento de alguns solos de forma mais rentável com este tipo de agricultura.
Queria ser aqui também porta-voz dum protesto ao Ministério da Agricultura e à Secretaria de Estado do Orçamento, em simultâneo, por terem publicado normas para pagamento de subsídio de gasóleo, obrigando todos os agricultores a abrir conta, para esse efeito, na Caixa Geral de Depósitos.
Parece-me um procedimento perfeitamente errado, inadequado, em relação a uma questão que devia ser colocada de modo a que o agricultor recebesse, livremente, o subsídio de gasóleo em qualquer instituição de crédito com a qual trabalhasse. É uma norma perfeitamente discriminatória e inaceitável num Governo como este, que o meu partido apoia politicamente. Esta questão devia ser rapidamente alterada, quer pela Secretaria de Estado do Orçamento, quer pelo Ministério da Agricultura, de modo a evitar que os seus funcionários, aos balcões do Ministério da Agricultura, e em nome deste, digam aos agricultores que têm de abrir primeiro conta na Caixa Geral de Depósitos e só depois disso é que podem preencher a documentação para receber o respectivo subsídio.
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A outra questão que se coloca, e que se coloca sempre que há frio ou calor, e portanto, quando as culturas se estragam, prende-se com a necessidade de subsídios para estas situações.
Penso que é chegada a altura de tentar encontrar com as organizações agrícolas, com as companhias de seguros e com o Estado, um seguro agrícola capaz de ser feito por todas as empresas, as seguradoras existentes e outras de tipo cooperativo que venham a constituir-se. Isto de modo a que o Estado pudesse dar um pequeno subsídio equivalente ao que gasta hoje, de forma que os agricultores possam ter esse instrumento, que qualquer sector económico em Portugal tem e que também devia existir na agricultura.
Também na agricultura se devia eliminar, de uma vez por todas, os aspectos relativos a esta questão que, muitas vezes, as pessoas põem em dúvida. As intempéries levam, de facto, à destruição de algumas colheitas, pelo que com o seguro tudo isto estaria eliminado.
Gostaria, também, de perguntar o que é que existe sobre a Lei do Arrendamento Rural.
Por outro lado, também foram extintas as bonificações dos créditos de campanha, no âmbito do SIFAP. Nem tudo estava bem nas anteriores linhas, mas penso que também não é acabando radicalmente com estas linhas, de um momento para o outro, tendo em atenção as necessidades agrícolas do País e a aposta que o Governo faz no aumento do produto da agricultura, que os objectivos do Ministério da Agricultura nesta área são alcançados.
O outro aspecto que aqui coloco, refere-se também ao meu desacordo relativamente à anunciada extinção do 1FADAP. Penso que também é um erro extinguir o 1FADAP. Nessa área, o SIFAP deve ser remodelado, para mais numa altura em que Portugal vai entrar para CEE e que o IFADAP, contra tudo e contra todos, conseguiu instituir, mais ou menos bem, o chamado projecto agrícola, a que hoje a grande maioria dos agricultores já recorrem — se eles não são capazes, as suas organizações, nomeadamente as de origem cooperativa, conseguem-no fazer e de uma forma gratuita para os agricultores.
Agora, penso que é mau, de uma forma que pode vir a ser difícil e dramática, destruir-se este aspecto numa altura em que se exige do agricultor, cada vez mais, projectos devidamente feitos e executados (que não sejam apenas um papel, mas que tenham tradução na prática), pelo que a extinção do IFADAP não contribuiu em nada para este objectivo.
A Caixa Central de Crédito Agrícola vai entrar em funcionamento, mas penso que a existência do IFADAP e da Caixa Central tem, em ambos os casos, razão de ser, completando-se perfeitamente no serviço que podem prestar à agricultura portuguesa.
Quanto às ajudas ao sector cooperativo, penso que o Ministério da Agricultura inscreve verbas significativas para essas ajudas, mas a situação actual do sector cooperativo agrícola é de facto difícil e, talvez, as verbas aqui inscritas sejam diminutas para as necessidades. O Ministério da Agricultura, ou outro organismo qualquer, devia começar por fazer nas cooperativas agrícolas, nomeadamente onde tem de investir a fundo perdido alguns capitais, uma certa investigação às contas que as cooperativas agrícolas apresentam. Em algumas situações (em adegas e não só) se esse processo cautelar tivesse sido feito, talvez se tivessem evitado algumas situações difíceis que hoje existem.
Embora não tenha muito a ver com o que aqui estamos a tratar, não queria deixar de fazer aqui eco daquilo que me tem chegado das organizações do leite em Portugal, das organizações cooperativas que representam mais de 90 % do total da produção do leite, relativamente ao teor da portaria recentemente publicada.
Penso que, embora esteja de acordo com o conteúdo da portaria, no sentido de apontar para a liberalização da vida portuguesa — e, portanto, o leite não podia deixar de ser uma dessas situações —, uma situação criada de forma tão drástica e diferente da situação anterior, e dado os investimentos avultados que as organizações das uniões das coorperativas de leite têm hoje, pode levar a que estas uniões tenham, por via de uma concorrência para a qual não estavam preparadas neste momento, falta de matéria-prima que ponha em causa os avultados investimentos que elas, neste momento, têm nesse sector.
Queria apenas colocar aqui a minha apreensão contra a eventualidade deste resultado.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, proponho a esta comissão o seguinte método de prosseguimento dos trabalhos: intervirão todos os Srs. Deputados inscritos, depois faremos uma pequena interrupção de 15 minutos, após o que os Srs. Secretários de Estado responderão, tendo eles até a possibilidade de organizarem melhor as suas respostas.
Se todos estão de acordo, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel.
O Sr. Vasco Miguel (PSD): — Sr. Presidente, muitas questões que poderia eventualmente formular, já foram feitas pelos Srs. Deputados que me antecederam.
Contudo, parece-me que poderiam ser realçados alguns aspectos, e pegando numa deixa do meu companheiro de bancada Bento Gonçalves, pergunto se o Sr. Ministro da Agricultura e os Srs. Secretários de Estado são adeptos ou não das regiões demarcadas.
Parece-me que é essencial fazer esta pergunta, porque com as verbas que realmente estão endossadas a este tipo de agricultura, não me parece viável nenhuma região demarcada no País. Endossar para as zonas que já estão demarcadas (ou as que provavelmente venham a ser demarcadas), a constituição dos organismos de coordenação que elas têm de ter e a efectivação do cadastro, é inteiramente impossível. Como é impossível formar uma zona sem cadastro, parece que a resposta não tem o mínimo de senso.
Apostamos ou não nas regiões demarcadas? Se apostamos temos de, pelo menos, dar verbas suficientes para se efectivar o cadastro, porque sem ele não há regiões demarcadas. Portanto, a pergunta muito concreta é se o Governo acredita e é sensível à formação das regiões demarcadas.
No que diz respeito à instalação de centros de formação profissional e aos 155 000 contos que estão aqui orçamentados, queria dizer que me parece que temos muitos e bons centros de formação profissional (alguns deles até luxuosamente equipados). O que é necessário fazer são mais cursos de formação profissional, e não novas instalações.
Se estamos para entrar na CEE — e tenho a absoluta certeza que nem os técnicos nem os agricultores estão integrados nesse processo — porque é que não se aproveitam estas verbas e com elas, utilizando os
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centros que temos — muitos e bons, Sr. Secretário de Estado — não se fazem cursos de formação?
Tenho a percepção nítida de que os técnicos, neste momento, não estão devidamente habilitados para dar formação profissional no que diz respeito à integração dos agricultores. Então, começaríamos por uma política de formação de técnicos para a integração e, a seguir e urgentemente, pela formação dos agricultores, aproveitando todos os centros e todas as disponibilidades de instalações do Ministério para os fomentar. Parece-me, portanto, que esta é uma verba sem cabimento.
Por outro lado, mais uma vez, queria alertar para o seguinte, acerca do sector cooperativo: esta verba de 161 000 contos pode significar um esforço efectivo do Ministério para tentar sanar este problema, mas isto não é nada. Esta verba não saneia absolutamente nada porque, por exemplo, temos adegas cooperativas que devem dez vezes esta verba. Portanto, não vamos sanar nada.
Vou fazer aqui uma pergunta praticamente igual à que fiz quando me referi às regiões demarcadas. O Governo acredita no sector cooperativo deste País? Se acredita tem de procurar saneá-lo, implementá-lo, e regularizar todo este sector. Ora, não é com 161 000 contos que se consegue seja o que for neste sector.
O Governo tem noção de quanto devem as empresas públicas e de quantas pessoas vivem delas? O Governo tem conhecimento dos números das dívidas das cooperativas agrícolas (e não me refiro só às adegas cooperativas), e de quantas pessoas dependem delas?
Apesar de não ter os números à mão, mas sabendo um pouco acerca deste sector, parece-me que o sector cooperativo é muito mais lato que o sector público empresarial, e que muito mais gente depende dele. Se há apostas de milhões de contos no sector público industrial, porque não fazer, também, uma aposta no sector cooperativo?
Deixo esta questão, porque me parece que não há uma aposta consistente no sector cooperativo agrícola. Não vejo aqui medidas de fundo que levem, no mínimo, a solucionar ou implementar este sector, como, por exemplo, medidas que conduzam ao seu saneamento, à sua implementação ou à sua regularização.
Isto parece-me bastante grave porque entendo que por aqui talvez passe o planeamento e a regularização da nossa agricultura. Se não fizermos esta aposta estamos a cometer erros gravíssimos. A questão fica posta.
Quanto aos planos integrados, Sr. Secretário de Estado, não estou contra eles. Parece-me é que os planos integrados já absorveram demasiados milhões, e tenho dúvidas de que eles resultem. O caso concreto que me leva a dizer isto é o seguinte: o custo do plano do vale do Mondego já vai para 20 milhões de contos e os agricultores dessa zona só sabem cultivar arroz. O que é que estes agricultores, depois destas despesas lá efectuadas, vão fazer se não há a tal formação? Eles não sabem o que vão fazer porque não há selecção das culturas que devem ser lá efectuadas. Andamos a gastar dinheiro só para dizer que o gastamos em grandes planos? Parece-me que haveria que fazer uma redistribuição desses dinheiros por coisas mais produtivas, como pequenas barragens e, de certa maneira, não deixar degradar os diques, no caso concreto dos vales do Tejo e Sorraia, como disse, e muito bem, o meu colega Rogério de Brito.
Por outro lado, também não se prevê aqui nenhuma definição relativamente à reforma agrária. Ela continua a ter uma política abstracta. Quando é que é resolvido, de uma vez por todas, o problema da reforma agrária? Não constam aqui verbas para indemnizações nem tão-pouco para uma política de fundo que leve a uma pacificação naquela zona.
Sr. Secretário de Estado, um assunto que também me parece importante, para que depois os créditos venham a ser atribuídos com algum critério, é definir, de uma vez por todas, o estatuto de agricultor. Quem é o agricultor em Portugal? É o agricultor em part--time? É o agricultor a tempo inteiro? Quais são os critérios relativos ao crédito? O agricultor de part-time terá as mesmas bonificações que o agricultor a tempo inteiro? Vamos, de uma vez por todas, definir quem é o agricultor neste país.
Por outro lado, Sr. Secretário de Estado, as geadas do Oeste e do Algarve — e eu sou um homem do Oeste —...
Risos.
O Orador: — Não sou é do far-west!
Sou um homem do Oeste e sei o que se passou. Mas, Sr. Secretário de Estado, se o problema das geadas é realmente um problema grave e se vamos tentar resolver, muito rapidamente, essa questão fica para trás uma coisa que provocou muito maiores prejuízos: as cheias. E os homens das cheias ainda nada receberam. É uma questão que deixo à consideração de V. Ex.a, mas que me parece pertinente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, vou colocar-lhe duas ou três questões muito breves e muito concretas, para as quais agradecia igualmente respostas muito concretas.
Somos defensores de que haja uma contenção realista das despesas correntes, face à situação a que chegaram as contas públicas. No entanto, custa-me um pouco a crer — e esta é a primeira questão concreta que gostaria de lhe colocar — como é que o seu ministério justifica o pretender atingir esse objectivo, ou seja, como é que o Ministério da Agricultura consegue, em termos de despesas correntes, viver este ano com apenas mais 8,7% do que o ano passado?
Segunda questão: as despesas correntes do Ministério, excluindo as despesas relacionadas com encargos com pessoal, têm uma dotação de 4 milhões de contos. Mais de 25% dessa dotação são para aquisição de serviços. Concretamente, em 4 milhões de contos, tem, para aquisição de serviços, 1 056 000 contos, dos quais mais de 70% são para aquisição de serviços não especificados. Qual a justificação desa verba, em termos relativos tão elevada, para aquisição de serviços não especificados.
Verba, relativamente tão elevada quanto é certo que, em relação ao Orçamento inicial de 1984, aumenta apenas 133%?! Não haverá, com certeza, no Orçamento, verbas que aumentem, nominalmente, tanto como esta da aquisição de serviços não especificados no Ministério da Agricultura.
Aliás, a questão não é apenas com o Ministério da Agricultura, é uma questão relacionada com todos os
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ministérios mas, no Ministério da Agricultura, este número assume, em termos relativos, proporções extremamente elevadas.
Terceira questão concreta: o conhecido projecto de desenvolvimento do Alqueva tem, fundamentalmente, duas componentes — embora tenha outras — ou seja, a componente eléctrica e a componente agrícola.
Já sabemos que, se colocarmos ao Governo questões sobre o problema do avanço das obras do Alqueva--Barragem, o Governo enviar-nos-á para a EDP, dizendo que o problema da barragem tem a ver com a EDP e não com ele.
Para evitar esse tipo de resposta, não colocarei a questão em termos globais mas, apenas, em termos de valia agrícola do Alqueva, que nada tem a ver, obviamente, com a EDP.
E aproveito, fazendo um parêntesis, pedir ao Governo que tenha a preocupação de responder a um requerimento meu, que deve estar lá pelo Ministério há cerca de um ano, solicitando os estudos existentes, que estão publicitados no Diário da República, sobre a valia agrícola do Alqueva.
Fechado o parêntesis, solicitava um terceiro esclarecimento concreto, sobre a razão da não existência de qualquer verba dotada para avanço de operações e obras de actividades em termos do aproveitamente da valia agrícola do Alqueva. São estas as 3 questões concretas que coloco, para as quais solicito, igualmente, respostas concretas.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Esta é, no fundo, a oportunidade única que temos para discutir em Comissão, o Orçamento, pelo que avançaria com algumas questões que não se situam propriamente no âmbito da despesa mas que têm a ver com a política do Ministério da Agricultura.
Uma das medidas que aparece incluída no Orçamento e que diz respeito à política deste Ministério, é a prevista extinção ou reestruturação dos organismos de coordenação económica.
A decisão é importante e, na perspectiva do CDS, é de aplaudir porque aponta no sentido correcto da eliminação de estruturas desnecessárias, fomentadoras de burocracia e que, hoje em dia — como, aliás, suponho que começa a ser reconhecido em largos espectros da Assembleia da República —, só pesam negativamente sobre a actividade económica.
No entanto, parece não ter havido uma coordenação perfeita na preparação do texto da proposta. Com efeito, depois da previsão da extinção ou reestruturação dos organismos de coordenação económica, aparece-nos mais à frente, no artigo 60.°, a possibilidade ou a concessão ao Governo de uma autorização para criar e reestruturar as receitas dos organismos cuja extinção se prevê num artigo anterior, suponho que no artigo 16.° Ou então, pior do que descoordenação, ter--se-á tratado de um acto falhado a demonstrar que, no fundo, não há verdadeira intenção de, até Dezembro de 1985, extinguir estes organismos.
Gostava que nos fossem dados alguns esclarecimentos nesse aspecto, designadamente, em que sentido e em que medida é que se prevê a reestruturação a par da extinção e porquê esta inclusão — que se vai tor-
nando já uma repetição fastidiosa de lei orçamental para lei orçamental — da possibilidade ou de autorização para criação e reestruturação das malfadadas taxas, que já foram definitivamente classificadas como impostos.
Ainda nesta medida e nesta perspectiva de receitas fiscais, apontaria e colocaria as seguintes questões, que têm influência directa sobre a política do Ministério da Agricultura.
No que respeita ao recentemente criado imposto sobre o valor acrescentado, que entrará em vigor no próximo dia 1 do mês de Julho, um dos problemas graves que, sem dúvida, se coloca, é o da descoordenação que parece ter havido entre a fixação das taxas nas diferentes fases do processo produtivo.
Esse aspecto atinge, designadamente, a agricultura num produto que, apesar de tudo, suponho ser importante na nossa economia agrária: o azeite. O azeite aparece isento como tal, mas a azeitona aparece taxada com a taxa normal de 16%.
Para além da violação nítida do princípio da neutralidade, que se quer afirmar como um dos objectivos principais da instauração deste imposto que se pretende nessa substituição do imposto de transacções — realmente, hoje em dia já ninguém acredita nisso —, esta medida pode prejudicar gravemente os produtores agrícolas de azeitona que não tenham incorporadas instalações para extracção do azeite.
Gostaria, pois, que fosse comentada alguma coisa sobre este aspecto do imposto sobre o valor acrescentado.
Retomando um assunto que já aqui foi referido hoje, gostaria também de obter um melhor esclarecimento sobre o sentido das alterações que se pretendem introduzir, através dos artigos 21.° e 22.°, na proposta do Orçamento que concedem autorizações ao Governo, no que respeita à contribuição predial e ao imposto sobre a indústria agrícola.
Suponho que tudo quanto está na proposta de lei é muito vago como autorização e não valerá argumentar aqui com a especialidade das autorizações legislativas contidas nas leis orçamentais para as aligeirar e nos fazer votar aquilo que, porventura, pouco mais será do que um cheque em branco.
Gostaria, portanto, que me pudessem ser dados alguns esclarecimentos sobre esta matéria.
O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): — Isso é no Plenário!
O Orador: — Estão a dizer-me que é no Plenário. Ora, eu comecei por referir, no princípio desta reunião, que seria mais útil começarmos por tratar estes temas aqui — aliás, foram tratados — para depois não os tratarmos apenas no Plenário onde, realmente, trataremos da receita.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, pensamos que os Srs. Secretários de Estado aqui presentes, a quem foram formuladas as perguntas, lhe darão a informação que tiverem disponível, sem prejuízo, obviamente, de esse assunto ser, como compete, discutido em Plenário.
O Orador: — Estão aqui presentes Srs. Secretários de Estado suficientes, designadamente, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, para ...
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias): — Sr. Presidente, peço a palavra.
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O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —
Sr. Deputado, julgo que esta matéria tem realmente a sua sede própria nesta Comissão, mas no dia ou nos dias dedicados ao Ministério das Finanças. Não tenho nada a opor a que se discuta este assunto hoje, mas julgo que, deste modo, estamos a arrumar mal as coisas. Na verdade, se estamos a discutir o orçamento do Ministério da Agricultura, não devemos estar a misturar alhos com bugalhos.
Sr. Deputado, desculpar-me-á mas assim não vamos a sítio nenhum.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Felicito-me muito por esta preocupação de rigor do Sr. Secretário de Estado do Orçamento, preocução de rigor que não encontrei vertida no texto do próprio Orçamento. No entanto, felicito-me por ela surgir agora aqui a propósito da condução dos trabalhos.
Suponho que vamos a toda a parte se os deputados puderem ser esclarecidos a propósito da discussão da política agrícola, ou a propósito da discussão da política fiscal, ou a propósito da discussão da política do Ministério das Finanças, isto é, se puderem ser esclarecidos nestes domínios. E seria bom que estes domínios fossem esclarecidos simultaneamente pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento e pelos Srs. Secretários de Estado e pelo Sr. Ministro — caso esteja presente — do Ministro da Agricultura porque são aspectos fiscais com incidência directa na política económica que concerne a este departamento.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.
O Sr. Rogério de Brito (PCP): — Nesta segunda volta irei colocar questões que, de algum modo, se prendem também com os esclarecimentos prestados pelo Sr. Ministro da Agricultura e com dúvidas suscitadas ou não pela sua intervenção.
Em relação à olivicultura sendo certo que, segundo o Sr. Ministro, esta verba orçamentada de 30 000 contos corresponde, de algum modo, à disponibilidade de plantas para substituições dos olivais velhos, não sei qual é a área prevista a ser abrangida por esta verba de 30 000 contos. Contudo, se tivermos em consideração que, grande parte —para não dizer a quase totalidade — dos nossos olivais estão em zonas marginais, cuja reconversão exige investimentos avultados, não apenas na preparação do terreno como, inclusivamente, numa perspectiva de irrigação e de novas tecnologias de fertilizações que a moderna olivicultura exige, não estou a ver qual é o número de plantas previstas nem a área a abranger, mas duvido que tenha qualquer significado em função da dimensão do problema.
Em relação aos secadores de milho, na questão que coloquei não estava exactamente a referir-me a que fosse o Estado a instalar secadores de milho para os agricultores, estava, sim, a referir-me a um apoio do Estado, à dotação, por parte das cooperativas, de secadores de milho. E há diversas formas de se fazer este
incentivo: desde subsídios — embora seja um termo que choca muita gente — a bonificação de juros, etc, há, enfim, diversas formas de se incentivar o apetrechamento de secadores de milho.
Em relação aos problemas da florestação — tenho pena que o Sr. Ministro não esteja presente —, quero dizer que a questão da floretação industrial não tem que ver, necessariamente, com o eucalipto, pois também se aplica às resinosas e, inclusivamente, ao pinheiro .
Tecnicamente, não tenho qualquer aversão ao eucalipto, posso é ter aversão à forma como o eucalipto pode estar a ser plantado. O eucalipto é uma árvore que tem razão de existir, que também é útil. Trata-se, simplesmente, de uma questão de zonagem e de ter em conta as economias locais dos sítios onde se pretende avançar com a eucaliptação.
Mas a floresta industrial não tem que ver apenas com o eucalipto, tem a ver com as resinosas. E a questão de fundo não foi respondida: nas áreas onde têm sido plantadas resinosas têm-se criado condições de utilização múltipla da floresta? Têm sido criadas, nessas zonas, condições de silvo-pastorícia, de implementação de pastagens melhoradas ou permanentes? Provavelmente será muito difícil que me dêem uma resposta neste sentido.
Por outro lado, o problema da floresta industrial tem a ver também com a rotação e com o crescimento, e não é por acaso que as zonas mais degradadas do País, isto é aquelas que, efectivamente, careciam de florestação, para serem recuperadas ou para ser contida a sua desertificação humana, não são contempladas.
É certo também que, logicamente, as celuloses preferem o eucalipto à resina — dá-lhes maior rendimento —, o eucalipto ao pinheiro, apesar de o pinheiro também servir para esse fim.
Uma outra questão que coloquei tinha a ver com a alimentação animal. Também aqui me parece que o Sr. Ministro não pegou devidamente no problema porque colocou a questão de uma forma em que teria dito: bem, alterar produções de um ano para o outro, requer grandes investimentos. Eu direi, tão-somente, que é possível produzir uma parte substancial — diria mesmo largamente maioritária — dos produtos proteicos necessários para a composição dos alimentos compostos com base em leguminosas proteicas sem necessidade de grandes investimentos, nomeadamente na zona do Alentejo, e, particularmente, se tivermos em conta a existência de solos cuja aptidão agrícola não permite grandes alternativas à produção de forragens e de legumisosas proteicas.
Outra questão tem a ver com as infra-estruturas a criar para a comercialização.
Diria que os esclarecimentos não foram completados, dado que eu coloquei a questão das verbas orçamentadas para o Algarve no que respeita à rubrica que se dá pelo nome de «aprimoramento da produção e da comercialização».
O que é que é para a produção? O que é que é para a comercialização?
Há outra verba que diz, salvo erro, «apoio ao programa de produção e comercialização de hortícolas e citrinos». O que é que é para hortícolas e o que é que é para citrinos? O que é programa de produção e o que é programa de comercialização?
Sabemos que não é possível, sequer, avançar para padrões de normalização da nossa produção hortícola
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ou frutícola sem a criação de infra-estruturas capazes e, muito menos, falar em termos de exportação. Sendo assim, é importante conhecermos isto, pois sem este conhecimento não podemos fazer uma análise crítica do Orçamento ou, pelo menos, com uma base minimamente aceitável, correndo o risco de trocarmos perguntas, contraperguntas e respostas, contra-respostas, porque as coisas não são devidamente esclarecidas.
Ainda em termos de infra-estruturas, foi aqui referido, por parte do Sr. Ministro, a importância de que se está a revestir esta área e apontou como exemplo os matadouros.
Não tenho nada contra a concentração das matanças, mas pergunto: nas mãos de quem ficará a concentração e em que condições? É um problema que já foi discutido com o Governo e que continua sem ser devidamente esclarecido.
Fecham-se matadouros mas, entretanto, muito mais do que os matadouros que se vão fechando, e com um peso muito mais grave em termos sanitários, são, por exemplo, os matadouros clandestinos, que todos nós sabemos onde se situam e que continuam a funcionar.
Fecham-se matadouros municipais e não se criam redes de recolha que permitam, efectivamente, aos produtores a colocação dos seus gados nesses sistemas de recolha por forma a que o produto do seu trabalho não seja fortemente desvalorizado com a intervenção de intermediários que, na situação actual, até têm uma função útil. Não tenho nada contra eles, embora os produtores não tenham o direito de poderem ver cortados os seus circuitos. Estas redes de recolha não existem, a não ser em casos pontuais; não têm sido suficientemente dotadas em termos financeiros para mobilizar os agricultores a entregarem o gado nessas redes. Não se entrega gado para depois se ficar 4 ou 5 meses à espera que seja pago esse gado entregue.
Por outro lado, quer os matadouros, quer as centrais de recepção — em termos de origem e não para produtos diversos, designadamente hortícolas, etc. —, colocam uma outra questão: quem vai, efectivamente, constituir o capital social dessas infra-estruturas? No caso dos matadouros, será a Junta Nacional dos Produtos Pecuários com possibilidades de transferir a sua quota inicial para terceiros, sem qualquer regulamentação?
Quem vai depois apanhar a maior quota-parte do capital social nos matadouros, por exemplo? E isto é também projectado para, por exemplo, as centrais de recepção e tratamento de produtos hortícolas ou frutícolas de origem. Quem vai ficar com a maioria do capital social? Os comerciantes, os industriais ou os produtores? Nada disto está regulamentado e, por isso, não é possível criticarmos todo este aspecto sem que, antes, isto esteja devidamente regulamentado. Quer dizer, o Orçamento pode ser pouco mas também pode ser muito. Será pouco se, efectivamente, as infra--estruturas forem para servir os produtores; será exagerado se forem para servir os industriais e os comerciantes. Isto não está esclarecido e as experiências que temos apontam no mau sentido.
Uma outra questão que também me parece de algum modo importante e útil prende-se com o facto de termos acesso, ainda antes da conclusão destes trabalhos, aos dados dos projectos que o Sr. Ministro não pôde entregar, certamente por se ter deslocado ao estrangeiro, mas que já aqui nos prometeu, por forma a que possamos fazer, ainda que rapidamente, uma análise
desses investimentos, bem como para onde e a quem se destinam.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Adegas.
O Sr. Mário Adegas (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Desejo fazer dois breves comentários embora previamente vá fazer uma outra afirmação, que é a de considerar que, em termos de Orçamento, a educação e a agricultura devem ser as áreas onde a contenção das despesas, correntes e de capital, deve ser mais cuidada, sobretudo na época que atravessamos.
No entanto, começamos a falar de agricultura e vemos que alguma coisa deve também ser^feita no sentido do rigor. Por isso mesmo, quero deixar aqui um comentário, que me surgiu durante o debate e que se prende com os seguros agrícolas: talvez fosse bom que o Ministério da Agricultura continuasse atento à promoção do seguro agrícola e até, eventualmente, ainda que de forma provisória e temporária, pudesse admitir uma comparticipação no prémio de seguro, levando a que os agricultores se orientem para o caminho adequado e nunca de qualquer outra forma. Não pode haver outro caminho e se o houve no passado, está ultrapassado. Hoje, se os problemas das geadas, inundações, pragas, seja do que for, não forem contemplados através do seguro agrícola, estaremos a manter os artificialismos em que somos, aliás, bastante ricos.
Naturalmente que, face ao problema do custo do seguro, o Ministério, através da sua própria função, ou as associações dos agricultores, podem tentar, junto dos institutos ou das companhias de seguros e dentro das leis de contratação e de mercado, através de pressão normal e transparente, que os custos, os prémios, sejam o mais compatíveis possível, mas sem artificialismos, porque os prémios têm de corresponder ao que se pediu. Portanto, transitória e temporariamente, seria bom que pudesse haver uma comparticipação e uma promoção intensa do seguro agrícola.
Não queria deixar de assinalar este aspecto porque julgo que não vai continuar a ser possível fazermos reuniões como a que está anunciada para hoje à tarde na Secretaria de Estado do Tesouro, sempre que aconteça qualquer calamidade, caminhando no sentido do «peditório» ou de soluções de emergência e retardando a solução real dos problemas.
O segundo ponto também especificado aqui é o de não podermos ter muitas ilusões acerca da amplitude das bonificações de crédito, mesmo na agricultura. Repito aquilo que disse inicialmente, embora pense que a haver restrições sucessivas nestas áreas, naturalmente que a agricultura e as pescas devem ficar para último lugar. Quer dizer, a começar a limpar-se este caminho, admito que tenha de haver uma hierarquização e até que estas áreas devam ser as últimas a ser metidas dentro dos esquemas de normalização de que a economia do País precisa. Mas, de qualquer maneira, chegará a vez dessas áreas sofrerem restrições e, então, estou convencido de que é preciso não ter ilusões de que as taxas e os custos do dinheiro terão de ser aqueles que a macroeconomia e a poupança do País possibilitarem. Todas as ilusões que se criem sobre bonificações — que, aliás, como sabem, depois não são pagas aos que têm de intervir na intermediação financeira, designa-
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damente, o sistema bancário — são adiamentos da solução do problema.
Ora, não devemos promover novas situações de bonificação e devemos traçar um plano rigoroso, cauteloso, de redução das que existem. Porém, numa hierarquização da rectificação necessária, admitimos que a agricultura — e neste caso também as pescas — devam ficar para último lugar.
De qualquer modo, numa Comissão como a de Economia, Finanças e Plano, não tenhamos ilusões, penso mesmo que uma palavra de realismo é necessária porque este não é um problema de sentimentos, nos quais podemos ser muito amplos e abertos, mas depois o realismo exige que não fomentemos mais artificialismos para acabar com os que já temos.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado. Estou certo que a Comissão de Economia, Finanças e Plano meditará nas considerações que fez.
Tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Fonseca.
O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): — Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Muito do que queria dizer foi já referido pelo Sr. Deputado Mário Adegas, do meu grupo parlamentar. De qualquer modo, a minha intervenção será também no sentido do máximo rigor, de um planeamento devidamente especificado, de tal forma que a transparência da economia também surja na agricultura, deixando esta de ser um parente pobre na economia nacional, que vive de autênticas esmolas à mesa do Orçamento do Estado, e ainda no sentido, de que o nosso agricultor, ele mesmo com a sua própria iniciativa, tenha uma palavra a dizer, tornando--se um homem de maioridade económica no nosso sistema.
Nessa perspectiva, quero chamar à atenção do Ministério da Agricultura relativamente ao seu respectivo PIDDAC, pois vejo nele algumas verbas que são absolutamente indefinidas. Segundo o critério orçamental, parece-me que para verbas mal definidas, actividades não programadas e despesas imprevistas existirá, a nível do Ministério das Finanças e do Plano, uma dotação provisional. Porém, verifico, por exemplo, na página 16 do PIDDAC, que aparecem verbas referenciadas como «dotações a desagregar». Mas, Sr. Secretário de Estado, dotações a desabregar onde? Num plano? Não será isto mais uma dotação previsional do que um plano, um programa, um projecto bem determinado? Não será de exigir aquele rigor de que o Sr. Deputado Mário Adegas ainda há pouco falava para que as despesas sejam bem aplicadas? Deixo isso não só à consideração do Sr. Secretário de Estado da Agricultura, mas especialmente à consideração do Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): — Sr. Secretário de Estado, no PIDDAC do Ministério da Agricultura, se a memória não me falha, estão incluídos 40 000 contos de subsídios para instalação de jovens agricultores. Considero essa verba exígua sob muitos aspectos e penso que a ela não é estranha a mentalidade que grassa hoje na nossa actividade agrícola.
A mentalidade do nosso agricultor, que foi durante muitos anos, na nossa sociedade, a cisterna de todas
as outras profissões. Isto é, o nosso agricultor era precisamente aquele que falhava em todos os outros sectores pelo que a sua única fuga era, efectivamente, a agricultura. Isto, porque a sua profissão não era dignificada, ele próprio nunca foi dignificado socialmente.
Hoja há milhares de jovens portugueses que se debatem com o problema de tentar modificar as infra--estruturas das suas explorações e que se sentem sós nessa luta. Assim, a minha primeira pergunta vai no sentido de pedir que seja feita uma explanação sobre qual a ideia geral do Ministério da Agricultura quanto à instalação de jovens agricultores.
Por outro lado, estou um pouco sensibilizado quanto à questão, que muitos dos Srs. Deputados já colocaram, das consequências das diversas acções que o Ministério da Agricultura tem levado a efeito — e continua a fazê-lo —, as quais, em termos de Orçamento, são autênticos sorvedouros das disponibilidades do Estado. Concretamente, foco dois aspectos: o primeiro, prende-se com os Serviços Regionais do Ministério da Agricultura e o segundo com os cursos de formação agrícola.
É evidente que sou mais sensível às questões da minha região, o Minho, onde predomina o minifúndio. Ora, estes cursos de formação agrícola e os respectivos custos — que têm um peso considerável no Ministério, juntamente com os serviços de descentralização — prendem-se com um problema de fundo que se vive no Minho e que é o seguinte: visam aqueles cursos a formação do agricultor não só no seu aspecto profissional mas também na sua dimensão social?
Por outro lado, analisando os custos agrícolas do minifúndio verifica-se que eles são terríveis, tanto em termos de bens de equipamento e respectivo desgaste, como em termos de horas mortas de não rentabilidade, particularmente devido à exploração das pequenas unidades, que têm custos nacionais, mas que até hoje ainda não estão verdadeiramente dimensionados. No entanto, creio que seria interessante que algum dia se fizessem esses estudos!
De qualquer modo, em termos de custos de produção, estes cursos de formação do agricultor são também efectivamente orientados no sentido da modificação da mentalidade do próprio agricultor? Quebram o isolacionismo em que o agricultor vive, em termos de minifúndio, extremamente agarrado à sua pequena exploração, não sendo capaz de se juntar a outros agricultores e fazer um emparcelamento livre das terras para delas extrair maior rendimento? Os custos de formação agrícola são sensíveis a esta questão?
Um segundo aspecto que desejo focar, ainda relacionado com esta questão, diz respeito à descentralização, aos Serviços Regionais do Ministério da Agricultura. Uma das críticas que tenho ouvido por parte dos jovens agricultores, é a de que na agricultura há doutores a mais e agricultores a menos. O que estou a trazer a esta Assembleia é o sentir de muitos jovens que me têm colocado esta questão no sentido de que técnicos têm tido mais uma acção teórica que prática junto dos agricultores. Tem o Ministério alguma coisa em vista para realizar, no sentido de modificar efectivamente esta situação? O técnico vai mesmo meter as mãos nas terras, juntamente com o agricultor, ou o agricultor vai continuar a ver o técnico lá em cima, criando-se uma relação de desconfiança entre ambos?
Na minha terceira questão focarei outro aspecto que me sensibiliza, e sobre o qual o Sr. Ministro se refe-
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riu na sua exposição. Disse que o Governo vai canalizar os seus esforços no sentido de apoiar o cooperativismo agrícola. Defendo o cooperativismo e uma grande parte dos problemas do minifúndio passam-se precisamente por não existir associativismo entre os agricultores, por não serem capazes de se unir e de criarem verdadeiras explorações agrícolas.
Fico francamente preocupado quando vejo que os nossos agricultores para explorarem as suas terras não obtêm créditos. Por seu lado, no Orçamento do Estado continuamos a ver cooperativas que acabam por não dar contrapartida válida aos agricultores, acabam por ser lugares onde as pessoas estão, onde o dinheiro do Estado é absorvido sem que dêem qualquer contrapartida aos agricultores que servem.
Uma outra questão prende-se com a gestão das cooperativas. O Ministério da Agricultura tem, efectivamente, feito um levantamento da forma de gerir as cooperativas agrícolas? Como é que elas estão a ser geridas a nível nacional?
A quarta questão que coloco é sobre o crédito da agricultura. Infelizmente, no ano de 1985, já foi dito em Plenário e ventilado aqui hoje, as pessoas habituaram-se a comer à «mesa do orçamento» em vez de lutarem contra a situação, pois é necessário empenharem o seu esforço. Habituaram-se a que o Estado tenha que ser o Estado-pai, que tudo tem de dar, que tem que resolver as deficiências das próprias pessoas. Mas, relativamente a esta questão, não deixarei de levantar um problema, que considero extremanente importante: é que o crédito à agricultura deve ser moralizado.
Há casos conhecidos, que são importantes, de pessoas que, tendo elevadas contas a prazo, obtêm dinheiro dos créditos agrícolas para investir e não investem, utilizando milhares de artificialismos entre os quais as facturas pró-forma — dado que os serviços de crédito não exigem factura real concedendo crédito com base na factura pró-forma, que é um orçamento, nem um documento é —, e depois de obtido o crédito, põem o dinheiro nos bancos a render juros a prazo. Esta situação é verdadeira, conheço alguns casos que acho ser preciso muito cuidado em abrir-se mão desta situação e conceder-se crédito só porque é bonito fazê--lo, só porque as pessoas dizem que precisam.
O crédito deve ser concedido, mas antes de mais terá de ser moralizado, terá de se responsabilizar as pessoas que o apliquem mal. Este é um trabalho que, quanto a mim, é o Ministério da Agricultura que tem de avançar com ele.
Um outro problema ainda relacionado com esta questão é o que se prende com o crédito par. Este tipo de crédito, como se sabe, foi também extensivo às partilhas e a questão levanta-se nas unidades agrícolas quando chega o momento em que os herdeiros têm de proceder efectivamente à partilha dos bens. Ora, exploração agrícola mais ou menos dimensionada, com as partilhas acaba por não ter qualquer rentabilidade. Então, o problema fundamenta] com que as pessoas se debatem é que quando recorrem ao crédito par têm imensas dificuldades em fazer com que o processo avance, para além de outras peripécias extremamente negativas que se passam de permeio entre os técnicos que abordam o caso concreto, assunto que gostaria de não trazer agora para aqui.
Gostaria de ouvir os Srs. Secretários de Estado no que respeita a este capítulo do crédito à agricultura para
saber se existem linhas bem definidas quanto à moralização, à utilização e à definição das unidades agrícolas, sua dimensão e fundamentalmente no que respeita à capacidade dinâmica dos nossos agricultures, à sua dinâmica de acção, ao que são capazes de produzir. E isto porque penso que, de outro modo, corremos o risco de fazer investir na agricultura milhões de contas e passados 4 ou 5 anos verificarmos que não tiveram qualquer contrapartida em termos de economia nacional, em termos de produção agrícola.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado João Eliseu, que é o último Sr. Deputado inscrito. Após a sua intervenção suspenderemos os trabalhos por 15 minutos.
O Sr. João Eliseu (PS): — Sr. Secretário de Estado, a questão que queria pôr relaciona-se com o programa de apoio ao desenvolvimento agrário e regional, FADAR, e com o distrito de Leiria. Este distrito está dividido em três zonas agrárias, uma das quais abrange os concelhos do norte, tendo a sua sede em Pombal e estando subordinada à Direcção Regional da Beira Litoral. Em relação à verba que é atribuída a esta Direcção Regional, aparece apenas aqui um projecto de uma importância maior, onde estão incritos 2 254 contos, que se destinam à zona das gândaras. Esta zona, embora tenha sido piloto, é uma zona onde já existe uma grande concentração de pessoal e de meios de actuação, devendo ser, dentro da Direcção Regional da Beira Litoral, aquela que dispõe de maior quantidade.
No entanto, a verba destinada para a zona agrária do norte do distrito de Leiria, deve ser irrisória, visto que nem sequer aparece desciminada, pelo menos no Orçamento que me foi destribuído. Esta zona é composta por 6 concelhos e 38 freguesias, com mais de 23 500 explorações agrícolas e dispõe apenas de 4 engenheiros-técnicos agrários. É, portanto, uma zona que deveria merecer apoio e estranho que nesta Direcção Regional não haja uma verba substancial destinada a esse fim.
A zona centro do distrito de Leiria, que tem a sua sede em Leiria, está subordinada à sua sub-região agrária de Tomar. E o que se vê aqui é que na Direcção Regional de Agricultura do Ribatejo e Oeste, a verba mais importante destina-se, exactamente, à zona agrária de Tomar, onde já existe a sede de uma sub-região. Isto também acontece na zona sul do distrito onde há, simultaneamente, uma zona agrária e a sede de uma sub-região, havendo, portanto, uma maior concentração de técnicos e, consequentemente de meios de actuação.
Também não aparece aqui verba indicada para a zona agrária de Leiria, embora, como o Sr. Secretário de Estado sabe, nela exista uma zona muito importante que é a do vale do Lis, onde foram feitas grandes obras pelo Governo como, por exemplo, a obra da rega do vale do Lis. Ela merecia um grande apoio por parte do Ministério da Agricultura, visto que é constituída por terrenos bons para a agricultura.
Portanto, a pergunta que faço é no sentido de saber qual o critério com que foram atribuídas estas verbas às diversas zonas agrárias, por conta do programa de apoio ao desenvolvimento agrícola regional, porque dá ideia que são exactamente certas zonas agrárias onde há maiores meios de actuação em termos técnicos e ou-
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tros, aquelas que acabam por ser mais beneficiadas no Orçamento de 1985.
O Sr. Presidente: — Como disse há pouco, não há mais Srs. Deputados inscritos, pelo que vamos suspender os nossos trabalhos por 15 minutos.
Eram 17 horas e 55 minutos.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos reiniciar os nossos trabalhos.
Eram 18 horas e 32 minutos.
O Sr. Presidente: — Para responder às questões que lhe foram postas, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Indústrias Agrícolas.
O Sr. Secretário de Estado das Indústrias Agrícolas
(Carlos Filipe): — Srs. Deputados, vamos prosseguir na nossa tentativa de resposta na sequência das questões que foram sendo apresentadas.
O Sr. Deputado Vilhena de Carvalho coloca uma primeira questão directamente ligada ao Orçamento, no que diz respeito a verbas com horas extraordinárias, que referiu serem de 27 843 contos. Perguntou se elas seriam para pagamento de serviços prestados além do período normal ou de pessoas que não fazem parte dos quadros.
Julgo que esta verba se destina a pagamento dos serviços prestados além do período normal, na medida em que para pagamento do pessoal fora dos quadros são outras as verbas consideradas, como é o caso da referente a serviços não especificados, questão também levantada por outros Srs. Deputados. Dç qualquer forma, esta verba de 27 000 contos para horas extraordinárias corresponde a 0,5 % das despesas com pessoal de todo o Ministério e, portanto, em termos de uma análise meramente global, creio que não se poderá dizer que se trate de uma verba exagerada. Creio que o facto de aparecer diferentemente representada ou distribuída entre várias direcções-gerais ou entre as próprias direcções regionais resulta dos diferentes contingentes de pessoal e da sua disponibilidade, actualmente existentes nesses serviços ou direcções, o que leva a que nalguns casos, e enquanto não puderem ser completados ou aumentados os quadros, exista necessidade destas horas extraordinárias.
Outro problema levantado pelo Sr. Deputado Vilhena de Carvalho foi o das zonas demarcadas vitivinícolas e se o Ministério tem empenhamento neste assunto. É evidente que o Ministério se vai empenhar neste problema. Simplesmente, e como foi já referido, trata-se de uma questão que se vem arrastando há anos, até porque algumas das regiões criadas, como as da Bairrada, da Anadia e do Algarve, ainda hoje não estão a funcionar.
A legislação existente sobre este assunto é complicada e complexa e prevê, nomeadamente, que sejam os produtores e os agricultores a organizarem-se para que existam os respectivos organismos. Isto não dispensa que o Ministério dê apoio a essa organização, como será necessário, e pensamos que se poderá introduzir um salto qualitativo e uma modificação significativa a partir do momento em que o Governo crie o projectado instituto nacional para os vinhos de denominação de origem, que terá, exactamente, uma função nacional para estes vinhos. Existe, assim, um projecto para este efeito, que o Governo irá apreciar
dentro de pouco tempo com vista à sua instalação e será a este instituto que cabe promover, apoiar e orientar todo o trabalho das regiões demarcadas e respectivos organismos. Sem prejuízo disso, o problema da demarcação é feito geograficamente a partir de análises técnicas e de pareceres relativos à distribuição das castas e às características das regiões, que são preparados pelos serviços do Ministério, quer os regionais, quer os organismos propriamente equacionados para a política vitivinícola, como é o caso das estações vitivinícolas existentes.
O problema do cadastro é, neste momento, da responsabilidade do Instrituto de Gestão e Exploração Fundiária (IGEF), que está a trabalhar em várias zonas com equipas, nomeadamente em Pinhel — e cito Pinhel porque foi uma zona demarcada aqui referida — cuja equipa está a funcionar com bons resultados e muito avançada, em Trás-os-Montes, especialmente no Douro, e no Alentejo. Prevê-se, por outro lado, que com as técnicas utilizadas até agora para fazer o cadastro, este processo seja, efectivamente, demorado, até porque tem levado anos. Por isso e para resolver este problema, é preciso intensificar e passar à utilização de novas tecnologias, como é o caso da fotografia aérea. Este assunto está de facto em estudo, existindo já um grupo de trabalho criado, não sei se o ano passado, para este efeito, e que irá fazer as propostas necessárias.
O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca apontou alguns exemplos da redução de verbas com serviços do Ministério e, nomeadamente também, no Gabinete do Ministro. É evidente que embora haja um aumento global no orçamento do Ministério para despesas correntes e de capital de 7 200 000 contos em 1984 para 9 milhões em 1985, foi necessário responder às necessidades mais urgentes de aumentos em alguns serviços e, por outro lado, limitar noutros. Existe aqui uma situação da restrição de despesa imposta por problemas mais gerais de política financeira do Estado.
No caso concreto do Gabinete do Ministro, previ-ram-se menos despesas para subsídios a conceder, nomeadamente a cooperativas, como vinha acontecendo, e ficou apenas incluída uma verba, salvo erro, de 160 000 contos. Além disso, deixaram de estar dele dependentes alguns órgãos que estavam nessa situação, como é o caso da Comissão de Peripneumonia, que passou para a responsabilidade total da Direcção-Geral da Pecuária. Há, portanto, uma situação de redução normal em alguns serviços, ao mesmo tempo que a outros foi possível fazer aumentos, porque se reconheceu que existia uma situação extremamente estrangulada, digamos assim, no funcionamento dos serviços que no ano de 1984 não puderam cumprir os seus objectivos. No contexto global, no entanto, é evidente que a verba relativa ao pessoal permanente absorve um acréscimo bastante significativo, o que acaba por constituir uma limitação para o funcionamento de vários serviços e suas direcções.
Outra questão que foi posta pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca é relativa ao calendário de protecção ao agricultor e à garantia de escoamento dos produtos agrícolas. Tem vindo a acontecer, nos últimos anos, uma certa preocupação dos governantes do Ministério da Agricultura de publicar, em tempo oportuno, os chamados preços de garantia para os produtos agrícolas, como é o caso fundamentalmente dos cereais e das oleaginosas, mas também do tomate, que
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é utilizado na indústria de concentrado de tomate, e preços de orientação para o vinho. A única novidade que existe, mas que julgo ser significativa, é que está para publicação um calendário efectivo com indicação das datas em que o Governo se compromete a publicar e a fixar estes preços de garantia. É evidente que quando se fala em preços de garantia isso não significa, necessariamente, que o Governo assegure o escoamento de todos os produtos agrícolas, porque existe mercado na maior parte dos casos. Trata-se de fixar um ponto de orientação e apenas nos casos, que ainda se mantêm, de aquisição em exclusivo por parte do Estado, é que existe uma garantia completa de escoamento. É o caso do trigo, que ainda hoje está em mercado com exclusivo da EPAC, não tendo sido ainda libertado, embora já haja instrumentos legais que preparam essa liberalização. Portanto, quando se diz garantia de escoamento dos produtos agrícolas, não se pretende dizer, como é evidente, que o Estado assegura a compra de todos os produtos agrícolas. O que significa é que ele estabelece orientações para o funcionamento do mercado e, nalguns casos, como por exemplo o dos cereais, o das oleaginosas e o do azeite, que têm vindo a ser adquiridos pelo IAPO e o das carnes, em que também se fazem operações de intervenção, em situações de mercado em que se conhece haver excesso de produção, com encargos, aliás, muito vultosos para o Estado o que tem dificultado, na prática, a flexibilidade deste sistema.
Levantou também alguns problemas relativos ao sistema de crédito, que foi aliás abordado por vários Srs. Deputados. Mas a questão concreta que referiu era no sentido de saber se estava previsto crédito em espécie à agricultura, o que considerava ser necessário. Respondo-lhe que não está de facto previsto crédito em espécie à agricultura. É evidente que através de linhas de crédito existentes no SIFAP, que proporcionam recursos próprios para as cooperativas de compra e venda, será possível a estas proporcionar aos seus associados os produtos, factores de produção, sementes, adubos, máquinas, etc, em condições adequadas, desde que essas cooperativas estejam organizadas nesses termos e que utilizem o crédito da melhor maneira.
É verdade que, a propósito, esta linha de crédito, que beneficia especialmente as cooperativas de compra e venda, deixou de ser bonificada ao abrigo de um aviso do Banco de Portugal, de Agosto de 1984, que foi feito, evidentemente, sob a orientação do Governo e que se concretizou agora no final de 1984 e em que as linhas de crédito de campanha e especialmente esta, que beneficiava as cooperativas de compra e venda, deixaram de ter bonificação.
Pôs também uma questão genérica, no sentido de saber que apoios existem às pequenas e médias explorações por parte do Ministério. É evidente que todas as formas de assistência técnica ou de extensão rural que existem e que se reconhece que é necessário melhorar e intensificar urgentemente, os vários programas existentes para apoio à produção de bovinos ou à reconversão de explorações agrícolas estão orientados com certeza, dada a estrutura fundiária do País, para o apoio a pequenas e médias explorações e não, especialmente, para grandes explorações. Acontece até que, em muitos casos, as grandes explorações, exactamente porque têm capacidade própria, dispõem de técnicas ao seu serviço que podem contratar e utilizar, não utilizando o apoio técnico do Estado.
Em relação à questão do fortalecimento cooperativo e da adesão à CEE, queria dizer que se trata, de facto, de um problema difícil, visto que implica alterações estruturais, que não têm vindo a ser feitas de modo suficiente, desde que se fala da adesão à CEE. Não se poderá fazer tudo de uma vez, mas existe vontade deste Ministério de apoiar, na medida dos meios de que dispõe, o movimento cooperativo. Concretamente, no âmbito dos projectos a financiar pelas verbas de pré--adesâo, já foi aqui anunciada — e daqui a pouco abordarei esse ponto com mais pormenor — a entrega de uma primeira carteira de projectos à CEE para apreciação e aprovação, onde estão incluídos alguns projectos de verbas significativas, que têm a ver com as estruturas cooperativas e com o apoio ao movimento cooperativo. Aproveito a oportunidade para referir que, como foi prometido pelo Sr. Ministro, este documento e estes projectos, que constituem as carteiras em apreciação para envio à CEE, serão enviados aqui à Comissão de Economia, para distribuição aos Srs. Deputados.
Posso já referir, embora com algum atraso, porque a apreciação dos projectos deverá ter sido feita a partir de Junho de 1984 e só este mês foi enviada uma primeira carteira, que esta carteira de projectos representa investimentos no valor de 4 milhões de contos, cabendo a financiamentos da CEE 2 050 000 contos, que são cerca de 50 %. A restante parte terá de ser financiada com a contribuição do Orçamento do Estado, que está incluída no PIDDAC de 1985 por capitais próprios ou para empréstimos bancários, como é natural, e que dizem respeito ao financiamento de origem nacional. Devo dizer ainda que este montante de 4 milhões de contos se trata de financiamentos relativos a 1985 e 1986, uma vez que o que estamos a discutir e a apresentar à CEE é o financiamento, até à adesão, para utilização de 50 milhões de ECUs.
Posso citar os projectos que constituem esta primeira carteira: um laboratório para o Instituto da Qualidade Alimentar, no valor de 130 000 contos, um programa de investimento...
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, dá-me licença que o interrompa? Se pudesse facultar-nos esses dados, ganharíamos tempo.
O Orador: — Com certeza que o farei.
Tudo isto vinha a propósito da questão do apoio às cooperativas. Existe um projecto apresentado pela União de Cooperativas de Leite de Entre-Douro e Minho, outro da PROLEITE e um outro da Direcção Regional do Algarve. Em termos de cooperativas são estes que já estão considerados. Outros estão em apreciação e discussão, mas há que reconhecer — e o Sr. Ministro já se referiu a isso — que existem algumas dificuldades no andamento destes projectos. É que embora eles devam ser apresentados por entidades proponentes, que são cooperativas, empresas privadas ou públicas como é, por exemplo, o caso do Cachão, nem sempre estão bem preparados. De maneira que quando se chega à sua apreciação é preciso muitas vezes fazer a reformulação e o reajustamento aos próprios critérios de selecção e de elegibilidade que estão convencionados com a CEE.
Pôs ainda o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca uma questão relativa aos PIDRs. Pedia ao Sr. Secretário de Estado da Produção Agrícola que abordasse
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esta questão, assim como o problema da situação do projecto da Cova da Beira e da utilização dos empréstimos estrangeiros.
Entretanto, assumiu a presidência a Sr." Vice--Presidente Ilda Figueiredo.
A Sr." Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Produção Agrícola.
O Sr. Secretário de Estado da Produção Agrícola
(Joaquim Gusmão): — Compete-me, portanto, responder à parte relativa aos PIDRs e nesse sentido quero dizer que em relação ao Ministério da Agricultura estão inscritas verbas para a actuação em cinco projectos integrados de desenvolvimento regional: Trás-os-Montes, Cova da Beira, Baixo Mondego, zona crítica alentejana e Nordeste algarvio.
Para não me alargar muito, vou referir, resumidamente, as acções que estão previstas, por rubricas, na parte relativa a Trás-os-Montes. Temos uma componente agrícola, que se desenvolve por reabilitação de 211 esquemas tradicionais de irrigação, portanto, de melhoria, localizados na zona de montanha. Vão-se construir também 13 pequenos aproveitamentos de irrigação na zona de montanha. Está também em concurso, e quase adjudicado, um estudo de viabilidade para um perímetro de cerca de 2000 ha de irrigação na margem direita do Douro.
Em relação ao crédito, ele existe para pequenos empreiteiros, no sentido de os equipar com máquinas, não só agrícolas, mas também com algum equipamento industrial. Há outro programa que consiste no crédito a pequenos e médios agricultores para investimentos nas explorações agrícolas, na zona de montanha, na dos vales submontanhosos, na do planalto mirandês e na do Douro. Nesta última zona, há um trabalho especial que abrange 2500 agricultores, e concretamente o estabelecimento de 1500 ha de vinhas novas, nos chamados mortórios, isto é, mais ou menos 1 ha por agricultor, portanto é a zona de pequena propriedade.
Há também um projecto de substituição de 500 ha de vinhas velhas na encosta e que também interessa a pequenos agricultores.
Existe também um outro programa que é o de crédito a cooperativas de serviços, para ampliação de instalações de armazenagem e para a compra de equipamento de recolha e calibragem de batatas de semente.
Temos ainda outra linha que se refere a salas de ordenha, estando já uma parte desta em construção que abrange 154 salas de ordenha a nível de aldeia nos vales de submontanha, por ordenha mecânica e refrigeração. Além disso, compreende ainda o projecto serviços de extensão e estações de investigação. Há, portanto, a componente não agrícola, mas isto já não diz respeito ao nosso Ministério, contudo, se VV. Ex."5 estão interessados, posso dizer de que é que consta.
Quanto ao PIDR da Cova da Beira, tem em vista dar continuação aos trabalhos de aproveitamento hidro-agrícola que ali está em construção como VV. Ex.85 sabem. Portanto, a barragem está concluída, faltando agora toda a rede de canais principais, que não são muitos — na verdade é apenas um —, com toda uma rede de rega por aspersão mas sem consumo de energia, toda a cota a que se desenvolve o canal. Trata-se, assim, de uma obra que está em curso e que, apesar
de ter sofrido alguns atrasos, nos últimos contactos que tivemos com a entidade financiadora, que é um banco alemão, soubemos que os pagamentos que estavam bloqueados já não o estão, daí o empréstimo estar a concluir-se.
Quanto ao Baixo Mondego, se é um projecto susceptível de críticas, é também um projecto integrado de desenvolvimento regional que se tem arrastado há muitos anos, mas penso que tem de se concluir, senão o vale do Mondego ficava pior do que estava. Portanto, temos de terminar o rio, tem de se construir o resto do canal — já tem uma parte feita —, tem de se abrir o enxugo secundário, que já começou, e tem de se fazer a rede secundária de rega e os caminhos.
Em suma, penso que não podemos agora abandonar o vale do Mondego no estado em que ele está até porque, presentemente, as condições de enxugo, como ainda não estão as estações de bombagem a funcionar, quase são piores do que estavam.
No que diz respeito ao PIDR do Alentejo, da zona crítica alentejana, há acções de extensão rural nas zonas de Barrancos, Moura, Beja, Odemira e Reguengos, como também há acções na parte de pequenos aproveitamentos hidráulicos. Já estão em construção duas barragens no concelho de Almodôvar e está prevista, para o ano de 1985, a construção de mais quatro pequenos aproveitamentos hidroagrícolas, portanto em zona de pequena propriedade onde têm grande impacte.
Quanto ao Algarve, há também instalações de zona agrária em Alcoutim, há apoio à caprinicultura, instalação de campos experimentais, construção de pequenas barragens, construção de armazéns para fins agrícolas e aquisição de equipamento.
Em resumo, independentemente de acções florestais de pequena monta, como aqui há pouco foi considerado, ao fim e ao cabo estão previstos 20 000 contos para acções de florestação e instalação de pastagens, 20 000 contos no PIDR do Algarve e 20 000 contos na zona crítica alentejana. Trata-se de verbas pequenas, mas, como VV. Ex." sabem, as dificuldades que o País atravessa não permitem fazer tudo ao mesmo tempo.
A Sr." Presidente: — Creio que há Srs. Deputados que se inscreveram para fazer perguntas às questões que já foram tratadas pelos Srs. Secretários de Estado, mas como penso que pretendem ainda continuar a responder às perguntas que lhes foram colocadas inicialmente, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Indústrias Agrícolas.
O Sr. Secretário de Estado das Indústrias Agrícolas
(Carlos Filipe): — O Sr. Deputado Bento Gonçalves falou no problema da lista dos projectos de pré-adesão, a qual será fornecida, dai o não voltar a esta questão neste momento.
Sobre a questão das regiões demarcadas, que pretendem defender a qualidade dos vinhos produzidos no País, é de facto urgente que se complete o trabalho relativo à criação das regiões já definidas ou criadas legalmente e que se faça a demarcação de outras ainda, até porque, indo por diante a adesão à CEE, a partir dela e por tratado, a demarcação de novas regiões já terá que ser feita de acordo com a CEE. Assim, só o que pudermos fazer até lá é que poderá ser feito completamente por nós, sem que tenha acordo da CEE.
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Outro aspecto que o Sr. Deputado focou é o problema específico dos vinhos de baixo teor alcoólico que são produzidos na região do Oeste, e talvez também noutras regiões. Esta questão é controversa porque existe até hoje no nosso país legislação que define um mínimo de graduação para os vinhos que podem ser comercializados e que, em geral, correspondem aos vinhos de qualidade que satisfazem essa graduação. Acontece porém que têm vindo a ser plantadas vinhas, hoje já com uma área significativa, em que vinhos que possivelmente — e defende-se que sim — têm qualidade e procura junto do consumidor têm menor graduação. Ora, eu explico que já é possível fazer a exportação destes vinhos porque a Junta dos Vinhos está autorizada a permitir a referida exportação e um dos argumentos é permitir-se a utilização deste mercado, dado que noutros países existe hoje procura para estes vinhos.
Também se defende, concretamente algumas adegas cooperativas da região do Oeste, que o mesmo devia ser feito para o mercado interno. Esta questão, como digo, é controversa, tendo o Governo de tomar uma posição final sobre o assunto, e isto porque existem opiniões diferentes a este respeito, nomeadamente as regiões demarcadas defendem o contrário desta evolução e até o próprio sector comercial em muitos casos.
Apesar de tudo, tem de se reconhecer que o vinho de baixo teor alcoólico acaba por ser comercializado através de artifícios como seja a sua aguardentação, e portanto é um argumento que terá de se ter em conta. Houve já uma portaria que pretendeu apresentar esta possibilidade e defini-la, mas, como é natural, ela não foi ainda por diante porque o Governo procura auscultar os vários sectores, e foi ao fazê-lo que encontrou grandes reacções a esta evolução. Portanto, o assunto está a ser reapreciado e voltará para uma posição final do Governo sobre o problema.
Uma outra questão que levantou o Sr. Deputado Bento Gonçalves diz respeito à questão da obrigatoriedade, de que, para a recepção do subsídio de gasóleo, esteja a ser exigida a abertura de contas na Caixa Geral de Depósitos. Não estou inteiramente a par do assunto, talvez o Sr. Secretário de Estado da Produção Agrícola possa dar um esclarecimento.
O Sr. Secretário de Estado da Produção Agrícola
(Joaquim Gusmão): — Sr. Deputado, o problema é que, ao fim e ao cabo, são 800 000 agricultores que recebem subsídio de gasóleo, o que pesa grandemente no serviço, porque o ano passado foi o meu serviço que efectuou a passagem de 800 000 cheques, cada cheque assinado por duas pessoas. Portanto, este ano, em relação ao subsídio de gasóleo de 1984, vamos processar de outra maneira, de tal modo que é o Ministério das Finanças que se vai encarregar desse serviço a partir das inscrições dos agricultores, não só das suas máquinas como da área de regadio.
Em suma, todo o processamento vai ser concentrado no centro de informática do Ministério das Finanças e aí o subsídio já vai calculado e gravado em fitas magnéticas por concelho, daí a facilidade que havia de gravar uma ou duas fitas magnéticas por concelho e enviar para a delegação da Caixa Geral de Depósitos que lançava o crédito na conta de cada indivíduo. É, assim, muito difícil que cada agricultor escolha ou a Caixa Geral ou a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo ou o banco A ou o banco B, pois o centro de informá-
tica do Ministério das Finanças terá dificuldade em fazer os processamentos nesses moldes.
Por outro lado, posso dizer que as reclamações têm sido muitas e estamos a encarar a hipótese — o Ministério das Finanças está a estudar isso — de, como a fita magnética vai ser feita por concelhos, fazer um código para a Caixa de Crédito Agrícola ou para a Caixa Geral de Depósitos. Estas são as únicas duas opções que vemos possibilidade de encarar, porque — não esqueçamos! — o trabalho é para 800 000 pessoas.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Almerindo Marques.
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado das Indústrias Agrícolas, faça favor de continuar.
O Sr. Secretário de Estado das Indústrias Agrícolas (Carlos Filipe): — O Sr. Deputado Bento Gonçalves falou ainda da questão da Lei do Arrendamento Rural. Quanto a isso, tenho conhecimento de que o Sr. Ministro está a trabalhar em vários projectos de legislação de fundo, entre eles a revisão da Lei de Bases da Reforma Agrária, uma lei sobre electrificação rural, lei de caça, lei de arrendamento florestal, e tem também entre mãos para apresentar — penso que à Assembleia da República — uma lei sobre arrendamento rural.
Colocou ainda o Sr. Deputado a questão, segundo vários aspectos, relativa ao sistema de crédito à agricultura. Sobre isso gostaria de formular, muito rapidamente, algumas opiniões e posições do Ministério a este propósito.
O Sr. Ministro referiu aqui que o Ministério está atento à questão do evoluir do problema do crédito agrícola, e, nomedamente, em relação a uma tomada de posição sobre a anunciada extinção do IFADAP. Efectivamente, do ponto de vista do Ministério da Agricultura, não é uma questão líquida ou que se possa considerar decidida porque há que fazer uma avaliação completa das vantagens que o sistema do SIFAP, instituído em 1979, representou e a que o Sr. Deputado Bento Gonçalves se referiu, concretamente, num aspecto extremamente importante, que é o da generalização da ideia do projecto agrícola, projecto como estudo e fundamentação de uma necessidade de crédito, de investimento.
Portanto, temos em certos casos projectos muito simples e, noutros casos, projectos mais desenvolvidos e complexos para maiores investimentos, em que há toda uma demonstração de receitas, resultados provisionais e de despesas, por forma a demonstrar, perante as instituições de crédito financiadoras, a viabilidade dos projectos. Isto é algo que se veio adquirindo e que, efectivamente, não estará ainda aperfeiçoado na medida em que, nos casos em que falta aos agricultores capacidade para elaborar, eles próprios, os projectos, é necessário que tenham apoios que terão de ser concedidos, quer pelos serviços do Ministério da Agricultura, como prevê o próprio sistema, quer até pelas instituições de crédito quando a isso se dispõem. É isto o que está z fazer, nomeadamente, o sistema do Crédito Agrícola Mútuo, com apoios do Ministério através de um protocolo que proporciona alguns técnicos para colaborarem com este sistema.
Isto não quer dizer que não seja necessário remodelar ou reformular o SIFAP, que tem duas grandes com-
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ponentes, entre outros aspectos, que são o crédito de campanha e o crédito de investimento. Contudo, essa formulação depende, afinal de contas, de uma definição de política agrícola que não existia no memento em que o próprio sistema foi criado. É necessário definir as prioridades regionais e por tipos de produção para que as linhas de crédito que constituem o sistema correspondam exactamente a essa política, ou seja, há aqui uma interdependência entre reformulação do sistema e trabalho do Ministério da Agricultura na definição dessa política de produção, o que é indispensável.
O crédito de campanha — já agora abordava também a questão levantada pelo Sr. Deputado Mário Adegas —, como referi há pouco, deixou de ser bonificado. É evidente que se torna mais difícil para os agricultores utilizar o referido crédito, que aliás continuava a constituir mais de 80 % do crédito do sistema concedido aos agricultores, porque exactamente é na área do investimento que é necessário conseguir maior dinamização e maior concessão de crédito por parte dos agricultores, sendo aí que todo o apoio deve incidir. Portanto, continuam a ser bonificadas essas operações de crédito ao investimento.
Há que reconhecer que as taxas de juro são muito elevadas e, mesmo com bonificações, os projectos, às taxas líquidas actuais, depois da bonificação, são dificilmente rentáveis. Daí que seja uma matéria que terá de ser revista, mas que põe todo o problema — também aqui sugerido — da moralização e do controle do crédito.
O controle do crédito de campanha é muito mais difícil, porque é um crédito a curto prazo em muito mais numerosas operações e que não se baseia, tal como o investimento, num projecto ou num documento justificativo e em que se possa apoiar esse mesmo controle e essa análise, por isso mesmo julgo que terá sido uma das razões determinantes, para além de outras de ordem económica, a extinção das bonificações do crédito de campanha.
O controle do crédito deve caber ao próprio IFA-DAP, que tem serviços regionais e técnicos que podem ser utilizados para isso, cabe às instituições de crédito, que são as primeiras interessadas nisso, e cabe também ou pode caber a serviços do Ministério da Agricultura. Mas é evidente que as próprias instituições de crédito têm aqui uma palavra especial a dizer porque são elas as mais directamente interessadas dado serem elas que concedem os fundos, devendo portanto assegurar que não há desvios na sua aplicação. De resto, existem sanções e quando são dectectados os desvios as bonificações cessam e deixam de ser concedidas.
No que diz respeito às ajudas ao sector cooperativo, diria muito rapidamente que o Ministério está a fazer a fiscalização das contas de algumas cooperativas, mas estas são mais de 600 e o trabalho relativo a isso é naturalmente demorado dentro das estruturas que o Ministério dispõe para o efeito. Assim, o Ministério está a começar ou está a actuar sobretudo em relação àquelas pessoas que se lhe dirigem a pedir auxílios e que, em geral, são pedidos de subsídios.
O Sr. Deputado levantou o problema da organização do leite e de uma decisão que recentemente foi tomada. Isso levar-me-ia a uma exposição demorada, a qual não posso fazer neste momento. Diria apenas que ao alterarem-se os preços do leite ao produtor em 12 de Janeiro, se deixou de definir um preço a pagar ao produtor por qualquer cooperativa ou união de coo-
perativas ou ainda empresa privada — mas como há o exclusivo das cooperativas, são elas as compradoras ou que o podem fazer nas zonas organizadas. Deixou, assim, de ser fixado um preço único de aquisição do leite ao produtor e a partir daí se desenvolverem todos os custos de recolha, concentração e tratamento do leite, até chegarmos ao consumidor. Foi agora decidido que o preço do leite que foi fixado fosse a nível da chegada do leite ao centro de concentração ou fábrica de tratamento. Contudo, houve o cuidado de, ao fazer esta actualização, deixar implícito neste preço um valor acrescido em relação ao que estava em vigor, para cobertura dos custos de recolha de leite, tansporte, concentração, as várias preparações e despesas relacionadas com isso. Esse aumento em relação às despesas de concentração, que ficou implícito no preço até à chegada à fábrica ou centro de concentração, que pertencem às uniões cooperativas, foi de 36 <7o, por forma a dar cobertura e a satisfazer a recolha do leite em todas as áreas em que existem produtores. De resto, o Ministério recebeu apoios, nomeadamente das cooperativas de base, não das uniões de cooperativas, em relação a esta política porque com ela será possível, eventualmente, pagar da melhor maneira aos produtores e valorizar até o preço do leite numa óptica de política de rendimentos dos agricultores.
Quando se diz que a referida alteração foi feita de forma drástica, é evidente que uma alteração deste conceito, que sempre teríamos de fazer após a adesão — porque é assim que é definido o preço do leite na comunidade — vinha sendo preparada e discutida com as uniões de cooperativas, já em várias circunstâncias na altura de se fazerem portarias anteriores, mas nunca foi levado muito a sério pelas uniões que isto viesse a fazer-se. Nós mesmos, antes de o fazermos — como sabem apesar de tudo, os diplomas de elevação dos preços são fixados e estudados nas últimas semanas antes disso ocorrer —, tivemos algumas reuniões com as uniões e discutimos as vantagens e desvantagens desta situação. E, foi finalmente, por decisão política tomada. A partir daqui veremos como se poderá enfrentar as consequências.
O Sr. Deputado Vasco Miguel levantou também o problema das regiões demarcadas, o qual já julgo ter abordado de algum modo noutra resposta, daí que passaria adiante.
Sobre a formação profissional, colocou o problema da verba de 150 000 contos, através de um programa . do Banco Mundial e chamou a atenção para a necessidade de que os técnicos estejam, eles próprios, habilitados a preparar os agricultores para a integração. É evidente que esta é uma problemática que o Ministério terá de abordar, e através da formação dos técnicos, dar resposta a esta necessidade. No meu entender, julgo que têm vindo a tomar-se algumas iniciativas, que não sei agora situar exactamente, já com vista a reuniões com agricultores que se têm concretizado nalgumas regiões — creio que no Atentejo, por exemplo — para discussão e informação acerca dos problemas que se levantam pela integração europeia.
O Sr. Deputado Vasco Miguel pôs-me novamente o problema do apoio ao sector cooperativo e sua viabilização. Queria dizer que o saneamento deste sector, em termos de difíceis situações financeiras, grande endivi-1 damento bancário — que resulta, muitas, vezes do nível de juros que não conseguem pagar — é extremamente elevado. Numa análise que o Ministério fez
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recentemente, elevam-se acima de 15 milhões de contos as dívidas das cooperativas ao IGEF, ao sistema bancário, ao IFADAP em crédito directo, aos bancos, etc. É evidente que o Estado, por si, não pode encarar mais de 15 milhões de contos.
Este saneamento não poderá, pois, ser encarado em termos de subsídios a conceder pelo Ministério que, para esse efeito, tem verbas restritas. Como se referiu há pouco, a verba é de, este ano, 160 000 contos.
Terão, pois, que ser encontradas outras soluções através de linhas de crédito que permitam reestruturar e consolidar estes créditos — de que já existem alguns exemplos anteriores, nomeadamente para o caso do crédito agrícola de emergência —, ou através de acordos directos com os credores e com as instituições de crédito, como, aliás, é orientação geral do Governo em relação à recuperação de empresas privadas. O mesmo pode dizer-se em relação às cooperativas.
Quanto aos PIDRs, o Sr. Secretário de Estado da Produção Agricola já tratou dessa questão.
Sobre a reforma agrária, a questão foi posta muito genericamente pelo Sr. Deputado Vasco Miguel. Como já referi, o Sr. Ministro da Agricultura — que poderá voltar a esta questão, se o entender — está a debruçar--se sobre toda a problemática das situações irregulares — falta de cumprimento da lei ou desajustamento da lei —, em relação às situações concretas que, até hoje, permaneceram na área geograficamente definida como sendo a área da reforma agrária, e está a preparar legislação com vista a opções para a resolução desses problemas, quer por expropriações que não foram feitas, quer por zonas expropriadas ou nacionalizadas que continuam a ser exploradas pelos seus detentores iniciais, portanto, sobre todo um conjunto de situações que não correspondem à definição da legislação. Tudo isto está a ser apreciado, com vista a serem tomadas decisões que permitam ultrapassar e, de uma vez, clarificar o problema.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira pôs o problema de haver um aumento apenas de 8,7 °Io no orçamento do Ministério da Agricultura para as despesas correntes. Já me referi à necessidade que houve de restringir e já me referi aos plafonds que foram indicados a este Ministério para as suas despesas. Por outro lado, também tem sido posição muito defendida a nível político a necessidade de que o Estado racionalize as suas despesas e faça essa contenção.
De maneira que é isso que vamos assumir, para além da preocupação que o Governo já assumiu de que a execução do Orçamento do Estado para 1985 terá que ser extremamente rigorosa para que se possam cumprir os orçamentos dos diversos ministérios que existem.
Referiu que as despesas correntes eram de 4 milhões e só aqui havia uma percentagem muito elevada para a aquisição de serviços não especificados. Creio que é, exactamente, através desta verba que são pagos os tarefeiros e o pessoal que está fora dos quadros. É por isso que a verba é elevada.
A última questão posta pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira tem a ver com o Alqueva, com a inexistência de verbas para este projecto e com a parte agrícola do projecto.
Sobre esta questão, peço ao Sr. Engenheiro Gusmão a sua colaboração.
O Sr. Secretário de Estado da Produção Agrícola: — Penso que o problema do Alqueva a nível da
agricultura é muito simples. Não temos verbas previstas porque o Governo ainda não decidiu sobre o arranque do projecto do Alqueva.
Em relação ao que o Sr. Deputado Octávio Teixeira pediu, devo dizer que é possível fornecermos-lhe o estudo que está feito da valia. Como, com certeza, sabe, foi uma empresa particular paga pelo Governo que fez um estudo de valia agrícola sobre o Alqueva.
O Sr. Secretário de Estado das Indústrias Agrícolas: — Dá-me licença que continue no uso da palavra, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: — Faça favor.
O Sr. Secretário de Estado das Indústrias Agrícolas: — A primeira das questões postas pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito diz respeito ao propósito anunciado pelo Governo e pela maioria, em relação à extinção dos organismos de coordenação económica.
É evidente que existe este propósito, tem estado a fazer-se a análise do problema e, nomeadamente, o Governo criou, em Agosto de 1983, uma Comissão Interministerial para os Mercados dos Produtos Agrícolas dado ter-se pensado que havia a fazer uma revisão completa nas instituições que existiam e que se relacionavam com toda esta matéria. Possivelmente, virá a existir uma lei-quadro para definir organismos dentro da institucionalização dos mercados dos produtos agrícolas na qual estarão incluídos os organismos de intervenção que substituirão, pelo menos, parte da actividade dos actuais organismos de coordenação económica, em que estão incluídos organismos de participação e diálogo com os agentes económicos, nomeadamente, os agricultores e o sector comercial e industrial ligado à agricultura e em que, por outro lado, se definirá a extinção ou a transformação dos organismos de coordenção económica.
A extinção desses organismos levanta toda uma série de problemas que tem de ser abordado.
Em primeiro lugar, sê-lo-á em termos de funções, porque algumas dessas funções podem ser transferidas para direcções-gerais ou serviços de linha dos ministérios, as outras, que estão ligadas à disciplina dos sectores, ter-se-á que ver onde é que irão ser incluídas. Pensamos que, à semelhança do que se passa em outros países, com os quais temos de nos comparar, parte dessas responsabilidades deverão caber a organismos inter-profissionais de que o Estado é parte, tal como os representantes da agricultura, do comércio e da indústria. Será, portanto, a esses organismos inter--profissionais que deverá caber a disciplina dos sectores.
Existe ainda um outro problema difícil, levantado com a possível extinção de alguns organismos. Refiro, a título de exemplo, o caso do IAPO. É que, estes organismos, porque não têm tido receitas proporcionadas pelo Estado para as actividades que têm desenvolvido, têm um endividamento bancário interno e extermo extremamente elevado.
Daí que a sua extinção implique uma primeira definição da assunção por parte do Estado dos compromissos existentes, nomeadamente, na ordem externa.
Estas questões têm que ser analisadas e têm que ser encontradas as respostas para que sejam resolvidas.
Nessa óptica, não espanta a possibilidade de o Governo ainda ter que reestruturar algumas receitas desses organismos até porque, efectivamente, quando se
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analisam os orçamentos, vê-se que dificilmente eles são equilibrados mesmo não estando a haver quaisquer admissões de pessoal ou não havendo as restrições que têm vindo a ser executada nesta área, atendendo a que as receitas próprias são muitas vezes desactualizadas por estarem há muito tempo em vigor sem qualquer adaptação aos valores da realidade económica actual.
Sobre o problema do IVA e do imposto sobre a indústria agrícola, era o Sr. Secretário do Estado do Orçamento quem podia dar uma contribuição para a discussão deste assunto, mas não está presente.
Sobre o imposto sobre a indústria agrícola posso apenas dizer que a questão está em estudo e estão, neste momento, a desenvolver-se trabalhos com a participação do Ministério da Agricultura, Ministério das Finanças e com a audição de comissões de agricultores para se esclarecer se, efectivamente, existe, uma base de incidência exequível para efeitos da aplicação deste imposto. Só após essa conclusão, se poderá andar com o projecto.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura.
O Sr. Ministro da Agricultura: — Só para complementar a intervenção do Sr. Secretario de Estado gostaria de dizer que, na altura em que se discutiu este problema e se analisou, no Ministério, o projecto de lei do imposto sobre a indústria agrícola, nos pareceu que o projecto apresentado pelo Ministério das Finanças não estava adequado à realidade agrícola, ou seja, trata-se de um projecto inspirado na actual contribuição industrial que se quer extrapolar a uma situação de indústria agrícola que é total e completamente diferente, podendo cair-se no risco de se vir a taxar a indústria agrícola por avaliação feita pelos chefes de Finanças nos diferentes bairros fiscais.
Daí que a nossa posição tenha sido a de incentivar uma acção no sentido de ser reformulado este projecto, adaptando-o melhor à realidade agrícola. Inclusivamente, na altura, fiz saber, junto do Ministério das Finanças, que a reformulação tinha que ser profunda e que, portanto, havia que acelerar os trabalhos de forma a que pudesse vir a ser aplicado ainda durante o ano de 1985.
Gostaria de dizer que, pessoalmente, tenho bastantes dúvidas acerca das possibilidades da sua aplicação durante este ano. Aliás, expusemos esta nossa opinião na devida altura. É certo que os grupos de trabalho estão a funcionar e que se está a fazer um grande esforço nesse sentido. Contudo, não sei se as reformulações, que têm de ser necessariamente profundas relativamente ao projecto que existe, vão permitir uma rápida conclusão destes trabalhos.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — O Sr. Ministro dá-me licença?
O Orador: — Faça favor!
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Queria apenas salientar que é reconfortante o esclarecimento que o Sr. Ministro acaba de dar.
Suponho que estes dois problemas, o do imposto sobre a indústria agrícola e o do imposto sobre o valor acrescentado, são os problemas fundamentais a considerar na política agrícola neste ano de 1985, pese embora o esforço de recuperação que há a fazer.
Só queria recordar ao Sr. Ministro que há uma previsão de cobrança de 2 100 000 contos.
O Orador: — Eu sei e estou consciente disso. Daí a urgência com que estamos a trabalhar no sentido de o implementar.
O que, na altura, disse ao Sr. Ministro das Finanças e no próprio Conselho de Ministros foi que, embora não sendo perito em Direito Fiscal, temia que a revisão do projecto existente pudesse demorar mais tempo do que aquele que todos nós desejaríamos que demorasse.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Muito obrigado, Sr. Ministro. Estou esclarecido.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Indústrias Agrícolas.
O Sr. Secretário de Estado das Indústrias Agrícolas: — O Sr. Deputado Rogério de Brito apresentou novamente uma série de questões que estão, de algum modo, relacionadas e que, aliás, apresentou como dúvidas acerca das respostas dadas inicialmente pelo Sr. Ministro da Agricultura, que neste momento já está presente.
Pela minha parte, vou abordar, muito rapidamente, alguns pontos e peço ao Sr. Engenheiro Gusmão que, em seguida, aborde especialmente o problema da olivicultura e o problema da florestação industrial, se entender querer fazê-lo de novo.
Sobre a questão dos secadores de milho é evidente que o Ministério entende que pode dar algum apoio nesta área, nomeadamente porque a EPAC tem secadores a funcionar e poderá mesmo vir a instalar outros. Mas as cooperativas e os próprios agricultores deverão também organizar-se no sentido de instalarem os seus próprios secadores.
Para isso poderão ter apoios, como são as bonificações do crédito de investimento para essa instalação — que existem no actual sistema de crédito — ou podem até apresentar projectos que possam beneficiar do programa de lançamento de infra-estruturas associadas, que é um dos que têm, no PIDDAC, dotações para o efeito.
Insistiu com o esclarecimento acerca do desdobramento das verbas de alguns programas que estão aí incluídos para a Direcção Regional do Algarve, entre produção e comercialização. Não sei, neste momento, dar-lhe esses elementos mas penso que o Ministério poderá depois enviá-los à Comissão.
Sobre o problema genérico das infra-estruturas de comercialização, devo dizer que, para além dos projectos já enviados à CEE e de outros que estão em apreciação, contamos com o desenvolvimento das ajudas de pré-adesão e durante todo o período de adesão, pois haverá então a possibilidade de novos financiamentos a fundo perdido, de forma significativa, visto que esta área é daquelas que tem um critério de selecção prioritário.
O problema que abordou sobre os matadouros clandestinos só agora começa a poder ser resolvido porque só com a legislação publicada em Outubro deste ano se define o esquema para o licenciamento dos matadouros, sejam da rede nacional de abate, sejam outros que não pertencem à rede nacional de abate por não serem de serviço público. Após as vistorias que vão
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ser feitas pelos organismos responsáveis, o licenciamento é concedido e todos os matadouros e locais de abate, em que não exista esse licenciamento, serão, naturalmente, fechados e sancionados por esse facto. Portanto, não havia, até há poucos meses, legislação que permitisse actuar nesta área.
Estamos de acordo quanto à necessidade de organização das redes de recolha para encurtar os circuitos em relação à possibilidade de canalizar, por parte dos produtores, os seus animais para o abate, assim como quanto à inexistência de projectos suficientes nesta área.
É certo que existem algumas experiência a funcionar, como é o caso do leilão de gado que a Junta dos Produtos Pecuários já faz hoje nalguns locais, mas é necessário intensificar essas acções. Se não for possível ir mais longe este ano, terá de sê-lo nos próximos anos.
É evidente que o problema da constituição do capital de empreendimentos em que o Estado participará, sejam centrais de recepção e origem, sejam os próprios matadouros, tem de ser resolvido caso a caso porque, por um lado, é desejável e necessário que os produtores participem nesse capital mas, em geral, por falta de meios ou por não terem disponibilidade, são os produtores a parte que menos aparece a contribuir para a constituição das sociedades de economia mista, já constituída, por exemplo, para os matadouros.
Naturalmente que os matadouros interessam também a outros sectores, designadamente, aos comerciantes de gado e aos próprios industriais que aproveitam as carnes. Por isso têm-se feito sempre negociações no sentido de a sua composição ser mista e ter participação das várias partes, além das quais estão também incluídas as autarquias. A participação da Junta dos Produtos Pecuários corresponde à parte do Estado que poderá vir a ser cedida no futuro a qualquer destas partes e, nomeadamente, aos produtores. Em relação às questões que o Sr. Deputado Mário Adegas levantou, já tratei do problema do crédito e, por outro lado, no que diz respeito ao seguro agrícola, creio que a posição que aqui defendeu é aquela que corresponde à orientação do Ministério, no sentido de se substituir, de uma vez, o papel supletivo e de apoio financeiro do Estado, através de subsídios em caso de calamidades, pela utilização correcta do seguro agrícola. Está em estudo alargar-se o seguro a outras modalidades, a outras culturas ainda hoje não incluídas.
Por outro lado, é preciso que os próprios agricultores se mentalizem, satisfazendo os requisitos técnicos — como é o caso das estufas, que aqui já foi referido —, de que é necessário que disponham de infra--estruturas nas suas explorações para poderem beneficiar do seguro. A comparticipação do Ministério para os prémios do seguro, no ano de 1985, está orçamentada em 150 000 contos e poderá, portanto, ajudar à divulgação do sistema.
O Sr. Deputado Portugal da Fonseca pôs uma questão relativa ao PIDDAC, dizendo que havia algumas verbas indefinidas para despesas com dotações a desagregar no PIDDAC e que não estavam completamente indicadas, perguntando qual é o seu destino e a sua aplicação.
Não posso, neste momento, responder, projecto por projecto, qual é essa aplicação mas chamava a atenção de que a verba não desagregada é de 75 000 contos, num total de projectos de 4 700 000 contos, e que, portanto, corresponde a cerca de 1 % do total.
O Sr. Deputado Domingues de Azevedo também colocou algumas questões, como seja a da fraca verba incluída no PIDDAC para apoio a jovens agricultores, que é apenas de 40 000 contos. Esta verba, efectivamente, corresponde ao subsídio actual concedido para a instalação de novos agricultores — 500 contos por exploração — e creio que o Sr. Ministro da Agricultura (que não sei se quererá depois dar algum esclarecimento complementar sobre isto), ainda recentemente recebeu a associação dos jovens agricultores, estando, pois, atento no sentido de que sejam conseguidos novos apoios, além de que, na revisão do sistema de crédito, poderão vir a considerar-se novas formas de apoie creditício aos jovens agricultores.
O problema da descentralização dos serviços regionais, é uma questão que tem a ver fundamentalmente com o esforço que o Ministério está a fazer para que elas disponham de leis orgânicas que lhes permitam funcionar adequadamente e que possam vir a traduzir, na prática, a actuação dos serviços de extenção e da ligação dos técnicos aos agricultores de uma forma mais directa, e que permitirá, ainda, acabar a instalação de zonas agrárias, que constituem cada uma das direcções regionais, para tornar mais eficaz a actuação local do Ministério. Esta, aliás, é uma das grandes linhas de orientação, incluídas nas Grandes Opções do Plano.
Disse que, apesar da afirmação do Sr. Ministro de que o Ministério pretendia apoiar o cooperativismo, não havia crédito suficiente ou adequado para as cooperativas, e perguntou se o Ministério estava a acompanhar a gestão das mesmas.
É evidente que o crédito às cooperativas existe. Diria mesmo, com algum conhecimento do sistema financeiro de apoio (SIFAP — Sistema de Financiamento à Agricultura e Pescas), que as cooperativas são especialmente privilegiadas neste sistema. Repare-se que há modalidades que só são aplicadas às cooperativas ou associações de agricultores, nomeadamente, nas indústrias agrícolas, porque não têm acesso a este sistema agricultores privados ou empresas privadas, a não ser quando estão a transformar ou a comercializar os seus produtos. Há, portanto, à partida um benefício no sistema, que tem em conta especialmente a situação das cooperativas.
Sobre o problema do controle de crédito, já me referi há pouco.
Finalmente, o Sr. Deputado João Eliseu, pôs uma questão concreta sobre o PADAR. Pedia ao Sr. Engenheiro Gusmão que fizesse a favor de explicar essa questão no que diz respeito ao distrito de Leiria e às suas zonas agrárias.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Produção Agrícola.
O Sr. Secretário de Estado da Produção Agrícola:
— Sr. Deputado, o PADAR é um programa muito vasto e que o Ministério da Agricultura talvez não tenha muita dificuldade em pô-lo a funcionar no País, na medida em que talvez seja dotado, se o Orçamento for aprovado, para o fazer.
Simplesmente, há uma dificuldade muito grave: a admissão de pessoal técnico, de nível médio, principalmente, para ocupar todos esses lugares. Como o Sr. Deputado sabe, tão bem como eu, hoje há uma enorme dificuldade em admitir pessoal para lugares de Estado — direcções regionais, direcções-gerais — e,
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ainda por cima, com a agravante de o Ministério da Agricultura ter a fama de ter muito pessoal. Esta é uma das grandes dificuldades, mas vamos ver se deslocando pessoal técnico dentro das próprias regiões, e se conseguirmos levar algum das cidades, onde ele está colocado, para as zonas onde é precisa a sua actuação, somos capazes de colmatar essa dificiência. O facto de estarem aqui algumas zonas agrárias — e que fez questão de salientar — mais dotadas do que outras é porque no sistema que este ano queríamos instalar não poderíamos estender o PADAR a todo o País. Portanto, tínhamos determinadas «zonas piloto» onde começaríamos a trabalhar na extensão. E no ano de 1986 íamos alargando, e talvez até 1987 conseguíssemos ter todo o sistema da extensão rural montado. Mas terá que ser por fases, como podem compreender os Srs. Deputados.
Aparecem, portanto, umas zonas agrárias mais dotadas do que outras porque, exactamente, era nessas que queríamos montar o serviço de extensão, como está programado.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.
O Sr. Rogério de Brito (PCP): — Peço desculpa de vir, pela terceira vez, levantar uma série de questões mas parece-me que é de toda a utilidade que saiamos devidamene esclarecidos sobre os problemas que se colocam em torno do Orçamento para a agricultura.
Há pouco o Sr. Secretário de Estado da Produção Agrícola explicitou a aplicação do montante dos 386 mil e tal contos do PIDR para Trás-os-Montes, e a única dúvida que se me coloca é a seguinte: confrontando esta verba com, salvo erro, cerca de 150 estruturas de ordenha colectiva, que referiu, com um melhoramento em 150 regadios tradicionais, com a construção de 3 novos regadios, o estudo de águas subterrâneas e dos regadios, por exemplo, do vale de Chaves, a minha dúvida é a de como esta verba se vai adequar a todos estes objectivos! Admito que isto seja uma perspectiva de escalonamento a mais do que um ano, mas de qualquer modo ...
Entretanto, assumiu a presidência a Sr." Vice--Presidente, Ilda Figueiredo.
O Sr. Ministro da Agricultura: — Sr. Deputado, o problema que coloca está correcto. Trata-se de um projecto a médio prazo, em que as diversas despesas estão escalonadas. Também tivemos o cuidado de fazer uma análise da capacidade que tem havido para, de certa maneira, serem gastas verbas que estavam alocadas, por exemplo, duranteo ano de 1984. E posso-lhe, por exemplo, dizer que a verba orçamentada de 1984, infelizmente — porque penso que é muito necessário que o investimento avance — nem toda ela foi utilizada por diversas dificuldades de utilização.
Portanto, fez-se um ajustamento dentro de um condicionamento total de verbas, no sentido de não se alocar verbas muito superiores àquelas em que há capacidade para gastar, mas dentro de uma perspectiva de plano a médio prazo.
A Sr.a Presidente: — Solicitava ao Sr. Deputado Rogério de Brito que continuasse a colocar as suas questões, para o Sr. Ministro poder responder.
O Sr. Rogério de Brito (PCP): — Uma outra questão, que ainda não foi esclarecida, é a seguinte: em relação à rubrica de «viabilização de empresas leiteiras da Beira Litoral», gostava de saber o que é que se entende, neste caso, por viabilização e quais são as empresas leiteiras.
Peço desculpa de referir de novo a problemática das verbas dotadas para as estruturas de mercado e fico a aguardar que o Sr. Ministro, logo que possível, possa mandar uma informação sobre o desdobramento daquelas verbas, relativas aos produtos hortícolas e aos citrinos, na parte de produção e comercialização. Parece-me que se devia dar uma grande importância a isto. Vou dar, só a título de exemplo, o caso de uma situação que pode decorrer da falta de esclarecimento destas situações. Assim, uma das acções que se tem pretendido desenvolver junto do Baixo Mondego, isto é, dos agricultores desta região, vai no sentido de que deixem de, pelo menos em parte substancial da área, cultivar o arroz, e apresentam-se por sua vez várias alternativas: uma delas, e exemplificando, são os produtos hortícolas. E eles respondem com uma certa lógica: produtos hortícolas para quem? Porquê? Porque as indústrias agro-alimentares que os utilizavam na região faliram e deixaram-nos «ficar pendurados» em milhares de contos. Por outro lado, não há estruturas que permitam assegurar o escoamento desses produtos para os mercados. Depois, também se poderá eventualmente falar da beterraba sacarina sem que esteja sequer definido se e como é que avançamos. Portanto, essas questões são importantes e têm de ser devidamente definidas sob risco de, enfim, trabalharmos um pouco no abstracto.
Voltava também aos matadouros clandestinos. Julgo que o dizer-se que não havia legislação que permitia proceder ao fecho destes matadouros não me parece correcto, pois bastava que eles fossem clandestinos e que as matanças, como tal, se fizessem sem inspecção sanitária para que aquilo fosse encerrado, não sendo assim autorizado qualquer abate de gado.
Na verdade, nós sabemos que são umas largas centenas — eu diria mesmo milhares, porque só à volta de Lisboa há umas centenas largas de matadouros clandestinos — onde se abatem milhares de toneladas, por ano, de carne, sem qualquer fiscalização sanitária, por onde nós sabemos que se escoam animais doentes, etc., que não são efectivamente entregues aos serviços para abate.
Ora bem, começou-se por fechar exactamente os matadouros municipais que, apesar de todas as suas deficiências estavam sob controle, e permite-se que aqueles continuem a subsistir. Ora, isto parece-me que é realmente um factor importante, prendendo-se o outro com a ideia de que são dotadas tantas verbas, designadamente ao nível de pré-adesão que, reconhecendo nós a situação de dificuldade real dos agricultores para participarem nas estruturas comerciais que se vão criando, quer ao nível de matadouros, quer de centrais de concentração, má origem de produtos, etc., torna--se evidente que os agricultores estão, efectivamente, num sector que está descapitalizado, esgotado. No fim de contas, este último tem sido aquele que tem alimentado toda uma série de sectores industriais, económicos e comerciais, etc., a montante e a jusante.
Tem de se encontrar uma forma de assegurar que esses agricultores participem maioritariamente — e estou convicto de que todos os Srs. Deputados, indepen-
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dentemente dos partidos, que estão ligados aos problemas da agricultura estão de acordo comigo —, tem de se assegurar, sob risco de se estar a cometer efectivamente mais um crime, a participação maioritária dos agricultores nessas infra-estruturas. Um dos graves problemas que a nossa agricultura tem é o de estar permanentemente a ser saqueada por sectores a montante e a jusante. Assim, vamos criar uma nova situação que vem reforçar aquela que vem já de trás? Isto é inconcebível, e não se podem avançar argumentos de que os agricultores não dispõem de verbas. Pois não! Isso sabemos nós, mas arranje-se tal, pois existem mecanismos para isso.
Os interesses dos industriais e comerciantes são muito legítimos mas, efectivamente, os industriais têm matadouros industriais para trabalharem e os comerciantes têm de funcionar dentro da sua área, mas não pode é ser à custa da permanente cedência da área em que os agricultores deviam intervir.
Finalmente, embora isso, talvez, não tenha muito que ver com o Orçamento de Estado, mas já que foi aqui colocado e que o Sr. Secretário de Estado abordou também o problema, queria referir o seguinte: em relação ao problema do leite foi aqui dito que, enfim, se compreende a situação que se está a criar, dado que é necessário avançar com a liberalização económica. Ora, há países onde é indiscutível a liberalização económica e onde, por interesses nacionais, essas situações foram acauteladas, mesmo em relação à CEE. Um caso concreto que todos nós conhecemos é o da Inglaterra.
Parece-me, portanto, que nem sequer se pode colocar a questão de que isto é uma imposição que decorre da CEE. Julgo que são interesses nacionais que se encontram acima de tudo, e que compete ao nosso governo e negociadores defender. E isto tem problemas muito sérios, que já se estão a colocar mesmo ao nível do estabelecimento, agora, do preço único para o leite. Resulta daqui que se vão criar problemas ao nível do primeiro escalão, colocando-se a seguinte questão: acontece que muitos senhores industriais vão passar a intervir em zonas organizadas e bem localizadas onde não há custos de recolha e de concentração e deixa-se às cooperativas leiteiras esse trabalho não podendo estas últimas remunerar o leite ao produtor ao preço correcto. Depois, vão dividir o próprio movimento leiteiro, porque para umas zonas aplicam um preço e para outras aplicam outro.
Ora bem, parece-me que isto tem que se lhe diga e mesmo em relação ao problema dos preços diferenciados no primeiro escalão a CEE também não impede, desde que a organização cooperativa que detém a recolha e a concentração do leite se encarregue dessa operação. Isto, aliás, é como os Ingleses fazem. E por que «diabo» é que não devemos defender interesses que eu diria até que são superiores aos dos Ingleses, porque o nosso sector produtivo é muito mais débil do que aquele de que os Ingleses dispõem?
São questões que eu não poderia deixar de aqui levantar.
A Sr.a Presidente: — Tem a palavra o Sr; Deputado Alexandre Reigoto.
O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): — O Sr. Secretário de Estado da Produção Agrícola falou, e ainda bem, no Douro.
A certa altura disse que iriam ser beneficiados cerca de 1500 agricultores no Douro, mercê dos mortórios.
V. Ex.a sabe, com certeza, que estes últimos têm trazido os vinicultores do Douro um pouco apoquentados porque não sabem se o Governo vai considerar mortórios o que de facto eles são ou se vai considerar, na prática, a portaria que —desculpe V. Ex.a mas, nesta altura, não me lembro do número — refere que «considera mortório snão só os terrenos filoxera-dos, mas também todos aqueles que nunca tiveram vinha».
Ora, como V. Ex.a facilmente ajuíza, sendo assim, passaria a ser mortório todo e qualquer terreno que nunca tivesse tido vinha, ou sejam, todos os pinhais, olivais e por aí fora.
V. Ex.a também conhece, com certeza, que foi destruída uma grande parte, senão a maior parte, do vale da Vilariça, onde existiam uns largos milhares de oliveiras que foram arrancadas e substituídas por vinha.
A minha preocupação, bem como a dos vinicultores do Douro, é saber até que ponto essa portaria vai ser posta em prática por este Governo e se este último vai consentir, por meio ou através dessa portaria, a legalização desses vinhedos que lá foram plantados, além de outros que possam porventura existir no Douro.
Por outro lado, fala-se aqui na designação das receitas correntes sobre impostos directos e eles, de facto, são directos e bem directos, mas directos aos agricultores: é a contribuição predial, é o imposto de mais--valias, é o imposto de cadastro, é o de indústria agrícola, sobre o qual, felizmente, o Sr. Ministro já nos sossegou, dizendo que talvez não seja bem aquilo que nós pensámos que fosse. Por exemplo, o imposto de cadastro, segundo suponho, baseia-se no cadastro de vinhas, e como V. Ex.a sabe, existe apenas uma região com cadastro completo embora, por vezes, imperfeito ou com certas anomalias.
É verdade que esse cadastro, a existir, já pagou o seu contributo por terem as vinhas cadastradas, porque ao darem-lhe uma licença tiveram de pagar x escudos ou x centavos — isto, falando nas vinhas mais antigas — por cada enxerto ou por cada videira que lá punham.
A minha pergunta baseia-se em saber se esse imposto de cadastro que aqui está previsto se refere às vinhas que vão ser legalizadas e que, por conseguinte, terão de ser cadastradas e sujeitas, evidentemente, a esse imposto, ou se este último vai incidir sobre as vinhas que estão já legalizadas e cadastradas.
Existe também um imposto em relação ao consumo de bebidas alcoólicas. É evidente que o vinho do Porto e os seus derivados, como sejam o vinho generoso, o vinho de pasto, as aguardentes, etc, são bebidas alcoólicas. Mas estará o Governo na disposição de rever essa situação no que toca aos vinhos de todo o País, uma vez que vai agravar substancialmente o rendimento, já tão pobre, do vinicultor?
Finalmente, quero referir-me a uma circular que me chegou às mãos, e que poderei fornecer ao Sr. Ministro, como vinicultor do Douro que sou, embora pequeno, em que a Casa do Douro alerta e chama a atenção para que os vinicultores terão de arrancar todas as árvores existentes nos vinhedos, pois se não o fizerem esses vinhedos perderão o direito ao benefício.
Ora, não me parece que certas árvores, principalmente as plantadas nas bordas dos vinhedos, possam causar tão grande prejuízo ás vinhas de forma a retirar a qualidade aos seus mostos.
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Assim, perguntaria ao Sr. Secretário de Estado se tem conhecimento desta situação, desta deliberação e desta convocatória que a Casa do Douro nos enviou e se concorda com ela.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Agradeço as respostas que me foram dadas a algumas das minhas perguntas. No entanto, outras há que me continuam a suscitar dúvidas, nomeadamente no que respeita às questões que pus ao Sr. Secretário de Estado.
Uma delas respeita à indefinição da tributação do imposto sobre a indústria agrícola e da contribuição predial. Que critérios lhes vão ser aplicados perante a adversidade das nossas estruturas económicas agrícolas? Gostaria de saber se, de facto, já têm qualquer tipo de informação sobre este aspecto.
Em relação à aquisição de serviços não especificados, que atinge verbas na ordem dos 600 000 contos, o Sr. Secretário de Estado diz que cuida serem destinados para pagamento de tarefeiros, a pessoal fora do quadro.
Acontece que no desenvolvimento do Orçamento está previsto o pagamento a tarefeiros e a pessoal fora do quadro. Gostaria de ser esclarecido sobre esta verba extraordinária e muito elevada, assim como gostaria que me fosse explicado o destino de algumas verbas que ao longo do Orçamento vão surgindo, como por exemplo as respeitantes a transferências a particulares ou a transferências a instituições particulares. Alguns milhares de contos são aplicados nessas transferências, que não entendo muito bem.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado: A minha primeira pergunta está relacionada com a questão dos tarefeiros, que já aqui foi colocada.
Há pouco acenei negativamente ao Sr. Secretário de Estado, mas não o fiz no sentido de querer dizer que não era verdade, mas sim no sentido de que não acreditava. Até porque o Sr. Secretário de Estado pôs a questão em termos dubitativos.
Gostaria, pois, de lhe pedir que me esclarecesse sobre qual é a parte da verba prevista que corresponde aos encargos com os tarefeiros.
A minha dúvida reside no facto de que, em princípio, essa verba devia vir classificada como despesas com o pessoal.
Aliás, se se atender às despesas com o pessoal, concretamente no que diz respeito ao Ministério da Agricultura, encontro aqui verbas para pessoal dos quadros aprovados por lei, verbas para pessoal contratado não pertencente aos quadros, verbas para pessoal adido aos quadros, verbas para pessoal fora de serviço aguardando aposentação, verbas para pessoal em qualquer outra situação, verbas para pessoal eventual, verbas para pessoal diverso, etc.
No entanto, solicito esse esclarecimento, pois ele convém para a nossa tomada de posição em relação à atribuição de certas verbas não só para o Ministério da Agricultura mas também para outros ministérios.
Em relação às despesas correntes globais, acho muito bem que se tente reduzir ao máximo os seus encargos. Pus a questão em termos de dúvida, isto é, se o Ministério considera que com os 8,7% conseguirá funcionar este ano.
Bom, o Sr. Secretário de Estado diz que sim. Aceitamos a priori a sua resposta, depois veremos daqui a uns meses o evoluir da situação.
Quanto à questão do Alqueva, concretamente em relação a valia agrícola do Alqueva, causou-me muita perplexidade a resposta que me foi dada. Fiquei de facto perplexo quando o Sr. Secretário de Estado referiu que em relação ao Alqueva não há nenhuma verba porque o Governo ainda não decidiu se o projecto avança ou não.
Ora bem, recordo-me que deve estar a fazer um ano que saiu uma resolução do Conselho de Ministros em que, taxativamente, se dizia que o projecto do Alqueva avançava e onde se impunha à EDP a dotação de uma verba de 80 000 contos, logo para o ano de 1984, que se destinaria a reactivar os estudos para depois se poder avançar com as obras em 1985.
Quando o Sr. Secretário de Estado refere que o Governo ainda não deu luz verde ao arranque do projecto do Alqueva, não posso deixar de ficar perplexo e gostaríamos que isso fosse esclarecido para sabermos do valor efectivo da resolução do Conselho de Ministros publicada há um ano.
Se essa resolução se mantém, se existe luz verde, julgamos que era altura de se começar a fazer dotações, por parte do Ministério da Agricultura, para o desenvolvimento da valia agrícola do Alqueva, para não cairmos numa situação que poderá ser a de, daqui a 4 ou 5 anos, estar completa a parte da valia energética e só então se iniciarem as obras para a valia agrícola. Assim, teríamos de esperar mais 10 ou 15 anos.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Almerindo Marques.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Domingues de Azevedo.
O Sr. Domingues de Azevedo (PS): — Sr. Secretário de Estado, talvez por deficiência minha, por não me ter feito entender convenientemente, das respostas que ouvi pareceu-me que o Sr. Secretário de Estado não entendeu as perguntas que eu havia formulado.
Quando me referi às direcções regionais da Agricultura, não estava tanto no meu espírito o saber do seu funcionamento orgânico, mas estava muito mais interessado em saber a contrapartida que elas são capazes de prestar à agricultura, à sociedade, pelo peso que têm nas custas do próprio Estado.
Frisei até um aspecto, dizendo que os nossos agricultores vêem os técnicos da direcção regional lá em cima, num podium. É necessário que eles vejam os técnicos das direcções regionais como verdadeiros amigos deles. Eles que tenham coragem de sujar as mãos e de ir ao concreto!
É quanto a esse trabalho que perguntei se havia ou não algum espírito de acção no Ministério da Agricultura.
Por outro lado, o Sr. Secretário de Estado, ao responder-me, disse que eu tinha dito que havia pouco crédito ao sector cooperativo. Não foi isso que eu disse, Sr. Secretário de Estado! Frisei até o aspecto do Mi-
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nho. Disse que não se trata só de um problema do Ministério da Agricultura, é um problema de Orçamento. Há projectos grandes que são autênticos sorvedouros de todas as receitas e que não deixam espaço de manobra em termos de capacidade dinamizadora do próprio Estado para que as pessoas possam agir.
Quando falei na concessão de crédito ao sector cooperativo e nas facilidades que, em termos de agricultura, se concedem a esse sector, perguntei se havia ou não um estudo organizado e se o Ministério sabe a forma como estão a ser geridos os dinheiros que são postos à disposição do cooperativismo. É que tenho dúvidas quanto à forma de funcionamento e à efectiva contrapartida de muitas cooperativas agrícolas neste País. Foi nesse domínio que fiz a pergunta.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Brasileiro.
O Sr. Álvaro Brasileiro (PCP): — Sr. Ministro, há algumas perguntas que vou formular e a que V. Ex.a poderá responder dizendo que pertencem a outros ministérios. Mas como as situações estão interligadas vou colocá-las.
Actualmente, na agricultura, o uso indiscriminado de pesticidas está a trazer graves consequências aos consumidores, muitos deles sem praticamene se aperceberem. Estão a ser lançados no mercado português pesticidas que já foram utilizados em Espanha onde deixaram, alguns deles, triste memória. O que é que o Ministério da Agricultura tem feito relativamente a este problema? Tem acompanhado, de facto, este flagelo?
O meu camarada Rogério de Brito também falou há pouco, aqui, no problema dos vales do Tejo e do Sor-raia. Fala-se muito na reconversão da vinha do vale do Tejo, terras de aluvião, riquíssimas, que, realmente, podiam produzir outras coisas. Mas as coisas estão pendentes de estudos que existem sobre a regularização do vale do Tejo e de toda essa zona. Sr. Ministro, as verbas são irrisórias, neste caso em relação ao distrito de Santarém.
Por outro lado, penso, Sr. Ministro, que aquelas zonas, dos chamados diques ou tapadões — como lhes queiram chamar —, a maior parte delas estão praticamente abandonadas, sem guarda-rios. Poder-se-á pensar que essas zonas não têm nada a ver com o Ministério da Agricultura. Mas estão interligadas devido às colheitas, às searas, e, portanto, é toda uma riqueza que pode ser desfeita de um momento para o outro se não houver precauções em relação a isso.
Sr. Ministro, chamava-lhe à atenção para que haja um olhar para aquelas zonas, que são zonas que merecem ser acompanhadas e — vamos lá! — ajudadas.
Já se falou aqui, também, no problema das geadas. Sr. Ministro, com certeza que um agricultor que investe pretende modernizar-se. Mas depois de ver toda uma «porrada» de dinheiro ir ao ar por causa de uma intempérie deve ser ajudado de maneira a poder prosseguir a sua vida.
Mas também houve agora, na zona dos vales do Tejo e do Sorraia, grandes estragos nas culturas devido a estas últimas cheias. Pretende o Sr. Ministro olhar também para estes agricultores que foram vítimas destas últimas enxurradas? Como é que encara esta situação?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr." Deputada lida Figueiredo, que é, aliás, a última deputada inscrita.
A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Inicialmente, o Sr. Ministro falou numa transferência de verbas, tanto quanto percebi do Fundo de Abastecimento para o sector da agricultura, no valor de 19,5 milhões de contos.
Gostava que, depois, V. Ex.a, apesar de não estar cá o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, especificasse um pouco melhor como era feita esta distribuição de verbas, isto é, se tiver elementos para isso.
Falou-se já hoje aqui — quer o Sr. Ministro, quer o Sr. Secretário de Estado, quer também alguns deputados — dos chamados organismos de coordenação económica. Habitualmente estas questões apareciam mais ligadas ao Ministério do Comércio, mas creio que neste momento não é só por o Sr. Ministro ser o mesmo, ou seja, por ter transitado do Ministério do Comércio e Turismo para o Ministério da Agricultura, que se falou aqui nestas questões ligadas à EPAC, ao IAPO, mas porque, de facto, neste momento, elas têm muito mais directamente a ver com o Ministério da Agricultura.
Gostaria, então, de saber qual é, neste momento, a intenção do Ministério da Agricultura — apesar de já conhecermos bastante bem a posição do Ministério do Comércio e de discordarmos inteiramente dela — em relação a estes organismos, visando, nomeadamente, a defesa da EPAC, dos agricultores, dos consumidores e os interesses do próprio País.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não tenho mais inscrições mas, como VV. Ex.as têm presente, são 20 horas. Creio que talvez pudéssemos fazer um pequeno esforço e ouvirmos agora as respostas do Sr. Ministro, após o que terminaríamos a reunião.
Sendo assim, estando todos de acordo, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura.
O Sr. Ministro da Agricultura: — Começaria por responder às perguntas do Sr. Deputado Rogério de Brito. Em relação à primeira, referente ao PIDR para Trás--os-Montes, há pouco interrompi-o — peço-lhe desculpa —, já lhe dei a resposta que me pareceu correcta.
Em relação à viabilização das exportações leiteiras da Direcção Regional da Beira Litoral, isso refere-se a um programa — aliás, parecido ou análogo àquele que também está a ser levado a cabo na região de Entre-Douro e Minho — que tem por função a reestruturação e o redimensionamento das estruturas produtivas de leite, no sentido de que o encabeçamento médio passe de 2 a 3 vacas, como é agora, para cerca de 12 vacas, no sentido de criar unidades competitivas em termos internacionais, aumentando, portanto, a superfície agrícola útil por exploração e dando um apoio financeiro no sentido de se fazer essa exploração.
Um outro objectivo é que se faça um aumento anual da produção de leite, da média que hoje anda por cerca de 3400 1 para cerca de 4500 l e, de certa maneira, centrar, progressivamente, e cada vez mais, as explorações leiteiras nas explorações que têm vocação para esse tipo de actividade.
Trata-se de um projecto que já vem de trás, que não é novo, e, na realidade, queria chamar a atenção — porque não o fiz no inicio desta minha intervenção — que a grande maioria dos projectos que estão previstos no PIDAC são projectos que já estavam em curso e que, portanto, ou estão em vias de conclusão ou estão em curso.
São os casos da PROCALFER, que todas as direcções regionais estão a seguir, do próprio projecto fio-
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restai, do projecto de formação profissional, e de muitos do PIDRs que, como os da Cova da Beira, etc, são projectos em curso e que, neste Orçamento, aparecem como questões novas, basicamente o PADAR, que é um projecto que aparece este ano, mas que ainda há que acordar com a CEE porque está em vias de conclusão.
Temos também os projectos do PAPE, e queria informar que fiz entrega ao Sr. Presidente desta Comissão do relatório do Ministério da Agricultura sobre a carteira de projectos já entregue em Bruxelas, sobre as carteiras que estão em vias de serem entregues no fim deste mês, primeira semana de Fevereiro, e sobre os outros que estão em via de preparação e, até, sobre os critérios de análise com que todos esses projectos foram feitos, no sentido de, realmente, demonstrar a transparência que existiu em todo este projecto.
O Sr. Deputado, consultando esse documento que entreguei, verificará que grande parte dos investimentos que estão feitos são-no, na realidade, em estruturas de mercado.
Entendemos que isso é fundamental, e que há um trabalho muito grande a fazer. Portanto, em todos os aspectos das estruturas de comercialização verá que há um ênfase muito grande nesse sector, como — e estou 100 % de acordo com o que disse — um sector fundamental sem o qual não se poderá desenvolver a montante ou, pelo menos, não se desenvolverá com lucro ou benefício evidente para os agricultores se não houver estruturas rápidas de escoamento dos produtos.
O Sr. Deputado verá, pela consulta e até pelos projectos ali incluídos, que foi essa a orientação.
Em relação ao vale do Mondego, eu não sabia, mas disse-me o Sr. Secretário de Estado, que existe um estudo bastante completo de orientação de novas culturas a fazer e se o Sr. Deputado estiver interessado nele, teremos prazer em lho facultar para consulta.
Confesso que não conheço esse estudo — mas o Sr. Secretário de Estado referiu-me a sua existência — que chegou mesmo a servir de base para os projectos de investimento e para o apoio dado pelo banco alemão ao projecto de desenvolvimento.
Terei também muito prazer em enviar o estudo à Comissão de Agricultura para vosso conhecimento e, desde já, solicito ao Sr. Secretário de Estado que anote esta minha promessa.
Em relação à participação dos agricultores nas estruturas de comercialização e, particularmente, no caso dos matadouros, estou 100 % de acordo consigo. Um dos grandes defeitos ou, pelo menos, das grandes dificuldades que constatei na nossa agricultura é, de certa maneira, a falta de participação dos agricultores nas diversas estruturas, inclusive, no próprio movimento cooperativo. Essa ligação é bastante débil: muitos agricultores usam o movimento cooperativo quase como organismo de intervenção, onde escoam os produtos que não conseguem colocar directamente no mercado.
Isso cria problemas de grande desequilíbrio financeiro e de grande fragilidade ao movimento cooperativo, que tem de ser radicalmente alterado, à parte um esforço importante por parte do Governo de criar incentivos a que essa participação se dê, para que haja, realmente, um verdadeiro fomento.
Pode crer que um dos problemas que mais me preocupa é o fortalecimento, o movimento e a participação dos produtores.
Mas é evidente que é impossível forçar estas questões. Pensamos que terá de ser tida em conta uma questão pedagógica, uma questão de incentivos no sentido de ajudar a fazer essa política.
Portanto, nas sociedades mistas que, para já, estão criadas, a maioria do capital continua, infelizmente, a pertencer ou ao Estado ou às autarquias, mas nada impede que, com o decorrer do tempo e com uma certa sensibilização, essas participações passem maioritariamente para os produtores e não — e estou de acordo consigo — para os intermediários ou para os comerciantes, que são aqueles que, em geral, aparecem para essas participações.
No entanto, terá de haver uma alteração de mentalidade e de princípio. Penso que o Sr. Deputado Portugal da Fonseca — numa intervenção que não tive o prazer de ouvir, mas que me foi referida — chamou a atenção para esse ponto e todos os senhores, como interessados que são, particularmente o Sr. Deputado Rogério de Brito, tê-lo-ão ouvido com atenção.
E realmente um movimento que pertence a todos nós, o de tentarmos sensibilizar e fortalecer este movimento cooperativo.
Em relação à liberalização económica do leite, o Sr. Deputado referiu que há casos de países em que essa liberalização não foi feita, tendo citado o caso da Inglaterra, o que é verdade. Mas, na realidade, o Sr. Deputado não terá dito — pelo menos, não veio a propósito e não vejo nisso qualquer intenção — que em Inglaterra isso se verifica porque existe uma produção excedentária em relação ao consumo.
A situação é completamente diferente num país que tem carências e num que é excedentário. O País vai-se confrontar, muito brevemente, com faltas de leite. Digo isto porque recebi esta manhã, no meu Ministério, um telex de muitas unidades fabris, com muitos postos de trabalho — não sendo, pois, tão poucas como isso —, que, neste momento, têm dificuldades de acesso a leite porque as uniões lhes recusam a entrega de leite. Ou seja, há indústrias importantes, a jusante, que têm de ter uma garantia do acesso ao leite e que, no actual sistema — de certa maneira, de concentração através das uniões —, não têm essa garantia. Neste momento, esse problema está criado e poderá afectar muita actividade económica de grande valor.
Portanto, temos de ir para uma solução que de maneira nenhuma ponha em causa os investimentos importantes feitos — como deve calcular não é esse o objectivo do nosso Ministério, até porque esses problemas recairão sobre nós próprios —, mas em que se crie uma situação de igualdade para todos aqueles que têm de se abastecer de leite, facto que não acontece na actual situação.
Verificamos que muitas cooperativas, dezenas delas — e poderei dar-lhe uma lista —, após esta decisão de integração do preço à porta da fábrica manifestaram o seu apoio total e completo. É, portanto, uma situação de que as uniões não gostarão porque era exactamente no primeiro escalão, que era bastante bem remunerado, e que as uniões iam buscar bastante dinheiro, mas que até não as incentivava à modernização dos seus sistemas de recolha.
O Sr. Deputado sabe que, por exemplo, a Proleite, em Oliveira de Azeméis, tem sistema de recolha todo refrigerado, todo moderno, todo up to date — se quiser —, mas há outras uniões que não tiveram essa preocupação porque os rendimentos que tinham do primeiro
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escalão lhe permitiam, de certa maneira, descurar essa parte e fazer reverter essas verbas do primeiro escalão para outros fins, como sejam, investimentos feitos a jusante.
O problema das uniões é um problema que tem de ser abordado. Houve muitos investimentos, aliás, em todo o movimento cooperativo — como penso que o Sr. Deputado Domingues de Azevedo referiu há pouco —, mas, muitos deles, foram feitos sem se atender grandemente ao factor viabilidade económico--financeira. Fizeram-se grandes projectos, e são problemas que terão de ser resolvidos.
Pode crer, Sr. Deputado, que, embora eu defenda — e tenho-o feito publicamente e, do meu ponto de vista, penso que estou certo — uma política de liberalização da economia portuguesa, esta medida da inclusão do leite no primeiro escalão não foi com intenção de liberalização; foi com a intenção de se criarem condições que fossem, por um lado, de modernização do sistema de recolha e, por outro lado, que ponham em igualdade de circunstâncias todos os sectores utilizadores de leite e não apenas as uniões cooperativas, que são concorrentes das outras unidades industriais, que fazem o seu leite e depois o dão ou não, em função daquilo de que entendem prescindir ou não.
É uma situação de clara injustiça e de clara desvantagem, que nós tentámos, com esta primeira medida, reparar.
Posso dizer-lhe que já vim encontrar isso negociado dessa maneira; sei — tenho a certeza — que foi duramente negociado, mas o acordo feito com a Comunidade previa que tivéssemos esse sistema a funcionar no final do período de transição.
O Sr. Deputado dirá que não era necessário fazê-lo desde já, uma vez que o período de transição será de 5 anos. Mas isso já fez parte do acordo celebrado com a Comunidade.
A nós pareceu-nos que, fazer agora ou mais tarde, os problemas seriam sempre os mesmos. E quanto mais cedo melhor, para nos podermos adaptar em casa e com as nossas regras.
Foi isso que nos orientou a fazer a mudança, desde Já.
Aquando da discussão do assunto com a Comunidade, este problema da Inglaterra veio muito à baila; os nossos negociadores chamaram a atenção e foi-lhes sempre dado o esclarecimento de que, num mercado superavitário, essa preocupação de igualização não é tão importante como nos mercados carenciados. Foi essa a razão que nos levou a tomar esta posição.
Tenho ainda aqui uma nota, da qual consta cooperativas leiteiras. Penso que isto está ligado ao problema anterior da integração no primeiro escalão. Não me recordo exactamente mas penso que está ligado ao primeiro escalão.
O Sr. Rogério de Brito (PCP): — Dá-me licença, Sr. Ministro?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Rogério de Brito (PCP): — Queria apenas dizer que admito que a referência fosse a viabilização das empresas leiteiras e subentendi, portanto, que o Sr. Ministro ...
O Orador: — (Gravação inaudível) ... a viabilização das empresas leiteiras da Beira Litoral. Não tinha respondido a isso mas respondi agora.
O Sr. Deputado Alexandre Reigoto fez-me perguntas bastante concretas sobre o imposto de cadastro e uma outra pergunta sobre os mortórios, a que o Sr. Secretário de Estado responderá depois, directamente, uma vez que eu nem sequer ouvi a primeira parte da sua intervenção.
Fez-me também perguntas relacionadas com o imposto de cadastro, com o imposto de bebidas alcoólicas. Lamento que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento não esteja aqui presente para lhe poder dar uma resposta mais concreta. Honestamente, não sei dizer-lhe se se aplica aos cadastros existentes se aos cadastros novos. Mas, se o Sr. Deputado tiver interesse em saber isso, esclarecerei o assunto com o Dr. Alípio Dias e, na primeira oportunidade, far-lhe-ei chegar às mãos essa informação.
Em relação à circular da Casa do Douro, quero dizer-lhe qua ainda não a li. Já me chamaram a atenção para esse facto mas ainda não conhecemos essa circular. Como sabe, a Casa do Douro tem uma autonomia em relação ao Ministério, embora dentro dos nossos costumes tradicionais, mesmo naquelas entidades que são autónomas, as pessoas se virem, sempre, para o Governo para que este lhes resolva os problemas. Não nos foi dado a conhecer, a mim e ao Sr. Secretário de Estado, esta circular mas temos a informação, através de uma pessoa da zona do Douro — que certamente conhece e que é o Sr. Engenheiro Serpa Pimentel, com quem tivemos uma reunião há oito dias — de que ela teria sido pouco esclarecida havendo criado uma certa perturbação. Não era, de maneira nenhuma, intenção da Casa do Douro ir tão longe como se terá pensado mas, sim, referir-se a algumas árvores que estavam a dar sombra a vinhas que, por isso mesmo, perdiam qualidade. Chamam, ainda, a atenção dos agricultores para o facto de existirem outras árvores, principalmente as circundantes, que sempre existiram e que não constituem qualquer problema. O Sr. Engenheiro Pimentel tinha, ainda, a informação de que a Casa do Douro iria esclarecer a situação brevemente, na primeira oportunidade. Assim sendo, o primeiro conhecimento que tivemos deste problema foi numa reunião com o referido Sr. Engenheiro.
Foi também colocado, penso que pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, o problema dos tarefeiros. Não ouvi a intervenção inicial do Sr. Secretário de Estado. Posso, no entanto, dizer-lhe que, pelo Orçamento, que tenho aqui à minha frente, temos no Ministério um problema de quadro único que funcionou até agora, mas gostaria de dizer que tenciono alterar essa situação. Nesse orçamento está prevista uma verba de cerca de 5 520 000 contos, e depois todo um conjunto de verbas parciais relativamente importantes que estão nas diversas rubricas das direcções regionais.
Só para lhe dar uma ideia, na Direcção-Gerai da Agricultura de Entre Douro e Minho estão previstos 178 000 contos para 1985 e a grande parte dessa verba é para despesas de pagamento de tarefeiros, a pessoal não permanente. Dos 178 000 contos, 175 600 contos destinam-se a pagamentos de despesas de vencimentos de pessoal não pertencente aos quadros, aquisição de material de expediente diverso, higiene e limpeza, peças para viaturas, etc. Os restantes 2400 contos são para pequenos trabalhos de terraplenagem. Assim, com
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este exemplo, se vê que grande maioria das verbas que aparecem são para pagamento de pessoal não permanente. Tenho a minha frente um quadro diferente daquele que os Srs. Deputados têm que possui discriminação das verbas que estão alocadas aos diversos serviços regionais, inclusive com a sua decomposição em despesas de funcionamento, de capital, e das suas orientações, pelo que terei prazer em fornecer esses elementos, se virem interesse nisso.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/ CDE): — O Sr. Ministro dá-me licença que o interrompa?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/ CDE): — A verdade é que a pergunta que eu tinha formulado era sobre avultadas verbas que atingem cerca de 600 000 contos em «aquisição de serviços não especificados». O Sr. Secretário de Estado não soube responder claramente pois disse julgar destinar-se a pagamento de tarefeiros. Acontece que em todas as direcções aparecem discriminadas verbas para pessoal permanente, pessoal contratado não pertencente aos quadros, pessoal em qualquer outra situação que se refere, naturalmente, a tarefeiros. O que pretendo saber é a que é que se destinam exactamente estas verbas denominadas por «aquisição de serviços não especificados».
O Orador: — Sr. Deputado, se bem interpreto, porque tenho à minha frente um quadro ligeiramente diferente do seu, nestas verbas por cada direcção existem verbas para pessoal e verbas para despesas não especificadas como sejam produtos de limpeza, pagamentos de telefone, água, electricidade, reparação de viaturas etc. Presumo que seja a consolidação dessas verbas totais que dará esse valor de cerca de 600 e tal mil contos, uma vez que no quadro que tem à sua frente, o Sr. Deputado diz ter discriminado o pessoal permanente e o pessoal contratado.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/ CDE): — Exactamente, Sr. Ministro. Está também discriminado o pessoal da limpeza, pagamento de telefones, etc. Além disso, consta em todas as direcções a aquisição de serviços não especificados.
O Orador: — Como lhe digo, o que tenho aqui é que desta verba, parte importante é para pagamento de pessoal não pertencente aos quadros, contratado, requisitado, de limpeza, etc, aquisição de material de expediente, produtos de limpeza, pagamentos de telefone, água, electricidade, reparação de viaturas, aluguer de instalações, combustíveis e lubrificantes, etc. Portanto, estas são as verbas principais em cada uma das direcções-gerais, uma vez que as próprias despesas de capital que aparecem nos respectivos orçamentos são bastante diminutas. Se o Sr. Deputado desejar, terei muito prazer em dar-lhe estes documentos que tenho aqui comigo, os quais são mais detalhados e de onde poderá retirar essas informações.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — A questão concreta é esta: aparece uma rubrica denominada «aquisição de serviços», a qual tem um aumento nominal, em relação ao Orçamento inicial do ano passado, de cerca de 33%. Dentro desta rubrica, que atinge o valor de 1 056 000 contos, aparece a rubrica «aquisição de serviços não especificados», — que, portanto, não inclui as locações, transportes, e ainda uma outra rubrica que agora não me recordo —, que tem um valor de 742 000 contos, isto é, um aumento nominal de cerca de 133%. É na explicação de um tão grande aumento na «aquisição de serviços não especificados» que surgiu a hipótese, colocada pelo Sr. Secretário de Estado, de eventualmente nela poder estar incluído o pagamento de pessoal tarefeiro. Julgo que não, porque, de facto, na rubrica relativa ao pessoal existe uma série de classificações do mesmo. A dúvida sobre o que é que estará incluído nessa verba de «aquisição de serviços não especificados» deve-se precisamente ao elevado aumento que nela se verifica.
O Orador: — Sr. Deputado, confirmo que, em minha opinião e de acordo com o quadro que me foi dado, não está incluído o pessoal não permanente na medida em que existe uma rubrica para «pessoal contratado não pertencente aos quadros». Assim sendo, parto do princípio que a rubrica em questão engloba o pagamento de serviços não discriminados na medida em que o valor total que detenho, embora com uma classificação diferente, na grande maioria das direcções regionais se destina a pagamento de serviços não especificados tal como reparação de viaturas, combustíveis, aluguer de instalações, etc.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Mas, isso está incluído na aquisição de serviços classificados, especificadamente.
O Orador: — É, digamos, uma classificação feita pela Secretaria de Estado do Orçamento, que não lhe possa esclarecer. O que posso fazer é ceder-lhe os mapas que são, no fundo, os orçamentos de cada um dos departamentos do Ministério da Agricultura e onde tudo isso está discriminado com as respectivas verbas distribuídas. Por outro lado, a soma total é igual. De qualquer forma, talvez o Sr. Secretário de Estado do Orçamento possa saber, posteriormente, como é que essa classificação foi feita, porque de momento não temos essa informação.
Em relação ao problema do imposto da indústria agrícola, penso que há pouco, na resposta que dei ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, já referi que o documento que, de certa maneira, é um anteprojecto daquele imposto, mereceu, por parte do Ministério da Agricultura, alguns reparos de certa profundidade por nos parecer que não está devidamente adaptado ao tipo de actividade de que se reveste, hoje, em Portugal, a nossa indústria agrícola.
Portanto, está criado, com representantes do Ministério da Agricultura, um grupo de trabalho que está a rever essa legislação no sentido de fazer a correcta adaptação e não se cair, amanhã, numa situação de arbitrariedade na atribuição do imposto da indústria agrícola. De qualquer modo, não lhe posso dizer qual vai ser a fórmula a que vamos chegar. Houve já três reuniões desse grupo de trabalho.
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A única coisa que lhe posso dizer é que, na opinião do Ministério da Agricultura, a forma actual prevista não é aquela que melhor satisfaz o interesse da agricultura.
Quero, no entanto, corrigir uma coisa que há pouco o Sr. Deputado Alexandre Reigoto terá mal interpretado das minhas palavras e que era o facto de que não iria ser lançado o imposto da indústria agrícola em 1985. Penso não ter ido tão longe, pelo menos não era isso que estava no meu espírito. Só lhe disse pensar haver muito trabalho a fazer, que faremos com o maior entusiasmo possível, e que, no entanto, se tem de andar depressa para se poder lançar o referido imposto em 1985. Mas o Sr. Secretário de Estado do Orçamento está convicto de que vai ser possível acabar o trabalho ainda este ano e portanto ser, ainda, possível arrecadar a verba de 2 100 000 contos em 1985.
Com menos experiência, quer de Direito Fiscal, como de tempo que demorará a adaptação, não deixarei, no entanto, de dar a melhor contribuição para que tal se concretize, vendo-se na altura, as conclusões.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira referiu o problema do Alqueva e a necessidade de haver varbas previstas para o mesmo no orçamento do Ministério da Agricultura.
Não estou de acordo com essa sua opinião, na medida em que o Alqueva é um projecto que demorará muitos anos a fazer. Estou à vontade para falar nele visto que, pessoalmente, sou favorável à sua construção e já o disse publicamente, tendo inclusivamente sido aprovado em 1980, por um governo em que eu tinha a responsabilidade da parte energética, que se avançasse com esse projecto dado a sua componente energética e tendo em atenção a dependência energética que o País tem de fontes primárias como o petróleo. O Alqueva é pecisamente um dos projectos com melhor potencial no que diz respeito aos nossos aproveitamentos hidroeléctricos. Penso que o facto de não estar no orçamento do Ministério da Agricultura não quer. dizer nada, na medida em que terá de vir a estar dentro de um ou dois anos. Quanto à questão de ele avançar ou não, o Sr. Ministro da Indústria e Energia poderá, melhor do que ninguém, esclarecer esse assunto na reunião que com ele terão na sexta-feira. Mas do facto de não aparecer no Ministério da Agricultura não se poderá tirar a conclusão de que a resolução do Conselho de Ministros que foi tomada — e confirmo que o foi — não teve ainda efectivação.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?
É que a questão que lhe coloquei prende-se com o facto de o Sr. Secretário de Estado, na resposta à minha pergunta, ter referido que não há nenhuma verba no Ministério da Agricultura para o Alqueva, porque não há luz verde para ele.
O Orador: — O Sr. Deputado Domingues de Azevedo falou no problema do pessoal das regiões e na necessidade de que esse pessoal dê verdadeira assistência aos agricultores. Referi, na minha intervenção, que a minha perspectiva de funcionamento do Ministério da Agricultura assenta basicamente, na existência de uma empresa de serviços de apoio aos agricultores. E se ela não conseguir transmitir essa confiança aos agricultores, pergunto se valerá a pena manter em funcionamento muitas das estruturas, que são realmente onerosas, que hoje somos obrigados a pagar.
Estou consciente de que em muitas situações tem havido deficiências graves no funcionamento das distritais e das regionais, havendo deficiências de mobilização das pessoas para tarefas desse apoio. Se, por exemplo, muitas vezes o próprio trabalho a tempo inteiro não é a regra desse sector, é um problema com que estamos muito preocupados e para o qual estamos a tentar encontrar uma solução, que mobilize e ince-tive realmente as pessoas a exercerem as suas funções, porque senão não vale a pena fazer a regionalização, visto que ela é demasiado cara para não ter resultados práticos mínimos. Ainda estamos, no entanto, convencidos de que a regionalização é a maneira correcta de resolver a questão e há que, portanto, criar as condições para que ela funcione. Estamos em crer que com a reformulação que estamos a fazer no Ministério, isso será possível.
Alguém disse, há pouco, que o Ministério da Agricultura tinha fama de ter muita gente e eu acrescentaria que tem a fama e o proveito, porque na realidade ele tem na sua totalidade 18 000 pessoas, se adicionarmos a 13 000 efectivos 5000 tarefeiros. Se juntarmos as pessoas que trabalham nos organismos de coordenação económica, ficaremos com cerca de 20 000 a 21 000 pessoas. O que está errado é a sua distribuição profissional, ou seja, enquanto há uma falta de quadros técnicos evidentes para dar apoio à agricultura, existe um excesso de pessoal não qualificado, que muitas vezes não presta a ajuda necessária. É nessa reformulação completa do Ministério que temos neste momento já equipas a funcionar.
Dir-lhe-ia, por exemplo, que só nos serviços centrais do Ministério vamos fazer a fusão de 4 direcções-gerais numa única e a redução e a alteração profunda das pessoas que estão a funcionar. Não haverá, eveidente-mente, quaisquer despedimentos.
De acordo com aquilo que o Governo pensa e aceita, existe de facto no Ministério da Agricultura uma população que, embora muito experiente, poderá optar pela sua reforma rápida. Dir-lhe-ei, por exemplo, que enquanto nestes serviços centrais o número de pessoas que estavam envolvidas era de 660, o novo quadro que apresentarei oportunamente prevê cerca de 200, com qualificações diferentes. Penso que esse será o caminho de reformular, mas enriquecendo o pessoal do Ministério, no sentido de ele estar mais apto e poder dar o apoio à agricultura e, também, de reduzir as despesas correntes, canalizando fundos para despesas reprodutivas e, dentro delas, para a extensão rural e o apoio, como foi manifestado por um dos Srs. Deputados no início da sessão, preocupação que também é nossa. Estou assim totalmente de acordo consigo. Em relação à sua intervenção sobre o sector cooperativo, penso que, há'pouco, ao referir-me à gravidade que este problema, se não for devidamente acompanhado, pode assumir, respondi à suas duas preocupações manifestadas na intervenção que fez.
O Sr. Deputado Álvaro Brasileiro levantou problemas de grande importância em relação aos problemas dos pesticidas inadequados. Devo dizer-lhe, com honestidade, que não sabia, uma vez que não gosto de estar a iludir as questões. É evidente que, como o Sr. Deputado disse inicialmente, a repercussão nos consumidores tem mais a ver com outros departamentos governamentais do que com o nosso,.mas não poderemos ser alheios a esse problema.
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Consequentemente, não deixarei de fazer um inquérito ou, pelo menos, mandar fazer um documento que me informe sobre se existem ou não no mercado esses pesticidas. O Sr. Deputado diz que sim e, pela sua experiência, estou convicto de que é verdade, mas não tinha essa informação.
Em relação ao vale do Tejo e ao vale do Sorraia, queria dizer que estive recentemente em Coruche e visitei essa região com bastante detalhe. Pude constatar a situação de assoreamento em que o Sorraia está e o perigo em que ele estaria face a quaisquer chuvadas mais intensas, que infelizmente vieram depois a acontecer. Como lhe disse, foi-nos na altura levantado um problema que decidimos logo e que será resolvido muito brevemente, sendo da nossa área directa, e que consiste em transferir a responsabilidade das limpezas das valas de enxugo de toda aquela região para a associação de regantes e não matê-la, como tem estado até agora, na Hidráulica do Tejo, que não tem feito pura e simplesmente a conservação dessas valas. Já contactámos com a Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos e essa transferência vai ser feita.
Em relação ao problema do desassoreamento dos vales do Sorraia e do Tejo, queria dizer-lhe que ele é, também, da responsabilidade da Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos e, portanto, do Ministério do Equipamento Social. Apesar disso, temos insistido muito no sentido de que se deve avançar rapidamente com essa obra, até para aproveitar em pleno a situação com duas culturas, podendo fazer os enxugos dessas regiões. Inclusivamente, um dos projectos que pensamos apresentar em Bruxelas é, precisamente, um projecto integrado no vale do Sorraia no qual está prevista a possibilidade de trabalhos importantes para o desassoreamento naquela região, embora seja, basicamente, na repartição das responsablidades, trabalho directamente ligado à Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos.
Em relação às geadas, já respondi de manhã.
Em relação às cheias, estamos neste momento a fazer o levantamento da situação, ou seja, ver se há ou não grandes prejuízos. Aliás, sobre isso, devo dizer-lhe que admito que haja bastantes prejuízos, mas de qualquer maneira fiquei impressionado quando fui a Coruche antes das cheias e ter visto os campos ainda muito alagados, exactamente por falta de drenagem, sendo-me até referido como um dos problemas que obstavam ao começo das culturas.
Em suma, estou esperançado que os prejuízos não sejam tão avultados com essas cheias porque muitos dos terrenos não tinham ainda sido cultivados, devido à deficiente situação das valas de enxugo e à impossibilidade que tinha havido de avançar para outras culturas.
(Palavras inaudíveis do Sr. Deputado Álvaro Brasileiro.)
O (Orador: — Sr. Deputado, com certeza que sim. Referia-me a Coruche apenas como exemplo da visita que fiz, mas estou a aguardar o relatório das Direcções Regionais para me colocarem essas questões.
A Sr.a Deputada Ilda Figueiredo colocou-me uma questão relativamente às verbas do Fundo de Abastecimento. Sobre issso, direi que permitia-me não lhe entregar este documento, uma vez que ele pertence à Secretaria de Estado do Orçamento, apesar de estar em
meu poder, e, como já em dia anterior referi na Comissão de Agricultura, parece-me indispensável que os Srs. Deputados tenham acesso a este documento. É que não ter acesso ao mesmo, proporciona uma visão incompleta do orçamento, e no caso do Ministério da Agricultura nós teremos cerca de 20 milhões de contos entre despesas correntes, despesas de capital, despesas de ordem e temos perto de 20 milhões de contos, directa ou indirectamente, para a agricultura, de verbas do Fundo de Abastecimento. É evidente que poderão sempre dizer que é indirectamente, quando, só para lhe dar o exemplo, para o gasóleo à lavoura, a preços de custo, está prevista uma verba de 7,5 milhões de contos no orçamento do Fundo de Abastecimento. Ora, isto para mim, é um apoio à agricultura.
Quando, por exemplo, nós temos previstos, para apoio aos cereais, cerca de 3 milhões de contos neste orçamento do Fundo de Abastecimento, trata-se no fundo da possibilidade de fixar preços de garantia mais elevados do que aqueles que são depois transmitidos para os consumidores. O Fundo de Abastecimento contribui com 3 milhões de contos, parece-me também ser uma verba de apoio à agricultura.
Quando temos verbas para aguardentes, concentrados de tomate e exploração de vinhos de 1,5 milhões de contos, no caso das aguardentes, por exemplo, servem para os subsidiar de forma a que possam fazer
0 benefício do vinho do Porto a preços que lhe permitam fazer a sua exportação competitiva, e não seguir uma solução que foi seguida no passado e que consistia, face ao problema do preço das aguardentes nacionais, que era excessivamente elevado, em governos autorizarem a importação de aguardentes. Ora, esta situação veio criar um problema mais, que é o da acumulação de aguardentes sem escoamento, daí o nós seguirmos uma posição diferente, e propomo-nos fazer um subsídio que está previsto ser de cerca de 800 000 contos, apenas no caso das aguardentes, para poder fazer o apoio.
No caso dos organismos de intervenção, por carên- , cia de meios financeiros, as intervenções em Portugal, [ nos últimos anos foram feitas, digamos, obrigando os I organismos de coordenação a acorrer a fundos da banca com juros extremamente elevados. Isto levava à criação de problemas, como os da aguardente, de acumulação de juros sobre juros e, portanto, a que os preços desses produtos atingissem valores muito elevados, e, simultaneamente, de outros produtos, como por exemplo o azeite, que quando se quis lançar no mercado ele estava de tal maneira onerado que é o próprio Governo que está a provocar a inflação, ao lançar anos depois esses produtos com valores adicionados.
O que aqui está previsto é, não uma verba para acorrer à totalidade das necessidades, mas uma verba de
1 100 000 contos para fazer uma bonificação que per- | mita que os organismos de intervenção, quando tenham j que fazer intervenção, possam, embora recorrendo à ! banca, ter os seus juros bonificados de maneira que fiquem valores que não sejam superiores à inflação estimada para o ano de 198S, ou seja, que eles não sejam, por si próprios, criadores de inflação.
No sector pecuário, o apoio à peste suína e à própria peripneumonia tem uma verba de 405 000 contos que também sai do sector do Fundo de Abastecimen- . tos, e o próprio sector do leite tem uma verba de 5 845 000 contos que estão aqui como apoio. Alás, como sabe, os preços pagos ao produtor são ainda su-
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periores àqueles que se teve de passar para o consumidor, essa a razão do referido subsídio.
Finalmente, ainda tem aqui as verbas, os encargos financeiros da geada de 1980-1981 e da seca de 1983 que também saem daqui do Fundo de Abastecimento com 1 123 000 contos:
Em suma, se somar estas verbas todas, estamos em cerca de 19 milhões de contos, que, directa ou indirectamente, são, no fundo, subsídios que são feitos ao sector agrícola e que, portanto, ao analisar o orçamento do Ministério, não deverão deixar de estar presentes. Aliás, já no outro dia, na Comissão de Agricultura, tinha chamado a atenção para este problema.
Tenho aqui o orçamento do Fundo de Abastecimento, mas sendo este documento do Ministério das Finanças, os senhores, quando tiverem reuniões com o referido Ministério, poderão verificar que há outros sectores subsidiados. Assim, era de muito interesse que os Srs. Deputados tivessem acesso a este problema.
Finalmente, a Sr.8 Deputada Ilda Figueiredo, perguntou sobre qual era a orientação em relação aos organismos de coordenação económica, uma vez que julga saber que eles hoje estão no Ministério da Agricultura. De facto, Sr.8 Deputada, a única tutela é a do Ministério da Agricultura, na medida em que, na minha opinião, a experiência que tenho nesse aspecto prova que, tutelas conjuntas de vários ministérios são sempre soluções pouco eficientes. Na realidade, penso que quando há que fazer uma clarificação, é melhor que haja uma única tutela, e neste aspecto os organismos de coordenação económica são organismos de intervenção com funções importantes no campo da agricultura e que também, noutros países — como sabe —, estão sob tutela do Ministério da Agricultura.
Outra pergunta que a Sr." Deputada me fez, acabou por responder imediatamente, ou seja, sobre a política do Ministério da Agricultura. Disse mesmo que sabia qual era a política que eu tinha quando estava no Ministério do Comércio. Pois, posso dizer-lhe, Sr.a Deputada, que pelo facto de ter mudado de Ministério não mudo de política, portanto ela será a mesma. Sei que diverge, sei que não está em concor-diancia, penso que tenho razão, a Sr." Deputada pensa que tem razão, mas a resposta é que a política será a mesma.
O Sr. Presidente: — Penso que esta parte dos nossos trabalhos está terminada ...
O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): — Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): — Sr. Presidente, o Sr. Ministro ficou de passar a palavra ao Sr. Secretário de Estado para me dar resposta sobre os mortó-rios, que é, aliás, a pergunta mais importante que lhe fiz.
O Sr. Presidente: — Tem, então a palavra o Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado da Produção Agrícola: — Sr. Deputado, o que sei é que a Direcção Regional da Agricultura, está a incidir nos mortórios ver-
dadeiros; não se trata, portanto, de autorizar ou fazer essas novas plantações em solos que não foram plantados.
O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): — Sr. Secretário de Estado, posso deduzir das suas palavras que não está a ser aplicada, nem vai ser, a portaria que considera mortórios os terrenos não só filoxerados como também aqueles que nunca tiveram vinha?
O Orador: — Exacto, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: — Creio que, afinal, o Sr. Deputado Rogério de Brito ainda queria fazer uma pequena intervenção.
Peço aos Srs. Deputados que aguardem mais uns momentos, pois tenho ainda que tratar com a Comissão alguns pontos que estão pendentes.
O Sr. Rogério de Brito (PCP): — Sr. Ministro, desculpe mas eu apenas pretendia dizer algo, que a meu ver é importante, sobre o uso de pesticidas. Assim, parece-me que seria curioso se o Sr. Ministro pudesse confrontar a relação dos pesticidas que nós temos no mercado com aqueles que estão condenados, portanto rejeitados, pela Organização Mundial de Saúde, e verificará que há uma série, infelizmente grande, de pesticidas que estão a ser utilizados no nosso país e que já estão rejeitados pela Organização Mundial de Saúde.
Queria também colocar a questão sobre os vales do Tejo e do Sorraia e outros problemas semelhantes. Normalmente nestas questões levanta-se sempre o problema da competência, e a competência entre diferentes ministérios pode levar, pura e simplesmente, à paralisação das coisas, daí que alguém tem de assumir. Assim, a questão é saber que ministério assume, por exemplo, o Ministério do Equipamento Social pode dizer que a sua obrigação é executar a obra depois de ela estar programada. São questões em que não nos metemos, mas o que me parece é que é necessário alguém assumir a competência das obras.
Finalmente, e para que fique registado, gostaria de dizer o seguinte: como o Sr. Ministro calcula, não estamos de acordo, no meu partido, com a questão que defendeu relativamente ao problema da exclusividade da recolha e da concentração do leite, nem quanto a causas, nem, provavelmente, quanto a consequências.
Há várias questões a colocar e eu diria apenas, a título de graça, que as cooperativas leiteiras, com os defeitos que possam ter, não fazem queijo com fécula de batata, que é uma coisa que os industriais de lacticínios fazem. Isto é apenas um exemplo de questões que se podem suscitar a esse nível.
O Sr, Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura.
O Sr. Ministro da Agricultura: — Queria agradecer ao Sr. Deputado Rogério de Brito ter dado a explicação à Sr.8 Deputada Ilda Figueiredo, sobre a razão por que é que a tutela conjunta dos organismos de coordenação económica passou a ser só do Ministério da Agricultura!
Risos.
A Sr.8 Dda Figueiredo (PCP): — Mas é que a explicação é outra, Sr. Ministro!
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O Sr. Presidente: — Além de pedir a todos os Srs. Deputados que meditemos para que nos nossos trabalhos de amanhã possam tirar alguns ensinamentos dos trabalhos de hoje, faria um rápido resumo do que neles se passou.
Assim, não houve quaisquer votações. Entraram de manhã várias propostas de aditamento e alteração, tendo à tarde entrado uma proposta de aditamento do PCP. Nenhuma delas foi votada, assim como qualquer das verbas discutidas nos dois ministérios.
Gostaria de apresentar à comissão uma proposta no sentido de as votações seram feitas em momento ulterior, tendo em conta que talvez se ganhe na meditação dessas propostas depois de se ter uma visão mais global das mesmas. Podemos voltar a este tema amanhã.
Por último, queria dizer que o Sr. Ministro me deixou este documento, que, atendendo ao seu volume, proporia que fosse fotocopiado apenas um exemplar para cada grupo e agrupamento parlamentar.
Queria mais uma vez pedir a vossa atenção para os trabalhos de amanhã, que começam às 10 horas e, se me permitem, para a natureza das intervenções. De facto, estamos a discutir o orçamento dos vários ministérios e não é fácil fazer esta discussão nem talvez fosse correcto, sem que façamos a articulação com a própria política implícita do Orçamento. Contudo, talvez ganhemos um pouco em nos lembrarmos que estamos a discutir o Orçamento, as verbas inscritas nos diversos ministérios, pese embora a necessidade da relação que acabei de referir.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento teve de sair mais cedo em virtude de ter recebido um telefonema da Presidência do Conselho de Ministros e pediu-me para apresentar as desculpas à Comissão.
Srs. Deputados, por hoje, dou por encerrados os nossos trabalhos.
Eram 20 horas e 45 minutos.
Estiveram presentes os seguintes Srs. Deputados:
Telmo da Silva Barbosa (PSD). Almerindo da Silva Marques (PS). Octávio Augusto Teixeira (PCP). António José Tomás Gomes de Pinho (CDS). Américo Albino da Silva Salteiro (PS). António Domingues de Azevedo (PS). António Jorge Duarte Rebelo de Sousa (PS). António José dos Santos Meira (PS). José António Borja dos Reis Borges (PS). José Manuel Niza Antunes Mendes (PS). Silvino Manuel Gomes Sequeira (PS). Maria Luísa Banha Modas Daniel (PS). Guido Orlando de Freitas Rodrigues (PSD). José Bento Gonçalves (PSD). José Adriano Gago Vitorino (PSD). Manuel Maria Portugal da Fonseca (PSD). Maria Martins Adegas (PSD). Virgílio Higino Gonçalves Pereira (PSD). Vasco Francisco Aguiar Miguel (PSD). José Manuel Mendes (PCP). Maria Ilda da Costa Figueiredo (PCP). Carlos Alfredo de Brito (PCP). Manuel Rogério de Sousa Brito (PCP). José Luís Nogueira de Brito (CDS). Alexandre Correia Carvalho Reigoto (CDS). João Corregedor da Fonseca (MDP). Joel Eduardo Hasse Ferreira (UEDS). Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).
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