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Quarta-feira, 31 de Maio de 1995

II Série-A — Número 46

DIÁRIO

da Assembleia da República

VI LEGISLATURA

4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1994-1995)

SUMÁRIO

Projecto de lei n.° 577/VI:

Reduz a duração semanal do trabalho normal (apresentado pelo PCP)..................................................................... 738

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II SÉRIE-A — NÚMERO 46

PROJECTO DE LEI N.a 577/VI REDUZ A DURAÇÃO SEMANAL DO TRABALHO NORMAL

Nota justificativa I

Em 1919, a Organização Internacional de Trabalho (OIT) aprovava a Convenção n.° 1 sobre a Duração de Trabalho na Indústria, através da qual se fixava em quarenta e oito horas a duração semanal de trabalho.

Em 1935, a mesma Organização, através da Convenção n.° 35, fixava o princípio da semana de quarenta horas, sem diminuição do nível de vida dos trabalhadores.

Em 1969, através da Recomendação n.° 166, a OIT fixa o princípio da redução progressiva da duração normal de trabalho por forma que esta atingisse as quarenta horas por semana, sem qualquer diminuição dos salários dos trabalhadores.

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Através dos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, os trabalhadores e os sindicatos conseguem alguns avanços na redução da duração semanal de trabalho.

A título de exemplo, registam-se as seguintes reduções:

Contrato colectivo de trabalho (CCT) pedreiros de granito — norte — redução de quarenta e cinco para quarenta e duas horas, acordada em 1984, para certas épocas do ano;

Indústrias químicas — redução da duração semanal em várias empresas — de quarenta e cinco para quarenta e duas horas e meia, ou mesmo de quarenta e cinco para quarenta horas, nos anos de 1985 e 1986;

Indústrias de cerâmica, cimento e vidro — redução em ACT (acordos colectivos de trabalho) e AE (acordos de empresa) para quarenta e duas horas e meia ou quarenta horas, conforme as empresas;

Indústrias metalúrgicas e metalomecânicas — fixação no CCT do princípio da redução progressiva da duração do trabalho. Redução efectiva nalgumas empresas;

Indústria têxtil, lanifícios, vestuário e peles — redução da duração semanal em várias empresas para quarenta, quarenta e uma, quarenta e uma e meia, ou quarenta e duas horas semanais;

Sectores de curtumes e lavandarias — redução, por IRCT (instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho), para quarenta horas semanais.

Durante os anos 90, centenas de milhares de trabalhadores transformaram a reivindicação da redução do horário de trabalho para as quarenta horas semanais num grande objectivo.

O PCP, correspondendo a esta justa reivindicação, apresentou na anterior Legislatura um projecto de lei nesse sentido, que só não teve vencimento devido ao voto contra do PSD.

Em 1990, o Governo acordou, no Acordo Económico e Social, na redução progressiva do horário de trabalho, comprometendo-se a desenvolver esforços no sentido da entrada em vigor do horário máximo nacional de quarenta

e quatro horas semanais em 1 de Janeiro de 1991 e a atingir as quarenta horas em 1995.

O próprio PSD, na campanha eleitoral para as legislativas de 1991, prometeu a redução para as quarenta horas, tal como outras forças políticas.

Todavia, em 7 de Janeiro de 1993, o PSD rejeitou, juntamente com o CDS-PP, novo projecto de lei do PCP para redução da duração semanal do trabalho normal para quarenta horas.

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A duração do trabalho em Portugal é ainda muito longa, em comparação com outros países industrializados com economia de mercado que têm vindo a reduzir a duração semanal do trabalho normal.

Em Portugal, em vez disso, temos assistido, de facto, a alguns retrocessos ou tentativas de retrocesso na base das quais está a negação da redução de tempo de trabalho. São exemplos disto:

a) O recurso a reformas antecipadas, desperdiçando mão-de-obra qualificada;

b) A chamada flexibilização dos horários;

c) O chamado lay-off, baseado na filosofia patronal de que os problemas das empresas decorrem dos salários demasiado elevados;

d) A elevação da idade de reforma das mulheres; é) A possibilidade de a duração normal do trabalho

semanal atingir as cinquenta horas, de os trabalhadores trabalharem por turnos durante 7, 8, 9, 10, 11 ou mesmo 12 dias seguidos e de o dia de descanso semanal complementar não ser gozado imediatamente antes ou depois do dia de descanso semanal obrigatório.

IV

A redução da duração semanal do tempo normal de trabalho impõe-se face ao panorama atrás referido.

Corresponde tal redução a dois objectivos fundamentais:

a) O aumento para o trabalhador do tempo destinado ao repouso e aos lazeres, permitindo-lhe uma maior disponibilidade para a sua participação na vida política e cívica, uma maior formação cultural, uma maior presença na sua vida familiar. E com isto se cumprirão alguns preceitos constitucionais;

b) A chamada «partilha do emprego», ou seja, a diminuição do desemprego por virtude da necessidade de contratar mais pessoal para ocupação das horas reduzidas.

Não oferece dúvidas que o primeiro objectivo será alcançado.

Quanto ao segundo objectivo, a verdade é que ninguém conseguirá ocultar que face à introdução das novas tecnologias e tendo em conta, conjuntamente, os custos de mão-de-obra, a produção, o aumento da produtividade, o aumento do poder de compra, a existência em Portugal de mão-de-obra qualificada no desemprego, a necessidade de uma organização de trabalho mais racional, tendo sempre em conta que tudo isto se deve subordinar a uma perspectiva de progresso e de desenvolvimento, ninguém

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conseguirá ocultar, dizíamos, que a redução da duração semanal do trabalho normal irá traduzir-se num aumento de oferta de emprego.

V

Encontrando-nos em 1995, ano em que, segundo o compromisso assumido pelo Governo, se devia ter atingido o horario máximo nacional de quarenta horas semanais e tendo em conta todos os considerando referidos, o PCP decidiu reapresentar o projecto de lei para redução da duração semanal do trabalho normal.

Assim, propõe-se a redução da semana de trabalho para quarenta horas, sem prejuízo dos regimes mais favoráveis. Relativamente ao trabalho nocturno por turnos e aos trabalhos insalubres, penosos ou perigosos do ponto de vista físico ou psíquico, prevê-se a redução para as trinta e cinco horas semanais.

Prevenindo efeitos perversos, que poderiam estar na mira de alguns empresários de vistas curtas, proíbe-se no projecto de lei que da redução proposta resultem para os trabalhadores diminuição das suas condições económicas (isto é, abaixamento do nível de salários) ou qualquer outro desfavorecimento nas suas condições de trabalho.

Permite-se o alargamento do tempo de descanso semanal complementar já previsto na lei, alargamento que pode vir a resultar de uma reorganização do trabalho nas empresas.

Prevê-se a redução progressiva da duração semanal de trabalho naqueles sectores onde a reorganização do trabalho exija um maior período de tempo.

Assim, no projecto de lei que ora se apresenta, intro-duzem-se algumas alterações ao Decreto-Lei n.° 398/91, de 16 de Outubro, e aos Decretos-Lei n.** 409/71, de 27 de Setembro, e 421/83, de 2 de Dezembro.

Estabelece-se no projecto de lei a obrigatoriedade de gozar seguidamente dois dias de descanso semanal, nos casos em que através de negociação colectiva os trabalhadores tenham direito a meio dia de descanso semanal complementar, o qual acrescerá a dia e meio de descanso obrigatório, que se fixa como mínimo. Corresponde esta previsão ao aumento para dia e meio do dia de descanso semanal obrigatório actualmente estabelecido por lei.

Impõe-se a obrigatoriedade de conceder aos trabalhadores por turnos o período de descanso semanal, após cinco dias de trabalho.

Reformula-se o regime quanto aos descansos compensatórios, por forma a garantir a saúde dos trabalhadores, quantas vezes debilitada por aturados e sucessivos períodos de trabalho suplementar.

Por último, estabelece-se para a entrada em vigor do diploma, apenas no que toca a redução do horário de trabalho, o prazo de seis meses, suficientemente amplo para se processar a reorganização do trabalho onde tal se revele necessário.

Nestes termos, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.°

Limite máximo da duração semanal de trabalho

1 — Sem prejuízo de regimes mais favoráveis, o periodo normal de trabalho não pode em caso algum ser superior a oito horas por dia e a quarenta horas por semana.

2 — O limite máximo referido no número anterior é fixado em sete horas por dia e trinta e cinco horas por se-

mana para o trabalho nocturno, por turnos, insalubre, penoso ou perigoso do ponto de vista físico e psíquico.

3 — Os limites referidos nos números anteriores podem ser reduzidos pelos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho.

Artigo 2.°

Regime transitório para determinadas actividades

1 — A redução da duração do trabalho normal, determinada pelo presente diploma, efectuar-se-á progressivamente nos sectores da agricultura, silvicultura e pecuária e nos sectores onde se utilize trabalho nocturno, por turnos, e onde se verifique a insalubridade, penosidade ou perigosidade do trabalho.

2 — Nos sectores da agricultura, silvicultura e pecuária, reduzir-se-á a redução do trabalho normal para quarenta horas até ao final do primeiro ano de vigência da lei.

3 — Relativamente ao trabalho referido no n.° 2 do artigo até ao final do primeiro ano de vigência da lei, o horário semanal será reduzido para quarenta horas e será fixado nas trinta e cinco horas até ao final do segundo ano.

Artigo 3.° Descanso semanal

1 — O período de descanso semanal será gozado continuamente e será de dois dias seguidos nos casos em que para além do mínimo de um dia e meio de descanso semanal obrigatório for estabelecido através de negociação colectiva o direito a meio dia de descanso semanal complementar.

2 — O domingo será dia de descanso semanal obrigatório, exceptuados os casos das actividades industriais autorizadas a laborar continuamente e os casos previstos no n.° 2 do artigo 37.° do Decreto-Lei n.° 409/71, de 27 de Setembro.

3 — Nos restantes casos de actividade isentas de encerramento ou de suspensão de laboração, o domingo só poderá deixar de ser dia de descanso semanal obrigatório através de negociação colectiva.

Artigo 4.° Trabalho por turnos

1 — A duração de trabalho de cada turno não pode ultrapassar os limites máximos dos períodos normais de trabalho fixados neste diploma.

2 — Os turnos no regime de laboração contínua e dos trabalhadores que assegurem serviços que não possam ser interrompidos, nomeadamente guardas, vigilantes e porteiros, devem ser organizados de modo que aos trabalhadores de cada turno sejam concedidos os dias de descanso semanal após a prestação de trabalho durante cinco dias consecutivos.

Artigo 5.° Pagamento do trabalho suplementar

1 — Só não é exigível o pagamento do trabalho suplementar se a entidade patronal provar que não determinou a sua prestação prévia e expressamente e provar simultaneamente que não se opôs, por si ou pelo superior hierárquico do trabalhador, à sua prestação.

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2 — Nos casos em que, sem conhecimento da entidade patronal ou de superior hierárquico do trabalhador, seja prestado trabalho suplementar indispensável para evitar prejuízos importantes, a entidade patronal só poderá eximir-se à obrigação do seu pagamento se provar a não existência de probabilidade de ocorrência daqueles prejuízos.

Artigo 6.° Descanso compensatório

1 — A prestação de trabalho suplementar em dia útil, em período de descanso semanal complementar e em dia feriado confere aos trabalhadores o direito a um período de descanso compensatório remunerado equivalente ao período de prestação de trabalho suplementar.

2 — O descanso compensatório referido no número anterior será gozado nos 7 dias seguintes à prestação do trabalho suplementar, excepto quando o trabalhador opte por perfazer um número de horas suplementar igual ao período normal de trabalho diário, caso em que o descanso compensatório será gozado no prazo de 30 dias.

3 — Nos casos de prestação de trabalho em período de descanso obrigatório, o trabalhador terá direito ao período legalmente fixado como descanso semanal obrigatório num dos três dias úteis seguintes.

4 — O incumprimento, por parte da entidade patronal, do dever de conceder os períodos de descanso compensatório atrás referidos determina, para além das sanções pela conduta infractora, a remuneração do trabalho prestado nesses períodos, com o correspondente acréscimo de prestação de trabalho suplementar, o qual não poderá, no entanto, ser inferior a 100%.

Artigo 1°

Proibição da redução de salários e do desfavorecimento das condições de trabalho

Da redução do horário de trabalho prevista neste diploma não pode resultar para os trabalhadores a redução do nível salarial ou qualquer alteração desfavorável das condições de trabalho.

Artigo 8.° Norma revogatória

Ficam revogadas as disposições do Decreto-Lei n.° 409/ 71, de 27 de Setembro, do Decreto-Lei n.° 421/83, de 2 de Dezembro, e do Decreto-Lei n.° 398/91, de 16 de Outubro, que contrariem o disposto no presente diploma.

Artigo 9.° Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia da sua publicação, com excepção das disposições respeitantes à redução da duração do horário de trabalho, que entrarão em vigor no prazo de seis meses a contar da data da publicação.

Assembleia da República, 24 de Maio de 1995. — Os Deputados do PCP: Octávio Teixeira — Lino de Carvalho— Alexandrino Saldanha — José Manuel Maia — António Murteira — António Filipe.

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