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Quinta-feira, 4 de Abril de 1996

II Série-A — Número 33

DIÁRIO

da Assembleia da República

VII LEGISLATURA

1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1995-1996)

SUMÁRIO

Projectos de lei (n.» 10/VTJ, 32/VTJ e 132/VTJ):

N." 1Q/VII (Aprova medidas para o desenvolvimento da ■ rede pública de educaçflo pré-escolar):

Relatório e parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano.................................................................... 588

N.' 32/VI1 (Confirma que Torres Vedras continua na área de responsabilidade da PSP e dignifica a respectiva unidade territorial):

Relatório e parecer da Comissão de Administração do Território. Poder Local, Equipamento Social e Ambiente............................................................................. 588

N.° 132/V1I — Sobre extinção da enfiteuse ou aforamento (apresentado pelo PS)....................................................... 589

Proposta de lei n.° 20/VII:

Cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais.......................................................................... 39°

Projecto de resolução n." 18ATI:

Acerca da realização de um estudo do impacte de aspectos

do Tratado da União Europeia (apresentado pelo PCP) 592

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PROJECTO DE LEI N.« 10/VII

(APROVA MEDIDAS PARA 0 DESENVOLVIMENTO DA REDE PÚBLICA DE EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR)

Relatório e parecer da Comissão de Economia, Finanças e Piano

Relatório

Nos termos regimentais aplicáveis, o PCP apresentou à Mesa da Assembleia da República um projecto de lei que «aprova medidas para o desenvolvimento da rede pública de educação pré-escolar», o qual foi admitido e.baixou às 1." e 5.* Comissões em 3 de Novembro de 1995. Tendo sido distribuído em reunião da Comissão de Economia, Finanças e Plano, sobre este projecto de lei cumpre fazer relatório e dar o seguinte parecer:

Enquadramento do tema. — De acordo com os autores do projecto de lei, a legislação existente em Portugal (desde a Constituição da República — artigo 73." — à Lei de Bases do Sistema Educativo, passando pela Lei n.° 5/77, que rege o sistema público de educação pré-escolar, e pelo Estatuto dos Jardins-de-Infância — Decreto-Lei n.° 542/ 79) faria prever um desenvolvimento acentuado da educação pré-escolar. No entanto, segundo os autores do projecto de lei, tal não se verificou ha prática, uma vez que «actualmente apenas 35,6 % das crianças entre os 3 e os 6 anos são abrangidas pela educação pré-escolar, sendo que só 24 % usufrui da rede pública de jardins-de-infância do Ministério da Educação».

Sustenta o Grupo Parlamentar do PCP que a razão para este atraso é, entre outras," «a ausência do plano nacional de educação pré-escolar», razão pela qual estão a apresentar este projecto de lei.

Âmbito do projecto de lei. — O projecto de lei n.° 10/ VTJ tem como objecto definido no seu artigo 1." estabelecer o «quadro geral da rede pública de educação pré--escolar» e instituir «mecanismos de garantia da sua efectiva realização e funcionamento».

Para levar a cabo este objecto, os autores do projecto de lei definem no n.° 2 do artigo 2." que «o Governo, ouvidos designadamente o Conselho Nacional de Educação, as autarquias locais, os sindicatos cujos associados intervêm na educação pré-escolar, as associações de pais e encarregados de educação e instituições ligadas à criança, apresentará na Assembleia da República, até ao fim de 1996, um plano nacional de desenvolvimento da educação pré-escolar, de acordo com os objectivos estabelecidos na presente lei».

Os autores do projecto de lei definem no n.° 1 do artigo 3.° como objectivo deste plano o de «assegurar a concretização do direito de todas as crianças à educação pré-escolar», traduzindo-se no «alargamento da rede pública de jardins-de-infância», garantindo, no prazo de três anos, a «universabilidade da frequência da educação pré-escolar pelas crianças entre os 5 e os 6 anos de idade» e a «possibilidade de frequência da educação pré-escolar por todas as crianças entre os 3 e os 5 anos de idade».

Um aspecto muito importante do projecto de lei está consagrado no artigo 6.°, em que se encontra estabelecido a gratuitidade da frequência da rede pública de educação pré-escolar. No artigo 8.° esti definido que «compete ao Governo planear e promover a formação inicial dos educadores de infância e do pessoal técnico de apoio, bem como garantir a respectiva formação contínua».

Para fazer face aos custos que, necessariamente, estas medidas envolvem, o artigo 10.° estabelece que as «verbas necessárias à execução da presente lei serão inscritas no Orçamento do Estado do ano subsequente à sua aprovação».

Parecer

Analisado e ponderado o articulado do projecto de lei n.° 10/VTJ, somos de parecer que o diploma se encontra em condições de subir a Plenário.

Palácio de São Bento, 23 de Janeiro de 1996.— A Deputada Presidente, Manuela Ferreira Leite — O Deputado Relator, João Moura de Sá.

Nota. — O relatório e o parecer foram aprovados por unanimidade.

PROJECTO DE LEI N.« 32/Vd

(CONFIRMA QUE TORRES VEDRAS CONTINUA NA ÁREA DE RESPONSABILIDADE DA PSP E DIGNIFICA A RESPECTIVA UNIDADE TERRITORIAL)

Relatório e parecer da Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente.

Relatório

Antecedentes legislativos:

Decreto-Lei n.° 321/94, de 29 de Dezembro, que aprova a orgânica da Polícia de Segurança Pública — este diploma já sofreu alterações, mas estas não colidem com a matéria em causa no presente projecto;

Portaria n.° 762/72, de 21 de Dezembro, que cria, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1973, um posto da PSP na sede do concelho de Toctes Vedras;

Portaria n.° 786/81, de 11 de Setembro, que eleva à categoria de esquadra o posto criado pela anterior, alterando também, em consequência, a respectiva constituição;

Portaria n.° 323/95, de 18 de Abril, que eleva a divisão a secção policial de Loures.

Nos termos do Decreto-Lei n.° 321/94, de 29 de Dezembro, diploma posterior aos outros dois citados, a PSP compreende o Comando-Geral, os comandos metropolitanos, os comandos regionais, os comandos de polícia, o comando das forças especiais e os estabelecimentos de ensino (artigo 17.°, n.° 1).

Por outro lado, as áreas, que serão áreas de grande densidade urbana, onde a PSP exerce as suas missões no continente são definidas por portaria do Ministério da Administração Interna (artigo 17.°, n.° 2), do mesmo modo que a criação e a extinção de subunidades (artigo 18.°).

A criação do posto de polícia e a sua posterior elevação a esquadra da cidade de Torres Vedras, embora efectuadas na vigência da anterior orgânica da PSP, enquadram-se na actual, enquanto subunidade do comando da polícia, nos termos do artigo 42.° do mesmo decreto-lei.

As subunidades do comando da polícia são a divisão, a secção e a esquadra (artigo 42.°, n.° 1), sendo esta, portanto, a de nível inferior.

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Estas subunidades ficam na dependência do comando hierárquico superior, consoante a sua localização (artigo 42.°, n.° 2) e a sede do comando de polícia, enquanto unidade territorial, é definida por portaria do Ministério da Administração Interna (artigo 39.°).

A esquadra de Torres Vedras encontra-se integrada no Comando Metropolitano de Lisboa, na anteriormente secção de Loures, entretanto elevada a divisão,"através da Portaria n.° 323/95, de 18 de Abril.

Antecedentes parlamentares. — O objectivo do presente projecto de lei foi já matéria de idêntica iniciativa legislativa dos proponentes na legislatura anterior, tendo sido apresentado sob o n.° 500/VI, o qual, baixando à 5.* Comissão — Comissão de Administração do Território, Equipamento Social, Poder Local e Ambiente —, não teve outros desenvolvimentos.

Sobre o projecto de lei. — O projecto de lei em análise apresenta um articulado composto apenas por dois artigos, o primeiro dos quais define directamente o seu objectivo, determinando a criação da secção da PSP de Torres Vedras, a instalar na sede do concelho.

Tal consistiria, de acordo com a orgânica da PSP atrás definida, na elevação da actual esquadra a um nível superior da organização da subunidade.

O artigo 2.° é a decorrência prática do artigo 1,° e determina que, para que a secção funcione, os meios humanos e materiais serão fixados por portaria do Ministério da Administração Interna.

Os fundamentos apresentados pelos proponentes são, à escala actual, os que já haviam determinado a elevação do posto de polícia a esquadra, ou seja, o desenvolvimento da região e a importância de Torres Vedras enquanto pólo de desenvolvimento da Região do Oeste.

Acresce ainda a maior expansão da cidade, que se verificará certamente segundo os proponentes com a construção da auto-estrada e do itinerário complementar n.° 1.

Entendem, assim, os proponentes que se o dispositivo policial existente (o correspondente à subunidade policial que é a esquadra) já é insuficiente para as necessidades e características urbanas da zona, importa assegurar:

Que a PSP não deixe de ter estrutura implantada em Torres Vedras;

Que essa estrutura venha a corresponder às novas características e necessidades resultantes dos factores de desenvolvimento acrescidos em consequência, nomeadamente, da maior acessibilidade.

Pretendem os proponentes assegurar tal objectivo pela via de lei formal, apresentando o presente projecto de lei, sendo certo que a concretização do proposto sempre exigirá posterior intervenção do órgão do Governo competente — o Ministério da Administração Interna.

Parecer

Assim, a Comissão é de parecer que o projecto de lei n.° 32/Vn se encontra em condições de subir a Plenário para discussão.

Palácio de São Bento, 20 de Março de 1996. — A Deputada Relatora, Isabel Castro. — O Vice-Presidente, Artur Torres Pereira.

Nota. — O relatório e o parecer foram aprovados por unanimidade.

PROJECTO DE LEI N.s 132/VII SOBRE EXTINÇÃO DA ENFITEUSE OU AFORAMENTO

Nota justificativa

As situações de aforamento (também designadas de emprazamento ou de enfiteuse) constituíam exemplos inequívocos de propriedade fraccionada ou imperfeita, visto a propriedade cindir-se em dois domínios — o «domínio directo» (o do senhorio) e o «domínio útil» (o do foreiro), correspondendo a formas dominiais pré-capitalistas.

O Decreto-Lei n.° 195-A/76, de 16 de Março, alterado pelo Decreto-Lei n.° 546/76, de 10 de Julho, veio abolir a enfiteuse de prédios rústicos que o Código Civil de 1966 ainda mantivera (artigos 1491.° a 1525.°) como forma de aquisição de um direito real de gozo. A abolição aqui consagrada corresponde à consolidação da propriedade dos prédios aforados nas mãos do foreiro, pelo que o titular do domínio útil, isto é, o titular do gozo, passou a ser proprietário pleno.

Assim, quando a Constituição da República Portuguesa de 1976 proibia, no seu artigo 99.°, n.° 2, os regimes de aforamento no propósito de reduzir e racionalizar as formas de exploração de terra alheia, já estes haviam sido extintos por acção do Decreto-Lei n.° 195-A/76.

Apesar do propósito legal de consolidação da propriedade dos prédios aforados nas mãos dos foreiros, na prática subsistiram pesadas dificuldades à concretização da vontade do legislador, pelo que os diversos grupos de foreiros existentes no território nacional têm enfrentado inúmeras dificuldades para que lhes -seja reconhecida de jure a sua qualidade de foreiros.

No sentido de ultrapassar esses obstáculos e, designadamente, a dificuldade de registo da enfiteuse, a Assembleia da República, após laborioso trabalho da Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, aprovou a Lei n.° 22/87, de 24 de Junho, nos termos da qual pretendia conferir aos interessados um instrumento de solução jurídica do seu problema. Por essa razão, decidiu aditar ao artigo 1." do Decreto-Lei n.° 195-A/76 um novo n.° 4, no qual estabelecia que «no caso de não haver registo anterior, nem contrato escrito, o registo da enfiteuse poderá fazer--se com base em usucapião reconhecido mediante justificação notarial ou judicial», e em complemento do presente número aditoü um outro n.° 5, pelo qual dispôs o seguinte:

5 — Considera-se que a enfiteuse se constitui por usucapião se quem alegar a titularidade do domínio útil provar por qualquer modo:

a) Que em 16 de Março de 1976 tinham decorrido os prazos de usucapião previstos na lei civil;

b) Que pagava uma prestação anual ao senhorio;

c) Que as benfeitorias realizadas pelo interessado contitular ou seus antecessores na posse do prédio ou parcela foram feitas na convicção de exercer direito próprio como enfiteuta;

d) Que as benfeitorias, à data da interposição da acção, têm um valor de, pelo menos, metade do valor da terra no estado de inculta, sem atender à sua virtual aptidão para a urbanização ou outros fins não agrícolas.

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A Lei n.° 22/87, elaborada na sequência das múltiplas exposições apresentadas por diversos grupos de foreiros espalhados pelo País, apesar da bondade legislativa das soluções nela ínsitas, não permitiu aos interessados lograr resolver o seu problema jurídico: o reconhecimento de jure da sua qualidade. Aliás, o n.° 5 aditado, cujo propósito era facilitar aos foreiros a prova do seu direito, veio, pelo contrário, agravar as dificuldades já existentes, na medida em que adensou as condições de aquisição da enfiteuse por usucapião, nomeadamente com o conteúdo atribuído à alínea d) daquele número.

Deste modo, a lei de 1987 não atingiu os objectivos a que a Assembleia da República se havia proposto e daí — não é de estranhar — as posteriores petições apresentadas por grupos de foreiros, designadamente.a da Comissão de Foreiros da Várzea Fresca — Salvaterra de Magos, cujo relatório e respectivas conclusões foram aprovados em 15 de Maio de 1991 pela Comissão de Petições.

É tendo em conta a necessidade de ultrapassar as reiteradas dificuldades mencionadas que as soluções ora propostas apontam para a criação de um quadro de presunções legais que facilitem à parte mais débil a prova do seu direito.

A mesma questão se coloca em termos muito semelhantes para os arrendamentos em estado inculto, visto ser difícil fazer a prova do que é terra em estado inculto quando os arrendamentos subsistam há mais de 50 anos.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do PS, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.°

O n.° 5 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 195-A/76, de 16 de Março, passa a ter a seguinte redacção:

5 — Considera-se que a enfiteuse se constituiu por usucapião se:

a) Desde, pelo menos, 15 de Março de 1946 até à extinção da enfiteuse o prédio rústico, ou súa parcela, foi cultivado por quem não era proprietário com a obrigação para o cultivador de pagamento de uma prestação anual ao senhorio;

b) Tiverem sido feitas pelo cultivador ou seus antecessores no prédio ou sua parcela benfeitorias, mesmo que depois de 16 de Março de 1976, de valor igual ou superior a, pelo menos, metade do valor do prédio ou da parcela, considerados no estado de incultas e sem atender a eventual aptidão para urbanização ou outros fins não agrícolas.

Artigo 2.°

É aditado ao artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 195-A/76, de 16 de Março, um novo número, com a seguinte redacção:

6 — Pode pedir o reconhecimento da constituição da enfiteuse por usucapião quem tenha sucedido ao cultivador inicial por morte ou por negócio entre vivos, mesmo que sem título, desde que as sucessões hajam sido acompanhadas das correspondentes transmissões da posse.

Artigo 3."

Presunção de arrendamento de terras no estado de incultas ou em mato

Para os efeitos do disposto no Decreto-Lei n.° 574/74, de 22 de Outubro, presume-se que as terras foram dadas de arrendamento no estado de incultas ou em mato se não houver contrato escrito de arrendamento ou ele for omisso quanto ao estado das terras e o arrendamento subsista há mais de 50 anos.

Palácio de São Bento, 27 de Março de 1996. — Os

Deputados do PS: Jorge Lacão-José Niza — José

Magalhães — Nelson Baltazar — António Braga — Osvaldo Castro.

PROPOSTA DE LEI N.« 2G7VII

CRIA NO ORDENAMENTO JURÍDICO ALGUNS MECANISMOS DESTINADOS A PROTEGER 0 UTENTE DE SERVIÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS.

Exposição de motivos

É tarefa do Estado prover à satisfação de necessidades iniciais e contribuir para o bem-estar e a qualidade de vida de todos. O cumprimento deste imperativo constitucional requer que o Estado se não desinteresse do modo como ele é conseguido e, designadamente, dos termos e condições em que os bens são fornecidos e os serviços prestados.

O presente diploma tem em vista o regime jurídico de serviços públicos essenciais. Nas sociedades modernas, os serviços públicos de água, gás, electricidade e telefone exigem especial atenção, atenta a sua natureza e características. E em relação a estes serviços que mais se justifica, desde já, a intervenção do legislador, em ordem à protecção do utente dos mesmos.

Domínio tradicional do Estado, Regiões Autónomas, autarquias e empresas públicas, os serviços públicos essenciais, já hoje entregues também a empresas privadas, são fundamentais para a prossecução de um nível de vida moderno e caracterizam-se tendencialmente pela sua universalidade, por serem prestados em regime de monopólio (local, regional ou até nacional) e por deverem atender a envolventes especiais, que não a uma meta óptica puramente comercial ou economicista.

Isso implica que a prestação de serviços públicos essenciais deva estar sujeita ao respeito por certos princípios fundamentais, em conformidade com a índole e as características desses serviços — princípios da universalidade, igualdade, continuidade, imparcialidade, adaptação às necessidades e bom funcionamento —, assim como vmçUea que ao utente sejam reconhecidos especiais direitos e à contraparte, impostas algumas limitações à sua liberdade contratual.

A necessidade de proteger o utente t maior quando ele não passa de mero consumidor final. Mas isso não significa que o legislador deva restringir o âmbito deste diploma a tal situação. Encara-se o problema em termos gerais, independentemente da qualidade em que intervém o utente de serviços públicos essenciais, sem prejuízo de se reconhecer que é a protecção do consumidor a principal razão que justifica este diploma e de nele se consagrar uma protecção acrescida para o consumidor quando é caso disso.

É certo que existem já na nossa ordem jurídica alguns

diplomas adequados a proteger o utente de serviços

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públicos essenciais. E não é de excluir o recurso a princípios, regras e institutos que, embora de carácter geral, permitem soluções jurídicas correctas neste domínio. Por isso se deixam de fora vários aspectos, aqueles em que parece não haver especialidades que justifiquem desvios ao regime geral, designadamente ao direito dos contratos, onde se inclui o diploma sobre as cláusulas contratuais gerais.

Mostra a experiência, porém, que é difícil alcançar a desejável protecção do utente de serviços públicos essenciais só por essa via. Compete ao legislador fazer opções valorativas, clarificar situações e disciplinar especiais interesses conflituantes. Torna-se necessário, designadamente, estabelecer especiais direitos e obrigações das partes, impedir actuações e práticas abusivas e consagrar a participação das organizações representativas dos utentes na definição do modelo a que obedecerá a prestação dos serviços públicos essenciais. São estes os objectivos visados pelo presente diploma.

Na prossecução deste desígnio, entende-se dever consagrar o direito de participação das organizações representativas dos utentes em alguns dos actos mais significativos para estes.

Além disso, e após se consagrar um princípio geral, assente na boa fé e na natureza dos serviços abrangidos por este diploma, bem como o dever de informação a cargo dos prestadores dos serviços públicos essenciais, procura reagir-se contra práticas e atitudes prejudiciais para os utentes, como a suspensão do serviço sem pré-aviso adequado e a recusa do direito à quitação parcial.

Prevê-se, ainda, a abolição de consumos mínimos obrigatórios, assim como, em qualquer caso, o direito a uma factura que especifique devidamente os valores do consumo, a qual, no serviço telefónico, a pedido do interessado, será uma facturação detalhada dos serviços, sem prejuízo de o prestador dever adoptar as medidas técnicas adequadas a salvaguardar os direitos à privacidade e ao sigilo das comunicações. A cifragem dos últimos algarismos do número de telefone chamado tem sido a medida técnica praticada em outros países e é aquela que se desenha no seio da União Europeia.

Por outro lado, entre os elevados padrões de qualidade a que a prestação de qualquer serviço está sujeita, deve incluir-se o grau de satisfação dos utentes.

•No p\ano da resolução dos conflitos, por último, incentiva-se o recurso a centros de arbitragem, constituídos ou a constituir, com competência genérica ou especializada em matéria de serviços públicos. Procura-se, assim, pela via arbitral, contribuir para uma «justiça acessível e pronta», como preceitua a Lei de Defesa do Consumidor.

Gostariam uns, porventura, que o legislador fosse mais longe; recearão outros que o legislador tenha ido longe demais. Optou-se por um diploma que se julga equilibrado e com as soluções importantes em ordem à protecção do utente de serviços públicos essenciais, depois de ouvidas as entidades e organizações representativas dos interesses que se pretende regular.

Assim, nos termos da alínea d) do n.° 1 do artigo 200.° da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da República a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° Âmbito e finalidade

1 — O presente diploma consagra regras a que deve obedecer a prestação de serviços públicos essenciais em ordem à protecção do utente.

2 — São os seguintes os serviços públicos abrangidos:

a) Serviço de fornecimento de água;

b) Serviço de fornecimento de energia eléctrica;

c) Serviço de fornecimento de gás;

d) Serviço fixo de telefone.

3 — Considera-se utente, para os efeitos previstos neste diploma, a pessoa singular ou colectiva a quem o prestador do serviço se obriga a prestá-lo.

Artigo 2." Direito de participação

1 — As organizações representativas dos utentes têm o direito de ser consultadas quanto aos actos de definição do enquadramento jurídico dos serviços públicos e demais actos de natureza genérica que venham a ser celebrados entre o Estado, as Regiões Autónomas ou as autarquias e as entidades concessionárias.

2 — Para esse efeito, as entidades públicas que representem o Estado, as Regiões Autónomas ou autarquias nos actos referidos no número anterior devem comunicar atempadamente às organizações representativas dos utentes os respectivos projectos e propostas, de forma que estes possam pronunciar-se sobre eles no prazo que lhes for fixado, que não será inferior a IS dias.

3 — As organizações referidas no n.° 1 têm ainda o direito de ser ouvidas relativamente à definição das grandes opções estratégicas das empresas concessionárias do serviço público, nos termos referidos no número anterior, desde que este serviço seja prestado em regime de monopólio.

Artigo 3.° Princípio geral

O prestador do serviço deve proceder de boa fé e em conformidade com os ditames que decorrem da natureza pública do serviço, tendo igualmente em conta a importância dos interesses dos utentes que se pretende proteger.

Artigo 4.° Dever de informação.

0 prestador do serviço deve informar convenientemente a outra parte das condições em que o serviço é fornecido e prestar-lhe todos os esclarecimentos circunstanciais que se justifiquem, de acordo com as circunstâncias.

Artigo 5.°

Suspensío do fornecimento do serviço público

1 —. A prestação do serviço não pode ser suspensa sem pré-aviso adequado, salvo caso fortuito ou de força maior.

2 — Em caso de mora do utente que justifique a suspensão do serviço, esta só poderá ocorrer após o utente ter sido notificado por escrito com a antecedência mínima de oito dias relativamente à data em que ela venha a ter lugar.

3 — A notificação a que se refere o número anterior, para além de justificar o motivo da suspensão, deve informar o utente dos meios que tem ao seu dispor para evitar a suspensão do serviço e, bem assim, para a retoma do mesmo, sem prejuízo de poder fazer valer os direitos que lhe assistam nos termos gerais.

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4 — A prestação do serviço público não pode ser suspensa em consequência de falta de pagamento de qualquer outro serviço, ainda que incluído na mesma factura, salvo se forem funcionalmente indissociáveis.

5 — Sem prejuízo do disposto do número anterior, o Governo regulamentará as questões relativas aos serviços de valor acrescentado.

Artigo 6.° Direito a quitação pardal

Não pode ser recusado o pagamento de um serviço público, ainda que facturado juntamente com outros, tendo o utente direito, a que lhe seja dada quitação daquele, salvo o disposto na parte final do n.° 4 do artigo anterior.

Artigo 7.° Padrões de qualidade

A prestação de qualquer serviço deverá obedecer a elevados padrões de qualidade, neles devendo incluir-se o grau de satisfação dos utentes, especialmente quando a fixação do preço varie em função desses padrões.

Artigo 8.° Consumos mínimos

São proibidas a imposição e a cobrança de consumos mínimos.

Artigo 9.° Facturação detalhada

1 — O utente tem direito a uma factura que especifique devidamente os valores que apresenta.

2 — No caso do serviço telefónico, e a pedido do interessado, a factura deve traduzir, com o maior detalhe possível, os serviços prestados, sem prejuízo de o prestador do serviço dever adoptar as medidas técnicas adequadas à salvaguarda dos direitos à privacidade e ao sigilo das comunicações.

3 — Às pessoas singulares a factura detalhada é fornecida sem qualquer encargo.

Artigo 10.° Prescrição

1 — O direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação.

2 — Se por erro do prestador do serviço foi paga importância inferior à que corresponde ao consumo efectuado, o direito a exigir a diferença de preço prescreve no prazo de seis meses após aquele pagamento.

3 — O disposto no presente artigo não se aplica ao fornecimento de energia eléctrica em alta tensão.

Artigo 11.° Caracter injuntivo dos direitos

1 — É nula qualquer convenção ou disposição que exclua ou limite os direitos atribuídos aos utentes pelo presente diploma.

2 — A nulidade referida no número anterior apenas pode ser invocada pelo utente.

3 — O utente pode optar pela manutenção do contrato quando alguma das suas cláusulas seja nula.

Artigo 12." Arbitragem

Os prestadores de serviços devem fomentar a arbitragem, no quadro da Lei n." 31/86, de 29 de Agosto, para o efeito de serem dirimidos eventuais conflitos com os utentes.

Artigo 13.°

Direito ressalvado

Ficam ressalvadas todas as disposições legais que, em concreto, se mostram mais favoráveis ao utente.

Artigo 14." Disposição transitória

0 disposto neste diploma é também aplicável às relações que subsistam à data da sua entrada em vigor.

Artigo 15.° Vigência

1 — O presente diploma entra em vigor 120 dias após a sua publicação.

2 — O artigo 2.° só produz efeitos após a definição pelo Governo das organizações representativas dos utentes a quem compete o direito de participação.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 28 de Março de 19%. — O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres. — O Ministro das Finanças, António Luciano Pacheco de Sousa Franco., — O Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, João Cardona Gomes Cravinho. — O Ministro da Justiça, José Eduardo Vera Cruz Jardim. — O Ministro da Economia, Augusto Carlos Serra Ventura Mateus. — A Ministra do Ambiente, Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira.

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.fi18/V.l

ACERCA DA REALIZAÇÃO DE UM ESTUDO DO IMPACTE DE ASPECTOS 00 TRATADO DA UNIÃO EUROPEIA

Tendo em conta o processo de revisão do Tratado da União Européia e considerando a gravidade da actua/ crise económica que caracteriza a Comunidade, com as elevadas taxas de desemprego e a aceleração de processos de exclusão social;

Considerando que quer a crise económica quer as suas consequências sociais não se podem isolar de uma estratégia comunitária e nacional;

Considerando que os critérios de Maastricht e o processo de flexibilização e desregulamentação do «mercado de trabalho» e a deslocalização contribuíram para o aumento do desemprego;

Considerando que o Tratado da União Europeia já está em vigor há três anos e que este estabelecia como objectivos e missões:

a) No artigo B («Disposições comuns»): «A promoção de um progresso económico e social equilibrado e sustentável [...] o reforço da coesão económica e social»;

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b) No artigo 2.°: «promover, em toda a Comunidade, o desenvolvimento harmonioso e equilibrado das actividades económicas [...], um elevado nível da qualidade de vida, a coesão económica e social e a solidariedade entre os Estados membros»;

c) No capítulo da política social — artigo 117.° (ant. 118.°-A): «a necessidade de promover a melhoria das condições de vida e de trabalho dos trabalhadores de modo a permitir a sua igualização no progresso»;

d) Relativamente à coesão económica e social (artigo 130.°-A): «desenvolver e prosseguir a sua acção no sentido de reforçar a sua coesão eco-

. nómica e social» e «reduzir a disparidade entre os níveis de desenvolvimento das diversas regiões e o atraso das regiões menos favorecidas, incluindo as zonas rurais»;

a Assembleia da República delibera:

1 — Elaborar um estudo exaustivo para que se avalie em que medida estes tão «nobres» e «generosos» objectivos

e missões têm sido concretizados no nosso país durante os três anos decorridos desde a assinatura do Tratado da União Europeia, nomeadamente em relação ao desemprego, à situação das nossas pescas e agricultura, à situação de importantes sectores e subsectores da indústria, às assimetrias regionais, e se identifique quais os obstáculos que têm dificultado a sua prossecução.

2 — Encarregar a Comissão de Assuntos Europeus da Assembleia da República de coordenar o estudo, recorrendo para tal à contribuição de outras comissões parlamentares, aos serviços, a contactos com a Administração Pública e com a administração comunitária, bem como a outras contribuições especializadas.

3 — Promover, após a conclusão, um debate no Plenário da Assembleia da República com a presença do Governo.

Assembleia da República, 27 de Março de 1996. — Os Deputados do PCP: Luis Sá — Octávio Teixeira — João Amaral.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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da Assembleia da República

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