O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1189

Quarta-feira, 16 de Julho de 1997

II Série-A — Número 62

DIÁRIO

da Assembleia da República

VII LEGISLATURA

2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

SUMÁRIO

Projectos de lei (n.°* 374/VII, 398/VII e 399/VII):

N." 374/VII (Criação do município de Vizela):

Texto de substituição, apresentado pelo CDS-PP....... 1190

N.° 398/VII — Acesso da Assembleia da República a documentos e informações classificados como segredo de

Estado (apresentado pelo PS)........................................... 1190

N.° 399/VII — Divórcio por mútuo consentimento e divórcio litigioso (alteração de requisitos) (apresentado pelo PS)............................................................................. 1)92

Proposta dc lei n.° 78/VII (Estabelece a regulamentação do trabalho dc estrangeiros cm território português):

Relatório e parecer da Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social ................................................... 1194

Proposta de resolução n.° 62/VIl (Aprova, para ratificação, a alteração ao n.° 2 do artigo 43." da Convenção sobre os Direitos da Criança, aprovada pela Resolução n.° 507155, da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 21 de Dezembro de 1995):

Relatório e parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação......................... 1195

Página 1190

1190

II SÉRIE-A — NÚMERO 62

PROJECTO DE LEI N.e 374/VII

(CRIAÇÃQ DO MUNICÍPIO DE VIZELA) Texto de substituição apresentado pelo CDS-PP

Nota justificativa

Considerando que as populações de Vizela, extinto que foi o estatuto da municipalidade de que a região desfrutou em tempos recuados, jamais deixaram de procurar obter de novo esse estatuto;

Considerando que tal aspiração ganhou fortes raízes, que se multiplicaram de geração em geração sempre com o maior fervor, numa demonstração de unidade global que, no presente, é tida no País como o paradigma do autêntico municipalismo;

Considerando que a reivindicação autonómica de Vizela é a mais antiga do País, tendo sido nos últimos tempos manifestada através de movimentações colectivas — aos últimos monarcas, aos dirigentes da 1.° República, aos governantes do regime anterior e, por forma mais expressiva, aos poderes constituídos após a Revolução de Abril;

Considerando que imediatamente depois da entrada em funções da hoje denominada «Assembleia da República» começaram a ser entregues novos pedidos, que, convertidos em projectos de lei por diferentes forças partidárias, levaram a reivindicação de Vizela a cinco debates em Plenário, o que até hoje não aconteceu com qualquer pretensão congénere;

Considerando que no debate em Plenário de 12 de Maio de 1982 a Assembleia da República aprovou uma resolução para que, no prazo de 60 dias, se criasse uma lei quadro para a matéria que, na impossibilidade de tal acontecer, a reivindicação de Vizela voltasse de novo a Plenário para ser definitivamente resolvida, deliberação a que não foi dado cumprimento;

Considerando que se encontra em curso o processo de revisão constitucional, que poderá permitir alargar o âmbito das matérias sujeitas a referendos locais e, consequentemente, permitir uma alteração, em consonância, do actual quadro legal daquelas consultas;

Considerando que o município de Vizela, com nove freguesias propostas, satisfaz todos os requisitos da Lei n.° 142/85 — Lei Quadro dos Municípios;

Assim, os Deputados signatários apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo l.°É criado o município de Vizela, com sede em Vizela, e integrado no distrito de Braga.

Art. 2.° O município de Vizela abrangerá a área das actuais freguesias de São João das Caldas de Vizela, São Miguel das Caldas de Vizela, Santa Maria de Infias, São Salvador de Tagilde e São Paio de Vizela, a destacar do concelho de Guimarães', Santo Adrião de Vizela e Santa Comba de Regilde, a destacar do concelho de Felgueiras e Santa Eulália de Barrosas e Santo Estêvão de Barrosas, a destacar do concelho de Lousada.

Art. 3." Com vista à instalação do município de Vizela, é criada uma comissão instaladora, com sede na vila de

Vizela.

Art. 4." — 1 — O governador civil do distrito de Braga nomeará no prazo de oito dias a comissão instaladora do município de Vizela.

2 — A primeira reunião da comissão instaladora realiza-se no prazo máximo de 15 dias, convocada pelo eleito

mais velho, que assumirá a presidência e escolherá dois secretários.

3 — Os membros da comissão elegerão, por maioria simples, na primeira reunião da referida comissão, o presidente e dois secretários.

4 — A comissão instaladora terá o apoio técnico e financeiro do Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, competindo ao Instituto Geográfico e Cadastral dar à assistência técnica própria da sua competência.

Art. 5.°— 1 —Compete à comissão instaladora elaborar um relatório donde constem, tendo em vista o disposto na lei, os bens, universalidades e quaisquer direitos e obrigações dos municípios de Guimarães, Felgueiras e Lousada que se 'transferem para o município de Vizela e fixar o montante das compensações a que eventualmente haja lugar.

2 — A relação dos bens, universalidades e direitos elaborados nos termos do número anterior será homologada pelos membros do Governo competentes e publicada no Diário da República, 2." série.

3 — A transmissão dos bens, universalidades, direitos e obrigações referidos nos números anteriores efectua-se por força da lei, dependendo o respectivo registo, quando necessário, de simples requerimento.

4 — Compete ainda à comissão instaladora promover as acções necessárias à instalação dos órgãos do novo município e assegurar a gestão corrente da autarquia.

Art. 6." No prazo de 90 dias após a entrada em vigor da presente lei terão lugar nas freguesias identificadas no artigo 2.° consultas directas aos cidadãos eleitores nelas recenseados, em que se questionará a sua concordância ou discordância com a integração da sua freguesia no concelho de Vizela, nos termos da lei.

Art. 7.° A vila de Vizela é elevada à categoria de cidade, nos termos da Lei n.° 11/82, de 2 de Junho.

Art. 8° A presente lei entra em vigor no dia 1 de Janeiro de 1998.

Palácio de São Bento, 10 de Julho de 1997. — Os De-' putados do CDS-PP: Maria José Nogueira Pinto — Manuel Monteiro — Galvão Lucas — Jorge Ferreira — Augusto Boucinha — Ferreira Ramos — Luís Queiró — Pedro Feist.

PROJECTO DE LEI N.9 398/VII

ACESSO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA A DOCUMENTOS E INFORMAÇÕES CLASSIFICADOS COMO SEGREDO DE ESTADO.

A Constituição da República Portuguesa e a lei consagram o direito fundamental de acesso dos cidadãos às informações e documentos da Administração e dós órgãos do Estado.

A transparência como regra e o segredo como excepção são, assim, a expressão de uma vida pública normal, que se estende aos mais diversos níveis da actividade política, económica, social e administrativa.

A natureza excepcional do segredo de Estado moàe^a--se na compreensão de que só podem constituir matérias fechadas ao conhecimento dos cidadãos as informações, objectos ou factos que, a serem divulgados de modo não

Página 1191

16 DE JULHO DE 1997

1191

autorizado, possam acarretar um dano, mais ou menos significativo, à salvaguarda da independência nacional, da unidade e integridade do Estado e da segurança interna e externa.

A Lei n.° 6/94, de 7 de Abril, que aprovou o regime do segredo de Estado, não precisou, porém, no respeito petas competências próprias dos órgãos de soberania, as condições do acesso da Assembleia da República às informações e documentos classificados como segredo de Estado.

Ora, a necessidade de regulação desta matéria é tanto mais. relevante quanto o exercício das competências fiscalizadoras e legislativas da Assembleia da República exige uma informação e acesso documental que não pode submergir a uma lógica fechada de segredo de Estado.

A adequação entre a necessidade institucional de informação do Parlamento e da reserva do segredo de Estado exige que se encontrem regras e procedimentos que combinem, de modo proporcionado, estes relevantes interesses em conflito.

Acresce que a própria lei do segredo de Estado veio a cometer à Assembleia da República a fiscalização do regime do segredo, nos termos da Constituição e do Regimento, e a instituir, junto desta, a Comissão de Fiscalização do Segredo de Estado, como entidade pública independente.

A proposta que agora apresentamos visa dar resposta à necessidade de completamento do edifício legislativo e institucional do regime do segredo de Estado.

E vai ao encontro da ideia de que. se é verdade que o sistema de Governo acolhido na Constituição não impõe que o «órgão parlamentar tenha de ter acesso, de forma ilimitada, às informações e documentos classificados como segredo de Estado pelo Presidente da República ou pelos membros do Governo», até pelo «próprio modo de funcionamento do órgão parlamentar e pela publicidade que é inerente às suas actividades, a qual se compadece dificilmente com as exigências de reserva em matéria de segredo de Estado» (in Acórdão do TC n.° 458/93), tal tem de compatibilizar-se com as competências constitucionais da Assembleia da República.

Assim, é importante reter que se a Constituição admite a oponobilidade pelo executivo ao segredo de Estado, tal não pode fazer-se inviabilizando as competências da Assembleia da República, designadamente as que respeitam ao disposto no artigo 165.°, alínea a) (vigiar pelo cumprimento da Constituição e das leis e apreciar os actos do Governo e da Administração), na alínea ;') do artigo 166.° (acompanhar e apreciar, nos termos da lei, a participação de Portugal no processo de constituição da União Europeia) e no artigo 200.°, n.° \, alínea f). da Constituição, atinentes à responsabilidade do Governo [apresentar, em tempo útil, à Assembleia da República, para efeitos do disposto na alínea _/'), do artigo 166.°, informação referente ao processo de constituição da União Europeia].

Refira-se ainda que cabe à Assembleia da República [artigo 164.°, alínea /'), da Constituição], «aprovar as contenções internacionais que versem matéria da sua competência reservada, os tratados de participação de Portugal em organizações internacionais, os tratados de amizade, de paz, de defesa, de rectificação de fronteiras, os respeitantes a assuntos militares e ainda quaisquer outros que o Governo entenda submeter-lhes» e ainda, designadamente, as deliberações respeitantes ao estado de sítio e de emergência ou, no limite, a autorização ao Presidente da República para declarar a guerra e fazer a paz.

Ora, tais competências, entre outras, implicam necessariamente o acesso ao segredo de Estado como necessidade essencial ao cumprimento das funções de soberania que cabem à Assembleia da República, a qual não se pode dissociar, por sua vez, do acesso individual dos Deputados a matéria reservada e, muito menos, a matéria classificada como segredo pelo próprio Presidente da Assembleia da República.

Assim, nos termos do artigo 170.° da Constituição da República, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Objecto

A presente lei estabelece os termos e condições em que a Assembleia da República tem acesso a documentos e informações classificados como segredo de Estado.

Artigo 2.°

Iniciativa do acesso

1 — A Assembleia da República tem acesso aos documentos e informações classificados como segredo de Estado por iniciativa das comissões parlamentares, das comissões de inquérito ou grupo parlamentar.

2 — O acesso aos documentos e informações abrangidos pelo segredo de Estado é requerido ao Governo através do Presidente da Assembleia da República.

Artigo 3.° Acesso a segredo de Estado

1 — O acesso aos documentos e informações abrangidos pelo segredo de Estado é assegurado:

a) A um Deputado de cada grupo parlamentar especialmente eleito para o efeito;

A) Aos presidentes dos grupos parlamentares ou a um representante de cada grupo parlamentar na comissão que tenha tomado a iniciativa de requerer o acesso, incluindo a comissão de inquérito, se a matéria tiver sido classificada como muito secreta;

c) Exclusivamente ao Presidente da Assembleia da República e presidente da comissão que solicitou o acesso, mediante fundamentação de excepcionalidade por parte da entidade com poderes de classificação definitiva.

2 — O Governo pode diferir, fundamentadamente e pelo tempo estritamente necessário, o acesso ao segredo de Estado em razão do decurso de negociações internacionais ou para a salvaguarda de relevante interesse nacional.

Artigo 4."

Transmissão pelo segredo à comissão parlamentar

Os documentos e informações abrangidos pelo segredo de Estado podem ser transmitidos pelo Governo à comissão parlamentar competente para conhecer e apreciar as matérias respeitantes ao disposto na alínea f) do artigo 166.° e alínea i) do artigo 200.° da Constituição, em reunião sujeita a segredo e exclusivamente participada pelos Deputados da respectiva comissão.

Página 1192

1192

II SÉRIE-A — NÚMERO 62

Artigo 5.°

Acesso a segredo de Estado classificado pelo PAR

Os documentos e informações classificados como segredo de Estado pelo Presidente da Assembleia da República são acessíveis aos Deputados nos termos do disposto no artigo 3.° dá presente lei.

Artigo 6.° Direito à informação dos Deputados

1 —O acesso da Assembleia da República ao segredo de Estado não afecta o direito individual dos .Deputados de acesso à informação nos termos estabelecidos no Regimento da Assembleia da República.

2 — A recusa de informações requeridas por Deputados, nos termos do artigo 159.°, alínea c), da Constituição, só pode efectivar-se com salvaguarda do disposto no artigo 180.°, n.° 2, da Constituição.

Assembleia da República, 15 de Julho de 1997. — Os Deputados do PS: Alberto Martins — Medeiros Ferreira — Francisco Assis — António Braga.

PROJECTO DE LEI N.9 399/VII

DIVÓRCIO POR MÚTUO CONSENTIMENTO E DIVÓRCIO LITIGIOSO (ALTERAÇÃO DE REQUISITOS)

Exposição de motivos

I — O divórcio foi introduzido em Portugal com a república, pelo Decreto de 3 de Dezembro de 1910. Este diploma, que admitia o divórcio por mútuo consentimento e o divórcio litigioso, esteve em vigor até à Concordata de 7 de Maio de 1940, celebrada entre o Estado Português e a Santa Sé. Então foi abolido o divórcio para os casamentos católicos contraídos a partir de 1 de Agosto de 1940 e manteve-se apenas o divórcio civil.

Com a ratificação do Protocolo Adicional à Concordata e o consequente Decreto-Lei n.° 261/75, de 27 de Maio, foi retomada a igualdade de tratamento entre o casamento católico e o casamento civil, sendo admitidos quer o divórcio litigioso quer o divórcio por mútuo consentimento.

Nos termos do artigo 1773.° do Código Civil, o divórcio «pode ser requerido ao tribunal por ambos os cônjuges, de comum acordo, ou por um deles contra o outro, com alguns dos fundamentos previstos nos artigos 1779° e 1781.° No primeiro caso, diz-se divórcio por mútuo consentimento e no segundo divórcio litigioso».

De acordo com a doutrina, o sistema português é um sistema misto, de compromisso entre o divórcio sanção e o «divórcio constatação da ruptura do casamento» ou «divórcio remédio».

No primeiro atende-se à culpa e a causas subjectivas; no segundo constata-se a ruptura conjugal e o reconhecimento de que a vida em comum se tornou insuportável. A ruptura do casamento na base da identificação de causa objectiva é o fundamento do divórcio por mútuo consentimento e das hipóteses litigiosas previstas no artigo 1781." do Código Civil.

Ao relevar no nosso projecto de lei as soluções do

«divorcio constatação da ruptura do casamento» procura

dar-se a qualquer dos cônjuges a possibilidade de requerer o divórcio com fundamento em dada ocorrência factual, sem ter de invocar actos imputáveis ao outro ou qualquer violação culposa.

1.2 — Ora, nos termos da lei vigente, o divórcio por mútuo consentimento só pode ser requerido pelos cônjuges ao fim de três anos, solução ainda mais exigente do que a protagonizada pela lei da república de 1910, a qual admitia o divórcio por mútuo consentimento aos casados há mais de dois anos, com idade superior a 25 anos.

A solução admitida na lei vigente, pela sua amplitude, estimula os cônjuges que não queiram aguardar o decurso deste prazo a recorrer à via litigiosa e constitui, só por si, uma penalização de uma situação cuja aferição não exige que os cônjuges tenham de invocar uma causa. Mas «a simulação de uma cauSa» ainda hoje se verifica quando os cônjuges não querem aguardar o prazo de três anos para requererem o divórcio por mútuo consentimento.

E, como o divórcio litigioso é invocável a todo o tempo com base na violação dos deveres conjugais, não é insólito que «a prova dessa violação seja feita», ficticiamente, por pura combinação entre os interessados, à margem do prestígio e credibilidade dos tribunais.

A solução que agora admitimos para o divórcio por mútuo consentimento —o seu requerimento a todo o tempo por ambos os cônjuges —, na esteira de idêntica solução no Código Civil francês,, supera a lógica do divórcio sanção ou o apelo a ficções probatórias assentes na simulação. Acresce que os seis meses que propomos, e que medeiam entre as duas conferências judiciais, dá à opção comum, e livremente aceite, o necessário período de reflexão.

1.3 — As causas do divórcio litigioso, requerido nos tribunais por um dos cônjuges contra o outro, têm como fundamento a violação culposa, subjectiva, dos deveres conjugais ou a ruptura da vida em comum (artigos 1779.° e 1781.°, respectivamente).

O artigo 1781.°, que intentamos alterar, reporta-se às causas objectivas do divórcio litigioso e da ruptura da «convivência» matrimonial. Na lei em vigor são fundamentos deste divórcio:

a) A separação de facto por seis anos consecutivos;

b) A ausência, sem que do ausente haja notícias, por tempo não inferior a quatro anos;

c) A alteração das faculdades mentais do outro cônjuge, quando esse facto, há mais de seis anos e pela sua gravidade, compromete a possibilidade da vida em comum.

A proposta que apresentamos, ao reduzir, desde logo, o prazo do divórcio litigioso por causa objectiva, vem ao encontro da ideia, referida no preâmbulo do Decreto-Lei n.° 561/76, de 17 de Julho, de «pôr termo à situação em que o vínculo conjugal, independentemente do comportamento ilícito ou moralmente reprovável de um ou ambos os cônjuges, se encontra irremediavelmente comprometido na sua subsistência».

Assim, fixa-se um período mínimo de ires anos na separação de facto e de dois anos na ausência sem motivo como períodos mínimos que evitem uma solução unilateral e irreflectida de divórcio.

Aceita-se ainda que a separação de facto por um ano possa constituir tempo bastante à declaração do divórcio,

Página 1193

16 DE JULHO DE 1997

1193

desde que se obtenha o consentimento do outro cônjuge contra o qual, inicialmente, se intentou a acção.

As soluções concretas que agora se admitem, na lógica de um divórcio remédio, têm paralelismo nas soluções pertinentes do direito alemão respeitantes ao casamento e ao divórcio.

Afasta-se, por sua vez, a iniciativa litigiosa específica no caso da alteração das faculdades mentais do outro cônjuge em tempo equivalente ao vigente para a separação de facto, deixando que as outras soluções do divórcio constituam possível opção de dissolução.

Elimina-se também a possibilidade de indeferimento pelo juiz do pedido formulado com base na alínea c) do artigo 1781.°, «quando seja de presumir que o divórcio agrave consideravelmente o estado mental do réu», o que corresponde ao afastamento de uma «cláusula de dureza», com carácter penalizador e aleatório que ultrapassa as exigências razoáveis de solidariedade e segurança.

2 — O projecto de lei que se apresenta procura reformular soluções jurídicas emergentes da Revolução de Abril de 1974, acompanhando o sentido das mutações sociais no que respeita às práticas e concepções sobre a vida familiar e sobre as margens de autonomia individual.

A análise sociológica é pacífica na revelação dos valores da contemporaneidade, identificados na generalidade dos inquéritos elaborados nos últimos 20 anos nas sociedades ocidentais. «Essa mudança de valores, que se faz sentir também nos diversos domínios da vida social, traduz-se na valorização do bem-estar individual e na ideia de que é a partir desse bem-estar, bu, pelo menos, sem o ilidir, que é possível construir os cenários da felicidade colectiva conjugal e familiar»

Ao aludir à subida da ruptura conjugal, Anália Torres (Divórcio em Portugal, Celta Editora, 1996, pp. 7 e segs.) afirma que «o divórcio torna-se mais frequente porque se transformou a forma de encarar o casamento. De instituição a preservar a qualquer custo, o casamento tornou-se, tendencialmente, numa relação que dura enquanto se mantiver compensadora para quem nela está .envolvido. De obediência a regras e padronizações impostas do exterior, passou-se para a ideia:da qualidade intrínseca da relação. Por outras palavras, as pessoas divorciam-se mais do que no passado porque casam de 'outra maneira', com outros valores, valores que enfatizam mais os laços interpessoais do que a dimensão institucional do casamento. E é exactamente porque se tende a valorizar dessa forma a relação conjugal que se aceita mais o divórcio. Assim, atribuir muita importância ao casamento, entendido como relação satisfatória, e tolerar a ruptura conjugal constituem as duas faces da mesma moeda e corresponde aos valores contemporâneos sobre o casamento. Rejeitados, neste movimento, são os valores tradicionais. Não, com certeza, a ideia de conjugalidade e muito menos a de família».

O aumento do divórcio desencadeou-se de forma mais vincada, quer na Europa quer nos Estados Unidos da América, a partir dos anos 60, em ritmos diferenciados segundo os países. A evolução do indicador conjuntural do divórcio, isto é, da relação entre casamentos e divórcios no mesmo ano, indica-nos que na «Dinamarca passou-se de 25 divórcios por 100, em 1970, para 45 por 100, em 1985. Em França, e para os mesmos anos, a subida deu-se dos 15 para os 30 divórcios por 100 casamentos. Èm Portugal passou-se dos 2 divórcios por 100,

em 1970, para os 10, em 1986, e só em 1994 esse número atingiu os 21 divórcios por 100 casamentos. Assim, em 1994, por cada 5 casamentos havia um divórcio» (ob. cit., pp. 23 e 210).

Em 1995 realizaram-se, em Portugal, 65 776 casamentos e foram declaradas 59 140 dissoluções de casamento (das quais 79,2 % se devem à morte dos cônjuges) e foram decretados 12 322 divórcios. Desses divórcios, 78,1 % tiveram por base comum o acordo dos cônjuges, 21,6% resultaram de processos litigiosos e 0,3 % da conversão de separação judicial de pessoas e bens {Estatísticas Demográficas, 1995, INE).

Ora, estes dados terão de compreender-se num quadro nacional cujos números evolutivos, referentes aos Censos de 1981 e 1991, respectivamente, apontam para uma população residente de 9 833 014 e 9 862 540. Desses, em 1981, havia, segundo o estado civil, casados legalmente 4 848 525. 4 341 301 solteiros, 557 552 viúvos, 47 318 separados e 43 318 divorciados. Por sua vez, em 1991, e da referida população total residente de 9 862 540, temos 4 815 574 casados, 4 000 309 solteiros, 194 086 vivendo em «união de facto», 635 504 viúvos, 119 278 separados e 97 789 divorciados {Recenseamento Geral da População, INE).

Seguindo as linhas de força detectáveis na incidência do divórcio, podemos por isso concluir que as profundas transformações da sociedade portuguesa se interligam com as estruturas familiares e os valores sociais e que a liberalização do divórcio corresponde a um naturável acréscimo de exigência na valoração da conjugalidade e da família. A percepção da escolha do cônjuge por critérios afectivos acresce a valorização da relação conjugal na base da partilha, da autonomia e da realização pessoal.

E este o quadro das propostas que apresentamos à apreciação da Assembleia da República.

Deste modo, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Os artigos. 1775.°, n.° 1, 1776.°, n.° 1, e 1781.°, alíneas a), b) e c), do Código Civil passam a ter a seguinte redacção:

Artigo 1775."

Requisitos

1 — O divórcio por mútuo consentimento pode ser requerido pelos cônjuges a todo o tempo.

' 2 —.........................................................................

3 —.........................................................................

Artigo 1776.° Primeira conferência

1 — Recebido o requerimento, o juiz convocará os cônjuges para uma conferência, em que tentará conciliá-los; se a conciliação não for possível, adverti-los-á de que deverão renovar o pedido de divórcio após um período de reflexão de seis meses a contar da data da conferência e dentro de um ano subsequente à mesma data, sob pena de a pedido ficar sem efeito.

2 —......................:..................................................

3 —.........................................................................

Página 1194

1194

II SÉRIE-A — NÚMERO 62

Artigo 1781.° Ruptura da vida em comum

São ainda fundamento do divórcio litigioso:

a) A separação de facto por três anos consecutivos;

b) A separação de facto por um ano se o divórcio for requerido por um dos cônjuges sem oposição do outro;

c) A ausência, sem que do ausente haja notícias, por tempo não inferior a dois anos.

Art. 2.° É eliminado o artigo 1784.° do Código Civil. Art. 3.° O artigo 1423." do Código de Processo Civil passa a ter a seguinte redacção:

Artigo 1423.° Nova conferência. Separação ou divórcio definitivo

1 — Decorridos seis' meses após a conferência a que se refere o artigo 1420.°, n.° 1, e dentro do ano subsequente à data da mesma, deverão os requerentes renovar o pedido de divórcio ou separação, sendo em face desse pedido designado dia para a conferência a que se refere o artigo 1777.° do Código Civil.

2 —.........................................................................

3 —.........................................................................

4 —.........................................................................

Assembleia da República, 26 de Junho de 1997. — Os Deputados do PS: Alberto Martins — Strecht Monteiro — Manuel Alegre — Elisa Damião — Helena Roseta — Eurico Figueiredo — Medeiros Ferreira — Maria do Rosário Carneiro — Maria Celeste Correia — Rui Namorado — Sérgio Sousa Punto — António Braga (mais quatro assinaturas ilegíveis).

PROPOSTA DE LEI N.9 78/VII

(ESTABELECE A REGULAMENTAÇÃO DO TRABALHO DE ESTRANGEIROS EM TERRITÓRIO PORTUGUÊS)

Relatório e parecer da Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social

Relatório 1 — Análise na generalidade

O trabalho de estrangeiros encontra-se regulado pelo Decreto-Lei n.° 97/77, de 17 de Março, assim como pela secção vi do capítulo n do Decreto-Lei n.° 491/85, de 26 de Novembro, que regula o sistema de contra-ordenações laborais.

A proposta de lei supracitada pretende adaptar o actual regime legal em função dos processos de regularização extraordinária da situação dos imigrantes clandestinos, nomeadamente o decorrente da Lei n.° 17/96, de 24 de Maio. Para além da prestação de trabalho subordinado em

território português por parte de cidadãos estrangeiros, alarga-se o seu âmbito à prestação de trabalho por cidadãos do espaço económico europeu e dos países com os quais existam acordos que consagrem a igualdade de tratamento com os cidadãos nacionais (artigo 1.°), bem como com os apátridas (artigo 12.°).

A presente proposta de lei visa ainda promover a eliminação do recurso a mão-de-obra estrangeira em situação ilegal e termina com a disposição em vigor que previa a obrigatoriedade de as empresas disporem de, pelo merios, 90 % de trabalhadores portugueses, o que levantava questões relativas à sua eventual inconstitucionalidade.

2 — Análise na especialidade

A proposta de lei n.° 78/VII estabelece o objecto da lei, fixando o âmbito da sua aplicação (artigo 1.°) e os procedimentos a observar nâ fundamentação dos contratos de trabalho, nomeadamente as formalidades de registo (artigos 3.° e 4.°).

A proposta estabelece ainda os comportamentos a que as empresas se encontram obrigadas no que respeita à comunicação da existência de trabalhadores estrangeiros nas empresas (artigos 6.° e 7.°) e ao cancelamento do registo dos contratos (artigo 5.°), alargando assim os procedimentos administrativos relativamente ao regime em vigor.

Inclui-se um novo regime de contra-ordenações laborais, na sequência da adaptação dos dois diplomas ainda em vigor e referidos no ponto anterior do presente relatório.

O artigo 8.° estabelece, assim, o novo valor das coimas em caso de violação ou não cumprimento das disposições legais.

Estabelecem-se ainda a aplicabilidade de sanções acessórias de privação (artigo 8.°, n.° 2), que podem assumir a forma de privação do direito de participação em arrematações ou concursos públicos e do direito a subsídio ou benefício outorgado por entidades públicas.

A fiscalização do cumprimento do diploma e aplicação das coimas compete ao IDICT (artigo 9.°).

Finalmente, são revogadas as normas legais já citadas que regulam o trabalho de estrangeiros em Portugal.

A proposta de lei foi submetida a discussão pública de 23 de Abril a 22 de Maio de 1997, tendo respondido uma entidade que, na generalidade, concorda com a proposta de lei em apreciação.

Parecer

A Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social é do seguinte parecer:

a) A proposta de lei n.° 78/VII preenche os requisitos constitucionais e legais para subir ao Plenário da Assembleia da República para apreciação e votação;

b) Os grupos parlamentares reservam as suas posições para o Plenário.

Palácio de São Bento, 20 de Junho de 1997. — O Deputado Relator, António Rodrigues.

Nota. — O relatório e parecer foram aprovados.

Página 1195

16 DE JULHO DE 1997

1195

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO N.9 62/VII

(APROVA, PARA RATIFICAÇÃO, A ALTERAÇÃO AO N.« 2 DO ARTIGO 43.» DA CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DA CRIANÇA, APROVADA PELA RESOLUÇÃO N.» 50/155,

. DA ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS, DE 21 DE DEZEMBRO DE 1995.)

Relatório e parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação.

Relatório

O Governo apresentou à Assembleia da República a presente proposta de resolução, que visa a ratificação da alteração a um artigo da Convenção sobre os Direitos da Criança.

A Convenção sobre os Direitos da Criança foi adoptada pela Resolução n.° 44/25, da Assembleia Geral das Nações Unidas, em 20 de Novembro de 1989, tendo entrado em vigor no dia 2 de Setembro de 1990 e a ela tendo aderido, nessa data, 61 Estados.

Pelo Decreto do Presidente da República n.° 49/90 e pela Resolução da Assembleia da República n.° 20/90, a assinatura desta Convenção, em 26 de Janeiro de 1990, foi ratificada por Portugal.

A Convenção sobre os Direitos da Criança tem sido considerada como a mais completa declaração dos direitos das crianças, consagrando o reconhecimento internacional de que as crianças — homens e mulheres do futuro — merecem ser objecto de especial atenção e tratamento e a elas devem ser estendidos todos os direitos civis, políticos, sociais, culturais e económicos que aos adultos são garantidos.

A Carta Social Europeia de 1961, adoptada pelo Conselho da Europa, foi ratificada por Portugal em 1991, através do Decreto do Presidente da República n.° 38/91, de 6 de Agosto, que, posteriormente, procedeu à assinatura da Carta Social Europeia (revista) em 3 de Maio de 1996, conforme Aviso do Ministério dos Negócios Estrangeiros n.° 230/96, de 11 de Julho, e que obrigou os Estados partes a prosseguir, entre outros compromissos, o de assegurar que «as crianças e adolescentes têm direito a uma protecção especial contra os perigos físicos e morais a que se encontrem expostos».

A alteração que o Governo se propõe ratificar respeita ao n.° 2 do artigo 43.° da Convenção, relativa à constituição e composição do Comité dos Direitos da Criança, que era inicialmente composto de 10 peritos, eleitos por voto secreto de entre uma lista de personalidades indicadas pelos

Estados membros de entre os seus nacionais, e que se pretende que passe a ser composto por 18 peritos.

Esta alteração assenta numa posição e decisão tomada pelos Estados partes na Convenção aquando da realização da Conferência' que teve lugar em 12 de Dezembro de 1995 e que foi posteriormente objecto da Resolução n.° 50/155.

E visa conferir maior celeridade e eficácia aos trabalhos do Comité dos Direitos da Criança no processo de análise e discussão dos relatórios apresentados periodicamente pelos Estados partes sobre a implementação da Convenção. *

A alteração entrará em vigor logo após ter sido aceite por uma maioria de dois terços dos Estados partes, conforme estipulado no artigo 50.° da referida Convenção.

Portugal, enquanto membro do Conselho da Europa e Estado signatário da Convenção sobre os Direitos da Criança, tem responsabilidades acrescidas quanto à salvaguarda dos respectivos direitos e à protecção adequada das crianças, fazendo respeitar os princípios consignados na Convenção, assim se garantindo, eficaz e cabalmente, uma protecção especial ao reconhecimento dos direitos de todas as crianças, sem excepção e sem discriminações.

Parecer

A Comissão Parlamentar de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação entende que a proposta de resolução n." 62/Vn preenche os requisitos constitucionais e regimentais aplicáveis, pelo que se encontra em condições de subir a Plenário e ser apreciada na generalidade, reservando os grupos parlamentares as suas posições para o debate.

Assembleia da República, 6 de Julho de 1997. — A Deputada Relatora, Rosa Atbernaz.

Nota. — O relatório e o parecer foram aprovados por unanimidade.

, A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

Página 1196

1196

II SÉRIE-A — NÚMERO 62

DIÁRIO

da Assembleia da República

Depósito legal 8819/85

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA, E. P.

1 —Preço de página para venda avulso. 9$S0 (IVA incluído).

2 —Para os novos assinantes do Diário da Assembleia da República, o período da assinatura será compreendido de Janeiro a Dezembro de cada ano. Os números publicados em Outubro. Novembro e Dezembro do ano anterior que completam a legislatura serào adquiridos ao preço de capa.

PREÇO DESTE NÚMERO 76$00 (IVA INCLUÍDO 5%)

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×