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Sexta-feira, 8 de Janeiro de 1999
II Série-A — Número 27
DIÁRIO
da Assembleia da República
VII LEGISLATURA
4.ªSESSÃO LEGISLATIVA (1998-1999)
SUMÁRIO
Projectos de lei (n.º 574/VII, 575/VII c 596/VII a 60(VII):
N.° 574/VII (Financiamento da actividade dos partidos políticos e das componhas eleitorais):
Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias................
N.° 575/VII (Alteração do regime de financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais):
V. Projecto de lei n.° 574/VII.
N.° 596/V1I —Cria um cadastro obrigatório de acidentes de automóveis e motociclos, visando aumentar a segurança rodoviária e a defesa do consumidor (apresentado pelo PS)... N.° 597/Vil —Elevação à categoria de vila da povoação da Luz, no município de Tavira (apresentado pelo Deputado Jorge Valente, do PS)..............................................
N° 598/VII —Garante aos pais e encarregados de educação melhores condições de participação na vida escolar e de acompanhamento dos seus educandos (apresentado pelo PCP) N.° 599/VII — Actualiza o regime de regalias e isenções fiscais das pessoas colectivos de utilidade pública (apresentado pelo PCP)............................................................
N 0 600/Vll — Aceleração de processo judicial atrasado (apresentado pelo PSD)....................................................
Propostas de lei (n.º5 209/VU, 223/VII e 224/VII):
N.°209/VII (Financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais)
V. Projecto de lei n.º 574/VII.
N.° 223/VII — Altera a Lei n.° 10/97. de 12 de Maio. que
reforça os direitos das associações de mulheres............ 745
N.° 224/VII — Autorização ao Govemo para dotar os engenheiros técnicos portugueses de uma associação profissional de natureza pública.......................................... 746
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Propostas de resolução (n.º118/VII e 128/VII a 130/VII):
N.° 118/V1I (Aprova, para ratificação, o Tratado de Amsterdão, que altera o Tratado da União Europeia, os tratados que instituem as Comunidades Europeias e alguns actos relativos a esses tratados, incluindo os anexos, os protocolos, bem como a Acta Final com as declarações, assinado em Amsterdão em 2 de Outubro de 1997):
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Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Europeus, incluindo anexos relativos a relatórios e pareceres das
740 Comissões de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, de Economia e de Defesa Nacional 747
741 N.° 128/VII — Aprova o Tratado de Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal entre a República Portuguesa e os Estados Unidos Mexicanos, assinado em Lisboa aos
742 20 de Outubro de 1998 (a).
N.° 129/VI1— Aprova o Tratado de Extradição entre a 744 República Portuguesa e os Estados Unidos Mexicanos,
assinado em Lisboa aos 20 de Outubro de 1998 (a). N.° 130/VII — Aprova a decisão do Conselho de Governadores do Banco Europeu de Investimento de 5 de Junho de 1998. no que se refere ao aumento do capital do Banco (a).
(a) São publicadas em suplemento a este número.
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PROJECTO DE LEI N.º 574/VII
FINANCIAMENTO DA ACTIVIDADE DOS PARTIDOS POLÍTICOS E DAS CAMPANHAS ELEITORAIS
PROJECTO DE LEI N.º 575/VII
ALTERAÇÃO DO REGIME DE FINANCIAMENTO DOS PARTIDOS POLÍTICOS E DAS CAMPANHAS ELEITORAIS
PROJECTO DE LEI N.º 209/VII
FINANCIAMENTO DOS PARTIDOS POLÍTICOS E DAS CAMPANHAS ELEITORAIS
Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
Relatório I — Introdução
Com a apresentação das iniciativas legislativas identificadas em epígrafe, abriu-se pela segunda vez na presente legislatura um processo legislativo destinado a rever o regime legal do financiamento dos partidos políticos.e das campanhas eleitorais, depois de, na passada sessão legislativa, ter sido aprovada a Lei n.° 56/98, de 18 de Agosto, que definiu o regime que presentemente vigora sobre esta matéria.
Precedendo a apreciação na generalidade dos projectos de lei então apresentados —projectos de lei n.ºs 313/VII, 314/ VII, 315/VII, 316/VII, 317/VII, 318/Vn e 319/VII (todos do PSD), 322/Vn (PS), 390/VII (PCP) e 410/VII (CDS/PP) — pelo Plenário da Assembleia da República, aprovou esta Comissão Parlamentar, em 25 de Setembro de 1997, relatório e parecer onde se afirma, a título de introdução:
A matéria do financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais, constante de todas as iniciativas legislativas que são objecto do presente relatório, é de grande importância democrática. Num Estado de direito democrático, baseado na soberania popular e organização política democráticas, e em que os cidadãos, através dos partidos políticos, concorrem para a formação da vontade popular e a organização do poder político, o controlo do financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais assume um importante papel garantístico da genuinidade democrática da designação dos titulares dos órgãos electivos e do próprio exercício do poder político.
Da igualdade de oportunidades e de tratamento das candidaturas aos órgãos de soberania, das Regiões Autónomas e do poder local depende, em larga medida, a liberdade real de escolha dos eleitores na designação dos respectivos titulares. Num país em que, ainda que nominalmente assegurados esses princípios, existam condições para que, por via do financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais, os detentores do poder económico possam influenciar o sistema partidário e condicionar a formação da vontade dos eleitores, está seriamente posta em causa a base democrática do poder político.
Acresce que as tendências que. se têm verificado nos últimos anos, de crescente espectacularização da vida política, de redução do debate político a uma mera competição entre mensagens publicitárias e de aumento
galopante de despesismo eleitoral, tornam a competição eleitoral muito mais vulnerável aos efeitos ditados pela eventual desigualdade de «armas» entre os diversos partidos no plano financeiro.
Foi, no entanto, a eclosão de escândalos públicos em diversos países, relacionados com o financiamento ilícito dos partidos e com situações de promiscuidade entre titulares do poder político e detentores do poder económico, que trouxe à ribalta do debate público nos últimos anos a questão do financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais. Foi assim que questões como a adequação do financiamento público dos partidos políticos, o controlo e a introdução de limitações ao seu financiamento privado, sobretudo da parte de pessoas colectivas, a introdução de mecanismos de controlo público da origem das receitas partidárias ou a fixação de limites de despesas admissíveis em campanhas eleitorais passaram a ser objecto frequente de debates públicos e a motivar iniciativas legislativas em diversos países.
O mesmo aconteceu em Portugal. Na VI Legislatura, na qual foram apresentadas 10 iniciativas legislativas directamente relacionadas com o financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais — projectos de lei n.1* 57/VI (PS), 318/ VI (PCP), 319/VI (PCP), 321/VI (PCP), 322/VI (CDS), 329/ VI (PSD), 332/VI (PCP), 545/VI (PCP) e 567/VI (PS)—, tendo sido aprovadas duas leis da Assembleia da República sobre a matéria — Lei n.° 72/93, de 30 de Novembro, aprovada com os" votos favoráveis do PSD e os votos contra de todos os partidos da oposição, e Lei n.° 27/95, de 18 de Agosto, aprovada com os votos favoráveis do PSD e do CDS e com os votos contrários do PS, PCP e PEV. E já na VII Legislatura, na qual foram apresentadas 10 iniciativas l&gvv lativas, que deram origem à Lei n.° 56/98, de 18 de Agosto.
II — Evolução legislativa
1 — Lei dos partidos políticos. — Após a Revolução de Abril de. 1974, o financiamento dos partidos políticos foi regulado pela primeira vez no Decreto-Lei n.° 595/74, de 7 de Novembro (lei dos partidos políticos). Aí se estabeleceu um conjunto de isenções fiscais (imposto do seio, Imposto sobre as sucessões e doações, sisa pela aquisição dos edifícios necessários à instalação da sede, delegações e serviços e pelas transmissões resultantes de fusão ou cisão, contribuição predial pelos rendimentos colectáveis de prédios ou parte de prédios urbanos da sua propriedade onde se encontrem instalados a sede central e delegações regionais, distritais ou concelhias e respectivos serviços), bem como a isenção de preparos e custas judiciais (artigo 9.°), sendo tais benefícios suspensos se o partido se abstivesse de concorra às eleições gerais ou se os candidatos por ele apoiados não obtivessem 100000 votos, pelo menos (artigo 22.°, n.° 1).
O artigo 20° da lei dos partidos políticos estabelecia o respectivo regime financeiro, contemplando:
a) A obrigatoriedade de discriminação em relatórios anuais das receitas e da sua proveniência e das despesas e sua aplicação;
b) A proibição de financiamento por parte de organismos autónomos do Estado, associações de direito público, institutos e empresas públicas, autarquias locais e pessoas colectivas de utilidade pública administrativa;
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c) A proibição de receber contribuições de valor pecuniário de pessoas singulares ou colectivas não nacionais, bem como de empresas nacionais;
d) A obrigatoriedade de publicação das contas no Diário da República, acompanhadas do parecer do órgão estatutário competente para a sua revisão e ainda do parecer de três revisores oficiais de contas, dois dos quais escolhidos anualmente por sorteio público realizado na Câmara dos Revisores Oficiais de Contas e o terceiro designado pelo partido.
2 — A Lei Orgânica da Assembleia da República (Lei n.° 77/88, de 1 de Julho) veio estabelecer critérios para a atribuição de subvenções públicas aos partidos e aos respectivos grupos parlamentares. Assim, a cada partido que houvesse concorrido ao acto eleitoral, ainda que em coligação, e que obtivesse representação parlamentar seria concedida urna subvenção anual para a realização dos seus fins próprios, desde que requerida ao Presidente da Assembleia da República (artigo 63.°, n.° 1). Tal subvenção consistia numa quantia em dinheiro equivalente a '/225 do salário mínimo nacional por cada voto obtido na mais recente eleição de Deputados à Assembleia da República (n.° 2). No caso de coligação eleitoral, a subvenção atribuída a cada um dos partidos nela integrados era igual à subvenção que, nos termos do n.° 2, correspondia à coligação eleitoral, distribuída percentualmente em função do número de Deputados eleitos por cada partido (n.° 3).
Para além disso, a Lei Orgânica da Assembleia da República previu a atribuição anual, a cada grupo parlamentar, de uma subvenção para encargos de assessoria aos Deputados, não inferior a quatro vezes o salário mínimo nacional anual, mais metade do valor do mesmo por Deputado, a ser paga mensalmente — redacção dada ao n.°4 do artigo 63.° da Lei n.° 77/88, de 1 de Julho, pelo artigo 11.° da Lei n.° 59/ 9"i, de. \1 de Agosto. Tais subvenções eram pagas em duodécimos, por conta de dotações especiais inscritas no orçamento da Assembleia da República (n.° 6).
A Assembleia da República suporta ainda, nos termos da respectiva lei orgânica (artigo 62°), as despesas de pessoal dos gabinetes dos grupos parlamentares, dos Deputados que sejam únicos representantes de um partido e dos Deputados que não integrem nenhum grupo parlamentar.
3 — O regime financeiro das campanhas .eleitorais foi sendo estabelecido nas respectivas leis eleitorais. Assim, à dafa da entrada em vigor da actual lei do financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais (Lei n.° 72/93, cie 30 de Novembro), as finanças eleitorais eram reguladas, para a Assembleia da República, pela Lei n.° 14/79, de 16 de Maio, artigos 75." a 78.°, para o Presidente da República, pelo Decreto-Lei n.° 319-A/76, de 3 de Maio, artigos 66.° a 69.°, para a Assembleia Legislativa Regional dos Açores, pelo Decreto-Lei n.° 267/80, de 8 de Agosto, artigos 75.° a 78.°, para a Assembleia Legislativa Regional da Madeira, pelo Decreto-Lei n.° 318-E/76, de 30 de Abril, artigos 69° a 72.°, para as autarquias locais, pelo Decreto-Lei» n.° 701-B/76, de 29 de Setembro, artigos 62.° a 65.° e para referendo, pela Lei n.° 45/91, de 3 de Agosto, artigos 62." a 66.° Nada se previa em matéria de finanças eleitorais na Lei Eleitoral para o Parlamento Europeu (Lei n.° 14/87, de 29 de Abril).
A regulação do financiamento das campanhas eleitorais assentava em alguns princípios comuns, a saber:
a) A inexistência de subvenções públicas às campanhas eleitorais. Todas as despesas de candidatura
e campanha eleitoral para a Assembleia da República, para as assembleias legislativas regionais e para as autarquias locais eram «suportadas pelos
respectivos partidos», ou pelos grupos de cidadãos eleitores, no caso de candidaturas dessa natureza às assembleias de freguesia. Todas as despesas de candidatura e campanha eleitoral para o Presidente da República eram suportadas pelos «respectivos candidatos, desde que por elas autorizadas, ou pelos seus mandatários ou representantes». A campanha para referendo poderia ser financiada por contribuições dos partidos políticos intervenientes, por contribuições de eleitores e pelo produto de actividades de campanha. Porém, as despesas de campanha eram da responsabilidade do partido que as tivesse originado ou que por elas assumisse a responsabilidade;
b) A atribuição de apoios em espécie por parte do Estado às campanhas eleitorais: tempos de antena gratuitos na rádio e televisão (com excepção das eleições para as autarquias locais) ou a utilização gratuita de edifícios ou recintos públicos para actividades de campanha;
c) A obrigatoriedade de contabilização de todas as receitas e despesas efectuadas com a apresentação de candidaturas e com a campanha eleitoral;
d) A proibição de aceitar quaisquer contribuições de valor pecuniário provenientes de empresas nacionais ou de pessoas singulares ou colectivas não nacionais. No caso das eleições para o Presidente da República ou para as autarquias locais, os candidatos ou mandatários só podem receber contribuições da parte de subscritores da candidatura ou
de partidos políticos que a apoiem; é) A fixação de limites de despesas globais, nos seguintes termos:
Para a Assembleia da República, 15 vezes o salário mínimo mensal por cada candidato (artigo 77.° da Lei n.° 14/79, de 16 de Maio);
Para Presidente da República, 25 mil contos, actualizável de acordo com a taxa de inflação anual medida pelo índice de preços ao consumidor apurado pelo INE, sendo acrescido de metade em caso de segundo sufrágio (artigo 68.° do Decreto-Lei n.° 319-A/76, de 3 de Maio);
Para a Assembleia Legislativa Regional da Madeira, 40 000$ por candidato, salvo as despesas de correio, em montante a fixar pelos delegados da Comissão Nacional de Eleições (artigo 71.° do Decreto-Lei n.° 318--E/76, de 30 de Abril);
Para a Assembleia Legislativa Regional dos Açores, 15 vezes o salário mínimo nacional por cada candidato (artigo 77.° do Decreto-Lei n.° 267/80, de 8 de Agosto);
Para as autarquias locais, 500$ por cada candidato (artigo 64.° do Decreto-Lei n.° 701-B/ 76, de 29 de .Setembro);
f) A obrigatoriedade de prestação de contas discriminadas à Comissão Nacional de Eleições em determinado prazo contado a partir da proclamação oficial dos resultados: 60 dias para a Assembleia da República e para a Assembleia Legislativa Regio-
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nal dos Açores, 30 dias para o Presidente da República, para a Assembleia Legislativa Regional da Madeira e para as autarquias locais (contados, nestes dois últimos casos, a partir do acto eleitoral) e 90 dias no caso dos referendos;
g) A obrigatoriedade de publicação das contas da campanha num dos jornais diários mais lidos no País, na região ou na autarquia, conforme os casos, ou em dois jornais (no caso dos referendos), ou em três (nas presidenciais);
h) A apreciação das contas pela Comissão Nacional de Eleições em prazos idênticos aos exigidos para a apresentação (à excepção das eleições autárquicas, em que o prazo de apreciação foi fixado em 60 dias) e respectiva publicitação num dos jornais mais lidos no País, na região ou na autarquia, ou no Diário da República, no caso dos referendos;
i) A possibilidade de suprimento de irregularidades verificadas no prazo de 15 dias;
j) A criminalização das infracções ao regime das finanças eleitorais —Decreto-Lei n.° 319-A/76, de 3 de Maio, artigos 131.° a 133.°, Lei n.° 14/79, de 16 de Maio, artigos 143.° a 145.°, Decreto-Lei n.° 267/80, de 8 de Agosto, artigos 143.° a 145.°, Decreto-Lei n.° 318-E/76, de 30 de Abril, artigos 127.° a 129.°, Decreto-Lei n.° 701-B/76, de 29 de Setembro, artigos 118.° a 121.°—, com excepção do regime do referendo, em que tais infracções foram qualificadas como contra-ordenações — Lei n.° 45/91, de 3 de Agosto, artigos 228.° a 230.°;
k) A obrigatoriedade de a Comissão Nacional de Eleições participar as irregularidades detectadas às entidades competentes para o exercício da acção penal, ou ao Tribunal de Contas, no caso dos referendos.
O Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 215/89, de 1 de Julho, determinou no seu artigo 49.° a não sujeição dos partidos políticos a ERS — redacção resultante da rectificação publicada no Diário da República, 1.º série, 2.° suplemento, de 31 de Outubro de 1989.
4 — A lei de financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais (Lei n.° 72/93, de 30 de Novembro), aprovada na VI Legislatura, veio regular pela primeira vez de uma forma integrada toda a matéria referente ao financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais (à excepção das campanhas para referendo). A Lei n.° 72/93 resultou da aprovação de um texto filial resultante da apreciação dos projectos de lei n.os 57/VI (PS), financiamento da actividade dos partidos políticos, 318/VI (PCP), regime de fiscalização das contas dos partidos políticos, 319/VI (PCP), altera o limite de despesas com as campanhas eleitorais para as autarquias locais, 321/VI (PCP), limite das despesas confidenciais das empresas, tendo em vista a transparência da vida política nacional, 322/VI (CDS), estatuto da função política, 329/VI (PSD), financiamento dos partidos políticos, e 332/ VI (PCP), financiamento da actividade dos partidos políticos e das campanhas eleitorais. Em votação final global, esta lei foi aprovada com os votos favoráveis do PSD e os votos contra dos restantes grupos parlamentares.
Já no final da VI Legislatura, no âmbito de um processo legislativo que ficou conhecido pelo nome de «transferência nas instituições e nos cargos políticos», foram apreciados sobre esta matéria os projectos de lei n.os 545/VI (PCP), que proíbe o financiamento de partidos políticos e de campanhas eleitorais por empresas e reduz o limite máximo admissível
das despesas realizadas em campanhas eleitorais, e 567/VI (PS), apreciação das contas dos partidos políticos pelo Tribunal de Contas e deduções fiscais. Em consequência desse processo, foi aprovada, com os votos favoráveis do PSD e do CDS e com os votos contra do PS, PCP e PEV, a Lei n.° 27/95, que introduziu algumas alterações no regime de fiscalização das contas dos partidos políticos, determinando a publicação dos donativos concedidos por pessoas colectivas e do património imobiliário em anexo à contabilidade dos partidos e possibilitando o reforço dos meios e recursos humanos por parte do Tribunal Constitucional com vista ao cumprimento das suas atribuições relacionadas com as contas partidárias.
A Lei n.° 72/93, de 30 de Novembro, cuja estrutura essencial se manteve inalterada pela Lei n.° 27/95, de 18 de Agosto, passou a admitir o financiamento dos partidos por parte de empresas nacionais, introduziu as subvenções públicas às campanhas eleitorais, atribuiu ao Tribunal Constitucional a competência para a apreciação da regularidade e legalidade das contas partidárias, mantendo, porém, as competências da Comissão Nacional de Eleições no que respeita às contas das campanhas eleitorais, conferiu natureza contra-ordenacional às infracções relativas à sua aplicação e fixou novos limites máximos admissíveis de despesas a realizar em cada campanha eleitoral.
De entre as questões suscitadas em ambos os processos legislativos, foi sobretudo a da admissibilidade do financiamento dos partidos por parte de empresas que gerou maior controvérsia aquando da aprovação do regime legal aprovado, tendo, inclusivamente, motivado os votos contrários do PCP.
5 — A Lei n.° 56/98, de 18 de Agosto, sobre o financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais, introduziu algumas inovações legais, donde é possível destacar:
a) A consideração para efeitos fiscais dos donativos concedidos aos partidos por parte de pessoas singulares ou colectivos que não tenham dívidas à administração fiscal ou à segurança social;
b) A proibição de os partidos receberem ou aceitarem quaisquer contribuições ou donativos indirectos que se traduzam no pagamento por terceiros de despesas que àqueles aproveitem, para além dos limites de donativos admissíveis;
c) O alargamento da possibilidade de beneficiar de subvenção estatal aos partidos políticos sem representação parlamentar que obtenham 50000 votos em eleições gerais;.
d) O aperfeiçoamento do regime de isenções fiscais;
e) A restrição do inventário anual aos bens imóveis e móveis sujeitos a registo;
f) A inclusão das contas das estruturas autónomas ou descentralizadas na contabilidade geral dos partidos;
g) A punição com coimas, entre 5 e 200 salários mínimos mensais nacionais, das pessoas singulares ou colectivas que violem o disposto na lei àt financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais;
h) A exigência da abertura de contas bancárias próprias para o depósito das receitas de campanha eleitoral;
0 A sujeição dos donativos para campanhas eleitorais aos limites aplicáveis aos donativos aos partidos;
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j) A redução dos limites máximos de despesas admissíveis em campanhas eleitorais nos seguintes termos:
Presidência da República: de 6000 salários mínimos mensais, acrescidos de 2000 no caso de 2.a volta, para 5500 e 1500, respectivamente;
Assembleia da República: de 50 para 35 salários mínimos mensais por candidato;
Assembleias legislativas regionais-, de 25 para 20 salários mínimos mensais por candidato;
Autarquias locais: de um quarto para um quinto dò salário mínimo mensal por candidato;
Parlamento Europeu: de 200 para 180 salários mínimos mensais por candidato;
k) A criação da figura do mandatário financeiro e a sua responsabilização, aceitação e depósito de donativos, pela autorização e controlo das despesas e pela elaboração e apresentação das contas da campanha;
l) A disponibilização de meios humanos qualificados para a Comissão Nacional de Eleições para efeitos de apreciação das contas das campanhas eleitorais.
No entanto, tal como aconteceu nos processos legislativos anteriores, a questão da admissibilidade legal do financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais por empresas voltou a ser a mais controvertida. O PCP insistiu na proibição do financiamento dos partidos por parte de empresas. O PS propôs a manutenção da situação legal vigente. O PP propôs a proibição de os partidos receberem donativos de empresas que possuam capitais públicos, ainda que a título minoritário. Já o PSD propôs que fosse a Assembleia da República a criar, em termos a regular no respectivo Regimento, um fundo destinado a financiar actividades de interesse para os vários partidos aí representados constituído por donativos de pessoas colectivas privadas, solução que suscitou dúvidas de constitucionalidade da parte do Sr. Presidente da Assembleia da República, expressas no respectivo despacho de admissão, e que radicam na «introdução de distorções significativas e sem fundamento material bastante no financiamento dos partidos políticos» que tal proposta poderia implicar.
III — Alterações propostas
1 — Sobre o financiamento por pessoas colectivas. — No presente processo legislativo, já não é apenas o PCP a propor a proibição do financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais por parte de pessoas colectivas, mas é também o PSD que propõe tal solução.
O PCP propõe a supressão de qualquer referência às pessoas colectivas no âmbito das receitas dos partidos (arti-e do regime dos donativos admissíveis (artigo 4.°), alarga a proibição de recepção de donativos aos das empresas privadas (artigo 5.°) e suprime as referências às pessoas coíectivas dos artigos 10.° (regime contabilístico), 14.° (sanções), 16.° (receitas de campanha), 17.° (limites das receitas) e 25." (percepção de receitas ou realização de despesas ilícitas).
O PSD segue essencialmente a mesma via, optando, porém, por alterar a formulação do artigo 5°, suprimindo a enumeração das pessoas colectivas aí vertida por uma referência genérica: «É proibida a aceitação pelos partidos polí-
ticos de donativos de natureza pecuniária ou outra concedidos por pessoas colectivas, nacionais ou estrangeiras, quaisquer que sejam os respectivos montantes.»
2 — Quanto ao regime dos donativos admissíveis. — O PSD propõe que os donativos de natureza pecuniária concedidos por cidadãos (que não podem exceder o limite anual de 30 salários mínimos mensais nacionais por doador) sejam obrigatoriamente titulados por cheque, independentemente do seu montante (tal exigência só existe actualmente para os donativos de montante superior a 10 salários mínimos). Propõe também que os partidos possuam um livro de registo próprio para os donativos e que estes sejam considerados para efeitos fiscais? independentemente da situação do doador perante a administração fiscal ou a segurança social. E propõe ainda a supressão da possibilidade da existência de donativos anónimos (que é presentemente admitida em doações de montante não superior a 10 salários mínimos mensais).
O Governo propõe a eliminação do limite máximo global dos donativos admissíveis (que é presentemente de 1000 salários mínimos mensais nacionais) e que a atribuição de donativos por pessoas colectivas seja precedida de deliberação, por escrito, do órgão social competente, que constará em anexo à contabilidade dos partidos. Também os donativos em espécie de montante superior a um salário mínimo nacional serão discriminados contabilisticamente, sendo qualquer donativo de valor superior a esse montante obrigatoriamente efectuado por transferência bancária ou por cheque. O Governo admite o anonimato dos donativos de valor não superior ao salário mínimo nacional mensal.
Propõe ainda o Governo que todos os donativos de natureza pecuniária sejam obrigatoriamente depositados em conta bancária exclusivamente destinada a esse efeito, que as receitas provenientes de actividades de angariação de fundos sejam sempre documentadas e que a cada donativo corresponda sempre a emissão de um recibo autenticado e numerado.
3 — Quanto ao regime contabilístico. — O PSD propõe o afastamento do segredo bancário em relação às contas dos partidos políticos e a instituição de um dever especial das instituições financeiras de colaboração com as autoridades em qualquer processo de averiguação ou investigação às contas dos partidos ou das campanhas eleitorais. O mesmo projecto de lei propõe que as contas a apresentar ao Tribunal Constitucional, quer dos partidos quer das campanhas, sejam acompanhadas de um relatório elaborado por auditores externos.
O Governo propõe que passem a constar do inventário nacional a apresentar pelos partidos os direitos reais ou pessoais de gozo sobre bens imóveis, bem como as participações em sociedades, créditos em quantia certa e depósitos bancários, devendo constar em anexo à contabilidade os extractos bancários e de cartões de crédito. Quanto às contas das campanhas eleitorais, propõe o Governo que as contas integrem as contas parciais relativas a cada círculo eleitoral para a Assembleia da República, a cada região autónoma ou a cada concelho, no caso das eleições autárquicas, sendo aplicável à contabilidade das campanhas regime semelhante ao que vigore para as contas dos partidos.
Regista-se ainda a proposta do Governo de que qualquer pagamento de despesas de montante superior a meio salário mínimo nacional sejam efectuadas por meio bancário que permita a identificação do montante e a entidade destinatária do pagamento.
4 — Quanto ao regime sancionatório. — O PSD propõe
a criminalização de um conjunto de infracções a que cor-
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responde actualmente um regime contra-ordenacional, nos seguintes termos:' a aceitação de donativos proibidos é punida com pena de prisão de 1 a 8 anos, sendo a mesma pena
aplicável aos administradores ou gerentes com poderes de vincularão da pessoa colectiva envolvida no financiamento
proibido. O procedimento criminal não depende de queixa nem de acusação particular. Os donativos proibidos que tenham servido para a prática de infracção são declarados perdidos a favor do Estado. O PSD propõe ainda a adopção de um regime sancionatório idêntico para as campanhas eleitorais, punindo com prisão de 1 a 3 anos os mandatários financeiros, os candidatos as eleições presidenciais e os primeiros subscritores de listas de cidadãos eleitores que violem o limite máximo de despesas admissíveis em campanhas eleitorais. O mesmo partido propõe ainda a criminalização, com prisão de 1 a 8 anos, da não apresentação de contas das campanhas eleitorais.
5 — Quanto às despesas das campanhas eleitorais. — Propõe ó PCP que se considerem despesas de campanha eleitoral as que, tendo essa finalidade, se efectuem a partir da publicação do decreto que marca a data das eleições até à realização do acto eleitoral respectivo. O Governo, por seu lado, propõe que sejam consideradas contribuições para a campanha eleitoral todos os donativos recebidos por partidos ou candidatos no período compreendido entre o termo do prazo para entrega de listas ou candidaturas e a data de prestação das contas, sendo consideradas despesas de campanha as que sejam efectuadas nesse mesmo período, com excepção das que decorram da instalação e funcionamento da sede, delegações e serviços dos partidos.
Em matéria de limites de despesas, o PCP propõe nova redução dos limites máximos de despesas admissíveis, nos seguintes termos:
Presidência da República: 4800 salários mínimos mensais, acrescidos de 1500 no caso de 2.° volta;
Assembleia da República: 30 salários mínimos mensais por candidato efectivo;
Assembleias legislativas regionais: 20 salários mínimos mensais por candidato efectivo;
Autarquias locais: um quinto do salário mínimo mensal por candidato efectivo;
Parlamento Europeu: 160 salários mínimos mensais por candidato efectivo.
O PSD propõe os seguintes limites:
Presidência da República: 4500 salários mínimos mensais, acrescidos de 1400 no caso de 2.a volta;
Assembleia da República: 20 salários mínimos mensais por candidato;
Assembleias legislativas regionais: 18 salários mínimos mensais por candidato;
Autarquias locais: um quinto do salário mínimo mensal por candidato;
Parlamento Europeu: 150 salários mínimos mensais por candidato.
O Governo propõe a adopção de um regime substancialmente diferente: assim, o limite máximo de despesas admissíveis, a fixar pela CNE, séria igual ao resultado da média aritmética das despesas apuradas nas contas presentes à CNE e relativas à primeira eleição realizada para cada órgão (PR, AR, ALR, PE ou autarquias locais) após a entrada em vigor da Lei n.° 72/93, de 30 de Novembro. O que, segundo a demonstração que o Governo apresenta no preâmbulo da proposta de lei, corresponderia a 408 256 contos.
6 —Alteração à Lei n.° 34/87, de 16 de Julho.— Da proposta de lei do Governo consta ainda a introdução de alterações à lei sobre crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos, no sentido de que passe também a ser punido com a pena de prisão correspondente aos crimes
de corrupção para acto ilícito, ou para acto lícito, cowCqtovc os casos, o titular de cargo político que, no exercício das
suas funções, por si ou interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar dinheiro, promessa de dinheiro ou qualquer vantagem patrimonial para partido, coligação eleitoral ou candidato, para a prática de acto que implique violação dos deveres do seu cargo ou omissão de acto que tenha o dever de praticar.
7 — Conclusão.—Concluída assim, em traços gerais, a apreciação das propostas constantes das iniciativas legislativas apresentadas em matéria de financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais, e reservando naturalmente os diversos partidos as suas posições para o debate em Plenário, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é do seguinte parecer:
Os projectos de lei n.05 574/VII, do PCP, e 575/VII, do PSD, bem como a proposta de lei n.° 209/VII, do Governo, estão em condições constitucionais e regimentais de subir a Plenário para apreciação na generalidade.
Assembleia da República, 6 de Janeiro de 1999. — O Deputado Relator, António Filipe. — O Deputado Presidente da Comissão, Alberto Martins.
PROJECTO DE LEI N.º 596/VII
CRIA UM CADASTRO OBRIGATÓRIO DE ACIDENTES DE AUTOMÓVEIS E MOTOCICLOS, VISANDO AUMENTAR A SEGURANÇA RODOVIÁRIA E A DEFESA DO CONSUMIDOR.
Exposição de motivos
Portugal detém um dos mais altos níveis de sinistralidade rodoviária, o maior número de acidentes mortais ou que deixaram marcas irreversíveis nas vítimas e ao mesmo tempo o parque automóvel mais envelhecido de entre os países da União Europeia.
Esta dura e triste realidade não se tem alterado, mesmo com a melhoria das vias de comunicação e com a dinamização do comércio automóvel, reflectindo-se de forma violenta na alteração da qualidade de vida dos acidentados e suas famílias, quando não resultam na morte.
Ao mesmo tempo, são evidentes os elevados prejuízos económicos e financeiros que são associados a estes trágicos acidentes, seja em indemnizações aos segurados, seja na perda de bens, e muitas vezes na incapacidade para o trabalho.
Constata-se ainda, entre nós, a crescente facilidade do comércio automóvel, muito especialmente no mercado de usados, quer na troca por viatura nova, quer na comprei recta de usados, devido ao seu preço mais atractivo.
Esta situação deriva também da intermediação de stands e companhias de seguros, que assim escoam as viaturas retomadas.
Todas estas circunstâncias contribuem para corresponder à elevada procura, juntando muitas vezes o «trigo» e o «joio», ou seja, viabiliza-se a venda de viaturas em adiantado estado de degradação «como se fossem pechinchas» junto com outras que são uma boa "alternativa aos veículos novos.
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Claro que os consumidores procuram sempre modelos mais recentes, verificando os anos das matrículas mais próximas, conjugando com o melhor preço possível.
Mesmo assim, e se é certo que estes factores são indicadores de confiança quanto ao estado da viatura, nem assim tornam completamente seguros os bens adquiridos nestas condições, pois os modernos meios e equipamentos possibilitam a reparação ou a substituição das peças acidentadas por outras novas, conseguindo esconder quase sempre a história do veículo.
Torna-se fundamenta) regular a segurança deste mercado e os direitos dos consumidores, especialmente quando dizem respeito à vida e integridade pessoal dos ocupantes e de terceiros que circulam nas nossas vias de comunicação.
Assim, adoptam-se medidas que pretendem dar a conhecer o estado do veículo usado que está no circuito comercial, garantindo a confiança dos compradores e ajustando os preços à verdade e qualidade intrínseca do bem transaccionado, em função desta e não só dá marca, modelo ou ano da matrícula.
Assim, os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais em vigor, apresentam o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° *
Objecto
Pelo presente diploma é criado o Cadastro de Acidentes de Automóveis e Motociclos.
Artigo 2.° Âmbito de aplicação
A presente lei aplica-se a todos os automóveis e motociclos.
Artigo 3.°
Organização
0 Cadastro de Acidentes de Automóveis e Motociclos funciona junto da Direcção-Geral de Viação.
Artigo 4.°
Inscrição obrigatória
São de inscrição obrigatória no Cadastro de Acidentes de Automóveis e Motociclos todos os acidentes ocorridos nos veículos das referidas espécies que sejam susceptíveis de afectar a sua qualidade intrínseca e ou as suas condições de segurança, nos termos a definir pelo Governo em diploma regulamentar.
Artigo 5.° Averbamentos
1 — O registo dos acidentes é efectuado no respectivo cadastro com base na entrega, por iniciativa do próprio, da companhia de seguros e da entidade policial competente que tenha tomado conta da ocorrência, dos seguintes elementos:
a) Cópia da participação à companhia de seguros e relatório da peritagem efectuada por esta;
b) Cópia da participação de acidente, elaborada pela entidade policial competente que tenha tomado conta da ocorrência;
c) Relatórios das inspecções obrigatórias ou voluntárias do veículo, a efectuar nos termos a definir em diploma próprio emitido pelo Governo.
2 — O prazo para a entrega dos elementos referidos no número anterior será definido em diploma regulamentar do Governo.
Artigo 6.°
Actualização e consulta pública
1 — O Cadastro a que se refere a presente lei deverá manter-se permanentemente actualizado e a sua consulta é pública.
2 — A pedido de qualquer interessado, pode ser emitida certidão do registo de acidentes de um veículo, mediante o pagamento da respectiva taxa.
Artigo 7.° Dever de informação
1 — Os estabelecimentos de venda de automóveis e motociclos devem informar os adquirentes sobre o estado desses veículos, exibindo certidões do Cadastro de Acidentes actualizado a 30 dias.
2 — A certidão deve ser entregue ao adquirente, juntamente com os documentos do veículo, uma vez que se realizar a transmissão de propriedade do veículo.
Artigo 8.° Sanções
1 — A regulamentação da presente lei deverá prever as contra-ordenações ao regime legal estabelecido, podendo as coimas ter o limite máximo de 2 000 000$.
2 — Ao processamento das contra-ordenações e destino das coimas aplicar-se-á o regime previsto no Código da Estrada e legislação complementar para as infracções ao referido diploma.
Artigo 9.° Responsabilidade perante terceiros
1 — Sem prejuízo da aplicação da sanção que ao caso couber, são anuláveis os negócios de disposição de veículos cujos sinistros não estejam averbados nos termos do disposto no presente diploma.
2 — A anulabilidade apenas poderá ser arguida pelo adquirente do veículo que desconheça a ocorrência do sinistro.
3 — As pessoas e entidades a quem incumbiria o dever de promover o averbamento no Cadastro que o não façam são solidariamente responsáveis pela restituição do preço do veículo e pelo pagamento das eventuais indemnizações devidas pelos prejuízos causados ao adquirente.
Artigo 10." Regulamentação
Todos os actos de regulamentação necessários para entrada em vigor da presente lei serão realizados pelo Governo no prazo de 180 dias a contar da publicação da presente.
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Artigo II.°
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor com a publicação da regulamentação a aprovar pelo Governo.
Os Deputados do PS: Paulo Neves — Luís Filipe Madeira — Francisco de Assis — Acácio Barreiros — Rui Namorado — José Junqueiro — Alberto Martins — Martim Gracias — José Magalhães — Manuel dos Santos.
PROJECTO DE LEI N.º 597/VII
ELEVAÇÃO À CATEGORIA DE VILA DA POVOAÇÃO DE LUZ, NO MUNICÍPIO DE TAVIRA
I — Introdução
Luz está situada no distrito de Faro, município de Tavira. Em termos geográficos, situa-se a 6 quilómetros de Tavira e a 23 quilómetros de Faro. É servida por acessos rodoviários e ferroviários.
As principais actividades económicas são a agricultura, o comércio e os serviços.
II — Enquadramento histórico e cultural
Luz foi desde tempos imemoriais uma das mais importantes e desenvolvidas terras de Tavira e do Algarve.
A sua história está intimamente ligada à história de Tavira e à história do Algarve.
A sua importância multissecular é atestada por provas documentais e arqueológicas que remontam mesmo ao período neolítico e ao início e afirmação da nacionalidade.
Monumentos religiosos e solarengos espelham na actualidade o cunho singular do interesse económico, artístico, social e cultural que esta povoação representou e representa no contexto do espaço geográfico em que se insere.
Segundo conceituados historiadores e pelos vestígios e objectos conhecidos, nomeadamente na Torre de Aires e na Quinta das Antas — antiga «Balsa» —, o seu povoamento remonta a épocas anteriores à própria nacionalidade.
A sua majestosa igreja matriz, edificada durante o século xvi, com o seu templo de três naves, todo de abóboda com aranhas de pedra artisticamente trabalhadas, os seus cinco altares e a porta lateral manuelina, as suas alfaias e imagens, é expressão do valor e da dignidade que esta terra sempre teve na sua área dè influência.
Situada tio litoral, parte da sua área integra o Parque Natural da Ria Formosa, um dos mais preciosos espaços naturais do País.
A riqueza dos solos faz do sector primário a sua principal actividade, destacando-se a cultura de citrinos e de produtos hortícolas secularmente apreciados pela sua qualidade.
A pecuária, a pesca, o cultivo de alfarrobeira, figueira e amendoeira e a vinha também têm expressão no âmbito do sector primário.
No sector secundário justificam referência algumas indústrias ligadas à construção civil e ao mobiliário.
No sector terciário distribuem-se postos de trabalho fundamentalmente pelo comércio, cafés, restaurantes, supermercados e ainda por instituições diversas prestadoras de serviços à comunidade.
Está dotada de infra-estruturas sócio-culturais e económicas dignas, compatíveis com o seu nível de desenvolvimento,
embora necessitando de outras que mais adequadamente reflictam o esforço desenvolvido. No domínio das infra-estruturas básicas —água, saneamento e acessibilidades—, embora necessitando de melhorias, vai sendo satisfatoriamente servida. O rigor da hospitalidade dos seus habitantes, a inserção
no Parque Natural da Ria Formosa, a proximidade das praias, o património e a beleza das suas paisagens conferem-lhe boas possibilidades de vir a ter no turismo uma significativa fonte de recursos.
Ill — Equipamentos colectivos, colectividades, monumentos, feiras e festas tradicionais
No plano do equipamento colectivo realça-se:
1) Equipamentos sociais:
Sede da Junta de Freguesia; Parque infantil; Mercado retalhista; Polidesportivo; Campo de futebol; Escolas;
Estação de correios; c Unidade de saúde;
Transportes públicos rodoviários;
Transportes públicos ferroviários;
Cemitério;
Agência bancária;
ATL;
2) Actividades económicas:
Praça de táxis; Supermercados;
Lojas de material de construção;
Oficinas de móveis;
Oficinas de automóveis;
Oficinas de veículos motorizados;
Prontos-a-véstir;
Empresas de construção civil;
Residenciais;
Restaurantes;
Cafés;
Farmácia;
Cabeleireiros;
Sapatarias;
Lojas de material eléctrico e electromecánico;
3) Colectividades de cultura e recreio e de desporto:
Rancho Folclórico da Luz; Associação Cultural da Luz; Sociedade Recreativa e Musical Luzense; Casa do Povo da Luz; Sonámbulos Futebol Club; Sociedade Columbófila Luzense;
4) Feiras e festas tradicionais:
Nós dias 4 e 5 de Setembro realiza-se a Feira Franca Anual, cujas origens remontam ao século xvi. As festas tradicionais realizam-se no terceiro fim-de-semana de Agosto. O Festival Internacional de Folclore da Luz de Tavira realiza-se no quarto fim-de-semana de Agosto e o Concurso de Charolas realizam-se no dia I de Janeiro.
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Conclusões
A povoação da Luz possui os equipamentos sociais, culturais, religiosos, escolares, transportes públicos e comunicações e de segurança, cumprindo os requisitos enunciados e previstos no artigo 12.° da Lei n.° 11/82, de 22 de Junho, que justificam a sua elevação à categoria de vila.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado abaixo assinado apresenta o seguinte projecto de lei:
Artigo único
A povoação da Luz, no concelho de Tavira, é elevada à categoria de vila.
Palácio dé São Bento, 17 de Dezembro de 1998. — O Deputado do PS, Jorge Valente.
PROJECTO DE LEI N.º 598/VII
GARANTE AOS PAIS E ENCARREGADOS DE EDUCAÇÃO MELHORES CONDIÇÕES DE PARTICIPAÇÃO NA VIDA ESCOLAR E DE ACOMPANHAMENTO DOS SEUS EDUCANDOS.
Preâmbulo
O Decreto-Lei n.° 372/90, de 27 de Novembro, publicado no uso da autorização legislativa concedida pela Assembleia da República através da Lei n.° 53/90, de 1 de Setembro, veio disciplinar o regime de constituição, bem como os deveres e direitos a que se encontram subordinadas as associações de pais e encarregados de educação.
Este decreto-lei, no seu artigo 15.°, concede aos titulares dos órgãos de associações de pais que sejam trabalhadores subordinados ou funcionários ou agentes da Administração Pública um direito especial que consiste na consideração como justificadas das faltas que sejam motivadas pela presença nas reuniões de órgãos directivos dos estabelecimentos de ensino a que pertençam as respectivas associações. Acrescenta, porém, que tais faltas, embora justificadas, determinam a perda de retribuição ou do vencimento correspondente.
Tal situação afigura-se incompatível com o papel crescentemente interventivo que tem vindo a ser atribuído às associações de pais no plano não apenas do funcionamento mas também na direcção, administração e gestão dos estabelecimentos de ensino, na medida em que, penalizando economicamente os membros das associações de pais em virtude da sua participação na vida das escolas, restringe essa participação aos cidadãos que tenham possibilidades económicas ou disponibilidade para a assegurar.
Na verdade, não faz sentido que a lei atribua direitos e mesmo deveres de participação as associações de pais (veja-se a legislação em vigor sobre direcção, administração e gestão das escolas) e negue, na prática, à maioria dos cidadãos as condições para o seu exercício.
Assim, correspondendo a uma reivindicação unânime das associações de pais e encarregados de educação, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português propõe que, para além de serem consideradas justificadas as faltas ao trabalho que sejam dadas por motivos inadiáveis relacionados com as actividades das associações de pais e respectivas estruturas federativas ou de coordenação nacional ou regional, ou com a presença em reuniões de órgãos de direcção,
administração ou gestão das escolas em que os pais e encarregados de educação devam legalmente estar representados, se considere uma forma de compensação económica de prejuízos sofridos em função do cumprimento desses deveres de participação.
Propõe-se, assim, que os pais e encarregados de educação que sofram perdas de retribuição em virtude de presença em reuniões de órgãos de direcção, administração ou gestão dos estabelecimentos de ensino para que tenham sido designados, ou em outras reuniões em que a participação das respectivas associações se encontre legalmente prevista, sejam integralmente compensados pelos prejuízos.
Propõe-se ainda a criação de um sistema de compensação pecuniária por perdas de retribuição sofridas por pais e encarregados de educação que sejam motivadas pelo cumprimento de obrigações inadiáveis que decorram das atribuições das associações a que pertençam ou das estruturas federativas ou de coordenação nacional ou regional em que estas se integrem.
Porém, importa que um novo direito seja reconhecido aos pais e encarregados de educação. Trata-se do direito de acompanhar devidamente a situação escolar dos seus filhos e educandos. Este acompanhamento constitui um direito e um dever de todos os pais e encarregados de educação, devendo ser criadas as condições para que ele possa ser cumprido e convenientemente exercido. Propõe-se, assim, que as faltas ao trabalho que sejam dadas pelos pais e encarregados de educação em virtude de comprovadas necessidades de acompanhamento escolar dos seus filhos e educandos sejam consideradas justificadas.
Iniciativa legislativa com conteúdo idêntico ao do presente projecto de lei foi já apresentada pelo Gruo Parlamentar do PCP na 1? sessão legislativa da presente legislatura. Nessa altura, o projecto de lei n.° 204/VII, do PCP, foi aprovado na generalidade no Plenário da Assembleia da República, tendo baixado à Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura para apreciação na especialidade. Essa apreciação, sucessivamente protelada ao longo de vários meses, concluiu com uma votação que defraudou as expectativas criadas, o que contrariou o sentido de voto que havia sido expresso no Plenário, tendo sido recusados todos os artigos propostos, por força dos votos contra do PS e da abstenção do CDS-PP (que havia votado favoravelmente na generalidade).
O PCP continua a considerar que a aprovação deste projecto de lei se justifica inteiramente. Porque propõe uma medida de elementar justiça, porque corresponde, no essencial, a uma reivindicação de há muito manifestada pelas associações de pais, mas, acima de tudo, porque visa possibilitar a desejável participação de muitos pais e encarregados de educação na vida das escolas. Este objectivo, pela importância que assume, justifica inteiramente o empenhamento do próprio Estado na sua concretização. Entende por isso o PCP que a consagração legal do direito dos pais a participar condignamente na vida escolar não é substituível por promessas de futuros acordos em sede de concertação social, que mais não têm feito do que adiar a resolução deste problema.
Nestes termos, os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresentam o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.°
Participação na vida escolar
1 — As faltas dadas por titulares de órgãos directivos de associações de pais e encarregados de educação dos estabele-
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cimentos de educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário que sejam trabalhadores por conta de outrem consideram-se justificadas, desde que sejam motivadas por alguma das seguintes situações:
a) Presença em reuniões referidas no artigo 12.° do Decreto-Lei n.° 372/90, de 29 de Novembro, ou em outras reuniões em que a participação das respectivas associações se encontre legalmente prevista;
b) Presença em reuniões de órgãos de direcção, administração ou gestão dos estabelecimentos de ensino para que tenham sido designados;
c) Cumprimento de obrigações inadiáveis que decorram das atribuições das associações a que pertençam ou das estruturas federativas ou de coordenação de nível nacional ou regional em que estas se integrem.
2 — O disposto na alínea b) do número anterior aplica-se aos membros eleitos para os órgãos de direcção, administração ou gestão de estabelecimentos de ensino em representação dos pais e encarregados de educação, mesmo que não sejam titulares de órgãos directivos de qualquer associação.
Artigo 2.°
Compensações pecuniárias
Os pais e encarregados de educação que sejam trabalhadores por conta de outrem e que sofram perdas de retribuição motivadas por alguma das situações previstas no artigo anterior têm direito a compensações pecuniárias nos termos dos artigos seguintes.
Artigo 3.° Presença em reuniões
1 — As perdas de retribuição motivadas pela presença nas reuniões referidas nas alíneas a) e b) do artigo 1." são integralmente compensadas.
2 — 0 regime de compensação estabelecido no número anterior é aplicável sem prejuízo de outras compensações previstas em leis ou regulamentos que sejam especialmente aplicáveis à presença em reuniões de outros órgãos em que as associações de pais e encarregados de educação devam estar representadas.
Artigo 4.°
Obrigações inadiáveis
A cada dia de retribuição perdida por motivo co cumprimento de obrigações previstas na alínea c) do n.° 1 do artigo 1.° corresponde o vencimento de uma compensação pecuniária de montante equivalente ao valor menos elevado
da ajuda de custo diária aplicável na Administração Pública, até ao limite de duas compensações mensais por cada titular.
Artigo 5.°
Responsabilidade pelo pagamento
Compete ao Ministério da Educação assegurar o pagamento das compensações pecuniárias previstas na presente lei e definir a forma do respectivo processamento.
Artigo 6.°
Acompanhamento dos educandos
As faltas dadas pelos pais e encarregados de educação de alunos da educação pré-escolar ou dos ensinos básico ou secundário que sejam trabalhadores por conta de outrem, desde que decorram de necessidades comprovadas de acompanhamento da situação escolar dos seus educandos,
consideram-se justificadas.
Artigo 7.°
Norma revogatória
É revogado o artigo 15." do Decreto-Lei n.° 372/90, de 27 de Novembro.
Artigo 8o Entrada em vigor
1 — A presente lei entra em vigor nos termos gerais, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
2 — Os artigos 3.°, 4." e 5.° da presente lei entram em vigor com a publicação da lei do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.
Os Deputados do PCP: Luísa Mesquita — António Filipe — Octávio Teixeira — João Amaral — Rodeia Machado— Alexandrino Saldanha — Bernardino Soares.
PROJECTO DE LEI N.º 599/VII
ACTUALIZA 0 REGIME DE REGALIAS E ISENÇÕES FISCAIS DAS PESSOAS COLECTIVAS DE UTILIDADE PÚBLICA
Preâmbulo
Em 7 de Novembro de 1977, foi publicado do Decreto-Lei n.° 460/77, que aprovou o estatuto das pessoas colectivas de utilidade pública. Este diploma foi elaborado na sequência da criação, pelo I Governo Constitucional, de um grupo de trabalho destinado a estudar e propor as condiçoes. para a obtenção do estatuto de utilidade pública e as regalias a conceder às colectividades a integrar no seu âmbito, dando cumprimento ao Programa desse governo, que reconhecia «a importância de auxiliar as colectividades de cultura, desporto e recreio, de fins não lucrativos, que prestam relevantes serviços à comunidade».
O Decreto-Lei n.° 460/77, de 7 de Novembro, estabeleceu as condições gerais para o reconhecimento de pessoas colectivas como de utilidade pública e o respectivo processo.
Assim, a declaração de utilidade pública é concedida pelo
Governo, mediante requerimento a apresentar pelas associações, desde que se encontrem reunidos determinados requisitos exigidos por lei.
O mesmo decreto-lei atribuiu às pessoas colectivas de utilidade pública um conjunto de regalias (isenção de taxas de televisão e de rádio, sujeição à tarifa aplicável aos consumos domésticos de energia eléctrica, escalão especial no consumo de água, tarifa de grupo nos transportes públicos estatizados, isenção de taxas previstas na legislação sobre espectáculos e divertimentos públicos e publicação gratuita
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no Diário da República das alterações dos estatutos) e remeteu para legislação futura as isenções fiscais, que viriam a ser definidas na Lei n.° 2/78, de 17 de Janeiro.
Aí se estabeleceu que as pessoas colectivas de utilidade pública poderiam beneficiar das seguintes isenções: imposto do selo, imposto sobre as sucessões e doações e de sisa pela aquisição de edifícios necessários à instalação da sua sede, delegações e serviços indispensáveis aos seus fins estatutários, contribuição predial pelo rendimento colectável de prédios urbanos onde se encontrem instalados a sede, delegações e serviços indispensáveis aos fins estatutários, impostos alfandegários sobre material indispensável aos seus fins e não produzido no País e ainda isenção de custas judiciais. Estas isenções, que poderiam ser totais ou parciais, ficavam dependentes de despacho conjunto dos Ministros da Administração Interna, das Finanças e da tutela, após parecer favorável da câmara municipal do concelho da sede da pessoa colectiva interessada.
Em 1981, a Lei n.° 2/78, de 17 de Janeiro, viria a ser revogada pelo Decreto-Lei n.° 260-D/81, de 2 de Setembro, que regulou o estatuto de utilidade pública de forma um tanto diversa: as isenções fiscais passaram a depender apenas de despacho do Ministro das Finanças e alterou-se a tramitação necessária para o requerimento das isenções, que passaram a ser as seguintes: imposto do selo, sisa e imposto sobre as sucessões e doações, contribuição predial, direitos de importação sobre mercadorias indispensáveis à consecução dos seus fins de que não exista produção no País e imposto sobre a venda de veículos automóveis sobre as ambulâncias (entretanto revogada pelo Decreto-Lei n.° 27/93).
Passados que foram mais de 20 anos sobre a Lei n.° 21 78 e quase 17 sobre o Decreto-Lei n.° 260-D/81, é hoje manifesta a sua desactualização. Não apenas porque os impostos sobre que incidiam as isenções foram sendo substituídos por outros sem que as isenções acompanhassem tais substituições, mas também porque o quadro legal não acompanhou a realidade associativa.
Assim, o que hoje se verifica é que a concessão do estatuto de utilidade pública a uma associação, sendo uma honra e representando um reconhecimento público do mérito da sua acção social, tem um efeito meramente simbólico, não representando, em termos práticos, qualquer benefício real para a associação em causa.
Estando assim desvirtuado o sentido que inicialmente foi dado à declaração de utilidade pública, que fazia corresponder a esse reconhecimento um conjunto de regalias, importa revalorizar de alguma forma esse estatuto, actualizando a legislação que lhe é aplicável. É esse o objectivo do presente projecto de lei do PCP.
Como tal, não se propõe qualquer alteração no regime de reconhecimento do estatuto de utilidade pública nem no regime de concessão de isenções, propondo-se, porém, o seguinte:
A actualização das isenções fiscais de acordo com os impostos actualmente existentes: imposto do selo, imposto municipal de sisa pela aquisição de imóveis, imposto sobre as sucessões e doações relativo a transmissão de imóveis e contribuição autárquica pelo rendimento colectável de prédios urbanos, desde que, em todos os casos, sejam destinados à realização dos fins estatutários das associações;
A equiparação das pessoas colectivas de utilidade pública às instituições particulares de solidariedade social para. efeitos de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas;
A isenção de imposto sobre o valor acrescentado relativo à transmissão e locação de bens, à prestação de serviços, bem como à aquisição de bens e serviços relacionados com as actividades sociais e com a construção ou conservação de imóveis destinados à realização dos fins estatutários das associações;
A isenção de imposto sobre veículos, imposto de circulação e imposto automóvel;
A isenção de custas e preparos judiciais.
Propõe-se de igual modo que os donativos de pessoas singulares a pessoas colectivas de utilidade pública possam, até certo montante, ser objecto de abatimento para efeitos de IRS.
O presente projecto de lei pretende ser um contributo para pôr termo a uma situação de fragrante injustiça. As pessoa colectivas a quem o Estado Português reconhece o estatuto de utilidade pública pelos serviços que prestam à comunidade subsistem, na esmagadora maioria dos casos, com enormes dificuldades, exclusivamente à custa do esforço dos seus dirigentes e associados, sem beneficiarem de um estatuto legal — e concretamente de um estatuto fiscal — que atenue um pouco essas dificuldades. Pelo contrário, agravam-nas. É esta situação absurda que importa inverter, através da revalorização do estatuto de utilidade pública.
Nestes termos, os deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresentam o seguinte projecto de lei:
Artigo 1." Isenções
Sem prejuízo de outros benefícios previstos na restante legislação aplicável, podem ser concedidas às pessoas colectivas de utilidade pública as seguintes isenções:
a) Imposto do selo;
b) Imposto municipal de sisa pela aquisição de imóveis destinados à realização dos seus fins estatutários;
c) Imposto sobre as sucessões e doações relativo à transmissão de imóveis destinados à realização dos seus fins estatutários;
d) Contribuição autárquica pelo rendimento colectável de prédios urbanos destinados à realização dos seus fins estatutários;
é) Imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas;
f) Imposto sobre o valor acrescentado relativo à transmissão e locação de bens, à prestação de serviços, bem como à aquisição de bens e serviços relacionados com as actividades sociais e com a construção ou conservação de imóveis destinados à realização dos seus fins estatutários;
g) Imposto sobre veículos, imposto de circulação e imposto automóvel;
h) Custas e preparos judiciais.
Artigo 2.°
O artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 442-B/88, de 30 de Novembro (Código do IRC) passa a ter a seguinte redacção:
Artigo 9.°
Pessoas colectivas de utilidade pública e de solidariedade social
1 — Estão isentas de ERC:
a) As pessoas colectivas de utilidade pública;
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b) As instituições particulares de solidariedade social e entidades anexas, bem como as pessoas colectivas àquelas legalmente equiparadas.
Artigo 3.°
0 artigo 56.° do Decreto:Lei n.° 442-A/88, de 30 de Novembro (Código do IRS) passa a ter a seguinte redacção:
Artigo 56.° Abatimentos por donativos de interesse público
1— ........................................................................
2 — Ao rendimento líquido, e até 15% do valor deste, abater-se-á ainda o valor dos donativos, em dinheiro ou em espécie, concedidos às seguintes entidades beneficiárias:
a) .....................................................................
b) .....................................................................
c) .,...................................................................
d) Pessoas colectivas de utilidade pública.
Artigo 4.° Regras de concessão e fiscalização
1 — Compete ao Governo definir, através de diploma regulamentar, as regras a que deve obedecer a apresentação dos pedidos de isenção e as condições de fiscalização do cumprimento das normas que determinaram as isenções.
2 — As isenções fiscais previstas na presente lei são concedidas por despacho do Ministro das Finanças.
Artigo 5." Norma revogatória É revogado o Decreto-Lei n.° 260-D/81, de 2 de Setembro.
Artigo 6.°
Entrada em vigor
Sem prejuízo da sua entrada em vigor nos termos gerais, a presente lei só produz efeitos financeiros com a entrada em vigor da lei do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.
Os Deputados do PCP: António Filipe— Octávio Teixeira — Rodeia Machado — João Amaral — Bernardino Soares — Alexandrino Saldanha.
PROJECTO DE LEI 1N.2 600/VII ACELERAÇÃO DE PROCESSO JUDICIAL ATRASADO
Exposição de motivos
O Grupo Parlamentar do PSD apresentou recentemente duas iniciativas legislativas destinadas a combater problemas estruturais que têm vindo a agravar-se no sector da justiça.
Uma delas foi o projecto de lei da privatização dos notários.
A outra visou a criação de assessores, licenciados em Direito e devidamente qualificados, que se ocuparão de questões e diligências acessórias e instrumentais, como forma de aliviar os magistrados judiciais de 1.° instância, dis-ponibilizando-os para o trabalho, o estudo e a decisão das questões de fundo.
Mas a atenção que o Grupo Parlamentar do PSD dedica à área da justiça não se esgota, em especial face à continuada inacção do Governo, com a apresentação daqueles projectos de lei.
As suas preocupações têm, de resto, aumentado com a constatação de que é cada vez maior o número de processos judiciais que se arrastam penosamente pelos tribunais cíveis, administrativos e fiscais e de que o Estado Português vem, mesmo, somando condenações no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem por não administrar a justiça em tempo razoável.
As partes sentem, por outro lado, que não existe um expediente processual adequado que lhes permita activar os processos que jazem, tantas vezes por anos e anos, nas secretarias ou nos gabinetes dos juízes.
E perdem-se depois entre exposições e queixas individuais dirigidas, por vezes em simultâneo, a entidades tão diversas como o Conselho Superior da Magistratura, o Ministério da Justiça, a Provedoria de Justiça, o Supremo Tribunal de Justiça e até a Presidência da República.
Essas exposições provocam, além do mais, um inútil crescendo de burocracia, que, quase sempre, redunda em meras acusações de recepção e em respostas vagas.
Mesmo quando dirigidas ao Conselho Superior da Magistratura, em regra não desencadeiam outra actividade que não seja o pedido de informações ao tribunal onde os autos estão pendentes e a sua transmissão aos interessados.
Se a lei, por um lado, sanciona o atraso ou a inércia das partes, tem todo o sentido que, por outro, as não deixe assim desprotegidas perante atrasos anómalos dos actos da secretaria ou do juiz.
Justifica-se, pois, a consagração de um incidente processual tendente a compelir à aceleração do processo que se encontre anormalmente atrasado.
A oportunidade da medida está ainda especialmente articulada com aquela outra, a que atrás se fez alusão, destinada a criar o corpo de assessores dos magistrados judiciais.
Em rigor, convém ter presente que esta medida não é totalmente nova na nossa ordem jurídica.
O incidente da «aceleração de processo atrasado» foi já introduzido no Código de Processo Penal e está vigente desde 1987.
Será aqui adaptado e enriquecido com uma norma de extinção que se afigura pertinente e justificada.
Cria-se, assim, um expediente processual próprio, ao serviço dos cidadãos, que poderão accionar e acompanhar o processamento das suas reclamações.
Cada incidente de aceleração do processo obrigará a um necessário e rápido diagnóstico da concreta situação do tribunal onde se revela o sintoma de crise, desde logo na medida em que se prevê a realização de um inquérito, em prazo que não pode exceder 30 dias, sobre os atrasos e as condições em que eles se verificaram, bem como o desencadear de certas medidas, designadamente «de gestão, de organização ou de racionalização de métodos que a situação justificar».
É uma iniciativa legislativa que promete contribuir decisivamente para a redução do número de processos judiciais com atrasos absolutamente anómalos e para a cura de muitos dos males de que enferma o nosso sistema judiciário.
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A experiência colhido de 10 anos de vigência daquelas disposições do Código de Processo Penal e a boa e pacífica aceitação que elas mereceram de todos os «operadores judiciários» aconselham a sua extensão e aplicação para além dos domínios da lei processual penal.
Teve-se em devida conta que o Conselho Superior da Magistratura é um órgão administrativo e que, por isso mesmo, não pode, em matéria judicial, decidir nem dar ordens aos juízes — que só estão sujeitos ao dever de obediência a decisões dos tribunais superiores, proferidas em sede de recurso.
Como, porém, seria atitude irrealista criar um incidente cuja competência coubesse ao tribunal hierarquicamente superior, à semelhança do que aconteceu com o Código de Processo Penal, vai-se até onde é possível, na certeza de que «o óptimo é inimigo do bom».
De todo inovador e justificável por óbvias razões de ordem prática é o conteúdo do artigo 3.°: se o juiz despachar o processo dentro de prazo razoável, çonsiderar-se-á findo o incidente, sem que haja lugar a instrução do pedido nem comunicação ao Conselho Superior da Magistratura.
Nestes termos, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PSD, apresentam o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° Aceleração de processo atrasado
1 — Quando num processo judicial a decorrer perante o tribunal ou o juiz, tiverem sido excedidos em mais de três meses os prazos previstos na lei, por motivo não imputável às partes, pode qualquer destas requerer a aceleração processual.
2 — O pedido é decidido pelo Conselho Superior da Magistratura.
3 — Estão impedidos de intervir na deliberação os juízes que, por qualquer forma, tiverem participado no processo.
Artigo 2.° Tramitação do pedido de aceleração
1 — O pedido de aceleração processual é dirigido ao presidente do Conselho Superior da Magistratura e entregue no tribunal a que o processo estiver afecto.
2 — O juiz instrui o pedido com os elementos disponíveis e relevantes para a decisão e remete o processo assim organizado, em 10 dias, ao Conselho Superior da Magistratura.
3 — Uma vez distribuído, o processo vai à primeira sessão ordinária, ou a sessão extraordinária, se nisso houver conveniência, e nela o relator faz uma breve exposição, concluindo por proposta de deliberação. Não há lugar a vistos, mas a deliberação pode ser adiada até dois dias, para análise do processo.
4 — A decisão é tomada, sem outras formalidades especiais, no sentido de:
á) Indeferir o pedido, por falta de fundamento bastante ou por os atrasos verificados se encontrarem justificados;
b) Requisitar informações complementares, a serem fornecidas no prazo máximo de cinco dias;
c) Mandar proceder a inquérito, a concluir no prazo de 30 dias, sobre os atrasos e as condições em que se verificaram, suspendendo a decisão até à conclusão do inquérito;
d) Propor ou determinar as medidas disciplinares, de gestão, de organização ou de racionalização de métodos que a situação justificar.
5 — A decisão é notificada ao requerente e imediatamente comunicada ao tribunal que tiver o processo a seu cargo e às entidades com jurisdição disciplinar sobre os responsáveis por atrasos que se tenham verificado.
Artigo 3.°
Extinção do incidente
Se o juiz despachar o processo dentro do prazo referido no n.° 2 do artigo anterior, considera-se findo o incidente sem que haja lugar a instrução do pedido nem a comunicação ao Conselho Superior da Magistratura.
Artigo 4.° Custas
O incidente é isento de custas, sem prejuízo do disposto no artigo 456.° do Código de Processo Civil.
Palácio de São Bento, 17 de Novembro de 1998. — Os Deputados do PSD: António Antunes — Guilherme Silva — (e mais uma assinatura).
PROPOSTA DE LEI N.º 223/VII
ALTERA A LEI N.9 10/97, DE 12 DE MAIO, QUE REFORÇA OS DIREITOS DAS ASSOCIAÇÕES DE MULHERES
Exposição de motivos
A Lei n.° 10/97, de 12 de Maio, que veio reforçar os direitos das associações de mulheres, continua a assentar no -critério da representatividade genérica, que se traduz numa ponderação de natureza essencialmente quantitativa.
No entanto, a prática tem vindo a revelar que existem organizações não governamentais de mulheres que, apesar de não possuírem representatividade genérica, desempenham um papel extremamente importante no apoio a mulheres carenciadas e na execução de projectos relacionados com a igualdade e com a participação das mulheres na vida social, profissional, cultural e política. Estas organizações estão representadas no conselho consultivo da Comissão para a Igualdade e os Direitos das Mulheres (CEDM).
Justifica-se, desde modo, proceder à alteração da Lei n.° 10/97, de 12 de Maio, no sentido de alargar às associações de mulheres representadas no conselho consultivo da CIDM os direitos que são concedidos naquele diploma legal às associações de mulheres com representatividade genérica.
Assim, nos termos da alínea d) do n.° 1 do artigo 197.° da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da República a seguinte proposta de lei, para valer como lei geral da República:
Artigo 1.°
Os artigos 2.° e 3.° da Lei n.° 10/97, de 12 de Maio, passam a ter a seguinte redacção:
Artigo 2.°
Direitos de participação e Intervenção
1 — Sem prejuízo de outras competências previstas na lei, as associações de mulheres com representa-
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tividade genérica, bem como as associações de mulheres representadas no conselho consultivo da Comissão para a Igualdade e os Direitos das Mulheres (CIDM) colectivamente consideradas, gozam do estatuto de
parceiro social, com direito, nomeadamente, a representação no Conselho Económico e Social.
2— ........................................................................
Artigo 3.°
Direito de antena
As associações de mulheres com representatividade genérica, bem como as associações de mulheres representadas no conselho consultivo da CIDM colectivamente consideradas, têm direito a tempo de antena na rádio e na televisão nos mesmos termos das associações profissionais.
Artigo 2.°
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 10 de Dezembro de 1998. — O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres. — O Ministro da Economia, Joaquim Augusto Nunes de Pina Moura — O Ministro dos Assuntos Parlamentares, António Luís Santos da Costa. — O Ministro Adjunto dó Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
PROPOSTA DE LEI N.º 224/VII
AUTORIZAÇÃO AO GOVERNO PARA DOTAR OS ENGENHEIROS TÉCNICOS PORTUGUESES DE UMA ASSOCIAÇÃO PROFISSIONAL DE NATUREZA PÚBLICA.
Exposição de motivos
Em 13 de Novembro de 1997, foi publicada a Lei n.° 122/ 97, que autorizou o Governo a dotar os engenheiros técnicos de uma associação profissional de natureza pública. A autorização foi concedida com a duração de 180 dias contados a partir da sua entrada em vigor, prazo que se revelou exíguo para concluir um processo tão complexo. Com efeito, a existência de mais de uma associação privada representativa dos engenheiros técnicos não permitiu a aprovação do respectivo decreto-lei no prazo estipulado no referido diploma.
Apesar de o Governo ter ponderado a hipótese de pedir à Assembleia da República a prorrogação da autorização concedida pela Lei n.° 122/97, opta-se por apresentar uma nova proposta de lei de autorização.
Dado o intento do Governo em dotar os engenheiros técnicos portugueses de uma associação profissional de natureza pública, vem pedir-se uma nova autorização legislativa, a qual tem o mesmo objecto, sentido, extensão e duração da que havia sido concedida pela Lei n.° 122/97, de 13 de Novembro.
Assim:
Nos termos da alínea d) do n.° I do artigo 197.º da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da República a seguinte proposta de lei:
Artigo 1°
Objecto
É concedida autorização ao Governo para dotar os engenheiros técnicos portugueses de uma associação profissional de natureza pública, bem como para, com a aprovação dos respectivos estatutos, completar a transposição para a ordem jurídica interna dá Directiva n.° 89/48/CEE, do Conselho das Comunidades Europeias, de 21 de Dezembro de 1988, já feita, em termos gerais, pelo Decreto-Lei n.° 289/91, de 10 de Agosto.
Artigo 2.°
Sentido e extensão
O sentido e extensão da legislação a elaborar ao abrigo do artigo anterior serão:
a) Criar uma comissão instaladora que dê expressão às diferentes associações representativas dos engenheiros técnicos e que proceda ao lançamento da associação profissional de natureza pública do sector;
b) Assegurar a representatividade da classe no domínio do ensino profissional da engenharia técnica;
c) Estabelecer regras de deontologia profissional, com a garantia da sua aplicação através do mecanismo disciplinar e do conjunto de medidas disciplinares aplicáveis;
d) Cometer à associação o registo de todos os engenheiros técnicos e a atribuição de títulos profissionais, bem como a protecção destes e das competentes profissões;
e) Instituir um sistema de eleições directas para os cargos directivos da associação;
f) Definir o âmbito das incompatibilidades e impedimentos, com o objectivo de assegurar a independência no exercício da engenharia técnica.
Artigo 3.° Duração
A autorização concedida pelo presente diploma tem a duração de 180 dias contados a partir da data da sua entrada em vigor.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 25 de Novembro de 1998. — O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres. — O Ministro Adjunto, Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho. — O Ministro do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, João Cardona Gomes Cravinho. — O Ministro da Educação, Eduardo Carrega Marçal Grilo. — O Ministro dos Assuntos Parlamentares, António Luis Santos da Costa.
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PROPOSTA DE RESOLUÇÃO N.º 118/VII
(APROVA, PARA RATIFICAÇÃO, 0 TRATADO DE AMSTERDÃO, QUE ALTERA O TRATADO DA UNIÃO EUROPEIA, OS TRATADOS QUE INSTITUEM AS COMUNIDADES EUROPEIAS E ALGUNS ACTOS RELATIVOS A ESSES TRATADOS, INCLUINDO OS ANEXOS, OS PROTOCOLOS, BEM COMO A ACTA FINAL, COM AS DECLARAÇÕES, ASSINADO EM AMSTERDÃO EM 2 DE OUTUBRO DE 1997.)
Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Europeus
Relatório
A proposta de resolução que visa a aprovação, para ratificação, do Tratado de Amsterdão foi apresentada pelo Governo à Assembleia da República no dia 10 de Agosto de 1998.
A proposta de resolução foi admitida por despacho do Presidente da Assembleia da República de 12 de Agosto de 1998, que determinou também a baixa à Comissão de Assuntos Europeus (CAE), comissão especializada permanente competente em razão da matéria. A proposta foi ainda anunciada na reunião da Comissão Permanente de 10 de Setembro de 1998.
A CAE, na sua reunião de 10 de Setembro de 1998, deliberou, em face das principais matérias que o Tratado aborda, solicitar parecer às Comissões de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, Defesa Nacional, Economia, Finanças e Plano e Trabalho, Solidariedade e Segurança Social. Na mesma reunião foi designado o Deputado José Medeiros Ferreira como relator da CAE e constituído um grupo de trabalho, composto pelos coordenadores de todos os grupos parlamentares.
Foi ainda pela CAE, e pelas mesmas razões, cumprindo o disposto na alínea v) do n.° 1 do artigo 227° da Constituição da República Portuguesa, solicitado às Assembleias Legislativas Regionais dos Açores e da Madeira que se pronunciassem sobre as matérias do Tratado que lhes dizem directamente respeito.
Audições da Comissão de Assuntos Europeus sobre o Tratado
Após a assinatura do Tratado, a CAE começou a programar os seus trabalhos em função da futura proposta de resolução, com a condicionante da anunciada realização de um referendo sobre a participação de Portugal na União Europeia, a realizar durante o ano 1998.
A proposta para a realização do referendo, com a definição da respectiva pergunta, foi aprovada pela Assembleia da República no dia 29 de Junho de 1998, tendo posteriormente sido remetida, nos termos constitucionais, pelo Sr. Presidente da República ao Tribunal Constitucional, para apreciação preventiva da sua constitucionalidade.
O Tribunal Constitucional, através do Acórdão de 29 de Julho de 1998, considerou a pergunta aprovada inconstitucional, pelo que o Governo, logo a 10 de Agosto de 1998, iniciou o processo parlamentar de aprovação para a ratificação do Tratado de Amsterdão, remetendo à Assembleia da RepúbJ/ca esía proposta de resolução.
Entretanto, a CAE, na sua reunião de 22 de Julho de í998, deliberou realizar um conjunto de audições, que de-
correram nos dias 15 e 30 de Setembro e 20 de Outubro de 1998, com audição das seguintes personalidades:
15 de Setembro de 1998:
Prof.° Maria Luísa Duarte.
30 de Setembro de 1998:
Prof. André Gonçalves Pereira, representante pessoal do Ministro dos Negócios Estrangeiros no grupo de reflexão sobre a Conferência Intergovernamental.
20 de Outubro de 1998:
Prof.° Maria João Rodrigues. Dr. António Vitorino. Dr. Alvaro de Vasconcelos. Prof. Nuno Severiano Teixeira.
Estiveram também presentes, na sessão de 15 de Setembro, a jornalista Maria de Lurdes Vale e, na sessão de 20 de Outubro, o jornalista Francisco Sarsfield Cabral, que intervieram na qualidade de comentadores dos oradores convidados.
I — Introdução
O Tratado de Amsterdão, assinado em 2 de Outubro de 1997, representa a conclusão dos trabalhos da Conferência Intergovernamental (CIG) que se iniciou no Conselho Europeu de Turim, realizado no dia 29 de Março de 1996, com a presença dos chefes de Estado e do Governo dos 15 Estados membros da União Europeia.
Esta Conferência estava já prevista no Tratado da União Europeia, assinado em Maastricht a 7 de Fevereiro de 1992, que estatuía, no n.°2 do artigo N, a convocação da mesma a fim de proceder à revisão daquele Tratado, uma vez que o mesmo inovava em diversos aspectos, nomeadamente na sua estrutura institucional, assente na fórmula dos pilares, sendo necessário proceder a uma avaliação da sua vigência e uma melhoria das questões que se revelassem de mais difícil implementação, segundo os objectivos da União e dos Estados membros.
O Grupo de Reflexão
Antes da CIG se iniciar, e tendo em consideração a necessidade de revisão dos tratados, já tinha sido designado um Grupo de Reflexão, presidido pelo espanhol Carlos Westendorp, que tinha como principal tarefa apresentar uma proposta de revisão dos mesmos que pudesse constituir uma base de trabalho para a Conferência.
Foi assim que, a 30 de Agosto de 1995, o Grupo de Reflexão — que incluia o Prof. Doutor André Gonçalves Pereira como representante português — apresentou um relatório intermédio, fixando prioridades na revisão dos tratados, como os princípios e objectivos da União, o sistema institucional, a cidadania, o espaço de liberdade e segurança, a política externa e de segurança comum e os instrumentos da União.
A 5 de Dezembro de 1995, o Grupo de Reflexão apresentou o seu relatório, que manteve os temas referidos no relatório intermédio, dividindo-se pelos seguintes capítulos: reforma da União Europeia, o cidadão e a União, instituições, actos, recursos e políticas e acção externa da Comunidade.
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Aquele relatório refere expressamente a sua preocupação com áreas como a promoção dos valores europeus, a criação de um espaço de liberdade e segurança interna, o emprego, o ambiente, a transparência das instituições europeias e a subsidiariedade, aliada à preocupação de um melhor
funcionamento e uma maior capacidade de acção externa da União, e a implementação de uma política de segurança e defesa europeia.
A Conferência Intergovernamental
Pouco depois da apresentação deste relatório, iniciou-se, no Conselho Europeu de Turim, a CIG, que decorreu entre Março de 1996 e Junho de 1997, sendo composta por representantes pessoais dos Estados membros, estando Portugal representado pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Dr. Seixas da Costa.
A CIG decorreu com uma frequência quase semanal, tendo a Assembleia da República, através da CAE, procedido a um acompanhamento muito pormenorizado dos trabalhos da Conferência, uma vez que o Sr. Secretário de Estado Dr. Seixas da Costa se deslocou, durante aquele período, por 14 vezes â Comissão para explicar o andamento dos trabalhos e recolher junto dos Srs. Deputados as suas opiniões sobre os assuntos que estavam em cima da mesa das negociações.
Além destas audições mais freqüentes, a CAE realizou audições com os Srs. Ministros da Defesa Nacional,. Dr. António Vitorino, da Administração Interna, Dr. Alberto Costa, e da Justiça, Dr. Vera Jardim. Estas audições incidiram especialmente sobre as matérias dos 2.° e 3." pilares do Tratado da União Europeia, uma vez que dos trabalhos da CIG ia resultando que estas duas estruturas institucionais iriam sofrer as alterações mais profundas.
Por outro lado, a realização dos conselhos europeus levou a que a Comissão realizasse audições com o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, Dr. Jaime Gama. após os Conselhos de Dublim, em Dezembro de 1996, e de Amsterdão, em Junho de 1997.
Também na perspectiva de acompanhamento da revisão dos tratados, a participação da CAE nas COSAC de Roma, Dublim e Haia merece uma especial referência, em especial a COSAC da Haia, que decorreu uma semana antes do Conselho de Amsterdão. A CAE publicou em tempo oportuno os documentos pertinentes.
Os Conselhos Europeus de 1996 e 1997
Durante o período em que a CIG decorreu, foram feitas avaliações dos seus trabalhos nos Conselhos Europeus de Florença, Dublim e Noordwijk, tendo a CIG encerrado os seus trabalhos no Conselho Europeu de Amsterdão, a 18 de Junho de 1997, sendo o Tratado posteriormente assinado, após a finalização dos trabalhos de redacção, no dia 2 de Outubro.
Os Conselhos de Florença e de Dublim, ainda no ano de 1996, já procederam à avaliação dos trabalhos da CIG, tendo mesmo sido realizados dois conselhos europeus em Dublim, o primeiro para abordar os avanços da CIG e o segundo para abordar as matérias habitualmente reservadas a estes conselhos.
No entanto, nas conclusões do Conselho Europeu de Dublim II (13 e 14 de Dezembro) já é possível extrair a congratulação do Conselho pelo facto de a presidência irlandesa ter já apresentado um «esboço geral do projecto de
revisão dos tratados», o que constituía uma boa base de trabalho para a conclusão da Conferência, agendada para Amsterdão.
Foi, no entanto, durante a presidência holandesa da União Europeia, que decorreu no 1.° semestre de 1997, que se
avançou definitivamente para os trabalhos finais da Conferência, que tiveram em consideração o conjunto de compromissos possíveis entre os Estados membros.
Efectivamente, no Conselho Europeu extraordinário de Noordwijk, realizado a 23 de Maio de 1997, foi apresentado já um projecto mais definitivo de Tratado, tendo o Conselho reafirmado a vontade de concluir a CIG no Conselho de Amsterdão, embora tal parecesse quase impossível, dada a falta de acordo ao nível em que a negociação decorria sobre um conjunto ainda apreciável de questões. Por isso, as negociações foram entregues aos membros do Conselho Europeu.
Finalmente, no dia 18 de Junho de 1997, e após um esforço notável, foi possível concluir o Conselho de Amsterdão com o anúncio de um acordo final sobre o Tratado, ficando a sua assinatura para mais tarde, dada a «necessária ultimação e harmonização definitiva dos textos sob o ponto de vista jurídico».
As principais alterações do Tratado
Embora o Tratado de Amsterdão tenha aprovado um conjunto grande de alterações ao Tratado da União Europeia, bem como tenha procedido à elaboração de uma versão compilada, em que se renumeram todos os artigos, a fim de facilitar a leitura do Tratado da União Europeia, é possível sistematizar as principais alterações, que constituem a base da análise dos outros capítulos deste relatório.
No entanto, é importante reter que o resultado final de Amsterdão se saldou por um conjunto de compromissos desta revisão dos tratados que, para muitos observadores, ficou aquém das expectativas criadas com uma tão longa conferência intergovernamental.
Assim, e na sequência do que tinha já sido proposto pelo Grupo de Reflexão, o Tratado de Amsterdão altera o Tratado da União Europeia em cinco áreas chave:
1) Liberdade, segurança e justiça;
2) A União e o cidadão;
3) Política externa efectiva e coerente;
4) As instituições da União;
5) Cooperação reforçada—flexibilidade.
Também é de assinalar a introdução de um novo título sobre o emprego no Tratado da Comunidade Económica Europeia.
II — Análise e avaliação do Tratado
O Tratado de Amsterdão pode ser dividido em três partes.
A primeira, e mais importante, é a que procede a alterações substantivas ao Tratado da União Europeia (artigo 1°), ao Tratado da Comunidade Europeia (artigo 2.°), ao Tratado CECA (artigo 3.°), ao Tratado EURATOM (artigo 4.°) e ao acto sobre a eleição dos representantes ao Parlamento Europeu por sufrágio directo e universal (artigo 5.°).
No próprio articulado do Tratado de Amsterdão se encontra a sua sistematização em três partes: a parte i contém as «alterações substantivas» aos tratados; a parte n ocupa-se da «simplificação dos tratados», eliminando disposições ca-
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ducas ou obsoletas e substituindo por números as letras que designavam alguns preceitos do Tratado de Maastricht, conforme dispõem as disposições gerais e finais; a parte é constituída exactamente por essas disposições, nomeadamente o artigo 12.°, que renumera os artigos, títulos e secções dos tratados.
A CIG aprovou também um certo número de actos (anexos, protocolos e declarações), cuja lista detalhada consta da Acta Final.
Quer a simplificação dos tratados (parte n) quer a nova numeração atribuída pelo artigo não merecem aqui mais do que uma referência.
A simplificação dos tratados reflecte uma preocupação do Grupo de Reflexão que produziu um relatório para a CIG. Simultaneamente, com a aprovação do Tratado de Amsterdão, tentaram os Estados membros simplificar o conjunto de tratados já existentes, a fim de facilitar a sua leitura e compreensão pelos cidadãos europeus.
Efectivamente, com as alterações aos tratados que instituíram as Comunidades Europeias no Acto Único e no Tratado de Maastricht, que aprovou também o Tratado da União Europeia, todo o enquadramento jurídico e institucional se tomou altamente complexo, nomeadamente com a introdução dos 2.° e 3.° pilares —com numeração autónoma—, pelo que se optou, no Tratado de Amsterdão, por publicar versões compiladas dos tratados que instituem a União Europeia e a Comunidade Europeia.
Esta preocupação de simplificação concretiza-se ainda no artigo 6.° do Tratado de Amsterdão, sendo que os cinco primeiros artigos deste Tratado alteram os tratados em vigor — o artigo I.° o Tratado da União Europeia, o artigo 2.° o Tratado da Comunidade Europeia, o artigo 3.° o Tratado da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, o artigo 4." o Tratado da Comunidade Europeia da Energia Atómica e o artigo 5.° o acto relativo à eleição dos representantes ao Parlamento Europeu.
Assim, o artigo 6." do Tratado de Amsterdão estipula um conjunto de alterações cujo objectivo único é retirar dos tratados existentes normas que já não fazem qualquer sentido (por exemplo, prazos que já expiraram referentes à União Aduaneira) e alterar normas remissivas, dadas as alterações de numeração entretanto operadas. Os anexos e protocolos aos tratados são também compatibilizados com as normas em vigor, a fim de que não constituam normativos cuja presença é desnecessária.
São ainda apresentados quadros de correspondência, assinalando as numerações anterior e a nova, a fim de que seja facilitada a compreensão e leitura dos tratados durante este período de transição. São ainda obviamente integrados os novos artigos aprovados pelo Tratado de Amsterdão, para que, no fim, se atinjam textos únicos — as versões compiladas, que integram também, no Tratado da União Europeia, os artigos dos 2.° e 3." pilares.
Embora estas versões compiladas constituam um avanço no processo de simplificação, ainda se constata uma formulação jurídica complexa no próprio conteúdo dos artigos, dificultando a sua compreensão para leitores não familiarizados com esta «floresta negra» jurídica, pelo que este objectivo se deverá manter numa futura revisão dos tratados.
Para os Deputados da Assembleia da República o que mais interessa analisar são as alterações substantivas e fazer a sua avaliação de um ponto de vista da Assembleia da República.
Como alterações substantivas avultam a consagração expressa do respeito pelos direitos fundamentais (artigo 6.°, n.° 1, do Tratado da União Europeia), que dá à União Europeia uma expressão de defesa activa dos regimes democrá-
ticos, a introdução de um processo sancionatório por violação grave e persistente dos direitos fundamentais (artigo 7." do Tratado da União Europeia), a atribuição de competências ao Tribunal de Justiça para fiscalizar a observância, por parte dos órgãos comunitários, dos direitos fundamentais [artigo 46.°, alínea d), do Tratado da União Europeia] e a extensão das cláusulas de não discriminação baseada no sexo, raça, origem étnica, religião, crença, deficiência, idade ou orientação sexual (artigo 13." do Tratado da Comunidade Europeia).
1 — Alterações no domínio do espaço de liberdade, segurança e justiça
Algumas alterações substantivas dizem respeito à cooperação policial e judiciária em matéria penal, no âmbito da qual se abriu caminho para uma comunitarização das competências relativas à concessão de vistos, direito de asilo, imigração e outras medidas relativas à livre circulação de pessoas (título iv do Tratado da Comunidade Europeia), das quais ficaram excluídas o Reino Unido e a República da Irlanda.
Deste modo estas medidas caem sob a alçada do Tribunal de Justiça (artigo 68° do Tratado da Comunidade Europeia). Dentro do prazo de cinco anos far-se-á transitar a competência do Conselho de Ministros relativa à passagem de vistos e ao visto uniforme que requer a unanimidade para o âmbito do processo de co-decisão, nos termos do artigo 67.° do Tratado da Comunidade Europeia.
Após cinco anos a contar da entrada em vigor do Tratado de Amsterdão a Comunidade poderá tomar medidas, por co-decisão, em matéria de cooperação policial e judiciária em matéria civil.
No Protocolo que integra o acervo de Schengen no âmbito da União Europeia e da Comunidade Europeia lê-se, preventivamente, que as disposições deste «só são aplicáveis se, e na medida em que, forem compatíveis com a legislação da União Europeia e da Comunidade», e assinala-se que essa integração se insere no âmbito da cooperação reforçada, uma das novidades do Tratado de Amsterdão.
Como dispositivos mais relevantes desse Protocolo assinalam-se a substituição do actual Comité Executivo de Schengen pelo Conselho de Ministros da Comunidade Europeia. Será, aliás, o Conselho que, deliberando por unanimidade, determinará, nos termos dos tratados, a base jurídica comunitária de cada uma das disposições do acervo de Schengen (artigo 2.° do Protocolo). Enquanto este complexo trabalho de classificação jurídica durar, o acervo de Schengen é regulado pelo título vi do Tratado da União Europeia.
Que estes dispositivos tiveram em conta o próximo alargamento está explícito no artigo 8." do Protocolo, que refere que as medidas tomadas pelas instituições neste âmbito devem ser aceites «na totalidade por todos os Estados candidatos à adesão».
Também é relevante assinalar que o artigo.7.° do referido Protocolo dispõe que o Conselho, deliberando por maioria qualificada, adoptará as modalidades de integração do Secretariado Schengen no Secretariado-Geral do Conselho.
Em suma, com a aprovação do Tratado de Amsterdão transitam para o l.°pilar as políticas de visto, imigração e asilo e outras relacionadas com a livre circulação de pessoas, havendo um prazo de cinco anos para se definirem as modalidades dessa transposição do domínio intergovernamental para o domínio comunitário. No 3.° pilar continuam as disposições relativas à cooperação policial e judiciária em matéria penal (artigo K. 1 a K.14).
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O acervo de Schengen foi incorporado no quadro da União, constituindo matéria própria da outra inovação deste Tratado: a cooperação reforçada.
Avaliação. — Na Cimeira de Amsterdão, pela primeira vez desde a queda do muro de Berlim, os dirigentes europeus deram um sinal claro de que a defesa dos direitos humanos e a promoção das liberdades públicas nos regimes democráticos representativos não eram um mero instrumento de luta ideológica.
A introdução, no Tratado da União Europeia, de potentes princípios políticos democráticos, como aqueles que agora figuram no seu artigo F (futuro artigo 6.°, n.° 1), segundo os quais a União Europeia se funda «nos princípios da liberdade, da democracia, do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais, bem como do Estado de direito», vem, assim, preencher uma lacuna importante.
Quer na perspectiva da criação de um espaço europeu de liberdade, segurança e justiça, quer na perspectiva do alargamento, esse aditamento ao Tratado de Maastricht pode servir de garantia sobre a impossibilidade de retrocesso a nível europeu do que a tanto custo se ganhou a nível dos Estados nacionais.
Os princípios fundamentais nos quais assenta a União Europeia e o complexo de liberdades, direitos e garantias, assumido a nível interno como a nível europeu, são condições prévias aos necessários desenvolvimentos políticos a nível comunitário para a criação de um espaço de liberdade, segurança e justiça, corolário da livre circulação de pessoas, mercadorias e capitais.
' Já nos EUA foram as primeiras 10 emendas à Constituição de 1787, conhecidas como The Bill of Rights, aprovadas em 1789, e mais tarde as emendas 13 e 14, derivadas do combate à escravatura e pela promoção dos direitos civis (só possíveis em 1865-1868, depois da guerra civil), que permitiram o reforço da União como garante do aprofundamento da cidadania democrática. Na América do Norte a União começou pelo reforço dos direitos dos cidadãos e dos Estados membros. E foi a União quem se impôs aos Estados federados na questão dos direitos cívicos em pleno século xx.
Ora, enquanto persistir o difuso sentimento entre nós, Europeus, de que as liberdades públicas e a participação democrática estão melhor garantidas a nível nacional do que a nível comunitário, não será possível ir mais longe do que se foi em Amsterdão, e essa é uma reflexão que obriga a todos e apela aos europeístas ao bom combate pela causa da liberdade, da justiça e da segurança.
Um dos sinais desse mal-estar pode ser visto pelo atraso nas ratificações dos acordos e convenções que de alguma maneira dizem respeito ao chamado «3.° pilar» por parte dos Estados signatários.
Quanto à extradição de nacionais, ela agora é admitida em Portugal, depois da revisão constitucional, «em condições de reciprocidade estabelecidas em convenção internacional, nos casos de terrorismo e de criminalidade internacional organizada, e desde que a ordem jurídica do Estado requisitante consagre garantias de um processo justo e equitativo» (artigo 33.°, n.° 3, da Constituição da República Portuguesa).
O esforço do constituinte nacional não encontra, porém, muitos exemplos inspiradores a nível de outros Estados.
Agiu bem o legislador ao só admitir tal excepção em condições de reciprocidade e,certamente para comprometer mais o Estado na luta contra a criminalidade e não para a transferir para qualquer outro Estado.
É certo que o combate aos actos terroristas e ao crime organizado é uma exigência da nossa civilização de Uberdade e da nossa comunidade de direito.
Por outro lado, como é do conhecimento geral, é da exclusiva competência da Assembleia da República, salvo autorização dada ao Governo, legislar sobre direitos, liberdades e garantias e definir os crimes e as penas e sobre o processo criminal (artigo 165.° da Constituição da República Portuguesa).
Os Portugueses estão, aliás, perante um novo ordenamento
jurídico nestas matérias derivadas da revisão do Tratado de Maastricht e da revisão da Constituição.
Ora, dentro de cinco anos a Comunidade poderá tomar medidas em matéria de cooperação policial e judiciária em matéria penal, no domínio da cooperação judiciária em matéria civil, e em matéria de asilo e imigração.
Não deixa de ser importante aqui voltar a acentuar que a nível da COSAC (Conferência dos Órgãos Parlamentares Especializados em Assuntos Europeus) se conseguiu impor à CIG a consagração do seu papel nestas matérias.
A integração do acervo de Schengen foi, sem dúvida, um dos passos mais significativos dados pela CIG. Deste modo, a transparência dos actos relacionados com Schengen sofreu uma melhoria qualificada e termina-se com a falta de suporte legal público que belisca as concepções democráticas de uma verdadeira União Europeia comunidade de direito. Doravante as normas sobre cooperação policial e judiciária em matéria civil serão publicadas no Jornal Oficial das Comunidades.
E também relevante o disposto no já referido artigo 8.° do Protocolo que obriga os novos Estados membros a aceitar na sua integralidade o acervo de Schengen. Mais uma vez se demonstra que o Tratado de Amsterdão teve em conta alguns dos problemas colocados pelo futuro alargamento.
in — Alterações institucionais
A) Papel dos parlamentos nacionais
A Assembleia da República vê acrescidas as suas responsabilidades e competências em matéria de União Europeia quer pelos termos do Tratado de Amsterdão quer pelos termos da quarta revisão da Constituição da República Portuguesa, ocorrida em 1997 .
. Esta última introduziu no artigo 161.°, sobre as competências política e legislativa da Assembleia da República, uma nova alínea, a n), que lhe confere a competência de «pronunciar-se, nos termos da lei, sobre as matérias pendentes de decisão em órgãos no âmbito da União Europeia que incidam na esfera da sua competência legislativa reservada», o que, nomeadamente nas matérias ditas do 3.° pilar respeitantes ao espaço de liberdade, segurança e justiça, há-de revelar-se precioso e exigente.
Este direito de pronúncia poderá ser exercido através de resoluções da Assembleia da República que tracem o quadro no qual o Governo terá de movimentar, mas será de evitar a modalidade do chamado «mandato imperativo», paralisador dos processos negociais a nível internacional.
Acresce que o novo regime jurídico de transposição de directivas comunitárias, consagrado no artigo 112.°, n.° 9, da Constituição da República Portuguesa, prescreve que «a transposição de directivas comunitárias para a ordem interna assume a forma de lei ou de decreto-lei, conforme os casos». Assim, a Constituição passou a atribuir essencialmen-
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te à actividade legislativa a tarefa de incorporar a norma comunitária na ordem interna, o que vem aumentar também o papel da Assembleia da República nesse campo.
Como já foi assinalado, essa norma corresponde às orientações do Tribunal de Justiça das Comunidades quando este recomenda que o direito comunitário derivado seja transposto por normas dotadas inequivocamente de «força de lei», «eficácia externa» e a necessária publicidade e transparência, que entre nós significa a publicação das normas no Diário da República.
O próprio Tratado de Amsterdão reconhece um papel relevante aos parlamentos nacionais no acompanhamento do processo legislativo ºomunitário.
Assim, o Protocolo n." 13, relativo ao papel dos parlamentos nacionais na União Europeia veio reforçar e densificar as medidas previstas na quarta revisão da Constituição da República Portuguesa.
Deste modo, todos os documentos de consulta da Comissão serão prontamente enviados aos parlamentos nacionais dos Estados membros, assim como as propostas legislativas da Comissão serão transmitidas atempadamente, por forma que cada governo as possa enviar ao respectivo parlamento.
Convém aqui referir que o presidente da CAE, da Assembleia da República, em sucessivas intervenções nas COSAC realizadas em Dublin, no Luxemburgo, na Haia, em Londres e em Viena, defendeu que a Comissão da Comunidade Europeia deveria enviar directamente aos parlamentos nacionais todos os documentos e iniciativas, por forma que o acompanhamento precoce do processo legislativo comunitário seja possível e assim se possa dar conteúdo ao direito de pronúncia parlamentar.
De qualquer maneira, o mesmo Protocolo n.° 13 impõe um prazo de seis semanas entre a data em que uma proposta legislativa, ou uma proposta de medida a adoptar (nomeadamente em aplicação do título vi do Tratado da União Europeia), é transmitida pela Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho, em todas as línguas, e a data em que esta é inserida na agenda do Conselho para deliberação, com vista à adopção quer de um acto legislativo, quer de uma posição comum nos termos dos artigos 189.°-B ou 189.°-C do Tratado da Comunidade Europeia.
Avaliação. — Dá-se deste modo um reforço do acompanhamento e controlo da Assembleia da República no processo legislativo comunitário, que obrigará, em princípio, depois da ratificação, por Portugal, do Tratado de Amsterdão, à revisão da actual Lei n.° 20/94.
A partir da conjugação das novidades da revisão constitucional e do Tratado de Amsterdão sobre o papel dos parlamentos nacionais fica assegurado entre nós o primado da Assembleia da República no processo legislativo interno em matérias comunitárias.
A revisão constitucional de 1997 concedeu à Assembleia da República o direito de pronúncia sobre matérias pendentes de decisão nos órgãos comunitários que sejam de sua competência legislativa reservada [artigo 161.°, alínea n)\ e o primado legislativo (artigo 112.°, n.° 9).
Com efeito, o primado da Assembleia da República no processo de transposição de directivas é agora assegurado pela obrigatoriedadede a forma da lei ser ou um decreto-lei ou uma lei. Nenhum destes actos de incorporação das directivas pode ser subtraído à esfera de competências da Assembleia da República se esta o quiser.
Aliás, compreende-se melhor este novo impulso à participação dos parlamentos nacionais nas questões europeias se se tiver em conta que a União Europeia passará a tratar de muitas matérias relacionadas com os direitos, liberdades e «garantias, e não apenas de questões económicas.
A CAE já iniciou um processo de maior participação nestas matérias, quer no acompanhamento das matérias de Schengen, quer no próprio acompanhamento do processo legislativo comunitário, como aconteceu com a aprovação do relatório sobre as Directivas Auto-Oil.
B) Parlamento Europeu
Estes desenvolvimentos sobre o novo papel dos parlamentares nacionais em nada pretende diminuir a importância do Parlamento Europeu na sua esfera de influência. E essa encontra-se sublinhada no Tratado.
Segundo o relatório do próprio Parlamento Europeu, «será no domínio da legislação comunitária que se farão sentir as consequências práticas das reformas introduzidas pelo Tratado de Amsterdão».
Com efeito, os múltiplos processos decisórios que envolviam o Parlamento Europeu foram reduzidos a três práticas (co-decisão, parecer favorável e consulta) e eliminaram-se figuras pouco utilizadas, como a 3.° leitura pelo Conselho de Ministros.
Alargou-se o processo de co-decisão a 24 novos domínios, embora não se tenha tocado, por exemplo, no artigo 43.° do Tratado da Comunidade Europeia, sobre política agrícola, no artigo 87.", sobre política de concorrência, no artigo 99.°, sobre harmonização fiscal, e no artigo 100.°, sobre a aproximação das legislações, em relação aos quais se continua apenas a prever a consulta do Parlamento Europeu.
O Parlamento Europeu foi, no entanto, contemplado com a necessidade do seu parecer favorável para a nomeação do presidente da Comissão e para a aplicação de sanções dos Estados membros que violem os princípios da União.
Por outro lado, o número máximo de Deputados foi fixado em 700.
C) Conselho de Ministros
As questões em debate foram:
O aumento da transparência;
A extensão do voto por maioria qualificada;
A reponderação de votos entre os Estados membros.
A extensão da votação por maioria qualificada revestia uma- importância decisiva em termos de eficácia do funcionamento e no avanço das políticas comuns, sobretudo na perspectiva do alargamento, mas com incidências práticas mesmo no actual quadro.
No Tratado da Comunidade Européia o voto por maioria qualificada foi alargado apenas às áreas da investigação e do desenvolvimento.
Subsiste, assim, a regra da unanimidade em muitas matérias respeitantes à coesão económica e social, como a protecção dos trabalhadores em fins de contrato, as contribuições financeiras para a promoção e a criação de empregos, a representação colectiva dos interesses dos trabalhadores, assim como as condições de emprego dos trabalhadores migrantes. Ora, a manutenção da unanimidade nas matérias sociais não tem em conta a introdução da moeda única e a necessidade de uma maior mobilidade da mão-de-obra.
Deste modo, só no Tratado da Comunidade Económica recensearam-se pelo menos 44 artigos que continuam a requerer o voto por unanimidade, entre os quais o artigo 99.°, relativo à harmonização fiscal, o artigo 130.°, relativo à política industrial, e ainda o artigo 130.°-D, relativo aos fundos estruturais.
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Quanto à transparência, ficou consagrada uma maior publicidade dos debates no Conselho de Ministros quando
este órgão actua na sua função legislativa.
D) Comissão — Alterações introduzidas em Amsterdão
A designação do presidente da Comissão ficou agora dependente do parecer favorável do Parlamento Europeu e o seu papel no interior da Comissão reforçado pela Declaração n.° 32, sobre a atribuição de pelouros aos outros comissários.
Quanto ao número de comissários, questão também conhecida como a da composição da Comissão, ficou estabelecido que este órgão não ultrapassará os 20 membros.
A conexão entre a composição do Executivo e a ponderação de votos no Conselho dá bem a ideia das dificuldades nestas pequenas reformas institucionais e está bem expressa no Protocolo n.° 11 do Tratado, cujo artigo 1." aqui se transcreve, pela sua importância no futuro da evolução da política da União:
Artigo 1."
À data da entrada em vigor do primeiro alargamento da União [...] a Comissão será composta por um nacional de cada Estado membro, desde que, nessa data, a ponderação dos votos no Conselho tenha sido alterada, através de uma nova ponderação dos votos ou de uma dupla maioria, de forma aceitável por todos os Estados membros, tendo em conta todos os elementos pertinentes, nomeadamente compensando os Estados membros que prescindam da possibilidade de designar um segundo membro da Comissão.
Trocar comissários por votos no Conselho de Ministros dá bem a ideia dos limites e das características das reformas institucionais em jogo e que se relacionam com o equilíbrio entre Estados.
E) Tribunal de Justiça
E um dos órgãos mais beneficiados com a revisão dos tratados. Note-se qué pela primeira vez são criadas competências em termos de jurisprudência do Tribunal de Justiça no domínio da cooperação intergovernamental.
As principais alterações dizem respeito aos domínios do espaço de liberdade, justiça e segurança.
Com efeito, até Amsterdão o Tribunal de Justiça só tinha competências neste domínio desde que estas lhe fossem expressamente atribuídas por outros diplomas de direito internacional, nomeadamente por convenções.
O novo artigo K.7 atribui ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias novas competências, sendo umas obrigatórias e outras facultativas. São competências obrigatórias as suscitadas por recursos interpostos pela Comissão, ou por um Estado membro, para fiscalizar a legalidade de decisões quadro; o Tribunal tem competências para fiscalizar violações de formalidades, desvios de poder e violações do Tratado. Entre as competências obrigatórias encontram--se ainda as derivadas de diferendos entre Estados membros relacionados com a interpretação, ou a execução, de actos jurídicos, quando estes não sejam resolvidos pelo Conselho no prazo de seis meses.
Estas normas constituem uma absoluta novidade, alargando o âmbito de actuação do Tribunal para lá do pilar comu-
nitário. A sua relevância é tanto maior quanto se sabe que houve matérias do 3.° pilar que foram comunitarizadas com o Tratado de Amsterdão — novo título iv, sobre vistos, asilo, imigração e outras políticas relativas à circulação de pessoas—, podendo pensar-se que já aí o Tribunal de Justiça ganharia poderes de interpretação em matérias sobre as quais nunca se tinha pronunciado.
Assim, com o Tratado de Amsterdão, assiste-se a um claro alargamento do controlo jurisdicional, em especial nas matérias da livre circulação de pessoas e no 3.° pilar, mas apenas para os Estados que assim o declarem.
O Govemo Português, propondo no artigo 2." da proposta de resolução n.° II8/VTÍ que aceita a competência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias nos termos previstos no artigo K.7, abre assim a possibilidade para que, em Portugal, matérias que até aqui eram apenas decididas em instâncias nacionais possam, caso se considere adequado para o bom julgamento da causa, ser objecto de uma interpretação pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, o que reforçará claramente a segurança jurídica da decisão posterior que vier a ser tomada pelo tribunal nacional que suscitou a questão prejudicial.
F) Tribunal de Contas
Foi atribuído ao Tribunal de Contas a consagração de órgão formal da União Europeia. Os Estados membros são convocados a cooperarem com o Tribunal de Contas, num espírito de confiança e respeitando a sua independência.
Em relação aos outros órgãos da União Europeia o Tribunal de Contas pode interpor recurso directo para o Tribunal de Justiça.
G) Comité Económico e Social e Comité das Regiões
Estes dois órgãos consultivos no processo legislativo àa União foram dotados de estruturas administrativas próprias e serão agora consultados obrigatoriamente no âmbito da política do emprego e da política social.
O Comité das Regiões reforçou o seu papel consultivo nos domínios dos transportes, da saúde pública e do ambiente.
Note-se que estes órgãos, como o Comité das Regiões ou o Conselho Económico e Social, anseiam por poder accionar directamente o Tribunal de Justiça, o que dá uma ideia da sua importância no funcionamento da União Europeia.
Avaliação. — O tópico da hipotrofia das reformas institucionais alcançadas em Amsterdão merece o consenso geral, mas o clamor só subiu de tom após a assinatura do Tratado, ou seja, quando já não havia nada a fazer.
É certo que a Bélgica, a França e a Itália produziram uma declaração relativa ao Protocolo n.° 11, sobre a evolução das reformas institucionais na perspectiva do alargamento. Estes países consideram que o Tratado de Amsterdão não dá resposta à necessidade de se efectuarem progressos substanciais na via do reforço das instituições da União Europeia e que esse reforço é condição indispensável para a conclusão das primeiras negociações de adesão dos países candidatos. Esses Estados membros declaram-se determinados a dar todo o seguimento adequado ao Protocolo no que diz respeito à composição da Comissão e à ponderação de votos no Conselho de Ministros e consideram também que uma significativa extensão do recurso ao voto por maioria qualificada é indispensável na perspectiva do alargamento.
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Só mais tarde se verá se o que está em jogo é a reforma das instituições ou a própria extensão do alargamento.
Está generalizada esta convicção da hipotrofia das alterações institucionais. O próprio Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 531/98, que recusou a pergunta colocada a referendo pela Assembleia da República, afirma taxativamente:
As reformas institucionais, que não foram profundas, incidiram em especial sobre a extensão de competência do Parlamento, do Tribunal de Justiça e do Comité das Regiões. [Suplemento ao Diário da República, 1." série, n.° 174, de 30 de Julho de 1998, p. 3660-(7).]
Há uma preocupação generalizada sobre a necessidade de democratizar as instituições e os órgãos da União Europeia.
O principal travão a essa democratização tem sido a percepção difusa de que nem sempre democratização a nível europeu significa maior equilíbrio entre Estados ou maior igualdade efectiva entre cidadãos.
Deste modo, não houve ainda maneira de conjugar harmoniosamente reformas institucionais com democratização nem democratização com equilíbrio entre os Estados. Daí os receios que tudo paralisam.
E, se se analisar bem o vigor da vertente intergovernamental da União Europeia, este tem muito a ver com as melhores condições possíveis para a manutenção do equilíbrio entre os Estados membros. Se não houvesse receio do estabelecimento de um desequilíbrio ainda maior entre países e entre regiões dos Estados membros, a necessidade de reformas institucionais capazes de preencherem o célebre défice democrático dos órgãos comunitários já se teria imposto perante o aplauso geral.
Há, pois, que romper com o círculo vicioso entre a necessidade de uma maior democratização das instituições comunitárias e o receio que essas reformas venham a introduzir uma maior desigualdade entre os Estados membros.
Nesse particular, as recentes propostas de alteração da composição da Comissão, ou de alteração da ponderação de votos de cada país no Conselho de Ministros, não são particularmente felizes e nem sequer são ousadas. Por um lado, elas, isoladas, já perturbam o actual equilíbrio existente entre os Estados, e, em conjunto, indiciam uma filosofia assente no agravamento da desigualdade entre Estados membros como base da União Europeia; por outro lado, não resolvem nenhum dos reais problemas institucionais requeridos pelo alargamento. Daí a prudência no tratamento que estes temas mereceram na revisão do Tratado. Nem o que foi aprovado nem as propostas em suspenso são respostas cabais ao desafio do alargamento. Uma nova dimensão política impõe-se para tornar eficaz o funcionamento e a solidariedade da União Europeia e ao mesmo tempo definir as características finais desta.
Uma maior democraticidade no funcionamento das instituições comunitárias não pode consistir apenas no reforço dos poderes das maiores potências europeias. Isso seria o fim da experiência comunitária iniciada com o Tratado de Roma. Foi o facto de não ler havido um «directório» dos mais poderosos que permitiu o sucesso da integração europeia desde 1957 até agora.
Se o que foi decidido na CIG não satisfaz ninguém, o oue é certo é ter sido esse o entendimento geral dos governos que negociaram e assinaram o Tratado de Amsterdão. Seria, pois, absurdo recusar a sua ratificação com o pretexto de que as reformas institucionais são insuficientes.
Assiste-se agora a uma fase de maior envolvimento prévio dos parlamentares nacionais nas discussões prospectivas sobre a reforma das instituições comunitárias, o que obriga os Deputados a um escrupuloso escrutínio sobre o mandato que possuem para o tratamento comprometedor destas questões antes de outros órgãos de soberania encarregues da política externa, como seja o Governo, a quem cabe o chamado treaty making power.
A Assembleia da República não se poderá comprometer previamente com qualquer matéria sobre a qual se tenha de pronunciar em termos de decisão final e última, como seja a aprovação, para ratificação, das propostas de resolução do Governo sobre tratados internacionais.
Ainda no domínio das reformas institucionais, é de referir que no artigo 2.° da proposta dè resolução em apreço a República Portuguesa declara aceitar a competência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias para decidir, a título prejudicial, sobre a validade e a interpretação das decisões quadro e das decisões sobre a interpretação das convenções estabelecidas ao abrigo do título vi do Tratado da União Europeia e sobre a validade e a interpretação das respectivas medidas de aplicação.
Para o efeito, de acordo com as regras previstas na alínea b) do n.° 3 do futuro artigo 35." (ex-K.7) do Tratado da União Europeia, qualquer órgão jurisdicional nacional pode pedir ao Tribunal de Justiça que se pronuncie, a título prejudicial, sobre uma questão em processo pendente perante esse órgão jurisdicional relativo à validade ou interpretação de um acto se considerar que uma decisão sobre essa questão é necessária ao julgamento da causa.
Note-se que a República Portuguesa não era obrigada, nos termos do próprio Tratado, a declarar desde já essa aceitação das competências do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias nesta matéria, pois no n.° 2 do referido artigo 35.° se prevê que tal declaração seja feita «posteriormente, a todo o tempo, qualquer Estado membro pode aceitar a competência do Tribunal de Justiça para decidir a título prejudicial nos termos do n.° 1».
Mais vale cedo do que nunca?
O que é certo é ficar a República Portuguesa numa atitude francamente comunitária com esta atitude.
Assim, embora se partilhe a insatisfação geral com o actual funcionamento das instituições da União Europeia, e muito em especial com o défice democrático e o de transparência na elaboração e aprovação da legislação comunitária, a avaliação feita do que está em jogo leva a não fazer depender a ratificação do Tratado de Amsterdão pela República Portuguesa de novas alterações institucionais.
IV — Introdução de um novo título no Tratado da Comunidade Europeia sobre emprego
Como resultado da gravidade das questões colocadas pela questão do emprego a nível europeu e das possíveis consequências no mercado do trabalho da adopção do euro, alguns dirigentes europeus, entre os quais o Primeiro-Ministro de Portugal, chamaram várias vezes a atenção para a lacuna existente na política comunitária a esse respeito.
As alternâncias governamentais no Reino Unido, na Itália e na França tomaram possível a consagração da dimensão social no Tratado revisto. Desde logo com a inclusão da Carta Social ,no título xi do Tratado da Comunidade Europeia (artigos 136.° e seguintes), levantado que foi o opiing-out britânico. Esta política social mantém a exigência de unanimidade no Conselho de Ministros e é submeti-
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da ao processo de co-decisão entre o Conselho e o Parlamento Europeu. Esta política social é reforçada pelo aprofundamento dos regimes relativos à saúde e à protecção dos consumidores nos títulos xin e xiv do Tratado da Comunidade Europeia.
Doravante os Estados membros estão comprometidos no desenvolvimento de uma estratégia coordenada erh matéria de emprego (artigo 125." do referido Tratado).
Avaliação. — Embora não haja, no domínio da política social e do emprego, uma extensão de competências concretas nem extensão do voto por maioria qualificada, a mera inclusão de um novo título sobre emprego, assim como a existência de um Comité de Emprego, obrigará o Conselho Europeu e o Conselho de Ministros a pronunciarem-se sobre os planos nacionais de emprego e, assim, a passar de uma atitude curativa para uma atitude preventiva», onde se inclui necessariamente a consideração de novos critérios, como o da empregabilidade e o da preparação profissional e educativa dos recursos humanos em cada um dos países.
Deste modo nas futuras conversações sobre a Agenda 2000 e o novo Quadro Comunitário de Apoio estes novos critérios de empregabilidade e de formação educativa e profissional terão de se impor no âmbito desta dimensão da coesão social entre Estados membros. Trata-se de encarar os trabalhadores, não como meros agentes económicos, mas como cidadãos da União Europeia.
Como se escreve no parecer da Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social desta Assembleia da República:
O Tratado de Amsterdão consagra alterações relevantes na estrutura normativa comunitária nomeadamente nos domínios sociais, dando maior dimensão ao conceito comummente aceite de modelo social europeu [...]
É pois toda uma política social europeia que se joga na promoção do emprego, nas condições de empregabilidade, na protecção aos trabalhadores e na paridade entre sexos.
V — As regiões ultraperiféricas no Tratado
O futuro artigo 299.° (ex-artigo 227.° do Tratado da Comunidade Europeia) consagra no seu n.° 2 uma atenção especial aos departamentos franceses ultramarinos, aos Açores, à Madeira e às ilhas Canárias, ou seja, às chamadas «regiões ultraperiféricas» do Protocolo do Tratado de Maastricht.
Na sua parte operativa o articulado dispõe que «o Conselho, deliberando por maioria qualificada, sob proposta da Comissão e após consulta ao Parlamento Europeu, adoptará medidas específicas destinadas, em especial, a estabelecer as condições de aplicação do presente Tratado a essas regiões, incluindo as políticas comuns.
O Conselho, ao adoptar as medidas pertinentes a que se refere o parágrafo anterior, terá em consideração domínios como as políticas aduaneira e comercial, a política fiscal, as zonas francas, as políticas nos domínios da agricultura e das pescas, as condições de aprovisionamento em matérias-primas e bens de consumo de primeira necessidade, os auxílios estatais e as condições de acesso aos fundos estruturais e aos programas horizontais da Comunidade.»
Tal consagração é uma notável conquista para as Regiões Autónomas e beneficia o Estado nas futuras negociações sobre a Agenda 2000 e as perspectivas financeiras do orçamento comunitário e os novos regulamentos dos diversos fundos.
Avaliação. —Consultadas, por iniciativa do presidente da Comissão de Assuntos Europeus, as Assembleias Legislativas Regionais sobre estes dispositivos, foram recebidos os dois pareceres que se anexam. A Assembleia Legis/atiVa Regional da Madeira afirmou que «sempre apoiou a integração na União Europeia e defende um estatuto especial decorrente da sua ultraperificidade, concorda com a ratificação do Tratado» e, de forma particular, com o regime aplicável às regiões ultraperiféricas propiciador de «impulsos especiais do desenvolvimento destas regiões, no sentido do reforço da coesão nacional e europeia».
Também a Assembleia Legislativa Regional dos Açores se pronunciou por unanimidade no sentido de ratificação, embora com uma declaração de voto do Deputado comunista Paulo Valadão, em que refere o seu entendimento de que a consagração da ultraperificidade é de tal forma imperativa «que obriga à assunção de medidas específicas com carácter permanente». O que torna mais expressivo o que se espera dessa inovação como factor positivo.
Estas disposições podem ser de muita valia na futura discussão sobre as perspectivas financeiras da União Europeia e a aprovação de programas especiais para as regiões ultraperiféricas, constituindo assim um reforço para a necessária coesão económica e social entre os Estados membros.
Nesse sentido foram introduzidas nas Grandes Opções do Plano para 1999, na epígrafe respeitante às Regiões Autónomas, dois parágrafos que implicam com as responsabilidades nacionais nesta matéria, e que se transcrevem:
A consagração das regiões ultraperiféricas no Tratado de Amsterdão obriga a ter em conta as necessidades especiais de apoio ao seu desenvolvimento, nomeadamente nos domínios financeiro, dos transportes, da energia, da agricultura, das pescas, da educação e da formação profissional em geral.
Daí que o Governo dê particular destaque às Regiões dos Açores e da Madeira no estabelecimento do próximo quadro financeiro da União Europeia.
Como em outros domínios só depois do encerramento dos debates sobre a Agenda 2000, e sobre as perspectivas financeiras da União até ao ano 2006, se poderá avaliar o real significado em termos de coesão económica e social do que foi aprovado em Amsterdão. Sendo certo que a letra do Tratado é superior às contingências das negociações políticas.
VI — Alterações introduzidas na PESC
O título v do Tratado de Maastricht, assinado em 1992, trata de política externa e de segurança comum (a PESC), embora fazendo a devida vénia a todas as outras instituições de segurança europeia, nomeadamente à UEO e à Aliança Atlântica, e permite uma análise de conteúdo de complementaridade entre a União Europeia (UE) e a Aliança Atlântica em diversas partes do seu articulado. Pela primeira vez um documento jurídico da Comunidade Europeia se refere à política de defesa. É, pois, algo de extremamente recente na história dos seus Estados membros.
Entre os objectivos da PESC contavam-se os da manutenção da paz e o reforço da segurança internacional ettv conformidade com os princípios da Carta das Nações Unidas (1945), do Acto Final de Helsínquia (1975) e da Carta
de Paris (Novembro de 1990).
Não havia referência aos propósitos da Aliança Aüânti-ca, o que se podia compreender pela necessidade de não fera
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formalmente a República da Irlanda e os então candidatos como a Áustria, a Suécia e a Finlândia, países neutrais ou neutralizados.
Na revisão do Tratado da União Europeia, o título v, que trata das disposições relativas à política externa e de segurança com as modificações mais pertinentes para o nosso propósito dizem respeito ao actual artigo J.7 (antigo J.4).
Assim, no seu n.° l pode ler-se que:
A PESC abrange todas as questões relacionadas com a segurança da União, incluindo a definição gradual de uma política de defesa comum [...] o que poderá conduzir a uma defesa comum se o Conselho Europeu adoptar uma decisão nesse sentido [...]
O novo conceito a reter depois de Amsterdão é, pois, a noção de gradualismo na abordagem da questão.
A UEO faz parte integrante do desenvolvimento da União, proporcionando à União o acesso a uma capacidade de defesa operacional [...] A UEO apoia a União, definindo os aspectos relativos à defesa. «A União incentivará, por conseguinte, o estabelecimento de relações institucionais mais estreitas com a UEO, na perspectiva da possibilidade de integração da UEO na União, se o Conselho Europeu adoptar uma decisão neste sentido.»
Em ambos os temas caberá aos Estados membros procederem à ratificação interna desses novos compromissos internacionais nos termos das respectivas normas constitucionais.
Tudo, aliás, é deixado ao critério soberano dos Estados membros nesse capítulo, mesmo a cooperação em matéria de armamento, tendo em conta a gradual definição de uma politica de defesa comum.
Um passo em frente é dado, no entanto, no que diz respeito à consagração no Tratado das Chamadas «Missões de Petersberg», definidas em Junho de 1992 pelos Ministros da Defesa da UEO. Assim, o n.° 2 do artigo J.7 afirma que:
As questões a que se refere o presente artigo incluem missões humanitárias e de evacuação, missões de manutenção da paz e missões de força de combate para a gestão de crises, incluindo missões de restabelecimento da paz.
Para essas missões — e só para essas missões na letra do Tratado — a UE recorrerá à UEO para preparar e executar as decisões e as acções no domínio da defesa.
O n.° 4 desse artigo J.7 recupera o espírito e parte da letra do anterior n.° 5 do ex-artigo J.4 ao afirmar:
O disposto no presente artigo não obsta ao desenvolvimento de uma cooperação mais estreita entre dois ou mais Estados membros a nível bilateral, no âmbito da UEO e a Aliança Atlântica, na medida em que essa cooperação não contrarie nem dificulte a'cooperação prevista no presente título.
Muito significativamente os Estados membros da União Europeia resolveram precisar a liberdade de cada um nestas matérias com a aprovação de um protocolo relativo ao citado artigo J.7 do Tratado da União Europeia, que estabelece os mecanismos para o reforço da cooperação recíproca entre a UE e a UEO, ao considerar que:
, A política da União, nos termos do artigo J.7, não afecta o carácter específico da política de segurança e de defesa de •determinados Estados membros, respeitará as obrigações dos Estados membros que vêem a
sua defesa comum realizada na NATO no âmbito do Tratado do Atlântico Norte e será compatível com a política de segurança e de defesa comum adoptada nesse âmbito.
A UEO é colocada assim no centro da complementaridade entre a UE e a Aliança Atlântica.
Em Dezembro de 1991 a UEO declarou-se o pilar europeu da Aliança Atlântica e em Junho de 1992 definiu as missões humanitárias como as mais próprias ao seu estado. Em Janeiro de 1994 a Cimeira da Aliança Atlântica deu luz verde à emergência de uma identidade europeia de segurança e de defesa (IESD), através do reforço da UEO e da constituição de combined joint task forces (CJTF) ou grupos de forças interexércitos multinacionais (GFIM). Este último conceito operacional foi o centro das decisões na Cimeira da NATO de Berlim, em Junho de 1996, que decidiu identificar os meios que a NATO poderia pôr à disposição da UEO em operações conduzidas por esta. Actualmente constituem forças afectas à UEO o Eurocorpo (Alemanha, França, Bélgica, Espanha e Luxemburgo) a força anfíbia anglo-holandesa, a Eurofor e a Euromarfor, estas últimas duas com participação portuguesa, além de outras forças afectas a missões concretas.
E assim muito revelador da complexidade da situação as justaposições de comandos no continente europeu no quadro da NATO, da UEO ou do Eurocorpo.
Deste modo justapõem-se no continente europeu, desde 1991, vários modos de articulação entre organizações políticas e militares.
É neste quadro que o Tratado de Amsterdão:
Reforça o papel do Conselho Europeu na definição dos princípios, orientações gerais e estratégicas para todos os domínios da PESC (J.3);
Especifica os objectivos da PESC, nomeadamente quanto à salvaguarda da União e das suas fronteiras exteriores (J.l);
Prevê a criação de um alto representante da UE para a PESC (J.l6);
Prevê a criação de uma nova célula de planificação da PESC e de alerta precoce, enquadrada no Secretariado-Geral do Conselho, e cujo pessoal será oriundo do Secretariado-Geral do Conselho, dos Estados membros, da Comissão e da UEO (declaração n.° 6 anexa ao Tratado).
Segundo a declaração n.° 6 relativa à criação de uma unidade de planeamento de política e de alerta precoce, será criada uma unidade de planeamento de política e de alerta precoce no Secretariado-Géral do Conselho, colocada sob a responsabilidade do respectivo Secretário-Geral, alto representante para a PESC.
Essa unidade terá nomeadamente por missões:
a) Acompanhar e analisar a evolução da situação nos domínios abrangidos pela PESC;
b) Avaliar os interesses da União em matéria da PESC e inventariar os domínios sobre os quais a PESC
; deve incidir no futuro;
c) Fornecer informações atempadas e alertar precocemente para situações que possam ter implicações significativas na PESC, incluindo potenciais crises políticas;
d) Elaborar documentos que apresentem opções fundamentadas de política que poderão conter análises, recomendações e estratégias para a PESC.
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O Tratado da Amsterdão inova ao sistematizar os conceitos de:
Princípios e orientações gerais; Estratégia comum; Acção comum; Posição comum.
O referido Tratado também inova ao incluir uma cláusula de flexibilidade, a chamada «abstenção construtiva», mediante a qual um Estado aceita que outros membros actuem em conjunto sobre eterminada matéria sem a sua participação. (artigo23.º do Tratado de Amsterdão).
Em síntese. — A definição progressiva de uma política comum poderá conduzir a uma defesa comum se o Conselho Europeu o decidir, recomendando aos Estados membros a sua adopção segundo os respectivos processos constitucionais (artigo J.7).
O Conselho Europeu pode propor o desenvolvimento de relações mais estreitas com a UE0 com vista a uma integração desta UE (artigo J.7); um protocolo anexo a este artigo prevê que um ano antes da sua própria entrada em vigor a UE e a UEO deverão preparar os instrumentos de cooperação reforçada.
O protocolo citado relativo ao artigo J.7 refere que a política da União não afectará o carácter específico da política de segurança e de defesa de determinados Estados membros, respeitará as obrigações decorrentes do Tratado do Atlântico Norte para certos Estados membros que vêem a sua defesa comum realizada no âmbito da NATO e será compatível com a política de segurança e de defesa comum adoptada nesse âmbito.
Deste modo, «no prazo de um ano a contar da data de entrada em vigor do Tratado de Amsterdão, a UE, em concertação com a UEO, estabelecerá as fórmulas de reforço da cooperação recíproca.
As chamadas «missões de Petersberg» (missões humanitárias de evacuação, missões de manutenção da paz, missões de forças de combate para gestão de crises, incluindo missões de restabelecimento da paz) estão agora incluídas na política de segurança comum (artigo J.7).
Está prevista a possibilidade de cooperação reforçada entre dois ou mais Estados a nível bilateral, no âmbito da NATO e no âmbito da UEO.
As despesas operacionais ficam a cargo do orçamento da Comunidade Europeia, com excepção das despesas com operações que tenham implicações militares, ou no domínio da defesa, e que não tenham sido decididas por unanimidade. Os Estados que o declararem formalmente não contribuirão para o financiamento de operações com implicações militares (artigo J.13, n.° 1).
Foi incluído no Tratado um acordo interinstitucional entre o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão sobre o financiamento da PESC, que permite a salvaguarda do poder orçamental do Parlamento Europeu, com a excepção já referida das despesas com operações que tenham implicações militares.
Avaliação. — Há neste capítulo algumas modificações que poderão agilizar a tomada de decisão a nível da PESC, já porque a UE definiu melhor os seus interesses próprios, já porque a introdução de uma zona euro colocará problemas novos no que diz respeito à defesa externa da nova moeda. A própria gestão externa do euro colocará o problema da representação externa da UE nas instituições internacionais como o FMI ou a OCDE. Haverá assim uma tendência natural para uma maior intervenção externa dos países da zona euro, contrariamente ao que se passou entre 1991 até hoje.
em que a tendência foi a do recolhimento. Assim, enquanto em Maastricht se bloqueou a PESC com os ferrolhos da dupla unanimidade, em Amsterdão a figura da abstenção construtiva deve ser lida como a abertura da porta para o exterior. É certo que no essencial a PESC continua a reger-se pela regra da unanimidade, mas existem duas excepções a ter em conta: as deliberações sobre a adopção de «acções comuns» por maioria qualificada, desde que os Estados membros o tenham decidido assim por unanimidade, e as questões processuais que apenas exigem a maioria simples.
Por outro lado, deu-se um passo em frente na agilização das tomadas de acções comuns.
As abstenções não impedem agora a aprovação das decisões. Os Estados que se abstenham não são obrigados a aplicar a decisão, mas aceitam que a decisão vincula a União. A decisão não é aprovada se as abstenções excederem dois terços (dos votos ponderados nos termos do artigo 148." do Tratado da União Europeia.
Como escreveu Barros Moura:
Não é muito clara a distinção, em função dos objectivos da PESC, entre as várias modalidades de decisão mencionadas no artigo J.2:
Princípios e orientações gerais; Estratégias comuns; Acções comuns;
Posições comuns. (Tratados da União Europeia, Lisboa, UAL, pp. 25-26.)
A distinção, no entanto, será decisiva quanto ao método de votação, pois a unanimidade para as estratégias comuns é exigida, enquanto basta a maioria qualificada para as acções e posições comuns.
No entanto, se um Estado declarar um «interesse nacional importante», pode impedir o voto de uma decisão por maioria qualificada.
Do ponto de vista da República Portuguesa não há qualquer reserva na aprovação destes dispositivos, que são suficientemente prudentes para fazer face à gestão concorrente de crises internacionais quer pela acção conjugada dos Estados membros quer pela política externa de cada um deles. Muito embora a Comissão de Defesa da Assembleia da República no seu relatório chame a atenção para a reformulação integral do título v do Tratado da União Europeia, tudo indica que a metodologia da sua aplicação será gradual.
O gradualismo e a flexibilização introduzidos na PESC pelo Tratado de Amsterdão poderão ainda permitir uma actuação concertada dos Estados membros na defesa externa da zona euro, da qual a República Portuguesa faz parte.
Neste ponto convém acentuar o que ficou aprovado no relatório da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação e no qual se salienta não se partilhar '«a ideia, também por vezes apresentada a propósito da PESC, de que as alterações aprovadas pelo Tratado de Amsterdão não têm qualquer relevância. Saber se essas alterações são positivas ou negativas ficará a cargo de cada grupo parlamentar ou Deputado [...]».
Pois a CAE considera essas alterações positivas.
VII — A cooperação reforçada consagrada no Tratado da União Europeia
A cooperação reforçada, introduzida por este Tratado na estrutura institucional da UE, constitui a possibilidade de um certo número de Estados membros poderem cooperar em áreas específicas usando o enquadramento institucional da União.
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Este conceito já vinha sendo desenvolvido com a experiência Schengen, pelo que a CIG o abordou de urna forma muito pormenorizada, dada a pressão de muitos Estados em pretenderem que tal figura pudesse ser utilizada, desde que não representasse a aplicação prática do princípio de uma Europa a várias velocidades.
Por isso, houve 22 propostas diferentes de introdução de cláusulas de cooperação reforçada, entre as quais uma portuguesa, no seguimento de uma resolução da Assembleia da República na anterior legislatura, que foram trabalhadas e
posteriormente consagradas no Tratado, da forma que veremos em seguida.
Institucionaliza-se assim, pela primeira vez, a noção de flexibilidade como principio básico dos Tratados, que, para a sua análise mais detalhada, se deve distinguir em três formas básicas, tal como foi consagrada no Tratado de Amsterdão:
1) Cláusula geral de cooperação reforçada;
2) Flexibilidade caso a caso;
3) Flexibilidade predefinida.
1 — A cláusula geral de cooperação reforçada constitui um modo de integração flexível que permite que certos Estados membros possam aprofundar a sua integração, estando sujeitos a certas condições definidas no Tratado, sendo aplicável apenas a certas políticas dentro da estrutura institucional da União.
As cláusulas gerais de cooperação reforçada são, por isso, a grande inovação do Tratado de Amsterdão, estando inseridas como segue:
a) No título VII (actos 43' a 45' do Tratado de Amsterdão) definem-se as regras gerais de aplicação da cláusula de cooperação reforçada. — Para a sua verificação, é necessário reunir as condições previstas nas alíneas a) a h) do artigo 43.° do Tratado, ou seja, que essa cooperação reforçada favoreça a realização dos objectivos da União, que respeite os princípios dos tratados, que seja utilizada apenas em último recurso, que envolva pelo menos a maioria dos Estados membros, que não afecte o acervo comunitário, que não afecte os direitos e competências dos Estados membros qúe nela não participem, que esteja aberta a todos os Estados membros e que seja autorizada pelo Conselho.
b) No artigo 5.°-A do Tratado de Amsterdão (artigo 11.° do Tratado da União Europeia na versão compilada) definem-se essas mesmas regras para o I.° pilar, com a elenca-gem de um conjunto de matérias que não podem ser objecto de cooperação reforçada, referidas nas alíneas a) a e) do n.° l do artigo. — A cooperação reforçada só pode assim ser aprovada se não incidir em domínios da competência exclusiva da Comunidade, se não afectar políticas, acções ou programas da Comunidade, se não disser respeito à cidadania da União, se permanecer nos limites de competências da Comunidade e não constitua uma discriminação ou restrição ao comércio entre Estados membros, nem distorcer a concorrência entre estes.
Com estas restrições, as matérias que poderão ser objecto de uma cooperação reforçada são muito limitadas. No entanto, matérias como a da fiscalidade (por exemplo, a criação, entre certos Estados membros, de um acordo sobre a taxa do IVA) poderão ser objecto deste tipo de cooperação.
O procedimento para atingir esta cooperação no 1.° pilar consiste numa decisão por maioria qualificada. No entanto, se um Estado membro invocar importantes razões de política nacional, a decisão terá de ser tomada por unanimidade no Conselho Europeu, o que constitui um afloramento dos acordos do Luxemburgo dos anos 60.
c) No artigo 40.°, que introduz o artigo K.I2, são definidas as regras para aplicação da cooperação reforçada em matérias do 3.° pilar. — Para que tal aconteça, é necessária a verificação de dois requisitos base: o respeito pelas competências da Comunidade e pelos objectivos do 3.° pilar e ainda o objectivo de reforçar a União no desenvolvimento mais acentuado das matérias de liberdade, segurança e justiça.
Neste caso, em vez de a Comissão apresentar a proposta, como no 1.° pilar, a Comissão apenas dará um parecer não
vinculativo à proposta dos Estados interessados em avançar para uma cooperação neste domínio, sendo a decisão tomada por maioria qualificada
Apesar de esta cláusula ser menos restritiva que a do 1.° pilar, é pouco provável que a mesma seja utilizada, dado que há situações de flexibilidade caso a caso, como se verá adiante.
2 — A flexibilidade caso a caso pode ser definida como um modo de integração flexível e que permite a um Estado membro abster-se numa votação sobre uma decisão e formalmente declarar que não a aplicará, ao mesmo tempo que aceita que os outros Estados membros a apliquem. Esta situação está prevista para a PESC, no artigo J. 13, introduzido pelo artigo 23.° do Tratado de Amsterdão.
Esta abstenção, comummente chamada «abstenção construtiva», acaba por ser uma mistura entre os mecanismos de decisão habituais e a cláusula de flexibilidade, reconhecendo-se que o Estado, apesar de se abster, considera que essa decisão vincula a União, mas não o vincula.
Tal solução aproxima-se claramente do que tem vindo a ser prática no Conselho de Segurança das Nações Unidas, possibilitando assim que a União avance em certas matérias sem uma votação unânime dos Estados membros, salvaguardando ao mesmo tempo as posições específicas do Estado que se absteve.
Esta regra é substancialmente diferente das do 1.° e 3.° pilares, uma vez que no caso do 2.° pilar a oposição dos Estados membros pode obrigar a uma passagem de maioria qualificada para unanimidade, sendo que a cooperação é uma decisão que abrange toda a União. Já nos 1.° e 3.° pilares, a decisão tomada não vincula os Estados que invoquem as importantes e expressas razões de política nacional.
O uso desta abstenção construtiva pode abranger matérias como acções de salvamento, humanitárias, de manutenção de paz e o uso de forças de combate na gestão de crises. No campo específico da PESC, esta abstenção pode ser usada na adopção de acções, posições ou estratégias comuns.
É, no entanto, evidente que, neste domínio, é suposto que a União actue em nome de todos os Estados. Se um ou alguns Estados se abstêm, a PESC fica afectada, dado que, quanto mais perto se está de um interesse vital de um Estado membro, mais necessária é a tomada de uma posição comum ou acção conjunta.
3 — A flexibilidade predefinida consiste numa integração flexível que se reporta a um campo específico, definida em todos os seus elementos, incluindo os objectivos e âmbito, sendo aplicável assim que o Tratado entre em vigor.
Este tipo de flexibilidade está inicialmente estabelecido em protocolos ou declarações que fazem parte integrante do Tratado de Amsterdão, como:
a) O protocolo que define a posição do Reino Unido e da Irlanda sobre o novo título referente à livre circulação de pessoas, asilo e emigração;
b) O protocolo que define a posição da Dinamarca sobre o Acordo de Schengen;
c) O protocolo que define a integração do acquis de Schengen na União.
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Com estes protocolos ficam claramente definidas as regras que regulam as relações entre políticas ou acordos previstos no Tratado e certos Estados membros que desejam para si um tratamento diferenciado nestas matérias.
Dada a diferença de pretensões dos Estados que são a
causa da aprovação dos protocolos e dos diferentes níveis exigidos, consoante as matérias, da decisão comunitária, estes
protocolos têm todos regras próprias, que ficam logo predefinidas nos tratados, sendo a base reguladora da relação entre os Estados e a União sobre as matérias envolvidas.
Avaliação. — O Tratado consagra as três formas de flexibilidade ou cooperação reforçada acima referidas. A sua institucionalização justifica-se por duas razões principais: a primeira, para fazer face aos problemas relacionados com o novo título sobre a livre circulação de pessoas, asilo e emigração e a incorporação de Schengen no Tratado; a segunda, para gerir o alargamento e uma União cada vez mais heterogénea.
A cláusula geral de cooperação reforçada do 1pilar será provavelmente pouco usada antes do alargamento, com a possível excepção, acima referida, da fiscalidade. Noutras políticas comuns não se vislumbra que haja agora necessidade de estabelecer qualquer cooperação reforçada. O mesmo acontece com o 3.° pilar, dado que a necessária flexibilidade está assegurada com a flexibilidade predefinida.
Quanto à flexibilidade caso a caso, ou abstenção construtiva, o seu desenvolvimento será decisivo em termos do 2." pilar, com os problemas que tal poderá trazer. Por um lado, há um risco de acertos orçamentais relacionados com essas abstenções, uma vez que o Estado que a invoca não está obrigado a contribuir para os custos da acção em questão. Por outro, esta abstenção vai um pouco contra a própria expressão de política externa e de defesa comum, dado que «comum» deveria querer significar que todos os Estados membros nela deveriam participar e contribuir.
Em relação à flexibilidade predefinida, há já matérias em que está em vigor. No entanto, deve prever-se que haja futuros problemas de jurisdição do Tribunal de Justiça em matérias de Schengen, dada a presença de Estados não membros, como a Islândia e a Noruega, e as regra próprias dos protocolos referentes à Dinamarca, ao Reino Unido e à Irlanda.
Com a institucionalização, no Tratado de Amsterdão, da flexibilidade, estabeleceu-se um mecanismo que permite a diferenciação permanente entre Estados, o que facilitará provavelmente a adesão dos países candidatos, que encontrarão uma forma mais fácil de aderir à União.
Ao mesmo tempo, confere-se a garantia, aos Estados membros, de que poderão avançar em matérias do seu interesse, não tendo de esperar pelos países que, por diversos motivos, não quererão avançar em domínios específicos, dentro das regras definidas no Tratado de Amsterdão.
Esta figura da flexibilidade é uma daquelas que tanto pode introduzir uma nova fase na história da UE como ser apenas mais um mecanismo potencial. O importante é que a sua aplicação seja transparente e não diminua os direitos já adquiridos pelos Estados membros. Em qualquer caso, esta figura de flexibilidade é a mais portentosa em termos da evolução da UE, pelo que a CAE considera que ela merecerá um acompanhamento especial.
Parecer
A Comissão de Assuntos Europeus apreciou nestes termos a proposta de resolução n.° 118ATI, que «aprova, para
ratificação, o Tratado de Amsterdão, que altera o Tratado da União Europeia, os tratados que instituem as Comunidades Europeias e alguns actos relativos a esses tratados, incluindo os anexos, os protocolos, bem como a Acta Final com as declarações, assinado em Amsterdão em 2 de Outubro de 1997», e dá parecer favorável a essa aprovação. Tendo em conta que a aprovação, para ratificação, do
Tratado é um acto de soberania essencial por parte da Assembleia da República,'a CAE declara que a proposta de resolução n.° 118/VII está em condições de subir a Plenário, esperando que aí se proceda a uma discussão alargada e a uma aprovação na generalidade, reservando-se os Deputados as respectivas posições para o debate.
Assembleia da República, 21 de Dezembro de 1998.— O Deputado Relator e Presidente da Comissão, José Medeiros \Ferreira.
Declaração de voto
Ex."10 Sr. Presidente da Comissão dos Assuntos Europeus:
Da análise do relatório sobre o Tratado de Amsterdão cumpre-me informar V. Ex.° do seguinte:
1 — Li e analisei o relatório elaborado por V. Ex.°, que considero, permita-me, bem estruturado.
2 — No entanto, por razões de coerência e por respeito aos compromissos assumidos aquando da campanha eleitoral e consubstanciados no programa do Partido Popular (eleitoral) e relativos às eleições legislativas de 1995, e porque nada de natureza substancial se alterou, por estas razões, abstenho-me na votação do parecer do relatório elaborado por V. Ex.1
0 Deputado, Augusto Boucinha.
ANEXO N.° I
Relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
I — Considerações prévias 1.1 — A proposta de resolução n.° 118/VII
O Governo apresentou à Assembleia da República uma proposta de resolução que aprova, para ratificação, o Tratado de Amsterdão, que altera o Tratado da União Europeia, os tratados que instituem as Comunidades Europeias e alguns actos relativos a esses tratados, incluindo os anexos, os protocolos, bem como a Acta Final com as declarações, assinado em Amsterdão em 2 de Outubro de 1997.
Esta apresentação foi efectuada nos termos da alínea d) do n.° 1 do artigo 197.° da Constituição da República Portuguesa e do n.° 1 do artigo 210.° do Regimento da Assembleia da República, com as necessárias adaptações.
O conteúdo da proposta de resolução consubstancia o disposto na alínea /) do artigo 161.° da Constituição da República Portuguesa assim como preenche os requisitos formais aplicáveis.
A proposta de resolução vertente foi aprovada na reunião do Conselho de Ministros de 2 de Julho de 1998 e deu entrada na Mesa da Assembleia da República em 12 de Agosto de 1998, tendo descido por despacho de S. Ex.' o Presiden-
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te da Assembleia da República às comissões especializadas para emissão de respectivo relatório/parecer.
Registe-se que a Comissão de Assuntos Europeus realizou um conjunto de audições subordinadas ao Tratado de Amsterdão entre 15 de Setembro e 20 de Outubro, com as seguintes individualidades: Maria Luísa Duarte, André Gonçalves Pereira, Maria João Rodrigues, Álvaro Vasconcelos, António Vitorino, Nuno Severiano Teixeira e Francisco Sarsfield Cabral.
1.2 — Um processo de ratificação não precedido de referendo sobre a construção europeia
A Assembleia da República deliberou propor a realização de um referendo sobre o processo de construção europeia antes da ratificação do Tratado. O Tribunal Constitucional pronunciou-se, contudo, pela inconstitucionalidade da Resolução n.° 36-A/98, em processo de fiscalização preventiva da sua constitucionalidade e legalidade.
Com efeito, em 8 de Julho de 1998, o Presidente da República requereu ao Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 115.°, n.° 8, da Constituição da República Portuguesa, e dos artigos 26." e 29.°, n.° 1, da Lei Orgânica do Regime do Referendo (Lei n.° 15-A/98, de 3 de Abril), «a fiscalização preventiva da constitucionalidade e da legalidade da proposta de referendo aprovada pela Resolução n.° 36--A/98 da Assembleia da República, publicada em suplemento à 1." série do Diário da República, de 30 de Junho, distribuído em 7 de Julho».
O Presidente da República fez acompanhar o seu requerimento de um elenco de dúvidas de constitucionalidade e de legalidade, relacionadas com a eventual violação, pela proposta de referendo, do disposto no artigo 115.°, n.ºs 1, 3, 4, 5 e 6, da Constituição e nos artigos 241." e 243.° da Lei Orgânica do Referendo, cuja apreciação solicitou.
A resolução em causa era do seguinte teor:
Resolução da Assembleia da República n.ºs 36-A/98
Proposta de realização de referendo sobre a participação de Portugal na construção da União Europeia.
A Assembleia da República resolve, nos termos e para os efeitos dos artigos 115.° e 161.° alínea j), da Constituição, apresentar a S. Ex.° o Presidente da República a proposta de realização de um referendo em que os cidadãos eleitores recenseados no território nacional e os cidadãos eleitores portugueses recenseados nos Estados membros da União Europeia sejam chamados a pronunciar-se sobre a pergunta seguinte:
Concorda com a continuação da participação de Portugal na construção da União Europeia no quadro do Tratado de Amsterdão?
Os antecedentes da Resolução n.° 36-A/98 da Assembleia da República encontram-se na proposta de resolução n.° 71/ VII (Governo) e nos projectos de resolução n.0* 69/VII (PCP), 91/VH (PSD) e 94/Vn (CDS-PP).
Na proposta de resolução n.° 71/VII, o Governo propôs a colocação da seguinte pergunta, à qual deveriam responder «os cidadãos eleitores recenseados no território nacional, bem como os cidadãos eleitores portugueses recenseados nos Estados membros da União Europeia»:
Portugal deve continuar a participar na construção da União Europeia que resulta do Tratado de Amsterdão?
Depois de considerar a adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia como um «passo essencial para a plena afirmação do nosso país no novo desenho geopolítico do continente, construído sob a égide da liberdade, da democracia e da prevalência dos valores do Estado de direito» e de explicar sumariamente a dinâmica do processo de integração, vincando, sobretudo, os avanços provocados pelo acto único europeu e pelo Tratado de Maastricht, o Governo passa a indicar as razões da proposta de referendo:
Na pendência da aprovação parlamentar do novo desenvolvimento da integração europeia que o Tratado de Amsterdão constitui, considera o Governo desejável poder aproveitar a nova configuração constitucional para auscultar a vontade popular sobre o ritmo e o sentido da participação portuguesa no projecto da União Europeia com vista a garantir que os futuros passos neste domínio continuarão a ser dados em perfeita consonância com sentido geral da opinião colectiva, a qual, no passado, sempre claramente se expressou através da adesão maioritária às linhas programáticas de cariz partidário que assumiram o projecto europeu como referente essencial da acção externa do País.
Para o Grupo Parlamentar do PCP:
A questão central que o Tratado de Amsterdão levanta é a do acréscimo de transferências de soberania, e esse é o objecto da pergunta do PCP. Obviamente, este acréscimo tem de ser enquadrado na dinâmica em que se insere e onde avulta a liquidação do escudo como moeda nacional e a sua substituição pela moeda única, bem como a imposição de orientações estritas para a atingir, de que resultam graves consequências sociais, bem como múltiplas consequências ulteriores; incluindo pesadas multas aos países.
Por isso, propôs a seguinte pergunta:
Concorda que a evolução da integração europeia implique maiores transferências de soberania nacional, desde a supressão do escudo e a imposição de multas aos países que não cumprem os critérios de Maastricht, até às novas transferências no Tratado de Amsterdão?
Por seu turno, o PSD apresentou também o seu projecto de pergunta, na sequência de um anterior projecto de resolução (67/Vn, de Outubro de 1997), no qual formulava não uma, mas três perguntas, que resultavam dos três pontos em relação aos quais considerava essencial a consulta popular: legitimação do aprofundamento da integração europeia, concordância com o reforço de poderes da União e assentimento relativamente ao acréscimo de cooperação, no seio da União, no âmbito do combate ao desemprego.
No projecto de resolução n.° 91/VTI, o PSD entendeu dever proceder a uma simplificação da consulta, propondo a seguinte fórmula:
Concorda com o aprofundamento da integração de Portugal na União Europeia, de acordo com o Tratado de Amsterdão?
À consulta popular deveriam ser chamados «todos os cidadãos eleitores regularmente recenseados, residentes em território nacional ou no estrangeiro».
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Finalmente, no projecto de resolução n.° 94/VII, o Grupo Parlamentar do CDS-PP recordou o propósito de referendar o avanço da integração em 1992, por ocasião da assinatura do Tratado da União Europeia, e, considerando que, passado esse momento, a realização do referendo não perdeu oportunidade, propôs as seguintes perguntas, a colocar a todos os cidadãos portugueses regularmente recenseados, quer
residentes em território nacional, quer na União Europeia ou
em qualquer outro país estrangeiro:
1) Concorda com a participação de Portugal na construção europeia no quadro do Tratado de Amsterdão?
2) Concorda que a evolução da construção europeia assente no reforço dos Estados nacionais, na cooperação e solidariedade entre os governos e no controlo democrático das decisões comunitárias, em detrimento do modelo de federalismo político?
Em face da rejeição dos projectos do PCP e do CDS-PP (o primeiro com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e o segundo com votos contra do PS, PCP e os Verdes e com a abstenção do PSD), e reunido o voto do PS e PSD em torno de uma redacção consensualizada, restava o problema da definição do universo eleitoral.
Com os votos a favor do PS, PCP e os Verdes. Desta e da primeira votação resultou a Resolução n.° 36-A/98, foi deliberado restringir a consulta aos cidadãos portugueses residentes em Estados membros da União.
O Tribunal Constitucional entendeu, todavia, que a proposta de referendo aprovada pela Resolução n.° 36-A798 da Assembleia da República não respeitava os requisitos de objectividade, clareza e precisão exigidos pelo artigo 115.°, n.° 6, da Constituição e pelo artigo 7.°, n.° 2, da Lei Orgânica do Regime do Referendo.
Nestes termos, não tendo havido renovação da iniciativa referendária, o processo de ratificação do Tratado de Amsterdão decorre segundo o modelo deliberativo geral configurado constitucionalmente: aprovação pela Assembleia da República — artigo 161.°, alínea /'). da Constituição — seguida de ratificação pelo Presidente da República — artigo 135°, alínea b), da Constituição.
O artigo 14.° do Tratado estabelece os requisitos para a respectiva entrada em vigor. Dispõe esse preceito:
1 — O presente Tratado será ratificado pelas Altas Partes Contratantes, de acordo com as respectivas regras constitucionais. Os instrumentos de ratificação serão depositados junto do Governo da República Italiana.
2 — O presente Tratado entra em vigor no primeiro dia do segundo mês seguinte ao do depósito do instrumento de ratificação do Estado signatário que proceder a esta formalidade em último lugar.
II — Antecedentes da proposta dc resolução n.° 118/VII
A proposta de resolução n.° 118/VTl tem em vista submeter à aprovação da Assembleia da República, para ratificação, o Tratado de Amsterdão, que altera o Tratado da União Europeia, os tratados que instituem as Comunidades Europeias e alguns actos relativos a esses tratados, assinado em Amsterdão em 2 de Outubro de 1997.
Após oito anos de negociações, foi assinado, em Junho de 1985, o Tratado de Adesão de Portugal às Comunidades Europeias, que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1986.
Os antecedentes do processo de integração e os problemas suscitados pelo seu aprofundamento através do Tratado de Maastricht foram examinados por esta Comissão em parecer elaborado pelos ora relatores, em 1992, para cujo conteúdo se remete.
Ill — A Conferência Intergovernamental (CIG 96) 3.1 Considerações gerais
A revisão dos tratados ora em apreço foi o resultado de um longo e intrincado processo deliberativo.
No limiar do século xxi, a União Europeia está confrontada com impressionantes desafios: rápida evolução da situação internacional; globalização da economia mundial, com impacte decisivo sobre o emprego, a competitividade e a criação de postos de trabalho; terrorismo, criminalidade e tráfico de droga; pressão migratória; desequilíbrios ecológicos e ameaças à saúde pública. Para enfrentar estes desafios as instituições políticas europeias carecem de reforma.
Por outro lado, o futuro alargamento da União constitui simultaneamente uma oportunidade única e um outro importante repto.
Tendo em conta estes factores, no conspecto que então apresentavam, o Conselho Europeu de Corfu deliberou a formação de um Grupo de Reflexão com o encargo de analisar e elaborar ideias sobre as disposições do Tratado da União Europeia e rever e propor outros eventuais melhoramentos num espírito de democracia e abertura, com base na avaliação de funcionamento do Tratado exposta nos relatórios. Além disso, na perspectiva do alargamento futuro da União, coube ao Grupo estudar as opções relativas às questões institucionais enumeradas nas conclusões do Conselho Europeu de Bruxelas e no Acordo de Ioannina (ponderação de votos, limiar de decisão por maioria qualificada, número de membros da Comissão e quaisquer outras medidas consideradas necessárias para facilitar o trabalho das instituições e garantir o seu funcionamento eficaz na perspectiva do alargamento).
O Conselho Europeu de Madrid (15 a 16 de Dezemòro de 1995) identificou os grandes desafios da União Europeia até ao final do século:
A revisão do Tratado da União Europeia;
A passagem à terceira fase da união monetária;
A revisão das perspectivas financeiras e do sistema de
recursos próprios da União; As negociações conducentes ao alargamento da União
aos países do Centro, Leste e Sul europeu.
O Conselho previu que a CIG 96 abordasse as seguintes questões:
As políticas e formas de cooperação previstas no Tratado da União Europeia (artigo B);
As disposições relativas à PESC (2.° pilar, artigos J.4 e J.10), em conjugação com a Declaração n.° 30 relativo à UEO;
A extensão eventual do campo de aplicação do procedimento de co-decisão (artigo 189.°-B);
Uma nova hierarquia dos actos normativos comunitários nos termos da Declaração n.° 16 anexa ao Tratado;
A introdução de novos títulos relativos aos domínios da protecção civil, energia e turismo nos termos da Declaração n.° I;
As disposições sobre as perspectivas financeiras nos termos do acordo interinstitucional de 29 de Outubro de 1993;
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As medidas de execução dos actos decididos por co-decisão quando integrados no processo de comitologia, nos termos do documento interinstitucional designado «Modus vivendi sobre comitologia»;
Questões institucionais relativas ao número de membros da Comissão, à ponderação de votos no Conselho e ao número de lugares a atribuir aos novos Estados membros, conforme a declaração do Conselho Europeu de Bruxelas de 10-11 de Dezembro de 1994;
Questões institucionais relativas à definição do limiar da maioria qualificada, conforme declaração do Conselho de Ionnina;
Questões institucionais relativas ao défice democrático, na perspectiva do alargamento, conforme conclusões do Conselho Europeu de Corfu.
O resultado global da CIG ficou longe das metas inicialmente fixadas, mas não deixou de abrir caminho à futura resposta aos desafios do novo milénio. Estes situam-se em dois planos: fazer da Europa uma questão que os cidadãos sintam como sua e alargar a Europa a mais de 20 Estados, garantindo concomitantemente 40 anos de construção europeia.
Esta dupla meta corresponde simetricamente a dois factores: um interno, outro externo. No plano interno, o debate em torno da ratificação do Tratado de Maastricht revelou cepticismo e distância face ao fenómeno comunitário e à Europa em geral.
No plano externo, os novos horizontes abertos pela queda do muro de Berlim conduziram ao engrossar dos pedidos de adesão dos Estados à Europa , comunitária.
O processo de construção comunitária exige, por um lado, mais transparência e compreensão por parte dos cidadãos, de modo que a expressão «uma Europa mais próxima dos cidadãos» ganhe contornos efectivos. E exige, por outro, um alargamento que reforce a União e confira a novos países do Centro e do Leste europeu o impulso transformador de que Portugal beneficiou com a sua adesão.
A/a verdade, em quatro décadas de construção comunitária registam-se quatro adquiridos fundamentais:
1) Atingiu-se uma comunidade de duração ilimitada;
2) Dotada de instituições próprias;
3) De personalidade jurídica; e
4) De capacidade de representação internacional.
A par desta estruturação jurídica a UE é também uma comunidade fundada na solidariedade, podendo servir de modelo inspirador a outros fenómenos semelhantes noutros pontos do globo.
Neste contexto, a principal questão da CIG 96 não foi a de aumentar as competências da União, por tal ter sido efectivado em quantidade razoável pelo Tratado da União Europeia. Entendeu-se que a atenção devia, sim, colocar-se na perspectiva de um reforço das situações em que se deve recorrer à regra de maioria.
3.2 — O Conselho Europeu de Turim
O Conselho Europeu de Turim de 29 de Março de 1996 sintetizou nos seguintes termos os passos dados e a dar:
Numa União firmemente empenhada na implementação integral dos tratados, incluindo as disposições sobre a União Económica e Monetária, a Conferência • constituirá uma oportunidade para enfrentar de maneira mais eficaz os desafios internos e externos a que será necessário fazer face nos próximos anos.
Estes desafios decorrem nomeadamente das vicissitudes da situação internacional, da globalização da economia e das suas repercussões sobre o emprego, a competitividade e a criação de postos de trabalho na União, do terrorismo, do tráfico de droga e da criminalidade internacional, das pressões migratórias e dos desequilíbrios ecológicos.
Além disso, o futuro alargamento da União, que constitui uma missão histórica e uma grande oportunidade para a Europa, constitui igualmente um desafio para a União a todos os níveis. Nesta perspectiva, as instituições e o respectivo funcionamento, bem como os processos da União, deverão ser melhorados de forma a preservar a sua capacidade de acção, mantendo e desenvolvendo embora o «acervo comunitário», no respeito do equilíbrio institucional. É essencial apoiar a própria natureza da construção europeia, que deve preservar e desenvolver as suas características de democracia, eficácia, solidariedade, coesão, transparência e subsidiariedade.
Os Chefes de Estado ou de Governo consideram que a Conferência deveria, à luz do Relatório do Grupo de Reflexão e sem prejuízo de quaisquer outras questões que possam vir a ser levantadas durante a Conferência, concentrar-se nas questões adiante descritas.
1 — Uma União mais próxima dos cidadãos
O Conselho Europeu solicita à CIG que baseie os seus trabalhos no facto de que no centro da construção europeia estão os cidadãos: a União deverá imperativamente responder de forma concreta às suas necessidades e preocupações.
Uma vez que os Estados membros estão empenhados em respeitar os direitos humanos, os valores democráticos e os princípios da igualdade e da não discriminação, e que a União é uma comunidade de valores, a CIG deverá analisar em que medida e de que modo será possível reforçar e melhor preservar esses direitos fundamentais.
Os cidadãos europeus atribuem cada vez maior importância às questões do domínio da justiça e dos assuntos internos. Numa área de livre circulação de pessoas, bens, capitais e serviços como é a União, o exercício desses direitos, em conformidade com as disposições do Tratado, deverá ser acompanhado de uma protecção adequada. O reforço do controlo das fronteiras externas da Comunidade contribuirá para esse efeito. Neste contexto, a Conferência deverá debruçar-se principalmente sobre as seguintes questões:
No âmbito dos objectivos definidos, o aperfeiçoamento dos métodos e instrumentos;
Uma melhor protecção dos cidadãos da União, nomeadamente contra a criminalidade internacional, o terrorismo e o tráfico de droga;
A implementação de políticas coerentes e eficazes em matéria de asilo, imigração e vistos;
A conciliação de pontos de vista divergentes sobre o controlo jurisdicional e parlamentar das decisões tomadas pela União Europeia no domínio da justiça e dos assuntos internos.
Para a União e os seus Estados membros a luta contra o desemprego constitui a principal prioridade. A promoção do emprego faz das políticas estruturais e económicas nacionais uma questão de interesse comum. A obtenção de melhores oportunidades de emprego exige uma política económica orientada para a estabilidade, uma maior competitividade e um crescimento sólido, nomeadamente através da concretização do mercado interno e da implemen-
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tacão dos critérios de convergência para a realização da União Económica e Monetária. No entanto, é necessária uma maior coordenação da acção. A fim de realizar o objectivo de assegurar um elevado nível de emprego, garantindo a protecção social, a CIG deveria por conseguinte analisar a forma como a União poderá estabelecer a base de uma maior cooperação e coordenação para reforçar as políticas nacionais. A CIG deveria ainda analisar em que medida e de que modo o Tratado poderá tomar mais eficazes e coordenar melhor os es-
forços dos nossos governos e dos parceiros sociais.
A CIG poderia também estudar a questão da compatibilidade entre a competitividade e o princípio do acesso geral
aos serviços fundamentais, tendo em conta os interesses dos
cidadãos.
Além disso, a CIG poderia analisar o estatuto das regiões mais periféricas, das regiões ultramarinas e ainda das regiões insulares da União.
Os nossos cidadãos atribuem igualmente grande importância a um meio ambiente saudável e sustentável. Assegurar um ambiente melhor constitui um desafio fundamental para a União e a CIG deverá analisar a forma de tomar mais eficaz e coerente a protecção ambiental a nível da União, tendo como objectivo um desenvolvimento sustentável.
A CIG deverá garantir uma melhor aplicação e cumprimento do princípio da subsidiariedade, a fim de assegurar a transparência e a abertura dos trabalhos da União, e para analisar a possibilidade de simplificar e consolidar os tratados.
2 —As Instituições no seio de uma União mais democrática e eficaz
Para aperfeiçoar as instituições da União Europeia e na perspectiva do futuro alargamento, os Chefes de Estado e de Governo salientam a necessidade de determinar a melhor forma de garantir uma maior eficácia do seu funcionamento, preservando sempre a sua coerência e legitimidade. A Conferência deverá debruçar-se sobre:
Os meios mais eficazes de simplificar os processos legislativos, tornando-os mais claros e transparentes;
A possibilidade de alargar o âmbito da co-decisão nos domínios puramente legislativos;
A questão do papel no Parlamento Europeu para além dos seus poderes legislativos, bem como da respectiva composição e do processo uniforme da sua eleição.
A CIG deveria igualmente analisar de que modo e em que medida os parlamentos nacionais poderão, também colectivamente, dar um maior contributo para as tarefas que incumbem à União.
No que se refere ao Conselho, cujo funcionamento haverá que melhorar, a CIG deveria abordar as seguintes questões: âmbito de aplicação da votação por maioria, ponderação dos votos e limiar para a tomada de decisões por maioria qualificada.
• A Conferência deverá estudar a melhor forma de a Comissão desempenhar as suas funções fundamentais com eficácia, tendo igualmente em conta a sua composição e a sua representatividade.
A Conferência deveria analisar em que medida e de que modo se poderá melhorar o papel e o funcionamento do Tribunal de Justiça Europeu e do Tribunal de Contas. A Conferência deveria igualmente estudar como obter uma maior clareza e qualidade da legislação e as formas e os meios para um combate à fraude mais eficaz.
Os Chefes de Estado ou de Governo solicitam à Conferência que analise em que medida e de que modo se deverão introduzir regras, de carácter geral ou aplicáveis a domínios específicos, que permitam a um certo número de Estados membros desenvolver uma cooperação reforçada, aberta a todos, compatível com os objectivos da União, preservando embora o «acervo comunitário» e evitando a discriminação e as distorções da concorrência e no respeito do quadro institucional único.
3 — Reforço da capacidade de acção externa da União
A situação internacional conduz a um aumento das responsabilidades da União e torna mais necessário o reforço da sua identidade na cena internacional, com o objectivo de promover a paz e a estabilidade. O peso político da União deve ser proporcional à sua força económica.
Paralelamente, é necessário reforçar a coerência e a unidade da acção externa da União em todos os domínios, respeitando integralmente o papel da Comissão.
A União Europeia fixou-se como objectivo a implementação de uma política externa e de segurança comum, incluindo a definição, a prazo, de uma política de defesa comum que poderá conduzir, no momento próprio, a uma defesa comum.
A realização deste objectivo exige uma maior capacidade de:
Identificar os princípios e os domínios da política externa comum;
Definir as acções necessárias para defender os interesses da União nesses domínios, em conformidade com tais princípios;
Instaurar processos e estruturas que permitam tomar decisões mais eficazes e atempadas, num espírito de lealdade e solidariedade mútuas;
Acordar em disposições orçamentais adequadas.
Tendo em conta estes objectivos, a Conferência deveria igualmente examinar em que medida e de que modo uma eventual nova função específica poderia dar a União a possibilidade de se exprimir de forma mais visível e coerente através de um rosto e uma voz mais identificáveis.
Entendeu-se ainda que a CIG deveria analisar a me/hor forma de afirmar a identidade europeia em matéria de segurança e defesa, impondo-se que se empenhasse em definir mais claramente as relações com a União da Europa Ocidental e em melhorar a capacidade operacional à disposição da União, com especial referência para a área abrangida pelas «missões de Petersberg» da União da Europa Ocidental e em conformidade com a Carta das Nações Unidas. A Conferência poderia igualmente examinar em que medida e de que modo o Tratado deveria incentivar uma cooperação mais estreita em matéria de armamento.
Tendo presente a experiência do Grupo de Reflexão e em conformidade com as conclusões do Conselho Europeu de Madrid de 15 e 16 de Dezembro de 1995, deliberou-se associar o Parlamento Europeu aos trabalhos da Conferência por forma a poder ser informado de forma regular e circunstanciada da evolução dos debates e, simultaneamente, fazer valer o seu ponto de vista sobre todas as questões debatidas caso o considere necessário.
3.3 — O Conselho Europeu de Florença
O Conselho Europeu de Florença (21 e 22 de Junho de 1996) acordou em orientações estratégicas em matéria. de
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emprego, crescimento e competitividade, tomou novas decisões quanto à preparação da transição para a união monetária, chegou a acordo sobre uma série de questões nos domínios da justiça e assuntos internos e das relações externas e procurou dar um novo impulso à CIG.
O Conselho Europeu limitou-se, basicamente, a registar que os trabalhos da Conferência realizados até essa data, com base nas directrizes definidas em Turim, tinham permitido «pôr em evidência as principais questões em jogo». Os trabalhos da Conferência durante esta primeira fase foram expostos no relatório elaborado sob a orientação da presidência, que, sem prejuízo das negociações, fez um balanço à atenção da próxima presidência com vista à preparação dos trabalhos futuros.
E, na síntese final, acrescentou-se:
A análise destas questões encontra-se já suficientemente avançada. A Conferência pode agora concentrar-se na busca de soluções equilibradas para as principais questões políticas que se colocaram. O Conselho Europeu espera realizar, na sua reunião de Dublim, os progressos decisivos que permitam respeitar o calendário definitivo em Turim, o que implica a conclusão da Conferência em meados de 1997.
Nesta perspectiva, o Conselho Europeu solicitou que a presidência irlandesa elaborasse, para a reunião de Dublim, um esboço geral de um projecto de revisão dos tratados, por forma a contemplar nomeadamente os objectivos seguintes:
Aproximar mais a União dos cidadãos;
Respondendo às suas expectativas no que se refere ao cumprimento do objectivo de um elevado nível de emprego, garantindo simultaneamente a protecção social e considerando os meios para dotar a União de uma base de cooperação e coordenação mais eficazes, a fim de reforçar as políticas nacionais;
Tomando a protecção do ambiente mais eficaz e coerente a nível da União, por forma a garantir um desenvolvimento sustentável;
Dando ao trabalho da União transparência e abertura;
Reforçando a cidadania europeia, sem substituir as cidadanias nacionais e respeitando simultaneamente a identidade nacional e as tradições dos Estados membros;
Respeitando os seus direitos fundamentais;
Respondendo às suas necessidades de segurança, o que implica o reforço significativo dos meios e instrumentos contra o terrorismo, o crime organizado e o tráfico de droga, bem como das políticas relativas a todos os aspectos do asilo, aos vistos ê à imigração, na perspectiva de um espaço judiciário comum nesta matéria;
Reforçar e alargar o âmbito da política externa e de segurança comum da União, o que implica designadamente que se tenham em conta, com vista a uma maior uniformidade e eficiência;
A interacção mais eficaz possível por parte dos diferentes intervenientes, de acordo com as funções que lhes foram atribuídas pelo Tratado, na elaboração e implementação das acções externas da União (Conselho Europeu, Conselho, Comissão, Presidência, Estados membros e, eventualmente, uma nova função no âmbito da PESC);
Uma maior coerência entre uma PESC reformulada e uma acção económica externa reforçada;
Os processos e as condições que regem a tomada de decisões, incluindo a possibilidade de eventualmente flexibilizar a regra da unanimidade;
Os meios que permitam assegurar o financiamento garantido e rápido das acções decididas;
A dimensão de segurança e de defesa da União e, designadamente, a possibilidade de inserir no Tratado objectivos que correspondam às «missões de Peters berg»;
O estreitamento dos laços entre a União Europeia e a UEO, tendo em vista definir a questão das suas relações futuras, na sequência dos resultados da reunião da NATO no mês de Junho, em Berlim;
Uma eventual cláusula de solidariedade política;
E, por fim, assegurar, nomeadamente na perspectiva do alargamento, o correcto funcionamento das instituições, respeitando ao mesmo tempo o seu equilíbrio e a eficácia do processo decisório, devendo, em especial, ter-se em consideração os seguintes pontos:
Relativamente ao Conselho: o âmbito de aplicação da votação por maioria qualificada, a ponderação dos votos e o limiar para a tomada de decisões por maioria qualificada;
Relativamente à Comissão: o seu modo de nomeação e respectiva composição;
Relativamente ao Parlamento Europeu: os procedimentos que presidem à sua participação no processo legislativo, bem como o seu papel político e de controlo;
Relativamente ao Tribunal de Justiça: a melhoria do papel desta instituição e do respectivo funcionamento;
Relativamente à União no seu todo: os meios de assegurar uma aplicação efectiva do princípio da subsidiariedade; a questão da suficiência de meios; uma análise mais aprofundada do alcance e das condições de uma cooperação reforçada, e a questão do contributo dos parlamentos nacionais, quer individual quer colectivamente, para a integração europeia.
O Conselho Europeu convidou ainda a CIG a procurar todos os meios possíveis de simplificar os tratados, de modo a tomar as finalidades e o funcionamento da União mais compreensíveis para os cidadãos.
3.4 — O Conselho Europeu de Dublim
Em 13 e 14 de Dezembro de 1996, o Conselho Europeu, reunido em Dublim, tomou diversas decisões significativas para o desenvolvimento continuado da União Europeia.
O Conselho Europeu:
Alcançou novos progressos decisivos no que respeita à União Económica e Monetária;
Identificou um amplo leque de medidas a serem implementadas a nível comunitário e nacional destinadas a incrementar o emprego;
Adoptou a Declaração de Dublim sobre o Emprego;
Congratulou-se com o esboço geral de um projecto de revisão dos tratados apresentado pela presidência irlandesa, que considerou constituir uma boa base para a fase final da CIG, a concluir em Amsterdão em Junho de 1997;
Adoptou uma série importante de medidas no domínio da justiça e dos assuntos internos e, nomeadamente, chegou a acordo sobre as vias e meios para combater os flagelos da droga, da criminalidade organizada, incluindo o terrorismo, e da exploração sexual das crianças;
Passou em revista a acção da União em matéria de relações externas.
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3.5 — Conselho Europeu de Amsterdão
O Conselho Europeu de Amsterdão de 1997 concluiu o apuramento dos textos em negociação.
O Tratado revisto adiou opções melindrosas de reforma institucional, mas introduz elementos potenciadores de novos progressos na dinâmica de integração, em termos que, ademais, garantem interesses relevantes de Portugal.
Por um lado, na linha das posições defendidas pela delegação portuguesa, fundadas num consenso multipartidário alargado, o Tratado de Amsterdão promove um reforço dos princípios básicos em que se funda a União e sublinha o seu empenho na promoção e respeito pelos direitos fundamentais.
Por outro lado, dá passos no sentido de intensificar o empenhamento da União da não discriminação e na eliminação das desigualdades e na promoção da igualdade entre homens e mulheres.
Na sequência de proposta apresentada pelo representante português no Grupo de Reflexão que preparou a Conferência, o Tratado consagra procedimentos para a adopção de medidas em caso de violação grave e persistente de princípios e direitos fundamentais por parte de um Estado membro.
Foi ainda introduzido um novo título relativo à criação progressiva de um «espaço de liberdade, segurança e justiça» que coloca sob a alçada das normas e procedimentos comunitários a acção comum em relação a questões como o asilo, os vistos, a imigração, os controlos nas fronteiras externas e a cooperação judiciária em matéria civil.
Em síntese mais pormenorizada, a revisão dos tratados orientou-se pelas seguintes preocupações:
a) Sublinhar os princípios de democracia e de Estado de direito em que se funda a União, reforçar o seu empenhamento na promoção e respeito pelos direitos fundamentais e na não discriminação e prever medidas em caso de violação grave e persistente de princípios e direitos fundamentais por um Estado membro;
b) Assegurar a liberdade de circulação dos cidadãos, simultaneamente garantindo a sua segurança, promovendo a criação progressiva de um espaço de liberdade, segurança e justiça e reforçando as medidas relativas à cooperação policial e judiciária em matéria penal;
c) Responder aos interesses concretos dos cidadãos, reforçando domínios que tocam de perto a sua vida quotidiana, introduzindo um capítulo relativo ao emprego, reforçando e ampliando as medidas relativas à política social, ao ambiente, à protecção dos consumidores e à protecção da saúde;
d) Consagrar o princípio da abertura e do acesso dos cidadãos à informação detida pelas instituições;
e) Dotar a União de uma maior capacidade de acção externa, mais credível e mais coesa, reforçando a sua identidade e visibilidade na cena internacional, reforçar a ligação da União Europeia à União da Europa Ocidental e incluir na política externa e de segurança comum as missões humanitárias e de evacuação, missões de manutenção da paz e missões de forças de combate para gestão de crises, incluindo missões de restabelecimento da paz;
f) Reforçar os poderes do Parlamento Europeu, alargar o campo de aplicação das decisões por maioria qualificada e alargar as competências do Tribunal de Justiça, Tribunal de Contas, Comité das Regiões e Comité Económico e Social;
g) Introduzir a figura das cooperações reforçadas, prevendo as condições em que um grupo de Estados poderá avançar no sentido de uma maior integração, respeitando os objectivos dos tratados e o quadro institucional único da União, não afectando as competências, os direitos, as obrigações e os interesses dos Estados membros que nelas não participem.
IV — Estrutura do Tratado
4.1 — Estrutura do Tratado
O novo Tratado, que veio a ser assinado em Amsterdão no dia 2 de Outubro de 1997, pelos plenipotenciários dos 15 Estados membros da União Europeia, divide-se em três partes:
Da primeira constam mudanças de tipo substantivo ao Tratado da União Europeia, e aos tratados institui-. tivos das três Comunidades;
A segunda procede ao saneamento de disposições tornadas obsoletas;
A terceira alberga disposições finais, incluindo uma disposição que procede à renumeração dos artigos dos tratados.
Assinale-se a simplificação formal a que se procedeu, substituindo por números as letras que designavam alguns preceitos do Tratado de Maastricht, eliminando dos textos vigentes disposições caducas e renumerando as disposições alteradas.
4.2 — Simplificação e consolidação dos tratados
Os tratados que instituem a União Europeia e as Comunidades Europeias têm-se tornado cada vez mais complexos e, por isso mesmo, cada vez menos fáceis de compreender, de facto, existem neste momento cerca de 12 tratados e actos fundamentais, sem contar os protocolos, que totalizam perto de 800 artigos.
A Conferência efectuou um trabalho de simplificação dos tratados, num exercício distinto das negociações de fundo sobre a revisão dos tratados. Os resultados desse trabalho constituem parte integrante do resultado final da Conferência. No que se refere à codificação dos tratados, a complexidade desse ambicioso exercício, que implica a fusão dos tratados sem alterar ou reabrir o debate sobre o acervo, levou a Conferência a não proceder a uma codificação oficial, mas a optar por uma consolidação oficiosa de todos os tratados pertinentes, incluindo o Tratado da União Europeia. Esse trabalho foi empreendido rapidamente após a assinatura do Tratado e os seus resultados, que tem carácter exemplificativo e juridicamente não vinculativo, têm vindo a ser divulgados publicamente.
4.3 — Do conteúdo: principais alterações
Salientam-se seguidamente as grandes áreas em que o Tratado de Amsterdão veio operar modificações: No tocante aos direitos fundamentais:
Consagração expressa da não discriminação (artigo 6.°, n.° 1 ,.do Tratado da União Europeia); instituição de um processo sancionatório por violação grave e persistente dos direitos fundamentais (artigo 7.° do Tratado da União Europeia);
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Atribuição ao Tribunal de Justiça de competência para fiscalizar a observância, por parte dos órgãos comunitários, dos direitos fundamentais [artigo 46.°, alínea d), do Tratado da União Europeia);
Consagração da cláusula de não discriminação baseada no sexo, raça, origem étnica, religião, crença, deficiência, idade ou orientação sexual (artigo 13.°
do Tratado da União Europeia);
Afirmação do princípio da igualdade entre sexos (artigos 2° e 3.°, n.° 2, do Tratado da União Europeia);
Declaração sobre a abolição da pena de morte;
Inserção de um novo artigo 213.°-B do Tratado da União Europeia relativo à protecção das pessoas singulares no respeitante ao tratamento e livre circulação de dados de natureza pessoal;
Declaração sobre o estatuto das igrejas e das organizações filosóficas e não confessionais.
No tocante à política externa de segurança comum (PESC):
Os objectivos da União em matéria de segurança e defesa foram reformulados por forma a ter em conta a evolução registada neste domínio após a negociação do Tratado da União Europeia.
As denominadas «missões de Petersberg», de natureza humanitária, são mencionadas no Tratado como aspectos da políüca de segurança da União salientando assim o desejo da União de desenvolver a sua acção nestas áreas de forma mais eficaz, assegurando, na medida do possível, a participação de todos.
As disposições do Tratado reforçam a cooperação entre a União Europeia e a União da Europa Ocidental, em especial a fim de facultar os meios operacionais para levar a cabo missões como as acima referidas. Foi dada ênfase à tomada de medidas que assegurem resultados mais eficazes e práticos. Poderá ser considerada a possibilidade de a política externa e de segurança comum da União evoluir para uma defesa comum, em simultâneo com a integração da União da Europa Ocidental na União. Qualquer mudança neste sentido exigiria uma decisão do Conselho Europeu, que ficaria ainda sujeita ao acordo por parte dos Estados membros, nos termos das respectivas exigências constitucionais.
A PESC foi melhorada através das formas a seguir indicadas:
Aumento da coerência global pelo reforço do papel do Conselho Europeu na definição de estratégias comuns para a política externa da União, que especificarão os seus objectivos, a sua duração e os meios a facultar pela União e pelos Estados membros;
Um alto representante para a PESC, cujas funções serão exercidas pelo Secretário-Geral do Conselho, assistirá o Conselho e a Presidência nos assuntos do âmbito da PESC. O alto representante chefiará igualmente uma unidade de planeamento da política e de alerta rápido que será criada para fornecer avaliações políticas e elementos mais precisos para a definição de políticas;
Os processos decisórios serão significativamente melhorados sob dois aspectos:
et) Em primeiro lugar, embora a unanimidade continue a ser a regra para todas as decisões políticas fundamentais, será reduzido o risco de impasse, prevendo-se um procedimento de «abstenção construtiva», nos termos da qual qualquer Estado membro que faça uma declaração formal para esse efeito não seria obrigado a aplicar uma decisão específica, embora aceitando que a decisão vincula a União;
b) Em segundo lugar, será introduzida a votação por maioria qualificada para as decisões no âmbito da PESC que dão execução a estratégias comuns acordadas por unanimidade pelo Conselho Europeu ou a acções comuns ou posições comuns que já tenham sido adoptadas. Encontra-se previsto um «travão de emergência» que permitirá que qualquer Estado membro se oponha à adopção de uma decisão por importantes e expressas razões de política nacional. Em tais casos, os Estados membros que considerem importante a actuação da União poderão, no caso de representarem uma maioria qualificada, submeter a questão ao Conselho Europeu, para ser tomada uma decisão por unanimidade.
As alterações introduzidas neste domínio (2.° pilar), quer as referentes aos objectivos políticos, que foram clarificados no referente à salvaguarda da União e das suas fronteiras externas e completados com a introdução de uma cláusula de solidariedade política, quer as referentes aos mecanismos institucionais e processos de decisão, vão no sentido de dotar a União Europeia de uma verdadeira política externa.
Este objectivo não foi conseguido inteiramente, face às divergências que continuam a fazer-se sentir entre os Estados membros (a regra da unanimidade continua a ser exigida para as decisões fundamentais e a invocação de um «interesse nacional importante» permite impedir a tomada de decisões).
Política social:
O Tratado,, levantado o opt out britânico, passou a incorporar o capítulo social (artigos 117.° a 120." do Tratado da Comunidade Europeia) com muito pequenas alterações:
Foi recuperado o «princípio da igualização no progresso», consagrado no Tratado de Roma;
Os direitos sociais fundamentais não foram incorporados (é feita uma referência exemplificativa, à Carta Social de 1989);
O processo de cooperação é substituído pela co-decisão, mas a exigência de unanimidade é mantida em relação a todas as matérias já previstas no Protocolo Social de Maastricht (artigo 118°, n.° 3);
O artigo 119.° foi aperfeiçoado mediante a extensão do princípio da igualdade de oportunidades e de tratamento entre homens e mulheres no emprego e no trabalho, incluindo o princípio a trabalho igual, salário igual, permitindo discriminações positivas;
Inovadoramente, o artigo 118.°, n.OT2 e 3, alínea a), permite adoptar, por maioria qualificada, medidas visando encorajar a cooperação na luta contra a exclusão social.
Política de emprego:
O Tratado apresenta relevantes inovações em matéria de política de emprego:
Inclusão, entre os objectivos da União, da promoção de um elevado nível de emprego (artigo 2.° do Tratado da União Europeia) e aditamento de um título dedicado ao emprego (título viu do Tratado da Comunidade Europeia), onde se prevê o desenvolvimento de uma estratégia coordenada entre os Estados membros e a Comunidade;
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Aperfeiçoamento dos regimes relativos à saúde pública (título xni do Tratado da Comunidade Europeia), à protecção dos consumidores (título xiv do Tratado da Comunidade Europeia) e ao ambiente (título XIX do Tratado da Comunidade Europeia);
Consagração de um «processo de cooperação reforçada» (artigo 43.° do Tratado da União Europeia), que permite a diferenciação flexível da cooperação entre alguns Estados membros, desde que autorizados por maioria qualificada ou, em certas circunstâncias, por decisão unânime; este processo é em especial aplicável ao pilar comunitário (artigo 11.° do Tratado da Comunidade Europeia) e à cooperação policial e judiciária em matéria penal (artigo 40.° do Tratado da União Europeia)?
4.4 — Reformas institucionais
As reformas institucionais, que não puderam ser profundas, incidiram em especial sobre a extensão de competências do Parlamento, do Tribunal de Justiça e do Comité das Regiões.
As instituições da União
Procurou-se assegurar que as instituições da União sejam mais compreensíveis e transparentes, como condição essencial para que a União seja melhor entendida e aceite pelos seus cidadãos. O Tratado estabelece claramente que todos os cidadãos têm direito de acesso aos documentos oriundos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão, sob reserva de princípios gerais e de restrições em razão do interesse público e privado, a decidir pela Comunidade. O Tratado preconiza uma melhor qualidade de redacção da legislação comunitária, a fim de contribuir para assegurar uma correcta aplicação da legislação por parte das autoridades nacionais competentes e uma melhor compreensão por parte dos cidadãos e dos agentes económicos.
0 Parlamento Europeu
O papel do Parlamento Europeu, enquanto verdadeiro co--legislador juntamente com o Conselho, foi reconhecido mediante a alteração do procedimento legislativo conhecido por co-decisão, em certos domínios (por forma a colocar o Conselho e o Parlamento Europeu em pé de igualdade), e mediante o significativo alargamento do âmbito das áreas legislativas a que esse procedimento é aplicável. Além disso, procedeu-se a uma maior simplificação, mediante a redução do número de procedimentos legislativos para três: co-decisão, parecer favorável e consulta. O número de deputados do Parlamento Europeu não poderá ser superior a 700, e dever-se-á ler em conta a necessidade de assegurar que o número de representantes de cada Estado membro constitui uma representação adequada. O Parlamento Europeu poderá ainda apresentar propostas no que toca ao seu próprio processo de eleição, baseadas em princípios comuns a todos os Estados membros.
Haverá um alargamento dos domínios em que se deverá recorrer à votação por maioria qualificada para a adopção de actos do Conselho, o que facilitará o processo decisório.
Comissão
O Tratado procura assegurar que a Comissão seja mais eficiente e eficaz através das seguintes medidas:
Atribuindo ao Presidente da Comissão maiores poderes no tocante à escolha dos comissários e ao exercício de uma liderança política;
Melhorando a organização interna da Comissão e a
estruturação dos seus serviços; Assegurando que a composição da Comissão evoluirá
à medida que a Comunidade se alarga.
Tribunal de Justiça
As competências do Tribunal de Justiça foram alargadas e clarificadas no que respeita à salvaguarda dos direitos fundamentais, à acção da União em matéria de asilo e imigração e às questões respeitantes à cooperação policial e judiciária.
Daí que a comunitarização do asilo e imigração ganhe em controlo jurisdicional e parlamentar e consequente reforço dos direitos fundamentais nestas áreas.
Tribunal de Contas
A competência do Tribunal de Contas foi alargada de forma significativa; foi dada uma maior autonomia administrativa ao Comité das Regiões; o âmbito da consulta ao Comité das Regiões e ao Comité Económico e Social regista alargamento.
Os parlamentos nacionais
O papel dos parlamentos nacionais foi objecto de um protocolo que prevê que lhes sejam atempadamente enviados documentos de consulta e propostas de legislação, estipulando que deve mediar um prazo de pelo menos seis semanas entre a apresentação de uma proposta de legislação e a sua apreciação em Conselho.
Os parlamentos nacionais são implicados na aprovação de diplomas do direito primário da União e desempenham igualmente um papel importante em relação à escolha da forma e dos meios de transposição para a legislação nacional do resultado a alcançar através das directivas CE. A Conferência dos Órgãos Especializados em Assuntos Comunitários (COSAC) dos Parlamentos Nacionais e do Partaras*-to Europeu, instância através da qual os parlamentos nacionais se podem consultar e informar mutuamente, poderá expressar o seu parecer em relação a certas questões a nível da União, sem que no entanto os parlamentos nacionais fiquem vinculados a esse parecer. Foram também tomadas medidas que contribuem para garantir que sejam enviados atempadamente aos parlamentos nacionais exemplares dos documentos de consulta e de propostas de legislação e que estabelecem que deverá mediar um prazo mínimo de «ás semanas entre a apresentação de uma proposta de legislação e a sua inscrição na ordem do dia do Conselho para deliberação, salvo em caso de particular urgência.
4.5 — O futuro alargamento e as alterações institucionais
Na perspectiva do futuro alargamento, partiu-se do princípio de que será necessário efectuar alterações institucionais que conciliem o desejo de dispor de um processo decisório mais eficaz com a necessidade de assegurar que as instituições tenham um carácter claramente democrático e se enraízem firmemente numa aceitação por parte da opinião pública. Neste contexto, a Conferência acordou em que, à data de entrada em vigor do próximo alargamento da Únião, os Estados membros que dispõem de dois comissários abdicarão de um deles, desde que, nessa data, a ponderação dos votos no Conselho tenha sido alterada através quer de uma nova ponderação dos votos quer da introdução de uma dupla maioria, de uma forma aceitável para todos os Estados
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membros. Ao proceder desta forma, dever-se-ão ter em conta todos os elementos pertinentes e, nomeadamente, compensar os Estados membros que abdiquem da possibilidade de designar um segundo membro da Comissão.
O mais tardar um ano antes da data em que a União Europeia passar a ser constituída por mais de 20 Estados membros, será convocada uma conferência intergovernamental* para proceder a uma revisão global às disposições dos
tratados relativas à composição e funcionamento das instituições.
Cooperação mais estreita — «flexibilidade»
O Tratado define as condições em que uma parte dos Estados membros poderão avançar sem os restantes para etapas de maior integração, respeitando os objectivos e interesses comuns da União, não pondo em causa a sua unidade institucional, nem comprometendo o princípio da igualdade entre os Estados membros.
Visou-se um difícil equilíbrio entre duas lógicas opostas: a possibilidade de a decisão ser tomada por maioria qualificada visa impedir a obstrução de Estados menos empenhados; a definição rigorosa dos requisitos da flexibilidade pretende salvaguardar o acervo comunitário e evitar que haja na União Estados participantes em núcleos «duros» ou «directórios» ao lado de Estados com estatuto dependente, numa Europeia cujas velocidades desiguais afectariam a existência de uma verdadeira União.
As expressões «cooperação mais estreita» e «flexibilidade» referem-se à possibilidade de um número de Estados membros inferior ao número total cooperar mais estreitamente em domínios específicos, no quadro institucional da União e não fora dele.
A noção de um regime flexível a nível da União não constitui uma novidade absoluta. As actuais disposições do Tratado permitem, por exemplo, aos Estados membros aproximarem-se a ritmos diferentes do objectivo da união económica e monetária plena.
O conceito de «cooperação mais estreita», na acepção utilizada no Tratado, refere-se às modalidades de execução dessa cooperação mais estreita num domínio específico, ela-òoradas, sempre que adequado e na medida do necessário, de acordo com princípios e condições rigorosos, incluindo:
Condições gerais que estabelecerão um quadro claro para essa cooperação, preservando simultaneamente os princípios fundamentais dos Tratados e salvaguardando os interesses de quaisquer Estados membros que eventualmente não desejem participar desde o início nessa cooperação, incluindo o seu direito de a ela se associarem em qualquer momento;
Cláusulas específicas aplicáveis às questões comunitárias e ao domínio da cooperação policial e judiciária entre Estados membros para combater a criminalidade, que estabelecerão as condições para uma cooperação mais estreita em cada um desses domínios.
A Comissão tem neste processo um papel especial, cabendo-lhe certificar-se da compatibilidade de qualquer pedido de cooperação mais estreita com as condições estabelecidas no Tratado, em especial no que se refere ao l.° pilar.
A decisão de autorizar regimes de flexibilidade deve ser tomada pelo Conselho, deliberando por maioria qualificada, apesar de se ter previsto, como salvaguarda, um veto («travão de emergência»).
As disposições do Tratado procuram, por conseguinte, estabelecer um equilíbrio entre os interesses legítimos dos Estados membros que desejam instaurar uma cooperação mais estreita em domínios específicos dentro do quadro da União e os dos Estados membros que optam por não se associarem a essa cooperação desde o início, assegurando simultaneamente que o actual acervo da União não seja afectado. 4.6 — Da justiça e assuntos internos
Tendo em conta as competências da I.° Comissão, afigura-se adequado aprofundar a análise das inovações decorrentes da revisão dos tratados no tocante à justiça e assuntos internos.
A cooperação nos domínios da justiça e assuntos internos foi uma das formas de acção de que a União se dotou para «completar as comunidades europeias». A sua instituição pelo título VI do Tratado da União Europeia representou em si uma novidade significativa em relação a uma cooperação entre Estados anteriormente marcada pela grande dispersão, pela escassez de resultados e pela escassa visibilidade dos seus trabalhos.
Com o Tratado de Maastricht, a cooperação entre os Estados membros nos domínios da justiça e dos assuntos internos passou a ser dotada de meios institucionais e jurídicos de natureza intermédia entre o sistema comunitário clássico e a simples cooperação intergovernamental, que se manteve, contudo, predominante:
A Comissão e o Parlamento Europeu desempenham um certo papel nessa cooperação, ainda que menor do que no domínio comunitário;
A iniciativa pertence aos Estados membros e à Comissão em certos domínios;
Foram criados novos instrumentos jurídicos (a posição comum, a acção comum e as convenções estabelecidas pelo Conselho);
A integração e a resolução dos litígios pelo Tribunal de Justiça foi em princípio excluída, mas podendo ser prevista pelo Conselho em certos domínios;
Foi configurado um procedimento para transferir certas acções para o domínio comunitário;
Admitiu-se a possibilidade de aplicação de um financiamento comunitário.
Após alguns anos de vigência do quadro regulador do 3.° pilar é, contudo, consensual um juízo negativo sobre o seu funcionamento tanto por parte de Estados membros como das organizações não governamentais de defesa dos direitos humanos.
Enquanto, por um lado, o Tratado atribui um grande significado à cooperação nesses sectores, qualificando-a como um dos três pilares para o desenvolvimento da União, por outro, a estrutura do pilar é muito frágil e sensível.
Na verdade:
1) O artigo 8.°-A (7.°-A do Tratado da União Europeia) não se concretizou, a liberdade de circulação de pessoas não foi assegurada até ao momento presente. As medidas necessárias de acompanhamento que deveriam ter sido adoptadas através do processo intergovernamental do título vi não foram implementadas;
2) Em quase todas as questões sobre a aplicação do Tratado da União Europeia no âmbito da cooperação não se chegou a acordo. A regra da unanimidade tem contribuído para esse bloqueio a nível decisório;
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3) A Comissão caracterizou a cooperação como ineficaz e os instrumentos fornecidos pelo Tratado como desadequados. O processo de tomada de decisão
caracterizou-se por uma completa ausência de transparência. Em todos os conselhos de justiça c assuntos internos foram adoptadas resoluções, recomendações e declarações sem que as instituições democráticas nacionais tenham sido chamadas à colação. A Comissão esteve inactiva neste sector devido ao papel pouco claro que lhe foi conferido.
O título vi é lacunar, nomeadamente quanto à protecção dos dados pessoais utilizados nos sistemas de informação de polícia e de segurança interna e às medidas tendentes a impedir a discriminação contra cidadãos de países terceiros.
Em função das reivindicações dos Estados membros e de um conjunto significativo de organizações, o Tratado incorpora nesta área um conjunto de alterações significativas.
Para assegurar a liberdade de circulação de pessoas no espaço comum, sem lesar a segurança e as liberdades dos cidadãos, procede-se à incorporação na competência da Comunidade Europeia de várias matérias antes do 3.° pilar. Às matérias não comunitarizadas, que continuam no 3." pilar, passam a aplicar-se processos de decisão mas eficazes e permite-se a uma maioria qualificada de Estados autorizar uma «cooperação mais estreita».
Passa a existir um controlo de legalidade perante o Tribunal de Justiça.
Sublinhe-se, no entanto, que a incorporação parcial de matérias do 3.° pilar na competência da Comunidade é feita com desvios significativos ao método comunitário e aos poderes normais das instituições. O Reino Unido, a Irlanda e a Dinamarca podem escolher caso por caso as medidas tomadas neste âmbito a que pretendem vincular-se.
São transferidas para o Tratado da Comunidade Europeia, por meio da inclusão de um novo título, varias matérias antes inseridas na cooperação intergovernamental:
Regras sobre a passagem das fronteiras externas e medidas necessárias à abolição de controlos nas fronteiras internas, inclusive para os nacionais de países terceiros (artigo B);
Medidas relativas ao asilo e à imigração, incluindo normas mínimas sobre a protecção temporária de refugiados e as condições de entrada e residência dos imigrados (artigo C);
Medidas necessárias ao bom funcionamento do mercado interno no domínio da cooperação judiciária em matéria civil (artigo E);
Além destas, são objecto de comunitarização (mas aqui integral) a luta contra a fraude lesiva dos interesses financeiros da Comunidade (artigo 209.°-A do Tratado da Comunidade Europeia) e a cooperação aduaneira, com exclusão dos aspectos penais (novo artigo).
No âmbito deste novo título do Tratado da Comunidade Europeia (livre circulação de pessoas, asilo e imigração) é fixado um máximo de cinco anos para que o Conselho, deliberando por unanimidade, adopte as medidas necessárias.
O poder de iniciativa é partilhado, neste período de cinco anos, entre os Estados membros e a Comissão. O Parlamento Europeu tem uma intervenção meramente consultiva.
Depois desse período inicial de cinco anos, o Conselho, deliberando por unanimidade, pode aplicar a co-decisão e 0 voto por maioria qualificada às matérias deste título, com
excepção das condições de passagem de vistos e do visto uniforme, que ficarão automaticamente abrangidas pela codecisão, findo o prazo de cinco anos (artigo G).
A Cooperação polictal e judiciária em matéria pena no âmbito da qual se procedeu a uma comunitarização das competências relativas à concessão de vistos, direito de asilo, imigração e outras políticas relativas à livre circulação de pessoas (título iv do Tratado da Comunidade Europeia, de cuja aplicação ficaram excluídos o Reino Unido e a Irlanda, por força de um protocolo anexo ao Tratado de Amsterdão).
As alterações mais relevantes traduzem-se em colocar estas matérias sob a alçada do Tribunal de Justiça (artigo 68.° do Tratado da Comunidade Europeia) e em fazer transitar a competência relativamente à passagem de vistos e ao visto uniforme, por decisão do Conselho, tomada por unanimidade, no prazo de cinco anos, para o âmbito do processo de co-decisão, nos termos do artigo 67.° do Tratado da Comunidade Europeia.
Sublinhe-se que o Conseil Constitucionnel francês pronunciou-se no sentido de que este aspecto do regime da concessão de vistos, direito de asilo e imigração ser incompatível com a Constituição francesa —por constituir um obstáculo às «condições essenciais do exercício da soberania» —, devendo portanto a Constituição ser revista antes da ratificação do Tratado.
O quadro constitucional português foi, contudo, revisto em 1992 em termos que habilitam suficientemente a Assembleia da República a aprovar o modelo decisional configurado no Tratado.
Dado que os objectivos do Acordo de Schengen, que criou já uma zona de livre circulação de pessoas entre 13 Estados membros, coincidem com os objectivos constantes do novo Tratado, o acervo de Schengen será integrado no quadro da União.
Foi tida em conta a situação do Reino Unido e da Irlanda, reconhecendo a sua zona de deslocação comum e o seu direito em matéria de controlos de pessoas nas suas fronteiras externas. Além disso, o Tratado prevê que o Reino Unido e a Irlanda possam decidir não participar na adopção de medidas adoptadas ao abrigo do novo título relativo aos vistos, asilo e imigração; se optar pela faculdade de não participação deste início, qualquer dos dois países pode decidir apHcar, numa data posterior, qualquer das medidas adoptadas. Excepto no que se refere às regras relativas aos vistos, disposições idênticas são aplicáveis à Dinamarca, que, para além disso, não participará na elaboração e execução de decisões que tenham repercussões no domínio da defesa.
Todavia, ao possibilitar a liberdade de circulação de um Estado membro para outro sem controlos nas fronteiras internas, não se poderá de forma alguma pôr em causa a segurança das pessoas que vivem na União. A criminalidade e as actividades criminosas, tais como o terrorismo, os cumes cometidos contra crianças, o tráfico de droga e a fraude, bem como racismo e a xenofobia, transcendem as fronteiras nacionais. Por conseguinte, considerou-se indispensável que, sempre que necessário, a União possa alargar para além dessas fronteiras a protecção dos seus cidadãos contra esses flagelos e proporcionar-lhes um ambiente de vida seguro. As alterações ao Tratado nesta área, que não afectam a especificidade da cooperação fora da Comunidade em relação a estas matérias, e é mesmo suposto que reforcem significativamente a capacidade de a União tomar medidas mais eficazes para prevenir e combater a criminalidade e para melhorar a cooperação policial e judiciária em matéria penal.
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A cooperação entre forças policiais, serviços aduaneiros e outros serviços especializados dos Estados membros responsáveis pela aplicação da lei será incrementada por forma a prevenir, detectar e investigar as infracções penais. O impacte a nível operacional do Serviço Europeu de Polícia (Europol) será também significativamente aumentado. Juntamente com o reforço do alcance e da eficácia dos instrumentos jurídicos à disposição da União e um maior papel do Parlamento Europeu e do Tribunal de Justiça as secções da União
nestes domínios sofrerão uma alteração qualitativa.
4.7 — Do enquadramento constitucional do Tratado de Amsterdão
Como oportunamente se referiu, o quadro constitucional português foi sucessivamente alterado em termos que habilitam sufecientemente a Assembleia da República a aprovar o novo modelo decisional configurado no Tratado. Cabe agora delimitar melhor em que termos tal ocorre.
Logo na primeira revisão constitucional, em 1982, tendo em vista a preparação da adesão de Portugal às Comunidades, foi introduzido no artigo 8." da Constituição um n.° 3, com a seguinte redacção:
As normas emanadas dos órgãos competentes das organizações de que Portugal seja parte vigoram directamente na ordem interna, desde que tal se encontre expressamente estabelecido nos respectivos tratados internacionais.
Na revisão constitucional de 1989 aditou-se um novo número (n.° 5) ao artigo 7.°, que passou a dispor:
Portugal empenha-se no reforço da identidade europeia e no fortalecimento da acção dos Estados europeus a favor da paz, do progresso económico e da justiça nas relações entre os povos.
Por outro lado, procurou-se precisar o sentido da parte final do n.° 3 do artigo 8.°, a fim de permitir a produção de efeitos de certos actos de direito comunitário derivado no ordenamento jurídico interno, sem mediação de qualquer acto legislativo ou regulamentar.
Aquando da adopção do Tratado da União Europeia, Portugal à semelhança de outros Estados, procedeu a uma revisão extraordinária da Constituição por forma a receber o Tratado da União Europeia.
A revisão constitucional de 1992 alterou os artigos 7.°, 15.°, 105.°, 166.° e 200.° da Constituição, a fim de tornar a \e\ fundamental conforme com a (nova) realidade europeia.
Artigo 7.°, uma vez que o n.° 5, introduzido em 1989 [...] se apresentava de alcance demasiado genérico para recobrir as exigências específicas de Maastricht;
Artigo 15.°, para consagração da capacidade eleitoral dos estrangeiros na eleição do Parlamento Europeu;
Artigo 105.°, devido ao exclusivo da emissão de moeda que atribuía ao Banco de Portugal.
Ao artigo 7.°, o mais relevante para a problemática em análise, foi aditado um novo número (n.° 6), nos termos do qual:
Portugal pode, em condições de reciprocidade, com respeito pelo princípio de subsidiariedade e tendo em vista a realização do princípio da coesão económica e social, convencionar o exercício em comum dos poderes necessários à construção da união europeia.
A Lei Constitucional n.° 1/92 alterou também o texto do n.° 5 do mesmo artigo 7.°, sublinhando o vector democrático do processo de integração.
As funções de informação e de acompanhamento e apreciação do processo de «construção da união europeia» passaram, a partir da revisão de 1992, a integrar expressamente a competência do Governo e da Assembleia da República. No decurso da quarta revisão constitucional, a Lei Constitucional
n.° )/97, de 20 de Setembro, veio reforçar os poderes da
Assembleia da República na construção europeia, devendo
caber-lhe pronunciar-se, nos termos da lei, sobre as matérias
pendentes de decisão nos órgãos da União Europeia que incidam na esfera da sua competência legislativa reservada.
A natureza ampla e flexível da cláusula de habilitação prevista no artigo 7.° faculta ao Estado Português a vinculação às obrigações descritas no número anterior, que implicam o exercício em comum de relevantes funções que no passado foram prerrogativa exclusiva dos Estados membros. Nas condições modernas de globalização essa forma de exercício de competências revela-se mais adequada ou igualmente adequada e em muitas circunstâncias a única capaz de dar resposta aos desafios existentes.
V — Conclusão e parecer
Em certo sentido o Tratado de Amsterdão marca uma pausa, adiando algumas decisões fundamentais (v. g., instituições, assuntos internos e justiça) por cerca de cinco anos a contar da data da entrada em vigor. Tal aponta para o ano de 2004, com o qual deverão coincidir, por um lado, o termo das perspectivas financeiras quinquenais, que entrarão em vigor no ano de 2000 e, por outro, a data das primeiras adesões depois de negociações com os países candidatos.
O empenhamento de Portugal nesta nova etapa da construção da União Europeia é uma componente essencial da política externa do País, imprescindível para a resposta eficaz aos desafios do 3." milénio.
Nestes termos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias considera reunidos os requisitos constitucionais e regimentais para a subida a Plenário da proposta de resolução n.° 118/VTí, que aprova, para ratificação, o Tratado de Amsterdão, assinado em 2 de Outubro de 1997.
Palácio de São Bento, 6 de Janeiro de 1999. — O Deputado Presidente, Alberto Martins. — Os Deputados Relatores: José Magalhães — Guilherme Silva.
ANEXO N.° 2
Relatório da Comissão de Economia, Finanças e Plano I — Introdução
As limitações do Tratado de Amsterdão nas suas aplicações no domínio económico e financeiro e enquanto instrumento de construção progressiva da União Européia são significativas. Mas, não deixa de ser pertinente verificar que o Tratado, na sua estrutura actual, abre caminho para algumas interessantes interpretações, tomando-se claro que todo o processo de evolução futura da União implicará, certamente, uma necessidade de aprofundar, no domínio económico, as questões que o alargamento e o aprofundamento suscitam.
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Neste relatório pretende-se efectuar uma reflexão globalizante, mas sintética, sobre aspectos essenciais focados no Tratado e que têm incidência directa ou indirecta na vertente económica, sem deixar de referir o enquadramento poli-
tico-institucional no qual emergiu o texto do Tratado de
Amsterdão.
II — Enquadramento político-institucional
O Tratado de Amsterdão, assinado em 2 de Outubro de 1997, resultou do trabalho de 18 meses em sede de Conferência Intergovernamental (CIG).
O Tratado de Amsterdão insere-se no processo de avanço da construção europeia. Pode-se considerar que o projecto europeu se encontra numa fase caracterizada por três eixos essenciais:
Aprofundamento da arquitectura institucional europeia; Alargamento da União Europeia aos PECOS; Reforço do papel da União nalgumas áreas essenciais.
Nestes diferentes domínios, os ganhos obtidos pelo texto do Tratado são moderados.
Tinham sido criadas fortes expectativas no sentido de que a CIG poderia transformar de forma substancial a organização, metodologia e práticas da União Europeia e das suas instituições. Mas, gradualmente, foi sendo percebido que, face à heterogeneidade de posturas dos Estados membros, ao diferente posicionamento político dos Governos, ao processo de evolução da UE, às características da liderança da Comissão e à pressão para alargamentos num futuro próximo, a CIG poderia afinal vir a obter resultados bastante limitados. Efectivamente e neste contexto, verificou-se que o Tratado de Amsterdão resultou num compromisso, envolvendo diversas alterações, que em vários casos constituíram significativos sinais para quem labora ou convive quotidianamente com as instâncias comunitárias, mas globalmente de menor relevância para os cidadãos europeus.
II —a) Domínios essenciais
Salientaríamos que o Tratado de Amsterdão é particularmente importante nos seguintes domínios, com impacte ou influência na área económica:
Dá visibilidade europeia ao problema do emprego e toma o combate ao desemprego uma prioridade da União: cada um dos Estados membros, mantendo-se senhor da sua política, deve passar a enquadrá-la na estratégia coordenada sobre o emprego a nível da Comunidade;
Simplifica e dá coerência lógica aos diferentes Tratados existentes;
Faz da consagração dos direitos dos cidadãos um dos objectivos mais importantes;
Incorpora Schengen na União: matérias como os vistos, o direito de asilo, de controlo de fronteiras externas, de cooperação entre polícias e entre alfândegas como forma de garantir a livre circulação de pessoas sem perturbações de ordem pública. Estas disposições são aplicadas a 13 países da UE (as excepções são o Reino Unido e a Irlanda), bem como à Noruega e à Islândia, devendo ter-se em conta que a Dinamarca goza de um regime especial;
Alarga a defesa dos interesses comerciais dos Estados membros a domínios como a propriedade intelectual e os serviços.
Para além disso:
Define regras que operacionalizam e flexibilizam o funcionamento da PESC — Política Externa e de Segurança Comum;
Assume como regra geral para a maioria dos domínios a co-decisao entre o Conselho e o Parlamento
Europeu;
Integra nas suas disposições relativas à política social, educação, formação e juventude o que não passava de um protocolo em Maastricht.
Sublinhemos a nova importância dada à temática articulada do:
II — 6) Desenvolvimento e emprego
E neste enquadramento interessa salientar o significado de duas expressões que constam do Tratado de Amsterdão e que traduzem uma nova percepção da situação actual: «desenvolvimento sustentável» e «nível elevado de emprego».
É simbólico que no mesmo ano em que é feita a ratificação do Tratado de Amsterdão se tenham consagrado os membros fundadores da UEM. A par do desenvolvimento financeiro e do aprofundamento da integração europeia, da Europa dos cidadãos. Nos dois campos Portugal está presente, prova que a adesão em 1985 foi a opção política acertada e de que o processo em curso revelou que Portugal tem capacidade para se afirmar.
III — Estrutura do Tratado
Em termos de estrutura, o Tratado de Amsterdão é composto de 3 partes, 1 anexo e 13 protocolos.
Parte I
A parte i inclui as alterações substanciais e consiste em cinco artigos:
Artigo 1.°, «Alterações ao Tratado da União Europeia»;
Artigo 2.°, «Alterações ao Tratado Que Institui a Comunidade Europeia»;
Artigo 3.°, «Alterações ao Tratado Que Institui a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço»;
Artigo 4.°, «Alterações ao Tratado Que Institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica»;
Artigo 5.°, «Alterações ao Acto Relativo à Eleição dos Representantes ao Parlamento Europeu».
Parte II
A parte n do Tratado de Amsterdão corresponde aos artigos 6.°, 7.°, 8.°, 9°, 10.° e 11.° e contempla disposições de simplificação dos tratados que não contêm matéria com relevância em termos económico-financeiros.
Parte III
A parte in inclui as disposições gerais e finais e consiste em quatro artigos (12.° a 15.°).
Também a parte ih do Tratado não parece relevante nas áreas de economia, finanças e plano, porquanto corresponde a «disposições gerais e transitórias».
Protocolos
Em termos dos protocolos, permitimo-nos destacar:
O que reafirma que os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade «continuarão a nortear a acção das instituições da União»;
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O que estabelece que «o mais tardar um ano antes da data em que a União Europeia passar a ser constituída por mais de 20 Estados membros será convocada uma conferência de representantes dos Governos dos Estados membros a fim de se proceder a uma revisão global das disposições dos Tratados relativas à composição e ao funcionamento das instituições».
IV — Emprego, desenvolvimento, trabalho e política social
Sublinhe-se que logo no artigo l.° do Tratado de Amsterdão é inserido um considerando que releva o apego dos
países da UE aos direitos sociais fundamentais, tal como definidos na Carta Social Europeia, assinada em Turim, em 18 de Outubro de 1961, e na Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores, de 1989. Esta adenda é confirmada pela consagração no artigo F dos valores políticos da Europa: liberdade, democracia e respeito pelos direitos do Homem e pelas liberdades fundamentais, tudo no âmbito de um Estado de direito.
O 7.° considerando do Tratado da União Europeia também é alterado no sentido de se reafirmarem os princípios do reforço da coesão, da protecção do ambiente, mas salientando o conceito de desenvolvimento sustentável.
Em relação ao artigo B do TUE, ganha relevo o compromisso na promoção de um elevado nível de emprego.
Outra inovação que pode ter repercussões a nível económico é o artigo J9, porque se assume que haverá coordenação entre os Estados membros no âmbito das organizações e conferências internacionais, onde haverá posições comuns.
No que respeita às alterações produzidas sobre o Tratado Que Institui a Comunidade Europeia (artigo 2." do Tratado de Amsterdão), é desde logo contemplada nos considerandos uma referência ao conhecimento, à «educação e à contínua actualização desses conhecimentos». À semelhança das alterações operadas no TUE, também se altera o artigo 2.° do Tratado Que Institui a Comunidade Europeia para se introduzirem os conceitos de desenvolvimento sustentável e da igualdade entre homens e mulheres.
Importante é também a alteração da alínea /) do artigo 3." quando, na sequência da Cimeira de Luxemburgo e da concepção e implementação dos planos nacionais de emprego, se defende «promoção de uma coordenação entre as políticas de emprego dos Estados membros, com o objectivo de reforçar a sua eficácia, mediante a elaboração de uma estratégia coordenada em matéria de emprego».
A protecção do ambiente é eleita como uma prioridade no artigo 3.°-C.
São efectuados vários ajustamentos sobre a livre circulação de pessoas e de controlo de fronteiras.
Face às preocupações económico-financeiras do desemprego na Europa, é inserido o título vi-A, relativo ao emprego, que merece uma análise mais detalhada:
A artigo 109.°-N define que:
Os Estados membros e a Comunidade se empenharão em «desenvolver uma estratégia coordenada em matéria de emprego e, em especial, em promover uma mão-de-obra qua-iificada, formada e susceptível de adaptação, bem como mercados de trabalho que reajam rapidamente às mudanças económicas».
O artigo I09.°-O esclarece que:
«[...] os Estados membros considerarão a promoção do emprego uma questão de interesse comum e coordenarão a sua acção neste domínio no âmbito do Conselho, nos termos do disposto no artigo I09.°-Q»
O artigo 109.°-P complementa afirmando que:
«A Comunidade contribuirá para a realização de um elevado nível de emprego, incentivando a cooperação entre os Estados membros, apoiando e, se necessário, completando a sua acção. Ao fazê-lo, respeitará as competências dos Estados membros» e recorda que «o objectivo de alcançar um elevado nível de emprego será tomado em consideração na definição e execução das políticas e acções comunitárias».
O artigo 109.°-Q estabelece que:
«O Conselho Europeu procederá anualmente à avaliação da situação do emprego na Comunidade e adoptará conclusões nessa matéria, com base num relatório anual conjunto do Conselho e da Comissão». Será também o
Conselho a definir anualmente as orientações que os Estados membros devem ter em conta nas respectivas políticas de emprego.
O «Conselho analisará anualmente a execução das políticas de emprego dos Estados membros, à luz das orientações em matéria de emprego. O Conselho, deliberando por maioria qualificada, sob recomendação da Comissão, pode, se o considerar adequado na sequência dessa análise, dirigir recomendações aos Estados membros». Em consequência, «o Conselho e a Comissão apresentarão anualmente ao Conselho Europeu um relatório conjunto sobre a situação do emprego na Comunidade e a aplicação das orientações em matéria de emprego».
Ora, estes aspectos parecem de extrema relevância no contexto da concretização dos novos objectivos do TUE sobre o emprego.
O artigo 109.°-R especifica que:
O Conselho pode adoptar acções de incentivo destinadas a fomentar a cooperação entre os Estados membros e apoiar a sua acção no domínio do emprego, por meio de iniciativas que tenham por objectivo desenvolver o intercâmbio de informações e de boas práticas, facultar análises comparativas e consultadoria, promover abordagens inovadoras e avaliar a experiência adquirida, em especial mediante o recurso a projectos piloto.
Pelo artigo 109.°-S é criado:
Um «.comité do emprego, com carácter consultivo, para promover a coordenação das políticas em matéria de emprego e de mercado de trabalho entre os Estados membros». «Os Estados membros e a Comissão nomearão, cada um, dois membros do comité.»
O título VIII, «Política social, educação, formação profissional e juventude», sofre uma profunda alteração no seu capítulo 1 sobre as disposições sociais, porquanto são substituídos os artigos 117.° a 120.°
O artigo 117.° estabelece como princípios que:
«A Comunidade e os Estados membros, tendo presentes os direitos sociais fundamentais, tal como os enunciam a Carta Social Europeia, assinada em Turim, em 18 de Outubro de 1961, e a Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores, de 1989, terão por objectivos a promoção do emprego, a melhoria das condições de vida e de trabalho, de modo a permitir a sua harmonização, assegurando simultaneamente essa melhoria, uma protecção social adequada, o diálogo entre parceiros sociais, o desenvolvimento dos recursos humanos, tendo em vista um nível de emprego elevado e duradouro, e a luta contra as exclusões.
Para o efeito, a Comunidade e os Estados membros desenvolverão acções que tenham em conta a diversidade das práticas nacionais, em especial no domínio das relações contratuais, e a necessidade de manter a capacidade concorrencial da economia comunitária.»
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O artigo 118.° esclarece que:
«A fim de realizar os objectivos enunciados no artigo 117.°, a Comunidade apoiará e completará a acção dos Estados membros nos seguintes domínios:
Melhoria, principalmente, do ambiente de trabalho, a fim de proteger a saúde e a segurança dos trabalhadores;
Condições de trabalho;
Informação e consulta dos trabalhadores;
Integração das pessoas excluídas do mercado de trabalho, sem prejuízo do disposto no artigo 127.°;
Igualdade entre homens e mulheres quanto às oportunidades no mercado de trabalho e ao tratamento no trabalho.»
Também fica definida a possibilidade de o Conselho «adoptar, por meio de directivas, prescrições mínimas progressivamente aplicáveis, tendo em conta as condições e as regulamentações técnicas existentes em cada um dos Estados membro».
Para salvaguardar a posição daqueles países tradicionalmente mais renitentes à regulamentação social (em especial o Reino Unido, mas não só), fica claro que só por unanimidade pode o Conselho deliberar sobre:
Segurança social e protecção social dos trabalhadores;
Protecção dos trabalhadores em caso de rescisão do contrato de trabalho;
Representação e defesa colectiva dos interesses dos trabalhadores e das entidades patronais, incluindo a cogestão, sem prejuízo do disposto no n.° 6;
Condições de emprego dos nacionais de países terceiros que residam legalmente no território da Comunidade;
Contribuições financeiras destinadas à promoção do emprego e à criação de postos de trabalho.
É referido que ao abrigo do presente artigo não se obsta a que os Estados membros mantenham ou introduzam medidas de protecção mais estritas compatíveis com o presente Tratado.
Como áreas excluídas deste artigo ficam as remunerações, o direito sindical, o direito de greve e o direito de lock-out. O artigo 118.°-A assegura que:
«[...] antes de apresentar propostas no domínio da política social, a Comissão consultará os parceiros sociais sobre a possível orientação da acção comunitária».
Com o artigo 118.°-B abre-se a possibilidade:
Do diálogo entre os parceiros sociais ao nível comunitário conduzir, se estes o entenderem desejável, a relações contratuais, incluindo acordos.
«Os acordos celebrados ao nível comunitário serão aplicados, quer de acordo com os processos e práticas próprios dos parceiros sociais e dos Estados membros quer nas matérias abrangidas pelo artigo 118.°, a pedido conjunto das partes signatárias, com base em decisão adoptada pelo Conselho, sob proposta da Comissão.»
Do artigo 118.°-C releva que:
A Comissão incentivará a cooperação entre os Estados membros e facilitará a coordenação das suas acções nos domínios da política social abrangidos pelo presente capítulo, designadamente em questões relativas:
Ao emprego;
Ao direito do trabalho e às condições de trabalho; À formação e ao aperfeiçoamento profissionais;
À segurança social;
A protecção contra acidentes e doenças profissionais; A higiene no trabalho;
Ao direito sindical e às negociações colectivas entre entidades patronais e trabalhadores.
O artigo 119.° sublinha:
A paridade, no sentido de que «os Estados membros assegurarão a aplicação do principio da igualdade de remuneração entre trabalhadores masculinos e femininos, por trabalho igual ou de valor igual».
Também prevê que «a fim de assegurar, na prática, a plena igualdade entre homens e mulheres na vida profissional, o princípio da igualdade de tratamento não obsta a que os Estados membros mantenham ou adoptem medidas que prevejam regalias específicas destinadas a facilitar o exercício de uma actividade profissional pelas pessoas do sexo subrepresentado, ou a prevenir ou compensar desvantagens na sua carreira profissional».
No artigo 119.°-A o propósito de que:
«Os Estados membros esforçar-se-ão por manter a equivalência existente dos regimes de férias pagas.»
Finalmente, o artigo 120° estabelece que:
A Comissão elaborará anualmente um relatório sobre a evolução na realização dos objectivos a que se refere o artigo 117.°, incluindo a situação demográfica na Comunidade.
V — Outros pontos relevantes
V — a) Regiões
Quanto à questão das regiões, refiramos que: O Comité das Regiões ganha novas competências porque no artigo 109.°, no artigo 125.°, no n.° 4 do artigo 127." e no artigo I30.°-S passa a ser consultado sobre os Planos Nacionais de Emprego, a aplicação do Fundo Social Europeu, a política de formação profissional da Comunidade e as acções a empreender no domínio da defesa do ambiente. Também o âmbito do artigo 198.° é alargado no sentido de que «o Comité das Regiões será consultado pelo Conselho ou pela Comissão nos casos previstos no presente Tratado e em todos os outros casos, nomeadamente aqueles que digam respeito à cooperação transfronteiriça, em que uma destas instituições o considere oportuno», abrindo a possibilidade da consulta deste órgão pelo Parlamento Europeu.
V — b) Fraudes
Para o combate às fraudes e actividades lesivas dos interesses financeiros da Comunidade entendeu-se que, para além das medidas dos Estados .membros, deviam prever-se também acções da parte da Comunidade. O efeito dissuasor pretendido e a protecção efectiva nos Estados membros serão assim activados por uma via dupla e coordenada (artigo 209°-A).
V — c) Estatísticas
Para além das competências próprias do SEBC e BCE, a elaboração de estatísticas também será levada a cabo pelo Conselho, sempre que tal se afigure necessário (artigo 213.°-A|
V — o) Regiões ultraperiféricas
Pelo n.° 2 do artigo 227.°, aos arquipélagos dos Açores e da Madeira (à semelhança das ilhas Canárias e dos departamentos franceses ultramarinos) é aplicado o Trata-
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do mas com as alterações que se mostrem adequadas à «insularidade, à sua pequena superfície, pelo relevo e clima difíceis e [...] sua dependência económica em relação a um pequeno número de produtos, factores estes cuja persistência e conjugação prejudicam gravemente o seu desenvolvimento».
V — e) Disposições relativas as normas dos Tratados CECA e CEEA
No artigo 3.° do Tratado de Amsterdão são introduzidas alterações no Tratado que institui a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço mas não há qualquer matéria com especial relevância em termos económico-financeiros.
No artigo 4.° do Tratado de Amsterdão são introduzidas alterações no Tratado que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica, das quais destacamos ajustamentos de pormenor quanto aos procedimentos de fiscalização das respectivas contas (artigo I60.°-C), mas não há qualquer outra matéria com especial relevância em termos económico-financeiros.
VI — A coordenação das políticas econômicas
A — A coordenação de políticas económicas que deveria ser instituída ou reforçada no quadro do Tratado de Amsterdão é exigida pelo funcionamento real das economias e pelo avanço da 3.a fase da UEM. A criação do euro vai exigir fortíssimos mecanismos de supervisão financeira, coordenada entre os níveis das diferentes nações (nomeadamente da zona do euro) e o nível europeu. Mas vai também reforçar a necessidade de evitar a adopção de políticas de efeitos eventualmente contraditórios no espaço político-econômico da União e obviamente no espaço do euro. O que não será fácil, em Estados membros com interesses económicos por vezes diferenciados e com bases eleitorais e programas político-econômicos diferenciados.
B — A análise do Tratado de Amsterdão, na sua vertente económica, para ser efectuada de forma lúcida, nesta data, deverá ter em conta os desenvolvimentos e interpretações recentes. Neste contexto, ganhará particular acuidade a integração de uma reflexão sobre a forma como as conclusões da presidência austríaca, na área económica, enquadram os artigos do Tratado aplicáveis, nas conclusões, do Conselho Europeu de Viena de Dezembro de 1998. Porque é no termo do funcionamento dos órgãos da União que se testa a aplicabilidade dos Tratados.
C — Na interpretação feita do artigo 2." do Tratado de Amsterdão, as conclusões da presidência do Conselho Europeu de Viena referem que «a estreita coordenação deverá tex por objectivo estabelecer um equilíbrio adequado na conjugação de políticas, contribuindo desse modo para a realização dos objectivos da Comunidade enunciados no artigo 2.° do Tratado».
D — É assim um dos aspectos actualmente mais relevantes da construção europeia, no qual se interligam as consequências globais do Tratado da União Europeia (nomeadamente na versão Amsterdão) o da necessidade de coordenação das políticas económicas nacionais. Essa necessidade já tinha sido reconhecida pelo ECOFTN de forma aprofundada no relatório para o Conselho Europeu do Luxemburgo, em Novembro de 1997.
Na continuidade deste processo, o Conselho Europeu de Cardiff, reunido em Junho de 1998, definiu as grandes linhas da estratégia da União Europeia de prossecução das reformas económicas, a fim de promover o crescimento, a prosperidade, o emprego e a inserção social.
Mais recentemente, de acordo com as conclusões da Presidência do Conselho Europeu de Viena (11/12 de Dezembro de 1998), pode-se afirmar que as «medidas tomadas têm sido bem sucedidas, em especial desde que o Conselho iniciou um verdadeiro processo de coordenação numa base anual».
Quando as modalidades de coordenação reafirmaram as conclusões de Viena que o Conselho aplicará plena e eficazmente os instrumentos previstos no Tratado em matéria de coordenação das políticas económicas «e que a sua actividade será articulada em tomo das orientações gerais das políticas económicas, adoptadas de acordo com o n.° 2 do artigo 103.º Entretanto, as «políticas e a evolução económica em cada um dos Estados membros e na Comunidade, serão acompanhados de perto, no âmbito da supervisão multilateral, de acordo com o n.° 3 do artigo 103.° do Tratado e avaliadas em função das orientações gerais das políticas económicas».
E — Já no que respeita ao n.° 4 do mesmo artigo 103.°, o Conselho de Viena relembra que «dirigirá recomendações a um Estado membro caso as suas políticas económicas não sejam compatíveis com as orientações gerais das políticas económicas ou sejam susceptíveis de comprometer o bom funcionamento da UEM».
Julga-se de referir ainda que, também nos termos das conclusões da Presidência do Conselho de Viena, «a ambição de assegurar uma coordenação eficaz das políticas económicas exigirá uma participação mais activa de todos os intervenientes neste processo, nomeadamente dos ministros reunidos no grupo Euro II, do Conselho e~dos Chefes de Estado ou de Governo».
. Parecer
Dado o consenso que se vai alargando quer na sociedade portuguesa, quer no actual espectro parlamentar, sobre o interesse, as vantagens e as potencialidades futuras da participação de Portugal na União Europeia, a Comissão recomenda a ratificação do Tratado de Amsterdão.
A discussão e votação desta ratificação poderá, aliás servir de reflexo do empenhamento nacional no aprofundamento da «ideia europeia».
Processos como o da discussão das perspectivas financeiras para o período de 2000 a 2006 (Agenda 2000), o do alargamento aos países do centro e leste da Europa e o da implementação da moeda única (já em curso) exigem qüe a UE evolua com passos firmes e justos. Estamos em crer que Portugal poderá, em diálogo com os Governos dos outros Estados membros, contribuir para uma significativa evolução no sentido de maior justiça, maior coesão, mais solidariedade, mais emprego e um maior empenhamento nacional e europeu na linha do «desenvolvimento sustentável». Procurando dar conteúdo concreto, no plano económico e social, à ideia e à prática da cidadania europeia.
Assembleia da República, 4 de Janeiro de 1999. — Pela Presidente, Fernando Serrasqueiro. — Os Relatores: Joel Hasse Ferreira — Carlos Brito.
ANEXO N.° 3
Relatório e Parecer da Comissão de Defesa Nacional I — Relatório
1 — O Tratado de Amsterdão é o resultado da Conferência Intergovernamental lançada em 29 de Março de 1996,
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aquando do Conselho Europeu de Turim. Foi adoptado no Conselho Europeu de Amsterdão de 16 e 17 de Junho e assinado pelos Ministros dos Negócios Estrangeiros dos 15 Estados membros em 12 de Outubro de 1997.
1.1 — O ütulo v do Tratado da União Europeia, intitulado «Disposições relativas à política externa e de segurança comum», foi integralmente reformulado pelo Tratado de Amsterdão, registando-se alterações substanciais e de conteúdo e a criação de seis novos artigos. No que respeita às alterações de sistematização, as matérias tratadas naquele titulo foram retomadas em novos artigos com numeração não correspondente.
Assim, e ensaiando uma correspondência entre as matérias tratadas nos artigos do Tratado da União Europeia e as alterações trazidas pelo Tratado de Amsterdão, temos que:
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
1.2 — Do ponto de vista jurídico, este acto visa alterar certas disposições do Tratado da União Europeia, dos Tratados que instituem as Comunidades Europeias e de alguns actos conexos. Não se trata, portanto, de substituir os outros Tratados, antes de acrescentar mais um tratado.
2 — Um dos principais objectivos da Conferência Intergovernamental consistia em reformular a política externa e de segurança comum (PESC), a fim de melhorar o seu funcionamento e, simultaneamente, de melhorar equipar a União Europeia a nível internacional. Esta reforma revelava-se especialmente urgente na sequência do desmembramento da ex-Jugoslávia. Era necessário que a União soubesse agir e prevenir, em vez de simplesmente reagir aos acontecimentos, no decurso dos quais ficou bem patente a fragilidade provocada pela reacção descoordenada dos Estados membros. Deste modo, nota-se no Tratado de Amsterdão a preocupação de ultrapassar as contradições existentes entre os objectivos comuns da PESC, especialmente ambiciosos, e os meios de que a União se dotou para os alcançar, não totalmente à altura das expectativas e dos desafios em causa.
3 — A política externa e de segurança comum (PESC) é regida, como se disse, pelas disposições constantes do título v do Tratado da União Europeia. A PESC é igualmente abordada no artigo B (artigo 2.° na .versão do T. A.) das disposições comuns, que prevê como um dos objectivos da União «a afirmação da sua identidade na cena internacional, nomeadamente através da execução de uma política externa e de segurança comum, que inclua a definição, a prazo, de uma política de defesa comum, que poderá conduzir, no momento próprio, a uma defesa comum [...]».
3.1 — O título v constitui um pilar distinto da União Europeia, umá vez que o seu processo de funcionamento e o seu carácter intergovernamental diferem dos procedimentos correntes nos sectores tradicionais da Comunidade, como o mercado intemo ou a política comercial, diferença esta que é especialmente visível em dois aspectos:
3.1.1 — A nível do processo de tomada de decisões, que exige um consenso entre os Estados membros, enquanto o recurso generalizado à votação maioritária caracteriza o domínio comunitário;
3.1.2 — No papel pouco significativo das instituições comunitárias (Comissão, Parlamento Europeu e Tribunal de Justiça) no âmbito do título v, que contrasta nitidamente com as suas atribuições nas esferas tradicionais de competência comunitária.
3.2 — A fim de incentivar um funcionamento harmonioso e evitar contradições entre os dois tipos de acções (comunitária e intergovernamental), o artigo C (artigo 3.° na versão do T. A.) prevê que:
A União assegurará [...} a coerência do conjunto da sua acção externa no âmbito das políticas por si adoptadas em matéria de relações externas, de segurança, de economia e de desenvolvimento. Cabe ao Conselho e à Comissão a responsabilidade de assegurar essa coerência. O Conselho e a Comissão assegurarão a execução dessas políticas de acordo com as respectivas atribuições.
3.3 — Foi no contexto de um balanço relativamente negativo que as negociações da Conferência Intergovernamental de 1996 procuraram introduzir, no novo Tratado, as reformas institucionais necessárias para conferir maior eficácia à PESC, através das medidas nas seguintes áreas:
O carácter operacional da PESC; A estratégia comum; O processo de tomada de decisões; O Alto Representante para a PESC; Unidade de planeamento da política e de alerta rápido;
Segurança europeia e União da Europa Ocidental; Financiamento das despesas relacionadas com a PESC.
3.3.1 —Carácter operacional da PESC:
O carácter operacional da PESC será reforçado através da introdução de instrumentos mais coerentes e de um processo de tomada de decisões mais eficaz. Passará a ser possível adoptar medidas através de uma votação por maioria qualificada, devido à dupla segurança representada pela abstenção construtiva (') e pela possibilidade de remeter uma decisão para o Conselho Europeu em caso de veto excepcional de um Estado membro. A Comissão^ por sua vez, estará mais envolvida nas tarefas de representação e de execução relacionadas com a PESC.
3.3.2 — A estratégia comum:
Com a entrada em vigor do Tratado de Amsterdão, novo instrumento de política externa virá juntar-se à acção comum e à posição comum. Trata-se da estratégia comum. Nos termos do artigo 13.° (ex-artigo J.3), o Conselho Europeu define os princípios e as orientações gerais da PESC e decide estratégias comuns nos domínios em que os Estados membros possuam importantes interesses em comum. Concretamente, uma estratégia comum especificará o seu objectivo, a sua duração e os meios a facultar pela União e pelos
(') A abstenção construtiva ou abstenção positiva consiste na possibilidade de, no âmbito da PESC, um Estado membro se abster numa votação do Conselho sem que tal impeça a deliberação por unanimidade. O Tratado de Amsterdão prevê que, se a abstenção for acompanhada de una declaração formal, o Estado membro em causa está dispensado de aplicar a decisão, mas é obrigado a reconhecer que a mesma vincula a União. Para além disso, o Estado membro deve abster-se de adoptar qualquer atitude susceptível de colidir com a acção da União baseada nessa decisão. Convém, todavia, referir que o mecanismo da declaração formal que acompanha a abstenção não poderá ser aplicável se os Estado* membros que decidam recorrer a este processo representarem mais de um terço dos votos ponderados do Conselho.
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Estados membros. Será posta em execução pelo Conselho, nomeadamente através de acções e de posições comuns. O Conselho poderá igualmente recomendar estratégias comuns ao Conselho Europeu.
3.3.3 — Tomada de decisões:
Após a entrada em vigor do novo Tratado, a regra geral continuará a ser a da unanimidade para a adopção das decisões relativas à política externa e de segurança comum. No entanto, os Estados membros disporão doravante da possibilidade de recorrer à abstenção construtiva, o que significa que a abstenção de um Estado membro não impedirá a adopção de uma decisão. Além disso, caso o Estado membro em questão faça acompanhar a sua abstenção de uma declaração formal, não será obrigado a aplicar a decisão, devendo, contudo, reconhecer, num espírito de solidariedade mútua, que a mesma vincula a União. Por conseguinte, o Estado membro em causa deverá abster-se de qualquer acção susceptível de colidir com a acção da União ao abrigo da referida decisão. Convém, todavia, referir que o mecanismo da declaração formal que acompanha a abstenção não poderá ser aplicável se os Estados membros que decidam recorrer a este processo representarem mais de um terço dos votos ponderados do Conselho.
O título v prevê, todavia, o recurso à maioria qualificada em dois casos:
Para a adopção de decisões de aplicação de uma estratégia comum definida pelo Conselho Europeu;
Para qualquer decisão que dê execução a uma acção comum ou a uma posição comum previamente adoptada pelo Conselho.
No contexto das decisões adoptadas por maioria qualificada, os Estados membros disporão, contudo, de uma cláusula de salvaguarda que lhes permite impedir o recurso a uma votação se justificarem o bloqueio por razões de política nacional importantes. Perante uma situação deste tipo, e após o Estado membro ter exposto os seus motivos, o Conselho, deliberando por maioria qualificada, poderá solicitar que a questão seja submetida ao Conselho Europeu, para que seja tomada uma decisão por unanimidade pelos Chefes de Estado e de Governo.
3.3.4 — O Alto Representante para a PESC:
O novo artigo 26.° (ex-artigo J.16) do Tratado da União Europeia prevê a criação de uma nova função que deverá contribuir para uma maior visibilidade e coerência da PESC: o Alto Representante para a PESC. Estas funções serão assumidas pelo Secretário-Geral do Conselho, que assistirá o Conselho, nessa qualidade, nas questões do âmbito da política externa e de segurança comum, contribuindo nomeadamente para a formulação, elaboração e execução das decisões políticas. A pedido da Presidência, actuará em nome do Conselho, conduzindo o diálogo político com terceiros. Esta nova função não impedirá o Conselho de nomear, sempre que considere necessário, um representante especial ao qual poderá ser conferido um mandato abrangendo questões políticas específicas, a exemplo do que já aconteceu na ex-Jugoslávia. A nível logístico, o Alto Representante beneficiará do apoio de uma unidade de planeamento da política e de alerta rápido que será criada no Secretariado-Geral do Conselho e colocada sob a sua responsabilidade.
3.3.5 —A unidade de planeamento da política e de alerta rápido:
A coerência da política externa e de segurança comum depende da reacção dos Estados membros face aos desen-
volvimentos internacionais. A ideia de criar uma unidade de planeamento da política e de alerta rápido no âmbito da PESC baseia-se no ponto de vista de que esta política necessita, para ser eficaz, de uma análise mais pertinente e mais precoce das evoluções externas a longo, médio e curto prazos. Ou seja, as decisões no âmbito da PESC devem apoiar-se numa melhor análise que seja, além disso, comum aos membros da União. Nesta perspectiva, numa declaração anexa ao Tratado de Amsterdão, a Conferência acordou na criação de uma Unidade de Planeamento de Política e de Alerta Precoce, no âmbito do Secretariado-Geral do Conselho, sob a autoridade do Alto Representante para a PESC, constituída por especialistas provenientes do Secretariado-Geral do Conselho, dos Estados membros, da Comissão e da União da Europa Ocidental (UEO).
A unidade terá nomeadamente por atribuições:
Acompanhar e analisar a evolução da situação nos domínios abrangidos pela PESC;
Avaliar os interesses da União em matéria de política externa e de segurança e inventariar os domínios sobre os quais a PESC poderá incidir no futuro;
Identificar atempadamente acontecimentos, potenciais crises políticas ou situações que possam ter implicações significativas na política externa e de segurança da União;
Elaborar, sob a responsabilidade da Presidência, a pedido do Conselho ou da Presidência ou por iniciativa própria, documentos que apresentem, de forma fundamentada, opções no que respeita à política a .seguir pelo Conselho.
3.3.6 — A segurança europeia e a União da Europa Ocidental:
Após a entrada em vigor do Tratado de Amsterdão, as «missões de Petersberg» (2) serão integradas no título v do Tratado da União Europeia.
(2) A Declaração de Petersberg, de 19 de Junho de 1992, constitui um elemento primordial da vontade de desenvolver a Uni3o da Europa Ocidental (UEO) enquanto componente de defesa da União Europeia e enquanto meio para fortalecer o pilar europeu da Aliança Atlântica (NATO). Nesta declaração, os Estados membros da UEO manifestam-se prontos a colocar a disposição da UEO unidades militares provenientes de qualquer dos ramos das suas forças convencionais, com vista à realização de missões militares sob a autoridade da UEO. Foram definidos os diferentes tipos de missões militares que podem ser realizadas pela UEO: para além de contribuírem para a defesa comum no âmbito da aplicação do artigo 5.° do Tratado de Washington e do artigo v do Tratado de Bruxelas alterado, as unidades militares dos Estados membros da UEO poderão ser utilizadas para:
Missões de carácter humanitário ou de evacuação de cidadãos: Missões de manutenção da paz;
Missões executadas por forças de combate para a gestão de crises, incluindo operações de restabelecimento da paz.
Com a entrada em vigor do Tratado de Amsterdão, estas missões «de Petersberg» passarão a estar expressamente mencionadas no novo artigo 17" (ex-artigo J.7) do Tratado da União Europeia. A Declaração de Petersberg indica igualmente que a UEO está disposta a apoiar, caso a caso e em conformidade com os seus procedimentos específicos, a aplicação eficaz de medidas de prevenção de conflitos e de gestão de crises, nomeadamente as actividades de manutenção da paz da OSCE ou do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Paralelamente, a Declaração pronuncia-se a favor de uma sólida parceria transatlântica e salienta a importância da aplicação da declaração relativa a UEO (n.°30) em anexo ao Tratado de Maastricht. Na terceira parte da declaração, que é consagrada ao alargamento' da UEO. os países membros definem os direitos e as obrigações dos Estados europeus que fazem parte da União Europeia e da Aliança Atlântica como futuros membros, observadores ou membros associados.
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Esta medida representa um importante passo em frente numa época em que a ameaça de conflitos em grande escala diminuiu nitidamente (em relação ao período de guerra fria), mas em que se assiste a uma recrudescência de conflitos locais que representam verdadeiras ameaças à segurança europeia (o conflito na ex-Jugoslávia, por exemplo). Neste contexto, as «missões de Petersberg» constituem certamente uma resposta adequada da União, traduzindo a vontade comum dos Estados membros de assegurar a segurança na Europa através de operações tais como missões humanitárias ou de restabelecimento da paz. A nível da segurança, o novo artigo 17.° (ex-artigo J.7) prevê que a PESC abranja todas as questões relacionadas com a segurança da União, incluindo a definição gradual de uma política de defesa comum que poderá conduzir a uma defesa comum se o Conselho Europeu adoptar uma decisão nesse sentido. Uma fórmula similar contempla a aproximação UE-UEO (3), prevendo que a União incentive o estabelecimento de relações institucionais mais estreitas entre as duas organizações na perspectiva da eventual integração da UEO na União, se o Conselho Europeu adoptar uma decisão nesse sentido.
As relações da UEO com a UE, por um lado, e com a NATO, por outro, foram objecto de negociações no âmbito da Conferência Intergovernamental. À UEO cabem simultaneamente as tarefas de ser a componente de defesa cia UE e o pilar europeu da NATO. Esta dupla relação tem sido sustentada em medidas, de carácter prático, tais como a harmonização de métodos de trabalho ou a sincronização de datas e locais dé reuniões. Contudo, e não obstante se verificarem alguns progressos, a delimitação das competências de cada uma destas organizações continua a não ser clara.
As relações UE-UEO têm progredido no sentido de uma maior cooperação entre o Conselho e os Secretariados, e da troca de informações e consultas entre a Comissão e a UEO. No entanto, ainda muito está por fazer: as presidências das duas organizações têm calendários diferentes, e se a UEO se faz normalmente representar nas reuniões da NATO, raramente vai às do Conselho.
Quanto às relações UEO-NATO, elas conheceram uma significativa evolução quando, na cimeira da NATO em Bruxelas em Janeiro de 1994, foi lançada a ideia do estabelecimento de forças de missão conjuntas. Ou seja, a NATO disponibilizará à UEO os seus recursos, para que esta os utilize em operações que sejam da sua exclusiva responsabilidade. Este conceito aplica-se a forças militares «separáveis mas não separadas», que podem ser temporariamente destacadas da NATO. O Conselho Atlântico de Berlim, de 2 e 3 de Junho de 1996, tornou possível evoluir desencadear estudos com vista a pôr em prática as referidas forças de missão conjuntas. No entanto, tudo está ainda em aberto com as reformas organizacionais em curso, quer da NATO, quer da UEO, que devem avançar no sentido de delimitar e clarificar convenientemente as competências das duas organizações, cujo grau de indefinição foi demonstrado à saciedade pelos acontecimentos na antiga Jugoslávia.
(') A União da Europa Ocidental (UEO) é uma organização de cooperação para a defesa e segurança que foi fundada em 1948, sendo constituída pelos Estados membros da União Europeia (com excepção da Áustria, Dinamarca. Finlândia, Irlanda e Suécia, países que gozam do estatuto de observador). A Islândia, a Noruega e a Turquia são Estados associados. O Tratado da União Europeia consagrou a UEO como «parte integrante do desenvolvimento da União Europeia», mantendo no entanto a sua autonomia institucional. Neste âmbito, compete & UEO preparar e executar as decisões e acções que tenham repercussões no domínio da defesa.
3.3.7—Financiamento das despesas operacionais relacionadas com a PESC:
Actualmente, o Tratado da União Europeia prevê que as despesas operacionais decorrentes da PESC fiquem a cargo quer do orçamento comunitário quer dos Estados membros, segundo uma chave de repartição a determinar, procedimento casuístico e que já motivou diversas críticas, nomeadamente da Comissão, no que se refere ao seu carácter complexo e ineficaz. Com a entrada em vigor do Tratado de Amsterdão, as despesas operacionais da PESC serão imputadas ao orçamento das Comunidades Europeias, com excepção das despesas operacionais decorrentes das acções que tenham implicações no domínio militar ou da defesa e nos casos em que o Conselho, deliberando por unanimidade, decida erro contrário. Neste último caso, está igualmente previsto que um Estado membro que tenha feito uma declaração formal na sequência de uma abstenção não seja obrigado a contribuir para o financiamento da operação em causa. Sempre que as despesas fiquem a cargo dos Estados membros, o novo texto prevê uma repartição segundo uma chave baseada no produto nacional bruto, salvo decisão em contrário do Conselho.
4 — Estas são as inovações que pareceram a esta Comissão merecerem maior destaque enquanto progressos, concretamente trazidos pelo Tratado de Amsterdão, para a implementação em condições de operacionalidade e efectividade das directrizes definidas pelos Estados membros da União Europeia em matéria de política externa e de segurança comum.
II — Parecer
Nestes termos, os Deputados que integram a Comissão Parlamentar de Defesa Nacional são do parecer que a proposta de resolução n.° 118/VII, que «Aprova para ratificação o Tratado de Amsterdão que altera o Tratado da União Europeia, os tratados que instituem as Comunidades Europeias e alguns actos relativos a esses tratados, incluindo Anexo, Protocolos, bem como a Acta Final com as declarações, assinado em Amsterdão, em 2 de Outubro de 1997», está em condições de subir a Plenário para discussão e votação na generalidade, reservando-se os Deputados as respectivas posições para o debate.
Assembleia da República, 13 de Outubro de 1998. — O Presidente da Comissão, Eduardo Pereira. — O Deputado Relator, Francisco Peixoto.
Relatório da Comissão de Trabalho, Solidariedade e Segurança Social
I — Análise na generalidade
O Tratado de Amsterdão consagra alterações relevantes na estrutura normativa comunitária, nomeadamente nos domínios sociais, dando maior dimensão ao conceito comummente aceite do «modelo social europeu».
Significa esta expressão a concretização de um conjunto de direitos, como a protecção social, a legislação laboral, a liberdade sindical e a concertação, isto apesar de não existir uma política comum nesta área, nem tão-pouco os programas lançados serem de dimensão suficiente para adequar políticas com as necessidades globais da Comunidade, ou de se ter verificado uma afectação de recursos financeiros bastantes pela Comunidade e pelos Estados membros para intervir neste domínios.
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A década de 90 fica marcada pela crescente preocupação que as instituições comunitárias, designadamente a Comissão Europeia, têm manifestado quanto às matérias sociais e ao emprego.
O processo de consulta, vasto e ambicioso, levado a cabo durante algum tempo, viria a encontrar substância no programa de acção social 1995-1997, que ensaiava os primeiros passos para o lançamento de uma política social europeia, surgindo na sequência dos Livros Verde e Branco sobre Política Social de 1993 e 1994, respectivamente.
De igual modo se tem desenvolvido a discussão acerca das medidas a tomar em sede de política de emprego que se tem afirmado, por necessidade imperiosa, como uma prioridade da União Europeia. O crescente desemprego que se verificou durante os últimos anos, fixando-se a taxa de desemprego a níveis extremamente elevados —e que atingiu em 1997 quase os 20 milhões de pessoas sem emprego no espaço da Europa comunitária—, determinou análises profundas, reflexões várias, acções pontuais e estratégicas e programas de intervenção decisivos.
Ao longo dos últimos anos, sucessivos Conselhos Europeus debruçaram-se sobre o problema e as decisões sucederam-se de forma a encontrar respostas, adequadas e eficazes, tendo em atenção os contornos específicos do problema em cada Estado membro e a necessidade de articular formas de intervenção entre si para reduzir os níveis elevados do desemprego verificado.
O problema do desemprego, afectando principalmente os jovens, as mulheres e os desempregados de longa duração, provoca um excedente de mão-de-obra disponível, aliado a um défice de qualificações, que põem em causa a competitividade europeia e provocam dramas socais de contornos preocupantes.
As alterações constatadas no domínio da organização do trabalho, em consequência da globalização e da sociedade da informação, são algumas das causas que conduziram àquele problema.
As consequências desta situação alargaram o número das pessoas consideradas tendo em atenção a situação de pobreza e de exclusão social, e motivam uma nova fonte de preocupações e de intervenção por parte das instituições comunitárias e naturalmente dos governos dos Estados membros.
O novo título acerca do emprego no Tratado de Amsterdão faz do emprego uma questão de interesse comum. Aliás, o Tratado e posteriormente o Conselho Europeu Extraordinário do Luxemburgo sobre o emprego sublinham a determinação comum de progredir no domínio do emprego e no combate ao desemprego, proporcionando os instrumentos adequados a essa finalidade.
O objectivo, fixado na generalidade pela Comunidade, parte do crescimento económico e da estabilidade macroeconómica para intensificar as reformas estruturais e diminuir sensivelmente a taxa de desemprego para níveis considerados suportáveis. Através dá convergência de políticas de emprego, integradas no processo da convergência que conduzirá à união económica e monetária e assentes na iniciativa empresarial e com políticas activas de emprego, a fim de melhorar a capacidade de inserção profissional, através da melhoria das qualificações, respondendo às necessidades e proporcionando reais possibilidades de trabalho.
Contudo, o problema, aliado a esta posição de prioridade, é que se verificou não haver uma correspondência no domínio orçamental, pela afectação de verbas para a realização dos objectivos previstos. Por outro lado, não se estabeleceram mecanismos de coordenação entre políticas de emprego e de políticas económicas, ressaltando uma clara preponderância
da política económica enquadrada na UEM e que condicionará directamente as acções a desenvolver no domínio do emprego e no quadro do Pacto de Estabilidade.
Os principais resultados de Amsterdão fixaram-se na questão do emprego. A política de emprego passa a ser assumida como um domínio prioritário. O Tratado dispõe agora de um título preciso e pormenorizado sobre a matéria e a política de emprego encontra-se no centro das preocupações da União Europeia.
Decorre do Tratado, no entanto, que a principal responsabilidade é dos Estados membros, a quem compete criar as condições necessárias para proporcionar a plena integração das pessoas na vida activa. Assim se reconhece que não é suficiente a tarefa de um país isoladamente na luta contra o desemprego, nomeadamente quando integrado num mercado aberto e comum a vários Estados — tal força a cooperação entre os Estados membros e a União, embora no respeito pelas competências próprias de cada Estado.
O Tratado permite, na prática, a aplicação antecipada das disposições relativas à coordenação das políticas de emprego dos Estados membros, a partir de 1998. Esta coordenação basear-se-á em orientações comuns que incidem simultaneamente nos objectivos e nos meios — «directrizes para o emprego» — inspiradas directamente na experiência adquirida na supervisão multilateral das políticas económicas, com o êxito já conhecido para a convergência no quadro da União Económica e Monetária.
Trata-se de criar para o emprego, tal como para a política económica^ embora respeitando as diferenças existentes entre os dois domínios e as situações de cada Estado membro, a mesma vontade de convergência para os objectivos decididos em comum, verificáveis e periodicamente actualizáveis.
Este objecto passa pelo desenvolvimento de uma política macroeconómica coordenada, apoiada num mercado interno eficaz, para uma nova dinâmica e confiança para o relançamento do emprego e ainda pela mobilização de todas as políticas comunitárias ao serviço do emprego, quer de enquadramento, quer de fomento, através da criação de novos postos de trabalho.
, A estratégia coordenada resulta do artigo 128." do Tratado inspirado no modelo da convergência económica, assente na definição, a nível da União, das «directrizes para o emprego». A aplicação das directrizes, que deverão respeitar o princípio da subsidariedade e as competências dos Estados membros, podem variar de acordo com os seus destinatários.
As políticas comunitárias ao serviço do emprego incluem os domínios do mercado intemo (concorrência e competitividade), fiscalidade, investigação e inovação, redes transeuropeias de transportes, fundos estruturais e as iniciativas especificamente orientadas para o desenvolvimento do emprego.
Neste quadro se inscrevem o Conselho Europeu de Copenhaga em Junho de 1993, donde partiu a ideia de criar um Livro Branco sobre uma estratégia de promoção do crescimento da competitividade e do emprego. Esse documento seria assumido pela Comunidade no Conselho de Bruxelas em Dezembro de 1993 e constitui um dos elementos mais determinantes da evolução do objecto «emprego» como uma das principais prioridades europeias.
Em reuniões do Conselho Europeu e em sucessivas cimeiras, este objectivo foi repetido. Quer em Corfu (Junho de 1994) como em Essen (Dezembro de 1994) e mais tarde em Madrid (Dezembro de 1995), os Chefes de Estado e de Governo reafirmaram o propósito de exigir a criação de emprego como o principal objectivo económico, social e político da União Europeia.
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Foi na sequência da fixação deste objectivo que a Comissão apresentou em 1997 o «Pacto de Confiança para o Emprego» e que o Tratado de Amsterdão viria a consagrar um capítulo específico sobre a matéria. Posteriormente, o objectivo emprego foi abordado ainda num Conselho Europeu extraordinário, realizado no Luxemburgo em Novembro de 1997, especificamente subordinado a este tema.
Dos trabalhos preparatórios da Conferência Intergovernamental de 1996 e que conduziu directamente ao Tratado de Amsterdão ressalta, no domínio do emprego, a reflexão produzida pela interligação que esta matéria assume a dois níveis: a perspectiva global como o problema do emprego deve ser encarado e o papel determinante dos Estados membros em conjugação com a Comunidade na definição de políticas de criação de novos postos de trabalho.
A Cimeira de Amsterdão que aprovou o Tratado alargou ainda o Protocolo Social a toda a Europa Comunitária.
O Tratado, ao reforçar os direitos fundamentais dos cidadãos da União, assegura, a partir de agora, a garantia dos direitos sociais, nomeadamente o artigo 13." do TCE, que consagra em sentido amplo o princípio da não discriminação.
Esta disposição que consagra o entendimento já existente quanto à extensão do princípio da não discriminação, que se mantém (artigo 6.° do TCE — artigo 12." do Tratado de Amsterdão), constitui-se como uma das formas de concretizar o livre exercício de uma profissão —quer no domínio da liberdade de circulação de trabalhadores, quer na liberdade de prestação de serviços— no espaço comunitário e que encontrará reflexos, como se verá, no princípio da igualdade de tratamento no acesso ao emprego e no trabalho.
O Tratado de Amsterdão proporciona possibilidades do estabelecimento de uma política social europeia, introduzindo e optimizando instrumentos de que a União dispõe para desenvolver as políticas no interesse dos cidadãos.
No domínio da segurança social, as alterações introduzidas não constituem um avanço significativo, sendo evidente que para a concretização de uma verdadeira coesão social e de um espaço de circulação de pessoas e nomeadamente de trabalhadores, a dimensão dos sistemas de protecção social assumem uma importância essencial.
A harmonização dos sistemas, apesar de desejável, constitui uma tarefa difícil na medida em que os mesmos têm natureza, regulamentação e vias de financiamento distintas, fruto da evolução que os sistemas foram sofrendo em cada Estado. As alterações introduzidas nos artigos 51.° e 56." (artigos 42.° e 46.° do Tratado de Amsterdão) mantêm a regra da unanimidade para a decisão do Conselho e proporcionam a intervenção indirecta através da adopção de directivas.
No fundo, continuamos a falar de cooperação, através de incentivos comunitários. Naturalmente que nos encontramos num domínio extremamente delicado, atendendo às diferenças' existentes nos vários sistemas de protecção dos Estados membros. Estamos em crer que a concretização da liberdade de circulação de trabalhadores e do desenvolvimento e garantia da mobilidade dos mesmos só se efectivará quando houver uma progressiva harmonização das legislações e que se possa encontrar mecanismos de compensação nestes casos.
Não se trata aqui de defender ou advogar a alienação de competências nacionais, mas tão só de salvaguardar a protecção social, designadamente, ao nível da previdência, o que
conferirá maior segurança aos cidadãos, convictos que estamos que também os trabalhadores portugueses «emigrados» poderão beneficiar desta evolução.
II — Análise na especialidade
O Tratado de Amsterdão consagra o emprego como um objectivo comum dos Estados membros e da Comunidade Europeia, devendo, para o efeito, assumir uma estratégia coordenada nesta matéria (artigo 125.°). Deste modo e no respeito, pelo princípio da subsidariedade, é criada uma estrutura para o acompanhamento e avaliação, de responsabilidade de um comité de acompanhamento, visando em particular a adopção pelo Conselho, em cada ano, de directrizes para o ano seguinte, de promoção do emprego e a elaboração anual, pelo Conselho e Comissão, de um relatório da situação, a submeter aos Chefes de Estado (artigo 126.° a 130.°).
Emprego
O título viu do Tratado trata da questão do emprego, constituindo-se, como já se referiu, uma das principais novidades introduzidas no quadro normativo comunitário.
Em primeiro lugar, dever-se-á referenciar a introdução de uma alteração ao artigo B do Tratado da União Europeia a fim de inscrever nos objectivos da União «a promoção de um elevado nível de emprego», articulado com a nova redacção do sétimo considerando do Tratado da União, onde se dispõe que o progresso económico e social será assegurado através da aplicação de políticas que garantam que os progressos na integração económica sejam acompanhados de progressos paralelos noutras áreas.
Correspondentemente, o artigo 2." do Tratado da Comunidade Europeia foi alterado de modo a incluir nos objectivos da União «a promoção de um nível elevado de emprego e da protecção social», assim como «um elevado grau de competitividade». Acresce que foi aditado um novo ponto ao artigo 3." do TCE a fim de incluir, como novo instrumento de intervenção, a promoção de coordenação entre as políticas de emprego dos Estados membros, tendo em vista reforçar a sua eficácia na definição de uma estratégia coordenada para o emprego.
A menção expressa à promoção de um elevado nível de emprego e de protecção social entre os objectivos gerais da União, bem como a referência à competitividade, faltava no processo de integração europeia. Importa referir no entanto que o único instrumento novo, e ainda assim limitado, que foi previsto para alcançar estes objectivos, consiste na promoção da coordenação das políticas de emprego dos Estados membros.
Todavia, é introduzido um novo capítulo acerca do emprego com seis artigos e duas declarações.
Coiistata-se que, por um lado, a Comunidade e os Estados membros comprometem-se a elaborar uma estratégia coordenada para o emprego (artigo 125.°). Os Estados membros mantêm a sua competência exclusiva neste domínio, articulando, no entanto, as suas políticas de emprego com as grandes orientações das políticas económicas dos Estados membros e da Comunidade, definidas nos termos do Tratado e considerando-se a promoção do emprego como uma questão de interesse comum. Por seu lado, a Comunidade, devendo respeitar as competências dos Estados membros, encorajará a cooperação entre eles, complementando a sua acção, tendo em atenção os objectivos do Tratado e a realização das políticas comunitárias.
A introdução de um capítulo acerca do emprego constitui uma das maiores novidades do Tratado, apesar de surgir sem princípios específicos ou quantificáveis, que regulem a
política de emprego e da competência se manter ao nível dos Estados, com a reserva de coordenação para o nível comunitário.
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Mas a circunstância de combinar a política de emprego com as políticas económicas e do emprego ser considerado como uma questão de interesse comum, constitui, desde logo, a assunção de que o emprego passe a ter um papel extremamente relevante no desígnio comunitário, encontrando-se no centro das suas preocupações, designadamente no
âmbito da União Económica e Monetária.
Cabe à Comunidade (artigo 129.°), nomeadamente ao Conselho, por proposta da Comissão, com pareceres do Parlamento, do Conselho Económico Social, do Comité das Regiões e do novel Comité do Emprego, elaborar anualmente as directivas para o emprego, através das quais os Estados membros receberão «recomendações» do Conselho.
A Comunidade poderá ainda adoptar medidas de incentivo destinadas a promover a cooperação entre os Estados membros e a impulsionar a sua intervenção, embora tal não implique qualquer exigência de harmonização das disposições legais dos Estados.
O artigo 130.° consagra a criação de um novo órgão, o comité do emprego, de natureza consultiva, composto por dois representantes dos Estados e dois representantes da Comissão. Este órgão tem como objectivo acompanhar a evolução da situação do emprego e das políticas de emprego nos Estados membros e na Comunidade formulando opiniões e contribuindo para a preparação de deliberações do Conselho, após consulta aos parceiros sociais.
Política social
Num outro capítulo, o Tratado de Amsterdão trata da política social. Trata-se da incorporação, nos artigos 136." e seguintes, do Protocolo de política social já existente (mas que apenas vinculava 14 Estados, dado que o Reino Unido não o tinha subscrito) em conjugação com o acordo de política social anexo àquele.
Resulta deste capítulo o estabelecimento de um compromisso estratégico e coerente relativo à política social da Comunidade, embora não tenha sido ainda assumida integralmente a carta comunitária dos direitos sociais fundamentais, e se lhe faça uma alusão no artigo 136.°, nem tão pouco se consagra como texto do Tratado a realização de uma união social. Mas, depreende-se daqui que a União se compromete a prosseguir uma política de combate à injustiça social, à exclusão, à discriminação e à pobreza, em face de «acções directas contra e exclusão social».
O artigo 136.° prevê como objectivos a promoção do emprego, da melhoria das condições de vida e de trabalho, uma protecção social adequada, o diálogo social, o desenvolvimento dos recursos humanos e a luta contra a exclusão. As acções da Comunidade e dos Estados membros deverão ter em conta a diversidade das práticas nacionais e a necessidade de manter a competitividade da economia da Comunidade.
O artigo seguinte (novo) prevê a existência de directivas do Conselho com a finalidade de alcançar prescrições mínimas para completar a acção dos Estados membros em domínios como:
Higiene e segurança no trabalho; As condições de trabalho; A informação e consulta dos trabalhadores; A integração dos excluídos do mercado de trabalho; Igualdade de tratamento entre homens e mulheres no acesso ao emprego e no trabalho.
Dispõe-se ainda a existência de mecanismos de incentivo à cooperação entre os Estados membros.
Este artigo prevê ainda a existência de prescrições mínimas em matérias como: a segurança social e a protecção social dos trabalhadores na situação de cessão do contrato de trabalho, representação e defesa colectiva dos trabalhadores, excluindo-se a sua extensão às questões de remuneração, do direito de associação, o direito à greve e ao lock-out.
O artigo 138.° consagra o dever de consulta dos parceiros sociais ao nível comunitário, antes de promover qualquer tipo de acção em matéria de protecção social. O diálogo entre parceiros sociais ao nível comunitário poderá conduzir à realização de acordos colectivos, que precederão decisões do Conselho. Esta medida, atendendo à preocupação de alcançar a concertação social, suscita-nos uma natural satisfação pelo alargamento de participação ao nível comunitário.
A tarefa de facilitar a coordenação das acções dos Estados membros em matéria de política social é cometida à Comissão, designadamente no que respeita ao emprego, ao direito do trabalho e às condições de trabalho, à formação profissional e aq aperfeiçoamento profissional, à segurança social, aos acidentes de trabalho e doenças profissionais, à higiene no trabalho, ao direito de associação e à negociação colectiva.
A obrigação de assumira aplicação do princípio de igualdade das remunerações entre homens e mulheres para o mesmo trabalho, ou para trabalho do mesmo valor, é imposta pelo artigo 141.° aos Estados membros. E poderão ser adoptadas medidas necessárias a fim de assegurar a aplicação do princípio de igualdade de oportunidades e da igualdade de tratamento entre homens e mulheres em matéria de emprego e de trabalho. Aceita-se ainda' que os Estados membros possam adoptar medidas de discriminação positiva a fim de compensar as desvantagens na carreira profissional.
Trata-se, assim, em matéria de emprego e trabalho, de assegurar em termos quase absolutos a consagração do princípio da igualdade conjugado com o princípio da não discriminação, a que já aludimos anteriormente. A dimensão destes dois princípios já não tem meramente uma natureza económica, mas reveste-se de uma dimensão social extraordinariamente importante, para além dos seus efectivos efeitos jurídicos e que concretizam direitos fundamentais de cidadania.
Mantém-se o já anteriormente expresso (no artigo 120.° Tratado da União Europeia) relativo às férias pagas agora previsto no artigo 142.°, enquanto que o artigo seguinte (novo) impõe a existência de um relatório anual relativo à realidade dos objectivos em matéria de emprego previsto no artigo 136.° Este relatório poderá dar origem à existência de relatórios específicos relativos à situação social na Comunidade.
III — Em conclusão
Em resumo, são as seguintes as principais características das alterações introduzidas pelo Tratado de Amsterdão nos domínios a que nos temos estado a referir:
a) Emprego
Passa a estar inscrito como um dos objectivos da União a promoção do progresso económico e social e de um elevado nível de emprego.
É feita a introdução de um título próprio no Tratado de Amsterdão que, no respeito pelas competências próprias de cada Estado, comete à Comunidade a responsabilidade de
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coordenar e promover a cooperação entre os Estados membros, nomeadamente através do estabelecimento de uma estratégia coordenada nesta matéria, através das directivas para
o emprego.
Dispõe ainda o Tratado que a promoção do emprego constitui uma questão de interesse comum.
É criado um comité do emprego, que tem por funções acompanhar a evolução da situação no domínio do emprego e formular pareceres, solicitados pelas restantes instituições comunitárias ou por iniciativa própria, composto por dois representantes nomeados por cada Estado membro e dois pela Comissão.
b) Trabalho
A Comunidade apoiará e completará a acção dos Estados membros, a fim de se obter a melhoria das condições de trabalho, de higiene, saúde e segurança dos trabalhadores, a promoção da igualdade entre homens e mulheres, através do recurso a directivas que definirão prescrições mínimas progressivamente aplicáveis.
Os direitos sociais de igual modo encontram uma regulamentação mais aprofundada, pela assunção no quadro dos direitos sociais fundamentais, nos termos da Carta Social Europeia e da Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores.
c) Concertação e diálogo social
A Comunidade assume o papel relevante dos parceiros sociais ao nível comunitário, pelo que promoverá a sua consulta de forma a aprofundar o diálogo social, que pode conduzir a relações contratuais, potenciadoras de acções ao nível comunitário com repercussão nos Estados membros, de acordo com os seus processos e práticas respectivos.
d) Política social
Define-se a cooperação entre Estados membros, bem como a cooperação promovida pela Comissão nos domínios do emprego, direito de trabalho, formação e aperfeiçoamento profissional, segurança social, protecção contra acidentes e doenças profissionais, higiene e segurança no trabalho, direito sindical e direito de negociação colectiva.
e) Princípio de igualdade
Estabelece-se o princípio de igualdade entre homens e mulheres no acesso ao emprego e no trabalho, quer ao nível da remuneração, quer de oportunidades e de tratamento, permitindo mesmo medidas de discriminação positiva.
f) Formação profissional
Mantêm-se as disposições relativas à necessidade de qualificar os trabalhadores europeus, quer na formação como no aperfeiçoamento profissional, nomeadamente como o apoio e suporte do Fundo Social Europeu, que tem por objectivo promover facilidades de emprego e a mobilidade geográfica e profissional dos trabalhadores na comunidade, bem como facilitar a adaptação às mutações industriais.
As modificações introduzidas pelo Tratado de Amsterdão dão passos significativos para a concretização de um dos princípios fundamentais para a existência da União — a coesão económica e social — impossível de realizar, se os direitos fundamentais dos cidadãos europeus não estiverem salvaguardados, nomeadamente, no que respeita às matérias de
inserção adequada e igual no mercado do emprego, no trabalho e na protecção social.
Parecer
A proposta de resolução n.° 118/VII, que aprova para ratificação o Tratado de Amsterdão que altera o Tratado da União Europeia, os tratos que instituem as Comunidades Europeias e alguns actos relativos a esses tratados, incluindo anexo, protocolos, bem como a Acta Final com as declarações, assinado em Amsterdão em 2 de Outubro de 1997, encontra-se em condições de ser apreciada pelo Plenário da Assembleia da República. Os grupos parlamentares reservam a sua posição para aí se pronunciarem.
Palácio de São Bento, 28 de Outubro de 1998. — O Deputado Relator, António Rodrigues.
Relatório da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação
I
Introdução
a) O presente relatório, respondendo ao pedido feito pelo Sr. Presidente da Comissão dos Assuntos Europeus, no seguimento da apresentação pelo Governo da proposta de resolução n.° 118/VII, aborda, essencialmente, os assuntos respeitantes ao título v do Tratado da União Europeia, artigos 11." a 28.°, na versão e redacção que lhe foi dada pelo Tratado de Amsterdão.
Os artigos 11." a 28.°, já mencionados, correspondem à nova numeração do referido título v, tal como consta das «Disposições gerais e finais», artigo 12.°, n.° 1, do Tratado de Amsterdão.
b) Ao título v agora revisto, na versão do Tratado de Maastricht, correspondiam os artigos J a J-ll.
Não é possível fazer uma comparação sistemática, artigo a artigo, entre as redacções dos Tratados de Maastricht e de Amsterdão, já que para além de terem agora sido introduzidas novas disposições, muitos dos princípios inseridos nos artigos anteriores foram agora dispostos, dispersamente, por vários dos novos artigos.
c) O Tratado de Amsterdão, cujo título v, referente à «Política externa e de segurança comum», aqui analisamos, foi concluído a 17 de Junho de 1997 e assinado a 2 de Outubro deste mesmo ano.
A alteração do Tratado de Maastricht encontrava-se prevista nos termos do seu artigo N, n.° 2, que estipulava a convocação, em 1996, de uma conferência de representantes dos governos dos Estados membros com vista a analisar as disposições em relação às quais estava pensada a revisão.
n
Enquadramento político geral
o) Os antecedentes quanto à aprovação do Tratado: A Assembleia da República aprovou uma proposta de referendo sobre o Tratado de Amsterdão, contida na Resolução n.°36-A/98, com a seguinte pergunta a colocar aos portugueses: «Concorda com a participação de Portugal no processo de construção europeia no quadro do Tratado de Amsterdão?»
Tal proposta, aprovada a 29 de Junho de 1990, decorria de projectos apresentados por parte do Governo, do PSD, do PP e do PCP, que apontavam para a realização de uma consulta popular sobre este tema.
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Esta consulta popular inseria-se nos compromissos políticos assumidos quer pelo Parlamento, quer pelo próprio Governo. Pelo Parlamento que votou novas disposições constitucionais, introduzidas pela Quarta Revisão Constitucional, aprovada pela Lei Constitucional n.° 1/97, de 20 de Setembro, que viria a entrar em vigor a 5 de Outubro desse ano, prevendo pela primeira vez a possibilidade de submissão a referendo de questões de relevante interesse nacional que devam ser objecto de convenção internacional, nos termos da alínea/) do artigo 161.° da Constituição, salvo se relativas à paz e à rectificação de fronteiras. Tais disposições constitucionais resultavam de uma vontade explícita, ou pelo menos como tal anunciada, de submeter a referendo o Tratado de Amsterdão. Elas não se limitavam a dispor para o futuro, já que no pensamento e nas palavras dos seus proponentes se tinha em mente o presente.
Pelo Governo, porque tal como decorria da sua proposta de resolução n.°7l/VII e de várias intervenções do Sr. Primeiro-Ministro, as alterações ao Tratado de Maastricht deveriam ser objecto de pronúncia por parte dos Portugueses, em referendo realizado para o efeito.
Posteriormente, o Tribunal Constitucional, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 115.°, n.° 8, e 223.°, n.° 2, alínea f), da CRP, do artigo 26.° da Lei Orgânica do Regime do Referendo e do artigo 11.° da Lei do Tribunal Constitucional, procedeu obrigatoriamente à fiscalização prévia da constitucionalidade e da legalidade da proposta de referendo, tendo concluído pelo Acórdão n.°53l/98, de 29 de Julho de 1998, o seguinte: «a pergunta constante da proposta de referendo aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.° 36-A/98 não respeita os requisitos de objectividade, clareza e precisão exigidos pelo artigo 115.°, n.°6, da CRP e pelo artigo 7.°, n.°2, da Lei Orgânica do Regime do Referendo e consequentemente tem por não verificada a constitucionalidade e a legalidade do referendo proposto na mencionada Resolução da Assembleia da República».
Face ao exposto importará referir:
1." O Tribunal Constitucional limitou-se, tal como lhe competia, a apreciar constitucional e legalmente a proposta de referendo que lhe foi submetida;
2.° O Sr. Presidente da República cumpriu a Constituição, não se tendo pronunciado politicamente, em nenhum momento, sobre a oportunidade ou inportunidade da realização deste referendo.
A resolução foi devolvida ao Parlamento unicamente porque a pergunta de referendo nela constante não obedecia aos requisitos de objectividade, clareza e precisão exigidos pela Constituição e pela Lei do Referendo.
Competia pois ao Parlamento refazer a pergunta aprovada, tornando-a conforme com os requisitos constitucionais e legais;
3.° Todavia, o Governo, propõe agora à Assembleia da República a aprovação, para ratificação, do Tratado de Amsterdão sem ter até ao presente dado qualquer explicação ou justificação quanto às razões que o levam a não propor sequer a alteração da pergunta rejeitada pelo TribunaL Constitucional;
4.° De igual modo procederá o Parlamento não respeitando a decisão política consubstanciada na sua Resolução n.°36-A/98, se aprovando a proposta de resolução que agora lhe é apresentada, não der uma explicação cabal quanto aos motivos que o levam a não continuar a propor o referendo.
b) O Tratado de Amsterdão:
Quanto ao Tratado de Amsterdão propriamente dito, têm sido feitas referências, propositadamente ou não, que na maior parte dos casos revelam um desconhecimento concreto quanto ao seu conteúdo. A ideia que geralmente a ele se associa traduz-se na inexistência de alterações substanciais, pretendendo-se identificá-lo como um tratado insignificante se comparado com os consideráveis avanços no domínio comunitário, trazidos pelo Tratado de Maastricht.
Não se pretende aqui fazer qualquer juízo opinativo quanto à doutrina evolutiva do processo de construção europeia que a este Tratado está subjacente, mas tal não significa que deixemos de evidenciar os aspectos gerais considerados mais relevantes e que no novo texto se encontram espelhados.
Dizemos mais relevantes desde logo para contrariar a ideia de que não existem alterações substanciais.
Aliás, é o próprio Tratado que o evidencia, já que a sua parte i tem como título «Alterações substantivas», por contraposição à sua parte n, que se destina a enunciar as «Disposições de simplificação».
Caberá a cada partido, mais concretamente a cada grupo parlamentar ou, no limite, a cada deputado, reflectir, interpretar e decidir em função das suas convicções o destino a dar ao seu voto, mas sempre na certeza de que se estará a votar um documento importante e não apenas um diploma sem conteúdo jurídico e político.
Como convém também assinalar que as alterações globais verificadas não são só de carácter processual e que quando o são elas manifestam um desejo político claro. Saber se uma determinada matéria é decidida por unanimidade ou por maioria qualificada, se está dependente da aprovação do Conselho ou também do Parlamento Europeu, tem um alcance político considerável que não pode ser resumido a uma análise simplista e curta.
Aspectos gerais
1 — Objectivos considerados pelo Tratado como prioritários:
Colocar o emprego e os direitos dos cidadãos no âmago da União Europeia;
Eliminar os últimos obstáculos à liberdade de circulação e reforçar a segurança;
Definir uma maior eficiência na estrutura institucional da União com vista ao seu alargamento;
Reforçar o papel da União Europeia na cena internacional.
2 — Novas políticas comunitárias mais relevantes:
Vistos;
Asilo;
Imigração;
Circulação de pessoas; Emprego;
Residência de emigrantes;
Certas regras de cooperação judiciária em matéria civil.
3 — Políticas mais relevantes que são reforçadas no plano comunitário:
Política social;
Ambiente;
Saúde pública;
Defesa dos consumidores.
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título i
Disposições comuns
1 — São introduzidos novos considerandos e dadas novas redacções aos artigos 2.°, 3.°, 5.° e 6.° (anteriores
artigos A, B, C, E c F).
2 — É inserido um novo artigo 7.°, que prevê a possibilidade de suspensão de certos direitos em relação a um Estado membro que viole os princípios da liberdade, da democracia, do respeito pelos direitos do Homem e das liberdades fundamentais.
título ii
Tratado que institui a Comunidade Europeia
Refere-se este título ao chamado I Pilar da União, actual artigo 8.° (anterior artigo G).
Pontos considerados mais importantes:
1 — Alteração substancial de um conjunto de matérias que passam a ser avaliadas e decididas pelo método da co-decisão, o que se traduz:
Num reforço efectivo do papel do Parlamento Europeu;
No aumento da influência da Comissão, desde logo no seu poder de iniciativa legislativa e no correspondente reforço do papel político do seu Presidente.
2 — Inserção, tal como já se referiu, de toda a disciplina relativa a «vistos, asilo, imigração e outras políticas relativas à livre circulação de pessoas». O chamado Tratado da Comunidade Europeia passa mesmo a ter um novo título, o título iv, introduzido agora pelo Tratado de Amsterdão.
3 — Também o emprego é institucionalizado ao nível do I Pilar, com a introdução de um título próprio, o novo título viu do Tratado que institui a Comunidade Europeia.
título vi
Disposições relativas à cooperação policial e judiciária em matéria penal
0 anterior título vi 'do Tratado de Maastricht foi profundamente reformulado pelo Tratado de Amsterdão.
Pontos considerados mais importantes:
1 — Integração no quadro jurídico e institucional da União quer do Acordo, quer da Convenção de Schengen, que corresponde ao acervo de Schengen e que diz respeito à supressão dos controlos nas fronteiras e à garantia de realização da livre circulação.
2 — Este novo título vi abrange matérias respeitantes à cooperação policial e judiciária em matéria penal e resulta do novo enquadramento institucional e da necessidade, que se considerou existir, de dar resposta aos problemas decorrentes da livre circulação de pessoas.
3 — Trata-se institucionalmente de questões como o tráfico de droga, terrorismo e outras acções ligadas ao crime organizado.
4 — Foi assumido que a segurança dos cidadãos dos Estados membros no que diz respeito às infracções mencionadas tem de ser garantida por uma acção comum e não isolada de cada Governo.
título vtj Disposições relativas à cooperação reforçada
Trata-se de disposição nova inserida peio Tratado de.
Amsterdão.
Pontos considerados mais importantes:
l — Prevê-se a possibilidade de um certo número de Estados poderem intensificar, entre si, as medidas previstas no título vi, recorrendo para tal às instituições, processos e mecanismos previstos nos Tratados.
título vm
Disposições finais
Os artigos 46.°, 48.°, 49.° e 53.° (anteriores artigos L, N, O e S) passam a ter novas redacções.
Nota final. — Não se faz no presente relatório qualquer referência aos títulos ui e iv respeitantes, nomeadamente, aos Tratados CECA e CEEA.
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O título v do Tratado da União Europeia, na redacção que lhe foi dada pelo Tratado de Amsterdão.
A política externa e de segurança comum
Não se partilha a ideia, também por vezes apresentada a propósito da PESC, de que as alterações aprovadas pelo Tratado de Amsterdão não têm qualquer relevância. Saber se essas alterações são positivas ou negativas ficará a cargo de cada grupo parlamentar ou deputado, que as analisará em função das suas opiniões ou convicções quanto ao modelo ou proposta política que defenda neste, como noutros capítulos.
Interessa no entanto deixar registado que o Tratado de Amsterdão avança no sentido da institucionalização da PÈSC e que não são as decisões por unanimidade, na definição de orientações gerais ou na decisão sobre estratégias comuns que anulam esse efeito, pretendido aliás por muitos, se não mesmo pela maioria, dos intervenientes no processo de revisão. .
Há novas expressões e a supressão de outras, que evidenciam significado e conteúdo políticos a que de seguida faremos referência.
Breve enquadramento político da matéria em análise:
A revisão da política externa e de segurança comum, tal como prevista no Tratado de Maastricht, foi sendo considerada logo após a sua aprovação a 7 de Fevereiro de 1992, como um dos principais objectivos da futura Conferência Intergovernamental que se destinasse a analisar este tema.
Considerada tímida por uns, inconsequente por alguns e inoperacional por outros, a PESC tal como consagrada, em Maastricht, passou a ser abertamente criticada na seqüência da crise da ex-Jugoslávia, perante a qual os Estados da União Europeia não deram mostras de entendimento e de uma actuação concertada.
Mas se há quem entenda que a União Europeia carece de uma acção única, no plano da política externa e também da segurança e que essa necessidade é tanto mais urgente perante a nova configuração geopolítica mundial, não deixam de se levantar vozes que aconselham prudência, por
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8 DE JANEIRO DE 1999
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considerarem estarmos diante de um domínio de grande sensibilidade, para as opiniões públicas nacionais característico para muitos do chamado núcleo essencial de soberania de cada Estado.
Foi neste quadro que as negociações conducentes à revisão deste título decorreram e se para uns os resultados alcançados são ainda fracos, outros há para quem os passos dados evidenciam um gradual distanciamento da concepção de pura intergovernamentalidade que neste âmbito deve existir.
Como por mais de uma vez se mencionou e agora se repete, não se pretende, propositadamente, tomar posição quanto à matéria revista, sem embargo de se assinalarem as mudanças mais significativas e que na nossa opinião são as seguintes:
1.° Introdução do conceito de integridade territorial da União e consequente supressão da expressão «Estados membros»;
2.° Reforço das atribuições do Conselho Europeu, desde logo na capacidade de decisão sobre a existência de uma defesa comum;
3." Consagração no Tratado da União (institucionalização) do princípio da «abstenção positiva»;
4.° Consagração no Tratado (institucionalização) de novas missões humanitárias — de evacuação, manutenção da paz, de forças de combate para gestão de crises, incluindo missões de restabelecimento da paz — em que a União, como tal, poderá intervir;
5.° Assumpção institucional do objectivo de integrar a UEO na União Europeia;
6." Introdução das votações por maioria qualificada na adopção das acções ou posições comuns;
1° Instituição de um Alio Representante para a PESC, função que ficará a cargo do Secretário-Geral do Conselho;
8." Criação de uma Unidade de Planeamento da Política e de Alena Geral, no âmbito do Secretariado Geral do Conselho e colocada sobre a responsabilidade do Secretário-Geral; 9." Maior envolvimento da Comissão Europeia no domínio da política externa e segurança comum; 10.° Possibilidade de cooperação reforçada entre dois ou mais Estados membros, a nível bilateral, no âmbito da NATO ou da UEO.
Breves notas sobre alguns dos pontos enunciados:
a) Papel do Conselho Europeu:
O Conselho Europeu (órgão da União e não da Comunidade) passa a decidir sobre a passagem de uma futura política de defesa comum a uma defesa comum.
Ao ser atribuída a um órgão da União esta competência (saindo da esfera da Conferência Intergovernamental), assume-se institucionalmente a vontade inequívoca, não expressa com este alcance em Maastricht, de adopção, a prazo, de uma defesa comum.
b) Integridade territorial da União:
Trata-se de uma importante inovação sob o ponto de vista político, já que a salvaguarda da integridade da União como um todo c não como a soma das partes correspondentes aos seus Estados membros é mais um passo para a existência de uma defesa comum.
c) Institucionalização da «abstenção positiva»:
O princípio da chamada «abstenção positiva» encontrava-se previsto numa Declaração contida na Acta Final, das'
Conferências dos representantes dos Governos dos Estados membros, reunidos em Roma, em 15 de Dezembro de 1990. Tal princípio é agora integrado no texto do próprio Tratado, afirmando-se que o Estado que se abstenha na aprovação de uma decisão comum não fica obrigado a aplicá-la, embora deva reconhecer que ela vincula a União. Pode no entanto um Estado, excepcionalmente,, evocar um interesse nacional importante, evitando assim a votação por maioria qualificada.
d) Integração da UEO na União Europeia:
É atribuída ao Conselho Europeu a possibilidade de decidir sobre a integração da UEO na União, sendo ainda de salientar que, de forma explícita, se faz menção «à capacidade operacional da União», elucidando-se que esta é garantida pela UEO.
A UEO assume, com efeito, um papel mais institucional no Tratado de Amsterdão, o que é justificado por quantos vêem nesta organização o «braço militar e de defesa» da União Europeia.
e) Alto Representante para a PESC (O Sr. ou Sr." PESC): Trata-se de uma clara inovação no plano dos Tratados,
embora a defesa de tal cargo ou «figura» venha sendo feita há largo tempo, na esteira de quem defende a existência de um rosto que represente a União no domínio da política externa, nomeadamente perante países terceiros.
Conclusão
Pensa-se ter respondido ao pedido feito pelo Sr. Presidente da Comissão dos Assuntos Europeus, num relato tão factual quanto possível, ainda que exaustivo e até minucioso em muitos casos.
Entendeu-se, porém, que, podendo não competir neste relatório, a explanação subjectiva dos pontos de vista do relator, que são aliás conhecidas sobre esta matéria, tal não deveria obstar que a Comissão de Negócios Estrangeiros deixasse de dar o seu contributo numa análise global, ainda que geral, no Tratado de Amsterdão como um todo.
Pretende-se também contribuir para que aqueles que ainda não tiveram oportunidade de ler o Tratado de Amsterdão possam encontrar neste relatório muitos dos pontos essenciais nele existentes e confrontar posições do passado e do presente com as opções que entendam tomar no futuro.
Uma coisa para nós fica clara— o Tratado de Amsterdão não é inócuo, nem desprovido de conteúdo, quer pela consolidação que faz de normas constantes em Maastricht, quer pelo reforço político de muitas ideias nele introduzidas, quer ainda pelas inovações verificadas.
Parecer
Face ao exposto, a Comissão Parlamentar de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação considera que a proposta de resolução n.° 118/VD está em condições legais e regimentais de ser discutida em Plenário, reservando os grupos parlamentares e os deputados as suas posições para o debate.
Palácio de São Bento, 20 de Outubro de 1998. —Pelo Presidente da Comissão. (Assinatura ilegível) — O Relator, Manuel Monteiro.
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II SÉRIE-A—NÚMERO 27
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