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0179 | II Série A - Número 012 | 06 de Janeiro de 2000

 

Entretanto, em Lisboa, vivia-se um clima de silêncio do poder político e dos órgãos de informação, face ao comprometimento do Governo com a aquela condução do processo de descolonização de Angola, e ao receio de que o favorecimento do regresso dos portugueses agravasse o já elevado número de 200 000 desempregados, e a difícil situação política que tal realidade acarretava.
Para a história fica a solução desesperada que levou os portugueses residentes em Angola a proporem-se atravessar o Zaire, o Congo-Brazzaville, o Gabão, os Camarões, a Nigéria, o Níger, a Argélia e Marrocos para atingir a ponta Norte de África, em Tânger, numa tentativa de fuga que ficaria conhecida por "longa marcha", e que, tanto as autoridades portuguesas como as angolanas demonstraram estar pouco dispostas a consentir, considerando-a o Ministro da Coordenação Interterritorial (Dr. Almeida Santos) "uma utopia".
Para as autoridades angolanas, sobretudo, tratava-se de uma fuga de bens em que não via vantagem. Bens de portugueses e, portanto, bens portugueses, note-se.
Quando o Governo português finalmente decidiu organizar uma ponte aérea para escoar os portugueses que fugiam de Angola, em Agosto de 1975, dos cerca de 500 000 portugueses ali residentes já 100 000 tinham abandonado o território. Nos meses de Verão, a TAP programou o transporte de 120 000 passageiros, aos quais se somaram os transportados pelos sete Boeings 747 diários integrados na ponte aérea - Isto para já não falar na participação de países amigos de Portugal na evacuação de portugueses de Angola.
O regresso dos portugueses de Angola foi, efectivamente, o mais dramático, culminando um movimento que de todos os territórios ultramarinos portugueses se gerou depois do 25 de Abril de 1974. Antecedeu-o o regresso dos portugueses de Moçambique, que se prolongaria, esgotado o fluxo angolano, e sucedeu-lhe o timorense.
Coube ao III Governo Provisório lidar com a queda da máscara da "descolonização exemplar", tornada óbvia pelo êxodo massivo de portugueses em direcção a Lisboa.
Depois de um muito rudimentar apoio do Ministério da Coordenação Interterritorial, em colaboração com a Cruz Vermelha e o Ministério dos Assuntos Sociais, foram adoptadas medidas de recepção e apoio aos portugueses forçados a regressar à Pátria.
Surge então, na Presidência do Conselho de Ministros, o Instituto de Apoio ao Retorno de Nacionais (IARN), criado pelo Decreto-Lei n.º 169/75, de 31 de Março, cujas atribuições eram as de estudar as medidas necessárias à integração na via nacional dos "retornados", a formulação de pareceres sobre os assuntos respeitantes à descolonização e regresso de emigrantes, competindo-lhe especialmente diligenciar no sentido da obtenção de trabalho e de créditos, fornecer ao Ministério Público os elementos para a organização da tutela e curatela de incapazes, prestar assistência médica e medicamentosa e colaborar com o Ministério dos Negócios Estrangeiros no sentido de serem obtidas as garantias e indemnizações pelos bens deixados pelos "retornados" no Ultramar.
Pelo despacho publicado no DR I Série de 28 de Abril de 1975, foi delegada no Ministro da Coordenação Interterritorial a competência para a resolução dos assuntos que corriam pelo IARN e, pelo Decreto-Lei n.º 484/75, de 10 de Setembro, foi criada uma comissão instaladora para gerir o IARN.
Desde então o regime de instalação foi sendo sucessivamente prorrogado por períodos de um ano (Despacho Normativo n.º 20/77, de 31 de Janeiro, Despacho Normativo n.º 29/78, de 3 de Fevereiro, Despacho Normativo n.º 11/79, de 11 de Janeiro, Decreto-Lei n.º 94/81, de 29 de Abril) até à sua extinção, que ocorreu pelo Decreto-Lei n.º 97/81, de 2 de Maio.
Avaliada a actividade do IARN sobre o ponto de vista dos beneficiários da mesma, ela teve certamente aspectos positivos. Prosseguiu-se uma política assistencial que se traduziu em medidas como a concessão de um subsídio de emergência no momento da chegada, prestou-se assistência médica, concederam-se subsídios de desemprego, de casamento, nascimento, aleitação, doença, maternidade, morte, funeral, pensões de sobrevivência, velhice e invalidez, embora de forma difusa e não coordenada. Concederam-se igualmente subsídios e empréstimos para habitação, mobiliário, reintegração profissional, acção social escolar, transporte e desembaraço de viaturas e bagagens, alojamento e alimentação.
No entanto, essa acção foi manifestamente insuficiente, desde logo, porque não abrangeu todos os desalojados porque nem todos eram, à face da lei vigente, cidadãos portugueses.
Basta lembrar os problemas que o Decreto-Lei n.º 308-A/75, de 24 de Junho, veio criar aos cidadãos oriundos de antigas colónias portuguesas no que respeitava à manutenção da nacionalidade portuguesa, mercê do critério altamente restritivo consagrado no seu artigo 1.º, tendo mesmo havido quem o não hesitasse em qualificar de racista...
Lembre-se, ainda, o que padeceram os funcionários públicos que, pretendendo inscrever-se no Quadro Geral de Adidos, tinham de fazer prova da conservação da nacionalidade portuguesa nos termos daquele decreto-lei, sem a qual não podiam aceder a esse estatuto.
Lembre-se, por fim, que só os cidadãos portugueses, como tal considerados os que preenchessem os requisitos daquele decreto-lei, poderiam aceder à assistência e apoio do IARN.
É de crer que os autores da "descolonização exemplar" quando publicaram o Decreto-Lei n. 308-A/75,e, igualmente, a Resolução do Conselho de Ministros de 5 de Maio de 1976 (DR I Série da mesma data), escreveram outra página lamentável da história portuguesa mais recente.
Mas a acção do IARN foi igualmente insuficiente, porque infrutífera, no que respeita àquela das suas atribuições que, porventura, para aqui mais nos interessa: a que respeita à colaboração com o Ministério dos Negócios Estrangeiros no sentido de serem obtidas as garantias e indemnizações pelos bens deixados pelos "retornados" no Ultramar.
Numa determinada altura o IARN fez publicar anúncios nos jornais, em que convidava os cidadãos portugueses retornados do Ultramar a apresentarem a relação dos bens perdidos junto de uma comissão criada para este efeito, que se encarregaria da quantificação dos valores e da apresentação de propostas de solução para os vários problemas.
No entanto, e apesar de muitos desse cidadãos terem apresentado tal relação, não obtiveram até hoje qualquer notícia da referida comissão, nem foram ressarcidos do valor de qualquer dos bens ali arrolados.
Estes cidadãos foram forçados a deixar para trás os seus bens para salvarem a sua vida e a das suas famílias. Em certos casos, mesmo, tiveram de trocá-los pela vida, por exigência das autoridades emergentes, e perante a conivência ou passividade das forças armadas portuguesas, estatutariamente obrigadas a defender um território que, embora na véspera de passar para outras mãos, era ainda português.
Não beneficiaram de qualquer protecção diplomática ou militar, não beneficiaram da solidariedade dos seus concidadãos, enfrentaram sozinhos os ódios acumulados ao longo

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