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1889 | II Série A - Número 059 | 15 de Julho de 2000

 

mercado de trabalho têm sido suficientes para a realização de uma efectiva igualdade entre homens e mulheres. De facto, embora se tenham verificado mudanças significativas nas relações sociais de género nos últimos anos, (...) essas mudanças não se traduziram ainda numa melhoria global do estatuto das mulheres nem no usufruto de uma plena cidadania."
Permanece, assim, um fosso entre a lei, o discurso e a prática, um fosso entre o efectivo contributo das mulheres para o desenvolvimento da nossa sociedade e a possibilidade de acederem às decisões que dizem respeito não só a si próprias mas à sociedade no seu conjunto. Subsistem ainda mecanismos que contribuem para a sua exclusão política e social.
A evolução dos resultados eleitorais, desde as eleições para a Assembleia Constituinte, em 1975, até aos nossos dias, mostra que há uma progressão extremamente lenta, com momentos prolongados de estagnação e até de retrocesso. Assim, depois dos primeiros 8% de mulheres eleitas, em 1975, as eleições para a Assembleia da República contaram com 4,9% de eleitas em 1976, oscilando depois nos vários actos eleitorais, até 1991, entre valores percentuais que não ultrapassam os 8,7%, verificando-se apenas em 1995 uma subida para os 12,5% e em 1999 uma subida para os 17,4%, e mantendo-se uma gritante sub-representação de mulheres no Parlamento.
Também nos vários outros níveis da tomada de decisão política as mulheres permanecem sub-representadas e a evolução verificada não corresponde às mudanças que se têm operado no estatuto das mulheres e no papel por elas hoje desempenhado na nossa sociedade.
Também no que se refere ao poder local, a evolução é preocupante. A representação das mulheres tem-se mantido muito baixa ao longo das duas décadas de construção da democracia em Portugal, sendo a este nível, ao invés do que se verifica noutros Estados membros da União Europeia e contra todas as expectativas, que a participação das mulheres nos órgãos de decisão é mais baixa. Esta fraca participação feminina tem-se perpetuado ao longo dos anos, sofrendo poucas alterações. Por exemplo, as mulheres representavam 1,3% dos presidentes de Câmara eleitos em 1979. Essa percentagem manteve-se inferior a 2% ao longo dos vários actos eleitorais - 1982, 1985 e 1993, com excepção de 1989, ano em que atingiu os 2,3% e apenas nas últimas eleições autárquicas, 1997, e mau grado a duplicação do número de mulheres presidentes de câmara de cinco em 1993 para 12 em 1997, as mulheres representam 3,9% do total de presidentes de câmara.
A representação feminina permanece também muito baixa em todos os órgãos autárquicos e nos vários cargos dentro destes órgãos. As mais altas percentagens atingidas verificaram-se ao nível dos membros das assembleias municipais, com 10,8% em 1989 e 11,3% de mulheres em 1993.
As mulheres encontram-se menos representadas nos cargos de maior protagonismo. Se nos reportarmos às eleições de 1993, as últimas para as quais dispomos de dados mais completos, a representação das mulheres nos cargos de presidente de câmara municipal (1,6%), de assembleia municipal (6,2%), de junta de freguesia (3,1%) e de assembleia de freguesia (6,5%), é sempre menor que nos cargos de vereadores das mesmas câmaras (8,7%), ou de membro de assembleia municipal (11,3%), de assembleia de freguesia (8,1%), ou de vogal de junta de freguesia (6,2%).
As mulheres estão mais representadas nos órgãos deliberativos que nos órgãos executivos - mais representadas nas assembleias municipais do que nas câmaras municipais, e mais representadas nas assembleias de freguesia do que nas juntas de freguesia.
Sendo a autarquia o nível político mais próximo dos cidadãos, seria de esperar que as mulheres pudessem pôr ao serviço da comunidade e das próprias mulheres os talentos, os valores, os interesses e as experiências que decorrem do seu dia a dia, chamando a atenção e procurando soluções para problemas em relação aos quais elas são tradicionalmente mais sensíveis, tais como a habitação, os transportes, o ambiente, a violência na família, a guarda de crianças, o cuidado com os idosos, os problemas ligados à conciliação da vida familiar com a vida profissional, à igualdade de oportunidades, o aumento da representação das mulheres nos órgãos de tomada de decisão teria resultados que ultrapassariam a legitimação democrática. Produziria mudanças sociais em benefício das mulheres e dos homens.
No entanto, a construção da igualdade deve assumir carácter privilegiado à escala regional e local, dado que estes níveis estão ligados, por excelência, ao exercício da cidadania e que o sexo do decisor tem um papel determinante, não só enquanto modelo de identificação, mas também na orientação das suas decisões e na definição das suas prioridades.
Assim, decisões de grande importância nas áreas política, social, económica ou cultural são tomadas por grupos maioritariamente masculinos, não só nas instituições políticas mas em todos os tipos de organizações. Estas decisões reflectem tendencialmente os valores, os pontos de vista e as experiências pessoais dos seus actores, mas afectam, não obstante, o conjunto da sociedade.
A subalternização das mulheres em muitas esferas da sociedade impede, assim, que a igualdade consagrada na lei consiga ter os necessários reflexos na prática.
Factores de vária ordem concorrem para que tal aconteça: históricos, culturais, factores sócio-económicos. Pesam também factores políticos tais como os critérios e os processos de selecção dentro dos partidos políticos, que utilizam valores masculinos, e o próprio sistema eleitoral. A organização e funcionamento dos partidos continuam a seguir uma lógica essencialmente masculina. As instituições políticas sempre se apresentaram, de facto, pouco acessíveis às mulheres, indecifráveis nos seus mecanismos, alheias à sua sensibilidade, aos seus tempos, aos seus modos de viver e de conceber a existência.
No que se refere aos critérios e processos de selecção utilizados pelos partidos políticos, verificamos que os líderes políticos ao nível nacional demonstram um maior grau de preocupação com a presença equilibrada das mulheres e dos homens na tomada de decisão do que os líderes locais. Ao nível local, a existência de fortes lobbies de pressão, conjugados com a inexistência de critérios objectivos para a integração de candidatos nas listas às eleições autárquicas, contribuem para a sub-representação das mulheres nessas listas ou para a sua presença em lugares não elegíveis.
A divisão tradicional dos papéis entre os sexos constitui outro dos principais obstáculos, pois os modelos veiculados, não são somente interiorizados pelas pessoas, mas estão antes imbricados na própria organização da sociedade e no seu funcionamento.
E, no entanto, não é de mais repeti-lo, a representação igualitária das mulheres e dos homens na tomada de decisão deve ser encarada como um direito humano fundamental e como questão de base de qualquer democracia. Mas somos levados a constatar que a democracia parlamentar não constitui, por si só, uma garantia de participação igualitária.

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