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1524 | II Série A - Número 041 | 15 de Março de 2001

 

É neste entendimento que o Partido Social Democrata considera que a oportunidade de abertura de um processo extraordinário de revisão não pode deixar de dar resposta a questões específicas que na agenda política nacional estão pendentes de alterações à Constituição, mal se compreendendo que esse processo de revisão, uma vez aberto, viesse a ocorrer ignorando e secundarizando matérias que, em alguns casos, aguardam há já alguns anos pela sua resolução constitucional.
Da análise criteriosa que fazemos, e sem prejuízo de um conjunto mais alargado de matérias que, pela sua natureza estruturante, devem vir a ser tratadas em sede de uma revisão ordinária, entendemos haver quatro pontos a merecer um tratamento imediato:
- A consagração da possibilidade de reconhecimento da jurisdição do Tribunal Penal Internacional;
- A reciprocidade de direitos políticos aos cidadãos dos países de língua portuguesa;
- A exclusão do exercício do direito à greve pelas associações sindicais integradas por agentes de forças de segurança;
- A limitação à renovação sucessiva do exercício de cargos políticos e de altos cargos públicos.
Nestes termos, ao abrigo do disposto no artigo 284.º, n.º 2, da Constituição, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, apresentam o seguinte projecto de resolução:
A Assembleia da República assume de imediato poderes constituintes a fim de proceder a uma revisão extraordinária da Constituição.

Palácio de São Bento, 8 de Março de 2001. Os Deputados do PSD: Durão Barroso - António Capucho - Manuel Moreira - Manuela Ferreira Leite - Luís Marques Guedes - Pedro Roseta - Rui Rio - Carlos Encarnação - Miguel Macedo - Fernando Seara.

Anexo

Projecto de revisão constitucional

Exposição de motivos

I - Tribunal Penal Internacional

O PSD entende que a existência de um Tribunal Penal Internacional permanente, que vem sendo preconizada desde o fim da I Guerra Mundial e que nunca foi possível concretizar, é um passo importante para a protecção da dignidade e dos direitos da pessoa humana.
O princípio da universalidade e indivisibilidade dos direitos humanos surge hoje como indiscutível e reflecte a unidade fundamental de todos os membros da família humana, bem como o reconhecimento da sua dignidade intrínseca na diversidade que lhe é própria.
Os direitos humanos e as liberdades fundamentais são inerentes a todos os seres humanos e devem ser protegidos contra qualquer violação, conforme afirma a Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre os Direitos Humanos, realizada em Viena em 1993.
Não pode ser esquecido o papel pioneiro de Portugal no processo pelo qual a humanidade veio a tomar consciência da sua unidade essencial.
A Constituição veio, naturalmente, a acolher este mesmo princípio da universalidade dos direitos humanos nas suas disposições relativas aos princípios fundamentais.
A criação do Tribunal Penal Internacional (TPI) tem como objectivos prevenir a repetição dos crimes contra a humanidade que aconteceram em escala inimaginável no século XX e pôr termo à actual inaceitável situação de impunidade.
Com efeito, quase todos os que cometeram os mais graves crimes contra a humanidade, o genocídio, a liquidação de milhões de inocentes, as mutilações, torturas e violações em massa não foram punidos, não tendo sido oferecida qualquer reparação à esmagadora maioria das numerosas vítimas.
É certo que existiram e existem alguns tribunais ad hoc, criados a posteriori para certos casos. Mas o que acontece é que têm julgado exclusivamente os vencidos ou os mais fracos, deixando-se sempre impunes os vencedores, que algumas vezes também praticaram crimes contra a humanidade.
Toda esta situação espelha o domínio de perspectivas ou ideologias transpersonalistas que subordinam a pessoa e os seus direitos quer a razões de oportunidade, quer aos interesses de determinados Estados, quer ainda à dupla avaliação das acções criminais à luz de certas ideologias ou projectos políticos, económicos ou sociais que os minimizam.
É esta lógica que o TPI pretende inverter.
Mas importa salvaguardar que a criação de uma jurisdição internacional permanente é complementar e em nada conflitua com a ordem jurídica interna portuguesa nem com os valores da comunidade nacional.
Devemos preservar os nossos valores, designadamente a inviolabilidade do direito à vida, que o TPI vem proteger.
É muito positivo que o TPI nunca possa aplicar a pena de morte, pena contrária à dignidade da pessoa humana. Uma vez que na sua jurisdição estão em causa os crimes mais graves e a eles não se aplica a pena de morte, abre-se uma importante oportunidade para que Portugal utilize a sua futura participação no TPI como forma de promover a total erradicação dessa pena bárbara em todo o mundo e para todas as situações.
O PSD entende ainda que Portugal deve apresentar uma declaração interpretativa ao Tratado, na qual reafirme os seus valores e o compromisso de julgar nos nossos tribunais todos os crimes punidos pelo Estatuto do TPI cometidos por portugueses, de acordo com o nosso direito interno, garantindo que a complementaridade da jurisdição do TPI não será utilizada no julgamento de nacionais.
Para tanto deve ser dada prioridade a uma revisão da nossa legislação penal, acolhendo todas as disposições necessárias a que os nossos tribunais tenham jurisdição plena. Este é realmente um aspecto fundamental, de modo a garantir a coerência da posição portuguesa.
Por último, devemos declarar formalmente a recusa em aceitar nos estabelecimentos prisionais portugueses a execução de penas de prisão não previstas na nossa ordem jurídica interna.
II - Reciprocidade de direitos políticos

Trata-se de fazer cumprir a reciprocidade de direitos políticos que a generosa alteração à Constituição brasileira tornou ainda mais irrecusável.
Na última revisão, em 1997, o Partido Socialista ficou isolado na oposição a que essa reciprocidade fosse consagrada na Constituição.