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Sexta-feira, 7 de Junho de 2002 II Série-A - Número 12

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

S U M Á R I O

Projectos de lei (n.os 51 a 57/IX):
N.º 51/IX - Regula e garante o exercício do direito de iniciativa legislativa popular (apresentado pelo PS).
N.º 52/IX - Regula o acompanhamento, pela Assembleia da República, do envolvimento de contingentes militares portugueses para o estrangeiro (apresentado pelo PS).
N.º 53/IX - Aprova o regime penal especial para jovens entre 16 e 21 anos (apresentado pelo PS).
N.º 54/IX - Fundo de Compensação Salarial dos Profissionais da Pesca (Altera o Decreto-Lei n.º 311/99, de 10 de Agosto) (apresentado pelo Deputado do BE Francisco Louçã).
N.º 55/IX - Alteração do Decreto-Lei n.º 199/99, de 8 de Junho (Revê as taxas contributivas do regime geral da segurança social dos trabalhadores por conta de outrem) (apresentado pelo Deputado do BE Francisco Louçã).
N.º 56/IX - Recuperação de edificações devolutas e degradadas em centros e núcleos históricos ou antigos (apresentado pelo PCP).
N.º 57/IX - Lei de Bases da Família (apresentado pelo CDS-PP).

Projectos de resolução (n.os 25 e 26/IX):
N.º 25/IX - Por uma verdadeira política de defesa e promoção do ensino da língua e cultura portuguesas no estrangeiro (apresentado pelo PCP).
N.º 26/IX - Estabelece a metodologia de reforma da tributação do património imobiliário (apresentado pelo PS).

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PROJECTO DE LEI N.º 51/IX
REGULA E GARANTE O EXERCÍCIO DO DIREITO DE INICIATIVA LEGISLATIVA POPULAR

1 - O Grupo Parlamentar do PS propôs a consagração constitucional do direito de iniciativa legislativa popular e obteve a viabilização da nova figura, que veio a ser incluída no acordo de revisão e votada em Plenário por maioria superior a 2/3.
Na redacção que lhe foi dada pela Lei Constitucional n.º 1/97, o artigo 167.º da Constituição veio dar expressão plena ao objectivo político subjacente à proposta do PS - aproximar eleitos e eleitores, abrindo as portas do Parlamento a iniciativas resultantes da criatividade dos cidadãos.
A agenda da Assembleia da República passa, assim, a poder incluir questões que mereçam destaque para um número significativo de portugueses e portuguesas, limitando-se, assim, o risco de fechamento institucional e de criação de temas tabu contra o sentir de correntes de opinião expressivas, evitando um divórcio entre os cidadãos e os seus eleitos para a Assembleia da República.
Na VII Legislatura, o PS procurou dar expressão legal à nova norma da Constituição. Não foi, contudo, possível finalizar em tempo o processo legislativo, que importa agora reiniciar e concluir.
2 - Há que regular em pormenor o novo instituto constitucional, tornando claras as regras aplicáveis e facilitando a sua apreensão pelos futuros utilizadores. O projecto de lei do PS tem um conjunto de características distintivas que o debate já realizado leva os signatários a reafirmar.
A - Parte-se, como é desejável, da distinção que a Constituição estabelece entre o direito de iniciativa legislativa popular e o direito de petição.
Este último não só pode ser exercido a nível individual ou por pessoas colectivas - ao contrário do direito de iniciativa de leis, reservado a colectivos integrados por milhares de pessoas -, como assenta num elevado grau de informalidade. De facto, as petições podem ser apresentadas por qualquer meio, entregues por via postal ou por fax, sujeitas a assinatura a rogo, entregues em qualquer serviço público em Portugal ou no estrangeiro e, devendo embora ser inteligíveis e dotadas de sentido, não é imprescindível que apontem soluções concretamente desenhadas.
Ao invés, a iniciativa legislativa de grupos de cidadãos não visa meramente chamar a atenção para uma situação, criticar actos administrativos, denunciar violações da Constituição ou da lei ou pedir providências aos poderes públicos. Trata-se de, concreta e especificamente, aventar soluções legais, desenhando os respectivos contornos em condições susceptíveis de persuadir os Deputados sobre o bem fundado do proposto.
Não se pretendeu estimular algo indistinguível de uma petição colectiva mas, sim, propiciar a elaboração de verdadeiros e próprios projectos de lei - denominação que melhor se coaduna com a Constituição.
Implica isto que os proponentes redijam em articulado as ideias com que pretendem contribuir para resolver problemas. Tal exigência não é insuportável para quem se proponha levar ao Parlamento soluções inequívocas e claramente enunciadas: basta que, entre os milhares de subscritores, alguns saibam e queiram assumir essa tarefa para a qual, de resto, não se fixa um estilo único, nem um padrão de sofisticação inatingível. A resposta obtida a apelos já feitos a pré-iniciativas populares, remetidas à Assembleia da República com escorreita redacção, revela que esta opção não inviabiliza iniciativas com bom apoio. Por outro lado, não se afigura recomendável a solução alternativa que consistiria em dissolver a iniciativa legislativa em petição genérica ou cometer a serviços da Assembleia da República a sua tradução em projecto. É que, para evitar a infidelidade aos desejos dos proponentes, essa "tradução de desejos" teria de estar sujeita a um vaivém de controlo por parte dos representantes dos interessados. Mau seria que os proponentes se limitassem a assinar soluções esboçadas em termos gerais, sendo as opções concretas mais tarde aprovadas por alguns representantes em articulação com a burocracia parlamentar, prática que claramente diminuiria o âmbito e efectividade da participação.
B - O projecto de lei do PS estabelece uma relação entre o número de cidadãos eleitores necessários para este efeito e o indispensável para desencadear referendos, prevendo que o exercício do direito possa ter lugar por iniciativa de 0,3% dos inscritos no recenseamento eleitoral. É verdade que bastam 5000 eleitores para fundar um partido, mas é certo que este pode não ter expressão pública relevante nem voz parlamentar. Ora, a iniciativa popular dá voz garantida.
Em concreto, a solução proposta pode conduzir à necessidade de reunir assinaturas em quantidade próxima do número de votos necessário para eleger um Deputado.
C - De acordo com o facultado pela Constituição - que permite ao legislador ordinário ampla margem de definição dos termos e condições do novo instituto constitucional -, propõe-se fundamentalmente que a iniciativa popular de leis recaia sobre matérias da área de reserva relativa da Assembleia da República, o que abrange um vasto elenco, desde o diversificado mundo dos direitos, liberdades e garantias, a muitas outras matérias relevantes: direito penal e processual penal; regime das infracções disciplinares; bases do sistema de segurança social, do Serviço Nacional de Saúde, do sistema de protecção da natureza, do equilíbrio ecológico e do património cultural; regime geral do arrendamento rural e urbano; organização dos tribunais; finanças locais e outros aspectos do estatuto das autarquias locais; função pública; ordenamento do território e do urbanismo, entre outras.
Não são abrangidas as matérias sobre as quais não podem também incidir referendos (o que se explica pela mesma ratio legis), bem como as que devam ser reguladas por lei constitucional, lei de valor reforçado ou resolução.
A experiência de aplicação do quadro legal permitirá proceder, em momento ulterior, a ajustamentos que se revelem necessários, ampliando ou restringindo o universo de temas agora delimitado.
D - Aos proponentes são dadas garantias de intervenção e votação em tempo certo de tudo o que propuseram. Sem isso o direito de iniciativa correria o risco de não dar lugar a um debate e votação. Mas acautelou-se que não haja agendamento mecânico: ao Presidente da Assembleia da República caberá garantir o bom cumprimento das prioridades e direitos que o Regimento prevê.
E - Quanto ao procedimento, assegura-se um regime semelhante ao aplicável aos demais projectos de lei, incluindo o incontornável cumprimento das regras constitucionais sobre consultas públicas tendentes a acautelar a participação dos interessados no processo legislativo (uma vez que de um mecanismo de participação não pode resultar a supressão de outros).

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F - Acautela-se também a gratuitidade dos actos necessários à obtenção de assinaturas e a sua fácil recolha, questão essencial para a efectividade de um direito que a Constituição quer livre e democraticamente exercido.
Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º
Direito de iniciativa legislativa popular

A presente lei regula e garante o exercício do direito de iniciativa legislativa popular junto da Assembleia da República.

Artigo 2.º
Titularidade

1 - O direito de iniciativa legislativa popular, enquanto instrumento de participação política democrática, é reconhecido aos cidadãos portugueses.
2 - A iniciativa legislativa é exercida colectivamente por grupos de cidadãos eleitores, em número não inferior a 0,3% dos inscritos no recenseamento em território nacional.

Artigo 3.º
Projectos de lei

1 - A iniciativa legislativa assume a forma de projecto de lei, a dirigir ao Presidente da Assembleia da República.
2 - Os proponentes são identificados pelo nome completo, bilhete de identidade, número de eleitor, residência e assinatura reconhecida.

Artigo 4.º
Representação dos proponentes

1 - O grupo de cidadãos eleitores é representado pelo primeiro signatário do projecto, salvo quando os proponentes optem por outra forma de representação e a especifiquem no acto de apresentação da iniciativa.
2 - O representante dos proponentes é notificado de todos os actos respeitantes ao processo legislativo e pode exercer junto da Assembleia da República diligências tendentes à boa execução do disposto na presente lei.

Artigo 5.º
Requisitos formais e garantias

1 - O projecto de lei deve:

a) Ser apresentado por escrito;
b) Estar redigido sob a forma de artigos, eventualmente divididos em números e alíneas;
c) Ter uma designação que traduza sinteticamente o seu objecto principal;
d) Apresentar uma breve justificação ou exposição de motivos.

2 - O exercício do direito de iniciativa é livre e gratuito, não podendo ser dificultada ou impedida por qualquer entidade, pública ou privada, a recolha de assinaturas e os demais actos necessários para a sua efectivação, nem dar lugar ao pagamento de quaisquer impostos ou taxas.

Artigo 6.º
Objecto

1 - Podem ser objecto de iniciativa legislativa popular as matérias previstas na alínea i) do artigo 164.º e no artigo 165.º da Constituição da República, com excepção das que tenham conteúdo orçamental, tributário ou financeiro.
2 - Não é admitida iniciativa de lei por grupos de cidadãos sobre matérias que, nos termos do artigo 198.º, n.º 2, da Constituição, sejam da exclusiva competência legislativa do Governo.

Artigo 7.º
Limites da iniciativa

Os grupos de cidadãos eleitores não podem apresentar iniciativas que envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das receitas previstas no Orçamento do Estado.

Artigo 8.º
Admissão

1 - A iniciativa legislativa popular não é admitida quando:

a) Não estiver subscrita nos termos previstos nos artigos 2.º e 3.º;
b) Não cumprir os requisitos formais prescritos nas alíneas a) e b) do artigo 5.º;
c) Infringir a Constituição ou os princípios nela consignados;
d) O seu objecto não respeite os limites definidos no artigo 6.º.

2 - O Presidente da Assembleia da República, quando entenda justificada a não admissão, notifica o representante dos proponentes para suprirem as deficiências encontradas, em prazo não inferior a 15 dias.
3 - Caso não haja resposta ou a correcção da deficiência não seja feita em tempo útil, a decisão do Presidente da Assembleia da República de não admissão é sujeita a confirmação do Plenário, com base em parecer da comissão competente, lido e votado nos termos previstos no Regimento para recursos de admissão de iniciativas legislativas.

Artigo 9.º
Publicação e envio à comissão

Admitida a iniciativa, o Presidente ordena que ela seja publicado no Diário da Assembleia da República e remetida à comissão competente em razão da matéria para elaboração de parecer.

Artigo 10.º
Consulta pública necessária

Quando se trate de legislação de trabalho ou de outra matéria cujo regime jurídico se encontre legalmente sujeito a participação dos interessados a comissão dá cumprimento às disposições legais, estatutárias e regimentais aplicáveis.

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Artigo 11.º
Exame em comissão

1 - O parecer é, em regra, emitido até ao trigésimo dia posterior ao envio à comissão.
2 - A comissão notifica o representante dos proponentes para, querendo, expor a iniciativa e responder a perguntas dos Deputados.

Artigo 12.º
Agendamento

Recebido o parecer da Comissão, ou esgotado o prazo referido no artigo anterior, a iniciativa legislativa é agendada para uma das 10 reuniões plenárias seguintes, sem prejuízo das prioridades regimentais e dos direitos de agendamento dos grupos parlamentares.

Artigo 13.º
Votação

1 - A votação na generalidade pode incidir sobre divisão do projecto cuja autonomia o justifique, em termos idênticos aos previstos no Regimento para projectos apresentados por Deputados.
2 - Quando a iniciativa obtenha aprovação, a votação na especialidade em comissão e a votação final global da iniciativa devem ser concluídas até ao sexagésimo dia posterior.

Artigo 14.º
Renovação

1 - As iniciativas legislativas populares definitivamente rejeitadas não podem ser renovadas na mesma sessão legislativa, salvo nova eleição da Assembleia da República.
2 - As iniciativas legislativas populares não votadas na sessão legislativa não carecem de ser renovadas na sessão legislativa seguinte, salvo termo da legislatura.

Artigo 15.º
Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no trigésimo dia posterior ao da sua publicação.

Assembleia da República, 31 de Maio de 2002. - Os Deputados do PS: José Magalhães - Alberto Martins - Jorge Lacão.

PROJECTO DE LEI N.º 52/IX
REGULA O ACOMPANHAMENTO, PELA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA, DO ENVOLVIMENTO DE CONTINGENTES MILITARES PORTUGUESES PARA O ESTRANGEIRO

Exposição de motivos

Na revisão constitucional de 1997, aprovada pela Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro, foi aditada uma alínea j) ao artigo 163.º da Constituição da República Portuguesa, nos termos da qual compete à Assembleia da República, no âmbito da sua competência de fiscalização política quanto a outros órgãos, "acompanhar, nos termos da lei e do Regimento, o envolvimento de contingentes militares portugueses no estrangeiro".
A inclusão deste tipo de normas constitucionais já constava da revisão constitucional de 1992 quanto a determinadas matérias, como é o caso do acompanhamento, pela Assembleia da República, da participação de Portugal no processo de construção da União Europeia.
Este comando constitucional, já incorporado na Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas, com a redacção dada pela sua quinta alteração, aprovada pela Lei Orgânica n.º 3/99, de 18 de Setembro, carece de ver precisados os seus contornos operacionais, por forma a garantir a sua exequibilidade.
Importa prever os termos em que o Governo deve prestar as informações à Assembleia da República para que esta possa exercer aquela faculdade que lhe está constitucionalmente atribuída, regulamentação essa que, naturalmente, terá de ser definida nos parâmetros resultantes do texto constitucional.
Na legislatura passada o Governo apresentou a proposta de lei n.º 61/VIII, com conteúdo similar à que agora se apresenta, tendo sido aprovada na generalidade com os votos de todos os partidos políticos à excepção do Bloco de Esquerda, contudo a mesma caducou com o término da legislatura.
Assim, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º
(Acompanhamento pela Assembleia da República)

Nos termos da presente lei a Assembleia da República acompanha o envolvimento de contingentes militares portugueses no estrangeiro, nomeadamente quando o mesmo decorra da satisfação dos compromissos internacionais do Estado português no âmbito militar ou da participação em missões humanitárias e de paz assumidas pelas organizações internacionais de que Portugal faça parte.

Artigo 2.º
(Comissão da Defesa Nacional)

Para efeitos da presente lei o acompanhamento da Assembleia da República será efectuado através da Comissão Parlamentar da Defesa Nacional, à qual, para tal efeito, devem ser enviadas ou prestadas pelo Governo todas as informações consideradas relevantes.

Artigo 3.º
(Âmbito da prestação das informações)

As informações a que se refere a presente lei compreendem, nos termos constitucionalmente definidos, todos os elementos essenciais que enquadram as operações e o desenrolar das mesmas, nomeadamente no que respeita aos meios humanos e logísticos a utilizar.

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Artigo 4.º
(Momento da prestação das informações)

As informações referidas no artigo anterior serão facultadas à Assembleia da República:

a) Antes do envio dos contingentes militares portugueses para o estrangeiro, sem prejuízo da adopção imediata das decisões militares que ao caso couberem;
b) Semestralmente, enquanto durarem as operações;
c) Até 60 dias após as operações serem dadas por findas.

Assembleia da República, 5 de Junho de 2002. - Os Deputados do PS: Marques Júnior - José Medeiros Ferreira - Miranda Calha - Acácio Barreiro - Alberto Costa - Vitalino Canas - José Saraiva - Ascenso Simões - José Magalhães.

PROJECTO DE LEI N.º 53/IX
APROVA O REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS ENTRE 16 E 21 ANOS

Exposição de motivos

Satisfazendo a injunção constante do artigo 9.º do Código Penal, institui-se, pelo presente diploma, um regime penal, específico para jovens de idade compreendida entre os 16 e os 21 anos.
São várias as razões que militam a favor deste regime.
Como se sabe, as estatísticas relativas a países ocidentais revelam que se verificou um aumento significativo da criminalidade depois da II Guerra Mundial.
Para muitos observadores a criminalidade .juvenil foi, em grande parte, responsável por este fenómeno.
Sendo difícil formular um juízo rigoroso sobre a situação portuguesa, por serem escassos e de difícil leitura os indicadores, não é ousado pensar que a delinquência juvenil possui, entre nós, características semelhantes às que foram detectadas noutros países.
Esta consideração obriga a procurar as respostas justificadas por um problema de indiscutível dimensão social.
Encontradas as reacções que melhor parecem adequar-se à prática, por menores, de factos qualificados pela lei como crime, há que encarar a situação dos jovens adultos.
Um pouco por todo o lado tem-se vindo a concluir que, embora os jovens adultos não devam ter um estatuto jurídico próprio, porquanto são já penalmente responsáveis - o direito dos jovens delinquentes corresponde como que a uma "parede falsa" entre o direito dos menores e o dos adultos - as representações sociais e as aquisições científicas apontam para a necessidade de lhes serem aplicadas soluções diferenciadas.
O direito penal dos jovens adultos surge, assim, como categoria própria, envolvendo um ciclo de vida.
Corresponde a uma fase de latência social que faz da criminalidade um fenómeno efémero e transitório.
Observa-se, com efeito, nas sociedades modernas, que o acesso à idade adulta não se processa como antigamente, através de ritos de passagem, como eram o fim da escolaridade, o serviço militar ou o casamento, que representavam um "virar de página" na biografia individual. O que ocorre, hoje, é uma fase de autonomia crescente face ao meio parental e de dependência crescente face à sociedade que faz dos jovens adultos uma categoria social heterogénea, alicerçada em variáveis tão diversas como são o facto de o jovem ter ou não autonomia financeira, possuir ou não uma profissão, residir em casa dos pais ou ter casa própria.
O acesso à idade adulta tende, desta forma, a realizar-se por patamares sucessivos.
Este período de latência social - em que o jovem escapa ao controlo escolar e familiar sem se comprometer com novas relações pessoais e profissionais - potencia a delinquência, do mesmo modo que, a partir do momento em que o jovem assume responsabilidades e começa a exercer os papéis sociais que caracterizam a idade adulta, regride a hipótese de condutas desviantes.
É este carácter transitório da delinquência juvenil que, se se quer evitar a estigmatização, deve ter-se presente ao modelar o sistema de reacções.
Nesta linha, o diploma consagra duas ideias fundamentais:

1 - A primeira consiste em assumir que os cidadãos maiores de 16 anos, sendo considerados imputáveis, estão sujeitos ás normas penais e é perante elas que devem responder. Coerentemente com a ideia da separação essencial dos sistemas penal e tutelar educativo, rompe-se com a tradição que o artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro, representava, permitindo, embora com baixíssimos coeficientes de execução, que fossem aplicadas medidas tutelares educativas a jovens adultos.
Tal como se concebem, as medidas tutelares educativas são destituídas do carácter punitivo típico das penas, sendo diferentes os postulados em que repousam. A diferente racionalidade dos dois sistemas encontra, aliás, nos jovens adultos, um momento especial de tensão, sendo tão naturais os problemas de sobreposição e de conflitos que se suscitam (equacionados no diploma que estabelece o regime de medidas tutelares educativas), como perfeitamente claros os critérios que lhes demarcam as fronteiras, ancorados que se encontram num elemento formal - a idade.
2 - A segunda ideia é a de evitar, na medida do possível, a aplicação de penas de prisão a jovens adultos.
Comprovada a natureza criminógenea da prisão sabe-se que os seus malefícios se exponenciam nos jovens adultos, já porque se trata de indivíduos particularmente influenciáveis, já porque a pena de prisão, ao retirar o jovem do meio em que é suposto ir inserir-se progressivamente, produz efeitos dessocializantes devastadores.
Aquela finalidade realiza-se, por várias formas.
Desde logo, ao nível da criminalidade geral, permitindo-se a atenuação especial da pena quando o tribunal considerar que a idade, no momento da prática do facto, por si ou associada a outras circunstâncias, anteriores ou posteriores ao crime ou contemporâneas dele, diminui por forma acentuada a ilicitude, a culpa do agente ou a necessidade da pena.
No que diz respeito à liberdade condicional, baixam-se os limiares de cumprimento de pena previstos no Código Penal, o que fica em consonância com a noção de tempo etário, com a maior capacidade de reintegração social dos

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jovens adultos e com a etiologia de uma criminalidade intrinsecamente associada a ciclos de vida. A manutenção dos pressupostos estabelecidos no Código Penal significa, por outro lado, que se deixaram incólumes os mecanismos de prevenção e de defesa social.
Já ao nível da pequena e da média criminalidade, o diploma vai no sentido da aplicação de penas de substituição. Em primeiro lugar, alargando o âmbito de aplicação das penas de multa, de prestação de trabalho a favor da comunidade e de admoestação, bem como prevendo um sistema mais flexível para a conversão da multa não paga. Em segundo lugar, criando três "novas" penas de substituição: a colocação por dias livres em centro de detenção, a colocação em centro de detenção em regime de semi-internato e o internamento em centro de detenção.
Quer evitar-se a aplicação da pena de prisão, ampliando o número de penas de substituição detentivas e adequando-as às especificidades dos jovens adultos. Em vez da prisão por dias livres e do regime de semidetenção, prevê-se a pena de colocação por dias livres em centro de detenção e a colocação em centro de detenção em regime de semi-internato.
Estas penas substituem uma pena de prisão aplicada, respectivamente, em medida não superior a seis meses e a três anos, consistindo a primeira num internamento descontínuo, por períodos correspondentes a fins-de-semana e a segunda numa privação de liberdade, de modo a que o jovem possa sair, sem acompanhamento, para exercer, no exterior, actividades escolares laborais, formativas, culturais ou desportivas. Assim, também o internamento em centro de detenção substitui a pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos.
Os centros de detenção deverão possuir uma configuração arquitectónica que os distinga das prisões, salvaguardados os aspectos relativos a segurança. Localizados em espaços urbanos e disseminados pelo País, desenvolverão o objectivo de abertura à comunidade, sem o qual, em rigor, nenhuma política criminal adquirirá consistência neste domínio.
Prevê-se ainda que, quando aplicada a jovens adultos, a pena de prisão é, em qualquer caso, executada em estabelecimentos especificamente destinados a jovens ou em secções de estabelecimentos prisionais comuns afectadas a esse fim. Esta diferenciação permitirá a reorientação da execução das penas no que respeita a matérias que a experiência revelou problemáticas, nomeadamente a alfabetização e a escolaridade, a iniciação de actividades laborais e de formação profissional, o apoio e enquadramento psicológico, a toxicodependência e a constituição de comunidades de interesses.
Nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de lei:

Capítulo I
Disposições gerais

Artigo 1.º
(Âmbito de aplicação)

1 - O presente diploma aplica-se a jovens que praticam crimes.
2 - Considera-se jovem o agente que, à data da prática do facto, tem idade compreendida entre os 16 e os 21 anos.
3 - O disposto no presente diploma não é aplicável a jovens penalmente inimputáveis em razão de anomalia psíquica.

Artigo 2.º
(Legislação subsidiária)

São aplicáveis as normas do Código Penal e do Código de Processo Penal em tudo o que não for contrariado pelo presente diploma.

Capítulo II
Penas

Artigo 3.º
(Penas aplicáveis)

1 - Salvo as penas de prisão por dias livres e regime de semidetenção, aplicam-se ao jovem as penas previstas no Código Penal.
2 - Para além das penas previstas no número anterior, aplicam-se ainda ao jovem as seguintes penas:

a) Colocação por dias livres em centro de detenção;
b) Colocação em centro de detenção em regime de semi-internato, adiante designada por colocação em semi-internato;
c) Internamento em centro de detenção.

3 - As penas previstas no n.º 2 são aplicáveis ao jovem que não tiver completado 21 anos à data da decisão em 1.ª instância, ou, independentemente da idade, quando a pena aplicada possa ser cumprida até o jovem atingir os 26 anos.

Artigo 4.º
(Atenuação especial da pena)

1 - O tribunal atenua especialmente a pena quando considerar que a idade do agente, no momento da prática do facto, por si ou associada a outras circunstâncias, anteriores ou posteriores ao crime ou contemporâneas dele, diminui por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.
2 - Se houver lugar à atenuação especial da pena, observa-se o disposto no artigo 73.º- do Código Penal, com as seguintes alterações:

a) O limite máximo da pena de prisão é reduzido a metade;
b) O limite mínimo da pena de prisão é reduzido a um sexto se for igual ou superior a três anos e ao mínimo legal se for inferior.

Artigo 5.º
(Dispensa de pena)

Quando o crime for punível com pena de prisão não superior a um ano, ou só com multa não superior a 240 dias, pode o tribunal declarar o arguido culpado mas não aplicar qualquer pena se se verificarem os pressupostos previstos no n.º 1 do artigo 74.º do Código Penal.

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Artigo 6.º
(Substituição da pena de prisão)

A pena de prisão aplicada em medida não superiora um ano é substituída por pena de multa, por outra pena não privativa de liberdade; ou por uma das penas previstas no n.º 2 do artigo 3.º, excepto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes.

Artigo 7.º
(Colocação por dias livres em centro de detenção)

1 - A pena de prisão aplicada em medida não superior a seis meses que não deva ser substituída por multa ou por outra pena não privativa de liberdade, é cumprida em dias livres em centro de detenção, sempre que o tribunal concluir que, no caso, esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2 - A colocação por dias livres em centro de detenção consiste no internamento descontínuo, por períodos correspondentes a fins-de-semana, não podendo exceder 36 períodos.
3 - Durante os períodos de internamento não são autorizadas saídas.

Artigo 8.º
(Colocação em semi-internato)

1 - A pena de prisão aplicada em medida não superior a três anos, que não deva ser substituída por multa ou por outra pena não privativa de liberdade nem cumprida em dias livres em centro de detenção, pode ser executada em semi-internato pelo tempo que lhe corresponderia se fosse cumprida em internamento em centro de detenção, se o condenado nisso consentir.
2 - A colocação em semi-internato consiste na privação de liberdade por forma a que o jovem possa sair sem acompanhamento para exercer, no exterior, actividades escolares, laborais, formativas, culturais ou desportivas.

Artigo 9.º
(Internamento em centro de detenção)

1 - A pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos, que não deva ser substituída por multa, por outra pena não privativa de liberdade, nem cumprida em dias livres ou em semi-internato, é cumprida em internamento em centro de detenção, excepto se a execução da prisão for exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes.
2 - O internamento em centro de detenção consiste na privação de liberdade por forma a que o jovem, para além das actividades que está obrigado a exercer no cendro, possa sair, com ou sem acompanhamento, para exercer no exterior actividades escolares, laborais, formativas, culturais ou desportivas.
3 - A pena de internamento em centro de detenção tem a duração mínima de um mês e máxima de cinco anos.

Artigo 10.º
(Prestação de trabalho a favor da comunidade)

1 - Se ao jovem dever ser aplicada pena de prisão em medida não superior a dois anos, o tribunal substituí-a por prestação de trabalho a favor da comunidade, sempre que concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2 - A prestação de trabalho é fixada entre 24 e 500 horas.

Artigo 11.º
(Admoestação)

Se ao jovem dever ser aplicada pena de multa em medida não superior a 240 dias, pode o tribunal limitar-se a proferir uma admoestação.

Artigo 12.º
(Conversão da multa não paga)

1 - Quando tiver sido aplicada pena de multa, que não for substituída por trabalho nem paga voluntária ou coercivamente, o juiz pode, de acordo com o critério de escolha da pena previsto no artigo 70.º do Código Penal, substituí-la por outra pena ou ordenar o cumprimento da pena de prisão aplicada na sentença ou da prisão subsidiária, nos termos do artigo 49.º, n.º 1, do Código Penal.
2 - O juiz determina o tempo de pena que considerar adequado, tendo em atenção a pena já cumprida e a pena substituída.
3 - Quando ordenar o cumprimento de pena de prisão, a sua duração não pode ser, em caso algum, superior ao tempo de prisão substituída.
4 - A prisão subsidiária não pode ultrapassar o tempo correspondente aos dias de multa, reduzidos a dois terços.

Artigo 13.º
(Liberdade condicional)

Os prazos estabelecidos nos n.os 2, 3 e 4 do artigo 61.º do Código Penal são reduzidos, no primeiro caso, para um terço da pena e, no mínimo, seis meses e nos restantes casos, para metade da pena.

Artigo 14.º
(Revogação das penas)

1 - Em caso de revogação, o juiz substitui a pena efectivamente aplicada por outra pena de substituição que considerar mais adequada ou ordena o cumprimento da pena de prisão, de acordo com o critério de escolha da pena previsto no artigo 70.º do Código Penal.
2 - O juiz determina o tempo que considerar adequado, tendo em atenção a pena já cumprida e a pena de prisão aplicada na sentença.
3 - Quando ordenar o cumprimento da pena de prisão, a sua duração não pode ser, em caso algum, superior ao tempo de prisão substituída.

Capítulo III
Execução da pena de prisão

Artigo 15.º
(Execução da pena de prisão)

Quando aplicada a jovens adultos a pena de prisão é, em qualquer caso, executada em estabelecimentos especificamente

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destinados a jovens ou em secções de estabelecimentos prisionais comuns afectadas a esse fim.

Capítulo IV
Execução das penas de colocação e de internamento em centro de detenção

Artigo 16.º
(Execução das penas de colocação e de internamento em centro de detenção)

1 - A execução das penas de colocação e de internamento em centro de detenção é regulada em legislação própria.
2 - A execução das penas de colocação e de internamento em centro de detenção pode prolongar-se até o seu destinatário completar 26 anos de idade, momento em que obrigatoriamente cessa.

Artigo 17.º
(Conteúdo da decisão)

1 - A decisão que fixar o cumprimento das penas de colocação e de internamento em centro de detenção especifica os elementos necessários à sua execução, indicando a data do início, e é comunicada, uma vez transitada em julgado, aos serviços competentes para a sua execução.
2 - Nos 10 dias imediatos os serviços competentes para a execução comunicam ao tribunal o centro de detenção em que a pena deve ser cumprida, devendo a indicação facilitar as deslocações do jovem no caso de serem aplicadas penas de colocação e de internamento em centro de detenção.
3 - O início do cumprimento da pena pode ser adiado, mediante autorização do tribunal, pelo tempo que parecer razoável mas nunca excedente a três meses, por razões de saúde do jovem ou da sua vida familiar, escolar ou profissional.

Artigo 18.º
(Plano individual de readaptação social)

1 - No caso de o jovem ser condenado a pena de internamento em centro de detenção de duração superior a três meses, é obrigatória a elaboração de plano individual de readaptação social.
2 - A decisão que aplicar a pena referida no número anterior deve conter o plano individual de readaptação social sempre que o tribunal se encontre habilitado, nesse momento, a organizá-lo.
3 - Quando a decisão não contiver o plano individual de readaptação social ou este dever ser completado, os serviços encarregados da execução procedem à sua elaboração ou reelaboração no prazo de 30 dias, obtendo-se, sempre que possível, o acordo do jovem, e submetem-no à homologação do tribunal.

Artigo 19.º
(Revisão das penas de colocação em centro de detenção)

As penas de colocação em centro de detenção por dias livres e em regime de semi-internato são revistas quando:

a) A sua execução se tiver tornado impossível, por facto não imputável ao jovem;
b) A sua execução se tiver tornado excessivamente onerosa para o jovem;
c) No decurso da execução, a pena se tiver tornado desajustada, por forma que frustre manifestamente os seus fins;
d) O jovem se tiver colocado em situação que inviabilize o cumprimento da pena;
e) O jovem tiver violado, de modo grosseiro ou persistente, os deveres inerentes ao cumprimento da pena;
f) O jovem cometer crime pelo qual venha a ser condenado.

Artigo 20.º
(Efeitos da revisão das penas de colocação em centro de detenção)

1 - Quando proceder à revisão das penas nos termos do artigo anterior, pelas razões indicadas nas alíneas a), b) e c), o tribunal pode:

a) Substituir a pena de colocação em semi-internato pela de colocação por dias livres em centro de detenção, desde que esta seja legalmente admissível, pelo tempo que considerar adequado, tendo em atenção o tempo de pena já cumprido;
b) Suspender a execução da pena de colocação em centro de detenção aplicada, pelo tempo que falta cumprir, sob condição de o jovem não cometer qualquer crime.

2 - Se o jovem cometer crime durante o tempo de suspensão decretada ao abrigo da alínea c) do número anterior, pelo qual venha a ser condenado, executa-se a pena substituída pelo tempo que falta cumprir. É correspondentemente aplicável o disposto no artigo 57.º, n.os 1 e 2, do Código Penal.
3 - Quando proceder à revisão das penas, nos termos do artigo anterior, pelas razões indicadas nas alíneas d), e) e f) do mesmo artigo, o tribunal pode:

a) Advertir solenemente o jovem para a gravidade do seu comportamento e para as suas eventuais consequências;
b) Prorrogar o tempo de pena aplicada até metade do prazo inicialmente fixado, sem exceder os prazos máximos das penas previstos na lei;
c) Revogar as penas aplicadas.

4 - A revogação das penas de colocação em centro de detenção determina:

a) O cumprimento da pena de internamento em centro de detenção, pelo tempo considerado adequado, tendo em atenção o tempo de pena já cumprido e o tempo de internamento em centro de detenção que lhe teria cabido cumprir;
b) O cumprimento da pena de prisão que lhe teria sido aplicada, pelo tempo considerado adequado, tendo em atenção o tempo de pena já cumprido.

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Artigo 21.º
(Revisão da pena de internamento em centro de detenção)

1 - A pena de internamento em centro de detenção é revista quando se verificar qualquer das situações indicadas nas alíneas d), e) e f) do artigo 19.º.
2 - Quando proceder à revisão nos termos do número anterior, o tribunal pode proceder de acordo com o previsto no artigo 20.º, n.º 3, alíneas a), b) e c).
3 - A revogação da pena determina o cumprimento da pena de prisão que lhe teria sido aplicada, pelo tempo considerado adequado, tendo em atenção o tempo de pena já cumprido.

Artigo 22.º
(Competência para a revisão)

1 - Cabe ao tribunal competente para a execução da pena nos termos do artigo 470.º do Código de Processo Penal, proceder à revisão nos termos dos artigos anteriores.
2 - O tribunal procede à revisão oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, do jovem ou do seu representante legal, se for menor, ou sob proposta dos serviços competentes para a execução.

Artigo 23.º
(Dever de informação)

1 - Os serviços competentes para a execução informam o tribunal nos termos definidos e com a periodicidade estabelecida na lei ou sempre que se verifiquem circunstâncias susceptíveis de fundamentar a revisão das penas, podendo propô-la em conformidade.
2 - Para além do disposto no número anterior, no decurso da execução das penas os serviços competentes para a execução informam ainda o tribunal nos termos e com a periodicidade que este determinar.

Artigo 24.º
(Processo de revisão)

1 - Quando entender dever proceder à revisão, o tribunal solicita ao centro de detenção o envio, no prazo de 15 dias, das informações, relatório ou parecer que entenda necessários ou realiza as diligências que se afigurem com interesse para a revisão.
2 - Quando entenderem dever propor a revisão das penas, os serviços competentes para a execução procedem nos termos do n.º 1 do artigo anterior.
3 - O tribunal decide por despacho, depois de recolhida a prova, precedendo parecer do Ministério Público e audição do jovem, que é obrigatoriamente assistido por advogado.
4 - O despacho do tribunal é comunicado ao jovem e ao director do centro de detenção, que dele recebem cópias.
5 - A condenação pela prática de crime cometido durante o cumprimento da pena é imediatamente comunicada ao tribunal competente para a execução, sendo-lhe remetida cópia.

Artigo 25.º
(Liberdade sob orientação e acompanhamento)

1 - A aplicação da liberdade sob orientação e acompanhamento depende sempre do consentimento do jovem.
2 - O tribunal de execução de penas coloca o jovem em liberdade sob orientação e acompanhamento quando se encontrar cumprido um terço das penas de colocação em centro de detenção em regime de semi-internato ou de internamento em centro de detenção e no mínimo dois meses, se for fundadamente de esperar, atenta a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da pena, que, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes.
3 - A liberdade sob orientação e acompanhamento tem uma duração nunca superior ao tempo de pena que falte cumprir.

Artigo 26.º
(Regime da liberdade sob orientação e acompanhamento)

1 - O tribunal de execução de penas pode impor ao jovem em liberdade sob orientação e acompanhamento:

a) O cumprimento de regras de conduta, nos termos do artigo 52.º do Código Penal;
b) O cumprimento de obrigações, nomeadamente previstas no artigo 54.º, n.º 2, do Código Penal ou a de frequência do centro de detenção durante um determinado número de horas por semana, não superior a seis.

2 - É correspondentemente aplicável à liberdade sob orientação o acompanhamento o disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 53.º e no artigo 54.º do Código Penal.

Artigo 27.º
(Falta de cumprimento das condições da liberdade sob orientação e acompanhamento)

1 - Se, durante o período de liberdade sob orientação e acompanhamento, o jovem, culposamente, deixar de cumprir qualquer dos deveres ou regras de conduta impostos, ou não corresponder ao plano de readaptação, o tribunal de execução de penas pode:

a) Advertir solenemente o jovem para a gravidade do seu comportamento e para as suas eventuais consequências;
b) Modificar os deveres, regras de conduta ou obrigações impostas ou o plano individual de readaptação, nomeadamente aumentando até 12 horas o período de frequência semanal no centro.

2 - A liberdade sob orientação e acompanhamento é revogada sempre que, no seu decurso, o jovem:

a) Violar, grosseira ou repetidamente, os deveres, regras de conduta ou obrigações impostas ou o plano individual de readaptação social; ou
b) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado e revelar que as finalidades que estavam na base da liberdade sob orientação e acompanhamento não puderam, por meio dela, ser alcançadas.

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3 - A revogação determina a execução da pena de colocação ou de internamento em centro de detenção que tenha sido aplicada, ainda não cumprida.
4 - O despacho do tribunal de execução de penas que revogar a liberdade sob orientação e acompanhamento é notificado ao jovem e são remetidas cópias ao director do centro de detenção e aos serviços competentes para a execução.

Artigo 28.º
(Extinção da pena)

1 - A pena de colocação em centro de detenção é declarada extinta se, decorrido o tempo de pena ou o período da liberdade sob orientação e acompanhamento, não houver motivos que possam conduzir à sua revogação.
2 - Se, findo o tempo de pena ou o período da liberdade sob orientação e acompanhamento, se encontrar pendente processo por crime ou incidente que possa determinar a prorrogação ou revogação da pena ou a revogação da liberdade sob orientação e acompanhamento, a pena só é declarada extinta quando o processo ou o incidente findarem e não houver lugar à revogação ou à prorrogação da pena ou à revogação da liberdade sob orientação e acompanhamento.

Artigo 29.º
(Processo da liberdade sob orientação e acompanhamento)

1 - Até 30 dias antes da data admissível para a liberdade sob orientação e acompanhamento, o centro de detenção remete ao tribunal de execução de penas:

a) Parecer fundamentado sobre a concessão da liberdade sob orientação e acompanhamento, elaborado pelo director do estabelecimento;
b) Relatório, elaborado pelos serviços de reinserção social, contendo uma análise dos efeitos da pena na personalidade do jovem, do seu enquadramento familiar e profissional e da sua capacidade e vontade de se readaptar à vida social, bem como outros elementos que aqueles serviços considerem com interesse para a decisão sobre a liberdade sob orientação e acompanhamento.

2 - Oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público ou do jovem, ou dos seus pais ou representante legal quando for menor, o tribunal solicita quaisquer outros relatórios ou documentos ou realiza diligências que se afigurem com interesse para a decisão sobre a liberdade sob orientação e acompanhamento, nomeadamente a elaboração ou a actualização, de forma a adaptá-lo à situação do jovem em liberdade, do plano individual de readaptação, quando este tenha sido já elaborado, pelos serviços de reinserção social.

Artigo 30.º
(Renovação da instância)

1 - Quando a liberdade sob orientação e acompanhamento for denegada, o tribunal de execução de penas deve reapreciar a situação do jovem, de seis em seis meses, contados desde o terço da pena.
2 - O tribunal de execução de penas, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, do jovem ou dos seus pais ou representante legal quando aquele for menor, pode reapreciar a situação do jovem a quem a liberdade sob orientação e acompanhamento tenha sido denegada, independentemente de decorrido o prazo fixado no número anterior.
3 - Quando a liberdade sob orientação e acompanhamento for revogada e a colocação em centro de detenção houver ainda de prosseguir por mais de seis meses, o tribunal de execução de penas deve reapreciar a situação do jovem decorrido aquele período.
4 - Até 30 dias antes da data admissível para a reapreciação da liberdade sob orientação e acompanhamento, o centro de detenção remete ao tribunal de execução de penas, nos termos do artigo 29.º, n.º 1, novo parecer e relatório ou a actualização deste, bem como outros elementos de interesse para a decisão. É obrigatório o envio de plano individual de readaptação quando a liberdade sob orientação e acompanhamento tiver sido revogada.
5 - Quando a reapreciação da liberdade sob orientação e acompanhamento tiver lugar oficiosamente ou a requerimento, o tribunal de execução de penas solicita ao centro de detenção o envio, no prazo de 15 dias, da documentação a que se refere o no anterior.
6 - É correspondentemente aplicável o disposto no artigo 31.º, n.os 4, 5 e 6.

Artigo 31.º
(Decisão sobre a liberdade sob orientação e acompanhamento)

1 - Até 10 dias antes da data admissível para a liberdade sob orientação e acompanhamento, o Ministério Público emite parecer sobre a sua concessão.
2 - Antes de proferir despacho sobre a concessão da liberdade sob orientação e acompanhamento, o tribunal de execução de penas ouve o jovem, nomeadamente para obter o seu consentimento.
3 - O despacho que deferir a liberdade sob orientação e acompanhamento, além de descrever os fundamentos da concessão, especifica o período de duração, o plano individual de readaptação ou, quando este não exista, os deveres, regras de conduta ou obrigações a que fica sujeito o jovem, sendo este notificado e recebendo cópia antes de libertado.
4 - O despacho que negar a liberdade sob orientação e acompanhamento é notificado ao jovem e ao director do centro.
5 - Do despacho que deferir a liberdade sob orientação e acompanhamento é remetida cópia ao director do centro de educação, aos serviços de reinserção social a quem cabe a orientação e acompanhamento do jovem e a outras instituições que o tribunal determinar.
6 - Quando a decisão não contiver o plano de readaptação social ou este dever ser actualizado, os serviços de reinserção social a quem cabe a orientação e o acompanhamento do jovem, procedem à sua elaboração ou actualização, ouvido o jovem, no prazo de 15 dias, e submetem-no à homologação do tribunal de execução de penas.

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Capítulo V
Disposições finais e transitórias

Artigo 32.º
(Revogação)

São revogados o Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro, e o Decreto-Lei n.º 90/83, de 16 de Fevereiro.

Artigo 33.º
(Entrada em vigor)

1 - A presente lei entra em vigor conjuntamente com a legislação a que se refere o artigo 16.º, n.º 1.
2 - Exceptuam-se do disposto no número anterior os artigos 1.º, 2.º, 3.º, n.º 1, 2.ª parte, 4.º, 5.º, 6.º, 10.º, 11.º, 12.º, 13.º, 14.º e 15.º, os quais entram em vigor no dia 1 de Janeiro de 2003.

Assembleia da República, 31 de Maio de 2002. - Os Deputados do PS: Vera Jardim - António Costa - Alberto Martins - José Magalhães - Jorge Lacão - Ascenso Simões.

PROJECTO DE LEI N.º 54/IX
FUNDO DE COMPENSAÇÃO SALARIAL DOS PROFISSIONAIS DA PESCA (ALTERA O DECRETO-LEI N.º 311/99, DE 10 DE AGOSTO)

Exposição de motivos

O Governo decidiu publicar o Decreto-Lei n.º 311/99, de 10 de Agosto, que criou o Fundo de Compensação Salarial dos Profissionais da Pesca, diploma que, sem prejuízo de ter introduzido um avanço legislativo importante, se revelou demasiado restritivo, no plano material, por não contemplar os pescadores de águas interiores. Por outro lado, os montantes da compensação são muito baixos e são liquidáveis a partir dos períodos mínimos considerados no seu âmbito material, o que faz com que os profissionais sejam apenas compensados a partir do 11.º dia ou do 31.º dia de imobilização, facto que o Bloco de Esquerda considera injusto.
É este diploma que o Bloco de Esquerda propõe que seja alterado, de forma a que, nas situações materiais de imobilização temporária que contemplam as compensações salariais, beneficiem os profissionais da pesca e dos trabalhadores de apoio à frota em terra, durante a totalidade do tempo de imobilização.
Por outro lado, e para que o direito ao fundo de garantia salarial seja salvaguardado, defendemos que o seu pagamento não deve depender das "disponibilidades orçamentais do fundo", tal como previsto no n.º 3 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 311/99, mas que deve ser assegurado, em caso de insuficiência do Fundo, por transferência do Orçamento do Estado, fonte de receita do Fundo prevista na alínea e) do artigo 12.º do mesmo diploma.
Desta forma, o Fundo pode cumprir o seu principal objectivo: apoiar os profissionais da pesca, de águas oceânicas e interiores, de rios e rias, desde o primeiro dia de paragem e, em regra, por todo o tempo de imobilização.
Assim sendo, a Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) dos artigo 161.º da Constituição da República, o seguinte:

Artigo 1.º

Os artigos 3.º, 4.º e 5.º do Decreto-Lei n.º 311/99, de 10 de Agosto, sofre as seguintes alterações:

"Artigo 3.º
(Âmbito pessoal)

São abrangidos pelo disposto no presente diploma os profissionais da pesca, inscritos marítimos, titulares de Cédula Marítima, exercendo a sua actividade em regime de contrato individual de trabalho e exclusividade a bordo de embarcações de pesca licenciadas para águas oceânicas e interiores, que se encontrem imobilizadas pelos motivos previstos no artigo seguinte, assim como os profissionais que exerçam actividade de apoio à frota em terra, nas mesmas embarcações.

Artigo 4.º
(Âmbito material)

1 - (...)

a) Catástrofe natural que origine a paragem das embarcações;
b) Interdição de pescar determinada por motivos excepcionais, nomeadamente de preservação de recursos, de defesa do ambiente, ou de protecção da saúde pública;
c) Mau tempo que origine falta de segurança na barra, praias e no mar, implicando o seu encerramento e a não saída para a faina durante, pelo menos, sete dias consecutivos, no caso de embarcações até 12 metros;
d) Paragem por avaria comprovada da embarcação, no caso de embarcações até 12 metros.

2 - (...)
3 - Para efeitos de aplicação do constante no n.º 1 do presente artigo, o armador da embarcação abrangida pelo referido na alínea d) deverá apresentar declaração, da entidade seguradora, comprovativa de que não recebeu qualquer compensação referente aos dias de paragem por avaria.
4 - Se o armador receber compensação da entidade seguradora pelos dias de pesca perdidos devido a avaria deverá pagar aos trabalhadores a respectiva compensação.
5 - Caso se verifique a imobilização das embarcações até 12 metros de acordo com o disposto em 1, a atribuição da compensação salarial será assegurada pelo Fundo e no caso de insuficiência deste será sempre assegurado pelo Orçamento do Estado.
6 - No caso das embarcações superiores a 12 metros que sofram uma imobilização forçada, determinada por avaria técnica, o armador deverá pagar aos trabalhadores uma compensação que equivalha, no mínimo, ao salário mínimo nacional.

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Artigo 5.º
(Montante da compensação)

1 - O valor da compensação pecuniária diária não deve ultrapassar uma 20.ª parte da remuneração média mensal auferida, em concreto, nos três meses imediatamente anteriores, nem ser inferior a uma 20.ª parte do salário mínimo nacional aplicado à indústria.
2 - (...)
3 - A compensação salarial é devida desde o 1.º dia e por todo o período de paragem".

Assembleia da República, 19 de Abril de 2002. - O Deputado do BE Francisco Louçã.

PROJECTO DE LEI N.º 55/IX
ALTERAÇÃO DO DECRETO-LEI N.º 199/99, DE 8 DE JUNHO (REVÊ AS TAXAS CONTRIBUTIVAS DO REGIME GERAL DA SEGURANÇA SOCIAL DOS TRABALHADORES POR CONTA DE OUTREM)

Exposição de motivos

Os pescadores ao longo dos tempos sempre foram profundamente prejudicados. Nos anos 50 foram lançadas as "Casas dos Pescadores", para a construção das quais os pescadores descontavam uma parte do seu salário, tal como para a construção dos próprios bairros dos pescadores. À excepção do que se passava em duas Casas dos Pescadores, os pescadores só tinham direito à acção médica social e para isso pagavam um selo.
Em Setembro de 1972 foi lançada a Caixa de Previdência e Abono de Família dos Profissionais da Pesca, com dois regimes: um, o Regime Geral para os Trabalhadores da Pesca Industrial, Bacalhau, Arrasto Costeiro, Mauritânia e Atlântico Sul e todos que quisessem aderir; o outro Regime era um regime provisório de 10% sobre o bruto do pescado vendido em lota, regime que foi aplicado à grande maioria dos trabalhadores da pesca, o qual era muito prejudicial aos pescadores na reforma e na doença.
Aquando da integração da Caixa de Previdência e Abono de Família dos Profissionais da Pesca no Regime Geral, os sindicatos e os trabalhadores lutaram para que houvesse alteração ao regime da segurança social, o que não veio a acontecer, mantendo-se hoje o mesmo regime especial em lei.
Em 1998 foi lançado um grande debate sobre este tema com a participação de todos os parceiros sociais: associações de armadores, sindicatos do sector e trabalhadores. Tudo levava a crer que se iria verificar a mudança tão desejada pelos trabalhadores da pesca, o que não veio acontecer por vontade política e por mudança do Secretário de Estado das Pescas.
Como é possível que no mesmo sector de actividade ("Cerco") na mesma localidade haja duas modalidades de Regime de Segurança Social, um de Regime Geral e outro de desconto de 10% sobre a venda bruta do pescado em lota?
Como é possível que, no sector da "Pesca Costeira", que faz pesca do largo industrial, só se desconte sobre os 10%? É escandaloso insistir em consagrar em lei o que é prejudicial para os pescadores. Os pescadores abrangidos pelo regime dos 10% têm reformas miseráveis devido a esta forma de desconto.
O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda considera que é preciso dignificar o pescador e a sua faina, e garantir a retribuição e integração num regime mais favorável e, assim, o direito dos pescadores a uma reforma digna.
Assim sendo, a Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) dos artigos n.º 161 da Constituição da República, o seguinte:

Artigo 1.º
Âmbito

A presente lei altera o artigo 34.º do Decreto-Lei n.º 199/99 que "Revê as taxas contributivas do regime geral de segurança social dos trabalhadores por conta de outrem".

Artigo 2.º
Alterações

O artigo 34.º do Decreto-Lei n.º 199/99 passa a ter a seguinte redacção:

"Artigo 34.º
Trabalhadores da pesca local

1 - A taxa contributiva relativa aos trabalhadores inscritos marítimos que exercem actividade na pesca local, quando se verifique o pagamento das contribuições nos termos do regime geral, é de 29,00 %, sendo, respectivamente, de 21,00 % e de 8,00 % para as entidades empregadoras e trabalhadores.
2 - Todos os trabalhadores inscritos marítimos dos sectores de pesca costeira e do largo passam a integrar o regime geral.
3 - Os trabalhadores inscritos marítimos portugueses das empresas mistas, cujos navios descarregam o pescado em portos portugueses, deverão igualmente integrar o regime geral.
4 - Os trabalhadores inscritos marítimos portugueses, que trabalhem em navios de conveniência, cujos armadores sejam portugueses, integram o regime geral.
5 - Os trabalhadores inscritos marítimos portugueses, cujos navios descarregam o pescado em portos estrangeiros, deverão integrar o regime geral".

Artigo 3.º
Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no ano subsequente à sua aprovação.

Assembleia da República, 19 de Abril de 2002. - O Deputado do BE Francisco Louçã.

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PROJECTO DE LEI N.º 56/IX
RECUPERAÇÃO DE EDIFICAÇÕES DEVOLUTAS E DEGRADADAS EM CENTROS E NÚCLEOS HISTÓRICOS OU ANTIGOS

Exposição de motivos

Os centros e núcleos históricos ou antigos dos aglomerados urbanos vêm continuamente sofrendo uma degradação que a manter-se provocará uma irreversível perda de um património fundamental em termos económicos, de ambiente urbano, de natureza cultural e de identidade das suas gentes.
Muitas das edificações que concorrem para esta situação encontram-se devolutas, fruto de negligência, incapacidade económica ou de propósitos de mera especulação imobiliária.
Embora existam alguns instrumentos legais que permitam intervir em determinados segmentos do tecido urbano, o Regulamento Geral das Edificações Urbanas ou a chamada "lei dos solos", a verdade é que a experiência evidencia que os municípios não têm, em muitos casos, capacidade financeira para fazer face aos investimentos necessários.
Esta situação tem de ser alterada e é possível encontrar soluções equilibradas que minimizem a inoperância das normas legais existentes, e que não esqueçam os interesses legítimos dos titulares dos direitos de propriedade e de outros direitos e garantias reais sobre as edificações devolutas.
Assim, é conferido aos municípios a possibilidade de realizar obras a benefício de empréstimos que não concorrem com os limites legais de endividamento, sendo ressarcidos, caso não sobrevenha pagamento voluntário, no âmbito de um processo de execução fiscal simplificado e mais expedito em que intervêm, promovendo a alienação em hasta pública dos prédios objecto de beneficiação.
Caso o valor das obras e encargos seja superior a 70% do preço da alienação do prédio beneficiado, caberá ao município suportar a diferença. Desta forma, pretende-se disponibilizar a favor dos proprietários e dos superficiários uma compensação não inferior a 30% do valor da alienação.
Para viabilizar a eficácia desta proposta, concede-se aos municípios um privilégio imobiliário especial sobre os prédios que beneficiem, através de normas especiais, de derrogação e alteração ao processo de execução fiscal.
Proíbe-se ainda a celebração de negócios jurídicos entre vivos que tenham por objecto imediato a fruição de imóveis devolutos degradados, tentando-se assim assegurar a efectivação do crédito do município e suscitar por parte dos titulares dos prédios uma atitude de maior diligência que acabe por evitar a necessidade de intervenção municipal.
Nestes termos, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º
Âmbito

A beneficiação por parte das câmaras municipais, em substituição dos respectivos proprietários e/ou superficiários, adiante designados titulares dos imóveis ou apenas titulares, de prédios urbanos localizados em centros ou núcleos históricos ou antigos que se encontrem devolutos fica sujeito ao regime deste diploma.

Artigo 2.º
Classificação e delimitação dos centros e núcleos históricos

1 - Consideram-se centros ou núcleos históricos ou antigos os assim classificados em plano municipal de ordenamento do território, independentemente da designação adoptada.
2 - Inexistindo plano municipal de ordenamento do território ou sendo este omisso, os centros ou núcleos históricos ou antigos são delimitados por deliberação da assembleia municipal, sob proposta da câmara municipal, precedida de inquérito público pelo período de 30 dias.
3 - A certidão de deliberação, acompanhada da planta que ilustre a delimitação, é remetida pela câmara municipal à Direcção-Geral do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano para efeitos de registo, competindo a esta última promover a correspondente publicação na II Série do Diário da República, no prazo de 20 dias contado da recepção do pedido de registo.

Artigo 3.º
Empréstimos

1 - Os municípios podem contrair empréstimos junto das instituições autorizadas a conceder crédito para intervir em prédios devolutos, devendo o contrato incluir a identificação de cada um dos prédios a beneficiar e a estimativa do custo provável das respectivas obras, acrescido de um máximo de 20%.
2 - A contratação dos empréstimos deve ser precedida da consulta a um mínimo de três instituições autorizadas de crédito.
3 - Os empréstimos beneficiam de um período de carência até dois anos e o seu prazo não pode exceder quatro anos, sendo contudo exigível a amortização de capital, na parte que lhes couber, no prazo de 60 dias, contado, consoante os casos:

a) Da data do pagamento das obras;
b) Da data do conhecimento do trânsito em julgado da sentença referida no n.º 4 do artigo 18.º.

4 - Os empréstimos contraídos ao abrigo deste diploma não concorrem para os limites de endividamento dos municípios.

Artigo 4.º
Prédios devolutos

1 - Para os efeitos do presente diploma, são considerados prédios devolutos os que se encontrem desocupados e aqueles cuja ocupação cesse após a câmara municipal, precedendo vistoria, notificar os respectivos titulares da sua insusceptibilidade de utilização.
2 - Ficam proibidos os negócios jurídicos por acto entre vivos que visem a constituição de usufruto, o uso e habitação, o arrendamento, o comodato ou outra forma de fruição do imóvel após a notificação referida no n.º 1.
3 - São nulos os negócios jurídicos que violem o disposto no número anterior.

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4 - A proibição de celebração dos mencionados negócios jurídicos é objecto de registo, mediante comunicação do presidente da câmara ao conservador do registo predial, instruída com fotocópia autenticada da deliberação ou despacho que reconheça a insusceptibilidade de utilização actual do prédio e com prova da notificação a que alude o n.º 1.
5 - O presidente da câmara poderá ordenar o despejo administrativo, a efectivar no prazo de 30 dias, dos prédios que a câmara municipal reconheça como insusceptíveis de utilização.
6 - O presente diploma não se aplica aos prédios objecto de contratos de arrendamento validamente celebrados.
7 - Os municípios têm legitimidade para arguir a nulidade dos contratos de arrendamento celebrados com preterição das normas legais aplicáveis, mesmo que essa nulidade seja imputável aos arrendatários.
8 - A partir da entrada em vigor deste diploma, os contratos de arredamento que não contenham a menção que se situam fora do centro ou núcleo histórico ou antigo só podem ser celebrados em face de alvará de licença ou autorização de utilização emitida há menos de quatro anos.

Artigo 5.º
Ordem de realização de obras

1 - Verificado, mediante vistoria, que um prédio devoluto se encontra degradado, por apresentar más condições de salubridade, de solidez ou de segurança contra riscos de incêndio ou por o seu estado de conservação prejudicar a imagem urbana, a câmara municipal, com dispensa de audiência prévia, ordena a execução das obras de beneficiação que as circunstâncias impuserem, fixando prazos para o início e conclusão das mesmas pelos respectivos titulares.
2 - É solidária a obrigação dos titulares do imóvel de prover à respectiva conservação e beneficiação.
3 - Da ordem de realização de obras deve constar uma estimativa do custo provável destas.
4 - Se a realização das obras depender de licenciamento municipal, a câmara municipal fixará também o prazo para que a licença seja requerida, mediante pedido devidamente instruído.
5 - A ordem mantém-se válida, continuando a ser exigível mesmo em caso de transmissão da propriedade ou do direito de superfície que se efective após a notificação para a realização das obras.
6 - Se ainda não tiver sido declarada a insusceptibilidade da utilização actual do prédio, com a notificação para a realização das obras, ficam proibidos os negócios jurídicos referidos no n.º 2 do artigo 4.º, sob cominação de nulidade, sendo o pedido de registo a que alude o n.º 4 do mesmo artigo instruído com fotocópia autenticada do acto que ordene aquelas e com prova da respectiva notificação.

Artigo 6.º
Impugnação

1 - Dos actos administrativos pelos quais seja reconhecida a insusceptibilidade de utilização de imóvel, seja ordenado o despejo administrativo, a realização de obras ou a posse administrativa de imóvel para a sua efectivação cabe recurso contencioso para o tribunal administrativo do círculo territorialmente competente, tendo em conta o disposto neste artigo.
2 - Os prazos para impugnação dos actos referidos no número anterior são reduzidos a um terço e correm durante as férias judiciais.
3 - Os processos são considerados urgentes, observando-se o seguinte:

a) Só há lugar a alegações no caso de ser produzida ou requerida prova;
b) O prazo para contestação e para alegações é de 15 dias;
c) É de cinco dias o prazo para vista ao Ministério Público e de 10 dias o prazo para a decisão do juiz.

4 - Os recursos jurisdicionais seguem o regime do artigo 147.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22 de Fevereiro.

Artigo 7.º
Incumprimento da decisão

1 - Se as obras não forem iniciadas ou concluídas nos prazos fixados ou não forem apresentados oportunamente os pedidos de licenciamento, devidamente instruídos, a câmara municipal, mediante despacho do seu presidente, tomará posse administrativa do prédio e promoverá, por empreitada ou administração directa, a execução dos trabalhos em falta.
2 - Poderá ainda a câmara municipal tomar, nos termos do número anterior, posse administrativa do prédio para corrigir os trabalhos que se mostrem desconformes com projecto aprovado ou com as características da edificação a beneficiar.
3 - O acto administrativo que determine a posse administrativa é notificado aos titulares do imóvel nos termos do artigo 19.º.
4 - A posse administrativa efectiva-se mediante auto, no qual é identificado o imóvel e especificadas a data e autoria do acto administrativo referido no número anterior e a data da respectiva notificação.
5 - A posse administrativa mantém-se durante todo o período em que decorrerem as obras, caducando com a conclusão destas.

Artigo 8.º
Posse administrativa

1 - Tomada a posse administrativa do prédio, o presidente da câmara municipal pode requerer ao juiz do tribunal tributário de 1.ª instância o arresto do imóvel a beneficiar, aplicando-se o Código de Procedimento e de Processo Tributário com as necessárias adaptações e as especialidades deste diploma.
2 - A competência territorial do tribunal tributário é determinada em função da localização do prédio.
3 - O arresto é decretado sem dependência de justo receio de insolvência ou de alienação do bem, contando que:

a) O acto administrativo que ordene a realização de obras ou que determine a posse administrativa não seja nulo ou inexistente;

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b) Os titulares do imóvel tenham sido notificados nos termos do artigo 19.º.

4 - Decretado o arresto, a câmara municipal fica constituída como depositária do imóvel.
5 - A apreensão não inibe a realização das obras por qualquer dos titulares ou por usufrutuário.
6 - Os embargos e recursos relativos à providência são entregues na secretaria do tribunal tributário.
7 - Para efeitos de embargos de terceiro, o prazo a que alude o n.º 3 do artigo 237.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário é reduzido para 20 dias e conta-se desde o dia em que tiver sido lavrado o auto da posse administrativa.
8 - O arresto só caduca nos seguintes casos:

a) Declaração de nulidade ou anulação do acto administrativo que ordene a realização de obras ou que determine a posse administrativa do imóvel;
b) Prestação de caução adequada;
c) Conclusão das obras sem intervenção da câmara municipal.

9 - A caução a que alude a alínea b) do número anterior é prestada em favor da câmara municipal pelo valor provável das obras, estimado por aquela para os efeitos do n.º 3 do artigo 5.º, acrescido de 15%.
10 - Se a caução for prestada por garantia bancária ou seguro de caução, estas têm de ser incondicionais, exigíveis à primeira interpelação e só libertáveis mediante deliberação da câmara municipal.

Artigo 9.º
Determinação do preço das obras

1 - Para determinação das obras promovidas pela câmara municipal, ter-se-á em conta:

a) O custo directo das mesmas;
b) Os encargos com empréstimos contraídos ao abrigo deste diploma;
c) O custo de amortização e reintegração dos equipamentos afectos às obras realizadas por administração directa;
d) Uma percentagem a fixar pela câmara municipal, a título de encargos administrativos, até um máximo de 10% do custo directo das obras.

2 - O crédito do município pelo preço das obras goza de privilégio imobiliário especial, graduado em primeiro lugar e com exclusão de qualquer outro até à concorrência do seu montante, sobre o prédio beneficiado.
3 - No caso previsto no n.º 2 do artigo 15.º, o crédito do município considera-se reduzido a 70% do preço das obras.

Artigo 10.º
Pagamento voluntário

1 - Concluída a intervenção, o presidente da câmara notifica os obrigados para procederem ao pagamento voluntário do preço das obras, em prazo certo, que não pode exceder 60 dias.
2 - Expirado o prazo de pagamento voluntário, o arresto que haja sido decretado converte-se em penhora do imóvel, mediante despacho do presidente da câmara, a quem cabe requerer o respectivo registo.
3 - Se o prédio não tiver sido arrestado, o presidente da câmara remete ao chefe de repartição de finanças certidão da dívida de que conste a identificação do prédio, para que este promova de imediato a respectiva penhora nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ficando contudo a câmara municipal constituída como depositária e não havendo lugar às formalidades prescritas nas alíneas a) e c) do seu artigo 231.º.
4 - Os embargos de terceiro quanto a prédios que não tenham sido arrestados ao abrigo do presente diploma são apresentados na repartição de finanças, tendo em conta o disposto no n.º 7 do artigo 8.º quanto ao prazo para o efeito fixado.

Artigo 11.º
Execução fiscal

1 - A execução fiscal segue os termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, com as especificidades constantes do presente diploma.
2 - É competente para a instauração da execução a repartição de finanças da localização do prédio.
3 - Os titulares do imóvel são solidariamente responsáveis pela dívida ao município.
4 - Recebida a certidão da dívida remetida pela câmara municipal, será instaurada a execução e promovida simultaneamente a citação do executado, do cônjuge, dos credores com garantia real sobre o prédio beneficiado, dos credores desconhecidos, dos sucessores dos credores preferentes e do chefe de repartição de finanças do domicílio dos devedores.
5 - As citações têm por função:

a) A dos executados, para deduzirem oposição à execução e requererem o pagamento em prestações ou a dação em pagamento das dívidas cujas certidões hajam sido apensadas à da dívida ao município e para pagarem a última na sua totalidade, atento o disposto no n.º 8;
b) A dos cônjuges, para requererem, sendo caso disso, a separação judicial de bens;
c) A dos dirigentes do órgão da execução fiscal, para os efeitos do artigo 241.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário;
d) A dos demais interessados, para reclamarem os seus créditos.

6 - O prazo de reclamação de créditos é de 15 dias.
7 - Salvo quanto ao representante da Fazenda Pública, o prazo para a reclamação de créditos conta-se do termo dos éditos publicados para a citação dos credores desconhecidos nos termos do n.º 4.
8 - A citação dos credores deve mencionar que o prazo para a reclamação de créditos corre independentemente da venda e que esta será promovida pela câmara municipal, mediante hasta pública.

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Artigo 12.º
Oposição à execução

1 - A oposição à execução, no que se refere à dívida ao município, só pode ser deduzida com os seguintes fundamentos:

a) Ilegitimidade da pessoa citada por esta não ser o próprio devedor que figura no título ou o seu sucessor, ou, sendo o que nele figura, não ser responsável pelo pagamento da dívida;
b) Falta de notificação do acto administrativo que, respectivamente, ordene a realização de obras e determine a posse administrativa do prédio, quando possa influir nos termos da execução;
c) Falsidade do título executivo, quanto também possa influir nos termos da execução;
d) Pagamento da dívida exequenda.

2 - Na execução que vise a cobrança de dívida ao município, o prazo para a oposição, quanto a todas as dívidas, é de 15 dias.
3 - Havendo oposição à execução relativamente a quaisquer outras dívidas autuadas conjuntamente ou apensadas ao processo, a execução prosseguirá quanto às dívidas que não tenham sido objecto de oposição.

Artigo 13.º
Hasta pública

Nada havendo que obste à venda do prédio ou logo que sejam decididas as questões que estejam a impedir o prosseguimento da execução, o chefe de repartição de finanças comunica-o ao presidente da câmara para que seja promovida a hasta pública, nos termos do artigo seguinte.

Artigo 14.º
Venda em hasta pública

1 - Recebida a comunicação a que alude o artigo anterior, a câmara municipal promoverá a venda do prédio em hasta pública, servindo de título da transmissão da propriedade ou do direito de superfície, o acto de arrematação homologado por despacho do presidente da câmara.
2 - Compete à câmara municipal fixar a base de licitação.
3 - A hasta pública é publicitada mediante editais e anúncios a inserir, por duas vezes, em dois jornais de expansão nacional, não podendo a praça ter lugar sem que tenha decorrido um mínimo de 10 dias sobre a data da publicação do último anúncio.
4 - O arrematante terá de pagar no acto da praça um mínimo de 30% do preço oferecido e satisfazer o restante no prazo máximo de 30 dias, sob pena da arrematação ficar sem efeito e de o arrematante perder em favor do município uma quantia correspondente a 20% do mesmo preço.
5 - A arrematação ficará igualmente sem efeito, com perda da quantia referida no número anterior, se o arrematante não satisfizer pontualmente as obrigações tributárias devidas.
6 - O auto de arrematação não pode ser homologado enquanto o arrematante não pagar integralmente o preço e não satisfazer as obrigações tributárias e sem que tenham decorrido 20 dias sobre a data da praça.
7 - O despacho de homologação é publicado mediante edital e anúncio a inserir, por uma vez, em dois jornais de expansão nacional utilizados para os efeitos do n.º 3.
8 - Os direitos que caducam nos termos do artigo 824.º, n.º 2, do Código Civil são transferidos para o produto líquido da venda (PLV), apurado nos termos do artigo seguinte.

Artigo 15.º
Produto líquido de venda

1 - Para efeitos deste diploma, tem-se por produto líquido da venda (PLV) o preço da alienação do prédio, deduzido do preço das obras, determinado nos termos do artigo 9.º.
2 - Se o preço das obras for superior a 70% do preço da alienação, caberá ao município suportar a diferença, sendo então o produto líquido da venda correspondente à parte do preço que remanescer a esses 70%.

Artigo 16.º
Anulação da venda

1 - A anulação da venda só pode ser requerida no prazo de 30 dias a contar da data da publicação que ocorrer em último lugar do despacho que homologue o auto de arrematação ou daquela em que o requerente tome conhecimento do facto que servir de fundamento à anulação, competindo-lhe provar a data desse conhecimento.
2 - A venda só pode ser anulada se:

a) For declarado nulo ou anulado o acto administrativo que determine a realização de obras ou a posse administrativa;
b) O imóvel não pertencer, ainda que em contitularidade, ao executado e for reivindicado pelo dono;
c) A hasta pública não tiver sido publicitada pela forma e com a antecedência prescritas no n.º 3 do artigo 14.º;
d) Tiver havido conluio na arrematação.

3 - Nos casos previstos no número anterior aplica-se o disposto no n.º 3 do artigo 909.º do Código de Processo Civil.

Artigo 17.º
Depósito do produto líquido de venda

1 - Recebido na sequência da arrematação em hasta pública o preço da venda, o produto líquido da venda é depositado na Caixa Geral de Depósitos, à ordem do chefe de repartição de finanças.
2 - O presidente da câmara municipal remete ao chefe da repartição de finanças o conhecimento do depósito e fotocópia autenticada dos seguintes elementos:

a) Auto de arrematação e despacho da respectiva homologação;
b) Editais e publicações impostas pelo artigo 14.º.

Artigo 18.º
Reclamação, verificação e graduação dos créditos

1 - Recebido o processo no tribunal tributário de 1.ª instância, a secretaria notifica o representante da Fazenda

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Nacional no prazo de 48 horas, para que este reclame os créditos no prazo de 15 dias.
2 - O juiz, com dispensa da convocação de credores, verifica e, sendo caso disso, confirma desde logo a graduação do crédito do município, mediante sentença em que ordena o cancelamento dos registos dos direitos que caducam nos termos do n.º 2 do artigo 824.º do Código Civil.
3 - Transitada em julgado a sentença que verifique e confirme a graduação do crédito do município, os autos prosseguirão os seus termos com vista à verificação e graduação dos demais créditos que hajam sido reclamados, podendo o juiz ordenar, nesta fase, a convocação dos credores.
4 - Com o trânsito da sentença a que alude o n.º 2, o que será oficiosamente notificado ao município no prazo de 48 horas, o montante recebido por este para satisfação do seu crédito, nos termos do artigo 9.º, passa a constituir receita municipal.

Artigo 19.º
Notificações

1 - As notificações a que aludem os artigos 4.º, n.º 1, 5.º e 7.º, n.º 3, são feitas pelos seguintes meios cumulativos:

a) Carta registada e com aviso de recepção remetida aos titulares constantes das inscrições ao registo predial e, caso não haja coincidência de pessoas ou o prédio não esteja descrito, também aos titulares constantes dos averbamentos à matriz predial;
b) Editais a afixar nos locais habituais e anúncios publicados, por uma vez, em dois dos jornais mais lidos na localidade, sendo um deles de expansão nacional.

2 - As notificações feitas pelo meio referido na alínea a) do número anterior produzem todos os seus efeitos se forem apenas recebidas por um titular do direito de propriedade ou do direito de superfície.
3 - Caso todas as cartas sejam devolvidas, mesmo que não assinadas, juntar-se-ão os subscritores ao processo, considerando-se as notificações validamente feitas, nas moradas constantes do registo e/ou da matriz, 20 dias após a data da publicação do anúncio que ocorrer em último lugar.

Artigo 20.º
Prazos

1 - Os prazos fixados neste diploma são contínuos e seguem o regime do artigo 279.º do Código Civil, não se suspendendo contudo durante as férias judiciais.
2 - São considerados urgentes, não se suspendendo durante as férias judiciais, os processos que corram em quaisquer tribunais, designadamente para conhecimento de questões prejudiciais à execução fiscal.
3 - As acções relativas a direitos reais sobre prédios objecto de intervenção ao abrigo do presente diploma que obstem à execução fiscal ou nela intercedam seguem o regime do processo sumário, independentemente do valor.

Artigo 21.º
Delegação de competências

As competências cometidas à câmara municipal e ao presidente da câmara pelo presente diploma são delegáveis nos termos gerais.

Artigo 22.º
Norma revogatória

É revogado o artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro, relativo ao Regime do Arrendamento Urbano.

Artigo 23.º
Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor 90 dias após a sua publicação.

Assembleia da República, 4 de Junho de 2002. - Os Deputados do PCP: Honório Novo - Bernardino Soares - Lino de Carvalho - Rodeia Machado - Bruno Dias - António Filipe.

PROJECTO DE LEI N.º 57/IX
LEI DE BASES DA FAMÍLIA

Exposição de motivos

A família é uma instituição primordial e fundamental na organização da vida em sociedade, que progressivamente tem vindo a ser objecto de estudo independente das ciências sociais, não lhe sendo atribuído pelo legislador a merecida relevância e autonomia no plano social, económico e cultural.
A Constituição da República Portuguesa, no artigo 67.º, reconhece a família como elemento essencial e fundamental da sociedade e atribui ao Estado a obrigação de "definir, ouvidas as associações representativas das famílias, e executar uma política de família com carácter global e integrado".
Pretende-se com a presente iniciativa legislativa criar um instrumento dinamizador deste preceito constitucional, que contenha as normas programáticas definidoras e orientadoras de uma política que promova e dignifique a instituição familiar no plano social, económico e cultural.
Neste sentido, parece-nos oportuno a elaboração de um diploma que dê forma a um quadro jurídico que reúna e integre a globalidade das medidas de política familiar, preservando os valores sociais e culturais transmitidos de geração em geração, deste modo a sistematização que presidiu à elaboração do presente diploma realça a importância social, económica e cultural da família como espaço natural de realização pessoal.
É intenção do CDS-PP estabelecer as linhas orientadoras de uma política global de família, de forma a permitir uma acção coerente, coesa e sobretudo eficaz, quer do legislador quer da Administração Pública.
A família confronta-se com novas realidades sociais, inesperadas e imprevistas, que anunciam novos e inéditos

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desafios que necessitam obrigatoriamente de um acompanhamento legislativo de modo a não fragilizar a unidade familiar.
Destacamos de estas novas realidades a preocupante evolução negativa da natalidade, o crescente número de famílias monoparentais que necessariamente precisam de uma protecção concreta e eficaz. Os novos tipos de trabalho, que permitem tanto o teletrabalho como a sujeição a uma vida urbana que impede o convívio familiar em termos qualitativos. Todos estes fenómenos necessitam de uma resposta enérgica e capaz de garantir uma melhoria significativa da qualidade de vida das famílias portuguesas.
Toda esta política assenta no reconhecimento de factos objectivos, como a função social, cultural e económica da família, a responsabilidade na educação dos filhos, a sua importância como lugar primeiro de expressão da liberdade e da solidariedade entre gerações, a promoção da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, a necessidade de partilha de responsabilidades familiares assim como a criação de condições preventivas de situações tendentes à desagregação da unidade familiar.
A política familiar não é a soma de diversas políticas sectoriais. Como política transversal deve dar dimensão familiar às políticas sectoriais e desenvolver-se a nível nacional e local.
Nesta perspectiva, parece oportuno a elaboração de uma lei de bases da família, com o objectivo de formular o enquadramento jurídico que permitirá a globalidade e a coerência das medidas de política familiar, visando a prevenção de problemas sociais com elevados custos económicos e encontrando soluções mais humanizadas e eficientes.
Em conclusão, com este diploma pretende-se estabelecer as linhas fundamentais da política familiar, visando a promoção e a melhoria da qualidade de vida das famílias portuguesas e a sua participação no desenvolvimento dessa mesma política.

Capítulo I
Dos princípios fundamentais

Base I
(Âmbito)

A presente lei define as bases em que assentam os princípios e os objectivos fundamentais da política familiar previstos na Constituição da República Portuguesa, que define a família como elemento fundamental da sociedade.

Base II
(Princípio geral)

O desenvolvimento da política familiar vincula o Governo a considerar a família como base da organização social nas diversas políticas sectoriais e nas questões relativas a cada um dos membros.

Base III
(Família e pessoa)

Todos têm direito a constituir família em condições de plena igualdade e a contrair casamento nos termos previstos na Lei.

Base IV
(Família e Estado)

Incumbe ao Estado, em estreita colaboração com as associações representativas dos interesses das famílias, a promoção, a melhoria da qualidade de vida e o desenvolvimento integral da família e de cada um dos seus membros.

Base V
(Unidade e estabilidade familiar)

A instituição familiar assenta na unidade, estabilidade e igual dignidade de todos os membros no respeito mútuo, cooperação e solidariedade para a consecução plena dos seus fins.

Base VI
(Função cultural e social)

O Estado reconhece a função da família enquanto transmissora de valores e veículo do estreitamento das relações de solidariedade entre gerações, no respeito pela liberdade individual.

Base VII
(Privacidade da vida familiar)

O Estado reconhece o direito à privacidade da vida familiar e promoverá os meios necessários à sua garantia no respeito pela integridade moral e física de todos os seus membros.

Base VIII
(Princípio da subsidariedade)

É da responsabilidade do Estado definir e promover uma política familiar no respeito pela iniciativa, organização e autonomia das famílias e das suas associações, que assegure a satisfação das suas necessidades económicas, sociais, culturais e morais.

Base IX
(Direito à participação)

O Estado reconhece o direito das famílias à organização, associação e participação, através das instituições representativas dos seus interesses, na definição da política familiar.

Base X
(Família como titular de direitos deveres)

O Estado reconhece a necessidade de promover a definição dos direitos e deveres sociais da família e dos direitos e deveres familiares da pessoa.

Base XI
(Direito à diferença)

1 - Na definição da política de família serão garantidas as características específicas de cada comunidade étnica e religiosa.
2 - O Estado promoverá a integração das famílias de imigrantes atendendo às suas necessidades e especificidades culturais.

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3 - O Estado desenvolverá medidas que assegurem o direito ao reagrupamento familiar, dando especial relevância às famílias de imigrantes.

Capítulo II
Dos objectivos

Base XII
(Globalidade, integração e coerência da política familiar)

O Estado criará e desenvolverá medidas que garantam a globalidade, integração e a coerência das várias políticas sectoriais de interesse para a família.

Base XIII
(Família e qualidade de vida)

Incumbe ao Estado proporcionar às famílias e aos seus membros a melhoria da qualidade de vida, nomeadamente a saúde, a educação, a habitação, o trabalho, o ambiente, adequada a uma vida familiar condigna.

Base XIV
(Direito a viver em família e com a família)

O Estado promoverá a compatibilização das actividades de todos os membros da família com as exigências da vida familiar.

Base XV
(Direito à conciliação entre a vida familiar e profissional)

O Estado promoverá a conciliação entre a vida familiar e profissional, nomeadamente através da harmonização do regime laboral com as exigências da vida familiar.

Base XVI
(Protecção à maternidade e paternidade)

A maternidade e a paternidade constituem valores humanos e sociais eminentes que o Estado deve respeitar e salvaguardar, cooperando com os pais no cumprimento da sua missão.

Base XVII
(Protecção às famílias numerosas)

O Estado criará condições e incentivos especiais para a protecção e apoio às famílias numerosas, nomeadamente em termos fiscais e económicos.

Base XVIII
(Protecção da criança)

O Estado assegurará a protecção e o desenvolvimento da criança antes e depois do seu nascimento.

Base XIX
(Garantia do exercício do poder paternal)

O Estado garantirá o exercício dos direitos e deveres consagrados na lei aos titulares do poder paternal com vista ao desenvolvimento integral e harmonioso da personalidade da criança.

Base XX
(Famílias monoparentais)

O Estado garantirá a igualdade de direitos às famílias monoparentais, assegurando o apoio especial de que estas carecem.

Base XXI
(Protecção dos menores privados do meio familiar)

O Estado, através de serviços públicos competentes, em parceria com as instituições privadas de solidariedade social e em colaboração com as instituições representativas dos interesses das famílias, promoverá uma política de protecção e enquadramento dos menores privados de meio familiar, proporcionando-lhes recursos materiais e humanos essenciais a um desenvolvimento psíquico e afectivo equilibrado.

Base XXII
(Idosos e deficientes na família)

O Estado estimulará a permanência, a realização e a participação na vida familiar das pessoas idosas e dos deficientes.

Base XXIII
(Toxicodependência, alcoolismo e factores desagregadores da família)

O Estado reconhece e apoiará a função fundamental da família na prevenção e recuperação dos toxicodependentes, dos alcoólicos e de outras situações tendentes à desagregação da unidade familiar.

Capítulo III
Da organização e participação

Base XXIV
(Organização)

O Estado disporá de serviços públicos próprios incumbidos de promover a política familiar, ouvidas as associações representativas das famílias.

Base XXV
(Associativismo familiar)

O Estado apoiará a criação de associações representativas dos interesses das famílias de âmbito local, regional e nacional e assegurará a devida representação orgânica e a sua participação no processo de desenvolvimento da política familiar e da sociedade em geral.

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Capítulo IV
Da promoção social, cultural e económica da família

Base XXVI
(Família e saúde)

1 - O Estado assegurará às famílias, em condições compatíveis com o orçamento familiar, o acesso a cuidados de natureza preventiva, curativa e de reabilitação.
2 - O Estado facilitará o acesso a uma rede nacional de assistência materno-infantil.

Base XXVII
(Família e educação)

1 - O Estado reconhece aos pais, como primeiros educadores, a liberdade de opção sobre o projecto educativo dos seus filhos.
2 - Cumpre ao Estado assegurar o bom funcionamento do sistema de ensino e criar as condições necessárias para que as famílias possam participar na política educativa e na gestão escolar.
3 - Os pais têm o direito de se opor a que os filhos sejam obrigados a receber ensinamentos que não estejam de acordo com as suas convicções éticas e religiosas.
4 - O Estado promoverá a criação de uma rede nacional de creches, ensino pré-escolar e de infra-estruturas de apoio à família.
5 - O Estado apoiará o desenvolvimento integral da personalidade das crianças, incluindo a educação afectivo-sexual, em colaboração com os pais, os serviços de saúde e a escola.

Base XXVIII
(Família e habitação)

Devem ser criadas condições para que cada família possa dispor de uma habitação que, pelas suas dimensões e demais requisitos, corresponda adequadamente às exigências de uma vida familiar saudável, preservada na sua intimidade e privacidade.

Base XXIX
(Família e trabalho doméstico)

É reconhecido o valor humano, social e económico do trabalho doméstico prestado pelos membros do agregado familiar, incumbindo ao Estado adoptar medidas tendentes à valorização económica deste trabalho.

Base XXX
(Família e cultura)

Compete ao Estado preservar a identidade cultural de cada família, favorecendo a transmissão e criatividade de elementos culturais com base na interacção de culturas, gerações e grupos sociais.

Base XXXI
(Família e segurança social)

1 - Serão, progressivamente, adoptadas medidas no sentido de garantir a compensação dos encargos familiares, por forma a preservar, convenientemente, a subsistência e o equilíbrio económico de cada família e de simplificar a atribuição de prestações à mesma.
2 - A acção social será essencialmente preventiva e realizada em colaboração com os vários membros da família, incentivando-se o apoio domiciliário e a criação de redes de solidariedade e vizinhança.
3 - O Estado promoverá a criação de uma rede nacional de equipamentos sociais de apoio á família, tendo em consideração a sua realidade plurigeracional.

Base XXXII
(Família e fiscalidade)

1 - Incumbe ao Estado tornar medidas que contribuam para o desenvolvimento de um sistema integrado de fiscalidade e segurança social, tendo por base um princípio de coeficiente familiar.
2 - O sistema fiscal deve, de forma progressiva, garantir e incentivar a unidade familiar, não podendo ser penalizadas as pessoas pelo facto de constituírem família.

Base XXXIII
(Família e ambiente)

1 - O Estado promoverá acções de formação e informação de forma a que seja possibilitado às famílias serem o garante de uma eficaz política de defesa e preservação do meio ambiente.
2 - Na prossecução de uma política de estilos de vida saudáveis o Estado reconhece à família o papel fundamental de primeiro e mais eficaz agente.

Base XXXIV
(Família e urbanismo)

1 - Serão criadas estruturas adequadas e espaços culturais, desportivos e de lazer, na zona residencial das famílias, que permitam um convívio intergeracional.
2 - A política de urbanismo do Estado terá em consideração as necessidades próprias de uma política familiar.

Base XXXV
(A família como unidade de consumo)

1 - A família constitui uma unidade de consumo com necessidades específicas, pelo que o Estado deverá promover, através de acções de informação e formação, a sua defesa contra formas de publicidade enganosa e de consumo inconvenientes.
2 - O Estado deverá tomar medidas no sentido de adequar os custos de consumos de bens e serviços essenciais ao orçamento familiar médio nacional.

Base XXXVI
(Família e comunicação social)

1 - O Estado deverá procurar que os meios de comunicação social respeitem os valores fundamentais e os fins essenciais da unidade familiar, nomeadamente os de ordem ética, educativa e social.

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2 - O Estado deverá combater a propagação da violência através dos meios de comunicação.
3 - O Estado deverá ter em especial atenção o problema da facilidade do acesso por crianças à pornografia difundida através do recurso às novas tecnologias.

Base XXXVII
(Voluntariado)

O voluntariado é considerado um meio fundamental de apoio familiar e como tal deve ser reconhecido, designadamente através do estabelecimento de um regime legal que o incentive e da colaboração dos organismos públicos.

Capítulo V
Disposição final

Base XXXVIII
(Disposição final)

O Estado adoptará as providências necessárias ao desenvolvimento e concretização da presente lei.

Assembleia da República, 3 de Junho de 2002. - Os Deputados do CDS-PP: Telmo Correia - Nuno Melo - João Almeida - Isabel Gonçalves - João Rebelo - Henrique Campos Cunha - Miguel Anacoreta Correia - Manuel Cambra - Diogo Feio.

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 25/IX
POR UMA VERDADEIRA POLÍTICA DE DEFESA E PROMOÇÃO DO ENSINO DA LÍNGUA E CULTURA PORTUGUESAS NO ESTRANGEIRO

Exposição de motivos

- Considerando que apostar no ensino da língua e cultura portuguesas nas comunidades lusas é uma opção estratégica, não devendo ser encarado como uma despesa mas sim como um investimento necessário para o presente e para o futuro de Portugal e, consequentemente, da nossa diáspora;
- Considerando que são cerca de cinco milhões, segundo as estimativas oficiais, os portugueses e luso-descendentes espalhados pelo mundo;
- Considerando que a Língua Portuguesa é a terceira língua mais falada na Europa;
- Considerando que o ensino e a difusão da língua e da cultura portuguesas assenta em grande parte na vontade, empenhamento e trabalho das comunidades portuguesas;
- Considerando que, para além de insuficiente, tem vindo a registar-se um real desinvestimento por parte do Estado português ao longo dos anos, nomeadamente no que diz respeito às verbas atribuídas no Orçamento do Estado;
- Considerando a ausência de articulação e coordenação entre o Ministério da Educação e o Instituto Camões no respeitante à promoção da cultura e da língua portuguesas no mundo,

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projecto de resolução:

A Assembleia da República resolve, nos termos do artigo 166.º, n.º 5, da Constituição, recomendar ao Governo a criação de um programa de expansão e qualificação do ensino da língua e da cultura portuguesas no estrangeiro, que passe:

a) Por um investimento financeiro que permita inverter a tendência para o definhamento que se tem vindo a verificar e orientado para a expansão da rede do ensino, o aumento de professores e em mais e melhores meios pedagógicos;
b) Por uma efectiva articulação dos vários ministérios que intervêm nesta área (Educação. Negócios Estrangeiros, Cultura, Ciência e Ensino Superior), para melhor rentabilizar os meios e materiais e humanos na perspectiva de mais e melhor promoção da língua e cultura portuguesas no estrangeiro;
c) Pela utilização da RTPi/África e a RDPi/África para a divulgação e programação de cursos de língua e cultura portuguesas, de forma a atingir um público muito vasto;
d) Pela divulgação na RTPi/África e na RDPi/África, enquanto serviço público, de programas de qualidade que contribuam e sejam um estímulo para a aprendizagem da língua e cultura portuguesas;
e) Pelo apoio aos órgãos de comunicação social de língua portuguesa publicados ou emitidos no estrangeiro, designadamente imprensa e rádio;
f) Pelo apoio aos vários projectos e cursos existentes, com provas dadas, quer seja nos regimes integrados ou paralelos quer seja por entidades privadas ou do movimento associativo;
g) Promoção de iniciativas de carácter cultural junto das comunidades portuguesas, nomeadamente: exibições de cinema português; deslocação de grupos de teatro, incluindo teatro infantil; realizações de mostras de obras literárias, realização de colóquios sobre a actualidade nacional;
h) Pela persistente intervenção junto dos governos onde existam importantes comunidades portuguesas, para que se consiga a efectiva integração do ensino da língua portuguesa no ensino oficial desses países;
i) Pela elaboração de manuais escolares e outro material pedagógico-didáctico que tenham devidamente em conta a especificidade deste ensino;
j) Pela elaboração de programas de acções de formação de professores que tenham em conta a especificidade deste ensino;
k) Pela regulamentação imediata do regime jurídico que está previsto no Decreto-Lei n.º 13/98, de 24 de Janeiro;
l) Pela colocação, por concurso, dos coordenadores do ensino no estrangeiro;
m) Pelo reconhecimento oficial da existência das comissões e conselhos de pais, que desempenham

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um papel relevante na organização dos cursos de língua portuguesa;
n) Pela elaboração de um "Livro Branco" sobre o ensino da língua e cultura portuguesas no estrangeiro, devendo, para o efeito, ser ouvidos os vários intervenientes: Conselho das Comunidades Portuguesas, estruturas sindicais dos professores, comissões e conselhos de pais e movimento associativo das comunidades portuguesas.

Assembleia da República, 5 de Junho de 2002. - Os Deputados do PCP: Luísa Mesquita - Bernardino Soares - Lino de Carvalho - Rodeia Machado.

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 26/IX
ESTABELECE A METODOLOGIA DE REFORMA DA TRIBUTAÇÃO DO PATRIMÓNIO IMOBILIÁRIO

A indispensabilidade de uma intervenção global no domínio da tributação do património reúne um largo consenso nacional, tanto no plano político como entre os especialistas em fiscalidade, o que justificou a realização de um estudo aprofundado das complexas incidências desta reforma nos domínios da equidade fiscal, do financiamento das autarquias locais, da habitação e das políticas de ordenamento do território e do urbanismo.
A Sisa é um imposto que onera de forma injusta a aquisição de imóveis, sobretudo quando destinados a habitação própria, proporcionando fenómenos significativos de evasão fiscal com participação activa das empresas imobiliárias e dos adquirentes, com a conivência das instituições de crédito.
Por outro lado, a contribuição autárquica, face à não actualização dos valores patrimoniais dos prédios mais antigos, tem contribuído para a criação de generalizadas situações de manifesta injustiça relativa, penalizando sobretudo os residentes em zonas de expansão nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, bem como a generalidade das famílias jovens.
A consciência dos efeitos recenseados não afasta a necessária ponderação das repercussões sociais, económicas e nas finanças locais de uma reforma geral da tributação do património.
Foram, nesta matéria, realizados diversos estudos cuja análise não pode ser dispensada pela Assembleia da República, designadamente:

Relatório sobre a tributação do património, coordenado pelo Prof. Dr. Sidónio Pardal (1996);
Relatório Final da Comissão da Reforma da Tributação do Património, coordenado pelo Dr. Henrique Medina Carreira (1999);
Relatório para a ECORFI do Prof. Dr. José Luís Saldanha Sanches relativo à tributação das transacções imobiliárias em sede de IVA (2001);
Anteprojecto de reforma da tributação do património elaborado pela Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais do XIV Governo Constitucional (2002).

Os trabalhos desenvolvidos constituem uma base sólida para que a Assembleia da República, em diálogo com o Governo, possa desenvolver com programa de reforma da tributação do património ponderado os factores ligados à consolidação orçamental, à redução dos riscos de fraude e evasão fiscais e à salvaguarda da situação financeira dos municípios.
Tendo em conta as competências que constitucionalmente lhe estão cometidas em matéria de legislação fiscal, a Assembleia da República delibera:

Promover até ao final da sessão legislativa a discussão dos estudos e relatórios elaborados sobre a reforma da tributação do património;
Promover a audição da Associação Nacional dos Municípios Portugueses sobre a reforma da tributação do património, designadamente sobre a incidência nas receitas municipais e nos poderes tributários próprios das autarquias locais;
Aprovar até ao final de 2002 as providências legislativas necessárias ao lançamento e concretização de um processo de avaliação geral dos prédios urbanos para efeitos fiscais, a realizar até 30 de Novembro de 2004;
Adoptar como objectivo o estabelecimento de critérios objectivos de determinação do valor patrimonial dos prédios urbanos baseados no custo médio de construção, nas características dos edifícios e na sua localização;
Aprovar até 30 de Setembro um projecto de reforma da tributação do património extinguindo o Imposto Municipal de Sisa e o Imposto sobre as Sucessões e Doações;
Aprovar até 30 de Setembro, ouvida a Associação Nacional de Municípios Portugueses, as alterações à Lei de Finanças Locais que garantam, enquanto não estiver em vigor o novo modelo de tributação estática do património imobiliário, a compensação dos municípios pela receita que deixam de obter em resultado da abolição do Imposto Municipal de Sisa.

Assembleia da República, 5 de Junho de 2002. - Os Deputados do PS: António Costa - Eduardo Cabrita - Joel Hasse Ferreira - Guilherme d'Oliveira Martins - José Augusto Carvalho.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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