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Sábado, 14 de Junho de 2003 II Série-A - Número 103

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2001-2003)

S U M Á R I O

Projectos de lei (n.os 281 e 310/IX):
N.º 281/IX (Alterações à Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais):
- Parecer do Governo Regional dos Açores.
N.º 310/IX (Alteração da lei-quadro da criação de municípios):
- Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente.

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PROJECTO DE LEI N.º 281/IX
(ALTERAÇÕES À LEI ELEITORAL DOS ÓRGÃOS DAS AUTARQUIAS LOCAIS)

Parecer do Governo Regional dos Açores

Por ofício n.º 734, de 20 de Maio, da Presidência do Governo Regional, é solicitado parecer urgente sobre o projecto de lei mencionado em epígrafe.
1 - De acordo com a respectiva exposição de motivos, e sucintamente, pretende-se "integrar o sistema eleitoral para as autarquias locais com o sistema de governo local", assegurando "a homogeneidade e a estabilidade do órgão executivo, bem como a personalização do voto, conferindo, simultaneamente, acrescidos poderes de fiscalização e controlo político aos órgãos deliberativos".
Destaca-se:
- A limitação de mandatos (até três) para os presidentes dos órgãos executivos;
- O presidente da câmara municipal (CM) passaria a ser, como já acontece para as freguesias, o cabeça de lista mais votado nas eleições para a assembleia deliberativa (AM);
- Seriam os presidentes dos órgãos executivos que passavam a designar, de entre os membros dos órgãos deliberativos directamente eleitos, os restantes membros daqueles;
- Aos órgãos deliberativos seria atribuída competência para apreciar a constituição, seguida da declaração de investidura, bem como as remodelações dos órgãos executivos, com exigência de maioria absoluta para a deliberação de rejeição;
- Seria reduzido o número de membros dos órgãos executivos municipais.
2 - Quanto à limitação de mandatos, o projecto de lei agora apresentado pode dizer-se que encontra fundamento numa leitura possível do artigo 118.º da Constituição, quando este determina que "ninguém pode exercer a título vitalício qualquer cargo político de âmbito nacional, regional ou local". Em bom rigor, o que o artigo efectivamente proíbe é a designação para o exercício por toda a vida de cargo político.
3 - Quanto às restantes regras agora propostas, há que alertar para a necessidade de o legislador proceder à articulação deste projecto com as normas da lei das autarquias locais1 (LAL).
(Isto partindo do pressuposto de que a lei eleitoral é o instrumento legal adequado para inscrever normas sobre a organização e funcionamento dos órgãos autárquicos.)
4 - Assim:

Projecto de lei n.º 281/X Norma prevista na LAL Observações
Artigo 2.º
Artigo 222.º LEAL Artigo 5.º Composição da Assembleia de Freguesia (AF)
Artigo 222.º n.º 3 LEAL Artigo 21.º, n.º 5 Plenário de cidadãos eleitores. (O n.º 2 do artigo 21.º refere-se ao quórum deliberativo)
Artigo 6.º Impossibilidade de eleição da AF
Artigo 223.º LEAL Artigo 42.º Composição da AM
Artigo 224.º LEAL Artigos 10.º e 46.º Mesa dos órgãos deliberativos (v. desenvolvimento infra)
Artigo 225.º Artigos 11.º, 47.º e 79.º Preenchimento de vagas. Novos. n.os 2 e 3
Artigo 226.º Artigos 24.º e 57.º Composição dos órgãos executivos
Artigo 227.º Artigo 24.º, n.º 1 Presidente do órgão executivo: estende o regime das freguesias aos municípios
Artigo 227.º, n.os 3 a 5 Novo (empate nas listas para os órgãos executivos)
Artigo 228.º Novo: escolha dos membros dos órgãos executivos
Artigo 229.º Novo: processo de formação do órgão executivo
Artigo 230.º Artigos 60.º (CM) e 80.º Início e cessação de funções
Artigo 230.º n.º 3 Novo: prática de gestão e eficácia das delegações de competência - 40.º, alínea b) do Código do Procedimento Administrativo
Artigo 231.º Artigos 29.º, 59.º 79.º O artigo 79.º ("preenchimento de vagas") aplica-se a todos os órgãos autárquicos. Os artigos 29.º e 59.º referem-se á convocação de novo acto eleitoral; no caso do artigo 59.° só para a CM, como é óbvio face ao regime vigente.
Artigo 2323.º Novo: vaga superveniente nas funções de vereador ou de vogal
Artigo 233.º Novo: remodelação r iniciativa do Presidente
Artigo 234.º Novo: outras causas de reconstituição
Artigo 235.º Novo: participação na discussão e votação apenas dos membros directamente eleitos dos órgãos deliberativos, em matéria de recomposição dos órgãos executivos

(1) Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, na redacção da Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Junho.

5 - Efectuado este quadro comparativo, acrescenta-se o seguinte:
Parece clara a necessidade de proceder à articulação dos diplomas comparados. Por duas vias possíveis: separando claramente o que é matéria do âmbito eleitoral do que é matéria de organização e funcionamento dos órgãos. Esta via aconselharia a alteração simultânea da LAL. A manter-se a opção constante do projecto dever-se-ia proceder à revogação dos artigos tornados supérfluos da mesma LAL.

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6 - Relativamente a alguns dos artigos, saliento o seguinte.
Genericamente, haveria vantagens em separar, tal como faz a LAL, as regras relativas aos órgãos das freguesias daquelas respeitantes aos órgãos do município.
Artigo 224.º (Constituição dos órgãos deliberativos):
Não se compreende a função do n.º 1: é redundante em relação ao artigo anterior.
O n.º 2 é manifestamente matéria de organização e funcionamento dos órgãos autárquicos, estando aliás tratada na LAL.
Artigo 233.º n.º 3 (Remodelação por iniciativa do presidente):
Parece excessivo que a intenção de remodelação seja submetida à apreciação do órgãos deliberativo, quando este depois irá também apreciar a designação em concreto. O que, aliás, o legislador implicitamente reconhece ao admitir, como forma de aprovação, em alternativa à maioria absoluta favorável dos membros em efectividade de funções, "a falta de deliberação sobre a mesma até ao encerramento do debate".
Quer neste artigo quer no artigo 229.º é inútil a afirmação de que os órgãos deliberativos se pronunciarão "querendo": nestes órgãos colegiais (ao contrário do que prevê o artigo 23.º do Código do Procedimento Administrativo) é possível a abstenção e é esta a única forma de não pronúncia admissível.
Artigo 235.° (Participação na votação e discussão):
Uma vez que só os membros directamente eleitos em efectividade de funções participarão na votação e discussão relativas à remodelação e reconstituição dos órgãos executivos, conviria esclarecer se os membros por inerência são ou não obrigados a estar presentes nessas reuniões.
7 - Duas questões adicionais.

a) Os membros do órgão executivo municipal que não pretendam renunciar ao mandato mas queiram deixar de integrar aquele órgão, terão ou não a possibilidade de regressar à AM? Tal possibilidade encontra-se prevista no artigo 75.º, n.º 1, da LAL, para os vogais da junta de freguesia que pretendam regressar à AF;
b) Procurando esta lei reforçar os poderes de fiscalização dos órgãos deliberativos sobre os órgãos executivos não seria esta uma boa oportunidade para esclarecer as consequências da aprovação de moções de censura aos órgãos executivos pelos órgãos deliberativos (previstas na alínea p) do n.º 1 do artigo 17.º e na alínea l) do n.º 1 do artigo 53.º, todos da LAL; v. ainda o n.º 5 do artigo 17.º da mesma lei)?

Ponta Delgada, 12 de Junho de 2003. O Director de Serviços de Administração Local, José Álvaro Amaral Afonso

PROJECTO DE LEI N.º 310/IX
(ALTERAÇÃO DA LEI-QUADRO DA CRIAÇÃO DE MUNICÍPIOS)

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente

Relatório

Notas preliminares

1 - O Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata (PSD) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República um projecto de lei que visa alterar a Lei-Quadro de Criação de Municípios (Lei n.º 142/85, de 18 de Novembro).
2 - Essa apresentação foi efectuada nos termos do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 130.º do Regimento.
3 - O projecto de lei n.º 310/IX desceu à Comissão do Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente para elaboração dos respectivos relatório e parecer.

Objecto e motivação

4 - A iniciativa em apreço pretende alterar a Lei n.º 142/85, de 18 de Novembro - Lei-Quadro da Criação de Municípios - através de um artigo único que possibilita a criação de novos municípios, mesmo que não estejam preenchidos os requisitos que a lei impõe.
Assim, se não se verificarem os requisitos da lei, propõe-se que possam ser criados novos municípios se houver deliberação votada por uma maioria qualificada de dois terços na Assembleia da República, fundamentada em excepcionais razões de ordem histórica e cultural ou em parecer favorável das assembleias de freguesia a integrar no novo município e das assembleias municipais dos concelhos em que essas freguesias se integram.
5 - Entendem os proponentes que o "papel insubstituível que os municípios têm nos representantes e intérpretes legítimos da vontade das comunidades locais" fundamentam a presente iniciativa. Consideram ainda que "existem situações no nosso país que, por relevantes razões de ordem histórica ou cultural ou por razões de excepcional interesse nacional, podem justificar a abertura de um regime de excepção ao quadro legal da criação de municípios, desde que reconvertidas e aceites por uma maioria qualificada".

Antecedentes

6 - O regime jurídico regulador da criação de municípios encontra-se previsto na Lei n.º 142/85, de 18 de Novembro, a qual surge na sequência dos princípios constantes da Lei n.º 11/82, de 2 de Junho, sobre a criação e extinção das autarquias locais e de determinação da categoria das povoações.
Estabelece-se, no artigo 2.º da Lei n.º 142/85, de 18 de Novembro, que os factores de decisão, na apreciação das iniciativas que visem a criação, extinção e modificação de municípios, são os seguintes:
- A vontade das populações abrangidas, expressa através dos órgãos autárquicos representativos, consultados nos termos do n.º 5 da Lei n.º 142/85;
- Razões de ordem histórica e cultural;
- Factores geográficos, demográficos, económicos, sociais, culturais e administrativos;
- Interesses de ordem nacional e regional ou local em causa.
Esta lei foi já objecto de duas alterações:
- A Lei n.º 124/97, de 27 de Novembro, que revogou o n.º 4 do artigo 14.º (directamente relacionado com a instituição de regiões administrativas); e
- A Lei n.º 32/98, de 18 de Julho, que diminuiu a área da futura área na criação pretendida a 24 Km2.
7 - À luz das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis têm de ser ouvidas a Associação Nacional

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dos Municípios Portugueses (ANMP) e a Associação Nacional de Freguesias (ANAFRE).
8 - A excepção criada assenta sobretudo numa vontade política de criação de novos municípios ao determinar que essa criação será feita por deliberação votada por uma maioria qualificada de dois terços na Assembleia da República, naturalmente fundamentada em um de dois requisitos não cumulativos:
Por um lado, as razões de ordem histórica e cultural, independentemente da vontade dos órgãos autárquicos envolvidos; e, por outro, sem necessidade desse fundamento desde que exista parecer favorável das actuais assembleias de freguesia e das assembleias municipais futuras, independentemente do parecer de nenhum órgão autárquico de origem da freguesia.

Questões sobre a constitucionalidade

9 - Determina a Constituição da República Portuguesa quais são as matérias exactas em que são necessárias maiorias qualificadas para a aprovação dos projectos de diplomas em análise. Não compete à Assembleia da República, por acto normativo, atribuir ou determinar a necessidade de norma de valor reforçado a um projecto de lei em concreto com vista à alteração de uma lei em vigor.
Assim, a Constituição, quanto à competência da Assembleia da República e à determinação dos actos normativos, determina de forma taxativa as matérias em que as exigências de maioria absoluta ou de dois terços dos deputados em efectividade de funções constituem condição para a aprovação do diploma e, ao mesmo tempo, determina quais são as categorias de leis de valor reforçado para efeitos de submeter a fiscalização da conformidade das outras leis com estas.
Independentemente da diferença entre as diversas situações, certas leis gozam de um estatuto diferente. "Foi para dar explícita guarida a este estatuto de supraordenação de algumas leis que foi introduzida em sede de revisão constitucional a figura de leis de valor reforçado que de forma expressa a Constituição menciona" (vide Constituição da República Portuguesa Anotada, Vital Moreira e Gomes Canotilho), mesmo que relativamente a elas não seja exigida nenhuma votação para além da maioria simples, como é o caso da Lei-Quadro de Criação de Municípios.
Daí que se conclua que não pode um acto normativo da Assembleia da República, que não uma revisão constitucional, determinar que um diploma carece de uma maioria de dois terços para a sua aprovação, sendo que não consta da tipificação constitucional, tratando-se, por isso, de um aditamento à Constituição e, por isso mesmo, ferido de inconstitucionalidade, mesmo que se refira a uma matéria que a Constituição considera de valor reforçado sem exigência de qualquer votação por maioria qualificada.

Conclusões

O projecto de lei n.º 310/IX está afectado por uma solução de inconstitucionalidade que eventualmente poderá ser depurada, podendo, uma vez superada e com essa reserva, subir a Plenário para discussão na generalidade.

Parecer

Nestes termos, e atendendo às conclusões, o projecto de lei pode subir a Plenário, reservando os grupos parlamentares as suas posições para a discussão do mesmo.

Assembleia da República, 12 de Junho de 2003. O Deputado Relator, Rodeia Machado - A Vice-Presidente da Comissão, Ofélia Moleiro.

Nota: - As conclusões foram aprovadas por maioria, com os votos a favor do PS e do PCP e votos contra do PSD e do CDS-PP, tendo-se registado a ausência do BE e de Os Verdes.
O parecer foi aprovado por maioria, com os votos a favor do PSD, CDS-PP e PS e votos contra do PCP, tendo-se registado a ausência do BE e de Os Verdes.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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