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Sábado, 30 de Abril de 2005 II Série-A - Número 10

X LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2005-2006)

S U M Á R I O

Projectos de lei (n.os 5, 8, 24, 28 e 33/X):
N.º 5/X (Alteração à Lei Eleitoral para os Órgãos das Autarquias Locais):
- Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
N.º 8/X (Altera o Decreto-Lei n.º 369/90, de 26 de Novembro, com vista a promover a igualdade entre homens e mulheres nos manuais escolares):
- Relatório e parecer da Comissão de Educação, Ciência e Cultura.
N.º 24/X [Altera a Lei n.º 17/2003, de 4 de Junho (Iniciativa Legislativa dos Cidadãos)]:
- Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
N.º 28/X (Alterações à Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais):
- Vide projecto de lei n.º 5/X.
N.º 33/X (Altera a Lei n.º 17/2003, de 4 de Junho, que regula a Iniciativa Legislativa de Cidadãos):
- Vide projecto de lei n.º 24/X.

Proposta de lei n.º 5/X:
Cria o SIFIDE - Sistema de Incentivos Fiscais em Investigação e Desenvolvimento Empresarial.

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PROJECTO DE LEI N.º 5/X
(ALTERAÇÃO À LEI ELEITORAL PARA OS ÓRGÃOS DAS AUTARQUIAS LOCAIS)

PROJECTO DE LEI N.º 28/X
ALTERAÇÕES À LEI ELEITORAL DOS ÓRGÃOS DAS AUTARQUIAS LOCAIS):

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

Relatório

Introdução

O Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata apresentou na Mesa da Assembleia da República, em 16 de Março de 2005, o projecto de lei n.º 5/X - Alteração à Lei Eleitoral para os Órgãos das Autarquias Locais.
Este projecto de lei, segundo os proponentes, assenta em cinco traves-mestras:

a) A eleição directa do presidente do órgão executivo como primeiro cidadão da lista mais votada para a assembleia municipal ou da freguesia;
b) A liberdade de indicação dos vereadores ou vogais pelo presidente eleito, de entre os membros escolhidos pelo eleitorado para a assembleia respectiva, garantindo-se sempre uma maioria absoluta no executivo para o candidato vencedor;
c) A garantia de representação das forças políticas não vencedoras no executivo;
d) O limite à renovação sucessiva dos mandatos para além de três;
e) A dependência política do executivo perante a assembleia, estabelecendo-se o princípio limite de dissolução simultânea dos dois órgãos em caso de reiterada rejeição à constituição em concreto do órgão executivo.

Por seu lado, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentou na Mesa da Assembleia da República, em 13 de Abril de 2005, o projecto de lei n.º 28/X - Alterações à Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais.
Também, segundo os proponentes, esse projecto de lei oferece as seguintes alterações:

- Eleição directa, secreta, universal, periódica e conjunta da assembleia municipal e do presidente da câmara municipal;
- O presidente da câmara municipal é o cabeça da lista mais votada para a assembleia municipal;
- Ao presidente da câmara municipal cabe o poder de designação dos demais membros da câmara municipal, escolhidos de entre os membros da assembleia eleitos directamente;
- À assembleia municipal assistem poderes de fiscalização reforçados, cujos corolários serão, nomeadamente, a apreciação da constituição, acompanhada da declaração de investidura, e da remodelação do órgão executivo;

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- Tais direitos apenas serão exercidos pelos membros da assembleia municipal eleitos directamente e em efectividade de funções;
- A deliberação de rejeição do executivo apresentado pelo presidente da câmara municipal carece de maioria absoluta, sendo, em caso de rejeições sucessivas, a resolução da crise política assim gerada devolvida aos eleitores;
- O número de membros do executivo camarário é reduzido.

Ambos os projectos de lei baixaram à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para elaboração de relatório e parecer na generalidade, tendo esta designado relator na sua reunião de 20 de Abril de 2005. Entretanto, ao abrigo de um direito potestativo de agendamento, o Grupo Parlamentar do PSD marcou o debate do seu projecto de lei para a reunião plenária de 28 de Abril de 2005, sendo o projecto de lei do Partido Socialista debatido por arrastamento com a concordância dos autores do agendamento.

Enquadramento constitucional e legal

A Constituição da República, na sequência da sua 4.ª revisão constitucional ocorrida em 1997, conheceu algumas alterações no seu Título VIII, relativo ao poder local. Concretamente quanto aos órgãos das autarquias locais, o artigo 239.º passou a dispor o seguinte:

- A organização das autarquias locais compreende uma assembleia dotada de poderes deliberativos e um órgão executivo colegial perante ela responsável;
- A assembleia é eleita por sufrágio universal, directo e secreto dos cidadãos recenseados na área da respectiva autarquia, segundo o sistema da representação proporcional;
- O executivo colegial é constituído por um número adequado de membros, sendo designado presidente o primeiro candidato da lista mais votada para a assembleia ou para o executivo, de acordo com a solução adoptada na lei, a qual regulará também o processo eleitoral, os requisitos da sua constituição e destituição e o seu funcionamento.

A freguesia dispõe de um órgão deliberativo designado por assembleia de freguesia, e de um órgão executivo, designado por junta de freguesia (artigos 244.º a 246.º), e o município dispõe de um órgão deliberativo, designado por assembleia municipal, constituído por membros eleitos directamente em número superior ao dos presidentes das juntas de freguesia, que a integram, e de um órgão executivo, designado por câmara municipal (artigos 250.º a 252.º).
A matéria relativa às eleições e ao estatuto dos titulares dos órgãos de poder local integra-se na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República (artigo 164.º, alíneas l) e m)), devendo a lei que disponha sobre a eleição dos titulares dos órgãos de poder local revestir a forma de lei orgânica (artigo 169.º, n.º 2).
Para além disso, as disposições relativas ao sistema e método de eleição dos órgãos executivos e deliberativos das autarquias locais carecem de aprovação por maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções (artigo 168.º, n.º 6, alínea d)).

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Como bem se nota, o actual texto da Constituição, resultante do acordo de revisão constitucional celebrado em 1997 entre o PS e o PSD, deixa em aberto questões fundamentais quanto à arquitectura legal dos órgãos das autarquias locais e, nomeadamente, quanto à composição e forma de eleição dos seus órgãos executivos. Não tendo ambos os partidos chegado a acordo quanto a essa matéria, adoptaram uma formulação constitucional aberta, que permitisse manter a constitucionalidade da legislação vigente, complementada por uma blindagem bipartidária de qualquer solução futura, cuja aprovação foi condicionada à obtenção de uma maioria parlamentar qualificada de dois terços.
A matéria objecto das iniciativas legislativas em apreciação encontra-se presentemente regulada através da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto, alterada pela Lei Orgânica n.º 5-A/2001, de 26 de Novembro, e da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, alterada pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro.
Nos termos da Lei Eleitoral para os Órgãos das Autarquias Locais (Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto), os membros dos órgãos deliberativos das autarquias locais e do órgão executivo do município são eleitos por sufrágio universal, directo, secreto e periódico e por listas plurinominais apresentadas em relação a cada órgão, dispondo o eleitor de um voto singular de lista (artigo 11.º). A conversão de votos em mandatos faz-se de acordo com o método de representação proporcional correspondente à média mais alta de Hondt (artigo 13.º).
Segundo a lei que estabelece o quadro de competências, assim como o regime de funcionamento dos órgãos dos município e das freguesias (Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, alterada pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro), a assembleia de freguesia é eleita por sufrágio universal, directo e secreto dos cidadãos recenseados na área da freguesia, segundo o sistema de representação proporcional (artigo 4.º), sendo composta por 19 membros quando o número de eleitores for superior a 20 000, por 13 membros quando for igual ou inferior a 20 000 e superior a 5000, por nove membros quando for igual ou inferior a 5000 e superior a 1000 e por sete membros quando for igual ou inferior a 1000. Nas freguesias com mais de 30 000 eleitores o número de membros atrás referido é aumentado de mais um por cada 10 000 eleitores para além daquele número. Quando, por aplicação da regra anterior, o resultado for par, o número de membros obtido é aumentado de mais um (artigo 5.º).
Nas freguesias com 150 eleitores ou menos a assembleia de freguesia é substituída pelo plenário dos cidadãos eleitores (artigo 22.º).
A junta de freguesia é o órgão executivo colegial da freguesia, sendo constituída por um presidente e por vogais, sendo que dois exercerão as funções de secretário e de tesoureiro (artigo 23.º).
Nas freguesias com mais de 150 eleitores o presidente da junta é o cidadão que encabeçar a lista mais votada na eleição para a assembleia de freguesia e nas restantes é o cidadão eleito pelo plenário de cidadãos eleitores recenseados na freguesia. Os vogais são eleitos pela assembleia de freguesia ou pelo plenário de cidadãos eleitores, de entre os seus membros, mediante proposta do presidente da junta, sendo que nas freguesias com 5000 ou menos eleitores há dois vogais, nas freguesias com mais de 5000 eleitores e menos de 20 000 eleitores há quatro vogais, e nas freguesias com 20 000 ou mais eleitores há seis vogais (artigo 24.º).
A assembleia municipal é o órgão deliberativo do município (artigo 41.º), sendo constituída por membros eleitos directamente em número superior ao dos presidentes de junta de freguesia que a integram. O número de membros eleitos directamente não pode ser inferior ao triplo do número de membros da respectiva câmara municipal (artigo 42.º).

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A câmara municipal é constituída por um presidente e por vereadores, um dos quais designado vice-presidente, e é o órgão executivo colegial do município, eleito pelos cidadãos eleitores recenseados na sua área. A eleição da câmara municipal é simultânea com a da assembleia municipal, salvo no caso de eleição intercalar (artigo 56.º).
É presidente da câmara municipal o primeiro candidato da lista mais votada ou, no caso de vacatura do cargo, o que se lhe seguir na respectiva lista. Para além do presidente, a câmara municipal é composta por 16 vereadores em Lisboa, 12 vereadores no Porto, 10 vereadores nos municípios com 100 000 ou mais eleitores, oito vereadores nos municípios com mais de 50 000 e menos de 100 000 eleitores, seis vereadores nos municípios com mais de 10 000 e até 50 000 eleitores, e quatro vereadores nos municípios com 10 000 ou menos eleitores (artigo 57.º).

Evolução histórica

A regulação da administração local, e, concretamente, a composição e forma de eleição dos seus órgãos, marca presença desde os primórdios do constitucionalismo português (para além da bibliografia citada, a melhor obra de referência nesta matéria continua a ser César de Oliveira, História dos Municípios e do Poder Local - dos Finais da Idade Média à União Europeia, Lisboa, Círculo de Leitores, 1996).
A Constituição de 1822 que, embora de curta vigência, tem o mérito de ter sido a primeira Constituição política da nossa história que dedicava um capítulo às câmaras (artigos 218.º a 223.º), no qual se dispunha que o governo económico e municipal dos concelhos residirá nas câmaras (artigo 218.º). Haverá câmaras em todos os povos, onde assim convier ao bem público (artigo 219.º). As câmaras serão compostas do número de vereadores que a lei designar, de um procurador e de um escrivão. Os vereadores e procurador serão eleitos anualmente de forma directa, à pluralidade relativa de votos dados em escrutínio secreto e assembleia pública (é óbvio que o universo eleitoral não correspondia ao que hoje conhecemos - ver Constituição de 1822, artigos 33.º e 220.º). Será presidente da câmara o vereador que obtiver mais votos, devendo em caso de empate decidir a sorte (artigo 220.º). Para os cargos de vereador e procurador somente poderão ser escolhidos os cidadãos que estiverem no exercício dos seus direitos, sendo maiores de 25 anos, tendo residido pelo menos dois anos no distrito do concelho, não lhes faltando meios de honesta subsistência, e estando desocupados de emprego incompatível com os ditos cargos. Os que servirem um ano não serão reeleitos no ano seguinte (artigo 222.º).
A Carta Constitucional, outorgada em 1826, também se referia à administração local, embora em termos menos desenvolvidos. Dispunha que em todas as cidades e vilas existentes, e nas mais que para o futuro se criarem, haverá câmaras, às quais compete o governo económico e municipal das mesmas cidades e vilas (artigo 133.º). As câmaras serão electivas, e compostas do número de vereadores que a lei designar, e o que obtiver maior número de votos será presidente (artigo 134.º).
Da evolução legislativa subsequente importa destacar a criação legal das juntas de paróquia, em 1830, por decreto de 26 de Novembro publicado nos Açores, "por se entender que era necessário que houvesse em todas as paróquias uma autoridade local que possuísse a inteira confiança dos vizinhos e que estivesse especialmente encarregada de prover e administrar os negócios e interesses particulares dos mesmos. Haveria em cada paróquia uma junta nomeada pelos vizinhos da paróquia e encarregada de promover e administrar todos os negócios que fossem de interesse puramente local" (ver António Cândido de Oliveira, Direito das Autarquias Locais, Coimbra Editora, 1993, p.16).

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Em 1832 o célebre Decreto n.º 23 de Mouzinho da Silveira, de clara inspiração napoleónica, previa a existência em cada concelho de um provedor de nomeação governamental que detinha o essencial do poder administrativo, existindo ao seu lado, com funções muito limitadas, um corpo administrativo designado por câmara municipal, eleita indirectamente, tendo um número de vereadores igual ao número de freguesias (nos concelhos apenas com uma freguesia o número de vereadores era de três. O Decreto n.º 23 referia-se às freguesias e extinguia as juntas de paróquia da organização administrativa - ver António Cândido de Oliveira, obra citada, p. 18).
As reacções contra a excessiva centralização não se fizeram esperar e, desde logo, a Carta de Lei de 25 de Abril de 1835, bem como o Decreto de 18 de Julho que o regulamentou, antecedentes do Código Administrativo descentralizador de 1836, substituíram o provedor pelo administrador do concelho, mas atribuíram maior relevância ao presidente da câmara municipal. A regra era a da separação entre funções deliberativas e fiscalizadoras, por um lado, e executivas, por outro. A deliberação e a fiscalização competiam aos órgãos eleitos, e a execução ao magistrado administrativo, com a excepção da câmara municipal, que tomava as deliberações cuja execução competia ao seu presidente.
Em 1936, sob o impulso decisivo de Passos Manuel, foram publicados o Decreto de 6 de Novembro, que suprimiu mais de 400 concelhos, fixando o seu número em 351, e o Código Administrativo (em 31 de Dezembro), que determinava a existência em cada concelho de uma câmara municipal composta por um número de vereadores que dependia do número de fogos (artigos 21.º e 22.º). A eleição das câmaras era anual (artigo 33.º) e o presidente da câmara era eleito pelos vereadores à pluralidade de votos (artigo 23.º), cabendo-lhe executar as deliberações camarárias (artigo 203.º). Em cada concelho havia um magistrado administrativo escolhido pelo Governo de entre uma lista de cinco cidadãos eleitos directamente na mesma ocasião em que fosse eleita a câmara (artigo 114.º). Os cidadãos dispunham, assim, de dois votos: para a câmara e para o administrador do concelho. Este último tinha funções essencialmente policiais.
Na paróquia a junta era eleita directamente e o presidente era escolhido pelos seus membros. Havia um regedor escolhido pelo administrador do concelho de entre uma lista tríplice de membros eleitos pelos cidadãos da paróquia (ver António Cândido de Oliveira, obra citada, p. 24).
A Constituição de 1838, resultante da revolução de Setembro e que vigorou apenas até 1842, não previa a existência de qualquer magistrado administrativo junto dos concelhos, estabelecendo apenas que em cada concelho existe uma câmara municipal eleita directamente pelo povo, que terá a administração económica do município na conformidade das leis (artigo 130.º).
Com o Código Administrativo de 1842, na sequência da restauração da Carta Constitucional, a administração do concelho continuou a integrar a câmara municipal composta por um número de vereadores proporcional ao número de fogos e eleita por sufrágio directo e censitário, ao lado de um administrador do concelho, de nomeação governamental, que participava nas reuniões da câmara com voto consultivo (artigo 97.º). Entretanto, o mandato dos vereadores passou a ser de dois anos (artigo 47.º) e o presidente da câmara passou a ser o vereador com mais votos obtidos na eleição directa (artigo 9.º). Foi instituído um conselho municipal que integrava os maiores contribuintes do concelho, em número igual ao dos vereadores (artigo 165.º).
O Código Administrativo de 1978, de Rodrigues Sampaio, retomando a tendência descentralizadora do Código de 1836, consagrou a eleição directa das câmaras municipais e das juntas de paróquia. O mandato dos vereadores passou a ser de quatro anos, com renovação parcial da Câmara de dois em dois anos (artigo 9.º). O presidente e o vice-presidente da câmara eram eleitos pelos vereadores (artigo 13.º). Foi abolido o

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conselho municipal e o administrador do concelho passou a ser indicado pelo Governo, sob proposta do governador civil.
O Código Administrativo de 1886, que representou um novo refluxo da descentralização, reduziu para três anos o mandato de todos os corpos administrativos, sem renovação parcial, e introduziu a representação das minorias nos órgãos deliberativos eleitos. Porém, com a acentuação da crise financeira do país e a instauração do regime ditatorial de João Franco, o Código Administrativo de 1896 consignou a nomeação governamental anual dos presidentes das câmaras municipais e reforçou os poderes dos administradores do concelho.
Após a revolução republicana de 1910, o Decreto de 13 de Outubro repôs parcialmente em vigor o Código Administrativo de 1878, enquanto não fosse publicado um novo Código a elaborar por uma comissão desde logo nomeada. Entretanto, foram nomeadas comissões administrativas para os concelhos até à realização de eleições em 1913.
A Constituição de 1911 continha um artigo sobre as instituições locais administrativas (artigo 66.º), que consagrava como bases da organização e atribuições dos corpos administrativos, a regular em lei especial, entre outras, a divisão dos poderes municipais em deliberativo e executivo e a representação das minorias nos corpos administrativos.
Nos termos da Lei n.º 88, de 7 de Agosto de 1913, complementada pela Lei n.º 621, de 23 de Junho de 1916, tanto os municípios como as freguesias dispunham de órgãos deliberativos eleitos: as câmaras municipais e as juntas de freguesia. A administração municipal era assegurada pela câmara, eleita directamente por um período de três anos e com um número de vereadores dependente da classificação dos concelhos, que elegia, por sua vez, uma comissão executiva permanente, de entre os seus membros. A oposição estava representada na câmara municipal, havendo um sistema de eleição baseado na apresentação de listas incompletas. Mantinha-se a figura do administrador do concelho, se bem que com funções muito limitadas.
Com a instauração da ditadura e com o Código Administrativo de 1936 dá-se uma ruptura com a tradição administrativa liberal. As câmaras municipais deixam de ser directamente eleitas. O presidente e o vice-presidente da câmara municipal passam a ser designados pelo Governo e os vereadores a ser eleitos por um conselho municipal de composição corporativa.
Para proceder a uma breve síntese do que foi a evolução constitucional e legal portuguesa até à revolução de 25 de Abril de 1974, quanto à matéria que nos importa, que é fundamentalmente a da composição e forma de eleição dos órgãos municipais, podemos reter o seguinte:
Em matéria de atribuições, competências e autonomia dos órgãos municipais, Portugal oscilou entre momentos de maior pendor centralizador, representados pela legislação de Mouzinho da Silveira de 1832 e pelos Códigos Administrativos de 1842 (Costa Cabral), de 1896 (João Franco) e de 1936 (Marcelo Caetano), e de maior descentralização, durante a vigência dos Códigos Administrativos de 1836 (Passos Manuel), de 1878 (Rodrigues Sampaio), e, em princípio, durante a I República (embora a realidade tenha ficado sempre muito distante do ideal republicano da descentralização).
O órgão "câmara municipal" existiu sempre, embora com configurações diversas, com um âmbito maior de competências próprias nos períodos de descentralização acima referidos, sujeito a maiores tutelas ou reduções de competências nos momentos de maior centralização. Em todo o caso, directamente eleito, embora por sufrágio censitário, com excepção dos anos finais da monarquia, a partir de 1886, e do período

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correspondente à ditadura entre 1926 e 1974. Durante a I República a câmara funcionava como órgão deliberativo, existindo uma comissão executiva.
O princípio da representação das minorias na câmara municipal foi introduzido entre nós em 1886 e manteve-se como um princípio constitucional e legal durante toda a I República.
Após a revolução democrática de Abril de 1974, e com a entrada em vigor da Constituição da República Portuguesa de 1976, a autonomia do poder local foi consagrada como um dos princípios constitucionais fundamentais em matéria de organização descentralizada do Estado de direito democrático.
Em matéria de órgãos representativos, a Constituição estabeleceu como órgãos representativos da freguesia a assembleia de freguesia e a junta de freguesia, sendo a primeira eleita pelos cidadãos eleitores residentes na área da freguesia e a segunda (órgão executivo) por escrutínio secreto pela assembleia de entre os seus membros (artigos 246.º e 247.º). No município a Constituição consagrou a assembleia municipal como órgão deliberativo, constituído pelos presidentes das juntas de freguesia e por membros, em número não inferior ao daqueles, eleitos pelo colégio eleitoral do município, e a câmara municipal como órgão executivo, eleito pelos cidadãos eleitores residentes na sua área, tendo por presidente o primeiro candidato da lista mais votada (artigos 251.º e 252.º).
A concretização destes princípios foi levada a cabo inicialmente, logo em 1976, pelo Decreto-Lei n.º 701-A/76, de 29 de Setembro, sobre a estrutura, competência e funcionamento dos órgãos do município e da freguesia, e pelo Decreto-Lei n.º 701-B/76, da mesma data, que estabeleceu a lei eleitoral dos órgãos das autarquias locais, tendo este último sido aperfeiçoado pelo Decreto-Lei n.º 757/76, de 21 de Outubro.
O primeiro dos diplomas referidos foi substituído em 1979 pela Lei n.º 79/77, de 25 de Outubro, normalmente designada por "Lei das Autarquias", que foi substituída sucessivamente pelas Leis n.º 100/84, de 29 de Março, e n.º 169/99, de 18 de Setembro (esta última com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro).
A lei eleitoral veio a ser alterada sucessivamente pela Leis n.º 14-B/85, de 10 de Julho, n.º 9/95, de 7 de Abril, n.º 50/96, de 4 de Setembro, vigorando no presente a Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto, alterada pela Lei Orgânica n.º 5-A/2001, de 26 de Novembro.

Antecedentes legislativos

Os projectos de lei em apreciação, visando alterar a lei eleitoral, bem como o regime de funcionamento dos órgãos das autarquias locais, tendo em consideração o quadro constitucional supra referido, resultante da revisão constitucional de 1997, tiveram já alguns antecedentes na VIII Legislatura, através da apresentação de um conjunto significativo de iniciativas legislativas apresentadas pelo Governo e por diversos grupos parlamentares (as iniciativas legislativas em causa foram as seguintes: propostas de lei n.os 32 e 34/VIII, do Governo, e projectos de lei n.os 354/VIII, do PCP, 356/VIII, do PSD, 357/VIII, do PSD, 360/VIII, do BE, 364/VIII, do CDS-PP, 365/VIII, do CDS-PP, e 370/VIII, do PS, que conduziram à aprovação final da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto, alterada pela Lei Orgânica n.º 5-A/2001, de 26 de Novembro, que regula a eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais, e pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro, que veio alterar a Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, sobre competências e funcionamento dos órgãos das autarquias locais. Sobre todas essas iniciativas legislativas foi elaborado um excelente e pormenorizado relatório para a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, da autoria do Deputado Fernando Roboredo

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Seara, cuja leitura vivamente se recomenda (Diário da Assembleia da República, II Série A n.º 33, de 10 de Fevereiro de 2001).

Conteúdo dos projectos de lei apresentados

Cumpre agora apreciar o conteúdo das iniciativas legislativas apresentadas.
Tendo em consideração a existência de pontos comuns a ambos os projectos de lei, ainda que as soluções propostas possam ser diferentes, proceder-se-á a uma apreciação separada de cada um dos temas abordados nos projectos de lei, seguida das observações tidas por pertinentes. Mas não sem que antes se chame a atenção para uma questão prévia.

Consideração sistemática

Os projectos de lei em apreciação utilizam uma técnica legislativa que consiste em aditar um novo capítulo à Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto (que regula a eleição dos titulares dos órgãos das autarquias locais). Acontece, porém, que as disposições propostas constituem alterações à Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, alterada pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro, que estabelece o quadro de competências, assim como o regime de funcionamento dos órgãos dos municípios e das freguesias. Essas alterações, sendo profundas, não são expressamente discriminadas. Não há nenhuma disposição revogatória das disposições deste último diploma cuja alteração se pretende, nem qualquer norma que expressamente se refira às alterações a introduzir a alguma delas.
Meramente a título de exemplo, refira-se que as disposições propostas para o novo capítulo a aditar à Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto, implicaria forçosamente a alteração, pelo menos, dos artigos 5.º, 21.º, 24.º, 42.º, 46.º, 79.º e 157.º da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro. Sendo certo que diversas disposições ficariam parcialmente em vigor, quanto a outras teria de ser deixada ao intérprete a árdua tarefa de ajuizar das condições da sua vigência, dada a sua compatibilização problemática com as novas disposições.
Ou seja, embora o presente processo legislativo decorra independentemente de qualquer outro, não parece concebível, em nome da unidade da ordem jurídica, que as disposições propostas - a serem aprovadas - não sejam cuidadosamente compatibilizadas com uma necessária revisão simultânea da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro. Se assim não fosse, o regime jurídico aplicável aos órgãos das autarquias locais tornar-se-ia um emaranhado de disposições parcialmente conflituantes, seguramente desprestigiante para o legislador e, obviamente, infernal para quem tivesse de aplicar a lei.

Composição e forma de eleição dos órgãos autárquicos

Ambos os projectos de lei propõem alterações profundas quanto à forma de eleição dos órgãos das autarquias locais e quanto à composição e forma de constituição dos órgãos executivos.
Ao nível das freguesias não se prevêem alterações significativas. Continuaria a ser eleita directamente apenas a assembleia de freguesia, sendo presidente do órgão executivo (junta de freguesia) o primeiro candidato da lista mais votada, sendo os demais membros do executivo eleitos na assembleia de freguesia sob proposta do presidente da junta.

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Ao contrário do projecto de lei do PS, que não propõe quaisquer alterações ao regime vigente quanto às juntas de freguesia, o projecto de lei do PSD pretende aplicar também a estas o regime de investidura proposto para as câmaras municipais, que adiante será analisado, cabendo às assembleias de freguesia um papel semelhante ao que se prevê para as assembleias municipais.
Quanto aos órgãos municipais, ambos os projectos de lei propõem que as assembleias sejam eleitas nos termos da legislação actual, propondo apenas o PSD a existência de vice-presidentes dos órgãos deliberativos. Já quanto à composição dos executivos, convergem em algumas alterações propostas e divergem em outras.
Assim, em ambos os projectos de lei os membros dos órgãos executivos deixariam de ser eleitos por sufrágio directo, à excepção do presidente, que seria o primeiro candidato da lista mais votada na eleição do órgão deliberativo.
Quanto ao número de vereadores, ambos os projectos de lei reduzem de 16 para 12 o número de vereadores da câmara municipal de Lisboa, não propondo qualquer alteração quanto às restantes.
Segundo o projecto de lei do PS, todos os vereadores seriam designados pela assembleia municipal, sob proposta do presidente da câmara, recaindo a escolha obrigatoriamente sobre membros da própria assembleia, que seriam imediatamente substituídos.
O presidente da câmara disporia de um prazo de 10 dias para propor o executivo e a assembleia pronunciar-se-ia sobre a proposta no prazo de cinco dias.
Qualquer grupo municipal ou um quinto dos membros da assembleia poderia apresentar uma moção de rejeição, cuja aprovação exigiria o voto da maioria absoluta dos membros em efectividade de funções. Neste processo apenas participariam os membros da assembleia directamente eleitos, sendo, portanto, excluída a participação dos presidentes das juntas de freguesia.
Se não fosse apresentada, ou se não fosse aprovada, moção de rejeição, o executivo considerar-se-ia investido em plenitude de funções.
Caso fosse aprovada moção de rejeição, o presidente da câmara disporia de 15 dias para propor novo executivo. Em caso de segunda rejeição, realizar-se-iam eleições intercalares.
A composição do órgão executivo poderia ser alterada em função de vagas ocorridas ou por remodelação da iniciativa do presidente, sendo que, em ambos os casos, deveria o presidente indicar os novos membros, e submeter a sua proposta à apreciação da assembleia municipal. Em caso de remodelação, esta, se submetida a votação, teria de obter os votos da maioria absoluta dos membros directamente eleitos em efectividade de funções. As remodelações seriam vedadas nos seis meses seguintes à rejeição da intenção de remodelação, nos últimos seis meses do mandato e nos primeiros seis meses subsequentes à apreciação, inicial ou intercalar, do órgão executivo.
A diferença mais significativa entre os projectos de lei do PS e do PSD diz respeito à composição do órgão executivo. Enquanto o PS propõe a indicação de todos os membros pelo presidente, o PSD propõe que, em cada órgão executivo, as listas não vencedoras tenham o direito de indicar quatro membros do executivo para as câmaras de Lisboa e do Porto, três membros para as câmaras dos municípios com mais de 100 000 eleitores, dois membros para as câmaras dos municípios que tenham entre 50 000 e 100 000 eleitores e um membro para as demais câmaras.
Ou seja, nas câmaras dos municípios com menos de 50 000 eleitores haveria um vereador indicado pela segunda lista mais votada. Nos demais municípios haveria dois, três ou quatro vereadores, indicados pelas listas menos votadas, segundo o método de Hondt, salvaguardando o princípio de que as listas que

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obtivessem mais de 10% dos votos teriam, em princípio, direito a um vereador. Os vereadores indicados pelas listas não maioritárias continuariam a ser membros da assembleia municipal.
Finalmente, o projecto de lei do PS prevê a possibilidade da aprovação de moções de censura à câmara municipal por maioria de dois terços dos membros em efectividade de funções, excepto nos primeiros 12 meses e nos últimos seis meses do mandato, ficando os proponentes, em caso de rejeição, impedidos de apresentar nova moção no prazo de seis meses. Em caso de aprovação da moção de censura, o presidente da câmara ver-se-ia obrigado a propor a remodelação do executivo, que seria investido nos termos previstos para o início do mandato.
Importa, porém, referir, para boa clarificação do que está em causa, que a aprovação de uma moção de censura nos termos propostos configura uma hipótese quase académica, se tivermos em conta que, no mandato autárquico em curso, apenas em quatro municípios (de entre os 308 existentes) a soma dos eleitos de todas as listas menos votadas atinge os dois terços dos eleitos directos da assembleia municipal, e ainda assim, tangencialmente. São os casos de Niza (cinco da CDU, cinco do PS e cinco do PSD), Bombarral (sete do PSD, seis GCE, quatro do PS, dois da CDS-PP e dois da CDU), Sertã (sete do PSD, sete do GCE, seis do PS e um do CDS-PP) e Santa Cruz das Flores (cinco do PS, cinco do CDS-PP, quatro do PSD e um da CDU).
Estas propostas, independentemente do seu mérito, cuja apreciação não cabe fazer em sede do presente relatório, suscitam a necessidade de três breves observações, destinadas a suscitar a ponderação de alguns aspectos:

1 - Importa clarificar as eventuais causas de convocação de eleições intercalares. Fica claro que, segundo ambos os projectos de lei, haverá lugar a eleições intercalares no caso da aprovação de duas moções de rejeição consecutivas do executivo municipal, no início do mandato. Já não é claro o regime proposto quanto às consequências da não aprovação de eventuais remodelações propostas pelo presidente do órgão executivo, parecendo que, na falta de aprovação, o executivo se manteria com a composição anterior, mesmo que contra a opinião do presidente.
2 - A realização de eleições intercalares no início do mandato, por aprovação de duas moções de rejeição do executivo, contraria a actual norma constante do n.º 3 do artigo 222.º da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto, segundo a qual não há lugar à realização de eleições intercalares nos seis meses posteriores às eleições gerais para os órgãos das autarquias locais. Parece haver a clara intenção de revogar esta norma. A ser assim, importa fazê-lo expressamente para eliminar eventuais dúvidas que possam surgir. Caso seja essa a solução desejada pelo legislador, tal significa o desaparecimento de um período de estabilidade mínima que sempre se quis garantir para os órgãos recentemente eleitos. O novo regime proposto pode conduzir a uma situação de eleições intercalares sucessivas até que uma força política obtenha a maioria absoluta.
3 - O regime proposto pelo PSD, segundo o qual os vereadores indicados para o executivo municipal pelas listas não maioritárias se mantém como membros da assembleia municipal, suscita algumas dificuldades que importa ponderar. Na medida em que a Constituição e a lei estabelecem a clara diferenciação entre o órgão deliberativo e o órgão executivo, sendo este último responsável perante o primeiro e estando sujeito à sai fiscalização, oferece algumas dificuldades conceber que alguém possa pertencer simultaneamente ao órgão fiscalizado e ao órgão fiscalizador. Mesmo tendo em consideração a especial qualidade com que esses vereadores integram o executivo, o presidente da câmara não parece estar impedido de lhes delegar competências nem estes de aceitar competências delegadas.

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Outras propostas constantes do projecto de lei n.º 5/X

O projecto de lei n.º 5/X, do PSD, contém ainda outras propostas de alteração e aditamento à Lei n.º 1/2001, de 14 de Agosto, sobre as seguintes matérias:

- Limites à renovação sucessiva de mandatos: aditamento de dois novos números ao artigo 7.º, sobre inelegibilidades e limitação à renovação sucessiva de mandatos, no sentido de que os presidentes dos órgãos executivos não possam ser reeleitos para além de três mandatos consecutivos, não podendo igualmente candidatar-se ou ser eleitos durante o triénio imediatamente subsequente ao termo do terceiro mandato consecutivo. Igual regime de não reeleição seria aplicável ao caso de renúncia do mandato.
Esta proposta funda-se no n.º 2 do artigo 118.º da Constituição, aprovado aquando da VI Revisão Constitucional (Lei Constitucional n.º 1/2004, de 24 de Julho), segundo o qual a lei pode determinar limites à renovação sucessiva de mandatos dos titulares de cargos políticos executivos.
- Dispensa de funções dos candidatos: alteração ao artigo 8.º, restringindo os direitos dos candidatos à dispensa de funções. Nos termos da proposta, o direito a dispensa de funções dos candidatos aos órgãos das autarquias locais é reduzido dos actuais 30 dias para os 12 dias correspondentes ao período da campanha eleitoral e deixa de ser aplicável a todas as funções - públicas e privadas - para ser aplicável apenas às funções exercidas no serviço público.
Esta proposta suscita dois problemas:
Um deles, de ordem constitucional, diz respeito à igualdade entre os candidatos. Coloca-se a questão de saber se a lei pode atribuir um determinado direito (neste caso à dispensa de funções para efeitos de campanha eleitoral) apenas a uma determinada categoria de cidadãos (os que prestem funções de serviço público), excluindo os demais. Esta proposta afigura-se de duvidosa compatibilidade com diversas disposições constitucionais conjugadas, designadamente a alínea b) do artigo 113.º, que consagra a igualdade de oportunidades e de tratamento das diversas candidaturas como princípio geral de direito eleitoral e o n.º 1 do artigo 13.º, que consagra o princípio da igualdade de todos os cidadãos perante a lei.
Um segundo problema é de ordem conceptual e diz respeito ao que seja "serviço público" para este efeito. A delimitação do que se entende por "serviço público" não é isenta de dificuldades. Saber se esta disposição seria aplicável aos cidadãos contratados pela administração pública ao abrigo de um contrato individual de trabalho, ou aos cidadãos ao serviço de uma empresa concessionária de um serviço público, seria tarefa complexa para o intérprete e geradora de potenciais situações de conflito e de disparidade na aplicação da lei. Aconselhar-se-ia, por isso, uma formulação mais rigorosa que delimitasse sem margem para dúvidas o universo a abranger.
Note-se entretanto que a redução da aplicação desta norma apenas ao período da campanha eleitoral também consta do projecto de lei n.º 28/X, do PS, que mantém, todavia, a sua aplicação a todos os candidatos independentemente de exercerem funções públicas ou privadas.
- Imunidade dos presidentes dos órgãos executivos: os presidentes dos órgãos executivos das autarquias locais só poderiam ser detidos ou presos em cumprimento de mandado judicial, salvo no caso de flagrante delito.
Esta proposta suscita igualmente dois problemas:
Um deles de inserção sistemática. A proposta surge como aditamento ao artigo 9.º, inserido no Capítulo IV, sobre "Estatuto dos candidatos", mas não diz respeito aos candidatos. Trata-se de uma matéria relativa ao

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estatuto dos presidentes dos órgãos executivos, e, assim sendo, deveria ser tratada em sede de alteração ao Estatuto dos Eleitos Locais (Lei n.º 29/87, de 30 de Junho, alterada pelas Leis n.º 97/89, de 15 de Dezembro, n.º 1/91, de 10 de Janeiro, n.º 11/91, de 17 de Maio, n.º 11/96, de 18 de Abril, n.º 127/97, de 11 de Dezembro, n.º 50/99, de 24 de Junho, n.º 86/2001, de 10 de Agosto, e n.º 22/2004, de 17 de Junho).
O segundo problema é de ordem constitucional. Pode o legislador estabelecer um regime especial de imunidade em matéria de detenção para os presidentes dos órgãos executivos das autarquias locais que não esteja expressamente previsto na Constituição? A resposta afigura-se-nos no mínimo duvidosa.
Na verdade, a Constituição estabelece no seu artigo 13.º o princípio geral da igualdade dos cidadãos perante a lei. O artigo 27.º estabelece os direitos dos cidadãos à liberdade e à segurança, o artigo 28.º regula os termos da aplicação da prisão preventiva e o artigo 32.º as garantias de processo criminal.
Os regimes excepcionais são os previstos expressamente na Constituição, no artigo 130.º para o Presidente da República, no artigo 157.º para os Deputados à Assembleia da República, e no artigo 196.º para os membros do Governo.
É certo que a Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto, prevê no seu artigo 9.º um regime para os candidatos aos órgãos das autarquias locais, segundo o qual nenhum candidato pode ser sujeito a prisão preventiva, a não ser em caso de flagrante delito, por crime doloso a que corresponda pena de prisão cujo limite máximo seja superior a três anos, e que, movido procedimento criminal contra algum candidato e indiciados estes definitivamente por despacho de pronúncia ou equivalente, o processo só pode prosseguir após a proclamação dos resultados das eleições. Trata-se, porém, de uma norma de aplicação temporal muito transitória - entre a apresentação da candidatura e a realização das eleições - e que introduz apenas um limite à aplicação da prisão preventiva, nada dispondo quanto à detenção.
Ao contrário, o que se propõe no projecto de lei n.º 5/X é um regime especial de detenção a aplicar a título definitivo aos presidentes das câmaras municipais e das juntas de freguesia. Estes nunca poderiam ser detidos ou presos fora de flagrante delito sem mandado judicial, independentemente do tipo de crime de que fossem suspeitos.
É uma questão que deve ser adequadamente ponderada quanto à sua conformidade constitucional.

Observações finais

Nos termos do artigo 151.º do Regimento da Assembleia da República, a comissão competente deve promover a consulta da Associação Nacional de Municípios Portugueses e da Associação Nacional de Freguesias sempre que se trate de projectos de lei ou propostas de lei respeitantes às autarquias locais. Sendo manifestamente o caso, embora tal consulta não seja viável antes da apreciação na generalidade, torna-se obrigatória a sua realização em tempo útil durante o debate na especialidade.
Nestes termos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias está em condições de extrair as seguintes

Conclusões

1 - O projecto de lei n.º 5/X - Alteração à Lei Eleitoral para os Órgãos das Autarquias Locais -, apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, propõe uma forma de eleição e um modelo organizativo dos órgãos autárquicos assente nos seguintes princípios:

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a) A eleição directa do presidente do órgão executivo, como primeiro cidadão da lista mais votada para a assembleia municipal ou da freguesia;
b) A liberdade de indicação dos vereadores ou vogais pelo presidente eleito, de entre os membros escolhidos pelo eleitorado para a assembleia respectiva, garantindo-se sempre uma maioria absoluta no executivo para o candidato vencedor;
c) A garantia de representação das forças políticas não vencedoras no executivo;
d) O limite à renovação sucessiva dos mandatos para além de três;
e) A dependência política do executivo perante a assembleia, estabelecendo-se o princípio limite de dissolução simultânea dos dois órgãos em caso de reiterada rejeição à constituição em concreto do órgão executivo.

2 - O projecto de lei n.º 28/X - Alterações à Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais -, apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, propõe um sistema baseado nos seguintes princípios:

a) A eleição directa, secreta, universal, periódica e conjunta da assembleia municipal e do presidente da câmara municipal;
b) Que o presidente da câmara municipal seja o primeiro candidato da lista mais votada para a assembleia municipal;
c) Que ao presidente da câmara municipal caiba o poder de designação dos demais membros da câmara municipal, escolhidos de entre os membros da assembleia eleitos directamente;
d) A dotação da assembleia municipal com o poder de apreciar a constituição, acompanhada da declaração de investidura, e a remodelação do órgão executivo;
e) O exercício de tais direitos compete apenas aos membros da assembleia municipal eleitos directamente e em efectividade de funções;
f) A deliberação de rejeição do executivo apresentado pelo presidente da câmara municipal carece de maioria absoluta, sendo, em caso de rejeições sucessivas, a resolução da crise política assim gerada devolvida aos eleitores através de eleições intercalares.

3 - Sem prejuízo de algumas ponderações e aferições de conformidade constitucional cuja avaliação se sugere em sede do debate na generalidade e/ou na especialidade, caso este tenha lugar, este processo legislativo, tendo em conta as suas implicações legislativas, não pode deixar de ser complementado pela revisão simultânea da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, alterada pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro, que estabelece o quadro de competências, assim como o regime de funcionamento dos órgãos dos municípios e das freguesias.
4 - Nos termos do artigo 151.º do Regimento da Assembleia da República, o presente processo legislativo carece de consulta à Associação Nacional de Municípios Portugueses e à Associação Nacional de Freguesias.

Parecer

Nestes termos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que os projectos de lei n.os 5/X, do PSD (Alteração à Lei Eleitoral para os Órgãos das Autarquias Locais), e 28/X, do PS (Alterações à Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais), estão em condições constitucionais e regimentais de subir a Plenário para apreciação na generalidade, reservando os grupos parlamentares para esse debate as respectivas posições sobre a matéria.

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Assembleia da República, 26 de Abril de 2005.
O Deputado Relator, António Filipe - O Presidente da Comissão, Osvaldo de Castro.

Nota - O relatório, as conclusões e o parecer foram aprovados por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CDS-PP, BE e Os Verdes.

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PROJECTO DE LEI N.º 8/X
(ALTERA O DECRETO-LEI N.º 369/90, DE 26 DE NOVEMBRO, COM VISTA A PROMOVER A IGUALDADE ENTRE HOMENS E MULHERES NOS MANUAIS ESCOLARES)

Relatório e parecer da Comissão de Educação, Ciência e Cultura

Relatório

Nota prévia

Os Deputados do Partido Ecologista Os Verdes, Heloísa Apolónia e outro, apresentaram, nos termos do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e dos artigos 131.º e 138.º do Regimento da Assembleia da República, o projecto de lei n.º 8/X, que "Altera o Decreto-Lei n.º 369/90, de 26 de Novembro, com vista a promover a igualdade entre homens e mulheres nos manuais escolares". Por despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República, de 12 de Abril de 2005, o projecto de lei vertente baixou à Comissão de Educação, Ciência e Cultura.

Da motivação

A exposição de motivos deste projecto de lei aborda a questão da reprodução de estereótipos femininos e masculinos inscritos nos conteúdos dos livros escolares que, à luz de objectivos ou determinações internacionais, do âmbito das Nações Unidas, da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa e do Parlamento Europeu, se encontra incluída na acepção educacional visando a promoção da igualdade de géneros e não discriminação das mulheres. Neste sentido adverte o documento em análise para a necessidade de, em sede de comissões científico-pedagógicas, haver lugar para um acompanhamento por parte de representantes do Conselho Consultivo da Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres e do Conselho Nacional de Educação, por forma a prevenir a inserção de conteúdos discriminatórios.

Do objecto

O presente projecto de lei pretende:
- Encontrar estratégias e implementar medidas que eliminem discriminações e desfaçam estereótipos tendentes à reprodução de modelos enraizados da diferenciação do papel do homem e da mulher na sociedade;
- Incluir nas comissões científico-pedagógicas para a apreciação da qualidade dos manuais escolares dois representantes de organizações não governamentais que integrem o Conselho Consultivo da Comissão

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para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres, bem como um representante do Conselho Nacional de Educação;
- Que a mencionada comissão científico-pedagógica emita parecer sobre a qualidade dos manuais escolares, no respeito pelos conceitos defendidos, a saber a promoção da igualdade de géneros e eliminação de todas as formas de discriminação, tendo em conta a defesa dos direitos humanos;
- Que entidades da sociedade civil ou órgãos pedagógicos dos estabelecimentos de ensino possam solicitar a apreciação dos manuais escolares;
- Que os encargos decorrentes da mesma apreciação imputem ao Ministério da tutela.

Parecer

A Comissão de Educação, Ciência e Cultura é do seguinte parecer:

a) Estão preenchidos todos os requisitos legais e regimentais para que o projecto de lei n.º 8/X suba ao Plenário da Assembleia da República para apreciação e votação;
b) Os grupos parlamentares reservam as suas posições para o debate.

Palácio de São Bento, 20 de Abril de 2005.
A Deputada Relatora, Cristina Granada - O Presidente da Comissão, António José Seguro.

Nota: - O parecer foi aprovado por unanimidade, tendo-se registado a ausência do BE e de Os Verdes.

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PROJECTO DE LEI N.º 24/X
[ALTERA A LEI N.º 17/2003, DE 4 DE JUNHO (INICIATIVA LEGISLATIVA DOS CIDADÃOS)]

PROJECTO DE LEI N.º 33/X
(ALTERA A LEI N.º 17/2003, DE 4 DE JUNHO, QUE REGULA A INICIATIVA LEGISLATIVA DE CIDADÃOS)

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

I - Relatório

1.1 - Considerações iniciais

O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projecto de lei n.º 24/X, que "Altera a Lei n.º 17/2003, de 4 de Junho (Iniciativa Legislativa de Cidadãos)".

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Igualmente, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresentou o projecto de lei n.º 33/X, que incide sobre matéria análoga, visando alterar a Lei n.º 17/2003, de 4 de Junho, que regula a Iniciativa Legislativa de Cidadãos.
A apresentação de tais iniciativas foi efectuada nos termos do artigo 167.º da CRP e do artigo 131.º do Regimento, reunido ainda os requisitos formais previstos no artigo 138.º do mesmo Regimento, pelo que nada parece obstar à sua admissibilidade.
Por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, ambos os projectos de lei baixaram à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para emissão do respectivo relatório e parecer, tendo sido designada a ora signatária.
A discussão, na generalidade, será efectuada em conjunto na reunião plenária de 27 de Abril de 2005.

1.2 - Dos antecedentes parlamentares e enquadramento legal

O instituto da iniciativa legislativa por parte de cidadãos encontra-se regulado na Lei n.º 17/2003, de 4 de Junho. Esta lei resultou da aprovação dos projectos de lei n.os 9/IX, do BE, 51/IX, do PS, 68/IX, do PCP, e 145/IX, do PSD e CDS-PP - vide relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, subscrito pelo Sr. Deputado António Filipe, in DAR II Série A n.º 38, de 5 de Novembro de 2002, e discussão conjunta na generalidade in DAR I Série n.º 50, de 18 de Outubro de 2002.
Sublinhe-se que o processo conducente à consagração deste direito se iniciou bastante antes, tendo sido apresentados e discutidos projectos de lei desta natureza ao longo da VII Legislatura (através dos projectos de lei n.os 422/VII, do PCP, 455/VII, do PSD, e 456/VII, do PS, a matéria da iniciativa legislativa popular já havia sido chamada à colação, tendo os mesmos sido aprovados na generalidade na reunião plenária de 12 de Fevereiro de 1998. Com o término da legislatura, e sem que se tivesse fixado um texto final em sede de especialidade, operou-se a sua caducidade), e da VIII Legislatura (em que se renovaram as iniciativas, tendo sido apresentados os projectos de lei n.os 75/VIII, do PSD, 95/VIII, do PCP, 192/VIII, do PS, e 193/VIII, do BE, todos aprovados na generalidade, por unanimidade. A dissolução da Assembleia da República no início de 2002 conduziu à caducidade destes projectos de lei), sem que o processo legislativo tivesse sido concluído.
A actual Lei n.º 17/2003 (sublinhe-se que esta lei foi aprovada por unanimidade em votação final global - vide DAR I Série n.º 113, de 26 de Abril de 2003), de 4 de Junho, regula os termos e condições em que grupos de cidadãos eleitores exercem o direito de iniciativa legislativa junto da Assembleia da República, nos termos do artigo 167.º da Constituição, bem como a sua participação no procedimento legislativo a que deram origem.
Esta lei é composta por 15 artigos, ao longo dos quais se densifica o regime da instituto da iniciativa legislativa de cidadãos no tocante à titularidade, objecto, limites, garantias, requisitos exigidos, tramitação, caducidade e renovação.
Segundo Miguel Sousa Ferro (in Iniciativa Legislativa Popular, Revista da Faculdade de Direito de Lisboa, Coimbra Editora, 2002), a iniciativa legislativa é juridicamente concebida como um poder (nomeadamente de grupos de cidadãos eleitores), atribuído directamente pela Constituição para a realização do interesse público.

1.3 - Breve enquadramento constitucional do direito de iniciativa legislativa popular

A Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro, veio possibilitar a consagração constitucional do direito de iniciativa legislativa popular. Com efeito, prevê o artigo 167.º, n.º 1, da CRP que "A iniciativa da lei e do

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referendo compete aos Deputados, aos grupos parlamentares e ao Governo, e ainda, nos termos e condições estabelecidas na lei, a grupos de cidadãos eleitores, competindo a iniciativa da lei, no respeitante às regiões autónomas, às respectivas assembleias legislativas regionais".
Através deste preceito constitucional é estabelecido o direito de iniciativa popular, legislativa e do referendo nos termos e condições estabelecidas na lei, a grupos de cidadãos eleitores - vide a este propósito Constituição da República Portuguesa, prefácio e anotações por Jorge Lacão, 4.ª Revisão Constitucional, Texto Editora, 1997).
É-lhes, obviamente, aplicável a "regra-travão" quanto a iniciativas que envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesas (artigo 167.º, n.os 2 e 3), assim como o regime da renovação (artigo 167.º, n.º 4).
A iniciativa legislativa popular é definida no Dicionário de Revisão Constitucional (por José Magalhães, Editorial Notícias, 1.ª Edição, Fevereiro de 1999) como um "instrumento de articulação entre a democracia directa e as instituições representativas". A iniciativa legislativa popular faculta, assim, aos cidadãos o direito de, em certas condições, apresentarem à Assembleia da República projectos de lei, assegurando-se a sua apreciação pelo Plenário.

1.4 - As opções legislativas contidas nos projectos de lei n.os 24/X, do PCP, e 33/X, do BE

Do projecto de lei n.º 24/X, do PCP:

Os proponentes da iniciativa vertente consideram como adequado o número mínimo de 5000 cidadãos eleitores para apresentar uma iniciativa legislativa à Assembleia da República, número, aliás, que têm vindo a defender em todas as iniciativas apresentadas sobre esta matéria.
Chamam à colação, a título comparativo, que com 7500 assinaturas se pode constituir um partido ou apresentar uma candidatura à Presidência da República, pelo que consideram que a exigência de 35 000 assinaturas é revelador de "falta de proporcionalidade".
Por forma a concretizar esta pretensão, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta-nos um articulado composto por um artigo único, onde se propõem alterar os requisitos actuais quanto ao número exigido de assinaturas para o exercício do direito de iniciativa legislativa (35 000), propondo que o direito de iniciativa legislativa possa ser exercido por um número mínimo de 5000 cidadãos eleitores.

Do projecto de lei n.º 33/X, do BE:

Por seu turno, o projecto de lei do BE incide igualmente sobre os requisitos constantes no n.º 1 do artigo 6.º da lei vigente, propondo os seus autores que o número mínimo exigível para a apresentação de projectos de lei à Assembleia da República possa ser diminuído consideravelmente e se cifre nas 4000 assinaturas.
Este projecto de lei prevê, ainda, uma alteração ao actual artigo 8.º, relativo à admissão das iniciativas, propondo-se o aditamento de um novo n.º 4, onde se consagra a possibilidade dos serviços jurídicos da Assembleia da República poderem sujeitar à consideração da comissão representativa de cidadãos subscritores modificações formais para melhoria do texto.
A motivação subjacente a este projecto de lei alicerça-se em duas ordens de argumentos. Em primeiro lugar, entende-se que será "de elementar equidade equiparar o número de cidadãos eleitores necessários

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para subscreverem uma iniciativa legislativa àqueles que a lei do exercício do direito de petição requer para que qualquer petição possa vir a ser apreciada em Plenário".
Os proponentes referem ainda, a título preambular, que, uma vez que se trata de iniciativas apresentadas por pessoas menos familiarizadas com técnicas legislativas, devem os serviços jurídicos da Assembleia da República propor à comissão representativa dos subscritores alterações formais para melhoramento do texto.
Refira-se que estas duas propostas de alteração ao texto legal vigente já constavam do projecto de lei n.º 9/IX, do Bloco de Esquerda, e que não foram acolhidas aquando da feitura do texto final que conduziu à Lei n.º 17/2003, de 4 de Junho.
A opção comum a ambos os projectos de lei é, sem dúvida e antes do mais, uma opção política que, como tal, terá de ser dirimida. No debate de 2002 foi amplamente discutida, tendo sido notória as profundas divergências entre os partidos políticos e que agora é colocada de novo a esta Assembleia da República para apreciação.
Entendemos, contudo, que não se deve forçar analogias com institutos intrinsecamente diferentes, designadamente com o instituto da petição.
Com efeito, o exercício do direito de petição reveste-se de alguma informalidade, e, tal como observam J.J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, "a petição não tem que ser adequada quanto ao seu objecto, nem apropriada quanto aos termos, não tendo que se apresentar respeitosa, cordata ou sequer pertinente. Também não tem de ser fundada, embora não possa ser maliciosa. O teor e os termos da petição podem pesar na sua apreciação, mas não na licitude do seu exercício. Finalmente, o direito de petição não exige a competência do órgão peticionado para praticar o acto ou tomar a providência pedidos, devendo aquele remeter ou reenviar a petição ao órgão ou autoridade pública competentes".
Tal como bem observa José Magalhães no já citado Dicionário, "da Constituição decorre uma distinção clara entre o direito de iniciativa legislativa popular e o direito de petição. Este último não só pode ser exercido a nível individual ou por pessoas colectivas - ao invés do direito de iniciativa legislativa, reservado a colectivos integrados por número significativo de pessoas - como repousa num elevado grau de informalidade".
O autor refere, ainda, que "devendo embora ser inteligíveis e dotadas de sentido, não é imprescindível que as petições apontem soluções concretamente desenhadas. Ao invés, a iniciativa legislativa de grupos de cidadãos não visa meramente chamar a atenção para uma situação, criticar actos administrativos, denunciar violações da Constituição ou da lei ou pedir providências aos poderes públicos. Trata-se de, concreta e especificamente, aventar soluções legais, desenhando os respectivos contornos em condições susceptíveis de persuadir os Deputados sobre o bem fundado do proposto".
Não se pretendeu efectivamente estimular algo indistinguível de uma petição colectiva mas, sim, potenciar a elaboração de verdadeiros e próprios "projectos de lei".
A norma constitucional remeteu para a lei, sujeita a variações em função do tempo e das circunstâncias, a fixação do número de cidadãos eleitores necessários para a subscrição de iniciativas legislativas. O legislador ordinário fixou esse tecto em 35 000 assinaturas.
Acresce que as experiências de direito comparado nesta matéria são reveladoras de um elevado patamar no tocante ao número mínimo exigível (em Espanha a Constituição exige 500 000 assinaturas reconhecidas, em Itália a iniciativa de leis carece de pelo menos 50 000 eleitores e no Brasil estabelece-se que os respectivos projectos devem ser subscritos por, pelo menos, 1% do eleitorado nacional de cinco ou mais Estados, em número não inferior a 0,3% dos eleitores de cada um deles. Nos países da Europa da leste o retrato não é muito diferente: na Polónia a titularidade recai sobre um mínimo de 100 000 cidadãos com direito

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a voto nas eleições para a Câmara dos Representantes, na Jugoslávia estabelece-se 30 000 eleitores, na Lituânia exige-se 50 000 cidadãos - vide Miguel Sousa Ferro, in Revista da Faculdade de Direito de Lisboa, Coimbra Editora, 2002), pelo que deveremos sempre neste domínio equacionar a acessibilidade dos cidadãos a este importante instrumento de democracia participativa com a vontade mais ou menos expressiva da sociedade portuguesa em relação a determinada matéria.

II - Conclusões

Do exposto se conclui que:

1 - O direito de grupos de cidadãos apresentarem iniciativas legislativas à Assembleia da República encontra-se consagrado no artigo 167.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, abertura essa que surgiu no decurso da IV Revisão Constitucional e que culminou na aprovação da Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro;
2 - O direito de iniciativa legislativa veio a ser regulado em 2003, com a aprovação da Lei n.º 17/2003, de 4 de Junho, que, no respeitante aos requisitos, estabelece actualmente, no n.º 1 do seu artigo 6.º, que "o direito de iniciativa legislativa de cidadãos é exercido através da apresentação à Assembleia da República de projectos de lei subscritos por um mínimo de 35 000 cidadãos eleitores";
3 - As iniciativas legislativas objecto de apreciação deste relatório apresentam soluções normativas que vão no sentido de alterar o n.º 1 do artigo 6.º da lei vigente, propondo a diminuição, de forma considerável, do número mínimo de assinaturas exigíveis para a apresentação de iniciativas, 5000 no projecto de lei n.º 24/X, do PCP, e 4000 no projecto de lei n.º 33/X, do BE;
4 - O projecto de lei n.º 33/X consagra ainda a possibilidade dos serviços jurídicos da Assembleia da República sugerirem aperfeiçoamentos formais à comissão representativa dos subscritores;
5 - A apresentação dos projectos de lei supra referidos foi efectuada nos termos do artigo 167.º da CRP e do artigo 131.º do Regimento, reunindo ainda os requisitos formais previstos no artigo 138.º do mesmo Regimento, pelo que nada parece obstar à sua admissibilidade.

Nestes termos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, é do seguinte:

III - Parecer

Os projectos de lei n.os 24/X, apresentado pelo Partido Comunista Português, e 33/X, apresentado pelo Bloco de Esquerda, encontram-se em condições constitucionais e regimentais de subir a Plenário para a apreciação na generalidade, reservando os grupos parlamentares a sua posição para o debate.

Assembleia da República, 26 de Abril de 2005.
A Deputado Relatora, Susana Amador - O Presidente da Comissão, Osvaldo Castro.

Nota - O relatório, as conclusões e o parecer foram aprovados por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CDS-PP, BE e Os Verdes.
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PROPOSTA DE LEI N.º 5/X
CRIA O SIFIDE - SISTEMA DE INCENTIVOS FISCAIS EM INVESTIGAÇÃO E DESENVOLVIMENTO EMPRESARIAL

Exposição de motivos

A capacidade de Investigação e Desenvolvimento (I&D) das empresas é um factor decisivo não só da sua própria afirmação enquanto estruturas competitivas, como da produtividade e do crescimento económico a longo prazo, facto, aliás, expressamente reconhecido no Programa do XVII Governo, assim como em relatórios internacionais recentes, nomeadamente nas conclusões do relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), Tax Incentives for Research and Development, 2003, e no relatório da Comissão Europeia, sobre Monitoring Industrial Research, 2004.
Foi neste contexto que já em 1997 tinha sido instituído pelo Decreto-Lei n.º 292/97, de 22 de Outubro, um crédito fiscal para investimento em I&D, SIFIDE, sendo que, a partir de então, Portugal deixou de ser um dos poucos países da OCDE a não dispor de um instrumento fiscal específico de apoio à I&D, minorando-se, consequentemente, a situação desfavorável em que se encontrava em termos de captação de investimento qualificado.
Dado o balanço positivo desta fase experimental da introdução dos incentivos fiscais à I&D empresarial, e considerando também a evolução dos sistema de apoio dos outros países, foi decidido pelo Decreto-Lei n.º 197/2001, de 29 de Junho, reforçar este sistema de apoio, aumentando para 20% a taxa de base e para 50% a taxa incremental, e permitindo a dedução até ao sexto exercício imediato. Como resultado desta alteração, em 2001 aderiram ao sistema mais 47% de novas empresas face ao número de empresas que tinham recorrido em 2000.
Considerando a grande adesão dos sujeitos fiscais a este incentivo e, bem assim, da evolução deste tipo de apoio noutros países, a aplicação do regime de crédito fiscal para investimento em I&D não só foi estendida aos triénios fiscais de 1998-2000 e de 2001-2003 (pelas Lei n.º 127-B/97, de 20 de Dezembro, e Lei n.º 3-B/2000, de 4 de Abril, respectivamente), como se aumentou de forma significativa o montante das taxas e o período de dedução das despesas em I&D através do Decreto-Lei n.º 197/2001, de 29 de Junho. De facto, entre 1997 e 2003, Portugal foi o país da União Europeia com o maior ritmo de crescimento em I&D empresarial (cerca de 18% ao ano a preços constantes), tendo sido registadas 1061 candidaturas ao sistema de incentivos, num universo total de 381 empresas. Neste âmbito, o apoio fiscal tornou-se o principal instrumento do apoio do Estado à I&D nessas empresas, tendo passado de 56%, em 1997, para 85%, em 2003; do total do apoio público, substituindo claramente em importância os apoios financeiros públicos que anteriormente eram a única forma de apoio. Nota-se que os dois tipos de apoios públicos são, aliás, fortemente complementares, já que se constata que 58% das empresas que recorreram ao SIFIDE não tiveram apoios financeiros à I&D no âmbito de fundos estruturais (isto é, QCA 2 e 3). De facto, o apoio por via fiscal representou só por si mais de 30% das despesas destas empresas em I&D depois da revisão da legislação em 2001, enquanto que anteriormente só cobria cerca de 15% destas despesas. Nota-se ainda que mais de 2000 empresas tiveram actividades de I&D desde 1995, tendo o SIFIDE contribuído para o alargamento do número de empresas com actividades de I&D em Portugal, em particular depois da sua revisão em 2001. Enquanto na primeira fase predominavam empresas mais antigas de sectores tradicionalmente com maior peso na I&D empresarial (Química, Equipamentos Eléctricos e Electrónicos, Telecomunicações), a revisão do SIFIDE em 2001 viria a aumentar o peso relativo das empresas criadas após

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1995, com predomínio de actividades e tecnologias mais modernas, como sejam o software, serviços às empresas, têxteis técnicos, e o despontar das empresas de biotecnologia. O papel do SIFIDE foi ainda mais importante como instrumento de intensificação do esforço de I&D empresarial de forma contínua. De facto, a percentagem das empresas que investiram em I&D três por cento ou mais das suas vendas passou de 42%, em 1998, para 48%, em 2003. Também o número de empresas que ultrapassou o limiar de 100 000 contos de dedução, estabelecido na legislação de 2001 para aplicação da taxa incremental, passou em dois anos de 6% para 16%, assinalando uma dinâmica que aconselha a sua actualização. Adicionalmente, o número médio de investigadores por empresa cresceu 50%. Um estudo realizado para as empresas que concorreram ao SIFIDE simultaneamente em 1998 e 2000 já tinha, aliás, mostrado que este sistema tinha um papel importante na melhoria do grau de formação dos recursos humanos, já que nesse biénio essas empresas aumentaram em 17% o número de licenciados e em 57% o número de mestres e doutores.
Foi neste contexto que, no panorama internacional, a OCDE considerou em 2001 Portugal como um dos três países com um avanço mais significativo na I&D empresarial e que o sistema nacional então vigente, comparativamente aos demais sistemas que utilizam a dedução à colecta e a distinção entre taxa base e taxa incremental, era um dos mais atractivos e competitivos.
A interrupção do sistema de incentivos fiscais na Lei do Orçamento do Estado para 2004 contrariou as expectativas dos agentes económicos que vinham a investir em I&D e que, desta forma, ficaram privados de um instrumento fundamental de apoio. De facto, o sistema da reserva fiscal para investimento, entretanto criado pelo Decreto-Lei n.º 23/2004, de 23 de Janeiro, não pode ser considerado como sucedâneo do regime do Decreto-Lei n.º 292/97, de 22 de Outubro. Na verdade, não só o seu âmbito subjectivo é mais restrito, como coloca em confronto directo investimentos para equipamentos e investimentos em I&D, cujas taxas e demais condições das categorias de despesas dedutíveis são comparativamente restringidas.
Importa, pois, repor, como previsto no Programa do Governo, os incentivos fiscais de dinamização da I&D empresarial em cooperação com as universidades e outras instituições de investigação, que terá um papel fundamental na implementação do plano tecnológico. A meta apontada, de triplicar as actividades de I&D pelas empresas a laborar em Portugal, só é possível com um redobrar do apoio público às empresas que efectivamente queiram apostar na inovação científica e tecnológica como eixo central das suas estratégias de competitividade. O apoio sob a forma de incentivo fiscal terá uma importância crescente, não só por ser uma forma mais expedita para as empresas que queiram intensificar os seus investimentos de forma organizada e continuada, como por permitir alavancar os efeitos dos apoios financeiros. Nas medidas de apoio financeiro à I&D em consórcio entre empresas e instituições de investigação do QCA 3 (POCTI e POSI) foi introduzida uma componente de apoio reembolsável, que representa um passo assinalável no envolvimento das empresas nos resultados dos projectos. A reposição do SIFIDE, ao permitir deduzir parte dos reembolsos que irão efectuar às entidades financiadoras, é um justo prémio a um envolvimento que se quer crescente.
Do regime constante do Decreto-Lei n.º 292/97, de 22 de Outubro, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 197/2001, de 29 de Junho, mantêm-se:

i) A forma da dedução de despesas;
ii) A dedução base de 20% das despesas realizadas e a dedução de 50% sobre o acréscimo de despesa, em relação aos dois exercícios anteriores;
iii) O período de seis anos em que as despesas podem ser deduzidas;
iv) O elenco das despesas dedutíveis.

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A experiência demonstra que os aspectos onde se mostra aconselhável inovar em relação àquele regime são os seguintes:

i) O aumento do montante máximo de dedução, que passa de 500 000 00 de euros para 750 00000 de euros;
ii) A fixação, desde já, do período de vigência deste regime, o qual é de cinco anos.

Assim, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.° da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da República a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.°
Objecto

O presente diploma tem por objecto o sistema de incentivos fiscais em I&D empresarial, "SIFIDE", o qual se processa nos termos dos números seguintes.

Artigo 2.°
Conceitos

Para efeitos do disposto no presente diploma, consideram-se:

a) "Despesas de investigação", as realizadas pelo sujeito passivo de IRC com vista à aquisição de novos conhecimentos científicos ou técnicos;
b) "Despesas de desenvolvimento", as realizadas pelo sujeito passivo de IRC através da exploração de resultados de trabalhos de investigação ou de outros conhecimentos científicos ou técnicos com vista à descoberta ou melhoria substancial de matérias-primas, produtos, serviços ou processos de fabrico.

Artigo 3.°
Despesas elegíveis

1 - Consideram-se dedutíveis as seguintes categorias de despesas, desde que se refiram a actividades de investigação e desenvolvimento tal como definidas no artigo anterior:

a) Aquisições de imobilizado, à excepção de edifícios e terrenos, desde que criados ou adquiridos em estado novo e directamente afectos à realização de actividades de I&D;
b) Despesas com pessoal exclusivamente envolvido em tarefas de I&D;
c) Despesas com a participação de dirigentes e quadros na gestão de instituições de I&D;
d) Despesas de funcionamento, até ao máximo de 55% das despesas com o pessoal directamente envolvido em tarefas de I&D contabilizadas a título de remunerações, ordenados ou salários, respeitantes ao exercício;
e) Despesas relativas à contratação de actividades de I&D junto de entidades públicas ou beneficiárias do estatuto de utilidade pública ou de entidades cuja idoneidade em matéria de investigação e desenvolvimento seja reconhecida por despacho conjunto dos Ministros da Economia e da Inovação e da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior;

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f) Participação no capital de instituições de I&D e contributos para fundos de investimentos, públicos ou privados, destinados a financiar empresas dedicadas sobretudo a I&D, incluindo o financiamento da valorização dos seus resultados, cuja idoneidade em matéria de investigação e desenvolvimento seja reconhecida por despacho conjunto dos Ministros da Economia e da Inovação e da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior;
g) Custos com registo e manutenção de patentes;
h) Despesas com a aquisição de patentes que sejam predominantemente destinadas à realização de actividades de I&D;
i) Despesas com auditorias à I&D.

2 - As entidades referenciadas na alínea e) não podem deduzir qualquer tipo de despesas incorridas em projectos realizados por conta de terceiros.
3 - Os custos referidos na alínea g) só são aplicáveis às pequenas e médias empresas.

Artigo 4.°
Âmbito da dedução

1 - Os sujeitos passivos de IRC residentes em território português que exerçam a título principal uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola e os não residentes com estabelecimento estável nesse território podem deduzir ao montante apurado nos termos do artigo 83.° do Código do IRC, e até à sua concorrência, o valor correspondente às despesas com investigação e desenvolvimento, na parte que não tenha sido objecto de comparticipação financeira do Estado a fundo perdido, realizadas no período de tributação que se inicie em 1 de Janeiro de 2006, numa dupla percentagem:

a) Taxa de base: 20% das despesas realizadas naquele período;
b) Taxa incremental: 50% do acréscimo das despesas realizadas naquele período em relação à média aritmética simples dos dois exercícios anteriores, até ao limite de € 750 000, o qual poderá ser revisto por decreto-lei.

2 - A dedução é feita, nos termos do artigo 83.° do Código do IRC, na liquidação respeitante ao período de tributação mencionado no número anterior.
3 - As despesas que, por insuficiência de colecta, não possam ser deduzidas no exercício em que foram realizadas poderão ser deduzidas até ao sexto exercício imediato.
4 - Para efeitos do disposto nos números anteriores, quando no ano de início de usufruição do benefício ocorrer mudança do período de tributação, deve ser considerado o período anual que se inicie naquele ano.

Artigo 5.°
Condições

Apenas poderão beneficiar da dedução a que se refere o artigo 4.° os sujeitos passivos de IRC que preencham cumulativamente as seguintes condições:
a) O seu lucro tributável não seja desensinado por métodos indirectos;
b) Não sejam devedores ao Estado e à segurança social de quaisquer impostos ou contribuições, ou tenham o seu pagamento devidamente assegurado.

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Artigo 6.°
Obrigações acessórias

1 - A dedução a que se refere o artigo 4.° deve ser justificada por declaração comprovativa, a requerer pelas entidades interessadas, ou de prova da apresentação do pedido de emissão dessa declaração, de que as actividades exercidas ou a exercer correspondem efectivamente a acções de investigação ou desenvolvimento, dos respectivos montantes envolvidos, do cálculo do acréscimo das despesas em relação à média dos dois exercícios anteriores e de outros elementos considerados pertinentes, emitida por entidade nomeada por despacho do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, a integrar no processo de documentação fiscal do sujeito passivo a que se refere o artigo 121.° do Código do IRC.
2 - No processo de documentação fiscal do sujeito passivo deve igualmente constar documento que evidencie o cálculo do benefício fiscal, bem como documento comprovativo de que se encontra preenchida a condição referida na alínea b) do artigo 5.°, com referência ao mês anterior ao da entrega da declaração periódica de rendimentos.
3 - As entidades interessadas em recorrer ao sistema de incentivos fiscais previsto no presente diploma devem disponibilizar atempadamente as informações solicitadas pela entidade referida no n.º 1 e aceitar submeter-se às auditorias tecnológicas que vierem a ser determinadas.

Artigo 7.°
Obrigações contabilísticas

A contabilidade dos sujeitos passivos de IRC beneficiários do regime previsto no presente diploma dará expressão ao imposto que deixe de ser pago em resultado da dedução a que se refere o artigo 4.° mediante menção do valor correspondente no anexo ao balanço e à demonstração de resultados relativa ao exercício em que se efectua a dedução.

Artigo 8.°
Exclusividade do benefício

A dedução a que se refere o artigo 4.° não é acumulável, relativamente ao mesmo investimento, com benefícios fiscais da mesma natureza previstos noutros diplomas legais.

Artigo 9.°
Vigência

O regime constante do presente diploma vigora por um período de cinco anos.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 21 de Abril de 2005.
O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa - O Ministro da Presidência, Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira - O Ministro dos Assuntos Parlamentares, Augusto Ernesto Santos Silva.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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