O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

Sexta-feira, 23 de Fevereiro de 2007 II Série-A — Número 47

X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)

SUMÁRIO Projectos de lei (n.os 211, 219, 236, 239, 340, 341, 345, 349, 352, 353, 354, 355, 356, 357, 358, 360, 361 e 362/X): N.º 211/X (Altera o Código Penal): — Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
N.º 219/X (Altera o Código Penal, eliminando a discriminação com base na orientação sexual existente no artigo 175.º): — Idem.
N.º 236/X (Altera o Código Penal): — Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
N.º 239/X (Aprova o regime da responsabilidade penal das pessoas colectivas): — Vide projecto de lei n.º 236/X.
N.º 340/X (Providências de combate à corrupção mediante gestão preventiva dos riscos da sua ocorrência): — Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
N.º 341/X (Aprova alterações ao Código Penal e à legislação penal avulsa sobre prevenção e repressão da corrupção): — Vide projecto de lei n.º 340/X..
N.º 345/X (Combate à corrupção): — Vide projecto de lei n.º 340/X.
N.º 349/X (Altera o Código Penal em matéria ambiental): — Vide projecto de lei n.º 236/X.
N.º 352/X (Altera o Código Penal): — Vide projecto de lei n.º 236/X.
N.º 353/X (Altera o Código Penal): — Vide projecto de lei n.º 236/X.
N.º 354/X (Altera as disposições da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, relativas à corrupção): — Vide projecto de lei n.º 340/X.
N.º 355/X (Altera os artigos 372.º e 374.º do Código Penal, relativos aos crimes de corrupção, e revoga o artigo 373.º do mesmo Código): — Vide projecto de lei n.º 340/X.
N.º 356/X (Determina regras de prestação de contas dos titulares de cargos políticos ou altos cargos públicos acerca do seu património): — Vide projecto de lei n.º 340/X.
N.º 357/X (Define a cativação pública das mais-valias urbanísticas como medida preventiva de combate ao abuso de poder e à corrupção): — Vide projecto de lei n.º 340/X..
N.º 358/X (Determina a divulgação dos resultados dos instrumentos de combate à corrupção e a sua comunicação ao Parlamento): — Vide projecto de lei n.º 340/X.
N.º 360/X (Adopta medidas legais de combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira): — Vide projecto de lei n.º 340/X.

Página 2

II SÉRIE-A — NÚMERO 47 ________________________________________________________________________________________________ 2
N.º 361/X (Institui o programa nacional de prevenção da criminalidade económica e financeira): — Vide projecto de lei n.º 340/X.
N.º 362/X (Altera legislação no sentido do reforço dos instrumentos de combate à corrupção): — Vide projecto de lei n.º 340/X.
Propostas de lei (n.os 98, 107 e 113X): N.º 98/X (Procede à vigésima primeira alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro): — Vide projecto de lei n.º 236/X.
N.º 107/X (Cria um regime de mediação penal, em execução do artigo 10.º da Decisão-Quadro n.º 2001/220/JAI, do Conselho, de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal): — Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
N.º 113/X (Aprova o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território): — Parecer da Comissão de Assuntos Parlamentares, Ambiente e Trabalho da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores.
Projectos de resolução (n.os 177, 178 e 183/X): N.º 177/X (Prevenção da corrupção): — Vide projecto de lei n.º 340/X.
N.º 178/X [Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção (Resolução n.º 58/4, da Assembleia Geral da ONU, de 31 de Outubro de 2003)]: — Vide projecto de lei n.º 340/X.
N.º 183/X (Medidas de combate à corrupção): — Vide projecto de lei n.º 340/X.

Página 3

3 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

PROJECTO DE LEI N.º 211/X (ALTERA O CÓDIGO PENAL)

Relatório, conclusões parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

I — Relatório

1 — Introdução

O projecto de lei n.º 211/X — «Altera o Código Penal —, da autoria do PS, deu entrada na Mesa da Assembleia da República em 20 de Fevereiro de 2006, tendo sido apresentado ao abrigo do artigo 167.º da Constituição da República e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos formais previstos no artigo 138.º do Regimento da Assembleia da República.
A discussão do projecto de lei supra referido encontra-se agendada para o Plenário da Assembleia da República do dia 21 de Fevereiro de 2007, onde será discutido conjuntamente com as seguintes iniciativas:

— Proposta de lei n.º 98/X, da autoria do Governo — «Procede à vigésima primeira alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro»; — Projecto de lei n.º 219/X, da autoria de Os Verdes — «Altera o Código Penal, eliminando a discriminação com base na orientação sexual existente no artigo 175.º»; — Projecto de lei n.º 236/X, da autoria do PSD — «Altera o Código Penal»; — Projecto de lei n.º 239/X, do mesmo partido — «Aprova o regime da responsabilidade penal das pessoas colectivas».

2 — Enquadramento constitucional

As normas constitucionais com interesse e relevância em matéria penal são as que constam dos artigos 24.º a 32.º da Constituição.

3 — Antecedentes legislativos

De uma forma geral, registam-se em cada legislatura várias iniciativas que visam alterar o Código Penal, seja com o objectivo de proceder à respectiva alteração nesta ou naquela matéria parcelar — como é o caso da presente iniciativa — seja no âmbito de uma visão mais compreensiva do funcionamento daquele corpo legislativo. Cuidaremos, neste ponto, de dar fé de iniciativas legislativas de anteriores legislaturas que tenham visado alterar o Código Penal, independentemente da substância da alteração pretendida.
Remontando apenas a duas legislaturas atrás, podemos assinalar as seguintes iniciativas legislativas:

Na VIII Legislatura: — Projecto de lei n.º 21/VIII, do BE — «Violência contra a mulher na família "crime publico" (altera o artigo 152.º do Código Penal, revisto pela Lei n.º 65/98)»; — Projecto de lei n.º 111/VIII, do CDS-PP — «Altera o Código Penal e o Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro — agravação das penas por crimes praticados em ambiente escolar e estudantil ou nas imediações de estabelecimento de ensino»; — Projecto de lei n.º 347/VIII, do PS — «Altera o artigo 178.º do Código Penal, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 65/98 de 2 de Setembro»; — Projecto de lei n.º 355/VIII, de Os Verdes — «Torna público o crime de abuso sexual de crianças (altera o artigo 178.º do Código Penal)»; — Projecto de lei n.º 369/VIII, do PCP — «Altera os artigos 169.º, 170.º, 176.º e 178.º do Código Penal»; — Projecto de lei n.º 405/VIII, do PCP — «Altera o Código Penal para garantia do julgamento em Portugal dos autores de crimes de maior gravidade que afectam a comunidade internacional no seu conjunto»; — Projecto de lei n.º 408/VIII, do CDS-PP — «Altera o artigo 172.º do Código Penal, criminalizando a conduta de quem for encontrado na posse de fotografias, filmes ou gravações pornográficas envolvendo menores de 14 anos»; — Projecto de lei n.º 468/VIII, do PSD — «Assegura a competência plena dos tribunais portugueses face à jurisdição do Tribunal Penal Internacional (Altera o Código Penal português em matéria do crime de genocídio dos crimes contra a humanidade e dos crimes de guerra)»; — Proposta de lei n.º 69/VIII, do Governo — «Altera os artigos 69.º, 101.º, 291.º, 292.º e 294.º do Código Penal»; — Proposta de lei n.º 73/VIII, do Governo — «Altera o artigo 143.º do Código Penal»; — Proposta de lei n.º 74/VIII, do Governo — «Altera o regime penal da falsificação da moeda»; — Proposta de lei n.º 77/VIII, do Governo — «Altera o regime penal do tráfico e detenção de armas»;

Página 4

4 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

— Proposta de lei n.º 91/VIII, do Governo — «Altera o regime jurídico dos crimes de tráfico de influência e de corrupção»; — Proposta de lei n.º 107/VIII, do Governo — «Altera o artigo 305.º do Código Penal».

Na IX Legislatura: — Projecto de lei n.º 22/IX, do BE — «Altera o Artigo 169.º do Código Penal e adita novo artigo nas matérias referentes ao tráfico de pessoas»; — Projecto de lei n.º 89/IX, do BE — «Despenalização da interrupção voluntária da gravidez»; — Projecto de lei n.º 190/IX, do BE — «Altera o Código Penal (Decreto-Lei n.º 400/82, de 3 de Setembro)»; — Projecto de lei n.º 206/IX, do PS — «Alteração ao Código Penal, na parte respeitante às organizações terroristas e terrorismo»; — Projecto de lei n.º 214/IX, do CDS-PP — «Altera o Código Penal alargando os prazos do direito de queixa e de prescrição nos crimes praticados contra a autodeterminação sexual de menores»; — Projecto de lei n.º 216/IX, do CDS-PP — «Combate à pedofilia, prostituição e pornografia infantis (Altera os artigos 66.º e 172.º a 177.º do Código Penal e introduz os artigos 171.º-A, 176.º-A e 179.º-A)»; — Projecto de lei n.º 218/IX, do PSD — «Criminalização da venda de crianças (Adita no Capítulo IV, do Título I, do Livro II, do Código Penal, o artigo 159.º-A)»; — Projecto de lei n.º 219/IX, do PSD — «Reforço da protecção das crianças vitimas de maus tratos e outras formas de violência (Altera os artigos 152.º, 249.º e 250.º do Código Penal)»; — Projecto de lei n.º 224/IX, do PSD — «Assegura a competência plena dos tribunais portugueses face à jurisdição do Tribunal Penal Internacional (Altera o Código Penal português em matéria do crime de genocídio, dos crimes contra a humanidade e dos crimes de guerra)»; — Projecto de lei n.º 230/IX, do BE — «Altera os artigos 118.º e 178.º do Código Penal»; — Projecto de lei n.º 238/IX, do PCP — «Estabelece medidas na área da reinserção social e medidas penais, relativamente a crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de que são vítimas menores»; — Projecto de lei n.º 262/IX, do PCP — «Altera o Código Penal para garantia do julgamento em Portugal dos autores de crimes previstos no Estatuto do Tribunal Penal Internacional»; — Proposta de lei n.º 73/IX, do Governo — «Estabelece o regime de prevenção e repressão do branqueamento de vantagens de proveniência ilícita»; — Projecto de lei n.º 405/IX, do PS — «Sobre a exclusão da ilicitude de casos de interrupção voluntária de gravidez»; — Projecto de lei n.º 409/IX, de Os Verdes — «Sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez»; — Projecto de lei n.º 460/IX, da autoria de todos os grupos parlamentares — «Alteração à Lei n.º 11/2004, de 27 de Março (Estabelece o regime de prevenção e repressão do branqueamento de vantagens de proveniência ilícita e procede à 16.ª alteração ao Código Penal e à 11.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro)»; — Projecto de lei n.º 482/IX, do PCP, — «Interrupção voluntária da gravidez»; — Projecto de lei n.º 488/IX, do BE — «Despenalização da interrupção voluntária da gravidez»; — Proposta de lei n.º 149/IX, do Governo — «Aprova o Código Penal».

4 — Conteúdo das iniciativas apresentadas

Cumpre agora apreciar o conteúdo do projecto de lei em análise, do ponto de vista dos seus objectivos, motivação e conteúdo.
O Partido Socialista visa conformar a lei penal portuguesa com o Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança, Relativo à Venda de Crianças, Prostituição Infantil, e Pornografia Infantil, adoptado em Nova Iorque, em 25 de Maio de 2000
1, e ao Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra a Criminalidade Organizada Transnacional, relativo à Prevenção, à Repressão e à Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças.
Consideram os subscritores do projecto de lei que a legislação penal nacional não assegura a adequada protecção da liberdade e da dignidade humanas, que são os bens jurídicos atingidos com o tráfico de seres humanos. Assim sendo, propõem-se os subscritores do projecto:

— Tipificar o crime de tráfico de crianças, criminalizando condutas que visem a transacção de crianças para extracção de órgãos, exploração sexual, de mão-de-obra e na mendicidade e a cedência de crianças em violação das regras da adopção; Aprovado, para ratificação, pela Resolução da Assembleia da República n.º 16/2003, de 5 de Março, e ratificado pelo Decreto do Presidente da República nº 14/2003, de 5 de Março. Aprovado, para ratificação, pela Resolução da Assembleia da República n.º 32/2004, de 2de Abril, e ratificado pelo Decreto do Presidente da República n.º 19/2004, de 2 de Abril.

Página 5

5 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

— Tipificar o crime de tráfico de pessoas para extracção de órgãos, exploração sexual, de mão-de-obra e na mendicidade, quando o agente recorra à ameaça ou ao uso da força ou a outras forma de coacção, ao rapto ou à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou de situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tem autoridade sobre outra, para fins de exploração; — Adoptar uma definição de criança, para fins do crime de tráfico de pessoas, que abranja todo o cidadão que não tenha atingido a maioridade; — Alargar a protecção do artigo 176.º (lenocínio e tráfico de menores) a todas as crianças, independentemente da sua condição de estrangeiro (sic).

A ponderação da solução legislativa a adoptar passou, segundo os subscritores, pelo confronto dos códigos penais alemão, austríaco, francês e espanhol, uma vez que todos eles são signatários, igualmente, dos instrumentos internacionais sobre venda de crianças, prostituição e pornografia infantil e sobre tráfico de pessoas mencionados, no presente relatório, em nota de rodapé.
Tudo visto e ponderado, os subscritores do projecto de lei fizeram as seguintes opções legislativas:

— No âmbito do tráfico de menores para fins de exploração sexual, alargaram o âmbito de protecção do tipo previsto no artigo 176.º a todos os menores, tendo igualmente procedido à agravação das respectivas penas; — Incluíram no artigo 159.º a exploração, com fins lucrativos, da mendicidade alheia; — Alargaram o âmbito de protecção do artigo 296.º a todos os menores e agravaram a pena máxima de três para cinco anos de prisão, de molde a permitir a punição da tentativa; — Criaram o tipo penal de tráfico de pessoas; — Alteraram a epígrafe do artigo 169.º para tráfico de pessoas para exploração sexual.

Cumpre referir, em particular, a reformulação total da incriminação do tráfico de pessoas, através da renomeação do tipo do artigo 169.º de forma a se entender reportado apenas ao tráfico de pessoas para fins sexuais, ao mesmo tempo que se consagra uma noção ampla de tráfico de pessoas no novo tipo do artigo 159.º-A. Com efeito, a noção de tráfico de pessoas é constituída por três elementos essenciais — o recrutamento, transporte e acolhimento das vítimas, a inexistência ou condicionamento da vontade da vítima e a sujeição a actividades degradantes ou desumanas —, mas a lei penal actual não reflecte a existência desses elementos incriminatórios: Portugal é dos poucos países da União Europeia que não tipifica, no seu direito penal, o crime de tráfico de seres humanos em sentido amplo, não havendo cobertura para a condenação de diversas formas de prática de actos que visam o enriquecimento através da venda de crianças e da exploração de mão-de-obra e da exploração através da mendicidade.
Nos outros tipos alterados — que são os dos artigos 176.º (Lenocínio e tráfico de menores) e 296.º (Exploração de menor na mendicidade) — constata-se um agravamento geral das penas aplicáveis, particularmente nos seus limites máximos. É ainda de referir que se passou a considerar apenas os menores, eliminando-se qualquer alusão à idade dos mesmos.

II — Conclusões

Nestes termos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias está em condições de extrair as seguintes conclusões:

I — Com a apresentação da iniciativa vinda de relatar pretende o Partido Socialista conformar a lei penal portuguesa com o Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança, Relativo à Venda de Crianças, Prostituição Infantil, e Pornografia Infantil, adoptado em Nova Iorque, em 25 de Maio de 2000, e ao Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas Contra a Criminalidade Organizada Transnacional, Relativo à Prevenção, à Repressão e à Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças; II — Consideram os subscritores do projecto que a legislação penal nacional não assegura a adequada protecção da liberdade e da dignidade humanas, que são os bens jurídicos atingidos com o tráfico de seres humanos; III — No que respeita ao tráfico de crianças, torna-se necessário criminalizar condutas que visem a transacção de crianças para extracção de órgãos, exploração sexual, de mão-de-obra e na mendicidade e a cedência de crianças em violação das regras da adopção; IV — Para tanto, e acolhendo conceitos dos instrumentos internacionais citados, torna-se necessário adoptar uma definição de criança que abranja todo o cidadão que não tenha atingido a maioridade, bem como alargar a protecção do artigo 176.º (lenocínio e tráfico de menores) a todas as crianças, independentemente da sua condição de estrangeiro; V — No que respeita ao tráfico de outras pessoas, a lei portuguesa carece de uma tipificação ampla da incriminação do tráfico de pessoas, seja para extracção de órgãos seja para exploração sexual de mão-deobra e, ainda, na mendicidade.

Página 6

6 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

III — Parecer

Nestes termos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o projecto de lei n.º 211/X — «Altera o Código Penal — está em condições constitucionais e regimentais de subir a Plenário para apreciação na generalidade, reservando os grupos parlamentares para esse debate as respectivas posições sobre a matéria.

Palácio de São Bento, 21 de Fevereiro de 2007.
O Deputado Relator, Nuno Magalhães — O Vice-Presidente da Comissão, António Montalvão Machado.

Nota — As conclusões e o parecer foram aprovados por unanimidade, tendo-se registado a ausência de Os Verdes.

———

PROJECTO DE LEI N.º 219/X (ALTERA O CÓDIGO PENAL, ELIMINANDO A DISCRIMINAÇÃO COM BASE NA ORIENTAÇÃO SEXUAL EXISTENTE NO ARTIGO 175.º)

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

I — Relatório

1 — Introdução

O projecto de lei n.º 219/X, da autoria de Os Verdes — «Altera o Código Penal, eliminando a discriminação com base na orientação sexual existente no artigo 175.º —, deu entrada na Mesa da Assembleia da República em 8 de Março de 2006, tendo sido apresentado ao abrigo do artigo 167.º da Constituição da República e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos formais previstos no artigo 138.º do Regimento da Assembleia da República.
A discussão do projecto de lei supra referido encontra-se agendada para o Plenário da Assembleia da República do dia 21 de Fevereiro de 2007, onde será discutido conjuntamente com as seguintes iniciativas:

— Proposta de lei n.º 98/X, da autoria do Governo — «Procede à vigésima primeira alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro»; — Projecto de lei n.º 211/X, da autoria do PS — «Altera o Código Penal»; — Projecto de lei n.º 236/X, da autoria do PSD — «Altera o Código Penal»; — Projecto de lei n.º 239/X, do mesmo partido — «Aprova o regime da responsabilidade penal das pessoas colectivas».

2 — Enquadramento constitucional

As normas constitucionais com interesse e relevância em matéria penal são as que constam dos artigos 24.º a 32.º da Constituição.

3 — Antecedentes legislativos

De uma forma geral, registam-se em cada legislatura várias iniciativas que visam alterar o Código Penal, seja com o objectivo de proceder à respectiva alteração nesta ou naquela matéria parcelar — como é o caso das presentes iniciativas — seja no âmbito de uma visão mais compreensiva do funcionamento daquele corpo legislativo. Cuidaremos, neste ponto, de dar fé de iniciativas legislativas de anteriores legislaturas que tenham visado alterar o Código Penal, independentemente da substância da alteração pretendida.
Remontando apenas a duas legislaturas atrás, podemos assinalar as seguintes iniciativas legislativas:

Na VIII Legislatura: — Projecto de lei n.º 21/VIII, do BE — «Violência contra a mulher na família "crime público" (altera o artigo 152.º do Código Penal, revisto pela Lei n.º 65/98)»; — Projecto de lei n.º 111/VIII, do CDS-PP — «Altera o Código Penal e o Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro — agravação das penas por crimes praticados em ambiente escolar e estudantil ou nas imediações de estabelecimento de ensino»;

Página 7

7 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

— Projecto de lei n.º 347/VIII, do PS — «Altera o artigo 178.º do Código Penal na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 65/98, de 2 de Setembro»; — Projecto de lei n.º 355/VIII, de Os Verdes — «Torna público o crime de abuso sexual de crianças (Altera o artigo 178.º do Código Penal)»; — Projecto de lei n.º 369/VIII, do PCP — «Altera os artigos 169.º, 170.º, 176.º e 178.º do Código Penal»; — Projecto de lei n.º 405/VIII, do PCP — «Altera o Código Penal para garantia do julgamento em Portugal dos autores de crimes de maior gravidade que afectam a comunidade internacional no seu conjunto»; — Projecto de lei n.º 408/VIII, do CDS-PP — «Altera o artigo 172.º do Código Penal, criminalizando a conduta de quem for encontrado na posse de fotografias, filmes ou gravações pornográficas envolvendo menores de 14 anos»; — Projecto de lei n.º 468/VIII, do PSD — «Assegura a competência plena dos tribunais portugueses face à jurisdição do Tribunal Penal Internacional (Altera o Código Penal português em matéria do crime de genocídio dos crimes contra a humanidade e dos crimes de guerra)»; — Proposta de lei n.º 69/VIII, do Governo — «Altera os artigos 69.º, 101.º, 291.º, 292.º e 294.º do Código Penal»; — Proposta de lei n.º 73/VIII, do Governo — «Altera o artigo 143.º do Código Penal»; — Proposta de lei n.º 74/VIII, do Governo — «Altera o regime penal da falsificação da moeda»; — Proposta de lei n.º 77/VIII, do Governo — «Altera o regime penal do tráfico e detenção de armas»; — Proposta de lei n.º 91/VIII, do Governo — «Altera o regime jurídico dos crimes de tráfico de influência e de corrupção»; — Proposta de lei n.º 107/VIII, do Governo — «“Altera o artigo 305.º do Código Penal».

Na IX Legislatura: — Projecto de lei n.º 22/IX, do BE — «Altera o artigo 169.º do Código Penal e adita novo artigo nas matérias referentes ao tráfico de pessoas»; — Projecto de lei n.º 89/IX, do BE — «Despenalização da interrupção voluntária da gravidez»; — Projecto de lei n.º 190/IX, do BE — «Altera o Código Penal (Decreto-Lei n.º 400/82, de 3 de Setembro)»; — Projecto de lei n.º 206/IX, do PS — «Alteração ao Código Penal, na parte respeitante às organizações terroristas e terrorismo»; — Projecto de lei n.º 214/IX, do CDS-PP — «Altera o Código Penal, alargando os prazos do direito de queixa e de prescrição nos crimes praticados contra a autodeterminação sexual de menores»; — Projecto de lei n.º 216/IX, do CDS-PP — «Combate à pedofilia, prostituição e pornografia infantis (Altera os artigos 66.º e 172.º a 177.º do Código Penal e introduz os artigos 171.º-A, 176.º-A e 179.º-A)»; — Projecto de lei n.º 218/IX, do PSD — «Criminalização da venda de crianças (Adita no Capítulo IV, do Título I, do Livro II, do Código Penal, o artigo 159.º-A)»; — Projecto de lei n.º 219/IX, do PSD — «Reforço da protecção das crianças vitimas de maus tratos e outras formas de violência (Altera os artigos 152.º, 249.º e 250.º do Código Penal)»; — Projecto de lei n.º 224/IX, do PSD — «Assegura a competência plena dos tribunais portugueses face à jurisdição do Tribunal Penal Internacional (Altera o Código Penal português em matéria do crime de genocídio, dos crimes contra a humanidade e dos crimes de guerra)»; — Projecto de lei n.º 230/IX, do BE — «Altera os artigos 118.º e 178.º do Código Penal»; — Projecto de lei n.º 238/IX, do PCP — «Estabelece medidas na área da reinserção social e medidas penais relativamente a crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de que são vítimas menores»; — Projecto de lei n.º 262/IX, do PCP — «Altera o Código Penal para garantia do julgamento em Portugal dos autores de crimes previstos no Estatuto do Tribunal Penal Internacional»; — Proposta de lei n.º 73/IX, do Governo — «Estabelece o regime de prevenção e repressão do branqueamento de vantagens de proveniência ilícita»; — Projecto de lei n.º 405/IX, do PS — «Sobre a exclusão da ilicitude de casos de interrupção voluntária de gravidez»; — Projecto de lei n.º 409/IX, de Os Verdes — «Sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez»; — Projecto de lei n.º 460/IX, da autoria de todos os grupos parlamentares — «Alteração à Lei n.º 11/2004, de 27 de Março (Estabelece o regime de prevenção e repressão do branqueamento de vantagens de proveniência ilícita e procede à 16.ª alteração ao Código Penal e à 11.ª alteração ao Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro)»; — Projecto de lei n.º 482/IX, do PCP — «Interrupção voluntária da gravidez»; — Projecto de lei n.º 488/IX, do BE — «Despenalização da interrupção voluntária da gravidez»; — Proposta de lei n.º 149/IX, do Governo — «Aprova o Código Penal».

4 — Conteúdo da iniciativa apresentada

Cumpre agora apreciar o conteúdo do projecto de lei em análise, do ponto de vista dos seus objectivos, motivação e conteúdo.

Página 8

8 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

De acordo com os subscritores do projecto de lei, o artigo 175.º do Código Penal, que cria um tipo legal de crime especificamente para punir os actos homossexuais com adolescentes, ao tratar de forma diferente um conjunto de actos sexuais previstos no artigo 174.º apenas em razão da diferente orientação sexual de quem os pratica, está a violar o disposto no artigo 13.º da Constituição.
Invocam os autores do projecto de lei a recente declaração de inconstitucionalidade deste artigo 175.º do Código Penal, constante dos Acórdãos n.os 247/2005, de 10 de Maio de 2005, e 351/2005, de 5 de Julho de 2005, para considerarem indubitável que os artigos 174.º e 175.º do Código Penal visam, de facto, proteger o mesmo bem jurídico (a liberdade e autodeterminação sexual relacionada com o direito ao livre desenvolvimento da personalidade do menos na esfera sexual) relativo ao mesmo grupo social (adolescentes com idades compreendidas entre os 14 e os 16 anos de idade) através da consagração da mesma moldura penal (prisão até dois anos ou multa até 240 dias).
As diferenças entre os dois tipos penais consistem, no entender dos subscritores, na existência de diferentes orientações sexuais dos agentes do crime, o que consideram, a todos os títulos, inaceitável.
Assumem no presente projecto de lei, portanto, o cumprimento da obrigação de expurgar do ordenamento jurídico nacional esta inconstitucionalidade.
É de referir, sumariamente, que o Tribunal Constitucional considerou, no Acórdão n.º 247/05, que a norma do artigo 175.º do Código Penal viola os artigos 13.º e 26.º, n.º 1, da Constituição na parte em que pune a prática de actos homossexuais com adolescentes mesmo que se não verifique, por parte do agente, abuso da inexperiência da vítima, ao passo que, no Acórdão n.º 351/05, alarga essa inconstitucionalidade à parte da norma em que inclui, como actos homossexuais de relevo, actos que não são incriminados pelo artigo 174.º do Código Penal. Considerou o Tribunal que o artigo 175.º, em comparação com o artigo 174.º, estabelece uma diferença de tratamento jurídico com base na orientação sexual (homossexual) que não tem fundamento racional.
Assim sendo, os autores do projecto de lei propõem-se revogar o artigo 175.º do Código Penal e alterar o artigo 174.º, consagrando num único artigo a criminalização de actos sexuais de relevo com adolescentes entre os 14 e os 16 anos.

II — Conclusões

Nestes termos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias está em condições de extrair as seguintes conclusões:

I — O projecto de lei n.º 219/X considera que o artigo 175.º do Código Penal, que cria um tipo legal de crime especificamente para punir os actos homossexuais com adolescentes, assim tratando de forma diferente um conjunto de actos sexuais previstos no artigo 174.º apenas em razão da diferente orientação sexual de quem os pratica, está a violar o disposto no artigo 13.º da Constituição; II — O Tribunal Constitucional também considera que o artigo 175.º, em comparação com o artigo 174.º, estabelece uma diferença de tratamento jurídico com base na orientação sexual (homossexual) que não tem fundamento racional; III — O Tribunal Constitucional, nos Acórdãos n.os 247/2005, de 10 de Maio de 2005, e 351/2005, de 5 de Julho de 2005, julgou inconstitucional a norma do artigo 175.º do Código Penal, por violação do disposto nos artigos 13.º e 26.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.

III — Parecer

Nestes termos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o projecto de lei n.º 219/X — Altera o Código Penal, eliminando a discriminação com base na orientação sexual existente no artigo 175º.» — está em condições constitucionais e regimentais de subir a Plenário para apreciação na generalidade, reservando os grupos parlamentares para esse debate as respectivas posições sobre a matéria.

Palácio de São Bento, 21 de Fevereiro de 2007.
O Deputado Relator, Nuno Magalhães — O Presidente da Comissão António Montalvão Machado

Nota — As conclusões e o parecer foram aprovados por unanimidade, tendo-se registado a ausência de Os Verdes.

———

Página 9

9 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

PROJECTO DE LEI N.º 236/X (ALTERA O CÓDIGO PENAL)

PROJECTO DE LEI N.º 239/X (APROVA O REGIME DA RESPONSABILIDADE PENAL DAS PESSOAS COLECTIVAS)

PROJECTO DE LEI N.º 349/X (ALTERA O CÓDIGO PENAL EM MATÉRIA AMBIENTAL)

PROJECTO DE LEI N.º 352/X (ALTERA O CÓDIGO PENAL)

PROJECTO DE LEI N.º 353/X (ALTERA O CÓDIGO PENAL)

PROPOSTA DE LEI N.º 98/X (PROCEDE À VIGÉSIMA PRIMEIRA ALTERAÇÃO AO CÓDIGO PENAL, APROVADO PELO DECRETOLEI N.º 400/82, 23 DE SETEMBRO)

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

I — Relatório

1 — Introdução

O Governo apresentou à Assembleia da República, em 12 de Outubro de 2006, a proposta de lei n.º 98/X, que procede à vigésima primeira alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-lei n.º 400/82, de 23 de Setembro.
Já anteriormente, em 16 de Fevereiro de 2006, um grupo de Deputados do PS havia apresentado o projecto de lei n.º 211/X, com a intenção de alterar o Código Penal.
Também o Grupo Parlamentar de Os Verdes apresentou, em 3 de Março de 2006, o projecto de lei n.º 219/X, que altera o Código Penal, eliminando a discriminação com base na orientação sexual existente no artigo 175.º, e a 13 de Fevereiro de 2007 deu entrada o projecto de lei n.º 349/X que altera o Código Penal em matéria ambiental.
Por sua vez, o Grupo Parlamentar do PSD apresentou, em 31 de Março de 2006, os projectos de lei n.º 236/X, que altera o Código Penal, e n.º 239/X, que aprova o regime da responsabilidade penal das pessoas colectivas.
O Grupo Parlamentar do CDS-PP, a 12 de Fevereiro de 2007, apresentou também um projecto de lei — projecto de lei n.º 352/X — com vista à alteração do Código Penal.
Por seu turno, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda também apresentou uma iniciativa legislativa, através do seu projecto de lei n.º 353/X, a 13 de Fevereiro de 2007.
A apresentação destas iniciativas legislativas foi feita nos termos do disposto da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º e do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo todas os requisitos formais previstos no artigo 138.º do mesmo Regimento.
As iniciativas legislativas foram remetidas, por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para efeitos de emissão do respectivo relatório, conclusões e parecer.
Considerando a matéria versada nas iniciativas legislativas apresentadas, foram promovidas audições, em sede de discussão na generalidade, às seguintes entidades:

— Ministro da Justiça, conjuntamente com o Presidente da Unidade de Missão para a Reforma Penal; — Procurador-Geral da República; — Conselho Superior da Magistratura; — Bastonário da Ordem dos Advogado, conjuntamente com o Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados; — Associação Portuguesa da Mulheres Juristas.

A discussão conjunta na generalidade das iniciativas legislativas em apreço está agendada para a reunião plenária do próximo dia 21 de Fevereiro.

Página 10

10 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

2 — Breve resenha histórica do Código Penal português

O Código Penal foi aprovado em 1982 — Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro — e entrou em vigor a 1 de Janeiro de 1983. O texto penal em vigor é o resultado de um conjunto, significativo, de alterações com particular relevância para a reforma de 1995 (Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março.
As primeiras iniciativas de compilação e sistematização das leis penais ocorreram nos séculos XV e XVI, como afirma o Professor Manuel da Costa Andrade, «surgindo como expressão do triunfo do poder central dos monarcas e doa consumação do processo de publicização do ius puniendi, a partir de então cometido ao monopólio do Estado, vale dizer, do rei». Como marco da história da codificação em Portugal deverá reter-se o Livro V das Ordenações — Afonsinas (1446/7), Manuelinas (1521) e Filipinas (1603) — que faz a primeira compilação das leis penais. As Ordenações Afonsinas consagram o triunfo do monopólio do poder punitivo pelo Estado. As Ordenações estiveram em vigor durante mais de quatro séculos, até 1852, data do primeiro Código Penal português.
O primeiro Código Penal português sofre a influência directa do Code Penal (1810) francês e dos desenvolvimentos doutrinais e jurisprudenciais que desencadeou, mas também de outros códigos europeus, de que é exemplo o espanhol de 1848. Este Código de 1852 obedece à doutrina da prevenção geral razão, apontada por vários autores, para o vasto leque de sanções com efeitos civis e políticos de que merecem destaque a pena de morte e a prisão perpétua. Já no final do século são introduzidas, além da liberdade condicional e da suspensão da pena, algumas medidas de segurança como a relegação.
Já no início do século XX há dois momentos que importa destacar. A reforma prisional de 1936, que propôs maximizar as oportunidades de ressocialização através de um sistema progressivo de execução da pena de prisão, no sentido da preparação para a liberdade. O segundo momento é o da reforma de 1954, da autoria do Ministro Cavaleiro Ferreira, que leva a cabo uma sistematização e codificação do direito extravagante e acentua o peso da ideia ético-retributiva confirmando as soluções da organização prisional e abrindo o caminho para uma interpretação monista em nome da tese da culpa pela personalidade.
Um novo Código Penal começa a ser preparado em 1961, sob a direcção e coordenação de Eduardo Correia, a pedido do Ministro da Justiça Antunes Varela. Mas, apesar de ter sido apresentado em 1963, o texto acabaria por nunca ser aprovado durante o regime do Estado Novo. O texto marca, no entanto, no plano interno e merece reconhecimento internacional e, no essencial, converter-se-ia no Código Penal de 1982. O texto legal decorre do clima que, então, se vivia na Europa por um lado, o prestígio do ideário ético-retributivo, consequência dos traumas das experiências do totalitarismo vincado no consciente colectivo, e, por outro, de uma convicção generalizada da conveniência de reduzir o recurso às penas de prisão, sobretudo à prisão de curta duração.
Em traços gerais pode destacar-se, na Parte Geral, a «(…) síntese entre as exigências da culpa e compromisso sem reservas com as metas ressocialização» (Professor Costa Andrade). Ressocialização enquanto direito do delinquente e dever do Estado, na formulação do autor «O projecto parte do reconhecimento da ideia de culpa. A aspiração de realizar a regeneração ou ao menos a readaptação do criminoso à vida social no quadro da pena de prisão constitui uma perfeita utopia. A prisão tem a marca da transitoriedade e a nota do precário e do contingente». A Parte Especial obedece à crença de que o direito penal deve limitar a sua intervenção à tutela de bens jurídicos.
Em 1988 é nomeada uma comissão de reforma do Código Penal, presidida por Figueiredo Dias, que termina o seu projecto de revisão em 1991, aprovado pelo Conselho de Ministros em 1993 e, com algumas alterações, convertido em lei pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, para entrar em vigor em 1 de Outubro desse ano.
A comissão que preparou a reforma de 1995 propôs-se, expressamente, manter inalterado tanto o sistema dogmático do Código de 1982 como o seu programa político-criminal. Desta reforma, salientem-se as seguintes alterações: reforço das penas de substituição de prisão — trabalho a favor da comunidade passa de pena de prisão de três meses para três anos; inovações ao nível do regime da liberdade condicional; na parte especial há numerosas alterações no sentido do reforço da tutela da pessoa e dos bens jurídicos pessoais.
Após dois anos da reforma de 1995 foi publicada a Lei n.º 65/98, de 2 de Setembro, dando corpo a uma nova revisão do Código Penal, não por oposição mas complementar. As alterações visaram, sobretudo, a Parte Especial.
Já em 2005, a 19 de Julho, foi criada a Unidade de Missão para a Reforma do Código Penal, pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 113/2005. É apresentada à Assembleia da República a proposta de lei n.º 98/X, agora em apreço, que diz, nos termos da exposição de motivos, que «a revisão abrange modificações materiais, aditamentos e meros ajustamentos formais. O seu âmbito é circunscrito, compreendendo um número limitado de regimes e mantendo incólume, no essencial, o Código Penal de 1995». «A revisão procura fortalecer a defesa dos bens jurídicos, sem nunca esquecer que o direito penal constitui a ultima ratio da política criminal do Estado. Na Parte Geral as alterações abrangem a lei penal no espaço e no tempo, a responsabilidade das pessoas colectivas, o concurso de crimes, o crime continuado, o consentimento do ofendido, as penas substitutivas de pena de prisão, a suspensão da pena de prisão, a

Página 11

11 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

liberdade condicional, o desconto de medidas privativas da liberdade na pena de prisão, o direito de queixa e a prescrição do procedimento criminal.
Na Parte Especial destaque para algumas das alterações: as modificações incidem nos crimes de homicídio qualificado, ofensa à integridade física grave, agravada pelo resultado e qualificada, violência doméstica, maus tratos, violação de regras de segurança, ameaça, coacção, tráfico de pessoas, coacção sexual, violação, abuso sexual de pessoa incapaz de resistência, abuso sexual de pessoa internada, fraude sexual, lenocínio, importunação sexual, abuso sexual de crianças, (…) danos contra a natureza, poluição, poluição com perigo comum (…) utilização de menor na mendicidade, resistência e coacção sobre funcionário, favorecimento pessoal, branqueamento e violação de segredo por funcionário».

3 — Do objecto, motivação e conteúdo das iniciativas

3.1 — Proposta de lei n.º 98/X: A proposta de lei, apresentada pelo Governo, tem por objectivo proceder a alterações à Parte Geral e à Parte Especial do Código Penal
3
, tendo por fonte os trabalhos realizados pela Unidade de Missão para a Reforma Penal, sendo certo que diversas alterações são suscitadas por obrigações comunitárias e internacionais.
Na exposição de motivos sustenta o Governo que a presente «revisão procura fortalecer a defesa dos bens jurídicos, sem nunca esquecer que o direito penal constitui a ultima ratio da política criminal do Estado».
Assim, das orientações preconizadas pela proposta de lei n.º 98/X destacam-se as seguintes:

— Diversificação das sanções não privativas da liberdade: o trabalho comunitário passa a ser aplicável a crimes com pena de prisão até dois anos; a prisão em regime de permanência na habitação passa a poder ser executada quando não exceder um ano e, em casos excepcionais (gravidez, idade, doença, menor a cargo ou familiar ao cuidado), dois anos; possibilidade de suspensão para penas de prisão até cinco anos; — Consagração da responsabilidade penal das pessoas colectivas: inúmeros crimes passam a ser imputados às pessoas colectivas, tais como os maus tratos, violação de regras de segurança, escravidão, tráfico de menores, lenocínio, burla informática e nas comunicações, discriminação racial ou religiosa, crimes de falsificação, branqueamento, corrupção, entre outros, bem como passam a estar consagradas penas acessórias aplicáveis a estas; — Ataque aos novos fenómenos criminais: dada a crescente preocupação ambiental destaque para a introdução do crime de incêndio da floresta, que se consuma independentemente da criação de perigo para a vida, a integridade física ou bens patrimoniais alheios de valor elevado; os crimes de danos contra a natureza e de poluição são alterados de forma a abrangerem a conduta de quem, em alternativa, violar disposições legais, regulamentares ou constantes de tratado ou convenção internacional ou obrigações impostas pela autoridade competente; — Reforço da tutela de pessoas particularmente indefesas: o crime de maus tratos, a violência doméstica e a infracção de regras de segurança passam a ser tipificados em preceitos distintos, em homenagem às variações do bem jurídico protegido; no crime de violência doméstica é ampliado o âmbito subjectivo do crime, passando a incluir as situações de violência que ocorram entre ex-cônjuges e pessoas de outro ou do mesmo sexo que mantenham ou tenham mantido uma relação análoga à dos cônjuges; alarga-se o âmbito do crime de discriminação racial ou religiosa, de forma a abranger a discriminação em função do sexo ou da orientação sexual; eleva-se a idade do consentimento para dezasseis anos; a prescrição do procedimento não se verifica antes do ofendido perfazer 23 anos nos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores; — Reforço da autoridade do Estado: os crimes de falsificação sofrem alterações; o conceito de documento de identificação é reformulado, passando a designar-se como documento de identificação ou de viagem e a englobar o cartão de cidadão; — Tipificação de novos crimes contra a liberdade pessoal e sexual: é criado o crime de importunação sexual, que abrange, para além do exibicionismo, o constrangimento a contactos de natureza sexual que não constituam actos sexuais de relevo; a condução perigosa de veículo rodoviário passa a englobar a realização de actividades não autorizadas de natureza desportiva ou análoga (vulgo street racing).

3.2 — Projecto de lei n.º 236/X, do PSD: O projecto de lei subscrito pelos Deputados do PSD tem como objectivo primordial alterar o Código Penal, com o intuito de o conformar aos diversos instrumentos internacionais e comunitários, à semelhança do projecto de lei n.º 211/X, do Partido Socialista, bem como atender às recomendações expressas no relatório final da Comissão de Estudo e Debate da Reforma do Sistema Prisional. 3 Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro, e alterado pela Lei n.º 6/84, de 11 de Maio, pelos Decretos-Lei n.os 101A/88, de 26 de Março, 132/93, de 23 de Abril, e 48/95, de 15 de Março, pelas Leis n.os 90/97, de 30 de Julho, 65/98, de 2 de Setembro, 7/2000, de 27 de Maio, 77/2001, de 13 de Julho, 97/2001, 98/2001, 99/2001, 100/2001, de 25 de Agosto, 108/2001, de 28 de Novembro, pelos Decretos-Lei n.os 323/2001, de 17 de Dezembro, e 38/2003, de 8 de Março, e pelas Leis n.os 52/2003, de 22 de Agosto, 100/2003, de 15 de Novembro, pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março, e pelas Leis n.os 11/2004, de 27 de Março, 31/2004, de 22 de Julho, e 5/2006, de 23 de Fevereiro.

Página 12

12 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

Assim, os Deputados do PSD propõem alterações, que se consubstanciam, nomeadamente, no seguinte:

— Reforçar a aplicação de penas não privativas da liberdade; — No domínio dos crimes sexuais, punição mais eficaz dos abusos sexuais de menores, com sanções proporcionadas à gravidade dos crimes; nos tipos penais relativos à autodeterminação sexual assegurar uma especial protecção de menores de 18; tipificação do tráfico interno de menores e de pessoas para exploração sexual e revogação do crime de actos sexuais com adolescentes; — Consagração de novas incriminações no capítulo dos crimes contra a liberdade pessoal, como o são a venda de crianças e o tráfico de pessoas para exploração do trabalho; — Alteração dos artigos 299.º (Associação criminosa) e 367.º (Favorecimento pessoal) com o objectivo de harmonizar direito interno e internacional; — Alterações no domínio dos crimes ambientais, de forma a assegurar uma protecção mais eficaz do meio ambiente; — Clarificação do leque de agentes do crime de violação de segredo de justiça, com o intuito de evitar eventuais divergências interpretativas; — Autonomização do crime de violência doméstica; — Modificações ao regime de execução de pena de prisão, ao regime da prestação de trabalho a favor da comunidade, aos pressupostos para a concessão de liberdade condicional e à utilização mais abrangente da vigilância electrónica.

3.3 — Projecto de lei n.º 239/X, do PSD: O projecto de lei sub judice tem por desiderato aprovar um regime de responsabilidade penal das pessoas colectivas. Os Deputados do PSD optaram por consagrar este regime em legislação extravagante ao invés de o incluir no Código Penal.
À semelhança do projecto de lei n.º 236/X, também do PSD, esta iniciativa visa adoptar medidas de responsabilização das pessoas colectivas — e algumas outras entidades equiparadas ou equiparáveis, como as sociedades civis ou as meras associações de facto — pela prática de actos que integram certos tipos penais, em conformidade com instrumentos de direito comunitário.
Através da iniciativa em análise as pessoas colectivas passam a ser criminalmente responsáveis quando, por ocasião da sua actividade, ocorram os seguintes factos ilícitos: — Procriação ou reprodução artificiais não consentidas; — Tráfico de pessoas para exploração do trabalho; — Comercialização de pessoa; — Crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual; — Pornografia de menores; — Falsificação de moeda, título de crédito e valor selado; — Falsificação de cunhos, pesos e objectos análogos; — Danos contra a natureza, poluição e poluição com perigo comum; — Associação criminosa; — Tráfico de influência; — Corrupção activa; — Desobediência; — Branqueamento; — Violação de segredo de justiça.

São consagradas como penas principais as penas de multa e de dissolução, sendo que esta só será decretada em última instância, quando a entidade colectiva tenha sido criada com a intenção, exclusiva ou permanente, de praticar os crimes ou quando a prática reiterada de tais crimes mostre que a pessoa colectiva está a ser utilizada, exclusiva ou predominantemente, para esse efeito.

3.4 — Projecto de lei n.º 349/X, de Os Verdes: Pretendem os proponentes desta iniciativa legislativa alterar os artigos 278.º e 279.º do Código Penal, alargando as situações que configuram danos contra a natureza e punindo a comercialização de fauna ou flora de espécie protegida (artigo 278.º do Código Penal). Quanto ao artigo 279.º, trata-se de conformar a lei nacional com o disposto nos tratados ou convenções internacionais. Desta forma o Partido Ecologista Os Verdes pretende chamar a atenção para a necessidade de uma maior efectivação do direito penal na área do ambiente, aliás como no desígnio da projecto de lei em apreço, que enfatiza a importância ambiental nas sociedades contemporâneas.

3.5 — Projecto de lei n.º 352/X, do CDS-PP: O Grupo Parlamentar do CDS-PP apresenta a sua iniciativa legislativa com o intuito de contribuir para a discussão da alteração do Código Penal em três áreas que considera essenciais:

Página 13

13 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

1 — Crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores, exploração sexual de crianças e pornografia infantil e outros crimes contra as pessoas. Destaque-se, neste domínio, o alargamento do princípio da aplicação universal da lei penal aos crimes previstos pelos artigos 163.º e 164.º, quando a vítima seja menor, a alteração do prazo de prescrição do procedimento criminal para que o mesmo não se extinga por efeito da prescrição antes de o ofendido perfazer 25 anos e, por fim, a revogação do artigo 175.º e alteração do artigo 174.º de modo a que seja punida a prática, por um maior, de quaisquer actos sexuais de relevo com adolescente, independentemente da natureza heterossexual ou homossexual do acto, desde que haja abuso da inexperiência do menor; 2 — A idade da imputabilidade penal propondo-se a fixação da idade de imputabilidade penal aos 14 anos; 3 — Acolhe algumas das sugestões da Comissão de Estudo e Debate da Reforma do Sistema Prisional (CEDERSP), criada pelo XV Governo Constitucional, designadamente através de alterações aos artigos 44.º a 47.º, sobre as penas principais. Propõe-se uma alteração ao regime da suspensão da execução da pena de prisão, considerando que deve ser alargado de forma a abranger penas de prisão até cinco anos. Destaque, finalmente, para a proposta de alteração dos pressupostos da concessão da liberdade condicional.

3.6 — Projecto de lei n.º 353/X, do BE: O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta algumas alterações ao Código Penal que se consubstanciam essencialmente no seguinte: suspensão da execução de pena de prisão passar a ser aplicada a penas de prisão até cinco anos; alargar a possibilidade de aplicação da pena de trabalho a favor da comunidade de penas de prisão até três anos; alterar o regime da liberdade condicional de modo a que a mesma seja concedida após o cumprimento de dois terços da pena; alargar o direito de queixa a pessoas que vivam em união de facto; autonomiza-se o crime de violência doméstica; atribui a natureza de crime público aos crimes contra a liberdade e autodeterminação de menores; propõe-se a revogação do artigo 175.º e, finalmente, no domínio da prevenção rodoviária, punir a condução em estado de embriaguez com a TAES de 0,5g/l.

4 — Audições realizadas no âmbito da Comissão Parlamentar

— Ministro da Justiça, conjuntamente com o Presidente da Unidade de Missão para a Reforma Penal (10 de Janeiro de 2007): Esta audição, conjunta com o Presidente da Unidade de Missão para a Reforma do Penal, teve por objectivo explicar, detalhadamente, a proposta de lei n.º 98/X, bem como apresentar as linhas gerais da mediação penal e do Código de Processo Penal. No que concerne ao Código Penal, o Sr. Ministro e o Mestre Rui Pereira destacaram quatro áreas com significativas alterações: a expansão das penas alternativas à pena de prisão; a inclusão no Código Penal da responsabilidade das pessoas colectivas; a protecção das vítimas indefesas e o ataque aos novos fenómenos criminais com particular relevância os crimes em matéria ambiental.
— Procurador-Geral da República (16 de Janeiro de 2007): Para o Sr. Procurador Geral da República houve duas considerações iniciais, a primeira dando conta de que estava a estudar as propostas apresentadas pelo Grupo Parlamentar do PSD, a segunda para referir o parecer que a PGR elaborou sobre as propostas apresentadas pelo Ministro da Justiça. Faz uma análise globalmente positiva da proposta de lei n.º 98/X e formulou um conjunto de sugestões para serem avaliadas em sede de discussão na especialidade.
— Conselho Superior da Magistratura (17 de Janeiro de 2007): Foi ouvido o Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura, que considerou a reforma do Código Penal uma «reforma necessária pelas mudanças sentidas na sociedade». As alterações propostas, segundo o Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura, traduzem recomendações comunitárias e transformações sociais. Entende que não há soluções estruturantes no novo Código Penal, com excepção para o regime da responsabilidade das pessoas colectivas e para a estatuição do cumprimento de penas substitutivas da pena de prisão (consta do parecer enviado, a 29 de Janeiro, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias). Deixa, também, sugestões de alterações a introduzir em sede de discussão na especialidade.
— Bastonário da Ordem dos Advogado, conjuntamente com o Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados; — Associação Portuguesa da Mulheres Juristas (7 de Fevereiro de 2007): Ouvida em audição no âmbito da Comissão Parlamentar, a Associação Portuguesa das Mulheres Juristas, tendo feito uma apreciação « (…) à luz do imperativo constitucional da promoção da igualdade de género (…), considera que a proposta de lei não teve em atenção «numerosos normativos» para a efectiva promoção da igualdade (parecer enviado a 7 de Fevereiro à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias). Foram feitas propostas para discussão na especialidade, designadamente sobre os crimes sexuais contra menores e o crime de violência doméstica.

5 — Antecedentes parlamentares

O actual Código Penal foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro, e foi, desde essa data, sujeito a inúmeras alterações, algumas profundas, que se consubstanciaram na Lei n.º 6/84, de 11 de Maio, no

Página 14

14 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

Decreto-Lei n.º 101-A/88, de 26 de Março, no Decreto-Lei n.º 132/93, de 23 de Abril, e no Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, nas Leis n.º 90/97, de 30 de Julho, n.º 65/98, de 2 de Setembro, n.º 7/2000, de 27 de Maio, n.º 77/2001, de 13 de Julho, n.º 97/2001, n.º 98/2001, n.º 99/2001, n.º 100/2001, de 25 de Agosto, n.º 108/2001, de 28 de Novembro, nos Decretos-Lei n.º 323/2001, de 17 de Dezembro, e n.º 38/2003, de 8 de Março, e nas Leis n.º 52/2003, de 22 de Agosto, n.º 100/2003, de 15 de Novembro, no Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março, e nas Leis n.º 11/2004, de 27 de Março, n.º 31/2004, de 22 de Julho, e n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro.

6 — Instrumentos comunitários e internacionais

Como já supra referido, muitas das alterações propostas nas diversas iniciativas legislativas, aqui em apreço, são suscitadas pela necessidade de conformar o direito penal interno com diversos instrumentos normativos comunitários e internacionais. Devem mencionar-se, neste contexto, os seguintes instrumentos:

— Protocolo Facultativo à Convenção sobre Direitos da Criança, Relativa à Venda de Crianças, Prostituição Infantil e Pornografia Infantil, adoptado em Nova Iorque, em 25 de Maio de 200, aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 16/2003, de 5 de Março, e ratificado pelo Decreto do Presidente da República n.º 14/2003, de 5 de Março; — Convenção das Nações Unidas contra a Criminalidade Organizada Transnacional e Protocolo Adicional Relativo à Prevenção, Repressão e à Punição de Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças, aprovados pela Resolução da Assembleia da República n.º 32/2004, de 2 de Abril, e ratificados pelo Decreto do Presidente da República n.º 19/2004, de 2 de Abril; — Decisão-Quadro n.º 2000/383/JAI, do Conselho, de 29 de Maio de 2000, alterada pela Decisão-Quadro n.º 2001/888 JAI, do Conselho, de 6 de Dezembro de 2001, sobre o reforço da protecção contra a contrafacção de moeda na perspectiva da introdução do euro, através de sanções penais e outras; — Decisão-Quadro n.º 2001/413/JAI, do Conselho, de 19 de Julho de 2002, relativa à luta contra o tráfico de seres humanos; — Protocolo Adicional à Convenção do Cibercrime, respeitante à criminalização de actos de natureza racista ou xenófoba, cometidos através de sistemas informáticos, assinado por Portugal, em 17 de Março de 2003; — Protocolo Adicional à Convenção Penal sobre a Corrupção, do Conselho da Europa, assinado por Portugal em 15 de Maio de 2003; — Decisão-Quadro n.º 2004/68/JAI, do Conselho, de 22 de Dezembro de 2003, relativa à luta contra a exploração sexual de crianças e pornografia infantil; — Convenção do Conselho da Europa Contra o Tráfico de Seres Humanos, assinada por Portugal, em 16 de Maio de 2005; — Decisão-Quadro n.º 2005/667/JAI, do Conselho, de 12 de Julho de 2005, destinada a reforçar o quadro penal para a repressão da poluição por navios.

II — Conclusões

1 — As iniciativas legislativas em apreço reflectem a preocupação com as alterações das sociedades contemporâneas e a necessidade de compatibilizar a legislação nacional com as normas internacionais, com o objectivo de alterar o Código Penal.
2 — A proposta de lei do Governo é mais ampla com vista a um novo Código Penal, consagrando novos tipos de crime, a autonomização de outros crimes como o da violência doméstica, uma particular atenção com a protecção das vítimas indefesas e a consagração da responsabilidade das pessoas colectivas no próprio Código Penal.
3 — O projecto de lei do Grupo Parlamentar do PSD apresenta, também, um conjunto significativo de alterações ao Código Penal, embora tenha deixado para diploma autónomo o regime da responsabilidade das pessoas colectivas.
4 — O projecto de lei do Grupo Parlamentar Os Verdes versa sobre matéria ambiental, com a preocupação com os artigos 278.º e 279.º, no sentido de alargar o âmbito do artigo 278.º e acompanhar as preocupações internacionais no caso do artigo 279.º, aliás como o projecto de lei apresentado pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
5 — O Grupo Parlamentar do CDS-PP apresenta um projecto de lei com vista à alteração do Código Penal, embora cinja a sua intervenção a três áreas específicas: crimes contra a liberdade e autodeterminação dos menores (preocupação também espelhada no projecto de lei do Bloco de Esquerda), a idade de imputabilidade penal e acolhe algumas propostas da CEDERSP.
6 — O projecto de lei do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta várias alterações ao Código Penal, com incidência, designadamente, no direito de queixa, na punição da discriminação em função da

Página 15

15 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

orientação sexual, onde se inclui o ódio homofóbico no âmbito do homicídio qualificado, alterando o regime da liberdade condicional e fazendo propostas ao nível da segurança rodoviária.
A apresentação das iniciativas legislativas foi efectuada nos termos regimentais.
Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é do seguinte

III — Parecer

A proposta de lei e os projectos de lei em apreço encontram-se em condições constitucionais e regimentais de subir a Plenário, reservando os grupos parlamentares as suas posições de voto para debate.

Lisboa, 21 de Fevereiro de 2007.
A Deputada Relatora, Anta Catarina Mendonça Mendes — O Vice-Presidente da Comissão, António Montalvão Machado.

Nota — As conclusões e o parecer foram aprovados por unanimidade, tendo-se registado a ausência de Os Verdes.

———

Página 16

16 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

PROJECTO DE LEI N.º 340/X (PROVIDÊNCIAS DE COMBATE À CORRUPÇÃO MEDIANTE GESTÃO PREVENTIVA DOS RISCOS DA SUA OCORRÊNCIA)

PROJECTO DE LEI N.º 341/X (APROVA ALTERAÇÕES AO CÓDIGO PENAL E À LEGISLAÇÃO PENAL AVULSA SOBRE PREVENÇÃO E REPRESSÃO DA CORRUPÇÃO)

PROJECTO DE LEI N.º 345/X (COMBATE À CORRUPÇÃO)

PROJECTO DE LEI N.º 354/X (ALTERA AS DISPOSIÇÕES DA LEI N.º 34/87, DE 16 DE JULHO, RELATIVAS À CORRUPÇÃO)

PROJECTO DE LEI N.º 355/X (ALTERA OS ARTIGOS 372.º E 374.º DO CÓDIGO PENAL, RELATIVOS AOS CRIMES DE CORRUPÇÃO, E REVOGA O ARTIGO 373.º DO MESMO CÓDIGO)

PROJECTO DE LEI N.º 356/X (DETERMINA REGRAS DE PRESTAÇÃO DE CONTAS DOS TITULARES DE CARGOS POLÍTICOS OU ALTOS CARGOS PÚBLICOS ACERCA DO SEU PATRIMÓNIO)

PROJECTO DE LEI N.º 357/X (DEFINE A CATIVAÇÃO PÚBLICA DAS MAIS-VALIAS URBANÍSTICAS COMO MEDIDA PREVENTIVA DE COMBATE AO ABUSO DE PODER E À CORRUPÇÃO)

PROJECTO DE LEI N.º 358/X (DETERMINA A DIVULGAÇÃO DOS RESULTADOS DOS INSTRUMENTOS DE COMBATE À CORRUPÇÃO E A SUA COMUNICAÇÃO AO PARLAMENTO)

PROJECTO DE LEI N.º 360/X (ADOPTA MEDIDAS LEGAIS DE COMBATE À CORRUPÇÃO E À CRIMINALIDADE ECONÓMICA E FINANCEIRA)

PROJECTO DE LEI N.º 361/X (INSTITUI O PROGRAMA NACIONAL DE PREVENÇÃO DA CRIMINALIDADE ECONÓMICA E FINANCEIRA)

PROJECTO DE LEI N.º 362/X (ALTERA LEGISLAÇÃO NO SENTIDO DO REFORÇO DOS INSTRUMENTOS DE COMBATE À CORRUPÇÃO)

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 177/X (PREVENÇÃO DA CORRUPÇÃO)

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 178/X [CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA A CORRUPÇÃO (RESOLUÇÃO N.º 58/4, DA ASSEMBLEIA GERAL DA ONU, DE 31 DE OUTUBRO DE 2003)]

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 183/X (MEDIDAS DE COMBATE À CORRUPÇÃO)

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

Relatório

Introdução

Todas as iniciativas parlamentares e legislativas que são objecto do presente relatório têm como denominador comum o combate à corrupção. De facto, este fenómeno tem vindo a suscitar grande preocupação em Portugal. Alastra na opinião pública a convicção de que a corrupção assume largas

Página 17

17 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

proporções a vários níveis da Administração Pública e em diversos sectores de actividade, ficando impune na grande maioria dos casos. A comunicação social faz eco de alguns casos envolvendo eventuais práticas de corrupção, havendo a convicção de que tal não passa da ponta de um enorme icebergue. Tanto os órgãos de soberania como os intervenientes no sistema judiciário têm vindo a fazer incidir as suas atenções sobre este fenómeno, a promover o debate sobre as suas causas e a procurar soluções para melhorar a prevenção e a punição da sua ocorrência.
Terão contribuído para esta crescente atenção ao fenómeno da corrupção não apenas alguns casos fortemente mediatizados, mas também o facto do 2.º Relatório de Avaliação sobre Portugal adoptado pelo GRECO (Grupo de Estados Contra a Corrupção), do Conselho da Europa, adoptado em 12 de Maio de 2006, conter um diagnóstico preocupante quanto à situação nacional em matéria de corrupção.
Na presente Legislatura a Assembleia da República teve já a oportunidade de se debruçar sobre o fenómeno da corrupção. Em Julho de 2006 teve lugar um debate de urgência suscitado pelo Grupo Parlamentar do PCP precisamente a propósito do já referido Relatório GRECO sobre Portugal e, em 14 de Dezembro de 2006, foram debatidas e aprovadas na generalidade iniciativas legislativas do PSD e do Governo sobre a corrupção no desporto e defesa da verdade desportiva (projecto de lei n.º 320/X, do PSD, e proposta de lei n.º 308/X, do Governo).
Porém, a disposição anunciada por vários grupos parlamentares para apresentar iniciativas sobre esta matéria levou a que tenha sido reservada a ordem de trabalhos de 22 de Fevereiro de 2007 para a discussão conjunta, na generalidade, das iniciativas apresentadas até essa data. Para além disso, está prevista a realização, para Março de 2007, de um colóquio internacional promovido pela Assembleia da República sobre o fenómeno da corrupção, sendo previsível que após essa realização se conclua o processo legislativo já iniciado.
Assim, no próximo dia 22 de Fevereiro de 2007, serão apreciadas as iniciativas que em seguida se indicam por ordem cronológica da sua apresentação: Em 19 de Janeiro foram apresentados por alguns Deputados do Partido Socialista o projecto de lei n.º 340/X, sobre providências de combate à corrupção mediante gestão preventiva dos riscos da sua ocorrência, e o projecto de lei n.º 341/X, que aprova alterações ao Código Penal e a legislação penal avulsa sobre prevenção e repressão da corrupção. Estes projectos de lei substituíram iniciativas legislativas com idênticas designações que haviam sido apresentadas em 27 de Julho de 2006 pelo Sr. Deputado João Cravinho e que foram entretanto retiradas.
Em 26 de Janeiro o PSD apresentou o projecto de resolução n.º 177/X, sobre prevenção da corrupção, e o projecto de lei n.º 345/X, sobre combate à corrupção.
Em 1 de Fevereiro o PCP apresentou o projecto de resolução n.º 178/X, propondo a aprovação, para ratificação, da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção (Resolução n.º 58/4, da Assembleia Geral da ONU, de 31 de Outubro de 2003).
Em 14 de Fevereiro o BE apresentou o projecto de lei n.º 354/X, que altera as disposições da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, relativas à corrupção, o projecto de lei n.º 355/X, que altera os artigos 372.º e 374.º do Código Penal, relativos aos crimes de corrupção, e revoga o artigo 373.º do mesmo Código (que reproduz matéria já constante do projecto de lei n.º 353/X, do mesmo Grupo Parlamentar, que altera o Código Penal), o projecto de lei n.º 356/X, que determina regras de prestação de contas dos titulares de cargos políticos ou altos cargos públicos acerca do seu património, o projecto de lei n.º 357/X, que define a cativação pública das mais-valias urbanísticas como medida preventiva de combate ao abuso de poder e à corrupção, e o projecto de lei n.º 358/X, que determina a divulgação dos resultados dos instrumentos de combate à corrupção e a sua comunicação ao Parlamento.
Em 15 de Fevereiro o Grupo Parlamentar do PCP apresentou o projecto de lei n.º 360/X, que adopta medidas legais de combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira, e o projecto de lei n.º 361/X, que institui o Programa Nacional de Prevenção da Criminalidade Económica e Financeira. Na mesma data o Grupo Parlamentar do CDS-PP apresentou o projecto de resolução n.º 183/X, sobre medidas de combate à corrupção.
Finalmente, em 16 de Fevereiro, o PS apresentou o projecto de lei n.º 362/X, que altera legislação no sentido do reforço dos instrumentos de combate à corrupção.
Dada a diversidade de matérias que constam das iniciativas legislativas que importa analisar, opta-se por abordar separadamente cada uma delas, bem como o respectivo enquadramento legal.

1 — Aprovação, para ratificação, da «Convenção de Mérida»

O Grupo Parlamentar do PCP propõe que a Assembleia da República aprove, para Ratificação, a Convenção da Organização das Nações Unidas (ONU) Contra a Corrupção, conhecida pela Convenção de Mérida, que foi negociada entre 21 de Janeiro de 2002 e 1 de Outubro de 2003 e veio a ser adoptada por Resolução da Nações Unidas n.º 58/4, de 31 de Outubro de 2003, e aberta à assinatura na cidade de Mérida (México) em Dezembro do mesmo ano. Trata-se de uma Convenção estabelecida na sequência de uma outra Resolução da ONU (n.º 55/61, aprovada na reunião plenária da Assembleia Geral de 4 de Dezembro de

Página 18

18 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

2000), que concluiu pela necessidade da existência de um novo instrumento legal internacional contra a corrupção.
Em 14 de Dezembro de 2005 esta Convenção entrou em vigor após o depósito do trigésimo instrumento de ratificação, de aceitação, de aprovação ou de adesão. Refira-se que dos Estados-membros da União Europeia, a França (em 11 de Julho de 2005), a Hungria (em 19 de Abril de 2005) e a Roménia (em 2 de Novembro de 2004) já o fizeram.
A apreciação desta Convenção por parte da Assembleia da República com vista à sua eventual aprovação implica que seja solicitado ao Ministério dos Negócios Estrangeiros o envio da respectiva tradução oficial em língua portuguesa.

2 — Alterações ao Código Penal

Quatro projectos de lei propõem alterações ao Código Penal quanto às seguintes matérias:

a) Corrupção passiva: Os projectos de lei n.º 341/X e n.º 345/X propõem que o artigo 372.º do Código Penal passe a consagrar o crime de corrupção passiva para acto determinado, definido no n.º 1:

«O funcionário que por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, directa ou indirectamente, sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para a prática ou omissão de um qualquer acto ou omissão inerentes ao exercício das suas funções ou por estas facilitados, ainda que anteriores àquela solicitação ou aceitação, é punido com pena de prisão de um a oito anos.»

Acrescentando o n.º 2 que «se o acto ou omissão forem contrários aos deveres do cargo, o agente é punido com pena de prisão de dois a oito anos».
E propõem também a consagração, no artigo 373.º, do crime de corrupção passiva em razão das funções, nos termos seguintes (segundo a redacção do projecto de lei n.º 341/X):

«Na pena prevista no artigo anterior incorre o funcionário que, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, directa ou indirectamente, por causa das suas funções, mas sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial ou não patrimonial, de pessoa que perante ele tenha tido ou tenha qualquer pretensão dependente do exercício das suas funções públicas.»

Os projectos de lei n.º 341/X e 345/X divergem, porém, na moldura penal quanto a este último tipo de crime. Enquanto o primeiro prevê uma pena de um a oito anos de prisão, o segundo prevê uma pena de seis meses a cinco anos. Ambos excluem da previsão legal as vantagens que forem reconhecidas de interesse público, previamente declaradas e autorizadas.
A redacção vigente do Código Penal, decorrente da Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro, distingue os dois tipos de crime em presença como «corrupção passiva para acto ilícito» (artigo 372.º), que se traduz na prática de acto ou omissão contrários aos deveres do cargo e «corrupção passiva para acto lícito» (artigo 373.º) traduzida na obtenção de vantagem patrimonial ou não patrimonial de pessoa que perante ao agente tenha tido ou venha a ter qualquer pretensão dependente do exercício das suas funções públicas.
Para além da vantagem em causa poder ser «directa ou indirecta» (distinção que o Código Penal actual não contempla), os projectos de lei n.º 341/X e n.º 345/X mantém, no essencial, os tipos de crime já existentes.
A «corrupção passiva para acto determinado» corresponde à «corrupção passiva para acto ilícito» se o acto ou omissão for contrário aos deveres do cargo, ou à «corrupção passiva para acto lícito» se assim não for. A «corrupção passiva em razão das funções» corresponde a uma variante já prevista no n.º 2 do artigo 373.º da «corrupção passiva para acto lícito».
A diferença fundamental está na medida das penas. Actualmente a corrupção passiva para acto ilícito implica uma pena que vai de um a oito anos de prisão e a corrupção para acto lícito implica uma pena de prisão até dois anos ou multa até 240 dias. No projecto de lei n.º 341/X a «corrupção passiva para acto determinado» implica uma pena de prisão de um a oito anos mesmo que o acto ou omissão não seja contrário aos deveres do cargo e de dois a oito anos se o for, e a «corrupção passiva em razão das funções implica igualmente uma pena de prisão de um a oito anos». O projecto de lei n.º 345/X prevê para este último uma pena de seis meses a cinco anos de prisão. Estamos, portanto, perante um agravamento drástico das penas de prisão aplicáveis à corrupção actualmente designada como «para acto lícito» para a qual, dos actuais dois anos de prisão ou multa até 240 dias se passa para uma pena de prisão que pode ir até aos oito anos sem previsão de qualquer pena de multa.
O projecto de lei n.º 355/X adopta uma sistematização algo diferente, mas unifica os tipos de crime acima referidos sob a designação de «corrupção passiva», prevendo para todas as suas variantes a pena de prisão de um a oito anos.

Página 19

19 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

Os projectos de lei n.º 341/X e 345/X excluem da corrupção passiva em razão das funções as vantagens que forem reconhecidas de interesse público, previamente declaradas e autorizadas (n.º 2 do artigo 273.º do Código Penal). Porém, o projecto de lei n.º 340/X obriga a que tais autorizações sejam registadas em suporte informático pelos órgãos ou responsáveis competentes, para efeitos de facilitar o acesso dos cidadãos ao seu conhecimento. Mais refere que as declarações e autorizações aplicáveis a membro de órgãos colectivos ou a responsável máximo são da competência do membro do Governo com tutela directa sobre as correspondentes entidades públicas, devendo ser objecto de registo. No caso das entidades autárquicas, o órgão competente é a assembleia municipal ou a assembleia de freguesia que organiza o respectivo registo.

b) Corrupção activa: A corrupção activa é punida actualmente com penas de prisão de seis meses a cinco anos se a sua finalidade for a obtenção de acto ilícito ou de pena de prisão até seis meses ou pena de multa até 60 dias se tiver como finalidade a prática de acto lícito (artigo 374.º). O projecto de lei n.º 341/X prevê para todos os casos uma pena de prisão de um a seis anos. O projecto de lei n.º 345/X prevê uma pena de prisão de seis meses a cinco anos caso o fim visado seja a obtenção de acto determinado, ou de prisão até três anos ou multa caso se trate de corromper em razão das funções. O projecto de lei n.º 355/X equipara totalmente a corrupção activa à corrupção passiva, prevendo também para esta última uma pena de prisão de um a oito anos, seja qual for a forma que revista.

c) Enriquecimento não justificado: O projecto de lei n.º 360/X propõe o aditamento de um artigo 374.º-A ao Código Penal, prevendo a criação de um novo tipo de crime de enriquecimento não justificado. Os cidadãos abrangidos pela obrigação de declaração de rendimentos e património dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos que, por si ou por interposta pessoa, estejam na posse de património e rendimentos anormalmente superiores aos indicados nas declarações anteriormente prestadas e não justifiquem, concretamente, como e quando vieram à sua posse ou não demonstrem satisfatoriamente a sua origem lícita, são punidos com pena de prisão até três anos e multa até 360 dias. Idêntico regime é aplicável a todos os cidadãos relativamente a quem se verifique, no âmbito de um procedimento tributário que, por si ou por interposta pessoa, estejam na posse de património e rendimentos anormalmente superiores aos indicados nas declarações anteriormente prestadas e não justifiquem, concretamente, como e quando vieram à sua posse ou não demonstrem satisfatoriamente a sua origem lícita.

d) Prazos de prescrição: Os projectos de lei n.º 342/X e 345/X propõem que o prazo de prescrição dos crimes de corrupção passiva para acto determinado, corrupção passiva em razão das funções, corrupção activa, peculato e participação económica em negócio, bem como do crime de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção sejam alargados de 10 para 15 anos.

3 — Alterações à Lei n.º 34/87, de 16 de Julho (Crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos)

Os artigos 16.º a 18.º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, constituem a transposição das disposições do Código Penal relativas aos crimes de corrupção para a esfera específica dos crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos. Assim, o artigo 16.º reporta-se ao crime de corrupção passiva para acto ilícito (artigo 372.º do Código Penal), o artigo 17.º refere-se ao crime de corrupção passiva para acto lícito (artigo 373.º do Código Penal) e o artigo 18.º prevê e pune a corrupção activa (artigo 374.º do Código Penal). A redacção actualmente vigente decorre da Lei n.º 108/2001, de 28 de Novembro.
O regime aplicável aos titulares de cargos políticos é agravado em relação ao regime geral. Assim, a corrupção passiva para acto ilícito é punida com prisão de dois a oito anos; a corrupção passiva para acto lícito é punida com prisão até três anos e multa até 300 dias; a corrupção activa é punida nos termos gerais, mas dispõe o n.º 3 do artigo 18.º que «o titular de cargo político que no exercício das suas funções, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a funcionário ou a outro titular de cargo político, ou a terceiro com conhecimento destes, vantagem patrimonial ou não patrimonial que não lhes seja devida, com os fins indicados no artigo 16.º (acto ou omissão contrários aos deveres do cargo) é punido com a pena prevista no mesmo artigo”, que é de dois a oito anos de prisão.
Os projectos de lei n.º 341/X, 345/X e 354/X, que se referem a esta matéria, alargam a sua aplicação aos titulares de altos cargos públicos, passando, assim, a abranger todos os titulares de cargos previstos na Lei n.º 64/93, de 26 de Agosto. Passam assim a ser abrangidos, para além dos cargos que já o são (Presidente da República, Presidente da Assembleia da República, Deputados, membros do Governo, Deputados ao Parlamento Europeu, representantes da República para as regiões autónomas, membros de órgãos de governo próprio das regiões autónomas, membros de órgãos representativos das autarquias locais e governadores civis), também os seguintes:

Página 20

20 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

a) Presidentes do conselho de administração de empresas públicas e de sociedades anónimas de capitais exclusiva ou maioritariamente públicos, qualquer que seja o modo da sua designação; b) Gestores públicos ou membros de conselhos de administração de sociedades anónimas de capitais exclusiva ou maioritariamente públicos, designadas por entidades públicas, desde que exerçam funções executivas; c) Membros em regime de permanência e a tempo inteiro de entidades públicas independentes.

Os projectos de lei n.º 341/X, 345/X e 354/X transpõem para a Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, as propostas que fazem em sede de Código Penal. Assim, os dois primeiros prevêem os crimes de corrupção passiva para acto determinado e de corrupção passiva em razão das funções e o projecto de lei n.º 354/X prevê o crime de corrupção passiva tout court. As molduras penais previstas são agravadas em relação ao regime geral. Nos projectos de lei n.º 341/X e 354/X a corrupção passiva implica sempre uma pena entre dois e oito anos de prisão, e no projecto de lei n.º 345/X, a corrupção passiva para acto determinado é punida com prisão de dois a 10 anos, ou de três a 10 anos no caso de actos contrários aos deveres do cargo.
Em matéria de corrupção activa, os projectos de lei n.º 341/X e 354/X revogam os n.os 1 e 2 do artigo 18.º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, presume-se que por lapso, na medida em que tal revogação deixaria sem punição a corrupção activa nos casos em que os titulares de cargos políticos fossem os agentes activos, o que não parece ser pretendido pelos proponentes, na medida em que mantém a punição da corrupção activa nos casos em que tanto os potenciais corruptos como os potenciais corruptores sejam titulares de cargos políticos.
O projecto de lei n.º 345/X não incorre no lapso e mantém na íntegra os n.os 1 e 2 do artigo 18.º.
Todos os projectos de lei que incidem sobre esta matéria mantêm disposição semelhante à do n.º 3 do artigo 18.º. Já quanto ao artigo 19.º (dispensa ou atenuação da pena), o projecto de lei n.º 345/X mantém-no integralmente, os projectos de lei n.º 341/X e 354/X revogam os n.os 1 e 2 que prevêem a dispensa de pena nos casos em que o agente voluntariamente repudiar a promessa que aceitara, ou restituir a vantagem, ou, tratandose de coisa fungível, o seu valor, antes da prática do facto, ou se o agente da corrupção activa voluntariamente, antes da prática do facto, retirar a promessa feita ou solicitar a restituição da vantagem dada. O projecto de lei n.º 354/X revoga mesmo a disposição do n.º 3 do artigo 19.º que prevê a atenuação especial da pena se o agente auxiliar concretamente na recolha das provas decisivas para a identificação ou a captura de outros responsáveis.
Em conformidade com as propostas feitas em sede de Código Penal, os projectos de lei n.º 341/X e 345/X propõem o alargamento para 15 anos do prazo de prescrição do procedimento criminal pelos crimes previstos nos artigos 16.º a 18.º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho.

4 — Alterações à Lei n.º 4/83, de 2 de Abril

À Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, entretanto alterada pela Lei n.º 38/83, de 25 de Outubro, e pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, sobre o controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos, são propostos dois tipos de alterações:

— O projecto de lei n.º 341/X propõe que a descrição dos elementos do activo patrimonial a constar da declaração de rendimentos e património passe a incluir para além das contas bancárias a prazo, também as contas bancárias à ordem; — Os projectos de lei n.º 341/X e 354/X propõem que o Ministério Público junto do Tribunal Constitucional proceda anualmente à análise de uma amostra aleatória simples com um erro de primeira espécie não superior a 5 % das declarações apresentadas após o termo dos mandatos ou da cessação de funções dos respectivos titulares, sem prejuízo de poder, a todo o tempo, analisar quaisquer outras.

5 — Alterações ao Código de Justiça Militar

O projecto de lei n.º 341/X propõe uma alteração ao n.º 1 do artigo 36.º do Código de Justiça Militar, aprovado pela Lei n.º 100/2003, de 15 de Novembro, sobre corrupção passiva.
Nos termos do Código vigente, é punido com pena de prisão de dois a 10 anos, aquele que, integrado ou ao serviço das Forças Armadas ou de outras forças militares, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, sem que lhe seja devida, vantagem patrimonial ou não patrimonial ou a sua promessa, como contrapartida de acto ou omissão contrários aos deveres do cargo e de que resulte um perigo para a segurança nacional.
Na proposta apresentada, a expressão «como contrapartida de acto ou omissão contrária aos deveres do cargo» é substituída por «para a prática ou omissão de um qualquer acto inerente ao seu cargo ou por este facilitado, ainda que anterior àquela solicitação ou aceitação».

6 — Alterações à Lei n.º 36/94, de 29 de Setembro

O projecto de lei n.º 341/X propõe duas alterações à Lei n.º 36/94, de 29 de Setembro, sobre medidas de combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira.

Página 21

21 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

O artigo 1.º desta lei atribui ao Ministério Público e à Polícia Judiciária a competência para realizar acções de prevenção relativas aos seguintes crimes:

a) Corrupção, peculato e participação económica em negócio; b) Administração danosa em unidade económica do sector público; c) Fraude na obtenção ou desvio de subsídio, subvenção ou crédito; d) Infracções económico-financeiras cometidas de forma organizada, com recurso à tecnologia informática; e) Infracções económico-financeiras de dimensão internacional ou transnacional.

O projecto de lei n.º 341/X dá nova redacção à alínea a) que passa a referir-se a «corrupção activa e passiva, tráfico de influência, peculato, participação económica em negócio, enriquecimento ilícito e concussão»; e à alínea d), que passa a referir-se a «infracções económico-financeiras cometidas de forma organizada ou com recurso à tecnologia informática». Note-se, porém, que o crime de «enriquecimento ilícito» aqui previsto, não se encontra previsto na lei nem consta do projecto de lei em referência.
Este projecto de lei propõe o aditamento de um artigo 9.º-A à Lei n.º 36/94, de 29 de Setembro, aplicável às pessoas colectivas. Nos termos desse novo artigo podem beneficiar da dispensa ou da atenuação especial da pena e da suspensão provisória do processo as pessoas colectivas ou entidades equiparadas, sempre que o agente por via de cuja actuação seja responsável beneficie desse regime, ou ainda quando titular de órgão de administração, pessoa com poder de representação ou poder de decisão em nome da pessoa colectiva ou equiparada auxilie concretamente na recolha das provas decisivas para a identificação ou a captura de outros responsáveis, denuncie o crime antes da instauração do processo-crime, ou contribua decisivamente para a descoberta da verdade.
Note-se, entretanto, que a aprovação desta disposição só fará sentido se for consagrada a responsabilidade criminal das pessoas colectivas nos termos constantes da proposta de lei n.º 98/X, que altera o Código Penal, e cujo processo legislativo se encontra em curso.

7 — Alterações à Lei n.º 5/2002, de 11 de Novembro

Os projectos de lei n.º 341/X, 345/X, 360/X e 362/X propõem aditamentos ao artigo 1.º da Lei n.º 5/2002, de 11 de Novembro, que estabelece medidas de combate à criminalidade organizada e económico-financeira.
Este diploma prevê um regime especial de recolha de prova, quebra de segredo profissional e perda de bens a favor do Estado relativa aos crimes elencados no seu artigo 1.º, que são os seguintes:

— Tráfico de estupefacientes; — Terrorismo e organização terrorista; — Tráfico de armas; — Corrupção passiva e peculato; — Branqueamento de capitais; — Associação criminosa; — Contrabando; — Tráfico e viciação de veículos furtados; — Lenocínio e lenocínio e tráfico de menores; — Contrafacção de moeda e de títulos equiparados a moeda.

A estes crimes, os projectos de lei n.º 341/X e 362/X aditam o tráfico de influência, a corrupção activa, e a participação económica em negócio. O projecto de lei n.º 345/X, a estes, adita ainda a concussão. O projecto de lei n.º 360/X adita o enriquecimento injustificado cuja consagração no Código Penal também propõe.

8 — Alterações ao Código de Processo Penal

O projecto de lei n.º 345/X propõe-se resolver o problema da apreensão de bens móveis ou imóveis do arguido aditando um novo n.º 2 ao artigo 197.º do Código de Processo Penal, prevendo que aquela possa ter lugar por decisão do juiz nos crimes de corrupção, peculato, participação económica em negócio, abuso de poder, violação de segredo, e ainda no crime de fraude na obtenção de subsídio ou subvenção.
O mesmo projecto de lei propõe ainda o aditamento de um novo n.º 4 ao artigo 204.º do Código de Processo Penal. Este artigo dispõe sobre as condições de aplicação das medidas de coação, prevendo que estas só possam se aplicadas se se verificar:

a) Fuga ou perigo de fuga; b) Perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e, nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova; ou c) Perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de perturbação da ordem e da tranquilidade públicas ou de continuação da actividade criminosa.

Página 22

22 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

A estas circunstâncias adita-se o «perigo da ocultação, alienação ou oneração de bens móveis ou imóveis, aquando da existência de fortes indícios de que o património móvel ou imóvel do arguido é manifestamente superior ao que resulta da avaliação dos seus rendimentos».

9 — Alterações à Lei Geral Tributária

A Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 389/98, de 17 de Dezembro, contém um artigo 89.º-A, com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, relativo a manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados. Aí se dispõe que há lugar a avaliação indirecta da matéria colectável quando falta a declaração de rendimentos e o contribuinte evidencie manifestações de fortuna constantes de uma tabela anexa ou quando o rendimento líquido declarado mostre uma desproporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendimento padrão resultantes dessa tabela.
Os projectos de lei n.º 341/X e 362/X propõem o aditamento de um novo n.º 10, dispondo que «os elementos respeitantes às manifestações de fortuna serão enviados ao Ministério Público para instauração de inquérito e, tratando-se de funcionário ou titular de cargo sob tutela de entidade pública, também à tutela para efeitos de averiguações no âmbito da respectiva competência». O projecto de lei n.º 356/X contém disposição semelhante, sendo que neste caso os elementos a enviar ao Ministério Público são os constantes de decisão de avaliação da matéria colectável com recurso ao método indirecto, após tornar-se definitiva.

10 — Alteração ao Regime Geral das Infracções Tributárias

O Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, prevê, no seu artigo 47.º, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, que, se estiver a decorrer processo de impugnação judicial ou tiver lugar oposição à execução, nos termos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, em que se discuta situação tributária de cuja definição dependa a qualificação criminal dos factos imputados, o processo penal tributário se suspenda até que transitem em julgado as respectivas sentenças.
O artigo 7.º do Código de Processo Penal, sob a epígrafe «Suficiência do processo penal», determina que o processo penal é promovido independentemente de qualquer outro e nele se resolvem todas as questões que interessam à decisão da causa (n.º1). Porém, «quando, para se conhecer da existência de um crime, for necessário julgar qualquer questão não penal que não possa ser convenientemente resolvida no processo penal, pode o tribunal suspender o processo que se decida esta questão no tribunal competente» (n.º 2). A suspensão pode ser requerida, após a acusação ou o requerimento para abertura da instrução, pelo Ministério Público, pelo assistente ou pelo arguido, ou ser ordenada oficiosamente pelo tribunal (n.º 3). O tribunal marca o prazo da suspensão, que pode ser prorrogado até um ano se a demora na decisão não for imputável ao assistente ou ao arguido. O Ministério Público pode sempre intervir no processo não penal para promover o seu rápido agendamento e informar o tribunal penal. Esgotado o prazo sem que a questão prejudicial tenha sido resolvida, ou se a acção não tiver sido proposta no prazo máximo de um mês, a questão é decidida no processo penal (n.º 4).
É propósito dos proponentes, com se afirma o preâmbulo do projecto de lei n.º 341/X, agilizar o apuramento de responsabilidades conexas à prática de crime tributário quando ocorrer a suspensão do processo tributário.
A solução que é proposta afigura-se. porém, problemática e até de difícil compreensão. De facto, a aplicação integral do artigo 7.º do Código de Processo Penal à situação em apreço parece implicar a revogação do artigo 47.º do RGIT, dada a diversidade de regimes entre ambos. A solução pretendida pelos proponentes parece ser mais correctamente atingível, transpondo para o RGIT a aplicação de algumas regras previstas no artigo 7.º do Código de Processo Penal, designadamente em matéria de prazos de suspensão e outros aspectos previstos no n.º 4.

11 — Criação de entidades específicas para a prevenção da corrupção

De entre as iniciativas apresentadas, três delas prevêem a criação de novas entidades para a prevenção e para o combate à corrupção ou à criminalidade económica e financeira em geral. O projecto de lei n.º 340/X propõe a criação de uma Comissão para a Prevenção da Corrupção, o projecto de resolução n.º 177/X propõe a criação de uma Agência Anti-Corrupção e o projecto de lei n.º 361/X propõe a criação de uma Comissão Nacional da Prevenção da Criminalidade Económica e Financeira. Vejamos de seguida cada uma delas.

a) Comissão para a Prevenção da Corrupção: O projecto de lei n.º 340/X propõe a criação de uma Comissão para a Prevenção da Corrupção (CPC).
Trata-se de uma entidade pública independente, de âmbito nacional, a funcionar junto da Assembleia da República e dispondo de serviços próprios de apoio técnico e administrativo.
A CPC é composta por três membros de integridade e mérito reconhecidos, dos quais um presidente e dois vogais, individualmente eleitos pela Assembleia da República por maioria de três quintos, após audição

Página 23

23 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

individual na comissão parlamentar competente. O mandato é exercido em regime de exclusividade, com a duração de quatro anos, renovável por uma vez.
A lei orgânica e o quadro de pessoal da CPC, bem como o regime de incompatibilidades, de impedimentos, de suspeições, de perda de mandato, e o estatuto remuneratório dos seus membros, são objecto de Lei da Assembleia da República.
A CPC tem por atribuições:

a) Centralizar as informações necessárias à gestão preventiva dos riscos de ocorrência de corrupção; b) Acompanhar e apreciar o cumprimento das disposições legais e regulamentares vigentes em matéria de prevenção da corrupção, em especial no que se refere aos planos de prevenção da corrupção; c) Criar e manter, com respeito pelas disposições legais sobre protecção de dados pessoais, um observatório actualizado das ocorrências ligadas à corrupção, bem como das penas e sanções aplicadas e das medidas correctivas consequentemente adoptadas; d) Promover ou colaborar na divulgação das boas práticas de prevenção da corrupção, nomeadamente através do fomento de acções de formação de âmbito geral ou sectorial.

Todas as entidades públicas, incluindo as da administração autárquica e as do sector empresarial do Estado, devem prestar a sua colaboração à CPC, facultando-lhe todas as informações que por esta, no exercício das suas competências, lhes forem solicitadas.
O projecto de lei n.º 340/X propõe igualmente a criação de um conselho de acompanhamento da actividade da CPC, composto por:

a) Três magistrados com mais de 10 anos de carreira, cada um dos quais designado respectivamente pelo Conselho Superior de Magistratura, pelo Conselho Superior do Ministério Público e pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, que preside; b) Duas personalidades designadas pelo Presidente da República; c) Duas personalidades designadas pelo Governo; d) Duas personalidades de reconhecido mérito, designadamente nas áreas de gestão financeira, fiscal e de ordenamento do território e de política criminal, eleitos pela Assembleia da República; e) Uma personalidade designada pelas organizações não governamentais cujo objecto preveja o combate à corrupção.

b) Agência Anti-Corrupção: O projecto de resolução n. 177/X propõe a criação de uma Agência Anti-Corrupção. A forma de projecto de resolução é assumida pelos proponentes tendo em consideração a impossibilidade de aprovar a criação de uma nova entidade pública no ano em curso por força da norma travão da Constituição. A opção seguida foi então a de recomendar ao Governo a criação de tal entidade.
O regime proposta consta de anexo ao projecto de resolução. A Agência Anti-Corrupção tem a natureza de entidade administrativa independente e funciona junto da Assembleia da República. Compete à Assembleia da República aprovar o regime de organização e funcionamento da Agência, bem como do estatuto dos seus membros por forma a garantir a sua independência no exercício de funções.
São atribuições da Agência acompanhar, formular propostas e apresentar pareceres sobre a adopção nacional das recomendações constantes do relatório de avaliação do Grupo de Estados Contra a Corrupção, de Maio de 2006, nomeadamente nos seguintes vectores de intervenção:

a) Reforço sistemático das investigações financeiras e patrimoniais, designadamente através da mobilização plena de meios jurídicos, técnicos e humanos; b) Revisão do regime legal da detecção, apreensão e perda dos produtos da corrupção e do tráfico de influências, com vista à melhoria da sua eficácia; c) Reforço do diagnóstico anti-branqueamento e sua articulação com o combate à corrupção, quer no plano da obrigação de declarar transacções suspeitas quer na formação adequada à detecção e ao reporte de indícios de corrupção; d) Análise proactiva dos riscos de corrupção a todo o sector público, tendo em vista a aplicação de medidas preventivas; e) Elaboração de códigos de conduta, com referências explicitas a aspectos deontológicos, a riscos da prática de corrupção e a um regime de sanções adequado no caso do seu desrespeito; f) Adopção de regras claras em matéria de conflitos de interesses e de migração abusiva do sector público para o sector privado; g) Protecção aos denunciantes de suspeitas de corrupção; h) Revisão do regime penal da corrupção, do tráfico de influências e do branqueamento, avaliando a eficácia das sanções, a sua proporcionalidade e o seu efeito dissuasor; i) Formação específica para os agentes da administração fiscal na detecção de indícios de corrupção.

Página 24

24 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

A Agência é composta por membros de integridade e mérito reconhecidos, indicados pelas seguintes entidades:

a) Um presidente, eleito por maioria de dois terços na Assembleia da República; b) Um juiz conselheiro (ou ex-juiz) indicado pelo Conselho Superior da Magistratura; c) Um juiz (ou ex-juiz) indicado pelo Tribunal de Contas; d) Um académico indicado pelo Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas.

Todas as entidades públicas, incluindo as autarquias e o sector empresarial do Estado, devem prestar a sua colaboração à Agência, facultando-lhe todas as informações que por esta, no exercício das suas funções, lhes forem solicitadas.

c) Comissão Nacional da Prevenção da Criminalidade Económica e Financeira: O projecto de lei n.º 361/X propõe a criação de uma Comissão Nacional da Prevenção da Criminalidade Económica e Financeira no âmbito de um Programa Nacional de Prevenção da Criminalidade Económica e Financeira, cuja criação consta da mesma iniciativa legislativa.
O Programa Nacional proposto tem como objectivo prevenir a prática dos crimes de natureza económica e financeira através de um conjunto integrado e concreto de medidas, e do aprofundamento e coordenação da acção das entidades que intervêm na prevenção e repressão desses tipos de crimes, sem prejuízo das competências próprias de cada uma delas, visando contribuir para a definição e concretização da política nacional nesta área. Para a prossecução destes objectivos é proposta a criação de uma Comissão Nacional da Prevenção da Criminalidade Económica e Financeira.
A Comissão Nacional tem por atribuições:

a) Coordenar a intervenção das entidades de supervisão, fiscalização e controlo em matéria de prevenção e combate à criminalidade económica e financeira; b) Acompanhar e avaliar a situação nacional quanto à ocorrência de crimes de natureza económica e financeira, quanto às suas consequências, e quanto aos efeitos das medidas adoptadas e da legislação, nacional e internacional, existente a este respeito; c) Elaborar, em conjunto com as entidades envolvidas, e submeter ao Governo, propostas relativas à prevenção da criminalidade económica e financeira, nomeadamente ao nível do controlo e fiscalização das entidades susceptíveis de ser utilizadas em operações previstas e punidas por lei; d) Apoiar a formação técnica e cientifica de pessoal qualificado com intervenção nesta matéria, particularmente de profissionais das estruturas representadas na Comissão; e) Desenvolver a cooperação internacional e estudar a realidade de outros países em matéria de prevenção e combate à criminalidade económica e financeira, com vista ao aperfeiçoamento das disposições legais sobre essa matéria.

A Comissão Nacional pode submeter à consideração do Governo e da Assembleia da República as propostas legislativas e regulamentares, bem como os relatórios e as recomendações que tiver por convenientes.
A Comissão Nacional é presidida por um juiz, a designar pelo Conselho Superior da Magistratura, e é composta por um representante de cada uma das seguintes entidades:

a) Procuradoria-Geral da República; b) Ministério das Finanças; c) Ministério da Justiça; d) Ministério da Administração Interna; e) Banco de Portugal; f) Instituto Português de Seguros; g) Comissão do Mercado de Valores Mobiliários; h) Polícia Judiciária; i) Direcção-Geral dos Impostos; j) Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo; k) Inspecção-Geral de Finanças; l) Inspecção-Geral de Jogos; m) Direcção-Geral das Actividades Económicas.

A Comissão Nacional integra ainda um secretário executivo, nomeado pelo Governo, que tem como funções secretariar a Comissão e assegurar o funcionamento dos respectivos serviços de apoio.

Página 25

25 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

Todas as entidades públicas e privadas têm o dever de cooperar com a Comissão Nacional na prossecução dos seus objectivos, designadamente facultando-lhe todas as informações que aquela solicite no âmbito das suas competências.

12 — Orientações Estratégicas de Prevenção da Corrupção

De acordo com os projectos de lei n.º 340/X e 358/X, o Governo aprova, de dois em dois anos, as Orientações Estratégicas de Prevenção da Corrupção, que deve enviar à Assembleia da República nos 15 dias subsequentes à sua aprovação. Ambos os projectos de lei prevêem a existência de relatórios de execução das Orientações Estratégicas, a elaborar pelo Governo e a enviar à Assembleia da República.

13 — Planos de prevenção da corrupção

Os projectos de lei n.º 340/X e 358/X propõem que todas as entidades públicas, incluindo as do sector empresarial do Estado, bem como as empresas municipais e regionais, e que exerçam actividade em sectores considerados de risco agravado, devam promover a elaboração de um plano pormenorizado, denominado Plano de Prevenção da Corrupção, tendo em conta as Orientações Estratégicas de Prevenção da Corrupção, contendo, designadamente, as medidas de gestão preventiva dos riscos de tráfico de influências, de corrupção, de peculato, de participação económica em negócio e de conflito de interesses. Os responsáveis máximos dessas entidades públicas devem promover a elaboração dos respectivos planos, a vigorar até ao termo do mandato, nos 45 dias subsequentes ao início das suas funções.
Os planos devem ser apresentados para aprovação ao membro do Governo competente.
Os Planos de Prevenção da Corrupção das entidades autárquicas, bem como das empresas municipais e regionais, são submetidos para aprovação pelo competente órgão nos 45 dias subsequentes ao início do respectivo mandato.
Ambos os projectos de lei prevêem que a Assembleia da República possa excepcionar entidades públicas nominalmente designadas da obrigação de elaboração do respectivo Plano com fundamento em perfil de risco negligenciável, segundo critérios de análise de risco fixados na lei.
Transitoriamente, nos primeiros quatro anos de aplicação da lei, só ficam obrigados à elaboração de planos os municípios com população superior a 100 000 habitantes ou orçamento superior a € 50 milhões de euros e entidades a designar pelo Governo, de acordo com critérios de análise de risco, em número não inferior a 25, pertencentes à Administração Central do Estado e ao sector empresarial do Estado.
No prazo de 120 dias a contar da data da publicação da lei, o Governo comunicará à Assembleia da República a lista das entidades a que se refere o número anterior, acompanhada da explicitação dos critérios de análise de risco que lhe são aplicáveis.

14 — Actividades e sectores de risco agravado de corrupção

Os projectos de lei n.º 340/X e 358/X propõem que se proceda à publicitação da tipificação dos riscos de corrupção segundo a natureza e características das actividades ou sectores, identificando os casos de risco agravado. Esses casos devem ser objecto de plano de acção próprio, incidindo, nomeadamente, sobre a verificação da adequação das medidas legislativas, regulamentares e de gestão, bem como sobre acções específicas de aconselhamento e de formação, geral ou sectorial. Ambos os projectos de lei consideram, desde logo, como de risco agravado as actividades abrangidas pelas aquisições externas à entidade de bens e serviços e pela gestão do território.
O projecto de lei n.º 358/X atribui esta competência ao Governo, enquanto o projecto de lei n.º 340/X a atribui à Comissão para a Prevenção da Corrupção, cuja criação propõe.

15 — Criação de um registo de procurações irrevogáveis

Os projectos de lei n.º 341/X, 345/X e 362/X propõem a criação, no âmbito do Ministério da Justiça, de um registo central das procurações irrevogáveis, a regulamentar pelo Governo no prazo de 90 dias a contar da data da entrada em vigor da lei. O projecto de lei n.º 362/X limita a obrigatoriedade de registo às procurações que contenham poderes de transferência da titularidade de imóveis.

16 — Responsabilidade dos superiores

Os projectos de lei n.º 340/X e 356/X propõem que a acusação de funcionário ou de titular de alto cargo público pela prática de crimes de corrupção, peculato, participação económica em negócio, tráfico de influência ou concussão, determine a realização de um inquérito ao serviço em que presta a sua actividade, visando o apuramento de eventual responsabilidade disciplinar, civil ou penal dos respectivos superiores hierárquicos.

Página 26

26 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

O referido inquérito deve também visar a realização de uma aprofundada auditoria de sistema relativa à gestão dos riscos de corrupção acompanhada da recomendação de procedimentos administrativos ou regulamentos adequados, é obrigatoriamente iniciado no prazo máximo de 15 dias a contar da data em que a tutela teve conhecimento da acusação do funcionário ou do titular de alto cargo público e tem carácter de urgência.

17 — Carta Nacional de Prevenção da Corrupção

O projecto de lei n.º 340/X propõe a elaboração de uma Carta Nacional de Prevenção da Corrupção por parte da Comissão para a Prevenção da Corrupção, a enviar à Assembleia da República, para efeitos de publicação, discussão pública e apreciação.

18 — Comunicação ao Ministério Público

Os projectos de lei n.º 341/X e 345/X propõem que logo que no âmbito de uma acção inspectiva ou fiscalizadora efectuada por uma entidade de fiscalização e de controlo da Administração Pública seja tomado conhecimento de qualquer crime, este deve ser comunicado ao Ministério Público no mais curto prazo, devendo os funcionários praticar os actos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova.

19 — Garantias dos denunciantes e protecção das testemunhas

Os projectos de lei n.º 341/X, 345/X e 362/X prevêem medidas de protecção dos trabalhadores da Administração Pública e de empresas do sector empresarial do Estado que denunciem o cometimento de infracções de que tiverem conhecimento no exercício das suas funções ou por causa delas. Assim, esses trabalhadores:

— Não podem ser prejudicados por qualquer forma, incluindo a transferência voluntária; — A aplicação de sanção disciplinar (ou a instauração de procedimento disciplinar, no caso do projecto de lei n.º 345/X) de que sejam alvo presume-se, até prova em contrário, constituir um acto de retaliação. No projecto de lei n.º 362/X tal sanção presume-se abusiva, se tiver lugar até um ano após a denúncia; — Têm direito ao anonimato, excepto os investigadores, até à dedução de acusação; — Gozam do direito de transferência a seu pedido, sem faculdade de recusa, após dedução de acusação.

O projecto de lei n.º 360/X propõe também que o regime previsto no artigo 16.º da Lei n.º 93/99, de 14 de Julho, sobre protecção de testemunhas em processo penal, que permite a não revelação da identidade da testemunha durante alguma ou em todas as fases do processo, se estiverem em causa crimes de tráfico de pessoas, associação criminosa, organização terrorista, terrorismo, tráfico de droga, ou crimes puníveis com pena de prisão de máximo igual ou superior a oito anos, cometidos por quem fizer parte de associação criminosa, no âmbito da finalidade ou actividade desta, possa ser aplicada também aos crimes de corrupção e enriquecimento injustificado.

20 — Constituição de assistente por associações

O Código de Processo Penal prevê, na alínea e) do n.º 1 do artigo 68.º, que nos crimes contra a paz e a humanidade, bem como nos crimes de tráfico de influência, favorecimento pessoal praticado por funcionário, denegação de justiça, prevaricação, corrupção, peculato, participação económica em negócio, abuso de poder e de fraude na obtenção ou desvio de subsídio ou subvenção, qualquer pessoa se possa constituir assistente.
Os projectos de lei n.º 341/X e 362/X propõem que nos processos em que estejam em causa esses crimes se possam constituir assistentes as associações sem fins lucrativos cujo objecto principal preveja o combate à corrupção, sem sujeição ao pagamento de qualquer taxa de justiça.

21 — Apresentação de relatórios

As iniciativas parlamentares em apreciação prevêem a apresentação de diversos relatórios a diversas entidades.
Os projectos de lei n.º 341/X, 358/X e 362/X propõem que o relatório a apresentar pelo Governo à Assembleia da República relativo à execução da Lei-Quadro da Política Criminal, nos termos do artigo 14.º, n.º 2 da Lei n.º 17/2006, de 23 de Maio, contenha uma parte específica relativa aos crimes de corrupção, da qual constarão obrigatoriamente os seguintes pontos:

Página 27

27 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

a) Mapas estatísticos dos processos distribuídos, arquivados, acusados, pronunciados e não pronunciados, bem como das condenações e absolvições e respectiva pendência em cada uma das fases, incluindo os factos resultantes da aplicação das Leis n.os 5/2002, 11 de Janeiro, e 11/2004, de 27 de Março, devendo também ser produzida nestes últimos casos mapa estatístico das comunicações à PGR discriminados segundo a norma especifica e as entidades que estiveram na sua origem; b) Áreas de incidência da corrupção activa e passiva; c) Análise da duração da fase da investigação e exercício da acção penal, instrução e julgamento com especificação das causas; d) Análise das causas do não exercício da acção penal, das não pronunciadas e das absolvições; e) Indicação do valor dos bens apreendidos e dos perdidos a favor do Estado; f) Principais questões jurisprudenciais e seu tratamento pelo Ministério Público; g) Avaliação da coadjuvação dos órgãos de polícia criminal em termos quantitativos e qualitativos; h) Apreciação, em termos quantitativos e qualitativos, da colaboração dos organismos e instituições interpelados para disponibilização de peritos; i) Referência à cooperação internacional, com especificação do período de tempo necessário à satisfação dos pedidos; j) Formação específica dos magistrados, com identificação das entidades formadoras e dos cursos disponibilizados, bem como dos eventuais constrangimentos à sua realização; k) Elenco das directivas dadas ao Ministério Público; l) Propostas, nomeadamente relativas a meios materiais e humanos do Ministério Público e órgãos de policia criminal e a medidas legislativas, resultantes da análise da prática judiciária.

O projecto de lei n.º 340/X dispõe que o relatório bienal da Comissão para a Prevenção da Corrupção seja apresentado à Assembleia da República até ao dia 15 de Fevereiro do ano imediato a que se refere o biénio e dele devem constar os pareceres elaborados e concedidos ao abrigo da presente lei, bem como uma avaliação do cumprimento dos Planos de Prevenção da Corrupção vigentes no ano a que se refere. Esse relatório deve ainda incluir a análise fundamentada de um ou mais temas de reconhecida relevância e oportunidade, acompanhada das recomendações consideradas adequadas.
O mesmo projecto de lei n.º 340/X propõe que o Governo envie à Assembleia da República até ao dia 15 de Fevereiro o relatório de execução das Orientações Estratégicas de Prevenção da Corrupção relativo ao biénio anterior.
O projecto de lei n.º 358/X propõe que o Governo apresente à Assembleia da República até ao dia 15 de Fevereiro de cada ano um relatório detalhado sobre as medidas aplicadas no combate à corrupção e sobre os resultados alcançados, bem como uma avaliação do cumprimento dos Planos de Prevenção da Corrupção vigentes no ano a que se refere.
Os projectos de lei n.º 340/X e 358/X prevêem uma tramitação parlamentar dos relatórios apresentados à Assembleia da República definida como segue:

1 — Os relatórios são publicados no Diário da Assembleia da República, até ao dia 1 de Março, após o que são remetidos pelo Presidente da Assembleia da República à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para efeitos de emissão de relatório e parecer e projecto de resolução.
2 — A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias procede à distribuição dos relatórios pelos seus membros e por outras comissões especializadas em razão da matéria.
3 — A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias promove a audição do Governo (e da Comissão para a Prevenção da Corrupção, no caso do projecto de lei n.º 340/X), elabora e remete ao Presidente da Assembleia da República o respectivo relatório e parecer e projecto de resolução no prazo de 30 dias a contar da data da sua publicação.
4 — Até 15 dias após a recepção do relatório e parecer e projecto de resolução referidos no número anterior, o Presidente da Assembleia da República inclui a sua apreciação na ordem do dia.
5 — O Plenário aprecia o relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e vota o projecto de resolução da mesma, bem como os que lhe sejam apresentados pelos grupos parlamentares.

Sem que esteja em causa neste momento qualquer tomada de posição quanto ao que é proposto, sempre se adianta que a obrigatoriedade que se propõe de que a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias apresente um projecto de resolução pode afigurar-se problemático, por várias razões.
Desde logo, porque a apresentação de iniciativas parlamentares constitui uma faculdade e nunca uma obrigatoriedade. Depois, porque a apresentação de uma iniciativa parlamentar por parte de uma Comissão, não havendo consenso quanto ao seu conteúdo surgiria sempre como uma iniciativa de uma maioria contra uma minoria e já não da Comissão no seu conjunto, havendo como que uma invasão da esfera de iniciativa própria dos grupos parlamentares. Finalmente, porque os projectos de lei nada revelam quanto ao conteúdo típico de tal projecto de resolução, e assim, a lei obrigaria a comissão parlamentar a apresentar um projecto de resolução, mas deixaria à sua criatividade a decisão quanto ao conteúdo.

Página 28

28 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

O projecto de lei n.º 340/X propõe que a Comissão para a Prevenção da Corrupção possa submeter à Assembleia da República outros relatórios e estudos elaborados no âmbito das suas competências, acompanhados das recomendações adequadas.
O projecto de resolução n.º 177/X propõe que a Agência Anti-Corrupção apresente à Assembleia da República, até ao final do mês de Outubro, um relatório de progresso sobre a adopção de medidas no combate à corrupção, podendo ainda apresentar, à Assembleia da República ou ao Governo, pareceres ou propostas concretas no âmbito das suas atribuições.

22 — Reforço de meios

O projecto de resolução n.º 183/X assenta sobretudo no reforço dos meios de combate à corrupção. Assim, recomenda ao Governo que:

— Em articulação com a anunciada revisão da Lei Orgânica da Polícia Judiciária, proceda ao reforço dos meios materiais, humanos e financeiros que, dentro da Polícia Judiciária, estão afectos ao combate à corrupção; — Proceda à inscrição em futuros Orçamentos do Estado de verbas afectas ao combate à corrupção, baseada num compromisso de médio prazo de melhoria das dotações orçamentais dos órgãos de polícia criminal especificamente encarregues do combate à corrupção; — Proceda à revisão do Decreto-Lei n.º 61/88, de 27 de Fevereiro, que cria o Gabinete Coordenador de Segurança, no sentido de o dotar de competências executivas na partilha de informação e de coordenação entre as diversas forças e serviços de segurança, reforçando igualmente os meios humanos e materiais de que o Gabinete dispõe; — Inscreva, na lei de política criminal a aprovar ao abrigo do disposto no artigo 7.º da Lei n.º 17/2006, de 23 de Maio, o combate ao crime de corrupção.

23 — Cativação das mais-valias urbanísticas

O projecto de lei n.º 357/X propõe-se definir os limites dos direitos e deveres que a propriedade do solo confere aos seus proprietários, como uma forma de evitar e combater o abuso de poder e os riscos de corrupção dos decisores políticos, e, por outro lado, estabelecer que as mais-valias urbanísticas geradas por actos administrativos da exclusiva competência da Administração Pública e da execução de obras públicas que resultem total ou parcialmente de investimento público, consequência de decisões político-administrativas, sejam cativadas para o interesse público. Para esse efeito, o valor das mais-valias corresponde à diferença entre o valor do solo a preços de mercado antes e depois da reclassificação de solo rural em solo urbano e do aumento dos índices de edificabilidade determinado pelos instrumentos de gestão territorial, ou por efeito de obras públicas.
O projecto de lei propõe-se alterar alguns diplomas relativos ao ordenamento do território e urbanismo.
Assim, à Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto, que estabelece as bases da política de ordenamento do território e de urbanismo, é aditado um novo artigo 15.º-A, segundo o qual:

— Sempre que da acção de planeamento do território resultar alteração da classificação e qualificação dos solos as mais-valias urbanísticas assim geradas revertem para o Estado quando ocorra uma transacção desses solos; — Sempre que os instrumentos de gestão territorial prevejam modalidades de associação público-privada sujeita a mecanismos de perequação, o cálculo de encargos e benefícios incluem a avaliação das mais-valias simples resultantes da aprovação desses instrumentos, revertendo estas para o Estado; — Todas as obras públicas de infra-estruturas e equipamentos que resultem em valorização de solos ou prédios situados no território envolvente dão lugar à cativação para o Estado de 50% das mais-valias urbanísticas deste modo produzidas; — As receitas resultantes da cativação das mais-valias são cobradas pela administração fiscal e revertem na sua totalidade em favor do Fundo Social Municipal, sendo distribuídas pelos municípios nos termos da Lei de Finanças Locais.

Ao artigo 16.º do mesmo diploma é aditado um novo n.º 2, segundo o qual «a execução dos instrumentos de planeamento territorial como o plano director municipal, o plano de urbanização e o plano de pormenor é da exclusiva competência dos órgãos de poder local, nos termos da lei».
São propostas alterações ao Código das Expropriações (Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, e pela Lei n.º 4-A/2003, de19 de Fevereiro. O artigo 23.º relativo à justa indemnização passa a dispor que na determinação do valor dos bens expropriados não pode tomar-se em consideração a mais-valia que resultar:

Página 29

29 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

— De obras ou empreendimentos públicos concluídos há menos de cinco anos, no caso de não ter sido liquidada a correspondente mais-valia; — De alterações nos instrumentos de gestão territorial válidos e eficazes concluídas há menos de cinco anos, nomeadamente pela reclassificação do solo em urbano e o aumento dos índices de construção; — De projecto de loteamento aprovado há menos de dois anos; — De quaisquer outras licenças ou autorizações administrativas válidas que, decorrido um período superior a um ano, não tenham sido iniciadas.

Finalmente, quanto ao regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial constante do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, com as alterações introduzidas pelos Decretos-Leis n.º 53/2000, de 7 de Abril, e n.º 310/2003, de 10 de Dezembro, é aditado um novo artigo n.º 143.º-A, dispondo que as mais-valias resultantes da alteração aos instrumentos de gestão territorial vinculativos, nomeadamente pela reclassificação do solo em urbano e pelo aumento dos índices de construção, são públicas e revertem para o Estado. São igualmente públicas e revertem para o Estado as mais-valias urbanísticas geradas por efeito de obras públicas ou investimentos públicos com impacto relevante.

Conclusões

1 — Por decisão de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, ouvida a Conferência de Representantes dos Grupos Parlamentares, foi agendada para a sessão plenária de 22 de Fevereiro de 2007 a apreciação das iniciativas legislativas e parlamentares apresentadas sobre matérias relacionadas com o combate ao fenómeno da corrupção.
2 — Até ao passado dia 16 de Fevereiro haviam dado entrada na Mesa da Assembleia da República 11 projectos de lei e três projectos de resolução apresentados por Deputados de cinco grupos parlamentares versando as matérias em causa.
3 — Apesar de nem todas as iniciativas apresentadas terem sido objecto de despacho de baixa à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias dado o escasso período de tempo decorrido desde a sua apresentação, todas foram objecto do presente relatório, por forma a viabilizar o agendamento de todas elas em perfeitas condições de igualdade.
4 — As iniciativas legislativas e parlamentares apresentadas versam sobre um vasto e diversificado conjunto de matérias de que o relatório dá conta de uma forma necessariamente sintética.
5 — Dada a extensão e a complexidade das matérias em apreciação, e dada a impossibilidade de efectuar quaisquer audições antes do debate na generalidade, chama-se desde já a atenção para a indispensabilidade de proceder a um amplo conjunto de audições durante a discussão na especialidade que venha a ter lugar, incluindo, nomeadamente, para além do Governo e outras entidades integrantes da Administração Pública, agentes judiciários, entidades ligadas ao sistema financeiro, e representantes dos poderes regionais e locais.

Nestes termos, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de

Parecer

Que os projectos de lei n.º 340/X, do PS, sobre providências de combate à corrupção mediante gestão preventiva dos riscos da sua ocorrência, n.º 341/X, do PS, que aprova alterações ao Código Penal e a legislação penal avulsa sobre prevenção e repressão da corrupção, n.º 345/X, do PSD, sobre combate à corrupção, n.º 354/X, do BE, que altera as disposições da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, relativas à corrupção, n.º 355/X, do BE, que altera os artigos 372.º e 374.º do Código Penal, relativos aos crimes de corrupção, e revoga o artigo 373.º do mesmo Código, n.º 356/X, do BE, que determina regras de prestação de contas dos titulares de cargos políticos ou altos cargos públicos acerca do seu património, n.º 357/X, do BE, que define a cativação pública das mais-valias urbanísticas como medida preventiva de combate ao abuso de poder e à corrupção, n.º 358/X, do BE, que determina a divulgação dos resultados dos instrumentos de combate à corrupção e a sua comunicação ao Parlamento, n.º 360/X, do PCP, que adopta medidas legais de combate à corrupção e à criminalidade económica e financeira, n.º 361/X, do PCP, que institui o Programa Nacional de Prevenção da Criminalidade Económica e Financeira, n.º 362/X, do PS, que altera legislação no sentido do reforço dos instrumentos de combate à corrupção, bem como os projectos de resolução n.º 177/X, do PSD, sobre prevenção da corrupção, n.º 178/X, do PCP, que aprova, para ratificação, a Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção (Resolução n.º 58/4, da Assembleia Geral da ONU, de 31 de Outubro de 2003), e n.º 183/X, do CDS-PP, sobre medidas de combate à corrupção, estão em condições constitucionais e regimentais de subir a Plenário para apreciação na generalidade, reservando os grupos parlamentares as suas posições quanto ao respectivo conteúdo.

Assembleia da República, 21 de Fevereiro de 2007.
O Deputado Relator, António Filipe — Pelo Presidente da Comissão, Osvaldo Castro.

Página 30

30 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

Nota: — As conclusões e o parecer foram aprovados por unanimidade, tendo-se registado a ausência de Os Verdes.

———

PROPOSTA DE LEI N.º 107/X (CRIA UM REGIME DE MEDIAÇÃO PENAL, EM EXECUÇÃO DO ARTIGO 10.º DA DECISÃO-QUADRO N.º 2001/220/JAI, DO CONSELHO, DE 15 DE MARÇO DE 2001, RELATIVA AO ESTATUTO DA VÍTIMA EM PROCESSO PENAL)

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

I — Relatório

1 — Nota preliminar

Nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, o Governo apresentou, em 29 de Novembro de 2006, à Assembleia da República a proposta de lei n.º 107/X, que «Cria um regime de mediação penal, em execução do artigo 10.º da Decisão-Quadro n.º 2001/220/JAI, do Conselho de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal», a qual reúne os requisitos formais previstos no artigo 138.º do mesmo Regimento.
Por despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República, de 6 de Dezembro de 2006, a iniciativa em apreço baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para efeitos de elaboração do respectivo relatório. A natureza da matéria objecto da presente iniciativa justificou a audição das seguintes entidades:

— Ministro da Justiça; — Conselho Superior do Ministério Público; — Conselho Superior da Magistratura; — Bastonário da Ordem dos Advogados; e — Presidente do Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz.

A discussão na generalidade desta iniciativa está agendada para a reunião plenária de 21 de Fevereiro de 2007.

2 — Objecto e motivação da iniciativa

A proposta de lei n.º 107/X visa introduzir no ordenamento jurídico um regime de mediação em processo penal, aplicável em processos por crimes cujo procedimento dependa de queixa ou de acusação particular.
O sistema de mediação penal que se pretende instituir é susceptível de ser aplicado a todos os crimes particulares e a certos crimes semi-públicos (contra as pessoas ou contra o património), desde que puníveis com pena de prisão não superior a cinco anos ou com sanção diferente da prisão. Em conformidade com o texto da proposta de lei, ficarão sempre excluídos do âmbito de aplicação da mediação penal:

— Os crimes sexuais; — Os crimes de peculato, corrupção e tráfico de influências: — Os casos em que o ofendido seja menor de 16 anos ou em que o arguido seja pessoa colectiva; e ainda — Os casos em que seja aplicável forma de processo especial sumária ou sumaríssima.

Esta iniciativa pretende, simultaneamente, dar cumprimento ao artigo 10.º da Decisão-Quadro n.º 2001/220/JAI, do Conselho, de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal, que exige aos Estados-membros que promovam a mediação nos processos penais relativos a infracções que considerem adequadas, devendo os acordos resultantes da mediação poder ser tidos em conta nesses processos.
Esta iniciativa corresponde, de acordo com o Governo, ao cumprimento do respectivo Programa, constituindo um reforço nos meios alternativos de resolução de litígios enquanto forma especialmente vocacionada para uma justiça mais próxima do cidadão, com o propósito de desenvolver novas formas de mediação e conciliação.
No cumprimento desse objectivo a proposta de lei em análise pretende criar um sistema de mediação penal, assente num processo informal e flexível, conduzido por um terceiro imparcial, o mediador, que

Página 31

31 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

promove a aproximação entre o arguido e o ofendido e os apoia na tentativa de encontrar activamente um acordo que permita a reparação — não necessariamente pecuniária — dos danos causados pelo facto ilícito e contribua para a restauração da paz social.
Importa destacar a natureza inicialmente experimental deste programa, a decorrer numa primeira fase num número limitado de circunscrições, tendo em vista o seu progressivo alargamento, já tendo por base os resultados de uma avaliação e monitorização.
Refira-se igualmente que é opção do Governo isentar a mediação de custas e incluir a mediação penal no quadro dos serviços de mediação dos julgados de paz, beneficiando da experiência de mediação já existente nesses tribunais, potenciando, por essa via, uma maior adesão à mediação.
Finalmente, cumpre assinalar que a matéria da mediação penal consta do Acordo Político-Parlamentar para a Reforma da Justiça», subscrito pelo PS e PSD, prevendo-se os seguintes princípios orientadores:

«Mediação penal

1 — A mediação penal será aplicável aos crimes contra bens jurídicos individuais, nomeadamente contra pessoas e contra património, com salvaguarda da recusa da vítima.
2 — Sem prejuízo do número anterior, a mediação penal deve ser aplicável a todos os crimes particulares, bem como aos crimes semi-públicos que o justifiquem em razão da sua natureza.
3 — Ficam excluídos da mediação penal os crimes contra a liberdade ou a autodeterminação sexual, os crimes contra menores de 16 anos, os crimes de corrupção, peculato e tráficos de influência.
4 — A mediação penal será incluída no quadro dos serviços de mediação prestados nos julgados de paz.»

3 — Experiências afins em Portugal

Esta iniciativa de introdução do regime de mediação em matéria penal enquadra-se nas experiências de mediação actualmente existentes em Portugal, nomeadamente, as realizadas no âmbito de:

3.1 — Julgados de Paz: Os Julgados de Paz, regulados pela Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, são tribunais com características especiais, competentes para resolver causas de valor reduzido de natureza cível, excluindo as que envolvam matérias de direito de família, direito das sucessões e direito do trabalho, de forma rápida e custos reduzidos.
Têm competência para apreciar e decidir acções declarativas cíveis, de valor não superior a €3.740,98, tais como:

— Incumprimento de contratos e obrigações; — Responsabilidade civil — contratual e extracontratual; — Direito sobre bens móveis ou imóveis — como, por exemplo, propriedade, condomínio, escoamento natural de águas, comunhão de valas, abertura de janelas, portas e varandas, plantação de árvores e arbustos, paredes e muros divisórias; — Arrendamento urbano, exceptuando o despejo; — Acidentes de viação.

No ano de 2006 entraram 5066 processos nos Julgados de Paz, o que representa um aumento de 43% face ao ano anterior, sendo de cerca de dois meses o tempo médio de duração de um processo nos Julgados de Paz.
Actualmente, após a instalação em 2006 dos Julgados de Paz de Trofa, Sintra, Coimbra e Santa Maria da Feira, existem 16 Julgados de Paz em Portugal, servindo 32 concelhos e uma população de mais de 2,3 milhões de habitantes.
Cerca de 31% dos processos findos nos Julgados de Paz terminaram através de mediação, tendo as partes alcançado um acordo pôs termo ao litígio sem necessidade de uma decisão do juiz de paz, que apenas o homologa.

3.2 — Gabinetes de Mediação Familiar: A mediação familiar é uma modalidade extrajudicial de resolução de conflitos parentais, em que os pais, com a sua participação pessoal e directa, são auxiliados pelo mediador a alcançar um acordo.
O Gabinete de Mediação Familiar é um serviço público gratuito do Ministério da Justiça — Direcção-Geral da Administração Extrajudicial —, criado com vista à resolução extrajudicial de situações de conflito parental relativas à regulação, alteração da regulação e incumprimento do exercício do poder paternal.

3.3 — Sistema de mediação laboral: O sistema de mediação laboral visa permitir que trabalhadores e empregadores utilizem um mecanismo de resolução alternativa de litígios laborais, excepto os relativos a acidentes de trabalho ou direitos indisponíveis.

Página 32

32 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

Este sistema de mediação laboral, que entrou em funcionamento em Dezembro de 2006, foi criado através da assinatura de um protocolo entre o Ministério da Justiça, a Confederação dos Agricultores de Portugal, a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal, a Confederação da Indústria Portuguesa, a Confederação do Turismo Português, CGTP — Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses — Intersindical Nacional e a UGT — União Geral de Trabalhadores.
Trata-se de um sistema que assenta numa lista de mediadores especializados em matéria laboral gerida pelo Ministério da Justiça, através da Direcção-Geral da Administração Extrajudicial.
Estima-se que mais de 30% do total de processos findos relativos a conflitos emergentes de contrato individual de trabalho possam, potencialmente, ser sujeitos a mediação laboral.

3.4 — Centros de informação, mediação, conciliação e arbitragem institucionalizados: A informação, mediação, conciliação e arbitragem institucionalizadas como mecanismos de resolução de conflitos são promovidas por associações privadas sem fins lucrativos, através de centros criados para o efeito. Na sua maioria, estes centros são limitados à resolução de conflitos de consumo, cujo valor não ultrapasse a alçada da primeira instância e com origem em estabelecimentos sitos na respectiva área territorial. Têm, no entanto, vindo a afirmar-se novos centros de arbitragem de âmbito territorial nacional, cuja competência não tem limite derivado do valor e que tratam matérias decorrentes de responsabilidade civil.
Nestes centros são alcançados cerca de 2000 acordos por ano resultantes deste tipo específico de mediação, o que representa mais de 20% do total dos litígios cuja composição é conseguida anualmente por estes centros de arbitragem.

3.5 — Escola de Criminologia da Faculdade de Direito do Porto e Departamento de Investigação e Acção Penal do Porto: A Escola de Criminologia da Faculdade de Direito do Porto iniciou um projecto-piloto de mediação penal em 2005, através de um protocolo com o Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) do Porto, abrangendo apenas crimes puníveis até cinco anos de prisão, com algumas exclusões em razão da natureza do ofendido ou do crime, algumas também previstas na presente proposta de lei.
A experiência tem, tanto quanto foi possível determinar, um âmbito ainda reduzido, mas entende-se que será conveniente ouvir em sede de especialidade os responsáveis pelo projecto, tanto da Escola de Criminologia da Faculdade de Direito do Porto como do Departamento de Investigação e Acção Penal do Porto.

4 — Antecedentes parlamentares

Em matéria de mediação, destaca-se apenas o projecto de lei n.º 83/VIII, do PCP, sobre os «Julgados de paz — organização, competência e funcionamento», que, conjuntamente com o projecto de lei n.º 82/VIII, do PCP, que «Altera a Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro — Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais —, esteve na origem da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho — «Regula a competência, organização e funcionamento dos julgados de paz e a tramitação dos processos da sua competência».

5 — Direito comparado

Existem já sistemas de mediação penal em países europeus, como, por exemplo, na Bélgica e em França.
Em concreto, a mediação penal foi introduzida em França pelo Decreto n.º 96-305, de 10 de Abril de 1996, estabelecendo um sistema no essencial similar ao que consta da proposta de lei do Governo, prevendo-se que o Procurador da República, com o acordo das partes, possa enviar o processo crime para mediação, se entender que desse modo se pode responder adequadamente às exigências de prevenção que no caso se façam sentir, designando um mediador independente e imparcial.
A experiência belga em matéria de mediação penal remonta já a 1987, de início apenas restrita a agressões praticadas por menores. Em 1994 a «Lei de Organização do Processo de Mediação Penal» veio formalizar o quadro legal de fundo belga, alargando a possibilidade de recurso a esta forma alternativa de resolução de conflitos penais relativamente a infracções cometidas por adultos, que não justifiquem a aplicação de uma pena de prisão superior a dois anos, sendo as respectivas condições do acordo objecto de um relatório oficial (um auto).
Em Espanha discute-se actualmente a introdução do instituto da mediação em matéria penal, em cumprimento das obrigações assumidas internacionalmente.

6 — Enquadramento constitucional

Os Julgados de Paz são tribunais extrajudiciais. Constituem um sistema de justiça com séculos de experiência.

Página 33

33 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

As revisões constitucionais de 1989 e de 1997 deram as actuais redacções às normas constitucionais vigentes nesta matéria, respectivamente, ao n.º 4 do artigo 202.º e ao n.º 2 do artigo 209.º da Constituição da República Portuguesa:

«Título V Tribunais

Capítulo I Princípios gerais

Artigo 202.º (Função jurisdicional)

1 — Os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo.
2 — Na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados.
3 — No exercício das suas funções os tribunais têm direito à coadjuvação das outras autoridades.
4 — A lei poderá institucionalizar instrumentos e formas de composição não jurisdicional de conflitos.

(…)

Capítulo II Organização dos tribunais

Artigo 209.º (Categorias de tribunais)

1 — Além do Tribunal Constitucional, existem as seguintes categorias de tribunais:

a) O Supremo Tribunal de Justiça e os tribunais judiciais de primeira e de segunda instância; b) O Supremo Tribunal Administrativo e os demais tribunais administrativos e fiscais; c) O Tribunal de Contas.

2 — Podem existir tribunais marítimos, tribunais arbitrais e julgados de paz.
3 — A lei determina os casos e as formas em que os tribunais previstos nos números anteriores se podem constituir, separada ou conjuntamente, em tribunais de conflitos.
4 — Sem prejuízo do disposto quanto aos tribunais militares, é proibida a existência de tribunais com competência exclusiva para o julgamento de certas categorias de crimes.»

7 — Enquadramento em termos de direito internacional

A presente proposta de lei visa dar cumprimento ao artigo 10.º da Decisão-Quadro n.º 2001/220/JAI, do Conselho, de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal, que exige aos Estadosmembros que, até 22 de Março de 2006, promovam a mediação nos processos penais relativos a infracções que considerem adequadas, devendo os acordos resultantes da mediação poder ser tidos em conta nesses processos:

«Artigo 10.º Mediação penal no âmbito do processo penal

1 — Cada Estado-membro esforça-se por promover a mediação nos processos penais relativos a infracções que considere adequadas para este tipo de medida.
2 — Cada Estado-membro assegura que possam ser tidos em conta quaisquer acordos entre a vítima e o autor da infracção, obtidos através da mediação em processos penais.

Artigo 17.º Execução

Os Estados-membros devem pôr em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente decisão-quadro:

Página 34

34 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

Até 22 de Março de 2006, no que se refere ao artigo 10.º, (…)»

A proposta de lei em análise baseia-se também nos vários princípios gerais contidos na Recomendação 99 (19) sobre a mediação em matéria penal, adoptada em 15 de Setembro de 1999 pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa, estabelecendo, designadamente, a necessidade de uma informação completa dos participantes quanto aos seus direitos e quanto ao processo de mediação e às suas consequências processuais; o livre consentimento na participação na mediação; e a confidencialidade das sessões de mediação.
Já em 14 de Junho de 2006 foi aprovada, pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa, a Recomendação (2006)8 sobre a Assistência a Vítimas de Crimes, que no seu artigo 13.º reafirma os potenciais benefícios para as vítimas e arguidos da mediação em matéria penal, sublinhando-se os princípios da liberdade de consentimento, da confidencialidade e do acesso a aconselhamento independente.

8 — Audições efectuadas

8.1 — Ministro da Justiça: Em audição realizada em 10 de Janeiro de 2007 o Sr. Ministro da Justiça salientou o papel da mediação penal como nova forma social de resolução de conflitos, bem como o movimento à escala mundial de valorização da justiça restaurativa, em complementaridade da justiça punitiva clássica.
Por outro lado, foi destacada a grande receptividade da população em geral relativamente às experiências já em vigor em matéria de mediação, nomeadamente os julgados de paz.
Em concreto, foi sublinhada:

— A restrição da aplicabilidade da medição penal apenas aos crimes particulares e semi-públicos; — A exclusão expressa dos crimes:

Cujo tipo legal preveja pena de prisão superior a cinco anos; Contra a liberdade ou autodeterminação sexual; De peculato, corrupção ou tráfico de influência; Que envolvam ofendidos menores de 16 anos.

— A valorização do papel do Ministério Público a quem incumbe a avaliação e a triagem dos processos a encaminhar para mediação; — A possibilidade de acompanhamento das partes por advogado, com carácter facultativo; — O cumprimento de obrigações de direito internacional e, particularmente, de direito comunitário; — A simplificação e incremento da celeridade processual.

8.2 — Procurador-Geral da República: O Sr. Procurador-Geral da República pronunciou-se positivamente sobre a iniciativa em apreço e a importância de esquemas alternativos de resolução de conflitos visando a paz social.
Acrescentou que a Procuradoria já se havia pronunciado sobre o ante-projecto desta proposta de lei, concluindo que muitas das sugestões efectuadas já haviam sido atendidas e incorporadas no texto apresentado na Assembleia da República, nomeadamente através da valorização do papel do Ministério Público que passa a ter competência para seleccionar os processos a enviar para mediação.
O Sr. Procurador-Geral alertou ainda para a necessidade de sensibilização da população para estes mecanismos e de afectação de meios administrativos adequados, sendo certo que se verifica alguma falta de experiência e de profissionais na área da mediação.
No que respeita ao articulado, destacou os seguintes aspectos:

— O risco de adiamentos injustificados, invocando-se «uma forte probabilidade de se alcançar um acordo»; — A necessidade de clarificação da tramitação processual nos casos em que o Ministério Público considere que o acordo contém alguma ilegalidade.

8.3 — Conselho Superior de Magistratura: O Sr. Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura iniciou a sua intervenção com um «forte aplauso» à proposta de lei n.º 107/X, na medida em que a mesma corresponde ao cumprimento de obrigações comunitárias e, em segundo lugar, porque introduz no nosso ordenamento jurídico um novo tipo de justiça restaurativa.
Por outro lado, foi destacado o contributo que a mediação penal pode dar para o desejado processo de descongestionamento dos tribunais, em particular relativamente à pequena e média criminalidade, permitindose a libertação de meios para a criminalidade mais grave.

Página 35

35 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

O Sr. Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura enfatizou positivamente a incorporação da generalidade das propostas apresentadas pelo CSM relativamente ao ante-projecto de diploma, discordando, contudo, nos seguintes pontos:

— Artigo 2.º, n.º 3, alínea c) — Trata-se de uma norma dispensável, na medida em que a exclusão expressa dos crimes de peculato, corrupção e tráfico de influências já decorre da regra geral do n.º 1 que restringe o recurso à mediação penal relativamente aos crimes de natureza particular ou semi-pública; — Relativamente ao artigo 5.º sugeriu que «a homologação apenas tivesse lugar no caso de não haver mais nenhuma obrigação a cumprir»; — Sugeriu uma redacção alternativa para o n.º 2 do artigo 6.º, recorrendo-se à fórmula do Código Civil sobre «direitos indisponíveis e negócios jurídicos ilícitos».

Quanto à possibilidade de intervenção de advogados, não foram suscitadas reservas atendendo ao carácter facultativo da mesma, tendo ainda sido sugerida a inclusão de uma norma sobre a possibilidade de nomeação de intérpretes, à semelhança do que sucede no Código do Processo Penal, bem como a consagração expressa da regra de que a homologação do acordo que envolva diversos arguidos só pode verificar-se com o acordo expresso de todos.

8.4 — Bastonário da Ordem dos Advogados Em audição de 23 de Janeiro de 2007 o Sr. Bastonário da Ordem dos Advogados considerou genericamente positiva a iniciativa do Governo em matéria de mediação penal, entendendo que pode ser vantajosa a presença e o aconselhamento por parte de advogado, com carácter facultativo. A imposição dessa presença poderia ser excessiva, podendo trazer atrasos e entorses a um processo que se pretende célere e cuja lógica é de uma justiça horizontal.

8.5 — Presidente do Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz: Em audição realizada em 23 de Janeiro passado o Sr. Presidente do Conselho de Acompanhamento dos Julgados de Paz regozijou-se com a intenção de transposição de uma decisão-quadro da União Europeia de natureza vinculativa, considerando que a proposta em análise corresponde à tradução e incorporação deste instrumento comunitário.
Por outro lado, foi ainda referido terem sido incorporadas as principais sugestões apresentadas pelo Conselho de Acompanhamento no seu anterior parecer.
Em particular, foram efectuadas seguintes sugestões:

— Alargamento da iniciativa de recurso à mediação penal aos arguidos e ofendidos; — Possibilidade de dispensa da sequência da lista de mediadores; — Possibilidade de audição de arguido e ofendido previamente à decisão do Ministério Público; — Possibilidade de aplicação do novo regime também aos processos pendentes.

II — Conclusões

1 — O Governo apresentou, em 29 de Novembro de 2006, à Assembleia da República a proposta de lei n.º 107/X, que «Cria um regime de mediação penal, em execução do artigo 10.º da Decisão-Quadro n.º 2001/220/JAI, do Conselho de 15 de Março de 2001, relativa ao estatuto da vítima em processo penal», a qual reúne os requisitos formais previstos no artigo 138.º do mesmo Regimento.
2 — A proposta de lei n.º 107/X visa introduzir no ordenamento jurídico um regime de mediação em processo penal, aplicável aos crimes particulares e a certos crimes semi-públicos (contra as pessoas ou contra o património), desde que puníveis com pena de prisão não superior a cinco anos ou com sanção diferente da prisão.

Face ao exposto a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é do seguinte:

III — Parecer

A proposta de lei n.º 107/X reúne os requisitos constitucionais e regimentais para subir a Plenário, reservando os grupos parlamentares as suas posições de voto para o debate.

Palácio de São Bento, 21 de Fevereiro de 2007.
O Deputado Relator, Marcos Perestrello — O Vice-Presidente da Comissão, António Montalvão Machado.

Nota: As conclusões e o parecer foram aprovados por unanimidade, tendo-se registado a ausência de Os Verdes.

———

Página 36

36 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

PROPOSTA DE LEI N.º 113/X (APROVA O PROGRAMA NACIONAL DA POLÍTICA DE ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO

Parecer da Comissão de Assuntos Parlamentares, Ambiente e Trabalho da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores

Capítulo I Introdução

A Comissão de Assuntos Parlamentares, Ambiente e Trabalho reuniu no dia 5 de Fevereiro de 2007, na delegação de São Miguel da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, em Ponta Delgada.
Da agenda da reunião constava a apreciação, relato e emissão de parecer, na sequência do solicitado por S. Ex.ª o Presidente da Assembleia, Legislativa, sobre a proposta de lei n.º 113/X — Aprova o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território.
A proposta de lei deu entrada na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores em 24 de Janeiro de 2007, tendo sido enviada à Comissão de Assuntos Parlamentares, Ambiente e Trabalho, para relato e emissão de parecer, até 13 de Fevereiro de 2007.

Capítulo II Enquadramento jurídico

A pronúncia dos órgãos de governo próprio da Região Autónoma dos Açores relativamente às questões de competência dos órgãos de soberania que digam respeito à Região exerce-se por força do disposto no n.º 2 do artigo 229.º da Constituição da República Portuguesa e na alínea i) do artigo 30.º do Estatuto PolíticoAdministrativo.
Tratando-se de actos legislativos, compete à Assembleia Legislativa a emissão do respectivo parecer, conforme determina a alínea a) do n.º 1 do artigo 79.º do Estatuto Político-Administrativo, o qual deverá ser emitido no prazo de 20 (vinte) dias nos termos do artigo 80.º do Estatuto Político Administrativo.
A emissão do parecer da Assembleia Legislativa cabe à comissão especializada permanente competente em razão da matéria, nos termos da alínea e) do artigo 42.º do Regimento.

Capítulo III Apreciação da iniciativa

a) Na generalidade: A mencionada iniciativa, ora submetida a parecer da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, no âmbito da audição dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas, tem por objecto a aprovação do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, projectando o futuro do território e incluindo um programa de acções com vista ao seu ordenamento e desenvolvimento.
O Programa do XVII Governo Constitucional definiu como prioridade a aprovação do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, como instrumento de política que visa imprimir maior coerência aos instrumentos de gestão territorial e a Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e Urbanismo (Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto) é considerada o pilar dos Instrumentas de gestão territorial.
O Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial foi aprovado, em desenvolvimento da Lei de Bases, pelo Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, aplicando-se à Região Autónoma dos Açores, com as adaptações constantes do Decreto Legislativo Regional n.º 14/2000/A, de 23 de Maio, e respectivas alterações.
A proposta de Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território a aprovar pela iniciativa em aprovação é demasiada genérica na caracterização e no diagnóstico para a Região Autónoma dos Açores, bem como na definição das opções estratégicas a considerar na organização do território do arquipélago.
Além do mais, as particularidades decorrentes das características geográficas, económicas e sociais das Açores aconselham a adopção de respostas específicas, encontradas através da acção dos órgãos de governo próprio, na aplicação de uma efectiva política regional de ordenamento do território, plasmada num Programa Regional da Política de Ordenamento do Território — cuja possibilidade de existência deverá ficar expressamente prevista na versão final da proposta de lei —, adaptado às problemáticas e especificidades regionais e concertado com os demais instrumentos de planeamento político e financeiro, anuais e plurianuais.
A, discussão da proposta de lei em Plenário da Assembleia da República está agendada para o próximo dia 16 de Fevereiro.

b) Na especialidade: Na apreciação na especialidade, a Comissão, deliberou, por unanimidade, apresentar as seguintes propostas de alteração:

Página 37

37 | II Série A - Número: 047 | 23 de Fevereiro de 2007

«Artigo 2.º (…)

1 — O PNPOT aplica-se a todo o território nacional, abrangendo o território historicamente definido no Continente Europeu e os Arquipélagos dos Açores e Madeira, bem como as águas territoriais definidas por lei, sem prejuízo das competências das regiões autónomas.
2 — O PNOPT constitui o quadro normativo de referência dos instrumentos de gestão territorial da responsabilidade das Regiões Autónomas dos Açores e Madeira, sem prejuízo da aprovação, por decreto legislativo regional, dos respectivos programas regionais da política de ordenamento do território.

Artigo 5.º (…)

1 — (…) 2 — (...) 3 — (...) 4 — (…) 5 — As propostas de concretização da estratégica de desenvolvimento e coesão territorial para as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira devem ser coerentes com os respectivos programas operacionais de desenvolvimento (QRESA e PDES).»

Capítulo IV Síntese da posição dos Deputados

Os Grupos Parlamentares do PS e do PSD e o Deputado Independente, na generalidade, não manifestaram oposição ao regime estabelecido na proposta de lei em apreciação, considerando, contudo, que a presente proposta do Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território é demasiado genérica na caracterização e no diagnóstico da Região Autónoma dos Açores, bem como na definição das opções estratégicas a considerar na organização do território do arquipélago.
Entendem ainda os Deputados que as particularidades decorrentes das características geográficas, económicas e sociais dos Açores aconselham a adopção de respostas específicas, encontradas através da acção dos órgãos de governo próprio, na aplicação de uma efectiva política regional de ordenamento do território, plasmada num Programa Regional da Política de Ordenamento do Território, adaptado às problemáticas especificidades regionais e concertado com os demais instrumentos de planeamento político e financeiro, anuais e plurianuais.

Capítulo V Conclusões e parecer

Com base na apreciação efectuada, na generalidade e na especialidade, a Comissão de Assuntos Parlamentares, Ambiente e Trabalho concluiu pela importância da iniciativa legislativa, não se opondo, por unanimidade, à respectiva aprovação, sem prejuízo da Região Autónoma dos Açores, no uso das suas competências próprias, poder vir a desenvolver a Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e Urbanismo (Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto) ou legislar quanto aos instrumentos de gestão territorial, como sucedeu com o Decreto Legislativo Regional n.º 14/2000/A, de 23 de Maio, e respectivas alterações, adaptando à Região o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (Decreto-lei n.º 380/99, de 22 de Setembro).
A Comissão conclui ainda, por unanimidade, propor alteração do articulado da proposta de lei, prevendo expressamente a possibilidade de existência nas regiões autónomas de Programas Regionais da Política de Ordenamento do Território, adaptados às problemáticas e especificidades insulares, nos termos propostos na apreciação na especialidade.

Ponta Delgada, 5 de Fevereiro de 2007.
O Deputado Relator, Rogério Veiros — O Presidente da Comissão, Hernâni Jorge.

Nota: — O parecer foi aprovado por unanimidade.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×