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Sexta-feira, 29 de Junho de 2007 II Série-A — Número 102
X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)
SUMÁRIO Propostas de lei (n.os 119, 128 e 148/X): N.º 119/X (Aprova normas para a protecção dos cidadãos da exposição involuntária ao fumo do tabaco e medidas de redução da procura relacionadas com a dependência e a cessação do seu consumo): — Relatório da discussão e votação na especialidade, texto final da Comissão de Saúde, e anexo incluindo propostas de alteração apresentadas pelo PS, PSD, PCP, CDS-PP e BE.
(a) N.º 128/X (Autoriza o Governo a legislar em matéria de prevenção e investigação de acidentes e incidentes ferroviários, na medida em que as competências a atribuir aos responsáveis pela respectiva investigação técnica sejam susceptíveis de interferir com o exercício de direitos, liberdades e garantias individuais): — Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações.
N.º 148/X (Aprova o regime jurídico das instituições de ensino superior): — Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Educação, Ciência e Cultura.
Projectos de resolução (n.os 218 e 219/X): N.º 218/X — Recomenda a adopção de medidas de apoio ao comércio local face aos impactos da obra do Metro Sul do Tejo (apresentado pelo PCP).
N.º 219/X — Sobre a instituição de exames nacionais no ensino básico (apresentado pelo CDS-PP).
(a) É publicado em Suplemento a este Diário.
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PROPOSTA DE LEI N.º 128/X (AUTORIZA O GOVERNO A LEGISLAR EM MATÉRIA DE PREVENÇÃO E INVESTIGAÇÃO DE ACIDENTES E INCIDENTES FERROVIÁRIOS, NA MEDIDA EM QUE AS COMPETÊNCIAS A ATRIBUIR AOS RESPONSÁVEIS PELA RESPECTIVA INVESTIGAÇÃO TÉCNICA SEJAM SUSCEPTÍVEIS DE INTERFERIR COM O EXERCÍCIO DE DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS INDIVIDUAIS)
Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações
I — Relatório
1. Nota prévia
Em 13 de Abril de 2007, deu entrada no Gabinete do Presidente da Assembleia da República a proposta de lei n.º 128/X, que visa autorizar o Governo a legislar em matéria de prevenção e investigação de acidentes ferroviários, na medida em que as competências a atribuir aos responsáveis pela respectiva investigação técnica sejam susceptíveis de interferir com o exercício de direitos, liberdades e garantias individuais.
Por despacho do Presidente da Assembleia da República, de 18 de Abril de 2007, a proposta de lei n.º 128/X baixou à Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações para produção do respectivo relatório.
A mencionada iniciativa legislativa foi apresentada do abrigo da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República (RAR).
A proposta de lei reúne os requisitos formais previstos nos n.os 2 e 3 do artigo 165.º, bem como o previsto no artigo 138.º e nos n.os 1 e 2 do artigo 197.º do Regimento da Assembleia da República.
Cumpre à Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, nos termos e para efeitos dos artigos 35.º e 143.º do Regimento da Assembleia da República, emitir o competente relatório e parecer.
2. Do objecto e motivação
A proposta de lei objecto do presente relatório é justificada pelo desenvolvimento legal do sector ferroviário, a nível comunitário, tornando-se dado assente que os acidentes ferroviários, numa perspectiva de segurança, deverão ser objecto de inquérito para averiguação das suas causas e assim prevenir a sua repetição, devendo ser tornados públicos os seus resultados. Sempre que necessário, outros acidentes e incidentes, percursores de acidentes graves devem ser igualmente objecto de inquérito sobre segurança.
Sobre o inquérito relativo à segurança, é dito que o mesmo deve correr em separado do judiciário sobre o mesmo acidente e ou incidente, bem como o acesso a provas e testemunhas. Aliás, o inquérito de segurança deve ser efectuado por organismo independente de outros intervenientes do sector ferroviário de modo a evitar quaisquer conflitos de interesse e qualquer possível envolvimento nas causas das ocorrências investigadas, devendo as suas investigações se efectuadas com a maior transparência possível.
Este diploma legal vem transpor para o ordenamento jurídico nacional a Directiva 2004/49/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004, relativa à segurança dos caminhos-de-ferro da comunidade, a qual inclui também disposições relativas às matérias de investigação e de acidentes e incidentes ferroviários, exigindo que sejam reguladas, designadamente, as competências e metodologias a aplicar pelo organismo responsável pela investigação de acidentes e incidente ferroviários: o Gabinete de Investigação de Segurança e Acidentes Ferroviários (GISAF).
Dado que as competências a atribuir ao GISAF poderiam ser susceptíveis de interferir com direitos, liberdades e garantias individuais, o Governo entendeu obter da Assembleia da República a competente autorização legislativa.
Esta autorização legislativa requerida pelo Governo é composta por quatro artigos, que definem o objecto (artigo 1.º), sentido (artigo 2.º) extensão (artigo 3.º) e prazo (artigo 4.º):
Artigo 1.º Objecto
É concedida ao Governo autorização para legislar em matéria de prevenção e investigação de acidentes e incidentes ferroviários, na medida em que as competências a atribuir aos responsáveis pela respectiva investigação técnica do Gabinete de Investigação de Segurança e de Acidentes Ferroviários (GISAF) sejam susceptíveis de interferir com o exercício de direitos, liberdades e garantias individuais.
Artigo 2.º Sentido
A presente autorização legislativa visa, no quadro da transposição da Directiva 2004/49/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004, relativa à segurança dos caminhos-de-ferro da comunidade,
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conferir aos responsáveis pelas investigações técnicas referidos no artigo anterior, poderes que permitam que tais investigações, sem prejuízo de eventual investigação criminal, decorram com a celeridade e eficácia de resultados necessários à detecção de causas de acidentes ou incidentes ferroviários e sua prevenção futura, tendo em vista a prevenção da sinistralidade ferroviária.
Artigo 3.º Extensão
O decreto-lei a aprovar ao abrigo da presente autorização legislativa definirá as seguintes competências dos investigadores responsáveis pela investigação técnica do GISAF:
a) Efectuar o levantamento imediato dos indícios e a recolha controlada de destroços ou componentes para fins de exame ou análise, salvo decisão de autoridade judiciária em contrário; b) Investigar todas as circunstâncias em que ocorreu o acidente ou incidente, incluindo aquelas que podem não estar directamente a ele ligadas, mas que se entenda serem de particular importância para a segurança do percurso; c) Solicitar à autoridade judiciária competente os relatórios das autópsias dos membros da tripulação que tenham falecido no acidente ou venham a falecer posteriormente como consequência deste, bem como os exames e os resultados das colheitas de amostras, efectuadas nas pessoas envolvidas na operação do material circulante e nos corpos das vítimas; d) Ordenar a realização de testes de alcoolemia ou despistagem de estupefacientes nas pessoas envolvidas no acidente, sendo a recusa considerada crime de desobediência qualificada nos termos da lei penal; e) Solicitar às autoridades judiciárias ou policiais a identificação das testemunhas já ouvidas por aqueles; f) Transmitir às autoridades judiciárias os elementos que lhe forem solicitados; g) Solicitar às autoridades judiciárias ou policiais, sem prejuízo da investigação judiciária, a conservação, custódia e vigilância do local e destroços, e a autorização para efectuar o mais rapidamente possível os exames e estudos necessários relativamente às pessoas e vestígios materiais de qualquer espécie, relacionados com o acidente; h) Ouvir depoimentos de pessoas envolvidas e de testemunhas de acidentes ou incidentes, podendo notificá-las por escrito para comparecerem, sob pena de desobediência, em caso de não comparência injustificada; i) Aceder, no exercício das suas competências, com a maior brevidade possível:
— Ao local do acidente ou incidente, bem como ao material circulante envolvido, à infra-estrutura em causa e às instalações de controlo do tráfego e da sinalização; — A uma listagem de provas, procedendo à remoção controlada de destroços das instalações ou componentes da infra-estrutura para efeitos de exame ou análise; — Ao conteúdo dos aparelhos de registo e dos equipamentos de bordo para registo das mensagens verbais e do funcionamento do sistema de sinalização e de controlo de tráfego, prevendo-se a possibilidade da utilização desses conteúdos; — Aos resultados do exame dos corpos das vítimas; — Aos resultados dos exames efectuados ao pessoal de bordo e outro pessoal ferroviário envolvido no acidente ou incidente.
Artigo 4.º Prazo
A autorização legislativa concedida pela presente lei tem a duração de 120 dias.
Conjuntamente com a proposta de lei vertente, o Governo remeteu à Assembleia da República o projecto de diploma que, embora não seja objecto de discussão em sede parlamentar, evidencia as soluções normativas que o Governo pretende aprovar no quadro do desenvolvimento da autorização legislativa. O Governo entendeu também enviar à Assembleia da República o anexo relativo ao conteúdo principal do relatório de inquérito sobre acidentes e incidentes, a que se refere o n.º 1 do artigo 11.º do projecto de decretolei.
3. Do quadro constitucional e legal 3.1. Da autorização legislativa
O artigo 165.º da Constituição (Reserva relativa de competência legislativa) define as matérias que são da exclusiva competência da Assembleia da República, «salvo autorização ao Governo». Entre as matérias que constam deste artigo está, precisamente na alínea b), os «Direitos, liberdades e garantias».
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Conforme é referido na exposição de motivos, «tendo em conta que as competências a atribuir aos responsáveis pela investigação técnica do GISAF poderiam ser susceptíveis de interferir com direitos, liberdades e garantias individuais, e dado o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição da República Portuguesa, entendeu o Governo ser necessário obter da Assembleia da República autorização para legislar nessas matérias».
As autorizações legislativas devem observar o disposto no n.os 2, 3, 4 e 5 do referido artigo 165.º da CRP.
No n.º 2 do mesmo artigo prescreve-se que «as leis de autorização legislativa devem definir o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização, a qual pode ser prorrogada». Como já atrás se fez referência, a proposta de lei em causa define de forma clara o objecto (artigo 1.º), o sentido (artigo 2.º) e a extensão (artigo 3.º) e o prazo (artigo 4.º), respeitando desta forma as exigências que a Constituição impõe em termos de autorizações legislativas.
3.2. Enquadramento legal
A Directiva 2004/649/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 20004, integrada no designado «Pacote Ferroviário II», vem definir o quadro de acção comunitária em matéria relativa à segurança dos caminhos-de-ferro da comunidade, conferindo poderes e competências próprias aos responsáveis pelas investigações técnicas de modo a que estas decorram com a celeridade e eficácia de resultados necessários à detecção de causas de acidentes ou incidentes ferroviários e sua prevenção futura, tendo em vista a prevenção da sinistralidade ferroviária, sem prejuízo de eventual investigação criminal. A Directiva que ora se transpõe vem alterar a Directiva 95/18/CE do Conselho, vulgarmente conhecida por Directiva relativa à segurança ferroviária.
II — Conclusões
1. A proposta de lei n.º 128/X, que autoriza Governo a legislar em matéria de prevenção e investigação de acidentes ferroviários, na medida em que as competências a atribuir aos responsáveis pela respectiva investigação técnica sejam susceptíveis de interferir com o exercício de direitos, liberdades e garantias individuais, foi apresentada do abrigo da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República (RAR).
2. Tratando-se de uma matéria enquadrável na alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP (Reserva relativa de competência legislativa), o Governo solicitou a necessária autorização legislativa à Assembleia da República.
3. Pela proposta de lei n.º 128/X, o Governo requer autorização para legislar em matéria de prevenção e investigação de acidentes ferroviários, na medida em que as competências a atribuir aos responsáveis pela respectiva investigação técnica sejam susceptíveis de interferir com o exercício de direitos, liberdades e garantias individuais.
4. A proposta de lei n.º 128/X encontra-se estruturada em quatro artigos, que correspondem, designadamente, ao objecto (artigo 1.º), sentido (artigo 2.º) e extensão (artigo 3.º) e prazo (artigo 4.º), respeitando as exigências que a CRP impõe em termos de autorizações legislativas (artigos 165.º, n.º 2).
III — Parecer
1. A proposta de lei n.º 128/X, do Governo, reúne os requisitos constitucionais, legais e regimentais para poder ser discutida e votada pelo Plenário da Assembleia da República.
2. Os grupos parlamentares reservam as suas posições de voto para o Plenário da Assembleia da República.
3. Nos termos regimentais aplicáveis, o presente relatório é remetido ao Sr. Presidente da Assembleia da República.
Assembleia da República, 30 de Maio de 2007.
O Deputado Relator, Jorge Fão — O Presidente da Comissão, Miguel Relvas.
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PROPOSTA DE LEI N.º 148/X (APROVA O REGIME JURÍDICO DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR)
Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Educação, Ciência e Cultura
I — Introdução
O Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República a proposta de lei n.º 148/X — «Aprova o regime jurídico das instituições de ensino superior» — nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos formais previstos no artigo 138.º do mesmo Regimento.
Por despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República, de 18 de Junho de 2007, a referida proposta de lei foi admitida, tendo baixado à Comissão de Educação, Ciência e Cultura.
Cumpre a esta Comissão pronunciar-se sobre esta iniciativa legislativa, emitindo o competente relatório e parecer, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 35.º e 143.º do Regimento da Assembleia da República.
II — Da motivação da iniciativa
O Governo entendeu apresentar a proposta de lei n.º 148/X tendo em vista estabelecer o regime jurídico das instituições de ensino superior, regulando a sua constituição, as atribuições, a organização, o funcionamento e competência dos seus órgãos, bem como a tutela e a fiscalização pública do Estado sobre essas instituições.
Considera o Governo que o regime jurídico, ora proposto, corresponde ao objectivo de reforma do ensino superior português, plasmado no seu Programa de Governo, e «constitui uma oportunidade sem precedentes para as próprias instituições de ensino superior e para as suas comunidades mais dinâmicas».
Neste sentido e em cumprimento deste objectivo, o Governo recorda, na exposição de motivos, os relatórios produzidos em 2006, a seu pedido, pela OCDE, sobre a análise de todo o sistema de ensino superior português, bem como pela ENQA — European Association for Quality Assurance in Higher Education, sobre a avaliação do sistema de garantia da qualidade do ensino superior praticado em Portugal. Deste último relatório resultaram recomendações e orientações ao Governo que serviram de «directrizes» (!?) à criação de um novo sistema de avaliação.
É igualmente feita referência à avaliação institucional externa, a que se submeteram voluntariamente algumas instituições, levada a cabo pela Associação Europeia de Universidades (EUA).
Neste contexto, e no âmbito da concretização do Processo de Bolonha, o Governo elenca as acções e as medidas que tem vindo a desencadear, referenciando os correspondentes diplomas que foram sendo aprovados, designadamente a revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo na parte respeitante ao ensino superior, o diploma relativo aos graus e diplomas do ensino superior, a reforma do regime de cursos de especialização tecnológica (CET), o regime de acesso ao ensino superior a maiores de 23 anos, a racionalização da oferta de cursos superiores de primeiro ciclo, no ensino público, com menos de 20 alunos e a legislação sobre o reconhecimento de graus e diplomas relativa à mobilidade nacional e internacional de estudantes e diplomados.
O Governo dá nota da proposta de lei sobre a Avaliação das Instituições de Ensino Superior, que apresentou, recentemente, na Assembleia da República, e da consequente criação da Agência Nacional de Garantia da Qualidade do Ensino Superior. Uma iniciativa que, registe-se, ainda não se encontra aprovada.
Ainda neste âmbito, refere o lançamento, em 2006, da iniciativa «Compromisso com a Ciência», enquanto «impacto manifesto na qualificação e abertura do ensino superior e no reforço do papel das instituições de investigação», assinalando, como decorrente desta medida, a título de exemplo, a concretização das parcerias internacionais com o MIT, CMU, UT Austin, Fraunhofer.
Nos termos da presente proposta de lei, este novo regime jurídico aplica-se a todos os estabelecimentos de ensino superior e ao sistema de ensino superior no seu conjunto, reunindo numa mesma lei, os regimes aplicáveis às instituições públicas e privadas, universitárias e politécnicas, revogando-se a Lei da Autonomia das Universidades, a Lei do Estatuto dos Estabelecimentos de Ensino Superior Politécnico, o Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo, e o Regime Jurídico do Desenvolvimento e Qualidade do Ensino Superior, para além de diversa legislação avulsa.
Não deixa, contudo, de parecer ambiciosa a denominação encontrada para esta lei, na medida em que algumas matérias fundamentais — como o financiamento ou o estatuto da carreira docente — integrarão certamente o regime jurídico do ensino superior, mas não se encontram contempladas nesta proposta de diploma.
O novo diploma irá regular os princípios de organização do sistema de ensino superior; a autonomia das universidades e institutos politécnicos; os princípios de organização e gestão das instituições de ensino superior; o regime legal das instituições públicas e privadas de ensino superior; o ordenamento da rede
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pública; os requisitos para a criação e transformação de estabelecimentos de ensino superior; a responsabilidade e fiscalização das instituições.
III — Do processo
Importa, em jeito de ressalva, fazer um breve enquadramento do contexto processual legislativo em que se elabora o presente relatório.
O Programa de Governo, aprovado em Março de 2005, afirmava peremptoriamente que «O Governo concederá também toda a prioridade à reforma do sistema de governo das instituições de ensino superior (…)»
1 Passado mais de um ano, a 16 de Junho de 2006, o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior anunciou no Plenário da Assembleia da República que iria lançar novas medidas «que serão preparadas e executadas nos próximos seis meses», afirmando concretamente que «procederemos à análise e promoveremos o debate público sobre a reforma dos modelos jurídico e organizativo das instituições do ensino superior e apresentaremos uma proposta coerente e informada sobre esta matéria»
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Decorridos vários meses, em Dezembro de 2006, o Sr. Primeiro-Ministro dedicou o debate mensal a este tema, tendo afirmado que «o meu desejo, Srs. Deputados, é o de apresentar à Assembleia da República, neste debate mensal, as principais linhas de orientação para a reforma do ensino superior em Portugal. Como é sabido, o Governo não perdeu tempo nesta área»
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Entretanto, a 23 de Fevereiro, o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino voltou a deslocar-se ao Parlamento para apresentar «as orientações do Governo para a reforma do sistema de ensino superior em Portugal»
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Finalmente, a 9 de Maio de 2007, o Governo «aprovou na generalidade», num Conselho de Ministros extraordinário realizado em Évora, uma proposta de regime jurídico para as instituições de ensino superior.
Pode, assim, deduzir-se que o Governo preparou internamente esta proposta, durante cerca de 26 meses.
Não nos parece, como tal, razoável que a intervenção requerida a um outro órgão de soberania, o Parlamento — cuja participação é imprescindível em todo o processo, nos termos constitucionais — se esgote em meia dúzia de dias.
O facto de esta iniciativa não revestir a forma de decreto-lei, mas ser uma proposta de lei, decorre da CRP e significa, precisamente, que a mesma deve ser alvo de uma análise, discussão, reflexão e, por último, decisão da Assembleia da República e não somente do Governo.
Acresce a tudo isto que, entre a «proposta de lei aprovada na generalidade» a 9 e Maio e a proposta de lei submetida ao Parlamento no dia 18 de Junho, foram sendo conhecidas sucessivas versões da proposta, à medida que a discussão pública tinha lugar.
Ou seja, estas alterações tornaram, em muitas circunstâncias, extemporâneas as reflexões, apreciações e considerações levadas a efeito pelos diferentes parceiros.
Assume, neste cenário, particular relevância a ausência, até ao momento da elaboração do presente relatório, de parecer do próprio Conselho Nacional de Educação.
Resumindo, tendo esta iniciativa sido distribuída na reunião da Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura do passado dia 20 de Junho, coube ao relator uma singela semana (cerca de quatro dias úteis) para a elaboração do presente relatório.
Resulta desta circunstância, a ausência de uma abordagem mais aprofundada sobre esta tão estruturante temática, designadamente com uma análise comparada com outros países (desde logo, com os países subscritores do Processo de Bolonha) e com uma referência aos diferentes pareceres e opiniões emitidos pelos diversos agentes que intervêm directamente no nosso ensino superior (CNE, CRUP, CCISP, estudantes, sindicatos, especialistas, etc.) e que são, até à data, desconhecidos da Comissão.
IV — Do objecto da iniciativa
A proposta de lei n.º 148/X, face à legislação actual aplicável, apresenta profundas alterações e inovações de que se destacam:
— A especialização do sistema binário, clarificando a diferente natureza e objectivos de universidades e politécnicos.
— A introdução de diversidade de estatuto legal das instituições públicas, com a criação de fundações públicas de direito privado, em que o Governo firma um acordo com a instituição, sendo que a tutela poderá decidir, por sua iniciativa, a criação de uma fundação quando se trate de nova instituição. 1 Diário da Assembleia da República, X Legislatura, 1.ª sessão legislativa, II Série-A, n.º 2, de 18 de Março de 2005.
2 Diário da Assembleia da República, X Legislatura, 1.ª sessão legislativa, I Série, n.º 136, de 16 de Junho de 2006.
3 Diário da Assembleia da República, X Legislatura, 2.ª sessão legislativa, I Série, n.º 31, de 21 de Dezembro de 2006.
4 Diário da Assembleia da República, X Legislatura, 2.ª sessão legislativa, I Série, n.º 53, de 23 de Fevereiro de 2007.
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Prevê, assim, que as universidades e institutos universitários públicos possam requerer ao Governo a sua transformação em fundações públicas com regime de direito privado, mediante proposta fundamentada do reitor, aprovada pelo conselho geral, por maioria absoluta dos seus membros. Mais se estabelece que a mudança institucional pode ainda ter por objecto: uma escola ou uma unidade orgânica de investigação de uma universidade, com a consequente separação e autonomização institucional; ou a criação de uma nova instituição que resulte da recomposição de unidades orgânicas de diversas instituições universitárias públicas e de instituições de investigação e desenvolvimento públicas ou privadas. Neste último caso, a criação da nova instituição pode resultar da iniciativa do Governo, ouvidos os órgãos das instituições envolvidas, ou da iniciativa destas.
Caso o Governo concorde com a transformação institucional será assinado um acordo entre o executivo e a entidade que será objecto de transformação.
A nova situação proposta surge com contornos pouco claros. Desde logo, por não se conhecer o enquadramento legal das propostas «fundações públicas de direito privado». Assim, como a inusitada intervenção governamental parece configurar um claro retrocesso na autonomia universitária consagrada constitucionalmente.
De igual modo, impõe-se uma advertência para a instabilidade que esta nova situação criará. Na verdade, pairará permanentemente a ameaça de que, por acção externa (Governo) ou por vontade de uma maioria meramente conjuntural, uma instituição possa ser desmembrada, quebrando realidades que, nalguns casos, foram sedimentadas secularmente.
As fundações são administradas por um conselho de curadores constituído por «cinco personalidades de elevado mérito», nomeados pelo Governo (em mais um aparente retrocesso na autonomia), sob proposta da instituição.
O exercício das funções de curador não é compatível com um vínculo laboral simultâneo com a instituição.
Os curadores têm um mandato de cinco anos, renovável uma única vez, não podendo ser destituídos pelo Governo sem motivo justificado.
As instituições de ensino superior públicas de natureza fundacional podem seleccionar os seus estudantes através de critérios e procedimentos próprios.
O financiamento do Estado às fundações é definido por meio de contratos plurianuais, de duração não inferior a três anos.
No âmbito do património da fundação estabelece-se que o Estado pode contribuir para o património da fundação com recursos suplementares, patrimoniais ou outros. Parece, assim, criar-se uma clara discriminação, ao não se referir expressamente esta mesma prerrogativa para as universidades e institutos politécnicos que não assumam o cariz de fundação.
As universidades podem propor a passagem a fundações públicas de direito privado, três meses depois da entrada em vigor da nova lei.
Os directores ou presidentes das unidades orgânicas podem promover a constituição de uma assembleia ad hoc para decidir, por maioria absoluta, no prazo de três meses depois da entrada em vigor da nova lei, sobre a transformação das unidades orgânicas em fundações.
Reforça-se aqui a possibilidade, já anteriormente abordada, de uma maioria conjuntural poder, num cenário ainda desconhecido, fragmentar uma determinada instituição cuja coesão, história e cultura foram sedimentadas durante décadas.
As fundações dispõem de autonomia nos mesmos termos das demais instituições de ensino superior públicas, têm estatutos próprios, aprovados pelo conselho de curadores da fundação, sujeitos a homologação governamental.
— A definição de requisitos comuns de exigência para a criação e continuidade de instituições de ensino superior, idênticos para instituições públicas ou privadas, impondo-se, designadamente, níveis de pessoal doutorado a tempo inteiro, sendo que a nível do corpo docente e no âmbito do ensino politécnico é concedido o título de especialista, que comprova a qualidade profissional numa determinada área, e cujas condições de atribuição serão fixadas por decreto-lei. Subsistem, assim, dúvidas sobre este conceito de «especialista» que deveria merecer uma mais aplicada definição.
No capítulo do corpo docente do ensino universitário, os quadros de todas as instituições terão de apresentar o rácio mínimo de um docente doutorado por cada 30 alunos, sendo que metade terá de estar a tempo integral. Os docentes em regime de tempo parcial não podem entrar no rácio em mais de duas instituições, bem como os que exercem a tempo integral apenas o poderão fazer na instituição a que pertençam.
Ainda neste capítulo, mas no âmbito do ensino politécnico, o corpo docente tem de dispor no mínimo de um detentor do título de especialista ou do grau de doutor por cada 30 estudantes, em que pelo menos 15% devem ser doutores em regime de tempo integral e, para além destes, pelo menos 35% devem ser detentores do título de especialista que poderão ser também detentores do grau de doutor.
Impõe-se que a adequação do corpo docente terá de ser feita no prazo de 18 meses, sob pena de revogação da autorização de funcionamento dos respectivos ciclos de estudos.
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— O reforço de garantias, designadamente em matéria patrimonial ou financeira, e de transparência quanto à identidade dos seus proprietários, exigidas às entidades instituidoras de estabelecimentos de ensino superior privado.
— A possibilidade de criação de consórcios entre instituições de natureza idêntica, a par de outros mecanismos de reorganização da rede e da oferta formativa.
— A organização interna das instituições, designadamente das suas unidades específicas, que poderão assumir forma e natureza distintas.
— A reforma do sistema de governo das instituições públicas, sendo que os órgãos de governo das universidades e dos institutos universitários são o conselho geral, o reitor e o conselho de gestão.
Estabelece-se, ainda, que os estatutos podem prever a criação de um Senado Académico como órgão de consulta obrigatória do reitor nas matérias definidas nos próprios estatutos.
O conselho geral é composto por 10 a 25 membros, dele fazendo parte os representantes dos professores e investigadores, dos estudantes e personalidades de reconhecido mérito.
Os representantes dos professores e investigadores, que devem constituir mais de metade da totalidade dos membros do conselho geral, são eleitos pelo conjunto dos professores e investigadores da instituição, pelo sistema de representação proporcional, nos termos dos estatutos e do competente regulamento eleitoral aprovado pelo reitor ou presidente.
Quanto às personalidades de reconhecido mérito, que devem constituir pelo menos 30% da totalidade dos membros do conselho geral, determina-se que são cooptados pelo conjunto dos representantes dos professores e investigadores e dos estudantes, por maioria absoluta, com base em propostas fundamentadas subscritas por, pelo menos, um terço daqueles membros. Há deliberações, expressas na lei, que são obrigatoriamente precedidas de parecer obrigatório, a elaborar e aprovar pelas personalidades externas.
O mandato dos membros eleitos ou designados é de quatro anos, apenas podendo ser destituídos pelo próprio conselho geral, por maioria absoluta, em caso de falta grave.
No âmbito das competências, cabe ao conselho geral eleger o seu presidente, por maioria absoluta, de entre os membros das personalidades de reconhecido mérito.
O reitor ou o presidente é designado pelo conselho geral, mediante um processo de selecção da sua responsabilidade, que inclui a nomeação de um comité para a condução e dinamização do processo, o anúncio público da abertura de candidaturas e a apresentação de candidaturas.
A destituição do reitor e do presidente tem lugar no caso de situação grave para a vida da instituição, podendo o conselho geral, convocado pelo presidente ou por um terço dos seus membros, deliberar, por maioria de dois terços dos seus membros, a suspensão do reitor ou do presidente e, após o devido procedimento administrativo, por idêntica maioria, a sua destituição.
O conselho de gestão é designado e presidido pelo reitor ou presidente, sendo composto por um máximo de cinco membros.
— Os conselhos científicos das instituições de ensino superior passam a incluir necessariamente representantes das suas instituições de investigação avaliadas e reconhecidas. Os conselhos pedagógicos, de composição paritária entre estudantes e professores, são órgãos de consulta prévia obrigatória em matérias de organização pedagógica e de métodos de avaliação de desempenho do corpo docente e discente.
— A criação da figura do Provedor do Estudante articulada com as funções e competências dos órgãos de governo da instituição e das suas unidades orgânicas.
— No âmbito do controlo financeiro, as auditorias externas realizam-se de dois em dois anos, devendo uma reportar-se à primeira metade do mandato do reitor ou presidente e a seguinte preceder em três meses o final do mandato correspondente.
— A gestão patrimonial e financeira das instituições de ensino superior públicas é controlada por um fiscal único que é designado de entre revisores oficiais de contas ou sociedades de revisores oficiais de contas, por despacho conjunto do ministro responsável pela área das finanças e do ministro da tutela, ouvido o reitor ou presidente.
— Os limites à nomeação e contratação: o número de unidades dos quadros de pessoal docente, de investigação e outro de cada instituição de ensino superior pública é fixado por despacho do ministro da tutela, através da aplicação de critérios estabelecidos por decreto-lei, excepcionando-se as instituições de ensino universitário públicas que poderão gerir livremente os seus recursos humanos, não estando sujeitas àqueles limites de nomeação e contratação.
As instituições públicas de ensino universitário ficam sujeitas ao dever de informação à tutela, remetendo trimestralmente para as Finanças e para a tutela informações relativas às despesas com pessoal.
— Nas disposições transitórias, prevê-se que no prazo de seis meses as instituições de ensino superior devem proceder à revisão dos seus estatutos, sob pena de se poder vir a considerar que a instituição se encontra em situação de degradação institucional.
Os mandatos consecutivos dos dirigentes de topo não podem exceder oito anos.
Determina-se que, excepcionalmente, os estatutos podem prever que os reitores ou presidentes das instituições, bem como os directores ou presidentes das unidades orgânicas, cujos mandatos não tenham terminado aquando da publicação dos estatutos, os concluam já dentro da vigência dos novos estatutos.
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Prevê-se, ainda, que as instituições de ensino superior procedam à eleição dos novos corpos dirigentes, no prazo de um ano, após a publicação do diploma.
— A exigência de contabilização consolidada de despesas e receitas.
— A intervenção do Estado em matéria da definição do elenco das provas específicas de acesso a cursos superiores, quando esteja em causa a coerência do sistema.
V — Enquadramento constitucional
A Constituição da República Portuguesa consagra expressamente a autonomia das Universidades no n.º 2 do artigo 76.º, «As Universidades gozam, nos termos da lei, de autonomia estatutária, científica, pedagógica, administrativa e financeira, sem prejuízo de adequada avaliação da qualidade do ensino».
Neste âmbito, importa ainda referir o disposto no n.º 1 do artigo 77.º, «Os professores e alunos têm o direito de participar na gestão democrática das escolas, nos termos da lei».
VI — Conclusões
1 — O Governo apresentou à Assembleia da República a proposta de lei n.º 148/X, «Aprova o regime jurídico das instituições do ensino superior»; 2 — Esta apresentação foi efectuada nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos formais previstos no artigo 138.º do mesmo Regimento.
3 — A proposta de lei n.º 148/X, visa estabelecer o regime jurídico das instituições de ensino superior, regulando a sua constituição, as atribuições, a organização, o funcionamento e competência dos seus órgãos, bem como a tutela e a fiscalização pública do Estado sobre essas instituições.
4 — O novo regime jurídico aplica-se a todos os estabelecimentos de ensino superior e ao sistema de ensino superior no seu conjunto, reunindo numa mesma lei, os regimes aplicáveis às instituições públicas e privadas, universitárias e politécnicas, revogando-se, entre outra legislação avulsa, a Lei da Autonomia das Universidades, a Lei do Estatuto dos Estabelecimentos de Ensino Superior Politécnico, o Estatuto do Ensino Superior Particular e Cooperativo, e o Regime Jurídico do Desenvolvimento e Qualidade do Ensino Superior.
5 — O novo diploma irá regular os princípios de organização do sistema de ensino superior; a autonomia das universidades e institutos politécnicos; os princípios de organização e gestão das instituições de ensino superior; o regime legal das instituições públicas e privadas de ensino superior; o ordenamento da rede pública; os requisitos para a criação e transformação de estabelecimentos de ensino superior; a responsabilidade e fiscalização das instituições.
6 — Encontrando-se na Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura uma outra iniciativa (projecto de lei n.º 271/X do PSD) que versa, em parte, sobre a mesma matéria, será se toda a pertinência a sua discussão conjunta, em sede de especialidade, caso sejam aprovadas na generalidade.
VII — Parecer
A Comissão de Educação Ciência e Cultura é do seguinte parecer:
A proposta de lei n.º 148/X reúne os requisitos constitucionais e regimentais para subir a Plenário, reservando os grupos parlamentares as suas posições de voto para o debate.
Assembleia da República, de 27 de Junho de 2007.
O Deputado Relator, Pedro Duarte — O Presidente da Comissão, António José Seguro.
Nota: As conclusões foram aprovadas por unanimidade.
O parecer foi aprovado por maioria, com votos a favor do PS e do CDS-PP, votos contra do PCP e abstenções do PSD e do BE.
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PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 218/X RECOMENDA A ADOPÇÃO DE MEDIDAS DE APOIO AO COMÉRCIO LOCAL FACE AOS IMPACTOS DA OBRA DO METRO SUL DO TEJO
O Metro Sul do Tejo constitui um projecto estruturante e estratégico para o Arco Ribeirinho Sul da Área Metropolitana de Lisboa. Trata-se de um empreendimento com um enorme potencial, desde logo nas vertentes da mobilidade e da qualidade ambiental e urbana, proporcionando uma oferta de transporte colectivo, com mais segurança e comodidade, melhor eficiência energética e menores impactos ambientais. Por outro lado, a
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dimensão que este projecto assume na promoção e qualificação do espaço urbano confere-lhe indiscutivelmente um carácter potenciador do desenvolvimento económico.
Com o Metro Sul do Tejo, a região poderá melhorar e aumentar a qualidade e a capacidade de transporte (redução dos tempos de percurso, garantia da fiabilidade dos horários, optimização dos modos de transporte colectivo da travessia do Tejo). Aspecto particularmente importante deste projecto é a complementaridade que promove com os outros sistemas de transporte (interfaces com o eixo ferroviário Norte-Sul, com os transportes fluviais e com os transportes colectivos rodoviários), indispensável para melhorar as condições de travessia do Tejo.
No entanto, a fase de concretização deste projecto tem vindo a colocar constrangimentos diversos. Com efeito, a obra de construção das infra-estruturas do Metro Sul do Tejo tem vindo a causar impactos muito significativos nas zonas afectadas, principalmente nas principais artérias de freguesias urbanas do concelho de Almada. Para além dos incómodos causados às populações residentes nestas áreas, colocam-se de forma ainda mais premente as consequências desta situação para as pequenas empresas que aí desenvolvem a sua actividade, com destaque para o comércio local.
A actividade económica e social em todas estas áreas é constituída por um vasto número de pequenas empresas do comércio local, na sua maioria de génese familiar. Estes estabelecimentos debatem-se com sérios problemas, que, em diversos casos, ameaçam o próprio futuro da sua actividade.
Segundo os comerciantes, verificam-se profundas quebras na actividade dessas pequenas empresas — algumas confirmam terem tido diminuições de facturação da ordem dos 70% — com graves prejuízos e mesmo com a ameaça do encerramento de estabelecimentos.
Este cenário vem tornar ainda mais difícil a situação do comércio local, face aos constrangimentos que já eram previsíveis em matéria de condicionamentos da rede viária e do estacionamento automóvel. Face a estes problemas concretos, os comerciantes das zonas afectadas organizaram-se e mobilizaram-se e com a sua Associação do Comércio e Serviços de Setúbal/Delegação de Almada têm vindo a expressar a sua extrema preocupação e necessidade de medidas urgentes pelas entidades responsáveis.
Sendo o Metro Sul do Tejo um empreendimento em que assumem particular responsabilidade o consórcio concessionário e o Estado concedente — representado neste âmbito pelos ministros responsáveis pelas tutelas dos Transportes e Obras Públicas e das Finanças — coloca-se nesta medida a evidente importância da Equipa de Missão do Metropolitano Sul do Tejo e da sua intervenção enquanto representante do Estado, com a incumbência de zelar pela garantia do efectivo cumprimento do contrato de concessão.
Por outro lado, também se verifica neste processo a incontornável necessidade de uma acção efectiva da tutela do ambiente. Essa necessidade coloca-se designadamente à Inspecção-Geral do Ambiente e do Ordenamento do Território, no tocante à fiscalização do cumprimento das medidas de minimização e das recomendações da «Declaração de Impacte Ambiental do Projecto de Execução do Metropolitano Ligeiro da Margem Sul do Tejo».
Recorde-se, aliás, que este empreendimento mereceu, em Dezembro de 2002, um parecer favorável condicionado ao cumprimento dessas mesmas medidas, recomendações e programas de monitorização.
São conhecidas as extremas dificuldades que enfrenta o comércio local, face à situação de crise económica que o País tem atravessado, com a população a registar a maior quebra do poder de compra dos últimos 20 anos, com o aumento do desemprego e da instabilidade laboral, com o endividamento das famílias a atingir os maiores valores de sempre. O quadro social e económico é de enorme gravidade e atinge particularmente o comércio local, mais vulnerável face à concorrência desigual das grandes empresas do sector.
Esta grave situação torna-se assim ainda mais grave para as micro e pequenas empresas do comércio local, nas zonas afectadas pela obra de construção das infra-estruturas do Metro Sul do Tejo. Razão pela qual o Governo, nomeadamente o Ministério responsável pela tutela da Economia, tem um incontornável papel a desempenhar na resposta aos problemas deste sector.
Já em 10 de Março de 2004, a Assembleia Municipal de Almada se pronunciou nesta matéria pela necessidade de medidas preventivas por parte da Tutela, tendo deliberado por unanimidade recomendar ao Governo um conjunto de acções, entre as quais se destaca «a adopção de medidas que atenuem os impactos das obras nas actividades económicas em geral e no comércio local em particular, incluindo a indemnização pelos prejuízos causados».
A necessidade de adoptar essas medidas ganha hoje uma actualidade e uma importância absolutamente indesmentíveis. Este é um problema que, pelas causas que lhe deram origem e pela dimensão que está a atingir, coloca também perante a Assembleia da República a necessidade de intervir com iniciativas que, no quadro das suas competências, sejam também uma prova concreta de solidariedade para com estas empresas e seus trabalhadores, contribuindo de forma objectiva e construtiva para a tomada de decisões que permitam minorar a crise económica e financeira que afecta estas empresas.
Assim, tendo em consideração os motivos acima expostos, a Assembleia da República resolve pronunciarse pela necessidade de o Governo tomar com urgência todas as medidas adequadas no apoio ao comércio local, nas áreas de influência das obras de construção das infra-estruturas do Metro Sul do Tejo, designadamente com a adopção das seguintes iniciativas:
1. Apuramento dos prejuízos para o comércio local, resultantes das obras em causa, com vista ao desenvolvimento de medidas que permitam a consequente compensação pelos danos causados;
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2. Criação de uma linha de crédito com juros bonificados, destinada a fazer face à situação particularmente exigente que o comércio local enfrenta nesta área; 3. Desenvolvimento de medidas ao nível da Tutela dos Transportes, no sentido de criar condições para a disponibilização de uma oferta reforçada de transporte colectivo, nomeadamente com serviços de vai-vem na ligação ao centro urbano, promovendo a acessibilidade aos estabelecimentos do comércio local; 4. Promoção de iniciativas destinadas à criação de condições para a utilização das verbas previstas ao abrigo do Sistema de Incentivos a Projectos de Modernização do Comércio (MODCOM), incluindo a realização de uma acção específica no quadro deste programa, aplicável à promoção do comércio local no contexto da realização de obras públicas.
Assembleia da República, 27 de Junho de 2007.
Os Deputados do PCP: Bruno Dias — Francisco Lopes— Agostinho Lopes — Honório Novo — Jorge Machado— Bernardino Soares — Jerónimo de Sousa — António Filipe — Miguel Tiago — José Soeiro — Luísa Mesquita.
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PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 219/X SOBRE A INSTITUIÇÃO DE EXAMES NACIONAIS NO ENSINO BÁSICO
1 — A situação da educação em Portugal
Os portugueses sentem, de uma forma constante, uma enorme dificuldade em perceber o que se passa no sector da educação em Portugal. Para além desta perplexidade, todos os anos somos assaltados com dificuldades suplementares e resultados sofríveis. Já é, mesmo, natural o aparecimento de resultados fracos em matérias tão sensíveis como Português e Matemática.
É assumido como um juízo comum que os estudantes portugueses sentem limitações na sua formação.
Para além desta constatação, os números de saída precoce do sistema escolar colocam Portugal num posicionamento medíocre no plano internacional.
As medidas para ultrapassar este estado de crise são várias e algumas simplesmente pontuais, mas têm de ser tomadas de modo urgente. Os nossos alunos e o futuro de Portugal, enquanto Estado, não podem esperar.
2 — O debate de ideias
Esta situação descrita em traços muito gerais, bem como a necessidade de perceber as suas causas, levam à necessidade de um debate que naturalmente também terá natureza ideológica. É natural que este possa dividir a opinião pública.
Todos conhecem as ideias que têm sido dominantes na nossa educação. O CDS não embarca nas teses do chamado «eduquês». Não nos deixamos convencer por aqueles que pretensamente são os superiores arautos da «escola progressista». Sentimos a necessidade de ultrapassar muitas das teses que têm assumido relevância na gestão de vários ministros da educação.
Defendemos a objectividade da capacidade de aprender e a possibilidade de o conhecimento científico chegar a conclusões. Acreditamos na escola como centro da educação. Queremos o prémio ao mérito e ao esforço que passa naturalmente por avaliação.
O ensino centrado no aluno deve ter mais em atenção as suas necessidades futuras do que os seus gostos actuais. Pode ser desenvolvido o gosto dos alunos pelas disciplinas, mas não se deve limitar o ensino àquilo que os alunos gostam. A educação é uma aposta no futuro.
3 — Os eixos centrais da solução
Não há para as matérias de educação uma receita mágica. Mas é evidente a necessidade de:
— Existência em Portugal de verdadeira liberdade de aprender e ensinar com a consequente liberdade de escolha; — Prémio ao mérito das escolas e alunos; — Centrar os esforços na sala de aula e nos aspectos essenciais do ensino; — Verdadeira formação científica para os professores; — Avaliação constante dos alunos, escolas, programas e manuais; — Valorização do conhecimento, da disciplina e do esforço.
4 — A situação da avaliação dos alunos no ensino básico em Portugal
Hoje em dia, a primeira vez que um aluno se submete a uma prova de exame, com consequências para a sua avaliação, é no 9.º ano de escolaridade, e apenas para as disciplinas de Português e Matemática. Até esse momento, a avaliação é essencialmente feita ao nível de escola.
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Provas gerais e universais para os alunos do nosso ensino básico apenas existem no 9.º ano de escolaridade. Antes, apenas existem as provas de aferição feitas a Português e Matemática para os alunos do 4.º e 6.º anos, as quais, no entanto, não têm qualquer consequência para a avaliação final do aluno.
5 — Uma visão crítica da avaliação de alunos no ensino básico
Através da breve descrição da forma de avaliar os alunos no ensino básico fica evidente que um aluno apenas contacta com exames externos no fim da escolaridade obrigatória, mais precisamente no 9.º ano. Uma grande percentagem de estudantes, apesar de se manterem no sistema e nele progredirem, pouco aprendem, e arrastam de forma crescente deficiências básicas a disciplinas como Português e Matemática.
A avaliação geral de conhecimentos não se pode fazer apenas, como neste momento acontece, no final da linha. É evidente que os exames nacionais não devem ser um elemento absoluto de avaliação. Os momentos de avaliação devem ser vários, e a vida do dia a dia escolar não pode, nem deve, ser descurada. No entanto, quanto mais cedo aparecerem na vida escolar os exames nacionais, mais cedo se conseguem detectar deficiências que de outro modo se mantêm em todo o percurso escolar.
Uma maior periodicidade dos exames teria aspectos benéficos para a escola e os alunos. Seria mais um sinal de prémio ao esforço, à dedicação e ao mérito. Seria uma maneira de desmistificar a figura dos exames que actualmente andam desaparecidos durante 9 anos de escola.
A solução não passa por umas provas de aferição que, de acordo com os seus promotores, não servem para avaliar os alunos, não servem para avaliar as escolas, e não servem para avaliar os professores. Isto é, não servem para quase nada. São provas de efeito nulo. As provas de aferição são bem a demonstração de uma ideologia pedagógica ultrapassada e de resultados nefastos.
Já chega de desperdício de recursos, tempo e fundos. É já tempo de aferir verdadeiramente os conhecimentos e de incentivar ao estudo. É certo que a Sr.ª Ministra da Educação já afirmou que os exames são uma peça essencial do sistema. Infelizmente entre o dizer e o fazer vai uma enorme distância. É, então, a altura para ser consequente.
O CDS-PP entende que os exames nacionais não vão resolver todos os problemas da educação no ensino básico. No entanto, é para nós claro que os exames:
a) Valorizam a parte científica do ensino; b) Clarificam o papel da escola na sua função essencial de transmitir conhecimentos; c) Introduzem, de forma clara, uma ideia de responsabilidade em relação às famílias, alunos e professores; d) Contribuem para a melhoria das escolas; e) Podem aumentar a confiança social nas escolas f) Introduzem um factor de igualdade de oportunidades g) Premeiam o esforço e o mérito.
6 — Mais exames nacionais no ensino básico
O CDS-PP sabe bem que o estudo, determinação e aplicação de exames nacionais, depende do Governo.
Já o experimentamos no passado quando contribuímos para o nascimento dos exames nacionais no 9.º ano de escolaridade. É uma matéria que depende muito da opção do Executivo.
De todo o modo, a Assembleia da República não pode manter-se à parte quanto a opções que são fundamentais. Assim, vem o CDS-PP defender a ampliação do regime de exames, fazendo a sua ligação ao final de cada um dos ciclos do ensino básico. Propomos a instituição de exames nacionais no 4.º e 6.º anos e o início do debate relativo à ponderação da sua consideração noutras disciplinas do 9.º ano de escolaridade.
7 — Resolução
Assim, e tendo em conta a importância para o futuro da educação em Portugal, a Assembleia da República recomenda ao Governo:
1. A tomada de medidas legislativas e administrativas necessárias à instituição de exames nacionais no 4.º e 6.º anos de escolaridade; 2. A medida deverá ser aplicada no ano lectivo de 2008/2009.
Palácio de São Bento, 27 de Junho de 2007.
Os Deputados do CDS-PP: Paulo Portas — Pedro Mota Soares — Diogo Feio — Nuno Magalhães — Helder Amaral — José Paulo Carvalho — Telmo Correia.
A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.