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Sexta-feira, 7 de Setembro de 2007 II Série-A — Número 130

X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)

SUPLEMENTO

SUMÁRIO Decretos n.os (130, 139, 150 e 160/X): N.º 130/X (Primeira alteração à Lei n.º 1/99, de 13 de Janeiro, que aprovou o Estatuto do Jornalista) — Mensagem do Presidente da República fundamentando a recusa de promulgação e devolvendo o decreto para reapreciação.
N.º 139/X (Altera a Lei Geral Tributária, o Código de Procedimento e de Processo Tributário e o Regime Geral das Infracções Tributárias): — Mensagem do Presidente da República fundamentando o veto por inconstitucionalidade que exerceu e devolvendo o decreto para reapreciação.
N.º 150/X (Aprova o regime de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas): — Mensagem do Presidente da República fundamentando a recusa de promulgação e devolvendo o decreto para reapreciação.
N.º 160/X (Aprova a orgânica da Guarda Nacional Republicana): — Idem.

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DECRETO N.º 130/X (PRIMEIRA ALTERAÇÃO À LEI N.º 1/99, DE 13 DE JANEIRO, QUE APROVOU O ESTATUTO DO JORNALISTA) Mensagem do Presidente da República fundamentando a recusa de promulgação e devolvendo o decreto para reapreciação.
Tendo recebido para promulgação como lei o Decreto n.º 130/X, da Assembleia da República, que procede à primeira alteração à Lei n.º 1/99, de 13 de Janeiro, que aprovou o Estatuto do Jornalista, decidi, nos termos da alínea b) do artigo 134.º e do artigo 136.º da Constituição da República Portuguesa, não promulgar aquele diploma, com os seguintes fundamentos: 1 — No quadro de uma sociedade aberta e pluralista, os diplomas relativos à actividade jornalística configuram-se sempre como essenciais para a estruturação de uma democracia de qualidade. Não por acaso os constitucionalistas sublinham que, entre os domínios fundamentais da salvaguarda da liberdade de imprensa, garantida pela norma do artigo 46.º da Constituição, se inscreve precisamente «a relevância do estatuto dos seus operadores, os jornalistas» (cf. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição da República Portuguesa Anotada, Tomo I, Coimbra, 2005, pág. 434).
2 — Como é sabido, o diploma ora sujeito a promulgação concitou em seu torno uma vasta controvérsia, seja entre os partidos com expressão parlamentar, seja entre a classe dos jornalistas e suas organizações representativas, seja, enfim, entre empresários da comunicação social, quando seria aconselhável que sobre o mesmo fosse alcançado um entendimento mínimo, atenta a sensibilidade da matéria em causa.
3 — Tenho afirmado, em diversas ocasiões, que a clareza das políticas públicas é essencial para a qualidade da nossa democracia. Tal aconselha, pois, a que algumas das soluções normativas acolhidas no presente diploma sejam objecto de uma nova ponderação por parte dos Deputados à Assembleia da República, de modo a que o Estatuto do Jornalista entre em vigor sem que em seu torno subsistam dúvidas, nomeadamente quanto a aspectos tão essenciais como a quebra do sigilo profissional, os requisitos de capacidade para o exercício da profissão e o regime sancionatório instituído.
4 — Assim — e sem questionar a necessidade de quebra do sigilo profissional dos jornalistas em determinadas situações, já prevista, aliás, na legislação em vigor —, não posso deixar de assinalar que a norma do artigo 11.º do Estatuto do Jornalista (adiante designado «Estatuto») permite interpretações divergentes, podendo abrir um espaço de indefinição e de insegurança jurídicas num domínio particularmente delicado, quer para o exercício da actividade jornalística quer para a eficácia da acção penal.
Desde logo, não é suficientemente clara a conjugação entre o regime definido no artigo 11.º do Estatuto e o previsto nas disposições do Código de Processo Penal em matéria de levantamento do sigilo profissional, em particular o artigo 135.º deste Código, que alude expressamente ao segredo profissional dos jornalistas.
Vários elementos sugerem que não se pretendeu criar neste domínio uma disciplina jurídica específica para os jornalistas. Com efeito, no Estatuto não só não se prevê expressamente a derrogação das disposições do Código de Processo Penal como, pelo contrário, o n.º 3 do artigo 11.º contém o inciso «de acordo com o previsto na lei processual penal». Para mais, a alteração ao Código de Processo Penal, recentemente aprovada pela Assembleia da República, mantém expressamente a inclusão dos jornalistas no regime definido pelo artigo 135.º daquele Código.
Contudo, o artigo 11.º do Estatuto contém, no que se refere à quebra do sigilo profissional, um conjunto de pressupostos cuja articulação com a lei processual penal não é inteiramente evidente, como seria desejável dado o especial melindre de que se reveste, para o exercício da actividade jornalística, a revelação das respectivas fontes de informação. Assim, não é líquido se um tribunal apenas pode ordenar a revelação das fontes de informação nos casos previstos no n.º 3 daquele artigo 11.º ou se, como sucede na generalidade das profissões (exemplo, advogados, médicos, membros de instituições de crédito), o pode fazer nos termos da lei geral.
Por outro lado, a enunciação dos pressupostos que permitem a obrigatoriedade da revelação das fontes é feita de forma pouco precisa de um ponto de vista técnico-jurídico, recorrendo-se a expressões como «crimes graves» ou «casos graves» («casos graves de criminalidade organizada») que são indubitavelmente potenciadoras de incerteza e de insegurança jurídicas.
5 — Permanece ainda por esclarecer, nos seus exactos contornos, se corresponde à solução mais adequada e proporcionada restringir o acesso à profissão a quem seja titular de habilitação académica de nível superior — sem que a razão de ser de tal exigência seja explicitada, uma vez que a mesma não incide sobre uma habilitação específica na área da comunicação social ou numa área conexa. Não existindo tal exigência em concreto, torna-se, pois, pouco compreensível o estabelecimento de um requisito que, por si só, não parece garantir a priori uma maior qualidade ou aptidão para o exercício específico da profissão de jornalista. Além disso, esse requisito, tal como enunciado no artigo 2.º n.º 1, do Estatuto, ao exigir a contratação de profissionais detentores de uma habilitação académica de nível superior, pode comportar um acréscimo das despesas de pessoal que, no limite, irá porventura ameaçar a viabilidade das pequenas ou

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médias empresas da área da comunicação social (exemplo, rádios locais ou imprensa regional), o que implica uma inquestionável compressão do pluralismo informativo e da liberdade de iniciativa económica.
Assim, seria útil ponderar se neste domínio não deveria, ao invés, prevalecer uma lógica de autoregulação, que garantisse, quer às empresas de comunicação social quer aos jornalistas, um maior espaço de liberdade e de flexibilidade no acesso à profissão.
6 — Não é também particularmente claro o regime sancionatório instituído, sobretudo quando cotejado com os aplicáveis a outras actividades profissionais. As razões que ditam este regime específico não se encontram razoavelmente explicitadas, nem foram satisfatoriamente esclarecidas no decurso do processo que conduziu à aprovação do presente diploma.
Na verdade, a graduação das sanções é determinada em função da culpa do agente, mas a sua aplicabilidade obedece a um esquema, previsto no artigo 21.º do Estatuto, nos termos do qual a determinação concreta de certas penas depende da existência de sanções anteriores.
Deste modo, e ao invés do que resultaria dos princípios gerais em matéria sancionatória, a aplicação das sanções não fica dependente em exclusivo da apreciação da gravidade da conduta e do grau de culpa do agente. É possível, por conseguinte, que um jornalista pratique um ilícito extremamente grave, com um muito elevado grau de culpa, e a esta conduta só possa aplicar-se a pena mais leve — a advertência registada — enquanto outro jornalista, tendo praticado uma infracção menos grave e com um grau de culpa substancialmente inferior, pode ser suspenso do exercício da actividade profissional. Ou seja, para efeitos de aplicação concreta das penas atribui-se um peso que não pode deixar de considerar-se excessivo à circunstância de o agente ter sido, nos três anos precedentes, objecto de outras sanções disciplinares. Tal representa uma clara limitação da competência, atribuída à Comissão da Carteira Profissional de Jornalista, para decidir livremente e aplicar as sanções que tiver por adequadas em função das circunstâncias concretas dos casos submetidos à sua apreciação, ou seja, em função da gravidade da conduta e do grau de culpa do agente.
Importaria, pois, não só evitar uma limitação infundada ao juízo sancionatório que compete à Comissão da Carteira Profissional de Jornalista mas ainda assegurar uma relação de conformidade lógica entre a gravidade da conduta e o grau de culpa do agente e os pressupostos de cada sanção aplicável.
Ante o exposto, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 134.º, alínea b), e 136.º, n.º 1, da Constituição da República, decidi não promulgar como lei o Decreto n.º 130/X da Assembleia da República, solicitando, pelos fundamentos apresentados, uma nova apreciação do citado diploma.

Lisboa, 3 de Agosto de 2007.
O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.

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DECRETO N.º 139/X (ALTERA A LEI GERAL TRIBUTÁRIA, O CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO E O REGIME GERAL DAS INFRACÇÕES TRIBUTÁRIAS)

Mensagem do Presidente da República fundamentando o veto por inconstitucionalidade que exerceu e devolvendo o decreto para reapreciação

Junto devolvo a S. Ex.ª o Sr. Presidente da Assembleia da República, nos termos do artigo 279.º, n.º 1, da Constituição, o Decreto da Assembleia da República n.º 139/X — «Altera a Lei Geral Tributária, o Código de Procedimento e de Processo Tributário e o Regime Geral das Infracções Tributárias», uma vez que o Tribunal Constitucional, através de acórdão cuja fotocópia se anexa, se pronunciou, em sede de fiscalização preventiva, pela inconstitucionalidade da norma constante do artigo 3.º do referido decreto.

Lisboa, 22 de Agosto de 2007.
O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.

Anexo: Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 442/2007.

Anexo

Acórdão n.º 442/2007 Processo n.º 815/07 Plenário Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro

Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional,

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I — Relatório

1 — O Presidente da República requereu, em 30 de Julho de 2007, ao abrigo do n.º 1 do artigo 278.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), do n.º 1 do artigo 51.º e do n.º 1 do artigo 57.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, alterada, por último, pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), que o Tribunal Constitucional aprecie a conformidade com o disposto nos artigos 2.º, 13.º, 18.º, 20.º, 26.º, n.º 1, 52.º, 266.º e 268.º da Constituição da República Portuguesa das normas constantes dos artigos 2.º e 3.º do Decreto n.º 139/X da Assembleia da República, de 5 de Julho de 2007, que «Altera a Lei Geral Tributária, o Código de Procedimento e de Processo Tributário e o Regime Geral das Infracções Tributárias», recebido na Presidência da República em 23 de Julho de 2007 para ser promulgado como lei.
O pedido assenta nos seguintes fundamentos:

«1.º — A parte final da norma do n.º 10 do artigo 89º-A da Lei Geral Tributária, agora acrescentada pelo artigo 2.º do decreto em apreço, determina que as decisões definitivas de determinação da matéria colectável são comunicadas não apenas ao Ministério Público, mas também, tratando-se de funcionário ou titular de cargo sob tutela de entidade pública, à tutela deste para efeitos de averiguações no âmbito da respectiva competência.
2.º — Trata-se de uma disposição que suscita fundadas dúvidas de constitucionalidade, em face do artigo 13.º da Lei Fundamental, uma vez que estabelece para os funcionários ou titulares de cargos sob tutela de entidade pública, na sua mera qualidade de contribuintes, um regime distinto do aplicável aos demais cidadãos, sem que pareça existir um fundamento material bastante para tal diferenciação.
3.º — O decreto ora submetido a promulgação procede ainda, no seu artigo 3.º, a duas alterações ao Código de Procedimento e de Processo Tributário surgindo, também aqui, fundadas dúvidas de constitucionalidade quanto à redacção prevista para os n.os 2 dos artigos 69.º e 110.º daquele Código.
4.º — Com efeito, as normas dos artigos 69.º, n.º 2, e 110.º, n.º 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário vêm associar ao exercício de um direito de reclamação ou de impugnação contenciosa por parte de um administrado a consequência inelutável de, sem o seu consentimento, a administração fiscal aceder a informação e documentos bancários que integram a sua reserva de intimidade da vida privada (artigo 26.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa).
5.º — Parece verificar-se, assim, uma restrição desproporcionada não apenas do direito à reserva da intimidade da vida privada como também do princípio do acesso ao direito e aos tribunais, acolhido no artigo 20.º da Constituição, enquanto corolário do princípio do Estado de direito, consagrado no artigo 2.º, com consequente violação do artigo 18.º, ambos da Lei Fundamental.
6.º — Ao ligarem o direito de reclamação ou impugnação contenciosa ao levantamento do sigilo bancário as normas sub judicio vêm pôr em causa, de uma forma que parece destituída de fundamento, o direito que a todos os cidadãos assiste de reclamarem de decisões das autoridades — artigo 52.º da Constituição — e, bem assim, o direito que o artigo 268.º, n.º 4, da Lei Fundamental atribui aos administrados de impugnarem quaisquer actos administrativos que os lesem, sendo ainda questionável se as citadas normas não afectam o princípio da boa fé da Administração contido no artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa.
7.º — Afigura-se, por conseguinte, que a possibilidade de acesso a elementos de natureza bancária, aberta pelo simples facto de o particular ter reclamado ou impugnado uma dada situação tributária, não só não surge rodeada de um conjunto necessário de garantias e mecanismos de salvaguarda como configura, em si mesma, uma restrição desproporcionada e irrazoável dos direitos conferidos pelas normas dos artigos 2.º, 18.º, 20.º, 26.º, n.º 1, 52.º, 266.º e 268.º da Constituição.»

Em anexo ao pedido foi remetido um memorando da Assessoria para os Assuntos Jurídicos e Constitucionais da Casa Civil da Presidência da República.
2 — O requerimento deu entrada neste Tribunal no dia 30 de Julho de 2007 e o pedido foi admitido na mesma data.
3 — Notificado para o efeito previsto no artigo 54.º da LTC, o Presidente da Assembleia da República veio apresentar resposta na qual oferece o merecimento dos autos e junta cópia dos Diários da Assembleia da República que contêm os trabalhos preparatórios relativos ao Decreto n.º 139/X.
4 — Elaborado o memorando a que alude o artigo 58.º, n.º 2, da LTC e fixada a orientação do Tribunal, importa decidir conforme dispõe o artigo 59.º da mesma Lei.

II — Fundamentação

5 — São duas as questões que o Tribunal deve apreciar.

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A primeira refere-se à apreciação da constitucionalidade da norma constante do artigo 2.º do Decreto n.º 139/X, da Assembleia da República.
A segunda concerne à apreciação da constitucionalidade das normas constantes do artigo 3.º do Decreto n.º 139/X, da Assembleia da República

A) Apreciação da constitucionalidade da norma constante do artigo 2.º do Decreto n.º 139/X, da Assembleia da República

6 — O artigo 2.º do Decreto n.º 139/X, da Assembleia da República, pretende adicionar um novo número ao artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária (LGT) que, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, estatui o seguinte:

«Artigo 89.º-A Manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados

1 — Há lugar a avaliação indirecta da matéria colectável quando falte a declaração de rendimentos e o contribuinte evidencie as manifestações de fortuna constantes da tabela prevista no n.º 4 ou quando o rendimento líquido declarado mostre uma desproporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendimento padrão resultante da referida tabela.
2 — Na aplicação da tabela prevista no n.º 4 tomam-se em consideração:

a) Os bens adquiridos no ano em causa ou nos três anos anteriores pelo sujeito passivo ou qualquer elemento do respectivo agregado familiar; b) Os bens de que frua no ano em causa o sujeito passivo ou qualquer elemento do respectivo agregado familiar, adquiridos, nesse ano ou nos três anos anteriores, por sociedade na qual detenham, directa ou indirectamente, participação maioritária, ou por entidade sediada em território de fiscalidade privilegiada ou cujo regime não permita identificar o titular respectivo; c) Os suprimentos e empréstimos efectuados pelo sócio à sociedade, no ano em causa, ou por qualquer elemento do seu agregado familiar.

3 — Verificadas as situações previstas no n.º 1 deste artigo, bem como na alínea f) do artigo 87.º, cabe ao sujeito passivo a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou o acréscimo de património ou o consumo evidenciados.
4 — Quando o sujeito passivo não faça a prova referida no número anterior relativamente às situações previstas no n.º 1 deste artigo, considera-se como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, no ano em causa, e no caso das alíneas a) e b) do n.º 2, nos três anos seguintes, quando não existam indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90.º, que permitam à administração tributária fixar rendimento superior, o rendimento padrão apurado nos termos da tabela seguinte:

Manifestações de fortuna Rendimento padrão 1 — Imóveis de valor de aquisição igual ou superior a € 250 000.
20% do valor de aquisição.
2 — Automóveis ligeiros de passageiros de valor igual ou superior a € 50 000 e motociclos de valor igual ou superior a € 10 000.
50% do valor no ano de matrícula, com o abatimento de 20% por cada um dos anos seguintes.
3 — Barcos de recreio de valor igual ou superior a € 25 000.
Valor no ano do registo, com o abatimento de 20% por cada um dos anos seguintes.
4 — Aeronaves de turismo.
Valor no ano do registo, com o abatimento de 20% por cada um dos anos seguintes.
5 — Suprimentos e empréstimos feitos no ano de valor igual ou superior a € 50 000. 50% do valor anual.

5 — No caso da alínea f) do artigo 87.º, considera-se como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, quando não existam indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90.º, que permitam à administração tributária fixar rendimento superior, a diferença entre o acréscimo de património ou o consumo evidenciados e os rendimentos declarados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação.
6 — A decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto constante deste artigo é da competência do director de finanças da área do domicílio fiscal do sujeito passivo, sem faculdade de delegação.

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7 — Da decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto constante deste artigo cabe recurso para o tribunal tributário, com efeito suspensivo, a tramitar como processo urgente, não sendo aplicável o procedimento constante dos artigos 91.º e seguintes.
8 — Ao recurso referido no número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, a tramitação prevista no artigo 146.º-B do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
9 — Para a aplicação dos n.os 3 a 4 da tabela, atende-se ao valor médio de mercado, considerando, sempre que exista, o indicado pelas associações dos sectores em causa.»

A alteração resultante do artigo em referência é do seguinte teor:

«Artigo 2.º Aditamento à Lei Geral Tributária

É aditado um n.º 10 ao artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, na redacção actual, com a seguinte redacção:

«Artigo 89.º-A (…)

1 — (…) 2 — (…) 3 — (…) 4 — (…) 5 — (…) 6 — (…) 7 — (…) 8 — (…) 9 — (…) 10 — A decisão de avaliação da matéria colectável com recurso ao método indirecto constante deste artigo, após tornar-se definitiva, deve ser comunicada pelo director de finanças ao Ministério Público e, tratando-se de funcionário ou titular de cargo sob tutela de entidade pública, também à tutela deste para efeitos de averiguações no âmbito da respectiva competência.» 7 — Para bem se compreender o alcance do preceito agora introduzido pelo Decreto n.º 139/X, da Assembleia da República, e ajuizar da sua validade constitucional há que ter presente o sentido prescritivo do artigo 89.º-A, em que o mesmo se insere.
Como da sua epígrafe logo transparece, esta norma dispõe sobre situações tributárias em que «falte a declaração de rendimentos e o contribuinte evidencie as manifestações de fortuna constantes da tabela prevista no n.º 4 ou quando o rendimento líquido declarado mostre uma desproporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendimento padrão resultante da referida tabela».
Em qualquer destas duas hipóteses, não se efectua a avaliação directa, mas a avaliação indirecta da matéria colectável. O artigo 89.º-A concretiza, assim, a alínea d) do artigo 87.º, dando corpo a uma das situações em que está legalmente prevista a realização daquela forma de avaliação.
Verificada a ocorrência de uma das duas previsões constantes do n.º 1, ao contribuinte é dada oportunidade de se pronunciar, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 60.º da LGT. Mas inverte-se o ónus da prova, pois deixa de valer a presunção de veracidade da sua declaração, se a tiver efectuado (artigo 75.º, n.º 2, alínea d)). Sobre ele recairá então o ónus de provar que os rendimentos declarados correspondem à realidade e que é outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas (n.º 3 do artigo 89.º-A), não gerando rendimentos tributáveis em sede de IRS.
Não logrando o sujeito passivo efectuar essa prova, apurar-se-á a matéria colectável pelo método indirecto constante do n.º 4 do artigo 89.º-A, a menos que a aplicação dos critérios do artigo 90.º permita à administração fixar rendimento superior.
A decisão de avaliação da matéria colectável, por este método, é, hoje, da competência do director de finanças da área do domicílio fiscal do sujeito passivo, sem faculdade de delegação (n.º 6 do artigo 89.º-A, na redacção dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro). Da decisão cabe recurso para o tribunal tributário, com efeito suspensivo, a tramitar como processo urgente (n.º 7 do mesmo artigo).
Deste regime resulta que ao interessado são facultadas garantias bastantes de comprovação da situação fiscal real: a decisão de avaliação da matéria colectável com recurso ao método indirecto só é tomada e só se torna definitiva quando ele não consegue contrariar os indícios de que dispõe de rendimentos tributáveis não declarados.

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8 — O n.º 10 que se pretende aditar ao preceito vem impor ao director de finanças que comunique a decisão definitiva ao Ministério Público «e, tratando-se de funcionário ou titular de cargo sob tutela da entidade pública, também à tutela deste para efeitos de averiguações no âmbito da respectiva competência».
É este segmento da norma cuja conformidade à Constituição é questionada, no pedido de fiscalização preventiva, nos seguintes termos:

«Trata-se de uma disposição que suscita fundadas dúvidas de constitucionalidade, em face do artigo 13.º da Lei Fundamental, uma vez que estabelece para os funcionários ou titulares de cargos sob tutela de entidade pública, na sua mera qualidade de contribuintes, um regime distinto do aplicável aos demais cidadãos, sem que pareça existir um fundamento material bastante para tal diferenciação.»

Há que averiguar, pois, se a lei tributária, com a introdução do n.º 10 do artigo 89.º-A, estabelece, para os funcionários ou titulares de cargos sob tutela de entidade pública, na sua mera qualidade de contribuintes, um regime distinto do que vigora para a generalidade dos cidadãos. Em caso afirmativo, cumpre apreciar se essa diferenciação encontra uma justificação razoável, de acordo com um critério materialmente fundado e constitucionalmente relevante.
Ora, no estrito âmbito da relação tributária, o que se constata é uma absoluta paridade de tratamento destes sujeitos em relação aos demais contribuintes. Eles ficam submetidos ao método de avaliação indirecta consagrado no artigo 89.º-A apenas por aplicação da previsão, de âmbito subjectivo universal, constante do n.º 1. O destinatário da norma é «o contribuinte», sem qualquer especificação qualificativa de uma certa categoria de sujeitos. A aplicação do regime está apenas situacionalmente condicionada, pois depende exclusivamente de uma certa conduta do contribuinte (quem quer que ele seja).
Pode concluir-se, assim, que os funcionários públicos ou titulares de cargos sob tutela pública detêm, em face da administração fiscal, em relação aos restantes sujeitos passivos, uma igual posição de direitos e deveres, quanto aos métodos de determinação da matéria colectável. Estes em nada são influenciados pelo seu particular vínculo à Administração Pública.
É a jusante da relação tributária — findo o processo de determinação da matéria colectável, com recurso ao método indirecto, e obtida uma decisão definitiva, administrativa ou judicial, a tal respeito — que efectivamente se introduz agora uma especialidade de regime: no que toca à generalidade dos cidadãos, impõe-se a comunicação da decisão apenas ao Ministério Público, ao passo que, tratando-se de um funcionário público ou titular de cargo sob tutela de entidade pública, a comunicação deve ser endereçada também à tutela. Quanto a esta, esclarece-se que a comunicação é «para efeitos de averiguações no âmbito da respectiva competência».
Afrontará esta diferenciação de regimes o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição da República? Recordemos a situação de base que desencadeia a aplicação do artigo 89.º-A da LGT. A administração tributária detectou indícios de uma infracção fiscal, resultante de o contribuinte evidenciar manifestações de fortuna, sem que tenha apresentado declaração de rendimentos, ou, tendo-o feito, sem que dela constem rendimentos tributáveis proporcionais aos meios de fortuna aparentados. Sendo-lhe dada possibilidade de justificar essa situação, o contribuinte não consegue fazer prova da regularidade da sua conduta fiscal.
Neste quadro situacional, tem cabimento a dúvida sobre a forma de aquisição de património por parte do contribuinte. Nessa medida, é comunicada ao Ministério Público a decisão. Sendo o contribuinte funcionário ou titular de cargo sob tutela de entidade pública, pode legitimamente questionar-se se os bens de fortuna alardeados resultam ou não do exercício abusivo, em proveito pessoal, das funções desempenhadas, ou se ele terá ou não exercitado outras actividades não permitidas ou não autorizadas. Por esse facto, a situação é presente à tutela, para que, quando justificado, esta possa proceder a averiguações que permitam esclarecer se houve ou não, por parte do funcionário em causa, infracção aos seus deveres funcionais.
Fica patente, por força deste enquadramento sistemático, a teleologia subjacente a esta exigência de comunicação. Não se trata de retirar consequências desvantajosas para o sujeito passivo, no plano da sua posição como funcionário ou titular de cargo sob tutela pública, por mero facto da situação fiscal em que ele se colocou. Esta situação apenas dá azo a que se deslinde se, por detrás dela, não haverá irregularidades de conduta no exercício das funções públicas em que o visado está investido. E, nesse outro plano (que não o do relacionamento tributário), a terem lugar consequências sancionatórias, designadamente do foro disciplinar, elas não têm como causa a situação tributária, em si, mas a forma de obtenção dos meios de fortuna que a originaram.
Por isso se colocam as averiguações a fazer, pela entidade de tutela, «no âmbito da respectiva competência». Não uma competência do foro tributário, que não está aqui em causa. Mas a competência resultante da tutela de um certo serviço ou organismo públicos, com um determinado âmbito funcional de actuação. O que pode ser objecto de averiguações são actos do funcionário ou titular de cargo sob tutela pública praticados no exercício das funções que lhe estão cometidas e não o seu relacionamento fiscal com a Administração.
Não se trata de impor ao funcionário público ou titular de cargo sob tutela de entidade pública, pelo facto de o ser, deveres acrescidos de conduta fora do âmbito da sua relação funcional com a Administração, mas de

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averiguar se, nesse âmbito, cumpriu, ou não, os deveres do cargo. A situação patrimonial detectada fiscalmente pode não ser alheia à violação desses deveres. No interesse público, que à Administração, em todas as suas dimensões, cumpre prosseguir, há que proceder a averiguações.
Não se vislumbra, na exigência de comunicação suplementar, para esse efeito, qualquer discriminação dos sujeitos por ela abrangidos, atentatória do princípio da igualdade, na sua dimensão de proibição de arbítrio e de diferenciações injustificadas.
Como se salientou no Acórdão n.º 409/99 deste Tribunal:

«Na verdade, o princípio da igualdade, entendido como limite objectivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a adopção de medidas que estabeleçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente não fundadas ou sem qualquer fundamentação razoável, objectiva e racional.»

Ora, no caso sub judicio, só quem está na situação descrita reúne condições objectivas para se aproveitar do exercício de funções públicas para auferir ganhos pessoais ilícitos. A delimitação do âmbito subjectivo de aplicação da norma, com a correspondente diferenciação de tratamento dos sujeitos abrangidos, encontra cabal justificação na especificidade objectiva da situação contemplada, em cotejo com a dos cidadãos que não desempenham aquele tipo de funções.
9 — De acordo com doutrina credenciada, «as diferenciações de tratamento podem ser legítimas quando: a) se baseiem numa distinção objectiva de situações; b) não se fundamentem em qualquer dos motivos indicados no n.º 2; c) tenham um fim legítimo segundo o ordenamento constitucional positivo; d) se revelem necessárias, adequadas e proporcionadas à satisfação do seu objectivo» (Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, I, 4.ª Edição, Coimbra, 2007, 340).
Todos estes quatro requisitos se encontram aqui preenchidos.
A distinção objectiva de situações não oferece dúvidas, de acordo com o acima exposto.
O mesmo se diga da não ocorrência de qualquer dos motivos ilegítimos de discriminação, enunciados no n.º 2 do artigo 13.º da Constituição da República.
O fim prosseguido com esta medida é também constitucionalmente relevante. Para além do objectivo genérico de combate à corrupção, está em causa a salvaguarda do atendimento exclusivo do interesse e da utilidade públicos por parte da Administração Pública, de acordo com os parâmetros que a Constituição da República lhe traça (artigo 266.º).
Ao prescrever uma comunicação da situação fiscal à tutela, para que esta possa proceder a averiguações, o n.º 10 do artigo 89.º-A da LGT aditado pelo Decreto em apreço mais não visa do que propiciar um controlo da observância deste princípio fundamental de toda a nossa arquitectura constitucional. Subordinados à Constituição e à lei (artigo 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa), os órgãos e agentes administrativos «estão exclusivamente ao serviço do interesse público», como enfaticamente acentua o artigo 269.º, n.º 1. No âmbito da sua competência, a entidade de tutela (aqui entendida em sentido amplo, por forma a abranger todas as formas de direcção e controlo funcionais, independentemente da natureza jurídica do vínculo que liga o visado à Administração Pública) deve assegurar, como imperativo primário, o efectivo cumprimento destas injunções constitucionais. Em conformidade, devem-lhe ser presentes situações anómalas, que um órgão estadual detectou, ainda que a outro nível de funcionamento do aparelho do Estado (mas dentro do exercício do mesmo tipo de poder — o poder executivo do Estado) e que podem ter a ver com irregularidades do serviço pelo qual responde.
Já oferece maior problematicidade a apreciação do respeito pelo princípio da proporcionalidade, nas suas três projecções. Se a observância da adequação não levanta dúvidas legítimas, poderá questionar-se se a medida é necessária e proporcionada, em sentido estrito.
Quanto ao primeiro aspecto, dir-se-á que a comunicação ao Ministério Público, sempre exigível, já assegura suficientemente a prossecução dos fins visados, tornando dispensável a comunicação também ao órgão de tutela.
E é, na verdade, certo que, estando em causa eventuais ilícitos criminais, a intervenção do Ministério Público é ou torna-se sempre necessária, por ele devendo decorrer as averiguações a levar a cabo. Mas, a participação do órgão de tutela pode justificar-se por uma razão diferente: tirar, no plano da organização interna dos serviços, consequências dessa situação e desencadear as medidas que se entendam apropriadas.
Por outro lado, convém não esquecer que poderão ter que ser averiguadas práticas do foro exclusivamente disciplinar. Será o caso, por exemplo, do exercício cumulativo de outras funções remuneradas ou lucrativas, quando proibidas ou não autorizadas.
No que diz respeito ao critério da justa medida, poderá dizer-se que a simples abertura de averiguações é de molde a causar incómodos, sendo certo que pode ficar suficientemente comprovada a total licitude da situação. Mas esse é um ónus que não se afigura excessivo, tendo também em conta que ele resulta da atitude omissiva do próprio sujeito, ao não fornecer à administração tributária prova bastante da fonte dos seus meios de fortuna, nos termos do n.º 3 do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária.

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10 — Em face do exposto, considera-se que existe fundamento material bastante para a exigência de comunicação, pelo director de finanças, da decisão de avaliação da matéria colectável com recurso ao método indirecto também à tutela de funcionário ou titular de cargo sob tutela de entidade pública, para efeitos de averiguações no âmbito da sua competência. A situação em que se encontram estes sujeitos, comparativamente aos restantes contribuintes, diferencia-se sob um ponto de vista que não é arbitrário nem irrazoavelmente discriminatório, pelo que a medida legislativa tem suporte material adequado.
Conclui-se, assim, que não há qualquer violação do princípio da igualdade, mesmo na formulação exigente acima enunciada.

B) Apreciação da constitucionalidade das normas constantes do artigo 3.º do Decreto n.º 139/X, da Assembleia da República

11 — O artigo 3.º do Decreto n.º 139/X altera os artigos 69.º e 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro, nos termos seguintes:

«Artigo 3.º Alteração ao Código de Procedimento e de Processo Tributário

Os artigos 69.º e 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro, na redacção actual, passam a ter a seguinte redacção:

«Artigo 69.º (…)

1 — (…) 2 — O direito de o órgão instrutor ordenar as diligências referidas na alínea e) do número anterior pode compreender, sempre que fundamentadamente se justifique face aos factos alegados pelo reclamante e independentemente do seu consentimento, o acesso à informação e documentos bancários relativos à situação tributária objecto de reclamação.
3 — Para efeitos do número anterior, o órgão instrutor procede à notificação das instituições de crédito, sociedades financeiras e demais entidades, instruída com a decisão de acesso à informação e documentos bancários, as quais devem facultar os elementos solicitados no prazo de dez dias úteis.

«Artigo 110.º (…)

1 — (…) 2 — A prova adicional a que se refere o número anterior pode compreender, sempre que se justifique face aos factos alegados pelo impugnante e independentemente do seu consentimento, o acesso à informação e documentos bancários relativos à situação tributária objecto da impugnação.
3 — Para efeitos do disposto no número anterior as instituições de crédito, sociedades financeiras e demais entidades devem facultar os elementos no prazo de 10 dias úteis, sendo o prazo de 90 dias do n.º 1 ampliado nessa medida.
4 — (anterior n.º 2) 5 — (anterior n.º 3) 6 — (anterior n.º 4) 7 — (anterior n.º 5) 8 — (anterior n.º 6) 9 — (anterior n.º 7)»

A redacção actual dos citados artigos 69.º e 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário é a seguinte:

«Artigo 69.º Regras fundamentais

São regras fundamentais do procedimento de reclamação graciosa:

a) Simplicidade de termos e brevidade das resoluções; b) Dispensa de formalidades essenciais; c) Inexistência do caso decidido ou resolvido;

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d) Isenção de custas; e) Limitação dos meios probatórios à forma documental e aos elementos oficiais de que os serviços disponham, sem prejuízo do direito de o órgão instrutor ordenar outras diligências complementares manifestamente indispensáveis à descoberta da verdade material; f) Inexistência do efeito suspensivo, salvo quando for prestada garantia adequada nos termos do presente Código, a requerimento do contribuinte a apresentar com a petição, no prazo de 10 dias após a notificação para o efeito pelo órgão periférico local competente.

Artigo 110.º Contestação

1 — Recebida a petição, o juiz ordena a notificação do representante da Fazenda Pública para, no prazo de 90 dias, contestar e solicitar a produção de prova adicional, sem prejuízo do disposto na parte final do n.º 5 do artigo 112.º.
2 — O juiz pode convidar o impugnante a suprir, no prazo que designar, qualquer deficiência ou irregularidade.
3 — O representante da Fazenda Pública deve solicitar, no prazo de três dias, o processo administrativo ao órgão periférico local da situação dos bens ou da liquidação, mas esse expediente não interfere no prazo da contestação previsto no n.º 1.
4 — Com a contestação, o representante da Fazenda Pública remete ao tribunal, para todos os efeitos legais, o processo administrativo que lhe tenha sido enviado pelos serviços.
5 — O juiz pode, a todo o tempo, ordenar ao serviço periférico local a remessa do processo administrativo, mesmo na falta de contestação do representante da Fazenda Pública.
6 — A falta de contestação não representa a confissão dos factos articulados pelo impugnante.
7 — O juiz aprecia livremente a falta de contestação especificada dos factos.» 12 — Vem pedida a apreciação da conformidade das normas constantes daquele artigo 3.º com o disposto nos artigos 2.º, 18.º, 20.º, 26.º, n.º 1, 52.º, 266.º e 268.º da Constituição da República Portuguesa.
O pedido convoca, pois, como parâmetros constitucionais de apreciação, os seguintes:

i) Direito à reserva da intimidade da vida privada (artigo 26.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa); ii) Direito à tutela jurisdicional efectiva, uma das dimensões do conteúdo do artigo 20.º da Constituição, entendido como corolário do princípio do Estado de direito, consagrado no artigo 2.º; iii) Direito de reclamação (artigo 52.º da Constituição da República Portuguesa) e direito de os administrados impugnarem judicialmente quaisquer actos administrativos que os lesem (artigo 268.º, n.º 4, da Lei Fundamental); iv) Princípio da proporcionalidade (artigos 2.º e 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa); v) Princípio da boa fé da Administração, contido no artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa.

13 — O artigo 3.º do Decreto sob escrutínio altera os artigos 69.º e 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário no sentido de permitir o levantamento do sigilo bancário em caso, respectivamente, de reclamação graciosa ou de impugnação judicial pelos contribuintes, desde que fundadamente tal se justifique, nos termos que a seguir melhor se explicitará.
Para sua apreciação, impõe-se começar por uma breve análise do actual regime de acesso, pela administração fiscal, à informação protegida por sigilo bancário.
O sigilo bancário encontra-se contemplado, como dever de segredo profissional, nos artigos 78.º a 84.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de Dezembro.
Prescreve o artigo 84.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras que a violação do dever de sigilo bancário é punível nos termos do Código Penal (artigo 195.º), sem prejuízo de outras sanções aplicáveis.
A primeira excepção ao dever de observância do sigilo bancário é a dispensa voluntária desse dever mediante autorização do cliente transmitida à instituição bancária (artigo 79.º, n.º 1 do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras). Para além disso, a lei prevê um conjunto de situações de dispensa legal do dever de sigilo e até de imposição do dever legal de informar.
Verifica-se que, ao longo do tempo, houve uma evolução extensiva do âmbito das derrogações ao sigilo bancário: primeiro, em benefício do Banco de Portugal e da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, enquanto autoridades de supervisão (Decreto-Lei n.º 298/92, que estabeleceu o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras); mais tarde, em prol da administração tributária, embora circunscrito ao necessário para preparar o relatório de inspecção tributária, quando pedida por iniciativa do contribuinte

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(Decreto-Lei n.º 6/99, de 8 de Janeiro); depois, em benefício das autoridades judiciárias, no âmbito do combate ao branqueamento de capitais (Decreto-Lei n.º 313/93, de 15 de Setembro), ao tráfico e consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas (Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro), à criminalidade organizada e à criminalidade económica (Lei n.º 5/2002, de 11 de Janeiro).
Com as alterações decorrentes da Lei n.º 30-G/2000, foram introduzidas novas possibilidades de acesso a informações protegidas pelo segredo bancário, por determinação directa da administração tributária.
Concretamente, o artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária (com alterações, por último, pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro), admite as seguintes derrogações ao sigilo bancário:

a) Acesso sem prévia autorização judicial e sem solicitar previamente a colaboração do contribuinte, quando existam: i) indícios da prática de crime em matéria tributária; ii) factos concretamente identificados, indiciadores da falta de veracidade do declarado (n.º 1 do artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária); b) Acesso sem prévia autorização judicial, após recusa de exibição ou de autorização para consulta e após audiência prévia do contribuinte, nos casos tipificados nas alíneas dos n.os 2 e 3 do artigo 63.º-B (artigo 63.ºB, n.os 2, 3 e 5, da Lei Geral Tributária); c) Acesso com prévia autorização judicial no caso de informação bancária relativa a familiares ou terceiros que se encontrem numa relação especial com o contribuinte (n.º 8 do artigo 63.º-B).

Nos casos acima referidos nas alíneas a) e b), estabelece-se o acesso directo da administração à informação (isto é, sem dependência de autorização judicial prévia), mas apenas para as situações aí expressamente enumeradas, mediante o preenchimento de determinados requisitos e assegurando algumas garantias ao contribuinte (vide Paula Barbosa, Do valor do sigilo — o sigilo bancário, sua evolução, limites: em especial o sigilo bancário no domínio fiscal — a reforma fiscal», in RFDUL, 2005, volume XLVI, n.º 2, 1265).
Essas garantias e requisitos são os seguintes:

— Necessidade de fundamentação da decisão, «com expressa menção dos motivos concretos que as justificam» — n.º 4 do artigo 63.º-B; — Audiência prévia do contribuinte visado (com excepção dos casos previstos no n.º 1 do artigo 63.º-B em que se permite um acesso directo e imediato) — n.º 5 do artigo 63.º-B; — Competência exclusiva do director-geral dos Impostos ou do director-geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo ou dos seus substitutos legais para tomarem este tipo de decisão (sem possibilidade de delegação) — n.º 4 do artigo 63.º-B; — Possibilidade de recurso judicial da decisão, através do meio processual urgente previsto no artigo 146.º-B do Código de Procedimento e de Processo Tributário que, embora só tenha efeito suspensivo nos casos do n.º 3 do artigo 63.º-B, conduz, nos casos de deferimento do recurso, à impossibilidade de utilização dos elementos de prova entretanto obtidos em desfavor do contribuinte — n.os 5 e 6 do artigo 63.º-B.

14 — As normas constantes do artigo 3.º do Decreto sob escrutínio vêm estabelecer ex novo que a administração tributária pode suscitar a derrogação do dever de sigilo bancário, no âmbito do procedimento administrativo de apreciação de reclamação graciosa, assim como no âmbito do processo judicial de impugnação de acto tributário.
Vejamos em que termos, num caso e noutro.
No procedimento administrativo de reclamação graciosa, que se caracteriza por ser um procedimento simples e breve (artigo 69.º, alínea a), na redacção actual), o órgão instrutor pode ordenar «outras diligências complementares manifestamente indispensáveis à descoberta da verdade material» (alínea e) do mesmo artigo).
Note-se que a reclamação graciosa desencadeada pelo contribuinte destina-se a obter uma reanálise de uma certa situação pela administração fiscal e é uma via normal de resolução de um litígio entre esta e o sujeito passivo do imposto. Ou seja, através deste procedimento, o contribuinte pretende obter a anulação (extrajudicial) de actos tributários, maxime, do acto de liquidação do imposto (artigo 68.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário), com fundamento, nomeadamente, na errónea qualificação e quantificação dos rendimentos, lucros, valores patrimoniais e outros factos tributários; na incompetência; na ausência ou vício da fundamentação legalmente exigida; na preterição de outras formalidades legais (artigo 99.º, aplicável por força do artigo 70.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário).
Além disso, há casos em que impugnação judicial é obrigatoriamente precedida de reclamação graciosa. É o que se passa, designadamente, nas situações previstas nos artigos 131.º, n.º 1, 132.º, n.º 3, 133.º, n.º 2, e 134.º n.os 3 e 7, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, e no artigo 86.º, n.os 2 e 5, da Lei Geral Tributária.
O acesso à informação bancária seria permitido nos termos que constam do n.º 1, alínea e), e do n.º 2 do artigo 69.º, na redacção do artigo 3.º do Decreto n.º 139/X:

i) Sem prévio consentimento do contribuinte e sem prévia autorização judicial;

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ii) Desde que «fundamentadamente se justifique face aos factos alegados pelo reclamante» e se apresente como uma diligência complementar manifestamente indispensável à descoberta da verdade material; iii) Desde que a informação e documentos bancários cujo acesso se pretende sejam relativos à «situação tributária objecto de reclamação».

Nos termos do disposto no artigo 73.º, n.os 1 e 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, a competência para a instrução da reclamação graciosa, incluindo a decisão de ordenar o acesso à informação e documentos bancários relativos à situação tributária objecto de reclamação, cabe, em princípio, ao serviço periférico local, ou seja, em regra, ao serviço de finanças da área do domicílio do contribuinte, da situação dos bens ou da liquidação.
A situação descrita aplica-se mutatis mutandis ao caso de levantamento do sigilo bancário pela administração fiscal em sede de processo judicial de impugnação.
No processo de impugnação judicial — que visa a eliminação (anulação, declaração de nulidade ou de inexistência) de actos tributários, com os fundamentos acima referidos (cfr. artigo 99.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário) — a Fazenda Pública pode, em sede de contestação, solicitar a produção de prova adicional (n.º 1 do artigo 110.º).
A nova redacção do n.º 2 do artigo 110.º vem permitir que essa prova adicional compreenda, «sempre que se justifique face aos factos alegados pelo impugnante e independentemente do seu consentimento, o acesso à informação e documentos bancários relativos à situação tributária objecto da impugnação».
À semelhança do que dispõe o novo n.º 3 do artigo 69.º, o n.º 3 do artigo 110.º (na redacção do artigo 3.º do Decreto n.º 139/X) esclarece que, para efeitos do acesso a essa informação «as instituições de crédito, sociedades financeiras e demais entidades devem facultar os elementos no prazo de 10 dias úteis», sendo o prazo para contestar ampliado nessa medida.
Em suma, tanto na situação de reclamação graciosa como na de impugnação judicial de actos tributários, prevê-se a possibilidade de a administração fiscal aceder directamente, isto é, sem o consentimento prévio do interessado e sem necessidade de autorização judicial, a informação coberta pelo sigilo bancário, desde que esse acesso se mostre justificado perante os factos alegados pelo reclamante/impugnante e desde que a informação bancária esteja relacionada com a situação tributária objecto da reclamação/impugnação.

15 — Descrito o regime vigente e apontadas as alterações contidas no artigo 3.º do Decreto n.º 139/X, é altura de estabelecer o confronto entre ambos.
As novas normas apresentam diferenças assinaláveis relativamente ao regime do artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária, acima descrito.
A primeira e mais saliente inovação prende-se com o facto de a derrogação ser desencadeada por uma iniciativa do contribuinte, em defesa dos seus direitos. Na verdade, prevê-se o acesso à informação bancária na sequência de um procedimento administrativo de segundo grau iniciado pelo contribuinte (reclamação) ou na sequência de impugnação judicial do acto tributário. Em qualquer caso, a actividade da administração e os poderes inquisitórios que lhe compete exercer estarão conformados pelo objecto da reclamação ou da impugnação, decorrentes do pedido formulado (neste sentido, v., em anotação ao artigo 58.º da Lei Geral Tributária, Leite de Campos/Benjamim Rodrigues/Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária, comentada e anotada, 3.ª edição, 2003, Lisboa, 269).
Em segundo lugar, na redacção dada pelo Decreto n.º 139/X aos n.os 2 e 3 do artigo 69.º e aos n.os 2 e 3 do artigo 110.º, não se prevê a audiência prévia do contribuinte, nem se prevê que a informação bancária seja solicitada, em primeiro lugar, ao seu titular.
Esta conclusão resulta, desde logo, da inexistência de previsão expressa dessa audiência prévia, sendo de salientar que a primeira versão da proposta de lei n.º 85/X, que esteve na génese do Decreto n.º 139/X, propunha uma redacção diferente do artigo 69.º da Lei Geral Tributária, que a seguir se transcreve:

«3 — Para efeitos do número anterior, o órgão instrutor solicita ao reclamante, por simples via postal, para no prazo de 10 dias úteis fornecer a informação e os documentos bancários relevantes para a apreciação da reclamação.
4 — Caso a informação solicitada não seja fornecida no prazo indicado, ou seja considerada insuficiente, o órgão instrutor procede à notificação das instituições de crédito, sociedades financeiras e demais entidades, instruída com a decisão de acesso à informação e documentos bancários, as quais devem facultar os elementos solicitados no prazo de 10 dias úteis.» (v. proposta de lei n.º 85/X publicada no Diário da Assembleia da República, II Série A, de 29 de Julho de 2006).

Esta solicitação prévia ao contribuinte foi abandonada na redacção final que veio a ser aprovada e que consta do Decreto em apreço, da qual agora resulta que, uma vez tomada a decisão de aceder à informação, a administração procede à notificação das instituições bancárias, que devem facultar os elementos no prazo de 10 dias.

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Por outro lado, a fase do procedimento de reclamação em que se insere o problema do acesso à informação bancária é a fase da instrução, pelo que não é ainda aplicável o princípio geral de audição do interessado consagrado no artigo 60.º da Lei Geral Tributária. Na verdade, só após a conclusão da instrução, e tendo a administração formado um projecto de decisão (decisão essa que, em certos casos, nem é da competência do órgão que instruiu a reclamação — cfr. o artigo 73.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário), será o reclamante notificado para exercer o seu direito de audição previsto no artigo 60.º da Lei Geral Tributária.
Não há um dever geral de prévia audição do reclamante quanto às diligências de prova que a administração considera necessárias para a instrução da reclamação. Por isso mesmo é que o artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária, nos casos em que a quis assegurar, veio dizê-lo expressamente (n.º 5). Ao invés, a nova previsão é totalmente omissa quanto a essa garantia.
A inexistência de uma previsão que contemple a audiência do interessado antes da decisão de aceder à informação bancária é ainda mais óbvia quando esteja em causa a impugnação judicial do acto tributário, pois aqui a administração tributária tomará essa decisão em sede de contestação do processo, pela Fazenda Pública. Ora, como expressamente resulta do disposto no novo n.º 3 do artigo 110.º, uma vez tomada a decisão, a administração solicita as informações às instituições de crédito, que as devem facultar no prazo de 10 dias, sendo do seu interesse comunicar tais diligências ao tribunal, para efeitos de obter a ampliação do prazo para a contestação.
Em terceiro lugar, e também ao contrário do que expressamente resulta do n.º 5 do artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária, não se prevê especificamente a possibilidade de recurso judicial da decisão de aceder à informação bancária tomada no âmbito do artigo 69.º ou do artigo 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Essa omissão não pode evidentemente significar a inimpugnabilidade judicial daquela decisão da administração, pois, além do mais, tal solução brigaria com o direito de acesso à justiça administrativa que o artigo 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, consagra, como concretização da garantia de acesso aos tribunais (artigo 20.º).
Na falta de indicação normativa específica, o intérprete sente-se levado a lançar mão do recurso urgente previsto no artigo 146.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário. Na verdade, no seu n.º 1, esta norma refere genericamente as «situações legalmente previstas de acesso da administração tributária à informação bancária para fins fiscais», pelo que abrange formalmente as hipóteses em apreço.
Simplesmente, não se vislumbra como será possível articular o procedimento de reclamação e, principalmente, o processo de impugnação judicial com um processo judicial autónomo de apreciação da legalidade da decisão de acesso à informação bancária, sem norma expressa que, nomeadamente, fixe os efeitos desse recurso judicial. Estando a decorrer uma impugnação judicial, seria inusitado e verdadeiramente anómalo abrir um novo processo para decisão sobre um meio de prova a utilizar naquela.
Parece, por isso, de concluir que o meio judicial urgente de impugnação da decisão de acesso à informação bancária, a que eventualmente se poderia recorrer, dificilmente poderá ser exercitado, muito menos em tempo útil, nos casos aqui em apreço.
Em quarto lugar, não pode deixar de se assinalar a diferença entre os órgãos competentes para decidir a necessidade de acesso à informação bancária. Enquanto que, no artigo 63.º-B, essa competência é reservada aos directores-gerais ou seus substitutos legais, no caso da reclamação graciosa, a competência para decisão idêntica é atribuída ao órgão periférico local (em regra, serviço de finanças), a quem incumbe a instrução da reclamação. A atribuição de competência a órgãos superiores da administração fiscal oferece, à partida, maiores garantias, do ponto de vista competencial, e diminui fortemente o risco de proliferação de decisões desencontradas, quanto à interpretação dos pressupostos relevantes.
Estas assinaláveis diferenças de regime não podem deixar de ser ponderadas na avaliação da conformidade constitucional das medidas em apreço.
É essa conformidade que vamos passar a analisar, começando pela afectação, ou não, do direito à reserva da vida privada.

16 — O segredo bancário não esperou pela moderna consagração dos direitos de personalidade e dos direitos fundamentais para vigorar na prática bancária. Pode dizer-se que desde sempre esteve institucionalmente presente na actividade deste sector económico, como factor e garantia do funcionamento eficiente do sistema.
Mas é incontroverso que a fundamentação jurídica desse regime ganhou um novo respaldo com a sua recondução, por largos sectores doutrinais e jurisprudenciais, à tutela da privacidade. Com isso, o instituto rompeu as fronteiras da relação contratual banqueiro-cliente, para assumir uma dimensão e implicações jurídico-constitucionais.
A confirmar-se o acerto deste enquadramento, o direito ao sigilo fica dotado de uma reforçada força de resistência a intrusões no âmbito protegido. De facto, se o direito fundamental à reserva da intimidade da vida privada (artigo 26.º, n.º 1, da Constituição da República) puder ser visto como integrando o direito ao segredo sobre os dados bancários respeitantes ao sujeito titular, a este direito será aplicável o regime dos direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrado.

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Esse regime contém, como nota saliente, a vinculação das entidades públicas e privadas aos preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias (artigo 18.º, n.º 1, da Constituição da República), bem como a salvaguarda de certos limites a respeitar nas intervenções que os restrinjam (n.os 2 e 3 do mesmo artigo).
Deste modo, a questão de saber se o segredo bancário recai no âmbito de protecção do direito à reserva sobre a intimidade da vida privada é uma verdadeira questão prévia, cuja solução marca decisivamente a oponibilidade à Administração Pública, e seus termos, da proibição de acesso aos dados bancários dos particulares.
É pela resposta a essa questão que começaremos o nosso percurso argumentativo.

16.1 — Das três manifestações em que se fracciona o conteúdo do direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar — direito à solidão, direito ao anonimato, e autodeterminação informativa — é esta última a sua expressão cimeira e mais relevante, e aquela que particularmente nos interessa quando está em causa o estatuto constitucional do sigilo bancário.
Por autodeterminação informativa poderá entender-se o direito de subtrair ao conhecimento público factos e comportamentos reveladores do modo de ser do sujeito na condução da sua vida privada. Compete a cada um decidir livremente quando e de que modo pode ser captada e posta a circular informação respeitante à sua vida privada e familiar.
Mas a determinação do domínio de reserva do sujeito, como objecto desse direito, não é tarefa fácil, dada a dificuldade de delimitação precisa do que seja a «vida privada».
Indicativamente poderá dizer-se que o conceito cobre a esfera de vida de cada um que deve ser resguardada do «público», como condição de plena realização da identidade própria e de salvaguarda da integridade e da dignidade pessoais.
Independentemente da posição perfilhada quanto a certas teorias que — em termos, aliás, não unívocos — diferenciam várias esferas concêntricas da vida privada, adere-se à posição de que, quer no artigo 26.º, n.º 1, da Constituição da República, quer no artigo 80.º do Código Civil, se consagra um direito genérico à reserva, cobrindo todo o âmbito da vida privada. A fórmula «reserva sobre a intimidade da vida privada», em ambas as normas utilizadas, não pode, pois, ser interpretada no sentido de circunscrever o domínio de protecção a uma certa parte da vida privada — a vida íntima, como núcleo central da vida privada.
Um pouco redundante, aquela fórmula normativa terá querido denotar o interesse protegido, demarcando-o do interesse coberto pela liberdade de condução de vida, e em particular da vida privada, de acordo com as opções próprias (nesse sentido, P. Mota Pinto, O direito à reserva sobre a intimidade da vida privada, Boletim da Faculdade de Direito, LXIX (1993), 479 s., 530-531, referenciando T. Auletta). Sendo ambos os direitos serventuários de valores de liberdade, e estando eles unificados no muito genérico conceito norte-americano de privacy, são entre nós tratados distintamente — o livre desenvolvimento da personalidade (artigo 26.º, n.º 1, da Constituição da República e artigo 70.º do Código Civil), como liberdade comportamental, de livre conformação e expressão da personalidade, e o direito à reserva, facultando o livre controlo da informação sobre aquilo que, em decorrência dessa liberdade de conduta, cada um faz na sua esfera privada (artigo 26.º, n.º 1, da Constituição da República e artigo 80.º do Código Civil).
No plano constitucional, esta interpretação no sentido de que toda a vida privada é objecto de reserva obtém um claro apoio no disposto no artigo 12.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem. Aí se proclama que «ninguém sofrerá intromissões na sua vida privada (…)», sem qualquer especificação restritiva.
Ora, nos termos do n.º 2 do artigo 16.º da Constituição da República, «os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem».
Sem embargo do que fica dito, e sem prejuízo da unidade do valor co-envolvido no dever de reserva enquanto autodeterminação informativa, reconhece-se, todavia, que é possível e justificado estabelecer graduações diferenciadoras entre zonas da vida privada, consoante a sua maior ou menor ligação aos atributos constitutivos da personalidade. Ainda que se deva evitar as sectorizações rigidamente tipificadoras, é forçoso admitir que as exigências de inviolabilidade da esfera privada não se fazem sentir de forma «plana» e uniforme no interior da área de tutela, o que tem reflexos de regime, sobretudo no que diz respeito ao apuramento da gravidade da lesão e dos seus efeitos danosos, para fixação de montantes indemnizatórios e para a realização adequada da tarefa de ponderação com outros interesses constitucionalmente protegidos.
Sendo este o âmbito objectivo do direito à reserva sobre a intimidade da vida privada, é altura de perguntar: cabe nele o sigilo bancário?

16.2 — A integração no âmbito normativo de protecção do direito à reserva da intimidade da vida privada dos dados relativos à situação económica de uma pessoa em poder de uma instituição bancária é de molde a provocar alguma perplexidade, se tivermos em conta a natureza e o sentido tutelador dos direitos da personalidade, que, neste ponto, constituem a matriz do imperativo constitucional. Poderá, na verdade, pensar-se que, estando em causa a protecção dos atributos da pessoa, dos bens constitutivos e expressivos

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da sua personalidade, só podem ser abrangidas situações subjectivas existenciais, sendo de rejeitar, à partida, a inclusão de aspectos patrimoniais, respeitantes ao ter da pessoa.
A isso há a contrapor que não é possível estabelecer, sobretudo nas sociedades dos nossos dias, uma separação estanque entre a esfera pessoal e a patrimonial. A posição económica de cada um não deixa de ser uma projecção externa da pessoa, constituindo um dado individualizador da sua identidade. E o sujeito pode ter, também no plano pessoal, um interesse tutelável, e tutelável constitucionalmente, a que, não só o montante e o conteúdo do seu património, mas também certas vicissitudes, favoráveis e desfavoráveis, que ele pode experimentar (saída de um prémio de um jogo, recebimento de uma herança, encargos com uma determinada opção de vida, por exemplo) sejam mantidos fora do conhecimento dos outros.
Não custa, assim, admitir «uma esfera privada de ordem económica, também merecedora de tutela» (Alberto Luís, Direito bancário, Coimbra, 1985, 88), como componente da mais geral esfera da privacidade.
No caso particular dos dados e documentos na posse de instituições bancárias, concernentes às suas relações com os clientes, há um argumento suplementar, que cremos decisivo, nesse sentido. Mormente no que respeita às operações passivas de movimentação da conta, não é apenas, nem é tanto, o conhecimento da situação patrimonial, em si mesma, que pode ser intrusivo da privacidade. O que sobremaneira importa é o facto de esse conhecimento, numa época em que se vulgarizou e massificou a realização de transacções através dos movimentos em conta, designadamente pela utilização de cartões de crédito e de débito — o chamado «dinheiro de plástico» — propiciar um retrato fiel e acabado da forma de condução de vida, na esfera privada, do respectivo titular.
É sobretudo como instrumento de garantia de dados referentes à vida pessoal, de natureza não patrimonial, que, de outra forma, seriam indirectamente revelados, que o sigilo bancário deve ser constitucionalmente tutelado.
Na verdade, como se disse no processo decidido pelo Tribunal Constitucional espanhol, pelo Acórdão n.º 110/1984, de 26 de Novembro, «uma conta-corrente pode constituir ‘a biografia pessoal em números’ do contribuinte» (apud Pisón Cavero, El derecho a la intimidade en la jurisprudencia constitucional, Madrid, 1993, 179). Através da análise do destino das importâncias pagas na aquisição de bens ou serviços, pode facilmente ter-se uma percepção clara das escolhas e do estilo de vida do titular da conta, dos seus gostos e propensões, numa palavra, do seu perfil concreto enquanto ser humano. O conhecimento de dados económicos permite, afinal, a invasão da esfera pessoal do sujeito, com revelação de facetas da sua individualidade própria — daquilo que ele é e não apenas daquilo que ele tem. Conhecimento que, por sua vez, e para além de tudo o mais, é susceptível de exploração económica (veja-se o florescente mercado de informações sobre dados dos consumidores), propiciando afinadas estratégias de marketing, frequentemente violadoras do direito à reserva, agora na sua veste de direito a estar só.
Conclui-se, assim, que o bem protegido pelo sigilo bancário cabe no âmbito de protecção do direito à reserva da vida privada consagrado no artigo 26.º, n.º 1, da Constituição da República.
Essa inclusão só é problemática em relação às pessoas colectivas, muito particularmente as sociedades comerciais, pelo facto de não valerem (ou, pelo menos, de não valerem de igual modo), em relação a elas, as considerações fundamentadoras acima aduzidas, que se apoiam na possibilidade de acesso à esfera mais pessoal.

16.3 — Mas uma coisa é o âmbito de protecção, prima facie, de uma previsão de um direito fundamental, outra é o seu âmbito de garantia efectiva (cfr. Gomes Canotilho, Dogmática de direitos fundamentais e direito privado, in Ingo Sarlet (org.), Constituição, direitos fundamentais e direito privado, 2.ª edição, Porto Alegre, 2006, 341 s., esp. 346 s.).
Este só se recorta, neste caso, em resultado de um balanceamento entre os interesses e valores ligados à tutela da privacidade e os interesses, também constitucionalmente protegidos, com eles conflituantes.
Nessa ponderação, e na lição de Canaris (a propósito dos imperativos constitucionais de protecção, mas com considerações transponíveis, ao que julgamos, para uma metodologia geral da ponderação), há que levar em conta não só a relação hierárquica abstracta entre os bens em conflito, mas também «o peso concreto dos bens e interesses envolvidos» — cfr. Direitos fundamentais e direito privado, trad. port. de Ingo Sarlet e P.
Mota Pinto, Coimbra, 2003, 112 s. E, nesta ponderação contextualizada de interesses, não pode deixar de se dar relevo decisivo ao «nível do direito fundamental afectado» e ao grau da sua lesão.
Ora, o segredo bancário localiza-se no âmbito da vida de relação, à partida fora da esfera mais estrita da vida pessoal, a que requer maior intensidade de tutela. Ainda que compreendido no âmbito de protecção, ocupa uma zona de periferia, mais complacente com restrições advindas da necessidade de acolhimento de princípios e valores contrastantes.
Posição esta defendida no recente Acórdão n.º 42/2007 deste Tribunal, onde expressamente se afirma: «O segredo bancário não é abrangido pela tutela constitucional de reserva da vida privada nos mesmos termos de outras áreas da vida pessoal» A susceptibilidade de «restrições (ao segredo bancário) impostas pela necessidade de salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos» foi, também, amplamente admitida pelo Acórdão n.º 278/95 deste Tribunal, logo após se ter considerado o sigilo bancário integrado no âmbito de protecção do direito à reserva da intimidade da vida privada.

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Por outro lado, quando a quebra do sigilo bancário promana da administração fiscal, não pode olvidar-se que ela não implica a abertura desses dados ao conhecimento geral, não tendo o impacto de abrir a porta a uma devassa pública. Na verdade, os conhecimentos obtidos pelo exercício da função tributária estão sujeitos ao dever de confidencialidade (artigo 64.º da Lei Geral Tributária) e a sua violação está tipificada de forma mais gravosa, face ao crime de violação do sigilo profissional (cfr. o artigo 91.º, n.º 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias e o artigo 195.º do Código Penal, por um lado, e artigo 383.º deste Código e os n.os 2 e 3 daquele artigo 91.º, por outro).
Nessa medida, o levantamento do sigilo bancário mantém a reserva quanto aos dados que dele são objecto, através da sua cobertura pelo sigilo fiscal, o que permitiu que se afirmasse que «a tutela dos legítimos interesses dos contribuintes que seria propiciada pelo sigilo bancário continua a estar garantida ainda que noutra sede e com menos condições» (Benjamim Rodrigues, O sigilo bancário e o sigilo fiscal, in AAVV., Sigilo bancário, Lisboa, 1997, 103 s., 112).
Só não é inteiramente assim porque o conteúdo do direito à reserva, contrariamente ao que o termo inculca, abrange não só a não difusão de dados, mas também a própria tomada de conhecimento. O acesso, em si mesmo e para prevenir a posterior divulgação, também está protegido (cfr., por todos, Paulo Mota Pinto, A protecção da vida privada e a Constituição, Boletim da Faculdade de Direito, LXXVI (2000), 153 s., 169).
Ora, com a derrogação do sigilo bancário por parte da administração fiscal, verifica-se o alargamento do círculo de pessoas que tomam conhecimento dos dados protegidos (ainda que se trate de pessoas obrigadas a guardar segredo), com «o inerente risco de este mais facilmente poder vir a ser violado». Mas, não obstante, é absolutamente certo que, em caso de levantamento do sigilo bancário pela administração fiscal, o sigilo fiscal «deixa salvaguardado o conteúdo essencial tanto do direito à privacidade da vida privada e familiar dos contribuintes como da dinâmica da actividade bancária» (Casalta Nabais, O dever fundamental de pagar impostos, Coimbra, 1997, 619; para uma qualificação do sigilo fiscal como «instrumento jurídico privilegiado» de garantia do direito à reserva da vida privada e familiar, cfr. o Acórdão n.º 256/2002 do Tribunal Constitucional).
Constata-se, pois, que, não só o sigilo bancário cobre uma zona de segredo francamente susceptível de limitações, como a sua quebra por iniciativa da administração tributária representa uma lesão diminuta do bem protegido.

16.4 — Se é assim do lado do direito à reserva, o que é que pode dizer-se do lado dos interesses ligados à administração fiscal que poderão justificar o seu sacrifício? Leia-se o que, neste contexto de confronto com o sigilo bancário, se escreveu sobre os fins do sistema fiscal, no relatório apresentado, em 1996, pela Comissão para o Desenvolvimento da Reforma Fiscal (Comissão Silva Lopes):

«Trata-se de prosseguir, não um, mas vários objectivos de interesse público, tantos quantas são as funções reconhecidas ao imposto: a da obtenção das receitas necessárias à efectivação das despesas públicas, de acordo com a qual cada indivíduo deverá pagar segundo a sua capacidade contributiva; a da regulação da actividade económica, sempre que o imposto seja utilizado como instrumento de políticas económicas conjunturais; e, por último, a de repartição da carga fiscal em harmonia com os princípios da equidade horizontal e da progressividade. Sucede que a adequada distribuição dos encargos tributários, tendo em vista a consecução de um ou de todos aqueles objectivos de interesse público, só pode alcançarse através da atribuição à Administração Fiscal de meios efectivos de controlo. Não será aceitável que o direito à privacidade tenha de ser protegido nos casos em que esteja a ser invocado para que algumas pessoas singulares ou colectivas possam escapar às obrigações fiscais cumpridas por outros contribuintes em situação semelhante» (apud Paula Barbosa, ob. cit., 1255, n. 43).

Estamos, pois, perante um relevantíssimo interesse público e, o que é mais, perante um interesse público a satisfazer de acordo com parâmetros constitucionalmente fixados. Em face da exigência primária de obtenção de receitas para suporte das despesas públicas e a realização dos fins do Estado social de direito, aos cidadãos é imposto, como encargo de cidadania, «o dever fundamental de pagar impostos». O modo de cumprimento desse dever e a estruturação do sistema fiscal que o enquadra estão submetidos a princípios, de tributação segundo a capacidade contributiva e de distribuição equitativa da carga fiscal, que visam, em último termo, assegurar a justiça fiscal.
No âmbito da tributação do rendimento, aceita-se hoje pacificamente, nas «sociedades bem ordenadas», que o modo eficiente de realizar estes objectivos assenta em que a matéria colectável seja determinada com base na declaração tributária do contribuinte (nas sociedades comerciais, com base no lucro apurado através da sua contabilidade).
Ora, na lógica do sistema de uma Administração fiscal de cunho predominantemente fiscalizador e de controlo, e na prossecução dos valores de justiça e equidade que informam a constituição fiscal, essa posição do contribuinte não pode deixar de ter como contrapartida o seu dever de cooperação, traduzido na apresentação, nos prazos fixados, da declaração de rendimentos e na sujeição do seu conteúdo à verdade

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material (cfr. Saldanha Sanches, Segredo bancário, segredo fiscal: uma perspectiva funcional, Fiscalidade, 21 (2005), 33 s., 37-40).
O princípio da tributação segundo a declaração do contribuinte tem, pois, como natural corolário, a possibilidade de controlo por parte da administração, sob pena de resultarem irremediavelmente frustrados aqueles objectivos e valores que moldam a «estrutura básica» (para empregarmos um conceito de John Rawls) da sociedade politicamente organizada.
A esse controlo não podem subtrair-se, de plano e sem mais, os elementos sobre o património e rendimentos do contribuinte em poder das instituições bancárias com quem ele está em relação, em particular os saldos e movimentações referentes a depósitos bancários. Atendendo ao peso relativo dos interesses aqui ligados à tutela da privacidade e ao diminuto grau da sua afectação, em concreto, pelo levantamento do sigilo bancário, por um lado, e à intensidade da exigência de efectivação da justiça fiscal, por outro, pode concluir-se que, em certas condições, é constitucionalmente legítima a restrição, com este fundamento, do direito à privacidade.
O princípio da distribuição equitativa da carga fiscal capacita a administração para realizar uma investigação tributária que não pode ser limitada, em absoluto, pelo sigilo bancário. Mesmo num sistema, como o nosso, fortemente garantístico, em termos de direito comparado, não existe base constitucional para que os dados que, em princípio, estão cobertos pelo segredo constituam uma espécie de «reduto inacessível» ao poder inspectivo da administração fiscal. Ainda quando perspectivado como representando uma restrição a um direito fundamental, o acesso a esses dados está legitimado, em certas condições, pela vinculação das entidades públicas à preservação de outros bens constitucionalmente consagrados.

16.5 — Ponto é que, na modelação concreta do regime legal, se prevejam resguardos e se consagrem mecanismos que, na medida do compatível com o essencial dos objectivos que estão por detrás do levantamento do sigilo bancário, acautelem ainda, de certa maneira, os interesses cobertos pela tutela constitucional da privacidade.
Nos seus pressupostos e na sua forma processual e procedimental de exercício, a derrogação do sigilo deve obedecer a critérios que evitem uma pouco condicionada ou excessiva intromissão, para além do necessário à satisfação dos fins constitucionais que a ela presidem.
Como se escreveu no Acórdão n.º 602/2005 deste Tribunal:

«Sendo o controlo administrativo das movimentações bancárias dos contribuintes, como método de avaliação da sua situação fiscal, uma realidade recente (…), e postando-se como necessário — e, quantas vezes para tanto como imprescindível — o conhecimento das respectivas operações, não se poderá deixar de concluir que se torna justificada, para proteger o bem constitucionalmente protegido da distribuição equitativa da contribuição para os gastos públicos e do dever fundamental de pagar impostos, a procura da consagração de uma articulação ponderada e harmoniosa da reserva (se não da intimidade da vida privada, ao menos da reserva de uma parte do acervo patrimonial) acarretada pelo sigilo bancário e dos interesses decorrentes dos citados direito e dever».

O que implica uma cuidada ponderação de eventuais meios alternativos, menos intrusivos, susceptíveis de conjugar harmonicamente ambas as exigências: as de tutela da privacidade e as de justiça e igualdade fiscais (cfr. Santamaria Pastor, Derecho a la intimidad, secretos y otras cuestiones innombrables, Revista española de derecho constitucional, n.º 15, 1985, 159 s., 171.
Para esse efeito, tendo as normas contidas no artigo 3.º do Decreto n.º 139/X, da Assembleia da República, conexionado a perda da reserva da privacidade com uma iniciativa procedimental ou processual do contribuinte, em defesa dos seus interesses, há que ajuizar se os princípios constitucionais que asseguram o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, com garantias de equidade procedimental e processual, foram ou não suficientemente acautelados. Eles próprios, em si mesmos, direitos fundamentais, com o estatuto dos direitos, liberdades e garantias, gozando, portanto, de valência autónoma, esses direitos servem à protecção de outros direitos, entre os quais o de reserva da privacidade.
Temos, pois, que fazer entrar, no campo valorativo, esses direitos e princípios, para apreciar se eles são afectados pela disciplina legal em concreto estabelecida.

17 — Na óptica do que fica dito, há que ajuizar se o regime que o n.º 3 do Decreto 139/X, da Assembleia da República, visa introduzir satisfaz ou não as exigências constitucionais garantísticas, quanto ao procedimento e ao processo administrativos.
Nesta matéria, o princípio primário é o do Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2.º, particularmente no segmento que baseia a República Portuguesa «no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais». Esse princípio projecta-se no direito do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva (artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa), o qual, por sua vez, no que respeita à relação cidadão-administração, encontra uma concretização particularizadora no artigo 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa.

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Todos estes preceitos formam um bloco normativo, pelo que os trataremos conjunta e articuladamente.
Antes, porém, de entrarmos no fundo da questão, importa fazer uma curta alusão ao enquadramento constitucional do direito a reclamar.

17.1 — Não é uniforme, entre nós, o entendimento sobre qual o suporte normativo da tutela constitucional do direito de reclamação, enquanto direito no âmbito de um específico procedimento administrativo.
No sentido de que essa tutela não se inclui no disposto no artigo 52.º da Constituição da República Portuguesa, já se pronunciou este Tribunal, no Acórdão n.º 198/2003, defendendo que nessa norma se trata de «um direito que comporta os direitos de representação, reclamação ou queixa, que se desenvolvem em paralelo com os direitos que se desenvolvem no procedimento administrativo ou na acção jurisdicional formais».
Na doutrina, aparentemente, admite-se a posição contrária (cfr. Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, I, Coimbra, 2005, 495-496; Gomes Canotilho/ Vital Moreira, ob. cit., 696, e Marcelo Rebelo de Sousa/A. Salgado de Matos, Direito administrativo geral, III, Lisboa, 2007, 207-208).
De todo o modo, aquela primeira posição não põe em causa a dignidade constitucional de um «direito à actuação administrativa perspectivado na dimensão de um direito à decisão», no qual não pode deixar de se incluir o direito à reclamação. Como se escreve no acórdão citado:

«(…) tal direito considerar-se-ia implícito nos grandes princípios constitucionais, sejam eles o direito a uma resposta da administração, conforme resulta do citado artigo 52.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, seja o princípio da legalidade a que a Constituição, no seu artigo 266.º, subordina a Administração Pública (ou de constituir uma decorrência deles, se não mesmo do próprio princípio do Estado de direito, conjugado com o «monopólio da autoridade» do Estado), seja ele ainda o dos «direitos dos administrados», de que se trata no artigo 268.º daquela».

Independentemente da posição a tomar nesta matéria, o que cumpre, neste contexto, sobremodo salientar, até pelas atinências com pontos que posteriormente teremos que tratar, é que, como diz Gomes Canotilho, «a exigência de um procedimento juridicamente adequado para o desenvolvimento da actividade administrativa considera-se como dimensão insubstituível da administração do Estado de direito democrático», Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª edição, Coimbra, 274-275.
Daí que o legislador, ao consagrar soluções, mesmo quando não forçosas constitucionalmente, esteja obrigado a fazê-lo de modo consentâneo com aquelas exigências.
Como se diz no Acórdão n.º 628/2005, a propósito da garantia constitucional do direito ao recurso:

«Na verdade, tal garantia, conjugada com outros parâmetros constitucionais, pressupõe, igualmente, que na regulação o legislador não adopte soluções arbitrárias e desproporcionadas, limitativas das possibilidades de recorrer — mesmo quando se trate de recursos apenas legalmente previstos e não constitucionalmente obrigatórios (assim, v. os Acórdãos do Tribunal Constitucional n.os 1229/96 e 462/2003 (…)».

Reportando estas considerações ao direito de reclamar, é inteiramente seguro que, onde previsto este mecanismo de defesa do administrado, a sua conformação deve obedecer às exigências do procedimento equitativo. Até porque, em muitos casos, quer no domínio fiscal, como já referido, quer fora dele, a reclamação é um passo obrigatório para acesso à impugnação judicial.
E mesmo quando assim não é, não pode esquecer-se a complementaridade entre ambos os meios de defesa, como salienta Pedro Machete, acrescentando:

«Os direitos e interesses dos particulares devem ser satisfeitos logo no procedimento, de modo a que o recurso ao tribunal funcione apenas como uma ultima ratio» — v. a audiência dos interessados no procedimento administrativo, Lisboa, 1995, 86.

Por tudo, deve entender-se que o direito ao processo equitativo, consagrado no n.º 4 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa tem uma extensão necessária, com as devidas adaptações, ao procedimento administrativo.

17.2 — A primeira questão que urge apreciar é a de saber se o pressuposto-base da derrogação do sigilo bancário prevista no artigo 3.º do Decreto 139/X, da Assembleia da República — a iniciativa do contribuinte em apresentar reclamação graciosa ou impugnação judicial do acto tributário –, só por si, e independentemente dos demais contornos do regime legal, fere ou não de morte a conformidade constitucional das disposições constantes daquele artigo.
Na verdade, se a abertura do sigilo bancário é um mal para o titular da posição atingida (até, eventualmente, por razões alheias à relação tributária), pode dizer-se que a ligação dessa consequência

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prejudicial àquelas iniciativas de defesa tem um efeito desincentivador à sua prática. Para evitar a provável perda do sigilo, o contribuinte retrair-se-á de accionar essas garantias impugnatórias, por mais fundadas que, a seus olhos, sejam as razões que lhe assistem.
Deste modo, é a própria lei que cria um contra-motivo ao exercício de direitos básicos do administrado, também eles direitos fundamentais: no que se refere à impugnação administrativa, o de apresentar reclamações para defesa dos seus direitos; no que toca à impugnação judicial, o de tutela jurisdicional efectiva (artigo 20.º), a implicar, além do mais, a conformação do processo de forma equitativa (n.º 4 do mesmo artigo).
Como garantia de defesa dos direitos e interesses do administrado, essa tutela abrange, nos termos do n.º 4 do artigo 268.º, «(…) a impugnação de quaisquer actos administrativos que os lesem (…)», pelo que também esta garantia é afectada.
Do ponto de vista da garantia da efectividade, designadamente da tutela jurisdicional, é difícil não encarar com reserva medidas deste tipo que, deixando formalmente intocada uma via de acção ou de defesa, criam indirectamente entraves fortes à sua real utilização. Se reclama ou impugna, o administrado arrisca-se seriamente a sacrificar o direito à reserva da privacidade; se, para evitar essa consequência, o não faz, então está, com essa atitude, a abrir mão de um instrumento fundamental de tutela dos direitos que a decisão administrativa pode lesar. Para exercitar um direito verdadeiramente nuclear do Estado de direito democrático, o contribuinte tem que estar disposto a pagar o preço elevado de perder o segredo sobre os dados em poder de entidades bancárias.
Só por si, no puro plano do princípio da efectividade das posições constitucionalmente protegidas e do direito a um procedimento e a um processo equitativos, a colocação do contribuinte nesta situação dilemática faz propender para um juízo de desvalor constitucional.
Mas, também aqui, não nos podemos ficar por um juízo em abstracto, fortemente apoiado numa précompreensão e desligado da consideração dos fins prosseguidos e dos meios concretamente fixados para os atingir. Para se alcançar, em definitivo, uma avaliação segura da conformidade constitucional da extensão do poder administrativo de derrogação do sigilo bancário que se pretende introduzir teremos, pois, que valorar, do ponto de vista daquelas garantias, as condições e os termos que a regem. Tarefa esta que, atenta a possibilidade de violação frontal dos princípios constitucionais referidos, deve ser conduzida com a consciência de que só uma conformação severamente restritiva e particularmente garantidora permitirá «salvar» a constitucionalidade daquela medida legislativa.
Obedecerão a essas exigências as condições de exercício daquele poder administrativo, tal como fixadas nas normas constantes do artigo 3.º do Decreto n.º 139/X? A resposta a dar remete-nos para uma análise concreta do regime legal, e para a sua correlação com os fins que ele prossegue.

17.3 — Ora, o que, desde logo, se constata é que, tendo que ser fundamentada e notificada, a decisão administrativa de levantamento do sigilo bancário não sofre, aparentemente, qualquer outro condicionamento.
Faculta um acesso directo à informação, sem dependência de autorização judicial prévia e do consentimento do visado, como já foi referido. O que, pondo de lado as situações particulares do n.º 2 do artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária, só tem paralelo nas duas hipóteses do n.º 1 do mesmo artigo. Mas aí estão em causa indícios da prática de crime em matéria tributária (alínea a) do preceito) ou de falta de veracidade do declarado (alínea b) do mesmo artigo). E lembre-se que, em processo executivo, a penhora de depósitos bancários (artigo 861.º-A do Código de Processo Civil) é um dos raros casos em que, após a reforma de 2003, subsiste o despacho judicial ordenatório. E, nesse âmbito, para além do interesse particular do exequente, está também em causa o interesse público — o da realização da justiça, conexionado com o princípio da efectividade da tutela jurisdicional.
Em segundo lugar, a derrogação administrativa não é um último recurso, de aplicação subsidiária, só actuante na falta de cooperação do interessado. Este não é chamado a exibir os documentos ou a autorizar a sua consulta. As entidades inspectivas podem, de imediato, notificar as instituições bancárias, pelo que o contribuinte não é chamado a uma participação voluntária no processo de decisão.
Em terceiro lugar, não estando especificamente previsto o direito de audição, também não parece, como já referido, que o seu reconhecimento, para este fim e nesta fase, possa ser integrado numa das previsões do artigo 60.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária. Sendo assim, parece que ao contribuinte fica vedado qualquer exercício de contraditório prévio, o que, por sua vez, faz perder grande parte do sentido útil do dever de fundamentação adequada.
Por último, não estando especificamente previsto o controlo judicial, não se afigura, na prática, viável o recurso ao processo urgente previsto no artigo 146.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
O que é particularmente notório quando a questão se coloque no âmbito da contestação a impugnação judicial. Na verdade, se tivesse sido intenção legislativa possibilitar, de forma célere e eficaz, o recurso judicial da decisão de acesso aos dados bancários, então muito mais facilmente teria sido prevista a possibilidade de o interessado pedir ao tribunal onde corre esse processo a apreciação da legalidade da decisão de acesso.
Assim se permitiria que a questão fosse enxertada no próprio processo de impugnação judicial regulado no artigo 99.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário, o que, repete-se, sem norma expressa não parece possível.

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17.4 — Persistem, assim, em pontos decisivos, fundadas dúvidas quanto aos direitos do contribuinte de participação no procedimento de decisão do acesso ao sigilo bancário e de impugnação judicial dessa decisão.
Esta falta de certeza e segurança jurídicas, só por si, vulnerabiliza a posição defensiva do contribuinte, em temos constitucionalmente censuráveis, por violadores do princípio do Estado de direito e do direito fundamental de acesso ao direito e à via judiciária (v. Gomes Canotilho, ob. cit., 497).
Como diz impressivamente o Tribunal Constitucional espanhol, a propósito de garantia similar à do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, consagrada no artigo 24.1 da Constituição do país vizinho: Esta tutela para ser «efectiva», como exige el artículo 24.1 da Constitución, ha de ser expedita y fácilmente determinable y no se puede obligar a un litigante a que averigüe y, casi adivine, en el conjunto del complejo ordenamiento procesal, qué medios tiene para obtener la protección de sus derechos e intereses legítimos (STC 30/1984, de 6 de Março, apud Sánchez-Cruzat, Derecho fundamental al proceso debido y el Tribunal Constitucional, Pamplona, 1992, 213).

17.5 — Para além de impreciso quanto às garantias de defesa que oferece, o regime em análise dá-nos, no seu desenho global, uma nova previsão de derrogação administrativa do sigilo bancário excessivamente aberta e pouco condicionada.
Precisamente numa situação em que essa medida, para além da afectação do direito à reserva da privacidade, como inevitavelmente acontece em todos os casos de levantamento que não passem pelo consentimento do titular, põe em causa também o direito à reclamação e à tutela jurisdicional efectiva, o legislador não predispõe medidas cautelares e atenuadoras, possíveis sem sacrifício do objectivo visado. Isto é, naquele caso em que a efectividade e consistência das garantias ao contribuinte mais se justificavam, é precisamente aquele em elas são mais descuradas.
Ao dizermos que essas garantias, e a sua efectividade prática, eram aqui particularmente requeridas, estamos sobretudo a pensar no contexto e na fase procedimental ou processual em que se faculta o acesso.
Note-se que a administração fiscal, durante a instrução que deu origem ao acto agora impugnado, não dispunha, salvo nas hipóteses do artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária, do poder de acesso directo a dados bancários. Quando o contribuinte se apresenta a exercer o seu direito de reclamação ou impugnação, ela, por esse facto, passa a deter um poder de acesso que anteriormente lhe estava negado, a pretexto da prossecução da verdade material a que já anteriormente estava vinculada.
No caso da impugnação judicial, é particularmente nítida a desconformidade ao princípio do processo equitativo (n.º 4 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa). Na verdade, houve uma decisão administrativa cuja validade já está a ser sindicada por um tribunal. E o que se verifica é que, em sede de contestação aos vícios que o requerente imputa a essa decisão, a administração ganha novos poderes administrativos, que depois pode fazer frutificar, a seu ganho, no processo judicial a decorrer. Para isso, é-lhe inclusivamente concedido um prazo suplementar de contestação (n.º 3, in fine, do artigo 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na redacção dada pelo artigo 3.º do Decreto n.º 139/X).
Numa espécie de reposição do procedimento tributário cuja decisão está a ser apreciada, os poderes administrativos, agora reforçados com uma nova prerrogativa, prolongar-se-iam, assim, na fase judicial.
Decorrendo à margem do processo de impugnação judicial, a derrogação do sigilo tem repercussão no seu resultado, sem que se mostre devidamente satisfeito, nem antes, nem após a prolação da decisão, o princípio fundamental do contraditório.
Assim, a violação do princípio do procedimento e do processo equitativo, quanto ao regime de derrogação do sigilo bancário na hipótese em apreço, vai conduzir a um condicionamento substancial do exercício, pelo contribuinte, das suas garantias impugnatórias de actos tributários. Não sendo directa e frontalmente restringido o direito de reclamar ou impugnar judicialmente, a verdade é que a forma não equitativa como está prevista a perda do sigilo e o factor causal que a determina esvaziam, em grande medida, aqueles direitos da sua efectividade prática.
Deste modo, mostram-se violados os artigos 2.º e os seus corolários: artigo 20.º, n.º 1 e n.º 4, e 268.º, n.º 4, da Constituição da República.

18 — Se passarmos de uma análise mais concentrada nos direitos fundamentais de natureza adjectiva para levarmos a cabo uma ponderação de bens, também no plano substantivo, somos levados a concretizar e desenvolver reflexões já feitas sobre as restrições à reserva da privacidade, à luz do princípio da proporcionalidade.
Recordemos que, na exposição de motivos da proposta de lei n.º 85/X, que está na génese da Decreto n.º 139/X, da Assembleia da República, se apresentam duas razões para as alterações legislativas.
Numa fase do processo em que se previa ainda que elas tivessem incidência apenas na reclamação graciosa, é-lhes apontado como fim, em primeiro lugar, «possibilitar à administração tributária, em estrita execução do princípio do inquisitório a que está subordinado o seu procedimento nos termos do artigo 58.º da Lei Geral Tributária, a averiguação plena dos factos alegados pelo contribuinte em sede de reclamação graciosa, designadamente mediante o acesso aos elementos pertinentes protegidos pelo sigilo bancário, de

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modo a que se obtenha do modo mais completo possível a verdade dos factos». A este objectivo, adiciona-se o de «impedir que, por dificuldades conhecidas nos poderes instrutórios, a contestação de factos tributários perante a administração seja utilizada como meio dilatório do pagamento da dívida tributária» (Diário da Assembleia da República, II Série-A, n.º 132, 29 de Julho de 2006, 60).
Estas medidas são expressamente relacionadas com as conclusões do Relatório sobre o Combate à Evasão e Fraude Fiscais, apresentado na Assembleia da República, em Janeiro de 2006, conclusões que, na parte que agora interessa, foram do seguinte teor:

«O exposto não nos impede, no entanto, de admitir que, à semelhança do regime belga, se possa associar a contestação administrativa de actos tributários ao necessário acesso à informação protegida pelo sigilo bancário, na exacta medida em que seja essencial para a decisão administrativa. Tal seria, também, um meio de dissuadir a litigância menos sustentada» (relatório da proposta de lei n.º 85/X, Diário da Assembleia da República, II Série-A, n.º 5, 6 de Outubro de 2006, 22).

É em função destes objectivos que temos que ajuizar da observância das três exigências em que analiticamente se desdobra o princípio da proporcionalidade: adequação, necessidade e proibição do excesso.
Esta estrutura de valoração, verdadeiro postulado normativo de correlação de meios a fins, encontra-se hoje consolidada na jurisprudência portuguesa, tendo sido enunciada no Acórdão n.º 634/93 deste Tribunal, da seguinte forma:

«O princípio da proporcionalidade desdobra-se em três subprincípios: princípio da adequação (as medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias devem revelar-se como um meio adequado para a prossecução dos fins visados, com salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); princípio da exigibilidade (essas medidas restritivas têm de ser exigidas para alcançar os fins em vista, por o legislador não dispor de outros meios menos restritivos para alcançar o mesmo desiderato); princípio da justa medida, ou proporcionalidade em sentido estrito (não poderão adoptar-se medidas excessivas, desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos.»

18.1 — Consideremos inicialmente o fim primeiramente enunciado.
A busca da verdade material, em execução do princípio do inquisitório, corresponde a um relevante princípio constitucional da tributação — o da igualdade fiscal, pautada pela capacidade contributiva, como expressão concreta do princípio da igualdade material. Não previsto num específico e directo preceito, o seu fundamento constitucional obtém-se do princípio da igualdade articulado com os demais princípios e preceitos da respectiva «constituição fiscal» (nesse sentido, Casalta Nabais, Direito fiscal, 4.ª edição, Coimbra, 2006, 154).
Saliente-se, no entanto, que esta apreciação tem de ser relativizada quando estamos situados num procedimento administrativo de segundo grau iniciado por acção do contribuinte ou quando a administração é chamada a contestar uma impugnação judicial.
No procedimento que conduziu à decisão ora objecto de reclamação ou impugnação, a administração já teve oportunidade de lançar mão de todas as diligências instrutórias previstas na lei. E recorde-se que, quanto ao acesso a dados bancários, essas diligências estão restringidas pelos pressupostos e garantias previstos no artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária, acima sumariamente enunciados.
A questão a pôr, em termos precisos, é portanto a de saber se, quando a actividade instrutória a desenvolver pela administração é apenas a necessária para decidir a reclamação ou para contestar a impugnação, se justifica a facilitação da possibilidade de acesso a dados cobertos por sigilo bancário. Isto é, se, por força dessa reacção impugnatória, a administração deve ser dotada de um poder inspectivo que anteriormente não detinha.
Sendo nesta fase a actividade instrutória delimitada pelo pedido formulado na reclamação ou na impugnação, será o regime em apreciação adequado, necessário e proporcionado?

18.2 — A adequação parece evidente, em relação ao fim imediato de obtenção da verdade material que, estando relacionada com o objecto da reclamação ou impugnação, possa estar oculta pelo sigilo bancário.
Permitindo o acesso a dados até aí sigilosos, as novas disposições legislativas permitem uma certificação segura das alegações com eles relacionados.
Pode dizer-se até que, nessa medida, ela é a que mais se adequa ao sentido ínsito na iniciativa do contribuinte. Impugnando este, judicial ou extrajudicialmente, um acto tributário, na determinação de cujo conteúdo já esteve presente o princípio do inquisitório, pelo que a administração já terá esgotado os meios de conhecimento ao seu dispor, justifica-se então que a atenção recaia sobre os dados cujo conhecimento lhe estava até aí vedado. Se o procedimento anterior tiver sido correctamente executado, a discrepância, a existir, resultará da impossibilidade de acesso aos elementos cobertos pelo sigilo bancário. Sendo assim, e na própria lógica do sentido útil da impugnação (que, naturalmente, é instaurada para ser atendida), é adequado o levantamento do sigilo.

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Já quanto ao objectivo mediato de combate à evasão e à fraude fiscal, que, confessadamente, constitui o pano de fundo e a teleologia última da medida legislativa, o veredicto tem que ser o oposto. Não se descortina uma conexão plausível entre situações de sonegação fiscal e iniciativas de reclamação por parte daqueles que a elas dão azo. Pelo contrário, plausível é que os infractores se preocupem em não suscitar a mínima atenção da máquina fiscal, pelo que serão esses, precisamente, os contribuintes menos dispostos a desencadear um procedimento de investigação suplementar. Não se vê, pois, que a medida possa contribuir para atingir o objectivo proclamado. Sendo, nesta perspectiva, ineficaz, a sua inadequação é manifesta.

18.3 — Quanto à necessidade ou exigibilidade, por falta de soluções alternativas menos gravosas, adensam-se as dúvidas quanto à conformidade constitucional, deste ponto de vista, das medidas em análise.
Relembre-se a fase do relacionamento tributário em que a questão se coloca. Como referido, a administração fiscal já tomou uma decisão, para a qual pôde, de acordo com o princípio do inquisitório (artigo 58.º da Lei Geral Tributária) e do princípio da legalidade fiscal (artigo 55.º do mesmo diploma), ordenar oficiosamente as diligências probatórias indispensáveis ao apuramento da verdade material, mesmo que elas se tenham destinado a provar os factos alegados pelo sujeito passivo.
Este reclama ou impugna. A partir daqui o que cumpre sobremaneira assegurar é que uma obstaculização abusiva do acesso às informações bancárias faça permanecer uma situação, sob o ponto de vista probatório, desfavorável à administração fiscal, nomeadamente por força das regras do ónus da prova aplicáveis.
Na verdade, se a resolução de tais dúvidas for incontroversamente possível mediante o acesso às informações bancárias, parece pouco justificado que o contribuinte se possa prevalecer de uma atitude obstativa para alcançar ganho de causa. Seria premiar um venire contra factum proprium, uma conduta oportunista de manipulação de um direito da esfera pessoal para obter vantagens ilícitas de ordem patrimonial.
Evitar essa consequência de todo injustificada, não só é um objectivo constitucionalmente legítimo, como pode dizer-se que corresponde ao imperativo de justiça e igualdade fiscais. Mas, para o atingir, outras soluções menos gravosas, designadamente um regime de ónus da prova adequado, são facilmente representáveis. Sem perda assinalável de eficácia, elas deixariam intocadas as exigências do processo justo e conduziriam a uma menor afectação do direito ao sigilo.
Para isso, bastaria que, onde fundadamente se demonstrasse a pertinência do conhecimento dos dados bancários para a decisão da reclamação ou impugnação, ficasse na disponibilidade do contribuinte (e não, imediata e directamente, na esfera de poder da administração) a preservação ou não do segredo. Uma decisão impeditiva infundada teria sempre consequências processuais desfavoráveis, em termos probatórios.
É nesta medida que a expressa dispensa de consentimento do contribuinte é particularmente penalizadora, de forma desmesurada e injustificada, para o bem jurídico tutelado pelo direito à reserva da privacidade. De facto, em face deste regime, embora não se possa dizer que o levantamento do sigilo bancário é uma consequência inelutável da reclamação, pois a administração pode sempre considerar que não há fundamento para tal, a verdade é que, com a sua iniciativa, o contribuinte perde, de imediato, e em bloco, aquilo que, ao fim e ao cabo, aquele direito lhe visava assegurar: o controlo sobre o fluxo informativo concernente a dados da sua esfera pessoal. Com isso, verifica-se o aniquilamento da posição e do valor de liberdade que o direito à reserva garante, não só quanto ao quando (neste aspecto, inevitavelmente, a partir da reclamação), mas também quanto ao modus faciendi de levar ao conhecimento da administração tributária e ao conteúdo da informação a prestar.
E, mesmo que a administração decida não derrogar o sigilo, a verdade é que, pelo simples facto de ter reclamado, o contribuinte fica completamente desinvestido de qualquer poder de decisão, transferido, in toto, para a esfera de poder da entidade administrativa. Só com isso é excessivamente afectada, de forma arbitrária, a autodeterminação informativa da pessoa do contribuinte.
Uma solução alternativa, dentro destes limites, estaria, em termos de direito substantivo, em sintonia com a natureza da prerrogativa que o direito à reserva lhe reconhece (um direito de liberdade, perfeitamente susceptível de limitações voluntárias).
Com a vantagem suplementar de, ao prestar o seu consentimento, o contribuinte ter a possibilidade de indicar com precisão, ou mesmo, apresentar comprovadamente, os dados relevantes, evitando uma extensão da inspecção a outras informações sob sigilo. Mas isso já tem a ver com a proibição do excesso, que abaixo trataremos.
Dir-se-á que uma solução deste tipo não satisfaz as exigências de verdade material, pois pode subtrair as informações sob reserva ao poder inquisitório das autoridades fiscais. Mas a verdade material não é uma verdade absoluta, é a verdade alcançável pelos meios processuais adequados, de acordo com o princípio do processo devido. As directrizes do due process of law são um claro limite ao poder inquisitório.
Recorde-se que, de acordo com o atrás expendido, é apenas o abuso do direito à reserva que se justifica impedir. Ora, a medida em apreço ultrapassa em muito esse objectivo, pelo que não satisfaz o critério da necessidade.

18.4 — Mas é no plano da proporcionalidade em sentido estrito que mais se evidenciam aspectos de regime contrários ao imposto pelo princípio da proporcionalidade, em sentido amplo. As condições de

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exercício do poder de derrogação ferem excessivamente, segundo cremos, a garantia de tutela jurisdicional efectiva e o direito à reserva da privacidade.
É certo que a derrogação não é automática, nem imediata, dependendo de uma decisão da administração fiscal, vinculada a três parâmetros. Por expressa remissão do n.º 2, que se intenta acrescentar ao artigo 69.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, essa medida integra-se nas diligências suplementares previstas na actual alínea e) do mesmo artigo, e estas só devem ser ordenadas quando se revelem «manifestamente indispensáveis à descoberta da verdade material». Por outro lado, o novo n.º 2 precisa que o acesso aos documentos bancários deve circunscrever-se aos «relativos à situação tributária objecto de reclamação» e só pode ser determinado «sempre que fundadamente se justifique face aos factos alegados pelo reclamante». Indicações análogas às duas últimas foram introduzidas no artigo 110.º, quando se alargou à impugnação judicial o regime de derrogação.
Simplesmente, a efectiva consistência prática destes resguardos só pode ser valorada tendo em conta a sua exequibilidade e em articulação com os restantes aspectos do regime legal.
Quanto à primeira, é manifesto que a limitação do acesso aos dados bancários que tenham a ver com a situação tributária corresponde a um simples «voto pio», tendendo a ficar irremediavelmente letra morta, na praxis corrente da actividade da administração tributária. De facto, a selecção, de entre a massa dos documentos disponíveis, das informações que interessam à decisão da reclamação ou da impugnação judicial, implica uma consulta e análise de todos os elementos respeitantes à relação ou relações bancárias do contribuinte. Se este tiver contactos negociais com mais do que uma instituição, todos os documentos a eles referidos terão que ser inspeccionados, para se poder identificar os que interessam à comprovação da situação em litígio.
Para a delimitação do acesso, com solicitação apenas das informações atinentes ao caso, seria necessário que a administração fiscal dispusesse de conhecimento antecipado, de forma precisa, da localização dos dados relevantes, o que, na maioria dos casos, não acontecerá, sobretudo quando o regime prescinde da audiência prévia do interessado, como acima se explicitou. Pelo que o critério da justa medida (aqui, a medida dos fundamentos alegados), que aquelas indicações normativas visam salvaguardar, não poderá, em muitíssimas situações, ser respeitado.
É certo que a decisão tem que ser fundamentada (o que já resultaria do artigo 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, do artigo 77.º da Lei Geral Tributária e do artigo 123.º do Código do Procedimento Administrativo) e notificada ao contribuinte (artigo 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa e artigo 77.º, n.º 6, da Lei Geral Tributária). Tendo este conhecimento da diligência, poderá vir espontaneamente fornecer informações que permitam a identificação precisa dos dados relevantes.
Mas, por um lado, é o próprio princípio do inquisitório que não permitirá à administração dar como certo que são apenas esses os elementos comprovativos, pelo que ela não ficará dispensada, em princípio, de alargar a investigação, de modo a obter uma certificação segura. Por outro lado, nada na lei impede que, simultaneamente com a notificação ao contribuinte, a administração faça seguir a notificação à entidade bancária, não esperando por uma eventual reacção de cooperação do visado. E então dependerá da atitude desta entidade a possibilidade de uma participação auxiliar do contribuinte.

18.5 — Se é assim quanto ao primeiro objectivo enunciado, o de prossecução da verdade fiscal, o que dizer do segundo, o de «impedir que (…) a contestação de actos tributários perante a administração seja utilizada como meio dilatório do pagamento da dívida tributária», ou, como vem expresso no relatório sobre o combate à evasão e à fraude fiscais, reproduzido na exposição de motivos da proposta de lei, como «um meio de dissuadir a litigância menos sustentada»? Trata-se, em primeira linha, de uma razão de conveniência ou de utilidade, de uma policy, não de um principle, como diria Dworkin, ainda que, indirectamente, o funcionamento eficiente do sistema fiscal se repercuta na realização da justiça fiscal.
Ora, razões de utilidade não podem ser invocadas para restringir direitos com estatuto dos direitos, liberdades e garantias.
De todo o modo, mesmo que a valoração se concentre no objectivo último de assegurar, a nível sistémico e macrojurídico, o funcionamento adequado da máquina administrativa e do aparelho judiciário fiscais, como condição de realização da justiça, sempre se dirá que, no regime em apreço, esse objectivo é levado a cabo por meios que vão para além do estritamente necessário.
Na realidade, não custa representar meios alternativos menos gravosos, designadamente por não acarretarem o sacrifício de bens da esfera pessoal, nem o abandono de garantias judiciárias nucleares para a efectividade do acesso à justiça.
Eles já estão presentes, aliás, no nosso ordenamento jurídico. Refira-se, antes de mais, o regime geral da litigância de má fé, aplicável no processo fiscal (artigos 104.º da Lei Geral Tributária e 122.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário). No próprio procedimento fiscal, está previsto que, em caso de pedido de revisão da matéria colectável fixada por métodos indirectos, possa ser aplicado ao sujeito passivo «um agravamento até 5% da colecta reclamada quando se verificarem cumulativamente as seguintes circunstâncias: a) Provar-se que lhe é imputável a aplicação de métodos indirectos; b) A reclamação ser

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destituída de qualquer fundamento; c) Tendo sido deduzida impugnação judicial, esta ser considerada improcedente» (artigo 91.º, n.º 9, da Lei Geral Tributária).
Se o legislador, dentro da margem da sua livre apreciação e conformação, for de entendimento que os meios existentes são insuficientes, tem sempre a possibilidade de alargar o âmbito aplicativo de medidas deste tipo. Tratando-se de sanções de natureza pecuniária, sem efeitos colaterais em bens de outra ordem, elas, sem perda da eficácia pretendida, estão, à partida, em boas condições para superarem o teste da proporcionalidade, desde que se contenham, em termos quantitativos, dentro de limites razoáveis.
Nos moldes em que vêm formuladas, as alterações operadas aos artigos 69.º e 110.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, pelo artigo 3.º do Decreto n.º 139/X, independentemente do que esteve presente na mens legislatoris, têm objectivamente por efeito obstaculizar, não apenas as reclamações notoriamente infundadas, de propósitos meramente dilatórios, mas, pura e simplesmente, em geral, a faculdade de reclamar e de impugnar judicialmente actos da administração fiscal.
Por isso, e em conclusão, elas não se limitam «ao necessário para salvaguardar outros direitos e interesses constitucionalmente protegidos» (n.º 2 do artigo 18.º da Constituição da República), tendo um carácter desproporcionado.

19 — Em face de tudo o que fica dito, podemos concluir que, tal como vem concretamente regulada, a solução sub judice não garante um procedimento e um processo justos no que diz respeito às condições de derrogação do sigilo bancário. Só por si, tal constituiria fundamento bastante para uma decisão de inconstitucionalidade.
Mas aquele vício, traduzido na falha de efectivação do «direito à normação procedimental», de forma precisa e adequada, repercute-se agravadamente no processo em que se reclama ou impugna, fundamentalmente na medida em que coloca o cidadão-contribuinte perante um dilema constitucionalmente inaceitável: ou corre o risco forte de perder a reserva sobre a sua privacidade, ou perde um instrumento importante de defesa dos seus direitos e interesses. Em vez de uma limitação harmónica e equilibrada das duas posições, permitindo a preservação simultânea do essencial das vantagens que elas propiciam, aquelas alterações «forçam» o contribuinte a uma opção entre uma ou outra.
O que não pode deixar de se considerar constitucionalmente inadmissível.

III — Decisão

Pelo exposto, ao abrigo do artigo 278.º da Constituição da República, o Tribunal Constitucional decide:

a) Não se pronunciar pela inconstitucionalidade da parte final da norma do n.º 10 do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária, na redacção dada pelo artigo 2.º do Decreto n.º 139/X da Assembleia da República; b) Pronunciar-se pela inconstitucionalidade dos n.os 2 e 3 do artigo 69.º e dos n.os 2 e 3 do artigo 110.º, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na redacção dada pelo artigo 3.º do Decreto n.º 139/X, da Assembleia da República, por violação dos artigos 2.º, 18.º, n.º 2, 20.º, n.os 1 e 4, 26.º, n.º 1, e 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa Lisboa, 14 de Agosto de 2007.
Joaquim Sousa Ribeiro — Maria Lúcia Amaral — José Borges Soeiro — Maria João Antunes — Vítor Gomes (com declaração de voto anexa) — Benjamim Rodrigues (com a declaração anexa) — Ana Maria Guerra Martins (com declaração de voto anexa) — Mário José de Araújo Torres [vencido quanto à alínea a) da decisão, pelas razões constantes da declaração de voto do Ex.
mo Conselheiro Carlos Cadilha, que inteiramente subscrevo, e ainda pela intolerável indeterminabilidade da menção a «titular de cargo sob tutela de entidade pública»] — Carlos Fernandes Cadilha [vencido quanto à alínea a) da decisão pelas razões constantes da declaração de voto junta] — João Cura Mariano [vencido quanto à alínea a) da decisão, pelas razões constantes da declaração de voto do Ex.
mo Conselheiro Carlos Cadilha, que inteiramente subscrevo] — Gil Galvão [vencido quanto à alínea b) da decisão, conforme declaração anexa] — Carlos Pamplona de Oliveira (vencido conforme declaração) — Rui Manuel Moura Ramos.
Declaração de voto

Considero que a inclusão do sigilo bancário de que sejam titulares pessoas colectivas no âmbito de protecção do direito à reserva da intimidade da vida privada, consagrado no n.º 1 do artigo 26.º da Constituição, não será apenas problemática, como o acórdão concede (n.º 16.2, último parágrafo), mas é, mais radicalmente, de afastar. E, como só na medida em que constitui refracção deste direito à reserva da privacidade se me afigura possível dar guarida ao sigilo bancário no elenco dos direitos fundamentais, entendo que o legislador não está subordinado, no reconhecimento e conformação do sigilo bancário relativamente a pessoas colectivas (e entes equiparados), ao regime constitucional dos direitos, liberdades e garantias.

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Efectivamente, os direitos fundamentais são primordialmente direitos de indivíduos, de pessoas singulares.
As pessoas colectivas somente são titulares daqueles direitos fundamentais que sejam compatíveis com a sua natureza (artigo 12.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa), o que coloca um problema de determinação que só casuisticamente pode ser resolvido. É certo que ser ou não compatível com a natureza das pessoas colectivas depende da própria natureza de cada um dos direitos fundamentais e que, em si mesmo, no conteúdo de protecção e poderes em que se analisa, as pessoas colectivas podem gozar do direito ao segredo bancário, como o direito ordinário torna evidente. Mas o que aqui se pondera é a cobertura do sigilo bancário pelo direito fundamental à reserva da intimidade da vida privada. Ora, mesmo quando seja concebível a conexão de certo direito fundamental com a personalidade colectiva, daí não se segue que a sua aplicabilidade nesse domínio opere nos mesmos termos e com a mesma amplitude com que decorre relativamente às pessoas singulares (Cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição da República Portuguesa Anotada, Tomo I, pag. 113).
Como o acórdão bem salienta, o que pode justificar que aspectos do «segredo do ter» da pessoa, patentes na conta e noutros dados da situação económica do titular em poder de uma instituição bancária, sejam assimilados ao «segredo do ser» protegido pela reserva da intimidade da vida privada é o que esses elementos podem revelar das escolhas ou contingências de vida do indivíduo, dos seus gostos e propensões, do seu perfil concreto enquanto ser humano, que cada um deve ser livre de resguardar do conhecimento e juízo moral de terceiros. Esta teleologia intrínseca surge eminentemente ligada à protecção da dignidade da pessoa humana, não sendo extensível a entes que apenas tem uma capacidade jurídica funcional, limitada pelo princípio da especialidade do fim que estatutariamente prosseguem, que não têm projecto de vida livremente determinado, pelo que o direito ao segredo bancário que contratual e legalmente se lhes reconheça não goza da protecção constitucional especificamente conferida pela inclusão do bem protegido pelo sigilo no âmbito do direito à reserva da intimidade da vida privada, consagrado no n.º 1 do artigo 26.º da Constituição.
Aliás, não deve olvidar-se que a potenciação da capacidade de agir a coberto da personalidade colectiva é um dos mais poderosos factores de exponenciação do risco que o sigilo bancário comporta para outros interesses ou valores constitucionais, designadamente para aqueles que à administração fiscal compete prosseguir.
Todavia, a negação da fundamentalidade do direito quando esteja em causa a situação de pessoas colectivas (e entes equiparados) não obsta a que acompanhe a pronúncia pela inconstitucionalidade da solução normativa a que se refere a alínea b) da decisão, pelas mais razões que levam o acórdão a concluir que ela não garante um procedimento e um processo justos no que diz respeito às condições de derrogação do sigilo bancário.

Vítor Gomes.
Declaração de voto

Votando, embora, ambas as pronúncias do Tribunal, restam-me, porém, algumas dúvidas sobre a fundamentação da decisão construída em torno da violação do direito constitucional de reserva à intimidade da vida pessoal e familiar, consagrado no artigo 26.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.
É que já defendemos que o sigilo bancário, consubstanciando, essencialmente e na sua matriz originária, um dever de sigilo profissional, não valia na direcção da administração fiscal (Benjamim Rodrigues, O sigilo bancário e o sigilo fiscal, op. cit.).
Mas desde a altura em que sustentámos essa posição — e já lá vai uma década — muita coisa mudou quer no domínio do risco objectivo de uma cada vez mais difícil gestão controlada da informação obtida, aqui incluída a informação bancária, quer no da possibilidade e facilidade de identificação, no seio da administração tributária e dos media, dos autores da violação do dever de sigilo fiscal, que nos infunde fundadas dúvidas sobre se, hoje, o sigilo bancário não deve ser entendido como integrando a reserva de privacidade económica, constitucionalmente tutelada.
Na verdade, os meios tecnológicos de que o homem, hoje, dispõe, associados à extensão dos dados que puderam passar a constar dos registos bancários por força do acesso directo e quase universal dos cidadãos ao sistema bancário e à possibilidade e facilidade da sua descodificação, permitem desnudar verdadeiramente o cidadão-contribuinte.
Os registos bancários permitem hoje, em relação aos utilizadores do sistema — e é preciso registar que são quase a totalidade dos cidadãos-contribuintes — identificar não só os movimentos de crédito, de débito e de financiamento, como a generalidade das pessoas com quem foram efectuadas essas operações, e até o tipo de bens a que elas respeitam, e, com eles, o estilo de vida pessoal que se tem.
Por seu lado, a facilidade de análise de todos esses dados quase permite afirmar que o tempo da obtenção da informação digital é quase coetâneo do tempo do acesso ao sistema e que aquela pode abranger o passado histórico quase com a mesma visibilidade do presente, por força da amplitude arquivística que o registo histórico pode abranger.

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A tudo isto acresce a desmaterialização dos meios de registo, as dificuldades em identificar não só a pessoa que lança a informação como aquela que a distrai do sistema e a torna pública, com o facilitismo que os mesmos meios tecnológicos permitem, e a extensíssima amplitude do conhecimento sobre a pessoa que o cruzamento de dados e das bases de dados faculta.
O acesso em si mesmo à informação transporta, hoje, por isso, um elevadíssimo risco de apreensão de factos que podem nada têm a ver com a razão desse acesso, bem como de uma posterior divulgação, feita de forma precisa, extensa, anónima ou dificilmente identificável.
Ora, numa altura em que cada vez mais as pessoas são também o que têm, deve questionar-se se este bem não cabe na reserva constitucionalmente recortada no artigo 26.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.
E estas dúvidas não se me esfumam, mesmo considerada a especial vinculação constitucional e legal da administração fiscal. É que, dentro da actual estrutura orgânica administrativa, cada vez mais se perde a relação entre o facto e o agente-pessoa e com isso os elementos desveladores de quem ilicitamente deixou sair para fora do seu foro funcional informação nele obtida.

Benjamim Rodrigues.
Declaração de voto

Não acompanhei a fundamentação do n.º 16 por considerar que não é pacífica a inclusão do sigilo bancário no direito à reserva da intimidade da vida privada (no mesmo sentido, Gomes Canotilho/Vital Moreira, anotação ao artigo 26,º, Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra, 2007, p. 469).
Em meu entender — tal como o próprio Acórdão admite no n.º 19 — a violação do direito a um procedimento e a um processo justos, só por si, afigura-se como fundamento bastante para justificar a pronúncia pela inconstitucionalidade das normas constantes dos n.os 2 e 3 do artigo 69.º e dos n.os 2 e 3 do artigo 110.º, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na redacção dada pelo artigo 3.º do Decreto n.º 139/X, da Assembleia da República.

Lisboa, 14 de Agosto de 2007.
Ana Maria Guerra Martins.
Declaração de voto

A possibilidade consagrada no n.º 10 do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária, na redacção introduzida pelo Decreto n.º 139/X, da Assembleia da República, de comunicação da decisão de avaliação da matéria colectável através de métodos indiciários à entidade da tutela, para efeitos de averiguações, quando essa decisão se reporte a funcionário ou titular de cargo, é susceptível de violar o princípio da igualdade no ponto em que a diferenciação que assim se estabelece em relação a qualquer outro cidadão contribuinte não se encontra justificada por um qualquer fundamento material válido.
A aludida norma não poderá deixar de ser interpretada como impondo à administração tributária a obrigação de comunicar a um órgão administrativo (que detenha poderes de inspecção sobre o funcionário ou titular de cargo) a simples decisão de submeter esse funcionário ou agente a um procedimento de avaliação indirecta para efeitos da determinação da matéria tributável. A comunicação deverá conduzir, como necessária decorrência da imposição legal, à abertura de um processo de averiguações que, dentro do quadro jurídico definido pelo artigo 88.º do Estatuto Disciplinar, implica a realização de diligências destinadas a detectar a eventual existência de faltas ou irregularidades no funcionamento dos serviços, e que poderão culminar com a subsequente instauração de um processo de inquérito ou um processo disciplinar.
Embora se reconheça, em tese geral, a existência de um princípio de cooperação entre as entidades administrativas relativamente à notícia e participação de factos praticados por um qualquer funcionário ou agente que sejam susceptíveis de integrarem uma infracção disciplinar (artigo 46.º do Estatuto Disciplinar), o que sobreleva no dever de comunicação previsto na citada norma do n.º 10 do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária, é a circunstância de a administração tributária se aproveitar do conhecimento privilegiado de que dispõe relativamente à situação fiscal de um funcionário para despoletar a realização de averiguações sobre eventuais comportamentos disciplinarmente puníveis, quando é certo que, por um lado, os dados recolhidos sobre a situação tributária dos contribuintes está sujeita, em princípio, a uma reserva de confidencialidade (artigo 64.º da Lei Geral Tributária), e, por outro lado, o que está na origem do dever de comunicação é uma mera decisão de procedimento tributário, e, por isso, uma decisão administrativa que em si mesma não é indiciária do cometimento de qualquer falta ou irregularidade que deva ser valorada disciplinarmente.
É claro que a Administração Pública e os seus funcionários e agentes, quando no exercício da suas funções, estão vinculados a um princípio de legalidade (artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa).
Porém, a principal consequência que daí decorre é a de que os cidadãos poderão reagir jurisdicionalmente contra quaisquer actuações materiais ilícitas ou decisões administrativas ilegais que lesem os seus direitos ou

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interesses legalmente protegidos (artigo 268.º, n.os 4 e 5, da Constituição da República Portuguesa); e, no plano das relações internas, o Estado e as demais entidades públicas poderão ainda accionar a responsabilidade civil, criminal e disciplinar dos seus funcionários e agentes pelas acções e omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício (artigo 271.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa). Nestes termos, a responsabilidade específica do funcionário e agente público pressupõe uma conexão funcional com o serviço, não podendo estar em causa simples comportamentos privados, nem bastando uma relação indirecta ou ocasional com o serviço (Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª edição revista, Coimbra, pág. 952).
Assim se compreende que, contrariamente ao que resultava do antigo estatuto disciplinar de 1943, o actual regime legal tenha passado a definir a infracção disciplinar como o facto praticado «com violação de algum dos deveres gerais ou especiais decorrentes da função», tendo deixado de a caracterizar como uma infracção desse tipo a violação de deveres sociais e, portanto, a simples a contravenção de deveres inerentes à vida privada do funcionário (cfr. artigo 3.º, n.º 1, do Estatuto Disciplinar aprovado pelo Decreto-Lei n.º 24/84, de 16 de Janeiro, no confronto com o artigo 2.º do Estatuto Disciplinar, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 32659, de 9 de Fevereiro de 1943).
No caso vertente, o que está em causa é a prolação pela administração tributária de uma decisão procedimental que implica a sujeição do contribuinte a uma avaliação indirecta da matéria tributável, quando se considerem verificados os pressupostos previstos no n.º 1 do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária, e que se traduzem na possível divergência entre a situação declarada pelo interessado, para efeitos tributários, e os meios de fortuna que externamente evidencie. Essa decisão, de natureza administrativa, é susceptível de recurso para o tribunal tributário, por parte do contribuinte (artigo 89.º-A, n.º 6), que poderá desde logo discutir, por essa via, a validade dos indicadores que serviram de base à avaliação indirecta. Por outro lado, a decisão, para além de poder ser revista jurisdicionalmente, não indicia em si mesma a prática de qualquer comportamento disciplinarmente censurável. Isto é, o que se pretende que seja comunicado ao serviço ou entidade administrativa com competência disciplinar sobre o contribuinte-funcionário não é a ocorrência de quaisquer factos indiciários de faltas ou irregularidades cometidas no âmbito da relação de serviço de que se tenha tomado conhecimento no âmbito de um procedimento tributário, mas unicamente a decisão (adoptada nesse procedimento) de que resulta para o interessado uma certa consequência fiscal.
E o que é importante notar é que essa comunicação é impulsionada por uma situação da vida particular do funcionário, como é o facto de este, enquanto mero cidadão, se ter relacionado com a administração no âmbito de uma relação jurídica tributária.
O comando contido na referenciada norma do n.º 10 do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária evidencia, como bem se vê, uma injustificável permeabilidade entre a relação jurídica tributária e a relação de serviço, e coloca o funcionário ou agente administrativo numa situação mais gravosa de qualquer outro cidadão contribuinte, sem que para isso subsista um fundamento material válido.
É patente que não há uma qualquer equivalência entre a sujeição comum de qualquer cidadão de vir a ser objecto, fundada ou infundadamente, de uma denúncia que envolva a eventual instauração de um processo sancionatório, e a situação particular do funcionário que, apenas pelo facto de o ser, passa a ter um tratamento diferenciado em relação a qualquer outro cidadão contribuinte, a ponto de a sua inclusão numa certa situação fiscal vir a desencadear, não apenas as consequências que estão definidas, em geral, para todos os contribuintes, mas também a suspeição do envolvimento em irregularidades em termos de justificar a abertura de um processo de averiguações.
É claro que um tal processo de averiguações, tendo por base uma decisão de procedimento tributário que prefigura uma divergência entre os meios de fortuna que o funcionário ostenta na sua vida privada e a declaração de rendimentos para efeitos fiscais, apenas pode ter como objectivo a indagação de factos que possam indiciar a obtenção de ganhos ilícitos — e que, por isso, se relaciona directamente, não com quaisquer considerações de interesse público que possam justificar uma reorganização dos serviços ou uma modificação do seu funcionamento, mas com a própria posição jurídica do funcionário. E neste plano de análise, o que interessa reter — conforme se deixou já esclarecido — é que não é uma simples decisão administrativa incidente sobre a situação fiscal do contribuinte, desligada de factos indiciários da prática de infracção disciplinar (que, a existirem, justificariam a instauração de processo disciplinar e não de mero processo de averiguações), que pode vir a interferir ao nível na relação de serviço, quando o contribuinte detenha também a qualidade de funcionário. Isso porque, como também se anotou, não é o presuntivo incumprimento de um dever fiscal (por não correspondência entre os rendimentos declarados e os rendimentos efectivamente existentes) que pode constituir, por si, uma infracção disciplinar.
De outro modo, a aceitar-se uma diferença específica com base no estatuto profissional dos contribuintes, sempre se poderia perguntar por que é que idêntico regime não é tornado extensivo a qualquer trabalhador activo, que, mesmo que inserido numa relação de trabalho de direito privado, está igualmente sujeito ao poder disciplinar da entidade empregadora.
Por tudo, entende-se que a parte final da norma do n.º 10 do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária, na redacção introduzida pelo Decreto n.º 139/X, da Assembleia da República, viola o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º, n.º 1, da Constituição da República, enquanto determina uma diferenciação entre cidadãos, com base em condições meramente subjectivas, e potencia, nesses termos, uma desigualdade na

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aplicação do direito. Pelo que, também nessa parte, ter-me-ia pronunciado pela inconstitucionalidade do referido segmento normativo.

Carlos Alberto Fernandes Cadilha.
Declaração de voto

Votei vencido quanto à alínea b) da decisão, no essencial pelas razões que, dadas as circunstâncias, muito sumariamente, passo a expor:

1 — Em primeiro lugar, porque considero que a Constituição da República Portuguesa não consagra um direito fundamental ao sigilo bancário para os clientes das instituições financeiras sujeitas ao dever de segredo.
Desde logo, porque um tal direito não consta de disposição expressa da Constituição, mas também porque considero que o sigilo bancário resultante do dever de segredo imposto às instituições financeiras se não encontra coberto pela reserva de intimidade da vida privada consagrada no artigo 26.º, n.º 1, da Constituição.
Na verdade, os elementos constantes dos ficheiros e documentos sujeitos ao dever de segredo por parte das instituições financeiras, além de dizerem respeito a transacções em que a própria instituição financeira é parte, não fazem naturalmente parte da esfera íntima do cliente e, em última instância, contêm apenas informação voluntariamente cedida às instituições financeiras, no decurso de transacções financeiras comuns, sem que daí decorra que, de cada vez que uma tal transacção acontece, o cliente esteja a expor a intimidade da sua vida privada a todos os empregados bancários com acesso às respectivas contas ou ao tratamento dos elementos da respectiva transacção.
2 — Em segundo lugar, consequentemente, porque, não sendo o sigilo bancário um direito fundamental dos clientes das instituições financeiras, estamos fora do âmbito de direitos, liberdades e garantias, o que implica que a liberdade de conformação do legislador não está necessariamente sujeita aos estritos limites constantes dos n.os 2 e 3 do artigo 18.º da Constituição. E, sendo assim, como iniludivelmente me parece que é, a criação pelo legislador, dentro da sua liberdade de conformação, de um sistema em que a administração tributária — incumbida da liquidação e cobrança da tributação que, constitucionalmente, visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas, bem como uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza e, também ela, sujeita ao dever de segredo — tem acesso a dados protegidos pelo sigilo bancário legalmente estabelecido, não afronta, em si mesmo, o Estado de direito democrático, nem quaisquer preceitos ou princípios constitucionais. Sendo ainda certo que, não valendo o actual artigo 63.º-B da Lei Geral Tributária como parâmetro de aferição da validade de quaisquer medidas legislativas respeitantes ao levantamento do referido sigilo, as diferenças de regime eventualmente existentes, além de se poderem incluir na já mencionada liberdade de conformação, não têm de «ser ponderadas na avaliação de conformidade constitucional das medidas em apreço».
3 — Finalmente, porque entendo, ao contrário da maioria que fez vencimento, que o acesso por parte da administração tributária a dados cobertos pelo sigilo bancário, quando, face a factos alegados pelo contribuinte, que pretende a anulação de actos tributários, tal se apresente como uma diligência manifestamente indispensável (e, consequentemente, em absoluto, fundadamente se justifique) para concretizar a justiça fiscal e a igualdade contributiva constitucionalmente exigidas e menos consideradas na tese vencedora (conferindo ou negando razão ao reclamante/impugnante), não afecta, em nada, quaisquer direitos de reclamação ou de impugnação. Aliás, nos casos em análise, constatando-se que, na ausência de um tal acesso, é consabido que é a administração tributária quem tem «o braço mais curto», tal acesso, ao invés de constituir um «contra-motivo ao exercício de direitos básicos do administrado» e de pôr em causa a tutela jurisdicional efectiva e o direito a um processo equitativo, constituirá, porventura, condição essencial para que este último tenha efectivamente lugar. Sendo ainda certo que, em última instância, caberá sempre a um tribunal apreciar a prova adicional produzida e o respectivo valor.
4 — Neste contexto, pronunciei-me pela não declaração de inconstitucionalidade dos n.os 2 e 3 do artigo 69.º e dos n.os 2 e 3 do artigo 110.º, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na redacção dada pelo artigo 3.º do Decreto n.º 139/X, da Assembleia da República.

Gil Galvão.
Declaração de voto

1 — Devo começar por dizer, quanto à alínea b) da decisão — que, todavia, subscrevo —, que, na minha opinião, o Acórdão n.º 198/2003 pretendeu não tomar posição sobre se «o direito de reclamação» se inclui, ou não inclui, «no disposto no artigo 52.º da Constituição», diferentemente do que se afirma no ponto 17.1. do

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presente aresto, onde se diz que o Tribunal, no referido Acórdão, optou por entender que «essa tutela não se inclui no disposto no artigo 52.º da Constituição da República Portuguesa».
2 — E votei vencido quanto à alínea a) da decisão pelas razões que, em síntese, são as seguintes: A norma impugnada determina que, no caso de a avaliação da matéria colectável ocorrer com recurso ao método indirecto, a respectiva decisão da administração fiscal deverá ser comunicada ao Ministério Público e, no caso de o contribuinte ser funcionário público ou agente de entidade pública, também «à tutela deste», «para efeitos de averiguações no âmbito da respectiva competência».
Esta técnica (seja qual for o real alcance da norma, que não foi averiguado) radica no entendimento — que o acórdão subscreve mas que, salvo o devido respeito, não acompanho — de que a divergência entre a declaração de rendimentos do contribuinte e aquilo que o legislador entende ser o padrão médio de vida do cidadão com tais rendimentos, conduz irrecusavelmente a um juízo de censura social do contribuinte, não dando margem a que se tenha por não ilegítimo um comportamento (leia-se, declaração de rendimento para efeitos fiscais) que se revele não totalmente coincidente com a avaliação da administração fiscal, mesmo nos casos em que, na determinação final, não ocorre a intermediação de um órgão independente, como é um tribunal.
Nesta óptica, a norma não terá outra utilidade que não a de exercer uma clara função intimidadora do contribuinte, especialmente quando este é funcionário ou agente público que, por esta via, vê ligar-se a estabilidade do seu emprego e a reserva da intimidade da sua vida privada e familiar à docilidade com que aceita as prescrições administrativas da autoridade fiscal.
É que as regras legais em vigor — retiradas, por exemplo, do estatuto do Ministério Público, do processo penal e do estatuto da Função Pública — já impõem o dever de denúncia de crimes, ou de ilícitos disciplinares, às autoridades com competência para a investigação criminal, ou para o procedimento disciplinar, conforme os casos, quando a notícia de qualquer uma destas infracções é conhecida no decorrer da actividade das autoridades públicas.
Mas não é isto — por evidente desnecessidade — que a norma pretende reafirmar: o que se pretende é que, mesmo não ocorrendo nenhuma infracção, quer de natureza criminal, quer de natureza disciplinar, a administração passe a denunciar a situação fiscal do contribuinte, comunicando ao serviço onde presta funções o funcionário ou o agente a «decisão de avaliação da matéria colectável», decisão onde necessariamente constam dados sobre a vida privada do cidadão, permitindo ainda — dada a imprecisão normativa — que, de um modo totalmente abusivo, se possa entender que a incorrecta declaração fiscal signifique autonomamente ilícito disciplinar.
A meu ver, a norma provoca, sem justificação suficiente, a violação do sigilo fiscal, garantia que este Tribunal já reconheceu assumir «um carácter instrumental de protecção do direito à reserva da intimidade da vida privada» (Acórdão n.º 256/2002).
Votei, portanto, no sentido da inconstitucionalidade da norma, por desconformidade com o artigo 26.º, n.os 1 e 2, da Constituição.

Carlos Pamplona de Oliveira.

———

DECRETO N.º 150/X (APROVA O REGIME DE RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO E DEMAIS ENTIDADES PÚBLICAS)

Mensagem do Presidente da República fundamentando a recusa de promulgação e devolvendo o decreto para reapreciação

Nos termos do artigo 136.º, n.º 1, da Constituição, junto devolvo, sem promulgação, o Decreto da Assembleia da República n.º 150/X, que «Aprova o regime de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas», recebido na Presidência da República no dia 8 do corrente para ser promulgado como lei, com os fundamentos constantes da mensagem que anexo.
Tendo recebido para promulgação como lei o Decreto n.º 150/X, da Assembleia da República, que aprova o regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas, decidi, nos termos da alínea b) do artigo 134.º e do artigo 136.º da Constituição da República Portuguesa, não promulgar aquele diploma, com os seguintes fundamentos:

1 — O diploma em apreço vem substituir o regime de responsabilidade civil extracontratual do Estado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48.051, de 21 de Novembro de 1967, o qual vigorou cerca de quatro décadas.
2 — O novo regime, aprovado por unanimidade na Assembleia da República no culminar de um longo processo legislativo, introduz uma autêntica mudança de paradigma no quadro da responsabilidade extracontratual do Estado, que é profundamente remodelada num sentido claramente ampliador da

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responsabilidade das entidades públicas, nomeadamente pelo exercício de funções administrativas, jurisdicionais, políticas e legislativas; 3 — Importa, por isso, que um diploma desta natureza contenha soluções normativas claras e transparentes do ponto de vista técnico-jurídico e, sobretudo, acolha regras e princípios cujo alcance haja sido devidamente ponderado e amadurecido, quer do ponto de vista conceptual quer do ponto de vista das suas possibilidades de concretização e de todas as suas consequências, maxime no plano financeiro, atendendo ao contexto específico do actual nível de desenvolvimento do País, no confronto com outros Estados europeus.
4 — De facto, uma alteração desta magnitude implica, naturalmente, um acréscimo significativo das despesas do Estado, em montantes que não é possível quantificar ou prever, e irá ter, por certo, um impacto muito profundo ao nível do funcionamento dos tribunais e dos serviços públicos em geral.
5 — Assim, em ordem a uma adequada defesa dos superiores interesses públicos, e sem questionar, de forma alguma, a oportunidade da introdução de um novo modelo de responsabilidade civil extracontratual do Estado, considero que será da maior conveniência que os Deputados à Assembleia da República reponderem a repercussão das soluções constantes do diploma.
Importa, na verdade, não esquecer que a responsabilidade do Estado é suportada, ao fim e ao cabo, pelos contribuintes e que o respectivo accionamento exige sempre a intervenção dos tribunais. Ora, várias soluções do diploma não só são de molde a produzirem consequências financeiras cuja razoabilidade em termos de esforço fiscal é questionável, como são potencialmente geradoras de uma tal sobrecarga sobre o aparelho judiciário que, provavelmente, se revelará desproporcionada.
Assim, sem que se pretenda debater em profundidade aspectos particulares do diploma, considero relevante fazer menção a algumas soluções nele consagradas, relativamente às quais julgo ser pertinente uma reponderação.
6 — No que concerne à responsabilidade civil por danos decorrentes do exercício da função administrativa, a obrigatoriedade do exercício do direito de regresso (artigo 6.º) dos titulares de órgãos, funcionários e agentes, em caso de dolo ou de culpa grave, pela prática ou omissão ilícitas de um acto determinante de indemnização, implicará o desencadear sistemático de processos de averiguação sobre o eventual dolo ou grau de culpa.
Resulta daqui que, sempre que o Estado for processado por acção ou omissão ilícitas, no exercício da função administrativa, o funcionário ou titular de órgão ver-se-á envolvido no respectivo processo judicial, com todos os encargos e ónus daí decorrentes. Assim o determina o n.º 4 do artigo 8.º, ao dispor que o apuramento de grau de culpa se faz no processo de determinação de indemnização e que «a respectiva acção judicial prossegue nos próprios autos, entre a pessoa colectiva de direito público e o próprio funcionário, para apuramento do grau de culpa deste e, em função disso, do eventual direito de regresso por parte daquela».
Ora, os actos em causa podem corresponder a vultuosos interesses violados, sem que o funcionário ou dirigente possa, de alguma forma, eximir-se à sua participação na decisão, sob pena de violar os seus deveres, sendo que não há qualquer controlo sobre a proporcionalidade entre os interesses que o funcionário representa — os interesses do Estado — e a sua capacidade financeira para ressarcir os particulares lesados.
Ainda que se venha a demonstrar não ter agido com dolo ou culpa grave, sempre terá que ser demandado obrigatoriamente, suportando os custos da defesa e a incerteza da decisão.
Recorde-se, a este propósito, que os interesses dos particulares já se encontram devidamente protegidos pela resposta solidária a que o Estado está vinculado.
Além disso, a assunção de cargos de responsabilidade pode ser seriamente dificultada, se as pessoas tiverem plena consciência dos riscos que correm em caso de decisão contestável, como terão necessariamente que ter e ser especialmente esclarecidas sobre esse aspecto, não sendo de excluir que os responsáveis administrativos procurem evitar a todo o custo tomar decisões contrárias aos interesses manifestados pelos particulares, pondo assim em risco a imparcialidade devida e a salvaguarda do interesse público.
7 — O conceito de responsabilidade por funcionamento anormal dos serviços, que é caracterizado através do recurso à noção de «padrões médios de resultado» (artigo 7.º, n.º 4), pode implicar, no limite, que a circunstância de um serviço não ter alcançado um «resultado médio» possa ser encarado como sinónimo de «funcionamento anormal». Ora, não pode deixar de se questionar o uso de um critério de «mediania de resultado» para aferição de uma realidade mais grave — a anormalidade do funcionamento do serviço.
O realismo inerente à aplicação deste acto legislativo aconselharia, por outro lado, que a definição do conceito de «funcionamento anormal do serviço» integrasse igualmente como padrão os meios disponíveis pela Administração Pública.
8 — No contexto da responsabilidade por danos causados no exercício da função jurisdicional, o diploma em apreço consagra (artigo 13.º) um princípio geral de responsabilidade do Estado por erro judiciário — realidade que, em bom rigor, não deve ser confundida com a da revogação de uma decisão judicial por uma instância superior.
Ora, a previsão de responsabilidade por erro judiciário é feita de um modo de tal forma abrangente que poderá conduzir a essa confusão, com consequências difíceis de prever a todos os níveis, incluindo o da

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salvaguarda do princípio da independência dos tribunais, entendido este na sua dimensão da liberdade de julgamento.
Suscita-se, ainda a este propósito, uma segunda ordem de considerações, a qual tem a ver com a determinação do carácter «manifesto» da inconstitucionalidade ou da ilegalidade da decisão, ou do carácter «grosseiro» da apreciação dos pressupostos de facto.
É certo que um pedido de indemnização dependa de prévia revogação da decisão danosa na respectiva ordem jurisdicional, mas quem vai decidir sobre o carácter «manifesto» da ilegalidade ou sobre o carácter «grosseiro» do erro de valoração da prova? Nada dizendo o diploma a esse respeito, a conclusão a tirar parece ser a de que tal juízo competirá ao tribunal competente para a acção de indemnização. Ora, esta solução não é isenta de crítica. De facto, a mesma lógica institucional e normativa, que conduz a condicionar o pedido de indemnização à revogação da decisão danosa na respectiva ordem de jurisdição, impõe que também seja esta ordem de jurisdição a dizer se o erro cometido pelo tribunal recorrido foi manifesto ou grosseiro, quanto ao direito ou quanto à apreciação dos factos. De outro modo, e em se tratando de responsabilidade pela decisão errada de um tribunal judicial, teríamos que, depois de ela haver sido revogada por um Tribunal da Relação ou pelo Supremo Tribunal de Justiça, iria ser um tribunal administrativo, por fim, a apreciar a gravidade do erro. Se for esta a solução a acolher no futuro, corre-se o risco de se verificar uma grave violação da independência de cada ordem de jurisdição — a qual reverte, ao fim e ao cabo, ao próprio princípio da independência da função judicial.
9 — Suscitam-se, igualmente, dúvidas sobre a clareza da solução acolhida quanto à responsabilidade dos magistrados judiciais e do Ministério Público (artigo 14.º, n.º 1).
Razões de segurança jurídica e de garantia do princípio da independência e irresponsabilidade dos magistrados judiciais aconselhariam a densificação dos conceitos de culpa grave e dolo para os efeitos da propositura da acção do direito de regresso, à semelhança do que sucede em outros ordenamentos europeus.
As garantias constitucionais de independência e irresponsabilidade dos magistrados judiciais impõem que estes só respondam por violações concretas dos deveres funcionais e nunca por eventuais erros ou incorrecções das decisões que proferem.
Importaria, assim, clarificar, na previsão contida no n.º 2 do artigo 14.º, que competirá aos conselhos de disciplina dos magistrados a averiguação prévia da violação concreta dos seus deveres funcionais, para efeitos do apuramento da natureza gravemente culposa ou dolosa da sua conduta. Essa precisão evitaria o risco de uma interpretação indevida do preceito, no sentido de que a proposição da acção de regresso pelos, conselhos decorreria automaticamente da condenação do Estado nos termos do artigo 13.º, a qual ofenderia as referidas garantias constitucionais.
10 — No âmbito da responsabilidade por actos das funções política e legislativa, verifica-se que, de uma ausência quase total de fundamentos para a proposição da correspondente acção de responsabilidade civil contra o Estado, se transita para uma desmesurada extensão das hipóteses de responsabilidade. Tal é patente no facto de se prever, para além da responsabilidade pelo ilícito decorrente da inconstitucionalidade por acção e omissão, também a que emerge da violação, por acção ou omissão, de obrigações impostas pelo direito internacional, direito comunitário e lei com valor reforçado.
11 — Impõe-se, antes de mais, assinalar uma discrepância textual e lógico-sistemática entre a epígrafe do Capítulo IV, que se reporta às «funções política e legislativa», e a epígrafe do artigo 15.º, que menciona a função «político-Iegislativa». Terá pretendido o legislador reconduzir a actividade política e a legislativa a funções distintas ou condensá-las na mesma função? Trata-se de uma redacção deficiente e geradora de incerteza jurídica quanto à determinação do objecto específico da responsabilidade.
Quanto à extensão dos pressupostos geradores de responsabilidade, afigura-se ser problemática e preocupante a solução acolhida quanto à responsabilidade por danos provocados, tanto por actos desconformes ao direito internacional e ao direito comunitário (artigo 15.º, n.º 1), como pela omissão das medidas legislativas necessárias para conferir exequibilidade a normas de convenções internacionais e a normas comunitárias que delas careçam (artigo 15.º, n.º 3).
Isto, não só pelo que tal significa em termos dos efeitos financeiros e processuais derivados de um profundo alargamento da responsabilidade dos entes públicos, como também pelo facto de criar um incomportável cenário de dupla oneração do Estado, que responderia pelo mesmo incumprimento, tanto no plano interno, como no plano comunitário e internacional.
Não parece, também, ser aceitável a consagração de um instituto de responsabilidade civil extracontratual fundado na omissão de providências legislativas necessárias para dar exequibilidade a actos legislativos de valor reforçado (artigo 15.º, n.º 3).
Esse instituto jurídico resulta na criação de um sistema implícito e subliminar de «fiscalização difusa da legalidade por omissão» para efeitos da constituição do Estado em responsabilidade civil, o qual merece reparo, na medida em que:

a) Cria situações de grande incerteza jurídica ao disseminar pelos tribunais comuns o poder de verificar uma situação omissiva de legislação complementar de lei reforçada, com base em pressupostos incertos e sem a existência de institutos suficientes e céleres de uniformização jurisprudencial, instituindo, deste modo,

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um sistema potenciador de desarmonia de julgados, situações de desigualdade entre particulares e insegurança jurídica; b) Dispensa, sem fundamento razoável, a intervenção do Tribunal Constitucional, como «juiz de leis», para a situação da omissão de normas legais que confiram exequibilidade a leis reforçadas, quando determina (artigo15.º, n.º 5) essa mesma intervenção na situação paralela de prévia verificação de uma inconstitucionalidade por omissão (situação cuja alteração deveria revestir a forma de lei orgânica); c) Não define os requisitos geradores de ilicitude decorrente da omissão de providências legislativas que confiram exequibilidade a leis de valor reforçado, daí; resultando uma larga margem de casuísmo e incerteza que deprecia a liberdade conformadora do legislador. Abrangerá, por exemplo, a referida omissão, apenas inobservância dos prazos fixados nas leis reforçadas, tendo em vista a respectiva complementação legal, ou envolverá igualmente outras disposições constantes dessas leis que, carecendo de desenvolvimento legal, não fixam prazos para esse efeito?

12 — No plano do julgamento da inconstitucionalidade e ilegalidade por acção, crê-se que se deveria ponderar, pelo menos numa fase transitória, um regime mais cautelar e prudente, nos termos do qual a responsabilidade pelo exercício da função legislativa se cingisse aos casos em que exista prévia declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral por parte do Tribunal Constitucional. Tais razões prudenciais decorrem nomeadamente:

— Da necessidade de se evitar situações incertas e desiguais derivadas de uma desarmonia de julgados, que podem afectar o próprio Tribunal Constitucional em sede de fiscalização concreta, questionando a justeza das indemnizações atribuídas com fundamento em normas que, tendo sido julgadas inconstitucionais ou ilegais, deixaram posteriormente de o ser em jurisprudência constante do mesmo Tribunal; — Da circunstância de se poder precludir a constituição do Estado em responsabilidade, mesmo quando os particulares sejam prejudicados por lei inconstitucional se, ao abrigo do n.º 4 do artigo 282.º da Constituição, o Tribunal Constitucional vier a restringir temporalmente os efeitos da sua decisão, por razões de segurança jurídica, equidade e interesse público, salvaguardando os efeitos passados da mesma lei que julgou inconstitucional.

Acrescente-se que não se entende a razão pela qual o diploma exige um carácter manifesto para a inconstitucionalidade que afecte decisões judiciais e prescinda desse mesmo grau de evidência para os actos legislativos. Seria, porventura, mais prudente restringir a responsabilidade a casos de leis manifestamente inconstitucionais ou ilegais.
Finalmente, não se qualifica o tipo de inconstitucionalidade relevante para acarretar a responsabilidade dos entes públicos (artigo 15.º, n.º 4), diferindo para o aplicador um poder de inovação criadora de direito que deve competir ao legislador. Semelhante opção normativa pode gerar situações de desigualdade, bem como de incerteza quanto ao desfecho processual, na medida em que, por exemplo, nalguns casos se fará relevar apenas a inconstitucionalidade material como fundamento da existência da responsabilidade, enquanto noutros poderão ser valorados, para o mesmo efeito, os restantes tipos de inconstitucionalidade.
13 — Importaria ponderar sobre se não seria mais adequado que os danos susceptíveis de indemnização fossem circunscritos ao universo da violação de direitos, liberdades e garantias, tal como se estabelece no artigo 22.º da Constituição, ao invés de se potenciar o alargamento da responsabilidade à afectação de outros direitos, opção susceptível de originar obrigações e encargos financeiros imprevisíveis para o Estado.
14 — Finalmente, de um ponto de vista global, ultrapassando considerações de cariz técnico-jurídico de pormenor, considero que a questão fulcral que me leva a pedir a reapreciação deste diploma situa-se no seguinte ponto: o presente regime de responsabilidade extracontratual do Estado reclama um esforço suplementar de reflexão dos Deputados quanto aos seus efeitos. Desde logo, quanto aos seus efeitos no plano da sanidade e equilíbrio das finanças do Estado, os quais derivam, sobretudo, do modelo adoptado pelo diploma para o regime de responsabilidade devido ao exercício da função legislativa. Depois, relativamente às consequências que se irão verificar no domínio da eficiência do sistema de justiça, num momento em que este se encontra num profundo processo de reforma com vista a dar resposta a outras exigências. Por fim, no tocante ao funcionamento e modernização da Administração Pública, que podem ser seriamente postas em causa por um regime que, querendo estimular a competência e o sentido da responsabilidade, acabe por fomentara paralisia e a «não-decisão».
Considero, em síntese, que deve ser repensado o pressuposto essencial em que assenta o presente diploma, nos termos do qual o Estado assumiria uma função «previdencialista» dos danos e riscos sociais através de uma expansão excessiva dos pressupostos de responsabilidade das entidades públicas, com especial relevo no domínio do exercício da função legislativa, ponto que não deixaria de contribuir, em prejuízo manifesto do interesse nacional, para uma relação pouco solidária entre o poder político e a sociedade civil.
Ante o exposto, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 134.º, alínea b), e 136.º, n.º 1, da Constituição da República, decidi não promulgar como lei o Decreto n.º l50/X da Assembleia da República, solicitando, pelos fundamentos apresentados, uma nova apreciação do citado diploma.

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Lisboa, 24 de Agosto de 2007.
O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.

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DECRETO N.º 160/X (APROVA A ORGÂNICA DA GUARDA NACIONAL REPUBLICANA)

Mensagem do Presidente da República fundamentando a recusa de promulgação e devolvendo o decreto para reapreciação

Nos termos do artigo 136.º, n.º 1, da Constituição, junto devolvo, sem promulgação, o Decreto da Assembleia da República n.º 160/X, que «Aprova a orgânica da Guarda Nacional Republicana», recebido na Presidência da República no dia 9 do corrente para ser promulgado como lei, com os fundamentos constantes da mensagem que anexo.
Tendo recebido, para ser promulgado como lei, o Decreto n.º 160/X, da Assembleia da República, que aprova a orgânica da Guarda Nacional Republicana, decidi, nos termos do n.º 1 do artigo 136.º da Constituição da República Portuguesa, não promulgar aquele diploma, com os seguintes fundamentos:

1 — O Decreto n.º 160/X, da Assembleia da República, que aprova a orgânica da Guarda Nacional Republicana, tem por objecto o exercício de funções de soberania nacional e reveste-se, por isso, da maior relevância, seja na perspectiva da configuração da Guarda Nacional Republicana como força de segurança seja nas óbvias implicações na organização da defesa nacional e até nas missões das Forças Armadas.
Esta última constatação está comprovada na natureza militar da Guarda Nacional Republicana; na sua missão de «colaborar na execução da política de defesa nacional», na sua atribuição de «cumprir, no âmbito da execução da política de defesa nacional e em cooperação com as Forças Armadas, as missões militares que lhe forem cometidas»; na possibilidade de a Guarda ser colocada sob o comando superior das Forças Armadas, nos termos da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas e do Regime do Estado de Sítio e do Estado de Emergência; na sua dependência do Ministro da Defesa Nacional quanto «à uniformização, normalização da doutrina militar, do armamento e do equipamento»; na sujeição dos que a integram «à condição militar»; na missão que agora se pretende atribuir à Guarda no âmbito do mar territorial português.
2 — Os reflexos na organização da defesa nacional e nas Forças Armadas assumem particular destaque nas alterações introduzidas pelo Decreto n.º 160/X ao nível da estrutura de comando da Guarda Nacional Republicana e na criação de uma subcategoria profissional de oficiais generais específica da Guarda.
Estas alterações não favorecem a necessária complementaridade entre as Forças Armadas e a Guarda Nacional Republicana e contendem com o equilíbrio e a coerência actualmente existentes entre ambas e com o modo do seu relacionamento, podendo afectar negativamente a estabilidade e a coesão da instituição militar por que ao Presidente da República cabe zelar, também pela inerência das suas funções de Comandante Supremo das Forças Armadas.
3 — É desnecessário sublinhar o quanto seria desejável que matérias sensíveis nas áreas da defesa e da segurança nacionais, como é o caso do conteúdo normativo do Decreto n.º 160/X, da Assembleia da República, fossem objecto de um amplo consenso político e jurídico em sede parlamentar, o que, como é sabido, acabou por não se verificar.
4 — A natureza, a relevância e a dignidade das matérias em causa aconselham, pois, a que algumas das soluções normativas acolhidas no presente diploma sejam objecto de adequada ponderação adicional por parte dos Deputados à Assembleia da República.
5 — O decreto em apreço prevê que o comandante-geral da Guarda Nacional Republicana seja um tenente-general, implicando a nomeação a graduação no posto de general, o que não acontece actualmente.
Mais: prevê que a nomeação do comandante-geral seja feita por despacho conjunto do Primeiro-Ministro e dos ministros responsáveis pelas áreas da defesa nacional e da administração interna, mediante audição do Conselho de Chefes de Estado-Maior se a nomeação recair em oficial general das Forças Armadas.
6 — Desde logo, não se vislumbra qualquer fundamento coerente para esta alteração na estrutura de comando da Guarda, não sendo esta comparável, na complexidade estrutural e nas exigências funcionais e operacionais, com o Estado-Maior-General das Forças Armadas e com os três ramos das Forças Armadas.
A atribuição do posto de general ao comandante-geral da Guarda Nacional Republicana não é uma mera questão protocolar ou de forma. Muito diferentemente, na atribuição do posto de general ao comandante-geral da Guarda Nacional Republicana estamos perante matéria de fundo, que representa uma alteração significativa relativamente ao regime actual e que contende seriamente com o equilíbrio existente no seio das chefias militares e com a organização da defesa nacional.
7 — De acordo com o Estatuto dos Militares das Forças Armadas, o posto de general corresponde actualmente tão só aos cargos militares aos quais a Constituição da República Portuguesa reconhece especial relevância, cometendo ao Presidente da República a competência para a nomeação e a exoneração, sob

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proposta do Governo, dos respectivos titulares: o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas e os Chefes de Estado-Maior dos três ramos das Forças Armadas.
Este significado constitucional resulta contrariado pelo Decreto n.º 160/X, ao contemplar o cargo de comandante-geral da Guarda Nacional Republicana com o mesmo nível hierárquico das chefias mais elevadas das Forças Armadas. Permitir-se-á, deste modo, inadequadas equiparações daquela a estas e poderá perverter-se a necessária complementaridade, concebida na lei, da Guarda perante as Forças Armadas e o eficaz relacionamento entre ambas.
8 — Estas alterações não têm paralelo nos países da União Europeia. Na verdade, nenhum outro país comunitário, com excepção da França, tem no activo em funções nacionais internas cinco generais e em nenhum país comunitário, sem excepção, o posto de general é atribuído a uma força de segurança não enquadrada de modo directo na estrutura da defesa nacional e não imediatamente dependente em termos operacionais do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas. Com este diploma, Portugal passaria a ser o único Estado-membro em que tal aconteceria.
9 — O desequilíbrio desta opção do Decreto n.º 160/X não é minorado pela atribuição do posto de general ao comandante-geral da Guarda através do mecanismo jurídico da graduação. De facto, a figura da graduação anda estruturalmente ligada, nos próprios termos da lei, a um carácter excepcional e temporário, mediante tramitação adequada e legalmente prevista. Ora, no caso em apreço não pode, em definitivo, falar-se daquele carácter excepcional e temporário. Seria altamente inconveniente que viesse a própria lei adulterar a figura da graduação, certamente não contribuindo para o prestígio, quer do posto de general quer da função de comandante-geral da Guarda Nacional Republicana.
10 — Trata-se, pois, de uma solução que não se enquadra na tradição da Guarda e para a qual não se identificam fundamentos de ordem organizativa, funcional ou operacional.
11 — O Decreto n.º 160/X, da Assembleia da República, preconiza a criação na Guarda Nacional Republicana de uma subcategoria profissional própria de oficiais generais, iniciando-se hierarquicamente no posto de major-general.
Compreende-se que não seja este diploma, que aprova a orgânica da Guarda Nacional Republicana, a regular aquela matéria; e daí que se limite a confirmar a natureza militar da Guarda, a explicitar a sujeição dos seus militares às bases gerais do estatuto da condição militar, a enunciar as categorias profissionais, subcategorias e postos que integram a carreira militar da Guarda e a pressupor uma revisão legislativa com vista ao «novo Estatuto dos Militares da Guarda» 12 — Ainda assim, importa ponderar dois aspectos da maior sensibilidade, qualquer deles de particular significado para a defesa e a segurança nacionais, porquanto ambos relevam na preservação do equilíbrio e da coerência entre a Guarda Nacional Republicana e as Forças Armadas e, sem dúvida, também na estabilidade e na coesão destas.
Esta ponderação deve ocorrer já no âmbito do diploma orgânico ora em análise, pois que neste se criam os postos de oficial general da Guarda e está anunciada oficialmente a intenção de prover tais postos, quer com oficiais licenciados em ciências militares pela Academia Militar quer com oficiais que tenham complementado a formação obtida no curso de formação de oficiais com outra licenciatura relevante para o exercício de funções.
13 — Por um lado, deve considerar-se que, sendo militar a natureza da Guarda Nacional Republicana e correspondendo os postos da categoria profissional dos seus oficiais aos dos oficiais das Forças Armadas, os requisitos de promoção aos postos de oficiais generais da Guarda não poderão deixar de ser idênticos e conforme o estipulado no Estatuto dos Militares das Forças Armadas. Qualquer previsão facilitadora desta promoção ao nível das qualificações exigidas seria um factor de grave perturbação da instituição militar, pelas comparações com os três ramos das Forças Armadas a que daria lugar.
14 — Por outro lado, considerando ainda a natureza militar da Guarda e o contributo desta para a defesa nacional, importa ter presente que é fundamental, por razões operacionais, que se não quebrem os laços tradicionais existentes entre as Forças Armadas, maxime o Exército, e a própria Guarda Nacional Republicana, em termos de formação militar de quem nela desempenha as funções de comando mais relevantes.
Se, até hoje, esta essencial ligação pessoal entre o Exército e a Guarda se construía naturalmente pelo recurso a oficiais generais do primeiro, ao caminhar-se agora para um corpo de oficiais generais oriundos dos quadros da Guarda, toma-se imperativo que este novo corpo próprio de oficiais generais não deixe, no mínimo, de ter recebido formação de nível superior e qualificações complementares em tudo equivalentes às exigidas aos oficiais generais do Exército.
15 — A nova Unidade de Controlo Costeiro da Guarda Nacional Republicana assumirá missões que actualmente são cometidas à Marinha portuguesa, quer como força militar quer no âmbito do Sistema da Autoridade Marítima, o que reclama articulação entre as duas estruturas e regulamentação desta articulação e da repartição dos respectivos empenhos de meios.
Contendendo as missões daquela Unidade de Controlo Costeiro da Guarda com a organização da defesa nacional, considera-se que a articulação entre a Guarda e a Autoridade Marítima Nacional deve ser regulada, no mínimo, através de decreto regulamentar e não por portaria com prevê o Decreto n.º 160/X.

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Considerando estes fundamentos, decidi, pois, conforme o n.º 1 do artigo 136.º da Constituição da República Portuguesa, solicitar nova apreciação do Decreto n.º 160/X, devolvendo-o para este efeito à Assembleia da República sem promulgação.

Palácio de Belém, 29 de Agosto de 2007.
O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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