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Quarta-feira, 10 de outubro de 2012 II Série-A — Número 12
XII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2012-2013)
S U M Á R I O
Projetos de lei [n.os
251/XII (1.ª) e 302/XII (2.ª)]:
N.º 251/XII (1.ª) (Cria a comissão da Assembleia da República para a fiscalização do sistema de informações da república portuguesa): — Requerimento do PCP dando conta da retirada desta iniciativa legislativa.
N.º 302/XII (2.ª) — Cria a Comissão da Assembleia da República para a Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa (PCP). Propostas de lei [n.
os 52 e 54/XII (1.ª) e n.
o 101/XII (2.ª):
N.º 52/XII (1.ª) (Cria a bolsa nacional de terras para utilização agrícola, florestal ou silvo pastoril, designada por «bolsa de terras»): — Relatório da nova apreciação da Comissão de Agricultura e Mar e textos de substituição. (a)
N.º 54/XII (1.ª) (Aprova benefícios fiscais à utilização das terras agrícolas, florestais e silvo pastoris e à dinamização da bolsa de terras): — Vide proposta de lei n.º 52/XII (1.ª). (a)
N.º 101/XII (2.ª) — Aprova o regime de garantia de qualidade e segurança dos órgãos de origem humana destinados a transplantação no corpo humano, de forma a assegurar um elevado nível de proteção da saúde humana, transpondo a Diretiva 2010/53/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de julho de 2010, relativa a normas de qualidade e segurança dos órgãos humanos destinados a transplantação. Projetos de resolução [n.
os 473 a 475/XII (2.ª)]:
N.º 473/XII (2.ª) — Recomenda ao Governo a ponderação do número de dependentes para a isenção de taxas moderadoras (PS).
N.º 474/XII (2.ª) — Recomenda a adoção de medidas urgentes para apoiar com fundos comunitários o projeto de requalificação do Mercado do Bolhão (PCP).
N.º 475/XII (2.ª) — Determina a divulgação imediata das condições de acesso e a abertura dos concursos de apoio às Artes (PCP). (a) São publicados em Suplemento.
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PROJETO DE LEI N.º 251/XII (1.ª)
(CRIA A COMISSÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA PARA A FISCALIZAÇÃO DO SISTEMA DE
INFORMAÇÕES DA REPÚBLICA PORTUGUESA)
Requerimento do PCP dando conta da retirada desta iniciativa legislativa
Nos termos do disposto do n.º 1 do artigo 122.º do Regimento da Assembleia da República, e em virtude da
apresentação de um texto com alterações do projeto de lei que abrange a mesma matéria, o Grupo
Parlamentar do Partido Comunista Português comunica que retira a seguinte iniciativa legislativa:
Projeto de Lei n.º 251/XII (1.ª) – Cria a Comissão da Assembleia da República para a Fiscalização do
Sistema de Informações da República Portuguesa.
Assembleia da República, 10 de outubro de 2012.
Bernardino Soares
Presidente do Grupo Parlamentar do PCP
———
PROJETO DE LEI N.º 302/XII (2.ª)
CRIA A COMISSÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA PARA A FISCALIZAÇÃO DO SISTEMA DE
INFORMAÇÕES DA REPÚBLICA PORTUGUESA
Exposição de motivos
Acontecimentos recentes, relacionados com a atividade de um dos Serviços que integram o Sistema de
Informações da República Portuguesa (SIRP), concretamente o Sistema de Informações Estratégicas de
Defesa (SIED), vieram pôr de novo em evidência a inadequação do modelo de fiscalização do SIRP.
Na verdade, um antigo diretor do SIED foi acusado pelo Ministério Público da prática de crimes
relacionados com o exercício dessas funções e tornou-se evidente perante a opinião pública que os Serviços
de Informações foram utilizados para fins estranhos às suas atribuições, em benefício de interesses privados,
com violação do segredo de Estado.
Acontece porém que a prática de tais atos só foram objeto de investigação após terem sido denunciados
pela comunicação social. Apesar da existência de um Conselho de Fiscalização do SIRP, não foi por via da
sua intervenção fiscalizadora que os atos ilícitos foram detetados. Por outro lado, a ação investigatória que a
Assembleia da República deveria ter prosseguido ao tomar conhecimento da prática de atos ilícitos do âmbito
dos Serviços de Informações foi inviabilizada com a invocação dos dispositivos legais mediante os quais a
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Assembleia da República delega as suas competências fiscalizadoras no Conselho de Fiscalização do SIRP, e
foi obstaculizada pelo regime legal do segredo de Estado que impede a Assembleia da República de aceder a
informação classificada.
A questão que assim mais uma vez se coloca é a do modelo de fiscalização do SIRP por parte da
Assembleia da República, que se relaciona diretamente com uma outra questão, que é a do acesso da
Assembleia da República a matérias classificadas como segredo de Estado. O presente projeto de lei propõe-
se regular essas duas questões, que assumem uma transcendente importância democrática.
A primeira questão tem sido objeto de grande e justificada controvérsia ao longo dos anos. O regime de
fiscalização parlamentar do Sistema de Informações da República Portuguesa não é feito diretamente através
da Assembleia da República, como seria adequado, mas através da interposição de um Conselho de
Fiscalização, integrado por três personalidades que são indicadas por acordo entre os dois partidos com maior
representação parlamentar.
Importa salientar que a Assembleia da República, enquanto órgão de soberania, não se restringe aos dois
maiores partidos. Os Deputados dos dois maiores partidos não têm uma legitimidade superior à dos restantes.
Nem o Parlamento se reduz à maioria parlamentar, nem a oposição se reduz ao grupo parlamentar mais
numeroso da oposição. Não há fiscalização parlamentar democrática de coisa nenhuma quando uma parte do
Parlamento é pura e simplesmente excluída do exercício dessa fiscalização.
Importa por isso repensar de novo o modo de fiscalização parlamentar dos Serviços de Informações.
A proposta que o PCP apresenta, através do presente projeto de lei, faz assentar a fiscalização
parlamentar do SIRP na existência, junto do Presidente da Assembleia da República, de uma Comissão por si
presidida, e que integra os Presidentes dos Grupos Parlamentares, bem como os Presidentes das Comissões
Parlamentares de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, de Defesa Nacional e de
Negócios Estrangeiros. Trata-se de uma instância parlamentar situada ao mais alto nível de responsabilidade,
tendo em conta o tipo de funções que lhe são confiadas.
Esta Comissão teria a seu cargo, no essencial, as funções que estão hoje cometidas ao Conselho de
Fiscalização do SIRP e à Comissão de Fiscalização do Segredo de Estado, a qual, apesar de ter sido criada
na Lei n.º 6/94, de 7 de abril (ou seja, há mais de 18 anos), só muito recentemente deu um ténue sinal de
existência, sendo absolutamente nula a sua atividade.
Assim, a Comissão de Fiscalização do SIRP, a funcionar junto do Presidente da Assembleia da República,
exerceria funções de fiscalização do SIRP, nos termos adiante explicitados, e asseguraria também as
condições de acesso, por parte do Parlamento, a matérias classificadas como segredo de Estado.
O artigo 156.º da Constituição determina que os Deputados têm o direito de requerer e obter do Governo
ou dos órgãos de qualquer entidade pública os elementos, informações e publicações oficiais que considerem
úteis para o exercício do seu mandato [alínea e)], bem como de fazer Perguntas ao Governo sobre quaisquer
atos deste ou da Administração Pública e obter resposta em prazo razoável, salvo o disposto na lei em matéria
de segredo de Estado [alínea d)].
Porém, a Lei do Segredo de Estado (Lei n.º 6/94, de 7 de abril) não regula em que termos a Assembleia da
República pode ter acesso a matérias abrangidas pelo segredo de Estado.
Se é perfeitamente justificável que o acesso dos Deputados a documentos e informações classificados
como segredo de Estado seja restringido, tendo em conta os interesses de segurança interna e externa do
Estado que a lei visa proteger, já não se afigura curial que essa restrição não seja, também ela, restrita e
devidamente fundamentada, apenas em função dos interesses protegidos. Esta ressalva é tanto mais
necessária porquanto, como se sabe, toda a atividade do Sistema de Informações da República Portuguesa se
encontra coberta ope legis pelo regime do Segredo de Estado.
Assim, é de admitir que, perante um requerimento apresentado por um ou mais Deputados, de acesso a
informações na posse do SIRP, as informações solicitadas possam ser fornecidas sem que daí decorra perigo
para a segurança interna ou externa do Estado. Se assim for entendido, tratar-se-á tão só de acautelar as
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medidas de salvaguarda do grau de confidencialidade que o Governo e o Secretário-geral do SIRP
considerem adequado.
Mas é de admitir também que o Segredo de Estado seja invocado para recusar o acesso às informações
solicitadas. Nesse caso, para além de se exigir um ato expresso de recusa devidamente fundamentado,
também é de admitir que a Assembleia da República enquanto órgão de soberania competente para fiscalizar
a atividade do Governo e da Administração – e já não apenas um Deputado individualmente considerado –
possa considerar que a fundamentação aduzida não é suficiente e pretenda solicitar esclarecimentos
adicionais.
Neste último caso, a instância adequada para fazer valer essa pretensão deve ser a Comissão de
Fiscalização do SIRP, cuja criação o PCP propõe. O Presidente da Assembleia da República, ouvida a
Comissão, e mediante solicitação de algum dos seus membros, poderia solicitar ao Governo esclarecimentos
adicionais acerca dos motivos da recusa de acesso a determinados documentos ou informações classificadas.
Esses esclarecimentos deveriam ser prestados por escrito ao Presidente da Assembleia da República, ou
presencialmente junto da Comissão, por um membro do Governo ou pelo Secretário-geral do SIRP, conforme
indicação dada pelo Primeiro-Ministro.
Note-se que não se propõe que haja uma derrogação do regime do segredo de Estado. Esse seria sempre
salvaguardado. Do que se trata é de encontrar um mecanismo efetivo, mediante o qual a Assembleia da
República, enquanto órgão plural, possa fiscalizar a boa aplicação do regime do segredo de Estado,
designadamente por parte do Sistema de Informações da República Portuguesa.
Se a Lei n.º 6/94, de 7 de abril, determina no seu artigo 1.º que o regime do segredo de Estado obedece
aos princípios da excecionalidade, subsidiariedade, necessidade, proporcionalidade, tempestividade,
igualdade, justiça e imparcialidade, bem como ao dever de fundamentação, importa encontrar uma forma de
fiscalizar minimamente o respeito por esses princípios. Isso não está a acontecer, e para bem da democracia,
é indispensável que aconteça.
Por outro lado, o PCP propõe que a Comissão de Fiscalização do SIRP substitua o atual Conselho de
Fiscalização do SIRP. Existem grandes vantagens nesta solução. A Assembleia da República passa a poder
fiscalizar diretamente, e já não por interposta entidade, a atividade do SIRP, através de uma instância restrita e
de elevada responsabilidade. A Comissão proposta dá as garantias de pluralismo necessário para a
idoneidade de qualquer instância de fiscalização democrática. Finalmente, mas não indiferente nos tempos
que correm, sendo os custos administrativos desta Comissão assegurados diretamente pelo Gabinete do
Presidente da Assembleia da República, será possível extinguir duas entidades com os custos administrativos
e remuneratórios que lhe são inerentes.
Nestes termos, O Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei regula o modo de exercício dos poderes de fiscalização da Assembleia da República sobre o
Sistema de Informações da República Portuguesa e o segredo de Estado.
Artigo 2.º
Comissão de Fiscalização
1 – Para os efeitos previstos na presente lei é criada junto do Presidente da Assembleia da República a
Comissão de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa, adiante designada por
Comissão de Fiscalização.
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2 – A Comissão de Fiscalização é presidida pelo Presidente da Assembleia da República e integra ainda:
a) Os Presidentes dos Grupos Parlamentares;
b) O Presidente da Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias;
c) O Presidente da Comissão Parlamentar de Defesa Nacional;
d) O Presidente da Comissão Parlamentar de Negócios Estrangeiros.
3 – A presidência da Comissão de Fiscalização, com as funções que lhe são inerentes, pode ser delegada
no Vice-Presidente da Assembleia da República pertencente ao partido maioritário.
Artigo 3.º
Atribuições e competências
1 – A Comissão de Fiscalização tem por atribuições assegurar o acompanhamento e a fiscalização
parlamentar da atividade do Secretário-Geral do SIRP e dos Serviços de Informações, bem como da aplicação
do regime do segredo de Estado, velando pelo cumprimento da Constituição e da lei, particularmente no que
se refere à fiscalização parlamentar dos atos do Governo e da Administração e à salvaguarda dos direitos,
liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos.
2 – Compete em especial à Comissão de Fiscalização, no âmbito da fiscalização do SIRP:
a) Apreciar os relatórios de atividades de cada um dos Serviços de Informações;
b) Receber do Secretário-Geral do SIRP, com regularidade bimensal, lista integral dos processos em
curso, podendo solicitar e obter, no prazo que determinar, os elementos que considere necessários ao cabal
exercício dos seus poderes de fiscalização;
c) Tomar conhecimento dos despachos emitidos ao abrigo do artigo 5.º da Lei-quadro do Sistema de
Informações da República Portuguesa;
d) Conhecer, junto do Primeiro-Ministro, os critérios de orientação governamental dirigidos à pesquisa de
informações e obter do Conselho Superior de Informações os esclarecimentos que entender sobre questões
de funcionamento do SIRP;
e) Efetuar visitas de inspeção, com ou sem aviso prévio, ao Secretário-geral e aos Serviços de
Informações, podendo observar, colher os elementos o obter as informações que considere relevantes;
f) Solicitar elementos constantes dos centros de dados que entenda necessários ao exercício das suas
competências ou ao conhecimento de eventuais irregularidades ou violações da lei;
g) Propor a realização de procedimentos inspetivos, de inquérito ou sancionatórios em razão de
ocorrências cuja gravidade o justifique;
h) Proceder à audição de qualquer entidade que considere necessário para o cumprimento das suas
atribuições;
i) Exercer as competências previstas nos artigos 5.º a 7.º da presente lei em matéria de fiscalização da
aplicação do regime do segredo de Estado;
j) Conhecer e apreciar as propostas de orçamento do SIRP, e acompanhar e fiscalizar a respetiva
execução, recebendo e podendo solicitar os elementos necessários ao cabal desempenho desses poderes.
3 – As atribuições e competências da Comissão de Fiscalização são aplicáveis às atividades de produção
de informações das Forças Armadas.
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Artigo 4.º
Funcionamento
1 – A Comissão de Fiscalização reúne ordinariamente com periodicidade trimestral e extraordinariamente
sempre que convocado pelo Presidente da Assembleia da República por sua iniciativa ou a solicitação de
qualquer dos seus membros.
2 – O Gabinete do Presidente da Assembleia da República garante o apoio técnico, logístico e
administrativo indispensável ao funcionamento da Comissão de Fiscalização.
Artigo 5.º
Acesso a documentos e informações sob Segredo de Estado
1 – A recusa de acesso a documentos e informações solicitadas por Deputados com fundamento em
segredo de Estado tem de ser expressa e acompanhada de informação a enviar ao Presidente da Assembleia
da República e aos Deputados requerentes sobre os seguintes elementos:
a) Indicação da entidade que procedeu ao ato de classificação;
b) Duração e prazo de caducidade do ato de classificação;
c) Fundamentação invocada para a classificação com indicação dos interesses a proteger e dos motivos
ou circunstâncias que a justificaram.
2 – Em caso de recusa de acesso a documentos e informações solicitadas por Deputados com fundamento
em segredo de Estado, o Presidente da Assembleia da República deve dar conhecimento da recusa e
respetiva fundamentação à Comissão de Fiscalização, que pode pronunciar-se sobre a matéria a pedido de
algum dos seus membros.
3 – Se a Comissão de Fiscalização considerar a recusa injustificada, solicita que a informação ou
documento em causa lhe seja entregue diretamente e procede ao seu encaminhamento para o Deputado
requerente, informando-o previamente dos termos em que tais informações podem, ou não, ser publicitadas.
4 – A Comissão de Fiscalização pode determinar que os documentos ou informações entregues nos termos
do presente artigo não sejam publicados no Diário da Assembleia da República ou em qualquer outra forma de
publicitação de acesso geral, e pode exigir dos destinatários a declaração, sob compromisso de honra, de que
se comprometem a guardar a confidencialidade das informações nos termos em que tal lhes seja solicitado.
5 – Os documentos e informações são fornecidos direta e pessoalmente aos requerentes pelo Presidente
da Assembleia da República, mediante a prestação do compromisso referido no número anterior.
6 – O regime previsto no presente artigo não é aplicável a documentos ou informações que tenham sido
classificados como segredo de Estado pelo Presidente da República.
Artigo 6.º
Prestação de informações na posse do SIRP
1 – Tratando-se de documentos e informações classificados como segredo de Estado nos termos da Lei-
Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa, a recusa de acesso a documentos e
informações solicitadas por Deputados deve ser expressa e fundamentada em parecer do Secretário-geral do
Sistema de Informações da República, com indicação dos interesses que essa recusa visa proteger, sendo
correspondentemente aplicável o disposto nos n.os
2 a 5 do artigo anterior.
2 – Se o Secretário-geral do Sistema de Informações da República, em parecer fundamentado, entender
que o acesso aos documentos ou informações em causa não põe em risco a segurança interna ou externa do
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Estado, o Primeiro-Ministro pode autorizar o seu fornecimento aos Deputados requerentes, podendo solicitar a
aplicação das medidas de salvaguarda referidas no artigo anterior.
3 – Nos casos previstos no número anterior, os documentos ou informações solicitados são enviados ao
Presidente da Assembleia da República, que procede à sua entrega nos termos solicitados, sendo
correspondentemente aplicável o disposto no n.º 5 do artigo anterior.
Artigo 7.º
Apreciação da recusa de acesso a documentos ou informações
1 – Na apreciação dos fundamentos da recusa de acesso a documentos ou informações nos termos da
presente lei a Comissão de Fiscalização pode solicitar ao Governo a prestação de esclarecimentos adicionais
acerca dos fundamentos da recusa do acesso a documentos e informações classificados como segredo de
Estado.
2 – Os esclarecimentos solicitados são prestados por escrito ao Presidente da Assembleia da República
ou, por determinação deste, presencialmente, em reunião da Comissão de Fiscalização, pelo membro do
Governo que o Primeiro-Ministro designar para o efeito.
3 – O Primeiro-Ministro pode solicitar a audição de qualquer membro do Governo por si indicado pela
Comissão de Fiscalização para prestar esclarecimentos, por sua iniciativa, sobre a recusa de fornecimento de
documentos e informações classificados como Segredo de Estado.
4 – Nos casos previstos no número anterior a Comissão de Fiscalização não pode tomar qualquer decisão
antes da realização da audição solicitada.
5 – Se os esclarecimentos versarem sobre documentos ou informações na posse do Sistema de
Informações da República Portuguesa, podem ser prestados pelo respetivo Secretário-geral, se o Primeiro-
Ministro assim o determinar.
6 – O disposto no presente artigo não é aplicável a documentos ou informações que tenham sido
classificados como segredo de Estado pelo Presidente da República.
Artigo 8.º
Responsabilidade
Quem tenha acesso a documentos ou informações classificados como segredo de Estado por aplicação da
presente lei fica obrigado ao dever de sigilo, sendo responsável nos termos da lei pela sua violação.
Artigo 9.º
Norma revogatória
1 – São revogados:
a) Os artigos 13.º e 14.º da Lei n.º 6/94, de 7 de abril.
b) Os artigos 8.º a 13.º da Lei-quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa na redação
que lhe foi dada pela Lei Orgânica n.º 4/2004, de 6 de novembro.
2 – Todas as referências legais ao Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República
Portuguesa e à Comissão para a Fiscalização do Segredo de Estado consideram-se reportadas à Comissão
de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa.
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Artigo 10.º
Extinção de entidades
São extintos o Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa e a
Comissão para a Fiscalização do Segredo de Estado.
Assembleia da República, 10 de outubro de 2012.
Os Deputados do PCP: António Filipe — Bernardino Soares — Rita Rato — Lurdes Ribeiro — Miguel Tiago
— Paulo Sá — Paula Santos — Agostinho Lopes — João Ramos — João Oliveira.
———
PROPOSTA DE LEI N.O 101/XII (2.ª)
APROVA O REGIME DE GARANTIA DE QUALIDADE E SEGURANÇA DOS ÓRGÃOS DE ORIGEM
HUMANA DESTINADOS A TRANSPLANTAÇÃO NO CORPO HUMANO, DE FORMA A ASSEGURAR UM
ELEVADO NÍVEL DE PROTEÇÃO DA SAÚDE HUMANA, TRANSPONDO A DIRETIVA 2010/53/UE DO
PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO, DE 7 DE JULHO DE 2010, RELATIVA A NORMAS DE
QUALIDADE E SEGURANÇA DOS ÓRGÃOS HUMANOS DESTINADOS A TRANSPLANTAÇÃO
Exposição de motivos
Ao longo dos últimos 50 anos, a transplantação de órgãos generalizou-se a nível mundial, proporcionando
grandes benefícios terapêuticos a centenas de milhares de doentes. A transplantação de órgãos é o
tratamento com uma melhor relação custo-eficácia nos casos de insuficiência renal crónica terminal, sendo o
único tratamento disponível nos casos de insuficiência terminal de órgãos como o fígado, os pulmões e o
coração.
Porém, a transplantação de órgãos comporta riscos. A vasta utilização terapêutica de órgãos humanos
para a transplantação requer que seja assegurada a qualidade e segurança desses órgãos de forma a
minimizar quaisquer riscos de transmissão de doenças.
Neste sentido, a dádiva, colheita, caracterização, análise, preservação, transporte e transplantação de
órgãos de origem humana deve cumprir elevados padrões de qualidade e segurança, por forma a assegurar
um elevado nível de proteção da saúde humana e evitar a transmissão de doenças através desses órgãos.
É ainda essencial, para garantir a qualidade e segurança dos órgãos, que a transplantação de órgãos
assente nos princípios da dádiva voluntária e gratuita, e que seja assegurada aos dadores vivos a maior
proteção possível, respeitando-se assim a dignidade da pessoa, nos termos plasmados na Convenção sobre
os Direitos do Homem e a Biomedicina, bem como do seu Protocolo Adicional relativo à Transplantação de
Órgãos.
Sendo necessário assegurar que os órgãos de origem humana destinados a transplantação apresentem
critérios de qualidade e segurança comuns a todos os Estados-membros, o Parlamento Europeu e o Conselho
da União Europeia aprovaram a Diretiva 2010/53/UE, de 7 de julho de 2010, relativa a normas de qualidade e
segurança dos órgãos humanos destinados a transplantação.
Com vista ao cumprimento das exigências europeias, bem como à promoção da aplicação eficaz das
disposições previstas no presente diploma, é estabelecido, ainda, um regime de sanções aplicável em caso de
infração.
Foi promovida a audição da Comissão Nacional de Proteção de Dados, do Conselho Nacional de Ética
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para as Ciências da Vida, da Ordem dos Médicos e da Sociedade Portuguesa de Transplantação.
Assim:
Nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da
República a seguinte proposta de lei:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objeto
1 - A presente lei estabelece normas que visam garantir a qualidade e segurança dos órgãos de origem
humana destinados a transplantação no corpo humano, de forma a assegurar um elevado nível de proteção da
saúde humana.
2 - A presente lei transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva 2010/53/UE do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 7 de julho de 2010, relativa a normas de qualidade e segurança dos órgãos humanos destinados
a transplantação.
Artigo 2.º
Âmbito de aplicação
1 - O disposto na presente lei é aplicável à dádiva, colheita, caracterização, análise, preservação,
transporte e implantação de órgãos de origem humana destinados a transplantação no corpo humano.
2 - O disposto na presente lei não se aplica à utilização de órgãos para fins de investigação, exceto se os
mesmos se destinarem à transplantação no corpo humano.
Artigo 3.º
Definições
Para efeitos do disposto na presente lei, entende-se por:
a) «Caracterização do dador», a recolha de informações pertinentes sobre as características do dador,
necessárias para avaliar a sua adequação à dádiva de órgãos, efetuar uma avaliação de risco adequada e
minimizar os riscos para o recetor, bem como para otimizar a atribuição de órgãos;
b) «Caracterização do órgão», a recolha de informações pertinentes sobre as características do órgão
necessárias para avaliar a adequação, efetuar uma avaliação adequada e minimizar os riscos para o recetor e
otimizar a atribuição de órgãos;
c) «Centros de sangue e da transplantação», serviços territorialmente desconcentrados do Instituto
Português do Sangue e Transplantação, IP (IPST, IP), a quem compete, de acordo com a Portaria n.º
165/2012, de 22 de maio, na área da transplantação:
i) Garantir o estudo laboratorial de dadores e de doentes candidatos a transplantação de órgãos;
ii) Assegurar a manutenção das condições necessárias para a escolha do par dador/recetor em
transplantação renal;
iii) Acompanhar a transplantação de órgãos;
d) «Colheita», o processo por meio do qual os órgãos doados são disponibilizados;
e) «Coordenador hospitalar de doação», licenciado em medicina, com formação específica para a deteção
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e avaliação de potenciais dadores de órgãos e tecidos para transplantação, preferencialmente das áreas dos
cuidados intensivos, urgência, emergência ou anestesia, cujas competências se encontram definidas na
Portaria n.º 357/2008, de 9 de maio, que integra a Rede Nacional de Coordenação da Colheita e
Transplantação;
f) «Dádiva», a doação de órgãos para transplantação;
g) «Dador», a pessoa que faz dádiva de um ou vários órgãos, quer a dádiva ocorra durante a vida, quer
depois da morte dessa pessoa;
h) «Eliminação», o destino final dado a um órgão quando este não é utilizado para transplantação;
i) «Gabinetes coordenadores de colheita e transplantação», estruturas autónomas dotadas de recursos
humanos especializados na área da coordenação de colheita e transplantação, e de equipas pluridisciplinares
para a realização da colheita de órgãos, tecidos e células nos dadores identificados, cujas competências se
encontram definidas na Portaria n.º 357/2008, de 9 de maio, que integram a Rede Nacional de Coordenação
da Colheita e Transplantação;
j) «Incidente adverso grave», uma ocorrência indesejável e inesperada associada a qualquer etapa do
processo, desde a dádiva até à transplantação, suscetível de levar à transmissão de uma doença infeciosa, à
morte ou a situações de perigo de vida, deficiência ou incapacidade do doente ou de provocar ou prolongar a
sua hospitalização ou morbilidade;
k) «Organismo de colheita», um estabelecimento de cuidados de saúde, uma equipa ou uma unidade de
um hospital ou qualquer outro organismo que proceda à recolha de órgãos ou à sua coordenação e que esteja
autorizado a fazê-lo pela Direção-Geral da Saúde (DGS);
l) «Organização europeia de intercâmbio de órgãos», uma organização sem fins lucrativos, pública ou
privada, dedicada ao intercâmbio nacional ou transfronteiriço de órgãos e cujos países membros são
maioritariamente Estados-membros;
m) «Órgão», uma parte diferenciada do corpo humano, constituída por vários tecidos, que mantém, de
modo significativamente autónomo, a sua estrutura, vascularização e capacidade de desenvolver funções
fisiológicas, incluindo as partes de órgãos que tenham como função ser utilizadas para servir o mesmo objetivo
que o órgão inteiro no corpo humano, mantendo as condições de estrutura e vascularização;
n) «Preservação», a utilização de agentes químicos, a alteração das condições ambientais ou outros meios
destinados a evitar ou retardar a deterioração biológica ou física dos órgãos humanos, desde a colheita até à
transplantação;
o) «Procedimentos operacionais», instruções escritas que descrevem as etapas de um processo
específico, incluindo os materiais e métodos a utilizar e o resultado final esperado;
p) «Rastreabilidade», a capacidade de localizar e identificar o órgão em cada etapa do processo, desde a
dádiva até à transplantação ou eliminação, incluindo a capacidade de:
i) Identificar o dador e o organismo de colheita;
ii) Identificar o recetor no centro de transplantação; e
iii) Localizar e identificar todas as informações não pessoais relevantes, relacionadas com os produtos e
materiais que entram em contacto com o órgão;
q) «Reação adversa grave», uma resposta indesejável e inesperada, incluindo uma doença infeciosa, do
dador vivo ou do recetor, que possa estar associada a qualquer etapa do processo, desde a dádiva até à
transplantação, que cause a morte ou ponha a vida em perigo, conduza a uma deficiência ou incapacidade ou
que provoque ou prolongue a hospitalização ou a morbilidade;
r) «Recetor», pessoa que recebe a transplantação de um órgão;
s) «Transplantação», o processo destinado ao restabelecimento de certas funções do organismo humano,
mediante a transferência de um órgão de um dador para um recetor;
t) «Unidade de colheita», as unidades em que é autorizada a atividade de colheita de órgãos de origem
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humana para fins de transplantação, pela DGS;
u) «Unidade de transplantação», um estabelecimento de cuidados de saúde, uma equipa ou uma unidade
de um hospital ou outro organismo que proceda à transplantação de órgãos e que esteja autorizado a fazê-lo
pela DGS.
CAPÍTULO II
Princípios que regem a dádiva de órgãos
Artigo 4.º
Princípios aplicáveis
1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 5.º da Lei n.º 12/93, de 22 de abril, alterada e republicada
pela Lei n.º 22/2007, de 29 de junho, e do disposto nos números seguintes, a dádiva de órgãos é voluntária e
não remunerada.
2 - Os dadores vivos têm direito a receber uma compensação estritamente limitada a cobrir as despesas
efetuadas e a perda de rendimentos relacionados com a dádiva.
3 - As condições em que pode ser concedida a compensação prevista no número anterior são definidas por
despacho do membro do Governo responsável pela área da saúde, não podendo constituir um incentivo ou
benefício financeiro para um potencial dador.
4 - O dador vivo tem sempre direito a ser indemnizado pelos danos decorrentes do processo de dádiva e
colheita, independentemente de culpa, nos termos do artigo 9.º da Lei n.º 12/93, de 22 de abril, alterada e
republicada pela Lei n.º 22/2007, de 29 de junho.
5 - A atividade desenvolvida pelas unidades de colheita não pode ter caráter lucrativo.
6 - A promoção da dádiva de órgãos deve fazer-se nos termos do artigo 15.º da Lei n.º 12/93, de 22 de
abril, alterada e republicada pela Lei n.º 22/2007, de 29 de junho.
7 - É proibida a publicidade sobre a necessidade de órgãos ou sobre a sua disponibilidade, quando tenha
por intuito oferecer ou procurar obter lucros financeiros ou vantagens equivalentes.
CAPÍTULO III
Autoridade competente
Artigo 5.º
Designação e funções da autoridade competente
1 - A autoridade competente responsável pela verificação do cumprimento dos requisitos previstos na
presente lei em todo o território nacional é a DGS, sem prejuízo da articulação com a Inspeção-Geral das
Atividades em Saúde, abreviadamente designada por IGAS, em matéria de fiscalização e inspeção.
2 - Compete à DGS, enquanto autoridade competente, nomeadamente:
a) Estabelecer e manter atualizado um sistema para a qualidade e segurança que abranja todas as etapas
do processo, desde a dádiva até à transplantação ou eliminação do órgão, incluindo a definição de
procedimentos operacionais a que refere o artigo 9.º;
b) Autorizar as unidades de colheita e as unidades de transplantação, de acordo com a presente lei,
mediante parecer favorável do Instituto Português do Sangue e da Transplantação, I.P., abreviadamente
designado por IPST, IP, enquanto entidade responsável pelo planeamento estratégico de resposta às
necessidades nacionais;
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c) Assegurar que as unidades de colheita e as unidades de transplantação, os Gabinetes Coordenadores
de Colheita e Transplantação, abreviadamente designados por GCCT e os Centros de Sangue e da
Transplantação, abreviadamente designados por CST, sejam submetidos a medidas de controlo ou auditorias
regulares a fim de verificar o cumprimento dos requisitos, diretrizes ou orientações emitidas pela DGS e pelo
IPST, IP, nos termos da presente lei;
d) Suspender ou revogar as autorizações concedidas às unidades de colheita e às unidades de
transplantação, caso as medidas de controlo demonstrem que não cumprem os requisitos previstos na
presente lei;
e) Estabelecer um sistema de notificação e gestão de incidentes e reações adversas graves, nos termos
do artigo 14.º, compatível com o sistema de informação do IPST, IP, referido no artigo 6.º;
f) Emitir diretrizes destinadas às unidades de colheita e às unidades de transplantação e profissionais de
saúde e a outras pessoas envolvidas em todas as etapas do processo de transplantação, desde a dádiva até à
transplantação ou eliminação de órgãos, incluindo orientações para a recolha de informações pré e pós-
transplante relevantes para avaliar a qualidade e a segurança dos órgãos transplantados;
g) Participar na rede de autoridades competentes da União Europeia, cuja criação se encontra prevista no
n.º 1 do artigo 19.º da Diretiva 2010/53/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de julho de 2010;
h) Fiscalizar o intercâmbio de órgãos com outros Estados-membros e com países terceiros, nos termos da
presente lei.
3 - É criado junto da DGS um Grupo Técnico Consultivo com a competência de apoiar técnica e
cientificamente o exercício das funções de autoridade competente, cujo âmbito de intervenção, composição e
funcionamento são definidos pelo Diretor-Geral da Saúde.
4 - Os membros do Grupo Técnico Consultivo não são remunerados, sem prejuízo do direito ao pagamento
de despesas com as deslocações, decorrentes das funções exercidas, nos termos previstos para a
generalidade dos trabalhadores em funções públicas.
Artigo 6.º
Registos e relatórios respeitantes às unidades de colheita e às unidades de transplantação
1 - O IPST, IP, é a entidade responsável por assegurar o funcionamento de um sistema de informação
único e integrado no domínio da colheita e transplantação, designado por Registo Português de
Transplantação (RPT).
2 - O RPT inclui os dados referidos nos artigos 13.º, 14.º, 17.º e 18.º.
3 - O RPT integra ainda dados relativos às atividades das unidades de colheita e das unidades de
transplantação, designadamente dados agregados sobre o número de dadores, bem como o tipo e a
quantidade de órgãos colhidos e transplantados ou eliminados, nos termos das disposições aplicáveis em
matéria de proteção de dados pessoais e segredo estatístico.
4 - O RPT permite ao IPST, IP, a gestão da lista de espera de doentes candidatos a transplantação,
seleção do par dador/recetor em transplantação, banco de tecidos e rastreabilidade, nos termos do disposto
da alínea o) do n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 39/2012, de 16 de fevereiro.
5 - O IPST, IP, garante à DGS o acesso à informação contida no RPT.
6 - Os níveis de acesso ao RPT são definidos em articulação entre o IPST, IP, e a DGS e submetidos a
autorização nos termos da Lei n.º 67/98, de 26 de outubro.
7 - A DGS e o IPST, IP, elaboram relatórios públicos e periódicos de atividades das suas áreas de
competência.
8 - Sempre que solicitados pela Comissão Europeia ou por outro Estado-membro, o IPST, IP, e a DGS
fornecem informações sobre o registo das unidades de colheita e das unidades de transplantação.
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Artigo 7.º
Autorização
1 - Compete à DGS autorizar as unidades de colheita e as unidades de transplantação, de acordo com a
presente lei, mediante parecer favorável do IPST, IP, enquanto entidade responsável pelo planeamento
estratégico de resposta às necessidades nacionais.
2 - A autorização da atividade de colheita de órgãos em dador cadáver só pode ser concedida a unidades
de colheita que disponham dos seguintes requisitos:
a) Unidade de cuidados intensivos ou de outros serviços hospitalares onde se prestem cuidados de
suporte ventilatório;
b) Coordenador hospitalar de doação, para cuja nomeação é necessário o parecer prévio do IPST, I.P., no
âmbito da sua atribuição de participar na definição estratégica global de desenvolvimento da transplantação;
c) Profissionais qualificados;
d) Protocolo estabelecido com o hospital onde se encontra sedeado o GCCT da sua área de referência,
com o qual a unidade se deve articular para referenciação de todos os potenciais dadores de órgãos, nos
termos da Portaria n.º 357/2008, de 9 de maio.
3 - Todos os estabelecimentos que disponham de cuidados de suporte ventilatório estão obrigados a, no
prazo de 60 dias contados da entrada em vigor da presente lei ou da criação da unidade, comunicar ao IPST,
IP, para efeitos de parecer prévio, a sua imediata disponibilidade para a realização de colheita de órgãos.
4 - O parecer favorável do IPST, IP, é remetido à DGS, a fim da atividade de colheita de órgãos ser
autorizada.
5 - A atividade de transplantação de órgãos só pode ser autorizada nas unidades que reúnam os seguintes
requisitos:
a) Requisitos gerais:
i) Instalações, equipamentos e apoios interdisciplinares necessários, designadamente, cuidados
intensivos, cirúrgicos, anestésicos e meios complementares de diagnóstico adequados ao tipo de transplante
para que se pede autorização;
ii) Um responsável médico pelo programa de transplantação com formação e experiência específica na
área;
iii) Profissionais qualificados.
b) Requisitos específicos mínimos:
i) Transplantação cardíaca: existência de um serviço de cirurgia cardiotorácica com apoios cirúrgicos,
cardiológicos, de cuidados intensivos e meios complementares de diagnóstico, devendo articular-se,
preferencialmente, com uma unidade de insuficiência cardíaca;
ii) Transplantação pulmonar: requisitos iguais aos referidos para o transplante cardíaco, com apoio de
pneumologia e microbiologia;
iii) Transplantação renal: existência de um serviço de nefrologia com possibilidade de realização de diálise;
iv) Transplantação reno-pancreática e transplantação pancreática: existência de um serviço de nefrologia
com possibilidade de realização de diálise, integrado numa unidade de transplante renal, em articulação com
uma unidade de endocrinologia;
v) Transplantação hepática: existência dum serviço com experiência em cirurgia abdominal, com apoios de
hepatologia, imunohematologia, infecciologia e oncologia médica, com disponibilidade de técnicas de
endoscopia e imagiologia;
vi) Transplantação múltipla multivisceral e de intestino: existência de um serviço com experiência de
transplantação;
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vii) Transplantação pediátrica: realização em ambiente hospitalar pediátrico, inscrevendo-se dentro de
programas específicos de centros com larga experiência na área dos diferentes tipos de transplante (coração,
pulmão, rim, pâncreas, fígado, intestino ou outros órgãos).
6 - O número mínimo de transplantes a realizar nas unidades de transplantação é definido pela DGS, tendo
em conta os padrões europeus e internacionais de qualidade e segurança que a evidência recomenda.
7 - O pedido de autorização para a atividade de transplantação é apresentado pelo responsável máximo do
estabelecimento de saúde, mediante requerimento dirigido à DGS, dele devendo constar as seguintes
informações:
a) Tipo de transplante a realizar;
b) Identificação do responsável médico pela equipa de transplante e respetivo curriculum vitae;
c) Qualificações do restante pessoal envolvido ou a envolver na atividade;
d) Plano anual de atividades, incluindo o que respeita ao número de transplantes que se propõe realizar;
e) Memória descritiva onde conste a identificação das instalações, equipamentos e apoios
interdisciplinares de que o estabelecimento de saúde dispõe para desenvolver a atividade, de acordo com os
requisitos previstos no n.º 5 do presente artigo.
8 - Tratando-se de atividade de colheita, o requerimento referido no número anterior é acompanhado dos
elementos referidos no n.º 2.
9 - A DGS procede à emissão da autorização, indicando as atividades autorizadas.
10 - As unidades de colheita e as unidades de transplantação não podem proceder a qualquer alteração
substancial das suas atividades sem a aprovação prévia da DGS.
11 - As unidades de colheita e as unidades de transplantação apresentam à DGS, até ao último dia do
mês seguinte ao ano a que respeitam, um relatório anual das suas atividades, o qual faz parte integrante da
avaliação necessária à manutenção da autorização de exercício de atividade.
Artigo 8.º
Medidas de controlo
1 - A DGS garante, em articulação com a IGAS, a realização periódica de auditorias, inspeções ou outras
medidas de controlo adequadas às unidades de colheita e às unidades de transplantação, aos GCCT e CST, a
fim de assegurar o cumprimento do disposto na presente lei.
2 - A DGS notifica por escrito os responsáveis dos serviços referidos no número anterior do resultado das
auditorias e inspeções efetuadas.
3 - A DGS estabelece as diretrizes referentes às condições de auditoria, inspeção ou outras medidas de
controlo, bem como à formação e qualificação dos profissionais envolvidos, a fim de garantir uma elevada
competência e desempenho, em articulação com a IGAS.
4 - Em caso de reações adversas ou incidentes graves ou de suspeita dos mesmos, a DGS garante a
realização de auditorias, inspeções ou outras medidas de controlo.
5 - A DGS garante a realização de auditorias, inspeções ou outras medidas de controlo a pedido das
autoridades competentes de outro Estado-membro, desde que justificado.
6 - Sempre que solicitado por outro Estado-membro ou pela Comissão Europeia, a DGS presta informações
sobre os resultados das inspeções e medidas de controlo relacionadas com os requisitos previstos na
presente lei.
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CAPÍTULO IV
Qualidade e segurança dos órgãos
Artigo 9.º
Regime para a qualidade e a segurança
1 - As unidades de colheita e as unidades de transplantação, os GCCT e os CST devem, no âmbito da sua
área de atuação, implementar e manter atualizado um sistema para a qualidade e segurança, de acordo com o
sistema estabelecido a nível nacional pela DGS, referido na alínea a) do n.º 2 do artigo 5.º, incluindo a
aplicação de procedimentos operacionais para:
a) Verificar a identidade do dador;
b) Verificar as informações relativas ao consentimento, autorização ou inexistência de objeções do dador
ou da sua família, de acordo com o estabelecido na lei, no local onde a dádiva e a colheita se realizaram;
c) Verificar se a caracterização dos órgãos e dos dadores foi realizada, tal como previsto no artigo 11.º;
d) A colheita, preservação, embalagem e rotulagem de órgãos, de acordo com os artigos 10.º e 12.º;
e) O transporte de órgãos humanos, tal como previsto no artigo 12.º;
f) A notificação exata, rápida e verificável de reações e incidentes adversos graves, tal como prevista no
artigo 14.º e no n.º 7 do artigo 17.º;
g) A gestão de reações e incidentes adversos graves, tal como prevista no n.º 2 do artigo 14.º;
h) Garantir a rastreabilidade, desde o dador até ao recetor e vice-versa, nos termos do artigo 13.º;
i) Assegurar a segurança e confidencialidade dos dados pessoais relativos aos dadores e recetores, nos
termos do artigo 18.º.
2 - Os procedimentos operacionais referidos nas alíneas f), g), h) e i) do número anterior especificam,
nomeadamente, as responsabilidades das unidades de colheita e as unidades de transplantação e das
organizações europeias de intercâmbio de órgãos.
3 - As unidades de colheita e as unidades de transplantação, os GCCT e os CST adotam as medidas
necessárias para assegurar que a documentação relativa aos procedimentos operacionais referidos nos
números anteriores se encontra disponível aquando das auditorias, inspeções ou outras medidas de controlo
realizadas no âmbito da presente lei.
Artigo 10.º
Colheita de órgãos
1 - As unidades de colheita asseguram que a seleção e avaliação de dadores sejam efetuadas sob o
aconselhamento e orientação do coordenador hospitalar de doação, no caso de dador cadáver.
2 - A colheita de órgãos é realizada em salas operatórias concebidas, construídas, mantidas e geridas de
acordo com a legislação aplicável e com as normas de boa prática clínica, de modo a garantir a qualidade e a
segurança dos órgãos colhidos.
3 - Os materiais e equipamentos utilizados na colheita são tratados de acordo com a legislação aplicável
em matéria de esterilização de dispositivos médicos.
Artigo 11.º
Caracterização dos órgãos e dos dadores
1 - Os órgãos e os respetivos dadores são caracterizados antes da transplantação, mediante a recolha do
conjunto de dados previstos na Parte A do anexo I à presente lei, da qual faz parte integrante.
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2 - Para além do conjunto mínimo de dados referidos no número anterior, a equipa médica, sempre que
necessário e tendo em conta a disponibilidade das informações e as circunstâncias particulares de cada caso,
procede à recolha das informações previstas na Parte B do anexo I à presente lei.
3 - Nas situações de emergência, devidamente fundamentadas do ponto de vista clínico, em que, de
acordo com uma análise benefício-risco, os benefícios esperados para o recetor superarem os riscos
decorrentes de dados incompletos, podem ser considerados para transplante os órgãos em relação aos quais
não se encontrem disponíveis todos os dados mínimos referidos na Parte A do anexo I à presente lei.
4 - Para cumprir os requisitos de qualidade e segurança previstos na presente lei, a equipa médica:
a) Obtém dos dadores vivos todas as informações necessárias, fornecendo-lhes, para o efeito, as
informações de que necessitem para compreender as consequências da dádiva;
b) Procura obter informações junto dos familiares do dadorou de outras pessoas, no caso dos dadores
post mortem, sempre que possível e apropriado;
c) Sensibiliza todas as pessoas a quem são pedidas informações para a importância da rápida
transmissão das mesmas.
5 - Os testes laboratoriais necessários à transplantação de órgãos são realizados por laboratórios do IPST,
I.P., que disponham de instalações e equipamentos e procedimentos operacionais adequados para assegurar
que as informações relativas à caracterização de órgãos e dadores sejam transmitidas às unidades de
transplantação em tempo útil.
6 - As unidades de transplantação verificam, antes de procederem à transplantação, se a caracterização do
órgão e do dador foi realizada e registada, nos termos da presente lei.
Artigo 12.º
Transporte de órgãos
1 - Os organismos, entidades ou empresas envolvidos no transporte de órgãos dispõem de procedimentos
operacionais adequados para garantir a integridade dos órgãos durante o transporte e um tempo de transporte
adequado, de acordo com o sistema referido no artigo 9.º, estando sujeitos a licenciamento e inspeção, em
termos a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área da saúde.
2 - Os recipientes utilizados para o transporte de órgãos são rotulados com as seguintes informações:
a) Identificação da unidade de colheita, incluindo data e hora, e da unidade de saúde onde foi realizada,
incluindo os respetivos endereços e números de telefone;
b) Identificação da unidade de transplantação de destino, incluindo unidade de saúde onde se encontra
instalada, endereço e número de telefone;
c) Indicação de que a embalagem contém um órgão, especificando o tipo de órgão e, se for caso disso, a
sua localização à esquerda ou à direita, e incluir a frase MANUSEAR COM CUIDADO;
d) As condições adequadas de transporte, de forma a manter a integridade do órgão.
3 - Os órgãos transportados são acompanhados do relatório sobre a caracterização do órgão e do dador.
4 - O disposto na alínea b) do n.º 2 não é exigível em caso de transporte de órgãos dentro do mesmo
estabelecimento.
5 - As unidades de transplantação verificam, antes de procederem à transplantação, se as condições de
preservação e transporte dos órgãos recebidos foram cumpridas.
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Artigo 13.º
Rastreabilidade
1 - Os órgãos colhidos e transplantados no território nacional são objeto de rastreabilidade, desde o dador
até ao recetor e vice-versa, a fim de proteger a saúde dos dadores e dos recetores.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, as unidades de colheita e as unidades de transplantação,
os GCCT e os CST dispõem, no âmbito da respetiva área de atuação, de um sistema de identificação dos
dadores e recetores que permita identificar cada dádiva e cada um dos órgãos a ela associados, de acordo
com o previsto no artigo 18.º, integrado no RPT.
3 - O sistema de informação referido no número anterior inclui os dados necessários para assegurar a
rastreabilidade em todas as fases do processo e as informações sobre a caracterização de órgãos e dadores
constantes dos anexos I e II à presente lei.
4 - Os dados necessários para assegurar a rastreabilidade são conservados durante pelo menos 30 anos
após a dádiva, independentemente do tipo de suporte e desde que salvaguardada a respetiva
confidencialidade e destruídos logo que não sejam necessários para efeitos de rastreabilidade.
5 - Em caso de intercâmbio de órgãos entre Estados-membros, a transmissão dos dados necessários para
assegurar a rastreabilidade e as informações sobre a caracterização de órgãos e dadores, referidos no n.º 3, é
feita de acordo com os procedimentos definidos nos termos do artigo 29.º da Diretiva 2010/53/UE do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de julho de 2010.
Artigo 14.º
Sistemas de notificação e gestão de reações e incidentes adversos graves
1 - As unidades de colheita e as unidades de transplantação, os GCCT e os CST dispõem de um sistema
de notificação, de acordo com o estabelecido pela DGS, destinado à comunicação, investigação, registo e
transmissão das informações relevantes e necessárias sobre:
a) Incidentes adversos graves suscetíveis de influenciar a qualidade e segurança dos órgãos e que
possam ser atribuídos à dádiva, colheita, caracterização análise, preservação e transporte dos órgãos;
b) Qualquer reação adversa grave, observada durante ou após a transplantação, que possa estar
relacionada com a colheita, análise, caracterização, preservação e transporte dos órgãos.
2 - As unidades de colheita e as unidades de transplantação, os GCCT e os CST dispõem de
procedimentos operacionais para notificar a DGS, no prazo máximo de 24 horas, das reações e incidentes
adversos graves, bem como para a sua gestão, incluindo para a investigação destinada a analisar as suas
causas e consequências e as medidas adotadas.
3 - Cabe à DGS monitorizar e gerir as notificações referidas no número anterior e emitir os alertas
necessários, a fim de serem tomadas as medidas adequadas.
4 - As unidades de colheita e as unidades de transplantação, os GCCT e os CST asseguram a interligação
entre o sistema de notificação referido no n.º 1 e o sistema de notificação previsto no artigo 11.º da Lei n.º
12/2009, de 26 de março.
5 - Em caso de intercâmbio de órgãos entre Estados-membros, a notificação das reações e incidentes
adversos graves é feita de acordo com os procedimentos definidos nos termos do artigo 25.º da Diretiva
2010/53/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de julho de 2010.
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Artigo 15.º
Profissionais qualificados
1 - Todo o pessoal das unidades de colheita e transplantação dispõe de descrições de tarefas atualizadas
que estabeleçam claramente as respetivas missões e responsabilidades.
2 - As unidades de colheita e as unidades de transplantação atribuem a responsabilidade pela gestão das
respetivas atividades e pela garantia da qualidade a pessoas diferentes e independentes entre si.
3 - Todo o pessoal das unidades de colheita e unidades de transplantação é objeto de formação inicial e
contínua adequada às respetivas tarefas.
4 - É obrigatória a existência de registos da formação ministrada, a qual deve incluir módulos referentes a
boas práticas.
5 - O teor dos programas de formação e a competência específica dos profissionais são periodicamente
avaliados pelos responsáveis das unidades de colheita e da transplantação.
CAPÍTULO V
Proteção do dador e do recetor e seleção e avaliação do dador
Artigo 16.º
Consentimento
1 - A colheita de órgãos em dadores vivos só pode ser efetuada após terem sido cumpridos os requisitos
relativos às informações e consentimento previstos nos artigos 7.º e 8.º da Lei n.º 12/93, de 22 de abril,
alterada e republicada pela Lei n.º 22/2007, de 29 de junho.
2 - A colheita post mortem de órgãos só pode ser realizada após verificação da não oposição ou
inexistência de restrições à dádiva, através de consulta do Registo Nacional de Não Dadores (RENNDA), nos
termos do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 244/94, de 26 de setembro.
3 - O consentimento do recetor é prestado e obtido de acordo com o previsto no artigo 7.º e n.os
1 e 2 do
artigo 8.º da Lei n.º 12/93, de 22 de abril, alterada e republicada pela Lei n.º 22/2007, de 29 de junho.
4 - Tratando-se de recetores menores, o consentimento é prestado pelos pais, desde que não inibidos do
exercício do poder paternal, ou, em caso de inibição ou falta de ambos, mediante autorização judicial.
5 - A transplantação de órgãos em menores com capacidade de entendimento e de manifestação de
vontade carece, também, da concordância destes.
6 - A transplantação de órgãos em recetores maiores, incapazes por razões de anomalia psíquica, só pode
ser feita mediante autorização judicial.
7 - O consentimento do recetor ou de quem legalmente o represente é sempre prestado por escrito, sendo
livremente revogável.
Artigo 17.º
Qualidade e aspetos relacionados com a segurança do dador vivo
1 - A dádiva e colheita de órgãos em vida para fins terapêuticos ou de transplante só podem realizar-se nos
termos e condições do artigo 6.º da Lei n.º 12/93, de 22 de abril, alterada e republicada pela Lei n.º 22/2007,
de 29 de junho.
2 - Os dadores vivos são selecionados com base no seu estado de saúde e história clínica, por uma equipa
multidisciplinar da unidade de transplantação, em consulta específica de dador vivo, sendo necessário o
registo da decisão, em suporte a integrar o RPT nos termos das disposições aplicáveis em matéria de
proteção de dados pessoais e segredo estatístico.
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3 - A avaliação a que se refere o número anterior implica a exclusão de pessoas cuja dádiva possa
constituir um risco inaceitável para a saúde.
4 - As unidades de transplantação possuem e mantêm atualizado um registo de dadores vivos, de acordo
com o previsto no artigo 18.º, integrado no RPT.
5 - As unidades de transplantação garantem o seguimento do dador vivo após o processo de dádiva e
colheita, e dispõem de um sistema de notificação, de acordo com o definido pela DGS, nos termos da alínea e)
do n.º 2 do artigo 5.º, destinado à comunicação, investigação, registo e transmissão de informações sobre:
a) Qualquer evento potencialmente relacionado com a qualidade e segurança do órgão doado e,
consequentemente, com a segurança do recetor;
b) Qualquer reação adversa grave, observada no dador vivo, que possa resultar da dádiva.
6 - As unidades de transplantação notificam a DGS, no prazo máximo de 24 horas, das reações e
incidentes adversos graves referidos no número anterior, bem como as conclusões da investigação destinada
a analisar as suas causas e consequências e as medidas adotadas.
Artigo 18.º
Proteção dos dados pessoais, confidencialidade e segurança do tratamento de dados
1 - No estrito respeito pelas condições estabelecidas na Lei de Proteção de Dados Pessoais, aprovada pela
Lei n.º 67/98, de 26 de outubro, os dados pessoais relativos aos dadores e recetores, seu tratamento e
interconexão, estão sujeitos a sigilo profissional e a medidas adequadas de segurança e confidencialidade de
informação.
2 - Ao dador e recetor é garantida a confidencialidade de toda a informação relacionada com a sua saúde,
com os resultados das análises das suas dádivas e com a rastreabilidade da sua dádiva.
3 - Na dádiva post mortem e na doação renal cruzada, o dador ou os seus familiares não podem conhecer
a identidade do recetor, nem o recetor ou os seus familiares a identidade do dador, devendo os respetivos
dados serem objeto de encriptação ou outro meio adequado a garantir o não cruzamento de informação.
4 - São expressamente proibidos aditamentos, supressões ou alterações não autorizadas dos dados
constantes das fichas dos dadores ou dos registos de exclusão, bem como a transferência não autorizada de
informações quando não cumpram o previsto na Lei n.º 67/98, de 26 de outubro.
5 - Os sistemas de informação previstos na presente lei garantem a segurança dos dados.
6 - Os direitos de acesso e oposição dos titulares dos dados à informação contida nos sistemas de registo
de dádivas e dadores exercem-se nos termos e condições referidas nos artigos 11.º e alínea a) do artigo 12.º
da Lei n.º 67/98, de 26 de outubro.
CAPÍTULO VI
Intercâmbio de órgãos e organizações europeias de intercâmbio de órgãos
Artigo 19.º
Intercâmbio de órgãos
1 - O intercâmbio de órgãos humanos com países terceiros está sujeito a autorização do IPST, I.P.,
mediante parecer favorável da DGS em matéria de qualidade e segurança, nos termos do número seguinte.
2 - O intercâmbio de órgãos referido no número anterior só pode ser autorizado quando se verifiquem as
seguintes circunstâncias:
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a) Os órgãos possam ser rastreados desde o dador até ao recetor e vice-versa;
b) Os órgãos cumpram os requisitos de qualidade e segurança previstos na presente lei ou, no caso de
países terceiros, normas equivalentes.
3 - A DGS garante a fiscalização do intercâmbio de órgãos com outros Estados-membros e com países
terceiros, em conformidade com os requisitos de qualidade e segurança previstos na presente lei.
4 - Para efeitos do disposto no número anterior, a DGS pode celebrar acordos com as autoridades
competentes congéneres de outros Estados-membros e de países terceiros, desde que as referidas
autoridades assegurem o cumprimento dos requisitos equivalentes aos previstos na presente lei.
Artigo 20.º
Organizações europeias de intercâmbio de órgãos
A DGS pode celebrar acordos com organizações reconhecidas oficialmente a nível europeu de intercâmbio
de órgãos, desde que as referidas organizações assegurem o cumprimento dos requisitos previstos na
presente lei, a fim de delegar nas referidas organizações, nomeadamente:
a) O exercício das atividades previstas no regime para a qualidade e segurança;
b) Funções específicas relacionadas com o intercâmbio de órgãos com outros Estados-membros e com
países terceiros;
c) A fiscalização do intercâmbio de órgãos com outros Estados-membros e com países terceiros.
CAPÍTULO VII
Infrações e sanções
Artigo 21.º
Contraordenações
1 - Às infrações em matéria de proteção de dados pessoais, confidencialidade e segurança do tratamento
de dados é aplicável o regime de contraordenações previsto na Lei n.º 67/98, de 26 de outubro.
2 - Constituem contraordenações leves:
a) A inobservância do n.º 3 do artigo 7.º;
b) A inobservância do n.º 1 do artigo 10.º;
c) O incumprimento do n.º 2 do artigo 11.º;
d) A inobservância da alínea c) do n.º 4 do artigo 11.º;
e) A inobservância dos n.os
1 e 4 do artigo 15.º.
3 - Constituem contraordenações graves:
a) A inobservância dos n.os
1, 2 e 5 do artigo 4.º;
b) A inobservância do n.º 11 do artigo 7.º;
c) O incumprimento das alíneas f) a i) do n.º 1 e o n.º 3 do artigo 9.º;
d) A inobservância das alíneas a) e b) do n.º 4 do artigo 11.º;
e) O incumprimento do n.º 2 do artigo 14.º;
f) A inobservância dos n.os
2, 3 e 5 do artigo 15.º;
g) A inobservância do disposto nos n.ºs 5 e 6 do artigo 16.º;
h) A inobservância do n.º 2, 5 e 6 do artigo 17.º;
i) As infrações que tenham servido para facilitar ou encobrir infrações leves;
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j) A reincidência na prática de infrações leves nos últimos seis meses.
4 - Constituem contraordenações muito graves:
a) A inobservância dos n.os
4 e 7 do artigo 4.º;
b) O funcionamento de unidades de colheita e unidades de transplantação sem a autorização da DGS, nos
termos dos n.os
1 e 10 do artigo 7.º;
c) O incumprimento das alíneas a) a e) do n.º 1 do artigo 9.º;
d) O incumprimento dos n.os
2 e 3 do artigo 10.º;
e) O incumprimento do n.º 1 do artigo 11.º;
f) A ausência da fundamentação prevista no n.º 3 do artigo 11.º;
g) A inobservância do n.º 5 do artigo 11.º;
h) A inobservância do n.º 6 do artigo 11.º;
i) O incumprimento dos artigos 12.º e 13.º;
j) O incumprimento do n.º 1 do artigo 14.º;
k) A inobservância do disposto nos n.ºs 1, 2, 3, 4 do artigo 16.º;
l) A inobservância dos n.os
3, 4 e 5 do artigo 17.º;
m) O incumprimento do n.º 1 do artigo 19.º;
n) As infrações que tenham servido para facilitar ou encobrir infrações graves ou muito graves;
o) A reincidência na prática de infrações graves nos últimos cinco anos.
5 - Nas contraordenações previstas nos números anteriores são puníveis a negligência e a tentativa, sendo
os montantes das coimas referidos no artigo seguinte reduzidos a metade.
Artigo 22.º
Coimas
As contraordenações previstas no artigo anterior são puníveis com coimas de acordo com a seguinte
graduação:
a) As contraordenações leves são punidas com coimas até € 750;
b) As contraordenações graves são punidas com coimas desde € 750 até € 10 000, para pessoas
singulares, e até € 22 500, para pessoas coletivas;
c) As contraordenações muito graves são punidas com coimas desde € 22 500 até € 35 000, para pessoas
singulares, e até € 66 000, para pessoas coletivas.
Artigo 23.º
Fiscalização, instrução e aplicação de coimas
1 - Compete à IGAS assegurar a fiscalização do cumprimento das disposições constantes da presente lei e
a aplicação das sanções previstas no presente capítulo.
2 - A IGAS é a entidade competente para instruir os processos de contraordenação cuja instauração tenha
sido determinada pela DGS ou pelo IPST, IP.
Artigo 24.º
Destino do produto das coimas
O produto das coimas previstas na presente lei reverte:
a) Em 60% para o Estado;
b) Em 30% para a DGS;
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c) Em 10% para a IGAS.
CAPÍTULO VIII
Disposições transitórias e finais
Artigo 25.º
Norma transitória
1 - As unidades de colheita e as unidades de transplantação já em funcionamento dispõem de um período
de 12 meses, contados a partir da data da publicação da presente lei, para se adaptarem aos requisitos nela
previstos.
2 - Após o período referido no número anterior as unidades de saúde onde se encontram instaladas as
unidades de colheita e as unidades de transplantação dispõem de um período máximo de trinta dias úteis para
requerer à DGS, nos termos do artigo 7.º, a renovação do pedido de autorização das atividades em
conformidade com o previsto na presente lei.
3 - O disposto nos números anteriores não obsta a que as unidades de colheita e os centros de
transplantação já em funcionamento possam requerer a renovação da autorização antes de decorrido o
período de adaptação previsto no n.º 1, caso reúnam os requisitos previstos na presente lei.
Artigo 26.º
Norma revogatória
São revogados os n.os
3 e 4 do artigo 3.º da Lei n.º 12/93, de 22 de abril, alterada e republicada pela Lei n.º
22/2007, de 29 de junho, e a Portaria n.º 31/2002, de 8 de janeiro, com exceção do artigo 9.º.
Artigo 27.º
Regulamentação
A regulamentação prevista na presente lei é aprovada no prazo de 120 dias a partir da sua entrada em
vigor.
Artigo 28.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 27 de setembro de 2012.
O Primeiro-Ministro, Pedro Manuel Mamede Passos Coelho — O Ministro Adjunto e dos Assuntos
Parlamentares, Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
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ANEXO I
(a que se refere o artigo 11.º)
Caracterização de órgãos e dadores
Parte A
Conjunto mínimo de dados a recolher obrigatoriamente
Conjunto mínimo de dados – informações destinadas à caracterização de órgãos e dadores a recolher para
cada dádiva, tal como exigido no n.º 1 do artigo 11.º e sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo 11.º
Conjunto mínimo de dados
Estabelecimento onde se realizou a colheita e outros dados de caráter geral
Data e hora da colheita para cada órgão
Tipo de dador
Grupo sanguíneo
Sexo
Causa da morte
Data do óbito
Data de nascimento ou idade estimada
Peso
Altura
Historial presente ou passado de consumo de drogas por via intravenosa (IV)
Historial presente ou passado de neoplasia maligna
Historial presente de outras doenças transmissíveis
Testes de VIH, VHC, VHB
Informações básicas para avaliar a função do órgão doado
PARTE B
Conjunto complementar de dados
Conjunto complementar de dados – informações destinadas à caracterização de órgãos e dadores a
recolher para além do conjunto mínimo de dados especificado na Parte A, com base na decisão da equipa
médica, tendo em conta a disponibilidade das informações e as circunstâncias particulares do caso, nos
termos do n.º 2 do artigo 11.º
Conjunto complementar de dados
Dados gerais
Informações relativas ao contacto do organismo/estabelecimento onde se realizou a colheita necessária à
coordenação, atribuição e rastreabilidade dos órgãos dos dadores aos recetores e vice-versa.
Dados relativos ao dador
Dados demográficos e antropométricos necessários para garantir uma compatibilidade adequada entre
órgão/dador e recetor.
História clínica do dador
História clínica do dador, em especial de patologias que possam afetar a adequação dos órgãos para
transplantação e implicar o risco de transmissão de doenças.
Dados físicos e clínicos
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Dados do exame clínico necessários à avaliação da manutenção fisiológica do potencial dador, bem como
qualquer descoberta que revele doenças não detetadas durante a análise da história clínica do dador e que
possam afetar a adequação dos órgãos para transplantação ou implicar o risco de transmissão de doenças.
Parâmetros laboratoriais
Dados necessários à avaliação da caracterização funcional dos órgãos e à deteção de doenças
potencialmente transmissíveis e de eventuais contraindicações à dádiva de órgãos.
Exames imagiológicos
Exames imagiológicos necessários à avaliação do estado anatómico dos órgãos para transplante.
Terapêutica
Tratamentos administrados ao dador e relevantes para a avaliação do estado funcional dos órgãos e da
adequação à dádiva de órgãos, em especial o uso de antibióticos, substâncias de apoio inotrópico ou
transfusão terapêutica.
ANEXO II
(a que se refere o artigo 13.º)
Informação sobre os dados mínimos acerca do dador/recetor a serem conservados
A. Pelas unidades de colheita de órgãos
Identificação do dador
Identificação da dádiva que incluirá, pelo menos:
- Identificação do organismo de colheita
- Código de colheita
- Data da colheita
- Local da colheita
- Tipo de dádiva (por exemplo, um órgão ou vários órgãos; dadores vivos ou dadores cadáver)
- Data de distribuição ou eliminação
- Identificação do centro de transplantação ao qual os órgãos foram distribuídos.
B. Pelos centros de transplantação de órgãos
Identificação do recetor
Identificação da unidade de colheita de órgãos fornecedora
Data da distribuição ou eliminação
Identificação do Clínico ou utilizador final/Instalação.
Tipo de órgão
Data da transplantação ou eliminação
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 473/XII (2.ª)
RECOMENDA AO GOVERNO A PONDERAÇÃO DO NÚMERO DE DEPENDENTES PARA A ISENÇÃO
DE TAXAS MODERADORAS
Exposição de motivos
As alterações efetuadas pelo atual Governo ao regime de acesso às prestações do Serviço Nacional de
Saúde, com especial destaque para a aplicação das novas regras de capitação para atribuição de isenções
em matéria de taxas moderadoras, impostas pelo Decreto-Lei n.º 113/2011, de 29 de novembro (alterado pelo
Decreto-Lei n.º 128/2012, de 21 de junho), e depois concretizadas pela Portaria n.º 311-D/2011, de 27 de
dezembro, têm conduzido, em muitos casos, a resultados iníquos que importa corrigir.
A anterior lei que regulava as taxas moderadoras (Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de junho) previa que a
capitação de rendimentos para verificação das condições de acesso a prestações sociais não contributivas,
bem como a outros apoios sociais (incluindo a isenção de taxas moderadoras) deveria corresponder à divisão
do rendimento do agregado familiar pelo número de todos os elementos desse agregado, de acordo com uma
escala de ponderação diferenciada.
O novo regime passou a prever – de acordo com o disposto no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 113/2011, e no
artigo 2.º da Portaria n.º 311-D/2011, de 27 de dezembro – que se encontrarão isentos do pagamento de taxas
moderadoras os utentes que integrem agregado familiar cujo rendimento médio mensal seja igual ou inferior a
1,5 vezes o valor do IAS (atualmente € 628,83).
Porém (e isso resulta da interpretação conjugada do artigo 2.º, n.º 2, e do artigo 4.º, ambos da Portaria n.º
311-D/2011, de 27 de dezembro), esse “rendimento médio mensal” passou a aferir-se mediante a divisão do
rendimento anual do agregado familiar por 12 meses e subsequente divisão pelo número de sujeitos passivos
a quem incumbe a direção do agregado familiar.
Significa isto que o novo regime, ao tratar indiferenciadamente agregados familiares compostos apenas
pelas pessoas a quem incumbe a sua direção e outros mais numerosos, prejudica estes últimos, os quais,
para um mesmo rendimento, serão seguramente mais necessitados de apoios sociais.
Este regime é atentatório de uma política de promoção da natalidade e falha clamorosamente na promoção
de uma discriminação positiva dos mais carenciados.
Também o Sr. Provedor de Justiça teve, muito recentemente (Recomendação n.º 11/B/2012, de 13 de
setembro), a oportunidade de se expressar sobre o resultado das alterações efetuadas pelo atual Governo ao
Regime de acesso às prestações do Serviço Nacional de Saúde, com especial incidência sobre o incremento
das taxas moderadoras que, em alguns casos, viram o seu valor ascender a mais do dobro.
Na sua recomendação o Sr. Provedor de Justiça alerta para “o maior significado económico” da isenção,
“face aos valores ora estabelecidos como taxas moderadoras” e, bem assim, para “a muito maior dificuldade,
especialmente para os agregados com rendimento ligeiramente superior ao limiar de isenção, em suportar os
valores em causa.”
Não se pode, pois, como bem observa o Sr. Provedor de Justiça, deixar de ter em conta que os relevantes
aumentos das taxas moderadoras potenciaram os riscos (em rigor, pré-existentes) do regime binário vigente
nesta matéria, em que um pequeno acréscimo pode significar a perda total do benefício ou, como bem conclui,
“para duas situações hipotéticas, uma correspondendo ao caso de isenção e outra não, aquela possa, coeteris
paribus, ter um rendimento disponível superior a esta última, isto contrastando uma igualmente hipotética
diferença de um euro na capitação respetiva, com os valores hoje em vigor para as taxas em apreço.”
Ora, como lapidarmente observa o Sr. Provedor de Justiça, “a alteração das referidas regras de capitação
originou o aparecimento de situações que, quando sujeitas a exercícios de comparação, indiciam uma afronta
preocupante aos Princípios da Justiça e da Igualdade”.
Casos como os que vêm referidos pelo Sr. Provedor de Justiça na sua Recomendação (“Um casal com
filhos com um rendimento de €1200 está isento, quando uma mãe ou pai sozinhos, com um rendimento de
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€650 e o mesmo número de filhos, já não beneficia de tal isenção”; ou “um agregado familiar constituído por 5
membros (3 filhos menores), auferindo um rendimento médio mensal de cerca de €1300 […] não se encontra
na situação de insuficiência económica necessária para efeitos de isenção de taxas moderadoras, na medida
em que, havendo que desconsiderar os menores a seu cargo, a simples divisão do seu rendimento médio
mensal por 2 redunda em um valor de cerca de €650, ou seja, superior ao limite mínimo estabelecido”) apenas
reforçam a conclusão, por si também expressa, de que o resultado da alteração legal ora vigente propicia
“para além da frustração do objetivo da introdução de critérios de racionalidade e de discriminação positiva dos
mais carenciados e desfavorecidos, a existência de situações de injustificável injustiça e desigualdade sociais,
porquanto beneficia os agregados familiares compostos apenas pelas pessoas a quem incumbe a sua direção,
correlativamente prejudicando os agregados mais numerosos, os quais, para um mesmo rendimento, serão
certamente mais necessitados de apoios sociais.”
Já na anterior sessão legislativa, o Partido Socialista, através do Projeto de Lei n.º 220/XII (1.ª), propôs a
inclusão ponderada dos dependentes na avaliação da capitação para efeitos de isenção. Essa solução foi,
porém, reprovada pelos deputados do PSD e CDS-PP.
No momento em que se constata, a cada dia, a deterioração da situação socioeconómica de um número
cada vez maior de famílias, importa que a solução normativa vigente – agora também inequivocamente
denunciada como “injusta” pelo Sr. Provedor de Justiça – seja urgentemente corrigida.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo
Parlamentar do Partido Socialista, abaixo-assinados, apresentam o seguinte projeto de resolução:
A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da
República Portuguesa, recomendar ao Governo que, com carácter de urgência, altere a regra de
capitação prevista na Portaria n.º 311-D/2011, de 27 de dezembro, no sentido de passar a prever que
outros membros integrantes do agregado familiar, para além dos sujeitos passivos a quem incumbe a
sua direção, sejam tomados em consideração no cálculo da situação de insuficiência económica, ainda
que com ponderações valorativas diferenciadas em função da idade, do grau de parentesco ou de
outros fatores adequados.
Assembleia da República, 27 de setembro de 2012.
Os Deputados do PS: Manuel Pizarro — Luísa Salgueiro — Filipe Neto Brandão — Francisco de Assis —
Nuno André Figueiredo — José Junqueiro.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 474/XII (2.ª)
RECOMENDA A ADOÇÃO DE MEDIDAS URGENTES PARA APOIAR COM FUNDOS COMUNITÁRIOS
O PROJETO DE REQUALIFICAÇÃO DO MERCADO DO BOLHÃO
Em 2014, o Mercado de Bolhão, na cidade do Porto, irá comemorar o seu centenário.
Hoje, este Mercado é uma pálida imagem do seu esplendor. Um mercado degradado e a degradar-se,
entre escoras de suporte, sem condições para o exercício das suas principais funções. Um mercado de
produtos frescos que, com os adiamentos sucessivos da sua requalificação, vai perdendo, num ciclo vicioso,
clientes e comerciantes, restando hoje apenas cerca de vinte e cinco por cento daqueles que lá exerciam a
sua atividade há uma década atrás.
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Mas o estado de degradação do Bolhão não constitui, apenas, uma perda para os seus vendedores e
clientes: é uma perda para a zona envolvente, que vê o quarteirão onde se encontra a definhar, ladeado pelas
ruas Formosa, Sá da Bandeira, Alexandre Braga e Fernandes Tomás, perdendo-se com o seu definhamento
não só atividade económica e postos de trabalho, como também o seu potencial turístico e cultural.
Em síntese, a degradação a que o Mercado do Bolhão está votado constitui uma perda para o Porto, que
perde um dos seus mais importantes símbolos, representativo da Alma da cidade e dos seus habitantes.
Desde 1998 que existe um projeto pronto de requalificação e modernização do Mercado do Bolhão em
situação de poder avançar e de ser executado, da autoria do Arquiteto Joaquim Massena, vencedor de um
concurso público internacional realizado na década de 90.
Em 2006, “rasgando” esse projeto, a Câmara Municipal do Porto (CMP) avançou com novo concurso, com
a ideia de concessionar o Mercado a um grupo privado. Concurso esse que viria a ser ganho pela empresa
TCN (TramCroNe), cujo projeto se traduzia, objetivamente, na destruição do interior do mercado e na criação
de um centro comercial. Entre a contestação popular e o incumprimento contratual por parte da TCN, este
projeto acabou por cair, salvando-se o mercado.
A CMP avançou, depois, para um projeto mais reduzido (que custou cerca de um milhão de euros),
elaborado pelo IGESPAR, com um custo de execução estimado de cerca de 20 milhões de euros, e que
retomava parcialmente o projeto de 1998. Previa-se, por parte da Câmara Municipal do Porto, a garantia de
financiamento público, em parte pela venda das ações que esta detinha no Mercador Abastecedor e/ou
também por via de uma possível indemnização relativa ao incumprimento por parte da TCN. No entanto, e não
obstante estas intenções, a verdade é que nada foi feito para executar este projeto e garantir as anunciadas
vias para o respetivo financiamento.
Refira-se, a propósito, que durante este processo nunca foram equacionadas, e consequentemente
garantidas, verbas de financiamento comunitário no âmbito do QCA II e III, nem agora do QREN. Isto apesar
de a Comissão Europeia considerar que este projeto é passível de se enquadrar nos financiamentos do
FEDER, conforme resposta escrita a questões formalmente apresentadas pelo PCP. De facto, e perante uma
pergunta dos Deputados do PCP ao Parlamento Europeu que pretendia averiguar da possibilidade do
“financiamento da recuperação do Mercado do Bolhão”, o Comissário Joahnnes Hahn, confirmou, de forma
inequívoca, que “no âmbito do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) para 2007-2013”, podem
ser financiadas “intervenções relacionadas com operações integradas em zonas urbanas de regeneração
prioritária”, acrescentando, logo em seguida, que são “as autoridades nacionais os responsáveis pela
execução dos projetos, no âmbito dos programas” nacionais. Termina a Comissão Europeia a sua resposta
informando que “as autoridades portuguesas apresentaram uma proposta de reprogramação para o QREN
atual, o que implica o aumento da taxa de cofinanciamento para os programas em questão em Portugal”.
É conhecido o valor patrimonial e histórico do edifício do mercado do Bolhão, bem como a importância que
este pode assumir na dinamização económica e social da cidade e da região, nomeadamente ao nível do
potencial turístico e do escoamento de produtos frescos, sobretudo de origem local e regional. No ano de
1997, foi feito o pedido de classificação do edifício do Mercado do Bolhão como imóvel de interesse público
patrimonial, facto que veio a ser aprovado através do Edital 10/97 da Câmara Municipal do Porto e
posteriormente confirmado pelos serviços do IPPAR, atual IGESPAR. O processo de classificação foi sendo
desenvolvido e, em 2006, o Despacho, proferido em 22 de fevereiro pela então Ministra da Cultura, homologou
a decisão do IGESPAR e confirmou a classificação do edifício do Mercado do Bolhão como imóvel de
interesse público patrimonial de âmbito nacional.
Há que ter a noção exata de que a ausência de uma intervenção de reabilitação contribuirá
inexoravelmente para acentuar o grau de degradação do edificado existente e, consequentemente, aumentará
os custos futuros da sua reabilitação. E que estes adiamentos sucessivos levarão a uma perda cada vez mais
acelerada dos comerciantes tradicionais que exercem a sua atividade no Bolhão e que fazem do mercado
aquilo que ele verdadeiramente é.
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Face à atual situação do Mercado do Bolhão torna-se assim inadiável avançar com a sua requalificação,
sob pena da situação estrutural e funcional deste equipamento poder vir a atingir uma situação irreversível de
sustentação.
Assim, importa que os poderes públicos locais e nacionais cooperem no sentido de garantir o
financiamento público para que o projeto de requalificação do Mercado do Bolhão avance, para que o Bolhão
possa comemorar o seu centenário com o esplendor que merece.
Este financiamento público terá que ser encontrado entre o orçamento municipal, as disponibilidades
financeiras do QREN e, igualmente, por estarmos perante um imóvel de interesse público patrimonial de
âmbito nacional, disponibilidades financeiras da Administração Central, através do Orçamento do Estado. Este
financiamento público exigirá contudo, e no essencial, a mobilização de fundos comunitários, tendo em conta a
recente proposta de reprogramação do QREN entregue pelo Estado Português na UE e as possibilidades de
utilização de pagamentos não executados de outros projetos, nomeadamente por via da aplicação da Regra
N+2/N+3.
Neste contexto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da
República recomenda que:
1. O Governo considere, na sequência da posição favorável da Comissão Europeia, que a execução do
projeto de requalificação e modernização do Mercado do Bolhão, elaborado pelo IGESPAR a solicitação da
Câmara Municipal do Porto, seja considerado elegível para financiamento comunitário no âmbito do QREN
(2007-2013);
2. O Governo adote as medidas adequadas para que, no âmbito da recente reprogramação do QREN, seja
garantido o cofinanciamento máximo de fundos comunitários para o financiamento da execução do projeto de
requalificação do Mercado do Bolhão, para além de uma comparticipação nacional adequada a inscrever no
Orçamento do Estado para 2013.
Assembleia da República, 10 de outubro de 2012.
Os Deputados do PCP: Honório Novo — Lurdes Ribeiro — Bernardino Soares — António Filipe — Miguel
Tiago — Paulo Sá — Rita Rato — Paula Santos — Agostinho Lopes — João Ramos — João Oliveira.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 475/XII (2.ª)
DETERMINA A DIVULGAÇÃO IMEDIATA DAS CONDIÇÕES DE ACESSO E A ABERTURA DOS
CONCURSOS DE APOIO ÀS ARTES
Desde que tomou posse, o Governo PSD/CDS deixou bem claro que aplicaria uma política de
secundarização das artes e da Cultura, sem no entanto, denunciar abertamente a sua intenção de liquidação
do sector, da capacidade de produção que reside num tecido de estruturas de criação de natureza vária e que
asseguram, no essencial, a liberdade de criação e fruição previstas no texto da Constituição da República.
De acordo com a Constituição e com a legislação em vigor, incumbe ao Estado o apoio a essas estruturas
como forma de assegurar as liberdades previstas. A política de direita ao longo dos últimos anos e com
particular intensidade a praticada pelos últimos Governo PS, PSD/CDS, tem vindo a relegar a Cultura para um
plano meramente mercantil, retirando-lhe a dimensão de direito conquistado, sujeitando todo o povo português
a uma política de elitização da cultura e massificação da mediocridade. Ao longo dos últimos anos, as
estruturas de criação artística de todo o país foram, não só confrontadas com a diminuição brutal dos valores
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dos apoios resultantes das candidaturas e projetos aprovados pela DGArtes como com a diminuição desses
valores durante a vigência de contratos assinados e de programas em curso. O Governo PS demonstrou total
falta de respeito quando decidiu impor, à margem dos compromissos assumidos, cortes de 23% do total de
cada programa e o Governo PSD/CDS foi ainda mais longe quando agravou esse corte para cima de 43%.
Maior desprezo pelo trabalho, empenho e importância do trabalho dessas estruturas, demonstrou o Governo
quando comunicou às estruturas a nulidade prática de todos os contratos assinados entre o Estado e as
estruturas de criação ao destinar-lhes um correio eletrónico onde se anunciava que a qualquer momento
poderiam ser revistos os valores das tranches a transferir, estando esse dependente da disponibilidade
financeira da DGArtes, por sua vez decidida politicamente por um Governo que entende que é legítimo
entregar quase oito mil milhões de euros a um banco para amparar crimes cometidos pela sua administração
mas que é demasiado gastar 80 milhões de euros em todo o sector cultural do país.
O Orçamento do Estado de 2012 previu para a Cultura (Património, Artes, Cinema, Arquivos e Bibliotecas)
uma verba abaixo dos 200 milhões de euros e a execução dessa verba não chega a metade desse valor. Isso
significa que, na prática, o orçamento real para a Cultura não atingiu os 100 milhões de euros e que o
orçamento para o apoio às artes se viu reduzido a 10 milhões de euros, representando uma quebra para
metade do executado antes da aplicação das políticas de “austeridade” contidas nos sucessivos PEC e agora
no Memorando da troica, verdadeiro Pacto de Agressão assinado por PS, PSD e CDS e FMI, UE e BCE. A
troica doméstica aplica diligentemente e com afinco a ordem de destruição e sufoco emitida pela troica
estrangeira e encontra na Cultura um obstáculo em duas dimensões fundamentais:
– Por um lado, a Cultura, como elemento de elevação da cultura dos cidadãos, contribui de forma decisiva
para o aprofundamento da democracia, para a consciencialização política e social da sociedade, para a
emancipação coletiva e individual do povo português;
– Por outro lado, a livre produção e fruição representa uma despesa e uma alternativa à ditadura do
mercado que este Governo defende e estimula, também na área da Cultura e das Artes.
Conjugando essas duas dimensões, entende-se a obsessão do Governo em torno da destruição do tecido
cultural, do esmagamento da cultura e arte livre, independente, popular e alternativa. Para este Governo, para
o PSD e o CDS só existem duas culturas: a da elite que pode pagar e da mediocridade e monocultura para
quem não integra as elites. “A cultura dominante é a da classe dominante” e o Governo demonstra bem o seu
compromisso de classe ao esmagar a cultura popular e livre e ao promover a cultura do entretenimento e do
entorpecimento social.
Todavia, tais intenções não foram anunciadas abertamente pelo Governo e têm mesmo sido dissimuladas
e camufladas pelas sucessivas mentiras, desculpas e falsos pretextos inventados pelo Governo, pelo PSD e
CDS, tantas vezes comunicadas pela intervenção do Secretário de Estado da Cultura. O Secretário de Estado
da Cultura, em sede de Comissão de Educação, Ciência e Cultura e questionado pelo Grupo Parlamentar do
Partido Comunista Português afirmava, em Junho, que os critérios, montantes e regulamentos dos concursos
da DGArtes seriam conhecidos brevemente.
Nessa mesma audição parlamentar, o Sr. Secretário de Estado da Cultura afirmava também um solene
compromisso de abrir até Setembro esses concursos. A acusação e denúncia do PCP, de que essas
afirmações se inseriam numa estratégia de dilatação de prazos e de desmobilização do sector veio a
comprovar-se integralmente. O mês de Setembro terminou e até hoje a única medida tomada pelo Governo foi
o anúncio colocado, a 28 de Setembro, no sítio de internet da DGArtes onde se lê o seguinte:
“A Direção-Geral das Artes está a aguardar a conclusão dos procedimentos administrativos que decorrem
das novas regras ditadas pelo Ministério das Finanças. Os Concursos Públicos de Apoio às Artes serão
abertos assim que forem aprovadas as respetivas portarias de extensão de encargos.”
Com este anúncio, não só o Governo assume que não concluiu os “procedimentos administrativos” no
prazo que o próprio definiu, como remete a resolução do problema e a realização de concursos para a
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aprovação de “portarias de extensão de encargos” que são da responsabilidade do próprio Governo. Ou seja,
o Governo assume involuntariamente a sua irresponsabilidade e o incumprimento dos seus compromissos.
Porém, enquanto todos estes prazos se dilatam, enquanto a legislação vigente é alvo de um veto ilegal, de
uma suspensão marginal e sem precedentes, as companhias, grupos de teatro, associações e outras
estruturas de criação artística são obrigadas a diminuir a sua programação, as contratações, e a sacrificar
quase completamente as atividades de investigação sendo que a bilheteira e a receita passam a constituir o
centro das suas preocupações por motivos de sobrevivência.
É urgente, aliás fundamental, que a Constituição da República Portuguesa deixe de ser para os Governos
apenas um papel e passe a ser cumprida e respeitada por todos quantos, mentindo, a juram defender. Esse
passo, essa rutura criaria as condições para uma nova política cultural e para a valorização orçamental do
sector, como é exigido por forças diversas na sociedade portuguesa, das que se destacam os movimentos em
defesa da cultura, os sindicatos e o movimento associativo popular. Só a rejeição do Pacto de Agressão e a
construção de uma alternativa política com os portugueses, com os jovens, os homens e as mulheres que
vivem do seu trabalho e que querem contribuir para a produção cultural livre, porque dessa produção
usufruem, com essa produção aprendem, se expressam criativa e criticamente.
Nesse sentido, além dos objetivos programáticos que se exigem e que se afirmam com cada vez mais
clamor por parte dos portugueses que reclamam a mudança de políticas, é absolutamente fundamental que
seja assegurado o financiamento do apoio às artes em tempo de impedir o colapso e encerramento de
estruturas, a contenção do desemprego entre os profissionais do sector e a total supressão da relação das
estruturas com o Estado.
Assim, nos termos e ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo
4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do
PCP, apresentam o seguinte projeto de resolução:
A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da
República Portuguesa, recomendar ao Governo:
a) A divulgação imediata dos montantes, critérios e regulamentos dos concursos de apoio às Artes;
b) A abertura dos concursos de apoio às artes até ao final do mês de Outubro;
c) A reposição, através do Orçamento do Estado para 2013, dos valores retirados ilegitimamente às
estruturas de criação artística que resultaram de alterações unilaterais e impostas pela DGArtes às
estruturas.
Assembleia da República, 10 de outubro de 2012.
Os Deputados do PCP: Miguel Tiago — Bernardino Soares — João Oliveira — António Filipe — Paulo Sá
— Rita Rato — Lurdes Rodrigues — Bruno Dias — João Ramos.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.