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II SÉRIE-A — NÚMERO 83

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Em Portugal, as causas estruturais da pobreza têm sido profundamente agravadas com mais de 36 anos

de políticas de direita, o processo de integração capitalista na União Europeia, a natureza do capitalismo e da

crise, e a aplicação das medidas do Pacto de Agressão da Troica.

De acordo com o Relatório «Medir a Pobreza Infantil» apresentado pela Unicef em 2012, 27% das crianças

portuguesas vivem em situação de carência económica, percentagem que se agrava para 46,5% no caso das

crianças que vivem em agregados monoparentais e mais ainda em famílias cujos pais estão desempregados

em que o índice de carência atinge os 73,6%. O Relatório conclui ainda que 14,7% das crianças portuguesas

até aos 16 anos vivem abaixo do limiar de pobreza, isto é em lares cujos rendimentos anuais por adulto estão

abaixo da mediana da distribuição dos rendimentos (cerca de €400/mês).

Note-se, porém, que este Relatório foi construído com base em indicadores de 2009, portanto anteriores ao

agravamento da situação de crise, à aplicação do Pacto da Troica e ao agravamento das políticas de

austeridade, o que significa que estes dados pecam por defeito.

Efetivamente, tudo indica que neste momento a situação da pobreza infantil é muito mais grave e, apesar

de ainda não existirem dados estatísticos atualizados que a permitam medir, os sinais vindos da sociedade

são muito preocupantes.

Em novembro de 2012, o Secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar reconhecia haver 13

000 crianças sinalizadas que chegavam com fome às escolas. A comunicação social noticiou vários casos de

crianças e jovens a desmaiarem em plena sala de aula, por falta de alimentação, e também situações em que

as direções das escolas suspenderam o fornecimento de refeições a crianças por falta de pagamento por parte

das famílias. As cantinas escolares passaram a estar abertas em períodos de férias letivas – e mais

recentemente algumas também ao fim de semana – por se saber que muitas crianças comem a sua única

refeição do dia na escola.

Também na área da saúde se poderão verificar retrocessos, com repercussões graves na saúde infantil, já

que segundo vários indicadores, o acesso à saúde em geral está ser dificultado, pelo aumento das taxas

moderadoras e redução das situações de isenção e pelo aumento dos preços dos medicamentos.

Cada vez mais famílias têm dificuldades em cumprir as necessidades básicas das crianças com

alimentação, vestuário, habitação, material escolar e cuidados de saúde. Há fome na escola, porque há fome

em casa. Falências e encerramento de empresas, salários em atraso, desemprego, cortes nos apoios sociais,

no subsídio de desemprego, abono de família, rendimento social de inserção, aumento do custo de vida. É

uma espiral de empobrecimento que arrasa a vida de largos milhares de famílias no nosso país.

A Sociedade Portuguesa de Pediatria denunciou recentemente que têm surgido nos hospitais casos que

não se registavam há 20 anos; mães que acrescentam água ao leite artificial, ou dão leite de vaca a bebés de

meses; crianças que na segunda-feira nos refeitórios escolares repetem tudo o que puderem; pais que não

têm condições de acompanhar os filhos no internamento hospitalar.

A Rede Europeia Anti Pobreza alerta para consequências do desemprego dos pais na vida das crianças:

situações de elevada instabilidade emocional e psicológica que influenciam as vivências das crianças e

provoca em muitos casos problemas de aprendizagem, de inserção no meio escolar, de discriminação,

violência.

Em Portugal, a taxa de risco de pobreza é superior à de alguns países com rendimentos mais baixos,

mesmo após a transferência dos valores das prestações sociais, o que torna claro a necessidade efetiva de

reforço dos mecanismos sociais de combate à pobreza e à exclusão social. Os cortes nas prestações sociais

são ainda mais injustos e chocantes, ao mesmo tempo que o Governo disponibiliza 12 mil milhões de euros

para os grupos económicos e financeiros.

Para além disto, o aumento do risco de pobreza está em estreita relação com a destruição, em curso, de

importantes funções sociais do Estado. Como é sabido, as transferências sociais têm um importante impacto

positivo na redução da pobreza e, assim sendo, a atual tendência no sentido da redução destas transferências

aponta para um previsível aumento da pobreza das famílias e consequentemente da pobreza infantil.

Com efeito, a redução generalizada das prestações sociais, em especial daquelas com maior incidência

nas famílias, como sejam o abono de família e o apoio da ação social escolar, mas também das prestações

substitutivas de rendimentos de trabalho perdidos, como as prestações de desemprego, as atribuídas em