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20 | II Série A - Número: 157S1 | 20 de Agosto de 2014

Sublinhe-se, por último, que neste domínio não há sequer divergência entre o Direito da União Europeia e o Direito Constitucional Português. Efetivamente os princípios constitucionais da igualdade, da proporcionalidade e da proteção da confiança que têm servido de parâmetro ao Tribunal Constitucional para aferir da constitucionalidade das normas internas relativas a matérias conexas com as que se apreciam nos presentes autos fazem parte do núcleo duro do Estado de Direito, integrando o património jurídico comum europeu, a que a União também está vinculada.
Dito isto, há que voltar a realçar que é tarefa indeclinável do Tribunal Constitucional português exercer a competência que o artigo 221.º da Constituição lhe confere.
26. A medida contida no Decreto n.º 262/XII da Assembleia da República implica uma alteração significativa na configuração do sistema previdencial da segurança social portuguesa, sobretudo no ponto em que determina, no seu artigo 4.º, sob a epígrafe “[c]álculo da contribuição de sustentabilidade”, uma redução do montante de pensões já em pagamento, a título definitivo, e, portanto, sem qualquer perspetiva de temporalidade.
Trata-se, por outro lado, de uma limitação do princípio do benefício definido, enquanto princípio estruturante do modelo de formação do direito à pensão, depois de ele ter sido legitimamente adquirido pelo seu titular.
É certo que essa medida não aparece isolada. Como já se referiu, o decreto da Assembleia institui um regime que é completado por outros mecanismos, constantes dos artigos 7.º, 8.º, 10.º e 11.º do decreto, que pretendem estender o esforço de “sustentabilidade” do sistema, não apenas aos seus contribuintes atuais (através das alterações marginais à contribuição dos trabalhadores para os sistemas de previdência social), mas ainda à sociedade no seu todo (através das alterações marginais à taxa normal do Imposto sobre o Valor Acrescentado). O que aparentemente poderia demonstrar a preocupação do legislador por exigências de justiça intergeracional.
Todavia, poderá dizer-se que o essencial da escolha política que o decreto contém se cifra na fixação das taxas correspondentes à «contribuição de sustentabilidade» fixadas no artigo 4.º. E essa fixação equivale indiscutivelmente a uma medida definitiva de redução das pensões já em pagamento.
O caráter fortemente «retrospetivo» desta medida já foi antes salientado. Por isso mesmo, salientada também foi a consistência particular que no caso adquire a necessária tutela da confiança das pessoas afetadas, titulares de direitos já «formados», e valorados – nos termos já descritos – pela Constituição.
A intensidade com que esta confiança merece ser protegida não pode ser tida, pelo Direito, como algo de meramente instrumental face à defesa de certos e determinados direitos subjetivos. Não está em causa um mero instrumento que sirva apenas para a afirmação de posições jurídicas detidas por um certo grupo da sociedade portuguesa. Está em causa, mais do que isso, o cumprimento de um princípio objetivo, decorrente de escolhas de valor que estruturam toda a ordem constitucional (artigos 2.º e 63.º) e, que por isso mesmo, interessam à comunidade no seu todo. Nessa medida, qualquer alteração legislativa que se pretenda introduzir no modelo previdencial português não pode deixar de ter em conta esse elemento de ponderação, que objetivamente vincula o legislador.
Note-se, por outro lado, que a alteração legislativa é apresentada num quadro de uma acentuada incerteza.
Desde logo porque a medida, em si mesma, põe em causa – em termos que serão melhor desenvolvidos adiante - o princípio da contributividade e a tendencial correspetividade entre as contribuições que o beneficiário efetua e o montante de pensão de que poderá usufruir após a passagem à situação de reforma, o que torna particularmente difícil que as pessoas saibam com o que podem contar relativamente ao destino que irá ser dado às contribuições que, por imposição da lei, presentemente realizam para sustentar o sistema da previdência social.
27. Perante os quadros gerais do atual sistema previdencial de segurança social, que foi definido num outro contexto histórico, e cuja subsistência no presente momento, sem qualquer modificação, poderá suscitar dificuldades de sustentabilidade das finanças públicas e do próprio sistema de pensões e colocar a República em situação de incumprimento perante as suas obrigações europeias e das suas obrigações perante gerações futuras, não pode deixar de reconhecer-se a necessidade de uma reforma do sistema.
O cumprimento desta necessária tarefa não tem, evidentemente, que ser levado a cabo por um só ato ou de uma só vez. É, no entanto, dificilmente compreensível que a implementação de medidas como as previstas no Decreto da Assembleia da República n.º 262/XII, implicando uma mitigação radical do princípio do benefício