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Quinta-feira, 29 de janeiro de 2015 II Série-A — Número 66
XII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2014-2015)
SUMÁRIO Projeto de lei n.o 763/XII (4.ª): Reorganização funcional da rede de serviços de urgência (BE).
Proposta de lei n.º 276/XII (4.ª) (Fixação de um sistema fiscal regional): — Parecer da Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
Projetos de resolução [n.os 1170, 1233 e 1234/XII (4.ª)]: N.º 1170/XII (4.ª) (Recomenda ao Governo um conjunto de medidas de carácter extraordinário de apoio aos produtores de castanha): — Informação da Comissão de Agricultura e Mar relativa à discussão do diploma ao abrigo do artigo 128.º do Regimento da Assembleia da República.
N.º 1233/XII (4.ª) — Aplicação das recomendações do Conselho Nacional de Educação relativamente ao enquadramento legal da educação especial (BE).
N.º 1234/XII (4.ª) — Municipalização escolar imposta à custa da autonomia das escolas (BE).
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PROJETO DE LEI N.O 763/XII (4.ª) REORGANIZAÇÃO FUNCIONAL DA REDE DE SERVIÇOS DE URGÊNCIA
Exposição de motivos
Nas últimas semanas têm-se sucedido as notícias dando conta das imensas dificuldades vividas nas urgências hospitalares em Portugal: serviços sobrelotados, doentes que aguardam horas e horas por atendimento, profissionais extenuados, falta de espaço nos serviços, doentes internados em macas nos corredores são realidades que estão a ocorrer cada vez com mais frequência um pouco por todo o país.
Chegámos ao absurdo de ver filas de ambulâncias em espera, paralisando as corporações de Bombeiros, que assim, ficam impedidos de responder a outras situações de urgência. Esta situação demonstra a degradação da qualidade das urgências do Serviço Nacional de Saúde (SNS), consequência das políticas de austeridade deste governo que podem até poupar euros mas que não poupam vidas. Esta degradação da qualidade leva a que os doentes aguardem horas num serviço de urgência, e que, nalguns casos, essa espera culmine com a sua morte enquanto aguardam atendimento, o que é absolutamente intolerável. Este panorama agrava-se no inverno mas a desorganização dos serviços de urgência, o seu mau funcionamento e os tempos de espera cada vez mais prolongados são permanentes e constantes ao longo de todo o ano. O inverno e as gripes próprias da época não são responsáveis pela degradação dos serviços de urgência hospitalares, apenas agravam os problemas e as dificuldades que condicionam a resposta daqueles serviços. A crise das urgências não é um problema sazonal. A sobrelotação dos serviços de urgência e as longas horas de espera são o resultado mais visível dos cortes praticados no SNS pelo ministro Paulo Macedo quer nos hospitais quer nos centros de saúde. Nos hospitais, cortando nas equipas e no número de camas disponíveis. Nos centros de saúde, reduzindo horários e consultas.
Em três anos e meio Paulo Macedo bateu todos os recordes: o mais baixo financiamento para o SNS, os maiores cortes na contratação de profissionais - médicos, enfermeiros e técnicos - a maior redução de horas extraordinárias, o maior número de serviços encerrados (urgências, SAPs, extensões de centros de saúde, serviços e unidades hospitalares), a maior redução nas equipas escaladas para as urgências, o maior corte nos meios de emergência, a maior redução no horário de funcionamento dos centros de saúde.
Os cortes de Paulo Macedo sangraram as urgências hospitalares daquilo que as faz funcionar bem e com eficácia: os profissionais de saúde. As equipas escaladas para as urgências estão reduzidas ao mínimo, faltam médicos, enfermeiros e técnicos em número suficiente para garantir um atendimento a tempo e horas e de qualidade.
Este problema agrava-se nos centros urbanos onde não existem urgências básicas e a população não tem outra alternativa que não seja dirigir-se à urgência hospitalar (polivalente ou médico-cirúrgica): se os centros de saúde não garantem atender os utentes no dia em que eles adoecem e precisam de consulta, se não há uma urgência básica onde possam dirigir-se, então, aos doentes não resta outra solução que não seja a urgência do hospital mais próximo. A ausência de resposta ao nível dos centros de saúde gera um fluxo intenso de doentes para as urgências hospitalares, um fluxo muito superior à capacidade de resposta das desfalcadas equipas dessas urgências. A escassez de profissionais impede que as urgências hospitalares satisfaçam essa procura intensa num tempo aceitável e o resultado é a sistemática acumulação de doentes, longas horas de espera e défices na qualidade da assistência prestada.
Às urgências hospitalares chegam dois tipos de doentes que, apesar de necessitarem de cuidados muito distintos, se juntam e acumulam no mesmo serviço e no mesmo espaço: os que precisam de uma resposta mais diferenciada e muito urgente ou mesmo emergente e muitos outros que requerem apenas cuidados básicos, uma assistência mais simples mas pronta. Situações clínicas diferentes requerem respostas, serviços, espaços e equipas diferentes. A mistura que hoje se verifica nas urgências hospitalares - sobretudo em momentos de grande sobrecarga - é um fator de perturbação do seu funcionamento, desorganiza e atrasa a prestação de cuidados.
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Numa urgência hospitalar o critério de atendimento só pode ser a gravidade clínica e não a ordem de chegada. Com equipas reduzidas e perante a avalanche de doentes, as equipas de serviço nas urgências hospitalares atendem as situações mais graves - e mesmo assim, nalguns casos, já muito fora do tempo clinicamente aceitável - e deixam em espera todas as outras situações que a triagem não tenha identificado como prioritárias e que são em número muito elevado: segundo dados oficiais, são 46% dos que procuram as urgências hospitalares e correspondem aos verdes e azuis, classificados como não urgentes.
Significa isto que, hoje e com este modelo, sem acesso no próprio dia a uma consulta no centro de saúde e com equipas reduzidas ao mínimo nas urgências pelos cortes impostos pelo governo, um elevadíssimo número de doentes não encontra nas urgências hospitalares a resposta que procura para o seu caso porque, simplesmente, as equipas de serviço não dispõem nem de tempo nem de condições para assistir outros doentes que não os mais prioritários, os mais graves. Hoje, nas urgências hospitalares, excluindo os casos mais graves, o doente vai à procura de assistência e o que encontra é uma longa espera por cuidados que podia e devia encontrar noutros serviços menos diferenciados mas de resposta mais pronta e rápida. São 46% os doentes que sofrem as consequências desta situação e que não encontram a resposta de que precisam nas urgências hospitalares.
Estes utentes são colocados em espera e atendidos exatamente nos mesmos espaços que utentes urgentes e pelos mesmos médicos, quando beneficiariam do atendimento por médicos de medicina geral e familiar, em espaço próprio, e libertando os recursos da urgência polivalente ou médico-cirúrgica para os utentes mais urgentes.
O Despacho n.º 5414/2008 (2.ª série), publicado no Diário da República, n.º 42, de 28 de fevereiro, definiu e classificou os serviços que constituem os pontos da Rede de Referenciação de Urgência/Emergência. De acordo com este Despacho, não existem serviços de urgência básica (SUB) nos grandes centros urbanos, nomeadamente, Lisboa, Porto, Coimbra… A criação nos hospitais de serviços de urgência básica associados às urgências polivalentes ou médicocirúrgicas é uma forma de atender às necessidades de 46% dos utentes de forma mais rápida e adequada, descongestionando, simultaneamente, os serviços de urgência mais diferenciados. Os utentes passam a dispor, no mesmo local, de serviços de urgência com diferentes níveis de diferenciação, para os quais seriam encaminhados, após triagem, consoante o seu grau de gravidade. As unidades de saúde também fariam uma gestão mais eficiente dos recursos disponíveis, alocando-os consoante a gravidade dos utentes atendidos, o que, por sua vez, lhes permitiria dar uma resposta mais rápida e mais adequada a cada situação. É esta alteração que o Bloco de Esquerda propõe no presente projeto de lei.
O Governo anunciou agora medidas para responder à situação de verdadeiro caos que se vive nos serviços de urgência. Medidas tardias e que não tocam no que é essencial - os cortes no financiamento e a redução de profissionais.
Mudar o modelo e investir nas equipas são medidas indispensáveis para responder à situação de 46% dos cidadãos que não encontram solução para o seu problema de saúde nos serviços de urgência hospitalar. A proposta do Bloco de Esquerda faz parte da solução e significa uma melhoria nas condições de atendimento nas urgências.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º Objeto
O presente diploma estabelece a reorganização funcional da rede de serviços de urgência.
Artigo 2.º Criação de novos serviços de urgência básica
1 - Todos os pontos da Rede de Referenciação de Urgência/Emergência classificados como serviços hospitalares de urgência polivalente e médico-cirúrgica passam a dispor de um serviço de urgência básica, a funcionar de forma articulada e integrada, e instalado em espaço próprio do respetivo hospital.
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2 - O disposto no número anterior também se aplica aos centros hospitalares que disponham de urgência polivalente ou médico-cirúrgica e não pode prejudicar o funcionamento dos serviços de urgência básica eventualmente instalados noutras unidades hospitalares do respetivo centro hospitalar. 3 - Os serviços de urgência básica a criar, ao abrigo do número 1, obedecem com as devidas adaptações ao disposto no Despacho n.º 18459/2006, de 12 de setembro, alterado pelos Despachos n.º 24681/2006, de 30 de novembro, n.º 727/2007, de 15 de janeiro, e n.º 16544/2007, de 30 de julho.
Artigo 3.º Regulamentação
O Governo regulamenta o disposto na presente lei no prazo de 60 dias a contar da data da sua publicação.
Artigo 4.º Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no primeiro dia útil após a sua publicação.
Assembleia da República, 30 de janeiro de 2015.
As Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda, João Semedo — Helena Pinto — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Cecília Honório — Catarina Martins — Luís Fazenda — Mariana Aiveca.
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PROPOSTA DE LEI N.º 276/XII (4.ª) (FIXAÇÃO DE UM SISTEMA FISCAL REGIONAL)
Parecer da Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio
Parecer da Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública
Índice PARTE I – CONSIDERANDOS PARTE II – OPINIÃO DO DEPUTADO AUTOR DO PARECER PARTE III – CONCLUSÕES PARTE IV – ANEXOS
PARTE I – CONSIDERANDOS
1. Nota preliminar A Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira apresentou à Assembleia da República a Proposta de Lei n.º 276/XII (4.ª) – “Fixação de um sistema fiscal regional”.
A presente iniciativa deu entrada no dia 15 de janeiro de 2015, tendo sido admitida e baixado, em 21 de janeiro, à Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública (COFAP), comissão competente, para elaboração do respetivo parecer.
Em 26 de janeiro foi promovida por S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República a audição dos órgãos de governo próprios das regiões autónomas, não tendo, até à data, sido recebidos os respetivos pareceres.
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A discussão na generalidade da Proposta de Lei n.º 276/XII (4.ª) encontra-se agendada para a sessão plenária de 29 de janeiro.
A presente iniciativa foi aprovada na Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira (ALRAM) com os votos favoráveis do PSD e do CDS-PP, e a abstenção de todos os restantes grupos parlamentares.
Entretanto a ALRM foi dissolvida pelo Senhor Presidente da República, ouvido o Conselho de Estado, pelo que, nesta data deixou de estar no pleno exercício das suas funções. Aliás, já se encontram marcadas eleições regionais, para a nova Assembleia, para o próximo dia 29 de março.
2. Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa Através da Proposta de Lei n.º 276/XII (4.ª), a ALRAM pretende que seja criado um sistema fiscal específico para a Região Autónoma da Madeira (RAM), fundamentando esta iniciativa no facto de a “situação social e económica estrutural” da Região ter sido “particular e fortemente fustigada e agravada com a crise económica e financeira”.
Acrescenta a exposição de motivos que o Programa de Ajustamento Económico e Financeiro estabelecido em 2012 entre os governos da Região e da República permitiu identificar melhor as fragilidades da RAM inerentes à sua condição de região ultraperiférica, bem como “os insuficientes recursos disponíveis que lhe facultam a prossecução daquele programa”.
Faz ainda notar a proponente o “estatuto de região ultraperifçrica (RUP) conferido á região pelo Tratado de Funcionamento da União Europeia (TFUE), através do seu artigo 349.º, que propugna que as RUP para combaterem os seus constrangimentos permanentes estruturantes, que, pela sua persistência e conjugação, prejudicam gravemente o seu desenvolvimento, recorram a medidas específicas, como, entre outras, as políticas aduaneira e comercial, a política fiscal e as zonas francas”.
Acrescenta que, “segundo o n.º 4 do artigo 107.º do Estatuto Político-Administrativo da RAM (…), o sistema fiscal regional será estruturado por forma a assegurar a correção das desigualdades derivadas da insularidade, a justa repartição da riqueza e dos rendimentos e a concretização de uma política de desenvolvimento económico e justiça social”.
A criação deste sistema fiscal regional, segundo os proponentes, entronca “nos princípios constitucionalmente consagrados da correção das desigualdades, da convergência económica e social e da solidariedade nacional (…)”.
Este enquadramento justificaria “a adoção de medidas fiscais de carácter geral para toda a Região (…)”.
Acrescentam os proponentes que a “Região Autónoma da Madeira, enquanto região ultraperifçrica (RUP), dotada de uma pequena economia insular, confronta-se com constrangimentos estruturais permanentes que afetam gravemente o seu desenvolvimento”, situação que se agravou nos últimos anos.
Terminam os proponentes a justificação da criação do sistema fiscal regional afirmando que as medidas “visam tambçm estimular e incentivar a modernização, diversificação, inovação e internacionalização da economia regional, através das entidades cuja direção efetiva seja assegurada a partir da e na Região Autónoma da Madeira”.
As medidas propostas assentam em três eixos: 1) A redução, para 12,5%, da taxa do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) a vigorar na RAM, sendo que, no interior dos parques industriais devidamente delimitados, sobre os primeiros dez mil euros de matéria coletável incidirá uma taxa de 10%. [artigos 2.º e 3.º] Presentemente, com a entrada em vigor do Orçamento do Estado para 2015 (Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro), a taxa de IRC que vigora no território nacional é de 21% (n.º 1 do artigo 87.º do Código do IRC), sendo que para as pequenas e médias empresas a taxa de IRC aplicável aos primeiros 15 mil euros de matéria coletável é de 17% (n.º 2 do mesmo artigo).
2) A atribuição de uma dedução de 60% à coleta do IRC para as empresas que “criem postos de trabalho adequados e necessários à natureza da atividade desenvolvida”, desde que preencham, pelo menos, duas das seguintes condições: a) Contribuam para a modernização da economia regional, nomeadamente através da inovação tecnológica de produtos e de processos de fabrico ou de modelos de negócio;
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b) Contribuam para a diversificação da economia regional, nomeadamente através do exercício de novas atividades de elevado valor acrescentado; c) Prossigam, pelo menos na percentagem de 50% do volume de negócios, atividades nos mercados internacionais ou efetuem operações com outras entidades abrangidas por este benefício; d) Contribuam para a fixação na Região de recursos humanos de elevado mérito e competência nos domínios técnico-científicos; e) Contribuam para a melhoria das condições ambientais; f) Contribuam para a projeção económica e visibilidade da Região nos mercados internacionais. [artigo 4.º]
São, ainda, propostas outras medidas para estas entidades, designadamente: a) O pagamento especial por conta, e outras tributações e retenções fiscais, são devidos na proporção da taxa de IRC aplicável; [artigo 5.º] b) Os juros de empréstimos por eles contraídos são isentos de IRS ou IRC, desde que o produto desses empréstimos se destine à realização de investimentos e ao normal funcionamento dos mutuários na Região Autónoma da Madeira e desde que os mutuantes sejam não residentes no restante território português, excetuados os respetivos estabelecimentos estáveis nele situados; [artigo 6.º] c) São também isentos de IRS ou IRC os rendimentos resultantes da concessão ou cedência temporária de patentes de invenção, licenças de exploração, modelos de utilidade, desenhos e modelos industriais, marcas, nomes e insígnias de estabelecimentos, processos de fabrico ou conservação de produtos e direitos análogos, bem como os derivados da assistência técnica e da prestação de informações relativas a uma dada experiência no sector industrial, comercial ou científico bem como artístico ou literário, e, ainda, os rendimentos das prestações de serviços; [artigo 7.º] d) São reduzidos, para 20%, os montantes devidos pelo Imposto do Selo, Imposto Municipal sobre Imóveis, Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, Derramas estadual, regional e municipal e taxas; [artigo 10.º] e) Os sócios ou acionistas gozam de isenção de IRS ou IRC relativamente aos lucros colocados à sua disposição por aquelas entidades, bem como aos rendimentos provenientes de juros e outras formas de remuneração de suprimentos, abonos ou adiantamentos de capital por si feitos à respetiva pessoa coletiva ou devidos pelo facto de não levantarem os lucros ou remunerações colocados à sua disposição por aquelas entidades. [artigo 8.º]
A estas empresas é concedido um “direito irrevogável ao regime” durante um prazo de 15 anos [artigo 11.º], como forma de garantir um período de tempo suficientemente atrativo, a confiança e a estabilidade dos investimentos efetuados.
Deste regime beneficiarão, também, as entidades licenciadas para operar na Zona Franca ou Centro Internacional de Negócios da Madeira. [artigo 12.º].
3) Adicionalmente, as taxas nacionais do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e dos impostos especiais de consumo são reduzidas em 30%. [artigo 9.º]
Conforme mencionado, a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira enquadra esta proposta de lei no âmbito do n.º 4 do artigo 107.º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira (Lei n.º 13/91, de 5 de junho, alterada pelas Leis n.os 130/99, de 21 de agosto, e 12/2000, de 21 de junho), segundo o qual “o sistema fiscal regional será estruturado por forma a assegurar a correção das desigualdades derivadas da insularidade, a justa repartição da riqueza e dos rendimentos e a concretização de uma política de desenvolvimento económico e justiça social”.
Alude, igualmente, às alíneas i) e j) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição da República Portuguesa, que dispõem, respetivamente, que as regiões autónomas têm o poder de “exercer poder tributário próprio, nos termos da lei, bem como adaptar o sistema fiscal nacional às especificidades regionais, nos termos de lei quadro da Assembleia da Repõblica” e “dispor, nos termos dos estatutos e da lei de finanças das regiões autónomas, das receitas fiscais nelas cobradas ou geradas, bem como de uma participação nas receitas tributárias do Estado,
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estabelecida de acordo com um princípio que assegure a efetiva solidariedade nacional, e de outras receitas que lhes sejam atribuídas e afetá-las ás suas despesas”.
De referir que o artigo 59.º, n.os 1 a 6, da Lei das Finanças das Regiões Autónomas (Lei Orgânica n.º 2/2013, de 2 de setembro, alterada pelas Leis n.os 83.º-C/2013, de 21 de dezembro, e 82-B/2014, de 31 de dezembro) dispõe sobre a adaptação do sistema fiscal nacional às especificidades regionais, conferindo poderes às próprias assembleias legislativas das regiões autónomas para, por um lado, “diminuir as taxas nacionais do IRS, do IRC e do IVA, até ao limite de 30%, e dos impostos especiais de consumo, de acordo com a legislação em vigor” [n.º 2] e, por outro, “determinar a aplicação nas regiões autónomas das taxas reduzidas do IRC definida em legislação nacional, nos termos e condições que vierem a ser fixados em decreto legislativo regional” [n.º 3].
Isto, “sem prejuízo do disposto em legislação fiscal nacional para vigorar apenas nas regiões autónomas […]”.
[n.º 1] A proposta de lei prevê que a legislação entre em vigor no ano económico seguinte ao da sua aprovação, o que permite ultrapassar os atuais condicionalismos no que respeita a medidas com incidência sobre a receita da Região, decorrentes da vigência do Programa de Ajustamento Economico e Financeira da RAM.
3. Conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e cumprimento da lei formulário A presente iniciativa, “Fixação de um sistema fiscal regional”, é apresentada pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, no âmbito da sua competência, ao abrigo do n.º 1 do artigo 167.º, da alínea f) do n.º 1 do artigo 227.º e do n.º 1 do artigo 232.º da Constituição, bem como do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República.
Toma a forma de proposta de lei, nos termos do n.º 1 do artigo 119.º, e é assinada pelo Presidente da Assembleia Legislativa, em conformidade com o disposto no n.º 3 do artigo 123.º, ambos do Regimento.
Mostra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo assim os requisitos formais do n.º 1 do artigo 124.º do Regimento. Caso seja aprovada, sugere-se a introdução de epígrafes em cada um dos artigos, de forma a facilitar a leitura da lei.
Cumpre ainda o disposto no n.º 3 do artigo 124.º do Regimento, uma vez que a Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira juntou uma “Nota Justificativa” a fundamentar a proposta.
Quanto à entrada em vigor da iniciativa, terá lugar no ano económico seguinte ao da sua aprovação, o que permite ultrapassar a proibição constitucional e regimental que veda a apresentação de iniciativas que “envolvam, no ano económico em curso, aumento das despesas ou diminuição das receitas do Estado previstas no Orçamento“, preceito conhecido como “lei-travão” (n.º 2 do artigo 167.º da Constituição e n.º 2 do artigo 120.º do Regimento).
No que concerne à Lei n.º 74/98, de 11 de novembro (sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas), alterada e republicada pela Lei n.º 42/2007, de 24 de agosto, a proposta de lei cumpre o disposto no artigo 13.º, ao incluir uma exposição de motivos, assim como o disposto no n.º 2 do artigo 7.º, uma vez que tem um título que traduz sinteticamente o seu objeto. Adicionalmente, a norma de entrada em vigor contida na proposta de lei cumpre o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da “lei formulário”.
4. Iniciativas legislativas pendentes sobre matéria conexa Efetuada uma pesquisa à base de dados do processo legislativo e da atividade parlamentar, verifica-se que, presentemente, não existem iniciativas legislativas sobre matéria idêntica.
PARTE II – OPINIÃO DO DEPUTADO AUTOR DO PARECER O Deputado autor do Parecer aceita, concorda e defende que a criação deste sistema fiscal regional pode proporcionar o investimento e a atração de empresas, nomeadamente estrangeiras, que façam arrecadar receitas fiscais suficientes que permitam à RAM diminuir o seu défice orçamental e honrar a dívida pública regional.
Na verdade a RAM tem, neste momento, três problemas cruciais: desemprego, dívida pública regional e meios financeiros insuficientes.
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Aliás, o problema da receita é, na RAM, estrutural e tem ficado sempre muito aquém das suas necessidades.
Tal se deve aos constrangimentos que têm afetado a receita gerada pelo CINM e sobretudo ao facto de, do ponto de vista económico, a RAM estar quase exclusivamente dependente do sector do Turismo que, naturalmente, não gera receita suficiente.
Por isso, esta proposta a ser aprovada visaria sobretudo a dinamização da economia regional e a sua diversificação para novos sectores de atividade.
Aliás, tiveram grande sucesso experiências fiscais semelhantes em países da União Europeia, como o Luxemburgo, a Holanda, a Áustria, Malta e Chipre.
PARTE III – CONCLUSÕES A Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública é de parecer que a Proposta de Lei n.º 276/XII (4.ª) – “Fixação de um sistema fiscal regional” reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser discutida e votada em plenário, reservando os grupos parlamentares o seu sentido de voto para o debate.
Palácio de S. Bento, 29 de janeiro de 2015.
O Deputado Autor do Parecer, Hugo Velosa — O Presidente da Comissão, Eduardo Cabrita.
PARTE IV – ANEXOS Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República.
Nota: O parecer foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do BE.
Nota Técnica
Proposta de Lei n.º 276/XII (4.ª) (ALRAM) Fixação de um sistema fiscal regional.
Data de admissão: 21 de janeiro de 2015.
Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública (5.ª)
Índice I. ANÁLISE SUCINTA DOS FACTOS, SITUAÇÕES E REALIDADES RESPEITANTES À INICIATIVA II. APRECIAÇÃO DA CONFORMIDADE DOS REQUISITOS FORMAIS, CONSTITUCIONAIS E REGIMENTAIS E DO CUMPRIMENTO DA LEI FORMULÁRIO III. ENQUADRAMENTO DOUTRINÁRIO IV. INICIATIVAS LEGISLATIVAS E PETIÇÕES PENDENTES SOBRE A MESMA MATÉRIA V. CONSULTAS E CONTRIBUTOS VI. APRECIAÇÃO DAS CONSEQUÊNCIAS DA APROVAÇÃO E DOS PREVISÍVEIS ENCARGOS COM A SUA APLICAÇÃO
Elaborada por: Vasco Cipriano (DAC), António Almeida Santos (DAPLEN) e Luís Correia da Silva (BIB).
Data: 27 de janeiro de 2015.
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I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa A Proposta de Lei em apreço, apresentada pela Assembleia Legislativa da Madeira (ALRAM), deu entrada na Assembleia da República a 15 de janeiro de 2015, sendo admitida e anunciada em 21 de janeiro de 2015, data em que baixou à Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública (COFAP), para apreciação na generalidade. Em reunião ocorrida a 21 de janeiro, e de acordo com o estatuído no artigo 135.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), a iniciativa foi distribuída, tendo sido designado autor do parecer da Comissão o Senhor Deputado Hugo Velosa (PSD).
A presente Proposta de Lei começa por contextualizar a iniciativa na atual situação económica e financeira da Região Autónoma da Madeira (RAU) e no cumprimento do seu Plano de Ajustamento Económico e Financeiro. Seguidamente, enquadra a proposta apresentada no estatuto de região ultraperiférica atribuído à RAU pelo Tratado de Funcionamento da União Europeia e na possibilidade de recorrer a medidas fiscais específicas para minorar os efeitos inerentes àquela condição.
Invocando a autonomia política e fiscal da RAU para fazer face às dificuldades intrínsecas da economia madeirense, agravadas pela crise económica e financeira, a ALRAM visa consubstanciar aquela autonomia fiscal numa série de medidas que reputa de incentivadoras da modernização, diversificação, inovação e internacionalização da economia regional, alegando objetivos de coesão, solidariedade e justiça social.
As medidas fiscais propostas assentam, essencialmente, na redução das taxas de IRC, IRS, IVA e dos impostos especiais de consumo.
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei formulário Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais A iniciativa é apresentada pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, nos termos da alínea f) do n.º 1 do artigo 227.º e do n.º 1 do artigo 232.º da Constituição, bem como do 118.º do Regimento, que consubstanciam o poder de iniciativa da lei.
Respeita os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 119.º e nas alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 124.º do Regimento, relativamente às iniciativas em geral, bem como os previstos no n.º 3 do artigo 123.º do referido diploma, quanto às propostas de lei em particular. Respeita ainda os limites da iniciativa impostos pelo Regimento, por força do disposto nos n.os 1 e 3 do artigo 120.º.
Verificação do cumprimento da lei formulário A proposta de lei inclui uma exposição de motivos, em conformidade com o disposto no artigo 13.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro (sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas), alterada e republicada pela Lei n.º 42/2007, de 24 de agosto.
Cumpre o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário, uma vez que tem um título que traduz sinteticamente o seu objeto [disposição idêntica à da alínea b) do n.º 1 do artigo 124.º do Regimento].
Quanto à entrada em vigor, terá lugar após a aprovação do Orçamento do Estado posterior à publicação da lei, nos termos do artigo 13.º.
A Presidente da Assembleia da República (PAR) promoveu a audição dos órgãos de Governo regionais, nomeadamente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA), do Governo da Região Autónoma dos Açores (RAA) e do Governo da Região Autónoma da Madeira (RAM), em 26 de janeiro do corrente ano.
III. Enquadramento doutrinário Enquadramento doutrinário/bibliográfico Bibliografia específica WISHLADE, Fiona – When policy worlds collide: tax competition, state aid, and regional economic development in the EU. Journal of European Integration = Revue d'intégration européenne. London. ISSN 0703-6337. Vol. 34, n.º 6 (Sept. 2012), p. 585-598. Cota: RE-326.
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Resumo: Este artigo aborda a relação entre a concorrência fiscal, o desenvolvimento regional e a ajuda estatal. A autora faz um estudo das alterações que ocorreram ao nível das ajudas estatais a determinadas regiões desde a década de 1990, ao mesmo tempo que analisar as consequências que estas alterações provocaram ao nível da política de coesão da União Europeia. No passado, a constatação da existência de concorrência fiscal injusta levou a que tanto a União Europeia como a OCDE tivessem de efetuar diversas alterações ao nível da política fiscal. Ao mesmo tempo, a Comissão Europeia prosseguiu uma abordagem cada vez mais rigorosa no sentido de disciplinar a ajuda regional, mesmo quando estão em causa as regiões mais desfavorecidas. Por outro lado, também os próprios tribunais foram chamados a pronunciarem-se sobre as taxas de impostos determinadas pelas autoridades regionais. Segundo a autora, todos estes eventos levaram a que governos nacionais e autoridades regionais autónomas pudessem criar medidas fiscais mais favoráveis do que aquelas autorizadas debaixo das regras de ajuda estatal no caso das regiões mais desfavoráveis. Este facto levanta importantes problemas para a política de coesão da UE, a economia de pequenas ilhas e a interação entre a política de concorrência e a fiscalidade da UE.
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria Efetuada consulta à base de dados da atividade parlamentar e do processo legislativo (PLC) não apurámos a existência de iniciativas pendentes conexas com a matéria em causa.
V. Consultas e contributos
Consultas obrigatórias Em 26/01/2015, a Presidente da Assembleia da República promoveu a audição dos órgãos de governo próprios da Região Autónoma da Madeira e do Governo Regional dos Açores, nos termos do artigo 142.º do Regimento da Assembleia da República, e para os efeitos do n.º 2 do artigo 229.º da Constituição.
Todos os pareceres e contributos remetidos à Assembleia da República são publicitados na página internet da iniciativa.
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Em caso de aprovação, é provável que a implementação do novo sistema fiscal regional tenha custos para o Orçamento do Estado, mas falta informação que permita tirar conclusões a este respeito.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1170/XII (4.ª) (RECOMENDA AO GOVERNO UM CONJUNTO DE MEDIDAS DE CARÁCTER EXTRAORDINÁRIO DE APOIO AOS PRODUTORES DE CASTANHA)
Informação da Comissão de Agricultura e Mar relativa à discussão do diploma ao abrigo do artigo 128.º do Regimento da Assembleia da República
1. Oito Deputados do Grupo Parlamentar do PS tomaram a iniciativa de apresentar o Projeto de Resolução n.º 1170/XII (4.ª) – Recomenda ao Governo um conjunto de medidas de carácter extraordinário de apoio aos produtores de castanha, ao abrigo do disposto na alínea b) do artigo 156.º (Poderes dos Deputados) da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º (Poderes dos Deputados) do Regimento da Assembleia da República (RAR).
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Esta iniciativa deu entrada na Assembleia da República a 4 de dezembro de 2014, foi admitida a 9 de dezembro de 2014 e baixou à Comissão de Agricultura e Mar, nesse mesmo dia.
2. O Projeto de Resolução (PJR) foi objeto de discussão na reunião da Comissão de Agricultura e Mar de 28 de janeiro de 2015, que decorreu nos termos abaixo expostos.
3. O Sr. Deputado Ivo Oliveira (PS) procedeu à apresentação do PJR.
4. Usaram ainda da palavra os Srs. Deputados Maria José Moreno (PSD), Abel Baptista (CDS-PP) e João Ramos (PCP).
5. Houve uma segunda ronda de intervenções, tendo usado da palavra os mesmos Srs. Deputados.
6. O Sr. Deputado Ivo Oliveira (PS) encerrou o debate.
7. Realizada a discussão, remete-se a presente Informação a S. Ex.ª a Presidente da Assembleia da República, nos termos e para os efeitos previstos no n.º 1 do artigo 128.º do Regimento da Assembleia da República.
Assembleia da República, em 28 de janeiro de 2015.
O Presidente da Comissão, Vasco Cunha.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1233/XII (4.ª) APLICAÇÃO DAS RECOMENDAÇÕES DO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO RELATIVAMENTE AO ENQUADRAMENTO LEGAL DA EDUCAÇÃO ESPECIAL
A publicação do Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, é um marco decisivo para a introdução e implementação do conceito de Escola Inclusiva no sistema de ensino português. Os princípios da Declaração de Salamanca são hoje tidos por consensuais: «O princípio fundamental das escolas inclusivas consiste em todos os alunos aprenderem juntos, sempre que possível, independentemente das dificuldades e das diferenças que apresentam. Estas escolas devem reconhecer e satisfazer as necessidades diversas dos seus alunos, adaptando-se aos vários estilos e ritmos de aprendizagem, de modo a garantir um bom nível de educação para todos, através de currículos adequados, de uma boa organização escolar, de estratégias pedagógicas, de utilização de recursos e de uma cooperação com as respetivas comunidades. É preciso, portanto, um conjunto de apoios e de serviços para satisfazer o conjunto de necessidades especiais dentro da escola».
No entanto, a sua implementação revelou problemas graves no decreto-lei, agravados pela subsequente legislação em vários aspetos. O Relatório Técnico de Políticas Públicas para Educação Especial, publicado pelo Conselho Nacional de Educação a pedido da Assembleia da República, expõe de forma clara os problemas do atual quadro normativo. Sobre os critérios de elegibilidade de alunos/as para medidas que correspondam a NEE considera o CNE: (…) a atual legislação deixa desamparado um conjunto considerável de alunos e alunas que manifestam necessidades educativas especiais e para os/as quais não é possível construir respostas educativas ajustadas, pela limitação imposta pelo quadro legal.
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Sobre a Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF) considera que (…) há técnicos/as, docentes, médicos/as), que ainda não dominam a linguagem e os conceitos deste instrumento de classificação, o que dificulta o seu entendimento e aplicação, bem como se verifica a inexistência de documentos de avaliação que apoiem a construção dos PEI.
Sobre as condições para as escolas inclusivas deixa claro o desfasamento dos meios disponibilizados para cumprir a missão de inclusividade: (…) Este desfasamento reflete-se na clara desadequação do quadro normativo à real disponibilização de recursos, quer em quantidade quer em qualidade, os quais são disponibilizados às escolas e demais instituições parceiras.
… e ainda que: (…) existem escolas que têm na sua população escolar alunos/as com NEE e não têm, em tempo õtil, os recursos e profissionais que permitam dar resposta apropriada a essas crianças e jovens.
Prossegue ainda com críticas à capacidade de desenvolvimento e implementação de respostas por parte das escolas e às deficiências na formação de profissionais e corpo docente.
Perante este quadro de análise crítica, considera o Bloco de Esquerda necessário tomar em séria consideração as recomendações de alteração do quadro normativo em vigor sobre educação especial explanadas pelo CNE, tomando por isso a iniciativa de subscrever as alterações propostas relativamente ao enquadramento legal, tal como previsto pelo conselho.
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que: 1 - Seja acautelada a situação das crianças a quem é autorizado o adiamento do ingresso na escolaridade, de forma a garantir as medidas de apoio através da intervenção precoce no(s) ano(s) de permanência adicional na educação pré-escolar e o cumprimento de 12 anos de escolaridade; 2 - Se proceda à alteração do Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, no que se refere ao desenvolvimento de: a. Medidas educativas temporárias que permitam responder às necessidades educativas especiais de caráter transitório, comprovadamente impeditivas do desenvolvimento de aprendizagens; b. Medidas de resposta a situações de alunos/as com dificuldades de aprendizagem específicas que comprovadamente impeçam a sua qualidade e desenvolvimento; c. Uma medida educativa adicional que permita a adaptação do currículo às necessidades educativas dos/as alunos/as, mais flexível do que a medida “adequações curriculares individuais” (prevista no artigo 18.º) mas menos restritiva do que o estabelecimento de um currículo específico individual (previsto no artigo 21.º);
3 - Seja acautelada a situação de crianças e jovens com NEE em momentos de avaliação externa das aprendizagens, permitindo a sua adequação às medidas educativas contempladas no PEI.
4 - Seja garantida a certificação pedagógica do percurso escolar realizado pelos/as alunos/as com PEI e CEI e revista a Portaria 275-A/2012, de 11 de setembro.
5 - Reajuste o processo de referenciação dos alunos com NEE para critérios pedagógicos, determinando a CIF como ferramenta de análise clínica de saúde, de caráter supletivo mas não determinante ao processo de referenciação.
Assembleia da República, 30 de janeiro de 2015.
As Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda, Luís Fazenda — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Cecília Honório — Catarina Martins — Helena Pinto — João Semedo — Mariana Aiveca.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1234/XII (4.ª) MUNICIPALIZAÇÃO ESCOLAR IMPOSTA À CUSTA DA AUTONOMIA DAS ESCOLAS Aconselhava a sensatez que após a apresentação do Guião para a Reforma do Estado o documento apresentado pelo vice-primeiro ministro Paulo Portas tivesse sido diligentemente colocado na prateleira como mera curiosidade. Infelizmente as suas lacunas qualitativas estavam em inversa proporção à vontade do governo em deixar a sua marca no sistema educativo. Não se pode deixar de olhar para este processo dito de municipalização sem o crivo da antecâmara da privatização de algumas escolas.
Com este ponto de partida, previsivelmente, as propostas de municipalização que o governo tem avançado junto de algumas autarquias surgem no meio de uma enorme nebulosa de conceitos e objetivos. Tem-se por certa a relação entre municipalização e autonomia das escolas e a ideia base de que isso contribui para uma mirífica liberdade, onde só é livre quem obedecer ao governo. É bom olhar para o concreto e desmistificar o que merece uma discussão séria e pública.
Em três anos de governo, o conceito de autonomia escolar foi utilizado como mecanismo de centralização de poder e simultânea desresponsabilização, afastando a discussão dos verdadeiros problemas sentidos pelos alunos. Um autêntico passa-culpas para as escolas por decisões e má gestão do governo por exemplo na colocação dos professores.
O centro de qualquer autonomia das escolas passa pelo seu orçamento. Ora, o projeto de “Contrato Interadministrativo de Delegação de Competências”, que o governo propõe ás càmaras municipais, revela que a única margem orçamental possível será criada à custa da diminuição de professores. A liberdade pedagógica, segundo este contrato, só teria lugar através da diminuição de professores. Será impossível a uma comunidade escolar procurar inovar o seu currículo porque o contrato não prevê qualquer disponibilidade para reforço de meios que possam vir a ser necessários. A propalada garantia do governo em que o município não terá influência na gestão do corpo docente não se sustenta quando se percebe que a legislação sobre colocação de professores subordinará indiretamente a “contratação de escola” aos “currículos flexíveis” resultantes da municipalização das comunidades educativas. Quando se confere aos municípios a competência de determinar 25% da estrutura curricular não se pode esperar outro resultado que não a transformação da escola numa plataforma empregadora do município, sem qualquer transparência ou democraticidade nos processos de concurso.
Neste contexto regulamentar, o governo introduz uma lógica de pretensos incentivos à gestão autónoma que, na prática e da forma como estão estruturados, vão servir unicamente como elemento de chantagem num sentido óbvio: a redução drástica do número de efetivos nas escolas, docentes e não-docentes, precários ou não.
A proximidade com a comunidade escolar dos municípios, um argumento recorrente e gasto, esconde pontos que deveriam ser discutidos: a relação das escolas com a comunidade é uma questão de democracia. E isso é para levar a sério. No entanto, em nenhum dos casos vindos a público se prevê que as assembleias das escolas tenham uma única palavra vinculativa a dizer sobre o processo de municipalização. Pelo contrário. Não só as propostas estão a ser tratadas diretamente com os presidentes de cada município como o próprio processo corre o risco de nunca necessitar de uma palavra das comunidades escolares que irão ser afetadas.
Por isso, a verdadeira discussão surge na escolha entre a municipalização do ensino ou o reforço da autonomia das escolas. O previsível caciquismo a que a gestão do parque escolar e corpo docente serão sujeitos numa escola totalmente dependente da respetiva Câmara Municipal é um motivo de enormíssima preocupação.
Devemos sobretudo ter em conta os exemplos históricos já disponíveis sobre estas políticas. Diane Ravitch, responsável por Educação nas administrações Bush (pai e filho) nos Estados Unidos da América, uma académica que se admite conservadora e com publicações extensas sobre liberdade de escolha, gestão de mercado e autonomia das escolas, chegou à conclusão de que, após 30 anos de municipalização agressiva, o mantra da escolha serviu apenas para retirar os melhores alunos das escolas em bairros mais pobres e, paralelamente, a autonomia subjugou as escolas à lógica da educação para exames em vez de garantirem uma educação plena.
Numa alteração tão profunda da relação do Estado com as comunidades escolares seria exigível algum debate público em vez do secretismo com que a municipalização está a ser concretizada. Ninguém conhece
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verdadeiramente os critérios da municipalização escolar proposta pelo governo, sendo apenas claro que variam conforme as negociações entre governo e autarcas. Ninguém conhece o que significa exatamente uma direção pedagógica municipalizada. Seria talvez necessário discutir primeiro se há curricula que podem ser totalmente locais e quais as suas consequências em termos de manuais escolares, gestão de professores e previsíveis discrepâncias de resultados entre alunos de diferentes regiões. Mas nada disto existe no debate público.
O Bloco de Esquerda propõe por isso que suspenda o processo de municipalização em negociação, que se anulem contratos já estabelecidos em respeito do princípio de autonomia escolas, e se proceda a um debate público onde os conselhos gerais das escolas possam intervir.
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo: 1 - A suspensão de qualquer negociação para uma transferência de competências de gestão pedagógica para as câmaras municipais; 2 - Em caso de conclusão de contratos bilaterais entre administração central e autarquias nesta matéria, promover a sua anulação com base na violação do princípio de autonomia das escolas.
3 - Realização de um debate público sobre as vantagens e desvantagens da municipalização do ensino a nível pedagógico, de impacto financeiro e impacto nos recursos humanos.
Assembleia da República, 30 de janeiro de 2015.
As Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda, Luís Fazenda — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Cecília Honório — Catarina Martins — Helena Pinto — João Semedo — Mariana Aiveca.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.