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Sexta-feira, 19 de março de 2021 II Série-A — Número 100
XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)
S U M Á R I O
Resolução:
Aprova o Acordo de Parceria Estratégica entre a União Europeia e os seus Estados-Membros, por um lado, e o Japão, por outro, assinado em Tóquio, em 17 de julho de 2018. Projetos de Lei (n.os 733 e 745 a 747/XIV/2.ª):
N.º 733/XIV/2.ª (Define os critérios de gestão do arvoredo urbano público e a obrigatoriedade da criação de regulamentos municipais): — Alteração do texto inicial do projeto de lei.
N.º 745/XIV/2.ª (BE) — Altera o regime jurídico-laboral de teletrabalho, garantindo maior proteção do trabalhador (décima nona alteração ao Código do Trabalho e primeira alteração da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais).
N.º 746/XIV/2.ª (PAN) — Determina a instalação de circuitos fechados de televisão em matadouros.
N.º 747/XIV/2.ª (PS) — Prorroga medidas excecionais e temporárias para salvaguarda dos direitos dos estudantes do ensino superior. Projetos de Resolução (n.os 1119 a 1124/XIV/2.ª):
N.º 1119/XIV/2.ª (PCP) — Propõe medidas de acesso a
medicamentos usados no tratamento da fibrose quística.
N.º 1120/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo a construção de um novo centro de saúde na Quinta do Conde, concelho de Sesimbra.
N.º 1121/XIV/2.ª (PSD) — Recomenda ao Governo a reabertura dos estabelecimentos termais no âmbito do plano de desconfinamento.
N.º 1122/XIV/2.ª (PSD) — Pela realização de um concurso de professores que melhor responda às necessidades de pessoal docente nas escolas.
N.º 1123/XIV/2.ª (PS) — Recomenda ao Governo que proceda a uma campanha que promova o consumo regular de flores e plantas naturais e que crie mecanismos de apoio a esta atividade.
N.º 1124/XIV/2.ª (PS) — Recomenda ao Governo que dê continuidade ao apoio à produção cultural e à criação artística como instrumento de desenvolvimento económico e de diferenciação turística do Algarve. Projeto de Deliberação n.º 12/XIV/2.ª (PS):
Solicita ao Conselho Nacional de Educação um estudo sobre os impactos da pandemia COVID-19 nas comunidades educativas, designadamente pelo aumento das desigualdades, e a necessária resposta em termos de políticas públicas.
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RESOLUÇÃO
APROVA O ACORDO DE PARCERIA ESTRATÉGICA ENTRE A UNIÃO EUROPEIA E OS SEUS
ESTADOS-MEMBROS, POR UM LADO, E O JAPÃO, POR OUTRO, ASSINADO EM TÓQUIO, EM 17 DE
JULHO DE 2018
A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea i) do artigo 161.º e do n.º 5 do artigo 166.º da
Constituição, aprovar o Acordo de Parceria Estratégica entre a União Europeia e os Seus Estados-Membros,
por um lado, e o Japão, por outro, assinado em Tóquio, em 17 de julho de 2018, cujo texto, na versão autenticada
em língua portuguesa, se publica em anexo.
Aprovada em 11 de fevereiro de 2021.
O Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues.
ANEXO
Vide Resolução da Assembleia da República n.º 82/2021 — Diário da República I Série n.º 55/2021, de 19
de março de 2021
———
PROJETO DE LEI N.º 733/XIV/2.ª(*)
(DEFINE OS CRITÉRIOS DE GESTÃO DO ARVOREDO URBANO PÚBLICO E A OBRIGATORIEDADE
DA CRIAÇÃO DE REGULAMENTOS MUNICIPAIS)
Preâmbulo
A boa gestão do arvoredo urbano é fundamental para a saúde pública, para a amenidade climática, para o
usufruto da população, para a valorização do território e para a promoção da biodiversidade. A presença de
árvores em meio urbano é desejável apesar de por vezes existirem conflitos entre diferentes usos do espaço.
Nem sempre as intervenções conduzidas ao nível do arvoredo ocorrem de acordo com as melhores práticas
técnico-científicas, provocando danos que afetam a vitalidade, a estabilidade e até a sobrevivência das próprias
árvores.
Cada vez mais despertos para esta problemática, os decisores em particular têm tido dificuldade em articular
a hierarquização dos diversos fatores determinantes para esta matéria. É assim importante que se perceba o
papel desempenhado pela «floresta urbana» na melhoria da qualidade ambiental das cidades e do bem-estar
humano.
São amplamente conhecidos os benefícios da manutenção e criação de «infraestruturas verdes urbanas»
que permitam obter ganhos em diversas vertentes que passam pela dimensão do ambiente, do clima, da saúde
e do urbanismo, contribuindo para a sustentabilidade dos espaços urbanos e das suas populações. A alocação
estratégica de árvores é determinante para reduzir gastos energéticos, tanto no aquecimento como no
arrefecimento dos territórios. No fundo, a proteção da «floresta urbana» significa a visão de futuro de um território
sustentável.
As alterações climáticas que são uma realidade inquestionável, trazem um aumento das ondas de calor que
podem ser reduzidas com a presença de árvores e de outros tipos de vegetação na cidade que controlam a
temperatura e a humidade relativa do ar, acrescido da capacidade de absorção de diversos gases com efeito de
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estufa destas «infraestruturas urbanas» que são verdadeiras fontes de vida fruto da sua biodiversidade. Para
além destes benefícios as árvores em espaço urbano promovem a infiltração de água, a redução do ruído e
acrescentam valores estéticos e culturais.
A importância de regulamentar a intervenção e gestão destas áreas está intrinsecamente ligada aos
territórios, em ações concretas e caracterizadoras dos mesmos, sendo estas as variáveis que determinam com
clareza os parâmetros de qualidade de vida no espaço urbano e rural.
Defender a importância da presença das árvores imbricadas na malha urbana, não significa considerar que
estas estão nas mesmas condições ou que devam ser tratadas como as dos espaços naturais – as quais não
necessitam de, nem devem ser intervencionadas – pelo que a gestão ativa do arvoredo urbano deve ser
considerada uma necessidade absoluta. Valorizar os inestimáveis serviços de ecossistema que as árvores
adultas prestam, não justifica que se caia no extremo oposto de considerar que, no espaço urbano, «as árvores
morrem de pé» ou que «nunca devam ser podadas».
Revela-se, assim, importante criar um quadro de atuação nacional com incidência ao nível local que promova
e sistematize as intervenções em termos de planeamento, implantação, gestão e manutenção do arvoredo, bem
como proceder-se à tipificação das infrações mais frequentes, regular contraordenações e fixar as respetivas
coimas.
A presente lei assume-se como forma de regulamentação da gestão do arvoredo urbano nas aldeias, vilas e
cidades em domínio público municipal e em domínio privado do município e património arbóreo do património
do estado.
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objeto
1 – A presente lei estabelece o regime de gestão do arvoredo urbano integrante do domínio público municipal
e do domínio privado do município, que deve ser plasmado em regulamento municipal.
2 – A presente lei aplica-se igualmente ao património arbóreo pertencente ao Estado, nomeadamente o
marginal às estradas nacionais também fora das zonas urbanas.
3 – Esta lei estabelece ainda as operações de poda, transplantes, critérios para abate e de seleção de
espécies a plantar, numa necessária definição de hierarquização.
Artigo 2.º
Definições
1 – Para efeitos do disposto na presente lei entende-se por:
a) Domínio público municipal – todos os espaços, equipamentos de utilização coletiva, infraestruturas e
demais bens que devam integrar o domínio público municipal por força da Constituição da República Portuguesa
ou de lei, e que se encontram sujeitos a um regime jurídico especial tendo em vista a salvaguarda e a realização
de interesses públicos;
b) Domínio privado do município – todos os espaços, equipamentos, infraestruturas e demais bens que o
município é titular e que não integram o domínio público municipal, nos termos do disposto na alínea anterior;
c) Património arbóreo – arvoredo constituído por:
i. Árvores ou arbustos conduzidos em porte arbóreo – genericamente designados como árvores –
existentes em espaços verdes, arruamentos, praças e logradouros públicos ou terrenos municipais;
ii. Árvores ou conjuntos arbóreos com regime especial de proteção;
iii. Árvores situadas à margem das estradas nacionais fora das áreas urbanas.
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d) Árvore – planta lenhosa perene com tendência para a formação de um caule principal distinto (tronco)
limpo de ramos na parte inferior (quando ramificado deve sê-lo nitidamente acima do solo);
e) Sistema radicular – conjunto de órgãos subterrâneos responsáveis pela fixação da planta ao solo e pela
realização da absorção de água e minerais;
f) Pernada – ramo estrutural inserido no tronco e que fornece sustentação à copa;
g) Copa – parte da árvore que inclui a maioria dos ramos portadores de folhas e se desenvolve a partir da
zona do tronco onde se inserem as primeiras pernadas;
h) Fitossanitário – relativo ao estado de saúde das espécies vegetais;
i) Poda – cortes feitos seletivamente na árvore (atarraques sobre gomos, atarraques sobre ramos laterais e
desramações) com objetivos técnicos específicos previamente definidos;
j) Poda em porte condicionado – intervenção em árvores implantadas em espaços confinados, como são
tipicamente as dos arruamentos nos centros urbanos, em que o seu crescimento é condicionado regularmente,
através de reduções de copa, para poderem coabitar com os equipamentos urbanos envolventes. Como estas
podas afetam geralmente uma parte significativa da área fotossintética da árvore, deverão obrigatoriamente ser
realizadas no seu repouso vegetativo;
k) Poda em porte natural – intervenção em árvores implantadas em espaços amplos, como são tipicamente
as dos jardins, parques e avenidas largas, conduzindo-as sem as reduzir nem alterar a forma típica da espécie,
sendo apenas limpas e «arejadas» (para aumentar a permeabilidade ao vento e a resistência a tempestades),
bem como submetidas a um «levantamento» gradual da copa, para resolver eventuais conflitos dos ramos mais
baixos com o trânsito rodoviário ou pedonal. Como estas podas afetam uma parte pouco significativa área
fotossintética da árvore, podem perfeitamente – até com vantagens, nomeadamente pela melhor visualização
dos ramos mortos e doentes a eliminar e pelo mais rápido recobrimento/compartimentação das feridas de corte
– ser realizadas depois do abrolhamento primaveril;
l) Repouso vegetativo – período de redução drástica da atividade das plantas, o qual, nas espécies adaptadas
ao nosso clima, ocorre geralmente no inverno, quando as árvores de folha caduca perdem toda a folhagem;
m) Rolagem – redução drástica da árvore, através do corte de ramos de grande calibre, deixando-a reduzida
ao tronco e pernadas estruturais;
n) Abate – corte ou derrube de uma árvore;
o) Substituição – plantação de uma árvore no lugar de outra;
p) Transplante – transferência de uma árvore de um lugar para outro;
q) Arborista – técnico devidamente credenciado para a execução de operações de gestão do arvoredo;
r) Norma de Granada – método de valorização de árvores e arbustos ornamentais que tem em conta diversos
fatores que atribuem valor aos elementos vegetais, para além do simples valor da madeira, tais como valores
paisagísticos, ambientais, sociais e culturais.
CAPÍTULO II
Regulamentos municipais de arvoredo urbano
SECÇÃO I
Competências
Artigo 3.º
Competências dos municípios
1 – Os municípios dispõem de atribuições no domínio do ambiente, como preceitua a alínea k) do n.º 2 do
artigo 23.º do anexo I da Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, na sua redação atual, bem como o artigo 21.º do
Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de abril, Decreto Lei n.º 49/2005, de 24 de fevereiro, na sua redação atual. Sem
prejuízo do que precede destaque-se ainda que compete aos municípios, ao abrigo da alínea qq) do n.º 1 do
artigo 33.º, do anexo I da Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, «Administrar o domínio público municipal».
2 – Constituem competências dos municípios assegurar a classificação do património natural e paisagístico,
nos termos da alínea t), n.º 1 do artigo 33.º do Regime Jurídico das Autarquias Locais aprovado pela Lei n.º
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75/2013, de 12 de setembro (anexo I).
3 – A classificação de arvoredo de interesse municipal processa-se de acordo com regimes próprios de
classificação concretizados em regulamento municipal, conforme se encontra previsto no artigo 3.º, n.º 12 da
Lei n.º 53/2012, de 5 de setembro, e no artigo 2.º, n.º 2 da Portaria n.º 124/2014, de 24 de junho.
Artigo 4.º
Prazo de publicação
Os municípios têm um prazo de 365 dias a contar da data de publicação da presente lei para fazer publicar
um regulamento ao abrigo da mesma.
Artigo 5.º
Registo dos regulamentos municipais
1 – Os regulamentos municipais têm de ser obrigatoriamente registados junto do ICNF.
2 – O ICNF tem um prazo de 30 dias para se pronunciar sobre o cabal cumprimento do mesmo em
conformidade com a presente lei, findo o qual se considera tacitamente aprovado.
3 – Caso o ICNF identifique imprecisões na redação dos regulamentos, terá de comunicar ao município, no
prazo do n.º 2 do presente artigo.
4 – O município no caso de ser notificado de acordo com o presente artigo, terá um prazo de 60 dias para
agir em conformidade e alterar o regulamento.
5 – No caso previsto no número anterior, e devolvido o regulamento ao ICNF, esta entidade terá um prazo
de 15 dias nas mesmas condições previstas no número dois do presente artigo.
SECÇÃO II
Arvoredo de interesse municipal
Artigo 6.º
1 – Os regulamentos municipais têm de acolher no seu articulado o expresso no artigo 3.º, n.º 12 da Lei n.º
53/2012, de 5 de setembro.
2 – Os regulamentos municipais têm de incluir:
a) Lista e planta de localização das árvores classificadas de interesse público e de interesse municipal
existentes no município;
b) Definição da estratégia municipal para o arvoredo urbano;
c) Identificação dos ciclos de manutenção;
d) Normas técnicas para a implantação e manutenção de arvoredo.
3 – Fica ao cargo de cada município criar uma listagem de espécies arbóreas e arbustivas adaptadas ou
suscetíveis de adaptação às condições edafoclimáticas de cada município, com as seguintes características:
a) Nome científico;
b) Porte;
c) Tipologia de uso;
d) Forma;
e) Caduca, perenifólia ou marcescente;
f) Observações.
4 – Compete aos municípios criar uma lista de espécies arbóreas de interesse público e de interesse
municipal considerando ainda as respetivas prioridades para conservação e proteção.
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SECÇÃO III
Espécies arbóreas protegidas e árvores classificadas
Artigo 7.º
Preservação de espécies
1 – Sem prejuízo da proteção legal que seja ou possa vir a ser determinada para outras espécies, o Decreto-
Lei n.º 169/2001, de 25 de maio, na sua redação atual (Decreto-Lei n.º 155/2004, de 30 de junho) estabelece
medidas de proteção ao sobreiro (Quercus suber) e à azinheira (Quercus ilex).
2 – O Decreto-Lei n.º 423/89, de 4 de dezembro, proíbe, em todo o território do continente, o arranque, o
corte total ou parcial, o transporte e a venda de azevinho espontâneo, (Ilex aquifolium).
3 – A intervenção de poda e abate, nas espécies referidas no número anterior, implantadas em espaço
público ou privado carece de autorização do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).
4 – Carecem de especial proteção, segundo os Programas Regionais de Ordenamento Florestal (PROF) em
vigor, o azereiro (Prunus lusitanica), o carvalho-alvarinho (Quercus robur), o carvalho-de-monchique (Quercus
canariensis), o carvalho-negral (Quercus pyrenaica), o teixo (Taxus baccata), o rododendro (Rhododendron
ponticum subsp. baeticum) e os zimbros, junípero e sabina (Juniperus sp.) por serem espécies com elevado
valor económico, patrimonial e cultural, com uma relação com a história e cultura das diversas regiões, pela
raridade que representam, bem como por terem uma função de suporte de habitat.
5 – Sempre que haja necessidade de intervenção em exemplares arbóreos sob gestão municipal que
implique o seu abate, transplante ou que de algum modo os fragilize, esta intervenção apenas pode ser
promovida após autorização dos municípios e com acompanhamento de técnicos qualificados para o efeito, que
determinarão os estudos a realizar, as medidas cautelares a adotar e o modo de execução dos trabalhos, e
procederá à fiscalização da intervenção de acordo com a presente lei.
6 – Serão criadas pelos municípios bases de dados com elementos arbóreos classificados que estão
acessíveis ao público como sinal de transparência e democratização da informação.
CAPÍTULO III
Critérios e regras gerais para gestão e manutenção do arvoredo urbano
SECÇÃO I
Artigo 8.º
Competência
Cabe aos municípios, de acordo com cada regulamento municipal, a gestão e a manutenção do arvoredo
urbano, salvaguardadas as reservas constantes nos artigos 6.º e 7.º
Artigo 9.º
Requisitos
1 – São requisitos funcionais, operacionais, ambientais e paisagísticos para as intervenções de plantio, poda,
limpeza e manutenção, abate e transplante de árvores em meio urbano e nos espaços públicos:
a) As operações urbanísticas, independentemente da sua natureza, devem acautelar a preservação das
espécies e exemplares existentes, salvo se numa base de hierarquização da vivência do espaço público se
justificar, pelo que qualquer remoção de uma árvore deve ser fundamentada e documentada com fotografias do
exemplar e da situação condicionante que justifica e enquadra a necessidade da sua remoção;
b) Qualquer remoção que ocorra como prevista na alínea anterior deverá ser sempre precedida de plantação
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de nova árvore nas proximidades do local, desde que não existam condicionantes relativas a infraestruturas, à
dimensão útil do espaço público e ao afastamento a outros exemplares;
c) Devem ser aproveitadas todas as oportunidades de aumentar o património arbóreo, nomeadamente ao
nível do estudo do espaço público municipal ou de cedência ao município;
d) Os conceitos técnicos determinados com a gestão e manutenção do arvoredo em meio urbano e espaço
público deverão estar plasmados de forma inequívoca em sede de regulamento municipal, e todas as
intervenções com maior grau de complexidade deverão ser sujeitas a fundamentação técnica de acordo com a
legislação;
e) A gestão e manutenção do arvoredo municipal deve ser alvo de monitorização e adaptação, sendo da
competência da assembleia municipal a aprovação de relatório anual, que deve posteriormente se publicado no
sítio do município.
CAPÍTULO IV
Gestão urbanística
SECÇÃO I
Artigo 10.º
Operações urbanísticas
Qualquer operação urbanística, que interfira com domínio publico ou privado do município e que contenha
zona arborizada deverá apresentar previamente um levantamento e caracterização da vegetação existente,
designadamente das espécies, porte e estado fitossanitário.
Artigo 11.º
Medidas de compensação
1 – Quando um conjunto arbóreo for necessariamente afetado por obras de reparação ou por operação
urbanística de qualquer natureza deverá o mesmo ser compensado pela plantação de uma área equivalente de
arvoredo no mesmo concelho.
2 – Sempre que se verifique a necessidade de valoração de uma árvore ou conjunto de árvores –
designadamente por dano ou para efeitos de análise custo/benefício – esta é feita segundo os princípios
orientadores da Norma de Granada.
CAPÍTULO V
Gestão e manutenção de arvoredo
SECÇÃO I
Intervenção no arvoredo
Artigo 12.º
Proibições
1 – Tendo por base a presente lei, não é permitido:
a) Abater ou podar árvores e arbustos de porte arbóreo sem prévia autorização do município onde se
localizem;
b) Qualquer intervenção no solo e subsolo, na área correspondente à projeção vertical das copas das árvores,
sem autorização do município onde se localize;
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c) Proceder a podas de rolagem;
Colher, danificar ou mutilar qualquer árvore ou arbusto de porte arbóreo;
d) Prender ou fixar em árvores, ou tutores de árvores, qualquer tipo de objeto ou amarra.
Artigo 13.º
A manutenção do arvoredo
1 – Todos os trabalhos de intervenção no arvoredo – com destaque para plantação, rega, poda, controlo
fitossanitário, abate, remoção de cepo, limpeza e remoção de resíduos deverão ser executados tendo em
atenção as boas práticas de acordo com o documento enquadrador «Boas Práticas de Gestão do Sistema
Arbóreo» (anexo I da presente lei) documento esse que servirá de referência a nível nacional, abrangendo todas
as entidades com responsabilidade na gestão do arvoredo.
2 – A gestão e manutenção do arvoredo em espaço público deverá ser executada por técnicos devidamente
preparados e credenciados para o efeito, de acordo com a presente lei.
3 – É do encargo de cada município criar um registo georreferenciado do arvoredo classificado em sistema
de coordenadas PT-TM06/ETRS89 (sistema global de referência recomendado pela EUREF) e disponibilizado
em plataforma eletrónica.
4 – Fica ao cargo dos municípios a realização de avaliações periódicas ao estado fitossanitário do arvoredo
e respetivas ações de melhoria, devendo realizar um relatório de monitorização anual.
Artigo 14.º
Podas
1 – A poda de árvores classificadas como de interesse público ou municipal ou igualmente pertencentes a
espécies protegidas, que por força de lei já carece de autorização do ICNF ou dos municípios, apenas é
permitida por motivos de segurança, por necessidade de promover a sua coabitação com os constrangimentos
envolventes ou quando vise melhorar as suas caraterísticas, não provocando a perda da sua forma natural.
2 – Excecionando-se os casos pontuais de necessária e urgente intervenção, a poda será realizada na época
adequada aos objetivos para ela definidos:
a) Os diversos tipos de poda em porte condicionado definidos no artigo 2.º da presente lei, devem ser
executados no período de repouso vegetativo das plantas. Há ainda outras vantagens na poda invernal, como
sejam evitar o período de nidificação das aves ou ocorrer no período de dormência da maioria de pragas e
doenças;
b) Os diversos tipos de poda em porte natural, definidos no artigo 2.º da presente lei, podem, até com óbvios
benefícios para a árvore, ser executados em pleno período vegetativo, a conhecida «poda em verde».
3 – Para além das podas de formação feitas correta e atempadamente – essenciais para a boa estruturação
das jovens árvores e para a sua adequação precoce aos condicionantes do ambiente urbano – as podas de
manutenção das árvores adultas só devem ocorrer quando haja risco de o arvoredo provocar danos na sua
envolvente, designadamente em pessoas, vegetação, estruturas construídas e outros bens, quando haja
necessidade de promover a sua coabitação com as estruturas urbanas envolventes ou em casos de gestão
tradicional do arvoredo em questão, nomeadamente as podas em porte condicionado, realizadas regularmente
para controlo do crescimento das árvores implantadas em situações de elevado constrangimento ou para
manutenção dos objetivos estéticos que presidiram à escolha do modelo de condução seguido, ou ainda, sempre
que tal se justifique, por motivos de força maior.
4 – As necessidades de poda de árvores são avaliadas pelos municípios ou pelo ICNF conforme a
competência e classificação do exemplar.
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Artigo 15.º
Plantações, transplantes, substituições de árvores e limpeza de caldeiras
1 – Sempre que existir a intenção de transplante e substituições de árvores terão de constar no pedido as
medidas a adotar relativamente às mesmas.
2 – Nos povoamentos florestais de arvoredo de interesse municipal não são permitidas mobilizações de solo
profundas que afetem o sistema radicular das árvores nem intervenções que removam a camada superficial do
solo, exceto se houver uma fundamentação que o justifique e que tenha cumulativamente parecer favorável do
município e do ICNF.
Artigo 16.º
Abate
1 – O abate de espécies arbóreas em domínio público municipal e domínio privado do município só deve
ocorrer quando haja perigo potencial e comprovado por análise biomecânica e/ou de fitossanidade, elaborada
por técnico com formação prevista na presente lei, de o arvoredo existente provocar danos na sua envolvente,
designadamente em pessoas, vegetação, estruturas construídas e outros bens.
2 – O abate de árvores pode ainda ocorrer quando esteja cumprido o plasmado no artigo nono
nomeadamente quando valores se sobreponham ao princípio constante no número um do presente artigo.
3 – Os abates só serão executados após autorização da autoridade competente, com exceção de casos
urgentes, onde a(s) árvore(s) possa(m) constituir perigo para a segurança de pessoas e bens.
Artigo 17.º
Hierarquização de salvaguarda
1 – Para o cumprimento do número dois do artigo anterior será necessário estabelecer uma hierarquização
de valores que possam justificar o mesmo.
2 – A hierarquização do presente artigo pretende estabelecer as exceções, que embora careçam de
fundamentação, permitem determinar o abate de uma árvore não classificada.
3 – Assim o fundamento deve ter como base a seguinte hierarquização:
a) Quando as árvores constituem comprovadamente – de acordo com o n.º 1 do artigo anterior – uma ameaça
para pessoas e bens;
b) Quando as árvores prejudicam a saúde pública, e apenas quando ficar inequivocamente comprovado que
são elas a real causa dos problemas sanitários. Por exemplo, não são aceitáveis justificações com base em
eventuais alergias que não sejam comprovadamente causadas pelas árvores em questão;
c) Quando as árvores afetam a mobilidade urbana ou nas estradas nacionais fora das zonas urbanas, mas
apenas quando não existam alternativas viáveis à sua manutenção;
d) Quando as árvores se apresentam em condições fisiológicas/fitossanitárias deficientes e sem perspetivas
de futuro, havendo óbvias vantagens em apostar na sua substituição por novas árvores saudáveis, de espécies
eventualmente mais adequadas às condições edafoclimáticas e de espaço existentes, constituindo um
investimento para as gerações futuras.
CAPÍTULO VI
Procedimento Administrativo
SECÇÃO I
Artigo 18.º
Pedidos de intervenção
1 – As pessoas singulares e coletivas, e de acordo com regulamento municipal, solicitam autorização ao
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município, através de requerimento próprio, identificando a operação, sua tipologia e localização, sempre que
esta se refira ou a intervenção em domínio publico ou privado municipal ou quando se trate de espécies
classificadas, protegidas e/ou consideradas de interesse municipal.
2 – Os municípios solicitam parecer não vinculativo ao ICNF, em requerimento próprio.
Artigo 19.º
Prazos
1 – Os municípios têm um prazo de 20 dias úteis para dar resposta aos requerimentos previstos no n.º 1 do
artigo anterior, considerando-se os mesmos deferidos no caso de a decisão não ser comunicada nesse prazo,
exceto quando se trate de abate de árvores onde não decorre a aprovação tácita.
2 – O ICNF tem um prazo de 5 dias úteis para emitir parecer de acordo com n.º 2 do artigo anterior.
SECÇÃO II
Fiscalização e processo contraordenacional
Artigo 20.º
Fiscalização
1 – Cabe aos municípios, de acordo com regulamento municipal, a fiscalização dos atos por si autorizados
ou cometidos à revelia por parte de qualquer pessoa singular ou coletiva.
2 – Cabe ao ICNF a fiscalização dos atos de gestão do arvoredo urbano efetuados pelos municípios.
Artigo 21.º
Contraordenações
1 – Sem prejuízo da responsabilidade civil e criminal a que houver lugar, nos termos da Lei Geral e das
Contraordenações especialmente consagradas na Lei n.º155/2004, de 30 de junho, e na Lei n.º 53/2012, de 5
de setembro, o incumprimento das disposições previstas nesta lei constitui contraordenação punível com coima,
nos termos previstos na presente.
2 – Dentro da moldura prevista, a concreta medida da coima a aplicar é determinada em função da gravidade
da infração, da culpa, da situação económica do infrator, do benefício económico retirado com a prática da
infração, da conduta anterior e posterior do agente e das exigências de prevenção.
3 – O pagamento das coimas previstas na presente lei não dispensa os infratores do dever de reposição.
4 – As contraordenações previstas são puníveis com coima de 100 a 10 000 euros, tratando-se de pessoa
singular, ou de 200 a 20 000 euros tratando-se de pessoa coletiva.
5 – A decisão sobre a instauração, a instrução do processo de contraordenação, a aplicação das coimas e
das sanções acessórias é da competência do presidente da câmara, ou do Presidente do ICNF, conforme a
competência, nos termos da lei.
6 – A aplicação das sanções suprarreferidas não isenta o infrator da eventual responsabilidade civil ou
criminal emergente dos factos praticados.
7 – Sempre que a contraordenação resulte de omissão de um dever, o pagamento da coima não dispensa o
infrator de dar cumprimento ao dever omitido, se este ainda for possível.
8 – Cumulativamente também poderão ser aplicadas as seguintes sanções acessórias:
a) Perda de objetos pertencentes ao agente;
b) Interdição do exercício de profissões ou atividades cujo exercício dependa de título público ou de
autorização ou homologação de autoridade pública;
c) Privação do direito a subsídio ou benefício outorgado por entidades ou serviços públicos;
d) Suspensão de autorizações, licenças e alvarás.
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CAPÍTULO VII
Estatuto Profissional
SECÇÃO I
Artigo 22.º
Profissão de Arborista
No prazo de 90 dias após a entrada em vigor da presente lei, o Governo promove o reconhecimento da
profissão de arborista devidamente credenciada para execução de operações de manutenção de arvoredo e
cria as bases para o desenvolvimento dessa profissão, atribuindo ao SNQ – Sistema Nacional de Qualificações,
a responsabilidade de – no prazo de um ano «definir e homologar um percurso formativo completo conferente
desta credenciação».
Artigo 23.º
Norma revogatória
Ficam revogadas as disposições legais ou regulamentares que disponham em sentido contrário à presente
lei.
Artigo 24.º
Entrada em vigor e produção de efeitos
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação salvaguardando-se o cumprimento dos prazos
estipulados no artigo quatro.
Palácio de São Bento, 19 de março de 2021.
Os Deputados do PSD: Adão Silva — Luís Leite Ramos — Bruno Coimbra — Hugo Martins de Carvalho —
Hugo Patrício Oliveira — Paulo Leitão — Nuno Miguel Carvalho — João Moura — Rui Cristina — António Maló
de Abreu — António Lima Costa — António Topa — Filipa Roseta — João Gomes Marques — José Silvano —
Emídio Guerreiro — Pedro Pinto.
(*) O texto inicial foi alterado a pedido do autor da iniciativa a 19 de março de 2021 [Vide DAR II Série-A n.º 95 (2021-03-12)].
———
PROJETO DE LEI N.º 745/XIV/2.ª
ALTERA O REGIME JURÍDICO-LABORAL DE TELETRABALHO, GARANTINDO MAIOR PROTEÇÃO
DO TRABALHADOR (DÉCIMA NONA ALTERAÇÃO AO CÓDIGO DO TRABALHO E PRIMEIRA
ALTERAÇÃO DA LEI N.º 98/2009, DE 4 DE SETEMBRO, QUE REGULAMENTA O REGIME DE
REPARAÇÃO DE ACIDENTES DE TRABALHO E DE DOENÇAS PROFISSIONAIS)
Exposição de motivos
A pandemia de COVID-19 obrigou a respostas de emergência sanitária que tiveram impactos profundos no
mundo do trabalho. Na sequência das restrições à mobilidade, operou-se uma transição abrupta para o
teletrabalho, sem mecanismos de preparação e de negociação coletiva. De realidade relativamente residual,
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este passou a ter uma expressão massiva, comportando uma alteração em grande escala na organização do
trabalho.
De acordo com dados divulgados pelo INE, no segundo trimestre de 2020, o número de trabalhadores em
teletrabalho atingiu 23%, mais de um milhão de pessoas a trabalhar com recurso a tecnologias de comunicação
e a partir de casa. Isto é, quase um quarto da população empregada. Esta passagem para o teletrabalho, por
imposição da legislação de emergência, revelou as ambivalências associadas a esta forma de trabalho, bem
como as suas consequências em várias dimensões da vida. Pelo modo como aconteceu, tratou-se de uma
resposta em grande medida improvisada, quer nas empresas privadas, quer nas organizações da Administração
Pública.
Vários estudos têm sublinhado os efeitos do teletrabalho no grande confinamento. O relatório do CoLABOR
(Trabalho e Desigualdades no Grande Confinamento), evidenciou as dificuldades na gestão dos tempos, com
os horários efetivamente trabalhados a ultrapassarem o período normal de trabalho, a multiplicação de tarefas
realizadas fora de horas, a sobrecarga das mulheres com crianças a cargo. Outros estudos enfatizaram os
efeitos ao nível do cansaço, aumento de peso, ansiedade, além do aumento da agitação, da irritação e do stress
nas crianças. A ausência de condições físicas, nomeadamente habitacionais, para que os diferentes elementos
da família desenvolvam o seu trabalho a partir de casa é um fator a ter em conta nos riscos acrescidos de tensão
familiar, potenciando situações de conflito e de violência. Por outro lado, muitas empresas aproveitaram o
recurso ao teletrabalho para pouparem custos inerentes ao trabalho, imputando-os aos trabalhadores. Assim,
as despesas com a manutenção dos locais de trabalho, com equipamentos, com eletricidade, água e ligação à
Internet foram transferidas para os trabalhadores, sem que a isso correspondesse, muitas vezes, qualquer
compensação. Não surpreende, pois, que, à transição em larga escala para o teletrabalho, tenha correspondido
um acréscimo de 15% dos custos das famílias com energia, que terão sido entretanto agravados pelo efeito do
aumento dos preços da eletricidade até 7% em janeiro de 2021. O consumo de Internet, também terá sofrido a
um aumento de 60%.
Estas consequências não são uma surpresa, à luz do debate sobre os benefícios e os custos do teletrabalho,
mas foram exponenciadas pelo modo acelerado e repentino como se fez esta transição, pela débil regulação do
teletrabalho (seja em termos de lei geral, seja ao nível das convenções coletivas), pela ausência de fiscalização
sobre o cumprimentos das regras legais e pela acumulação, em muitos casos, entre teletrabalho e cuidado de
filhos menores e de outros dependentes (realidade potenciada pelo modo como foram, até março de 2021,
desenhados os apoios à família para os períodos de suspensão das aulas presenciais).
Em defesa do teletrabalho, é comum serem destacados os efeitos que este pode ter na redução das
despesas de deslocação para a empresa, na possibilidade de um maior equilíbrio territorial e ambiental, ou no
aproveitamento melhor do tempo. Por outro lado, os riscos relativos ao teletrabalho decorrem do isolamento dos
trabalhadores; da perda dos momentos formais e espontâneos de partilha de experiência e conhecimento que
favorecem o desenvolvimento profissional; da diluição das fronteiras entre a vida profissional e a vida familiar e
pessoal; do descontrolo do tempo de trabalho, com a erosão das fronteiras entre tempo de descanso e tempo
para a empresa; das violações potenciais dos direitos de privacidade e do espaço de intimidade do trabalhador,
com mecanismos de controlo e vigilância acrescidos; da transposição dos custos gerais da empresa para os
custos individuais dos trabalhadores; ou da desarticulação de formas de representação coletiva e de
socialização dos trabalhadores. No caso das mulheres, particularmente, o controlo sobre o tempo pode ser
bastante exíguo, dados os constrangimentos familiares e domésticos que conduzem à «invasão» do tempo
noturno pelo trabalho, para aproveitar o sono das crianças, com o desgaste da vida pessoal daí resultantes.
A difusão do teletrabalho veio confrontar-nos com a necessidade de novas respostas para algumas das
questões fundadoras do próprio direito do trabalho. Uma das mais importantes é, sem dúvida, a do tempo de
trabalho, cuja limitação está na origem do movimento operário e se encontra consagrada, por exemplo, na
primeira Convenção da Organização Internacional do Trabalho, de 1919, que limitava o tempo de trabalho para
as 8 horas diárias e as 48 horas por semana, na indústria. Ao diluir as fronteiras tradicionais entre a vida
profissional e a vida pessoal, entre o espaço da empresa e o espaço privado, o teletrabalho faz com que a
prestação do trabalho como que «acompanhe» o trabalhador onde quer que ele esteja, potenciando a ideia de
uma conexão permanente, de uma escravização pela hiperdisponibilidade para responder às solicitações do
empregador mesmo, eventualmente, no seu tempo de repouso. Ora, a garantia da limitação do tempo de
trabalho é uma questão imperiosa. No debate sobre a delimitação da exploração, sobre a segurança e saúde
no trabalho, sobre a sinistralidade laboral ou sobre a partilha de emprego, a fixação de um limite máximo da
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duração do trabalho é fundamental. Curiosamente, o Código do Trabalho parece estabelecer uma sobreposição
– do nosso ponto de vista equívoca e perigosa – entre a figura da «isenção de horário», regulada pelo artigo
218.º, e o teletrabalho, ao referir que aquela se aplica a quem esteja a prestar atividade neste regime.
No ordenamento jurídico português, o teletrabalho é já regulado e disciplinado pelo Código do Trabalho. O
Acordo Europeu sobre o Teletrabalho, que data de 2002, estabelece múltiplas disposições, transpostas para a
lei portuguesa a partir de 2003. Entre essas disposições europeias destacam-se: a atribuição aos
teletrabalhadores de proteção semelhante à dos trabalhadores que exercem a sua atividade nas instalações do
empregador; a regulamentação das suas condições de trabalho, saúde e segurança, formação e direitos
coletivos; o carácter voluntário do teletrabalho (que deve ser uma escolha não apenas do empregador mas,
principalmente, do trabalhador); e o princípio da reversibilidade (que significa que a opção pela prestação em
teletrabalho deve poder ser reavaliada, permitindo-se ao trabalhador recuar e voltar a trabalhar nas instalações
da empresa).
Atualmente, o regime jurídico do contrato de trabalho subordinado à distância encontra-se regulado pelos
artigos 165.º e seguintes do Código do Trabalho. Na nossa lei, o teletrabalho implica a combinação de um
elemento geográfico (o trabalho é realizado à distância) e de um elemento tecnológico (o recurso a tecnologias
de informação e de comunicação). Assim, distingue-se o teletrabalho do mero trabalho no domicílio. De resto, o
teletrabalho pode desenvolver-se no domicílio do teletrabalhador, mas também em centros satélite,
comunitários, numa modalidade móvel ou «nómada», não tendo necessariamente de ser executado em casa.
O que o distingue é ser feito fora das instalações da empresa e mediante o recurso a tecnologias de informação
e de comunicação.
No plano das relações individuais de trabalho, a legislação portuguesa prevê que o «trabalhador em regime
de teletrabalho tem os mesmos direitos e deveres dos demais trabalhadores» (formação e promoção ou carreira
profissional, limites do período normal de trabalho, segurança e saúde no trabalho, reparação de danos
emergentes de acidente ou doença profissional, etc.). Além disso, para evitar o seu isolamento, prevêem-se
contactos regulares do teletrabalhador com a empresa e com os demais trabalhadores. A lei estabelece, ainda,
que cabe ao empregador facultar os instrumentos de trabalho e assumir as despesas relacionadas com a sua
manutenção, cabendo ao trabalhador o dever de acautelar a sua conservação.
Todavia, têm surgido muitos problemas quer na aplicação efetiva das normas existentes, quer na
interpretação sobre o alcance de algumas delas. Numa fase inicial da pandemia, foram suscitadas dúvidas sobre
o pagamento do subsídio de alimentação quando o trabalhador se encontra a trabalhar em casa, o que motivou
um esclarecimento do Governo, e continua ainda hoje a não ser garantido o pagamento, pelo empregador, dos
custos fixos decorrentes do teletrabalho. Têm sido discutidas múltiplas interpretações sobre o que deve
entender-se por «instrumentos de trabalho» (um computador, seguramente é-o; mas uma secretária e uma
cadeira, por exemplo, não devem também ser incluídos neste conceito?). Surgiram casos flagrantes de violação
dos direitos dos trabalhadores através da instalação, nos instrumentos de trabalho (computadores e telemóveis),
de programas informáticos que permitem a reprodução total do que o trabalhador executou no terminal ou a
gravação de reuniões com o ambiente do seu domicílio, o que aliás motivou pronunciamentos da Comissão
Nacional de Proteção de Dados. Está muito longe de se encontrar resolvido o problema suscitado pelo abuso
nos horários de trabalho, proporcionado pela «teledisponibilidade» permanente que, sendo até contrária às
disposições gerais da lei relativas ao tempo de descanso, acaba por ser uma realidade na prática, sem que
tenha surgido um sinal suficientemente inequívoco do legislador para reprimir a conexão abusiva por parte das
empresas. Têm surgido também problemas ao nível do regime de acidentes de trabalho, com casos em que as
companhias de seguros rejeitam a extensão do seguro aos acidentes ocorridos no espaço doméstico, mesmo
em horário de trabalho.
Por outro lado, o Estado português terá de transpor, até agosto de 2022, a Diretiva (EU) 2019/1158 do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, que se refere a regimes de trabalho a distância,
incluindo o teletrabalho, estabelecendo que «os Estados-Membros devem tomar as medidas necessárias para
garantir que os trabalhadores, com filhos até uma determinada idade, de pelo menos oito anos, e os cuidadores
tenham o direito de solicitar regimes de trabalho flexíveis» e que «os empregadores devem tomar em
consideração e atender esses pedidos de regimes de trabalho flexíveis num prazo razoável» e que «o
trabalhador deve também ter o direito de solicitar o regresso ao ritmo de trabalho original antes do termo do
período acordado, sempre que uma alteração das circunstâncias o justificar».
O Bloco de Esquerda entende que, neste contexto, é preciso dar um impulso legislativo capaz de proteger
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os trabalhadores. Não se trata de «incentivar» o teletrabalho, nem de assumir que ele é «o paradigma do futuro»
a ser promovido. Com efeito, muitos trabalhadores foram obrigados, por imposição legal excecional decorrente
das medidas sanitárias, a trabalhar através deste regime. Mas à medida que a pandemia for sendo debelada, é
expectável que muitos retomem a rotina no local de trabalho convencional, diminuindo significativamente a
incidência de teletrabalho «em tempo integral». É da maior importância, ainda assim, disciplinar o teletrabalho,
assumindo que, depois desta experiência, haverá uma parte minoritária dos trabalhadores que permanecerá
neste regime e que, perante as evidentes lacunas da lei e os abusos registados, é responsabilidade da lei laboral
proteger quem trabalha e minorar os riscos decorrentes desta modalidade de trabalho.
Assim, o presente projeto do Bloco de Esquerda pretende introduzir na lei as seguintes alterações:
1 – Estabelecer os conceitos de «trabalhador em regime de teletrabalho» e «trabalhador em regime de
trabalho a distância»;
2 – Clarificar os conceitos de «tempo de trabalho» e de «tempo de descanso», consagrando o dever de a
entidade empregadora respeitar o «tempo de desconexão profissional», através de um enquadramento mais
protetor dos trabalhadores;
3 – Prever que a violação reiterada desse dever de desconexão por parte das empresas no tempo de
descanso do trabalhador constitua indício de assédio, com as consequências daí decorrentes;
4 – Eliminar o vínculo, na lei, entre a figura da «isenção de horário» e o «teletrabalho»;
5 – Explicitar que, em regime de teletrabalho, se mantém o direito ao subsídio de alimentação e que é
responsabilidade do empregador o fornecimento dos meios de informação e comunicação utilizados em
teletrabalho;
6 – Clarificar as regras de pagamento, pelo empregador, das despesas originadas em regime de teletrabalho
e em regime de trabalho a distância, através da introdução de uma cláusula imperativa, que não pode ser
afastada por acordo individual, que inclui, designadamente, as despesas com telecomunicações, água e energia
(incluindo climatização);
7 – Na linha da Diretiva (EU) 2019/1158 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019 (que
o Estado português se obrigou a transpor para a legislação nacional até agosto de 2022), que estabelece o
direito de trabalhadores com filhos e trabalhadores que sejam cuidadores acederem a regimes de trabalho
flexíveis, prever que também o regime de teletrabalho, designadamente com horário flexível, passa a ser um
direito para quem tenha a seu cargo filho ou outro dependente a cargo menores de 12 anos ou,
independentemente da idade, com deficiência ou doença crónica ou ainda no caso de trabalhador que seja
cuidador não principal de pessoa dependente;
8 – Na linha da mesma diretiva, definir as regras de fundamentação qualificada perante a intenção de recusa
dos pedidos de regime de teletrabalho e de trabalho a distância, consagrando a obrigatoriedade de parecer das
entidades públicas responsáveis pela área de igualdade no trabalho e no emprego;
9 – Prever que as normas relativas ao teletrabalho são imperativas, garantindo que não podem ser afastadas
ou alteradas por acordo individual com o trabalhador e que, em sede de instrumento de regulamentação coletiva
de trabalho, só podem ser alteradas por normas que disponham em sentido mais favorável aos trabalhadores.
10 – Consagrar a excecionalidade do regime de visita do empregador ao domicílio do trabalhador, prevendo
o acordo do trabalhador e notificação prévia;
11 – Garantir uma periodicidade mínima de contactos presenciais entre o trabalhador e a empresa e os seus
colegas de trabalho;
12 – Reforçar o princípio da reversibilidade do acordo do trabalhador relativamente ao teletrabalho,
duplicando o período atual durante o qual o trabalhador pode denunciar o contrato para prestação subordinada
de teletrabalho e prevendo que o trabalhador possa regressar ao regime presencial antes do prazo acordado se
houver uma alteração de circunstâncias que o justifique;
13 – Na linha das orientações da Comissão Nacional de Proteção de Dados, proibir que o empregador
imponha, designadamente através de softwares informáticos, uma conexão permanente por meio de imagem
ou som durante a jornada de trabalho.
14 – Garantir que as estruturas de representação coletiva dos trabalhadores têm acesso aos contactos dos
trabalhadores em regime de teletrabalho;
15 – Alargar, na regulamentação do regime de reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais,
o conceito de «local de trabalho», para que seja inequívoca a aplicação destas disposições quando este é
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exercido no domicílio, impedindo a qualificação de acidentes profissionais ocorridos em casa como «acidentes
domésticos».
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
1 – A presente lei procede à décima nona alteração do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de
12 de fevereiro, e alterado pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de
25 de junho, 47/2012, de 29 de agosto, 11/2013, de 28 de janeiro, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de
maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015, de 14 de abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril,
28/2016, de 23 de agosto, 42/2016, de 28 de dezembro, 73/2017, de 16 de agosto, 14/2018, de 19 de março,
90/2019, de 4 de setembro e 93/2019, de 4 de setembro, na parte relativa aos regimes de teletrabalho e de
trabalho exercido à distância.
2 – O presente diploma altera a Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro, que regulamenta o regime de reparação
de acidentes de trabalho e doenças profissionais.
Artigo 2.º
Âmbito de aplicação
1 – O disposto no presente diploma aplica-se aos trabalhadores a laborar em regime de teletrabalho e de
trabalho a distância, no âmbito das relações de trabalho abrangidas pelo Código do Trabalho.
2 – O presente diploma aplica-se, igualmente, com as necessárias adaptações, ao regime de teletrabalho
previsto na Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que aprova a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, com as
posteriores alterações.
Artigo 3.º
Alterações ao Código de Trabalho
Os artigos 3.º, 29.º, 165.º, 166.º, 168.º, 169.º, 170.º, 171.º, 199.º, 218.º e 465.º do Código do Trabalho,
aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 3.º
(…)
1 – […].
2 – […].
3 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […];
g) […];
h) […];
i) […];
j) […];
l) […];
m) […];
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n) […];
o) Teletrabalho e trabalho à distância.
4 – […].
5 – […].
Artigo 29.º
(…)
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – A prática de assédio constitui contraordenação muito grave, sem prejuízo das eventuais
responsabilidades disciplinar e penal previstas nos termos da lei.
6 – […].
Artigo 165.º
Noção de trabalho à distância e de teletrabalho
1 – Considera-se trabalho à distância a atividade laboral prestada no domicílio do trabalhador ou em
lugar por este determinado, com subordinação jurídica, durante uma parte ou a totalidade da sua jornada
de trabalho, com carácter regular.
2 – Considera-se teletrabalho a prestação laboral realizada com subordinação jurídica, fora da
empresa e através do recurso a tecnologias de informação e de comunicação.
Artigo 166.º
Regime de contrato para prestação subordinada de teletrabalho e regime de trabalho à distância
1 – Pode exercer a atividade em regime de teletrabalho ou em regime de trabalho à distância um
trabalhador da empresa ou outro admitido para o efeito, mediante a celebração de contrato escrito para
prestação subordinada de teletrabalho ou de trabalho à distância.
2 – Verificadas as condições previstas no n.º 1 do artigo 195.º, o trabalhador tem direito a passar a exercer
a atividade em regime de teletrabalho ou em regime de trabalho à distância, quando este seja compatível
com a atividade desempenhada.
3 – Além das situações referidas no número anterior, o trabalhador com filho ou outro dependente a
cargo menor de 12 anos ou, independentemente da idade, com deficiência ou com doença crónica, ou o
trabalhador a quem seja atribuído o estatuto de cuidador não principal de pessoa dependente, nos
termos da lei, tem direito a exercer a atividade em regime de teletrabalho ou em regime de trabalho à
distância, nomeadamente em horário flexível, quando este seja compatível com a atividade desempenhada
e a entidade patronal disponha de recursos e meios para o efeito.
4 – […].
5 – […]:
a) […];
b) Indicação da atividade a prestar pelo trabalhador, com menção expressa do regime de teletrabalho ou
trabalho à distância, e correspondente retribuição;
c) […];
d) Se o período previsto para a prestação de trabalho em regime de teletrabalho ou de trabalho à distância
for inferior à duração previsível do contrato de trabalho, a atividade a exercer após o termo daquele período;
e) O modo de instalação e manutenção dos instrumentos de trabalho e o modo de pagamento das
inerentes despesas de consumo e de utilização;
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f) […];
g) Indicação da periodicidade das deslocações presenciais do trabalhador às instalações da empresa,
que ocorrerá, no mínimo, mensalmente.
6 – […].
7 – A forma escrita é exigida apenas para prova da estipulação do regime de teletrabalho e do regime de
trabalho à distância.
8 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.os 2, 3 e 4.
9 – O empregador abstém-se de estabelecer comunicações com o trabalhador fora do tempo de
trabalho através de ferramentas digitais, como telefonemas, mensagens de correio eletrónico e outras.
10 – O dever de desconexão por parte do empregador inclui, nomeadamente, disposições práticas
para desligar ferramentas digitais para fins de trabalho durante o período de descanso do trabalhador e
indicação dos tempos de pausa.
Artigo 167.º
(…)
1 – No caso de trabalhador anteriormente vinculado ao empregador, a duração inicial do contrato para
prestação subordinada de teletrabalho ou de trabalho à distância não pode exceder três anos.
2 – O empregador pode denunciar o contrato referido no número anterior durante os primeiros 30
dias da sua execução.
3 – O trabalhador pode denunciar o contrato referido no número 1 durante os primeiros 90 dias da
sua execução, ou sempre que uma alteração das circunstâncias o justificar.
4 – Cessando o contrato para prestação subordinada de teletrabalho ou de trabalho à distância, o
trabalhador retoma a prestação de trabalho, nos termos acordados ou nos previstos em instrumento de
regulamentação coletiva de trabalho.
5 – (Anterior n.º 4.)
Artigo 168.º
Instrumentos de trabalho em prestação subordinada de teletrabalho e de trabalho à distância
1 – Os instrumentos de trabalho respeitantes a tecnologias de informação e de comunicação utilizados pelo
trabalhador, assim como outros indispensáveis ao exercício da sua função profissional, são fornecidos pelo
empregador.
2 – Cabe ao empregador assegurar a respetiva instalação e manutenção e o pagamento das inerentes
despesas, nomeadamente os custos fixos gerados pelo uso de telecomunicações, água, energia,
incluindo climatização, e outros conexos com o exercício das funções.
3 – […].
4 – […].
Artigo 169.º
Igualdade de tratamento de trabalhador em regime de teletrabalho ou de trabalho à distância
1 – O trabalhador em regime de teletrabalho ou de trabalho à distância tem os mesmos direitos e deveres
dos demais trabalhadores, nomeadamente no que se refere à formação e promoção ou carreira profissionais,
limites do período normal de trabalho e outras condições de trabalho, segurança e saúde no trabalho e reparação
de danos emergentes de acidente de trabalho ou doença profissional.
2 [Novo] – O trabalhador em regime de teletrabalho ou de trabalho à distância tem direito a subsídio
de refeição, em moldes idênticos aos dos trabalhadores presenciais, bem assim como aos restantes
complementos remuneratórios.
3 – (Antigo n.º 2.)
4 – (Antigo n.º 3.)
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Artigo 170.º
Privacidade de trabalhador em regime de teletrabalho ou em regime de trabalho à distância
1 – […].
2 – Sempre que o teletrabalho ou o trabalho à distância seja realizado no domicílio do trabalhador, a visita
ao local de trabalho só deve ter por objeto o controlo da atividade laboral, que não possa ser realizada de
outra forma, bem como dos instrumentos de trabalho e apenas pode ser efetuada entre as 9 e as 19 horas,
com a assistência do trabalhador ou de pessoa por ele designada.
3 –A visita prevista no número anterior é marcada por acordo entre as partes.
4 – Na falta de acordo, a visita será realizada após aviso prévio ao trabalhador, com a antecedência
mínima de 48 horas.
5 – No acesso ao domicílio do trabalhador, as ações integradas pelo empregador devem ser
adequadas e proporcionais aos objetivos e finalidade da visita.
6 – O controlo da prestação, por parte do empregador, deve respeitar os princípios da
proporcionalidade e da transparência, sendo proibido impor a conexão permanente, durante a jornada
de trabalho, por meio de imagem ou som.
7 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.
Artigo 171.º
Participação e representação coletivas de trabalhador em regime de teletrabalho ou em regime de
trabalho à distância
1 – O trabalhador em regime de teletrabalho ou em regime trabalho à distância integra o número de
trabalhadores da empresa para todos os efeitos relativos a estruturas de representação coletiva, podendo
candidatar-se a essas estruturas.
2 – […].
3 – Qualquer estrutura de representação coletiva dos trabalhadores pode utilizar as tecnologias referidas no
número anterior para, no exercício da sua atividade, comunicar com o trabalhador em regime de teletrabalho ou
em regime de trabalho à distância, nomeadamente divulgando informações a que se refere o n.º 1 do artigo
465.º.
4 – Para efeitos do estabelecimento das comunicações previstas neste artigo, o empregador fornece
às estruturas de representação coletiva dos trabalhadores os contactos necessários e adequados do
trabalhador em regime de teletrabalho ou em regime de trabalho à distância.
5 – (Anterior n.º 4.)
Artigo 199.º
(…)
1 – [Anterior corpo do artigo.]
2 – O período de descanso deve corresponder a um tempo de desconexão profissional.
3 – As formas de garantir o tempo de desconexão profissional, designadamente através da não
utilização das tecnologias de informação e comunicação durante o período de descanso do trabalhador,
podem ser estabelecidas mediante instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
4 – A violação do disposto no n.º 2 pode constituir assédio, nos termos e para os efeitos do disposto
no artigo 29.º deste Código.
Artigo 218.º
(…)
1 – […]:
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a) […];
b) […];
c) (Revogada.)
2 – […].
Artigo 465.º
(…)
1 – […].
2 – A distribuição de informação sindical prevista no número anterior inclui o contacto, por via de
comunicação eletrónica, com os trabalhadores da empresa cuja prestação de trabalho seja feita em
regime de teletrabalho ou trabalho à distância.
3 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos números anteriores.»
Artigo 4.º
Aditamento ao Código de Trabalho
É aditado o artigo 166.º-A ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, com a
seguinte redação:
«Artigo 166.º-A
Apreciação do pedido
1 – No caso de pretender recusar o pedido previsto nos n.os 2 e 3 do artigo 166.º, o empregador
comunica ao trabalhador, no prazo de 20 dias, por escrito e com os fundamentos previstos na presente
lei, especificando os motivos da incompatibilidade com a atividade desempenhada.
2 – Quando a recusa tenha por fundamento a indisponibilidade de recursos e meios da empresa para
o efeito, cabe ao empregador demonstrar e provar que tal pedido acarreta encargos de ordem financeira
e técnica desproporcionados e que atendeu à duração do teletrabalho ou trabalho à distância pedido
pelo trabalhador.
3 – O trabalhador pode apresentar, por escrito, uma apreciação no prazo de cinco dias a partir da
receção da decisão de recusa.
4 – Nos cinco dias subsequentes ao fim do prazo para apreciação pelo trabalhador, o empregador
envia o processo para apreciação pela entidade competente na área da igualdade no trabalho e no
emprego, com cópia do pedido, do fundamento da intenção de recusar e da apreciação do trabalhador.
5 – A entidade referida no número anterior, no prazo de 30 dias, notifica o empregador e o trabalhador
do seu parecer, o qual se considera favorável à intenção do trabalhador se não for emitido naquele prazo.
6 – O empregador, em relação ao objeto do pedido, não pode proceder em sentido diverso do parecer
prestado, salvo em cumprimento de uma decisão judicial.»
Artigo 5.º
Alterações à Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro
O artigo 8.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro, que regulamenta o regime de reparação de acidentes de
trabalho e doenças profissionais, passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 8.º
(…)
1 – É acidente de trabalho aquele que se verifique no local e no tempo de trabalho ou no domicílio do
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trabalhador em regime de teletrabalho ou de trabalho à distância e produza direta ou indiretamente lesão
corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte redução na capacidade de trabalho ou de ganho ou a
morte.
2 – […]:
a) «Local de trabalho» todo o lugar em que o trabalhador se encontra ou deva dirigir-se em virtude do seu
trabalho ou o domicílio do trabalhador em regime de teletrabalho ou de trabalho à distância e em que
esteja, direta ou indiretamente, sujeito ao controlo do empregador;
b) […].»
Artigo 6.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.
Assembleia da República, 19 março de 2021.
As Deputadas e os Deputados do BE: José Moura Soeiro — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua —
Jorge Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — Joana Mortágua
— João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —
Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.
———
PROJETO DE LEI N.º 746/XIV/2.ª
DETERMINA A INSTALAÇÃO DE CIRCUITOS FECHADOS DE TELEVISÃO EM MATADOUROS
Exposição de motivos
I. Enquadramento
São muitos os relatos, provas documentais e denúncias relacionadas com maus tratos a animais de pecuária
ocorridos em matadouros portugueses e europeus, bem como noutras partes do mundo, além de outras
questões relevantes para o cumprimento das regras de bem-estar animal. Estes relatos incluem ainda matérias
de relevo para o bem-estar dos consumidores, como a falta de cumprimento das regras de higiene e segurança
nestes equipamentos. Nos últimos anos, multiplicam-se as notícias de situações graves de incumprimento de
várias regras e procedimentos de proteção e bem-estar dos animais em matadouros, nas diversas fases do
processo de abate, nomeadamente no transporte, descarga, encaminhamento, estabulação, imobilização,
atordoamento e no próprio abate dos animais.
Recentemente, o assunto foi denunciado numa reportagem da RTP intitulada «E se nós falássemos», emitido
no dia 25 de fevereiro de 2021, onde as condições degradantes de transporte, manuseamento e abate de
animais nos matadouros portugueses foi posta a descoberto. Os maus-tratos a animais transportados vivos para
fora do País e para os matadouros têm gerado uma enorme indignação e desaprovação social no nosso País e
tem levado a que cada vez mais países decidam avançar com a instalação de circuitos de vídeo nas instalações
dos matadouros, com vista a monitorizar o processo de abate dos animais fiscalizando de forma mais eficaz as
regras de bem-estar animal.
As situações de incumprimento mais frequentes verificam-se durante o processo de condução dos animais
pelos operadores de exploração dos matadouros (doravante designados operadores), que em toda a cadeia são
muitas vezes ineficientes, insensíveis, causando sofrimento desnecessário, além de agressões físicas
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deliberadas, aos animais. Existe um padrão de condutas nos matadouros que consubstancia o incumprimento
das normas de bem-estar e proteção animal, nomeadamente:
• Aplicação de descargas elétricas em zonas do corpo dos animais não permitidas, com durações
prolongadas e pouco espaçadas;
• Aplicação de pancadas com violência, nomeadamente pontapés, empurrões e agressões em partes
sensíveis do corpo;
• Ineficiência na imobilização dos animais no abate de modo a evitar quaisquer dores, sofrimento, agitação,
lesão ou contusão inúteis;
• Atordoamento dos animais sem que estes se encontrem em relaxamento, de forma a que o abate se
efetue em condições eficazes e sem demoras;
• Deficiente posicionamento dos meios mecânicos ou elétricos na cabeça dos animais no momento do
atordoamento ou morte, e utilização demasiado prolongada dos equipamentos, sem comodidade ou precisão;
• Anomalias diversas no método de abate por gaseamento, seja nos requisitos dos gases, na infalibilidade
do procedimento, ou na câmara de anestesia onde os animais são expostos ao gás;
• Decapitações e operações de sangria efetuadas com o animal ainda consciente.
São vários os países que já possuem sistemas de videovigilância nos matadouros. Inglaterra é um desses
países, onde a implementação desta medida surgiu na sequência de uma consulta pública realizada em 2017,
através do Departamento de Ambiente, Alimentação e Assuntos Rurais/Department for Environment, Food &
Rural Affairs (DEFRA), onde se constatou que 99,2% dos cidadãos ingleses era favorável à obrigatoriedade de
instalação de sistemas de CFTV em matadouros.
Em Espanha, o Governo está também a desenvolver um processo semelhante com vista à instalação de
circuitos de videovigilância nos matadouros através do Ministério de Consumo, que já colocou em marcha o
processo de «Consulta Pública Prévia do Real Decreto relativo à instalação de sistemas de videovigilância nos
matadouros para controlo do bem-estar animal». Prevê-se para breve a concretização desta medida em todo o
território espanhol.
Também a Escócia já aprovou a instalação de um sistema de vídeo obrigatório nos matadouros, estando
previsto que entre em vigor a partir de 1 de julho de 2021. Holanda e Israel são outros países onde a medida já
se encontra implementada.
II. As preocupações dos cidadãos face ao bem-estar animal
A problemática questão de abusos e violação das regras de bem-estar animal nos matadouros preocupa os
cidadãos europeus, incluindo os consumidores portugueses, como ficou demonstrado no inquérito do
Eurobarómetro realizado em 2015, onde ficou demonstrado que os europeus defendem maiores garantias de
bem-estar para os animais de pecuária. Neste inquérito, quando questionados sobre a importância de proteger
o bem-estar dos animais de criação, 50% dos cidadãos portugueses responderam que consideravam «muito
importante», 49% consideraram «importante» e apenas 1% respondeu «pouco importante».
A resposta dos consumidores portugueses (99% consideram que esta questão era muito importante ou
importante) revela a importância do tema e falta de confiança nas normas e procedimentos de bem-estar nos
matadouros e no seu cumprimento e fiscalização, deixando claro que consideram que deve existir um maior
esforço no sentido de melhorar as condições de bem-estar dos animais de produção. No mesmo estudo 78%
dos portugueses consideram que «gostariam de ter mais informação sobre as condições a que os animais de
criação estão sujeitos em Portugal».
Em Portugal existem cerca de 150 matadouros licenciados (incluindo ungulados, aves e lagomorfos) e são
abatidos em média, anualmente, cerca de 11 milhões de animais (30 136 por dia). A grande maioria destes
matadouros são privados, muitos deles propriedade das empresas de produção de carne, pelo que importa
garantir uma fiscalização isenta e eficiente que contribua para a confiança dos consumidores nas políticas de
bem-estar animal.
O bem-estar dos animais no matadouro é particularmente preocupante na medida em que todas as fases do
processo – desde o descarregamento, maneio, encaminhamento e estabulação, até ao atordoamento e abate –
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oferecem um potencial de angústia, sofrimento e dor. O número de animais envolvidos é bastante elevado e as
necessidades de produção comercial significam que manter a proteção e o bem-estar dos animais pode ser
particularmente desafiante. A transição do animal vivo para o produto à base de carne é aquela que requer
especial cuidado e onde se deve garantir ao máximo as melhores práticas.
III. Quadro legal de proteção dos animais no momento do abate
O Regulamento da União Europeia n.º 1099/2009, que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2013, e que é
diretamente aplicável aos Estados-Membros, regula a proteção dos animais no momento do abate,
estabelecendo que apenas os matadouros que abatam mais do que 1000 cabeças normais de mamíferos, ou
150 000 ou mais unidades de aves de capoeira ou coelhos, têm que nomear um responsável pelo bem-estar
dos animais que assegura o cumprimento das regras.
O regulamento em causa obriga a que os matadouros assegurem várias condições e normas com vista ao
bem-estar dos animais e, apesar de não prever a utilização de CFTV, também não a proíbe, ao referir que «os
Estados-Membros podem adotar disposições nacionais destinadas a garantir uma proteção mais ampla dos
animais no momento da occisão do que as previstas no presente regulamento.
O referido regulamento obriga a que durante o atordoamento e abate esteja presente um inspetor sanitário
que analise a conformidade das práticas com a legislação. No entanto, bem sabemos que é impossível que este
consiga verificar todas as práticas durante todo o processo.
Assim como em termos mais genéricos, nos seus considerandos, refere que: «A occisão de animais pode
provocar dor, aflição, medo ou outras formas de sofrimento dos animais, mesmo nas melhores condições
técnicas disponíveis. Certas operações associadas à occisão podem provocar stress e todas as técnicas de
atordoamento apresentam inconvenientes. Os operadores das empresas ou quaisquer pessoas envolvidas na
occisão de animais deverão tomar as medidas necessárias para evitar a dor e minimizar a aflição e sofrimento
dos animais durante o processo de abate ou occisão, tendo em conta as melhores práticas neste domínio e os
métodos autorizados ao abrigo do presente regulamento. Por conseguinte, a dor, a aflição ou sofrimento deverão
ser consideradas como evitáveis sempre que os operadores das empresas ou quaisquer pessoas envolvidas na
occisão de animais infrinjam uma das disposições do presente regulamento ou utilizem práticas autorizadas sem
ter em conta a respetiva evolução técnica, provocando assim dor, aflição ou sofrimento nos animais, por
negligência ou intencionalmente.»
E ainda reconhece que «o bem-estar dos animais é um princípio comunitário consagrado no protocolo n.º 33
relativo à proteção e ao bem-estar dos animais, anexo ao Tratado que institui a Comunidade Europeia (Protocolo
n.º 33). A proteção dos animais no momento do abate ou occisão é um tema que preocupa o público e influencia
a atitude dos consumidores em relação aos produtos agrícolas.»
Em Portugal, o controlo e fiscalização dos matadouros compete à Direção-Geral de Alimentação e Veterinária
(DGAV), na qualidade de autoridade veterinária sanitária nacional. A legislação que rege esta matéria é o
Decreto-Lei n.º 28/96, de 2 de abril, que transpõe a Diretiva n.º 93/119/CE do Conselho, de 22 de dezembro.
A Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), na sua publicação intitulada «Bem-Estar Animal no
Abate», expressa a sua preocupação com o cumprimento das normas, defendendo que se deve «Assegurar
que a manipulação eficiente pelos operadores dos animais em toda a cadeia e situações para não causar
sofrimento desnecessário». Para a CAP, «muitos fatores devem ser tomados em consideração quando da
decisão e adoção das melhores técnicas nos matadouros» sendo que «o principal fator deverá ser o bem-estar
animal». Defende ainda que «devem ser introduzidas normas e procedimentos nesse sentido a todos os
operadores e operações envolvidos, quer no encaminhamento quer no abate dos animais». A CAP, tal como os
seus congéneres britânicos, evidencia preocupações em assegurar a proteção e o bem-estar animal, procurando
proceder à melhoria dos procedimentos em toda a cadeia do abate dos animais.
IV. As vantagens da utilização de sistemas de CFTV em matadouros
Segundo o parecer da Farm Animal Welfare Committee (FAWC) – entidade independente criada pelo
Governo britânico cujo objetivo é prestar apoio consultivo ao DEFRA – sobre a utilização de CFTV nos
matadouros, as conclusões a que chegaram foram as seguintes:
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«Em resumo, embora reconheçamos as limitações e preocupações associadas com a introdução e uso da
CCTV nos matadouros, argumentamos que, como complemento dos requisitos legais existentes e das práticas
de gestão para a observação e verificação das práticas dos matadouros, a CCTV oferece alguns benefícios
reais aos operadores e ao resto da cadeia alimentar:
• No aumento da confiança pública de que os processos de abate de animais são realizados
adequadamente;
• Como componente de conformidade legal como garantia relativa ao tratamento dos animais;
• Como meio de identificar problemas de bem-estar animal ou incidentes que podem não ser identificados
por quem estiver no local a observar;
• Como fonte de provas potenciais de práticas menos corretas relativas ao bem-estar animal;
• Como uma ferramenta de gestão para auxiliar os operadores a avaliar as operações nos seus matadouros;
• Como uma ferramenta valiosa na formação de pessoal em relação ao maneio dos animais e ao seu bem-
estar.
Também a British Veterinarian Association (BVA) – o órgão representativo nacional da profissão de médico-
veterinário no Reino Unido – se pronunciou relativamente à instalação destes circuitos, tendo congratulado a
proposta da DEFRA (homóloga britânica da DGAV) para a obrigatoriedade da instalação de CFTV em
matadouros. A BVA manifestou o seu total apoio à medida, reconhecendo que a mesma permite o aumento de
oportunidades de melhoria no maneio e abate dos animais, bem como reduz os riscos de saúde pública e
aumenta a confiança dos consumidores nos operadores.
Esta entidade considera que os sistemas de CFTV constituem uma ferramenta importante de trabalho que
permite aos inspetores sanitários e veterinários manter um alto nível de bem-estar animal, bem como auxiliá-los
no seu papel de monitorização de forma mais eficiente e efetiva.
No mesmo sentido, a Food Standards Agency (FSA) – a entidade competente pela segurança alimentar e
higiene no Reino Unido – recomenda também que todos os matadouros tenham sistemas de CFTV,
considerando que esta é uma ferramenta eficiente na monitorização do bem-estar animal.
Importa realçar que as imagens de CFTV podem ter um valor especial ao nível da formação, ao incentivar o
comportamento sensível e empático dos trabalhadores em relação aos animais, consciencializar para áreas e
práticas de potencial interesse social e promover um sentimento de responsabilidade coletiva. Em certos casos
de práticas inadequadas por parte de quem maneia os animais em matadouros, desconhecidas pelos
operadores, a instalação destes circuitos consubstancia um meio adicional para verificação do cumprimento das
normas de bem-estar. Os sistemas de CFTV são um auxílio importante para a observação física, particularmente
nas áreas pequenas, confinadas ou de alto risco onde a inspeção física é limitada, como é o caso da área de
atordoamento, na qual pode não haver espaço suficiente para que um observador veja todo o procedimento.
Os sistemas CFTV também fornecem uma valiosa ferramenta de formação para os trabalhadores, através
da gravação de operações de rotina e de incidentes específicos. A gravação de rotina pode ser usada para
treinar/formar os trabalhadores e os operadores na identificação de possíveis padrões de segurança de falhas
ou como contributo para auditoria e verificação de bem-estar. A evidência registada de incidentes pode ser
usada para identificar a ocorrência de práticas precárias, não padronizadas ou ilegais.
Note-se que a utilização destes circuitos vai além da defesa do bem-estar de cada indivíduo em particular, já
que permite fazer uma retrospetiva e avaliação geral do sucesso de cada prática nas diversas fases, desde a
estabulação até ao abate efetivo, permitindo assim uma melhor avaliação das necessidades comportamentais
dos animais.
Ao permitir a verificação do cumprimento das normas 24 horas por dia, este sistema revela-se particularmente
importante nas fases em que o risco de ferimento ou sofrimento desnecessário demonstra ser mais elevado.
As imagens de CFTV com registo permanente podem ser mantidas por períodos de tempo razoáveis, por
exemplo por 90 dias, e podem ser vistas retrospetivamente, periodicamente ou em resposta imediata a um
problema ou alegada violação de procedimentos ou padrões, permitindo uma intervenção rápida e retificação.
As imagens de CFTV podem ser armazenadas e usadas para avaliação de procedimentos regulares em
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intervalos determinados. Podem ser verificadas por solicitação da entidade fiscalizadora e, se armazenadas e
arquivadas corretamente, ser usadas para retornar a momentos específicos do passado, por exemplo, para
identificar o ponto em que um procedimento ou processo começou a falhar, atendendo aos padrões exigidos.
Importa referir ainda que a instalação de um sistema de CFTV não substitui a presença física do inspetor
sanitário, nem pode justificar uma menor intervenção da sua parte, funcionando antes como um meio auxiliar de
inspeção e um recurso adicional de fiscalização da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária, conduzindo a
uma maior garantia no cumprimento das normas de proteção e bem-estar animal e de saúde pública.
De mencionar que as imagens obtidas pelos sistemas de CFTV apenas são acessíveis ao próprio operador,
ao inspetor sanitário e à Direção-geral de Alimentação e Veterinária.
Os sistemas de CFTV podem ainda fornecer informações úteis aos operadores na gestão de instalações, na
garantia de segurança do local e equipamentos e na organização de fluxos de trabalho. Os operadores em
países que têm este modelo implementado valorizam também o facto de os sistemas de CFTV diminuírem o
risco de assalto ou dano. Os sistemas de CFTV também podem proteger os trabalhadores de danos graves ou
até mesmo morte, através da deteção de práticas potencialmente perigosas. Também incidentes menores
podem ser evitados assim como danos aos equipamentos, pois é possível corrigir deficiências na sua utilização.
Por fim, em certos casos os trabalhadores sentem-se inibidos de relatar incidências do mau tratamento de
animais e, havendo câmaras, já não precisam de sentir essa preocupação, pois terceiros já podem verificar
aquilo que eventualmente um trabalhador possa ter presenciado.
Ao nível dos custos, o relatório independente do professor Ian Rotherham da Sheffield Hallam University
(publicado agosto de 2016) indica que o sistema independente de monitoramento CCTV a instalar nos
matadouros ingleses custaria entre £150 000 e £370 000 (172 640€/425 760€) por ano, demonstrando que este
custo é económico e viável. «A conclusão clara é que o sistema atual de monitorização do bem-estar está a
falhar e que o uso obrigatório de CCTV com monitorização independente é a única solução robusta», refere o
relatório.
V. A utilização de CFTV e a proteção de dados pessoais
No que diz respeito à proteção dos dados pessoais dos trabalhadores, dispõe o artigo 20.º do Código do
Trabalho que:
«A utilização de equipamento referido no número anterior é lícita sempre que tenha por finalidade a proteção
e segurança de pessoas e bens ou quando particulares exigências inerentes à natureza da atividade o
justifiquem». Refere ainda que «nos casos previstos no número anterior, o empregador informa o trabalhador
sobre a existência e finalidade dos meios de vigilância utilizados, devendo nomeadamente afixar nos locais
sujeitos os seguintes dizeres, consoante os casos: ‘Este local encontra-se sob vigilância de um circuito fechado
de televisão’ ou «Este local encontra-se sob vigilância de um circuito fechado de televisão, procedendo-se à
gravação de imagem e som’, seguido de símbolo identificativo», o que, aliás, já acontece em centros comerciais
e escolas, por exemplo.
Tendo em conta que no caso do maneio de animais, alguns até de grande porte, está em causa não só o
bem-estar do animal como também dos trabalhadores que com eles tenham que lidar, bem como existe risco
para a saúde pública, justifica-se a instalação de CFTV nos matadouros. Os trabalhadores devem ser informados
de que estão a ser filmados, mas também devem estar conscientes dos benefícios que isso lhes pode trazer.
Se um trabalhador não souber lidar convenientemente com um animal de grande porte, por exemplo, pode ele
próprio vir a sofrer lesões graves. A possibilidade de gravação e revisão das imagens permite a melhoria dos
procedimentos, sendo uma oportunidade de aprendizagem também para os trabalhadores e um contributo para
um ambiente de trabalho mais seguro.
VI. Conclusão
A afirmação de Portugal como País desenvolvido e eticamente diferenciador passa por elevar a fasquia
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legislativa também nesta matéria, praticando sem receios os mais altos padrões de proteção e bem-estar animal,
acompanhando países como Espanha, Inglaterra, França ou Alemanha. Seguindo este sentimento geral que
atravessa a Europa, os portugueses defendem que todos os animais devem ser tratados com o maior respeito
nas várias fases da sua vida e estar sujeitos aos mais altos padrões de bem-estar possível, independentemente
do fim a que se destinam, além de se mostrarem preocupados com as questões sanitárias nos matadouros. A
introdução de sistemas de CFTV em matadouros é a demonstração de que os consumidores podem confiar nos
operadores portugueses. O PAN considera, por isso, fundamental a sua implementação, com o objetivo de
contribuir para a melhoria significativa da proteção e das condições de bem-estar dos animais no momento do
seu abate e aumentar a confiança dos consumidores na produção de alimentos.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do PAN apresenta o
seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei determina a instalação de circuitos fechados de televisão em matadouros.
Artigo 2.º
Definições
Para efeitos do presente diploma entende-se por:
a) Circuito fechado de televisão (CFTV) – o sistema de gravação, acesso e armazenamento de imagens em
tempo real dentro de uma rede fechada que oferece a possibilidade de acesso e reprodução imediatos e de
armazenamento;
b) Inspetor sanitário – o médico veterinário, nomeado pelo serviço oficial competente, responsável pelo
controle da higiene e pelas inspeções legalmente exigidas;
c) Matadouro – toda a instalação aprovada pelos serviços oficiais competentes e utilizada para o abate e
preparação das reses destinadas ao consumo público;
d) Operador económico – quem exerce a atividade de exploração económica do matadouro.
Artigo 3.º
Instalação de sistemas de circuito fechado de televisão
1 – É obrigatória a instalação sistemas de CFTV em todos os matadouros, designadamente nas áreas em
que os animais vivos são descarregados, estabulados, transportados e encaminhados dentro do matadouro e
no local onde são mantidos, atordoados e abatidos.
2 – As câmaras devem ser colocadas em zonas que permitam observar os animais vivos em todas as fases
descritas no número anterior.
3 – Os matadouros dispõem do prazo de um ano, a contar da data de entrada em vigor da presente lei, para
proceder à implementação do disposto nos números anteriores.
Artigo 4.º
Autorização de instalação de câmaras fixas
1 – A instalação de câmaras fixas, nos termos da presente lei, está sujeita a autorização do membro do
Governo que tutela a agricultura.
2 – A decisão de autorização é precedida de parecer da Comissão Nacional de Proteção de Dados, que se
pronuncia sobre a conformidade do pedido face às necessidades de cumprimento das regras referentes à
proteção de dados.
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Artigo 5.º
Captação e gravação de imagem
1 – A captação e gravação de imagem, por via de sistemas de CTFV, deve ocorrer todos os dias de forma
ininterrupta durante 24 horas.
2 – Os sistemas de CFTV devem possibilitar a visualização imediata das imagens capturadas e a sua
gravação.
3 – As imagens captadas devem ser mantidas por um período mínimo de 90 dias.
4 – As imagens captadas podem ser observadas exclusivamente pelos operadores, pelos inspetores
sanitários e pela Direção-Geral de Alimentação e Veterinária, sem prejuízo dos poderes atribuídos às demais
autoridades policiais e judiciárias, a quem deve ser garantido o acesso às imagens e a apreensão das mesmas
nos termos legalmente estabelecidos.
5 – Os técnicos encarregues de verificar as imagens captadas devem ter formação adequada para o efeito,
nomeadamente terem conhecimento de técnicas de observação assim como estarem conscientes do uso
limitado que as imagens captadas podem ter.
6 – As imagens captadas podem ser utilizadas para fins de formação dos trabalhadores, desde que
salvaguardada a proteção de dados pessoais.
Artigo 6.º
Dever de comunicação
Em caso de identificação de situações de abuso ou não cumprimento das regras de bem-estar animal, os
operadores devem imediatamente comunicar os factos à entidade fiscalizadora.
Artigo 7.º
Sinalética
Deve estar afixado em local visível, junto das câmaras de vigilância, a informação de que o local se encontra
sob vigilância de um sistema CFTV, devendo todos os trabalhadores ser expressamente informados da
utilização de tal sistema e dos objetivos da sua utilização.
Artigo 8.º
Inspetor sanitário
O sistema de CFTV não pode substituir a presença do inspetor sanitário ou outros veterinários encarregues
de proceder a ações de fiscalização e auditoria.
Artigo 9.º
Fiscalização
Sem prejuízo das competências atribuídas por lei a outras entidades, compete, em especial, à DGAV e aos
médicos veterinários municipais assegurar a fiscalização do cumprimento da presente lei.
Artigo 10.º
Sanções
As infrações ao disposto na presente lei, designadamente ao disposto nos artigos 3.º a 8.º, constituem
contraordenações puníveis com coima, cujo montante mínimo é de (euro) 500 e o máximo de (euro) 50 000.
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Artigo 11.º
Penas acessórias
Consoante a gravidade da contraordenação e a culpa do agente, poderão ser aplicadas, simultaneamente
com a coima, as seguintes sanções acessórias:
a) Perda a favor do Estado de objetos e animais pertencentes ao agente utilizados na prática do ato ilícito;
b) Interdição do exercício de uma profissão ou atividade cujo exercício dependa de título público ou de
autorização ou homologação de autoridade pública;
c) Privação do direito a subsídio ou benefício outorgado por entidades ou serviços públicos;
d) Privação do direito de exercer a atividade de criação de animais;
e) Encerramento de estabelecimento cujo funcionamento esteja sujeito a autorização ou licença de
autoridade administrativa;
f) Suspensão de autorizações, licenças e alvarás.
Artigo 12.º
Tramitação processual
1 – Compete à DGAV a instrução dos processos de contraordenação.
2 – Compete ao Diretor-Geral de Alimentação e Veterinária a decisão de aplicação das coimas e das sanções
acessórias.
Artigo 13.º
Afetação do produto das coimas
A afetação do produto das coimas faz-se da seguinte forma:
a) 10% para a autoridade autuante;
b) 40% para a autoridade com capacidade de instrução dos processos de contraordenação;
c) 50% para o Estado.
Artigo 14.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor um ano após a sua publicação.
Assembleia da República, 19 de março de 2021.
O Deputado e as Deputadas do PAN: André Silva — Inês de Sousa Real — Bebiana Cunha.
———
PROJETO DE LEI N.º 747/XIV/2.ª
PRORROGA MEDIDAS EXCECIONAIS E TEMPORÁRIAS PARA SALVAGUARDA DOS DIREITOS DOS
ESTUDANTES DO ENSINO SUPERIOR
Exposição de motivos
A pandemia de COVID-19 veio criar uma assinalável disrupção do ensino em Portugal, levando a um esforço
hercúleo por parte das instituições de ensino superior para garantir a continuidade das atividades letivas de
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modo virtual.
Dada esta situação foi aprovada a Lei n.º 38/2020, de 18 de agosto, que entre diversas medidas garantiu o
acesso a mais épocas de exames aos alunos do ensino superior, determinou a exclusão do ano letivo 2019/2020
para efeitos de contabilização no âmbito do regime de prescrições, e permitiu a candidatura e admissão
condicional a ciclos de estudo sem a conclusão do ciclo de estudos anteriores. Apesar desta última medida não
estar limitada temporalmente, as primeiras duas estão explicitamente limitadas ao ano letivo que já cessou.
Apesar do regresso parcial ao regime presencial, ainda existem inúmeras situações de atividades letivas à
distância, momentos de avaliação online e impossibilidade de alunos de comparecerem a estes momentos de
avaliação em consequência de períodos de isolamento profilático. Neste sentido, torna-se urgente prorrogar,
atempadamente, para o ano letivo 2020/2021 o acesso a mais épocas de exame e a exclusão para efeitos do
regime de prescrição.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados abaixo assinados
apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à primeira alteração à Lei n.º 38/2020, de 18 de agosto, para prorrogar medidas
excecionais e temporárias para salvaguarda dos direitos dos estudantes do ensino superior.
Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 38/2020, de 18 de agosto
O artigo 5.º da Lei n.º 38/2020, de 18 de agosto, passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 5.º
[…]
1 – Nos anos letivos 2019/2020 e 2020/2021, todos os estudantes devem ter acesso a todas as épocas de
exames, em moldes a definir pelas instituições de ensino superior, designadamente em relação à inscrição para
a época especial.
2 – (…).
3 – Os anos letivos 2019/2020 e 2020/2021 não são considerados para efeitos de contabilização do prazo
de prescrição.»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 19 de março de 2021.
As Deputadas e os Deputados do PS: Miguel Matos — Filipe Pacheco — Tiago Estevão Martins — Alexandra
Tavares De Moura — Ana Passos — Cristina Sousa — Francisco Rocha — Anabela Rodrigues — João Azevedo
Castro — Clarisse Campos — Sofia Araújo — José Manuel Carpinteira — Francisco Pereira Oliveira —
Romualda Fernandes — Susana Correia — Lúcia Araújo Silva — Joana Bento — José Rui Cruz — Palmira
Maciel — Telma Guerreiro — Hortense Martins — Cristina Mendes da Silva — Rita Borges Madeira — Nuno
Fazenda — Fernando Paulo Ferreira — Sílvia Torres — Olavo Câmara — Susana Amador — Marta Freitas —
João Miguel Nicolau — Martina Jesus — Norberto Patinho — Jorge Gomes — Vera Braz — Maria Joaquina
Matos — Paulo Porto — Pedro Sousa.
———
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1119/XIV/2.ª
PROPÕE MEDIDAS DE ACESSO A MEDICAMENTOS USADOS NO TRATAMENTO DA FIBROSE
QUÍSTICA
Exposição de motivos
Em Portugal existem cerca de 400 pessoas com fibrose quística. Tratando-se de uma doença que afeta
particularmente órgãos como pâncreas, pulmões, fígado e intestino, o comprometimento pulmonar é
responsável por cerca de 90% da morbilidade e mortalidade associadas à fibrose quística.
A evolução da doença condiciona consideravelmente a qualidade de vida das pessoas com esta doença,
limitando não só a sua participação ativa na sociedade como também uma redução muito significativa da sua
esperança média de vida que neste momento se estima ser de 40 anos de idade.
Os tratamentos atualmente disponíveis para a fibrose quística, ainda que com importantes progressos,
apenas permitem a diminuição de alguns dos seus sintomas. Contudo, têm surgido medicamentos inovadores
que, não representando a tão desejável cura, demonstraram melhorar significativamente quer o prognóstico da
evolução da doença e os seus efeitos, quer a qualidade de vida da pessoa com fibrose quística.
Conscientes do que representa a doença e os seus efeitos para a sua vida e dos benefícios que resultam do
acesso aos medicamentos inovadores, os doentes e as suas associações representativas têm solicitado, não
só a disponibilidade dos medicamentos em causa, como também a celeridade de todo o processo que, na
maioria dos casos, tem demorado cerca de 5 anos até à sua comparticipação.
No contexto atual, todos os medicamentos têm, assim, de ser avaliados e aprovados pelas autoridades
competentes relevantes, nacionais ou europeias, antes de poderem ser comercializados. Em Portugal, é o
INFARMED, enquanto autoridade nacional do medicamento e produtos de saúde, quem tem responsabilidades
nessa avaliação e consequente decisão de comparticipação. O acesso aos novos medicamentos está
dependente antes de mais da obtenção de autorização de introdução no mercado (AIM) e numa fase posterior
da demonstração da vantagem terapêutica e económica considerando a prática clínica existente. Ou seja, o
processo de financiamento dos medicamentos por parte do Estado requer uma detalhada avaliação
farmacoterapêutica e farmacoeconómica, à qual se segue uma fase de negociação com o titular da AIM, na
base da qual são celebrados os contratos e são definidas as condições de utilização e as indicações terapêuticas
para as quais o medicamento pode ser utilizado.
É muitas vezes, na fase de negociação que o processo se torna mais moroso e difícil, pois a indústria
farmacêutica realiza as suas pesquisas orientadas basicamente pelo lucro o que revela a perspetiva da relação
entre saúde e mercado transformando a saúde em mercadoria quando deveria constituir um bem e um direito.
O PCP defende que os doentes devem ter acesso ao tratamento mais adequado e aos novos medicamentos
com evidência científica dos seus benefícios no plano clínico, e defende que o Estado, não pode ficar refém dos
interesses da indústria farmacêutica e tem de defender o interesse público e do País.
Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a
seguinte:
Resolução
A Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, considerando a necessidade
de garantir o acesso aos novos medicamentos destinados ao tratamento de doentes com fibrose quística,
recomenda ao Governo que:
1 – Tome as medidas necessárias, que permitam otimizar os procedimentos com vista à conclusão do
processo de avaliação dos novos medicamentos para o tratamento da fibrose quística;
2 – Assegure a dispensa dos novos medicamentos, pelas farmácias hospitalares aos doentes com fibrose
quística, com indicação clínica para aceder às novas terapêuticas;
3 – Implemente medidas de identificação, denuncia e combate ao monopólio no setor farmacêutico, tornando
públicas todas as negociações, documentos e avaliações sem limites de confidencialidade.
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Assembleia da República, 19 de março de 2021.
Os Deputados do PCP: João Dias — Paula Santos — António Filipe — João Oliveira — Jerónimo de Sousa
— Diana Ferreira — Duarte Alves — Bruno Dias — Ana Mesquita — Alma Rivera.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1120/XIV/2.ª
RECOMENDA AO GOVERNO A CONSTRUÇÃO DE UM NOVO CENTRO DE SAÚDE NA QUINTA DO
CONDE, CONCELHO DE SESIMBRA
Exposição de motivos
Com 33 879 habitantes e 23 050 eleitores, a Quinta do Conde é a mais jovem e a maior freguesia do concelho
de Sesimbra.
Face ao crescimento e desenvolvimento desta localidade, situada no coração da península de Setúbal, em
1995 foi-lhe atribuído o estatuto de vila, transformando-a no centro aglutinador da região, tanto na prestação de
serviços como no setor comercial.
A proximidade à capital de distrito, Setúbal, bem como à cidade de Lisboa e à Autoeuropa, centros de
emprego por excelência, conferem à freguesia de Quinta do Conde uma significativa atratividade. Certo é,
porém, que a evolução demográfica verificada nesta freguesia não tem sido acompanhada do necessário reforço
de serviços públicos, muito em especial ao nível da disponibilização de cuidados de saúde.
A freguesia dispõe de duas unidades de saúde – Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados da Quinta
do Conde (UCSP) e Unidade de Saúde Familiar Conde Saúde (USF) – as quais são manifestamente
insuficientes para prestar um serviço público de qualidade aos habitantes da Quinta do Conde.
Cerca de metade da população local não dispõe sequer de médico de família, bem como do devido
acompanhamento ao nível dos cuidados de saúde primários.
Acrescem, ainda, a escassez de profissionais de saúde, especialmente de médicos, enfermeiros, assistentes
técnicos e operacionais, a pressão demográfica, o envelhecimento da população e a escassez de transportes
públicos.
Por outro lado, no período noturno, compreendido entre as 20h e as 8h, não existe assistência médica na
zona, sendo impraticável o Hospital de São Bernardo, situado em Setúbal, a mais de 20km da Quinta do Conde,
garantir uma resposta efetiva e de qualidade, dados os seus próprios condicionalismos.
A população de Quinta do Conde não pode ser condenado a esta sensação de abandono no que toca aos
cuidados de saúde, pelo que, face à necessidade de garantir a todos os habitantes da freguesia o acesso a uma
resposta do Serviço Nacional de Saúde, 4190 peticionários, através da Petição n.º 41/XIV/1.ª, já solicitaram a
«Construção de um novo Centro de Saúde na freguesia da Quinta do Conde, concelho de Sesimbra, com um
Serviço de Urgência Básica», invocando a existência de um compromisso da Câmara Municipal de Sesimbra
para a cedência do terreno e do projeto.
Com a presente iniciativa, o Partido Social Democrata procura contribuir para a resolução de um problema –
a insegurança da população de uma freguesia perante a falta de acesso aos cuidados de saúde primários.
Importa, assim, que o Governo reforce o investimento no Serviço Nacional de Saúde, em ordem à construção
de um novo equipamento de saúde na Quinta do Conde, com os necessários recursos humanos e materiais, e
ponderando ainda a necessidade de o dotar com um serviço de urgência básica, adequado à resolução das
situações urgentes de menor gravidade dos utentes do SNS.
Nestes termos, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados,
do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, apresentam o presente projeto de resolução, através do
qual recomendam ao Governo que:
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1 – Inicie, a breve prazo, todos os procedimentos e medidas necessários para que se proceda à construção
de um novo centro de saúde na Quinta do Conde, no concelho de Sesimbra, ponderando a necessidade de
dotar esse equipamento de saúde com um serviço de urgência básica, adequado à resolução das situações
urgentes de menor gravidade dos utentes do SNS;
2 – Assegure que esta unidade de saúde será dotada de todos os equipamentos e profissionais de saúde
necessários ao seu bom funcionamento.
Palácio de São Bento, 19 de março de 2021.
Os Deputados do PSD: Adão Silva — Fernanda Velez — Nuno Miguel Carvalho — Fernando Negrão — Rui
Cristina — Sandra Pereira — Álvaro Almeida — Cláudia Bento — Helga Correia — Jorge Salgueiro Mendes —
Mónica Quintela — Sara Madruga da Costa.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1121/XIV/2.ª
RECOMENDA AO GOVERNO A REABERTURA DOS ESTABELECIMENTOS TERMAIS NO ÂMBITO DO
PLANO DE DESCONFINAMENTO
Exposição de motivos
Desde a antiguidade que o termalismo se encontra associado a tratamentos ao nível da saúde baseados em
recursos naturais aos quais lhes é atribuída a função curativa. Foi esse facto que lhe conferiu a sua credibilidade
e perpetuação até aos dias de hoje. O conceito de termalismo evoluiu e, hoje em dia, faz parte de um conceito
bastante abrangente – o turismo de bem-estar, estando este último agregado ao turismo de saúde.
Isso mesmo reconheceu o Decreto-Lei n.º 142/2004, de 11 de Junho, segundo o qual «a atividade termal
está, histórica e umbilicalmente, ligada ao sector da saúde e à prestação de cuidados nesta área, o que tem
vindo a refletir-se na legislação que regula o sector há largos anos, com destaque para o ainda parcialmente
vigente Decreto n.º 15401, de 20 de Abril de 1928, que, para além de disciplinar a indústria de exploração de
águas, inclui também regras sobre a criação, organização e funcionamento dos estabelecimentos termais».
Acresce, aliás, que os estabelecimentos termais são unidades prestadoras de cuidados de saúde, sujeitos à
regulação da Entidade Reguladora da Saúde (ERS) e tutelados pelo Ministério da Saúde.
Presentemente, os estabelecimentos termais estão enquadrados pela Orientação n.º 31, da Direcção-Geral
de Saúde (estabelecimentos termais e COVID-19), que define os procedimentos a adotar na reabertura e
funcionamento em contexto COVID-19, enquanto instrumento adicional ao cumprimento das normas e
disposições legais vigentes.
Até ao momento, porém, a reabertura das termas não consta do plano de desconfinamento, estabelecido
pelo Governo. Com efeito, de acordo com o Decreto n.º 4/2021, de 13 de março, diploma que regulamenta o
estado de emergência decretado pelo Presidente da República, não é concedida às termas a permissão de
reabertura por integrarem o n.º 8 do anexo I, enquadrado pelo artigo 16.º, norma que se reporta ao
«Encerramento de instalações e estabelecimentos».
Verdade é, contudo, que no anexo I do referido decreto não consta a obrigatoriedade de encerramento de
outras tipologias de unidades prestadoras de cuidados de saúde integradas ou não na rede de prestação de
cuidados de saúde, independentemente da sua natureza jurídica, nem as entidades e estabelecimentos
prestadores de cuidados de saúde dos sectores social e privado, situação que gera uma inaceitável
desigualdade relativamente ao setor termal.
Assim, vem o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, nos termos da Constituição e do Regimento
da Assembleia da República, recomendar ao Governo que os estabelecimentos termais sejam incluídos no plano
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de desconfinamento, desde que salvaguardadas as condições de segurança estabelecidas pela Direção-Geral
da Saúde.
Palácio de São Bento, 19 de março de 2021.
Os Deputados do PSD: Adão Silva — Ricardo Baptista Leite — António Maló de Abreu — Hugo Patrício
Oliveira — Cláudia Bento — Alberto Machado — Rui Cristina — Sandra Pereira — Álvaro Almeida — Bruno
Coimbra — Pedro Alves — Fernanda Velez — Cristóvão Norte — Luís Leite Ramos — Artur Soveral Andrade.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1122/XIV/2.ª
PELA REALIZAÇÃO DE UM CONCURSO DE PROFESSORES QUE MELHOR RESPONDA ÀS
NECESSIDADES DE PESSOAL DOCENTE NAS ESCOLAS
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1123/XIV/2.ª
Exposição de motivos
O atual sistema educativo assiste a múltiplos problemas estruturais, muitos deles com origem no acesso e
no exercício da profissão docente.
A avançada idade média dos docentes, a diminuição de candidatos aos cursos com a via profissionalizante
no ensino, a instabilidade profissional agravada pela constante alteração das colocações, raramente próximo da
residência, resultam num desgaste profissional e exaustão emocional dos docentes, sem precedentes.
A enorme mobilidade docente, com prejuízo para os docentes e para o trabalho das escolas, não tem
merecido qualquer preocupação por parte do ministério, que tem resolvido questões estruturais com medidas
isoladas.
O PSD entende que os concursos de professores são já uma manta de retalhos que estão longe, muito longe,
de servir os professores e a educação, razão pela qual não pode compactuar com medidas avulsas e de
aparência, propostas por outros grupos parlamentares que sobrecarregariam todo o sistema de ainda mais
injustiças sem o benefício nem a dignificação dos docentes e da sua atividade.
O aviso de abertura n.º 4493-A/2021, publicado pela Direção-Geral da Administração Escolar, que
regulamenta o concurso de educadores de infância e de professores dos ensinos básico e secundário, é uma
dupla desilusão. Primeiro perde a oportunidade de encetar a adoção de medidas que aumentem a atratividade
da profissão docente e, segundo, agrava a condição profissional de muitos docentes.
Escudando-se no Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul (TCA do Sul), o Governo informou que
a partir do ano letivo 2021/2022, a colocação do pessoal docente dos quadros no concurso de mobilidade interna
(MI) seria efetuada apenas em horários completos.
É de realçar que um docente de QA/QE ou de QZP cumpre sempre um horário total de 35 horas de serviço
semanal, distribuídos entre componente letiva a componente não letiva de estabelecimento (apoio a alunos,
coadjuvação, tutorias, clubes, atividades do plano anual de atividades, cargos de gestão intermédia, direção de
turma, entre outros) e a componente não letiva de trabalho individual (preparação das aulas e da avaliação do
processo ensino-aprendizagem, a elaboração de estudos e trabalhos de investigação de natureza pedagógica
ou científico-pedagógica).
Apesar do Governo alegar uma adequada gestão de recursos humanos, este não a demonstra nem com
factos, nem com estudos credíveis a sua alegação.
No que respeita aos professores que se enquadram nos requisitos da «norma-travão», o Ministério da
Educação impõe que os docentes manifestem preferências pelo maior número de quadros de zona pedagógica
(QZP), de forma a garantir a sua colocação naquele concurso e nos quadros do Ministério da Educação. Caso
não cumpram o requisito e consequentemente não obtenham colocação, ficarão impedidos de celebrar qualquer
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contrato com o Ministério da Educação no ano letivo 2021/2022, deixando assim, professores sem escola e
escola sem professores.
O presente concurso reflete a ação governativa em matéria de educação nos últimos anos: modifica o
estritamente necessário, enganando problemas estruturais, evidenciando um trabalho amador e provisório,
comprometendo o futuro e o desenvolvimento das nossas crianças e jovens e, consequentemente do País.
Assim, relevando o acima referido e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o
Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata vem propor que a Assembleia da República recomende ao
Governo:
1 – Proceda às alterações indispensáveis no concurso de mobilidade interna que permitam que as
colocações se façam em horários completos e incompletos, respeitando a graduação profissional dos docentes
opositores ao concurso;
2 – Proceda, de acordo com o enquadramento legal, às alterações indispensáveis no concurso externo que
possibilite que todos os docentes não vinculados no concurso de educadores de infância e de professores do
ensino básico e secundário, sejam incluídos em todas as fases subsequentes durante o ano letivo 2021/2022.
Assembleia da República, 19 de março de 2021.
Os Deputados do PSD: Adão Silva — Luís Leite Ramos — Cláudia André — António Cunha — Alexandre
Poço — Carla Madureira — Maria Gabriela Fonseca — Ilídia Quadrado — Firmino Marques — José Cesário —
Duarte Marques — Emídio Guerreiro — Isabel Lopes — Margarida Balseiro Lopes — Maria Germana Rocha —
Hugo Martins de Carvalho — Pedro Alves.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1123/XIV/2.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE PROCEDA A UMA CAMPANHA QUE PROMOVA O CONSUMO
REGULAR DE FLORES E PLANTAS NATURAIS E QUE CRIE MECANISMOS DE APOIO A ESTA
ATIVIDADE
A COVID-19 atingiu de forma avassaladora os modos de vida, um pouco por todo o mundo, com
repercussões, não só ao nível da saúde, mas também em múltiplos setores da atividade económica.
Contudo, há setores que, apesar da gravidade da situação, continuaram a assegurar com regularidade e
eficiência as suas funções e, por isso mesmo, têm passado despercebidos: a atividade agrícola, pecuária e
agroindustrial – dos quais todos dependemos diariamente – tem demonstrado uma capacidade de resiliência
inigualável. A produção e o fornecimento alimentar, em quantidade e em qualidade, têm-se mostrado à altura
das necessidades, garantindo a procura de bens de consumo fundamentais, sejam frutas, legumes, carne, peixe,
laticínios, cereais e seus derivados, azeite e óleos alimentares ou vinho.
Pelo contrário, o setor das plantas e flores naturais, por não fornecerem bens essenciais, viu a sua procura
cair a pique e passando a registar quebras significativas na sua atividade, dado ter ficado sem procura para os
seus produtos. Esta atividade que vale por ano mais de 500 milhões de euros, que ocupa uma área superior a
1500 hectares, que tem mais de 1000 explorações dispersas por todo o país, que emprega mais de 3000
trabalhadores de forma permanente, necessita do relançamento da procura, mais do que medidas cirúrgicas de
apoio.
Assim, e ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados
apresentam o seguinte projeto de resolução.
A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do art.º 156.º da Constituição da República
Portuguesa, recomendar ao Governo que:
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1 – Proceda a uma campanha institucional que publicite a importância do setor das flores e plantas naturais
na economia nacional e que promova o consumo regular dos seus produtos;
2 – Crie mecanismos de apoio adequados à especificidade desta atividade económica.
Palácio de São Bento, 19 de março de 2021.
As Deputadas e os Deputados do PS: João Azevedo Castro — José Manuel Carpinteira — Francisco Rocha
— Ana Passos — Santinho Pacheco — Sofia Araújo — Francisco Pereira Oliveira — Clarisse Campos — Joana
Bento — Manuel dos Santos Afonso — João Miguel Nicolau — Olavo Câmara — Norberto Patinho — Sara Velez
— José Rui Cruz — Marta Freitas — Palmira Maciel — Cristina Sousa — Anabela Rodrigues — Romualda
Fernandes — Susana Correia — Lúcia Araújo Silva — Alexandra Tavares de Moura — Telma Guerreiro —
Hortense Martins — Cristina Mendes da Silva — Rita Borges Madeira — Nuno Fazenda — Sílvia Torres —
Susana Amador — Martina Jesus — Jorge Gomes — Filipe Pacheco — Vera Braz — Maria Joaquina Matos —
Pedro Sousa — João Paulo Pedrosa.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1124/XIV/2.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE DÊ CONTINUIDADE AO APOIO À PRODUÇÃO CULTURAL E À
CRIAÇÃO ARTÍSTICA COMO INSTRUMENTO DE DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO E DE
DIFERENCIAÇÃO TURÍSTICA DO ALGARVE
O desejo de cultura, assim como o desejo de viajar, é nos dias de hoje cada vez maior.
Sair da «nossa casa» e entrar na «casa do outro» parece ser a resposta à padronização das cidades por
efeito da globalização e da banalização das rotinas do quotidiano. A cultura e a criação artística como fatores
disruptivos da massificação dos produtos surge nos tempos modernos como um fator distintivo e capaz de tornar
um determinado território diferente do outro.
Esta é a razão pela qual a cultura constitui hoje um trunfo importante para o desenvolvimento turístico e o
principal elemento de singularidade para atrair a determinado espaço mais e novos visitantes. Dar a um destino
uma marca própria é sem dúvida um dos maiores fatores de competitividade e sucesso de uma determinada
região turística.
O Algarve, maior destino turístico português, tanto em número de camas, como em número de visitantes e
receitas, tem desde sempre no sol e na praia os seus maiores fatores de atração turística, mas ao longo dos
anos, fruto da concorrência internacional e do desejo de manter-se como um destino líder foi desenvolvendo
outros «produtos» e outras «experiências» turísticas.
O golfe, onde já é hoje considerado o melhor destino do mundo, a natureza e a observação de aves, tirando
partido do clima, da posição geográfica face a rotas migratórias e da existência de um conjunto de zonas
húmidas, ria Formosa, ria de Alvor, Sapal de Castro Marim, lagoa dos Salgados, Paúl de Lagos, entre outras,
de incontestável beleza e riqueza ao nível de biodiversidade, uma serra mediterrânea, cujos percursos pedestres
começam hoje a ser um potencial económico para as populações do interior da região e, claro, as atividades
ligadas ao mar, com especial relevo a náutica marítima de recreio, onde dispõe de quatro grandes marinas:
Vilamoura, Lagos, Portimão e Albufeira e vários portos de recreio desde Sagres a Vila Real de Santo António.
Paralelamente, o Algarve foi também pioneiro no desenvolvimento e promoção de um conjunto de eventos
de grande escala como meio alternativo e complementar de atrair visitantes durante um certo período de tempo.
São disso, exemplo maior, com carácter periódico e regular, o master de golfe e o Campeonato Mundial Equestre
de Saltos de Obstáculos, duas provas desportivas de dimensão internacional que se realizam no Algarve
ininterruptamente há 12 anos, assegurando visitantes numa época de menor procura.
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No último ano, é justo também assinalar dois outros eventos de grande impacto mundial, já anunciados
também para 2021, o Grande Prémio de Fórmula 1 e o Moto GP, que para além do público que podem atrair ao
Algarve para assistir às provas, asseguram uma visibilidade e uma posição internacional do Algarve em termos
concorrenciais de enorme relevância para a notoriedade turística da região e de Portugal.
Em conjunto com as autarquias, a Região de Turismo do Algarve e os hoteleiros da região, o Algarve foi ao
longo dos anos tentando complementar a sua oferta base com outras experiências designadamente também na
área cultural, ainda que se admita, com menor visibilidade e reconhecimento.
Seja porque desde o Estado Novo sempre se promoveu a ideia errada de que esta é uma região
culturalmente pobre e destituída de património, seja porque a criação de circuitos culturais, materiais e imateriais,
necessitam de tempo e persistência, a verdade é que a cultura e a criação artística nunca assumiram na região
todo o seu potencial, tanto do ponto de vista económico, como de afirmação de uma nova experiência turística,
contribuindo dessa forma para a diferenciação do produto «Algarve» também do ponto de vista cultural.
Apesar da Universidade do Algarve ministrar um reputado curso de artes visuais, com destacados artistas
plásticos portugueses no seu quadro docente, de que são exemplo Xana e Rui Sanches, e da região ser e ter
sido residência eleita de um notável elenco artístico, internacional e nacional, desde Patrick Swift, a Günter
Grass, de João Cutileiro, a Jorge Mealha, de Joaquim Bravo, a Pedro Cabrita Reis, passando por Rene Bertholo,
Cruzeiro Seixas, Cid dos Santos ou Costa Pinheiro, para além dos seus naturais, Manuel Baptista, Lídia Jorge,
Viviane, Domingos Caetano, William Junqueira, Gastão Cruz, Nuno Júdice, Rodrigo Gomes, Rúben Garcia,
Áurea, Carlos Guilherme, Ricardo Valentim, Mário Laginha, Dino D’Santiago, Henrique Ralheta, Rodrigo Rosa,
José Eduardo, Vanessa Barragão, Mariana Gomes, José Carlos Fernandes, entre tantos e tantos outros, na
verdade a cultura nunca conseguiu desenvolver todo o seu potencial económico, nem o destino turístico Algarve
conseguiu materializar esta vantagem concorrencial.
Nos anos oitenta a região do Algarve foi palco do Festival Internacional de Música, tendo ficado igualmente
celebres as digressões da Gulbenkian, a Bienal de Arte de Lagos ou a Galeria Trem em Faro. Com altos e
baixos, muito dependentes da interpretação de cada um dos 16 municípios da região a este tipo de iniciativas,
haveríamos no inicio do milénio de assistir à criação do ALLGARVE, cuja polémica com o nome acabaria por
diminuir, se não mesmo tornar irrelevante, o seu contributo para uma diferenciação cultural da região e mais
recentemente ao 365 Algarve, que à sua quarta edição acabou por ficar suspenso, como praticamente toda a
atividade económica da região, em virtude da pandemia COVID-19.
O balanço efetuado pela Universidade do Algarve a este programa que se desenvolve na época baixa e
privilegia os territórios do interior e de baixa densidade não pode deixar de merecer uma referência. 70% das
empresas de alojamento, restauração e animação turística já conhece ou ouviu falar do programa, tendo mesmo
recomendado eventos e classificando o mesmo em termos de desempenho entre «de acordo com as
expectativas» e «algo melhor do que esperavam». Ainda assim, o número de turistas não ultrapassa os 20% do
total de 377 mil espectadores no conjunto das três primeiras edições. O que nos permite concluir da necessidade
de aprofundar o modelo do programa e a sua interligação com o sector hoteleiro.
Ainda assim, apesar da intermitência de uma aposta na cultura e no seu potencial económico como
experiência turística, foram ficando estruturas organizadas, de que se destacam a ACTA – Companhia de Teatro
do Algarve, a Orquestra Clássica do Sul, a Orquestra de Jazz do Algarve, o LAC – Laboratório de Atividades
Criativas, a Associação 289 e um conjunto de empresas, associações e iniciativas particulares que se juntam a
uma rede de galerias, teatros e museus municipais que proporcionam um fértil terreno criativo na região que
através do município de Faro propõe-se ser Capital Europeia da Cultura em 2027.
Sendo reconhecido que o turismo é essencialmente cultural e que a criação artística e a cultura são fatores
de competitividade e de desenvolvimento económico, parece-nos claro que o Algarve, enquanto principal destino
turístico do País, deveria desenvolver uma estratégia continuada de forma a afirmar a cultura como experiência
de vivência agradável e entusiasmante para os seus visitantes e, não menos relevante, para os seus residentes.
Sabendo que turismo é cultura e que a cultura é economia, é lógico que os destinos turísticos de maior
sucesso são aqueles que conseguem diferenciar-se, nomeadamente, criando sinergias positivas entre a
indústria da cultura e a indústria do turismo.
Assim, ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados
apresentam o seguinte projeto de resolução.
Nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa, a Assembleia da República
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resolve recomendar ao Governo:
1 – Que o Governo continue a disponibilizar para a região do Algarve um programa de apoio à produção
cultural e à criação artística como instrumento de desenvolvimento económico e de diferenciação da maior região
turística do País,
1 – Que, em complemento ao programa previsto no número anterior, e dado o contexto de mitigação dos
impactos negativos sobre a atividade das empresas do tecido cultural decorrentes das medidas de proteção de
saúde pública de combate à pandemia COVID-19, se considere a criação de uma linha específica para as
empresas das regiões mais fortemente impactadas, onde se inclui o Algarve.
Palácio de São Bento, 19 de março de 2021.
As Deputadas e os Deputados do PS: Luís Graça — Jamila Madeira — Carlos Pereira — Hugo Costa —
Maria Joaquina Matos — Ana Passos — Francisco Pereira Oliveira — Cristina Sousa — Francisco Rocha —
Anabela Rodrigues — João Azevedo Castro — Clarisse Campos — Sofia Araújo — José Manuel Carpinteira —
Romualda Fernandes — Susana Correia — Lúcia Araújo Silva — Joana Bento — José Rui Cruz — Palmira
Maciel — Hortense Martins — Cristina Mendes da Silva — Rita Borges Madeira — Nuno Fazenda — Sílvia
Torres — Olavo Câmara — Susana Amador — Marta Freitas — João Miguel Nicolau — Martina Jesus — Jorge
Gomes —Vera Braz — Pedro Sousa — João Paulo Pedrosa.
———
PROJETO DE DELIBERAÇÃO N.º 12/XIV/2.ª
SOLICITA AO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO UM ESTUDO SOBRE OS IMPACTOS DA
PANDEMIA COVID-19 NAS COMUNIDADES EDUCATIVAS, DESIGNADAMENTE PELO AUMENTO DAS
DESIGUALDADES, E A NECESSÁRIA RESPOSTA EM TERMOS DE POLÍTICAS PÚBLICAS
Não é novidade que as desigualdades injustas, sejam resultantes da diferença de condição à nascença ou
sejam desenvolvidas durante a infância ou durante a vida adulta, estão, mais uma vez, a agravar-se com a crise
espoletada pela pandemia de COVID-19.
A criação e desenvolvimento da escola pública, universal e gratuita, tem vindo a constituir uma ferramenta
importante para avançar no combate à desigualdade e para tentar interromper a reprodução de desigualdades
sociais logo desde os primeiros anos de vida das crianças e durante a adolescência e juventude. Essa missão
de combate às desigualdades, se já antes dava sinais de necessidade de reforço, foi gravemente afetada pela
crise pandémica e pelas respetivas consequências sociais e económicas.
A pandemia, que vem afetando transversalmente vários setores da sociedade, tem um impacto alargado na
condição social e económica dos alunos e das suas famílias, desfavorecendo os que já eram mais
desfavorecidos, mas tem, também, um impacto específico na educação.
A solução adotada, em muitos países, como resposta às restrições ao funcionamento das escolas exigidas
pela pandemia, foi o recurso a um ensino à distância/não presencial. Como resposta à crise, deu-se um
acelerado processo de transformação digital da e na sociedade, passando muitas respostas pelo recurso aos
meios digitais – opção que se revela, em muitos dos casos, um sucedâneo e não um verdadeiro substituto.
A interrupção, mesmo quando parcial, das atividades presenciais nas escolas, ao impossibilitar a interação
direta em toda a sua riqueza, é referida como um fator de perturbação no processo de aprendizagem, pela sua
ocorrência abrupta e pela distância com possíveis efeitos na qualidade da relação educativa, que não existe
sem relação humana, importando aferir com mais profundidade estes efeitos percebidos por alunos,
encarregados de educação e professores.
Quando a desigualdade educativa se alimenta das desigualdades sociais anteriores e alimenta novas
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desigualdades sociais, com efeitos particularmente nefastos nas crianças, adolescentes e jovens, alguns
estudos, produzidos em Portugal e em outros países, têm sublinhado a gravidade destes impactos da pandemia
de COVID-19, a sua profundidade e a necessidade de os enfrentar na sua complexidade.
Importa, pois, partindo do conhecimento já produzido, identificar o mais claramente possível o que está a
acontecer efetivamente no mundo da educação no nosso País como efeito da pandemia e contribuir para
preparar a escola pública para as tarefas que essa realidade impõe às políticas públicas de educação.
Assim, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo
Parlamentar do Partido Socialista apresentam o seguinte projeto de deliberação:
A Assembleia da República delibera solicitar ao Conselho Nacional de Educação um estudo sobre os efeitos
da pandemia de COVID-19, bem como das consequências económicas e sociais das medidas tomadas para a
debelar, nas comunidades educativas no nosso País, em particular no que toca ao agravamento das
desigualdades educativas, e das desigualdades sociais e económicas que lhes estão associadas, estudo esse
que possa, ainda, contribuir, quer para o desenho de políticas públicas, designadamente políticas públicas de
educação, que respondam aos novos desafios originados pela pandemia, quer para uma melhor compreensão,
por parte de todos os parceiros relevantes, dos esforços a desenvolver para uma resposta coletiva a esses
novos desafios.
Palácio de São Bento, 19 de março de 2021.
As Deputadas e os Deputados do PS: Porfírio Silva — Tiago Estevão Martins — Miguel Matos — Carla Sousa
— Elza Pais — Maria Joaquina Matos — Maria Da Graça Reis — Alexandra Tavares De Moura — Cristina
Mendes da Silva — Martina Jesus — Sílvia Torres — Palmira Maciel — Fernando José — Telma Guerreiro —
Cristina Sousa — Francisco Rocha — Anabela Rodrigues — João Azevedo Castro — Clarisse Campos — Sofia
Araújo — José Manuel Carpinteira — Francisco Pereira Oliveira — Romualda Fernandes — Susana Correia —
Lúcia Araújo Silva — Joana Bento — José Rui Cruz — Ana Passos — Hortense Martins — Rita Borges Madeira
— Nuno Fazenda — Fernando Paulo Ferreira — Olavo Câmara — Susana Amador — Marta Freitas — João
Miguel Nicolau — Norberto Patinho — Jorge Gomes — Vera Braz — Rosário Gambôa — Paulo Porto — Pedro
Sousa — João Paulo Pedrosa.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.