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Sexta-feira, 26 de março de 2021 II Série-A — Número 105
XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)
S U M Á R I O
Decretos da Assembleia da República (n.os 125 e 126/XIV): (a) N.º 125/XIV — Cessa o regime de suspensão de prazos processuais e procedimentais adotado no âmbito da pandemia da doença COVID-19, alterando a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março. N.º 126/XIV — Altera o Estatuto dos Benefícios Fiscais, o Código do Imposto do Selo, o Código Fiscal do Investimento, o Código do Imposto Sobre os Veículos e o Código do Imposto Único de Circulação e cria uma medida extraordinária de contagem de prazos no âmbito do IRC. Resoluções: (a) — Aprova o Acordo Quadro entre a República Portuguesa e as Nações Unidas sobre Reuniões das Nações Unidas a ter lugar na República Portuguesa, assinado em Nova Iorque, em 11 de maio de 2020. — Recomenda ao Governo que estabeleça o programa nacional de apoio ao uso da bicicleta no ensino pré-escolar e que calendarize, orçamente e execute outras medidas que promovem a mobilidade ativa pedonal e ciclável. — Recomenda ao Governo que conclua com urgência o processo referente ao apoio à recuperação dos danos causados em infraestruturas municipais nos distritos de Aveiro, Braga, Castelo Branco, Coimbra, Guarda, Leiria,
Lisboa, Porto, Santarém, Viana do Castelo, Vila Real e Viseu pelas tempestades Elsa e Fabien ocorridas em 2019. Projetos de Lei (n.os 761 a 765/XIV/2.ª): N.º 761/XIV/2.ª (BE) — Determina a revisão do regime de recrutamento e mobilidade do pessoal docente dos ensinos básico e secundário. N.º 762/XIV/2.ª (BE) — Programa de vinculação dos docentes de técnicas especiais do ensino artístico especializado nas áreas das artes visuais e dos audiovisuais. N.º 763/XIV/2.ª (PCP) — Reforço dos direitos dos trabalhadores da saúde. N.º 764/XIV/2.ª (PAN) — Determina a obrigatoriedade da instalação de sistema de deteção de incêndio em explorações pecuárias, procedendo à quinta alteração ao Decreto-Lei n.º 220/2008, de 12 de novembro. N.º 765/XIV/2.ª (PCP) — Regula o regime de trabalho em teletrabalho. Projetos de Resolução (n.os 1143 e 1152 a 1160/XIV/2.ª): N.º 1143/XIV/2.ª (Por uma lei europeia do clima com metas ambiciosas): — Alteração do texto inicial do projeto de resolução. N.º 1152/XIV/2.ª (CH) — Recomenda ao Governo que autorize a atribuição do subsídio extraordinário de risco no
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combate à pandemia de COVID-19, também aos agentes das polícias municipais, acabando, desta forma, com a situação discriminatória que afeta estes profissionais. N.º 1153/XIV/2.ª (BE) — Massificar a testagem para controlar a pandemia. N.º 1154/XIV/2.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que incentive o desenvolvimento de novo modelo de máscaras transparentes certificadas e garanta o total acesso da comunidade surda aos serviços públicos no contexto COVID-19. N.º 1155/XIV/2.ª (PCP) — Valorização profissional, social e remuneratória dos trabalhadores da saúde. N.º 1156/XIV/2.ª (PCP) — Pelo reforço da estrutura de saúde
pública. N.º 1157/XIV/2.ª (PCP) — Programa gratuito de dispensa regular de autotestes domiciliários COVID-19. N.º 1158/XIV/2.ª (PCP) — Reforço da capacidade do Serviço Nacional de Saúde. N.º 1159/XIV/2.ª (PEV) — Pela necessidade de integrar a preservação da biodiversidade marinha nas obras de infraestruturas portuárias. N.º 1160/XIV/2.ª (PSD) — Pela promoção do conhecimento do património arqueológico em Portugal, pela sua valorização salvaguarda e preservação. (a) Publicados em Suplemento.
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PROJETO DE LEI N.º 761/XIV/2.ª DETERMINA A REVISÃO DO REGIME DE RECRUTAMENTO E MOBILIDADE DO PESSOAL DOCENTE
DOS ENSINOS BÁSICO E SECUNDÁRIO
Exposição de motivos
O regime dos concursos para educadores de infância e professores dos ensinos básico e secundário tem acumulado problemas, como as ultrapassagens e o desrespeito pela graduação profissional. À falta de abertura negocial dos Governos para soluções globais de valorização da carreira docente e de combate à precariedade somam-se revisões avulsas.
A abertura dos concursos para 2021/2022 (Aviso n.º 4493-A/2021) manteve todos os problemas acumulados de um regime que se transformou numa manta de retalhos, acrescentando alguns novos. Uma dessas alterações é o acesso à «norma travão», que permite que docentes que cumpram três anos de serviço em horário anual e completo abram uma vaga para vinculação. O Governo pretende obrigar estes precários a concorrer a todos os quadros de zona pedagógica (QZP), podendo ficar vinculados em qualquer ponto do país. A forma de o fazer é a ameaça de despedimento dos professores que não obtenham vaga e ficam, por força das novas regras, impedidos de ser contratados em 2021/2022.
A persistência e agravamento das injustiças para com a classe docente criam sérios problemas na escola pública. A falta de atratividade da carreira e o envelhecimento do corpo docente há muito que se faz notar na falta de professores em vários grupos de recrutamento. Todos os anos há escolas e turmas às quais faltam professores durante meses. Esses horários que ficam por preencher são imprescindíveis ao bom funcionamento das escolas. Há muitos anos que se tornou evidente que a falta de professores não é um problema pontual.
Sabemos também que a falta de professores está mais concentrada no sul e que há maior oferta de docentes a norte. É preciso tomar medidas positivas para incentivar a mobilidade territorial. O Bloco de Esquerda tem-se batido, ao longo dos anos, pela valorização da carreira docente. Recentemente, em setembro de 2020, o Bloco de Esquerda voltou a defender a criação de uma compensação aos professores deslocados. Os professores deslocados são prejudicados por terem de suportar os custos acrescidos de transporte e habitação resultantes da sua colocação longe de casa. Para responder a esse problema, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresentou o Projeto de Lei n.º 551/XIV/2.ª, que previa a criação do Regime de Compensação a Docentes Deslocados. Em janeiro de 2021, o PS, com o apoio do PSD, rejeitou este contributo para a resolução da falta de professores em várias regiões do País.
Outra vertente importante para a solução quer do problema de falta de professores, quer das condições de trabalho para os e as docentes é a redução da dimensão geográfica dos Quadros de Zona Pedagógica (QZP). O Governo comprometeu-se a «estudar o modelo de recrutamento e colocação de professores com vista à introdução de melhorias que garantam maior estabilidade do corpo docente, diminuindo a dimensão dos quadros de zona pedagógica» (Programa do XXII Governo Constitucional, p. 23). No entanto, o resultado prático dessa promessa está por conhecer.
Ao nível do combate à precariedade, em fevereiro de 2021, o Bloco de Esquerda apresentou o Projeto de Lei n.º 682/XIV/2.ª que cria um programa extraordinário de vinculação dos docentes. Essa vinculação dos professores precários é urgente. Além de ser uma injustiça para com os professores mantê-los anos a fio numa situação de precariedade laboral, a persistência desta situação contribui para o abandono da profissão. E o País não se pode dar ao luxo de continuar a perder professores.
Os professores precisam de regras justas, coerentes e estáveis. É urgente proceder a uma revisão do regime dos concursos para educadores de infância e professores dos ensinos básico e secundário. Quer professores contratados, quer professores do quadro, têm de gerir o seu percurso profissional e familiar de acordo com as regras vigentes. A expectativa de vincular em determinados quadros e a expectativa de mobilidade territorial são legítimas ao fim de vários anos de trabalho. O regime dos concursos precisa ser revisto como um todo. Essa revisão deve ser feita em negociação com as estruturas sindicais.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
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Artigo 1.º Objeto
A presente lei determina a abertura de um processo negocial com as estruturas sindicais para a revisão do
regime de recrutamento e mobilidade do pessoal docente dos ensinos básico e secundário estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de junho.
Artigo 2.º
Revisão do regime de recrutamento e mobilidade do pessoal docente dos ensinos básico e secundário
No prazo de 30 dias, o Governo inicia negociação com as estruturas sindicais para a revisão do regime de
recrutamento e mobilidade do pessoal docente dos ensinos básico e secundário de forma a garantir a valorização da carreira docente nos termos definidos no artigo 3.º da presente lei.
Artigo 3.º
Valorização da carreira docente A revisão do regime de recrutamento e mobilidade do pessoal docente dos ensinos básico e secundário
prevista na presente lei orienta-se pelos seguintes critérios: a) respeito pela graduação profissional e eliminação de ultrapassagens; b) vinculação de docentes contratados mais célere e sistemática; c) inclusão dos horários incompletos para efeitos de mobilidade interna; d) alteração dos intervalos horários; e) redução significativa da dimensão geográfica dos Quadros de Zona Pedagógica.
Artigo 4.º Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação. Assembleia da República, 26 de março de 2021.
As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Alexandra Vieira — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Jorge Costa — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.
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PROJETO DE LEI N.º 762/XIV/2.ª PROGRAMA DE VINCULAÇÃO DOS DOCENTES DE TÉCNICAS ESPECIAIS DO ENSINO ARTÍSTICO
ESPECIALIZADO NAS ÁREAS DAS ARTES VISUAIS E DOS AUDIOVISUAIS
Exposição de motivos
Em Portugal há duas escolas públicas de ensino artístico especializado no âmbito das artes visuais e dos audiovisuais: a Escola Artística António Arroio, em Lisboa, e a Escola Artística Soares dos Reis, no Porto.
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Ao longo de décadas, estas escolas têm vindo a desempenhar um papel relevante na formação artística de centenas de jovens e adultos em diferentes áreas de expressão. Destacam-se por duas razões: estão na vanguarda das técnicas mais arrojadas e, em simultâneo, são baluartes para a preservação das técnicas nas suas formas tradicionais, como por exemplo, a fotografia analógica, a serigrafia, a tipografia, entre outras.
Os cursos têm por base a disciplina de Projeto e Tecnologias e outras disciplinas que são comuns, como Gestão das Artes, Imagem e Som e Teoria do Design. Estas áreas estão organizadas em quatro cursos:
Comunicação Audiovisual — Cinema/Vídeo, Fotografia, Multimédia e Som Design de Comunicação — Design Gráfico e Design Multimédia Design de Produto — Equipamento, Cerâmica, Ourivesaria e Têxteis Produção Artística — Cerâmica, Gravura/Serigrafia, Ourivesaria, Pintura Decorativa, Realização Plástica do
Espetáculo e Têxteis. O trabalho de qualidade desenvolvido depende em grande medida do empenho profissional dos docentes
contratados de Técnicas Especiais que desenvolvem um trabalho de qualidade. Estes docentes são uma necessidade permanente da escola pública, porém a sua situação profissional
permanece precária, embora muitos destes professores tenham mais de três contratos sucessivos com horário completo.
A sua vinculação tem dependido de processos extraordinários, tais como os que aconteceram para os anos letivos de 2014-2015 e de 2018-2019. Cerca de 30 professores das Técnicas Especiais puderam ser oponentes ao concurso interno juntamente com várias centenas de professores de música e de dança em 2018. Após este concurso, foi criado um concurso ordinário, mas apenas para os professores de música e de dança.
Desde então, não voltou a realizar-se mais nenhum concurso extraordinário para os docentes da Técnicas Especiais desde então. Verifica-se, assim, uma dupla injustiça, de pendor discriminatório e que impede a vinculação destes professores.
Essa dupla injustiça resulta no facto de, no momento atual, existirem 40 docentes das Técnicas Especiais para os quais não foi previsto o concurso ordinário nem voltou a haver um concurso extraordinário. Refira-se que estes professores e professoras reúnem todas as condições que lhes permite serem oponentes a concurso e acederem à vinculação, tais como 3 ou mais contratos sucessivos, com horário completo e foram reconduzidos nos últimos 3 anos letivos. Uns fizeram a profissionalização em exercício, quase todos incrementaram as suas qualificações académicas com mestrados e doutoramentos, e todos realizaram a avaliação de desempenho docente.
Em 2018, a situação extraordinária criada pelo Ministério da Educação deveu-se ao facto de a própria União Europeia ter recomendado a resolução da precariedade dos professores portugueses, em particular do ensino artístico, no âmbito de uma ação de promoção do emprego e do combate à precariedade, embaraçando o Estado português e o Ministério da Educação, ele próprio promotor de precariedade. Foram integrados por esta via os professores de música e de dança, assim como os docentes do Ensino Artístico Especializado das Artes Visuais e dos Audiovisuais. Este foi o último concurso extraordinário de vinculação destes docentes.
Estes docentes são uma necessidade permanente da Escola Pública, porém a sua situação profissional permanece precária e a sua vinculação depende, no imediato, da abertura de concursos de vinculação extraordinária. Esse deve ser o primeiro passo de um programa de vinculação que vise, mediante negociação sindical, criar um regime específico de seleção e recrutamento de docentes do ensino artístico especializado nas áreas das artes visuais e dos audiovisuais.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º Objeto
A presente lei cria um programa de vinculação de docentes de técnicas especiais do ensino artístico
especializado nas áreas das artes visuais e dos audiovisuais dos estabelecimentos públicos de ensino.
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Artigo 2.º Programa de vinculação de docentes de técnicas especiais do ensino artístico especializado nas
áreas das artes visuais e dos audiovisuais 1 – Nos trinta dias subsequentes à publicação da presente lei, é aberto um procedimento concursal para a
vinculação extraordinária de docentes do ensino artístico especializado nas áreas das artes visuais e dos audiovisuais, nos estabelecimentos públicos de ensino.
2 – O procedimento concursal previsto no número anterior cumpre os seguintes critérios: a) o número de vagas a abrir tem em conta as necessidades permanentes identificadas pelas escolas; b) sem prejuízo do critério anterior, todos os docentes do ensino artístico especializado nas áreas das artes
visuais e dos audiovisuais que tenham mais de três contratos sucessivos em horários anuais e completos são automaticamente vinculados.
3 – A dotação de vagas a preencher, de acordo com o previsto nos números anteriores, é fixada por portaria
do membro do Governo responsável pela área da educação. 4 – Para efeitos do previsto no presente nos números anteriores é aplicável o disposto no artigo 9.º do
Decreto-Lei n.º 15/2018, de 3 de julho, que aprovou o regime específico de seleção e recrutamento de docentes do ensino artístico especializado da música e da dança.
5 – Até ao final do ano letivo de 2020/21, é aberto um processo negocial com as estruturas sindicais para a criação de um regime específico de seleção e recrutamento de docentes do ensino artístico especializado nas áreas das artes visuais e dos audiovisuais.
Artigo 3.º
Regime transitório Até à entrada em vigor do regime específico de seleção e recrutamento de docentes do ensino artístico
especializado nas áreas das artes visuais e dos audiovisuais, é aplicável, com as devidas adaptações, o anexo a que se refere o n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 15/2018, de 3 de julho, que aprovou o regime específico de seleção e recrutamento de docentes do ensino artístico especializado da música e da dança.
Artigo 4.º
Regulamentação A presente lei é regulamentada pelo Governo, mediante negociação sindical, no prazo de 30 dias contados
a partir da data da sua publicação.
Artigo 5.º Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação. Assembleia da República, 26 de março de 2021.
As Deputadas e os Deputados do BE: Alexandra Vieira — Joana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Jorge Costa — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.
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PROJETO DE LEI N.º 763/XIV/2.ª REFORÇO DOS DIREITOS DOS TRABALHADORES DA SAÚDE
Exposição de motivos
Um ano depois da epidemia do SARS-CoV-2, há duas lições que podemos desde já tirar: a importância do Serviço Nacional de Saúde (SNS) público, geral e universal, assumindo-se como a solução adequada para prestar os cuidados de saúde a todos os cidadãos, não obstante as o desinvestimento de que tem sido alvo por parte de sucessivos Governos; e a importância dos trabalhadores da saúde no garante da prestação de cuidados de saúde.
Sujeitos a elevados ritmos de trabalho, em situação de cansaço extremo, os trabalhadores da saúde tiveram o reconhecimento da população em geral. É justo e é legítimo que o reconhecimento do País ao seu desempenho se traduza na melhoria das suas condições de trabalho, no reforço dos seus direitos e na sua valorização profissional.
Dada a carência de profissionais de saúde o SNS, o Governo procedeu à contratação de mais profissionais, muito embora ainda não sejam suficientes face às exigências que se colocam no SNS seja no combate à epidemia da COVID-19, seja na recuperação da atividade assistencial nos cuidados de saúde primários e nos cuidados hospitalares.
No ano de 2020 o Governo procedeu à contratação de trabalhadores com contratos de trabalho a termo por períodos de quatro meses, renovável por mais quatro meses, e somente quem perfaça oito meses de contrato até 31 de março de 2021, tem possibilidade de ser integrado no serviço, através de um vínculo permanente. No ano de 2021 as contratações de trabalhadores são feitas com base em de contrato de trabalho a termo incerto. Não garantido desta forma o Governo, as necessárias condições de estabilidade no trabalho a estes trabalhadores.
Para além disto o Governo não garante igualmente a vinculação dos trabalhadores que foram contratados após 1 de agosto de 2020, o que é inaceitável, quando todos estes trabalhadores desempenham funções permanentes e são necessários para assegurar o funcionamento dos serviços não só em tempos de epidemia, mas também na recuperação de todos os atrasos na prestação de cuidados, portanto estes trabalhadores não podem ser despedidos e devem ser integrados nos estabelecimentos do SNS.
Por exemplo, quanto aos enfermeiros, dos 1295 contratados até 31 de julho de 2020, somente cerca de 600 foram vinculados; a partir de 1 de agosto foram contratados 2010 enfermeiros cujo contrato termina após 31 de março de 2021, pelo que se não forem tomadas medidas serão despedidos e em 2021 foram contratados até ao final do mês de fevereiro 322 enfermeiros com contratos a termo incerto, sem qualquer estabilidade.
O SNS e o País precisam que todos os trabalhadores da saúde, que desempenham funções permanentes, que tenham sido contratados antes da epidemia, no âmbito das medidas excecionais de combate à epidemia ou com contratos de substituição sejam vinculados nos respetivos estabelecimentos de saúde com contrato de trabalho por tempo indeterminado ou sem termo, consoante o caso, vendo reconhecido o tempo de serviço prestado para efeitos de posicionamento remuneratório.
Por outro lado, há uma injustiça que persiste e que urge resolver que se prende com a não contabilização de todos os pontos para efeitos de alteração de posicionamento remuneratório. Os trabalhadores que por via da atualização salarial, viram os seus pontos para trás não serem contabilizados para efeito de alteração de posicionamento remuneratório. Essa atualização foi considerada como tendo progredido na carreira, quando não foi disso que se tratou, mas tão somente de corrigir situações de injustiça salarial.
São exemplo disto aos enfermeiros que auferiam um salário inferior a 1201,48 euros, e que por este motivo perderam os pontos referente aos anos anteriores ao ajustamento remuneratório, passando a auferir o salário base da carreira; ou os assistentes operacionais, que perderam os pontos porque alteraram o seu posicionamento remuneratório em consequência do aumento do salário mínimo nacional.
Defendemos que todos os pontos devem ser contabilizados para efeitos de alteração do posicionamento remuneratório, reconhecendo os anos de trabalho prestado.
Propomos ainda a aplicação do horário de trabalho de 35 horas por semana e de sete horas por dia, a todos os trabalhadores da saúde, que independentemente da modalidade contratual, vínculo, carreira ou profissão
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desempenham funções em estabelecimentos que integram o SNS, sem qualquer perda de remuneração. Com o presente projeto de lei, o PCP propõe medidas concretas que reforçam os direitos dos trabalhadores
da saúde, resolvendo alguns dos problemas que persistem no SNS, assegurando um vínculo efetivo a todos, considerando que todo o trabalho prestado é considerado através da contabilização dos pontos para efeitos de alteração de posicionamento remuneratório e consagrando a aplicação do horário de trabalho de 35 horas.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º Objeto
A presente lei estabelece medidas de reforço dos direitos dos trabalhadores da saúde.
Artigo 2.º Âmbito
1 – A presente lei aplica-se a todos os trabalhadores que desempenham funções nos órgãos, organismos,
serviços e demais entidades do SNS, incluindo o setor público empresarial do Ministério da Saúde. 2 – São abrangidos pela presente lei todos os trabalhadores, independentemente da modalidade contratual,
carreiras e profissões, designadamente médicos, enfermeiros, técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica, técnicos superiores de saúde, assistentes técnicos, assistentes operacionais, e outros igualmente considerados nos termos do n.º 1.
Artigo 3.º
Conversão de Contratos de Trabalho 1 – Os contratos de trabalho celebrados com trabalhadores no âmbito das medidas excecionais e temporárias
de resposta à epidemia SARS-CoV-2 são convertidos em contratos de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado ou sem termo, dispensando a autorização de membros do Governo.
2 – A conversão prevista no n.º 1 abrange os trabalhadores com vínculo precário, contratados em momento anterior à epidemia SARS-CoV-2 que respondam a necessidades permanentes e não possuam o adequado vínculo jurídico, assim como os trabalhadores contratados com contratos de substituição.
3 – Quando a conversão do vínculo laboral prevista nos números anteriores depender da realização de concurso, os trabalhadores referidos nos números anteriores são automaticamente considerados opositores ao concurso e o procedimento concursal é realizado por cada serviço ou entidade com a abertura de vagas em número correspondente.
4 – Nos serviços ou estabelecimentos de saúde cujos mapas de pessoal não disponham de vagas não ocupadas suficientes, são automaticamente aditadas o número de vagas necessário para corresponder às necessidades permanentes identificadas, estando dispensados de autorização do membro do Governo.
5 – No caso de os contratos de trabalho cessarem entretanto, estes são automaticamente prorrogados até à conversão do contrato de trabalho para termo indeterminado ou sem termo, consoante o caso.
Artigo 4.º
Tempo de serviço 1 – No âmbito da conversão dos vínculos laborais previsto no artigo anterior o tempo de serviço decorrido
desde a celebração de contrato inicial, independentemente da modalidade contratual, releva sempre para efeitos de desenvolvimento da carreira, designadamente para efeito de alteração de posicionamento remuneratório.
2 – Para efeitos de alteração de posicionamento remuneratório dos trabalhadores referidos no número anterior, na ausência de avaliação de desempenho deve ser atribuído um ponto por cada ano de serviço não avaliado.
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3 – O tempo de exercício de funções na situação que deu origem ao processo de regularização extraordinária releva para efeitos de carreira contributiva, na medida dos descontos efetuados.
Artigo 5.º
Contagem dos Pontos para efeitos de descongelamento das carreiras 1 – Os trabalhadores que tenham sido alvo de alteração do posicionamento remuneratório, de categoria ou
de carreira, independentemente da respetiva causa ou fundamento, e da qual tenha resultado o reposicionamento remuneratório, designadamente por via de transição de carreira ou por via da atualização da base remuneratória da TRU da Administração Pública, estabelecida no Decreto-Lei n.º 29/2019, de 20 de fevereiro, mantêm os pontos detidos no momento do reposicionamento, assim como as correspondentes menções qualitativas de avaliação do desempenho, que relevam para efeitos de futura alteração do posicionamento remuneratório.
2 – O disposto no número anterior é também aplicável aos trabalhadores da Administração Pública com contrato de trabalho nos termos do Código do Trabalho, incluindo aqueles que tenham tido alteração do posicionamento remuneratório por via de equiparação remuneratória aos trabalhadores em funções públicas da mesma categoria profissional.
3 – Para efeitos do disposto no presente artigo os pontos e respetivas menções qualitativas que os trabalhadores detinham no momento do reposicionamento remuneratório são adicionados aos pontos detidos à data da entrada em vigor da presente lei e considerados para futura alteração do posicionamento remuneratório.
4 – A contabilização de pontos, no âmbito do artigo 18.º da Lei do Orçamento do Estado para 2018, aos trabalhadores com contrato de trabalho nos termos do Código do Trabalho, é igual, para todos os efeitos legais, incluindo a alteração do correspondente posicionamento remuneratório, à contabilização de pontos dos trabalhadores da Administração Pública com contrato de trabalho em funções públicas, retroagindo essa contabilização ao ano de 2004.
Artigo 6.º
Horário de Trabalho 1 – O período normal de trabalho, em regra, de 7 horas por dia e 35 horas por semana é aplicado a todos os
trabalhadores da saúde, independentemente da modalidade contratual, carreiras e profissões. 2 – Do disposto no número anterior não podem resultar para os trabalhadores alterações laborais
desfavoráveis, nomeadamente diminuição da retribuição.
Artigo 7.º Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação. Assembleia da República, 26 de março de 2021.
Os Deputados do PCP: Paula Santos — João Dias — João Oliveira — António Filipe — Jerónimo de Sousa — Ana Mesquita — Alma Rivera — Bruno Dias — Diana Ferreira — Duarte Alves.
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PROJETO DE LEI N.º 764/XIV/2.ª DETERMINA A OBRIGATORIEDADE DA INSTALAÇÃO DE SISTEMA DE DETEÇÃO DE INCÊNDIO EM
EXPLORAÇÕES PECUÁRIAS, PROCEDENDO À QUINTA ALTERAÇÃO AO DECRETO-LEI N.º 220/2008, DE 12 DE NOVEMBRO
Nos últimos anos temos sido confrontados com inúmeros casos de incêndios em explorações pecuárias que resultaram na morte de milhares de animais carbonizados.
Só neste ano de 2021 já morreram mais de 5000 animais carbonizados em explorações pecuárias na sequência de incêndios com origem desconhecida. Um dos casos ocorreu na madrugada de 14 de março numa exploração pecuária do concelho de Montemor-o-Novo, onde cerca de 1400 leitões morreram num incêndio de grandes dimensões.
Dois dias depois, um novo incêndio num aviário no concelho de Oliveira de Frades, matou cerca de quatro mil pintos que estavam no seu interior.
Estes casos surgem na sequência de outros que têm sido noticiados na imprensa. Em 2019 num caso semelhante morreram mais de 1000 leitões e porcos numa suinicultura do concelho do Cartaxo na sequência de um incêndio que teve origem na zona da maternidade da exploração pecuária.
Apesar da frequência com que ocorrem incêndios neste tipo de explorações, a legislação atual, nomeadamente o Decreto-Lei n.º 224/2015, de 9 de outubro, que procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 220/2008, de 12 de novembro, que estabelece o regime jurídico da segurança contra incêndio em edifícios, bem como a legislação especial aplicável às instalações destinadas à exploração pecuária, não inclui este tipo de exploração apesar dos riscos que estes apresentam em matéria.
A legislação deve ter em conta preocupações com o nível de risco de incêndio do local onde é implementada a exploração, mas também deve prever os riscos de incêndio no interior das próprias explorações, assegurando a segurança dos funcionários e dos animais.
A ocorrência destes incêndios, com os prejuízos que causam nas explorações e os milhares de animais que já vitimaram, revelam um problema que deve merecer a nossa atenção e preocupação, assegurando melhores condições de segurança que previnam acidentes deste tipo no futuro com a instalação de sistemas de deteção de incêndio e sensores de fumo nas explorações pecuárias.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PAN apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º Objeto
A presente lei determina a obrigatoriedade da instalação de sistema de deteção de incêndio em explorações
pecuárias, procedendo para o efeito à quinta alteração ao Decreto-lei n.º 220/2008, de 12 de novembro, alterado pelos Decretos-Leis n.os 224/2015, de 9 de outubro, e 95/2019, de 18 de julho, pela Lei n.º 123/2019, de 18 de outubro, e pelo Decreto-Lei n.º 9/2021, de 29 de janeiro, que estabelece o regime jurídico da segurança contra incêndio em edifícios.
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-lei n.º 220/2008, de 12 de novembro É alterado o artigo 3.º do Decreto-lei n.º 220/2008, de 12 de novembro, na sua redação atual, que passa a
ter a seguinte redação:
«Artigo 3.º […]
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a) ............................................................................................................................................................... ; b) ............................................................................................................................................................... ; c) ............................................................................................................................................................... ; d) ............................................................................................................................................................... ; e) ............................................................................................................................................................... ; f) ................................................................................................................................................................ ; g) ............................................................................................................................................................... ; h) ............................................................................................................................................................... ; i) As instalações pecuárias e suiniculturas. 2 – ............................................................................................................................................................ . 3 – ............................................................................................................................................................ . 4 – ............................................................................................................................................................ . 5 – ............................................................................................................................................................ . 6 – ............................................................................................................................................................ .
Artigo 8.º […]
1 – ............................................................................................................................................................ : a) .............................................................................................................................................................. ; b) .............................................................................................................................................................. ; c) .............................................................................................................................................................. ; d) .............................................................................................................................................................. ; e) .............................................................................................................................................................. ; f) ............................................................................................................................................................... ; g) .............................................................................................................................................................. ; h) .............................................................................................................................................................. ; i) ............................................................................................................................................................... ; j) ............................................................................................................................................................... ; k) .............................................................................................................................................................. ; l) ............................................................................................................................................................... ; m) Tipo XII «instalações pecuárias» corresponde a edifícios, grupos de edifícios, partes de edifícios,
pavilhões, instalações similares ou outro local, podendo incluir zona não completamente fechada ou coberta, ou instalações móveis e recintos ao ar livre, que não recebendo habitualmente público, destinados ao exercício de atividades pecuárias, onde os animais se encontram mantidos.
2 – ............................................................................................................................................................ .»
Artigo 3.º Regime Transitório
1 – A presente lei aplica-se aos procedimentos de controlo prévio das operações urbanísticas de reabilitação
de instalações pecuárias e suiniculturas pendentes à data de entrada em vigor da presente lei. 2 – As instalações pecuárias e suiniculturas já existentes dispõem de um prazo de um ano após a entrada
da presente lei para proceder à implementação de sistemas de segurança contra incêndios. 3 – As novas instalações pecuárias e suiniculturas estão obrigatoriamente sujeitas ao regime de segurança
contra incêndio, devendo para o efeito proceder à instalação nos recintos de produtos e equipamentos com os requisitos essenciais legalmente previstos tendentes a garantir a segurança contra incêndios e ainda a existência de planos de contingência que para além das pessoas, inclua os animais.
4 – No prazo de 90 dias após a entrada em vigor da presente lei, o Governo procede à aprovação da
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regulamentação do disposto no número anterior.
Artigo 4.º Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no primeiro dia do mês seguinte ao da sua publicação. Assembleia da República, 26 de março de 2021.
O Deputado e as Deputadas do PAN: André Silva — Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real.
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PROJETO DE LEI N.º 765/XIV/2.ª REGULA O REGIME DE TRABALHO EM TELETRABALHO
Exposição de motivos
O desenvolvimento científico e tecnológico é uma realidade com incidência em todos os planos da vida e da sociedade, e também no trabalho. Ele pode servir os trabalhadores ou, no quadro da sua apropriação pelo capital, ser posto ao serviço do seu objetivo de agravamento da exploração e de ataque aos direitos dos trabalhadores.
Sabemos que hoje com a crescente automação do processo produtivo que alia, nomeadamente, inteligência artificial e computação a organização do trabalho permite, em muitas situações, a separação física em diversas das unidades de produção de componentes, fora do mesmo espaço e até do mesmo país, dissociadas da unidade de produção que finaliza um determinado produto.
Sabemos também que a informática e o processo de digitalização de muitas atividades desmaterializaram a base de informação para o trabalho e abriram a possibilidade de uma separação física, presencial, do local a partir do qual se opera essa informação.
O grau de informatização nos processos produtivos, máquinas e equipamento tornam possível também a sua manutenção e mesmo manejo à distância.
A cada vez maior capacidade e velocidade de comunicação a partir das redes eletrónicas permite tecnicamente que, mesmo com separação física de centenas ou milhares de quilómetros, as condições de acesso não sejam muito diferentes das que tem quem acede, por via do mesmo tipo de redes, a escassas dezenas de metros.
É neste contexto que é referido o teletrabalho. No entanto, no conceito de teletrabalho misturam-se realidades muito diferentes: trabalho à distância em instalações da empresa; o trabalho à distância em espaço comum a várias empresas e o trabalho a partir da residência dos trabalhadores que é, afinal, o que pretende ser promovido e endeusado.
Para o PCP não está em causa o aproveitamento das novas tecnologias ao serviço do desenvolvimento e da melhoria das condições de trabalho e de vida. O que está em causa, como várias vezes a vida tem demonstrado, é o aproveitamento por parte do grande capital, para criar ilusões e fragilizar os trabalhadores ou reduzir direitos.
O atual contexto epidémico favoreceu uma mais larga utilização de formas de teletrabalho a partir de casa, facto que alguns pretendem aproveitar para uma generalização acrítica, promovendo ilusões sobre vantagens para os trabalhadores e omitindo-se as consequências negativas, que aliás este período claramente evidenciou.
São muitos os riscos de perda, atropelo de direitos e consequências negativas para os trabalhadores em teletrabalho designadamente:
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• Pressão para alargamento de horários, ritmos de trabalho, disponibilidades permanentes, com a dificuldade acrescida de definir, controlar e fiscalizar os tempos de trabalho;
• Transferência para os trabalhadores de custos de instalações, sua manutenção e acomodação, comunicações, água, eletricidade, consumíveis e material de escritório, bem como a pressão para o uso de instrumentos de trabalho do trabalhador ao serviço da empresa;
• Invasão da privacidade e intimidade da vida dos trabalhadores, confusão entre o espaço de trabalho, o espaço familiar, o espaço pessoal e privado;
• Fazer caminho para acabar com componentes da remuneração dos trabalhadores, no imediato ou a prazo – como o subsídio de refeição, de transportes e outros, que estejam relacionados com a deslocação para o local de trabalho;
• Desresponsabilização das questões de segurança e saúde no trabalho e da prevenção de acidentes de trabalho e doenças profissionais, estabelecendo a confusão entre o que é esfera privada e individual e a que é do trabalho em condições de teletrabalho, para fugir às responsabilidades que cabem às empresas, num quadro em que se potencia o desenvolvimento e agravamento de doenças do foro psicossocial resultantes do isolamento e da solidão, bem como da não diferenciação do ambiente do trabalho e da residência;
• Separação física e maior isolamento dos trabalhadores uns dos outros, em seu prejuízo, negando a possibilidade de partilha de experiências e conhecimentos que favorecem o seu desenvolvimento profissional e pessoal, com a promoção da fragilização (se não mesmo uma rutura) na construção de laços de sociabilização e de afirmação de espaços de solidariedade coletiva, com impactos negativos no esclarecimento, na unidade, na organização e na luta dos trabalhadores.
Para o PCP é claro que os trabalhadores em teletrabalho têm de ter os mesmos direitos e segurança no
trabalho que os restantes trabalhadores, conforme prevê o Código do Trabalho. Também nos parece evidente que a entidade empregadora tem a obrigação de criar as condições de trabalho
que protejam o trabalhador das implicações do trabalho em visor, designadamente com observância a pausas, ergonomia e características técnicas do material, atenção especial na saúde.
Mas num momento em que o teletrabalho está imposto, em que há empresas que, de forma oportunista, pretendem tornar definitiva uma realidade transitória e temporária por força da situação sanitária, impondo aos seus trabalhadores o teletrabalho de forma permanente (como fez a seguradora Liberty, recentemente) e aproveitando o teletrabalho para atropelar e retirar direitos, o PCP apresenta propostas que fixam e garantem os direitos dos trabalhadores abrangidos pelo teletrabalho:
• Propomos que seja fixado um valor de ajudas de custo para compensar o trabalhador pelos gastos
acrescidos, nomeadamente, com comunicações, eletricidade, água, entre outros, rejeitando que as responsabilidades da entidade patronal sejam transferidas para os trabalhadores;
• Garantimos que os instrumentos de trabalho respeitantes a tecnologias de informação e de comunicação, o economato, equipamentos de trabalho como cadeira, secretária e demais mobiliário afeto à atividade laboral, sua instalação e acomodação, bem como todos instrumentos e equipamentos utilizados pelo trabalhador no local de trabalho são fornecidos pela entidade patronal, cabendo a esta arranjos e manutenção dos mesmos;
• Garantimos que um trabalhador em teletrabalho tem um posto de trabalho seu na empresa, rejeitando a ideia de que a casa do trabalhador seja um posto de trabalho ou local de trabalho – casa, habitação, espaço familiar são da esfera privada do trabalhador, não podendo ser encaradas ou definidas como uma «extensão» da empresa;
• Garantimos a possibilidade de, a qualquer momento, o trabalhador poder regressar ao posto de trabalho na sua empresa, assegurando a preservação de uma lógica temporária e transitória do trabalho a partir do domicílio;
• Garantimos que o trabalhador tem o poder de rejeitar a proposta de teletrabalho, quando considere que não estão reunidas as condições para que preste a sua atividade com dignidade, privacidade e respeito pelas condições de segurança e saúde no trabalho.
O PCP, rejeitando a transformação do domicílio do trabalhador num local de trabalho da empresa e a
generalização do teletrabalho como uma panaceia para todos os males, não abdica de intervir e apresentar
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propostas que salvaguardem os direitos dos trabalhadores em situação de teletrabalho. Nestes termos e ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º e da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, os
Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º Objeto
A presente lei procede à décima sexta alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprovou o Código
do Trabalho, com vista à garantia dos direitos dos trabalhadores em regime de teletrabalho.
Artigo 2.º Alteração ao anexo da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprova a revisão do Código do
Trabalho Os artigos 166.º, 167.º, 168.º, 169.º e 170.º do anexo à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, com as alterações
introduzidas pela Lei n.º 105/2009, de 14 de setembro, Lei n.º 53/2011, de 14 de outubro, Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, Lei n.º 47/2012, de 29 de agosto, Lei n.º 69/2013, de 30 de agosto, Lei n.º 27/2014, de 8 de maio, Lei n.º 55/2014, de 25 de agosto, Lei n.º 8/2015, de 14 de abril, Lei n.º 120/2015, de 1 de setembro, Lei n.º 8/2016, de 1 de abril, Lei n.º 8/2016, de 23 de agosto, Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, Lei n.º 14/2018, de 19 de março, Lei n.º 90/2019, de 4 de setembro, e Lei n.º 93/2019, de 4 de setembro, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 166.º
Regime de teletrabalho 1 – O trabalhador pode excecionalmente exercer a atividade em regime de teletrabalho mediante a
celebração de acordo com a entidade empregadora. 2 – ............................................................................................................................................................ . 3 – ............................................................................................................................................................ . 4 – ............................................................................................................................................................ . 5 – O acordo está, obrigatoriamente, sujeito a forma escrita e deve conter: a) ............................................................................................................................................................... ; b) Indicação da atividade a prestar pelo trabalhador, com menção expressa do regime de teletrabalho, o
instrumento de regulamentação coletiva de trabalho aplicável, a retribuição, incluindo o subsídio de refeição e demais valores a pagar nos termos da alínea f);
c) Indicação do período normal de trabalho, bem como, do horário de trabalho diário e semanal; d) O período previsto para a prestação de trabalho em regime de teletrabalho, após o qual o trabalhador
regressa ao seu local e posto de trabalho; e) A identificação dos instrumentos de trabalho, todos da propriedade da entidade empregadora,
conforme previsto no artigo 168.º; f) (Novo) Valor a pagar, mensalmente, pela entidade empregadora a título de abono de ajudas de
custo por conta do acréscimo de despesas realizadas ou a realizar, nomeadamente, com os consumos de água, eletricidade, Internet e telefone;
g) [Anterior alínea f).] 6 – Na prestação de trabalho, em regime de teletrabalho, o horário de trabalho não se pode iniciar
antes das 8 horas e terminar depois das 19 horas. 7 – ............................................................................................................................................................ . 8 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto nos n.os 3 e 5 e constitui contraordenação
leve a violação do disposto no n.º 4.
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Artigo 167.º Duração do teletrabalho
1 –A duração inicial do acordo para prestação de trabalho em regime de teletrabalho não pode
exceder três anos,podendo, este período, ter a duração até cinco anos quando estabelecido em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
2 – Qualquer das partes pode fazer cessar, a todo o tempo, o acordo referido no número anterior. 3 – Cessando o acordo para prestação de trabalho em regime de teletrabalho, o trabalhador retoma a
prestação de trabalho, no local e posto de trabalho definido no contrato de trabalho. 4 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto no número anterior.
Artigo 168.º Instrumentos de trabalho e pagamento de despesas em regime de teletrabalho
1 – Os instrumentos de trabalho respeitantes a tecnologias de informação e de comunicação,
economato e qualquer instrumento ou mobiliário eventualmente necessário, pertencem ao empregador e são por este cedidos, devendo ainda assegurar a instalação e manutenção dos mesmos e o pagamento das inerentes despesas.
2 – (Novo) A entidade empregadora assegura ainda o pagamento do acréscimo de despesas que o trabalhador tenha pela execução do trabalho em regime de teletrabalho, nomeadamente, com os consumos de água, eletricidade, Internet e telefone cujo valor diário não poderá ser inferior ao correspondente a 2,5% do valor do Indexante dos Apoios Sociais, sem prejuízo da aplicação de disposições mais favoráveis ao trabalhador em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
3 – (Anterior n.º 2.) 4 – (Anterior n.º 3.)
Artigo 169.º Segurança e saúde no trabalho e Igualdade de tratamento
1 – ............................................................................................................................................................ . 2 – ............................................................................................................................................................ . 3 – ............................................................................................................................................................ . 4 – (Novo) O empregador deve promover, com a periodicidade de 3 meses, a realização de exames de
saúde adequados para avaliar a aptidão física e psíquica do trabalhador para o exercício do trabalho em regime de teletrabalho, bem como a repercussão deste e das condições em que é prestado na sua saúde.
5 – (Novo) O empregador deve assegurar: a) A adequação dos meios de proteção e prevenção em matéria de segurança e saúde dos
trabalhadores em regime de teletrabalho, bem como, que os mesmos se encontrem disponíveis a qualquer momento;
b) A atualização dos seguros de acidentes de trabalho considerando o exercício da atividade laboral em regime de teletrabalho, seja qual for o local onde este seja prestado.
6 – (Novo) Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.
Artigo 170.º Privacidade de trabalhador em regime de teletrabalho
1 – ............................................................................................................................................................ . 2 – (Novo) Os instrumentos de trabalho eletrónicos, de imagem e som destinam-se exclusivamente
ao exercício da atividade laboral não podendo ser usados para vigilância e controlo do trabalho e do espaço em que o trabalhador se encontra, por parte da entidade empregadora.
3 – Sempre que o teletrabalho seja realizado no domicílio do trabalhador, a visita ao local tem que ter a
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concordância do trabalhador e só deve ter por objeto a instalação, reparação e manutenção dos instrumentos de trabalho, devendo ser marcada por acordo e apenas pode ser efetuada, entre as 10 e as 17 horas, com a assistência do trabalhador ou de pessoa por ele designada.
4 – (Novo) O controlo da atividade laboral do trabalhador em regime de teletrabalho só pode ser efetuado no local e posto de trabalho do mesmo, nas instalações da entidade empregadora.
5 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.
Artigo 171.º Participação e representação coletivas de trabalhador em regime de teletrabalho
1 – O trabalhador em regime de teletrabalho, mantém os direitos sindicais e integra o número de
trabalhadores da empresa para todos os efeitos relativos a estruturas de representação coletiva, podendo candidatar-se a essas estruturas.
2 – É garantido ao trabalhador, pela entidade empregadora, a utilização de tecnologias de informação e de comunicação afetas à prestação de trabalho para participar em reunião ou plenários sindicais promovidos por estrutura de representação coletiva dos trabalhadores, assim como o tempo necessário à sua deslocação até ao máximo de 1 hora e 30 minutos.
3 – Qualquer estrutura de representação coletiva dos trabalhadores pode utilizar as tecnologias referidas no número anterior para, no exercício da sua atividade, comunicar com o trabalhador em regime de teletrabalho, através de listagem dos contactos eletrónicos dos trabalhadores em teletrabalho, cedida pela entidade empregadora, nomeadamente divulgando informações a que se refere o n.º 1 do artigo 465.º.
4 – (Novo) O trabalhador pode ainda, nos termos do número anterior, receber toda a informação sindical por comunicação eletrónica ou através dos portais reservados aos trabalhadores, cuja publicação deve ser garantida pela entidade empregadora.
5 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto no presente artigo.
Artigo 231.º Registo de trabalho suplementar
1 – ............................................................................................................................................................ . 2 – ............................................................................................................................................................ . 3 – (Novo) O trabalhador em regime de teletrabalho só pode realizar trabalho suplementar desde que
o mesmo seja solicitado por escrito pela entidade empregadora. 4 – (Anterior n.º 3.) 5 – (Anterior n.º 4.) 6 – (Anterior n.º 5.) 7 – (Anterior n.º 6.) 8 – (Anterior n.º 7.) 9 – (Anterior n.º 8.) 10 – (Anterior n.º 9.)»
Artigo 3.º Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação. Assembleia da República, 26 de março de 2021.
Os Deputados do PCP: Diana Ferreira — António Filipe — João Oliveira — Paula Santos — Alma Rivera — Duarte Alves — Jerónimo de Sousa — Ana Mesquita — João Dias — Bruno Dias.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1143/XIV/2.ª (*)
(POR UMA LEI EUROPEIA DO CLIMA COM METAS AMBICIOSAS)
Exposição de motivos
A Comissão Europeia quer implementar legislação vinculativa quanto à neutralidade climática até 2050 através de uma Lei Europeia do Clima, tornando a União Europeia líder na luta contra as alterações climáticas. Esta lei deverá definir a meta de redução de gases com efeito de estufa (GEE) até 2030, em comparação com os valores de 1990. Assistem responsabilidades acrescidas à Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia para tornar este instrumento suficientemente ambicioso e verdadeiramente eficaz para cumprir os seus objetivos na mitigação da atual emergência climática.
Considerando o papel central que a estabilidade climática assume a nível global, suas conexões transversais a todos os aspetos das atividades humanas e tomando como base os estudos científicos que apontam os limites biofísicos à expansão das intervenções humanas no sistema terrestre, essa lei deve estruturar as mudanças sistêmicas necessárias para que a União Europeia cumpra as metas acordadas internacionalmente e prepare-se para uma nova realidade geopolítica.
A nível mundial, as emissões de gases com efeito de estufa (GEE) têm vindo a aumentar continuamente até 2019, até a um nível incompatível com o objetivo do Acordo de Paris de manter o aquecimento global abaixo de 2ºC, e preferencialmente abaixo de 1,5ºC, em relação à época pré-industrial. De acordo com o «Relatório Especial sobre os Impactos do Aquecimento Global de 1,5ºC acima dos níveis pré-industriais», publicado em 2018 pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, um aumento da temperatura global média superior a 1,5ºC está associado a maiores riscos da ocorrência de ondas de calor, de secas severas, de incêndios florestais extremos, de tempestades e inundações catastróficas, e do aumento do nível do mar, constituindo uma ameaça à biodiversidade e aos ecossistemas terrestres e marítimos. As contribuições determinadas a nível nacional (NDC na sigla inglesa) até agora assumidas de forma incondicional ou mesmo condicional são insuficientes e acabam por ser consistentes com um aquecimento global de pelo menos 3ºC.
Ainda que a proposta inicial da Lei de Bases do Clima apenas previa uma redução da emissão de GEE de 50% até 2030 em relação ao ano de referência de 1990 (o que já representaria um aumento substancial em relação à meta anunciada em 2014), a 17 de setembro de 2020, a proposta foi emendada, depois da pressão exercida por organizações não-governamentais do ambiente, por grupos de cientistas, e pelo próprio Parlamento Europeu, para atingir uma redução de 55%. No entanto, esta meta ainda se revela insuficiente perante os compromissos assumidos no Acordo de Paris para manter o aumento da temperatura global média abaixo de 1,5ºC em relação à época pré-industrial. Neste momento, e de acordo com os dados do Programa Ambiental das Nações Unidas, os esforços desenvolvidos mantém o mundo numa trajetória para um aumento de 3,2ºC até ao final do século, incompatível com um clima estável. O relatório salienta a necessidade de uma redução anual de 7,6% da emissão de GEE a nível mundial, sendo que durante o ano de 2020, com a atividade económica fortemente atingida pela pandemia de COVID-19, essa redução foi de apenas 7,0%, com tendência para regressar aos níveis pré-pandémicos.
De acordo com a Associação ZERO, uma redução anual de 7,6% significaria, a nível da União Europeia, alcançar, no mínimo, uma redução de 65% em comparação com as emissões em 1990, sem sequer contar com as responsabilidades históricas dos países europeus pelos níveis atuais de GEE na atmosfera. Assim, a proposta atual da Comissão Europeia é claramente insuficiente, e mesmo a proposta do Parlamento Europeu de reduzir as emissões em 60% fica aquém das necessidades. Anota-se ainda que a contabilização dos sumidouros naturais, aquáticos, dos solos, das florestas ou outros, não poderão servir para justificar o aumento de emissões de gases com efeito de estufa ou evitar a sua redução, uma vez que é impossível calcular a efetiva eficácia dessa contabilização, para além da questão do usufruto legal desses mesmos sumidouros, sendo de excluir ainda as chamadas medidas de compensação nesse âmbito.
Tendo em conta as responsabilidades acrescidas do Governo português no contexto do exercício da Presidência do Conselho da União Europeia, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada abaixo assinada propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
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1 – Empregue as diligências tomadas por adequadas para que o Conselho da União Europeia, dentro das
suas atribuições no processo legislativo, tenha em consideração as responsabilidades da União Europeia quanto à redução da emissão de gases com efeito de estufa, com particular atenção à necessidade da fixação da meta para a redução da emissão desses mesmos gases em 2030 em 65%, em relação aos valores de 1990;
2 – Intervenha junto das outras entidades envolvidas no processo legislativo, nomeadamente o Parlamento Europeu, o Comité Económico e Social e o Comité das Regiões, bem como a própria Comissão Europeia, no sentido de abdicar da contabilização do sequestro pelos sumidouros naturais ou de eventuais medidas de compensação nesse âmbito;
3 – Promova a inclusão das emissões relacionadas com o transporte internacional marítimo e aéreo, não consideradas no Acordo de Paris, bem como das emissões incorporadas nos bens importados de países localizados fora do espaço da União Europeia;
4 – Interceda junto da Comissão Europeia e dos restantes Estados-Membros da União Europeia que no âmbito das negociações do Tratado da Carta de Energia seja defendida, de uma só voz, a sua reformulação profunda garantindo a salvaguarda do meio ambiente e a proteção da saúde pública, retirando todas as cláusulas desse tratado que coloquem em causa o integral cumprimento das metas da futura Lei Europeia do Clima.
Assembleia da República, 26 de março de 2021.
A Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.
(*) O texto inicial foi alterado a pedido do autor da iniciativa a 26 de março de 2021 [Vide DAR II Série-A n.º 103 (2021-03-24)].
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1152/XIV/2.ª RECOMENDA AO GOVERNO QUE AUTORIZE A ATRIBUIÇÃO DO SUBSÍDIO EXTRAORDINÁRIO DE
RISCO NO COMBATE À PANDEMIA DE COVID-19, TAMBÉM AOS AGENTES DAS POLÍCIAS MUNICIPAIS, ACABANDO, DESTA FORMA, COM A SITUAÇÃO DISCRIMINATÓRIA QUE AFETA ESTES
PROFISSIONAIS
Exposição de motivos
Aos agentes da Polícia Municipal cabe a função, à semelhança do que acontece com os elementos das restantes Forças e Serviços de Segurança, fiscalizar o cumprimento das normas dispostas no Decreto n.º 4/2021.
Esta fiscalização, como determina o decreto supracitado, passa pela «sensibilização da comunidade quanto ao dever geral de recolhimento domiciliário e à interdição das deslocações que não sejam justificadas».
O mesmo documento aponta ainda que «compete às forças e serviços de segurança e às polícias municipais» determinar o «encerramento dos estabelecimentos e a cessação das atividades previstas no anexo i» do referido decreto, bem como, entre outras funções, o «acompanhamento e seguimento de pessoas em isolamento profilático ou em vigilância ativa» e o «aconselhamento da não concentração de pessoas na via pública».
Todos estes aspetos estão categoricamente definidos no Decreto n.º 4/2021, o que coloca os agentes das polícias municipais numa situação de igualdade perante os restantes elementos das Forças e Serviços de Segurança.
Porém, esta igualdade apenas está garantida no que à exigência das suas funções diz respeito, pois o Governo – ou por opção política ou por esquecimento e em qualquer dos casos mostra bem a incompetência
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deste Executivo – não incluiu os polícias municipais na decisão de atribuição do subsídio extraordinário de risco no combate à pandemia de COVID-19 como se pode comprovar pelo número 3 do artigo 2.º da Portaria n.º 69/2021: «Nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 291.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, a presente portaria aplica-se aos militares das Forças Armadas e da Guarda Nacional Republicana e aos elementos da Polícia de Segurança Pública, da Polícia Judiciária, da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais e do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e aos profissionais da carreira de sapador bombeiro».
Não se compreende a razão pela qual os agentes da Polícia Municipal não têm direito a receber este subsídio extraordinário de risco no combate à pandemia de COVID-19 quando, por lei, têm exatamente os mesmos deveres que os restantes elementos dos Serviços e Forças de Segurança, estando, por isso, expostos ao mesmo de risco de contágio no exercício das suas funções.
Esta disparidade de direitos é discriminatória para com toda uma classe profissional que se vê assim vexada na sua dignidade e no reconhecimento público do seu trabalho.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República, reunida em sessão plenária, recomenda ao Governo que:
– Acione todos os mecanismos necessários para que os elementos da Polícia Municipal de todo o País
recebam, a par dos profissionais das restantes Forças e Serviços de Segurança, o subsídio extraordinário de risco no combate à pandemia de COVID-19, colmatando, desta forma, a situação discriminatória em que estes agentes se encontram atualmente.
Lisboa, 25 de março de 2021.
O Deputado do CH, André Ventura.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1153/XIV/2.ª MASSIFICAR A TESTAGEM PARA CONTROLAR A PANDEMIA
A pandemia de COVID-19 foi decretada pela Organização Mundial de Saúde no dia 11 de março de 2020. Desde então registaram-se mais de 124 milhões de infetados em todo o mundo e mais de 2,7 milhões de mortes provocadas pelo novo coronavírus, o SARS-CoV-2. Em Portugal, desde os primeiros casos diagnosticados no início de março de 2020, registaram-se já mais de 800 mil infetados e quase 17 mil óbitos.
Perante um vírus com as características do SARS-CoV-2 desde cedo se soube que o controlo da pandemia passaria por uma identificação rápida dos infetados, pelo rastreio e testagem dos contactos de risco, mas também da população em geral, tendo com conta a possibilidade de circulação de assintomáticos com capacidade de contágio.
Assim, conter o vírus e a pandemia – para evitar a circulação comunitária descontrolada e a consequente pressão sobre as respostas de saúde – teria de passar sempre pela intensificação das respostas de testagem e de rastreio. Essa intensificação nem sempre existiu. Pelo contrário, houve momentos em que ambas as respostas ficaram bem aquém das exigências do momento, como quando os inquéritos epidemiológicos em atraso se acumularam ou quando a percentagem de testes positivos chegou a ser 20% do número total de testes, revelando, por um lado, uma circulação descontrolada do vírus, por outros lado, a clara insuficiência no que toca à testagem total realizada no País.
Durante o mês de janeiro de 2021 o país viveu um aumento muito expressivo e rápido de casos de COVID-19, o que levou o Serviço Nacional de Saúde ao limite. Perante a situação foi decretado um novo confinamento. Esse confinamento está agora a ser levantado de forma gradual e progressiva, mas as ameaças persistem: a prevalência da variante britânica em Portugal e o consequente aumento da mobilidade e dos contatos com cada nova medida de desconfinamento. Perante as ameaças é sempre possível um aumento da incidência, da
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transmissibilidade, assim como o recrudescimento da pandemia, algo que está, aliás, a acontecer noutros países da Europa neste preciso momento, levando a novas medidas restritivas e a novos confinamentos. É isso que tem de ser prevenido e controlado.
Para além das medidas não farmacológicas, de proteção individual e coletiva, e para além da necessária intensificação da vacinação, a política de resposta à COVID-19 deve assentar também numa estratégia de testagem alargada.
Esta conclusão não é novidade, mas a verdade é que essa nova estratégia não tem existido. Desde o primeiro desconfinamento que se sabe que o controlo da pandemia passaria por testar e rastrear, mas durante meses manteve-se uma abordagem de testagem muito limitada. Mesmo agora, durante o segundo confinamento, o Governo perdeu tempo e a verdade é que a testagem diária acabou por cair abruptamente: atingiu-se um pico em torno dos 70 000 testes diários entre os dias 19 e 29 de janeiro, mas durante o mês de fevereiro esta testagem diária já tinha caído para os 30 000.
Para que não se repitam erros do passado e para que não se perca mais tempo a implementar uma política massiva e alargada de testagem e rastreio é necessário:
– Alargar a testagem a todos os que contataram com caso suspeito ou com caso confirmado. Tem sido feita
uma abordagem pouco abrangente no que toca a contatos de casos suspeitos ou confirmados, sendo inúmeras as situações em que contatos próximos não são testados. O que se propõe, nesta nova abordagem de testagem, é que todos os contatos identificados sejam encaminhados para teste;
– Promover a testagem regular em locais de aglomeração de indivíduos, como estabelecimentos de ensino, estabelecimentos de saúde e locais de trabalho. Para além da testagem regular em escolas, indústria, construção civil e outros contextos de trabalho, propõe-se a disponibilização de testes a todos os que se desloquem a cuidados de saúde, como centros de saúde e hospitais, mesmo que não apresentem sintomas relacionados ou sejam indivíduos suspeitos de estarem infetados com COVID-19 e desde que não tenham feito um teste nos 7 dias anteriores.
– Instalar de pontos de colheita para testagem gratuita em centros de saúde e em locais de maior concentração populacional como, por exemplo, bairros. Estes pontos de colheita são garantidos por profissionais de saúde do SNS, com articulação com laboratórios de hospitais do SNS, institutos e laboratórios públicos ou academia.
– Estabelecer parcerias com associações e organizações que atuem junto de populações mais vulneráveis ou excluídas socialmente, incentivando uma abordagem de proximidade na testagem. Às associações com quem se estabelecer parcerias serão disponibilizados testes rápidos de antigénio e formação especifica para realização de colheita e análise, existindo a obrigação de reporte dos resultados às entidades de saúde.
– Proceder a testagem massiva da população de um determinado local, freguesia ou concelho, quando se registar um surto ou um aumento rápido de novas infeções, de forma a identificar e isolar infetados, interrompendo cadeias de transmissão.
Esta é uma estratégia bem mais alargada do que a que tem vindo a ser seguida. Assenta na disponibilização
de mais testes em mais contextos, num melhor aproveitamento da capacidade que o SNS consegue garantir, seja de colheira, seja de análise, bem como no estabelecimento de parcerias com associações e, sempre que possível, numa abordagem entre pares que permita chegar a populações que muitas vezes, por via da sua exclusão, escapam a outras abordagens e às próprias entidades de saúde. Serão necessárias a formação e a capacitação destas entidades, mas elas são possíveis e desejáveis. Se se concretizarem é possível chegar a muito mais pessoas com um custo muito mais reduzido.
Com esta estratégia garante-se a testagem de todos os contatos de casos confirmados ou suspeitos e de contextos onde existe maior aglomeração e contato de indivíduos (e, por isso mesmo, maior risco de propagação); criam-se vários pontos de colheita no território nacional onde qualquer cidadão pode ser testado, sendo a colheita e a análise garantidas pelo SNS; aumenta-se a capacidade de testagem, envolvendo-se para isso entidades com trabalho estabelecido no terreno junto de populações mais vulneráveis e/ou excluídas.
Em suma, garante-se uma verdadeira estratégia de testagem capaz de identificar com rapidez novos casos e prevenir o recrudescimento da pandemia. Será preciso algum investimento, é certo, mas Portugal não pode continuar a ser dos países que menos gasta no combate à pandemia.
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de
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Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que: 1. Alargue a estratégia de testagem para SARS-CoV-2, nomeadamente através: a) Da testagem de todos os contatos de casos suspeitos ou confirmados de COVID-19; b) Da testagem regular em estabelecimentos de ensino, na indústria, construção civil, agricultura e outros
contextos de trabalho onde o número de trabalhadores, a sua aglomeração ou contato o justifiquem; c) Da disponibilização de testes aos utentes que se desloquem a entidades do SNS, como centros de saúde
e hospitais, mesmo que não apresentem sintomas relacionados ou sejam indivíduos suspeitos de estarem infetados com COVID-19 e desde que não tenham feito um teste nos 7 dias anteriores;
d) Da criação de pontos de colheita e análise em centros de saúde e outros locais com maior concentração populacional como, por exemplo, bairros habitacionais, assegurados pelo Serviço Nacional de Saúde;
e) Do estabelecimento de parcerias com associações com trabalho no terreno junto de populações mais vulneráveis ou excluídas para que estas, em articulação com as entidades de saúde, fazer chegar a testagem a estas mesmas populações;
f) Da testagem massiva da população de determinado local, freguesia ou concelho onde se registe surto ou um aumento rápido de novos casos de infeção;
2. Para concretização das medidas previstas no número anterior o Governo procede a um aproveitamento
da capacidade instalada no SNS, a investimento em profissionais e meios para o SNS sempre que necessário. 3. Para a concretização da estratégia de testagem por intermédio de parcerias com associações que
trabalham com populações vulneráveis ou excluídas, promove-se a formação de elementos dessas associações, capacitando-as para a colheita de amostras e manuseamento de testes rápidos.
Assembleia da República, 25 de março de 2021.
As Deputadas e os Deputados do BE: Moisés Ferreira — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Jorge Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — Joana Mortágua — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1154/XIV/2.ª RECOMENDA AO GOVERNO QUE INCENTIVE O DESENVOLVIMENTO DE NOVO MODELO DE
MÁSCARAS TRANSPARENTES CERTIFICADAS E GARANTA O TOTAL ACESSO DA COMUNIDADE SURDA AOS SERVIÇOS PÚBLICOS NO CONTEXTO COVID-19
A obrigatoriedade do uso de máscaras ou viseiras no acesso ou permanência nos espaços e estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços, nos serviços e edifícios de atendimento ao público e nos estabelecimentos de ensino e creches, pelos funcionários docentes e não docentes, veio criar barreiras de comunicação à comunidade surda e a outras pessoas com dificuldades auditivas, que depende da leitura dos lábios e de língua gestual portuguesa para comunicar eficazmente. Numa fase inicial as máscaras transparentes pareciam solucionar estas dificuldades de comunicação, mas volvido quase um ano do início da crise sanitária COVID-19, tal não se verificou.
O modelo de máscaras transparentes certificado e comercializado em Portugal revelou alguns problemas. Por exemplo, são máscaras que embaciam facilmente e que, mesmo usando produtos específicos para o evitar, obrigam a várias limpezas. Por outro lado, são máscaras de difícil ajuste à face, o que levou a que a grande maioria das pessoas surdas e demais utilizadores rejeitassem o seu uso e optassem pela máscara cirúrgica.
De facto, as pessoas que necessitam da leitura labial e da expressão facial para comunicar ficaram, neste
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contexto, isoladas. Com a obrigatoriedade de utilização de máscaras nos estabelecimentos comerciais, serviços públicos, estabelecimentos de ensino e creches e transportes coletivos de passageiros, as pessoas surdas ou com dificuldades auditivas veem agravadas as suas dificuldades no acesso a estes bens e serviços essenciais. Para além disso, uma vez que os médicos e enfermeiros utilizam sempre máscaras, a comunicação com estes profissionais fica bastante condicionada e põe em causa o acesso de pessoas surdas à prestação de cuidados de saúde.
Uma das soluções apontadas para solucionar este problema foi o uso de viseiras, mas uma vez que a Direção-Geral da Saúde veio dar conta de que a utilização de viseira não deve dispensar o uso simultâneo de máscara, as dificuldades de comunicação das pessoas surdas continuam por resolver.
Face ao exposto, e respondendo aos múltiplos apelos da comunidade surda, o PAN considera essencial que o Governo incentive a investigação na área da produção de máscaras transparentes que correspondam verdadeiramente às necessidades destas pessoas. É fundamental que se encontrem soluções mais eficazes, inclusivas e de utilização cómoda e utilitária.
Não obstante, importa que, até que novos modelos sejam disponibilizados, se garantam alternativas viáveis para as pessoas surdas, nomeadamente para conseguirem comunicar nos serviços públicos, assegurando que aqueles que leem os lábios ou dependem das expressões faciais usadas na Língua Gestual Portuguesa possam compreender corretamente os interlocutores e comunicar eficazmente.
Nestes termos, a Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, por intermédio do presente projeto de resolução, recomenda ao Governo que:
1 – Em colaboração com as entidades que atuam no setor, e auscultando as associações representativas da
comunidade surda, incentive junto do setor empresarial o desenvolvimento de um novo modelo de máscaras transparentes certificadas;
2 – Em colaboração com as entidades que atuam no setor, e auscultando as associações representativas da comunidade surda, promova a existência de alternativas para pessoas surdas ou com dificuldades auditivas nos serviços públicos, que assegurem que aqueles que leem os lábios ou dependem das expressões faciais usadas na comunicação em língua gestual portuguesa conseguem visualizar os lábios dos interlocutores e entender o significado e a intenção daquele que fala, para facilitar a comunicação.
Palácio de São Bento, 26 de março de 2021.
O Deputado e as Deputadas do PAN: André Silva — Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1155/XIV/2.ª VALORIZAÇÃO PROFISSIONAL, SOCIAL E REMUNERATÓRIA DOS TRABALHADORES DA SAÚDE
Exposição de motivos
O reforço do Serviço Nacional de Saúde (SNS) passa indubitavelmente pela valorização profissional, social e remuneratória dos seus trabalhadores. Se dúvidas houvesse quanto à sua importância, a epidemia da COVID-19 veio demonstrar inequivocamente que os trabalhadores da saúde são um pilar na garantia de melhores cuidados de saúde aos utentes e à população. Sendo por isso amplamente reconhecidos por estes, como têm demonstrado as diversas manifestações espontâneas. Para além dos aplausos, estes trabalhadores precisam de ser reconhecidos e valorizados nos seus direitos, na melhoria das condições de trabalho e na dignificação das suas carreiras.
A enorme carência de trabalhadores da saúde nos estabelecimentos que integram o SNS, os elevados ritmos de trabalho, a falta de condições de trabalho, a ausência de investimento que conduz à obsolescência dos
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equipamentos, bem como a desvalorização social, profissional e remuneratória destes trabalhadores têm potenciado a sua à desmotivação e provocado a sua saída do SNS, seja por aposentação, seja para exercer funções em entidades privadas ou fora do País.
Esta desvalorização social, profissional e remuneratória dos trabalhadores da saúde é parte integrante da estratégia de descredibilização e fragilização do SNS. Estratégia que está associada aos objetivos de transferir a prestação de cuidados de saúde para os grupos privados da saúde.
O reforço do SNS, da sua capacidade de resposta e da sua qualidade é indissociável da valorização destes trabalhadores. Sabemos que sem profissionais valorizados e reconhecidos não há SNS. Por isso é que não é inocente o ataque aos direitos dos trabalhadores, pois tem sido uma via para destruir o serviço público de saúde e para potenciar os interesses dos grupos privados.
É urgente tomarem-se medidas de valorização e reconhecimento dos trabalhadores da saúde, no sentido de se obter um SNS mais robusto seja na prestação de cuidados, na prevenção e despiste de situações de doença, bem como no processo de manutenção da saúde. Neste sentido é fundamental a existência de trabalhadores motivados, com perspetivas de carreira e de desenvolvimento profissional. Desta forma, é imperativo a valorização das suas carreiras, a reposição e criação de novas carreiras na área da saúde para a garantia de direitos e dignificação destes trabalhadores – questão central no reforço capacidade do SNS.
É preciso assegurar condições de trabalho, mas igualmente o desenvolvimento profissional, a formação, a participação em projetos de investigação e simultaneamente tomar medidas que permitam a fixação de trabalhadores da saúde nas regiões do interior.
Os elevados ritmos de trabalho, a exposição continua destes trabalhadores a situações de elevado nível de stress, bem como a sua exposição constante a situações de doença e a agentes patogénicos demonstra bem a necessidade que existe de proteção destes trabalhadores, por isso defendemos que seja criado o serviço de saúde ocupacional, nos estabelecimentos onde ainda não existem e consequentemente sejam reforçados de meios técnicos e humanos os já existentes.
A iniciativa que apresentamos propõe um conjunto de medidas para a valorização dos trabalhadores de saúde do SNS, com base na dignificação profissional e no respeito pelos seus direitos.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte:
Resolução
A Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, de, recomenda ao Governo
a adoção de medidas de valorização profissional, social e remuneratória dos trabalhadores da saúde, reconhecendo a diferenciação técnica e a importância das funções exercidas, através da:
1 – Valorização e dignificação das carreiras dos trabalhadores da saúde, imprescindível não só para a
valorização e reconhecimento profissional, mas também enquanto elemento estruturante para a melhoria da qualidade dos cuidados de saúde prestados aos utentes, procedendo designadamente à revisão das carreiras, incluindo a reposição e a criação de novas carreiras especiais; assegurando de forma regular e nos termos da lei as indispensáveis progressões e promoções, bem como a valorização das remunerações.
2 – Contabilização de todos os pontos para efeitos de alteração de posicionamento remuneratório, incluindo todos os trabalhadores da saúde independentemente da modalidade contratual, vínculo, carreira e profissão.
3 – Criação de um regime de dedicação exclusiva no Serviço Nacional de Saúde, de natureza opcional pelo trabalhador e com a atribuição dos respetivos incentivos.
4 – Definição de uma efetiva compensação aos trabalhadores da saúde pelo exercício de funções em condições de penosidade e risco, que tenha em conta aspetos remuneratórios, quanto ao horário de trabalho, dias suplementares de férias, condições para a aposentação, entre outros, considerando o ónus da função e a exposição destes trabalhadores a elevadas situações de stress físico e psicológico bem como a agentes patogénicos.
5 – Aplicação do subsídio extraordinário de risco, nos termos previstos do artigo 291.º da Lei n.º 75-B/2020, 31 de dezembro, a todos os trabalhadores da saúde.
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6 – Implementação de medidas que permitam a fixação de profissionais de saúde nas regiões com maior carência.
7 – Eliminação das desigualdades de direitos e de condições de trabalho existentes entre trabalhadores, procedendo à conversão dos contratos individuais de trabalho em contratos de trabalho em funções públicas.
8 – Regularização de todas as situações de trabalhadores com vínculos precários que desempenham funções permanentes, integrando-os nos serviços com contratos de trabalho com vínculo público efetivo.
9 – Criação de serviços de saúde ocupacional em todos os estabelecimentos de saúde, dotados dos trabalhadores necessários para o seu funcionamento e desempenho das respetivas atribuições.
10 – Adoção de uma estratégia nacional de segurança e saúde no trabalho, dando especial atenção à proteção da saúde mental dos trabalhadores.
11 – Criação de programas específicos de formação continua e permanente dos trabalhadores de saúde, potenciando a aquisição de conhecimentos e competências na área da inovação e tecnologia na saúde.
12 – Promoção na participação em projetos de investigação e conhecimento de novas técnicas bem como conferências, seminários, congressos e outras ações para consolidação e aquisição de competências.
13 – Garantia de condições de trabalho adequadas, nomeadamente no plano das instalações e dos equipamentos.
14 – Disponibilização para a negociação coletiva com as organizações representativas dos trabalhadores, com vista à sua valorização profissional, social e remuneratória, e ao reforço dos direitos dos trabalhadores da saúde.
Assembleia da República, 26 de março de 2021.
Os Deputados do PCP: Paula Santos — João Dias — João Oliveira — António Filipe — Jerónimo de Sousa — Ana Mesquita — Alma Rivera — Bruno Dias — Diana Ferreira — Duarte Alves.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1156/XIV/2.ª PELO REFORÇO DA ESTRUTURA DE SAÚDE PÚBLICA
Exposição de motivos
I A Organização Mundial de Saúde define a saúde como o «estado de completo bem-estar físico, mental e
social e não somente ausência de afeções e enfermidades». A Declaração de Alma-Ata que resultou da Conferência Internacional sobre Cuidados de Saúde Primários,
em 12 de setembro de 1978, no Cazaquistão, URSS, considera que «a promoção e proteção da saúde dos povos é essencial para o contínuo desenvolvimento económico e social e contribui para a melhor qualidade de vida e para a paz mundial».
Alma-Ata priorizou a acessibilidade de todos aos cuidados de saúde primários, próximos das comunidades para responder aos principais problemas das populações no plano da promoção, da prevenção, da cura e da reabilitação. Entende ainda que a plena participação dos indivíduos e da comunidade é muito importante, instituindo como um direito e um dever a participação individual e coletiva dos povos no planeamento e na execução dos seus cuidados de saúde.
Em 1986 realizou-se a 1.ª Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde em Ottawa, no Canadá, que aprovou as orientações estratégicas para alcançar o objetivo de «saúde para todos» lançado em Alma-Ata. A declaração de Ottawa define a promoção de saúde como «o processo que visa aumentar a capacidade dos indivíduos e das comunidades para controlarem a sua saúde, no sentido de a melhorar». Entende a saúde como
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um recurso para a vida e não a finalidade da vida, estabelecendo as condições básicas e os recursos fundamentais para melhorar a saúde, a saber: paz, abrigo, educação, alimentação, recursos económicos, ecossistema estável, recursos sustentáveis, justiça social e equidade. Esta conferência concluiu que «a saúde é criada e vivida pelas populações em todos os contextos da vida quotidiana: nos locais onde se aprende, se trabalha, se brinca e se ama.»
O compromisso para a promoção de saúde decidido em Ottawa passa pela promoção de políticas saudáveis; o combate a meios insalubres, más condições de vida, má nutrição e más condições de habitabilidade; o combate às desigualdades; pelo reconhecimento dos indivíduos e das populações como o principal recurso de saúde, apoiando-as para se manterem saudáveis e pela reorientação dos serviços de saúde para a promoção de saúde, para além das suas responsabilidades de prestação de cuidados curativos.
II
Foi com a Constituição da República Portuguesa em 1976 que o direito à saúde para todos os portugueses
ficou pela primeira vez consagrado. Foi com a Revolução de Abril e com o regime democrático que se iniciou a generalização do acesso à saúde, mesmo nas zonas mais recônditas do País, com o desenvolvimento de programas de proximidade no acesso à saúde, como o serviço médico à periferia que permitiu o acesso de muitos portugueses à saúde. Simultaneamente, a generalização e o alargamento do Programa Nacional de Vacinação e o investimento do poder local democrático nas infraestruturas básicas, no abastecimento de água e saneamento, na higiene urbana e na recolha e tratamento de resíduos sólidos urbanos, proporcionaram extraordinários avanços na saúde pública.
A Constituição da República Portuguesa estabelece que «todos têm direito à protecção da saúde e o dever de a defender a promover» e que esse direito é realizado através de um serviço nacional de saúde universal e geral e realça a importância dos determinantes sociais da saúde, na «criação de condições económicas, sociais, culturais e ambientais que garantam, designadamente, a proteção da infância, da juventude e da velhice, e pela melhoria sistemática das condições de vida e de trabalho, bem como pela promoção da cultura física e desportiva, escolar e popular, e ainda pelo desenvolvimento da educação sanitária do povo e de práticas de vida saudável».
Apesar de a Constituição identificar os determinantes sociais para a promoção da saúde e de existir planos com o objetivo de promover a saúde, a situação da saúde da população é preocupante. Dos objetivos e planos traçados à realidade concreta, vai um longo caminho, e muitas vezes as metas definidas não são alcançadas por falta de meios para a sua implementação. O desinvestimento no SNS que decorre das opções políticas de sucessivos Governos afeta negativamente a área da saúde pública.
Nos últimos anos a prevenção da doença e a promoção da saúde foram profundamente desvalorizados. Basta observar o financiamento nesta área, a alocação de recursos humanos e a sucessiva concentração de serviços, afastando-os dos cidadãos e das comunidades. Um caminho que teve como consequência a existência de uma estrutura de saúde pública depauperada, sem capacidade de intervenção, afogada em tarefas burocráticas e praticamente sem disponibilidade para a realização da sua atividade prioritária, a elaboração de informação e planos no domínio da saúde pública, a vigilância epidemiológica e a gestão de programas de intervenção no âmbito da prevenção, promoção e proteção da saúde da população em geral ou de grupos específicos.
As sucessivas alterações ao nível da estrutura de saúde pública tiveram impactos negativos. A existência de uma unidade de saúde pública por Agrupamento de Centros de Saúde, com dimensão que chega a ultrapassar os 300 mil habitantes ou com áreas que correspondem a distritos, não é possível realizar um trabalho de proximidade. Os Governos de PS e de PSD/CDS foram responsáveis pela progressiva desestruturação e destruição da estrutura de saúde pública.
Face às insuficiências, muitas vezes a atividade dos serviços de saúde pública é reativa em função de determinada ocorrência, sem capacidade para tomar a iniciativa no campo da promoção da saúde e da prevenção. A intervenção foi reativa nos surtos de legionella, tal como assim está a ser no combate à epidemia do SARS-CoV-2.
O surto de legionella em Vila Franca de Xira deveria ter sido exemplo para corrigir os erros do passado e avançar na criação de uma estrutura de saúde pública com capacidade de intervenção, como o PCP propôs em
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2015. Não foi essa a opção do Governo PSD/CDS, nem foi essa a opção do Governo PS. Ultrapassado o problema, a área da saúde pública voltou a cair no esquecimento. Quando rebenta a epidemia do SARS-CoV-2, a saúde pública é chamada a intervir, com dificuldades, com insuficiências e limitações diversas, que durante mais de um ano de epidemia nunca chegaram a ser colmatadas, apesar das propostas e das soluções apresentadas pelo PCP. Continua por implementar a norma aprovada no Orçamento do Estado para 2021 de contratação de profissionais de saúde para as equipas de saúde pública, com o objetivo de cumprir, pelo menos os rácios definidos na legislação há mais de uma década, nomeadamente um médico especialista em saúde pública por 25 mil habitantes, um enfermeiro por 30 mil habitantes e um técnico de saúde ambiental por 15 mil habitantes.
De acordo com os dados que constam da Plataforma BI da Reforma, de novembro de 2019, no território continental havia 307 médicos de saúde pública, 234 enfermeiros e 363 técnicos de saúde ambiental, quando deveriam existir pelo menos 412 médicos, 343 enfermeiros e 686 técnicos de saúde ambiental, para assegurar no mínimo os rácios, que mesmo estando aquém das necessidades, nem mesmo assim têm sido cumpridos. As 55 unidades de saúde pública têm somente 201 assistentes técnicos, 28 assistentes operacionais, 44 higienistas orais e 38 técnicos superiores de diversas áreas. Este é o quadro de pessoal das esquipas locais de saúde pública para 278 concelhos em Portugal continental.
Para além do País ter um número reduzido de médicos de saúde pública, a esmagadora maioria dos que estão em funções têm mais de 50 anos, sendo um grupo bastante envelhecido. Se não forem tomadas urgentemente medidas para reforçar a formação médica especializada na área da saúde pública, o número de médicos de saúde pública será ainda mais reduzido num curto espaço de tempo, dado que as entradas não substituem as saídas, não assegurando a renovação e comprometendo seriamente a capacidade de resposta do SNS.
A própria Direção-Geral de Saúde (DGS) funciona com um número muito reduzido de trabalhadores de saúde, o que se reflete nas dificuldades na implementação dos programas de saúde em vigor. Hoje a DGS tem uma estrutura organizacional desajustada, um financiamento exíguo e um reduzido número de trabalhadores, o que constituem constrangimentos e obstáculos concretos na sua capacidade de intervenção. A 31 de dezembro de 2018, a DGS tinha 134 trabalhadores de acordo com o seu balanço social, de entre os quais 16 são médicos, 11 são enfermeiros, 42 técnicos superiores, 28 assistentes técnicos e 12 assistentes operacionais.
O financiamento da área da saúde pública não corresponde às necessidades, não possibilitando a dotação dos serviços de saúde pública dos meios para o desenvolvimento das suas atribuições e competências, nem para o desenvolvimento de programas de prevenção da doença e de promoção da saúde.
III
É amplamente reconhecido que a atual estrutura de saúde pública é desadequada para a nossa realidade e
que é urgente promover uma restruturação na área da saúde pública, que recupere a autonomia na intervenção, garanta capacidade e dotada de meios para uma intervenção próxima das populações e das comunidades, com eficiência e eficácia.
Perante esta realidade, o PCP propôs em 2015, o Projeto de Resolução n.º 1579/XII/4.ª – Por uma nova política de saúde pública, que caso tivesse sido considerado permitia o reforço da estrutura de saúde pública, e hoje estaríamos em melhores condições para enfrentar a epidemia.
Na sequência do Despacho n.º 11232/2016, de 19 de setembro, é criada a Comissão para a Reforma da Saúde Pública Nacional. Esta comissão elaborou um conjunto de documentos designadamente «Modelo de uma Rede de Serviços de Saúde Pública», «Capacitação dos Serviços de Saúde Pública», «Modelo de Implementação dos Estudos de Impacte na Saúde em Portugal», «Contratualização dos Serviços de Saúde Pública Locais», de julho de 2017.
Entretanto em janeiro de 2017 o Governo dá entrada na Assembleia da República da Proposta de Lei n.º 49/XIII/2.ª que aprova a Lei de Saúde Pública. Esta proposta foi bastante criticada pelos profissionais de saúde e pelas entidades da área da saúde por introduzir uma verdadeira reorganização na área da saúde pública e limitar-se a algumas competências e funções da Autoridade de Saúde, tendo caducado com o fim da Legislatura.
Neste mandato, o Governo através do Despacho n.º 2288/2020, de 18 de fevereiro de 2020, criou a Comissão para a Elaboração da Proposta de Reforma da Saúde Pública e Sua Implementação, que ficou com a
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incumbência de elaborar uma proposta de Lei da Saúde Pública, tendo como referência a Lei de Bases da Saúde aprovada em 2019 e os compromissos internacionais na área da saúde pública assumidos, nomeadamente, junto da Organização das Nações Unidas, Organização Mundial da Saúde, Conselho da Europa e União Europeia; analisar a legislação com implicações nos serviços de saúde pública com o objetivo de identificar eventuais alterações que sejam necessárias e avaliar e monitorizar os recursos humanos e as suas necessidades na área da saúde pública.
Foi tornado público a entrega do Relatório da Comissão para a Elaboração da Proposta de Reforma da Saúde Pública e Sua Implementação, em dezembro de 2020 à Ministra da Saúde, o qual não se encontra disponível. Segundo as notícias o relatório confirma a insuficiência da estrutura de saúde pública, a carência de profissionais de saúde, a desadequação dos rácios, como a epidemia deixou evidente e defende o reforço da capacidade de vigilância epidemiológica pelos serviços de saúde pública. Defende também a dotação dos serviços de saúde pública dos recursos humanos e materiais e de capacidade de intervenção na sociedade.
No âmbito da saúde pública, a Lei de Bases da Saúde aprovada em 2019 determina que «Compete ao Estado acompanhar a evolução do estado de saúde da população, do bem-estar das pessoas e da comunidade, através do desenvolvimento e da implementação de instrumentos de observação em saúde» e que o Governo «deve identificar áreas específicas de intervenção, programas e ações de promoção da saúde e da prevenção da doença ao longo da vida, tendo presentes os problemas de saúde com maior impacto na morbilidade e na mortalidade, os desafios sociodemográficos e a existência de determinantes não modificáveis, bem como sociais, económicos, comerciais, ambientais, de estilo de vida e de acesso aos serviços». Determina também as competências da autoridade de saúde. Aspetos que necessitam de desenvolvimento e concretização.
A epidemia da COVID-19 veio confirmar a importância da existência de uma estrutura de saúde pública forte, com capacidade e interventiva na prevenção e na promoção de saúde.
O PCP defende o investimento na área da saúde pública. Neste sentido apresenta um projeto de resolução onde propõe a adoção de um conjunto de medidas que a serem concretizadas permitem robustecer a estrutura de saúde pública, dar-lhe capacidade e dimensão para responder às necessidades das populações.
O PCP entende que o investimento na promoção de saúde traz ganhos em saúde para os utentes e torna o SNS mais eficiente. Investir na prevenção da doença e na promoção de saúde, para além de garantir uma vida mais saudável e melhor saúde para as pessoas, permite diagnóstico precoce e reduz os custos associados à cura e ao tratamento.
E que investir na saúde pública, reforçar as suas estruturas e meios, é essencial para melhorar a saúde aos portugueses, indo ao encontro dos princípios constitucionais.
Assim, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte:
Resolução
A Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, recomenda ao Governo o
investimento no reforço da estrutura de saúde pública, com o objetivo de melhorar o estado de saúde da população, considerando o seguinte:
1. Para o reforço da intervenção e atuação da saúde pública em Portugal é imprescindível assumir uma
estrutura organizacional dirigida pela Direção-Geral de Saúde e a dotação de meios financeiros, tecnológicos e humanos adequados às equipas de saúde pública, a saber:
a) A salvaguarda da autonomia e independência da autoridade de saúde pública no exercício das suas
competências, em que a Direção-Geral de Saúde assume a direção técnica dos serviços de saúde pública, nomeadamente do Instituto Nacional de Saúde Pública Dr. Ricardo Jorge e das estruturas de saúde pública a nível regional e local.
b) A organização das estruturas de saúde pública numa base concelhia, com o objetivo de assegurar uma maior proximidade junto das comunidades locais.
c) A estruturação dos serviços de saúde pública deve considerada em função das necessidades de saúde dos utentes, garantido a humanização dos serviços e da prestação de cuidados e promovendo a participação
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democrática das populações, das entidades locais, das autarquias no âmbito da política de saúde pública a nível nacional, regional e local.
d) A articulação das equipas de saúde pública com os diversos níveis de cuidados de saúde, designadamente cuidados de saúde primários, cuidados hospitalares e cuidados continuados e paliativos.
e) O reforço da dotação financeira na área da saúde pública, com o objetivo de alcançar 5% do orçamento total para o Programa Saúde até ao final da atual Legislatura, garantindo assim o adequado financiamento da Direção-Geral de Saúde, dos programas de saúde pública específicos e das estruturas de saúde pública nos seus diferentes níveis.
f) A revisão dos rácios de profissionais de saúde necessários nos serviços de saúde pública a nível nacional, regional e local de forma a adequá-los às necessidades das populações e de aproximar as equipas das comunidades.
g) O reforço do número de profissionais de saúde, nas estruturas de saúde pública, a nível nacional, regional e local, assente no funcionamento de equipas multidisciplinares, constituídas por médicos de saúde pública, enfermeiros especialistas em saúde comunitária, técnicos de saúde ambiental, psicólogos, epidemiologistas, nutricionistas, assistentes sociais, geógrafos, sociólogos, entre outros, com a dimensão adequada face à situação epidemiológica e às especificidades das populações e dos territórios que abranjam.
h) A concretização do reforço do número de profissionais de saúde implica a adoção de medidas excecionais, nomeadamente:
i. A valorização da especialidade médica de saúde pública, assim como a valorização dos enfermeiros
especialistas em saúde comunitária e dos técnicos de saúde ambiental, dignificando a carreira, direitos e remunerações, definindo um regime específico de prevenção que abranja todos os profissionais dos serviços de saúde pública;
ii. O desenvolvimento de um plano de formação na área da saúde pública, de forma a ultrapassar a enorme escassez de profissionais de saúde, bem como acautelar as necessidades futuras do País na área da saúde pública; iii. A abertura extraordinária de vagas para a formação médica especializada na área da saúde pública.
i) A libertação das equipas de saúde pública das tarefas burocráticas, para se dedicarem ao exercício de
funções diretamente relacionadas com áreas de intervenção da saúde pública e a promoção da saúde. j) A modernização e inovação tecnológica nos serviços de saúde pública, com a modernização dos sistemas
de comunicação, informáticos e de informação, com a criação de um sistema de informação dedicado e autónomo para a saúde pública, enquanto ferramenta fundamental para a monitorização do estado de saúde da população e com capacidade de georreferenciação, orientado para a identificação e ação em caso de doença infectocontagiosas.
k) A criação de um Observatório em Saúde, dotado de autonomia técnica e financeira que, em articulação com as entidades nacionais, regionais e locais do SNS, acompanhe a evolução do estado de saúde da população, o bem-estar da comunidade, que permita prestar informação e recomendações à autoridade de saúde.
2. Para o reconhecimento e valorização da saúde pública nas suas diversas vertentes, é fundamental o
desenvolvimento da sua atividade, em particular na prevenção da doença e promoção da saúde, na avaliação dos riscos e na prevenção dos fatores e controlo das situações que podem causar ou acentuar prejuízos para a saúde das pessoas ou das comunidades, através da adoção das seguintes medidas:
a) O desenvolvimento de estudos epidemiológicos a nível local e regional, para identificar a cada momento
os riscos existentes, as principais doenças e comorbilidades, assim como o estabelecimento de um plano de ação de prevenção específico para cada comunidade.
b) A criação de um programa nacional no âmbito da promoção da saúde, com o objetivo de formar, informar e sensibilizar os utentes para o bem-estar e a saúde, contribuindo assim para a elevação do conhecimento dos utentes para a proteção da sua saúde.
c) O planeamento e desenvolvimento de programas de prevenção regulares, que integre os diversos tipos
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de prevenção (primária, secundária e terciária) considerando os estudos epidemiológicos realizados. d) A criação de um programa de saúde pública de intervenção primária, com cobertura em todo o território
nacional nos cuidados de saúde primários, procurando ser o mais próximo possível dos utentes, dirigido:
i. Ao longo do ciclo de vida das pessoas nas suas diferentes fases, a saúde materno-infantil, integrando com ações específicas na vacinação); a saúde escolar (pré-escolar, ensino básico e secundário e ensino superior); o planeamento familiar e a saúde da mulher; a saúde dos idosos; e a saúde ambiental, que aborde os aspetos relacionados com as condições de habitabilidade, o espaço urbano, o ciclo urbano da água, a mobilidade, entre outros;
ii. À saúde ocupacional, que considere as condições se saúde e de segurança nos locais de trabalho; iii) Às doenças Crónicas, tendo em conta as de maior prevalência na população portuguesa, as que
causam maiores comorbilidades e maior mortalidade. e) O envolvimento das instituições sociais e de entidades públicas e privadas no desenvolvimento do
programa de saúde pública de intervenção primária, previsto no ponto anterior. f) A promoção de estilos de vida saudáveis, dando uma especial atenção à nutrição, à atividade física, ao
consumo de tabaco e álcool e à atividade laboral, que procure prevenir as doenças relacionadas, incentivando à adoção de uma alimentação saudável e à participação em atividades no âmbito do desporto escolar e do desporto popular;
g) A criação de um programa de saúde pública de intervenção secundária que abranja numa perspetiva mais global a vertente da saúde humana e saúde ambiental, que tenha em conta o local de residência, o meio envolvente, o espaço público e o local de trabalho.
3. A criação de um Programa de Intervenção Primária e Controlo da Bactéria da Legionella em todos os
edifícios e estabelecimentos de acesso ao público, independentemente da sua natureza pública ou privada, incluindo instalações industriais e que possuam equipamentos suscetíveis de desencadear o risco de infeção por legionella, cabendo ao Estado assegurar a melhoria do desempenho energético e da qualidade do ar interior e exterior dos referidos edifícios e estabelecimentos, da responsabilidade da Direção Geral de Saúde em articulação com as autoridades regionais e locais de saúde pública e o Instituto Nacional de Saúde Pública Dr. Ricardo Jorge, com o objetivo de:
a) Promoção da saúde e segurança dos utilizadores e dos trabalhadores; b) Definição e estabelecimento de medidas de prevenção primária e controlo da bactéria legionella; c) Identificação e avaliação dos perigos e fatores de risco, cabendo às autoridades regionais em articulação
com as autoridades locais de saúde pública identificar na sua região todos os sistemas de equipamentos onde existam condições favoráveis ao desenvolvimento de bactérias do género legionella, nomeadamente na água quente sanitária, sistemas de ar condicionado, torres de arrefecimento, condensadores de evaporação, humidificadores, aparelhos de aerossóis, fontes decorativas e redes de abastecimento de água;
d) Estabelecimento e implementação de medidas nas diversas vertentes: tecnológica, analítica e epidemiológica em todos os estabelecimentos públicos e privados tendentes a prevenir e controlar o surgimento e desenvolvimento da bactéria legionella;
e) Redução significativa do número de casos de infeção por legionella. 4. A criação de um Plano de Adaptação dos Serviços de Saúde Pública às Emergências Epidemiológicas
de Doenças Transmissíveis e Não Transmissíveis, da responsabilidade da DGS, tendo por base a experiência da recente epidemia da COVID-19, em particular a avaliação crítica dos aspetos positivos e negativos, permitindo no futuro ultrapassar dificuldades e corrigir erros e falhas identificados.
5. A elaboração anual do Relatório sobre o Estado da Saúde dos Portugueses a apresentar à Assembleia da República, até ao final do 1.º semestre do ano seguinte, que integre a análise da situação da saúde a nível nacional, regional e local; as ações desenvolvidas pelos serviços públicos de saúde, a identificação dos indicadores de saúde (incluindo indicadores relativos às situações de doença), a identificação quantitativa e
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qualitativa dos ganhos em saúde e as prioridades de intervenção nos anos seguintes. Assembleia da República, 26 de março de 2021.
Os Deputados do PCP: Paula Santos — João Dias — João Oliveira — António Filipe — Jerónimo de Sousa — Alma Rivera — Ana Mesquita — Bruno Dias — Diana Ferreira — Duarte Alves.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1157/XIV/2.ª PROGRAMA GRATUITO DE DISPENSA REGULAR DE AUTOTESTES DOMICILIÁRIOS COVID-19
Exposição de motivos
A testagem, pela possibilidade de identificar os indivíduos infetados com o SARS-CoV-2, constitui um elemento fundamental no esforço para conter e mitigar a pandemia COVID-19 ajudando a prevenir a transmissão pessoa a pessoa.
Se no passado recente a testagem, constituindo uma importante medida, enfrentava sérias dificuldades para uma maior utilização, muito por razões de carência de testes no que respeita à quantidade e diversidade de opções, hoje essas dificuldades não se colocam. Ou seja, estão disponíveis testes em número e opções diversas que permitem um conjunto de soluções associadas à testagem da COVID-19.
A testagem pode ser feita para testar a presença de infeção atual/ativa ou passada, consoante se faça um teste viral ou um teste de anticorpos respetivamente. No que respeita aos testes de anticorpos estes não devem ser usados para diagnosticar uma infeção ativa, uma vez que a produção de anticorpos pode demorar de 1 a 3 semanas após a infeção.
No que aos testes virais diz respeito, isto é, aqueles que são capazes de testar a presença de infeção ativa, estes testes podem ser de dois tipos:
• Teste molecular de amplificação de ácidos nucleicos, também conhecido como teste de RNA ou
PCR. São testes que detetam as informações genéticas, o RNA, do vírus SARS-CoV-2. O que só é possível se o
vírus estiver presente, ou seja se alguém estiver ativamente infetado. Para tal, são recolhidas amostras do nariz ou da boca para descobrir se a pessoa está infetada com SARS-CoV-2.
• Teste de antígeno, também conhecido como «teste rápido». São comummente chamados de «teste rápido» porque o tempo de obtenção de resultados é muito mais
rápido que os testes de PCR e como têm custos associados mais baixos são usados para rastrear pessoas em grande número.
Os testes de antigénio, em vez de detetar o material genético do vírus, detetam uma proteína do vírus. No essencial, funcionam da mesma forma que os testes moleculares, procedendo-se à recolha de amostras do nariz ou da garganta, porém produzem o resultado em poucos minutos, o que é uma vantagem muito significativa. A evolução destes testes permite que existam testes de usos profissional e testes que dispensam a intervenção dos profissionais podendo ser feitos em casa através de um autoteste pela colheita de saliva.
Em Portugal foi implementada uma Estratégia Nacional de Testes para SARS-CoV-2, através da Norma da Direção-Geral da Saúde 019/2020 de 26/10/2020 atualizada a 26/02/2021. Esta estratégia tem como principal objetivo a utilização adequada de testes laboratoriais. Procurando assim a deteção e o isolamento precoce de
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casos de infeção por SARS-CoV-2 o que irá reduzir e controlar a transmissão da infeção, prevenindo e mitigando os seus impactos nos serviços de saúde e na população.
O avanço do conhecimento científico permite-nos perceber que a par da necessidade de se intensificar a testagem, é igualmente necessário que a mesma cumpra critérios epidemiológicos e seja integrada num mecanismo de rastreio efetivo dos contatos tornando a utilização de testes na população mais eficaz e eficiente e principalmente útil no controlo da pandemia. Nesse sentido, é, pois, fundamental que se faça uma utilização apropriada dos diferentes tipos de testes e que se proceda ao rastreio efetivo dos contactos pelas equipas de saúde pública que procederá de forma conveniente.
A testagem diagnóstica é fundamental, ou seja, testar as pessoas suspeitas de infeção pela sintomatologia que apresentam ou que tenham tido contatos com outras infetadas procedendo-se ao isolamento atempado e adequado de todos os casos de infeção por SARS-CoV-2. No entanto é preciso ir à procura do vírus através de rastreios regulares nos contextos comunitários e laborais, isto significa que mesmo sem conhecimento da existência de casos de infeção são criadas condições para que se possa aceder a testes rápidos de antigénio em pessoas sem evidência ou suspeita de infeção.
Cerca de 1 em cada 3 pessoas com coronavírus não tem sintomas, mas ainda pode contagiar outras pessoas. Os testes regulares de pessoas sem sintomas são importantes para ajudar a deter a propagação do vírus e proteger a saúde pública. À medida que vão sendo levantadas as medidas restritivas associadas ao desconfinamento é preciso tudo fazer para proteger a população e identificando precocemente as possíveis cadeias de contágio.
A Portaria n.º 56/2021, de 12 de março, que estabelece um regime excecional e temporário para a realização em autoteste de testes rápidos de antigénio, vem reconhecer que se deve permitir a realização do teste pelo próprio, ou seja é autorizado o acesso da população aos testes de antigénio em autoteste, enquanto medida de proteção da saúde pública, o que não se coaduna com o uso exclusivo por profissionais. A referida portaria define ainda que os testes rápidos de antigénio para uso pelo próprio podem ser disponibilizados nas unidades de saúde do sistema de saúde; nas farmácias e locais de venda de medicamentos não sujeitos a receita médica e noutros locais a definir pelo Governo.
Este regime excecional autorizando a colocação e disponibilização no mercado de testes rápidos de antigénio de autoteste, não acautela a possibilidade de acesso com critérios de toda a população independentemente das suas condições socioeconómicas. A criação de um programa de dispensa gratuita de autotestes, pode ser uma medida que não eliminando as outras oportunidades de testagem, pode contribuir de forma efetiva para a proteção da Saúde Pública e das populações mais vulneráveis e ao mesmo tempo aliviar o impacto da pandemia nos serviços de saúde.
Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte:
Resolução
A Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, da República, considerando
a necessidade de garantir o acesso aos testes rápidos de antigénio usados pelo próprio no domicílio como medida de proteção da saúde pública, recomenda ao Governo que:
1. Reforce a capacidade de testagem diagnóstica COVID-19 nos serviços de saúde do SNS, no que respeita
aos testes Molecular (PCR) ou Antigénio (testes rápidos); 2. Reforce a capacidade para a realização das análises laboratoriais dos testes moleculares nos hospitais
do SNS e nos centros de investigação públicos; 3. Implemente um programa gratuito de dispensa regular de autotestes domiciliários nos centros de saúde
e respetivas extensões de saúde do Serviço Nacional de Saúde, que tenha em conta o seguinte: a. Para a concretização do referido programa o Governo cria a regulamentação onde define a população a
ter acesso atribuição de kits de autoteste domiciliário e a periodicidade para a sua dispensa; b. Os kits de autoteste domiciliário, são fornecidos através do enfermeiro que avalia se o utente cumpre os
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critérios de acesso e periodicidade; c. O enfermeiro treina os utentes/família que recebem os kits de autoteste domiciliário e avalia a sua
capacidade de autoteste; d. Podem ser formados outros profissionais para colaborarem na autotestagem em contextos laborais,
escolas e outros contextos comunitários; e. Os pedidos de dispensa gratuita dos kits podem ser feitos presencial ou por via telefónica ou digital. f. Assegurar que há informação em caso de resultado positivo, aos serviços de saúde pública. Assembleia da República, 26 de março de 2021.
Os Deputados do PCP: João Dias — Paula Santos — João Oliveira — António Filipe — Jerónimo de Sousa — Ana Mesquita — Alma Rivera — Bruno Dias — Diana Ferreira — Duarte Alves.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1158/XIV/2.ª REFORÇO DA CAPACIDADE DO SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE
Exposição de motivos
A realidade comprova que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) é a solução para assegurar o direito constitucional à saúde para todos, por isso a prioridade deve ser o reforço da sua capacidade de resposta, em proximidade e com qualidade para garantir que todos os utentes têm acesso à saúde, independentemente da sua condição económico-social.
Não existisse em Portugal um SNS com carácter público, universal e geral e a resposta na epidemia do SARS-CoV-2 seria seguramente diferente. Viu-se como os grupos privados da saúde reduziram ou encerraram a atividade na primeira fase, recusaram a entrada de doentes com COVID-19 nas suas instalações, revelando que o que lhes verdadeiramente interessa é o negócio da saúde. Viu-se igualmente a campanha desenvolvida por setores reacionários e pelos partidos de direita, na tentativa de descredibilização do SNS, com o objetivo de transferir a prestação de cuidados para os hospitais privados dos grandes grupos económicos.
O SNS enfrenta há mais de um ano a epidemia do SARS-CoV-2, com insuficiências e limitações que não são de hoje, mas que a epidemia evidenciou e agravou. As insuficiências e limitações com que o SNS se confronta são consequência das opções políticas de sucessivos Governos, de desinvestimento público, que se traduz no subfinanciamento crónico, na carência de profissionais de saúde, na redução de serviços e valências, nos elevados tempos de espera nas consultas, cirurgias, exames e tratamentos.
Não obstante o aumento do financiamento do Serviço Nacional de Saúde nos últimos anos, este continua aquém das necessidades, ao não assegurar a adequada dotação financeira dos estabelecimentos de saúde do SNS. A transferência de verbas do Orçamento do Estado para o SNS é inferior às despesas realizadas pelo SNS, de onde se concluí que o subfinanciamento crónico persiste.
O subfinanciamento do SNS tem reflexos nas dificuldades existentes na prestação de cuidados nos centros de saúde e nos hospitais, na obsolescência dos equipamentos, na degradação das condições de trabalho e das instalações, no número insuficiente de trabalhadores da saúde, entre outros. Portanto a dotação dos estabelecimentos do SNS dos meios financeiros necessários é condição para reforçar o investimento, melhorar as condições de prestação de cuidados e assegurar o acesso de todos os utentes aos cuidados de saúde.
Por outro lado, é igualmente necessário pôr fim à promiscuidade entre o setor público e privado e canalizar os recursos públicos para reforçar o SNS e investir no SNS e não para aumentar os lucros dos grupos privados da saúde.
A Lei de Bases da Saúde determina a existência de um Plano Plurianual de Investimentos no SNS, enquanto
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instrumento de planeamento e programação dos investimentos necessários para reforçar a capacidade no SNS. Importa por isso dar concretização a esta norma e elaborar o Plano Plurianual de Investimentos que tenha em consideração a necessidade de remodelar, ampliar e construir novas instalações de centros de saúde e hospitais, a internalização dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica, a recuperação das cerca de 4000 camas perdidas nos últimos anos nos hospitais públicos e que hoje, está mais do que comprovada a sua necessidade.
Importa também proceder à inovação e modernização tecnológica, que permita mais eficácia e eficiência na prestação de cuidados de saúde, colocando como objetivo a dotação de 2,5% do orçamento das instituições para este fim.
Os cuidados de saúde primários podem e devem ser valorizados e assumir maior relevância na prestação de cuidados de saúde, deixando os hospitais para os cuidados de saúde mais diferenciados. Os cuidados de saúde primários têm uma enorme importância na prevenção da doença e da promoção da saúde. Para que seja uma realidade, o investimento nos cuidados de saúde primários é absolutamente prioritário, através da atribuição de médico e enfermeiro de família a todos os utentes; do alargamento das suas valências, nomeadamente na saúde mental, saúde visual, saúde oral, na reabilitação e na alimentação saudável; da existência de respostas para a doença aguda e da existência de uma cobertura de proximidade em todo o território, da reabertura das extensões e centros de saúde encerrados. Os cuidados de saúde primários conheceram um acréscimo da sua atividade, com o acompanhamento de doentes assintomáticos ou com sintomas ligeiros, ou na elaboração das listagens e convocatória dos cidadãos no âmbito do plano de vacinação. Não faz sentido que, perante a necessidade de recuperar a prestação de cuidados em atraso e acompanhar os utentes, devido à epidemia tenham sido encerradas extensões de saúde e que ainda não tenham sido reabertas, deixando as populações à sua sorte.
A Lei de Bases da Saúde também prevê a criação dos Sistemas Locais de Saúde. Avançar neste modelo de organização no SNS permite a otimização dos recursos e a articulação entre vários níveis de cuidados, eliminando ineficiências. Os Sistemas Locais de Saúde não podem continuar apenas no papel, é preciso implementá-los, com o objetivo de robustecer a estrutura e organização do SNS e ao mesmo tempo assegurar melhores cuidados aos utentes.
O reforço do número de trabalhadores de saúde constitui outro elemento central para o reforço do SNS. Apesar de nos últimos anos o número de trabalhadores da saúde no Ministério da Saúde ter aumentado, continua ainda aquém das necessidades. O aumento do número de trabalhadores de saúde é fundamental para assegurar o adequado funcionamento dos serviços, para reduzir as listas de espera e para que os cuidados de saúde sejam prestados com qualidade e atempadamente.
Melhorar as condições de acesso aos cuidados de saúde passa pela melhoria das condições de prestação de cuidados de saúde, passa pelo investimento na modernização e inovação tecnológica, passa pelo investimento nas instalações e no aumento da capacidade de resposta dos centros de saúde e hospitais, passa pelo reforço do número de trabalhadores da saúde, e passa também pela eliminação dos obstáculos que continuam a criar dificuldades e a impedir o acesso dos utentes à saúde, como são exemplo as taxas moderadoras. Neste sentido propomos em definitivo a eliminação das taxas moderadoras, garantindo assim a gratuitidade do acesso à saúde; e a atribuição dos transportes de doentes não urgentes a todos os utentes que dele necessitem para aceder aos cuidados de saúde a que têm direito.
Neste momento estão colocadas enormes exigências no SNS, com a necessidade dar resposta ao combate à epidemia, de não deixar ninguém para trás, e recuperar a atividade assistencial em atraso, por isso é fundamental o reforço do SNS. É neste sentido que o PCP apresenta esta iniciativa onde propõe medidas concretas que permitem reforçar a capacidade do SNS e dotá-lo das condições necessárias para dar a resposta que se exige e que os portugueses têm direito.
Assim, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte:
Resolução
A Assembleia da República recomenda ao Governo, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição a
adoção de medidas para o reforço da capacidade do Serviço Nacional de Saúde (SNS), como solução para
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assegurar o direito constitucional à saúde para todos, incluindo designadamente: 1 – O reforço do financiamento do SNS, de forma a dotar os serviços públicos de saúde das condições
necessárias e do investimento para a prestação de cuidados de saúde com qualidade, bem como para a melhoria da sua organização.
2 – A exclusão do SNS da aplicação da Lei dos Compromissos e Pagamentos em Atraso, com o objetivo de eliminar os obstáculos na aquisição de bens essenciais na prestação de cuidados, nomeadamente de medicamentos, material clínico ou equipamentos e na realização de investimentos que permitem melhorar as condições dos serviços públicos de saúde na prestação de cuidados de saúde.
3 – A reversão do modelo de regime de parcerias público privadas na gestão de estabelecimentos de saúde, garantindo a sua gestão pública e pondo fim à promiscuidade entre público e privado.
4 – O investimento na modernização e na inovação tecnológica nos estabelecimentos de saúde que integram o SNS, através de:
a) Criação das condições para assegurar 2,5% dos orçamentos dos estabelecimentos de saúde para a sua
atualização tecnológica e funcional; b) Substituição dos sistemas de comunicações, informáticos e dos equipamentos para a realização de
exames de diagnóstico; c) Internalização dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica, reforçando a capacidade do SNS,
nos cuidados de saúde primários e nos cuidados hospitalares; d) Harmonização dos sistemas de informação existentes nos estabelecimentos do SNS, de forma a
assegurar a integração e a interoperabilidade dos sistemas, que permita a partilha de informação, salvaguardando a proteção dos dados pessoais em saúde.
e) Criação do processo clínico único que centralize toda a informação clínica do utente, facilitando a comunicação entre os diferentes níveis de cuidados, bem como a prestação de cuidados de forma integrada no SNS.
5 – A elaboração de um Plano Plurianual de Investimentos no SNS, com vista ao alargamento da rede
pública nos cuidados de saúde primários, nos cuidados hospitalares e nos cuidados continuados e paliativos considerando:
a) A remodelação, ampliação e/ou construção de novas instalações nos cuidados de saúde primários e nos
cuidados hospitalares; b) O alargamento da rede pública de cuidados continuados e de cuidados paliativos; c) A recuperação do número de camas de agudos perdido nos últimos anos, com a reposição de cerca de
quatro mil camas nos hospitais públicos; d) O aumento de unidades públicas de hemodiálise em todas as regiões, associadas aos hospitais; e) A ampliação da capacidade pública na realização de meios complementares de diagnóstico e terapêutica; f) O reforço de valências nos cuidados de saúde primários em particular nas áreas da saúde mental, saúde
visual, saúde oral, reabilitação, na alimentação saudável, entre outros. 6 – A criação de um gabinete dedicado ao planeamento das instalações e equipamentos do SNS junto da
ACSS com a responsabilidade da identificação das necessidades de investimento, do planeamento, da programação e de projeto de construção de instalações, bem como de coordenação, de operacionalização e de estabelecimento de normas e procedimentos em engenharia de saúde, com a constituição de equipas técnicas que integrem arquitetos e engenheiros.
7 – A implementação dos sistemas locais de saúde que possibilite uma maior articulação entre os vários níveis de cuidados, a gestão integrada na prestação de cuidados aos doentes, o aumento da resolutividade dos casos, com maior proximidade e cooperação entre os estabelecimentos de saúde com as entidades locais.
8 – A capacitação dos cuidados de saúde primários, para que assumam uma maior relevância no acompanhamento dos utentes, na promoção de saúde e na prevenção da doença, com a atribuição de médico e enfermeiro de família a todos os utentes, o alargamento das valências, a reabertura de extensões e centros
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de saúde encerrados e que são essenciais para assegurar a prestação de cuidados de proximidade às populações e a criação e alargamento de serviços para responder à doença aguda, libertando os hospitais e as urgências hospitalares para a prestação de cuidados de saúde diferenciados.
9 – A contratação de profissionais de saúde necessários no SNS para garantir e aumentar a capacidade de funcionamento dos serviços públicos de saúde, dos médicos, enfermeiros, técnicos superiores de saúde e técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica, assistentes técnicos e assistentes operacionais com vínculo público efetivo, para combater a epidemia do SARS-CoV-2 e para recuperar a atividade assistencial em atraso.
10 – O desenvolvimento do funcionamento dos serviços públicos de saúde assente em equipas multiprofissionais, envolvendo as diferentes áreas do conhecimento e experiências, o que potencia uma intervenção integrada, de maior qualidade e eficácia na prestação de cuidados.
11 – A adoção de medidas concretas para a redução dos tempos de espera para consultas, cirurgias, tratamentos e exames de diagnóstico e terapêutica, no âmbito do SNS, assegurando a qualidade dos cuidados de saúde prestados em tempo útil, assim como a segurança dos utentes.
12 – A eliminação definitiva das taxas moderadoras que constituem um obstáculo no acesso dos utentes aos cuidados de saúde, assegurando a gratuitidade do SNS, bem como a atribuição gratuita dos transportes de doentes não urgentes a todos os utentes que dele necessitem para aceder aos cuidados de saúde a que têm direito.
Assembleia da República, 26 de março de 2021.
Os Deputados do PCP: Paula Santos — João Dias — João Oliveira — António Filipe — Jerónimo de Sousa — Alma Rivera — Ana Mesquita — Bruno Dias — Diana Ferreira — Duarte Alves.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1159/XIV/2.ª PELA NECESSIDADE DE INTEGRAR A PRESERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE MARINHA NAS
OBRAS DE INFRAESTRUTURAS PORTUÁRIAS
As construções ou intervenções na orla costeira, servindo necessidades de mobilidade e acessibilidade das atividades económicas, implicam também fortes alterações das condições e hidrodinâmicas naturais e nos ecossistemas marinhos onde se inserem. É possível, no entanto, reduzir os seus impactes ambientais e ao mesmo tempo construir um ecossistema, mesmo que artificial, com maior valor ecológico.
Se estas obras são fundamentais, então mais do que minimizar ou mitigar os impactos que elas têm sobre o ambiente marinho, importa aproveitar a oportunidade para construir novos ecossistemas em que se consiga integrar e harmonizar a atividade humana com o meio natural. Atualmente, com algumas técnicas ou medidas simples, é possível atingir um máximo de desenvolvimento ecológico mesmo num meio que sendo artificial permite o desenvolvimento de um ecossistema rico em biodiversidade.
Para atingir estes objetivos, é fundamental encontrar formas de construir as infraestruturas em zonas marinhas que integrem e interajam com as áreas naturais adjacentes. Este tipo de abordagem não acarretará, necessariamente, um acréscimo dos custos das referidas obras. Trata-se apenas de promover pequenas alterações ao projeto, que minimizem a diferença entre o construído e o meio anterior à intervenção.
A costa portuguesa é, frequentemente, fustigada por violentas tempestades e furacões que, não raras vezes, provocam estragos avultados e obrigam a obras de recuperação, reconstrução ou mesmo até de relocalização de portos e infraestruturas marítimas. Seja no continente, seja nas regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, estes momentos de intervenção ou reconstrução podem ser vistos como oportunidades para desenvolver uma nova abordagem ecológica, através da aplicação de soluções simples, mas que fazem uma grande diferença na preservação da fauna costeira e marinha.
As intervenções ou edificações previstas devem reproduzir arquitetonicamente, ainda que de modo artificial, a linha de costa, onde dominam as rochas ásperas e cheias de reentrâncias. Assim, as peças de betão a
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construir e a colocar em contacto direto com o meio marinho podem ser rugosas e cheias de reentrâncias, de modo a contribuir para a fixação dos diversos organismos marinhos e promover um aumento da biodiversidade no local. Para além do aumento da biodiversidade, o número de bivalves, como por exemplo, as cracas e lapas, irá aumentar, nomeadamente porque estas infraestruturas poderão ter um papel importante em termos de maternidade para estas espécies. Uma simples medida consiste em adaptar o molde utilizado na fabricação das peças de betão.
Na zona interdita ou entre marés a biodiversidade é bastante rica em diversidade ecológica, devido às poças de água temporárias que aí se formam é à renovação de água em cada maré. É possível, e relativamente simples, construir nas novas infraestruturas poças artificiais, reproduzindo assim o meio natural na zona entre marés. Tal como deve ser reproduzido, dentro dos possíveis, o tipo de fundo marinho adjacente às zonas de implantação do porto ou infraestrutura marítima, principalmente em zonas onde existem poucas áreas de concentração de areia e sedimentos. Por norma estas zonas são alvo de fenómenos de hidrodinamismo marítimo cíclicos com períodos de remoção e de adição das referidas areias e sedimentos. Nos portos há uma grande concentração de sedimentos permanente e este constitui um ecossistema claramente mais pobre quando comparado com um ecossistema de fundo rochoso. Isto deve-se principalmente à redução do hidrodinamismo natural no fundo dos portos.
As obras marítimas têm como principal objetivo a redução do hidrodinamismo de superfície, as ondas. Na realidade, a hidrodinâmica do fundo pouco tem importado para os projetistas dos portos, a não ser no que se refere a eventuais problemas de acumulação de sedimentos com consequente redução das profundidades dos portos. Contudo, é possível manter o objetivo de redução da hidrodinâmica das ondas à superfície sem se anular totalmente a hidrodinâmica do fundo. Para tal, será necessário construir canais de circulação da água no fundo dos molhos de proteção dos portos e infraestruturas marítimo-portuárias. Podem ainda ser construídos pequenos recifes artificiais dentro das áreas portuárias, sem pôr em causa a sua navegabilidade, o que ainda tem a vantagem de serem de fácil monitorização.
Existem exemplos de intervenções semelhantes, um pouco por todo o mundo, e que devem servir de inspiração e de modelo a utilizar no nosso país. Refiram-se a construção de poças de maré no porto de Sydney na Austrália e no paredão de defesa da maré de Shaldon e Ringmore, no Reino Unido, a construção de pequenos buracos em estruturas adjacentes à orla costeira em São Roque, em Ponta Delgada. A experimentação de maiores rugosidades no porto de Seattle, Washington, EUA.
É possível também minimizar o impacte que as construções têm no meio terrestre costeiro e que acaba por afetar a avifauna local. Assim, nos telhados e nas fachadas dos edifícios de apoio portuário pode ser facilitada a nidificação das aves marinhas, reduzindo-se a iluminação «parasita» e criando nichos com coberto vegetal adequado para facilitar a vida das aves, sem comprometer a função técnico-administrativa dos edifícios.
É tendo em conta este conjunto de preocupações, e mesmo considerando que esteja prevista a minimização de impactos ambientais deste tipo de projetos nos estudos exigidos pela legislação – Estudos de Impacte Ambiental (EIA) e Planos de Gestão Ambiental (PGA), sobretudo na perspetiva da gestão de resíduos e outras medidas avulsas de menor importância, que o Grupo Parlamentar de Os Verdes apresenta o seguinte projeto de resolução:
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República
delibera recomendar ao Governo que: – Crie medidas e ações concretas de preservação da biodiversidade marinha nos regulamentos de
construção, reconstrução ou requalificação de obras de portos e infraestruturas marítimas costeiras e exija às entidades que gerem as infraestruturas portuárias que integrem essas medidas nos projetos e respetivos cadernos de encargos desse tipo de obras.
– Integre nessas medidas o apoio à construção e colocação de peças de betão que tenham superfície rugosa e reentrâncias, simulando as existentes no meio natural, construção de poças artificiais na zona entre as linhas de maré; construção de paredões com ângulos de maior exposição solar; construção de canais de circulação da água no fundo dos molhes de proteção dos portos e infraestruturas marítimo-portuárias para impedir a acumulação de areias e inertes; redução da iluminação «parasita» nos edifícios e introdução de nichos com coberto vegetal adequado, que atraiam e facilitem a nidificação de aves marinhas.
– Defina rácios limites entre a linha de costa artificializada vs linha de costa natural, no sentido de minimizar
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os impactos ambientais cumulativos, no meio marinho. Assembleia da República, 26 de março de 2021.
Os Deputados do PEV: Mariana Silva — José Luís Ferreira.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1160/XIV/2.ª PELA PROMOÇÃO DO CONHECIMENTO DO PATRIMÓNIO ARQUEOLÓGICO EM PORTUGAL, PELA
SUA VALORIZAÇÃO SALVAGUARDA E PRESERVAÇÃO
O Património Arqueológico, recurso cultural finito e não renovável, traduz-se num testemunho das vivências e atos humanos, revelando-se como uma marca de identidade para os territórios, pilar de desenvolvimento socioeconómico, cultural e turístico, sendo um franco contributo para a coesão territorial.
As transformações contemporâneas da sociedade, a velocidade e voracidade das suas ações, bem como as intervenções por parte do sujeito coletivo no território que o rodeia, por vezes, colocam em causa a existência deste bem comum.
A ação humana, por vezes antagónica, é a origem de uma constante pressão sobre o património arqueológico, levando por vezes à sua degradação ou até mesmo destruição.
Como exemplo dessa pressão, podemos olhar para o que se passa no território agrícola e florestal do nosso país, onde num quadro de quase perfeita oposição, podemos ver, de um lado o abandono do território rural e a sua desertificação, originando a crescente ocupação desordenada do solo agrícola por espécies arbóreas e florestais, por outro a agricultura de regime intensivo e superintensivo, as ações de arborização e rearborização que ocupam antigos territórios agrícolas, associadas às áreas de expansão florestal, bem como a crescente utilização de meios mecanizados nas atividades agroflorestais, quer de conservação quer de exploração. No meio do quadro, encontramos a imperiosa necessidade de valorizar e tornar sustentável o setor agroflorestal, um dos mais importantes do nosso tecido socioeconómico.
No entanto, verifica-se que por força das caraterísticas intrusivas inerentes à atividade agroflorestal, estas constituem fatores de elevado risco para a identificação e preservação dos vestígios arqueológicos, levando por vezes à destruição parcial ou até mesmo total, do património arqueológico, como os que têm vindo a público recentemente, e que a Assembleia da República tem acompanhado no âmbito dos trabalhos desenvolvidos na Comissão de Cultura e Comunicação.
O reconhecimento da importância do desenvolvimento sustentável da agricultura e da produção florestal, a par com, o igualmente importante reconhecimento da importância do património arqueológico, o reconhecimento da importância que ambos têm no desenvolvimento da nossa sociedade, do seu papel como motor de desenvolvimento económico e social, turístico e coesão territorial, a todos deverá impelir para a criação de uma consciência coletiva que promova a adoção de medidas mitigadoras dos referidos fatores de risco.
Deverá, pois, competir a todos a preservação do Património Arqueológico, sendo certo que neste desígnio as entidades públicas adquirem um papel de especial importância na definição de políticas públicas que propiciem a proteção e valorização do património cultural português, a defesa da natureza e o ambiente, a preservação dos recursos naturais e patrimoniais, bem como assegurar um correto ordenamento do território.
No cumprimento deste desidrato, regista-se o papel que os vários níveis da Administração Central e Local têm de assumir, não só na concretização das referidas políticas públicas, como também no cumprimento da legislação atualmente em vigor,
Considerando a natureza dos vestígios arqueológicos, e o meio onde os mesmos estão inseridos, a legislação portuguesa estabelece um regime especial de proteção legal ao Património Arqueológico.
Com efeito, não só através da Lei n.º 107/2001 de 8 de setembro, que estabelece as bases da política e do regime de proteção e valorização do património cultural, como também no Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial – Lei n.º 48/98, de 11 de agosto –, e no consequente Decreto-Lei n.º 80/2015, de 14 de maio,
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podemos encontrar determinações desta natureza. Neste domínio regista-se que a Lei de Bases do Património Cultural, Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, no
n.º 1, do artigo 11.º, define claramente como sendo «(…) um dever de todos, a preservação do património cultural, não atentando contra a sua integridade».
E acrescenta que, «(…) qualquer ato de destruição de Monumentos Nacionais, Imóveis de Interesse Público são passíveis de serem considerados crime público».
Posto isto, importa referir que, o facto de ser passível de só ser considerado crime público atos de destruição em Monumentos Nacionais, Imóveis de Interesse Público, deixa de fora desta esfera todos os outros níveis de classificação, bem como aqueles que estão em vias de classificação.
Por outro lado, força da exigência técnica inerente ao processo de classificação, verifica-se que os mesmos se prolongam no tempo mais do que é desejável, impedindo por este motivo a atuação atempada e adequada das entidades fiscalizadoras, quando se verificam atos de destruição sobre o património cultural.
No que concerne ao atual quadro legal, importa ainda referir que o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, Lei n.º 48/98, de 11 de agosto, na alínea d) do artigo 3.º, define que «um fim» da política de ordenamento do território e de urbanismo, é o de «assegurar a defesa e valorização do património cultural e natural», matéria complementada pelo 1, 2 e 3 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 80/2015, de 14 de maio, nos seguintes termos, «Os vestígios arqueológicos (…) que representam testemunhos da história da ocupação e do uso do território e assumem interesse relevante para a memória e a identidade das comunidades, são identificados nos programas e nos planos territoriais» e que os «(…) os programas e os planos territoriais estabelecem as medidas indispensáveis à proteção e à valorização do património arquitetónico, arqueológico e paisagístico, acautelando o uso dos espaços envolventes», e que «(…) no quadro definido por lei e pelos programas e planos territoriais, cuja eficácia condicione o respetivo conteúdo, os planos intermunicipais e municipais estabelecem os parâmetros urbanísticos aplicáveis e a delimitação de zonas de proteção».
Neste quadro, consideram-se os inventários fundamentais nos processos de planeamento do território, consubstanciados nas «Cartas de Património» ou «Cartas Arqueológicas», entendidas como instrumentos dinâmicos, de atualização essencial em qualquer processo de gestão e planeamento e ordenamento do território, nomeadamente os Planos Diretores Municipais e Planos Municipais de Pormenor, bem como a sua inventariação na Base de Dados Endovélico – Sistema de Informação e Gestão Arqueológica da Direção Geral do Património Cultural, matérias que necessitam de ser uniformizadas e consensualizadas transversalmente, quer nas várias estruturas organizativas da administração central, quer na administração local.
Importa pois, não só criar mecanismos de uniformização dos sistemas de registo e bases cartográficas, como também promover o registo e inventariação do Património Arqueológico na cartografia dos instrumentos territoriais, bem como definir e classificar o nível de proteção as áreas onde o mesmo se insere, criando assim as ferramentas necessárias, no domínio do ordenamento do território, que permitam a atuação preventiva em sede de licenciamento parte dos municípios, diminuindo assim o risco sobre o património arqueológico.
Apesar do atual quadro legal em vigor, considerar um conjunto de instrumentos que permitem a preservação e salvaguarda do património arqueológico, nomeadamente através da sua classificação e inventariação, verifica-se a necessidade de se promover uma atuação preventiva através da adoção de mecanismos de controlo prévio, matéria que adquire especial relevância quando o que está em apreço é a atividade agroflorestal, pelo facto de, nos termos do Decreto-Lei n.º 555/99, de 1 de dezembro, as mobilizações de solos destinadas exclusivamente a fins agrícolas ou florestais não serem consideradas mobilizações de terrenos, pelo que não são obrigadas a licença, Comunicação Prévia, ou Autorização de Utilização, nos termos do artigo 4.º do referido Decreto-Lei.
Ainda no que concerne ao quadro legal em vigor, refere-se o Fundo de Salvaguarda do Património Cultural, criado através do Decreto-Lei n.º 138/2009, de 15 de junho, que visa responder à determinação da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, que estabelece as bases da política e do regime de proteção e valorização do património cultural, de criar um fundo público para os bens culturais, que sedestina a financiar medidas de proteção e valorização apenas de intervenções em imóveis classificados ou em via de classificação, e resultantes de intervenções promovidas pela administração pública.
Atente à natureza do vestígio arqueológico, bem como à do risco que existe sobre ele, torna-se crucial a criação de políticas públicas que promovam o equilíbrio entre as várias necessidades de uma sociedade moderna, quer sejam sociais, económicas ou culturais.
Deverão ser multissetoriais, atuando em vários domínios, nomeadamente o do conhecimento e valorização, o da prevenção, o da educação e sensibilização, o da preservação, salvaguarda e proteção, o do licenciamento
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e fiscalização, de caracter transversal, mas que também de proximidade, no qual as autarquias locais e as comunidades intermunicipais, têm um papel fundamental.
Importa registar, o papel virtuoso que as autarquias locais têm tido na salvaguarda e proteção do património cultural, na sua valorização, através de inúmeros projetos levados a cabo, realçando o naturalmente assumido pela natureza das suas competências no domínio do licenciamento e fiscalização, pela proximidade que têm ao território, como ainda nas respostas de proximidade.
Considera-se a sua participação de extrema relevância também no reconhecimento e identificação do património arqueológico, pelo conhecimento de proximidade que têm do território, mas também na persecução de políticas educativas e de sensibilização, que conduzam não só à sua valorização, mas também à sua salvaguarda e proteção.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do PSD propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo:
1. Criação de mecanismo de uniformização de processos de registo, classificação e inventário entre os
vários organismos da administração central, promovendo e agilizando o Sistema Endovélico. 2. Crie mecanismos de agilização e monotorização do processo de classificação do património, bem como
do Sistema Endovélico. 3. Criação de um guia metodológico, que determine os critérios, parâmetros e fatores a serem considerados
na elaboração das Cartas de Património e das Cartas de Arqueologia, que seja objeto de uma prévia consensualização interorganizacional, que promova a identificação de áreas de proteção e salvaguarda do património arqueológico bem como a obrigatoriedade da sua inclusão nos instrumentos de gestão territorial.
4. Reforce os mecanismos de licenciamento municipal-controlo prévio, nomeadamente no que concerne à atividade agroflorestal, avalie o seu âmbito de aplicação no que concerne à mobilização de solos para fins agrícolas e florestais de carater intrusivo.
5. Avalie e promova a adoção de medidas de controlo prévio das operações agroflorestais de caracter intrusivo, em sede de Regime Jurídico de Avaliação de Impacto Ambiental, Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, e Regime jurídico das Edificações Urbanas e regulamentos municipais.
6. Crie um Plano de Emergência para a Recuperação do Património Classificado e promova a criação de equipas multidisciplinares, especializadas de intervenção de emergência nacionais pela salvaguarda do património cultural, com dotação financeira através do Fundo de Salvaguarda Nacional.
7. Promova a criação de Gabinetes Municipais/Intermunicipais do Património Cultural, através da criação de regulamentação especifica que defina os seus objetivos, estrutura técnica no domínio da arqueologia. O objetivo principal é o do reconhecimento, salvaguarda e preservação do património bem como o acompanhamento das atividades agroflorestais nos respetivos territórios, valorização e educação para o Património cultural, contribuindo ativamente para a dinamização das Cartas de Património e Arqueologia e Sistema Endovélico. Como forma de promoção da sua criação, inclua na referida regulamentação, um mecanismo de apoio financeiro de apoio às atividades realizadas pelos Gabinetes, consubstanciado num modelo de candidatura junto do junto do Ministério da Cultura.
Assembleia da República, 26 de março de 2021.
Os Deputados do PSD: Ricardo Baptista Leite — Paulo Rios de Oliveira — Carla Borges — Filipa Roseta — Fernanda Velez — Carlos Silva — Cláudia Bento — Helga Correia — Alexandre Poço — Cláudia André — Firmino Marques — Isabel Lopes — João Moura — Sérgio Marques — Olga Silvestre — Ilídia Quadrado.
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