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30 DE MARÇO DE 2021

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PROJETO DE LEI N.º 771/XIV/2.ª CONSAGRA A NATUREZA PÚBLICA DOS CRIMES DE VIOLAÇÃO, DE COAÇÃO SEXUAL, DE

FRAUDE SEXUAL, DE ABUSO SEXUAL DE PESSOA INCAPAZ DE RESISTÊNCIA E DE PROCRIAÇÃO ARTIFICIAL NÃO CONSENTIDA E ALARGA OS PRAZOS DE PRESCRIÇÃO DE CRIMES CONTRA A

LIBERDADE E AUTODETERMINAÇÃO SEXUAL DE MENORES E DO CRIME DE MUTILAÇÃO GENITAL FEMININA, PROCEDENDO À ALTERAÇÃO DO CÓDIGO PENAL E DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.

Exposição de motivos

Na XIII legislatura, por via do Projeto de Lei n.º 1047/XIII/4.ª, apresentado pelo PAN, e de outros projetos de âmbito similar, a Assembleia da República aprovou por unanimidade a Lei n.º 101/2019,de 6 de setembro, que alterou o Código Penal por forma a assegurar que o enquadramento relativo aos crimes de coação sexual, violação e abuso sexual de pessoa internada se encontra adaptada ao disposto na Convenção de Istambul, assegurando-se a centralidade da falta de consentimento nestes tipos de crime.

Apesar deste inequívoco avanço, atualmente há aspetos da Convenção de Istambul que estão por concretizar no ordenamento jurídico português, um dos quais se prende com a necessidade de se assegurar a atribuição da natureza pública a todos os crimes contra a liberdade sexual, que integram a secção I do capítulo V do Código Penal, algo que permitiria que o Ministério Público passasse a ter legitimidade para promover o processo penal correspondente, independentemente de qualquer manifestação de vontade da vítima nesse sentido. A Convenção de Istambul prevê no seu artigo 55.º, n.º 1, que «as Partes deverão garantir que as investigações das infrações previstas nos artigos 35.º, 36.º, 37.º, 38.º e 39.º da presente Convenção ou o procedimento penal instaurado em relação a essas mesmas infrações não dependam totalmente da denúncia ou da queixa apresentada pela vítima, se a infração tiver sido praticada no todo ou em parte no seu território, e que o procedimento possa prosseguir ainda que a vítima retire a sua declaração ou queixa» e no seu artigo 18.º, n.º 4, que «a prestação de serviços não deverá depender da vontade das vítimas de apresentar queixa ou de testemunhar contra qualquer perpetrador». Particularmente, relativamente a este artigo 55.º, n.º 1, o Grupo de Peritos em Ação contra a Violência contra Mulheres e Violência Doméstica (GREVIO), grupo de peritos independentes responsável pelo controlo da aplicação da Convenção de Istambul, recomendou, no seu relatório de avaliação de 20191, a alteração da legislação nacional, afirmando: «GREVIO urges the Portuguese authorities to amend their legislation to make it conform with the rules regarding ex parte and ex officio

prosecution set out in Article 55, paragraph 1, of the Istanbul Convention, as regards in particular the offences

of physical and sexual violence». Acresce que muitas vezes o constrangimento causado pelo crime na vítima, a dificuldade em integrar o

sucedido, o receio de ter de voltar a enfrentar o agressor, a exposição pública da sua intimidade perante as autoridades públicas e policiais e o receio da lógica de revitimização associada ao processo levam a que, nestes casos, a/o ofendida/o acabe por preferir o silêncio e a impunibilidade da/o agressor/a à denúncia do crime e impulso do processo penal. Comprovativo desta realidade são as estatísticas referentes ao crime de violação, que nos demonstram que existem verdadeiras cifras negras nesta matéria, com apenas 431 participações do crime de violação em 20192 – valor manifestamente baixo, apesar de representar um aumento de 2,4% face a 2018. Atendendo à situação referida a consagração da natureza pública de todos os crimes contra a liberdade sexual, ao retirar o impulso processual e toda a penosidade que lhe está associada do âmbito da vítima, garantiria uma redução significativa das cifras negras associadas a estes crimes e daria, assim, um contributo para a redução da ocorrência futura de muitos crimes desta natureza, quer pelo facto de, por um lado, a comunidade ver reforçados os seus meios gerais de prevenção e sensibilização, quer, por outro lado, uma maior dissuasão dos potenciais agressores relativamente a estes crimes. Sublinhe-se que a atribuição de natureza pública a estes crimes não irá levar a condenações injustas, uma vez que na fase de inquérito e nas fases subsequentes do processo o crime de violação será investigado de acordo com as regras gerais de imputação penal e as garantias concedidas à defesa.

Importa, contudo, sublinhar que nos crimes contra a liberdade sexual, que integram a secção I do capítulo V do Código Penal, é a liberdade sexual que se pretende tutelar, que, conforme afirma Paulo Pinto de

1 GREVIO (2019), Baseline Evaluation Report Portugal, página 76. 2 Sistema de Segurança Interna (2020), Relatório anual de segurança interna – ano de 2019, página 13.

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