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Sexta-feira, 8 de abril de 2022 II Série-A — Número 8
XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)
S U M Á R I O
Moção de rejeição n.º 1/XV/1.ª (CH): Do Programa do XXIII Governo Constitucional. Deliberação n.º 1-PL/2022: (a) Elenco e composição das comissões parlamentares permanentes. Projetos de Lei (n.os 35 a 37/XV/1.ª): N.º 35/XV/1.ª (CH) — Aumenta para 300 euros a componente fixa do suplemento por serviço e risco nas forças de segurança auferido pelos militares da Guarda Nacional Republicana e pelos agentes da Polícia de Segurança Pública. N.º 36/XV/1.ª (PAN) — Prevê o crime de assédio sexual, procedendo à quinquagésima sexta alteração ao Código Penal e à vigésima alteração ao Código do Trabalho. N.º 37/XV/1.ª (PCP) — Revoga a extinção do Serviço de
Estrangeiros e Fronteiras. Projeto de Resolução n.º 19/XV/1.ª (PAN): — Título e texto iniciais — Recomenda ao Governo a criação de canais para queixas de comportamentos de assédio, discriminação e bullying em todos os estabelecimentos de ensino, a implementação de códigos de conduta nos locais de trabalho e de ensino e programas de formação para a prevenção e combate ao assédio. — Alteração de título e texto do projeto de resolução — Recomenda ao Governo a criação de canais para queixas de comportamentos de assédio, discriminação e bullying em estabelecimentos de ensino e locais de trabalho, a implementação de códigos de conduta e programas de formação para a prevenção e combate ao assédio. (a) Publicada em Suplemento.
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MOÇÃO DE REJEIÇÃO N.º 1/XV/1.ª
DO PROGRAMA DO XXIII GOVERNO CONSTITUCIONAL
Exposição de motivos
Nas eleições do passado dia 30 de janeiro os portugueses deram maioria absoluta ao Partido Socialista, mas
elegeram o Chega como terceira força política nacional, dando também um sinal claro de mudança e,
consequentemente, pretenderam com o seu voto, um maior escrutínio da atividade do Governo e do Partido
Socialista.
O PS em 2011 conduziu o País à mais grave crise financeira, económica e social da nossa história, não
permitiremos que o faça de novo. Se é verdade que o Plano de Recuperação e Resiliência dá o conforto de
poder contar com muitos milhões de euros, tal como António Costa apelidou a «bazuca europeia», também é
verdade que o PS não é o Partido das contas certas é, sim, o Partido dos amiguismos e do «familygate». Agora
com uma «bazuca» nas mãos e uma maioria absoluta, o Partido Socialista tem passadeira vermelha para fazer
o que entender, mas o Chega não vai permitir mais abusos.
O Programa do XXIII Governo Constitucional não passa de verdadeira propaganda eleitoral, vazio de
conteúdo e de propostas concretas que deem resposta às preocupações dos portugueses. Este é um programa
propositadamente vago para dificultar o escrutínio da atuação do Governo.
As ditas opções programáticas, repletas de intenções que se materializam em «pretendemos fazer»,
«prosseguir», «reforçar», «alargar», «promover», etc., não passam de declarações de intenções e, claramente,
não constituem uma visão estratégica de Portugal.
Verifica-se, sim, a opção por políticas de curto prazo, com fundo eleitoralista, sem a adequada prudência
orçamental, sempre necessária, mas ainda mais atendendo ao atual contexto político internacional.
A atual conjuntura internacional implica medidas concretas com vista à proteção do nosso País e dos nossos
cidadãos que não estão previstas no programa de Governo apresentado.
Desde logo e começando por algo que corresponde a uma necessidade básica, o conflito na Ucrânia gera
incerteza quanto ao abastecimento de alimentos. Recorde-se que Portugal importa 75% do milho de que precisa
e mais de 90% do trigo para pão e massas, sendo que a Ucrânia é precisamente o maior fornecedor de milho a
Portugal. O nosso país é autossuficiente em pouco mais que azeite, tomate e leite, sendo por isso de
surpreender que face ao contexto atual o Programa de Governo ignore por completo a soberania alimentar do
nosso país. Mas para além disso, mantém uma Ministra da Agricultura que provou não ter as competências
necessárias para ocupar o cargo e mantém uma política que ao invés de fomentar a nossa agricultura apenas
ajuda a asfixiar mais os nossos agricultores.
O contexto pandémico que estando praticamente ultrapassado, deixou marcas evidentes, especialmente ao
nível social e económico pelo que uma aposta na recuperação económica é absolutamente fundamental. No
programa do Governo podemos ler que «Foi adotada uma política económica que teve como prioridade ajudar
as empresas a manter a capacidade produtiva e os postos de trabalho e a proteger o rendimento das famílias.
Foram lançados apoios de emergência às empresas, como o layoff simplificado, para ajudar a suportar os custos
do trabalho, o programa Apoiar, para ajudar as empresas a suportar os custos fixos, as moratórias e linhas de
crédito, para garantir o financiamento e a liquidez das empresas, para além de apoios específicos para os
setores mais atingidos pela pandemia (turismo, restauração, transportes e cultura).» O que não diz é o número
de empresas que não sobreviveram, que ficaram insolventes e tiveram que fechar as portas. Só em 2021
encerraram quase 13 mil empresas apesar dos apoios.
Atendendo ao atual preço dos combustíveis, inflação, ao custo dos bens essenciais que estão cada vez mais
inacessíveis, aos baixos salários médios, não se prevê melhorias para breve e, em especial, o programa do
Governo não dá respostas.
Pior, no que diz respeito aos combustíveis, e bem sabendo da importância do preço destes para a nossa
economia em geral, mas também para a vida dos portugueses em particular, o Governo ignora por completo
esta problemática no seu programa. Provavelmente fá-lo porque é uma importante fonte de receita para o
Estado, ignorando os impactos que tem no dia a dia da vida dos portugueses. Note-se que o ano passado, só
entre janeiro e abril, o Estado arrecadou quase mil milhões de euros com os dois maiores impostos indiretos
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que cobra sobre os combustíveis rodoviários, ou seja, com o IVA e com o ISP, o que equivale a 61,62% de todo
o dinheiro que os portugueses gastaram a abastecer os seus veículos, no período referido. Ainda assim, o
Governo nada refere quanto ao adicional de ISP que, de medida temporária parece ter passado a definitiva,
nada diz sobre o facto de os preços serem incomportáveis para os portugueses, bem sabendo que muitos deles
precisam do carro para poder trabalhar, porque o país não é só Porto e Lisboa.
No que diz respeito às medidas anticorrupção, é verdade que o Governo enuncia algumas medidas
relacionadas com a transparência e com campanhas anticorrupção, mas também é verdade que continua sem
anunciar mão pesada para quem incumprir. Recorde-se que segundo os resultados do Barómetro Global de
Corrupção de 2021, quase 90% dos portugueses acredita que há́ corrupção no Governo, que os Deputados da
Assembleia da República e os banqueiros estão entre os mais corruptos e 41% dos portugueses considerou
que a corrupção aumentou. Estes dados são uma mancha para o nosso país e para a democracia portuguesa.
Em vez de prever penas mais pesadas, mais meios para a investigação deste tipo de crimes, o Governo prevê
elaborar guias de procedimentos e ações de consciencialização.
Para além disso, prevê «Promover uma mais eficiente publicação das contas dos partidos políticos, de forma
uniformizada e facilitando o acesso, especialmente no que concerne aos períodos eleitorais», mas não prevê o
reforço dos meios humanos e técnicos da Entidade das Contas para fiscalização dos Partidos apesar dos vários
alertas para o efeito e de vários processos terem prescrito por falta de capacidade daquela entidade para dar
resposta. Entre 2017 e 2021, segundo o Presidente da Entidade das Contas e do Financiamento dos Partidos
Políticos à data, prescreveram um total de 82 processos, tendo-se poupado milhares de euros aos Partidos. É
com este tipo de políticas que o Chega não pode e não vai compactuar.
Apesar de saber que este é o debate de um programa de governo com uma maioria absoluta, isso não vai
travar o Chega, pelo contrário, ainda torna mais importante a sua missão.
Por isso, em coerência com os seus compromissos eleitorais e com os valores que norteiam o Partido, o
Chega declara a sua oposição ao caminho delineado pelo PS e deixa evidente que é a única oposição ao Partido
Socialista. A votação desta moção deixará absolutamente clara a base política de apoio a este Governo e,
consequentemente, coresponsabiliza o Governo e quem o apoiar por todas as suas ações, mas também
omissões.
Nestes termos, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 192.º da Constituição da República Portuguesa e das
demais normas constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Chega propõe que seja
rejeitado o Programa do Governo apresentado à Assembleia da República pelo XXIII Governo Constitucional.
Palácio de São Bento, 7 de abril de 2022.
Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel
Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias
— Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.
———
PROJETO DE LEI N.º 35/XV/1.ª
AUMENTA PARA 300 EUROS A COMPONENTE FIXA DO SUPLEMENTO POR SERVIÇO E RISCO NAS
FORÇAS DE SEGURANÇA AUFERIDO PELOS MILITARES DA GUARDA NACIONAL REPUBLICANA E
PELOS AGENTES DA POLÍCIA DE SEGURANÇA PÚBLICA
Exposição de motivos
É indiscutível que o exercício das profissões relacionadas com a segurança pública têm riscos associados,
o que inclusivamente já é reconhecido legalmente tanto no Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro, que
aprova o sistema remuneratório dos militares da Guarda Nacional Republicana como no Decreto-Lei n.º
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243/2015, de 19 de outubro, e posteriores alterações, que aprova o estatuto profissional do pessoal com funções
policiais da Polícia de Segurança Pública. Não basta, no entanto, esse reconhecimento na letra da lei, importa
também compensar devidamente estes profissionais que são essenciais para a manutenção da paz pública.
O chamado «subsídio de risco» era inicialmente de apenas trinta e um euros, tendo aumentado para cem
euros em janeiro deste ano, decorrente da aprovação do Orçamento do Estado do ano passado. Em
cumprimento do disposto no artigo 42.º da LOE 2021, relativo à atribuição de valor específico que compense o
risco e a penosidade acrescidos das respetivas funções, o Governo determinou o aumento de sessenta e nove
euros na componente fixa do suplemento por serviço nas forças de segurança, passando este subsídio a
contemplar o risco da profissão.
No preâmbulo do Decreto-Lei n.º 77-C/2021, de 14 de setembro, podemos ler que a atribuição deste subsídio
reflete o reconhecimento do «papel fundamental das forças de segurança na preservação da segurança interna
do país», para além de também reconhecer que «o exercício das funções policiais caracteriza-se pelo exercício
de direitos e cumprimento de deveres especiais, mas também por condições particulares e específicas da
prestação de trabalho, sobretudo no que se refere ao risco e penosidade acrescidos das suas funções em face
dos demais trabalhadores da Administração Pública».
Acontece que este valor tem sido contestado pelos sindicatos da PSP e associações socioprofissionais da
GNR, que o consideram insuficiente e pouco dignificante face aos riscos que efetivamente sentem no exercício
das suas funções.
Desde logo não se compreende porque é que os profissionais da PSP e da GNR veem ser-lhes atribuído um
subsídio de valor muito inferior ao auferido pelos agentes da Polícia Judiciária e do Serviço de Estrangeiros e
Fronteiras, que a este título recebem quatrocentos e trinta euros.
Quando foi anunciado o aumento do subsídio para cem euros, a várias estruturas representativas dos
profissionais da GNR e PSP imediatamente reagiram referindo que o valor atribuído era insuficiente e
reivindicando o valor de quatrocentos e trinta euros, sendo que admitem aceitar um aumento faseado desse
valor.1
Recorde-se que, segundo o Relatório de Segurança Interna (RASI) de 20202, em resultado da atividade
operacional das forças de segurança pública registaram-se três óbitos (dois militares da GNR e um agente da
PSP), sete feridos com necessidade de internamento (dois militares da GNR, três agentes da PSP e dois agentes
da polícia judiciária) e 846 feridos ligeiros, dos quais trinta e cinco da polícia judiciária e os restantes da GNR e
PSP. É evidente o nível de risco associado ao exercício destas profissões bem como a circunstância da GNR e
PSP, devido à sua proximidade com as populações, estarem mais expostas a situações de violência.
É verdade que a maioria dos contactos com o público são pacíficos, no entanto, não podemos ignorar as
situações em que não o são, e em que especialmente os cidadãos atuam no sentido de exercer violência contra
os polícias e de constranger a sua atuação, para além de sabermos que em alguns desses casos os agressores
estão armados o que eleva o risco de ofensa à integridade física do polícia. A violência neste âmbito pode
assumir diversas formas, pode ir desde a violência física, a ameaça, injúrias e em certas circunstâncias pode
levar à prática do crime de homicídio.
Acresce que a falta de valorização profissional, as dificuldades no exercício da profissão, entre outros fatores,
tem levado a que, nas últimas duas décadas, 160 polícias portugueses – 80 na PSP e 80 na GNR – tenham
terminado com a própria vida. Sendo que comparativamente, a taxa de incidência de suicídios nas forças de
segurança varia entre o dobro e o triplo face à população geral3. Esta é uma estatística a que não podemos ficar
indiferentes, cabendo ao Estado assegurar a proteção daqueles que zelam por todos nós.
O Chega desde sempre tem priorizado as reivindicações dos profissionais das forças de segurança,
precisamente por compreender a importância da sua função. No seu programa eleitoral, o Partido defende a
promoção de «uma cultura cívica de respeito pela autoridade e dignidade dos agentes das forças e serviços de
segurança que envolva a sensibilidade dos cidadãos comuns. Esta renovada ambição cívica exige reformas
administrativas, logísticas e legislativas que dotem as forças policiais, e respetivos agentes, de recursos, meios
e dignidade pessoal, familiar, profissional e social indispensáveis ao bom desempenho da sua missão de
1 https://observador.pt/2021/09/02/policias-desconhecem-valor-do-subsidio-de-risco-aprovado-esta-quinta-feira-pelo-governo/ 2 https://www.portugal.gov.pt/download-ficheiros/ficheiro.aspx?v=%3d%3dBQAAAB%2bLCAAAAAAABAAzNDQ1NAUABR26oAUAAAA%3d 3 https://visao.sapo.pt/atualidade/sociedade/2021-11-25-o-que-se-passa-nas-policias-taxa-de-suicidios-e-mais-do-dobro-da-populacao-geral/
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soberania.» Para além disso, deixou o compromisso de propor um projeto lei que assegure o reconhecimento
de que estas profissões são «de desgaste rápido associada a riscos, penosidade e exigência física e
psicológica.» Face ao que, vem propor o aumento da componente fixa do suplemento por serviço e risco nas
forças de segurança auferido pelos militares da Guarda Nacional Republicana e pelos agentes da Polícia de
Segurança Pública para 300 euros, já em 2022, logo após a aprovação do Orçamento do Estado.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Chega apresenta o
seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei aumenta para 300 euros a componente fixa do suplemento por serviço e risco nas forças de
segurança auferido pelos militares da Guarda Nacional Republicana e pelos agentes da Polícia de Segurança
Pública, para tanto procede à alteração do:
a) Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro, e posteriores alterações, que aprova o sistema remuneratório
dos militares da Guarda Nacional Republicana;
b) Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro, e posteriores alterações, que aprova o estatuto profissional
do pessoal com funções policiais da Polícia de Segurança Pública.
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro
É alterado o artigo 20.º do Decreto-Lei 298/2009, de 14 de outubro, alterado pelos Decretos-Leis n.º 46/2014,
de 24 de março, n.º 113/2018, de 18 de dezembro, n.º 7/2021, de 18 de janeiro, e n.º 77-C/2021, de 14 de
setembro, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 20.º
Suplemento por serviço e risco nas forças de segurança
1 – […]:
a) […];
b) Uma componente fixa, no valor de (euro) 300.
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].»
Artigo 3.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro
É alterado o artigo 154.º do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro, alterado pela Lei n.º 114/2017, de
29/12 e pelo Decreto-Lei n.º 77-C/2021, de 14 de setembro, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 154.º
[…]
1 – […].
2 – Não obstante o disposto no número anterior, a componente fixa do suplemento por serviço e risco
nas forças de segurança, prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 102.º do Decreto-Lei n.º 299/2009, de 14
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de outubro, na sua versão originária, é fixada no valor de (euro) 300.»
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.
Assembleia da República, 7 de abril de 2022.
Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel
Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias
— Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.
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PROJETO DE LEI N.º 36/XV/1.ª
PREVÊ O CRIME DE ASSÉDIO SEXUAL, PROCEDENDO À QUINQUAGÉSIMA SEXTA ALTERAÇÃO
AO CÓDIGO PENAL E À VIGÉSIMA ALTERAÇÃO AO CÓDIGO DO TRABALHO
Exposição de motivos
A Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a
Violência Doméstica, adotada em Istambul, a 11 de maio de 2011, no seu artigo 40.º estabelece que «as partes
deverão adotar as medidas legislativas ou outras que se revelem necessárias para assegurar que qualquer tipo
de comportamento indesejado de natureza sexual, sob forma verbal ou física, com o intuito ou efeito de violar a
dignidade de uma pessoa, em particular quando cria um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante
ou ofensivo, seja passível de sanções penais ou outras sanções legais».
O assédio sexual é um grave problema social que, para além de violar direitos fundamentais, constitui um
comportamento que produz elevados danos na vítima, nomeadamente psíquicos, económicos e sociais.
Estima-se que uma em cada três mulheres tenha sido ou é, presentemente, vítima de assédio sexual no local
de trabalho, sendo este um dos principais fatores que afetam a saúde de trabalhadores e trabalhadoras em todo
o mundo, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Sendo uma das diversas formas de violência de género, que afeta sobretudo as mulheres, reveste
indubitavelmente contornos insidiosos, quer no espaço público, quer nos locais de trabalho, onde assistimos a
uma quase total impunidade por parte dos agressores e uma falta de proteção das vítimas.
Esta falta de proteção está muito enraizada naquela que tem sido uma verdadeira aceitação social do
assédio, uma vez que com a normalização deste tipo de comportamento as vítimas desenvolvem mecanismos
de internalização e uma autoculpabilização pelas ações de terceiros.
A ausência de condenações e de cumprimento de penas efetivas desvirtuam o objetivo das sanções penais,
nomeadamente a sua prevenção geral e especial e a sua capacidade para defesa de bens jurídicos essenciais,
demonstrando à sociedade uma desvalorização da violência sexual e do impacto desta na vida das vítimas.
O mesmo acontece quando se transfere para qualquer comportamento da vítima a tentativa de justificação
que conduza à atenuação da culpa do agressor quanto a atos sexuais não consentidos, perpetuando a existência
de um sistema judicial misógino e que menoriza e desconsidera os crimes de natureza sexual, os danos morais,
físicos, emocionais e psicológicos provocados às vítimas.
O princípio da dignidade da pessoa humana e a superioridade inerente em relação ao património impõem
que os crimes contra a liberdade sexual das pessoas não possam ter penas efetivas semelhantes a crimes
patrimoniais pouco graves ou «bagatelas» penais.
As alterações legislativas efetuadas em 2015, que abrangeram os crimes de violação, coação sexual e
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importunação sexual, pretenderam dar cumprimento ao disposto na Convenção do Conselho da Europa para a
Prevenção e o Combate à Violência Contra as Mulheres e a Violência Doméstica.
Porém, a figura da importunação sexual, revestida de conceitos amplos, indeterminados e de natureza e
gravidades diversas, é a norma jurídica que é quase sempre utilizada quando se fala de assédio sexual. No
nosso entendimento, tal não se afigura suficiente.
Se falamos de condutas e de um problema social que afeta mais de metade da população atual, a
criminalização destes comportamentos e a cabal proteção do bem jurídico em causa torna-se absolutamente
essencial.
A autonomização do crime de assédio sexual daria não só cumprimento à Convenção de Istambul, como
responderia aos anseios sociais prementes e da própria tendência do Direito Internacional que tem procurado
combater todas as formas de violência de género.
Ainda que se entenda que alguns comportamentos normalmente caracterizados e socialmente designados
como assédio sexual possam subsumir-se ao previsto para o crime de importunação sexual, o Código Penal é
tímido no que diz respeito à proteção do bem jurídico. A própria fraqueza do conceito de «importunação»
demonstra o intrínseco desdém de uma sociedade patriarcal.
Por outro lado, o Código do Trabalho prevê, no seu artigo 29.º, a proibição da prática de assédio, conferindo
à «vítima o direito de indemnização» e subsumindo-o, do ponto de vista contraordenacional, a uma
contraordenação muito grave, «sem prejuízo da eventual responsabilidade penal prevista nos termos da lei».
A mencionada norma do Código do Trabalho parece lançar o mote para a necessidade de uma formulação
similar e correlacionada no Código Penal português, nomeadamente para a eventual criação de uma norma
autónoma, tal como já se verifica noutros ordenamentos jurídicos, como é o caso do Código Penal Francês e
Espanhol.
É essencial ressalvar que está em causa a violação de direitos fundamentais das vítimas, como o direito ao
livre desenvolvimento da personalidade e o direito à integridade pessoal, que incluem a liberdade e
autodeterminação sexual (artigos 25.º e 26.º da Constituição da República Portuguesa), bem como o direito ao
trabalho, (artigo 58.º, n.º 1) e o direito à igualdade de oportunidades na escolha da profissão (artigo 58.º, n.º 2).
O assédio sexual condiciona o acesso ao emprego, à manutenção do emprego ou promoções profissionais
e cria um ambiente de trabalho hostil e intimidatório.
De igual modo, o assédio sexual nos locais de trabalho assume contornos de gravidade superior ao praticado
noutros contextos, na medida em que a vítima vive dependente, para a sua sobrevivência económica e da sua
família, da manutenção do seu posto de trabalho, o que leva a que, na maioria das vezes, estas vítimas não se
defendam nem apresentem a devida queixa.
Pretende-se, todavia, que se estenda, tal como faz o Código Penal Espanhol, o assédio sexual às relações
laborais, docentes ou de prestação de serviços, não se limitando, evidentemente, o assédio sexual no trabalho
à existência ou não de um contrato de trabalho ou da existência de subordinação jurídica, bem como a situações
de trabalhadores e trabalhadoras liberais e prestadores de serviços, e ainda nas relações de docentes e alunos
e alunas, chamando desta forma à colação a conhecida existência de assédio sexual nas universidades.
É de conhecimento público e patente no Relatório Anual de Segurança Interna de 2020, que os crimes contra
a liberdade a autodeterminação sexual afetam maioritariamente vítimas do sexo feminino. Todavia, importa
lembrar que a forma como são transmitidos os casos e percecionadas as vítimas condiciona, de sobremaneira,
as denúncias dos casos pelas vítimas, onde se inclui também o sexo masculino.
A violência de género, em todas as suas formas, tem vindo a ser uma preocupação reiterada do PAN, tendo
já defendido, no passado, que a legislação portuguesa se encontrava desajustada em matéria de crimes sexuais
e que era premente a adequação da lei nacional ao disposto na Convenção de Istambul, ratificada por Portugal
em 2013.
Para o efeito, o PAN elaborou um projeto de lei para alterar o Código Penal (Projeto de Lei n.º 1047/XIII/4.ª)
para que o sexo sem consentimento fosse considerado crime de violação, endurecendo a moldura penal para
que os violadores cumpram pena de prisão efetiva e ainda para que a coação sexual e a violação se tornassem
crimes públicos, ou seja, não dependentes de queixa das vítimas para que o processo seja iniciado, à
semelhança do que já acontece para crimes como a violência doméstica.
O constrangimento causado pelo crime na vítima, o receio de voltar a enfrentar o agressor, a exposição
pública da sua intimidade perante as autoridades públicas e policiais e o receio da revitimização associada ao
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processo, levam a que, nestes casos, as vítimas acabem por optar pelo silêncio e impunibilidade do agressor à
denúncia do crime e impulso do processo penal.
Entende-se que a atribuição de natureza pública aos crimes sexuais, no presente caso, o crime de assédio
sexual, reforça a proteção da vítima e contribui para a redução deste tipo de crimes.
Relembre-se que o processo penal acarreta aspetos negativos com forte impacto psicológico que não devem
ser ignorados, dos quais se destaca a sujeição da vítima a um penoso processo de revitimização.
Assim, qualquer alteração legal que atribua natureza pública aos crimes contra a liberdade sexual deverá
evitar cair no erro de fazer prevalecer cegamente o interesse comunitário na persecução penal sobre a vontade
da vítima, tendo em conta estes aspetos negativos associados ao procedimento criminal e prever, conforme
defendeu a APAV1, uma válvula de escape, através da qual se possa dar voz à vítima e valorar a sua vontade.
Tendo em conta o anteriormente exposto, o PAN propôs que todos os crimes contra a liberdade sexual, à
exceção do crime de importunação sexual de pessoas maiores de idade, passem a ter natureza pública. Assim,
no crime de assédio sexual, em linha com o que defendeu a APAV, prevê-se que nos procedimentos iniciados
pelo Ministério Público relativamente a estes crimes contra pessoas maiores de idade, a vítima possa, a todo o
tempo, requerer o arquivamento do processo e que tal requerimento só possa ser recusado pelo Ministério
Público, quando, de forma fundamentada, se considere que o prosseguimento da ação penal é o mais adequado
à defesa do interesse da vítima e que o pedido se deveu a qualquer tipo de condicionamento por parte do arguido
ou de terceiro. Neste último caso, deverá haver lugar à aplicação das medidas necessárias à sua proteção contra
eventuais retaliações.
O PAN considerou ainda de grande importância, em iniciativa anterior, a revogação dos artigos 165.º e 166.º
do Código Penal, concernentes aos crimes de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência e abuso sexual
de pessoa internada, dado entender que estes devem ser integrados nos crimes de coação sexual e violação,
passando a revestir o fundamento de circunstâncias agravantes, uma vez que se reportam a situações de
pessoas com especial vulnerabilidade, donde a reprovação social e legislativa deve revestir-se de maior
intensidade.
Desta forma, pretende o PAN promover uma alteração de paradigma intrínseco e crónico da culpabilização
da vítima, que muitas vezes se verifica na forma como são apresentados ou comentados os casos, tanto na
comunicação social como na própria lei ou jurisprudência.
O PAN apresentou ainda, numa perspetiva preventiva, o Projeto de Lei n.º 1191/XIII/4.ª, no qual pretendia
obrigar todos os agressores sexuais à frequência de programas de reabilitação.
Desta feita, pretende o PAN recomendar que sejam cumpridos os objetivos previstos na Estratégia Nacional
para a Igualdade e a Não Discriminação 2018-2030 «Portugal + Igual», aprovada pelo XXI Governo
Constitucional a 8 de março de 2018 e pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 61/2018, de 21 de maio,
reconhecendo a Igualdade e a Não Discriminação como condição para a construção de um futuro sustentável
para Portugal, bem como a necessária implementação de um código de conduta de prevenção e combate ao
assédio sexual nos locais de trabalho, de formação em ambientes escolares, de docência, dos órgãos de polícia
criminal, magistrados judiciais e do Ministério Público e dos órgãos de comunicação social – com vista a informar
de forma correta, desconstruindo os valores tradicionais e dessexualizar a violência sexual e colocando a tónica
no agressor e não na vítima.
A violência sexual não é sexo, nem pode ser desvalorizada. A violência sexual é crime e deve ter um
enquadramento penal que não permita quaisquer interpretações dúbias das normas aplicáveis.
Nestes termos, a abaixo assinada Deputada única representada do partido Pessoas-Animais-Natureza, ao
abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, apresenta o seguinte projeto de lei:
1 APAV (2018), Contributo da APAV referente ao Projeto de Lei n.º 1047/XIII/4.ª (PAN), página 10.
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Artigo 1.º
Objeto
1 – A presente lei procede:
a) À quinquagésima sexta alteração do Código Penal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de
setembro.
b) À vigésima alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
Artigo 2.º
Aditamento ao Código Penal
É aditado à secção I do capítulo V do título I do livro II do Código Penal o artigo 163.º-A, passando a ter a
seguinte redação:
«Artigo 163.º-A
Assédio Sexual
1 – Quem fizer uma proposta ou solicitar favores de natureza sexual, para si ou para terceiro, ou adotar um
comportamento de teor sexual indesejado que humilhe, intimide ou ofenda é punido com pena de prisão até 2
anos ou com pena de multa.
2 – O procedimento criminal não depende de queixa.
3 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, nos procedimentos iniciados pelo Ministério Público
relativamente ao crime de assédio sexual e que não tenham sido praticados contra menor ou que deles não
tenha resultado suicídio ou morte da vítima, a vítima pode, a todo o tempo, requerer o arquivamento do processo,
só podendo o Ministério Público rejeitar tal requerimento quando, de forma fundamentada, considere que o
prosseguimento da ação penal é o mais adequado à defesa do interesse da vítima e que o pedido se deveu a
qualquer tipo de condicionamento por parte do arguido ou de terceiro, caso em que deverá promover sempre a
aplicação das medidas necessárias à sua proteção contra eventuais retaliações.»
Artigo 3.º
Alteração ao Código Penal
São alterados os artigos 177.º e 178.º do Código Penal, o qual passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 177.º
[…]
1 – […]:
a) […]; ou
b) Se encontrar numa relação familiar, de coabitação, de tutela ou curatela, ou de dependência hierárquica,
de docência, económica ou de trabalho do agente e o crime for praticado com aproveitamento desta relação.
c) […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].
7 – […].
8 – […].
Página 10
II SÉRIE-A — NÚMERO 8
10
«Artigo 178.º
[…]
1 – O procedimento criminal pelos crimes previstos nos artigos 163.º, 164.º, 165.º, 167.º, 168.º e 170.º,
depende de queixa, salvo se forem praticados contra menor ou deles resultar suicídio ou morte da vítima.
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].»
Artigo 4.º
Alteração ao Código do Trabalho
São alterados os artigos 10.º e 29.º do Código do Trabalho, os quais passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 10.º
[…]
As normas legais respeitantes a direitos de personalidade, liberdade e autodeterminação sexual, igualdade
e não discriminação e segurança e saúde no trabalho são aplicáveis a situações em que ocorra prestação de
trabalho por uma pessoa a outra, sem subordinação jurídica, sempre que o prestador de trabalho deva
considerar-se na dependência económica do beneficiário da atividade.
Artigo 29.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – Constitui assédio sexual o comportamento indesejado de caráter sexual, sob forma verbal, não verbal ou
física, com os objetivos ou o efeitos referidos no número anterior, ou com o objetivo de afetar a liberdade ou
autodeterminação sexual da pessoa.
4 – […].
5 – […].
6 – […].»
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Assembleia da República, 7 de abril de 2022.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
———
Página 11
8 DE ABRIL DE 2022
11
PROJETO DE LEI N.º 37/XV/1.ª
REVOGA A EXTINÇÃO DO SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS
Exposição de motivos
Na XIV Legislatura, o Governo fez aprovar na Assembleia da República alterações à Lei de Segurança
Interna, à Lei de Organização da Investigação Criminal e às Leis Orgânicas da PSP e da GNR, tendo como
único objetivo a extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
O Governo pretendeu extinguir o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, repartindo as suas atuais atribuições
por cinco entidades distintas: o Serviço de Estrangeiros e Asilo a criar, o Instituto de Registos e Notariado, a
Polícia judiciária, a Polícia de Segurança Pública e a Guarda Nacional Republicana.
O PCP não concordou com essa pretensão e votou contra a proposta de lei.
Não está em causa a justeza da razão invocada pelo Governo de separar, no âmbito do SEF, as funções
policiais das funções administrativas. Essa separação é adequada, é justa e o PCP sempre a defendeu. Não é
justo nem adequado que tudo o que se relaciona com o estatuto legal dos estrangeiros em Portugal seja tratado
por um serviço policial, como se os estrangeiros fossem potenciais delinquentes. Se um cidadão nacional renova
o seu cartão de cidadão no Instituto dos Registos e Notariado não há qualquer razão para que um cidadão não
nacional tenha de recorrer a um serviço policial para requerer ou renovar a sua autorização de residência.
O problema não está, portanto, na criação de um novo Serviço de Estrangeiros e Asilo. A questão é a de
saber se uma medida dessa natureza deve implicar necessariamente a extinção do SEF enquanto serviço de
segurança, ou seja, se existem razões válidas para extinguir o SEF nas circunstâncias, no tempo e no modo em
que o Governo o pretende fazer.
Na verdade, o momento escolhido pelo Governo para propor a extinção do SEF, não podia ser pior. Não só
não constava no programa do Governo a extinção do SEF, como esse processo, no momento em que surgiu,
não poderia deixar de ser visto como uma fuga para a frente perante as dificuldades que o Governo enfrentou
na sequência de um crime horrível cometido nas instalações e por elementos do SEF. Ninguém acredita que o
Governo avançasse para a extinção do SEF se esse crime não tivesse sido cometido e se não tivessem sido
cometidos erros dramáticos na gestão política desse processo.
Mas ao avançar para a extinção, o Governo fez recair as consequências do crime sobre toda uma instituição
e sobre todos os elementos que a integram, e essa generalização não é justa. Perante um crime horrível, exigia-
se uma rigorosa investigação, a condenação dos responsáveis, e a adoção de medidas organizativas que
garantam que nada de semelhante voltará a acontecer. Extinguir uma força policial em consequência de um
crime cometido por elementos seus é tratar essa força como se fosse uma associação criminosa e isso não é
justo.
A questão, porém, não é só a do momento em que a extinção foi decidida. É também a de saber se há razões
suficientes para supor que da distribuição das funções policiais do SEF por três forças de segurança distintas
haverá ganhos para a segurança interna. Essas razões não estão demonstradas.
O SEF desenvolve a sua atividade há mais de 35 anos. Tem uma experiência própria decorrente da sua ação
no terreno, com atribuições específicas e distintas das que pertencem a outras forças e serviços de segurança.
Tem um papel específico e relevante em matéria de cooperação internacional. Tem uma identidade e uma
experiência própria de intervenção em áreas tão complexas como o combate às redes de imigração ilegal ou de
tráfico de seres humanos. Tem uma formação específica, distinta da que é ministrada às forças e serviços de
segurança por onde os seus efetivos vão ter de se repartir.
As dificuldades com que o SEF se tem debatido ao longo dos anos decorrem, em larga medida, de uma
escassez de recursos humanos, cujo reconhecimento unanime atesta a importância da sua missão.
Pretende o Governo que os profissionais do SEF com funções policiais sejam repartidos por três forças de
segurança. Acontece, como ninguém ignora, que a natureza dessas forças reflete enormes diferenças quanto à
sua natureza e quanto ao estatuto dos seus profissionais. O problema, contudo, está muito longe de ser de
natureza estatutária ou socioprofissional. O problema é o de saber se, conhecidas as dificuldades que afetam
as forças e serviços de segurança para garantir a multiplicidade de funções de que são incumbidas, haverá
condições para que os elementos do SEF integrados nestas forças possam garantir o grau de especialização
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II SÉRIE-A — NÚMERO 8
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que atualmente os diferencia.
A opção de extinguir o SEF foi medida avulsa, uma ação típica de fuga para a frente, sem equacionar
globalmente a estrutura nacional de segurança interna e sem medir previamente todas as dificuldades
decorrentes desse processo. Arrisca-se, se for por diante, a criar situações de instabilidade ao nível das diversas
forças e serviços envolvidos e a causar prejuízos sérios ao país em matéria de segurança interna.
Apesar das críticas, o Governo decidiu mesmo avançar com a extinção do SEF e essa decisão, aprovada na
AR, traduziu-se na Lei n.º 73/2021, de 12 de novembro, que introduziu alterações na Lei de Segurança Interna,
na Lei de Organização da Investigação Criminal e nas Leis Orgânicas da PSP e da GNR.
Publicada em 12 de novembro de 2021, a lei deveria entrar em vigor em 12 de janeiro de 2022. Sucede,
porém, que as dificuldades para que o PCP alertou em devido tempo, não tardaram em surgir, o que levou o
Governo a propor à Assembleia uma alteração à lei, antes mesmo da sua entrada em vigor, no sentido de alargar
o respetivo período de vacatio legis, de modo que a entrada em vigor só ocorra no próximo dia 12 de maio.
A situação de indefinição em que o Governo lançou o SEF é insustentável. A recente demissão do Diretor
Nacional é um reflexo disso mesmo. O SEF é hoje uma instituição paralisada, com todas as consequências que
isso implica para os cidadãos que precisam de resolver inadiavelmente problemas relacionados com a sua
permanência em Portugal. Em vez de tentar perceber como pode extinguir o SEF, melhor seria se o Governo
se preocupasse em criar condições para que ele pudesse trabalhar.
É isso que o PCP propõe com o presente projeto de lei. Revogar as alterações legislativas aprovadas no
âmbito do processo de extinção do SEF e repristinar as normas revogadas do modo a manter o estatuto jurídico
e operacional do SEF. Haverá então condições de serenidade para tomar as decisões que se imponham para
separar devidamente as funções policiais das administrativas relativamente em tudo o que se refere ao estatuto
jurídico dos cidadãos estrangeiros em Portugal.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Norma revogatória
A presente lei revoga a Lei n.º 73/2021, de 12 de novembro, que introduziu alterações na Lei de Segurança
Interna, na Lei de Organização da Investigação Criminal e nas Leis Orgânicas da PSP e da GNR.
Artigo 2.º
Norma repristinatória
1 – São repristinados:
a) Os artigos 12.º, 23.º-A e a alínea d) do n.º 2 do artigo 25.º da Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto;
b) os artigos 3.º, 18.º e 21.º da Lei n.º 53/2007, de 31 de agosto;
c) os artigos 3.º, 22.º e 40.º da Lei n.º 63/2007, de 6 de novembro;
d) os artigos 7.º e 13.º da Lei n.º 49/2008, de 27 de agosto.
e) o Decreto-Lei n.º 252/2000, de 16 de outubro;
nas redações anteriores à Lei n.º 73/2021, de 12 de novembro.
2 – É consequentemente revogada a Lei n.º 89/2021, de 16 de dezembro.
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.
Assembleia da República, 8 de abril de 2022.
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Os Deputados do PCP: Paula Santos — Alma Rivera — Bruno Dias — João Dias — Diana Ferreira —
Jerónimo de Sousa.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 19/XV/1.ª
Título e texto iniciais
RECOMENDA AO GOVERNO A CRIAÇÃO DE CANAIS PARA QUEIXAS DE COMPORTAMENTOS DE
ASSÉDIO, DISCRIMINAÇÃO E BULLYING EM TODOS OS ESTABELECIMENTOS DE ENSINO, A
IMPLEMENTAÇÃO DE CÓDIGOS DE CONDUTA NOS LOCAIS DE TRABALHO E DE ENSINO E
PROGRAMAS DE FORMAÇÃO PARA A PREVENÇÃO E COMBATE AO ASSÉDIO
Exposição de motivos
A Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL) abriu, de 11 a 25 de março, um canal para receção
de denúncias de comportamentos de assédio, discriminação e bullying por parte do corpo docente.
Em apenas 11 dias, recebeu, por essa via, 70 denúncias, 50 das quais foram validadas como relevantes. As
queixas eram referentes a 31 docentes, ou seja, cerca de 10% do total de professores e assistentes da
faculdade, sendo que sete concentraram mais de metade das queixas.
Das 50 queixas validades, 29 dizem respeito a casos de assédio moral, 22 de assédio sexual, 8 de práticas
discriminatórias de sexismo, 5 de xenofobia e racismo e uma de homofobia.
O relatório desta experiência, criada por iniciativa do Conselho Pedagógico, conclui pela existência de
«problemas sérios e reiterados de assédio sexual e moral perpetrados por docentes da faculdade».
A direção da faculdade mostrou-se concordante com a criação de um código de conduta de forma a clarificar,
determinar e valorar como infrações determinadas condutas.
Refere-se que «os alvos de xenofobia/racismo terão sido alunos brasileiros, negros ou originários de países
africanos de língua oficial portuguesa» e, «no caso do sexismo, todos os casos se referem a discriminação de
pessoas do género feminino»1.
Relativamente ao que resultará das queixas efetuadas através deste canal e que deram origem ao relatório
que será analisado pela Direção da Faculdade ainda não é certo que todas se traduzam em queixas formais e
sigam os trâmites existentes para inquéritos disciplinares, uma vez que é a Direção da Faculdade que tem poder
disciplinar. Todavia, é indubitável a grande importância desta iniciativa, não só para a possível tramitação das
queixas apresentadas como para o empoderamento das vítimas e o combate ao silêncio reiterado que resulta
deste tipo de crimes, bem como ao combate ao «sentimento de impunidade» e «clima de medo» de que a
Associação Académica da FDUL refere existir.
Esta iniciativa, ainda que embrionária, demonstra pelas inúmeras queixas, num curto período de tempo, a
urgência de fazer chegar mecanismos semelhantes a todos os estabelecimentos de ensino, onde as relações
de especial poder, como é o caso das relações de docência, conduzem muitas vezes à prática dos crimes em
apreço, que na maior parte das vezes não são relatadas pelos alunos por receio de represálias e por descrença
no procedimento e procedência das suas queixas.
Desta forma, é premente a definição de códigos de conduta e de boas práticas produzidas por entidades que
se dedicam ao ensino e a implementação, em consonância com o canal criado, de mecanismos e procedimentos
que permitam acompanhar a tramitação de forma transparente e independente. Para tal, importa também
garantir o acompanhamento por representantes dos alunos, de modo que assegurem o correto tratamento das
queixas pelos órgãos dos estabelecimentos de ensino ou o encaminhamento para o Ministério Público.
1 https://www.dn.pt/sociedade/10-dos-docentes-da-faculdade-de-direito-da-ul-denunciados-por-assedio-e-discriminacao-14740133.html
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O PAN, como um partido pautado pelo princípio da não-violência, é, veementemente, contra qualquer tipo
de discriminação xenófoba, racista, sexista, homofóbica, transfóbica ou quaisquer outras.
Desta forma, o combate à discriminação e ao assédio, enquanto fenómenos que se têm demonstrado como
estruturais e, muitas vezes, socialmente aceites, é absolutamente essencial, principalmente numa perspetiva de
proteção das vítimas, uma vez que a normalização deste tipo de comportamento resulta no desenvolvimento de
mecanismos de internalização e numa autoculpabilização pelas ações de terceiros.
Não nos podemos esquecer que, quando se trata de situações de assédio sexual, o que está em causa é a
violação de direitos fundamentais, como o direito ao livre desenvolvimento da personalidade e o direito à
integridade pessoal, que incluem a liberdade e autodeterminação sexual (artigos 25.º e 26.º da Constituição da
República Portuguesa), bem como o direito ao trabalho, (artigo 58.º, n.º 1) e o direito à igualdade de
oportunidades na escolha da profissão (artigo 58.º, n.º 2).
A violência de género, em todas as suas formas, tem vindo a ser uma preocupação reiterada do PAN, tendo
já defendido, no passado, que a legislação portuguesa se encontra desajustada em matéria de crimes sexuais
e que é premente a adequação da lei nacional ao disposto na Convenção de Istambul, ratificada por Portugal
em 2013. Desta forma, o PAN pretende e apresenta uma vez mais a alteração ao Código Penal, de forma que
o mesmo se ajuste ao clamor da sociedade civil, bem como siga os bons exemplos de outros países da União
Europeia como o caso de França e Espanha, e preveja e autonomize o crime de assédio sexual.
Desta forma, pretende o PAN promover uma alteração de paradigma intrínseco e crónico da culpabilização
da vítima, que muitas vezes se verifica na forma como são tratados ou apresentados os casos, tanto na
comunicação social como na própria lei ou jurisprudência.
Desta feita, o PAN visa recomendar que sejam cumpridos os objetivos previstos na Estratégia Nacional para
a Igualdade e a Não Discriminação 2018-2030 «Portugal + Igual», aprovada pelo XXI Governo Constitucional a
8 de março de 2018, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 61/2018, de 21 de maio,
reconhecendo a igualdade e a não discriminação como condições para a construção de um futuro sustentável
para Portugal.
Nesse sentido, para além do efetivo combate ao assédio sexual, com as necessárias alterações legislativas
propostas pelo PAN, é necessário prevenir a sua ocorrência que ao longo dos anos se tem vindo a normalizar
e a aceitar, por um lado pela facilitação de canais para apresentação de denuncia, criando modelos similares ao
ora testado pela FDUL. Urge também a implementação de códigos de conduta de prevenção e combate ao
assédio sexual em contextos laborais e docentes, pois é nestes contextos que a relação de especial poder
reveste contornos mais insidiosos e gravosos, de forma a que se torne claro os comportamentos suscetíveis de
se subsumir a assédio, permitindo a «desaprendizagem» da normalização destes comportamentos que se
tornaram aceites por consequência de muitos anos de sociedade patriarcal e misógina, e ainda das necessárias
ações de formação dos órgãos de comunicação social e dos agentes judiciários.
Pretende-se assim assegurar a não perpetuação de estereótipos de género, de culpabilização da vítima ou
de sexualização da violência, que coloca reiteradamente a tónica na vítima e não no agressor, bem como o
cumprimento de condenações e penas efetivas dos crimes de natureza sexual, que não desvirtuem o objetivo
das sanções penais, nomeadamente a sua prevenção geral e especial e a sua capacidade para defesa de bens
jurídicos essenciais, demonstrando à sociedade uma desvalorização da violência sexual e do impacto desta na
vida das vítimas.
Com este projeto de resolução, o PAN tem como objetivo garantir a implementação de um código de conduta
de prevenção e de combate ao assédio sexual nos contextos laborais, de docência, dos órgãos de comunicação
social, órgãos de polícia criminal e magistrados judiciais e do Ministério Público, para que se sensibilize para a
prevenção nos diferentes contextos de vida e assegurar a não perpetuação de estereótipos de género,
culpabilização da vítima ou normalização da violência sexual.
O PAN, com este projeto de resolução, pretende ainda contribuir para uma mudança de paradigma, de forma
que a culpa incida sobre o agressor e não sobre a vítima e que, ao invés de um constante controlo de danos e
mera política de fraca resposta, se efetive em primeira linha uma eficaz política preventiva, de educação e
formação para a erradicação da violência sexual em todas as suas formas.
Nestes termos, a abaixo assinada Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, ao abrigo das disposições
constitucionais e regimentais aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
1 – Garanta e promova a criação de canais abertos para a denúncia de comportamentos de assédio,
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discriminação e bullying em todos os estabelecimentos de ensino;
2 – Garanta a implementação de um código de conduta de prevenção e combate ao assédio sexual nos
locais de trabalho por parte das entidades empregadoras e nos estabelecimentos de ensino por parte da
respetiva direção, cuja elaboração envolva a comunidade científica, académica, associativa e ainda
representantes das/os trabalhadoras/es e estudantes, onde devem constar, entre outras, as seguintes
disposições:
a) Sem prejuízo do decorrente da lei, promova, através dos Códigos de Conduta, uma clara definição do que
é assédio sexual;
b) A consagração do dever de proporcionar um ambiente de educativo e de trabalho seguro, saudável e
sadio, livre de assédio sexual;
c) A previsão e funcionamento de um mecanismo de denúncia dos casos de assédio sexual dentro da própria
empresa ou estabelecimento de ensino;
d) A previsão e funcionamento de um mecanismo de investigação imparcial dos casos de assédio sexual
dentro da própria empresa ou estabelecimento de ensino;
e) Mecanismos e compromissos de aplicação de medidas disciplinares contra os agressores, aquando da
conclusão de processo disciplinar que determine a culpabilidade do agressor, sem prejuízo das garantias de
defesa que a este deve assistir;
f) O dever de sigilo e confidencialidade quanto às partes e factos constantes dos processos disciplinares de
assédio sexual;
g) A divulgação das disposições penais e laborais relevantes bem como o direito à indemnização por parte
da vítima.
3 – Proceda à implementação de um programa de formação obrigatório nas escolas, contextos laborais ou
de docência que sensibilize para a prevenção e combate ao assédio sexual nos diferentes contextos de vida.
4 – Proceda à implementação de um programa de formação, destinado aos órgãos de comunicação social,
que assegure a não perpetuação de estereótipos de género, culpabilização da vítima ou sexualização da
violência, que coloca reiteradamente a tónica na vítima e não no agressor.
5 – Proceda à implementação de um programa de formação aos órgãos de polícia criminal e magistrados
judiciais e do Ministério Público, com vista ao cumprimento de condenações e penas efetivas dos crimes de
natureza sexual, que não desvirtuem o objetivo das sanções penais, nomeadamente a sua prevenção geral e
especial e a sua capacidade para defesa de bens jurídicos essenciais, demonstrando à sociedade uma
desvalorização da violência sexual e do impacto desta na vida das vítimas.
Assembleia da República, 7 de abril de 2022.
Título e texto substituídos a pedido do autor
RECOMENDA AO GOVERNO A CRIAÇÃO DE CANAIS PARA QUEIXAS DE COMPORTAMENTOS DE
ASSÉDIO, DISCRIMINAÇÃO E BULLYING EM ESTABELECIMENTOS DE ENSINO E LOCAIS DE
TRABALHO, A IMPLEMENTAÇÃO DE CÓDIGOS DE CONDUTA E PROGRAMAS DE FORMAÇÃO PARA
A PREVENÇÃO E COMBATE AO ASSÉDIO
Exposição de motivos
A Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL) abriu, de 11 a 25 de março, um canal para receção
de denúncias de comportamentos de assédio, discriminação e bullying por parte do corpo docente.
Em apenas 11 dias, recebeu, por essa via, 70 denúncias, 50 das quais foram validadas como relevantes. As
queixas eram referentes a 31 docentes, ou seja, cerca de 10% do total de professores e assistentes da
faculdade, sendo que sete concentraram mais de metade das queixas.
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Das 50 queixas validades, 29 dizem respeito a casos de assédio moral, 22 de assédio sexual, 8 de práticas
discriminatórias de sexismo, 5 de xenofobia e racismo e uma de homofobia.
O relatório desta experiência, criada por iniciativa do Conselho Pedagógico, conclui pela existência de
«problemas sérios e reiterados de assédio sexual e moral perpetrados por docentes da faculdade».
A direção da faculdade mostrou-se concordante com a criação de um código de conduta de forma a clarificar,
determinar e valorar como infrações determinadas condutas.
Refere-se que «os alvos de xenofobia/racismo terão sido alunos brasileiros, negros ou originários de países
africanos de língua oficial portuguesa» e, «no caso do sexismo, todos os casos se referem a discriminação de
pessoas do género feminino»1.
Relativamente ao que resultará das queixas efetuadas através deste canal e que deram origem ao relatório
que será analisado pela Direção da Faculdade ainda não é certo que todas se traduzam em queixas formais e
sigam os trâmites existentes para inquéritos disciplinares, uma vez que é a Direção da Faculdade que tem poder
disciplinar. Todavia, é indubitável a grande importância desta iniciativa, não só para a possível tramitação das
queixas apresentadas como para o empoderamento das vítimas e o combate ao silêncio reiterado que resulta
deste tipo de crimes, bem como ao combate ao «sentimento de impunidade» e «clima de medo» que a
Associação Académica da FDUL refere existir.
Esta iniciativa, ainda que embrionária, demonstra pelas inúmeras queixas, num curto período de tempo, a
urgência de fazer chegar mecanismos semelhantes a todos os estabelecimentos de ensino, onde as relações
de especial poder, como é o caso das relações de docência, conduzem muitas vezes à prática dos crimes em
apreço, que na maior parte das vezes não são relatadas pelos alunos por receio de represálias e por descrença
no procedimento e procedência das suas queixas.
Desta forma, é premente a definição de códigos de conduta e de boas práticas produzidas por entidades que
se dedicam ao ensino e a implementação, em consonância com o canal criado, de mecanismos e procedimentos
que permitam acompanhar a tramitação de forma transparente e independente. Para tal, importa também
garantir o acompanhamento por representantes dos alunos, de modo que assegurem o correto tratamento das
queixas pelos órgãos dos estabelecimentos de ensino ou o encaminhamento para o Ministério Público.
O PAN, como um partido pautado pelo princípio da não-violência, é, veementemente, contra qualquer tipo
de discriminação xenófoba, racista, sexista, homofóbica, transfóbica ou quaisquer outras.
Desta forma, o combate à discriminação e ao assédio, enquanto fenómenos que se têm demonstrado como
estruturais e, muitas vezes, socialmente aceites, é absolutamente essencial, principalmente numa perspetiva de
proteção das vítimas, uma vez que a normalização deste tipo de comportamento resulta no desenvolvimento de
mecanismos de internalização e numa autoculpabilização pelas ações de terceiros.
Não nos podemos esquecer que, quando se trata de situações de assédio sexual, o que está em causa é a
violação de direitos fundamentais, como o direito ao livre desenvolvimento da personalidade e o direito à
integridade pessoal, que incluem a liberdade e autodeterminação sexual (artigos 25.º e 26.º da Constituição da
República Portuguesa), bem como o direito ao trabalho, (artigo 58.º, n.º 1) e o direito à igualdade de
oportunidades na escolha da profissão (artigo 58.º, n.º 2).
A violência de género, em todas as suas formas, tem vindo a ser uma preocupação reiterada do PAN, tendo
já defendido, no passado, que a legislação portuguesa se encontra desajustada em matéria de crimes sexuais
e que é premente a adequação da lei nacional ao disposto na Convenção de Istambul, ratificada por Portugal
em 2013. Desta forma, o PAN pretende e apresenta uma vez mais a alteração ao Código Penal, de forma que
o mesmo se ajuste ao clamor da sociedade civil, bem como siga os bons exemplos de outros países da União
Europeia como o caso de França e Espanha, e preveja e autonomize o crime de assédio sexual.
Desta forma, pretende o PAN promover uma alteração de paradigma intrínseco e crónico da culpabilização
da vítima, que muitas vezes se verifica na forma como são tratados ou apresentados os casos, tanto na
comunicação social como na própria lei ou jurisprudência.
Desta feita, o PAN visa recomendar que sejam cumpridos os objetivos previstos na Estratégia Nacional para
a Igualdade e a Não Discriminação 2018-2030 «Portugal + Igual», aprovada pelo XXI Governo Constitucional a
8 de março de 2018, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 61/2018, de 21 de maio,
reconhecendo a igualdade e a não discriminação como condições para a construção de um futuro sustentável
1 https://www.dn.pt/sociedade/10-dos-docentes-da-faculdade-de-direito-da-ul-denunciados-por-assedio-e-discriminacao-14740133.html
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para Portugal.
Nesse sentido, para além do efetivo combate ao assédio sexual, com as necessárias alterações legislativas
propostas pelo PAN, é necessário prevenir a sua ocorrência que ao longo dos anos se tem vindo a normalizar
e a aceitar, por um lado pela facilitação de canais para apresentação de denuncia, criando modelos similares ao
ora testado pela FDUL. Urge também a implementação de códigos de conduta de prevenção e combate ao
assédio sexual em contextos laborais e docentes, pois é nestes contextos que a relação de especial poder
reveste contornos mais insidiosos e gravosos, de forma a que se torne claro os comportamentos suscetíveis de
se subsumir a assédio, permitindo a «desaprendizagem» da normalização destes comportamentos que se
tornaram aceites por consequência de muitos anos de sociedade patriarcal e misógina, e ainda das necessárias
ações de formação dos órgãos de comunicação social e dos agentes judiciários.
Pretende-se assim assegurar a não perpetuação de estereótipos de género, de culpabilização da vítima ou
de sexualização da violência, que coloca reiteradamente a tónica na vítima e não no agressor, bem como o
cumprimento de condenações e penas efetivas dos crimes de natureza sexual, que não desvirtuem o objetivo
das sanções penais, nomeadamente a sua prevenção geral e especial e a sua capacidade para defesa de bens
jurídicos essenciais, demonstrando à sociedade uma desvalorização da violência sexual e do impacto desta na
vida das vítimas.
Com este projeto de resolução, o PAN tem como objetivo garantir a implementação de um código de conduta
de prevenção e de combate ao assédio sexual nos contextos laborais, de docência, dos órgãos de comunicação
social, órgãos de polícia criminal e magistrados judiciais e do Ministério Público, para que se sensibilize para a
prevenção nos diferentes contextos de vida e assegurar a não perpetuação de estereótipos de género,
culpabilização da vítima ou normalização da violência sexual.
O PAN, com este projeto de resolução, pretende ainda contribuir para uma mudança de paradigma, de forma
que a culpa incida sobre o agressor e não sobre a vítima e que, ao invés de um constante controlo de danos e
mera política de fraca resposta, se efetive em primeira linha uma eficaz política preventiva, de educação e
formação para a erradicação da violência sexual em todas as suas formas.
Nestes termos, a abaixo assinada Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, ao abrigo das disposições
constitucionais e regimentais aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
1 – Garanta e promova a criação de canais abertos para a denúncia de comportamentos de assédio,
discriminação e bullying em estabelecimentos de ensino e em entidades empregadoras com mais de 50
trabalhadores ao serviço;
2 – Garanta a implementação de um código de conduta de prevenção e combate ao assédio sexual nos
locais de trabalho por parte das entidades empregadoras e nos estabelecimentos de ensino por parte da
respetiva direção, cuja elaboração envolva a comunidade científica, académica, associativa e ainda
representantes das/os trabalhadoras/es e estudantes, onde devem constar, entre outras, as seguintes
disposições:
a) Sem prejuízo do decorrente da lei, promova, através dos Códigos de Conduta, uma clara definição do que
é assédio sexual;
b) A consagração do dever de proporcionar um ambiente de educativo e de trabalho seguro, saudável e
sadio, livre de assédio sexual;
c) A previsão e funcionamento de um mecanismo de denúncia dos casos de assédio sexual dentro da própria
empresa ou estabelecimento de ensino;
d) A previsão e funcionamento de um mecanismo de investigação imparcial dos casos de assédio sexual
dentro da própria empresa ou estabelecimento de ensino;
e) Mecanismos e compromissos de aplicação de medidas disciplinares contra os agressores, aquando da
conclusão de processo disciplinar que determine a culpabilidade do agressor, sem prejuízo das garantias de
defesa que a este deve assistir;
f) O dever de sigilo e confidencialidade quanto às partes e factos constantes dos processos disciplinares de
assédio sexual;
g) A divulgação das disposições penais e laborais relevantes bem como o direito à indemnização por parte
da vítima.
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II SÉRIE-A — NÚMERO 8
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3 – Proceda à implementação de um programa de formação obrigatório nas escolas, contextos laborais ou
de docência que sensibilize para a prevenção e combate ao assédio sexual nos diferentes contextos de vida.
4 – Proceda à implementação de um programa de formação, destinado aos órgãos de comunicação social,
que assegure a não perpetuação de estereótipos de género, culpabilização da vítima ou sexualização da
violência, que coloca reiteradamente a tónica na vítima e não no agressor.
5 – Proceda à implementação de um programa de formação aos órgãos de polícia criminal e magistrados
judiciais e do Ministério Público, com vista ao cumprimento de condenações e penas efetivas dos crimes de
natureza sexual, que não desvirtuem o objetivo das sanções penais, nomeadamente a sua prevenção geral e
especial e a sua capacidade para defesa de bens jurídicos essenciais, demonstrando à sociedade uma
desvalorização da violência sexual e do impacto desta na vida das vítimas.
Assembleia da República, 7 de abril de 2022.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.