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Quinta-feira, 2 de junho de 2022 II Série-A — Número 35
XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)
S U M Á R I O
Projetos de Lei (n.os 107 a 111/XV/1.ª): N.º 107/XV/1.ª (BE) — Garante o direito à habitação, protegendo o uso das frações para fins habitacionais. N.º 108/XV/1.ª (PS) — Reforça a salvaguarda do interesse público, a autonomia e a independência da regulação e promoção do acesso a atividades profissionais, alterando a Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, e a Lei n.º 53/2015, de 11 de junho. N.º 109/XV/1.ª (PCP) — Revoga o regime de atribuição de «vistos gold» – autorização de residência para atividade de investimento (nona alteração à Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que define as condições de entrada, permanência, saída e afastamento do território nacional). N.º 110/XV/1.ª (PCP) — Reduz o financiamento público aos partidos políticos e às campanhas eleitorais (oitava alteração à Lei n.º 19/2003, de 20 de junho). N.º 111/XV/1.ª (IL) — Regula as condições em que a morte medicamente assistida não é punível e altera o Código Penal.
Projetos de Resolução (n.os 7, 49, 85 e 86/XV/1.ª): N.º 7/XV/1.ª (Adaptação do Plano Nacional da Água às alterações climáticas, como medida de combate à seca): — Texto final da Comissão de Ambiente e Energia. N.º 49/XV/1.ª (Recomenda ao Governo que contribua para o aprofundar da democracia europeia e para o fortalecimento do projeto europeu, através do debate de propostas para a melhoria da arquitetura institucional da União Europeia, bem como para garantir a nossa independência energética face a atores externos): — Alteração do texto inicial do projeto de resolução. N.º 85/XV/1.ª (PSD) — Programa de redução das perdas de água nas redes de abastecimento público. N.º 86/XV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo que execute com urgência o troço do IC8 entre Pombal e Avelar (Ansião), com inclusão de desnivelamentos dos acessos e, proceda à cabimentação dos recursos financeiros necessários.
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PROJETO DE LEI N.º 107/XV/1.ª
GARANTE O DIREITO À HABITAÇÃO, PROTEGENDO O USO DAS FRAÇÕES PARA FINS
HABITACIONAIS
Exposição de motivos
O Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, de 22 de março de 2022, veio
sedimentar o entendimento de que «no regime da propriedade horizontal, a indicação no título constitutivo, de
que certa fração se destina a habitação, deve ser interpretada no sentido de nela não ser permitida a
realização de alojamento local».
Esta decisão torna visível o processo de gentrificação acelerado dos grandes centros urbanos que coloca
em causa o direito à habitação. Milhares de casas que antes serviam para habitação, e que foram construídas
e licenciadas para esse fim, passaram a servir para alojamento local ou apartamentos turísticos em prejuízo do
mercado de arrendamento habitacional.
Há, pelo menos, três lições que se podem retirar do processo de gentrificação em Portugal e dos diplomas
legais que o permitiram.
A primeira é que o Estado – não só o governo, mas também os municípios – falharam. Perante um modelo
de negócio baseado numa ilegalidade que ganhava força com o direito à habitação, a escolha do Estado foi
fechar os olhos. Perante uma ilegalidade tão grosseira, o lucro rápido falou mais alto e milhares de pessoas
foram expulsas do local onde viviam para que as suas casas se tornassem hotéis informais.
A segunda lição é uma consequência da primeira: a gentrificação e os processos especulativos agravaram,
de forma decisiva, o direito das pessoas a terem uma casa a preços dignos. Vários motivos explicam os
preços absurdos das casas em Portugal e o crescimento desenfreado do alojamento local é certamente um
deles.
Por fim, a terceira lição nasce com o Acórdão acima referido. Perante tal decisão, o caminho do legislador
não pode ser de tornar legal o que é ilegal; perante uma situação de emergência habitacional, o caminho não
pode ser voltar a esquecer o direito à habitação e acelerar ainda mais o negócio que retira casas ao
arrendamento. O caminho tem de ser, isso sim, reconhecer o erro e garantir que não há uma corrida às
alterações dos títulos constitutivos dos imóveis em causa.
O direito à habitação não se garante permitindo que milhares de casas que estavam destinadas à
habitação possam agora ver o seu destino alterado para comércio. Pelo contrário. Proteger o direito à
habitação é garantir que essas casas são mesmo para habitação, seja para o seu proprietário viver, seja para
ser arrendada para habitação nos termos das leis que regem o arrendamento.
Portugal vive uma crise no acesso a uma habitação digna. A oferta pública é insuficiente; o arrendamento,
cada vez mais precário e sustentado em contratos anuais que não oferecem estabilidade, tem preços que os
salários não acompanham; a compra de casa é proibitiva para a generalidade das pessoas. O mínimo a fazer
é impedir a redução definitiva do número de casas disponíveis para habitação.
O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda considera, assim, que a opção de quem pretende tornar legal
a ilegalidade, numa clara promoção de um negócio que, por ausência de regras ou limitações, está a colocar
em causa o direito constitucional à habitação.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei estipula que apenas nos territórios de baixa densidade é possível alterar o título constitutivo
no sentido de frações destinadas a habitação passarem a estar destinadas a comércio, serviços ou indústria
apenas é possível nos territórios de baixa densidade.
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Artigo 2.º
Limitação das alterações ao título constitutivo
1 – As modificações ao título constitutivo que visem a alteração do destino das frações de «habitação» para
qualquer outro fim, apenas podem ocorrer em territórios de baixa densidade.
2 – Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se territórios de baixa densidade os de nível iii
da Nomenclatura de Unidades Territoriais para Fins Estatísticos (NUTS III) com menos de 100 habitantes por
Km2 ou um produto interno bruto (PIB) per capita inferior a 75 /prct. da média nacional.
Artigo 3.º
Efeitos retroativos
A presente lei retroage os seus efeitos à data de 22 de março de 2022.
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Assembleia da República, 2 de junho de 2022.
As Deputadas e os Deputados do BE: Mariana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Catarina Martins —
Joana Mortágua — José Moura Soeiro.
———
PROJETO DE LEI N.º 108/XV/1.ª
REFORÇA A SALVAGUARDA DO INTERESSE PÚBLICO, A AUTONOMIA E A INDEPENDÊNCIA DA
REGULAÇÃO E PROMOÇÃO DO ACESSO A ATIVIDADES PROFISSIONAIS, ALTERANDO A LEI N.º
2/2013, DE 10 DE JANEIRO, E A LEI N.º 53/2015, DE 11 DE JUNHO
Exposição de motivos
Desde há muitos anos que a União Europeia alerta para a necessidade de os Estados-Membros
identificarem e eliminarem entraves no acesso a profissões reguladas, de forma a criar oportunidades de
emprego e aumentar o potencial de crescimento económico na Europa. Neste contexto, em 2017 a Comissão
Europeia adotou uma Comunicação relativa às recomendações para a reforma da regulação dos serviços
profissionais [COM (2016) 820, de 10 de janeiro de 2017], onde identifica uma série de entraves resultantes da
regulamentação dos serviços profissionais pelos Estados-Membros, que não visam necessariamente a
consecução de objetivos de interesse geral ou, quando os visam, não são adequados, necessários ou
proporcionais. Nesta Comunicação a Comissão Europeia faz apelo a diversos estudos que demonstram que a
redução de entraves pode aumentar a produtividade e eficiência da economia, bem como o emprego. Assim, a
Comissão faz várias recomendações aos Estados-Membros, incluindo Portugal, no sentido de eliminaram
restrições injustificadas e criarem um quadro regulamentar que promova crescimento, inovação e emprego.
Também a Diretiva 2018/958, de 28 de junho de 2018, transposta para o ordenamento jurídico nacional
pela Lei n.º 2/2021, de 21 de janeiro, sobre o regime de acesso e exercício de profissões e atividades
profissionais, tem como objetivo assegurar que as regras nacionais de organização do acesso às profissões
reguladas não constituam um obstáculo injustificado ou desproporcionado ao exercício do direito fundamental
à livre escolha de uma atividade profissional.
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No âmbito do Semestre Europeu, a União Europeia considera que os esforços de Portugal para reduzir a
carga regulamentar das profissões reguladas, que tiveram tradução na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que
estabelece o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações públicas profissionais,
foram travados ou mesmo revertidos pelos estatutos das diferentes ordens. Alertou, igualmente, para a falta de
resposta às recomendações da Comissão sobre a regulação dos serviços profissionais, bem como à análise
da OCDE de 2018 sobre a concorrência no domínio das profissões autorreguladas em Portugal,
recomendando expressamente a redução de restrições nas profissões altamente reguladas.
De entre as recomendações da OCDE a Portugal (Economic Outlook 2019) consta a redução de barreiras
regulatórias nas profissões reguladas e, especificamente, a alteração de regras ao nível da supervisão do
acesso a estas profissões, que deve estar a cargo de um órgão independente. Já em 2018, a OCDE, em
cooperação com a Autoridade da Concorrência (AdC), realizou uma avaliação de impacto concorrencial da
regulamentação de uma série de profissões autorreguladas (advogados, solicitadores, agentes de execução,
notários, engenheiros, engenheiros técnicos, arquitetos, auditores, contabilistas certificados, despachantes
oficiais, economistas, farmacêuticos e nutricionistas). De entre as recomendações formuladas pela OCDE e
AdC, destacam-se a necessidade de separar a função regulatória da função representativa e de as mesmas
serem dotadas de um órgão de supervisão independente, de forma a contribuir para uma melhor regulação e
criar incentivos à inovação em prol dos consumidores. Uma outra recomendação, prende-se com a
necessidade de, nas sociedades profissionais, abrir o acesso a parcerias, propriedade e gestão de empresas
profissionais a indivíduos de outras profissões e permitir que empresas multidisciplinares atuem nos vários
setores profissionais, de forma que diferentes modelos de negócios surjam no mercado e respondam à
procura de serviços multidisciplinares.
Tendo em consideração este contexto, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista realizou, entre março e
julho de 2020, audições com representantes das ordens profissionais, associações representativas dos
diferentes profissionais e associações de estudantes para analisar estas e outras recomendações.
O presente projeto de lei visa introduzir alterações ao regime jurídico das associações públicas
profissionais, cuja inestimável missão de regulação e representação oficial de amplos setores de atividade em
nome do interesse público deve ser reforçada através de medidas que garantam uma maior independência e
isenção da sua função regulatória e a eliminação de restrições não justificadas pelo interesse público. Por isso,
é objetivo deste diploma reforçar as competências regulatórias do órgão de supervisão das associações
profissionais e garantir a sua independência e isenção, densificando o regime jurídico em vigor que já prevê a
obrigatoriedade deste órgão independente. Por outro lado, tendo em consideração que uma das principais
missões das associações públicas profissionais é a defesa dos interesses gerais dos destinatários dos
serviços, propõe-se que o Provedor do cliente passe a ser obrigatório, ao mesmo tempo que se reforça os
poderes de fiscalização das associações. Para eliminar restrições injustificadas ao acesso às profissões
reguladas, estabelecem-se limites claros quanto aos estágios profissionais e eventuais cursos de formação e
exames, que não devem incidir sobre matérias já lecionadas e avaliadas pelas instituições de ensino superior,
que estão sujeitas a processos de avaliação e acreditação rigorosos, que envolvem as associações públicas
profissionais.
Por fim, com o objetivo de dar pleno cumprimento ao artigo 25.º da Diretiva 2006/123/CE, relativa aos
serviços no mercado interno é proposta uma densificação das condições de constituição e funcionamento das
sociedades profissionais multidisciplinares, já previstas na lei em vigor, para que possam fornecer serviços
multidisciplinares e inovadores, com claros benefícios para os seus beneficiários.
Não tendo sido possível concluir o procedimento legislativo da matéria na XIV Legislatura, em função da
dissolução da Assembleia da República, urge retomar a discussão sobre a matéria em sede parlamentar,
acolhendo, desde já, na versão apresentada alguns dos muitos contributos e elementos de melhoria recolhidos
no decurso do debate realizado até ao momento.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados abaixo
assinados do Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentam o seguinte projeto de lei:
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Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à alteração:
a) Da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação, organização e
funcionamento das associações públicas profissionais;
b) Da Lei n.º 53/2015, de 11 de junho, que define o regime jurídico da constituição e funcionamento das
sociedades de profissionais que estejam sujeitas a associações públicas profissionais.
Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 2/3013, de 10 de janeiro
Os artigos 3.º, 5.º, 7.º, 8.º, 12.º, 14.º, 15.º, 16.º, 18.º, 20.º, 21.º, 24.º, 25.º, 26.º, 27.º, 29.º, 30.º, 46.º e 48.º
da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação, organização e funcionamento
das associações públicas profissionais, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 3.º
Constituição
1 – […].
2 – A constituição de novas associações públicas profissionais é sempre precedida dos seguintes
procedimentos:
a) […];
b) Audição das associações representativas da profissão e emissão de parecer de outras partes
interessadas, nomeadamente reguladores de serviços prestados pelas profissões em questão,
Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), Conselho Coordenador dos Institutos
Superiores Politécnicos (CCISP), associações científicas ou profissionais das áreas abrangidas,
Autoridade da Concorrência e representantes dos consumidores;
c) […].
3 – […].
Artigo 5.º
Atribuições
1 – São atribuições das associações publicas profissionais, nos termos da lei:
a) A representação e defesa dos interesses gerais da profissão, no respeito dos direitos e
interesses gerais dos destinatários dos serviços;
b) [Anterior alínea c);]
c) [Anterior alínea d);]
d) [Anterior alínea e);]
e) [Anterior alínea f);]
f) [Anterior alínea g);]
g) [Anterior alínea h);]
h) A fiscalização sobre a atuação dos seus membros no âmbito das suas funções, para efeitos de
exercício do poder disciplinar, podendo estabelecer protocolos com os competentes serviços de
fiscalização e inspeção do Estado;
i) […];
j) […];
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k) […];
l) […];
m) […];
n) […].
2 – As associações públicas profissionais estão impedidas de exercer ou de participar em atividades de
natureza sindical ou que se relacionem com a regulação das relações económicas ou profissionais dos seus
membros, bem como exercer atividades de natureza comercial, sem prejuízo da comercialização de
artigos institucionais.
3 – As associações públicas profissionais não podem, por qualquer meio, seja ato ou regulamento,
estabelecer restrições à liberdade de acesso e de exercício da profissão, nem infringir as regras da
concorrência na prestação de serviços profissionais, nos termos do direito nacional e da União Europeia.
Artigo 7.º
Criação e extinção
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – As associações públicas profissionais são criadas por tempo indeterminado e só podem ser extintas,
fundidas ou cindidas nos termos do presente artigo e verificadas as condições do artigo 3.º
Artigo 8.º
Estatutos
1 – Os estatutos das associações públicas profissionais são aprovados por lei e devem regular, com os
limites definidos na presente lei, as seguintes matérias:
a) […];
b) […];
c) Estágios profissionais ou outros, previstos em lei especial que sejam justificadamente necessários para
o acesso e exercício da profissão, apenas quando o estágio profissional não faça parte integrante do
curso conferente da necessária habilitação académica;
d) Número de períodos de inscrição por ano, nos casos em que esteja prevista a realização de estágio
profissional ou exame, devendo, pelo menos, haver um período de inscrição por ano.
e) […];
f) […];
g) […];
h) […];
i) […];
j) […];
k) […];
l) […];
m) […];
n) […];
o) […];
p) […];
q) Provedor dos destinatários dos serviços.
2 – Para os efeitos das alíneas c) e d) do número anterior, os estatutos estabelecem o regime do estágio
de acesso à profissão ou, sendo o caso, do período formativo correspondente, nomeadamente, quanto aos
seguintes aspetos:
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a) Duração máxima do estágio, que não pode exceder os 12 meses, a contar da data de inscrição e
incluindo as fases eventuais de formação e de avaliação;
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […];
3 – A organização das fases eventuais de formação e de avaliação dos estágios profissionais referidos no
número anterior é da responsabilidade das associações públicas profissionais respetivas, sem prejuízo de a
lei definir o envolvimento de entidades públicas nos procedimentos de implementação ou de execução do
estágio profissional ou regimes de financiamento das entidades formadoras públicas e, sendo caso disso, o
envolvimento de entidades empregadoras públicas na realização dos estágios.
4 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, a definição das matérias a lecionar no período
formativo e, eventualmente, a avaliar em exame final deve garantir a não sobreposição com matérias
ou unidades curriculares que integram o curso conferente da necessária habilitação académica,
devendo as eventuais fases de formação ser também disponibilizadas na modalidade de ensino à
distância com taxas reduzidas.
5 – [Anterior n.º 4.]
6 – As taxas cobradas durante o estágio profissional ou eventual período de formação obedecem
aos critérios da adequação, necessidade e proporcionalidade.
7 – Os estágios profissionais são remunerados nos termos a definir nos estatutos das respetivas
associações públicas profissionais.
8 – A avaliação final do estágio é da responsabilidade de um júri independente, que deve integrar
personalidades de reconhecido mérito, que não sejam membros da associação pública profissional.
9 – Nos termos do disposto na alínea o) do n.º 1, as associações públicas profissionais não podem
recusar o reconhecimento de habilitações académicas e profissionais obtidas no estrangeiro que
estejam devidamente reconhecidas em Portugal ao abrigo da lei, do Direito da União Europeia ou de
convenção internacional, nem sujeitar os detentores dessas habilitações a provas, exames, ou outro
tipo de condições de acesso que não resultem expressamente das regras aplicáveis
Artigo 12.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – As associações públicas profissionais devem ainda prestar e solicitar às associações públicas
profissionais ou autoridades administrativas competentes dos outros Estados-Membros e à Comissão
Europeia assistência mútua e tomar as medidas necessárias para cooperar eficazmente, no âmbito dos
procedimentos relativos a prestadores de serviços já estabelecidos em outro Estado-Membro, nos termos dos
artigos 26.º a 29.º do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, na redação atual, do n.º 2 do artigo 51.º da Lei
n.º 9/2009, de 4 de março, na redação atual, e dos n.os 2 e 3 do artigo 19.º da Diretiva 2000/31/CE, do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho de 2000, relativa a certos aspetos legais dos serviços da
sociedade de informação, em especial do comércio eletrónico, no mercado interno, nomeadamente através do
Sistema de Informação do Mercado Interno.
4 – Em matéria de reconhecimento das qualificações profissionais, as associações públicas profissionais
exercem as competências previstas no n.º 7 do artigo 47.º e no n.º 2 do artigo 51.º da Lei n.º 9/2009, de 4 de
março, na redação atual, sob a coordenação da entidade que exerça as atribuições previstas no artigo 52.º
do mesmo diploma.
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Artigo 14.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – Nos casos em que a qualificação obtida noutro Estado-Membro da União Europeia ou do Espaço
Económico Europeu diga respeito ao exercício de atividades comparáveis àquelas exercidas pelos
profissionais especializados em território nacional, o procedimento de reconhecimento de qualificações
profissionais especializadas segue os termos do artigo 47.º da Lei n.º 9/2009, de 4 de março, na redação
atual.
4 – Sempre que uma especialidade obtida noutro Estado-Membro não tenha correspondência em Portugal
e não seja possível reconhecer as qualificações do profissional de forma global com recurso a medidas de
compensação, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º da Lei n.º 9/2009, de 4 de março, na redação
atual, o acesso às especialidades nacionais é regulado pelas disposições aplicáveis aos profissionais cujas
qualificações de base foram obtidas em território nacional, sem qualquer discriminação, seguindo os termos do
artigo 47.º do mesmo diploma, apenas o reconhecimento das qualificações profissionais de base.
Artigo 15.º
Órgãos
1 – […].
2 – Constituem órgãos obrigatórios das associações públicas profissionais:
a) […];
b) […];
c) Um órgão de supervisão, nos termos do artigo 15.º-A;
d) Um órgão disciplinar, eleito pela assembleia representativa, que exerce o poder disciplinar,
devendo integrar personalidades de reconhecido mérito que não sejam membros da associação
pública profissional;
e) [Anterior alínea d);]
f) Um Provedor do destinatário dos serviços.
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].
7 – A assembleia representativa é eleita por sufrágio universal, direto, secreto e periódico.
8 – […].
9 – […].
10 – O órgão de supervisão é independente no exercício das suas funções.
11 – […].
12 – […].
13 – As listas de candidatos aos órgãos eletivos das associações públicas profissionais devem
promover a igualdade entre homens e mulheres, assegurando que a proporção de pessoas de cada
sexo não seja inferior a 40%, salvo se no universo eleitoral existir uma percentagem de pessoas do
sexo menos representado inferior a 20%.
Artigo 16.º
Elegibilidade
1 – […].
2 – Os estatutos podem condicionar a elegibilidade para o cargo de membro dos órgãos com
competências executivas à verificação de um tempo mínimo de exercício da profissão, nunca superior a cinco
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anos, e para o cargo de presidente, de bastonário ou de membro dos órgãos com competência disciplinar
e de supervisão, nunca superior a 10 anos.
3 – […].
4 – Não são elegíveis para os órgãos das associações públicas profissionais os profissionais que
tenham desempenhado cargos em órgãos dos sindicatos do setor nos últimos quatro anos.
Artigo 18.º
Poder disciplinar
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].
7 – O exercício das funções disciplinares das associações públicas profissionais é definido nos respetivos
estatutos, competindo ao órgão disciplinar com recurso para o órgão de supervisão.
8 – […].
9 – Têm legitimidade para participar factos suscetíveis de constituir infração disciplinar ao órgão disciplinar
e para recorrer das decisões para o órgão de supervisão, designadamente:
a) […];
b) O provedor dos destinatários dos serviços;
c) […];
d) […];
Artigo 19.º
Incompatibilidades no exercício de funções
1 – […].
2 – O cargo de titular de órgão das associações públicas profissionais é incompatível com o exercício de
quaisquer funções dirigentes na função pública.
3 – Os estatutos das associações públicas profissionais podem prever outras incompatibilidades
necessárias à salvaguarda do interesse público, autonomia e independência em relação à respetiva
profissão, bem como adaptar o regime previsto no número anterior às especificidades do exercício da
respetiva atividade profissional regulada.
Artigo 20.º
Provedor dos destinatários de serviços
1 – Sem prejuízo do estatuto do Provedor de Justiça, as associações públicas profissionais designam uma
personalidade independente com a função de defender os interesses dos destinatários dos serviços
profissionais prestados pelos membros daquelas.
2 – O provedor dos destinatários dos serviços é designado pelo Bastonário ou Presidente da
associação pública profissional sob proposta do órgão de supervisão e não pode ser destituído, salvo
por falta grave no exercício das suas funções.
3 – Sem prejuízo das demais competências previstas na lei ou nos estatutos, compete ao provedor analisar
as queixas apresentadas pelos destinatários dos serviços e fazer recomendações para a sua resolução, bem
como em geral para o aperfeiçoamento do desempenho da associação.
4 – O cargo de provedor é remunerado, nos termos a definir no estatuto ou em regulamento da
associação pública profissional.
5 – […].
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Artigo 21.º
Referendo interno
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – Os referendos só são vinculativos se neles participar mais de metade dos membros da associação
pública profissional, salvo se a proposta submetida a referendo obtiver mais de 66% dos votos e a participação
for superior a 40%.
Artigo 24.º
Acesso e registo
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […]:
a) Verificação das capacidades profissionais pela sujeição a estágio profissional ou outro, previstos em lei
especial, nos termos e com os limites definidos na presente lei;
b) […];
c) Realização de exame final de estágio com o objetivo de avaliar os conhecimentos e as competências
necessárias para a prática de atos de confiança pública a realizar por um júri independente nos termos e
com os limites definidos na presente lei.
7 – […].
8 – […].
Artigo 25.º
Inscrição
1 – Têm direito a inscrever-se nas associações públicas profissionais todos os que preencham os requisitos
legais para o acesso à profissão e a desejem exercer, individualmente, em sociedade de profissionais ou em
sociedade multidisciplinar.
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].
Artigo 26.º
Exercício da profissão em geral
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – Os prestadores de serviços profissionais, incluindo as sociedades de profissionais, as sociedades
multidisciplinares ou outras formas de organização associativa de profissionais referidas no n.º 4 do artigo
37.º e os demais empregadores ou subcontratantes de profissionais, ficam sujeitos aos requisitos constantes
dos n.os 1 e 2 do artigo 19.º e dos artigos 20.º e 22.º do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, e ainda, no
que se refere a serviços prestados por via eletrónica, ao disposto no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7
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de janeiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 62/2009, de 10 de março, e pela Lei n.º 46/2012, de 29 de agosto.
5 – […].
Artigo 27.º
Sociedades de profissionais e multidisciplinares
1 – Podem ser constituídas sociedades de profissionais que tenham por objeto principal o exercício de
profissões organizadas numa única associação pública profissional.
2 – Podem ainda ser constituídas sociedades multidisciplinares de profissionais para exercício de
profissões organizadas em associações públicas profissionais, juntamente com outras profissões
organizadas ou não em associações públicas profissionais, desde que:
a) A sociedade garanta a aplicação do regime de incompatibilidades e impedimentos aplicável, bem
como de prevenção de conflitos de interesses, devendo, na ausência de medidas que garantam a
inexistência de tais conflitos, a prestação de serviços ser recusada ou cessada.
b) Os responsáveis pela orientação e execução de funções de interesse público sejam profissionais
qualificados;
c) Seja garantida a independência técnica, a proteção de informação de clientes e a observância
dos deveres deontológicos aplicáveis a cada atividade profissional desenvolvida;
d) A sociedade seja dotada de um sistema interno de salvaguarda de sigilo profissional, sempre
que aplicável.
3 – As sociedades profissionais referidas nos números anteriores, constituídas em Portugal, podem
ser sociedades civis ou assumir qualquer forma jurídica admissível por lei para o exercício de atividades
comerciais.
4 – Podem ser sócios, gerentes ou administradores das sociedades referidas no número anterior
pessoas que não possuam as qualificações profissionais exigidas para o exercício das profissões
organizadas na associação pública profissional respetiva, ficando vinculados aos deveres
deontológicos e de sigilo aplicáveis ao exercício das profissões abrangidas.
Artigo 29.º
Incompatibilidades e impedimentos
Os estatutos podem prever regras relativas incompatibilidades e impedimentos no exercício da profissão,
desde que respeitem o disposto na presente lei e se mostrem necessárias e proporcionais ao objetivo de
garantir a independência, imparcialidade e integridade da profissão e, caso se justifique, o segredo
profissional, e não possam ser substituídas por alternativas menos restritivas da liberdade profissional.
Artigo 30.º
Reserva de atividade
1 – Sem prejuízo do disposto na alínea b) do artigo 358.º do Código Penal, as atividades profissionais
associadas a cada profissão só lhe são reservadas quando tal resulte expressamente da lei, fundada em
razões imperiosas de interesse público constitucionalmente protegido, segundo critérios de adequação,
necessidade e proporcionalidade, com enumeração taxativa das atividadesreservadas.
2 – As associações públicas profissionais não podem, por qualquer meio, estabelecer atividades
reservadas.
3 – [Anterior n.º 2.]
4 – [Anterior n.º 3.]
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12
Artigo 46.º
Controlo jurisdicional
1 – Os regulamentos e as decisões das associações públicas profissionais praticadas no exercício de
poderes públicos estão sujeitos ao contencioso administrativo, nos termos das leis do processo administrativo.
2 – Sem prejuízo do disposto no Código de Processo nos Tribunais Administrativos, têm
legitimidade para impugnar a legalidade dos atos e regulamentos das associações públicas profissionais:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) O provedor dos destinatários dos serviços.
Artigo 48.º
Relatório anual e deveres de informação
1 – As associações públicas profissionais elaboram anualmente um relatório sobre o desempenho das suas
atribuições, em especial sobre o exercício do seu poder regulatório e do poder disciplinar, o qual deve
ser apresentado à Assembleia da República e ao Governo, até 31 de março de cada ano.
2 – […].
3 – […].»
Artigo 3.º
Aditamento à Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro
É aditado o artigo 15.º-A da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação,
organização e funcionamento das associações públicas profissionais, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 15.º-A
Órgão de Supervisão
1 – O órgão de supervisão é independente no exercício das suas funções, vela pela legalidade da atividade
exercida pelos órgãos da associação e exerce poderes de controlo, nomeadamente em matéria disciplinar e
em matéria de regulação do exercício da profissão.
2 – Sem prejuízo de outras estabelecidas por lei, são competências do órgão de supervisão:
a) O exercício das atribuições previstas na alínea c) do artigo 8.º, em especial a determinação das regras
de estágio, incluindo a avaliação final, bem como a fixação de qualquer taxa referente às condições de acesso
à inscrição na associação profissional;
b) O reconhecimento de habilitações e competências profissionais obtidas no estrangeiro;
c) O exercício de poderes de controlo em matéria disciplinar, mediante recurso das decisões do órgão
disciplinar;
d) A supervisão da legalidade e conformidade estatutária e regulamentar da atividade exercida pelos
órgãos da associação;
e) A proposta de designação do provedor dos destinatários dos serviços, nos termos do n.º 2 do artigo
20.º;
f) A pronúncia, em sede de consulta, sobre propostas de atos legislativos que fixem reservas de atos da
profissão.
3 – Sem prejuízo do disposto no número seguinte, o órgão de supervisão é composto pelos seguintes
membros:
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a) Quatro representantes da profissão, inscritos na associação pública profissional;
b) Três membros oriundos dos estabelecimentos de ensino superior que habilitem academicamente o
acesso à profissão organizada em associação pública profissional, não inscritos na associação profissional;
c) Uma personalidade de reconhecido mérito, cooptada pelos membros referidos nas alíneas anteriores,
por maioria absoluta.
4 – Os membros previstos nas alíneas a) e b) do número anterior são eleitos pela assembleia
representativa por maioria absoluta dos seus membros.
5 – O Provedor dos destinatários dos serviços é, por inerência, membro de pleno direito do órgão de
supervisão, com direito de voto em todas as matérias, salvo em relação aos recursos de decisões disciplinares
por si interpostos.
6 – Os membros do órgão de supervisão elegem o Presidente de entre os membros não inscritos na
associação pública profissional.»
Artigo 4.º
Alteração à Lei n.º 53/2015, de 11 de junho
É alterado o artigo 7.º da Lei n.º 53/2015, de 11 de junho, que define o regime jurídico da constituição e
funcionamento das sociedades de profissionais que estejam sujeitas a associações públicas profissionais, que
passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 7.º
Objeto social
1 – […].
2 – […].
3 – Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, podem ainda ser constituídas sociedades
multidisciplinares de profissionais para exercício de profissões organizadas em mais do que uma
associação pública profissional nos termos dos n.os 2 a 4 do artigo 27.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de
janeiro.»
Artigo 5.º
Norma revogatória
É revogado o n.º 1 do artigo 33.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, o n.º 2 do artigo 9.º e o artigo 55.º da
Lei n.º 53/2015, de 11 de junho, que define o regime jurídico da constituição e funcionamento das sociedades
de profissionais que estejam sujeitas a associações públicas profissionais.
Artigo 6.º
Norma transitória
1 – O regime previsto na presente lei aplica-se às associações públicas profissionais já criadas e em
processo de criação.
2 – As associações públicas profissionais já criadas devem adotar as medidas necessárias para o
cumprimento do disposto na presente lei.
3 – No prazo de 120 dias após a entrada em vigor da presente lei, o Governo apresenta uma proposta de
lei de alteração dos estatutos das associações públicas profissionais já criadas e demais legislação aplicável
ao exercício da profissão, que os adeque ao regime previsto na presente lei, devendo expressamente avaliar
se os regimes de reserva de atividade em vigor cumprem o disposto no artigo 30.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de
janeiro, na redação dada pela presente lei.
4 – Para efeitos do disposto na parte final do número anterior, a Autoridade da Concorrência envia ao
Governo, no prazo de 60 dias após a entrada em vigor da presente lei, um relatório sobre o cumprimento dos
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critérios estabelecidos no n.º 1 do artigo 30.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, bem como na Lei n.º 2/2021,
de 21 de janeiro, com uma recomendação quanto à manutenção, alteração ou revogação dos regimes de
reserva de atividade em vigor.
Artigo 7.º
Reexame
No prazo de três anos a contar da data de entrada em vigor da presente lei, a Autoridade da Concorrência
deve apresentar à Assembleia da República um relatório sobre a aplicação e eficácia da presente lei, podendo
ser acompanhado de propostas adequadas.
Artigo 8.º
Entrada em vigor e produção de efeitos
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e produz efeitos no prazo de 90 dias
após a sua publicação.
Palácio de São Bento, 1 de junho de 2022.
Os Deputados do PS: Eurico Brilhante Dias — Alexandra Leitão — Joana Sá Pereira — Pedro Delgado
Alves — Miguel Matos — Carlos Pereira — Cláudia Santos — Rita Borges Madeira — Maria Begonha — Luís
Capoulas Santos — Ricardo Lima — Eduardo Oliveira — Paulo Araújo Correia — António Pedro Faria —
Ricardo Pinheiro — Pedro Anastácio — Tiago Barbosa Ribeiro — Bruno Aragão — Clarisse Campos —
Alexandra Tavares de Moura — Gilberto Anjos — João Miguel Nicolau — Sara Velez — Francisco Rocha —
José Rui Cruz — Nuno Fazenda — Palmira Maciel — Maria João Castro — Rosário Gambôa — Susana
Correia — Anabela Real — Fátima Correia Pinto — Cláudia Avelar Santos — Agostinho Santa — Nelson Brito
— Salvador Formiga — Francisco Pereira de Oliveira — Irene Costa — Patrícia Faro — Cristina Sousa —
Mara Lagriminha Coelho — Raquel Ferreira — Eunice Pratas — Ana Isabel Santos — João Paulo Rebelo —
Cristina Mendes da Silva — Miguel Iglésias — Lúcia Araújo da Silva — João Azevedo Castro — Sérgio Ávila
— Tiago Soares Monteiro — Eurídice Pereira — Fernando José — Dora Brandão — Romualda Nunes
Fernandes — Paulo Marques — Norberto Patinho — Pedro Coimbra — Jamila Madeira — Tiago Brandão
Rodrigues.
———
PROJETO DE LEI N.º 109/XV/1.ª
REVOGA O REGIME DE ATRIBUIÇÃO DE «VISTOS GOLD» – AUTORIZAÇÃO DE RESIDÊNCIA PARA
ATIVIDADE DE INVESTIMENTO (NONA ALTERAÇÃO À LEI N.º 23/2007, DE 4 DE JULHO, QUE DEFINE
AS CONDIÇÕES DE ENTRADA, PERMANÊNCIA, SAÍDA E AFASTAMENTO DO TERRITÓRIO NACIONAL)
Exposição de motivos
O regime de autorização de residência para atividade de investimento (vistos gold) foi introduzido pela Lei
n.º 29/2012, de 9 de março, logo na primeira alteração sofrida pela Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprovou
o regime jurídico de entrada, permanência e afastamento de estrangeiros do território nacional. Recorde-se
que o regime jurídico de entrada e permanência de estrangeiros em Portugal, tem sofrido sucessivas
alterações através da Lei n.º 56/2015, de 23 de junho; da Lei n.º 63/2015, de 30 de junho; da Lei n.º 59/2017,
de 31 de julho; da Lei n.º 102/2017, de 31 de julho; da Lei n.º 26/2018, de 5 de julho; da Lei n.º 28/2019, de 29
de março e, finalmente, da Lei n.º 14/2021, de 12 de fevereiro, esta última com alterações específicas ao
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regime dos vistos gold.
As alterações introduzidas pela Lei n.º 29/2012 com previsão deste regime teve por base o Regulamento
(CE) n.º 180/2009, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho, e a transposição para a ordem
jurídica interna de um conjunto de Diretivas do Parlamento Europeu e do Conselho (2008/2015/CE, de 16 de
dezembro; 2009/50/CE, de 25 de maio; 2009/52/CE, de 18 de junho; 2011/51/EU, de 11 de maio e
2011/98/EU, de 13 de dezembro).
Assim, investidores nacionais de Estados terceiros mediante o preenchimento de um conjunto de requisitos
e por um período mínimo de cinco anos, podem obter a Autorização de Residência para Atividade de
Investimento (ARI) no nosso País. A autorização de residência é feita por um período inicial de um ano, sendo
que a lei prevê a sua renovação por cada dois anos. Da mesma forma, o titular de ARI tem direito ao
reagrupamento familiar nos termos gerais.
Na verdade, é atribuída esta autorização desde que haja uma transferência de capital para um banco com
sede em Portugal para a criação de postos de trabalho ou para a compra de um imóvel. Este último é o meio
mais usado, bastando para isso um contrato de compra e venda e o valor do imóvel depositado.
Os mais de seis mil milhões de euros investidos para obter uma autorização de residência foram quase na
totalidade para compra de imóveis (mais de 90%), incindindo em Lisboa, Porto, Cascais e outras zonas do
litoral.
O direito ao reagrupamento familiar permite ainda que os cidadãos abrangidos circulem livremente não só
em Portugal como também em todos os países do Espaço Schengen. A autorização de residência atribuída é
temporária, podendo tornar-se permanente ao fim de cinco anos de renovação consecutiva no país. Findo
esse período, o titular tem direito à residência permanente e pode pedir a nacionalidade portuguesa por
naturalização (nos termos da Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, na sua redação atual, que aprova a Lei da
Nacionalidade). E, recorde-se esta autorização de residência não obriga o investidor a residir no território
nacional, mas tão só a permanecer sete dias num primeiro investimento e 14 nos seguintes (se os houver).
Recentemente, o Governo alterou, ao abrigo de uma autorização legislativa, o regime aplicável aos vistos
gold (Decreto-Lei n.º 14/2021, de 12 de fevereiro). Sumariamente, a partir de 1 janeiro de 2022, foram
aumentados os montantes mínimos, que no caso da transferência de capital passa para 1, 5 milhões de euros
e impõe-se que a aquisição de imóveis que se destinem a habitação se situem nas Regiões Autónomas da
Madeira e dos Açores ou nos territórios do interior (Portaria n.º 208/2017, de 13 de julho).
No mês de dezembro de 2021, foram atribuídos 84 vistos gold dos quais 71 em aquisição de imóveis
(sendo 35 para reabilitação urbana e 13 por via de transferência der capital. Até dezembro de 2021 foram
atribuídas 10 254 autorizações de residência – 9585 por via de compra de imóveis; 649 por transferência de
capital e apenas 20 por criação de postos de trabalho. Ao mesmo tempo, foram atribuídas 17 221 autorizações
de residência por via do reagrupamento familiar.
Na verdade, todos os objetivos maiores da consagração deste mecanismo saíram gorados. Quase não
houve investimento produtivo ou gerador de postos de trabalho e ao invés, há uma clara contribuição para a
especulação imobiliária e para a criação de dificuldades no mercado do arrendamento para habitação.
Para o PCP, a questão não é a de pressupor que todos os cidadãos estrangeiros que têm dinheiro para
investir e solicitem a autorização de residência sejam criminosos ou corruptos. Não existe qualquer presunção
de atos ilícitos. A questão é que as autorizações de residência em Portugal não devem ser objeto de
comercialização. Quem reside e trabalha em Portugal, seja investidor ou não, deve poder legalizar a sua
situação e obter autorização de residência. O critério para o acesso a autorização de residência, e por essa via
à aquisição de nacionalidade por via de naturalização, não pode ser o de ter dinheiro e por esse motivo poder
utilizar este mecanismo para entrar e circular livremente no espaço Schengen.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República e da alínea b) do n.º 1
do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo assinados do Grupo
Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Revoga o regime de atribuição de autorização de residência para atividade de investimento
A presente lei revoga o regime de autorização de residência de uma atividade de investimento aos
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nacionais de Estados terceiros, para efeitos de exercício pessoal ou através de uma sociedade.
Artigo 2.º
Norma revogatória
São revogados a alínea d), do n.º 1 e o n.º 4 do artigo 3.º, o artigo 90.º-A e a alínea r), do n.º 1 do artigo
122.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, na sua redação atual e os artigos 61.º e 65.º a 65.º-K do Decreto
Regulamentar n.º 84/2007, de 5 de novembro, na sua redação atual.
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Assembleia da República, 3 de junho de 2022.
Os Deputados do PCP: Paula Santos — Alma Rivera — Bruno Dias — Jerónimo de Sousa — Diana
Ferreira — João Dias.
———
PROJETO DE LEI N.º 110/XV/1.ª
REDUZ O FINANCIAMENTO PÚBLICO AOS PARTIDOS POLÍTICOS E ÀS CAMPANHAS ELEITORAIS
(OITAVA ALTERAÇÃO À LEI N.º 19/2003, DE 20 DE JUNHO)
Exposição de motivos
O PCP mantém a sua posição de que os partidos políticos devem ser responsáveis pela recolha dos meios
financeiros de que necessitam para desenvolver a sua atividade, devendo esse financiamento assentar
essencialmente nas contribuições dos seus militantes e apoiantes.
Tal opção deve ser acompanhada da obrigação de os partidos políticos assegurarem simultaneamente o
cumprimento de regras adequadas a prevenir e combater fenómenos de corrupção, designadamente proibindo
o financiamento dos partidos por empresas de forma a evitar a captura de partidos políticos por interesses
económicos por via do financiamento partidário.
A realidade em Portugal é, no entanto, diferente.
A Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, sobre o financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais,
aprovada em 2003 pela maioria PSD/CDS então existente, aumentou muito significativamente o montante das
subvenções públicas aos partidos políticos, quer no financiamento corrente quer no financiamento das
campanhas eleitorais. O PCP opôs-se frontalmente a esse aumento por considerar que, proibido o
financiamento por parte de empresas (proibição que o PCP defendeu sozinho durante muitos anos), o
essencial do financiamento partidário deve ser garantido pela atividade e pelo esforço militante dos seus
membros e apoiantes.
Por outro lado, os limites de despesas eleitorais sofreram, igualmente na lei aprovada em 2003, um enorme
aumento, elevando a possibilidade de gastos para níveis inaceitáveis face às dificuldades que o povo
português já na altura atravessava. Estes elevados níveis de gastos eleitorais, que aliás acentuam a
desproporção de meios entre as forças políticas, em nada contribuem para o esclarecimento das diversas
opções eleitorais ou para a apresentação de propostas alternativas e distorcem a suposta igualdade
democrática de candidaturas.
A redução das subvenções públicas aos partidos e às campanhas eleitorais que foram decididas nos
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últimos anos ficaram sempre aquém do que o PCP sempre defendeu.
Assim, com a presente iniciativa, o PCP propõe que as subvenções públicas aos partidos, em vez de
corresponderem como atualmente a 1/135 do IAS por cada voto obtido em eleições legislativas passem a
corresponder a 1/225, operando uma redução significativa (40%) do seu montante.
De igual modo, quanto ao financiamento público das campanhas eleitorais, o PCP propõe que as
subvenções às campanhas para a Assembleia da República, para a Presidência da República e para o
Parlamento Europeu sejam reduzidas a metade, e que sejam reduzidas em 75% as subvenções às
campanhas eleitorais para as assembleias legislativas das regiões autónomas. Para as autarquias locais, o
PCP propõe que a subvenção seja de valor total equivalente a 100% do limite de despesas admitido para o
município e não de 150% como atualmente. Este nível de redução acompanha, na proposta do PCP, a
redução do limite de despesas admissíveis nas campanhas eleitorais para as autarquias locais para um terço
do que está hoje previsto.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea c) do n.º 1 do artigo 4.º do
Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo único
Os artigos 5.º, 17.º e 20.º da Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, com as alterações introduzidas pelo Decreto-
Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro, pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, pela Lei n.º 55/2010, de 24
de dezembro, pela Lei n.º 1/2013, de 3 de janeiro, pela Lei Orgânica n.º 5/2015, de 10 de abril, pela Lei n.º
4/2017, de 16 de janeiro, e pela Lei Orgânica n.º 1/2018, de 18 de junho, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 5.º
Subvenção pública para financiamento dos partidos políticos
1 – […].
2 – A subvenção consiste numa quantia em dinheiro equivalente à fração 1/225 do valor do IAS, por cada
voto obtido na mais recente eleição de Deputados à Assembleia da República.
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].
7 – […].
8 – […].
Artigo 17.º
Subvenção pública para as campanhas eleitorais
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – A subvenção é de valor total equivalente a:
a) 10 000 vezes o valor do IAS para as eleições para a Assembleia da República;
b) 5 000 vezes o valor do IAS para as eleições para a Presidência da República e para o Parlamento
Europeu;
c) 1 000 vezes o valor do IAS para as eleições para as Assembleias Legislativas Regionais.
5 – Nas eleições para as autarquias locais a subvenção é de valor total equivalente a 100% do limite de
despesas admitido para o município, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 20.º
(…).
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Artigo 20.º
Limites das despesas de campanha eleitoral
1 – O limite máximo admissível de despesas realizadas em cada campanha eleitoral, nacional ou regional,
é fixado nos seguintes valores:
a) 5000 vezes o valor do IAS na campanha eleitoral para Presidente da República, acrescido de 1500
vezes o valor do IAS no caso de concorrer a segunda volta;
b) 30 vezes o valor do IAS por cada candidato apresentado na campanha eleitoral para a Assembleia da
República;
c) 20 vezes o valor do IAS por cada candidato apresentado na campanha eleitoral para as Assembleias
Legislativas Regionais;
d) 150 vezes o valor do IAS por cada candidato apresentado na campanha eleitoral para o Parlamento
Europeu.
2 – O limite máximo admissível de despesas realizadas nas campanhas eleitorais para as autarquias locais
é fixado nos seguintes valores:
a) 450 vezes o valor do IAS em Lisboa e Porto;
b) 300 vezes o valor do IAS nos municípios com 100 000 ou mais eleitores;
c) 150 vezes o valor do IAS nos municípios com mais de 50 000 e menos de 100 000 eleitores;
d) 100 vezes o valor do IAS nos municípios com mais de 10 000 e menos de 50 000 eleitores;
e) 50 vezes o valor do IAS nos municípios com 10 000 ou menos eleitores.
3 – […].
4 – […].
5 – […].»
Assembleia da República, 2 de junho de 2022.
Os Deputados do PCP: Paula Santos — Alma Rivera — Bruno Dias — Jerónimo de Sousa — Diana
Ferreira — João Dias.
———
PROJETO DE LEI N.º 111/XV/1.ª
REGULA AS CONDIÇÕES EM QUE A MORTE MEDICAMENTE ASSISTIDA NÃO É PUNÍVEL E
ALTERA O CÓDIGO PENAL
O Iniciativa Liberal nasceu para defender intransigentemente o direito de cada cidadão «pensar o que
quiser, de exprimir o que pensa como quiser, e de pôr em prática o que pensa como quiser, desde que essa
expressão ou essa prática não infrinja diretamente a igual liberdade de qualquer outro indivíduo.»
Estes princípios, que representam nada mais do que a liberdade individual de qualquer cidadão de criar a
sua própria personalidade e de poder, sem entraves, escolher o caminho ao longo da sua existência, não
podem ser ignorados quando a vida chega ao seu fim.
As escolhas livres e conscientes que cada pessoa faz ao longo da sua história podem ter diferentes
motivações – um cidadão pode ser movido, em diferentes momentos, pela busca da felicidade própria ou da
de terceiros, pelo desejo de conforto material, pelo desejo de reconhecimento, pela tentativa de obter sucesso
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profissional ou familiar de acordo com as suas próprias definições, pela vontade altruísta de construir um
mundo melhor para terceiros ou por qualquer outra razão que lhe comprazer. Uma forte motivação para uma
escolha de um cidadão livre, informado e consciente pode ser a vontade de pôr fim a uma situação de
sofrimento. Essa mesma decisão só pode ser encarada como uma questão do foro íntimo, pessoalíssimo, de
cada ser humano.
Numa sociedade caracterizada pelo respeito perante a vontade dos seus cidadãos, será sempre
inadmissível tratar a morte medicamente assistida como uma questão pública, deslocando o poder de decisão
do indivíduo para o coletivo.
A defesa da liberdade individual não pode ser apenas uma tentativa de proteção dos cidadãos contra
ingerências da autoridade ou contra agressões de terceiros (liberdades negativas). É também necessário
garantir que os cidadãos possam exercer a sua vontade individual, as suas liberdades positivas – desde que o
consubstanciar destas vontades não represente uma limitação às liberdades negativas de outros cidadãos.
Importa, por isso, dizer que o facto de se enquadrar juridicamente um determinado direito não implica qualquer
tipo de promoção ou incentivo à utilização do mesmo. A nossa pretensão, e é preciosa, é a de que direitos
individuais não sejam interditados e sancionados por falta de enquadramento.
Não cabe ao Estado, através do Direito Penal, impor padrões morais aos indivíduos. Assim, a
descriminalização proposta pelo presente diploma cobre apenas condutas que não merecem essa tutela
penal, nem a consequente privação de liberdade dos indivíduos que as pratiquem; ao contrário, são decisões
provindas de uma esfera íntima individual que o Estado não pode violar.
Entendemos que deve ser garantido às pessoas que, padecendo de lesão definitiva de gravidade extrema
ou doença grave e incurável, e que se encontram em sofrimento de grande intensidade a possibilidade de
anteciparem o fim da própria vida duma forma mais digna, o que, para muitos, significará uma morte pacífica,
nos seus próprios termos. Contudo, tal não pode significar a substituição da rede de cuidados paliativos por
este procedimento. Estes devem ser assegurados a todos os cidadãos incluindo, e especialmente, àqueles
que, reunindo as condições jurídicas para pedir a morte medicamente assistida, escolham não o fazer.
Definir a vontade que pode dar início a um procedimento de morte medicamente assistida e como a ajuda
pode ser praticada neste procedimento reveste a maior importância. Da mesma forma que o ordenamento
jurídico português exige formas qualificadas para a realização de certos atos e negócios jurídicos que, em
matéria de importância, não se podem comparar à opção pela morte medicamente assistida, que não pode, de
modo algum, operar-se num quadro legislativo simplista. Porém, e contrariamente aos atos e negócios
jurídicos mencionados, na morte medicamente assistida há necessidade de garantir a possibilidade de
revogação, a todo o tempo, da decisão de iniciar o procedimento, e que essa revogação seja o menos onerosa
e formal possível, de forma que a livre revogação o seja verdadeiramente, e haja o máximo de garantias
possível de que qualquer pessoa que optou pela morte medicamente assistida o desejava inequivocamente.
Deste modo, prevêem-se diversos momentos em que a vontade do indivíduo de continuar com o
procedimento é objeto de indagação. Assim, cada pessoa que decide pela morte medicamente assistida é
consultada por, pelo menos, dois médicos. Assegura-se assim, por conseguinte, que se não se cumprirem os
requisitos legais ou no caso de a pessoa manifestar dúvidas em relação à sua execução, o procedimento seja
imediatamente cancelado.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do
Iniciativa Liberal apresentam o seguinte projeto de lei:
Capítulo I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei regula as condições especiais em que a morte medicamente assistidanão é punível e altera
o Código Penal.
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Artigo 2.º
Definições
Para efeitos da presente lei, considera-se:
a) Morte medicamente assistida: morte que ocorre por decisão da própria pessoa, em exercício do seu
direito fundamental à autodeterminação e livre desenvolvimento da personalidade, quando praticada ou
ajudada por profissionais de saúde;
b) Suicídio medicamente assistido: autoadministração de fármacos letais pelo próprio doente, sob
supervisão médica;
c) Eutanásia: administração de fármacos letais, pelo médico ou profissional de saúde devidamente
habilitado para o efeito;
d)Doença grave e incurável: doença que ameaça a vida, em fase avançada e progressiva, incurável e
irreversível, que origina sofrimento de grande intensidade;
e) Lesão definitiva de gravidade extrema: lesão grave, definitiva e amplamente incapacitante que coloca a
pessoa em situação de dependência de terceiro ou de apoio tecnológico para a realização das atividades
elementares da vida diária, existindo certeza ou probabilidade muito elevada de que tais limitações venham a
persistir no tempo sem possibilidade de cura ou de melhoria significativa;
f) Sofrimento de grande intensidade: sofrimento físico, psicológico e espiritual, decorrente de doença
grave e incurávelou de lesão definitiva de gravidade extrema, com grande intensidade, persistente,
continuado ou permanente e considerado intolerável pela própria pessoa;
g) Médico orientador: médico indicado pelo doente que tem a seu cargo coordenar toda a informação e
assistência ao doente, sendo o interlocutor principal do mesmo durante todo o processo assistencial, sem
prejuízo de outras obrigações que possam caber a outros profissionais;
h) Médico especialista: médico especialista na patologia que afeta o doente e que não pertence à mesma
equipa do médico orientador.
Artigo 3.º
Morte medicamente assistida não punível
1 – Para efeitos da presente lei, considera-se morte medicamente assistida não punível a que ocorre por
decisão da própria pessoa, maior, cuja vontade seja atual e reiterada, séria, livre e esclarecida, em situação de
sofrimento de grande intensidade, com lesão definitiva de gravidade extrema ou doença grave e incurável,
quando praticada ou ajudada por profissionais de saúde.
2 – Para efeitos da presente lei, consideram-se legítimos apenas os pedidos de morte medicamente
assistida apresentados por cidadãos nacionais ou legalmente residentes em território nacional.
3 – A morte medicamente assistida ocorre em conformidade com a vontade e a decisão da própria
pessoa, que se encontre numa das seguintes situações:
a) Lesão definitiva de gravidade extrema;
b) Doença grave e incurável.
4 – A morte medicamente assistida pode ocorrer por:
a) Suicídio medicamente assistido;
b) Eutanásia.
5 – O pedido subjacente à decisão prevista no n.º 1 obedece a procedimento clínico e legal, de acordo com
o disposto na presente lei.
6 – O pedido pode ser livremente revogado a qualquer momento, nos termos do artigo 12.º
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Capítulo II
Procedimento
Artigo 4.º
Abertura do procedimento clínico
1 – O pedido de abertura do procedimento clínico de morte medicamente assistida é efetuado por pessoa
que preenche os requisitos previstos no artigo anterior, doravante designada por doente, em documento
escrito, datado e assinado pelo próprio, ou pela pessoa por si designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, a
ser integrado em Registo Clínico Especial (RCE) criado para o efeito.
2 – O pedido é dirigido ao médico escolhido pelo doente como médico orientador.
3 – O médico orientador deve obrigatoriamente aceder ao historial clínico do doente e assumi-lo como
elemento essencial do seu parecer, emitido nos termos do artigo 5.º
4 – Não são admitidos os pedidos de doentes sujeitos a processo judicial para aplicação do regime do
maior acompanhado, enquanto o mesmo se encontrar pendente, sendo o procedimento de morte
medicamente assistida imediatamente suspenso quando o processo judicial for instaurado posteriormente à
apresentação do pedido e enquanto o mesmo decorra, independentemente da fase em que o procedimento de
morte medicamente assistida se encontre.
5 – Ao doente é sempre garantido, querendo, o acesso a cuidados paliativos.
Artigo 5.º
Parecer do médico orientador
1 – O médico orientador emite parecer fundamentado sobre se o doente cumpre todos os requisitos
referidos no artigo 3.º e presta-lhe toda a informação e esclarecimento sobre a situação clínica que o afeta, os
tratamentos aplicáveis, viáveis e disponíveis, designadamente na área dos cuidados paliativos, e o respetivo
prognóstico, após o que verifica se o doente mantém e reitera a sua vontade, devendo a decisão do doente
ser registada por escrito, datada e assinada.
2 – A informação e o parecer prestados pelo médico e a declaração do doente, assinados por ambos,
integram o RCE.
3 – Se o parecer do médico orientador não for favorável à morte medicamente assistida do doente, o
procedimento em curso é cancelado e dado por encerrado e o doente é informado dessa decisão e dos seus
fundamentos pelo médico orientador, podendo o procedimento ser reiniciado com novo pedido de abertura,
nos termos do artigo 4.º
Artigo 6.º
Confirmação por médico especialista
1 – Após o parecer favorável do médico orientador, este procede à consulta de outro médico, especialista
na patologia que afeta o doente, cujo parecer confirma ou não que estão reunidas as condições referidas no
artigo anterior, o diagnóstico e prognóstico da situação clínica e a natureza grave e incurável da doença ou a
condição definitiva e de gravidade extrema da lesão.
2 – O médico especialista referido no número anterior é atribuído de forma sequencial, de entre uma lista
de médicos especialistas na patologia que afeta o doente, que manifestem interesse em integrar essa lista,
elaborada pela Ordem dos Médicos, tendo em conta um critério de territorialidade que promova a proximidade
geográfica do médico especialista ao doente.
3 – O parecer fundamentado do médico especialista é emitido por escrito, datado e assinado por ele e
integra o RCE.
4 – Se o parecer do médico especialista não for favorável à morte medicamente assistida do doente, o
procedimento em curso é cancelado e dado por encerrado e o doente é informado dessa decisão e dos seus
fundamentos pelo médico orientador, podendo o procedimento ser reiniciado com novo pedido de abertura,
nos termos do artigo 4.º
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5 – No caso de parecer favorável do médico especialista, o médico orientador informa o doente do
conteúdo daquele parecer, após o que verifica novamente se o doente mantém e reitera a sua vontade,
devendo a decisão do doente ser registada por escrito, datada e assinada pelo próprio ou pela pessoa por si
designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, e, juntamente com o parecer ou pareceres alternativos emitidos
pelo médico ou médicos especialistas, integrar o RCE.
6 – Caso o doente padeça de mais do que uma lesão definitiva de gravidade extrema ou doença grave e
incurável, o médico orientador decide qual a especialidade médica a consultar.
Artigo 7.º
Confirmação por médico especialista em psiquiatria
1 – É obrigatório o parecer de um médico especialista em psiquiatria, sempre que ocorra uma das
seguintes situações:
a) O médico orientador e ou o médico especialista tenham dúvidas sobre a capacidade da pessoa para
solicitar a morte medicamente assistida revelando uma vontade séria, livre e esclarecida;
b) O médico orientador e ou o médico especialista admitam que a pessoa seja portadora de perturbação
psíquica ou condição médica que afete a sua capacidade de tomar decisões.
2 – Se o médico especialista em psiquiatria confirmar qualquer uma das situações referidas no número
anterior, o procedimento em curso é cancelado e dado por encerrado, sendo o doente informado dessa
decisão e dos seus fundamentos, podendo o procedimento ser reiniciado com novo pedido de abertura, nos
termos do artigo 4.º
3 – O parecer do médico especialista em psiquiatria é emitido por escrito, datado e assinado pelo próprio e
integra o RCE.
4 – A avaliação necessária para a elaboração do parecer referido no n.º 1 envolve, sempre que a condição
específica do doente assim o exija, a colaboração de um especialista em psicologia clínica.
5 – No caso de parecer favorável do médico especialista em psiquiatria, este, acompanhado do médico
orientador, deve informar o doente do conteúdo daquele parecer, após o que verifica novamente se o doente
mantém e reitera a sua vontade, devendo a decisão consciente e expressa deste ser registada em documento
escrito, datado e assinado pelo próprio ou pela pessoa por si designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, o
qual integra o RCE.
6 – O médico especialista em psiquiatria elabora um relatório com a descrição das consultas com o doente,
incluindo, nomeadamente considerações sobre a atitude do doente e discussões com o mesmo que julgue
relevantes para o procedimento clínico da morte medicamente assistida, o qual é integrado no RCE.
Artigo 8.º
Parecer da Comissão de Verificação e Avaliação
1 – Nos casos em que se apresentem os pareceres favoráveis nos termos dos artigos anteriores,
reconfirmada a vontade do doente, o médico orientador remete cópia do RCE para a Comissão de Verificação
e Avaliação dos Procedimentos Clínicos de Morte Medicamente Assistida (CVA), prevista no artigo 24.º,
solicitando parecer sobre o cumprimento dos requisitos e das fases anteriores do procedimento, que é
elaborado no prazo máximo de 5 dias úteis.
2 – Quando a CVA tiver dúvidas sobre se estão reunidas as condições previstas na presente lei para a
prática da morte medicamente assistida, deveconvocar os médicos envolvidos no procedimento para prestar
declarações, podendo ainda solicitar a remessa de documentos adicionais que considere necessários.
3 – Em caso de parecer desfavorável da CVA, o procedimento em curso é cancelado e dado por
encerrado, podendo ser reiniciado com novo pedido de abertura, nos termos do artigo 4.º
4 – No caso de parecer favorável da CVA, o médico orientador deve informar o doente do conteúdo
daquele parecer, após o que verifica novamente se este mantém e reitera a sua vontade, devendo a sua
decisão consciente e expressa ser registada em documento escrito, datado e assinado pelo próprio ou pela
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pessoa por si designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, o qual integra o RCE.
Artigo 9.º
Concretização da decisão do doente
1 – Mediante parecer favorável da CVA, o médico orientador, de acordo com a vontade do doente, combina
o dia, hora, local e método a utilizar para prática da morte medicamente assistida.
2 – O médico orientador informa e esclarece o doente sobre os métodos disponíveis para praticar a morte
medicamente assistida, designadamente a autoadministração de fármacos letais pelo próprio doente ou a
administração pelo médico ou profissional de saúde devidamente habilitado para o efeito, mas sob supervisão
médica, sendo a decisão da responsabilidade exclusiva do doente.
3 – A decisão referida no número anterior deve ser consignada por escrito, datada e assinada pelo doente,
ou pela pessoa por si designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, e integrada no RCE, sem prejuízo do
disposto no n.º 6 do artigo 3.º
4 – Entre o agendamento, nos termos do n.º 1 do presente artigo, e a administração dos fármacos letais,
decorre um período de reflexão, não inferior a dois dias, durante o qual é obrigatório o acompanhamento
psicológico.
5 – Após a consignação da decisão, o médico orientador remete cópia do RCE respetivo para a Inspeção-
Geral das Atividades em Saúde (IGAS), que pode acompanhar presencialmente o procedimento de
concretização da decisão do doente.
6 – No caso de o doente ficar inconsciente antes da data marcada para a realização do procedimento de
morte medicamente assistida, o procedimento é interrompido e não se realiza, salvo se o doente recuperar a
consciência e mantiver a sua decisão.
Artigo 10.º
Administração dos fármacos letais
1 – Além do médico orientador e outro profissional de saúde, obrigatoriamente presentes aquando da
administração dos fármacos letais, podem estar presentes outros profissionais de saúde por indicação do
médico orientador, assim como pessoas indicadas pelo doente, desde que o médico orientador considere que
existem condições clínicas e de conforto adequadas.
2 – Imediatamente antes de se iniciar a administração ou autoadministração dos fármacos letais, o médico
orientador deve confirmar se o doente mantém a vontade de requerer a morte medicamente assistida, na
presença de uma ou mais testemunhas, devidamente identificadas no RCE.
3 – Caso o doente não confirme expressamente a sua vontade de requerer a morte assistida,
nomeadamente se manifestar qualquer dúvida, o procedimento em curso é cancelado e dado por encerrado, o
que é inscrito em documento escrito, datado e assinado pelo médico orientador, integrando o RCE, podendo o
procedimento ser reiniciado com novo pedido de abertura, nos termos do artigo 4.º
4 – No caso previsto no número anterior, deve ser entregue ao doente o respetivo RCE, devendo uma
cópia ser anexada ao seu processo clínico e outra enviada para a CVA com o respetivo Relatório Final do
médico orientador, nos termos do artigo 17.º
Artigo 11.º
Decisão pessoal e indelegável
1 – A decisão do doente em qualquer fase do procedimento clínico de morte medicamente assistida é
estritamente pessoal e indelegável.
2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, caso o doente que solicita a morte medicamente
assistida não saiba ou esteja impossibilitado fisicamente de escrever e assinar, pode, em todas as fases do
procedimento em que seja requerido, fazer-se substituir por pessoa da sua confiança, por si designada apenas
para esse efeito, aplicando-se as regras do reconhecimento de assinatura a rogo na presença de profissional
legalmente competente, devendo a assinatura ser efetuada na presença do médico orientador, com referência
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expressa a essa circunstância, e na presença de uma ou mais testemunhas.
3 – A pessoa designada pelo doente para o substituir nos termos do número anterior não pode vir a obter
benefício direto ou indireto da morte do doente, nomeadamente vantagem patrimonial, nem ter interesse
sucessório.
Artigo 12.º
Revogação
1 – A revogação do pedido de morte medicamente assistida cancela o procedimento clínico em curso e
encerra-o, devendo a decisão ser inscrita no RCE pelo médico orientador.
2 – Mediante a revogação do pedido é entregue ao doente o respetivo RCE, devendo ser anexada uma
cópia ao seu processo clínico com o Relatório Final do médico orientador.
Artigo 13.º
Locais autorizados
1 – A escolha do local para a prática da morte medicamente assistida cabe ao doente.
2 – O procedimento de morte medicamente assistida pode ser praticado nos estabelecimentos de saúde do
Serviço Nacional de Saúde e dos setores privado e social que estejam devidamente licenciados e autorizados
para a prática de cuidados de saúde, disponham de internamento e de local adequado e com acesso
reservado.
3 – Caso a escolha do doente recaia sobre local diferente dos referidos no número anterior, deve o médico
orientador certificar que o mesmo dispõe de condições clínicas e de conforto adequadas para o efeito.
Artigo 14.º
Acompanhamento
Além do médico orientador e de outros profissionais de saúde envolvidos no procedimento de morte
medicamente assistida, podem estar presentes, também para os efeitos previstos no n.º 2 do artigo 10.º, as
pessoas indicadas pelo doente.
Artigo 15.º
Verificação da morte e certificação do óbito
A verificação da morte e a certificação do óbito obedecem à legislação em vigor, devendo as respetivas
cópias ser arquivadas no RCE.
Artigo 16.º
Registo Clínico Especial
1 – O RCE inicia-se com o pedido de morte medicamente assistida redigido pelo doente, ou pela pessoa
por si designada nos termos do n.º 2 do artigo 11.º, e dele devem constar, entre outros, os seguintes
elementos:
a) Todas as informações clínicas relativas ao procedimento em curso;
b) Os pareceres e relatórios apresentados pelos médicos e outros profissionais de saúde intervenientes no
processo;
c) O parecer da CVA;
d) As decisões do doente sobre a continuação do procedimento ou a revogação do pedido;
e) A decisão do doente sobre o método de morte medicamente assistida;
f) Todas as demais ocorrências consideradas relevantes.
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2 – Concluído o procedimento ou cancelado por revogação do pedido do doente, decisão médica ou
seguindo parecer da CVA, o RCE é anexado ao Relatório Final, devendo ser anexada uma cópia ao processo
clínico do doente.
3 – O médico orientador é responsável pelo RCE, nele integrando os documentos a que se refere o n.º 1.
4 – O doente tem acesso ao RCE sempre que o solicite ao médico orientador.
5 – O modelo de RCE é estabelecido em regulamentação a aprovar pelo Governo.
Artigo 17.º
Relatório Final
1 – O médico orientador elabora, no prazo de 15 dias após a morte, o respetivo Relatório Final, ao qual é
anexado o RCE, que remete à CVA e à IGAS.
2 – A obrigação de apresentação do Relatório Final mantém-se nos casos em que o procedimento é
encerrado sem que tenha ocorrido a morte medicamente assistida do doente seja por decisão médica ou
parecer desfavorável da CVA.
3 – Do Relatório Final devem constar, entre outros, os seguintes elementos:
a) A identificação do doente e dos médicos e outros profissionais intervenientes no processo, incluindo os
que praticaram ou ajudaram à morte medicamente assistida, e das pessoas consultadas durante o
procedimento;
b) Os elementos que confirmam o cumprimento dos requisitos exigidos pela presente lei para a morte
medicamente assistida;
c) A informação sobre o estado clínico, nomeadamente sobre o diagnóstico e prognóstico, com
explicitação da natureza grave e incurável da doença ou da condição definitiva e de gravidade extrema da
lesão e das características e intensidade previsível do sofrimento;
d) O método e os fármacos letais utilizados;
e) Data, hora e local onde se praticou o procedimento de morte medicamente assistida e a identificação
dos presentes;
f) Os fundamentos do encerramento do procedimento.
4 – O modelo de Relatório Final é estabelecido em regulamentação a aprovar pelo Governo.
Capítulo III
Direitos e deveres dos profissionais de saúde
Artigo 18.º
Profissionais de saúde habilitados
1 – Os profissionais de saúde inscritos na Ordem dos Médicos e também os inscritos na Ordem dos
Enfermeiros podem praticar ou ajudar no procedimento de morte medicamente assistida, excluindo-se aqueles
que possam vir a obter qualquer benefício direto ou indireto da morte do doente, nomeadamente vantagem
patrimonial.
2 – Para efeitos da prossecução do ato de morte medicamente assistida, os profissionais de saúde
referidos no número anterior devem verificar previamente a existência de prescrição dos fármacos
necessários, efetuada nos termos legais aplicáveis.
3 – Aos profissionais de saúde envolvidos no procedimento de morte medicamente assistida é
disponibilizado, sempre que solicitado, apoio psicológico.
Artigo 19.º
Deveres dos profissionais de saúde
No decurso do procedimento clínico de morte medicamente assistida, os médicos e outros profissionais de
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saúde que nele intervêm devem respeitar os seguintes deveres:
a) Informar o doente de forma objetiva, compreensível, rigorosa, completa e verdadeira sobre o
diagnóstico, tratamentos aplicáveis, viáveis e disponíveis, resultados previsíveis, prognóstico e esperança de
vida da sua condição clínica;
b) Informar o doente sobre o seu direito de revogar a qualquer momento a sua decisão de requerer a morte
medicamente assistida;
c) Informar o doente sobre os métodos de administração ou autoadministração dos fármacos letais para
que aquele possa escolher e decidir de forma esclarecida e consciente;
d) Assegurar que a decisão do doente é livre, esclarecida e informada;
e) Auscultar com periodicidade e frequência a vontade do doente;
f) Dialogar com os profissionais de saúde que prestam cuidados ao doente e, se autorizado pelo mesmo,
com os seus familiares e amigos;
g) Falar com o procurador de cuidados de saúde, no caso de ter sido nomeado e se para tal for autorizado
pelo doente;
h) Assegurar as condições para que o doente possa contactar as pessoas com quem o pretenda fazer;
i) Assegurar o acompanhamento psicológico do doente.
Artigo 20.º
Sigilo profissional e confidencialidade da informação
1 – Todos os profissionais que, direta ou indiretamente, participam no procedimento de morte medicamente
assistida estão obrigados a observar sigilo profissional relativamente a todos os atos, factos ou informações de
que tenham conhecimento no exercício das suas funções nesse âmbito, respeitando a confidencialidade da
informação a que tenham tido acesso, de acordo com a legislação em vigor.
2 – O acesso, proteção e tratamento da informação relacionada com o procedimento de morte
medicamente assistida processam-se de acordo com a legislação em vigor.
Artigo 21.º
Objeção de consciência
1 – Nenhum profissional de saúde pode ser obrigado a praticar ou ajudar ao ato de morte medicamente
assistida de um doente se, por motivos clínicos, éticos ou de qualquer outra natureza, entender não o dever
fazer, sendo assegurado o direito à objeção de consciência a todos os que o invoquem.
2 – A recusa por objeção de consciência do profissional de saúde pode ser apresentada a todo o tempo e
implica:
a) No caso da recusa pelo médico orientador, a suspensão do procedimento até que o doente escolha um
novo médico orientador que, após consultar o RCE, pode rejeitar, determinando nova escolha pelo doente;
b) No caso de recusa por qualquer outro profissional de saúde, a sua substituição apenas nos casos em
que seja indispensável para o cumprimento da presente lei ou em que o médico orientador o determine.
3 – A recusa do profissional deve ser comunicada ao doente num prazo não superior a 24 horas.
4 – A objeção de consciência é manifestada em documento assinado pelo objetor, dirigido ao responsável
do estabelecimento de saúde onde o doente está a ser assistido e o objetor presta serviço, se for o caso, e
com cópia à respetiva ordem profissional.
5 – A objeção de consciência é válida e aplica-se em todos os estabelecimentos de saúde e locais de
trabalho onde o objetor exerça a sua profissão.
6 – A objeção de consciência pode ser invocada a todo o tempo e não carece de fundamentação.
7 – Uma vez registada, nos termos do n.º 4 do presente artigo, considera-se que o profissional de saúde é
objetor de consciência para todos os procedimentos de morte medicamente assistida posteriores, até que o
profissional de saúde o revogue, declarando o contrário em documento dirigido ao responsável do
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estabelecimento de saúde onde presta serviço e, se for o caso, enviando uma cópia à respetiva Ordem
profissional.
Artigo 22.º
Responsabilidade disciplinar
Os profissionais de saúde não podem ser sujeitos a responsabilidade disciplinar pela sua participação no
procedimento clínico de morte medicamente assistida, conquanto cumpram todas as condições e deveres
estabelecidos na presente lei.
Capítulo IV
Fiscalização e avaliação
Artigo 23.º
Fiscalização
1 – Compete à IGAS a fiscalização dos procedimentos clínicos de morte medicamente assistida, nos
termos da presente lei.
2 – Em caso de incumprimento da presente lei, a IGAS pode, fundamentadamente, determinar a
suspensão ou o cancelamento e encerramento de procedimento em curso.
Artigo 24.º
Comissão de Verificação e Avaliação dos Procedimentos Clínicos de Morte Medicamente Assistida
Para cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 8.º e avaliação da aplicação da presente lei, é criada a
Comissão de Verificação e Avaliação dos Procedimentos Clínicos de Morte Medicamente Assistida (CVA).
Artigo 25.º
Competências da Comissão de Verificação e Avaliação dos Procedimentos Clínicos de Morte
Medicamente Assistida
Compete à Comissão de Verificação e Avaliação dos Procedimentos Clínicos de Morte Medicamente
Assistida:
a) Acompanhar a aplicação da lei no domínio ético, médico e jurídico, e emitir pareceres no âmbito deste
acompanhamento;
b) Receber e analisar todos os registos de procedimentos de morte medicamente assistida praticados ou
encerrados, verificando o cumprimento dos requisitos legais, prévia e posteriormente, nos termos dos artigos
8.º e 27.º;
c) Elaborar e enviar à Assembleia da República, anualmente, um relatório de avaliação da aplicação da
presente lei, nos termos do artigo 28.º;
d) Consultar peritos e especialistas nas matérias conexas com as suas atribuições, podendo obter de
quaisquer entidades e instituições todas as informações necessárias ao desenvolvimento das suas funções.
Artigo 26.º
Composição e funcionamento da Comissão
1 – A CVA é composta por cinco personalidades de reconhecido mérito que garantam especial
qualificação nas áreas de conhecimento relacionadas com a aplicação da presente lei, designadas da seguinte
forma:
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a) Um jurista indicado pelo Conselho Superior da Magistratura;
b) Um jurista indicado pelo Conselho Superior do Ministério Público;
c) Um médico indicado pela Ordem dos Médicos;
d) Um enfermeiro indicado pela Ordem dos Enfermeiros;
e) Um especialista em bioética indicado pelo Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida.
2 – Não podem integrar a CVA os profissionais de saúde, referidos nas alíneas c) e d) do número anterior,
que tenham manifestado objeção de consciência nos termos do artigo 21.º
3 – O mandato dos membros da CVA é de cinco anos, renovável por um único período.
4 – A CVA elabora e aprova o seu regulamento interno e elege, de entre os seus membros, um
presidente.
5 – A CVA funciona no âmbito da Assembleia da República, que assegura os encargos com o seu
funcionamento e o apoio técnico e administrativo necessários.
6 – Os membros da CVA não são remunerados pelo exercício das suas funções, tendo direito a senhas de
presença por cada reunião em que participam de montante a definir por despacho do Presidente da
Assembleia da República e, bem assim, a ajudas de custo e a requisições de transporte nos termos da lei
geral.
Artigo 27.º
Verificação
1 – A CVA avalia a conformidade do procedimento clínico de morte medicamente assistida, através de
parecer prévio, nos termos do artigo 8.º, e através de relatório de avaliação, nos termos do número seguinte.
2 – Uma vez recebido o Relatório Final do processo de morte medicamente assistida, que inclui o respetivo
RCE, a CVA examina o seu conteúdo e avalia, no prazo de cinco dias após essa receção, os termos em que
as condições e procedimentos estabelecidos na presente lei foram cumpridos.
3 – Nos casos em que a deliberação prevista no número anterior seja de desconformidade com os
requisitos estabelecidos pela presente lei, a CVA remete o relatório ao Ministério Público para os devidos
efeitos e às respetivas ordens dos profissionais envolvidos para efeitos de eventual processo disciplinar.
Artigo 28.º
Avaliação
1 – A CVA apresenta, anualmente, à Assembleia da República, um relatório de avaliação da aplicação da
presente lei, com informação estatística detalhada sobre todos os elementos relevantes dos processos de
morte medicamente assistida e que pode conter recomendações.
2 – Para elaboração do relatório são avaliados, com garantia de anonimato e confidencialidade, os
relatórios finais e respetivos RCE remetidos à CVA pelos médicos orientadores, que devem prestar todos os
esclarecimentos adicionais que esta lhes solicite.
3 – A IGAS presta à CVA as informações solicitadas sobre os procedimentos de fiscalização realizados
relativamente ao cumprimento da presente lei.
Capítulo V
Alteração legislativa
Artigo 29.º
Alteração ao Código Penal
Os artigos 134.º, 135.º e 139.º do Código Penal passam a ter a seguinte redação:
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«Artigo 134.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – A conduta não é punível quando realizada no cumprimento das condições estabelecidas na Lei n.º
__/____.
Artigo 135.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – A conduta não é punível quando realizada no cumprimento das condições estabelecidas na Lei n.º
__/______.
Artigo 139.º
[…]
1 – [Atual corpo do artigo.]
2 – Não é punido o médico ou enfermeiro que, não incitando nem fazendo propaganda, apenas preste
informação, a pedido expresso de outra pessoa, sobre o suicídio medicamente assistido, de acordo com o n.º
3 do artigo 135.º».
Capítulo VI
Disposições finais e transitórias
Artigo 30.º
Seguro de vida
1 – Para efeitos do contrato de seguro de vida, a morte medicamente assistida não é fator de exclusão.
2 – Os profissionais de saúde que participam, a qualquer título, no procedimento clínico de morte
medicamente assistida de uma pessoa segura perdem o direito a quaisquer prestações contratualizadas.
3 – Para efeitos de definição de causa de morte da pessoa segura, deve constar da certidão de óbito a
realização de procedimento de morte medicamente assistida.
4 – Uma vez iniciado o procedimento clínico de morte medicamente assistida, a pessoa segura não pode
proceder à alteração das cláusulas de designação dos beneficiários.
Artigo 31.º
Sítio da Internet
A Direção-Geral da Saúde disponibiliza, no seu sítio da Internet, uma área destinada a informação sobre a
morte medicamente assistida não punível, com os seguintes campos:
a) Informação sobre os procedimentos clínicos;
b) Formulários e documentos normalizados;
c) Legislação aplicável.
Artigo 32.º
Regulamentação
O Governo aprova, no prazo máximo de 90 dias após a publicação da presente lei, a respetiva
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regulamentação.
Artigo 33.º
Disposição transitória
Nos dois primeiros anos de vigência da presente lei, a CVA apresenta semestralmente à Assembleia da
República o relatório de avaliação a que se refere o n.º 1 do artigo 28.º
Artigo 34.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor 30 dias após a publicação da respetiva regulamentação.
Palácio de São Bento, 2 de junho de 2022.
Os Deputados do IL: Patrícia Gilvaz — Rui Rocha — Bernardo Blanco — Carla Castro — Carlos Guimarães
Pinto — Joana Cordeiro — João Cotrim Figueiredo — Rodrigo Saraiva.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 7/XV/1.ª
(ADAPTAÇÃO DO PLANO NACIONAL DA ÁGUA ÀS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS, COMO MEDIDA DE
COMBATE À SECA)
Texto final da Comissão de Ambiente e Energia
Recomenda ao Governo que inclua no Programa Nacional de Reformas – 2022 uma revisão do Plano
Nacional da Água (Decreto-Lei n.º 76/2016, de 9 de novembro)
A Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, resolve recomendar ao
Governo que inclua no Programa Nacional de Reformas – 2022 uma revisão do Plano Nacional da Água
(Decreto-Lei n.º 76/2016, de 9 de novembro), que tenha como prioridade a mitigação dos efeitos das
alterações climáticas e assegure nomeadamente:
a) A identificação de zonas ameaçadas pela escassez de água para uso humano para os próximos 50
anos;
b) A identificação dos tipos de cultura agrícola compatíveis com a disponibilidade hídrica projetada para os
próximos 50 anos;
c) A realização de um levantamento dos diplomas nacionais e convenções internacionais que prevejam
regimes de exceção que tenham a precipitação histórica como referência e a previsão de recomendações
tendentes a assegurar a sua compatibilização com os objetivos de adaptação às alterações climáticas;
d) A determinação de restrições ao uso da água para determinadas atividades económicas sempre que tal
não seja compatível com a disponibilidade hídrica;
e) A previsão de fontes alternativas de obtenção de água potável e de retenção de recursos hídricos no
solo; e
f) A garantia de implementação de planos de uso eficiente da água.
Aprovado em 31 de maio de 2022.
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O Presidente da Comissão, Tiago Brandão Rodrigues.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 49/XV/1.ª (*)
(RECOMENDA AO GOVERNO QUE CONTRIBUA PARA O APROFUNDAR DA DEMOCRACIA
EUROPEIA E PARA O FORTALECIMENTO DO PROJETO EUROPEU, ATRAVÉS DO DEBATE DE
PROPOSTAS PARA A MELHORIA DA ARQUITETURA INSTITUCIONAL DA UNIÃO EUROPEIA, BEM
COMO PARA GARANTIR A NOSSA INDEPENDÊNCIA ENERGÉTICA FACE A ATORES EXTERNOS)
Quando celebramos o Dia da Europa não assinalamos uma vitória numa guerra ou uma batalha qualquer.
Quando celebramos o Dia da Europa, celebramos uma ideia, e, através desta comemoração, comemoramos
também a ideia de que as ideias importam, de que as ideias fazem história, de que vale a pena pôr ideias em
cima da mesa e de que vale a pena discuti-las com os outros. Foi isso que Robert Schuman fez há 72 anos e
é isso que o Livre quer fazer na Assembleia da República.
Considerando que:
a) O Dia da Europa foi instituído como uma celebração da paz e da unidade no continente europeu,
assinalando-se todos os anos no aniversário da histórica «Declaração Schuman», apresentada a 9 de maio de
1950 pelo ministro francês Robert Schuman, que firmou a criação da Comunidade Europeia de Carvão e Aço
(CECA).
b) A Europa no pós-guerra procurou desenvolver-se no sentido da paz, de forma a sarar o trágico legado
da Segunda Grande Guerra, tendo o nascimento das comunidades europeias — hoje, União Europeia — e o
fim da Guerra Fria, simbolizada pelo derrube do Muro de Berlim, em 1989, inundado de confiança e de
otimismo quanto ao futuro os povos da Europa.
c) Setenta e dois anos depois da Declaração Schuman, assinalamos hoje o Dia da Europa num cenário de
guerra violência, morte e destruição. A 24 de fevereiro, a Federação Russa invadiu a Ucrânia, dando início a
uma agressão militar que até hoje perdura, tendo o conflito causado já milhares de vítimas, milhões de
refugiados e de deslocados internos.
d) A resistência ucraniana tem surpreendido o mundo, como um exemplo de coragem, empenho e
inspiração, desde logo, para a própria Europa. A luta pela independência a que hoje assistimos em território
ucraniano não é apenas uma disputa pelo futuro da Ucrânia, mas pelo futuro de toda a Europa — estão em
jogo os valores em que assentou a ordem europeia do pós-guerra, a sua arquitetura de segurança, e, acima
de tudo, o papel da Europa na ordem internacional que agora se desenha.
Considerando também que:
e) O auxílio europeu à resistência ucraniana tem sido fornecido sob diversas formas e feitios, com vários
Estados-Membros a fornecerem equipamento militar, ajuda humanitária e outros tipos de apoio ao esforço da
defesa da Ucrânia. No entanto, a União Europeia ainda não avançou com o apoio que o LIVRE considera ser
o mais eficaz para travar a ofensiva da Rússia de Putin: a criação de uma conta fiduciária detida por um
estado terceiro onde sejam depositados todos os pagamentos dos Estados-Membros da UE por combustíveis
fósseis russos de forma a parar de contribuir para o esforço de guerra russo e, sob certas condições ajudar a
financiar a reconstrução da Ucrânia a título de reparações de guerra. A criação desta conta fiduciária teria um
impacto significativo no financiamento do esforço de guerra russo, reduzindo a receita diária das exportações
de combustíveis fósseis da Rússia em mil milhões de euros.
f) A criação de programas de apoio à eficiência energética, ao conforto térmico e ao melhor isolamento
das nossas casas que permitam reduzir a dependência de combustíveis fósseis são essenciais, de maneira a
promover uma transição para fontes de energia alternativas e renováveis e aumentar a nossa independência
energética. Isolar termicamente as casas da União Europeia e assegurar que o conforto térmico dos europeus
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é garantido graças a energias renováveis é, neste momento, uma das formas mais eficazes de isolar
internacionalmente Putin, a nível estratégico, político e militar.
g) Para melhor auxiliar a Ucrânia e para estar em condições de ser um polo estrategicamente autónomo
que se posicione como bastião global de defesa dos direitos humanos, a União Europeia precisa também de
enfrentar os seus desafios internos. Para isso, a Europa precisa de confrontar o autoritarismo e as ameaças
ao Estado de Direito que se apresentam dentro do espaço europeu, nomeadamente através das ações de
Viktor Orbán e do governo húngaro do FIDESZ e seus aliados e de se transformar numa verdadeira
democracia transnacional sólida e coesa.
h) Para além de questões da sua arquitetura interna, a União precisa também de abordar os desafios do
seu futuro, seja a nível de maior integração dos Estados-Membros, da criação de uma verdadeira democracia
transnacional e da inclusão no projeto europeu de todos aqueles que dele quiserem fazer parte.
Considerando por fim que:
i) Mais do que nunca, ao assinalarmos este ano o Dia da Europa, reafirmamos o nosso empenho pela
paz, pela unidade, pela solidariedade entre europeus e para com a Ucrânia — incluindo, na sua aspiração de
se tornar membro da União Europeia e reforçamos igualmente o empenho pelos valores universais que estão
na origem da construção europeia: a liberdade e a democracia, a dignidade de todos os seres humanos, o
respeito pelo estado de direito e por uma ordem mundial assente na lei internacional.
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre propõe à
Assembleia da República que, através do presente projeto de resolução, delibere recomendar ao Governo
que:
1 – Contribua para o aprofundar da democracia europeia e para o fortalecimento do projeto europeu,
prosseguindo o debate, na medida das suas competências, das propostas que constam do relatório final da
Conferência Sobre o Futuro da Europa, nomeadamente:
a) Assegurar a defesa do estado de direito em todos os Estados-Membros garantindo o cumprimento dos
valores e princípios elencados nos tratados e criando, no quadro das instituições europeias, uma conferência
anual sobre o estado de direito na União Europeia;
b) Fortalecer a Democracia europeia, lançando um debate transnacional sobre assuntos europeus,
incluindo sobre a possibilidade de o Parlamento Europeu lançar referendos ao nível da União Europeia para
matérias de grande importância, e seguindo atentamente debates que já estão em curso nas instituições
europeias, como o das listas transnacionais, o da forma de eleição presidência da Comissão Europeia e o da
possibilidade de dotar o Parlamento Europeu de iniciativa legislativa;
c) A melhoria dos mecanismos de decisão das instituições europeias nomeadamente através da redução
da necessidade de decisões por unanimidade no Conselho da União Europeia – que devem passar a ser
tomadas por maioria qualificada – com exceção para a admissão de novos membros na União Europeia e para
alterações aos princípios fundamentais da UE consagrados nos tratados europeus;
d) A transformação do Conselho da União Europeia num verdadeiro Senado da União Europeia, com
representantes permanentes eleitos diretamente pelos cidadãos de cada Estado-Membro;
e) O combate à desinformação no seio da UE através do fortalecimento da independência dos media e de
organizações cuja missão é a verificação de factos;
f) A redução da dependência da UE de atores externos em setores estratégicos para a União, aumentado
a investigação, desenvolvimento e estimulando a inovação dentro da União Europeia;
2 – Contribua para o debate sobre a criação de uma Confederação Europeia que albergue todos os países
com estatuto de candidatos a membro da União Europeia, conforme avançado pelo Secretário-Geral do
Partido Democrático italiano, Enrico Letta, ou sobre a criação de uma Comunidade Política Europeia, ideia
lançada pelo Presidente da República Francesa, Emmanuel Macron, com objetivos semelhantes.
3 – Envide todos os esforços junto das instituições europeias com vista à criação de incentivos ao
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isolamento e eficiência energética das habitações e locais de trabalho da União Europeia, recorrendo a
energias alternativas e renováveis, de forma a garantir a independência energética da União e que a
democracia europeia não fica refém do petróleo e gás russos, bem como a melhorar o conforto térmico de
todos os cidadãos europeus e a contribuir para o combate às alterações climáticas.
Assembleia da República, 2 de junho de 2022.
O Deputado do L, Rui Tavares.
(*) O texto inicial foi publicado no DAR II Série-A n.º 24 (2022.05.09) e foi substituído a pedido do autor em 2 de junho de 2022.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 85/XV/1.ª
PROGRAMA DE REDUÇÃO DAS PERDAS DE ÁGUA NAS REDES DE ABASTECIMENTO PÚBLICO
Portugal continua a ter níveis inaceitáveis de perdas de água nas suas redes de abastecimento público, o
que é especialmente grave num contexto de diminuição da disponibilidade hídrica e de agravamento da seca.
Os investimentos em redução de perdas têm sido insuficientes e, portanto, continuamos a pagar o tratamento
de demasiada água que se desperdiça.
Nesta matéria, e de acordo com o último Relatório Anual dos Serviços de Águas e Resíduos em Portugal
(RASARP 2021), há três indicadores especialmente preocupantes devido ao desempenho globalmente
insuficiente, seja nos serviços em alta ou em baixa, nomeadamente:
• Indicador AA08 – Água não faturada
• Indicador AA12 – Perdas reais de água
• Indicador AA09 – Reabilitação de condutas
Indicador AA08 – Água não faturada
• Avalia o nível de perdas económicas correspondentes à água que, apesar de ser captada, tratada,
transportada, armazenada e distribuída, não chega a ser faturada aos utilizadores.
• O indicador é definido como a percentagem de água entrada no sistema que não é faturada.
• A água não faturada inclui perdas reais, perdas aparentes (incluindo as perdas por erros de medição e
uso não autorizado) e pelo consumo autorizado não faturado.
• Serviços em alta – água não faturada: 5,7% do total de água entrada no sistema; Perdas reais: 21
milhões de m3/ano.
• Serviços em baixa – água não faturada: 28,7% do total de água entrada no sistema; Perdas reais:
174 milhões de m3/ano.
• A percentagem de água não faturada é mediana no serviço em alta e no serviço em baixa, indiciando
potencial de melhoria.
• A síntese da qualidade do serviço para as Entidades Gestoras é a seguinte:
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• Ao longo dos últimos cinco anos verificou-se uma evolução medíocre neste indicador, não se
conseguindo uma redução substancial da água não faturada, seja nos sistemas em alta ou em baixa.
Água não faturada 2016 2017 2018 2019 2020
Alta – AA08a – Média do indicador (%) 5,2 4,9 5,1 4,8 5,7
Baixa – AA08b – Média do indicador (%) 29,8 30,2 29,4 28,8 28,7
Indicador AA12 – Perdas reais de água
• Avalia as perdas reais de água (fugas e extravasamentos) enquanto bem escasso que exige uma
gestão racional.
• O indicador é definido como o volume de perdas reais por ramal ou por unidade de comprimento de
conduta.
• A avaliação das perdas reais de água no serviço em alta é mediana.
• No serviço em baixa, a avaliação das perdas reais de água é mediana para as entidades com densidade
de ramais igual ou superior a 20 por quilómetro de rede e boa para as entidades gestoras em baixa com
densidade de ramais inferior a 20 por quilómetro de rede.
• Existe, portanto, potencial de melhoria com a implementação de metodologias de redução das perdas
de água.
• A síntese da qualidade do serviço para as Entidades Gestoras é a seguinte:
• Ao longo dos últimos cinco anos verifica-se uma evolução medíocre neste indicador, não se
conseguindo uma redução substancial das perdas reais de água, seja nos sistemas em alta ou em baixa.
Perdas reais de água 2016 2017 2018 2019 2020
Alta – AA12a – Média do indicador [(m3/(km.dia)] 6,6 6,2 6,0 5,5 5,8
Baixa – AA12b – Média do indicador [(l/(ramal.dia)] 126 137 128 125 125
Indicador AA09 – Reabilitação de condutas
• Avalia a existência de uma prática continuada de reabilitação das condutas por forma a assegurar a sua
gradual renovação e uma idade média aceitável da rede.
• O indicador é definido como a percentagem média anual de condutas de adução e distribuição com
idade superior a dez anos que foram reabilitadas nos últimos cinco anos (conceito a aplicar a EG de sistemas
em baixa e em alta).
• Em 2021, conclui-se que, em Portugal continental, a reabilitação de condutas é insatisfatória no serviço
em alta e no serviço em baixa, indiciando potencial de melhoria com uma prática continuada de reabilitação de
condutas.
• A síntese da qualidade do serviço para as Entidades Gestoras é a seguinte:
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A perspetiva do regulador
Os indicadores mostram claramente os níveis inaceitáveis de perdas de água nas redes de abastecimento
público e uma trajetória de redução do problema que é insuficiente.
Importa salientar a perspetiva e as recomendações que são feitas pela Entidade Reguladora dos Serviços
de Água e Resíduos (ERSAR):
• «Face aos desafios colocados pelas alterações climáticas, o progressivo aumento da capacidade de
reserva de água tratada para abastecimento, constitui um indicador importante, que deve ser acompanhado
pela aposta no desafio da redução das perdas reais de água, que persiste com valores demasiado
elevados (…)» (pág. 403).
• Manifesta-se essencial garantir a elaboração de um programa de redução de água não faturada,
por parte das entidades gestoras, que permita a redução ao longo do tempo das perdas reais e aparentes,
assim como do consumo de água autorizado não faturado (pág. 68).
• A elaboração de um programa de redução de água não faturada (…) aumentará a eficiência na
prossecução do serviço e, desse modo, uma maior disponibilidade financeira para a realização dos
investimentos necessários, novos e de reabilitação, a custos mais adequados para o utilizador final do
serviço, num cenário económico e operacionalmente mais sustentável (pág. 68).
Novo ciclo de planeamento e de investimento (2030)
O Plano Estratégico para o Setor de Abastecimento de Água e Gestão de Águas Residuais e Pluviais, para
o período de 2021-2030, contemplará a necessidade de redução das perdas de água.
Contudo, é relevante a perspetiva do regulador quando à existência de um programa de ação dirigido à
redução das perdas e da água não faturada. Este programa pode ser relevante para obter um melhor
desempenho na reabilitação das redes de abastecimento e para aproveitar as dotações financeiras ao abrigo
do Portugal 2030 para eficiência no uso de recursos.
Torna-se evidente que no anterior período de programação os investimentos concretizados foram
insuficientes. Só com o seu reforço será possível obter melhorias nestes indicadores.
Assim, vem o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, nos termos da Constituição e do Regimento
da Assembleia da República, recomendar ao Governo que:
1 – Prepare um programa de redução das perdas de água nas redes de abastecimento público em
articulação com as Entidades Gestoras.
2 – Reforce o investimento na reabilitação de redes ao abrigo do Portugal 2030.
Assembleia da República, 2 de junho de 2022.
Os Deputados do PSD: Hugo Martins de Carvalho — Bruno Coimbra — Sónia Ramos — Hugo Patrício
Oliveira — Alexandre Simões — Carlos Cação — Cláudia André — Jorge Salgueiro Mendes — Alexandre
Poço — António Prôa — António Topa Gomes — Cláudia Bento — João Marques — Patrícia Dantas — Paulo
Ramalho — Rui Cristina.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 86/XV/1.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE EXECUTE COM URGÊNCIA O TROÇO DO IC8 ENTRE POMBAL E
AVELAR (ANSIÃO), COM INCLUSÃO DE DESNIVELAMENTOS DOS ACESSOS E, PROCEDA À
CABIMENTAÇÃO DOS RECURSOS FINANCEIROS NECESSÁRIOS
O IC8 é um itinerário complementar que faz a ligação entre a A17 e a A23, promovendo uma ligação
principal entre o litoral e o interior do País, sendo uma das vias estruturantes da região do Pinhal Interior.
A requalificação desta via rápida não está concluída, faltando a intervenção, senão mesmo nova
construção do troço entre Pombal e Avelar (Ansião), com cerca de 20 km. Atualmente é uma adaptação da
estrada nacional n.º 237, batizada de Itinerário Complementar, com bastantes cruzamentos de nível, curvas e
deficiente sinalização, que têm provocado um significativo aumento da sinistralidade rodoviária,
nomeadamente um número elevado de vítimas mortais e feridos graves. As suas características técnicas e
estruturais apenas se adequam a servir localmente as povoações dos concelhos de Pombal e Ansião, não
respondendo eficazmente às exigências do trânsito nacional que o utiliza.
Possui um elevado tráfego de veículos pesados de transporte de madeira principalmente, oriundos dos
vários concelhos da Região do Pinhal Interior, para as fábricas de celulose da Leirosa e para o porto da
Figueira da Foz.
Em 2010, este troço foi incluído na Concessão do Pinhal Interior Norte, mas não foi possível concretizar as
obras necessárias, pelas razões sobejamente conhecidas. Desde então não voltou a ser incluído em qualquer
documento estratégico da Infraestruturas de Portugal.
Recorde-se que esta é uma via estratégica e essencial a Portugal, pela sua ligação direta a Espanha,
assumindo uma importância decisiva numa lógica de intermodalidade, com a ligação ao porto da Figueira da
Foz e à plataforma logística, assim como, pela sua conexão às linhas ferroviárias do Norte e do Oeste e, às
autoestradas A1, A13, A23, A17 e A8.
Passados todos estes anos, e depois de inúmeros acidentes mortais, é premente a execução deste troço
do IC8 entre Pombal e Avelar, com a inclusão de acessos desnivelados e iluminados e respetiva sinalização
vertical e horizontal.
Recentemente, um estudo europeu, apresentado pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária,
sinalizou este troço como de «alto risco», pelas deficientes condições de construção, tráfego e número de
acidentes graves.
Execute com a máxima urgência o troço do IC8 entre Pombal e Avelar (concelho de Ansião), com a
inclusão dos nós desnivelados necessários, respetiva iluminação, a sinalização vertical e horizontal necessária
e, proceda à cabimentação dos recursos financeiros suficientes para a sua integral construção.
A Assembleia da República resolve, nos termos do disposto do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da
República Portuguesa, recomendar ao Governo que:
Recomenda ao Governo que execute com urgência o troço do IC8 entre Pombal e Avelar (Ansião), com
inclusão de desnivelamentos dos acessos e, proceda à cabimentação dos recursos financeiros necessários.
Assembleia da República, 2 de junho de 2022.
Os Deputados do PSD: João Marques — Paulo Mota Pinto — Paulo Rios de Oliveira — António Topa
Gomes — Márcia Passos — Hugo Patrício Oliveira — Olga Silvestre — Cláudia André.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.