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II SÉRIE-A — NÚMERO 43

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V

Enquadramento ideológico e político

A liberdade de expressão, sobretudo a liberdade de dizer ao poder político o que o poder político não quer

ouvir, e de consumir tal conteúdo crítico produzido por terceiros, é um direito de todo o indivíduo.

A liberdade de expressão não existe só para que possamos falar de assuntos corriqueiros; existe, sim, para

que qualquer um de nós possa denunciar perversões dos poderes instituídos. A liberdade de expressão é

condição necessária para uma cidadania informada e ativa. A liberdade de expressão é fundamental ao debate

político numa democracia saudável. A liberdade de expressão é a base de uma sociedade livre que consiga

resistir a tentativas de medidas autoritárias por parte do poder político.

O debate político, esse, faz-se não só de factualidades a preto-e-branco, mas também e sobretudo de

opiniões, ambiguidades e níveis de cinzento. No debate político prolifera informação que pode ser falsa, errada,

parcial, especulativa, manipuladora, persuasiva, polémica, subversiva, hiperbólica, metafórica, todo o tipo de

figuras de estilo, falácias lógicas e artifícios retóricos, verdades esticadas e mentiras por omissão, liberdade

criativa. A comunicação política e partidária depende frequentemente de narrativas subjetivas apresentadas

como verdades, factoides, meias-verdades seletivas, incorreções variadas. No fim do dia, muitos argumentos

políticos são matéria de princípios e valores, que por vezes são complementados com informação imperfeita.

Neste contexto, se é verdade que alguns argumentos maliciosos misturam mentiras no meio de verdades,

também é verdade que argumentos políticos muito pertinentes podem não ser factualmente robustos.

Nada disto deve ser avaliado literalmente e a subjetividade inerente à opinião não deve estar,

constantemente, sujeita a um crivo de objetividade definido por um terceiro. É um mau serviço à democracia

assinalar indiscriminadamente conteúdos políticos que possam não ser objetivos.

VI

Censura

Em Portugal já atravessámos uma longa noite de ditadura, onde imperava a censura. Nunca mais.

A censura começa com promessas de zelosamente limpar o debate de falsidades, para proteger a população,

e acaba a rotular de intrujices inaceitáveis o que são desafios legítimos ao poder político.

Pela censura, primeiro abafam-se aspetos políticos incómodos, porque alguém usou uma inverdade ou não

usou factos oficiais. Depois, temas inteiros passam a ser tabu, porque podem ser inaceitavelmente subjetivos,

ou simplesmente diferentes da narrativa oficial. Por fim, extingue-se a própria atividade de escrutínio e crítica

porque pode ser antipatriótico questionar o poder.

É importante salientar que não será necessário que haja censura pura e dura, ou seja supressão direta de

discurso político discordante, e lápis azul nas redações físicas e digitais, para que estes mecanismos corroam

a vitalidade democrática do País. A mera existência de sistemas oficiais de verificação de factos imporá um

chilling effect, o conceito de «respeitinho», de tão má memória. A mera possibilidade de um conteúdo ou canal

poder levar «cartão amarelo« e poder sofrer consequências arbitrárias será suficiente para instaurar a

autocensura, e impor comportamentos ordeiros.

Assim se controlam não só as publicações, mas também os pensamentos.

VII

Verificadores de factos

Sendo o Estado ele próprio um produtor de informação política, necessariamente subjetiva, e muitas vezes

pouco suportada em factos indubitavelmente provados, é parte interessada em qualquer poder de validação da

informação nos fóruns digitais. Não é legítimo que seja o Estado a definir quem são as entidades idóneas para

atestar a verdade em temas políticos que podem ser sensíveis aos próprios poderes políticos. São poderes que

não se admitem a um estado autoritário, e muito menos num estado democrático.

O Estado democrático não deve exercer qualquer censura. Nem deve subcontratar tal função, nem deve

tolerar que terceiros, supostamente independentes, exerçam tal poder sobre as pessoas e a comunidade.

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