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Sexta-feira, 12 de maio de 2023 II Série-A — Número 223
XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)
S U M Á R I O
Decreto da Assembleia da República n.º 49/XV: (a) Reforça a proteção das vítimas de crimes de disseminação não consensual de conteúdos íntimos, alterando o Código Penal e o Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de janeiro, que transpõe para a ordem jurídica nacional a Diretiva 2000/31/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho, relativa a certos aspetos legais dos serviços da sociedade de informação, em especial do comércio eletrónico, no mercado interno. Resolução: (a) Recomenda ao Governo que crie um grupo de trabalho e adote um plano nacional para combater discursos de ódio. Projetos de Lei (n.os 763 e 767 a 788/XV/1.ª): N.º 763/XV/1.ª (Lei de Bases Gerais da Caça): — Alteração do texto inicial do projeto de lei. N.º 767/XV/1.ª (PAN) — Assegura a neutralidade de género no registo civil e reforça os direitos das pessoas trans, intersexo e não binárias, alterando o Código de Registo Civil e o Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado. N.º 768/XV/1.ª (PCP) — Melhora as condições de acesso das pessoas com deficiência à prestação social para inclusão e altera o momento a partir do qual esta prestação é devida aos beneficiários (quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro).
N.º 769/XV/1.ª (PAN) — Estabelece a obrigatoriedade do complemento solidário para idosos ter um valor nunca inferior ao valor do limiar da pobreza, alterando o Decreto-Lei n.º 232/2005, de 29 de dezembro. N.º 770/XV/1.ª (PCP) — Reposição dos escalões do abono de família para crianças e jovens, com vista à sua universalidade. N.º 771/XV/1.ª (PAN) — Prevê a criação do Provedor das Crianças e das Gerações Futuras. N.º 772/XV/1.ª (PAN) — Prevê a alteração da composição e funcionamento das comissões de proteção de crianças e jovens. N.º 773/XV/1.ª (PAN) — Garante o enquadramento legal e um financiamento adequado do Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação, alterando a Lei da Água. N.º 774/XV/1.ª (PAN) — Salvaguarda o direito de acesso à prestação social para a inclusão nos casos de atraso na notificação de comparência na junta médica, alterando o Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro. N.º 775/XV/1.ª (CH) — Altera o Regime Jurídico que estabelece a atividade de transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados (TVDE). N.º 776/XV/1.ª (BE) — Alarga a proteção conferida pela prestação social para a inclusão (quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro).
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N.º 777/XV/1.ª (PAN) — Prevenção da ocorrência de acidentes de trabalho e doenças profissionais e adaptação da legislação laboral aos fenómenos climáticos extremos. N.º 778/XV/1.ª (CH) — Assegura o cumprimento da Convenção de Istambul reforçando a proteção das vítimas em caso de assédio sexual. N.º 779/XV/1.ª (L) — Altera as regras de atribuição da prestação social para a inclusão nos casos em que depende ainda de obtenção de atestado de incapacidade multiuso e admite a acumulação daquela com a pensão social de velhice. N.º 780/XV/1.ª (L) — Prevê a criminalização da ciberviolência. N.º 781/XV/1.ª (L) — Cria as respostas de apoio psicológico para vítimas de assédio e violência sexual no ensino superior e alarga o âmbito de aplicação dos Códigos de Boa Conduta para a Prevenção e Combate ao Assédio a todos os membros da comunidade académica. N.º 782/XV/1.ª (BE) — Altera as taxas aplicáveis ao regime da contribuição sobre o setor bancário. N.º 783/XV/1.ª (BE) — Reforça a promoção da autodeterminação de género, procedendo à alteração da Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, e do Decreto-Lei n.º 131/95, de 6 de junho. N.º 784/XV/1.ª (BE) — Institui o Provedor da Criança. N.º 785/XV/1.ª (IL) — Elimina os benefícios fiscais dos partidos políticos e reduz o valor das subvenções públicas (oitava alteração à lei de financiamento dos partidos políticos, Lei n.º 19/2003, de 20 de junho). N.º 786/XV/1.ª (CH) — Cria o Provedor da Criança. N.º 787/XV/1.ª (BE) — Introdução do critério da paridade na composição do Tribunal Constitucional (alteração à lei de
organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional, Lei n.º 28/82, de 15 de novembro). N.º 788/XV/1.ª (BE) — Progressões, salários e condições de trabalho para os profissionais de enfermagem do Serviço Nacional de Saúde e dos serviços e organismos sob administração direta ou indireta do Ministério da Saúde. Projetos de Resolução (n.os 669 e 694 a 698/XV/1.ª): N.º 669/XV/1.ª (Aprovação de novos modelos de avaliação dos alunos, assentes em princípios de avaliação contínua, eliminando os exames e revendo o regime de provas de aferição): — Alteração do texto inicial do projeto de resolução. N.º 694/XV/1.ª (PCP) — Salvaguarda dos valores naturais do Parque Natural da Arrábida. N.º 695/XV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que crie um programa da atração de trabalhadores remotos para os territórios de baixa densidade. N.º 696/XV/1.ª (PAN) — Recomenda ao Governo que crie um travão à subida da prestação do crédito habitação. N.º 697/XV/1.ª (IL) — Recomenda ao Governo que estabeleça a gratuidade das alterações ao Cartão de Cidadão. N.º 698/XV/1.ª (CH) — Pela imediata suspensão da aplicação da Portaria n.º 86/2023, de 27 de março, que procede à alteração das regras relativas à distribuição, por meios eletrónicos, dos processos nos tribunais judiciais e nos tribunais administrativos e fiscais.
(a) Publicadas em Suplemento.
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PROJETO DE LEI N.º 763/XV/1.ª (1)
(LEI DE BASES GERAIS DA CAÇA)
Exposição de motivos
Volvidas cerca de duas décadas desde a publicação da Lei n.º 173/99, de 21 de setembro, que instituiu a Lei
de Bases Gerais da Caça, e do respetivo regulamento aprovado pelo Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto,
ainda que com sucessivas alterações que, no essencial, mantiveram a disciplina jurídica originária, impõe-se,
no momento atual, uma expressiva reforma do regime jurídico da caça, de forma a, pelo menos, procurar
conciliar a gestão e o exercício dessa atividade, que é socialmente fraturante, com os imperativos, socialmente
consensuais, da conservação da natureza, da proteção do ambiente e da biodiversidade e do respeito pelos
animais.
Casos recentes amplamente divulgados como o evento que levou à morte de mais de 500 animais indefesos
e confinados na Quinta da Torre Bela, no concelho de Azambuja, em dezembro de 2020, ou as cruentas e
sistemáticas montarias durante as quais um número ilimitado de cães atacam à dentada javalis e outros animais,
têm vindo a suscitar generalizada contestação e forte alarme social em torno do fenómeno da caça.
Estão em causa cenários reais de horror, impróprios de uma sociedade que se diz e se pretende evoluída, a
par de anacronismos legais gritantes, desfasados dos atuais valores de respeito pela natureza e pelos animais.
A título de exemplo, cite-se a possibilidade de, em pleno Século XXI, continuar a ser possível em Portugal
matar animais à paulada, com lanças, com bestas ou com arcos, ou, ainda, a viabilidade de confrontar
mortalmente animais através da utilização de cães, de furões ou de aves de rapina como instrumentos de caça.
Ou seja, admite-se a utilização de meios que inquestionavelmente são causadores de elevado e injustificado
sofrimento aos animais, posto que há meios alternativos menos pungentes como seja a utilização de armas de
fogo.
Por outro lado, a lei vigente permite que animais de espécies consideradas cinegéticas sejam criados, detidos
e reproduzidos em cativeiro para serem abatidos em treinos e no exercício da caça desportiva para fins lúdicos.
Tal realidade não é hoje eticamente aceitável, condenando anualmente largos milhares de animais a uma
breve vida de confinamento para, no único momento de liberdade que lhes é concedido, servirem de mero alvo
em exercícios de pontaria, que obviamente podem e devem ser realizados com recurso a objetos inanimados.
Ora, só na época venatória de 2018/2019 foram abatidos nas zonas de caça, entre outras espécies de
animais, 744 106 tordos, 147 687 pombos, 127 889 perdizes-vermelhas e 115 929 coelhos-bravos, num total de
1 329 149 animais, muitos dos quais criados em cativeiro para esse fim.
Por força da Lei n.º 8/2017, de 3 de março, os animais gozam atualmente, entre nós, de um estatuto legal
que lhes reconhece dignidade enquanto seres vivos sensíveis e merecedores de proteção em virtude dessa sua
natureza, estando inclusive vedado ao proprietário de quaisquer animais lhes causar dor, sofrimento ou
quaisquer outros maus-tratos injustificados, abandono ou morte.
Impõe-se, outrossim por tal proveniência, adequar o regime jurídico da caça aos princípios e normas legais
entretanto aprovados e vigentes nessa matéria, na perspetiva da coerência sistémica.
Como é sobejamente conhecido e tem vindo a ser crescentemente denunciado pela sociedade civil, em geral,
e pelas organizações ambientalistas, em particular, a realidade da caça, respaldada por um regime jurídico
conivente, consiste hoje na mera exploração dos ecossistemas, alimentada por autênticas fábricas de produção
de animais, desnaturados pelo confinamento e destinados a alvo fácil de caça para gáudio de um número cada
vez mais reduzido de praticantes.
Segundo dados divulgados pelo Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (ICNF) referentes a maio
de 2020, a maioria dos caçadores, distribuídos por classes etárias, tem entre 61 e 70 anos de idade e os
caçadores com idade até 30 anos representam 2,9 % do total, o que é bem sintomático do crescente e acentuado
declínio dessa atividade, bem como do desinteresse ou repúdio dos mais jovens pela mesma.
Nesse contexto, que espelha o declínio do setor da caça e decrescente número limitado de praticantes,
carece totalmente de justificação que cerca de 80 % do território nacional esteja ocupado com 5103 zonas de
caça, o equivalente a uma área superior a 7 milhões de hectares, na sua maioria zonas de caça «associativas»
e «turísticas».
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O Estado deve, sim, fomentar a criação e gestão de reservas, santuários e parques naturais e de recreio,
designadamente por reconversão de zonas de caça, que possam ser fruídos pela comunidade, em geral, e nos
quais se promova a qualidade de vida ambiental e se implementem programas de sensibilização, conservação
da natureza e de preservação das espécies.
O setor da caça é hoje praticamente deficitário, tendência que, face ao exposto, tende a agravar-se nos
próximos anos. Os cerca de 10 milhões de euros em taxas e licenças que o Estado arrecada não justificam, nem
compensam, o elevado investimento no setor.
Com efeito, foi anunciado em 2021 a atribuição de 10,4 milhões de euros no setor da caça, dos quais cinco
milhões de euros destinados à «promoção da biodiversidade e ao valor ambiental e social dos espaços
florestais», dinheiros públicos que deviam ser destinados à efetiva promoção da biodiversidade e do ambiente,
privilegiando ações e medidas que não impliquem o abate de animais, que suscitem o interesse consensual da
comunidade e a participação ativa dos jovens, em especial.
Atendendo ao exposto, não resulta legítimo fazer repercutir os elevados custos da atividade cinegética sobre
o conjunto dos cidadãos e cidadãs em Portugal e ainda onerar grande parte do território nacional com essa
finalidade em detrimento de outras amplamente apreciadas e suscetíveis de contribuir para os objetivos
ambientais, em particular de preservação das espécies.
O ordenamento do setor não deve, assim, ir além das atuais zonas de caça nacionais e municipais,
atualmente no total de 916, absorvendo mais de 2,6 milhões hectares de área, as quais se devem reger por
normas de gestão rigorosa, sob fiscalização do ICNF.
Destarte, impõe-se também reconfigurar o direito à não caça em termos presuntivos, libertando os cidadãos
do pesado ónus de o requererem junto da Administração Pública e ainda de o sinalizarem nos próprios terrenos
de que são detentores.
Por outro lado, propõe-se a criação de um órgão consultivo, de cariz científico, junto do Ministério do
Ambiente, designado por Conselho Nacional da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, ao qual caberá
igualmente, ponderados os censos disponíveis, identificar as espécies e respetivos quantitativos abrangidos em
cada época venatória, entre outros requisitos que assegurem o equilíbrio sustentável das populações de cada
espécie e o efetivo ordenamento, a assegurar pelo ICNF.
Aponta-se também a necessidade de apostar na formação e educação ambiental dos candidatos a
praticantes e praticantes, sensibilizando-os, nomeadamente, para as exigências da conservação da natureza,
da preservação das espécies e do respeito pelo ambiente.
Segundo dados divulgados em novembro de 2020 pela Polícia de Segurança Pública, nos últimos três anos
registaram-se mais de 300 ocorrências de violência doméstica com armas de fogo; só em 2019, foram
reportados 108 crimes de violência doméstica com recurso a arma de fogo. É, pois, fundamental, a título cautelar,
a avaliação psicológica dos candidatos a caçadores, por forma a aferir a necessária aptidão para a utilização de
armas de fogo em contextos de habitualidade como o exercício da caça.
Outrossim, não se afigura consentâneo com os atuais valores que regem a nossa sociedade que jovens
menores de idade, ainda que com autorização dos pais, possam caçar, manobrando armas de fogo, matando
seres vivos, podendo colocar-se a si em risco e a outras pessoas. A idade mínima para acesso a essa atividade
perigosa e de inegável violência deve coincidir com a maioridade.
Por outro lado, há muito também que as organizações ambientalistas portuguesas alertam para a
necessidade de se proceder à diminuição significativa dos animais e das espécies de animais que podem ser
caçados, excluindo dessa possibilidade pelo menos as espécies com populações reduzidas ou em declínio como
a rola brava ou comum, o zarro, a piadeira, o arrabio, o tordo-zornal, o tordo-ruivo ou mesmo o coelho-bravo.
Carece igualmente de sentido ético e de fundamento sério que animais como a raposa e os saca-rabos sejam
considerados espécies cinegéticas, não obstante o respetivo estatuto de conservação no nosso território não
seja atualmente preocupante. Tratam-se de mamíferos de pequeno porte, inofensivos para os humanos, que
não são utilizados na alimentação humana nem suscitam comprovados problemas de saúde ou de segurança
pública.
Têm, ao invés, importante atuação no equilíbrio natural de populações de espécies sinantrópicas, tais como
ratos e cobras, e, bem assim, contribuem para a eliminação de resíduos depositados na natureza, como sejam
cadáveres de animais de que se alimentam.
Acresce que têm como predadores naturais algumas das subespécies mais ameaçadas da Europa e do
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mundo, como a águia-imperial-ibérica, o lince e o lobo ibéricos. A escassez de alimento, grande parte do qual
alvo da caça, contribuiu, como é sabido, para esse alarmante estatuto.
A conservação das espécies ameaçadas implica a preservação do respetivo habitat e a gestão integrada das
populações de espécies que lhes servem de alimento, incluindo as raposas e os saca-rabos.
Ora, segundo dados divulgados pelo ICNF, só na época venatória de 2018/2019 foram caçados nas zonas
de caça 11 228 raposas e 6787 saca-rabos.
O certo é que a caça a essas duas espécies é hoje alvo de forte e fundada contestação popular a que o
poder político não pode ficar indiferente, devendo sempre optar por formas naturais de equilíbrio dos
ecossistemas e das populações de cada espécie, mediante a realização de censos regulares e, sendo
necessário, a redistribuição controlada dos animais, princípio este que que é transversal e que deve presidir às
opções políticas de controlo populacional das espécies.
Por fim, impõe-se a revisão do quadro sancionatório, sendo que o vigente está manifestamente
desatualizado, não se revelando sequer dissuasor da prática ilícita ou mesmo consentâneo com outros regimes
sancionatórios equiparados. A título de exemplo, atente-se que a falta de seguro de responsabilidade civil que
é exigido para o exercício de uma atividade tão potencialmente perigosa como a caça é punida com coima de
24,94 euros no seu limite inferior, que ainda pode ser especialmente atenuada em caso de negligência. Ou o
exercício da caça sob efeito do álcool cuja coima é de apenas 74,82 a 374,10 euros, se a taxa de álcool no
sangue (TAS) for igual ou superior a 0,5 g/l, ou de 149,64 a 748,20 euros, se a TAS for igual ou superior a 0,8
g/l e inferior a 1,2 g/l. Repare-se que sendo aquelas taxas de alcoolémia detetadas no exercício da condução
automóvel, as coimas são de 250 a 1250 euros e de 500 a 2500 euros, respetivamente, o que evidentemente
não faz sentido e revela-se desajustado.
Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
Regimento, a Deputada do PAN apresenta o seguinte projeto de lei:
CAPÍTULO I
Objeto e princípios
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei estabelece as bases do regime jurídico da caça, ponderados os princípios da conservação e
fomento da natureza e da biodiversidade e da defesa do património natural.
Artigo 2.º
Definições
Para efeitos do presente diploma, considera-se:
a) Áreas de refúgio de caça – áreas destinadas a assegurar a conservação ou fomento da fauna e/ou flora,
nas quais a caça é interdita;
b) Caça ou atividade cinegética – a atividade que visa capturar e/ou matar animais das espécies com
interesse cinegético, através dos meios e processos permitidos pela presente lei.
c) Espécies com interesse cinegético – as espécies com origem silvestre e em estado de liberdade natural
que figurem na lista aprovada para cada época venatória.
Artigo 3.º
Princípios gerais
A política cinegética nacional obedece aos seguintes princípios:
a) A conservação, defesa e fomento do património natural, fauna e flora, e dos equilíbrios biológicos;
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b) O respeito pelo estatuto dos animais legalmente reconhecido enquanto seres dotados de sensibilidade;
c) A criteriosa inserção das atividades humanas, com vista à minimização dos impactos na natureza e na
paisagem;
d) A criação e gestão de reservas, santuários e parques naturais e de recreio, bem como a classificação e
proteção de paisagens e sítios, de modo a garantir a conservação da natureza e a preservação dos equilíbrios
naturais;
e) A promoção e aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de
renovação e a estabilidade ecológica, com respeito pelo princípio da solidariedade entre gerações;
f) A promoção da saúde pública e ambiental;
g) A promoção da educação ambiental e do respeito pelos valores ambientais, pelo estatuto dos animais e
pela defesa da natureza.
Artigo 4.º
Tarefas do Estado
1 – Para a prossecução dos princípios estabelecidos no artigo anterior cabe ao Estado desenvolver
programas e formas de ação adequados, designadamente em colaboração com as autarquias locais e as
organizações não governamentais de defesa e proteção do ambiente.
2 – Compete, nomeadamente, ao Estado promover a reconversão das zonas de caça em reservas,
santuários e parques naturais e de recreio, bem como a classificação e proteção de paisagens e sítios, de modo
a garantir a conservação da natureza e da biodiversidade e a preservação dos equilíbrios naturais.
CAPÍTULO II
Conservação das espécies
Artigo 5.º
Normas de conservação
As normas para a conservação das espécies com interesse cinegético devem contemplar:
a) Medidas que visem assegurar a preservação das espécies e a manutenção da biodiversidade e dos
equilíbrios biológicos do meio, privilegiando-se as formas de controlo natural das populações, designadamente
mediante a introdução de predadores e o incremento de programas que incentivem a sua preservação ou a
redistribuição dos animais;
b) Princípios de afetação racional do ponto de vista ecológico das populações das espécies com interesse
cinegético;
c) Medidas que respeitem os diferentes estádios de reprodução e de dependência das espécies com
interesse cinegético;
d) Medidas que evitem a perturbação desnecessária e evitável dos indivíduos ou dos grupos das espécies
com interesse cinegético, no respeito pela natureza, estado e características de cada espécie;
e) Medidas tendentes a evitar infligir dor ou quaisquer outros maus-tratos que resultem em sofrimento
injustificado para os animais das espécies com interesse cinegético;
f) Em particular, para as espécies migradoras, medidas que visem respeitar o período de reprodução e de
retorno das mesmas, sem prejuízo da observância das demais normas.
Artigo 6.º
Conselho nacional da conservação da natureza e da biodiversidade
1 – É criado junto do Ministério do Ambiente o Conselho nacional da conservação da natureza e da
biodiversidade, abreviadamente designado por CNCNB, com as seguintes atribuições:
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a) Funções consultivas do Governo, nomeadamente no que se refere à definição da política cinegética
nacional nos termos e para os efeitos enunciados nos artigos 3.º e 4.º, e à implementação das normas de
conservação a que se refere o artigo 5.º ou ainda para quaisquer assuntos que caibam no âmbito da presente
lei;
b) Identificação das espécies com interesse cinegético em cada época venatória, bem como os respetivos
quantitativos e períodos venatórios, entre outros requisitos que assegurem o equilíbrio das populações de cada
espécie na perspetiva da conservação dos recursos naturais e da preservação do ambiente e dos ecossistemas;
c) Emissão de pareceres relacionados com quaisquer assuntos que caibam no âmbito da presente lei, com
vista à implementação das normas de conservação a que se refere o artigo 5.º.
2 – O CNCNB tem a seguinte composição:
a) Três elementos do ICNF, IP, dois dos quais do departamento de conservação da natureza e da
biodiversidade;
b) Dois representantes designados pelas organizações não governamentais do ambiente com atuação na
promoção e valorização da biodiversidade e na proteção dos animais silvestres;
c) Duas pessoas de reconhecido mérito científico na promoção e valorização da biodiversidade e na
proteção dos animais silvestres, ambas designadas pelo ministro da área do ambiente.
3 – O mandato dos membros do CNCNB tem a duração de cinco anos, podendo ser renovado uma vez pelo
prazo de três anos.
4 – O CNCNB elege, de entre os seus membros, um presidente e um vice-presidente, competindo a este
substituir o presidente nas suas ausências e impedimentos.
5 – Os membros do CNCNB são independentes no exercício das suas funções, não representando as
entidades que os elegeram ou designaram.
6 – Os membros do CNCNB têm direito a senhas de presença de montante a fixar por despacho conjunto
dos Ministros das Finanças e do Ambiente.
Artigo 7.º
Preservação das espécies
1 – Tendo em vista a preservação das espécies e da biodiversidade, é proibido:
a) Capturar ou destruir ninhos, covas e luras, ovos e crias de qualquer espécie, salvo nas condições previstas
na lei;
b) Caçar qualquer animal que não integre espécie com interesse cinegético;
c) Caçar animal de espécie com interesse cinegético fora dos respetivos períodos de caça, fora das jornadas
de caça ou em dias em que a caça não seja permitida;
d) Caçar animal por processos não autorizados ou indevidamente utilizados;
e) Caçar animal por meios não autorizados ou indevidamente utilizados;
f) Causar dor ou sofrimento desnecessário e injustificado aos animais, nomeadamente através da utilização
de instrumentos perfurantes ou cortantes, armadilhas, paus e objetos afins ou através da utilização de animais
designadamente cães, furões ou aves de rapina;
g) Ultrapassar as limitações e quantitativos de captura estabelecidos.
2 – É igualmente proibido:
a) Causar perturbação desnecessária e evitável dos indivíduos ou dos grupos das espécies com e sem
interesse cinegético, designadamente fazendo-os sair das respetivas tocas, ninhos ou outros locais onde
habitualmente essas espécies se abrigam;
b) Caçar nas queimadas, áreas percorridas por incêndios e terrenos com elas confinantes, numa faixa de
500 metros, enquanto durar o incêndio e nos 60 dias seguintes;
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c) Caçar nos terrenos cobertos de neve;
d) Caçar nos terrenos que durante inundações fiquem completamente cercados de água e nos 500 m
adjacentes à linha mais avançada das inundações, enquanto estas durarem e nos 60 dias seguintes.
Artigo 8.º
Espécies com interesse cinegético
1 – Consideram-se espécies com interesse cinegético as espécies que tenham origem silvestre e se
encontrem em estado de liberdade natural, e que, em cada época venatória, constem de listagem a elaborar
pelo conselho nacional da conservação da natureza e da biodiversidade, observadas as exclusões dos números
seguintes.
2 – Não podem ser consideradas espécies com interesse cinegético as espécies legalmente protegidas e
aquelas que estejam ameaçadas ou sob ameaça, nomeadamente, e entre outras, a rola-comum, o zarro, a
piadeira, o arrabio, o tordo-zornal, o tordo-ruivo, o coelho-bravo ou quaisquer outras que constem da Lista
Vermelha publicada pela International Union for Conservation of Nature and Natural Resources.
3 – São igualmente excluídas como espécies com interesse cinegético as raposas e os saca-rabos.
Artigo 9.º
Espécies com interesse cinegético em cativeiro
1 – Não é permitida a reprodução, criação e/ou detenção de espécies com interesse cinegético em cativeiro,
sem prejuízo do disposto no número seguinte.
2 – O ICNF, IP, pode, mediante parecer prévio do CNCNB, autorizar a reprodução, criação e detenção de
espécies com interesse cinegético em centros de recuperação de animais, santuários ou reservas naturais, com
o exclusivo propósito de repovoamento e quando este se mostre necessário ao equilíbrio dos ecossistemas e à
preservação da biodiversidade.
Artigo 10.º
Áreas de refúgio de caça
O Governo deve criar áreas de refúgio de caça para fins de proteção e conservação da natureza ou para
quaisquer outros fins, nomeadamente, para criação de santuários e reservas de vida selvagem ou parques
naturais e de recreio.
Artigo 11.º
Período venatório
1 – A caça só pode ser exercida durante os períodos fixados para cada espécie com interesse cinegético.
2 – Os períodos venatórios devem, entre outros requisitos específicos de cada espécie que desaconselhem
a perturbação ou intervenção humanas, respeitar os ciclos reprodutivos das espécies sedentárias e, quanto às
espécies migradoras, as épocas e a natureza das migrações.
3 – Compete ao CNCNB fixar, em cada época venatória, as espécies com interesse cinegético e os
respetivos quantitativos e períodos venatórios.
Artigo 12.º
Repovoamentos
Os repovoamentos de espécies, mediante redistribuição de animais em estado silvestre ou introdução de
predadores de origem silvestre, são permitidos para fins de controlo populacional e equilíbrio dos ecossistemas,
devendo ser objeto de planeamento adequado sob parecer prévio do CNCNB.
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CAPÍTULO III
Gestão e ordenamento dos recursos com interesse cinegético
Artigo 13.º
Gestão dos recursos com interesse cinegético
A gestão dos recursos com interesse cinegético compete ao Estado, podendo ser transferida
temporariamente ou concessionada às autarquias locais.
Artigo 14.º
Normas de ordenamento cinegético
1 – As normas de ordenamento cinegético devem contemplar:
a) A conservação e a exploração racional das espécies com interesse cinegético em moldes sustentáveis,
em conformidade com os princípios e normas estabelecidos nos artigos 3.º e 5.º;
b) A existência de planos de gestão e exploração cinegética e de planos globais de gestão e exploração
obrigatórios;
c) A existência de planos de gestão e exploração cinegética específicos, quando tal se justifique.
2 – Devem igualmente ser observados o direito da União Europeia e as convenções internacionais aplicáveis.
Artigo 15.º
Zonas de caça
1 – As zonas de caça podem, no respeito pelas normas referidas no artigo anterior, prosseguir objetivos da
seguinte natureza:
a) De interesse nacional, a constituir em áreas com características físicas e biológicas que requeiram
especiais requisitos em matéria de preservação ou em áreas que, por motivos de segurança, justifiquem ser o
Estado o único responsável pela sua administração;
b) De interesse municipal, sem prejuízo das normas de conservação previstas no artigo 5.º.
2 – O Estado pode transferir para as associações de defesa do ambiente ou para as autarquias locais a
gestão temporária das zonas de caça de interesse nacional já existentes, não podendo ser criadas novas zonas
de caça.
3 – O exercício da caça nas zonas de caça de interesse nacional ou municipal está sujeito ao pagamento de
taxas.
4 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, a gestão das zonas de caça deverá ser objeto de
regulamentação por parte do Ministério do Ambiente.
Artigo 16.º
Definição das zonas de caça
Ao Ministério do Ambiente, ouvido o Conselho Nacional da Conservação da Natureza e da Biodiversidade,
compete:
a) Definir prioridades quanto aos tipos de zonas de caça vigentes em cada município ou região;
b) Estabelecer áreas máximas e mínimas para cada tipo de zona de caça;
c) Estabelecer as regras de gestão das zonas de caça, observadas, entre outras, as regras constantes do
artigo seguinte;
d) Determinar a passagem, temporária ou definitiva, das zonas de caça a áreas de refúgio de caça;
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e) Extinguir as zonas de caça, afetando-as a fins de interesse público, designadamente a reservas,
santuários e parques naturais.
Artigo 17.º
Gestão das zonas de caça
1 – Constituem obrigações das entidades gestoras, designadamente:
a) Ter um responsável técnico permanente, com funções de organização e gestão operacional, devendo
superintender em todas as atividades que ocorram na zona de caça e cumprir e fazer cumprir todos os requisitos
legais aplicáveis;
b) Efetuar e manter a sinalização das zonas de caça;
c) Cumprir e fazer cumprir as normas reguladoras do exercício da caça que lhes são diretamente aplicáveis;
d) Cumprir os planos de gestão (PG), assim como os planos anuais de exploração (PAE);
e) Não permitir o exercício da caça até à aprovação do PAE;
f) Apresentar um PAE ao ICNF, até 15 de julho de cada ano, propondo nomeadamente:
i) Espécies e processos de caça autorizados;
ii) Número de exemplares de cada espécie a abater, devendo, no caso das espécies de porte grande, ser
indicados o sexo e a idade;
iii) Número previsto de jornadas de caça e limite de animais a abater por jornada de caça.
g) Comunicar, até 15 de julho de cada ano, ao CNCNB um exemplar do PAE;
h) Manter atualizada uma contabilidade simplificada, na qual sejam registadas as receitas e despesas
efetuadas e onde se possa apurar o resultado final;
i) Apresentar anualmente, até 15 de junho, ao ICNF os resultados da exploração cinegética e da execução
financeira respeitantes à época venatória anterior, em termos a regulamentar por meio de portaria do membro
do Governo com responsabilidade na área ambiental.
2 – O ICNF dispõe do prazo de 60 dias para aprovação do PAE referido na alínea f) do número anterior,
sendo em tudo aplicável o disposto no Código de Procedimento Administrativo, designadamente, presumindo-
se o indeferimento tácito se o referido prazo não for cumprido.
3 – O ICNF deve tratar estatisticamente os resultados da exploração cinegética recebidos das zonas de
caça e remeter ao CNCNB e ao Instituto Nacional de Estatística o quadro de resultados obtidos, nomeadamente
o número total de animais abatidos de cada espécie com interesse cinegético, devendo igualmente proceder ao
levantamento da densidade populacional (censos) por cada espécie cujos resultados remeterá todos os anos
ao CNCNB.
4 – O responsável técnico previsto na alínea a) do n.º 1 deve ter aptidão para o efeito, mediante formação
específica e avaliação teórica, a cargo pelo ICNF, cujos conteúdos programáticos serão definidos pelo CNCNB,
nos termos a regulamentar.
5 – É proibido o exercício da caça em zonas relativamente às quais não exista PAE aprovado, sem prejuízo
do disposto nos artigos 18.º a 20.º.
Artigo 18.º
Terrenos de caça condicionada
Não é designadamente permitido caçar:
a) Nos terrenos murados, nos quintais, parques ou jardins anexos a casas de habitação e, bem assim, em
quaisquer terrenos que circundem estas, numa faixa de proteção de 800 metros;
b) Nos terrenos ocupados com culturas agrícolas ou florestais, durante determinados períodos do seu ciclo
vegetativo, quando seja necessário proteger aquelas culturas e respetivas produções e para tal tenham sido
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sinalizadas nos termos da lei.
Artigo 19.º
Terrenos não cinegéticos
1 – Constituem terrenos não cinegéticos as áreas de proteção, as áreas de refúgio e os campos de treino,
bem como as áreas classificadas, incluindo as áreas protegidas tais como parques ou reservas naturais.
2 – Constituem áreas de proteção, designadamente, os seguintes locais:
a) Povoados, terrenos adjacentes de hospitais, escolas, lares de idosos, instalações militares, estações
radioelétricas, faróis, instalações turísticas, parques de campismo e desportivos, instalações industriais,
instalações de criação ou de alojamento de animais, estradas nacionais, linhas de caminho de ferro, praias de
banho, bem como quaisquer terrenos que os circundem, numa faixa de proteção não inferior a 800 metros;
b) Aeródromos e estradas secundárias, numa faixa de proteção não inferior a 600 metros.
Artigo 20.º
Direito à não caça
1 – O direito à não caça é a faculdade de os proprietários ou usufrutuários e arrendatários se oporem à caça
nos seus terrenos, passando estes a constituir áreas de direito à não caça.
2 – O direito à não caça não está sujeito a qualquer reconhecimento e presume-se exercido no caso de não
se encontrar colocada sinalização permitindo o exercício da caça.
3 – Os proprietários, arrendatários e usufrutuários que pretendam permitir o exercício da caça nos seus
terrenos devem requerer a respetiva autorização, nos termos a regulamentar, só podendo ser feito o seu
exercício após a obtenção da devida autorização para o efeito e colocação da devida sinalética.
Artigo 21.º
Campos de treino de caça
1 – As associações de caçadores, os clubes de tiro e as entidades titulares de zonas de caça podem ser
autorizadas a instalar campos de treino de caça, nos termos a definir em portaria do membro do Governo com
responsabilidade na área do Ambiente.
2 – Nos treinos não podem ser utilizados quaisquer animais vivos.
3 – As entidades gestoras de campos de treino de caça devem assegurar a recolha dos resíduos resultantes
das atividades neles desenvolvidas, após o seu término.
CAPÍTULO IV
Exercício da caça
Artigo 22.º
Requisitos
Só é permitido caçar aos indivíduos maiores de 18 anos, detentores de carta de caçador e que estiverem
munidos da necessária licença de caça e demais documentos legalmente exigidos.
Artigo 23.º
Carta de caçador
1 – A obtenção da carta de caçador fica dependente de exame constituído por prova teórica, por prova prática
e por avaliação psicológica, sujeito ao pagamento de taxa, a realizar pelo candidato perante os serviços
competentes do Estado e representantes do CNCNB, nos termos a definir, e destinado a apurar se o interessado
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possui a aptidão e os conhecimentos necessários para o exercício da caça, incluindo em matéria de conservação
da natureza e de respeito pelos valores do ambiente e pelo estatuto dos animais.
2 – O procedimento de exame, a duração das provas e a avaliação psicológica a que se referem os n.os 1 e
7 são definidos por portaria do membro do Governo responsável pela área do ambiente.
3 – Para efeitos da realização do exame referido no n.º 1, os candidatos devem frequentar ações de formação
durante prazo mínimo de um ano, a ministrar pelo ICNF.
4 – Os conteúdos programáticos das ações de formação e das provas de avaliação a que se referem os
números anteriores e n.º 7 são definidos pelo CNCNB.
5 – São condições para requerer a carta de caçador:
a) Ser maior de 18 anos;
b) Não ser portador de anomalia psíquica ou de disfunção orgânica, psicológica ou fisiológica que torne
perigoso o exercício da caça;
c) Ser portador da licença de uso e porte de arma para atos venatórios;
d) Não estar sujeito a proibição de caçar por disposição legal ou decisão judicial.
6 – A carta de caçador e respetivas revalidações estão sujeitas a taxa, nos termos a definir.
7 – A carta de caçador deve ser revalidada de quinze em quinze anos até o titular perfazer 60 anos de idade,
após o que a revalidação passa a ser necessária de cinco em cinco anos, mediante comprovação dos requisitos
indicados no número um, através de provas teórica e prática, a definir nos termos dos n.os 2 e 4.
8 – A carta de caçador caduca sempre que os respetivos titulares sejam condenados por qualquer crime de
caça, sem prejuízo das demais circunstâncias previstas na lei.
Artigo 24.º
Licenças de caça
1 – As licenças de caça têm validade temporal e territorial.
2 – Devem ser estabelecidas licenças de caça para diferentes meios, processos e espécies com interesse
cinegético.
3 – As licenças de caça estão sujeitas ao pagamento de taxas, nos termos a definir por portaria do membro
do Governo responsável pela área do ambiente.
Artigo 25.º
Documentos que devem acompanhar o caçador
1 – Durante o exercício da caça o caçador é obrigado a trazer consigo e a apresentar às entidades com
competência para a fiscalização, sempre que lhe seja exigido:
a) A carta de caçador;
b) A licença de caça;
c) As licenças dos cães que o acompanhem, incluindo o comprovativo do registo referido no n.º 4 do artigo
33.º;
d) A licença de uso e porte de arma e o livrete de manifesto;
e) O recibo comprovativo do pagamento do prémio do seguro de caça válido;
f) O bilhete de identidade, o cartão de cidadão ou o passaporte;
g) Comprovativo da autorização para exercício da caça na zona nacional ou municipal em causa.
2 – O caçador que não apresente todos os documentos referidos no número anterior não pode exercer a
caça, devendo abandonar, de imediato, a zona de caça onde se encontre, sem prejuízo da instauração dos
competentes autos de contraordenação.
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Artigo 26.º
Auxiliares dos caçadores
1 – Os caçadores podem ser ajudados por auxiliares, maiores de idade, com a função exclusiva de
transportar equipamentos, mantimentos, munições ou caça abatida.
2 – Cada caçador só pode ser acompanhado por um auxiliar, que não pode fazer parte da linha de caçadores
nem praticar quaisquer atos venatórios.
Artigo 27.º
Procedimento para o exercício da atividade venatória
O exercício da atividade venatória depende de pedido de permissão administrativa dirigida ao Presidente do
Conselho Diretivo do ICNF e deve ser instruído designadamente com os documentos referidos no n.º 1 do artigo
25.º.
Artigo 28.º
Seguro de responsabilidade civil
1 – Para o exercício da caça os caçadores têm de ser detentores de seguro obrigatório de responsabilidade
civil por danos causados a terceiros com coberturas mínimas de 500 mil euros para danos corporais e de 200
mil de euros para danos materiais ou danos contra a natureza.
2 – Os montantes mínimos do seguro referido no número anterior podem ser atualizados, mediante aumento
a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área do ambiente.
Artigo 29.º
Meios de caça
1 – No exercício da caça, e dentro dos limites fixados nos artigos seguintes, apenas são permitidos os
seguintes meios:
a) Armas de fogo;
b) Barco;
2 – Para os efeitos do presente diploma, são considerados objetos os meios utilizados no exercício da caça.
Artigo 30.º
Armas de fogo
1 – No exercício da caça apenas podem ser utilizadas as armas de fogo classificadas, nos termos da lei
aplicável, como armas de caça.
2 – As armas semiautomáticas, que correspondem às armas de fogo que se recarregam automaticamente
por ação do disparo, apenas podem ser utilizadas no exercício da caça quando estejam previstas ou
transformadas de forma que não possam comportar mais de três munições.
3 – No exercício da caça com armas de fogo é proibido o uso ou detenção de cartuchos carregados com
projéteis vulgarmente designados por chumbos.
4 – No exercício da caça com armas de fogo, os caçadores devem recolher os cartuchos vazios após a sua
utilização.
5 – Fora do exercício da caça só é permitido o transporte de armas de fogo legalmente classificadas como
de caça quando descarregadas, acondicionadas em estojo ou bolsa e desacompanhadas de munições.
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Artigo 31.º
Barco
1 – É proibida a utilização de barco na caça, com exceção das espécies de interesse cinegético a definir,
ouvido o CNCNB.
2 – É proibida a utilização de barco para perseguir os animais, bem como atirar com o barco em movimento
ou com o motor em funcionamento.
Artigo 32.º
Processos de caça
1 – A caça pode ser exercida pelos seguintes processos:
a) De salto – Aquele em que o caçador se desloca para procurar, perseguir ou capturar animais de espécies
com interesse cinegético que ele próprio encontra;
b) À espera – Aquele em que o caçador, parado, aguarda os animais de espécies com interesse cinegético
a capturar;
c) De aproximação – Aquele em que o caçador se desloca para capturar determinado animal de espécies
com interesse cinegético de grande porte.
2 – Nos processos de caça de salto e de aproximação, os grupos ou linhas de caçadores não podem ser
constituídos por mais de três caçadores, devendo entre linhas mediar no mínimo 250 m.
3 – É designadamente proibido:
a) Cercar os animais em terrenos vedados ou, por qualquer meio, impedindo-os de escapulir ou dificultando
a sua fuga;
b) Permitir o confronto entre animais, designadamente permitindo que os cães utilizados como auxiliares na
caça ataquem ou se confrontem com qualquer animal incluindo animais de interesse cinegético a capturar;
c) Causar perturbação desnecessária aos animais a capturar, designadamente fazendo-os sair das
respetivas tocas, ninhos ou outros locais onde habitualmente essas espécies se abrigam, reproduzem ou
nidificam;
d) Utilizar chamarizes, negaças ou quaisquer outros objetos ou produtos destinados a atrair a caça;
e) Enxotar ou praticar quaisquer atos que possam conduzir as espécies cinegéticas de uns terrenos para
outros;
f) Iluminar os animais a caçar.
Artigo 33.º
Animais de companhia utilizados como auxiliares na caça
1 – Os cães podem ser utilizados como auxiliares na caça, unicamente para efeito de seguimento de pistas
e de rasto de animais de interesse cinegético a capturar, sendo expressamente proibido que os cães possam
perseguir e/ou matar mamíferos selvagens, por desporto ou de qualquer outra forma.
2 – No exercício da caça, cada caçador só pode utilizar até dois cães e cada grupo de caçadores até um
máximo total de cinco cães.
3 – Para além da identificação e registo gerais a que os cães estão submetidos, nos termos atualmente
previstos no Decreto-Lei n.º 82/2019, de 27 de junho, é obrigatório o registo dos cães utilizados na caça junto
do ICNF, nos termos e condições a estabelecer por portaria do membro do Governo responsável pela área do
ambiente.
4 – Aos cães utilizados na caça aplica-se o regime jurídico relativo aos animais de companhia,
nomeadamente o disposto no Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, incluindo o respetivo regime
sancionatório, cujos alojamentos de hospedagem deverão observar as normas estabelecidas nesse diploma,
estando igualmente sujeitos ao procedimento de mera comunicação prévia previsto nos artigos 3.º e 3.º-A
daquele diploma.
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5 – Os cães utilizados na caça devem ser transportados dentro de veículos automóveis apropriados,
devidamente equipados e licenciados para o efeito, nomeadamente em termos de espaço, ventilação,
temperatura, segurança e fornecimento de água; os animais têm de ter, no mínimo, espaço suficiente para
estarem de pé, deitados, para se virarem e sentarem normalmente, devendo cada animal dispor de uma
superfície de base de, pelo menos, 1,22 m x 1,22 m.
6 – Os cães utilizados na caça não podem ser transportados em atrelados, reboques ou semirreboques e
afins, devendo ser transportados em carrinhas próprias, e devidamente homologadas, destinadas ao transporte
de animais de companhia.
7 – Sem prejuízo da utilização de cães na atividade cinegética nos termos previstos no presente diploma,
os mesmos são sempre considerados para todos os legais efeitos atinentes à sua proteção como animais de
companhia, sendo aplicável à sua detenção, alojamento ou transporte as regras decorrentes da legislação em
vigor.
8 – Os maus tratos e o abandono dos cães utilizados na caça são punidos nos termos gerais do Código
Penal, no âmbito dos crimes contra animais de companhia, sem prejuízo do disposto no artigo 47.º do presente
diploma.
Artigo 34.º
Marcação dos animais mortos
1 – Todos os animais mortos no exercício da caça estão sujeitos a marcação, nos termos a definir por portaria
do membro do Governo responsável pela área do ambiente.
2 – Terminada a jornada de caça, não podem os animais caçados ser transportados sem a marcação a que
se refere o número anterior.
3 – A marcação referida nos precedentes números é efetuada através de selos em material durável, inviolável
após o fecho, com uma parte destacável e onde constam, nomeadamente, as seguintes inscrições:
a) Identificação da espécie:
b) Número de ordem da série;
c) Época venatória;
d) Dia e mês de abate do animal;
e) Processo de caça;
f) Número da zona de caça;
g) Número da credencial.
4 – A entrega dos destacáveis dos selos é feita no ICNF, até 15 de junho de cada época venatória.
5 – O incumprimento do disposto no número anterior impede a aquisição de novos selos, sem prejuízo do
competente procedimento contraordenacional.
6 – Os modelos dos selos e as normas para a sua colocação serão aprovados pelo ICNF, ao qual compete
igualmente o exclusivo da sua comercialização, designadamente através de plataforma informática própria.
7 – O registo dos dados correspondentes a cada selo utilizado é da responsabilidade da entidade gestora da
respetiva zona de caça, em suporte informático disponibilizado pelo ICNF, onde constem para cada selo, os
elementos referidos no n.º 3.
CAPÍTULO V
Regime sancionatório
SECÇÃO I
Disposições comuns
Artigo 35.º
Participação
Os agentes de autoridade competentes para o policiamento e fiscalização da caça que tiverem conhecimento
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da prática de qualquer infração em matéria de caça que não tenham presenciado devem efetuar a competente
participação e enviá-la às entidades competentes para o respetivo procedimento criminal ou contraordenacional.
Artigo 36.º
Apreensão e devolução de objetos
1 – Podem ser provisoriamente apreendidos pelas autoridades policiais ou administrativas competentes os
objetos que serviram ou estavam destinados a servir para a prática de crime ou contraordenação de caça e
quaisquer outros que forem suscetíveis de servir de prova.
2 – Os objetos são restituídos logo que se tornar desnecessário manter a apreensão para efeitos de prova,
a menos que sejam declarados perdidos a favor do Estado.
3 – Os objetos apreendidos são restituídos logo que a decisão se torne definitiva e os mesmos não tenham
sido declarados perdidos.
4 – Consideram-se perdidos a favor do Estado os objetos que tenham sido apreendidos e que, após
notificação aos interessados a ordenar a sua entrega, não tenham sido reclamados no prazo de dois meses.
5 – Os bens e produtos declarados perdidos a favor do Estado revertem para o ICNF, que lhes dá o destino
que julgar adequado.
Artigo 37.º
Apreensão de animais
1 – Os exemplares de animais mortos apreendidos e suscetíveis de consumo público são entregues a
instituições de solidariedade social.
2 – Os animais vivos ilicitamente detidos e capturados são entregues ao ICNF a fim de, sendo possível,
serem devolvidos à natureza ou, sendo necessário, alojados em instalações adequadas, designadamente
parques ou santuários.
3 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, a captura e detenção de animais de espécies protegidas é
criminalizada nos termos legalmente previstos, designadamente no Código Penal e demais legislação especial.
Artigo 38.º
Registo de infrações de caça
1 – O registo de infrações de caça é efetuado e organizado nos termos a regular, observado o disposto nos
números seguintes.
2 – O ICNF dispõe de uma base de dados que contém o registo de infrações de caça, do qual devem constar
os crimes e contraordenações de caça praticados e respetivas sanções aplicadas.
3 – O infrator, seja pessoa singular ou coletiva, tem acesso ao seu registo, sempre que o solicite, nos termos
a regular.
4 – Aos processos em que deva ser apreciada a responsabilidade de qualquer infrator é sempre junta uma
cópia do respetivo registo.
Artigo 39.º
Perda a favor do Estado
A condenação por qualquer crime ou contraordenação previstos nesta lei implica a perda a favor do Estado
dos instrumentos, bens, produtos e animais que tiverem servido ou estivessem destinados a servir para a sua
prática, designadamente as armas, veículos e cães utilizados na caça.
Artigo 40.º
Concurso de infrações
1 – Se o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contraordenação, o arguido é responsabilizado por
ambas as infrações, instaurando-se para o efeito processos distintos a decidir pelas autoridades competentes,
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sem prejuízo do disposto nos números seguintes.
2 – A decisão administrativa que aplique uma coima caduca quando o arguido venha a ser condenado em
processo criminal pelo mesmo facto, por decisão transitada em julgado, sem prejuízo das medidas cautelares
aplicadas e das sanções acessórias previstas para a contraordenação.
3 – Sendo o arguido punido pela prática de crime, poderão aplicar-se as sanções acessórias previstas para
as contraordenações.
4 – Verificando-se concurso de crimes ou concurso de crime e contraordenação, deve o agente responder
pela prática de ambos, sem prejuízo do processamento da contraordenação caber igualmente às autoridades
competentes para o processo criminal.
SECÇÃO II
Dos crimes de caça
SUBSECÇÃO I
Tipos de crime de caça
Artigo 41.º
Exercício perigoso da caça
1 – Quem, no exercício da caça, não estando em condições de o fazer com segurança por se encontrar em
estado de embriaguez ou sob a influência de álcool, estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou substâncias
com efeito análogo, ou, ainda, por deficiência física ou psíquica, criar deste modo:
a) perigo para a vida de outrem é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos;
b) perigo para a integridade física de outrem é punido com pena de prisão até 3 anos;
c) perigo para bens patrimoniais alheios de valor elevado é punido com pena de prisão até 3 anos ou com
pena de multa até 360 dias.
2 – Se do facto previsto as alíneas a) a c) do número anterior resultar, respetivamente, a morte da vítima,
ofensa à integridade física grave ou dano, o agente é punido com a pena aplicável ao crime respetivo agravada
de um terço nos seus limites mínimo e máximo.
3 – Se o perigo referido na alínea a) do n.º 1 for criado por negligência, o agente é punido com pena de prisão
até 3 anos.
4 – Se o perigo referido na alínea b) do n.º 1 for criado por negligência, o agente é punido com pena de prisão
até 2 anos.
5 – Se o perigo referido na alínea c) do n.º 1 for criado por negligência, o agente é punido com pena de prisão
até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.
6 – Se a conduta referida na alínea a) do n.º 1 for praticada por negligência, o agente é punido com pena de
prisão até 2 anos.
7 – Se a conduta referida na alínea b) do n.º 1 for praticada por negligência, o agente é punido com pena de
prisão até 1 ano.
8 – Se a conduta referida na alínea c) do n.º 1 for praticada por negligência, o agente é punido com pena de
prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias.
9 – Se da conduta referida nos números anteriores resultar a morte de um animal ou maus tratos a um animal,
a mesma será punida nos termos previstos, quer no artigo 278.º do Código Penal e 387.º e seguintes também
do Código Penal.
Artigo 42.º
Exercício da caça sob influência de álcool
Quem, no exercício da caça, apresentar uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l é punido
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com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força
de outra disposição legal.
Artigo 43.º
Crimes contra a preservação da fauna e das espécies
1 – A infração ao disposto em qualquer das alíneas do n.º 1 do artigo 7.º é punida com pena de prisão até
3 anos ou com pena de multa até 360 dias.
2 – A infração ao disposto em qualquer das alíneas do n.º 2 do artigo 7.º é punida com pena de prisão até
2 anos ou com pena de multa até 240 dias.
3 – Na mesma pena indicada no n.º 1 incorre quem infringir o disposto no n.º 2 do artigo 21.º.
4 – Na mesma pena indicada no n.º 2 incorre quem exercer a caça em terrenos não cinegéticos, de caça
condicionada sem consentimento de quem de direito, nas áreas de não caça e nas zonas de caça às quais não
se tenha legalmente acesso.
5 – A tentativa é punível.
Artigo 44.º
Utilização indevida de auxiliares
A infração ao disposto no artigo 26.º é punida com pena de prisão até 6 meses ou com pena de multa até
100 dias.
Artigo 45.º
Falta de habilitação para o exercício da caça
Quem exercer a caça sem estar habilitado com a carta de caçador, quando exigida, é punido com pena de
prisão até 2 anos ou multa até 240 dias.
Artigo 46.º
Desobediência
1 – A recusa do caçador ou dos auxiliares deste em acatar as ordens emanadas pelos agentes fiscalizadores
em obediência ao previsto no presente diploma é punida com a pena correspondente ao crime de desobediência
simples.
2 – A violação da interdição do direito de caçar é punível com a pena correspondente ao crime de
desobediência qualificada.
Artigo 47.º
Abandono de cães utilizados na caça
1 – Quem abandonar cão utilizado na caça é punido com pena de prisão até seis meses ou com pena de
multa até 100 dias, se pena mais grave não lhe couber no âmbito dos crimes contra animais de companhia
previstos no Código Penal.
2 – Se dos factos previstos no número anterior resultar perigo para a vida do animal ou para a fauna, o limite
da pena aí referida é agravado em um terço, se pena mais grave não couber por força dos crimes previstos no
Código Penal.
3 – Se dos factos previstos no n.º 1 resultar a morte do animal, a privação de importante órgão ou membro
ou a afetação grave e permanente da sua capacidade de locomoção, o agente é punido com pena de prisão de
6 meses a 2 anos ou com pena de multa de 60 a 240 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra
disposição legal, designadamente as previstas para os crimes contra animais de companhia.
4 – Para efeitos do disposto no n.º 1, considera-se abandono de cão utilizado na caça deixá-lo à sua sorte
em zona de caça, sem que o respetivo detentor tenha comunicado ao Sistema de Informação de Animais de
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Companhia (SIAC) e ao ICNF a sua perda ou procedido à sua transmissão para a guarda e responsabilidade
de outras pessoas ou entidades.
SUBSECÇÃO II
Penas acessórias
Artigo 48.º
Proibição de exercício da caça
1 – É condenado na proibição de exercício da caça por um período fixado entre três a dez anos quem for
punido por qualquer crime previsto nos artigos anteriores.
2 – No prazo de 10 dias a contar do trânsito em julgado da sentença, o condenado entrega na secretaria do
tribunal, ou em qualquer posto policial, que remete àquela, a carta de caçador e as licenças de caça de que for
titular, se as mesmas não se encontrarem já apreendida no processo.
3 – A secretaria do tribunal comunica a proibição de caçar ao ICNF no prazo de 20 dias a contar do trânsito
em julgado da sentença, bem como participa ao Ministério Público as situações de incumprimento do disposto
no número anterior.
4 – Não conta para o prazo da proibição o tempo em que o agente estiver privado da liberdade por força de
medida de coação processual, pena ou medida de segurança.
Artigo 49.º
Proibição de exercer gestão de caça
1 – É condenado na proibição de gerir zona de caça e de integrar, gerir ou representar entidade gestora de
zona de caça, e bem assim, de fazer parte dos respetivos órgãos sociais, por um período fixado entre três e dez
anos, quem for punido por qualquer crime previsto nos artigos anteriores.
2 – A prática de qualquer crime previsto nos artigos anteriores por entidades gestoras de zonas de caça de
interesse nacional nos termos do n.º 2 do artigo 15.º implica a revogação do direito a essa gestão.
SECÇÃO III
Das contraordenações de caça
SUBSECÇÃO I
Contraordenações e sanções aplicáveis
Artigo 50.º
Contraordenações e coimas
1 – Constituem contraordenações de caça punidas com coima de (euro) 300 a (euro) 3000:
a) O facto descrito no artigo 42.º, quando o infrator apresentar uma taxa de álcool no sangue igual ou superior
a 0,5 g/l e inferior a 0,8 g/l;
b) A falta de qualquer documento obrigatório durante o exercício da caça, em infração ao n.º 1 do artigo 25.º;
c) A entrega dos destacáveis dos selos a que se refere o n.º 4 do artigo 34.º após 15 de junho e até 30 de
junho de cada época venatória.
2 – Constituem contraordenações de caça punidas com coima de (euro) 600 a (euro) 6000:
a) O facto descrito no artigo 42.º, quando o infrator apresentar uma taxa de álcool no sangue igual ou superior
a 0,8 g/l e inferior a 1,2 g/l;
b) A reprodução, criação e ou detenção de espécies com interesse cinegético em cativeiro em infração ao
artigo 9.º;
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c) O incumprimento pelas entidades gestoras das zonas de caça de qualquer obrigação constante do n.º 1
do artigo 17.º;
d) O exercício da caça em zonas de caça relativamente às quais não exista PAE aprovado;
e) A instalação de campo de treino de caça sem autorização para o efeito ou o exercício de treino de caça
fora de locais autorizados para o efeito;
f) A omissão pelas entidades gestoras de campos de treino de caça de proceder à recolha dos resíduos,
em infração ao disposto no n.º 3 do artigo 21.º;
g) A falta do seguro de responsabilidade civil a que se refere o n.º 1 do artigo 27.º;
h) A omissão de recolha dos cartuchos vazios em infração ao n.º 4 do artigo 29.º;
i) O transporte de armas de fogo fora do exercício da caça em infração ao n.º 5 do artigo 29.º;
j) A presença de cães em zonas de caça sem estarem presos à trela ou sem utilizarem açaimes em infração
ao disposto no n.º 2 do artigo 32.º, sem prejuízo da eventual cominação nos termos dos artigos 7.º, n.º 1, alíneas
e) e f), e 43.º, n.º 1;
l) A utilização de cães em número superior ao previsto no n.º 3 do artigo 32.º, sem prejuízo da eventual
cominação nos termos dos artigos 7.º, n.º 1, alíneas e) e f), e 43.º, n.º 1;
m) A omissão do registo dos cães utilizados na caça junto do ICNF em infração ao disposto no n.º 4 do artigo
32.º;
n) O transporte dos cães auxiliares na caça em desrespeito do disposto nos n.os 6 e 7 do artigo 32.º.
o) A omissão da marcação dos animais mortos em infração ao disposto no n.º 1 do artigo 34.º;
p) O transporte de animais mortos sem a devida marcação em infração ao disposto no n.º 2 do artigo 34.º;
q) A omissão da entrega dos destacáveis dos selos a que se refere o n.º 4 do artigo 34.º ou a entrega dos
mesmos após 30 de junho de cada época venatória.
r) O incumprimento pela entidade gestora da zona de caça da obrigação a que se refere o n.º 7 do artigo
34.º.
3 – As coimas aplicadas às pessoas coletivas têm o limite mínimo correspondente ao dobro da coima mínima
prevista para as pessoas singulares e poderão elevar-se até ao montante máximo de (euro) 44 890.
4 – A tentativa e a negligência são puníveis com a coima aplicável à contraordenação consumada
especialmente atenuada.
Artigo 51.º
Sanções acessórias
Consoante a gravidade da contraordenação e a culpa do agente, poderão ser aplicadas, simultaneamente
com a coima, as seguintes sanções acessórias:
a) Perda a favor do Estado dos instrumentos, bens, produtos e animais que tiverem servido ou estivessem
destinados a servir para a sua prática, designadamente as armas, veículos e cães utilizados na caça.
b) Inibição do exercício da caça pelo período de dois a cinco anos;
c) Inibição de gerir zona de caça e de integrar, gerir ou representar entidade concessionária ou gestora de
zona de caça, e bem assim, de fazer parte dos respetivos órgãos sociais pelo período de dois a cinco anos;
d) Revogação do direito a gerir zona de caça de interesse nacional a que se refere o n.º 2 do artigo 15.º;
e) Inibição pelo período de dois a cinco anos do exercício de uma profissão ou atividade reguladas no
presente diploma, cujo exercício dependa de título público ou de autorização ou homologação de autoridade
pública;
f) Privação do direito a subsídio ou benefício outorgado por entidades ou serviços públicos às atividades
reguladas no presente diploma;
g) Encerramento ou suspensão temporária do funcionamento de campo de treinos ou de qualquer instalação
relacionada com a atividade da caça cujo funcionamento esteja sujeito a autorização ou licença de autoridade
administrativa;
h) Perda ou suspensão de autorizações, licenças e alvarás.
i) Perda de benefícios fiscais, de benefícios de crédito e de linhas de financiamento de crédito de que haja
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usufruído;
j) Imposição das medidas que se mostrem adequadas à prevenção de danos à Natureza e a animais, à
reposição da situação anterior à infração e à minimização dos efeitos decorrentes da mesma;
l) Publicidade da condenação.
Artigo 52.º
Reincidência
1 – É sancionado como reincidente quem cometer uma contraordenação depois de ter sido sancionado por
qualquer outra contraordenação à presente lei ou seus regulamentos, praticada há menos de cinco anos.
2 – Em caso de reincidência, os limites mínimo e máximo da coima e das sanções acessórias são elevados
em um terço do respetivo valor.
Artigo 53.º
Determinação da medida da coima
1 – A determinação da medida da coima faz-se em função da gravidade da contraordenação, da culpa, da
situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da prática da contraordenação.
2 – Sem prejuízo dos montantes máximos fixados, a coima deverá sempre que possível exceder o benefício
económico que o agente retirou da prática do ato ilícito.
Artigo 54.º
Concurso de contraordenações
1 – Quem tiver praticado várias contraordenações é sancionado com uma coima cujo limite máximo resulta
da soma das coimas concretamente aplicadas às infrações em concurso.
2 – A coima a aplicar não pode exceder o dobro do limite máximo mais elevado das contraordenações em
concurso.
3 – A coima a aplicar não pode ser inferior à mais elevada das coimas concretamente aplicadas às várias
contraordenações em concurso.
SUBSECÇÃO II
Fiscalização e procedimento
Artigo 55.º
Fiscalização
1 – A fiscalização da caça compete ao ICNF, ao Corpo Nacional da Guarda Florestal, à Guarda Nacional
Republicana, à Polícia de Segurança Pública, aos guardas florestais auxiliares, nos termos das suas
competências, e, em geral, a todas as autoridades policiais a quem caiba assegurar a fiscalização do
cumprimento das normas constantes do presente diploma e legislação complementar.
2 – Nos autos de notícia dos agentes de autoridade referidos no número anterior, por contraordenações que
tenham presenciado relativas àquela matéria, é dispensada a indicação de testemunhas sempre que as
circunstâncias do facto a tornem impossível, sem prejuízo de fazerem fé até prova em contrário.
3 – Os agentes de autoridade aos quais compete a polícia e fiscalização da caça estão impedidos de caçar
durante o exercício das suas funções.
Artigo 56.º
Pagamento voluntário
1 – É admitido o pagamento voluntário da coima em qualquer altura do processo, mas sempre antes da
decisão, a qual será liquidada pelo mínimo, sem prejuízo das custas que forem devidas.
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2 – O pagamento voluntário da coima não exclui a possibilidade de aplicação de sanções acessórias.
Artigo 57.º
Instrução e decisão
Compete ao ICNF a instrução dos processos de contraordenação e a aplicação das coimas e das sanções
acessórias.
Artigo 58.º
Prazo da instrução
1 – O prazo para a instrução é de 60 dias.
2 – Se por fundadas razões a entidade que dirigir a instrução não a puder completar no prazo indicado no
número anterior solicita a sua prorrogação à entidade que ordenou a instrução pelo prazo indispensável à sua
conclusão.
Artigo 59.º
Notificação e defesa do arguido
1 – Recebido o auto de notícia ou participação, o arguido deve ser notificado para, no prazo de 15 dias úteis,
apresentar resposta escrita, podendo juntar documentos ou arrolar testemunhas até ao limite de três por cada
infração, dando-se sem efeito as que excedam esse número.
2 – As testemunhas arroladas pelo arguido são apresentadas por este no local, dia e hora designados para
a respetiva inquirição.
Artigo 60.º
Proposta de decisão
Finda a instrução do processo, o instrutor elabora, no prazo de 10 dias úteis, proposta de decisão,
devidamente fundamentada, em relatório.
Artigo 61.º
Decisão
1 – Compete ao Presidente do Conselho Diretivo do ICNF aplicar as coimas e as sanções acessórias.
2 – A competência prevista no número anterior pode ser delegada no Vice-Presidente do Conselho Diretivo
do ICNF ou nos diretores regionais deste Instituto.
Artigo 62.º
Destino das coimas
O produto das coimas é repartido da seguinte forma:
a) 10 % para a entidade autuante;
b) 40 % para a entidade que instrui o processo e aplica a coima;
c) 50 % para o Estado.
Artigo 63.º
Reformatio in pejus
Não é aplicável aos processos de contraordenação instaurados e decididos nos termos deste diploma e
legislação complementar a proibição da reformatio in pejus, devendo essa indicação constar expressamente de
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todas as decisões finais que admitam impugnação ou recurso.
Artigo 64.º
Prescrição do procedimento
1 – O procedimento por contraordenação extingue-se por efeito da prescrição logo que sobre a prática da
contraordenação hajam decorrido os seguintes prazos:
a) Cinco anos, quando se trate de contraordenação a que seja aplicável uma coima de montante máximo
igual ou superior a (euro) 44 890;
b) Três anos, nos restantes casos.
2 – Sem prejuízo da aplicação do regime de suspensão e de interrupção previsto no regime geral do ilícito
de mera ordenação social, a prescrição do procedimento por contraordenação interrompe-se também com a
notificação ao arguido da decisão condenatória.
Artigo 65.º
Prescrição da coima e das sanções acessórias
As coimas e as sanções acessórias prescrevem no prazo de três anos contados a partir do caráter definitivo
da decisão condenatória ou do trânsito em julgado da sentença, consoante o caso.
CAPÍTULO VI
Disposições finais e transitórias
Artigo 66.º
Regulamentação
O Governo, no prazo de 90 dias a contar da data da publicação da presente lei, procederá à sua
regulamentação.
Artigo 67.º
Regiões autónomas
A presente lei aplica-se às regiões autónomas, com as necessárias adaptações a introduzir por decreto
legislativo regional.
Artigo 68.º
Concessões de caça
As concessões de caça atribuídas ao abrigo da Lei n.º 173/99, de 21 de setembro, e legislação complementar,
mantêm-se válidas até ao fim do respetivo período de vigência, sem prejuízo da obrigatoriedade de observarem
as disposições constantes da presente lei e legislação complementar em tudo o que não esteja expressamente
regulado no título de concessão.
Artigo 69.º
Conversão das concessões
No prazo de 90 dias após a publicação da regulamentação prevista no artigo 65.º, as entidades exploradoras
de áreas concessionadas podem solicitar ao ICNF a conversão das concessões em parques, reservas ou
santuários nos termos previstos no n.º 2 do artigo 4.º, desde que cumpram os necessários requisitos nos termos
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a regular.
Artigo 70.º
Norma revogatória
São revogados a Lei n.º 173/99, de 21 de setembro, e o Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto, bem
como toda a legislação complementar.
Artigo 71.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor seis meses após a data da sua publicação.
Palácio de São Bento, 9 de maio de 2023.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
(1) O texto inicial da iniciativa foi publicado no DAR II Série-A n.º 220 (2023.05.09) e substituído, a pedido do autor, em 12 de maio de
2023.
———
PROJETO DE LEI N.º 767/XV/1.ª
ASSEGURA A NEUTRALIDADE DE GÉNERO NO REGISTO CIVIL E REFORÇA OS DIREITOS DAS
PESSOAS TRANS, INTERSEXO E NÃO BINÁRIAS, ALTERANDO O CÓDIGO DE REGISTO CIVIL E O
REGULAMENTO EMOLUMENTAR DOS REGISTOS E NOTARIADO
Exposição de motivos
A Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, surgida na sequência de iniciativa do PAN e de outros partidos e aprovada
num processo legislativo atribulado, constituiu um importante avanço no âmbito do direito à autodeterminação
da identidade de género e expressão de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa, já
que entre outros aspetos permitiu o reconhecimento jurídico da identidade de género por via da mudança da
menção do sexo no registo civil e da consequente alteração de nome próprio, sem subordinação a um relatório
clínico.
Sem prejuízo dos avanços registados, volvidos quase 5 anos da aprovação da Lei n.º 38/2018, de 7 de
agosto, constata-se que há aspetos referentes ao registo civil em que o direito à autodeterminação da identidade
de género e expressão de género não está a ser plenamente assegurado nos termos legalmente previstos.
No âmbito da discussão na especialidade do Orçamento do Estado para 2023, aprovado pela Lei n.º 24-
D/2022, de 30 de dezembro, por proposta do PAN, o artigo 192.º, procurando assegurar a igualdade para as
pessoas trans, nacionais residentes no estrangeiro, no acesso e celeridade do pedido de registo de mudança
da menção do sexo e do nome próprio, estabeleceu que durante o corrente ano o Governo deveria melhorar os
procedimentos consulares no pedido de registo de mudança da menção do sexo e do nome próprio. Esta
proposta surgiu porque, de acordo com os dados partilhados por organizações não governamentais de defesa
dos direitos das pessoas lésbicas, gays, bissexuais, trans e intersexo, o número de pedidos de informação/ajuda
por parte de pessoas trans e suas famílias residentes no estrangeiro tem aumentado, desde 2020, devido ao
desconhecimento dos procedimentos por parte de funcionárias/os da rede consular, visível em situações em
que houve a cobrança de 200 € de emolumentos, apesar de tal taxa ter sido suprimida pelo Orçamento do
Estado para 2020.
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Com a presente iniciativa pretende-se dar resposta a dois problemas existentes e em que a Lei n.º 38/2018,
de 7 de agosto, não está a ser plenamente respeitada.
Por um lado, verifica-se que o Código do Registo Civil, no seu artigo 103.º, continua a obrigar os nomes
próprios registados a não «suscitar dúvidas sobre o sexo do registando», o que constitui uma preocupante
restrição dos direitos das pessoas trans e intersexo que assim não podem afirmar plenamente a sua identidade
pessoal quando não mudem a menção de sexo no seu registo. Por isso, com a presente iniciativa o PAN,
procurando garantir a neutralidade de género no registo civil e assegurar o pleno respeito pelos princípios
consagrados na Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, propõe a eliminação da exigência de que o registo de nomes
próprios não suscite dúvidas sobre o sexo do registado.
Por outro lado, fruto também do potencial impacto desta alteração legislativa que ora se propõe e dos alertas
lançados publicamente pela rede ex aequo – Associação de jovens lésbicas, gays, bissexuais, trans, intersexo
e apoiantes, verifica-se que o artigo 10.º, n.º 1, alínea ad), do Regulamento Emolumentar dos Registos e
Notariado ao referir a gratuitidade do «procedimento de mudança da menção do sexo no registo civil e da
consequente alteração de nome próprio», não assegura a gratuitidade dos procedimentos de alteração de nome
próprio, sem alteração da menção de género, justificada com base no direito à autodeterminação da identidade
de género, protegido Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto. Isto significa que a gratuitidade só estará assegurada nos
casos em que haja alteração de género, obrigando ao pagamento de um custo de 200 euros, por exemplo, em
casos de pessoas não binárias que, face à impossibilidade de ter um marcador de género neutro, e querendo
mudar o seu nome, preferem não mudar o seu marcador de género atual. Assim, com a presente iniciativa, o
PAN propõe a alteração Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado por forma a garantir a gratuitidade
do procedimento de alteração de nome próprio no registo civil, sem mudança da menção do sexo, quando tal
mudança seja fundamentada no direito à autodeterminação da identidade de género.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada
Deputada do Pessoas-Animais-Natureza apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à alteração:
a) Do Código de Registo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 131/95, de 6 de junho, na sua redação atual; e
b) Do Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de
14 de dezembro, na sua redação atual.
Artigo 2.º
Alteração ao Código de Registo Civil
É alterado o artigo 103.º do Código do Registo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 131/95, de 6 de junho,
que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 103.º
[…]
1 – […]
2 – […]
a) Os nomes próprios devem ser portugueses, de entre os constantes da onomástica nacional ou adaptados,
gráfica e foneticamente, à língua portuguesa;
b) […]
c) […]
d) […]
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3 – (Revogado.)
4 – […]»
Artigo 3.º
Alteração ao Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado
É alterado o artigo 10.º do Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei
n.º 322-A/2001, de 14 de dezembro, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 10.º
[…]
1 – […]
a) […]
b) […]
c) […]
d) […]
e) […]
f) […]
g) […]
h) […]
i) […]
j) […]
l) […]
m) […]
n) […]
o) […]
p) […]
q) […]
r) […]
s) […]
t) […]
u) […]
v) […]
x) […]
z) […]
aa) […]
ab) […]
ac) […]
ad) […]
ae) Procedimento de alteração de nome próprio no registo civil, sem mudança da menção do sexo, justificada
com base no direito à autodeterminação da identidade de género.
4 – […]»
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação, com exceção da alteração ao artigo 10.º do
Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de
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dezembro, que entra em vigor no dia 1 de janeiro de 2024.
Palácio de São Bento, 12 de maio de 2023.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
———
PROJETO DE LEI N.º 768/XV/1.ª
MELHORA AS CONDIÇÕES DE ACESSO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA À PRESTAÇÃO SOCIAL
PARA INCLUSÃO E ALTERA O MOMENTO A PARTIR DO QUAL ESTA PRESTAÇÃO É DEVIDA AOS
BENEFICIÁRIOS (QUARTA ALTERAÇÃO AO DECRETO-LEI N.º 126-A/2017, DE 6 DE OUTUBRO)
Exposição de motivos
A Constituição da República Portuguesa determina que o Estado tem a obrigação de «realizar uma política
nacional de prevenção, tratamento, reabilitação e integração» das pessoas com deficiência, bem como de apoio
às suas famílias, devendo «assumir o encargo da efetiva realização dos seus direitos».
O Estado português está vinculado a diplomas internacionais, como a Convenção sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência que determina, no n.º 2 do seu artigo 28.º que «Os Estados Partes reconhecem o
direito das pessoas com deficiência à proteção social e ao gozo desse direito sem discriminação com base na
deficiência e tomarão as medidas apropriadas para salvaguardar e promover o exercício deste direito (…)».
A realidade tem mostrado que as pessoas com deficiência e as suas famílias estão especialmente
vulneráveis a situações de pobreza e exclusão social.
Para atestar a situação de incapacidade e beneficiar da prestação social para a inclusão é necessária a
obtenção de atestado médico de incapacidade multiuso. O tempo de espera para a realização de juntas médicas
e emissão de atestado médico de incapacidade multiuso é elevadíssimo e em muitos casos chega aos dois
anos.
Sendo o atestado médico de incapacidade multiuso um documento fundamental à instrução do pedido da
prestação social para a inclusão, o requerente não pode ficar dependente das demoras e atrasos para a sua
obtenção e só a partir desse momento receber a prestação.
Deve considerar-se sim que, não recai sobre o requerente o ónus de aguardar pela respetiva certificação da
incapacidade para receber a partir daí a prestação social para a inclusão, devendo o pagamento ser devido a
partir da data em que é efetuado o pedido da certificação da incapacidade.
Sem prejuízo de outras medidas que importa tomar e efetivar, a proteção social e o acesso à mesma por
parte das pessoas com deficiência pode traçar um caminho que garanta melhores condições de vida às pessoas
com deficiência.
É neste sentido que vai a proposta do PCP, pretendendo aprofundar e melhorar a proteção social das
pessoas com deficiência por via da melhoria da prestação social para a inclusão.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei reforça as condições de acesso das pessoas com deficiência à prestação social para inclusão
e altera o momento a partir do qual é devida aos beneficiários a referida prestação.
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Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro
Os artigos 15.º e 17.º do Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro, na sua redação atual, passam a ter a
seguinte redação:
«Artigo 15.º
Condições gerais de atribuição da prestação
1 – […]
2 – Em casos excecionais e devidamente fundamentados e de acordo com parecer favorável do INR, pode
ser reconhecido o direito a esta prestação a beneficiários que, tendo um grau de incapacidade inferior a 60 %,
estejam numa situação particularmente incapacitante.
3 – (Anterior n.º 2.)
4 – (Anterior n.º 3.)
5 – A prestação social para a inclusão pode ser atribuída a quem adquira deficiência ou incapacidade após
os 55 anos, quando se comprove não resultar de processos degenerativos comuns ou associados ao normal
envelhecimento, designadamente quando resulte de acidente ou outra causa excecional.
6 – (Anterior n.º 5.)
7 – (Anterior n.º 6.)
8 – (Anterior n.º 7.)
9 – (Anterior n.º 8.)
10 – (Anterior n.º 9.)
11 – (Anterior n.º 10.)
Artigo 17.º
Valor da Prestação
1 – […]
2 – A prestação é paga a 14 meses, garantindo as prestações correspondentes aos subsídios de férias e de
Natal.
Artigo 23.º
Início do direito à prestação
1 – […]
2 – […]
3 – Nas situações em que o titular, na data em que apresenta o requerimento, junta comprovativo do pedido
de certificação da deficiência antes de perfazer 55 anos, o requerimento considera-se devidamente instruído,
desde que venha a ser certificada a situação de deficiência com um grau de incapacidade igual ou superior a
60 %.
4 – […]
5 – Nas situações em que o titular junta comprovativo do pedido de certificação da deficiência, a prestação
é devida a partir do mês desse pedido, ainda que o deferimento fique dependente da apresentação do
original do atestado médico de incapacidade multiúso.
6 – Nas situações em que o grau de incapacidade igual ou superior a 60 % tenha resultado de junta médica
de recurso, a prestação é devida desde o início do mês em que foi efetuado o respetivo pedido de junta
médica de recurso.»
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Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com a publicação da Lei do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.
Assembleia da República, 12 de maio de 2023.
Os Deputados do PCP: Manuel Loff — Paula Santos — Bruno Dias — Alma Rivera — Duarte Alves — João
Dias.
———
PROJETO DE LEI N.º 769/XV/1.ª
ESTABELECE A OBRIGATORIEDADE DO COMPLEMENTO SOLIDÁRIO PARA IDOSOS TER UM
VALOR NUNCA INFERIOR AO VALOR DO LIMIAR DA POBREZA, ALTERANDO O DECRETO-LEI N.º
232/2005, DE 29 DE DEZEMBRO
Exposição de motivos
Nos últimos anos e nomeadamente no âmbito do Orçamento do Estado de 2023 tem-se verificado um esforço
para repor o valor de referência do complemento solidário para idosos acima do limiar de pobreza, de modo a
reforçar a eficácia desta medida no combate à pobreza entre os idosos.
Contudo, tal medida surge fruto de um contexto político determinado e sem que o Decreto-Lei n.º 232/2005,
de 29 de dezembro, que enquadra o complemento solidário para idosos, preveja a necessidade de este
compromisso ser respeitado nas atualizações periódicas impostas pelo mencionado diploma. Isto significa que
o valor de referência do complemento solidário para idosos ficará à mercê de maiorias políticas circunstanciais
e não garante aos seus beneficiários a segurança de que o mesmo terá um valor superior ao limiar da pobreza.
Clarificar a lei por forma a acautelar esta situação torna-se especialmente importante quando sabemos que,
na sequência da crise sanitária provocada pela COVID-19, Portugal foi o país da União Europeia que mais subiu
nos índices de pobreza, tendo a carência atingindo especialmente os idosos, e quando sabemos que, em 2021,
os idosos foram a faixa etária em idade adulta com maior taxa de risco de pobreza após transferências sociais
por grupo etário.
Portanto, com a presente iniciativa o PAN pretende assegurar uma alteração do Decreto-Lei n.º 232/2005,
de 29 de dezembro, de forma a assegurar que as atualizações periódicas do valor referência do complemento
solidário para idosos nunca possam ter um valor abaixo do limiar da pobreza, por forma a garantir que ninguém
com rendimentos abaixo do limiar da pobreza (no valor mais recente) fica excluído deste apoio social.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada
Deputada do Pessoas-Animais-Natureza apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à nona alteração ao Decreto-Lei n.º 232/2005, de 29 de dezembro, alterado pelos
Decretos-Leis n.os 236/2006, de 11 de dezembro, 151/2009, de 30 de junho, e 167-E/2013, de 31 de dezembro,
pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de março, pelo Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro, pela Lei n.º 71/2018,
de 31 de dezembro, e pelos Decretos-Leis n.os 136/2019, de 6 de setembro, e 94/2020, de 3 de novembro, que
cria o complemento solidário para idosos.
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Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 252/2007, de 5 de julho
O artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 232/2005, de 29 de dezembro, passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 9.º
[…]
1 – O valor de referência do complemento é fixado, e objeto de atualização periódica, por portaria dos
membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da solidariedade e segurança social, tendo em
conta a evolução dos preços, o crescimento económico e a distribuição da riqueza, e não poderá ter um valor
inferior ao valor do limiar de risco de pobreza, conforme divulgado pelo Instituto Nacional de Estatística, IP.
2 – […]
3 – […]»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia 1 de janeiro de 2024.
Palácio de São Bento, 12 de maio de 2023.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
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PROJETO DE LEI N.º 770/XV/1.ª
REPOSIÇÃO DOS ESCALÕES DO ABONO DE FAMÍLIA PARA CRIANÇAS E JOVENS, COM VISTA À
SUA UNIVERSALIDADE
Exposição de motivos
I
Em Portugal, foi a revolução de abril de 1974 e a conquista de um sólido corpo de direitos económicos e
sociais que abriu o caminho de construção e garantia dos direitos das crianças nas suas múltiplas dimensões.
Conforme consagrado na Constituição da República Portuguesa (artigo 69.º), cabe ao Estado e à sociedade
proteger as crianças «com vista ao seu desenvolvimento integral», designadamente contra todas «as formas de
abandono, de discriminação, e de opressão». Ao Estado cabe garantir, respeitar e promover o exercício pleno
dos seus direitos, com vista ao seu desenvolvimento integral e à efetivação dos seus direitos económicos, sociais
e culturais. Ao sistema público de segurança social cabe um importante papel na promoção dos direitos das
crianças.
Recorda-se que no estudo realizado pela UNICEF, intitulado «As crianças e a crise em Portugal, Vozes de
Crianças, Politicas Públicas e Indicadores Sociais, 2013» refere que «O abono de família é um apoio financeiro
que o Estado atribui às famílias por cada criança ou jovem até aos 24 anos de idade».
As opções assumidas por diversos Governos ao longo de muitos anos, acentuaram a desvalorização do
abono de família, quer quanto aos seus montantes, quer quanto à redução dos seus beneficiários. Os cortes em
importantes prestações sociais, onde se inclui o abono de família, aprofundaram as desigualdades sociais e as
situações de pobreza e de exclusão social, com especial incidência nas crianças e nos jovens, que se viram
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confrontados, na sua vivência diária, com elevadas carências, significando ainda uma desproteção das crianças
e dos jovens e um recuo do papel do Estado, no domínio da segurança social, na garantia de das condições
básicas para um crescimento e desenvolvimento harmonioso.
Com o contributo do PCP foram dados passos positivos na melhoria desta prestação social em diversos
Orçamentos do Estado na XIII Legislatura, mas importa continuar esse caminho, levando mais longe, a mais
crianças e a mais famílias, esta indispensável prestação social.
Para o PCP o direito ao abono de família constitui um direito da criança e assume-se como um sinal do dever
de proteção do Estado às crianças e jovens, na promoção dos seus direitos mais elementares. Motivo pelo qual,
a atribuição do abono de família não deve depender dos rendimentos do agregado familiar, mas sim constituir
um direito inequívoco da criança. Este é um dever do Estado e uma expressão concreta da solidariedade de
toda a sociedade para com os direitos das crianças.
A valorização do abono de família a crianças e jovens e do subsídio pré-natal enquadra-se na necessidade
de a Assembleia da República ir mais longe na promoção dos direitos das crianças.
II
Para o PCP as crianças de hoje têm de ter os seus direitos salvaguardados e respeitados, porque elas são
a maior riqueza de um país.
A segurança social em matéria de direitos tem de incorporar esta conceção. Assim o Partido Comunista
Português defende um sistema de prestações familiares de acesso universal. Apesar de as várias
regulamentações destas prestações referirem o princípio da universalidade, este nunca teve correspondência
nas regras efetivamente aplicadas.
Da lei à vida vai uma grande distância. O universo de famílias a aceder a estas prestações é reduzido,
correspondendo maioritariamente a agregados que vivem em situações de pobreza extrema ou próximas desta.
Propomos, portanto, que as crianças, independentemente do agregado familiar em que estão inseridas, tenham
garantida uma infância plena de direitos, com direitos de segurança social, na saúde, na educação e habitação,
em condições de igualdade, sem que o acesso a estes direitos seja restringido às crianças e jovens com base
em critérios economicistas, naturalmente desproporcionados e socialmente injustos, para assim contribuir para
o desenvolvimento das crianças e jovens e de todo o País, combatendo desigualdades e garantindo a proteção
da infância e da juventude no superior interesse da criança.
Com esta proposta o PCP defende o abono de família como um direito da criança e entende que devem ser
criadas as condições para uma maior abrangência do abono de família, com vista à sua universalização.
Este projeto de lei do PCP representa um contributo decisivo que vai ao encontro da garantia e do
cumprimento dos direitos das crianças e de um rumo de progresso social.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei repõe os escalões do abono de família para crianças e jovens, com vista à sua universalidade.
Artigo 3.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 176/2003, de 2 de agosto
O artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 176/2003, de 2 de agosto, na sua redação atual, passa a ter a seguinte
redação:
«Artigo 14.º
[…]
1 – […]
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2 – Para efeitos da determinação do montante do abono de família para crianças e jovens são estabelecidos
os seguintes escalões de rendimentos indexados ao valor do indexante dos apoios sociais (IAS), em vigor à
data a que se reportam os rendimentos apurados:
1.º escalão – rendimentos iguais ou inferiores a 0,5;
2.º escalão – rendimentos superiores a 0,5 e iguais ou inferiores a 1;
3.º escalão – rendimentos superiores a 1 e iguais ou inferiores a 1,5;
4.º escalão – rendimentos superiores a 1,5 e iguais ou inferiores a 2,5;
5.º escalão – rendimentos superiores a 2,5 e iguais ou inferiores a 5;
6.º escalão – rendimentos superiores a 5.
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – […]
7 – […]
8 – […]»
Artigo 3.º
Reposição integral do 4.º, 5.º e 6.º escalões do abono de família
1 – É reposto o pagamento do 4.º escalão do abono de família para crianças e jovens além dos 36 meses de
idade, nos termos a fixar pelo Governo em portaria.
2 – Com vista à consagração da universalidade do abono de família para crianças e jovens, são ainda
repostos o 5.º e 6.º escalão, cujo pagamento se efetua nos termos a fixar pelo Governo em portaria.
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com a publicação da Lei do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.
Assembleia da República, 12 de maio de 2023.
Os Deputados do PCP: Manuel Loff — Paula Santos — Bruno Dias — Alma Rivera — João Dias — Duarte
Alves.
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PROJETO DE LEI N.º 771/XV/1.ª
PREVÊ A CRIAÇÃO DO PROVEDOR DAS CRIANÇAS E DAS GERAÇÕES FUTURAS
Exposição de motivos
As crianças e jovens enfrentam inúmeros desafios. Desde situações de abuso, violência, exploração,
pobreza, discriminação e exclusão social, estes grupos etários são especialmente vulneráveis na medida em
que a violação dos seus direitos afetam, consequentemente, o seu desenvolvimento e o seu futuro.
Por tal, a proteção dos direitos das crianças e dos jovens é fundamental para garantir o seu desenvolvimento
saudável e pleno e encontra respaldo em diversa legislação nacional e internacional.
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Desde logo, a Convenção sobre os Direitos da Criança, ratificada por Portugal em 21 de setembro de 1990,
representa um vínculo jurídico para os Estados que a ela aderiram e que se comprometeram, assim, a promover
e proteger de forma eficaz os direitos e liberdades nela consagrados. No entanto, volvidos mais de 30 anos, os
direitos básicos das crianças e jovens continuam por não estar assegurados na sua plenitude, sendo necessário
proceder a alterações legislativas de forma que o superior interesse da criança seja garantido em todas as ações
e decisões que lhes digam respeito.
A referida Convenção sobre os Direitos da Criança estabelece um conjunto de direitos fundamentais de todas
as crianças e jovens, incluindo o direito à vida, à educação, à saúde, à proteção contra a violência, à não
discriminação, entre outros. Direitos que devem ser protegidos e promovidos por Governos, instituições,
organizações e pela sociedade em geral.
Diante de todos os desafios que enfrentam, é essencial que sejam tomadas medidas para proteger e
promover os direitos das crianças e dos jovens, nomeadamente com a criação de um provedor da criança e das
gerações futuras em Portugal.
A criação de uma entidade que garanta a aplicação da Convenção sobre os Direitos das Crianças não é só
necessária como foi recomendada nas observações finais do Comité dos Direitos da Criança, em 20191.
Também a Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica
Portuguesa, no seu relatório final, recomenda a «criação, se constitucionalmente possível, da figura do
«Provedor da Criança», enquanto entidade independente, autónoma, em articulação com a Provedoria de
Justiça e outras estruturas julgadas necessárias, mas com atuação específica na área da criança e da família»2.
Por tudo o que vai exposto, com a presente iniciativa o partido Pessoas-Animais-Natureza pretende dar
cumprimento às diversas recomendações e resposta aos desafios e prever a criação de um provedor da criança
e das gerações futuras, entendendo-se, para o efeito, um provedor para todas as crianças e jovens, sob a tutela
do Provedor de Justiça.
Pretende-se que este provedor seja uma figura de proximidade, dotada de autonomia, que tem por função
principal a defesa, promoção e proteção dos direitos, liberdades, garantias e interesses legítimos das crianças
e jovens, em conformidade com a legislação nacional e internacional de proteção dos direitos humanos,
permitindo que suas vozes sejam ouvidas, as suas necessidades atendidas de forma adequada e justa e os
seus direitos garantidos.
Nas áreas da infância e da juventude existem diversas entidades e organizações a desenvolver um meritório
trabalho na proteção dos direitos destes grupos etários. Contudo, inexiste ainda uma entidade que de forma
coordenada e concertada garanta, perante as entidades públicas e privadas, o integral cumprimento, que emita
recomendações neste âmbito e promova as alterações necessárias.
Finalmente, pretendemos que seja também considerado e defendido como direito das gerações futuras e
direito a garantir pelo provedor, a solidariedade intergeracional, como princípio que determina que as gerações
presentes têm o dever de manter a integridade do planeta para a vida das gerações futuras, como premissa
fundamental para o cumprimento da premissa de uma sociedade justa e solidária.
Este princípio implica a conservação da possibilidade de escolha da geração futura quanto à utilização dos
recursos naturais, o que implica a garantia da diversidade de recursos naturais, proibindo a sobre-exploração e
o de conservação da qualidade ambiental desses mesmos recursos naturais. Assim, considera-se que a criação
do provedor se justifica no quadro de uma sociedade moderna, como uma figura próxima, atenta, acessível,
através de linguagens e meios adequados, zelando pelas suas necessidades e proteção junto de todas as
organizações, públicas e privadas.
Com a presente iniciativa, o partido Pessoas-Animais-Natureza pretende que seja dado esse passo
importante e acompanhe outros países que promoveram a criação de uma figura semelhante, como Espanha,
Finlândia, Irlanda, Islândia, Lituânia, Noruega, Polónia e a Suécia3.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada
Deputada do Pessoas-Animais-Natureza apresenta o seguinte projeto de lei:
1 1363938 (provedor-jus.pt) 2 Microsoft Word – relatório final_27_03_2023.docx (darvozaosilencio.org) 3 https://ficheiros.parlamento.pt/DILP/Publicacoes/Temas/73.ProvedorDaCrianca/73.pdf
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Artigo 1.º
Objeto
A presente lei cria o Provedor da Criança e das gerações futuras, alterando, para o efeito, o Estatuto do
Provedor de Justiça, aprovado pela Lei n.º 9/91, de 9 de abril.
Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 9/91, de 9 de abril que aprova o Estatuto do Provedor de Justiça
«Artigo 1.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – […]
4 – O Provedor de Justiça nomeia e tutela o Provedor da Criança e das gerações futuras
5 – (Anterior n.º 4.)
Artigo 3.º
Natureza e finalidade
O Provedor da Criança e das gerações futuras é um órgão nomeado pelo Provedor de Justiça que tem por
função principal a defesa, promoção e proteção dos direitos, liberdades, garantias e interesses legítimos das
crianças e jovens, em conformidade com a legislação nacional, europeia e internacional de proteção dos direitos
humanos.
Artigo 4.º
Competências
Ao Provedor da Criança e das gerações futuras compete:
a) Receber e analisar denúncias de violação dos direitos das crianças e dos jovens, de forma próxima,
acessível, através de linguagens e meios adequados, zelando pelas suas necessidades e proteção junto de
todas as organizações, públicas e privadas;
b) Dirigir recomendações aos órgãos competentes com vista à correção de atos ilegais ou injustos dos
poderes públicos ou à melhoria da organização e procedimentos administrativos dos respetivos serviços a
entidades públicas e privadas;
c) Assinalar as deficiências de legislação que verificar, emitindo recomendações para a sua interpretação,
alteração ou revogação, ou sugestões para a elaboração de nova legislação, as quais serão enviadas ao
Provedor de Justiça que, por sua vez remete para o Presidente da Assembleia da República, ao Primeiro-
Ministro e aos ministros diretamente interessados e, igualmente, se for caso disso, aos Presidentes das
Assembleias Legislativas das regiões autónomas e aos Presidentes dos Governos Regionais;
d) Emitir parecer, a solicitação do Provedor de Justiça, sobre quaisquer matérias relacionadas com a sua
atividade;
e) Promover a divulgação do conteúdo e da significação de cada um dos direitos e liberdades fundamentais
das crianças e jovens, bem como da finalidade do provedor das gerações futuras, dos meios de ação de que
dispõe e de como a ele se pode fazer apelo;
f) Intervir, nos termos da lei aplicável, na tutela dos interesses coletivos ou difusos, nomeadamente
ambientais, quando seja posta em causa a solidariedade intergeracional.
g) Monitorizar a atuação de serviços públicos e privados que tenham responsabilidade pela proteção e
promoção dos direitos das crianças e dos jovens;
h) Promover campanhas de sensibilização e educação sobre os direitos das crianças e dos jovens;
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i) Colaborar com outras instituições públicas e privadas, nacionais e internacionais, que atuam na área da
proteção e promoção dos direitos das crianças e dos jovens.
j) Garantir a representação nacional e internacional no que se relacione com a promoção e proteção dos
direitos das crianças e jovens.
Artigo 5.º
Composição e nomeação
1 – O Provedor da Criança e das gerações futuras é nomeado pelo Provedor de Justiça, nos termos do
Estatuto do Provedor de Justiça, por quatro anos.
2 – Após o termo do período por que foi designado, o Provedor da Criança e das gerações futuras mantém-
se em exercício de funções até à posse do seu sucessor.
3 – A designação do provedor deve efetuar-se nos 30 dias anteriores ao termo do quadriénio pelo Provedor
de Justiça em funções.
Artigo 6.º
Organização e funcionamento
O Provedor da Criança e das gerações futuras terá uma estrutura própria de organização e funcionamento,
definida em regulamento interno, aprovado pelo Provedor de Justiça.
Artigo 7.º
Regulamentação
O Governo procede à regulamentação da presente lei no prazo de 90 dias a contar da data da sua publicação.
Artigo 8.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua aprovação.
Palácio de São Bento, 11 de maio de 2023.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
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PROJETO DE LEI N.º 772/XV/1.ª
PREVÊ A ALTERAÇÃO DA COMPOSIÇÃO E FUNCIONAMENTO DAS COMISSÕES DE PROTEÇÃO
DE CRIANÇAS E JOVENS
Exposição de motivos
Por iniciativa do PAN, foi apresentada e aprovada na Assembleia Municipal de Lisboa, por unanimidade, uma
moção cujo objetivo se prende com a alteração da composição e funcionamento das comissões de proteção de
crianças e jovens, com vista a densificar a garantia de direitos e proteção das crianças e jovens em risco.
Dessa forma, e em cumprimento com o apresentado a nível municipal, vem o PAN dar cumprimento às
resoluções apresentadas e aprovadas no que diz respeito às alterações legislativas propostas.
Assim, e fazendo uso do referido na mencionada moção, e considerando que:
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«I. Continua a ser recorrente a prática de atos de violência sobre crianças que, por vezes, culminam na sua
morte, comprovando que o acompanhamento das autoridades não tem sido suficiente para evitar desfechos
trágicos. Todos os anos em sede de 6.ª Comissão Permanente da Assembleia Municipal de Lisboa, são
analisados os relatórios das quatro CPCJ de Lisboa e produzidos relatórios e recomendações sobre esta
matéria».
II. Estas recomendações são semelhantes, ano após ano, e referem que as CPCJ necessitam de um melhor
acompanhamento dos problemas identificados no seu funcionamento, que se estude a possibilidade da
colocação de técnicos a tempo inteiro com perfis adequados às funções e às necessidades das CPCJ, que o
Ministério da Saúde afete técnicos especializados para suprir as lacunas, sobretudo na área de saúde mental,
que se profissionalizem os técnicos da CPCJ tornando as equipas da Comissão na sua forma restrita mais
coesas, estáveis e que possam trabalhar de forma contínua nos processos de promoção e proteção de crianças
e jovens, entre outras medidas.
III. A 6.ª Comissão Permanente emitiu todos os anos pareceres e recomendações que não surtiram o efeito
pretendido, sendo que os problemas de funcionamento das quatro CPCJ de Lisboa se mantêm e em alguns
casos até se agudizaram – são exemplos disso a Recomendação 43/01 de 20211, o parecer sobre o Relatório
Anual de Atividades de 2020 das CPCJ Lisboa Norte, Ocidental, Oriental e Centro e Resposta à Pandemia2, o
parecer sobre o Relatório Anual de Atividades de 2019 das CPCJ Lisboa Norte, Ocidental, Oriental e Centro e
Resposta à Pandemia3 e o parecer – Audição com os presidentes das CPCJ Lisboa Norte, Ocidental, Oriental e
Centro sobre o Relatório Anual de Atividades de 20184.
IV. De acordo com o Relatório Anual de Avaliação da Atividade das CPCJ relativo a 2021, divulgado pela
Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ)5, “(…) em 2021,
foram comunicadas às CPCJ 43 075 crianças em situações de perigo, mais 3416 do que em 2020, o que traduz
um aumento de 8,6 %. As principais entidades comunicantes são, à semelhança dos anos anteriores, as forças
de segurança e os estabelecimentos de ensino. A violência doméstica, logo seguida da negligência, constituíram
as categorias de perigo mais registadas nas comunicações recebidas pelas CPCJ, mantendo a tendência do
ano anterior (…) No ano em apreço, as CPCJ cessaram a sua intervenção em 40 163 processos, tendo sido
remetidos ao patamar seguinte de intervenção – o tribunal – 31,6 % destes. Para o ano de 2022 transitaram
31 469 processos, dos quais 17 341 tinham medida em execução”.
V. É urgente que nos debrucemos sobre o enquadramento legal em vigor que teve início em 1991 com o
Decreto-Lei n.º 189/91, de 17 de maio: Regulação da criação, competência e funcionamento das comissões de
proteção dos menores, que posteriormente viriam a ser reformuladas de acordo com a Lei de Proteção de
Crianças e Jovens em Perigo, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, na atual redação introduzida pela
Lei n.º 23/2017, de 23 de maio, que tem por objeto promover os direitos e a proteção das crianças e dos jovens
em perigo, por forma a garantir o seu bem-estar e desenvolvimento integral.
VI. Assim e nos termos do seu artigo 3.º, há legitimidade de intervenção para promoção dos direitos e
proteção da criança e do jovem em perigo quando os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de
facto, ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento, ou quando esse
perigo resulte de ação ou omissão de terceiros ou da própria criança ou do jovem a que aqueles não se oponham
de modo adequado a removê-lo.
VII. Do mesmo modo e em matéria de modalidades de intervenção, prevê-se que a promoção dos direitos e
a proteção da criança e do jovem em perigo incumbe às entidades com competência em matéria de infância e
juventude, às comissões de proteção de crianças e jovens e aos tribunais.
VIII. Em primeira linha, as entidades com competência em matéria de infância e juventude adiante
designadas por ECMIJ, devem promover ações de prevenção primária e secundária, designadamente definir
planos de ação local para a infância e juventude, com vista à promoção, defesa e concretização dos direitos da
criança e do jovem, sendo a sua intervenção efetuada de modo consensual com os pais, com o representante
legal ou com a pessoa que tenha a guarda de facto, consoante o caso.
IX. Seguidamente, a intervenção das comissões de proteção das crianças e jovens, adiante designadas por
1 https://www.am-lisboa.pt/documentos/1667489846T1gJK7dh3Dp95QS4.pdf 2 https://www.am-lisboa.pt/documentos/1638470220C3dGV4su8Nd78ZO7.pdf 3 https://www.am-lisboa.pt/documentos/1617734923G1mIM7ne2Ke76JQ2.pdf 4 https://www.am-lisboa.pt/documentos/1570812477E3qHO3bg5Wm67IE2.pdf 5 https://www.cnpdpcj.gov.pt/documents/10182/16406/ra2021cpcj/aba29f21-787d-41fc-8ee8-76d5efa82855
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CPCJ, dependem do consentimento expresso e prestado por escrito pelos pais, representante legal ou pela
pessoa que tenha a guarda de facto, consoante o caso.
X. Por último, a intervenção judicial tem lugar quando não esteja instalada comissão de proteção de crianças
e jovens com competência no município ou na freguesia da respetiva área da residência, ou a comissão não
tenha competência nos termos da lei para aplicar uma medida de promoção e proteção adequada, para além
das demais situações tipificadas no artigo 11.º da referida lei.
XI. Com efeito, existem várias ECMIJ que têm como fim dar apoio educativo, social e proteger as crianças e
os jovens, designadamente internatos, centros de acolhimento temporário e outras instituições com respostas
socioeducativas referentes a crianças e jovens, as quais estão normalmente habilitadas com técnicos da área
do serviço social, da educação e da psicologia. Algumas das situações de crianças ou jovens em perigo que
chegam ao conhecimento destas estruturas, podem se assim for entendido, ser participadas às comissões de
proteção de crianças e jovens em perigo ou aos tribunais.
XII. Contudo, a intervenção destas estruturas só pode ser efetivada se os pais, representantes legais, quem
tenha a guarda da criança/jovem ou o próprio jovem com idade igual ou superior a 12 anos, concordarem e
colaborarem na intervenção. Neste caso, é promovida uma intervenção informal. Na impossibilidade de se atuar
de forma adequada para remover o perigo em que se encontra a criança, estas entidades estão vinculadas à
participação do caso à CPCJ ou aos tribunais, de acordo com a existência deste tipo de respostas na área de
residência da criança ou jovem.
XIII. Ora e não se pretendendo ser exaustivo com a disciplina legal das comissões de proteção, não podemos
deixar de fazer uma alusão rápida às competências, composição e funcionamento das CPCJ, as quais podem
funcionar em modalidade alargada ou restrita, adiante designadas, respetivamente, de comissão alargada e de
comissão restrita.
XIV. À comissão alargada compete desenvolver ações de promoção dos direitos e de prevenção das
situações de perigo para a criança e jovem, designadamente, informar a comunidade sobre os direitos da criança
e do jovem, promover ações e colaborar com as entidades competentes tendo em vista a deteção dos factos e
situações que afetem os direitos e interesses da criança e do jovem, ou colaborar com as entidades competentes
no estudo e elaboração de projetos inovadores no domínio da prevenção primária dos fatores de risco, bem
como na constituição e funcionamento de uma rede de respostas sociais adequadas.
XV. À comissão restrita compete intervir concretamente nas situações em que a criança ou o jovem está em
perigo, nomeadamente, atender e informar as pessoas que se dirigem à comissão de proteção, decidir pela
abertura e proceder à instrução do processo de promoção, solicitar a participação dos membros da comissão
alargada nos processo por si instruídos, sempre que se mostre necessário ou solicitar parecer e a colaboração
de técnicos de entidades públicas ou privadas, ou ainda, decidir pela aplicação e revisão das medidas de
promoção e proteção, para além das demais competências previstas no artigo 21.º do diploma em análise.
XVI. Do mesmo modo, enquanto a comissão alargada integra vários representantes de entidades públicas e
privadas, com uma composição extensa, a comissão restrita é sempre composta por um número ímpar, nunca
inferior a 5 dos membros que integram a comissão alargada, sendo membros por inerência o presidente e os
representantes do município, da segurança social, da saúde, da educação e um membro, de entre os
representantes das instituições particulares de solidariedade social/organizações não governamentais.
XVII. Acreditamos que o diploma em questão padece de algumas falhas e contradições suscetíveis de colocar
em causa o normal funcionamento das CPCJ e por essa via a proteção das crianças e jovens sob a sua tutela.
XVIII. Por um lado, o apoio ao funcionamento das comissões de proteção, designadamente, nas vertentes
logística, financeira e administrativa, é assegurado pelo município, nos termos a definir pela Comissão Nacional.
XIX. Sendo que, os membros que representam e obrigam os serviços e as entidades que os designam,
acumulam as funções que desempenham nas CPCJ às que exercem nos respetivos serviços.
XX. É de entender que uma competência tão urgente e exigente como a das comissões restritas, deve ser
tão célere quanto possível, não se compadecendo com a acumulação de outras funções públicas, não obstante
a própria letra da lei especificar no seu artigo 25.º, que as funções dos membros da comissão de proteção no
âmbito da competência desta, têm caráter prioritário relativamente às que exercem nos respetivos serviços e
constituem serviço público obrigatório.
XXI. A esta circunstância acresce que os membros da comissão restrita exercem funções em regime de
tempo integral ou parcial, em conformidade com os critérios de referência estabelecidos pela Comissão Nacional
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de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ), a par da complexidade e pouca
clareza das normas atinentes à afetação de técnicos para prestar apoio à atividade das comissões, gerando
dificuldades numa atuação tão exigente e eficaz como a imposta quando se está perante situações de perigo
para crianças e jovens.
XXII. Em suma, acreditamos que os membros das comissões restritas devem exercer funções em regime de
tempo integral, devendo ser criado um quadro de pessoal próprio e permanente que permita o recrutamento de
técnicos nas áreas do serviço social, psicologia, direito, educação e saúde, que assuma a coordenação de casos
e emita pareceres no âmbito dos processos que tenha a seu cargo, salvaguardada a imparcialidade e
independência das suas decisões, devendo ainda ser avocados a participar nos respetivos trabalhos, outros
elementos ainda que sem vínculo à função pública, especialmente habilitados nas referidas áreas do saber e
com especial conhecimento pelos problemas da infância e juventude.
XXIII. Tanto mais que existem atualmente várias CPCJ nas quais, o volume processual ultrapassa os 100
processos por gestor, contrariando inclusive as Recomendações da CNPDP que aconselha que cada gestor de
processo não ultrapasse os 40 processos de promoção e proteção.
XXIV. Ora e sem prejuízo da intervenção das comissões de proteção estar condicionada ao consentimento
expresso prestado pelos pais, representante legal ou pela pessoa que tenha a guarda de facto, e não devendo
os tribunais ficar arredados desta responsabilidade, impõe-se uma atuação célere e eficaz nas situações em
que a criança ou o jovem está em perigo, pelo que a composição das comissões restritas deverá integrar
técnicos em número suficiente, respeitando o ratio de processos ativos por comissário de acordo com os tempos
de afetação mínima aprovados pelo Conselho Nacional da CNPDP.»
Face a tudo o que vai exposto, recomenda a referida moção que, em primeira linha, a Assembleia da
República proceda à alteração da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, aprovada pela Lei n.º 147/99,
de 1 de setembro, na sua atual redação, na parte respeitante às competências, composição e funcionamento
das comissões de proteção, designadamente para:
a) A criação de um quadro de pessoal próprio e permanente com formação e experiência na área da infância
e família, das comissões de proteção na sua modalidade restrita, cujo volume processual assim o exija, e que
consiga dar uma reposta célere e adequada ao volume de processos que lhes são confiados, permitindo o
recrutamento de técnicos nas áreas do serviço social, psicologia, direito, educação, saúde e serviços
administrativos;
b) Que os membros das comissões restritas, nas CPCJ cujo volume processual assim o exija, como é o caso
das CPCJ de Lisboa, passem a exercer as respetivas funções em regime de tempo integral, respeitando o ratio
de processos ativos por comissário de acordo com os tempos de afetação mínima aprovados pelo Conselho
Nacional da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens;
c) Que os técnicos que integrem os quadros de pessoal das comissões de proteção exerçam as respetivas
funções, salvaguardados os princípios da responsabilidade, imparcialidade e independência das suas decisões,
e cujos resultados devem ser medidos através de indicadores previamente fixados, que permitam assegurar
entre outros, a transparência, imparcialidade e a prevenção da discricionariedade na sua avaliação de
desempenho.
d) Que a tutela das CPCJ transite do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social para a
Presidência do Conselho de Ministros.
E ainda que seja solicitado aos membros do Governo competentes que procedam às necessárias alterações
ao Decreto-Lei n.º 159/2015, de 10 de agosto, na sua atual redação, que procedeu à criação da Comissão
Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens e define a respetiva missão, atribuições,
tipo de organização interna e funcionamento, no sentido de reforçar as suas atribuições em matéria de poderes
de direção e orientação concretas sobre as comissões de proteção de crianças e jovens.
Desta forma, o PAN apresenta a presente iniciativa, com vista a dar cabal cumprimento a todas as
recomendações supra identificadas e, dessa forma, reforçar a missão e organização das comissões de proteção
e, consequentemente, garantir a proteção de todas as crianças e jovens em risco.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada
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Deputada do Pessoas-Animais-Natureza apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei altera a composição e funcionamento das comissões de proteção de crianças e jovens,
procedendo, para o efeito, à alteração à Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, que aprova a Lei de Proteção de
Crianças e Jovens em Perigo.
Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 147/99, de 1 de setembro
É alterado o artigo 3.º da Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, que aprova a Lei de Proteção de Crianças e
Jovens em Perigo, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 3.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – As comissões de proteção de menores são reorganizadas por portaria conjunta dos Ministros da Justiça
e da Presidência do Conselho de Ministros.
4 – As comissões de proteção de crianças e jovens que sucederem às comissões de proteção de menores,
nos termos dos números anteriores, são declaradas instaladas por portaria conjunta dos Ministros da Justiça e
da Presidência do Conselho de Ministros.
5 – […]
6 – […]
7 – […]
8 – […]»
Artigo 3.º
Alteração à Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo
São alterados os artigos 20.º-A e 22.º da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, aprovada em
anexo à Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, que passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 20.º-A
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – De forma a capacitar a atividade das comissões restritas dos municípios cujo volume processual seja
elevado, a Comissão Nacional pode autorizar a criação de um quadro de pessoal próprio e permanente com
formação e experiência na área da infância e família, permitindo o recrutamento de técnicos nas áreas do serviço
social, psicologia, direito, educação, saúde e serviços administrativos.
4 – Os técnicos que integram as comissões de proteção exercem as respetivas funções, salvaguardados os
princípios da responsabilidade, imparcialidade e independência das suas decisões.
5 – A avaliação de desempenho dos técnicos é efetuada através de indicadores fixados previamente, de
forma a assegurar a transparência e imparcialidade dos resultados.
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Artigo 22.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – Nas comissões de proteção dos municípios cujo volume processual o justifique, os membros das
comissões restritas exercem as respetivas funções em regime de tempo integral, respeitando o ratio de
processos ativos por comissário, de acordo com os tempos de afetação mínima aprovados pelo Conselho
Nacional da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens.»
Artigo 4.º
Criação de grupo de trabalho
Nos 60 dias seguintes à entrada em vigor da presente lei, o Governo promove a criação de um grupo de
trabalho, com uma equipa multidisciplinar, de forma a analisar as necessárias alterações ao Decreto-Lei
n.º 159/2015, de 10 de agosto, que procedeu à criação da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e
Proteção das Crianças e Jovens e define a respetiva missão, atribuições, tipo de organização interna e
funcionamento, no sentido de reforçar as suas atribuições em matéria de poderes de direção e orientação
concretas sobre as comissões de proteção de crianças e jovens.
Artigo 5.º
Regulamentação
O Governo procede à regulamentação da presente lei no prazo de 90 dias a contar da data da sua publicação.
Artigo 6.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua aprovação.
Palácio de São Bento, 12 de maio de 2023.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
———
PROJETO DE LEI N.º 773/XV/1.ª
GARANTE O ENQUADRAMENTO LEGAL E UM FINANCIAMENTO ADEQUADO DO PROGRAMA DE
AÇÃO NACIONAL DE COMBATE À DESERTIFICAÇÃO, ALTERANDO A LEI DA ÁGUA
Exposição de motivos
Em Portugal, os registos científicos1 demonstram que, nos anos mais recentes, tem-se observado uma maior
frequência de episódios de seca meteorológica, alguns deles que se têm prolongado por mais de um período
1 https://www.ipma.pt/pt/oclima/observatorio.secas/pdsi/apresentacao/evolu.historica/
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húmido (outono e inverno) e seco (primavera e verão). Têm também abrangido uma maior percentagem do
território, uma situação notória em todo o território nacional, mas afetando mais as regiões nordeste e sul.
Só entre o ano de 1941 e 2022, ocorreram em Portugal vários episódios de seca, sendo que, desde 1980, já
se registaram nove ocasiões em que mais de 10 % do território esteve em situação de seca extrema e quatro
em que mais de 75 % de Portugal continental estava em seca severa ou moderada.
De acordo com os dados do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), nos últimos 80 anos,
destacam-se os seguintes episódios de seca meteorológica com maior severidade: 1944/45, 1948/49, 1980/82,
1991/93, 1994/95 e ainda em 2004/06, 2011/12, 2015, 2017/18, 2019 e 2022. Das secas meteorológicas
referidas atrás, as mais graves foram a seca de 1944/45 – a mais longa ocorrida desde 1941 – e a seca de
2004/06 – a de maior extensão territorial (100 % do território afetado) e também a mais intensa (tendo em conta
os meses consecutivos em que o território se encontrou em situação de seca severa e extrema. O IPMA realça
ainda a seca meteorológica de 2016/2017, evento que registou um agravamento muito significativo no início do
outono, situação pouca habitual para a época do ano.
A par da situação de seca meteorológica, também a seca hidrológica tem adotado contornos deveras
preocupante, tendo a situação de seca hidrológica registada em 2022 sido considerada a mais grave do século
devido à conjugação de temperaturas altas e fraca precipitação. Com efeito, o ano hídrico de 2021/22 foi
excecionalmente seco na Europa, com grande impacto na Península Ibérica, tendo-se verificado,
inclusivamente, em Portugal cinco ondas de calor.
2022 foi também o quinto ano seguido com precipitação abaixo da média. O passado ano hidrológico
terminou com um défice de precipitação de -393,8 mm e foi o 3.º mais seco desde 1931, depois de 2004/05 e
1944/45, o que contribuiu para um preocupante decréscimo das reservas de água em todas as albufeiras
monitorizadas pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA). Apesar das chuvas de setembro, estas não foram
suficientes para que houvesse um aumento das disponibilidades hídricas superficiais nem subterrâneas, pois o
solo extremamente seco não permitiu a infiltração em profundidade nem a escorrência.
No corrente ano, tudo aponta para que o País se veja novamente a braços com uma situação de seca que,
em 40 % do território, é já severa e extrema2. Para tal, contribuíram os valores das temperaturas média e máxima
acima do normal no mês de abril, bem como o registo de ondas de calor que, conjuntamente com a reduzida
precipitação durante os meses de março e abril, resultou num baixo teor de água no solo, com maior incidência
a sul do País. Nas bacias hidrográficas nesta região do País, a situação de seca meteorológica tem persistido,
não tendo sido possível a recuperação hídrica devido à ocorrência de reduzidas afluências às albufeiras,
resultantes de precipitações pouco significativas ou nulas durante o ano hidrológico, designadamente nas bacias
hidrográficas do Sado, Mira, Arade e das Ribeiras do Algarve.
Não obstante a frequência e a gravidade das secas, Portugal continua a tratar a seca como um fenómeno
esporádico e a apresentar graves lacunas na prevenção e no combate estruturado e continuado a este
fenómeno, ainda que todos os cenários climáticos da comunidade científica coloquem o nosso país como um
dos mais vulneráveis às alterações climáticas.
Em Portugal, o primeiro Programa de Ação Nacional para Combater a Desertificação (PANCD – Portugal) foi
aprovado em 19993, tendo sido alvo de revisão em 20144 e encontrar-se-á, atualmente, a ser alvo de nova
revisão. Apesar de identificar um conjunto de objetivos e linhas de ação, o Tribunal de Contas (TdC) no seu
relatório de 2019 «concluiu que o PANCD-Portugal carecia de uma estimativa de custos e que, igualmente, o
governo português não atribuiu qualquer dotação orçamental ao mesmo»5. O referido relatório também assinalou
que o PANCD – Portugal não havia definido as ações a adotar para concretizar os objetivos e linhas de ação
definidos nem as quantias ou fontes de financiamento envolvidas. Acresce que no relatório enviado por Portugal
à CNUCD (Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação) não se especificou o montante
dedicado à luta contra a desertificação.
Concluiu ainda o TdC neste relatório que a Comissão Nacional de Coordenação não tinha cumprido as suas
funções, devido a «falta de recursos humanos e financeiros». Dava ainda nota de que «não estava a ser
recolhida informação nem a proceder-se a quaisquer análises ou avaliações sobre a execução do programa e
dos seus resultados. Assim, não estavam garantidos nem a supervisão nem o acompanhamento do programa».
2 https://www.portugal.gov.pt/pt/gc23/comunicacao/noticia?i=ministerio-da-agricultura-e-alimentacao-reconhece-situacao-de-seca-severa-e -extrema-em-cerca-de-40-do-territorio-nacional. 3 https://dre.pt/dre/detalhe/resolucao-conselho-ministros/69-1999-375062. 4 https://dre.pt/dre/detalhe/resolucao-conselho-ministros/78-2014-65983231. 5 https://erario.tcontas.pt/static/docs/relatorio_conjunto_tce_tcp.pdf.
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Situação que, em 2022, terá sido corrigida com o reforço de recursos humanos afetos à execução e
acompanhamento do programa e a intensificação dos trabalhos da Comissão Nacional de Coordenação e de
vários núcleos regionais, em especial no âmbito do processo de avaliação e revisão do PANCD.
Face a todas as considerações referidas, é evidente que Portugal precisa de investir de forma mais
consistente na compreensão, diagnóstico e no acompanhamento da situação de desertificação, de degradação
do solo e de seca no território nacional. Nesse sentido, com a presente iniciativa, procurando dar cumprimento
às recentes recomendações do TdC, o Pessoas-Animais-Natureza propõe que a Lei da Água passe a
estabelecer um enquadramento legal geral do Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação que
garanta a sua vigência e revisão periódica e que, cumprindo as exigências Convenção das Nações Unidas de
Combate à Desertificação nos Países Afetados por Seca Grave e ou Desertificação, se assuma como o
instrumento nacional da aplicação das orientações, das medidas e dos instrumentos da convenção nas áreas
semiáridas e sub-húmidas secas do território nacional, bem como nas iniciativas de cooperação multilateral e
bilateral de Portugal, que se inscrevam no seu âmbito. Com este enquadramento legal assegura-se que este
plano passa, por um lado, a ter de definir metas a atingir, medidas destinadas às populações, ecossistema e
aos diversos setores económicos afetados, as estimativas de custos, e os respetivos mecanismos de
implementação e de monitorização da execução, e a ter, por outro lado, uma dotação orçamental anual
adequada à respetiva implementação.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada
Deputada do Pessoas-Animais-Natureza apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à sexta alteração à Lei da Água, aprovada pela Lei n.º 58/2005, de 29 de dezembro,
alterada pelos Decretos-Leis n.os 245/2009, de 22 de setembro, 60/2012, de 14 de março, e 130/2012, de 22 de
junho, e pela Leis n.os 42/2016, de 28 de dezembro, e 44/2017, de 19 de junho.
Artigo 2.º
Alteração à Lei da Água
É aditado o artigo 41.º-A à Lei da Água, aprovada pela Lei n.º 58/2005, de 29 de dezembro, com a seguinte
redação:
«Artigo 41.º-A
Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação
1 – O Governo, em articulação com a academia e os organismos públicos competentes, promove a revisão,
atualização e avaliação da execução do Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação, de dois em
dois anos, o qual deve ter por objetivo, entre outros, a aplicação das orientações, das medidas e dos
instrumentos da Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação nas áreas semiáridas e sub-
húmidas secas do território nacional, bem como nas iniciativas de cooperação multilateral e bilateral de Portugal,
que se inscrevam no seu âmbito.
2 – Do programa mencionado no número anterior deve constar a definição das metas a atingir, as medidas
destinadas às populações, ecossistema e aos diversos setores económicos afetados, as estimativas de custos,
e os respetivos mecanismos de implementação e de monitorização da execução.
3 – A dotação orçamental adequada à implementação do Programa de Ação Nacional de Combate à
Desertificação deve ser inscrita e atualizada anualmente no Orçamento do Estado.»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
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Palácio de São Bento, 12 de maio de 2023.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
———
PROJETO DE LEI N.º 774/XV/1.ª
SALVAGUARDA O DIREITO DE ACESSO À PRESTAÇÃO SOCIAL PARA A INCLUSÃO NOS CASOS
DE ATRASO NA NOTIFICAÇÃO DE COMPARÊNCIA NA JUNTA MÉDICA, ALTERANDO O DECRETO-LEI
N.º 126-A/2017, DE 6 DE OUTUBRO
Exposição de motivos
O atestado médico de incapacidade multiuso é um documento que comprova o grau de incapacidade física
ou mental, permanente ou temporária, de um utente, sendo que, dependendo do grau de incapacidade atribuído,
poderá conferir ao seu portador benefícios fiscais, o acesso à prestação social para a inclusão, a isenção de
taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde, o atendimento prioritário, a isenção do imposto automóvel,
o acesso ao transporte não urgente de doentes, a proteção e apoios sociais, ou a concessão de bolsas de
estudo no ensino superior.
Apesar de o quadro legal em vigor estabelecer que depois de o utente fazer o pedido de avaliação receberá
uma notificação de comparência na junta médica num prazo de 60 dias, a verdade é que têm chegado ao
conhecimento público inúmeros casos em que esta notificação de comparência está a demorar 1, 2 e até 3 anos.
Tal situação, para além de constituir um preocupante incumprimento do quadro legal em vigor, está a privar
milhares de cidadãos portadores de deficiência ou de incapacidade de aceder aos apoios que lhe são devidos,
nomeadamente à prestação social para a inclusão.
Atendendo a que estes atrasos não são imputáveis aos cidadãos requerentes e procurando que não sejam
prejudicados por tais atrasos, com a presente iniciativa o PAN pretende assegurar que o acesso à prestação
social para inclusão seja sempre garantido com efeitos à data da apresentação do requerimento devidamente
instruído. Desta forma e evitando as injustiças ditadas pelos atrasos das juntas médicas, garante-se o acesso à
prestação social para a inclusão com a mera entrega de comprovativo do pedido de certificação.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada
Deputada do Pessoas-Animais-Natureza apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à quinta alteração ao Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro, alterado pela Lei
n.º 114/2017, de 29 de dezembro, e pelos Decretos-Leis n.os 33/2018, de 15 de maio, 136/2019, de 6 de
setembro, e 11/2021, de 8 de fevereiro, que cria a prestação social para a inclusão, alarga o complemento
solidário para idosos aos titulares da pensão de invalidez e promove os ajustamentos necessários noutras
prestações sociais.
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro
O artigo 23.º do Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro, passa a ter a seguinte redação:
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«Artigo 23.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – […]
4 – […]
5 – Nas situações em que o titular junte o comprovativo do pedido de certificação da deficiência, o deferimento
fica dependente da apresentação do original do atestado médico de incapacidade multiuso, sendo a prestação
devida a partir da data da apresentação do requerimento devidamente instruído, nos termos do presente artigo.
6 – Nas situações em que o grau de incapacidade igual ou superior a 60 % tenha resultado de junta médica
de recurso, a prestação é devida a partir da data da apresentação do requerimento devidamente instruído, nos
termos do presente artigo.»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia 1 de janeiro de 2024, produzindo efeitos no dia seguinte ao da sua
publicação.
Palácio de São Bento, 12 de maio de 2023.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
———
PROJETO DE LEI N.º 775/XV/1.ª
ALTERA O REGIME JURÍDICO QUE ESTABELECE A ATIVIDADE DE TRANSPORTE INDIVIDUAL E
REMUNERADO DE PASSAGEIROS EM VEÍCULOS DESCARACTERIZADOS (TVDE)
Exposição de motivos
A atividade de transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados (TVDE)
existe em Portugal desde 2014, altura em que a plataforma UBER iniciou a sua operação em Portugal, sendo
certo que só foi regulamentada em 2018 com a aprovação da Lei n.º 45/2018, de 10 de agosto.
A atividade dos operadores de plataformas eletrónicas e dos operadores de TVDE pode ser exercida por
pessoas coletivas estabelecidas em território nacional, mediante comprovação de que possuem os requisitos de
acesso à atividade, nomeadamente estão sujeitas a licenciamento, cabendo ao IMT, IP, exercer as funções de
regulamentação técnica, licenciamento e fiscalização.
Em abril de 2023, o sector TVDE resume-se aos seguintes indicadores registados no Instituto da Mobilidade
e dos Transportes, IP:
● 14 operadores de plataformas eletrónicas licenciados pelo IMT, IP, sendo que apenas 4 se encontram em
actividade1;
● 12 283 operadores de TVDE licenciados pelo IMT, IP2;
● 49416 motoristas certificados pelo IMT, IP3.
1 TVDE-OperadoresPlataforma-ListaSite.pdf (imt-ip.pt) 2 TVDE_ListaDeOperadoresPorDistrito.pdf (imt-ip.pt) 3 N-CertificadosMotoristasTVDE (2) (imtonline.pt)
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Em relação aos dois últimos indicadores desconhece-se o número real de operadores e motoristas que
estejam em funções, pois a circunstância de estarem licenciados ou certificados não significa que estejam
atualmente a exercer.
Após quase 5 anos da aprovação da lei foram identificadas lacunas e insuficiências por quem opera neste
setor, que tendem a comprometer a sua adequada operacionalidade e eficiência.
Para mais, o período pós-pandemia trouxe «a recuperação da atividade», com um aumento de cerca de 30 %
do número de motoristas a operar nestas plataformas, quando comparado com o período pré-pandémico.
Aliás, a atividade TVDE que inicialmente era apenas disponibilizada em algumas cidades, abrange agora
todo o território continental e a Madeira, tendo representado nos três primeiros trimestres de 2021, 107 593
viagens por dia, segundo o relatório final de 2022, sobre a avaliação do regime TVDE do IMT, IP4.
Importa referir que a própria lei prevê, no seu artigo 31.º, que «A implementação dos serviços regulados na
presente lei, no território nacional, é objeto de avaliação pelo IMT, IP, decorridos três anos sobre a respetiva
entrada em vigor, em articulação com a AMT, com as restantes entidades competentes e associações
empresariais e de cidadãos relevantes».
Por consequência, o IMT elaborou um relatório de avaliação5, que foi de seguida enviado, em janeiro de
2022, para a Autoridade da Mobilidade e dos Transportes, que o apreciou, tendo sido alvo do Parecer n.º
19/AMT/20226, que aponta para a premência da revisão do diploma vigente, mormente no respeitante à
consagração legal da obrigatoriedade de celebração de contratos de trabalho entre os operadores de TVDE e
os seus motoristas.
O Chega considera que se deve pugnar por um modelo que promova um maior equilíbrio entre as partes, a
melhoria do serviço TVDE, bem como a justa valoração do seu serviço. Para este efeito, o veículo TVDE deve
estar licenciado para a respetiva atividade junto do IMT, como já acontece com o motorista e a empresa, assim
como à obrigatoriedade de os motoristas terem formação adequada se deve acrescentar o domínio da língua
portuguesa. Acrescenta-se ainda a preocupação com o cumprimento das normas europeias que relacionam o
menor consumo de combustível com a redução das emissões de gases com efeito de estufa, permitindo a
utilização de veículos com mais de 7 anos, desde que cumpridos certos requisitos. Por outro lado, permite-se a
colocação de publicidade dentro dos veículos, assim como se reduz o valor das coimas, por se considerarem
excessivas.
Assim, nos termos constitucionais e legalmente aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do Chega
apresentam a seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
O presente diploma altera a Lei n.º 45/2018, de 10 de agosto, que aprova o regime jurídico da atividade de
transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados a partir de plataforma
eletrónica.
Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 45/2018, de 10 de agosto
São alterados os artigos 2.º, 10.º, 12.º, 14.º, 15.º, 17.º e 25.º do Decreto-Lei n.º 45/2018, de 10 de agosto,
que passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 2.º
[…]
1 – […]
2 – […]
4 Relatorio TVDE_28.12.2021_Final.pdf (imt-ip.pt) 5 Relatório TVDE_28.12.2021_Final.pdf (imt-ip.pt) 6 parecer_19_gaj_dapp_10fev_imt.pdf (amt-autoridade.pt)
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3 – A prestação de um serviço de TVDE inicia-se com a aceitação, por um motorista ao serviço de um
operador, de um pedido de transporte entre dois pontos submetido por um ou mais utilizadores numa plataforma
eletrónica e termina com o abandono pelo utilizador desse veículo, depois de realizado o transporte para o
destino selecionado, ou por qualquer outra causa que implique a cessação de fruição do veículo pelo utilizador,
devendo o preço refletir o serviço prestado desde a aceitação do transporte.
4 – As empresas que desenvolvam a atividade de transporte em táxi não podem simultaneamente
desenvolver a atividade de operador de TVDE.
5 – O operador de TVDE é o garante da gestão da frota e da legalidade administrativa.
Artigo 10.º
[…]
1 – […]
2 – O motorista de TVDE, que presta serviço ao operador de TVDE, deve preencher, cumulativamente, os
seguintes requisitos:
a) […]
b) Deter certificado de curso de formação rodoviária para motoristas, nos termos dos números seguintes,
assim como dominar a língua portuguesa, pelo menos na vertente oral;
c) […]
d) […]
e) […]
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – […]
7 – […]
8 – […]
9 – […]
10 – […]
11 – […]
12 – […]
Artigo 12.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – […]
4 – Os veículos devem possuir idade inferior a sete anos a contar da data da primeira matrícula, com
exceção:
a) Dos veículos que cumpram as normas EURO mais exigentes em termos do controlo de emissões
poluentes, caso em a idade do veículo não deve ultrapassar os nove anos;
b) Dos veículos elétricos e híbridos, cuja idade não deve ultrapassar os 12 anos.
5 – […]
6 – […]
7 – […]
8 – É permitida a colocação ou exibição de publicidade no interior ou exterior do veículo que efetue TVDE.
9 – […]
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Artigo 14.º
[…]
1 – […]
2 – O operador da plataforma eletrónica deve bloquear o acesso aos serviços prestados pela mesma por
parte dos operadores de TVDE, motoristas ou veículos que incumpram qualquer dos requisitos referidos na
presente lei, sempre que disso tenha ou devesse ter conhecimento, devendo para o efeito notificar os
operadores do bloqueio e da sua justificação com pelo menos 15 dias de antecedência.
3 – […]
Artigo 15.º
[…]
1 – […]
2 – Os valores das tarifas são fixados livremente entre as partes, sem prejuízo do disposto nos números
seguintes, devendo os preços finais cobrir todos os custos associados ao serviço, em harmonia com as melhores
práticas do sector dos transportes, nomeadamente tendo em conta o custo por minuto, o custo do
quilómetro e a circunstância de se tratar ou não de trabalho noturno.
3 – O operador da plataforma eletrónica pode cobrar uma taxa de intermediação, a qual não pode ser superior
a 20 % do valor da viagem calculada nos termos dos números anteriores.
4 – […]
5 – […]
6 – […]
7 – […]
8 – […]
Artigo 17.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – […]
4 – Para efeitos do licenciamento referido no n.º 1, devem ser transmitidos pelo interessado os seguintes
elementos instrutórios:
a) […]
b) […]
c) Sede e morada do estabelecimento fixo de atendimento ao público;
d) […]
e) […]
f) […]
g) […]
h) […]
5 – […]
6 – […]
7 – […]
8 – […]
9 – […]
10 – […]
11 – […]
12 – Os operadores de plataformas eletrónicas são obrigados a enviar para a Autoridade da Mobilidade e
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dos Transportes os contratos que vinculam os direitos e os deveres dos operadores de TVDE.
Artigo 25.º
[…]
1 – […]
2 – São sancionadas com coima de (euro) 1000 a (euro) 3500, no caso de pessoas singulares, ou de (euro)
2500 a (euro) 7500, no caso de pessoas coletivas, as seguintes infrações, praticadas com dolo ou negligência:
a) A prestação de serviços de TVDE fora de plataforma eletrónica ou a rescisão sem justa causa dos
contratos com os operadores de TVDE.
b) […]
c) […]
d) […]
e) […]
f) […]
g) […]
h) […]
i) […]
j) […]
k) […]
l) […]
m) […]
n) […]
o) […]
p) […]
q) […]
r) […]
s) […]
t) […]
u) […]
v) […]
w) […]
x) […]»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação em Diário da República.
Palácio de São Bento, 12 de maio de 2023.
Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel
Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias
— Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.
———
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PROJETO DE LEI N.º 776/XV/1.ª
ALARGA A PROTEÇÃO CONFERIDA PELA PRESTAÇÃO SOCIAL PARA A INCLUSÃO (QUARTA
ALTERAÇÃO AO DECRETO-LEI N.º 126-A/2017, DE 6 DE OUTUBRO)
Exposição de motivos
A Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) no seu artigo 28.º estatui que «os Estados
Parte reconhecem o direito das pessoas com deficiência à proteção social e ao gozo desse direito sem
discriminação com base na deficiência e tomarão as medidas apropriadas para salvaguardar e promover o
exercício deste direito» através de diversas medidas das quais destacamos as que se destinam a:
a) «Assegurar às pessoas com deficiência, em particular às mulheres e raparigas com deficiência e pessoas
idosas com deficiência, o acesso aos programas de proteção social e aos programas de redução da pobreza»;
b) «Assegurar às pessoas com deficiência e às suas famílias que vivam em condições de pobreza, o acesso
ao apoio por parte do Estado para suportar as despesas relacionadas com a sua deficiência, incluindo a
formação, aconselhamento, assistência financeira e cuidados adequados» e, ainda,
c) «Assegurar o acesso igual das pessoas com deficiência a benefícios e programas de aposentação».
A prestação social para a inclusão (PSI), criada pelo Decreto-Lei n.º 126-A/2017, é um instrumento de grande
importância para assegurar o cumprimento destes objetivos. Na verdade, a PSI constitui uma medida que, no
plano conceptual, representa uma mudança de paradigma na proteção social das pessoas com deficiência face
à situação existente, distanciando-se de políticas assistencialistas, uma vez que se funda numa perspetiva de
cidadania, permite a acumulação com rendimentos do trabalho e virá simplificar todo o sistema de proteção
social nesta área.
No entanto, a medida carece de aperfeiçoamento para poder corresponder, de forma cabal, aos objetivos
que pretende alcançar.
O Mecanismo Nacional de Monitorização da Implementação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas
com Deficiência (Me-CDPD) aquando da publicação do diploma que criou a PSI já tinha identificado algumas
questões acerca das quais elaborou recomendações ao Governo, de que destacamos as seguintes:
1 – Tratando-se de uma prestação que tem por objetivo (entre outros) apoiar as pessoas com deficiência ou
incapacidade que se encontram em situação de pobreza, importa estabelecer um valor distinto para a população
com deficiência considerando os custos acrescidos que advêm desta condição;
2 – Não deveriam ser estabelecidas restrições de acesso à nova prestação social de inclusão (PSI), em razão
da idade ou grau de incapacidade atestado, sob pena de se estabelecerem fatores acrescidos de desigualdade;
3 – No caso das pessoas com 60 % a 79 % de incapacidade, a acumulação da totalidade da componente
base deve ser possível com o valor da remuneração mensal mínima garantida (salário mínimo).
O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, na linha das observações do Me-CDPD, identificou um conjunto
de alterações essenciais com vista à sua concretização, que permitem reforçar uma prestação social tão
importante que representou uma viragem histórica na política de proteção social das pessoas com deficiência e
uma oportunidade de melhoria de vida para muitas pessoas. Assim, em primeiro lugar, este projeto de lei alarga
o acesso à PSI a pessoas com deficiência inferior a 60 % que estejam em situação de especial incapacidade ou
deficiência e a quem adquira a deficiência após os 55 anos sem que tal decorra dos processos de
envelhecimento natural. Em segundo lugar, no caso da incapacidade ser igual ou superior a 60 % passam a ser
aplicadas as mesmas regras das pessoas com grau de incapacidade igual ou superior a 80 %, ou seja, a
existência de rendimentos de trabalho não influencia o valor da componente base e, por último, o completamento
terá apenas em conta os rendimentos do próprio titular da prestação, sem que sejam considerados os
rendimentos de referência do agregado familiar.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
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Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro, alterado pela Lei
n.º 114/2017, de 29 de dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 33/2018, de 15 de maio, pelo Decreto-Lei n.º 136/2019,
de 6 de setembro, e pelo Decreto-Lei n.º 11/2021, de 8 de fevereiro, alargando a proteção conferida pela
prestação social para a inclusão.
Artigo 2.º
Alterações aoDecreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro
São alterados os artigos 11.º, 15.º e 19.º do Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro, na sua redação
atual, que passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 11.º
[…]
1 – O rendimento de referência a considerar para o cálculo do complemento é igual à soma dos rendimentos,
previstos no número seguinte, do titular da prestação, definido nos termos do artigo 14.º.
2 – […]
3 – […]
4 – […]
Artigo 15.º
[…]
1 – […]
2 – O reconhecimento do direito à prestação pode abranger, excecionalmente, titulares de um grau de
incapacidade inferior a 60 %, que estejam numa situação de incapacidade e/ou dependência especialmente
gravosa atestada por parecer do INR.
3 – (Anterior n.º 2.)
4 – (Anterior n.º 3.)
5 – (Anterior n.º 4.)
6 – (Anterior n.º 5.)
7 – (Anterior n.º 6.)
8 – (Anterior n.º 7.)
9 – (Anterior n.º 8.)
10 – (Anterior n.º 9.)
11 – (Anterior n.º 10.)
Artigo 19.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – (Revogado.)
4 – (Revogado.)
5 – (Revogado.)
6 – Na situação de o titular da prestação ter um grau de incapacidade igual ou superior a 60 %, o montante
da componente base da prestação é igual ao montante mensualizado do valor de referência anual da
componente base em vigor, independentemente do valor dos seus rendimentos.»
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Artigo 3.º
Norma revogatória
É revogado o disposto no artigo 14.º, n.º 3 do artigo 19.º e os n.os 2, 3, 4 e 5 do artigo 22.º, todos do Decreto-
Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro, na sua redação atual.
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com a publicação da Lei do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.
Assembleia da República, 12 de maio de 2023.
As Deputadas e os Deputados do BE: Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Catarina
Martins — Joana Mortágua.
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PROJETO DE LEI N.º 777/XV/1.ª
PREVENÇÃO DA OCORRÊNCIA DE ACIDENTES DE TRABALHO E DOENÇAS PROFISSIONAIS E
ADAPTAÇÃO DA LEGISLAÇÃO LABORAL AOS FENÓMENOS CLIMÁTICOS EXTREMOS
Exposição de motivos
Portugal é dos países da Europa mais suscetível aos efeitos das alterações climáticas, nomeadamente aos
fenómenos climáticos extremos.
A sujeição permanente a condições de trabalho adversas, como elevadas temperaturas ou golpes de calor,
é suscetível de originar a ocorrência de acidentes de trabalho ou o desenvolvimento de doenças profissionais
ou crónicas.
Recentemente, em Espanha, foram anunciadas alterações legislativas com vista a proibir o trabalho ao ar
livre quando exista alerta vermelho ou laranja decretado pela Agência Espanhola de Meteorologia (AEMET) para
episódios de altas temperaturas, prevendo medidas obrigatórias em matéria laboral e, desta forma, a adoção de
medidas de adaptação às condições climáticas que se registem (elevadas temperaturas e outras condições
climáticas).
A Vice-Presidente do Governo espanhol destacou que já existiram diversos episódios graves de altas
temperaturas que afetaram, por exemplo, trabalhadores da limpeza e defendeu a proibição da realização dessas
atividades em situações de alerta laranja ou vermelho para ondas de calor1. Estas alterações ocorrem um ano
depois de um funcionário da limpeza da Câmara Municipal de Madrid ter morrido devido a insolação causada
por altas temperaturas2. Em 2022, o Instituto de Saúde Carlos III, tutelado pelo Ministério da Saúde, fixou em
360 as mortes atribuíveis às altas temperaturas registadas nos primeiros seis dias da onda de calor que afetou
Espanha e que abrangeu o período de 10 a 15 de julho3. Em Portugal, só em julho de 2022, Portugal registou
um excesso de mortalidade entre 7 e 13 de julho correspondente a 238 óbitos, cujas causas foram atribuídas à
onda de calor que então se verificava4.
A medida acima referida faz parte de um pacote que o governo espanhol irá aprovar, em reação a uma seca
1 El Gobierno prohibirá el trabajo al aire libre durante las olas de calor – Economía nacional e internacional – Cinco Días (elpais.com) 2 Muere un empleado de limpieza del Ayuntamiento de Madrid por un golpe de calor mientras trabajaba – Madrid – El País (elpais.com) 3 Sanidad estima que la ola de calor se cobra ya 360 víctimas mortales – Fortunas – Cinco Días (elpais.com) 4 https://www.dn.pt/sociedade/onda-de-calor-provocou-excesso-de-mortalidade-de-238-obitos--15020502.html.
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prolongada que atinge atualmente algumas regiões de Espanha.5
Tal como Espanha, Portugal enfrenta uma nova crise de seca e episódios de temperaturas elevadas para a
época do ano, os quais se vão sentir cada vez com mais frequência devido à crise climática. No entanto, ainda
que no quadro normativo português existam normas que obrigam os empregadores a zelar pela saúde e
segurança dos seus trabalhadores, não existe nenhuma previsão específica relativa ao trabalho prestado sob
condições de altas temperaturas. Fenómenos que, tal como já referidos, cada vez se farão sentir mais
frequentemente, principalmente para os trabalhadores que desenvolvem a sua atividade profissional no exterior,
como é o caso dos trabalhadores responsáveis pela higiene urbana, trabalhadores da construção civil ou da
agricultura, e que, por essa razão, estão mais vulneráveis a golpes de calor, a acidentes de trabalho ou até
mesmo ao desenvolvimento de doenças profissionais.
As alterações climáticas não são um mero conceito abstrato e afetam as pessoas e a sua qualidade de vida,
por isso, é essencial adaptar a legislação laboral também a esta realidade.
Também no Reino Unido, 39 membros do Governo assinaram uma proposta de lei que visa a proibição do
trabalho em temperaturas superiores a 30 graus centígrados ou a 27 ºC, no caso de trabalhos que envolvam um
maior esforço físico6.
Em Portugal, o Código do Trabalho refere aqueles que são os princípios gerais em matéria de segurança e
saúde no trabalho, no seu artigo 281.º, prevendo que «o trabalhador tem direito a prestar trabalho em condições
de segurança e saúde» e que «o empregador deve assegurar aos trabalhadores condições de segurança e
saúde em todos os aspetos relacionados com o trabalho, aplicando as medidas necessárias tendo em conta
princípios gerais de prevenção».
Em algumas prestações de trabalho específicas, nomeadamente a que ocorre dentro de espaços fechados,
está já estabelecido ser dever do empregador garantir, conforme obriga o Decreto-Lei n.º 243/86, de 20 de
agosto, que aprova o Regulamento Geral de Higiene e Segurança do Trabalho nos Estabelecimentos
Comerciais, «boas condições de temperatura e humidade, de modo a proporcionar bem-estar e defender a
saúde dos trabalhadores» pela climatização do espaço. Contudo, quando a prestação de trabalho é efetuada
ao ar livre esse controlo não é possível fazer de outra forma que não mediante a proibição de prestar o trabalho
naquele momento, se não existir a possibilidade de o realizar no interior, só assim se garantindo a saúde e a
segurança do trabalhador.
Por tal, o PAN pretende que seja interditada a prestação de trabalho que envolva a exposição do trabalhador
aos agentes climáticos extremos, nomeadamente a temperaturas iguais ou superiores a 35 ºC, por mais de duas
horas, excecionando os profissionais de salvamento e socorro para quem se aplicará legislação especial.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada
Deputada do Pessoas-Animais-Natureza apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
1 – A presente lei limita a prestação de trabalho que envolva a exposição do trabalhador aos fenómenos
climáticos extremos, nomeadamente a altas temperaturas, adaptando a legislação laboral às alterações
climáticas, garantindo a saúde e segurança dos trabalhadores e prevenindo a ocorrência de acidentes de
trabalho e doenças profissionais.
2 – A presente lei procede, para o efeito do previsto no número anterior:
a) À alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro; e
b) À alteração à Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, que aprova o regime jurídico da promoção da
segurança e saúde no trabalho.
5 Seca asfixia Espanha: «É preciso converter a Andaluzia no Silicon Valley da Europa» – Espanha – Público (publico.pt) 6 Heatwave: When is it too hot to work? – BBC News.
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Artigo 2.º
Alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro
«Artigo 281.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – […]
7 – É condicionada, em legislação especial, a prestação de trabalho que envolva a exposição do trabalhador
aos fenómenos climáticos extremos.
8 – (Anterior n.º 7.)»
Artigo 3.º
Alteração à Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, que aprova Regime Jurídico da Promoção da
Segurança e Saúde no Trabalho
É alterado o artigo 48.º, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 48.º
[…]
1 – […]
2 – É limitada a prestação de trabalho por período de tempo superior a duas horas que envolva a exposição
do trabalhador no exterior a temperaturas iguais ou superiores a 35 ºC, com exceção das atividades de resgate
e salvamento ou outras previstas em legislação especial.»
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.
Palácio de São Bento, 12 de maio de 2023.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
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PROJETO DE LEI N.º 778/XV/1.ª
ASSEGURA O CUMPRIMENTO DA CONVENÇÃO DE ISTAMBUL REFORÇANDO A PROTEÇÃO DAS
VÍTIMAS EM CASO DE ASSÉDIO SEXUAL
Exposição de motivos
A Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a
Violência Doméstica, também conhecida por Convenção de Istambul, ocorrida em 2011, visa a proteção das
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mulheres e raparigas nomeadamente através de um quadro jurídico abrangente que contém várias medidas e
respostas que os Estados devem adotar, justamente na proteção e prevenção de violência e abusos contra
vítimas do sexo feminino e da criminalização de agressores.
Segundo o artigo 40.º da dita Convenção, cuja epígrafe é «Assédio Sexual», «As partes deverão adotar as
medidas legislativas ou outras que se revelem necessárias para assegurar que qualquer tipo de comportamento
indesejado de natureza sexual, sob forma verbal, não verbal ou física, com o intuito ou efeito de violar a dignidade
de uma pessoa, em particular quando cria um ambiente intimidante, hostil, degradante, humilhante ou ofensivo,
seja passível de sanções penais ou outras sanções legais».
Contudo, e ainda que Portugal tenha ratificado o texto da Convenção em 2013, é por demais evidente que,
em matéria de prevenção e proteção das vítimas em caso de assédio, o nosso País continua muito aquém de
medidas legislativas cabais e eficazes, podendo-se assim considerar que Portugal não cumpre na íntegra a
Convenção de Istambul.
Há quem defenda que se deve proceder à criação de um tipo incriminador específico denominado justamente
«assédio sexual»; outros consideram que tais condutas já são punidas através de outros tipos legais de crime
ou sanções de outra natureza.
Em 2015 esta discussão foi trazida a Plenário, tendo dado origem à aprovação da Lei n.º 83/2015, de 5 de
agosto, que alterou o artigo 170.º do Código Penal, com a epígrafe «importunação sexual» e passou a prever
que «Quem importunar outra pessoa, praticando perante ela atos de carácter exibicionista, formulando
propostas de teor sexual ou constrangendo-a a contacto de natureza sexual, é punido com pena de prisão até
1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave não couber por força de outra disposição legal».
Ora, tendo em conta a redação do artigo anterior à alteração, fica verificado que o legislador introduziu ao
elenco das condutas mencionadas na norma a formulação de propostas de teor sexual.
É fundamental termos em conta que a maioria dos casos de assédio sexual ocorre contra mulheres e
raparigas menores, sendo que estas últimas têm menor capacidade para lidar ou mesmo fazer frente a tais
abusos.
Segundo um estudo realizado pela Fundação Manuel dos Santos e divulgado em 2019, «As mulheres em
Portugal, hoje – Quem são, o que pensam e o que sentem»1, 16 % das mulheres inquiridas afirmaram ter sido
vítimas de assédio sexual, sendo que se destacam as situações de «insinuações sexuais/atenção sexual não
desejada» (piadas ou comentários ofensivos sobre o corpo/aspeto; olhares insinuantes ofensivos; propostas
indesejadas de carácter sexual, etc.) e «contacto físico não desejado» (tocar, apalpar, beijar, etc.).
Por outro lado, para além do contexto laboral, os casos de assédio em contexto escolar e universitário têm
aumentado, com casos a surgirem e a abrirem uma «caixa de Pandora» que pode demonstrar uma dramática
realidade. O mais recente caso a trazer o assunto tabu à colação, é o de Boaventura de Sousa Santos2. Após
este caso ter sido tornado público, foram várias as denúncias, demonstrando que a realidade é ainda
desconhecida. A Ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior afirmou recentemente que nos últimos 5
anos foram realizadas 38 queixas de assédio sexual, das quais apenas quatro foram sancionadas. Contudo, os
números da ministra não coincidem com o que é afirmado por diversas instituições de ensino superior, em que
por exemplo, apenas 19 instituições relataram mais de 150 casos3.
Como agravante, Portugal é ao dia de hoje um País cujas políticas de imigração são de total desregulação e
descontrolo, com aumentos exponenciais de comunidades de países cujas culturas civilizacionais são
totalmente díspares à ocidental, em que se observa o papel da mulher menorizado a um nível que talvez nem
nos antípodas da nossa civilização tenha ocorrido.
Mais do que nunca, por questões de justiça, de segurança e dignidade das mulheres, é imperativo
salvaguardar que a nossa sociedade não compactue com comportamentos que extravasam por completo o mero
flirt ou namorico. Trata-se sim de criminalizar condutas grotescas, humilhantes e atentórias à liberdade de cada
pessoa, independentemente do sexo, nomeadamente em contexto laboral, escolar, universitário, tal como no
próprio assédio de rua. A mulher deve ter a liberdade de gozar a sua feminilidade, tal como um homem a
liberdade para a apreciar. Contudo, qualquer tipo de linguagem, expressões, propostas ou ações grosseiras que
1 https://www.ffms.pt/sites/default/files/2022-04/as-mulheres-em-portugal-hoje.pdf. 2 https://www.dn.pt/sociedade/todas-sabemos-boaventura-sousa-santos-entre-os-acusados-de-assedio-no-cesuniversidade-de-coimbra--1 6160057.html 3 https://www.dn.pt/sociedade/universidades-e-politecnicos-receberam-mais-de-uma-centena-de-queixas-num-ano-16224305.html.
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coloquem em causa a intimidade de cada um deve ser punida.
Assim, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentalmente aplicáveis, os Deputados do Chega
apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à alteração do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março,
na sua redação atual, reforçando a proteção das vítimas em caso de importunação sexual.
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março
São alterados os artigos 170.º e 177.º do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, que aprova o Código Penal,
alterado pela Lei n.º 90/97, de 30 de julho, Lei n.º 65/98, de 2 de setembro, Lei n.º 7/2000, de 27 de maio, Lei
n.º 77/2001, de 13 de julho, Lei n.º 97/2001, de 25 de agosto, Lei n.º 98/2001, de 25 de agosto, Lei n.º 99/2001,
de 25 de agosto, Lei n.º 100/2001, de 25 de agosto, Lei n.º 108/2001, de 28 de novembro, Decreto-Lei n.º
323/2001, de 17 de dezembro, Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de março, Lei n.º 52/2003, de 22 de agosto, Lei n.º
100/2003, de 15 de novembro, Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, Lei n.º 11/2004, de 27 de março, Lei
n.º 31/2004, de 22 de julho, Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, Lei n.º 16/2007, de 17 de abril, Lei n.º 59/2007,
de 4 de setembro, Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro, Lei n.º 40/2010, de 3 de setembro, Lei n.º 32/2010, de 2
de setembro, Lei n.º 4/2011, de 16 de fevereiro, Lei n.º 56/2011, de 15 de novembro, Lei n.º 19/2013, de 21 de
fevereiro, Lei n.º 60/2013, de 23 de agosto, Lei Orgânica n.º 2/2014, de 6 de agosto, Lei n.º 59/2014, de 26 de
agosto, Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, Lei n.º 82/2014, de 30 de dezembro, Lei Orgânica n.º 1/2015, de 8 de
janeiro, Lei n.º 30/2015, de 22 de abril, Lei n.º 81/2015, de 3 de agosto, Lei n.º 83/2015, de 5 de agosto, Lei n.º
103/2015, de 24 de agosto, Lei n.º 110/2015, de 26 de agosto, Lei n.º 39/2016, de 19 de dezembro, Lei n.º
8/2017, de 3 de março, Lei n.º 30/2017, de 30 de maio, Lei n.º 83/2017, de 18 de agosto, Lei n.º 94/2017, de 23
de agosto, Lei n.º 16/2018, de 27 de março, Lei n.º 44/2018, de 9 de agosto, Lei n.º 101/2019, de 6 de setembro,
Lei n.º 102/2019, de 6 de setembro, Lei n.º 39/2020, de 18 de agosto, Lei n.º 40/2020, de 18 de agosto, e pela
Lei n.º 58/2020, de 31 de agosto, Lei n.º 57/2021, de 16 de agosto, Lei n.º 79/2021, de 24 de novembro, e Lei
n.º 94/2021, de 21 de dezembro, os quais passam ter a seguinte redação:
«Artigo 170.º
[…]
Quem importunar outra pessoa, praticando perante ela atos de carácter exibicionista, formulando propostas
de teor sexual ou constrangendo-a a contacto de natureza sexual, é punido com pena de prisão até 2 anos ou
com pena de multa até 240 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.
Artigo 177.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – […]
4 – As penas previstas nos artigos 163.º a 168.º e 170.º a 175.º, nos n.os 1 e 2 do artigo 176.º e no artigo
176.º-A são agravadas de um terço, nos seus limites mínimo e máximo, se o crime for cometido conjuntamente
por duas ou mais pessoas.
5 – […]
6 – As penas previstas nos artigos 163.º a 165.º, 168.º, 170.º, 174.º, 175.º e no n.º 1 do artigo 176.º são
agravadas de um terço, nos seus limites mínimo e máximo, quando os crimes forem praticados na presença ou
contra vítima menor de 16 anos;
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7 – As penas previstas nos artigos 163.º a 165.º, 168.º, 170.º e 175.º e no n.º 1 do artigo 176.º são agravadas
de metade, nos seus limites mínimo e máximo, se a vítima for menor de 14 anos.
8 – A pena prevista no artigo 170.º é agravada de um terço, nos seus limites mínimo e máximo, se o crime
for cometido em ambiente laboral, escolar ou universitário.
9 – (Anterior n.º 8.)»
Artigo 3.º
Entrada em Vigor
A presente lei entra em vigor no prazo de 30 dias a contar da sua publicação.
Palácio de São Bento, 12 de maio de 2023.
Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel
Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias
— Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.
———
PROJETO DE LEI N.º 779/XV/1.ª
ALTERA AS REGRAS DE ATRIBUIÇÃO DA PRESTAÇÃO SOCIAL PARA A INCLUSÃO NOS CASOS
EM QUE DEPENDE AINDA DE OBTENÇÃO DE ATESTADO DE INCAPACIDADE MULTIUSO E ADMITE A
ACUMULAÇÃO DAQUELA COM A PENSÃO SOCIAL DE VELHICE
Exposição de motivos
Já passaram quase 6 anos desde que o Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro, criou a prestação social
para a inclusão (PSI), no âmbito da inclusão das pessoas com deficiência. Foi ela apresentada como «uma das
prioridades da ação governativa» e «corolário de uma sociedade que se quer mais justa, mais solidária, que
respeita a diversidade e a encara como um fator de riqueza e de progresso», conforme se pode ler no preâmbulo
do diploma. Reconhecendo-se a importância de tal mecanismo de apoio, é chegado o tempo de retirar
conclusões a partir do tempo que já leva de vigência, aproveitando-as para o melhorar.
Lembra-se que à recomendação feita em março de 2020 pela Provedora de Justiça à Ministra do Trabalho,
Solidariedade e Segurança Social1, na sequência da soma de queixas recebidas sobre a matéria, se seguiu uma
outra, já em 2023, manifestando as mesmas preocupações, verificada a ineficácia da prestação «desde logo em
resultado da dilação que ainda se verifica na emissão dos atestados médicos de incapacidade multiusos
(AMIM)». Uma vez mais, recomenda aquele órgão ao Governo que o pagamento da PSI seja devido desde a
data da apresentação dos requerimentos para certificação da deficiência por junta médica ou de recurso da sua
decisão2, assim não penalizando ainda mais quem é merecedor de proteção, por conta de razões heterónomas,
como acontece com estes atrasos, que começam a parecer épicos na sua dimensão. E mais: promovendo a
coerência – e a justiça – do regime, que regista uma fundamental diferença entre quem já dispõe e quem ainda
não dispõe de um atestado médico de incapacidade multiuso. De facto, é não só inaceitável como também
incompreensível que as pessoas com deficiência que estejam a aguardar junta médica que a certifique, por
atrasos do sistema que de si não dependem, apenas vejam o seu direito reconhecido depois de aquela estar
certificada. O que delas não depende não pode, enfim, estar a onerá-las.
1 Recomendação n.º 2/B/2020, disponível em Deficiência/Incapacidade. Prestação Social de Inclusão. Problemas vários no acesso. (2/B/2020) – Provedoria de Justiça (provedor-jus.pt) 2 Recomendação n.º 2/B/2023, disponível em Prestação Social para a Inclusão. Provedora de Justiça renova apelo ao Governo para assegurar o pagamento tempestivo às pessoas incapacitadas ou com deficiência – Provedoria de Justiça (provedor-jus.pt)
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Entende ainda o Livre que esta é uma oportunidade para introduzir justiça no sistema ao incluir nele a
possibilidade de cumulação da prestação social para a inclusão com a pensão social de velhice. Visando a
primeira prosseguir justiça social, não se vê a que título e com que fundamento não é ela cumulável com a
pensão social de velhice, que é também um importante mecanismo de justiça social que se dirige, além do mais,
a uma população economicamente vulnerável.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre apresenta o
seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à alteração do Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro, na sua redação atual.
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro
São alterados os artigos 23.º e 29.º, ambos do Decreto-Lei n.º 126-A/2017, de 6 de outubro, na sua redação
atual, que passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 23.º
[...]
1 – [...]
2 – [...]
3 – [...]
4 – [...]
5 – Nas situações em que o titular junta comprovativo do pedido de certificação da deficiência, o deferimento
fica dependente da apresentação do original do atestado médico de incapacidade multiuso, sendo a prestação
devida a partir do mês da apresentação do pedido de certificação devidamente instruído, nos termos do
n.º 2.
6 – Nas situações em que o grau de incapacidade igual ou superior a 60 % tenha resultado de junta médica
de recurso, a prestação é devida a partir do mês da apresentação do requerimento de interposição do
recurso devidamente instruído, nos termos do n.º 2.»
«Artigo 29.º
[...]
A prestação pode acumular com as seguintes prestações, sem prejuízo da aplicação das regras de atribuição
de cada uma das componentes da prestação:
a) [...]
b) [...]
c) [...]
d) [...]
e) [...]
f) [...]
g) [...]
h) [...]
i) [...]
j) [...]
k) [...]
l) [...]
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58
m) [...]
n) [...]
o) Pensão social de velhice.»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor na data de entrada em vigor do Orçamento do Estado subsequente à sua
publicação.
Assembleia da República, 12 de maio de 2023.
O Deputado do L, Rui Tavares.
———
PROJETO DE LEI N.º 780/XV/1.ª
PREVÊ A CRIMINALIZAÇÃO DA CIBERVIOLÊNCIA
Exposição de motivos
O acesso generalizado à internet potenciou um conjunto alargado de condutas criminosas em linha, tendo
algumas formas de cibercriminalidade já sido vertidas para o Código Penal e objeto de legislação específica, a
nível nacional e europeu.
Um destes fenómenos, que apesar de socialmente reconhecido não encontra ainda consagração legal
expressa, é o da ciberviolência que pode ser definido como qualquer forma de violência exercida em linha, como
a perseguição, intimidação ou assédio online.
A ciberviolência, apesar de poder ser direcionada a qualquer pessoa, é uma forma de violência com base no
género, uma vez que a investigação disponível revela que afeta desproporcionalmente mulheres e raparigas,
bem como grupos de pessoas pertencentes a comunidades específicas. Em 2018, a relatora especial das
Nações Unidas sobre violência contra as mulheres publicou um estudo1 revelando que as mulheres jovens e
raparigas estão especialmente expostas à ciberviolência, considerando que pelo menos 12,5 % das situações
de intimidação em contexto escolar acontecem através de tecnologias da informação e da comunicação. No
mesmo sentido apontam os resultados do estudo do Serviço de Estudos do Parlamento Europeu intitulado
Combating Gender based Violence: Cyber Violence – European added value assessment2 que estima que entre
4 a 7 % das mulheres na União Europeia tenham sido vítimas de assédio online e entre 1 e 3% foram vítimas
de perseguição online e que os custos globais de combate a estes cibercrimes se situem entre os 49 e os 89,3
mil milhões de euros.
Já em 2021, o Parlamento Europeu adotou uma resolução com recomendações à Comissão Europeia sobre
o combate à ciberviolência3, enquadrando-a também no quadro da violência com base no género e explicitando
ainda que «algumas mulheres e pessoas LGBTIQ, como as feministas e ativistas LGBTIQ, as artistas, as
mulheres que ocupam cargos políticos e públicos, as jornalistas, as bloguistas, as defensoras dos direitos
humanos e outras figuras públicas, são particularmente afetadas pela ciberviolência de género, o que, para além
de lhes causar danos à reputação, danos psicológicos e sofrimento, também pode dar origem a perturbações
1 A/HRC/38/47: Report of the Special Rapporteur on violence against women, its causes and consequences on online violence against women and girls from a human rights perspective – OHCHR 2 Apenas disponível em inglês: CombatingGenderbasedViolence: CyberViolence – ThinkTank – EuropeanParliament (europa.eu) 3 Textos aprovados – Combate à violência com base no género: Ciberviolência – Terça-feira, 14 de dezembro de 2021 (europa.eu)
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nas condições de vida da vítima, a invasões da privacidade e a danos nas relações pessoais e na vida familiar
que as dissuadem de participar dignamente na vida política, social, económica e cultural. Mais recentemente, a
Comissão Europeia apresentou uma proposta de diretiva4 para combater a violência contra mulheres e a
violência doméstica e que pretende criminalizar a ciberviolência, nomeadamente a ciberperseguição; O
ciberassédio; e o ciberincitamento à violência ou ao ódio.
Igualmente relevantes para a pertinência da presente iniciativa legislativa são quer a recomendação expressa
do Comité das Nações Unidas para a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra as Mulheres para que
Portugal altere o seu Código Penal e defina todas as formas de violência com base no género, incluindo a
ciberviolência [parágrafo 23. a)]5, quer a igual recomendação do parecer sobre a violência doméstica6 aprovado
por unanimidade pelo Conselho Económico e Social no passado dia 3 de março.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre apresenta o
seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei prevê a criminalização da ciberviolência, procedendo, para o efeito, à alteração do Código
Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, revisto e republicado pelo Decreto-Lei
n.º 48/95, de 15 de março.
Artigo 2.º
Aditamento ao Código Penal
É aditado o Capítulo IX ao Título I do Livro II e o artigo 201.º-A ao Código Penal, com a seguinte redação:
«CAPÍTULO IX
Dos cibercrimes
Artigo 201.º-A
Ciberviolência
1 – Quem adotar, de forma reiterada, comportamentos de ameaça ou coação, através de tecnologias da
informação e da comunicação, contra pessoa ou grupo de pessoas fazendo-a, justificadamente, temer pela sua
segurança ou das pessoas a seu cargo, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa, se pena
mais grave não lhe couber por força de outra disposição legal.
2 – Quem praticar as condutas descritas no número anterior, disponibilizando a uma multiplicidade de
utilizadores finais, através de tecnologias da informação e da comunicação, material ameaçador ou insultuoso,
com o efeito de causar danos morais significativos à vítima, é punido com pena de prisão até 5 anos, se pena
mais grave não lhe couber por força de outra disposição legal.
3 – As condutas previstas nos números anteriores são agravadas de metade, nos seus limites mínimos e
máximos, quando praticadas contra vítima menor, contra pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça,
cor, origem étnica ou nacional, ascendência, religião, sexo, orientação sexual, identidade de género ou
deficiência física ou psíquica.
4 – As penas previstas nos artigos 153.º, 154.º-A, 163.º, 167.º, 170.º, 171.º a 176.º-A, 180.º e 181.º são
agravadas de um terço, nos seus limites mínimos e máximos, quando os crimes forem praticados ou publicitados
através de tecnologias da informação e da comunicação.»
4 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:52022PC0105 5 N2242081.pdf (ecoi.net) 6 Parecer-VD-Aprovado-em-plenario-3-marco.pdf (ces.pt)
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Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.
Assembleia da República, 12 de maio de 2023.
O Deputado do L, Rui Tavares.
———
PROJETO DE LEI N.º 781/XV/1.ª
CRIA AS RESPOSTAS DE APOIO PSICOLÓGICO PARA VÍTIMAS DE ASSÉDIO E VIOLÊNCIA
SEXUAL NO ENSINO SUPERIOR E ALARGA O ÂMBITO DE APLICAÇÃO DOS CÓDIGOS DE BOA
CONDUTA PARA A PREVENÇÃO E COMBATE AO ASSÉDIO A TODOS OS MEMBROS DA
COMUNIDADE ACADÉMICA
Exposição de motivos
No passado mês de abril, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior divulgou que um inquérito
às instituições do ensino superior revelou a existência de 38 queixas de assédio sexual, nos últimos cinco anos,
que deram origem a 31 processos disciplinares, dos quais apenas resultaram quatro sanções (tendo os restantes
sido arquivados ou estando as investigações ainda em curso)1. Já a Agência Lusa noticiou que lhes foi
comunicado, por 19 instituições do ensino superior, 154 queixas de assédio sexual e moral, discriminação ou
violência, estando a sua maioria concentradas em três instituições específicas: Universidade de Lisboa (60),
Universidade de Coimbra (36) e a Universidade do Porto (19)2.
O assédio no ensino superior não é, infelizmente, um fenómeno recente nem nacional, pelo que é importante
que se criem respostas que envolvam toda a comunidade académica e que promovam uma mudança de cultura
e de hábitos de socialização e que protejam as vítimas de todas as formas de assédio e de violência sexual.
Neste sentido, a Ministra Elvira Fortunato divulgou em 2022 uma carta aberta3 às instituições do ensino superior
apelando a que:
«a) Adotem códigos de conduta e boas práticas visando a prevenção e combate ao assédio moral e sexual
em contexto académico, quer entre docentes, funcionários e estudantes, quer entre pares;
b) Facilitem canais para apresentação de denúncias de assédio, com mecanismos ágeis de avaliação
imparcial que permitam tramitar adequadamente as situações em causa;
c) Desenvolvam os procedimentos disciplinares que se revelem necessários em função da veracidade e
gravidade das situações;
d) Promovam iniciativas de sensibilização junto dos estudantes, docentes, investigadores e demais
funcionários, garantindo que as instituições continuem a ser espaços de liberdade, incompatíveis com situações
de assédio moral e sexual».
Mais, e no seguimento de novas denúncias de assédio, o Governo anunciou4 a criação de um grupo de
trabalho interministerial, juntando o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, o Ministério da
Educação, o Ministério Adjunto e dos Assuntos Parlamentares e o Ministério do Trabalho, Solidariedade e
1 Inquérito do Ministério revelou 38 queixas de assédio sexual nas universidades – Observador 2 Mais de uma centena de queixas de assédio recebidas por universidades – Ensino superior – Público (publico.pt) 3 ficheiro.aspx (portugal.gov.pt) 4 Governo cria grupo para combater assédio no ensino superior (sapo.pt)
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Segurança Social, para desenvolver ações pedagógicas junto das instituições do ensino superior para
prevenção e combate ao assédio.
Em analogia, dados recentes de um inquérito da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima5 sobre a perceção
da população sobre assédio sexual no local de trabalho revelaram que 18 % da amostra afirmou ter sido vítima
de pelo menos uma situação de assédio sexual no local de trabalho. A maioria das vítimas são mulheres e a
pessoa agressora é, regra geral (55 %), um superior hierárquico. Na maioria dos casos não há formalização de
denúncia, tendo sido apresentadas diversas razões, como a dificuldade em fazer prova do assédio, vergonha,
receio de desvalorização e receio de represálias.
Respostas de apoio à vítima são fundamentais e devem estar direcionadas ao impacto que o assédio, de
qualquer ordem, e a violência sexual tem nas suas vidas. Foi esta, aliás, a prioridade apresentada pelo Conselho
de Reitores das Universidades Portuguesas6 em resposta às recentes denúncias públicas de assédio e violência
sexual no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra.
Neste sentido, entende o Livre que é possível adaptar as respostas de apoio psicológico (RAP) para crianças
e jovens vítimas de violência doméstica, que existem no âmbito da Rede Nacional de Apoio a Vítimas de
Violência Doméstica, como mecanismo de apoio às vítimas de assédio e violência sexual no ensino superior,
devendo a sua criação ser uma obrigação do Estado e não sujeitas à discricionariedade de cada instituição do
ensino superior.
Estas RAP que propomos criar são respostas de atendimento, acompanhamento e apoio psicológico
especializado a vítimas de assédio e violência social, disponibilizadas a todos os membros da comunidade
académica, que emergem do reconhecimento do impacto nefasto do assédio e violência sexual no bem-estar
físico, emocional e psicológico das vítimas e que cujo trabalho de intervenção no ensino superior promoverá,
naturalmente, uma cultura de proteção e de salvaguarda da igualdade e não discriminação no meio académico,
contribuindo inclusivamente para melhores práticas de profissionais e futuros profissionais.
Para uma abordagem holística ao combate ao assédio e violência sexual no ensino superior, o Livre propõe
também que os Códigos de Boa Conduta para a Prevenção e Combate ao Assédio no Trabalho, criados pela
Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, tenham não só um âmbito de aplicação alargado, não estando os seus
destinatários constritos à existência de um determinado vínculo jurídico com a respetiva instituição do ensino
superior, como também sejam adaptados para incluir estudantes e demais membros da comunidade académica.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre apresenta o
seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei cria respostas de apoio psicológico para vítimas de assédio e violência sexual no ensino
superior e alarga o âmbito de aplicação dos Códigos de Boa Conduta para a Prevenção e Combate ao Assédio
no Trabalho das instituições de ensino superior a todos os membros da comunidade académica.
Artigo 2.º
Respostas de apoio psicológico para vítimas de assédio e violência sexual no ensino superior
1 – As respostas de apoio psicológico (RAP) para vítimas de assédio e violência sexual no ensino superior
correspondem a serviços de apoio psicológico e psicoterapêutico, com recurso a metodologias de intervenção
individual ou em grupo e baseadas em abordagens especializadas, como abordagens psicoterapêuticas em
trauma, de terapia afirmativa, ou cognitivo-comportamental.
2 – Cada instituição do ensino superior tem a sua respetiva RAP para vítimas de assédio e violência sexual
e os seus serviços de atendimento, acompanhamento e apoio são disponibilizados a todos os membros da
comunidade académica.
3 – AS RAP são objeto de protocolo de colaboração entre a Comissão para a Cidadania e a Igualdade de
Género, a Ordem dos Psicólogos Portugueses e as respetivas instituições de ensino superior.
4 – Para além dos serviços direcionados às vítimas, as RAP poderão estabelecer protocolos com outras
5 Barómetro APAV 24012022 6 Assédio sexual: reitores defendem apoio às vítimas e investigação dos casos «doa a quem doer» – Observador
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entidades para dinamização de ações de informação e sensibilização junto da comunidade académica.
Artigo 3.º
Regulamentação
O Governo procederá, mediante auscultação prévia das relevantes entidades com trabalho nesta área,
incluindo a Ordem dos Psicólogos Portugueses, à regulamentação das RAP para vítimas de assédio e violência
sexual no ensino superior no prazo de 120 dias.
Artigo 4.º
Códigos de Boa Conduta para a Prevenção e Combate ao Assédio
As instituições do ensino superior alargam explicitamente o âmbito de aplicação e procedem às necessárias
adaptações, dos respetivos Códigos de Boa Conduta para a Prevenção e Combate ao Assédio no Trabalho,
previstos na Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, a todas as pessoas trabalhadoras, independentemente do vínculo
jurídico que detenham, bem como a professores e oradores convidados da instituição, estudantes e demais
membros da comunidade académica.
Artigo 5.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor na data de entrada em vigor do Orçamento do Estado subsequente à sua
publicação.
Assembleia da República, 12 de maio de 2023.
O Deputado do L, Rui Tavares.
———
PROJETO DE LEI N.º 782/XV/1.ª
ALTERA AS TAXAS APLICÁVEIS AO REGIME DA CONTRIBUIÇÃO SOBRE O SETOR BANCÁRIO
Exposição de motivos
A transformação de um modelo económico que alia a financeirização às desigualdades e à destruição
ambiental requer o controlo democrático do sistema financeiro. Para isso, a propriedade pública é condição
essencial, mas não suficiente. Ao controlo acionista dos bancos devem corresponder uma estratégia económica
clara para o desenvolvimento do país e uma gestão profissional, limpa e transparente.
A fragilidade do atual modelo ficou exposta com a crise e a derrocada de todos os grandes negócios
alavancados em dívida no pressuposto de uma eterna valorização dos ativos financeiros. Para além da
destruição de tecido empresarial das PME, muito dependente da procura interna atacada pela austeridade, os
bancos foram obrigados a registar nos seus balanços milhares de milhões de euros de perdas associadas a
créditos especulativos. As imparidades foram, em parte, pagas com fundos públicos. Depois de várias
transferências a fundo perdido no BPN, BPP e no Banif, o sistema bancário foi financiado pelo Fundo de
Resolução, que, por sua vez, foi financiado pelo Estado, direta e indiretamente (além do contributo da CGD, as
contribuições obrigatórias das outras instituições bancárias são receitas do Estado).
Desde 2008, o Estado colocou-se assim numa situação de financiador de última instância do capital dos
bancos, tendo, no entanto, abdicado dos seus direitos de gestão e propriedade.
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A contribuição sobre o setor bancário (CSB) foi criada pela Lei do Orçamento do Estado de 2011 para fazer
face à crise financeira. Esta contribuição tinha como objetivos desmotivar comportamentos de risco nos
mercados financeiros, por um lado, mas, também, uma preocupação redistributiva, chamando o setor a contribuir
para o equilíbrio das contas públicas.
O Fundo de Resolução (FdR), criado em 2012, tinha como missão prestar apoio financeiro a futuras medidas
de resolução que viessem a ser aplicadas pelo Banco de Portugal. O seu financiamento foi, desde início,
garantido pela criação de uma contribuição periódica sobre o setor bancário, assim como pela consignação da
receita da contribuição extraordinária sobre o setor bancário.
Ambas as contribuições, suportadas pelas instituições financeiras em Portugal, constituem receita do Estado.
Em particular, a contribuição extraordinária sobre o setor bancário tem natureza de receita tributária, apesar de
ser depois direcionada para o Fundo de Resolução. Por outro lado, uma vez que o Fundo de Resolução integra
o perímetro das administrações públicas, as operações de injeção de capital nos bancos pelo Fundo de
Resolução são relevadas para efeitos de apuramento do saldo das AP.
Segundo o relatório de contas do FdR, o ano de 2021 é o primeiro ano em que se observa uma melhoria na
situação líquida do Fundo de Resolução desde 2015, o ano que marca o início do período em que a situação
patrimonial do Fundo de Resolução foi penalizada pelo reconhecimento dos efeitos financeiros decorrentes da
aplicação de medidas de resolução ao BES e ao Banif.
Note-se que a situação financeira do FdR em 2021 só foi possível porque o FdR contestou o pedido do Novo
Banco para o pagamento de uma tranche de 209 milhões de euros, ao abrigo da garantia concedida pelo
Governo do Partido Socialista aquando da venda do banco. Esta recusa, assim como o facto de o Novo Banco
ter regressado aos lucros depois de esgotada a garantia pública, demonstram como esta foi utilizada e gerida
de forma abusiva pela instituição detida pelo fundo Lone Star. Foi esta a motivação das propostas do Bloco de
Esquerda, sempre rejeitadas, para que cessassem os pagamentos do Estado ao Novo Banco. Ao contrário dos
lucros do banco privado, a situação patrimonial do fundo é ainda muito deficitária e, no pior dos cenários, só em
2062 toda a dívida perante os contribuintes será saldada.
Em suma, o Fundo de Resolução constituiu-se como um mecanismo indireto de intervenção do Estado na
banca. As suas necessidades de financiamento são, na realidade, necessidades de financiamento do Estado.
Para credibilizar a narrativa de que a banca um dia pagará este empréstimo, a contribuição sobre o setor
bancário – que é receita geral do Estado – é desviada para o Fundo de Resolução. Sem esta, o capital em dívida
nunca seria pago dentro do prazo estabelecido.
Tendo em consideração os lucros apresentados pelo setor bancário, fruto do aumento das taxas de juro que
tanto têm penalizado quem tem um crédito à habitação recente, é justo que se atualizem as contribuições sobre
o setor bancário. O aumento da receita do FdR permitirá que este salde a sua dívida com o Estado de forma
antecipada, contribuindo positivamente para as contas públicas.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à alteração da Contribuição sobre o sector bancário aprovado pela Lei n.º 55-A/2010,
de 31 de dezembro, alterada pelas Leis n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, 82-B/2014, de 31 de dezembro, e
7-A/2016, de 30 de março.
Artigo 2.º
Alteração ao regime da contribuição sobre o setor bancário
O artigo 4.º do regime que cria a contribuição sobre o setor bancário, aprovado pelo artigo 141.º da Lei n.º 55-
A/2010, de 31 de dezembro, passa a ter a seguinte redação:
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«Artigo 4.º
Taxa
1 – A taxa aplicável à base de incidência definida pela alínea a) do artigo anterior varia entre 0,03 % e 0,4 %
em função do valor apurado.
2 – A taxa aplicável à base de incidência definida pela alínea b) do artigo anterior varia entre 0,0003 % e
0,002 % em função do valor apurado.»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com a aprovação do Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.
Assembleia da República, 12 de maio de 2023.
As Deputadas e os Deputados do BE: Mariana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Catarina Martins — Isabel
Pires — Joana Mortágua.
———
PROJETO DE LEI N.º 783/XV/1.ª
REFORÇA A PROMOÇÃO DA AUTODETERMINAÇÃO DE GÉNERO, PROCEDENDO À ALTERAÇÃO
DA LEI N.º 38/2018, DE 7 DE AGOSTO, E DO DECRETO-LEI N.º 131/95, DE 6 DE JUNHO
Exposição de motivos
A expansão dos direitos das pessoas transgénero e do reconhecimento à autodeterminação da identidade e
expressão de género tem levado a uma maior compreensão do género como um espectro amplo, perante o qual
um sistema de classificação binário homem/mulher se torna cada vez mais limitativo e opressor. Por outro lado,
a identificação não-binária surge também, crescentemente, como uma declaração existencial contra o modo
como a sociedade conforma o que é «ser homem» e «ser mulher». O sistema de classificação binário nasce do
mesmo preconceito patriarcal que atribui a cada pessoa, desde o nascimento, um papel de género
(masculino/feminino) assente na hierarquia e na divisão sexual. Historicamente, a rigidez da classificação
binária, com a sua estrutura de poder e divisão de papéis, foi também uma imposição colonial europeia a culturas
que reconheciam mais de dois géneros ou que não atribuíam a essa classificação a mesma relevância ou função
em estruturas de poder e dominação.
O questionamento da divisão do mundo em dois géneros rigidamente definidos tem sido cada vez maior. O
estudo europeu «Trans Rights» envolveu cinco países (Portugal, França, Reino Unido, Países Baixos e Suécia)
e concluiu que mais de 40 % dos entrevistados (na comunidade LGBTQI+) definiam o seu género como estando
para lá do binário feminino/masculino. Nos EUA, o Instituto Williams, da Universidade da Califórnia assume
existirem cerca de 1,2 milhões de pessoas não binárias. Em Portugal, os Censos não permitem uma
autoidentificação não binária das pessoas, não fornecendo informação sobre a extensão da rejeição destas
categorias.
Na última década têm-se somado os Estados que avançaram para o reconhecimento legal de um terceiro
género, designado por «outro» ou «diverso», usado para designar pessoas que não se sentem representadas
pelo padrão binário e pela definição dominante do ser homem e ser mulher. Depois da Austrália, em 2011,
também Bangladesh, Canadá, Dinamarca, Islândia, Índia, Malta, Nepal e Nova Zelândia reconheceram
legalmente a identificação de género não binário. Outras opções de género não binárias – como a identificação
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«X» no passaporte ou uma terceira opção para pessoas intersexo – foram introduzidas na Irlanda, Colômbia,
Argentina, Estados Unidos da América e Alemanha. As soluções são muito diferentes e a tensão é entre a
necessidade de reconhecer identidades não binárias e o combate à consagração de categorias legais que
podem ter como efeito o reforço do próprio binarismo ou a criação de guetos legais para todas as pessoas que
rejeitam qualquer das categorias existentes.
Em Portugal o quadro legal é binário. Mas com a aprovação da nova lei de identidade de género, em 2018,
Portugal afirmou-se como um dos países com a legislação mais avançada no reconhecimento de direitos às
pessoas trans. As alterações propostas no presente projeto de lei, não rompendo ainda totalmente com o
binarismo legal, são mais um passo em direção ao respeito pela igualdade e pela autodeterminação de género.
Se, por um lado, efetivamente, os sexos não são binários – são um espectro que passa por feminino,
intersexo e masculino, por outro lado, o registo civil nacional, que apenas considera dois sexos, é a base atual
dos mecanismos legais de proteção da igualdade de género, nomeadamente em termos de combate à violência
contra as mulheres e em matéria de promoção da paridade na representação política. Por essa razão, esta
iniciativa não altera o registo civil de sexos, mantendo-se na versão que resultou da lei da autodeterminação de
género de 2018, optando por outra via de reconhecimento da identidade das pessoas não binárias e de género
diverso. Assim, tendo em consideração a atual realidade social e legal do País, a experiência de outros países
e as lutas dos movimentos feminista e LGBTQIA+, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe duas
mudanças imediatas:
– Acabar com a obrigatoriedade de o nome próprio corresponder à identificação com um sexo,
– Permitir que as pessoas intersexo, não binárias e de género diverso possam requerer que não haja
identificação de sexo no seu documento de identificação.
Desta forma, ao fazer avançar os direitos das pessoas intersexo, trans, não binárias e de género diverso é
reforçada a luta geral pela igualdade.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei, com vista a reforçar o respeito pelo princípio constitucional da Igualdade:
a) Altera a Lei do direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e à proteção
das características sexuais de cada pessoa, Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, alargando os direitos das pessoas
intersexo, não binárias e de género diverso;
b) Altera o Código de Registo Civil, revogando a obrigação do nome próprio não poder suscitar dúvidas
sobre o sexo da pessoa registada e alargando os direitos das pessoas intersexo, não binárias e de género
diverso.
Artigo 2.º
Alteração ao Código de Registo Civil
A presente lei procede à alteração do artigo 103.º do Código do Registo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei
n.º 131/95, de 6 de junho, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 103.º
[…]
1 – […]
2 – O nome completo deve compor-se, no máximo, de seis vocábulos gramaticais, simples ou compostos,
dos quais só dois podem corresponder ao nome próprio e quatro apelidos, devendo observar-se, na sua
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composição, as regras seguintes:
a) Os nomes próprios devem ser portugueses, de entre os constantes da onomástica nacional ou adaptados,
gráfica e foneticamente, à língua portuguesa;
b) […]
c) […]
d) […]
e) […]
f) […]
3 – (Revogado.)
4 – […]»
Artigo 3.º
Alteração à Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto
A presente lei procede à alteração do artigo 6.º da Lei n.º 38/2018, de 7 de agosto, que terá a seguinte
redação:
«Artigo 6.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – […]
4 – […]
5 – Sem prejuízo do previsto nos números anteriores, as pessoas intersexo e as pessoas que não se
identifiquem com o género masculino, nem com o género feminino têm direito a requerer que não haja menção
de sexo no seu cartão de cidadão.»
Artigo 4.º
Regulamentação
No prazo de 90 dias o Governo regulamenta os procedimentos com vista a garantir o disposto no artigo
anterior.
Artigo 5.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com a aprovação da regulamentação referida no artigo anterior.
Assembleia da República, 12 de maio de 2023.
As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua —
Catarina Martins — Isabel Pires.
———
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PROJETO DE LEI N.º 784/XV/1.ª
INSTITUI O PROVEDOR DA CRIANÇA
Exposição de motivos
Uma conceção moderna dos direitos das crianças e das suas especificidades reclama mais do que um mero
enquadramento nos direitos humanos em geral, desde logo porque há determinados direitos que se aplicam de
forma exclusiva às crianças. Por essa razão, a União Europeia tem vindo a defender abertamente que a
promoção dos direitos das crianças deve ser tratada como uma questão que exige ações específicas e cuja
proteção deve ser integrada de forma transversal em todas as políticas europeias e nacionais.
As crianças há muito que deixaram de ser meros objetos de direitos para passarem a ser sujeitos de direitos,
nomeadamente do direito a serem ouvidas em todas as decisões e nas políticas que lhes digam respeito, o
direito à compreensão dos processos em que estão envolvidas, o direito ao respeito pela vida privada e familiar
e à integridade e dignidade.
A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos
da Criança prescrevem que as crianças têm o direito de participar nos processos de tomada de decisão que
possam ser relevantes nas suas vidas e de influenciar as decisões tomadas a seu respeito – na família, na
escola ou na comunidade. Para que as crianças possam exercer estes direitos de forma efetiva, é necessário
que exista quem lhes dê voz, um representante, um defensor.
É em resposta a esta abordagem específica e multidimensional dos direitos das crianças que tem vindo a ser
reclamada por diversos setores da sociedade, por especialistas, por profissionais da área da infância e
juventude, por investigadores e académicos, a criação da figura do Provedor da Criança, uma figura
representativa específica para os direitos das crianças.
No plano internacional, constata-se que Portugal é dos poucos países europeus que não instituiu esta figura
específica, sendo que a Rede Europeia de Provedores da Criança conta com a participação de 34 países
Estados-Membro do Conselho da Europa.
Argumenta-se, contra a criação do Provedor da Criança, que as suas funções seriam redundantes, pois o
papel de defensor da criança está já atribuído ao Provedor de Justiça, bem como a outras figuras institucionais
que atuam na área da infância e juventude, posição com a qual Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda
discorda.
Com efeito, é inegável que a complexidade e a diversidade de questões que se colocam ao Provedor de
Justiça em matéria de infância e juventude exigem uma resposta pró-ativa, não só que defenda e controle o
respeito pelos direitos fundamentais das crianças, como adote uma postura de proximidade e diálogo
permanente com todas as organizações públicas e privadas e, sobretudo, que seja acessível a todas as crianças,
incentivando e proporcionando espaços de diálogo e de contacto direto com os jovens, informando-os sobre os
seus direitos e mecanismos de queixa e defesa, estimulando a sua participação ativa na sociedade, e
promovendo a construção de uma cidadania social e responsável.
Acresce que, por não ter instituído um provedor da criança, foi negada a Portugal a integração, como membro
de pleno direito, na Rede Europeia de Provedores da Criança, tendo sido aceite apenas como observadora a
Presidente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens.
Por estas razões, e por defender que numa sociedade moderna, complexa e especializada, se deve propiciar
todos os mecanismos para uma proteção dos direitos das crianças como previstos na Convenção sobre os
Direitos das Crianças das Nações Unidas, entende o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda que se impõe a
criação da figura do Provedor da Criança.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei institui o Provedor da Criança, enquanto órgão singular, dotado de autonomia administrativa e
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que prossegue a sua missão de forma isenta, autónoma e imparcial.
Artigo 2.º
Missão e âmbito
1 – O Provedor da Criança tem por missão a promoção e a plena implementação da Convenção sobre os
Direitos da Criança, a defesa dos direitos, interesses e bem-estar das crianças e jovens, a sensibilização das
crianças e dos adultos para os direitos humanos das crianças, bem como o reforço da participação das crianças
nas decisões e nas políticas que lhes digam respeito.
2 – O Provedor da Criança prossegue a sua missão através do acompanhamento da atuação dos poderes
públicos e em colaboração com o Provedor de Justiça, os organismos da Administração Pública, associações,
instituições ou outras entidades cujo objeto seja a promoção dos direitos das crianças.
Artigo 3.º
Competências
1 – Compete ao Provedor da Criança:
a) Receber queixas e sugestões relativamente à atuação dos poderes públicos em matéria de direitos das
crianças;
b) Encaminhar às entidades competentes informação que receba sobre situações que coloquem em risco os
direitos das crianças;
c) Promover e realizar audições, conferências e mesas redondas com crianças e jovens por forma
proporcionar o debate e a receber contributos sobre a matérias que envolvem as vidas e os direitos das crianças;
d) Emitir pareceres e recomendações, no quadro da sua missão e competências, por iniciativa própria, na
sequência de queixas e sugestões recebidas ou a pedido do Governo em matérias relativas aos direitos das
crianças;
e) Contribuir para que os direitos das crianças sejam considerados na definição e na execução das políticas
do Governo e das autarquias locais;
f) Identificar deficiências na legislação relativas aos direitos das crianças e emitir recomendações para a sua
interpretação, alteração ou revogação, ou sugestões para a elaboração de nova legislação;
g) Produzir e divulgar informações sobre os direitos das crianças e sobre a legislação aplicável nesta matéria;
h) Monitorizar a existência, o acesso e a eficácia das formas de defesa e sistemas de queixas disponibilizados
às crianças, nomeadamente, em instituições e escolas, bem como o acesso das crianças aos tribunais.
i) Propor ao Governo medidas necessárias à prevenção de riscos suscetíveis de pôr em causa os direitos
das crianças;
j) Elaborar um relatório anual sobre a sua atividade e sobre a situação dos direitos das crianças a nível
nacional;
k) Promover e colaborar em ações de formação, em seminários e eventos similares, em ações de
demonstração, informação e sensibilização e em publicações sobre a temática dos direitos das crianças.
l) Representar o Estado português junto de organizações nacionais e internacionais dedicadas à promoção
e defesa dos direitos das crianças, nomeadamente da Rede Europeia de Provedores da Criança.
2 – O Provedor da Criança, no desenvolvimento da sua atividade, deve ter em consideração os contributos
das organizações da sociedade civil, das associações juvenis, das associações representativas dos direitos das
crianças, de peritos e investigadores.
3 – A aprovação de atos legislativos ou regulamentares em matérias que envolvam os direitos e os interesses
das crianças deve ser precedida de audição do Provedor da Criança, que se pronuncia no prazo de 10 dias
úteis.
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Artigo 4.º
Publicidade e acesso
1 – A atividade desenvolvida pelo Provedor da Criança é publicada no respetivo sítio na Internet.
2 – O Provedor da Criança deve, ainda, disponibilizar no seu sítio na internet um sistema de queixas e um
canal para receber as opiniões das crianças, bem como fornecer informação, com linguagem simples e
acessível, sobre os direitos das crianças e formas e mecanismos existentes para os defender.
Artigo 5.º
Regulamentação
O Governo procede à regulamentação da presente lei no prazo de 120 dias a contar da data da sua
publicação.
Artigo 6.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à data da sua aprovação.
Assembleia da República, 12 de maio de 2023.
As Deputadas e os Deputados do BE: Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Catarina Martins — Joana
Mortágua — Isabel Pires.
———
PROJETO DE LEI N.º 785/XV/1.ª
ELIMINA OS BENEFÍCIOS FISCAIS DOS PARTIDOS POLÍTICOS E REDUZ O VALOR DAS
SUBVENÇÕES PÚBLICAS (OITAVA ALTERAÇÃO À LEI DE FINANCIAMENTO DOS PARTIDOS
POLÍTICOS, LEI N.º 19/2003, DE 20 DE JUNHO)
Exposição de motivos
O modelo de financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais é essencial em qualquer
sistema democrático e para a credibilidade das suas instituições.
O valor dos impostos cobrados aos portugueses está em máximos históricos. Ao mesmo tempo, os partidos
políticos estão isentos da generalidade dos impostos, recebendo, ainda, dezenas de milhões de euros em
subvenções públicas pagas pelos impostos dos portugueses. A atual lei atribui aos partidos políticos benefícios
que são negados aos cidadãos. Esta é uma desigualdade perante a lei que não podemos tolerar. Porque
discriminar positivamente os partidos políticos em detrimento dos cidadãos e das empresas é inaceitável,
propomos o fim das isenções fiscais de que os partidos políticos atualmente gozam.
É evidente que o sistema democrático tem um custo de representação, do qual os partidos devem ser
ressarcidos. No entanto, consideramos que esse valor tem sido demasiado elevado. Por isso propomos que os
valores totais atribuíveis aos partidos sejam reduzidos. No caso da subvenção pública para financiamento dos
partidos políticos, propomos uma redução de cerca de 40 % no valor que os portugueses atualmente pagam
aos partidos políticos, continuando a mesma a ser atribuída em função do número de votos.
Quanto à subvenção de campanha, o modelo atual não é só excessivamente dispendioso, como é
manifestamente iníquo. O Estado atualmente atribui ambas as subvenções – a de financiamento dos partidos
políticos e a de campanha – sobretudo com base na representação conseguida pelos partidos. Este modelo
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beneficia os maiores partidos e os que já fazem parte do sistema.
Se o objetivo da subvenção de campanha é garantir algum nível de igualdade de meios de campanha, limitar
a subvenção aos partidos que elejam representantes contraria esse princípio. Deste modo, consideramos
essencial para o livre e concorrencial confronto de ideias (incluindo as que não vingam eleitoralmente), que:
a) A subvenção de campanha veja o seu valor total reduzido;
b) A subvenção de campanha seja atribuída em igual montante a cada um dos partidos que,
cumulativamente:
i) Concorram a, pelo menos, metade dos círculos eleitorais
ii) Concorram a círculos eleitorais que correspondam a, pelo menos, 51 por cento dos mandatos para a
Assembleia da República ou para as Assembleias Legislativas Regionais.
É claro que a presente proposta não implica a necessidade de recorrer a mais financiamento privado, o qual
permanece sujeito a limitações com as quais concordamos. O que esta proposta implica, isso sim, é a
necessidade de os partidos usarem de muito maior frugalidade e buscarem muito maior eficácia no planeamento
das suas campanhas. Para além disso, já é altura de as campanhas eleitorais deixarem de ser autênticos
atentados ambientais pelas emissões que originam e pelo desperdício que as têm caracterizado. Um partido
que se propõe eleger representantes para, entre outras coisas, administrar o dinheiro dos contribuintes, deve
ser o primeiro a dar o exemplo de boa gestão.
Finalmente, e porque devemos aprender com a experiência de campanhas anteriores, introduzimos um
conjunto de simplificações no processo de registo e verificação dos gastos de campanha. A democracia tem
custos, mas não precisam ser tão altos como têm sido.
Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º 1
do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, o Deputado da Iniciativa Liberal apresenta o seguinte
projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à oitava alteração à Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, sobre financiamento dos partidos
políticos e das campanhas eleitorais, alterada pelo Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro, pela Lei n.º 64-
A/2008, de 31 de dezembro, pela Lei n.º 55/2010, de 24 de dezembro, pela Lei n.º 1/2013, de 3 de janeiro, pela
Lei Orgânica n.º 5/2015, de 10 de abril, pela Lei n.º 4/2017, de 16 de janeiro, e pela Lei Orgânica n.º 1/2018, de
19 de abril.
Artigo 2.º
Alteração à Lei 19/2003, de 20 de junho, sobre financiamento dos partidos políticos e das
campanhas eleitorais
Os artigos 5.º, 10.º, 12.º, 14.º-A, 16.º, 17.º, 18.º, 19.º, 20.º, 21.º e 27.º da Lei n.º 19/2003, de 20 de junho,
sobre financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais, na sua redação atual, passam a ter a
seguinte redação:
«Artigo 5.º
[…]
1 – […]
2 – A subvenção consiste numa quantia em dinheiro equivalente à fração 1/220 do valor do IAS, por cada
voto obtido na mais recente eleição de Deputados à Assembleia da República.
3 – […]
4 – […]
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5 – […]
6 – […]
7 – […]
8 – […]
Artigo 10.º
[…]
1 – Os partidos não estão sujeitos a IRC.
a) (Revogado.)
b) (Revogado.)
c) (Revogado.)
d) (Revogado.)
e) (Revogado.)
f) (Revogado.)
g) (Revogado.)
h) (Revogado.)
2 – (Revogado.)
3 – (Revogado.)
Artigo 12.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – […]
7 – […]
8 – São igualmente anexas às contas nacionais dos partidos, para efeitos da apreciação e fiscalização a que
se referem os artigos 23.º e seguintes, as contas dos grupos parlamentares e dos Deputados únicos
representantes de um Partido da Assembleia da República, bem como as contas das campanhas eleitorais.
9 – […]
10 – […]
Artigo 14.º-A
[…]
1 – Os grupos parlamentares, os Deputados únicos representantes de um partido e os Deputados não
inscritos, quando existam, podem dispor, se o pretenderem, de número de identificação fiscal próprio, sendo-
lhes também aplicável os direitos e obrigações de natureza fiscal estabelecidos na lei para os partidos políticos.
2 – […]
a) […]
b) […]
c) […]
3 – […]
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Artigo 16.º
[…]
1 – As atividades da campanha eleitoral só podem ser financiadas por:
a) […]
b) […]
c) Donativos de pessoas singulares;
d) […]
2 – […]
3 – […]
4 – As receitas previstas nas alíneas c) e d) do n.º 1 estão sujeitas ao limite de 60 IAS por doador e são
obrigatoriamente tituladas por cheque ou por outro meio bancário que permita a identificação do montante e da
sua origem.
5 – […]
6 – […]
Artigo 17.º
[…]
1 – […]
2 – Têm direito à subvenção:
a) Os partidos que concorram ao Parlamento Europeu que obtenham pelo menos 2,5 % dos votos;
b) Os partidos que concorram, no mínimo e cumulativamente, a metade dos círculos eleitorais, nos termos
da lei, e a 51 % dos lugares sujeitos a sufrágio para a Assembleia da República ou para as Assembleias
Legislativas Regionais;
c) Os candidatos à Presidência da República que obtenham pelo menos 5 % dos votos.
3 – […]
4 – A subvenção é de valor total equivalente a:
a) 2000 vezes o valor do IAS para as eleições para a Assembleia da República;
b) 1000 vezes o valor do IAS para as eleições para a Presidência da República e para o Parlamento Europeu;
c) 400 vezes o valor do IAS para as eleições para as Assembleias Legislativas Regionais.
5 – […]
6 – […]
7 – […]
8 – […]
Artigo 18.º
[…]
1 – A subvenção é repartida igualmente pelos partidos e candidatos que preencham os requisitos do n.º 2 do
artigo anterior.
2 – […]
3 – Nas eleições para as autarquias locais, a subvenção é repartida igualmente pelos partidos, coligações e
grupos de cidadãos eleitores que preencham os requisitos do n.º 3 do artigo anterior.
4 – […]
5 – (Revogado.)
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6 – (Revogado.)
Artigo 19.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – O pagamento das despesas de campanha faz-se obrigatoriamente, por instrumento bancário, nos termos
do artigo 9.º, com exceção das despesas de montante inferior ao valor de 2 IAS desde que, durante este período,
estas não ultrapassem o valor global de 2 % dos limites fixados para as despesas de campanha.
4 – […]
5 – As despesas realizadas no dia de eleições com a apresentação ao público e à comunicação social da
reação política aos resultados são ou não consideradas despesas de campanha eleitoral, consoante decisão
de cada partido.
6 – As despesas faturadas pelos prestadores de serviços mesmo após a data da eleição, por causa não
imputável às candidaturas, são consideradas despesas de campanha eleitoral, desde que cumpram os
requisitos do n.º 1 do presente artigo.
Artigo 20.º
[…]
1 – O limite máximo admissível de despesas realizadas em cada campanha eleitoral, nacional ou regional, é
fixado nos seguintes valores:
a) 1000 vezes o valor do IAS na campanha eleitoral para Presidente da República, acrescido de 250 vezes
o valor do IAS no caso de concorrer a segunda volta;
b) 6 vezes o valor do IAS por cada candidato apresentado na campanha eleitoral para a Assembleia da
República;
c) 10 vezes o valor do IAS por cada candidato apresentado na campanha eleitoral para as Assembleias
Legislativas Regionais;
d) 30 vezes o valor do IAS por cada candidato apresentado na campanha eleitoral para o Parlamento
Europeu.
2 – O limite máximo admissível de despesas realizadas nas campanhas eleitorais para as autarquias locais
é fixado nos seguintes valores:
a) (Revogado.)
b) 90 vezes o valor do IAS nos municípios com 100 000 ou mais eleitores;
c) 45 vezes o valor do IAS nos municípios com mais de 50 000 e menos de 100 000 eleitores;
d) 30 vezes o valor do IAS nos municípios com mais de 10 000 e até 50 000 eleitores;
e) 15 vezes o valor do IAS nos municípios com 10 000 ou menos eleitores.
3 – No caso de candidaturas apresentadas apenas a assembleias de freguesia, o limite máximo admissível
de despesas é de um décimo do valor do IAS por cada candidato.
4 – […]
5 – […]
Artigo 21.º
[…]
1 – […]
2 – […]
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3 – […]
4 – No prazo de 30 dias após o termo do prazo de entrega de listas ou candidatura a qualquer ato eleitoral,
o partido, a coligação, o grupo de cidadãos ou o candidato a Presidente da República remetem à Entidade das
Contas e Financiamentos Políticos a lista completa dos mandatários financeiros e promovem a sua
publicação nos seus sítios na internet.
Artigo 27.º
[…]
1 – No prazo máximo de 120 dias, no caso das eleições autárquicas, e de 90 dias, nos demais casos, após
o pagamento integral da subvenção pública, cada candidatura presta à Entidade das Contas e Financiamentos
Políticos as contas discriminadas da sua campanha eleitoral, nos termos da presente lei.
2 – […]
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – A Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, quando verificar qualquer irregularidade nas contas,
deve notificar a candidatura para apresentar, no prazo de 60 dias, as contas devidamente regularizadas.»
Artigo 3.º
Norma revogatória
São revogadas as alíneas a) a h) do n.º 1, os n.os 2 e 3 do artigo 10.º, a alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º, os
n.os 5 e 6 do artigo 18.º e a alínea a) do n.º 2 do artigo 20.º da Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, na sua redação
atual.
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.
Palácio de São Bento, 12 de maio de 2023.
Os Deputados da IL: Patrícia Gilvaz — João Cotrim Figueiredo — Bernardo Blanco — Carla Castro — Carlos
Guimarães Pinto — Joana Cordeiro — Rodrigo Saraiva — Rui Rocha.
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PROJETO DE LEI N.º 786/XV/1.ª
CRIA O PROVEDOR DA CRIANÇA
Exposição de motivos
Na sequência da apresentação do relatório da Comissão Independente para o Estudo de Abusos Sexuais
contra Crianças na Igreja Católica, o abuso sexual de menores tomou de assalto o espaço mediático e expôs a
crua realidade de cinquenta anos de abusos praticados por sacerdotes da Igreja Católica: foram validados 512
casos de 564 testemunhos recebidos, com um número de vítimas estimado da ordem das 4815, repartidas por
um período temporal que se estende de 1950 a 2022.
Não é, pois, de estranhar que a 12.ª Recomendação da Comissão Independente para o Estudo de Abusos
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Sexuais contra Crianças na Igreja Católica seja a de «Criação, se constitucionalmente possível, da figura do
“provedor da criança”, enquanto entidade independente, autónoma, em articulação com a Provedoria de Justiça
e outras estruturas julgadas necessárias, mas com atuação específica na área da criança e da família».
Também o Chega considera essencial a criação da figura do provedor da criança, enquanto entidade com
competências efetivas para receber as queixas especificamente relacionadas com as crianças e jovens e para
formular recomendações às entidades públicas, assim aproximando o nosso País do padrão europeu neste
tema, que é o do respeito e da defesa dos direitos da criança de forma autónoma do poder político. Competirá
ao Provedor da Criança providenciar esforços no sentido de garantir a plena implementação da Convenção dos
Direitos da Criança1, assumindo um papel de autoridade independente (do Governo e de quaisquer outras
entidades públicas), que promove e protege os direitos das crianças perante entidades públicas e privadas e
acompanha as condições de desenvolvimento sob as quais as crianças crescem.
Em 1997, foi criada pela UNICEF a rede europeia dos provedores da criança (ENOC), com o propósito de
constituir uma instância de ligação entre os provedores da criança na Europa – dela fazem parte vários Estados-
Membros da União Europeia, como sejam Áustria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, França, Reino Unido e Suécia
– e que já está implantada em mais de 30 países europeus.
É certo que na Provedoria de Justiça existe um núcleo da criança, do cidadão idoso e da pessoa com
deficiência, que constitui a estrutura que assegura o tratamento multidisciplinar das questões suscitadas por
pessoas, integradas em qualquer destes grupos, que se encontrem em situações que envolvam particular
vulnerabilidade dessas mesmas pessoas. Este núcleo também tem funções de sensibilização e de promoção
dos direitos humanos das crianças, dos idosos e das pessoas com deficiência, visto que o Provedor de Justiça
desempenha missões específicas enquanto instituição nacional de direitos humanos.
No entanto, todos conhecemos a complexidade e a diversidade de questões que se colocam ao Provedor de
Justiça, em matéria de infância e juventude, e que reclamam a intervenção de um provedor específico para este
grupo etário, unicamente dedicado a ele e que seja pró-ativo na defesa dos direitos fundamentais das crianças
e jovens.
Numa sociedade moderna, é obrigação dos cidadãos desencadear todos os mecanismos para proteção dos
direitos das crianças, o que nos leva a defender a criação de um provedor da criança, enquanto órgão flexível e
adaptável às necessidades dos seus destinatários.
Acresce que, com a criação de um provedor da criança, Portugal ganharia autoridade reforçada para integrar
a ENOC, assim contribuindo para a melhoria do respeito dos direitos das crianças, em Portugal e na Europa, e
para a maior implementação da Convenção dos Direitos da Criança através do apoio às ações individuais e
coletivas nesse domínio e à aplicação das políticas nacionais nesta área.
E onde se deverá «ancorar» o Provedor da Criança, de forma a garantir-lhe as características da autonomia,
da independência e da proatividade indispensáveis à tarefa que aqui lhe pretendemos confiar?
Parece-nos que não poderá ser noutra instituição que não a própria Provedoria de Justiça, pelo que se
propõem algumas alterações à respetiva lei orgânica.
Pelo exposto, e nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados
apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
1 – A presente lei procede à criação da figura do provedor da criança e à sua integração na estrutura orgânica
da Provedoria de Justiça, aprovada pela Lei n.º 9/91, de 9 de abril.
2 – A presente lei procede à quarta alteração à Lei n.º 9/91, de 9 de abril, alterada pelas Leis n.os 30/96, de
14 de agosto, 52-A/2005, de 10 de outubro, e 17/2013, de 18 de fevereiro.
Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 9/91, de 9 de abril
1 – O Capítulo VI da Lei n.º 9/91, de 9 de abril, passa a Capítulo VII.
1 A Convenção sobre os Direitos da Criança foi adotada pelas Nações Unidas em 20 de novembro de 1989 e ratificada por Portugal em 21 de setembro de 1990.
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2 – O Capítulo VII da Lei n.º 9/91, de 9 de abril, é composto pelos artigos 47.º, 48.º e 49.º, com a seguinte
redação:
«Artigo 47.º
Remissão
A designação “Provedoria de Justiça” substitui, para todos os efeitos, a de “Serviço do Provedor de Justiça”
constante da legislação em vigor ou de quaisquer outros atos com eficácia legal.
Artigo 48.º
Alterações à lei orgânica
O Governo procederá por decreto-lei às alterações necessárias à Lei Orgânica da Provedoria de Justiça, Lei
n.º 10/78, de 2 de março, no prazo de 180 dias.
Artigo 49.º
Norma revogatória
É revogada a Lei n.º 81/77, de 22 de novembro.»
Artigo 3.º
Aditamento à Lei n.º 9/91, de 9 de abril
É aditado à Lei n.º 9/91, de 9 de abril, um Capítulo VI, intitulado «Provedor da Criança», composto pelos
artigos 45.º e 46.º, com a seguinte redação:
«CAPITULO VI
Provedor da Criança
Artigo 45.º
[…]
1 – É criado o cargo de Provedor da Criança, com competência para as questões relativas às matérias da
infância e da juventude e o propósito de zelar pela promoção do respeito pelos direitos da criança por parte das
entidades públicas, à luz dos instrumentos internacionais e nacionais aplicáveis.
2 – O Provedor da Criança tem o estatuto de Provedor-Adjunto, cabendo-lhe coadjuvar o Provedor de Justiça,
de forma exclusiva, nas matérias previstas no número anterior.
3 – Com exceção das competências relativas à gestão da Provedoria de Justiça, o Provedor da Criança tem
os poderes que a presente lei atribui ao Provedor de Justiça, nas matérias previstas no número anterior.
4 – Ao Provedor da Criança são aplicáveis as incompatibilidades e impedimentos que se aplicam ao Provedor
de Justiça.
Artigo 46.º
Designação e mandato
1 – O Provedor da Criança é eleito pela Assembleia da República.
2 – O mandato do Provedor da Criança coincide com o mandato do Provedor de Justiça.»
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Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 12 de maio de 2023.
Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel
Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias
— Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.
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PROJETO DE LEI N.º 787/XV/1.ª
INTRODUÇÃO DO CRITÉRIO DA PARIDADE NA COMPOSIÇÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
(ALTERAÇÃO À LEI DE ORGANIZAÇÃO, FUNCIONAMENTO E PROCESSO DO TRIBUNAL
CONSTITUCIONAL, LEI N.º 28/82, DE 15 DE NOVEMBRO)
Exposição de motivos
As mulheres têm sido ao longo da história protagonistas da conquista dos seus próprios direitos em todas as
esferas da vida, ampliando o alcance das liberdades individuais e coletivas, dos direitos sexuais e reprodutivos,
dos direitos sociais, culturais e económicos e do direito à participação política.
Na senda da construção de um País mais livre, mais justo e mais fraterno, a Constituição da República
Portuguesa de 1976 acolheu o legado dessas lutas e reivindicações, nomeadamente reconhecendo o direito à
igualdade (artigo 13.º). Com a revisão constitucional de 1997, a promoção da igualdade entre homens e
mulheres passou a estar elencada como uma das tarefas fundamentais do Estado [alínea h) do artigo 9.º] e o
artigo relativo à participação política dos cidadãos (anterior artigo 112.º e atual artigo 109.º) foi alterado de forma
a tornar evidente a dimensão da igualdade de género, passando a ler-se: a «participação direta e ativa de
homens e mulheres na vida política constitui condição e instrumento fundamental de consolidação do sistema
democrático, devendo a lei promover a igualdade no exercício dos direitos cívicos e políticos e a não
discriminação em função do sexo no acesso a cargos políticos».
Cumprindo este desígnio, em 2006 foi dado um importante passo ao nível dos órgãos colegiais
representativos do poder político, com a publicação da Lei da Paridade (Lei Orgânica n.º 3/2006, de 21 de
agosto). A composição das listas passou a obedecer a um critério mínimo de representatividade de mulheres e
homens. Este caminho de promoção da paridade foi prosseguido, em 2017, com a introdução de critérios de
paridade ao nível das entidades administrativas independentes com funções de regulação da atividade
económica dos setores privado, público e cooperativo (alterando a Lei-Quadro n.º 67/2013, de 28 de agosto) e,
em 2019, com a publicação do regime da representação equilibrada entre homens e mulheres no pessoal
dirigente e nos órgãos da Administração Pública (Lei n.º 26/2019, de 28 de março). Com a revisão da Lei da
Paridade em 2019 (Lei Orgânica n.º 1/2019, de 29 de março), foi elevada de 33 % para 40 % a representação
mínima de cada um dos sexos na composição das listas para a Assembleia da República, para o Parlamento
Europeu e para as autarquias locais.
Como se tem verificado ao longo dos últimos anos, a introdução dos critérios de paridade contribuiu
efetivamente para a promoção dos objetivos constitucionais de uma participação mais igualitária de mulheres e
homens nos órgãos do poder político. Devendo esse caminho ser prosseguido também ao nível do Tribunal
Constitucional. Afinal, como constatou a Associação Portuguesa de Mulheres Juristas: «pelo menos desde 2020,
se vem verificando uma sub-representatividade das juízas mulheres no Tribunal Constitucional, o que o afasta
dos princípios de representação paritária» exigidos às listas para a Assembleia da República, para o Parlamento
Europeu, para os órgãos eletivos das autarquias locais e para as entidades administrativas independentes (Nota
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da APMJ, 13 de abril de 2023).
O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda acompanha posição da Associação Portuguesa de Mulheres
Juristas, segundo a qual «o espírito e axiologia da Constituição concorrem no sentido de que deve ser
consignado, na lei, o princípio de representação paritária no que respeita à composição do Tribunal
Constitucional» (Carta da APMJ ao Presidente da Assembleia da República, 19 de abril de 2023).
A eleição do Tribunal Constitucional é uma eleição dinâmica, dado que os mandatos não se iniciam nem
terminam todos ao mesmo tempo, e obedece a critérios específicos. O Tribunal Constitucional é composto por
10 juízes eleitos pela Assembleia da República e por 3 juízes cooptados pelos juízes eleitos. Esses 13 juízes
são necessariamente ou juízes de outros tribunais ou juristas. E a cada eleição ou cooptação a decisão é
condicionada pelo respeito por uma quota mínima de 6 juízes dos restantes tribunais. A proposta do Grupo
Parlamentar do Bloco de Esquerda é que a cada eleição ou cooptação de um novo juiz as listas tenham também
um critério de paridade, sendo preenchidas de modo a promover uma composição global do Tribunal
Constitucional que corresponda a um mínimo de 6 juízes e um mínimo de 6 juízas.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei introduz o critério da paridade entre homens e mulheres na composição do Tribunal
Constitucional, procedendo à alteração à Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal
Constitucional, Lei n.º 28/82, de 15 de novembro.
Artigo 2.º
Alteração à Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, Lei
n.º 28/82, de 15 de novembro
Os artigos 12.º, 14.º, 18.º e 19.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal
Constitucional, Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 12.º
(Composição)
1 – […]
2 – […]
3 – A composição do Tribunal Constitucional observa o critério da paridade entre homens e mulheres.
Artigo 14.º
(Candidaturas)
1 – […]
2 – As listas propostas à eleição devem conter a indicação de candidatos em número igual ao dos mandatos
vagos a preencher e ser preenchidas de modo a promover uma composição global do Tribunal
Constitucional que corresponda a um mínimo de 6 juízes de cada um dos sexos.
3 – […]
4 – […]
5 – […]
Artigo 18.º
(Relação nominal dos indigitados)
1 – […]
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2 – A relação deve conter nomes em número igual ou superior ao das vagas a preencher, incluindo:
a) Os de juízes dos restantes tribunais em número pelo menos suficiente para preenchimento da quota de
lugares a estes reservada e ainda não completada,
b) Os de juristas e juízes dos restantes tribunais em número pelo menos suficiente para
preenchimento da quota reservada para cada um dos sexos e ainda não completada, repetindo-se a
operação as vezes necessárias para aquele efeito.
Artigo 19.º
(Votação e designação)
1 – […]
2 – […]
3 – Cada co optante assinala com uma cruz os quadrados correspondentes aos indigitados em que vota, não
podendo votar num número de indigitados superior ao das vagas a preencher, nem num número de indigitados
que não sejam juízes dos restantes tribunais que afeta a quota de lugares a estes reservada, nem num número
de indigitados que afete a quota de pelo menos 6 juízes de cada um dos sexos, sob pena de inutilização
do respetivo boletim.
4 – […]
5 – […]
6 – […]
7 – […]
8 – […]
9 – […]»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Assembleia da República, 12 de maio de 2023
As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua —
Catarina Martins — Isabel Pires.
———
PROJETO DE LEI N.º 788/XV/1.ª
PROGRESSÕES, SALÁRIOS E CONDIÇÕES DE TRABALHO PARA OS PROFISSIONAIS DE
ENFERMAGEM DO SERVIÇO NACIONAL DE SAÚDE E DOS SERVIÇOS E ORGANISMOS SOB
ADMINISTRAÇÃO DIRETA OU INDIRETA DO MINISTÉRIO DA SAÚDE
Exposição de motivos
O Serviço Nacional de Saúde é um serviço público insubstituível e é garante do direito de proteção na saúde
em Portugal. Sem ele a esmagadora maioria da população não teria condições ou possibilidades de aceder a
serviços de saúde.
No entanto, a desorçamentação por via da cada vez maior transferência do orçamento do SNS para privados,
assim como a falta de investimento nos seus trabalhadores, está a colocar em risco o SNS.
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Faltam profissionais nos cuidados de saúde primários e isso reflete-se num cada vez maior número de
utentes sem médico e sem enfermeiro de família, em cada vez mais pessoas sem acompanhamento regular,
em mais grávidas e doentes crónicos por vigiar, por exemplo. Faltam profissionais de saúde nos hospitais e isso
reflete-se nas enormes listas de espera para consultas e cirurgias, assim como na dificuldade em responder a
todas as necessidades de saúde e até na dificuldade em manter em pleno funcionamento determinados serviços,
desde urgências hospitalares a outros serviços e departamentos.
A falta de profissionais tem causas e razões. Deve-se à falta de condições de trabalho, de carreira e de
remuneração que faz com que os profissionais não queiram fixar-se ou permanecer no SNS. Os baixos salários
que são pagos no SNS, a deterioração de carreiras e a generalização de contratos individuais, os inúmeros
turnos e horas extraordinárias exigidas ou a forma como o Ministério da Saúde simplesmente não corresponde
às expectativas de quem trabalha e luta por SNS melhor são alguns dos problemas que temos pela frente.
No caso das enfermeiras e enfermeiros do SNS isso é evidente. Há cada vez mais necessidade destes
trabalhadores, mas muitos optam por não ficar no SNS. Inclusivamente, muitos optam por trabalhar em países
estrangeiros. Não é de admirar.
Os profissionais de enfermagem do SNS ganham abaixo dos técnicos superiores da Administração Pública
e abaixo, por exemplo, de outros licenciados no SNS. Ao longo dos últimos anos têm visto o Governo a fazer
um braço de ferro, não para melhorar as suas condições de trabalho, mas sim para impedir essa melhoria.
Apagão de pontos e de anos de serviço, impedimento burocrático de progressões, congelamentos salariais e de
carreira durante anos a fio, tratamento diferenciado e discriminatório entre contratos de trabalho em funções
públicas e contratos individuais de trabalho, recusa de posicionamento na categoria de enfermeiro especialista
os enfermeiros que são, de facto, especialistas e titulados pela Ordem. Tudo tem valido para poupar dinheiro à
custa dos salários, das carreiras e da motivação das enfermeiras e dos enfermeiros. E quando assim é o
resultado só pode ser a falta de enfermeiros no SNS, a dificuldade de captar e fixar profissionais.
Se se quer um SNS público, universal, de qualidade e de proximidade, que responda atempadamente e que
consiga corresponder a todas as necessidades de saúde, individuais e coletivas, é preciso investir neste projeto.
Isso é, acima de tudo, investir nos seus trabalhadores. O Governo não o está a fazer, mas sabemos que os
profissionais de saúde não desistiram do projeto do SNS e é por isso que se manifestam, que reivindicam e se
mobilizam.
O Dia Internacional do Enfermeiro de 2023 é mais um exemplo disso. A assinalar este seu dia, as enfermeiras
e os enfermeiros portugueses exigem a dignificação da sua profissão, a construção de um melhor SNS e uma
melhor resposta em saúde para todas e todos.
Por concordar com todos estes objetivos, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta uma
iniciativa legislativa para melhorar as remunerações destes profissionais, garantir as suas progressões em
carreira, garantir igualdade de tratamento entre CTFP e CIT, combater a precariedade na profissão, instituir um
estatuto de risco e penosidade e contratar mais enfermeiros para o SNS.
Com esta lei garantir-se-á uma renegociação do número de posições e índices remuneratórios nas carreiras
de enfermagem, de modo que, pelo menos, se atinja a paridade remuneratória com a carreira de técnico superior
da administração pública. Garantir-se-á, também por renegociação, que o número de posições remuneratórias
nas categorias das carreiras de enfermagem é respeitador da dignidade e valorização das enfermeiras e dos
enfermeiros. O Governo impôs uma tabela remuneratória que exige mais de cem (100!) anos de trabalho para
atingir a posição remuneratória mais elevada. Esta falta de seriedade não pode existir. Todos os trabalhadores
devem ter a justa perspetiva de progredir em carreira e de, pelo menos, ter a oportunidade de atingir o seu topo
durante a sua vida de trabalho.
Com esta lei garantir-se-á ainda a contabilização de todos os anos de serviço e de todos os pontos para
progressão em carreira, assim como a transição de todos os enfermeiros especialistas para a categoria de
enfermeiro especialista. Cria-se ainda um estatuto de risco e penosidade que preveja matérias como a existência
de um suplemento remuneratório por risco e penosidade, mecanismos para uma mais rápida progressão de
carreira, majoração de dias de descanso por anos de trabalho, redução da carga horária semanal por anos de
trabalho, antecipação da idade de reforma sem penalização por anos de trabalho e por exercício de trabalho por
turnos, entre outras matérias que venham a ser acordadas com as estruturas representativas dos trabalhadores
abrangidos.
Para além de todos estes aspetos é garantido o igual tratamento entre contratos de trabalho em funções
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pública e contratos de trabalho individuais, assim como a regularização de todos os vínculos precários.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda
apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede a alterações nas condições de trabalho, carreira e remuneração dos profissionais de
enfermagem do Serviço Nacional de Saúde e dos serviços e organismos sob administração direta ou indireta do
Governo no âmbito do Ministério da Saúde.
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 71/2019, de 27 de maio
Os artigos 7.º e 8.º do Decreto-Lei n.º 71/2019, de 27 de maio, que altera o regime da carreira especial de
enfermagem, bem como o regime da carreira de enfermagem nas entidades públicas empresariais e nas
parcerias em saúde, alterado pela Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 7.º
[…]
1 – O número de posições remuneratórias das categorias da carreira especial de enfermagem, assim como
os correspondentes níveis remuneratórios da tabela remuneratória são definidos no prazo máximo de 90 dias,
depois de negociação e acordo com as estruturas representativas dos trabalhadores abrangidos pela presente
carreira, e com o objetivo de valorização das atuais condições remuneratórias.
2 – As posições e índices remuneratórios previstos no número anterior respeitam a paridade salarial entre as
carreiras de enfermagem e de técnico superior da Administração Pública, sem prejuízo de outros valores
favoráveis aos trabalhadores.
3 – As posições remuneratórias previstas no n.º 1 são em número que possibilite a qualquer trabalhador,
mediante progressão, atingir a posição remuneratória mais elevada de cada categoria durante o seu tempo
expectável de carreira profissional.
4 – O tempo de serviço e os pontos obtidos no âmbito do processo da avaliação do desempenho, realizada
em momento anterior ao processo de transição para a carreira especial de enfermagem estabelecida pelas
alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 71/2019, de 27 de maio, relevam integralmente para efeitos de
alteração de posição remuneratória, independentemente da posição remuneratória em que o trabalhador seja
colocado por efeito da transição.
Artigo 8.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – Transitam ainda para a categoria de enfermeiro especialista todos os trabalhadores enfermeiros titulares
da categoria de enfermeiro detentores de título de enfermeiro especialista.
4 –. (Anterior n.º 3.)
5 – (Anterior n.º 4.)
6 – (Anterior n.º 5.)
7 – (Anterior n.º 6.)»
Artigo 3.º
Aditamento ao Decreto-Lei n.º 71/2019, de 27 de maio
São aditados os artigos 9.º-A, 10.º-A e 10.º-B ao Decreto-Lei n.º 71/2019, de 27 de maio, alterado pela lei
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n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, com a seguinte redação:
«Artigo 9.º-A
Estatuto de risco e penosidade
1 – Os enfermeiros do Serviço Nacional de Saúde e dos serviços e organismos sob administração direta ou
indireta do Governo no âmbito do Ministério da Saúde têm direito a um estatuto de risco e penosidade.
2 – Esse estatuto contempla matérias como a existência de um suplemento remuneratório por risco e
penosidade, mecanismos para uma mais rápida progressão de carreira, majoração de dias de descanso por
anos de trabalho, redução da carga horária semanal por anos de trabalho, antecipação da idade de reforma sem
penalização por anos de trabalho e por exercício de trabalho por turnos, entre outras matérias que venham a
ser acordadas com as estruturas representativas dos trabalhadores abrangidos.
3 – O estatuto previsto no número anterior é regulamentado no prazo máximo de 90 dias e após negociação
com as estruturas representativas dos trabalhadores abrangidos.
Artigo 10.º-A
Disposição complementar
1 – O presente regime aplica-se a todos os enfermeiros integrados em carreira de enfermagem,
independentemente do vínculo por contrato individual de trabalho ou contrato de trabalho em funções públicas.
2 – Para efeitos do número anterior, aos enfermeiros em contrato individual de trabalho e em contrato de
trabalho em funções públicas no Serviço Nacional de Saúde ou em serviços e organismos integrados na
administração direta ou indireta do Estado, sob tutela do Ministério da Saúde, é dado igual tratamento no que
concerne à remuneração, horário de trabalho e dias de férias, à atribuição de pontos por ano trabalhado, à
incorporação e progressão em carreira e a outros aspetos laborais, não podendo existir discriminação entre
trabalhadores em função do seu regime de contratação.
3 – Na harmonização dos vários aspetos entre os regimes de contrato individual de trabalho e contrato de
trabalho em funções públicas é sempre relevado o que for mais favorável para o trabalhador.
Artigo 10.º-B
Norma de salvaguarda
O disposto no presente diploma não condiciona nem prejudica a adaptação e o desenvolvimento legais das
normas da Lei de Bases da Saúde que acomodam a carreira dos profissionais de enfermagem no Serviço
Nacional de Saúde».
Artigo 4.º
Regularização de situações precárias
1 – De forma a combater a precariedade é constituída relação jurídica de emprego por tempo indeterminado
ou sem termo com os trabalhadores do Serviço Nacional de Saúde e dos serviços e organismos sob
administração direta ou indireta do Governo no âmbito do Ministério da Saúde contratados de forma precária,
temporária ou a termo ao abrigo de outra modalidade ou regime, sempre que correspondam a necessidades
permanentes das instituições.
2 – Os trabalhadores contratados para substituição por ausência temporária de trabalho, sempre que
correspondam ou possam ser alocados a necessidades permanentes das instituições, são também abrangidos
pelo disposto no número anterior.
3 – A conversão em contratos por tempo indeterminado ou sem termo dos trabalhadores é realizada no prazo
de 30 dias.
4 – Sempre que a conversão do vínculo laboral depender de realização de concurso os trabalhadores que
desempenham as funções para as quais são abertas vagas são automaticamente considerados opositores a
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esse concurso.
5 – No caso de não existirem, nos serviços ou instituições de saúde, vagas por ocupar em número suficientes
nos respetivos mapas de pessoal, são automaticamente aditadas as vagas necessárias para incluir todos os
profissionais cujo contrato deve ser convertido para contrato por tempo indeterminado ou sem termo.
Artigo 5.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no com o Orçamento do Estado subsequente ao da sua publicação.
Assembleia da República, 12 de maio de 2023.
As Deputadas e os Deputados do BE: Catarina Martins — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Isabel
Pires — Joana Mortágua.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 669/XV/1.ª (2)
(APROVAÇÃO DE NOVOS MODELOS DE AVALIAÇÃO DOS ALUNOS, ASSENTES EM PRINCÍPIOS
DE AVALIAÇÃO CONTÍNUA, ELIMINANDO OS EXAMES E REVENDO O REGIME DE PROVAS DE
AFERIÇÃO)
Exposição de motivos
O PCP defende uma opção política de valorização da avaliação contínua que exige, por princípio, a existência
de condições materiais e humanas em todas as escolas, de acordo com os projetos pedagógicos construídos
pelas comunidades escolares, e exige também a criação de condições de disponibilização de profissionais
(docentes, funcionários, psicólogos, técnicos de ciências da educação) que contribuam para a melhoria do
processo de ensino-aprendizagem e, com isso, para a inclusão efetiva de todos os estudantes,
independentemente das suas condições económicas, sociais, culturais e outras.
A avaliação deve ter como objetivo principal não a seriação dos avaliados, mas antes a consideração, a cada
momento, da situação de cada aluno face aos conhecimentos ministrados, com vista ao estabelecimento de
estratégias de consolidação e recuperação adequado às necessidades de cada um.
A disponibilização de condições materiais (equipamentos desportivos, bibliotecas apetrechadas, espaços
polidesportivos) pode ter um papel determinante para a capacidade de cada escola desenvolver através de cada
projeto próprio de escola, e com isto envolver e estimular a participação dos estudantes, reforçando estratégias
de aquisição de conhecimentos, reflexão e espírito crítico e assim a formação integral do indivíduo.
A valorização da avaliação contínua exige uma filosofia de organização da escola baseada na criação de
estratégias pedagógicas, de organização e de funcionamento em contexto de sala de aula ou fora dela que deve
ser estimulada e contabilizada no momento de avaliação.
A valorização da avaliação contínua exige por isso uma política de investimento público, valorização
sociolaboral dos seus profissionais, criação de condições de estabilidade e previsibilidade na organização e
desenvolvimento do trabalho, em tudo contrárias às que têm vindo a ser impostas por sucessivos governos.
Poderemos mesmo afirmar que a desvalorização da avaliação contínua é parte integrante de uma estratégia
mais profunda de desfiguração e descredibilização da escola pública e de favorecimento da escola privada e de
uma perspetiva elitista de acesso ao conhecimento e à cultura.
Ao longo do tempo tem vindo a generalizar-se a imposição das provas nacionais e exames nacionais, como
aconteceu com a implementação por parte do anterior Governo PSD/CDS-PP das provas finais do 4.º ano do
1.º ciclo, agora revogadas, e as provas finais de 6.º e 9.º anos dos 2.º e 3.º ciclos.
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Contudo, e apesar da eliminação dos exames do 4.º e 6.º anos, mantêm-se no 9.º, 11.º e 12.º anos, o que
constitui um mecanismo de agravamento de assimetrias socioeconómicas e de total desrespeito pelo trabalho
dos estudantes e dos professores, para além de negarem aquele que deverá ser o papel da escola: contribuir
para a formação integral e desenvolvimento do indivíduo. Para além da manifesta falta de equidade, o método
de avaliação por exame tem demonstrado ineficácia e perversão, uma vez que obriga a um estudo orientado,
não para reforçar o saber, mas para garantir sucesso no exame.
Já o carácter das provas de aferição no 2.º, 5.º e 8.º anos assenta em distorções tendentes a desvalorizar a
sua função de diagnóstico e a assemelhá-las a exames. A rigidez das mesmas e o seu formato e exigência,
mesmo não sendo obrigatórias e não sendo consideradas para a avaliação dos alunos, criam, em alunos muito
novos, como é o caso dos do 2.º ano, ainda sem estrutura emocional suficiente, situações de stress e ansiedade
desnecessárias. Deste modo o PCP considera, que este modelo de provas de aferição, que imita o modelo dos
exames, deveria ser revisto, no sentido a cumprirem o objetivo adequado à sua natureza de diagnóstico.
Acresce ainda que, no presente ano letivo, e no caso das provas de aferição, as mesmas serão em formato
digital, inclusive as provas de aferição do 2.º ano. Esta decisão, pelo formato digital, tem sido contestada devido
à idade prematura das crianças do 2.º ano, que se encontram em processo de aquisição das competências de
escrita e leitura, de desenvolvimento da motricidade fina e da caligrafia.
O PCP não ignora o avanço tecnológico e as potencialidades da digitalização, contudo, esta deve ser usada
com parcimónia e tendo em conta o desenvolvimento integral da criança e todo o processo de ensino-
aprendizagem.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República e da alínea b) do n.º 1 do
artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte projeto
de resolução:
Resolução
A Assembleia da República recomenda ao Governo, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da
República, a aprovação de novos modelos de avaliação dos alunos, assentes em princípios de avaliação
contínua, que incluam:
1 – A revisão do atual regime de provas de aferição nos 2.º, 5.º e 8.º anos, de modo que estas:
a) Sejam adequadas à idade em que são realizadas;
b) cumpram o seu objetivo de diagnóstico evitando qualquer semelhança com a realização de exames
eliminatórios;
c) excluam o modelo de realização em formato digital.
2 – A eliminação das provas finais do 9.º ano.
3 – A eliminação dos exames do 11.º e 12.º anos.
Assembleia da República, 11 de maio de 2023.
Os Deputados do PCP: Manuel Loff — Alma Rivera — Paula Santos — Bruno Dias — João Dias — Duarte
Alves.
(2) O texto inicial da iniciativa foi publicado no DAR II Série-A n.º 218 (2023.05.05) e substituído, a pedido do autor, em 12 de maio de
2023.
———
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 694/XV/1.ª
SALVAGUARDA DOS VALORES NATURAIS DO PARQUE NATURAL DA ARRÁBIDA
Exposição de motivos
Recentemente, esteve em consulta pública o estudo de impacte ambiental do projeto da pedreira de calcário
e marga Vale de Mós A (Novo Plano de Pedreira Vale de Mós A), desenvolvido pela Secil – Companhia Geral
de Cal e Cimento, S.A. A Secil pretende fundir as pedreiras de marga Vale de Mós A e Vale de Mós B, exploradas
para produção de cimento, assim como ampliar a área de exploração e reduzir a profundidade da cota base de
exploração.
A área objeto do estudo de impacte ambiental para a ampliação das pedreiras da Secil é parte integrante do
Parque Natural da Arrábida. De acordo com o Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida (POPNA),
a área em causa está classificada como área de proteção parcial Tipo I, que «compreendem os espaços que
contêm valores naturais e paisagísticos com significado e importância excecional ou relevante do ponto de vista
da conservação da natureza, bem como elevada ou moderada sensibilidade ecológica» (n.º 1 do artigo 14.º do
POPNA) e que «constituem objetivos prioritários das áreas de proteção parcial do Tipo I a preservação e a
valorização dos valores de natureza biológica, geológica e paisagística relevantes para a garantia da
conservação da natureza e da biodiversidade» (n.º 2 do artigo 14.º do POPNA).
A pretensão da empresa não respeita o estabelecido nos instrumentos de gestão territorial em vigor
relativamente à área em causa, destacando-se que a alínea c) do artigo 8.º do POPNA determina a interdição
da «instalação de novas explorações de recursos geológicos, nomeadamente pedreiras, e a ampliação das
existentes por aumento de área licenciada». Desde modo, a pretensão de ampliação das pedreiras em causa
constitui uma violação do POPNA. Tal como também não é compatível com o estabelecido no Programa da Orla
Costeira Espichel-Odeceixe.
Os estudos realizados no âmbito do Plano de Gestão da ZEC Arrábida/Espichel confirmam os valores
naturais em presença, e que o POPNA já reconhecia por meio da classificação que atribuiu à área em
apreciação. Na ZEC Arrábida/Espichel estão identificados 32 tipos de habitats alvo de proteção, assim como
diversas espécies de fauna e flora também com estatuto de proteção, pelo que a ampliação pretendida da área
de exploração de inertes vem ao arrepio das orientações de salvaguarda dos valores naturais que importa
proteger.
De acordo com o parecer da Câmara Municipal de Setúbal, no Plano Diretor Municipal (PDM) de Setúbal, a
área proposta para ampliação está classificada como constituindo «Espaços Culturais e Naturais», e na revisão
do PDM, está classificada como «Espaços Naturais e Paisagísticos». O regulamento do PDM em revisão prevê
a aplicação dos artigos 103.º, 104.º e 105.º a essas áreas.
No que respeita ao artigo 103.º, o Regulamento estabelece que «Os Espaços Naturais e Paisagísticos
correspondem às áreas de maior valor natural, às zonas sujeitas a regimes de salvaguarda mais exigentes e às
áreas de reconhecido interesse natural ou paisagístico, como o estuário do rio Sado, cujo uso dominante não
seja agrícola, florestal ou de exploração de recursos geológicos, constituindo sistemas indispensáveis à
conservação e preservação da natureza, da biodiversidade e da paisagem».
Neste contexto fica claro que a proposta de ampliação das pedreiras não se configura com o disposto do
Plano Diretor Municipal de Setúbal em revisão. Por outro lado, é também de destacar que a Câmara Municipal
de Setúbal, no seu parecer sobre o projeto avaliado, refere que «não são admissíveis alterações aos
instrumentos de gestão territorial em vigor e em revisão, designadamente o POPNA e o PDM, que permitam
enquadrar a pretensão do proponente».
Atendendo ao exposto e cumprindo os instrumentos de gestão territorial em vigor e em revisão, o Governo
deve opor-se à proposta da empresa e não permitir a ampliação da área de exploração das pedreiras da Secil.
Acrescenta-se igualmente que o POPNA coloca também como objetivo, na alínea g) do artigo 2.º, «promover
as ações que potenciem o encerramento das pedreiras existentes, garantindo a sua recuperação ambiental e
paisagística», destacando-se que ao longo de todos estes anos, os sucessivos Governos não tomaram qualquer
iniciativa neste sentido.
A verdade é que o POPNA foi permissivo com atividades muito agressivas e com grande impacto na natureza,
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como a intensificação da exploração de inertes em profundidade ou a coincineração de resíduos industriais
perigosos, mas muito restritivo na manutenção das atividades tradicionais de pequena escala, seja na pesca,
agricultura ou pastorícia, e que ao longo de séculos as populações que sempre residiram e desenvolveram
atividades no parque foram responsáveis pela proteção e conservação da Arrábida.
Atualmente existem 11 pedreiras na Arrábida numa área total de 323 hectares, quando em 1976 as pedreiras
ocupavam cerca de 150 hectares. E das 11 pedreiras existentes, somente duas estão em recuperação.
Com o objetivo de salvaguardar o extraordinário património ambiental e cultural do Parque Natural da
Arrábida, deve ser desenvolvida uma estratégia para a Arrábida, que permita iniciar um processo, que
salvaguardando todos os postos de trabalho, permita, progressivamente reduzir a atividade extrativa neste
território.
Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a
seguinte
Resolução
A Assembleia da República, nos termos n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República, recomenda ao
Governo que:
1 – Assegure o respeito e cumprimento do estabelecido nos instrumentos de gestão territorial em vigor e
em revisão, com eficácia sobre a área das pedreiras da Secil, não emitindo parecer favorável à ampliação da
área de exploração das atuais pedreiras da Secil no Parque Natural da Arrábida;
2 – Desenvolva as diligências necessárias para reduzir o volume de resíduos perigosos submetidos a
coincineração, tendo em vista a cessação desta atividade no Parque Natural da Arrábida;
3 – Proceda à revisão do Plano de Ordenamento do Parque Natural da Arrábida, envolvendo a participação
das autarquias, das populações e associações e entidades dos concelhos de Palmela, Sesimbra e Setúbal, e
que considere as soluções mais adequadas para assegurar a proteção da natureza e salvaguardar as atividades
económicas tradicionais, que contribuem para o desenvolvimento e a preservação da Arrábida;
4 – Crie uma estratégia de desenvolvimento económico no Parque Natural da Arrábida, que promova a
progressiva redução das atividades associadas à extração de inertes e assegure a recuperação integral das
áreas a esta afetas, procedendo à sua renaturalização;
5 – Assegure que no âmbito da estratégia de desenvolvimento económico que venha a ser considerado
para o Parque Natural da Arrábida, sejam salvaguardados todos os postos de trabalho atualmente existentes.
Assembleia da República, 12 de maio de 2023.
Os Deputados PCP: Paula Santos — Bruno Dias — Duarte Alves — Alma Rivera — João Dias — Manuel
Loff.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 695/XV/1.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE CRIE UM PROGRAMA DA ATRAÇÃO DE TRABALHADORES
REMOTOS PARA OS TERRITÓRIOS DE BAIXA DENSIDADE
Considerando que as regiões de baixa densidade têm vindo a registar uma inquietante diminuição
populacional, conforme revelado pelos últimos censos, de 2021, com graves consequências ao nível do
desenvolvimento destes territórios, urge criar condições de atratividade de pessoas, com o objetivo de contrariar
o seu declínio demográfico e responder aos anseios das populações.
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Conforme descrito no 8.º Relatório sobre a Coesão da União Europeia, o aumento das disparidades ao nível
da coesão económica, social e territorial nas regiões da Europa, nomeadamente nos territórios de baixa
densidade e situados na periferia do continente, afigura-se cada vez mais complexo e matizado. Não obstante,
verifica-se que tais disparidades tendem a aumentar devido, essencialmente, a tendências emergentes como
sejam as mudanças climáticas, transformações tecnológicas e mudanças demográficas.
Os indicadores económicos dão a ler uma tendência de queda que importa inverter com urgência para
responder a este desafio socioeconómico e demográfico. O mapa das disparidades da União Europeia mostra-
se cada vez mais complexo. A título de exemplo, o comportamento dos Países de Leste, com as suas
idiossincrasias históricas, pode vir a ter uma influência determinante no desenho da próxima política de coesão.
A gestão do território europeu é um exercício multifacetado, não se limitando a acompanhar cegamente os eixos
e dicotomias Norte/Sul e Este/Oeste. Os alertas sucedem-se, uma vez que as transformações em curso, como
a transição digital, podem agravar ainda mais as desigualdades, apesar de a UE estar empenhada num processo
de coesão em que a transição digital e a transição verde são decisivas.
Caso não sejam pilotadas com discernimento e prudência, algumas megatendências destacadas em
recentes relatórios da União Europeia podem agravar as desigualdades regionais, acentuando o
descontentamento entre os cidadãos dos territórios menos favorecidos, que não podem ser deixados para trás.
Assim, considerando que estamos no Século XXI, século de inovações disruptivas e tecnologias pioneiras,
será necessário desenvolver uma estratégia inovadora não apenas para atrair novos residentes para os
territórios de baixa densidade, como, numa lógica de complementaridade, captar pessoas que, mesmo que de
forma temporária, intermitente ou pendular, possam reanimar localidades, estimular a economia local, valorizar
o património e quebrar o isolamento social e territorial.
Neste quadro, temos assistido à entrada em jogo de novas realidades laborais, que assentam na prestação
de trabalho remoto, que em certos casos evidenciam a presença de trabalhadores-viajantes que tornaram
obsoleto, através da digitalização, o conceito de local de trabalho e que selecionam destinos temporários com
base, entre outros, na segurança, no baixo custo de vida e na riqueza paisagística, ambiental e cultural, critérios
cumpridos pelos mais diversos territórios de baixa densidade do nosso País, de Norte a Sul.
Apesar destas inegáveis valências, uma estratégia de captação destes trabalhadores passará
necessariamente pela criação de condições técnicas e logísticas, a começar pela existência de uma rede WiFi
de alta performance, que permitam atrair pessoas para trabalharem remotamente para qualquer parte do mundo.
Atualmente, existem exemplos no País e noutras regiões da Europa que permitem constatar que projetos de
captação e acolhimento deste perfil de trabalhadores são capazes de gerar, a partir de pequenos investimentos
iniciais, um volume de negócios elevado e benéfico para as regiões e para o País no geral. Estudos recentes
comprovam a importância destes projetos e dos valores envolvidos, na ordem dos milhares de milhões de euros,
para combater o despovoamento e a anemia dos territórios de baixa densidade.
Entre nós, é relevante ter presente que esta é uma realidade já em curso, com trabalho desenvolvido na área
do empreendedorismo e da captação de pessoas que trabalham remotamente, por parte de algumas autarquias
nos territórios de baixa densidade e nas regiões autónomas. Nesse sentido, o desenvolvimento de uma
estratégia integrada que potencie os efeitos positivos desta nova forma de prestação de trabalho, e que colha a
experiência de outros territórios, aprendendo com os impactos aí verificados.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis os Deputados abaixo assinados apresentam o
seguinte projeto de resolução:
A Assembleia da República resolve, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República
Portuguesa, recomendar ao Governo que:
1 – Identifique os territórios de baixa densidade ao nível das NUT III que pretendam acolher trabalhadores
que a partir dai assegurem trabalho remoto;
2 – Proceda à identificação dos territórios que pretendam acolher este perfil de trabalhadores nas regiões
autónomas, em articulação com os respetivos governos regionais;
3 – Diligencie para que, durante o ano de 2023, as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento de cada
NUT III situada em territórios de baixa densidade, e cada região autónoma, desenvolvam e implementem um
plano de captação, identificando, em cada uma das NUT III, as habitações disponíveis ou o modelo de
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alojamento, bem como as principais ofertas em áreas como a saúde, educação, cultura, ambiente, desporto e
outras de interesse relevante;
4 – Identifique, em consonância com a Estratégia Nacional para a Conectividade em Redes de
Comunicações Eletrónicas de Capacidade Muito Elevada 2023-2030, as lacunas na cobertura por este tipo de
redes nos territórios de baixa densidade, em cada uma das NUT III e nas regiões autónomas, de modo a garantir
uma conectividade de qualidade, em banda larga e a preço acessível, no conjunto destes territórios;
5 – Coordene o desenvolvimento de uma Plataforma Eletrónica de Posicionamento Mundial, com recurso a
megadados, com a finalidade de aproximar os perfis dos territórios aos possíveis interessados;
6 – Promova uma campanha internacional, em articulação com o Ministério dos Negócios Estrangeiros e a
rede consular, para a divulgação da iniciativa;
7 – Defina o montante e o programa de financiamento junto dos programas operacionais regionais e
nacionais que permitam operacionalizar o programa referido no ponto 4;
8 – Apresente os cronogramas de execução física e financeiros para implementar o programa referido no
ponto 4 durante o ano de 2023.
Palácio de São Bento, 12 de maio de 2023.
As Deputadas e os Deputados do PS: António Monteirinho — Susana Amador — Pedro Cegonho — Ricardo
Pinheiro — Nelson Brito — José Carlos Alexandrino — Rui Lage — Miguel Iglésias — Sérgio Ávila — Raquel
Ferreira — João Azevedo — João Paulo Rebelo — Cristina Sousa — Marta Freitas.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 696/XV/1.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE CRIE UM TRAVÃO À SUBIDA DA PRESTAÇÃO DO CRÉDITO
HABITAÇÃO
Exposição de motivos
Nos últimos meses, a postura dura adotada pelo Banco Central Europeu tem gerado um aumento em flecha
das taxas de juro, já que, no início do mês de maio, se deu uma subida em 25 pontos base as taxas de juro de
referência na Zona Euro – naquela que foi a sétima subida consecutiva desde julho de 2023 – e que as taxas
de Euribor a 6 meses (as mais usadas nos créditos à habitação em Portugal) atingiram o valor histórico de
3,629 %. Este aumento em flecha tem gerado e vai continuar a gerar um forte impacto no rendimento das
famílias em Portugal, já que de acordo com algumas estimativas tal vai traduzir-se num aumento da prestação
em 200 euros por cada 100 mil euros de empréstimo.
Num momento em que sabemos que, também devido a esta escalada de taxas de juro, os cinco maiores
bancos que operam em Portugal obtiveram lucros agregados de 2583 milhões de euros em 2022, mais 1000
milhões de euros que em 2021, foi tornado público pelo Banco Central Europeu que Portugal foi o 2.º país da
União Europeia onde os juros nos novos empréstimos habitação mais subiram.
Estes dados e o preocupante impacto que estes aumentos poderão ter nos rendimentos das famílias,
demonstram-nos a necessidade de se adotarem medidas adicionais de apoio às famílias com créditos à
habitação, a cujas necessidades as medidas aprovadas pelo Governo acodem apenas parcialmente. Um dos
exemplos da insuficiência desses apoios é o dos apoios extraordinários às famílias para pagamento da renda e
da prestação de contratos de crédito, criados pelo Decreto-Lei n.º 52/2022, de 4 de agosto, que para além de
ter um valor insuficiente, deixará, à partida, de fora pelo menos um quarto dos contratos de crédito habitação,
ao passo que o apoio referente ao arrendamento deixará de fora 84 % dos contratos de arrendamento.
Na sua atividade parlamentar o PAN tem procurado dar resposta às necessidades das famílias com crédito
à habitação, tendo inclusive conseguido aprovar o Projeto de Lei n.º 465/XV/1.ª, que pôs fim à cobrança da
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comissão bancária referente ao processamento das prestações a todos os clientes bancários – uma medida que
abrangerá 5 milhões de contratos e permitirá uma poupança anual global de 119,3 milhões de euros a cada ano.
Face à insuficiência do quadro de apoios existente e à necessidade de se ir mais longe, com a presente
proposta o PAN, prosseguindo o seu esforço de proteção das famílias face à escalada das taxas de juro, propõe
a criação de um travão à subida da prestação do crédito habitação, seja ativado assim que a taxa de juro aplicada
ao contrato ultrapasse os 3 pontos percentuais face à taxa contratada no momento inicial do empréstimo e em
que se verifique uma taxa de esforço superior a 35 %.
Esta proposta, defendida também publicamente pela DECO, dispensa a intervenção direta do Estado, exige
uma maior solidariedade da parte da banca, estabiliza a prestação mensal num valor previsível para o futuro e
asseguraria às famílias uma poupança mensal de 113,23 euros.
Nestes termos, a abaixo assinada Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, ao abrigo das disposições
constitucionais e regimentais aplicáveis, propõe que a Assembleia da República adote a seguinte resolução:
A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República
Portuguesa, recomendar ao Governo que, em articulação com as instituições de crédito, as suas organizações
representativas e as organizações representativas dos clientes bancários e dos consumidores, crie um
mecanismo travão à subida da prestação do crédito habitação, que sem quaisquer encargos adicionais seja
ativado assim que a taxa de juro aplicada ao contrato ultrapasse os 3 pontos percentuais face à taxa contratada
no momento inicial do empréstimo e se verifique uma taxa de esforço superior a 35 %, e que impeça o aumento
da prestação.
Palácio de São Bento, 12 de maio de 2023.
A Deputada PAN, Inês de Sousa Real.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 697/XV/1.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE ESTABELEÇA A GRATUIDADE DAS ALTERAÇÕES AO CARTÃO
DE CIDADÃO
Exposição de motivos
O Estado exige o pagamento de taxas ou emolumentos, muitas vezes avultados, para várias alterações aos
dados constantes do Cartão de Cidadão, nomeadamente a alteração do nome, cujo processo carece do
pagamento de 200 €, de acordo com o Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado. A alteração de
outros dados como a alteração de morada ou da fotografia pessoal, que implicam a renovação do Cartão de
Cidadão, também exigem o pagamento de taxas.
Note-se que, nos termos do artigo 16.º do Regulamento Geral de Proteção de Dados, diretamente aplicável
na ordem jurídica nacional, o titular de dados pessoais tem o direito de obter a retificação dos dados pessoais
inexatos que lhe digam respeito.
Da consagração deste direito decorre que o Estado não deverá colocar qualquer entrave à retificação ou
alteração dos dados identificativos do cidadão, através da obrigatoriedade do pagamento de taxas ou
emolumentos de caráter substancialmente avultado. O carácter avultado da quantia de 200 € é manifesto e não
deve ser mantido.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais, legais e regimentais aplicáveis, os Deputados da IL abaixo
assinados propõem que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
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Proceda à alteração do quadro normativo, legal e/ou regulamentar, de forma a consagrar a gratuidade das
alterações aos dados pessoais constantes do Cartão de Cidadão, nomeadamente a alteração do nome e da
morada.
Palácio de São Bento, 12 de maio de 2023.
Os Deputados da IL: Patrícia Gilvaz — João Cotrim Figueiredo — Bernardo Blanco — Carla Castro — Carlos
Guimarães Pinto — Joana Cordeiro — Rodrigo Saraiva — Rui Rocha.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 698/XV/1.ª
PELA IMEDIATA SUSPENSÃO DA APLICAÇÃO DA PORTARIA N.º 86/2023, DE 27 DE MARÇO, QUE
PROCEDE À ALTERAÇÃO DAS REGRAS RELATIVAS À DISTRIBUIÇÃO, POR MEIOS ELETRÓNICOS,
DOS PROCESSOS NOS TRIBUNAIS JUDICIAIS E NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS
Exposição de motivos
A Lei n.º 55/2021, de 13 de agosto, e a Lei n.º 56/2021, de 16 de agosto, vieram consagrar novos mecanismos
de controlo da distribuição eletrónica dos processos judiciais e dos processos da jurisdição administrativa e
fiscal, confiando ao Governo a respetiva regulamentação, o que teve lugar através da Portaria n.º 86/2023, de
27 de março, que procede à alteração das regras relativas à distribuição, por meios eletrónicos, dos processos
nos tribunais judiciais e, bem assim, nos tribunais administrativos e fiscais.
Ora, estas alterações suscitaram reservas e preocupações significativas por parte de diversos atores do
sistema judicial, incluindo os magistrados judiciais e do Ministério Público, e outros profissionais envolvidos na
administração da justiça1.
De acordo com a regulamentação estabelecida na supracitada portaria publicada no final de março, a
distribuição eletrónica passa a requerer a presença diária de diversos agentes da justiça para acompanhar o
processo, incluindo o presidente do tribunal, que designa um juiz titular e um substituto em caso de impedimento,
um magistrado do MP, um oficial de justiça e um advogado.
Esta nova exigência de presença de múltiplos agentes durante a distribuição eletrónica representa uma
mudança significativa no procedimento anterior, que era em larga medida automatizado.
Além disso, a regulamentação estabelece a obrigatoriedade de elaborar atas que anexam os resultados da
distribuição, bem como a divulgação das decisões, deliberações, provimentos e orientações que podem
condicionar as operações de distribuição, permitindo um escrutínio efetivo.
Obviamente que tais mudanças levantaram preocupações sobre a carga burocrática adicional que passa a
ser imposta ao sistema judicial, com consequências graves na celeridade processual.
O próprio Ministério da Justiça2 reconheceu que as alterações podem aumentar esta carga burocrática sobre
o sistema judicial, o que tem gerado críticas por parte da magistratura judicial e do Ministério Público, que
argumentam que estas medidas podem afetar negativamente a eficiência e a celeridade dos processos judiciais.
Além disso, a contestação enfatiza a falta de diálogo e consulta prévia com os profissionais do setor, que são
diretamente afetados pelas mudanças, bem como a falta de adequação e de eficácia das alterações ora
implementadas.
Como se apontou acima, a entrada em vigor das novas regras para a distribuição eletrónica dos processos
tem sido contestada pela magistratura judicial e pelo Ministério Público, e o próprio Conselho Superior da
Magistratura apontou que «(…) pugnou sempre por solução diametralmente diversa da que veio a ser adotada
1 Vide https://www.rtp.pt/noticias/pais/alvo-de-criticas-alteracoes-a-distribuicao-eletronica-de-processos-entram-em-vigor_n1485580 2 Vide https://prevpap.gov.pt/ppap/index?windowId=2b5
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pelo Governo e que alertou o poder político para os efeitos da própria lei (…) no trabalho dos tribunais, por
acarretar mais burocracia. O órgão de gestão e disciplina dos juízes assumiu ainda o seu desconhecimento sob
"a forma de construção e atualização do algoritmo de distribuição” (…)»3.
Adão Carvalho, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, apontava, em 4 de abril do
corrente ano que «(…) a lei em causa, não só não aumenta a fiabilidade do sistema de distribuição eletrónica
dos processos judiciais, como vai obrigar o Ministério Público a estar presente em todas as distribuições de
processos, todos os dias e em todo o País, sem que tenha qualquer domínio sobre o processo como as mesmas
são efetuadas, nem podendo garantir, por qualquer forma, a fiabilidade do mesmo (…)»4.
A própria Bastonária da Ordem dos Advogados «(…) diz que este foi um dia de caos nos tribunais, com a
entrada em vigor das alterações à distribuição eletrónica de processos (…)»5.
O colapso do sistema informático «Citius» em todo o País, ocorrido esta semana, também despertou
preocupações adicionais em relação às atualizações e mudanças relacionadas com a entrada em vigor do novo
sistema de distribuição eletrónica dos processos judiciais.
António Marçal, Presidente do Sindicato dos Funcionários Judiciais, manifestou a sua preocupação com as
informações que indicavam uma possível relação entre as atualizações do sistema e a implementação deste
novo sistema de distribuição eletrónica dos processos judiciais.6
O referido colapso do sistema «Citius» levantou dúvidas sobre a robustez e a capacidade técnica para lidar
com a transição para este novo sistema e provocou interrupções significativas nos serviços judiciais.
É importante que tais preocupações sejam adequadamente consideradas pelo Governo e que haja espaço
para uma reavaliação das medidas e metodologia propostas, no quadro de um diálogo construtivo, visando a
melhoria do sistema judicial, e a garantia da eficiência e celeridade dos processos judiciais, sem provocar o
colapso do sistema.
É igualmente necessário garantir uma infraestrutura tecnológica robusta, uma metodologia que não ocupe
desnecessariamente os operadores, afastando-os e formação adequada dos profissionais envolvidos, para
evitar interrupções no sistema judicial, e garantir uma administração eficiente da justiça.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentalmente aplicáveis, os Deputados do Grupo
Parlamentar do Chega recomendam ao Governo que:
1 – Suspenda com efeitos imediatos a aplicação da Portaria n.º 86/2023, de 27 de março, que estabelece as
novas regras para a distribuição eletrónica de processos, devido ao aumento da carga burocrática, e potencial
ineficiência do novo sistema de distribuição;
2 – Realize uma reavaliação abrangente dos mecanismos de distribuição dos processos judiciais em
Portugal, assegurando a participação e consulta de profissionais do setor, incluindo os magistrados judiciais, os
representantes do Ministério Público, os advogados e outras partes interessadas;
3 – Após a reavaliação, apresente um relatório à Assembleia da República contendo as conclusões,
recomendações e medidas propostas para aperfeiçoar o sistema de distribuição de processos, com base nas
contribuições recebidas, e nas melhores práticas internacionais.
Palácio de São Bento, 12 de maio de 2023.
Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo —Gabriel
Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias
— Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.
3 Vide https://www.tsf.pt/portugal/sociedade/alteracoes-a-distribuicao-eletronica-de-processos-judiciais-entram-em-vigor-sob-criticas-16333 674.html 4 Vide https://visao.sapo.pt/opiniao/bolsa-de-especialistas/2023-04-03-a-falacia-da-lei-sobre-a-distribuicao-eletronica-dos-processos-judiciais/ 5 Vide https://www.rtp.pt/noticias/pais/bastonaria-da-ordem-dos-avogados-criticou-dia-de-caos-na-justica_v1485817 6 Vide https://tek.sapo.pt/noticias/internet/artigos/sistema-informatico-citius-em-baixo-para-atualizacoes-ate-ao-final-da-semana