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Segunda-feira, 16 de outubro de 2023 II Série-A — Número 19

XV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2023-2024)

S U M Á R I O

Projetos de Lei (n.os 945 e 947 a 953/XV/2.ª): N.º 945/XV/2.ª — Reduz a taxa de IVA para 13 % e procede à revogação da taxa adicional de ISP sobre os combustíveis: — Alteração de título e texto do projeto de lei. N.º 947/XV/2.ª (BE) — Proíbe a venda de casas a não residentes. N.º 948/XV/2.ª (BE) — Controlo de rendas para defender o direito à habitação. N.º 949/XV/2.ª (BE) — Limita a variação da taxa de esforço no crédito à habitação. N.º 950/XV/2.ª (BE) — Cria um limite para o aumento de rendas em 2024. N.º 951/XV/2.ª (BE) — Elimina com efeitos imediatos o regime do residente não habitual.

N.º 952/XV/2.ª (PS) — Combate ao desperdício alimentar. N.º 953/XV/2.ª (PSD) — Procede à alteração dos limites territoriais entre a freguesia de Fontelonga e a União das Freguesias de Lavandeira, Beira Grande e Selores do concelho de Carrazeda de Ansiães. Projetos de Resolução (n.os 940 a 942/XV/2.ª): N.º 940/XV/2.ª (CH) — Recomenda ao Governo o alargamento urgente da rede de cuidados paliativos. N.º 941/XV/2.ª (PS) — Recomenda ao Governo a adoção de medidas de compensação à apicultura. N.º 942/XV/2.ª (CH) — Recomenda ao Governo que dê cumprimento à Resolução da Assembleia da República n.º 160/2021, de 14 de maio, relativa à proteção dos pais em caso de perda gestacional.

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PROJETO DE LEI N.º 945/XV/2.ª(*)

REDUZ A TAXA DE IVA PARA 13 % E PROCEDE À REVOGAÇÃO DA TAXA ADICIONAL DE ISP

SOBRE OS COMBUSTÍVEIS

Exposição de motivos

É indiscutível a nossa dependência dos combustíveis fósseis. Para que haja uma verdadeira perceção da

realidade, em 2002 surgiu um relatório da IEA – International Energy Agency1, que dizia que 34,9 % da matriz

energética mundial derivava do petróleo e 21,2 % era fruto de gás natural.

Em Portugal, as famílias portuguesas deparam-se na atualidade com preocupantes problemas económico-

financeiros, fruto não só da conjuntura existente, com os mercados internacionais em constante instabilidade,

mas, sobretudo, com as constantes mutabilidades dos mercados energéticos e dos combustíveis fósseis.

Há que perceber o que leva a estas oscilações constantes de mercado, que tanto oneram o bolso de todos

os cidadãos portugueses.

Decomposição do preço2 do gasóleo à cotação de 1,49 € do dia 06/10/2023, como mero exemplo:

Decomposição do preço3 da gasolina à cotação de 1,609 € do dia 06/10/2023, como mero exemplo:

Para melhor entendimento sobre os preços de referência de mercado, há que entender a sua composição.

Dentro de cada litro de combustível que cada português coloca no seu depósito estão inclusos:

a) Preço da matéria-prima, que é de cotação diária e emitida internacionalmente pela Argus Media;

b) Custo do transporte do produto petrolífero para o terminal correspondente nacional;

c) Custo de incorporação dos substitutos de gasóleo, responsáveis pela redução de emissões de gases com

1 https://educacao.uol.com.br/disciplinas/geografia/fontes-de-energia-2-carvao-petroleo-gas-agua-e-uranio.htm 2 https://www.ense-epe.pt/decomposicao-de-preco/ 3 https://www.ense-epe.pt/decomposicao-de-preco/

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efeito de estufa (GEE). Obrigação nacional anual prevista no n.º 1 do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 84/2022, de

9 de dezembro4;

d) Custos para a parte das reservas de segurança constituída e controlada diretamente pela entidade central

de armazenagem – a ENSE;

e) Custos com operações logísticas de receção de petróleo bruto ou produtos derivados de petróleo e

respetiva armazenagem temporária;

f) ISP – Impostos sobre todos os produtos petrolíferos e energéticos, se forem consumidos ou vendidos

para uso carburante ou combustível. Nesta página, o ISP incorpora igualmente o valor da taxa de contribuição

rodoviária e da taxa de carbono;

g) IVA – Imposto sobre o valor acrescentado aplicado a todas as componentes que compõem o preço,

incluindo o ISP.

Traduzindo em percentagem aproximadamente à data de 06/10/2023, podemos elencar o seguinte:

a) Gasóleo

1 – Matéria-prima, transporte, descarga, refinação, biocombustíveis, reserva e armazenamento – 51,55 %

2 – ISP – 29,73 %

3 – IVA – 18,72 %

A totalidade de impostos sobre o preço final do gasóleo é de sensivelmente – 48,45 %

b) Gasolina

1 – Matéria-prima, transporte, descarga, refinação, biocombustíveis, reserva e armazenamento – 45,37 %

2 – ISP – 35,92 %

3 – IVA – 18,71 %

A totalidade de impostos sobre o preço final da gasolina é de sensivelmente – 54,63 %

De acordo com a notícia de 24 de agosto do sapo.pt, «Com preços do petróleo sem sinais de quebra, alívio

nos combustíveis está nas mãos do fisco»5. Mais informa que «Subida da cotação do Brent, que deve continuar

impulsionada pela OPEP+ e carga fiscal a 50 % levaram combustíveis em Portugal a máximos de 10 meses».

De acordo com o último relatório6 da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), referente aos

preços médios praticados na UE no 2.º trimestre de 2023, «Portugal situa-se na décima primeira posição dos

países que vendem gasolina 95 simples a um preço mais elevado, sendo que o preço praticado corresponde a

uma diferença de 37,8 cent/l e 28,1 cent/l, face ao país com os preços mais baixos e ao país com os preços

mais altos, respetivamente».

Convém salientar, que o Leste da Europa praticou os preços médios de venda de gasolina 95 simples mais

baixos na UE. Dos restantes países europeus, a Finlândia, a Dinamarca, a França, a Grécia, assim como a

Alemanha, a Itália, e os Países Baixos apresentaram os PMV de gasolina 95 simples mais altos da UE.

No mesmo período, e no que aos preços do gasóleo simples diz respeito, verificou-se que a Europa de Leste

é a região que, genericamente, praticou os preços mais baixos a nível europeu. A Suécia e a Finlândia, em

conjunto com a França e a Itália, apresentaram os preços de gasóleo simples mais altos da UE. O PMV diminuiu

em média cerca de 14,8 cent/l na UE-27, comparado com o preço médio no trimestre anterior.

«Portugal situa-se na décima segunda posição dos países que vendem gasóleo simples mais barato na UE,

sendo que o preço praticado corresponde a uma diferença de 25,3 cent/l (relativamente a Malta) e 43,2 cent/l

(referente à Suécia) face ao país com os preços mais baixos e ao país com os preços mais altos,

respetivamente».

O Estado português arrecadou nos cofres públicos, nos últimos 7 anos, a quantia de aproximadamente 27 mil

4 https://diariodarepublica.pt/dr/detalhe/decreto-lei/84-2022-204502328 5 https://eco.sapo.pt/2023/08/24/com-precos-do-petroleo-sem-sinais-de-quebra-alivio-nos-combustiveis-esta-nas-maos-do-fisco/ 6 https://www.erse.pt/media/p0wjysue/2-t2023-boletim-pre %C3 %A7os-ue-27.pdf

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milhões de euros em ISP – imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos –, segundo dados da Pordata.7

De acordo com os últimos dados globais fornecidos pelo INE8, um dos motivos que fez com que a taxa de

inflação quebrasse o ciclo de descida prendeu-se sobretudo com o facto de os combustíveis voltarem a subir de

forma acentuada. Baseado nos dados do INE, o preço do gasóleo subiu cerca de 10,5 % face a julho e a gasolina

subiu na ordem dos 8,1 %.

Face a esta conjuntura, as famílias voltam a ser as mais atingidas e as que mais sofrem neste panorama. De

acordo com a notícia do Jornal de Notícias, de 28/09/20239, a taxa de carbono quase que triplicou no gasóleo,

de 5 para 14 cêntimos por litro.

De acordo com a mesma notícia, «[…] ter um automóvel não é sinal de riqueza. Para muitos cidadãos, […]

é uma ferramenta essencial. Cobrar 50 % de imposto sobre um bem essencial não promove a justiça ambiental,

tem outro nome: saque fiscal».

Fazendo um mero exercício exemplificativo, se se enchesse um depósito de 50 litros de gasóleo, uma vez

por semana, durante um ano inteiro, a preços de maio, o valor era de 3624 €/ano, e de 4167 €/ano na gasolina.

A preços de setembro, e a manter-se o cenário, serão 4643 €/ano para o gasóleo e 4830 €/ano a gasolina. Em

suma, 50 % dos valores apresentados revertem para os cofres do Estado.

Assim, é fundamental reduzir o preço dos combustíveis, sendo uma das formas mais eficientes de o fazer,

através da redução dos impostos.

Face ao exposto, vem o Grupo Parlamentar do Chega propor a eliminação do adicional do ISP – imposto

sobre os produtos petrolíferos e energéticos – e a redução da taxa de IVA de 23 % para 13 %, como forma de

mitigar a carga fiscal e facilitar a vida de todos os portugueses.

A referida redução da taxa de IVA é permitida pela Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro

de 2006, mais especificamente pelo artigo 118.º, que dispõe que «Os Estados-Membros que, em 1 de janeiro

de 1991, aplicavam uma taxa reduzida às entregas de bens e às prestações de serviços não referidas no Anexo

III podem aplicar a taxa reduzida ou uma das duas taxas reduzidas previstas no artigo 98.º a essas entregas de

bens ou prestações de serviços, desde que essa taxa não seja inferior a 12 %». Ora, atendendo a que naquela

data efetivamente a gasolina, gasóleo e fuelóleo se encontravam a taxa reduzida, então, não se verifica qualquer

impedimento comunitário para que volte a estar.

Assim, nos termos constitucionais e legalmente aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do Chega

apresentam o seguinte projeto de lei:

7 https://www.pordata.pt/db/portugal/ambiente+de+consulta/tabela 8 https://www.publico.pt/2023/09/12/economia/noticia/combustiveis-travaram-descida-inflacao-agosto-2063041 9 https://www.jn.pt/3788443201/o-saque-fiscal-nos-combustiveis/

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Artigo 1.º

Objeto

O presente diploma, pretende eliminar o adicional do ISP e reduzir a taxa de IVA de 23 % para 6 %.

Artigo 2.º

Revogação da Portaria n.º 24-A/2016, de 11 de fevereiro

É revogada a Portaria n.º 24-A/2016, de 11 de fevereiro, e demais alterações à mesma, no que ao imposto

adicional de ISP diz respeito.

Artigo 3.º

Alteração à Lista II – do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado

É aditada à Lista II, anexa ao Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de dezembro, que aprova o Código do Imposto

sobre o Valor Acrescentado, a verba 2.42, com a seguinte redação:

«Lista II

Bens e Serviços Sujeitos a Taxa Intermédia

1.13 Gasolina e gasóleo rodoviário.»

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da publicação do Orçamento do Estado subsequente à sua

aprovação.

Palácio de São Bento, 16 de outubro de 2023.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel

Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias

— Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.

(*) O título e o texto da iniciativa foram publicados no DAR II Série-A n.º 15 (2023.10.09) e substituídos, a pedido do autor, em 16 de

outubro de 2023.

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PROJETO DE LEI N.º 947/XV/2.ª

PROÍBE A VENDA DE CASAS A NÃO RESIDENTES

Exposição de motivos

Em Portugal, o direito fundamental a uma casa está por cumprir. Na última década (2011-2021), os preços

das casas em Portugal aumentaram 80 % e as rendas subiram 42 %. Os residentes no País gastam com a casa

uma percentagem brutal dos seus rendimentos, pagando o preço de políticas públicas que promoveram a

especulação e o turismo residencial de luxo.

Durante a intervenção da troica, a atração de capitais estrangeiros para o imobiliário constituiu uma estratégia

para potenciar as receitas fiscais e a rentabilidade do setor. Depois de desmantelar as leis que protegiam o

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arrendamento, o Governo do PSD/CDS-PP dedicou-se a aprofundar as medidas que transformaram Portugal

num paraíso para fundos imobiliários, vistos gold, nómadas digitais e residentes não habituais. Esta política

produziu os resultados pretendidos. À medida que os preços dos imóveis disparavam, multiplicaram-se também

as entidades dispostas a lucrar com a especulação.

Em 2015, quando o PS chegou ao poder, a habitação já era uma bomba-relógio, mas nada impediu o novo

Governo de manter as leis que promovem a venda de imóveis a capitais estrangeiros. Com o apoio da direita, o

ex-Ministro Siza Vieira apostou mesmo na criação de novas formas de exploração financeira do imobiliário, com

a constituição das SIGI, sociedades de investimento e gestão imobiliária. Este foi o contexto perfeito para o

crescimento do negócio, num período em que a política de juros baixos (e até negativos) empurrava os capitais

internacionais para a rentabilidade garantida do imobiliário.

A crise da habitação não é, assim, uma singularidade portuguesa, mas o fruto da conjugação entre a

liberalização dos mercados de habitação e a política monetária expansionista, à saída de uma crise financeira

que reduziu as taxas de rentabilidade do capital financeiro. Os Governos portugueses só agravaram esta

tendência, com as suas políticas de privilégio e desigualdade.

Com o apoio da legislação europeia, o imobiliário transformou-se numa classe de ativos para investidores

institucionais internacionais. Num estudo recente sobre a financeirização do mercado imobiliário na Europa1, os

economistas Daniela Gabor e Sebastian Kohl, concluem que: «os imóveis residenciais da Europa tornaram-se

uma classe de ativos atraente para investidores em todo o mundo, apoiados por uma série de políticas

governamentais que visam ostensivamente os proprietários de imóveis: o apoio aos mercados imobiliários

aumenta os preços das casas e reduz a acessibilidade para os cidadãos, enquanto o apoio à renda para famílias

que pagam aluguer garante retornos estáveis para os investidores».

Segundo o Banco de Portugal, a evolução do número de não residentes marcou o mercado imobiliário em

Portugal. Em junho de 2022, os não residentes representavam 11,7 % do valor das transações, que estão

particularmente concentradas em Lisboa, Porto e Algarve. Em particular, na área de reabilitação urbana de

Lisboa, foram transacionados 1656 imóveis por não residentes em 2021. Só no primeiro semestre de 2022,

foram 801 imóveis (+35 % do que no mesmo período de 2021), sendo que o valor médio dessas transações por

não residentes é 95 % superior ao das transações feitas por residentes. Esta tendência é acompanhada pelo

aumento verificado na atribuição de vistos gold. Em 2022, foram concedidos 725 vistos gold em Lisboa (+55 %

do que 2021) e 215 no Porto (+216 % do que em 2021).

Este processo de gentrificação e financeirização da habitação motivou a mobilização de cidadãos e

autoridades locais em várias cidades europeias. Em Barcelona e Berlim criaram-se políticas para o controlo das

rendas, enquanto em Amesterdão se optou por limitar o alojamento local e por medidas que impedem a compra

de casas para outros fins que não a habitação permanente. No Canadá, o Governo do Partido Liberal proibiu a

venda de edifícios residenciais a estrangeiros, medida que já tinha sido implementada na Nova Zelândia e que,

recentemente, será também uma realidade nas ilhas de Ibiza, Maiorca e Menorca. Os defensores destas

medidas, cuja aplicação tem sido dificultada pelo poder dos interesses imobiliários, invocam o mesmo

argumento: a concorrência do capital financeiro e de não residentes endinheirados torna os preços das casas

incomportáveis para os cidadãos locais. Se esta é a realidade no Canadá, nos Países Baixos, na Alemanha ou

na Catalunha, mais o é em Portugal, onde os salários não competem nem com o poder financeiro dos fundos

de investimento, nem como os rendimentos pessoais atraídos pelos regimes dos vistos gold, dos benefícios

fiscais a residentes não habituais, ou a especuladores.

A procura externa, alicerçada em rendimentos de capitais ou pessoais sem comparação em Portugal, não só

contribui para a inflação dos preços da habitação, como demonstra o Banco de Portugal, como inviabiliza as

tímidas medidas destinadas a promover a habitação, desviando recursos e vontades para os segmentos

turísticos e de luxo.

Como demonstram as experiências internacionais, o processo de inflação imobiliária requer medidas

excecionais, destinadas a proteger o direito à habitação. Para além da revogação das medidas de atração de

capital estrangeiro no imobiliário português, o Bloco de Esquerda vem propor a proibição da compra de imóveis

destinados à habitação por não residentes, sempre que estes se localizem em zonas de pressão urbanística.

Esta medida, adotada recentemente, em diferentes versões, pelos Governos dos Países Baixos e do Canadá,

justifica-se pelo reconhecimento da situação de grave violação do direito constitucional à habitação, em nome

1 My home is an asset class. 2022

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de interesses financeiros de curto prazo.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à proibição da venda de imóveis em território nacional a pessoas, singulares ou

coletivas, com residência própria e permanente ou sede no estrangeiro, por forma a combater a escalada de

preços com a habitação.

Artigo 2.º

Definições

Para efeitos da presente lei, entende-se por:

a) «Imóveis», os prédios urbanos nos termos do artigo 204.º, n.º 1 e n.º 2, do Código Civil;

b) «Alienação de imóveis», qualquer tipo de transação que, relativamente a um bem imóvel, vise a

constituição de um direito real relativo a esse imóvel;

c) «Territórios de baixa densidade», os territórios de Nível III da nomenclatura de unidades territoriais para

fins estatísticos (NUTS III) com menos de 100 habitantes por km2 ou um produto interno bruto (PIB) per capita

inferior a 75/prct. da média nacional;

d) «Não residentes», todas as pessoas, singulares ou coletivas, que não tenham a sua residência própria e

permanente ou sede ou direção efetiva em território nacional.

Artigo 3.º

Proibição da alienação de imóveis

1 – Não é permitida a alienação, de forma direta ou indireta, de imóveis a não residentes.

2 – O disposto no n.º 1 do presente artigo aplica-se igualmente:

a) A sociedades comerciais, com sede em Portugal, cujo beneficiário efetivo, nos termos da Lei n.º 89/2017,

de 21 de agosto, na sua redação atual, seja não residente;

b) A pessoas que detenham visto de residência com fundamento no artigo 3.º, n.º 1, alínea d) e artigo 90.º-A

da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, na sua redação atual.

3 – O disposto no n.º 1 do presente artigo não se aplica a:

a) Cidadãos portugueses com residência própria e permanente fora de Portugal;

b) Imigrantes que possuam autorização de residência permanente nos termos dos artigos 76.º a 80.º da

Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, na sua redação atual;

c) Pessoas abrangidas pela proteção conferida pela Lei n.º 27/2008, de 30 de junho, e pela Lei n.º 67/2003,

de 23 de agosto, ambas na sua redação atual;

d) Cidadãos estrangeiros que adquiram um imóvel, em compropriedade, com o seu cônjuge ou com pessoa

unida de facto;

e) Transações de imóveis em territórios de baixa densidade.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

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Assembleia da República, 15 de outubro de 2023.

As Deputadas e os Deputados do BE: Mariana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Joana Mortágua — Isabel

Pires — José Moura Soeiro.

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PROJETO DE LEI N.º 948/XV/2.ª

CONTROLO DE RENDAS PARA DEFENDER O DIREITO À HABITAÇÃO

Exposição de motivos

A última década viu o preço da habitação subir desmesuradamente para níveis incompatíveis com os

rendimentos médios dos trabalhadores. Ana Cordeiro Santos calcula que, a partir de 2013, os preços reais da

habitação terão crescido 51 %, enquanto os salários terão aumentado apenas à razão de 4 %. Entre

arrendatários, 26 % tinham, em 2019, despesas superiores a 40 % dos seus rendimentos.

Em Lisboa, Porto e cidades mais pressionadas os valores são bem mais preocupantes, tanto mais que a

percentagem da população em situação de arrendamento é bastante superior à média do País. No Porto e em

Lisboa mais de 40 % da população arrenda uma habitação e, entre 2011 e 2021, segundo dados do Censos, o

arrendamento apenas subiu 2 % em Lisboa e 4 % no Porto – enquanto a média nacional alcança os 16 % de

aumento no arrendamento. Estamos a falar de cidades com habitação pública na ordem dos 10 % – Porto – e

7 % – Lisboa.

Sobre os preços do imobiliário, só de 2021 para 2022 o preço da habitação aumentou 13,5 % (terceiros

trimestres). Na última década (2010-2022), os preços das casas em Portugal aumentaram 80 % e o valor médio

mensal das rendas subiu 42 %. A habitação passou a ser um veículo financeiro para «investimento» e

«depósito» de grandes fortunas e de fundos de investimento. Foi um fenómeno global que ocorreu ao mesmo

tempo que se registou uma acumulação de capital sem paralelo. A desigualdade social foi decisiva para

transformar a habitação em «ativo financeiro» que, por sua vez, reproduz as desigualdades.

Em Portugal, esta realidade teve um impacto muito relevante dada a escassa oferta pública, a total

liberalização do setor, os incentivos e benefícios fiscais à especulação imobiliária e os baixos salários da

generalidade dos trabalhadores. Portugal é dos países da União Europeia onde as rendas mais aumentaram

desde 2015. A brecha social decorrente dessa falta de acesso à habitação tem vindo a ser analisada e existem

já dados preocupantes sobre a incapacidade de acesso da população mais jovem à habitação. O acesso – ou

falta dele – a uma habitação é um novo risco social2.

Na panóplia de políticas de habitação recentes, inscritas na nova geração de políticas de habitação (NGPH),

faltam mecanismos que levem a uma redução substancial das rendas praticadas em Portugal, assim como a

modificações da lei do arrendamento mais protetoras dos inquilinos no arrendamento privado. O mesmo ocorre

no Programa Nacional de Habitação. Esta questão é relevante já que em 1990, 2006 e 2012 existiram alterações

de política que levaram a uma redução substancial da estabilidade dos contratos de arrendamento, permitindo

períodos de contrato muito reduzidos e a liberalização dos preços. A par com mecanismos potenciadores da

especulação – vistos gold, regime do residente não habitual, benefícios a fundos de investimento imobiliário,

liberalização do alojamento local – a pressão sobre a habitação foi exponenciada e o País enfrenta uma crise

habitacional que não tem resposta que a trave. Em 2019, as alterações à lei do arrendamento não recuperaram

sequer o período mínimo de 5 anos para a existência de contratos mais estáveis.

Estamos neste momento numa situação díspar, em que contratos anteriores a 1990 – no Porto e Lisboa,

segundo o Censos, são apenas 36 000 e 152 000 no País – estão ainda protegidos a nível temporal e de valor

de rendas e os restantes são contratos temporalmente muito reduzidos e com rendas exorbitantes. Ao contrário

do que tem vindo a ser dito, a liberalização total de 2012 não trouxe dinamismo ao mercado de arrendamento

privado, já que, entre 2011 e 2021, no Porto e em Lisboa, não houve mais do que 2 % e 4 % de aumento de

2 05_JI_Housing_EN_NC_web.pdf (gulbenkian.pt)

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alojamentos em arrendamento privado. Também isto nos leva a crer que a reabilitação ocorrida nestas cidades

terá sido maioritariamente canalizada para outros fins, nomeadamente potenciada por fundos comunitários e

benefícios fiscais direcionados ao uso turístico ou benefícios fiscais canalizados para uso

especulativo/financeiro. De facto, todos os problemas estruturais do nosso edificado (desde logo do ponto de

vista energético) se mantêm, expondo que a tão propalada reabilitação foi de fraca qualidade, visando apenas

o lucro rápido.

Em vários países europeus a política de limitação de rendas tem vindo a ser uma das ferramentas aplicadas,

demonstrando que estabilização das rendas pode ser preponderante para a efetiva implementação de outras

políticas públicas de habitação. Estamos perante soluções diferentes, e com outros critérios, da ideia do

congelamento de rendas que Portugal aplicou – na I República, no Estado Novo e até 1990. Não falamos de um

preço administrativo único e sem alterações, mas sim de mecanismos flexíveis, que equilibram os preços das

rendas garantindo atualizações e que têm vindo a ter efeitos positivos na manutenção ou expansão da dimensão

do mercado de arrendamento (The IUT, 20183).

A Constituição da República Portuguesa estipula o direito à propriedade, assim como estipula o direito à

habitação e um vasto número de direitos que decorrem do acesso pleno à habitação. Deste modo, é necessário

conceber um conjunto de regras sociais que permita a concretização destes direitos e de uma vida digna,

saudável e plena. Há certamente vários caminhos para o fazer, mas é inegável que o direito de fundos

imobiliários ou grandes proprietários a açambarcar habitações, a estabelecer preços incomportáveis e assim

condicionar o mercado atenta contra o direito à habitação, contra uma economia justa para todos e contra a

coesão social.

Para procurar resolver este problema, 13 países da União Europeia estabeleceram mecanismos de controlo

de rendas, a que se juntam ainda países como o Reino Unido, a Noruega e a Suíça. As medidas são variadas

e incluem a determinação de um valor inicial para a renda (dependente de requisitos específicos) e a limitação

ou proibição de aumento das rendas. No que diz respeito aos 38 países da Organização para a Cooperação e

Desenvolvimento Económico (OCDE), 23 impõem regulação a aumentos durante a duração do contrato e em

13 existe algum tipo de regulação do valor inicial.

O relatório Rent Control: Principles, Practicalities and International Experience, elaborado pela UK

Collaborative Center for Housing Evidence – amplamente difundido numa peça do Diário de Notícias –, compilou

esta realidade e dá inclusive conta de que existem normas de controlo de rendas iniciais na Áustria, Dinamarca,

França, Alemanha, Irlanda, Holanda, Suécia e nas grandes cidades de França. E há controlo e limitações de

renda na Áustria, Bélgica, Croácia, Chipre, Dinamarca, França, Alemanha, Irlanda, Luxemburgo, Holanda,

Noruega, Polónia, Escócia, Espanha, Suécia e Suíça.

Relatou ainda que o uso do termo «renda usurária» é utilizado em vários países para designar rendas

especulativas fixadas acima do admissível, tendo em conta as características do locado e/ou o valor de

referência do mercado. Sendo que, na Alemanha, as rendas usurárias são um crime previsto na secção 291

(usura), que é punível com três anos de prisão ou multa. Ainda na Alemanha, existe desde longa data uma

limitação percentual ao aumento da renda e, a partir de 2015, passou a existir também um limite à renda inicial

em zonas de carência aguda de habitação, que não pode ser fixada em mais de 10 % acima do valor médio

praticado na área.

Em França, existe igualmente, desde 1989, o controlo da renda inicial de um contrato nessas zonas de

carência habitacional, que tem como referência um índice oficial e só o pode ultrapassar em 20 %.

No Estado espanhol, o Governo abriu a porta a que os governos das autonomias possam criar leis de controlo

de rendas a grandes proprietários em zonas de pressão habitacional e que criem incentivos fiscais aos pequenos

proprietários para baixar as suas rendas, permitindo assim que o governo autonómico da Catalunha possa voltar

a esse tema depois de o Tribunal Constitucional ter rejeitado a sua iniciativa. Um relatório recente4 do

Observatori Metropolità de l'Habitatge, de Barcelona, concluiu que existe um impacto positivo da aplicação da

regulação de rendas e conduz à redução dos valores das rendas, principalmente nos primeiros meses de

aplicação, e que não houve lugar a uma diminuição dos contratos de arrendamento nestes territórios e em

Barcelona aumentaram expressivamente (+7,3 %).

No Luxemburgo, à exceção do segmento de luxo, desde 2006 a lei estabelece regras para evitar as referidas

rendas usurárias e, sendo assim, as rendas não podem exceder anualmente o correspondente a 5 % do capital

3 IUT-position-paper-for-the-EU-Partnership-for-Housing-040518FINAL.pdf 4 O22015_LAB_Control-lloguer_ampliada_Informe.pdf (ohb.cat)

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investido pelo proprietário. Note-se que esta lei foi da autoria do então Primeiro-Ministro Jean Claude Juncker,

que viria a ser presidente da Comissão Europeia e que pertence ao Partido Popular Social Cristão (filiado no

Partido Popular Europeu). Presentemente, o Luxemburgo estuda alterações à lei para reduzir o aumento das

rendas, nomeadamente reduzir o valor de 5 % para 3 % a 3,5 %, especificar a forma de cálculo do capital

investido e eliminando o conceito de segmento de luxo.

Em Portugal, existe, como referimos, uma exceção nos contratos celebrados anteriormente a 1990 – um

sistema bastante marcado no tempo e de uma realidade diferente da atual que não se procura replicar – em que

os aumentos de renda são limitados à inflação. Fora isso, o mercado habitacional está liberalizado com os

enormes impactos sociais conhecidos, mesmo que tenham existido tentativas de um programa de limitação de

rendas – 20 % abaixo do preço de mercado – através da atribuição de benefícios fiscais aos senhorios – isenção

de IRS e IMI. Mesmo com estes benefícios, a adesão tem sido muito pouco relevante e não existe uma limitação

efetiva ao escalar do valor das rendas.

A realidade da União Europeia e de outros países da OCDE mostra que a regulamentação e o controlo de

rendas conseguiram travar o seu aumento desmesurado. Os mitos que frequentemente se invocam quando se

propõe este tipo de políticas não existem: nestes países as habitações não desapareceram do mercado, existe

investimento na reabilitação de habitações e os proprietários garantem remuneração bastante do arrendamento,

(em Barcelona os contratos até aumentaram). Aliás, segundo o estudo de Kettunen & Ruonavaara (2020) no

mercado privado de arrendamento liberalizado as quotas situam-se entre 1,7 % e 19,8 %, enquanto nos

mercados com alguma regulação a quota de arrendamento privado varia entre os 8 % e os 50 %5. Isto, a par

com as políticas certas de disponibilização de edificado.

No presente projeto de lei, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta um conjunto de normas

para o controlo de rendas e a estipulação de rendas máximas que permitam defender o direito à habitação.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à décima segunda alteração ao Novo Regime do Arrendamento Urbano, aprovado

pela Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, implementando limitações aos valores de rendas habitacionais para

defesa do direito à habitação.

Artigo 2.º

Aditamento à Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro

É aditado o artigo 24.º-A à Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, com a seguinte redação:

«Artigo 24.º-A

Renda máxima permitida

1 – Os novos contratos de arrendamento têm como valor limite de renda mensal o definido por portaria dos

membros do Governo, tendo em consideração, designadamente, os seguintes fatores:

a) Área;

b) Qualidade do alojamento e das partes comuns do edifício onde se localiza, nomeadamente:

i) Anomalias na estrutura, cobertura, paredes, pavimentos, escadas, janelas, portas e instalações

técnicas;

ii) Falta de luz e ventilação natural;

iii) Inexistência de instalações sanitárias e de banho;

iv) Cozinha com equipamento básico de fogão e frigorífico;

5 Full article: Rent regulation in 21st century Europe. Comparative perspectives (tandfonline.com)

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v) Instalações adequadas e funcionais de eletricidade, de distribuição de água e de drenagem de águas

residuais.

c) Certificação energética;

d) Localização;

e) Valor mediano das rendas por m2 de novos contratos de arrendamento de alojamentos familiares, de

acordo com a última atualização divulgada pelo Instituto Nacional de Estatística, IP (INE, IP);

f) Tipologia.

2 – Os valores definidos no número anterior não podem ser superiores aos previstos na Portaria n.º 277-

A/2010, de 21 de maio.

3 – Os novos contratos de arrendamento de uma parte de habitação têm como valor limite de renda mensal

o definido por portaria dos membros do Governo, tendo em consideração, designadamente, os seguintes fatores:

a) Valor de referência do preço de renda da habitação onde se insere o alojamento;

b) Área do quarto, que deve possuir uma área útil superior a 6 m2 e ser dotado de iluminação e ventilação

natural através de janela, porta envidraçada ou varanda envidraçada em contacto direto com o exterior;

c) Qualidade do quarto.

4 – A renovação de contratos de arrendamento tem como valor limite de renda mensal os definidos nos n.os

1 a 3, conforme aplicável.

5 – A realização de novos contratos de arrendamento em imóveis arrendados por contrato cessado há menos

de 6 meses e que não tenham sido objeto de obras de beneficiação estão limitados ao valor da renda do contrato

anterior, ou aos limites definidos no n.º 1 caso seja inferior.

6 – A realização de novos contratos de arrendamento de uma parte de habitação arrendada por contrato

cessado há menos de 6 meses e que não tenha sido objeto de obras de beneficiação estão limitados ao valor

da renda do contrato anterior, ou aos limites definidos no n.º 3 caso seja inferior.»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 15 de outubro de 2023.

As Deputadas e os Deputados do BE: Mariana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Joana Mortágua — Isabel

Pires — José Moura Soeiro.

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PROJETO DE LEI N.º 949/XV/2.ª

LIMITA A VARIAÇÃO DA TAXA DE ESFORÇO NO CRÉDITO À HABITAÇÃO

Exposição de motivos

Escalada histórica dos preços da habitação em Portugal

Segundo o índice de preços da habitação, publicado pelo Banco de Portugal, o custo da habitação em

Portugal duplicou entre 2015 e 2023, ultrapassando em muito a subida de preços sentida noutros setores.

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Fonte: BdP

Na prática, segundo dados do INE, no primeiro trimestre de 2023, o preço mediano das vendas de

alojamentos familiares custava mais 500 € por m2 do que no período homólogo de 2019. Na Área Metropolitana

de Lisboa, esse aumento foi de 853 €, na Área Metropolitana do Porto foi de 681 €.

Fonte: INE

Esta escalada histórica dos preços da habitação em Portugal, que antecede o processo inflacionista atual,

tem causas concretas: a promoção do turismo habitacional de luxo, com o regime do residente não habitual ou

os vistos gold; a liberalização do mercado do arrendamento; a proliferação desenfreada do alojamento local; ou

os incentivos fiscais aos fundos de investimento imobiliário, que contribuíram para tornar a habitação num

investimento especulativo, no contexto de um cenário de taxas de juro historicamente baixas.

Sem surpresas, à evolução dos preços de compra de habitação em Portugal correspondeu o aumento do

volume de empréstimos destinados a este fim, em particular a partir de 2021. Uma vez que o número de

devedores particulares se mantém relativamente inalterado ao longo deste período (2 milhões em agosto de

2023), conclui-se que o valor dos empréstimos mais recentes e, consequentemente, das prestações, aumentou

ao longo dos últimos anos.

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Fonte: BdP

O aumento das taxas de juro e dos lucros da banca

O recente aumento do preço dos empréstimos coloca muitos devedores bancários sob enorme pressão. Num

ano, desde agosto de 2022, a taxa de juro cobrada pelos bancos nos novos empréstimos aumentou 2,2 pontos

percentuais (pp), refletindo o movimento da Euribor, a que estão indexados os contratos de hipoteca em

Portugal. Em agosto deste ano, a taxa de juro reportada pelo Banco de Portugal atingiu os 4,23 %, depois do

maior aumento mensal desde 2003.

Fonte: BdP e BCE

O aumento substancial das prestações associadas ao crédito à habitação não é uma mera hipótese teórica

– uma parte significativa de todos os empréstimos estão associados a taxas de juro variáveis.

No caso de um contrato indexado à Euribor a 12 meses que tenha sido atualizado em agosto, o aumento da

prestação mensal poderá atingir os 265 €, ou seja, o dobro do apoio único de 125 € por pessoa atribuído pelo

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Governo em setembro do ano passado1. Em 2022, a DECO anunciava ter recebido 31 500 pedidos de ajuda de

famílias, o mais alto de sempre, com dificuldades em fazer face ao aumento do custo de vida, em particular ao

pagamento da prestação da casa (um terço). Em relação ao primeiro trimestre deste ano, período em que o

número de pedidos de ajuda somou já 7500, aumentaram para 44 % os que invocaram aquele motivo.

Como contrapartida do aumento dos juros, os bancos têm vindo a apresentar, desde o primeiro semestre de

2021, um aumento muito substancial dos seus lucros. Só no primeiro semestre de 2023, e depois da limpeza do

balanço do Novo Banco com recurso a fundos públicos, os cinco maiores bancos nacionais reportaram lucros

totais de 1994 milhões de euros.

Banco (consolidado)/ M€2020 S12021 S12022 S12023 S1

CGD 248,6 294,2 485,7 607,9

Millenium 76 12 75 423,2

NB -377,8 137,7 266,7 373,2

Santander 154,5 81,4 241,3 333,7

BPI 42,6 185,1 201 256,2

Total143,9710,412701994

Um contexto explosivo que requer de respostas urgentes

Ao aumento do preço da habitação, que se faz sentir nos contratos mais recentes, juntam-se dois fatores

conjunturais capazes de precipitar uma crise de rendimentos e despejos em Portugal. Por um lado, a inflação,

que, na ausência de atualizações remuneratórias, já consome o equivalente a um salário médio mensal. Por

outro, o aumento abrupto das taxas de juro, que contribuirá para a rápida degradação do poder de compra dos

trabalhadores e correspondente reforço dos lucros bancários.

Este contexto requer soluções que aliviem os orçamentos familiares e protejam o direito à habitação. É nesse

sentido que aponta o pacote de medidas que o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta, e de que

este projeto de lei é parte integrante.

Com este projeto de lei, pretende-se proteger os mutuários de crédito à habitação para habitação própria e

permanente dos aumentos das taxas de juro e das prestações mensais associadas, por via da manutenção da

taxa de esforço verificada em 2021. A taxa de esforço, definida pelo Banco de Portugal, corresponde ao

quociente entre os encargos associados a empréstimos bancários e o rendimento mensal dos mutuários. De

acordo com as recomendações do supervisor, que define o indicador debt service-to-income (DSTI), a taxa de

esforçomáxima para concessão de crédito deverá ser de 50 %.

Com a inflação sentida nos últimos meses e o recente aumento das taxas de juro, um número significativo

de famílias viu as suas prestações do crédito à habitação disparar relativamente ao seu rendimento disponível.

Assim, para assegurar a estabilidade financeira dos mutuários, são necessárias medidas excecionais que

impeçam variações súbitas das taxas de esforço – limitando-as a 2 pontos percentuais face à média de 2021 –

e que impeçam que, em qualquer caso, esta supere os 50 %.

As instituições financeiras deverão assim renegociar os spreads e restantes condições associadas aos

contratos de crédito habitacionais com taxa de juro variável, de forma que o DSTI, calculado considerando o

aumento na taxa Euribor, não registe um aumento médio anual acima de 2 pontos percentuais, não

ultrapassando, em qualquer circunstância, o valor máximo de 50 %.

Assim, e nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

1 Para um empréstimo de 150 mil euros, a 30 anos, com um spread de 1 %.

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Artigo 1.º

Objeto

A presente lei impõe a renegociação temporária das condições contratuais dos créditos à habitação, quando

destinados a habitação própria e permanente, de forma a limitar a variação da taxa de esforço dos mutuários.

Artigo 2.º

Âmbito

1 – O presente diploma aplica-se às operações de crédito à habitação a que, por via do aumento das taxas

de juro, estejam associadas prestações mensais correspondentes a uma variação da taxa de esforço superior

a 2 pp, ou que ultrapasse os 50 %.

2 – Para efeitos do número anterior consideram-se:

a) Por «operações de crédito à habitação», todas as operações de crédito, bem como de locação financeira,

de imóveis elegíveis, destinadas à aquisição ou construção de habitação própria e permanente, concedidas por

instituições de crédito, sociedades financeiras de crédito, sociedades de investimento, sociedades de locação

financeira, sociedades de factoring e sociedades de garantia mútua, bem como por sucursais de instituições de

crédito e de instituições financeiras a operar em Portugal, adiante designadas por «instituições»;

b) Por «taxa de esforço», o indicador DSTI (debt service-to-income) tal como definido na «Recomendação

do Banco de Portugal no âmbito dos novos contratos de crédito celebrados com consumidores».

Artigo 3.º

Requisitos de aplicabilidade

1 – O regime jurídico constante da presente lei é aplicável às situações de créditos à habitação em que se

verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:

a) O crédito à habitação esteja garantido por hipoteca que incide sobre o imóvel que é a habitação própria

permanente do agregado familiar do mutuário;

b) O valor patrimonial tributário do imóvel não exceda os 250 000 €.

2 – O presente diploma não se aplica às operações de crédito concedido a beneficiários de regimes,

subvenções ou benefícios, designadamente fiscais, para fixação de sede ou residência em Portugal, incluindo

para atividade de investimento, com exceção dos cidadãos abrangidos pelo Programa Regressar.

Artigo 4.º

Renegociação das operações de crédito à habitação

1 – O disposto nos números seguintes é aplicável exclusivamente às operações de crédito destinadas à

aquisição ou construção de habitação própria e permanente.

2 – As instituições estão obrigadas à renegociação das condições contratuais das operações abrangidas de

forma a garantir uma variação máxima da taxa de esforço dos mutuários de 2 pp face à taxa de esforço média

de 2021, ou no momento da contratualização, no caso de contratos realizados em data posterior

3 – Da variação estabelecida no número anterior não pode resultar uma taxa de esforço superior a 50 %.

2 – A renegociação deverá ser promovida pela instituição através da apresentação ao mutuário de uma ou

mais propostas adequadas à sua situação financeira, que devem compreender, designadamente, a redução da

taxa de spread contratualizada.

3 – Na apresentação de propostas aos beneficiários, as instituições observam os deveres de informação

previstos na legislação e regulamentação específicas.

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Artigo 5.º

Garantias dos beneficiários

Na aplicação do presente regime, a instituição está impedida de:

a) Resolver o contrato de crédito com fundamento em incumprimento;

b) Intentar ou prosseguir com ações judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito;

c) Ceder a terceiro uma parte ou a totalidade do crédito; ou

d) Transmitir a terceiro a sua posição contratual.

Artigo 6.º

Proibição de cobrança de comissões

1 – Às instituições está vedada a cobrança de comissões pela renegociação das condições contratuais no

âmbito do presente diploma, designadamente no que respeita à análise e à formalização dessa operação.

2 – O disposto no número anterior não impede a cobrança ao beneficiário, mediante a apresentação da

respetiva justificação documental, de encargos suportados pelas instituições perante terceiros e que estas

possam legitimamente repercutir nos beneficiários, tais como pagamentos a conservatórias, cartórios notariais

ou encargos de natureza fiscal.

Artigo 7.º

Dever de prestação de informação

1 – As instituições têm o dever de divulgar e publicitar o regime excecional previsto no presente diploma, no

seu sítio na internet e através dos contactos habituais com os seus clientes.

2 – O Banco de Portugal regulamenta os moldes em que a prestação de informação prevista no número

anterior deve ser efetivada.

3 – Ao incumprimento do estabelecido no n.º 1 aplicam-se as disposições previstas no n.º 2 do artigo 17.º do

presente diploma.

Artigo 8.º

Supervisão e sanções

1 – O Banco de Portugal é responsável pela supervisão e fiscalização do regime transitório previsto no

presente diploma.

2 – O incumprimento pelas instituições dos deveres previstos no presente diploma ou na regulamentação

adotada pelo Banco de Portugal para a sua execução, constitui contraordenação punível nos termos do artigo

210.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei

n.º 298/92, de 31 de dezembro, na sua redação atual, sendo aplicável ao apuramento da respetiva

responsabilidade contraordenacional o regime substantivo e processual previsto naquele regime geral.

Artigo 9.º

Regulamentação

O Banco de Portugal regulamenta a presente lei num prazo de 30 dias.

Artigo 10.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

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Assembleia da República, 15 de outubro de 2023.

As Deputadas e os Deputados do BE: Mariana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Joana Mortágua — Isabel

Pires — José Moura Soeiro.

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PROJETO DE LEI N.º 950/XV/2.ª

CRIA UM LIMITE PARA O AUMENTO DE RENDAS EM 2024

Exposição de motivos

Portugal vive um contexto inflacionista sem precedentes. A habitação tem vindo a sofrer um processo

autónomo de aumento dos preços, tanto das rendas como dos preços de compra, fruto da especulação, excesso

de liquidez nos mercados internacionais, turismo desregulado, mas também das políticas de atração de

investimento externo para o imobiliário.

Segundo o índice de preços da habitação, publicado pelo Banco de Portugal, o custo da habitação em

Portugal duplicou entre 2015 e 2023. Este aumento, que se traduz na quase impossibilidade de adquirir um

imóvel nas grandes cidades, alastrou-se também às rendas para habitação permanente.

Num contexto de baixos salários, a habitação já é um fator de empobrecimento e exclusão da população dos

maiores centros urbanos, reservados ao turismo e às moradas de luxo. Se a este cenário for somado o presente

processo inflacionista (tendo como pano de fundo a estagnação salarial imposta, desde logo, aos funcionários

públicos), o direito à habitação sofre mais um revés.

No mercado de arrendamento, na generalidade dos casos, a atualização das rendas é feita anualmente. Para

contratos posteriores a 1990, essa atualização reflete o coeficiente de atualização de renda. Assim, em outubro,

é publicado em aviso o valor do coeficiente apurado pelo INE tendo por base a variação do IPC nos últimos 12

meses (com referência a agosto), que no ano passado foi de 5,43 %. No entanto, em 2023 não se aplicou o

coeficiente de atualização anual de renda, sendo o coeficiente a vigorar nos diversos tipos de arrendamento

urbano e rural abrangidos de 1,02. Ainda assim, o coeficiente de atualização das rendas definido para 2023

(1,02) foi o mais alto dos últimos 10 anos.

Já este ano, as rendas atualmente em vigor poderão ser sujeitas a uma atualização de 6,94 % no próximo

ano. Se nada for feito, a mera atualização automática das rendas prevista para 2024, de 6,94 %, será o maior

aumento das rendas nos últimos 30 anos.

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A confirmar-se, este aumento pode conduzir a uma situação insustentável para muitas famílias para quem

as despesas de habitação já são um fator de empobrecimento. A limitação da atualização das rendas é, assim,

uma condição para garantir o direito à habitação num período de extraordinárias dificuldades financeiras para a

generalidade da população. Acresce que este travão a mais um aumento dos preços na habitação se constitui

também como uma forma de contrariar as pressões inflacionistas.

Esta medida, fundada em princípios de justiça social, mas também de racionalidade económica, deve

abranger todos os contratos de arrendamento, independentemente da sua natureza, e aplicar-se também aos

novos contratos, impedindo que este mecanismo seja utilizado como forma de pressionar os inquilinos. Esse

teto deve corresponder aos coeficientes vigentes para 2022, que constam do Aviso n.º 17 989/2021.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei protege os contratos de arrendamento, limitando o aumento de rendas ao coeficiente de

atualização de rendas do ano de 2021.

Artigo 2.º

Limitação ao aumento de rendas

1 – Em 2024 os coeficientes de atualização anual de rendas são fixados nos valores estipulados no Aviso n.º

17 989/2021 (1,0043).

2 – Os coeficientes máximos de atualização de rendas fixados nos termos do número anterior aplicam-se a

todos os contratos de arrendamento, independentemente da sua natureza, e sem prejuízo de regimes mais

favoráveis aplicáveis ao arrendatário.

3 – Para os novos contratos de arrendamento, o valor da renda não pode ser superior ao fixado no contrato

anterior, referente mesmo imóvel, aplicado o coeficiente de 1,0043.

4 – Quando não exista contrato de arrendamento que sirva de referência, o limite referido no n.º 1 aplica-se

tendo em conta o valor da renda média da subsecção estatística da localidade do imóvel, nos termos da última

atualização divulgada pelo Instituto Nacional de Estatística.

Artigo 3.º

Norma transitória

Às atualizações de renda efetuadas a partir da entrada em vigor da presente lei aplica-se o limite estabelecido

no n.º 1 do artigo 2.º.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Assembleia da República, 15 de outubro de 2023.

As Deputadas e os Deputados do BE: Mariana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Joana Mortágua — Isabel

Pires — José Moura Soeiro.

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PROJETO DE LEI N.º 951/XV/2.ª

ELIMINA COM EFEITOS IMEDIATOS O REGIME DO RESIDENTE NÃO HABITUAL

Exposição de motivos

Em vigor desde 2009, o estatuto de residente não habitual atribui benefícios fiscais, durante um período de

10 anos, a quem solicite a residência fiscal em Portugal. A justificação para a introdução destas regalias está

espelhada no preâmbulo do decreto-lei que as cria, onde o argumento é o de «atração da localização dos fatores

de produção, da iniciativa empresarial e da capacidade produtiva no espaço português».

As regalias fiscais aplicam-se a profissionais estrangeiros qualificados em atividades de elevado valor

acrescentado ou com caráter científico, artístico ou técnico, mas também a pensionistas com reformas obtidas

no estrangeiro. Em 2022, o Estado português gastou 1507,9 milhões de euros (subindo de 1271,8 milhões em

2021 e de 972,2 em 2020), englobando os benefícios fiscais a todos os residentes não habituais. Para se ter

uma ideia da ordem de grandeza, o gasto anual da Segurança Social em 2021 com subsídio de desemprego e

apoio ao emprego foi de 1592,5 milhões e com o rendimento social de inserção foi de 356 milhões.

Os efeitos desta medida são perversos e injustos. Um relatório produzido pelo Observatório Fiscal da União

Europeia, em 2021, conclui que o regime português para pensionistas estrangeiros, com uma taxa de imposto

sobre rendimento de pessoas singulares (IRS) de 10 % (que já foi de isenção total), é um dos mais prejudiciais

para a concorrência fiscal na União Europeia (UE). Segundo o relatório, estes regimes têm longas durações,

grandes vantagens fiscais e visam apenas indivíduos de rendimentos muito elevados ou não se repercutem

numa atividade económica real no Estado-Membro.

Mas não são só os pensionistas. Cidadãos não-residentes que declarem viver em Portugal uma parte do ano

podem ainda usufruir de uma taxa plana de IRS de 20 % e de isenção total dos rendimentos de capitais

recebidos. Para além da injustiça face aos residentes em Portugal, este regime é um convite à compra de casas

por não residentes que, partindo de uma situação financeira muito superior à dos residentes, beneficiam ainda

de privilégios fiscais injustificáveis. O regime do residente não habitual é um dos fatores que conduziram

diretamente à crise da habitação, sem que isso tenha levado o Governo a agir para o eliminar. O recente anúncio

do seu fim, feito nos últimos meses de 2003, é ilustrativo da postura do Governo, que entende que finalmente o

regime cumpriu o seu papel, leia-se, inflacionou os preços da habitação. Ainda assim, o anúncio está longe de

ser uma boa notícia para quem, como o Bloco de Esquerda, há muito denuncia o abuso deste regime. Se nada

for feito, o intervalo de tempo entre o anúncio e a concretização da medida provocará uma corrida aos pedidos

de registo, que depois se manterão por 10 anos. Foi assim com os vistos gold e nada indica que será diferente

com o regime do residente não habitual. Acrescente que, como anunciado pelo Ministro das Finanças, o fim do

regime não se fará por completo, prevendo o Governo exceções que mantêm a situação de injustiça e privilégio.

Para evitar os efeitos perversos de anúncios inconsequentes e impedir a continuação do privilégio, agora

com novas regras, o Bloco de Esquerda propõe o fim (com efeito imediato) do regime fiscal para residentes não

habituais em sede de IRS.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à eliminação com efeitos imediatos do regime do residente não habitual, alterando,

para o efeito, o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), aprovado pelo Decreto-

Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro, na sua atual redação.

Artigo 2.º

Norma revogatória

São revogados os n.os 8 a 12 do artigo 16.º, o n.º 6 do artigo 72.º, os n.os 4 a 8 do artigo 81.º, o n.º 8 do artigo

99.º e a alínea d) do n.º 1 do artigo 101.º do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares,

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aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro, na sua redação atual.

Artigo 3.º

Aplicação no tempo

O disposto na presente lei produz efeitos a partir de 2 de outubro de 2023, não sendo admissíveis novos

pedidos a partir desta data.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.

Assembleia da República, 15 de outubro de 2023.

As Deputadas e os Deputados do BE: Mariana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Joana Mortágua — Isabel

Pires — José Moura Soeiro.

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PROJETO DE LEI N.º 952/XV/2.ª

COMBATE AO DESPERDÍCIO ALIMENTAR

Exposição de motivos

Estima-se que um terço de todos os alimentos produzidos no mundo sejam irremediavelmente

desperdiçados. Na Europa, esse é o destino anual de 89 milhões de toneladas de bens passíveis de serem

consumidos e que, ao invés, são perdidos como lixo, maioritariamente pelas famílias (53,6 %) e nos setores de

processamento e transformação (19,4 %).

Em Portugal, os dados oficiais pela primeira vez revelados indicam que, em 2020, foram desperdiçados

1,89 milhões de toneladas de alimentos, com uma média de 183,6 quilos por cada cidadão português, bem mais

do que se estimara anteriormente.

Cada alimento desperdiçado corresponde a todo um processo de utilização de recursos naturais – terra

(muitas vezes desflorestada para fins agrícolas), água, energia proveniente de combustíveis fósseis – mão-de-

obra, fertilizantes químicos, pesticidas, infraestruturas e investimento pecuniário nas diferentes etapas da

cadeia, que poderia ser alocado a outro objetivo mais necessário e que assim se perdeu em toda a linha. É uma

perda superior a 728 mil milhões de euros, todos os anos.

Cada alimento desperdiçado corresponde também a uma onerosa cadeia de circuitos – recolha, tratamento

e deposição de resíduos – até ao destino final. Representa combustível, mão-de-obra, espaço e impacto na

produção de gases nocivos, durante a decomposição.

Vivemos uma época de abundância, em que os países desenvolvidos conseguem, genericamente, fazer

chegar à esmagadora maioria dos seus habitantes alimentos em quantidade e qualidade, por vezes

transportando-os por milhares de quilómetros entre o local de produção e o consumidor final.

Conseguimos produzir praticamente tudo em toda a parte do mundo e durante todo o ano,

independentemente dos custos ambientais que tal implica.

E conseguimos resolver complexas questões técnicas de conservação, armazenamento e distribuição.

O cidadão tem à sua disposição um extraordinário manancial de produtos, numerosas versões do mesmo

alimento no mesmo espaço, diversificadas opções com preços e apresentações para praticamente todos os

gostos e quase todas as carteiras.

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Paradoxalmente, a restante humanidade – muitos milhões de pessoas – não tem o suficiente para sobreviver

e enfrenta problemas de subnutrição que, por afetarem dramaticamente as camadas mais jovens da população,

põem em causa gerações inteiras e o futuro desses povos vulneráveis.

Acresce que estas populações desprotegidas dependem dos países desenvolvidos para se alimentarem,

estando frequentemente sujeitas às consequências nefastas de políticas e estratégias comerciais que utilizam

o alimento como fator de pressão e chantagem sobre quem não tem alternativas.

A recente pandemia de COVID-19 e a guerra imposta pela Rússia à Ucrânia mostraram à evidência as

fragilidades dum sistema com estes alicerces.

Mas, já antes, diversas organizações internacionais, instituições e governos haviam percebido que o

desperdício alimentar é imoral, é irracional e insustentável, tanto mais que se prevê que as necessidades

alimentares da humanidade cresçam de 40 % a 54 %, entre 2012 e 2050, impulsionadas pela procura individual

e pelo aumento genérico da população.

Combater o desperdício alimentar é uma prioridade mundial pública e política, uma responsabilidade social

coletiva e uma obrigação que cada um de nós deve interiorizar nas suas escolhas quotidianas.

Portugal é signatário das metas adotadas em 2015 no âmbito das Nações Unidas e relativas à redução do

desperdício alimentar, como parte dos Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável 2030, apontando-se a

«redução, para metade, do desperdício de alimentos per capita, a nível mundial, e a redução do desperdício de

alimentos ao longo das cadeias de produção e de abastecimento, incluindo os que ocorrem pós-colheita».

A redução do desperdício alimentar está também consignada, de forma transversal, em diversas iniciativas

europeias e nacionais, já que se afirma como objetivo nas políticas ambientais, agrícolas e de pescas.

Em 2016, o Governo português criou a Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar – na qual

o Ministério da Agricultura participou – visando uma abordagem integrada e multidisciplinar para a definição de

uma Estratégia Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar, articulando o meio académico, as associações

representativas do setor alimentar, os municípios e a sociedade civil. Esta estratégia, aprovada em 2018,

resultou num plano de ação composto de 14 medidas que espelham os objetivos de prevenir, reduzir e

monitorizar o desperdício alimentar, do produtor ao consumidor. Desde essa data, foram já desenvolvidas

diversas iniciativas de sensibilização e informação, assim como alguma produção legislativa.

O presente projeto de lei pretende sistematizar legislação e prática já existentes, alargar o seu alcance,

aprofundar as dinâmicas criadas, estabelecendo condições para operacionalizar processos, agilizar circuitos e

instituir condições para que cada agente da cadeia – per se e em colaboração com os elos próximos – contribua

de forma decisiva para o objetivo comum, de reduzir ao mínimo possível o desperdício alimentar em Portugal.

A doação de alimentos excedentários está já consignada em lei e concorre com outras diligências tendentes

a suprir necessidades de nutrição de camadas mais carenciadas da população, que não encontraram ainda

alternativa, mas a prioridade desta iniciativa legislativa é, a montante, reduzir o desequilíbrio que conduz ao

desperdício.

Almeja-se alcançar esse desiderato com a conjugação de ações e esforços por parte de toda a cadeia, com

especial incidência nos sectores de restauração, hotelaria e similares e na distribuição alimentar – uma vez que,

tanto nas pescas, como na agricultura, já existem posturas e práticas que instam os agentes a agir no controlo

do desperdício e no seu encaminhamento para valorização.

O combate ao desperdício alimentar deve ser apresentado como uma tendência a seguir, um ato de

inteligência, uma atitude a replicar, mormente com forte aposta junto das camadas mais jovens, abertas a alterar

o paradigma e despertas para as questões de emergência climática pelas recentes e mediáticas campanhas

realizadas.

A principal questão não deve ser o que fazer ao desperdício, mas sim como reduzi-lo ao máximo,

responsabilizando cada um pelo excesso que origina, seja nas escolhas de supermercado, seja no restaurante.

Só depois avançam as opções de encaminhamento, que devem apontar primeiramente para a valorização e

venda dos produtos – com ou sem transformação – para consumo humano, colocando estes bens ao dispor do

público e a preços reduzidos, numa estratégia em que todos ganham, os meios empregados são rentabilizados

ao máximo e se reduz a pressão sobre os recursos naturais.

Só numa segunda fase, os produtos devem seguir para a doação, sempre com respeito pelas regras de

higiene e segurança alimentar.

Apenas na etapa seguinte se aponta para a reciclagem, não como resíduo, mas como subproduto de alta

qualidade para outras indústrias ou fertilizante composto para a agricultura, substituindo com vantagem os

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adubos químicos e fomentando uma economia circular e sustentável.

Os planos de controlo de desperdício a desenvolver e assumir por estes agentes, serão entrosados nos

planos municipais a criar com o mesmo fim – e que se pretende tenham um forte pendor de sensibilização ativa

e diversificada, com reforço positivo, junto das populações. Conjugados, criarão uma malha cada vez mais

apertada para o desperdício alimentar, minimizando as quantidades e as oportunidades da sua existência.

Partindo, assim, da sociedade civil e do valioso contributo da administração local, todos os planos se

interligarão, remetendo, a nível estrutural, para a Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar,

repositório e eixo orientador de todas as ações a desenvolver.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados abaixo assinados,

do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, apresentam o seguinte projeto de lei:

CAPÍTULO I

Disposições gerais

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei estabelece o regime de prevenção e redução de perdas e desperdícios alimentares em todos

os agentes da cadeia de abastecimento alimentar, em especial no setor da restauração, nos estabelecimentos

de retalho alimentar e no pescado, procedendo:

a) À definição de ações específicas para estes setores;

b) À delineação de campanhas de informação, sensibilização, capacitação e mobilização para os agentes

económicos e para a comunidade de consumo;

c) À fixação de uma estratégia de baixo custo para produtos em fim de prazo ou excedentes;

d) Ao incentivo à doação de alimentos descontinuados, mas em bom estado para consumo.

Artigo 2.º

Fins

A presente lei visa:

a) Alcançar as metas de uma verdadeira economia circular;

b) Afirmar os princípios de sustentabilidade e segurança alimentar na dialética da produção versus consumo;

c) Acionar todos os mecanismos possíveis na ajuda ao combate à pobreza alimentar;

d) Atingir as metas estabelecidas para 2030 pela Assembleia Geral da ONU em setembro de 2015:

i) Reduzir, para metade, o desperdício de alimentos per capita;

ii) Reduzir os desperdícios de alimentos ao longo das cadeias de produção e de abastecimento, incluindo

os que ocorrem pós-colheita;

iii) Reduzir substancialmente a geração de resíduos por meio da prevenção, redução, reciclagem e

reutilização.

iv) Reforçar e complementar o estabelecido na Estratégia Nacional e Plano de Ação de Combate ao

Desperdício Alimentar.

Artigo 3.º

Obrigações gerais

Os agentes da cadeia de abastecimento alimentar têm as seguintes obrigações:

a) Assumir o combate ao desperdício alimentar como um objetivo prioritário da instituição;

b) Colaborar ativamente nas campanhas tendentes à redução do desperdício alimentar;

c) Apresentar e executar estratégias próprias e inovadoras, com o mesmo fim;

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d) Monitorizar os resultados das estratégias encetadas, ajustando o que se verifique não estar a surtir efeito;

e) Comunicar os resultados às entidades competentes, sempre que tal for solicitado.

Artigo 4.º

Hierarquia de prioridades

Os agentes da cadeia de abastecimento alimentar devem observar a seguinte ordem de prioridades:

a) Prevenir o desperdício;

b) Promover ativamente o escoamento do desperdício a baixo custo, cumprindo com as regras de higiene e

segurança alimentar;

c) Doar o desperdício em coordenação com outras entidades a trabalhar no setor;

d) Separar e encaminhar o desperdício orgânico para valorização industrial ou agrícola.

Artigo 5.º

Ações destinadas a prevenir e a reduzir o desperdício alimentar

As ações destinadas a prevenir e a reduzir o desperdício alimentar devem obedecer aos seguintes princípios:

a) Reforço de medidas de educação, consciencialização e prevenção para a racionalização e o consumo

responsável dos bens alimentares, tendo em conta o desperdício, o meio ambiente, a solidariedade e a saúde;

b) Promoção do hábito coletivo de doar ou comercializar a preço reduzido, prioritariamente, os bens

alimentares em excesso para os seres humanos e só posteriormente para aproveitamento de alimentação

animal ou transformação orgânica;

c) Fomento da economia circular e reduzir o desperdício ao longo de toda a cadeia de abastecimento

alimentar.

CAPÍTULO II

Práticas específicas para setores de atividade

Artigo 6.º

Práticas específicas para a restauração, hotelaria e similares

1 – As empresas de restauração, hotelaria e similares devem estar munidas de um plano de combate ao

desperdício alimentar assente nos critérios previstos na Estratégia Nacional de Combate ao Desperdício

Alimentar e de acordo com os princípios consignados na presente lei.

2 – As empresas referidas no número anterior devem ainda estabelecer uma política de «desperdício zero»

na confeção dos alimentos, utilizando, sempre que possível, todas as partes do alimento para fins alimentares

específicos.

3 – As empresas referidas no n.º 1 disponibilizam um sistema de embalagem que permita ao cliente, no final

das refeições, levar as sobras dos alimentos pedidos e pagos.

4 – Sempre que possível, devem ser privilegiadas embalagens reutilizáveis, nomeadamente passíveis de

devolução, com restituição do valor da tara paga sem IVA adicionado, pelo consumidor ou outro sistema que

previna a criação de resíduos, devendo esta prática ser incentivada pelo setor da restauração.

5 – Da prática prevista no número anterior estão excluídos os sistemas de bufete ou outros em que as

quantidades não são limitadas.

5 – Nos estabelecimentos com sistema de bufete, deve ser instalada informação clara junto dos mesmos

onde se sensibilize o utilizador para optar por um abastecimento faseado, em pequenas quantidades, ao invés

de um abastecimento com quantidades superiores àquelas que será capaz de comer.

6 – As empresas devem promover, junto do cliente, uma informação objetiva sobre as quantidades

expectáveis por dose ou outras porções unitárias utilizadas.

7 – As empresas devem ainda promover, sempre que aplicável, uma rotina de refeições excedentes a baixo

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custo, a partir de uma determinada hora do dia, a definir pelo estabelecimento, colocando ao dispor de um

público alargado bens de qualidade e que, assim, podem resultar em proventos para o estabelecimento de

restauração.

8 – Esgotadas as opções referidas nos números anteriores, as empresas devem promover a doação de

alimentos descontinuados, mas em bom estado para consumo, articulando com as diversas entidades já a

trabalhar no setor.

9 – Deve ainda ser garantida, em última hipótese, que os resíduos alimentares são encaminhados para a

recolha diferenciada de resíduos orgânicos para posterior compostagem ou outro tipo de valorização aplicável,

em articulação com os sistemas municipais e multimunicipais responsáveis pela recolha de biorresíduos.

10 – A implementação do plano de combate ao desperdício alimentar referido no presente artigo, bem como

o enquadramento das restantes práticas acima elencadas são regulamentadas pelo Governo.

Artigo 7.º

Promoção das condições para consumo humano

1 – Aos operadores de restauração coletiva, do retalho alimentar e da indústria alimentar não é permitido

tornar impróprio para consumo humano alimentos não vendidos que ainda sejam comestíveis, devendo estes

estes ser encaminhados de acordo com a hierarquia de prioridades de combate ao desperdício alimentar

enunciada no artigo 4.º e com as obrigações aplicáveis ao estabelecimento em causa.

2 – O Governo procede à regulamentação das condições de aplicação do presente artigo.

3 – As microempresas ficam isentas do cumprimento do presente artigo.

Artigo 8.º

Práticas específicas para os estabelecimentos de retalho alimentar

1 – Os estabelecimentos de retalho alimentar devem estar munidos de um plano de combate ao desperdício

alimentar assente nos critérios previstos na Estratégia Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar e de

acordo com os princípios consignados na presente lei.

2 – Aos estabelecimentos de retalho alimentar, e desde que estejam reunidas condições para tal, é

recomendada a disponibilização de uma secção/área especial para produtos em situação de aproximação de

fim de prazo de validade, em bom estado para consumo humano, a vender a custo reduzido para o consumidor.

3 – As secções mencionadas no número anterior devem ser promovidas com recurso a um marketing positivo

e inclusivo, de forma a informar os consumidores das vantagens da aquisição destes produtos para a sua

economia familiar, para o combate ao desperdício e o seu impacto no ambiente e para uma clara política de

combate à pobreza alimentar.

4 – No local, deve ser fornecida informação sobre estratégias de conservação, confeção e aproveitamento

daqueles produtos com a manutenção das suas qualidades e garantia de segurança alimentar, com vista a

contribuir para desmistificar receios infundados por parte do consumidor.

5 – Aos estabelecimentos de retalho alimentar de média e grande dimensão, com mais de 400 m2, é

obrigatória a celebração de acordos de doação dos excedentes alimentares com as entidades de apoio social

como IPSS e serviços públicos de apoio social.

Artigo 9.º

Promoção do aproveitamento sustentável do pescado

1 – A fileira do pescado deve obedecer aos seguintes princípios:

a) Promover a captura de espécies mais abundantes, mas menos consumidas ou conhecidas, como forma

de reduzir as rejeições e aliviar a pressão em espécies mais vulneráveis;

b) Diligenciar informação sobre espécies consideradas sustentáveis e pouco valorizadas, mas de ótimo valor

nutricional, como o carapau e a cavala;

c) Promover campanhas para ensinar o consumidor a utilizar espécies menos conhecidas, mas abundantes

e sustentáveis, nomeadamente com divulgação de receitas;

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d) Promover o aproveitamento total do pescado, preferencialmente no seu consumo ou em alternativa por

indústrias de transformação;

e) Incentivar a indústria conserveira;

f) Promover outras formas de conservação, como, em certas circunstâncias, a congelação;

g) Facilitar o consumo de proximidade;

h) Incentivar a doação da produção em excesso para consumo humano;

i) Reduzir o desperdício ao máximo, de acordo com princípios da economia circular e encaminhar os

subprodutos ou resíduos orgânicos de acordo com os princípios da hierarquia de resíduos, e em particular para

reaproveitamento industrial e valorização.

2 – A garantia da incorporação dos princípios gerais enunciados no número anterior no ordenamento jurídico

português é assegurada através de iniciativa legislativa do Governo.

CAPÍTULO III

Obrigações dos municípios e do Governo

Artigo 10.º

Obrigações dos municípios

1 – Os municípios devem implementar planos municipais de redução do desperdício alimentar.

2 – Os planos municipais de redução do desperdício alimentar referidos no número anterior devem obedecer

aos seguintes princípios:

a) Os municípios elaboram e colocam em prática, no prazo de 18 meses a contar da data de entrada em

vigor da presente lei, um plano municipal de redução do desperdício alimentar;

b) O plano referido na alínea anterior deve estabelecer metas claras para a área geográfica do município,

de acordo com as metas nacionais definidas pela Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar;

c) O plano deve incluir a realização de campanhas para a comunidade em geral, e para o retalho alimentar

e outras empresas dos setores alimentares, restauração e similares, hotelaria e cantinas, no sentido de informar

e formar sobre a necessidade de combater o desperdício alimentar e a urgência do contributo de todos para a

economia circular e para a sustentabilidade e segurança alimentar, em prol da solidariedade humana e do

equilíbrio ambiental;

d) O plano deve incluir ações específicas nos refeitórios e cantinas com gestão a cargo dos municípios ou

de empresas por estes contratadas;

e) O plano deve ser articulado com os agentes das diferentes etapas – da produção ao consumo – na área

geográfica abrangida;

f) O plano deve incluir campanhas para públicos específicos, referidamente, o público escolar, com ações

articuladas com os agrupamentos de escolas e adaptadas às diferentes camadas etárias;

g) O plano deve estabelecer um sistema de incentivos – prémios prestigiantes de boas práticas – para os

estabelecimentos que se destaquem nestas práticas, por exemplo, através de indicadores como a proporção de

refeições excedentárias vendidas e resíduos orgânicos recolhidos, em relação ao número total de refeições

servidas, ou no caso do canal Horeca; proporção de alimentos vendidos nas áreas destinadas a produtos em

aproximação ou fim de prazo de validade, nos estabelecimentos de distribuição alimentar;

h) As ações inovadoras e eficazes dos agentes devem ser divulgadas nos meios ao alcance do município,

como forma de promover a mobilização em torno do objetivo comum de reduzir o desperdício alimentar.

Artigo 11.º

Obrigações do Governo

1 – Incumbe ao Governo:

a) Instituir o prémio nacional de combate ao desperdício alimentar que vise premiar projetos que contribuam

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de forma significativa para a redução do desperdício alimentar; qualquer pessoa ou instituição pode concorrer a

este prémio e na atribuição do mesmo devem ser tidos em conta como candidatos as eventuais instituições

vencedoras dos prémios que possam ser atribuídos pelos municípios; a todos os concorrentes qualificados é

atribuído um selo de combate ao desperdício alimentar.

b) Definir a atribuição de incentivos fiscais para todas as empresas e estabelecimentos a quem é atribuído

o selo de combate ao desperdício alimentar, referido na alínea anterior;

c) Realizar anualmente uma campanha nacional que informe e motive a comunidade em geral, na perspetiva

de consumidor, para as vantagens de fazer um consumo responsável, sustentável e solidário;

d) Definir a atribuição de incentivos fiscais pela doação de alimentos não vendidos, através de deduções no

IRC relativas a doações a determinadas entidades (exemplo: IPSS) e a isenção do IVA relativamente a alimentos

doados/vendidos a baixo custo;

e) Definir a atribuição de incentivos junto de retalhistas e consumidores para o uso de plataformas ou apps

na luta contra o desperdício alimentar através de novos hábitos de consumo;

f) Articular e apoiar financeiramente as autarquias locais para promoção do combate ao desperdício

alimentar, através da implementação dos planos municipais de combate ao desperdício alimentar, previstos na

Lei n.º 62/2021.

CAPÍTULO IV

Monitorização, fiscalização e quadro sancionatório

Artigo 12.º

Monitorização e acompanhamento

1 – A monitorização e acompanhamento do cumprimento dos objetivos e das obrigações da presente lei é

feita em conjunto com o acompanhamento da Estratégia Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar.

2 – A informação relativa à monitorização e acompanhamento é agregada ao relatório de progresso da

Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar (CNCDA).

Artigo 13.º

Responsabilidade e quadro sancionatório

1 – As ações e omissões que não contribuam para o combate ao desperdício alimentar são geradoras de

responsabilidade.

2 – É definido, em diploma próprio, um regime contraordenacional, como instrumento dissuasor e

sancionatório de:

a) Ações e omissões lesivas para o combate ao desperdício alimentar;

b) Práticas violadoras das disposições legais e regulamentares relativas ao combate ao desperdício

alimentar.

CAPÍTULO V

Disposições finais

Artigo 14.º

Regulamentação

O Governo deve, no prazo de 120 dias após a publicação da presente lei, aprovar os atos normativos

necessários à execução da presente lei.

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Artigo 15.º

Regiões autónomas

A presente lei aplica-se às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, nos termos a definir por decreto

legislativo regional.

Artigo 16.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no primeiro dia do segundo mês após a sua publicação, produzindo os seus

efeitos com a entrada em vigor do Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.

Palácio de São Bento, 16 de outubro de 2023

As Deputadas e os Deputados do PS: Eurico Brilhante Dias — Ricardo Pinheiro — João Miguel Nicolau —

Clarisse Campo s— Pedro do Carmo — Dora Brandão — Cristina Mendes da Silva — Berta Nunes — Marta

Freitas — Salvador Formiga — Jamila Madeira — Hugo Costa — Miguel Cabrita — Pedro Cegonho — Agostinho

Santa — Susana Barroso — Joaquim Barreto — Luís Graça — João Azevedo Castro — Norberto Patinho —

António Monteirinho — Gilberto Anjos — João Azevedo — Manuel dos Santos Afonso — Palmira Maciel —

Sérgio Ávila — Sobrinho Teixeira — António Sales — Susana Correia.

———

PROJETO DE LEI N.º 953/XV/2.ª

PROCEDE À ALTERAÇÃO DOS LIMITES TERRITORIAIS ENTRE A FREGUESIA DE FONTELONGA E

A UNIÃO DAS FREGUESIAS DE LAVANDEIRA, BEIRA GRANDE E SELORES DO CONCELHO DE

CARRAZEDA DE ANSIÃES

Exposição de motivos

Nos termos da Constituição da República Portuguesa, a divisão administrativa do território é estabelecida

por lei, conforme disposto no n.º 4 do artigo 236.º, sendo da exclusiva competência da Assembleia da República

legislar sobre a modificação das autarquias locais, alínea n) do artigo 164.º.

O Executivo da freguesia de Fontelonga, sentiu a necessidade de averiguar a correção dos seus limites

administrativos presentes na atual Carta Administrativa Oficial de Portugal (CAOP) em vigor, resultante da

definição, aquando dos Census 2001, por se considerarem lesadas em oposição ao que historicamente sempre

foi considerado território pertencente a esta freguesia, no referente à delimitação administrativa entre as partes

envolvidas.

A pretensão que apresentaram foi apoiada no conhecimento histórico das populações e dos elementos

constituintes dos respetivos órgãos autárquicos, bem como de antigos marcos de delimitação administrativa

existentes.

Os elementos relativos ao procedimento de delimitação administrativa (PDA) entre a freguesia de Fontelonga

e a união das freguesias de Lavandeira, Beira Grande e Selores (concelho de Carrazeda de Ansiães) deram

entrada na Direção-Geral do Território (DGT) em 27 de dezembro de 2022.

A DGT procedeu à análise da componente técnica, no que respeita à componente gráfica da delimitação, e

informou que este processo estava bem instruído e cumpria o exigido no documento «Orientações para a

execução de um PDA», conforme anexo 1.

O acordo entre as autarquias locais envolvidas para proceder à alteração dos seus limites administrativos,

anteriormente fixados na CAOP, está expresso nas deliberações aprovadas por unanimidade nas reuniões da

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Assembleia de Freguesia e Junta de Freguesia de Fontelonga e da Assembleia de Freguesia e Junta de

Freguesia da União das Freguesias de Lavandeira, Beira Grande e Selores (concelho de Carrazeda de Ansiães),

conforme atas constantes do anexo 2.

Os limites definitivos foram inseridos sobre cartografia georreferenciada da DGT (ortofotomapas de 2015 –

CROA50), com licença de utilização com o Registo n.º 150/2019.

Foi lavrada a memória descritiva dos limites em acordo (limites definitivos), bem como o layout da

representação cartográfica Anexo A, validado com os selos brancos (quando existentes) e assinaturas dos

representantes de todos os órgãos autárquicos envolvidos, conforme anexo 2.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido

Social Democrata abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Delimitação administrativa territorial

Nos termos da presente lei é definida a delimitação administrativa territorial entre a freguesia de Fontelonga

e a União das Freguesias de Lavandeira, Beira Grande e Selores, no concelho de Carrazeda de Ansiães.

Artigo 2.º

Limites territoriais

Os limites administrativos territoriais entre as freguesias referidas no artigo anterior são os que constam do

anexo 2 da presente lei, que dela faz parte integrante.

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 16 de outubro de 2023.

Os Deputados do PSD: Adão Silva — José Silvano — Jorge Paulo Oliveira — Sofia Matos — João Barbosa

de Melo — Dinis Faísca — Fátima Ramos — Firmino Marques — Firmino Pereira — Gabriela Fonseca —

Guilherme Almeida — Isaura Morais — João Prata — Germana Rocha.

———

PROJETOS DE RESOLUÇÃO N.º 940/XV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO O ALARGAMENTO URGENTE DA REDE DE CUIDADOS PALIATIVOS

Exposição de motivos

O SNS está em crise e todos os seus serviços estão em rutura, em consequência das derivações ideológicas

dos últimos Governos.

Hoje temos mais de 1,6 milhões de portugueses sem médico de família, falta de medicamentos, tempos de

espera para consultas de especialidade cada vez mais alargados e alguns até com anos de espera, urgências

hospitalares a fechar, promessas de construção de hospitais há mais de quarenta anos e que continuam por

cumprir, entre outras coisas.

Por outro lado, a degradação do SNS faz com que os profissionais de saúde abandonem os serviços públicos

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procurando melhores condições de trabalho no setor privado ou mesmo fora do País.

Infelizmente, os cidadãos com necessidade de cuidados paliativos são os mais vulneráveis e mais

penalizados, pois precisam de resposta imediata e o seu estado clínico não lhes dá tempo de espera, pois a

morte está por escassos meses, por semanas e em alguns casos por dias.

Segundo o Atlas Global de Cuidados Paliativos, em média e em termos globais, apenas uma em cada dez

pessoas que precisam deste tipo de cuidados conseguirá efetivamente obtê-los1. A Organização Mundial da

Saúde divulgou ainda que anualmente mais de 20 milhões de pessoas precisam de recorrer a cuidados

paliativos, sendo que 6 % destas são crianças2.

Especificamente em Portugal, segundo a Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos, temos mais de

100 mil doentes, mas destes só 30 mil encontram resposta na rede nacional de cuidados paliativos3.

Esta situação ganha especial preocupação, porque Portugal se encontra entre os países com população

mais envelhecida e, por consequência, com uma maior prevalência de doenças crónicas. De acordo com OCDE

– Better caring at the end of life, de 20234, cerca de 90 % dos cidadãos europeus morre em consequência de

doenças crónicas e progressivas, facto que demonstra a necessidade de respostas paliativas.

Há promessas de alargamento de respostas, mas estas tardam a sair do papel. A realidade é que cerca de

70 % dos doentes com necessidades de cuidados paliativos e as suas famílias são entregues à sua sorte,

abandonados pelo SNS, não têm outra solução que não procurar resposta no setor privado ou, para quem não

tem condições económicas de o fazer, acabam por morrer desacompanhados em casa ou num qualquer

corredor de hospital. Assim, é urgente e prioritário inverter esta situação.

A solução passa pela construção imediata de novas unidades de cuidados continuados, a reabilitação de

espaços de saúde fechados para o aproveitamento e assistência aos doentes, a criação de mais equipas de

acompanhamento domiciliário, o reforço de meios materiais e humanos nas equipas existentes, assim como a

atribuição de um cheque cuidados paliativos, que permite à pessoa que não tem resposta no serviço público

aceder a esses mesmos serviços no privado.

É preciso que o Governo reconheça a necessidade de investir em políticas públicas direcionadas para o

término da vida, o envelhecimento da população e a maior preponderância de doenças como o cancro e

demências, assim o exigem.

Pelo que, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentalmente aplicáveis, os Deputados do Grupo

Parlamentar do Chega recomendam ao Governo que:

1. Proceda à implementação urgente de um programa de alargamento da rede de cuidados paliativos com

reabilitação de espaços e a construção de novas unidades em todo o território nacional;

2. Crie novas equipas de cuidados paliativos em regime ambulatório, bem como proceda ao reforço de

recursos materiais e humanos das equipas já existentes;

3. Proceda à criação de um cheque cuidados paliativos para todos os doentes que não encontrem vaga em

tempo útil no setor público.

Palácio de São Bento, 13 de outubro 2023.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel

Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias

— Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.

———

1 Disponível online em Global Atlas of Palliative Care, 2nd Ed 2020 – thewhpca. 2 OMS: mais de 20 milhões precisam de cuidados paliativos todos os anos – ONU News 3 A Tua Vida Importa-nos – APCP – Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos 4 Time for Better Care at the End of Life – en – OECD

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PROJETOS DE RESOLUÇÃO N.º 941/XV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO A ADOÇÃO DE MEDIDAS DE COMPENSAÇÃO À APICULTURA

Exposição de motivos

As abelhas têm uma função polinizadora essencial às plantas, sendo que a dieta mediterrânica depende

quase exclusivamente da polinização destas e que, para além das paisagens cultivadas, esta forma de

polinização natural estende-se às flores silvestres, aos arbustos e árvores, contribuindo para a saúde e

resiliência dos ecossistemas.

Sendo um produto base da gastronomia e dos hábitos alimentares da Península Ibérica, a sua produção

desdobra-se num papel de atividade económica por si própria, mas também de garante da existência de

fruticultura e de agricultura.

A espécie autóctone da Península Ibérica, a Apis Mellifera Iberiensis, tem uma presença milenar, com uma

adaptação própria ao território, que em muito dita também as características do modo de produção e do produto

obtido.

No entanto, nas últimas décadas, a existência de abelhas tem sido ameaçada por fatores como as alterações

climáticas, as alterações de utilização dos solos e das práticas agrícolas, invasões biológicas e bioagressores,

como os ácaros varroa, microsporos de nosema, vírus e outros, o que degrada os habitats potenciais, criando

disrupções ambientais.

A importância deste setor é atestada desde logo pelo facto de, no ano de 2021, estarem registadas em

Portugal 10 435 explorações apícolas, com um número total de 792 239 colónias e 9 denominações de origem

protegida.

Neste momento, as colónias de abelhas têm poucas condições de sobrevivência per si, sem a intervenção

de um apicultor que as alimente, caso necessário, ou que translade a colmeia para um local onde exista floração.

A sua localização está muitas vezes ligada também à limpeza e manutenção de terrenos, que na ausência

desta atividade estariam abandonados, cumprindo um papel social de complemento de atividades pouco

lucrativas ou de criação de atividades por conta própria.

É fulcral apoiar esta atividade, da qual dependem tantas outras, introduzindo um sistema de incentivos

específico, à semelhança do que fez o Governo regional da Extremadura espanhola, que, reconhecendo a

importância e as dificuldades do setor, aprovou um apoio a ser atribuído diretamente aos apicultores, no âmbito

da «Operação 10.1.3 Apicultura para a Biodiversidade», tendo por base as colmeias existentes e não a área

abrangida, procurando garantir a continuidade desta atividade, incluindo a necessidade de proteção da

transumância tradicional, tornando-a atrativa para os apicultores.

Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados

do Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentam o seguinte presente projeto de resolução:

A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República

Portuguesa, recomendar ao Governo:

1) A criação de um apoio aos apicultores do continente, para compensar os elevados custos de produção

associados ao baixo rendimento resultante dos preços praticados na venda do mel e do pólen, de caráter anual,

pago por colmeia, a atribuir na forma de montante unitário fixo aos apicultores que cumpram compromissos de

manutenção de atividade, durante 5 anos;

2) Que o nível de apoio anual desta intervenção seja atribuído em função do número de colmeias em

atividade, pago diretamente ao beneficiário.

Palácio de São Bento, 12 de outubro de 2023.

As Deputadas e os Deputados do PS: Paula Reis — Ricardo Pinheiro — João Miguel Nicolau — Pedro do

Carmo — Tiago Soares Monteiro — José Pedro Ferreira — Eduardo Alves — Lúcia Araújo da Silva — José Rui

Cruz — Cristina Sousa — António Monteirinho — Berta Nunes — Sobrinho Teixeira — Agostinho Santa —

Página 31

16 DE OUTUBRO DE 2023

31

Susana Barroso — Hugo Costa — Norberto Patinho — Gil Costa — Salvador Formiga — Luís Graça — Gilberto

Anjos — Palmira Maciel — Dora Brandão — Clarisse Campos — Joaquim Barreto — João Azevedo Castro —

João Azevedo — Manuel dos Santos Afonso — Sérgio Ávila — António Sales — Cristina Mendes da Silva.

———

PROJETOS DE RESOLUÇÃO N.º 942/XV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE DÊ CUMPRIMENTO À RESOLUÇÃO DA ASSEMBLEIA DA

REPÚBLICA N.º 160/2021, DE 14 DE MAIO, RELATIVA À PROTEÇÃO DOS PAIS EM CASO DE PERDA

GESTACIONAL

Exposição de motivos

A perda gestacional tem um impacto devastador na saúde mental individual e do casal, nos momentos

imediatos e após a perda. Esta constatação, que podia ser relativizada por ser do domínio empírico, está hoje

cientificamente comprovada, sendo as conclusões do inquérito The psychological impact of early pregnancy loss

in Portugal: incidence and the effect on psychological morbidity1, conduzido por investigadores da Universidade

da Madeira, elucidativas a este respeito.

Entre outros dados, referentes às perdas gestacionais não voluntárias: «As respostas ao inquérito mostram

que 7 a 12 meses após a perda, 56 % das mulheres apresentavam sintomas de ansiedade, 31 % de depressão

e 25 % de stress pós-traumático. […] uma proporção substancial de mulheres apresentou sintomas persistentes

de morbilidades clínicas 3 anos ou mais após a perda. Especificamente, 24 % das mulheres apresentavam

sintomas preocupantes de luto perinatal, 56 % de ansiedade, 27 % de depressão e 15 % de stress pós-

traumático.»

Assim, e de forma conclusiva: «Estes resultados mostram que é essencial fornecer um acompanhamento

mais holístico após a perda gestacional precoce, que além dos efeitos físicos considere também as

consequências psicológicas de um evento desta natureza. Isto passa por aumentar a oferta de apoio psicológico

preventivo a estas mulheres e pela monitorização de possíveis sintomas de luto perinatal agravado, ansiedade,

depressão e de stress pós-traumático.»

Presciente sobre esta matéria, já em 2021 tinha sido apresentado na Assembleia da República o Projeto de

Resolução n.º 1218/XIV/2.ª, que deu origem à Resolução da Assembleia da República n.º 160/2021, aprovada

a 14 de maio, tendente ao reforço da proteção dos pais em caso de perda gestacional.

Constava dessa resolução, entre outras recomendações, que o Governo procedesse à reorganização dos

serviços de saúde materna e obstétrica das instituições hospitalares, garantindo a existência de alas separadas

para o internamento de parturientes em situação de parto normal e mulheres que sofreram perdas gestacionais

e que garantisse a prestação de apoio psicológico aos casais em caso de perda gestacional, independentemente

da fase da gravidez em que esta ocorra, assegurando a disponibilização de consulta no prazo máximo de 15 dias

após a alta.

No entanto, apesar da urgência e relevância no cumprimento desta resolução, quer em função do bem-estar

dos progenitores, quer para minorar os problemas de natalidade e de «inverno demográfico» que se registam

em Portugal, passados mais de dois anos após a sua aprovação, não se registaram quaisquer desenvolvimentos

para dar cumprimento ao que ali está inscrito.

Algumas das propostas não têm sequer qualquer impacto económico, como é o caso por exemplo de

assegurar o direito da parturiente a ser acompanhada por qualquer pessoa por si escolhida ou a que diz respeito

à existência de alas separadas para as parturientes que sofreram perda gestacional, sendo apenas uma questão

de organização. Não serão necessárias grandes explicações, perante a evidência da violência que representa

para a mulher que acabou de perder um filho ficar num quarto com alguém que felizmente não sofreu a mesma

perda e, eventualmente, até irá receber visitas com o mesmo entusiasmo e felicidade por receber o novo membro

1 Vide: https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fpubh.2023.1188060/full; consultado em 2023-10-12.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 19

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da família. O momento da perda exige recato e apoio, coisa que infelizmente ainda não é assegurada a estas

famílias.

Assim, nos termos constitucionais e regimentalmente aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do

Chega recomendam ao Governo que:

Proceda com a máxima urgência à implementação das recomendações elencadas na Resolução da

Assembleia da República n.º 160/2021, de 14 de maio, nomeadamente:

1 – Reorganize os serviços de saúde materna e obstétrica das instituições hospitalares, garantindo a

existência de alas separadas para o internamento de parturientes em situação de parto normal e mulheres que

sofreram perdas gestacionais;

2 – Garanta a prestação de apoio psicológico aos casais em caso de perda gestacional, independentemente

da fase da gravidez em que esta ocorra, assegurando a disponibilização de consulta no prazo máximo de 15 dias

após a alta;

3 – Sensibilize os profissionais de saúde para a importância de promover um acompanhamento mais

humanizado das situações de perda gestacional, independentemente do momento da gravidez em que esta

ocorra;

4 – Reconheça à mulher internada, por motivo de perda gestacional, o direito a ser acompanhada por

qualquer pessoa por si escolhida;

5 – Garanta que, nas instituições hospitalares, são prestadas aos pais todas as informações legais

necessárias, nomeadamente sobre o acesso a licença e subsídio por interrupção da gravidez, e a necessidade

ou não de certificado de óbito ou de funeral;

6 – Elabore um relatório específico para registo das situações de perda gestacional, retirando estes dados

do relatório anual de complicações nas interrupções da gravidez, como forma de garantir um melhor

acompanhamento e compreensão destas situações e a adoção de medidas para prevenir a sua ocorrência.

Palácio de São Bento, 16 de outubro de 2023.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel

Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias

— Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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