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Sábado, 25 de Maio de 1991

II Série-B — Número 31

DIÁRIO

da Assembleia da República

V LEGISLATURA

4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1990-1991)

SUPLEMENTO

SUMÁRIO

Inquéritos parlamentares:

IV Comissão Eventual de Inquérito ao Acidente de Camarate:

Relatório final e declarações de voto apresentadas pelo PS, pelo PCP e pelo deputado independente João Corregedor da Fonseca........... H8-(2)

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Reiatório tinat da IV Comissão Eventual de

Inquérito ao Acidente de Camarate

Identificação de siglas AR —Assembleia da República.

CEI AC — Comissão Eventual de Inquérito ao Acidente de Camarate. Cl — Comissão de inquérito.

DCCB — Direcção de Combate ao Crime c ao Banditismo.

DGAC — Direcção-Geral da Aviação Civil.

LML — Instituto dc Medicina Legal.

IXDEP — Instituto Nacional de Defesa de Portugal.

LNMG — Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica.

1ST — bisiiiuto Superior Técnico.

LNlTll— Laboratório Nacional de Engenharia c Tecnologia Industrial.

LPC — Laboratório dc Polícia Científica.

NTSB — National Transportation Safcly Board.

PGR — Procurador-geral da República.

PJ — Polícia Judiciária.

RTP — Radiotelevisão Portuguesa.

SC1ACV — Secção Central de Investigação dc Actividades Concertadas

dc Violência. SPEL— Sociedade Portuguesa de Explosivos. TIC — Tribunal dc Instrução Criminal.

CAPÍTULO I Introdução

1 — Constituição. — Tendo sido aprcscnuido o projecto dc resolução n.9 14/V, subscrito por deputados do PSD c cio CDS, para constituição dc uma nova comissão dc inquérito parlamentar sobre a tragédia dc Camarate (Diário da Assembleia da República, 2.' série, n.° 92, de 13 dc Julho dc 1988), que foi discutido e aprovado em Plenário (Diário da Assembleia da República, 1.* série, n.9 112, dc 7 de Julho dc 1988), a Assembleia da República, pela Resolução n.9 14/88, publicada no Diário da Assembleia da República, 2.'- séric-A, n.9 20, dc 17 de Fevereiro dc 1989, e no Diário da República, 1.» série, n.9 173, dc 28 dc Julho dc 1988, deliberou constituir a IV Comissão dc Inquérito Parlamentar, cm cujos trabalhos participassem, querendo, representantes dos familiares das vítimas, nos lermos da lei de processo e segundo o estatuto já estabelecido pela anterior Comissão, para continuar a averiguar, por forma cabal, as causas c circunsuíncias cm que ocorreu a iragédia que vitimou em 4 dc Dezembro dc 1980, cm Camarate, o Sr. Primciro-Ministro, Dr. Francisco Sá Carneiro, o Sr. Minisiro da Defesa, engenheiro Adelino Amaro da Costa, e seus acompanhantes, com a seguinte distribuição pelas forças políticas representadas na Assembleia da República:

Partido Social-Dcmocraia—16 deputados; Panido Socialista — 7 deputados; Partido Comunista Português — 2 deputados; Partido Renovador Democrático — 1 deputado; Partido do Centro Democrático Social — 1 deputado; Partido Ecologista Os Verdes — 1 deputado; Intervenção Democrática — 1 deputado.

2 — Composição. — Pelos respectivos partidos políticos foram indicados para integrar a Comissão os seguintes deputados:

Mário Júlio Montalvão Machado (PSD); Aristides Alves do Nascimento Teixeira (PSD); Armando Manuel Pedroso Militáo (PSD); Aurora Margarida dc Carvalho S. Borges de Carvalho (PSD);

Carla Maria Talo Diogo (PSD);

Carlos Manuel Oliveira da Silva (PSD);

Cecília Pita Catarino (PSD);

Dinah Serrão Alhandra (PSD);

Eduardo Alfredo de Carvalho Pereira da Silva (PSD);

João Domingos Fernandes de Abreu Salgado (PSD);

João Soares Pinto Montenegro (PSD);

José Guilherme Pereira Coelho dos Reis (PSD);

José Luís Bonifácio Ramos (PSD);

José Alberto Puig dos Santos Costa (PSD);

José Manuel da Silva Torres (PSD);

Reinaldo Alberto Ramos Gomes (PSD);

Armando António Martins Vara (PS);

João Barroso Soares (PS);

José Florêncio Botelho Caslcl-Branco (PS);

José Manuel Lello Ribeiro dc Almeida (PS);

Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta (PS);

Mário Manuel Cal Brandão (PS);

Raul Fernando Sousela da Costa Brito (PS);

António da Silva Mota (PCP);

Amónio José Monteiro Vidigal Amaro (PCP);

Rui José dos Santos Silva (PRD);

Narana Sinai Coissoró (CDS);

Herculano da Silva Pombo Sequeira (PEV).

Pela Resolução da Assembleia da República n.9 13-A/ 88 (alterações ao Regimento da Assembleia da República), publicada no Diário da República, 1.* série, n.u 168, dc 22 dc Julho dc 1988, foram extintos os agrupamentos parlamentares, facto pelo qual o Agrupamento Parlamentar da Inicrvcnção Democrática não chegou a indicar o seu deputado.

A partir dc 6 dc Janeiro dc 1990 a Sr.1 Deputada Carla Maria Tato Diogo (PSD) deixou dc exercer funções dc deputada.

O Grupo Parlamentar do PSD não procedeu à sua substituição.

Por carta dc 10 dc Dezembro dc 1990, o Sr. Deputado Herculano da Silva Pombo Sequeira (PEV) comunicou à Presidência da Mesa da AR que passaria a deputado independente, facto pelo qual deixou dc constar da relação dos membros desta Comissão.

Acresceram ainda à Comissão os seguintes representantes dos familiares das vítimas que respectivamente se indicam:

Representantes dc Maria Arminda Bernardo dc Albuquerque:

Augusto Jose dc Matos Sobral Cid; Manuel Basílio dc Castro;

Representantes dc Vasco Abccassis:

Pedro Cid; Nuno Rogeiro;

Representantes dc Maria Margarida A. Lacerda Gouveia:

Marcelo Rebelo dc Sousa;

Alexandre Patrício Pinto Basto Gouveia;

Representantes dc Manuel Rafael Amaro da Costa:

Alexandre Martins Moniz de Bettencourt; José Duarte dc Almeida Ribeiro c Casuo;

Representantes dc Maria Manuela da Silva C. Simões Vaz da Silva Pires:

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Norberto António Gomes de Andrade; Maria Manuela da Silva C. Simões Vaz da Silva Pires;

Representantes de Vitalina Antónia Ramos Nunes:

João Pedro Xavier de Brito; José Manuel Duarte Figueiredo.

3 — Tomada de posse c eleição da mesa. — Aos 19 de Janeiro de 1989, foi, por S. Ex.* o Presidente da AR, conferida posse à Comissão, conforme consta do respectivo livro dc registo dc posse, lendo a mesma reunido a 31 de Janeiro dc 1989 para eleição da mesa, que passou a ter a seguinte constituição:

Presidente — Fernando José Russo Roque Correia

Afonso (PSD). Vice-presidente — por consenso dc todos os partidos

a vice-presidência coube ao PS, que não chegou a

indicar o nome do seu deputado. Secretários:

António da Silva Mola (PCP); João Domingos Fernandes dc Abreu Salgado (PSD).

4 — Regimento. — Iniciados os trabalhos, a Comissão aprovou o seu regimento, semelhante, aliás, ao dc comissões anteriores, conforme publicação inserta no Diário da Assembleia da República, 2' séric-A, n." 20, dc 17 dc Fevereiro dc 1989.

5 — Substituições. — Antes do início dos trabalhos c no decurso dos mesmos verificaram-sc as seguintes substituições cie dcpuiados:

Mário Júlio Monialvão Machado (PSD) por Fernando

José Russo Roque Correia Afonso (PSD), cm 6

de Dezembro dc 1988; Armando Manuel Pedroso Militão (PSD) por Mary

Patrícia Pinheiro Correia e Lança (PSD), cm 1 dc

Fevereiro dc 1989; Raul Fernando Sousela da Costa Brito (PS) por José

Ernesto Figueira dos Reis (PS), cm 18 dc Abril

dc 1989;

José Florêncio Botelho Castcl-Branco (PS) por Luís Gcordano dos Santos Covas (PS), cm 4 dc Maio dc 1989;

Mário Manuel Cal Brandão (PS) por Rui António Ferreira da Cunha (PS), cm 4 dc Maio dc 1989;

Armando Amónio Martins Vara (PS) por António Fernandes da Silva Braga (PS), em 23 dc Maio dc 1989;

João Barroso Soares (PS) por Carlos Manuel Luís (PS), em 22 dc Janeiro dc 1990;

António José Monteiro Vidigal Amaro (PCP) por João Cerveira Corregedor da Fonseca (Indep.), cm 17 dc Janeiro dc 1989.

Relativamente aos representantes dos familiares das vítimas, não se verificou qualquer substituição.

6 — Sigilo. — No início dos uabalhos foram devidamente ajuramentados todos os membros da Comissão, os representantes dos familiares das víumas e, bem assim, todos os funcionários da AR que, por qualquer forma, iam prestar a sua colaboração, no scnüdo dc guardarem absoluto sigilo sobre tudo quanto ocorresse no decurso dos trabalhos, já que o regimento da Comissão a isso os obrigava.

A igual sigilo foram sujeitos —c devidamente ajuramentados — os depoentes na Comissão.

7 — Prorrogação do prazo de vigência. — O prazo que inicialmente foi concedido à Comissão para conclusão dos seus uabalhos foi prorrogado quatro vezes por períodos sucessivos dc seis meses.

8 — Reuniões. — A Comissão, que tinha por incumbência continuar o trabalho das anicriores, reuniu ao longo dc três anos, tendo as suas actas sido reunidas em 27 volumes, com o número total dc 6962 páginas.

9 — Deslocações. — A Comissão realizou várias deslocações.

Deslocou-se cm 24 dc Maio dc 1989 ao hangar do Aeroporto da Portela, onde examinou os destroços do avião.

Em 27 dc Junho de 1989 dcslocou-se ao aeródromo de Tires para proceder a uma cuidada inspecção a um Cessna 421, modelo semelhante ao acidentado em Camarate.

Em 6 dc Julho dc 1989 deslocou-se, acompanhada por várias entidades, à zona do Aeroporto da Portela onde o Cessna se despenhou em 4 de Dezembro dc 1980, para obler esclarecimentos adicionais sobre questões técnicas dc aeronáutica.

No dia 9 dc Março dc 1990 a Comissão deslocou-se à Amadora, a fim dc ali prosseguir com os seus trabalhos dc investigação com vista ao apuramento da verdade.

Em 27 dc Agosto dc 1990 a Comissão dcslocou-sc novamente ao aeródromo dc Tires, acompanhada por uma comissão dc peritos, onde examinou um Cessna 42) cedido pela empresa Vila Magna Albufeira Jardim.

Finalmente, cm 21 dc Setembro dc 1990 dcslocou-sc dc novo ao hangar do Aeroporto da Portela, acompanhando uma comissão dc cientistas, que procedeu à recolha dc amostras do avião sinistrado, para que eslas fossem sujeitas às competentes análises que permitissem o esclarecimento da origem dos materiais encontrados cm proporções anómalas, descritas no relatório da mesma comissão dc pcriios, na primeira fase dos trabalhos.

10 — Diligencias empreendidas pela IV CE1AC. — No âmbito dos trabalhos desia Comissão foram desencadeadas as diligências cuja natureza c resultados constam do quadro que segue:

Descrição geral das diligências solicitadas pela IV Comissão

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Das diligências acima descritas, destacam-sc as seguintes, entre outras:

O relatório dos exames referentes ao processo n.9 609/ 83, realizados a pedido do Ex.™1 Sr. Dr. Juiz dc Direito do TIC de Loures, pela comissão dc nove peritos indigitados por esse Tribunal, com vista a apurar a proveniência do fósforo encontrado nas roupas das vítimas — solicitado cm 11 de Outubro de 1989. Não foi satisfeito o pedido. Após várias insistências (26 dc Janeiro c 13 dc Março de 1990), o relatório foi remetido c entregue à Comissão cm 21 de Maio de 1990;

O relatório referente ao processo n.9 609/83 (TIC dc Loures), realizado pela comissão de peritos, a pedido desta Comissão Eventual dc Inquérito, para análise de novas amostras recolhidas do avião sinistrado em Camarate, com o objectivo de esclarecer a «origem dos materiais encontrados cm proporções anómalas», descritas no relatório da mesma comissão de peritos na primeira fase dos trabalhos — solicitado cm 4 dc Setembro dc 1990. Foi remetido e entregue à Comissão cm 5 dc Fevereiro dc 1991.

11 — Audição dc depoentes. — A Comissão, por proposta dc qualquer dos seus membros, procedeu à audição de depoentes, mesmo dc alguns que já haviam prestado testemunhos constantes dos autos, para que estes confirmassem ou infirmassem o seu teor. Inquiriu 38 depoentes, muitos dos quais mais dc uma vez, c procedeu a acareações sempre que sc justificaram.

A Comissão procedeu à audição dos seguintes depoentes:

1) Dr. António Silva Santos —PJ;

2) Dr. José Manuel Morais Anes — PJ;

3) Dr. José Alberto de Almeida Marques Vidal — PJ;

4) Dr. Álvaro Augusto Teixeira Lopes — PJ;

5) Engenheiro Mário Jorge Dinis da Fonseca — PJ;

6) Dr.! Maria Cândida C. Trigo dc A. Negreiros Vaz — IST;

7) Engenheira Maria João P. de A. M. Cabral dc O. Basto — IST;

8) Dr.» Maria Vitória Pinheiro — LNETI:

9) Engenheiro Gil Pires Martins — LNETI;

10) Prof. Doutor José Avelino Lima dc Faria — CCM;

11) Dr.' Maria Ondina G. Dionísio Vidigal Figueiredo — CCM;

12) Prof. Vasco António de S. Lacerda de Brederode — IST;

13) Prof. Mário Ncry Rodrigues Nina — IST;

14) David Pereira Borges de Azevedo — comissário da PSP;

15) Dr.» Isabel Pinto Ribeiro —IML;

16) Dr.? Maria Eduarda Marques Silva — Hospital de São José;

17) Mário António Inácio Costa — chefe dc esquadra (PSP);

18) Manuel Guimarães da Cosu» — segundo-subchefe (PSP);

19) Comandante Manuel António Monieiro Gaspar Frade;

20) Dr. Alcides Teixeira Lopo;

21) Comandante João Luís Morango Penaguião;

22) José da Cruz Marques Monteiro — inspector da PJ;

23) Paulo Condcsso Franco — subinspector da PJ;

24) Dr. Paulo das Graças Esteves Bernardino — inspector da PJ;

25) Eurico João Leal Marques Taxa;

26) Álvaro Estudante Fonúnha;

27) Conselheiro Oclávio Castelo Paulo — presidente da ASMP;

28) Juiz António Rodrigues Simão — SRS da ASMP;

29) Juiz Orlando Viegas Afonso —SN da ASMP;

30) Juiz Pedro Gonçalves Mourão — vogal da direcção nacional da ASMP;

31) Dr.' Maria Alice Marques — PJ;

32) Engenheiro António Victor dos Santos Almeida Viçoso —DGAC;

33) Engenheiro Joaquim Maria Dores Vidal da Silva —SPEL;

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34) Engenheiro Jorge Manuel Pires Tomás Gonçalves — SPEL;

35) Fernando Teixeira dc Matos — SPEL;

36) Comandante Georgino Santos Silva;

37) José António dos Santos Esteves;

38) Dr. Francisco José de Sousa Pessoa da Costa;

nas seguintes reuniões:

1) Reunião dc 16 dc Março dc 1989;

2) Reuniões dc 16 de Março dc 1989, 6 dc Março, 28 dc Junho c 19 dc Julho dc 1990 c 26 de Fevereiro dc 1991;

3) Reuniões dc 18 dc Abril dc 1989, 6 dc Março, 28 de Junho e 19 dc Julho dc 1990 c 21 dc Fevereiro dc 1991;

4) Reunião dc 16 dc Março dc 1989;

5) Reuniões dc 18 de Abril dc 1989, 6 de Março de 1990 c 21 dc Fevereiro dc 1991;

6) Reuniões dc 13 de Abril dc 1989, 6 dc Março, 19 de Junho c 19 dc Julho dc 1990 c 21 dc Fevereiro dc 1991;

7) Reuniões dc 13 dc Abril dc 1989, 6 dc Março c 19 dc Junho dc 1990 c 26 dc Fevereiro dc 1991;

8) Reuniões de 11 dc Abril dc 1989, 6 dc Março c

19 de Julho dc 1990 e 26 dc Fevereiro dc 1991;

9) Reuniões dc 11 dc Abril dc 1989 c 6 dc Março c

20 dc Junho dc 1990;

10) Reuniões dc 13 dc Abril dc 1989, 6 dc Março e 20 dc Junho dc 1990 e 21 dc Fevereiro dc 1991;

11) Reuniões dc 11 dc Abril dc 1989, 6 dc Março e 19 c 20 de Junho dc 1990 c 26 dc Fevereiro de 1991;

12) Reunião dc 8 dc Junho dc 1989;

13) Reunião dc 8 dc Junho dc 1989;

14) Reunião dc 8 dc Junho dc 1989;

15) Reunião dc 22 dc Junho dc 1989;

16) Reunião de 22 dc Junho dc 1989;

17) Reunião dc 22 de Junho dc 1989;

18) Reunião dc 22 dc Junho dc 1989;

19) Reunião dc 3 dc Outubro dc 1989;

20) Reuniões dc 3 dc Outubro c 9 dc Novembro dc 1989;

21) Reuniões dc 9 dc Novembro dc 1989 c 20 dc Dezembro dc 1990;

22) Reuniões dc 19 dc Outubro dc 1989 c 25 dc Janeiro dc 1990;

23) Reunião dc 19 dc Outubro dc 1989;

24) Reunião dc 5 dc Dezembro dc 1989;

25) Reunião dc 11 dc Janeiro dc 1990;

26) Reunião dc 25 dc Janeiro dc 1990;

27) Reunião dc 15 dc Maio dc 1990;

28) Reunião de 15 de Maio dc 1990;

29) Reunião dc 15 dc Maio dc 1990;

30) Reunião dc 15 dc Maio dc 1990;

31) Reuniões dc 19 dc Julho dc 1990 e 26 dc Fevereiro de 1991;

32) Reuniões dc 19 dc Julho c 10 dc Outubro dc 1990;

33) Reunião dc 25 dc Outubro dc 1990;

34) Reunião de 25 dc Outubro dc 1990;

35) Reunião de 25 dc Outubro dc 1990;

36) Reunião dc 11 dc Dezembro dc 1990;

37) Reuniões dc 20 dc Dezembro dc 1990 c 14 dc Fevereiro dc 1991;

38) Reunião de 14 dc Fevereiro dc 1991.

12 — Matéria a investigar. — A IV CEIAC incluiu como matéria integrante da sua investigação anteriores documentos c trabalhos investigatórios que a seguir se discriminam:

I) Os inquéritos conduzidos pela DG AC e pela PJ, adiante designados por investigação oficial, bem como os despachos que sobre eles recaíram e as investigações acessórias, a que, legitimamente requeridas a respeito das mesmas, se procedeu sob a égide governamental; II) Todo o conteúdo dos trabalhos das I, II e III CEIAC.

13 — Objecto. — Diversamente da I CEIAC, mas à semelhança das II e III CEIAC, foi objecto da IV CEIAC «averiguar, por forma cabal, as causas e circunstâncias cm que ocorreu a tragédia que vitimou, cm 4 de Dezembro de 1980, cm Camarate, os então Primciro-Ministro e Ministro da Defesa, respectivamente Dr. Francisco Sá Carneiro c engenheiro Adelino Amaro da Costa, c acompanhantes».

14 — Conteúdo da matéria investigada. — A matéria investigada pelas I, II, III c IV CEIAC encontra-se compilada num processo reunido durante sete anos de inquérito parlamentar c é constituído por 129 volumes c por 38 456 páginas de processo.

15 — Fecho dos trabalhos da Comissão. — A IV CEIAC promoveu todas as diligencias requeridas pelos seus membros ou pelos representantes dos familiares das vítimas e, após o esgotamento destas, deliberou marcar um prazo para o requerimento de todas as novas diligências a efectuar. Após todas elas terem lido lugar, a IV CEIAC deliberou, por unanimidade, encerrar os seus trabalhos c nomear uma comissão dc redacção que apresentasse um projecto dc relatório final até ao dia 2 dc Maio dc 1990.

Essa comissão dc redacção foi composta por:

Deputado José Luís Ramos (PSD); Deputado Carlos Luís (PS); Deputado António Mola (PCP); Deputado Rui Silva (PRD); Deputado Narana Coissoró (CDS); Sr. Augusto Cid (representante dos familiares das vítimas).

O deputado Carlos Luís (PS) foi substituído pelo deputado Rui Cunha (PS) na comissão dc redacção.

A comissão dc redacção reuniu no dia 4 dc Abril dc 1991 c deliberou mandatar o deputado Jose Luís Ramos para apresentar um anteprojecto dc relatório.

CAPÍTULO II

Hipótese de acidente sem fundamentação técnica plausível

16 — Os relatórios oficiais. — As conclusões dos relatórios oficiais evidenciam como causa provável do sinistro «a perda de potencia de propulsão do motor esquerdo, devido a um esgotamento inesperado do combustível dos depósitos da asa do mesmo lado na íasc crítica dc subida após a descolagem, com a consequente perda dc velocidade, agravada pelos efeitos dc resistência aerodinâmica produzidos, cumulativamente, pela rotação passiva da hélice do mesmo lado, pela incompleta recolha úosflaps c nela desfavorável distribuição de pesos {...}; o

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acidente poderia ter sido evitado sc tivessem sido cumpridos os procedimentos correntes da preparação do voo, da inspecção da aeronave antes do voo, da lista dc verificações antes da descolagem (-.] ou eventualmente diminuídas as suas consequências sc houvesse sido utilizado todo o comprimento disponível da pista para a manobra de descolagem» (cf. fls. 81 e 82 do relatório da DG AC).

Outra causa do desastre seria «a tensão psíquica vivida pelo piloto, a precipitação da partida e a fadiga psíquica» (cf. n. 82 do relatório da DGAC c fl. 23 do relatório da PJ de Outubro de 1981).

17 — Cálculos de consumo da aeronave. — Ora, cálculos relativos às quantidades dc combustível existentes no avião são falíveis e por isso destituídos de valor probatório, porquanto, como consta do processo, «6 completamente impossível determinar o modo como o piloto Jorge Albuquerque controlou c usou a gasolina dos vários depósitos» (cf. o relatório da DGAC, a fl. 86). Mas os cálculos efectuados pela DGAC, com aquela reserva, alcançam dois valores limite dc quantidade possível dc combusüvcl: 254 1 e 331,6 1.

Porém, a DGAC, para efeitos dc cálculo dc peso da aeronave, considera outro valor (80 galões = 302,8 I) c a PJ, por seu termo, refere 307 1 (cf. fl. 82 do relatório da DGAC e fl. 16 do relatório da PJ). Assim, dos relatórios oficiais constam quatro valores diferentes de cálculo de combustível existente na aeronave à partida da pista, o que põe. só por si, cm causa qualquer conclusão válida baseada neste fundamento.

Quanto a considerar-sc que os depósitos da asa esquerda não teriam mais que 10 I a 15 1 de combustível na fase dc descolagem, passou a considerar-sc o valor dc 254 l no total. Isso faria com que o avião apresentasse uma notável assimetria dc pesos, já que teria 15 I numa asa e 240 l na ouua asa, o que seria facilmente detectável nas manobras dc aterragem c descolagem. Aliás, isto 6 reconhecido pela própria DGAC (cf. fls. 85 e 87 do relatório da DGAC). Porém, nada disso sc verificou quer na aterragem do voo anterior do avião, onde uma testemunha refere que aquela «aterragem fora de tal modo suave que o general Soares Carneiro, que vinha a dormitar, nem deu por isso» (cf. o depoimento dc Mário David, a fl. 286 da II CEIAC), quer na descolagem para o voo fatídico que foi perfeitamente normal até à produção da emergência (cf. o depoimento do controlador da torre, Gaspar Frade, a fl. 1615 do IV vol. da II CEIAC). Aliás, a percepção dc tal assimetria leria dc ser imediata, chegando a verificar-sc nos primeiros segundos da corrida dc descolagem, antes ainda dc o avião tirar as rodas do chão c a tempo dc a interromper, sc necessário (cf. o depoimento do piloto-mecânico Georgino Silva, de fl. 4858 a fl. 4861 do x vol. da II CEIAC).

Perante tal situação, a DGAC termina por aventar a hipótese de furto dc gasolina dos depósitos da asa esquerda, que variaria nos seguintes índices:

a) 80 1 a 90 1, na hipótese dc 254 ]; by 128 I a 138 1, na hipótese dc 302 1;

c) 133 1 a 143 1, na hipótese dc 307 1;

d) 157 I a 167 I, na hipótese dc 331 I.

Contudo, a PJ refuta a hipótese dc roubo de gasolina, afirmando que, «não obsiante os esforços desenvolvidos, não sc lograram detectar indícios mínimos que comprovassem a existência daquela infracção» (cf. fl. 13 do relatório da PJ).

A outra teoria avançada, que seria a do escapamento do combustível para o wing-locker direito, inoperalivo, avançada no relatório da PJ (cf. de fl. 13 a fl. 18 do relatório da PJ), foi declarada completamente inconsistente e infundada pelos peritos ouvidos pela CEIAC (cf., entre ouuos, o depoimento do engenheiro-Viçoso à II CEIAC, fl. 7611, que chega a qualificar tal hipótese como absurda), já que uma teoria que se reporta a depósitos da asa direita nunca poderia explicar um esvaziamento de depósitos da asa esquerda, porque não há um sistema de comunicação de combustível entre as duas asas da aeronave.

Aliás, a própria DGAC não dá a devida relevância a testemunhos que contrariam a inexistência de combustível na asa esquerda. De facto, há testemunhos que referem a existência de gasolina na asa esquerda.

O bombeiro Carica Ferrão refere que «a asa esquerda tinha gasolina, que cia sentia-se, mas não tinha muita» e «o depósito estava roto» (cf. o depoimento do bombeiro, dc fl. 5364 a fl. 5366 do XI vol. da II CEIAC). Aliás, o rompimento imediato dos ianques de gasolina devido aos embates levou a que quantidade apreciável dc gasolina ficasse espalhada no terreno, mas inexplicavelmente a DGAC nunca procedeu a uma análise do mesmo. Neste sentido, o depoimento de Mário Mascarenhas refere que «as amostras de terreno que recolhi nunca foram submetidas a análise» (cf. fl. 8176 doxvm vol. da II CEIAC). Acresce a isto que a CEIAC registou informações acerca dc escorrimento a partir do teclo da Vivenda Paulos, em cujo forro do telhado ficou a asa esquerda, que nunca foi devidamente investigado pelas entidades oficiais (cf. fl. 8175 do xviii vol. da II CEIAC). Por outro lado, tudo leva a admitir que o piloto tenha feito as inspecções habituais por meio dc varetas antes do voo da aeronove, nomeadamente à suficiência do combustível existente nos depósitos. Quanto à alegada imprecisão dos indicadores dc combusüvcl do painel de instrumentos do cockpii, foi verificado pela própria DGAC que aquela menor precisão só leria lugar na «faixa medida entre três quartos e cheio» (cf. fl. 56 do relatório da DGAC), pelo que seria inverosímil que o piloto efectuasse o voo se observasse no painel dc instrumentos o indicador dc combustível na posição dc vazio.

18 — Evolução da aeronave. — O avião fez uma rolagem na pista suficiente para atingir a velocidade dc segurança (120 milhas/hora), como ficou demonstrado na CEIAC (cf. a acareação dc Maria Emília Queiroz com Aida Augusta, conjugada com o depoimento do piloto Georgino Silva, a fl. 4855 da II CEIAC, o depoimento do comandante Teixeira Lopo, de fl. 47 a fl. 49 da III CEIAC, c o depoimento do piloto Vilfrcdo Fernandes, fl. 279 do relatório da DGAC).

Resulta infundada a hipótese levantada pela DGAC quanto ao recurso a flaps para a descolagem. Por um lado, o NTSB discorda desta hipótese e vários depoentes ouvidos pelas comissões parlamentares de inquérito foram unânimes cm recusar a hipótese dc o piloto Jorge Albuquerque haver recorrido a flaps para descolar. A testemunha Vilfrcdo Fernandes refere que «o Jorge não usava normalmente flaps para efectuar a descolagem» (cf. fl. 282 do relatório da DGAC) c a testemunha Georgino Silva acrescenta que «aqui, cm Portugal, nas pistas que temos utilizado não é necessário usar flaps nem nunca vi o Albuquerque utilizá--los» (cf. fls. 4931 e 4932 do x vol. da II CEIAC).

A DG AC no seu relatório, na tentativa de justificar uma rolagem muito curta, dá como referência para situar o ponto

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dc descolagem um caminho dc acesso «alfa», baseando essa sua informação no testemunho do conuolador da torre. Isto foi, porém, repetido c categoricamente desmentido por aquele conuolador da torre, Gaspar Frade (cf. II CEIAC, p. 1616), o que demonstra a falta dc fundamentação do pressuposto da DGAC.

Por outro lado, o avião estava abaixo do seu peso máximo, com um número de passageiros dentro da loiação normal para aquele tipo dc aparelhos (cf. a acareação dc Georgino Silva com António Mascarenhas c ainda a consulta ao «Manual de serviço do avião Cessna 421-A», p. 3-10 B).

Contrariamente ao que afirma a DGAC, não ficou provado que a situação do motor esquerdo fosse, no momento das colisões, a dc parado, pois o facto dc o motor não estar embandeirado pode significar que, embora cm perda de potencia, o motor estivesse cm funcionamento a baixo regime. Eric Newton refere que «lhe Lh propciler, which was not fealhered, aldiough rotating, suggested from iis condition of the blades that was loss of power» (cf. o relatório dc Eric Newton, in Livro de Camarate, ed. do Ministério da Justiça, p. 294). Neste sentido, o piloto Georgino Silva referiu que várias vezes procedeu à paragem dc um motor à descolagem com o piloto Jorge de Albuquerque c que ele «era rápido c nem sequer hesitava» em resolver a situação (cf. o depoimento dc Georgino Silva, fl. 4849 do X vol. da II CEIAC) c o piloto Vilfrcdo Fernandes referiu que durante um voo ferry no Norte da Europa um dos motores perdeu potência c «o Albuquerque reagiu muito bem, bastante rápido. Fez todos os procedimentos, embandeirou o motor, etc.» (cf. fl. 268 do relatório da DGAC). Portanto, resulta claro que o piloto Jorge Albuquerque estava bastante experimentado nos procedimentos de emergência para paragem dc um motor.

Por outro lado, diversos técnicos aeronáuticos confirmaram à.Comissão que a extensão da pista utilizada para a descolagem era mais que suficiente, estava dentro das normas dc segurança c era procedimento usual para aviões desse tipo (cf. o depoimento dc António Penaguião, a fl. 2331 do v vol. da II CEIAC, o depoimento dc Georgino Silva, a lis. 4833 c 4922 do X vol. da II CEIAC, c o depoimento de Inácio Passos, a fl. 4558 do X vol. da II CEIAC c a H. 224 do relatório da DGAC). Neste sentido, aliás, a simples observação das plantas que integram o processo implica a conclusão dc que o avião ao executar uma corrida dc descolagem dc cerca dc 500 m ainda lhe restam, como recurso, mais dc 750 m dc pista (cf. a planta do Aeroporto, a fl. 127 do relatório da DGAC). Assim, o avião dispunha à partida de 1200 m a 1300 m dc comprimento na pista 18/36.

Ainda relativamente ao aspecto dc segurança relacionado com a extensão dc pista utilizada na descolagem, os depoentes comandantes Georgino Silva c João Penaguião deixaram bem claro que, mesmo que o piloto tivesse utilizado a extensão de pista 3/6, o facto dc, como a DGAC afirma, a emergência ter ocorrido a acerca dc 50 m dc altura c com o irem recolhido c bloqueado o piloto seria obrigado a executar os procedimentos normais para voo num só motor, uma vez que o regresso à mesma pista estaria desde logo comprometido.

Isto porque o tempo que ia despender na identificação do motor parado, nos procedimentos para controlo da aeronave c no baixar dc novo do trem dc aterragem levaria a que não dispusesse dc pista suficiente para aterrar cm frente (cf. os depoimentos dc João Penaguião, IV CEIAC, pp. 114 e scgs., c dc Georgino Silva, IV CEIAC, p. 71).

Aliás, uma consulta ao «Manual dc voo do avião Cessna 421», no capítulo de falha do motor à descolagem, os procedimentos indicados para uma falha dc motor à altitude indicada (cerca dc 50 m) não contemplam uma aterragem cm frente, mas antes o prosseguimento do voo num só motor (cf. o «Manual de voo do avião Cessna 421», Owner's manual, cap. «Engine failurc ling flíght», fl. 3-5).

Acrcsccnic-sc ainda que o avião Cessna 421, como avião mullimotor, é dotado de características técnicas que lhe permitem manter uma razão de subida com um motor parado. Por outro lado, o piloto Jorge Albuquerque linha uma vasia experiência cm operações com aviões deste género (cf. fl. 4 do relatório da DGAC, onde sc refere que o piloto tinha mais dc 50 horas de voo neste tipo de avião) e numa situação dc emergência como a figurada pela DGAC (paragem dc motor à descolagem) era das que o piloto Jorge Albuquerque mais facilmente dominava (cf. o relatório da DGAC, p. 197, c II CEIAC, fl. 4859 do X vol.). Aliás, seria muito difícil, a menos que incapacitado, que o piloio fosse surpreendido por qualquer efeito decorrente dc uma emergência desse tipo, já que esse avião dispunha dc um sistema automático de aviso sonoro (stall warning), que começa a locar entre 5 a 10 milhas/ hora c antes dc o avião locar o solo (cf. o dcpoimcnlo dc Amónio Penaguião, fl. 2280 do v vol. da 11 CEIAC).

19 — Alegadas deficiências da aeronave. — Quanto a alegadas deficiências da aeronave sustentadas nas conclusões oficiais, a CEIAC pôde apurar que:

1." O depósito dc combustível do fuso do motor direito (wing-lockcr), não operativo, consta do equipamento opcional do avião, pelo que a sua utilização era desnecessária, porquanto o avião não efectuava voos dc longo curso (cf. o dcpoimcnlo dc Georgino Silva, dc fl. 4928 a fl. 4934 do x vol. da II CEIAC);

2." Quanto ao alternador do lado direito, o PGR não refere mais que «dúvidas dc funcionamento» (cf. o despacho do PGR dc 12 dc Outubro dc 1981). Aliás, desde o início do processo parece esclarecido que a eventual avaria não csuiria no alternador, mas tão-só no sistema dc indicação dc carga, como o prova o dcpoimcnlo dc Georgino Silva, onde refere: «Julgo que o alternador funcionava. O problema era na indicação (...) Uma vez, cm Braga, csüve a uabalhar com o avião só no motor direito, duranie a noite |...) 'e sc' não trabalhasse notava-se logo um abaixamento nas luzes, o que não sucedeu.» (Cf. o depoimento dc Georgino Silva, relatório da DGAC, p. 210, c ainda os depoimentos dc Vilfrcdo Fernandes c Eurico Taxa, pp. 280 c 263, respectivamente.) O aludido despacho do PGR refere ainda «dificuldades c interrupções nas transmissões», o que não corresponde ao que consta do relatório técnico da DGAC, e, por outro lado, o controlador da torre, Gaspar Frade, não dc/xa margem para dúvidas ao afirmar que «as comunicações foram fortes c claras, bastante nítidas» (cf. fl. 236 do relatório da DGAC);

3." Utilização dc gerador dc pista — por ter sido largamente repetido nos meios de comunicação social que a utilização úo gerador dc pista pelo piloto Jorge dc Albuquerque para arranque do motor esquerdo era sinioma de deficiência nesse

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molor, a Comissão fez questão de nesta matéria ouvir vários peritos aeronáuticos c pilotos, nomeadamente o piloto Georgino Silva, responsável pela manutençüo da aeronave, tendo sido opinião unânime que a utilização do gerador é prática corrente na aviação c muito especialmente sempre que se verificam baixas temperaturas, como era o caso. Aliás, o próprio «Manual do Cessna» (Owner's manual) recomenda a utilização dc gerador de pista quando se verifiquem baixas temperaturas, nos seguintes termos: «If it is not available, external power should be used for starting because of the higher ranking power required and the decreased battery output at low temperatures.» (Cf. «Manual», fl. 2—15); 4.9 Não sc colheu qualquer fundamento para concluir que o motor do lado esquerdo «babava óleo». A CEIAC pôde verificar que os motores não apresentavam qualquer avaria através dc vários depoimentos. Vilfrcdo Fernandes declarou que «os motores estavam como novos, pois tinham sido adquiridos na América depois dc uma revisão geral» (cf. o relatório da DGAC, p. 264). O proprietário do Cessna, Eurico Taxa, referiu que o aparelho estava cm bom estado e que não notou «quaisquer deficiências no avião» (cf. o depoimento de Eurico Taxa, p. 26 da IV CEIAC). O depoente Inácio Passos é peremptório ao declarar que, tendo inspeccionado na manhã seguinte ao desastre, cuidadosamente, o local onde o Cessna YV-3J4 P estivera estacionado, não encontrou o mínimo vestígio quer de gasolina quer dc óleo (cf. fl. 224 do relatório da DGAC c lis. 4575 c 4673 do x vol. da II CEIAC). Porém, a eventual existência dc manchas dc óleo na placa dc estacionamento deste tipo dc aviões rcvcslc-sc dc uma certa normalidade, já que os respectivos motores consomem bastante óleo c os pilotos nas suas inspecções antes de qualquer voo verificam níveis c atestam os depósitos dc óleo, possuindo, normalmente, para este efeito um recipiente de óleo para necessários ajustes dc nível. Como o Cessna tocava aeródromos onde não era fácil obter esse óleo, o piloto trazia consigo, por precaução, um recipiente na bagageira da asa. Portanto, quaisquer manchas encontradas na placa dc estacionamento dificilmente deveriam ser atribuídas a mau esiado do motor, mas antes ao procedimento dc ajustamento c inspecção dc níveis dc óleo que tiveram lugar.

20 — Inspecção prévia ao avião. — Não se encontrou fundamento para afirmar que o piloto não tenha cumprido os procedimentos correntes de preparação do voo, a inspecção tia aeronave antes do voo c a lista dc verificações antes da descolagem. Esta posição assentava numa presunção dc que o piloto só sc deslocara para o avião às 19 horas c 30 minutos (cf. fls. 13, 14 c 68 do relatório da DGAC).

Resulta do processo que o piloto Jorge Albuquerque já estava junto do Cessna desde as 19 horas. Neste sentido, as declarações de Leonardo Coelho, assistente dc operações portuárias, que afirma «suponho que a saída do piloto Albuquerque pata o avião deveria processar-sc por volta das 19 horas» (cf. o depoimento dc Leonardo Coelho,

relatório da DGAC, fl. 189), c a análise do mapa dc coordenação dc transportes (cf. fl. 289 do relatório da DGAC).

A inspecção era tanto mais possível pois tanto o piloto como o co-piloto eram portadores de lanternas de voo nocturno, indispensáveis às inspecções prévias aquando de voos nocturnos (cf. os depoimentos dc Inácio Passos, fls. 4658, 4673 c 4675 do x vol. da II CEIAC, c dc Maria do Rosário Pimentel, fl. 5067 do xi vol. da II CEIAC).

21 —Competência c condição do piloto. — Segundo testemunhos dc técnicos c dc profissionais profundamente conhecedores das capacidades do piloto, nomeadamente do seu instrutor dc mullimolorcs, a competência aeronáutica do piloto Jorge Albuquerque era muito boa. Refere a dado passo: «E posso garantir-lhe que o Jorge Albuquerque foi muito apertado, não só por mim, mas até por outros. Não foi por ser o Albuquerque, mas porque era o sistema usado cm Moçambique devido aos pilotos terem dc ser treinados para trabalhar no mato, em campos curüssimos, com muitas dificuldades.» (Cf. o depoimento do comandante Gouveia, fl. 1866 do iv vol. da II CEIAC.) Não se encontrou qualquer fundamento nos autos para afirmar, como fez a DGAC, que o piloto apresentava fadiga (cf. fl. 4 do relatório da DGAC), mas, pelo contrário, depoimentos dc pessoas que contactaram com o piloto no momento do embarque ou pouco antes atestam o seu ar repousado e boa disposição (cf. o depoimento de Maria do Rosário Pimentel, II CEIAC).

A CEIAC teve a possibilidade dc ouvir a gravação do diálogo entre o piloto c a torre de controlo, podendo ajuizar que o tom dc voz utilizado não é, dc modo nenhum, indicador dc qualquer nervosismo, como chegou a ser alegado (cf. o depoimento do piloto Georgino Silva, fl. 8609 do xix vol. da II CEIAC). Por outro lado, as expressões dc índole técnica que constam da comunicação entre o piloto do Cessna c a torre dc controlo c que foram consideradas como indiciando precipitação ou pressa excessiva foram esclarecidas por técnicos aeronáuticos ouvidos pela Comissão, pelo controlador da torre, Gaspar Frade, c pelo relatório do NTSB (p. 20) como tratando-se de linguagem comum c corrente da gíria aeronáutica nas suas comunicações rádio.

Quanto ao alegado «movimento do avião com o gerador ligado», apenas o total desconhecimento da prática dos aeroportos c uma leitura c interpretação menos atenta do depoimento em que sc fundara pode ter permitido ao PGR (cf. o despacho dc 12 dc Outubro de 1980) estabelecer essa inferência. Dc facto, ficou sobejamente esclarecido que o avião, por não estar calçado, sc limitou a descair ligeiramente com o arranque do motor direito (cf. o depoimento do funcionário da TAP Artur Elias, fl. 220 do relatório da DGAC), mas isso não significou o arranque da aeronave, pois só posteriormente, como refere aquele depoente, c após os dois motores estarem a funcionar, «o piloto fez sinal para tirar a ficha» e o operador deu ao piloto «o sinal dc OK» c após isso o avião arrancou (cf. o depoimento dc Artur Elias, fl. 220 do relatório da DGAC).

22 — Trajectória dc voo c sequencia dc embates. — Segundo reiterados testemunhos do controlador da torre à DGAC, à PJ c às várias CEIAC c com base nas precisas referências visuais que cita c nas colas que cm consequência são calculadas, foi possível estabelecer rigorosamente que o avião não ultrapassou na sua máxima altura os 20 m a 25 m acima do nível da pista, fazendo, por consequência, uma trajectória nivelada c horizontal até ao

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local dos embates finais, no Bairro das Fontainhas. É a elevação do terreno c do casario no bairro dc Camarate, aproximadamente 20 m, relativamente ao nível da pista, que explica o embate da aeronave nesses pontos, c não uma trajectória descendente de que o avião viesse arrimado. Esses testemunhos do controlador da torre, Gaspar Frade, permitem csiabclcccr dc modo rigoroso que o avião, na altura da emergência c sua máxima altura, começou por pranchar nitidamente sobre a direita, só depois sc desviando sobre a sua esquerda até ao local dos embates c sua imobilização final, atitude inicial que é inteiramente anormal se se tivesse verificado uma paragem do motor esquerdo (cf. o depoimento de Gaspar Frade, fl. 46 da III CEIAC).

Ora, este nítido pranchamento sobre a dirciu nâo está representado na planta a fl. 94 do relatório da DG AC, sendo certas as suas importantes consequências na trajectória do aviüo.

Por outro lado, dada a documentação fotográfica junta ao processo das habitações atingidas, pela observação dos destroços c dos registos dos embales que na asa esquerda e na cauda (estabilizador esquerdo) sc verificaram c pelo debate com técnicos aeronáuticos (cf., entre outros, os depoimentos de João Penaguião c Georgino Silva na IV CEIAC), pode dar-sc por concluído que a seguir ao corte dos fios clccuicos sc deu o primeiro embate da asa esquerda com dois pequenos pilares dc cimento armado nas traseiras da Vivenda Paulos, que seccionaram e arrancaram a asa esquerda, rasgando-a c fracturando cm diversos pontos os respectivos depósitos dc combustível, projectando, por inércia, aquela secção da asa, que ficou depositada no forro do telhado da referida Vivenda Paulos. O aviüo vem a imobilizar-sc contra o 1." andar da Vivenda Zeca, em posição dc ponic, com a traseira apoiada no beiral do telhado da habitação fronteira c o nariz, no sentido da trajectória, dentro do 1 .* andar c forro do telhado da referida Vivenda Zeca.

Ora, quanto à trajectória c sequência dc embates, foi patente na CEIAC que a Cl da DGAC não fez qualquer estudo da sequência dc embates (cf. os depoimentos dc Mário Mascarenhas, fl. 8226 da II CEIAC, c dc Graça Reis, fi. 8376 da II CEIAC).

23 — Exames médicos legais. — Quanto às autópsias, ficou apurado pela CEIAC que foram mandadas cxccunr com grande urgência c que os seus relatórios, ainda que assinados por dois médicos, foram apenas elaborados por um deles, assim como as próprias autópsias (cf. os depoimentos dos médicos José Sombrcirciro, fl. 695 da III CEIAC, e dc Fernando Fonseca, fl. 891 da III CEIAC).

O Dr. Fernando Fonseca chega a afirmar que «quando cheguei ao Instituto, às 8 da manhü, as vítimas já estavam a ser metidas cm caixões e algumas delas já tinham saído do IML». O médico legisla, Dr. José Sombrcirciro, reconheceu ainda que desconhecia qual o tipo dc exames que especificamente deveriam ser feitos cm casos dc vítimas de desastres aéreos (v. g., recolha dc tecidos, exame aos tímpanos), nDo tendo por isso procedido a lais pesquisas (cf. o depoimento do Dr. José Sombrcirciro, fls. 158 e 759 da III CEIAC).

24 — A improbabilidade dc sabotagem, segundo as entidades oficiais. — O PGR afirma que «o concurso dc eventuais actos dc sabotagem ou dc ataque directo exigiriam inicialmente preparação adequada, que se nâo compadece, em termos dc probabilidade, com a circunstância

dc a utilização do aparelho sinistrado para transporte do Primciro-Minislro, Ministro da Defesa c demais individualidades ter apenas sido aceite cerca das 12 horas e 20 minutos do próprio dia do sinistro, ter sido comunicada depois das 16 horas e, ao que parece, nâo ler ultrapassado o conhecimento dc um número restrito c insuspeito dc pessoas» (cf. o despacho do PGR de 12 dc Outubro dc 1981). Este prc-juízo dc improbabilidade dc preparação dc sabotagem por falta dc tempo consta igualmente dc outras conclusões anteriores, nomeadamente da DGAC (cf. fls. 158 c segs. do relatório da DGAC).

Porém, esse pré-juízo apresenta contradições, já que no processo inicial da DGAC consta que a confirmação do voo entre os Gabinetes do Primciro-Minislro c do Ministro da Defesa c deste último Gabinete com o piloto foi feita cerca da hora do almoço (cf. fl. 287 do relatório da DGAC). Por seu turno, cm artigo publicado num jornal, Adriano Vasco Rodrigues, evocando a última vez que estivera com Adelino Amaro da Costa, recorda que tal aconteceu no princípio da noite dc 3 dc Dezembro dc 1980, durante um voo TAP dc Lisboa para o Porto, em que Adelino Amaro da Costa o informou c a ouiros circunstantes dc que teria dc regressar a Lisboa nessa noite, «a fim dc acompanhar no dia seguinte ao Porto Francisco Sá Carneiro» (cf. Jornal da Guarda, dc 10 dc Dezembro dc 1982).

Há ainda a destacar o facto dc o Cessna 421-314P ter estado estacionado no Parque Delta, sem qualquer vigilância especial, entre cerca das 3 horas c 30 minutos c as 19 horas do dia 4 dc Dezembro, não tendo sido solicitados ao Aeroporto dc Lisboa quaisquer serviços dc assistência ou vigilância para aquela aeronave (cf. fi. 162 do relatório da DGAC).

O pré-juízo dc improbabilidade no respeitante à preparação dc sabotagem por paric das entidades oficiais contemplou só c unicamente a hipótese dc a mesma ser dirigida ao cnulo Primciro-Minislro, Dr. Sá Carneiro. Ora, foi-nos possível apurar que tanio o Ministro da Defesa, Adelino Amaro da Cosia, como o candidato presidencial general Soares Carneiro, ao serviço, aliás, dc quem o avião sc encontrava, constituíam igualmente potenciais alvos dc um atentado. Assim, conforme consta do depoimento dc Manuela Vaz Pires, sogra dc Adelino Amaro da Cosia (cf. fl. 624 da I CEIAC), c dc Carlos Azeredo, assessor do entâo Primciro-Minislro (cf. fi. 302 da I CEIAC), o Ministro da Defesa receava pela sua vida, era portador dc uma arma c transportava consigo documentação altamente confidencial. Quanio ao candidato general Soares Carneiro, saliente-se que um responsável da DINFO (informações miliiarcs), Oliveira Marques, aconselhou o piloto Jorge Cru/, (cf. os depoimentos e acareações dc Jorge Cru/., Isabel Nunes c Oliveira Marques, a fls. 4877 c segs. da III CEIAC) a não prestar o seu contributo para aquela campanha como piloio do candidato Soares Carneiro porque a sua vida correria perigo.

Esic conselho viria a ser acatado por aquele piloto, que dcsmoniou uma hélice da sua aeronave para similar uma avaria do motor como pretexto para nao emprestar os seus serviços de piloto a essa campanha eleitoral (cf. fl. 1592 da III CEIAC).

25 — Análise do NTSB. — A CEIAC lastima que o NTSB nao sc lenha prestado a colaborar com o inquérito parlamentar, apesar das reiteradas insislcncias feitas junto daquele organismo, por forma a estudar os dados novos e

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a aclarar as diversas dúvidas e omissões que foram suscitadas relativamente à análise dc 26 dc Junho dc 1982. De referir que os próprios técnicos do NTSB qualificam o seu trabalho como «uma análise» c não como um relatório, o que se justifica por não ter um carácter conclusivo.

Acresce a isto que o próprio NTSB vem a reconhecer, em 18 dc Dezembro de 1983, que o peso e a dcsccniragcm da aeronave não leriam sido correctamente calculados (lembremos que este ponto era o factor causal considerado decisivo para o sinistro), o que, só por si, põe cm causa as conclusões.

Por outro lado, a CEIAC pôde constatar que o NTSB nao efectuou uma investigação original cm Camarate, mas apenas sc limitou, na curta semana cm que a sua equipa esteve cm Portugal, a produzir uma análise sobre informações fornecidas pelas autoridades portuguesas (cf. fl. 1 da análise do NTSB). Aliás, essas informações foram parciais, já que a existência dc um rasto detectado no terreno sobrevoado pela aeronave com a extensão e configuração que foi possível a esta Comissão apurar e que era do conhecimento da PJ desde o dia seguinte ao sinistro não foi transmitido aos lécnicos do NTSB para uma avaliação e explicação, o que vicia à partida qualquer juízo global de ocorrência. Quanto à carta assinada pelo Sr. Ronald Schcede e dirigida à CEIAC cm 1986, cia não merece relevância, pois não sc procedeu a qualquer estudo ou ponderação sobre os dados novos nem foi deslocada a Portugal qualquer equipa para confirmar ou não as provas indiciárias entretanto apuradas e que punham cm causa a análise do NTSB dc 1982.

26 — Pareceres dos técnicos Eric Newton e James Mason. — Os pareceres lécnicos dc Eric Newton e James Mason perdem grande parte da sua fundamentação, pois, após uma primeira visita aos destroços da aeronave, foi aconselhado unicamente por Eric Newton a que se procedesse o mais depressa possível à exumação dos corpos dos pilotos e ü pesquisa nesses corpos dc minúsculos estilhaços. Para esse efeito, Eric Newton entregou ao jornalista Artur Albarran, que o acompanhava, ampliações do tipo dc estilhaço que deveria ser procurado, recomendando que a pesquisa leria dc ser minuciosa, feita com grande cuidado c por técnicos allamcntc competentes. Artur Albarran declarou na CEIAC que os peritos estrangeiros consideravam que a sua função na investigação seria apenas a de fornecer umas «pistas», mas que «depois deveriam ser os peritos portugueses a levar isto até ao fim» c «deixaram-me foiografias dos estilhaços a serem procurados», mas, «embora eles tenham feito essa recomendação, essa pesquisa não foi feita» (cf. o depoimento dc Artur Albarran, fl. 1239 da III CEIAC).

Foi, aliás, com base nessa directiva que os familiares das vítimas insistiram junto das autoridades oficiais no sentido dc se procederem urgentemente às exumações dos corpos; tal como previa o engenheiro Eric Newton, os exames radiológicos ao corpo do piloto Jorge Albuquerque vieram comprovar a existência dos estilhaços que o técnico inglês sugerira lá esiarcm.

Torna-sc patente a evidência de que os peritos estrangeiros chamados a colaborar na investigação oficial, c não propriamente a fazerem uma investigação própria c independente, íoram condicionados c limitados no seu trabalho, sendo forçados a avançar, cm privado c até junto dc jornalistas, pistas c sugestões que não puderam ou quiseram contemplar nos relatórios fornecidos às autoridades oficiais.

CAPÍTULO III

Avaliação crítica das investigações oficiais

A IV CEIAC reitera os juízos negativos já anteriormcnie feitos a este propósito por outras comissões dc inquérito quanto às investigações oficiais. Tais juízos foram formulados no sentido que a seguir resumidamente sc transcreve.

27 —Conclusões da I CEIAC:

a) Quanto à actuação do Governo, considera-se prejudicial para o prosseguimento das investigações a nota oficiosa de 11 de Outubro de 1982. De facto, consiaia-se que até àquela data não só a PJ não tinha ainda na sua posse resultados dc análises laboratoriais importantes como os trabalhos da Cl da DGAC sc encontravam numa fase muito preliminar.

Descoordenação entre as actividades da Cl da DGAC c da PJ, bem como certas investigações paralelas de técnicos da TAP, cuja intervenção nunca esteve bem definida. A inexistência dc um organismo especializado em acidentes e segurança aeronáuticos com competência e atribuições dc âmbito superior às da actual DGAC contribuiu de modo decisivo para aquela descoordenação.

b) Quanto à actuação da Cl da DGAC, poderiam ter contribuído para um apuramento mais exacto dos factos as seguintes diligencias: pesquisa dc existência de gasolina derramada cm toda a zona do lerreno nas proximidades da Vivenda Paulos c inquirição dc dois pilotos de um cargueiro francês DC-3 que se encontravam no Parque Delta c que terão assistido, junto do avião sinistrado, aos preparativos para a partida.

c) Quanto à actuação da PJ, são imputados ao trabalho dc investigação criminal realizado por esta entidade actos dc negligência: a PJ tratou insuficientemente elementos relevantes para o processo, não realizou atempadamente pesquisa exaustiva c adequada nos destroços do avião nem investigou o espectro alargado dc modalidades de sabotagem diferentes dc utilização de explosivos e não aprofundou nem acareou os relatos dc testemunhas oculares que referenciaram o avião como já tendo um foco dc incêndio antes do primeiro embate com os daquelas que não sc referem ou negam tal ocorrência.

28 — Conclusões da II CEIAC. — A II CEIAC vem reconhecer a impossibilidade que leve cm cumprir todas as diligencias por dissolução da Assembleia entretanto ocorrida, mas, apesar disso, considerou que não foram contrariadas as conclusões da anterior Comissão Parlamentar de Inquérito.

29 — Conclusões da III CEIAC:

a) Quanto às actuações governamentais, foi considerado que, não havendo procedimentos clássicos e bem roünados das autoridades policiais cm casos do tipo ocorrido, verificaram-se no terreno múltiplas formas de descoordenação de que o Governo só mais tarde veio a ler informação (fl. 6966 do xv vol. da II CEIAC), para o que poderão ler contribuído as indefinições quanto à repartição dc competências no tocante às polícias (fl. 1385 do ui vol. da II CEIAC). No âmbito da PSP, a quem cabia a segurança do Primciro-Ministro, não foi determinado qualquer inquérito, nem determinadas, no âmbito das competências da respectiva lulcla, medidas que pudessem contribuir para os objectivos referidos na nota oficiosa cilada (11 dc Dezembro de 1980).

Considcra-sc que contribuiu ainda decisivamente para adensamento das dúvidas públicas a tomada dc posição

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governamental posterior ao conhecimento do relatório elaborado pela I CEIAC (emitida através da nota oficiosa de 30 dc Abril de 1983) c a publicação pelo Ministério da Justiça dc um volume que, ao contrário do anunciado cm 30 dc Abril dc 1983, veio a não conter «integralmente os relatórios periciais produzidos c algumas peças do processo consideradas relevantes ou significativas para esclarecimento público», o qual veio ulteriormente a ser retirado.

b) Quanto à actuação da Cl da DGAC, a Comissão considera muito negativas e desprovidas de jusúficação as imposições registadas quanto à extinção, configuração, agregação c natureza dos vestígios encontrados na área relevante para as investigações.

c) Quanto à actuação da PJ, não foram esclarecidos aspectos relevantes sobre o concreto relacionamento antes c depois dc 4 dc Janeiro dc 1981 entre a PJ e as instâncias governamentais competentes. No apuramento dc tais aspectos, do ângulo da PJ deparou a Comissão com omissões, contradições c discrepâncias que não foram ultrapassáveis. Também no exame das questões dc relacionamento interno susceptíveis dc projecção nas investigações foram encontradas contradições inultrapassáveis, mesmo através dc acareação (actas dc 13 dc Maio dc 1986 c dc 15 dc Janeiro dc 1987), o que profundamente sc lamcnia c assinala.

30 — A IV CEIAC. — A IV CEIAC, após analisar todo o processo, encontra-se cm condições dc formular uma apreciação globalmente crítica à actuação das entidades oficiais pelas razões que a seguir se indicam:

1.* Nota oficiosa dc 13 dc Dezembro dc 1980.— A Presidência do Conselho dc Ministros c os Ministérios da Justiça e dos Transportes emitiram no dia 13 dc Dezembro dc 1980 uma nota oficiosa cm que, depois dc lembrar que a «metodologia c disciplina dc um inquérito recomendam a abstenção dc serem formuladas hipóteses insuficientemente comprovadas, bem como dc serem divulgadas conclusões parciais», decide fazer isso mesmo, evocando «o clima emocional e a natural ansiedade gerada pela tragédia». Nessa sua nota oficiosa as entidades excluem a hipótese dc ter ocorrido um acto criminoso c avançam os argumentos que haviam dc ser a sua base dc fundamentação para explicar a hipótese de acidente. Note-se que à data deste comunicado oficial os investigadores tinham já pleno conhecimento do resultado das autópsias que a ausência dc fracturas indiciava, bem como da existência dc um rasto no terreno sobrevoado pela aeronave.

E dc salientar que esta nota oficiosa vinha um pouco no sentido do comunicado do PSD da noite dc 4 dc Dezembro dc 1980, onde sc excluía categoricamente a hipótese dc a queda do avião Cessna sc ficar a dever a uma sabotagem. O teor desse comunicado teria ficado a dever-sc ao facto dc «uma agitação no Norte do País que evitasse afrontamentos» (cf. o depoimento dc Viana Baptista, fl. 5964 da II CEIAC). A CEIAC não pode acciutr esta justificação, pois não foram conhecidos nenhuns incidentes c porque tal facto era susceptível dc condicionar gravemente as investigações.

2.* Juízos preconcebidos dc alguns investigadores sobre as causas da tragédia. — Técnicos houve que cm depoimentos na Comissão Parlamentar deixaram bem expresso que possuíam pré-juízos sobre as causas da tragedia, o que levou a amputar cm muito a investigação dc exames c medidas necessários. Rcfiram-sc, a título dc mero exemplo, as declarações do comandante Graça Reis, da Cl da DGAC, que assim que chegou ao local já tinha a explicação para

o sucedido. Refere, a dado passo, «expliquei de imediato ao Sr. Ministro o que, cm princípio, linha acontecido, porque é dos livros, é típico aquele desastre motivado pela falta dc potência num motor» (cf. fl. 8267 da II CEIAC, depoimento dc Graça Reis), c para justificar a ausência de estudos relativos à sequência dc embates do Cessna sinistrado afirmou que aqueles exames eram dispensáveis, porque sc esteve perante «um típico acidente à descolagem» (fl. 8273 da II CEIAC), c do director do LPC dl ■>;. António Silva Santos, que, no mesmo sentido, refere que «sc tratava dc um voo à portuguesa» (cf. o depoimento dc António Silva Santos, fl. 46 da IV CEIAC) c reconhece ter opiniões pessoais sobre a origem das substâncias suspeitas encontradas no avião, segundo ele «provinham da espuma dos bombeiros», pelo que sc dispensava a experimentação laboratorial (cf. o mesmo depoimento, fls. 101-144 c 167 da IV CEIAC). O Dr. Garcia Marques, director-adjunio da PJ, dispensa pareceres sobre o rasto, porque estava adquirido que sc traiava dc um «cfciio túnel» (preenchimento por partículas leves incendiadas com origem no foco dc incêndio dc um corredor dc vácuo deixado pelo avião ao longo da sua trajectória desde o final da pista até ao local dos embates, segundo explicação do Dr. Lourenço Martins) (cf. o depoimento dc Lourenço Martins, fl. 10 540 da III CEIAC), desliga das investigações um inspector que observou o rasto c cm consequência suscita a hipótese dc atentado no seu relatório (cf. o depoimento dc Pedro Amaral, fls. 1948, 2012 e 1932 da III CEIAC).

3.* Ausência dc preservação dos destroços da aeronave.— A chocante c inexplicável negligencia das autoridades cm assegurar a necessária preservação dos desuoços do aparelho constitui só por si um dado para o qual csia Comissão não encontrou explicação. Lembremos que a aeronave sc despenhou num local coincidente com os limites da área do Aeroporto c que o acesso dos populares a essa zona sc fez através dc uma área reservada perante a total passividade das autoridades encarregues da preservação dos destroços. Essa zona poderia ser facilmente isolada, já que, para além da área reservada do Aeroporto, a rua do Bairro das Fontainhas onde o avião sc imobilizou era cslrcila c sem saída. Os próprios técnicos da Cl da DGAC referem nos seus depoimentos lerem presenciado nesse local a apropriação de partes componenics da aeronave por pessoas estranhas à investigação (cf. os depoimentos do engenheiro Viçoso, fl. 7082 da 11 CEIAC, c do comandante Graça Reis, n. 8267 da II CEIAC) c outros depoentes relataram à Comissão que possuem cm casa dcstr(x:os do avião sinistrado (cf., a título dc exemplo, o depoimento dc Eurico Taxa, fl. 77 da IV CEIAC). No entanto, aqueles técnicos retiraram-se do local para só iniciarem as investigações no dia seguinte, limimndo-sc a constatar a pilhagem a que a aeronave foi sujeita (cf. o depoimento do comandante Graça Reis, fl. 8268 da II CEIAC).

Esta circunstância compromete gravemente c à partida uma investigação que sc devia pautar pelo rigor. Aliás, isto mesmo foi reconhecido pela DGAC, que escreveu no respectivo relatório que «a intervenção dc pessoas não autorizadas que conseguiram acesso» aos destroços prejudicou o «rigor das observações e exames periciais levados a cabo pela Cl» (cf. o relatório da DGAC, vol. iv, fl. 34).

4.* Recusa da PJ c da DGAC cm retirar ilacções da detecção dc um rasto no terreno à vertical da trajectória do avião. — Uma equipa da PJ, chefiada pelo inspector

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Pedro Amaral, encontra, referencia e levanta do solo um rasio de fragmentos vários provenientes da aeronave nos dias 5 e 6 de Dezembro dc 1980 c rcmclc-os para a PJ solicitando um exame laboratorial do departamento competente da PJ, o LPC (cf. o ofício dc remessa n.9 63 579, de 9 dc Dezembro de 1980, da 3.» Secção da Directoria de Lisboa da PJ para o LPC, exame n.9 3486/90, dc 16 dc Dezembro, do LPC c relatório do inspector da referida 3.» Secção dc 22 dc Dezembro dc 1980).

A CEIAC pôde confirmar c esclarecer de uma forma inequívoca a existência e as características essenciais desse rasto, através de depoimentos do inspector responsável pela brigada que pesquisou os terrenos do Aeroporto entre o topo da pista 18/36 c o local dc embate do avião e dc vários agentes que integraram esta brigada e que procederam ao levantamento dos fragmentos, bem como por acareação, sempre que se suscitaram dúvidas (cf. os diversos depoimentos do inspector Pedro Amaral, sub-inspector Sousa, agente Luís Maciel c agente Romão à III CEIAC).

O inspector Pedro Amaral elaborou um relatório onde chamava a atenção para a gravidade da existência desse rasto c para a necessidade urgente dc para ele sc encontrar uma explicação, chegando no mesmo documento a fazer uma alusão a duas hipóteses possíveis, acidente c atentado. Porem, a resposta a esse relatório começou por ser uma tentativa dc levar o inspector a modificar os termos do seu relatório (cf. o depoimento de Pedro Amaral, fl. 1954 da III CEIAC) c, perante a recusa peremptória do mesmo, a PJ optou pela desvalorização do documento dc Pedro Amaral, atribuindo-lhe imprecisão (cf. o relatório da PJ dc Outubro dc 1981, fls. 20 c 21), c, por outro lado, a PJ explica o rasto encontrado no terreno pela acção do vento após o incêndio do avião, sem sc preocupar cm confirmar com o inspector c a sua equipa a exacta localização no terreno dos resíduos encontrados e recolhidos nem dc obter uma explicação científica para a existência desse rasto c orientação do mesmo. Acresce que este relatório só viria a ser junto aos autos cm 1983, facto para o qual a CEIAC não consegue encontrar explicação.

Por outro lado, a DGAC, presente nos terrenos do Aeroporto à mesma data (5 dc Dezembro dc 1980), limitou--sc a pesquisar apenas uma parte da zona sobrevoada pela aeronave compreendida pela estrada da Charneca c pelas traseiras das casas atingidas, enquanto toda a zona que distava entre o final da pista 3/6 c a mesma estrada foi pesquisada pela equipa do inspector Pedro Amaral (cf. os depoimentos dc Pedro Amaral, fl. 1968 da III CEIAC, c de Mário Mascarenhas, 0. 3780 da III CEIAC).

Para csic csiranho e inaceitável facto juslifica-sc a DGAC, ao esclarecer a CEIAC, que não houve coordenação alguma entre as várias entidades encarregues da investigação, nomeadamente entre a DGAC c a PJ. O engenheiro Viçoso, presidente da Cl da DGAC, «chega a referir que nunca disse que linha havido coordenação» c admite que «não leve conhecimento do relatório da PJ» (cf. o depoimento do engenheiro Viçoso, (Is. 7520 c 7521 da II CEIAC).

A corroborar a afirmação do presidente da Cl da DGAC, o próprio director da PJ, Lourenço Martins, vem confessar que estas duas entidades, a PJ c a DGAC, ocultavam uma da outra informações respeitantes à investigação (cf. o depoimento dc, Lourenço Martins, ÍY Vò 523 da 111 CEIAC).

Esta situação rcvcla-se sui generis a todos os títulos, já que equipas a trabalhar dc costas voltadas encerram uma forte susceptibilidade dc comprometer ioda a investigação.

Partindo do princípio que a DGAC não linha conhecimento da extensão lotai do rasio c da sua configuração, a mesma entidade omite no seu relatório que o rasto por si dctccifldo era relativamente estreito (cerca de 8 m de largura) c que na zona coincidente com os fios eléctricos cortados pela asa esquerda da aeronave o mesmo rasto apresentava uma nítida mudança de direcção, formando um cotovelo coincidente, aliás, com a alteração dc rumo da aeronave por pranchamento sobre a esquerda. A planta desse rasio elaborada ao tempo pela DGAC c inexplicavelmente omitida durante muito tempo só foi entregue na Comissão Parlamentar cm 1987 c a simples observação da mesma permite concluir que o vento não poderia ser responsabilizado por semelhante inflexão.

Porém, se dúvidas ainda houvesse, a PJ deslocou para os terrenos do Aeroporto um desenhador seu, que acompanhou a equipa do inspector Pedro Amaral no dia 5 de Dezembro dc 1980 c que, face ao que observou, elaborou uma planta com a extensão c localização do rasto no lerreno. Este documento, de fulcral importância para a compreensão dos factos, desapareceu misteriosamente dos autos de inquérito da PJ. Porém, a CEIAC conseguiu depois dc muita insistência ter acesso ao croquis que esteve na base do desenho final, tendo assim a possibilidade de tomar conhecimento do traçado do rasto (cf. o croquis de António Carichas c o seu depoimento na CEIAC, bem como a confirmação do inspector Pedro Amaral c da sua equipa à

III CEIAC).

5.' Ausência dc um estudo sobre a sequência de embates da aeronave. — A CEIAC pôde apurar que não houve qualquer csiudo da sequência dc embates da aeronave. Como sc compreende, esse csiudo reveste-sc dc uma imprescindibilidade cm qualquer investigação dc acidentes aéreos com vista ao apuramento das circunstâncias da queda do aparelho c das acelerações a que o mesmo foi sujeito aquando do despenhamento. Porém, o presidente da Cl da DGAC, engenheiro Viçoso, reconhece «não ter muita experiência cm investigação dc acidentes aéreos» (cf. o depoimento do engenheiro Viçoso, fl. 78 da

IV CEIAC) e os membros da DGAC António Mascarenhas c Graça Reis confirmaram a ausência desse csiudo por entenderem que o mesmo era desnecessário (cf. os seus dcpoimcnlos nas I c II CEIAC). Tais factos não podem merecer a aceitação da CEIAC, tanto mais que o posicionamento da aeronave após a imobilização sugerida referida pela DGAC no respectivo relatório (dc nariz para baixo e cauda encostada à moradia Zeca) eslava em lotai contradição com os testemunhos oculares dos moradores dc Camarate e, por outro lado, não explica a projecção do motor esquerdo para a rua adjacente nem a destruição e fogo registado no l.9 andar da moradia Zeca.

A ausência desse csiudo levou a que a DGAC desconhecesse a existência dc dois pilares cm cimento armado nas traseiras da Vivenda Paulos responsáveis pela destruição c arranque da asa esquerda do aparelho, bem como da rotura das suas células dc combustível. Este facto conslilui, aliás, impedimento para a DGAC elaborar um pré-juízo correcto sobre a existência de combusu'vel na asa esquerda, explicando, consequentemente, a disparidade c contradição patenteada nesses cálculos.

6." Incompletude dos exames médico-Icgais. — A CEIAC teve ocasião dc apreciar os relatórios médico--legais c dc sobre os mesmos irocar impressões com os peritos médicos responsáveis pelos mesmos, Drs. José Sombrcirciro c Fernando Fonseca. Constatou, não sem espanto, que dos dois médicos que assinaram as autópsias

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apenas um excculou as mesmas, não Lendo o médico legisla, Dr. Fernando Fonseca, lido sequer acesso aos corpos, limilando-sc a assinar os exames. Refere esle pcriio, a dado passo, «quando cheguei ao Insiituto, às 8 horas da manhü, as vítimas já estavam a ser metidas cm caixões c algumas delas já tinham saído do IML. Começaram a ser autopsiadas às 3 horas da manhã, não Tui chamado para assistir às autópsias e a última das sete foi autopsiada às 6 horas c 30 minutos da manhã» (cf. o depoimento dc Fernando Fonseca, fl. 891 da III CEIAC).

Ora, lai procedimento contraria gravemente as disposições legais vigentes que determinam que as autópsias sejam feitas por dois médicos legislas.

Quanto à celeridade com que as mesmas decorreram, cerca dc meia hora para cada corpo, esta só é explicada por pressões vindas do próprio Governo, que entendeu proceder às cerimónias fúnebres na manhã do dia seguinte (cf. o depoimento dc Lourenço Martins, fl. 10 526 da III CEIAC). Esta incompreensível pressão govcmamcnial pode explicar cm parte a ligeireza com que estes exames foram conduzidos.

A Comissão apurou igualmente que as autópsias foram executadas na madrugada dc 5 dc Dezembro dc 1980, dc forma muito apressada, meia hora para cada autópsia, não havendo a preocupação dc pesquisa dc indícios que pudessem levar a uma explicação para as causas du tragédia. Assim, o Dr. José Sombrcirciro vem a confessar desconhecer, à data das autópsias, a metodologia que deveria Ver seguido para sinistrados daquele tipo dc acidentes (cf. o depoimento dc José Sombrcirciro, fl. 762 da III CEIAC).

Não foram os corpos radiografados, não houve colheitas dc tecidos para posteriores análises porque «não acharam necessário» (cf. fl. 751 da III CEIAC) c não sc efectuaram exames aos tímpanos das vítimas, reconhecendo aí que linha «sido uma falha nossa», pois não lhes «ocorreu o problema do tímpano» (cf. o depoimento dc José Sombrcirciro, fl. 752 da 111 CEIAC). Assim, ambos os peritos viriam a confessar perante a CEIAC as deficiências desses exames médico-lcgais (cf. igualmente o depoimento dc Fernando Fonseca, fls. 910 c segs. da 111 CEIAC).

A constatação dc que as vítimas não sofreram fracturas nem lesões internas deveria só por si ler alertado as autoridades para a circunstância dc as mesmas csiarcm inconscientes ou mesmo mortas no momento do impacte c de, porianio, sc eslar peranie forte probabilidade dc acto criminoso. Aliás, alguns jornalistas chegam a adianlar csia hipótese, cilando entidades oficiais (cf. Espaço '/'. Magazine, Janeiro dc 1981, p. 181, onde sc afirma que a carbonização foi anterior à queda do aparelho). Aliás, a mesma hipótese foi sugerida por peritos médicos ouvidos pela Comissão (cf. o depoimento do Dr. Vasconcelos Marques, fl. 1277 da III CEIAC).

1." Descaminho dc peças materiais relevantes para a investigação. — Ao longo dos seus trabalhos a CEIAC foi por diversas vezes confrontada com o desaparecimento c descaminho de importantes peças materiais do processo sem qualquer explicação plausível por parte das entidades oficiais.

A CEIAC teve oportunidade dc, mediante exames radiológicos comparativos entre radiografias aos pés do piloto onde eram bem visíveis a presença dc inúmeros fragmentos dc elevada densidade metálica c as amostras que deveriam comer esses fragmentos, consultar o desaparecimento dos resíduos metálicos detectados nos calcáneos do piloto Jorge Albuquerque à dala da sua exumação.

Chamados a depor os peritos médicos que intervieram nesses exames c os peritos do LNET1 que procederem à classificação c identificação das amostras, os mesmos não souberam explicar o descaminho das panículas metálicas enviadas para o LNETI para análise c qualificaram de «csiranho» esse desaparecimento (cf. os depoimentos dc Maria Helena Carvalho, Henrique Carvalhinhos c Oliveira Sampaio à II CEIAC). Assim, a amostra que deveria conter os resíduos metálicos dos pés do piloto Albuquerque quando radiografados deixou misteriosamente os mesmos «escapulircm-sc», o que, para a CEIAC, consütui um acto extremamente grave c a todos os títulos inexplicável.

A CEIAC constatou igualmente o descaminho de todo o material que compunha o rasto que ia do final da pista 3/6 até às casas atingidas. A CEIAC solicitou, por diversas vezes, à PJ que lhe enviasse esses materiais para serem objecto dc estudo, não só quanto à sua quantidade como lambem quanto à sua composição. Para espanto da CEIAC, tudo o que a PJ assegurou ter em seu poder resumia-se a algumas fotografias desses materiais (cf. Livro de Camarate, fl. 83, do Ministério da Justiça), confirmando desconhecer totalmente o paradeiro dos malcriáis recolhidos. Isto apesar dc o próprio relatório do LPC dc 16 dc Dezembro dc 1980 aludir a «três frascos dc vidro incolor dc boca larga c uma caixa dc papelão» lhe terem sido entregues pelos agentes da PJ contendo vários tipos dc resíduos recolhidos «desde o fim da pisla onde o avião descolou alé à rede da vedação junto à estrada antes do embate nos fios condutores dc electricidade» (cf. o relatório citado anteriormente, fl. i). O subinspector Sousa neste ponto esclarecia a Comissão ao afirmar que dos resíduos recolhidos no terreno só alguns foram fotografados (cf. a acareação do subinspector Sousa e inspector Pedro Amaral na III CEIAC).

A par do descaminho dos resíduos dos componentes do rasto, a CEIAC consialou igualmente o desaparecimento do desenho que assinalava cm planta do Aeroporto a extensão c configuração do rasto, desenho esse executado por um desenhador da própria PJ que acompanhou a equipa dc investigação ao local c que constatou no terreno a existência desse rasto (cf. o depoimento dc António Carichas à III CEIAC). Apesar disso, a CEIAC logrou recuperar um croquis do mesmo desenhador c que serviu dc base à execução do desenho final onde era patente a configuração, localização, orientação c extensão do rasio, documento esse reconhecido e confirmado pelo autor, António Carichas.

Da audição dc alguns agentes c responsáveis da PJ presentes no local da tragédia na noiic dc 4 dc Dezembro, conclui-se que dc enue os vários objectos recolhidos dos destroços c pertencentes aos ocupantes do avião foi recolhida uma pasta parcialmente queimada contendo vários documentos sob a forma de dossiers. O agente Victor Pereira afirma ter encontrado nos destroços uma pasta com «documentos militares», que entregou ao inspector Pedro Amaral (cf. os depoimentos dc Victor Pereira, fl. 5559 da III CEIAC, c dc Pedro Amaral, fl. 2045 da III CEIAC), lendo este por sua vez ordenado ao agente Álvaro Mililüo que «não entregasse esses papéis a ninguém [a não ser ao inspcctorl na PJ» (cf. o depoimento do inspector Pedro Amaral, 11. 2045 da III CEIAC). Tanto o inspector Pedro Amaral como o agente Álvaro Militao confirmaram à CEIAC que os documentos foram acondicionados numa mala metalizada do fotógrafo da equipa da PJ c do local transportados para a Gomes Freire.

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Da audição do dirccior-geral da PJ, na altura o Dr. Lourenço Martins, confirma-se a relevância atribuída por aquela Polícia a estes documentos (fl. 10 446 da III CEIAC) encontrados nos terrenos do Aeroporto, o que significa que eles chegaram ao seu conhecimento. O direcior-gcral chega a classificá-los como «confidenciais» (cf. o depoimento dc Lourenço Martins, fl. 10 511 da III CEIAC).

Estes «documentos militares» nâo constam dos autos c dcsconhccc-sc o seu paradeiro, bem como nâo há qualquer alusão tanto à pasia encontrada, que pela sua descrição sc julga pertencer a Adelino Amaro da Cosia, nem à que pertencia ao Primciro-Minislro, Francisco Sá Carneiro. Acresce que as duas pequenas malas dc mâo dc senhora foram encontradas entre os destroços, pelo que nâo haveria qualquer justificação para o desaparecimento ou destruição de duas pastas bastante mais volumosas e resistentes.

Por ludo isto, a CEIAC nüo pode deixar dc manifcslar a sua estranheza e perplexidade c nüo compreende por que razão determinadas peças materiais do processo nüo foram devidamente resguardadas c preservadas, uma vez que a investigação oficial não foi até agora encerrada.

8.? Ausência de estudo sobre a posição relativa das vítimas. — Ao somatório dc deficiências c omissões acresce a ausência dc um estudo sobre a posição relativa das vítimas, estudo esse imprescindível cm qualquer acidente aéreo. Esse estudo leria, desde logo, permitido esclarecer aspectos essenciais relacionados com a eventual sobrevivência das vítimas e daria à investigação preciosas indicações dos momentos que imediatamente antecederam c sucederam ao dcspcnhamcnio da aeronave.

9.! Investigação dc gabinete, intimidação dc testemunhas oculares ou outras e pressões sobre jornalistas. — A CEIAC considera surpreendente a metodologia utilizada pela DGAC no seu trabalho de campo, nomeadamente na audição dc icsicmunhas. Assim, o controlador da torre, Gaspar Frade, testemunha ocular que ocupava um lugar de observação privilegiado e que seguiu atentamente toda a manobra dc descolagem do Cessna, só seria ouvido pela comissão da DGAC cm 16 dc Fevereiro dc 1981, ou seja, mais dc dois meses sobre a dala da tragédia e cm véspera da conclusão do inquérito da DGAC. Talvez por essa razão, as indicações prestadas pelo controlador sobre a altura atingida pela aeronave, comportamento da mesma c alusão a uma explosão não foram levadas cm devida coma no relatório final da DGAC (cf. o relatório final da DGAC c o depoimento dc Gaspar Frade, a 11. 235 daquele rclalório), o que não deixa dc sc revelar estranho.

Os investigadores policiais optaram por uma investigação dc gabinete, chamando as testemunhas a depor nas instalações da PJ sem qualquer enquadramento anterior ou posterior no terrenos do Aeroporto e do bairro dc Camarate.

Os depoimentos foram cm muitos casos incompletos c alasiaram-sc das questões importantes, sendo o caso mais flagrante o do chefe dc segurança pessoal do Primciro--Minisiro, Inácio Costa, cujo longo depoimento terminaria abruptamente no exacto momenio cm que o chefe Cosia esclarecia que, após a descolagem do aviüo, linha observado uma explosão. Os investigadores policiais nüo sc preocuparam cm apurar cm que momento do voo o chefe Cosia observou essa explosão, preferindo partir do pressuposto dc que a mesma teria ocorrido aquando do impacte com o solo, quando era do perfeito conhecimento das auioridadcs que nüo ocorreu qualquer explosão quando o avião sc despenhou. O chefe Cosia, ouvido pela CEIAC, deixa isto bem claro, chegando a afirmar que só assinou

as suas declarações na PJ porque «estava aí subentendido que o avião teria explodido no ar» (cf. o depoimento de Inácio Cosia, fl. 79 da IV CEIAC).

O agente Guimarães Cosia, que na altura acompanhava o chefe Inácio Costa, em declarações à PJ confirmou a versão do seu colega. Mais tarde, viria a ser «convidado» pela PJ a alterar o seu depoimento cm relação ao ponto cm que afirmara ter visto o avião a arder no ar, situando dcsla vez sobre as casas dc Camarate c não em momento anterior (cf. o depoimento de Guimarães Costa na II CEIAC).

Casos houve cm que testemunhas oculares, cujos depoimentos não eram .concordantes com o entendimento oficial da PJ, foram ameaçadas de processos judiciais por falsos testemunhos no caso dc não alterarem a sua versão dos acontecimentos. O Sr. Agostinho Félix, que morava na rua do Bairro das Fontainhas onde o avião embateu, declarou na CEIAC que quando relatou a um agente da PJ o que viu foi ameaçado «com um inquérito dc falsos testemunhos derivado ao facto dc ele querer que eu dissesse que o avião não eslava cm ponte. Ora, se cu linha visto o avião cm ponic, como é que podia dizer que ele não estava cm ponic?» (cf. o depoimento dc Agostinho Félix, fl. 5143 da II CEIAC).

Outras testemunhas chamadas a depor na PJ referem «tentativas de amcdroniamenio» c de alteração de declarações por parte da PJ (cf. o depoimento dc Maria Manuela Vaz Pires, fi. 613 da I CEIAC).

A Comissão tomou igualmente conhecimento do caso dc uma icsicmunha, Álvaro Foniinha, que alegou ler sido alvo dc «uma tentativa dc aliciamento» por parte de um subinspector da PJ responsável pela condução da investigação dc Camarate com o objeclivo dc contrariar as suas declarações iniciais, onde fazia afirmações dc eventual relevância para o apuramenio da verdade. A testemunha Álvaro Foniinha chega a declarar que «o inspector Monteiro tentou aliciar-me pedindo-me para eu dizer que linha sonhado» (cf. o depoimento dc Álvaro Foniinha e a acareação desic com o inspector Marques Monteiro, fl. 4 da IV CEIAC).

Um jornalisia que tentou elaborar um trabalho televisivo sobre a tragédia dc Camarate chega a referir à CEIAC que foi «muiio pressionado c censurado» pela sua estrutura hierárquica c que «a PJ c a DGAC lhe dificultaram cm muito o trabalho de investigação» (cf. o depoimento dc Artur Albarran, fls. 1286 e 1306 da III CEIAC). Referiu ainda ler encontrado nos arquivos da RTP declarações feitas à televisão por populares no dia da queda do avião que contrariavam totalmente as declarações oficiais (idem, fl. 1335 da III CEIAC) e que nunca foram reveladas publicamente.

10.* Ausência dc análises laboratoriais imcdialamenie após a queda do avião. — A Comissão pôde constatar que não foram cfcciuadas quaisquer análises laboratoriais dc pesquisa a substâncias suspciias nas roupas das vítimas e que a recolha dc amostras no aviüo sinistrado sc lerá limitado à zona dos poços dos trens dc aterragem siluados nas asas do Cessna (cf. os depoimentos dc Graça Reis c Américo Vieira â II CEIAC), c nunca ao interior do cockpit do avião. Essa lacuna rcvcla-se de particular gravidade e compromete por si só toda a investigação oficial. Vários anos após a tragédia, a CEIAC conseguiu levar a bom termo exames químicos dc zonas do cockpit do avião nunca antes investigadas e que vieram a revelar-se decisivos para o apuramento das causas e circunstâncias que rodearam a queda do avião. Contudo, peritos houve da PJ que nüo

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esconderam a sua animosidade e oposição à minúcia c dcialhc dcslcs exames sugeridos pela CEIAC, alegando a sua desnecessidade. O engenheiro Diniz da Fonseca, da PJ, chega a declarar que «isto está a um nível científico dc pormenor», que a CEIAC está a fazer um «trabalho dc lupa» e que «o uabalho lhes permite atingir este grau dc profundidade mas eu discuto, inclusivamente, a utilidade do mesmo» (cf. o depoimento dc Diniz da Fonseca, fls. 140, 143 e 150 da IV CEIAC).

11.' Ausência de explicação para a retenção dos aviões de José e Nuno Moreira. — As autoridades oficiais nunca esclarecerem as verdadeiras razões que levaram a Guarda Fiscal a apreender na manhã dc 26 dc Novembro, no aeródromo de Tires, o avião Cessna que sc encontrava ao serviço dc campanha do general Soares Carneiro c dc que eram proprietários José c Nuno Moreira. Estranhamente, as mesmas autoridades permitiram que um avião ligeiro, na mesma situação legal do avião apreendido, c que viria a ser o avião sinistrado, pudesse efectuar no dia seguinte um voo para tfansporte do general Ramalho Eanes c dc sua esposa de Braga para Chaves.

Estranhamente, a Guarda Fiscal não volta a actuar c o avião que efectuou o voo com o general Ramalho Eanes passa para o serviço da campanha do general Soares Carneiro, apesar dc o proprietário do avião retido ter tentado por todos os meios libertá-lo, prontilicando-sc a pagar dc imediato as multas necessárias. Porém, nüo foi atendido na sua pretensão nem lhe foi dada qualquer explicação para o facto. Só cm Março dc 1981 as autoridades procederam à entrega do avião, sem exigirem o pagamento de qualquer multa nem avançar qualquer explicação para a sua retenção. As investigações policiais posteriores não vieram esclarecer este incidente, que poderá, eventualmente, ter importantes conexões com o desfecho da tragédia.

12.' Ausência de explicação para a morte dc José Moreira cm vésperas dc ir depor à Comissão dc Camarate. — A Comissão analisou a morte cm circunstâncias estranhas do engenheiro José Manuel da Silva Moreira c da sua companheira, Elisabete Piedade da Silva, ocorrida cm 5 dc Janeiro dc 1983, cm Carnaxide. O engenheiro José Moreira desenvolvia uma investigação particular sobre Camarate c iria depor perante a I CEIAC escassos dias depois da sua morte. Jose Moreira era irmão dc Nuno Moreira, ambos proprietários do avião Cessna inicialmente utilizado na campanha eleitoral do general Soares Carneiro e que escassos dias antes do sinisuo havia sido apreendido c substituído pela aeronave sinistrada. A Comissão pôde verificar que a PJ estipulou logo no dia seguinte, dc forma precipitada, que a morte de José Moreira c de Elisabete Silva nada teria a ver com o caso dc Camarate, acrescentando não existir qualquer ligação dc interesse com este caso, quando a realidade era bem diferente — José Moreira não só era o dono do avião retido como o empregador dos pilotos que pereceram cm Camarate, como era ainda o impulsionador dc vários ensaios dc voo no seu aviüo Cessna com corte de motor à descolagem com vista a colocar cm causa a tese oficial dc acidente cm Camarate. Além disso, José Moreira tinha declarado cm entrevista a um jornal que estava na posse dc informações «dc extrema delicadeza c melindre relacionadas com a tragédia c provocadas por ela». Nesse mesmo artigo esclarece que não divulgaria essas informações sem antes as comunicar à Comissão dc Camarate, ao Prof. Freitas do Amaral ou ao engenheiro Ângelo Correia, facto que nunca viria a ocorrer por ter morrido entretanto.

A explicação para a sua morte —inalação dc gás, produto dc má queima dc um esquentador colocado na cozinha do apartamento — resulta manifestamente inconsistente, nos próprios lermos dos autos c dos documentos que dele consmm. O perito médico legal Dr. Fernando Fonseca, ouvido pela Comissão, declarou que a morte dc José Moreira «poderia ter sido provocada pela introdução dc um gás sob pressão no nariz e na boca, exactamente como sc fosse uma máscara para anestesia, tendo sido uma pressão maior que entrou c que rompeu os alvéolos. Por isso, c que não sei explicar [...] mas há monóxido de carbono a mais nas vítimas» (cf. o depoimento dc Fernando Fonseca, fl. 48 da 111 CEIAC). Existem assim os mais fortes indícios que José Moreira c Elisabete Silva tenham sido assassinados por introdução forçada dc gás nos seus pulmões, já que a quantidade dc monóxido aí encontrada rcvcla-sc muito superior à dc uma vulgar morte acidental.

13.' Informações dc que estava algo em preparação visando uma figura proeminente do Estado e ausência dc quaisquer medidas preventivas da ocorrência. — A Comissão teve ainda conhecimento, pela análise do processo e por depoimentos por si recolhidos, da existência dc avisos c notícias, previas a 4 dc Dezembro dc 1980, porventura relacionados com a ocorrência do sinistro. Militares responsáveis dos Serviços de Informação do Exército da Região Militar do Norte receberam informações dc que algo dc grave sc iria passar no País até «quatro dias antes das eleições» c pela «importância da notícia» comunicaram-na para Lisboa, para o Estado-Maior-Gcncral das Forças Armadas (cf. os depoimentos do tcncnic-coroncl Oliveira Santos c do tenente-coronel Rui Tomás na III CEIAC). Inexplicavelmente, nenhuma medida preventiva de segurança foi tomada pelas autoridades competentes, nomeadamente o serviço dc vigilância à aeronave que servia dc transporte nas deslocações do candidato à presidência c que, conforme ofício da Guarda Fiscal, confirma não ler sido requerido qualquer serviço de vigilância ou protecção ao avião cm questão.

14." Insuficiência invesligalória cm relação a alegados suspeitos. — A PJ recebeu, no dia 8 dc Janeiro de 1981, uma informação da Scoiland Yard de que um indivíduo dc nome Sinan Lcc Rodrigues, que chegou a Portugal a 3 dc Dezembro dc 1980, com passaporte falso c que, segundo aquela polícia, «poderia estar relacionado com a eventual sabotagem do avião em que seguia o ex-Primeiro--Minislro de Portugal, Dr. Francisco Sá Carneiro» (cf. a informação dc serviço da PJ, fl. 439 da 1 CEIAC). Ainda segundo a polícia inglesa, aquele indivíduo teria estado na área dc manutenção de aviões do Aeroporto dc Lisboa na altura cm que sc deu o desastre c por isso a PJ oficiou ao Gabinete da Interpol no sentido dc colher mais informações (cf. fl. 869 da I CEIAC).

Estranhamente, c talvez sistematicamente, um agente da PJ ligado desde o início à investigação dc Camarate vem oficiar cm resposta que «não sc vê qualquer relação do indivíduo (Sinan Lcc Rodrigues) com o caso de Camarate» (cf. fl. 1166 da I CEIAC).

Porém, a CEIAC pode às autoridades competentes a extradição dc Sinan Lee Rodrigues para Portugal c, cm 5 c 18 dc Junho dc 1985, têm lugar duas audições com aquele indivíduo, que sc recusa peremptoriamente a abordar o assunto dc Camarate (cf. os depoimentos dc Lee Rodrigues na II CEIAC).

Queda, assim, por esclarecer até hoje quais os motivos que trouxeram Lcc Rodrigues clandestinamente a Portugal no dia 3 dc Dc/.cmbro dc 1980 c quais os seus cassas

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duranie o período dc tempo que dista entre 3 c 10 dc Dezembro de 1980, data cm que embarcou clandestinamente, sob falsa identidade e disfarçado dc comandante dc aviões, para Londres, onde foi imediatamente detido.

A mesma ligeireza nas investigações leva a que a PJ ignore por completo o eventual envolvimento do suspeito José dos Santos Esteves, indivíduo com cadastro na PJ c que já em 1982 contactara elementos da RTP dizendo-sc conhecedor da forma como o aviáo teria sido saboiado (cf. os depoimentos dc Artur Albarran e Barata Fcyo à III CEIAC). Acresce a isto que a CEIAC teve a oportunidade dc examinar e autenticar (cf. o depoimento dc Francisco Pessoa na IV CEIAC) uma gravação dc uma conversa telefónica entre José Esteves c o seu empregador dc cntüo, Francisco Pessoa, onde aquele indivíduo descreve em pormenor uma alegada sabotagem ao avião que transportava o Primciro-Ministro, fornece nomes dc suspeitos c cúmplices e sc afirma conhecedor de todo o processo.

CAPÍTULO IV Relacionamento com o TIC

31 —O processo judicial em que sc investigavam os factos que originaram a morte do Primciro-Ministro, Dr. Sá Carneiro, e seus acompanhantes foi confiado ao TIC de Loures, nos termos do disposto no Código dc Processo Penal dc 1929, aplicável àquele processo.

Ora, já cm 1984, o magistrado judicial do TIC dc Loures, Dr. Fonseca Ferrão, exprimiu objecções ao aforamento do processo, alegando incompetência territorial do Tribunal de Loures, com base nas circunstâncias dc, havendo crime, este haver sido cometido em Lisboa, devendo, em consequência, o processo transitar para Lisboa (cf. o despacho do juiz dc Loures dc 11 dc Maio dc 1984). - Porém, esta questão nunca foi dilucidada, mas a CEIAC pôde constatar a patente falta dc meios humanos (já que existia apenas um juiz para fazer face a toda a instrução criminal daquela comarca) c dc meios materiais daquele Tribunal, como, aliás, o próprio juiz Dr. Fonseca Ferrão asseverou a elementos da CEIAC que, por algumas vezes, o contactaram. Urgia que um magistrado fosse destacado apenas para a instrução deste processo, mas isso nunca veio a acontecer.

32 — Quando a III CEIAC encerrou os seus trabalhos deliberou facultar «dc imediato c.integralmente os autos à Procuradoria-Geral da República, para que possa examiná--los, avaliar os elementos deles constantes c proceder consoante as conclusões que leve a cabo» (cf. cap. vu «Conclusões» da III CEIAC, Diário da Assembleia da República, 2.' série, p. 1750).

Consequentemente, o PGR, Dr. Cunha Rodrigues, lavrou em 17 dc Setembro dc 1987 um despacho cm que considera que os elementos constantes do inquérito parlamentar realizado pelas 1, // e ¡11 CEIAC «são de manifesta utilidade para a investigação dos factos de que resultou a morte do Primciro-Ministro. Dr. Francisco Sá Carneiro, e individualidades que o acompanhavam».

Neste enfoque determinou o envio dc cópia do inquérito pivrlamcniar para sc promover a sua junção ao processo judicial c para sc «requerer as diligencias suscitadas pelos elementos, constantes do inquérito, com requisição dos meios que se mostrarem necessários, nomeadamente cm matéria dc exames e perícias», e ainda o estabelecimento dc providencias para que haja um acompanhamento pelos

magistrados que «sc revelarem indispensáveis e que se obtenha a colaboração técnica, processual e de polícia necessária», a fim dc que «o acompanhamento c a iniciativa processual do Ministério Público sejam efectivados com inteiro rigor c a maior profundidade» (cf. o despacho do PGR dc 17 de Setembro de 1987, IV CEIAC).

33 — Contudo, porque após o encerramento dos trabalhos da III CEIAC foi descoberta a existência de elevados teores dc fósforo na roupa das vítimas pelo LPC e porque os deputados não tinham conhecimento de qualquer iniciativa ou diligência por parte do TIC dc Loures, cm consequência do despacho do PGR c dos trabalhos da III CEIAC, decidiram os Srs. Deputados Montalvão Machado, José Luís Ramos, Cecília Catarino, Dinah Alhandra e João Salgado enviar cm 23 dc Fevereiro de 1988, ou seja, um ano após o encerramento do inquérito da III CEIAC, um requerimento ao Ministério da Justiça para urgente informação do andamento das investigações e da efectivação das diligências requeridas.

A resposta do Ministério da Justiça, por informação do PGR, refere que, «cm 11 dc Fevereiro, o Ministério Público exarou, no processo, uma extensa e circunstanciada promoção, cm que requer a realização dc 10 diligencias, cm larga medida sugeridas por elementos obtidos cm inquérito parlamentar».

34 — Por não considerar aquela resposta satisfatória, a AR decide reabrir os trabalhos dc inquérito parlamentar cm 13 dc Julho dc 1988, constituindo a IV CEIAC, por considerar necessário c urgente aprofundar uma investigação que já durava há longo tempo e porque o facto de existir fósforo na roupa das vítimas não foi tido em conta nas conclusões da anterior CEIAC.

Após a tomada dc posse, a IV CEIAC decidiu de imediato ouvir os técnicos do LPC que procederam ao exame da roupa das vítimas com o objectivo de esclarecer a proveniência do fósforo detectado. Nessa audição aqueles técnicos foram peremptórios acerca da necessidade de utilizar métodos analíticos mais sofisticados do que os disponíveis naquele Laboratório (cf. o relatório do LPC da PJ dc 21 dc Agosto dc 1987 c o depoimento do técnico Morais Anes na IV CEIAC).

Para obviar csia dificuldade, a Cl contactou diversas entidades oficiais, nomeadamente o LNETI c o IST, no sentido dc averiguar a possibilidade dc sc prosseguirem as investigações da proveniência do fósforo cm colaboração com o LPC da PJ. Tendo a Cl obtido resposta positiva daquelas entidades, foi sugerida a constituição dc uma comissão dc peritos que trabalhasse junto do TIC dc Loures, já que era a este Tribunal que estavam confiadas as roupas das vítimas.

O TIC dc Loures concorda com a sugestão da Comissão, mas, surpreendentemente, decide que os peritos trabalharão cm regime de exclusividade para o Tribunal, ameaçando--os com prisão c obrigando-os a não prestar qualquer esclarecimento à Comissão Parlamentar dc Inquérito (cf. os ofícios do TIC dc Loures enviados a todos os peritos pela juíza Fátima Mala Mouros, com a data dc 23 dc Novembro dc 1989, IV CEIAC, e ainda os depoimentos daqueles peritos na IV CEIAC onde justificam a sua recusa cm responder a questões formuladas).

A IV CEIAC considerou deveras estranho tal procedimento, já que alé aí linha havido, cm ecrios momentos, uma csuciia colaboração entre o TIC dc Loures c as comissões parlamentares dc inquérito. Rcfira-sc, a título dc mero exemplo, a deslocação ao hangar do Aeroporto da Portela, onde sc encontram os destroços do avião

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Cessna, dc uma delegação da Comissão Parlamentar acompanhada pelo anterior Sr. Juiz do TIC dc Loures, Dr. Fonseca Ferrão. Também na sequencia dc anteriores diligencias da

III Comissão Parlamentar de Inquérito, estiveram em Portugal, cm Abril dc 1989, dois técnicos britânicos com o objectivo de colaborarem na investigação da proveniência

do CrMovo. A IV Comissão Eventual dc Inquérito que

estava a aguardar a conclusão das diligências quis ouvir aqueles peritos. Estes compareceram c declararam que a juíza do TIC de Loures os advertira expressamente dc que não poderiam revelar a mais ninguém, nomedamente à Comissão Parlamentar, o que realmente descobrissem. O Dr. John Gilbert chega a referir, perante os estupefactos membros da IV CEIAC, o seguinte: «O Tribunal informou--nos dc que fomos encarregues por elc dc fazer o trabalho c, como tal, sendo o Tribunal o clicnie, só podemos fornecer informações a quem o cliente entender. A decisão não nos cabe a nós, mas sim ao Tribunal.» (Cf. o depoimento dc John Gilbert, pcriio britânico, fl. 58 da

IV CEIAC.)

Após infrutíferas diligencias por parte da Cl com visla a apurar do andamento do trabalho dos peritos, soube aquela Comissão, cm Novembro dc 1989, que os técnicos tinham terminado a sua tarefa c que tinham elaborado um relatório conclusivo sobre a matéria cm causa, ou seja, o do exame da roupa das vítimas dc Camarate.

Consequentemente, a Comissão Eventual dc Inquérito solicitou ao TIC dc Loures que lhe fosse facultado o relatório daquele exame pericial, exame esse que resultara, repila-se, por iniciativa da própria Cl.

A resposta do TIC foi clara c precisa: «O processo cnconira-sc cm segredo dc justiça, pelo que nada há a informar.»

Foi com viva surpresa c intensa perplexidade que a Comissão Parlamentar de Inquérito recebeu este ofício oriundo do TIC dc Loures.

Por um lado, o Código dc Processo Penal estipula como regra fundamental o da natureza pública do processo penal, existindo o segredo dc justiça apenas na fase dc instrução c, mesmo aqui, com limitações. Dc facto, o n.u 4 do artigo 86.9 do Código dc Processo Penal estipula:

Pode, todavia, a autoridade judiciária que preside à fase processual respectiva ordenar ou permitir que seja dado conhecimento a determinadas pessoas do conteúdo do acto ou dc documento em segredo dc justiça sc tal sc afigurar conveniente ao esclarecimento da verdade.

Dado o papel de relevo que as diversas comissões parlamentares têm prcslado no decurso da investigação, com toda a certeza o n.a 4 do artigo 86.9 teria aplicação. Aliás, o próprio TIC de Loures c a Procuradoria-Gcraí da República tinham reconhecido anteriormente c por diversas vezes o relevante papel para o apuramento da verdade da Comissão de Inquérito Parlamentar.

Além disso, o artigo 181.9 da Constituição da República Portuguesa estipula no seu n.9 5 o seguinte:

As comissões parlamentares dc inquérito gozam dc poderes de invesügaçâo próprios das autoridades judiciais.

Isto significa que as comissões de inquérito parlamentares não têm poderes dc julgar mas dispõem dc poderes elc investigação na sua forma mais lata, ou seja,

equiparados às autoridades judiciais, à semelhança, aliás, dc outras democracias dc países ocidentais, tais como os Esuidos Unidos da América, Itália ou Reino Unido (cf., a título dc exemplo, Vcrgotlini, «Les invesligations des commissions parlamcnlaires cm Iialic», in Révue de Droit Public, ano dc 1985, t. 101, Paris, fl. 39, c Kennclh Shcpslc, «Inquiry Commiltcc», in American Politicai

Science Review. vol. 81, Março, 1987).

A Comissão Parlamentar dc Inquérito deparou assim com uma nítida c inexplicável obstrução ao seu trabalho dc investigação parlamentar por parte da Sr.* Juíza do TIC dc Loures. Tal procedimento prefigura uma clara violação dc normas constitucionais, legais e regimentais.

Porque sc podia configurar um conflito de índole insülucional entre, por um lado, o Parlamento, através da Cl, c, por outro, os tribunais, através do TIC dc Loures, entendeu a Comissão Parlamentar dc Inquérito mandatar o seu presidente, Dr. Fernando Correia Afonso, para contactar directa c pessoalmente o Sr. Presidente do Supremo Tribunal dc Justiça, também na sua qualidade dc presidente do Conselho Superior da Magistratura.

Após este coniacio dc natureza pessoal, decorrido um espaço de tempo bastante, c porque a juíza do TIC dc

Loures continuava a recusar a entrega do relatório à Comissão Parlamcniar, esta mandata novamente o seu presidente para iniciar contactos de natureza oficial, por um prazo não superior a 30 dias, com o presidente do Conselho Superior da Magistratura, conselheiro Victor Coelho.

Nesses contactos formais, o presidente da Comissão dc Inquérito Parlamcniar, Dr. Correia Afonso, levou de novo o assunto ao conhecimento do conselheiro Dr. Victor Coelho, presidente do Conselho Superior da Magistratura, tendo esle usado de toda a diligência, nomeadamente numa reunião com a própria juíza do TIC de Loures, no sentido de encontrar a forma de ultrapassar a questão e de ser facultado o relatório à Comissão.

Porém, passados 15 dias após essa reunião, c contra as legítimas expectativas criadas, csla Comissão Parlamcniar dc Inquérito é surpreendida por nova recusa da juíza do TIC dc Loures, através dc ofício dc 6 de Março de 1990. Aí já não sc faz referência ao lâo propalado segredo dc justiça, mas apenas a critérios dc oportunidade (cf. o ofício do TIC dc Loures sob a referência n.9 106 da IV CEIAC).

Face a notícias vindas a lume na comunicação social sobre o conflito entre o TIC dc Loures c a CEIAC, a Associação Sindical dos Magistrados Judiciais foi recebida, a seu pedido, pela Comissão dc Inquérito Parlamcniar. Aí aquela Associação Sindical presta-se a colaborar no scnüdo de desbloquear a questão, considera iralar-sc dc uma «juíza nova preocupada, lalvcz demasiado», com a salvaguarda dc princípios estatutários (cf. os depoimentos dos juízes Dr. Orlando Afonso c Dr. Rodrigues Simão, fls. 31 c 41, respectivamente, da IV CEIAC), admite a falta dc meios do TIC dc Loures para realizar iniciativas dc investigação (cf. o depoimento do Dr. Orlando Afonso, fl. 90 da IV CEIAC) c anuncia que a questão irá ser cm breve desbloqueada, pois a juíza do TIC dc Loures iria enviar o documento dos peritos para a AR.

Finalmente, em 23 dc Julho dc 1990, o documento elaborado pelos pcriios indicados pela CEIAC c com o objecto determinado por csla Cl c enviado para a AR.

A IV CEIAC não pode deixar dc considerar lastimável este episódio, que denota uma ausência por pane da juíza do TIC dc Loures dc uma clara percepção das competências dc uma comissão dc inquóriio parlamentai e sobretudo do

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valioso e inestimável contributo da investigação parlamentar para o esclarecimento dos factos relacionados com a trágica morte dc Francisco Sá Carneiro c seus acom-

panhames.

Acresce a isio que a juíza do TIC dc Loures, sintomaticamente, encerrou a instruçüo quando lhe foi presente o primeiro documento dos peritos indicados para a AR onde se descobriu bário no Cessna sinistrado, enquanto a Comissão Parlamentar dc Inquérito após a recepção do mesmo documento decide fazer uma nova série de diligências investigatórias, de entre as quais um exame comparativo com outro Cessna, contactos com o fabricante, peritagem da SPEL, etc, o que evidencia bem a diferença dc atitudes face à investigação.

CAPÍTULO V Matéria probatória

35 — A IV CEIAC, ao integrar no seu trabalho toda a matéria probatória das anteriores comissões a acrescer ao seu próprio trabalho investigatório, cncontra-sc cm posição de enunciar os seguintes pontos que considera provados:

1.° Deflagração e visualização dc um incêndio em voo na aeronave Cessna. — As comissões parlamentares puderam ouvir e confinnar dc um modo exaustivo, ao longo dc interrogatórios demorados, detalhados c esclarecedores, que diversas testemunhas oculares observaram, algumas destas, o clarão correspondente à deflagração inicial do incêndio cm pleno voo da aeronave e, todas estas, que o avião embateu nas casas do Bairro das Fontainhas transportando já um incêndio a bordo.

O controlador da torre do Aeroporto, Gaspar Frade, em serviço na altura do sinistro, afirmou ter visto claramente o avião interromper a sua subida, por altura da intercepção das pistas 18/36 e 03/21, pranchar nitidamente sobre a direita c seguir-sc uma explosão ainda antes dc embater nas casas (cf. o depoimento de Gaspar Frade, fls. 7318 c TÍ38 do xvi vol. da II CEIAC). Esta testemunha foi peremptória quando chamada a esclarecer o fenómeno da explosão observado, distingue claramente o primeiro clarão e o posterior foco de incêndio no local da colisão (cf. fls. 7339 e 8606 a 8662 da II CEIAC). O testemunho do controlador da torre e a sua descrição da atitude do avião após a descolagem é perfeitamente compaü'vel com a orientação do rasto no terreno encontrado pela PJ. Assim, ao afirmar que o avião pranchou notoriamente sobre a asa direita, momentos após a descolagem, a ponto dc imaginar que o piloto não conseguiria recuperar, o controlador explica que desviou momentaneamente a sua atenção para accionar os mecanismos dc alarme, pelo que não sc lerá apercebido com exactidão da trajectória do avião (cf. o depoimento de Gaspar Frade na II CEIAC).

O polícia Inácio Costa, chefe da PSP c à altura chefe da segurança do Primeiro-Minisiro, que se encontrava na placa do Aeroporto na altura da partida do Cessna, observou toda a sequência de descolagem do aparelho, tendo visto distintamente uma explosão no ar, que comparou a uma «bola de fogo», continuando a acompanhar vtSualmcvwç. o vwtòo cm chamas até o mesmo desaparecer no seu horizonte. Perante a Comissão, o chefe Costa afirma que «o avião começou a rolar na pista, a certo ponto, levantou, começou a ganhar altura c, cm determinado momento, na rota ascendente, vi o avião envolver-se numa

bola dc fogo, cm chamas» (cf. o depoimento do chefe Costa. fl. 8 da IV CEIAC c fls. 2459 a 2561 do v vol. da II CEIAC).

Resulta lambóm provado que o chefe Costa apresentou

esta descrição do sinistro desde o dia cm que sc verificou c o observou quer perante outras pessoas, como a secretária do Gabinete do Primeiro-Minisiro, Maria José Moreira Rato (cf. o depoimento dc Maria José Moreira Rato, fls. 1 a 37 da III CEIAC), quer perante as autoridades de investigação (cf. o depoimento dc Inácio Costa no inquérito da PJ).

O guarda da PSP Guimarães Costa, à data do sinistro elemento do corpo de segurança do Primeiro-Minisiro, que sc encontrava na placa do Aeroporto junto do edifício do movimento, afirma ter acompanhado a descolagem do avião e ter observado um súbito clarão, que definiu como «explosão», no ar, no fim da pista (cf. o depoimento dc Guimarães Costa, fls. 4044 e segs. do IX vol. da II CEIAC).

O professor universilário e antigo oficial dc artilharia Eduardo Sousa, que na altura chegava de automóvel a

Lisboa, pela Auio-Estrada do Norte, e se encontrava na elevação dc terreno antes da portagem, afirmou ter visto o súbito clarão de uma explosão no ar, sobre o Aeroporto dc Lisboa, que assemelhou ao «efeito luminoso dc uma granada antiaérea», indo mais tarde, já cm Lisboa, ao ter conhecimento da tragédia c da hora a que ocorreu, a relacionar a explosão que vira no ar com a possível causa do sinistro (cf. o depoimento dc Eduardo Sousa, dc fl. 5808 a fl. 5942 do xn vol. da II CEIAC).

A testemunha Maria Emília Queiroz, que sc encontrava junto a um pequeno chafariz perto de sua casa, em Camarate, declarou ter visto um clarão dc chamas no ar, não lendo observado quaisquer luzes dc presença da aeronave c ouvindo momentos depois o estrondo dc um embate, vindo mais tarde, ao saber da queda do avião, a relacionar o que viu no ar com o avião sinistrado (cf. o depoimento dc Emília Queiroz, dc fl. 4703 a 0. 4781 do x vol. da II CEIAC).

A depoente Maria João Poças, que se encontrava dentro dc um carro num largo que dista cerca dc 100 m do local da colisão em Camarate, tendo sido alertada por «um ruído muito estranho dc motores dc avião», observou distintamente, ao sair do carro para verificar o que se tratava, o avião a passar à sua frente, envolto cm chamas, ames dc colidir no Bairro das Fontainhas, colisão que identificou pelo estrondo do embate, já que não via o seu local (cf. o depoimento dc Maria João Poças, dc fl. 3770 a fl. 3832 do vm vol. da II CEIAC).

O depoente António Poças, irmão da precedente, enconirava-sc perto da mesma referida viatura c viu a aeronave aproximar-se cm chamas — «bola de fogo» — e progredir na direcção das casas onde viria a embater (cf. dc 0. 3832 a fl. 3942 do vm vol. da II CEIAC).

O depoente Francisco Vidal, que circulava na direcção dc Lisboa, na via rápida a seguir à portagem da Aulo--Estrada do Norte, declarou ter visio o avião envolto subitamente cm chamas, localizando o fogo na frente do avião, lendo-o visto ainda progredir em chamas, até que desapareceu do seu horizonte. Declarou ainda ter verificado que o avião ficou sem luzes dc posição depois da deflagração (dc fl. 7243 a fl. 7316 do xvi vol. da II CEIAC).

Carlos Mendes, que sc encontrava à porta dc sua casa, no Bairro das Fontainhas, na rua onde o avião sc imobilizou, declara ter distinguido chamas no nariz do avião, quando o mesmo cruzou a rua, antes dc colidir contra a Vivenda Zeca, referindo também um rasto dc fumo cin-

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zento na cauda do avião (cf. de fl. 986 a fl. 994 do v vol. da I CEIAC c dc fl. 6545 a fl. 6627 do xiv vol. da II CEIAC).

A depoente Aida Augusta, que sc encontrava junto à poria dc sua casa, no bairro de Camarate, declarou que, tendo a sua atenção sido atraída por um trabalhar estranho de motores dc avião cm voo, observou a seguir o avião a passar em direcção ao Bairro das Fontainhas, vindo a arder claramente, e ouvindo, de seguida, o estrondo do embate nas casas (da fl. 4762 a fl. 4815 do x vol. da II CEIAC).

A depoente Maria Torgal, que sc encontrava a cerca dc 100 m do local da colisão, só sc apercebeu da aeronave na sua trajectória final, depois de cortar o traçado eléctrico, c, embora tendo visto que não trazia luzes dc presença, observou-a c descreveu-a como vindo «muito iluminada», ainda que não se recorde sc a mesma voava cm chamas ou não (de fl. 3945 a fl. 4037 do VIII vol. da II CEIAC).

Avelino Ascensão, guarda do portão n* 16 do Aeroporto dc Lisboa, junto ao qual se encontrava, que também só visionou a fase final do voo, dada a sua explosão no terreno, afirma ter ouvido explosões que partiam da aeronave já cm pleno voo c ter observado chamas que iluminavam a parte da cauda do avião, tendo-as intcrprciado como rates produzidos pelo escape do avião (fl. 4187 do ix vol. da II CEIAC).

Duas únicas testemunhas oculares do voo (fl. 238 do vol. «Investigação operacional» da DGAC), José Monteiro entretanto falecido (dc fl. 4308 a fl. 4359 do IX vol. da II CEIAC), declararam ler seguido a trajectória da aeronave sem observarem incêndio cm voo. A primeira afirma que o avião ficou sem luzes dc posição após a produção da emergência, tendo acompanhado visualmente todo o voo subsequente, o «bater de asas» c a sua progressão até ao embate final, sem sc aperceber de qualquer fogo a bordo. A segunda declarou que o aparelho terá mantido as suas luzes dc presença até ao momento da colisão, mas que sc apercebeu, a ccria altura, dc que o aviOo ia cair, tendo disso prevenido um colega seu que sc encontrava próximo c que já nada pôde observar (dc fl. 4308 a fl. 4859 do IX vol. da II CEIAC).

Face aos testemunhos oculares, ao seu número c à valorização relativa entre si e em conjugação com outros elementos do processo, conclui-se existir prova testemunhal bastante sólida de que o avião se incendiou em pleno voo.

Relevam neste sentido:

a) O número de testemunhos oculares, 10 num total dc 14, que distintamente o observaram c o descrevem dc forma essencialmente coerente entre si;

b) A especial consistência dos depoimentos do controlador da torre cm serviço c do chefe Costa, que, sendo chefe da segurança do Primciro--Ministro c lendo-o acompanhado ao embarque, expressamente voltou à placa do Aeroporto quando, estranhando a demora na descolagem, quis averiguar o que se passava, verificando nesse momento que o avião já se encontrava a entrar na pista 18/36 c lendo seguido a sua trajectória como a descreveu para os autos;

c) A diversa formação dos referidos 10 testemunhos c o facto dc lodos descreverem os acontecimentos do mesmo modo substancial;

d) O lacto dc estes mesmos 10 testemunhos sc situarem cm pontos dc observação distintos, os quais, significativamente, sc situam cm círculo relativamente à trajectória descrita pelo Cessna, isto é, à sua esquerda, à suá direita, atrás c ã frente.

2.9 Rasto dc fragmentos encontrado nos terrenos sobrevoados pelo Cessna. — Dos diversos depoimentos do inspector Pedro Amaral e da sua equipa, que pesquisaram os terrenos do Aeroporto e que encontraram um rasto de fragmentos, foi possível a esia Comissão delinear a sua extensão, orientação e conteúdo.

No tocante à sua extensão, está estabelecido que o rasto sc estendia desde cerca de 50 m do topo da pista 18/36 até às cercanias do local do embate final da aeronave, numa exicnsão contínua de cerca dc 400 m, medidos entre cerca dc 50 m do topo da pista c 45 m do primeiro embate do avião nas traseiras da Vivenda Paulos. Está também estabelecido que a DGAC apenas teve conhecimento, por virtude dc comprovada descoordenação DGAC/PJ, do iroço desse rasto compreendido entre os 45 m contados do ponto do aludido primeiro embate aos 155 m do mesmo ponto. Está provado que os fragmentos recolhidos no troço rcstanic (dc cerca de 280 m) até aos 50 m do topo da pista (designadamente os papéis queimados, que constam da análise do LPC) provinham inequivocamente da aeronave c do seu interior. O rasto estende-se, portanto, cm toda esla extensão.

Quanto à largura deste rasto c a outros aspectos da sua geometria, resultou provado:

a) Que o rasto dcnoia uma inflexão que é nítida em determinado ponto do seu uaçado, muito próximo do local onde o avião primitivamente cortou uns fios clécuicos na sua rota dc embate (verificação coincidente quer em croquis da PJ quer cm planta da DGAC);

b) Que o rasto, cm toda a sua extensão, consiste numa faixa dc largura relativamente estreita c sensivelmente uniforme (verificação coincidente quer cm fontes da PJ quer cm fontes da DGAC no troço que foi do seu conhecimento).

Rcfira-sc ainda que quanto a este ponto, embora os membros da brigada da PJ que procederam ao levantamento no terreno tenham produzido, quando interrogados quanto à estimativa da sua largura, avaliações diferentes (6 m, 8 m, 10 m, 15 m e 20 m), todos são unânimes em confirmar, ao longo da respectiva extensão, a sua largura constante. Também do auto dc diligência efectuada cm Dezembro de 1982, expressamente sobre esse ponio, a largura foi confirmada c medida no terreno como sendo dc 11 m (cf. o auto dc diligência da I CEIAC de 1982).

A DGAC, relativamente ao troço dc que teve conhecimento, representou-o cm planta, que consta do processo, também com largura uniforme c csueita (medida à escala, revelou 8 m).

Quanto ao conteúdo do rasto, este consistia cm:

a) Papéis queimados, pedaços de tecido, material sintético c outros materiais leves, enconuados em toda a sua extensão;

b) Pedaços maiores dc lã dc vidro, achados próximo do poste do traçado eléctrico cortado pelo avião (o pedaço maior deste consta dos autos coma tendo as dimensões dc 10 cm x 15 cm);

c) Ouuos pedaços dc lã dc vidro, enconuados «entre as duas cercas», isto é, no troço compreendido entre 100 m a cerca dc 260 m do primeiro embate na traseira da Vivenda Paulos;

d) Peças achadas junto do poste do referido traçado eléctrico c referidas como «ninho dc abelhas», dc que foram encontradas três c apenas uma pôde

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ser recolhida. Esta peça foi desencaminhada, mas dos autos consta ainda a sua fotografia. O inspector da brigada da PJ que procedeu à sua recolha do solo pôde identificar o seu aspecto,

em confronto com o «Manual do avião», como correspondendo ao material que tecnicamente 6 designado de honeycomb; segundo o «Manual», este tipo dc material integra o painel dc estanquidade do sistema dc pressurização c era, no avião sinistrado, de alumínio (cf. os depoimentos do inspector Pedro Amaral na III CEIAC c o «Manual do avião Cessna»); e) Uma outra peça achada também junto do referido poste do traçado eléctrico c referenciada inicialmente como podendo consistir em «revestimento de um turbo-compressor», peça esta que desapareceu e dc que não resta sequer qualquer registo fotográfico. Está apurado que não podia consistir no aludido revestimento dc lurbo-comprcssor, mas não ficou apurado cm que consistiria, visto que desapareceu.

Pode também verificar-se c concluir-sc, com base cm reiterados testemunhos dos elementos da referida brigada da PJ, que os materiais acima referidos sc encontravam distribuídos no solo por forma relativamente regular c uniforme (cf. os depoimentos do inspector Pedro Amaral e dos agentes Luís Maciel, António Romão Matos c António Figueiredo na III CEIAC). Acresce que, segundo depoimento da PJ, nomeadamente dc Lourenço Martins (cf. o depoimento dc Lourenço Martins, fl. 10 560 da III CEIAC), não sc procedeu à recolha integral dos resíduos que formavam o rasto. O então dircctor-gcral da PJ chega a referir que «na altura não houve a preocupação dc recolher todos os papéis e todos os detritos deixados na pisia», mas lüo-só aqueles que eram legíveis (depoimento

de Lourenço Martins, idem). A dúvida sobre os registos materiais anteriores estava unicamente cm saber sc o descrito rasto seria proveniente do avião em pleno voo ou da acção do vento que, sendo muito moderado (5-6 nós), se verificava na noite do sinistro.

Está provado c foi expressamente afirmado pela DGAC que, tendo a Cl da DGAC concluído pela explicação da «acção do vento», conjugada com a pluma térmica do incencio final, o fez com base em pura dedução pessoal, sem haver efectuado qualquer teste, simulação ou csiudo científico (cf. os depoimentos do engenheiro Viçoso nas I,

II e IV CEIAC).

É também claro dc uma acareação efectuada que, estivesse a Cl da DGAC no pleno conhecimento da extensão do rasto dc fragmentos, a sua dedução teria sido completamente diferente.

Está também provado que a PJ apresentou semelhante conclusão — «acção do vento» — pelo simples motivo dc que a DGAC assim concluíra, mas sem, todavia, ponderar ou analisar o conhecimento mais completo que tinha da matéria dc facto (cf. o dcpoimcnlo dc Garcia Marques na

III CEIAC, dc Paulo Bernardino na II CEIAC c dc Lourenço Martins na III CEIAC).

Para esclarecer a questão foi solicitado estudo científico a peritos qualificados, Profs. Mário Nina c Vasco Brederode, do IST, que foi enuegue cm 12 dc Agosto dc 1986 à III CEIAC.

O estudo efectuado, que foi confirmado c reforçado cm documentos posteriores sobre novas questões apresentadas aos peritos e nas detalhadas audiências perante a Comissão

(de 11 dc Dezembro de 1986 da III CEIAC), conclui peremptoriamente do seguinte modo:

De entre os mecanismos considerados de indução do rasto dc fragmentos: a) dispersão pelo vento a

pariir do local dc incêndio; b) libertação em voo; c]

organização pelo vento junto ao solo, o único capaz dc produzir um rasto com uma configuração geral próxima do assinalado no solo é o da libertação dos fragmentos durante a fase de voo da aeronave.

Esla conclusão, apresentada logo em 12 de Agosto dc 1986, apesar de clara e solidamente fundamentada, foi objecto, dentro da Comissão c fora dela, de tentativas dc desvalorização com base na eventual imprecisão de dados oficiais fornecidos aos espccialisuis do IST, nomeadamente os referentes à orientação magnética da pista 18/36. Por estas razões, os Profs. Brederode c Nina enviam uma cana à Comissão onde esclarecem estes pontos (cf. a carta sob a referência S-13/87 à III CEJAC) c onde afirmam que a correcção introduzida acerca da orientação magnética da pista «vem implicar que a diferença angular enue o rumo médio do vento e direcção do uoço ao longo do rasto tivesse aumentado, passando dc 13° para 21o», terminando a carta com as seguintes palavras: «Pelos argumentos acima apresentados, a conclusão final do nosso relatório sai reforçada.»

Surpreendentemente, o coronel Mário Mascarenhas, da DGAC, ouvido pela III CEIAC, conlcssa que a Cl da DGAC crcctuara um levantamento topográfico do rasto assinalado por aquela Cl no terreno e envia-o para a CEIAC. Esta Comissão envia imediatamente esta planta aos Profs. do IST, que remetem à AR uma nova carta onde afirmam que a «fracção do rasto agora registada na planta topográfica corrobora dois aspectos que referimos e

apreciámos no nosso relatório: i) inflexão do rasto de

fragmentos junto ao poste dc suporte dos cabos eléctricos seccionados pela aeronave [...] c ü) perfeita orientação do troço menor do rasto», c ainda que «estes novos dados vêm assim, naturalmente, comprovar as conclusões que extraímos da análise feita, ou seja, que dos mecanismos considerados dc indução do rasto dc fragmentos o único capaz dc produzir um rasto com uma configuração geral próxima da do assinalado no solo é o da libertação dos fragmentos durante a fase dc voo da aeronave» (cf. a carta sob a referência S-278/86 do Prof. Vasco de Brederode dirigida à III CEIAC).

Sintomaticamente, a Procuradoria-Gcral da República c a PJ vêm a público desvalorizar o parecer pericial do IST, pelo que os Profs. Brederode e Nina solicitam a consulta dos ofícios da Procuradoria-Gcral da República c da PJ à III CEIAC e, após isto, remetem à Cl a sua resposta, que a determinado passo refere:

Leitura atenta dos dois ofícios permitiu-nos notar a sua espantosa analogia formal c dc conteúdo e identificar claramente os pontos em que é atribuído carácter conjectural «cm alguns aspectos» ou «num ou noutro ponto» ao nosso trabalho, especificamente parágrafos 4 c 3.2 dos ofícios dos Srs. Procurador--Gcral da República c Director-Gcral da PJ, respectivamente.

Não nos foi obviamente possível enconuar nesses ofícios qualquer fundamento para a adjectivação empregue, pelo que a questão que levantámos continua sem resposta.

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Em particular, o ofício do Sr. Procurador-Gcral da República sugerc-nos ainda os seguintes comentários:

1) Quanto ao n.9 1—6 dc todo incompreensível para nós que a índole quase exclusivamente documental do nosso trabalho lhe possa retirar características processuais dc verdadeira perícia;

2) Quanto ao n.4 2 — realçamos suficientemente, e aló nas conclusões finais do nosso estudo tivemos o cuidado dc o explicitar, que o facto dc alguns dos dados dc trabalho serem imprecisos c outros contraditórios cm nada prejudicou o essencial da nossa análise, permitindo-nos tirar uma conclusüo clara c bem fundamentada;

3) Quanto ao n.9 3 — a solidez das descrições da configuração e natureza do rasto dc fragmentos, peça base do estudo, foi sendo gradualmente clarificada c reforçada no decorrer da nossa interacção com a Comissão, graças a novos dados que foram vindo a lume, cm particular o levantamento dc parte do rasto pela DGAC c os croquis do Sr. Desenhador Carichas c do Sr. Inspector Pedro Amaral.

Com csla consulia dc documentos que nos foi por V. Ex.? propiciada, as nossas dúvidas quanto ao fundamento das apreciações críticas feitas ao nosso trabalho pelo Sr. Procurador-Gcral da República c pelo Sr. Dircctor-Gcral da PJ avolumaram-se. [Cf. a caria dos Profs. Brederode c Nina sob a referência S-23/87 à III CEIAC]

A CEIAC nüo pode deixar de estranhar profundamente que as autoridades dc aeronáutica civil c da PJ jamais sc lenham preocupado cm obter uma explicaçüo científica junto dc um organismo competente, mas não tenham hesilado lenlar desvalorizar o único estudo isento c serio sobre a maicria, nüo sem antes reconhecer a sua total incompetência para o fazer. Assim que a PJ, cm ofício remetido à CEIAC, afirma cm dado passo que «a PJ sente dificuldade acrescida em lidar com conhecimentos técnicos que nos escapam» (cf. a resposta da PJ à CEIAC sobre o esludo do IST).

Relativamente às possíveis variações do rumo do vento que poderia ter ocorrido na noite dc 4 dc Dezembro dc 1980, foi requerida a audiçüo dc dois técnicos do INMG, que teceram algumas considerações acerca dc uma possível variaçüo cnirc os anemógrafos colocados na pista. Para que ludo ficasse devidamente esclarecido, a III CEIAC requereu novamente aos professores do IST esclarecimentos adicionais sobre esta questão. A resposta não sc fez esperar. Os Profs. Vasco Brederode c Mário Nina respondem do seguinte modo:

[...] Solicita-nos V. Ex.? uma aprcciaçüo dos dois registos de anemógrafo remetidos à CEIAC pelo IN MG, com a finalidade dc estabelecer sc «dc uma leitura comparativa desses gráficos resulta qualquer alteração das conclusões do relatório do IST». Prontifica-se V. Ex.! a diligenciar no sentido dc chamar outros organismos oficiais a colaborar ncsia aprcciaçüo, caso lai sc reconheça necessário.

Como V. Ex." pronuimcnic sc apercebeu, sempre frisámos, justificámos c tentámos deixar bem claro junto da Comissão (tanto através do nosso relatório, como oralmente, nas diversas audições na AR, como por escrito, na correspondência que trocámos com questões e esclarecimentos complementares) que o rasto dc fragmentos considerado nunca poderia ter sido dominantemente produzido pelo vento atmosférico, independentemente da velocidade c rumo deste [...].

Quanto ao interesse da exequibilidade em sc proceder a ensaios com um anemógrafo adicional localizado na zona do rasto, tal como V. Ex.' muito bem refere na vossa carta, também nós consideramos perfeitamente «desnecessário» proceder a este tipo dc ensaios para validar as nossas conclusões. Sc alguma vez o tivéssemos considerado (mesmo que apenas) desejável para melhor fundamentarmos o nosso estudo, leríamos nós próprios tomado a iniciaüva dc o recomendar à CEIAC logo na fase inicial da nossa intervenção.

Como leníamos deixar claro nos nossos depoimentos junio da Comissão, consubstanciando o texto do relatório, na análise que vos apresentámos do mecanismo dc dispersão pelo venio tivemos obviamente já cm conta a influencia da configuração do terreno (relevo, casario, vegetação) e das condições de estabilidade da atmosfera no estabelecimento da evolução da velocidade do vento em altura e da intensidade de turbulência cm toda a região de interesse.

Dado que as conclusões do IST apontavam para a existência dc um incêncio a bordo do Cessna na fase do voo c uma rotura dc fuselagem por onde os materiais leriam sido expelidos, importava explicar o modo dc funcionamento dc um eventual mecanismo de ejccçüo dc materiais. Os perilos do IST também forneceram por escrilo esse esclarecimento complementar à Comissão, que a dado passo refere:

Embora não disponha a Universidade de peritos cm explosivos, podemos avançar que, nesta hipótese, a expulsão dc fragmentos através de qualquer comunicação estabelecida com o exterior seria controlada, entre outros factores, pela área c forma da perfuração c pelo diferencial de pressões instalado entre as regiões a monianic c a jusante do corpo de objectos movimentados, isto é, não só peta sobrepressâo criada no interior, como é o caso da cabina de um Cessna pressurizado, como pelo eventual efeito de sucção resultante de uma baixa pressão estática local reinante na zona da perfuração e associada ao escoamento em torno da aeronave como um todo.

Desenvolvido o mecanismo de aumento de pressão no interior:

a) O habitáculo da aeronave pode considerar-se um sistema a volume constante;

b) A dcllagração dc um engenho incendiário liberta, cm tempo muito curto, uma enorme quantidade dc produtos gasosos;

c) Os produtos gasosos são libertados a elevada temperatura, como resultado da reacção fortemente cxolérmica;

d) A libertação de gases e o aumento de tem-pcraiurd do ar c gases comidos no habitáculo

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traduz-sc num aumento dc pressão estática. [Cf. a carta dos peritos do IST de 24 dc Novembro de 1986 à III CEIAC]

Mas, apesar dc tudo isto, as conclusões da III CEIAC desvalorizam o parecer e respostas complementares dos professores e peritos do IST, pelo que estes, perante o texto final das conclusões da III CEIAC, resolvem enviar à AR uma carta onde desmontam os argumentos contrários, terminando do seguinte modo:

(-]

Leitura atenta dessas 11 páginas dedicadas ao nosso trabalho, de entre um total de 64 páginas do relatório, imediatamente revelou estarem essas mesmas páginas eivadas dc incorrecções c dc críticas à nossa actuação. Algumas dessas incorrecções e críticas são técnica e eticamente graves.

Técnico-cieniificamente compete-nos, como únicos peritos intervenientes e directamente visados nesta matéria, corrigir as inexactidões insertas c responder às críticas formuladas pela Comissão na apresentação c apreciação do trabalho que lhe submetemos. Tendo já sido extinta a Comissão responsável pelo relatório tomado público, sentimo-nos na obrigação dc nos dirigirmos a todas VV. Ex." dando-vos conhecimento da nossa apreciação da parte do relatório que especificamente nos diz respeito.

[•••]

Tendo muitas das questões suscitadas neste capítulo do relatório sido anteriormente levantadas pelo próprio Sr. Vice-Prcsidentc da Comissão, e na altura devidamente esclarecidas, pcrguniamo-nos: porque ainda tantas incorrecções c críticas ao nosso trabalho neste fragmento do relatório agora tomado público?

[•••]

' Assim, a insistência nas muitas incorrecções dc que estas subsecções estão pejadas só pode ser compreendida se a elaboração desta parcela do texto do relatório tiver sido cometida a algum dos membros da Comissão que nunca tenhamos tido o ensejo de encontrar nas diversas reuniões em que houve oportunidade de debater os aspectos em causa e que. concomitantemente, não tenha tido oportunidade nem de apreender as bases da apreciação crítica que tentámos claramente apresentar no nosso relatório nem de se inteirar do teor das questões que nos foram levantadas e dos esclarecimentos que prestámos à CEIAC.

Chamados à IV CEIAC, aqueles peritos dc aerodinâmica c de combustão são categóricos em reafirmar as conclusões anteriormente formuladas c confirmadas à medida que iam chegando novos elementos (v. g., a planta da DGAC — cf. os depoimentos dos Profs. Vasco Brederode e Mário Nina na IV CEIAC — e a carta dirigida à IV CEIAC sob a referência S-77/89).

Do exposto pode concluir-se que o avião sinistrado largou em voo fragmentos queimados pertencentes ao seu interior, o que evidencia que tenha sido objecto dc uma deflagração, com o consequente rompimento da sua fuselagem. Aliás, se dúvidas ainda existissem sobre esia matéria, o relatório do LPC com data de 16 dc Dezembro de 1980, que se reporta aos resíduos queimados que lhe foram enviados para análise, 6 bem explícito. Rcfcrindo-

-sc a um dos recipientes onde tinham sido acondicionadas várias amostras dc resíduos «mais ou menos carbonizados», refere explicitamente que esses resíduos foram «encontrados no terreno do Aeroporto desde o fim da pista onde o avião descolou até à rede da vedação junto à estrada antes do embale nos fios condutores dc electricidade do lado oposto da rede» (cf. o relatório do exame n.° 3846/ 80.D do LPC), zona esta referida pelo inspector Pedro Amaral como tendo sido a área pesquisada por si e a sua equipa no dia 5 dc Dezembro dc 1980.

3.9 Existência dc fragmentos metálicos nos pés do piloto Albuquerque. — Aquando da exumação dos corpos dos pilotos cm Novembro de 1982, foram radiografados, permitindo a sua detecção, minúsculos e numerosos corpos estranhos nos pés do piloto e só neste. Permanecem os registos radiológicos em poder da CEIAC.

Requeridos exames rigorosos às amostras por raspagem dos pés do piloto, foi verificado, perante documentos radiográficos inequívocos c constantes dos autos, que aquilo que foi extraído dos pés do piloto desapareceu.

Chamados a depor, responsáveis de enudades oficiais que manusearam estas amostras ou a cuja guarda estiveram confiadas confirmaram a manifesta discrepância com a realidade c não souberam produzir qualquer explicação para o descaminho das amostras autênticas.

Conquanto não possa eventualmente considerar-se a evidência radiológica como prova completa, não pode deixar dc atentar-se no registo radiográfico quer dos pés do piloto antes de qualquer extracção dc amostras quer das próprias amostras depois dc extraídas, sendo cm todos os documentos dos autos evidente a natureza metálica das partículas exactamente descritas na leitura radiológica directa.

Perante estes registos radiológicos, a Comissão solicitou a um perito radiologista, o Prof. Doutor Luís Aires de Sousa, um estudo acerca da natureza c eventual proveniência daqueles fragmentos. Aquele eminente perito conclui do seguinte modo:

Os pedaços metálicos contidos nas partes moles, nas zonas assinaladas, tem densidade elevada, arestas vivas e não são —na sua generalidade— seguramente provenientes dc fusão dc metal. Radiologicamente é possível excluir que sejam de liga de alumínio igual à da fuselagem da aeronave, mas não é possível determinar qual o metal.

E acrescenta que «a existência de pequenos fragmentos metálicos, com as características assinaladas (arestas vivas, contornos irregulares c densidade radiológica elevada), nas partes moles sugere que foram animados dc energia cinética elevada para os fixar nas referidas partes moles» e que a fonte desta energia «não poderia ser muito distante dos pés» (cf. o estudo pericial do Prof. Aires dc Sousa, bem como o seu depoimento à III CEIAC).

O Dr. Fernando Fonseca, perito médico legal ouvido sobre esta matéria, chega a qualificar aquelas partículas dc metal como «estilhaços» (cf. o depoimento de Femando Fonseca, fl. 957 da III CEIAC).

Pelo exposto, pode concluir-se que teve lugar uma deflagração no Cessna cm zona não muito distante do piloto Jorge Albuquerque, o que provocou a incrustraçâo

nos seus pés de partículas metálicas com arestas vivas não pertencentes, portanto, ao material componente do avião sinistrado.

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4.9 Ausência dc fracturas nos corpos das vítimas. — Está esclarecida no processo a ausência dc fracturas na generalidade das vítimas (cf. o relatório das autópsias) c sobre este aspecto a Comissão pôde ouvir peritos módicos qualificados. O Dr. Vasconcelos Marques, médico do Dr. Sá Carneiro, refere que «o Dr. Sá Carneiro tinha condiçáo predisponente para ter lesões de coluna (....] sempre que alguém tiver um acidente c náo esteja consciente, a probabilidade dc haver fracturas dos membros é mínima ou nula [...]» (fl. 11); «[...] sc mc perguntar por que é que nenhum tinha fracturas, dir-lhe-ci que sc deve ao facto dc nenhum deles estar consciente. Aliás, é um assunto que náo tem sequer discussão» (cf. o depoimento do Dr. Vasconcelos Marques, fl. 1259 da III CEIAC).

No mesmo sentido apontam as análises do Armcd Forces Institui of Palhology cm Março dc 1982 (fls. 366 c scg. do processo da PJ), que, na sua tradução oficial (Livro de Camarate, p. 290, cd. do Ministério da Justiça), referem:

Quando não há sinais dc fracturas c dc injúrias viscerais evidentes na autópsia, os exames radiológicos do corpo inteiro c dissecação da parte posterior do pescoço são úteis na determinação dc outras causas dc incapaciiação física.

O perito médico legal, Dr. Fernando Fonseca, inquirido acerca das mesmas questões pela Comissão, é bem claro ao referir que as vítimas no momento de colisão «poderiam estar desmaiadas mas vivas» (cf. o dcpoimcnlo dc Fernando Fonseca, fl. 922 da III CEIAC).

Conclui-se, assim, que na altura da colisão da aeronave com as casas de Camarate as vítimas já sc encontravam inanimadas. Fa/, sentido a afirmação dc outros pontos acerca do entendimento dc que as vítimas sc encontravam ainda vivas no momento do embate, mas, para a ausência dc fracturas, o que tem relevância é o seu estado dc inconsciência ou ausência dc sentidos.

5.g Ausência dc comunicações entre o Cessna c a torre dc controlo do Aeroporto. — A última comunicação enue o avião c a torre de controlo do Aeroporto verificou-sc às 20 horas, 16 minutos c 25 segundos, consistindo na autorização para a descolagem c sua resposta (11. 90 do rclaidrio da DGAC).

Assim, no tempo cm que durou o voo, ou seja, entre o início dc descolagem c o embale final, nenhuma comunicação existe cnlre o avião c a torre ou vice-versa. Este facto rcvcla-sc estranho, já que a rapidez com que a comunicação rádio pode ser efectuada cnlre a lorrc dc controlo c a aeronave cm voo é extremanente fácil c rápida.

Técnicos aeronáuticos ouvidos pela Cl são do entendimento de que resulta muito provável como explicação o corte anormal dc possibilidade dc comunicação rádio ou na incapacitação dc tripulação (cf. os depoimentos dos piloios Georgino Silva, IL 31 da IV CEIAC, Alcides Teixeira Lopo, III CEIAC, João Penaguião, III CEIAC, c comandante Mário Gouveia, III CEIAC). Este último chega a descrever pormenorizadamente o sistema dc comunicações com a torre referindo a facilidade dc lai contacto, «basta carregar num botão situado no manche», pelo que sc não houve contacto era porque o piloto «estava inanimado» (cf. o dcpoimcnlo do comandante Mário Gouveia Homem, fl. 6103 da III CEIAC).

6." Sobrevivência das vítimas. — Existem testemunhos claros dc que o avião quando imobilizado cm posição dc ponic sobre as casas dc Cainaraic não registava quaisquer sinais dc vida a bordo do Cessna.

João Pereira Santana, morador do bairro dc Camarate, refere que «as pessoas pensavam que o avião caiu sem ninguém» c por isso «é que não houve tentativa dc salvamento» (cf. o dcpoimcnlo dc João Santana, fl. 254 do relatório da DGAC).

O faclo é coerente com a existência dc um incêndio a bordo c com o eslado dc inanimaçâo das vítimas.

O já referido perilo médico legal, Fernando Fonseca, foi explícito cm considerar que, cm sua opinião, o incêndio «deu-se antes da colisão», fundamcniando-sc cm que as vítimas não teriam atingido as percentagens de monóxido dc carbono encontradas no respectivo sangue sc o incêndio livesse consistido apenas num braseiro dc gasolina (cf. o dcpoimcnlo dc Fernando Fonseca, fls. 26 e 75 da III CEIAC).

7." Disposição relativa dos corpos das vítimas. — Resulta dos autos, c cm particular do depoimento do médico legisla, que não só efectuou as autópsias como acompanhou a própria remoção dos corpos das vítimas do local do sinistro, que estas, conquanto parcialmente queimadas, «quem as conhecesse era capa/, dc as identificar relativamente» (cf. o depoimento dc José Sombrcirciro, fls. 55, 181 c 186 da III CEIAC).

Pela observação directa constante dos autos relativamente a este aspecto (fl. 4091 do vol. D da 1 CEIAC), decorre que, ao remover os corpos das vítimas do solo após a combustão do aparelho c a extinção do incêndio, o corpo dc um dos pilotos sc encontrava cm posição supra-jacente, os passageiros a seguir c o outro piloto cm posição subjacente.

Pela análise comparativa dos outros documentos dos autos, não resultam quaisquer dúvidas sobre qual dos pilotos sc encontrava cm posição suprajacente (comandante Jorge Albuquerque) c qual dos pilotos sc enconuava cm posição subjacente relativamente à totalidade dos passageiros da aeronave (co-piloio Alfredo dc Sousa).

No mesmo sentido salicnui-sc, por exemplo, que o perito médico legal Fernando Fonseca declara (cf. fl. 121, 15 dc Abril dc 1986) que, «com respeito à proximidade ou afastamento do foco |...| sc [uma vítima] está mais perto, morre mais depressa c terá menos monóxido dc carbono».

Isto é, do ponto dc vista mcdico-lcgal, c possível determinar o momento relativo dc ocorrência da morte dc cada uma das vítimas, sendo que o diferente grau dc inalação dc fumos é suficientemente indiciário a este respeito, por virtude da paragem de respiração aquando da morte, c estes graus relativos podem cxirair-sc com suficiência da percentagem da carboxi-hemoglobina detectada cm cada uma das vítimas — o piloto Jorge Albuquerque tem a mais baixa destas laxas dc carboxi--hcmoglobina (40%) c o co-piloio Alfredo dc Sousa uma das mais alias (58%).

Pelo modo como o avião resvalou para o solo, o Çacvo é indiciário dc que o piloto c o co-piloio a bordo, a seguir a produ/.ir-sc a emergência, deixaram dc csiar no mesmo local da aeronave — cockpit — c o co-piloto sc encontraria na traseira da cabina no momento dos embales.

Por outro lado, o manipulo da porta do Cessna apresentava, segundo o processo c as observações feitas imediatamente após o sinistro, indícios dc haver sido mexido durante o voo. Aliás, o próprio NTSB c desta opinião ao afirmar no seu estudo que «lhe lowcr main door was found with its handlc jammed in a partially opcn position» (cf. o csiudo do NTSB, appendix D, fl. 4, parágrafo 5).

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Vários técnicos aeronáuticos ouvidos pela CEIAC relativamente a esta questão são unânimes cm afirmar que lai situação apenas poderia ser resultante dc uma

emergência muito grave, designadamente incêndio a bordo (cf. o depoimento de Georgino Silva, fls. 4871 c 4872 do x vol. da II CEIAC). Este último chega a referir que a icnuuiva dc abertura da porta teve lugar, «quanto a mim, houve a tentativa dc fazer sair o fumo e os gases, possivelmente até a pedido dos passageiros» (idem).

8.9 Fonte dc combustão. — Resulta transparente dos auios que, apesar de ser muito inclinada a rua onde se deu a colisão do avião, não sc registou qualquer escorrimento dc gasolina no decurso do incêndio até ser extinio pelos bombeiros. Esic facto é indício bastante dc que o incêndio não terá consistido tanto na combustão da gasolina contida nos depósitos da asa direita, mas sobretudo na cabina da aeronave.

9.v Incêndio autónomo no forro do telhado da Vivenda Zeca. — O avião imobilizou-se contra o l.9 andar da Vivenda Zeca, por onde penetrou, como o provam vários documentos juntos ao processo, nomeadamente material fotográfico que dá conta da destruição ocorrida naquele piso.

Na rua onde o avião acabou por cair c ser consumido pelo logo verificaram-sc dois incêndios distintos: um, o maior, consistente na combustão do avião; outro, mais restrito c confinado, no madeiramento do forro do telhado da Vivenda Zeca. Igualmente nesse sentido releva a documcnuição fotográfica, a planta da DGAC (fl. 92) c ainda o relatório da DGAC onde sc afirma que «o foco principal foi extinto em cerca dc vinte segundos com espuma c um pequeno incêndio no prédio que suportou a colisão principal da fuselagem foi cxünto com mangueiras dc nevoeiro actuadas do prédio em frente (cf. o relatório da DGAC, 11. 136, «Investigação operacional»).

O bombeiro Carita Ferrão, que trabalhou na extinção do incêndio, fez declarações no mesmo sentido, afirmando que «existia outro edifício a seguir onde o avião bateu mesmo, suponho dc frente, e era precisamente a esse canto é que eslava o foco de incêndio» (cf. o depoimenio dc Carita Ferrão, fl. 185 do relatório da DGAC).

Assim, e aliás em coerência com os dados anteriores, considerando quer a sequência dos embates quer a profundidade do ponto onde se registou o referido «pequeno incêndio» autónomo, pode ser reforçada a conclusão dc que o avião ardia já cm voo, uma vez que a combustão final da aeronave no solo jamais poderia explicar o incêndio no l.9 andar da Vivenda Zeca.

10." Detecção dc fósforo na roupa das vítimas c dc bário cm zonas do cockpil do avião. — A III CEIAC diligenciou no sentido dc apurar sc na roupa das vítimas existiam resíduos dc fósforo c para tanto coniactou o LPC, a fim dc proceder ao exame pericial a essas roupas. Porém, o resultado desse exame só seria remetido à III CEIAC após o encerramento dos seus trabalhos cm Janeiro dc 1987, pelo que as suas conclusões não puderam ser levadas cm consideração por essa Comissão. Contudo, a CEIAC recomendou às entidades responsáveis o urgente apuramento da origem do fósforo encontrado nas roupas das vítimas e indicou os organismos que deveriam ser contactados a fim dc sc constituir uma comissão dc peritos que Ci/.cssc um estudo aprofundado dessa matéria. A CEIAC lembra as conclusões dos primeiros exames que levaram à descoberta do fósforo. Assim, no primeiro relatório do LPC referc-se ler encontrado fósforo na roupa das vítimas em teores heterogéneos quanto à sua

distribuição c concentração c que o fósforo «é comum a alguns materiais sintéticos dc uso comum, nomeadamente fibras icxtcis, ligas anticorrosão, polímeros, estabilizamos, plastificantes, agentes tcnso-aclivos, engenhos incendiários e fumígenos» (cf. o relatório do LPC dc 27 dc Março dc 1987, fl. 13 201 da IV CEIAC). Note-se que é a primeira vez que um documento oficial vem colocar a hipótese da existência dc um engenho incendiário ou fumígeno a bordo do avião cm que viajava o Primeiro-Minisiro, Dr. Sá Carneiro.

A gravidade dc tal hipótese obrigava necessariamente ao prosseguimento urgente das investigações por parte das autoridades competentes, pelo que foi requerido um segundo exame pericial ao LPC, onde se procedeu à deflagração dc um engenho incendiário junto dc peças dc vestuário a fim dc sc verificar o seu efeito no mesmo, bem como um exame comparativo dos resíduos de fósforo deixados pela espuma dos bombeiros utilizada cm Camarate. Aí o LPC, reconhece que o «ensaio sobre roupas diversas com uma granada dc fósforo da SPEL [...] deu resultados do mesmo tipo dos encontrados na roupa das vítimas», mas conclui que o LPC não possui instrumento que possibilite um esclarecimento definitivo sobre «se o fósforo encontrado na roupa das vítimas dcsle sinistro teve origem no engenho incendiário (por exemplo, granada) ou noutra qualquer substância (pó químico, etc), é necessário distinguir sc elc eslá sob a forma dc elemento químico ou sc, pelo conirário, está quimicamente ligado a outros elementos» (cf. o relatório do LPC dc 21 de Agosto dc 1987, exame n.9 249/87-FQ, IV CEIAC).

Assim, foi constituída uma comissão de peritos, por sugestão da Comissão Parlamentar de Inquérito, composta por elementos dc comprovada idoneidade científica c oriundos dc várias entidades com complementaridade entre si, como o IST, o LNETI, o LPC e a Faculdade dc Ciências dc Lisboa.

Esta investigação concluía pela impossibilidade dc sc determinar com exactidão a origem do fósforo, uma vez que ele existia sob a forma dc fosfaio c lanio podia provir dc um engenho incendiário como da espuma dos bombeiros. Aliás, os peritos ouvidos pela CEIAC são claros ao afirmarem que a dificuldade dc distinguir entre aquelas duas proveniências significa admitir a compatibilidade daqueles registos com o engenho incendiário (cf. os depoimentos dos peritos, particularmente dc Morais Anes, do LPC, fls. 107 c 108 da IV CEIAC, c dc Maria Ondina Figueiredo, fl. 121 da IV CEIAC).

Acresce que esta Comissão conseguiu apurar, através dc depoimentos do próprio médico do IML presente ao levantamento dos corpos c da descrição feita por jornalista do Diário de Lisboa prcsenic no local, que o corpo do Primeiro-Minisiro, Francisco Sá Carneiro, foi o quinto a ser retirado dc uma fila dc corpos (cf. o depoimento dc José Sombrcirciro, IV CEIAC, c a noucia do jornal Diário de Lisboa, dc 5 dc Dezembro dc 1980), o que significa que haveria mais quatro corpos sobre ele c, portanto, as suas roupas não deveriam ler sofrido apreciável contaminação provocada pela espuma dos bombeiros. Ora, consiaia-sc no relatório que foi justamcnic nas roupas do Primciro-Minisuo que foram dcicciados os mais elevados índices dc fósforo. Este aspecto vem trazer a fone suspeita dc que a contaminação nas roupas do Primeiro-Minisiro não tem origem no produto utilizado pelos bombeiros no alaquc ao incêndio.

A CEIAC, face à possibilidade dc cxisLência de um «engenho incendiário ou fumígeno» a bordo do avião

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(cf. o relatório do LPC dc 27 de Março dc 1987, fl. 13 201 da IV CEIAC), havia sentido a necessidade dc sc informar junto do 1NDEP (indústrias dc defesa), fabricantes dc armamento, com o objectivo dc se esclarecer sobre a composição química mais utilizada cm diferentes tipos dc explosivos (cf. o ofício n.9 108, de 3 dc Julho dc 1990, da IV CEIAC) para melhor saber o que procurar c, sequencialmente, a informação recebida do INDEP acerca desta matéria fora facultada dc imediato à comissão dc peritos, por forma que esses dados pudessem ser tidos eventualmente em conta no relatório a elaborar. Nestes termos, os peritos, explorando esta via, vem dar especial relevância à pesquisa dc quantidades anormais de alguns elementos indicadores particularmente significativos no contexto dc eventual presença de um engenho explosivo. Assim, referem que, «perante a recomendação de pesquisar eventuais testemunhos da utilização dc engenhos incendiários ou explosivos c, tendo presente as informações constantes do documento n.9 1 (INDEP), procurou-sc despistar um elemento químico dc ocorrência rara cm circunsüincias comuns c que pudesse indiciar aqueles engenhos. Dos elementos referidos no documento n.° 1, apenas o telúrio e o bário correspondem a estas condicionantes (uma vez que os demais estão presentes na quase totalidade dos materiais a ensaiar); contudo, o telúrio assumiria presumivelmente a forma dc um composto volátil nas condições ambientais cm questão, pelo que a pesquisa subsequente incidiu exclusivamente sobre a presença dc bário nos materiais a analisar.» (Cf. o relatório da comissão dc peritos, n. 5 da IV CEIAC.)

Por isto, tornou-se evidente para a CEIAC a particular relevância que, ncsie contacto, possuía a investigação da presença dc bário no avião sinistrado. Nesta conformidade, foi solicitado ao fabricante do avião que informasse a CEIAC sobre sc na composição dos materiais consütuinics da aeronave Cessna entrava o elemento químico bário. Em ofício com daia dc 26 de Sclcmbro de 1990, a Empresa Cessna Aircraft Co. informava a CEIAC sobre os elementos químicos e ligas metálicas que entram na composição dos materiais de fabrico do avião, excluindo liminarmente a presença do bário nesses materiais. Assim, a Cessna refere:

The cockpit arca and structurc around lhe windows is predominantly aluminum alloy. The windows are made of strctchcd acrylic shect, they are aitachcd using stecl screws and nuts. The upholstery trim material around the windows is made of ABS plasiic shecL There are small amounts of olher materiais such as copper and brass used in lhe arca of lhe insirumcni panei along wilh aluminum and stecl. Cessna does not use barium in consiruction of the aircraft.

No entanto, a comissão de peritos viria a dcicciar bário em proporções anormais em amostras recolhidas do avião sinistrado, particularmente na zona do cockpit. Rcfcrc-se que, «assim, os produtos claros dc tonalidade esverdeada observáveis cm qualquer das ires amosiras mosiraram-sc praticamente isentos dc bário, enquanto um maicrial escuro retirado da amosira n.ç 3 (obtido junio üs janelas laterais do cockpit) apresentou um teor significalivamcnic mais elevado daquele elemento» (cf. o relatório da comissão dc peritos de 21 dc Novembro dc 1989, fl. 13 da IV

CEIAC). Estes mesmos peritos afastaram a hipótese de o teor anormal de bário encontrado na amostra n.9 3-B poder resultar dc pó químico dos bombeiros (cf. os relatórios, fl. 13) c ainda, a fl. 18, referem:

A presença de bário detectada nos materiais escuros aderentes à superfície dc duas zonas dc amostragem do cockpit não poderá ser inteiramente atribuída à utilização de pó químico pelos bombeiros.

Todavia, o mesmo relatório abre outras hipóteses sobre a proveniência dc bário ao sugerir que o mesmo «possa ter origem na degradação dos materiais» diversos utilizados na construção da aeronave, «visio tralar-sc de zonas (dentro do cockpit) onde existem componentes de constituição muito diversa» (cf. o relatório dc 21 dc Novembro dc 1989, fl. 18).

Portanto, nâo resultando desses trabalhos inteiramente clara a proveniência deste elemenio, bário, nas amostras do avião sinistrado e lendo sido o bário escolhido pela comissão dc peritos como indicador privilegiado da eventual ocorrência dc uma explosão, não podia esta CEIAC dc forma alguma encerrar os seus trabalhos sem esclarecer devidamente c dc uma forma cabal csla questão. Com este objectivo mandatou dc novo a comissão de peritos, que, por sua vez, cnicndcu dever integrar mais dois especialistas, para esclarecer a «origem dos materiais encontrados cm proporções anómalas descritas no relatório da mesma comissão dc peritos na primeira fase dos trabalhos» (cf. o ofício n.9 132, de 4 dc Setembro dc 1990, da IV CEIAC).

A CEIAC enviou lambem a csla comissão dc peritos o ofício n.° 135, dc 25 dc Setembro dc 1990, comendo informações sobre o explosivo Sismogel 1 e granadas incendiárias c fumígenas, c o ofício n.9 148, dc 30 dc Outubro dc 1990, comendo uma descrição sumária dos materiais existentes no cockpit do avião Cessna 421-B. bem como um certificado indicando que a companhia fabricante desic modelo não utilizava cspccificamcnie bário na construção da aeronave.

Foi igualmente enviado à comissão dc peritos o ofício n.9 136, dc 25 dc Setembro dc 1990, em que sc formalizavam os quesitos antcriormcnie apresentados, a saber:

1.' Determinar sc os teores dc bário encontrados no revestimento interno do Cessna 421-B e nas amostras dc unia recolhidas na aeronave sinistrada são compatíveis com os leores do mesmo elemento químico encontrado nas amostras extraídas da aeronave sinistrada c já objecto da análise que deu origem ao relatório apresentado ao TIC dc Loures c ao Parlamento;

2." Em caso de n3o compatibilidade, indicar os respectivos valores quantiiaiivos.

Com vista à prossecução destes objectivos, ficou ainda acordado que sc procederia a um exame comparativo dos materiais componentes dc um avião da mesma marca, Cessna, e série, 421, c dos materiais do avião sinistrado.

Em consequência, elementos do LPC procederam à recolha dc amostras na aeronave .sinisirada c num avtào Cessna dc comparação, modelo 421-B.

Foi ainda solicitada ü SPEL a dcscriçüo pormenorizada dc vários tipos dc granadas incendiárias e das substâncias que entram na sua constituição. Em resposta, a SPEL menciona em ofício a composição dc dois üpos dc granadas (incendiárias com fósforo plastificado C de térmite) e de um explosivo (o Sismogel I) que coniém bário cm proporções significativas na sua composição.

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O bário aprcscnia-sc nos materiais constituintes destes engenhos explosivos sob diversas formas: sulfato no Si.smogcl I, nitrato na carga principal da granada M-351 (térmite) c cromato (nas espoletas das granadas M-351 c M-352).

Em consequência, a comissão dc peritos entendeu, para além da presença dc bário e das proporções cm que ocorre nos materiais do avião, esclarecer ainda a forma química cm que se dá essa ocorrência, pelo que, com este fim, utilizou técnicas analíticas complementares (espectroscopia dc absorção dc raios infravermelhos).

A recolha dc amostras na aeronave sinistrada c no avião Cessna de comparação teve, portanto, como principal objectivo apurar se nos materiais que constituem normalmente o avião o bário nalguma das suas formas poderia ocorrer nas proporções enconuadas nas amostras n.° 3-B (cf. o depoimento do perito Morais Anes, dc 2 dc Fevereiro de 1991, à IV CEIAC). Essa amosuagem visou, consequentemente, um conjunto muito variado dc materiais, com a excepção do tipo dc metal do depósito negro, como tinias, pós c ligas metálicas, redes não metálicas, materiais pulverulentos heterogéneos, óleos, espumas, revestimentos, alcatifas, tecidos, plásticos, carnagens, etc. (cf. a tabela i, fl. 4 do relatório, de 5 dc Fevereiro dc 1991, da IV CEIAC).

As amostras n.9 3-B correspondentes a duas zonas dc amostragem com depósito negro na zona do cockpil foi lambem reanalisada. Do exame comparativo dos dois aviões resultou claro c inequívoco que as proporções dc bário encontradas nas várias componentes do aviüo que serviu para comparação não eram compatíveis com os teores dc bário encontrados nas amostras n.9 3-B acima referidas e retiradas dos destroços do aparelho na zona do cockpit.

É de salientar ainda que nenhuma das amosuas retiradas desia vez do avião sinistrado, incluindo um conjunto muito variado dc materiais onde não sc verifica a presença do depósito negro acima referido, apresenta teores dc bário, compatíveis com os resultados anteriores (amostra n.« 3-B).

A comissão dc peritos conseguiu também apurar que o bário encontrado nos provetes constantes das amostras n.° 3-B sc apresentam sob a forma dc sulfaio dc bário. Esic resultado pareceu desde logo da maior imporiância, quer por este composto ser um constituinte relevante dc um explosivo corrente (Sismogcl I) quer pela sua estabilidade química oferecer grande resistência a eventuais alterações que entretanto ocorram com o decurso do icmpo (cf. o depoimento do perito Lima dc Faria dc 21 dc Fevereiro de 1991 à IV CEIAC).

Do conjunto de resultados obtidos por esta comissão dc peritos c da comparação efectuada resulta ainda que o sulfato dc bário idenüficado nas amostras n.9 3-B é um material totalmente estranho à constituição do avião Cessna c a todos os materiais seus componentes. Dada a possibilidade, ainda que remota, da presença dcslc clcmcnlo decorrer dc contaminação posterior cm virtude do mau acondicionamento dos destroços do avião, a comissão preocupou-sc em apurar sc a presença do sulfato dc bário sc poderia ficar a dever a contaminação posterior à queda do avião. Esta hipótese foi liminar c categoricamente rejeitada pelos peritos membros da comissão c especialistas nesta área.

Morais Anes tdwe a dado passo, quando interrogado sobre essa qucsulo, que «rejeita essa hipótese pura c simplesmente Não é um clcmcnlo comum, não existe nas poeiras — enfim, da maneira como cie aparece, é dc

rejeitar essa hipótese. Claramente! Para mim, não há dúvidas a esse respeito.» (Cf. o depoimento de Morais Anes, fl. 74 da IV CEIAC.)

Esta CEIAC, confrontada com a forte possibilidade dc ter ocorrido uma deflagração a bordo do avião que transporiava o Primeiro-Ministro, entendeu solicitar à SPEL que esclarecesse sobre os efeitos produzidos por um engenho explosivo ou incendiário que fossem compatíveis com a descrição dc ocorrência feita pelas testemunhas oculares (bola dc fogo após a descolagem), com o rasto deixado no terreno, com os estilhaços nos pés do público, com elevado grau dc carbonização deste, os aspectos de sobrevivência dos ocupantes com os esuagos produzidos no aparelho, com a ausência dc comunicações rádio entre o aparelho c a torre dc controlo c com a ausência de uma detonação audível. A estas questões os peritos da SPEL avançaram a hipótese dc utilização de um engenho incendiário, pois:

o) Funcionamento da cspolcia (se o accionamento foi mecânico) perfeitamente audível, mas abafado pelo ruído dos motores;

b) Após cerca dc dois segundos dar-sc-ia o início da combustão da carga de térmite com uma elevação rápida da temperatura até cerca de 2200°C;

c) Entretanto, verificar-sc-iam os primeiros sinais, provavelmente dc surpresa, por um anormal aumento da temperatura no interior do cockpil;

d) Dc acordo com o comportamento da chapa da estrutura, seguir-sc-ia o seu rompimento (se era dc alumínio, tem um ponto dc fusão de cerca dc 700°C), provavelmente com chama curta c imediato aumento da temperatura interior;

c) Auto-inflamação dos materiais combustíveis circundantes (tecido do asscnio, roupas do piloto, papéis, plásticos, isolamento dc cabos eléctricos, etc);

f) Consumo do oxigénio no interior do cockpil.

Permito-me sugerir que, com uma fonte de calor dc cerca dc 220()°C, mesmo que por hipótese consideremos cerca dc um décimo do seu valor como temperatura média no interior do cockpil, dependendo da sua cubicagem, esta seria da ordem dos 200°C a 3(X)0C.

Nestas condições, pelo facto de o piloto estar mesmo sobre a fonte de calor/incendiária e admitindo que csia situação sc passou como descrevo, penso que há razões para que sc aceite que o mesmo foi a sua primeira c principal vítima.

Pelas razões apontadas auás c pelo facto de a fonte considerada estar mais próxima do sistema dc comunicação rádio (equipamentos sempre sensíveis à humidade c temperatura) e dada em termos comparativos com outros órgãos dos aviões, a sua maior vulnerabilidade a factores agressivos externos, considero como provável (embora dependendo do posicionamento deste e eventuais espaços livres de acesso na estrutura inferior do avião) que o equipamento dc comunicação rádio pudesse ter sido o primeiro sistema do avião a ser danificado (antes mesmo do rompimento da chapa da estrutura), impedindo o seu funcionamento. [Cf. o relatório do perito da SPEL Fernando Matos dc 29 dc Novembro dc 1990 à IV CEIAC.j

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Um corpo humano siluado na proximidade dcslc lipo dc granada ficará submetido a um calor tão intenso que, cm minha opinião, carbonizará completamente. [Cf. o depoimento do perito da SPEL Jorge Tomás Gonçalves dc 29 dc Novembro dc 1990 à IV CEIAC.J

A ausência de comunicações pode ler resultado, cm primeira análise, da incapacidade operativa da tripulação face a uma situação dc incencio que sc admite tenha rapidamente atingido o comandante, impedindo-o dc ter qualquer outra atitude que não a de sobrevivência, quer tentando controlar o incêndio quer tentando segurar o aviüo. [Cf. o dcpoimcnlo do perito da SPEL Vidal da Silva dc 29 dc Novembro de 1990 à IV CEIAC]

Confrontada com as conclusões do relatório da comissão dc peritos acerca do sulfato de bário, a CEIAC viu-se forçada a consultar de novo a SPEL, nos seguintes termos:

Tendo em atenção o estado dos destroços, c muito particularmente da zona do cockpit dc onde foi retirada a amostra de fuselagem que acusou a presença dc sulfato dc bário, elucidar-nos sc o facto dc apenas nesse local c nessa amostra ter sido detectado este elemento químico que entra na composição do Sismogel I poderá dc alguma forma ficar a dever--sc a uma circunstância fortuiia ou sc, pelo contrário, essa descoberta indicia que a zona do cockpit deveria acusar um significativo grau dc contaminação por essa substância química antes da sua total destruição pelo Togo.

E ainda sc a utilização do explosivo Sismogel I poderia ou não ser compatível com os fragmentos metálicos encontrados nos pés do piloto, o rasto deixado pelo aparelho c com os testemunhos oculares dc uma explosão sem estrondo, tipo bola dc fogo, que, segundo as testemunhas, envolveu o aparelho na sua fase inicial dc subida. A estas questões os peritos da SPEL esclareceram que o Sismogel I deixou de ser fabricado pela SPEL no final da década de 70, pelo que se inclinariam mais para a utilização dc outro lipo dc gel, nomeadamente a Gelatina III, cuja percentagem dc sulfato de bário atinge os 9%. Dado o estado dc destruição completo pelo fogo do cockpit do avião sinistrado, estes peritos consideram ter sido um acaso dc sorte a descoberta dc amosuas desta zona do avião cm que surge o sulfato dc bário. Esclarecem ainda que esta substância, Gelatina III, dado o seu alto teor explosivo, só poderia ter sido utilizada cm pequena quantidade (30 g a 50 g), «a suficiente para provocar estragos sem haver desintegração do cockpit com a aeronave cm voo».

O seu efeito destruidor, a dar-se, nas condições que referimos, foi localizado provocando destruição dos materiais circundantes c muito provavelmente fogo (temperatura de explosão dc cerca dc 2500°C).

Para as quantidades de explosivo referidas, a quantidade de sulfato dc bário envolvida estaria entre 1,5 g a 4,5 g.

Os resultados de uma situação como atrás referimos são compatíveis com os testemunhos oculares.

O mesmo se passaria para uma detonação localizada, provocando uma abertura na parte inferior do cockpit, com a saída dc materiais incandescentes provenientes do seu interior.

A detonação já referida, a passar-se nas condições indicadas, poderia, se a mesma tivesse ocorrido sob o Jugar

do pilolo-comandantc, ter provocado estilhaços metálicos, daí a sua presença nos pés do referido piloto.

Considerando o que já foi dito no n.9 1 — detonação de uma pequena carga explosiva seguida do incêndio—, as situações apontadas são compatíveis. O Sismogel lea Gelatina IH são as únicas composições explosivas, fabricadas na SPEL, que usam o sulfato de bário (cf. o depoimento dc Fernando Matos, da SPEL, de 14 dc Março dc 1991, à IV CEIAC).

Ainda sobre a utilização deste explosivo, o perito Jorge Gonçalves, da SPEL, csclarcce-nos que «numa combustão lenia ou rápida (detonação) é previsível ficarem resíduos depositados dc sulfato de bário recobrindo as peças atingidas» (cf. o depoimento de Jorge Gonçalves, da SPEL, dc 14 dc Março dc 1991, à IV CEIAC).

Deste modo, a CEIAC entende dar por adquirido que toda a evidência recolhida aponta para a presença de um explosivo do tipo Gelatina III ou Sismogel I a bordo da aeronave sinistrada.

A CEIAC não teve meios para investigar qual a composição exacta do engenho utilizado, visto que o mesmo pode ter sido dc fabrico artesanal c teria sido consumido pelo incêndio. Contudo, os peritos da SPEL ouvidos na Comissão inclinam-se para uma granada fumo--fóslbro plastificado cm que a gelatina teria funcionado como indiciador (cf. os depoimentos dc Fernando Matos, dc Vidal da Silva c dc Jorge Gonçalves à IV CEIAC). Acresce que o perito dc explosivos coronel Oliveira Marques, cm depoimentos na CEIAC, esclareceu a mesma sobre os procedimentos dc colocação dc um engenho deste tipo c do tempo despendido nessa acção, que, em qualquer dos casos, não excederia os quinze minutos (cf. o dcpoimcnlo dc Oliveira Marques à III CEIAC).

Salicnic-sc que ficou perfeitamente esclarecida a hora dc marcação do voo no avião sinistrado pelo Gabinete do Primciro-Ministro, marcação essa que ocorreu pelas 12 horas do dia 4 dc Dezembro de 1980 (cf. os depoimentos dc Filipa Melo c Castro, fl. 287, o relatório da DGAC c dc Maria José Moreira Rato à III CEIAC).

CAPÍTULO VI Conclusões

36 — A CEIAC teve oportunidade dc consultar exaustivamente vários relatórios dc investigação de acidentes aéreos elaborados por peritos estrangeiros onde eram estabelecidas as causas dos desastres c, nomeadamente, aquele que vitimou o Presidente do Paquistão, Zia Ul-Haq, enviado pela Embaixada do Paquistão a pedido da CEIAC. Este relatório, elaborado por uma equipa dc peritos americanos c paquistaneses, conclui que, «na ausência dc explicações técnicas que expliquem a causa do desastre, a comissão julga que o acidente foi mais provavelmente causado pela perpetração dc um acto criminoso ou sabotagem» (cf. o relatório, fl. 18), depois dc ter encontrado nos destroços elementos químicos csuanhos à aeronave cm quantidades desabituais.

37 — Pelo que ficou aduzido no capítulo u, a IV CEIAC entende estar habilitada a concluir o seguinte:

l.9 As entidades oficiais construíram uma hipótese dc acidente sem fundamentação técnica plausível, porque, nos lermos do capítulo ir.

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a) Nao há base conclusiva para sustentar que sc tenha esgotado o combustível na asa esquerda, tudo levando a pensar exactamente o contrário;

b) Não colhem os alegados factores limitativos da normal performance c evolução do avião;

c) Não existe qualquer fundamento no processo para acusar o piloto de «homicídio por

negligência» (cf. o despacho do PGR dc 12

de Outubro dc 1981);

2.9 A CEIAC entende fazer uma avaliação muito crítica das investigações oficiais, porque, nos termos do capítulo ni:

a) São adiantadas conclusões através dc uma nota oficiosa sem estarem terminadas as investigações;

b) Alguns elementos pertencentes à investigação tinham nítidos juízos preconcebidos sobre as causas da tragédia;

c) Os destroços da aeronave não foram preservados, comprometendo o rigor das investigações;

d) Grave recusa da PJ c da DGAC cm retirar as devidas ilacções da detecção dc um rasto no terreno à vertical da trajectória do avião;

e) Não foi elaborado um estudo sobre a sequência dc embates da aeronave;

f) Os exames médico-lcgais foram deficientes c incompletos;

g) Muiias peças relevantes para a investigação sofreram descaminho por parte das entidades oficiais;

h) Não foi elaborado um estudo sobre a posição relativa das vítimas;

<') Não foi feita uma devida investigação no terreno;

j) Houve inaceitáveis pressões c até actos

intimidaiórios sobre testemunhas oculares ou outros depoentes; 0 Não foram feitas as necessárias análises laboratoriais às roupas das vítimas c ao avião sinistrado;

m) Não foi encontrada qualquer explicação para a retenção dos aviões dc José c Nuno Moreira;

n) Não foi dada explicação plausível para a morte dc Jose Moreira;

o) Não foi dada qualquer atenção a informações recolhidas pelo Serviço dc Informações do Exército dc que eslava algo cm preparação visando figura proeminente do Estado;

p) Notória insuficiência invesiigatória cm relação a alegados suspeitos;

3.° Entende, nos lermos do capítulo iv, expressar a sua estranheza pela reiterada obstrução aos seus trabalhos investigalórios por parle da juíza do TIC dc Loures;

4.9 Nos lermos do capítulo v, a CEIAC considera provados os seguintes facios:

a) Deflagração c visualização dc um incêndio cm voo na aeronave Cessna;

b) Libertação cm pleno voo dc um rasto dc fragmentos queimados provenientes do seu

interior c depositados nos terrenos através dc uma rotura na fuselagem e à vertical da sua trajectória dc voo:

c) Existência de estilhaços metálicos nos pés do piloto Jorge Albuquerque;

d) Ausência dc fracturas na generalidade dos corpos das vítimas;

e) Ausência dc comunicações entre o Cessna e a torre de controlo do Aeroporto após a descolagem;

f) Ausência dc sinais de sobrevivência das vítimas;

g) Deflagração de um incêndio autónomo na vivenda onde colide o nariz do avião;

h) Detecção dc fósforo na roupa das vítimas e de sulfato de bário cm zonas do cockpit do avião sinistrado;

/) O espaço dc tempo que mediou entre a marcação do voo do Primciro-MinisUo (12 horas do dia 4 dc Dezembro) e a descolagem do aparelho (20 horas e 20 minutos) é mais que suficiente para a execução dc uma saboiagcm, caso a mesma visasse o Primeiro-Minisiro.

38 — A conjugação dc lodos os elementos dados como provados c já referidos c não existindo qualquer explicação estritamente técnica para a produção acidental do sinistro constituem prova bastanlc c segura dc que;

a) Verificou-se uma deflagração no avião no momento da sua descolagem e voo ascendente;

b) Esta deflagração foi responsável pelo rompimento da fuselagem, por onde sc escoaram diversos fragmentos queimados;

c) A detecção do composto sulfato dc bário, matéria estranha à composição da aeronave c presente no explosivo Sismogcl I c Gelaúna III, é indiciadora dc que na origem dessa deflagração lerá estado um explosivo desic tipo;

d) Esta deflagração só pode ter resultado dc uma acção provocada com a intenção dc produzir uma sabotagem;

c) Tendo cm atenção os efeitos do engenho utilizado,

tudo indica que sc pretendeu simular um acidente

mortal à descolagem; f) Esta sabotagem leve por resultado a eliminação

física dc todos os ocupantes do avião c constituiu,

portanto, um atentado.

39 — O chocante somatório dc negligências, lacunas, omissões, sonegação dc evidências, intimidações e descaminho dc peças fundamentais do processo não podem de forma nenhuma cneonirar suporte na alegada falia de meios com que as autoridades sc tentaram justificar ou até na mera incompetência, podendo ser interpretadas como ocullação grave dc actos correlativos dc um crime.

CAPÍTULO VII

Propostas e recomendações

40 — Medidas a propor ao Plenário. — A Comissão deliberou propor ao Plenário, nos lermos do artigo 6." da Lei n.9 43/77, dc 18 dc Junho, c das pertinentes disposições regimentais, que a AR:

a) Dê toial publicidade aos autos, nos termos das disposições legais aplicáveis;

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b) Facullc dc imediato c integralmente os autos a Procuradoria-Geral da República, para que os possa examinar, avaliar os elementos deles constantes c proceder cm conformidade, nomeadamente à descoberta dos autores do atentado;

c) Solicite urgentemente às autoridades competentes uma sindicância à Cl responsável pela investigação técnica da DGAC, ao departamento do DCCB c da SC/ACV da PJ que instruiu o processo c investigou a ocorrência e ao IML, onde foram executadas as autópsias das vítimas, por

forma que sc apurem as responsabilidades que cabem a cada um destes organismos na inexplicável incúria, negligência dc investigação c eventual encobrimento dos factos;

d) Manifestar público reconhecimento pelas inestimáveis e abnegadas contribuições para o trabalho da Cl dos representantes dos familiares das vítimas, com especial destaque para o falecido Dr. Jorge Saldanha, pelo seu empenhamento c relevante contribuição técnica, para a Sr.* D. Maria Manuela Vaz Pires, que na sua dupla qualidade dc representante c dc familiar próximo das vítimas contribuiu com a sua presença c interesse cm todas as reuniões e diligencias da Comissão, c para o Sr. Augusto Cid, pelo seu contributo, que, por diversas vezes, ajudou a Comissão a prosseguir as diligências invcsiigaiórias, para os peritos que nas várias áreas prestaram um imprescindível auxílio para o apuramento da verdade, para todas as testemunhas que voluntariamente prestaram os necessários esclarecimentos à Comissão Parlamcniar de Inquérito c ainda para os vários funcionários e técnicos da AR que colaboraram com a Comissão Parlamentar.

O presente relatório foi aprovado por maioria, com votos a favor do PSD e do CDS e a abstenção dos restantes partidos e do Sr. Deputado Independente João Corregedor da Fonseca.

Palácio de São Bento, 21 dc Maio dc 1991. —Pela Comissão de Relatores, José Luís Bonifácio Ramos. — O Presidente da Comissão, Fernando Correia Afonso.

Declaração de voto

Embora as conclusões das várias entidades que procederam a averiguações sobre a tragédia ocorrida cm Camarate, cm 4 dc Dezembro dc 1980, apontassem no sentido de acidente à descolagem, a postura do PS, ncsia Comissão, foi sempre no sentido de viabilizar a realização dc diligências que procurassem a obtenção de novos indícios.

Para o efeito, apoiou iniciativas dc terceiros c lomou, através dos seus representantes na Comissão, a iniciativa de soliciuir várias diligencias, airavés dc requerimentos apresentados em comissão.

Ao PS interessa, acima dc tudo, o esclarecimento da verdade, não enfileirando cm juízos preconcebidos, sejam eles no sentido da conclusão dc acidente ou dc crime.

Ao surgirem novos indícios durante os trabalhos da IV Comissão, c dada a limitação dc meios inerentes à mesma, entende o PS que os autos deverão ser remetidos à Procuradoria-Geral da República, para que, tal como sc

propõe no relatório, «os possa examinar, avaliar os elementos deles consianics c proceder em conformidade». Quanto à menção expressa da descoberta dos autores do atentado, entende o PS que os novos indícios surgidos deverão ser tidos em conta como base para o prosseguimento das averiguações por parte das entidades competentes para o efeito, mas que será excessivo concluir, nesta sede, pela existência dc atentado.

Com efeito, se a determinado passo do relatório se critica a existência de juízos preconcebidos no sentido da conclusão da existência dc acidente à descolagem, que terão influenciado c limitado as averiguações cm determinado scnüdo, desvalorizando outros indícios, não deverá esta Comissão ler procedimento análogo, mas, outrossim, facultar à Procuradoria-Geral da República todos os indícios, que sem juízos preconcebidos possam determinar o apuramento final da verdade.

Sérias reservas nos merece a proposta dc sindicância às entidades averiguadoras, designadamente pelos pressupostos cm que assentam.

No relatório em apreciação aquelas entidades são acusadas dc incúria, negligência c eventual encobrimento dc factos, mas não podemos omitir alguns factores que, entre outros, enquadraram a sua actuação.

Assim, aquando da queda do avião, a área não foi devidamente isolada, proporcionando que vários populares que acorreram ao local remexessem os destroços c levassem até para suas casas peças ou fragmentos como recordação.

Por outro lado, a inexperiência em acidentes deste tipo c a limitação dc meios poderão ter impedido que, sobre o acontecimento, sc tivesse ido tão longe quanto possível na aplicação dc técnicas dc invcsúgaçüo existentes cm países com maior experiência cm casos desta natureza.

A juntar aos indícios então obtidos no sentido dc se concluir por acidente à descolagem, não podem ter sido alheios na formulação dessa convicção o comunicado do PSD emitido na própria noite do acidente e a nota oficiosa do Governo dc 13 dc Dezembro dc 1980.

Com efeito, não nos podemos esquecer que o malogrado Dr. Francisco Sá Carneiro era líder do PSD c Primciro--Ministro c que o PSD era o partido maioritário do Governo que emitiu a referida nota oficiosa, pelo que a influência destes documentos não poderia ser despicienda.

O PS apoia vivamente as propostas contidas no relatório no sentido dc ser dada loial publicidade aos aulos nos lermos das disposições legais aplicáveis c dc ser manifestado público reconhecimento a lodos os que colaboraram com a IV Comissão dc Inquérito.

O PS entende que, face aos novos indícios surgidos, as averiguações deverão prosseguir, airavés das entidades compcicntcs para o efeito, com o objectivo do loial apuramento da verdade, mas rejeita que, perante o conjunio dc indícios c os meios disponíveis, esta Comissão possa, desde já, apresentar conclusões determinantes.

Concluindo, o PS absiém-se na votação do relatório, na perspectiva dc viabilizar o desejável prosseguimento das averiguações, mas manifesta reservas quanto às oulras conclusões c propostas do relatório, com ressalva das que sc referem à publicidade dos aulos c ao público reconhecimento a lodos os que colaboraram com a Comissão.

Os Dcpuiados do PS: Rui Cunha — José Reis — Luís Covas — António Braga.

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Declaração de voto

Decorridos mais dc 10 anos apds a tragédia dc Camarate, terminaram os trabalhos da IV Comissão Eventual de Inquérito ao Acidente dc Camarate, ficando assim concluídas as investigações encetadas cm anteriores legislaturas.

Foram analisados inúmeros documentos emanados das entidades que, a diversos níveis, intervieram neste processo.

Foram ouvidos inúmeros depoimentos.

Discutiram-se exaustivamente todos os elementos constantes das actas.

Contudo, c apesar do referido, é meu entendimento que continuam a subsistir alguns factos insólitos, insuficientemente explicados, a exigir, por isso, melhor estudo e investigações.

Dei o meu acordo a todas as diligências propostas por outros membros da Comissão ou pelos representantes dos familiares das vítimas, com vista a uma profunda clarificação das causas da tragédia.

Estudei atentamente lodos os elementos anteriormente recolhidos, sobre os quais foi sugerida uma requalificação. Analisei com profundidade os dados novos que, entretanto, chegaram ao conhecimento da Comissão, sempre no intuito de contribuir para a descobcria da verdade.

Durante os trabalhos da Comissão surgiram informações que me sugerem dúvidas c suspeições.

Receio que factos menos claros estejam a ser instrumentalizados para a obtenção dc efeitos políticos circuns-uinciais c não para ajudar a fazer luz sobre as causas da tragedia.

Em consciência, porém, c sem prejuízo dc imprescindível investigação a proceder pelas autoridades competentes, os elementos constantes do processo não me permitem concluir com certeza pela existência dc um acto criminoso.

Considero que estão esgotados os meios dc que a Assembleia da República dispõe para aclarar as causas c circunstâncias cm que ocorreu a tragédia dc Camarate.

Entendo, no entanto, que, podendo haver dúvidas perante estas conclusões, compete às entidades oficiais especializadas c competentes debruçarem-se sobre os factos, no sentido da descoberta da verdade, em que, profundamente, os membros da Comissão se empenharam.

Assembleia da República, 24 dc Maio dc 1991.— O DcpuUido do PCP, António Mota.

Declaração de voto

A Assembleia da República promoveu, ao longo dc 10 anos, quatro comissões dc inquérito a fim dc serem apreciadas as causas c circunstâncias cm que ocorreu o acidente dc Camarate. A IV Comissão dc Inquérito, constituída cm 6 dc Julho dc 1988, deu por concluídos os seus trabalhos no dia 21 dc Maio dc 1991, tendo ultrapassado o prazo inicial dc seis meses para a apresentação do seu relatório.

Durante o período cm que integrei a.Comissão —c como o já havia feito nas uês anteriores comissões dc inquérito — prcocupci-mc em obter todos os esclarecimentos necessários que conuibuíssem para a descoberta

da verdade c para que, cm consciência, pudesse tirar conclusões claras sobre as causas e circunstâncias em que ocorreu a tragédia.

Como o meu apoio, c no cumprimento da resolução aprovada pela Assembleia da República c no respeito pelo seu próprio Regimento, a IV Comissão dc Inquérito apreciou relatórios oficiais, analisou cxlcnsa documentação, procedeu a audições c promoveu ainda outras diligências consideradas essenciais. As actas da Comissão são prova bastante da actividade desenvolvida durante o inquérito.

Dc acordo com a resolução da Assembleia da República de 6 dc Julho de 1988, aproveitei os trabalhos das I, II c III Comissões dc Inquérito c analisei o relatório da Dirccção-Gcral da Aeronáutica Civil, cujos responsáveis daquele departamento prestaram depoimentos sobre a maioria. Considerei ainda a posição assumida por pcriios estrangeiros c não deixei de tomar em consideração os depoimentos dos cientistas chamados à Comissão, bem como os relatórios científicos apresentados.

Depois dc estudar c ponderar todo o processo, e ao verificar que subsistem algumas dúvidas sobre matérias específicas c sobre algumas deficiências ocorridas durante as investigações oficiais efectuadas a seguir à queda do avião, considero, contudo, como um excesso que as negligências encontradas possam ser «interpretadas como ocultação grave dc actos correlativos dc um crime».

Uma vez que defendo a clarificação total e a busca da verdade sobre a tragédia de Camarate, entendo que toda a matéria constante dos autos desta IV Comissão dc Inquérito é insuficiente para sc determinar que tenha havido qualquer atentado.

Por esse motivo, congralulo-mc pelo facto dc todos os autos irem ser remetidos para a Procuradoria-Gcral da República, a fim dc serem devidamente analisados. De acordo com essa análise, a Procuradoria-Geral da República procederá cm conformidade e sc ordenar a reabertura de investigações oficiais deve o Governo c a Administração Pública providenciar no sentido dc proporcionarem àquela entidade lodos os meios necessários dc forma a facilitar as suas averiguações.

Entendo que a IV Comissão Eventual de Inquérito ao Acidente dc Camarate não deve propor a realização de sindicâncias a quem quer que seja, uma vez que ultrapassa quer a resolução que a criou quer o seu próprio regimento c por extravasar as competências próprias da Assembleia da República.

A publicidade dos autos merece a minha inteira aprovação.

Finalmente, expresso a opinião dc que uma tragédia desta natureza não deve, não pode, por motivos éticos, morais c culturais, ser objecto dc especulações c dc aproveiutmentos políticos ocasionais.

A minha abstenção na votação é determinada pelo facto de, perante as dúvidas c deficiências referidas, ser de opinião que as autoridades competentes, como a Procuradoria-Gcral da República, devem ser chamadas a pronunciar-se.

Assembleia da República, 28 dc Maio de 1991.— O Deputado Independente, João Corregedor da Fonseca.

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